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Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG A Escola "Escola é... o lugar onde se faz amigos não se trata só de prédios, salas, quadros, programas, horários, conceitos... Escola é, sobretudo, gente, gente que trabalha, que estuda, que se alegra, se conhece, se estima. O diretor é gente, o coordenador é gente, o professor é gente, o aluno é gente, cada funcionário é gente. E a escola será cada vez melhor na medida em que cada um se comporte como colega, amigo, irmão. Nada de ‘ilha cercada de gente por todos os lados’. Nada de conviver com as pessoas e depois descobrir que não tem amizade a ninguém nada de ser como o tijolo que forma a parede, II Modulo do Curso Centralizado de Formação Política – Escola Nacional de Formação da CONTAG – ENFOC Brasília-DF, 06 a 17 de novembro de 2006 1

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Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG

A Escola

"Escola é... o lugar onde se faz amigosnão se trata só de prédios, salas, quadros,

programas, horários, conceitos...Escola é, sobretudo, gente,

gente que trabalha, que estuda,que se alegra, se conhece, se estima.

O diretor é gente, o coordenador é gente, o professor é gente,

o aluno é gente, cada funcionário é gente.E a escola será cada vez melhor na medida em que

cada umse comporte como colega, amigo, irmão.

Nada de ‘ilha cercada de gente por todos os lados’.Nada de conviver com as pessoas e depois

descobrirque não tem amizade a ninguém

nada de ser como o tijolo que forma a parede,indiferente, frio, só.

Importante na escola não é só estudar, não é só trabalhar,

é também criar laços de amizade,é criar ambiente de camaradagem,

é conviver, é se ‘amarrar nela’!Ora , é lógico... numa escola assim vai ser fácil

estudar, trabalhar, crescer,fazer amigos, educar-se,II Modulo do Curso Centralizado de Formação Política – Escola Nacional de Formação da CONTAG – ENFOC

Brasília-DF, 06 a 17 de novembro de 20061

Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG

ser feliz."

Paulo Freire

Prezada (o) Companheira (o),

Finalmente chegou o dia do nosso reencontro! É hora de vivenciar o que diz o Paulo Freire sobre estudar, fazer amigos e criar o ambiente de camaradagem.

No módulo passado discutimos os seguintes eixos temáticos: Estado, sociedade e ideologia; e História, concepções, estruturas e práticas sindicais. E vimos o quanto é importante conhecer a nossa própria história, refletir sobre a prática e planejar melhor a ação sindical. Emocionamos-nos com os depoimentos das lideranças históricas do MSTTR, que contribuíram para reencontrarmos com as nossas próprias histórias. Foi importante também conhecer as contribuições dos precursores do sindicalismo no Brasil e perceber como elas influenciam nossa prática.

Nesse segundo módulo iremos abordar o eixo temático: Desenvolvimento sustentável e solidário – concepções, desafios e perspectivas; e o eixo pedagógico metodológico: Pedagogia para uma nova sociabilidade.

Vamos iniciar a abordagem temática com a discussão sobre análise de conjuntura, evidenciando os elementos que cada um de vocês trouxe dos estados (atividade inter-módulo), sistematizados em painéis regionais. Esse caminho se faz necessário para que possamos II Modulo do Curso Centralizado de Formação Política – Escola Nacional de Formação da CONTAG – ENFOC

Brasília-DF, 06 a 17 de novembro de 20062

Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG

compreender em quais cenários (locais, regionais e nacional) iremos atuar na perspectiva de implementação do Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário. Para tanto, teremos momentos de muitas reflexões e reapropriação conceitual sobre desenvolvimento e sócio-economia solidária.

Paralelamente iremos realizar diálogos pedagógicos no sentido de sistematizar o percurso formativo e refletir sobre a prática educativa. A idéia é construir referenciais para contribuir com a multiplicação da formação nas regiões e nos estados, conforme prevê a estratégia formativa da ENFOC. Os diálogos deverão gerar orientações pedagógico-metodológicas para apoiar diretamente as ações descentralizadas e contribuir com a animação da formação no MSTTR.

Bons estudos!

Escola Nacional de Formação da CONTAG – Brasília (DF), 06 de Novembro de 2006

ÍNDICE SUMÁRIO

TEXTOS Página

01 MATRIZ PEDAGÓGICA DO II MÓDULO DO CURSO NACIONAL DE FORMAÇÃO POLÍTICA

04

II Modulo do Curso Centralizado de Formação Política – Escola Nacional de Formação da CONTAG – ENFOCBrasília-DF, 06 a 17 de novembro de 2006

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02 PRIMEIRO MÓDULO DO CURSO

Relatório Síntese Preliminar

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03 O SENTIDO DOS DIÁLOGOS PEDAGÓGICOS 70

04 RELATÓRIO SOBRE O PERFIL DOS/AS PARTICIPANTES DO 1° MÓDULO DA ENFOC

75

05 O DIREITO À FESTA E À LUTA

Emir Sader

92

06 O PROCESSO ELEITORAL LATINO-AMERICANO ATUAL

Kjeld Jakobsen

99

07 HERANÇA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL

Tania Bacelar de Araújo

106

08 PARA UM DESENVOLVIMENTO EM NOVAS BASES - Notas provisórias

Marco Aurélio Nogueira

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Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG

II MÓDULO DO CURSO DE FORMAÇÃO POLÍTICA DA ENFOC/CONTAG.Brasília – DF, 06 a 17 de novembro de 2006.

(versão final em 31/10/2006)

EIXO PEDAGÓGICO/METODOLÓGICO: Pedagogia para uma nova sociabilidade EIXO TEMÁTICO: Desenvolvimento rural sustentável e solidário: concepções, desafios e perspectivas.

1. OBJETIVO GERAL: Objetivo Geral:

Viabilizar a formação de militantes do MSTTR, de modo que aprimorem sua capacidade multiplicadora e potencializadora da ação formativa em suas áreas de atuação.

2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS: Socializar e aprofundar referenciais teóricos, políticos e ideológicos que fundamentam e alimentam os ideais e a luta sindical e popular.

Re-avaliar e fortalecer a luta sindical , numa visão e prática transformadoras, estimulando processos de mudanças de atitudes, comportamentos e práticas individuais e coletivas, coerentes com as exigências de implementação do PADRSS. Favorecer a experimentação, sistematização e apropriação de novas metodologias pedagógicas que realimentem a prática formativa do movimento sindical. Contribuir para a constituição de uma rede de formadores/as que assumam e implementem o projeto de formação do MSTTR.

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Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG

Dia Tema Objetivos Turno/Metodologia

06/11

(Segunda)

Chegada dos/as educandos/as e acomodação

Manhã – acomodações

Mística – Acolhimento, Integração e levantamento das expectativas para o II Módulo.

Escolha das comissões de trabalho Apresentação detalhada da programação. Acordos de convivência

Estimular a discussão sobre as identidades individuais e coletivas dos educandos/as; Reafirmar compromissos com a ENFOC; Criar um ambiente de co-responsabilidade e comprometimento com o curso.

Tarde: 14:00h - Mística: reencontro, identidade do (a) educador (a), protagonismo, memorial e expectativas para II módulo.

Equipe de Coordenação: Nicinha e Célia.

Diálogos pedagógicos: identidades – diferentes sujeitos e diferente histórias:

Reapropriação do módulo anterior – Síntese temática e pedagógica.

Orientações referentes ao Intermódulo

Revisitar aspectos temáticos e pedagógicos vivenciados no módulo anterior.

Construir entendimentos comuns sobre a socialização das atividades intermódulos

Tarde: 16:00h - diálogos pedagógicos.

Equipe de Coordenação: Domingos e Célia.

Exposição dialogada sobre principais aspectos temáticos e metodológicos vivenciados no módulo anterior.

Orientações para socialização das atividades inter-módulo.

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Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG

Dia Tema Objetivos Turno/Metodologia

07/11

(Terça)

Conjuntura Nacional e Internacional: Contexto e perspectivas

Cenário (s) pós-eleitoral

Relação dos movimentos sociais com as forças vitoriosas

Tendências de desenvolvimento

Integração latino-americana.

Impactos das políticas globalizadas sobre o campo brasileiro.

Socializar, refletir e sistematizar aspectos que evidencie a dimensão pós eleitoral e as tendências de desenvolvimento.

Compreender o contexto sócio-político do Brasil no cenário pós-eleitoral e as tendências de desenvolvimento do Brasil e da América Latina.

Manhã: 08:30h - Socialização do inter-módulo por região

Equipe de Coordenação: Domingos e Célia.

Serão montados cinco grandes murais que comporão uma visão panorâmica das macro-regiões compostos pelas informações dos estados. A socialização será em forma de ciranda (visitações).

Tarde: 14:00h - exposição dialogada com Kjeld Jakobsen do Observatório Social.

08/11

(Quarta)

Diálogos pedagógicos; atividade intermódulo - aspectos relevantes identificados e lições aprendidas

Evidenciar lições apreendidas e refletir sobre limites e desafios para institucionalização da ENFOC.

Manhã: – 08:30 às 09:00h – Dinâmicas de grupos.

09:00h - Socialização da Estratégia da Escola junto às Federações e sugestões a serem consideradas.

Equipe de Coordenação: Amarildo e Mundinha.

Estado e Desenvolvimento

Estado – neoliberalismo (Estado Mínimo, patrimonialismo, protecionismo, democracia).

Relação entre Estado e Sociedade Civil

Compreender a trajetória histórica do Estado e refletir sobre o papel do Estado na contemporaneidade.

Manha: 10:00h às 12:30 - Oficina de leitura.

Tarde: 14:00h - Exposição dialogada – Cátia Lubambo (FUNDAJ)

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Dia Tema Objetivos Turno/Metodologia

09/11

(Quinta)

Diálogos pedagógicos: memorial, Pesquisa Perfil educandos/as e atividade intermódulo.

Partilhar lições aprendizagens que marcaram a trajetória individual e coletiva.

Construir Identidade coletiva dos educandos/as, considerando as dimensões social, cultural e de atuação política.

8:30 às 09:00h – Dinâmicas de Grupo 09:00h – depoimentos sistematizados e socialização da Pesquisa.

Equipe de Coordenação: Célia, Amarildo, Nicinha e Eryka.

Desenvolvimento Rural: conceitos e concepções (matrizes estruturadoras)

Padrões de desenvolvimento rural implantados no Brasil e seus impactos políticos, sociais, econômicos, ambiental e cultural.

As dimensões do Desenvolvimento humano, ressaltando a participação das mulheres, juventude e a questão ambiental.

Elementos a serem destacados para construção do desenvolvimento rural sustentável e solidário.

Explicitar as concepções de desenvolvimento, evidenciando as principais matrizes: sócio-políticas; culturais; produtivas e ideológicas.

Identificar perspectivas para as questões agrícolas e agrárias na dimensão do DRSS.

Refletir sobre as condições de trabalho e as relações de trabalho no campo

Manhã: 10:30h - Painel com Guilherme Delgado (IPEA) e Emma Siliprandi (SENAES/MTE).

Tarde: 14:00h – continuação do Painel – cochichos e debates em plenária - com a presença de Guilherme Delgado e Emma Siliprani.

Dia Tema Objetivos Turno/Metodologia

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10/11

Sexta feira

Aprofundamento temático

Pluriatividade

Ruralidade

Territorialidade

Representatividade – participação social

Construir entendimentos a cerca dos temas em debate na atualidade.

Manhã: 08:30h às 09:00h – dinâmicas de Grupo.

09:00h - grupos de estudos ou rodas de conversa sobre temas pré-selecionados.

Equipe de Coordenação: Eliene e Mundinha

Síntese temática:

Reflexão sobre os principais elementos centrais discutidos nos grupos.

Aprofundar temas específicos e construir sínteses.

Tarde: 14:00h - Síntese temática com contribuição de Humberto Oliveira (Secretaria de Desenvolvimento Territorial – SDT/MDA).

11/11

(Sábado)

Sistematização e Avaliação Identificar, numa visão processual, as potencialidades, fragilidades e as possíveis correções a serem feitas na semana seguinte.

Construir processualmente as abordagens metodológicas e de conteúdos significativos e sugestões para a semana seguinte.

Dia Todo: Oficinas Pedagógicas

Equipe de Coordenação: Domingos Corcione e Comissão de Trabalho

12/11 (Domingo)

Lazer coletivo (planejar com comissão) A partir das 09:00h

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Dia Tema Objetivos Turno/Metodologia

13/11 (Segunda)

A dimensão do Político no pedagógico – atividades intermódulo, memorial e rememoria as semana anterior.

Revisitar aspectos temáticos e pedagógicos do PPP.

Manhã: 8:30h às 09:00h – dinâmicas de grupos.

09:00h – diálogos pedagógicos.

Equipe Coordenação: Eliene, Amarildo e Domingos.

O PADRSS: resgate histórico e referencial teórico.

Socializar a trajetória histórica do MSTTR na construção do DRSS, destacando contexto, avanços e desafios.

Manhã: 10:00h – exposição dialogada sobre o PADRSS (CONTAG)

Sócio-economia, solidária: conceitos e concepções (Matrizes Estruturadoras)

As relações sociais e econômicas vivenciadas

A autogestão e a cooperação

Participação dos sujeitos

Identificar mudanças de práticas e de atitudes vivenciadas por meio das experiências solidárias.

Refletir sobre desafios e limites das experiências solidárias e identificar os avanços alcançados.

Tarde: 14:00h - Depoimentos vivências de práticas solidárias (Catende - PE, Lagoa Seca - PB e Cresol - PR).

Equipe Coordenação: Célia e Nicinha.

14/11

(Terça)

Sócio-economia solidária: conceito e concepções (Matrizes Estruturadoras)

Compreender as diferentes concepções que fundamentam as práticas solidárias.

Manhã: 08:30h às 09:00h – dinâmicas de grupo.

09:00h - Exposição Dialogada com Paul Singer (SENAES/MTE).

Equipe de Coordenação: Célia e Amarildo.

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Dia Tema Objetivos Turno/Metodologia

14/11

(Terça)

Diálogos pedagógicos: síntese temática e metodológica. Construção coletiva feita pela equipe de sistematização e orientações para as oficinas de aprofundamentos temáticos.

Sistematizar grandes questões temáticas e metodológicas vivenciadas.

Tarde: 14:00h – Diálogos pedagógicos

Equipe de Coordenação: Célia e Domingos

15/11

(Quarta)

Aprofundamento temático sobre o PADRSS:

1. Econômico, tecnológico, produtivo, ambiental e social.

Organização da produção (nos assentamentos e na agricultura familiar)

Meio ambiente.

2. Relações de trabalho no campo e meio ambiente.

3. Políticas sociais e cultura.

Políticas públicas para o campo (saúde, educação e cultura).

4. Desigualdade e discriminação social

Igualdade de Gênero, geração, raça e etnia.

Proteção infanta juvenil

5. Organização e gestão sindical , parcerias e alianças.

Identificar contradições e limites entre a teoria (concepção) do PADRSS e a prática política, sindical e produtiva do MSTTR e de sua base.

Identificar avanços e perspectivas de superação para o efetivo desenvolvimento do PADRSS em todas as suas dimensões.

Manhã: 08:30h às 09:00h – dinâmicas de grupo.

09:00h - Oficinas por blocos temáticos.

Equipes de Coordenação: Assessorias convidadas da CONTAG e de outras organizações parceiras.

Tarde: 14:00h às 16:00h – continuação dos trabalhos das Oficinas.

Tarde: 16:00h - Socialização das questões discutidas das Oficinas, em 10 minutos. Cada Oficina contará com um facilitador convidado/a. A socialização será feita pelos educandos/as.

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Dia Tema Objetivos Turno/Metodologia

16/11

(Quinta)

Diálogo pedagógico – síntese temática sobre as grandes questões discutidas nas oficinas de aprofundamento temático.

Evidenciar aspectos temáticos e estratégicos, identificados no aprofundamento temático sobre o PADRSS e construir orientações político-pedagógicas a serem assumidas pela Escola e pelo MSTTR.

Manhã: 08:30 às 09:00h – dinâmicas de grupos.

09:00h - Apresentação de síntese temática das grandes questões temáticas, procurando identificar limites desafios e contradições entre prática e teoria.

Equipe de Coordenação: Mundinha, Domingos e Nicinha.

Diálogos pedagógicos: pós-módulos.

Retomar estratégia político-pedagógica da Enfoc (Rede, GEDs, descentralizados).

Construção de agendas

Fazer acertos políticos sobre tarefas, procedimentos e estratégia da Enfoc.

Tarde: 14:00h - conversa em plenário

Equipe de Coordenação: Amarildo e Célia

17/11

(Sexta)

Sistematização e avaliação Identificar potencialidades, fragilidades e possíveis correções pedagógico-metodológicas a serem feitas nas próximas atividades da Escola.

Manhã e tarde: Oficinas pedagógicas e formatura.

Equipe do GT

Solenidade de Formatura Coordenação: Comissão de Formatura e GT

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II MÓDULO DO CURSO CENTRALIZADO – ENFOCEixo Temático: Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário – concepções, desafios e perspectivas

Eixo Pedagógico-metodológico: Pedagogia para uma nova sociabilidade

06/11 (SEG)Manhã: Chegada e acolhimento.Tarde: Mística, integração, expectativas, diálogos pedagógicos

07/11 (TER) Manhã e tarde: Conjuntura Nacional e Internacional: contexto e perspectivas08/11 (QUA) Manhã: Diálogos pedagógicos e oficina de leitura (Estado e Desenvolvimento)

Tarde: Exposição dialogada sobre Estado e Desenvolvimento09/11 (QUI) Manhã e tarde: Diálogos pedagógicos e Desenvolvimento Rural: conceitos e concepções (matrizes estruturadoras)10/11 (SEX) Manhã e tarde: Aprofundamento temático: pluriatividade, territorialidade, ruralidade e representatividade/participação social11/11 (SAB) Manhã e tarde: Sistematização e avaliação12/11 (DOM) Manhã e tarde: Lazer coletivo13/11 (SEG) Manhã: Diálogos pedagógicos e PADRSS: resgate histórico e referencial teórico

Tarde: Socialização de experiências no campo da sócio-economia solidária14/11 (TER) Manhã: Exposição dialogada: Economia Solidária.

Tarde: Diálogos pedagógicos15/11 (QUA) Manhã e Tarde: Oficinas de aprofundamento temático sobre o PADRRS16/11 (QUI) Manhã e Tarde: Diálogos pedagógicos17/11 (SEX) Manhã: Avaliação e sistematização

Tarde: Formatura

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PRIMEIRO MÓDULO DO CURSO NACIONAL DE FORMAÇAO POLÍTICA DA CONTAG - ENFOC (Relatório Síntese Preliminar)

Brasília/DF, 14 a 25/11/2006

14/11/2006 – SEGUNDA FEIRA

Início das atividades às 14:00, com uma mística, iniciada na parte externa do CESIR, entre os painéis comemorativos dos 40 anos da CONTAG, que resgatou imagens históricas das lutas e de homens e mulheres, sujeitos dessa trajetória. Durante a caminhada entre os painéis, foram apresentados os elementos água, terra, fogo (chama) e semente. Água, terra e semente compuseram o primeiro ato: o plantio, a indução da germinação, uma alusão à fertilidade: de sonhos, conhecimentos.Em seguida, os/as participantes, um a um, acenderam suas velas e se apresentaram indicando de onde vinham e que compromissos iriam assumir a partir daquele momento.

COMPROMISSOS: acender a chama da esperança; multiplicação; fidelidade; fortalecimento; aprender; conquistar aprendizados; conhecimento; continuidade do trabalho; constâncias; trabalho; renovação; responsabilidade; desenvolvimento; igualdade, transformação, inovação; partilha; igualdade, formação; vitória; compartilhar; construção; mudança; organização; defender; socializar; lutas; paz; politização; viver e não ter a vergonha de ser feliz; seriedade; conquistar espaços; solidariedade; dedicação; persistência; amadurecimento; soma; ação; atitude; reciclagem; respeito; abrir os olhos e os ouvidos; potencializar; conscientizar; organização sindical; aprofundamento; animação; acreditar; justiça; enriquecimento dos conhecimentos; ampliação dos aprendizados.

15/11/2006 – TERÇA FEIRA

TEMA: Trabalho, Identidades e Relações Sociais.

SUB-TEMAS: - O que é trabalho - Importância do trabalho na construção das identidades e relações sociais - Relações sociais de gênero, geração, raça e etnia - Trabalho como forma de humanização e como forma de escravidão

EXPOSITORA: Suzanna Sochaczewski

A exposição foi iniciada com uma provocação acerca do conceito trabalho. A questão “A abelha trabalha?” trouxe várias reflexões para o significado do termo trabalho.

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Há uma convenção de que a abelha não trabalha. O trabalho é usado em vários sentidos. Convencionamos chamar trabalho aquilo que a abelha não faz. A abelha tem um DNA que a define e a programa para determinadas atividades. A abelha tem tudo programado, enquanto que a espécie humana não tem programação, aprende socialmente. Fomos aprendendo a reflexão e o fazer melhor. Essa capacidade de pensar, refletir e fazer diferente a abelha não tem. Temos capacidade de criar para o bem e para o mal, e isso vai construindo e transformando, cotidianamente, o mundo. Convencionamos chamar esta atividade humana de trabalho.O trabalho voltado para o mal destrói, polui, desagrega. O trabalho voltado para o bem planta, cura, produz conhecimento. Mas o trabalho não é só do bem e do mal. O que é melhor: ser escravo, servo da gleba ou trabalhador assalariado? Todo trabalho é pesado, seja intelectual ou braçal. O trabalho é sempre uma atividade social, não existe trabalho isolado. Ela relaciona e integra as pessoas. Quais os dois maiores problemas da atividade trabalho? É decidir quem trabalha. Porque a sociedade decide quem trabalha. Ou seja, há uma decisão social e não apenas isolada e individual. O segundo problema é como se distribui o fruto do trabalho.

VIAGEM NO TEMPO: A história do trabalho vai mudando de acordo com as épocas.

Os mais fortes e mais espertos pensaram em organizar o trabalho de forma diferente. Aos poucos o trabalho foi tomando um caráter menos grupal e assumindo uma diferente configuração de divisão sexual do trabalho. Além de dividir, contém um componente de dominação de um sobre o outro. Ao mesmo tempo em que o trabalho leva à dignidade, à sobrevivência; leva também à dominação. Antes a dominação era apenas por força física, por distribuição de riquezas. Hoje é baseada numa relação de hierarquia e relação de poder.Na Grécia Antiga, o escravo era considerado o “pé do homem”, e não uma espécie humana. O trabalho era considerado algo desqualificado. A elite fazia arte, filosofia, esporte. O ócio era status. Nesta época, quem decidia quem trabalhava? A sociedade decidia, pois havia uma ética de quem trabalha era o perdedor, que devia ser escravo a serviço do vencedor. Esse era o regime do trabalho escravista. O Senhor era dono do escravo e o escravo se sentia totalmente pertencente ao Senhor. O escravo dependia de tudo o que o Senhor lhe oferecer.

No feudalismo (Idade Média) havia o trabalho servil, quem decidia quem era servo ou senhor? Havia a crença de que era Deus/Igreja quem decidia, pois se acreditava que a desigualdade era vontade de Dele, e que haveria vida após a morte, onde seria compensado do sofrimento na terra. O Senhor não era dono do servo; ele era obrigado a dar proteção a seus servos. Havia até àqueles que cediam parte de suas terras para os servos. O servo trabalhava para si e para o Senhor. A parte menor de seu trabalho para si, a maior para o Senhor. Havia, inclusive, o direito do Senhor de se servir sexualmente da esposa do servo em sua noite de núpcias. Havia uma forma parcial de pertencimento ao Senhor. Não podia sair da terra. O trabalho seguia o ritmo das estações.

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Sistema Capitalista / Trabalho Assalariado: A diferença entre este tipo de trabalho e os demais é o recebimento do salário. A palavra salário vem de sal, produto que se comprava na época. Aquilo que o trabalhador recebe para comprar o sal. Na medida em que o trabalhador vai perdendo os meios de produção e de vida (terra, água, etc.), passa a comprar tudo através do trabalho assalariado. O trabalhador estava preso e com a liberdade perdeu a terra; o assalariado é o sem-terra. É livre dos meios de vida (comida, agasalhos, etc), livre dos instrumentos de trabalho (enxada, tear, etc). Tinha apenas a força de trabalho para oferecer. A noção de liberdade é perigosa porque nenhum de nós é livre das necessidades básicas de sobrevivência. É verdade que o trabalhador, no sistema capitalista, não é coisa do Senhor nem está preso ao Senhor. Mas está preso à necessidade de sobrevivência de maneira desigual. Há exploração porque o trabalhador não decide quem trabalha, e não é ele quem decide como as riquezas serão distribuídas. O capitalismo nega o ócio (não fazer nada). O ócio vira negócio. Há uma modificação na maneira de pensar e desenvolver o trabalho. O ritmo do trabalho é acelerado. Trabalhava-se mais de 18 horas por dia, inclusive as crianças.Que tecnologia utilizamos ä cada época? Antes era tacape, hoje tudo é informatizado. As tecnologias ajudam a produzir uma quantidade de riqueza suficiente para a sobrevivência de toda humanidade. Mas há uma concentração nas mãos de poucos. A máquina trabalha? Ela não trabalha, mas ela tem trabalho nela. Trabalho vivo é feito pelo ser humano – tem força mental e braçal. A máquina contém trabalho morto, que foi feito pelo ser humano. Ex. microfone.

Composição dos grupos: Jovens, homens, mulheres.

1. O que é ser um (a) trabalhador e/ou trabalhadora rural no Brasil, no século XXI?2. Quais são os sonhos que o trabalho propicia?

RESULTADO DOS GRUPOS DE TRABALHO

GRUPOS DE JOVENS

O que é ser um (a) trabalhador e/ou trabalhadora rural no Brasil, no século XXI?

Plantar para comer, subsistência e para comercializar o produto. Meeiro, posseiro, agricultor, assalariado, etc.; o agricultor familiar decide (horários,

tarefas, etc). O assalariado rural não. Identidade com a terra; ter vínculo com a terra; desenvolver atividade no meio rural,

desde que seja o maior fonte de renda. Afirma a identidade, contrapondo-se aos preconceitos e estereótipos.

Mais do que a profissão, é um modo de vida, é ter orgulho de ser agricultor ou assalariado rural. Estilo/modo de vida, mas há dificuldade de muitos trabalhadores não reconhecer sua atividade produtiva como profissão.

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É um profissional marginalizado devido ao pensamento que se criou na sociedade de que somos desdentados, sujos, etc.

Agricultura é uma atividade econômica pouca valorizada, por insuficiência de políticas públicas para o desenvolvimento rural. A maioria defende o meio ambiente

Ser trabalhador rural é uma opção? - tem haver com a relação familiar, com a relação de propriedade da terra. Envolvimento da família com a produção.

Há desvalorização de dentro e de fora. É gerador de trabalho e distribuidor de renda, porque o produto do seu trabalho dinamiza o comércio/a econômica local.

É um transformador da sociedade porque gera trabalho e distribui renda, desenvolvendo o espaço local e diminuindo as desigualdades.

Comparações em relação ao trabalhador urbano: O trabalhador urbano não reconhece o produto de seu trabalho. No campo, o trabalhador rural reconhece e se apropria do fruto de seu trabalho, não tendo alienação do processo produtivo.

SONHOS: Sonho, respeito, amor, igualdade, preservação, paixão, tranquilidade, amizade, vida, esperança, paz, prosperidade.Suzanna: Não é todo trabalhador rural que gosta de trabalhar no campo, a exemplo do assalariado da cana. O campo guarda outros valores. Há relação de troca e de solidariedade no campo, que não tem uso da moeda ou do valor monetário. O capitalismo - que tem viés urbano e competitivo - combate esses valores de solidariedade e troca, desqualificando-o. O tipo de trabalho e reflexão que faz de seu trabalho ajuda a fazer crítica à sociedade capitalista, e propõe alternativas para transformar a sociedade.

GRUPO DE MULHERES

O que é ser uma trabalhadora rural no Brasil, no século XXI?

Apresentação em versos, Anísia/CE:

Ser trabalhadora é ser gente de valor É ser forte e resistenteSente, sofre e passa a dor. Agente transformador mais também discriminada Vive metade da vida, mas constrói identidade Sua raiz e cultura O poder é patriarcal, mas o saber é matriarcal.

Devemos considerar o passado e o presente / processo histórico: É ter potencial de se organizar em diferentes espaços. É ter coragem de enfrentar o

preconceito e quebrar as barreiras da invisibilidade; é ter orgulho de ser trabalhadora rural e se contrapor a definição de doméstica ou do lar.

É uma categoria que trabalha no espaço do campo, produzem alimentos. Gerenciam a sua produção familiar.

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Valorizar seu trabalho e sua ação e o sentimento de pertencimento. Buscar ampliar seus direitos humanos e nas políticas públicas. A trabalhadora rural jovem fará a diferença na construção de um novo olhar. Trabalhar a mãe-terra numa visão integradora, com delicadeza e cuidado. “Somos trabalhadoras rurais, ocupando diversos espaços públicos e políticos (conselhos,

partidos, sindicatos, etc).” É uma tarefa difícil e árdua, porque nem sempre há reconhecimento.

SONHOS: Valorização, esperança, reconhecimento, liberdade, transformação, segurança, autonomia, solidariedade. Terra, ouro, céu, floresta, movimento das mulheres, saúde, educação, dignidade e solidariedade, moradia, preservação do meio ambiente, amor e igualdade, justiça e partilha, paz e prosperidade, reforma agrária já, auto-estima, igualdade, união, respeito, compreensão.

GRUPO DE HOMENS

O que é ser trabalhador rural? É símbolo de resistência Ter que dominar a gestão da propriedade – beneficiamento e comercialização. Trabalha na “fábrica a céu aberto”, sujeito às pragas, fatores climáticos adversos. Qualquer que seja sua condição, em uma relação direta com a terra e o meio ambiente;

compreender e interagir com a diversidade da natureza do seu trabalho na roça. Ter certa autonomia na gestão/execução do seu trabalho e em relação a algumas

necessidades: gás, energia elétrica, etc. O trabalhador rural tocou a industrialização em 1960 e 1970. Mas o/a trabalhador/a

urbano não consegue tocar o trabalho no campo. Está organizado num sistema sindical que envolve 4 mil municípios, 27 estados e

nacionalmente. Pouco acesso em algumas regiões a serviços essenciais como saúde, educação, transporte,

etc. Em muitas regiões: assalariados (as) competem como máquinas e lutam por mudanças nas

empresas. Na agricultura familiar, competem com a grande produção.

SONHOS: Independência econômica, dignidade, cidadania, LIBERDADE. Proporcionar respeito; realização pessoal, familiar e social. Tranqüilidade e melhoria da qualidade de vida. Conhecimento e novos meios de produção.

Suzanna: Reconhece-se como categoria profissional, resistindo numa forma de vida sem abrir mão dos bens da modernidade. Há uma reivindicação por acesso aos serviços e bens. Autonomia: quebra o mito do capitalismo de que só os capitalistas sabem organizar a produção e só eles sabem o que dá lucro.Como os trabalhadores e trabalhadoras rurais estão sonhando, o dominador não terá vez. Este sonho é possível. O grupo expressou bem o significado do que é trabalhar, pensar, mudar, transformar. Tudo isso é sonhar!

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Mário Quintana: “Se as coisas são inatingíveis, não é motivo para não querê-las. Que tristes os caminhos se não forem a presença distantes das estrelas.”

16/08/2006 – QUARTA FEIRA

Tema: SISTEMAS DE SOCIEDADES: Patriarcado, escravismo, feudalismo, capitalismo, socialismo, comunismo.Características de cada sistema social e seus vestígios no Brasil de hoje.

Objetivos: Identificar e refletir sobre os distintos sistemas sociais, suas características e vestígios na sociedade brasileira atual.

Expositor/a:

1 Cláudio Nascimento, Ministério do Trabalho e Emprego/Secretaria de Economia Solidária.

2 Heleith Saffiotti, Professora aposentada da USP e Pesquisadora.

Cláudio Nascimento

Conceito de Modo de Produção:

ASPECTO NATURAL ASPECTO SOCIAL

Relações entre seres humanos e natureza Relações entre seres humanos

Relações produtivas

Força produtiva

Podemos ter modos de produção com características antagônicas, onde se desenvolve a luta de classe. Podemos ter modos de produção não-antagônicos, que não tem existência de classe. As forças produtivas (conhecimento, tecnologia, organização social, meios de produção – terra, máquina.). São criações humanas e elementos da natureza. Para entender a sociedade é preciso entender sua formação social e seu modo de produção.

Formação Social Superestrutura: ideologia, (religião, moral, arte, filosofia, etc)Estrutura; Relação de produçãoInfra-estrutura: força de produção

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Não há uma linha de evolução dos modos de produção (socialista, capitalista, feudal, etc) que se desenvolveram igualmente em todos os países. O Brasil tem um processo dialético, e não linear.

Modos de produção: Comunidade produtiva: Existiam as comunas. Não existia a figura do Estado nem as classes sociais. A propriedade era coletiva. A divisão social do trabalho era natural – não havia excedentes. A distribuição da produção não era necessariamente igualitária. Há também a presença da mulher cuidando da economia e da agricultura. A apropriação desigual da produção e a apropriação do conhecimento pela Igreja foram levando para a passagem das classes sociais e a criação do Estado. As mulheres passam a ser excluídas da agricultura a partir do surgimento de novas tecnologias (arado) Tributário, onde as classes dominadas pagavam tributos /, também chamado de Modo de Produção Asiático. Modo de produção feudal (Europa Central, Japão): a terra torna-se o principal meio de produção. Estabelece-se o trabalho servil e surgem os proprietários de terra. O excedente era apropriado pelos donos de terra – assegurados por direitos constituídos. Ausência de troca mercantil. Escravista: Os senhores donos dos meios de produção e dos/as escravos exploravam o trabalho humano, imprimiam castigos físicos e assegurava o mínimo para a sobrevivência.Mercantil simples, no início do sistema capitalista.Capitalista - apresenta várias etapas, todas trazem mudanças profundas na superestrutura, no modo e forças de produção. O projeto de um país exige estudar a formação social mundial e seus reflexos na sociedade brasileira e no seu modo de produção. Características: generalização da forma de mercadoria – com preços e quantidades; duas classes sociais antagônicas – luta de classe / burguesia (financeira, latifundiária, etc.) e proletariado/classe trabalhadora. Classe trabalhadora mais complexa devido a reestruturação produtiva. O que é a classe trabalhadora hoje?. A burguesia se apropria das riquezas produzidas por toda sociedade. É possível superar o modo de produção capitalista? O socialismo é modo superior. Socialista: se coloca como uma transição para o modo de produção comunista. Características: extinção do Estado, não existência de classe social sem antagonismo; riquezas produzidas pertencem ao conjunto da sociedade = mão propriedade privada; eliminação de muitas contradições: uma delas seria a relação desigual entre mulheres e homens – e fim das classes sociais antagônicas. Comunista: seria ainda mais superior, tendo superado a existência do Estado, as classes, as relações desiguais. A jornada de vida deve ser maior que a jornada de trabalho. Existiu algum tipo de sociedade comunista? Tivemos revoluções (Revolução Francesa, Revolução Americana, Revolução Russa.) visando superar as dominações. Mas a sociedade que criamos foi uma sociedade socialista de Estado Burocrático, reforçando o aparato do Estado na economia. A apropriação das riquezas foi pelo Estado e não pela classe trabalhadora. O que queremos? É preciso aprofundar.

HELEITH SAFFIOTTI – ONTOGÊNESE E FILOGÊNESE DO GÊNERO

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“Não há revolução sem teoria” – Lênin

No Brasil quando se fala em ecologia, se pensa no meio ambiente. Mas existem 3 tipos de ecologias: mental, social, ambiental – a reunião das 3 é chamada de ecosofia. Como pode haver no Brasil ecologia social se há mulheres apanhando dos seus maridos? Estima-se que a humanidade tenha por volta de 250/300 mil anos. Há uma idéia muito presente em livros e conferencias: a de que estamos vivendo os últimos momentos do patriarcado. Mas isso não é verdade!

ONTOGÊNESE: ONTO- ser, GENESE – origem. Antes de ter qualquer forma de vida sobre a terra, havia unicamente uma espera ontológica. Só havia minerais – esferas inorgânicas, não havia vida própria. Mais adiante, a partir da proteína existente no mar ou na terra, surge uma nova esfera ontológica: orgânica – vida vegetal e animal. O máximo que se faz nesta etapa é a reprodução, não há transformações radicais. Os animais são protozoários, de uma única célula, que foram sofrendo mutações e evoluções. A terceira esfera ontológica é o ser social – este, além de reproduzir, transformar, inventa, interfere na natureza, etc.Qual é a grande diferença entre o ser social e o ser ontológico? A abelha faz o mesmo trabalho a vida toda, mas não há a criação do novo, não podem idealizar, nem refletir sobre aquilo que construíram. O ser social cria, inventa, idealiza, planeja mentalmente e materialmente – isso é exclusivo do ser humano.

TEOLOLOGIA: TELOS = FIM: quando planejamos para um determinado fim. Mas em um planejamento social, temos um fim e acabamos realizando um outro não previsto, porque temos outras forças sociais que interferem no processo. A esfera ontológica social não existe isolada das demais esferas. Precisamos da terra, vegetais. A ideologia não é apenas um conjunto de conhecimentos falsos e verdadeiros. Ela tem um substrato material, se corporifica. Ex.: Uma pessoa dominada é encolhida, encurvada, não tem postura de luta. Precisamos combater o sexismo e o racismo na linguagem e na lei. No Código Civil há o homicídio – homem que comete crime. Não existe femicídio.Existe a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão – Em 1793, uma francesa foi guilhotinada porque escreveu Declaração universal dos Direitos da Mulher e da Cidadã. O Aborto é um problema de caráter social e não-religioso. Deslocar um assunto de caráter social para o religioso, é pura Ideologia. Existem clínicas equipadas para a prática do aborto que é muito cara, que só atendem mulheres ricas. Para as que não podem pagar, fica a opção do auto-aborto, que é sempre clandestino. Quem morre e fica com seqüelas são as mulheres pobres. O aborto é indefensável, porque ele deve ser usado em último recurso. A descriminalização é que é defensável.Os animais foram se transformando em hominídeos – que são dotados de certa inteligência, de fazer planejamento – que vão se transformando em seres humanos, ao longo de mais de 300 mil anos.

COMUNIDADE PRIMITIVA

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O SER HUMANO SEMPRE DEPENDEU DO TRABALHO PARA SOBREVIVER. Em todas as sociedades há uma divisão sexual do trabalho. A coleta era atribuída às mulheres, e aos homens cabia a atividade da caça. A caça era praticada uma ou duas vezes por semana, com resultado incerto de seu trabalho. Porque se atribuiu a coleta às mulheres e a caça aos homens? Porque cabia às mulheres a amamentação. O E o choro das crianças na hora da caça poderia espantar a caça. Não há muita relação com a força física, pois muitas caças eram atribuídas às mulheres, mesmo estando grávidas. As mulheres sempre trabalharam mais do que os homens. O tempo livre era mais desfrutado pelos homens. Este tempo era dedicado à criação – por isso há mais cientistas homens do que mulheres. Após a comunidade primitiva, as colheitas passaram a ser monetarizadas. As mulheres passaram a trabalhar a terra e os homens a comercializar os produtos. Nas comunidades primitivas havia muita igualdade entre mulheres e homens, exceto em relação ao tempo livre. As mulheres eram muito respeitadas, porque tinha o poder da criação, considerado divino: procriar e criar. Eram consideradas Deusas. As feministas americanas nos deixaram dois legados: Positivo – que o conceito do patriarcado indica o vetor da dominação-exploração; exploração-dominação. Negativo – o feminismo sexista e radical que imaginava uma sociedade sem homens. Isso é base da razão cartesiana, que significa que é possível separar a razão do sentimento, das emoções. Esta razão opera por dicotomia.

O tempo livre dos homens levou-os ao trunfo do poder, e tirou o endeusamento e poder das mulheres. Ainda assim, nunca existiu uma sociedade matriarcal. De uma sociedade igualitária, se passou para uma sociedade patriarcal. Isso se confirma pelas evidências arqueológicas, históricas. A resistência das mulheres durou mais de três milênios (3.100 a.C.), visto que somente em 600 A.C os homens conseguiram construir o patriarcado, que tem apenas poucos mais de 2 mil anos.O patriarcado determina, em última instância, o que a mulher deve fazer. O movimento feminista tenta elimina-lo, porque não é bom nem para mulheres nem para homens. As mulheres recebem menos que os homens. O principal papel do homem que é a virilidade e ser provedor da família, o que tem sido difícil cumprir devido ao desemprego. Esses homens são invadidos de um profundo sentimento de impotência, desalento.Saffiotti trabalha com 3 categorias para a sociedade urbana-industrial: racismo, sexismo e classes sociais. As classes existiam em sim e não para si. A conquista do poder político pela burguesia expressa bem isso. Os povos (independente de cor) tinham litígio com outros povos e os conquistados eram submetidos à dominação-exploração e exploração-dominação. Os homens eram eliminados e as mulheres escravizadas, porque serviam para 3 funções: como mão de obra, sexo e procriação. Até hoje a mulher entra no mercado de trabalho, não como trabalhadora, mas como mulher. Sua inserção no mercado de trabalho é diferente, é sempre possível a mulher sofrer assédio sexual.O sexismo e racismo são idênticos / nascem juntos na sociedade escravocrata antiga. No Brasil, o escravismo é um modo de produção moderno. Escravismo tem 3 instancias: Econômica, política e ideológica. Não existe co-existência de modos de produção. Pode persistir

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no capitalismo a forma de fazer de outro modo de produção, mas não há existência de outros elementos que confirmem-no enquanto modo de produção. Relação homem mulher na Idade Média: O casamento dependia da autorização do Senhor Feudal. A noite de núpcias era do senhor feudal e não do marido. O servo e a serva serviam ao Senhor de forma diferente. No século XVI o capitalismo nasce com duas determinações: mercantil e capital financeiro. Este sistema se consolida no século XVIII porque passa a ter determinação empírica, que é a industrialização. Nascem dois personagens: proletariado e a burguesia. Antes disso, havia apenas embriões de classe: castas, estamentos, etc. Na sociedade industrial, estes embriões se consolidam e aparecem claramente. Quando nascem as classes sociais, já existe o sexismo e racismo. É o capitalismo que dá origem à dona de casa. O século XIX é essencialmente doméstico, como retrata na literatura, poesia, etc. O capitalismo emerge numa situação excelente: as mulheres exploradas e o preconceito contra outras categorias. Há um enovelamento das 3 categorias: sexismo, racismo e classes sociais.Simone Beauvoir afirma em “Segundo Sexo”: ninguém nasce mulher, torna-se mulher. Ela combateu o determinismo biológico.Gênero é o que a sociedade faz para formatar o que é ser mulher ou ser homem. Mas não existe um único modelo para ser homem e mulher. Há várias matrizes de gênero.Quando surgiu o conceito de gênero usava-se a expressão sistema de sexo/gênero. A ênfase no social levou ao essencialismo social, dissociado do ideológico. Na sociedade igualitária, o conceito de gênero dá conta de analisar as relações. No capitalismo o conceito de gênero é insuficiente. - Saffiotti adota a ordem patriarcal de gênero: só este binômio dará conta da superação da contradição de interesses entre mulheres e homens. É uma expressa que mostra que na base do sexo se estabelece uma divisão do trabalho e também comunica o vetor da dominação-exploração.Cláudio Nascimento: A Heleieth trabalhou a questão do modo de produção no patriarcado, mas ainda temos que conversar um pouco mais sobre o modo de produção em outros sistemas. No patriarcado a professora esclareceu o papel das mulheres.Precisamos incorporar em nossa discussão o feudalismo, o capitalismo, o socialismo que muitos chamam de capitalismo de Estado. Temos que considerar as experiências históricas de socialismo, a União Soviética, a Nicarágua, entre outras. Embora algumas experiências se tenham se extinguido, temos que refletir e levar em consideração para entender o que dessas experiências podemos levar em conta para discutir um modo de produção socialista, pensando o Brasil.Esse momento, essa discussão é muito importante para qualquer movimento social e sindical. Para um processo de atualização do projeto político de cada situação é preciso conhecer a história. Quais elementos de cada tipo de sistema de sociedade estão presentes na formação da sociedade brasileira? São elementos que não foram eliminados, existem há mais de 3, 4 séculos. É preciso debruçar no passado para entender o presente e traçar o futuro. São elementos estruturantes, veremos que existem muitos.Considerar por exemplo, o que do conjunto de elementos que a Professora trouxe, ainda estão presentes em nossa sociedade, em qualquer nível, seja ideológico, político, econômico.Quando pegamos a superestrutura, ideologia dos sistemas de sociedade, temos também a história de luta dos movimentos sociais. Isso também é importante a gente estudar. Aprender a identificar e compreender seus traços ou vestígios.

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As comunidades quilombolas, por exemplo, vão buscar seus valores no passado e conseguem com isso, garantir a permanência desses traços. As comunidades indígenas também se pautam no resgate de valores históricos. A preservação dos valores, a relação com a terra, com o meio ambiente, são definidores do tipo de sociedade que queremos. São necessários para pensar projeto de sociedade e configurar a visão de mundo. A cosmovisão das comunidades quilombolas e indígenas são amplas, interessantíssimas, reveladoras do pensamento que fortalece o projeto de sociedade.O capitalismo é terrível porque elimina a cultura e as crenças das pessoas. Tudo se torna mercadoria, a vida passa a ser quantificada. Se nós queremos pensar a história tridimensional no tempo (passado, presente e futuro) o resgate dos elementos passados, que são constitutivos de nossa utopia. Sonhar com olhos abertos é trabalhar as possibilidades concretas de futuro (utopia concreta). Quando a gente pensa o Brasil, em um modo de produção capitalista, observamos os resquícios de outros sistemas. Isso não quer dizer que são sistemas co-existentes. Para pensar um projeto estratégico, cada pessoa, militante, organização, necessita recorrer aos elementos da história do país. O atual momento revela isso, é uma encruzilhada. Isso não é uma questão para ser solucionada em um, dois, governos ou 10, 20 anos. É uma questão de longo prazo, daí a necessidade de visualizar o modo de produção.O recuo mínimo é de 25 anos e a projeção futura também. É pensar em longa duração. Isso é obrigação dos partidos políticos, dos sindicatos. É dever do militante também. É uma necessidade profunda, precisamos identificar os vestígios das comunidades primitivas, do escravismo, feudalismo, e perceber como esses elementos dificultam os avanços e para visualizar o futuro para engravidar nossa utopia, nosso projeto.

Divisão em cinco grupos, onde cada um trabalhará um sistema de sociedade, respondendo as seguintes questões:

1. Identificar as principais características do sistema de sociedade.2. Identificar eventuais vestígios, sinais, traços desse sistema hoje no Brasil.

Apresentação dos grupos:

Comunismo primitivoPrincipais características do sistema comunidades

Caça e coleta; a divisão do trabalho acontecia naturalmente; Propriedade coletiva, pequena agricultura; Nômades – para caçar e coletar, as pessoas precisavam se deslocar; Não havia excedentes Inexistência de Estado 60% da produção alimentar era responsabilidade das mulheres Preservação da natureza Relações de gênero: mais respeito às mulheres, responsáveis pela agricultura e pelo

cuidado com os filhos.

Vestígios da comunidade primitiva nos dias de hoje:

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Comunidades extrativistas: fitoterapia, uso de plantas para o cuidado com a saúde Comunidades quilombolas Comunidades indígenas Mulher responsável pelo cuidado com os filhos Solidariedade Mulher responsável pela economia do lar (sustento)

Escravismo Os primeiros escravos eram os perdedores das guerras, escravizados pelos vencedores. Os

escravos se assumiam enquanto escravos e assumiam a identidade de perdedores, susceptíveis aos maus tratos, submissos para sempre, sem que isso revele que não havia tentativa de revoltas.

Todo provimento dos escravos era feito pelo vencedor, a exploração e a dominação caracterizavam os escravos enquanto um bem, uma mercadoria. Os donos tratavam inclusive da saúde dos escravos para mantê-los produtivos.

Apesar de distante da história, há muitas características nos “escravos de hoje”.

Contradições: Sociedade de classes Agricultura familiar X agronegócio Igreja, crenças e ideologias Ser humano = mercadoria Trabalhador produto descartável Trabalho assalariado X trabalho escravo Exploração sexual de mulheres e jovens Coação física Dominação econômica social e psicológica Hábitos alimentares

Feudalismo Relação servil de trabalho Humanização marcada pela dominação e pela exploração Concentração de terras Sistema auto-suficiente de produção Economia agropastoril Relação dominado X dominador pela posse da terra Conformismo por influência da religião

Vestígios Concentração de terras Relação de trabalho (meeiro – paga tributos) Relação de trabalho ainda marcadas pela submissão e exploração – capatazes, vaqueiro,

nas grandes propriedades. Condições de trabalho no campo Divisão de classe/detenção dos meios de produção.

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Sistema feudal dava ferramentas e terra: assalariado de corte de cana recebe as ferramentas, e do salário desconta-se as ferramentas, alimentação e transporte.

Relações de poder: concentrado nas mãos do dono da terra

Capitalismo Estado mínimo e produção em alta escala Poder capital financeiro + consumismo; Globalização financeira Desigualdade social Consumo como regulador da produção Divisão de classes sociais

Vestígios: Precarização do trabalho Instalação de multinacionais Compromisso da mídia com a elite dominante Exigência de mão de obra especializada Mecanização da produção Dependências .... Flexibilização das relações de trabalho Descompromisso das grandes empresas com o meio ambiente e responsabilidade social

Socialismo Fim das contradições entre classes sociais Fim da alienação Ampla liberdade dos trabalhadores Separação entre Estado e partido Revogabilidade permanente dos mandatos Um meio, uma transição para se chegar ao comunismo “sociedade ideal”.

Vestígios: A sociedade brasileira é capitalista, temos poucos vestígios: Comunidades quilombolas e agricultura familiar PADRSS – Projeto de desenvolvimento do MSTTR

Cláudio Nascimento: O grupo está construindo uma proposta socialismo. Na década de 60 a gente tinha o socialismo como ordem do dia. O resultado das experiências desgastou o conceito de socialismo e o capitalismo se aproveitou muito disso. Sobretudo com o que diz respeito ao leste europeu. O capitalismo prega o fim da história, o fim das contradições, o fim da luta de classes.Começamos a fazer uma discussão sobre desenvolvimento. O atual governo possui muitas frentes para discutir a questão do desenvolvimento. São 11 ministérios pensando um contraponto ao desenvolvimento idealizado pelo capitalismo. Há uma concepção no capitalismo de desenvolvimento focado na economia. A concepção desse governo discute desenvolvimento humano, segundo Josué de Castro, o desenvolvimento do homem. É uma palavra em disputa. Do mesmo modo, temos que disputar o conceito de socialismo.

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É preciso discutir o controle social das políticas públicas, socializar o poder sobre as políticas com o Estado. Se o socialismo não está explicito no discurso, a disputa pela democratização do Estado é uma prática rica dos movimentos sociais trilhando pelos caminhos do socialismo. Tem a ver com a capacidade dos movimentos sociais em ser Estado, em assumir para disputar a hegemonia. Lula representa isso para o povo.A prática é sempre mais rica do que a teoria, ela traz elementos mais universais e vocês fazem parte disso.Outro elemento que a gente traz na discussão de desenvolvimento, é a relação entre capital e trabalho. Discussão de Estado e sociedade tem por base pensar formas justas e democráticas. Temos que incorporar a cultura no debate. Não queremos um mundo quantificado transformado em mercadoria. No auge dos movimentos sociais (fim dos anos 70 e anos 80), um grupo de trabalhadores, entre eles o Lula, pensou uma universidade do trabalhador e criaram o Instituto Cajamar. O Paulo Freire era o presidente e o Instituto passou a trabalhar a história. As pessoas precisavam estudar a história para compreender o sentido da luta. O processo histórico é feito de avanços e retrocessos. A ação dos seres humanos é que garante o avanço. O que aconteceu aqui, na tradução dos elementos dos sistemas de produção pela arte foi muito rico.Sobre as comunidades primitivas, conforme o grupo colocou, existem traços da economia da vida nas experiências. Quem tem esse entendimento é a criança. O valor da mulher no conhecimento sobre a economia da casa, da medicina natural, da sobrevivência. E isso é importante ser analisado para quebrar os vestígios do patriarcado nas relações de gênero.Esse tipo de sociedade foi fundamental para que os pensadores refletissem sobre o comunismo primitivo para descrever o socialismo e o comunismo. O trabalho na comunidade primitiva era definido pela vida das pessoas (economia da vida e não a jornada de trabalho para a produção) e o tempo também era o tempo das pessoas. O trabalho das mulheres era mais respeitado As pessoas se visitavam mais, faziam festa, iam pescar e esse tempo também era trabalho. Recuperar a visão de trabalho na sua totalidade na comunidade primitiva é fundamental. Conceito de trabalho era baseado na totalidade da vida, na jornada da vida. O capitalismo veio para recortar o tempo para trabalho considerando a produção. O trabalho se tornou um meio de produção de mais valia (em cada 8 horas, em 6 se produzem mais-valia).No capitalismo o homem é econômico, antes eram ludens, a vida tinha um encantamento, as deusas eram femininas. Com o patriarcado os desuses se tornaram masculinos. No Brasil temos muitos vestígios do escravismo: o mandonismo, da força, da concentração de poder e propriedades, o racismo. Esses vestígios caracterizaram a nossa classe dominante. A aliança da burguesia industrial com a burguesia latifundiária avançou nas formas de exploração (feudalismo).No campo da superestrutura, temos a cultura, valores universais que se seguem fortalecidas. São valores importantes para pensar a sociedade do futuro.A dificuldade do grupo para discutir o socialismo é normal porque antes era mais claro, mas hoje a idéia socialista em termos de Brasil é difusa. Temos uma pluralidade de sujeitos que discutem o socialismo que é fabuloso. É de uma diversidade imensa.É importante conhecer o que autores pensaram e pensam o Brasil e o capitalismo na sua etapa atual. Caio Prado Júnior, Milton Santos, Josué de Castro. É uma tarefa de todo mundo.

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Socialismo significa participação. Não importa o nome que se dá, mas é importante fazer a discussão e retomar o conceito. Senão a classe dominante faz o que fez com o conceito de solidariedade.

17/08/2006 – QUINTA FEIRA

Tema: ESTADO, SOCIEDADES E IDEOLOGIAS.

- Conceito de Ideologia.- Conceito e origem do Estado.- Evolução das concepções e da formação do Estado.- Sistemas de Governo.- Relação entre Estado, Sociedades e Ideologias.

Objetivos: 1 Situar a origem e evolução histórica do Estado ao longo da Historia da humanidade.2 Compreender como o Estado e Ideologia produzem e reproduzem relações desiguais.

Expositor/a:

Cláudio Nascimento, Ministério do Trabalho e Emprego/Secretaria de Economia Solidária Nalú Faria, da Sempre Viva Organização Feminista – SOF.

Moderação – Cícero Cavalcanti: Este momento, com certeza resulta de processos anteriores vivenciados pelos movimentos sociais. Durante as décadas de 1970 e 80, a reflexão sobre o Estado e a sociedade que queríamos, estava na ordem do dia, muitas das nossas atuais UTOPIAS se cristalizaram neste período.Na década de 1990, com o avanço do modelo neoliberal e as derrotas da classe trabalhadora, muitos intelectuais e dirigentes sociais, passaram a negar essas UTOPIAS. Outros procuraram adequar as propostas da classe trabalhadora à lógica neoliberal. Alguns, no entanto, reafirmaram suas UTOPIAS como se o tempo não tivesse mudado o cenário. É neste cenário que a urgência de uma escola de formação política da classe trabalhadora ganhou força. A ENFOC nasce com a responsabilidade de ser um dos espaços para que a classe trabalhadora recoloque os nossos sonhos e nossa UTOPIA na ordem do dia, a partir de um olhar atual e que dialogue as demandas, desafios e perspectivas para a sociedade e, consequentemente, para os movimentos sociais.Esta pretensão da ENFOC esta presente entre os segmentos da esquerda por em muitos estados, que confiam e esperam que a escola se consolide a partir dos objetivos propostos.

Abordagem Inicial de Cláudio Nascimento

Iniciou sua exposição reapresentando o entendimento sobre a superestrutura:

MODO DE PRODUÇÃO

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ASPECTO NATURAL ASPECTO SOCIAL Relações entre seres humanos e natureza Relações entre seres humanos

MODO DE PRODUÇÃO

Relações produtivas Força produtiva

FORMAÇÃO SOCIAL

SUPERESTRUTURA ESTRUTURA INFRAESTRUTURA

Ideologia (religião, moral, arte, filosofia,...)

Relação de Produção – Modo de Produção

Força de Produção – Modo de Produção

A partir desta reflexão inicial, pontuou alguns aspectos e conceitos, inclusive, sobre Estado, Ideologia e Sociedades.

Partindo das reflexões sobre as Comunidades Primitivas, evidenciou como seria uma sociedade sem classe e sem Estado. Como seria então, a alternativa da classe trabalhadora para superar os problemas o atual modelo de sociedade para atingir este patamar de organização? Apontou as comunas, que significa uma sociedade comum onde a auto-gestão seja a lógica presente na superestrutura e na própria estrutura, como alternativa a ser perseguida enquanto UTOPIA maior da classe trabalhadora.A Ideologia não é algo puramente cerebral, ela esta ligada as emoções, se corporifica e se materializa. Tem uma relação íntima com as emoções. 1989 foi um exemplo disso, o choque entre as idéias dos que queriam transformação e as dos que repetiam o discurso dominante sobre o “Fim da História”. Infelizmente para a classe trabalhadora, o discurso conservador ganhou a opinião dos eleitores.A sexualidade adquire, recentemente, uma maior importância na proposta de sociedade da classe trabalhadora, inclusive, enquanto proposta de inclusão.A luta de idéias esta presente na estrutura e funcionamento do Estado, tanto quanto na sociedade civil.O surgimento, desenvolvimento e hegemonização do patriarcado, vêm acompanhados da moral, valores conservadores.O Estado sempre foi coercitivo, não é coincidência que ao longo da historia, as Forças Armadas sempre contaram com maior investimento humano, material e financeiro. A coerção, sempre fez parte da ação do Estado, inclusive, junto ã sociedade, desencadeando sempre um desencantamento entre os povos. Cláudio tomou como exemplo, as experiências de Canudos, Palmares, outras, como referências para entendermos uma sociedade fundamentada a partir da propriedade social e de uma gestão de Estado coletivo, traçando um paralelo com as ações de estímulo à participação social do Governo Lula.Desde a Associação Internacional dos Trabalhadores (conhecida como a 1ª Internacional) que a classe trabalhadora já reafirmava como deveria ser o Estado.Uma experiência referencial para esta construção, foi a Comuna de Paris. Paris tinha 20 bairros e, em cada bairro, eram escolhidos dez representantes que compunham o fórum de deliberação das

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políticas do governo de Paris durante a Comuna. O mesmo ocorria com relação a Saúde e outros serviços essenciais, onde os profissionais das áreas, junto com representação dos bairros, eram responsáveis por pensar e acompanhar a execução das políticas.A classe trabalhadora sempre buscou ser poder político, gestora do Estado. Hoje nós somos poder, somos gestores do Estado brasileiro. Uma reflexão ganha força entre a classe trabalhadora: Como deve ser o Estado que queremos? Como deve se dar a participação social no Estado que queremos? Estas questões estão ainda para serem respondidas.Quando os trabalhadores ganharam as primeiras eleições estaduais e agora, no governo Lula, este conflito ganhou materialidade. A participação de lideranças nestes governos, por exemplo, gerou certa confusão de identidade, quando somos governo? Quando somos lideranças vindas dos movimentos sociais? O aparelho de Estado, em alguns casos, engole alguns companheiros. A burocracia e o “jogo de aparências” de quem dela faz parte, afastam alguns desses companheiros e companheiras das demandas da classe trabalhadora.Em outros casos, não conseguimos articular/integrar alguns espaços de decisão política (ministérios e secretarias), mantendo a lógica histórica do Estado de ação partida e desconectada das demandas e necessidades da sociedade.

Abordagem Inicial de Nalu Farias:

Que ideologia justifica as desigualdades das mulheres?

Muitos estudiosos contribuíram para naturalizar a idéia da mulher enquanto sexo feminino, reprodutora, e que a esfera pública (relativa a produção) e a esfera privada (relativa a reprodução), desconectando-a da condição de “fêmea”. Mesmo os filósofos libertários, sempre negaram a importância das mulheres no espaço publico através de variados argumentos e com o mesmo objetivo.O capitalismo separou quem produz, de quem não produz e as mulheres na família passaram a ficar em segundo plano, ainda que sejam responsáveis por tarefas produtivas. Logo, as bases para a consolidação do capitalismo já estava dada, quando os diversos sistemas anteriores negaram a participação das mulheres. O trabalho doméstico, visto como algo natural, inerente às mulheres, vai resultar na criação da figura de “dona de casa”. As mulheres passam a ingressar no mercado de trabalho, não como trabalhadoras, mais sim, como mulheres. No campo isto é explicito, ainda hoje são vistas como colaboradoras no trabalho do marido. Uma das maiores lutas das mulheres trabalhadoras rurais e serem reconhecidas como trabalhadoras.

Dimensões da opressão das mulheres: Divisão sexual do trabalho < piores condições de trabalho / dupla jornada;

Sexualidade; Poder; Maternidade; Violência.

O Estado passa a ser constituído para execução política (as mulheres como recurso disponível); repressão / punição; controle ideológico e normativo. Até mesmo a experiência da Comuna de Paris, excluiu as mulheres e eliminou as descontentes, inclusive, algumas foram decapitadas por suas proposições e tentativas de participação.

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Plenária: Hoje estamos governando o país, em alguns momentos, percebemos que fazemos confusão entre estar no governo e estar nos movimentos sociais. Como então sermos movimento sindical e tratar companheiros que hoje estão governo?

Cláudio Nascimento: Ainda hoje vemos uma postura incoerente com o que defendemos, são companheiros (as) que se apropriam das organizações sindicais e sociais por décadas, ainda que tenham um discurso avançado. Como poderemos ter um aprendizado que desconstrua a cultura patrimonialista e clientelista, presente no Estado que agora somos seus gestores?Penso que muitas das criticas que o PT fazia a partidos conservadores, hoje, vemos alguns poucos companheiros (as) reproduzindo-as no Estado, no PT e nas organizações.Precisamos fortalecer as organizações sociais com projeto de sociedade definido, para viver e trabalhar no Brasil que queremos. As esquerdas precisam fazer uma avaliação critica sobre os governos que já tivemos, constituímos e participamos.

Nalú Faria: A classe trabalhadora amadureceu em vários momentos, o que vivemos hoje. A nossa capacidade de governar e sermos poder, resulta desse amadurecimento.Mudar por dentro, foi a alternativa que conseguimos implementar no plano federal, estadual e municipal.A ideologia neoliberal foi a justificativa teórica do capitalismo para neutralizar o avanço da classe trabalhadora ascendente durante a década de 1980 a meados de 1990. O padrão de consumo neste período é um exemplo disso, passamos a mensurar não mais as condições de trabalho e de salário, mais sim, quanto poderíamos consumir / usufruir.Ao mesmo tempo em que a classe trabalhadora acumulou derrotas no Brasil e no mundo, vivenciou em finais da década de 90, a retomada de lutas unitárias em escala mundial: as grandes greves na Europa; as manifestações de Seattle e posteriormente em Genova; impedimento da implantação da ALCA; organização dos Fóruns Sociais Mundiais, Regionais e em muitos paises; eleição de Chavez, Kirshiner, Michelle Bachelet, Lula e Evo Morales na América Latina; reversão da privatização das águas no Chile.

A eleição do Lula é resultante desta retomada das lutas da classe trabalhadora em escala mundial. Muitos companheiros e companheiras, principalmente petistas, ao assumir o aparato de Estado, caíram nessa armadilha e passaram a ter na aparência e no modo de consumo, o seu status, reproduzindo muitos aspectos que antes combatíamos.Queremos re-eleger Lula, mais também, não podemos imaginar que neste mandato tivemos um governo dos trabalhadores. O governo precisa conclamar os trabalhadores para ir as ruas para garantir maiores avanços para a classe trabalhadora.Conseguimos alguns avanços no campo com este governo, mais estes avanços estão a todo o momento sendo alvo dos grandes empreendimentos rurais, como por exemplo o avanço da produção do eucalipto nos últimos anos. Devemos pensar a sociedade globalmente, só assim, poderemos construir alternativas para nossas demandas históricas.

Encaminhamentos para os trabalhos em grupo pela moderação: Os/as participantes foram orientados a destacar em grupos as questões trazidas por Cláudio e Nalú que merecem destaque e

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que indicam que lacunas podem ser preenchidas no debate; e identificar que implicações os temas abordados trazem para a vida dos trabalhadores e trabalhadoras, particularmente, do campo.

Nalú Faria: Quanto a divisão sexual do trabalho – as crianças sejam homens ou mulheres, são educadas para reproduzir as “características e aspectos”necessários para a reprodução do capital.A própria organização produtiva no campo, como o corte de cana e outras atividades que requerem maior força física, o capitalismo exige a presença masculina e, as atividades que requerem maior delicadeza (fruticultura principalmente) excluem-se os homens e as mulheres passam a mão-de-obra preferencial. Desde o nascimento e desenvolvimento das crianças, que as mães e pais já vestem e educam a partir do que é convencionado aos homens e as mulheres.As mulheres precisam defender suas convicções e se firmar enquanto protagonista da sua própria história, seja nas relações estabelecidas no local de trabalho, na família e entre amigos. Quanto ao nosso papel em relação ao governo Lula, existem alguns desafios como, por exemplo, garantir o lucro dos bancos e dos grandes conglomerados e ao mesmo tempo garantir as conquistas da classe trabalhadora e ampliar o papel social do Estado; e como governar com uma base aliada formada por alguns políticos que em nível local sempre esteve contra as bandeiras da classe trabalhadora.Devemos estar permanentemente nas ruas e com as bandeiras erguidas. Precisamos estar propondo e pressionando o governo Lula e qualquer que venha a ser o governo, a atender as nossas propostas.Quanto ao comportamento das lideranças que estão no governo, precisamos separar esclarecer alguns aspectos. As lideranças quando estão no governo, passam a ser governo e não mais uma liderança que esta no governo. As diferenças decorrem da postura política diante das demandas da classe trabalhadora.

Cláudio Nascimento: A efervescência da formação política nas duas últimas décadas, resultou numa significativa retomada de espaço político pela classe trabalhadora.A idéia desta escola de formação da CONTAG demonstra uma vigorosa retomada deste processo de formação das lideranças e de estimulo as novas lideranças.Precisamos compreender melhor o Estado, contudo, a formação do Estado brasileiro precisa ser objeto de aprofundamento desta escola. A análise de conjuntura, estimuladora da militância nas décadas de 80 e 90, precisa ser retomada pela classe trabalhadora, inclusive, pela escola de formação da CONTAG.

DIA 19/11/2006 – SÁBADO

Socialização das mini-plenárias (Capitalismo no Campo)

Mini-plenária – Relação do Capital/Trabalho no sistema de assalariamento (Assalariadas/os), em atividades permanentes, diaristas, sazonais X grandes empresas.Facilitação: Marleide

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Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAGRELAÇÃO DO CAPITAL/TRABALHO NO SISTEMA DE

ASSALARIAMENTO (ASSALARIADAS/OS), EM ATIVIDADES PERMANENTE, DIARISTAS, SAZONAIS X GRANDES EMPRESAS

SISTEMA CAPITALISTA

CAPITAL: REPRESENTAÇAO EM DINHERO E PODE SER COMO TODOS OS MEIOS DE PRODUÇAO

CRIADOS PELO TRABALHO.

TEORIA MAXISTA CAPITAL É O RESULTADO DAACUMULAÇÃO DA MAIS VALIA

CAPITALISMO: SISTEMA ECONOMICO DOMINANTE

CAPITAL HUMANO: COJUNTO DE INVESTIMENTOS DESTINADOSA FORMAÇAO EDUCACIONAL E PROFISSIONAL

DE DETEMINADA POPULACAO

NA SOCIEDADE CAPITALISTA O TRABALHO HUMANO ASSUME FORMA DE TRABALHO ASSALARIADO

RELAÇÃO DO CAPITAL/TRABALHO NO SISTEMA DE ASSALARIAMENTO (ASSALARIADAS/OS), EM ATIVIDADES

PERMANENTE, DIARISTAS, SAZONAIS X GRANDES EMPRESAS

FATORES DE PRODUÇÃO

SISTEMA CAPITALISTA

TRABALHO CAPITALTERRA

ACUMULO DE CAPITAL PROJETO LIBERAL/NEO LIBERAL

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ASSALARIAMENTO (ASSALARIADAS/OS), EM ATIVIDADES PERMANENTE, DIARISTAS, SAZONAIS X GRANDES EMPRESAS

MERCADO DE TRABALHO NO BRASILTRABALHO: GRAU DE APERFEIÇOAMENTODAS FORÇAS PRODUTIVAS E DA DIVISAO

DA ATIVIDADE PRODUTIVA

DIVISAO DE TRABALHO: DISTRIBUIÇAODE TAREFAS ENTRE INDIVIDUOS

OU AGRUPAMENTOS SOCIAS

TRABALHO HUMANO ASSUMEA FORMA DE TRABALHO ASSALARIADO

COM BASE NO MODELO CAPITALISTA

EMPREGO

DESEMPREGO

REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA

DESEMPREGO TECNOLOGICO OU ESTRUTURAL

FLEXIBILIZAÇÃO: CONTRATAR E REMUNERAR

INFORMALIDADE

COMPETITIVIDADE

DESREGULAMENTAÇÃO DO MERCADO DE TRABALHO

MODERNUIZÃÇÃO NO CAMPO DESVALORIZAÇAO DO MERCADO DE TRABALHO NO CAMPO

RELAÇÃO DO CAPITAL/TRABALHO NO SISTEMA DE ASSALARIAMENTO (ASSALARIADAS/OS), EM ATIVIDADES

PERMANENTE, DIARISTAS, SAZONAIS X GRANDES EMPRESAS

RELAÇÃO CAPITAL TRABALHONO ASSALARIAMENTO RURAL

AS RELACÕES DE TRABALHO NO CAPITALISMO CARACTERIZAM-SE COMO RELAÇÕES

DE ASSALARIAMENTO

RELACAO DE TRABALHO NO MEIO RURAL

TRANSFORMAÇÃO NO ASSALARIAMENTO RURAL

MERCADO DE TRABALHO NO MEIO RURAL

PATRONATO RURAL EMPRESAS RURAIS

Detém os meios de produção Decidem mudanças no P. produção;Exploram os trabalhadoras/es rurais;

Objetivam o aumento do lucro.

TRABALHADORAS/ESASSALARIADAS/OS RURAIS

Executam as atividades;São expropriadas/os dos P. produção;

Vendem a força de trabalhoCompram os meios de vida

ESCLUSÃO DA

3º IDADE

TRABALHO ESCRAVOTRABALHO TEMPORARIO

TRABLHO SAZONALTRABALHO PERMANENTE

TRABALHO DIARISTA E SAFRISTAPRECARIZAÇÃO DO TRABALHO

FLEXIBILIZAÇÃO

RELAÇÕES DE ESPLORAÇÃO

SINDICALIZACO CAMPNHAS SALARIAIS

NEGOCIAÇOES COLETIVAS

O QUE QUEREMOS?

Que o emprego seja tratado como política de Estado e não política de governo.

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Políticas públicas para as/os trabalhadoras/es assalariadas/os rurais. Igualdade salarial e oportunidade de emprego para mulheres e homens em diferentes

idades e etnias.

Mini-plenária: Exclusão dos meios de produção no campo – a situação do Sem Terra X Latifundiário. Facilitação: Nicinha

1 – Que tipo de dominação e exploração o capitalismo provoca no campo?

A exclusão do trabalhador pela hegemonia do poder dos latifundiários; O domínio da comercialização que favorece a idéia de que é melhor ser empregado do

que agricultor familiar. A mídia, por outro lado, através da televisão, deforma as informações impondo uma alienação cultural;

A negação de direitos nos acordos coletivos, manobrando nas relações sindicais, e mesmo as cláusulas contempladas nos acordos e convenções, não são respeitadas;

Impõe uma tecnologia associada à questão da monocultura, agrotóxicos e transgênicos. A revolução verde, portanto, representa um dos fatores de dominação, por outro lado, a agroindústria familiar esbarra em uma legislação que engendra uma burocracia que favorece ao patrão, possuidor de uma licença que com o seu rótulo comercializa o produto, comprado da agroindústria familiar, por um preço irrisório.

Expulsa o trabalhador do campo oferecendo quantia que seduz o trabalhador a vender sua terra;

Concentração e monopólio dos meios de produção e das terras – mesmo os agricultores familiares se submetem ao trabalho análogo de escravo;

2 – Quem são os excluídos do campo?

- A alta concentração fundiária no Brasil, juntamente com a ausência de reforma agrária, propiciou a exclusão dos agricultores e agricultoras dos meios de produção, entre estes os mais atingidos foram: os idosos, as mulheres, os jovens, índios, quilombolas, meeiros, sem terra, etc.

- Os assalariados rurais.

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4 – Como os assentamentos de reforma agrária podem auxiliar na superação da exclusão no campo?

Pela conscientização, começando nos acampamentos, por meio de um projeto que contemple as diretrizes de uma educação do campo;

Pela transformação da lógica individualista pela cooperativa, que gera desenvolvimento para os assentados, inclusão social e inserção no mercado, pela promoção da educação e o fortalecimento nas reivindicações das políticas públicas;

Por meio de uma reforma agrária com planejamento tático, operacional e estratégico. Maior interação entre os sindicatos, federações e CONTAG; Cursos de formação para acampados: associativismo, cooperativismo; Liberação de crédito com assistência técnica especializada, permanente e estruturada,

garantida pelo Estado, sem necessariamente ser executada por uma entidade estatal.

Mini-plenária: Agricultura familiar X agricultura patronal. Facilitação: Zeke Beze.

Conceito de modernização é controverso, dá a entender que a modernização é para melhorar sem considerar muito as implicações advindas desse processo para a vida dos/as agricultores/as familiares. Com relação ao incremento de produção é preciso visualizar a diferença entre a agricultura de auto-fornecimento e da agricultura de fornecimento externo (dependência do monopólio das grandes empresas).

Modernização: necessidade do campo em suprir as demandas urbanas para alimentação.Questão: Quem é mais eficiente? A grande produção (extensiva) ou a agricultura familiar. A monocultura “cansa a terra”. Nos países desenvolvidos a agricultura familiar tem relevância na produção de alimentos e na economia.

É importante discutir a identidade de classe para orientar a organização dos trabalhadores. Hoje o sindicato patronal se coloca como representante dos/as agricultores/as familiares.As diferenças entre agricultura de fornecimento externo e de auto-fornecimento estão nas sementes, máquinas, insumos, equipamentos. Há também diferenças em relação às regiões do

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O Brasil é um dos países com maior concentração fundiária do mundo – índice de gini < que 0,85, quando o máximo é 1(um) O incremento da modernização capitalista aprofundou o processo de concentração fundiária e revitalizou o poder de classe dos grandes produtoresAprofundou também o grau de dominação e a expulsão maciça de trabalhadores e trabalhadoras rurais do campo, com forte redução dos cultivos tradicionaisIdeologizou o termo agronegócio.

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país. No sul uma radicalização no corte com o fornecimento externo, pois pode inviabilizar algumas iniciativas da agricultura familiar. Para o Nordeste e Centro Oeste, a dependência externa trás muito mais prejuízo.A agricultura familiar tem que buscar os meios de modernização. Mas a tecnologia não pode ser orientada pelo interesse das empresas, mas sim a partir da realidade da agricultura familiar, integrada à sua cultura, aos seus costumes. Nesse caso, a universidade, EMBRAPA, e outras devem desenvolver tecnologias adequadas. A organização dos trabalhadores/as tem um papel muito importante na articulação e reivindicação pelas novas tecnologias adaptadas à agricultura familiar.A modernização no campo dentro desses parâmetros deve levar em consideração a questão da qualidade de vida dos/as agricultores/as familiares. A modernização não deve ser orientada pelo mercado, mas sim de acordo com a perspectiva de desenvolvimento rural sustentável. Questão: é para competir?

Plenária: Com relação ao cooperativismo, temos que considerar a origem dos assentamentos que

são os acampamentos. Nos acampamentos se estruturam, ainda que de forma precária, organizações familiares e para produção. Depois de assentados, esse processo não é considerado. É preciso pensar o cooperativismo a partir dessa organização mais espontânea. Isso também se reflete no assalariamento. Em Pernambuco na Usina Catende, os/as agricultores/as familiares, ex-assalariados têm dificuldade de assimiliar essa relação de produção. O inverso também é fato.

O grupo de assalariamento trouxe muitos desafios, sobretudo na relação de dependência (trabalhar a semana, receber o salário e fazer a feira). Apesar disso, é safrista, é diarista. Existe uma diversidade que interfere na identidade do trabalhador/a rural. Como a gente se identifica enquanto trabalhador/a assalariado/a ou agricultor/a familiar.

O terceiro grupo falou da diferença entre agricultura familiar e patronal. Considerando que para a agricultura familiar a relação custo/produção é menor de que a patronal, onde estamos errando? Como equacionar?

Com relação às tecnologias, imprescindíveis para a agricultura familiar, temos que ver a questão da auto-tecnologia, das possibilidades alternativas. Não há visibilidade e nem se apropria da tecnologia que vem sendo desenvolvida pelos/as agricultores/as.

Há um descompasso entre a modernização forma de produção mais primitiva em relação ao meio ambiente. A tecnologia avança e trás melhoria na qualidade de vida, mas os processos mais primitivos como o extrativismo no norte deve ser considerado.

As questões do emprego e do salário revelam contradições. Muitos agricultores/as familiares educam seus filhos para um posto de trabalho melhor que ofereçam um bom salário, para disputar no mercado de trabalho. Como pensar educação dos descendentes para a auto-gestão?

Os 3 temas são os focos centrais de nossa caminhada. Temos que refletir sobre a construção dos sistemas cooperativos. A cooperação tem que se dar primeiro entre as pessoas, do contrário, seremos sempre escravos do capitalismo. O sistema de cooperação entre as pessoas pode nos levar a conviver melhor com o capitalismo. Nos assentamentos, a primeira preocupação que ocorre é a de individualização dos lotes e da produção.

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Zeke Beze: Dificuldade do/a assalariado/a voltar a ser agricultor/a: o assalariado vive do trabalho, o agricultor familiar também. A CONTAG dialoga com isso, os agricultores familiares e assalariados são trabalhadores rurais, os que vivem do trabalho. São assuntos muito interligados e se influenciam. A discussão tecnológica e de meios de produção dialogam com essas dimensões.Eficiência da agricultura familiar e patronal: nesse caso não está se falando o custo ou do rendimento. A questão da renda depende de muitas coisas, depende de políticas públicas. A eficiência se articula com as políticas públicas em várias dimensões. Na Europa a agricultura familiar responde porque tem tido um olhar diferenciado de outras regiões do mundoAgricultura tradicional X moderna: nessa discussão não está implícito o critério de valor, mas sim o de adequação. A agricultura tradicional tem sido recuperada por vários segmentos porque durante muito tempo tentou-se sepultar essa dimensão como se essa fosse atrasada. A agricultura moderna não é milagrosa. Hoje se procura recuperar muitas práticas da agricultura tradicional. A agroecologia, por exemplo, faz isso.

Marleide: A discussão temática na mini-plenária se articulou com o conjunto de informações trabalhado desde o começo do curso. Por mais que a gente não conheça a teoria ao pé da letra, a gente tem noção. Para esse debate é preciso entender alguns conceitos, como o capitalismo e o mercado de trabalho. A leitura dos elementos do mercado de trabalho (reestruturação, flexibilização) embora seja muito visível no meio urbano, também aconteceu no meio rural de uma forma muito mais cruel. O grupo discutiu o como se dá essa relação entre capital e trabalho no meio rural e como isso interfere na vida do/a trabalhador/a rural. Assalariados/as rurais não é uma política. Podem ser considerado público. Quando falamos em salário, lembramos de convenção e acordo. Os/as assalariados/as não é público da reforma agrária? Podem se tornar agricultores/as? Qual é a política pública negociada para esse público. Como dar conta dessa lacuna?Estamos em uma sociedade em um sistema capitalista que contempla essa relação de assalariamento no campo que não pode ser vista como uma situação negativa. É um público protagonista e importante, é quem sustenta muitos sindicatos.

Nicinha: Organização agrária nacional é pautada na concentração da terra, desde o momento da divisão do país em capitanias hereditárias: a grande propriedade para alguns poucos amigos da corte. Foi estabelecido o sistema escravista (africanos, brasileiros, índios e mestiços). Essa organização foi potencializada no país com a extensão geográfica e pelo Estado. É uma organização fundiária pautada na propriedade privada. A Lei de Terras institucionalizou o sistema de posse e da propriedade privada com práticas como a grilagem. 85,2 dos imóveis – 20% das terras e 1,6% dos imóveis ocupam 43,6% das terras.Agronegócio é uma palavra ideologizada que virou uma marca do negócio dos grandes, como conseqüência da estrutura fundiária concentradora e excludente.Os excluídos/as do campo são 5 milhões de famílias sem terra que desejam cultivar a terra, o que deve chegar a 25 milhões de pessoas. E os/as agricultores/as familiares são excluídos/as? Pelo sistema capitalista estariam extintos. A agricultura familiar é um subproduto da agricultura concentradora: cerceada pelas políticas

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públicas, detentora das piores terras, salvo exceções. Passam por processos de exploração e exclusão.A dominação ideológica também acentua os processos de exclusão. O significado das lutas sociais no campo, como instrumentos de resistência, esperança e de conquistas. É conflituoso, tem o aspecto da violência e da intransigência.A visibilidade do acampamento: tem um papel fundamental nas ações de reforma agrária.Identidade do/a trabalhador/a sem terra é recente e surge no processo de luta pela terra. A denominação de trabalhador/a rural assalariado/a ou agricultor/a, ou sem terra, depende do lugar onde se está. Quando se fala em sem terra, pouco se associa ao movimento sindical, mas sim ao MST. Assentados/as em alguns lugares não querem ser chamados de agricultores familiares, querem manter a denominação de sem terra.

II UNIDADE:

DIA 21 DE AGOSTO – SEGUNDA FEIRA

Abertura: Manoel Santos, Raimunda Celestina de Mascena e Juraci Souto

Manoel Santos – Estamos iniciando a segunda semana do curso de formação. O principal sentimento que nos envolve nessa retomada do processo de formação pela CONTAG é a alegria. A retomada da formação nesse momento além da alegria do encontro da militância das cinco regiões, entre jovens e os mais experientes. Temos muitos desafios. O primeiro desafio é o de marchar junto com um público diversificado em geração, em tempo de militância e de direção das instâncias e nas assessorias. O outro desafio é o de acertar o passo nessa diversidade para dançarmos no mesmo ritmo. Também temos o desafio de contribuir com a formação de novas lideranças, assessores (as) e dirigentes (as), compreendendo qual é o papel de cada um no movimento. Dirigente não precisa assumir o papel do assessor e nem o contrário. São caminhadas e formações diferentes e assessorias e direções precisam combinar o passo para avançarem juntos nos processos. É importante termos muita paciência nessa relação. Essa diversidade também diz respeito ao acúmulo diferenciado que cada pessoa tem em sua caminhada. Isso implica em um esforço coletivo para se estabelecer um diálogo para que todos (as) acompanhem o ritmo da formação.Esse curso não acaba aqui. Temos outras etapas nesse processo pedagógico.A opção feita pelos (as) trabalhadores (as) no 9o Congresso Nacional, deliberando que a direção encaminhasse a retomada da formação e a criação da Escola, trouxe para nós a necessidade de discutir o trabalho, sistemas de sociedade, estado e sociedade civil para subsidiar a luta sindical, para pensar qual sociedade queremos construir, como formular nossas ações. A formação da qual falamos não é doutrinária. Tem que preservar a liberdade de opinião de todos (as). Tem que ter uma perspectiva libertadora, crítica, tem que contemplar diversas visões.Temos ainda que construir juntos a multiplicação desse processo. Todos nós temos responsabilidade, sendo que o dirigente tem uma responsabilidade muito maior, porque trás a dimensão da decisão política em fortalecer essa estratégia nacionalmente e em cada estado.

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Raimundinha: A Coordenação Política da Escola é formada por Manoel, Raimunda Celestina, David e Juraci. Somam-se a esse grupo, representantes de todas as regiões, formando o Grupo Gestor. Temos também a equipe pedagógica formada por integrantes da assessoria da CONTAG. A relação entre dirigentes e assessores é de ajuda, de complementação. Mas nessa sala somos todos (as) alunos (as).

Juraci: Esse momento é fruto de uma avaliação que fizemos ontem. O processo formativo tem um papel muito importante no fortalecimento do nosso movimento sindical, fortalecimento do Sistema CONTAG. Por isso o que Manoel falou sobre a multiplicação é muito importante. Os que aqui estão terão o compromisso de contribuir com a formação dos (as) que não puderam vir.

CONTEXTO E ORIGEM DO SINDICALISMO NA EUROPA E BRASIL

Domingos: essa segunda unidade leva em conta todo acúmulo da primeira unidade, desde as abordagens temáticas até as avaliações que fizemos no sábado. Agora, para discutirmos o sindicalismo é preciso retomar aquelas informações, para compreendermos quando, onde e em qual sistema social nasceu o sindicato. O sindicato nasceu no capitalismo, mas não foi no meio rural, foi a classe operária que criou o sindicato.Mas vimos na semana passada que o capitalismo também avançou no campo, sob os aspectos econômicos e políticos. Assim pudemos visualizar a dimensão da luta de classes. Para compreendermos melhor, precisamos conhecer e refletir sobre o sindicalismo, conhecer a origem histórica do movimento sindical, no meio urbano e no meio rural.Orientações para leitura: auto-disciplina, leitura e reflexão coletiva, introdução de um novo hábito.

Altamiro Borges, jornalista, (Centro e Estudos Sindicais):

A CONTAG teve um papel muito importante na retomada do movimento sindical no Brasil. A história do movimento sindical no mundo e no Brasil é muito rica e deveria ser contada na escola oficial. Na UNICAMP tem um curso de quase um ano sobre o assunto. Sindicato é um fenômeno do sistema capitalista. Apesar do capitalismo se proclamar para sempre, antes do capitalismo vivemos outros sistemas de sociedade e nelas a luta de classe, as revoltas. O que não existia nos sistemas anteriores era a forma de organização.No escravismo o homem era escravo de outro homem, no feudalismo, escravo do senhor feudal, no capitalismo é “livre”.A média mundial das horas trabalhadas para pagar o salário é de 2,1 em relação às 8 horas. As demais compõem a mais-valia, que vai para o bolso do capitalista. Para crescer, o capitalista precisa explorar cada vez mais. O capitalista vai aumentar a sua mais-valia diminuindo salários, aumentando a jornada e investindo nas novas tecnologias e formas de gerenciamento.O trabalhador vai lutar para diminuir a mais-valia, diminuindo a jornada, aumentando salário, inserindo a dimensão menos alienante do trabalho.Essas questões são inconciliáveis. O patrão para acumular mais precisa explorar mais o o trabalhador para viver melhor tem que lutar.

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A organização começa na Inglaterra, berço do capitalismo, a partir da revolução industrial. Um operário chamado Nedd Lud revoltado, quebra a máquina por vê-la como inimiga. Foi demitido e substituído por crianças Esse ato conquistou adesões e iniciou o movimento Luddista (movimento de quebrar máquinas). Mas os trabalhadores perceberam que o caminho não era por aí. Rapidamente o movimento Luddista criou o seguro patrimonial. O próprio patrão passou a quebrar maquinas para adquirir novas e mais modernas com o seguro.Depois passou se para a sabotagem, cujo termo de origem francesa significa tamanco. Os operários colocavam o tamanco na máquina e parava a produção.O passo seguinte foi o boicote. Mister Boicote era um capataz que ficava ao lado dos trabalhadores com chicote. As pessoas se organizavam para deixar de comprar aqueles produtos para provocar a demissão de Mister Boicote.A greve, paralisia coletiva do trabalho foi uma forma de luta que surgiu no século 19. Com o tempo percebeu-se que as formas de luta, por mais belas, prescindiam de uma organização. Surgiram as trade-union. São diferentes dos nossos sindicatos, mas os sindicatos são o que são por conta da trade-union. Havia a concorrência entre trabalhadores também e Marx dizia que os trabalhadores precisavam vencer uma concorrência para vencer a outra. As trade-union eram rudimentares organizações e clandestinas. A dos trabalhadores têxteis tinha estatuto e só admitia membros a partir de 2 anos de observação. Em caso de traição, a trade-union matava os traidores através de seu braço armado. Não podia ter traição. Com o crescimento das trade-union, passaram a criar problemas para os patrões. Passaram a agir com mais inteligência, por exemplo, fazer greve em momento de grande produção e baixo estoque para poder negociar, porque até então não reconheciam a trade-union e se recusavam a negociar.A primeira lei de sindicatos na Inglaterra foi aprovada pelos lordes em 1824. Deixou de proibir a greve, mas passou a controlar e reprimir. Foi criada a legislação de greve para controlar. Os patrões passaram a agir pela cooptação. Nesse período houve um grande movimento de atos familiares (batizado, casamento) envolvendo patrões e empregados.Com o crescimento do capitalismo (escravidão assalariada) e das formas de luta, o sindicalismo avança no mundo. No Brasil o sindicalismo demorou de chegar porque não havia relação de assalariamento. O Brasil foi o último a acabar com a escravidão e foi um dos últimos a ter sindicato. O capitalismo foi tardio. O sindicalismo começou no Brasil no final do século 19 como Uniões Mutualistas, de caráter assistencialista de ajuda mútua. 80 % dos recursos era para pagar caixão de enterro. Era a primeira forma de organização.Depois surgiram as uniões operárias ou ligas operárias. As empresas eram pequenas e frágeis, não havia como ter sindicatos de categoria, o que existia eram as ligas de várias categorias.O sindicalismo surge com a consolidação do capitalismo no Brasil.Dom João suspendeu a lei que proibia a produção de roupas no Brasil cessando a dependência da Europa, em 1850 proíbe o tráfico de escravos da África. São os primeiros passos do capitalismo no Brasil. A mão de obra negra no Brasil estava escasseando porque a vida útil era curta. A pouca mão de obra negra passou a ser para os trabalhos mais pesados.Imigração européia favorecida pelo excedente de mão de obra nos países de origem. Em 1917 um censo em São Paulo identificou que 4% da mão de obra era nativa, outras de imigrantes. Os trabalhadores imigrantes tinham vivido o luddismo, sabotagem, boicote e trade-union. Tivemos o privilégio de abrigar grandes lideranças sindicais banidas pela polícia européia.

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O industrial brasileiro era o latifundiário do café. Com a primeira guerra mundial com bons preços do café, eles tinham mais recursos para investir na indústria. Com a crise do café jogaram peso na indústria. A reação patronal com as ações dos trabalhadores era de muita violência. Estrangeiros que participavam de reuniões eram banidos do país. A lei de sindicalização proibia a adesão de estrangeiros e o movimento sindical era clandestino. Mas era também pavio-curto. Os anarquistas tinham ação direta. Era altamente combativo e enfrentava muitas dificuldades.Em uma ação grevista numa pequena empresa em 1917, José Martinez, um operário morreu vítima de uma ação repressiva da polícia. Isso provocou a adesão à greve em solidariedade, se multiplicando pelo estado de São Paulo, indo para outros estados, chegando até Recife.A greve foi muito forte. Uma das formas de confronto com a polícia era jogar bolinhas de gude no chão para deter a cavalaria. Era uma greve grande e forte, mas não tinham política porque era de ação (concepção anarquista).Outra grande greve foi a de Niterói. Os militares chamados a reprimir o movimento, eram filhos de operários aderiram a greve. Foi quase insurrecional. Sempre liderada pelos anarquistas, tendo como centro São Paulo e Rio de Janeiro.Em 1917 dois fatos importantes abalam a organização anarquista. A Revolução Russa liderada pelo Lênin a partir da consciência socialista e a greve de São Paulo onde os operários tinham o poder na mão, mas perderam pela falta de capacidade de resistência.A crise dos anarquistas gerou uma discussão teórica. Aconteceu um racha e uma parte se junta em 1922 para criar o Partido Comunista. Dos 9 fundadores, 8 eram anarquistas. O Brasil é sui generis. É o único país no mundo que o Partido Comunista foi criado pelos anarquistas.Daí, o movimento sindical passou a ter um recorte político.

Nalú Faria (SOF):

As mulheres e as crianças compunham em um primeiro momento a maioria no trabalho. Com o surgimento do sindicato, observaram-se apesar de serem maioria, as mulheres tinham baixo índice de sindicalização e participação no movimento. Nos Estados Unidos e na Europa, havia uma forte presença das mulheres nos movimentos grevistas, mas nem sempre vinculadas ao sindicato. O debate sobre o trabalho das mulheres nas fabricas perpassou o movimento sindical e o debate dos socialistas.Veremos a seguir que os socialistas, depois comunistas, e os anarquistas influenciaram fortemente a origem do movimento sindical no Brasil.Para os anarquistas, que não concordavam com a organização em partidos políticos, o trabalho nas fábricas era indigno para as mulheres, que deveriam tem uma condição diferenciada no trabalho fabril. O debate foi aquecido em um contexto de muita pobreza e a visão do homem provedor não se configurou. No entanto, o salário feminino sempre foi considerado “ajuda”, e por isso deveria ser menor para “não atrapalhar” o trabalho masculino.08 de março: corre a história de que o patrão incendiou a fábrica em 1857 com as operárias presas dentro. Em 1857 ter uma fábrica era um grande bem. Nenhum patrão iria incendiar seu patrimônio, visto que nem seguro existia na época. Quando se passou a estudar o caso, essa passagem histórica não foi encontrada. Ao contrário, encontrou-se uma grande história de luta.

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O partido socialista americano pensou em trabalhar uma data para comemorar o dia das mulheres, que foi comemorado pela primeira vez na última semana de fevereiro. Em Nova York uma grande greve foi articulada em novembro de 1909. Várias fábricas foram aderindo a greve. Os homens aderiram a greve e ela foi até 17 de fevereiro de 1910 na medida em que as empresas maiores conseguem negociar as reivindicações. As mulheres estavam nas empresas menores. O relato conta sobre mulheres fazendo piquetes no frio e na chuva, sendo arrastadas e presas pela polícia. As sufragistas (movimento pelo voto da mulher) predominantemente da classe média burguesa faziam coletas de recursos para apoiar as mulheres grevistas. Foi comemorado mais uma vez o dia das mulheres. Em uma das fábricas que não se negociou as melhores condições de trabalho, um incêndio acidental ocorreu em 1911. Essa fábrica não estava de acordo com as normas de prevenção de incêndio. 124 mulheres e 21 homens morreram. Houve uma grande comoção. Ficou claro se a fábrica tivesse negociado as condições de trabalho a fábrica não teria pegado fogo.É muito importe os estudos feitos sobre a história de luta das mulheres, como se inseriram e se organizavam.Na Alemanha, por volta de 1850, depois na Rússia os socialistas puxaram o debate sobre a socialização do trabalho doméstico e o trabalho da mulher.Segunda conferencia internacional das mulheres socialistas em 1910 a Clara Zetkin propôs a criação do dia internacional de mulher. Elas tinham uma revista “Pela Igualdade” que tinha uma boa circulação. O dia passou a ser o 8 de março.Tanto na Alemanha como na Rússia aparece o debate sobre as mulheres burguesas. O movimento das mulheres burguesas sufragistas era muito forte e o socialismo se deu conta que se não partissem para a organização das mulheres, as burguesas o fariam. Foi uma boa pressão para a ação dos socialistas. A organização incluía mulheres urbanas e camponesas, embora a organização no campo fosse muito mais trabalhosa.Com o racha da segunda internacional, a grande parte das mulheres se alia ao setor mais moderado. Em 1900, aparece o primeiro texto da Krupskaya, esposa de Lênin, sobre a organização autônoma das mulheres. Na Rússia e na Alemanha havia a compreensão de que era importante a importância da mulher na revolução.Em 1917 a mobilização pelo dia 8 de março estava sendo feita e ganhando força. Há inclusive uma versão de que a revolução russa ganha força a partir dessa mobilização. As mulheres brasileiras participaram ativamente das greves. Em 1906 foi criada a primeira associação de mulheres, um jornal, o “Avante”. Ter uma revista ou jornal era uma demanda interessante. Na Rússia nem todas liam, então as lideranças iam para as portas de fábrica ler o jornal para as demais. A greve de 1917 começou em uma fábrica onde trabalhavam mulheres. Apesar de quase sempre a mobilização serem por necessidade de melhorar as condições de trabalho, casos de violência e assédio sexual eram também motivos de movimentos.Até 1920 a participação de mulheres era ativa e começou a decrescer a partir daí. Havia uma priorização pela mão de obra masculina. O movimento sindical de 1920 passou a fazer uma discussão mais voltada para a legislação, a formalização do trabalho. As mulheres tinham muita dificuldade de participar de reuniões e movimentos porque a forma do debate e para reunir não possibilitava que elas estivessem presentes. O reforço à idéia de que a mulher deveria ficar em casa.

DEBATE:

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Como desconstruir o mito do dia 8 de março sobre a queima de mulheres? Como se deu no campo a inserção das mulheres no movimento sindical?Como Nalú compreende a relação do socialismo utópico e real?Em muitos casos, as mulheres são restringidas pelo mercado de trabalho. Aos poucos as mulheres passam a ocupar os postos de trabalho. Existe algum estudo?Citar mais as contribuições teóricas de algumas mulheres pensadorasFalar um pouco mais sobre a fundação do Partido Comunista no Brasil.

Altamiro: Temos muita revolta camponesa no Brasil: Canudos, Contestado. Tivemos muita dificuldade de organização no campo. Na década de 40 o Partido Comunista tenta organizar os trabalhadores no campo, mas a violência foi acachapante. Com o avanço do capitalismo no campo, surgem muitas organizações: no Engenho Galiléia em Pernambuco, a associação dos trabalhadores da Galiléia que começa assistencialista e vai adquirindo caráter de luta, recebe contribuições de Francisco Julião. A partir daí, as Ligas Camponesas passam a ter uma importância muito grande no nordeste. No Sudeste a ULTAB, no Sul o MASTER, um movimento de sem terras com contribuições de Brizola. No Nordeste apareceu um momento de disputa para se contrapor, um movimento de direita.Sobre a fundação do PC - existiam 4 grandes correntes no movimento sindical: uma advinda do movimento trade-unionista ou sindicalismo pragmático ou sindicalismo de resultados (concepção da Força Sindical). Outra é a anarquista que quer dizer negação do poder. O anarquismo tem características de muita combatividade, pregava o sindicalismo auto-gestionário mas não se colocava na disputa política. Era uma corrente pela ação direta. A corrente marxista vinculava a questão econômica na luta sindical, sendo necessário fazer a disputa econômica. A outra concepção é a social democracia, que derivou do movimento marxista. O fundamental para essa concepção é a disputa eleitoral.O PC vem da experiência do anarquismo dada a dificuldade de sobreviver sem projetos políticos. Nasce com virtudes e defeitos do anarquismo.A década de 20 é um momento em que o movimento operário reduz as forças. Uma parte de burguesia brasileira se revolta com a burguesia do café com leite do Sudeste. O crescimento econômico se coloca a serviço da infra-estrutura de São Paulo e Rio de Janeiro. Lideranças como Getúlio Vargas e o representante da oligarquia da cana de açúcar João Pessoa se revoltam, refletindo em um racha nas forças armadas. Isso envolve a intelectualidade. A Semana da Arte Moderna em 1922 é uma revolta contra a cultura européia.

Nalú: em 1996 as mulheres passaram a ter contato com a informação sobre a farsa do 8 de março. O primeiro foi de René Cote, uma canadense que fez um primeiro estudo. Depois, uma espanhola a Ana Isabel Alvarez Gonzalez escreveu sobre isso. O primeiro livro não é traduzido, mas o segundo será. É importante conhecer a história e sair contando. A história real é muito mais bonita e mais rica.No Brasil as correntes sindicais de maior relevância eram a anarquista e a socialista. Os socialistas utópicos defendiam a igualdade das mulheres, principalmente mães por uma questão ética e de respeito. Marx buscou o econômico a partir da base material e da opressão histórica.O anarquismo reforçava a idéia de mulheres frágeis, passíveis de serem corrompidas. Trabalho “moralmente ético”. A noção de família guiada pelo homem tinha um forte viés.

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A Alexandra Kollontai, líder do Partido Comunista participou da oposição obreira, tinha uma visão de que a mudança da sociedade passava pelo socialismo. Para ela não haveria mudança na vida das mulheres no capitalismo. Fazia crítica ao patriarcado e ao casamento burguês onde o marido era o chefe da família. Defendeu direito ao aborto, divórcio liberdade sexual. Foi a única ministra após a revolução bolchevique. Discutiu as cotas universitárias, a inserção da mulher em vários tipos de trabalho.Emma Goldmann, feminista anarquista, radical. Não apoiou o direito do voto (visão anarquista). Apoiou o aborto, criticou a prostituição. Na rota do tráfico estavam as polonesas e judias para o Brasil e Europa. Imperialismo, desemprego, igualdade de condições de trabalho eram temas que se somavam ao da exploração sexual. Temos que retomar essa discussão.

Plenária: Que influencias o atraso da chegada do MS no Brasil trouxe? E Luis Carlos Prestes na história do PC no Brasil? Falar sobre as conseqüências da ação dos anarquistas na Rússia para os anarquistas brasileiros.

Nalú: Na relação com movimento de mulheres identificamos a luta pelo voto, mas tem outras questões. Houve 2 ondas de feminismo sendo a primeira de 1850 a 1930 das sufragistas (luta pelo voto feminino) como necessidade para a construção da igualdade. Parte do movimento operário não defendia o voto feminino. Nos Estados Unidos, os movimentos de negros e das operárias seguiram o movimento das sufragistas, mas em um determinado momento os homens negros se juntaram com os brancos para manterem o voto somente dos homens. O apoio das sufragistas à greve não se manteve até o fim. Kollontai em uma viagem aos Estados Unidos refletiu sobre essa aliança, chegando a conclusão que não interessa estarem juntas (operárias e burguesas). Questões como esta também foi enfrentada pela Comissão Nacional das Mulheres Trabalhadoras da CUT no momento de constituição.A segunda onda, a partir de 1960, decorre do embate entre duas tendências: o da radicalização do feminismo liberal (feminismo radical) que apregoava a luta de gênero em detrimento da luta geral de classe (expoente Betty Frida) e a outra das socialistas que abordavam o trabalho doméstico, a violência, a sexualidade e queriam um movimento autônomo, organizado e dirigido pelas mulheres.

Altamiro: As questões colocadas sobre concepções sindicais são polêmicas. As disputas muitas vezes viram tendencismo onde as pessoas não ouvem ninguém. No sindicato aparecem várias idéias, se não for assim, deixa de ser sindicato. São idéias inorgânicas e orgânicas. As inorgânicas são dispersas e isoladas e as orgânicas pressupõem organização, discussão coletiva.As matrizes são: trade-unionista, anarquista, sindicalismo cristão, comunista/marxista e a social democrata.Tradeunionista: nasce nos países capitalistas desenvolvidos, imperialistas. Tem a ver com a expansão do capitalismo, inclusive para explorar operários de outros países com suas características: força de trabalho mais barata e desorganizada, matéria prima abundante e mais barata, mercado de consumo virgem, governos frágeis passíveis de facilitar a entrada de capital estrangeiro e maior extração de mais-valia para investir na redução dos conflitos de classe no país de origem. Sindicalismo dos Estados Unidos nascido sob a égide anti-capitalista passou a ser defensora do capitalismo como meio de expandir para explorar outros países e distribuir migalhas para operários americanos (businessunion) – AFL-CIO

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Anarquista (França, Itália, Portugal, Brasil): a partir de Proudhon “A filosofia da miséria”. Uma sociedade sem sindicato financiada pelo patrão através dos bancos populares. Para Bakunin “A greve é tudo” pela ação, o sindicato é o instrumento e não os bancos populares. Quem vai tocar é uma minoria ativa (anarco-sindicalismo). Com o desenvolvimento do capitalismo, essas idéias vão perdendo as forças, a greve deixa de ser tudo. Com a revolução de 30 e o sindicalismo oficial, os anarquistas e socialistas se opuseram ao sindicato oficial. Os socialistas percebem que não podem seguir isolados e retornam, enquanto que o anarquismo não adere ao sindicalismo oficial. O anarquismo não existe mais enquanto corrente, mas como concepção.Sindicalismo Cristão: a igreja detinha muito poder econômico, religioso e político no feudalismo. Com as revoluções burguesas, a igreja se posiciona contra a burguesia porque ela acabaria com os servos. A Revolução Francesa guilhotinou muitos cardeais e bispos. No primeiro momento a igreja ficou contra o sindicato porque “colocavam contra os próprios irmãos: patrões e empregados” criou círculos cristãos para evitar a contaminação anarquista e comunista. A igreja se colocava enquanto o lugar para unir trabalhador e patrão.O sindicalismo no Brasil tem 100 anos o que dificultou o processo de organização e formação. Nosso sindicalismo enfrentou ditaduras atrozes, agiu e se manteve.PC nasceu com o nome de Partido Comunista do Brasil. Classe operária nacional e nos países os partidos se organizam enquanto seção. Nasce com a marca operária e crítica ao anarquismo pela negação da política. Amplia a dimensão para além do sindicalismo e o Prestes que era burguês e tem grande importância. O Partido recebe também a adesão de muitos outros segmentos, como por exemplo, dos artistas.

Trabalho em Grupo sobre concepções e correntes sindicais: discutir e aprofundar as seguintes correntes: anarquistas, comunistas, amarelos (na Inglaterra denominada tradeunionistas) e cristãos. Estudo de textos; visualização dos mapas; identificar as posições e influencias de cada corrente; preparação para o júri simulado (escolha de 2 advogados e preparação da torcida organizada)

Apresentação das defesas:

Comunistas: Combate ao capitalismo; base fundamental é o partido – principal instrumento de luta combinação de forças. O sindicato tem que ser organizado e planejado. Parlamentarismo é a estratégia para transformar a sociedade. A produção da sociedade é de todos. Pelo fim do capitalismo.Defendem e reafirmam a corrente como importante instrumento de libertação dos trabalhadores das forças de produção. Protesta contra os sindicalistas cristãos, empenhados em aprofundar a alienação da classe trabalhadora, de esfriar a luta de classe. Os amarelos, pelegos fazem acordos com o patronato defendendo a convivência com o capitalismo. Isso não leva nada. Os anarquistas não têm propostas, não sabem o que fazer.

Amarelos: Sindicalistas pela igualdade. Política deve ser moderada não revolucionária. A ordem está acima de tudo e para o progresso.Interesse em conseguir conquistas específicas. Acreditam ser maioria e faz a luta pelo reconhecimento sindical. Congresso de 1929 de sindicalistas. Os amarelos defendem a ordem

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acima de tudo, ordem de classe. Defendem o imposto sindical para manter o sindicado e o assistencialismo. Não há inimizade com patrões. São contrários à greve porque acreditam que não se consegue vitórias através da violência. A forma é pelo diálogo, pela conciliação de classe.Propostas concretas por respostas imediatas. No capitalismo a força de trabalho seja valorizada. A revolução mata e trás a discórdia. Revolução, questões sociais são caso de polícia e não do movimento sindical. Temos que atuar pela paz. Não podemos ser contra o Estado. O Estado é escolhido por nós. O tribunal é a expressão da igualdade. Os anarquistas dizem que o capitalismo mata e torna o trabalhador sedentário. O capital flui e faz bem à sociedade.Tendência reformista. O imposto sindical não é desse tempo (até anos 20), foi instituído no Estado Novo. O sindicalismo amarelo era manobrado pelo Estado burguês e pelo patrão.

Anarquistas: Defendem a auto-gestão do proletariado. O Estado, poder judiciário e os partidos políticos são opressores. Os trabalhadores e trabalhadoras são independentes e autônomos/as. Defendem o fim do capitalismo. Os sindicatos não devem ser atrelados ao Estado, à igreja e nem aos partidos políticos. Combatem os sindicatos que se aliam ao Estado para ficar com as migalhas. Os trabalhadores/as devem construir a sociedade que desejam. Pelo fim do Estado, fim da Igreja, fim do comunismo, pelo fim dos partidos políticos e das eleições.Os cristãos defendem o amor e a paz. Deveriam explicar as mortes dos inocentes. A igreja católica foi a que mais matou; os amarelos defendem o Estado e o capitalismo, que são opressores dos trabalhadores; os comunistas “vendidos” ao Estado não podem defender sua ideologia.Defendem o embate direto na ação sindical, falar das greves insurrecionais como principal instrumento de luta. Os dirigentes sindicais não devem ter liberação. A organização deve ser por local de trabalho e de moradia, não focando a organização de quem não está trabalhando.Defendiam o socialismo democrático sem Estado e sem classes, era o socialismo libertário. Essa é a diferença o socialismo defendido pelos marxistas com o Estado forte.Defendiam as escolas modernas, que se preocupavam com as famílias dos alunos também. Pela a co-educação, a liberdade sexual.

Cristãos: O Santo Papa apresenta uma das mais rica e completa lição de como os irmãos devem viver na carta encíclica “RERUM NOVARUM”. Aos que vivem pregando a luta e a destruição entender que Deus criou o homem para viver em paz. Como podemos admitir irmãos destruindo irmãos. A propriedade é um bem sagrado que Deus agraciou alguns irmãos e os irmãos não devem brigar entre si para tomar pertences dos outros. Pela ordem e pela justiça, todos devem aceitar as diferenças para serem abençoados e agraciados com o reino dos céus. Deus é a fonte inspiradora. O comunismo defende a guerra e a morte. O rico teve a sua luta a sua conquista, se o pobre não conseguiu e isso é natural. Vamos ajudar os pobres. O movimento sindical deve ajudar conseguindo alimento, roupa, sapatos para quem precisa. Apelo pela paz, argumentos contra a luta de classes.

Lições das correntes sindicais:

- Ainda hoje temos essas tendências. Nenhuma tem toda razão.

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- Estudar o passado para pensar o futuro. Conhecer a história e corrigir a prática. O resgate dessa história é importante. Precisamos seguir no tempo e atualizar a história do movimento sindical

- Devemos desconstruir a história. “A gente sabia de outra história”. Existe uma propagação de uma imagem muito negativa em relação ao comunismo.

- “Só sei que sei que nada sei” (Sócrates – jogador). O processo de aprendizagem é muito importante.

- É natural que haja projetos e concepções diferentes no movimento sindical. Veremos nos momentos anteriores muitas outras situações de confrontos de concepções e práticas. A dificuldade é dialogar com os diferentes, ter a capacidade de ver e debater sem que a disputa política subtraia a capacidade das pessoas em escutar e conhecer as divergências, trabalhá-las com respeito. Na prática, será que há suficiente escuta sobre o que dizem as outras concepções que não são as nossas.

- O fato de não querer ouvir pode ser o medo de se convencer do contrário. A resistência é pensar que tudo tem que ser do “meu jeito”. As pessoas só podem ser boas se forem “da minha corrente”.

- A formação deve ser um espaço de escuta e falar sobre as diferentes formas de ver o mundo. A aprendizagem deve ser transposta para o cotidiano sindical.

DIA 22 DE AGOSTO – TERÇA FEIRA

RAÍZES E ITINERÁRIO DAS LUTAS E ORGANIZAÇÕES DO CAMPO“A dor da gente não sai no jornal” - Chico Buarque

Socorro SilvaSegue transcrição do esquema de aula, cujo texto completo compõe o Caderno da II Unidade.

MEMÓRIA E HISTÓRIA Memória Tensão entre lembrança e esquecimento – individual - psicológica Tensão entre intencionalidade do silêncio – coletiva- política

História Olhar do presente sobre o passado História sobre uma memória é representativa da realidade Quando se fala em história – quem fala – interdita para que isso não se torne

um saber

A memória tem aqui uma dupla significação: é entendida como um conjunto de representações do passado que se tornaram dominantes e, também, diz respeito à capacidade dos sujeitos (pessoal e coletivamente) pensarem o passado, reavivando dele situações e experiências silenciadas.

A memória é mediadora entre o presente e o passado e, por isso, possui um potencial crítico-transformador.

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As disputas pelas memórias dos acontecimentos vividos ou negados não é um problema novo na história. Num certo sentido, desde os primórdios da humanidade esse problema está presente. Somente algumas memórias continuaram vivas no tempo, conquistando posições hegemônicas e tornando-se referência para pensar o próprio passado.

Os grupos e classes dominantes foram relegando ao silêncio e ao esquecimento as experiências, a história e a cultura dos grupos populares.

O silenciamento dessas memórias é um pressuposto para a construção da hegemonia dos grupos dominantes e da consolidação do seu domínio.

PAPEL DA MÉMORIA NA FORMAÇÃO

O passado precisa ser pensado enquanto potencialidade subversiva e não como legitimador de determinadas representações que se tornaram dominantes

As experiências anteriores retornam como modelos de práticas na vida contemporânea Restituir o sentido que os sujeitos atribuem as práticas

RAÍZES DE NOSSA ORGANIZAÇÃO

Lutas e rebeliões populares ao longo de toda a colônia, império e inicio da república populares formados por complexa composição étnica, social e ideológica – índios, caboclos, camponeses, escravos, alfaiates, barqueiros, religiosos, seleiros, etc

o Amplos movimentos de massa construindo novas formas de organização social, política e econômica

o Ações específicas e localizadaso Movimentos messiânicos o Todos com a característica de confronto com a opressão, a miséria, a dependência,

a ausência de direitos, a luta pela posse da terra e por melhores condições de vida e de trabalho.

Modelo agrário exportador dependente Modelo agrário exportador comercial dependente

CONTROLE E REPRESSÃO DA ORGANIZAÇÃO

Repressão armada: por ex: uso de aviões na guerra do contestado (1915) e guerra do caldeirão (1926)

Leis e normas:o Lei de Terras – 1850 – casamento do capital com a propriedade da terrao Lei de regulação do trabalho assalariado – 1830 -1837. o Ato adicional de proibição de organização – 1834.o Lei Adolfo Gordo – 1907 – expulsão dos imigrantes o Conselho Nacional do Trabalho – 1921- controle dos sindicatos

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LUTAS PARA CONSTRUÇÃO DO SINDICALISMO

- Colônias anarquistas e escolas internacionalistas – inicio da formação político-sindical – (inicio de 1900)

- Posseiros da Rodovia Rio-Bahia- MG- 1940-1964- associação de posseiros - Trombas e Formoso – GO- 1948-1964- Associação de Lavradores - Formação do Bloco Operário e Camponês – PCB – 1927 - Criação da Associação dos Lavradores Fluminense – 1958 – sindicato de campos - 1938

CONTEXTO DO SINDICALISMO CORPORATIVISTA

- Processo de modernização conservadora –– aceleração da industrialização de base - Paradigma do urbanismo – dicotomia campo – cidade- instituição do conceito de cidade –

1937 - Construção do Estado Moderno, criador de classes sociais modernas (burguesia industrial

e proletariado) - O fortalecimento de uma classe média urbana, insatisfeita com o domínio imposto pelas

oligarquias agrárias. - Reajuste na oligarquia agrária para se manter no poder – diversificação do capital.- Forte processo migratório

Lei de Sindicalização (decreto 19.770, de 19 de março de 1931). Sindicalismo como cooperação entre patrões e empregados para o progresso da sociedade Intervenção direta do Ministério do Trabalho na criação e funcionamento dos sindicatos

Disciplinar o trabalho, considerando-o como mero fator de produção

PROJETO SINDICAL POPULISTA DE VARGAS Leis sociais Constituição corporativista de 1937 Criação da CLT Instalação da justiça do trabalho Criação do imposto sindical LEGISLAÇÃO FEITA PARA OS TRABALHADORES URBANOS

CONSTRUÇÃO DA ESTRUTURA SINDICAL OFICIAL

Ideologia corporativista Repressão e silêncio dos setores mais combativos Medidas legais e político-ideológicas Propaganda doutrinaria Ênfase nos benefícios sociais Práticas de formação sindical

E NO CAMPO?

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Esse tipo de organização não atingiu logo o campo, pois não considerava a especificidade do trabalho no campo,

Além disso, quase não existiam juntas de conciliação e julgamento nas cidades do interior, o código civil não permitia a organização de sindicatos rurais, e os proprietários rurais agiam de forma repressiva, inclusive acionando a polícia para reprimir qualquer tentativa de organização e mobilização dos trabalhadores (as) rurais.

Somente em 1944 - Decreto 7.038 autoriza de forma explicita a sindicalização rural.

ALÉM DISSO NO CAMPO, O MOVIMENTO ERA OUTRO

LIGAS CAMPONESAS – 1955 – delegacias, núcleos (diferentes estratégias de organização)

ULTAB- 1954 MASTER – 1950

E O CONTEXTO?

Modelo nacional desenvolvimentista com ênfase na industrialização Afluxo de capitais estrangeiros Acentuação da separação entre campo e cidade- subordinação da agricultura a

industrialização Modelo nacional desenvolvimentista e mudar a orientação econômica (Jânio e João

Goulart) Educação Popular

CRIAÇÃO DA CONTAG E ESSA HISTÓRIA COMO FOI? COMO A ESTRURA OFICIAL POSSIBILITOU E INFLUENCIOU SEU PROCESSO

DE CRIAÇÃO?

DIA 23 DE AGOSTO – QUARTA FEIRA

Reapropriação temática e metodológica

Metodologia é a linha geral da ação educativa: é participativa; de construção coletiva; de capacitação política, ideológica e pedagógica.

Estratégia metodológica: plano de ações formativas articuladas em torno dos objetivos pré-fixados

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Curso centralizado Cursos descentralizados Atividades

intermodulares Grupos de Estudos

Dirigidos (GED)

FORMAÇAO DE EDUCADORES E EDUCADORAS

(Multiplicadores/as)

Métodos e técnicas (dinâmicas): instrumentos e mecanismos para concretizar a metodologia e estratégia pedagógica definidas.

Principais métodos, técnicas e dinâmicas que estamos utilizando: Integração e animação: canções, festas, correio da amizade, brincadeiras, esporte;

De motivação (Mística): resgate das lutas e da missão (saudade e projeção); símbolos: semente, água, chama, terra; gestos, poesias, canções.

De construção e reconstituição da identidade individual e coletiva: memorial, construção do perfil das pessoas do grupo, pesquisa e banco de dados, depoimentos.

Apropriação temática: Exposição, dinâmicas de grupo (ciranda, cochicho, oficinas, júri simulado); estudos de textos; estudos de mapas; pesquisa, sistematizações.

De avaliação: mandala, questionários diários, roteiros avaliativos, oficinas avaliativas, rádio popular.

De sistematização: reapropriação temática periódica com uso de “mapa de idéias”, relatórios; construção de orientações metodológicas.

Nascimento da classe operária no Brasil:

Associações mutualistas Ligas camponesas Outras associações

Jornais Greves Escolas Congressos Lutas

Leitura equivocada da sociedade

brasileira a partir de uma visão importada

AmarelosCristãos

AnarquistasSocialistasComunistas

Brasil pré-capitalistaTransição democrático-burguesa

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Operário = vanguardaCamponês e burguês nacional

(aliados)

Imposição da estrutura sindical oficial

Classe dominante:

Não reconhecimento dos sindicatos rurais; conceito de cidade; expulsão de estrangeiros

REPRESSÃOIdeologia corporativa

A memória dos trabalhadores rurais foi relegada ao silêncio ou colocadas em segundo plano. Não foi valorizado o perfil dos operários, o potencial do campo e a identidade de classe do/a trabalhador/a rural

Apesar disso os/as trabalhadores/as rurais avançaram muito

Mobilizações de resistência (Ligas Camponesas)

Mobilizações de ocupações de terra (MASTER)

Associações Sindicatos

ULTAB

STTR’s/FETAG’s

CONTAG

Trabalho em grupo: Quais são os fatos mais marcantes da luta dos trabalhadores/as rurais neste período?

Apresentação dos grupos:

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De 1964 a 1984: Período marcado pela repressão intensa aos movimentos sociais e aos sindicatos. Com o

golpe militar em 64, os sindicatos articulados são devassados e a história de luta dos trabalhadores é abafada. Nesse mesmo ano houve uma intervenção na CONTAG com forte repressão aos dirigentes e lideranças sindicais. Muitos resistiram e seguiram enfrentando a ditadura militar. As reuniões eram disfarçadas em torno de fatos familiares e religiosos para continuar a luta.

Zé Rota, interventor da CONTAG, fez um acordo com o Ministério do Trabalho para encaminhar a eleição em 1968. A atividade que marcou o reinício foi uma atividade de formação e planejamento em Petrópolis. Depois disso a CONTAG realizou vários encontros nos estados e nas regiões. Foi um período de muito conflito em todas as regiões. O processo de transferência de pessoas do sul para norte, por exemplo, criou muitos conflitos na luta pela posse da terra.

O governo criou o FUNRURAL com uma função assistencialista. Muitas federações, sindicatos, delegacias sindicais foram criadas nesse período. Em

poucos estados não havia a organização em federações. Foi realizado em 1979 o Terceiro Congresso da CONTAG. Vários ministros estiveram

presentes no Congresso; A greve dos canavieiros em Pernambuco em 79, expandindo para demais estados do nordeste nos anos seguintes.

I CONCLAT em 1981 – Congresso envolvendo diversas categorias para a criação de uma central sindical. Houve um racha e uma parte desse grupo original criou a Central Única dos Trabalhadores em 1983. A CONTAG não se filiou de imediato, mas o fez em 1995.

Era um momento marcado pela luta pela anistia ampla, geral e irrestrita. As mulheres avançam na organização no campo. Em 1983 Margarida Alves foi assassinada na Paraíba.

Outro fato importante foi o movimento pelas Diretas Já.

De 1985 a 1994: Unicidade sindical Programa Nacional de Reforma Agrária Constituição de 1988 Mais garantia: nenhum trabalhador rural poderia ganhar menos de um salário mínimo Luta pela previdência social Ampliação dos direitos sociais, inclusive da mulher. Aposentadoria da mulher e auxílio maternidade Políticas de crédito 89: encontro de mulheres trabalhadoras rurais reuniu 30 mil mulheres Luta de reconhecimento da categoria dos trabalhadores rurais Fora Collor em 1992 IV Congresso dos Trabalhadores Rurais I eleição descentralizada da CONTAG em 1989, quando foi eleita a primeira mulher

suplente de direção. Muitas ocupações de terra. O movimento sindical e outros movimentos trabalharam a

ocupação, sendo criado o PNRA para abafar a luta pela terra.

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Muitos conflitos, lutas das oposições sindicais com destaque para a igreja progressista, MST, e outros

Previdência e aposentadoria das mulheres Discussão e consolidação do PROCERA, hoje o PRONAF. Surgiu a contribuição confederativa. Marcado pela seca, acentuando o êxodo rural de trabalhadores rurais do nordeste Plano real e alguns governos populares municipais e estaduais. Início do processo de privatização Seca de 93 marcada por políticas compensatórias Ocupação da SUDENE 94: I Congresso Nacional, sendo assegurado a presença de mulheres (2 delegadas por

cada estado) Acentuação da violência no campo.

Outras questões Período de articulação da UDR Assembléia constituinte, efervescência dos movimentos populares

De 1995 a 2006: Mundial ALCA Meio ambiente G20 em contraponto ao G8 Fórum Social em contraponto ao Fórum Econômico Mercado justo e solidário Ataques terroristas de 11 de setembro e outros atentados; Guerra contra o terror (EUA, Inglaterra, e Iraque); Prisão de Sadan Hussein Euro (moeda, unificada da Europa) Guerra libra Israel Resistência do Iran quanto a usina nuclear A era Bush, morte do Papa. Fórum social mundial Implantação da ALCA Crise da argentina Eleição de Hugo Chaves Coordenação do Brasil na missão de paz no Haiti

América Latina MERCOSUL – com a pauta da agricultura familiar Criação da COPROFAM Eleição de segmentos progressistas (Brasil, Peru, Bolívia, Chile – primeira mulher). Fórum Social de Caracas II Encontro

BRASIL:

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Avanço do Neoliberalismo e privatizações (período FHC); Crescimento dos partidos de esquerda, culminado na eleição de Lula; Criação do MDA; crédito fundiário; Legislação específica sobre educação do campo; PRNA; Estatuto do Idoso; Criação do PRONAF; descentralização das políticas públicas e controle social; CPI da terra; Acirramento da violência no campo Luta pela erradicação do trabalho infantil e escravo; GTB; Marcha das Margaridas;

filiação da CONTAG à CUT ; criação de setores específicos nas direções dos STTR’s, FETAG’s e CONTAG; Cotas no MSTTR; Eleição do 1° Deputado Federal do MSTTR;

Projeto de integração das bacias hidrográficas; Eleição de Lula; Reforma da Previdência; controle da inflação; Programa Fome Zero +

Transferência de Renda; Plano Nacional de Florestas; Fórum Social Amazônico; Lei da Agricultura Familiar; PROUNI; Acordos e convenções coletivas; PADRSS; Convênio CONTAG/INSS; luta pela previdência rural;

Criação da FETRAF/MPA; Criação da Escola Nacional de Formação da CONTAG. Luta contra a regularização dos transgênicos Inserção organizada da juventude no MSTTR Congresso da terceira idade Plenárias das mulheres Segundo encontro latino americano de trabalhadores rurais

Depoimentos – momento de grande importância no curso. Iremos ouvir testemunhos de vida, da história viva feitos por sujeitos protagonistas da história do MSTTR.

Francisco Urbano: Companheira Hilda, Manoel, a alegria maior é conversar com jovens. Comecei aos 18 e 19 anos. A JAC Juventude Agrária Católica era o que tinha de mais reacionário. Na casa dos meus pais, em Natal, Rio Grande do Norte, tinha um rádio que só pegava uma estação, ligada à Igreja. Eu não concordava com tudo, mas não tinha maturidade para questionar. Trabalhava e naquele tempo, aos sábados pela tarde os filhos eram liberados de trabalhar. Eu estava jogando bola e Dom Expedito passou e me chamou para fazer um curso de formação sindical. Ele me chamou porque eu era questionador e pegava no meu pé. Falei pra minha mãe e pedi pra ela não contar para meu pai. Ela arrumou minha mala com uma rede e roupa. A rede ainda estava molhada, eu cheguei e estendi a rede para poder secar para dormir.Tinha que fazer um trabalho para estimular os trabalhadores a se sindicalizarem. A partir daí, em 63 passei a ser suplente do STR. Em 1965, quando prenderam o presidente da Federação, tinha uma reunião do sindicato. Tinha um grupo de 25 pessoas e a gente só andava junto, porque os fazendeiros eram muito violentos. Em 1965 fui eleito Presidente do STR em São Paulo de Potengi. Em novembro de 1966 fui eleito vice-presidente da FETAG do Rio Grande do Norte. Em 20 de janeiro de 1967 fui para Natal. Afastei-me da religião. A minha base para o sindicalismo eu fui buscar no velho Partidão, onde fiz minha formação política e mantenho até hoje minha visão marxista, acredito na formação marxista como forma de vida de uma sociedade.Em 67 cheguei federação em janeiro e em março dei minha primeira entrevista.

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Continuei a luta organizando o sindicato. Em 1963, antes do golpe, houve em Natal a primeira convenção nacional dos trabalhadores rurais. O presidente da Federação conseguiu liberar os trens para que todos os camponeses pudessem fazer seus percursos.Tínhamos na época uma posição contrária ao da CONTAG. É fundamental que a gente tenha clareza de quem apoiava a luta camponesa: os comunistas, a ala esquerda de Igreja (AP), a ala direita tentava organizar o sindicato contra os comunistas. No RN tinha 3 federações funcionando no mesmo lugar: dos trabalhadores rurais, dos lavradores e dos pequenos produtores.A Igreja conservadora para combater os comunistas ajudou a fundar a CONTAG em Recife no final de 63. Mas nem todos concordavam com isso.Em 62 o Deputado Fernando Ferraro do Rio Grande do Sul aprovou no Congresso Nacional o Estatuto do Trabalhador Rural. Nesse estatuto é que foi criada a Previdência Rural. Mas não foi implantado porque os usineiros e outros agricultores não queriam contribuir. Somente em 71, o governo militar implementou a partir do que já havia sido acumulado. Não havia aposentadoria, mas sim um auxílio velhice no valor de meio salário mínimo. É bom deixar isso claro, a aposentadoria rural não foi criada nem pela ditadura, nem pela Constituição de 88.Nos anos 50, havia uma grande efervescência no país com a eleição de Juscelino Kubistchek, um líder conservador, que não seguia a cartilha de ninguém. Houve até uma tentativa de evitar que ele tomasse posse. Depois veio a eleição de Jânio Quadros. Naquela época a gente votava no vice também. O João Goulart estava na chapa do opositor ao Jânio, o Lott.Seca de 58, mobilização da igreja para cobrar ações mais efetivas do governo para a questão da seca. Daí criou-se a SUDENE. O Jânio renunciou e Jango assumiu com o compromisso de fazer 4 reformas: agrária, educação, saúde e do Estado. De todas as reformas, a agrária era a fundamental. O golpe de 64 foi para barrar a possibilidade de barrar a reforma agrária. Os latifundiários se juntaram com a UDN (urbanos e capitalistas) para derrubar o João Goulart.Quando assumimos a Federação, criamos um grupo para recuperar os sindicatos e os sindicalizados fragilizados a partir das brutais intervenções militares. Em 1965 o José Rota, articulado com o Ministério do Trabalho fez uma eleição.Fizemos um documento que foi distribuído aos companheiros de confiança. Nesse momento a CONTEC (Confederação dos bancários) era nossa grande aliada. CONTAG, CONTEC e segmentos da indústria se organizaram para realizar o primeiro congresso de trabalhadores. Nesse congresso cada delegado tinha direito a falar somente um minuto. Como dar oportunidade do José Francisco falar? Então eles combinaram e quando ele se inscrevesse, 30 rurais e mais 15 urbanos se inscreveram em seguida. O regimento permitia que as pessoas passassem a palavra para outra pessoa. Assim José Francisco falou 45 minutos. Depois veio a retomada da CONTAG.

Hilda: Esse momento é de aprendizado, vou passar um pouco da minha vivência, falar como eu vim para o movimento. Quando a gente vai para algum movimento pensa mais nos outros. É importante socializar a nossa experiência. Associei-me ao STR Surubim em PE em 1973 por convite de minha mãe. Eu era separada e tinha 4 filhos, me associei pensando no assistencialismo e não pela importância da mulher participar do sindicato. Fiquei um tempo como sócia. Depois foi que eu comecei a participar das reuniões a convite da minha mãe. Logo fui eleita delegada sindical e nos anos 80 passei a compor a diretoria do STR. Eu morava na casa da minha mãe e minhas irmãs questionavam muito porque só vivia viajando e elas tinham que cuidar de meus filhos. Meus filhos diziam que quando crescessem iriam dar dinheiro para que eu pudesse viajar.

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Gostaria de dar parabéns para tantos jovens e mulheres que hoje estão aqui. Quando eu comecei tinha pouca mulher. Minha mãe participava do sindicato, mas nunca foi para nenhuma atividade fora do sindicato. As mulheres ficam sempre no sindicato. Nos anos 80 a comissão nacional das mulheres trabalhadoras rurais surgiu a partir de 2 estados, questionando a exclusão das mulheres das frentes produtivas da seca e do próprio sindicato (sertão de Pernambuco) e discutindo a previdência (Rio Grande do Sul).No Quarto Congresso da CONTAG eu estava aqui em Brasília e fui ver. Tinham poucas mulheres, mas elas estavam fazendo depoimentos sobre a resistência e a participação na luta. Em relação à Comissão Provisória, discutíamos a importância das mulheres participarem dos eventos políticos. A gente fazia uma discussão e ia para o embate no Conselho da CONTAG para sensibilizar os companheiros. Nesse congresso a Gedalva de Sergipe foi eleita para a suplência da direção. Ela relatava a dificuldade que enfrentava na direção. Queria atuar como uma diretora, mas encontrava muitas dificuldades. Chegou a participar e viajar para alguns estados e nem sempre era reconhecida como diretora. Apesar disso, considerávamos um avanço e passamos a discutir essa condição.No quinto congresso, 4 companheiras foram eleitas como suplentes. Puxamos uma manifestação, fizemos uma reunião específica e decidimos quem iria para a direção. Nesse mandato conseguimos garantir que as diretoras realizassem as reuniões da Comissão e a participação nas reuniões do Conselho da CONTAG. As reuniões da Comissão eram marcadas antes das reuniões do Conselho.No Sexto Congresso, já havíamos discutido que a gente queria deixar de ser suplente e indicar mulheres para a executiva. Participamos da comissão coordenadora do congresso, mas não conseguimos manter um nome na executiva, mas conseguimos eleger uma coordenadora com status de diretora na CONTAG. O nome não foi escolhido no Congresso. Saímos do congresso considerando que tivemos uma vitória e a comissão escolheu o nome posteriormente. Duas mulheres concorreram, eu e a Santiago do Norte. Duas mulheres por estado participaram dessa reunião. Fui eleita a coordenadora e assim as coisas melhoraram porque antes a comissão era coordenada por um homem.Não podemos esquecer da importância das mulheres (trabalhadoras e assessoras) nessa caminhada. A gente tinha muita dificuldade, já ficou sem assessoria. Foi muito difícil para mim porque eu não passei por esse processo que vocês estão passando hoje. Qualquer um de vocês que venha para a direção nacional tem mais facilidade do que eu tive naquela época. Meu cargo no sindicato foi de Secretária (cargo geralmente atribuído às mulheres).A gente tinha uma relação muito forte (coordenadora e comissão). Fui buscar ajuda em outros lugares fora da CONTAG. Eu percebia que os homens queriam ajudar, mas eu tinha medo de me aproximar, porque havia muita rejeição para a participação da mulher. Muitos conselheiros questionavam onde as mulheres tinham capacidade de participar de uma direção nacional e eu perguntava onde a capacidade dos homens havia sido medida.A gente articulava os estados e tinha muita Federação que não liberava recursos para as mulheres participarem das reuniões da Comissão. As mulheres viajavam de ônibus e os homens de avião. Além disso, as mulheres acumulavam tarefas e davam conta. Os encontros regionais realizados nesse período discutiram gênero. Havia disposição para participar das reuniões, mas era visível a ausência de mulheres nas direções das instâncias.

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Até o Sétimo Congresso a gente travou uma luta sobre a cota de 30% enquanto estratégia afirmativa para ampliar a participação das mulheres nas direções. Alguns companheiros apoiaram a proposta, mas a maioria foi contra. Quando a gente assumiu a comissão, houve uma proposta de que a comissão não deveria mais se reunir. Defendemos que seria necessário manter esse espaço. A discussão da cota trouxe resultados muito bons. A assessoria da CONTAG contribuiu muito para essa deliberação. Era tudo muito difícil e a gente nem podia chorar. No Congresso conseguimos trazer 42% de mulheres e colocar 30 % na direção.A gente percebe o quadro de mulheres nas direções crescendo. Precisamos avançar mais ainda, inclusive que essas mulheres participem da política partidária. A classe tem dois sexos.Foi aqui que eu aprendi a me libertar, eu aprendi muitos direitos. Continuo associada ao STTR, não tenho nenhum cargo, mas estou em um movimento autônomo que tem mulheres do sindicato e outras que não são.

ESSE DEPOIMENTO MOSTRA QUE NENHUM DIREITO É CONQUISTADO SEM MUITA LUTA, NEM QUE SEJA DENTRO DA SUA PRÓPRIA CASA.

Manoel Santos: Sou bisneto de escravo, neto e filho de sem terra e fui sem terra até 34 anos. Não sou assentado, eu consegui comprar um pedaço de terra que foi aminha libertação. Estudei até a quarta série. Associei-me quando o sindicato foi criado, minha carteira é 340 e o sindicato tem mais de 12 mil.Do mesmo modo que a Hilda, associei-me para tirar o dente e fazer consulta, mas o sindicato não tinha isso. Então eu deixei de pagar. Em 73 comecei a participar da ACR (AP). Eu fui levado pela minha mãe, que era uma mulher muito ativa. Ela brigou muito com meu pai e comigo para eu ir para o sindicato. Fui para a reunião e fiquei o tempo todo calado e o padre veio falar comigo. Depois comecei a participar e aí eu percebi que precisava voltar para o sindicato. Nunca pensei que eu fosse ser um diretor do sindicato. Resisti muito e me tornei primeiro suplente em 78. Antes já tinha sido delegado de base. Um diretor muito combativo foi assassinado e eu assumi a tesouraria.A CONTAG tem uma influencia forte de muitas lutas como as Ligas Camponesas, Trombas e Formoso, Contestato e outras que deram origem à ULTAB e depois a CONTAG, onde 29 federações de 18 estados participavam. Dessas 29, 27 federações já eram reconhecidas. Com o governo militar das 29 federações, apenas 11 continuaram reconhecidas. Na eleição de 68 para retirar o José Rotta apenas 11 pessoas votaram, um por federação reconhecida oficialmente.A ditadura militar proibia qualquer reunião de sindicato para organização. A CONTAG e as federações só podiam se reunir com a presença do Ministério do Trabalho. A força de resistência queimava por debaixo dos panos. A eleição de José Francisco em 68 foi de 6 votos contra 5, mas foi muito importante para nós. Passou a ter uma atuação mais incisiva nas denúncias contra fazendeiros e começou a fazer uma discussão interna para reorganizar os sindicatos e as federações. Naquela época a gente não fazia curso de 12 dias, fazia curso de 30 dias.O trabalho era clandestino pela CONTAG, mas a AP, a ACR continuava fazendo seu trabalho. Atuávamos na resistência na terra (não fazíamos lutas de ocupação de terras, o MASTER havia sido eliminado) e na fundação de sindicatos a partir de metas estabelecidas. A outra frente de luta era com os assalariados, principais vítimas do capital e da repressão.

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Em 1978 quando o ABC paulista estava em greve, o campo também estava em greve (Pernambuco, depois outros estados do Nordeste e São Paulo). Entramos da luta pela democratização e depois pelas Diretas Já. Lula e José Francisco, principais lideranças da cidade e do campo, voltaram a se encontrar para fundar a CUT. Lutávamos também pela retomada dos sindicatos amarelos que estavam sob intervenção militar.Uma vez eu fui com José Francisco para Goiana para a assembléia. A Federação já havia enviado os panfletos para o STR chamando a assembléia. O Presidente veio armado e disse que havia entregado metade dos panfletos para o delegado e outra metade para os usineiros. Fomos para a feira e rapidamente passamos a juntar gente e fizemos a assembléia ali mesmo. A gente não tinha carro, ia de bicicleta, no carro da feira, a pé.Hoje estamos fazendo o que a CONTAG já fazia antes. Temos uma relação direta com as federações, com secretarias das políticas que atuamos. Nós discutimos amplamente modelo de sociedade, políticas públicas, a inserção das mulheres nos programas e na organização. Uma das lutas importantes no nordeste a partir de 79 a 83 foi entrar na discussão para enfrentar prefeitos para criar programas de atendimento ao povo que estava passando fome por causa da seca. Em 1993 o ponto mais forte foi a ocupação da SUDENE em Recife. Prendemos o Superintendente e forçamos a realização de uma reunião com o Presidente da República. Conseguimos abrir um programa que investiu 600 milhões de reais no NE. Avançamos na construção do nosso projeto sobre PDLS para uma atuação mais autônoma nos municípios. Em 94 iniciamos o Grito da Terra, com uma série de negociações onde conseguimos ampliar políticas para o campo.Mais recentemente demos outros passos. A necessidade de permear a luta sindical com a luta partidária. Somos bons para fazer a luta sindical, mas quem delibera sobre as políticas públicas são os políticos. Em todos os estados os/as trabalhadores/as rurais somos fortes, temos peso, mas a representação é quase nenhuma. Dos 513 deputados, apenas 6 são próximos da CONTAG e do MST e abancada ruralista tem mais de 100. Estamos orientando a nossa base a votar em Lula e estamos discutindo o programa de governo. Em 2002, não sei quantos candidatos tínhamos, mas elegemos 3 estaduais e 1 federal. Já com essa orientação, lançamos em 2.004, 2.450 candidatos a vereador, prefeito e vice-prefeito. Desses, elegemos 450. Precisamos acompanhar esses/as companheiros/as. Dessa vez, temos 30 candidatos. É um processo em construção. Nesse momento de retomada da formação, precisamos ter isso muito claro para avançarmos e fortalecermos o MSTTR, dando continuidade ao que foi feito no passado.

Segunda rodada:

Manoel: a luta dos trabalhadores não se dá só aqui. A partir do Sexto Congresso começamos a investir nas relações internacionais. A COPROFAM (Coordenação Trabalhadores/as rurais da Agricultura Familiar – América Latina) é coordenada pela CONTAG. A inserção dos/as trabalhadores/as se dá a partir de um compromisso com nossos interesses.Quando não discutimos entre nós e votamos sem orientação, somos utilizados pelos partidos como massa de manobra. A orientação vem dos partidos. Temos que ter clareza sobre a política partidária. A CONTAG é uma das organizações com maior heterogeneidade e diversidade política. Os 2.450 candidatos lançados em 2004 são dos mais variados partidos. Sou do Partido dos Trabalhadores e compreendo e defendo que a CONTAG não venha a ser instrumento

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partidário. Tem um leque de partidos que pensam assim. Os candidatos que mais se aproximam são do PT, PC do B e PSB, mas temos candidaturas de outros partidos.As mulheres na luta trouxeram uma oportunidade de melhorar o sentimento e compreensão sobre o movimento. No começo era difícil porque a maioria dos dirigentes atuava no foco da ditadura militar, sob a ótica dos interventores. Avançamos muito porque passamos a trabalhar a participação das mulheres com propostas, com ações. Mudamos a nossa forma de organizar. Nenhuma organização sindical avançou tanto quanto a CONTAG.Sobre a angústia FETRAF X CONTAG: já vivi muito isso, agora estou mais tranqüilo. Quando filiamos à CUT, trouxemos os companheiros/as que agora fundaram a FETRAF. Disputamos no Sexto Congresso e depois trabalhamos uma composição. Depois de 3 meses o grupo criou a FETRAF. Talvez a gente se junte lá na frente, mas agora está cada um para cada lado.

Hilda: Sobre o assistencialismo, temos que acabar definitivamente com essa prática. Eu ajudei a acabar com o assistencialismo no meu sindicato.As propostas construídas pelas mulheres tinham a ver com o fortalecimento da organização das mulheres e se conversou com os companheiros para aprovar no Conselho. A proposta das cotas também foi no cochicho para buscar apoio dos companheiros e aprovar.No Sexto Congresso sofremos muito. A gente dormia com uma companheira na executiva e acordava sem o cargo. Tinha várias reuniões e negociações. Além da disputa de gênero, tinha as disputas das tendências. A companheira escolhida para ir para a executiva negociou com outro companheiro da tendência dela e ficamos sem o cargo. Nós mulheres somos sensíveis mesmo, choramos de alegria e de tristeza.

Francisco Urbano: Na época da ditadura militar tinha um programa do governo que fornecia bolsas para filhos de trabalhadores rurais sindicalizados estudarem. O ruim era a época porque parecia ser uma forma de controle, mas no Rio Grande do Norte foi uma ação interessante.A principal forma de controle era a ausência da liberdade sindical. O governo militar não precisou criar nenhuma lei especial para acabar com os sindicatos. A CLT já tinha brecha. O que ele fez foi editar o AI 5 para caçar lideranças.Sobre a participação da mulher na luta sindical, em alguns embates no campo contra a repressão, as mulheres eram colocadas na frente dos militares e policiais militares como uma estratégia. Mas elas já estavam participando. Quando os homens estavam à frente das lutas, a mulher estava em casa sustentando a luta. O grande momento de afirmação da mulher na luta foi após a queda da ditadura.

DIA 24 DE AGOSTO 2006 – QUINTA FEIRA

TEMA:As Centrais Sindicais e a luta da classe trabalhadora

SUB-TEMASCentrais Sindicais no Brasil.Origens Históricas da CUT.O MSTTR na CUT.

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OBJETIVOS:Compreender os significados e importância das Centrais na luta da classe trabalhadora.Identificar os princípios que motivaram a criação da CUT

Exposição de Vagner – Presidente da CNB e membro da Direção Nacional da CUTVagner iniciou sua exposição resgatando sua identidade sindical e de militante. Enfatizando ainda mais, sua identidade enquanto “pessoa”. Sua família (esposa, filhos, pai, mãe e amigos) foi a porta de entrada para abordar a necessidade de reconhecer e respeitar as opiniões, inclusive, as opiniões divergentes. Colocou-se como um “socialista por formação da vida”. Como entender o sistema capitalista sem se indignar com a lógica que o “mercado deve regular a vida das pessoas”.Ainda adolescente, acompanhou amigos mais velhos que eram metalúrgicos e participaram da retomada das greves em finais de 1970. Diferiu a formação do PT e da CUT, como algo parecido com o que ocorre com o PSOL. O PT e a CUT nascem a partir dos trabalhadores de base, não por uma classe media e intelectuais.O aprendizado sindical dos trabalhadores brasileiros já vem sendo experimentado desde o inicio do século passado. Mas, após a abertura política, as estratégias deixaram de ser meramente reivindicativas, para incorporar outras dimensões como a proposição, pressão e negociação, sem perder suas características reivindicativas. Antes disso, a classe trabalhadora já vinha experimentando experiências de organizações supra-categoria, a exemplo da CGTB, PUA, BOC, MUT. Contudo, a experiência da CUT representa a concretização da mais duradoura experiência de central brasileira.Quando a classe trabalhadora vinha construindo uma proposta de central no fim da década de 1970 e nos primeiros anos da década de 80, houve divergências político-ideológicas entre os grupos políticos organizados e a CUT nasce em 1983 e no mesmo ano nasce a CGT.A Força Sindical já nasce posteriormente a partir da ação da FIESP e do governo (FHC), em que pese, existirem militantes coerentes e combativos na base da Força. Poderia argumentar que este nascimento teve nossa participação direta. Nas eleições do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo (principal base da Força), Medeiros (atualmente deputado federal) era o candidato deles e nós (CUT) lançamos 3 chapas, consequentemente, perdemos largamente as eleições.As tendências que atuam na CUT, surgiram principalmente com a abertura política, onde muitos agrupamentos políticos foram para a vida sindical com “cara própria” e a CUT foi o espaço de atuação enquanto forças vivas da sociedade.Em principio a CUT era quase exclusivamente composta por forças petistas. Com a entrada dos companheiros da CSC (Corrente Sindical Classista) a CUT ganhou e muito, combatividade e representatividade. Algumas forças deixaram de existir individualmente e passaram a compor com outras forças e formarem blocos mais plurais (ou menos monolíticos). Outras saíram do PT e, posteriormente da CUT, a exemplo da Convergência Socialista que saiu do PT e criou o PSTU e recentemente saíram da CUT e criaram o COMLUTAS. A CUT nasceu afirmando alguns princípios: pluralidade democrática; liberdade e autonomia; contrato coletivo nacionalmente articulado; sindicalismo de base, com a cara da base e com propostas para a base; organização por local de trabalho enquanto alternativa de organização da classe trabalhadora; unidade da classe trabalhadora. Estes princípios serão enraizados na

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sociedade, quando a CUT for reconhecida como entidade sindical, daí a importância da Reforma Sindical. Atualmente existem varias centrais descompromissadas e atreladas a partidos e segmentos conservadores (USI, SDS, FORÇA SINDICAL, NOVA CENTRAL, CGT, dentre outras menos expressivas).

Manoel José dos SantosResgatou as iniciativas de organização supra-categoria experimentadas pela classe trabalhadora (desde a CGT – Comando Geral dos Trabalhadores).A formação e fundação da CONTAG foi uma experimentação da pluralidade e respeito as opiniões e posições políticas.Com relação ao processo de construção da proposta da CUT durante a ditadura militar, evidenciou a participação da CONTAG nestes debates, inclusive na coordenação dos principais organizações e fóruns em inicio da década de 80, como as oposições sindicais e a articulação com os movimentos populares. Foram muitas as divergências, dentre elas, as propostas de uma “CUT sindical ou uma CUT movimento”, sendo aprovado que a CUT deveria trabalhar nas duas frentes. Esta medida (artigo 8º do regimento do CONCLAT) garantia com os mesmos direitos e peso político as oposições reconhecidas, mesmo que o Sindicato daquela base estivesse na construção do CONCLAT.A CONTAG, discordando desse encaminhamento, saiu e passou a construir uma alternativa que foi a CGT. Mais a CONTAG não permanece por muito tempo e retira-se da CGT (da direção e da área de influência). Nesse sentido, a CONTAG desestimulou as Federações e Sindicatos que se aproximavam das idéias e propostas da CUT. Este comportamento estimulou uma maior animosidade entre cutistas e não cutistas. A CUT pasou a construir uma alternativa de organização, os Departamentos Rurais Estaduais e Nacional, entendendo que a CONTAG não teria mais jeito e não dava mais pra continuar a co-existir na área de influencia da CUT.Militantes de vários estados, discordando deste encaminhamento, passaram a problematizar e estimular que a estratégia fosse rediscutida e aprovaram em evento na Bahia e referendada em Goiás, a estratégia de trabalhar “por dentro”. Os militantes cutistas passam então a estimular a filiação de Federações e Sindicatos por todo o país.No segundo momento, a proposta de proporcionalidade (conforme é utilizada pela CUT) para a CONTAG, passou a ser referência de democratização e de convivência ética entre as forças em disputa nas entidades sindicais, mas não foi aprovada. Esta proposição já foi experimentada por algumas Federações sem muito êxito, pois criava dificuldades para a unidade da classe trabalhadora.Com a filiação da CONTAG á CUT, ficou acertado politicamente que na medida que as Federações venham a se filiar ä CUT, os Departamentos Rurais nos estados deixariam de existir. Alguns companheiros cutistas passaram a compor a direção da CONTAG.No congresso seguinte, por personalismo, não foi possível a unidade para a eleição da direção da CONTAG, sendo apresentado duas chapas, uma encabeçada por Airton e outra por Manoel Santos, ambos de uma mesma corrente política na CUT.No congresso seguinte as forças cutistas tentam se recompor, mais uma vez isto e impossível. Saem duas chapas, uma encabeçada por Manoel Santos e outra por Edson Pimenta.

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DEPOIMENTOSAMORIM (FETRAECE) - Enfatizou a pouca clareza sobre grandes questões por parte de muitas das lideranças. Como também, que nem toda proposições elaboradas pelas direções tem ressonância nas bases. Em 27 de novembro de 1987, em Goiânia, foi deliberada a extinção dos Departamentos Rurais. O Departamento na CUT no Ceará foi criado num Ano Novo, militantes abnegados, garantiram o quorum e a fundação. Com o ingresso de cutistas na direção da FETRAECE e sua filiação à central, ficou o impasse: como ficariam os projetos negociados pelo Departamento? Estes e outros acertos precisaram ser construídos de imediato.Uma sugestão para os formadores da ENFOC, é identificar e difundir a concepção e modo de vida que é a “Agricultura Familiar”.Na atualidade, dirigentes sindicais vêm se tornando algo para além do sindical. Ganhando notoriedade nos municípios, contraditoriamente, os sindicatos não vêm possibilitando maior interação com a base. As assembléias dos sindicatos servem para os dirigentes apresentarem suas propostas, contudo, é impossível a base se pronunciar sobre aquela (ou propor outra) no mesmo momento em que toma contato com ela. Daí a necessidade de formarmos nossas lideranças com essa preocupação, como dar conta das demandas e desafios que na atualidade nos atormenta, a exemplo da violência.Aquele “aperto” que passei estando num espaço sem entender ao certo o que acontecia ainda está presente na vida de muita gente que desconhece as grandes questões da atualidade e quais as alternativas para superá-las.

AVELINO GANZER (PA) – Ex Vice Presidente da CONTAGApresentou suas saudações à CONTAG pela iniciativa da ENFOC. No momento em que grande parte das pessoas tem duvidas sobre onde chegar, por que lutar e como deve ser a sociedade, a ENFOC traz estas preocupações para a roda de debates.A historia recente de organização da classe trabalhadora, sobretudo, nas décadas de 70 e 80, precisa ser entendida á luz da economia, cultura e conjuntura da época, este é o desafio que temos pela frente.Depoimento: Ainda novo, de uma família de 11 irmãos sai do sul do país para a região transamazônica, sou migrante. Morávamos em casa de `taperi` (coberta de palha), vi muita gente morrer de malária e ser enterrado na beira da estrada. E neste tempo que me conheci como gente, em plena ditadura militar.Quanto a guerrilha do Araguaia, por exemplo, desconhecíamos aquela realidade. O INCRA dizia que marginais, ladrões de banco perigosos estavam brigando com o Exercito no Araguaia, e quem visse algum deles podiam matar que o Exercito iria recompensar. Quando chegaram alguns padres americanos, com a Teologia da Libertação, passaram a explicar sobre o que era sindicato, associação e como a solidariedade poderia ser alternativa para uma vida melhor.No meio de rezas e cânticos, ensinavam a gente sobre “direitos”, coisa que desconhecíamos. Funcionários do INCRA ao saberem das reuniões vinham e acabavam com elas.A família era sempre a nossa referência para entender as organizações, com princípios, coordenação sem imposição, com solidariedade e com ajuda mútua.

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Um dos desafios era ter uma turma com um grande desnível, alguns desconheciam o tema, outros já ouviram falar e alguns poucos, militantes que migraram para a região.Surgia o debate sobre o “novo sindicalismo”, comprometido e atento as pessoas, suas demandas, perfil, diversidade e perspectivas. As divergências maiores não demoraram a surgir e ganhar espaço na agenda política. Dentre elas, era por um sindicalismo de massa ou de direção; se teríamos um movimento exclusivamente sindical, ou ampliado para outras organizações; autônomos ou não diante dos partidos (mesmo que de esquerda).Quando estive numa reunião das oposições sindicais em Itapecerica da Serra, levado por uns padres, foi emocionante para mim. Vi companheiros que estiveram escondidos por todo o tempo em função da ditadura, se abraçando e chorando pelo reencontro.Mais um outro momento muito emocionante para mim, foi quando ganhamos as eleições sindicais em Santarém, do STR. O Lula esteve na posse, vista como uma grande vitória por toda a esquerda.Quando cheguei ao CONCLAT fiquei maravilhado com aquela quantidade de delegados e o nível de debates que se estabelecia. As reuniões entraram pela noite afora e na escolha dos relatores, deu-se o maior debate. Imaginem ser relator numa época em que tudo era datilografado, se o relator quisesse poderia omitir o que ele quisesse, ou evidenciar o que ele quisesse.O artigo 8º do regimento do CONCLAT foi o grande debate, seriam delegados os escolhidos nos sindicatos e na oposição, ou apenas nos sindicatos?A CUT seria uma entidade sindical representativa das Confederações, ou seria uma organização de trabalhadores representados ou não pelas Confederações Sindicais?Estes embates se davam muito em função da discussão sobre a Liberdade e Autonomia Sindical (convenção 87 da OIT), alguns companheiros (mais precisamente do PC do B) defendiam enfaticamente a Unicidade Sindical. Ainda hoje, este debate ainda permeia a discussão sobre Reforma Sindical.O medo de ser engolido pelos vícios e concepções do sindicalismo atrelado, corrompesse o chamado “novo sindicalismo”.Outra reflexão após a criação da CUT, era qual o tratamento a ser dado a organização por categoria. Os urbanos passaram a construir estruturas verticais e no campo, a proximidade com a CONTAG e sua historia, dividia as opiniões, mesmo no campo majoritário. Seria optar entre ter departamentos (como ao final foi aprovado) ou em federações nos moldes da estrutura sindical oficial.Posteriormente, o debate maior passou a ser a condição dos agricultores familiares a partir das categorias de analise marxista. Existiam dois segmentos na representação da CONTAG, os assalariados e os agricultores familiares, seriam compatíveis estarem numa mesma entidade? Reflexões como estas nortearam o debate e a agenda sindical.Nunca tive a pretensão de estar na direção da CUT e da CONTAG, nunca foi meu projeto de vida (que era retornar para a roça e tocar a produção), mas, ainda assim, precisei aceitar o desafio de estar na direção destas entidades.

Questões levantadas pela plenária após os cochichos- Como a CUT vê a FETRAF nos estados, nas bases de Federações filiadas a CUT?- Como vocês vêem a questão das tendências no interior da CUT, atrapalham ou ajudam?- Qual a proposta da central para a área rural e, em especial a juventude?

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- Como a CUT pode retomar seus princípios iniciais, já que vem se distanciando nos últimos anos?

- Quanto a proporcionalidade, ainda nova para muitas entidades sindicais rurais, na CUT (principalmente nos estados) esta proposta vem acumulando reclamações e engessando a luta em muitos casos. O que vocês acham disto?

- Houve muitos rachas surgindo muitas tendências, isto é bom ou ruim?- O que diferencia e aproxima os sindicatos filiados a CUT dos sindicatos não filiados?

ARGUMENTOS

A CUT não tem poder de implantar descontentamento por todo o país, mais também, não pode se negar a ouvir os trabalhadores organizados e que buscam a central.

Quanto aos aposentados, devem estar na sua categoria de origem. Não é possível termos duas organizações de uma mesma base filiadas a CUT (FETRAF e

CONTAG). Mas a direção da CUT não pode se opor a organização diferenciada, já que a CNB surge na base da CONTEC.

Sindicatos não podem se transformar em comitê, mesmo que do Lula, se isto esta acontecendo é um erro.

Acho que a CUT não perdeu rumo, continuamos acreditando nos princípios e proposições originais. A divergência é salutar, a disputa sem limites não, ela atrapalha e inibe a convivência entre os diferentes. Tendências é a materialização de formas diferenciadas para fazer uma mesma coisa. Na maioria das vezes, não partindo de visões programáticas, mais sim, de interesses pessoais de uma ou mais pessoas. Precisamos desnudar o que existe de verdade ou não, sobre as diferenças entre as tendências. A formação sindical deve ter um papel fundamental nesse sentido.

A relação ou atrelamento da CUT com o Estado, é uma mentira. Mas, se falarmos da relação entre CUT e governo Lula provoca muita confusão de papéis.

A CUT não pode ser compreendida como algo eterno, enquanto experimento, ela tem que se adequar permanentemente para dar conta dos desafios atuais da classe trabalhadora e os que estão por vir. Uma das grandes conquistas desde a fundação, destaca-se a constituição de entidades combativas e comprometidas com os princípios e programa da central.

As conquistas que temos hoje, como o PRONAF e outras, surgem das reflexões do departamento da CUT e da CONTAG, não apenas legado de uma ou de outra.

Outro passo a partir da CUT para qualificar ainda mais a ação sindical, é vermos a presença das companheiras trabalhadoras rurais e da juventude, o que não iria ser possível na década de 80.

A inserção da CUT e da CONTAG nos espaços internacionais, resultam desta integração. Atualmente, a CONTAG tem uma relação com organizações internacionais, sejam sindicais ou de representação da agricultura familiar, ou ainda, de ONGs.

REFLEXAO SOBRE PERSPECTIVAS PARA O MOVIMENTO SINDICAL BRASILEIRO

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Vagner/CUT: A CUT faz uma avaliação critica sobre a taxa de juros durante esta gestão, esperamos que o governo mude estas regras nesta próxima gestão.Os movimentos sociais precisam fazer uma distinção de como era o país e as relações entre o governo e a sociedade civil. Mudou para melhor e isto precisa ser evidenciado cotidianamente. O Lula ainda não esta eleito, a campanha ira ser agressiva a medida que se aproxima as eleições. Precisamos ter cuidado com o “já ganhou”. Precisamos ficar vigilantes e propositivos quanto a democratização do Estado, só assim, teremos a sustentabilidade das nossas conquistas. A hegemonia na sociedade das propostas progressistas requer percebermos que a burguesia não é igual, tanto quanto os trabalhadores não são monolíticos.O fortalecimento da organização da CUT é uma das urgentes demandas que temos pela frente. A CUT não tem duvidas que a CONTAG é preferencialmente a nossa organização no campo. Desde a sua fundação que os trabalhadores rurais estiveram juntos e, à frente da construção, fortalecimento e consolidação da CUT no inicio da década de 80.

Manoel / CONTAG: As eleições deste ano são fundamentais para a continuidade de uma gestão democrática popular. Mas, precisamos também, perceber que nestes quatro anos precisamos construir alternativas de sucessão sem comprometer a governabilidade do próximo governo. Eleger Lula no primeiro turno deve ser a nossa prioridade. Sem o “já ganhou”, mais também sem o derrotismo que eles (setores conservadores) tentarão disseminar em nosso meio.Ao PSDB e PFL, caberá ser oposição mais ferrenha e mais complicada que foi nesta gestão que termina. Eles têm a certeza que em 2010 eles retomam o poder no país.As reivindicações do MSTTR ainda estão para ser atendidas na integra, teremos muito trabalho pela frente, inclusive, contra a política econômica que hoje engessa algumas das políticas sociais. Precisamos estar atentos a estas questões, nesse sentido, precisamos planejar como deve se organizar e fazer sindicalismo as nossas entidades sindicais. Por exemplo, planejar para 10 anos considerando os desafios postos para 2010 no plano político e no plano econômico.

ATIVIDADES INTER-MÓDULOS E GRUPOS DE ESTUDO DIRIGIDO

Atividade 1:

Interagir com demais companheiros e companheiras das Federações em seus estados para socializar os processos educativos vivenciados nesse primeiro módulo centralizado, como porta de entrada para uma reflexão sobre a estratégia formativa que ora desenvolvemos.

Orientamos a utilização, como subsídio para esse debate, do Projeto Político Pedagógico e deste documento sobre as atividades inter-módulo e Grupos de Estudos Dirigidos.

É necessário que se registre as reflexões críticas, reações sugestões que o diálogo sobre a estratégia formativa da Escola possa gerar.

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Atividade 2: Reunir subsídios estaduais, regionais e nacionais que nos permitam analisar o momento conjuntural do país, considerando os aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais. Para que esse debate seja rico, orientamos o seguinte levantamento:

Elementos presentes nos processos políticos eleitorais: como a questão do desenvolvimento apareceu nos programas de governo, em especial das forças vitoriosas; fotos; fatos; relação com os movimentos sociais; entre outros aspectos;

Atores relevantes nesse processo que se desenha;

A inserção dos Movimentos Sociais e em especial do MSTTR nesse contexto.

As abordagens devem evidenciar a diversidade dos sujeitos e suas dinâmicas. Essa atividade tem como objetivo auxiliar os estudos do II Módulo Centralizado a ser realizado em novembro próximo, quando ocorrerá a socialização das informações levantadas, compondo um grande painel sobre o momento político das regiões e do país.

SISTEMATIZAÇÃO – Orientações Político-Metodológicas

– contribuições preliminares –

1. Quanto ao planejamento da Ação Formativa : Planejar ações formativas articuladas em torno de objetivos pré-fixados, superando as práticas formativas fragmentadas e descontínuas.

2. Quanto à Metodologia da Ação Formativa : Contribuir para a implementação ou aprimoramento de processos formativos que favoreçam a participação, a construção coletiva de conhecimentos e uma capacitação política, pedagógica e ideológica de trabalhadores e trabalhadoras rurais.

Aprender a utilizar adequadamente métodos e dinâmicas que atendam às múltiplas necessidades dos processos formativos: integração e animação, motivação e mística, apropriação temática e construção das identidades, avaliação e sistematização.

3. Quanto à postura a ser assumida frente às distintas posições e visões que aparecem no cotidiano sindical: Ter abertura e assumir uma postura crítica para identificar limites e valores em cada visão ou posição política, tratando com respeito pessoas e grupos a elas ligados.

Fazer dos espaços formativos uma oportunidade para aprender a lidar com o pluralismo de opiniões existentes no MSTTR, construindo consensos que fortaleçam a unidade e a luta da classe trabalhadora.

4. Quanto ao estudo e à leitura pessoal e coletiva : Criar ou consolidar hábitos de leitura e de estudo individuais e coletivos, priorizando temas e aspectos onde se reconheça ter lacunas ou fragilidades.

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5. Quanto ao registro da memória das lutas do MSTTR : Contribuir para assegurar um registro de qualidade, fiel e sistemático, das lutas e demais experiências do MSTTR, para que seja preservada a memória da classe trabalhadora.

6. Quanto à mística e à comemoração das conquistas : Possibilitar que na vida das nossas entidades também sejam celebradas as conquistas, pois elas estimulam à solidariedade, renovam sonhos e reafirmam projetos. Os projetos nos fazem perceber que não há limites para a luta, para o trabalho.

7. Quanto à dimensão humana do militante e da militante : Os militantes e as militantes, antes de tudo, são pessoas. As pessoas são plurais: têm muitas dimensões que precisam ser realizadas. É importante zelar para que o MSTTR não perca esta pluridimensionalidade de seus militantes.

8. Quanto à coerencia entre o discurso e a prática : Toda a ação de liderança e de organização também é uma ação pedagógica. A coerência entre o discurso e a prática diária é o maior sinal de que cremos em nosso ideário, é a garantia de não nos desviarmos de nosso projeto e o testemunho inquestionável de que acreditamos nele.

9. Quanto aos processos organizativos : O MSTTR, no intento de cumprir sua missão, deve sempre ter presente que ao representar e organizar pessoas faz a convocação para o estímulo à solidariedade e ao fortalecimento das ações associativas. O coletivo não suplanta a pessoa. Os dois precisam se complementar.

10. Quanto à corresponsabilidade na ação formativa : No sindicalismo deve haver princípios e fundamentos de corresponsabilidade na ação que “sirvam para todos, mas também para mim” (cf. fala de Amorim).

11. Quanto ao processo de aprendizagem : Assumir a postura de eterno aprendiz: “Não existe uma verdade. Há muitas verdades que podem se complementar”.

12. Quanto ao público: Implementar processos formativos com a participação representativa dos mais variados segmentos do MSTTR, priorizando mulheres e jovens e considerando a transversalidade de gênero, geração, raça e etnia.

13. Levar em conta as especificidades de cada público e realidade, com suas necessidades, aspirações e demandas.

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O sentido dos diálogos pedagógicos

O Movimento Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais tem uma trajetória de práticas

formativas em suas diversas instâncias e políticas. Atualmente, vivencia uma fase de retomada da

formação política que implica necessariamente em uma “releitura da prática formativa vivenciada

e das lições aprendidas”, buscando “ampliar nossos olhares, mudar atitudes, rever

comportamentos individuais e coletivos, de modo a favorecermos o exercício de novas práticas

(...) para fortalecer a luta sindical e possibilitar ações transformadoras e libertadoras” 1.

Nesse sentido, lança mão de duas dimensões: a da formação programada e da formação na ação

(na prática cotidiana). Ambas se ancoram nos princípios articuladores da prática com a teoria e da

construção coletiva do conhecimento.

São elementos de uma pedagogia que valoriza o que cada um/a sabe e as múltiplas possibilidades

de construção de novos conhecimentos. A relação entre diversos saberes, sistematizados ou não,

requer que os sujeitos dos processos educativos estabeleçam diálogos entre si e com os espaços

onde estão. Uma grande questão se evidencia nessa dimensão: o respeito às diferenças entre os

interlocutores do diálogo.

Para Paulo Freire2, a existência do diálogo nos processos de aprendizagem requer que tenhamos

disponibilidade para viabilizar a interação entre seres e saberes, na perspectiva da consciência de

sermos inacabados: “O sujeito que se abre ao mundo e aos outros inaugura com seu gesto a

relação dialógica em que se confirma como inquietação e curiosidade, como inconclusão em

permanente movimento na História”.

A relação dialógica, da qual fala Freire3, não é favor, nem cortesia, muito menos deve ser

confundida com tagarelice. O diálogo existe na exposição crítica e metódica, onde os

aprendizados se dão por intelecção. Exige respeito mútuo, maturidade, exige saber perguntar,

1 Projeto Político Pedagógico – CONTAG, 20062 FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia – Coleção Leitura. Paz e Terra, São Paulo, 1996.3 FREIRE, Paulo. À sombra desta mangueira – Olho D’água, São Paulo, 1995.

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saber responder e saber ouvir. Trata-se de uma pedagogia contra o silêncio imposto pelo

autoritarismo recorrente em nossa sociedade e localizado na história como inimigo da

curiosidade. É a curiosidade que nos torna disponíveis à indagação e abertos à possibilidade de

conhecer.

“A dialogicidade é cheia de curiosidade e inquietação”. É propulsara das ações e reações pela

transformação. É prática fundamental à natureza humana, que se institui social e historicamente,

e à democracia. A prática educativa assim pode ser denominada se estiver comprometida com a

liberdade e a autonomia dos sujeitos e com a construção coletiva e participativa dos

conhecimentos.

Ao assumirmos uma pedagogia indissociável da realidade do Movimento Sindical de

Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, temos que assumir a nossa tarefa de criar o clima para o

diálogo.

Nessa perspectiva, os conteúdos do Módulo serão intercalados por diálogos pedagógicos,

momentos, especialmente planejados para reforçar nossas reflexões sobre o eixo temático:

“Desenvolvimento rural sustentável e solidário: concepções, desafios e perspectivas” e o eixo

pedagógico-metodológico: “Pedagogia para uma nova sociabilidade”.

A idéia é provocar diálogos sobre a forma e o conteúdo, e organizar, a partir dos passos dados,

as informações sobre os temas, técnicas e dinâmicas com a intenção de construir

permanentemente o fio lógico do módulo. É trocar impressões sobre as práticas vivenciadas e

ordenar as partes para futuras abstrações e necessários desdobramentos na ação formativa

multiplicadora.

Com relação aos conteúdos, os diálogos cumprirão o papel de sistematizar as informações,

articular os sub-temas e contribuir com a construção de argumentos favoráveis ao Projeto

Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário. É contribuir com a compreensão

do conceito de desenvolvimento rural, com foco na fundamentação de sua concepção e os

significados para a organização sindical dos/as trabalhadores/as rurais. É construir junto da e

para a prática.

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Nos diálogos metodológicos iremos inventariar os aprendizados, refletir sobre cada passo dado e

discutir os possíveis caminhos para o aprimoramento e a multiplicação da prática formativa. O

produto dos diálogos deverá alimentar outras iniciativas de formação assumidas pelas estruturas

do MSTTR, a exemplo do curso descentralizado, pós-módulos (GED’s), oficinas de

aprofundamento temático, entre outras iniciativas.

É no espaço dos diálogos que iremos problematizar o papel do/a educador/a sindical e os

princípios políticos pedagógicos que orientam a nossa prática. Compreendemos ser a

incorporação dos diálogos em nosso fazer educativo, imprescindível para a consolidação de uma

prática democrática, coletiva e participativa de construção de conhecimentos. Dessa forma,

pretendemos dar corpo a uma outra dimensão atribuída aos diálogos, que é a da animação e

articulação da rede de educadores/as do MSTTR.

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FICHAS DE APROPRIAÇÃO PEDAGÓGICO-METODOLÓGICA

PREMISSA:

Mesmo reconhecendo que as Fichas devam priorizar os Diálogos Pedagógicos, sugerimos que não se restrinjam a eles, mas busquem valorizar e sistematizar outros aspectos e vivências pedagógico-metodológicas que mereçam destaque no decorrer de todo o curso.

Com isso queremos dizer, também, que seria interessante se ver a possibilidade de resgatar o acúmulo pedagógico-metodológico do I Módulo, para que sejam elaboradas Fichas que o incorporem. Acreditamos que seja ainda possível. Da mesma forma, esperamos que isso aconteça com relação aos cursos descentralizados e aos GEDs, em 2007.

OBJETIVOS DAS FICHAS:

Sistematizar a aprendizagem pedagógico-metodológica do curso da ENFOC – centralizado e descentralizado, inclusive dos GEDs – priorizando os Diálogos Pedagógicos, de modo a favorecer sua apropriação crítica.

Elaborar subsídios teórico-práticos que alimentem a formação pedagógico-metodológica dos formandos e formandas da ENFOC.

ROTEIRO-GUIA DE CADA FICHA:

1. Anotar informações de caráter mais geral . Referimo-nos à data, local, tema, momento ou unidade do Módulo...

2. Resumir os objetivos específicos do Diálogo Pedagógico ou do Momento Temático aos quais a Ficha estiver se referindo. Desta forma ficará mais fácil compreender até que ponto a metodologia utilizada possa ter ajudado a alcançar os objetivos postos inicialmente.

3. Elaborar uma breve síntese . Trata-se de fazer um breve resgate – uma síntese – do Diálogo Pedagógico ou do Momento Temático ao qual a Ficha se refere, explicitando conteúdo e metodologia, passos dados e resultados alcançados.

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4. Reconstituir detalhadamente os aspectos pedagógico-metodológicos relevantes, que tenham sido vivenciados no Diálogo Pedagógico ou no Momento Temático. Isso implicará, concretamente, em:

Destacar reflexões pedagógicas e metodológicas que sejam consideradas mais importantes.

Reconstituir dinâmicas de grupo ou outros “caminhos pedagógico-metodológicos” e orientar sobre os cuidados que se fizerem necessários em relação à modalidade de sua aplicação, visando sua replicação criativa. Isso poderá ser feito com a ajuda de esquemas, planilhas, mapas mentais, gráficos ou anotações bem ordenadas.

Valorizar – seletivamente - aquelas contribuições de painelistas ou da plenária que possam ajudar de forma especial no processo de capacitação pedagógico-metodológica dos formandos e formandas.

5. Elaborar orientações pedagógico-metodológicas finais . Isso quer dizer fazer arremates sobre os enfoques trabalhados anteriormente, complementando sugestões anteriores, sugerindo cuidados...

6. Apontar eventuais indicações bibliográficas . Poderão ser recuperadas orientações de palestrantes ou acrescentadas outras orientações bibliográficas.

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CONTAG – CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA

ENFOC - ESCOLA NACIONAL DE FORMAÇÃO

Relatório sobre o Perfil dos/as Participantes do 1° Módulo da ENFOC 4

1. APRESENTAÇÃO

As informações apresentadas neste relatório são fruto de um processo que envolveu os/as participantes do 1° Módulo da Escola Nacional de Formação/2006, na intenção de fortalecer os exercícios de (re)construção da identidade coletiva do grupo.

O processo que subsidiou a consolidação deste documento tomou a seguinte configuração: definição coletiva (GT ENFOC) dos objetivos, princípios e etapas norteadoras da pesquisa; elaboração e revisão do instrumento (questionário); constituição e nivelamento de informações junto à equipe de pesquisadores; aplicação dos questionários entre os/as participantes; e tabulação e leitura analítica dos dados.

É importante destacar que os resultados ora apresentados, caracterizam-se como um retrato do grupo que participou do 1° Módulo da ENFOC. Faz-se oportuno destacar que seu objetivo reside no desejo de entender melhor que valores e projetos de vida e de classe, animam estas pessoas para se organizarem dentro das instâncias do MSTTR e de outros espaços de organização popular. Dessa forma podemos entender que o interesse da pesquisa foi muito específico, não refletindo necessariamente a opinião do conjunto de trabalhadores/as rurais e/ou dirigentes sindicais de todo país.

2. SOBRE A AMOSTRA

Estiveram presentes nos 12 dias de atividades do 1° Módulo da ENFOC, 119 pessoas. A intenção da pesquisa era atingir a 100% dos/as participantes, sendo para isso estruturada uma equipe com 06 pesquisadores/as (responsáveis pela aplicação dos questionários) e 2 supervisoras (responsáveis pelo acompanhamento dos pesquisadores/as, revisão dos questionários aplicados, tabulação dos dados e elaboração dos gráficos e relatórios).

Ao final do processo de aplicação dos questionários, foi atingido aproximadamente 90,7%, da meta geral, representando um universo de 108 pessoas, entre homens e mulheres.

Mesmo não conseguindo atingir a meta de 100%, entendemos que a amostra apresentada garante credibilidade aos dados que se seguem.

3. SOBRE A APLICAÇÃO DOS QUESTIONÁRIOS4 Relatório organizado por Eryka Galindo/Assessora CONTAG. A pesquisa foi feita durante o I Módulo, no

período de 14 a 25 de agosto de 2006. Participaram da equipe de pesquisa: Ana Carolina – DF, Cícera Nunes – PE, Miscilene Cruz – PI, Nestor Bonfantti – RS, Sônia Santos – PE, Viviane Rodrigues – SE, Marleide Barbosa/CONTAG e Eryka Galindo/CONTAG (coordenadora). Os dados foram tabulados por Eryka Galindo e Mônica Olinto.

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A equipe responsável pela aplicação dos questionários foi constituída por 6 integrantes do próprio grupo. Antes da iniciação dos trabalhos foi desenvolvida uma vivência de apropriação em relação ao instrumento (questionário) e nivelamento das informações gerais sobre o processo de pesquisa.

Cada pesquisador cumpria uma meta diária, que variava de 03 a 06 questionários aplicados. Ao final do 1° Módulo, foi necessária a aplicação de alguns questionários através do telefone, uma vez que algumas pessoas não foram entrevistadas durante os 12 dias de atividades, por falta de tempo.

Concluído as entrevistas, os questionários foram devidamente decodificados e tabulados, para que enfim pudessem ser confeccionados os gráficos e a relatório final.

4. SOBRE OS RESULTADOS GERADOS

Os resultados finais foram decodificados e tabulados assim que o processo de aplicação dos questionários foi concluído.

Embora o relatório possibilite a análise e leitura crítica, por parte de cada indivíduo em relação aos dados expressos, o GT da ENFOC, reconhece nesta iniciativa um importante meio de construir coletivamente, reflexões mais articuladas com os objetivos da Escola. Além disso, outro papel não menos importante, diz respeito a garantia de maior coerência entre os processos metodológicos adotados durante o 2° Módulo e os anseios dos/as participantes, expressos na pesquisa.

5. INFORMAÇÕES GERAIS

Ao todo foram 108 participantes entrevistados, considerando um universo de 119 participantes da ENFOC (este total considera o número de pessoas que participaram pelo menos de um painel, independentemente de estarem dentro dos critérios de aproveitamento, que prevê o mínimo de 75% de presença nas atividades). Vale destacar que dos outros 11 participantes, 10 são Diretores da CONTAG ou assessores (que não cumpriram a carga horária necessária) e 01 é do Estado do RJ (que não conseguiu ser entrevistado durante o módulo e nem mesmo conseguimos entrar em contato por telefone).

O maior número de entrevistados reside nos estados do Nordeste (38%), seguido do Centro-oeste (29%). Enquanto as regiões Norte (12%), Sudeste (11%) e Sul (10%), perfizeram cada um, o número de 11 a 13 participantes entrevistados.

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Regiões*12%

38%

10%

11%

29% Norte

Nordeste

Sul

Sudeste

Centro-oeste

* Os Diretores e Assessores da CONTAG, residente em Brasília, foram enquadrados como pertencentes a região Centro-oeste.

Sobre a questão da raça e etnia, a maioria dos entrevistados se percebem como pertencentes a raça branca (37%), parda (27%) e negra (20%).

Em meio a esta declaração, podemos perceber as vivencias formativas podem oportunizar significativas experiências e debate sobre as questões étnica e raciais, garantindo maiores formulações para o MSTTR, sobre as contribuições etnicas para o estado brasileiro, bem como sobre o lugar destes grupos no mundo contemporâneo, garantindo com isso, o fortalecimento da identidade racial especialmente entre os que se declaram negros e pardos. Outro destaque é a ausência, no grupo, de pessoas que afirmem ser indígena.

Raça

37%

4%20%

27%

10%

2%

Branca Indígena

Morena Negra

Parda Outras

Outra informação importante, considerando o contexto geral da amostra, diz respeito ao baixo índice (3,36%) de participação no evento, e conseqüentemente de entrevistados/as, que tem algum tipo de deficiência. Só foi identificado uma tipo de deficiência entre os/as quatro entrevistados/as, que no caso é a deficiência visual parcial.

6. SEXO

Dos/as 108 participantes entrevistados/as, 66% são mulheres e 34% são homens, como mostra no gráfico a seguir:

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Sexo

66%

34%FemininoMasculino

Este dado nos mostra como vem se destacando a participação da mulher, nas atividades formativas, além do seu lugar de destaque dentro da ENFOC. Ao passo que podemos reconhecer êxito nas estratégias desenvolvidas pelo MSTTR no que se refere a valorização da participação feminina nos espaços políticos, especialmente de formação, podemos também admitir que a inclusão de uma abordagem que valoriza a especificidades feminina, é indispensável.

Considerando o número de dirigente sindicais por sexo podemos perceber que a maioria são mulheres (57%). Dessas, 35% declaram ocupar mais de um cargo no MSTTR (Ex: diretoras da FETAG e STTR). Entre os homens dirigentes, que representam um universo de 43% dos entrevistados, 23% afirmam ocupar mais de um cargo nas instancias sindicais.

Número de Dirigentes por Sexo

57%

43% DirigentesmulheresDirigenteshomens

7. FAIXA ETÁRIA

Outro destaque, refere-se a participação da juventude na ENFOC, afinal 41% dos/as entrevistados/as estão na faixa de 16 a 32 anos. Embora a organização da Juventude através das Comissões Municipais, Estaduais e Nacional, além das Coordenações nessas instâncias, ainda esteja em processo de consolidação, este dado nos mostra como a inserção da juventude dentro do MSTTR vem crescendo, associada a isso, como este segmento vem priorizando a dimensão da formação na sua trajetória política, enquanto dirigentes e/ou assessores.

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Faixa etária

41%

55%

4% 16 a 32 anos

33 a 55 anos

Mais de 55 anos

8. PROFISSÃO

Entre as profissões que mais aparecem nos resultados da pesquisa, podemos admitir que a ampla maioria dos/as entrevistados/as reconhecem-se como trabalhadores/as rurais. Na intenção de preservar os termos usados pelos entrevistados regionalmente, mantemos no gráfico todos as denominações, apresentados no questionário, que guardam relação com a profissão de trabalhador/a rural, são elas: Agricultor/a, lavrador/a, assalariado/a rural e trabalhador/a rural.

Mesmo com o aprofundamento dentro do MSTTR, sobre a necessidade da valorização da categoria dos/as trabalhadores/as, como instrumento fundamental para a construção de uma concepção e identidade de classe, ainda é possível ver que alguns dirigentes ainda associam o trabalho desenvolvido nas instâncias sindicais, a sua verdadeira profissão, como está expresso nos 5% que afirmam serem dirigentes sindicais.

Profissão

51%

5%11%

2%

13%

8%

6% 3% 1%

Agricultor/a, Lavrador/a, Trabalhador/arural e Assalariado/a ruralDirigentes sindicais

Assessor/a

Funcionários MSTTR (Secretáriasexecutivas FETAG e STTR)Outras

Professor/a, educadora, pedagoga

Engenheiros agronômos e Técnicosem agropecuáriaEstudante

Não responderam

9. ESCOLARIDADE

Quando perguntados sobre que nível de ensino concluiu, pudemos perceber o alto número de pessoas que terminaram o 3° ano do ensino médio. É importante deixar claro que necessariamente os 38% que afirmar terem concluído o ensino médio, pararam de estudar, na

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verdade a seqüência de perguntas, também valorizou a idéia de continuidade dos estudos, como podemos ver no 2° gráfico.

Gráfico 1

Nível de Ensino Concluído4%

38%

9%19%

16%

11%

3%Curso Técnico

Ensino Médio

Ensino fundamental 1

Ensino Fundamental 2

Ensino superior

Especialização

Mestrado

Gráfico 2

N° de pessoas que estão ou não estudando atualmente

30%

70%

Estão estudandoatualmente

Não estão estudandoatualmente

Mesmo assim, podemos perceber que apenas 30% estão estudando atualmente. Levando em conta que 96% dos/as entrevistados/as estão na faixa-etária ou da juventude ou da meia idade, o número de pessoas que estão estudando atualmente, ainda é bem reduzido.

Em compensação o número de pessoas interessadas em darem continuidade aos estudos, especialmente na intenção de concluir o ensino superior, representa um enorme salto.

Gráfico 3

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Nível de interesse dos/as participantes em dar continuidade aos estudos

92%

8%Interessados/as em darcontinuidade aos estudos

Não interessadosem darcontinuidade aos estudos

Gráfico 4

Nível de ensino que os/as participantes que desejam dar continuidade aos estudos pretendem concluir

11%1%

56%

29%

1%2% Fundamental 2

Médio

Técnico

Superior

Especialização ou mestrado oudoutoradoNão responderam

Entre a pessoas que não manifestam o interesse da darem continuidade aos estudos (8% - observar gráfico 3), podemos admitir maior razão deste desinteresse a falta de tempo. Neste sentido, precisamos aprofundar uma reflexão sobre como a continuidade dos estudos, especialmente entre dirigentes sindicais e assessores, pode contribuir e influenciar na ação destes indivíduos no MSTTR. Para isso é necessário avaliar as dimensões da auto-estima e auto-confiança, da maior qualidade dos processos de formulação e acesso a informação. Em meio a estas questões, faz-se oportuno refletir sobre melhores condições para garantia do acesso a educação, tanto do ponto de vista da criação de oportunidade como de disponibilidade.

Gráfico 5

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O que motiva o deseinteresse por continuar estudando

45%

22%

33% Falta tempo

Não responderam

Outros motivos

10. SOBRE OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO USADOS PARA OBTER INFORMAÇÃO, HÁBITOS DE LEITURA E UTILIZAÇÃO DA INFORMÁTICA NO DIA-A-DIA.

10.1 INSTRUMENSTO PARA A OBTENÇÃO DE INFORMAÇÕES/CONHECIMENTO

Podemos reconhecer que os jornais e a televisão são os dois meios de comunicação mais usados pelos/as participantes, para se manterem bem informados em relação aos acontecimentos sociais, com percentual de 23% e 22%, respectivamente. Também é muito expressivo o uso da Internet entre os/as participantes (15%). Este dado nos ajuda a compreender que instrumentos pedagógicos pode complementar ou integrar o processo de formação desencadeado pela ENFOC, afinal essa articulação com os aspectos mais enraizados na vida dos/as cursistas, compreende uma das dimensões do projeto político pedagógico da Escola.

Instrumentos mais usados pelos/as participantes para se manterem informados

12%

23%

22%

15%

10%

14%4% Revistas

Jornais

Televisão

Internet

Rádios

Livros

Outros meios

10.2 HÁBITOS DE LEITURA

Quando perguntados sobre a quantidade de livros lidos por mês os/as participantes afirmam ler menos de 1 ou até mesmo 1 livro mensalmente.

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Construindo uma relação com o gráfico anterior e o seguinte, podemos perceber que mesmo sendo o livro o 4° instrumento mais usado, pelos/as cursistas, para obter informações, é possível perceber que o ritmo de leitura ainda é pouco intenso entre a turma.

Média de Livros Lidos por Mês

36%

22%3%

29%

10%

1 livro

Entre 2 e 3 livros

Mais de 3

Menos de 1 livro

Nenhum

Os temas de leitura preferidos podem ser vistos no gráfico abaixo:

Temas de Leitura Preferidos

7%12%

9%

11%

14%6%5%

7%

6%

23%

Auto-ajuda e espiritualidade

Literatura, romance, contos e poesias

Educação

História

Política

Gênero

Meio rural

Movimento sindical

Sociologia

Outros*

*A categoria Outros, agrupou todas as sentenças com incidência de resposta igual ou inferior a 5. Alguns temas enquadrados como Outros são: relações de trabalho;

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economia; direito; administração; psicologia geração; cooperativismo; comércio solidário; cultura e comunicação; meio ambiente; saúde e previdência social.

10.3 UTILIZAÇÃO DA INFORMÁTICA NO DIA-A-DIA

Pelo que mostra a pesquisa, indiscutivelmente, a maior parte dos/as cursistas utilizam sabem mexer com informática. Entre os recursos mais utilizados podemos firmar que se destacam programas de edição de texto e a Internet, ambos comum índice de 32%.

Noções de informática

91%

9%

Participantes comnoções deinformática

Participantes semnoções deinformática

Programas mais usados

32%

15%

5%

16%

32%Word

Excel

Power point

Internet

Outros

Destaca-se a alta freqüência com que os/as entrevistados/as utilizam a informática, onde aproximadamente 62% afirmam utilizá-la diariamente.

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Utilização da informática

62%16%

7%

10% 5%

Todos os dias

Entre 6 e 4 dias

Entre 3 e 2 dias1 dia

Não respondeu

11. FORMAÇÃO POLÍTICO-SINDICAL

A maioria dos/as entrevistados/as já participaram de alguma atividade formativa promovida pelo STTR’s, FETAG’s ou CONTAG. O que demonstra como a questão da formação político-sindical está sendo vista como prioridade na ação do MSTTR.

O representativo número de pessoas que manifestam terem participado de atividades formativas, associado ao também elevado número de jovens entrevistados, pode nos levar a crer que a juventude está inserida nas atividades formativas do MSTTR. Este aspecto é muito importante pois reflete o investimento e o compromisso com os novos dirigentes e assessores, responsabilidade essa que cada vez mais ser fortalecida.

Participação em cursos do MSTTR

67%

33% Quem participou decursos do MSTTR

Quem nuncaparticipou de cursosdo MSTTR

Além de uma ampla participação em vivências formativas desencadeada pelo MSTTR, os/as entrevistados/as também participaram de cursos promovidos por outras instituições e organizações sociais, aspecto esse que revela uma ampla parceria que pode ser orientada para o fortalecimento da ação da classe trabalhadora rural.

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Participação em cursos promovidos por outras entidades

64%

36%Quem participou decursos de outrasorganizações

Quem nunca participoude cursos de outrasorganizações

Para o grupo entrevistado, a formação político-sindical tem influenciado de forma decisiva na formulação de propostas e no próprio acompanhamento das políticas públicas por parte do MSTTR. Esta afirmação é justificada quando observamos que aproximadamente 31% os processo formativos garantem uma intervenção mais qualificadas dos indivíduos nos espaços políticos. Ainda sobre esta questão, podemos admitir que 19% acreditam que a formação possibilita a construção de propostas mais coerentes com a realidade dos\as trabalhadores\as rurais (19%).

Mesmo assim, podemos considerar que este aspecto não é suficiente aprofundar quais os resultados efetivos para a vida dos\as trabalhadores\as rurais, advindos por esta maior inserção dos\as dirigentes sindicais nos espaços de elaboração e controle social das políticas públicas. Ele nos serve como um elemento importante para pensar sobre que dimensões o processo de formação pode valorizar ou tem valorizado.

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Impactos da Formação Político-sindical

31%

19%11%

11%

7%

14%

6% 1%

Garantindo uma intervenção maisqualificada dos indivíduos nosespaços políticos

Contribuindo com a proposição deplíticas públicas coerente com arealidade rural

Construindo consensos internos querespeitem a diversidade do MSTTR(unidade na pluralidade)

Maior Conhecimento sobre arealidades vividas nas diversasregiões do Brasil

Promovendo relações desolidaridade dentro do MSTTR

Reforçando novos sentidos epraticas comprometidas com aigualdade de gênero, geração, raçae etnia Outras respostas

Pessoas que não responderam12. INSERÇÃO NO MSTTR E EM OUTRAS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS

12.1 PARTICIPAÇÃO NAS INSTÂNCIAS DO MSTTR

A pesquisa também possibilitou o reconhecimento dos cargos ocupados pelos\as participantes do 1º Módulo da ENFOC, dentro das instâncias do MSTTR. Sendo assim podemos perceber, que a maioria são Diretores\as (27%) e Assessores\as (21%) das FETAG’s, há também uma representativa participação de Diretores\as dos STTR’s na composição do grupo da ENFOC (21%).

Podemos perceber que parte significativa dos\as participantes, atuam nas secretarias de formação e organização sindical (28%). Além da área de formação, participaram coordenadores\as e secretários\as da juventude rural (15%) e presidentes das FE TAG’S, CONTAG E STTR’s, como podemos ver nos gráficos abaixo:

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Cargo no MSTTR

21%

27%21%

5%

7%2%3%

5%

4% 5%

Diretor/a STTR

Diretor/a FETAG

Diretor/a CONTAG

Assessor/a STTR

Assessor/a FETAG

Assessor/a CONTAG

Assistente Técnico CONTAG

Delegado/a de base

Coordenado/a Rgional ou dePóloOutros

Áreas de atuação

28%

5%

15%6%2%

9%

5%

4%

13%

2%8%

3%

Formação e Organização SindicalAssalariados/as ruraisJuventude rural MulheresAgráriaAgrícolaPolíticas SociaisSecretaria Geral Secretaria de FinançasPresidênciaVice-presidênciaOutras

Outro destaque importante, diz respeito ao alto índice de dirigentes que ocupam mais de um cargo, nas diferentes instâncias do MSTTR(%).

Considerando o tempo de participação no MSTTR, podemos perceber que a maioria (29%) do grupo, está inserido nas instâncias sindicais entre 1 e 5 anos. Este dado tem uma relação direta com o alto índice de jovens participantes deste módulo.

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Tempo de participação no MSTTR6%

29%

13%

12%

16%

24%

Menos de 1 anoDe 1 a 5 anosDe 6 a 10De 11 a 15De 16 a 20Mais de 20

12.2 FILIAÇÃO PARTIDÁRIA

Considerando a participação em partidos políticos, podemos perceber que a maioria dos\as entrevistados\as estão atualmente vinculados a partidos políticos (55%). Dos 45% que afirmam não estarem atualmente filiados, 9% admitem já ter tido filiação partidária, além desses outros 3% se identificam como militantes políticos. Os outros 33% de fato não estão nem nunca estiveram filiados\as.

Gráfico 1

Filiação Partidária

55%

9%

3%

33%Filiados a partidosatualmenteDesfiliados atualmente

Nunca filiados masmilitantesNunca filiados, nemmilitantes

Considerando o número de jovens atualmente filiados, maior parte deles estão vinculados ao PT (70%) e ao PC do B (10%).

Gráfico 2

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Partidos em que estão filiados10%7%

5%3%

70%

5%

PC do B PMDB

PSB PSC

PT Outros

Entre os\as participantes atualmente desfiliados\as, podemos perceber que 28% eram do PT.seguido pelo PMDB e PDT, cada uma com 18%, como demonstra o gráfico abaixo:

Gráfico 3

Partidos em que foram filiados

28%

9%

9%18%

18%

9%

9%

PT PDT PSDB

PMDB PTB PPS

PSB

Podemos perceber que partidos como PMDB e PSDB, apresentam índices maiores no que se refere a desfiliação. Esta afirmação é possível quando articulamos as informações dos gráficos 2 e 3, afinal no primeiro gráfico, que trata do número de pessoas atualmente filiadas, o PMDB aparece com percentual igual a 7% e o PSDB dentro da categoria Outros. Enquanto isso, no gráfico seguinte (referente a desfiliação) estes números se ampliam (PMDB com 18% e o PSDB com 9%).

12.3 PARTICIPAÇÃO EM CONSELHOS

Grande parte dos\as entrevistados\as admitem ser conselheiros\as de políticas públicas (58%), especialmente nos níveis estaduais (52%) e municipais (31%). Este dado, reforça a importância de desencadear processos formativos que valorizem a intervenção desses sujeitos, resignificando os princípios orientadores o desenvolvimento rural sustentável, para que a intervenção nesses espaços de controle social gerem melhores impactos para a vida dos\as trabalhadores\as.

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Participação em Conselhos

58%

14%

28% Pessoas que participamatualmente

Pessoas que jáparticiparam

Pessoas que nuncaparticiparam

Instâncias de Participação nos Conselhos

4%

31%

52%

11% 2%

COMUNITÁRIA

MUNICIPALESTADUAL

NACIONALINTERNACIONAL

CONCLUSÕES

Estes dados nos ajudam a perceber o que fazem e pensam os\as participantes da ENFOC. Neste sentido, este instrumento vem auxiliar na (re)construção de processos metodológicos mais condizentes com os anseios do grupo, sem perder de vista as orientações do Projeto Político Pedagógico.

Os dados apresentados, revelam a diversidade que marca o grupo da ENFOC, afinal os\as participantes apontam diferentes formas de organização e concepção sobre o universo do MSTTR.

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O DIREITO À FESTA E À LUTA5

Emir Sader

Há exatamente quatro anos atrás comemorávamos – tantos de nós na Avenida Paulista, outros

tantos pelo Brasil afora e para além daqui -, finalmente a vitória de Lula, a vitória do PT, a vitória

da esquerda. Encontrávamos-nos com tanta gente que colocava para fora, nas lágrimas, nos

gritos, tanta coisa reprimida, que vinha de longe: da lembrança dos companheiros que não

puderam comemorar aquilo conosco às frustrações acumuladas de ver o país ser despedaçado

pelo governo que terminava – finalmente – derrotado naquele dia.

Comemorávamos, mas com um travo amargo na garganta. Sabíamos que era o nosso governo,

mas alguma coisa nos escapava ali. Ganhávamos, fechávamos o governo FHC com sua derrota –

o mais importante naquele momento -, mas se desenhavam sombras sobre a vitória, que

indicavam que ela nos escapava. Da “Carta aos brasileiros” ao “Lulinha, paz e amor”, de Duda

Mendonça a Palocci e – confirmando tristemente as sombras, a Henrique Meirelles -, mais do que

algo nos apontava que a nossa vitória não era necessariamente nossa vitória, a vitória da

esquerda, a vitória do anti-neoliberalismo, a vitória do “outro mundo possível” pelo qual

estivéramos lutando tanto tempo.

Havíamos lutado contra as privatizações, havíamos lutado contra as (contra) reformas neoliberais,

de menos Estado, menos políticas sociais, menos regulamentação, menos direitos trabalhistas,

menos empregos formais, menos soberania, menos esfera pública, menos educação pública,

menos cultura pública. Havíamos luta contra a cassação de direitos dos trabalhadores, dos

aposentados, dos trabalhadores sem terra, das universidades públicas, da saúde pública.

Havíamos resistido e naquele dia sentíamos que, apesar de tudo o que se havia dilapidado do

país, havíamos derrotado ao projeto neoliberal de FHC, havíamos triunfado.

O dia da posse e do discurso de Lula em Brasília pareciam o ponto de chegada de mais de uma

década de lutas de resistência, em que o Brasil se havia tornado depositário das esperanças da

esquerda de todo o mundo. O Brasil de Lula, do PT, do MST, da CUT, de Porto Alegre, do

orçamento participativo, do Fórum Social Mundial.5IN: http://agenciacartamaior.uol.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=65

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Nossas desconfianças se confirmaram com mais rapidez do que supúnhamos. Henrique Meirelles,

manutenção da taxa de juros, superávit fiscal – eram pontas de iceberg mais profundo: a

manutenção do modelo econômico herdado de FHC. Primeiro, chamado de “herança maldita”.

Que não foi desembrulhado como pacote, para mostrar o Brasil desfeito e refeito como Bolsa de

Valores nas mãos dos tucanos-pefelistas, o Brasil da privataria na educação e na cultura, do maior

escândalo da história do país com a privatização das estatais – saneadas com o dinheiro público

do Bndes, para em seguida ser vendida a preços de banana de novo com recursos públicos do

Bndes.

Em nome da superação dessa “herança” nos foi empurrada uma (contra) reforma da previdência,

que desatou um fatal desencontro entre os movimentos sociais e o governo, porque assinalava um

caminho de “reconquistar a confiança do mercado” às custas de direitos sociais dos

trabalhadores. O nosso governo fazia o que chegou a ser dito que fazíamos “o que FHC não tinha

tido coragem de fazer” – sem dizer que era porque não teve força, pela resistência que nós lhe

opusemos.

Não demorou para que o modelo – primeiro chamado de “herança maldita” – fosse perenizado,

com a manutenção das taxas de juros reais mais altas do mundo, com um superávit fiscal mais

alto que o definido pelo FMI, com a ditadura dos “contingenciamento” de recursos pela equipe

econômica, que passou a ter o poder de definir quantos recursos iriam (ou não iriam) para as

políticas sociais, qual o aumento possível do salário mínimo e tudo o mais que deveria ter sido a

referência central do governo, se fosse para cumprir a “prioridade do social” para o qual tinha

sido eleito.

Logo se perpetuou o modelo, logo se afirmou que ela era o melhor, se agradeceu em abraço ao

antecessor de Lula pela herança - a partir dali rebatizada de bendita - que havia deixado e se

afirmou que “dez anos eu tivesse, dez anos manteria este superávit fiscal”. Acompanhava-se um

discurso desmobilizador, de auto-complacência, que não apontava quais eram os adversários, os

que haviam produzido o país mais injusto do mundo, que levou Lula à presidência para redimi-lo

e não para perenizá-lo.

Nunca sentimos tanta amargura. Porque uma coisa era ver o país ser despedaçado pelos que nos

haviam derrotado, outra era ver uma equipe no Banco Central completamente alheia a toda a

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tradição dos economistas do PT se dar o direito de predominar sobre o que notabilizou o PT –

suas políticas sociais. Outra coisa era ver grandes empresários fazerem predominar seus

interesses agro-negócios-exportadores, de disseminação dos trangênicos, sobre os sem terra, a

reforma agrária, a economia familiar, a auto-suficiência alimentar no nosso governo. Outra coisa

era ver as rádios comunitárias serem reprimidas em lugar de serem incentivadas, a imprensa

alternativa sobreviver a duras penas, enquanto o governo continuava a alimentar os grandes

monopólios anti-demcráticos da mídia privada. Outra coisa era ver os softwares alternativos

serem subestimados ou descartados em favor dos grandes lobbies das corporações privadas. Pelo

nosso governo.

Foi duro, foi muito duro. Talvez tivesse sido mais fácil – se tudo fosse pensado do ponto de vista

da biografia individual de cada um – ter rompido, ter ido embora, ter dito tudo o que o governo

merecia ouvir, com todos os tons e sons. Mas teria sido dizer que tínhamos sido

irremediavelmente derrotados, que tudo o que tínhamos feito nas décadas anteriores tinha

desembocado numa imensa derrota. Teria sido abandonar as trincheiras de luta que tínhamos

construído com tanto esforço e sacrifício. Dava vontade. Em certos momentos teria sido muito

mais fácil deixar correr solta a palavra, aderir à teoria da “traição”, refugiar-nos nas denuncias e

abandonar a possibilidade de construir uma alternativa concreta.

Como se não bastasse tudo isso, vieram os “escândalos”: Waldomiro Diniz, Roberto Jéferson,

“mensalão”, “sanguessugas” – cada um como uma nova estaca no nosso coração. A imagem ética

do PT, construída como a menina dos nossos olhos era revertida. Nos tornávamos o partido dos

“maiores escândalos da história do país”. A palavra “petista” passava a ser revestida de uma

desconfiança de “corrupção”. Nada de pior poderia acontecer a um partido que tinha nascido,

crescido, se fortalecido e se tornado vitorioso com as bandeiras da “justiça social e da ética na

política”. Não éramos fiéis nem a uma nem à outra.

No entanto, não nos fomos. Ficamos. Seguimos tentando encontrar os fios para retomar o

caminho de que nos havíamos desviado. Sabíamos que os grandes enfrentamentos ainda estavam

por ser dados. Sabíamos que nossa política externa era a correta e se havia tornado essencial para

o continente – agora povoado de governos progressistas, como nunca na história da América

Latina. Sabíamos que nos podíamos orgulhar da Petrobrás – que quase havia se tornado Petrobrax

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nas mãos criminosas dos tucanos -, da autosuficiência em petróleo, de que uma das maiores

empresas do mundo havia resgatado o Brasil da crise do petróleo através de uma tecnologia de

pesquisa e extração de petróleo em águas profundas, com tecnologia nacional e pública.

Sabíamos que a privataria na educação, que havia feito proliferar faculdades e universidades

privadas como verdadeiros shopping-centers que vendiam educação como big-macs, havia

terminado. Que se fortaleciam as universidades públicas, que passávamos a ter, pela primeira vez,

políticas públicas de cultura, abertas à criatividade e à diversidade popular. Que Lula não era

FHC, que o PT não era o PSDB. Que os movimentos sociais não eram mais criminalizados e

reprimidos. Que a relação com a Venezuela, a Bolívia, Cuba, a Argentina, o Uruguai – era de

irmandade e não de preconceitos de quem olha para o Norte e para fora. Que a ALCA tinha sido

brecada e derrotada pela nossa política externa. Que o Brasil tinha sido o principal responsável

pela reaparição do Sul do mundo no cenário internacional com o Grupo dos 20 e as alianças com

a África do Sul e a Índia. Que as políticas sociais do governo, mesmo não sendo as que

historicamente haviam caracterizado ao PT, mudavam, pela primeira vez o ponteiro da

desigualdade – a maior do mundo, o maior desafio da história brasileira – no sentido positivo.

Que nem que fosse por solidariedade com a grande maioria dos brasileiros – pobres, miseráveis,

excluídos, discriminados, humilhados e ofendidos secularmente -, tínhamos que valorizar essas

políticas sociais.

Ficamos também porque sabíamos que ir-se seria recair na velha e infértil tentação do refúgio no

doutrinarismo – caminho justamente que o PT se havia proposta a superar. Seria retomar o velho

circulo de Sísifo, interminável de avanços, vitória, “traição” e retomada da resistência. Como

uma tragédia grega que havia condenado a esquerda a ter razão, mas ser sempre derrotada. A ter

vergonha e desconfiança da esquerda que triunfa. Dos desafios que a construção de uma

hegemonia alternativa coloca diante de nós.

Valeu a pena termos ficado, termos continuado na luta, termos acreditado que este é o melhor

espaço de luta, de acumulação de forças, de construção de alternativas para o Brasil. Não porque

tenhamos triunfado nas eleições. Claro que também por isso. Porque derrotamos o grande

monopólio privado da mídia, demonstrando que é possível e indispensável construir formas

democráticas de expressão da opinião pública, tirando-a das mãos oligopólicas das quatro

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famílias que se acreditavam donas do que se pensa no Brasil. Claro que porque derrotamos o

bloco tucano-pefelista – e de cambulhada mandamos para a aposentadoria política a Tasso

Jereissatti, a ACM, a Jorge Bornhausen, a FHC -, derrotamos a direita.

Mas principalmente porque recuperamos a possibilidade de construir um “outro Brasil” –

caminho que parecia fechado em meio a tanto superávit fiscal, a taxas de juros exorbitantes, a

tantas denúncias.

Recuperamos, especialmente no segundo turno, porque chamamos a direita de direita. Dissemos

um pouco das desgraças que eles fizeram para o Brasil – finalmente abrimos o dossiê da “herança

maldita”. Criminalizamos as privatizações, possibilitando que aparecesse à superfície a

condenação majoritária dos brasileiros a um processo embelezado e sacralizado pela mídia e

pelos arautos do grande capital privado dentro dela. Porque apelamos à mobilização popular,

porque fizemos uma campanha de esquerda no segundo turno. Porque comparamos o governo

deles com o nosso que, mesmo com todas as suas fraquezas, mostrou-se inquestionavelmente

superior ao deles. Foi isso que triunfou. Triunfamos pelo que mudamos, não pelo que

mantivemos. Ganhamos porque nos mostramos diferentes e não iguais a eles.

Comemoramos agora de novo, na Avenida Paulista ou em tantos outros lugares – antes de tudo

nesses milhões de casas de beneficiários da Bolsa Família, da eletrificação rural, dos micro-

créditos, do aumento do salário mínimo, mas principalmente os dignifica, ao se sentirem

contemplados e representados. Nessas casas onde nunca se duvidou que este governo é melhor

que todos os outros. Que nos deram a lição da tenacidade e da resistência contra as campanhas

terroristas da mídia.

Comemoramos com o mesmo travo amargo na garganta, mas com esperança e com mais

confiança. Comemoramos o direito de ter outra oportunidade. Comemoramos a força que

conseguimos construir e reconstruir. Comemoramos o direito de sair da política econômica

conservadora que impediu o crescimento econômico e poderia bloquear a extensão do

crescimento social – caso perdurasse a ditadura dos “contingenciamentos” de recursos.

Comemoramos o direito de banir essa maldita expressão – “contingenciamento” – do vocabulário

político do governo.

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Comemoramos o direito a reabrirmos espaços de luta e de esperança que nossos erros haviam

ameaçado de fechar. Comemoramos porque conseguimos nos salvar de uma derrota que teria

condenado a esquerda – e com ela, o país – a muitos anos de novos retrocessos. Comemoramos

porque bloqueamos a possibilidade de regressões na América Latina e seguimos nos somando aos

processos de integração. Comemoramos porque neste momento assinamos acordo com a Bolívia,

demonstrando que o caminho do diálogo e do entendimento com os paises amigos é o caminho

correto.

Não foi fácil manter a dignidade e a esperança, mesmo durante a campanha. Mas resistimos, com

dignidade, até que triunfamos. E reconquistamos o direito à esperança. Principalmente no

segundo turno, com uma campanha de esquerda, de reivindicar o Brasil que queremos,

enunciando os inimigos de um Brasil justo e solidário – as forças políticas, midiática,

econômicas: as elites tradicionais.

Ganhamos o direito a lutar, a lutar por um governo que finalmente promova a prioridade do

social, seja um governo pós-neoliberal, trabalhe pela construção de uma democracia com alma

social.

Comemoremos, porque merecemos a vitória, apesar dos nossos erros. Mas para estar à altura da

nossa vitória, temos que fazer dela uma vitória da esquerda. Uma vitória que esteja à altura do

emocionante apoio que o governo recebeu, ao longo de toda a campanha, dos mais pobres, dos

mais marginalizados, dos que constituem a grande maioria dos brasileiros, dos que trabalham

mais e ganham menos. Dos que souberam, como ninguém, resistir à enxurrada de propaganda

que a mídia despejou sobre todos. Fazer do novo governo, antes de tudo o governo deles. De

todos os brasileiros, mas sobre tudo dos que sempre foram marginalizados, excluídos, reprimidos,

que sempre viveram e morreram sobrevivendo, no anonimato, no silêncio, no abandono.

Comemoremos, mas juremos nunca mais deixar que o nosso governo se desvie do caminho do

desenvolvimento econômico e social, das políticas de universalização dos direitos, de

democratização da mídia, de socialização da política e do poder. Nunca mais aceitarmos que o

nosso governo se confunda com o governo dos outros, faça e diga o que os outros disseram e nos

legaram a “herança maldita”.

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Comemoremos e retomemos a luta, em condições melhores, por um “outro Brasil possível”, que

está ao alcance de nós, do governo, do PT, da esquerda, dos movimentos sociais, da

intelectualidade crítica, das militância política e cultural. Dessa luta depende o segundo governo

Lula, que conquistamos com muito sofrimento e tenacidade.

Soubemos dizer “Não à direita”, saibamos dizer “FHC nunca mais”, saibamos construir a

“prioridade do social”, saibamos derrotar a direita em todos os planos, saibamos construir um

Brasil justo, solidário, democrático e humanista. Para voltarmos a comemorar daqui a quatro

anos, sem travos amargos, sem desconfiança, com o coração e a mente orgulhosos do país que

soubemos construir.

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O PROCESSO ELEITORAL LATINO – AMERICANO ATUAL

Kjeld Jakobsen6

Neste ano de 2006, tivemos a posse de Evo Morales na presidência da Bolívia, o que foi

um fato de suma importância, principalmente, por representar o resultado do acúmulo de forças e

avanço das lutas sociais daquele país que provocaram a renúncia de vários presidentes nos

últimos anos e levaram à presidência um dos líderes mais importantes destas lutas e ainda por

cima um “Aymara” representante da população originária majoritária no país, que, no entanto,

sempre esteve excluída dos centros de poder e decisões.

Após ter adotado uma série de medidas para assegurar a posse e o controle das riquezas

naturais do país, em particular, os hidrocarbonetos e promover a reforma agrária, o governo

Morales e o seu partido Movimiento Al Socialismo (MAS) agora lutam para levar adiante a

aprovação de uma nova Constituição para o país que dê sustentação jurídica permanente aos

compromissos assumidos com a maioria da população boliviana. No entanto as mudanças vêm

enfrentando forte resistência da direita do país que, inclusive, tenta articular movimentos

autonomistas nas províncias onde é mais forte.

No início do ano foi também eleito o novo presidente do Haiti, René Préval, que já havia

governado o país de 1996 a 2001. É do mesmo partido “Fanmi Lavalas” do presidente Bertand

Aristide que renunciou ou foi destituído em 2003. (A distância entre os dois conceitos neste caso

é muito estreita). Desde que este deixou o governo há tropas da ONU (MINUSTAH) no país,

lideradas pelo Brasil e cujo tempo de permanência ainda não está definida pela ONU.

Tivemos ainda quatro outras eleições presidenciais onde os partidos progressistas não

venceram e cujos resultados devem ser analisados de forma distinta: Costa Rica, Peru, Colômbia

e México.

Na Costa Rica em fevereiro Oscar Sanches Árias do Partido da Libertação Nacional –

PLN foi o vencedor das eleições presidenciais. Ele já havia sido presidente de 1986 a 1990 e em

1987 recebeu o Prêmio Nobel da Paz pela sua atuação nas negociações de paz na América

6 Presidente do Observatório Social (CUT Brasil; DIEESE, CEDEC, UNITRABALHO)

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Central. No entanto, agora apresentou uma plataforma totalmente neoliberal em defesa da

privatização das empresas públicas costaricenses e da assinatura do Tratado de Livre Comércio

da América Central (Cafta). Venceu seu oponente Ottón Sollis por uma margem de apenas 1,1%

dos votos.

O seu oponente fora Ministro de Planejamento do primeiro governo de Árias e que

renunciou na época por discordar do plano de ajuste estrutural implementado por Árias sob

orientação do FMI. Candidatou-se pelo Partido da Acción Ciudadana – PAC que foi criado em

2002 e já surpreendera naquela ocasião ao eleger 24 deputados federais.

Sollis chegou muito próximo da vitória numa campanha onde se opunha ao Cafta e

enfatizava a adoção de medidas de participação popular e de combate à corrupção. Sua ascensão

ao segundo lugar rompeu uma tradição de disputa bipartidária entre o PLN e o democrata cristão

Partido da Unidade Social Cristã (PUSC), ambos desgastados por sucessivos escândalos de

corrupção.

No Peru, a disputa principal deu-se em junho passado entre Ollanta Humala, um militar da

reserva e candidato pela coalizão partidária Unión por el Peru e Alan Garcia que já presidira o

país na década de 1980 pelo Partido Aprista.

Humala apresentou-se com uma plataforma nacionalista e de promoção dos direitos

sociais que lhe deu a maior votação no primeiro turno, embora insuficiente para vencer as

eleições. No segundo turno, o apoio dos partidos de direita a Garcia deu a este a maioria de votos

de 54%. No entanto, o resultado envolve uma série de outros fatos dignos de registro.

Houve uma nítida divisão do eleitorado. Enquanto Alan Garcia venceu com folga na

capital e províncias próximas, Ollanta Humala triunfou nas 16 províncias do interior,

principalmente nas regiões mais pobres.

Sua coalizão partidária é a mais representativa no parlamento com 36%, seguido pelo

APRA com 30%, embora seu posicionamento político e programático ainda não esteja muito

claro. Os partidos de esquerda tradicionais como o socialista (PSP), o comunista (PCP) e o

“Pátria Roja” todos juntos tiveram apenas 1,5% dos votos no primeiro turno e ficaram sem

representação parlamentar.

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Na Colômbia o presidente Álvaro Uribe foi reeleito no primeiro turno em maio com

62,2% dos votos. Porém, o Pólo Democrático Alternativo alcançou o segundo lugar, com a

candidatura de Carlos Gavíria, superando o Partido Liberal e tornando-se uma alternativa real de

poder no país. Este avanço eleitoral da esquerda deve-se também a um processo de acúmulo das

lutas sociais, da construção de unidade do Pólo, bem como de suas alianças locais e do sucesso

obtido em governos municipais e estaduais conquistados em 2003, como, por exemplo, o governo

municipal de Bogotá e o estado do Valle.

No entanto, Uribe detém a maioria no parlamento desde as eleições parlamentares de

março e vem levando adiante seu programa neoliberal que inclui a realização de um acordo de

livre comércio com os EUA. Aliás, o governo colombiano tem sido um dos aliados mais

importantes dos interesses americanos na América Latina.

No México houve uma das campanhas eleitorais mais disputadas onde o candidato do

Partido da Revolución Democrática (PRD), Andrés Manoel Lopez Obrador esteve na dianteira

praticamente todo o tempo, porém enfrentando uma duríssima campanha caluniosa e

anticomunista que partia dos partidos dos demais candidatos e que era apoiada pelo governo e

pelos meios de comunicação. O comentário sobre a eleição mexicana é um pouco mais longo que

os demais, pois representa uma lição sobre a falta de limites e escrúpulos da direita nas disputas

que para ela são cruciais.

Embora na reta final o candidato do Partido de la Acción Nacional (PAN), Felipe

Calderón, tivesse subido nas pesquisas, ainda assim dificilmente venceria as eleições. No entanto,

no dia 6 de setembro o Tribunal Eleitoral do Poder Judiciário Federal (TRIFE) do México o

declarou vencedor da eleição presidencial ocorrida em 2 de julho, por uma diferença de apenas

243.000 votos (0,58%) num total de 41 milhões de votos.

Os recursos judiciais apresentados por Andrés Manoel Lopez Obrador do PRD solicitando

a recontagem dos votos foram solenemente ignoradas apesar dos sérios indícios de fraude

eleitoral.

O PRD articulou um processo de mobilizações, para pressionar o TRIFE para recontar

todos os votos, por quase dois meses incluindo a realização de grandes assembléias no centro da

Cidade do México, normalmente acompanhadas por mais de um milhão de pessoas e por um

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acampamento de simpatizantes no Zócalo a praça central da cidade, bem como bloqueando as

avenidas principais da capital.

No entanto, manter estas mobilizações justamente onde seu apoio é maior acabou gerando

certo desgaste devido aos incômodos causados à população, particularmente, pelos bloqueios das

avenidas.

A assembléia realizada por Lopez Obrador no dia 16 de setembro deliberou pela

suspensão da mobilização mantida até então e propôs um movimento de desobediência civil e de

não reconhecimento das instituições mexicanas, a começar pela não legitimação do novo

presidente da república. Esta assembléia proclamou Lopez Obrador como o presidente eleito e

decidiu empossá-lo como tal e como dirigente de um governo paralelo no dia 20 de novembro,

uma data simbólica, pois marcou o início da Revolução Mexicana em 1910.

Calderón tentará governar com uma aliança com o Partido de la Revolución Institucional

(PRI) que lhe custará caro e que terá que ser renegociada a cada momento, o que somado à

oposição do PRD lhe promete seis anos difíceis pela frente.

O irônico a estas alturas dos acontecimentos é que determinados setores esquerdistas que

pregaram o voto nulo, pois para eles o PRD e a candidatura de Lopez Obrador não representavam

diferenças fundamentais em relação aos demais partidos e candidatos, agora reconhecem que a

participação eleitoral do PRD, o questionamento radical do sistema eleitoral mexicano e a

assembléia de 16 de setembro que decidiu estabelecer um governo paralelo representam as ações

políticas mais importantes dos últimos anos.

O problema é que agora não há arrependimento e autocrítica que resolva. Lopez Obrador

não foi empossado como presidente porque a direita o combateu ferozmente, desde a tentativa de

impedir que se candidatasse, seguido pela campanha torpe e caluniosa e culminando com a

fraude. A campanha pelo voto nulo e que todos eram “farinha do mesmo saco” ajudou a direita a

dar posse a Calderón.

Uma campanha no sentido contrário poderia ter contribuído para derrotar a direita e

vencer, ao mesmo tempo, o PAN e o PRI, o que não teria sido pouca coisa diante da história

mexicana e teria contribuído muito para transformar o México num país mais democrático, com

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um governo mais respeitoso com os movimentos sociais e que certamente contribuiria para o

processo de transformação política da América Latina e Caribe.

De qualquer maneira, esta eleição confirmou a decadência do PRI e o PRD tornou-se uma

alternativa real de poder polarizando com o PAN e o PRI pela esquerda. A coalizão PRD –

Partido del Trabajo (PT) – Partido de la Convergência (PC) aumentou seu número de cadeiras na

câmara de deputados de 19,4% para 28,99%, enquanto o PRI coligado com o Partido Verde (PV)

caiu de 39,8% para 28,21%. O PAN, por sua vez, cresceu de 29,6% para 33,39%. Outros partidos

menores somaram 9,41%. No senado, o PAN obteve 33,54%; o PRD, 29,69% e o PRI, 28,07%.

Dos 31 estados mexicanos e o distrito federal, os dois candidatos principais ganharam em

16 deles cada um, mas no Estado do México onde o PRI sempre venceu, o resultado foi 2,3

milhões de votos para Lopez Obrador, 1,7 milhões para Calderón e 989 mil para Madrazo do

PRI. Na Cidade do México, o PRD só não conseguiu eleger quatro membros da Assembléia.

Com toda certeza, a situação política do México não será mais a mesma.

Nas eleições presidenciais do Equador em outubro, passou para o segundo turno o

candidato da direita, derrotado por Lucio Gutierrez em 2002, Álvaro Noboa pelo Partido da

Renovação Institucional (PRI) e pela esquerda, o candidato Rafael Correa pela Alianza Pais (AP).

O segundo turno será no dia 26 de novembro.

Na Nicarágua, de acordo com as pesquisas, Daniel Ortega é o candidato com maiores

chances de vencer as eleições no dia 5 de novembro. A situação eleitoral do Equador e Nicarágua

abre a possibilidade de ampliarmos o número de países com governos progressistas.

Por último, está em andamento a consolidação deste processo de mudanças pela via

eleitoral. A começar pela posse de Michelle Bachelet no Chile em março como a segunda

presidente do país, consecutiva, pelo Partido Socialista Chileno. Lula acaba de ser reeleito no

Brasil e em dezembro haverá eleições presidenciais na Venezuela onde 25 candidatos de

oposição enfrentam a candidatura à reeleição de Hugo Chavez que deverá consagrar-se vencedor.

O próximo a apresentar-se é Nestor Kirchner na Argentina em 2007.

Os resultados deste processo de consolidação demonstram que a maioria da população

quer seguir o caminho das mudanças e não se sente seduzida em retornar ao passado. Por

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exemplo, na campanha do segundo turno no Brasil, um dos temas que derrubou o candidato da

direita foi o vínculo de seu partido, o PSDB, e o seu envolvimento pessoal com as privatizações.

Porém, embora esta consolidação não esteja ocorrendo por meio de rupturas profundas no

sistema há uma resistência duríssima da direita à alternância de poder e às mudanças em marcha

no nosso continente.

Em primeiro lugar, seus partidos políticos, suas lideranças principais, a mídia e as forças

econômicas na nossa região apresentam o quadro eleitoral que para nós é tão favorável, de forma

totalmente diferente. Para eles, este ano, houve uma vitória das forças de mercado que barraram o

“populismo de esquerda no Peru, Colômbia e México”.

Chamam nossos governos de populistas para tentar estigmatizar e desqualificar a nossa

política. Quando Lula, Evo ou Chavez visitam bairros e dialogam diretamente com o povo ou

implementam programas sociais é populismo, mas quando FHC monta num jegue, usa chapéu de

vaqueiro nordestino e come “buchada de bode”, como fez em 1994, é simples campanha eleitoral,

assim como quando Alckmin agora arrisca uns passos de forró.

Um outro truque, que partiu do ex-ministro de relações exteriores do governo Fox no

México, Jorge Castañeda, foi o de classificar os governos progressistas entre esquerda moderna e

esquerda atrasada. Segundo ele, no primeiro grupo estariam Kirchner, Tabaré Vazques, Lula e

Bachellet e no segundo Fidel Castro, Chavez e Evo Morales. Tentativa ingênua de sugerir que há

divisões no interior do processo, enquanto temos clareza que há realidades nacionais e processos

políticos distintos e muitos objetivos comuns.

Esta mesma direita tão refinada e defensora da democracia, não tem maiores escrúpulos

em se utilizar de medidas nada democráticas para se manter no poder. Na Venezuela, promoveu

até golpe de estado, que foi derrotado em seguida pela intervenção popular.

Nestas eleições no Brasil, todas as armas foram utilizadas pela coalizão do candidato

presidencial da direita com o apoio dos meios de comunicação, servidores públicos

remanescentes dos governos anteriores e de parte do poder judiciário. As calúnias e o desrespeito

desferidos contra Lula foram de uma dimensão incalculável, embora a conseqüência tenha sido

uma grande perda de credibilidade da mídia.

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No México não hesitaram em utilizar a simples fraude nas eleições. A coligação que

apoiava Lopez Obrador apontou a ocorrência de irregularidades em cerca de 50.000 urnas de um

total de 132.000, ou seja, quase 38% dos votos estão sob suspeita.

Portanto, temos que estar sempre atentos e não minimizar a disposição da direita em lutar

para preservar ou retomar suas posições e interesses e por outro lado, para consolidar o processo

temos que atender às expectativas da população. A próxima eleição onde todas as armas serão

utilizadas para interromper o processo será na Argentina em 2007.

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HERANÇA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL7

Tânia Bacelar de Araújo8

Chamamos de herança recente o período que vai dos anos trinta até hoje, quando o

Brasil passou por uma transformação muito grande. Nos anos 20, este era um país rural e

agrícola. O censo de 1920 dizia que 30% da população brasileira vivia nas cidades e 70%

vivia no campo. Cinqüenta anos depois era o inverso - 70% nas cidades e 30% no campo.

Até 1930, a economia do Brasil era uma economia agrícola. Em 1980, o Brasil era o oitavo

PIB industrial do mundo. Depois dos sete grandes, o oitavo era o Brasil. Isto nos dá uma

idéia da mudança de perfil na sociedade e na economia, em meio século. O que alguns

países passaram séculos para fazer, o Brasil fez em cinqüenta, sessenta anos.

Transformou-se numa potência industrial média, com maior parcela da sua gente

morando nas cidades. Este ainda é o perfil do Brasil. Para entender os dias de hoje, é

necessário saber que Estado tínhamos anteriormente, e que heranças e traços foram

ficando nesse percurso. Essencialmente, o que caracterizava o Estado Brasileiro era seu

caráter desenvolvimentista e conservador9. Não era um Estado do bem estar social. O

Estado era o promotor do desenvolvimento e não o transformador das relações da

sociedade. Um Estado conservador, que logrou promover transformações fantásticas sem

alterar a estrutura de propriedade, por exemplo. Sua grande marca: um estado

desenvolvimentista, conservador, centralizador e autoritário. Nessa fase, o grande objetivo

do Estado brasileiro era consolidar o processo de industrialização. Desde o começo do

século, optou-se pela industrialização. A grande tarefa era consolidar esse processo e fazer

do Brasil uma grande potência; assim, o grande objetivo era de ordem econômica:

construir uma potência intermediária, no cenário mundial.

7 Capítulo extraído do Texto “As Políticas Públicas no Brasil”, publicado pela CESE em 1996 (P. 55-76). Nesses fragmentos a autora aborda aspectos relevantes sobre o papel do Estado brasileiro na configuração do padrão de desenvolvimento.

8 Doutora em Economia Pública, Planejamento e Organização do Espaço, Professora do Mestrado de Geografia; Ciência Política e Desenvolvimento Urbano da UFPE.

9 Esta afirmação foi tirada de um livro muito interessante da Lidia Goldenstein, professora de defendeu e publicou recentemente essa tese. O livro se chama "Repensando a dependência".

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O Estado desempenhava a função de promover a acumulação privada, na esfera

produtiva. O essencial das Políticas Públicas estava voltado para promover o crescimento

econômico, acelerando o processo de industrialização. O Estado brasileiro pretendeu isto

sem transformar as relações de propriedade na sociedade brasileira. O Brasil do século

vinte será exemplo de país que alcançou uma economia das mais dinâmicas, sem ter

transformado suas relações de propriedade. Em certo sentido, o Estado brasileiro compara-

se ao Estado japonês, que também foi desenvolvimentista, mas fez uma transformação

fundamental na sociedade japonesa, distribuindo o acesso à educação. E isto permitiu que

o Japão tivesse a trajetória que teve no século vinte. O Japão era um País destruído, depois

da segunda guerra mundial; arrasado, bombardeado, ocupado militarmente, e, algumas

décadas depois se tornou a segunda potência econômica do mundo. O que sobrou, no

Japão, depois da segunda guerra? Japonês, pessoas relativamente melhor qualificadas do

que a média dos indivíduos das outras sociedades do mundo. Eles montaram a estratégia

de desenvolvimento, com base 'no único recurso abundante que tinham no pós-guerra:

japonês com um bom grau de qualificação. O Estado brasileiro nunca fez isto. A

revolução educacional está para ser feita. As vésperas do século XXI, quando a Educação

é, evidentemente, um requerimento até da Economia, as Políticas Públicas, no Brasil, não

promovem esse acesso que o Estado japonês promoveu. A Reforma Agrária é outro tabu.

O Brasil consegue ser a oitava potência industrial, um grande produtor agrícola do mundo,

inclusive de grãos, sem fazer a Reforma Agrária. Aqui, também, nós seremos um

exemplo: foi possível promover uma industrialização fantástica, com 75% da população

nas cidades, e aumentar de maneira incrível, a produção agrícola, sem mexer na estrutura

de propriedade da terra. A questão da terra continua, ainda hoje, crucial, como no começo

do século XX.

Um outro exemplo de desenvolvimentismo se deu na Coréia. Mas o Estado coreano

foi às relações de propriedade e distribuiu o acesso à terra. E, depois da Reforma Agrária,

montou um programa de industrialização voltado para o mercado interno, e, só no terceiro

momento, internacionalizou seu processo de industrialização. Fala-se muito na revolução

educacional coreana, mas, antes da revolução educacional, foi feita a Reforma Agrária. E,

antes da internacionalização da indústria, foi implantado um parque industrial voltado para

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o mercado interno, que cresceu a partir do momento em que se distribuiu a renda e

democratizou-se o acesso à terra, o que nunca se fez no Brasil. O Estado brasileiro

conseguiu implantar um projeto industrial sem alterar as relações de propriedade da terra.

As oligarquias sempre foram muito fortes no Brasil: sempre estiveram no pacto político

dominante e colocaram essa exigência. O Brasil levou a agricultura ao interior, para não

mexer na estrutura fundiária das áreas consolidadas, para isto, levou estradas, energia,

armazenamento; construiu cidades inteiras no Centro Oeste, por exemplo, porque, no

pacto político estava sempre esta exigência: não mexer na estrutura de posse da terra nas

áreas do processo tradicional de ocupação do país. E esta é uma restrição que permanece

até hoje.

O Estado brasileiro é, tradicionalmente, centralizador. A pouca ênfase no bem-estar,

ou seja, a tradição de assumir muito mais o objetivo do crescimento econômico e muito

menos o objetivo de proteção social ao conjunto da sociedade, fez com que o Estado

assumisse uma postura de fazedor e não de regulador. Nós não temos tradição de Estado

regulador; nós temos tradição de Estado fazedor, protetor, mas não de Estado que regule,

que negocie com a sociedade os espaços políticos; estamos reaprendendo a fazer isto. A

tradição de que Público é governo, Público é governamental, é uma tradição muito forte

na sociedade brasileira e isso leva a que só haja - quando há - Políticas Públicas

governamentais. Esta é a grande dificuldade de se operar com a noção de Estado no Brasil,

que é uma noção mais ampla do que governo. O Estado regulador requer o diálogo entre

governo e sociedade civil, e nós não temos tradição de fazer isto. É um traço autoritário. O

Estado centralizador, em muitos momentos da nossa vida recente, se junta com o

autoritário; tivemos uma longa ditadura no período Vargas; depois uma longa ditadura nos

governos militares pós-64. Então, o viés autoritário é muito forte nas Políticas Públicas do

País.

O Estado fica muito mais vulnerável aos lobbies dos poderosos, mas intenso à

pressão social. Dado ao seu caráter autoritário, não precisa se legitimar com a grande

parcela da sociedade. Então, fica refém dos lobbies dos poderosos nos gabinetes

principalmente, de Brasília, já que o Estado se concentra na União. E as grandes lideranças

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nos períodos das ditaduras, nem pressão podiam fazer. Alguns estavam exilados, outros

foram mortos. Então, a tradição, o ranço da vertente autoritária é um traço muito forte nas

políticas públicas do país. Disto, vem que as políticas públicas eram muito mais políticas

econômicas. Se olharmos a história recente, as políticas sociais e as políticas regionais são

meros apêndices, não são o centro das preocupações das Políticas Públicas. Tanto nas

políticas sociais como nas políticas regionais, o corte é predominantemente compensatório,

porque o central era a política econômica, já que a política industrial era hegemônica,

porque o projeto central era o da industrialização.

A política agrícola também estava no centro, mas era subordinada à política

industrial. Era necessária uma política de exportação, quando não tínhamos o setor

produtor de bens de capital, porque as exportações é que financiavam a importação de

bens de capital para a indústria crescer. Além disso, era preciso essa política de

exportação para pagar a divida externa. Também era necessária uma política agrícola para

produzir alimentos para o mercado interno, porque a população estava sendo atraída para

as cidades, por conta do processo de industrialização. Então, a política agrícola não estava

no centro do foco.

O carro-chefe era a política industrial. A política agrícola só era importante, face aos

objetivos da política industrial. Esta, sim, tem sempre este caráter central no núcleo das

Políticas Públicas e as outras são políticas compensatórias, adicionais, acessórias. As

políticas sociais estão nesta vertente. Define-se a política industrial e a política agrícola do

país, como se o Brasil fosse, todo ele, uniforme; formula-se uma política habitacional, num

país heterogêneo como o nosso, como se o Brasil fosse um grande banco, o mesmo

esquema de financiamento, o mesmo padrão de construção para o país inteiro. Essa é a

visão do corte nacional, com um desprezo fantástico pela heterogeneidade real do País.

Quem está lá em Brasília, tende a pensar que o Brasil é uma média. E a média não diz quase

nada do Brasil, que é um País muito heterogêneo. A conseqüência desse corte é a

dificuldade em considerar a heterogeneidade real do Brasil. Cada lugar requer uma solução

que venha da realidade. Quando se tem uma política centralizada, o tratamento é

homogeneizado.

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O corte nacional tem essa desvantagem e ele esteve muito presente na nossa trajetória

recente. A centralização dá outro viés, porque é proposta de cima para baixo. Essa é uma

outra tradição das políticas, no país: são formuladas a partir do corte nacional setorial e

aplicadas de cima para baixo, par enquadrar a realidade àquela visão, que vem da

abordagem centralizadora, com corte autoritário, e a conseqüente dificuldade de se

promover a participação. (...).

Mas, vejamos ainda: que tipo de ação praticou o Estado? O Estado brasileiro fez

tudo para promover o projeto industrial: financiou, protegeu, criou alíquotas, produziu

insumos básicos. As estatais, que estão sendo privatizadas agora10, produziam insumos

básicos. Naquelas atividades mais pesadas, de investimento mais pesado, com taxa de

retorno mais lento, com insumos que têm mais disseminação, foi que o setor estatal

produtivo entrou. A produção de aço, a mineração, a produção de petróleo e de energia,

tudo isso tem a mesma natureza: é insumo básico. Entrou em projetos grandes, onerosos,

com taxas de retorno mais lentas, para possibilitar que o setor produtivo privado ficasse

com o mais leve e rapidamente rentável. A oferta de infra-estrutura econômica teve um

grande destaque. O que se fez de rodovia, de portos, de instalações de telecomunicações

nesse país, nos últimos anos, é uma coisa fantástica. E quem fez? O Estado brasileiro. As

políticas públicas de oferta da infra-estrutura econômica necessária para o setor produtivo

privado operar ficou praticamente na mão do Estado Brasileiro. (...)

Em menor grau, o Estado brasileiro ofertou, também, serviços sociais, de segurança

e justiça. Mas em muito menor grau. O Estado regulador, embora com uma face muito

menor do que o Estado realizador, também se fez presente, quando imprescindível a seu

projeto. Por exemplo, na era Vargas, o Estado interveio para regular a relação trabalho-

capital. Quer dizer, no momento em que a opção é a da industrialização, que o operariado

vai surgindo e que é necessário definir as regras do jogo entre o trabalho e o capital, o

Estado brasileiro surge com força. É da era Vargas o salário mínimo e o essencial da legislação

trabalhista que ainda se tem. Na Justiça do Trabalho, ou seja, nos mecanismos de regulação da

relação trabalhador urbano e capital, o Estado esteve muito presente. Talvez uma das grandes

marcas do Estado regulador seja a de atuar dentro da lógica de patrocinar a industrialização. Nas 10 O texto refere-se ao período do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso – (nota nossa).

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políticas macroeconômicas o Estado também tem um papel regulador importante. Se

observarmos a trajetória das políticas macro, veremos que seu grande papel é regulador. Até

porque, isto é da natureza das políticas macro: elas ditam as regras do jogo da produção.

Congelamento de preços, política cambial, taxas de juros, são mecanismos muito mais de

regulação do jogo, do que de realização. (...) E o que herdamos disto? Na minha visão, herdamos

um País que consegue ser a oitava economia do mundo, em poucos anos e ao mesmo tempo, tem

a maior fratura social dentre os países de perfil semelhante. Não há outro País que tenha o

mesmo perfil do Brasil. Conseguiu percorrer esta trajetória econômica, que é exitosa do ponto

de vista de seus objetivos, mas nenhum outro país tem o perfil de distribuição de renda do

Brasil: 20% dos mais pobres têm, apenas, 2% da renda nacional, enquanto os 10% mais ricos

têm quase 50% dessa renda. Só a Guatemala, que é um pequeno País, sem a importância

econômica do Brasil, no mundo, é que apresenta um perfil semelhante11. Na verdade, nós

herdamos este perfil: um País com uma grande vitalidade econômica - que, talvez, se torne um

exemplo de êxito econômico na historia do Século XX - e, ao mesmo tempo, profundamente

fraturado, com dois terços da sua população fora do mercado. É com esse Brasil fraturado que

nós vamos enfrentar uma nova era.

Os anos 90 vão ser de mudanças na economia mundial. Vivemos uma fase de crise. Não é

só a crise do mundo socialista. Há uma crise, também, no mundo capitalista. Os economistas

usam dois indicadores básicos para mostrar essa crise: o modesto crescimento da produção -

taxa mundial média de 2,5 a 3%, com exceção da China que tem crescido 10% ao ano, nos

últimos cinco anos. Mas, na média, mesmo os grandes paises têm taxa de crescimento muito

pequena. Outro indicador é a taxa de investimento, também muito modesta nos últimos anos. A

economia capitalista também entrou numa crise nos anos 90 e a fase que a gente vive é de

preparação e de mudanças, talvez, para um outro ciclo expansivo, mas que não se firmou ainda.

Quando o Brasil estava com todo o gás, "tromba" com o ambiente mundial que começa a

enfrentar problemas. Nesse ambiente, creio que haja mudanças que estão se operando no

mundo. E aí, destaco três grandes movimentos: o movimento de globalização; o movimento de

reestruturação produtiva, e o movimento de financeirização da riqueza.

11 Um relatório recente do Banco Mundial e um estudo recente do DIEESE fazem esta comparação.

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PARA UM DESENVOLVIMENTO EM NOVAS BASES (Notas provisórias)

Marco Aurélio Nogueira12

Hoje, quando falamos em desenvolvimento, somos arrastados por alguns temas inevitáveis, que

se impõem por sobre posicionamentos políticos, opções doutrinárias e escolhas teóricas.

1. Estamos sentindo as dores e os prazeres de um quádruplo esgotamento:

a. Esgotou-se, antes de tudo, o modelo de desenvolvimento que fez a glória do capitalismo

no correr dos últimos dois séculos: agressivo, destruidor do trabalho humano, predador da

natureza, impulsionador da produção intensiva de bens de consumo supérfluos, baseado

na subordinação da ciência e da tecnologia aos ditames da produção mercantil,

cronicamente incapaz de produzir, ao mesmo tempo que progresso técnico e

superprodução de bens, padrões superiores de vida coletiva, trabalho e distribuição de

renda. Por mais que esse modelo continue a se reproduzir em escala mundial, ele não

parece mais dar conta de suas contradições e ambigüidades, e perde consensos de modo

generalizado. Sequer a passagem do modelo de uma fase “fordista-taylorista”, marcada

pela rigidez e pelo trabalho-intensivo, para uma fase de “acumulação flexível”, marcada

pela tecnologia-intensiva e pelos impulsos eletro-eletrônicos, melhorou sua sorte. Aliás,

são muitos os indícios e os indicadores de que o capitalismo flexível e informático produz

ainda mais barbárie e horror do que antes: nunca foi tão grande o contraste entre

opulência concentrada e miséria disseminada, entre o estoque extraordinário de

conhecimentos científicos e a progressão de doenças epidêmicas primitivas, etc.

b. Esgotou-se também o modelo neoliberal com que se tentou, dos anos 70 em diante,

responder à falência do modelo taylorista-fordista, contornar a crise do Estado de Bem-

Estar e repor a centralidade do mercado, a partir de políticas de desregulamentação e de

ajustes de clara orientação monetarista. Ainda que o programa neoliberal persista de

forma dissimulada nas agendas governamentais que abriram o século XXI, ficou

ostensivamente patente a sua inadequação aos ideais de uma “boa sociedade” ou mesmo 12 Cientista Político, Professor da UNESP; articulista do jornal O Estado de São Paulo.

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de uma economia capaz de realizar a essência do capitalismo. Os estragos acumulados, o

aumento da miséria e da desigualdade, a tragédia do desemprego, deixaram evidente que

os mercados, por si sós, não têm condições de levar a resultados socialmente justos e

economicamente eficientes. Os próprios fundamentos éticos e intelectuais do laissez-

faire, que haviam ensaiado um retorno triunfal nos anos 1980, chegaram ao início do

século XXI em estado de penúria lógica e moral.

O reformismo neoliberal não oferece alternativa real aos problemas do capitalismo. Se se

pode aceitar que o neoliberalismo conseguiu “ajustar” a economia capitalista e conter a

hiperinflação, não há como negar que agora ele se tornou um perigo, ameaçando paralisar

o enfermo e condená-lo a morrer curado. Os cenários mais facilmente percebidos não

autorizam visões otimistas: o espectro da crise agiganta-se por toda a parte, produzindo

turbulências no plano societal e no individual, no mercado e no Estado, pondo em risco

equilíbrios e direitos.

A despeito dos ininterruptos avanços tecnológicos, das descobertas da ciência e das

conquistas produtivas, a desigualdade continua viva e operante. Desníveis brutais de

renda, de escolaridade, de saúde, de nutrição, de oportunidades, continuam a separar os

homens. Irrompem onde antes havia padrões invejáveis de eqüidade, penetrando pelas

fendas da ordem social, encarapitados nos ombros de desempregados, estrangeiros e

migrantes. Cristalizam-se e ganham inédito aprofundamento em países historicamente

desnivelados e que há décadas vivem na expectativa de que estaria para se iniciar uma era

de maior justiça social. A desigualdade alarga-se por conta da reprodução exaustiva do

passado, por efeito da revolução tecnológica e como conseqüência da combinação de

novos e antigos problemas sociais. Hoje, a rigor, todos os países estão expostos a ela.

Naqueles que mergulham de modo mais passivo na globalização, o impacto é demolidor.

c. Na esteira deste processo, esgotou-se também, nos países capitalistas periféricos, o

modelo desenvolvimentista construído entre as décadas de 30 e 60, sustentado pela

regulação e pela intervenção do Estado, pela “substituição de importações” e, mais tarde,

pelo endividamento das economias, por milagres econômicos que aceleraram

artificialmente a industrialização e não promoveram avanços simultâneos no plano social.

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d. Esgotou-se, enfim, por ter alcançado sua plena explicitação, a crise da esquerda, que bem

ou mal acompanhou as vicissitudes do neoliberalismo, recebeu o impacto das mudanças

estruturais que afetaram as sociedades contemporâneas e sentiu os efeitos da

desagregação do sistema socialista do Leste europeu. Desse ponto de vista, o final do

século XX foi riquíssimo e pleno de novidades e paradoxos.

Na grande maioria dos países e nas diversas posições do espectro político-ideológico, fazem-se

sentir os sintomas deste quádruplo esgotamento. Trata-se de algo ainda impreciso e sem rumo

nítido, muito concentrado na retomada de algum protagonismo social-democrata (a “terceira

via”) e em esforços de reinvenção que envolvem antigos alinhamentos partidários, comunidades

virtuais, organizações civis, movimentos sociais e instituições governamentais. Não há, porém,

como fechar os olhos para as determinações, os efeitos e os desdobramentos potenciais da

situação. Progressivamente, a movimentação “alternativa” foi ganhando ímpeto e se alastrando

por diferentes países, infiltrando-se, como opinião e como incentivo à ação, pelos interstícios da

vida contemporânea, a ponto de reivindicar a constituição de uma “sociedade civil” a ela

vinculada. As sucessivas reuniões do Fórum Social Mundial, as ações ecológicas e

ambientalistas, a proliferação de associações e movimentos antiglobalização, o rápido

crescimento da cibermilitância, possível graças à ampla difusão da Internet, tudo foi mostrando

que homens e mulheres, grupos e classes sociais, ainda que num cenário dramaticamente

condicionado pela ação de poderosos conglomerados e organizado sob a forma de um “império”,

se agitam e se mexem sem cessar.

São fatos que anunciam um aumento do desconforto global e da disposição cívica de lutar por um

“outro mundo”. Uma espécie de reversão parece estar em marcha, dizendo respeito seja à

movimentação social, seja ao campo político-cultural mais especificamente demarcado pela

esquerda e pela democracia.

2. Houve um tempo, não muito distante, em que se acreditava que a pobreza e a desigualdade

representavam uma espécie de “sacrifício” inevitável: eram o preço que se pagaria pela

construção do progresso. Com a expansão econômica, paulatinamente, viria junto a solução para

as mazelas sociais. Bastaria, portanto, operar em termos macroeconômicos para que a igualdade

se produzisse. Nesta medida, não seria necessário investir em políticas sociais, já que o

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desenvolvimento social seguir-se-ia automaticamente ao desenvolvimento econômico. Seria

impossível dividir o bolo antes que ele crescesse. O desenvolvimento seria um processo

inevitavelmente cruel, banhado em sangue, suor e lágrimas, e não se separaria de uma etapa na

qual ocorreria “uma importante restrição do bem-estar no curto prazo em troca da obtenção de

recompensas muito maiores no futuro” (Amartya Sem).

A grande maioria dos latino-americanos sabe bem a que levaram tais convicções. Foram perdidos

anos preciosos à espera de um desenvolvimento que operaria milagres. A industrialização se

acelerou e virou fato marcante em quase todos os países sem que se dessem passos firmes em

direção ao desenvolvimento social. A América Latina não melhorou como deveria nas áreas

estratégicas, na saúde, na habitação, na educação, sem falar na distribuição de renda.

Com o fim das ditaduras e a generalizada retomada da vida democrática no continente, mudou a

sensibilidade dos governos para com a questão. Falas, promessas e intenções tornaram-se mais

generosas e importantes avanços legais foram alcançados. A despeito disso, o fosso permaneceu

dilatado. Os gastos governamentais com o social não subiram, poucos esforços foram

despendidos para melhorar a qualidade da gestão das políticas sociais, quase nada foi feito para

valorizar seriamente o “capital humano” dos diversos países. A inoperância dos governos ressoou

na sociedade, colaborando sobremaneira para tensionar as relações sociais e a convivência

democrática.

Aos poucos, foi aumentando a sensação de que a situação se aproximou demais de seu limite.

Foi-se reconhecendo que o crescimento econômico não traz por si só desenvolvimento social e

que políticas e ajustes macroeconômicos recessivos são poderosas fontes geradoras de pobreza e

desigualdade. É verdade que quanto mais tardar a dinamização das economias, maiores serão as

distâncias sociais. Mas é impossível imaginar um crescimento econômico sustentável sem

investimentos regulares, expressivos e permanentes no social. A pobreza e a desigualdade

deformam a economia, quebram-lhe a competitividade e estiolam seus mercados, chegam mesmo

a bloquear o próprio crescimento. Por isso, a política econômica não pode continuar a ser

concebida de costas para a sociedade, como atributo de técnicos e funcionários preocupados em

racionalizar custos e privilegiar a lógica dos mercados: ela precisa ter um forte e claro conteúdo

social. A adoção de políticas sociais especificamente voltadas para a diminuição da desigualdade

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gera estímulos fantásticos nos vários níveis da sociedade. Sua contribuição para a economia, por

exemplo, é notável, tanto em termos de aumento da eficiência dos trabalhadores quanto em

termos de estabilidade. Sem diminuição da desigualdade e da exclusão, além do mais, a política e

a democracia ficam permanentemente ameaçadas.

Este “novo” modo de pensar as conseqüências da pobreza e as relações entre o econômico e o

social freqüenta agendas de governos, de ONGs e de partidos democráticos, tornou-se

recomendação expressa de importantes agências internacionais de fomento, como o Banco

Mundial, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e o Banco Interamericano de

Desenvolvimento. Nunca se reuniram tantos apoios para uma causa tão nobre. O caminho não

está inteiramente aberto e a lógica cega e irracional da globalização capitalista está mais viva do

que nunca. Mas não deixa de ser motivo de esperança perceber que o campo de batalha está

delimitado, e nele pequenas vitórias têm repercussões de impacto incomensurável.

3. Da década de 1990 para cá, estamos às voltas com um ciclo sem projetos nacionais, como

costumamos falar.

É um ciclo que gira em torno de três eixos principais: democratização, desenvolvimento e

reforma.

O contexto geral de globalização capitalista, ao promover uma certa “desconstrução” dos

Estados-nação, força a que os aparelhos de Estado adquiram maior preeminência do que o

Estado como comunidade de destino. A reforma do aparelho de Estado subiu ao palco e arrastou

consigo, para os bastidores, a idéia mesma de Estado e, por extensão, de comunidade nacional. O

Estado tornou-se um personagem incômodo na nova ordem mundial em constituição.

Ao mesmo tempo em que se diluem as imagens e os símbolos nacionais, a questão nacional

reaparece, no mundo, sob a forma do fundamentalismo religioso, do fanatismo xenófobo e da

afirmação daquilo que Castells chamou de “identidades de resistência”.

É um tipo de nacionalismo em parte à moda antiga (apaixonada e cegamente irracional) e em

parte antiinstitucional. Seus protagonistas são movimentos, não partidos. É a “sociedade civil”,

bem mais que o Estado. Até sua noção de direitos de cidadania parece ancorar fora da nação,

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num território cosmopolita que não dá muito abrigo ao que acontece no plano mais concreto da

vida nacional.

4. Como pensar o desenvolvimento neste contexto?

a. É impossível conceber vida comunitária sem espaços organizados e sem estratégias de

desenvolvimento.

b. Hoje, a organização dos espaços e a definição das estratégias de desenvolvimento são

objetivadas sempre mais de modo compartilhado. As nações (e seus Estados) tornaram-se

interdependentes e não podem dar passos isolados, num andamento exclusivo.

c. Mas as nações não desapareceram e nem deixaram de ser protagonistas estratégicas da

aventura histórica mundial. Ainda continuam a ser os grandes elos que unem o planeta. Sem

elas não há rede mundial. Não é verdade que tudo acontece exclusivamente a partir dos

interesses das empresas e dos mercados. Não necessitamos somente de instituições

mundiais de regulação, que “dêem um Estado” à sociedade mundial em constituição e

controlem o mercado irresponsável. Precisamos também de Estados nacionais capazes de

atuar com generosidade em seus âmbitos específicos de atuação e de jogar um papel

positivo no mundo.

d. Sendo isso verdadeiro, ou ao menos razoável, a questão do projeto nacional mantém-se

mais viva do que nunca. Continua a ser indispensável descobrir um modo de manter e

atualizar os laços que unem as pessoas em comunidades que são essencialmente nacionais,

ainda que não sejam mais apenas nacionais.

e. O diferencial é que hoje não dá para simplesmente concentrar esforços no Executivo forte e

esperar que ele “faça a história”. Não dá para desalojar a sociedade civil e o mundo dos

movimentos do palco dos acontecimentos. Ao mesmo tempo, porém, o social não basta a si

próprio: na ausência de um Estado, o social desvincula-se da idéia republicana, ou seja,

converte-se em um espaço de interesses autonomizados, mas não de direitos. O melhor

terreno para o desencadeamento de dinâmicas de emancipação, de liberdade e de

autodeterminação não é o Estado em sentido estrito (ou seja, o mundo do governo, da

administração ou do poder), mas a sociedade civil, quer dizer, a malha de movimentos e

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associações com as quais os interesses sociais se organizam e buscam se afirmar perante os

demais, diante do Estado e como Estado.

f. Hoje, também não dá para minimizar o valor da democracia política e a força da

democratização. Sem dinâmicas dialógicas e sem formas ampliadas e sustentáveis de

participação, não haverá avanços. Ficou para trás a idéia de que o decisionismo estatal abre

as portas do futuro.

g. Por fim, é impossível reiterar a idéia tradicional de desenvolvimento, qual seja, a do

desenvolvimento econômico impetuoso e não-sustentável, indiferente à natureza e aos

homens.

5. Um projeto nacional e democrático de desenvolvimento – em torno do qual pode crescer um

novo pensamento crítico, de esquerda – será simultaneamente:

- democrático e institucional,

- construtivista e deliberativo,

- participacionista e dialógico,

- ecológico e desenvolvimentista,

- distributivista e igualitário.

6. Particularmente no que diz respeito à idéia de desenvolvimento, creio ser possível observar

também o seguinte.

a. Há hoje algumas limitações dramáticas ao desenvolvimento à moda antiga. O próprio meio

ambiente, a natureza, não suporta mais a continuidade da predação. Não teria como

assimilar a reiteração de um esforço de expansão que se concentrasse na produção intensiva

de bens supérfluos, maciçamente distribuídos, repletos de “valor agregado” mas incapazes

de gerar valorização social. Uma hipotética tentativa de incentivar os países pobres a

acelerar suas turbinas para se aproximarem dos países ricos esbarraria numa crise ecológico

de proporções catastróficas.

b. Há também uma limitação ética ao mero prosseguimento de um padrão de desenvolvimento

indiferente à sorte das comunidades. Trata-se de uma limitação que apenas desponta, mas

que certamente ganhará fôlego daqui para frente.

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c. Um novo modelo de desenvolvimento terá de ser economicamente viável, socialmente

justo, ambientalmente equilibrado, tecnologicamente avançado, focado na qualidade do

produto e da vida, bem como capaz de incorporar pessoas, não apenas tecnologia. Terá de

ser sustentável. Traduzindo em detalhes, trata-se de um desenvolvimento capaz de:

- desconcentrar, distribuir renda e produzir equilíbrios;

- progredir em ritmo mais lento e com menor competitividade;

- colar-se às reais necessidades sociais (e não apenas aos interesses de mercados e

empresas);

- basear-se na responsabilidade e na responsabilização de todos, e de modo

particular das empresas e dos mercados;

- ser solidário.

- articular grandes, médios e pequenos empreendimentos.

d. Desenvolvimento é mais que crescimento. Não se trata de inovação tecnológica ou de

expansão produtiva em sentido estrito. Se não trouxer consigo empregos e

humanidade, vale pouco. Desenvolvimento precisa viabilizar uma “vida melhor”, não

apenas superávits e aumentos do PIB.

7. Não poderá haver desenvolvimento sustentável sem regulação. Qualquer forma avançada de

crescimento e de progresso somente se objetivará se for politicamente concebido, sustentado e

controlado. O desenvolvimento é uma decisão política e pressupõe um pacto social.

a. A regulação política, porém, não poderá mais ser estritamente estatal. Não se trata apenas

de “mais Estado”, sobretudo se isto significar “mais aparelho de Estado” e “mais

intervenção estatal”. Nas atuais condições sócio-políticas, a regulação terá de ser também

social: terá de abrir espaço para “mais sociedade civil”. Além de decisões (de investimento,

de alocação de recursos, de políticas públicas), necessita-se também de opiniões e pressões

ético-políticas.

8. Não pode haver desenvolvimento – e muito menos desenvolvimento sustentável – sem algum

tipo de contestação da dominância do capital financeiro, e isso no mínimo por duas razões:

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a. Por sua volatilidade e por sua natureza “parasitária”, este capital permite apenas um

crescimento artificial, trava a produção e instabiliza a economia, deixando-a sem condições

de gerar movimentos orgânicos e regulares de expansão.

b. O capital financeiro tem, como programa político, uma reforma do Estado que afasta o

Estado da regulação e impossibilita qualquer política social conseqüente. Converte a

política social, na melhor das hipóteses, numa mera continuidade da compensação

tradicional (o que não pode ser desprezado), impossibilitando-a de se traduzir numa ação

reformadora efetivamente distributiva e aberta para a reformulação do pacto social e do

perfil social da sociedade.

c. A contestação do capital financeiro não precisa ser entendida em chave revolucionarista,

como se fosse possível uma ruptura súbita e categórica com a ordem sistêmica capitalista.

Ela só pode ser feita em termos processuais.

d. Aceitar a dominância do capital financeiro representa a reiteração dos mesmos interesses de

classe (das alianças e dos projetos de poder) que têm patrocinado a atual armação sócio-

cultural do capitalismo globalizado. Significa, em suma, manter inalterada a direção de

classe da orientação macroeconômica, da política social e da reforma do Estado, por mais

que se possam admitir mudanças tópicas no plano do discurso, da formulação de programas

sociais generosos ou do gerenciamento público.

9. Tanto para ser construído quanto para ser implementado e sustentado, um novo

desenvolvimento requer uma modificação generalizada no modo de ver o mundo, de organizar

as atividades, de agir politicamente e de pensar teoricamente:

- um novo associativismo;

- um novo padrão de demanda: aprender a “pedir menos”;

- um novo modo de compor as agendas;

- uma nova teoria democrática, de perfil não-institucionalista, ou seja, que saiba

pensar o institucional como parte da experiência histórica viva, como produto dela, não como

uma variável independente ou como a resultante de modelos abstratamente concebidos;

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- novas formas de luta, baseadas na negociação, na persuasão, no convencimento

público, numa pressão social que não se divorcie da ação institucional, em “tempos mais longos”.

Esta é certamente uma conclusão insuficiente. Mas creio que ela pode nos ajudar a manter

distância da tentação de pensar e projetar o desenvolvimento em termos “patrióticos” e ufanistas

ou à moda antiga, como derivação exclusiva do estatal.

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