cláudia coutinho - dentre outras coisas

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Cotidiano Dentre Outras Coisas' Claudia Coutinho Johnny já lhes deixou amostra, na penúltima edição deste jornal, com a interessante crônica "Leio no ônibus, sim senhor". Falo de um jovem de vinte e três anos, mineiro de Sete Lagoas e re- sidente na Cidade Nova. Não um jovem como qualquer outro que você encontra no bar da esquina ou na agitação noturna, jogando con- versa fora madrugada adentro. Ao invés de dizer "Vou agitar esta noite que vai ser o bicho!", como a maioria dos jovens de sua idade, ele, recolhido em sua escri- vaninha, prefere debulhar palavras como um mágico, tecendo idéias, construindo coisas belas como: "Em noite de repouso, Quando desperto-me em pronta insônia, É que vejo esta chuva errônea, Errando de estação e endereço"... Ou então: "Inda é manhã nas idas do dia, E aquilo que seria remota lem- brança Brada seus tenores palavrões"... Se deixa de lado o verso e assu- me a prosa poética como em "Um homem que vivia no riacho", com a sensibilidade à flor da pele e ex- trema habilidade, Johnny comove- nos com sua arte ao dizer: ..." Até mesmo balança uma ca- noa manca nesta minha morada, neste meu riozinho... Isto, durante a tarde, quando a luz perde o gos- to. Neste instante de preguiça da luz batalhadora, por volta da Ave- Maria, num desânimo profundo, é a sombra que gosta de lamber o are- noso riacho, meu leito, durante um . tempo sádico, Pelo menos, neste meu desencanto, a noite é curta, como afirma a razão do relógio." É que o jovem poeta, amante da literatura e bom leitor desde crian- ça, acreditou na palavra como a melhor forma de se inscrever neste: mundo de incertezas e frustrações. Para ele, que lançou há pouco seu primeiro livro, "Dentre Outras Coi- sas", pela editora "Mulheres Emer- gentes", a palavra tem sido sua companheira nos momentos de s0- lidão, (e desse mal quem não há de sofrer ainda que vez ou outra?) a cristalização de suas angústias, a fugaz satisfação de seus desejos. Estudante de Direito na PUC- MG, Johnny Batista Guimarães, no frescor de sua juventude, descobre e realiza o que muitos só consegui- ram na maturidade. Se fala de amor? E como! ..."Dizer que se perdeu em meus poemas? Ai de mim! Leio-os, Leio-os, E só a encontro!" Como todo bom poeta, também chora (com dor de poeta) por algum . amor perdido. (Que ser humano ... não o perdeu, desde o início?): . "Tropeço foi arrastá-Ia . Portodaartéria, :: Esquecendo-me de que um dia ': Teria que percorrê-las " ~ I. Forçosamente." :: Há alguma tristeza também. Uma .: certa amargura que espero poder ali- :: viar com meu carinho, nesta singela :: mas merecidahomenagem. :: "

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Page 1: Cláudia Coutinho - Dentre Outras Coisas

CotidianoDentre Outras Coisas'

Claudia Coutinho

Johnny já lhes deixou amostra,na penúltima edição deste jornal,com a interessante crônica "Leio noônibus, sim senhor".

Falo de um jovem de vinte e trêsanos, mineiro de Sete Lagoas e re-sidente na Cidade Nova. Não umjovem como qualquer outro quevocê encontra no bar da esquina ouna agitação noturna, jogando con-versa fora madrugada adentro.

Ao invés de dizer "Vou agitaresta noite que vai ser o bicho!",como a maioria dos jovens de suaidade, ele, recolhido em sua escri-vaninha, prefere debulhar palavrascomo um mágico, tecendo idéias,construindo coisas belas como:

"Em noite de repouso,Quando desperto-me em pronta

insônia,É que vejo esta chuva errônea,Errando de estação e endereço"...Ou então:"Inda é manhã nas idas do dia,E aquilo que seria remota lem-

brançaBrada seus tenores palavrões"...Se deixa de lado o verso e assu-

me a prosa poética como em "Umhomem que vivia no riacho", coma sensibilidade à flor da pele e ex-trema habilidade, Johnny comove-nos com sua arte ao dizer:

..." Até mesmo balança uma ca-noa manca nesta minha morada,neste meu riozinho... Isto, durantea tarde, quando a luz perde o gos-to. Neste instante de preguiça daluz batalhadora, por volta da Ave-Maria, num desânimo profundo, éa sombra que gosta de lamber oare-

noso riacho, meu leito, durante um .tempo sádico, Pelo menos, nestemeu desencanto, a noite é curta,como afirma a razão do relógio."

É que o jovem poeta, amante daliteratura e bom leitor desde crian-ça, acreditou na palavra como amelhor forma de se inscrever neste:mundo de incertezas e frustrações.Para ele, que lançou há pouco seuprimeiro livro, "Dentre Outras Coi-sas", pela editora "Mulheres Emer-gentes", a palavra tem sido suacompanheira nos momentos de s0-lidão, (e desse mal quem não há desofrer ainda que vez ou outra?) acristalização de suas angústias, afugaz satisfação de seus desejos.

Estudante de Direito na PUC-MG, Johnny Batista Guimarães, nofrescor de sua juventude, descobree realiza o que muitos só consegui-ram na maturidade.

Se fala de amor? E como!..."Dizer que se perdeu em meus

poemas?Ai de mim!Leio-os,Leio-os,E só a encontro!"Como todo bom poeta, também

chora (com dor de poeta) por algum .amor perdido. (Que ser humano ...não o perdeu, desde o início?): .

"Tropeço foi arrastá-Ia .Portodaartéria, ::Esquecendo-me de que um dia ':Teria que percorrê-lasSó "~ I.Forçosamente." ::Há alguma tristeza também. Uma .:

certa amargura que espero poder ali- ::viar com meu carinho, nesta singela ::mas merecidahomenagem. ::"