constituição ou morte
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Para celebrar o 9 de Julho - Caderno especial conta a história do Movimento Constitucionalista e livro traz relato inédito de um soldado.TRANSCRIPT
Constituição, ou morte!Líder do governo provisório de 1930, Getúlio Vargas
suspendeu a Constituição de 1891 e dissolveu o Congresso.
Protestos eclodiram em SP. A escalada atingiu o máximo em 23 de maio de 1932,quando quatro manifestantes tombaram baleados na Praça da República.
Com as iniciais dos nomes dos quatro mortos, Miragaia, Martins,Dráusio, de 14 anos, e Camargo, batizou-se o movimento que uniu SP: MMDC.
O MMDC reuniu voluntários, treinou-os, armou-os e os vestiu com fardas.Foi a maior mobilização nacional: dos 135 mil soldados, 35 mil eram paulistas.
A Associação Comercial liderou as classes empresariais e promoveu campanhascomo a do Ouro para o Bem de São Paulo e Capacetes de Aço.
Em 9 de julho, começaram os combates. Até a rendição, em 2/10, morreram 830 com b a t e n t e s,muitos foram presos e 104, exilados. E a Constituição nasceu em 1934.
2 -.ESPECIAL DIÁRIO DO COMÉRCIO terça-feira, 8 de julho de 2014
Os ideaisde 1932 ainda
estão vivos
Rogério Amato
EEm 9 de julho de 1932
eclodia em São Paulo
o maior movimento
cívico armado que o
Brasil vivenciou até hoje. Os
paulistas pegaram em armas
para defender o direito à liber-
dade e pela Constituição, que
o governo provisório de Getú-
lio Vargas, instaurado em
1930, protelava em conceder.
Por essa razão, este movimen-
to civil ficou conhecido como
Revolução Constitucionalista.
Não se queria a separação de
São Paulo do Brasil, mas sim a
convocação da Assembleia
Constituinte, que redigiria
uma nova Constituição.
O idealismo movia a todos
em torno da questão da consti-
tucionalidade, um verdadeiro
frenesi envolvia toda a socieda-
de paulista e conquistou apreço
de outras regiões do País, que
estavam inconformadas com
os desmandos do governo dita-
torial. Neste
movimento, a
As soc iaç ão
Comercial de
S ã o P a u l o
(ACSP) teve
papel impor-
tante como
e l e m e n t o
agl utina dor
d a s f o r ç a s
co mba tent es
e como porta-
voz do anseio
da sociedade
paulista fren-
te a um gover-
no intransi-
gente
As Associa-
ções Comerciais do Estado de
São Paulo também participa-
ram ativamente deste movi-
mento, que lutava em defesa
dos valores que sempre nor-
tearam a atuação das entida-
des, conforme se constata no
Manifesto divulgado em 17 de
fevereiro de 1932. Nesse Mani-
festo, as entidades paulistas,
lideradas pela ACSP, pediam
“a restauração do regime
constitucional, mediante a de-
cretação imediata de uma no-
va lei eleitoral que asseguras-
se a moralidade e a verdade do
sufrágio e a convocação de
uma Constituinte em moldes li-
berais, de acordo com o senti-
mento público, com as tradi-
ções nacionais e com o grau de
adiantamento da civilização
brasileira”.
No d ia 23
de maio des-
s e m e s m o
ano, na capi-
tal paulista,
uma multidão
tomou conta
das ruas, pra-
ças, viadutos
e janelas dos
edi f íc ios. O
povo lotou a
Praça do Pa-
t r i a rca , se-
guiu em mar-
cha pelo Via-
duto do Chá,
Rua Conse-
lheiro Crispi-
niano e chegou ao Palácio dos
Campos Elíseos, então sede do
governo de São Paulo, onde
protestou. Ao cair da noite, ma-
nifestantes reunidos na Praça
da República resolveram inva-
dir a sede da Legião Revolucio-
nária, entidade tenentista
transformada no Partido Popu-
lar Progressista. Tiros foram
disparados contra a multidão,
resultando na morte de quatro
jovens estudantes – M a r t in s ,
Miragaia, Dráusio e Camargo –,
que ficaram imortalizados pela
sigla MMDC, símbolo da Revo-
lução Constitucionalista.
No dia 9 de julho o movimen-
to ganhou as ruas da capital e
do interior do Estado. Foi a
maior mobilização militar que o
País já assistiu, envolvendo um
total de 135 mil soldados, dos
quais apenas 35 mil paulistas. A
inferioridade bélica dos paulis-
tas era enorme. Houve bata-
lhas sangrentas, a violência dos
combates era assustadora.
Dentre todos os que lutaram
pelos ideais paulistas em 32,
queremos destacar a figura de
Carlos de Souza Nazareth, que
na presidência da Associação
Comercial de São Paulo tornou-
se o líder das classes empresa-
riais em um momento dramáti-
co da vida do Estado. Sua atua-
ção não se limitou apenas à mo-
bilização da população, mas
engajou a entidade de forma
efetiva no Movimento Revolu-
cionário, trabalhando na arre-
cadação de recursos, no alista-
mento de voluntários e na orga-
nização da logística, realizando
campanhas importantes como
“Capacetes de Aço para os Sol-
dados Constitucionalistas” e a
“Campanha do Ouro para o
Bem de São Paulo”.
Entre agosto e setembro os
combates foram ferozes e a
desvantagem dos paulistas
frente às forças federais ficava
cada dia mais evidente. Solda-
dos de Minas Gerais atravessa-
ram a fronteira e ameaçavam
as cidades de Cruzeiro e Cam-
pinas; tropas federais tomam
Itapira (próximo a Mogi Mirim),
Pinheiros, Lavrinhas e outras
cidades do Vale do Paraíba. A
última batalha ocorreu em
Campinas, cruelmente bom-
bardeada. Em 1º de outubro
era assinado o armistício, com
o fim da guerra.
Após a rendição dos paulis-
tas, Carlos de Souza Nazareth,
juntamente com outros líderes
do movimento, foi preso, envia-
do à Casa de Correção do Rio de
Janeiro e depois exilado em Por-
tugal, onde ficou por dois anos
até o País restabelecer o regime
democrático. Da prisão, após
saber que seria deportado, Na-
zareth enviou mensagem para
a diretoria da ACSP, concluída
com a célebre frase, que tor-
nou-se o seu lema: “Não esmo-
recer para não desmerecer”.
Dois anos após o fim do con-
flito, Getúlio Vargas convocou a
Assembleia Constituinte de-
fendida por São Paulo. Ao re-
gressar ao Brasil, Carlos de Sou-
za Nazareth assumiu a presi-
dência da Companhia de Arma-
zéns Gerais e mais tarde foi
eleito deputado na Assembleia
Estadual Constituinte. Deixou a
política e se dedicou às ativida-
des relacionadas com o comér-
cio e a indústria. Foi presidente
da Bolsa de Mercadorias de São
Paulo (BMSP, que em maio de
1991 foi incorporada à BM&F).
Neste 9 de julho, queremos
lembrar aqueles que deram es-
forço, talento e até a vida pelos
ideais de democracia e liberda-
de. Com base nos mesmos prin-
cípios e valores, continuamos
lutando pelos mesmos objeti-
vos de 32, de contribuir para um
Brasil com liberdade, respeito
aos direitos de todos, seguran-
ça e desenvolvimento econô-
mico e social.
ROGÉRIO AM ATO É PRESIDENTE DA
ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DE SÃO
PAU L O (ACSP), DA FEDERAÇÃO DA S
ASSOCIAÇÕES COMERCIAIS DO
ES TA D O DE SÃO PAU L O ( FAC E S P ) E
DA CONFEDERAÇÃO DA S
ASSOCIAÇÕES COMERCIAIS E
EMPRESARIAIS DO BRASIL ( C AC B )
Ayrton Vignola/Folha Imagem
Paulo Pampolin/Hype
Diretor de RedaçãoMoisés Rabinovici
Ed i to r - Ch e feJosé Guilherme
Rodrigues Ferreira
Edição Carlos Ossamu
Diagramação Evana Clicia Lisbôa Sutilo
Gerente Executiva de PublicidadeSonia Oliveira
(Telefone: 3180-3029 – s o l i ve i ra @ a c s p. co m . b r )
Presidente Rogério Amato
terça-feira, 8 de julho de 2014 DIÁRIO DO COMÉRCIO ESPECIAL - 3
Ruy MartinsAltenfelder Silva
OOdia 9 de julho marca o
início da Revolução
Co nsti tuc ion alis ta
de 1932. É a data cí-
vica mais importante do Esta-
do de São Paulo.
É preciso refletir sobre a
atualidade do Movimento
de 1932.
Costuma-se indagar o que o
Estado de São Paulo perdeu na
Revolução Constitucionalista.
Depende do conceito de perda
ou de ganho. Se partirmos do
princípio que a Revolução teve
por semente a luta pelos prin-
cípios democráticos, pela de-
fesa do Estado de Direito, São
Paulo foi o grande vencedor.
A Revolução
de 1932 teve o
apoio de amplos
setores da socie-
dade paulista.
Par t i c ip ar am ,
com espírito cívi-
co, intelectuais,
industriais, co-
m e r c i a n t e s ,
operários, estu-
dantes, além de
políticos ligados
à Republica Ve-
lha ou Part ido
D e m o c r á t i c o.
O foco era um
só: a luta antidi-
tatorial.
Dos preciosos
documentos re-
lacionados com
a Revolução de
32, vale a pena
destacar o Mani-
f es to do Povo
Brasileiro, subs-
crito, dentre ou-
tros, por: dom
Duarte Leopol-
do , arceb ispo
m et ro po li ta no ;
monsenhor Gas-
tão Liberal Pin-
to, vigário geral de São Paulo;
José Maria Whitaker, diretor
do Banco Comercial de São
Paulo; Francisco Pais Leme de
Monlevade, diretor da Estra-
da de Ferro Sorocabana; Gui-
lherme de Almeida, da Acade-
mia Brasileira de Letras; Can-
tídio de Moura Campos, dire-
Manoel (SP). Fez seus estudos
de ensino Médio no Colégio
Mackenzie. No dia 23 de maio
de 1932 encontrava-se na Pra-
ça da República, exercendo o
nobre direito de cidadania, de-
fendendo o estado democráti-
co de Direito, quando eclodiu o
conflito. Foi morto pelas forças
da repressão, em consequên-
cia dos ferimentos recebidos
naquela noite histórica.
DRAUSIO MARCONDES DE
SOUSA (D), filho de um farma-
cêutico, com apenas 14 anos
de idade, participou da mani-
festação ocorrida em São Pau-
lo, na Praça da República, em
23 de maio de 1932, em prol do
Estado Democrático de Direi-
to. Foi mortalmente ferido a ti-
ros. Apesar dos cuidados que
recebeu, acabou falecendo no
dia 28 de maio. Foram suas ul-
timas palavras:
“EU ESTAVA DESTINADO
PARA ESTE SACRIFÍCIO. SE
MIL VIDAS TIVES-
SE, TODAS ELAS
DARIA PELA NO-
BRE CAUSA DA LI-
B E RTA Ç Ã O D A
T E R RA Q U E M E
VIU NASCER.”
Re v ere n c i em o s
todos os que parti-
ciparam deste his-
tórico Movimento
e, principalmente,
os que tombaram
na frente de bata-
lha. Eles não mor-
reram à toa por
São Paulo, pois clamaram por
legalidade e liberdade.
A luta e os ideais do Movi-
mento Constitucionalista de
1932 não foram em vão. A da-
ta de 9 de julho não pode desa-
parecer do calendário dos que
amam a liberdade.
RUY MA RT I N S ALT E N F E L D E R SI LVA É
PRESIDENTE DA ACADEMIA PAU L I S TA
DE LETRAS JURÍDICAS (APLJ) EDO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
DO CE N T RO DE INTEGRAÇÃO
EMPRESA ESCOLA (CIEE)
Fotos: reprodução
A Revolução ConstitucionalistaA Revolução Constitucionalista
tor da Faculdade de Medicina;
Antônio de Almeida Prado,
professor da Faculdade de
Medicina; Antônio Carlos Pa-
checo e Silva, professor da Fa-
culdade de Medicina e diretor
do Hospital de Juqueri; Teodo-
ro Ramos, da Escola Politécni-
ca; José Aires Neto, da Santa
Casa de Miseri-
có rd ia de São
Paulo; Plinio Bar-
reto, presidente
do Instituto dos
Advogados e co-
laborador do jor-
nal O Estado de
São Paulo; min.
Cos ta Manso ,
presidente do
Tribunal de Justi-
ça do Estado de
São Paulo; Sa-
mue l R ibe i ro ,
engenheiro; Fa-
bio da Silva Pra-
do, industrial.
E s s e d o c u-
mento, datado
de 13 de julho de
1932, concitava
os brasileiros:
“Respeitemo -nos uns aos ou-tros. São Paulo le-vantou-se em ar-mas pela lei, pelonosso estremeci-do Brasil. Brasilei-ros nascidos emSão Paulo, brasi-leiros de todo o
Brasil, assim como a espada cur-vou-se perante a lei, curvemo-nos uns aos outros pelo Brasil,unido e forte, dentro da mesmalei. Brasileiro, ouvi o grito de nos-sa estremecida e angustiada Pá-tria que nos chama. Não permitaisque a confusão provocada por al-gum interessado nos separe. A
Constituição nos unirá a todos eum novo Brasil unido vencerá.”
Vale a pena também re-
lembrar e homenagear os
quatro primeiros heróis de
32 (MMDC):
ANTONIO AMERICO CA-
MARGO DE ANDRADE (C),
paulistano, nasceu no dia 3 de
dezembro de 1901.
Foi baleado mortalmente
em plena Praça da
República, quan-
do participava e
apoiava o movi-
mento dos paulis-
tas pela defesa do
Estado Democrá-
tico de Direito.
EUCLIDES BUE-
NO MIRAGAIA (M),
paulista de São Jo-
sé dos Campos,
nasceu no dia 21
de abril de 1911.
Miragaia estu-
dou na Escola de
Comércio Carlos de Carvalho
e trabalhou com seu tio como
auxiliar de cartório. Encon-
trava-se na Praça da Repúbli-
ca, no dia 23 de maio de 1932,
apoiando o movimento em
prol do Estado Democrático
de Direito. Foi abatido a tiros
pelas forças da repressão, no
levante dos paulistas contra
o governo provisório de Getú-
lio Vargas.
MARIO MARTINS DE ALMEI-
DA (M), nascido em 8 de feve-
reiro de 1901, na cidade de São
Acima, manifestação popular a favor de uma novaConstituição; abaixo, homenagens aos heróis da
Revolução – Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo.
Leandro Moraes/Luz
Ruy MartinsAltenfelder da Silva
6 -.ESPECIAL DIÁRIO DO COMÉRCIO terça-feira, 8 de julho de 2014
A ACSP em defesaA ACSP em defesada Constituiçãoda Constituição
Com seu presidenteCarlos de Souza
Nazareth à frente, aentidade assumiu
inúmeras tarefas paraauxiliar o movimento
re v o l u c i o n á r i o
AAAssociação Comer-
cial de São Paulo
(ACSP) teve um pa-
pel de destaque no
Movimento Constitucionalista
de 1932, em particular pela co-
rajosa atuação de seu presi-
dente na época, o empresário
Carlos de Souza Nazareth, que
assumiu o comando da entida-
de em 11 de fevereiro de 1932.
O Brasil passava por um mo-
mento delicado: na economia,
a quebra da Bolsa de Nova York
teve reflexos extremamente
negativos nas lavouras de café,
principal produto de exporta-
ção do Brasil; e na política, o
País vinha sendo dirigido por
um governo provisório, chefia-
do por Getúlio Vargas, que, para
se manter no poder, adiava a
formação de uma Assembleia
Constituinte para a redação de
uma nova Constituição.
A ACSP articulou um amplo
movimento, chamado Liga
Paulista Pró-Constituinte,
que serviu de apoio à Frente
Única Paulista (FUP), fruto da
união entre membros do Par-
tido Republicano Paulista
(PRP) e Partido Democrático
(PD), que tinha como princi-
pais reivindicações a autono-
mia de São Paulo, a nomea-
ção imediata de um interven-
tor no Estado que fosse pau-
l i s t a e c i v i l ( n o q u e f o i
atendido) e a convocação de
uma Assembleia Nacional
Constituinte. A Liga congre-
gava dezenas de entidades
representativas do Estado,
que assinaram um manifesto
em que se comprometeram a
não pagar impostos federais
e estaduais até que as reivin-
dicações fossem atendidas.
Ela também organizou um gi-
gantesco comício na Praça da
Sé, no dia 24 de fevereiro do
mesmo ano, que reuniu mais
de 100 mil manifestantes.
É indiscutível a relevância da
atuação da ACSP junto ao Go-
verno Provisório até a interven-
ção do embaixador Pedro de
Toledo, que embora há muito
tempo afastado do Estado,
mereceu o apoio da FUP e aca-
bou aderindo ao Movimento
Constitucionalista. No dia 22
de maio, Getúlio Vargas enviou
o seu ministro da Fazenda,
Oswaldo Aranha, para se reu-
nir com o interventor Pedro de
Toledo. Temia-se que a inten-
ção era pressionar a formação
de um secretariado tenentista,
alinhado com a ditadura de
Vargas. Várias manifestações
ocorreram na cidade.
No dia 23 de maio o movi-
mento ganhou proporções gi-
gantescas. A ACSP conclama-
va o comércio a fechar suas
portas e a se juntar à multidão.
Nessa mesma noite, manifes-
tantes reunidos na Praça da Re-
pública tentam invadir a sede
da Legião Revolucionária, uma
entidade pró-Vargas. Foram re-
cebidos a tiros. Morreram os jo-
vens Martins, Miragaia, Dráu-
zio e Camargo, imortalizados
pela sigla MMDC.
Em 9 de julho de 1932 estou-
ra a Revolução Constituciona-
lista. Carlos de Souza Nazare-
th e os membros da diretoria
da ACSP assumiram inúmeras
tarefas para auxiliar o movi-
mento. Foram responsáveis
pelo controle de receita e des-
pesa, além de serem um im-
portante elo de comunicação
entre governo e entidades de
classe, comércio, indústria e
agricultores. A ACSP foi a res-
ponsável pelas campanhas de
produção de capacetes e de
doação de ouro (Ouro para o
Bem de São Paulo).
Nazareth chefiou pessoal-
mente o Departamento de
Abastecimento e dirigiu ou-
tros serviços, que tinham o ob-
jetivo de promover a assistên-
cia à frente de combate e reta-
guarda, incluindo o auxílio às
famílias dos voluntários. O
presidente da ACSP chegou a
fazer um apelo pela Rádio Edu-
cadora Paulista aos comer-
ciantes e às indústrias para
que não aumentassem os pre-
ços dos produtos e que garan-
tissem o emprego e os salários
dos empregados que desejas-
sem alistar-se ao movimento.
Tudo isso para evitar que a po-
pulação fosse penalizada ain-
da mais com a situação.
A campanha de alistamento
civil foi intensa, uti-
lizando-se de carta-
zes que foram fixa-
dos à porta de esta-
belecimentos co-
merciais. Os esta-
belecimentos que
aderiram ao movimento osten-
taram nas suas fachadas carta-
zes como o seguinte teor: “To -
dos os nossos empregados alis-
tados no Exército Constituinte
têm assegurados os seus luga-
res e garantidos os seus orde-
nados integrais durante o tem-
po da incorporação”.
Entre agosto e setembro os
combates foram ferozes e a
desvantagem dos paulistas
frente às forças federais era
evidente. Soldados de Minas
Gerais atravessaram a frontei-
ra e ameaçavam as cidades de
Cruzeiro e Campinas; tropas fe-
derais tomam Itapira (próximo
a Mogi Mirim), Pinheiros, Lavri-
nhas e outras cidades do Vale
do Paraíba. A última batalha foi
em torno de Campinas, que foi
bombardeada. Em 1º de outu-
bro é assinado o armistício, com
o fim da guerra.
Após a rendição dos paulis-
tas, Carlos de Souza Nazareth,
juntamente com outros líderes
do movimento, foi preso, en-
viado à Casa de Correção do Rio
de Janeiro e depois exilado em
Portugal, onde ficou por dois
anos até o País restabelecer o
regime democrático. Da pri-
são, após saber que seria de-
portado, Nazareth enviou uma
mensagem por telégrafo para
a diretoria da ACSP, concluída
com a célebre frase, que tor-
nou-se o seu lema: “Não esmo-
recer para não desmerecer”.
Ao regressar ao Brasil, Car-
los de Souza Nazareth assumiu
a presidência da
Companhia de Ar-
mazéns Gerais e
mais tarde foi elei-
to deputado na as-
sembleia Estadual
Constituinte até
1937. Deixou a política e se de-
dicou às atividades relaciona-
das com o comércio e a indús-
tria. Foi presidente da Bolsa de
Mercadorias de São Paulo
(BMSP, que em maio de 1991
foi incorporada à BM&F).
Carlos de Souza Nazareth
faleceu no dia 28 de março de
1951 por problemas cardía-
cos. Seis anos depois, seus
restos mortais foram transfe-
ridos para o mausoléu no Obe-
lisco do Ibirapuera da Revolu-
ção de 1932.
Fotos: Reprodução
Os principaislíderes doMovimentoforam presos;abaixo, nocentro, Carlosde SouzaNazarethe Pedro deTo l e d o .
terça-feira, 8 de julho de 2014 DIÁRIO DO COMÉRCIO ESPECIAL - 7
Heróis nos campos de batalhaHeróis nos campos de batalhaAlém dos enormes prejuízos materiais, mais de 800 soldados paulistas perderam a vida em combates sangrentos
AARevolução Constitu-
cionalista tomou as
ruas de São Paulo no
dia 9 de julho de 1932
e já no dia seguinte, o ex-inter-
ventor Pedro de Toledo foi acla-
mado governador do Estado.
Aguardava-se forte reação do
governo ditatorial de Getúlio
Vargas, por isso, nas rádios, os
locutores convocavam volun-
tários para o combate.
Na madrugada do dia 10, as
Forças Revolucionárias Paulis-
tas tomaram as linhas férreas,
paralisando completamente o
tráfego de trens. A medida se
estendeu para os edifícios pú-
blicos estaduais e federais.
Getúlio Vargas, em
mensagem lida pelo
rádio, afirmava que
tinha a seu lado a Ma-
rinha e a guarnição
do Rio de Janeiro e de
todo o Norte, e que
“preferia morrer de
armas na mão a ser
governado por pau-
l i s ta s ”. A declaração
acendeu os ânimos,
fazendo com que o
general Bertholdo Klinger se
pronunciasse num telegrama
ao general Góes Monteiro, afir-
mando que era preciso agir,
pois a situação era pior do que
há quatro anos.
BatalhasDentre as áreas de confron-
to, destacou-se a região do Tú-
nel da Mantiqueira, na frontei-
ra entre São Paulo e Minas Ge-
rais. Esta área era considera-
da estratégica para as tropas
paulistas, que se empenha-
ram em defender o local, pois
permitia o controle do acesso
à região sul de Minas Gerais.
No dia 17 de julho, soldados do
Movimento Revolucionário lu-
taram contra as tropas fede-
rais na região.
As tropas getulistas avan-
çaram pelo Vale do Paraíba. Ci-
dades como Caçapava e Lore-
na foram tomadas, assim co-
mo outras cidades rebeladas
foram derrotadas em seguida,
como Itapira, Atibaia e Bra-
gança Paulista. As notícias
que eram publicadas na im-
prensa na época contavam os
avanços e recuos de guerra.
O fechamento das frontei-
ras do Estado dificultou a en-
trada de armamentos, princi-
palmente o bloqueio do porto
de Santos, que foi tomado pe-
los getulistas em 12 de setem-
bro. Tal situação fez que esfor-
ços se concentrassem na pro-
dução de armas, munições,
máscaras de gás, veículos
blindados (trens, carros e lan-
chas), canhões e na constitui-
ção de recursos para que as
tropas pudessem lutar.
A desvantagem bélica das
tropas revolucionárias era
enorme. Para ludibriar os ini-
migos, os paulistas criaram a
“ma traca ”, que era um simu-
lador do ruído das metralha-
doras, que enganava os inimi-
gos, que pensavam
estar sob o alvo. Tam-
bém com esse objeti-
vo, foi criado o “canhão
bres ser ia no”, um ca-
nhão que não dispara-
va, mas que enganava
nas observações aéreas.
A debilidade de recursos
das tropas paulistas era visí-
vel e os comandantes antevi-
ram uma derrota. Em 14 de se-
tembro, os revolucionários
enviaram ao almirante Proto-
genes Guimarães, Ministro da
Marinha uma proposta de ar-
mistício, que foi concebida por
Bertoldo Klinger. O primeiro
contato dos negociadores,
dos dois lados, só aconteceria
quinze dias depois, sem que a
deposição de armas fosse
acordada. Enquanto isso, a
imprensa paulista, tendo co-
mo intenção manter a chama
acesa da luta, destacava as
vantagens do exército paulis-
ta em diferentes frentes.
A derrotaNo dia 19 de setembro era
publicado o protesto das asso-
ciações de classe de São Paulo
junto ao ministro Afrânio de
Mello Franco. Manifestavam-
se contra o ato estúpido e bár-
baro, cruel e desumano que foi
o bombardeio da cidade de
C a m p i n a s ,
praticado por
aviões a serviço do gover-
no ditatorial.
Em 21 de setembro era noti-
ciado o bombardeio de cida-
des abertas e de ambulâncias
e hospitais da Cruz Vermelha,
que manifestou o seu protesto
contra os métodos de guerra
que estavam sendo usados,
fazendo vítimas crianças in-
defesas, ambulâncias que
transportavam doentes e pes-
soas abnegadas que aten-
diam aos doentes. No
mesmo dia, a incipien-
te força aérea paulis-
ta destruíram cinco
aparelhos dos inimi-
gos estacionados em
Mogi-Mirim.
O número de mortos cres-
ceu nos embates que se se-
guiram até 2 de outubro,
quando as tropas paulistas fo-
ram derrotadas pelo general
Pedro Aurélio de Góes Montei-
ro. Os sinais de enfraqueci-
mento indicavam que a via
mais adequada para a ques-
tão era a solicitação de armis-
tício. O governo, reunido com
os comandantes militares e
representantes das associa-
ções comerciais, chegou à
conclusão que não havia mais
condições de continuar o con-
fronto, tendo em conta a ren-
dição da Força Pública Paulis-
ta, localizadas em Cruzeiro,
que sem alternativas depuse-
ram as armas.
As tropas governistas ocu-
param a capital paulista e im-
puseram uma perseguição in-
clemente aos revoltosos: a Re-
volução de 1932 terminara. O
saldo era um prejuízo mate-
rial elevado e a perda da
vida de mais de 800
paulistas. Apesar da
derrota, a impressa
destacou a abnega-
ção do povo paulista
em não esmorecer e sem-
pre lutar, como no passado ha-
via ocorrido com os bandeiran-
tes, referencial a ser ter como
exemplo de perseverança.
Para o novo governo provi-
sório foi nomeado com o Ge-
neral Valdomiro Castilho de Li-
ma. No dia 3 de outubro o
MMDC foi dissolvido. A priori-
dade agora era dar assistên-
cia aos retirantes e às famílias
dos combatentes.
Fotos: Reprodução
A desvantagembélica das
t ro p a srevolucionárias
era enorme,não havia como
resistir aopoderio das
forçasgetulistas.
Uniformes de combatedos soldados paulistas
8 -.ESPECIAL DIÁRIO DO COMÉRCIO terça-feira, 8 de julho de 2014
O povo paulistaO povo paulistaatendeu ao chamadoatendeu ao chamado
Doações para a campanhaOuro para o Bem deSão Paulo ganharamnotoriedade e garantiramrecursos para a guerra
Reprodução
Campanha Ouropara o Bem de
São Paulo,iniciativa da ACSP.
Colar Carlosde SouzaNazareth
Em 19 de agosto de 2003,o governador Geraldo
Alckmin, por meio doDecreto nº 48.033 oficializoua criação do Colar Carlosde Souza Nazareth,instituído pelaAssociaçãoComercial deSão Paulo, quetem por objetivohomenag earp e rs o n a l i d a d e sbrasileiras ouestrangeiras, que porseus méritos pessoais erelevantes serviçosprestados no que dizrespeito à cidadania,tenham-se tornado dignasde reconhecimento público.
Trata-se de uma Cruz deMalta esmaltada de amareloe perfilada de ouro, com 75mm de extremo a extremo deseus ramos, com a efígie deCarlos de Souza Nazareth,de perfil oitavado e noreverso um disco trazendoo emblema da Associação
DDesde os primeiros
momentos da Revo-
lução Constitucio-
nalista, os paulistas
fizeram doações de joias e ob-
jetos de valor que podiam ser
transformados rapidamente
em dinheiro. Estas contribui-
ções eram para garantir os re-
cursos necessários para a
guerra, o que fez com que
ACSP organizasse um sistema
para a captação desses bens.
Assim foi lançada a campanha
“Ouro para o Bem de São Pau-
l o”, também chamada “O u ro
para a Vitória”, iniciativa en-
cabeçada por Carlos de Souza
Nazareth, presidente da ACSP
na época. A campanha foi ins-
pirada nas doações de ouro
feitas pelos europeus durante
a Primeira Guerra Mundial.
A ACSP combinou com al-
guns bancos, como o Banco
Comercial, Banco do Comér-
cio e Indústria, Banco do Esta-
do, Banco Noroeste e Banco
de São Paulo, o recebimento
das doações de joias, que
eram feitas em guichês es-
pecíficos. Em reco-
nhecimento ao valio-
so gesto, os doadores
recebiam um diploma
de honra, onde consta-
va o nome e a distinção
de ter doado ouro para o
bem de São Paulo. Mem-
bros de diferentes cama-
das sociais fizeram doa-
ções, unidos entorno dos
ideais da luta. A campa-
nha conquistou notorieda-
de e passou a ser um sím-
bolo do desprendimento e
da defesa da liberdade.
A cada dia a Campanha do
Ouro registrava o crescimen-
to das doações e a comoção
popular. Empresários, presi-
dentes de entidades e religio-
sos vinham a público manifes-
tar o seu apreço pela causa e
conclamar o povo a aderir.
Muitos deles fizeram doações
expressivas, como a conheci-
da Condessa de Lara, que por
meio do Banco Comercial, ofe-
receu um cheque polpudo de
contos de réis. Antonieta Pen-
teado da Silva Prado, dama
d e s ta c a-
da da sociedade paulista,
depositou donativos e objetos
de arte de ouro e platina. José
de Azevedo Marques, ex-mi-
nistro das Relações Exterio-
res, fez a doação de medalhas
recebidas enquanto exercia o
cargo de ministro do governo
de Epitácio Pessoa. O maestro
Antão Fernandes doou a
sua batuta de ébano com
o qual regia o Hino Nacio-
nal em ocasiões solenes.
Mas não era apenas a
parcela mais abastada
da população que fazia
doações. Os jornais
publicavam matérias
comoventes, com o
objetivo de sensibili-
zar as pessoas a con-
tribuírem para a causa. O
ideal patriótico era evocado,
como o registro de uma aluna
do Colégio Sagrado Coração
de Jesus, Lygia Maria dos San-
tos, publicado no jornal O Es-
tado de S. Paulo do dia 18 de
agosto:
“Sou pequenina, de 8 anos.
Mas ontem fui também levar
‘meu ouro’para o nosso queri-
do São Paulo. Não é nada, mas
era só o que eu tinha; é o pri-
meiro anelzinho que meus
pais me deram porque tirei o
primeiro lugar no ano passado
na minha classe. Fiz o que pa-
pai e mamãe fizeram, dando
alianças e abotoaduras.
Assim Deus abra mais ainda
o coração da nossa gente, para
sofrer com paciência todos os
insultos dos invejosos Juarez Tá-
vora e Juracy Magalhães.
Nossa Senhora Aparecida
que nos proteja”.
Outros trechos e cartas
completas foram publicados
na imprensa, permitindo com-
preender como uma grande
corrente se formou, sempre
salientando o altruísmo do
doador, que agia sem vacilar.
O discurso do período mostra-
va que era a luta do Direito
contra a Força, lembrando que
São Paulo defendia o Direito
da nação brasileira de um regi-
me constitucional.
Assim, a Campanha do Ouro
obtinha resultados importan-
tes em Santos, Campinas,
Franca e Rio Claro, e novas co-
missões eram formadas em
Bauru, Catanduva, São João da
Boa Vista e Araraquara. Doa-
ções identificadas ou anôni-
mas, grandiosas ou modestas,
de engenheiros, médicos, polí-
ticos, diplomatas misturavam-
se com as contribuições de
equipes de futebol que dispu-
nham dos troféus e medalhas
conquistados nos campeona-
tos. Os paulistas mostravam,
com as doações, o seu ardor e a
identificação com a causa.
Comercial deSão Paulo.
Este ano, aACSP entregará
o Colar Carlos deSouza Nazareth
a Luiz GonzagaBer telli,presidenteexecutivo doCIEE (Centrode Integração
Empresa Escola),diretor da Fiesp e
presidente da AcademiaPaulista de História. E oCIEE concederá a Medalhado Mérito Hernâni Donato aautoridades paulistas,educadores e empresários.
As láureas serãoentregues durante oseminário "O Ideal daR evo l u ç ã oConstitucionalista de 1932",que será realizado hoje,dia 8 de julho, às 8h30, noEspaço Sociocultural –Teatro CIEE (Rua Tabapuã,445 – Itaim Bibi).