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ponto_e_virgula dezembro 2007 EDIÇÃO 9 Para entender o fenômeno do beijar sem compromisso Bovary de Gustave Flaubert conseguiria, hoje, um álibi na internet Os “enlatados” que fazem bem A primeira parada é o consulado última edição! (do ano. ou não)

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Page 1: Dezembro2007

ponto_e_virgula dezembro 2007 EDIÇÃO 9

Para entender o fenômeno do beijar sem compromisso

Bovary de Gustave Flaubert conseguiria, hoje, um álibi

na internet

Os “enlatados” que fazem bem

A primeira parada é o consulado

última edição!

(do ano. ou não)

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ponto_e_virgula MÊS 2007 EDIÇÃO 9

Adriana SeguroJuliana Sakae

Luisa FreyLucas SarmanhoMarina Almeida

Marina VeshagemPedro Santos

Fernanda VolkerlingLuisa Frey

Marina Veshagem

Carolina MouraJuliana SakaeThiago Bora

Juliana Sakae

Adriana SeguroLucas SarmanhoMarina AlmeidaRodrigo Tonetti

Fernanda DutraMaurício TussiMatheus Joffre

;www.revistapontoevirgula.com

Florianópolis - SC

ESPAÇOS NESTA EDIÇÃO

Perfil

Cinema

Literatura

Viagem

Criação

Fotografia

Entrevista

Causos&Coisas

Quer ficar comigo?

Intercâmbio Gastronômico

Madame Infidelidade.comJoel Silveira: A víbora que injetou seu veneno no jornalismo brasileiro

Cineterapia: O Virgem de 40 Anos, Huckabees e Hora de Voltar

Pai rico, pai pobre: conselhos para lidar com o emprego, o mundo dos negócios e das finanças e, principalmente, o dinheiro

Lisa Belkin e os contos reais do New York Times

Antes da viagem propriamente dita, uma aventura no consulado norte-americano

Na última ediçlão (ou não) da revista, uma homenagem à equipe ponto-e-vírgula

Assim como fazia Madame Bovary, hoje se paga por álibis; desta vez pela internet

À beira da piscina, the fire is out of control

Prazer momentâneo: o “ficar” como comportamento da sociedade contemporânea

Comilanças, guloseimas, pratos típicos e até estranhos na terra da batata

[sumár io]

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carta ao leitor

[car ta ao le i tor ]

Ponto final

A ponto-e-vírgula, nascida de uma crise coletiva na faculdade de Jornalismo, encerra (ou não) o expediente para análise psiquiátrica. Enlouquecidos, os escritores, diagramadores, editores e revisores esperneiam-se; pedem um tempo para tratamento médico após nove meses de intensa atividade.

Foram duas dezenas de reuniões nervosas, alguns litros de cafeína e novecentos e-mails de discussão para criar -- e recriar -- a ponto-e-vírgula. Chegávamos ao dia primeiro de cada mês exaustos, porém orgulhosos com a filha.

Não sabemos quando, mas nossa primogênita tornou-se um produto. Repetiria a palavra até que esta gritasse o conceito por trás das letras. Funcionalista, tecnicista, pragmatista e tantos -istas... Palavras tão presentes no nosso cotidiano mas contrárias ao propósito inicial da revista.

Faremos uma pausa. A ponto-e-vírgula sentará em um divã ao lado de Morin, Hall e Bourdieu até encontrarmos uma resposta.

O bebê, vulgo cabeçudo, terá nosso carinho eterno.

Você, leitor, deguste nossa-última-ou-não edição;

A Redação

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“Eu não levaria João Gil-berto de forma ne-nhuma, com aquele

violãozinho, uma coisa horrorosa. Ali-ás, o melhor talvez fosse deixá-lo numa ilha deserta, sem violão! Assim, eu po-deria ir embora.” Essa é a resposta de Joel Silveira para quem ele não leva-ria para uma ilha deserta. É estranho como nada, além das próprias palavras de Joel, pode descrevê-lo tão bem. Se o estilo de escrever do jornalista o revela, também o torna um dos maiores repór-teres que o Brasil já teve.

Joel Silveira - mais de 60 anos de carreira - era Sergipano. Nasceu em 23 de setembro de 1918 e faleceu em 15 de agosto de 2007. O jornalista mudou-se para o Rio de Janeiro em 1937 e traba-lhou em grandes publicações, como O Cruzeiro, Diretrizes, Última Hora, O Es-tado de São Paulo, Correio da Manhã e a revista Manchete. No apartamento da Rua Francisco Sá, em Copacabana, no Rio de Janeiro, o “homem mais temido do Brasil” – apelido dado por Assis Cha-teaubriand - passou seus últimos anos. Somente a velhice conseguiu enganar o jornalista; um problema não diagnostica-do nas pernas dificultava seu caminhar, além de uma doença na próstata, diabe-

te e uma catarata que o impedia de ler. Por ironia - em se tratando de

Joel não poderia deixar de ser – a casa do repórter parece uma fortaleza forma-da por uma biblioteca com cerca de 18 mil volumes. “Só falta livro no banheiro e na cozinha. Mas eu já li tudo, não tem mais nada do que ler”. Joel viveu a his-tória brasileira das últimas décadas. Di-versas dessas situações inusitadas ele contou em entrevistas.

As histórias da víbora

Como réptil que se preze, Joel cultivou alguns desafetos. É o caso do dramaturgo e jornalista Nelson Rodri-gues, com quem trabalhou no Diários Associados. Joel narrou algumas ve-zes a ocasião de troca de palavras entre os dois. “Uma vez, eu estava escreven-do alguma coisa - escrevo depressa na máquina. De repente, Nelson Rodrigues caminha em minha direção, fica para-do diante de mim com um cigarro pen-dendo na boca e exclama: Patético! Em seguida, vai embora, em silêncio. Quan-do acabei de escrever, fui até a mesa de Nelson – que batia à máquina com dois dedos – e fiz a mesma coisa. Fiquei em silêncio vendo-o escrever. Depois, disse,

simplesmente: ‘Dramático!’. Fui embo-ra. Nosso único diálogo resumiu-se a estas duas exclamações – ‘patético’ e ‘dramático’.”

Conta-se também que certa vez o repórter teria roubado a amante de JK. Joel confirmou a história, não se sabe se por vaidade ou veracidade. “É, mas depois nós fizemos as pazes no Panamá. Ele tinha acabado de ser eleito governa-dor de Minas Gerais (1950) e queria le-var a fulana. E eu disse para ela ‘Como é, você quer ir pra Minas? Tem que es-colher’. E ela escolheu.”

Quem vai para a Guerra?

Quando o Brasil entrou na Se-gunda Guerra Mundial, o Diários As-sociados – rede de jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão de Assis Chateaubriand – tinha três opções de repórteres experientes para enviar para a cobertura: Carlos Lacerda, David Nas-ser e Edmar Morel. Ele escolheu Joel Silveira, que tinha 26 anos de idade e vinte dias de jornal. Ao despedir-se dele, o patrão alertava: “O senhor vai para a guerra, mas não me morra, seu Silveira! Não me morra! Repórter é para mandar notícia, não é para morrer!”

[per f i l ]

O repórter dissidenteA vida, as histórias e a personalidade da brilhante víbora do jornalismo

por Marina Veshagem

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“Estive no front nove meses e 11 dias. Naquele tempo era preciso acompanhar as tropas, o jor-nalista era como um soldado, estava lá na fren-te com eles. Era um trabalho terrível. Era risco verdadeiro. A guerra é uma coisa horrorosa. O pior não é propriamente o combate. O pior é por onde a guerra passa, o que ela deixa para trás. É a subversão de todos os valores. A gente vê um pai entregando a filha por uma barra de choco-late, uma coisa horrorosa”, relatou Joel sobre a experiência.

A repressão da Ditadura

No período do Regime Militar (1964 - 1984) Joel Silveira foi preso sete vezes. Só depois do AI-5 (1968), foram cinco prisões: três pelo Exér-cito, uma pela Marinha e outra pela Aeronáu-tica. Para o jornalista, a pergunta era sempre a mesma. “Você é comunista?”. Ele dizia: “Eu não sou comunista, não pertenço ao Partido Co-munista. Os senhores estão cansados de saber que eu sou é socialista, democrático. Podem me prender, fazer o diabo, mas eu não vou dizer que não sou. Sou contra esse cinismo, porque não considero revolução. Os senhores deram foi um golpe”. Apesar disso, Joel afirmou nunca ter so-frido maus-tratos, principalmente porque vários dos golpistas eram da FEB (Força Expedicio-nária Brasileira) – que participou da Segunda

Guerra Mundial – e Joel ganhou prestígio com a cobertura do conflito. O período mais longo que o repórter ficou preso foi em 13 de dezembro de 1968, o dia do AI-5. Ele passou o fim do ano na cadeia e só saiu na véspera do carnaval.

O repórter pobre

Joel orgulhava-se de refutar a crença de que jornalista que não enriquecesse seria bur-ro. “Bom, então eu sou uma besta quadrada, porque sou o jornalista mais pobre do Brasil”. O repórter garantia nunca ter sido jornalista para adquirir status, o que considerava trair a profis-são. “Podem me chamar de feio - o que eu sou. É uma opinião. Podem dizer que eu escrevo mal, é uma opinião, eu respeito. Agora, dizer que eu sou desonesto, isso não. Aí eu processo!” Joel deve o respeito adquirido como jorna-lista a sua honestidade e fidelidade à profissão. O “jornalista mais pobre do Brasil” foi agracia-do com o prêmio Machado de Assis em 1998, o mais importante da Academia Brasileira de Le-tras, pelo conjunto de sua obra. Foi ganhador dos prêmios Líbero Badaró, Prêmio Esso Espe-cial, Prêmio Jabuti e o Golfinho de Ouro. Também foi homenageado pelo Segundo Congresso Inter-nacional de Jornalismo Investigativo, realizado entre os dias 17 e 19 de maio de 2007 pela Asso-ciação Brasileira de Jornalismo Investigativo. ;

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a) Estou entediado, mas sou felizb) Por que a grama é verde?c) Estou virando um vegetal

Alguns enlatados americanos, na hora certa, melhoram o humor e proporcionam horas de reflexão sem dor. Existencialismo, virgindade e depressão são trata-

dos em Huckabees, Hora de Voltar e O Virgem de 40 Anos de uma maneira irreverente, com bom-humor, lágrimas e, claro, sexo. Se você enquadra o seu humor atual em alguma das alternativas, alugue um destes filmes e boa sorte.

cineterapia

O Virgem de 40 Anos

Um homem de meia-idade que coleciona super-heróis na caixa original, assiste a vários pornôs por dia e vai ao trabalho de bicicleta e capacete, é o protagonista de uma história clás-sica de superação, contada de maneira pouco ortodoxa.

Andy Stitzer (Steve Carrel, o Evan de Todo Poderoso 2) é metódico, politicamente correto e tem seu apartamento próprio. Sua vida está sob controle, até o dia em que os colegas de trabalho descobrem que ele é virgem. David (Paul Rudd, o Mike de Friends), Jay (Romany Malco) e Cal (Seth Rogan) fazem de tudo para que Andy ten-ha sua primeira noite com uma mulher. O filme

aborda a virgindade de uma forma singular, sem cair nos clichês de comédias românticas. No primeiro dia em que Andy vai ao trabalho, depois que todos sabem do seu segredo, o es-pectador espera a discriminação ou sarcas-mo e encontra uma cena irreverente: “o seu problema é que você coloca a vagina em um pedestal”, diz o colega de trabalho.

O Virgem de 40 anos é ideal para ver com os amigos em um domingo à tarde ou naque-las madrugadas sem absolutamente nada para fazer. Se você sabe onde estará daqui a dez dias às 10h49, tem dominação sobre sua rotina e acha que sua vida é maravilhosa por isso, assista ao filme, “tire a vagina do pedes-tal” and let the sun shine.

Assista tambémBoratNão assistaAmerican Pie 4

a) “Let the sun shine”

por Juliana Sakae

[ cinema ] 6

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I Heart Huckabees

Albert Markovski (Jason Schwartzman, o Luis XV de Maria Antonieta) está intrigado com as coin-cidências da vida e procura uma dupla de “existen-cialistas”, Bernard (Dustin Hoffman) e Vivian Jaffe (Lily Tomlin, de A Família Buscapé). Aos poucos, Markovski descobre que a vida é muito mais compl-exa do que pensa, e o espectador mergulha em teorias bizarras sem questionar sua veracidade – no filme, as teorias encaixam-se ao roteiro e à trilha sonora. A comédia é sutil, sem procurar a piada clichê, mas você conseguirá rir (se não tiver preconceito). O bom-beiro Tommy Corn (Mark Wahlberg, de O Planeta dos Macacos) torna-se o melhor amigo de Markovski, na busca por respostas existenciais. Naomi Watts e Jude Law também estão presentes em personagens este-reotipados – Watts é uma garota loira e ignorante e Law o dono do shopping Huckabees, machista e mul-herengo, mas ambos reforçam a singularidade do protagonista e seu companheiro.

I Heart Huckabees é ideal para quando você quer rir sem se esforçar, e está de saco cheio do pastelão norte-americano. A trilha sonora ajuda você a lem-brar do filme por muito tempo e a refletir sobre coin-cidências, destino e transcendentalismo – mesmo que você não acredite em absolutamente nada disso.

Assista tambémBrilho Eterno de Uma Mente Sem LembrançasNão assistaAs Branquelas Um Salão do Barulho

Garden State (Hora de Voltar)

Andrew Largeman (Zach Braff, da série Scrubs) é um ator mal-suce-dido que vive sob dominação do pai, seu psiquiatra, mesmo morando a mais de 4.000 quilômetros de distância. Largeman perde a mãe e deve voltar à cidade natal para o enterro, ponto de partida do filme. Sob efeito de inúmeros calmantes e anti-depressivos prescritos pelo pai, Largeman tem dificuldade de sentir a morte da mãe, assim como os pequenos mo-mentos da vida. Decide, então, procurar um psiquiatra próprio, quando conhece Sam (Natalie Portman, de Closer), uma garota com uma doença psíquica singular que trará luz à inércia de Largeman. O coveiro, an-tigo amigo de infância, (Peter Sarsgaard, de Plano de Vôo) acompanha a trajetória de Largeman na pequena cidade e o guia para uma vida mais intensa, de emoções e dor.

Hora de Voltar consegue perceber a sutileza da depressão sem tomar o tema como pano de fundo. Na primeira cena, Largeman permanece en-torpecido químico e emcionalmente, mesmo em uma forte turbulência no avião. Aos poucos, somos apresentados ao mundo da não-sensação, quando nada é engraçado ou triste. O filme é perfeito para momentos de inércia, quando você escolhe olhar para o teto em vez de sair de casa ou prefere a solidão a qualquer companhia viva.

Assista tambémO Amor Não Tira Férias

Não assistaTudo Acontece em Elizabeth Town

b)

c)

“You rock, rock”

“Are You Really Retarded?”

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Acumular dinheiro não é mais uma questão de quanto você ganha por mês nem de qual é a sua profissão. É com essa idéia que o livro Pai Rico, Pai Pobre, conta os segredos dos ricos, que os trabalhadores de classe baixa

ou média não vêem. Tudo através de uma visão de simples empreendedorismo:

“Os ricos não trabalham por dinheiro. Eles fazem o dinheiro trabalhar pra eles”.

Escrito por Robert Kiyosaki, Pai Rico, Pai Pobre faz parte de textos escri-tos ao longo de sete anos, sobre a educação financeira que tivera em sua vida e principalmente durante a infância e lhe proporcionara a chance de se tornar milionário. Em um de seus cursos sobre educação financeira, Kiyosaki des-perta o interesse da contadora Sharon L. Lechter.

Junto de sua filha adolescente, ela participou do jogo de tabuleiro Cash-flow, criado pelo milionário havaiano, que desafia os jogadores a usar difer-entes métodos de lidar com o dinheiro para sair da Corrida dos Ratos para a Pista Rápida. Um paralelo entre a vida de trabalhadores e a vida dos ricos. Lechter então ajuda Kiyosaki a organizar os textos e criar o livro.

Nascido no Havaí, o autor conta como desenvolveu seu conhecimento fi-nanceiro através do convívio com seus dois “pais”: o pai de Mike, um amigo de infância, e o seu próprio pai biológico. Daí o pai rico e o pai pobre. Seu pai ver-dadeiro, o pai pobre, era funcionário público e ganhava um bom salário. O pai de Mike, seu amigo, possuía vários pequenos negócios, nenhum com grande visibilidade, e era considerado pobre, mas possuía um grande conhecimento sobre dinheiro. Com o passar dos anos, pai rico conseguiu se tornar o homem mais rico do Havaí, enquanto o pai de Kiyosaki apenas pagava dívidas.

Assim, Pai Rico, Pai Pobre vai mostrando ao leitor uma visão diferen-ciada de se ver o emprego, o mundo dos negócios e das finanças e, principal-mente, o dinheiro. Tudo através das experiências do próprio autor, a partir dos ensinamentos de seu pai rico, e de sua decisão de não seguir os conselhos de seu pai pobre.

por Lucas Sarmanho

[ l i teratura] 8

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Mas Kiyosaki alerta: não se trata de ensinar as pessoas a ficarem ricas. Isto, segundo ele, é um dever do leitor descobrir. O que ele propõe é mostrar como a educação financeira pode ser fun-damental para que as pessoas possam sair da Corrida dos Ratos.

Educação financeira que não se baseia apenas em ganhar dinheiro, mas em saber mantê-lo. Por que mesmo pessoas ricas podem empobrecer rapidamente se não tiverem controle sobre seu patrimônio. E o segredo de tudo, segundo ele, é simples: “A maio-ria das pessoas tem dificuldades financeiras porque não conhece a diferença entre um ativo e um passivo”.

Para diferenciá-los, basta considerar bens ativos, tudo aqui-lo que gera lucros por si só, como imóveis para venda ou alu-guel, ações, títulos, propriedade intelectual, entre outros. O que acontece, no entanto, é que as pessoas investem todo seu dinheiro em bens passivos, como casas e carros e bens de consumo cada vez mais caros. Como exemplo, Kiyosaki cita seus dois “pais”: En-quanto pai pobre encarava sua casa como o maior patrimônio da família, pai rico considerava a própria casa como um prejuízo, que lhe obrigava a pagar impostos e manutenção.

E é assim que, quando a pessoa percebe, está presa na Cor-rida dos Ratos. Quanto mais dinheiro elas têm, mais elas gastam com passivos, e mais dinheiro elas precisam para manter esses passivos. Para evitar tal destino e conseguir chegar a Pista Rápida, segundo ensina o pai rico de Kiyosaki, tudo o que se deve fazer é usar a própria inteligência. Não ser refém do dinheiro, não traba-lhar por ele. Ao invés disso, trabalhar para adquirir conhecimentos que possam ser úteis no futuro. E principalmente, aprender a usar o dinheiro para conseguir mais dinheiro.

No Brasil Pai Rico, Pai Po-bre foi lançado em 2000, e desde então tem feito grande sucesso. Na inter-net, é possível inclusive encontrar até sites dedi-cados às idéias de Robert Kiyosaki, como o fórum Clube do Pai Rico (www.clubedopairico.com.br).

198 páginasAutor: Robert Kiyosaki e Sharon L. LechterEditora CampusMaria MonteiroPreço: R$28,20 ;

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No ano em que o romance francês Madame Bovary completa 150 anos, um serviço de venda de álibis on-line se populariza em todo o mundo

por Marina Almeida

Emma Bovary, personagem central da obra de Gus-tave Flaubert, vive presa ao casamento com Car-los, um marido entediante, provinciano e que não

a faz feliz. Uma das poucas alegrias da personagem é ler romances nos quais as heroínas são felizes para sempre. Nem o nascimento de sua filha a fez sair do vazio em que estava mergulhada. Emma não se encontrava em uma sociedade onde as mulheres foram criadas para casarem, serem fiéis, cuidarem da casa, do marido e dos filhos. Em busca da felicidade, Emma cede às investidas de Rodolfo e, posteriormente, de Léon. A partir daí, sua vida é repleta de mentiras para encontrar os amantes sem que o marido e os habitantes da pequena cidade francesa de Yonville descubram a infidelidade.

O romance chocou a sociedade do século XIX. Flau-bert foi julgado por ofensa à moral e à religião. As partes consideradas mais picantes foram retiradas do livro e, só após o autor ser inocentado, voltaram a integrar o roman-ce. Nos dias atuais o adultério não causa mais tanta po-lêmica quanto em 1857 (ano do lançamento de Madame Bovary). A sociedade acostumou-se a conviver com casais infiéis nos livros, filmes e novelas.

Porém, a infidelidade não é apenas tolerável, tornou-se um negócio rentável e que cada dia mais toma conta do mundo. Hoje é possível comprar álibis pela internet. O pioneiro nesse ramo foi o site norte-americano Álibi network, em funcionamento há dois anos. Mas agora esse serviço se popularizou e se espalhou por todo o mundo.

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Podemos dizer que Emma foi precursora desse ofício. Para encontrar seu segundo amante, Léon, inventava aulas de piano na cidade vizinha. Diante das insinuações do marido (que en-controu a suposta professora, a qual alegou não conhecer sua mulher), correu atrás de um comprovante do pagamento das aulas. Pagando uma boa quantia, Emma conseguiu que a pro-fessora confirmasse que vinha tendo aulas por meses.

Providenciar comprovantes de pagamentos de restau-rantes, hotéis e passagens aéreas é um dos serviços ofereci-dos pelos sites. Basta se cadastrar, solicitar e pagar. Pron-to, está comprovada uma viagem de negócios. Por mais algum dinheiro, ainda pode haver um cartão postal e uma ligação com DDD ou DDI da cida-de possivelmente visitada, bem como certifica-do de participação em congressos e simpósios.

Os serviços não se restringem aos papéis: profissionais dos sites ligam para a casa do cliente, convocando-os para reuniões de emer-gência, avisando da doença ou falecimento de um primo distante, dentre outras desculpas.

Assim como em Madame Bovary, pagar para sustentar uma mentira ainda custa caro. No romance, além de pagar pelo recibo da pro-fessora de música, Emma paga a ama de sua filha para receber as cartas do amante e, pres-sionada pelo comerciante local (que sabe das aventuras da personagem), faz um empréstimo em cima de outro. A falência é um dos motivos do suicídio da personagem. O preço de um álibi virtual varia de acordo com a complexidade e pode chegar a U$200,00. Pode ser caro, mas pela rapidez com que os sites surgem, parece que existem pessoas dispostas a pagar o que for preciso para manter o segredo.

Dom casmurro (1899) – Uma das obras primas da literatura brasileira. O livro de Machado de Assis é uma das mais bem construídas histórias de infidelidade. Ao contrário da obra de Flaubert, apenas pela leitura é impossível saber se Capitu traiu seu marido, Bentinho, com Escobar.O romance apresenta diversas cenas e fatos que sugerem a traição – a semelhança do filho do casal com Escobar, a capacidade de Capitu em dissimular, o desespero da personagem com a morte de Escobar. Mas, ao mesmo tempo, não há nada que realmente comprove a infidelidade. Também se deve levar em conta que o romance é narrado em primeira pessoa, por Bentinho, o que confere uma visão parcial dos fatos.

Pecados íntimos (Little children - 2006) – O filme retrata a sociedade americana do século XXI, mas se assemelha em muitos aspectos ao romance de Flaubert. Assim como em Madame Bovary, a personagem principal, Sarah Pierce (Kate Winslet), vive em uma cidade onde as mulheres se dedicam integralmente aos filhos e marido. Uma sociedade onde o adultério é intolerável. Sarah, cansada da vida que leva, conhece Brad Adamson (Patrick Wilson) e começa com ele uma intensa relação. Os sentimentos que levaram Emma e Sarah a traírem seus maridos são parecidos. Tanto que em uma cena Sarah diz ter se apaixonado por Emma por entendê-la perfeitamente.

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Vestindo calça jeans e uma camisa branca com uma pequena estam-pa no peito, Rafael, 20 anos, pega

um frasco de vidro sem rótulo e passa o perfume nos pulsos e em volta do pesco-ço. São 21h30 de um sábado e ele está pronto para a balada. Vinte e cinco mi-nutos depois, longe dali, quem está na rua esperando pelas amigas é Ana, 17 anos, que está de calça jeans e com uma blusa decotada cor de rosa. Eles não se conhecem, mas no final da “night” am-bos terão ficado com alguém.

Difícil de definir exatamente – o sexo também está incluído ou são só beijos e alguns amassos? –, o “ficar” está longe de produzir consenso entre quem “fica” ou entre quem estuda esse comporta-mento. A psicóloga Jaqueline Chaves, autora de “Ficar com”: um estudo sobre um código de relacionamento no Brasil (Revan, 2001), defende que, no início da década de 80, “surgiu um novo tipo de relacionamento, nomeado pelos jovens como ‘ficar’ e que é marcado pela falta de compromisso e pela pluralidade de dese-jos, sendo o objetivo principal a busca de prazer”.

O médico Jairo Bouer, 41 anos de idade, referência nos meios de comuni-cação quando o assunto é sexualidade juvenil, discorda. “O ‘ficar’ sempre exis-tiu entre os jovens. Na época em que eu comecei, a gente ia pra festas, ficava, mas não tinha esse nome. Esse compor-tamento de ter uma intimidade maior

com uma pessoa sem um vínculo afetivo de longo prazo existe há muito tempo.”

Eles concordam entretanto, que na sociedade do século XXI as práticas do “ficar” se tornaram, digamos assim, mais livres. “A partir da Revolução Sexual houve certa flexibilização dos costumes e as pessoas ficaram tranqüilas para ‘ficar’ mais”, ressalta Jairo Bouer.

Aquilo que se convencionou cha-mar de Revolução Sexual trata de movi-mentos ocorridos após a 2ª Guerra Mun-dial com o objetivo de dar visibilidade aos adolescentes, até então relegados a segundo plano na sociedade. São exem-plos a geração beat – jovens intelectuais norte-americanos que, cansados da mo-notonia da vida, resolvem, fazer uma re-volução cultural por meio da literatura, sempre regada a sexo livre, drogas e pé-na-estrada – e o movimento hippie, cujos hábitos de vida eram um pouco diferente dos beats, valorizando sobretudo a vida comunitária, o amor livre e as religiões orientais. Foram manifestações que de-ram visibilidade aos jovens, que, por sua vez, mudaram valores, quebraram estig-mas e revolucionaram o comportamen-to sexual. Agora sem amarras, sem cor-rentes e sem repressão, o sexo passou a ser encarado como qualidade humana natural e livre. Com o surgimento da pí-lula, na década de 60, tais idéias sobre a sexualidade se expandiram. Às mulheres foi permitido o prazer sexual desvincula-do da gravidez.

Quer ficar comigo?por Pedro Santos

O “ficar” e as relações de troca, prazer, descarte, liberdade e experimentação

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Os jovens de hoje são filhos daqueles que se casaram entre os anos 70 e 80, e, portanto, frutos da juventude contestadora – “sexo, dro-gas e rock n’ roll” – e da época em que tabus fo-ram quebrados. O entusiasmo foi reprimido pela descoberta do vírus HIV. Com a AIDS, a idéia de “amor livre” é substituída por “sexo seguro”. A conseqüência foi a modificação nas formas de relacionamento, mas o espaço aberto pela Revo-lução Sexual jamais seria fechado.

O sexólogo Moacir Costa, autor de Sexu-alidade na adolescência: dilemas e crescimento (L&PM, 2002) acredita que a iniciação sexual de hoje tem menos fantasmas do que a de gerações anteriores porque o “ficar” representa uma etapa intermediária para o namoro. Assim, os jovens chegariam à primeira relação sexual mais bem preparados do que seus pais e avós.

Na sociedade globalizada em que estamos inseridos – lembrando sempre que o “estamos inseridos” se refere aos grandes centros urbanos do mundo (no interiorzão do Brasil, por exem-plo, as condições e comportamentos são comple-tamente diferentes) -, vivemos um mundo de re-sultados rápidos, em que consumir traz prazer e há pouca espera para o que se deseja, exemplos disso são o fast-food, o video-clip e o sistema de delivery. O “ficar” se encaixa perfeitamente na busca por prazer individual e pelo desprendi-mento. “É massa porque não tem aquela coisa do compromisso, de ficar sempre dando satis-fação. Você fica com a menina, curte o momen-to e deu. Depois é sair logo pra próxima”, conta Rafael, que na noite daquele sábado beijou duas meninas.

Engana-se quem pensa que a atitude par-

te unicamente do lado masculino. Ana diz que raramente “chega” em meninos, mas já ajudou uma amiga a ficar com alguém. “Eu só cutuquei o guri e apontei para trás, onde estava minha amiga. Ele foi para lá, eles conversaram e depois se beijaram.”

Jairo Bouer confirma que as meninas tam-bém querem ficar sem compromissos, mas há certas diferenças entre os sexos, como não pode-ria deixar de ser. “O que a gente percebe é que a mulher tende a enxergar a estabilidade em uma relação mais do que o homem. O ‘ficar’ algumas vezes seguidas, para a menina, é um indicativo de estabilidade, pode significar namoro. Para o cara há uma pressão do grupo social de que ele tem que ficar mais, é aquela coisa de não poder sair ‘zerado’ da balada.”

Apesar de começar na adolescência, esse comportamento ultrapassa o público de 12 a 18 anos e não tem idade certa para se extinguir. Festas universitárias, com pessoas acima de 25 anos, mostram como a experiência dita juvenil se prolonga. Como explica o doutor Jairo, o “fi-car” é bom pela liberdade de experimentar coi-sas diferentes e ruim quando o comportamento se torna banal: “A gente tem que entender que o ‘ficar’ tende a ser um comportamento de transi-ção. Você fica enquanto não está afim de namo-rar, quando não quer levar uma história mais a sério. Tem uma característica de aprendizagem, passagem, transição. Vejo problema quando al-guém fica retido nessa fase, sem passar para o estágio seguinte, que é encarar a outra pessoa como outra pessoa, não só como um instrumen-to do seu prazer. (risos)” ;

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A gastronomia faz parte da cultura de um povo. Não há como viajar pensando em calorias e, para os enjoados, uma viagem não deve ter nem metade da graça. Desafortunados também aqueles que têm medo de provar o novo e se

lamentam o tempo todo por não poder comer arroz e feijão, mesmo que fiquem ape-nas uma semana longe. O mesmo vale para os estrangeiros que acham a feijoada estranha ou nossos quitutes doces demais.

Em 2005, em pleno inverno europeu, uma adolescente desembarca na Ale-manha, ou melhor, “Batatolândia”. Sim, lá se come batata quase todos os dias: cozida, frita, purê, sala-da de batatas. E isso é apenas uma amostra do que minha querida “mãe de intercâmbio”, Angelika, me oferecia. Logo que cheguei, me indicou na sala uma escrivaninha daquelas antigas, com o tampo que fecha, onde ficavam os doces: bombons, línguas de gato, marzipan (doce à base de amêndoas e açúcar), Gummibärchen (balinhas de goma em forma de ursinhos). Na mesa de centro, res-quícios do Natal: deliciosos biscoitos feitos em casa. Na geladeira, a gaveta destina-da a verduras estava também lotada de chocolates.

Além das comidas caseiras e dos fartos lanches preparados por Angelika para as excursões às cidades vizinhas, qualquer hora era tempo de uma guloseima. Sempre se passava por um supermercado (onde até os chocolates Lindt são bara-tos), por uma padaria de dar água na boca com seus pãezinhos de nozes e amên-doas, uma confeitaria com um belo chocolate quente para esquentar e um típico Apfelstrudel.

Café da manhã Imagine um sucrilhos recheado com Nutella. Sim, essa maravilha existe e

era meu café da manhã quase todos os dias. Também havia milhares de tipos de pães pretos e cheios de grãos, principalmente domingo, quando Angelika ia à pa-daria cedo. Para acompanhar, geléias, mel, manteiga com granulado (não sei se era invenção da minha “irmã”, Stephanie) e Nutella, é claro. Também tinha a opção dos iogurtes, de sabores dos mais variados: café com amêndoas, framboesa, Apfels-trudel, pêra com raspas de chocolate, cereja, avelã, e um que era uma espécie de pudim, de chocolate ou baunilha.

por Luisa FreySaudade, lugar novo, comida nova. O resultado? Comer, comer e... comer

Intercâmbio Gastronômicofoto: Luisa Frey

disponível em: www.flickr.com

disponível em: www.gastronomiepreis.de

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Comida típica No dia em que cheguei, Angelika preparou para o jantar verduras,

carne de porco (e não adianta os brasileiros torcerem o nariz, porque é gos-toso) e Knödel (bolinhos à base de farinha e batata) - parte do repertório de receitas de minha avó. Outras comidas típicas que eu já conhecia: Kassler (costeleta de porco), Sauerkraut (chucrute, que é repolho em con-serva), lin-güiça branca, Apfelmuss (purê de maçã que se come como acompanhamen-to de pratos salgados).

Na Floresta Negra, tive o privilégio de experimentar um autêntico bolo homônimo, com cerejas naturais e, em Estrasburgo – França - comi um ver-dadeiro bolo “mil folhas” em um Salon de Thé. Para o Ano Novo, ganhei um porquinho (lá é símbolo de sorte) de marzipan e em primeiro de janeiro, se compra na padaria um Pretzel gigante, do tamanho de um prato, que parti-mos e comemos com geléia no café da manhã.

Esquisito, mas gostosoAlgumas vezes, a refeição era algo que para nós seria sobremesa. Um

dia, o almoço foi um prato fundo de arroz doce. Era cozido no leite e acres-centávamos o que queríamos: açúcar e canela ou uma divina compota de cerejas. Outra vez, comemos um prato que se chama Kaiserschmarren (veja o box com a receita) – são pedaços de uma massa como de panqueca, co- bertos de açúcar e com uvas passas, acompanhados de pêssego em calda.

Na França, também aconteceu uma refeição inusitada. Uma amiga pe-diu em uma lanchonete hambúrguer com batatas fritas e quase morremos de rir quando chegou uma baguete gigante, envolta por papel alumínio, recheada com um filé (não era hambúrguer) e batatas fritas. Sim, elas esta-vam dentro do sanduíche! E o pior é que era gostoso.

Acho que a coisa mais diferente que tive coragem de comer - e não me arrependi - foi estômago de porco recheado. Nada de cara de nojo, por favor. Os tios de Stephanie nos levaram para jantar na Weinhaus Henninger (casa de vinhos Henninger) - um restaurante bem antigo em uma cidade que de tão pequena é quase um vilarejo, Kallstadt, na região de Rheinpfalz. Dá até para pegar de lembrança uma reprodução de um cardápio do ano de 1937, quando eram servidos sopa de tartaruga e porco selvagem assado. Eu não podia deixar de comer o que tinha de mais típico: um prato de chucrute com Leberknödel (bolinho de fígado – confesso que deste não gostei muito), lin-güiça e o tal estômago de porco – surpreendentemente bom.

Pequenos vícios Depois de poucos dias, Angelika não precisava mais perguntar o que eu queria beber. A resposta era sempre “Apfelsaft” (suco de maçã). O de lá é transpa- rente e não grosso como o daqui. Uma delícia! De sobremesa, Angelika e Stephanie criaram algo inusitado: Mohrenkopf (conhecemos como nhá benta ou dan top) no microondas. Esquentados por alguns segundos, o chocolate e o marshmallow der-retiam de leve. Bem light. No jantar, normalmente lanchávamos e, além dos diversos frios, eu gostava muito de comer no pão filés de salmão ou outro peixe defumado e também queijo brie. Coisas que aqui no Brasil são luxo e lá são comuns.

Os chocolates É uma tentação ter todos os chocolates suíços, como o Lindt, e os também maravilhosos alemães sempre à disposição e em conta. Um dos mais gos-tosos é o da marca Rittersport, vendido em peque-nas barras quadradas, com recheios diversos: nougat (creme de avelã), biscoito, cappuccino, café, iogurte, marzipan. Também há milhares de tipos de chocola-tes da Milka, Ferrero e Kinder. Em Berlin, na maior loja de departamento que já vi – a KaDeWe – um dos andares é só de chocola-tes! É de dar água na boca! Tiramos foto com um sino gigante de chocolate em uma vitrine e nos encanta-mos com as coisas de Páscoa, apesar de ainda ser janeiro.

disponível em: www.oberstdorf.de 15

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Lanches e guloseimas É muito vantajosa a proximidade com outros países europeus. Além do chocolate suíço, há o ma-ravilhoso sorvete italiano por toda a parte, em divinos sabores como marzipan, avelã ou café. Outra coisa que eu gostava de comer na rua (bem melhor que McDonald‘s ou Burger King) não era nada alemã, mas vendida em toda parte. Trazido pe-los imigrantes turcos, o Döner Kebab é uma opção barata (acho que o pequeno custava 2,50 euros) e de sustância. É um tipo de pão sírio cortado ao meio recheado com salada de pepino, carne de carneiro (aquele churrasquinho grego que fica girando) e mo-lho de iogurte. Muito gostoso.Nas padarias, também havia algo bom e barato. Cha-ma-se Berliner, é uma espécie de sonho recheado com geléia e coberto com açúcar de confeiteiro. Por sorte, durante meus dois meses na Alema-nha, morei no quarto andar de um prédio sem eleva-dor. Além disso, eu ia a pé para a escola, andávamos bastante nas excursões e o frio consome muitas calo-rias. Mesmo assim, o saldo de quilos ao final da via-gem foi positivo: quatro! Mas, sem arrependimentos.

Ingredientes:50g de uvas passas2 colheres de sopa de rum100g de farinha de trigo4 colheres de sopa de creme de leite1/8 de litro de leitesal3 ovos1 pacote de açúcar baunilha (se não tiver, substitua por meia colher de chá de es-sência de baunilha)30g de manteiga40g de lascas de amêndoas (opcional)2 colheres de sopa de açúcar10g de açúcar de confeiteiro

Modo de preparo:Deixe as uvas passas de molho no rum por cerca de 30 minutos. Enquanto isso, misture bem a farinha, o creme de leite e o leite. Adicione uma pitada de sal. Separe os ovos, reserve as claras e adicione as gemas à massa. Deixe a massa descansar por cerca de 30 minutos. Bata, então, as claras com o açúcar baunilha em ponto de neve e misture levemente à massa. (Se for substituir por essência de baunilha, bata as claras em neve, acrescente-as à massa e só então adicione a essência). Derreta em uma frigideira a manteiga e adicione as lascas de amên-doas. Despeje a massa por cima, virando a frigideira para que cubra toda a sua su-perfície como uma panqueca. Jogue as uvas passas peneiradas por cima. Frite por cerca de 4-5 minutos, em fogo médio, até que o fundo fique dourado. Vire as panquecas e doure o outro lado. Rasgue (e não corte) com o garfo em pequenos pedaços e polvilhar com açúcar. Aumente o fogo e sacuda a frigideira para que o açúcar caramelize de leve. Polvilhe o açú-car de confeiteiro e sirva imediatamente. Pode ser acompanhado de calda de baunilha, al-guma compota ou pêssegos em calda.

Kaiserschmarren

UMA ALEMÃ NO BRASILDe julho a setembro daquele mesmo ano de 2005, minha “irmã ale-mã” Stephanie ficou em minha casa. Ela veio para cá exatamente com o mesmo espírito que fui para lá: o de experimentar tudo e não ligar para as calorias. Dava gosto preparar todas as nossas comidas típicas e a ver repetir e lamber os beiços. Ela adorou feijoada, goiaba-da, musse de maracujá, pão de queijo, guaraná, creme de abacate, pé-de-moleque, doce de leite, leite condensado e brigadeiro, é claro. Em São Paulo, não é aconselhável uma alemã sair andando a pé so-zinha. E, o frio do inverno brasileiro não queima tantas calorias como o do europeu. Acreditem se quiser, ela acabou engordando mais no Brasil do que eu na “Batatolândia” (batata, chocolate, biscoito, pão-lândia!).

disponível em: kuechenruf.blog.de

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Lisa Belkin faz parte da equipe do jornal americano New York Times. Além de repórter e editora, é responsável pela seleção das histórias que integram o livro Histórias do New York Times, lançado esse ano no Brasil pela editora Ediouro. Em entrevista por e-mail, Belkin fala sobre o Times e do processo de produção do livro.

ponto-e-vírgula - Como você decidiu organizar o livro Histórias do New York Times?Lisa Belkin - Eu faço parte da equipe de repórteres e editores do Times. As conversas sempre nos remetiam ao fato de que fazíamos nossos filhos dormirem com histórias que saíam no jornal do dia. Não aquelas sobre crimes, guerras ou tragédias, mas as emocionan-tes, que nos fazem pensar ou são alegres. Os contos reais. Então nós dissemos: por que não publicar essas histórias em livro? E por algum motivo, acabei ficando com o trabalho.

; - Como as histórias foram selecionadas?Belkin - Primeiro eu perguntei a muitos repórteres quais histórias eles lembravam – que eles escreveram ou que leram. Depois passei a procurar nos arquivos as histórias mais antigas. Passei um tempo maravilhoso apenas lendo.

; - O leitor não sabe quando as histórias foram publicadas. Foi uma opção ou esquecimento?Belkin - As datas não foram incluídas nos artigos, pois assim ficam eternos. Algumas histórias ficavam confusas sem as datas, então incluímos.

[entrevista]

Histórias do New York Timespor Marina Ferraz

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; - Qual a diferença entre as histórias do Times e dos demais jornais? Por que as histórias desse livro são interessantes para o leitor?Belkin - O Times é considerado um jornal mais intelectual que os outros. E porque nós temos vários repórteres ao redor do mundo, temos o luxo de pu-blicar pequenas histórias que interessam a pessoas dos lugares mais dis-tantes. Coisa que os outros jornais não têm pessoal e dinheiro para fazer.

; - Como os repórteres encontram as pessoas que ilustram as histó-rias?Belkin - Algumas vezes as pessoas entram em contato conosco para con-tar suas histórias. Algumas vezes outras pessoas nos chamam a atenção para determinada história. Algumas vezes nós realmente lemos sobre essas pessoas em jornais locais – isso acontece mais em países estrangeiros ou lugares fora da área de Nova York. E nossos repórteres gastam muito tempo apenas conversando com as pessoas sobre nada em especial, e as histórias surgem disso.

; - Você acredita que exista uma maneira específica de escrever para o Times, diferente dos outros jornais?Belkin - Eu penso que ainda existam muitos bons jornais nos Estados Uni-dos. O Times não tem o monopólio. Mas eu estou muito orgulhosa do quão duro o Times me faz trabalhar para ter certeza de que meus fatos estão precisos e minhas histórias são imparciais.

; - Lendo o livro, percebe-se que as histórias são totalmente humanas. Os leitores vêem que o jornalista passou um longo tempo com os per-sonagens da matéria. Isso é uma característica do jornalismo america-no ou do Times em especial?Belkin - Infelizmente não é uma característica do jornalismo americano. Mas nenhum profissional é 100% perfeito.

Lisa Belkin

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Depois de fazer o passaporte, pagar taxas, arranjar um emprego, pagar taxas, ter um lugar para morar nos

Estados Unidos e... pagar taxas, o próximo passo é enfrentar a “indústria do visto”. Além de juntar duas dezenas de papéis, é preciso se deslocar para São Paulo, Rio de Janeiro, Recife ou Brasília, com a possibi-lidade de voltar sem o dito cujo. Ter o vis-to negado significa desperdício de tempo e dinheiro, e o principal: planos frustrados.

2ª feira, 19:15h - Saída da antiga ro-doviária de Florianópolis. Mais uma leva de estudantes universitários brasileiros que quer trabalhar nos Estados Unidos neste verão. Só falta o visto. O ônibus para nos levar a São Paulo é alugado pela agên-cia de intercâmbio. Algumas pessoas pu-xam papo logo, outras ainda estão tímidas e se contentam em observar as primeiras conversas.

O funcionário da agência de viagens distribui pastas para cada um organizar a sua papelada: “Coloque tudo nos lugares indicados na pasta, para não ficar perdido na hora. É nessa ordem que eles vão pe-dir, e só entregue o que pedirem!” Quatro formulários, recibos de taxas, passaporte, foto e uma lista de documentos que en-

fureceu muitos pais: desde a carteira de motorista à escritura da casa e extrato bancário.

??:?? - exibição do DVD pirata de Tropa de Elite, enquanto o longa brasilei-ro está nos cinemas de todo o país. Durmo ao som de risadas e imitações que surgem nos cantos do ônibus:

- Fanfarrão!- Desiste, 02! Pede para desistir, 02!06:04 – Após duas paradas durante

o trajeto, o ônibus estaciona próximo ao consulado com quase todos dormindo.

Sob o céu indeciso entre noite e dia, vamos à lanchonete estrategicamente lo-calizada em frente ao consulado. Dezenas de adolescentes recém-chegados de ou-tras cidades do país disputam a frente do balcão para fazerem seus pedidos. Nada como forrar a barriga, escovar os dentes e disfarçar a cara de noite mal dormida com um pouco de água no rosto e uma ajeitada no cabelo! Tendo conferido mais uma vez os documentos, aos poucos nos dirigimos em bando à fila, enquanto alguns entram no estabelecimento para despertarem com um café.

Não faz nem dez minutos que esta-mos na fila – e essa ainda não chega a ter uma centena de pessoas. É nessa hora que o “jeitinho brasileiro” vem a calhar. O

funcionário da agência nos cha-ma e junta todos do ônibus em frente à porta do consulado. De-vem ser mais umas dicas para a

A viagem para conseguir um “sim” dos norte-americanos

[v iagem] 19

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entrevista - pensamos -, mas já esta-mos lá dentro quando percebemos que furamos a fila. Sabe-se lá o que temos de diferente em relação àqueles outros jovens, que vieram sozinhos ou com outras agências.

Na primeira porta, as bolsas são ligeiramente revistadas, e en-tão continuamos em outra fila. No-mes conferidos e, agora sim, entra-mos no prédio. Detector de metais, nada eletrônico passa. Mp3 players e celulares ficam guardados até a saída. Seguimos as setas amarelas no chão que indicam: visto.

As taxas para fazer a entrevis-ta somam 280 reais, mais o “Sedex” para o visto, caso você passe. Inte-

ressantes são os termos ouvidos duran-te a espera. Parece vestibular: “se eu for aceito”, “se passar”, “se conseguir”, “se der tudo certo”. As filas seguem sobre bancos de seis metros. “Eita povo orga-nizado, nunca vi fila em banco! Ou então isso quer dizer: vai demorar...”

O local para solicitar o visto é uma área com esses bancos de um lado e de outro, perpendiculares a uma seqüência de guichês. Primeiro, seus documentos são conferidos, depois são retiradas as impressões digitais, paga-se uma taxa

de 40 reais, faz-se a “entrevista”... Se o vis-to for aprovado, é só entrar na fila do paga-

mento do “Sedex”. No consulado dos EUA, enquanto

uma multidão espera para ser entrevis-tada, o clima é de uma tensão tênue e amizade instantânea.

- É perto de Miami. E você, vai pra onde?

- Está muito nervoso?- Como se soletra o meu nome em

inglês? - Vai dar tudo certo, você vai ver!- Dizem que a moça daquela cabine

é muito simpática. Tomara que a minha entrevista seja com ela.

- Parece uma humilhação ter que fazer isso tudo. É como se eu estivesse implorando pelo visto.

- Por que a gente não foi chamado?Por que algumas pessoas, assim

como eu, não foram chamadas para a impressão digital, enquanto senhas posteriores já estão na entrevista? Uma moça com microfone, no centro do sa-lão, diz os números em ordem crescente, com alguns deles faltando. Nada melhor para teorias de conspiração: “Será que tem câmera escondida e ouviram eu fa-lar mal dos Estados Unidos? Já fui re-provada? Ou simplesmente não sabem

contar?”. - A chamada é aleatória, explica a

funcionária. A verdade é que pulam um ou dois

números em cada dezena. Não demorou muito e eu, assim como os outros retar-datários, fui direcionada à impressão di-gital e à entrevista, em inglês.

- O quê você estuda?- O quê sua mãe faz?- Você tem irmã ou irmão mais velho?- Ele mora no Brasil?- Ok, Adriana. Seu visto foi apro-

vado. Leve esse papel e pague a taxa ali adiante.

- Thank you. Então, viajei 11 horas, fui atrás -

assim como minha mãe -, de papeladas para comprovar que tenho “vínculo com o país” e que a família tem condições de me sustentar, tudo para não pedirem documento algum e fazerem as mesmas perguntas que estão nos formulários? Ótimo. É nessas horas que a gente acha que estão rindo da nossa cara. Mas olho em volta e os meus colegas de viagem é que sorriem, foram todos “aceitos” e podem entrar nos Estados Unidos. Mais tarde, recebo uma ligação materna e mensagens de amigos, reclamando da falta de notícias. É que, para mim, eu tinha ido simplesmente ”pegar” o visto. ;

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a equipe

[ fotografia ] 21

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Dourada:Luz do sol.Mar,Piscina,Óculos escuros.Hum,Quente:Gostoso.FótonsSombra,Computador.Sol,De novo.Walk awayNão.I love the sound of you walking awaySorry, vou ficar right here.This fireÃ?Is out of controlHum.Uma da tarde.Calor.Raios UV.Piscina?Não.So come on home...Ok.Almoço (ruim).Ai!Vermelho.Frio e calor.Mais vermelho!Ai, ai!Quilos de pós-sol,Movimento:Ai, ai, aaai!

por Carolina Moura

[cr iação]

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causos&coisas

29 Revista Viagem 2007

Quem responderia SIM?Alguma vez distribuiu ou vendeu ilegalmente substâncias con-troladas (drogas), praticou ou foi agenciador de prostituição?( ) sim ( ) nãoPretende entrar nos Estados Unidos para praticar violações no controle de exportação, ou atividades subversivas ou terroris-tas, ou qualquer outra atividade ilegal? É membro ou repre-sentante de alguma organização terrorista atualmente desig-nada pelo Secretário de Estado dos Estados Unidos? Alguma vez participou de perseguições sob a orientação do Governo Nazista da Alemanha, ou participou de genocídio?( ) sim ( ) nãoAlguma vez manteve uma criança cidadã estadunidense fora dos Estados Unidos, separada da pessoa a quem a custódia foi legalmente concedida por um tribunal nos Estados Unidos; alguma vez votou nos Estados Unidos em violação de alguma lei ou regulamento, ou renunciou à cidadania estadunidense com o propósito de fugir dos impostos?( ) sim ( ) não

Não-Me-Toque é o nome de uma cidade no inte-rior do Rio Grande do

Sul. Com 15 mil habitantes, e emancipada em 1954, a cidade chegou a mudar de nome em 1971, chamando-se “Campo Real”, em homenagem ao cere-al rei, maior produto de cultivo na cidade. Mas a mudança não agradou a maioria e através de um plebiscito, ficou decidido que a cidade voltaria ao nome de origem, em 1976.

A origem do nome tão peculiar ainda é duvidosa. Mas possui duas hipóteses principais. Uma seria por causa da abundância da planta Dasyphyllum spine-scens, conhecida popularmente

por “não-me-toque” na região. A outra, defende que quando os imigrantes alemães chegaram ao local, no final do séc. XIX, os índios que habitavam a região foram expulsos de lá. Um vel-ho índio, porém, se rejeitava a sair e costumava gritar aos visi-tantes “Não me toques de min-ha querência!”. Seja qual for a verdadeira origem, uma es-critura do Cartório de Registro de Imóveis de Passo Fundo-RS, datada em 20 de julho de 1885, comprova a existência da Fa-zenda Não-Me-Toque na região.Ah, e sabe como se chama quem nasce em Não-Me-Toque? Não, não é fresco, é não-me-toquen-se mesmo!

Acredite se quiser!!!

Acho que fiz algumas pessoas sentirem pena de mim.

Depois da edição de outubro, até recebi uma mensagem cheia de metáforas e

esperança, dizendo que “Ele” está me esperando, do outro lado da rua. E, no

mesmo dia, descobri que Ele sempre esteve ali, do outro lado da mesa, além dos

copos de cerveja e cestinhas de batata frita. O filho de Maria e José. Por trás de

sua barba e sobrancelhas negras, ele sorriu timidamente.

Todos os meses, opera milagres... Suplantando os erros de texto e diagramação

da ponto-e-vírgula. Sim: o filho de Maria e José assina em nosso expediente.

E Nele, e no poder da revisão, eu acredito.

Carolina Moura (aquela que vai para o inferno)

– A ponto-e-vírgula respeita todas as crenças e religiões, inclusive a de nossa escritora –

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;www.revistapontoevirgula.come ponto-final.