diga que você é um deles

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UWEM AKPAN DIGA QUE VOCÊ É UM DELES A realidade das crianças em uma África devastada pela guerra

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De Uwen Akpan

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Page 1: Diga que você é um deles

U W E M A K P A N

D I G A Q U E V O C ÊÉ U M D E L E S

U W E M A K P A N

A realidade das crianças em uma África devastada pela guerra

UW

EM

AK

PA

ND

IGA

QU

E VOCÊ É U

M D

ELES

UWEM AKPAN nasceu em Ikot Akpan Eda, no sul da Nigéria. Após estudar � loso� a e inglês nas Universidades de Creighton e Gonzaga, cursou teologia por três anos na Universidade Católica da África Oriental. Ordenado padre jesuíta em 2003, fez mestrado em produção textual na Universidade de Michigan, em 2006. “O quarto dos meus pais”, uma história incluída nessa sua primeira coletânea, foi um dos cinco contos de escritores africanos escolhidos como � nalistas para o concurso Caine Prize for African Writing. Em 2007, começou a lecionar em um seminário em Harare, no Zimbábue.

Angélique Kidjo, vencedora do Grammy Award e estrela do gênero world music, escreveu uma canção original, Agbalagba, inspirada em Diga que você é um deles. Para baixar gratuitamente a canção e também uma gravação em áudio de “Uma ceia de Natal”, interpretada por Uwem Akpan, visite o site

www.sayyoureoneofthem.comwww.digaquevoceeumdeles.com.br

O primeiro conto publicado de Uwem Akpan, “Uma ceia de Natal”, apareceu no número da revista The New Yorker dedicado aos estreantes de � cção, em 2005. O retrato pintado pela história de uma família que vive num barracão improvisado no Quênia urbano e de sua tentativa de encontrar presentes de qualquer tipo para a iminente festa de Natal dá uma realidade prosaica às circunstâncias mais extremas – e assinala a chegada de um escritor de talento estonteante.“O quarto dos meus pais” é o relato de uma menina ruandense sobre a luta de sua família para manter uma fachada de normalidade em meio a atos atrozes. Em “Engordando para o Gabão”, um irmão e uma irmã se confrontam com a tentativa do tio de vendê-los como escravos. “Carros fúnebres de luxo” cria um microcosmo da África dentro de um ônibus cheio de passageiros refugiados e nos apresenta a um adolescente muçulmano que invoca a fé para suportar uma viagem traiçoeira pela Nigéria. “Que língua é essa?” revela o desgaste emocional do con� ito cristão-muçulmano na Etiópia pelos olhos de amigas de infância.Cada história é um testemunho da sabedoria e da resistência das crianças, mesmo diante das situações mais a� itivas que nosso planeta pode oferecer.

“– Mas, mamãe, você me disse que só mulher prostituta sai de noite.– Monique, eu já disse: nada de perguntas hoje.Ela para e � ca olhando para mim. Como estou a ponto de abrir a boca

novamente, mamãe grita:– Cale-se! Vá lá se sentar com seu irmão.Mamãe nunca gritou comigo. Hoje ela está estranha. As lágrimas brilham

em seus olhos. Apanho o frasco de Amour Bruxelles, o perfume que papai deu a ela porque a ama. Peço a mamãe que ponha um pouco de perfume em mim, mas ela se recusa.

– Quando eles perguntarem – recomenda, severa, sem olhar para mim –, diga que você é um deles, ouviu?

– Quem?– Qualquer um. Você precisa aprender a cuidar de Jean, Monique. Você

precisa mesmo, entende?”

TRECHO EXTRAÍDO DO CONTO “O QUARTO DOS MEUS PAIS”

Em cinco contos, o autor narra as mazelas de uma África desolada pelas guerras sob o olhar de suas maiores vítimas: as crianças.

De forma comovente, os contos humanizam os perigos da pobreza e da violência, revelando uma prosa delicada e ao mesmo tempo chocante.

Page 2: Diga que você é um deles

U W E M A K P A N

Tradução

Alice Xavier

D I G A Q U E V O C Ê

É U M D E L E SA realidade das crianças em uma África

devastada pela guerra

Page 3: Diga que você é um deles

© 2008 by Uwem Akpan

Direitos de tradução reservados à Ediouro Publicações Ltda., 2009

Diretor: Edaury Cruz

Assistente editorial: Fernanda Cardoso

Coordenadora de produção: Adriane Gozzo

Assistente de produção: Juliana Campoi

Preparação de texto: Tuca Faria

Revisão: Rosane Albert

Editora de arte: Ana Dobón

Projeto gráfi co e diagramação: A2

Capa: Keith Hayes

Imagens de capa e lombada: David Sacks

Imagem da orelha: Comfort Ukpong

Mapa: John Barnett

Agradecimentos ao � e New Yorker, onde os contos “Uma ceia de Natal” e “O quarto

dos meus pais” foram publicados pela primeira vez, sofrendo alterações para esta edição.

“Uma ceia de Natal” também foi publicado no Kwani? e no Guardian (Nigéria).

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Akpan, Uwem Diga que você é um deles / Uwem Akpan ; tradução Alice Xavier. -- São Paulo : Ediouro, 2009. Título original: Say you’re one of them. ISBN 978-85-00-01629-5 1. Contos africanos 2. Crianças - África - Ficção 3. Ficção nigeriana em inglês I. Título.

09-02697 CDD-823.92

Índice para catálogo sistemático:1. Contos : Literatura nigeriana em inglês

823.92

Ediouro Publicações Ltda.

Rua Nova Jerusalém, 345

Bonsucesso - Rio de Janeiro - RJ - CEP: 21042-235

Tel.: (21) 3882-8200 - Fax: (21)3882-8212/8313

www.ediouro.com.br

Page 4: Diga que você é um deles

Para meus pais, Linus e Margaret, cujo

amor é um mundo de histórias entre eles.

E para meu tio, George, que esteve lá.

Page 5: Diga que você é um deles

S

Uma ceia de Natal

Engordando para o Gabão

Que língua é essa?

Carros fúnebres de luxo

O quarto dos meus pais

Posfácio

Agradecimentos

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Page 9: Diga que você é um deles

Se o nosso Deus, a quem servimos, for capaz de nos livrar,

ele nos livrará da causticante fornalha em chamas e

do teu poder, ó rei; e mesmo que ele não o seja, então

deves saber, ó rei, que não serviremos a teu deus, nem

adoraremos a estátua que tu erigiste.

DANIEL 3:17-18

O que é bom foi declarado a ti: que pratiques a justiça,

ames com ternura e andes humildemente com o teu Deus.

MIQUEIAS 6:8

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AGORA QUE MINHA IRMÃ MAIS VELHA, Maisha, tinha doze anos, ne-

nhum de nós sabia mais como se relacionar com ela. Maisha nunca perdoou

nossos pais por não terem dinheiro sufi ciente para mandá-la à escola. Ela anda-

va se comportando como um gato que está voltando ao estado selvagem: cada

vez aparecia menos em casa e fi cava só o tempo de trocar de roupa e me dar

algum dinheiro para entregar aos nossos pais. Quando ia em casa, Maisha os

evitava tanto quanto possível, como se a presença deles lhe lembrasse muitas

coisas na vida que dependiam de dinheiro. No entanto, embora respondesse

mal a papai de vez em quando, ela nunca dizia nada a mamãe. Quem às vezes

se dispunha a provocá-la era mamãe.

– Malaya! Puta! Você ainda nem tem peito! – dizia mamãe.

Maisha fazia de conta que não ouvia.

Seus pensamentos ela compartilhava com Naema, nossa irmã de dez anos,

mais do que com todos nós outros somados. Em geral, falavam sobre o que

uma menina de rua deve fazer e o que não deve. Maisha deixava Naema experi-

mentar seus sapatos de salto alto, mostrava-lhe como pintar o rosto, como usar

dentifrício e escova de dente. Dizia a Naema que fugisse de qualquer homem

que a espancasse, não importando quanto dinheiro lhe oferecesse; e que ela iria

tratá-la como tratava mamãe se Naema virasse adulta para ter uma quantidade

exagerada de fi lhos. Dizia-lhe que mais valia passar fome que sair com qual-

quer homem sem usar preservativo.

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Uwem Akpan

Quando estava trabalhando, no entanto, fazia de conta que não conhecia

Naema, talvez porque ela lhe recordasse a casa, ou por não querer que visse

que a irmã mais velha não era tão chique e elegante quanto gostaria de parecer.

A mim Maisha tolerava mais fora de casa que dentro. Por mais esfarrapado que

eu estivesse, podia conversar com minha irmã na calçada. Um menino de oito

anos não atrapalhava quando ela estava esperando fregueses. Nós sabíamos

fi ngir que éramos estranhos – apenas um menino de rua conversando com

uma prostituta.

Mesmo assim, nossa família machokosh tinha sorte. Diferentemente da maio-

ria, nossa família sem-teto se mantivera reunida – pelo menos até aquele Natal.

O SOL TINHA MORRIDO, no anoitecer da véspera de Natal. O mau tem-

po desorganizara as estações do ano, e Nairóbi estava mergulhada numa en-

chente baixa. A chuva leve de dezembro tamborilava em nosso telhado de lona

encerada. Eu estava sentado no chão do barraco, que fi cava sobre uma laje de

cimento no fi nal de um beco, encostado nos fundos de uma velha fábrica de

tijolos. Os ventos ocasionais faziam inchar as paredes de polietileno marrom.

O chão se achava forrado com as almofadas que eu havia catado no lixo da

rua Biashara. À noite, enrolávamos o bordo do encerado para deixar entrar o

brilho das luzes de segurança da fábrica. Uma tábua que servia de porta fi cava

encostada no muro.

Um trovão acordou mamãe. Ela se levantou preguiçosamente, retirando as

mãos do baú de Maisha, que tinha fi cado segurando enquanto dormia. O baú

era azul-marinho, com reforços e rodinhas de bronze, e ocupava grande parte

da área de moradia. Em pânico, mamãe saiu tateando as paredes, e foi apalpar

os gêmeos de dois anos – meu irmão Otieno e minha irmã Atieno –, e Baba,

meu pai; os três dormiam, embolados uns nos outros como fi lhotinhos de ca-

chorro. Mamãe procurava Baby. A camiseta branca, que ela ganhou três meses

atrás, quando Baby nasceu, tinha duas manchas de leite na frente. Naquele

momento mamãe deve ter lembrado que ele estava com Maisha e Naema. Re-

laxando, bocejou e espreguiçou-se, indo atingir um caibro de cortiça. Uma das

pedras que ancoravam nosso telhado caiu para o lado de fora.

Nesse momento, mamãe botou as mãos debaixo da shuka e tornou a amar-

rar em volta da cintura os cordões da bolsa de dinheiro que o sono e o álcool

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tinham tirado do lugar. Ficou remexendo em nossa caixa de papelão da família,

apanhando roupas, sapatos e meu novo uniforme escolar, enrolado em docu-

mentos inúteis que Baba roubara de bolsos alheios. Mamãe continuou a pro-

curar, e o conteúdo da caixa foi se empilhando em cima de Baba e dos gêmeos.

Ela então desencavou uma lata de cola de sapateiro New Suntan. A cola foi

presente de Natal dos fi lhos de uns machokosh que moravam ali perto.

Mamãe sorriu para a cola e me deu uma piscada, empurrando a língua atra-

vés do buraco deixado pelos dentes que faltavam. Abriu com destreza a tampa

da lata, e o barraco foi invadido pelo cheiro de sapataria. Fiquei olhando mamãe

derramar kabire em minha “mamadeira” de plástico. À luz mortiça, a cola brilha-

va, quente e amarela. Embora minha mãe ainda parecesse embriagada da festa

da noite anterior, suas mãos estavam tão fi rmes que as volumosas pulseiras feitas

de guirlandas de papel-alumínio, presente da festa natalina da igreja, nem sequer

balançaram. Depois de haver derramado bastante, cortou o jorro de cola com

uma inclinação da lata. O restinho da cola que entrou no frasco afi nou, enrolan-

do-se, e fi cou pendurado no ar como uma estalactite. Ela cobriu o plástico com a

palma da mão, para conservar a força da cola. Cheirar cola ia matar minha fome

se Maisha não voltasse para casa com uma ceia de Natal para nós.

Mamãe se virou para Baba, empurrando-lhe o corpo com o pé.

– Acorde, faz dias que você não trabalha!

Baba se virou e gemeu. Seus pés estavam esticados para fora do barraco,

por baixo da parede impermeável. Os dedões haviam escapado dos tênis mo-

lhados. Mamãe o cutucou de novo com o pé, e ele começou a mover as pernas

como se estivesse caminhando no sono.

Lá fora, nossa cadela rosnou. Mamãe estalou os dedos, e a cadela entrou, a

barriga madura da prenhez se balançando como roupa molhada posta a secar

no varal e enfunada pelo vento. Perita em descobrir cadelas prenhas, minha

mãe passara um mês e meio tentando atraí-la com carinhos e comida, até que

ela se tornou nossa; mamãe esperava vender os fi lhotes e conseguir dinheiro

para comprar meus livros escolares. Agora a cadela estava lambendo o rosto de

Atieno. Mamãe apalpou a barriga do animal com os dedos em gancho, como

uma parteira nativa.

– Ah, Simba, o parto está caçando você – ela cochichou nos ouvidos da

cachorrinha. – Como a escola está caçando meu fi lho.

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Empurrou a cadela para fora. Simba se deitou, cobrindo com seu calor os

pés de Baba. De vez em quando dava um latido, para evitar que outros cães

mexessem em nossa cozinha móvel, encostada na parede da loja.

– Jigana, ontem à noite você teve sorte com Baby? – mamãe me perguntou

de repente.

– Um pouco – tranquilizei-a e entreguei-lhe um punhado de moedas e de

cédulas.

Ela meteu o dinheiro embaixo da shuka; o zíper da bolsa soltou dois peidos

ruidosos.

Embora no Natal as pessoas fossem mais generosas com os mendigos, nos-

sa verdadeira isca era Baby. Nós nos revezávamos em empurrá-lo na cara dos

passantes.

– Ah, fi lho, você nunca vai ver um Natal como o deste ano. – Seu rosto se

abriu num sorriso. – No ano que vem vamos pagar a mensalidade da escola.

Não vai ter nada de fi car zanzando por aí. Nem fi car amolengando o miolo

com cola, garoto. Você voltará pra escola! A chuva te pegou com Baby?

– A chuva me pegou aqui.

– E Baby? Quem tá carregando ele?

– Naema.

– E Maisha? Por onde ela anda, que não vem dar plantão com a criança?

– Mamãe, ela está muito zangada.

– Essa menina tá bate que bate na minha cabeça. Agora faz três mês que

nem me dá bom-dia. Que bicho tá cumeno o juízo dela?

Às vezes as palavras de mamãe saíam como se ela estivesse bocejando, por

causa da brecha larga da boca banguela.

– Ora, só porque agora ela rebola que rebola o corpo pros homens endi-

nheirados, tá achando que me dá a volta? Diz aí, por que Maisha se negou a

fi car com Baby?

– Ela diz que é exploração infantil.

– Exploração infantil? Maisha agora é funcionária de ONG? Essa menina

gosta mais de ser puta que de pedir esmola com Baby?

– Sei não. Ela foi embora com os clientes turistas. Hoje foi tudo gente bran-

ca de verdade, só musungu. Com macaco e tudo.

Mamãe cuspiu pela abertura da porta.

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– Eca, esses aí não tomam jeito! Conheço eles. Nunca pagam a tarifa de

Natal, e ainda por cima deixam o motorista trepar com ela. Jigana, fala com

essa menina. Ou você não quer completar a escola? Ela não pode te dar só o

uniforme.

Eu concordei balançando a cabeça. Em dois dias já havia experimentado

oito vezes o uniforme, louco para voltar às aulas. A camisa de xadrez branco e

verde e o short verde-oliva tinham fi cado amassados. Meti a mão na caixa de

papelão e alisei um pedaço da roupa que se destacava da bagunça.

– Por que você está bagunçando o uniforme tão bonito? – perguntou ma-

mãe. – Tem paciência, garoto. A escola tá quase chegando.

Afundou a mão dentro da caixa, enterrando o pacote.

– Maisha gosta de você – disse baixinho. – Por favor, Jigana, diz pra ela que

você precisa de mais coisas: sapatos, a taxa da associação dos professores, a

taxa do preparatório. A gente tem que poupar todo o dinheiro do Natal pra dar

instrução a você, o primeiro fi lho homem. Diga a Maisha que pare de comprar

aquelas roupas de marca, tão ridículas, roupa montada, roupa com cheiro de

gente branca morta, e que nos entregue o dinheiro.

Dizendo isso, começou a dar socos enfurecidos na tampa do baú. O baú

era uma grande obstrução, a única mobília que tínhamos com forma sólida e

defi nida. Havia um ano que Maisha trouxera o baú para casa, e antes de abri-lo

sempre mandava a gente sair do barraco. Nenhum de nós conhecia seu con-

teúdo secreto, a não ser o perfume insistente. Para nós ele continha mistério

e consolação, sentimentos que iam crescendo a cada vez que Maisha chegava

a casa com mais coisas. Às vezes, quando ela não aparecia por muito tempo,

nossa angústia transformava o baú numa garantia da volta dela.

– Malaya! Prostituta! É só ela não voltar que eu quebro esse caixão hoje de

noite mesmo! – dizia mamãe, furiosa, cuspindo no cadeado de segredo e sacu-

dindo a arca até nós ouvirmos os objetos baterem uns nos outros.

Na ausência de Maisha ela sempre descontava a raiva no baú. Estiquei os

braços para agarrar as mãos dela.

– Ah, seu cafetão! – rosnou. – Você defende a malaya.

– Não é culpa dela. São turistas musungu.

– Acho bom você voltar pra escola antes de ela fugir.

– Vou ter de contar pra ela o que você disse.

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UWEM AKPAN nasceu em Ikot Akpan Eda, no sul da Nigéria. Após estudar � loso� a e inglês nas Universidades de Creighton e Gonzaga, cursou teologia por três anos na Universidade Católica da África Oriental. Ordenado padre jesuíta em 2003, fez mestrado em produção textual na Universidade de Michigan, em 2006. “O quarto dos meus pais”, uma história incluída nessa sua primeira coletânea, foi um dos cinco contos de escritores africanos escolhidos como � nalistas para o concurso Caine Prize for African Writing. Em 2007, começou a lecionar em um seminário em Harare, no Zimbábue.

Angélique Kidjo, vencedora do Grammy Award e estrela do gênero world music, escreveu uma canção original, Agbalagba, inspirada em Diga que você é um deles. Para baixar gratuitamente a canção e também uma gravação em áudio de “Uma ceia de Natal”, interpretada por Uwem Akpan, visite o site

www.sayyoureoneofthem.comwww.digaquevoceeumdeles.com.br

O primeiro conto publicado de Uwem Akpan, “Uma ceia de Natal”, apareceu no número da revista The New Yorker dedicado aos estreantes de � cção, em 2005. O retrato pintado pela história de uma família que vive num barracão improvisado no Quênia urbano e de sua tentativa de encontrar presentes de qualquer tipo para a iminente festa de Natal dá uma realidade prosaica às circunstâncias mais extremas – e assinala a chegada de um escritor de talento estonteante.“O quarto dos meus pais” é o relato de uma menina ruandense sobre a luta de sua família para manter uma fachada de normalidade em meio a atos atrozes. Em “Engordando para o Gabão”, um irmão e uma irmã se confrontam com a tentativa do tio de vendê-los como escravos. “Carros fúnebres de luxo” cria um microcosmo da África dentro de um ônibus cheio de passageiros refugiados e nos apresenta a um adolescente muçulmano que invoca a fé para suportar uma viagem traiçoeira pela Nigéria. “Que língua é essa?” revela o desgaste emocional do con� ito cristão-muçulmano na Etiópia pelos olhos de amigas de infância.Cada história é um testemunho da sabedoria e da resistência das crianças, mesmo diante das situações mais a� itivas que nosso planeta pode oferecer.

“– Mas, mamãe, você me disse que só mulher prostituta sai de noite.– Monique, eu já disse: nada de perguntas hoje.Ela para e � ca olhando para mim. Como estou a ponto de abrir a boca

novamente, mamãe grita:– Cale-se! Vá lá se sentar com seu irmão.Mamãe nunca gritou comigo. Hoje ela está estranha. As lágrimas brilham

em seus olhos. Apanho o frasco de Amour Bruxelles, o perfume que papai deu a ela porque a ama. Peço a mamãe que ponha um pouco de perfume em mim, mas ela se recusa.

– Quando eles perguntarem – recomenda, severa, sem olhar para mim –, diga que você é um deles, ouviu?

– Quem?– Qualquer um. Você precisa aprender a cuidar de Jean, Monique. Você

precisa mesmo, entende?”

TRECHO EXTRAÍDO DO CONTO “O QUARTO DOS MEUS PAIS”

Em cinco contos, o autor narra as mazelas de uma África desolada pelas guerras sob o olhar de suas maiores vítimas: as crianças.

De forma comovente, os contos humanizam os perigos da pobreza e da violência, revelando uma prosa delicada e ao mesmo tempo chocante.