cleyton miranda barros gestÃo de empreendimentos … · a idéia de economia solidária reflete...
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CENTRO FEDERAL DE EDUCACAO TECNOLOGICA DA BAHIA
CLEYTON MIRANDA BARROS
GESTÃO DE EMPREENDIMENTOS SOLIDÁRIOS
SALVADOR – 2003
CLEYTON MIRANDA BARROS
GESTÃO DE EMPREENDIMENTOS SOLIDÁRIOS
Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Administração pelo Centro Federal de Educação Tecnológica da Bahia, sob orientação do Professor Doutor Nilton Vasconcelos.
CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DA BAHIA SALVADOR - 2003
“(...) é possível construir circuitos
eficientes de economia não-
capitalista no transcurso da
prolongada marcha histórica que
permitira ao ser humano – no
tempo e no ritmo que se
mostrarem adequados – depositar
a mentalidade possessiva que é
própria do capitalismo na mesma
prateleira em que estão arquivados
o feudalismo e a escravidão”.
Luiz Inácio Lula da Silva
AGRADECIMENTO
Agradeço a Deus,
Em quem confio e entrego a minha vida.
A minha família,
Que tem sido a minha fonte de motivação.
Aos colegas do CEFET/Ba,
Especialmente a André, Cristiane, Flavia e Siomar,
Pessoas com quem mais aprendi durante o curso.
Aos bons professores do CEFET/Ba,
Que desenvolvem seriamente o seu trabalho e
Encaram o magistério como uma vocação.
Em especial à Professora Lívia Simões.
E a todas as pessoas que contribuíram direta ou
Indiretamente para a realização deste trabalho.
RESUMO
Esta monografia tem o objetivo de identificar os desafios da gestão dos empreendimentos situados no campo da economia solidária, a partir do estudo de caso de uma cooperativa popular de um bairro periférico de Salvador. Inicialmente foi realizada uma incursão pelo trabalho de diversos autores no sentido de melhor compreender o significado particular da economia solidária, os seus espaços se articulação e a natureza das organizações a ela pertencentes. A seguir, foi desenvolvido um esforço para tentar compreender as dificuldades vividas por esses empreendimentos a partir da experiência da Coofe, Cooperativa Múltipla Fontes da Engomadeira, cooperativa de caráter popular dedicada à fabricação e comercialização de pães, situada num bairro periférico de Salvador. A partir da análise de fontes secundárias, do acompanhamento do empreendimento e da realização de entrevistas entres os cooperativados, constatou-se que o empreendimento vem enfrentando dificuldades que ameaçam seriamente a sua sobrevivência.
SUMÁRIO
1.0 INTRODUÇÃO 06
2.0 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 09
2.1 Economia Solidária 09
2.2 Economia Solidária no Brasil 14
2.3 Empreendimentos Solidários 17
2.4 Gestão de Empreendimentos Solidários 19
3.0 A COOFE E OS SEUS DESAFIOS DE GESTÃO 25
3.1 Histórico 25
3.2 A Visão do Negócio 26
3.3 O Perfil dos Cooperados 27
3.4 A Divisão do Trabalho 28
3.5 A Divisão das Sobras 29
3.6 O Aprendizado da Produção Coletiva 30
3.7 A Autogestão do Empreendimento 31
3.8 O Conhecimento Gerencial 33
3.9 O Conhecimento Técnico da Produção 34
3.10 O Modelo de Gestão 36
3.11 O desafio Mercadológico 37
3.12 O Processo de Comunicação 38
5.0 CONCLUSÃO 40
6.0 REFERÊNCIAS 44
8
1.0 INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, em decorrência das freqüentes crises econômicas que
tem atingido diferentes partes do mundo, temos assistido à proliferação de
iniciativas autônomas de grupos populares organizados na sociedade civil,
visando a produção de atividades econômicas com características diferentes
daquelas praticadas pelo mercado.
A esse conjunto de iniciativas convencionou-se chamar de Economia
Solidária, um modo de produção e distribuição alternativo ao capitalismo, criado e
recriado periodicamente pelos que se encontram ou temem ficar marginalizados
pelo mercado de trabalho. A economia solidária casa o princíp io da unidade entre
a posse e o uso dos meios de produção e distribuição, e sua unidade típica é a
cooperativa de produção, cujos princípios organizativos são: posse coletiva dos
meios de produção pelas pessoas que os utilizam para produzir; gestão
democrática da empresa por participação direta ou por representação; repartição
da receita líquida entre os cooperativados por critérios aprovados após discussões
e negociações entre todos; destinação do excedente (denominado sobras)
também por critérios acertados entre todos os cooperados.
O empreendimento solidário pode ser descrito como sendo uma forma de
expressão da economia solidária que pode assumir um formato de cooperativa,
empresa autogestionária, rede e outras formas de associação para produção de
bens ou prestação de serviços.
A gestão de empreendimentos solidários é o tema desenvolvido neste
trabalho, que tem o objetivo de identificar os principais desafios de gestão
enfrentados pela Coofe – Cooperativa Múltipla Fontes de Engomadeira.
As dificuldades de gestão enfrentadas pelos empreendimentos solidários
vêm sendo estudadas por alguns autores do campo (GAIGER; LISBOA; MOURA).
Esta monografia objetiva-se desenvolver um estudo de caso focado na Coofe.
9
Trata-se de observar em que medida os problemas de gestão da Coofe têm
correspondência com as conclusões dos estudiosos do assunto.
A pesquisa realizada foi do tipo exploratória, visando a provisão de um
maior conhecimento sobre o tema e o problema de pesquisa em perspectiva -
Quais são os desafios de gestão enfrentados pela Coofe? - com utilização de
dados de fontes primárias e secundárias.
Os dados primários foram obtidos pela realização do levantamento de
experiência e pelo método de observação informal. Foram feitas entrevistas a
partir de um questionário com perguntas não-estruturadas, aplicadas entre os
membros da cooperativa estudada, tanto em grupo quanto individualmente, e
entre alguns apoiadores externos da organização. Tais entrevistas, como
preconiza o método de levantamento de experiência, caracterizaram-se pela
informalidade e pouca estruturação e foram realizadas a partir da apresentação de
um pequeno roteiro de assuntos abordados e colocados na forma de perguntas
abrangentes.
As entrevistas foram aplicadas no período de novembro de 2002 a fevereiro
de 2003. Já a observação informal, realizada no mesmo período, foi dirigida no
sentido de observar unicamente objetos, comportamentos e fatos de interesse
para o problema em estudo e obtidos informalmente.
Os dados secundários foram obtidos através de levantamento bibliográfico,
levantamento de pesquisas efetuadas anteriormente e do trabalho de alguns
apoiadores externos do empreendimento. Tais informações foram utilizadas com o
objetivo de estabelecer melhor o problema de pesquisa, apreender outros
métodos já testados e aprovados de coleta de dados, verificar outros tipos de
dados que poderiam servir de fonte comparativa e complementar aos dados
primários coletados.
Além disso, os dados secundários foram utilizados também para a
formulação das hipóteses, a partir da apreciação do texto de alguns autores que
se dedicam ao estudo dos problemas de gestão enfrentados pelos
empreendimentos solidários. Este procedimento permitiu descobrir idéias e
10
explicações possíveis para o fenômeno posteriormente investigado,
constituindo uma contribuição fundamental para a estruturação inicial do projeto
de pesquisa cujo tema abordado encontra-se ainda em fase inicial de análise e
compreensão.
O presente trabalho, que tem o objetivo de identificar os desafios
enfrentados pelos empreendimentos solidários, está dividido em quatro capítulos.
O primeiro capítulo consta desta introdução e apresenta um panorama do estudo
que foi realizado, o tema da pesquisa, o problema e a metodologia utilizada para
atingir os objetivos da pesquisa.
No segundo capítulo, trataremos da fundamentação teórica do trabalho,
fazendo uma apreciação conceitual dos termos terceiro setor, economia social,
economia solidária e economia popular, tendo como objetivo estabelecer a
fronteira, em termos de significado particular, entre essas várias noções. Além
disso, é feita uma reflexão sobre as características e os desafios da gestão de
empreendimentos situados no campo da economia solidária.
Já no terceiro capítulo, faremos uma descrição da Cooperativa Múltipla
Fontes da Engomadeira, a Coofe, empreendimento surgido de uma iniciativa da
ITCP, Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares, e é composto em sua
maioria por mulheres residente no próprio bairro da Engomadeira, em Salvador.
Apesar de ser uma cooperativa múltipla, atualmente a Coofe se dedica apenas à
produção e comercialização de pães, cujo maior volume de vendas é alcançado
pelas entregas em domicílio.
Ainda no terceiro capitulo são apresentados os resultados da pesquisa de
campo, onde apontamos as principais dificuldades enfrentadas pela Coofe, a partir
das informações obtidas através da realização de entrevistas com alguns
indivíduos envolvidos com o trabalho da cooperativa e da observação informal do
empreendimento.
O trabalho é concluído no quarto capítulo, numa análise dos
empreendimentos solidários e seus desafios, sem a preocupação de estabelecer
uma visão normativa a respeito do tema.
11
2.0 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 ECONOMIA SOLIDÁRIA
Ao tratarmos do tema Economia Solidária é necessária a apreciação de
alguns conceitos que estão presentes numa esfera de ação não pertencente ao
Estado e, muito menos à Iniciativa Privada.
Essa apreciação conceitual dos termos Terceiro Setor, Economia Social,
Economia Solidária e Economia Popular tem como objetivo estabelecer uma
fronteira entre as várias noções, de modo a permitir a visualização das
características pertencentes a cada um, levando em consideração o conhecimento
do próprio contexto ou lugar sócio-histórico onde foram formulados.
Se levantássemos uma indagação acerca do que existe em comum entre as expressões terceiro setor, economia social, economia solidária e economia popular (e poderíamos acrescentar ainda aquela de economia informal), talvez a resposta mais evidente fosse a referência a um espaço de vida social e de trabalho intermediário entre as esferas do estado e do mercado. Esses vários termos fariam assim alusão a um espaço de sociedade recentemente percebido também como lugar de produção e distribuição de riqueza, portanto, como mais um espaço econômico, isto é, lugar de geração de emprego e renda. (FRANÇA, 2002, p.9)
Dentro e fora do ambiente acadêmico, percebe-se uma serie de “confusões
terminológicas”, fruto da grande ausência de pesquisas sobre o tema. Alem disso,
existe também uma enorme dificuldade para se distinguir organizações que não
pertencem nem à iniciativa privada e, nem ao setor público.
Diferenças importantes subjazem as noções de Terceiro Setor, de Economia Solidária, de Economia Social e de Economia Popular (e ainda aquela de economia informal), ligados não somente aos contextos sócio-politicos em que emergiram esses termos, mas também a interpretações distintas acerca do papel que desempenham essas praticas e/ou iniciativas na sociedade, especialmente no que se refere ao lugar que elas devem ocupar em relação às esferas do Estado e do Mercado. (FRANÇA, 2002, p.10)
12
Sendo assim, é necessário entender em que lugar histórico se
constroem essas categorias e qual o significado particular que acompanha a
origem desses conceitos, essa é, na visão de França (2002, p.10), uma condição
indispensável para o entendimento das diferenças entre esses termos.
O terceiro setor, por exemplo, é herdeiro de uma tradição anglo-saxônica, particularmente impregnada pela idéia de filantropia. Essa abordagem identifica o terceiro setor ao universo das instituições sem fins lucrativos, as quais apresentam cinco características essenciais: elas são formais, privadas, independentes, não devem distribuir lucros e devem comportar um certo nível de participação voluntária. (FRANÇA, 2002, p.10)
Já as noções de Economia Solidária e Economia Social, inscrevem-se num
contexto europeu mais geral, e francês, em particular. Em contraste, no que se
refere à noção de terceiro setor (tipicamente norte americana), a relação com o
Estado Social, na Europa, é constituída das experiências associativistas.
Contrastando com a idéia de terceiro setor, as noções de economia social e
economia solidária são herdeiras de uma tradição histórica fundamental,
relacionada com o movimento associativista operário da primeira metade do
século XIX na Europa, que foi traduzido numa dinâmica de resistência popular,
fazendo emergir um grande numero de experiências solidárias largamente
influenciadas pelo ideário de ajuda mútua (mutualismo), da cooperação e da
associação.
A idéia de Economia Solidária reflete assim a própria ação de grupos locais
na tentativa de gestão da riqueza, ou seja, na tentativa de resolução das suas
problemáticas sociais.
Na prática, pois, o termo Economia Solidária identifica hoje uma série de
experiências organizacionais inscritas numa dinâmica atual em torno de novas
formas de solidariedade. O fato é que se vem verificando a emergência e
desenvolvimento de um fenômeno de proliferação de iniciativas e práticas
socioeconômicas diversas. São as chamadas iniciativas locais na Europa. Elas
assumem , na maioria dos casos, a forma associativa e buscam responder a
13
certas problemáticas locais e especificas. Essa expressão “economia
solidária” vem assim, num primeiro momento, indicar a associação de duas
noções historicamente dissociadas, isto é, iniciativa e solidariedade. E ainda
sugerir, com essas experiências, a inscrição da solidariedade no centro mesmo da
elaboração coletiva de atividades econômicas.
Como fenômeno, a emergência de uma economia solidária está
intimamente ligada à problemática de uma exclusão social crescente, que se
define cada vez mais como questão urbana, num contexto atual, mas que remonta
aos anos de 1980, de crise do Estado Providência.
A economia social define uma série de iniciativas associativistas que, ao
recusarem a autonomia do aspecto econômico nas suas práticas, em face aos
demais aspectos – social, político, cultural, etc...- e simbolizam um ideal de
transformação social que não passa pela tomada de poder político via aparelho do
Estado, mas pela possibilidade de multiplicação das experiências de reprodução
das relações de produção.
Já a noção de Economia Popular é utilizada, na maioria das vezes, para
identificar uma realidade heterogênea, um processo social que pode ser traduzido
pela aparição e expansão de numerosas pequenas atividades produtivas e
comerciais no interior de setores pobres e marginais da América Latina. Os
biscates ou ocupações autônomas, as microempresas familiares, as empresas
associativas ou, ainda, as organizações econômicas populares, constituem alguns
exemplos de iniciativa desse universo.
Conforme defende Singer(2002, p.13), a economia solidária surge como
modo de produção e distribuição alternativo ao capitalismo, criado e recriado
periodicamente pelos que se encontram (ou temem ficar) marginalizados pelos
mercado de trabalho. A economia solidária casa o principio da unidade entre
posse e uso dos meios de produção e distribuição (da produção simples de
mercadorias) com o principio da socialização destes meios (do capitalismo). Sob o
capitalismo, os meios de produção são socializados na medida em que o
progresso técnico cria sistemas que só podem ser operados por grande número
14
de pessoas, agindo coordenadamente, ou seja, cooperando entre si. Isso se
dá não somente nas fábricas, mas também nas redes de transporte, comunicação,
de suprimento de energia, de água, de vendas no varejo e etc.
O modo solidário de produção e distribuição parece à primeira vista um híbrido entre o capitalismo e a pequena produção de mercadorias. Mas, na realidade, ela constitui uma síntese que supera a ambos. A unidade típica da economia solidária é a cooperativa de produção, cujos princípios organizativos são: posse coletiva dos meios de produção pelas pessoas que a utilizam para produzir; gestão democrática da empresa ou por participação direta (quando o numero de cooperadores não é demasiado) ou por representação; repartição da receita liquida entre os cooperadores por critérios aprovados após discussões e negociações entre todos; destinação do excedente anual (denominado “sobras”) também por critérios acertados entre todos os cooperadores. A cota básica do capital de cada cooperador não é remunerada, somas adicionais emprestadas a cooperativa proporcionam a menor taxa de juros do mercado. (SINGER, 2002, p.13)
Ainda segundo o mesmo autor, a economia solidária não pode ser considerada
criação intelectual de alguém, embora os grandes autores socialistas
denominados “utópicos” da primeira metade do século XIX (Owen, Fourier,
Buchez, Proudhon etc.) tenham dado contribuições decisivas ao seu
desenvolvimento. “A economia solidária é uma criação em processo contínuo de
trabalhadores em luta contra o capitalismo. Como tal, ela não poderia preceder o
capitalismo industrial, mas o acompanha como uma sombra, em toda a sua
evolução.” Singer(2002, p.13).
Um momento de degeneração da economia solidária foi a recusa de
grandes e poderosas cooperativas de consumo européias, no fim do século XIX,
de adotar a autogestão nos estabelecimentos fabris e comerciais que iam criando.
O mesmo foi feito pelas grandes cooperativas agrícolas, na Europa e América do
Norte e mais tarde nos demais continentes. O que chocou as lideranças históricas
do cooperativismo, principalmente de extração socialista cristã, que davam
prioridade às cooperativas de produção autogeridas como meio de liberação da
classe operária. Segundo Singer, a partir daí, seguiu-se uma polêmica na qual se
formulou a teoria de que cooperativas de produção não tinham condições de se
desenvolver no seio do capitalismo, cabendo à elas duas possibilidades: ou
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fracassam como empresas ou, quando tinham sucesso econômico,
degeneravam, acabando como empresas capitalistas comuns.
Para compreender a lógica da economia solidária é fundamental considerar
a critica operária e socialista ao capitalismo. O que ela condena no capitalismo é
antes de tudo a ditadura do capital na empresa, o poder ilimitado que o direito de
propriedade proporciona ao dono dos meios de produção, pois, todos os que
trabalham na empresa só o podem fazê-lo por ato de vontade do capitalista, que
pode demitir qualquer um tão logo sua vontade mude.
A economia solidária é o projeto que, em inúmeros paises há dois séculos, trabalhadores vem ensaiando na pratica e pensadores socialistas vem estudando, sistematizando e propagando. Os resultados históricos deste projeto em construção podem ser sintetizados do seguinte modo: 1. homens e mulheres vitimados pelo capital organizam -se como produtores associados tendo em vista não só ganhar a vida mas reintegrar-se à divisão social do trabalho em condições de competir com as empresas capitalistas; 2. pequenos produtores de mercadorias, do campo e da cidade, se associam para comprar e vender em conjunto, vi sando economias de escala, e passam eventualmente a criar empresas de produção socializada, de propriedade deles; 3. assalariados se associam para adquiri em conjunto bens e serviços de consumo, visando ganhos de escala e melhor qualidade de vida; 4. pequenos produtores e assalariados se associam para reunir suas poupanças em fundos rotativos que lhes permitem obter empréstimos a juros baixos e eventualmente financiar empreendimentos solidários; 5. os mesmos criam também associações mutuas de seguros, cooperativas de habitação etc. (SINGER, 2002, p.14)
Seria um erro supor que a economia solidária é a única opção de
sobrevivência das camadas mais pobres e excluídas das classes trabalhadoras.
Não é verdade que a pobreza e exclusão tornam suas vitimas eminentemente
solidárias. O que se observa é que há muita solidariedade entre os mais pobres e
que a ajuda mutua é essencial à sua sobrevivência. Mas esta solidariedade se
limita aos mais próximos, com os quais a pessoa se identifica. A mesma pessoa
que se mostra solidária com parentes e vizinhos, disputa com unhas e dentes
qualquer oportunidade de ganho com outras, que lhe são estranhas”. E muito
deles internalizam os valores do individualismo que fundamentam a instituição do
capitalismo.
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É importante registrarmos a visão de Gaiger sobre o tema, para o qual
a economia solidária guarda semelhanças com a economia camponesa. Em
primeiro lugar, porque as “relações sociais de produção desenvolvidas nos
empreendimentos econômicos solidários são distintas da forma assalariada. Muito
embora, também aqui, os formatos jurídicos e os graus de inovação no conteúdo
das relações sejam variáveis e sujeitos à reversão, as praticas de autogestão e
cooperação dão a esses empreendimentos uma natureza singular, pois modificam
o principio e a extração do trabalho excedente. Assim, aquelas praticas: a)
funcionam com base na propriedade social dos meios de produção, vedando a
apropriação individual desses meios ou na sua alienação particular; b) o controle
do empreendimento e o poder de decisão pertencem à sociedade de
trabalhadores, em regime de paridade de direitos; c) a gestão do empreendimento
esta presa à comunidade de trabalho, que organiza o processo produtivo, opera
as estratégias econômicas e dispõe sobre o destino do excedente produzido. Em
suma, há uma unidade entre as posse e o uso dos meios de produção.
2.2 ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL
O cooperativismo chegou ao Brasil no começo do século XX, trazido pelos
emigrantes europeus. Tomou principalmente a forma de cooperativas de consumo
nas cidades e de cooperativas agrícolas no campo. As cooperativas de consumo
eram em geral por empresa e serviam para proteger os trabalhadores dos rigores
da carestia. Nas décadas mais recentes, as grandes redes de hipermercados
conquistaram os mercados e provocaram o fechamento da maioria das
cooperativas de consumo. As cooperativas agrícolas se expandiram e algumas se
transformaram em grandes empreendimentos agroindustriais e comerciais. Mas
nenhuma destas cooperativas era ou é autogestionária. Singer(2002, p.122). Sua
direção e as pessoas que a operam são assalariadas, tanto nas cooperativas de
consumo como nas de compra e vendas agrícolas. Por isso não se pode
considerá-las como parte da economia solidária.com a crise social das décadas
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perdidas de 1980 e de 1990, em que o país se desindustrializou, milhões de
postos de trabalho foram perdidos, acarretando desemprego em massa e
acentuada exclusão social, a economia solidária reviveu no Brasil. Ela assumiu em
geral a forma de cooperativa ou associação produtiva, sob diferentes modalidades
mas sempre autogestionária.
A economia solidária começou a ressurgir, no Brasil, de forma esparsa na década de 1980 e tomou impulso crescente a partir da segunda metade dos anos 1990. Ela resulta de movimentos sociais que reagem à crise de desemprego em massa, que tem inicio em 1981 e se agrava com a abertura do mercado interno às importações, a partir de 1990. Em 1991, tem inicio o apoio de assessores sindicais a operários que conseguem se apossar da massa falida da empresa que antes o empregava, formando uma cooperativa de produção, que retoma as operações e assim salva os postos de trabalho ate então ameaçados de fechamento. Três anos depois, diversas empresas autogestionárias com esta origem fundam a ANTEAG - Associação Nacional de Trabalhadores em Empresas Autogestionárias e de Participação Acionaria. (SINGER 2002, p.25)
Ainda na década de 80, a Cáritas, entidade ligada à Conferencia Nacional
dos Bispos do Brasil (CNBB), financiou milhares de pequenos projetos
denominados PACS, Projetos Alternativos Comunitários. Uma boa parte dos
PACS destinava-se a gerar trabalho e renda de forma associada para moradores
das periferias pobres de nossas metrópoles e da zona rural das diferentes regiões
do país. Uma boa parte dos PACS acabou se transformando em unidades de
economia solidária, alguns dependentes ainda da ajuda caritativa das
comunidades de fiéis, outros conseguindo se consolidar economicamente
mediante a venda de sua produção no mercado.
Um outro componente da economia solidária no Brasil é formado pelas
cooperativas e grupos de produção associada, incubados por entidades
universitárias, que se denominam Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas
Populares (ITCPS). As ITCPS são multidisciplinares, integradas por professores,
alunos de graduação e pós-graduação e funcionários, pertencentes às mais
diferentes áreas do saber. Elas atendem grupos comunitários que desejam
trabalhar e produzir em conjunto, dando-lhes formação em cooperativismo e
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economia solidária e apoio técnico, logístico e jurídico para que possam
viabilizar seus empreendimentos autogestionários.
Objetivando uma atuação mais eficiente em nível nacional, as ITCPS
constituíram uma rede que se reúne periodicamente para trocar experiências,
aprimorar a metodologia de incubação e se posicionar dentro do movimento
nacional de economia solidária. Posteriormente a rede se filiou á Fundação
Unitrabalho, que reúne mais de 80 universidades e presta serviços, nas mais
diferentes áreas, ao movimento operário. Desde então, a Unitrabalho desenvolve
um programa de estudos e pesquisas sobre economia solidária.
Nos últimos anos, estas entidades começaram a receber um números
crescente de trabalhadores desejosos de formar empreendimentos solidários. Os
meios de comunicação de massa começaram finalmente a tomar conhecimento
desta movimentação e incluem em seus noticiários esporadicamente reportagens
sobre cooperativas que conseguiram gerar trabalho e renda para os seus
membros. Cada vez que reportagens como essas são exibidas na televisão,
dezenas de grupos procuram as incubadoras universitárias e outras entidades que
apóiam o novo cooperativismo.
Economicamente, a situação de cooperativas e grupos de produção associada é muito variada, desafiando generalizações, mesmo porque há apenas levantamentos parciais em alguns estados. Mas duas tendências podem ser apontadas como prováveis: 1. A maioria das cooperativas sobrevive por anos, apesar da extrema debilidade do que chamamos bases de sustentação; 2. A maioria das cooperativas ainda depende muito do apoio das entidades que as garantem e continuam acompanhando. (SINGER, 2002, p.27)
A necessidade de consolidar os empreendimentos solidários de modo
que possam se sustentar reciprocamente já é reconhecida e deu lugar à formação
de foros de economia solidária e cooperativas populares em diversas regiões do
país. Mas tais esforços ainda não conseguiram quebrar o isolamento econômico
das cooperativas, embora os contatos entre elas se multipliquem. Cresce a
compreensão de que a construção da competência de empreendimentos se dá
19
por um processo de aprendizagem, que envolve membros das cooperativas e
das entidades de apoio.
2.3 EMPREENDIMENTOS SOLIDÁRIOS
Ao tratarmos de empreendimentos situados no campo da Economia
Solidária, estamos no referindo a uma organização que pode assumir formato de
cooperativa, empresa autogestionária, rede e outras formas de associação para a
produção e/ ou aquisição de produtos e serviços. Moura(2002, p.79)
A literatura atual sobre a economia solidária converge em afirmar o
caráter alternativo das novas experiências populares de autogestão e cooperação
econômica. Dada a ruptura que introduzem nas relações de produção capitalistas,
elas poderão representar a emergência de um novo modo de organização do
trabalho e das atividades econômicas em geral.
Nestas organizações o trabalho exerce um papel nitidamente central, por
ser fator preponderante, senão exclusivo, em favor do empreendimento. Nessa
condição, determina uma racionalidade em que a proteção àqueles que detém a
capacidade de trabalho torna-se vital.
Ao propiciar uma experiência efetiva de dignidade e equidade, o labor produtivo é enriquecido do ponto de vista cognitivo e humano. O maior interesse e motivação dos associados, o emprego, mutuamente acordado, da maior capacidade de trabalho disponível, a divisão dos benefícios segundo o aporte em trabalho, são fatos relacionados com a cooperação, no sentido de acionar e favorecer um maior rendimento do trabalho associado. (GAIGER, 1999, p.12)
À medida que essas características ecentuam-se, provocam uma reversão
do processo ocorrido nos primórdios do capitalismo, quando o trabalhador foi
separado dos objetos por ele produzidos e converteu-se em propriedade de
outrem, em mercadoria adquirida e destinada ao uso do capital. A autogestão e a
cooperação são acompanhadas por uma reconciliação entre o trabalhador e as
forcas produtivas que ele detém e utiliza. Não sendo mais um elemento
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descartável e não estando mais separado do produto do seu trabalho, agora
sob seu domínio, o trabalhador recupera as condições necessárias, mesmo se
não suficientes, para uma experiência integral de vida laboral e ascende a um
novo patamar de satisfação, de atendimento a aspirações não apenas materiais
ou monetárias. Por conseguinte, as relações de produção dos empreendimentos
solidários não são apenas atípicas para o modo de produção capitalista, mas
contrarias à forma social de produção assalariada: nesta, o capital emprega o
trabalho: naqueles, os trabalhadores empregam o capital.
Podemos entender os empreendimentos solidários como expressão de
uma forma social de produção especifica, contraposta à forma típica do
capitalismo e, no entanto, com ela devendo conviver, para subsistir em formações
históricas ditadas pelo modo de produção capitalista. Nos dias atuais, as
inovações principais que a nova forma traz e mostra-se capaz de reproduzir
concentram-se no âmbito das relações internas, dos vínculos mútuos que definem
o processo social imediato de trabalho e de produção dos empreendimentos
solidários. A economia solidária não reproduz em seu interior as relações
capitalistas, no melhor dos casos as substitui por outras, mas tampouco elimina
ou ameaça a reprodução da forma tipicamente capitalista. Iniciativas de grande
interesse estão aparecendo, como as redes e clubes de troca, as cooperativas de
credito e outras, alternativamente à lógica mercantil do dinheiro e das trocas em
geral, porem de modo ainda experimental, suplementar e subsidiário em muitos
casos.
Sob o prisma das relações que cultivam entre si e com os demais agentes
econômicos, as iniciativas solidárias vivem um momento de profusão, ao mesmo
tempo em que de debilidade. A todo instante, surgem novas organizações de
credito, troca e consumo solidário, alem de noticias de avanços nas que já
existem, gerando um ambiente de emulação pródigo em encontros e projetos:
cooperativas de credito, bancos populares, moedas sociais, redes de troca, etc.
Entretanto, salvo poucas iniciativas de maior porte ou relativa maturidade, esses
mecanismos são experimentais, valem por seu significado intrínseco, não pelo
seu impacto.
21
Para assegurar sua reprodução, os empreendimentos solidários precisam lidar adaptativamente com as externalidades capitalistas. As tentativas de romper o circulo,
ao entrarem em contato, reforçam-se moral e politicamente, mas carecem por hora de praticas efetivas de intercambio econômico, tanto mais quando envolvem segmentos e atores sociais diferentes. (GAIGER, 2002, p.16)
2.4 GESTÃO DE EMPREENDIMENTOS SOLIDÁRIOS
De acordo com Lisboa, muitas são as debilidades e os problemas
constantes no cotidiano dessas organizações, tais como carência de capital de
giro, acesso ao credito, design, controle de qualidade, comercialização e
tecnologia. “Na gestão de empreendimentos solidários, além de lidarmos com os
valores individualistas e de competição, há percalços de ordem material e
relacionados ao pouco aprendizado da produção coletiva.” Lisboa(1999, p.2). Ele
lembra ainda que todos os esforços, no conjunto, são ainda insuficientes para
fortalecer os pequenos empreendimentos solidários.
Um outro aspecto a ser considerado, conforme defende Moura (2002, p.83),
é a necessidade do aprendizado da gestão coletiva e a quebra do distanciamento
entre produção e gestão, ou seja, o desafio de romper com a divisão entre
trabalho manual e intelectual que se expressa na dicotomia entre produção e
gestão, pois os que produzem não se ocupam da gestão do empreendimento por
não se sentirem em condições para tanto.
Segundo Lisboa (1999, p.1), o campo da Economia Solidária, baseado na
pequena empresa comunitária, na agricultura familiar, no trabalho doméstico,
autônomo, nas cooperativas e empresas de autogestão, aos poucos supera o
“desafio do mercado” e viabiliza sua competitividade no mesmo, constituindo-se
como uma alternativa desde o interior das relações mercantis. Trata-se de um
outro circuito econômico diferenciado do mercantil-capitalista e do estatal no qual
os pobres constroem suas próprias alternativas comunitárias de provisão material
de sua existência através de relações de solidariedade.
Apesar de recentemente descobertas pelos intelectuais, as atividades que
dão substrato a Economia Solidária são muito antigas, e somente não eram
22
visíveis para o olhar regido pelos “parâmetros da razão econômica-social
iluminista”. Nos países semiperiféricos , em particular, a acumulação capitalista
não levou à desorganização da pequena produção mercantil, conforme nos revela
Lisboa(1999, p.2): sempre tivemos um grande conjunto da população
“sobrevivendo” às margens do mercado numa economia de “subsistência”,
subordinada sem dúvida.
Cresceram nos anos 90 ações institucionais de apoio as iniciativas
populares e solidárias, em geral através de múltiplas políticas de geração de
emprego e renda. Mas, no momento, apesar de todos estes esforços (que no
conjunto ainda representam uma pequena gota no oceano) muitas ainda são as
debilidades dos empreendimentos solidários, os quais carecem de estabelecer um
selo comum que identifique os produtos e serviços por eles gerados (desafio da
certificação), além de generalizadamente ter problemas como o acesso ao crédito,
á mídia, design, controle de qualidade, embalagens, código de barras, distribuição
e comercialização (desafio mercadológico), bem como os decorrentes de barreiras
legais (desafio do marco legal), do desenvolvimento tecnológico, da carência de
entidades de apoio e de padrões gerenciais adequados (desafio da autogestão e
da construção da metodologia do empreendedorismo solidário).
Conforme defende Veiga (2001, p.70), a experiência recente de formação
de grupos associativos com finalidade econômica demonstra que a combinação
de mudanças tecnológicas e organizacionais com exigência de novas atitudes e
comportamentos na superação de 6 dificuldades principais para o
desenvolvimento dessas formas de trabalho, ocupação e geração de renda. Essas
dificuldades são:
As barreiras culturais que devem ser vencidas junto aos trabalhadores
no sentido de superação do emprego tradicional como horizonte de ocupação a
ser atingido. Prevalece ainda uma mentalidade de busca da imaginada segurança
proporcionada pelo vínculo empregatício (e, portanto, da subordinação e não da
liberdade e independência) e das garantias trabalhistas (cujos benefícios podem
ser obtidos de outra forma como, por exemplo, através de fundos opcionais nas
23
cooperativas). A alternativa do associativismo econômico só surge como
último recurso ante a impossibilidade de recolocação no mercado de trabalho
tradicional. No entanto, esta tem sido uma tendência crescente.
Torna-se necessário incentivar a formação de uma mentalidade
empreendedora e solidária que potencialize a criação e o desenvolvimento do
associativismo econômico e sua ligação com o mercado globalizado em termos de
tendências, necessidades e gostos, mas com princípios éticos, preço justo, peso e
medidas respeitados, pureza e qualidade dos produtos.
A barreira cultural também esta presente nos empresários, setores do
sindicalismo, técnicos do governo, quadros das agencias tradicionais de
capacitação, qualificação, fomento e financiamento, que não estão preparados
para lidar com trabalhadores não qualificados ou semiqualificados que atualmente
ingressam no mercado do associativismo econômico, assim como desconhecem
as propostas da Economia Solidária e as experiências em curso no país. Faz-se
necessária uma mudança na cultura destes agentes de desenvolvimento social e
econômico no sentido de sua adaptação à nova realidade social de seu público-
alvo, da criação e utilização de novas metodologias de capacitação e
aprendizagem.
Mesmo do ponto de vista do financiamento destas novas iniciativas, há
uma nova barreira cultural que deve ser superada. Os critérios tradicionais de
funcionamento para empreendimentos econômicos em termos de garantias para o
empréstimo de capital, mecanismos de repasse e avaliação dos resultados são
inadequados a essa nova realidade. É preciso criar novos critérios que
disponibilizem fundos já existentes que ultrapassem os atuais critérios baseados
em garantia patrimonial, ficha cadastral junto à entidade do sistema financeiro e a
lucratividade como principal indicador de resultado. Viabilidade mercadológica,
existência de apoio técnico e gerencial adequados, capacitação de pessoal e
geração de trabalho e renda como indicadores de resultados mensuráveis,
passiveis de avaliação devem nortear os novos mecanismos de financiamento
necessários para o desenvolvimento do associativismo econômico. Mas
24
fundamentalmente será a constituição de cooperativas de crédito que poderão
atender às exigências destes novos empreendimentos, beneficiando ampla
parcela da população local.
Uma característica deste momento inicial de desenvolvimento de novas
formas de empreendimentos associativos econômicos é a existência ainda de uma
fragmentação muito grande das diversas experiências. Este fato leva a um
desperdício de oportunidades em termos de troca de experiências e iniciativas
conjuntas que poderiam alavancar muitos dos projetos em andamento. Torna-se
necessário a criação de instrumentos, mecanismos e instituições que possibilitem
um associativismo em escala municipal e regional entre os diversos grupos que se
formam.
Mesmo quando as barreiras anteriormente citadas são superadas, há a
falta de acompanhamento duradouro das iniciativas dos diferentes grupos por
parte dos órgãos de apoio e financiamento. Esta falta de acompanhamento tem
deixado espaço para estes grupos enfrentarem dificuldades – muitas vezes
determinadas pela inexperiência administrativa e de gestão – que de outra
maneira poderiam ser evitadas. É preciso que o acompanhamento duradouro dos
grupos associativos seja sistemático e esteja combinado com a existência de
espaços que permitam a troca de experiências e a realização de iniciativas
conjuntas por parte desses grupos. Daí que a incubagem, inclusive como espaço
publico disponibilizado para alavancar os grupos por um determinado período,
seja imprescindível.
Outra deficiência parte do poder público, principalmente o municipal, por
ser este o mais próximo dos grupos, que por hora ainda não tem conseguido
gestar uma política pública de geração de trabalho e renda adequada, muitas
vezes se atendo somente a requalificação ou qualificação da mão-de-obra sem se
preocupar com a geração de novos postos de trabalho. Isto ocorre não só no
sentido das suas próprias diretrizes quanto no sentido da dificuldade de um
levantamento de dados confiáveis do seu público-alvo, realização de um cadastro
de desempregados e empregados, o levantamento detalhado da “economia
25
submersa” que só é possível detectar através de um mergulho em
profundidade indo-se de casa em casa e, ainda, das potencialidades econômicas
do município para que se posssa orientar a formulação de suas diretrizes e os
caminhos para a real concretização de uma política e a implementação de
instrumentos e incentivos necessários como, por exemplo, a criação de feiras ou
locais permanentes de negócios e mesmo de espaço (galpões) para instalação
das unidades mesmo que por um período determinado de tempo para dinamizar a
economia local.
Nas condições atuais , os empreendimentos solidários experimentam uma
dupla subsunção à economia capitalista: de um lado, estão sujeitos aos efeitos da
lógica de acumulação e às regras de intercambio impostas ao conjunto de agentes
econômicos, de conteúdo eminentemente utilitário; de outro, como forma de
responder à premissa de produtividade competitiva, estão compelidos a adotar a
base técnica do capitalismo, os processo materiais de produção por ele
introduzidos continuamente, configurando-se com isso uma subsunção formal
inversa, de uma base sobre uma forma, similarmente ao caso da economia
camponesa, conforme nos revela Gaiger (2002, p.13). Essas coerções,
naturalmente, cerceiam a lógica econômica solidária, pois a obrigam a conviver
com tensionamentos e a conceder em seus princípios, que se fossem adotadas
sem restrições, terminariam por descaracterizar o que há de especifico no
solidarismo econômico.
Na gestão de empreendimentos solidários, merece destaque a eliminação
da parcela do excedente antes apropriada pela classe patronal para fins privados,
pois sua destinação, agora, fica ao arbítrio dos trabalhadores, quer somando-se à
remuneração do trabalho, quer sendo revertida na empresa. A coexistência de
proprietários abastados, empresas insolventes e folhas de pagamento irrisórias
deixa de ter lugar. A supressão das relações assalariadas e do antagonismo entre
o capital e o trabalho a elas intrínseco, desonera a empresa igualmente por
diminuir custos com estruturas de controle e supervisão, com estímulos
pecuniários a fidelidade e eficiência dos que ocupam funções no topo da
hierarquia, com programas destinados a conquistar a adesão dos trabalhadores
26
aos objetivos da empresa; em suma, com estratégias as mais diversas da
empresa capitalista, fadadas a recompor continuamente o espírito corporativo.
Sendo o zelo e a atitude de colaboração dos trabalhadores, comprovadamente, indispensáveis a qualquer empresa e geralmente mais eficazes do que estratégias patronais de convencimento e coação, com maior razão há de verificar-se quando existe um vinculo imediato entre a performance do empreendimento e os benefícios individuais auferidos, ao lado da menor rotatividade da forca de trabalho e da partilha dos valores e objetivos da organização. O interesse dos trabalhadores em garantir o sucesso do empreendimento estimula maior empenho com o aprimoramento do processo produtivo, a eliminação de desperdícios e de tempos ociosos, a qualidade do produto ou dos serviços, alem de inibir o absenteísmo e a negligencia. Efeitos com esses, ao derivarem da natureza associada e cooperativa do trabalho e das características participativas dos empreendimentos, lhes conferem uma racionalidade própria, virtualmente superior a das empresas capitalistas que acionam os mesmos fatores materiais de produção. (GAIGER, 2002, p.14)
Além do mais, a empresa capitalista, a partir de certos limites, apenas
pode flexibilizar os seus custos econômicos assumindo em contrapartida os
custos sociais decorrentes. Por sua vez, nas cooperativas em que os ganhos são
socializados, o mesmo se admite mais facilmente com as perdas. O incremento
da jornada de trabalho, ou sua redução e conseqüente abatimento das retiradas
individuais, como estratégias de ajuste as flutuações de mercado, uma vez que
aprovadas de forma democrática e transparente, são a melhor garantia contra o
desemprego para os cooperados. De certo modo, a empresa associativa esta
dotada de maleabilidade similar a dos autônomos e dos profissionais liberais, com
a faculdade adicional de diluir custos fixos, assumidos individualmente nos demais
casos, e de poder ampliar mais facilmente sua planta produtiva e de serviços.
27
3.0 A COOFE E OS SEUS DESAFIOS DE GESTÃO
3.1 Histórico
A Cooperativa Múltipla Fontes de Engomadeira (COOFE), está localizada
no bairro de Engomadeira, é composta de 23 cooperados, na sua maioria
mulheres e residentes no próprio bairro.
Conforme nos revela Silva (2002), a COOFE surgiu de uma iniciativa da
ITCP, Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares, que se constitui em um
projeto de pesquisa e extensão da Universidade Estadual da Bahia (UNEB).
Situada na vizinhança do bairro e por notar um certo potencial
organizativo da comunidade a incubadora resolveu investir nesta empreitada
servindo como um verdadeiro catalisador, fomentador e potencializador do
surgimento da organização.
A Cooperativa, embora enfrentando sérios problemas econômicos que
desfiam a sua gestão, apresenta um relativo avanço em questões de registro
legal, de vínculo com organizações de apoio a este tipo de iniciativa e de
amadurecimento da atividade empreendedora, quando comparada com
empreendimentos solidários similares, os quais raramente apresentam essas
características.
A interação incubadora-comunidade deu-se inicialmente por intermédio
das organizações locais, a fim de promover a mobilização de um grupo disposto a
construir um empreendimento solidário. Membros da ITCP distribuíram material de
divulgação aos moradores do bairro, convidando-os para uma reunião na
Associação de Moradores do Bairro e comunicando a possibilidade de fomento de
uma renda alternativa para a população local. A participação dos moradores nesta
reunião, além de ser uma iniciativa associativa, iria refletir o potencial interesse por
esta realidade, e isto denotava uma demanda latente para o projeto. Nesta reunião
foram explicados os objetivos do projeto e suas devidas parcerias. As reuniões
28
posteriores foram para a definição das particularidades do empreendimento,
sendo a própria comunidade quem decidiu qual atividade exerceriam.
Além do trabalho da ITCP a Coofe vem recebendo o apoio de outras
instituições. A primeira delas é constituída por uma equipe de alunos da Escola de
Administração da UFBa – Universidade Federal da Bahia, com supervisão de
professores do Nepol – Núcleo de Pesquisa de Poderes Locais, cuja iniciativa é da
ACC – Atividade Curricular em Comunidade, um programa de extensão da
universidade em parceria com a escola, atuando por intermédio de alunos da
disciplina Bansol.
Atualmente esses alunos estão assessorando os cooperados no
gerenciamento do empreendimento e monitorando o auxilio financeiro realizado
pelo Bansol à Coofe no último ano, o que permitiu sanear momentaneamente a
cooperativa numa difícil situação de caixa.
Merece registro também o trabalho desenvolvido pelo CEFET-Ba – Centro
Federal de Educação Tecnológica da Bahia, através do cursos de Administração e
por intermédio de alunos da disciplina Administração da Produção II. Tais alunos
realizaram no mês de setembro de 2002 um importante trabalho intitulado
Diagnósticos e Sugestões para a Coofe, com o objetivo de diagnosticar problemas
relacionados à custos, comercialização, organização e produção e propor
soluções a fim de auxiliar nas decisões dosa cooperados e promover o
crescimento da Coofe.
3.2 A Visão do Negócio
Para os membros da Coofe, de modo geral, a cooperativa é vista apenas
como uma possibilidade de obtenção de renda, e isso acaba diminuindo a
capacidade dos indivíduos de resistirem diante das dificuldades encontradas para
levar adiante o projeto. Em alguns casos os cooperados chegaram a abandonar o
trabalho na Coofe, logo que surgiu uma outra possibilidade de geração de renda.
Mesmo quando não surge alternativa de renda, opta-se por ficar em casa sem ter
29
nada a fazer, do que trabalhar sem a certeza de obter recompensa material
ao final do período.
É importante observar que a busca de uma alternativa de ocupação e
renda, em si, de modo algum representa uma ameaça para o desenvolvimento do
empreendimento. Na verdade, o perigo está na mera busca de uma fonte de renda
dissociada da consciência dos benefícios inerentes ao trabalho associado, pois a
partir do momento em que o indivíduo passa a compreender profundamente a
essência dos valores do cooperativismo e adquire consciência da importância
dessa modalidade de trabalho em suas vidas, capaz de oferecer recompensas
superiores e não limitadas a remuneração pela forca de trabalho, cria-se um
vínculo muito forte, para com a organização da qual participam e com o projeto
compartilhado por todos.
Ou seja, a simples busca de uma remuneração não faz com que o individuo
sinta-se parte de um grupo, assimile a cultura existente neste ambiente e, muito
menos, esteja disposto a sacrificar-se pelo êxito da empreitada. Tais
características, são fundamentais para a sobrevivência de iniciativas econômicas
sujeitas a todo tipo de adversidade, seja pela sua relativa falta de amadurecimento
ou pelas dificuldades inerentes a empresas de alguma forma situada a margem
do modelo econômico vigente.
3.3 O Perfil dos Cooperados
Em relação ao perfil dos cooperados, estamos certos de que a escolaridade
constitui uma enorme dificuldade não apenas pelo acirramento da competição
entre as empresas, visto que na disputa por mercado o grau de instrução dos
colaboradores é uma ferramenta essencial, mas sobretudo pela limitações
provocadas por esta deficiência, tais como: maior dificuldade em assimilar o
conteúdo dos cursos ministrados por intermédio da ITCP; problemas pelo
desconhecimento da importância de cumprir as orientações relacionadas ao
controle das atividades da cooperativa; dificuldade na transmissão de
conhecimento entre os membros; deficiência muito grande na execução de
30
atividades e tarefas tradicionalmente exercida pelos níveis mais elevados da
pirâmide hierárquica nas empresas capitalistas, como planejamento, controle de
custos, contabilidade e etc.
É importante citar também que o fato da cooperativa ser constituída
basicamente por mulheres, muitas delas com filhos e exercendo o papel de chefes
de família, contando com a cooperativa muitas vezes como única fonte de renda,
observa-se a dificuldades das mesmas no processo de comercialização, por exigir
grandes deslocamentos levando consigo o carrinho dos pães, o que exige grande
esforço físico da parte de indivíduos cuja média de idade é de 40 anos,
provocando inclusive o afastamento de alguns membros por alegarem ser uma
atividade ”muito puxada”.
Além disso, a questão dos filhos e da responsabilidade de chefiar famílias,
acaba provocando outras complicações, seja por imprimir as mulheres uma dupla
e desgastante jornada de trabalho, ou pela necessidade de sustentação do grupo
familiar, muitas delas, embora bastante apegadas com o trabalho na cooperativa,
acabam tendo que abrir mão temporariamente ou desistindo da Coofe para buscar
uma outra fonte de renda que seja capaz de suprir as suas necessidades.
3.4 A Divisão do Trabalho
A falta de critérios na divisão do trabalho pode produzir algumas
dificuldades, principalmente no tocante a cada cooperado executar
adequadamente as suas atividades, com base nas habilidades e competências
possuídas.
Este problema pode estar diretamente ligado à falhas, tanto da liderança,
quanto do planejamento, que são fatores essenciais para um projeto de gestão ser
bem sucedido. No que diz respeito a liderança, não defendemos aqui uma ação
baseada na hierarquia e na coerção, como ocorre nas empresas capitalistas, pois
isto acabaria por deteriorar o modelo de autogestão tão importante dentro do
cooperativismo. Entretanto, a existência de líderes com visão suficiente para saber
incentivar a criação de critérios que facilitem a alocação adequada dos
31
cooperados nos postos de trabalho, aliando a questão da produtividade com a
satisfação pessoal.
Por outro lado, apenas o estabelecimento de critérios para a divisão do
trabalho não seriam suficientes para resolver os problemas decorrentes tanto da
má alocação da mão-de-obra dentro da cooperativa, o que acaba por reduzir a
produtividade e a motivação, quanto da má distribuição da força de trabalho,
gerando desequilíbrio nas diversas áreas da organização e, provocando com isso
o protesto de alguns, sob a alegação de estarem trabalhando mais que os demais
membros, sendo esta uma das causas mais comuns de geração de conflitos.
É valido também, registrar que pelo fato da divisão social do trabalho ser
uma característica marcante da empresa capitalista e, neste caso, sendo
determinante na remuneração dos indivíduos e na geração das desigualdades,
esta herança cultural levada pelos cooperados para dentro dos empreendimentos
solidários acaba fomentando a possibilidade de reprodução de mecanismos
notadamente capitalistas, os quais, poderiam vir a distorcer os elementos
característicos das iniciativas associativas solidárias.
3.5 A Divisão das Sobras
No tocante à divisão das sobras, os problemas da Coofe estão
freqüentemente associados à falta de controle eficiente da freqüência e no registro
das horas efetivamente trabalhadas, tendo em vista que a remuneração ou
distribuição das sobras é feita de forma proporcional ao total de horas trabalhadas
num determinado período.
Como este controle é deficiente, se observa novos conflitos entre os
membros, seja pela contestação do montante destinado a cada membro ou por
reclamações questionando a diferença entre o montante recebido e a parcela de
contribuição dada a organização. Portanto, dá-se inicio à uma discussão muito
freqüente nas cooperativas, dentro e fora da economia solidária, a respeito da
forma mais adequada de distribuir as sobras. Sendo que alguns autores defendem
a divisão por igual das sobras, por considerarem este um instrumento mais
32
igualitário por não oferecer nenhum tipo de diferenciação entre os membros,
no processo de repartição dos resultados.
Um outro método defendido é o baseado na qualificação de cada membro
e, conseqüentemente na função exercida por ele dentro da estrutura da
cooperativa, oferecendo assim, remunerações mais próximas ao que o mercado
oferece, como forma de atrair indivíduos qualificados para a organização.
Observa-se na Coofe, que o valor muitas vezes desprezível ou nulo das
sobras, pode contribuir para a constituição de outra grande barreira para o
funcionamento regular da organização, pois termina sendo a causa principal da
maioria dos afastamentos dos membros da cooperativa, da desmotivação dos que
permanecem e da criação de entraves na atração de membros mais
escolarizados, tão importantes para o fortalecimento do empreendimento.
3.6 O Aprendizado da Produção Coletiva
Os diferentes problemas enfrentados pela COOFE e elos empreendimentos
solidários de forma geral estão, muitas vezes, associados ao ineditismo que a
experiência de produção associada representa para os membros da cooperativa.
A cultura laboral existente na organização possui elementos que são herança do
emprego tradicional, baseado no sistema clássico de recompensas e punições
para cumprimento dos objetivos e metas.
Em todas as áreas da cooperativa é possível detectar os traços dessa
cultura, que precisa ser superada o quanto antes, sob pena de acabar por sufocar
as peculiaridades mais expressivas dessa forma de produção. Pois, para um novo
arranjo organizacional é necessária uma nova cultura, baseada num novo sistema
de valores capaz de possibilitar aos indivíduos a construção de um modelo
eficiente de produção e distribuição de riquezas, baseado na cooperação e na
solidariedade entre iguais.
Vale ressaltar também a importância, mas sobretudo a dificuldade deste
processo de aprendizagem. A importância está na necessidade de
33
conscientização dos indivíduos quanto à natureza, princípios e objetivos da
iniciativa da qual participam, a fim de promover a motivação e o comprometimento
de todos na superação das adversidades e na busca de solução para os
constantes conflitos. A dificuldade se origina, dentre outros fatores, no ineditismo
do fenômeno na vida dos membros, na deficiência do meio acadêmico em
compreender e explicar as nuances desse tipo de atividade e, na forma
subordinada como os empreendimentos solidários se relacionam com as
empresas capitalistas.
Em suma, o aprendizado dos mecanismos coletivos de gestão é condição
necessária tanto para a viabilidade da cooperativa enquanto empreendimento
econômico, à medida que a produtividade da mesma tende a aumentar e o seus
processos tornarem-se mais eficientes, quanto para a realização de cada individuo
enquanto trabalhador, pela elevação do nível de socialização do grupo.
3.7 Autogestão do Empreendimento
As decisões na Coofe são tomadas, predominantemente, de forma
colegiada, com grande envolvimento dos membros, em especial, no que se refere
a assuntos que eles julgam poder interferir mais diretamente na sua sorte e na da
própria organização, ou seja, muitos assuntos cruciais para o destino da
cooperativa, mas não reconhecidos desta forma pelos membros, acabam ficando
em segundo plano e a responsabilidade por trata-los recai sobre os ombros de um
grupo restrito, em geral formado pelos cooperativados presentes no
empreendimento desde a sua origem.
Um outro fato digno de relato relacionado com o processo decisório é a
forte dependência da organização em relação às entidades de apoio, seja a ITCP
ou a UFBA. Embora tais entidades estejam sempre incentivando e promovendo a
independência e autonomia da Coofe na tomada de decisões, verifica-se
freqüentemente que os membros tendem a aguardar orientações no sentido de
apontar o que deve ser feito para resolver os problemas e superar as dificuldade
da organização.
34
Esse tipo de situação pode estar associado ao baixo nível de
escolaridade do cooperativados, que muitas vezes consideram o “pessoal da
universidade” mais capaz para fazer o diagnóstico dos problemas existentes e
indicar a solução ideal para cada caso, como também, ou à inexperiência dos
membros na gestão da empresa, por se tratar de uma atividade em si bastante
complexa em empresas tradicionais, ainda mais se tratando de empreendimentos
situados no campo da economia solidária.
É válido também lembrar que a tomada de decisões na Coofe, é
influenciada pela capacidade de comunicação do individuo e na sua habilidade em
convencer os demais e obter dos mesmos o apoio na defesa de determinadas
idéias, o que, de certa forma, identifica traços de liderança, mas por outro lado
pode vir a fragilizar a autogestão e o caráter democrático da iniciativa, em função
da inibição de alguns membros para expor as suas idéias, pela timidez ou medo
em falar para o grupo, fazendo com que prevaleça a opinião dos mais hábeis em
se comunicar.
Um outro elemento que deve ser considerado é a forte influencia do grupo
que fundou a cooperativa. Existe forte afinidade e cumplicidade entre eles e,
conseqüentemente o pensamento deste grupo passa a ser hegemônico e
influencia praticamente todas as atividades da organização, não favorecendo o
surgimento de espaços para a germinação de novas idéias trazidas pelos novos
membros e limitando a capacidade destes na implementação de ações capazes
de gerar melhorias para todos.
Esses problemas da Coofe, presentes também em muitos
empreendimentos solidários, sugerem que os trabalhadores conseguem mais
facilmente deter o controle dos meios de produção ao controle da gestão do
empreendimento. Tal barreira, de modo geral, requer tempo considerável para ser
superada, justamente por estar apoiada na cultura existente nas empresas
capitalistas, cuja divisão entre trabalho manual e trabalho intelectual são
transferidas para as iniciativas solidárias construídas pelos trabalhadores
excluídos do mercado de trabalho.
35
Por tudo isso, a eficiência das decisões da cooperativa a coloca diante
de um dilema. De um lado, a presença explicita de uma liderança formal ou
informalmente constituída poderia reduzir os conflitos e envolver todo o grupo na
busca das melhorias para a organização e na concentração de esforços para a
superação das dificuldades, mas, ao mesmo tempo, corre-se o risco de ver o
exercício de um modelo inadequado de liderança descaracterizar a natureza
democrática e participativa do empreendimento, comprometendo os seus objetivos
e afastando-o dos princípios sobre os quais ele se estabeleceu e passou a contar
com a simpatia e o apoio da sociedade.
3.8 O Conhecimento Gerencial
Em diversas etapas do trabalho na cooperativa, o grupo precisa atuar como
gerente de negócio: tomando decisões, analisando o mercado, planejando as
ações a serem tomadas, enfim, adotando uma serie de procedimentos que exigem
um certo nível de conhecimento e experiência na arte de administrar.
Daí surge uma outra dificuldade na gestão da Coofe, decorrente da falta de
conhecimento e da inexperiência dos seus membros, no que diz respeito a gestão
de empresarial. Essa é uma das diferenças fundamentais entre as cooperativas
populares e as cooperativas constituídas de trabalhadores que se apossam da
massa falida das empresas. Enquanto no segundo caso o grupo que comandara a
nova empresa já trabalha há anos e possui amplo conhecimento da organização,
do mercado onde ela atua e possui formação específica para atuarem em suas
respectivas funções, no primeiro caso os trabalhadores possuem características
diametralmente opostas, pois na maioria dos casos estão há muito tempo
desempregados, são indivíduos semiqualificados ou sem nenhuma formação e
desconhecem até o perfil do mercado onde pretendem atuar.
A correta realização das funções administrativa tem sido um outro problema
para a Coofe. Atividades como planejamento, organização, direção e controle, tão
importantes para o funcionamento de toda e qualquer empresa, não tem sido
executados de forma satisfatória, sendo muitas vezes negligenciadas.
36
Como já citado diversas vezes neste trabalho, o reduzido nível de
escolaridade e a inexperiência dos membros em cargos gerenciais tem
prejudicado o trabalho dos mesmos, por reduzir as chances de acertos das suas
decisões. Além disso, mesmo após a realização de alguns treinamentos para
suprir as deficiências dos membros na realização dessas atividades, observa-se o
baixo comprometimento deles na participação nessas tarefas administrativas,
muito provavelmente pela falta de conscientização a respeito da importância
dessas tarefas para o bom gerenciamento do empreendimento.
Vale registrar também a forte dependência da Coofe em relação as
entidades de apoio, a ITCP e a UFBa, no que se refere à realização dessas
tarefas administrativas. Na prática, poucos são os membros que realmente se
interessam e se envolvem com esta importante etapa do processo de gestão.
Dessa forma, fica comprometido o nível de participação coletiva na gestão do
empreendimento e a autogestão.
.Esses fatos nos dão a real dimensão do desafio que essas organizações
terão pela frente, na tentativa de fugir de um desfecho semelhante ao de muitas
empresas capitalistas que todos os anos tentam sua sorte no mercado, cujos
membros se ocupam de todos os detalhes do negócio, exceto com a qualificação
do seu corpo gerencial. Mas, embora o quadro esteja melhorando gradativamente,
as cooperativas ainda não contam com uma gama variada de organizações de
apoio, incentivo e promoção, com acontece com as empresas capitalistas.
3.9 O Conhecimento Técnico da Produção
Uma etapa crucial no processo de implantação da cooperativa é a escolha
da atividade a ser exercida. Geralmente, esta escolha é baseada na afinidade do
grupo, o seu nível de conhecimento e o nível de demanda da comunidade em
relação ao tipo de produto ou serviço que será oferecido. Muito dificilmente esses
três elementos serão combinados, no caso especifico das Coofe, observa-se
razoável afinidade do grupo com a atividade de panificação, o nível de
conhecimento eleva-se continuamente, com o devido auxílio da ITCP, haja visto
37
que no início das operações da cooperativa este conhecimento era superficial
e restrito à poucos membros. Observa-se que a oferta do produto na comunidade
é bastante elevada, de forma que a concorrência em preço passa a ser acirrada,
por se tratar de um item alimentício cada vez mais pesado no orçamento das
famílias, provocando a sua substituição por alimentos mais acessíveis para as
comunidades de baixa renda.
Este fator, muito provavelmente, contribui em muito para a debilidade da
situação financeira do empreendimento e para as constantes crises de solvência
enfrentadas nos últimos meses, ameaçando inclusive a própria sobrevivência da
iniciativa, que vem se mantendo pelo empenho e pela capacidade dos membros
de se sacrificarem pelo projeto.
Quando comparamos as cooperativas populares com as do tipo tradicional,
no que se refere ao conhecimento técnico dos membros. Observa-se que as
iniciativas tradicionais geralmente contam com profissionais especializados e com
profundos conhecimentos na função que exercem, pois se trata de organizações
surgidas pela associação de indivíduos que trabalham numa determinada área ou
por trabalhadores que assumem a massa falida das empresas em que trabalham
já há algum tempo, portanto, são detentores de ampla experiência e grande
conhecimento acumulado.
Já para as iniciativas populares, as operações são mais difíceis em função
da ausência das condições acima, pois primeiro reúnem-se indivíduos carentes de
alguma ocupação, os quais terão que se adaptar a novas funções e situações
exigidas. Verifica-se assim, a necessidade de multiplicação de entidades de apoio
como a ITCP, bem como a melhoria da metodologia das mesmas, de forma a
estabelecer uma continua promoção da cooperativa, sem retirar a sua autonomia
e sem interferir na autogestão.
Inúmeras dificuldades tem comprometido a produção de mercadorias pela
Coofe, a começar pelo local onde está instalada, totalmente inadequado para um
ponto comercial. O imóvel é residencial, portanto não foi projetado para funcionar
como fábrica de pães. A Coofe está instalada num edifício de dois andares e em
38
função do desconforto térmico provocado pela operação do forno, os
moradores do andar superior tiveram que isolar um dos quartos da casa.
Na mesma gravidade estão os fatores referentes à segurança das
operações. Existem problemas com a fiação da casa, cujo aquecimento pode
provocar curtos-circuitos e até princípios de incêndio. Os corredores são muito
estreitos e a movimentação das fôrmas quentes causam acidentes entre os
cooperados, como pode ser contatado nas queimaduras dos braços de alguns
deles.
Além disso, se verificam problemas com o layout do ambiente de trabalho,
com a organização e o planejamento da produção. Em função das vias de
circulação serem muito estreitas, as fôrmas freqüentemente esbarram nas
paredes e os pães são lançados ao chão. Em alguns turnos, chegam a trabalhar
20 cooperados dividindo os mesmos cômodos, o que obstrui toda a produção e o
escoamento das fôrmas. É visível a desorganização do espaço físico na sala de
preparo, a qual serve também como deposito de material e de insumos e as
fermentadeiras ficam espalhadas pelo ambiente, dificultando ainda mais o
trabalho.
Ademais, é notável a ausência de padronização das atividades de produção
na cooperativa, pois a ordem de produção depende da própria equipe de trabalho
do turno da manha e o registro das operações tem sido muito irregular,
comprometendo o planejamento e o orçamento da produção.
3.10 O Modelo de Gestão
Certamente, uma das maiores dificuldades enfrentadas pelos
empreendimentos solidários diz respeito a ausência de padrões gerenciais
adequados a esta modalidade de organização. Ou seja, ao analisarmos a teoria
administrativa, verificamos que todo o conjunto de idéias formuladas sobre
administração de empresas é direcionado para a gestão da empresa capitalista
tradicional.
39
Esta carência de um modelo de gestão baseado nas características do
empreendimento solidário, pode provocar o enfraquecimento do mesmo, diante da
sua incapacidade de responder de forma eficiente aos desafios enfrentados
diariamente. Tal problema, acaba produzindo uma dificuldade adicional, pois além
do limitado conhecimento das técnicas de gestão, por parte dos membros da
Coofe, verifica-se também que nem sempre essa técnicas são as mais adequadas
para a solução dos problemas existentes no empreendimento.
Ainda com relação à gestão, observa-se que apesar dos constantes
avanços da arte de administrar na formulação das mais diferentes técnicas de
gerenciamento de empresas, ainda persiste uma grande necessidade de criação
de um modelo que compreenda a realidade das organizações situadas no campo
da economia solidária, baseado num novo perfil de organização, muito mais
participativa, democrática e igualitária.
Sendo assim, revela-se de suma importância o estudo e implementação
dos métodos mais adequados de gerenciamento de organizações como a Coofe,
dando-lhes melhores condições adaptação as contingências da economia
capitalista e, mais adiante, poder lançar as bases de um novo tipo de sociedade.
3.11 O Desafio Mercadológico
Nenhum outro desafio descrito neste trabalho tem ameaçado tão
seriamente a sobrevivência da Coofe quanto o desafio mercadológico, ou seja, as
atividades de seleção do mix de produtos a serem produzidos, a determinação dos
preços, a inexistência de promoções e a atividade de logística estão
comprometendo seriamente a própria continuidade do empreendimento.
Dois elementos, em especial, estão prejudicando seriamente as vendas da
Coofe, o primeiro deles é a falta de um ponto fixo para a cooperativa, que tenha
uma localização mais adequada para uma empresa comercial, visto que
atualmente a cooperativa esta funcionando num imóvel residencial adaptado para
funcionar como empresa, localizado num beco de uma rua de difícil acesso do
bairro da Engomadeira. A segunda dificuldade é a distribuição dos pães, pois o
40
maior volume de vendas da Coofe está nas operações em domicilio, onde os
membros se organizam em duplas para percorrer as diversas ruas do bairro,
buscando atender aos clientes novos e os habituais.
Levando em consideração o elevado nível de concorrência do mercado de
panificação, a manutenção de preços competitivos tem sido um outro desafio para
a cooperativa, na busca da elevação dos níveis de venda, de modo a alcançar um
patamar aceitável no que diz respeito aos custos da atividade e na geração das
sobras a serem distribuídas aos membros.
Portanto, apesar das deficiências do conhecimento e da experiências dos
cooperativados nas tomadas de decisões referentes a promoção do nível de
vendas do empreendimento, será exigido da Coofe, com o constante trabalho das
entidades de apoio, uma forte atuação no sentido de superar essas deficiências e
posicionar o empreendimento em condições de concorrer com as padarias
existentes no bairro.
3.12 O Processo de Comunicação
Muitos dos problemas apontados nesta pesquisa são agravados pela
deficiência observada na comunicação interna e externa à organização. Uma
cooperativa popular como a Coofe, pelas suas características, requer um modelo
de comunicação amplo e dinâmico, permitindo a todos os cooperativados o pleno
conhecimento das informações referentes a organização, de forma a permitir a
sua participação nas tomadas de decisões.
Diferentemente das empresas capitalistas tradicionais, nas quais as
informações são elementos da disputa pelo poder e o acesso a elas é feito
mediante controle, nos empreendimentos solidários, o livre acesso e posse das
informações é condição necessária para a autogestão do empreendimento.
Portanto, enquanto no primeiro caso temos apenas a figura do gerente utilizando
todas as informações disponíveis para tomar decisões, no caso das cooperativas
populares, é a posse coletiva das informações que garantira a participação de
todos na gestão e o caráter democrático do empreendimento.
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Esta eficiência no processo de comunicação é importante não apenas
no que se refere ao relacionamento com o publico interno, pois deve se estender
também a comunidade na qual a cooperativa atua, as entidades de apoio ao
empreendimento e, fundamentalmente, os consumidores. No caso da Coofe, o
que observamos é uma deficiência na comunicação com todos esses agentes.
A comunidade, de modo geral, desconhece a existência, a natureza e os
objetivos do empreendimento. As entidades de apoio precisam estabelecer um
novo padrão de comunicação com a cooperativa, de forma a melhor colaborar
com o seu desenvolvimento, a partir da melhoria do conhecimento de suas
dificuldades e limitações. Já na sua relação com o seu público consumidor, a
Coofe precisa não apenas melhorar a sua divulgação, enquanto empresa que
precisa ganhar mercado e, conseqüentemente aumentar as vendas, mas é
importante também o posicionamento do empreendimento de forma diferencia
dentro do mercado e, acima de tudo, assinalando as suas particularidades e
objetivos mais nobres, indo alem da geração de emprego e renda, cativando a
simpatia dos seus consumidores potenciais e valorizando o espírito associativo da
comunidade.
42
5.0. CONCLUSÃO
Apesar da proliferação das iniciativas de apoio a economia solidária
ocorrida nos últimos anos, muitos ainda são os desafios a serem enfrentados
pelos empreendimentos, a fim de adquirirem as condições necessárias para
sobreviverem como organizações economicamente viáveis. Em meio à diversas
dificuldades, os empreendimentos solidários vem conseguindo se manter
atuantes, disputando mercado com as empresas capitalistas e desenvolvendo
novas formas de ganhos para os seus membros, ganhos esse diferentes dos
econômicos em si, tais como a auto-estima, a identificação com o trabalho e com
o grupo produtivo, o companheirismo, além de uma noção crescente de autonomia
e cidadania. Tais formas de ganhos são verificados na Coofe e, acreditamos,
serem responsáveis não apenas pela motivação dos membros para o trabalho,
mas sobretudo pela persistência e credibilidade que eles tem com o projeto, o que
os faz perseverar no empreendimento, apesar dos longos períodos trabalhados
sem receber nenhum tipo de recompensa financeira pelo seu trabalho e, quando
isto acontece, o valor recebido é muito aquém do necessário para suprir as suas
necessidades.
Embora a Coofe receba apoio técnico da ITCP-UNEB e apoio financeiro do
Bansol-UFBa, ajuda esta que infelizmente nem todos os empreendimentos
solidários podem contar, verifica-se a continuidade das dificuldades enfrentadas,
inclusive com o agravamento dessas nos últimos meses. Pelo visto, este entrave
ao desenvolvimento da cooperativa pode estar associado à incapacidade da
atividade de panificação, dentro da estrutura atual do empreendimento, de gerar
renda suficiente para todos os membros, sendo atualmente objeto de análise
pelos cooperativados, a implantação de um nova atividade na cooperativa, capaz
de viabilizar economicamente a organização e produzir sobras suficientes para o
atendimento das necessidades dos seus membros.
Uma das limitações do presente trabalho é a falta de explicação para a
existência de profundas dificuldades na cooperativa, mesmo contando com
suporte técnico e financeiro, os quais tem se mostrado determinantes para a
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consolidação e o sucesso de muitas iniciativas solidárias. Tal explicação
mereceria inclusive a realização de novas pesquisas e estudos sobre o tema.
Um outro elemento que merece a atenção de estudos futuros é a
capacidade das cooperativas populares se desenvolverem no seio do capitalismo
sem degenerarem, ou seja, quais são as possibilidades dos empreendimentos
solidários obterem sucesso econômico sem degenerar, acabando como empresas
capitalistas comuns, principalmente quando o empreendimento se torna maior e
mais complexo.
De modo geral, verificamos que os desafios enfrentados pela Coofe se
enquadram no panorama geral traçado na parte inicial do trabalho, a partir dos
diversos autores que tem estudado os empreendimentos solidários. Esses
desafios nos parece estar freqüentemente associado a três elementos: os desafios
culturais, como conseqüência do ambiente forjado pela conjuntura
socioeconômica em torno da organização; os desafios de ordem técnica, como
conseqüência da baixa escolaridade dos membros, os quais muitas vezes
dominam o processo produtivo mas não estão preparados para pesquisar
mercados em busca de novas oportunidades de negócios, nem para acompanhar
a evolução das tecnologias referentes a produtos e processos; os desafios
inerentes a cada cooperativa em função do seu perfil, pois muitas vezes o tipo de
atividade desenvolvida pela cooperativa pode não ser a mais favorável á este tipo
de organização, pelo menos durante o período de consolidação do
empreendimento, alem disso a eficiência da organização pode estar
comprometida em função do perfil dos membros que a compõem ou da
comunidade onde atua.
Quando tratamos dos desafios definidos com culturais, verificamos na
Coofe a dificuldade da produção coletiva, principalmente no que diz respeito a
divisão entre trabalho manual e trabalho intelectual e na debilidade da autogestão
do empreendimento, a partir do recuo da grande maioria dos cooperativados dos
espaços de decisão, provavelmente sustentados em vivencias anteriores como
funcionários de empresas tradicionais, nas quais sempre foram excluídos da
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gestão. Ainda que na cooperativa as condições sejam diferentes, os
cooperativados não ousam romper o paradigma da submissão vivenciado em
experiências anteriores, o que muitas vezes os impede de construir uma gestão na
qual tenham, verdadeiramente, o poder de decisão.
Podemos facilmente observar a predominância de desafios de ordem
técnico-gerencial existente na Coofe, problemas esses cujas características se
aproximam bastante das relatadas na fundamentação teórica deste trabalho,
especialmente na pesquisa desenvolvida por Lisboa (1999).
É justamente na deficiência dos fatores de ordem técnica que estão os
maiores desafios para a consolidação da Coofe como empreendimento
economicamente viável, capaz de competir como as diversas empresas
capitalistas que atuam no seu ramo de atividade e gerar renda num volume
adequado para todos os seus cooperativados. Ainda no caso da Coofe, os
desafios de ordem técnica são constituídos pela deficiência conhecimento técnico
e de administração por parte dos membros, o que acaba por comprometer a
eficiência das decisões tomadas e a produtividade do trabalho realizado pela
cooperativa. Ao lado desses elementos estão a inexistência de um mecanismo
adequado de divisão do trabalho dentro da organização, que potencialize o
trabalho associativo e reduza a possibilidade de conflitos, alem da formulação de
um modelo de gestão antenado com as especificidades das organizações situadas
no campo da economia solidária, permitindo-lhes alcançar alto nível de
competitividade sem descaracterizar o seu perfil democrático, igualitário e
participativo.
Por fim, ainda sobre os desafios técnicos, observamos a existência de mais
dois fatores cujas dificuldades podem ter sua origem ligada diretamente ao baixo
nível de escolaridade do cooperativados. São eles: o desafio mercadológico,
ligado a gestão da comercialização dos produtos e o desafio de efetivação das
função administrativas dentro do empreendimento, cuja execução esta
freqüentemente associada as entidades externas de apoio, por forca do
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desconhecimento dos membros da operacionalização e da importância da
realização dessas atividades para o êxito do projeto.
Quando apontamos os desafios relacionados ao perfil da cooperativa,
estamos nos referindo a três elementos verificados na Coofe. São eles: a limitação
na visão do negócio, onde os membros buscam apenas a obtenção de renda, sem
levar em conta outras formas de ganhos possíveis com o trabalho associado, os
outros elementos são o perfil dos membros da cooperativa e a deficiência do
processo de comunicação da Coofe, fundamental na socialização do
conhecimento técnico-administrativo e na ampliação da participação política.
É importante ainda ressaltar que, como já foi registrado, este trabalho não
possui um caráter normativo, ou seja, ele não pretende apontar caminhos e
oferecer soluções para os problemas enfrentados pelos empreendimentos
solidários, nem esgotar todo o conteúdo referente ao tema, muito embora,
consideramos de grande contribuição as informações aqui registradas, o que de
alguma maneira contribuirá para a geração e desenvolvimento de iniciativas
genuinamente solidárias.
O futuro da economia solidária está diretamente ligado ao sucesso dos
diversos empreendimentos na busca e superação dos seus desafios. Pois, a
economia solidária só se transformará em uma iniciativa superior ao capitalismo
quando ela puder oferecer a parcelas crescentes da população, oportunidades
concretas de autosustento, usufruindo do mesmo bem-estar médio que o emprego
assalariado proporciona. Em outras palavras, para que a economia solidária se
transforme de paliativo dos males do capitalismo em competidor do mesmo, ela
terá que alcançar níveis de eficiência na produção e distribuição de mercadorias
comparáveis ao da economia capitalista, mediante o apoio de serviços financeiros,
científicos e tecnológicos solidários.
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6.0. BIBLIOGRAFIA
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