concepÇÕes e aÇÕes docentes de educaÇÃo …
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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DAS CIÊNCIAS
ADELMO FERNANDES DE ARAÚJO
CONCEPÇÕES E AÇÕES DOCENTES DE EDUCAÇÃO
AMBIENTAL, SUSTENTABILIDADE E COMPLEXIDADE NO
CONTEXTO ESCOLAR
Recife - PE
2016
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DAS CIÊNCIAS
DOUTORADO EM ENSINO DAS CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
CONCEPÇÕES E AÇÕES DOCENTES DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, SUSTENTABILIDADE E COMPLEXIDADE NO
CONTEXTO ESCOLAR
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino
das Ciências da Universidade Federal Rural de Pernambuco
(UFRPE) como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do
título de Doutor em Ensino de Ciências e Matemática.
Orientadora: Profa. Dra. Maria Marly de Oliveira Coorientador: Prof. Dr. Romildo de Albuquerque Nogueira
Recife - PE
2016
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Sistema Integrado de Bibliotecas da UFRPE Biblioteca Central, Recife-PE, Brasil
M188c Araújo, Adelmo Fernandes de Concepções e ações docentes de educação ambiental, sustentabilidade e complexidade no contexto escolar / Adelmo Fernandes de Araújo. – 2016. 131 f. : il. Orientadora: Maria Marly de Oliveira. Coorientador: Romildo de Albuquerque Nogueira. Tese (Doutorado) – Universidade Federal Rural de Pernambuco, Programa de Pós-Graduação em Ensino das Ciências, Recife, BR-PE, 2016. Inclui referências e apêndice(s). 1. Educação ambiental 2. Sustentabilidade 3. Ensino I. Oliveira, Maria Marly de, orient. II. Nogueira, Romildo de Albuquerque, coorient. III. Título
CDD 507
CONCEPÇÕES E AÇÕES DOCENTES DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, SUSTENTABILIDADE E COMPLEXIDADE NO
CONTEXTO ESCOLAR
Banca Examinadora:
____________________________________________________
Profa. Dra. Maria Marly de Oliveira – UFRPE Presidente
____________________________________________________
Profa. Dra. Sandra Regina Paz da Silva – UFAL Examinadora externa
____________________________________________________
Profa. Dra. Solma Lúcia Souto Maior de Araújo Baltar – UFAL Examinadora externa
____________________________________________________
Profa. Dra. Gilvaneide Ferreira de Oliveira – UFRPE Examinadora externa
____________________________________________________
Profa. Dra. Zélia Maria Soares Jófili - UFRPE Examinadora interna
____________________________________________________
Prof. Dr. Romildo de Albuquerque Nogueira – UFRPE Coorientador
Tese defendida e aprovada em: 21 / 12 / 2016
DEDICATÓRIA
Professor Juvenal Cordeiro Inô (in memorian) Seu Fernando, Nando, Delson, Cicinho, Luiz e Kleber,
foram Vossas Parcerias que me impulsionaram até aqui. Aos Senhores dedico
AGRADECIMENTOS
O Tratado da Gratidão de Sto. Tomás de Aquino fala dos três níveis da gratidão:
o nível superficial (reconhecimento intelectual), o nível do agradecimento (dar
graças a alguém por algo que esse alguém nos fez) e o nível profundo (do vínculo
e do comprometimento com as pessoas). Assim, digo obrigado, e obrigado quer
dizer, fico obrigado, vinculado e comprometido perante vós.
Alá/Brahma/Caos/Deus/Olodumaré – minha causa primeira e única.
Equipe Espiritual: Dona Yvonne, Salatiel, Zazi, Irmã Veneranda, Irmão
Clarêncio e tantos outros – por estarem ao meu lado me inspirando, intuindo,
encorajando, amparando e reconfortando.
Dona Creuza e Seu Fernando – meus pais, meus lastros e esteios nessa
jornada terrena, a quem devo essa encarnação e suas extensões.
Fernando, Delson e Cicinho – meus irmãos, por partilharem comigo o mesmo
seio familiar, berço de humildade e amor.
Carol (minha filha bem-amada) e Anginha – pelas parcerias de vida vivida.
Lula – meu irmão-amigo, pelo apoio incondicional, que me tem sido alento no
turbilhão da vida.
Kleber Henrique – meu companheiro, pelos ensinamentos e aprendizados
intelectuais, místicos e humanos, que mutuamente temos vivenciado.
Profa. Dra. Maria Marly de Oliveira – orientadora, pelo exemplo de sabedoria,
competência, simplicidade carinho e amizade com que conduziu esse
doutoramento.
Prof. Dr. Romildo de Albuquerque Nogueira – coorientador, pela atenção,
dedicação, profissionalismo e confiança em mim.
Professores e Licenciandos – sujeitos deste estudo, que confiaram a mim
conhecer parte de suas trajetórias, sobre as quais me debruço nessa investigação.
A todos e todas, ausentes, presentes, encarnados e desencarnados, que
contribuíram para a minha formação humana e acadêmica, comigo chegaram até
aqui e ainda hão de comigo caminhar.
Eternamente fico obrigado, vinculado e comprometido perante vós.
Aos “Doutores” o melhor quinhão.
Quanto a mim, creio que:
“Somos todos filhos de Deus e, nessa condição, seus herdeiros. Isto significa que nascemos para a felicidade e para sermos felizes,
independente de quem fomos ou do que fizemos. Todas as experiências se convertem em aprendizado,
importando que, de agora em diante, esforcemo-nos por fazer diferente”. Yvonne do Amaral Pereira/Pedro Camilo (2014)
SUMÁRIO
Dedicatória.................................................................................................... iii Agradecimentos............................................................................................ iv Epígrafe........................................................................................................ v Sumário......................................................................................................... vi Resumo......................................................................................................... viii Abstract......................................................................................................... xix Resumen....................................................................................................... x Lista de Figuras............................................................................................. xi Lista de Quadros........................................................................................... xii Lista de abreviaturas e siglas........................................................................ xiii INTRODUÇÃO..............................................................................................
14
Capítulo 1
DIALOGANDO SOBRE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, SUSTENTABILIDADE E COMPLEXIDADE
1. Educação, formação e práticas docentes....................................... 21
1.1 Educação Ambiental: paradigmas, trajetórias e definições............. 24
1.2 Ruptura paradigmática: do cartesianismo ao paradigma complexo.........................................................................................
26
1.3 Trajetórias e documentos da educação ambiental......................... 28
1.4 Educação ambiental escolar........................................................... 31
1.5 Sustentabilidade ............................................................................. 43
1.6 Complexidade ................................................................................. 52
Capítulo2
O PERCURSO METODOLÓGICO DA INVESTIGAÇÃO 2. Tipo de pesquisa: abordagem qualitativa........................................ 60
2.1 Pesquisa de campo......................................................................... 62
2.1.1 Campo de pesquisa......................................................................... 62
2.1.2 Sujeitos da pesquisa....................................................................... 64
2.2 Estratégias metodológicas utilizadas para construção dos dados.. 68
2.2.1 Entrevistas....................................................................................... 68
2.2.2 Questionários abertos..................................................................... 69
2.2.3 Observação participante............................................................... 70
2.3 Metodologia interativa: um processo hermenêutico – dialético....... 71
2.3.1 Círculo Hermenêutico-Dialético....................................................... 72
2.3.2 Categorias de análise no processo hermenêutico-dialético............ 74
2.4 Análise hermenêutico-dialética (AHD)............................................. 76
2.5 Operacionalização da pesquisa: seus momentos........................... 77
Capítulo 3
TECENDO RELAÇÕES ENTRE AS UNIDADES DE ANÁLISE E AS CATEGORIAS TEÓRICAS
3.1 Concepções docentes sobre educação ambiental,
sustentabilidade e complexidade.................................................... 80
3.1.1 Concepções sobre educação ambiental......................................... 80
3.1.2 Concepções sobre sustentabilidade................................................ 85
3.1.3 Concepções sobre complexidade ................................................... 89
3.2 Como é trabalhada a educação ambiental na prática docente....... 93
3.3 Relações entre educação ambiental, sustentabilidade e complexidade..................................................................................
100
3.4 Sugestões de melhoria da prática docente em educação ambiental.........................................................................................
104
3.5 Sugestão de Oficina de Formação Docente (OFD).......................... 108 CONCLUSÃO...............................................................................................
109
REFERÊNCIAS............................................................................................
115
Apêndice A: Roteiro das entrevistas.............................................................
123
Apêndice B: Questionário aplicado as licenciandos.....................................
125
Apêndice C: Convite enviado aos Docentes e Licenciandos.........................
128
Apêndice D: Roteiro da Oficina de Formação Docente (OFD).......................
129
Apêndice E: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido...........................
130
RESUMO
Esta tese trata de um estudo realizado a partir das concepções e ações docentes de educação
ambiental, sustentabilidade e complexidade no contexto escolar. Discute a educação ambiental
contextualizando a sustentabilidade, o rompimento com o paradigma cartesiano e a importância da
complexidade para o ensino-aprendizagem das questões relativas ao meio ambiente. A maneira como
os professores concebem e praticam as atividades é o mote reflexivo para inferirmos sobre as
contribuições de seus ofícios na formação dos alunos. Partindo da problemática: quais são as
concepções e atividades docentes de educação ambiental, sustentabilidade e complexidade que estão
sendo trabalhadas em escolas da educação básica do agreste alagoano; e quais seus possíveis
impactos na formação de sujeitos críticos e transformadores. Objetivamos analisar as concepções e
ações docentes de educação ambiental, sustentabilidade e complexidade visando oferecer subsídios
para uma prática crítico-transformadora. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, cujos dados foram
construídos através da técnica de entrevistas do CHD (docentes), questionários abertos (licenciandos)
e observação participante; categorizados e analisados através da Análise Hermenêutico-dialética. As
concepções identificadas de educação ambiental apresentam caráter intervencionista, naturalista,
individual, disciplinar e comportamental. Sobre sustentabilidade, abordam seus aspectos técnicos
(manejo do meio ambiente) e não tratam das questões da educação. Em relação à complexidade,
desconhecem o termo, ou apresentam confusão conceitual do seu significado, associando-o a níveis
de organização biológico. Quanto às atividades de educação ambiental há docentes que não as
realizam. Outros realizam, mas não desenvolvem ações que contemplam a contextualização, a
transversalidade e a interdisciplinaridade. Os resultados evidenciam um obstáculo significativo na
formação de indivíduos críticos e transformadores, sendo necessário investir na formação dos
professores. Enfatizando mudanças paradigmáticas no modo de pensar, falar e agir docente, para que
suas escolhas epistemológicas e metodológicas contribuam para a formação discente. Este estudo
pode contribuir para refletir sobre futuros processos de formação docente que primem pela construção
de uma sociedade sustentável e ambientalmente justa.
Palavras-chave: Educação ambiental, sustentabilidade, complexidade, criticidade e transformação.
ABSTRACT
This thesis deals with a study based on the conceptions and actions of teachers of environmental
education, sustainability and complexity in the school context. It discusses environmental education by
contextualizing sustainability, breaking with the Cartesian paradigm and the importance of complexity
for teaching-learning about environmental issues. The way teachers conceive and practice activities is
the reflexive motto for inferring about the contributions of their crafts in the training of students. Starting
from the problematic: what are the conceptions and teaching activities of environmental education,
sustainability and complexity that are being worked in schools of the basic education of the Agreste
region in the state of Alagoas; and what its possible impacts on the formation of critical and transforming
subjects. We aim to analyze the conceptions and teaching actions of environmental education,
sustainability and complexity aiming to offer subsidies for a critical-transforming practice. This is a
qualitative research, whose data were constructed through the technique of CHD interviews (teachers),
open questionnaires (for Licentiate degree students) and participant observation; categorized and
analyzed through Hermeneutic-Dialectic Analysis. The identified conceptions of environmental
education are interventionist, naturalistic, individual, disciplinary and behavioral.On sustainability, they
address their technical aspects (environmental management) and do not address education issues. In
relation to complexity, they do not know the term, or present conceptual confusion of its meaning,
associating it with levels of biological organization. As for environmental education activities there are
teachers who do not do them. Others carry out, but do not develop actions that comprises
contextualization, transversality and interdisciplinarity. The results show a significant obstacle in the
formation of critical and transforming individuals, and it is necessary to invest in teacher training.
Emphasizing paradigmatic changes in the way teachers think, speak and act, so that their
epistemological and methodological choices contribute to the formation of students. This study may
contribute to influence on future processes of teacher training that will lead to the construction of a
sustainable and environmentally fair society.
Keywords: Environmental education, sustainability, complexity, criticality and transformation
RESUMEN
Esta tesis es un estudio realizado delante las concepciones y acciones de los profesores de educación
ambiental, sostenibilidad y complejidad en el contexto escolar. Se analiza la educación ambiental
contextualizando la sostenibilidad, la ruptura con el paradigma cartesiano y la importancia de la
complejidad de la enseñanza y el aprendizaje de cuestiones relacionadas con el medio ambiente. La
forma en que los profesores conciben las actividades de práctica es el tono reflexivo para inferir sobre
las contribuciones de sus trabajos en la formación de los estudiantes. Partiendo de la problemática:
cuales son las concepciones de los profesores y actividades de educación ambiental, la sostenibilidad
y la complejidad que se está trabajando en las escuelas de educación básica de agreste alagoano; y
cuales son sus posibles impactos en la formación de sujetos críticos y transformadores. El objetivo fue
analizar las concepciones y la enseñanza de la educación ambiental, la sostenibilidad y la complejidad
con la intención de ofrecer subsidios para una práctica crítica y transformadora. Se trata de un estudio
cualitativo, cuyos datos fueron construidos por la técnica de entrevistas CHD (maestros), cuestionarios
abiertos (licenciados) y observación participante; categorizados y analizados por Análisis
Hermenéutico-dialéctico. Los conceptos de educación ambiental han identificado intervencionista,
naturalista, individual, disciplinar y el comportamiento. Sobre sostenibilidad, abordan sus aspectos
técnicos (gestión ambiental) y no abordan las cuestiones de educación. En cuanto a la complejidad, sin
darse cuenta del término, si existe confusión conceptual del significado, asociándolo con los niveles
biológicos de la organización. En cuanto a las actividades de educación ambiental para maestros que
las no realizan. Otros lo hacen, pero no se desarrollan actividades dirigidas a la contextualización, la
transversalidad y la interdisciplinariedad. Los resultados muestran un obstáculo importante en la
formación de individuos críticos y transformadores, es necesario invertir en la formación de profesores.
Haciendo hincapié en los cambios paradigmáticos de la manera de pensar, hablar y actuar
educativamente, para que sus opcinoes epistemológicas y metodoloicas contribuyan a la formación
del estudiante. Este estudio puede contribuir a reflexionar sobre los futuros procesos de formación de
profesores que se destacan por la construcción de una sociedad sostenible y ambientalmente justa.
Palabras clave: Educación ambiental, la sostenibilidad, la complejidad, la criticidad y transformación.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Círculo Hermenêutico-Dialético............................................ 73
Figura 2 Classificação dos dados....................................................... 75
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Perfil dos docentes participantes da investigação................. 65
Quadro 2 Disciplinas citadas pelos licenciandos................................... 66
Quadro 3 Matriz das categorias de dados............................................. 75
Quadro 4 Matriz geral das categorias de dados investigados................ 79
Quadro 5 Educação ambiental (Concepção)......................................... 81
Quadro 6 Sustentabilidade (Concepção)............................................... 85
Quadro 7 Complexidade (Concepção).................................................. 89
Quadro 8 Como é trabalhada a educação ambiental (Atividades desenvolvidas) ......................................................................
93
Quadro 9 Relações entre educação ambiental, sustentabilidade e complexidade.........................................................................
100
Quadro 10 Sugestões de melhoria da prática docente em educação ambiental...............................................................................
104
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AHD Análise Interativa Hermenêutico-Dialética
et al Expressão latina que significa “e outros”
CHD Círculo Hermenêutico-Dialético
CNUMAD Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e
Desenvolvimento
Dr./Dra. Doutor / Doutora
EA Educação Ambiental
EAE Educação Ambiental Escolar
EJA Educação de Jovens e Adultos
ONU Organização das Nações Unidas
PIB Produto Interno Bruto
PIBID Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência
PCN Parâmetros Curriculares Nacionais
PNEA Política Nacional de Educação Ambiental
PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
Prof./Profa. Professor / Professora
ProNEA Programa Nacional de Educação Ambiental
sic Expressão latina que significa “isso mesmo/assim mesmo”
SISNAMA Sistema Nacional de Meio Ambiente
UFAL Universidade Federal de Alagoas
UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura
UFRPE Universidade Federal Rural de Pernambuco
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INTRODUÇÃO
“O senhor [...] Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto:
que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando.
Afinam ou desafinam”1
As discussões em torno da educação ambiental (EA) envolvem diversas
temáticas, perspectivas teóricas e metodológicas. A sua legitimação tem se dado
através de debates, realizações de conferências e elaborações de documentos, tanto
na esfera governamental, quanto na civil. No universo de pesquisas em que a EA vem
sendo construída ao longo das últimas décadas, ressaltamos que algumas questões
da EA que é desenvolvida no ambiente escolar, nos intrigam e incitam a procurar
explicações e compreensões para as suas ocorrências.
O campo da EA que ocorre nas escolas apresenta algumas especificidades
distintas para a sua efetivação e dentre elas, destacamos a figura dos professores.
Neste estudo, nossa intenção é olhar para eles, para seus processos formativos, suas
concepções e atividades que realizaram ou estavam realizando, no momento da
pesquisa, em EA, buscando compreender como essas práxis se efetivam e quais os
seus impactos na formação dos discentes.
Araújo (2006; 2011) apresentou estudos acerca da EA desenvolvida em
escolas, nos quais podemos perceber um distanciamento entre as concepções, os
saberes e as atividades vivenciadas nas ações de EA na escola, e a formação de
sujeitos capazes de interferir no meio socioambiental em que se encontravam. Araújo2
(2006) destaca que os discentes envolvidos na pesquisa não conseguiam relacionar
o lixo que eles mesmos produziam, durante o tempo em que permaneciam na escola,
com suas atividades; e que os docentes defendiam a ideia de que a questão do lixo
no ambiente escolar se devia à falta de educação doméstica dos alunos.
1 ROSA, João Guimarães. Grande Sertão: Veredas. 1994. 2 Monografia de Especialização no ensino de Biologia, intitulada Resíduos escolares: percepção e atitude ambientais dos estudantes e professores de uma escola pública na cidade de Recife, que verificou como os estudantes e professores percebiam e agiam em relação ao descarte final dos resíduos produzidos por suas ações, no espaço escolar.
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No estudo de Araújo3 (2011) os professores realizaram projetos de trabalho
para desenvolver atividades de EA e para tal, escolheram algumas turmas. Quando
questionados sobre os motivos que os levaram a escolher tais turmas, a resposta foi
“a grande quantidade de lixo presente nas referidas salas de aula”. Um outro dado
que merece menção é o fato de que após a realização dos projetos de trabalho, os
professores se queixavam que tiveram grandes dificuldades para desenvolvê-los, pois
a indisciplina e a falta de empenho dos alunos na temática escolhida eram muito
grandes.
Ao analisar tais dados, Araújo (2011) ressalta que a metodologia empregada
pelos professores requeria uma prática docente com ênfase na mediação, na qual
docentes e discentes deveriam partir de uma problemática de pesquisa, e através da
busca de fontes de informação, interpretações, análises e elaborações fossem
capazes de propor soluções para os problemas apresentados. Em oposição a esse
modelo, os docentes desenvolveram os projetos de trabalho centrados em aulas
expositivas e de transmissão de saberes prontos, meramente disciplinar, nas quais os
alunos copiavam o que era escrito no quadro branco, sem nenhuma elaboração, nem
reflexão.
Os dados apresentados acima nos levam a inferir que de fato há um obstáculo
para que as aulas de EA sejam momentos de reflexão crítica das questões ambientais,
considerando-se as complexidades que lhes são inerentes, nas múltiplas esferas da
vida social, política, econômica e da natureza. Tratar a EA nessa vertente requer um
modelo de pensar e agir que considere as questões do ambiente inseridas nos seus
contextos: cultural, social, político e econômico. Assim, a ação pedagógica deve ter
essa intencionalidade, e concorrer para a formação de indivíduos capazes de
criticamente interferir na realidade na qual estão inseridos.
Além dessas constatações, temos o fato de que os temas desenvolvimento
sustentável e sustentabilidade permeiam todos os discursos e práticas da EA, seja no
meio escolar, social, econômico ou governamental. Se tomarmos como parâmetro o
Triple Bottom Line (a linha das três pilastras) que propõe como modelo de
desenvolvimento sustentável a ideia de economicamente viável, socialmente justo e
3 Dissertação de Mestrado em ensino das Ciências, intitulada Projetos de trabalho e educação ambiental: uma estratégia de ensino-aprendizagem sob a perspectiva da complexidade, que analisou o uso de projetos de trabalho como estratégia de ensino-aprendizagem em educação ambiental sob a perspectiva da complexidade.
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ambientalmente correto; podemos fazer uma análise do quanto os conceitos,
interesses e ações divergem quando tratam da questão da sustentabilidade e ou do
desenvolvimento sustentável.
Boff (2013) ao analisar criticamente esse tripé, pontua que na esfera
empresarial e dos negócios o economicamente viável se refere a quantidade que deve
sempre crescer, crescimento material, ganhar dinheiro com o menor investimento,
máxima rentabilidade e concorrência e menor tempo, um modelo
industrial/capitalista/consumista. O socialmente justo é impossível sob a ótica de
produção e consumo capitalista. Basta olharmos para nosso país, no qual cinco mil
famílias controlam 46% do PIB4, em detrimento da imensa parcela da população que
vive à margem, em pleno descaso do poder público, em situações de miséria
socioambiental. Neste modelo econômico, o discurso do ambientalmente correto e
justo se move em direção à natureza tirando-lhe tudo que lhe for útil e lucrativo,
destruindo a biodiversidade.
Para Boff (2012) “no modelo padrão de desenvolvimento que se quer
sustentável, o discurso da sustentabilidade é vazio e retórico”. Há um paradoxo no
que desejamos e acreditamos como sendo desenvolvimento sustentável ou
sustentabilidade e nossas ações no cotidiano. Tanto na esfera social quanto
educativa, os discursos são incongruentes com as práticas. Esse fato nos leva a
reflexões sobre esse modelo compartimentado de pensar e agir que aprendemos.
Para a manutenção desse sistema acreditamos que as propostas educativas
centradas no modelo linear, binário e analítico não permitem o entendimento das
questões ambientais como sendo um sistema complexo, em que as questões sociais,
econômicas e políticas, têm interesse em manter as desigualdades, o consumo
descontrolado, as injustiças e a exploração.
Mariotti (2013) relata que muitas pessoas, talvez a maioria, têm dificuldade em
“pensar de maneira linear/binária, isto é, pensar em termos de interconexões de
coisas, ideias, pessoas e eventos”. Essa dificuldade precisa ser rompida, visto que se
os seres vivos e a natureza são complexos, todas as relações estabelecidas entre
eles são igualmente complexas. Desconsiderar essa premissa é reduzir a
sustentabilidade a práticas acríticas, descontextualizadas e que não resultam em
impactos de transformação na construção de um Planeta sustentável.
4 Atlas Social do Brasil de 2010, publicado pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
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Face ao exposto, justificamos esta tese pela necessidade de refletir e
compreender como os professores concebem e praticam a EA nas escolas, a
sustentabilidade e a complexidade; de que maneira articulam saberes e metodologias
quando se propõem a trabalhar EA no âmbito escolar e quais os possíveis impactos
dessa EA na formação dos discentes.
Este estudo que parte dos espaços de formações docentes que ora atuamos,
e busca compreender os sujeitos pesquisados, que são os licenciandos em Ciências
Biológicas da UFAL/Arapiraca (docentes em formação inicial) e os professores que já
atuam na educação básica de escolas do agreste alagoano (docentes em formação
continuada). Considerando, seus contextos do pensar (concepções) sobre EA,
sustentabilidade e complexidade; suas formações e práticas em atividades
consideradas como sendo de EA.
Esta tese foi pensada e construída a partir do ponto de vista dos professores
através de um diálogo centrado em suas concepções, formações, atividades e
sugestões de melhorias no campo das relações de ensino e aprendizagem da EA.
Pois, entendemos que os professores são seres humanos que trabalham com outros
seres humanos, atuam no campo social e educativo, interagem com diversas pessoas,
de diferentes etnias, classes sociais, credos religiosos, idades, níveis cognitivos,
experiências e orientações sexuais, Arroyo (2013) os define como “alguém que
aprendeu o viver humano, seus saberes e valores, os significados da cultura, a falar,
a dominar a fala, a razão, o juízo”.
O ofício5 do professor é atuar na formação humana, é uma prática social própria
da educação, que se efetiva na interação com outras pessoas, promovendo encontros
e desencontros de ensino e aprendizagem para a construção de conhecimentos, do
aprender e ensinar a ser, a fazer, a viver e a conviver. Desse modo, pressupõe a
construção de objetivos, finalidades e conhecimentos educacionais, envolvendo
atividades teóricas e práticas (BATISTA NETO; SANTIAGO, 2006), implica em
escolhas epistemológicas e metodológicas, e se vinculam a determinados
paradigmas; por isso mesmo deve trazer em seu bojo saberes necessários à prática
docente, Freire (2006), dentre eles, destacamos a rigorosidade metodológica, a
5 O uso do termo ofício fundamenta-se nas ideias de Arroyo (2013), que remete a um fazer qualificado e profissional, portanto, os ofícios se referem a um coletivo de trabalhadores qualificados, os mestres de um ofício que só eles sabem fazer, que lhes pertence, porque aprenderam seus segredos, seus saberes e suas artes.
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competência profissional e o comprometimento, para que os encontros de ensino e
aprendizagem possam ser mais frequentes do que os desencontros.
Assim, a vinculação dos professores ao paradigma que considera a EA
centrada no ensino disciplinar, com ideias conservacionistas, preservacionistas e
comportamentais, precisa ceder lugar para o desenvolvimento de uma EA centrada
em abordagens teóricas e metodológicas que promovam uma formação de cidadãos
críticos e transformadores. Desse modo, o ofício do professor deve ser contribuir para
essa efetivação, construindo um conhecimento que permita a compreensão de que as
relações entre todos os elementos da Terra são complexas, incertas, não neutras,
precisam de seus contextos para serem compreendidas. Enfim, que o ser humano,
sendo um sujeito ativo no mundo, estabelece relações consigo mesmo, com outros
seres humanos, e com todos os seres vivos, influencia e é influenciado, portanto, não
deve existir distinção entre sujeito-objeto.
É nessa perspectiva que nos propomos a arvorar no campo das concepções e
práticas docentes em EA, começando por delinear que trataremos da EA na escola
(espaço formal) e que esta não se presta a tratar apenas das questões biológicas e
ecológicas, nem tampouco está associada a datas comemorativas, ou “projetos”
impostos pelas coordenações escolares ou secretarias de educação, feiras de
ciências ou algo similar, características atribuídas às atividades ditas como sendo de
EA e que ocorrem nas escolas, que na sua grande maioria contribuem mais para a
desaprendizagem ou o reforço de conceitos e comportamentos inadequadas no
campo das relações de ensino e aprendizagem em EA.
Por ora defendemos uma Educação Ambiental Escolar (EAE) como processo
de construção de conhecimentos, valores e atitudes, de modo crítico e transformador,
que considere toda e qualquer relação entre os seres humanos e a natureza e entre
eles mesmos, e contemple as questões sociais, políticas, econômicas, éticas e
culturais; e que esteja voltada para a sustentabilidade planetária.
Esta perspectiva de EAE só será possível se adotarmos o paradigma da
complexidade como modelo de formação, de pensar, de sentir e de agir docente e
discente; que apresenta o mundo como um sistema complexo, no qual os seres vivos,
também complexos estão mergulhados, em imensuráveis interelações, todos
submetidos a ações de fatores abióticos também complexos. Esse todo, que
chamamos de biosfera, Planeta Terra, em constantes causalidades circulares
(causais e recursivas), no qual qualquer análise ou busca de soluções que se
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proponha a ter significado, há de considerar as partes, o todo, suas relações e
emergências, a complexidade.
Num mundo linear, cujas relações estão pautadas no modelo causa-efeito,
compartimentado e disciplinar, perdemos o foco nas redes, nas ligações, nas
relações; ao tirarmos o contexto, não conseguimos articular os saberes, os
sentimentos, o falar e o agir. Somos os sujeitos, a natureza e o meio ambiente,
tornaram-se nossos objetos. Assim, perpetuamos esse ensinar e aprender recheado
de certezas, de contradições e exclusões. Morin (2003) ao nos propor uma cabeça
bem-feita, ressalta que a organização dos conhecimentos comporta dois tipos de
operações, que ocorrem simultaneamente de modo circular, da ligação à separação,
da separação à ligação. A ligação caracteriza-se por operações de conjunção,
inclusão e implicação; ao passo que a separação se refere aos processos de
diferenciação, oposição, seleção e exclusão.
Nesse contexto elegemos a temática sustentabilidade para nos servir de mote
à construção deste estudo, entendendo que se trata de um tema ainda não
compreendido pela maioria dos licenciandos, professores, alunos e sociedade de um
modo geral. Há uma incompreensão dos conceitos de sustentabilidade e
desenvolvimento sustentável, geralmente são tomados um pelo outro; contudo cada
um guarda consigo suas particularidades.
Assim, além dessa constatação, o tema sustentabilidade ainda apresenta uma
relevância para o debate escolar, refere-se ao fato de que as ações desenvolvidas
nas escolas, que tratam de EA e que se propõem a trabalhar o tema sustentabilidade
apresentam propostas metodológicas insustentáveis, frágeis e não promovem
mudanças significativas no âmbito escolar e nem socioambiental.
Ante o exposto, nossas inquietações nos levam a elaborar o seguinte problema
de pesquisa: quais são as concepções e as atividades docentes de educação
ambiental, sustentabilidade e complexidade que estão sendo trabalhadas em escolas
da educação básica do agreste alagoano; e quais seus possíveis impactos na
formação de sujeitos críticos e transformadores?
Autores como Guimarães (2007), Reigota (2009, 2010) e Layrargues (2009,
2012) nos apresentam estudos que constatam que as escolas já desenvolvem alguma
atividade de EA. Entretanto, essas atividades são consideradas fragilizadas e
pontuais, e que os professores apresentam limitações quanto à formação,
principalmente no aspecto conceitual de temas relacionados ao meio ambiente.
20
Para dar conta da problemática acima construímos os seguintes objetivos:
Objetivo geral
Analisar as concepções e ações docentes de educação ambiental,
sustentabilidade e complexidade visando oferecer subsídios para uma prática
crítico-transformadora.
Objetivos específicos
Identificar as concepções docentes de educação ambiental, sustentabilidade e
complexidade que estão sendo vivenciadas em escolas da educação básica do
agreste alagoano.
Diagnosticar as atividades de educação ambiental que estão sendo trabalhadas
em escolas da educação básica do agreste alagoano.
Inferir sobre a formação de sujeitos críticos e transformadores, a partir das
atividades e concepções docentes diagnosticadas e identificadas.
Esta tese está estruturada em três capítulos, o primeiro trata da fundamentação
teórica, e apresenta um estudo das três categorias teóricas, abordando as temáticas
educação e formação de professores; educação ambiental: paradigmas,
trajetórias/documentos e definições; sustentabilidade e complexidade.
O segundo aborda sobre o percurso metodológico da investigação; esclarece
sobre o tipo, o campo, o objeto e os sujeitos da pesquisa, pontuando sobre as
estratégias metodológicas para a construção dos dados (entrevistas, questionários
abertos e observação participante), com ênfase na metodologia interativa (OLIVEIRA,
2016).
O terceiro apresenta as relações estabelecidas entre as unidades de análise e
as categorias teóricas, partindo de um quadro (Quadro 4: Matriz geral das categorias
de dados investigados) construído a partir da categorização e na análise dos dados.
Em seguida, a discussão dos resultados está organizada em cinco blocos: 1)
concepções docentes sobre educação ambiental, sustentabilidade e complexidade; 2)
como se trabalha a educação ambiental na prática docente; 3) Relações entre
educação ambiental, sustentabilidade e complexidade; 4) sugestões de melhorias da
prática docente em educação ambiental, e 5) Sugestão de Oficina de Formação
Docente (OFD).
21
___________________________________________________________________
Capítulo 1
DIALOGANDO SOBRE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, SUSTENTABILIDADE E COMPLEXIDADE
___________________________________________________________________
“De minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no Universo [...] Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer.
Porque eu sou do tamanho do que vejo e não do tamanho da minha altura”6
Este capítulo trata da fundamentação teórica que sustenta esta tese; as
abordagens apresentadas a seguir, traduzem o que ora pensamos, falam do local em
que nos encontramos; uma leitura particular, uma interpretação que sinaliza e orienta
nosso caminhar em direção à formação de sujeitos críticos e transformadores
(docentes e discentes), no intuito de alinhar o pensar, o conhecer, o sentir, o falar e o
agir para com as questões ambientais.
1. EDUCAÇÃO, FORMAÇÃO E PRÁTICAS DOCENTES
Os debates em torno dos processos de formação e das práticas docentes têm
sido alvo de interesses de governantes, pesquisadores da educação e professores.
Desse modo, tem-se criticado a racionalidade técnico-formativa, os modelos e as
instituições de formação docente, sobretudo no que se refere às perspectivas de
ensino e aprendizagem livrescas, teóricas, seletivas e propedêuticas. As
universidades brasileiras são herdeiras da educação jesuíta, portanto, seus cursos de
licenciaturas têm formado professores com ênfase nas aulas expositivas e centradas
na transmissão do saber.
Nesse direcionamento, Imbernón (2009, grifos do autor) corrobora enfatizando
que as formações docentes ocorrem em “cursos padronizados implementados por
experts, nos quais os professores são considerados como ignorantes que participam
de sessões formativas com experts que os “culturizam e iluminam” profissionalmente”.
Este fato evidencia o modelo de ensino e aprendizagem cartesiano e disciplinar,
centrado numa formação científico-metodológico-didática, que não prioriza a reflexão,
a criticidade e as mudanças sociais.
6 PESSOA, Fernando. O Guardador de Rebanhos. 2015.
22
A formação dos experts promove a perpetuação da alienação profissional
docente, e pressupõe a ignorância do professor ou licenciando, num contexto que não
promove a participação, a reflexão e a desmitologização. Destacamos ainda, que no
contexto da formação continuada há uma ausência de aproximação dos licenciandos
com seus espaços sociais, principalmente as escolas. Esta falta de integração é
percebida no modelo formativo pelo distanciamento que há entre a teoria e a prática.
Apresentam-se dicotomizadas, por um lado há uma supervalorização dos saberes
específicos da disciplina a ser ensinada, em detrimento dos saberes pedagógicos,
teóricos e práticos.
Este cenário pode ser exemplificado pelo papel que os estágios
supervisionados ocuparam nas últimas décadas, nos cursos de licenciaturas, onde
permaneceram relegados à etapa final dos cursos, um momento destinado a se
aprender a dar aulas; uma proposta formativa que reforçava nas concepções e
práticas docentes a ideia de que uma “boa aula” é aquela na qual o professor expõe
o conteúdo e os alunos copiam, isto é, centrada na transmissão de conteúdos prontos
e descontextualizados.
Compreendendo que teoria e prática são indissociáveis na prática docente,
cremos que esse cenário aponta para uma necessidade de reflexões e mudanças
acerca da formação dos professores, seja ela inicial ou continuada, considerando,
sobretudo, as concepções de educação, sociedade e ambiente, que permeiam as
instituições formadoras e os agentes formativos. Segundo Pimenta (2012) o cerne da
atividade prática do professor é o ensino e a aprendizagem, é o conhecimento técnico
e prático para que haja a garantia de que a aprendizagem seja efetivada como uma
consequência do ato de ensinar.
Nessa perspectiva, o ofício do professor requer preparações técnicas e
práticas, que não se limitam aos cursos de formação, mas se nutrem deles para a
construção dos saberes necessários à prática docente. Essa perspectiva compreende
os professores como indivíduos reflexivos e críticos, cujas práticas não se configuram
como mero espaço aplicativo de saberes provenientes da teoria, mas um campo que
produz saberes específicos derivados das suas próprias práticas; donde se conclui
que o ofício do professor se configura como “espaço prático específico de produção,
de transformação e de mobilização de saberes” (TARDIF, 2013).
A esse respeito, Imbernón (2009) destaca que o processo formativo dos
professores deveria considerar que o professor possui conhecimentos objetivos e
23
subjetivos. Portanto, a construção do conhecimento por parte dos professores é um
processo amplo e não linear, está ligada à prática profissional e condicionada pela
organização da instituição educacional em que esta é exercida; e é um processo
complexo, adaptativo e experiencial.
Em se tratando, especificamente, sobre a formação dos professores de
Ciências e Biologia Delizoicov, Angotti e Penambuco (2002) destacam que ela deveria
contribuir para a superação do senso comum pedagógico, visto que se trata de um
locus privilegiado para fomentar determinados debates, como por exemplo: a
compreensão de um ensino que tivesse como pressuposto uma ciência para todos, e
que em conjunto com a tecnologia fossem compreendidas como atividades humanas,
social, histórica e cultural. Que fosse capaz de incorporar à prática docente os
conhecimentos atuais em ciência e tecnologia; superasse as deficiências dos livros
didáticos e aproximasse a pesquisa em ensino de Ciências e o ensino de Ciências.
Os autores concluem que “a formação de professores, na maioria dos cursos, ainda
está mais próxima dos anos 1970 do que de hoje”.
Carvalho e Gil-Pérez (2011) chamam a atenção para um dado relevante na
formação inicial dos professores de Ciências, o fato de que os docentes apresentam
uma enorme carência de conhecimentos científicos, o que acaba por criar um entrave
no envolvimento deles em determinadas atividades, levando-os a agir como
transmissores mecânicos dos conteúdos, centrados principalmente nos livros
didáticos adotados pelas escolas.
Ao tratar das visões deformadas da ciência e da tecnologia Cachapuz et al.
(2005) tratam de uma deformação que a grande maioria dos docentes critica, que é a
transmissão de uma visão descontextualizada de ciência, e a crença de ela seja
socialmente neutra. Essas visões são apresentadas aos docentes e construídas
desde as suas formações e perpassam suas práticas em sala de aula. Portanto são
passadas aos alunos e se propagam na sociedade. Essas visões não consideram os
impactos das atividades científicas e tecnológicas no meio social e ambiental, bem
como os interesses e influências de alguns segmentos da sociedade no
desenvolvimento de determinadas tecnologias, principalmente a economia capitalista.
Essas visões distorcidas dificultam a formação de cidadãos capazes de atuar
de maneira crítica na sociedade; e contribuem para um entendimento de que a ciência
deve fornecer subsídios cada vez maiores para o desenvolvimento de novas e
melhores tecnologias, cada vez mais sofisticadas, caras e excludentes. De fato, há
24
progresso quando a ciência promove o avanço tecnológico, todavia, o que se
desconsidera, tanto no processo formativo quanto no campo de atuação do professor
é a reflexão sobre a deterioração do planeta causada pela geração de tantos bens de
consumo cada vez mais descartáveis, a ênfase no consumo desenfreado e o
condicionamento das necessidades cada vez mais crescentes em ter, em detrimento
do ser.
1.1 Educação ambiental: paradigmas, trajetórias e definições
Os paradigmas são “estruturas de pensamento que de modo inconsciente
comandam nosso discurso” (MORIN, 1997), portanto, estão presentes em todos os
aspectos da vida humana: científicos, cotidianos, culturais, educacionais e tantos
outros. Assim, o ofício do professor, isto é, suas concepções, escolhas e atitudes,
acontecem em função de um determinado paradigma ou de um conjunto de ideias,
princípios, crenças, valores, comportamentos e atitudes; sua ideologia revela um
quadro epistêmico que é reflexo de um paradigma que lhe está subjacente e que
direciona suas escolhas metodológicas.
Luckesi (2011) destaca que não há prática de ensino e aprendizagem que não
esteja vinculada a uma determinada concepção pedagógica, a qual estabelece um
direcionamento para o agir docente, que de maneira consciente ou inconsciente
reflete a compreensão que guia as ações do professor. Nesse direcionamento, Morin
(2005b) corrobora com Luckesi (2011) pontuando que os paradigmas selecionam as
operações lógicas que se tornam simultaneamente preponderantes, pertinentes e
evidentes sob seus domínios, nos quais os sujeitos pensam, conhecem, sentem,
falam e agem seguindo paradigmas inscritos culturalmente neles.
As visões de mundo e sistemas de valores, desde o século XVII, são
influenciadas pelas ideias do filósofo, médico e matemático francês René Descartes,
que como método analítico propôs a decomposição do pensamento e dos problemas
em suas partes estruturantes, tantas quantas fossem necessárias para o seu estudo,
análise e compreensão. Faz uma alusão à metáfora do relógio e suas engrenagens
para explicar os fatos e a natureza, resolver os problemas; concebendo uma natureza
regida por leis e matematizada. Como se não bastasse a matematização da natureza,
a derrocada final se dá pela matematização do pensamento humano, que estabelece
25
a superioridade do homem sobre a natureza, passando a considerar sujeitos e objetos
isolados, distintos e dicotomizados.
O pensamento cartesiano-newtoniano influenciou os modelos de educação,
levando ao surgimento de escolas que tratam o saber e as pessoas em disciplinas
estanques, de maneira compartimentada e linear, fragmentando o todo em partes e
focadas em certezas. Nelas não há espaço para a integração, as interações, o erro e
as incertezas; o professor “detém” e “transmite” o saber, os alunos são tábulas rasas,
não questionam, e suas capacidades de criar, criticar e intervir são tolhidas. Segundo
Freire (1987) uma educação “domesticadora”, “bancária”; os sábios doam o “saber”
aos que nada sabem. Os homens são vistos como seres da adaptação e do
ajustamento, quanto mais “arquivos” e “depósitos” receberem menos desenvolverão
suas consciências críticas, se inserirão no mundo, o transformarão.
O modelo de ensino e aprendizagem pautado no paradigma cartesiano-
newtoniano impossibilita qualquer abordagem de EA que pretenda abordar a crise
ecológica, a sustentabilidade e a complexidade. Assim, as propostas de EA têm
contribuído muito pouco para a formação de sujeitos críticos e transformadores. Para
a articulação e organização dos conhecimentos, a fim de que o reconhecimento e o
conhecimento dos problemas do mundo aconteçam é necessário que se reforme o
pensamento (MORIN, 2005a), portanto a questão fundamental da educação passa a
ser a reforma paradigmática, pois é a partir da mudança na maneira de pensar que as
outras modificações passam a se tornar efetivas.
A lógica clássica, binária, do certo e do errado, não consegue apresentar
respostas para os problemas sociais e ambientais que a humanidade enfrenta na
atualidade. Entre as crises de valores, ética, ambiental, política, e tantas outras pelas
quais o homem moderno vem travando, inclusive contra a si mesmo, há a crise
paradigmática. Nesse patamar, é de extrema urgência a necessidade de um outro
modo de pensar, que possa modificar esse cenário, revendo em que bases
ontológicas, epistemológicas e metodológicas pretendemos desenvolver uma EA que
considere o diálogo entre os elementos que integram o triângulo da vida, ser humano,
natureza e sociedade.
26
1.2 Ruptura paradigmática: do cartesianismo ao paradigma complexo
A compreensão do significado de paradigma nos remete às ideias de Kuhn
(2006), que o compreende como sendo “aquilo que os membros de uma comunidade
partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em indivíduos que
partilham um paradigma”. Desse modo, o paradigma se refere aos modelos, padrões
e conceitos que são compartilhados por um determinado grupo de cientistas e que é
capaz de explicar traços da realidade. Não se trata de uma teoria, ao contrário são os
paradigmas que fazem surgir ou morrer determinadas teorias.
A ciência positivista proporcionou o desenvolvimento da ciência e da tecnologia
movida pelo paradigma cartesiano, este fato promoveu grandes avanços nas mais
diversas áreas das atividades humanas. Todavia o método analítico, que é
considerado capaz de dar as únicas explicações verdadeiras, promoveu o isolamento
das partes de seu todo, e as explicações e soluções que dele advieram não
contemplaram as relações entre as partes e dessas com o todo.
Dessa maneira, a humanidade passou a conviver com a fragmentação do
pensamento, um mundo compartimentado e unilateral. Esse modo de pensar e agir,
levou o homem a modelos de sociedades que acreditam ser as detentoras da
exploração da natureza, cujos bens, acreditam ser ilimitados. Para a visão científica
clássica só há o determinismo, uma concepção de conhecimento que “exclui toda a
ideia de autonomia nos indivíduos e nos grupos, exclui a individualidade, exclui a
finalidade, exclui o sujeito” (MORIN, 2008).
Na atualidade, fala-se na ruptura desse modelo de pensar dicotômico e
compartimentado, que seja capaz de promover a distinção sem separar e dissociar.
Tomando como exemplo a dualidade da luz, poderíamos perguntar se a luz é onda ou
é partícula. E a resposta poderia ser luz, partícula ou luz e partícula simultaneamente.
Essas respostas podem ser dadas de acordo com a lógica pela qual perguntamos e
estamos respondendo. Para a lógica binária, a luz ou é partícula ou é onda. Para a
lógica ternária as três respostas são admissíveis. Na atualidade convivemos com
estas duas lógicas. Entretanto, a lógica ternária considera os níveis de realidade.
Vivemos, portanto, um momento de transição, de mudanças paradigmáticas, de
reconstrução nas maneiras como vemos, pensamos, sentimos e agimos.
Santos, B. (2010) chama esse momento de crise do paradigma dominante, que
põe fim a um ciclo hegemônico de uma certa ordem científica, e anuncia o paradigma
27
de um conhecimento prudente para uma vida decente, portanto o paradigma
emergente da crise, trata de um paradigma científico (o paradigma de um
conhecimento prudente) e de um paradigma social (o paradigma de uma vida
decente). Nesse direcionamento, todo conhecimento científico-natural é científico-
social; todo conhecimento é local e total; todo conhecimento é autoconhecimento; e,
todo conhecimento científico visa constituir-se em senso comum (SANTOS, B., 2010).
Em sintonia com Morin (2005a), consideramos que para a EA ser pertinente,
quatro dimensões precisam ser consideradas: o contexto, o global, o multidimensional
e o complexo. Os problemas e questões relacionadas à vida só adquirem significado
em seus contextos de ocorrências; isolados, eles são insuficientes e sem sentido. O
mesmo se dá em relação ao global; uma vez que ele é mais que o contexto, é o
conjunto das inúmeras partes ligadas em interações retroativas. As unidades
complexas ser humano, natureza e sociedade que compõem o planeta são
multidimensionais. O ser humano é simultaneamente biológico, psíquico, social,
espiritual e racional. A natureza tem as dimensões biológica, antropológica, física,
química, é caos e cosmo, tudo ao mesmo tempo. A sociedade comporta as dimensões
históricas, econômicas, religiosas, políticas e éticas. Sendo todos esses elementos
diferentes, considerados inseparáveis e constituintes de um sistema maior,
humano/natureza/sociedade, também complexo, as explicações, os entendimentos e
as solução só podem advir da maneira de conhecer, sentir, falar e agir sob a ótica do
paradigma da complexidade, ou seja, igualmente complexo.
Nesse contexto, o paradigma da complexidade desvela essa tessitura
inseparável, inter-relacionada, esse tecido de vida e não vida, de seres vivos e
humanos, sujeitos e objetos, alunos e professores, enfim todos os contextos e
dimensões da esfera terrena, em infinitas interações, agindo umas sobre as outras e
delas recebendo suas influências, num “complexus” – aquilo que está junto, unido, um
tecido formado por diversos fios que se uniram e formaram uma unidade (MORIN,
2008); em todas as esferas (individual, social ou ambiental) a ideia de unidade não
deve suplantar a de diversidade, todas são singular e múltiplas.
Passar do paradigma cartesiano para o complexo não significa abandonar a
disciplinaridade, mas colocar as disciplinas em diálogo, uma sofisticação na maneira
de pensar e de agir, as disciplinas continuam a existir, porém passam a se comunicar,
interferem umas nas outras, são inseparáveis; as partes e o todo são igualmente
reguladores e regulados, incertos e caóticos. Essa visão de um grande tecido (rede
28
de relações) nos permite uma melhor compreensão dos seres, fatos e problemas, e
uma busca de soluções, que considere as emergências, o incompleto, o
socioambiental. Enfim a complexidade é um princípio epistemológico que “implica uma
atitude que requer, por sua vez, um novo olhar sobre o objeto do conhecimento, bem
como sobre o aluno, o professor, a escola, os problemas e a própria dinâmica da vida”
(MORAES, 2015).
1.3 Trajetórias e documentos da educação ambiental no Brasil
O campo da EA tem sido alvo de interesses e discussões de muitos
pesquisadores, professores, cidadãos comuns, empresas, políticos e nações. A
preocupação com as questões ambientas remonta ao final dos anos sessenta do
século passado, nos Estados Unidos e na Europa, com o surgimento dos movimentos
ecológicos e, no Brasil, nas décadas de setenta e oitenta, e estava focada nos riscos
e nos impactos causados ao meio ambiente ocasionados pelo consumo das
sociedades industriais.
Carvalho (2006) destaca que a EA “é parte do movimento ecológico”, fruto das
preocupações que as sociedades começaram a ter em relação à manutenção de suas
vidas e à qualidade das mesmas, tanto para as gerações presentes quanto para as
futuras. Portanto, ela despontou como uma proposta de construir relações harmônicas
entre os seres humanos e o meio ambiente. Sem desconsiderar a participação de
pessoas e grupos sociais, ativos e quase anônimos, que têm contribuído para o
fortalecimento do que hoje chamamos de EA. A seguir um breve histórico dos eventos
mais conhecidos que possibilitaram a sua difusão e legitimação.
Somente nos anos setenta é que se discutiu a EA como políticas públicas em
conferências internacionais. Inicialmente, na Primeira Conferência Internacional sobre
Ambiente Humano, em 1972, na capital da Suécia, Estocolmo, que reuniu 113 países.
Essa conferência alertava a humanidade para a necessidade de critérios e princípios
comuns que orientassem a humanidade para a preservação e melhoria do ambiente
humano (TORRES, 2010). Em 1977, foi realizada a Conferência Intergovernamental
de Educação Ambiental, em Tbilisi, capital da Geórgia (ex-União Soviética),
organizada em parceria pela UNESCO com o Programa de Meio Ambiente da ONU
(PNUMA). Na ocasião foram elaborados objetivos, definições, princípios e estratégias
para a EA que ainda são adotados em todo o mundo, na atualidade.
29
Em 1992, realizou-se a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente
e Desenvolvimento (CNUMAD), no Rio de Janeiro (Brasil), também conhecida como
Rio-92 ou Eco-92. Foi a primeira Conferência das Nações Unidas que teve a
participação da sociedade civil (cidadãos do mundo). Entre os documentos que
resultaram dessa conferência, destacamos a Agenda 21, com recomendações aos
governantes, inclusive para o desenvolvimento da EA e o Tratado sobre a Educação
Ambiental para as Sociedades Sustentáveis. Foi o documento elaborado pela
sociedade civil e definiu o marco político para o projeto pedagógico da educação
ambiental. Assim, ao longo de sua trajetória, a EA vem sendo construída como
resultado das discussões e documentos elaborados nessas conferências e demais
esferas do poder público e sociedade civil, tanto na instância global quanto nacional.
O Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e
Responsabilidade Global é um documento que consta de dezesseis princípios; um
plano de ação com vinte e duas diretrizes, e um sistema de coordenação,
monitoramento e avaliação, com oito itens pontuando o comprometimento que todos
que o assinam devem assumir. Especifica, ainda, os grupos que devem ser envolvidos
e a captação de recursos. A análise dos princípios da EA, no referido documento
(BRASIL, 2003), aponta para uma EA no âmbito escolar, pautada no pensamento
crítico e inovador; na transformação e construção da sociedade, individual e coletiva;
na formação de cidadãos com consciência local e global; uma educação não neutra,
ideológica, como ato político; focada na natureza, no ser humano e no universo de
forma interdisciplinar; devendo tratar as questões globais numa perspectiva sistêmica,
em seu contexto social e histórico.
A Agenda 21 (BRASIL, 1995) é um documento com mais de duas mil e
quinhentas recomendações, distribuídas em quarenta capítulos e quatro seções que
tratam da dimensão social e econômica, da conservação e gestão dos recursos para
o desenvolvimento, e do fortalecimento do papel dos grupos e dos meios de
implantação. A implantação da Agenda 21 ficou a cargo de cada país. No Brasil
podemos observá-la nas instâncias federal, estadual e municipal, como também uma
versão da Agenda 21 Escolar. Segundo Torres (2010), na versão federal, são
apresentadas sugestões de ações ambientais para o próximo século ancoradas na
preservação da biodiversidade, no manejo dos recursos naturais, na justiça
econômica e social, e na participação da sociedade. O capítulo trinta e seis trata da
promoção do ensino, da conscientização e do treinamento. Destaca que o ensino,
30
inclusive o formal, deve ter a função de promover o desenvolvimento sustentável;
modificar a atitude das pessoas, para que elas sejam capazes de avaliar os problemas
de desenvolvimento sustentável e abordá-los; conferir consciência ambiental e ética,
valores e atitudes, técnicas de comportamentos em consonância com o
desenvolvimento sustentável.
Uma breve comparação dos dois documentos sinaliza que a Agenda 21 aponta
para uma perspectiva comportamental em direção ao desenvolvimento sustentável,
enfatizando uma EA pautada em termos técnicos, como treinamento, modificar atitude
e técnicas de comportamento. Ao passo que o Tratado de Educação Ambiental para
Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, se aproxima mais da
perspectiva de EA como um processo de aprendizagem, baseado no pensamento
crítico, na formação cidadã; como um ato político pautado em valores e transformação
social.
No Brasil, foram tomadas algumas iniciativas referentes a institucionalização
de políticas e diretrizes públicas na esfera governamental federal, que contribuíram
para a inserção da EA no âmbito educacional. Em 1997 os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN) foram aprovados pelo Conselho Nacional de Educação,
apresentando a necessidade de se tratar alguns temas sociais, de abrangência
nacional, denominados de temas transversais: meio ambiente, ética, pluralidade
cultural, orientação sexual, trabalho e consumo, o referido documento propõe que
esses temas sejam trabalhados de maneira transversal7 no currículo escolar.
Em 1999, foi criado o Programa Nacional de Educação Ambiental (ProNEA),
vinculado à Secretaria Executiva do Ministério do Meio Ambiente e promulgada a Lei
9.795/1999, que estabeleceu a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA).
Esta lei sugere que a EA seja um processo de construção de valores, conhecimentos,
habilidades, atitudes e competências relacionado com a conservação do meio
ambiente; uma proposta de educação que pode ser desenvolvida tanto em espaços
formais (escolar) quanto não formais (não escolar). Propõe ainda uma prática
educativa integrada, contínua e permanente, devendo estar presente, de forma
7 Acerca da Transversalidade os PCN (BRASIL, 2001) destacam que os temas transversais têm natureza diferente das áreas convencionais; sua complexidade faz com que nenhuma das áreas, isoladamente, seja suficiente para abordá-los; atravessam os diferentes campos do conhecimento; integram as áreas convencionais de forma a estarem presentes em todas elas, relacionando-as às questões da atualidade; as áreas convencionais devem acolher os temas transversais de forma que seus conteúdos as explicitem e seus objetivos sejam contemplados.
31
articulada, em todas as modalidades e níveis de ensino, inclusive nos currículos dos
cursos de formação docente, e não ser implantada como disciplina específica das
propostas curriculares de ensino formal, exceto nos cursos, programas e projetos de
graduação, pós-graduação e de extensão, quando é facultada a criação do
componente curricular específico (BRASIL, 1999).
A PNEA foi regulamentada pelo Decreto 4.281/2002, que determinou que sua
execução deveria ser realizada pelos órgãos e entidades integrantes do Sistema
Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), pelas instituições educacionais públicas e
privadas dos sistemas de ensino, pelos órgãos públicos da União, Estados, Distrito
Federal e Municípios, envolvendo entidades não governamentais, de classe, meios
de comunicação e outros segmentos da sociedade. Portanto, a realização da EA deve
ser considerada como componente essencial e permanente nos currículos da
educação brasileira, desde a educação básica até os cursos de pós-graduação
(BRASIL, 2002).
Em paralelo às ações na esfera governamental, desde 1990, a área de
pesquisa no campo da EA vem se fortalecendo. Desse modo, os estudos, debates e
publicações se fortaleceram e cresceram, foram criados programas de pós-
graduação, lançados livros sobre EA, realizados eventos científicos e surgiram
associações, periódicos e revistas. Autores como Carvalho (2006, 2011), Grün (2007),
Freire (1987, 1992, 2006, 2008), Guimarães (2007), Reigota (2009, 2010), Loureiro
(2005, 2007, 2009, 2012), Layrargues (2009, 2012), Morin (1997, 2005a, 2005b, 2007,
2008), Leff (2008, 2010a, 2010b, 2012), Boff (2013), dentre outros têm contribuído
para os avanços dos estudos, pesquisas e fortalecimento da EA, tanto no cenário
nacional quanto internacional.
1.4 Educação ambiental escolar
Existem diversos conceitos, documentos e autores que tratam dos princípios,
objetivos e metas da EA. Abordam contextos dos movimentos sociais, escolares e
acadêmicos; enfocando seus aspectos epistemológicos e metodológicos, ora
enfatizam o caráter mais intervencionista, ora se apresentam como campo de
pesquisa. Seja qual for a diretriz a ser seguida, partimos do pressuposto de que o
campo da EA é complexo, pois é formado pelas contribuições de diferentes áreas do
conhecimento, reunindo diversas perspectivas teóricas e metodológicas.
32
A EA pode ser compreendida seguindo duas linhas de raciocínio: a naturalista
e a socioambiental, a primeira, foca nas questões de conservação e preservação das
espécies, nos processos físicos, biológicos e nas interações ecossistêmicas. Para os
naturalistas a natureza se apresenta como boa, em ordem e em paz, e o ser humano,
um indivíduo nefasto, destruidor, que interfere de maneira destruidora no ambiente
natural.
A outra vertente é a socioambiental, que além dos processos físicos, biológicos
e das interações ecossistêmicas, considera as dimensões políticas, sociais e culturais
entre os seres humanos e a relação deles com a natureza. Portanto, a natureza e os
seres humanos estão em contínua e mútua interações, de co-pertencimento e co-
evolução.
Na atualidade, há um esforço na esfera do ensino e aprendizagem da EA para
a superação da visão naturalista e conservadora, antropocêntrica e preservacionista,
em detrimento de uma vertente socioambiental, crítica e transformadora. Visto que na
visão naturalista existe um obstáculo ao entendimento do Planeta como um sistema
complexo, formado por seres igualmente complexos. Assim, existe um direcionamento
no sentido de reivindicar e preparar os cidadãos para exigir e construir uma sociedade
mais justa socialmente, com cidadania e ética nas relações socioambientais
(REIGOTA, 2009).
Este estudo se dá no contexto escolar, e embora existam diversas definições
para a EA, não nos sentimos contemplados por nenhuma delas quando se referem a
EA que é desenvolvida nas escolas. Assim, após várias leituras, reflexões e
discussões, e com base na Lei 9.795/99 (BRASIL, 1999), documentos, diretrizes, e
nas ideias dos autores Freire (2006; 2008), Guimarães (2007), Grün (2007), Morin
(2008), Mousinho (2008), Reigota (2009), e tantos outros, entendemos e definimos a
Educação Ambiental Escolar (EAE) como sendo um processo educativo intencional,
no qual os sujeitos8 são estimulados a construir conhecimentos, valores, habilidades
e atitudes, de modo interdisciplinar, reflexivo e crítico, para com as questões
ambientais, considerando-se o contexto, o global, o multidimensional e o complexo
das relações existentes entre os seres humanos e a natureza e si mesmos, vivendo
em sociedade, imbricados pelas complexas relações da cultura, da política e da
8 Sujeito, segundo Luckesi (2011, p. 29) “tomar posse de si mesmo, a fim de ser capaz de confrontar-se com as facilidades e dificuldades da vida e do mundo, administrando-as para o seu bem-estar, assim como do outro e do meio ambiente”.
33
economia, voltados para a sustentabilidade planetária, com ações conscientes e
transformadoras.
Esclarecemos que o conceito acima busca enfatizar questões específicas do
âmbito escolar, e do ofício do professor, ao considerar a EA como um processo
educativo intencional, interdisciplinar, transversal, de caráter formativo na construção
de conhecimentos e a formação humana, sob a ótica da complexidade, considerando
os contextos complexos do social, político, cultural e econômico. É, portanto, uma
tentativa de reunir num conceito, algumas diretrizes conceituais necessárias para o
desenvolvimento de uma EA na escola.
Partindo do conceito construído acima, que ora passa a ser considerado neste
estudo, no qual consideramos a EAE como sendo um processo educativo,
destacamos que para a sua realização necessitamos da participação dos professores.
Assim, o ofício do professor no exercício da EAE, deve estabelecer sintonia entre suas
próprias concepções9 e práticas10 docentes com os conceitos chave apresentados na
definição acima, uma vigilância ao que se propõe, como se concebe e vivencia uma
EA que prima pela formação de sujeitos críticos e transformadores.
Guimarães (2007) constatou que havia uma limitação compreensiva para os
professores que buscavam inserir a dimensão ambiental na educação. Embora já
exista uma difusão crescente da inserção da EA nas escolas, as atividades educativas
a ela relacionadas se apresentam fragilizadas em suas práticas pedagógicas, visto
que essas ações não conseguem gerar transformações significativas da realidade
vivenciada e pesquisada. O autor argumenta ainda que o ensino fragmentado e
disciplinar, que vem sendo desenvolvido nas escolas, potencializa a realização de
atividades isoladas, de cunho comportamental e descontextualizado. Esse
diagnóstico se opõe a um ofício docente como um ato intencional, que carece de
planejamentos, metodologias e avaliações, num contínuo “ação-reflexão-ação”,
práxis, teoria na ação e ação na teoria. Entendendo que os homens são seres do
“quefazer”, o fazer é ação e reflexão, é transformação do mundo, portanto, todo fazer
9 Entendida aqui como “operação intelectual pela qual o entendimento forma um conceito” (JAPIASSU e MARCONDES, 2006, p. 51). 10 Ações do professor em suas atividades em sala de aula ou no espaço escolar, contudo não desconsideramos a importância e existência da prática pedagógica (práticas gestora, discente, gnosiológica e ou epistemológica) (SOUZA, 2009).
34
do “quefazer” é iluminado por uma teoria, o “quefazer” é teoria e prática, é reflexão e
ação (FREIRE, 1992).
Os dados da pesquisa “O que fazem as escolas que dizem que fazem
Educação Ambiental”11 (BRASIL, 2007), realizada nas escolas brasileiras de ensino
fundamental, demonstram que houve um crescimento no número de escolas que
realizavam a EA: em 2001, eram de aproximadamente 115 mil, ao passo que, em
2004, foram registradas quase 152 mil instituições. No entanto, ao analisar os
resultados da referida pesquisa Loureiro et al. (2007) corrobora com as ideias de
Guimarães (2007), em relação ao destino final do lixo, das escolas que realizavam
EA: 49,3% utilizavam a coleta periódica do lixo, 41,3% queimavam o lixo, 11,9%
jogavam o lixo em outras áreas, e menos de 5% reutilizavam ou reciclavam o lixo.
Loureiro et al. (2007) pontuam que apesar de todas as limitações de
infraestrutura pública referentes à coleta do lixo, o quadro descrito acima revela
indícios sobre práticas docentes em EA contraditórias com os postulados principais,
sobre os quais se constrói a sua lógica teórica e pedagógica. O esperado era que,
sendo as escolas pesquisadas espaços de formação em EA, as atitudes em relação
ao descarte do lixo fossem diferentes, e que sendo elas espaço de poder e de
transformação, pudessem influenciar a comunidade na qual estavam inseridas. A EA
deveria ocupar esse locus, apresentando impactos significativos na escola e na
sociedade, promovendo um ensino e aprendizagem pautados na reflexão, na
criticidade e na transformação do meio socioambiental local e global.
No que tange à formação de professores, Loureiro et al. (2007) destacam que
dos 418 docentes que responderam à pesquisa, a maioria possuía especialização
(197) e curso superior completo (141), sendo a área de ciências humanas a que
aparece em destaque como área de formação. Quando os dados da referida pesquisa
são analisados por região, Medeiros et al. (2007) constataram que das oitenta escolas
pesquisadas, situadas no nordeste brasileiro, no que tange à formação de professores
para se trabalhar com a EA, responderam que os responsáveis por suas formações
foram: o Ministério da Educação (59); a secretaria estadual (35); secretaria municipal
(25); e, as universidades particulares (12). As universidades públicas aparecem quase
que ausentes como responsáveis por esse processo de formação, pois só foram
citadas por sete docentes.
11 As porcentagens não somam 100%, pois em alguns questionários a pergunta foi considerada múltipla escolha, quando deveria ser dicotômica.
35
Quanto às atividades desenvolvidas, a pesquisa revela que elas estavam
relacionadas a temas específicos, eram pouco mobilizadoras e esporádicas. Não
havia preocupação em relação aos valores que precisavam ser desenvolvidos nessas
atividades, de modo que as mesmas se efetivassem em impactos no meio social e
ambiental. Um exemplo foi a questão do lixo (água, lixo e reciclagem foram as
temáticas citadas pela maioria das escolas); em uma das escolas que se dizia
trabalhar com a temática, não foram encontrados coletores apropriados, nem
detectadas práticas de reciclagem. Ao contrário, os alunos observados não
demonstravam nenhum cuidado para com o lixo, não se interessavam em reduzir a
sua produção, em zelar pela escola, nem em manter o ambiente limpo.
Nossas experiências de práticas formativas e de pesquisas acadêmicas
também confirmam os dados da pesquisa “O que fazem as escolas que dizem que
fazem Educação Ambiental” (BRASIL, 2007); comentados por Medeiros et al. (2007)
e Loureiro et al. (2007). Corroboram também os dados do estudo realizado por
Guimarães (2007), como sendo a falta de formação docente, inicial ou continuada,
voltada para a inserção das questões ambientais nas práticas dos professores,
principalmente nos currículos de formação das universidades públicas, um dos
motivos pelos quais há tanta discrepância nas relações de ensino e aprendizagem no
campo da EA.
Os reflexos dessa ausência de formação ou formação inadequada dos
professores podem estar relacionados com o modo fragilizado com que são tratadas
as questões ambientais em suas práticas docentes, Layrargues (2012) verificou que
nos últimos vinte anos, pesquisas apontam para um relativo fracasso da EA, “as
atividades educativas relacionadas ao meio ambiente não têm conseguido, em geral,
mobilizar os indivíduos para um engajamento efetivo na luta pela proteção ambiental”.
A reflexão acima não esgota o debate acerca das fragilidades da EA no espaço
escolar. Acreditamos que outras questões contribuem para essa fragilização, no
entanto, nossos argumentos são em direção à necessidade de se promover uma
formação em EA sob a ótica da complexidade, estruturada numa outra visão de
mundo, outro paradigma, outra racionalidade, que se proponha a ressignificar o
pensar e agir docente, a escola, a sociedade e a natureza, pautados na
sustentabilidade planetária.
Medina (2001) refletindo sobre a formação de professores em EA, chama a
atenção para as especificidades conceituais das temáticas ambientais, alertando que,
36
como qualquer outra área do conhecimento, essas especificidades devem ser
compreendidas com clareza por parte dos professores, para que o exercício docente
no ensino formal atinja os objetivos didáticos e metodológicos propostos. Em
pesquisas realizadas com professores, sobre a concepção de meio ambiente, Reigota
(2010) destaca que quase todos possuíam uma representação naturalista sobre meio
ambiente, isto é, meio ambiente como sinônimo de natureza. Em estudo similar,
Oliveira e Pereira (2015) evidenciam que 18,2% dos docentes entrevistados também
possuíam uma concepção naturalista.
Araújo (2011) ao pesquisar a concepção dos professores sobre EA relata que
os docentes associam meio ambiente às disciplinas de biologia e ciências, e que seu
ensino é para uma vida melhor e para conscientizar as pessoas. Esses estudos
evidenciam fragilidades das práticas docentes, visto que se há incompreensões
equivocadas no campo conceitual, possivelmente haverá obstáculos ao entendimento
e à concepção, e consequentemente quanto às escolhas metodológicas para o
desenvolvimento de uma EA que contemple outras instâncias, ultrapassando a
compreensão puramente naturalista, disciplinar, descontextualizada e
comportamental. Tal fato exigirá tanto dos professores formadores, quanto dos
docentes que atuam em EA que se debrucem sobre essas fragilidades, buscando
superar as visões limitadas e as práticas docentes pontuais, impostas pelo modo
cartesiano de pensar e agir dos docentes.
Loureiro et al. (2007) constatam que 30% das escolas visitadas no Brasil
realizavam EA há mais de três anos e que 22,7% há mais de dez anos. Guimarães
(2007) em sintonia com Loureiro et al. (2007) dizem que é consenso da grande maioria
dos que pesquisam a EA, que as escolas já desenvolvem alguma atividade
considerada como sendo de EA. No entanto, têm sido pensadas e desenvolvidas em
um modelo escolar pautado nas ideias mecanicistas da ciência cartesiana, de
simplificação e redução, acabam descontextualizando os fenômenos sociais e
ambientais das questões culturais, políticas e econômicas.
Nesse direcionamento corroboramos com Guimarães (2007) quando destaca
que a educação tradicional, cartesiana, não pode e/ou não quer perceber as redes de
poder que estruturam as relações de dominação existentes na sociedade atual; seja
entre os seres humanos, classes sociais, nações, natureza e humanidade. Desse
modo, o poder e a dominação são mantidos, as diferenças sociais e econômicas se
alargam, o espaço ambiental oferecido aos ricos, diferencia-se cada vez mais; para a
37
classe dominante coleta seletiva, saneamento básico, água pura; para as camadas
menos favorecidas, lixo acumulado, esgotos a céu aberto, águas contaminadas.
Na proposta cartesiana de escola, existe o rompimento com a visão orgânica
de mundo, fragmentação dos saberes e estabelecimento da ética antropocêntrica, na
qual os seres humanos aparecem como parte independente da natureza, ou seja, eles
devem dominá-la, explorá-la, torná-la seu objeto, retirando dela o máximo que
puderem, coisificando-a. Grün (2007) destaca que no antropocentrismo o homem é o
centro, “senhor e possuidor da natureza”12, dono de tudo; todas as coisas do universo
devem existir única e exclusivamente em sua função; esse mito tem uma grande
importância na manutenção da crise ecológica.
A visão fragmentária de educação favorece o desenvolvimento de atividades
de EA na escola de maneira pontual, isoladas, de cunho comportamental e individual,
geralmente em datas específicas do calendário escolar, ou como atividades de
visitação a reservas ecológicas, parques e zoológicos. Estas, são atividades
necessárias, se forem realizadas com objetivos claros e fruto de reflexões; todavia,
são realizadas de modo a considerar que vivemos em um meio distinto do que seja a
natureza; o mundo do homem não é o mundo da natureza, assim, em determinados
momentos, devemos entrar em contato com o meio ambiente, aquele algo exterior a
nós, desconectado da nossa cultura, da política e da economia que nos move.
Destacamos ainda, que muitas dessas atividades ao serem realizadas nas
escolas, produzem resultados contrários ao que se propõem, algumas visitações se
transformam em momento de lazer e excursões de “visitação” ao meio ambiente. Uma
outra atividade que merece menção são as chamadas feiras de ciências, ao
construírem modelos didáticos que são geralmente usados para apresentar as
problemáticas das questões ambientais, usa-se muito material industrializado, como
isopor, cartolina, plástico e outros materiais, que ao término das apresentações são
facilmente transformados em mais resíduos, mais lixo, uma atitude antagônica ao que
está sendo proposto, nestes eventos, como reflexões conceituais e atitudinais das
atividades de EA, entre elas a redução na produção do lixo.
Essas constatações nos levam a crer que a EA desenvolvida nas escolas não
tem conseguido cumprir aquilo a que se propõe. Pregamos a sustentabilidade
ambiental e nosso pensar, sentir e agir caminham na direção da insustentabilidade.
12 Descartes (1983).
38
Esse contexto de fragilidades das práticas docentes em EA contribui para a
manutenção da crise ecológica, e para a formação indivíduos acríticos e incapazes de
interferir e promover mudanças no meio socioambiental. O desafio maior é abandonar
uma educação centrada no cartesianismo, repensar o rompimento estabelecido entre
o ser humano e a natureza e a compartimentação do saber. Além disso, romper com
ideias e comportamentos antropocêntricos é tarefa árdua, nos desvencilharmos
desses paradigmas e lógicas que não conseguem explicar os problemas, encontrar
soluções e nos impedem de avançar na direção de um mundo sustentável.
Estamos e vivemos numa crise paradigmática, que nutre a crise ecológica que
ameaça a sobrevivência humana no Planeta. Nessa travessia urge modificar nossas
estruturas de pensamento, sentimentos e comportamentos, Morin (2005b) alerta que
“para articular e organizar os conhecimentos e assim reconhecer e conhecer os
problemas do mundo, é necessária a reforma do pensamento” (p. 35), uma educação
para a compreensão deve ressignificar o modo de pensar e ver o mundo. Cientes de
que a escola apresenta condições propícias para a realização dessas mudanças, visto
ser um espaço de formação humana, passaremos a discorrer sobre o papel do
professor nesse contexto, delineando as ações docentes numa perspectiva crítica e
transformadora, visto que as práticas docentes em EA têm sido impregnadas com uma
visão ingênua. A esse respeito Freire (2006) ressalta que:
O saber que a prática docente espontânea ou quase espontânea, “desarmada”, indiscutivelmente produz é um saber ingênuo, um saber de experiência feito, a que falta a rigorosidade metódica que caracteriza a curiosidade epistemológica do sujeito (p. 38).
Superar essa visão ingênua de EA, que consequentemente produz saberes
ingênuos e comportamentos descomprometidos com os cuidados necessários para
com a sustentabilidade planetária, se torna um desafio para os professores, visto que
necessitamos desenvolver consciências críticas e transformadoras, capazes de
reconhecer as complexidades das inter-relações existentes entre cultura, sociedade,
economia, política, todos os seres vivos e as condições que compõem o meio
ambiente. As práticas docentes ingênuas em EA não conseguem construir a
curiosidade epistemológica dos alunos, que por sua vez acabam não enxergando e
nem interferindo em seus contextos de vidas, nos seus cotidianos e em suas escolhas.
39
Mas como superar essa ingenuidade que nos acompanha e se efetiva em
nossas práticas? Freire (2006) ao falar da prática docente espontânea ou quase
espontânea, “desarmada”, nos alerta que para a construção de uma EAE que prime
pela criticidade e transformação deveremos inserir nos processos formativos dos
professores alguns posicionamentos teóricos e metodológicos que possam ajudá-los
a ressignificar suas concepções e práticas, a “pensar e ensinar certo”, pois, “só, na
verdade, quem pensa certo, mesmo que, às vezes pense errado, é quem pode ensinar
a pensar certo” (p.27).
O pensar certo (ser crítico) proporciona o agir certo (ser sócio, cultural, político,
econômico e ambientalmente transformador). Não construiremos mudanças
significativas nessas estruturas complexas enquanto nosso pensar e ensinar não
contemplarem o entendimento de que somos seres inacabados, dependentes do meio
ambiente e influenciados por diversos outros fatores. Mas nem por isso mesmo,
somos menos detentores da capacidade de reflexão, capazes de se perceber no
mundo e, a partir desse reconhecimento, compreender as redes de conexões que nos
vinculam aos outros e ao meio, e assim encontrarmos respostas para a crise ambiental
que nos ameaça, mas não nos tolhe a capacidade humana de sermos éticos para com
o meio ambiente e todas as formas de vida do Planeta.
Freire (2006) destaca que o papel do professor não é somente o de ensinar os
conteúdos, mas também o de ensinar a pensar certo. Os professores e os alunos que
memorizam mecanicamente, são seres repetidores de ideias, de frases e de
pensamentos estanques, que perderam a capacidade de criticidade, de invenção, de
transformação e não conseguem perceber as relações entre o que estudam e as
questões do seu cotidiano. Sabem os conceitos, podem até recitá-los, mas não
conseguem vinculá-los com as questões da realidade do mundo no qual estão
inseridos. Assim, pensam errado, pois vivem numa realidade idealizada,
desconectada do mundo concreto, real e complexo.
Araújo (2011) em consonância com Santos (2001) entende que a construção
de um fazer docente voltado para a criticidade e a transformação necessita de um
outro perfil de professor, portanto de outras práticas docentes. Desse modo, a
formação docente se torna um caminho para que essa mudança se efetive, não
somente pelos papeis que os professores terão que assumir, mas que sejam,
inclusive, capazes de transformar suas próprias ideias e práticas, distanciando-se do
modelo conservador de educação. A esse respeito Freire (2006d) alerta que a reflexão
40
crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação teoria/prática, pois não há
docência sem discência. Essas duas ações se explicam e os sujeitos que as compõem
apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do
outro. A seguir discutiremos alguns aspectos da formação que se propõe a ser crítica
e transformadora.
As explicações dadas pela lógica cartesiana são descontextualizadas e
disciplinares, portanto não contemplam as complexidades, acasos e incertezas dos
problemas ambientais e tampouco, favorecem a formação de sujeitos críticos capazes
de interferir na realidade de modo sustentável e ético. A esse respeito Grün (2007)
ressalta que nossos discursos são reducionistas e que precisamos de uma
abordagem complexa, pois qualquer pedagogia ou currículo que não considerar essa
premissa contribuirá muito pouco para a formação de cidadãos capazes de interferir
na realidade da crise ambiental.
Os discursos e as práticas docentes são resultado de processos formativos
igualmente conservadores. Investir nessa direção que nos foi imposta ao longo dos
anos é possível, visto que os homens são seres de busca e sua vocação ontológica é
a humanização. Cedo ou tarde poderão perceber a contradição na qual a educação
escolar procura mantê-los e se comprometerão então na luta por sua libertação
(FREIRE, 2008).
Ainda em consonância com Freire (2008) cremos que o ponto de partida para
essas mudanças se encontra nos próprios homens, contudo não existimos fora do
mundo, fora da realidade que nos cerca. Desse modo o movimento deve se iniciar na
relação homem-mundo; no seu momento presente, no contexto em que se encontram,
ora imersos, ora emersos, ora incertados. Somente partindo desta situação – que
determina a percepção que eles têm – é podem começar a atuar.
Uma prática docente que estimule a formação crítica e transformadora deve ser
igualmente crítica e transformadora. Luckesi (2011) ressalta que quando agimos em
nossas práticas docentes cônscios das teorias que sustentam nossas ações, esse fato
nos impulsiona, pois temos ciência do que queremos, para onde estamos caminhando
e como queremos ir, o que implica ter clareza dos fins que nos propomos a alcançar
e das metodologias que vamos lançar mão para chegar aos objetivos desejados.
Assim, uma prática docente em EAE que se proponha a formar sujeitos com a
capacidade crítica e transformadora se fundamenta num movimento dinâmico e
dialético entre o fazer e o pensar sobre o fazer (FREIRE, 2006), portanto um abandono
41
do pensar e do fazer ingênuo em detrimento de um pensar e um fazer crítico e
transformador. Desse modo, a ressignificação do papel social do professor, enquanto
sujeito consciente que irá atuar no processo educativo da EAE, proporcionando a
formação de alunos igualmente críticos há de reconhecer que a conscientização se
inicia na tomada de posse da realidade, estranhando-a, para que depois imbuídos de
novas perspectivas possam decidir, optar e intervir.
Para que o processo de conscientização se efetive precisamos ainda romper
com os mitos, nos desmitologizar, o desafio do pensar e agir em EAE é o de promover
a desmistificação de concepções e ideias impostas pela sociedade capitalista, pelos
modelos de consumo construídos e validados pela mídia. Enfim, é proporcionar um
ambiente de ensino e aprendizagem que valorize a contextualização, a
problematização e a mudança; ainda em sintonia com Freire (2008) ressaltamos que
a prática do professor deve primar por relações não opressoras, pois:
Os opressores jamais poderão provocar a conscientização para a libertação: como desmitologizar, se eu oprimo? Ao contrário, porque sou opressor, tenho a tendência a mistificar a realidade que se dá à captação dos oprimidos, para os quais a captação é feita de maneira mística e não crítica (...) por isso mesmo a conscientização é o olhar mais crítico da realidade, que a des-vela para conhecê-la e para conhecer os mitos que enganam e que ajudam a manter a realidade da estrutura dominante (FREIRE, 2008, p.33, grifo do autor).
Ao enfatizarmos a desmitologização como condição necessária ao processo de
conscientização, essa premissa só será possível se olharmos para a crise ambiental
desvelando sua realidade, conhecendo-a em suas variadas e complexas inter-
relações, considerando a dimensão humana, a natureza, a sociedade, a cultura, a
política e a economia. Ao contrário, torna-se impossível realizar uma EAE crítica e
transformadora centrada em relações de poder e opressão que favorecem a
manutenção dos mitos e a formação de indivíduos acríticos. Surgindo em direção
oposta, o processo de conscientização olha e acolhe a realidade enxergando suas
complexidades, e criticamente vendo e compreendendo as relações de interesse e
poder que lhes são impostas, rompendo com os mitos para, desvelando-os poder
construir e transformar o contexto.
Nesse sentido, o perfil do professor passa a ser o de mediador desse processo,
realizando práticas docentes, que contemplem essa desmitologização, assumindo
uma EAE em suas dimensões pedagógicas e políticas, articulando e promovendo o
42
debate entre seres humanos, natureza e sociedade. Sobre essa postura Layrargues
(2009) propõe uma EA que favoreça o desenvolvimento da consciência ecológica dos
alunos, mas que ao mesmo tempo seja capaz de contextualizar questões relativas à
padronização cultural, à exclusão social, a concentração de renda, às relações de
trabalho, ao mercado e à alienação. Essas reflexões são muito oportunas e ganham
um significado ímpar quando contextualizadas num país eminentemente desigual,
injusto e segregado como o Brasil.
A proposta de educação como mola propulsora da transformação social, que
caracteriza a EA crítica, segundo Loureiro (2005) tem seus fundamentos na Teoria
Crítica do Conhecimento, e está vinculada à Escola de Frankfurt, que buscou a
compreensão crítica e global da sociedade contemporânea, recorrendo à teoria e ao
método dialético (Karl Marx), visando construir uma visão integrada de ciência e
filosofia, e uma atuação de transformação nas relações sociais. No campo da
educação, os diálogos se deram com Henri Giroux, um dos fundadores da pedagogia
crítica, Peter McLaren e Paulo Freire.
O desafio de uma EA que se propõe a ser crítica e transformadora é com a
formação de professores que levem a ações docentes capazes de articular teorias e
metodologias que possam garantir na escola, o desenvolvimento dos atributos da
EAE: trabalhar a perspectiva crítica, a interdisciplinaridade, a problematização, a
contextualização, a transversalidade, a complexidade das dimensões humana, da
natureza e da sociedade, suas emergências e inter-relações.
Loureiro (2005) apresenta alguns elementos que devem ser observados na
verificação da coerência entre princípios teóricos-metodológicos e práticas docentes
em uma EAE que se proponha à formação de sujeitos críticos e transformadores. São
eles: vinculação do conteúdo com a realidade da comunidade; aplicação prática e
crítica do conteúdo apreendido; articulação entre conteúdo e problemas da realidade
local e global; projeto político-pedagógico construído coletivamente; aproximação
escola-comunidade e articulação entre ensino e pesquisa, reflexão sistematizada e
prática docente.
Por fim, destacamos que uma prática docente em EAE crítica e transformadora
há de romper com o modelo de escola em que os alunos são simples objetos de seus
processos formativos. Nesse direcionamento Torres et al. (2014) argumentam que
para que se efetive um processo educativo em EAE que se proponha a formação de
sujeitos críticos e transformadores, tendo como parâmetros a construção de
43
conhecimentos e práticas que lhes deem condições de intervir criticamente no meio
em que vivem, há de ser um processo que considere os alunos como sujeitos não
neutros, responsáveis pela construção de seus próprios conhecimentos e atitudes,
capazes de atuar na sua realidade, transformando-a. Portanto:
É o sujeito consciente das relações existentes entre sociedade, cultura e natureza, entre homens e mundo, entre sujeitos e objeto, por que se reconhece como parte de uma totalidade e como sujeito ativo do processo de transformações sócio-histórico-culturais (TORRES et al., 2014, p. 15, grifos dos autores).
O propósito de formar sujeitos conscientes das relações que estabelecem uns
com os outros, com a cultura e a natureza; uma compreensão de que fazem parte de
um todo, mantendo suas individualidades, mas interferindo e sendo interferido; um
sujeito ativo no mundo e com o mundo, que se reconstrói ao agir, deve ser a premissa
do professor que deseja trabalhar com a EAE. Ainda nesse direcionamento Luckesi
(2011) enfatiza que um dos objetivos do ofício do professor “é proporcionar condições
para que cada educando se torne um sujeito”.
Acreditamos em uma formação docente em EAE que promova, desde seu
processo formativo, reflexões sobre a maneira como o ser humano pensa, e de que
forma esse pensar se efetiva nas escolhas e práticas, sobretudo na ação dos
professores. Assim, mediante essa abertura, entendida como possibilidade de ruptura
paradigmática esperamos vislumbrar outras formas de pensar, sentir e agir,
comprometidas com uma EAE que prime pela sustentabilidade planetária.
1.5 Sustentabilidade
Ao defendermos uma EAE que se proponha a trabalhar as questões ambientais
com vistas à sustentabilidade do Planeta, nos deparamos com uma incompreensão
conceitual do termo sustentabilidade, por parte dos professores. Esse fato acaba
perpassando as práticas docentes e se efetiva em construções conceituais
equivocadas nos alunos. As concepções de sustentabilidade se confundem com as
de desenvolvimento sustentável. Esta última, expressão muito recente, foi
apresentada de forma clara no relatório da primeira-ministra norueguesa Gro Harlem
Brundtland, em 1987 e definida como “aquele que atende as necessidades das
44
gerações atuais sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atenderem
as suas necessidades e aspirações” (BRUNDTLAND, 1987).
Alves (2015) destaca que nos anos seguintes à publicação do Relatório
Brundtland a ideia de desenvolvimento sustentável incorporou além da dimensão
ambiental, os aspectos social e econômico, o chamado triple bottom line; o tripé da
sustentabilidade que tem como premissa ser concomitantemente, socialmente justo,
economicamente inclusivo e ambientalmente responsável. Boff (2013) destaca que a
expressão desenvolvimento sustentável, após o referido relatório, passou a ser
utilizada em todos os documentos oficiais dos governos, da diplomacia, dos projetos
das empresas, nos discursos ambientalistas e nos meios de comunicação. Assim
sendo, o entendimento de seu significado se encaminha em duas direções:
O desenvolvimento sustentável é proposto ou como um ideal a ser atingido ou então como um qualificativo de um processo de produção ou de um produto, feito pretensamente dentro de critérios de sustentabilidade, o que na maioria dos casos, não corresponde à verdade (BOFF, 2013, p.36-37).
Esse entendimento de que o desenvolvimento sustentável se apresenta como
um aval, uma certificação para validar o consumo, ou minorar a responsabilidade que
devemos ter para com os produtos que “legalmente” consumimos e que são retirados
da natureza, tem sido mote de discursos e práticas docentes em nossas escolas.
Contudo, as relações de crescimentos, de lucros exorbitantes, de explorações sociais
e ambientais não são analisadas e nem levadas em consideração quando tratamos
dessa problemática com nossos alunos. Atualmente o conceito de desenvolvimento
sustentável ocupa lugar comum e se tornou modismo, sendo ensinado nas escolas
de modo acrítico, linear e descontextualizado.
Desmembrando a expressão desenvolvimento sustentável, passamos a
discorrer sobre o entendimento do conceito de sustentabilidade. Em sua acepção
etimológica está a palavra latina sustentare, com o mesmo significado do verbo
sustentar, em português. Ao interpretar os sentidos dados ao verbo sustentar Boff
(2013) os agrupa em dois sentidos: um passivo (equilibrar-se, manter-se, conservar-
se sempre à mesma altura, conservar-se sempre bem) referente à ecologia, tudo que
a Terra faz para se manter de modo que seus ecossistemas não entrem em colapso,
portanto que haja condições da Terra se conservar, prosperar, fortalecer-se e evoluir;
o outro um ativo (conservar, manter, proteger, nutrir, alimentar, fazer prosperar,
45
subsistir, viver) sugere ações realizadas de fora para dentro, portanto, nossas ações
em relação à Terra, a todos os seres vivos que se mantem vivos, protegidos e
alimentados de nutrientes, a ponto de resistirem às ameaças que possam vir a sofrer.
Para Mariotti (2013) a proposta dos três pilares da sustentabilidade: “bem-estar
social, prosperidade econômica e proteção animal” se baseia nos pressupostos
daquilo que queremos ou devemos fazer, mas não explicita sobre se podemos fazer
tudo o que queremos. De fato, nós, seres humanos, ainda nos encontramos distantes
desse ideário a ser atingido. Como desfrutar bem-estar social com tantas
desigualdades sociais? Como prosperar economicamente sem explorar os seres
humanos e a natureza? Como proteger a fauna e flora sem matar e destruir para
sobreviver? Não somos altruístas a esse ponto, e tanto na esfera individual quanto na
coletiva agimos como seres humanos que somos, unidades complexas, pois trazemos
em nós mesmos, de modo bipolarizado, caracteres antagônicos: econômico e
consumista, sábio e louco, trabalhador e lúdico, empírico e imaginário, prosaico e
poético, conclui Morin (2005b).
Contudo, para que possamos delinear o debate sobre sustentabilidade no
âmbito escolar e na prática docente, retomamos o conceito de sustentabilidade, à
guisa de compreendê-lo e propor reflexões que possam favorecer a prática dos
professores que se propõem a desenvolver atividades que tratem da problemática
ambiental. Considerando a polissemia do termo em voga, destacamos ser tarefa
árdua apresentar uma linha de raciocínio que contemple seu entendimento na esfera
escolar e sobretudo na prática docente.
Loureiro (2012) fala que o conceito de sustentabilidade é instigante, complexo
e desafiador, visto que o termo abre múltiplas possibilidades de desdobramentos, bem
como um variado leque de relações, podendo contemplar aspectos das ciências
biológicas, da política, da economia, da ecologia, do ambiente, enfim, permite diversos
e diferentes empregos de sua nomenclatura.
Face a esse fato e em meio a tantos conceitos, apresentamos a definição de
sustentabilidade na concepção de Boff (2013), pois a consideramos como sendo a
mais próxima das ideias que ora acreditamos. Sustentabilidade é:
Toda ação destinada a manter as condições energéticas, informacionais, físico-químicas que sustentam todos os seres, especialmente a Terra viva, a comunidade de vida, a sociedade e a vida humana, visando sua continuidade e ainda atender as necessidades da geração presente e das futuras, de tal
46
forma que os bens e serviços naturais sejam mantidos e enriquecidos em sua capacidade de regeneração, reprodução e coevolução (BOFF, 2013, p.107).
Boff (2013) classifica seu conceito como holístico, integrador, compreensivo e
o mais includente possível. Seus argumentos versam sobre a proposta de sustentar
todas as condições necessárias à vida de todos os seres vivos, inclusive a Terra. Ao
fazê-lo ele rompe com a ideia antropocêntrica que coloca o homem como ser superior
e que está fora da natureza. Ao abordar a questão das necessidades da geração
presente e das futuras, sugere a ideia de equidade social, devendo os seres humanos
da atualidade se debrucem de modo sinérgico e cooperativo com a ideia de
distribuição dos bens e dos serviços de modo igualitário.
Esse conceito nos convida a reflexões e nos impulsiona na direção de novas
maneiras de pensar, sentir e agir, isto é, mudanças paradigmáticas, tanto na esfera
individual, quanto na social, mas sobretudo nas nossas relações de ensino e
aprendizagem e formação humana. Uma formação que favoreça a intervenção
humana no meio socioambiental considerando as capacidades de regeneração, de
reprodução e de coevolução dos seres vivos e da Terra. O grande desafio de
trabalharmos o conceito apresentado por Boff (2013) enfatizando as questões
ambientais, com nossos alunos é ensinar e aprender a condição humana.
Destacamos as ações de ensinar e aprender em respeito às ideias
apresentadas inicialmente neste estudo, em que Freire (2006) destaca que não há
docência sem discência. Necessitamos sim, de uma formação docente que prime
também por essa desconstrução de um mundo compartimentado, descontextualizado,
injusto e não dialógico. Ao falar sobre a educação do futuro Morin (2005b) destaca
que ela deverá ser o ensino primeiro e universal, centrado na condição humana; os
seres humanos se reconhecendo em sua humanidade comum e, simultaneamente,
reconhecendo a diversidade cultural inerente a todo ser humano.
Nesse exercício de reconhecimento situando o ser humano, “Homo complexus”
(Morin 2005b), no universo, suas relações com os outros e consigo mesmo, num
contexto plural de culturas, temos como mediador um saber fragmentado e
compartimentado, que não nos permite religar fatos, situações, contextos e ações.
Assim, avançamos no conhecimento das partes e permanecemos ignorantes no
entendimento das interelações e no desenvolvimento de ações sustentáveis pautadas
em ações conscientes e éticas.
47
Para a construção de um outro modo de pensar, sentir e agir em relação às
questões ambientais, Leff (2008) recomenda a formação de um novo saber e a
integração interdisciplinar do conhecimento, capazes de explicarem o comportamento
dos sistemas socioambientais complexos.
O saber ambiental problematiza o conhecimento fragmentado em disciplinas e a administração setorial do desenvolvimento, para construir um campo de conhecimentos teóricos e práticos orientado para a rearticulação das relações sociedade-natureza (LEFF, 2008, p.145).
Nesse direcionamento, esse saber ambiental considera o diálogo entre os
conhecimentos disciplinares e especializados, a proposta de construção de
conhecimentos tanto teóricos quanto práticos, podendo ser entendidos como
conceituais e atitudinais, com o objetivo de ressignificar a maneira como temos nos
relacionado com a natureza, conosco mesmos e com os demais seres vivos; numa
perspectiva inclusiva dos valores éticos e dos saberes práticos e teóricos, tradicionais
ou não. Esse fato emerge da falta insaciável de conhecimento que impele o saber
para a busca de novos sentidos de civilização, novas compreensões teóricas e novas
formas práticas de apropriação do mundo (LEFF, 2008).
Ante a limitação imposta pelos limites cartesianos de pensar, sentir e agir, que
nos aliena e nos coisifica, ilustradas por Mariotti (2013), quando nos apresenta o termo
autossabotagem, argumentando que a percepção de que os seres humanos com
frequência pensam e agem contra os seus próprios interesses é antiga, mas as
tentativas de negá-la também o são.
Para sustentar seus argumentos, o autor cita o exemplo das monoculturas que
depois de algum tempo acabam esterilizando o solo, e passam a produzir efeitos
contrários aos desejos dos monocultores. Esse fato ocorre a longo prazo, no entanto,
nossas mentes estão condicionadas pelo imediatismo e localismo, de modo que o
problema só será percebido posteriormente. Se por ventura buscarmos soluções
imediatistas, logo o problema retorna e assim o transferimos para as gerações futuras.
Nossas ideias e práticas de sustentabilidade carregam em si mesmas as suas
insustentabilidades, num processo de retroalimentação contínuo.
Ao destruir o mundo o homem se autodestrói, não importam os estratagemas de autoengano que usar para disfarçar esse estado de coisas. A ideia de separação sujeito-objeto pode ser considerada o ponto inicial, embora não único, do empenho em dificultar ou inviabilizar qualquer projeto de
48
sustentabilidade, mesmo os que se proclamam mais pragmáticos e realistas (MARIOTTI, 2013, p. 25).
A meta é incluir o ser humano no ambiente em que vive, em suas ações, em
suas relações, como parte indissociável de um todo, um sistema complexo, formado
por complexidades individuais que se juntam para formá-lo, contudo carecem
igualmente de acolhida pois se reconhecem socioambiental em relações de interações
e dependências mútuas. Leff (2010a, p.78) afirma que o futuro aparece como um
projeto, “sustentado em uma nova racionalidade, em que o pensamento, a fala e o
sentimento reativem o sentido da vida e regenerem os potenciais da natureza”.
A construção de uma nova racionalidade passa pelo modo como nos
relacionamos com a natureza do ponto de vista econômico, a maneira como tratamos
a crescente degradação do meio ambiente e a escassez cada vez maior dos recursos
naturais, em nome do capitalismo. Ou seja, uma economia que estimula o consumo,
a exploração e a desigualdade social, ao tempo em que promove a poluição, ou seja
uma economia insustentável.
Leff (2010a) argumenta que a problemática ambiental tem proporcionado
reflexões nas diversas áreas da humanidade, fato esse que gerou mudanças nos
sistemas socioambientais complexos que afetam as condições da sustentabilidade
planetária, que por sua vez impõe a necessidade de internalizar as bases ecológicas
e os princípios jurídicos e sociais com a finalidade de que os recursos naturais ainda
existentes possam ser gerenciados de modo democrático, justo e igualitário.
A crise ambiental problematiza os paradigmas estabelecidos do conhecimento e demanda novas metodologias capazes de orientar um processo de reconstrução do saber que permita realizar uma análise integrada da realidade (LEFF, 2010b, p. 62).
Esse fato exige que nós professores promovamos reflexões no campo
epistemológico e nas estratégias metodológicas que usamos em nossas práticas para
a construção de conceitos e atitudes, bem como a compreensão dos fatos e
procedimentos relacionados ao estudo das questões ambientais; para que
efetivamente os espaços educativos da escola sejam de formação humana, capazes
de promover mudanças sociais.
Franco (2012, p. 56) considera a EA “para as sociedades sustentáveis como
uma proposta que se contrapõe ao modelo de desenvolvimento econômico como a
49
única via para a sustentabilidade”. Corroboramos com o autor, visto que se
mantivermos o eixo técnico-econômico como saída para a crise ambiental num
discurso de sustentabilidade que mantém o modelo capitalista dominante, não
conseguiremos mudanças nas bases econômicas e sociais de produção e consumo,
principalmente diante da ânsia de lucro e da competitividade que se faz presente na
cultura das mascaradas empresas verdes.
Vale ressaltar que, em se tratando de complexidade, além das esferas dos
fenômenos físicos e ecológicos, é de extrema urgência uma formulação do
pensamento e das ações no direcionamento da “natureza complexa dos processos
econômicos e políticos que engendram (desiguais no capitalismo) as formas de uso e
apropriação material e simbólica no ambiente pelos agentes sociais” (LOUREIRO,
BARBOSA e ZBOROWSKI, 2009).
Nessa vertente, o ofício do professor não deve desconsiderar as relações de
dominação no campo ambiental, refletindo sobre o conceito de justiça ambiental,
inclusive relacionada aos grupos sociais marginalizados ou que vivem nas periferias;
em que muitos, inclusive, dependem diretamente da extração e manejo de recursos
naturais. Outros aspectos merecem menção, como por exemplo as condições de vida
de grande parcela da população, residindo em favelas, sem acesso a saneamento
básico, vulneráveis a enchentes, doenças e violências. Não há justiça socioambiental,
quando se constata que “os benefícios ambientais são distribuídos de maneira
desigual pela sociedade, o mesmo pode-se dizer quanto aos riscos, danos e
problemas ambientais” (LOUREIRO, BARBOSA e ZBOROWSKI, 2009). Do lado
oposto dos excluídos, estão os de maior poder político e aquisitivo, desfrutando de
áreas ambiental e socialmente seguras, ecologicamente corretas e sustentáveis.
Gutiérrez e Prado (2013) destacam que a crise ambiental é fruto do
aproveitamento irracional dos recursos naturais que temos realizado nas últimas
décadas. Assim, querer resolvê-la partindo apenas da dimensão desenvolvimentista
é um erro, pois desconsideramos as relações inerentes ao novo paradigma
emergente. Continuamos com uma visão econômica, estreita e reducionista do
planeta nos distanciando de uma perspectiva mais ampla e abrangente,
fundamentada na ética que reconhece que o equilíbrio ecológico exige uma série de
mudanças profundas em nossa percepção do papel que deve desempenhar o ser
humano no ecossistema planetário.
50
Tendo em vista que a escola é parte da sociedade, nela há a reprodução dos
paradigmas e padrões sociais. Destacamos que as ideias e comportamentos de
insustentabilidade aportam no espaço escolar e muito dificultam o trabalho do
professor na reconstrução de conceitos e atitudes que promovam a busca de soluções
quando tratamos das questões ambientais. Assim seria função também da sociedade
e de seus correlatos se sensibilizarem para com essa mudança de perspectiva
paradigmática, para que os movimentos de fora para dentro e de dentro para fora da
escola pudessem de fato ter repercussões significativas, nela e na sociedade.
Tristão (2008) assinala que o papel da escola é construir valores e estratégias
que possibilitem os alunos a pensar e a escolher de modo consciente o que é melhor
para eles, do ponto de vista cultural, econômico e ambiental para que possam em
suas comunidades alcançarem um nível de sustentabilidade que contribua com os
objetivos das esferas regionais, nacionais e globais.
Nesse direcionamento é necessário que os professores assumam em seus
discursos e práticas uma perspectiva formativa dos alunos, isto é, empreendam
esforços no sentido de ajudar os alunos a pensar, sentir e agir, identificando quais os
elementos que afetam a sustentabilidade planetária, e quais as possibilidades reais
de manejar essas dificuldades.
Essa ação requer uma formação do professor, uma mudança na sua relação
com o saber e o ensinar, uma nova postura, portanto, que leve os alunos a: a)
refletirem criticamente sobre o lugar que ocupam no mundo, considerando o
significado de sustentabilidade para eles e para suas comunidades, local e global; b)
aplicarem conceitos alternativos de desenvolvimento e de viver; c) vislumbrarem
outras possibilidades de desenvolvimento; d) aprenderem a argumentar defendendo
as escolhas de determinadas concepções, criando possibilidades para alcançá-las; e
e) participarem da vida em comunidade tornando reais suas convicções (UNESCO,
1999).
Ainda nesse direcionamento Delors et al. (2006, grifos nossos) recomendam
que à educação cabe fornecer aos professores e alunos os mapas de um mundo
complexo, constantemente em mutação, movido por incertezas, uma espécie de
bússola que permita navegar através dele. Assim, a educação deve se organizar em
torno de quatro aprendizagens fundamentais que ao longo de toda a vida, servirão de
alguma maneira como os pilares do conhecimento: aprender a conhecer (adquirir os
instrumentos da compreensão), aprender a fazer (agir sobre o meio envolvente),
51
aprender a viver juntos (participar e cooperar com os outros em todas as atividades
humanas) e aprender a ser (desenvolver o compromisso individual para com o futuro
coletivo).
No que tange à EA, sobretudo ao ensino e à aprendizagem da sustentabilidade,
os quatro pilares da educação destacados acima, estão totalmente em consonância
com a formação de seres humanos complexos habitando um mundo igualmente
complexo e plural, pois dispomos de uma cultura vasta e uma enormidade de saberes.
Desse modo, aprender a conhecer é o passo inicial no direcionamento de como
e para onde olhamos as questões ambientais, quais os saberes que explicam
determinado contexto e fenômeno e de que modo esses saberes se articulam.
Aprender a fazer é o passo seguinte, no enfrentamento dos problemas individuais e
coletivos, das catástrofes ambientais, das imprevisibilidades da Terra. Aprender a
viver juntos compreendendo o outro, todos os seres vivos e o planeta, bem como seus
elementos constituintes, percebendo as interdependências e inter-relações às quais
estamos vinculados, gerindo conflitos, no exercício e diálogo da alteridade. Por fim
aprender a ser de maneira autônoma e consciente, empoderados da responsabilidade
individual do compromisso com a coletividade, pautando nossas ações em atitudes
de sustentabilidade.
Uma escola em que os espaços de ensino e aprendizagem possam ser a
própria expressão do mundo real, se a escola é a sociedade, e essa por sua vez está
inserida num contexto ambiental, político, econômico e cultural. Não há por que não
viver, estudar, compreender esses contextos no âmbito escolar. Nessa direção
corroboramos com Tristão (2008) que recomenda a criação de espaços pedagógicos
na escola, nos quais possam ser vivenciadas a expressão, a criação, a reapropriação
do saber, as diferenças, o equilíbrio, o desequilíbrio, a solidariedade e a experiência
de conhecer outras lógicas do conhecimento.
Se é na escola em que o contexto, o global, o multidimensional e o complexo
devem ser considerados (MORIN, 2005b) para que a produção do conhecimento
tenha significado e signifique molas de transformações socioambientais, é nela que a
convivência com as contradições e os conflitos, podem ter um significado expressivo
na construção dos sentidos em direção à sustentabilidade (TRISTÃO, 2008).
Por fim, um convite a pensar um modelo de escola, de professor e de prática
docente que promovam a sustentabilidade da Terra, considerando a complexidade
planetária, entendendo todas as suas “vias de complexificação (a diferença e o
52
entrelaçamento entre a complexidade do ser e do pensamento), para, a partir dali,
abrir novas vias do saber no sentido de reconstrução e da reapropriação do mundo”
(LEFF, 2012, p. 57).
1.6 Complexidade
Do conceito inicial de EAE destacamos a necessidade de considerar as
complexidades das relações existentes entre os seres humanos, e entre esses e a
natureza, imbricados pela sociedade, cultura, política e economia. Assim, diante
desse processo educativo, no qual ensinamos e aprendemos simultaneamente, e que
se propõe a romper com princípios e metodologias da lógica binária, instala-se a
necessidade de se reconhecer a complexidade ambiental. Morin (2008, p.10) nos
alerta que “não haverá transformação sem reforma do pensamento, ou seja, revolução
nas estruturas do próprio pensamento”, tornando o pensamento complexo.
Leff (2010b) destaca que a educação das futuras gerações deve prepará-las
para que aceitem as incertezas e compreendam as complexas redes de inter-relações
entre todos os processos da vida, sejam eles objetivos e subjetivos, pois somente
assim é que serão desenvolvidas habilidades inovadoras capazes de construir o
inédito. Essa formação, faz com que os “indivíduos se preparem para a construção de
uma nova racionalidade [...] para um processo de emancipação que permita o
surgimento de novas formas de reapropriação do mundo” (LEFF, 2010b, p. 219).
Tanto para Morin (2008) quanto para Leff (2010b) há recomendações acerca
de uma nova proposta educativa, aqui, particularizada como uma proposta para EAE
crítica e transformadora. Para Morin é imprescindível que promovamos uma reforma
nas cabeças, no modo de pensar, para que as mesmas passem da condição de
“cheias” para “bem-feitas”. Tanto Morin quanto Leff abordam a questão da incerteza e
da complexidade: características do mundo natural, dos seres vivos e de todos os
sistemas e inter-relações que compõem a Terra, inclusive dos aspectos sociais,
econômicos, políticos e culturais. Leff destaca ainda a necessidade de se construir
uma nova racionalidade.
Assim, para se resolver a crise ambiental necessitamos, primeiro, resolver a
crise do pensamento, repensar nosso papel no mundo e com o mundo, nos
reconhecermos como unidades complexas em relação com outras igualmente
complexas, num sistema socioambiental, cultural, econômico e político complexo.
53
Nesse processo de desconstrução e reconstrução do pensamento, estabelecer os
vínculos de religação entre sujeito e objeto, natureza e ser humano, para que num
processo de desalienação e desmitologização possamos ressignificar e reconstruir
formas de pensar, sentir, e gerir nossas ações no mundo.
Morin (2008) ao falar que complexus assinala é tudo aquilo que está junto, é
um tecido formado por diversos fios que de forma entrelaçada se intercruzam e
formam uma única estrutura, nos convida a reconhecer esse emaranhado que somos
e em que estamos imersos em nossas inter-relações socioambientais. A escola
necessita promover o pensamento complexo, para que o ensino e a aprendizagem da
EAE aconteçam sob essa lógica, permitindo que os alunos se reconheçam como
unidades complexas, atuando em uma rede de inter-relações complexas. O
reconhecimento é a porta de entrada para a mudança na forma de pensar dos alunos,
para posteriormente desenvolverem os sentimentos e agirem sob a égide do
pensamento complexo.
Há entre os leigos ou os que iniciam a se familiarizar com o termo
complexidade, uma falsa premissa de que ela seja sinônimo de complicado; e que a
unidade complexa destrói as complexidades das unidades individuais que a
compõem. Ao se tomar o conceito de complexidade como sinônimo de complicado,
se estabelece um obstáculo que dificulta o entendimento mais abrangente do nosso
lugar no planeta e o papel que devemos desempenhar no espaço socioambiental em
que nos movemos.
Ao considerarmos o tecido ambiental entendemos que esse é formado por
inúmeros outros fios, igualmente complexos, mas que mantêm suas individualidades.
A título de exemplo, consideremos um retalho de linho: ele é composto por diversos
fios de linho, que foram tecidos e formaram o retalho. O retalho de linho, considerada
uma emergência, não aniquila as propriedades individuais de cada fio, contudo ela só
se dá na interação dos fios tecidos.
O tecido ambiental, formado por diversas unidades, possui determinadas
emergências que só se efetivam nas relações dessas unidades, em seus contextos.
Ao isolarmos as partes constituintes do tecido ambiental, algumas emergências
deixarão de existir. Esse fato impede que nós, seres humanos, compreendamos o
todo. Compreender as partes não nos leva à compreensão do todo, e vice-versa. O
modo de pensar complexo necessita ser promovido pelas escolas, nos discursos e
54
nas práticas docentes, para que o pensar e agir dos alunos caminhem nessa direção
e de fato se efetivem.
Pensar a complexidade em EAE exigirá do professor um caminhar que desvele
a complexidade do mundo, das relações e suas emergências. Pois assim, o
conhecimento necessita caminhar na direção da realidade e dos problemas que
enfrentamos, visto que se apresentam cada vez mais transversais, multidimensionais,
globais, complexos, incertos, imprevisíveis e de consequências amedrontadoras.
A Educação Moderna coisifica o conhecimento em objeto descartável, mercantilizável, separado do sujeito, fora do sujeito que o apropria com o intuito de aprovar a disciplina para depois esquecer. Não estabelece relações com o crescimento pessoal, mutações na percepção dos fenômenos e com o modo de estar nesse mundo (SANTOS, A., 2010, p. 36).
Essa tem sido a proposta de EA encontrada nas escolas atualmente, um
conhecimento descontextualizado, na qual os alunos memorizam os conhecimentos
e os repetem em situações específicas como as chamadas feiras de ciências.
Portanto, uma EA linear e fragmentada que não consegue explicar as individualidades
com multirreferencialidades (genética, cultural, social, histórica, política e econômica),
nem dá conta da complexidade das relações ecossistêmicas. A esse respeito Santos
(2009) relembra que as aulas dos professores se configuram como explicações
exaustivas de definições, conceitos, fórmulas, pautadas numa linguagem voltada para
a racionalidade tecnológica e científica. O modelo fragmentado de ensino apresenta
um conhecimento neutro e objetivo. Desse modo, esse saber vivenciado em nossas
salas de aula perde em sentido ao não trabalhar a relação com o todo e com os
sujeitos dos processos cognitivos.
Os modelos de EA pautados no cartesianismo exemplifica o que Morin (2007)
classificou como paradigma da simplificação, que carrega em si a disjunção, a
redução e a abstração. Descartes ao separar o sujeito/eu pensante (Ego cogitans) e
a coisa entendida/material (Res extensa) criou um problema trágico na ciência, visto
que o ser humano passou a não se reconhecer mais, a não dispor da capacidade auto
reflexiva (MORIN, 2008).
Na direção oposta ao pensar dicotômico, cartesiano sujeito-objeto, parte-todo,
razão-emoção, a EAE crítico e transformadora deve indicar um modo de ensinar e
aprender articulado e contextualizado. Dentre os princípios metodológicos (MORIN;
CIURANA; MOTTA, 2003) ou operadores cognitivos (MARIOTTI, 2008) elaborados
55
para se entender e colocar em prática a complexidade. Dentre eles destacamos que
o operador hologramático, Santos (2009) destaca que na prática docente, os
professores o têm desconsiderado; desse modo separam o todo da parte e dão um
tratamento mecanicista ao conhecimento.
O operador hologramático pode ser entendido usando-se a metáfora do
holograma13, uma figura obtida pelo processo holográfico. Seu enunciado é o
seguinte: “não apenas a parte está no todo, mas o todo está na parte” (MORIN, 2007,
p. 74). Para um pensar complexo, que considera a relação entre o todo e as partes,
entre as partes e o todo e entre as próprias partes, devemos considerar quatro
princípios: a) o da emergência; b) o da imposição; c) o da complexidade do todo; d) o
da distinção, mas não separação entre o objeto (ou o ser) de seu ambiente
(MARIOTTI, 2010).
O princípio da emergência – o todo é superior à soma das partes. Esse princípio
se refere ao fenômeno das propriedades emergentes. Por exemplo, uma floresta é
formada por inúmeras árvores, que por sua vez formam uma imensa copa; a
emergência copa só se dá pelo aglomerado das diversas árvores juntas, isto não
significa que todas elas tenham copas frondosas. Pode até existir entre elas aquelas
que possuem uma copa pouco significativa, contudo é do conjunto das copas
individuais de cada árvore que emerge a imensa copa. Outro exemplo é o fenômeno
das inundações ocasionado pelo depósito de lixo nos bueiros urbanos. A emergência
inundação é fruto dos resíduos descartados por pessoas que trafegaram naquela
área; no entanto o lixo descartado individualmente poderia ou não contribuir para tal
resultado.
O princípio da imposição – o todo é inferior à soma de suas partes. Tomemos
por exemplo o caso das gaivotas: entre elas pode ter aquelas que voam mais rápido
e outras que voam de forma mais lenta. No entanto, quando voam em conjunto
procuram manter uma velocidade tal que o voo entre elas fique harmônico. Assim, o
voo daquelas mais ágeis se torna latente, restrito ou inibido em detrimento daquelas
que voam mais lento. No que tange às relações com o meio ambiente, podemos
ilustrar com o exemplo de uma pessoa extremamente consumista e que passa a
13 Holograma fotografia que produz uma imagem tridimensional, obtida por laser (HOUAISS, 2004). 13Imagem obtida pelo processo holográfico, cada ponto contém virtualmente a totalidade do objeto reproduzido, isto é, as partes estão contidas no todo, e o todo está contido em cada uma das partes que o constituem (MARIOTTI, 2010)
56
conviver com pessoas preocupadas com as questões de consumo e meio ambiente.
Em troca da aceitação e da acolhida no convívio social, a pessoa consumista tende a
colocar seu comportamento de consumo em estado latente ou inibido, embora isso
possa acontecer momentaneamente.
O princípio da complexidade dos sistemas – reconhece que os dois princípios
anteriores são simultaneamente antagônicos e complementares. Dessa maneira, o
todo é ao mesmo tempo maior e menor que a soma das suas partes, uma vez que a
relação entre as partes e o todo é circular e não linear.
O princípio da distinção, mas não separação entre o objeto (ou ser) e seu
ambiente – o conhecimento de qualquer parte só é possível com o conhecimento das
interações dessa parte com o seu contexto. Assim, podemos ilustrar biologicamente
que o conhecimento do nicho ecológico de uma determinada espécie só é possível
conhecendo-se as interações do seu habitat.
Em relação às questões socioambientais, ilustramos com o exemplo das
araras-azuis-de-lear, também chamadas de ararinhas azuis, uma espécie de arara
endêmica do estado da Bahia (Brasil), ameaçada de extinção, existente no Raso da
Catarina. Qualquer estudo que se proponha a trabalhar na sua conservação há de
considerar as interações ecológicas que as araras-azuis-de-lear realizam em seu
habitat natural. Realizar estudos em laboratórios artificiais que não representam as
condições reais e, depois tentar introduzi-las na natureza, dificilmente irá ter sucesso,
visto que os laboratórios não representam o habitat real das ararinhas azuis.
No modelo fragmentado de escola, de ensino e aprendizagem, proposto pelo
pensamento/lógica binária, nos acostumamos a achar natural ensinar, aprender,
pensar, ver, sentir e agir num mundo compartimento, todo separado. Trazemos esse
contexto para nossas vidas, e somos seres fragmentados, desarticulados em nossos
pensamentos, emoções e atitudes. Pensamos em sustentabilidade, mas nossas
emoções e atitudes não condizem com nosso pensar, agimos de maneira
extremamente consumista, por exemplo.
Todavia, as evidências que nos cercam nos mostram que o mundo é orgânico,
o planeta, os seres humanos, os seres vivos, os elementos abióticos, enfim, tudo está
interligado, tudo se inter-relaciona, mas nossos sentidos perderam a capacidade de
fazer essas conexões. O saber trabalhado em nossas salas de aula não nos permite
fazer essas conexões, nos ensina a neutralidade e a desconexão.
57
O grande desafio da EAE crítica e transformadora é considerar que o
conhecimento de um fato, de um conceito, de algo ou de uma situação isolada é
ineficiente. É necessário que situemos o fato, o conceito, o algo ou a situação no seu
contexto para que possam adquirir sentido, significado, promover aprendizagens
significativa, e assim os alunos sejam capazes de criticamente opinar, escolher e agir.
Segundo Morin, existe uma inadequação:
Cada vez mais ampla, profunda e grave entre, de um lado, os saberes desunidos, divididos, compartimentados e, de outro, as realidades ou problemas cada vez mais multidisciplinares, transversais, multidimensionais, transnacionais, globais e planetários. Nessa inadequação tornam-se invisíveis: o contexto, o global, o multidimensional e o complexo. Para que o conhecimento seja pertinente, a educação deverá torná-los evidentes (MORIN, 2005b, p.36).
Se a proposta é ressignificar nossas práticas docentes de modo que cada vez
mais possamos nos tornar e formar seres humanos críticos, autônomos e
transformadores, conscientes de nossos papeis na construção da sustentabilidade
planetária, as práticas docentes devem romper com o ensino compartimentalizado. O
ensino e a aprendizagem da EAE crítica e transformadora devem considerar a
interdisciplinaridade, a transversalidade, a multidimensionalidade e a
transnacionalidade dos saberes ambientais, vinculados às suas realidades.
Esse reconhecimento desvela os contextos, considera o local e o global,
reconhecendo suas complexidades. Nesse direcionamento, o aprender e o ensinar
em EAE são pertinentes, capazes de promover uma formação que contribuirá para a
sustentabilidade planetária, estabelecendo relações éticas em qualquer esfera
humana, visto que todo ato ético é um ato de religação, com o outro, consigo mesmo,
com a humanidade, com os outros seres vivos e com o planeta (MORIN, 2005a).
Assim, a EAE crítica e transformadora vislumbra a formação de sujeitos que
estão em permanente processo educativo e que se encontram inseridos num
emaranhado de contextos sociais, culturais e históricos. Para tal, a prática docente
tem a intencionalidade de promover a formação de atitudes, resultantes do “pensar
certo”, construídas a partir de mediações didáticas reflexivas, que levem a “ação dos
sujeitos no mundo e sua vinculação afetiva com os valores éticos e estéticos dessa
visão de mundo” (CARVALHO, 2006, p. 187).
Por fim haveremos de trilhar um caminho que nos proporcione o exercício da
alteridade, reconhecendo que somos todos iguais e importantes, indistintamente,
58
humanos, fauna, flora e planeta. Ainda que mantenhamos nossas diferenças, nossas
diversidades, todos temos valor, somos importantes nessa teia de vida que é o Planeta
Terra. Morin (2005a) nos lembra que existe uma necessidade vital, social e ética de
amizade, de afeição e de amor para que os seres humanos se realizem. A experiência
fundamental de religação de nós, seres humanos, é o amor. Em grau máximo da
complexidade humana, a religação só pode ser amorosa.
As concepções teóricas expostas até aqui sinalizam para um conjunto de
pressupostos teóricos e metodológicos, que reorientam as práticas docentes para
uma proposta de EAE crítica e transformadora. Assim, os processos que visam
trabalhar a formação docente ou as práticas de EAE na perspectiva desta tese, devem
se apoderar do conceito de EAE apresentado neste estudo, e se ater aos seguintes
pressupostos:
Romper com um modelo de formação docente, de escola, de ensino e de
aprendizagem centrado no cartesianismo, pontual, disciplinar e
descontextualizado.
Construir, de modo articulado e contextualizado, conhecimentos, valores e
atitudes em relação às questões ambientais para que os alunos possam se
tornar críticos e transformadores.
Considerar as ideias de Freire de saber ingênuo e espontâneo, pensar e
agir certo (2006) e desmitologizado (2008).
Considerar a complexidade como algo inerente a todos os componentes
que compõem a Terra, sejam eles abióticos ou bióticos, bem como as
interações e emergências estabelecidas entre tudo que compõe o cosmos;
recorrendo ao princípio metodológico (MORIN; CIURANA; MOTTA, 2003)
ou operador cognitivo (MARIOTTI, 2008) hologramático (MORIN, 2007)
para pensar, sentir, falar e agir de maneira complexa.
Respeitar o conceito de sustentabilidade planetária, pensando, sentindo,
falando e agindo de maneira ética e com alteridade.
Enfatizamos a urgente necessidade de repensarmos nossas relações com a
Terra, que em última instância, quiçá primeira, é uma relação conosco mesmos, visto
que fazemos parte de um todo orgânico, imbricados em infinitas relações. A escola
pode iniciar esse processo de transformação e os professores têm um papel
59
importantíssimo nesse processo de ressignificação de nosso pensar, nosso sentir,
nosso falar e nosso agir.
Urge acordarmos desse sono profundo, nos convida Morin, para que despertos,
possamos reestabelecer relações não ingênuas e espontâneas, mas pensando e
agindo certo, livres e desmitologizados, é o que nos propõe Freire.
60
___________________________________________________________________
Capítulo 2
O PERCURSO METODOLÓGICO DA INVESTIGAÇÃO ___________________________________________________________________
“Em toda investigação, há sempre o perigo de simplificação, de nivelamento, de rigidez, de moleza, de enclausuramento, de esclerose, de não retroação; há sempre a necessidade, reciprocamente de estratégia, reflexão, arte”.14
Neste capítulo tratamos do percurso metodológico que traçamos para a
realização deste estudo. Entendemos a pesquisa como sendo uma atividade
sistematizada de investigação, de diálogo e de reflexão em torno de uma realidade,
de seres humanos ou de uma problemática, que exige do pesquisador suportes
teóricos, metodologias e arte. Nosso estudo trata de seres humanos, os professores.
A pesquisa é ainda a produção de conhecimentos, fruto da curiosidade, da
inquietação, da inteligência e da atividade investigativa dos indivíduos, a partir e em
continuação do que já foi elaborado e sistematizado por estudos anteriores (LÜDKE;
ANDRÉ, 2013).
2. TIPO DE PESQUISA: ABORDAGEM QUALITATIVA
Compreendendo que o ofício do professor é uma atividade humana que se
concretiza na prática docente, e que para sua concretização concorrem uma infinidade
de variáveis, o que as caracteriza como um sistema complexo, incerto e não linear;
que podem ser planejadas, e carregam em si mesmas as bagagens socioculturais de
quem as pratica e as incertezas quanto às suas realizações, podendo ou não se
efetivarem. Morin (2005a) afirma que há um hiato entre a intenção e a ação, que pode
ser justificada pela ecologia da ação.
Nesse direcionamento as ações ou práticas docentes, não estão presas à
vontade dos seus autores, pelo contrário, à medida que elas entram no jogo das inter-
retro-ações dos contextos nos quais ocorrem, passam a assumir o risco de
fracassarem, se desviarem ou sofrerem distorção de sentido. Desse modo os efeitos
14 MORIN (2008, p.339).
61
das ações dependem não somente das intenções de quem as pratica, mas sobretudo
das condições do meio nas quais ocorrerão (MORIN, 2005a).
Além das incertezas que permeiam a efetivação das práticas docentes, é fato
que as atividades em EA já se encontram incorporadas ao espaço escolar, muito
embora, na sua maioria, caracterizam-se por ações pontuais, pautadas em modelos
de ensino fragmentados, cartesianos e disciplinares; baseadas numa visão
mecanicista de escola, em que predomina o conteúdo e a informação num fluxo de
transmissão de conhecimento do professor para o aluno, descontextualizado das
realidades social, ambiental, cultural, econômica e política dos alunos e professores.
Este estudo trata das ações e concepções docentes sobre educação ambiental,
sustentabilidade e complexidade. As concepções docentes são operações intelectuais
que norteiam as ações do professor no espaço escolar; mas também são processos
humanos permeados das subjetividades, crenças e valores de quem os intenciona,
planeja e executa; Minayo (2016a), afirma que a pesquisa qualitativa “trabalha com o
universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e
das atitudes”.
Partimos do pressuposto de que os professores para vivenciarem as suas
práticas necessitam mover fundamentos teóricos quanto aos saberes e conteúdos,
estratégias de ensino (metodologias) e estabelecer relações com seus alunos e com
a instituição de ensino à qual estão vinculados. Assim, as práticas docentes
caracterizam-se como processos intencionais, que além das especificidades acima
tratadas ainda trazem em seu bojo um contexto socioambiental, histórico, político e
ético inerente ao fazer que é a própria prática. Oliveira (2016) nos lembra que a
pesquisa qualitativa é um processo de reflexão e análise da realidade através da
utilização de métodos e técnicas para compreensão detalhada do objeto de estudo
em seu contexto histórico e/ou segundo sua estruturação.
Nesse direcionamento Bogdan e Biklen (1982) destacam que o objetivo da
pesquisa qualitativa é a compreensão do comportamento e da experiência humana, é
tentar compreender os processos mediante pelos quais as pessoas constroem
significados e buscam descrevê-los; o significado dado às coisas e à vida são o foco
de atenção do pesquisador.
Por fim, Franco (2012) argumenta que as abordagens qualitativas, “são uma
aproximação aberta às realidades que são múltiplas e dinâmicas no contexto das
relações humanas e a intrincada rede de significações e percepções que qualificam
62
esses processos”. Fundamentados nas ideias, supracitadas, de Morin (2005a),
Minayo (2016a), Bogdan e Biklen (1982), Oliveira (2016) e Franco (2012) justificamos
que nossa pesquisa caminha na vertente qualitativa, pois trata das incertezas,
significados, crenças e valores, do universo das concepções e ações docentes,
refletindo e analisando seus contextos, buscando compreender essas experiências
humanas que se dão em uma realidade múltipla e dinâmica que é a escola.
Em sintonia com Minayo (2016a) entendemos que essa investigação tem um
ritmo próprio e peculiar, chamado de ciclo de pesquisa, que iniciou com uma pergunta
e termina com respostas, que se desdobram em outras interrogações.
Esse ciclo é formado por três fases: fase exploratória; trabalho de campo e
análise e tratamento do material empírico e documental (capítulo terceiro, desta tese).
A fase exploratória consistiu na elaboração do projeto de pesquisa e nos preparativos
necessários para ir a campo, desde leituras e construção de um quadro referencial
consistente, como a delimitação do objeto de pesquisa, elaboração da hipótese, dos
objetivos e das estratégias/recursos para a construção dos dados. As duas outras
etapas se referem ao trabalho de campo e a análise e tratamento dos dados
construídos, que veremos adiante.
2.1 A pesquisa de campo
Ainda segundo Minayo (2016a) podemos inferir que a etapa de campo
(segunda fase do ciclo de pesquisa) consistiu em estabelecermos diálogos com a
realidade a ser pesquisada e o quadro teórico que foi estabelecido na fase
exploratória. Desse modo, com a intenção de estabelecer relações e observações que
pudessem refutar ou confirmar nossos objetivos, buscamos mecanismos de
comunicação e interlocução com os pesquisados, através de observações, entrevistas
e aplicação de questionários.
2.1.1 Campo da pesquisa
Segundo Minayo (2014) o campo em pesquisa qualitativa é o “recorte espacial
que diz respeito à abrangência, em termos empíricos, do recorte teórico
correspondente ao objeto da investigação”. Esta investigação procurou analisar as
concepções e atividades dos professores sobre educação ambiental, sustentabilidade
63
e complexidade que estão sendo vivenciadas na escola, trabalhou com “gente e suas
criações, compreendendo-os como atores sociais em relação” (MINAYO, 2014); essas
relações decorrentes do ofício docente em prol da formação discente.
Nesse intuito, esta investigação foi realizada no âmbito do Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) da Universidade Federal de
Alagoas (UFAL) – Campus de Arapiraca, especificamente no subprojeto do curso de
Biologia Licenciatura.
O PIBID é um programa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (CAPES), regulamentado pela portaria 096/CAPES, de 18/07/2016,
que visa fomentar a iniciação à docência, contribuindo para a formação docente inicial
(nível superior) e melhorando a qualidade da educação básica pública brasileira. O
artigo 4º da referida portaria, trata de seus objetivos, que são:
I – incentivar a formação de docentes em nível superior para a educação básica; II – contribuir para a valorização do magistério; III – elevar a qualidade da formação inicial de professores nos cursos de licenciatura, promovendo a integração entre educação superior e educação básica; IV – inserir os licenciandos no cotidiano de escolas da rede pública de educação, proporcionando-lhes oportunidades de criação e participação em experiências metodológicas, tecnológicas e práticas docentes de caráter inovador e interdisciplinar que busquem a superação de problemas identificados no processo de ensino-aprendizagem; V – incentivar escolas públicas de educação básica, mobilizando seus professores como co-formadores dos futuros docentes e tornando-as protagonistas nos processos de formação inicial para o magistério; VI – contribuir para a articulação entre teoria e prática necessárias à formação dos docentes, elevando a qualidade das ações acadêmicas nos cursos de licenciatura; VII – contribuir para que os estudantes de licenciatura se insiram na cultura escolar do magistério, por meio da apropriação e da reflexão sobre instrumentos, saberes e peculiaridades do trabalho docente (BRASIL, 2013).
Assim, os objetivos do PIBID ao tempo em que valorizam o magistério,
incentivam e contribuem para a formação docente em nível superior. Esse fato eleva
a qualidade da formação inicial dos professores, uma vez que os insere no cotidiano
da escola, contando com a participação dos professores da educação básica como
co-formadores desses futuros docentes. Ressaltam ainda as contribuições no campo
da articulação entre teoria e prática, e a reflexão sobre instrumentos, saberes e
peculiaridades do ofício de professor.
O subprojeto PIBID/Ciências Biológicas/UFAL Arapiraca/AL, na época da
realização da pesquisa, era composto por duas coordenadoras de área (professoras
64
do curso de Biologia Licenciatura, UFAL – Campus de Arapiraca), quatro supervisores
(professores de escolas públicas da educação básica, da rede estadual Arapiraca/AL
e municipal de Taquarana/AL, que supervisionavam os bolsistas de iniciação à
docência (ID) do curso de Biologia Licenciatura, UFAL – Campus de Arapiraca) e vinte
e dois pibidianos (estudantes bolsistas de iniciação à docência do curso de Biologia
Licenciatura, UFAL – Campus de Arapiraca).
Ressaltamos que as atividades do subprojeto ocorriam na UFAL – Campus de
Arapiraca e nas escolas, e eram caracterizadas por momentos de estudos, formações,
elaboração de materiais, planejamentos, realização de atividades e produções
científicas.
2.1.2 Sujeitos da pesquisa
Do grupo de participantes do subprojeto PIBID/Ciências Biológicas/UFAL
Arapiraca/AL participaram da pesquisa os quatro professores (supervisores) e os vinte
e dois licenciandos (pibidianos). Quanto aos professores, três trabalhavam na rede
estadual de Alagoas (Arapiraca/AL) e um na rede municipal de Taquarana/AL;
atuavam como co-formadores, acompanhando e orientando cerca de cinco
licenciandos em suas respectivas escolas. Os referidos professores trabalhavam em
escolas distintas, inclusive distantes fisicamente; dessa forma, trabalhamos com a
realidade de quatro escolas alagoanas, sendo três estaduais e uma municipal, em
duas cidades, Arapiraca e Taquarana, respectivamente.
Para a preservação da identidade dos docentes, no processo de categorização,
análise e construção dos dados, os nomes verdadeiros foram preservados, sendo
substituídos pela inicial maiúscula da palavra “Professor”, P, seguida por um número,
desse modo, passaremos a chamar os docentes de P1, P2, P3 e P4; uma nomeação
genérica e aleatória que foi designada, a partir dos encontros para a realização do
primeiro momento da pesquisa de campo que foram as entrevistas.
O perfil dos docentes quanto ao sexo, idade e formação, é o seguinte: duas são
do sexo feminino e dois são do sexo masculino; com idades variando entre 30 (trinta)
e 60 (sessenta) anos. Quanto à formação inicial, todos fizeram o curso de licenciatura
em Ciências Biológicas, pela mesma instituição de ensino, Universidade Estadual de
Alagoas (UNEAL). Três relataram que durante o curso de graduação não tiveram
nenhum suporte para trabalhar com EA em sala de aula, e um relatou que teve uma
65
disciplina que tratava da EA, mas que não lembra se o nome era EA nem os detalhes
da mesma. Em relação à pós-graduação, todos têm o título de especialista, fizeram
especialização, sendo um em Metodologia do Ensino, um em Gestão Educacional e
dois em Gestão ambiental. A seguir, no quadro 1, apresentamos outras características
do perfil docente.
Quadro 1 Perfil dos docentes participantes da investigação
Características do Perfil
DOCENTES
P1 P2 P3 P4
Tempo em anos de atividade/prática docente
14 14* 10 13
Disciplinas que já lecionou
Ciências Biologia
Matemática
Ciências Biologia
Ciências Biologia
Matemática
Ciências Biologia
Atu
alm
en
te
Onde trabalha Rede
estadual/AL Rede estadual/AL
Rede estadual/AL e Municipal**
Rede estadual/AL e
Municipal
Quais disciplinas leciona
Biologia Biologia Biologia
Matemática Ciências Biologia
Em que nível da educação básica
Ensino Médio Ensino Médio Ensino Médio
EJA Ensino Médio
Participa/participou de formação continuada em EA
Não Não Não Sim***
Comentários sobre a formação continuada na área de EA
A rede estadual ofertou um
projetinho (sic) de escolas
sustentáveis que acabou não indo para frente
Fez umas capacitaçõezinhas (sic) esporádicas
--- ---
Fonte: Elaborado pelo autor da tese Notas: *Antes era bancária. **Em duas cidades alagoanas, na estadual leciona Biologia e na municipal Matemática. ***Pelo Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA) e no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), pois se engajou na secretaria de meio ambiente.
As características apresentadas no quadro acima, mostram que os docentes já
atuam como professores, em média há 12 anos; lecionam as disciplinas de
Matemática e Ciências (ensino fundamental e EJA) e Biologia (ensino médio). Todos
trabalham na rede estadual de Alagoas, e também dois na rede municipal. Nenhum
participou de formação continuada em EA, promovida pela escola ou secretarias de
educação.
66
O grupo de licenciandos do curso de Biologia Licenciatura da UFAL – Campus
de Arapiraca, era composto por vinte e dois estudantes bolsistas de iniciação à
docência, chamados de Pibidianos, por estarem vinculados ao PIBID. Porém, do total
de vinte e dois licenciandos somente vinte participaram da pesquisa. O perfil dos
licenciandos15 quanto ao sexo, idade e formação, é o seguinte: dezessete (85%) do
sexo feminino e três (15%) do sexo masculino, com idades predominantes entre 20 e
30 anos (95% dos licenciandos) e apenas um (5%) com idade inferior a 20 anos.
Quanto ao processo de formação inicial dos licenciandos destacamos que no
momento da pesquisa quinze (75%) estavam cursando entre o quinto e o oitavo
período do curso de Biologia Licenciatura e cinco (25%) se encontravam apenas com
a matrícula vínculo com a universidade, visto já terem concluído o curso e/ou estavam
faltando cursar uma disciplina e defender o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).
Quanto à graduação (formação inicial) quatorze (70%) relataram que a mesma
lhes havia dado suporte para trabalhar a EA, e cinco (30%) responderam que não.
Entre os que responderam sim: dois citam somente o PIBID; três citam o PIBID e
outros; um cita um Projeto de Extensão num Assentamento e 12 citam as seguintes
disciplinas vivenciadas no curso, conforme quadro 2 abaixo:
Quadro 2 Disciplinas citadas pelos licenciandos
Disciplinas citadas Vezes que foi citada
Educação Ambiental / Bases para a Educação Ambiental / Fundamentos e Bases da Educação Ambiental
7
Conservação e Manejo / Conservação e Manejo dos Recursos Naturais 7
Ecologia / Ecologia e Meio Ambiente 8
Projetos Integradores 3
Estágios Supervisionados 2
Anatomia + Morfologia Vegetal + Botânica + Saúde na escola 1
Fonte: Elaborado pelo autor da tese
Os alunos que responderam “Não”, estão cursando o quinto, o sexto e o sétimo
períodos, e apresentam como justificativa que as disciplinas não foram cursadas,
entretanto, entre o grupo de alunos que respondeu sim, há dois do quinto período que
15 No processo de categorização, análise e construção dos dados, os nomes verdadeiros dos licenciandos foram preservados. Para nominá-los, utilizamos a inicial maiúscula da palavra “Licenciandos”, L, seguida de um número. Assim, passaremos a chamá-los de L1, L2, L3, L4, L5, L6, L7, L8, L9, L10, L11, L12, L13, L14, L15, L16, L17, L18, L19 e L20. Os números foram atribuídos na proporção em que os questionários iam sendo devolvidos pelos participantes da pesquisa.
67
citou o PIBID, e um sétimo que citou as disciplinas: Conservação e Manejo dos
Recursos Naturais, Ecologia, Projetos Integradores, Saúde na Escola e os Estágios
Supervisionados.
No que tange à pratica docente em EA dezesseis relatam que já tiveram alguma
experiência e quatro nenhuma. Em relação às práticas docentes elas foram realizadas
em escolas públicas; na educação básica (doze citam o ensino fundamental, onze o
ensino médio e seis os dois níveis de escolaridade). Quanto ao exercício prático das
atividades 12 citam o PIBID, seis os Estágios Supervisionados e três dizem que já são
professores, sendo um voluntário e um da educação infantil.
A escolha dos sujeitos da pesquisa se justifica pelo fato de que o pesquisador
passou em concurso público para professor da Universidade Federal de Alagoas,
Campus de Arapiraca, inviabilizando a realização do estudo junto a um grupo de
professores em Recife-PE. Assim, após algumas tentativas frustradas em encontrar
um grupo de professores; fomos acolhidos pelas coordenadoras do PIBID Biologia
Licenciatura da UFAL – Campus de Arapiraca, que após conversas, nos conduziram
ao grupo de professores e licenciandos.
O grupo de sujeitos da pesquisa do PIBID Biologia Licenciatura da UFAL –
Campus de Arapiraca, composto por docentes e licenciandos, se caracteriza por ser
um grupo singular para a realização desta investigação, pois foi possível analisar as
concepções e atividades docentes em educação ambiental, sustentabilidade e
complexidade, de um grupo de docentes composto por professores formados em
exercício da profissão e licenciandos em formação inicial, mas que já exercem
atividades nas escolas. Ressaltamos ainda que esse grupo, embora seja formado por
subgrupos, que participam de processos formativos em suas respectivas escolas, se
encontram periodicamente para formações coletivas.
Por fim, nosso objetivo não foi analisar as concepções e ações sobre educação
ambiental, sustentabilidade e complexidade de um grupo específico de
professores/licenciandos. Não foi objeto do estudo a localidade dos sujeitos da
pesquisa. A análise das concepções e ações docentes de educação ambiental,
sustentabilidade e complexidade que realizamos ela se propôs a inferir acerca de
subsídios para uma prática crítico-transformadora, independentemente de onde
residiam ou atuassem os sujeitos da pesquisa.
68
2.2 Estratégias metodológicas utilizadas para a construção dos dados
Para atendermos ao principal objetivo de nosso estudo e compreendendo que
os dados não são capturados por instrumentos, cabendo ao pesquisador apenas
decodificá-los, antes são construídos e elaborados, inclusive por quem os analisa;
escolhemos como estratégias/recursos de investigação qualitativa: as entrevistas, que
foram aplicadas através da técnica do Círculo Hermenêutico-Dialético (CHD); os
questionários abertos; a observação participante; e o caderno de campo. Todos esses
recursos de investigação foram elaborados tendo como parâmetros a
problematização, os objetivos da investigação, e alicerçados em seus aportes
teóricos.
2.2.1 Entrevistas
Compreendemos as entrevistas como sendo um diálogo a dois ou em grupo,
planejado e realizado por um pesquisador como estratégia de construção de dados
para uma determinada finalidade investigativa. Segundo Minayo (2016b) as
entrevistas constituem uma representação da realidade, são modos de pensar, de
sentir, de atuar, são condutas, “projeções para o futuro, razões conscientes ou
inconscientes de determinadas atitudes e comportamentos”. São utilizadas para
construir dados descritivos na linguagem própria dos sujeitos entrevistados,
permitindo ao pesquisador desenvolver intuitivamente uma ideia sobre a maneira
como os sujeitos interpretam aspectos do mundo (BOGDAN; BIKLEN, 1982).
Considerando que as entrevistas tratam de reflexões vivenciadas pelos
entrevistados, sejam elas assuntos pessoais, profissionais ou concepções sobre
determinado assunto, as utilizamos através de um roteiro16 de entrevistas, composto
de três momentos:
a) No primeiro momento, com nove perguntas, tivemos o objetivo de construir
os perfis dos entrevistados, no que se refere a idade, sexo, formação,
prática docente em EA, local e tempo de trabalho;
16 O roteiro das entrevistas encontra-se na íntegra no Apêndice A, página 123.
69
b) No segundo momento, com quatro perguntas, conversamos sobre as
concepções dos professores sobre educação ambiental, sustentabilidade e
complexidade;
c) No terceiro momento, com duas perguntas, buscamos conhecer como
atualmente os professores trabalham a EA em suas práticas docentes e
quais as sugestões que eles propõem para a melhoria das práticas docentes
em EA, principalmente para se trabalhar as temáticas sustentabilidade e
complexidade.
Ressaltamos que utilizamos um único roteiro de entrevista para os quatro
entrevistados, e que seu registro foi feito através de gravação de áudio em celular,
com aplicativo de gravador de voz; e posteriormente transcritas.
As entrevistas no segundo momento foram realizadas através da técnica do
Círculo Hermenêutico-Dialético (CHD), que segundo Oliveira é definido como um
processo:
[...] de construção e reconstrução da realidade de forma dialógica através de um vai e vem constante (dialética) entre as interpretações e reinterpretações sucessivas dos indivíduos (complexidade) para estudar e analisar um determinado fato, objeto, tema e/ou fenômeno da realidade (OLIVEIRA, 2013, p.62).
A definição acima corrobora com o que pretendíamos com a realização do
CHD, que tinha como objetivo identificar as concepções docentes sobre educação
ambiental , sustentabilidade e complexidade, dando aos docentes a oportunidade de
construí-las e reconstruí-las à medida que participaram da pesquisa, de modo
dialógico com o pesquisador e com os demais sujeitos; visto que durante a realização
do CHD ora essas concepções foram verbalizadas individualmente, ora confrontadas
com outras concepções e por fim revisitadas, refletidas e ressignificadas no encontro
final com o grupo de entrevistados.
2.2.2 Questionários abertos
Compreendendo que os fenômenos sociais e humanos são complexos, e que
as concepções e práticas docentes passam por esse viés, optamos pela aplicação de
questionários abertos junto aos vinte licenciandos. Nossa intenção foi identificar suas
70
concepções, atividades de EA realizadas e opiniões, compreendendo-as como
informações que estão impregnadas de “sentimentos, crenças, expectativas e
situações vivenciadas” (OLIVEIRA, 2016) durante todo o processo formativo, seja ele
inicial ou continuado.
Assim, em sintonia com Vasconcelos (2009) optamos por questões abertas
visto que buscamos conhecer as sutilezas e os aspectos subjetivos do tema, cujas
respostas foram pós-codificadas a partir dos padrões e categorias extraídas dos
próprios discursos dos respondentes, dessa maneira consideramos seus contextos,
histórias de vidas e processos de formação; o que nos leva a compreender de maneira
mais complexa as suas falas.
Os questionários abertos aplicados aos licenciandos17 constavam de onze
perguntas sobre idade; sexo; formação inicial e atividades desenvolvidas em EA;
concepções sobre sustentabilidade, complexidade e EA; e, sugestões que eles
propunham para a melhoria das práticas docentes em EA, principalmente para se
trabalhar as temáticas sustentabilidade e complexidade. Ressaltamos que as
questões, propostas nos questionários acima, versam sobre as mesmas perguntas
das entrevistas realizadas com os professores, uma vez que tivemos o propósito de
cruzar os referidos dados.
2.2.3 Observação participante
A observação participante foi realizada durante todo o processo da pesquisa,
os docentes foram entrevistados em seus locais de trabalho, exceto P4, que achou
melhor não irmos à escola, e assim, marcamos a sua entrevista na UFAL Campus
Arapiraca/AL. Os licenciandos, em sua maioria, responderam ao questionário durante
encontros realizados com as coordenadoras do PIBID, ocasião em que estávamos
presentes. Assim, pudemos observar os sujeitos da pesquisa em seus contextos de
trabalho ou de formação.
Nossa intenção não era interagir de maneira direta com os contextos individuais
dos sujeitos da pesquisa, mas conhecer parte deles, visto que entre eles havia um
contexto comum, ao qual nos detemos mais em observação, que era o contexto de
17 O roteiro dos questionários abertos aplicados aos licenciandos encontra-se na íntegra no Apêndice B, página 125.
71
formação/encontros junto com as coordenadoras do PIBID; que aconteciam na UFAL
Campus Arapiraca-AL.
Assim, contemplamos o que propõe Oliveira (2016, p. 81) como proposta das
observações participantes, que é “estabelecer uma relação direta com grupos ou
pessoas, acompanhando-os em situações informais ou formais e interrogando-os
sobre os atos e seus significados por meio de um constante diálogo”.
Nossas observações tiveram também caráter intervencionista, uma vez que
participamos do processo de formação do grupo de sujeitos participantes da pesquisa.
Nesse direcionamento Minayo (2016b) ressalta que “o observador faz parte do
contexto sob sua observação e, sem dúvida, modifica esse contexto, pois interfere
nele, assim como é modificado pessoalmente”. Durante todo o processo da pesquisa
de campo, pudemos vivenciar na prática as observações de Freire (2006) que de fato
não há “docência sem discência”, ensinamos ao aprender, as experiências são
mútuas e igualmente significativas.
Ressaltamos ainda que o principal instrumento de nossas observações foi o
caderno de campo, no qual foram registradas as informações que não faziam parte
dos materiais formais das entrevistas e dos questionários.
2.3 Metodologia interativa: um processo hermenêutico-dialético
Segundo Oliveira (2016) a metodologia interativa está calcada nos
pressupostos teóricos do método pluralista construtivista de Guba e Lincoln (1989),
no método de análise de conteúdo de Bardin (1977) e no método hermenêutico-
dialético de Minayo (2004). Essa metodologia utiliza o Círculo Hermenêutico-Dialético
(CHD) para a realização de entrevistas, isto é, uma estratégia para a construção de
dados; ressaltando a dialogicidade como um fio condutor no estabelecimento de
interações entre o pesquisador e os sujeitos da pesquisa, no processo de construção
e reconstrução da realidade.
Oliveira (2016) define a metodologia interativa como sendo um “processo
hermenêutico-dialético e dialógico que facilita entender e interpretar a fala e os
depoimentos dos atores sociais em seu contexto [...], em direção a uma visão
sistêmica da temática em estudo”. Nesse direcionamento, justificamos que a escolha
por essa metodologia se deve ao fato de que ela tem como premissa ser um processo
72
dialético, complexo, dialógico e sistêmico ao tratar da construção dos dados;
perspectivas que comungam com nossas perspectivas teóricas.
Oliveira (2016) ao analisar as palavras-chave da definição de metodologia
interativa pontua que a perspectiva da complexidade significa refletir e pensar vendo
as coisas como um todo complexo, “em uma sucessão de fatos, de fenômenos, de
falas que se entrecruzam formando uma unidade”; particularizando esse significado
em nossa investigação, entendemos que nosso olhar deve ser de totalidade para com
o ofício do professor, sem contudo esquecermos de que essa unidade complexa é
resultante de outros fatores, contextos e formações igualmente complexas.
Quanto a dialogicidade a autora se fundamenta nas ideias de Morin e Freire;
para Morin (2005b) o caráter dialógico une de modo complementar termos
antagônicos que não se separam: teoria/prática, ensino/aprendizagem,
consenso/conflito, concepção/ação. Para Freire (2006) a reflexão crítica sobre a
prática é uma exigência da relação teoria/prática, a práxis, é ao mesmo tempo ação e
reflexão. Sem essa perspectiva o diálogo não passa de palavras vazias, soltas,
jogadas ao vento; “os fenômenos educativos não podem ser concebidos,
compreendidos ou melhorados sem a presença do diálogo” (MORAES, 2015).
Destacamos ainda a importância e o papel da hermenêutica para o tipo de
pesquisa que ora realizamos, uma vez que ela enfatiza a compreensão das
concepções docentes sobre a EA, sustentabilidade e a complexidade; isto é, permite-
nos realizar uma reflexão compreensiva da prática docente inserida no seu contexto,
seja ele formativo ou de ação, permeada de um antes, um durante e um depois, mas
também repleta de intenções, limites, imprevistos e possibilidades.
2.3.1 Círculo Hermenêutico-Dialético (CHD)
Conforme mencionamos anteriormente, o segundo momento das entrevistas
foi realizado através do CHD. Oliveira (2016) ressalta que o CHD é um processo
dialético, caracterizado pela constante relação que há entre o pesquisador e os
entrevistados, portanto supõe constantes diálogos, críticas, análises, construções e
reconstruções coletivas.
Para compreender melhor o que estamos falando, observemos a figura 1,
próxima página, que representa o CHD utilizado nesta pesquisa. Ela foi construída a
partir dos estudos de Oliveira (2016) e teve como parâmetros a dissertação de
73
mestrado de Araújo (2011). A figura abaixo é composta por três círculos pontilhados
e concêntricos. O mais externo representa os entrevistados; o do meio corresponde
ao ir e vir no processo de construção e reconstrução teórica; e o mais interno em cujo
interior está escrita a palavra realidade, representa o encontro final com todos os
entrevistados.
Figura 1 Círculo Hermenêutico – Dialético (CHD)
Procedimento metodológico
P = docentes entrevistados C = construção da realidade em estudo
Fonte: Modificado de Oliveira (2016) e Araújo (2011)
Desse modo, em nossa pesquisa, na figura 1, podemos observar que de fora
para dentro, o primeiro círculo se refere aos quatro professores, denominados P1, P2,
P3 e P4; podemos ainda observar que P1 e P2, P2 e P3 e P3 e P4 estão conectados
com setas curvas e pretas que representam os roteiros das entrevistas (o mesmo para
todos os entrevistados).
O segundo círculo pontilhado representa a construção e reconstrução da
realidade pesquisada, que se configura como o nível das sínteses das entrevistas (em
azul), representado pela letra C. Assim, em nossa pesquisa C1 representa a síntese
da primeira entrevista de P1, que foi levada à P2 e que, após ser entrevistado, a
recebeu e fez seus comentários, juntando novos elementos. A síntese C2 foi
74
elaborada com base nas respostas dadas por P2 (entrevista) e de seus comentários
à síntese C1. Assim, esse processo foi realizado, sucessivamente, a partir de P1-C1-
P2, P2-C2-P3, P3-C3-P4 e P4-C4 que estão conectadas por setas róseas, até
chegarmos ao último entrevistado, P4. Esse movimento simboliza a dinâmica do vai e
vem das construções e reconstruções teóricas.
O terceiro círculo, em cujo centro aparece a palavra REALIDADE, representa o
resultado do encontro final entre todos os entrevistados e o pesquisador. No encontro
final, foi apresentado aos entrevistados uma síntese geral das entrevistas realizadas,
naquela ocasião novas discussões foram realizadas, para que novos comentários
fossem juntados, excluídos e/ou ampliados; considerando-se a dialogicidade e a
complexidade das realidades entrevistadas, em busca de uma compreensão o mais
próximo possível das realidades dos docentes. Com o resultado dessa etapa ocorreu
o fechamento da pré-análise dos dados da realidade estudada, considerando-se o seu
todo, suas partes, seus contextos e especificidades.
2.3.2 Categorias de análise no processo hermenêutico-dialético
Nosso estudo analisou as atividades e concepções docentes de EA,
sustentabilidade e complexidade que estavam sendo vivenciadas nas salas de aulas
das escolas. Nesse direcionamento os dados construídos foram agrupados em três
grandes categorias: categorias teóricas, categorias empíricas e unidades de análise.
A estruturação de nossa tese nessas categorias foi elaborada a partir das
recomendações de Oliveira (2016). A autora entende que as categorias teóricas se
referem à fundamentação teórica do estudo, as leituras convergentes ao tema central
e dão o suporte à análise dos dados. As categorias empíricas “emergem da pesquisa
de campo” (p. 97) portanto surgiram das questões formuladas no roteiro das
entrevistas e nas questões dos questionários. As unidades de análise emergiram das
respostas dadas pelos sujeitos pesquisados. Essas categorias fundamentam os três
grandes marcos da Metodologia Interativa. Na próxima página, a figura 2, próxima
página, apresenta uma síntese das categorias e como elas se relacionam, conforme
proposto por Oliveira (2016).
75
Figura 2 Classificação dos dados
Fonte: Oliveira (2016, p. 98)
A seguir, no quadro 3, apresentamos como essas categorias foram
estruturadas em nosso estudo. Nele apresentamos as três grandes categorias
teóricas: educação ambiental, sustentabilidade ambiental e complexidade ambiental,
e suas categorias empíricas.
Quadro 3 Matriz das categorias de dados
Categorias Teóricas Categorias Empíricas
Educação Ambiental
Concepções
Como trabalha a Educação Ambiental na prática docente
Sugestões de melhoria da prática docente em Educação Ambiental
Sustentabilidade Ambiental Concepções
Complexidade Ambiental
Concepções
Relações entre Educação Ambiental, Sustentabilidade e Complexidade
Fonte: Elaborado pelo autor da tese
Ressaltamos que as categorias teóricas apresentadas no quadro acima foram
trabalhadas no capítulo primeiro desta tese, fundamentação teórica, e que as
categorias empíricas foram construídas a partir delas, portanto correspondem às
CATEGORIAS TEÓRICAS
CATEGORIAS EMPÍRICAS UNIDADES DE ANÁLISE
76
questões do roteiro de entrevistas (CHD) e às perguntas dos questionários abertos
(licenciandos).
2.4 Análise interativa hermenêutico-dialética (AHD)
A análise e a construção dos dados desta tese aconteceram em dois
momentos, no primeiro, durante as entrevistas realizadas com a técnica do CHD, visto
que sua dinâmica já nos leva a essa construção e análises; e posteriormente através
das observações e dos dados presentes nos questionários abertos. Oliveira (2016, p.
128), em consonância com Minayo (2004) ressalta que o método hermenêutico-
dialético “coloca a fala em seu contexto para entendê-la no seu interior e no campo
da especificidade histórica e totalizante que é produzida”. Assim, esse método nos
proporciona uma interpretação aproximada da realidade; interpretar a realidade em
sua totalidade não é possível ao pesquisar, seja por suas limitações interpretativas e
ou por sua presença no contexto, o que acaba por descaracterizá-lo e modificá-lo.
Segundo Oliveira (2016) para a operacionalização do método hermenêutico-
dialético, a análise dos dados deve considerar dois níveis, o nível das determinações
fundamentais e o nível de encontro com os fatos empíricos. Nessa pesquisa, no nível
das determinações fundamentais buscamos entender as concepções dos sujeitos da
pesquisa, a partir dos seus contextos formativos e de suas práticas docentes; nesse
direcionamento elaboramos dois perfis dos sujeitos pesquisados, um dos docentes e
outro dos licenciandos.
No que tange ao nível de encontro com os fatos empíricos a análise e a
construção dos dados se deu através das observações e dos dados presentes nas
entrevistas e nos questionários abertos à luz do nosso marco teórico, presente no
capítulo segundo; essa dinâmica explicita a interatividade que há entre a primeira fase
da pesquisa e a segunda, o que a torna bastante significativa e contextualizada, uma
vez que ela desvela conexões entre as concepções e as atividades docentes dos
sujeitos pesquisados.
77
2.5 Operacionalização da pesquisa: seus momentos
A pesquisa foi estruturada e realizada em sintonia com o que nos propõe
Bogdan e Biklen (1982) quando aborda que nas abordagens qualitativas os
pesquisadores estabeleçam relações de empatia para com os sujeitos da pesquisa,
empreendendo esforços para que possam compreender vários pontos de vistas.
Partindo dessa premissa, traçamos um caminho para nossa pesquisa, que nos
permitisse a compreensão, cuja proposta não foi o “juízo de valor; mas, antes, o de
compreender o mundo dos sujeitos e determinar como e com que critérios eles o
julgam” (p. 287). Nesse direcionamento apresentamos a seguir o trajeto realizado
nesta tese.
Levantamento bibliográfico para subsidiar a problemática em estudo.
Definição de problema, objetivos e hipóteses da pesquisa.
Contato com as Coordenadoras do PIBID/UFAL, subprojeto Ciências
Biológicas, Campus Arapiraca para apresentação e acolhimento da
proposta de pesquisa.
Construção das estratégias de construção de dados.
Contato com os quatro docentes (supervisores) participantes do
PIBID/UFAL, subprojeto Ciências Biológicas, Campus Arapiraca para
realização das entrevistas (CHD), os contatos foram realizados por e-mail e
telefone, à medida que eles foram demonstrando disponibilidade para as
entrevistas, as mesmas foram realizadas.
Contato com os vinte e dois licenciandos (pibidianos) participantes do
PIBID/UFAL, subprojeto Ciências Biológicas, Campus Arapiraca para
aplicação dos questionários.
Análise e categorização das respostas dos questionários respondidos pelos
licenciandos.
Análise e categorização das respostas dos questionários respondidos pelos
docentes e licenciandos.
Análise final de todos os dados construídos durante a pesquisa, à luz dos
estudos teóricos e por meio da análise interativa hermenêutico-dialética.
78
___________________________________________________________________
Capítulo 3
TECENDO RELAÇÕES ENTRE AS UNIDADES DE ANÁLISE E AS CATEGORIAS TEÓRICAS
___________________________________________________________________ “Nós não conhecemos senão a maneira como as percebemos, maneira esta que nos é própria, mas que pode muito bem não ser necessária para todos os seres, ainda que o seja para todos os homens. É dessa maneira, exclusivamente, que iremos tratar. O espaço e o tempo são as formas puras da mesma, e a sensação em geral, a sua matéria”.18
Este capítulo se refere à terceira etapa do ciclo de pesquisa (MINAYO, 2016),
tratamento e análise do material, portanto uma valorização, compreensão e
interpretação dos dados empíricos, articulando-os à luz das categorias teóricas:
educação ambiental, sustentabilidade e complexidade; e iremos tecer relações entre
as unidades de análise e as categorias teóricas
Minayo (2016) recomenda que para mantermos a fidedignidade das análises
nas investigações qualitativas é preciso estruturá-las nos verbos compreender e
interpretar. Assim, nosso intuito nesse capítulo não é classificar as concepções, as
atividades realizadas e as sugestões de melhorias da prática docente em EA, em
certas, erradas ou emitir juízo de valor a seus respeitos, não temos essa intenção.
Nosso intuito é construir reflexões a partir das falas dos sujeitos da pesquisa, de
maneira interpretativa e compreensiva, tendo como lastro os autores e ideias que
apresentamos no capítulo primeiro.
Tendo em vista que os dados desta investigação foram categorizados e
analisados seguindo os pressupostos da Metodologia interativa (OLIVEIRA, 2016),
realizamos: 1) a complementação da pré-análise que havia sido sistematizada durante
as entrevistas (síntese final do CHD); 2) análise dos questionários sistematizando
cada questão; 3) cruzamento dos dados construídos durante as entrevistas (CHD) e
aplicação dos questionários. Como resultado desse processo de categorização e
análise, apresentamos a matriz geral dos dados, conforme o quadro 4, na próxima
página, nele temos as três grandes categorias teóricas: educação ambiental,
18 Kant (B59; TP 68), apud Pascal (2007)
79
sustentabilidade ambiental e complexidade ambiental, as categorias empíricas
(representadas pelos números, os títulos) e as unidades de análise (representadas
pelos marcadores).
Quadro 4 Matriz geral das categorias dos dados investigados
EDUCAÇÃO AMBIENTAL SUSTENTABILIDADE COMPLEXIDADE
1. Concepções 1.1. Docentes (CHD)
Teoria e prática.
Preservação e conservação.
Aprender a viver sem causar danos.
Preparar e orientar o aluno e a comunidade.
Comportamento.
Educar para o trânsito e lixo.
1. Concepções 1.1. Docentes (CHD)
Práticas para melhorar o meio ambiente.
Garantia para as gerações futuras.
Algo que se mantém e se sustenta.
Reciclar, preservar e reutilizar.
Usar a matéria de forma consciente.
1. Concepções 1.1. Docentes (CHD)
É tudo que está ligado (junção).
Complicado, nunca li/vi, não sei/não tenho ideia.
Profundo, abrangente e trabalhoso.
Níveis de organização.
Vários fatores envolvidos e interligados.
1.2. Licenciandos (Questionário)
Ensinar e educar.
Preservação e conservação.
Instrução e orientação.
Conscientizar e sensibilizar.
Práticas.
Cuidar do meio.
1.2. Licenciandos (Questionário)
Ações e práticas
Estratégias, mecanismos, meios, métodos e técnicas.
Recursos naturais.
Atitudes e cuidado com o meio ambiente.
1.2. Licenciandos (Questionário)
Não conhece, não ouviu falar.
Estudo e conhecimento.
Sistema, cadeia, fatores e interação.
2. Como trabalha a Educação Ambiental na prática docente 2.1 Docentes (Entrevista)
Não realiza.
Atividades (PIBID), trabalhos e
projetos.
Vinculada a conteúdos ou livro
didático.
Campanhas e passeatas na
sociedade.
Avaliação das atividades.
2. Relações entre Educação Ambiental, Sustentabilidade e Complexidade 2.1. Docentes (Entrevista)
Tudo ligado e interligado.
Educação ambiental e sustentabilidade.
2.2 Licenciandos (Questionário)
Não realiza.
Atividades (PIBID).
Projetos. Oficinas (PIBID).
Pesquisa acadêmica.
2.2. Licenciandos (Questionário)
Relacionados.
Educação ambiental como veiculadora.
3. Sugestões de melhoria da prática docente em Educação Ambiental 3.1. Docentes (Entrevista)
Formação docente (continuada).
Implantação de composteira e horta na escola.
3.2. Licenciandos (Questionário)
Formação docente (inicial).
Palestras e publicações.
Atividades de campo.
Projetos.
Educação e mobilização.
Fonte: Elaborado pelo autor da tese
80
A análise dos dados desta investigação está estruturada em quatro categorias
empíricas, construídas em estreita sintonia com seus objetivos específicos, que são:
I – identificar as concepções docentes sobre educação ambiental, sustentabilidade e
complexidade; II – diagnosticar as atividades de educação ambiental; e III – inferir
sobre a formação de sujeitos críticos e transformadores.
Assim, a categoria 1) Concepções docentes sobre educação ambiental,
sustentabilidade e complexidade, contempla o objetivo I; a categoria 2) Como se
trabalha a educação ambiental na prática docente, dá conta do objetivo II. No que se
refere ao objetivo III, ele será contemplado com reflexões das categorias 1 e 2, bem
como das interpretações originadas das categorias 3) Relações entre educação
ambiental, sustentabilidade e complexidade e 4) Sugestões de melhorias da prática
docente em educação ambiental.
Os quadros construídos e analisados contemplam dados dos docentes e dos
licenciandos, uma interface entre professores já formados e em formação, tecendo
relações de compreensão entre os universos dos sujeitos da pesquisa que possam
nos ajudar a inferir sobre a formação de sujeitos críticos e transformadores, a partir
das concepções docentes em educação ambiental, sustentabilidade e complexidade,
e as atividades que são desenvolvidas em torno dessas problemáticas.
3.1 CONCEPÇÕES DOCENTES SOBRE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, SUSTENTABILIDADE E COMPLEXIDADE
Referente à categoria empírica concepções sobre educação ambiental,
sustentabilidade e complexidade, os dados categorizados foram organizados e
analisados de acordo com as categorias teóricas: educação ambiental,
sustentabilidade e complexidade, conforme os quadros 4, 5 e 6, respectivamente.
3.1.1 Concepções sobre educação ambiental
A análise do quadro 5, na próxima página, mostra que os docentes apresentam
concepções de EA em torno de seis unidades de análise, que abordam sobre teoria,
prática, preservação, conservação, aprender a viver, preparar e orientar o aluno,
comportamento e educar para o lixo e o trânsito.
81
Quadro 5 Educação Ambiental (Concepção)
Categoria Unidades de análise
Docentes Licenciandos
EDUCAÇÃO AMBIENTAL Concepção
Teoria e prática.
Preservação e conservação.
Aprender a viver sem causar danos.
Preparar e orientar o aluno e a comunidade.
Comportamento.
Educar para o trânsito e lixo.
Ensinar e educar.
Preservação e conservação.
Instrução e orientação.
Conscientizar e sensibilizar.
Práticas.
Cuidar do meio.
Fonte: Elaborado pelo autor da tese
A unidade de análise que trata da “Teoria e prática”, presente na fala de P1:
“[...] teoria e prática, direcionada ao que você vai fazer pra (sic) melhorar a qualidade
de vida da gente e do meio ambiente [...]”, apresenta um caráter intervencionista de
EA. Já a unidade de análise “Preservação e conservação”, ilustrada pelas falas: “[...]
é preservação, é manutenção do ambiente [...]” (P1); “[...] preservação, educar com
ciência [...]” (P2) e “[...] questão de conservar, de preservar, para as futuras gerações
[...]” (P3), enfocam uma EA numa visão naturalista.
Assim, as ideias de uma EA intervencionista e naturalista aparecem no ideário
dos professores, essa constatação é corroborada pelos estudos de Guimarães (2007).
Os professores que tentam trabalhar com as questões ambientais apresentam uma
limitação compreensiva, possivelmente associada ao modelo de pensar cartesiano,
que por sua vez leva às práticas disciplinares e descontextualizadas.
Os professores usam os conceitos de preservação e conservação sem
distingui-los, um dado constatado nos estudos de Medina (2011) ao refletir sobre a
importância das especificidades conceituais dos temas relativos ao meio ambiente. A
ausência de clareza e compreensão conceitual comprometem o ofício docente, visto
que sua ação necessita atingir determinados objetivos didáticos, e para os fazê-los de
maneira intencional, necessitam encontrar caminhos metodológicos que
proporcionem essa efetivação.
A unidade de análise “Aprender a viver sem causar danos” é defendida por P1:
“É aprender como viver num meio ambiente sem provocar danos [...]”, reforça a ideia
de uma EA naturalista, na qual o ser humano nefasto e destruidor, interfere na
natureza boa, em ordem e em paz.
82
A unidade de análise “Preparar e orientar o aluno e a comunidade” está
presente nas falas de P1: “É preparar o aluno como geração futura [...]”; P2: “É
preparar pra (sic) garantir, no sentido do professor ele tá mostrando, como a gente
pode fazer, como é que a gente pode através da educação garantir os recursos [...]”;
e, P3: “[...] orientarmos alunos, e a sociedade em si da problemática ambiental [...]”.
As ideias de preparar e orientar são reforçadas pelas ideias comportamentais da EA,
presentes na unidade de análise “Comportamento”, e defendida por P2: É o
comportamento diante do lixo; P3: “[...] nortear a população [...]”; e P4: “Trabalhar
desde o comportamento [...]”.
Essas concepções de cunho comportamental e individual denotam uma visão
fragmentada e descontextualizada de EA, imposta pelo modelo cartesiano, que não
promove o debate das questões socioambientais em seus aspectos multidimensionais
e complexos.
Por fim a unidade de análise “Educar para o trânsito e lixo”, defendida por P4:
“[...] educação para o trânsito, desde normas de educação para o trânsito [...]”,
aparece descontextualizada no conjunto das concepções docentes dos sujeitos da
pesquisa; muito embora o referido tema tenha relação com a EA.
Quanto aos licenciandos cinco unidades de análise emergiram das falas e
versam sobre ensinar, educar, instruir, orientar, área de estudo, conscientização,
sensibilização, conservação, práticas e cuidados com o meio.
A unidade de análise “Ensinar e educar” emergiu das falas de L2, L17 e L19,
que consideram o ensino como sendo aprender as consequências de atos negativos
quanto a natureza; utilizar os recursos de forma correta; construção de um olhar mais
sensível entre ser humano e meio ambiente; e cuidado com o Planeta. Vejamos as
falas de L2 e L17:
A educação ambiental visa ensinar quais as consequências de atos negativos contra a natureza, bem como educar criança, jovem e adultos como utilizar os recursos naturais de forma correta, para preservação. Para que o ambiente esteja disponível para toda sociedade (L2). Educar para o meio ambiente eu entendo como levar alguém a compreender a importância do cuidado com o planeta (L17).
Essas concepções apresentam enfoque naturalista, ideia também defendida
por L1; eles concebem uma EA descontextualizada das questões sociais, culturais,
83
políticas, econômicas; na qual predomina a ideia dos atos negativos praticados pelos
seres humanos contra a natureza.
A unidade de análise “Preservação e conservação” é entendida por L3, L10,
L11 e L18 associada a prática educativa, manutenção ou manejo da natureza e do
meio ambiente, como exemplo, tomemos a fala de L18: “O ato de educar para a
conservação, manutenção e manejo da natureza e dos recursos ambientais”. Mais
uma vez, há reincidência de ideias intervencionistas e naturalistas, defendidas por P1
e P2, anteriormente.
“Instrução, orientação e área de estudo” essa unidade de análise se aproxima
das ideias de uma EA focada na individualidade e no comportamento humano, e é
defendida por L12 e L20, conforme argumenta L2: “Educação ambiental é a forma de
orientar os alunos e a população, sobre como o ambiente se comporta e auxiliar as
pessoas a respeitarem os limites da natureza”.
As ideias em torno da unidade de análise “Conscientizar e sensibilizar” foram
defendidas por L1, L5, L6, L8, L9, L13, L15 e L16; e discorrem sobre a importância
das áreas de estudo e do meio ambiente; impactos ambientais causados pelo homem;
formação de caráter; hábitos errôneos e prejudiciais ao meio e recursos naturais; que
podem ser exemplificadas nas falas abaixo:
Medidas de conscientização e formação de caráter ambiental com o objetivo de informar, educar e prevenir atitudes incorretas e agressivas ao meio ambiente (L6).
É a conscientização de que muitos hábitos errôneos prejudiciais ao meio ambiente, podem ser mudados de forma a não agredir o meio ambiente (L8).
As concepções de conscientização aqui expostas se opõem às ideias de Freire
(2008, grifo do autor), quando enfatiza que o processo de conscientização “[...] é o
olhar mais crítico da realidade, que a des-vela para conhecê-la e para conhecer os
mitos que enganam e que, ajudam a manter a realidade da estrutura dominante”.
Desejar conscientizar os alunos sem lhes proporcionar um ambiente que favoreça a
desmistificação das ideias impostas pelo capitalismo e pelo consumo exacerbado que
a mídia nos impõe, é desconhecer o real significado do conceito conscientizar.
A unidade de análise “Práticas” se refere às práticas sustentáveis e que visam
amenizar os danos ambientais, emergiram das falas de L4 e L14. Por fim a unidade
de análise “Cuidar do meio”, refere-se a “[...] respeitar e zelar pelo bem-estar (sic) do
84
meio ambiente. Adotando com isso práticas ambientais saudáveis que não causem
grandes impactos para o ambiente e para os seres vivos que nele vive (sic)” (L7).
As concepções dos docentes e dos licenciandos acima expostas denotam que
o entendimento do que seja a EA se encontra muito aquém do que propõem os
autores, leis e documentos que tratam da EA no âmbito escolar presentes neste
estudo. Com base nos dados analisados podemos inferir que as concepções de EA
aqui abordadas desconsideram o contexto, o global, o multidimensional e o complexo,
conforme recomenda Morin (2005a).
Nas concepções dos docentes e licenciandos não há menção acera dos
processos históricos, das leis, documentos, tratados e legislação que tratam da EA.
Essas questões são relevantes para o ofício docente, pois além de contextualizar a
EA na história da humanidade, conhecendo suas lutas enquanto movimentos
ecológicos (CARVALHO, 2006), ajuda o aluno a melhor compreendê-la. Também
apresenta as bases legais que a regulamentam, apresentando-lhes subsídios teóricos
e metodológicos para desenvolver suas atividades em sala de aula.
As concepções ratificam a pesquisa de Brasil (2007) e de Guimarães (2007) de
que as atividades de EA estão cada vez mais presentes nas escolas, contudo esse
aumento quantitativo, não apresenta avanços qualitativos. Contudo permanecem
centradas nos aspectos naturalistas, preservacionistas, conservadores e
antropocêntricos. Não avançamos nos aspectos socioambientais, na formação da
criticidade e do poder transformador de nossos alunos, para que sejam capazes de
construir uma sociedade mais justa social e ambientalmente.
Não há menção sobre a construção de valores, conhecimentos, habilidades,
atitudes e competências. Não se apresentam as relações de ensino e aprendizagem
numa perspectiva interdisciplinar, transversal e contextualizado para a formação
humana, incluindo aspectos sociais, políticos, econômicos, culturais. Enfim, uma EA
como ato intencional, que requer planejamentos, metodologias e avaliações, com
clareza da finalidade do ofício docente (LUCKESI, 2011).
De fato, necessitamos desenvolver uma EA que considere a complexidade das
relações, estruturada em outro paradigma, outra racionalidade, que leve os seres
humanos a pensarem e agirem focados na sustentabilidade do Planeta. O desafio dos
docentes é romper com essa visão ingênua de educação, que tem produzido saberes
e indivíduos ingênuos, passivos, apáticos e descomprometidos com as relações de
cuidado com a vida. Reconhecer que as inter-relações sociais, culturais, econômicas,
85
políticas, ambientais e humanas são parte integrante desse sistema complexo é
premissa para o desafio de formar cidadãos críticos e transformadores, indivíduos
conscientes da complexidade socioambiental, das inter-relações entre o ser
humano/sociedade/natureza, para que possam agir como sujeitos ativos no mundo,
com o mundo.
3.1.2 Concepções sobre sustentabilidade
A análise do quadro 6, abaixo, trata da sustentabilidade, mostra que as
concepções docentes falam de práticas para melhoria do ambiente; garantia para as
próximas gerações; algo que se mantem; reciclar, preservar e reutilizar; e, uso
consciente da matéria.
Quadro 6
Sustentabilidade (Concepção)
Categoria Unidades de análise
Docentes Licenciandos
SUSTENTABILIDADE Concepção
Práticas para melhorar o meio ambiente.
Garantia para as gerações futuras.
Algo que se mantém e se sustenta.
Reciclar, preservar e reutilizar.
Usar a matéria de forma consciente
Ações e práticas.
Estratégias, mecanismos, meios, métodos e técnicas.
Recursos naturais.
Atitudes e cuidado com o meio ambiente.
Fonte: Elaborado pelo autor da tese
A unidade de análise “Práticas para melhorar o meio ambiente” emergiu da fala
de P1 “Tudo que você utiliza, todas as nossas práticas em casa, na escola seja feita
de uma maneira em que você reaproveite tudo o que você tá utilizando pra melhorar
o meio ambiente”, uma ideia de sustentabilidade que trata da esfera individual,
associada ao comportamento humano em relação ao reaproveitamento e reutilização
dos resíduos que seriam descartados. Uma concepção que comunga com as ideias
de P2 e P4. Tomemos por exemplo a fala de P4: “Fazer reutilizações, diminuir lixo,
utilizar o máximo possível do que seja descartado, reaproveitamento, presente na
unidade de análise “Reciclar, preservar e reutilizar”. P1 e P4 apresentam uma visão
de sustentabilidade que não ultrapassa os limites da esfera meio ambiente/natureza,
86
limita-se a apresentar uma solução para minimizar a quantidade lixo, entretanto, não
reflete, por exemplo as questões do consumo exagerado, a exploração e as
desigualdades sociais.
A unidade de análise “Garantia para as gerações futuras”, emerge das falas de
P1: “Ter garantia e manter para dar condições para o futuro [...]”; P2: “Aquilo que possa
ser praticado de uma forma que seja garantia de uma geração futura”; e P3: “De uma
forma que não venha a faltar futuramente”. P1, P2 e P3 argumentam sobre a
necessidade de se usar os recursos naturais no presente, garantindo que as gerações
futuras também possam usufruir deles.
Essa concepção está presente nos documentos e definições que tratam da
sustentabilidade, a exemplo do Tratado de Educação Ambiental para Sociedades
Sustentáveis e Responsabilidade Global (BRASIL, 2003) e Boff (2013). Entretanto,
essas concepções não esclarecem como resolver o paradoxo de se ter bem-estar
social, desenvolvimento econômico e proteção ambiental, sem promover injustiças
sociais, exploração dos seres humanos e da natureza, sem destruir a biodiversidade.
Nossos anseios são incompatíveis com nosso modelo consumista imposto pelo
capitalismo e validado pelos meios de comunicação; não refletimos sobre a
capacidade regenerativa, reprodutiva e de coevolução dos bens e serviços naturais
da Terra, da comunidade viva, da sociedade e dos seres humanos (BOFF, 2013).
A unidade de análise “Algo que se mantém e se sustenta” emergiu da fala de
P2: “Uma coisa que se mantém e se sustenta. O que se faz hoje garante o futuro, não
é uma coisa de momento, não pode deixar de faltar, eu faço hoje, amanhã acaba, não
existe mais”, essa concepção enfatiza as concepções analisadas na unidade de
análise “Garantia para as gerações futuras”, não reflete as relações de alienação
impostas pelo capital, e ratificam os argumentos de Mariotti (2013) de que os seres
humanos pensam e agem sobre seus próprios interesses (autossabotagem),
podemos constatar, na atualidade, as consequências da destruição causada à Terra.
De fato, outra racionalidade é necessária, para que nosso pensar, falar e sentir
possam reativar o sentido da vida e regenerar os potenciais da natureza (LEFF,
2010a).
A unidade de análise “Usar a matéria de forma consciente” que emergiu da fala
de P3: “Seria o ser humano usar a matéria (meio ambiente em si/os recursos) de uma
forma consciente”, sinaliza para o processo de conscientização, no entanto não amplia
87
esse entendimento para as esferas sociais, culturais, econômicas e políticas.
Novamente a ênfase aqui é centrada nas questões da natureza e meio ambiente.
Para os licenciandos, o entendimento da sustentabilidade ambiental passa por
ações e práticas; estratégias, mecanismos, meios, métodos e técnicas;
desenvolvimento; recursos naturais; cuidado com o meio ambiente; e, atitudes.
A unidade de análise “Ações e práticas” emergiu das falas de: L1: “Atender as
necessidades humana sem prejudicar o meio”; L5: “Desenvolvimento sem causar
grandes danos ao meio ambiente”; L6: “Promover a não degradação do planeta”; L7:
“Que não agridam tanto o meio ambiente”; L14: “Que conservem e protejam o
ambiente”. Os licenciandos ratificam as concepções dos docentes, pois argumentam
em torno da sustentabilidade ambiente/natureza, enfatizando a vertente naturalista de
EA. A ideia de desenvolvimento aparece na fala de L1, enquanto as demais
apresentam apenas a noção. Um discurso que não contempla as questões de
consumo, de sociedade e economia, e nem se debate a questão de desenvolvimento
sem destruição dos recursos naturais.
A unidade de análise “Estratégias, mecanismos, meios, métodos e técnicas”,
defendida por L2, L4, L8, L10 e L12, expressam concepções de técnicas que podem
ser utilizadas como ferramentas que promovam a sustentabilidade, esse dado nos
chama a atenção pelo fato de que os sujeitos pesquisados são licenciandos, as
concepções aqui expostas não apresentam caraterísticas associadas à educação e
nem formação humana, mas apenas de manejo com o meio ambiente. Uma visão
muito técnica, típica dos profissionais que não trabalham com educação. Vejamos:
Técnicas para utilizar os recursos naturais sem agredir, desenvolvendo métodos que preservem tais recursos para as futuras gerações (L2). Estratégias desenvolvidas que buscam beneficiar o meio ambiente, com técnicas não prejudiciais (L8).
As concepções acima nos levam à reflexão de que nossos futuros professores
estão sendo formados para trabalhar a EA numa perspectiva técnica de manejo do
meio ambiente, uma formação que favorece a manutenção do paradigma cartesiano,
e não olha para a formação de seres humanos; um distanciamento das ideias de Morin
(2005b), de que o ensino deveria ser centrado na condição humana, um
reconhecimento do ser humano como individuo social, histórico, cultural e político.
88
A unidade de análise “Recursos naturais”, emergiu das falas de L3, L9, L11,
L13, L15, L16, L18 e L19, e abordam questões referentes ao uso, manejo,
preocupação, preservação, usufruto e consumo dos recursos naturais de modo que
eles possam continuar existindo e serem garantidos para as gerações futuras; uma
reincidência das ideias naturalistas, voltadas para o meio ambiente, impregnando as
concepções. Entretanto, nas falas de L9 e L19, aparecem dados relevantes, vejamos:
Consumo consciente dos recursos naturais, visando a preservação e manutenção do meio para essa geração, pensando nas gerações futuras. Busca pelo meio ambiente equilibrado, em um estilo de vida que possa contribuir para isto, tendo a espécie humana como “dentro do ambiente” (sic) e não superior a este (L9, grifos nossos). Utilização de recursos naturais de forma e quantidade responsável sem que haja danos ao meio ambiente, ou seja, voltada para sua necessidade e não exploração apenas com olhar capitalista em detrimento ao meio ambiente (L19, grifos nossos).
Da fala de L9 destacamos “consumo consciente” e “espécie humana como
“dentro do ambiente””; considerar a questão do consumo consciente no debate da
sustentabilidade do ambiente natural é de extrema pertinência, pois rompe com um
modo de pensar uma saída para a crise ecológica. Os licenciandos demonstrar estar
centrados numa visão de desenvolvimento e uso dos recursos naturais apenas, a
problemática é complexa e mais ampla, e requer o rompimento das visões estreitas e
reducionistas, que não contemplam as questões políticas, econômicas e sociais. L19
corrobora nesse direcionamento, ao afirmar “[...] exploração apenas com olhar
capitalista [...]”.
Destacamos ainda a ênfase dada por L19 ao citar os termos dentro do ambiente
entre aspas. Será que essa atitude se refere a um estranhamento do que seja meio
ambiente? Algo do qual não fazemos parte? Se assim o for, é necessário que
rompamos com esse estranhamento, essa falta de inclusão do ser humano no
contexto ambiental, indo mais além e entendendo que o equilíbrio ecológico requer o
reconhecimento de que o ser humano é parte integrante dos ecossistemas.
A unidade de análise “Atitudes e cuidado com o meio ambiente”, relaciona-se
com as questões de preservação, minimizar os impactos, conservar o meio, evitar o
aceleramento do consumo dos recursos naturais; e emergiram das falas de L17 e L20,
mais uma vez as concepções pululam em torno da vertente ser humano/natureza, que
não favorece a construção de valores e estratégias que levem a ações conscientes.
89
As concepções acerca da sustentabilidade, apresentadas pelos docentes e
licenciandos, se distancia de um conceito de sustentabilidade numa perspectiva de
complexidade (LOUREIRO, 2012), pois, na sua maioria só contemplaram aspectos
biológicos, ecológicos e ambientais, e completa ausência das questões políticas,
econômicas e culturais. Esse hiato nas concepções, contribui para a manutenção da
crise ecológica, pois não consegue problematizar e nem contextualizar as questões
ambientais sob a ótica da complexidade.
Leff (2010a) ao propor a construção da nova racionalidade nos convida a
pensar, a falar e a sentir no sentido da vida e na regeneração dos potenciais da
natureza, um convite ratificado pelas ideias de Morin (2005b) quando solicita que a
premissa primeira do ensino deveria ser ensinar a condição humana. Bem como, as
reflexões de Delors et al. (2006) de aprender a conhecer, a fazer, a ser e conviver. As
recomendações desses autores pressupõem um ofício do professor que proporcione
aos seus alunos a reflexão crítica sobre o lugar e o papel que ocupam na Terra, na
construção de redes de significados, sentidos e direções pautadas na ética e na
alteridade, em torno da construção de um mundo mais igualitário e com menos
injustiças sociais.
3.1.3 Concepções sobre complexidade
A análise do quadro 7, que fala das concepções docentes sobre complexidade
foram estruturadas cinco unidades de análise que falam de: tudo estar ligado;
complicado, não leu e não tem ideia; profundo, abrangente e trabalhoso; níveis de
organização e vários fatores envolvidos.
Quadro 7
Complexidade (Concepção)
Categoria Unidades de análise
Docentes Licenciandos
COMPLEXIDADE Concepção
É tudo que está ligado (junção).
Complicado, nunca li/vi, não sei/não tenho ideia.
Profundo, abrangente e trabalhoso.
Níveis de organização.
Vários fatores envolvidos e interligados.
Não conhece, não ouviu falar.
Estudo e conhecimento.
Sistema, cadeia, fatores e interação.
Tipos de ambiente e interação.
Fonte: Elaborado pelo autor da tese
90
A unidade de análise “É tudo que está ligado (junção) emerge das falas de P1
e P3:
[...] é tudo que tá ligado com a sobrevivência do meio ambiente e da gente também. Junção de todas as coisas (seres vivos e meio ambiente), parte biótica e abiótica (P1). Complexidade ambiental é toda essa junção da questão ambiental em si (P3).
As ideias acima, que associam a complexidade com a junção de fatores, não
deve ser interpretada como perda da individualidade das partes que se juntam. Essa
ideia parece corroborar com os “mal-entendidos” que são associados à complexidade,
que sugere a ideia de completude (Morin, 2008), ao contrário, a complexidade é
incompletude e incerteza. O conceito de complexidade diz que o complexo é tudo
aquilo que está junto, um tecido, formado por fios que se entrelaçam e se intercruzam,
mas que não perdem suas propriedades individuais. Contudo, na unidade complexa
existem emergências que só se dão pelo entrelaçamento e intercruzamento das
partes (Morin, 2008).
A unidade de análise “Complicado, nunca li/vi, não sei/não tenho ideia”,
emergiu das falas de: P1: “Complexidade ambiental é complicado [...] eu nunca li nada,
nem vi”; P2: “É uma coisa que é complicada, bem complicada”; e, P4: “Eu não sei, não
tenho nem ideia”. Para essa unidade de análise, podemos fazer duas observações, a
primeira é sobre o fato de que o tema complexidade esteja ausente do ideário dos
professores, sobretudo para aqueles que se propõem a trabalhar com EA. A segunda
diz respeito ao entendimento de que a complexidade é algo difícil, talvez por
aproximações semânticas entre os termos, acabe-se tomando um pelo outro.
A unidade de análise “Profundo, abrangente e trabalhoso”, emerge da fala de
P2 e parece corroborar com as anteriormente citadas, visto que associa a
complexidade a um aprofundamento de um estudo, algo que é mais trabalhoso.
[...] é um algo assim mais profundo, mais abrangente e mais trabalhosa, que se aprofunda mais, se estende mais, que é mais aprofundada, que pode ser mais pesquisada (P2).
Ressaltamos que o mais aprofundado, abrangente, trabalhoso e aprofundado
não necessariamente seja complexo, por exemplo um estudo disciplinar e especialista
91
pode se aprofundar ao máximo e não apresentar caráter de complexidade, não
estabelecer relações, nem permitir diálogos com outros saberes e conhecimentos.
A unidade de análise “Níveis de organização”, defendida por P2: “Os seres
unicelulares não são complexos, só os pluricelulares. É complexo em níveis de
complexidade, biológico, população e comunidades”, denota uma associação da
complexidade com níveis organizacionais dos seres vivos, níveis taxonômicos.
A unidade de análise “Vários fatores envolvidos e interligados”, presente nas
falas de: P1: “[...] tudo interligado” e P3 “[...] tudo, todas as coisas interligadas, vários
fatores envolvidos e interligados (seres humanos e meio ambiente=bióticos e
abióticos)”, muito embora se refiram a tudo/todas as coisas, inclusive incluindo os
fatores bióticos e abióticos, não contemplam a natureza complexa dos processos
econômicos e políticos que determinam as formas de apropriação, exploração e uso
dos recursos naturais (LOUREIRO et al., 2009).
Assim, percebemos que há uma dificuldade no entendimento do que seja
complexidade ambiental, o que dificulta o rompimento do modo de pensar cartesiano,
disciplinar e compartimentado. Não enxergar os seres vivos como unidades
complexas, imersas em contextos igualmente complexos, cujas vinculações e redes
de conexões formam um emaranhado de complexidades infinitas, é uma limitação
grande, que precisa ser rompida, para que a disjunção, a redução e a abstração,
impostas pelo paradigma da simplificação, possa ceder espaço ao paradigma da
complexidade, que permite a articulação, a inclusão e a contextualização, condições
necessárias para um pensar e agir crítico e transformador.
Em relação aos licenciandos as unidades de análise abordam sobre não
conhecer e nem ouvir falar na complexidade; a complexidade é estudo, conhecimento,
sistema, cadeia, fatores, organização, interação; se refere a características do
ambiente; pode ser ainda tipos de ambiente e interação ou dificuldade de entender; o
licenciando L8 não respondeu a essa questão, deixou sua resposta em branco. As
respostas de L3, L12, L18 e L20 estavam vagas e sem sentido, portanto, foram
desconsideradas.
A unidade de análise “Não conhece, não ouviu falar” emerge da fala de L1, L2
e L11; e, são aqui corroboradas pelas concepções de P1, P2 e P4. Esse dado ratifica
nossa preocupação com a ausência da temática no processo de formação docente.
Uma formação inadequada pode ter relação com a fragilização com que os
professores trabalham a EA na escola, visto que elas não conseguem mobilizar os
92
sujeitos em um engajamento efetivo, crítico e transformador, um dado constatado por
Layrargues (2012).
A unidade de análise “Estudo e conhecimento”, a exemplo de P2, associa a
complexidade a estudar mais profundamente; a maneira como se lida com o tema,
como se “passa” a EA; questões complexas requerem muitos estudos; todo o
complexo da educação; e, construção do conhecimento em sua totalidade, emergiram
das falas de L7, L10, L14, L16, L17 e L19. A associação da complexidade a estudo é
um dado presente nas falas dos sete sujeitos participantes da pesquisa, todavia não
encontramos na literatura estudos que possam justificar tal ocorrência; porém Morin
(2008, p.223) pontua que “o campo do conhecimento não é mais o campo do objeto
puro, mas o do objeto visto, percebido, co-produzido por nós, observadores-
conceptores”.
A unidade de análise “Sistema, cadeia, fatores e interações” emergiu das falas
de L4, L5, L6, L9, L13 e L15 e associa a complexidade a sistema integrado dos
organismos; a cadeia de eventos; conjunto de fatores que cercam o ambiente; e
fatores que em EA a torna difícil de lidar; formas de interações exercidas no ambiente;
relações existentes entre os diversos tipos de ambientes. Observemos as falas:
Uma cadeia, os eventos não ocorrem de forma isolada, uma ação realizada isoladamente reflete todo o conjunto (L5). Conjunto de fatores (social, ambiental, moral) que cercam o ambiente (L6).
Muito embora as concepções da unidade de análise “Sistema, cadeia e fatores”
apresentem divergências em seus significados, a concepção de L5 aborda a questão
dos eventos não ocorrerem isolados, que uma ação realizada isoladamente reflete no
todo, essa ideia tem sintonia com o operador cognitivo hologramático (MORIN, 2007),
cujo enunciado é: “não apenas a parte está no todo, mas o todo está na parte”. L8 fala
em fatores e cita o social, o ambiental e o moral, que “cercam” o ambiente; nessa fala
há indícios de um reconhecimento da complexidade na esfera social, contrapondo-se
ao grande número das concepções, centradas em aspectos físicos e ecológicos.
A presença diminuta de concepções sobre complexidade que comungue com
nosso referencial teórico, nos leva a deduzir que de fato, há um obstáculo conceitual
na maneira como os docentes e licenciandos compreendem a complexidade.
Compreendendo que qualquer discussão, formação ou intervenção que se proponha
93
a trabalhar com a EA numa perspectiva de formação de cidadãos críticos e
transformadores, só será viabilizada se passar pelo viés da complexidade e do
pensamento complexo.
Se os problemas ambientais são complexos, incertos, imprevisíveis e podem
levar a destruição do Planeta, a maneira de estudá-los, compreendê-los e apresentar
soluções há de ser complexa, considerar as incertezas e imprevisibilidades. O ofício
do professor deve romper com o modelo dicotômico sujeito-objeto, parte-todo, razão-
emoção; o ensino deve primar pela contextualização e articulação, pelo diálogo entre
os saberes. Para que o conhecimento seja pertinente e favoreça a formação crítica e
transformadora, a educação deverá tornar-se o contexto, o global, o multidimensional
e o complexo evidenciados (MORIN, 2005).
3.2 Como é trabalhada a educação ambiental na prática docente
Da categorização das concepções docentes sobre a maneira como esses
professores trabalham a EA em suas práticas docentes emergiram seis unidades de
análise conforme descrição do quadro 8, a seguir.
Quadro 8
Como é trabalha a Educação Ambiental (Atividades desenvolvidas)
Categoria Unidades de análise
Docentes Licenciandos
EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Como trabalha a Educação Ambiental na prática docente
Não realiza.
Atividades (PIBID), trabalhos e projetos.
Vinculada a conteúdos ou livro didático.
Campanhas e passeatas na sociedade.
Avaliação das atividades.
Não realiza.
Atividades (PIBID).
Projetos.
Oficinas (PIBID).
Pesquisa acadêmica.
Fonte: Elaborado pelo autor da tese
Entre as falas dos professores há relatos de que não se realiza atividades de
EA; e os que dizem realizá-las falam em atividades, trabalhos e projetos
desenvolvidos; que abordam a EA quando tratam de conteúdos de biologia e ciências;
que realizam campanhas e passeatas na sociedade; quanto ao processo de avaliação
todos falam que essas atividades são avaliadas.
A unidade de análise “Não realiza”, presente na fala de P3: “O ano passado...
Já fiz já, fiz a questão de coleta do lixo (há mais de dois anos) [...] atualmente) não,
94
por que (sic) na verdade a gente segue um cronograma”, esse fato revela que o
docente em voga parece desconhecer as recomendações sobre o ensino e a
aprendizagem da EA presentes na PNEA (BRASIL, 1999) e no Decreto 4.281/2002;
para justificar a não realização de atividades sobre EA em suas aulas, P3 argumenta
que:
[...] eu peguei só primeiro ano esse ano, eu sei que isso é uma questão que às vezes nem, você tem que fazer independente de seguir um conteúdo programático, por exemplo, a parte ambiental é muito diversificada, mas como eu fiquei só com o primeiro ano esse ano, a gente trabalha muito essa questão de célula, né, e aí a parte ambiental é mais no terceiro ano, então, esse ano, eu não trabalhei praticamente, que eu lembre nada compreensão (P3).
Os argumentos de P3 giram em torno da questão do conteúdo; contudo ele
parece ter conhecimento de que a EA deve ser vivenciada independente de conteúdos
(“você tem que fazer independente de seguir um conteúdo programático”), continua
argumentando em favor da não realização, citando as questões da diversidade da EA;
e a série que leciona, defendendo a tese de que EA “é mais no terceiro ano”.
A PNEA recomenda que a EA seja uma prática educativa integrada, contínua
e permanente em todos os níveis de escolaridade; devendo se fazer presente de
forma articulada, transversal e interdisciplinar (BRASIL, 1999). Ao refletirmos sobre a
formação de P3 ressaltamos que apesar dele ser licenciado em Ciências Biológicas e
possuir especialização em Gestão Ambiental, não conseguiu efetivar em seu ofício de
professor a inserção da EA.
A unidade de análise “Atividades (PIBID), trabalhos e projetos” emergiu das
falas de P1, P2 e P3, vejamos:
Essa parte de sustentabilidade com relação a, a lixo né, reciclagem, essas coisas assim, a gente tem sempre, procura fazer trabalhos assim envolvendo é material reciclado, reciclagem (P1). Trabalhos nas salas de aulas, eles confeccionaram cartazes, fizeram paródias, fizeram... até um mosquito arrumaram (P2). Quando é do sexto ao nono ano a gente trabalha mais focalizado na escola, a gente faz lixeiros pra escola, eles trazem latas, trazem aquelas, aquelas latas de tinta, aqueles baldes, a gente trabalha muito isso, coleta seletiva, a gente faz trabalhos na escola, sexto ao nono ano, por que (sic) são mais novos, mais jovens, é difícil até de deslocar (P3).
As atividades mencionadas pelos docentes estão associadas à reciclagem,
confecção de cartazes, paródias e lixeiros; sobre essas atividades não há clareza de
95
que as mesmas se referem a ações de projetos realizados em EA, ou se não passam
de atividades pontuais. Ao serem questionados sobre a natureza das atividades,
alguns as associam a projetos, contudo no decorrer de suas falas há evidências de
que de fato, essas atividades aconteceram em um momento pontual durante o ano
letivo, e não de forma articulada e permanente, como preconizam os documentos de
referência; observemos:
Na semana do meio ambiente a gente procura desenvolver atividades relacionadas a isso aí (P1). Nós trabalhamos a semana todinha com palestras [...] agora quem se engajou mais foi a professora de biologia, geografia e a professora de história (P2). Tem o dia de exposição, como a gente tem muitos dias de sábado a trabalhar, aí nós normalmente nos sábados trabalhamos esses projetos (P4).
As falas de P1, P2 e P4 ratificam os argumentos sobre as atividades de EA que
são desenvolvidas nas escolas. Medeiros et al. (2007) destacam que elas tratam de
assuntos específicos, são pouco mobilizadoras e ocorrem esporadicamente;
Guimaraes (2007) argumenta que essas atividades focadas no ensino fragmentado e
disciplinar, favorecem as atividades de cunho comportamental e descontextualizado.
Os argumentos acerca da realização de projetos são vagos, conforme defende P3:
“[...] quando é ciências por exemplo, do sexto ao nono ano a gente faz projetos na
escola, muitas coisas [...]”, no decorrer das falas essas “muitas coisas” são atividades
que não caracterizam a realização de projetos conforme defende Araújo (2011).
Outro fato merece menção, a questão de que, em alguns contextos, essas
atividades se apresentam como ações não planejadas, não intencionais, cujas
realizações não atenderam a nenhum critério metodológico, nesse direcionamento P3
pontua que trabalhou “Da seguinte forma, fizemos os... os.... aqueles bichinhos de
coleta, né, e, do lixo, entre os degradáveis e os não degradáveis”. L3 incorre numa
confusão conceitual entre o significado e as características da coleta seletiva de
resíduos sólidos, não consegue nomear os coletores de lixo, chamando-os de
“bichinhos”
Ressaltamos ainda que todos os docentes fizeram referências às atividades
desenvolvidas nas escolas, pelo PIBID; relataram que houve construção de horta,
atividades de reciclagem e produção de sabão com óleo usado em frituras. Inclusive,
essa foi a única atividade de EA, mencionada por P3: “[...] o pessoal do pibid (sic), nós
96
fizemos uma horta”, que aconteceu em suas aulas; um diagnóstico que ratifica um dos
objetivos do programa, que é de inserir o licenciando nas escolas da rede pública,
dando-lhes oportunidade de criação e participação em experiências metodológicas e
práticas docentes que superem problemas identificados no processo de ensino e
aprendizagem.
A unidade de análise “Vinculada a conteúdos ou livro didático”, trata da EA
sendo vivenciada a partir dos conteúdos das disciplinas ou livro didático. P2 relata que
“nos segundos anos, a gente trabalhando agora a questão de parasitose aí vem a
questão de saneamento básico, não é, aí a gente toca nesse assunto”. Vejamos os
argumentos de P4 para a maneira como trabalha a EA no ensino fundamental “[...]
tem o livro didático pra gente acompanhar e tem o planejamento em rede [...] trabalha
sempre a teoria na sala e às vezes a gente consegue alguma coisa, na rede municipal
é mais difícil por que a gente tem que seguir um planejamento municipal, a gente não
pode fazer um planejamento muito diferenciado”.
Ressaltamos nas falas de P2 e P4 a maneira como trabalham a EA em suas
atividades em sala de aula, de maneira vinculada e/ou transversal aos conteúdos da
disciplina de biologia ou ao livro didático, inclusive essa é uma das recomendações
para se trabalhar a EA no âmbito escolar, proposta pelos documentos de referência,
quanto pelos autores que estudam e escrevem sobre ela. A fala de P4 apresenta um
dado relevante, quando aborda a questão do planejamento municipal que tem que ser
seguido, o que impede a ação do professor; mesmo diante dessa imposição, P4
consegue realizar atividades de EA, um movimento contrário aos argumentos de P3,
vistos na unidade de análise “Não realiza” ao se referir ao fato de que as aulas seguem
um cronograma.
A unidade de análise “Campanhas e passeatas na sociedade” emergiu das
falas de P2 e P4, vejamos:
Passeata logo no início do ano sobre a dengue, a dengue e a água, né, essa relação entre a dengue e a água, tem tudo, né, a ver, tanto da questão de preservação da água, como a questão do que a água pode causar, quando parada, em relação à dengue (P2). Quando é com os mais adultos, a gente trabalha... a gente já fez campanha na feira, eles confeccionaram gibis falando sobre essa questão do lixo, como você vai trabalhar o seu lixo em casa [...]. A secretaria de saúde com a do meio ambiente conseguiu fazer esses gibizinhos, aí eles produziram e a gente fez o gibi, a gente imprimiu, aí a gente entregou na feira” [...] passeata na cidade [...] até limpeza assim dos terrenos baldios agente (sic) conseguiu arrecadar muito lixo (P4).
97
As atividades realizadas por P2 e P4 parecem ser mobilizadoras, e ter impactos
nos meios sociais e ambientais, não há como mensurarmos quais esses impactos;
entretanto, essas atividades ainda que pareçam chamar a atenção da sociedade e
autoridades para as questões relativas ao meio ambiente, apresentam um viés
naturalista, à medida que tratam mais do comportamento, das ações que se
estabelece entre o ser humano e a natureza. São atividades necessárias e
importantes, mas se forem realizadas mecanicamente não levam a reflexões que
possam modificar nosso modo de pensar, sentir e agir.
Nossos argumentos são corroborados pela fala de P4 (grifos nossos), quando
ao final do seu relato explica como consegue esse tipo de mobilização junto aos
alunos: “[...] a gente já foi para Aracaju, oceanário, vai pra zoológico, a gente sempre
tenta tá (sic) fazendo aulas desse tipo assim, pra... até pra seduzir o aluno”. Seduzir
não é “ensinar a pensar certo” (FREIRE, 2006), o pensar certo é proporcionar,
epistemologicamente e metodologicamente, um ambiente favorável à formação
crítica, ou seja, pensar certo é ser crítico, que proporciona o agir certo, que se
caracteriza por ações ambientais, sociais, culturais, políticas e econômicas
transformadoras, que primam pela sustentabilidade planetária.
A unidade de análise “Avaliação das atividades” ratifica nossos argumentos
acima, vejamos:
Teve nota é... pelo o que eles fizeram, por exemplo, a participação na passeata, as paródias que eles fizeram, os cartazes [...] se não tiver nota eles não se animam muito pra participar, se não tiver nota, não se interessa não” (P2). Aí eu atribuo uma nota, entendeu? Faço normalmente, normalmente faço regrinhas assim [...] a gente faz gincana também, todo ano tem uma gincana municipal pra disputar entre escolas, as três maiores escolas do município, municipais (P4).
Os discursos de P2 e P4, que tratam da avaliação das atividades em EA não
se distanciam da maneira como a grande parte dos professores tem recorrido à
avaliação como uma arma para se conseguir determinados fins. Luckesi (2011) nos
alerta que nossas práticas ainda estão presas aos exames e não às avaliações, visto
que nossas ações de acompanhamento dos alunos ainda têm “por base a perspectiva
da aprendizagem passada, da classificação, da seletividade, da prática pedagógica
autoritária e, por isso, não dialógica” (p. 210).
98
Quanto aos licenciandos, as unidades de análise tratam dos que não realizam
ações de EA; dos que realizam alguma atividade, projetos, oficinas e pesquisas para
elaboração de TCC. Os que se encontram representados na unidade de análise “Não
realiza”, foram L1, L3, L4, L12, L15, L16 e L18. A exemplo de P3, esses licenciandos
relatam que ainda não realizaram atividades de EA. Os referidos licenciandos estão
cursando entre o 5º e o 8º semestre do curso, o que poderia ser uma explicação para
o fato de ainda não terem realizado as atividades. Entretanto, existem outros
licenciandos cursando o mesmo intervalo do curso que já as desenvolveram.
A unidade de análise “Atividades” refere-se a “[...] reutilização e construção de
materiais [...]” (L6); “[...] mutirões de limpeza, seminários, palestras, jogos didáticos,
cartilhas educativas e vídeos [...]” (L11); e, “[...] coleta de lixo [...]” (L17). As atividades
desenvolvidas pelos licenciandos apresentam similaridade com as dos docentes.
Entretanto, destacamos que os jogos didáticos, os seminários, as palestras e as
cartilhas educativas aparecem como atividades diferenciadas em relação às demais,
confirmando o caráter criativo e inovador em experiências metodológicas, das ações
do PIBID nas atividades de EA na escola.
A unidade de análise “Projetos” se desdobra em três dimensões, a considerar
a fala dos licenciandos. Para A8 e A10 são projetos de intervenção; e, para A13 é
projeto interdisciplinar; os primeiros se referem a atividades sobre lixo e construção
de uma horta medicinal e jardim na escola; o outro reuniu vários graduandos de
diversos cursos em torno de um curso de extensão sobre hidroponia, feita com lixos
domiciliares, enfatizando o custo benefício e o fácil acesso aos recursos. Nessas
concepções destacamos o caráter interdisciplinar utilizado para se trabalhar com EA,
muito embora a atividade não tenha acontecido no âmbito escolar, merece reflexão
uma vez que reúne indivíduos de diversas áreas do conhecimento para pensar e
resolver um problema ambiental, o que sugere uma perspectiva de complexidade.
A unidade de análise “Oficinas (PIBID)” emergiu da fala de L2, L5, L7 e L14, e
todas se referem à produção de sabão ecológico a partir do óleo de cozinha usado.
Os argumentos para justificar as oficinas giram em torno de que o descarte
inadequado do óleo de cozinha usado pode contaminar os lençóis freáticos; as
características químicas do óleo; e, ensinar a produzir o sabão.
Os licenciandos falam que a atividade foi desenvolvida como ação do PIBID;
muito embora a proposta de realização de oficinas esteja centrada no caráter prático,
na qual a teoria seja vista na prática, podendo haver inclusive espaço para realização
99
de debates. Portanto uma atividade diferenciada, que promove a contextualização e
a formação crítica. Destacamos que a mesma teve foco apenas nas questões de meio
ambiente/natureza, o único diferencial é visto na fala de A14, sobre a possibilidade de
a atividade servir como momento de aprendizagem para que os alunos possam
aprender a fabricar o sabão, abrindo-se uma possibilidade, inclusive, de renda
financeira.
A unidade de análise “Pesquisa acadêmica” emergiu das falas de L9: “[...]
ensino fundamental, sobre água e lixo”; L19: “[...] coleta seletiva de resíduos sólidos”;
e “[...] reutilização de pneus automotivos como vasos de plantas inseridos no jardim,
construídos pelos alunos em um espaço sem uso na escola” (L20). Todas se referem
a atividades de pesquisa para a realização de TCC. Um dado relevante, uma vez que
as pesquisas em EA escolar fortalecem os estudos, as publicações e os debates na
área de EA, contribuindo para os avanços e melhorias conceituais e metodológicas
de todos que se propõem a inserir a dimensão ambiental em seus discursos e práticas.
A análise da categoria como trabalha a EA na prática docente sinaliza que tanto
professores quanto licenciandos concebem as atividades em EA pautadas em uma
visão naturalista de EA, enfatizando o comportamento humano e um ensino disciplinar
e descontextualizado. De modo geral são realizadas em datas específicas do
calendário escolar. Ressaltamos que a proposta de uma EA permanente, transversal
e permanente, explicitada nos documentos de referência para a EA, não é realizada
na escola; os temas abordados não contemplam temáticas sociais, econômicas e
políticas, concentram-se nos aspectos ecológicos e de meio ambiente, na relação
homem/natureza.
Assim, essas constatações ratificam as ideias de Guimarães (2007) de que de
fato há limitações compreensivas impostas aos professores que tentam inserir a EA
no ambiente escolar. Essas limitações se evidenciam nas constatações relatadas nos
parágrafos acima, e se distanciam de uma proposta de EAE como um processo
educativo intencional, cujos planejamentos, metodologias e processos avaliativos
devem ser escolhidos em sintonia com uma proposta que leve à reflexão e à
transformação social.
As atividades citadas pelos docentes e licenciandos, aparecem como resultado
de práticas espontâneas ou quase espontâneas, “desarmadas”, que conduzem a
reprodução um saber ingênuo, não promove o pensar certo (FREIRE, 2006). Parece
não haver clareza para onde os professores e licenciandos estão caminhando ao
100
proporem a maioria das atividades em EA relatadas, o que nos lembra Luckesi (2011)
quando ressalta a necessidade de o ofício do professor ser pautado em ações
cônscias com determinados pressupostos teóricos, para que as escolhas
metodológicas possam ser coerentes com o resultado que se espera alcançar.
Desejar formar seres humanos críticos e transformadores nas perspectivas
relatadas anteriormente é uma tarefa muito difícil de realizar; ainda que tenhamos as
contribuições das atividades dos licenciandos que trazem para o ambiente escolar
atividades que podem suscitar a reflexão, como a realização de oficinas, jogos
didáticos e confecção de cartilhas. Entretanto, essas atividades desconsideram o ser
humano como indivíduos sociais, históricos e complexos, em infinitas inter-relações
entre eles mesmos, o meio e todos os seres vivos, envoltos em contextos econômicos
e políticos igualmente complexos.
3.3 Relações entre educação ambiental, sustentabilidade e complexidade
A análise da categoria “Relações entre educação ambiental, sustentabilidade e
complexidade” tinha como objetivo compreender de que maneira os docentes e
licenciandos conseguiam articular os três conceitos. Desse modo, com as repostas
elaboramos o quadro 8. Os docentes apresentaram as seguintes unidades de análise:
“Tudo ligado e interligado” e “Educação ambiental e sustentabilidade”.
Quadro 9
Relações entre Educação Ambiental, Sustentabilidade e Complexidade
Categoria Unidades de análise
Docentes Licenciandos
COMPLEXIDADE Relações entre
Educação Ambiental, Sustentabilidade e
Complexidade
Tudo ligado e interligado.
Educação ambiental e sustentabilidade.
Relacionados.
Educação ambiental como veiculadora.
Fonte: Elaborado pelo autor da tese
Para a unidade de análise “Tudo ligado e interligado” P3 afirma que: “estão
interligados os três”; e P1 argumenta:
Tudo ligado um pouco, um com o outro. Tudo tem a ver, se você tem prática e teoria, você tem esclarecimento sobre educação ambiental, você tem como
101
melhorar, fazer com que o ambiente se torne sustentável, e isso aí tudo tem a ver com a parte de complexidade (P1).
P3 afirma que os três estão interligados, mas não sabe explicar, enquanto P1
pontua que tudo “está ligado um pouco” e continua argumentando sobre teoria e
prática como condição para estabelecimento de relações de sustentabilidade com o
Planeta, e que isso tem a ver com complexidade. Tanto P3 quanto P1 não conseguem
articular os três conceitos, pontuando sobre as relações entre os seres vivos e a
natureza, a importância da EA como processo formativo, e a complexidade dos seres
vivos, do ambiente, e dos processos culturais, econômicos, políticos e sociais, nos
quais estamos imersos.
A unidade de análise “Educação ambiental e sustentabilidade” emerge das
falas de:
Não tem sustentabilidade se eu não tiver uma boa educação, a gente precisa do conhecimento pra (sic) poder, a coisa se tornar sustentável, então a educação (ter ciência, dar a ciência) vai nos ajudar a ter esse conhecimento, pra poder através do conhecimento ter a sustentabilidade, e essa complexidade vai se tornar mais fácil, não vai ser tão complexo mais não (sic), por que (sic) na verdade é complexo por que são muitos fatores, muitas questões econômicas, sociais e de cultura (P2). A partir do momento que há uma educação ambiental isso vai refletir na sustentabilidade [...] porque a partir do momento que a população tá educada ambientalmente ela vai ter como fazer com que o meio seja sustentável (P3). Educação ambiental vem primeiro pra (sic) poder você desenvolver a sustentabilidade. Quando uma pessoa ela (sic) tem conhecimento, ela tem conceitos, ela vivencia aquilo ali sobre educação ambiental, ela tem um pouco mais de consciência, é mais fácil trabalhar a sustentabilidade (P4).
P2, P3 e P4 associam a educação à sustentabilidade, entretanto eles não
explicitam que tipo de educação é essa. Ao longo dessa investigação vimos
argumentando sobre os riscos de uma EA pensada e desenvolvida sob o viés
mecanicista da ciência cartesiana, cujas abordagens dos fenômenos socioambientais
são descontextualizadas dos aspectos culturais, políticos e econômicos. Esse tipo de
EA que parece permear o universo das escolas envolvidas nesta pesquisa, não
favorece a formação crítica e transformadora. Enquanto não superarmos nossos
discursos e práticas em torno do ofício do professor, em detrimento da complexidade,
qualquer proposta teórico-metodológica contribuirá muito pouco para a transformação
da crise ambiental que nos foi imposta.
Em se tratando de complexidade, podemos observar na fala de P2 a
compreensão de que complexo é algo difícil, e que à proporção que formos estudando
102
vai se tornando fácil, menos complexo. Apesar de P2 fazer tal associação, ao final de
sua fala considera que “por que na (sic) verdade é complexo por que são muitos
fatores, muitas questões econômicas, sociais e de cultura”; essa é a primeira e única
vez em que os sujeitos da pesquisa associam a complexidade a questões que não
sejam ambientais/naturais.
Quanto aos licenciandos, destacamos que L1, L4 e L5 não responderam à esta
questão, deixando em branco. L8, L10, L14, L16, L17 e L20 deram respostam
completamente sem sentido, como por exemplo: “[...] um jardim na escola [...]” (L10);
e, “Sustentabilidade seria o cuidado, a complexidade seria o cuidado mais
aprofundado” (L17). Em relação aos demais conseguimos elaborar duas unidades de
análises: “Relacionados” e “Educação ambiental como veiculadora”.
A unidade de análise “Relacionados” emerge das falas de L2, L3, L6 e L7, e
abordam aspectos de relação entre os conceitos, L2 só relaciona EA e
sustentabilidade; e, considera que a construção do conhecimento nos aspectos
culturais e sociais, da maneira como conservar os recursos naturais leva a
sustentabilidade. L3, L6 e L7 consideram a EA, a sustentabilidade e a complexidade,
vejamos:
Por mais que abranjam grandes áreas do meio ambiente os conceitos de sustentabilidade ambiental; complexidade ambiental e educação ambiental se interligam de forma direta no bom funcionamento do ambiente (L3). Promover sustentabilidade ambiental, complexidade ambiental e educação ambiental é unir ações com todas as esferas (social, ambiental e moral) através da educação do ensino” (L6). Sustentabilidade ambiental, complexidade ambiental e Educação ambiental, são 3 vertentes ambientais que correlacionam-se (sic) entre si através de práticas ambientais usadas que visam a melhoria ambiental (L7).
L3 entende que a interligação entre os três conceitos promove o bom
funcionamento do ambiente. L6 argumenta que a promoção da EA, da complexidade
e da sustentabilidade está vinculada a ações sociais, ambientais e morais, através da
educação do ensino. L7 entende que os três conceitos se correlacionam entre si
através de práticas ambientais que se propõem a melhorar o ambiente. Os
argumentos apresentados pelos licenciandos apesar de mostrarem articulação entre
os termos, e citarem aspectos sociais e ambientais, permanecem impregnados pelo
paradigma da simplificação, que carrega em si mesmo a disjunção, a redução e a
abstração (MORIN, 2007).
103
A unidade de análise “Educação ambiental como veiculadora” emerge das falas
de L9, L11, L12, L13, L15, L18 e L19, tomam a EA como a responsável por ensinar
conceitos, explicar os fenômenos, os métodos, tomemos como exemplo as falas de
L9 e L15:
Mediante o ensino em educação ambiental, promover ações que sejam capazes de sensibilizar pessoas de forma clara, objetiva, problematizando a nossa realidade em busca de soluções e participação ativa objetivando um planeta sustentável, a partir das ações de cada pessoa (L9). A educação ambiental como disciplina pode oferecer bases para que os indivíduos compreendam a importância da sustentabilidade ambiental para a manutenção da vida e também transmitir conhecimentos sobre as complexas relações existentes na natureza, o que pode nortear iniciativas que contribuam para a preservação e manutenção desses ambientes (L15).
Nas falas de L9 e L15 o discurso enfatiza o comportamento individual e de
caráter naturalista, mesmo quando L15 mencione as complexas relações existentes
na natureza. Morin (2005a) nos lembra que o saber fragmentado e compartimentado
não permite que os seres humanos consigam religar os fatos, as situações, os
contextos e as ações. A humanidade tem avançado na compreensão e conhecimento
das partes, as especializações contribuíram para esse fato. No entanto, ela
permanece ignorante na compreensão das inter-relações humanas, ser humano e
natureza, e as relações sociopolíticas e econômicas que nos são impostas. Esse
modelo não promove o entendimento necessário para que possamos pensar e agir
em prol da sustentabilidade planetária.
Precisamos de um novo saber ambiental, que contemple a problematização do
conhecimento fragmentado, das partes, que possa permitir a construção de campos
de conhecimentos teóricos e práticos que consiga religar as relações entre sociedade
e natureza (LEFF, 2008).
A dificuldade imposta pelo modelo cartesiano-newtoniano de pensar, nos
impede de estabelecer relações entre as complexidades que compõem o mundo em
que vivemos. Impossível pensar fenômenos complexos como o ensino, a
aprendizagem, os processos avaliativos, o conhecimento, e as práticas inerentes à
EA sob a ótica de princípios simplificadores e reducionistas. A complexidade comporta
a incompletude e a incerteza (MORIN, 2008), nesse contexto a EA deve levar os
alunos a aprenderem a dialogar com as incertezas, percebendo os antagonismos, as
ambivalências, o tecido comum, “o diálogo entre as partes e o todo, reconhecendo a
104
inseparabilidade sujeito/objeto, na qual ambos coevoluem naturalmente, imbricados
um no outro à medida que a realidade se transforma” (MORAES, 2015, p.60).
3.4 Sugestões de melhorias da prática docente em educação ambiental
A categoria “Sugestões de melhorias da prática docente em educação
ambiental” teve como propósito sabermos se os professores e licenciandos
conseguiam fazer uma reflexão sobre as próprias concepções e práticas. E a partir
dessa reflexão proporem melhorias para as limitações encontradas na realização de
atividades relativas à EA.
Quadro 10 Sugestões de melhoria da prática docente em Educação Ambiental
Categoria Unidades de análise
Docentes Licenciandos
EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Sugestões de melhoria da prática
docente em Educação Ambiental
Formação docente (continuada).
Implantação de composteira e horta na escola.
Formação docente (inicial).
Palestras e publicações.
Atividades de campo.
Projetos.
Educação e mobilização.
Fonte: Elaborado pelo autor da tese
A unidade de análise “Formação docente (continuada)” emergiu da fala de P2,
que argumenta sobre a formação e a flexibilidade no currículo para se trabalhar a EA;
e P4 que coloca a formação como primeira e única sugestão:
Eu acho que primeiro tinha que ter capacitação pro (sic) professor, primeiro, trabalhar com o professor, o professor fazer cursos, especialização, capacitação, alguma coisa do tipo. Primeiro tinha que trabalhar o professor, depois, que o professor tiver capacitado pra isso é que ele vai trabalhar com os alunos, eu entendo dessa forma (P4).
As falas de P2 e P4 sobre a formação docente são validadas pelas ideias de
autores como Guimarães (2007), Reigota (2010), Medina (2001) e Layrargues (2012),
quando tratam dos aspectos da fragilidade da EA no âmbito escolar e que
possivelmente estão vinculados à formação inadequada dos professores para se
trabalhar as questões relativas ao meio ambiente em salas de aulas.
105
Assim, as propostas de formação docente deveriam contemplar além dos
aspectos teóricos e metodológicos inerentes à área da EA, favorecer os debates e as
discussões em torno do paradigma cartesiano e da complexidade. Desse modo, os
espaços de reflexão em torno da maneira como o ser humano pensa e age sob a
lógica dos paradigmas vigentes seria um locus de ressignificação de conceitos. Por
fim, deveria se proporá realizar mudanças no modo de pensar docente, dando-lhe
condições de promover uma EA que pudesse contribuir na formação das consciências
ecológicas dos alunos, contextualizando todas as questões da sociedade, inclusive a
exploração humana, as desigualdades e a concentração de renda.
A unidade de análise “Implantação de composteira e horta na escola”, emergiu
das falas de P1: “A primeira coisa era tornar a escola sust... autossustentável com
relação a todos os resíduos que é (sic) produzido aqui na escola, é... resto de alimento,
é... a gente ter um... uma composteira orgânica”; e, P2: “Olhe deixe eu dizer uma coisa
assim, que eu acho importante que não tem, aqui na escola tinha uma horta”. Os
argumentos de P1 são de que a escola deveria se tornar sustentável; enquanto P2
defende a ideia de que a construção de uma horta na escola promoveria o
engajamento dos alunos; melhoraria da indisciplina e do comportamento dos alunos;
e, do rendimento escolar.
Quanto aos licenciandos as unidades de análise versam sobre formação
docente (inicial); palestras e publicações; atividades de campo; projetos; e, educação
e mobilização.
A unidade de análise “Formação docente (inicial)” emergiu das falas de L1, L3,
L4, L6, L8, L12, L13 e L15, e enfatiza a importância da formação nas escolas e na
universidade. Tomemos por exemplo as falas de L1: “[...] temática relevante, mas não
tive a oportunidade de vê-la sendo discutida”; L4: “No nível superior, pois os conteúdos
voltados para essa área são pouco explorados”; e, L6: “Formação de cunho teórico,
pois não é fácil entender e relacionar sustentabilidade e complexidade”. A seguir as
falas de L12, L13 e L15 que tratam especificamente da formação inicial:
Na graduação ainda não presenciei nenhuma disciplina que aborde a educação ambiental, seria conveniente abordar seminários e palestras voltadas ao tema (L12). Disciplinas eletivas ou obrigatórias na grade do curso (muita das vezes há alunos com brilhantes projetos a serem colocados em prática mas não há quem o (sic) oriente (L13).
106
Tem que começar pela universidade, já que a educação ambiental, pelo menos no curso de Biologia da UFAL, foi pouco trabalhada e as práticas na área tem (sic) que ser mais frequentes, pois o biólogo tem a responsabilidade perante a sociedade de educar os indivíduos e cultivar essa consciência ambiental (L15).
O diagnóstico relatado por L12, L13 e L15 apresenta uma lacuna na formação
dos licenciandos em ciências biológicas para atuar com as questões relativas à EA.
Esse diagnóstico ratifica o perfil dos docentes quando relatam que durante seus
cursos de graduação não tiveram suporte para trabalhar com EA na escola; e com
falas de P2 e P4 discutidas anteriormente, quando ressaltaram a importância da
formação docente (continuada) em EA como uma das possibilidades de melhoria de
suas práticas; endossando as falas dos autores Guimarães (2007), Reigota (2010),
Medina (2001) e Layrargues (2012), citados anteriormente.
A unidade de análise “Palestras e publicações” emerge das falas de L16 e L20,
e tratam da importância dos docentes e licenciandos participarem de palestras e
realizarem publicações na área de EA; essas duas ações contribuem para a fortalecer
o campo da EA escolar.
A unidade de análise “Atividades de campo” emergiu das falas de L7, L14 e
L18, que entendem as atividades de campo, como visitas a lixões e reservas
ecológicas, levam os alunos a respeitarem o meio ambiente, “Pois fazem o aluno sentir
a verdadeira realidade, da poluição, dos moradores que catam, de que é necessário
produzir menos lixo” (L14).
Ressaltamos que tais atividades são importantes e necessárias, contudo elas
não levam necessariamente à aprendizagem, à reflexão e às mudanças de hábitos,
pelo simples fato de se colocar os alunos em contato com a “realidade”. Por outro
lado, podem reforçar a ideia de que o meio ambiente é algo que está fora, e nós vamos
lá conhecer, a “realidade”, que é o meio ambiente, que está nos lixões e nas reservas;
podendo ainda se tornarem em meros passeios turísticos.
Essas atividades podem ser bastante proveitosas quando calcadas na reflexão,
na visita aos ambientes como levantamento de situações para estudos, ou
constatação de construções teóricas desenvolvidas em sala de aula.
A unidade de análise “Projetos” emergiu das falas de L2, L9 e L19, que propõem
os projetos de extensão na universidade, e o desenvolvimento de projetos de trabalho
no ambiente escolar. Essas sugestões de fato contribuem para a melhoria das práticas
docentes em EA. Os projetos de extensão, por contemplarem a pesquisa e o ensino,
107
constituem campo bastante fecundo para o desenvolvimento das reflexões, estudos e
publicações de trabalhos na área da EA.
Entendemos os projetos de trabalho na perspectiva de Hernández (1998),
como um planejamento de ensino e aprendizagem em que as concepções de escola
valorizam não somente as estratégias cognitivas, mas principalmente os papeis que
os professor e alunos desempenham. Neles os estudantes são os responsáveis por
suas próprias aprendizagens, e os professores são mediadores desse processo.
Zabala (2002) classifica os projetos de trabalho como métodos globalizantes,
uma vez que consideram a maneira como as disciplinas se relacionam, um ensino não
disciplinar, visto que os conteúdos de aprendizagem não se apresentam nem se
organizam a partir de nenhuma disciplina. Entretanto os discursos relatados sobre a
realização de projetos não parecem comungar com Hernández (1998) e Zabala
(2002).
A unidade de análise “Educação e mobilização” emergiu das falas de L5, L10,
L11 e L17 e falam de uma educação para o meio (preservação); mobilização dos
professores da educação básica para desenvolverem projetos de EA; um convite aos
professores para que eles possam mobilizar seus alunos com dinâmicas
diferenciadas.
Face o exposto, as reflexões em torno das sugestões de melhorias das práticas
docentes em EA, assinalam uma grande ênfase na formação dos professores. Esse
fato poderá preencher uma lacuna nas atividades dos professores, contribuindo para
minorar suas fragilidades, uma vez que pode promover a construção de conceitos
específicos e propor reformas na maneira de pensar. Desse modo o ambiente escolar
poderá se tornar espaço fértil na formação de indivíduos comprometidos com a
sustentabilidade planetária.
São de extrema relevância as sugestões apresentadas pelos licenciandos,
sobretudo as que foram abordadas nas unidades de análise “Palestras e publicações”
e “Projetos”, pois aparecem como estratégias que favorecem e contribuem para uma
formação crítica e transformadora.
108
3.5 Sugestão de Oficina de Formação Docente (OFD)
Inspirados em autores, como Guimarães (2007), Reigota (2010), Medina (2011)
Layrargues (2012) e outros que propõem a necessidade de formação de educadores
ambientais, elaboramos e realizamos uma Oficina de Formação Docente (OFD) com
os docentes e licenciandos participantes da pesquisa. Acreditamos se tratar de uma
contribuição à ressignificação das concepções docentes e consequentemente poder
contribuir em suas futuras práticas em sala de aula.
A OFD foi realizada através da Sequência Didática Interativa (SDI), com as
temáticas sustentabilidade e complexidade, com o intuito de oferecermos subsídios
aos licenciandos e docentes, nos aspectos teóricos e metodológicos, para futuras
práticas docentes em EA.
Todos os sujeitos envolvidos na pesquisa foram convidados19, através de e-
mail, para participar da OFD. Foi realizada em abril de 2016, e teve a duração de
quatro horas, ao término, os participantes tiveram direito a um coffee break e a
certificados, emitidos pela Coordenação do Curso de Biologia Licenciatura e o PIBID.
A programação20 da OFD foi construída com base nas respostas do CHD e dos
questionários abertos aplicados aos licenciandos, especificamente sobre o que eles
entendiam sobre o que era sustentabilidade e complexidade ambiental. Dividimos a
OFD em três momentos, no primeiro trabalhamos o contexto, a definição e os
fundamentos da SDI (Oliveira, 2013); no segundo realizamos uma SDI com a temática
“Sustentabilidade e Complexidade Ambiental”, e, no terceiro, realizamos uma roda de
conversa sobre os conceitos de sustentabilidade e complexidade ambiental; partindo
da definição final, construída durante a SDI e com os fundamentos de um recorte de
um artigo científico de Araújo (2016, no prelo). Por fim aplicamos um questionário
aberto para avaliar a experiência vivenciada.
19 Convite na íntegra no Apêndice C, página 128. 20 O Roteiro da OFD na íntegra no Apêndice D, página 129.
109
CONCLUSÃO _______________________________________________________________
“Não serei um poeta de um mundo caduco. Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros. Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles considero a enorme realidade. O tempo é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas”.21
Durante o período em que realizamos esta investigação tivemos a oportunidade
de ler, refletir e reler. Um processo contínuo que nos levou às reflexões,
conhecimentos e descobertas à medida em que a problemática de pesquisa e os
objetivos iam tomando forma. A busca por referenciais teóricos que estabelecessem
conexões entre EA, sustentabilidade e complexidade se tornou um desafio, pois na
grande maioria das vezes o que encontrávamos eram materiais que tratavam das
temáticas em separado.
A fundamentação teórica desta tese foi construída com o propósito de
caracterizar a EA vivenciada na escola, tomando como parâmetros a sustentabilidade
e a complexidade. Nossos objetos de estudos foram as concepções e atividades dos
professores que foram ou estavam sendo desenvolvidas sobre EA, sustentabilidade e
complexidade no âmbito escolar.
Nosso ponto de partida foi a problemática: quais eram as concepções e as
atividades docentes de educação ambiental, sustentabilidade e complexidade que
estavam sendo trabalhadas em escolas da educação básica do agreste alagoano; e
quais seus possíveis impactos na formação de sujeitos críticos e transformadores?
De antemão já sabíamos que as escolas, de um modo geral, já desenvolviam
algum tipo de atividade em EA. Desse modo, objetivamos analisar as concepções e
ações docentes de educação ambiental, sustentabilidade e complexidade visando
oferecer subsídios para uma prática crítico-transformadora.
Para viabilizar a problemática e o objetivo geral da tese elaboramos três
objetivos específicos: 1) Identificar as concepções docentes de educação ambiental,
sustentabilidade e complexidade que estão sendo vivenciadas em escolas da
educação básica do agreste alagoano; 2) Diagnosticar as atividades de educação
ambiental que estão sendo trabalhadas em escolas da educação básica do agreste
21 ANDRADE, Carlos Drummond de. Mãos dadas. (2008).
110
alagoano; e, 3) Inferir sobre a formação de sujeitos críticos e transformadores a partir
das atividades e concepções docentes diagnosticadas e identificadas.
Tal problemática e objetivos servirão de mote para nossas reflexões nesse
texto de conclusão, que não se esgota em si mesmo, pois trata do nosso olhar, diante
desse ciclo investigativo que se encerra, um contexto complexo e preenchido de
incertezas, que muda a cada instante, num eterno vir a ser, nós, os sujeitos
participantes da pesquisa, o ambiente e a sociedade.
As concepções docentes que estavam sendo trabalhadas nas escolas
pesquisadas foram agrupadas em três categorias: educação ambiental,
sustentabilidade e complexidade.
Quanto à EA as concepções identificadas versam sobre teoria, prática,
preservação, conservação, ensino, educação, vivências, preparação, orientação,
comportamento, conscientização, sensibilização, cuidar do meio e educação para o
trânsito e lixo. Os sujeitos da pesquisa apresentaram concepções com foco no caráter
intervencionista, naturalista, individual, disciplinar e comportamental da educação
ambiental.
Havendo entre algumas, a exemplo de, preservação e conservação,
conscientização e sensibilização, e instrução/orientação e educação falta de clareza
e compreensão conceitual dos termos/conceitos, não os distinguindo-os, sendo
tomados um pelo outro. Os enfoques comportamental e individual revelam visões
fragmentadas e descontextualizadas de EA, centradas no ensino disciplinar e
cartesiano.
Os sujeitos pesquisados não citam: leis, tratados e documentos de referências
para a EA; a construção de valores e atitudes; a interdisciplinaridade e os aspectos
históricos. Também não fazem nenhuma menção aos aspectos sociais, políticos,
econômicos e culturais, desconsideram os contextos e as relações com o global e o
multidimensional.
Quanto à sustentabilidade as concepções identificadas foram práticas, ações,
estratégias, mecanismos, meios, métodos, técnicas, recursos naturais, atitudes e
cuidados com o meio ambiente, garantia para as gerações futuras, algo que se
mantém e se sustenta, reciclar, preservar, reutilizar e usar a matéria de forma
consciente. As concepções dos professores/licenciandos revelam um conceito de
sustentabilidade centrado nos aspectos do ambiente e da natureza. Embora tenham
havido relatos de preocupação com as gerações futuras, eles não esclarecem como
111
ser sustentável e não promover a exploração, a injustiça social, a exploração dos
seres humanos e a degradação da natureza.
Ao falarem de desenvolvimento não fazem referências à complexidade,
enfatizam apenas aspectos ecológicos e ambientais da sustentabilidade, não
mencionam as relações de consumo e destruição da biodiversidade. Um discurso que
contribui para a manutenção da crise ecológica, pois não propõe um conceito de
sustentabilidade voltado para a construção de um mundo mais igual, com justiça
social.
Enfim, as concepções abordam aspectos técnicos da sustentabilidade, como
manejo do meio ambiente. Uma perspectiva tecnicista da sustentabilidade, que se
distancia de uma proposta de ensino e aprendizagem, com foco na formação cidadã,
considerando a condição histórica, social, cultural e política dos seres humanos.
Quanto à complexidade as concepções identificadas abordam sobre junção,
complicado, nunca li/vi, não sei/não tenho ideia, profundo, abrangente, trabalhoso,
níveis de organização, vários fatores envolvidos e interligados, estudo e
conhecimento, sistema, cadeia, fatores e interação e tipos de ambiente. Parte dos
sujeitos pesquisados não conhecem o conceito de complexidade; outros associam o
termo à completude, a complicado, a junção, estudo profundo, corroborando com os
mal-entendidos que são associados à complexidade (MORIN, 2008).
Destacamos ainda a confusão conceitual em relação à associação do conceito
de complexidade com complicado e níveis de organização biológica dos seres vivos.
As concepções que conseguiram associar a complexidade a vários fatores,
contemplando os fatores bióticos e abióticos, não conseguem inserir em seus
discursos as questões sociais, econômicas e políticas, quando se tratada de
complexidade e meio ambiente.
Entre as concepções em apenas uma há indícios do aspecto da complexidade
e das questões sociais, as demais tiveram seus focos nas questões físicas e
ecológicas do meio ambiente. Essa incompreensão ou ausência de conhecimento da
complexidade na esfera da EA se apresenta como um obstáculo à realização de
discussões e entendimentos das reais condições das questões ambientais. Portanto,
não favorece a compreensão do mundo nem a busca de soluções para se resolver a
crise ecológica.
As concepções identificadas acima, sobre educação ambiental
sustentabilidade e complexidade, não oferecem subsídios aos professores para que
112
eles possam exercer seu ofício de maneira intencional, rompendo os limites da
disciplinaridade, se apropriando de metodologias que promovam a formação de
sujeitos críticos e transformadores.
O diagnóstico das atividades docentes que foram ou estavam sendo
trabalhadas nas escolas pesquisadas foram as seguintes: não realizam, atividades e
oficinas do PIBID, trabalhos, projetos, vinculadas a conteúdos ou atividades do livro
didático, campanhas e passeatas na sociedade. Ao afirmarem que não realizam
atividades em EA, os sujeitos pesquisados demonstram desconhecer ou não seguir
as recomendações da legislação e documentos que tratam da EA. Ela deve estar
inclusa no espaço escolar de forma integrada e contínua em todos os níveis de
escolaridade, e seu ensino deve ocorrer de forma articulada, transversal e
interdisciplinar (BRASIL, 1999).
No rol dos que realizam ou realizaram atividades em EA, destacamos que as
mesmas aparecem de forma pontual e esporádico durante o ano letivo, abordam
assuntos específicos e não conseguem mobilizar ações concretas no meio
socioambiental. O enfoque das atividades estava relacionado com as relações entre
os seres humanos e a natureza, de cunho comportamental, que não promovem a
reflexão, nem a formação de atitudes ecologicamente sustentáveis.
Contudo destacamos que as atividades desenvolvidas no âmbito do PIBID,
facultando aos licenciandos e docentes a oportunidade de participar e realizar
experiências metodológicas diferenciadas, criativas e inovadoras. Outras atividades
merecem menção, como, as oficinas para realização de sabão e as hortas, que se
caracterizam como atividades práticas e envolventes, mas que foram realizadas sem
oportunizar o momento para a realização de reflexões e formação crítica dos alunos,
focaram-se apenas nos aspectos meio ambiente e natureza.
As atividades realizadas na esfera da pesquisa acadêmica fortalecem a
pesquisa no campo da EA. Entretanto, foram centradas na realização de TCC e não
de pesquisas no âmbito da formação dos alunos das escolas. Por fim, podemos inferir
que as atividades relatadas pelos sujeitos da pesquisa impossibilitam a formação de
sujeitos críticos e transformadores, pois as mesmas não levam em consideração a
contextualização, a interdisciplinaridade e os aspectos social, econômico e político
das relações humanas com o meio ambiente.
Nesse sentido, podemos inferir que as concepções docentes e as atividades
desenvolvidas nas escolas pesquisadas pouco podem contribuir para a formação de
113
discentes críticos e transformadores. Por serem pautadas no modelo cartesiano, os
docentes e licenciandos contribuem para a manutenção da crise ecológica, visto que
suas concepções e atividades em EA e sustentabilidade caminham à margem dos
aspectos sociais, culturais, políticos e econômicos. E não promovem ação-reflexão-
ação; não contemplam a complexidade; não assumem o caráter político, protagonista
e socioambiental; não reflete no campo metodológico as intenções educativas de
formar indivíduos críticos e transformadores.
Face ao exposto concluímos que nossos objetivos de pesquisa foram
alcançados. Entretanto, a título de contribuições desejamos saber de que maneira os
sujeitos pesquisados conseguiam articular as três categorias teóricas desta tese:
educação ambiental, sustentabilidade e complexidade; e quais as sugestões de
melhorias da prática docente eles propunham.
Em relação às articulações entre as categorias teóricas, os docentes e
licenciandos falaram sobre tudo ligado e interligado, EA e sustentabilidade,
relacionados e EA como veiculadora. De modo geral os sujeitos pesquisados não
conseguiram articular os três conceitos. E um número expressivo de participantes não
respondeu à essa questão, ou deram respostas evasivas.
Percebemos uma dificuldade em articular os conceitos de forma clara,
coerente, contextualizada e complexa. Donde concluímos que os docentes e
licenciandos possuem um modo de pensar centrado no paradigma cartesiano, fruto
de seus processos formativos e experiências. Todavia, quando conseguem articular
os três termos só articulam aspectos sociais e ambientais, novamente uma limitação
imposta pelo modelo cartesiano, que não permite a contextualização e a religação de
saberes e fatos, situações e demais temas relacionados às questões ambientais.
O diagnóstico dessa dificuldade dos docentes e licenciandos sinaliza para a
impossibilidade de formar indivíduos críticos e transformadores na perspectiva do
pensamento cartesiano, simplificador e disciplinar.
Em relação às sugestões de melhorias das práticas docentes os sujeitos da
pesquisa falam em formação docente, implantação de composteira e horta, palestra,
publicações, atividades de campo e projetos. Entre as proposições estão aquelas que
tratam de aspectos metodológicos/práticos, como a implantação de composteira e
horta na escola, que podem se tornar significativas desde que sejam vivenciadas
enfatizando outros aspectos a elas relacionadas, que promovam o diálogo crítico e a
formação de indivíduos pensantes.
114
Outras sugestões podem proporcionar melhorias nas relações de ensino e
aprendizagem da EA na escola, pois fortalecem o campo da pesquisa (palestras e
publicações) e favorecem a formação de indivíduos críticos e transformadores
(projetos).
Por fim, a formação de professores, inicial e continuada, aparece como um
dado bastante expressivo na fala dos entrevistados, sinalizando para uma lacuna
existente na história de vida dos docentes e licenciandos. Isto justifica, em parte, o
modelo fragilizado das atividades de EA que são desenvolvidas nas escolas.
Concluímos que há muito a ser feito no campo da formação de professores
para trabalhar a EA, pois modificar estruturas de pensamento requer esforço
individual, às custas de estudo, reflexão, e desconstrução de modelos cristalizados
em nossa maneira de pensar, sentir, ver, falar e agir. Contudo cremos no caráter da
incompletude humana, donde podem surgir as transformações tão necessárias e
urgentes.
Uma formação docente para trabalhar a EAE que aqui propomos requer
preparação do professorado, uma preparação inclusive em direção a si mesmos, pois
é no ser humano que reside a semente da mudança, que desperta e no encontro com
o outro encontra campo fértil para a construção de um Planeta sustentável.
O desafio é grande, mas nossas reflexões continuam a nos impulsionar, pois
no percurso desta investigação momentos tivemos em que depoimentos nos
encorajaram e nos lembraram o quanto ainda temos muito a fazer. Certa ocasião, P2
olhou para mim, com emoção na voz e me disse:
[...] a essas alturas está muito difícil dar aula, muito difícil ser professor, não sei se é por que (sic) eu já tô (sic) esse tempo todo, não sei... E assim professor eu posso não saber falar bonito, alguma coisa, mas assim... uma coisa que eu faço muito, quando eu quero fazer uma coisa eu vou lá, eu vou pesquisar eu faço, sabe (P2).
O que responder a essa professora “quando diz que está muito difícil dar aula”?
Ainda não sei. Das poucas certezas que tenho, diante destas palavras derradeiras é
a de que este estudo pode contribuir para a reflexão sobre futuros processos de
formação de professores que desejam trabalhar com questões ambientais.
Um convite à boniteza que é ser professor, gente que gosta de gente, e se
propõe a formar gente.
115
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116
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123
APÊNDICE A – Roteiro das entrevistas
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO – UFRPE
Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação - PRPPG
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DAS CIÊNCIAS – PPGEC
SUSTENTABILIDADE E COMPLEXIDADE: OBSTÁCULOS, DESAFIOS E
POSSIBILIDADES NO ÂMBITO DA PRÁTICA DOCENTE EM EDUCAÇÃO
AMBIENTAL
Adelmo Fernandes de Araújo
Roteiro das entrevistas em três momentos, o primeiro momento tem como
objetivo a elaboração de um perfil dos professores, que será construído com base nas
respostas das seguintes perguntas:
1. Sexo?
2. Idade (20 e 30) / (30 a 40) / (40 a 50)?
3. Qual a sua formação inicial/graduação?
4. Em que área participou de cursos de pós-graduação (especialização,
mestrado, doutorado)? Especificar e justificar a escolha do curso.
5. Quantos anos de experiência de prática docente? Especificar as disciplinas
ministradas e as séries.
6. Disciplina(s) que leciona no momento.
7. Trabalha em quantas escolas e quais períodos? Especificar se as
escolas/colégios são da rede estadual, municipal e/ou particular.
8. A sua formação inicial lhe deu suporte para trabalhar Educação Ambiental?
9. Já participou ou participa de formação continuada? Especificar tempo, local
e quem promoveu(ve) esse processo de formação.
No segundo momento buscaremos identificar as concepções dos professores
quanto aos conceitos de sustentabilidade, complexidade e educação ambiental, e será
124
realizado através da técnica do CHD. Para a realização das entrevistas, no CHD,
seguiremos o seguinte roteiro:
1. O que você entende por sustentabilidade ambiental?
2. O que você entende por complexidade ambiental?
3. O que você entende por educação ambiental?
4. Estabeleça relações entre os conceitos de sustentabilidade ambiental,
complexidade ambiental e educação ambiental.
Por fim, terceiro momento, solicitaremos aos professores que respondam a
duas perguntas:
1. Atualmente como você trabalha as questões de educação ambiental em sua
prática docente? (especificar em sua resposta conteúdos, estratégias de
ensino e avalição).
2. Apresente sugestões para a melhoria da prática docente em
educação ambiental, principalmente para se trabalhar o tema
“sustentabilidade e complexidade”.
125
APÊNDICE B – Questionário aplicado aos licenciandos
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO – UFRPE
Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação - PRPPG
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DAS CIÊNCIAS – PPGEC
Prezados(as) alunos(as) do curso de Biologia Licenciatura, da Universidade
Federal de Alagoas – Campus Arapiraca,
Este questionário é parte integrante de uma pesquisa que irá compor uma tese
de Doutorado em Ensino de Ciências da Universidade Federal Rural de Pernambuco
(UFRPE). Sua participação nos ajudará a esclarecer questões relativas à prática
docente em Educação Ambiental, Sustentabilidade Ambiental e Complexidade
Ambiental.
Agradecemos suas contribuições.
Questionários Aberto
1. Sexo? ________________
2. Idade (20 e 30) / (30 a 40) / (40 a 50)? __________________
3. Atualmente está cursando que período do curso de Biologia Licenciatura?
_________________________________________________________
4. A sua graduação lhe deu algum suporte para trabalhar Educação Ambiental?
(especificar disciplinas, projetos, extensão).
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
126
5. Você tem alguma experiência com a prática docente? (especificar nível de ensino,
disciplina lecionada, série, tipo de escola/colégio).
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
6. O que você entende por sustentabilidade ambiental?
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
7. O que você entende por complexidade ambiental?
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
8. O que você entende por educação ambiental?
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
127
9. Estabeleça relações entre os conceitos de sustentabilidade ambiental,
complexidade ambiental e educação ambiental.
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
10. Você já desenvolveu ou desenvolve alguma atividade em educação ambiental?
(especificar em sua resposta conteúdos, estratégias de ensino e avalição).
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
11. Apresente sugestões para a melhoria da prática docente em educação ambiental,
principalmente para se trabalhar o tema “sustentabilidade e complexidade”.
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
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APENDICE D – Roteiro da Oficina de Formação Docente (OFD)
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO – UFRPE
Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação - PRPPG
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DAS CIÊNCIAS – PPGEC
OFICINA DE FORMAÇÃO DOCENTE
Sequência Didática Interativa (SDI)
Prof. Me. Adelmo Fernandes de Araújo
1. Contextualização, justificativa e boas vindas:
2. Atividade 1: Dinâmica: Desatando o nó humano. Objetivo: Compreender o processo vivido na solução de um determinado problema. Criar novas expectativas com relação a algum problema de difícil solução.
3. Atividade 2: Exposição dialogada.
Objetivo: Introduzir os participantes numa reflexão sobre o contexto e a definição de Sequência Didática Interativa (SDI).
4. Atividade 3: Realização de uma SDI.
Objetivo: Realizar uma SDI com uma temática de educação ambiental.
Etapas: Respostas individuais. Respostas em grupo. Respostas em grupo líderes (construção de uma definição) e atividade nos
grupos origem. Socialização e reconstrução da definição.
5. Atividade 4: Exposição dialogada.
Objetivo: Introduzir os participantes numa reflexão sobre a temática de educação ambiental e a definição construída durante a SDI.
6. Reflexões finais, agradecimentos e disponibilidade para novos desafios.
7. Coffee break.
130
APÊNDICE E – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO – UFRPE
Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação - PRPPG
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DAS CIÊNCIAS – PPGEC
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Convidamos o (a) Sr. (a) para participar da Pesquisa “Concepções de ações docentes
de educação ambiental, sustentabilidade e complexidade no contexto escolar”, sob a
responsabilidade do pesquisador/professor Me. Adelmo Fernandes de Araújo. A
pesquisa pretende analisar as concepções e ações docentes da rede pública de
Arapiraca e dos licenciandos do curso de Biologia Licenciatura (UFAL/ Campus
Arapiraca), inferindo seus impactos na formação de sujeitos críticos e
transformadores.
Sua participação é voluntária e se dará através da realização de entrevistas,
responder questionário e participar de oficinas de formação. Desse modo, o (a) Sr. (a)
contribuirá como parte de uma pesquisa de Doutorado, bem como para o
aprofundamento dos estudos na área permitindo um olhar diferenciado da temática
no ensino e aprendizagem de educação ambiental.
Se depois de consentir em sua participação o Sr. (a) desistir de continuar participando,
tem o direito e a liberdade de retirar seu consentimento em qualquer fase da pesquisa,
seja antes ou depois da coleta dos dados, independente do motivo e sem nenhum
prejuízo a sua pessoa. O (a) Sr (a) não terá nenhuma despesa e também não receberá
nenhuma remuneração. Os resultados da pesquisa serão analisados e publicados,
mas sua identidade não será divulgada, sendo guardada em sigilo.
Para qualquer outra informação, o (a) Sr. (a) poderá entrar em contato com o
pesquisador no endereço eletrônico araú[email protected], pelos telefones: (82)
99803-1470, ou ainda poderá entrar em contato com o local de trabalho do
pesquisador/professor na Universidade Federal de Alagoas – Campus Arapiraca, na
Avenida Manoel Severino Barbosa, S/N, Bom Sucesso, 57309-005, Arapiraca – AL,
Brasil.
131
Eu, ______________________________________________________________, fui
informado sobre o que o pesquisador quer fazer e porque precisa da minha
colaboração, e entendi a explicação. Por isso, eu concordo em participar da pesquisa,
sabendo que não vou ganhar nada e que posso sair quando quiser. Este documento
é emitido em duas vias que serão ambas assinadas por mim e pelo pesquisador,
ficando uma via com cada um de nós.
Arapiraca, ____/ ____/ 2016
___________________________________
Assinatura do Participante
___________________________________
Assinatura do Pesquisador