desenvolvimento rural, processos sociais e produtos agroecológicos
DESCRIPTION
Esta obra traz em detalhe diversos assuntos importantes para o desenvolvimento social, ambiental e rural num âmbito regional, mas também que as propostas e experiências dos autores relatas nestes escritos possam surtir efeito tanto a nível estadual quando nacional para o desenvolvimento da agricultura de base sustentável e familiar.TRANSCRIPT
Adamastor Pereira Barros
Marcos Barros de Medeiros
(Organizadores)
DESENVOLVIMENTO RURAL, PROCESSOS SOCIAIS E
PRODUTOS AGROECOLÓGICOS
VOLUME I
BANANEIRAS – PARAÍBA
ADAMASTOR PEREIRA BARROS
2014
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
UFPB/ CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS SOCIAIS E AGRÁRIAS,
CAMPUS III, CIDADE UNIVERSITÁRIA, BANANEIRAS PB S/Nº
CEP 58220-000 -www.cchsa.ufpb.br
ILUSTRADOR/ CAPA
Maycown Douglas de Oliveira Miranda
REVISÃO DE TEXTO E NORMALIZAÇÃO BIBLIOGRÁFICA
Heriberto Francisco Xavier
Claudiane da Silva Ferreira
1ª EDIÇÃO
Versão digital (2014)
Ficha Catalográfica
O CONTEÚDO DOS CAPÍTULOS É DE INTEIRA RESPONSABILIDADE DOS AUTORES.
É PERMITIDA A REPRODUÇÃO PARCIAL OU TOTAL DESTA OBRA, DESDE QUE CITADA A FONTE E QUE NÃO SEJA PARA VENDA OU QUALQUER FIM
COMERCIAL.
B277d
Barros, Adamastor Pereira, Medeiros, Marcos
Barros 2014-
Desenvolvimento rural, processos sociais
e produtos agroecológicos- Adamastor Pereira
Barros, Marcos Barros de Medeiros-
Bananeiras-PB Edição do Autor, 2014.
124 p. ; E-book: pdf.
ISBN: 978-85-917035-1-7
1. Ciências Agrárias, 2. Agroecologia. 3
Tecnologias Sociais
I Título
CCD:630.36
CCU: 631.1
ORGANIZADORES
ADAMASTOR PEREIRA BARROS
Licenciado em Ciências Agrárias pelo Centro de Ciências Humanas Sociais e Agrárias da Universidade Federal da Paraíba – CCHSA/UFPB
Mestrando em Produção Vegetal no Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Espírito Santo – CCA/UFES, Alegre, Espírito Santo. [email protected]
MARCOS BARROS DE MEDEIROS
Licenciado em Ciências Agrárias pelo Centro de Ciências Humanas Sociais e Agrárias da Universidade Federal da Paraíba – CCHSA/UFPB
Mestre em Agronomia CCA/UFPB
Doutor Entomologia ESALQ/Universidade de São Paulo - USP
Coordenador do Curso de Graduação em Ciências Agrárias - Licenciatura a Distância - UFPB Virtual
Coordenador Chefe da Clínica Fitossanitária do CCHSA/UFPB
Universidade Federal da Paraíba - Centro Ciências Humanas Sociais e Agrárias, Bananeiras-PB. [email protected]
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Apresentação
A Agroecologia vem a cada dia crescendo e ganhando espaço no cenário agrícola
nacional e internacional. O Brasil vem ano a ano desenvolvendo muitas pesquisas em
parcerias com institutos e universidades para fomentar a pesquisa e a pesquisação em
agroecologia voltado para a produção sustentável de alimentos sem deixar de lado os
valores sociais envolvidos no processo de produção de alimentos em um cenário mundial
que se demanda alta eficiência produtiva nas lavouras do Brasil.
É nesse cenário de desafios para a produção de alimentos que ainda existe uma
grande lacuna a ser preenchida que o Programa de Pós-graduação em Ciências Agrárias e
Agroecologia – PPGCAG do Centro de Ciências Humanas Sociais e Agrárias da UFPB, vem
desenvolvendo pesquisas e formação de recursos humanos de alta qualidade para o
ensino, pesquisa e extensão rural.
Esta obra é fruto de esforços coletivos do Dr. Marcos Barros de Medeiros e os
autores desta obra abaixo mencionados. No inverno de 2014 na região do Brejo
Paraibano, especificamente do município de Bananeiras –PB, onde o professor Medeiros
que é Docente vinculado ao programa, contou com a disposição de vários profissionais e
estudantes vinculados ao programa, estes autores abordam temas de alta relevância para
o desenvolvimento da Agroecologia e da Agricultura Familiar para serem trabalhados e
apresentados neste compilado de Ciências Agrárias
Não apenas torna-se importante por trazer em apenas uma obra diversos assuntos
importantes para o desenvolvimento social, ambiental e rural num âmbito regional, mas
também que as propostas e experiências dos autores relatas nestes escritos possam surtir
efeito tanto a nível estadual quando nacional para o desenvolvimento da agricultura de
base sustentável e familiar.
Adamastor Pereira Barros
Sumário
CAPÍTULO 01 ....................................................................................................................................... 9
CULTURA DO TOMATE (Solanum lycopersicum): O DESAFIO DE UM
PRODUTOR NO MANEJO AGROECOLÓGICO NA ZONA RURAL DE CAMPINA
GRANDE-PB
Renally Cardoso Farias
CAPÍTULO 02 .....................................................................................................................................20
SUCESSÃO RURAL: RETRATOS DA JUVENTUDE RURAL DE SERRARIA – PB
Gustavo José Barbosa
CAPÍTULO 03 .....................................................................................................................................26
INCENTIVO A SISTEMAS AGROFLORESTAIS NA REGIÃO SUL DO PARÁ
Leopoldo Oliveira de Lima
CAPÍTULO 04 .....................................................................................................................................37
A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO
José Romário Lacerda de Barros
Adamastor Pereira Barros
CAPÍTULO 05 .....................................................................................................................................50
APLICAÇÕES DO NONI (Morinda Citrifolia L.) NA MEDICINA POPULAR
Juliana Pontes Soares
Marcos Barros de Medeiros
Rejane Pontes Soares
CAPÍTULO 6 ........................................................................................................................................67
DIFUSÃO DE TECNOLOGIAS SOCIAIS AGROECOLÓGICAS PARA A
AGRICULTURA FAMILIAR
Antonio Cardoso
Murielle Magda Medeiros Dantas
Valter da Silva
CAPÍTULO 7 ........................................................................................................................................81
O MANDACARU (Cereus jamacaru P. DC.) COMO FONTE ALTERNATIVA
ALIMENTAR ANIMAL NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO
Juliana Ferreira Gonçalves
Gilberto Nunes de Souza
Marcos Barros de Medeiros
CAPÍTULO 8 ........................................................................................................................................96
TRABALHO, SEGURANÇA E SAÚDE NA AGRICULTURA FAMILIAR
Newton Alessandro Cavalcante de Albuquerque
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
8
João Maria Soares da Silva
Adamastor Pereira Barros
CAPÍTULO 9 ..................................................................................................................................... 114
ORGANIZAÇÃO DE UMA FEIRA DE PRODUTOS AGROECOLÓGICOS
Valter da Silva
Antônio Cardoso
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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CAPÍTULO 01
CULTURA DO TOMATE (Solanum lycopersicum): O
DESAFIO DE UM PRODUTOR NO MANEJO
AGROECOLÓGICO NA ZONA RURAL DE CAMPINA
GRANDE-PB
Renally Cardoso Farias
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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CULTURA DO TOMATE (Solanum lycopersicum): O DESAFIO DE UM
PRODUTOR NO MANEJO AGROECOLÓGICO NA ZONA RURAL DE
CAMPINA GRANDE-PB
Renally Cardoso Farias1
INTRODUÇÃO
O enfoque agroecológico traz consigo as ferramentas teóricas e
metodológicas que nos auxiliam a considerar, de forma holística e sistêmica, as
seis dimensões da sustentabilidade, ou seja: a Ecológica, a Econômica, a Social,
a Cultural, a Política e a Ética (CAPORAL; COSTABEBER, 2002). Com base
nisso, a compreensão da Agroecologia não pode ser vista apenas em relação
aos fatores ecológico e/ou social, de forma insolada, ela deve ser vista como um
todo, compreendendo e executando as seis dimensões de forma aninhada.
Para Moraes (1997), o tomateiro destaca-se entre as hortaliças cultivadas
por ser extremamente exigente em nutrientes, apresentando demandas
diferenciadas de acordo com os estágios de desenvolvimento, a duração do
ciclo de cultivo, o genótipo e a época do ano.
Diante da crescente comercialização da cultura do tomate (Solanum
lycopersicum), e o anseio que os consumidores que visam uma qualidade de
vida sustentável têm, surge a necessidade de que a mesma seja cultivada em
ambientes orgânicos, livre de agrotóxicos e fertilizantes químicos para o
consumo humano. Com base nisso, os produtores familiares têm focado na
produção de tomate livre de todos estes resíduos químicos. Porém, a cultura tem
apresentado bastante desafio para os produtores, visto que esta necessita de
cuidados com relação ao manejo, em razão dela ser mais suscetível à incidência
e proliferação de pragas maléficas.
1 Aluna especial no Programa de Pós-Graduação em Ciências Agrárias (Agroecologia)/UFPB,
Bananeiras, PB. E-mail: [email protected]
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Segundo a EPAMIG2 (1992), o tomateiro é muito suscetível a doenças,
tais como mancha-de-estenfílio, murcha-de-fusário, e mosca-branca: Bemisia
tabaci(Gennadius) que dificultam seu cultivo, notadamente quando este cultivo
é realizado a céu aberto, sendo empregados, intensivamente, produtos químicos
para controlá-las.
Assim, tendo em vista conhecer mais de perto o desafio de produtores
rurais no que tange ao manejo agroecológico do tomateiro, realizou-se um
estudo de campo no período de três dias: 22(vinte e dois) 29(vinte e nove) de
Abril, e 05(cinco) de maio de 2014. Neste sentido, os objetivos deste estudo
foram: (1) abordar o manejo agroecológico do tomate (Solanum lycopersicum)
no Sitio Catolé de Boa Vista, município de Campina Grande-PB, e (2) analisar
os desafios, nesse manejo, através de uma produção realizada por um agricultor
do referido Sítio.
Neste Sitio, foram feitas tentativas de produção agroecológica da cultura
do tomate e, devido ela ser problemática em reação ao manejo e por ter grande
susceptibilidade a pragas e doenças, sua produção, em uma área selecionada
de 1 hectare (ha), apresentou forte incidência de pragas maléficas.
Portanto, mesmo com os significativos avanços observados na cadeia
produtiva do tomate, ainda existem entraves tecnológicos a serem solucionados
para permitir maior competitividade (VILELA et al., 2001) entre a produção
convencional e a agroecológica.
REFERENCIAL TEÓRICO
O SEMIÁRIDO
Para Silva (2006), o conceito técnico de Semiárido foi estabelecido a
partir de uma norma da Constituição Brasileira de 1988, que, no seu art.
159, institui o Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE). A
norma constitucional manda aplicar, no Semiárido brasileiro, 50% dos recursos
2 Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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destinados ao Fundo. A Lei 7.827, de 27 de setembro de 1989, regulamentando
a Constituição Federal, define como Semiárido a região inserida na área de
atuação da SUDENE3, com precipitação pluviométrica média anual igual ou
inferior a 800 mm.
Silva (2006) verifica que estão sendo formuladas três propostas ou
alternativas para a realidade do Semiárido brasileiro: combater as secas e os
seus efeitos; aumentar a produção e a produtividade econômica na região,
sobretudo com base na irrigação; e convivência, combinando a produção
apropriada com a qualidade de vida da população local.
CULTURA DO TOMATE (Solanum lycopersicon)
O tomate, originário da América do Sul, é cultivado em quase todo o
mundo, e a sua produção global duplicou nos últimos 20 anos. Um dos principais
fatores para a expansão da cultura é o crescimento do consumo. Entre 1983/85
e 2003/05, a produção mundial per capita de tomate cresceu cerca de 36%,
passando de 14 kg por pessoa por ano para 19 kg, de acordo com dados da
Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO/ONU).
Para Peres (2007), o tomate é classificado, na olericultura, como uma
solanácea herbácea, de cultura anual. É uma hortaliça que possui vitaminas
em sua composição (A, C e potássio). Seus frutos podem ser consumidos in
natura, saladas, extrato, tomate seco e condimentado.
Segundo Cardoso et al. (2010), o Brasil é um dos maiores produtores
mundiais de tomate (Solanum lycopersicon), junto com a China, os Estados
Unidos, a Itália, a Turquia, a Espanha, o Egito e o México.
Diante da crescente comercialização da cultura do tomate, e o anseio que
os consumidores que visam uma qualidade de vida sustentável têm, surge a
necessidade de que a mesma seja cultivada em ambientes orgânicos, livre de
agrotóxicos e fertilizantes químicos para o consumo. Com base nisso, os
produtores familiares têm focado na produção de tomate livres de todos estes
3 Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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resíduos químicos. Sendo que a cultura tem apresentado bastante desafio para
os produtores, visto que esta necessita de cuidados com relação ao manejo, em
razão dela ser mais suscetível à incidência e proliferação de pragas maléficas.
Dessa forma, a produção da cultura do tomate, manejado de forma
agroecológica, tem crescido significativamente em razão de que o produto se
destaca com relação a sua pouca demanda e por ser produzido com base nos
princípios da agricultura orgânica. Por esta cultura apresentar dificuldade diante
do manejo orgânico, os produtores têm produzido em pequena escala, porém, o
que é produzido tem agregado valor ao produto.
O tomateiro é muito suscetível a doenças, mancha-de-estenfílio, murcha-
de-fusário, que dificultam seu cultivo, notadamente quando a céu aberto, sendo
empregados, intensivamente, produtos químicos para controlá-las (EPAMIG,
1992).
Diante disso, vem-se produzindo a cultura do tomate sob o controle dos
fatores climáticos externos, ou seja, através de sombreamento por telas e/ou
viveiros de produção, onde esta prática tem controlado e minimizado a incidência
de pragas maléficas que atacam a cultura, tais como mosca-branca, (Bemisia
tabaci), tripés (Thrips palmi), traça-do-tomateiro (Tuta absoluta)
AGROECOLOGIA
Para Godoy e Anjos (2007), objetivando a busca pela qualidade de
alimentos, os conceitos de soberania alimentar e sistemas de produção
baseados na agroecologia, ganharam muita atenção nas duas últimas décadas,
influenciando os movimentos sociais no campo e originando as feiras
agroecológicas. Dessa forma, as feiras livres têm desempenhado um papel
muito importante na consolidação econômica e social, especialmente da
agricultura familiar sob o ponto de vista do feirante, representando também um
espaço público, socioeconômico e cultural, extremamente dinâmico e
diversificado sob o ponto de vista do consumidor.
Os consumidores dos produtos de origem agroecológica, ao priorizarem
sua saúde e bem-estar, estão conscientes de que também promovem a
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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qualidade de vida e saúde para os trabalhadores rurais e que contribuem para o
estabelecimento de um novo tempo (ASSIS et al,1996).
A agricultura com base ecológica, ou melhor, orgânica, a cada dia é
reconhecida pelo mercado consumidor que almeja uma qualidade tanto do
produto quanto para a saúde humana, qualidade está vindoura em estratégias
de produção com ênfase agroecológica e a preocupação em um manejo de um
solo, em tratos culturais. Uma autonomia para não se atrelar a insumos externos,
buscando ao máximo utilizar-se dos meios que sua propriedade oferece e, com
isto, gerando economia e uma produção com base ecológica.
Segundo Melo et al. (2009), a agricultura orgânica vem ganhando cada
vez mais reconhecimento social, político e científico em todo o mundo por estar
fundamentada na aplicação de estratégias agroecológicas, mediante o uso de
insumos locais, aumentando o valor agregado e propiciando uma cadeia de
comercialização mais justa.
MANEJO ORGÂNICO
Para Moraes (1997), o tomateiro destaca-se entre as hortaliças cultivadas
por ser extremamente exigente em nutrientes, apresentando demandas
diferenciadas de acordo com os estágios de desenvolvimento, com a
duração do ciclo de cultivo, com o genótipo e com a época do ano.
Diante das problemáticas que as pragas e doenças causam de forma
avassaladora na cultura do tomate, os produtores têm dado muita importância
em um cultivo sombreado, ou em estufas, visto que este método tende a impedir
e minimizar a disseminação e proliferação das pragas, no mais, o sombreamento
dá a possibilidade de controlar os fatores climáticos externos.
De acordo com Leal (2006), a principal vantagem do sombreamento é a
ausência de chuvas no interior das estufas, fazendo com que não haja lixiviação
dos nutrientes aplicados, os quais, com o tempo, tendem a se concentrar na
superfície do solo. Quando chove, a estufa funciona como uma espécie de
chaminé, fazendo com que a umidade a sua volta migre, por difusão, para o
interior da estufa, carregando sais e aumentando a salinização.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Por esta razão, se faz necessário a utilização de manejos que venham a
maximizar o controle de pragas e doenças e, dessa forma, possa fortalecer a
produção tomateira no sentido de produzir em base orgânica e um produto de
boa qualidade para o mercado consumidor.
As principais medidas de controle de doenças bacterianas em tomateiro
são: plantar sementes de boa qualidade e/ou tratar previamente as
sementes; plantar cultivares resistentes; não plantar próximo a lavouras
velhas de tomate; evitar excesso de nitrogênio usando adubação equilibrada
(EMBRAPA, 2003).
Segundo Ferreira et al. (2003), a adição de matéria orgânica ao solo
aumenta a dose do adubo nitrogenado necessária à obtenção das máximas
produções total, comercial e extra de frutos de tomate, independente da
época de plantio.
Desta forma tem acontecido na zona rural do município de Campina
Grande-PB, mais precisamente no Sítio Catolé de Boa Vista. Nesta localidade,
tem se intensificado a produção de tomate orgânico para consumo familiar,
dando certa atenção à matéria orgânica do solo, segundo informações obtidas
por um associado do Assentamento Pequeno Richard. Este associado informou
que: “se o solo está nutrido, há diversos tipos de nutrientes, consequentemente,
diante disso, a possibilidade que não haja tamanha perca no cultivo é maior”.
Quando perguntado sobre a forma que tem produzido a cultura, o
associado informou “que tem feito um banco de sementes e vem semeando em
copos descartáveis sob o controle de temperatura, ou seja, usando uma pequena
tela, visto que das sementes que foram semeadas diretamente no solo, poucas
conseguiram germinar e crescer sem que houvesse percas, no sentido de que
logo houve ataque de pragas”.
Quando perguntado, ao associado, sobre as vendas da colheita que
obteve, este comentou que o fruto in natura é muito procurado, porém, devido
esta cultura ser de difícil manuseio, e por passar por um grande período de
estiagem no Semiárido Paraibano, este não conseguiu produção para a venda e
a tentava de produção orgânica foi feita apenas para consumo familiar.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Com relação à rentabilidade na produção orgânica de tomate, o associado
informou que há uma grande possibilidade de recursos financeiros, porém, tem
sido um desafio muito grande produzir em longa escala a cultura do tomate,
sendo que já fez a tentativa em pequena escala com todos os métodos de
manejo que poderiam ser utilizado em grande produção e, infelizmente, só houve
percas. Enfatizando o manejo adequado para a produção satisfatória do tomate,
o mesmo respondeu que, até então, uma das possibilidades de evitar danos é o
controle da temperatura externa, pois acredita que, se a cultura está protegida
por uma tela, o ataque de pragas é reduzido. No mais, informou que um dos
fatores benéficos na produção é que, antes de tudo, se tenha um solo fértil, pois,
consequentemente, haverá nutrientes suficientes para o bom desenvolvimento
do tomateiro e facilitará o controle de pragas e doenças através do uso frequente
de caldas e repelentes naturais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do assunto discutido neste trabalho, pôde-se obter claras
informações a respeito da cultura do tomate e de seu manejo agroecológico.
Este manejo é rentável e há possibilidade de sucesso no quesito colheita de boa
qualidade, porém, esta cultura exige maiores cuidados por ser muito susceptível
a pragas e doenças.
A produção convencional é descartada, pois, segundo informações do
associado que foi entrevistado, existem 50 associados que acreditam que a
produção tomateira não seria viável para o local, nem rentável, mediante ao fato
da cultura ser muito exigente no manejo e por ser de custo elevado.
Com relação ao associado entrevistado: “acredita na viabilidade da
produção tomateira realizada nos moldes agroecológicos” e afirma que “há
dificuldades na produção desta cultura” e vê esta produção como “um desafio
para agroecologia”.
Sobre as dificuldades e alternativas viáveis, precisa-se de mais incentivos
para a produção agroecológica no local, como por exemplo, uma assistência
técnica que venha a orientar os agricultores familiares de forma direta na
produção e dá subsidio à produção com práticas agroecológicas, visto que os
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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conhecimentos populares aliados aos técnicos se constituem como uma das
possibilidades de sucesso na produção do tomate.
Sobre a agroecologia e produção orgânica, o associado informa que: “é
viável, é rentável, e a única dificuldade de produzir nos dias de hoje é a questão
da escassez de água no local e a falta de profissionais que possam orientar os
pequenos produtores”.
Este trabalho indica que a produção do tomate orgânico estar a cada dia
crescendo no Brasil e sendo escolhido na mesa dos consumidores que prezam
pela saúde humana e por um consumo de qualidade. No distrito de Catolé de
Boa Vista, especificamente no lote do produtor Francinildo Filho Silva, a
produção do tomate ainda não é viável com base no manejo agroecológico, uma
vez que se nota a realização intensiva de praticas conservacionista, por parte
dos pequenos agricultores, e isso dificulta, por exemplo, a ministração de oficinas
e a difusão de ideias agroecológicas naquela localidade.
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DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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SUCESSÃO RURAL: RETRATOS DA JUVENTUDE RURAL DE SERRARIA -
PB
Gustavo José Barbosa4
INTRODUÇÃO
O Estatuto da Juventude sancionado pela Presidente da República, Dilma
Rousseff, com a Lei 12.852 de 05 de Agosto de 2013, afirma que: “são
consideradas jovens as pessoas com idade entre 15 (quinze) e 29 (vinte e nove)
anos de idade” (BRASIL, 2013). Na agricultura familiar, esta parcela significativa
da população passa por um momento de instabilidade, pois, não se vislumbra a
médio e longo prazo condições que lhes garantam uma vida financeira estável e
digna.
O êxodo rural é uma ameaça constante para o futuro do campesinato, e
ainda é uma temática pouco explorada pela academia e por organismos
governamentais que, ao tratar do tema “juventude” tende a generalizar a
discussão, não observando as especificidades desta parcela que habita no
campo (Castro, 2009). Por outro lado, entidades que representam o campesinato
brasileiro, como a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
(CONTAG), tem apresentado ao Governo Federal uma pauta extensão em prol
da juventude de campo, que engloba ações que vão do acesso à terra até a
qualificação profissional (CONTAG, 2014).
Num estudo realizado por Brasil (2005), observou-se que os
pesquisadores que se arriscam a estudar esta problemática da juventude
campesina, se deparam com duas situações desafiadoras: a constante migração
e a falta de clareza da realidade desta fatia da população brasileira. Um dos
desafios dos órgãos que trabalham pela permanência do jovem no campo, é
identificar os motivos que os levam a migrar para zona urbana, e quais ações
podem ser construídas com os sujeitos deste contexto, para gerar condições
dignas de permanência na gleba (BRASIL, 2013).
4 Aluno do Programa de Pós-graduação em Ciências Agrárias (Agroecologia) da Universidade
Federal da Paraíba. E-mail: [email protected]
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
22
Nos últimos anos, o Governo Federal através do Ministério do
Desenvolvimento Agrário (MDA), tem promovido algumas políticas públicas com
o objetivo de manter o jovem camponês nas atividades que sua família
desenvolve há gerações. Entre estas ações, podemos citar a aquisição de
propriedades pelo Minha Primeira Terra do Programa Nacional de Crédito
Fundiário (PNCF), e o Crédito Rural através do Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF Jovem).
Especialmente no Nordeste, o acesso a estas políticas públicas ainda é
tímido, pois a dinâmica de organização dos jovens campesinos (associação,
sindicato e cooperativa) ainda é pequena, logo, as conquistas alcançadas junto
ao Governo são pouco difundidas na base. Outro fator considerável, é a falta de
ação das entidades para planejar junto com os jovens a operacionalização das
atividades, sejam os órgãos de extensão rural públicos ou do terceiro setor.
Neste sentido, buscamos conhecer o perfil da juventude rural do município
de Serraria-PB, para que a partir deste desenho social, possamos vislumbrar
ações concretas que possibilitem construir um futuro de dignidade nas
comunidades rurais. Este desafio só será alcançado através da organização dos
jovens, mapeando seus problemas, buscando traçar caminhos que alcancem
bons resultados, através da interação dos órgãos que trabalham com esta
parcela vital para a sobrevivência da agricultura familiar, e o futuro do país.
PERFIL DA JUVENTUDE
Este trabalho foi realizado no município de Serraria-PB, inserido no
Território da Borborema, e organizado em diversas comunidades rurais e
assentamentos da reforma agrária. Foi aplicado um questionário previamente
elaborado com jovens rurais nas seguintes comunidades: Campineiro, Matinha,
Pau Barriga e Salamandra.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Tabela 01. Frequência observada por região (%) e total (%) das características
sociais de jovens rurais no município de Serraria, Estado da Paraíba.
Variáveis Resultados
Idade (anos) (%)
Entre 15 e 20 50,00
Entre 20 e 25 25,00
Entre 25 e 29 25,00
Sexo (%)
Masculino 50,00
Feminino 50,00
Estado Civil (%)
Solteiro 62,50
Casado 12,50
União Estável 25,00
Escolaridade (%)
Alfabetizado 12,50
Fundamental Incompleto 43,75
Médio Incompleto 18,75
Médio Completo 12,50
Superior Incompleto 12,50
Integração
Igreja 43,75
Associação 18,75
Sindicato 18,75
Nenhum 18,75
Na tabela 01 são apresentados os dados relativos à idade, onde 50% dos
jovens estão na faixa de 15 a 20 anos, sendo um ponto importante a ser
analisado, pois neste período está sendo formada a consciência crítica do
indivíduo e seus planos para o próximo período. Com relação ao sexo, percebe-
se ainda na tabela 01 que há um equilíbrio entre jovens do sexo masculino e
feminino, demonstrando a necessidade de trabalhar ações afirmativas de
gênero, para que as mulheres tenham condições de desenvolver suas atividades
produtivas sem prejuízos presentes constantemente na sociedade.
Com relação ao estado civil, é possível visualizar que mais de 60% ainda
é solteiro, o que demonstra a tarefa de divulgar as políticas públicas que
garantam a permanência destes jovens no campo. No que trata da escolaridade,
conclui-se que houve um significativo avanço em relação a um passado recente
no Brasil, onde tínhamos uma população rural analfabeta, já que a pesquisa
mostra que mais de 70% dos entrevistados já ultrapassou a barreira do
analfabetismo e está ativo na dinâmica escolar.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
24
Um dos fatores que possibilitará a organização e a permanência do jovem
no campo será a sua participação efetiva em entidades que os represente.
Identificamos na pesquisa que mais de 40% frequenta com assiduidade a Igreja,
majoritariamente a Católica Romana. Após o Concílio Vaticano II, a Igreja
Católica Apostólica Romana (ICAR) iniciou um trabalho de base voltado para as
questões sociais, e hoje é possível visualizar inúmeros organismos que
trabalham a temática campesina, que podem contribuir com a juventude rural:
Pastoral da Juventude Rural (PJR), Serviço de Assistência Rural (SAR) e a
Comissão Pastoral da Terra (CPT); os religiosos ligados a Teologia da
Libertação, ao se aproximaram dos movimentos sociais, enaltecem a
convergência entre a religião e a luta campesina, atraindo assim a juventude
para a comunidade religiosa (BRASIL, 2009).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa nos aponta a existência de uma juventude que luta para ter
uma vida diferente dos seus pais, que na maioria das vezes não ultrapassou a
barreira do analfabetismo e, consequentemente não encontrou condições para
crescer na dinâmica organizacional da sua Unidade Familiar de Produção (UFP).
Logo, o panorama aponta a possibilidade de realizar um trabalho eficiente, que
através da inserção dos jovens nas políticas públicas voltadas para a agricultura
familiar, dê condições para que eles permaneçam no campo.
A agricultura familiar tem se apresentado na economia brasileira como
setor de grande importância na produção de alimentos, fazendo-se necessária a
garantia da sucessão rural, para que a população nas décadas vindouras não
enfrente uma crise na segurança alimentar. O trabalho com a juventude rural
garantirá ao País a estabilidade de milhares de cidadãos, a produção de base
familiar de qualidade utilizando tecnologias adaptadas e agroecológicas, e a
construção de uma pátria soberana que bem antes da chegada dos europeus no
século XVI já era agrícola.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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REFERÊNCIAS
Brasil. Antônio Maria Gomes de Castro (et al). Juventude rural, agricultura
familiar e políticas de acesso à terra no Brasil. Brasília: Mda, 2013. 56 p.
BRASIL. Elisa Guaraná de Castro. UFRRJ. Os jovens estão indo embora? :
Juventude Rural e a construção de um ator político. Rio de Janeiro: Mauad, 2009.
223 p
BRASIL. Nilson Weisheimer. Juventudes rurais: mapa de estudos
recentes. Brasília: Mda, 2005. 76 p.
BRASIL. Lei nº 12.852, de 05 de agosto de 2013. Institui o Estatuto da
Juventude e dispõe sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das
políticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de Juventude - SINAJUVE.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-
2014/2013/Lei/L12852.htm. Acesso em: 01/05/2014.
CASTRO, E. G. Juventude Rural no Brasil: processos de exclusão e a
construção de um ator político. Revista Latino-americana de Ciências Sociais. V.
7, p. 179-208, 2009.
CONTAG. Sobre a Sucessão Rural. Disponível em
http://www.contag.org.br/index.php?modulo=portal&acao=interna&codpag=387
&ap=1&nw=1. Acesso em: 01/05/2014.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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CAPÍTULO 03
INCENTIVO A SISTEMAS AGROFLORESTAIS NA
REGIÃO SUL DO PARÁ
Leopoldo Oliveira de Lima
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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INCENTIVO A SISTEMAS AGROFLORESTAIS NA REGIÃO SUL DO PARÁ
Leopoldo Oliveira de Lima 5
INTRODUÇÃO
Sistemas Agroflorestais (SAF’s), segundo Rebraf (2007), podem ser
definidos como o cultivo de espécies agrícolas de ciclo curto, frutíferas, perenes
lenhosas (árvores, arbustos, palmeiras, bambus), florestais (madeireiras e não
madeireiras) e/ou criação de animais, quando manejados no mesmo espaço
físico e tempo, de forma intencional. Segundo Adbo (2008), para ser considerado
um Sistema Agroflorestal, necessariamente, deve haver uma espécie florestal
com utilização, madeireira ou não madeireira, neste sistema de produção.
No mesmo Módulo, deve-se procurar cultivar e manejar diferentes
espécies de vegetais de diferentes grupos ecológicos sucessionais (pioneira,
secundária e clímax) em diferentes estratos arbóreos. Os SAF’s possuem várias
vantagens, dentre elas podemos destacar: o melhoramento das condições físico-
químicas e biológicas dos solos devido a constante ciclagem de nutrientes entre
os seres vivos e o solo existentes nos sistemas.
Para Vasquez e Costas (2011), os SAF’s contribuem no controle da
erosão do solo devido a permanente cobertura do mesmo; possibilitando a
ocupação do solo com maior aproveitamento da luz, dos nutrientes e da água
presentes no sistema em virtude do cultivo, ao mesmo tempo de diferentes
espécies vegetais com exigências nutricionais divergentes.
Outra vantagem, segundo Abdo (2008), está na possibilidade de
recuperação de áreas degradadas e, por conseguinte, regularização ambiental
dos estabelecimentos familiares junto aos órgãos ambientais governamentais.
Do ponto de vista socioeconômico, as principais vantagens, conforme
Barreto [19-?], devem-se a uma melhor distribuição de mão-de-obra familiar, ao
5 ¹ Engenheiro Agrônomo, Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Ciências Agrárias
(Agroecologia), Universidade Federal da Paraíba - Campus III, Bananeiras - PB, e-mail: [email protected]
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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longo do ano, gerando renda e emprego, bem como maior variedade de
alimentos disponíveis, garantindo segurança alimentar e nutricional aos
agricultores familiares; outra característica de SAF’s consiste na redução dos
riscos de perda da produção, devido ao maior "equilíbrio" do sistema
diversificado com a produção de frutas, culturas brancas, produtos florestais não-
madeireiros e produtos florestais madeireiros.
A implantação de SAF’s está atrelada a vários princípios agroecológicos,
dentre os quais se destaca a diversificação específica e genética do
agroecossistema no tempo e no espaço. Segundo Altieri. et al. (1989), também
permite o aumento das interações biológicas, os sinergismos entre os
componentes do sistema, promove importante processos e serviços ecológicos.
Possibilita, ainda, condições de solo favoráveis para o crescimento das plantas,
particularmente, através do manejo de matéria orgânica, aumentando a atividade
biótica do solo.
Portanto, neste trabalho será discutido sobre os Sistemas Agroflorestais,
tomando por base uma experiência de incentivo à sua implantação no Projeto de
Assentamento Pecosa, na região Sul do Estado do Pará, no município de
Conceição do Araguaia. O processo de incentivo à implantação de SAF’s ocorreu
em três etapas, a primeira se inicia a partir de 1996, com implantação de módulos
demonstrativos de SAF’s em estabelecimentos familiares, com assessoria de
Organizações Não Governamentais de região. A segunda fase ocorreu em 2004
com a elaboração do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Assentamento,
onde se propõe a implantação de módulos de SAF’s como política pública de
desenvolvimento sustentável para região. E a terceira etapa, entre 2010 e 2013,
se dá a partir da contratação de operações de crédito rural através do Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar(PRONAF), tendo como
proposta de desenvolvimento a implantação de SAF’s e/ou sistemas de
fruticultura consorciados, quando a implantação de módulos SAF’s torna-se uma
política pública de desenvolvimento.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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RELATO DA EXPERIÊNCIA
O presente trabalho tem por objetivo relatar algumas experiências de
diversificação de sistemas de produção de agricultores familiares, no município
de Conceição do Araguaia, a partir da implantação de módulos demonstrativos
de Sistemas Agroflorestais, da elaboração de Planos de Desenvolvimento
Sustentáveis dos Assentamentos (PDSAs) e da implantação de algumas
propostas de desenvolvimento de SAF’s a partir do Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF).
O município de Conceição do Araguaia, localizado na região Sul do
Estado do Pará, no bioma Amazônia, possui um clima tropica com uma estação
chuvosa e uma estação seca bem definidas. A vegetação, predominante na
região, é Floresta Amazônica, com algumas áreas de transição para o Cerrado.
O sistema de produção praticado na região, conhecido como "roça de
toco" ou agricultura migratória, consiste na derrubada e queima da mata nativa
e na implantação de culturas alimentares anuais, quase sempre acompanhadas
de gramíneas para a formação das pastagens. Este sistema baseia-se na
fertilidade natural dos solos e por meio das cinzas e possibilita que haja,
inicialmente, uma grande diversidade de espécies cultivadas, além de, durante
o período de pousio, permitir a regeneração de parte das espécies vegetais
presentes na área.
No entanto, na medida em que cresce a demanda pelo uso da terra,
percebe-se que este período de pousio não tem sido adotado por boa parte dos
agricultores familiares, que recorrem à implantação de pastagens logo no
primeiro ano. Tem-se verificado que esta prática contribui para o aumento da
degradação ambiental na medida em que aumentam as áreas de abertura e,
também, as áreas desgastadas pelo uso contínuo.
O processo de implantação de SAF’s na região do Sul do Pará teve início
na década de 1990, quando os agricultores familiares da região já haviam
conquistado as terras com luta, sangue e organização. Era necessário dar um
passo a mais: viver de forma digna na zona rural com desenvolvimento
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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econômico, gerando emprego e renda com conservação do meio ambiente.
Segundo o PDH e a DIOCESE DE CONCEIÇÃO DO ARAGUAIA (2000), a partir
de uma discussão entre o Sindicato de Trabalhadores Rurais (STR) de
Conceição do Araguaia-PA e o STR de Floresta do Araguaia-PA, com a
assessoria técnica do Projeto de Desenvolvimento Humano (PDH) - Diocese de
Conceição do Araguaia, e da Comissão Pastoral de Terra (CPT) foi avaliado que
a implantação de SAF’s ser uma alternativa aos agricultores familiares como
forma de diversificação da produção frente ao processo de pecuarização dos
estabelecimentos familiares da região.
Segundo Copatiorô (2004), entre 1995 e 1996, foram implantados no
Projeto de Assentamento Pecosa, em Conceição do Araguaia-PA, 09 (nove)
Módulos Demonstrativos de SAF’s. Neste processo, houve apoio do
Departamento Nacional de Cooperativismo (DENACOOP), recebendo, cada
família participante do Projeto, R$ 1.000,00 (um mil reais), sem devolução, para
iniciar as atividades produtivas (aquisição de mudas, sementes, saquinhos e
construção de viveiros). O local definido para desenvolver os módulos de SAF’s,
dentro do estabelecimento, foi discutido com a família observando as condições
edafoclimáticas, bem como, a topografia do lote.
De acordo com o PDH e a DIOCESE DE CONCEIÇÃO DO ARAGUAIA
(2000) e Copatiorô (2004), foram implantados módulos com as seguintes
espécies vegetais: banana (Musa spp), cupuaçu (Theobroma grandiflorum
Schum), café (Coffea arábica L.), ingá (Inga sp), manga (Mangifera indica L.),
citrus (Citrus spp), coco (Cocos nucifera L.), maracujá (Passiflora edulis Sims),
abacaxi (Ananas comosus L. Merril), caju (Anacardium occidentale L.), acerola
(Malpighia punicifolia L.), bacaba (Oenocarpus bacaba Mart.), cacau
(Theobroma cacao L.) e algumas espécies florestais nativas da região como
jatobá (Hymenaea courbaril L.), cedro (Cedrela fissilis Vell) e mogno (Swietenia
macrophylla King).
No início do processo de plantio das mudas, em cada módulo, foi
sugerido, nas entrelinhas, o cultivo de culturas anuais como arroz (Oryza Sativa
L.), milho (Zea mays L.) e mandioca (Manihot esculenta Crantz), visando a
segurança alimentar das famílias, podendo, também, aproveitar áreas de
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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capoeiras e enriquecê-las com as espécies frutíferas e florestais. Os Módulos
estavam se desenvolvendo bem nas condições locais, mas, em 1998, uma
queimada descontrolada dizimou a maioria dos módulos de SAF’s do Projeto de
Assentamento, segundo Copatiorô (2004).
A partir destes Módulos Demonstrativos de SAF’s, em 2004, a
Cooperativa de Serviço e Apoio ao Desenvolvimento Humano e Sustentável
Atiorô (COPATIORÔ) buscou incentivar a multiplicação destas experiências
como Políticas Públicas. Este processo se deu através da elaboração de Projeto
de Desenvolvimento Sustentável do Assentamento (PDSA) em convênio com o
INCRA (Instituto Nacional de Reforma Agrária), com a inclusão de módulos de
SAF’s como proposta de desenvolvimento para agricultores familiares
assentados da reforma agrária.
Com metodologia de pesquisa participativa, respeitando o histórico de
experiência passadas, as condições locais dos estabelecimentos familiares e os
saberes locais das populações durante o processo de construção do PDSA do
Projeto de Assentamento Pecosa, foram sugeridos, às famílias do Projeto, dois
tipos de Módulos. Para aquelas famílias que possuíam áreas mais secas e mais
altas foram sugeridos Módulos "Tipo Sol", isto é, aquelas que apresentassem
espécies vegetais que eram mais exigentes em luminosidade, com boa
aceitação comercial e que eram cultivadas por algumas famílias. Foram
propostos módulos com as seguintes culturas: citrus (Citrus spp), coco (Cocos
nucifera L.), acerola (Malpighia glabra L.), abacaxi (Ananas comosus L. Merril).
Os Módulos "Tipo Sombra" (Figura 1) foram propostos para agricultores
familiares com espécies vegetais que necessitavam de sombreamento. O
objetivo desses módulos era a reposição florestal das áreas derrubadas, além
de enriquecer as áreas de mata remanescentes com culturas comerciais. Nestes
módulos foram propostas as seguintes culturas: cupuaçu (Theobroma
grandiflorum Schum), café (Coffea spp L.), banana (Musa spp), e castanha-do-
pará (Bertholettia excelsa H.B.K.).
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Figura 1 - Módulo de sombra com cultivo de banana e cupuaçu – Foto: Leopoldo
Oliveira de Lima
A partir destas experiências, várias propostas de crédito do PRONAF
(Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) foram
contratadas na Agência do Banco da Amazônia de Conceição do Araguaia-PA.
Entre 2010 e 2013, foram efetivadas 38 (trinta e oito) operações de crédito rural
do PRONAF-A para agricultores familiares do Projeto de Assentamento Pecosa.
Todas as operações de crédito possuíam como elemento e proposta de
desenvolvimento a implantação de SAF’s e/ou sistemas de fruticultura
consorciados, totalizando um valor de R$ 761.478,85 em investimentos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Existem alguns desafios para implantação dos SAF’s na região Sul do
Estado do Pará: o primeiro consiste na dificuldade para realizar a irrigação das
mudas de espécies florestais e frutíferas na primeira estação seca após o plantio
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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das mesmas. Muitas vezes por haver carência de rede de energia na zona rural
da região, ou por não haver recursos financeiros para aquisição dos
equipamentos de irrigação (canos, bombas). Assim, a irrigação é feita de cova
em cova com regadores manuais, demandando muito tempo e esforço físico das
famílias. Muitas vezes, os Módulos não se desenvolvem de forma satisfatória,
chegando, algumas plantas, a morrerem por deficiência hídrica (Figura 2).
Figura 2- Frutífera morta devido a déficit hídrico- Foto: Leopoldo Oliveira de
Lima
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Outro desafio, difícil de ser superado e que desestimula muitas pessoas
que desejam trabalhar com SAF’s, são as queimadas descontroladas que
geralmente, ocorrem todos os anos no período de julho a setembro, matando e
destruindo pomares, casas (Figura 3), animais silvestres e domésticos,
pastagens, matas, além dos módulos de Sistemas Agroflorestais.
Figura 3- Moradia destruída pelo fogo- Foto: Leopoldo Oliveira de Lima
É necessário, também, que os profissionais de ciências agrárias, a
maioria formada para trabalhar e difundir tecnicamente os conceitos da chamada
Revolução Verde, principalmente os envolvidos com a Assistência Técnica e a
Extensão Rural (ATER), mudem suas mentalidades, transformando o paradigma
de desenvolvimento que possuem e passem a incentivar a implantação de SAF’s
aos agricultores familiares campesinos, como instrumento para transição
agroecológica dos sistemas agrários.
Apesar destas dificuldades, já existem agricultores familiares com
experiências bem sucedidas de SAF’s na região Sul do Pará, onde os mesmos,
além de produzirem frutos, lenha, óleos essências, madeira, também fazem a
integração de seus sistemas de produção vegetal com a criação de abelhas,
peixes, bovinos e suínos, gerando renda, trabalho e segurança alimentar para
as famílias.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
35
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABDO, Maria Teresa Vilela Nogueira; VALERI, Sérgio Valiengo; MARTINS,
Antônio Lúcio Mello. Sistemas Agroflorestais e Agricultura Familiar: Uma
Parceira Interessante. Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária, [si], v. 1,
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ALTIERI, Miguel et al. Agroecologia: As Bases Científicas da Agricultura
Alternativa. 2. ed. Rio de Janeiro: AS-PTA, Assessoria e Serviços & Projetos em
Agricultura Alternativa, 1989. 237 p.
BARRETO, George Thomas Pacheco. SAF’s (A Castanheira Feliz). Marituba:
Emater-Pará, [19-?]. 14 p.
COOPERATIVA DE SERVIÇO E APOIO AO DESENVOLVIMENTO HUMANO E
SUSTENTÁVEL ATIORÔ - COPATIORÔ (Pará). Plano de Desenvolvimento
Sustentável do Projeto de Assentamento Pecosa. Conceição do Araguaia,
2004. 97 p.
PROJETO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO (PDH) - DIOCESE DE
CONCEIÇÃO DO ARAGUAIA/COMISSÃO PASTORAL DA TERRA - CPT
(Org.). Sistemas agroflorestais como uma alternativa para a agricultura
familiar do Sul do Pará: Relato de Experiência em Conceição do Araguaia e
Floresta do Araguaia -Pará. Conceição do Araguaia, 2000. 28 p.
REBRAF. Manual Agroflorestal para a Mata Atlântica. [si], 2007. 53 p.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL (UAB). Cadernos de Licenciatura em
Ciências Agrárias, Universidade Federal da Paraíba; Centro de Ciências
Humanas Sociais e Agrárias; Organizadores: Marcos Barros de Medeiros,
Geralda Macedo, Luís Felipe de Araújo – Autores: Silvestre Fernandez Vásquez
e José Roberto da Costa. Sistemas Agroflorestais. Bananeiras: Editora
Universitária/UFPB, 2011. v.7. Caderno Especial 04.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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CAPÍTULO 04
A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO
SEMIÁRIDO BRASILEIRO
José Romário Lacerda de Barros
Adamastor Pereira Barros
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO
José Romário Lacerda de Barros6
Adamastor Pereira Barros
INTRODUÇÃO
Cerca de um terço da superfície terrestre está emersa pela água deste
volume 97,5% constituem-se águas salgadas disponíveis nos oceanos e que não
se adéquam para a maior parte das atividades humanas devido às elevadas
taxas de sais encontradas em sua composição, já os outros 2,5% constitui-se
como água doce essencial para os diferentes usos, deste valor 68,9%
encontram-se em forma de geleiras; 29,9% são as águas subterrâneas; 0,3%
são os rios e lagos e 0,9% são os demais reservatórios.
O Brasil abriga 13% dos recursos hídricos do todo o total disponível do
planeta, só que estes se encontram geograficamente distribuídos de forma
heterogênea. Mais de 68,5% do volume de água está na região norte onde vivem
cerca de 6,98% da população; na região centro oeste o volume é de 15,7 para
6,41% da população; na região sudeste onde vive quase a metade da população
brasileira cerca de 42,65% detém apenas um volume de 6% na região sul possui
um volume de 6,5% para uma população de 15,05% e a região nordeste possui
um valor de apenas 3,3% para uma população de 28,91%.
A região nordeste é caracterizada pela ocorrência de duas estações, a
chuvosa que advém em poucos meses do ano e a seca que sobrevém na maioria
dos meses, altas temperaturas, distribuição heterogenia das chuvas e pela baixa
umidade.
Cirilo et al (2005, p. 82) destaca que “o clima do semiárido é marcado por
um regime de chuvas intensamente limitado em quatro meses fevereiro a maio,
6 Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Ciências Agrárias (Agroecologia)/UFPB,
Bananeiras, PB. E-mail: [email protected]
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
39
e por uma grande variabilidade interanual”. Exclusivamente em todo semiárido,
a precipitação média ocorre entre 300 e 800 mm/ano (REBOUÇAS, 1997). A
evaporação da região nordeste atinge 3000 mm/ano (ROBERTO, 2007).
Carvalho (2013, p. 3) ressalva que “o subsolo rico em rochas cristalinas, de baixa
permeabilidade, dificulta a infiltração de água no subsolo, contribuindo para que
seja inibida a formação de aquíferos subterrâneos”.
Este capítulo objetiva contribuir para a conscientização da problemática
da escassez hídrica e promover o envolvimento da sociedade nos debates e
ações decisórias relativas à gestão dos recursos hídricos, com ênfase na região
semiárida.
Sua elaboração foi baseada em pesquisa bibliográfica, fundamentadas
em partes de trabalhos de autores da área afim e em consenso com a política
ambiental do país e com isso espera-se colaborar para a evolução do
conhecimento dessa temática que é de suma importância para todos.
ASPECTOS SOCIAIS
Águas urbanas, disponibilidade e impactos
Segundo Mucelin e Bellini (2008, p. 111) “a criação das cidades e a
crescente ampliação das áreas urbanas têm contribuído para o crescimento de
impactos ambientais negativos”. A dinâmica das cidades depende de uma série
de fatores relacionados a eventos severos ou indesejáveis, que podem repercutir
nas atividades e na vida da sociedade causando transtornos devido à
distribuição do espaço urbano (RIGHETTO et al, 2009). Com o processo de
urbanização os impactos sobre os corpos de água tende a alargar em volume e
velocidade o escoamento superficial, reduzindo a recarga de aquíferos,
deteriorando os mananciais e aumentando a vazão de pico, se comparadas às
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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vazões observadas para a bacia em seu estado natural (JUNIOR, 2009).
Com o avanço industrial o número de fabricas aumentou
progressivamente e com isso os materiais trabalhados não são tratados e são
lançados diretamente nos rios e córregos, esses materiais podem ser metais
pesados que quando em contato com os corpos hídricos podem causar
mortandade de várias espécies na vida marinha, e assim causar um grande
abalo no ecossistema.
Águas rurais e acessibilidade
A água também traz
dificuldades para os moradores das
zonas rurais quanto a sua
acessibilidade, uma vez que no
semiárido nordestino em
decorrência da falta de tecnologias
poupadoras de água, a população
rural enfrenta um caos nos períodos secos.
Os reservatórios no campo são em sua grande maioria de pequeno porte
e estes se esgotam muito precocemente, como a região devida suas
características geológicas não permitem a perfuração de poços com grandes
vazões, sobrevêm nas propriedades de uma maneira homogenia a perca das
plantações, falta de alimentação para o gado e consequente queda de produção
agropecuária acarretando a falta de renda e migração dos habitantes para as
zonas urbanas.
O fornecimento de água pelas companhias de abastecimento ainda são
muito incomuns nas zonas rurais, a população continuamente fica prendida o
assistencialismo simples do abastecimento por carros-pipa e a qualidade destas
águas é desconhecida na maioria dos casos.
Figura 1: Semiárido da Paraíba. Foto: JRL Barros.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Açudagem, transposição e programa 1 milhão de cisternas
Os terrenos nordestinos dificultam a retenção de água no solo a qual se
perde rapidamente devidos estas características e também ao fato das chuvas
locais serem de alta intensidade em um curto período de tempo favorecido pelo
rápido escoamento superficial. Com isso tornou-se necessário a fim de guardar
a água nessas extensões, a construção de obras hídricas, como barreiros,
cisternas, açudes e barragens. Barbosa e Ponzi Jr. (2006, p. 32) destacam que
“a construção de grandes açudes públicos pelo Departamento Nacional de
Obras Contra as Secas (DNOCS) veio acompanhada de uma proposta de
reordenação da estrutura fundiária”.
O Programa 1 Milhão de Cisternas (P1MC) visa a articulação e a
convivência sustentável com o Semiárido. A finalidade do P1MC é favorecer
cerca de 5 milhões de pessoas no semiárida, com água potável pelo meio das
cisternas de placas. As bases para criação do P1MC foram à experiência por
parte da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) foi a captação de água de chuva
por iniciativa familiar (CASTRO, 2011).
A integração da bacia do rio São Francisco tema mais discutido no
nordeste, mira transpor parte das águas a jusante do lago de Sobradinho através
de aquedutos e bombeamento por dois eixos até rios e açudes dos estados de
Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte. O assunto é cercado de
polêmicas, pois tem grande importância para o abastecimento da região
nordeste, mas tem entraves ambientais devido à dimensão da obra. Becker
(2010, p. 3) destaca que “para o governo federal, este projeto representa a
redenção do Semiárido, uma vez que tem por objetivo beneficiar até 2025, 390
municípios e 12 milhões de sertanejos que enfrentam a seca”.
Usos da água
1) Agricultura
A agricultura é responsável por 70 % do uso da água no mundo. A maioria
dos sistemas de irrigação atuais não são eficientes e assim desperdiçam a água
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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que ultrapassa os limites de demanda adequados para cada cultura. Outra
dificuldade é a diminuição do estoque de água refletem na própria atitude em
reflexos negativos, a escassez prejudica no caso da agricultura irrigada no
abastecimento de alimentos provocando aumento dos preços dos alimentos.
2) Industrial
O uso da água no setor industrial se caracteriza por ser realizado de
variadas formas, a citar o uso como insumo no processo produtivo a exemplo do
que é mostrado na figura abaixo, o uso em sistemas de utilidades (resfriamento,
caldeiras etc.) e para fins sanitários.
3) Consumo urbano e rural
A crescente e continuada urbanização alarga a demanda de água para
tratamento e fornecimento, assim como as ações antrópicas nas cidades para a
realização das necessidades diárias, nas cidades os desperdícios com lavagem
de calçadas e de veículos. É muito comum à água que abastece as cidades
prover de regiões circunvizinhas. É necessário um esforço ambiental educativo
da população para a utilização de metodologias eficientes como o reuso da água
que consiste no uso de água residuária ou água de qualidade inferior tratada ou
não.
O consumo rural continua sendo um dos que menos consume água no
nordeste em virtude da diminuição da população rural e da ausência de
abastecimento por companhias de abastecimento no campo, o consumo rural é
baseado na captação da água da chuva através das cisternas para utilização
das principais atividades normalmente beber e preparação de alimentos.
4) Hidrelétricas
A energia hidrelétrica é a obtenção de energia elétrica através do
aproveitamento do potencial hidráulico de um rio. Para que esse processo seja
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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realizado é necessária à construção de usinas em rios que possuam elevado
volume de água e que apresentem desníveis em seu curso.
Os impactos ambientais ocasionados pelo represamento da água para a
formação de imensos lagos artificiais são: destruição de extensas áreas de
vegetação natural, matas ciliares, o desmoronamento das margens, o
assoreamento do leito dos rios, prejuízos à fauna e à flora locais, alterações no
regime hidráulico dos rios e extinção de algumas espécies de peixes.
ASPECTOS DE LEGISLAÇÃO
A Lei 9433 de 08 de janeiro de 1997
A Lei Nº. 9.433, institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, com o objetivo de
assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água,
em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos, com vistas ao
desenvolvimento sustentável; a prevenção e a defesa contra eventos
hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos
recursos naturais (BRASIL, 1997).
O atual modelo de gerenciamento de recursos hídricos é discutido em três
modelos: modelo burocrático, modelo econômico-financeiro e modelo sistêmico
de integração participativa.
No primeiro modelo, Borsoi e Torres (1997, p. 9) destacam que “a
administração pública tinha como objetivo predominante cumprir e fazer cumprir
os dispositivos legais sobre águas. Havia extensa legislação a ser obedecida,
relativa a concessões e autorizações de uso, licenciamento de obras, ações de
fiscalização, interdição e multa etc.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
44
O segundo modelo levava a obediência aos princípios legais vigentes,
não conseguiu levar a utilização social e econômica da água, gerando conflitos
entre os setores (PIZAIA et al., 2007).
O mais contemporâneo modelo de gerenciamento de recursos hídricos é
o sistêmico de integração participativa, caracterizado pela criação de uma
estrutura sistêmica, responsável pela execução de funções gerenciais
específicas e pela adoção de três instrumentos: o primeiro é o planejamento
estratégico por bacia hidrográfica, o segundo é a tomada de decisão através de
deliberações multilaterais e descentralizadas e o terceiro refere-se ao
estabelecimento de instrumentos legais e financeiros (SILVA, 2006).
OS INSTRUMENTOS DE GESTÃO
1) Os planos de recursos hídricos
Os planos de Recursos Hídricos são diretores e de longo prazo e visam a
fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional de Recursos
Hídricos e o gerenciamento dos recursos hídricos com horizonte de
planejamento compatível com o período de implantação de seus programas e
projetos.
2) O enquadramento dos corpos hídricos segundo os usos preponderantes
De acordo com a Resolução CONAMA 20/86, “o enquadramento dos
corpos d’água deve considerar não necessariamente seu estado atual, mas os
níveis de qualidade que deveriam possuir para atender às necessidades da
comunidade e garantir os usos concebidos para os recursos hídricos”.
3) A outorga de direito dos usos de recursos hídricos
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
45
Segundo Almeida (2003, p.3) “a outorga é um instrumento discricionário
através do qual o proprietário de um recurso natural estipula quem pode usá-lo
e as respectivas limitações”.
4) A cobrança pelo uso dos recursos hídricos
Para Pedras et al. (2003, p. 6), “a cobrança pelos usos dos recursos
hídricos sugerirá um estímulo econômico à racionalização desses usos através
de refinamentos nos sistemas produtivos, quer seja reduzindo os volumes
captados e consumidos, quer seja melhorando a qualidade dos efluentes
lançados procurando assim a recomendação da importância do uso sustentável
dos recursos hídricos”. A cobrança pela retirada de água bruta é tratada como
um instrumento de gestão que visa a atingir objetivos sociais, financeiros,
econômicos ou ambientais (RIBEIRO E LANNA, 1997).
5) O sistema de informação sobre recursos hídricos
Rocha et al (2002) destaca que “ o Sistema de Informações sobre
Recursos Hídricos é um dos instrumentos da Política de Recursos Hídricos,
tendo sido instituído com o objetivo de reunir, consolidar e divulgar os dados e
informações relacionados à gestão dos recursos hídricos otimizando o
planejamento e aumentando a eficiência do uso da água”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do abordado pode-se obter as seguintes considerações:
A escassez hídrica é uma ameaça para a população que habita o semiárido
devido suas características naturais e o modelo de desenvolvimento utilizado.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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O acesso à água e sua utilização nas zonas urbanas e rurais podem ter
impactos ambientais de enormes dimensões em aspectos quantitativos e
qualitativos.
Os transtornos que ocorrem no nordeste são decorrentes da falta de políticas
públicas de combate ao desperdício da água e de sua acessibilidade.
O Programa 1 Milhão de Cisternas é uma tecnologia de convivência com o
semiárido responsável por garantir água potável para consumo humano e a
transposição do rio São Francisco surge como uma alternativa em épocas de
estiagens prolongadas.
Entre os usos da água devem ser mais trabalhados em relação a uma utilização
mais racional: a agricultura, o uso industrial e o urbano.
A legislação nacional ainda é pouco utilizada na pratica e deve aprimorar-se em
alguns aspectos como a fiscalização, estabelecimento de liberação de
demandas, cobrança pelo uso dos recursos hídricos a fim de inibir o desperdício
dentro da bacia hidrografia.
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de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de
Recursos Hídricos, regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Constituição
Federal, e altera o art. 1º da Lei nº 8.001, de 13 de mar. de 1990, que
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CAPÍTULO 05
APLICAÇÕES DO NONI (Morinda Citrifolia L.) NA
MEDICINA POPULAR
Juliana Pontes Soares
Marcos Barros de Medeiros
Rejane Pontes Soares
APLICAÇÕES DO NONI (Morinda Citrifolia L.) NA MEDICINA POPULAR
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Juliana Pontes Soares7
Marcos Barros de Medeiros
Rejane Pontes Soares
INTRODUÇÃO
O uso de plantas medicinais para o tratamento de doenças vem desde os
primórdios da civilização. A difusão do conhecimento empírico permitiu que as
plantas fossem positivamente selecionadas para sanar a necessidade de cura
de determinadas enfermidades. Sendo assim, a transmissão destes
conhecimentos, muitas vezes de forma oral, permitiu que várias gerações
tivessem acesso a diversas formas de tratamento (FLORES, 2005).
O avanço da medicina convencional não inibiu o progresso das práticas
curativas populares, pois estas trazem a possibilidade de uma melhor relação
custo – benefício para a população, promovendo saúde a partir de plantas
produzidas localmente.
A Morinda citrifolia é uma planta que tem sido usada por mais de 2000 anos
pelos povos polinésios. Conhecida como Noni, popularizou-se devido sua
infinidade de nutracêuticos e vem sendo utilizada no tratamento de várias
enfermidades dentre as mais citadas estão câncer, diabetes, hipertensão, dor,
problemas respiratórios, problemas digestivos, stress, dentre outros (MATOSO
et al., 2013).
Praticamente todas as partes da planta são utilizadas, e a cada uma delas são
atribuídas propriedades medicinais diferentes. A planta consegue se adaptar às
mais diversas situações de clima e solo, produzindo frutos durante todo ano
(SALOMON, 1999).
O fruto é a parte mais utilizada no preparo do suco, o qual vem sendo alvo de
pesquisas na atualidade pela busca de benefícios que o mesmo possa oferecer.
Apesar do uso crescente no Brasil, a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância
7 Enfermeira, Especialista em Enfermagem do Trabalho e Saúde da Família, aluna do
programa de pós-graduação em Ciências Agrárias (Agroecologia)-UFPB. E-mail: [email protected]
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Sanitária) levanta dúvidas sobre a finalidade e a segurança dos produtos obtidos
a partir do Noni, proibindo assim a comercialização dos mesmos no País. A
comercialização de qualquer alimento contendo esse ingrediente só será
permitida após a comprovação de sua segurança de uso e registro na ANVISA,
conforme determinam a Resolução nº. 16/1999 e a Resolução RDC nº.
278/2005.
Levando em consideração a relevância que tem alcançado os estudos sobre
as propriedades medicinais da M. citrifolia (Noni), é de fundamental importância
a realização de pesquisas que avaliem os reais benefícios que este fruto pode
trazer à saúde. Diante do exposto, o presente trabalho teve como objetivo
realizar um levantamento sobre o uso da M. citrifolia (Noni) para fins terapêuticos
na medicina popular, verificar as partes da planta utilizadas no processo de
produção dos medicamentos populares, formas de preparo e posologia desses
medicamentos, identificar a ocorrência de eventos adversos e identificar as
possíveis patologias que ocasionaram o seu uso.
ORIGEM E IMPORTÂNCIA DO USO DAS PLANTAS MEDICINAIS
O conhecimento e o uso das plantas medicinais há milhares de anos
atravessa gerações, e a cada dia, as pessoas vêm descobrindo novas espécies
e diferentes formas de uso empregadas para cura de enfermidades.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define plantas medicinais como
sendo todo ou qualquer vegetal, cultivado ou não, que possa ser utilizado para
fins terapêuticos, como também considera que as mesmas sejam as melhores
fontes para obtenção de novas drogas. A referida organização estima que 80%
da população mundial utilizam plantas medicinais como medicação básica, não
obstante, este uso apresenta uma taxa anual de crescimento de 7%. Atualmente,
70% das drogas disponíveis foram desenvolvidas direta ou indiretamente a partir
de fontes naturais, subdivididos em plantas, microrganismos e animais (BRASIL,
2006).
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53
O emprego das plantas é bastante comum no uso tradicional/popular devido
a seus benefícios medicinais. Dessa forma, torna-se imprescindível o
conhecimento sobre a dose adequada a ser utilizada pelo paciente e a parte da
planta apropriada para a produção do medicamento, além de suas propriedades
terapêuticas, pois existem aquelas que são altamente tóxicas, mesmo se usada
em pequenas doses, podendo ocorrer efeitos colaterais como aborto, tontura,
cefaleia, diarreia, hipotensão, taquicardia, vertigem ou até mesmo a morte
(SILVA, 2003).
No Brasil, a cultura de uso de plantas medicinais deve-se inicialmente aos
índios, depois aos negros e europeus. Na ausência de médicos, os mesmo
recorriam ao uso de plantas medicinais para curar ou amenizar suas
enfermidades. Esse conhecimento foi enriquecido através da observação dos
animais, que também buscam nos vegetais o alívio para seus males. A soma de
toda essa diversidade de saberes populares trouxe à atualidade tudo o que se
sabe sobre as propriedades medicinais de diversas plantas presentes em nossas
florestas e nos quintais das residências, principalmente, das famílias campesinas
(SERAFINI, 2013).
A diversidade de espécies vegetais nativas existentes no Brasil e o fácil
acesso que se tem a essas plantas, bem como o baixo custo e a dificuldade de
acesso da população à assistência médica convencional, fez com que
aumentasse o número de pessoas fazendo uso de tratamento à base de plantas
medicinais. Na maioria das vezes, essas plantas são utilizadas in natura na
forma de chás preparados por decocção ou infusão, maceração, como
lambedores/xaropes, sucos ou formas de uso externo como cataplasma.
Dentre as diversas espécies conhecidas e utilizadas está a M. Citrifolia com
sua riqueza de propriedades medicinais, a qual é popularmente conhecida como
Noni.
ORIGEM E CARACTERÍSTICAS DA Morinda Citrifolia (Noni)
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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A Morinda Citrifolia, popularmente conhecida como Noni, é uma planta
pertencente à família Rubiaceae. A mesma é originária do sudoeste da Ásia e
da Austrália. Há mais de 2.000 anos tem sido utilizada com sucesso na Polinésia
Francesa tanto como alimento como para fins medicinais e como tintura no
tingimento de tecidos, e em outros países como China e Índia. Os habitantes
dessas regiões levaram o Noni para as ilhas do Pacífico Sul, Taiti, Havaí e
Malásia (SILVA et al., 2009).
A planta chega a medir de 3 a 7 metros de altura, apresenta flores e frutos
durante todo ano, conforme ilustrado na Figura 1. O fruto possui um formato
ovalado, como mostra a Figura 2, apresentando várias sementes, tal como pode
ser visualizado na Figura 3, e sua coloração muda de acordo com o
amadurecimento, variando desde verde até esbranquiçado, como mostra a
Figura 4, quando está pronto para consumo. A polpa também sofre mudanças
de coloração com o período de maturação, passando da cor branca para
amarelada e, nesse ponto, o fruto está pronto para consumo (SILVA, 2010;
SOUZA et al., 2010).
Figura 1 Detalhe da Inflorescência do Noni. Figura 2 Aspecto do fruto do Noni .
Figura 3: Detalhe das sementes do Noni.
Figura 4: Variação de cores do fruto de acordo com a maturação.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
55
O fruto apresenta diferentes estádios de maturação em uma mesma planta e
ao mesmo tempo, conforme a Figura 5. No período de amadurecimento, o fruto
exala um odor bútrico forte bastante característico (CALIXTO, 2001). A planta se
adapta a clima tropical e temperado e, frequentemente, cresce em áreas
florestais com cerca de 400 metros acima do nível do mar e em regiões costeiras
ao nível do mar. Desenvolve-se bem em solos vulcânicos ricos em minerais,
apesar de também se desenvolver em solos arenosos ou com grande umidade.
Apresenta também tolerância para cultivo a céu aberto ou com 80% de
sombreamento, em condições de encharcamento por certo período de tempo, e
muito resistente e tolerante a solos salinos chegando a se beneficiar dos
minerais contidos na água do mar (FERNANDO et al., 2010).
ESTUDO DE CASO: APLICAÇÕES POPULARES DO NONI NO MUNICÍPIO
DE SERTÃOZINHO-PB
Com a finalidade de conhecer a concepção da população acerca do uso da
Morinda citrifolia (Noni) como planta medicinal realizou-se uma pesquisa, a qual
se caracterizou como um estudo descritivo e exploratório com abordagem
quantitativa, realizado no Município de Sertãozinho-PB. De acordo com o IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no ano de 2013, sua população
Figura 5: Frutos em diferentes estádios de maturação
em uma mesma planta.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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foi estimada em 4.728 habitantes e sua área territorial é de aproximadamente 33
Km2. A amostra foi composta por 40 pessoas que estavam em uso da Morinda
citrifolia (Noni), maiores de 18 anos, independente de sexo. Os dados foram
coletados através de entrevistas individuais na residência do entrevistado,
utilizando um questionário semiestruturado, elaborado para esta pesquisa. Para
análise dos dados utilizou-se como ferramenta auxiliar uma planilha eletrônica.
Os resultados obtidos seguem apresentados, com as ilustrações de gráficos e
tabelas.
Em relação à faixa etária, das 40 pessoas que compuseram a amostra, 35%
eram maiores de 60 anos, com predominância de pessoas do sexo feminino,
67,5%, conforme apresentados nos Gráficos 1 e 2.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Todos os entrevistados responderam utilizar o fruto do Noni como produto
medicinal. Esta parte da planta parece possuir vasta atividade terapêutica, sendo
a mais preferida e utilizada no preparo dos remédios caseiros, principalmente
sobre a forma de suco. O suco tornou-se um suplemento alimentar bastante
consumido, na medicina popular vem sendo utilizado no tratamento de uma série
de doenças. Por outro lado, a literatura é bastante conclusiva sobre as
substâncias presentes nas folhas, que são utilizadas como analgésico e em
casos de inflamações externas, e das flores, que são empregadas no tratamento
de inflamações oculares, raízes, utilizadas na redução da pressão sanguínea,
sementes, que possuem efeito laxativo, casca, que possui propriedade
adstringente e é utilizada no tratamento da malária, por exemplo (MANACH;
DONOVAN, 2004).
Quanto ao preparo do suco, ainda não se sabe ao certo uma receita para o
preparo e uma dosagem estabelecida para seu uso diário. Mas cada pessoa
possui uma maneira particular de preparar o suco e uma dose de consumo,
conforme apresentado nas Figuras 6A; 6B; 6C e 6D.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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A receita mais citada na entrevista foi a que utiliza 3 frutos 52,5% para 1 litro
de suco de uva 70%, conforme apresentado nas Tabelas 1 e 2. O suco de uva,
segundo os entrevistados, tem por finalidade “mascarar” o sabor forte que o fruto
possui, facilitando assim a aceitação por parte das pessoas.
Tabela 1: Número de frutos utilizados no preparo do suco.
n= frequência de respostas
Nº de frutos n %
½ fruto 2 5
1 fruto 8 20
2 frutos 6 15
3 frutos 21 52,5
4 frutos 3 7,5
Figura 6A - Preparo do suco do Noni Figura 6B - Preparo do suco do Noni
Figura 6D - Preparo do suco do Noni Figura 6C - Preparo do suco do Noni
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Tabela 2 : Substância adicionada no preparo do suco. n= frequência de resposta
COMPOSIÇÃO (n) %
SUCO DE UVA
500 ml 8 20
1 litro 28 70
ÁGUA
500 ml 2 5
VINHO
1 litro 2 5
Com relação à posologia, 35% afirmaram fazer uso do preparo apenas 1 vez
ao dia, conforme apresentado no Gráfico 3.
Atualmente, tem sido identificado no Noni 160 compostos fitoquímicos, dentre
os principais estão fenólicos, ácidos orgânicos e alcaloides. Entre os compostos
fenólicos mais importantes estão as antraquinonas, acubina, ácido asperuloside
e escopoletina (SU et al., 2005). Os principais ácidos orgânicos são o caproico
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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e caprílico, e o principal alcaloide é a Proxeronina que, após ser ingerida, é
absorvida no trato digestivo e armazenada no fígado, a cada 2 horas é lançada
gradativamente na corrente sanguínea, onde sofre a ação da Proxeroninase,
transformando-se em Xeronina, a mesma provoca reações no núcleo celular
fazendo com que os nutrientes sejam absorvidos mais facilmente melhorando
assim a capacidade dos órgãos humano (ULLOA et al., 2012).
Quando questionados sobre as possíveis categorias de enfermidades que
levaram ao uso do Noni, os entrevistados destacaram como sendo as mais
comuns: problemas gastrintestinais, seguido dos problemas endócrinos,
problemas geniturinários, problemas músculo-esquelético, câncer, problemas
circulatórios, problemas respiratórios, problemas neurológicos/psicológicos,
conforme apresentado na Tabela 3.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Tabela 3 – Categorias de doenças que ocasionaram o uso do Noni
DOENÇAS n %
Câncer 4 10
Problemas músculo-esquelético 6 15
Problemas endócrinos 8 20
Problemas gastrointestinais 10 25
Problemas neurológicos/psicológicos 1 2,5
Problemas geniturinários 6 17,5
Problemas circulatórios 2 5
Problemas respiratórios 2 5
n= frequência de respostas
O Noni popularizou-se devido suas propriedades medicinais e por auxiliar na
melhora de uma gama de enfermidades. Sua introdução no Brasil é recente,
mesmo assim o seu uso tomou uma proporção grandiosa, devido relatos de
pessoas que usaram o fruto e sentiram, mesmo que gradativamente, uma
melhora significativa nos sintomas de algumas doenças (WANG et al., 2002).
Quanto aos problemas gastrointestinais, a maioria dos entrevistados referiu
sentir alívio nos sintomas da Gastrite nas primeiras semanas de uso, passando
a não mais sentir azia, náuseas e dor na região epigástrica. A literatura mostra
que o Noni é capaz de inibir o crescimento de algumas bactérias, dentre elas
está o Helicobacter pylori, responsável por infectar a mucosa do estômago
humano.
Em relação aos problemas no sistema endócrino, o Noni tem sido bastante
utilizado pela maioria dos entrevistados em casos de diabetes. Os mesmos
realizaram exames de glicemia antes de iniciar o tratamento com o fruto e
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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compararam com exames feitos após algum tempo de uso, observando uma
redução significativa na taxa de glicose.
Os entrevistados também referiram sentir melhora em problemas do sistema
geniturinário, tais como: corrimento vaginal, irregularidade menstrual e infecção
urinária.
Dentre os diversos problemas que pode apresentar o sistema músculo-
esquelético, o reumatismo foi o mais citado pelos entrevistados. Os mesmos
referiram um alívio nos sintomas após o uso do Noni, passando a exercer suas
atividades diárias normalmente, devido ao desaparecimento das fortes dores
causadas por esta patologia.
Quanto ao câncer, um dos entrevistados estava em tratamento, há alguns
anos, de um nódulo na tireoide, mas não apresentava resultado. Após conhecer
o Noni, através de um médico do Hospital Universitário em João Pessoa, passou
a fazer uso do mesmo e, após 1 ano e 3 meses de uso, o nódulo reduziu de
tamanho, não necessitando de intervenção cirúrgica. Também foi citado por
outros entrevistados por reduzir os efeitos colaterais ocasionados pela
quimioterapia.
Em relação aos problemas circulatórios, a hipertensão arterial foi a mais citada
nas entrevistas. A literatura mostra que o Noni vem sendo comumente usado em
casos de hipertensão arterial, pois um dos seus componentes é a escopoletina.
Essa substância promove a vasodilatação, fazendo com que o sangue possa
fluir mais facilmente por onde antes estava ocorrendo a vasoconstricção. Esse
mecanismo faz com que haja uma redução na força de bombeamento do
coração levando a pressão arterial para níveis considerados como normais, ou
seja, promovendo um equilíbrio, não deixando que fique abaixo do nível normal
(ZHAN; ZHOU, 2003).
Os problemas do aparelho respiratório também estavam presentes entre as
categorias de doenças mais citadas. Uma das patologias que apareceu com
mais frequência foi a asma brônquica. Um dos entrevistados encontrava-se em
uso do Noni há 6 meses e afirmou sentir o alívio dos sintomas da asma a partir
da primeira semana de uso, não apresentando mais crises asmáticas.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
63
Quanto aos problemas neurológicos/psicológicos, a insônia foi citada por um
dos entrevistados. Há algum tempo, o mesmo sofria de insônia e após começar
o tratamento com Noni, a partir das primeiras semanas de uso, passou a
perceber que estava conseguindo dormir mais cedo, bem como não acordava
mais durante a noite.
Quanto ao início dos resultados após o uso, 62,5% relataram notar um alívio
dos sintomas entre 1 e 3 semanas, conforme apresentado na Tabela 4.
Tabela 4 – Tempo de tratamento até a remissão dos sintomas, após inicio das
aplicações do Noni.
Período de tratamento n %
1 a 3 semanas 25 62,5
1 a 2 meses 10 25
Acima de 2 meses 5 12,5
n = frequência de respostas
Quando questionados sobre a ocorrência de efeitos adversos, um dos
entrevistados referiu ter apresentado edema nos membros inferiores e na face
durante o período que fez uso do Noni, desaparecendo logo após ter suspendido
o uso, conforme apresentado no Gráfico 4.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
É crescente o interesse de pesquisadores na área das plantas medicinais,
pois sente-se uma necessidade de reconhecer o verdadeiro benefício para a
saúde proporcionado por esses vegetais. Há alguns anos, o Noni vem sendo
alvo de inúmeras pesquisas que, em sua maioria, revelam as qualidades
benéficas do mesmo, mas, apesar de existir pesquisas já concluídas, pouca
informação se tem sobre os seus constituintes, sendo necessário um maior
aprofundamento nas pesquisas no que diz respeito às suas propriedades
medicinais, bem como elucidações sobre prescrições do produto, dose diária,
indicações, contraindicações e seus efeitos adversos. Dentre todos os benefícios
expostos anteriormente, segue-se um alerta para gestantes. Estudos concluíram
que o suco não deve ser utilizado por mulheres em estado gestacional, pois pode
ocasionar uma má formação congênita, trazendo sérias complicações ao feto.
Se faz necessário uma maior realização de estudos nesta área para que
futuramente o fruto do Noni possa ser utilizado com segurança pela população.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
65
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CAPÍTULO 6
DIFUSÃO DE TECNOLOGIAS SOCIAIS
AGROECOLÓGICAS PARA A AGRICULTURA
FAMILIAR
Antonio Cardoso
Murielle Magda Medeiros Dantas
Valter da Silva
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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DIFUSÃO DE TECNOLOGIAS SOCIAIS AGROECOLÓGICAS PARA A
AGRICULTURA FAMILIAR
Antonio Cardoso8
Murielle Magda Medeiros Dantas
Valter da Silva
INTRODUÇÃO
O desenvolvimento tecnológico da agricultura permitiu a incorporação de
um conjunto de tecnologias “avançadas” ou “modernas” que, indubitavelmente,
aumentaram a produção e a produtividade das atividades agropecuárias,
havendo alterações nas relações sociais no campo. Contudo, a incorporação
dessas tecnologias frequentemente ocorreu de forma inadequada à realidade do
meio rural, seja pela maneira como se deu esta implantação, seja pela natureza
mesma das tecnologias introduzidas (CAPORAL; COSTABEBER, 2000).
Desse modo, objetiva-se solidificar e disseminar tecnologias sociais de
baixo custo e menos dependentes do sistema externo, construindo grupos de
interesses com capacitação continuada, antes, durante e depois da implantação
dessas tecnologias, na perspectiva de fortalecimento de um processo
pedagógico diferenciado, além do acompanhamento técnico e de apoio às
famílias de agricultores familiares, assentados da Reforma Agrária,
comunidades quilombolas, dentre tantas outras, caracterizando estes espaços
em ambientes ativos de troca e construção de saberes.
A implantação de tecnologias adaptadas ao semiárido brasileiro é uma
proposta de reflexão e de aprendizado sobre a Extensão Rural e o seu papel na
transição agroecológica e o fortalecimento das famílias envolvidas. As
tecnologias alternativas proporcionam uma melhor compreensão pedagógica da
realidade local por parte dos atores envolvidos.
8 Engenheiro Agrônomo/UFPB, Mestrando em Ciências Agrárias (Agroecologia)
PPGCAG/UFPB, Coordenador Técnico da AGEMTE - Assessoria de Grupo, Especializada
Multidisciplinar em Tecnologia e Extensão. E-mail: [email protected]
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
69
Como isso, algumas tecnologias sociais foram implantadas nas Unidades
Demonstrativas Pedagógicas da Agricultura Familiar – UDPAF, promovidas pela
Assessoria de Grupo, Especializada Multidisciplinar em Tecnologia e Extensão
– AGEMTE, através de contrato com o Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária – INCRA, junto ao Programa de Assessoria Técnica Social e
Ambiental – ATES em Assentamentos da Reforma Agrária.
As Unidades Demonstrativas Pedagógicas da Agricultura Familiar,
UDPAF, são utilizadas de forma educativa para intercâmbio, capacitação e
oficinas, por permitirem as observações, experimentação e reflexão coletiva
sobre as questões tecnológicas, econômicas, sociais e ambientais que envolvem
o manejo dos recursos naturais e a gestão da unidade produtiva.
Tecnologia Social, aliada à Agroecologia, compreende produtos, técnicas
ou metodologias reaplicáveis desenvolvidas na interação com a comunidade e
que representam efetivas soluções de transformação social.
O processo de implantação de tecnologias sociais, como planejado,
ocorreu de acordo com as potencialidades e características de cada uma das
Unidades Demonstrativas Pedagógica da Agricultura Familiar, observando-se os
ciclos produtivos, desde a segurança alimentar da família ou do grupo de
interesse até a produção de excedentes visando à geração de renda.
Os Assentamentos onde as UDPAFs estão localizadas e onde estas
tecnologias foram implantadas são: Projeto de Assentamento Margarida Maria
Alves I, no município de Juarez Távora; Projeto de Assentamento Margarida
Maria Alves II, Projeto de Assentamento Maria da Penha I, ambos localizados no
município de Alagoa Grande e Projeto de Assentamento Vazante, localizado no
município de Tacima. Todos os municípios citados estão localizados no estado
da Paraíba.
As principais tecnologias abordadas, dentro de cada unidade, foram:
cisterna de ferro e cimento, geodésica, painéis solares, biodigestor e defumador
artesanal.
Construção e implantação da cisterna alternativa
Este tipo de cisterna normalmente é construído na superfície. Ela tem uma
altura de até dois metros. Antes de concretar o fundo, só é preciso retirar a terra
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fofa. O chão é nivelado a uma profundidade de cerca de 20 cm e uma camada
de cascalho e areia grossa é colocada debaixo da camada de concreto.
Para a construção dessa cisterna é preciso colocar papelão em volta da
mesma para que se possa rebocá-la.
A cisterna em destaque (Figuras 1 a 4) foi construída, dentro de um
enfoque pedagógico, nos Assentamento Margarida Maria Alves I, Maria da
Penha I e Vazante, onde foi dado início com a montagem da estrutura de ferro
em formato tubular, fixação da tela e do papelão em toda estrutura. Feito isso, a
armação recebeu uma camada de cimento na parte externa para isolar e garantir
que o material a ser colocado não vaze. A parte interna também foi rebocada,
constituindo-se, desta forma, um produto final de alta qualidade e de baixo custo.
O valor da cisterna alternativa de ferro e cimento com capacidade para 12 mil
litros é em torno de R$ 750,00.
Figuras 01 a 04. Construção da cisterna alternativa de ferro e cimento
01 02
04 03
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Construção e implantação da Geodésica frequência 02 com raio de
03 m
A Domos Geodésica ou simplesmente Geodésica é uma estrutura
arquitetônica utilizada pelas mais diversas civilizações desde a antiguidade,
apresentando extraordinária resistência e leveza (NOSSA TERRA, 2013). A
construção efetuada teve como matéria prima canos de PVC de 32’, com um
diâmetro de 6 m (raio de 3 m). Para a montagem desta estrutura serão utilizados
72 metros de cano, divididos em 35 pedaços de 1,8541 m e 74,14 m, utilizando
30 pedaços de 1,6396 m. Para os pedaços maiores, utiliza-se um ângulo de 18°
nas extremidades para o encaixe das peças, conseguidos através de uma
máquina artesanal. Para os pedaços menores, ângulos de 16°, conforme quadro
abaixo. A fixação das peças ocorre com parafusos, arruela e porcas de ferro. Se
a estrutura for bem manejada e com os cuidados necessários, terá uma longa
durabilidade.
O objetivo desta estrutura é a montagem de uma estufa para a produção
de mudas de hortaliças e frutíferas, além de servir como uma sala de aula
itinerante, onde se possa repassar e transferir conhecimentos teóricos para
serem aplicados na prática. Nas questões produtivas, pode servir como uma
estrutura para criação de galinhas caipiras e/ou capoeira, podendo acomodar em
torno de 20 a 30 aves. O custo para implantação desta estrutura é em torno de
R$ 350,00.
Esta estrutura foi implantada nos Assentamentos Margarida Maria Alves
I, Margarida Maria Alves II e Maria da Penha I, com a finalidade de produção de
mudas de hortaliças e espécies frutíferas, como maracujá, caju e manga.
Tipo Quantidade Comprimento Ângulo Metros
A 35 1,8541 m 18° 72
B 30 1,6396 m 16° 74,14
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
72
Figuras 03 a 08. Construção e implantação da geodésica para produção de mudas
Construção e manufatura de painéis solares
Painéis solares fotovoltaicos são dispositivos utilizados para converter
a energia da luz do Sol, abundante na natureza, em energia elétrica. Os painéis
solares fotovoltaicos são compostos por células solares, assim designadas já
que captam, em geral, a luz do Sol. Estas células são, por vezes, e com maior
propriedade, chamadas de células fotovoltaicas, ou seja, criam uma diferença de
potencial elétrico por ação da luz do sol. Na sua maioria, estas células solares
baseiam-se no semicondutor de silício (Si) que é muito utilizado na
microeletrônica. O fato da tecnologia das células fotovoltaicas não ter uma
06
07 08
05
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grande utilização na produção direta de eletricidade, deve-se aos elevados
custos de produção (NEOSOLAR ENERGIA, 2013).
Para minimizar estes entraves, a Assessoria de Grupo, Especializada
Multidisciplinar em Tecnologia e Extensão – AGEMTE, em parceria com o
Instituto Federal de Educação Superior da Paraíba – IFPB, vem realizando
oficinas de construção de painéis solares nos Assentamentos da Reforma
Agrária da Zona da Mata Norte, Brejo e Curimataú paraibanos, áreas de atuação
da AGEMTE.
As oficinas têm como objetivo capacitar os participantes para confeccionar
seus próprios painéis solares, sendo divididas em duas etapas, a teórica e a
prática. Na etapa teórica, foram trabalhados os seguintes conceitos e princípios:
conceitos fundamentais de Eletricidade (tensão, corrente e resistência elétrica);
princípios fundamentais da eletrônica; ligações em série e em paralelo; o que é
e como utilizar um multímetro; os diversos tipos de ferro de solda, qual utilizar e
como utilizar; como identificar as polaridades das baterias; como interconectar
geradores e cargas; como conectar interruptores; outros conceitos fundamentais
de eletricidade e de eletrônica necessários para a correta confecção do painel
solar e para sua instalação e operação (AGEMTE, 2013).
Como resultados destas oficinas, os participantes já estão aptos a
reaplicar as habilidades e competências adquiridas, de construção de painéis
solares, nos Assentamentos, contribuindo para a ampliação da produção
agrícola, de forma sustentável e autônoma, diminuindo sua dependência das
condições externas e reduzindo custos com energia elétrica convencional.
Foi feito um teste na UDPAF do Assentamento Maria da Penha II, em
Alagoa Grande, com um painel solar de 1 m2 manufaturada em uma dessas
oficinas, com uma bomba de porão de 12 w, utilizadas em embarcações. O
Resultado foi que, a 30 metros de altura, a bomba impulsionada pela energia
captada do painel solar, colocou água a 180 m da área de implantação do
experimento. A manufatura das placas resulta em uma economia significativa no
custo da tecnologia, barateando o valor em cerca de 40%, se comparado a
painéis solares da mesma potência comercializados no mercado. Fazendo um
comparativo, um painel solar convencional custa em torno de R$ 1.600,00
enquanto que o painel manufaturado custa em torno de R$700,00. Já a bomba
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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de porão varia de R$ 60,00 a R$ 240,00, dependendo da vazão que se quer
chegar.
Recentemente a AGEMTE desenvolveu, através de seu Diretor Técnico,
Flavio Luna, um kit móvel com painel solar e bateria recarregável adaptado a um
carro de mão para que o agricultor possa locomover esta tecnologia da
residência da família até o lote onde trabalha, facilitando o manuseio e o seu
trabalho. Este kit custa em torno de R$ 1.800,00. A iniciativa oferece ao agricultor
um novo meio de produção a partir de energia renovável e contribui para a
melhoria da qualidade de vida das famílias do campo e sua inclusão no mundo
das novas tecnologias.
Figuras 09 a 11 – Oficina de Construção de painel solar fotovoltaico
09 10
11 12
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Construção e implantação do biodigestor
Biodigestor anaeróbico é um equipamento usado para o processamento
de matéria orgânica, como, por exemplo, fezes e urina de animais, e vegetais da
produção agrícola em biogás.
O biogás é uma mistura de vários tipos de gases. O metano, principal
componente do biogás, não tem cheiro, cor ou sabor, mas outros gases da
mistura podem conferir um ligeiro odor de alho ou de ovo podre que, através de
um processo simples de filtragem, podem ser facilmente eliminados da
composição do biogás. Pode-se afirmar com segurança que o uso do biogás na
cozinha é higiênico, não desprende fumaça e não deixa resíduos nas panelas
(MATTOS; JUNIOR, 2011).
Um biodigestor funciona como um reator químico em que as reações
químicas têm origem biológica, ou seja, são feitas por bactérias que digerem
matéria orgânica em condições anaeróbicas (isto é, em ausência de oxigênio).
O digestor anaeróbico produz 02 produtos:
Biogás, que é uma mistura de gases – cerca de
75% metano e 25% CO2 e
Fertilizantes de ótima qualidade (bem melhores do que os
fertilizantes químicos), muitas vezes misturados à água e, portanto, em
forma líquida, mas em alguns processos também sólidos.
Além de fornecer estes 02 produtos, o uso dos biodigestores proporciona
outras importantes vantagens:
Evita a poluição do meio ambiente com os dejetos orgânicos,
sobretudo das águas, que tradicionalmente foi o seu principal destino,
mas também do solo.
Combate o aquecimento global, pela queima do gás metano,
9 vezes mais causador do efeito estufa do que o Co2 resultante da sua
queima
Reduz significativamente o espaço utilizado para o
tratamento dos dejetos animais, em relação a outro método mais
atrasado, as lagoas de decantação.
Elimina os maus odores dos dejetos animais
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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O biodigestor foi construído no Projeto de Assentamento Margarida Maria
Alves II, na parcela do Sr. José de Arimatéia, onde a UDPAF está Instalada. O
primeiro passo para a construção foi a escavação do buraco - uma contra partida
do Sr. José de Arimatéia, logo após, técnicos, assentados e os estagiários do
SERTA, Servico de Tecnologia Alternativa, deram início a montagem da
estrutura de ferro em formato tubular, fixação da tela e do papelão em toda
estrutura. Feito isso, a armação recebeu uma camada de cimento na parte
interna para isolar e garantir que o material que será colocado não vaze. A parte
externa também foi rebocada. Em seguida, após todas as instalacões dos canos,
mangueira e registro, acoplou-se uma caixa d`água de 3 mil litros emborcada,
sendo esta a câmara do gás. Todos os custos para implantação dessa estrutura
giram em torno de R$ 1.800,00.
Além da economia do gasto com gás de cozinha, a familia está fazendo
uso de uma tecnologia limpa, economicamente viável, reciclando dejetos
considerados poluientes, melhorando, desta forma, sua qualidade de vida.
Figuras 13 a 16 – Construção e implantação do Biodigestor – UDPAF do PA
Margarida Alves II
13
16 15
14
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77
Construção e implantação do defumador
A coloração, o aroma e o sabor desejados pelo consumidor são
determinados pela presença de certos componentes químicos constituintes da
fumaça.
A fumaça tem um efeito conservante que, associado ao calor, resulta na
redução da umidade, essencial no controle do desenvolvimento de
microrganismos.
Conhecido como “Chaminé defumadora”, sua construção é bem simples
e barata. É um defumador médio indicado para uma produção de até 35 Kg de
defumado por dia. Sua fonte de calor e fumaça é oriunda da saída de um fogão
a lenha. Também pode ser utilizada serragem, queimando-a diretamente na
base do defumador.
A construção deste se deu com a colaboração dos estagiários do
SERTA e o auxílio da equipe da AGEMTE, utilizando estrutura de alvenaria
obedecendo aos princípios da permacultura. O defumador foi construído com
tijolos, cimento, varões de ferro e chapa de alumínio. Esta tecnologia serve
para agregar valor à carne, principalmente a suína.
Foram construídos dois defumadores: um na UDPAF do Projeto de
Assentamento Margarida I e outro na UDPAF do Projeto de Assentamento
Margarida II. Os custos para construção desta estrutura gira em torno de R$
100,00
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Figuras 17 a 20 – Construção e implantação do defumador alternativo
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As cinco tecnologias apresentadas se adaptam à agricultura familiar por
terem viabilidade prática e serem de baixo custo para implantação.
Entendendo que os processos de implantação dessas tecnologias são
dinâmicos e sistêmicos, são realizados momentos sequenciados e construtivos
com monitoramento e avaliação permanente, capacitando, nos processos
técnicos e pedagógicos, os beneficiários para investigar os procedimentos e
rumos das ações, provocando correções quando necessário.
Em todas as tecnologias, o processo ocorreu de forma participativa, em
que as famílias envolvidas serão multiplicadoras dos conhecimentos teóricos e
práticos para outras comunidades, de forma que possa divulgar as tecnologias
adaptadas a cada realidade.
17 18
19 20
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
79
Por tudo que foi apresentado, conclui-se que esse processo visa o acesso
e divulgação de novas tecnologias alternativas, ocasionando a mudança de
comportamento dos atores envolvidos, provocando o interesse dos mesmos por
tecnologias sociais de baixo custo, onde possa gerar renda e conhecimento para
as famílias assentadas da Reforma Agrária.
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80
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DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
81
CAPÍTULO 7
O MANDACARU (Cereus jamacaru P. DC.) COMO
FONTE ALTERNATIVA ALIMENTAR ANIMAL NO
SEMIÁRIDO BRASILEIRO
Juliana Ferreira Gonçalves
Gilberto Nunes de Souza
Marcos Barros de Medeiros
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
82
O MANDACARU (Cereus jamacaru P. DC.) COMO FONTE ALTERNATIVA
ALIMENTAR ANIMAL NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO
Juliana Ferreira Gonçalves 9
Gilberto Nunes de Souza
Marcos Barros de Medeiros
INTRODUÇÃO
A região semiárida do nordeste brasileiro é constituída de várias sub-
regiões onde predominam uma grande diversidade de clima, vegetação, solo,
água e aspectos socioeconômicos. Estas áreas formam um bioma denominado
caatinga.
As regiões semiáridas apresentam características edafoclimáticas com
baixa precipitação de chuva, ocasionando o longo período de estiagem e
afetando a produção de forragem, causando baixo desempenho aos sistemas
de produção, pois a produção forrageira se dá num espaço de tempo muito curto,
ficando os animas por longo período em regime de pasto, repercutindo na baixa
produção de leite, carne, poucas crias e levando até a morte de animais. Neste
cenário, em que o balanceamento nutricional é afetado, o Mandacaru (Cereus
jamacaru P. DC.) vem superar as necessidades e se contrapor a práticas que
ameaçam a sustentabilidade ambiental, sobretudo a saúde animal, a exemplo
do uso da cama de galinha na dieta dos animais.
Segundo Moreira (2005), há muito tempo se busca uma espécie forrageira
capaz de suportar as longas estiagens que ocorrem no semiárido e ainda assim
ser produtiva. Neste aspecto, o Mandacaru (Cereus jamacaru P. DC.) merece
atenção especial por sua grande adaptação, valor nutritivo e produtividade.
9 Coordenadora Pedagógica – Secretaria Municipal de Educação (Educação do Campo) de
Cacimbas-PB. E-mail: [email protected]
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83
O Mandacaru tem uma representação social na Região Nordeste do
Brasil. Segundo Albuquerque (2001), no bioma Caatinga, é a espécie que
caracteriza as áreas denominadas de cariris e cerrados, marcante fitofisionomia
da região, o verde chama a atenção em meio à vegetação sem cor da caatinga,
é uma espécie adaptada ao clima semiárido da região, desenvolve-se nos mais
adversos tipos de solos e suporta até três anos de seca. O surgimento de suas
flores simboliza o “fim da seca” nas regiões semiáridas, conforme expresso, por
exemplo, na música Xote das Meninas, do poeta Luiz Gonzaga:
“Mandacaru quando fulora na seca É o sinal que a chuva chega no sertão Toda menina que enjoa da boneca É sinal que o amor já chegou no coração [...]”
Por ser uma planta que tem durabilidade, resistência, adaptabilidade e
beleza, é tida como o slogan que identifica o povo nordestino e sua cultura. O
Mandacaru vai além dos domínios geográficos da caatinga e quebra o tabu de
sua utilidade apenas para a alimentação dos rebanhos, chegando a ser
cultivada, inclusive, como planta ornamental e medicinal, já que possui
propriedades terapêuticas.
Durante muito tempo, o homem do campo substituiu o Mandacaru
(Cereus jamacaru P. DC.) pela Palma Forrageira (Opuntia fícus indica Mill e
Napolea cochinillifera salm-Dych) para alimentação de seus rebanhos, porém,
nos últimos anos a Cochonilha do Carmim (Dactylopius opuntiae) dizimou os
palmares da região, provocando a volta do uso do Mandacaru como forragem
animal. Segundo Andrade Lima (1965), o número de espécies de cactáceas no
Nordeste brasileiro não é grande, todavia, na paisagem da zona seca, que
representa a maior parte da área total da região, algumas espécies são
numerosas, chegando a ser dominantes da formação vegetal. Algumas dessas
espécies são: Coroa de frade (melocactus), mandacaru (Cereus jamacaru),
facheiro (Pilosocereus); palma (Tacinga); catingueira (Caesalpinia pyramidales),
sabiá (Mimosa caesalpiniifolia), angico (Anadenanthera colubrina), juremas preta
e branca (Mimosa tenuiflora e M. artemisiana); ipê roxo (Tabebuia impetiginosa),
cumaru (Amburana cearensis), aroeira (Myracroduon urundeuva), marmeleiro
(caearia canmbessedisia) (DRUMOND et al., 2004).
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
84
No município de Cacimbas-PB, nos anos de 2012 e 2013, houve
prolongados períodos de seca e os criadores utilizaram o Mandacaru como fonte
de alimento para seu rebanho. No entanto, fizeram isso de forma predatória,
queimando, cortando toda a planta e sem fazer a reposição, surgindo a
necessidade de um trabalho de mobilização dos criadores para utilização do
Mandacaru de forma racional, estimulando tal cultura através do uso dos campos
de Mandacaru como reservas estratégicas para a ração animal nos períodos de
estiagem prolongada e, dessa forma, garantindo o equilíbrio do bioma Caatinga.
Lima e Sidersky (2002), estudando o papel das plantas nativas nos
sistemas agrícolas familiares do Agreste da Paraíba, constataram que algumas
cactáceas, de modo especial o Mandacaru, são utilizadas como planta forrageira
pelos agricultores no período de seca.
Diante do exposto, ressaltamos que a abordagem desse tema foi
escolhida após observações feitas durante algumas visitas à comunidade de
Monteiro, município de Cacimbas-PB, realizadas nos meses de agosto e
setembro, período em que as pastagens tornam-se escassas na comunidade.
Nestas visitas, foi possível perceber que, entre tantas experiências exitosas,
aquelas envolvendo o Mandacaru foram as que mais chamavam atenção no
momento, pelo fato de a maioria dos criadores terem vendido seus rebanhos por
baixos valores e outros rebanhos terem morrido por falta de alimento durante a
seca que se prolongou nos dois últimos anos (2012 e 2013).
Oliveira (1996) relatou que, em razão das incertezas climáticas e do
fenômeno das secas periódicas no Nordeste do Brasil, as cactáceas, graças às
suas características fisiológicas de economia no uso da água, representam uma
fonte de suprimento de água e uma alternativa alimentar para os rebanhos do
semiárido. Neste sentido, fundamentados em diversos conceitos levantados e
em experiências vivenciadas durante o período de construção deste artigo,
buscamos avaliar os níveis de conhecimentos dos criadores da comunidade de
Monteiro, município de Cacimbas-PB, acerca do manejo adequado e da
quantidade de forragem produzida por pés/planta de acordo com o seu
desenvolvimento, analisando-se o Mandacaru pode garantir a nutrição dos
rebanhos.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Nessa postura, reconhecemos que os movimentos sociais e a educação
popular são importantes vias de manutenção, perpetuação e agregação de
valores à cultura de um povo, ela se configura em uma importante ferramenta
quando há o desejo de se manter vivas as riquezas culturais. Desta forma,
buscamos parceria com a CAMEC (Central das Associações do Município de
Cacimbas-PB), que muito contribuiu na mobilização e no desenvolvimento do
Projeto Salve Minha Vaquinha, projeto este que oferece cursos e estratégias
para que os criadores do município de Cacimbas-PB produzam forragens e se
conscientizem da importância da sustentabilidade como um processo contínuo
ao longo da vida e para que a temática fosse sendo aprofundada com mais
naturalidade de forma interdisciplinar.
Objetivou-se com o projeto incentivar a utilização do Mandacaru de forma
sustentável, analisando possíveis fatores que contribuam para que criadores do
município de Cacimbas-PB façam uso do Mandacaru para forragem, além de
enfatizarmos a importância da reposição através do plantio planejado dos
campos de Mandacaru como reservas estratégicas nos períodos de estiagem e
equilíbrio do bioma Caatinga.
O Mandacaru
O Mandacaru (Cereus jamacaru), planta típica do bioma Caatinga,
conhecida popularmente como cardeiro, pertence à família das cactáceas, mais
precisamente de porte arbóreo (pode atingir de 3 a 5 metros de altura),
ramificado, com flores brancas, compridas que se abrem à noite ostentando suas
belezas. O fruto é de cor violeta forte, tem polpa branca com muitas sementes
pretas, saboroso, servindo de alimento para diversas aves típicas da caatinga.
Seu caule é cladódio: modificado, acumulando água e exercendo função
fotossintética, rico em nutrientes, proteínas, fibras e água, o que garante a
nutrição animal no período de estiagem e escassez de pastagens.
O Mandacaru tem uma representação social na Região Nordeste do
Brasil, No bioma Caatinga, é a espécie que caracteriza os cariris e cerrados,
marcante fitofisionomia da região, o verde que chama a atenção em meio à
vegetação sem cor da caatinga, são espécies adaptadas ao clima semiárido da
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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região, desenvolve-se nos mais adversos tipos de solos e suporta até três anos
de seca. O surgimento de suas flores simboliza o “fim da seca” nas regiões
semiáridas.
O Mandacaru, entre outras cactáceas nativas da caatinga, tem sido
utilizado nos períodos de seca prolongada, como um dos principais suportes
forrageiros dos ruminantes (SILVA et al., 2005).
Por ser uma planta que tem durabilidade, resistência, adaptabilidade e
beleza, é tida como o slogan que identifica o povo nordestino e sua cultura, e vai
além dos domínios da caatinga e de alimentação para o rebanho, chegando a
ser cultivado como planta ornamental e medicinal, pois possui propriedades
terapêuticas. Existe uma variedade de Mandacaru, sem espinhos, usada na
alimentação de animais. A variedade comum predominante no Nordeste é
altamente espinhenta e também é usada na alimentação de animais, quando
seus espinhos são queimados ou cortados. É preciso alguns cuidados ao servir
o Mandacaru ao rebanho, pois o material precisa ser queimado até que o fogo
derreta os espinhos, evitando assim machucar os animais.
Quanto à composição química bromatológica da planta, os valores,
encontrados por Barbosa (1997) e Lima (1998), variaram entre 11,01 e 12,91%.
Outras pesquisas mostram resultados entre os limites de 5,08 a 10,18%, e o teor
de cinzas encontrado na planta foi de 23,07%.
As técnicas simples para o plantio e manejo do Mandacaru favorecem a
implantação dos cultivos nas propriedades do Semiárido. Segundo o biólogo
Gilberto Nunes, os criadores podem cultivar um grande número de plantas
consorciando com outros tipos de plantas e aproveitando terrenos com pedras e
lajedos. Uma novidade na região é o plantio do Mandacaru sem espinho, mas,
segundo relatos dos criadores que o cultivam, tal espécie é mais sensível à seca
do que as espécies com espinhos, porém, facilita a vida do criador pelo fato de
ser melhor de manejar pela falta de espinhos. O mandacaru possui um grande
teor de proteína, resiste à falta de chuvas e o primeiro corte acontece no primeiro
ano. O plantio em áreas cercadas é uma alternativa de exploração que aumenta
a capacidade de suporte das propriedades.
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MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho de intervenção teve como finalidade mobilizar
agricultores/criadores, do município de Cacimbas-PB, para vivenciar um
intercâmbio de experiências com intuito de incentivar o uso do mandacaru de
forma sustentável. O mesmo desenvolveu-se na Área de Experimento da Central
das Associações do Município de Cacimbas-PB (CAMEC), no período de
novembro de 2013 a janeiro de 2014, no qual contamos com a participação de
agricultores/criadores, presidente de algumas associações e do presidente da
CAMEC, o biólogo Gilberto Nunes. A Central é composta por 14 associações
comunitárias, que totalizam uma média de 253 criadores associados. A média
anual de chuvas no município de Cacimbas-PB é de 750 mm, sendo que 82%
do total é concentrada entre os meses de fevereiro e maio. A temperatura média
é de 24 °C.
A área experimental analisada representa um importante espaço de
aprendizado, de compartilhamento de conhecimentos como fonte de inspiração
para reais possibilidades de aproveitamento dos recursos naturais e, por
conseguinte, uma convivência sustentável com a realidade da caatinga a partir
de práticas alternativas.
Os objetivos do trabalho foram: debater sobre vários aspectos envolvendo
o mandacaru, focando sempre a importância da sustentabilidade; fortalecer as
ações do Projeto Salve Minha Vaquinha, já mencionado anteriormente, além de
enfatizarmos a importância da reposição através do plantio planejado dos
campos de Mandacaru como reservas estratégicas nos períodos de estiagem e
equilíbrio do bioma Caatinga.
O percurso metodológico escolhido, para o alcance dos objetivos
propostos, foi configurado através de levantamentos bibliográficos para obter
subsídios sobre a escolha do tema e do assunto que serviram como elemento
para a fundamentação teórico-prática do trabalho e, ainda, para a realização da
pesquisa de campo.
No decorrer do trabalho, realizaram-se visitas em lócus na área de
experimento da CAMEC para conhecimento da realidade e levantamento de
dados, onde conhecemos mais detalhadamente várias estratégias criadas para
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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convivência com a seca, tais como as cisternas de captação de água da chuva
e os plantios alternativos. Uma das entidades envolvidas no trabalho/projeto foi
a CAMEC, organização que atua no município de Cacimbas-PB e em outros
municípios da região do semiárido, mais especificamente no médio sertão
paraibano, desenvolvendo ações que fomentam o desenvolvimento rural
sustentável. Suas ações capacitam agricultores/as para o desenvolvimento de
tecnologias sociais, sustentáveis, capazes de facilitar a convivência com o
semiárido. A comunidade conta com um acervo de tecnologias sociais
sustentáveis, entre tantas observamos quintais produtivos de hortaliças e vários
projetos de convivência com semiárido, dos quais destacamos o de Estocagem
de Alimentos para Período de Estiagem. Para intervenção na comunidade de
Monteiro, buscamos conhecer mais detalhadamente a plantação de Mandacaru
existente na área de experimento da CAMEC e nas propriedades vizinhas.
Na Figura 1, pode-se observar o porte e quantidade de mandacarus
existentes na área de experimento da CAMEC.
Figura 1 – Levantamento das plantas de Mandacaru existentes na área de
experimento da CAMEC.
Como ferramenta de coleta de informações, realizaram-se coletas de
dados por meio de entrevistas e observações e registros das
participações/intervenções dos entrevistados durante quatro encontros/oficinas
com os criadores. No primeiro encontro, apresentou-se o projeto e realizou-se
uma breve explanação sobre o uso do Mandacaru como forragem animal.
Levantamos, através de rodas de conversa, os conhecimentos prévios dos
mesmos quanto ao uso sustentável do Mandacaru para forragem e deixamos
como tarefa para cada criador planejar uma forma de implantar ou manter em
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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sua propriedade uma área de cultivo de Mandacaru, bem como representar
através de desenho seu campo de Mandacaru atual.
Na Figura 2, pode-se observar o envolvimento dos participantes
interagindo e contextualizando as questões levantadas.
Figura 2 – Encontro com os criadores na Central das Associações no Sítio
Monteiro, município de Cacimbas-PB
No encontro seguinte, cada criador apresentou seu projeto de campo de
Mandacaru, e foram observadas as distâncias e áreas de plantio existentes a
serem implantadas, além de orientarmos quanto à forma de plantio para que não
se torne uma monocultura de mandacaru. Na oportunidade, foram levantados
alguns questionamentos em relação ao valor nutricional do Mandacaru.
Na Figura 3, pode-se observar que os criadores têm uma visão de
monocultura para constituir seus campos de mandacarus, onde fizemos a
interferência.
Figura 3 – Plantio e manejo do mandacaru de forma simples
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
90
Na ocasião, destacaram-se, pelos agricultores, algumas observações que
chamaram a atenção, entre elas o sistema radicular bem desenvolvido,
acumulando bastante água e a cutícula protetora sobre a casca, a qual impede
a evapotranspiração da água da planta, conforme mostra a Figura 4.
Figura 4 – Cutícula protetora que faz com que não ocorra a evapotranspiração.
O terceiro encontro contou com a colaboração do biólogo e veterinário
Gilberto Nunes, que fez uma explanação sobre importância, cultivo, identificação
e manipulação do Mandacaru. Na ocasião, foram feitas provocações a fim de
que os agricultores participassem de forma entusiasmada do processo, seja com
dúvidas ou com relatos de experiências próprias. Na Figura 5, pode-se observar
a grande aceitação e motivação dos agricultores.
Figura 5 – Encontro com os
produtores na Central das
Associações no Sítio
Monteiro, município de
Cacimbas-PB
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
91
O quarto encontro foi realizado com trabalhos práticos e iniciado com a
preparação do que batizamos como biomassa de Mandacaru. A matéria-prima
utilizada foram plantas de Mandacaru, adquiridas na área de abrangência do
campo de estudo desta pesquisa. Após o corte, as mesmas foram medidas,
pesadas e trituradas em forrageira e postas para secar, por meio da secagem
natural, para desidratação e armazenamento em fenos. Percebemos na
pesagem que plantas com 4 metros pesam em média de 800 a 900 quilos,
conforme mostra a Figura 6.
Figura 6 – preparação da biomassa de Mandacaru.
Após o corte do material fresco e selecionado, e triturado em máquina
forrageira, este pode ser ofertado imediatamente para alimentação dos animais,
processo mais indicado uma vez que no período de seca busca-se forragem com
alto teor de água. Para fenação, os materiais excedentes foram espalhados
sobre lona plástica, exposta ao sol para desidratação, até atingir o ponto de feno.
Quanto mais rápida for essa secagem, menores serão as perdas. O ponto para
fenação se dá quando o material chega de 15 a 20% de umidade, podendo ser
acondicionado em fardos para guardar. Pode-se observar que o processo de
fenação do Mandacaru melhora o paladar e elimina princípios tóxicos,
aumentando o seu consumo pelos animais.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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RESULTADOS E DISCUSSÃO
O trabalho foi realizado a partir de quatro encontros com
agricultores/criadores do município de Cacimbas-PB para vivenciar um
intercâmbio de experiências com intuito de incentivar o uso do mandacaru de
forma sustentável. O mesmo desenvolveu-se na Área de Experimento da
Central das Associações do Município de Cacimbas-PB (CAMEC). Dos
participantes dos encontros, 34,5% são do sexo masculino e 65,5 % do sexo
feminino, diferença bem significativa que chama atenção, pois as mulheres
participam mais ativamente dos trabalhos socioeducativos, enquanto os homens
são menos interessados.
De acordo com os dados evidenciados na Figura 8, podemos perceber a
importância do Mandacaru como forragem animal, constatando a sua
importância como alternativa alimentar para sustentação do rebanho nos
períodos de seca.
Figura 8 – Porcentagem do uso do Mandacaru pelos criadores para Forragem
Animal
Quando indagados sobre a importância do uso de forma sustentável, 90%
dos participantes afirmaram ser de suma importância a revitalização e produção
de campos de Mandacaru, salientando que o mesmo não precisa de muitos
cuidados como as demais forragens e ainda resistem às secas que assolam a
região, o que requer iniciativas que trabalhem e disseminem a prática do uso do
mesmo de forma sustentável.
66,9% fazem uso em
ano de seca
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Os encontros com os criadores nos fez perceber a necessidade de uma
reestruturação das instituições de pesquisa e extensão e das políticas públicas
de assistência técnica aos criadores do município de Cacimbas-PB, uma vez que
a EMATER não funciona no município por falta de uma equipe técnica
qualificada, ficando os agricultores familiares com os conhecimentos populares,
mas com a necessidade dos conhecimentos técnicos que precisam ser somados
para gerar soluções inovadoras. Percebemos também que os espaços
acadêmicos precisam proporcionar esse tipo de vivência.
CONCLUSÃO
Em função do grande período de estiagem na região e pela inviabilidade
econômica de se alimentar o rebanho comprando-se alimentos e suplementos
industriais, bem como a escassez da Palma Forrageira devido às devastações
ocasionadas pela Cochinilha do Carmim, o Mandacaru constitui-se como uma
excelente alternativa para a produção de forragem e também como suplemento
alimentar para os animais do semiárido.
A partir dessa interação com os agricultores/criadores, que são os atores
do sistema alimentar em questão, podemos perceber a importância dos
conhecimentos prévios que os agricultores possuem e que, a partir do segundo
encontro, tivemos mais facilidade de discussão acerca do tema, já que fomos
bem acolhidos e alguns criadores que resistiam às discussões, no primeiro
encontro, já começaram a interagir no grupo. Sentimos a necessidade de dar
continuidade ao trabalho de mobilização acerca do tema alimentação animal e
de outros temas que surgiram no decorrer dos encontros uma vez que o
município tem uma necessidade de assistência aos criadores/produtores.
A convivência com os agricultores/criadores, com o mandacaru como
alimentação animal e com estudos sobre o semiárido nos proporcionou
oportunidades de colocar em prática as teorias estudadas e adquirir novos
conhecimentos enquanto estudantes e profissionais das ciências agrárias,
principalmente através do processo de construção do conhecimento a partir da
valorização de experiências concretas.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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REFERÊNCIAS
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caatinga, no período chuvoso e pasto de capim buffel diferido, no período
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UTILIZAÇÃO E MANEJO DO XIQUEXIQUE E MANDACARU COMO
RESERVA ESTRATÉGICA DE FORRAGEM. Disponível em:
www.emparn.rn.gov.br/Acesso em: 21 de junho de 2014.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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CAPÍTULO 8
TRABALHO, SEGURANÇA E SAÚDE NA
AGRICULTURA FAMILIAR
Newton Alessandro Cavalcante de Albuquerque
João Maria Soares da Silva
Adamastor Pereira Barros
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TRABALHO, SEGURANÇA E SAÚDE NA AGRICULTURA FAMILIAR
Newton Alessandro Cavalcante de Albuquerque10
João Maria Soares da Silva
Adamastor Pereira Barros
INTRODUÇÃO
O Brasil, campeão de exportações de
grãos e produtos agroindustriais, é um país
de imensas extensões territoriais onde é
muito comum encontrarmos grandes e
pequenas porções de terra onde é praticado
o cultivo do solo como atividade econômica
sendo assim de massiva representação a
agricultura de base familiar. Portanto, na
sequência discutiremos sobre Legislação
vigente, o uso de EPI´s, produtos
fitossanitários e equipamentos agrícolas, de
forma adequada e com segurança.
Nesse sentido surge a necessidade de divulgação dos procedimentos,
equipamentos e normas relativas à profissão mais antiga da humanidade, a do
agricultor, onde os profissionais competentes como Técnicos Agrícolas,
Agrônomos, Veterinários e também Agentes Comunitários de Saúde da Própria
comunidade façam orientações onde o profissional do campo possa ter uma
melhor instrução sobre sua segurança e de sua família ao exercer sua profissão.
A ergonomia e o trabalhador rural
10 Técnico Administrativo em Educação-CCHSA-UFPB, Aluno Especial do PPGCAG
(Agroecologia)-Mestrando em Ciências Agrárias – Agroecologia, Centro de Ciências Humanas
Sociais e Agrárias CCHSA/ Universidade Federal da Paraíba- UFPB, Bananeiras-PB. E-mail:
Imagem 1: Luís Moreira de Araújo Júnior (2014)
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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Muitos dos profissionais desse setor agrário são comumente acometidos
por problemas como dores e doenças no seu sistema músculo-esquelético,
geralmente com o passar dos anos, desenvolvendo tais trabalhos de campo de
forma incorreta, operando equipamentos e maquinário e manuseando
determinados insumos sem proteção e de forma inadequada. Assim, essas
enfermidades pesam mais ao ponto de atrapalhar o desenvolvimento de suas
atividades de trabalho e, consequentemente, afeta sua qualidade de vida.
O homem do campo doente é uma pessoa improdutiva e, por essa razão,
chega até a assumir uma postura desmotivada perante a vida familiar e social.
Partindo deste princípio, prosseguiremos com a explicitação de alguns conceitos
e recomendações acerca da saúde e segurança do agricultor familiar. Para tanto,
tomaremos por base a Norma Regulamentadora 31 - Segurança e Saúde no
Trabalho na Agricultura, Pecuária Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura
MAPA (BRASIL, 1997) A Recomendação supracitada estabelece os preceitos a
serem observados na organização e no ambiente de trabalho, de forma a tornar
compatível o planejamento e o desenvolvimento das atividades da agricultura,
pecuária, silvicultura, exploração florestal e aquicultura com a segurança, a
saúde e o meio ambiente do trabalho. Em 2005, a NR 31 foi criada pelo Ministério
do Trabalho e Emprego (MTE) para preservar a segurança e a saúde do
trabalhador rural, esteja ele inserido no contexto das pequenas, médias ou
grandes propriedades rurais.
Com o avanço tecnológico da agricultura no Brasil e também com o
maior acesso, por exemplo, a linhas de financiamentos e de créditos agrícolas,
não só o grande produtor, mas também o médio e o pequeno têm a possibilidade
de adquirir equipamentos e máquinas que facilitam o trabalho com produtos
agrícolas, contudo, isso acaba também por impor um determinado ritmo
acelerado ao trabalho do homem do campo.
Tal exigência, das máquinas e dos equipamentos, acaba submetendo o
homem a praticar posturas inadequadas na execução de determinados
movimentos corporais que, por sua vez, são muito repetitivos e, por
consequência, acarretam enfermidades, casos clínicos de lesões no sistema
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
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muscular e esquelético do agricultor, distúrbios osteomusculares relacionados
ao trabalho (DORT).
Riscos e limitações da atividade agrícola no campo
No ponto de vista de Luiz (2006), sobre algumas limitações da
ergonomia no setor agrário:
A aplicação da ergonomia na agricultura ainda não ocorre
com a intensidade desejável, devido ao caráter
relativamente disperso dessa atividade e ao pouco poder
de organização e reivindicação dos trabalhadores rurais. É
na agricultura, onde se concentra a maior parte dos
trabalhos mais árduos que se conhecem. (LUIZ, 2006,
p.39)
Partindo desse sentido, observamos um dos maiores gargalos da
economia agrícola em nosso país e
concluímos que muito ainda se tem por
fazer no que diz respeito à organização
social dos Agricultores e à oferta de
educação profissional aos agricultores para
que haja uma melhor efetivação da
produtividade nas unidades familiares.
Em todo o mundo, a agricultura é
apontada como uma das atividades cujo
risco de acidentes e contaminação é iminente e, por conta disso, muitas vezes o
produtor acaba se envolvendo em
acidentes com máquinas e também se
contaminando com produtos químicos, tais como: Fungicidas, Acaricidas,
herbicidas dentre outros produtos fitossanitários que são adquiridos e
indiscriminadamente. Como resultado dessa contaminação, muitos produtores
rurais chegam a adoecer e a perder sua capacidade de trabalhar saudavelmente.
Em trabalhos que são realizados, por exemplo, com máquinas e motores
barulhentos, por um longo período de horas diárias, é indispensável o uso de
Agricultor Operando maquinário agrícola sem uso de EPI. Foto: Luís Moreira de Araújo Júnior(2014
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
100
protetores auriculares. A exposição do trabalhador a longas horas de ruídos,
além de trazer danos diretos à audição, afeta indiretamente o sistema nervoso
central, altera o metabolismo e eleva os níveis de estresse do mesmo.
A exposição do trabalhador a ambientes com temperatura elevadas e
com umidade do ar reduzida ou muito elevada, durante muitas horas, reduz
drasticamente a produtividade e eleva os riscos de acidentes no campo. Em dias
quentes, com temperatura e umidade do ar elevadas, não se recomendam a
execução de trabalhos braçais, como os de manejo do solo, e/ou atividades com
uso de roupas que dificultem a mais ainda a troca de calor da pele com o
ambiente, pois elas dificultam a refrigeração do corpo humano, Almeida & Viega
(2008).
A presença de mais vapor de água no ambiente dificulta a evaporação
das gotículas de suor da pele do trabalhador. Podemos tomar como exemplos
de ocorrência de altas temperaturas e altos índices de umidade relativa do ar
alguns estados do Norte do Brasil, a exemplo do Acre que possui elevada
umidade relativa do ar em dias quentes. Logo, a recomendação é para que se
realizem pequenas pausas durante a jornada de trabalho diária e para que o
trabalhador tome bastante líquido para a hidratação do corpo. Além disso,
recomenda-se o uso de roupas leves, o que ajuda a melhorar o desempenho dos
trabalhos de campo e a proteger contra a irradiação solar. Estas roupas devem
ser bem arejadas e com comprimento considerável (que cubra todo o braço) para
proteção contra queimaduras.
O uso indiscriminado de defensivos alternativos como caldas, inseticidas
naturais e biofertilizantes, mesmo estes sendo de procedência ambiental, sem
considerar a devida recomendação técnica e sem a utilização de equipamentos
de proteção por parte do manipulador, é capaz de expor o agricultor a sérios
problemas de saúde, doenças graves e sequelas devido à contaminação
biológica por fungos bactérias nocivos ao homem. A contaminação pode se dar
por inalação de gases (metano, gás-carbônico), aspiração de poeira (pós-
vegetais, calcário, cinzas), e contato com líquidos fitossanitários alternativos
(absorção cutânea, com olhos, mucosas, e ferimentos na pele).
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
101
Quando falamos de fitoquímicos, como os defensivos químicos
(agrotóxicos), estamos, na verdade, chamando a atenção para o uso
indiscriminado dos mesmos, pois são capazes de provocar sérios danos por
contaminação à saúde do ser humano, dos animais de produção, das abelhas e
de outros insetos importantes para a manutenção da biodiversidade. Tal uso vem
acarretando a simplificação da biodiversidade e provocando a contaminação do
meio ambiente terrestre e aquático visto que a solubilidade, dessas substâncias,
é de fácil disseminação, ficando, portando, a recomendação de evitar o seu uso
e substituí-lo por caldas naturais, extratos vegetais, óleos essenciais e
biofertilizantes alternativos, mas sem deixar de usar os Equipamentos de
proteção individuais-EPI’S para evitar exposição do produtor a esses produtos,
mesmo que sejam de origem natural.
Manuseio de cargas e postura corporal
Ao longo de anos de trabalho com atividades agropecuárias, o homem
do campo geralmente é acometido com um dos mais comuns problemas no
campo, que são as dores e problemas no sistema músculo-esquelético,
principalmente dores nas costas que são uma das principais reclamações dos
trabalhadores como mostram Luiz (2006) e Costa (2010). Muitas podem ser as
precauções que vêm a corrigir a postura do trabalhador rural em suas árduas
tarefas diárias, tais como os programas de educação postural, organizados pelo
Serviço Nacional de Aprendizagem Rural -SENAR, que trazem muitas
orientações aos trabalhadores que manuseiam cargas, trabalham com tratores
e realizam atividades diárias que exigem do aparelho locomotor (coluna
vertebral, músculos, tendões) bastante resistência e flexibilidade como, por
exemplo, o plantio, tratos culturais, colheita, dentre outras atividades
relacionadas com a agricultura.
Ao executar práticas de plantio, o trabalhador deve agachar-se, se
apoiando sobre as pernas, distribuindo o peso do tronco sobre as pernas, desta
forma a coluna vertebral não fica sobrecarregada, pois tal atividade demanda
vários minutos na mesma posição. Ao manusear máquinas pesadas, como
tratores, por longas horas, o operador deve manter postura ereta ao dirigir,
usando os respectivos EPI’s (Equipamentos de Proteção Individual)
recomendados para tal prática, tais como os protetores auriculares. Não apoiar-
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
102
se no volante, e manter a postura com a coluna formando um ângulo de 90º com
o assento da máquina, e sempre que se sentir muito cansado realizar pausas de
poucos minutos seguidos de alongamentos dos braços e pernas com a finalidade
de aliviar a tensão sobre os músculos.
Ao preparar produtos fitossanitários, caldas, diluição de agroquímicos,
proceder com o máximo de segurança em tal atividade com finalidade de se
evitar acidentes de contaminação. Usar todos os EPI’s necessários para
manuseio desses produtos, avental, jaleco, máscara, óculos, touca árabe, luvas,
botas, não deixando de lado que esses produtos devem ser preparados em local
específico para tal finalidade para se evitar contaminação de animais, alimentos
e de fontes de água. Deve providenciar uma bancada com altura considerável
(com no mínimo de 1 metro de altura) para evitar lesões na coluna e acidentes
ao vestir a bomba de pulverização, também é interessante deixar este ambiente
exclusivo para o preparo de produtos fitossanitários.
Para o levantamento de caixas com cargas, por exemplo, caixas de
tomates, cenouras, hortaliças de um modo geral, fazer tal procedimento
abaixando-se com a coluna ereta e flexionando os joelhos e assim o
levantamento das cargas estrará sendo feito de forma suave, ou seja, quem faz
o esforço do levantamento são as pernas e não a coluna vertebral. Quando se
desejar fazer o carregamento destas caixas em carrinhos de mão, não se deve
rotacionar o tronco com cargas suspensas para evitar torções na coluna. O mais
Importante de tudo isso é o alongamento dos braços e pernas antes e depois
dos trabalhos e, desta forma, alivia-se a tensão e o estresse de toda a
musculatura requerida nessa atividade.
Procedimentos e normas para a segurança do trabalhador rural
Apesar de o nosso mundo contemporâneo estar baseado em uma série de
avanços científicos e dominado pelas novas tecnologias, no que se refere à
segurança e saúde do trabalho, observar-se que ainda são consideráveis as
causas de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho em seus diversos
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
103
ambientes como nas fábricas, nas construções civis, nos hospitais e,
indispensavelmente, na agricultura.
Geralmente, o que se pode verificar é que, de um modo geral, a falta de
concepção e resistência do próprio trabalhador a fazer uso de Equipamentos de
Proteção Individual (EPI’s) originam as causas acidentais e os problemas de
saúde acarretados pela ausência do conhecimento das Normas de Segurança e
Saúde do Trabalho. O cumprimento destas normas serve para almejar uma
qualidade de vida mais saudável e, consequentemente, duradoura.
Segundo Boigues et al. (2006), os fatores de segurança, saúde e
qualidade de vida no trabalho são primordiais dentro de uma empresa, pois se
deve considerar que o homem, que está por trás dos trabalhos, é a essência do
universo. No Brasil, o problema de segurança, saúde e qualidade de vida
relacionado diretamente ao trabalho, durante mais de três séculos, não foi motivo
de preocupação, já que a mão-de-obra era constituída basicamente, em sua
maioria, por escravos.
A falta de conhecimento do homem do campo sobre seus direitos e deveres
aliada a deficiência na prestação de serviços por alguns órgãos públicos,
cooperados e/ou cooperativas e sindicatos rurais proporcionam, juntos, uma
deficiência na extensão de conhecimentos ao trabalhador rural, que deveria ser
melhorado o serviço de assistencialismo técnico, formando-os em cursos de
capacitação e gerando novos horizontes e compreensões no tocante as normas
de segurança.
É justamente nesses aspectos que órgãos e/ou instituições de ensino,
pesquisa e extensão devem disponibilizar a oferta de conhecimentos aos
trabalhadores, sejam estes do campo ou da cidade, propondo a realização de
cursos de capacitação, oficinas, palestras e campanhas de conscientização, por
exemplo. Nestes pode-se especificar a importância do desenvolvimento de suas
tarefas com mais segurança e saúde.
Equipamentos de Proteção Individual (EPI’S)- NR 6
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
104
Segundo a Portaria SIT11 nº. 194, de 07 de dezembro de 2010 (BRASIL,
2010), para os fins de aplicação, considera-se Equipamento de Proteção
Individual (EPI), todo dispositivo ou produto, de uso individual, utilizado pelo
trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de ameaçar à segurança
e à saúde no trabalho.
Referindo-se a Norma Regulamentadora (NR) n°. 6, inserida pela Portaria
SIT n.º 107, de 25 de agosto de 2009, alterada pela portaria SIT/TEM nº
194/2010, todo empregador deverá dar plenas condições para que o empregado
venha a ter a possibilidade de obter os EPI’s e fazer uso destes de forma correta.
Ainda segundo a NR n°. 6, cabe ao empregador: adquirir o EPI adequado ao
risco de cada atividade, exigir seu uso, fornecer ao trabalhador somente o EPI
aprovado pelo órgão nacional competente em matéria de segurança e saúde no
trabalho, orientar e treinar o trabalhador sobre o uso adequado do EPI, guarda e
conservação do mesmo, substituir imediatamente, quando danificado ou
extraviado, responsabilizar-se pela higienização e manutenção periódica,
comunicar ao Ministério do Trabalho e Emprego qualquer irregularidade
observada e registrar o seu fornecimento ao trabalhador, podendo ser adotados
livros, fichas ou sistema eletrônico.
Quanto à responsabilidade do trabalhador, de acordo com NR 06, cabe
ao empregado quanto ao EPI: usar, utilizando-o apenas para a finalidade a que
se destina, responsabilizar-se pela guarda e conservação, comunicar ao
empregador qualquer alteração que o torne impróprio para uso e cumprir as
determinações do empregador sobre o uso adequado.
A NR n°. 6 classifica uma vasta lista de EPI’s, podendo ser usados na
indústria, construção civil, hospital, agricultura, pecuária e etc. São exemplos de
EPI’s que podem ser utilizados na agropecuária os itens listados no Quadro 1.
Quadro 1. Lista de Equipamentos de Proteção Individual (EPI’s) Utilizados na
Agricultura
EXEMPLOS DE EPI’s PROTEÇÃO
INDIVIDUAL
1-Capacete; 2-Capuz ou balaclava Proteção da cabeça
11 SIT: Secretaria de Inspeção do Trabalho – Ministério do Trabalho e Emprego
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
105
1-Óculos; 2-Protetor facial; 3-Máscara de Solda Proteção dos olhos e face
1-Protetor auditivo e/ou auricular Proteção auditiva
1-Respirador purificador de ar não motorizado
2-Respirador purificador de ar motorizado
3-Respirador de adução de ar tipo linha de ar
comprimido
4-Respirador de adução de ar tipo máscara
autônoma
5-Respirador de fuga
Proteção respiratória
1-Vestimentas
2-Coletes para proteção do tronco contra riscos de
origem mecânica e/ou físicos, batas e/ou aventais
de proteção química, entre outros
Proteção do tronco
1-Luvas; 2-Creme protetor; 3-Manga; 4-
Braçadeira; 5-Dedeira
Proteção dos membros
superiores
1-Calçado 2-Meia; 3-Perneira; 4-Calça Proteção dos membros
inferiores
1-Macacão; 2-Vestimenta de corpo inteiro; Proteção do corpo inteiro
1-Dispositivo trava-queda 2-Cinturão Proteção contra quedas
com diferença de nível
Dentre estes EPI’s ainda pode-se recomendar alguns específicos
utilizados na agropecuária, como: luvas de borracha e/ou couro, máscaras
respiratórias de carvão ativado, viseira facial, jaleco, calça repelente, boné ou
touca árabe, avental e bota de couro e/ou borracha. Todos estes materiais
devem conter o certificado de aprovação (CA) do MTE.
Além de usá-los de forma correta, também se precisa de uma boa higiene.
Após serem usados, devem ser guardados em um local apropriado que os
mantenham limpos e conservados para o uso seguinte. Com relação à limpeza
da touca árabe, luva, jaleco, calça repelente, avental e bota de borracha, estes
devem ser colocados em um recipiente com um produto para retirar os resíduos
incrustados. Quando se tratar do respirador, devemos efetuar a limpeza
retirando o filtro de carvão ativado para, eventualmente, lavarmos a máscara e,
depois de usá-la, se faz necessário passar álcool 70% (v/v) para sanitizar a
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
106
viseira facial, limpando-a, antes disto, com sabão neutro e uma esponja macia,
para não causar ranhuras na viseira.
Independentemente de qualquer produto ou trabalho que seja executado
com os EPI’s, deve-se alertar pelo cuidado da higienização e a conservação dos
mesmos, observando quando estiverem com algum defeito para o uso, para que
possam ser trocados de forma imediata. Os EPI’s são materiais usados para
proteção de nossa saúde, respeitando as normas prescritas pela Norma
Regulamentadora n°. 7, inserida pela Portaria GM-MTE n.º 3.214, de 08 de junho
de 1978 e alterada pela Portaria SIT-MTE n.º 236, de 10 de junho de 2011
(BRASIL, 2011). Portanto, sem uma higienização e conservação correta poderá
ser acarretada uma eventual fonte de contaminação prejudicial à saúde. Devido
a essas causas é que o conhecimento e o cuidado de como fazer uso destes
equipamentos é de fundamental importância para o desenvolvimento seguro de
suas tarefas e bem estar para a saúde do agricultor.
SEGURANÇA, HIGIENE E SAÚDE DOS ORDENHADORES
Conhecendo a Norma Regulamentadora (NR) N°. 31
Com o objetivo de estabelecer os preceitos a serem observados na
organização e no ambiente de trabalho, de forma a tornar compatível o
planejamento e o desenvolvimento de diversas atividades, dentre elas a
agricultura e pecuária, foi publicada a Norma Regulamentadora (NR) n°. 31
(2005) com a finalidade de estabelecer as normas sobre SEGURANÇA E
SAÚDE NO TRABALHO.
É importante ressaltar que responderão solidariamente pela aplicação
desta regulamentação as empresas, empregadores, cooperativas de produção
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
107
ou parceiros rurais que se congreguem para desenvolver tarefas ou que
constituam um grupo econômico. Segundo a NR-31 (2005), sempre que haja
dois ou mais empregadores rurais ou trabalhadores autônomos que exerçam
suas atividades em um mesmo local, estes deverão colaborar na aplicação das
prescrições sobre segurança e saúde. As demais regras e proposições
prescritas poderão ser vistas na íntegra nesta norma regulamentadora.
Segurança Individual dos Ordenhadores
Para uma ordenha segura há necessidade de alguns materiais, tais como:
detergente neutro, álcool (70° INMP) e o
papel toalha descartável. Também são
exigidas pelas normas regulamentadoras
as vestimentas necessárias para ordenha
higiênica e garantia da segurança
individual, sendo: jaleco, avental, botas e
gorro. Para Silva et al. (2013), estes
materiais são essenciais para higiene
pessoal e comportamento dos ordenhadores. Estes materiais devem ser de cor
clara, preferencialmente de cor branca.
Outra característica, de acordo com a
Portaria n°. 326 (BRASIL, 1997) do
Ministério da Saúde (MS), citado por Silva et
al. (2013), é a lavagem das mãos, devendo
ser realizada sempre que iniciar os trabalhos; antes de iniciar a ordenha de cada
animal e após o ordenhador utilizar o sanitário, manipular material contaminado
e realizar a lavagem e desinfecção das mãos após a manipulação de qualquer
material contaminante que possa transmitir doenças. Outra característica trata-
Figura 3: Procedimento de ordenha realizado de forma incorreta pelo ordenhador, sem o uso de EPI e em ambiente impróprio. Foto: Luiz Moreira de Araújo Júnior(2014).
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
108
se da proibição ao uso de adornos (anéis, alianças, brincos, relógio, pulseira,
colar, piercing, etc.).
Algumas diretrizes devem ser explicadas aos ordenhadores objetivando
oferecer qualificação em matéria higiênico-sanitária e de higiene pessoal,
conforme serão mostradas na sequência.
Figura 5: EPI´s utilizados na prática da ordenha.
FOTO: JOÃO MARIA SOARES DA SILVA (2013)
Figura 4: Procedimento Correto para Realização da ordenha. FOTO: JOÃO MARIA SOARES DA SILVA (2013)
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
109
Normas Higiênico-Sanitárias dos Ordenhadores
A ordenha é a atividade oriunda da obtenção do leite, realizada em
animais lactantes. Esta pode ser realizada manual e/ou mecanicamente. Para
realização desta atividade, existem normas funcionais que permitem a correta e
adequada manipulação higiênico-sanitária do leite obtido e comportamento
higiênico dos ordenhadores, fatores que originam as Boas Práticas de Higiene
Figura 6: Ordenhador praticando atos errados: comer, beber, fumar, Manusear cédulas no ambiente passível de contaminação dos alimentos. FOTO: JOÃO MARIA SOARES DA SILVA (2013)
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
110
na Ordenha (BPHO’s), garantindo a inocuidade da matéria-prima e a saúde dos
ordenhadores.
Nestes preceitos, a Portaria n°. 368 (BRASIL, 1997) adverte que nas
áreas de manipulação do leite não devem ser realizados atos que possam
originar uma contaminação, como: comer, fumar, tossir ou outras práticas anti-
higiênicas. Ainda ressalva que devem ser exigidos hábitos higiênicos de todo o
pessoal que trabalhe na ordenha, como também a proibição de fumar durante a
manipulação do leite.
Segundo Silva et al. (2013), diversas regras higiênicas são estabelecidas
pela Portaria n°. 216 (BRASIL, 2004), destacando-se os itens que regulamentam
a higiene e o comportamento dos ordenhadores. O ordenhador deve tomar
banhos diários e, sempre que iniciar as atividades da ordenha, deve estar bem
uniformizado. Também é preciso que o ordenhador evite espirrar, cantar,
assobiar e/ou falar, manipular dinheiro, fumar, conversar/cumprimentar, passar
os dedos no nariz, orelhas, boca e/ou coçar a cabeça e/ou qualquer parte do
corpo.
Observamos, com este exemplo, que se deve ter cuidados com a higiene
pessoal para que a saúde dos ordenhadores não seja comprometida e também
para não afetar a higiene na obtenção e qualidade do leite.
Saúde dos Ordenhadores
A garantia e acompanhamento da saúde e comportamento dos
ordenhadores são pontos fundamentais para a correta realização da ordenha
nas instalações familiares das propriedades rurais produtoras de leite.
A Instrução Normativa n°. 62 (BRASIL, 2011) define outros importantes
fatores tais como: ter carteira de saúde, renovada anualmente ou quando
necessário; usar macacão e avental plástico ou similar de cor branca, gorro e
botas de borracha, dividir os trabalhos no estábulo, de maneira que o ordenhador
se restrinja à sua função, cabendo a outros as demais operações (limpeza do
curral, preparo da ração ou soltura dos animais no pasto, por exemplo).
Durante as atividades, os ordenhadores deverão manter-se
uniformizados, protegidos, calçados adequadamente e com os cabelos cobertos,
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
111
unhas, bigode e barbas aparados e não apresentarem feridas infectadas,
infecções cutâneas, chagas ou diarreias. Um ponto muito importante para a
melhoria da saúde dos ordenhadores é a participação em cursos de qualificação
e exames de rotina.
Ainda será preciso verificar a situação de saúde, não apresentando riscos
de contaminação ao leite e serem advertidos sobre a importância de
submeterem-se aos exames médicos e laboratoriais que avaliem a sua condição
de saúde antes do início de sua atividade e/ou periodicamente e após o início
das mesmas.
CONCLUSÃO
Diante da temática abordada neste capítulo é de grande importância que
os profissionais das ciências agrárias possam desenvolver orientações,
recomendações das técnicas adequadas para o bom desempenho das atividade
agropecuárias por parte dos agricultores, desta forma reduzindo os números de
acidentes e prejuízos no campo seguindo as normas como recomenda as
instruções normativas citadas neste capítulo.
Vale a pena ressaltar que existem muitas dificuldades para fazer com que
esse conhecimento chegue aos agricultores e seus empregadores portanto é
bastante importante que sejam desenvolvidas pesquisas e estudos mais
aprofundados que levem a uma divulgação efetiva destas informações.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, R. A. C. S.; VEIGA, M. M. Aspectos relevantes na termorregulação
corporal no uso de equipamento de proteção individual. XXVIII Encontro
Nacional de Engenharia de Produção. Rio de Janeiro, 2008
BOIGUES, C. C. A.; CARVALHO, E. P.; CORREIA, G. B.; BAUMGARTEN, J. D.;
PAIVA, V. M. SEGURANÇA E QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO: UMA
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
112
ANÁLISE QUALITATIVA EM EMPRESAS DE MÉDIO PORTE DA REGIÃO DE
PRESIDENTE PRUDENTE. 2006. 118f. Monografia (Bacharel em
Administração) - Faculdades integradas “Antônio Eufrásio de Toledo” Faculdade
de Ciências Econômicas e Administrativas de Presidente Prudente. Presidente
Prudente/SP, 2006.
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego- MTE. NORMA
REGULAMENTADORA 6 - EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL.
Publicada pela Portaria GM n.º 3.214, de 08 de junho de 1978. Atualização mais
recente dada pela Portaria SIT n.º 194, de 07 de dezembro de 2010. (2010).
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego-MTE. NORMA
REGULAMENTADORA 7 - PROGRAMAS DE CONTROLE MÉDICO DE
SAÚDE OCUPACIONAL. Publicada pela Portaria GM n.º 3.214, de 08 de junho
de 1978. Atualização mais recente dada pela Portaria SIT n.º 236, de 10 de junho
de 2011. (2011).
BRASIL. Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA). Portaria
n°. 368 de 08 de setembro de 1997. Aprova o regulamento técnico sobre
condições higiênico-sanitárias e de boas práticas de fabricação para
estabelecimentos produtores/industrializadores de alimentos. Diário Oficial da
República Federativa do Brasil, Brasília, 04 set. 1997.
COSTA, C.K.L.; LUCENA, N.M.G.;TOMAZ, A.F.; MÁSCULO, F.S.. AVALIAÇÃO
ERGONÔMICA DO TRABALHADOR RURAL: ENFOQUE NOS RISCOS
LABORAIS ASSOCIADOS À CARGA FÍSICA. GEPROS- Gestão da produção,
Operações e Sistemas – Ano 6, nº 2, p.101-1012, abril-Junho/2011.
_________. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Departamento
de Inspeção de Produtos de Origem Animal. Instrução Normativa nº. 62, de 29
de dezembro de 2011. Regulamento Técnico de Produção, Identidade e
Qualidade do Leite tipo A, o Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de
Leite Cru Refrigerado, o Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
113
Leite Pasteurizado e o Regulamento Técnico da Coleta de Leite Cru Refrigerado
e seu Transporte a Granel. D.O.U., 30/12/2011 - Seção 1. 24p.
_________. Ministério da Saúde. Portaria n°. 326, de 30 de julho de 1997.
Estabelece regulamento técnico condições higiênico-sanitárias e de boas
práticas de fabricação para estabelecimentos produtores/industrializadores de
alimentos. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 01 ago.
1997.
_________. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(ANVISA). Resolução RDC nº. 216, de 15 de setembro de 2004 . Dispõe sobre
Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação. Diário
Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, p. 25, 16 set. 2004.
Seção 1, p. 25.
NR31 -Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho na
Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura – NR 31,
aprovada pela Portaria nº. 86 do Ministério do Trabalho e Emprego em
03.03.2005.
LUIZ, G.S., ANÁLISE DO TRABALHO AGRÍCOLA: UM ENFOQUE
ERGONÔMICO. FACULDADE ASSIS GURGACZ – FAG, Cascavel-PR, 2006;
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HIGIENE NA ORDENHA (BPHO’S). Bananeiras: UFPB, 2013. 47p. : il.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
114
CAPÍTULO 9
ORGANIZAÇÃO DE UMA FEIRA DE PRODUTOS
AGROECOLÓGICOS
Valter da Silva
Antônio Cardoso
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
115
ORGANIZAÇÃO DE UMA FEIRA DE PRODUTOS AGROECOLÓGICOS
Valter da Silva12
Antônio Cardoso
INTRODUÇÃO
Dentre muitos desafios da agricultura familiar, a comercialização é sem
dúvidas um problema secular, presente nas comunidades rurais. Pensando
nisso o governo brasileiro através do Pronaf – Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar, liberou linhas de créditos para a compra
de insumos agrícolas, escoamento da produção e comercialização. Sendo a
comercialização o resultado da produção agrícola em que o agricultor familiar
investe todo seu recurso financeiro e, ainda o seu trabalho braçal e de membros
de sua família; havia a necessidade de se criar uma ponte de ligação entre o
agricultor e o consumidor final, evitando assim, os atravessadores. Por isso, o
governo federal criou o PAA – Programa de Aquisição de Alimentos da
Agricultura Familiar e o PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar, que
são formas diretas de o produtor rural fornecer alimentos para instituições
públicas e associações rurais e de bairro.
Com o advento e a expansão das chamadas feiras de produtos orgânicos
ou agroecológicos, foi preciso também através de editais ou chamadas públicas
liberar o aporte financeiro, oriundo do Ministério do Desenvolvimento
Agrários/Secretaria de Agricultura Familiar – MDA/SAF, com o objetivo de
incentivar a implantação dessas feiras nos vários municípios brasileiros. Foi
neste contexto que diversos municípios paraibanos foram contemplados com a
feira. Além de ser mais uma forma direta de comercialização de produtos da
agricultura familiar, a feira agrega valores socioambientais em todos os itens
comercializados. Logo, quando se fala de agricultura sustentável, se está falando
de estilos de agricultura de base ecológica que atendam a requisitos de
12 Engenheiro Agrônomo –CCA/UFPB, Mestrando em Ciências Agrárias( Agroecologia) –PPGCAG/ CCHSA UFPB. E-mail: [email protected]
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
116
solidariedade entre as gerações atuais e destas para com as futuras gerações,
o que alguns autores chamam de uma “ética da solidariedade (Caporal e
Costabeber, 2004). Segundo Santos et al., (2011), é preciso aprimorar os
tradicionais sistemas agrícolas existentes, na busca de produtividade e
qualidade do produto final destinado ao consumo in natura. Portanto o uso de
tecnologias adequadas é o único meio para se promover a preservação do meio
ambiente e da saúde humana, lembramos ainda, que a conscientização
socioeducativa do produtor rural também contribui para esse propósito.
O objetivo deste trabalho é informar ao leitor quanto à implantação de
feiras de produtos agroecológicos em seu município.
Agricultura Familiar e Agroecologia
Agricultura Familiar é a agricultura praticada pelo pequeno agricultor rural;
o mesmo se dispõe de sua força braçal e de seus familiares dependentes, para
produzir em sua pequena propriedade rural o sustento da família. A agricultura
familiar é entendida como uma forma social particular de organização da
produção, tendo como base a unidade de produção gerida pela família
(Hinterholz e Ribeiro, 2011).
A agricultura familiar nos últimos anos vem passando por uma transição
em seu sistema de produção convencional, por um sistema de produção de base
ecologicamente sustentável. A agricultura familiar por muitas décadas foi refém
do pacote tecnológico vendido pela revolução verde. Segundo Hinterholz e
Ribeiro (2011), A chamada Revolução Verde surgiu logo após a Segunda guerra
Mundial e tinha como pressuposto o aumento de produção e da produtividade
agrícola. Foi à ideia vendida pela Revolução Verde que trouxe para o Brasil as
indústrias de fertilizantes e adubos químicos, as indústrias de herbicidas e outros
agroquímicos e ainda as montadoras de máquinas pesadas (caminhões, tratores
agrícolas e seus implementos). Atualmente percebe-se que, apenas, os
latifundiários responsáveis pelos grandes monocultivos conseguiram lucrar com
o pacote tecnológico vendido pela Revolução verde. E que a agricultura familiar
no Brasil sempre foi detentora de poucas terras; chegando até mesmo existir
unidade de produção familiar com três hectares ou menos, não tinha como os
mesmos lucrar já que era preciso de altos investimentos.
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
117
Segundo Caporal e Costabeber (2004, p.7): Desde muito
tempo a sociedade vem buscando estabelecer estilos de
agricultura que sejam menos agressivos ao meio ambiente
e capazes de proteger os recursos naturais, assegurar maior
longevidade, tentando fugir do estilo convencional de
agricultura que passou a ser hegemônico a partir dos novos
descobrimentos da química agrícola, da biologia e da
mecânica ocorridos a partir do final do século XIX. Em
diversos países, surgiram versões destas agriculturas
alternativas, com diferentes denominações: orgânica,
biológica, ecológica, biodinâmica, regenerativa,
permacultura, etc., cada uma delas seguindo determinados
princípios, tecnologias, normas, regras e filosofias, segundo
as correntes a que estão aderidas.
Então, para sair do sistema de produção agrícola vendido pela Revolução
verde, que além de caro, era deletério do meio ambiente e do homem foi preciso
chegar ao conceito de Agroecologia. A Agroecologia é uma ciência que engloba
todos os princípios fundamentais das chamadas agricultura alternativas, porém
de forma multidisciplinar, visando encontrar soluções adaptáveis para um
sistema de produção agropecuário que seja mantenedor de recursos naturais e
protetores da biodiversidade e da saúde humana.
Resumindo, a Agroecologia se consolida como enfoque
científico na medida em que este campo de conhecimento
se nutre de outras disciplinas científicas, assim como de
saberes, conhecimentos e experiências dos próprios
agricultores, o que permite o estabelecimento de marcos
conceituais, metodológicos e estratégicos com maior
capacidade para orientar não apenas o desenho e manejo
de agroecossistemas sustentáveis, mas também processos
de desenvolvimento rural sustentável, Caporal e Costabeber
(2004, p.13).
DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014
118
É neste contexto de transição de um sistema de produção agropecuário
convencional para um sistema de produção agropecuário de base ecológica e
sustentável; que as feiras de produtos agroecológicos vêm incentivar a produção
agrícola e pecuária dentro dos preceitos da Agroecologia e, educando e
estimulando o consumidor final para uma alimentação saudável oriunda de um
sistema de produção sustentável.
Comercialização da Agricultura Familiar
O governo federal instituiu políticas públicas para a comercialização
institucional através dos Programas de Aquisição de Alimentos (PAA) e do
Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que são formas diretas de
o produtor rural fornecer alimentos para as escolas da rede pública de ensino,
no caso do PNAE; e fornecer alimentos aos hospitais públicos, aos presídios, as
associações rurais e de bairro e ainda as instituições filantrópicas, no caso PAA.
Sem dúvida essa iniciativa do governo federal vem estimulando a geração de
emprego e renda. Mas as oportunidades do agricultor familiar não param por aí;
a possibilidade do mesmo vender a produção excedente em feira livre existe.
Principalmente se ele quer agregar valor à sua produção, nesse caso a feira de
produtos agroecológicos atende essa expectativa.
É bom lembrar que a agricultura familiar sempre tentou procurar uma
maneira de comercializar seus produtos. No entanto, não existiam as
oportunidades que se encontra hoje, e por muitas vezes a produção era vendida
a pessoa do atravessador, nas feiras livres ou nas Centrais de Abastecimento
(CEASAS). O atravessador adquiria a produção por preços muito abaixo do que
era praticado no mercado local, ficando com todo o lucro do agricultor. Para
vender nas centrais de abastecimento o agricultor deveria dispor de pelo menos
um caminhão e às vezes de motorista habilitado e ainda comprar um ponto de
venda nessas centrais. A venda feita nas feiras livres sempre foi a alternativa
mais viável para o agricultor familiar, já que ele poderia vender na feira livre de
seu município e de municípios vizinhos.
Quando o agricultor familiar é proprietário de um sacolão no comércio da
cidade, ele pode vender diretamente a sua produção ao consumidor final, por
um preço justo para ambas as partes. Mas sabemos que nem todo agricultor
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familiar tem um ponto de comércio; por isso, a venda da produção familiar nas
feiras livres é talvez, depois do PAA e do PNAE, a única alternativa vantajosa
para o agricultor. A venda da produção familiar em feira livre dá um bom
rendimento principalmente quando a feira local ou da região é grande.
O sistema de comercialização compreende diversas etapas,
e cada uma exige a atuação de agentes executando
determinadas funções ou serviços. Tais funções adicionam
utilidades e, consequentemente, valor ao produto. Conforme
sua natureza, as utilidades podem ser de lugar, de tempo e
de forma. Por exemplo, uma dona-de-casa vai ao sacolão
(lugar), aos sábados pela manhã (tempo), para adquirir
pequenas quantidades de hortaliças que são escolhidas e
acondicionadas a sacos plásticos (forma). Note-se que tais
produtos foram escolhidos em quantidades muito maiores,
em propriedades rurais distantes e há alguns dias. Então,
são as utilidades adicionadas ao produto, desde a fonte
produtora até o momento em que ele é colocado no porta-
malas do carro da família, que possibilitam a satisfação do
consumidor, Filgueira (2007).
Pelo que foi exposto, logo acima, o agricultor também tem que ficar
antenado com as novidades e o surgimento de possíveis nichos de mercado.
Com o advento da agricultura orgânica e da Agroecologia como ciência, o
consumidor final busca por alimentos saudáveis, mesmo que para isso ele tenha
que pagar um pouco mais.
Atualmente a produção orgânica ou nos preceitos da Agroecologia tem
conquistado um mercado consumidor exigente, que está disposto a pagar mais,
por um produto livre de agrotóxico e que respeite o meio ambiente. Para atender
essa demanda os agricultores familiares devem se organizar para poder
implantar em seus municípios e em municípios da região, feiras de produtos
agroecológicos e até mesmo se agruparem em associação rural para poder
vender a produção para as grandes redes de supermercados da capital e região
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metropolitana. É nos grandes centros urbanos que se encontra o maior mercado
consumidor de produtos agroecológicos.
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Figuras 1 a 4 - Feira de produtos Agroecológicos de Bananeiras/PB.
Foto: Antonio Cardoso – AGEMTE
Mobilização e Formação da Associação
Na formação da feira de produtos agroecológicos os “agentes envolvidos”
devem ser os primeiros a ser mobilizados e convocados para as reuniões e
debates acerca da implantação da feira. Entende-se aqui por agentes
envolvidos: os agricultores familiares, os mini pecuaristas, os pecadores
artesanais, os artesões rurais e de modo geral os mini produtores rurais. O
sindicato, os associados e cooperados de comunidade rurais devem se fazer
presentes; sendo aconselhável que o Conselho Municipal de Desenvolvimento
Rural Sustentável (CMDRS), conduza os encaminhamentos para a formação da
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feira. No entanto, a instância máxima e deliberativa para o funcionamento da
feira deve ser deve ser construída pelos próprios agricultores.
Para se chegar à formação da feira serão necessárias pelo menos cinco
etapas. A primeira será uma reunião informando aos interessados, o que venha
a ser uma feira de produtos agroecológicos. E na oportunidade é preciso levar
ao conhecimento de todos os presentes, o entendimento sobre Agricultura
Familiar, Agroecologia, Associação e comercialização. Temas brevemente
discorridos neste trabalho. É bom lembrar que alguns desses temas é do
cotidiano do agricultor, e por isso não haverá dificuldades do agente mobilizador
prestar os devidos esclarecimentos. Devendo o mesmo reforçar, apenas, o que
venha a ser agroecologia e as diversas formas de comercialização. A segunda
etapa será outra reunião, desta vez para cadastrar os agricultores interessados
em participar da feira e anotar em fichas individuas o que eles produzem. A
terceira etapa seria fazer uma visita técnica nas propriedades dos agricultores
cadastrados para ver o que realmente eles produzem e se produzem e, se está
dentro do preceito da Agroecologia. Lembrando que esta terceira etapa deverá
ser periódica, como forma de fiscalizar se o que eles produzem está dentro da
ideologia da agroecologia. A quarta reunião seria para decidir questões sobre a
criação de uma associação de agricultores familiares da feira de produtos
agroecológicos. Quinta etapa seria para organizar a implantação da feira. Nessa
etapa decidiria questões sobre:
Em que dia(s) da semana a feira deveria ocorrer;
Quantos bancos de venda deveriam compor a feira;
Que produtos seriam vendidos;
Como seria feita o escoamento da produção para feira (individual
ou coletiva);
Onde a feira ficaria localizada, a prefeitura cederia o espaço;
A feira teria seu reconhecimento na Lei Orgânica do Município;
Quem ficaria responsável pela montagem e desmontagem da
estrutura da feira, entre outros assuntos a tratar.
A quarta reunião como já foi dito, trata de questões sobre a criação da
associação da feira. Não cabe aqui neste trabalho desdobrar todo o
procedimento para finalizar essa etapa. No entanto, passaremos os passos
necessários para se chegar a esse objetivo.
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Primeiro é preciso saber que a associação de produtores rurais é uma
sociedade de pessoas sem fins lucrativos, regido por um Estatuto Social
(regimento interno);
O estatuto diz tudo sobre a associação e seus sócios: seus
direitos e deveres e seu funcionamento. Tudo que estiver
escrito nele deverá ser cumprido; por isso, tudo deve ser
bem discutido entre os futuros sócios. O estatuto deve estar
pronto para ser lido e aprovado na primeira reunião da
associação, Embrapa (2006 p.14).
Segundo, a associação será criada por um grupo de associados, os
assim, chamados fundadores, formado por pessoas físicas (agricultores
familiares ou mini produtores rurais). Terceiro, a associação deve ser registrada
no Cartório de Registro de Títulos e Documentos, no Cadastro Geral de
Contribuinte - CGC da Receita Federal na Receita Estadual, na Prefeitura
Municipal e no Instituto Nacional de Seguridade Social-INSS. Quarto é a diretoria
quem homologa o pedido de ingresso de novos associados. Quinto, o valor da
jóia, ou seja, da taxa de inscrição é a Assembleia Geral quem decide, assim
como, a taxa mensal a ser cobrada. É preciso que o(s) agente(s) mobilizador
(es), seja orientado por um advogado nessa etapa da criação da associação.
Maiores informações obtêm-se na Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 que
disciplinam o associativismo no código civil e na Lei nº 11.127, de 28 de junho
de 2005 que alterou alguns artigos da lei nº 10.406.
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Figuras 6 a 8 - Organização da feira de produtos agroecológicos de Bananeiras
e Alagoa Grande/PB.
Foto: Antonio Cardoso – AGEMTE
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a criação da feira de produtos agroecológicos é preciso forma uma
comissão com os integrantes da associação e se possível da sociedade civil
organizada para fazer a fiscalização dos alimentos que é produzido no campo
pelos agricultores. Isso é importante para garantir a fidelidade do sistema de
produção nos moldes da Agroecologia. E assim, garantir ao consumidor final, a
qualidade dos alimentos que é vendido na feira. Tem-se que diversificar a
produção de alimentos para que o consumidor tenha mais opções no momento
de levar o(s) produto(s) para casa. Deve-se fazer um calendário de plantio e
colheita junto aos agricultores para que se tenham sempre alimentos
diversificados a disposição o ano inteiro.
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REFERÊNCIAS
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princípios. Brasília: MDA/SAF/DATER-IICA, 2004. 24 p.
SANTOS, E. S. dos; LACERDA, J. T. de; MATIAS, E. C.; BARBOSA, M. M.
Cultivo do inhame em base agroecológica. João Pessoa-PB: Emepa, 2011.
60p.
HINTERHOLZ, B.; RIBEIRO, V. de M. Feira Agroecológica: uma alternativa
para comercialização de produtos oriundos da agricultura familiar orgânica
no município de medianeira-PR: o caso da AAFEMED. Pato Branco: UTFPR,
2011.7p. Disponível
em:<http://revistas.utfpr.edu.br/pb/index.php/SysScy/article/view/1379/852>,
Acesso em: 25/04/2014.
FILGUEIRA, F. A. R. Novo Manual de Olericultura: Agrotecnologia moderna
na produção e comercialização de hortaliças. 3. ed. rev. e ampl. Viçosa, MG:
Ed. UFV, 2007. 421p.
EMBRAPA. ABC da Agricultura Familiar: Como organizar uma associação.
Brasília-DF, 2006. 45p.