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34 FRONTEIRAS / ARTIGOS CONFLITOS POR TERRA E ÁGUA NO ALTO SOLIMÕES ENVOLVENDO POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS. Reginaldo Conceição da Silva O s múltiplos usos dos recursos florestais e hídricos e a variedade de agentes sociais evidenciam a com- plexidade dos fenômenos associados à sociodiver- sidade amazônica e as estratégias diferenciadas de povos tradicionais face a seus direitos territoriais. As oposições a estes usos, por interesses que pressionam o mercado de terras, evidenciam os inúmeros conflitos sociais por acesso a terras e água, que dispõem as comunidades tradicionais num cenário de incertezas face ao futuro. Na mesorregião do Alto Solimões, na fronteira tríplice Bra- sil, Colômbia e Peru, as tensões sociais têm aumentado, devido à intensificaçao da ação ilegal de madeireiros, grileiros, garimpeiros, empresas mineradoras e pescadores comerciais envolvendo terras tradi- cionalmente ocupadas por indígenas, ribeirinhos e comunidades agroextrativistas. Este texto visa um breve mapeamento dos con- flitos por terra e água, no Alto Solimões, no estado do Amazonas. Para tal, utilizamos dados secundá- rios extraídos dos Informativos da Comissão Pas- toral da Terra – CPT – 2011 (1), e de informações obtidas nos órgãos públicos, localizados na cidade de Tabatinga, como a Fundação Nacional do Índio (Funai), no período de 2009 a 2012, bem como de observações de campo. Acerca da Amazônia Ocidental, escreve Becker (2): “é forte a presença de populações indígenas, caboclas e de forças militares”. A autora continua A região é também marcada pela vulnerabilidade das fronteiras políticas com Colômbia, Peru e Bolívia”. Cabe-nos chamar a atenção para o fato de que a mesorregião do Alto Solimões, abrange terras tradicionalmente ocupadas justapostas aos territó- rios colombiano e peruano, cujas populações indígenas e ribeirinhas perpassam as jurisdições territoriais e políticas. No tocante às características sociais e espaciais do Alto Solimões, Becker reitera que: “Apresenta e maior diversidade cultural e étnica, decorrente da convivência de três nacionalidades na fronteira política com o Peru e a Colômbia, onde é forte a mobilidade espacial em torno de Tabatinga e Letícia. Ademais, as populações ribeirinhas e extra- tivistas são significativas e os núcleos urbanos relativamente mais numerosos” (2). Quanto à sua composição, a mesorregião é composta dos muni- cípios: Tabatinga, Benjamin Constant, São Paulo de Olivença Ata- laia do Norte, Santo Antônio do Iça, Amaturá, Tonantins, nos quais convivem os seguintes povos indígenas: Tikuna, Kokama, Kambe- ba, Kulina, Kanamari, Katukina, Mayoruna, Miranha e Cayxana. Nesta configuração, percebe-se, pela quantidade de cidades e pela diversidade de grupos indígenas, que a divisão territorial aos moldes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE é pouco ex- pressiva, quando se tenta entender a complexa relação socioespacial no contexto fronteiriço. Importa destacar que a demarcação e criação de terras indíge- nas – TI, sob responsabilidade da Funai, nessas unidades espaciais, não foi suficiente para assegurar-lhes o direito de uso do território, enquanto espaço de uso tradicional. Há conflitos com interesses que pretendem usurpar as terras indígenas. Há conflitos que negam os direitos constitucionais e a ocupação tradicional, contrariando também o que estabelece o Decreto 6.040 de fevereiro de 2007, que determina a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais – PNPCT. (3) Uma datação desses conflitos pode ser registrada com a ocorrên- cia do chamado “Massacre do Capacete”, perpetrado por madeirei- ros e registrado pelo Máguta-CDPAS (Centro de Documentação e Pesquisa do Alto Solimões) na publicação de 1988 intitulada “A lá- grima Tikuna é uma só” (4): “Viemos comunicar que hoje, 28 de março de 1988, às 12 horas do dia, nós reunidos entre 4 comunidades, na localidade Ticuna São Leopoldo no Amazonas, município de Benjamin Constant, na casa do Ticuna Aselia- res Flores Salvador, aconteceu uma grande triste- za entre nós. Que 20 homens armados, homens civilizados armados com espingardas calibre 16, rifles, revólver e metralhadora ameaçaram nós. Com esta ameaça, eles mataram em adul- tos e crianças 11 pessoas. E 22 ficaram feridas. As comunidades que estavam reunidas são: S.Leopoldo, Novo Porto Lima, Bom Pastor e Porto Espiritual.” (Carta–relatório escrita na Aldeia de Novo Porto Lima, na noite do massacre, antes da chegada da Funai e da Polícia Federal, pelo professor Ticuna dessa localidade, Santo Cruz Maria- no Clemente ou Pucuracu). Uma outra ocorrência, que difere da anterior por estar referida a tensões entre comunidades tradicionais, foi registrada, dez anos de- pois, por Carvalho (5) (2010, p.47 – 48), na homologação de Terras Indígenas do Vale do Javari, em 1998, no município de Atalaia do Norte. Segundo o autor foi instituída “uma das maiores reservas da Amazônia, beneficiando várias etnias indígenas; entretanto, os agricultores ribeirinhos, remanescentes de antigos soldados da bor- racha, tiveram de deixar suas terras, casas e demais benfeitorias”, tal medida desencadeou uma tensão, que perdura até os dias de hoje. E, continua o autor, “apenas uma pequena parte dos ribeirinhos recebeu indenização do governo”. Ao serem compelidos a deixarem essas terras, segundo Carva- lho (5) (2010,p. 175) “um dos maiores deslocamentos humanos do estado do Amazonas”, aproximadamente seiscentos ribeirinhos foram fixar-se na cidade de Tabatinga, fronteira entre Brasil-Co- lômbia-Peru. CONFLITOS COM INTERESSES QUE PRETENDEM USURPAR AS TERRAS INDíGENAS

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coNflitos por terra e água No alto solimões eNvolveNdo povos e comuNidades tradicioNais.

Reginaldo Conceição da Silva

os múltiplos usos dos recursos florestais e hídricos e a variedade de agentes sociais evidenciam a com-plexidade dos fenômenos associados à sociodiver-sidade amazônica e as estratégias diferenciadas de povos tradicionais face a seus direitos territoriais.

As oposições a estes usos, por interesses que pressionam o mercado de terras, evidenciam os inúmeros conflitos sociais por acesso a terras e água, que dispõem as comunidades tradicionais num cenário de incertezas face ao futuro.

Na mesorregião do Alto Solimões, na fronteira tríplice Bra-sil, Colômbia e Peru, as tensões sociais têm aumentado, devido à intensificaçao da ação ilegal de madeireiros, grileiros, garimpeiros, empresas mineradoras e pescadores comerciais envolvendo terras tradi-cionalmente ocupadas por indígenas, ribeirinhos e comunidades agroextrativistas.

Este texto visa um breve mapeamento dos con-flitos por terra e água, no Alto Solimões, no estado do Amazonas. Para tal, utilizamos dados secundá-rios extraídos dos Informativos da Comissão Pas-toral da Terra – CPT – 2011 (1), e de informações obtidas nos órgãos públicos, localizados na cidade de Tabatinga, como a Fundação Nacional do Índio (Funai), no período de 2009 a 2012, bem como de observações de campo.

Acerca da Amazônia Ocidental, escreve Becker (2): “é forte a presença de populações indígenas, caboclas e de forças militares”. A autora continua “A região é também marcada pela vulnerabilidade das fronteiras políticas com Colômbia, Peru e Bolívia”. Cabe-nos chamar a atenção para o fato de que a mesorregião do Alto Solimões, abrange terras tradicionalmente ocupadas justapostas aos territó-rios colombiano e peruano, cujas populações indígenas e ribeirinhas perpassam as jurisdições territoriais e políticas.

No tocante às características sociais e espaciais do Alto Solimões, Becker reitera que:

“Apresenta e maior diversidade cultural e étnica, decorrente da convivência de três nacionalidades na fronteira política com o Peru e a Colômbia, onde é forte a mobilidade espacial em torno de Tabatinga e Letícia. Ademais, as populações ribeirinhas e extra-tivistas são significativas e os núcleos urbanos relativamente mais numerosos” (2).

Quanto à sua composição, a mesorregião é composta dos muni-cípios: Tabatinga, Benjamin Constant, São Paulo de Olivença Ata-laia do Norte, Santo Antônio do Iça, Amaturá, Tonantins, nos quais

convivem os seguintes povos indígenas: Tikuna, Kokama, Kambe-ba, Kulina, Kanamari, Katukina, Mayoruna, Miranha e Cayxana. Nesta configuração, percebe-se, pela quantidade de cidades e pela diversidade de grupos indígenas, que a divisão territorial aos moldes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE é pouco ex-pressiva, quando se tenta entender a complexa relação socioespacial no contexto fronteiriço.

Importa destacar que a demarcação e criação de terras indíge-nas – TI, sob responsabilidade da Funai, nessas unidades espaciais, não foi suficiente para assegurar-lhes o direito de uso do território, enquanto espaço de uso tradicional. Há conflitos com interesses que pretendem usurpar as terras indígenas. Há conflitos que negam os direitos constitucionais e a ocupação tradicional, contrariando também o que estabelece o Decreto 6.040 de fevereiro de 2007, que determina a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais – PNPCT. (3)

Uma datação desses conflitos pode ser registrada com a ocorrên-cia do chamado “Massacre do Capacete”, perpetrado por madeirei-ros e registrado pelo Máguta-CDPAS (Centro de Documentação e Pesquisa do Alto Solimões) na publicação de 1988 intitulada “A lá-

grima Tikuna é uma só” (4): “Viemos comunicar que hoje, 28 de março de 1988, às 12 horas do dia, nós reunidos entre 4 comunidades, na localidade Ticuna São Leopoldo no Amazonas, município de Benjamin Constant, na casa do Ticuna Aselia-res Flores Salvador, aconteceu uma grande triste-za entre nós. Que 20 homens armados, homens civilizados armados com espingardas calibre 16, rifles, revólver e metralhadora ameaçaram nós.

Com esta ameaça, eles mataram em adul-tos e crianças 11 pessoas. E 22 ficaram feridas. As comunidades que estavam reunidas são: S.Leopoldo, Novo Porto Lima, Bom Pastor e

Porto Espiritual.” (Carta–relatório escrita na Aldeia de Novo Porto Lima, na noite do massacre, antes da chegada da Funai e da Polícia Federal, pelo professor Ticuna dessa localidade, Santo Cruz Maria-no Clemente ou Pucuracu).

Uma outra ocorrência, que difere da anterior por estar referida a tensões entre comunidades tradicionais, foi registrada, dez anos de-pois, por Carvalho (5) (2010, p.47 – 48), na homologação de Terras Indígenas do Vale do Javari, em 1998, no município de Atalaia do Norte. Segundo o autor foi instituída “uma das maiores reservas da Amazônia, beneficiando várias etnias indígenas; entretanto, os agricultores ribeirinhos, remanescentes de antigos soldados da bor-racha, tiveram de deixar suas terras, casas e demais benfeitorias”, tal medida desencadeou uma tensão, que perdura até os dias de hoje. E, continua o autor, “apenas uma pequena parte dos ribeirinhos recebeu indenização do governo”.

Ao serem compelidos a deixarem essas terras, segundo Carva-lho (5) (2010,p. 175) “um dos maiores deslocamentos humanos do estado do Amazonas”, aproximadamente seiscentos ribeirinhos foram fixar-se na cidade de Tabatinga, fronteira entre Brasil-Co-lômbia-Peru.

Há conflitos com interesses qUe

pretendem UsUrpar as

terras indígenas

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Mediante essas diferentes modalidades de conflito, as terras tra-dicionalmente ocupadas, entendidas aqui como “os espaços neces-sários à reprodução cultural, social e econômica dos povos e comu-nidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária”, como reza o Decreto 6.040 de fevereiro de 2007, Art. 3o, não estariam longe de serem transformadas em palco de dispu-tas, sobretudo num momento em que os interesses dos agronegócios avançam sobre a faixa de fronteira.

A CPT, preocupada com tal recorrência, acompanha vários conflitos envolvendo o uso de terras e águas no Alto Solimões, senão vejamos:

Devido às suas características geográfica e étnica, essa mesorre-gião, envolvida historicamente em conflitos por terra e água, tem em comum entre os municípios impasses envolvendo, muitas vezes, os próprios poderes executivos. Alguns desses litígios se arrastam por anos e seu final não parece se descortinar a curto ou médio prazo. As atividades econômicas das populações indígenas encontram-se subordinadas aos interesses que controlam a comercialização dos produtos oriundos de práticas agrícolas, extrativistas e pesqueiras.

Uma simples visita às feiras livres e ruas centrais dessas cidades que sediam os municípios, reflete uma dúbia situação deveras con-flituosa. Por um lado, a ausência de pequenos agricultores, produ-zindo numa escala que atenda ao fornecimento regular de alimentos à população, revelando pontos críticos das políticas agrícolas. De outro as iniciativas agrícolas voluntárias e absolutamente autôno-mas de indígenas e ribeirinhos, que lavram a terra de acordo com

uma dinâmica sazonal e, assim, produzem alimentos frescos (frutas, verduras, legumes e pescados). Além disso, os centros urbanos não dispõem de locais apropriados para a comercialização e armazena-mento dos produtos. Uma das dimensões dos antagonismos se con-figura na oposição entre uma camada de comerciantes, designada como atravessadores, e os produtores diretos. Outra dimensão se re-fere às tensões entre o poder público e os donos de empreendimentos comerciais fixos, que comercializam roupas, alimentos, bebidas e materiais permanentes, tais como os equipamentos de computa-ção, mobiliário etc. Os interesses comerciais em flagrante expansão abrangem a pesca, a coleta de peixes ornamentais, a atividade madei-reira, a exploração mineral e a propriedade da terra.

Na cidade de Tabatinga destaca-se também que o uso de força policial para dirimir litígios, envolvendo a disputa por recursos na-turais, é recorrente.

Os tipos de conflitos mostrados acima, bem como os agentes envolvidos, possuem uma peculiaridade histórica, que revigoram no espaço-tempo sob as distintas políticas públicas no âmbito nacional, que são ineficazes quando se trata de assegurar os direitos constitu-cionais e aqueles preconizados por convenções internacionais, rati-ficadas pelo Brasil.

Longe de grandes empreendimentos estratégicos do ponto de vista governamental, o Alto Solimões, enquanto região de diversidade socio-cultural, dotada de um aparato institucional e militar, apresenta ocor-rências de conflitos, sem perspectiva imediata de solução, envolvendo o direito ao uso das terras, águas e demais recursos florestais e minerais.

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Reginaldo Conceição da Silva é professor de geografia da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) – Tabatinga e membro do Grupo de Pesquisa Saberes e Práticas Discursivas na Amazônia (IFRO). Email: [email protected].

RefeRênCias bibliogRáfiCas.

1. Canuto, A..; Luz, C.R. da S. e Wichinieski, I. (Orgs.) Conflitos no campo

Brasil 2011. Goiânia: CPT Nacional Brasil, 2012.

2. Becker, B. K. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. Rio de Ja‑

neiro: Garamond, 2009.

3. Brasil. Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007, que “Institui a

Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Co‑

munidades Tradicionais”.

4. Máguta‑CDPAS‑ A lágrima Ticuna é uma só. Benjamin Constant. 1988

5. Carvalho, J.B. de. Desmatamentos, grilagens e conflitos agrários no

Amazonas. Manaus: Editora Valer, 2010.

territórios quilombolas em liNhas de froNteira: quilombolas do forte príNcipe da beira

Emmanuel de Almeida Farias Júnior

Negros do guaporé Os territórios negros do Guaporé, linha de fronteira entre Brasil e Bolívia, são constituídos a partir de distintos processos de territorialização, desde o século XVIII. Tais processos remetem à denominada “situação colonial” e à ação “bandeirante” nos confins do sertão na busca de riquezas: ouro e pedras preciosas.

Segundo Teixeira, “a posse portuguesa do Vale do Guaporé foi confirmada com a assinatura do Tratado de Madri, em 1750. Entre-tanto, as páreas de exploração aurífera já vinham sendo trabalhadas desde a década de 1730 pelos mineiros de Cuiabá e São Paulo” (1)

As minas de ouro e diamantes do Mato Grosso e adjacências eram mantidas pela força de trabalho negra escravizada. Rebeldias, fugas, doenças e esgotamento das lavras de ouro constituem condi-ções para a formação de quilombos no Guaporé.

Entre os quilombos mais renomados do Vale do Guaporé, está o do Piolho, localizado às margens do rio Galera. Segundo o Anal de Vila Bela de 1770, a primeira destruição deste quilombo ocorreu em 22 de julho do mesmo ano. Esse quilombo tinha rei e rainha, o rei tinha morrido, a rainha se chamava Thereza, do povo Benguela.

Os quilombolas que conseguiram fugir voltaram a se reagru-par. Uma nova expedição torna a destruir o quilombo formado pelos sobreviventes e seus descendentes. O Diário da Diligência foi reproduzido por Roquette-Pinto (1917). De acordo com o referido Diário, a fuga de escravos e a formação de quilombos preocupava o governo colonial, marcado pela decadência das minas de ouro (2).

Os quilombos foram duramente perseguidos pelo governo pro-vincial de Mato Grosso. O aquilombamento do vale do Guaporé permitiu o espraiamento territorial e a formação de pequenos povo-ados, com diversificadas unidades residenciais.

As crônicas de expedições punitivas relatam os quilombos cons-tituídos por negros e indígenas. O contato entre negros e indígenas do Vale do Guaporé possibilitou uma nova fisionomia étnica.

Com o esgotamento das lavras e as doenças, os senhores de escra-vos fugiram do Guaporé, abandonando a escravaria à própria sorte. Livres, os ex-escravos passaram também a ocupar efetivamente o Vale do Guaporé e a constituir unidades familiares autônomas.

a liberdade Não recoNhece froNteiras Os quilombos es-tavam localizados tanto do lado português, quanto do lado cas-telhano. São inúmeros os esforços dos administradores coloniais para que os representantes da Coroa de Castela restituíssem os escravos que se encontravam em território espanhol. Tais inicia-tivas administrativas estão explicitadas em ofício datado de 05 de setembro de 1754.

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