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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE
CURSO DE SERVIÇO SOCIAL
ELENICE ARAÚJO ANDRADE
AS PERSPECTIVAS DOS USUÁRIOS DE CRACK EM TRATAMENTO EM UMA COMUNIDADE TERAPÊUTICA NO PROCESSO DE
REINSERÇÃO SOCIAL
FORTALEZA 2014
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ELENICE ARAÚJO ANDRADE
AS PERSPECTIVAS DOS USUÁRIOS DE CRACK EM TRATAMENTO EM UMA COMUNIDADE TERAPÊUTICA NO PROCESSO DE
REINSERÇÃO SOCIAL
Monografia apresentada ao curso de graduação em Serviço Social da Faculdade Cearense - FaC, como requisito para obtenção do título de bacharelado. Orientadora: Verbena Paula Sandy
FORTALEZA – CE 2014
Bibliotecário Marksuel Mariz de Lima CRB-3/1274
A553p Andrade, Elenice Araujo
As perspectivas dos usuários de crack em tratamento em uma
comunidade terapêutica no processo de reinserção social /
Elenice Araujo Andrade. Fortaleza – 2014.
83f. Orientador: Prof.ª Esp. Verbena Sandy Paula.
Trabalho de Conclusão de curso (graduação) – Faculdade
Cearense, Curso de Serviço Social, 2014.
1. Crack – dependência química. 2. Comunidade terapêutica.
3. Reinserção social. Paula, Verbena Sandy. II. Título
CDU 364
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ELENICE ARAÚJO ANDRADE
AS PERSPECTIVAS DOS USUÁRIOS DE CRACK EM TRATAMENTO EM UMA COMUNIDADE TERAPÊUTICA NO PROCESSO DE
REINSERÇÃO SOCIAL
Monografia apresentada como exigência para a obtenção do título de bacharelado em Serviço Social, outorgado pela Faculdade Cearense – FaC, tendo sido aprovada
pela banca examinadora composta pelos professores.
Data de aprovação:____/___/____
__________________________________________ Professora Orientadora: Esp. Verbena Sandy Paula
____________________________________________ Prof.Ms.Jefferson Falcão Sales
______________________________________________ Prof.ª. Esp. Talitta Cavalcante Albuquerque Vasconcelos
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AGRADECIMENTOS
Ao meu Deus, obrigada, Senhor, por tudo.
Ao meu amor Fernando, que sempre me incentivou e me apoiou em todos os
momentos.
A minha mãe, que foi meu pai também, e as minhas irmãs.
A Emille, Sara e Mirella, obrigada pelo amor e carinho.
A minha filha amada, Débora Andrade.
Agradeço a todas as minhas amigas de turma, em especial a Gerlânia, Helane
e Ana Maria, por me aturarem, pelo apoio no dia a dia, sem as quais não seria
possível chegar até aqui.
As minhas colegas de estágio, Vanessa, Ilana e Iana, o qual foi uma
experiência ímpar.
A todos os profissionais do Desafio Jovem, em especial meu amigo Jan Diego,
muito obrigada.
A todos os sujeitos da minha pesquisa pela disponibilidade e confiança.
A minha supervisora de campo Natalia Fialho, pela sua contribuição
importantíssima.
A minha orientadora Verbena Sandy, pela disponibilidade, compreensão e
paciência.
Aos meus queridos mestres, com carinho.
Aos professores que participaram da minha banca meu imenso agradecimento.
5
Ao Sistema de Saúde Escola órgão ligado à Prefeitura Municipal de Fortaleza,
pela contribuição importantíssima neste processo.
Agradeço a todos que contribuíram de forma direta ou indireta para a
realização deste trabalho.
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“A sociedade, qualquer que seja seu nível, quer falar, quer discutir, quer aprender sobre drogas. Quer, sobretudo, partilhar medo. Não é justo, nem estratégico, colocar em cima desse pânico o discurso de terror. Não podemos reduzir a percepção do problema. Devemos compreender, sempre, que se trata de uma questão multifatorial e complexa” (CAVALCANTE,1997,p.14).
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RESUMO
O consumo de substâncias psicoativas ocorre desde os primórdios da civilização. Inicialmente, o homem recorria a produtos naturais, e eram poucas as variações dos tipos de drogas, o que se alterava na verdade era a maneira de usar e as motivações que levam a isto. A evolução da sociedade e o desenvolvimento de novas tecnologias, entretanto, acabaram por contribuir para o surgimento de drogas cada vez mais potentes e, com grande poder de dependência, dentre elas, pode-se destacar o crack. Atualmente no Brasil, o uso de crack tem crescido de forma desenfreada. Tal fenômeno ganhou grande visibilidade e tem se tornado um problema social e de saúde pública. Especialmente, porque há, por parte dos dependentes dessa substância, uma quebra de vínculos sociais e comunitários, com consequente comprometimento das relações familiares e sociais. Sendo assim, o presente trabalho busca responder aos seguintes questionamentos: qual a percepção dos indivíduos sobre o processo de Reinserção Social? Qual a contribuição deste modelo de tratamento para processo de Reinserção Social? Quais dificuldades que envolvem o processo de Reinserção? Tem-se como objetivo geral conhecer as perspectivas dos usuários de crack em tratamento na Comunidade Terapêutica Desafio Jovem do Ceará Dr. Silas, no que concerne ao processo de reinserção social. Trata-se de uma de uma pesquisa qualitativa, descritiva e bibliográfica. Para atingir o objetivo proposto, se recorreu a entrevistas semiestruturadas, as quais foram, posteriormente, analisadas em paralelo com a literatura pertinente ao tema. A amostra foi composta de quatro residentes do sexo masculino, em tratamento residencial na Comunidade em questão. Conclui-se que o processo de reinserção social é lento e perpassa por várias etapas.
Palavras chave: Crack. Dependência química. Comunidade Terapêutica. Reinserção Social.
ABSTRACT
The consumption of psychoactive substances occurs since the dawn of civilization . Initially , the man resorted to natural products , and there were few changes in the types of drugs , which was actually changed the way you use and the motivations that lead to this. The evolution of society and the development of new technologies , however, eventually contributing to the emergence of increasingly powerful drugs and with great power dependency , among which we can highlight the crack . Currently in Brazil , the use of crack cocaine has grown rampant . This phenomenon has gained great visibility and has become a social and public health problem. Especially because there is , by the dependents of that substance , a breakdown of social ties and community , with consequent impairment of family and social relationships . Thus , this paper seeks to answer the following questions : what is the perception of individuals about the process of Probation ? What is the contribution of this treatment model for Social Reintegration process? - Difficulties which involve the process of reintegration ? Has as main objective to know the prospects of crack users in treatment in Therapeutic Community Youth Challenge of Ceará Dr. Silas , regarding the social reintegration process. This is one of a literature search , qualitative, descriptive and exploratory nature. To achieve the proposed objective , we used the semi-structured interviews, which were subsequently analyzed in parallel with the pertinent literature. The sample consisted of four male residents in residential treatment in the community in question . We conclude that the reinsertion process is slow and permeates several steps .
Keyword: Crack. Chemical dependency. Therapeutic Community. Probation
LISTA DE SIGLAS
ANVISA – Agencia Nacional Vigilância Sanitária
AIDS - Síndrome da imunodeficiência adquirida
CAPS - Centro Atendimento Psicossocial
CAPS _ Centro de Atenção Psicossocial
CEBRID- Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas
CT- Comunidade Terapêutica
CID-10- Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas
Relacionados com a Saúde.
DSM IV – O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (Diagnostic
and Statistical Manual of Mental Disorders – DSM)
DST – Doença Sexualmente Transmissível
FIO CRUZ- Fundação Oswaldo Cruz
MS- Ministério da Saúde
OBID – Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas
OMS – Organização Mundial de Saúde
PNAD - Política Nacional sobre Drogas
SENAD- Secretaria Nacional Anti-Droga
SUS – Sistema Único de Saúde
SPA – Substância Psicoativa
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11
1 USO DE DROGA NA HUMANIDADE .................................................................... 19
1.1 Breve histórico do uso de drogas ............................................................ 19
1.2 Conceituando a dependência, o uso e o uso/nocivo de substâncias
químicas .................................................................................................. 24
1.3 Aspectos Socioculturais do consumo de crack no Brasil ........................ 28
2 POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE DROGAS ............................................................ 33
2.1 Legislações sobre drogas no Brasil ......................................................... 34
2.2 Rede de atenção aos usuários de crack e outras drogas ....................... 44
2.3 Comunidade terapeutica como rede de apoio ......................................... 48
3 REINSERÇÃO SOCIAL DO DEPENDENTE QUÍMICO ......................................... 52
3.1 O cenário ................................................................................................. 52
3.2 História dos sujeitos ............................................................................... 56
3.3 Tratamento residencial como possibilidade ............................................. 61
3.4 Dificuldades e possibilidades que envolvem o processo de reinserção
social....................................................................................................... 65
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 66
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 68
APÊNDICES .............................................................................................................. 76
ANEXOS ................................................................................................................... 82
INTRODUÇÃO
O uso de drogas1 é um fato tão antigo quanto a própria humanidade. A história
mostra que o homem faz uso de substâncias alteradoras da consciência desde os
primórdios da humanidade; o que se altera é o motivo, a substância e o modo de
uso dela. No entanto, a relação entre o homem e a droga é histórica e se perpetua
entre gerações (BUCHER, 1992).
Na atual sociedade, entre as drogas mais conhecidas e mais usadas estão: o
álcool, a maconha, o tabaco, a cocaína e seus derivados. Do ponto de vista legal,
são classificadas em lícitas (permitidas por lei) e ilícitas (proibidas por lei). Quanto a
sua origem, são classificadas em três grupos: naturais (plantas contêm drogas
psicoativas), semissintéticas (resultado de reações químicas realizadas em
laboratório nas drogas naturais) e sintéticas (produzidas, unicamente, por
manipulações químicas em laboratórios, não dependendo, para sua confecção, de
substâncias vegetais ou animais como matéria-prima). Já em relação ao consumo,
distingue-se por: uso, abuso e dependência (FRANKENBERGER, 2009).
Conforme Duarte e Morihisa (2011), existem diferenças entre uso, abuso e
dependência de drogas. O uso, segundo os autores, é o consumo de alguma
substância psicoativa; torna-se abusivo quando há uma ingestão cada vez maior em
doses elevadas ocasionando problemas de ordem física, psíquica e danos sociais.
Já a dependência, se caracteriza pelo prejuízo ou sofrimento significativo.
Para diagnosticar a dependência, destacam Duarte e Morihisa (2011, p. 48), é
importante observa a Classificação Internacional de Doenças (CID-10) e o Manual
Diagnóstico e Estatístico (DSM - IV), que a classificam como sendo: “um mal-
adaptativo com prejuízo ou sofrimento clinicamente significativos”.
Nessa mesma linha, seguem Ribeiro e Rezende (2013, p. 37), os quais
destacam que, para diagnosticar a dependência, a CID-10 aconselha se observar a
1 De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), droga é qualquer substancia não
produzida pelo organismo que tem propriedade de atuar sobre um ou mais de seus sistemas, produzindo alterações em seu funcionamento.
12
presença de pelo menos três fatores por um período de um ano. Dentre eles, pode-
se destacar:
a) um forte desejo ou senso de compulsão para consumir a substância; b)
dificuldades em controlar o comportamento de consumir a substância em termos de
seu início, término e níveis de consumo; c) um estado de abstinência³ fisiológica
quando o uso da substância cessou ou foi reduzido, como evidenciado por:
síndrome de abstinência para a substância ou o uso da mesma substância (ou de
uma intimamente relacionada) com a intenção de aliviar ou evitar sintomas de
abstinência.
Segundo Costa (2001), para a Organização Mundial de Saúde (OMS), a
dependência química é considerada uma doença, por estar associada a fatores de
ordem psíquica e social, não tendo uma causa definida. Ela surge em decorrência
de múltiplos fatores, tendo mais influência em determinados indivíduos que em
outros.
No contexto do crack, conforme Perrenoud e Ribeiro (2012, p. 34), a
dependência é um fenômeno relativamente novo, surgido na década de 80 nas
periferias dos Estados Unidos. Nesse sentido, o autor relata: “[...] essa substância
produzia uma euforia de grande magnitude e curta duração, seguida de fissura
intensa e desejo por uma nova dose [...].” Além do efeito da droga, dizem os autores,
outro grande atrativo era o preço baixo em relação às outras substâncias
psicoativas. Assim, o número de adeptos do crack cresceu consideravelmente.
Segundo dados da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ. 2013), existem no
Brasil atualmente cerca de 370 mil usuários de crack; tal informação é de extrema
relevância quando colocada em confronto com realidade do aumento do índice de
violência no Brasil, pois pesquisas indicam que o crack funciona como
potencializador das agressões.
De acordo com Sapori (2010, p. 4), o fenômeno crack envolve impactos mais
profundos nas relações sociais, por se tratar de uma droga que produz efeitos
peculiares na vida de seus usuários. Nesse sentido, as consequências são danosas
13
tanto a nível individual e familiar quanto no contexto da sociedade, pois tem
influência direta sobre o aumento da violência e da criminalidade. In verbis:
A entrada do crack em Belo Horizonte é seguida de uma epidemia de homicídios que atingiu a cidade a partir de 1997. Os resultados obtidos pela pesquisa mostram que há uma forte evidência de que o crescimento das ocorrências de homicídios em Belo Horizonte a partir de 1997 possa ser explicado, em grande medida, pela intensificação dos conflitos relacionados ao tráfico de drogas.
Para Ganev e Lima (2011), reinserir essa população dentro dos padrões
comportamentais esperados pela sociedade é um desafio multidisciplinar,2 de modo
que diversos saberes e práticas envolvidos garantam a coesão do atendimento.
Diante do exposto, há a necessidade de uma atenção diferenciada no que diz
respeito ao tratamento, à recuperação e à reinserção social dos dependentes de
crack.
Buscando dar uma resposta às mobilizações sociais com necessidades
advindas de uma nova realidade brasileira, surgiram vários mecanismos para
responder uma problemática cada vez maior e complexa. Neste sentido, foi criada a
Rede de Atenção psicossocial aos usuários de crack e outras drogas, a fim de
garantir um tratamento mais humanizado que se difere do anterior.
Neste sentido, há muito tempo já atua no Ceará uma das instituições pioneiras
a qual elegemos como campo de pesquisa; é o Desafio Jovem do Ceará Dr. Silas
Munguba, denominada de comunidade terapêutica, baseada no modelo psicossocial
e espiritual, que trabalha com a convivência entre pares. Tal entidade atua na área
da dependência química, na perspectiva de cuidar do indivíduo em sua totalidade,
na prevenção, tratamento e reinserção social, atuando desde 1975, há quase quatro
décadas no município de Fortaleza, atendendo pessoas de todo o Brasil, localizada
na av. Dedé Brasil, 565, no bairro da Parangaba.
A aproximação do campo de pesquisa e o interesse pelo tema se deu a partir
da nossa vivência enquanto estagiária na instituição, quando observava e
2 [...] é preciso insistir que, se falamos em tratar para reinserir socialmente indivíduos dependentes de
drogas, é porque tal dependência, de algum modo, teve por consequências (para além dos aspectos meramente físicos e psíquicos): isolamento, rompimentos, desfiliação face a pessoas, lugares, circunstâncias, instituições, atividades [...] (GANEV; LIMA, 2011, p. 114).
14
acompanhava o trabalho da assistente social daquela instituição nos atendimentos
com os residente e as suas respectivas famílias durante todo o processo de
tratamento, recuperação e ao retorno ao lar, enquanto estagiária de Serviço Social
tivemos o prazer de acompanhar muitos casos.
Neste sentido, a grande inquietação era entender o universo dos usuários de
crack que chegavam à instituição de uma maneira tão comprometida em todos os
aspectos, seja com a família, com emprego, com o próprio sujeito, seja em relação
ao físico ou ao psicológico. Há uma fragilização em todos os aspectos. Ao aderirem
ao tratamento, surge a possibilidade de recomeçar uma vida diferente da anterior. O
objeto geral deste trabalho é analisar as perspectivas dos usuários de crack em
tratamento a nível residencial no Desafio Jovem do Ceará no processo de
Reinserção Social.
Busca-se responder, portanto, aos seguintes objetivos específicos: conhecer a
percepção dos indivíduos sobre o processo de Reinserção Social; verificar a
contribuição deste modelo de tratamento para processo de Reinserção Social; e
apontar as dificuldades que envolvem o processo de Reinserção.
Definiram-se como critério para participar da pesquisa os residentes há mais de
três meses no Desafio Jovem do Ceará, do sexo masculino, com idade mínima de
16 anos e que tenham sido usuários de crack. O lapso temporal de três meses foi
adotado, porque, ao completar esse período, iniciam-se os processos de interação
entre residentes na instituição e seus familiares.
Essa interação se caracteriza por visitas periódicas do usuário aos seus
familiares, momento marcado por grandes expectativas para os sujeitos envolvidos
nesta dinâmica. A equipe de profissionais também é tomada por inquietações
recorrentes; nesse contexto, busca-se saber: como pensam estes indivíduos? Como
reagem ao voltar para o mesmo ambiente depois de algum tempo livre do uso de
drogas? Quais as perspectivas, os sonhos e os anseios em recomeçar uma nova
vida longe das drogas?
Inicialmente, a pesquisa contou com 15 (quinze) residentes da Comunidade
Terapêutica (CT), porém, no decorrer do processo, alguns sujeitos, por motivos
15
diversos,3 deixaram de participar do estudo. Desse montante inicial, apenas quatro
alunos deram continuidade ao tratamento. Todavia, o número elevado de
desistência e a não adesão ao tratamento para dependência do crack é, conforme
relata Laranjeira (2012), um dos principais problemas enfrentados pelas
comunidades que se dedicam a essa tarefa.
Visando resguardar a identidade dos sujeitos pesquisados, estes serão
apresentados com nomes fictícios. Assim, foi adotada a sugestão de que os sujeitos
envolvidos na pesquisa foram alcunhados com nomes de pedras preciosas:
Turmalina, 23 anos, solteiro, estudou até o 3º ano do ensino médio, iniciou
consumindo álcool e tabaco por volta dos 15 anos de idade, Seu primeiro contato
com a “pedra” foi aos 16 anos de idade. Está em tratamento residencial há quatro
meses.
Topázio, 24 anos, solteiro, estudou até a 5ª série do ensino fundamental.
Começou a beber com 11 anos de idade. Usou maconha, cocaína, mesclado e, aos
18 anos de idade, conheceu o crack. Está em tratamento residencial há quatro
meses.
Diamante, 33 anos, solteiro, estudou até a 3ª série do ensino fundamental.
Usuário de álcool, maconha, cocaína e crack. Aos 14 anos de idade iniciou sua
jornada no submundo da dependência, fazendo uso de substancias alteradoras de
consciência por quase duas décadas. Está em tratamento residencial há quatro
meses.
Rubi, 33 anos, solteiro, estudou até 5ª série do ensino fundamental. Usuário
de álcool, maconha, mesclado, cocaína, psicotrópico e crack. Seu primeiro contato
com as droga foi aos 13 anos de idade. Nos últimos sete anos, o crack passou a ser
a droga que mais consome. Está em tratamento há seis meses.
A idade dos sujeitos pesquisados variou entre 23 e 33 anos e a média de idade
para o ingresso no consumo de substâncias alteradoras de consciência foi de 13
3 Dos 15 (quinze) sujeitos que iniciaram a pesquisa 3 (três) abandonaram o tratamento; 5 (cinco)
foram transferido para outra modalidade de tratamento; 3 (três) tiveram alta a pedido.
16
anos. No concernente à escolaridade, apenas um dos pesquisados completou o
ensino médio, dois cursaram até a 5ª série e um fez até a 3ª série do ensino
fundamental. Em relação às drogas, percebe-se que todos citaram terem feito uso
de múltiplas substancias psicoativa, porém o crack era a principal droga de
consumo.
O percurso metodológico do presente trabalho foi desenvolvido a partir de uma
pesquisa bibliográfica, da leitura de livros, revistas, material impresso, internet,
dentre outros que abordam o tema; qualitativa, uma vez que tem como meta
compreender e interpretar a percepção dos sujeitos envolvidos; descritiva, pois, o
registro e a interpretação dos fatos do mundo físico sem a interferência do
pesquisador; e exploratória, realizada através de entrevistas semiestruturadas.
A pesquisa bibliográfica é o ponto inicial de todo e qualquer trabalho científico,
e é desenvolvida com base em material já elaborado constituído principalmente de
livros e artigos científicos. Conforme Gil (2002, p. 44): “[...] a principal vantagem da
pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma
gama de fenômenos muita mais ampla do que aquela que poderia pesquisar
diretamente.” Sendo assim, para que alcançássemos os objetivos deste trabalho, foi
necessário um levantamento bibliográfico a respeito do tema.
A pesquisa qualitativa se caracteriza por um conjunto de diferentes técnicas
interpretativas que visam descrever e decodificar os componentes de um sistema
complexo de significados. Tem por objetivo traduzir e expressar os sentidos dos
fenômenos do mundo social. Minayo (2010, p. 22), ao discorrer acerca desse
método de estudo, destaca que “a abordagem qualitativa se aprofunda no mundo
dos significados. Esse nível de realidade não visível precisa ser exposta e
interpretada, em primeira instância, pelos próprios pesquisados”.
Segundo Velho (2008), é na pesquisa qualitativa que o pesquisador faz uma
análise profunda do indivíduo e do seu meio social, daí a importância do contato do
pesquisador com a realidade pesquisada, onde o sujeito pesquisado poderá ser
observado de diferentes maneiras. Portanto, o método qualitativo se mostra eficaz
para os objetivos traçados para este trabalho.
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Já a pesquisa descritiva faz uso de dados ou fatos colhidos da própria
realidade, tendo a coleta de dados como uma das suas tarefas principais.
Desenvolve-se principalmente nas ciências humanas e sociais. No presente
trabalho, o instrumento utilizado foi a entrevista semiestruturada, com o intuito de
compreender a realidade de maneira reflexiva.
A entrevista semiestruturada, segundo Minayo (2010), combina perguntas
fechadas e abertas, em que o entrevistador tem a possibilidade de discorrer sobre o
tema em questão sem ter que apresentar a indagação formulada, as entrevistas
foram gravadas e o sigilo, garantido; ocorreram entre os meses de agosto e
setembro de 2013. A adesão à pesquisa se deu de forma voluntária, com a entrega
e esclarecimento do termo de livre consentimento, explicado o objetivo da pesquisa
e que a não participação não causaria nenhum prejuízo aos residentes e que a
recusa não será motivo de nenhuma restrição futura de acesso aos serviços
prestados no Desafio Jovem do Ceará e, caso consentissem em participar, a
qualquer momento poderiam desistir e se retirar, sem nenhum constrangimento.
No primeiro capítulo, fez-se um breve histórico sobre o uso de droga pela
humanidade, como esse uso foi se alterando até chegar aos dias atuais.
Conceituamos a dependência química como doença que acarreta problemas
psicossociais e é considerada atualmente um problema de saúde pública e foram
feitas considerações sobre os aspectos socioculturais do uso do crack no Brasil.
No segundo capítulo, houve uma exposição sobre a trajetória da Política Sobre
Drogas no Brasil, deu-se ênfase na criação da Lei 11.343/06 que estabelece o
Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas – SINASD; fez-se alusão à elaboração
do Plano Crack, que prevê parcerias do Estado com as Comunidades Terapêuticas
e os equipamentos disponibilizados pelo Estado para tratar pessoas com problemas
em decorrência do crack e outras drogas.
No terceiro capítulo, as considerações foram em relação ao campo da
pesquisa, trata-se de uma CT, no município de Fortaleza, Desafio Jovem do Ceará,
instituição pioneira na área da dependência química, baseada no modelo
psicossocial e espiritual, que trabalha com a convivência entre os membros.
apresentou-se o trabalho desenvolvido pela instituição, o modelo de tratamento, as
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principais atividades trabalhadas com os residentes e análises dos dados da
pesquisa.
1 USO DE DROGA NA HUMANIDADE
A evolução do consumo de drogas nas sociedades ocidentais pode ser
analisada quanto à sua incidência cultural. Porém, nos últimos trinta anos, estudos
indicam uma significativa mudança, entre os níveis de consumo e as consequências
danosas deste uso abusivo, cada vez mais presente em nossa sociedade, são,
principalmente, o aumento da criminalidade, um maior índice de acidente de trânsito
em decorrência do consumo de drogas. Assim, são vários os problemas sociais e
familiares em decorrência do uso de drogas lícitas e ilícitas. Sendo assim, cabe
distinguir entre uso e abuso de drogas no mundo atual do modelo antigo.
1.1 Breve histórico do uso de drogas
O uso de substâncias alteradoras de consciência pelo homem não é um
fenômeno recente; tem-se registro desse ato em diversos períodos da civilização,
variando de uma cultura para outra. As relações estabelecidas entre o homem e as
substâncias psicoativas, bem como o significado atribuído a elas, ganham
dimensões diferentes a partir das transformações sociais e históricas que ocorreram
no mundo. Duarte e Morihisa (2011, p. 42) caminham nesse sentido ao afirmarem
que o uso de drogas
[...] é fenômeno antigo e perpassa diversas culturas, seu uso se dá desde por razões culturais, religiosas, por recreação ou como forma de enfretamento de problemas, para transgredir ou transcender, como meio de ressocialização ou para se isolar; o homem sempre se relacionou com drogas [...].
Niel (2011, p. 139) afirma que diversos registros históricos comprovam o uso
de substâncias entorpecentes pelo homem, seja com objetivos farmacológicos ou
ritualísticos. Segundo o autor, por volta do ano 2.000 a.C., verifica-se o uso da
papoula (ópio) e da Cannabis (maconha), com finalidades terapêuticas e
ritualísticas. Diz ainda que esse hábito foi muito difundido principalmente na China,
na Índia e no Egito, 4.000 anos a.C. Conforme o autor, na atual região do Irã, os
sumérios lançavam mão da papoula de ópio, conhecida como “planta da alegria”,
como uma forma de obter contato com os deuses.
20
Bergeron (2012) também relata que alguns povos que viviam na Mesopotâmia,
há 3.000 a.C., já faziam uso de substância psicoativas, para alguns fins, porém,
segundo o autor, durante a Idade Média, no ano de 1.500 a.C., houve um aumento
significativo do plantio do ópio por camponeses europeus, resultando na
diversificação das finalidades do consumo dessa substância. Nesse novo contexto, o
uso do ópio assumia um caráter terapêutico, analgésico e anestésico, para
proporcionar a sensação de bem-estar e euforia, sendo mais frequente no meio da
elite burguesa europeia.
Conforme Bucher (1992), por volta de 1800 d.C., o uso da cocaína
(Erythroxylum coca) alcançou grandes proporções. De início, diz o autor, por causa
das propriedades analgésicas e anestésicas; depois, seu consumo adquiriu maiores
dimensões. Dentre outros fins, a substância era usada como tonificante e fortificante
de vinho (uma mistura de álcool com folhas de coca), e como remédio para a
dependência da morfina.
Nesse sentido, assevera Bucher (1992), Sigmund Freud, foi o primeiro médico
a usá-la como antídoto para a dependente de morfina quando receitou a substância
para um amigo que fazia uso contínuo da morfina. A droga, inicialmente ministrada
como antidepressiva e analgésica, diz o autor supramencionado, se destacou por
provocar reações adversas, tais como: alteração de humor, agressividade e
dependência. O que culminou com a sua proibição. Ao refazer a história dessa
substância, o autor relata que
[...] ela foi extraída das folhas da coca meados do século passado; em 1860, o químico alemão Niemann conseguiu isolar, entre os seus numerosos alcaloides, o alcaloide principal (80%) e os chamou de “cocaína”. Em 1898 foi descoberta a exata fórmula de sua estrutura química; em 1902, Willstatter (posteriormente prêmio Nobel) produziu cocaína sinteticamente em laboratório. Sob forma de cloridrato de cocaína, ela forma um pó branco cristalino „neve‟ [...] (BUCHER, 1992, p. 118).
Embora consumida em larga escala pelos povos andinos, o uso da cocaína
pela via pulmonar era desconhecido na América do Sul antes dos anos de 1970.
Somente a partir desta década foi que se popularizou o consumo inalado da
substância, tanto nos países produtores quanto nos Estados Unidos da América. Na
transição para os anos 80, dizem Perrenoud e Ribeiro (2012, p. 33), surge nos
Estados Unidos da América a cocaína na forma base livre,
21
[...] ou freebasing, sintetizada a partir da adição de éter sulfúrico a cocaína refinada em meio aquoso altamente aquecido [...] assim como o consumo da pasta básica o freebasing é considerada o precursor do crack nos Estados Unidos [...]
O uso de substancias alteradoras de consciência pelos povos brasileiros
também não é um fenômeno recente. Segundo Figueiredo (2002), relatos históricos
mostram que foram os escravos africanos que trouxeram a maconha (cannabis) para
o Brasil, como uma maneira de cultivar algo que já lhes era familiar. Posteriormente,
o cultivo foi disseminado por todo o país, o que facilitou o uso entre as diferentes
etnias: negros, índios e brancos.
Durante a ditadura militar, diz Buscher (1992), o Brasil teve sua maior fase de
repressão contra o uso da maconha, em 1933 aconteceram várias prisões referentes
ao comércio ilegal de maconha. Em 1938, o Presidente da República Getúlio
Vargas, lança o Decreto-Lei de nº. 891 que proíbe o plantio, cultivo, colheita e
exploração da maconha, em todo território nacional.
Outro fato que Buscher (1992) destaca é que, a partir da década de 1950, a
indústria farmacológica ganha destaque com a formulação de vários medicamentos
dentre eles os barbitúricos, largamente utilizados como sedativo, uso esse que,
devido ao elevado risco de suicídio, foi banido após a criação dos
benzodiazepínicos. Porém, diz o autor, a partir dos anos de 1960, se propaga a ideia
da contracultura e a ideologia hippie, que divulga o uso de substâncias psicoativas
como modo de vida essencial à dinâmica de se viver na contemporaneidade.
[...] a contestação hippie deu um tom aos movimentos alternativos, a busca do belo, do prazeroso, do flower-power na terra. A fé nos ideais idílios de pureza e de bondade juntava-se a experiências psicodélicas. A efervescência das discussões políticas, a intensidade da agitação cultural, o entusiasmo pela abertura de novos caminhos cosmopolíticos associavam-se ao florescimento de um novo misticismo, oscilante entre o fervor religioso da ingenuidade e o fanatismo sectário de ideologia de partido (BUSCHER, 1992, p. 28).
No entanto, com as mudanças econômicas e sociais, o movimento hippie perde
um pouco sua influência e o encanto, conforme Buscher (1986, p. 133): “[...] a
recusa do modelo dos pais, a exaltação de novos modos de viver e militantismo
cordial cederam a um desencanto cada vez mais radical [...].‟‟ A busca por uma vida
alternativa aos poucos foi cedendo lugar ao modo de viver da atual sociedade.
22
Bergeron (2012, p. 29), entretanto, se refere a uma diversificação das drogas, o
que, consequentemente, causou a alteração do perfil destes usuários:
[...] primeiramente, os produtos utilizados se diversificam: depois da maconha, que começa a ser cada vez mais consumida nos anos 1960, é a heroína (nos anos 1970), em seguida a cocaína e o crack (a partir dos anos 1980) é finalmente, as anfetaminas e o esctasy, nos anos 1990, que, juntos passam a formar o essencial dos produtos ingeridos [...] atualmente além dos estudantes, são os jovens dos meio menos favorecido, os desempregados, os operários ou os trabalhadores sem qualificação que usam drogas. Mas também os empregados ou outros membros das classes médias [...].
Nesse contexto, fica evidente a disseminação e a democratização do acesso e
do consumo de substâncias psicoativas que, nos últimos anos, tem estado presente
em todas as camadas sociais. Para Bergeron (2012), esse fenômeno, em última
instância, tem relação direta com os altos índices de violência.
Nesse sentido, diz Nicastri (2011), as drogas estimulantes do Sistema Nervoso
Central (SNC) são capazes de aumentarem a capacidade das atividades de
determinados neurônios, o que traz como consequências um estado de alerta
exagerado, insônia e aceleração psíquica.
O uso indiscriminado de substâncias psicoativas, especialmente o crack, dizem
Guimarães et al. (2008), se tornou um importante problema de saúde pública, uma
vez que elas têm sido apontadas como sendo a principal causa de internações em
hospitais psiquiátricos. A dependência dessa droga é também interpretada pelos
autores como um fator potenciador da violência, pois a análise dos antecedentes
criminais dos 30 (trinta) sujeitos por eles pesquisados mostrou que é frequente a
presença de crimes em dependentes de crack e esta variável está relacionada a
mais ansiedade, depressão e fissura.
Ao se analisar a dependência química do crack no contexto da saúde pública,
Borini, Guimarães e Borini (2003) demonstram entendimento semelhante aos de
Guimarães et al. (2008), pois associam a alta prevalência de internações de
indivíduos menores de idade, em hospitais psiquiátricos, ao uso de crack, com ou
sem associação com outras drogas. Contudo, ressaltam os autores
supramencionados, os dependestes desta substância química, têm perfis
psicoemocionais e comportamentais diverso dos executivos consumidores de álcool,
23
o que acarreta problema para os hospitais que estão voltados para o tratamento do
alcoolismo. In verbis:
A maioria das hospitalizações se faz para desintoxicação, embora uma proporção significativa delas seja de indivíduos, em geral menores de idade, encaminhados por autoridades do ministério público, seja por cometerem pequenos delitos ou por solicitação dos familiares, que se sentem impotentes para controlar a situação. Esses novos clientes, com perfis psicoemocionais e comportamentais bastante diferentes dos usuários exclusivos de álcool, têm trazido problemas para as instituições hospitalares adaptadas para tratamento de alcoolistas (BORINI; GUIMARÃES; BORINI, 2003, p. 172).
Cabe aqui um aparte para ressaltar que as substâncias psicoativas (SPA)
podem ser divididas em depressores (álcool, sedativos/hipnóticos, solventes
voláteis), estimulantes (nicotina, cocaína, anfetaminas, ecstasy), opióides (morfina e
heroína) e alucinógenos (PCP, LSD, Canabis). Dentre as mais conhecidas, segundo
a Organização Mundial de Saúde (OMS, 2013, online), estão as anfetaminas e a
cocaína, bem como o seu derivado, o crack.
Formigoni, Galduroz e Micheli (2009, p. 3), ao falarem sobre os efeitos das
substâncias psicoativas no organismo, ressaltam que “cada droga tem seu
mecanismo de ação particular, mas todas as drogas de abuso agem, direta ou
indiretamente em um mesmo local do cérebro.” Porém, a dependência química é um
fator muito comum entre os usuários de drogas.
De acordo, com Duarte e Morihisa (2011), atualmente no Brasil são utilizados
dois sistemas de classificação de doenças para diagnosticar o uso, o abuso, ou uso
abusivo, e a dependência de substâncias psicotrópicas: a Classificação Internacional
de Doença (CID-10) e o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtorno Mental
(DSM-IV), da Associação Psiquiátrica Americana.
Ambos os sistemas classificatórios, dizem Duarte e Morihisa (2011, p. 45),
refletem nos seus critérios para dependência os conceitos de Síndrome de
Dependência do Álcool, essa validação, dizem os autores, “permitiu que os sistemas
classificatórios atuais operacionalizassem o conceito psicopatológico da
dependência ao utilizar critérios práticos e confiáveis”, possibilitando um bom
diagnóstico, etapa primeira, antes de qualquer abordagem.
24
Cumpre, pois, a partir desse momento, traçar algumas considerações acerca
do que se entende atualmente sobre os termos: dependência, uso e uso/abusivo, ou
nocivo, de substâncias psicoativas.
1.2 Conceituando a dependência, o uso e o uso/nocivo de
substâncias químicas
Tecendo algumas considerações acerca do que se deve compreender por
dependência, Ribeiro e Marques (2012, p. 212) destacam ser importante distinguir-
se os conceitos para entender cada uma dessas categorias. Nesse sentido
destacam: “o [...] consumo não é por si só um critério de uso problemático, nocivo,
tampouco de dependência.” Porém, como os padrões de consumo e a capacidade
de se autorregular são fatores individuais, ou seja, variam de pessoa para pessoa; o
uso de substâncias psicoativas torna-se preocupantes, pois, na maioria das vezes,
ele evolui da ingestão leve à dependência.
A dependência química é uma doença complexa, caracterizada pelo uso
compulsivo de drogas. Embora cada droga produza efeitos físicos distintos, todas as
substâncias químicas podem alterar permanentemente o funcionamento do cérebro
e a personalidade do dependente. Lemos e Fonseca (2011, p. 31), asseveram que:
Quando falamos em Dependência Química (DQ), estamos nos referindo a uma doença psiquiátrica de ordem biológica, psicológica e social, portanto, um transtorno biopsicossocial. Trata-se de uma doença causada por drogas psicotrópicas, drogas lícitas e ilícitas, que afetam nosso cérebro e, consequentemente, nosso comportamento.
Conforme Niscastri (2011) a dependência química se manifesta pela
necessidade psíquica e/ou física do uso de determinadas substâncias que alteram
ou modificam o funcionamento do organismo de forma descontrolada e imprevisível,
causando danos e alterações a todo o corpo, em especial ao Sistema Nervoso
Central (SNC).
Nesse contexto, a droga tem como característica a potencialização das
sensações que ativam o sistema ou circuito de recompensa do indivíduo,
acarretando no uso repetitivo, mesmo que as perdas recorrentes deste
25
comprometam e ameacem a vida do sujeito. Laranjeira (2013), em entrevista ao Dr.
Dráuzio Varela, sobre a dependência química, esclarece que:
O sistema de recompensa do cérebro que é acionado pelas drogas, representa uma área encarregada de receber estímulos de prazer e transmitir essa sensação para o corpo todo, como por exemplo, temperatura agradável, emoção gratificante, alimentação, sexo. Essa área do sistema de recompensa foi evoluindo com o tempo no homem e a interferência das drogas ocorre por uma espécie de curto circuito na mesma, provocando uma ilusão química de prazer que induz a pessoa a repetir seu uso compulsivamente. Com a repetição do consumo, todas as fontes naturais de prazer perdem o significado e só interessa o prazer imediato propiciado pela droga, independente das consequências.
Conforme Duarte e Morihisa (2011), a autoadministração de qualquer
quantidade de substância psicoativa pode ser definida em diferentes padrões de uso
de acordo com suas possíveis consequências. Nesse contexto, tem-se: uso
experimental, recreativo, controlado e uso social de drogas (BRASIL, 2013).
O uso experimental, de acordo os autores, se caracteriza pelos primeiros
poucos episódios de contato de uma droga específica, algumas vezes incluindo
tabaco ou álcool, extremamente infrequentes ou não persistentes (BRASIL, 2013).
O uso recreativo, diz o Ministério da Justiça (2013), é o consumo de uma
droga, em geral ilícita, em circunstâncias sociais ou relaxantes, sem implicações
com dependência e outros problemas relacionados. Contudo, vale ressaltar, há
aqueles que discordem desse posicionamento, asseverando que, no caso de droga
ilícita, não seja possível este padrão devido às implicações legais relacionadas
(BRASIL, 2013).
O uso controlado, segundo o Ministério da Justiça (2013), refere-se à
manutenção de um consumo regular, não compulsivo e que não interfere com o
funcionamento habitual do indivíduo. Termo também controverso, pois se questiona
se determinadas substâncias permitem tal padrão. Já o uso social, pode ser
entendido, de forma literal, como o consumo em companhia de outras pessoas e de
maneira socialmente aceitável, mas também é usado de forma imprecisa, querendo
indicar os padrões acima definidos (BRASIL, 2013).
Marques e Ribeiro (2007, p. 20) afirmam que o Abuso/Uso Nocivo é quando o
indivíduo apresenta problemas associados ao consumo, com isso “é caracterizado
26
pela presença de danos físicos e mentais decorrentes do uso. Geralmente, tal
padrão é criticado por outras pessoas e acarreta consequências sociais para o
usuário.” É importante percebe que há fatores de risco que desencadeiam o uso
para o uso nocivo, os fatores podem ser de risco ou de proteção conforme
mencionado anteriormente.
Um dos critérios do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtorno Mental
(DSM IV, 2013) em relação ao consumo abusivo de drogas é “o uso recorrente, que
resulta em fracasso em cumprir obrigações importantes relativas a seu papel no
trabalho, na escola ou em casa”.
Já o Código Internacional de Doenças (CID-10), considera como o uso nocivo
quando há indícios nítidos de danos físicos ou psicológicos em decorrência do uso.
A Organização Mundial de Saúde (OMS, 2004), com base no CID-10, destaca que a
dependência de substâncias inclui seis critérios dos quais o sujeito na presença de,
pelo menos, três deles pode ser considerado dependente:
1. Um desejo forte e compulsivo para consumir a substância; 2. Dificuldades para controlar o comportamento de consumo de substancias em termos de inicio, fim ou níveis de consumo; 3. Estado de abstinência fisiológica quando o consumo é suspenso ou reduzido, evidenciado por: síndrome de abstinência característica; ou consumo da mesma substancia (ou outra muito semelhante) com a intenção de aliviar ou evitar sintomas de abstinência; 4. Evidencia de tolerância, segundo a qual ha necessidade de doses crescentes da substancia psicoativa para obter-se os efeitos anteriormente produzidos com doses inferiores; 5. Abandono progressivo de outros prazeres ou interesses devido ao consumo de substancias psicoativas, aumento do tempo empregado em conseguir ou consumir a substancia ou recuperar-se de outros efeitos; 6. Persistência do consumo de substancias apesar de provas evidentes de consequências manifestamente prejudiciais, tais como lesões hepáticas causadas por consumo excessivo de álcool, [...].. Devem fazer-se esforços para determinar se o consumidor estava realmente, ou poderia estar, consciente da natureza e da gravidade do dano
Nesse contexto, a dependência química surge como uma relação alterada
entre um indivíduo e o modo de consumir uma substância psicoativa. É o consumo
de maneira exagerada e continua um impulso que leva a pessoa a usar uma droga
frequentemente para obter prazer. Para Ribeiro e Marques (2012, p. 213) a
dependência química é
27
[...] Um padrão de consumo compulsivo, geralmente voltado para o alivio ou a evitação de sintomas provocados pela abstinência. Ela se torna mais importante do que parte ou mesmo a totalidade das atividades e compromissos sociais do individuo, que passa a tratá-los com negligência ou abandono a fim de privilegiar o uso [...].
Conforme Mauricio (2013), a dependência química é o uso frequente e
exagerado da droga, com quebra de laços sociais e afetivos, é a perda de poder
decidir em relação ao não uso da droga (licita ou ilícita) na qual o organismo já se
adequou anteriormente, portanto é uma doença de uso progressivo um hábito
impossível de romper sem causar sofrimento. Cavalcante (1997, p. 22) vê a
dependência química como uma relação que o indivíduo forma com as substâncias
psicoativas, de difícil quebra de vínculos. Nesse sentido, destaca: “é um hábito
impossível de romper sem sofrimento”.
Quando a dependência química está relacionada ao crack, o uso traz prejuízos
em diversas áreas, que vão desde dificuldades para aprendizagem a perturbações
mentais, conforme explicitam Schnnorr e Hess (2012, p. 4):
[...] uso crônico do crack provoca prejuízos nas funções cognitivas, nas áreas de atenção e flexibilidade mental, capacidade de controle, concentração, aprendizagem entre outros que podem durar longos prazos ou torna-se irreversível [...].
Segundo Alves, Ribeiro e Castro (2011, p. 171), o crack é uma droga feita a
partir da mistura de pasta de cocaína com bicarbonato de sódio e ácido sulfúrico,
sendo uma forma impura de cocaína. Uma das suas principais características é a
intensidade do efeito de euforia em um curto espaço de tempo. “[...] a utilização
produz uma euforia de grande magnitude e de curta duração, seguida de intensa
fissura e desejo de repetir a dose. Logo se percebeu o potencial altamente
dependógeno dessa nova forma de administração da droga.”
Ainda conforme, o autor citado acima, o crack é geralmente fumado, o nome
deriva do verbo "to crack", que, em inglês, significa "quebrar", devido aos pequenos
estalidos produzidos pelos cristais (as pedras) ao serem queimados, como se
quebrassem e muitos dos seus usuários desenvolvem um consumo de forma tão
compulsiva que passam a viver em função apenas da droga.
[...] muitos dos dependentes de crack passam a noite ou mesmos dias seguidos consumido a droga até a completa exaustão, sem dormir e sem se
28
alimentar minimamente e isso implica obviamente uma grande vulnerabilidade a doenças clinicas, desnutrição e, comportamento impulsivos, violento, e promiscuidade no sentido de obtenção da droga ou de dinheiro para a droga (ALVES, RIBEIRO; CASTRO, 2011, p. 172).
De acordo com Alves, Ribeiro e Castro, (2011, p. 174), o crack, por ser uma
droga, usada de forma fumada, provoca uma capacidade maior de dependência, em
relação às demais, os efeitos de euforia e bem estar leva o individuo a querer fazer
uso cada vez mais e de forma interrupta
[...] magnitude e a duração dos efeitos ocasionados influenciam o desejo de repetir o consumo e a suscetibilidade do individuo ao abuso e à dependência [...] o usuário de crack se expõe mais ao risco de dependência porque utiliza a droga com mais frequência, em maior quantidade e tem mais sensibilidade aos efeitos das substâncias. A associação com dependência de álcool e maconha, bem como déficit de atenção, hiperatividade e transtorno da personalidade antissocial, aumentam o risco de dependência entre os usuários [...] (PERRENOUD; RIBEIRO, 2012, p. 47).
Conforme Marques e Ribeiro (2011, p. 109), o uso de crack é sempre
complexo, devido às complicações implícitas, vai desde o consumo leve/moderado
até o uso nocivo/dependência. Para Santos Junior e Fiks (2012, p. 109), “[...] o crack
é uma droga reconhecida por ser muito deletéria para o organismo e devastadora
para o psiquismo.”
1.3 Aspectos Socioculturais do consumo de crack no Brasil
Entre as drogas mais devastadoras, está o crack, que surge na periferia das
grandes cidades dos Estados Unidos, como Los Angeles, Nova York e Miami.
Segundo Guimarães (2008), estudos feitos no Brasil comprovam que os usuários de
crack estão inseridos em um contexto maior de violência e vulnerabilidade social
resultando em diversos problemas relacionados à saúde, morte, criminalidade e
efeito do próprio crack.
Conforme Ribeiro (2012), o histórico do uso de crack no Brasil passou por
consideráveis mudanças tanto no perfil do usuário como nos índices cada vez
maiores de consumo. Nos últimos vinte anos, tornou-se uma questão de saúde
pública; estudo recente nos leva a crer que o uso do crack perpassa todos os níveis
29
econômicos e sociais, mas tendo uma maior visibilidade nas classes menos
favorecidas, devido os efeitos devastadores que provoca.
O crack surge no Brasil, segundo Ribeiro (2012), na década de 1990, em
especial na cidade de São Paulo; um dos atrativos era o preço muito baixo em
relação à cocaína, outro era o efeito mais intenso. Além disso, alguns usuários de
cocaína injetável abandonaram essa via de administração com temor da
contaminação do HIV e passaram a fazer uso do crack.
Um dos primeiros estudos relacionados ao consumo do crack no Brasil,
segundo Ribeiro (2012), foi realizado no município de São Paulo, cujo perfil do
usuário era homem com baixa escolaridade, idades inferior a 30 anos, advindo de
famílias de baixo poder aquisitivo. Outro estudo, no estado de Minas Gerais, ainda
segundo o autor, nesta mesma época, trata a respeito do grande número de
mortalidade dos usuários de crack, devido ao tráfico.
Segundo pesquisa realizada pelo Centro Brasileiro de Informações sobre
Drogas (CEBRID) o uso de crack quase dobrou nos últimos anos. De acordo com o
órgão em tela, os levantamentos sobre usuários de crack, feitos em 2001 e 2005,
contemplaram cerca de 8 mil pessoas de 12 a 65 anos de idade. No período entre
as duas pesquisas, o percentual dos que já haviam experimentado crack passou de
0,4% para 0,7%. Isso evidencia o aumento do consumo dessa droga (CEBRID,
2013).
Relevante destacar que, segundo o Cebrid (2013), a tendência de aumento,
visto na expansão do consumo de crack, foi registrada para praticamente todos os
tipos de drogas, especialmente as de maior consumo, grupo em que estão álcool,
tabaco, maconha e cocaína. Nesse sentido, Ribeiro (2012, p. 36) destaca que o
Brasil é o maior mercado consumidor da América do Sul:
O uso de crack vem sendo observado em idades cada vez mais precoces em todo o país e em todas as classes sociais trata-se de uma droga de fácil obtenção, cujo consumo em geral é precedido pelo consumo do álcool e /ou tabaco. Desse modo as Políticas Públicas brasileiras precisam ser direcionadas para a prevenção do consumo nessas populações, visando primeiramente programas efetivos de prevenção do consumo de drogas licitas [...].
30
Dentre os riscos mais frequentes está a overdose, que é o uso em maior
quantidade da droga podendo causar a morte do/a usuário/a, risco de criminalidade,
pois a droga está diretamente associada aos maiores índices de homicídios, por si
só, trata-se de algo ilícito e que está sempre em conflito seja com a polícia ou com
os traficantes, sendo os riscos que são consequências do uso da substância como
insônia, problemas psicológicos e problemas familiares.
O crack tem sido associado a aumento de risco de reações tóxicas, como problemas cardíacos, paralisia respiratória, psicose paranóide, disfunção pulmonar, e com aumento da incidência de uma variedade de doenças sexualmente transmissíveis (NAPPO, 2004, p. 17).
Pesquisa semelhante à realizada pelo Cebrid, entre 2001 e 2005, foi feita pela
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), entre 2011 e 2013, na qual também se traçou o
perfil dos usuários de crack no Brasil. Os dados desse novo estudo mostram que a
população de usuários dessa droga é constituída por pessoas com uma média de
idade de 30 anos, do sexo masculino, geralmente, de cor preta ou parda e oriundas
de um contexto de vulnerabilidade social. São ainda, predominantemente, solteiros e
com pouca escolaridade. Dentre os usuários de crack, mostra a pesquisa, é
expressivo o número dos que vivem em situação de rua ou passavam parte do
tempo na rua (FIOCRUZ, 2013).
Ainda no contexto do crack, de acordo com a pesquisa supramencionada, a
maioria dos entrevistados não tinham um trabalho formal, cerca de 65% eram
autônomos ou diziam fazer algum tipo de “bico”, 7,5% dos entrevistados disseram
fazerem uso de sexo em troca da droga. Outra fonte para obtenção do crack,
segundo o grupo pesquisado,é o envolvimento ilícito com o tráfico, sendo que 6,4%
praticavam roubo/furto. Relevante ressaltar ainda que, geralmente, os usuários de
crack fazem uso de outras drogas, conforme mostram Perrenoud e Ribeiro (2012, p.
37):
[...] o perfil dos consumidores de crack no país – jovens, desempregados, com baixa escolaridade e baixo poder aquisitivo, provenientes de famílias desestruturadas, com antecedentes de uso de múltiplas drogas e comportamento sexual de risco [...].
Diante desse quadro, fica evidente que são vários os problemas sociais
desencadeadores da dependência química, em especial do crack, o que tem como
31
consequência problemas como: a violência, o envolvimento com tráfico de droga, a
situação de rua, dentre outros fatores potencializadores de desajuste social. Verifica-
se, igualmente, que é comum os usuários de crack trocarem o corpo por droga ou
por dinheiro para adquirir a “pedra”. Nesse contexto, surge uma população em
potencial risco de exposição a Doenças Sexualmente Transmitidas (DST) ou mesmo
à gravidez indesejada, conforme ponderam Nappo, Sanchez e Ribeiro (2012, p.
572):
Agrega-se a esse quadro desolador o fato de essas mulheres estão sob o efeito da droga, de fissura ou paranoia, não havendo a menor possibilidade de coerência em relação ao quesito preservativo. Esquecem-se de utilizá-lo ou mesmo aceitam passivamente a recusa do parceiro em fazer seu uso, uma vez que há urgência em terminar o ato para comprar a “pedra” e reiniciar o ciclo.
A vulnerabilidade social dos usuários de crack é de uma complexidade e um
desafio enorme para a efetivação das políticas sociais envolvendo essa
problemática, pois muitos são os casos em que esses sujeitos passam a usar
drogas de forma compulsiva e, como consequências, tais indivíduos podem ter seus
vínculos familiares e sociais fragilizados ou totalmente rompidos, no sentido de eles
próprios saírem de casa para as ruas, de a família abandoná-los por não terem mais
possibilidades de conviverem com a situação da dependência química,
principalmente nos casos envolvendo o uso do crack, já que essa droga é a que tem
o maior poder de provocar a dependência do sujeito.
Vale salientar que, além dessas implicações do uso de drogas envolvendo a
família e o usuário, outro aspecto que é atingido por tal problemática é a vida social
desse indivíduo, onde há um afastamento da sociedade para com os dependentes
de drogas, de modo que esse sujeito acaba sendo estigmatizado no âmbito social,
nessa realidade há, portanto, uma dissociabilidade entre o dependente químico e a
sociedade, sendo que esse sujeito passa na maioria dos casos a se “autoexcluir”
como pode se verificar na citação abaixo:
O uso crônico do crack, segundo os estudos a respeito, deteriora o individuo cognitivamente, promovendo um baixo índice de funcionamento mental. Os prejuízos cognitivos do uso crônico da droga contribuem para seu isolamento e para o abandono por parte da família (GUIMARAES; ALELUIA, 2012, p. 427).
32
Segundo Bessa (2012), estudos apontam que a experimentação de drogas na
fase da adolescência é um caso “normal”, porém alguns fatores contribuem para que
certos indivíduos se tornem dependentes ou não dessas substâncias psicotrópicas.
Para Bessa (op. cit., p. 622), fatores como a personalidade do indivíduo, o
ambiente familiar em que ele está inserido e a substância que experimentou são
relevantes para o desencadeamento da dependência. Nesse sentido, ressalta: “[...]
se a experimentação ocorrer com a cocaína, em especial na forma de crack, o risco
de jovem se tornar dependente é muito grande [...].”
Essa constatação é de grande relevância, pois é sabido que o uso de drogas
por jovens é um dos fatores desencadeadores de problemas de saúde mental e
comorbidades associadas ao uso de drogas, como, por exemplo, a evasão escolar e
o envolvimento com o crime. Nesse contexto, o grande desafio do Estado e da
sociedade é no sentido de consolidação das Políticas Públicas, no sentido de
garantir o acesso desses indivíduos a serviços públicos de qualidade, seja no que
diz respeito a prevenção, tratamento e a reinserção social.
33
2 POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE DROGAS
De acordo com Santos e Oliveira (2012), entende-se por políticas públicas o
conjunto de ações coletivas voltadas para a garantia dos direitos sociais,
configurando um compromisso público que visa dar conta de determinada demanda,
em áreas diversas.
Segundo Pereira (2005) e Souza (2006), nos estados modernos, as políticas
públicas se converteram em instrumento essencial no processo de construção das
sociedades, pois codificam normas e valores sociais, influenciando a conduta dos
sujeitos, contendo, a partir dos textos normativos, modelos de sociedade.
As Políticas Públicas Sobre Drogas no Brasil durante muito tempo tratavam de
modo semelhante os usuários ocasionais e os traficantes de substâncias
psicoativas. As legislações sobre o tema não levavam em consideração o princípio
da dignidade da pessoa humana, fato que sofreu considerável transformação a partir
de 1988, por ocasião da XX Assembleia Geral das Nações Unidas, que encontrou
respaldo na Constituição Federal que entrou em vigor neste mesmo ano. Nesse
sentido, é o entendimento de Duarte e Dalbosco (2013, p. 218).
A partir de 1998, o Brasil consolida uma política nacional específica sobre o tema da redução da demanda e da oferta de drogas. Foi depois da realização da XX Assembleia Geral das Nações Unidas, na qual foram discutidos os princípios diretivos para a redução da demanda de drogas, aderidos pelo Brasil, que as primeiras medidas foram tomadas. O então Conselho Federal de Entorpecentes (CONFEN) foi transformado no Conselho Nacional Antidrogas (CONAD) e foi criada a Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD), diretamente vinculada à, então, Casa Militar da Presidência da República.
De acordo com o conceito dado por Teixeira (2002, p. 2), ao se tratar sobre
Políticas Públicas, está se falando de um princípio que norteia a ação do poder
público em relação à sociedade.
[...] Políticas públicas são diretrizes, princípios norteadores de ação do poder público; regras e procedimentos para as relações entre poder público e sociedade, mediações entre atores da sociedade e do Estado. São, nesse caso, políticas explicitadas, sistematizadas ou formuladas em documentos (leis, programas, linhas de financiamentos) que orientam ações que normalmente envolvem aplicações de recursos públicos [...].
34
Nesse sentido, pode-se afirmar que a Política Nacional Sobre Drogas (PNAD) e
a Política Nacional Sobre o Álcool são marcos legais que embasam a ação do
Estado em relação à realidade brasileira.
2.1 Legislações sobre drogas no Brasil
Seguindo o modelo internacional de combate às drogas, encabeçado pelos
Estados Unidos, o Brasil desenvolve ações de combate e punição para reprimir o
tráfico. Essa tendência, porém, não é algo recente, vem desde os tempos de
colônia. De acordo com Avelino (2010), as Ordenações Filipinas, de 1603, já
previam penas de confisco de bens e degredo para a África para os que portassem,
usassem ou vendessem substâncias tóxicas. O título LXXXIX da respectiva
codificação determinava que
Nenhuma pessoa tenha em sua caza para vender, rosalgar branco, nem vermelho, nem amarello, nem solimão, nem água delle, nem escamoneá, nem ópio, salvo se for Boticário examinado, e que tenha licença para ter Botica, e usar do Officio. E qualquer outra pessoa que tiver em sua caza alguma das ditas cousas para vender, perca toda sua fazenda, ametade para nossa Câmera, e a outra para quem o accusar, e seja degradado para África até nossa mercê. E a mesma pena terá quem as ditas cousas trouxer de fora, e as vender a pessoas, que não forem Boticários. 1. E os Boticários as não vendão, nem despendão, se não com os Officiaes, que por razão de seus Officios as hão mister, sendo porem Officiaes conhecidos per elles, e taes, de que se presuma que as não darão á outras pessoas. E os ditos Officiaes as não darão, nem venderão a outrem, porque dando-as, e seguindo-se disso algum dano, haverão a pena que de Direito seja, segundo o dano for. 2. E os Boticários poderão metter em sua mezinhas os ditos materiaes, segundo pelos Médicos, Cirurgiões, e Escriptores for mandada. E fazendo o contrario, ou vendendo-os a outras pessoas, que não forem Officiaes conhecidos, pola primeira vez paguem cincoenta cruzados, metade para quem accusar, e descobrir. E pola segunda haverão mais qualquer pena, que houvermos por bem.
O texto evidencia o rigor característico das disposições presentes nas
Ordenações Filipinas. Considerando crime certos desvios meramente morais,
cominando penas corporais, infamantes e cruéis, e até mesmo a pena de morte para
diversas condutas, tal codificação representa bem a ideologia vigente a seu tempo.
O país continuou nessa linha com a adesão à Conferência Internacional do Ópio, de
1912 (AVELINO, 2010).
35
A vinda da Família Real portuguesa para o Brasil, em 1808, salvo a edição de
algumas leis de natureza processual penal, em nada alterou a vigência das
Ordenações Filipinas no país. Essa realidade, diz Avelino (2010), somente foi
modificada com a proclamação da independência por Dom Pedro I, em 1823, e a
consequente outorga da Constituição de 1824, influenciada pelos ideais do
Liberalismo que emanavam da França e dos Estados Unidos.
Nesse sentido, diz Pierangeli (2001), em seu artigo 179 a Constituição do
Império estabelecia regras de cunho liberal que deveriam ser observadas quando da
criação do sistema penal genuinamente pátrio. Em seus diversos itens, diz o autor,
tal diploma legal trazia diretrizes que ainda hoje fundamentam o Direito Penal
brasileiro, como os princípios da irretroatividade, da igualdade e da pessoalidade da
lei, e ainda a abolição da aplicação de penas cruéis.
Ainda de acordo com Pierangeli (2001), o Código Penal do Império promulgado
em 1830 estava fundamentado em preceitos iluministas, tendo sofrido influência por
parte do projeto Mello Freire,4 encomendado por D. Maria I para reformular as
Ordenações Filipinas, e pelo projeto de Código Penal elaborado por Edward
Livingston,5 em 1825, para o Estado de Louisiana.
Embora o Código Penal do Império não tratasse da questão relativa às drogas
em seu texto, diz Pierangeli (2001), o regulamento de 29 de setembro de 1851
abordou o assunto ao regular a venda de substâncias e medicamentos e ao tratar de
política sanitária.
De acordo com Avelino (2010), o Código Penal de 1890, diferentemente do
anterior, foi marcado por erros. Em seu artigo 159, inserido no Capítulo III, que
tratava dos crimes contra a saúde pública, do Título III, o qual se referia aos crimes
contra a tranquilidade pública, abordava a questão relativa às drogas ao dispor: “Art.
159. Expor à venda, ou ministrar, substâncias venenosas, sem legítima autorização
4 Pascoal José de Melo Freire dos Reis (1738 – 1798) - autor de um projeto de Código Penal a ele
encomendado pela rainha D. Maria I ao qual deu o título de Ensaio do Código Criminal. 5 Edward Livingston (1764 - 1836) - figura influente na elaboração do Código Civil Louisiana de 1825,
um código civil baseado em grande parte no Código Napoleônico.
36
e sem as formalidades prescriptas nos regulamentos sanitários: Pena – de multa de
200$000 a 500$000.”
Buscando efetivar o combate ao crescente uso das chamadas “substâncias
venenosas”, foi editado em julho de 1921, sob a inspiração da Convenção de Haia
de 1912, o Decreto n.º 4.294, regulamentado pelo Decreto n.º 14.969. Segundo
Avelino (2010), os dispositivos em comento abordavam não apenas aspectos
criminais, como a cominação de pena de 1 a 4 (quatro) anos para as infrações de
venda e uso de entorpecentes, mas também medidas relativas ao controle do
comércio, necessidade de prescrição médica e normas de registro.
Editado em 11 de janeiro de 1932, o Decreto n.º 20.930 passou a utilizar a
expressão “substâncias tóxicas” para englobar entorpecentes como o ópio, a
cocaína e a maconha, além de atribuir ao Departamento Nacional de Saúde a
função de classificar as substâncias capazes de alterar comportamentos (AVELINO,
2010).
Tecendo considerações sobre o assunto, Pedrinha (2009, p. 5491) destaca que
a visão de que as drogas seriam tanto um problema de saúde quanto de segurança
pública, desenvolvida pelos tratados internacionais da primeira metade do século
passado, foi paulatinamente traduzida para a legislação nacional. Até que, em 1940,
o Código Penal nacional confirmou a opção do Brasil de não criminalizar o consumo:
Quando sobreveio o Código Penal de 1940, firmou-se a opção por não se criminalizar o consumo de drogas. No contexto histórico da redemocratização, após o Estado Novo, foi se delineando, a partir de 1946, um eixo moralizante, que foi se aderindo ao discurso da droga, o que continuaria até 1964 [...].
Nesse contexto, segundo Pedrinha (2009), estabeleceu-se uma “concepção
sanitária do controle das drogas”, pela qual a dependência é considerada doença e,
ao contrário dos traficantes, os usuários não eram criminalizados, mas estavam
submetidos a rigoroso tratamento, com internação obrigatória. Porém, diz a autora, o
golpe militar de 1964 e a Lei de Segurança Nacional deslocaram o foco do modelo
sanitário para o modelo bélico de política criminal, que equiparava os traficantes aos
inimigos internos do regime:
37
[...] Para Nilo Batista, este ano significou a baliza divisória da ruptura do modelo de política criminal, que se translocou do sanitário para o bélico. Todavia, se percebem algumas permanências, vinculadas à construção do estereótipo da dependência e da doença. O marco foi justamente o ano do golpe militar, e não sem motivo. Pois este regime passou a ter ingerência sobre a condução de toda a política criminal no Brasil (PEDRINHA, 2009, p. 5491).
Não por acaso, analisa Pedrinha (2009. p. 5491), a juventude associou o
consumo de drogas à luta pela liberdade:
[...] da Europa às Américas, a partir da década de 60, a droga passou a ter uma conotação libertária, associada às manifestações políticas democráticas, aos movimentos contestatórios, à contracultura, especialmente as drogas psicodélicas, como maconha e LSD.
Momento em que, segundo Batista (1996), entrou em cena a guerra fria, com o
capitalismo industrial de guerra, propiciando a militarização das relações
internacionais, no campo da geopolítica. Para o governo militar, diz a autora, a droga
era tida pelo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS)6 como elemento de
subversão, uma arma da guerra fria, associada a uma estratégia comunista para
destruir o Ocidente
e as bases morais da civilização cristã. Nessa direção, os
investimentos foram se tornando cada vez mais vultuosos no combate ao uso de
substâncias entorpecentes.
Ainda nesse sentido, relevante destacar o posicionamento de Carvalho (2013),
o qual destaca que, após a aprovação da Convenção Única sobre Entorpecentes,
pelo Decreto nº 54.216, de 1964, a adesão belicista passou a ser plena, com a
expansão da repressão. Em 1968, logo após o Ato Institucional nº 5, o Decreto nº
385 modificou o artigo 281 do Código Penal em vigor na época, acrescentou outros
verbos criminalizadores. O Decreto-lei nº 753 de 1969, diz o autor, reforçou a
fiscalização sobre o uso das drogas ilícitas.
No ano de 1971, entrou em vigor a Lei nº 5.726 que, em seu primeiro artigo, já
esboçava a preocupação com o combate ao tráfico. Demonstrava ser este um dever
de todos. De acordo com Pedrinha (2009, p. 5492), a lei em questão transpôs, no
6 O Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), criado em 1924, foi o órgão do governo
brasileiro, utilizado principalmente durante o Estado Novo e mais tarde no Regime Militar de 1964, cujo objetivo era controlar e reprimir movimentos políticos e sociais contrários ao regime no poder.
38
âmbito penal, aqueles que seriam os espectros da Lei de Segurança Nacional (Lei nº
7.170, de 1983) e impôs grande repressão:
Nas campanhas iniciais de Lei e Ordem os traficantes se coadunavam ao inimigo interno, quando eram jovens sucumbiam ao cancelamento da matrícula escolar e ainda eram incentivados a delatar outros envolvidos com drogas. Professores e diretores da rede de ensino deveriam delatar também, tinham o dever jurídico de encaminhar os alunos suspeitos de envolvimento com drogas, fato que consistia em prestação de serviço relevante. Cabia aos infratores medida de recuperação com internação para tratamento psiquiátrico. A Lei 5.726 de 1971 estabeleceu a equiparação entre usuário e traficante, com até 6 anos de pena privativa de liberdade e trouxe a tipificação da quadrilha composta por dois membros. Nesse contexto, foi se moldando uma política criminal bélica.
A década de 1970, assevera Carvalho (2013), foi marcada pela política de
criminalização das drogas. Nesse sentido, o autor destaca as modificações da
Convenção Única de Estupefacientes realizadas em 1972, seguida da visita do
grupo de estudos do Congresso Americano à América Latina sobre Estupefacientes
e Psicotrópicos, em 1973, ano em que o Brasil aderiu ao Acordo Sul-Americano
sobre Estupefacientes e Psicotrópicos (ASEP) e, com base nele, baixou a Lei nº
6.368, de 1976, que separou as figuras penais do traficante e do usuário. Além
disso, a lei fixou a necessidade do laudo toxicológico para comprovar o uso.
De acordo com Pedrinha (2009, p. 5493), a Lei nº 6.368 de 1976 possibilitou um
elevado aumento nas tipificações de tráfico de drogas. Tal diploma, diz a autora, retirou
o termo combate, contido no primeiro dispositivo legal e o substituiu por prevenção e
repressão e distinguiu as figuras penais do tráfico e do usuário, especialmente no
tocante à duração das penas:
Nesse sentido, as penas podiam variar de 3 a 15 anos de reclusão e multa para o tráfico e de detenção de 6 meses a 2 anos e multa para o uso. Nesta última espécie cabia a substituição por pena alternativa e sursis. Além disso, esta lei fixou a necessidade do laudo toxicológico, retirou o trancamento da matrícula dos usuários e a delação no que tange aos agentes da área da educação. Verificou-se, ainda, o chamado fenômeno da multiplicação dos verbos, sinalizado por Zaffaroni, o qual deu-se através dos crescimento dos tipos penais incriminadores, ao longo dos anos.
As mudanças políticas e econômicas que ocorreram ao longo da década de
1980, mais uma vez, tiveram influência direta no tratamento legal das drogas. Com o
fim da Guerra Fria, diz Pedrinha (2009), novas potências econômicas passaram a
atuar de modo hegemônico. Acompanhou-se a internacionalização das corporações,
39
o desmantelamento do Estado, a desregulamentação dos mercados e a
liberalização financeira. Esse panorama favoreceu o empobrecimento das camadas
sociais, o aumento das taxas de desemprego e a marginalização social, que deram
propiciaram o Estado Policial. Nesse cenário, a funcionalidade mítica da droga
incidiu, mais especificamente, sobre o setor pauperizado da sociedade:
O discurso legitimante mostra-se apto a conjugar argumentos políticos, morais, religiosos e acuradamente legais. [...], as mistificações ideológicas retratam uma elaboração conceitual teórica que ganha relevo midiático, pelo dogma da ilicitude ontológica da droga. Contudo, faz-se necessário ir além dos estereótipos esboçados grosseiramente, desmistificá-los, para se perceber, em muitos casos, a vulnerabilidade dos personagens, como: as mulitas e os traficantes famélicos, que magicamente se transformam em temíveis inimigos.
A Constituição de 1988, segundo Pedrinha (2009), determinou que o tráfico de
drogas seria crime inafiançável e sem anistia. Medida fortemente questionada por
conflitar com períneos insculpidos na própria Carta Magna. Ainda nessa seara,
surgiu no cenário nacional a Lei nº 8.072, de 1990, a chama Lei de Crimes
Hediondos, que proibiu o indulto e a liberdade provisória nos crime de tráfico de
drogas, além de dobrar os prazos processuais, com o objetivo de aumentar a
duração da prisão provisória.
A Convenção de Viena, em 1991 foi aprovada pelo Congresso brasileiro; tal
atitude reforçou o viés punitivo que vinha se delineando ao longo dos últimos anos.
Assim, em meados da década de 90, o Governo brasileiro criou o Programa de Ação
Nacional Anti-Drogas (PANAD), que tem como objetivo geral: “Planejar,
supervisionar, coordenar, articular e promover ações judiciais e medidas
administrativas de prevenção ao uso, tratamento ao dependente ou usuário, e à
repressão ao comércio de drogas ilícitas” e a Secretaria Nacional Anti-Drogas
(SENAD).
Nos anos de 1994 e 1995, veio ao Brasil uma Comissão de Fiscalização das
Nações Unidas (ONU) com o objetivo de analisar o andamento de ações no tocante
à impunidade e à dificuldade de repressão. Segundo Pedrinha (2009), ambas as
comissões teceram severas críticas ao governo brasileiro. Diante da tentativa de
40
melhor atender às críticas da ONU, o Brasil partiu para um novo paradigma na
política criminal de drogas, o da militarização.
A Lei de Drogas (Lei 11.343/06) eliminou a pena de prisão para o usuário e o
dependente, ou seja, para aquele que tem droga ou a planta para consumo pessoal.
A legislação também passou a distinguir o traficante profissional do eventual, que
trafica pela necessidade de obter a droga para consumo próprio e que passou a ter
direito a uma sensível redução de pena.
Já a criação da Força Nacional de Segurança e as operações nas favelas do
Rio de Janeiro, iniciadas em 2007 e apoiadas pelas Forças Armadas, seguidas da
implantação das unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), reforçaram a repressão e
levaram a presença do Estado a regiões antes entregues ao tráfico, não apenas
atendendo às críticas internacionais, como também como preparação para a Copa
do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016.
As discussões em torno das leis que tratam do tráfico e dependência de drogas
continuam a ser feitas no Congresso, envolvendo ainda aspectos como o aumento
de impostos e o controle do álcool e do cigarro. A Resolução de nº 03, que o
Conselho Nacional Antidrogas (CONAD), aprovou institui a Política Nacional sobre
Drogas, no dia 27 de outubro de 2005, A Secretaria Nacional Antidroga (Senad),
órgão responsável por coordenar e integrar as ações do governo relativo a redução
da demanda.
A Política Nacional sobre Drogas estabelece os fundamentos, os objetivos, as diretrizes e as estratégias indispensáveis para os esforços, voltados para a redução da demanda e da oferta de drogas, possam ser reduzidos de forma planejada e articulada (DUARTE; DALBOSCO, 2011, p.219)
Dentre outros pressupostos da Política Nacional sobre Drogas (PNAD),
destacam-se: a) buscar incessantemente, atingir o ideal de construção de uma
sociedade protegida do uso de drogas ilícitas e do uso indevido de drogas lícitas; b)
reconhecer a diferença entre usuário, a pessoa em uso indevido, o dependente e o
traficante de drogas, tratando-os de forma diferenciada.
Nessa perspectiva e de acordo com a nova reformulação da PNAD, é
imprescindível tratar de maneira diferente o dependente químico do traficante, ou
41
seja, estabelece o aumento de pena para o traficante e o tratamento para o
dependente químico.
[...] Se por um lado as atividades de repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas são acentuadas, com definição de novos crimes correlatos e o aumento das penalidades previstas, por outro lado, distingue a condição de usuários e dependentes de drogas e aborda, de forma mais extensiva que as leis anteriores, as atividades de prevenção ao uso indevido, atenção à saúde e reinserção social [...] (SANTOS; OLIVEIRA, 2012, p. 88).
Ainda de acordo com a da Política Nacional sobre Drogas, é importante
destacar que o seu principal objetivo está centralizado na busca de implantar e
implementar a rede
Implantar e implementar rede de assistência integrada, pública e privada, intersetorial, para pessoas com transtornos decorrentes do consumo de substâncias psicoativas, fundamentada em conhecimento validado, de acordo com a normatização funcional mínima, integrando os esforços desenvolvidos no tratamento.
Para que tal objetivo fosse efetivado, o Governo criou vários mecanismos
para estruturar a rede de atendimento à pessoa com problemas do uso decorrente
de abuso de substâncias psicoativa. Em relação ao Tratamento, Recuperação e
Reinserção social, a PNAD traçou algumas diretrizes dentre as principais.
2.1.4 na etapa da recuperação, deve-se destacar e promover ações de reinserção familiar, social e ocupacional, em razão de sua constituição como instrumento capaz a de romper o ciclo consumo/tratamento, para parte dos envolvidos, por meio de parcerias e convênios com órgão governamentais, assegurando a distribuição descentralizada de recurso técnica e financeira. (BRASIL. 2006).
Segundo Santos e Oliveira (2012), as Politicas públicas atuais atuam na
perspectiva de prevenção e promoção da saúde, cuja finalidade é fortalecer os
fatores de proteção e diminuir os riscos para o uso, pois se entende que tão
importante como tratar os indivíduos já em uso é preciso proteger os que ainda não
entraram em contato para se trabalhar.
A Legislação atual do Brasil compreende a dependência química como um
problema de saúde pública, em conformidade com a Politica Nacional Sobre Drogas,
a legislação é inovadora e coloca o Brasil em evidência no cenário mundial ao criar o
SISNAD que traz como um dos seus princípios. “I - O respeito aos direitos
42
fundamentais da pessoa humana, especialmente quanto à sua autonomia e a sua
liberdade”.
Diferente das legislações anteriores, que não diferenciavam o
usuário/dependente do traficante, o projeto de Lei (PL), nº 115/02 do Senado tornou-
se a Lei nº 11.343/06 e substituiu as leis nº 6.368/76 e nº 10.409/02 assim a Lei
passa a compreender que os dependentes químicos necessitam ser tratados e
reinseridos na sociedade, aumentar a pena de detenção para traficantes. Desta
forma, o Art. 1º da Lei 11.343/06 trata a respeito da criação do SISNAD:
Art. 1º Esta Lei institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - SISNAD; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes. (BRASIL, 2006)
O SISNAD foi instituído com a intenção de articular, integrar, organizar e
coordenar as atividades que tratem a respeito da prevenção do uso indevido, a
atenção e a reinserção social de usuários e dependentes químicos como medidas
de reprimir a produção ilegal de droga, um dos seus objetivos é: “I - Contribuir para a
inclusão social do cidadão a torná-lo menos vulnerável a assumir comportamento de
risco para o uso indevido de drogas, seu tráfico e outros comportamentos
correlacionados.” Em relação à prevenção, a Lei traz como um dos principais
objetivos
I- O reconhecimento do uso indevido de drogas como fator de interferência na qualidade de vida do indivíduo e na relação com a comunidade a qual pertence; III- promover a integração entre as Políticas de prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas e repressão a sua produção não autorizada ao tráfico ilícito e as políticas publicas. (BRASIL, 2006).
A Lei dispõe de alguns critérios que são tidos como atividades de reinserção
social de usuários ou dependentes de drogas, aquelas que são direcionadas para a
integração ou reintegração das redes sociais.
Diante do aumento do número de usuário de crack e suas consequências,
relacionada à violência e à criminalidade, noticiadas diariamente pela mídia,
necessita de uma resposta por parte do Estado. Neste sentido, foi instituído o
43
decreto de nº 7.179, em maio de 2010. O Plano Integrado De Enfrentamento Ao
Crack e Outras Drogas, e cria o eu Comitê Gestor com a finalidade de destinar
recursos de forma intersetorial e descentralizada.
O Plano Crack está articulado em eixos como prevenção, cuidado e segurança
publica, é um conjunto integrado de ações atuando em segmentos diferente para
beneficia a sociedade brasileira.
§ 1o As ações do Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras
Drogas deverão ser executadas de forma descentralizada e integrada, por meio da conjugação de esforços entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, observadas a intersetorialidade, a interdisciplinaridade, a integralidade, a participação da sociedade civil e o controle social( BRASIL, 2010).
Dentre os objetivos previstos no Plano está a estruturação da Rede
I - estruturar, integrar, articular e ampliar as ações voltadas à prevenção do uso, tratamento e reinserção social de usuários de crack e outras drogas, contemplando a participação dos familiares e a atenção aos públicos vulneráveis, entre outros, crianças, adolescentes e população em situação de rua (BRASIL, 2010).
São previstas no Plano ações imediatas e ações estruturantes; a primeira diz
respeito à ampliação do número de leitos para desintoxicação de dependentes de
crack e outras drogas, traz também ações de combate ao tráfico articulações entre
as policias e capacitação, prevenção , tratamento e reinserção social. “I - ampliação
do número de leitos para tratamento de usuários de crack e outras drogas.”
A segunda faz referência à ação estruturante que prevê a integração e
mobilização de boas práticas para atender o usuário e/ou dependentes de crack e
outras drogas no que diz respeito à prevenção, tratamento e reinserção social.
O Decreto Presidencial admite parcerias entre Estado e Comunidades Terapêuticas
conforme para que
Art. 7o
- A. Para a execução do Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas poderão ser firmados convênios, contratos de repasse, termos de cooperação, ajustes ou instrumentos congêneres com órgãos e entidades da administração pública federal, dos Estados (BRASIL, 2010).
44
2.2 Rede de atenção aos usuários de crack e outras drogas
Conforme Ribeiro e Lima (2012), o número de usuários de crack no Brasil tem
aumentado nos últimos anos, e com isso surgem os enormes problemas sociais e de
saúde: como o alto índice de violência urbana e mortalidade entre jovens
usuários/as de substâncias psicoativas, o aumento do índice de doenças como,
tuberculose, DST/HIV, hepatites, complicações cardiovasculares, problemas
psíquicos associados. Neste mesmo pensamento, seguem Gigliotti, Presman e
Aguilera (2012, p. 608), que apresentam que “os dependentes químicos têm o maior
risco de contrair alguma doença relacionada ao tabaco quando comparada a
população em geral”.
A dependência química é uma problemática complexa e diferente que
engloba não apenas área da saúde, mas devem estar articuladas com as demais
áreas das Politicas sociais como Saúde, Educação, Segurança Pública, Habitação,
Assistência Social enfim, devem ser um conjunto de ações integradas para a
diminuição dos impactos pessoais e sociais do dependente químico.
O Brasil vem ao longo dos anos avançando no modelo de saúde mental, na de
criação de Leis que garanta uma humanização no atendimento a pessoas com
transtorno mental e problemas relacionados ao uso de substâncias psicoativas, o
movimento de saúde mental que culminou com a reforma psiquiátrica, a criação de
Leis e Portarias que substituem o modelo anterior dito asilar e hospitalocêntrico em
serviços como os Centros de Atendimento Psicossocial (CAPS), Centro Atendimento
Psicossocial Álcool e Droga. (CAPS-AD) e os (CAPS-AD 24h), Consultório na Rua,
Leitos nos Hospitais Gerais, Comunidades Terapêuticas (CTs) dentre outros.
A partir do ano de 1992, os movimentos sociais, inspirados pelo Projeto de Lei Paulo Delgado, conseguem aprovar em vários estados brasileiros as primeiras leis que determinam a substituição progressiva dos leitos psiquiátricos por uma rede integrada de atenção à saúde mental. É a partir deste período que a política do Ministério da Saúde para a saúde mental, acompanhando as diretrizes em construção da Reforma Psiquiátrica, começa a ganhar contornos mais definidos. É na década de 90, marcada pelo compromisso firmado pelo Brasil na assinatura da Declaração de Caracas e pela realização da II Conferência Nacional de Saúde Mental, que passam a entrar em vigor no país as primeiras normas federais regulamentando a implantação de serviços de atenção diária, fundadas nas experiências dos primeiros CAPS, NAPS e Hospitais-dia, e as primeiras
45
normas para fiscalização e classificação dos hospitais psiquiátricos (BRASÍLIA, 2005).
Um dos avanços considerados importante em relação à saúde mental no
Brasil foi a promulgação da Lei de nº 10. 216 de 2001, que garante proteção a
pessoas portadoras de transtornos mentais e modifica o modelo assistencial de
saúde mental existente, nesse sentido, o Ministério da Saúde, avança e estabelece
normas como a portaria de n.º 336/2002, a fim de criar equipamentos públicos para
atender de forma humanizada sujeitos com transtornos mentais.
Art. 1º Estabelecer que os Centros de Atenção Psicossocial poderão constituir-se nas seguintes modalidades de serviços: CAPS I, CAPS II e CAPS III, definidos por ordem crescente de porte/complexidade e abrangência populacional, conforme disposto nesta Portaria; (BRASÍLIA, 2001)
De acordo com este novo modelo de Atenção voltado para desospitalização e
reabilitação psicossocial da pessoa com sofrimentos psíquicos, o Governo lança a
portaria de nº 3.088, instituindo a rede de Atenção Psicossocial para Pessoas com
Sofrimento ou Transtorno Mental e com Necessidades Decorrentes do Uso de
Crack, Álcool e outras Drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde com a
intenção de oferecer um suporte de cuidados, acolhimento e acompanhamento
contínuo a esta população.
Como componente importante da Rede estão os (CAPS-AD), que oferecem
serviços para tratar pessoas com problemas relacionados ao álcool e outras drogas.
[...] estes centros especializados desenvolvem um conjunto de atividades que vão desde o atendimento individual (medicamentoso, psicoterápico, de orientação entre outros) atendimento com grupo ou oficina terapêutica e visitas domiciliares. Também devem oferecer condições para o repouso, bem como para a desintoxicação de paciente que necessitem desse tipo de cuidado e que não demandem atenção clinica hospitalar (CARVALHO; CHAIBUB; MIRANDA, 2010, p. 237).
Assim, os CAPS-AD 24h são unidades referência ao atendimento do
dependente e dos familiares, em um contexto de maior vulnerabilidade social e de
agravamento da crise decorrente do uso abusivo ou recaídas, abstinência, ameaças
de morte, ou outro problema. Os serviços disponibilizam atendimento para adultos
ou crianças e adolescentes no sentido de garantir cuidados clínicos contínuos. O
(CAPS-AD 24h), tem até 12 leitos para observar e monitorar, durante 24 horas. O
46
funcionamento ocorre diariamente e nos finais de semanas, incluindo feriados;
indicado para municípios ou regiões com população acima de 200.000 habitantes.
De acordo com Laranjeira (2012), as Políticas Públicas estabelecem serviços
especializados na área da dependência química, porém existem problemas para a
efetivação e funcionamento destes equipamentos, como; a falta de profissionais
qualificados, escassez de recursos para os profissionais desenvolverem suas
atividades, a demanda elevada e a falta de condição de trabalho, um dos piores
agravantes é a falta destes equipamentos em muitas cidades brasileiras, outra critica
que o autor faz é em relação a casos graves da dependência do crack, pois em
muitos centros não existem diretrizes claras em relação à intervenção psicoterápica
ou familiar, assim, segundo o autor “[...] esses centros existentes devem ser
otimizados por meio da criação de programas específicos para os usuários de
crack”.
Embora tendo suas limitações, a rede vem se estruturando desde a década de
90 e atualmente dispõe de um leque de equipamentos, dentre eles os Consultórios
na Rua, que tem como proposta levar os profissionais da área da saúde, mais perto
dos indivíduos em especial os usuários de crack, álcool e outras drogas no sentido
de oferecer o primeiro acolhimento, um suporte clínico imediato, no cuidado aos
primeiros socorros dos adictos, a equipe trabalhar no sentido de ser um suporte a
mais na redução de danos aos dependentes, conforme a portaria nº 122, de 2011 do
Ministério da Saúde.
Nesse sentido, a rede tem sido ampliada para atender caso mais simples com
cuidados paliativos até mais complexos, que demande tempo para desintoxicação
do uso abusivo de álcool, crack e outras drogas; este serviço disponibiliza vagas em
Hospital Geral, funciona diariamente e recebe demanda através de
encaminhamentos dos outros serviços da rede. Atualmente, são diversas as
modalidades, de atendimento e de tratamento oferecido aos dependentes químicos
conforme relata a autora abaixo.
As propostas e formas de atendimento terapêutico variam de acordo com a visão de mundo e perspectiva política, ideológica e religiosa dos diferentes grupos e instituições, governamentais e não governamentais, atualmente nesta área. Da abstinência total á redução de danos, do internamento ao atendimento ambulatorial, dos grupos de autoajuda ao tratamento
47
medicamentoso, de programas governamentais a comunidades terapêuticas, o usuário de substancias psicoativas, que deseja ou necessita de tratamento, tem uma variedade de alternativas, optando por aquela mais adequada ao seu perfil e/ou necessidades. (COSTA, 2009, p.2).
Assim, podemos perceber que há por parte do governo Federal, iniciativa
para tentar amenizar as implicações do uso abusivo de crack e outras drogas, em
maio de 2010, lançou o Plano Crack que tem como meta ampliar a rede de
atendimento, dentre outros, prevê parceria com as Comunidades Terapêuticas
(CTs). As Comunidades Terapêuticas são instituições que há muito já desenvolvem
um trabalho com dependentes químicos e familiares, com objetivo de tratar o
individuo e a família que sofre com o uso abusivo de drogas, conforme Fracasso
(2011, p.64) relata:
Serviços de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso ou abuso de substâncias psicoativas (SPA), em regime de residência ou outros vínculos de um ou dois turnos, segundo modelo psicossocial, são unidades que têm por função a oferta de um ambiente protegido, técnica e eticamente orientados, que forneça suporte e tratamento aos usuários abusivos e/ou dependentes de substâncias psicoativas, durante período estabelecido de acordo com programa terapêutico adaptado às necessidades de cada caso. É um lugar cujo principal instrumento terapêutico é a convivência entre os pares. Oferece uma rede de ajuda no processo de recuperação das pessoas, regatando a cidadania, buscando encontrar novas possibilidades de reabilitação física e psicológica, e de reinserção social (Serviços urbanos ou rurais conhecidos como CTs).
Por meio dessa abordagem, em que o dependente é o principal responsável
pela sua cura, denominado de (CTs), é um ambiente saudável com horários
definidos, regras claras, com plano terapêutico individual, levando em consideração
não apenas o tratamento, mas todo o processo de reinserção social.
[...] O paciente é tratado como o principal protagonista de sua cura. Trata-se de um sistema estruturado, com limites precisos e funções bem delimitadas, regras claras e afetos controlados, através de normas, horários e responsabilidades. Todas estrutura é para que o paciente se situe totalmente no tratamento, sendo assim, o trabalho, tanto pela equipe profissional, quanto pelos pacientes (SABINO; CAZENAVE, 2005, p168).
De acordo com Fracasso (2011), a diferença dessa modalidade de tratamento
é que as (CTs) utilizam como agente chave a própria comunidade para o processo
de recuperação, ou seja, tem como base a filosofia de tratamento através da
linguagem, a difusão de vivência.
48
[...] o principal instrumento terapêutico é a convivência entre os residentes, surgiram no cenário brasileiro, ao longo dos últimos quarentas anos, antes mesmo de existir qualquer política pública de atenção a dependência no país (COSTA, 2009, p. 2).
De acordo com Vidal, Bandeira e Gontijo (2007) a formulação da Rede de
Atendimento psiquiátrico tem conseguido avanços importantes nas últimas décadas
em relação à melhora na qualidade de vida das pessoas atendidas. Porém, não
podemos deixar de mencionar as fragilidades existentes no atendimento aos
usuários de crack e outras drogas, como; a falta de articulação entre as políticas
sociais, os serviços oferecidos pela área da saúde são precarizados, a demanda é
considerável, a falta de profissional especializado na área são questões que
devemos considerar num processo de reinserção social do dependente químico.
O SUS formal corresponde ao que está estabelecido pela Constituição Federal, constituições estaduais, leis orgânicas, decretos, portarias, resoluções, pactos e regulamentos, embora muito distante da realidade dos serviços públicos, em que prevalece o SUS real e o SUS para pobre (PAIM, 2009, p 73).
Para o autor a elaboração de Leis, são medidas que legitimam, porém não há
uma efetivação delas; o que existe é um sucateamento dos serviços públicos
brasileiro, no sentido da lógica do mercado que favorece cada vez mais para a
desigualdade social, não tendo políticas efetivas que de fato garantam educação de
qualidade, serviços de saúde acessíveis a toda a população, saneamento básico,
assistência social ao alcance de todos são questões básicas que a Constituição já
garante desde 1988, mas ainda está muito longe da realidade brasileira,
necessidades que devem ser levada em consideração no processo de reinserção
social para uma população desprovida do básico.
2.3 Comunidade terapêutica como rede de apoio
A origem das Comunidades Terapêuticas, segundo Fracasso (2008), se dá
em decorrência da organização religiosa chamada Oxford; este movimento religioso
tinha por objetivo um modo de vida mais próximo do idealizado por Cristo.
[...] este grupo, conhecido como Grupo de Oxford, buscava um estilo de vida mais fiel aos ideais cristãos: se encontravam várias vezes por semana para ler e comentar a Bíblia e se comprometiam reciprocamente a serem
49
honestos. Entre 10 e 15 anos depois, constataram que 25% dos seus participantes eram alcoolistas em recuperação (FRACASSO, 2008, p. 10).
De acordo com a autora citada acima, foi nos Estados Unidos, na cidade de
Santa Mônica, que um pequeno grupo de alcoolistas em recuperação decidiram
viver juntos para se manterem em abstinência e na busca de um novo estilo de vida.
Desta forma, nasceu à primeira (CT), denominada de Synanon, cujo modo de viver
era a convivência harmoniosa entre seus membros.
No dia 18 de setembro de 1958, Chuck Dederich e um pequeno grupo de alcoolistas em recuperação decidiram viver juntos para, além de ficarem em abstinência, buscarem um estilo alternativo de vida [...] adotaram um sistema de relacionamento direcionado em uma atmosfera quase carismática, o que para o grupo foi muito terapêutico [...] (FRACASSO, 2008, p. 10).
No ano de 1963, o Monsenhor William Bórbrien e David Deitch fundaram a
(CT) cujo nome era Daytop Village, passaram a tratar não somente indivíduos
alcoolistas, mas também pessoas usuárias de outras substâncias psicoativas.
Surge, então, o modelo para as futuras Comunidades Terapêuticas em todo o
mundo que só se aperfeiçoaram no decorrer do tempo.
Segundo Fracasso (2008), assim como em Oxford, as (CTs), surgiram no
Brasil através de um movimento religioso liderado por um pastor cujo nome era
Edmundo, portanto foi na cidade de Goiânia que surgiu a primeira Comunidade
Terapêutica, designada de Desafio Jovem, somente no ano de 1978, na cidade de
Campinas (SP), que as (CTs) ganharam maior visibilidade com a Fazenda do
Senhor Jesus, liderada por padre Haroldo Rham. Esta (CT) foi precursora no Brasil
em relação à abordagem psicossocial no quadro funcional.
Segundo Costa (2001), as (CTs) chegaram ao Brasil, antes mesmo que
houvesse Políticas públicas sobre drogas. A proposta era prestar serviço aos
indivíduos que têm problemas com o uso e abuso de Substâncias Psicoativas
(SPAs). O surgimento das Comunidades Terapêuticas, de acordo ainda com a
autora, se dá a partir de duas grandes lacunas deixada pelo Estado.
Em primeiro lugar, a questão do uso, para autora, estaria na dimensão da
repressão, somente depois dos anos 60 é que a população teve como opção os
hospitais mentais e as clínicas particulares, época que começam a surgir no Brasil
50
as (CTs). Ainda conforme a autora citada, a segunda proposta passaria pelo âmbito
das questões religiosas, no intuito de evangelizar, como a finalidade de oferece uma
resposta aos que necessitavam de ajuda para se livrar do uso abusivo de drogas
lícitas ou ilícitas.
De início, o desenvolvimento das (CTs) se deu a partir de trabalho filantrópico
sem recursos do Estado, com os avanços das Políticas na área da dependência
química o Governo cria mecanismos políticos para as comunidades terapêuticas a
fim de integrá-las a rede socioassistencial; para tal, foi necessária uma resolução da
ANVISA a fim de regular o funcionamento de todas as Comunidades Terapêuticas.
Cresceram baseadas no serviço voluntário, na prática assistencialista e no ensino religioso, mas cresceram! E mais: alcançaram resultados, enquanto as políticas públicas passavam ao largo da questão da dependência química, pois esta era um „caso de policia‟ e não de „política de saúde publica‟ (COSTA, 2009, p. 6).
A preocupação do governo era principalmente em relação à clandestinidade e
ao mau funcionamento de algumas (CTs); em virtude disso, em 2001 lançou a
Resolução RDC. Nº 101 da ANVISA, o regulamento para o funcionamento das
Instituições que tratam de pessoas com problemas decorrente de álcool e outras
drogas, em consonância a RDC anterior em 2011 divulga a RDC-29, onde o
regulamento é refeito, considerando elementos importantes em favor das
Comunidades Terapêuticas. Para Fracasso e Landre (2012), “[...] as comunidades
deixaram de se adequar às normas gerais de um serviço de saúde. Tal qual um
hospital ou centro de tratamento, em favor de seu caráter residencial e de convívio
família[...]”, tem por objetivo
Parágrafo único. O principal instrumento terapêutico a ser utilizado para o tratamento das pessoas com transtornos decorrentes de uso, abuso ou dependência de substâncias psicoativas deverá ser a convivência entre os pares, nos termos desta Resolução.(Resolução da ANVISA RDC de Nº 29)
A Resolução traz critérios claros em relação ao funcionamento da CTs, à
infraestrutura, a gestão de funcionários, enfim orienta em relação a vários critérios
que devem ser considerados no cotidiano de uma CT.
Devido ao redimensionamento técnico-operacional, as comunidades
terapêuticas passaram a integrar a Rede de Atenção Psicossocial, considerado um
51
instrumento a mais para atender uma demanda crescente de usuários de
substâncias psicoativas, embora sendo alvo de muitas críticas, por várias questões
que não vamos nos aprofundar, mas vamos apenas citar superficialmente como a
questão religiosa, a abstinência total e pelo fato de as CTs fazerem parte do terceiro
setor.
No entanto, as críticas não tiram o mérito dessas Instituições que já
desenvolvem um trabalho há décadas, antes mesmo que o Estado compreendesse
a questão da dependência como doença. A abordagem é resgatar a dignidade de
indivíduos que perderam tudo em virtude do uso de drogas, neste sentido as (CTs),
proporcionam um ambiente saudável para o processo de tratamento, recuperação e
reinserção social. Conforme Fracasso (2009), “[..] capaz de oferecer a oportunidade
de interagir, escutar, aprender, projetar e crescer de maneira que reflita a
capacidade e o potencial individual e coletivo das pessoas [...]” com regras claras,
uma equipe de profissionais qualificados para atender de forma ampla esta
população.
52
3 REINSERÇÃO SOCIAL DO DEPENDENTE QUÍMICO
Diante de uma realidade envolvendo o usuário de crack e as mais diversas
complexidades no âmbito familiar e sociais já apresentadas nesse estudo,
trataremos a partir de então das perspectivas de reinserção social de ex-usuários de
crack residentes na Comunidade Terapêutica Desafio Jovem do Ceará, sendo
imprescindível situarmos/considerarmos os seguintes aspectos no processo de
reinserção social: Quem são estes sujeitos, qual o contexto em que viviam antes do
tratamento, como era a relação sócio-familiar, o que pensam sobre o Programa de
Acompanhamento Terapêutico (tratamento a nível residencial) e quais suas
perspectivas de futuro/vida após concluírem o tratamento.
A reinserção social decorre de ações que implicam em reconstruir as perdas,
a sociabilidade, a cidadania, aspectos sociais e comunitários que foram deixados em
consequência do uso de crack. De acordo, com o Observatório Brasileiro de
Informações sobre Droga - OBID, o termo reinserção Social significa “o
estabelecimento ou regaste de uma rede social inexistente ou comprometida pelo
período de abuso da droga”.
No tocante, o processo de reinserção social do usuário de crack a Senad
orienta que deve ser um processo permanente que envolve vários atores sociais,
logo, reinserção social diz respeito não somente a altruísmo do dependente químico,
frente a questões de se manter em abstinência, mas faz referência a uma gama de
possibilidades disponíveis para não retroceder a situação de uso, nesse sentido
reinserção social deve ser garantido como um direito social.
3.1 O cenário
O Desafio Jovem do Ceará Dr. Silas Munguba é uma Instituição filantrópica
sem fins lucrativos, sob proc. N° 28977.011868/94-34 de Utilidade Pública Federal,
atualmente denominada de Comunidade Terapêutica, criada por Dr. Silas Munguba,
na década de 70, devido à preocupação com o aumento do número de jovens
usuários de drogas. Sensível à causa, procurou estudar sobre o tema e difundir a
prevenção entre diversos setores da sociedade, culminado na criação de uma das
53
mais respeitosas instituição que trata de pessoas com problemas relacionados a
álcool e outras drogas.
De acordo com Regulamento interno da instituição, denominado de manual do
aluno, assim começou a jornada no que diz respeito à fundação de uma das
instituições mais conhecida no Estado do Ceará; foi na década de 1970, que Dr.
Silas decidiu cuidar das pessoas que sofriam devido o uso de substâncias
psicoativas, já era conhecido por causa das palestras que ministrava no Brasil para
prevenção do uso de drogas.
No entanto, a inquietação do médico passou a ser outra: como tratar as
pessoas que já sofrem devido ao uso? Neste sentido, a autora revela que ele
resolve unir forças com outro membro de sua Igreja, na qual já havia desenvolvido
outro projeto parecido na cidade de Brasília, João Furtado e Silas decidiram criar
uma casa de Recuperação; nascia ali uma das Instituições pioneiras no Estado do
Ceará, em relação ao tratamento, recuperação e reinserção social de pessoas com
problemas referentes ao álcool e /ou outras drogas.
Conforme Rodrigues (2010), durante 20 anos, o DJC atendeu os dependentes
químicos e alcoolistas apenas no Programa de Acompanhamento Terapêutico
através do Núcleo de Internamento. No ano de 1998, nascia o Núcleo de
Assistência Ambulatorial, hoje denominado de Programa de Assistência
Psicossocial, com o objetivo de atender dependentes químicos e alcoolistas que
precisam e desejam o tratamento, mas não podem ser internados por não
desejarem ou não estarem dentro do perfil, a modalidade é destinada também a
mulheres e a ex residentes da Instituição.
O Desafio Jovem do Ceará se consolida no tratamento de dependentes
químicos, possibilitando-lhes alcançarem um bem estar físico, mental, espiritual e
social. A entidade atualmente dispõe de duas modalidades de tratamento, sendo
estas: o Programa de Assistência Psicossocial e o Programa de Acompanhamento
Terapêutico. Esses tratamentos possuem atividades diferenciadas com a mesma
equipe atuante.
54
O Programa de Assistência Psicossocial7 é desenvolvido através de grupos
temáticos, preparação para o internamento, atendimentos individual e aulas no
supletivo, a equipe composta por profissionais de diversas áreas como: da
orientação cristã, do Serviço Social, da Terapia Ocupacional, da Psicologia e de
professores da Educação Básica. Essa modalidade de tratamento é destinada às
pessoas que são transferidas do internamento e/ou aqueles que possuem um nível
menor de comprometimento.
A outra modalidade é o Programa de Acompanhamento Terapêutico, é um
modelo voltado para atender exclusivamente homens acima dos 16 anos, por um
período pré-estabelecido de até nove meses, tendo todo suporte psicossocial,
contando com uma equipe multidisciplinar, no qual desenvolvem atividades como:
de grupos, laborterapia, supletivo, terapia ocupacional, esporte, orientação cristã,
atendimento individual no sentido de proporcionar uma mudança no estilo de vida,
desde interrupção do uso total de drogas a sua reinserção à sociedade.
Assim, a Comunidade Terapêutica Desafio Jovem do Ceará tem como missão
“trabalhar o ser humano em toda sua essência na prevenção e no tratamento ao uso
indevido de drogas” como filosofia de trabalho: a prevenção do uso de drogas, o
tratamento para os dependentes químicos e familiares.
Para que tal objetivo seja cumprido, o trabalho oferecido pela Instituição é no
sentido de conscientizar, criar mecanismo para mudanças no estilo de vida dos
dependentes, a metodologia desenvolvida pelos profissionais tem como meta
proporcionar novos interesses, hábitos saudáveis, responsabilidade por si e pelo
outro, direcionar para novos padrões de vida longe das drogas, para que haja uma
reinserção tanto a nível social como familiar.
Considerando que a CT é um ambiente de tratamento, as interações entre os membros são planejadas para serem terapêuticas dentro do contexto das normas que demandam de cada membro o exercício de um papel duplo. O objetivo do tratamento não é somente ajudar o dependente a começar a sair das drogas, mas ajudá-lo também a desenvolver um estilo de vida que sustente uma existência sóbria (FRACASSO, 2008, p. 20).
7 Programa de Assistência Psicossocial (tratamento a nível ambulatorial)
55
Logo, o Desafio Jovem do Ceará trabalha com uma equipe multiprofissional
composta por psicólogo, assistentes sociais, terapeuta ocupacional, coordenadores,
educadores cristãos, professores, educador físico e um grupo de agentes
terapêuticos. A equipe multidisciplinar trabalha para proporcionar ao dependente
químico e alcoolista a sua reintegração social nas cinco áreas, a saber: física,
psicológica, espiritual, social e cognitiva.
Na área física, são desenvolvidas atividades ligadas à saúde do corpo como: a
prática da educação física, esportes e laborterapia.
[...] o exercício físico aeróbicos de alta intensidade parece ser eficaz e de grande utilidade no tratamento dos usuários de substancias psicoativas, especialmente de cocaína. a forma física e os níveis de energia dos ex. usuários em recuperação melhoram durante a prática esportiva, modificando positivamente sua percepção corporal, equilibrando seu senso de autocontrole e favorecendo a interação com seus pares [...] (RIBEIRO, OLIVEIRA; MIALICK, 2012, p. 501).
Área psicológica: trabalha com o dependente químico e seus familiares, com
propósito de identificar e tratar os conflitos psíquicos inerentes a cada ser humano.
Os pacientes aprendem que há diferentes caminhos para mudanças de comportamento e que o terapeuta poderá ajudá-los a encontrar esses caminhos por intermédios de técnicas clinicas. Ao longo do tempo, o tratamento pode ser considerado mais uma “jornada de descoberta” pessoal, não apenas uma recuperação (PADIM, 2012, p. 325).
Os profissionais que trabalham a área espiritual objetivam através dos
ensinamentos de Cristo uma mudança no estilo de vida dos dependentes químicos,
ou seja, é através da Bíblia que eles têm subsídios teóricos para garantir uma vida
longe das drogas.
[...] a reunião, de cunho religioso, utiliza-se da bíblia ou de outro livro religioso a caba agindo como terapia de grupos, permitindo que seus frequentadores dividam com o grupo suas angustias e recebam sugestões de como superá-las. Sentem-se apoiados, sem serem julgados pelos atos errôneos que porventura possam ter cometido durante os anos em que as drogas definiam os rumos de sua vida [...] (SANCHEC; RIBEIRO, 2012, p. 486).
Ao se trabalhar a área social dos dependentes químicos, tem como objetivo
fortalecer e/ou restabelecer os vínculos familiares e comunitários dos residentes,
orientar e encaminhar os mesmos para o processo de reinserção social. “[...] a
participação da família no tratamento está diretamente relacionado ao grau de
56
necessidade de mudança por parte do usuário, de manutenção da abstinência e da
continuidade do processo de recuperação [...]” (FRACASSO; LANDRE, 2012, p.
510)
A área cognitiva está ligada à área de aprendizagem, e acontecer na instituição
a partir do convênio firmado com a Secretaria de Educação do Ceará, fica a cargo
dos professores de educação permanente que têm a função de ensinar os
indivíduos que não tiveram a oportunidade de concluir seus estudos ou que nunca
estudaram em decorrência do uso de (SPAs), logo é uma possibilidade de ter
acesso com profissionais gabaritados na área.
[...] os mais jovens, quando têm condições e são apoiados pela família ou companheiros, retornam aos estudos. Quando isso acontece, é a retomada do ciclo natural da vida, da capacidade de investir na esperança de melhores dias e de não mais voltar à desesperança das drogas e do álcool (COSTA, 2001, p. 239).
O trabalho que a Instituição desenvolve é no sentido de tratar, recuperar e
reinserir o dependente químico nas diversas atividades desenvolvidas por uma
equipe multiprofissional, através de modalidades diferenciadas de tratamento,
voltada para atender o individuo em sua integralidade colaboram para melhoria da
qualidade de vida e o exercício pleno de cidadania, a pretensão é torná-lo um sujeito
autêntico capaz de fazer escolhas longe das drogas.
3.2 História dos sujeitos
Turmalina, 23 anos de idade, solteiro, ensino médio completo, costureiro,
nunca teve problemas com a justiça, não tem histórico de situação de rua, mas
passava boa parte do tempo na rua em busca do crack, tem parentes próximos que
faz uso de drogas lícitas, a saber, o álcool, advindo de uma relação conflituosa com
o pai, está na 4ª internação, usou pela primeira vez álcool e tabaco por volta dos 15
anos de idade, a relação com o crack ocorreu em virtude da influência de amigos e
da curiosidade. Experimentou a “pedra” com 16 anos; de início, fumava apenas
quando usava álcool, no decorrer dos anos o crack passou a ser a primeira e única
opção, vivendo apenas em função de usar, inúmeras foram as consequências do
uso do crack: contraiu tuberculose, abandonou as relações sociais com amigos e
familiares, em relação ao emprego não tinha vínculo formal de trabalho, fazia
57
apenas bico numa facção e já estava preste a sair; em relação ao HIV, nega que
tenha ocorrido em detrimento do uso da “pedra”, está em tratamento residencial há
quatro meses.
Topázio, 24 anos, solteiro, estudou até a 5ª série do ensino fundamental, não
tem problemas com a justiça, não tem histórico de situação de rua. Tem familiares
que fazem uso de substância psicoativa, começou a beber com 11 anos de idade,
usou maconha, cocaína, mesclado, mas a preferência era pelo crack que conheceu
com 18 anos, em decorrência de amizades; no início, associava o álcool com o
crack, em virtude disso, perdeu a companheira e vendeu tudo que possuía como
geladeira, fogão, cama, celular etc.; as relações familiares muito fragilizadas, com
conflitos constantes com os pais, passou a viver isolado somente em função do uso
compulsivo do crack, em tratamento residencial acerca de quatro meses.
Diamante, 33 anos, solteiro, estudou até a 3ª série do ensino fundamental,
não tem filhos, não tem problemas com a justiça, não viveu em situação de rua,
usuário de álcool, maconha, cocaína e crack, do qual tem preferência; o primeiro
contato com álcool foi através de amigos; a maconha foi em torno dos 14 anos de
idade através do seu genitor, que era dependente químico e alcoolista, a saber
(maconha e álcool), o uso da cocaína era esporádico; aos 17 anos de idade, por
curiosidade e influência de amigos usou crack pela primeira vez, fazendo uso por
quase duas décadas; nos últimos anos, o uso ficou descontrolado, acarretando com
problemas psíquicos e sociais, a fissura o levava à prática de assaltos para comprar
a “pedra”, dívidas com traficante era outro agravante; o relacionamento com a
família era complicadíssimo, não conseguia emprego formal, os bicos que fazia
eram apenas para comprar o crack; está em tratamento a nível residencial há
quatro meses.
Rubi, 33 anos, artesão, tem uma companheira, sem filhos, não viveu em
situação de rua nem tem problemas judiciais, tem familiares que são usuários de
maconha e cocaína, usuário de álcool, maconha, mesclado, cocaína, psicotrópico e
crack. Segundo ele, o crack é uma droga poderosa e alucinante, usou pela primeira
vez há treze anos por curto espaço de tempo, nos últimos sete anos passou a ser a
droga de preferência, usava de forma cada vez mais compulsiva, cometendo
58
pequenos furtos dentro de casa; chegou a vender a roupa do corpo para adquirir a
“pedra”, logo, houve um agravamento dos problemas sócio-familiares em
decorrência do uso compulsivo; está em tratamento há seis meses.
Percebe-se que o perfil dos entrevistados não é diferente dos dados
divulgados recentemente pela Fio Cruz(2013), que apontou o perfil dos usuários de
crack no Brasil: são adultos jovens, solteiros, com baixa escolaridade, com relações
familiares fragilizadas, percebe-se que há por partes dos dependentes químicos, a
busca por uma droga cada vez mais forte e que os efeitos sejam capazes resolver
seus problemas seja de ordem psíquica, familiar ou econômica, no entanto, no
decorrer do tempo o uso abusivo acarreta maiores transtornos .
De acordo com os relatos dos entrevistados, o primeiro contato com as
drogas foi através de amigos ou familiares próximos, todos foram unânimes em
afirmar que o primeiro contato com as drogas foi na adolescência; conforme Bessa
(2012), a adolescência é uma fase na qual há transformações no próprio corpo como
a nível psíquico, segundo o autor estudos comprovam a tendência de
experimentação de drogas nesta fase da vida, podendo levar a desenvolver
inúmeros problemas pra algumas pessoas e outras não.
O primeiro contato com as substâncias ocorre muitas vezes por “pressão do
grupo” no qual o indivíduo faz parte, ou no contexto familiar vulnerável, com
presença de uso de alguma substância psicoativa, o que Ribeiro, Yamguchi e
Duailibi (2012), dizem ser fatores de riscos os “componentes individuais e sociais
que influencia positivamente ou negativamente para o consumo”.
Nesse sentido, existem inúmeros fatores de risco e também de proteção, pois
os sujeitos são indivíduos que vivem em interação com os demais, em especial
nesta fase onde a busca pelo “novo”, por novas sensações, a falta de expectativas
em relação ao futuro e tendo nas drogas a possibilidade de “algo a mais”, conforme
Bessa (2012), “o uso de substância psicoativa que passa a ser muito atraente nesta
fase”. Portanto, é imprescindível para nossa compreensão que as drogas surgem
nesta etapa com um elemento desestabilizador para a vida dos indivíduos que
buscam “prazer”, conforme a fala deles.
59
[...] incentivos de amigos, as amizades, primeiro foi o álcool a maconha, os amigos incentivaram ai veio a curiosidade, achava aquilo ali legal, que quem fazia aquilo ali era massa e tal. (RUBI, 33 anos).
[...] eu não gostava de drogas ele dizia borá macho é bom experimenta, ai experimentei e todo dia tava fumando mais ele (TOPÁZIO, 24 anos).
As motivações do consumo são as mais variadas: a busca pelo prazer,
problemas inerentes ao próprio indivíduo, busca por “autonomia social”, afirmação
da identidade, a disponibilidade das drogas lícitas/ilícitas no mercado, o uso
recreacional que tende a levá-los para a dependência. Conforme Bucher (1992), “ a
passagem de uma etapa para outra não segue o mesmo ritmo em todas as
pessoas”, assim percebe-se nas falas que os motivos que o levaram a usar pela
primeira vez não são os mesmos que os fizeram permanecer, de forma gradativa e
isolada nota-se que cada sujeito pesquisado passou de uma etapa para outra
conforme o discursos dos próprios entrevistados:
Curiosidade; um vizinho meu, ele disse, que era bom, 17 anos, comecei a usar e fiquei gostando e fiquei com aquela fissura de mais e mais, foi indo não deixei mais (TOPÁZIO, 24 anos).
[...] fazia coisa que eu nunca tinha feito, eu nunca pensei que um dia eu podia fazer né por causa da droga, mas o crack fez eu fazer isso ai, fez eu desinteressar pelo trabalho, fez com que eu quase perdesse minha família, minha mulher, trouxe muitas consequências (RUBI, 33 anos).
Percebe-se, nas falas, o modo pelo qual viviam os residentes, antes do
tratamento no DJC, de forma tão comprometida com a droga que os problemas
ultrapassavam as questões individuais e familiares. Havia, por parte dos indivíduos,
desinteresses e abandono por questões práticas do cotidiano, abandono de
emprego, risco de morte, conflitos familiares uma desfiliação em todos os aspectos
da vida, comprometimento considerável culminando com o isolamento social. As
consequências de ter o crack como droga de preferência são as mais diversas
conforme eles citam:
[...] a tuberculose foi através do crack, o HIV não, mas influenciar devido à baixa imunidade [...], os problemas sociais que o crack tirou de mim foi o prazer de viver as amizades né, nem foi que meus amigos se afastarão de mim, aconteceu de eu me afastar deles primeiro entendeu? [...] eu perdi esse convívio social com as pessoas, com a minha família, também eu tinha perdido esses laços, nem mesmo tava perto deles, porque eu passava boa parte do tempo na rua do que dentro de casa (TURMALINA, 23 anos)
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Vários problemas, perdi a mulher que eu tinha [...], fui e disse pra ela que eu usava, perdi ela separemos, muitas coisas na vida boa que eu perdi, também, que por exemplo minha família que isolaram mais eu, me deixaram mais distante, dizia que não era vida pra mim e eu quer saber de nada... muito é bom (TOPÁZIO, 24 anos )
A dependência perpassa por momentos de quebra de vínculos sociais e
comunitários, em que os sujeitos ficam excluídos dos aspectos básicos de
sociabilidade, pressupondo uma reinserção social que Ganev e Lima (2011, p.115),
denomina de que “consequências da dependência de drogas são, elas mesmas, os
pressupostos da necessidade de reinserção social”, devido o grau de
comprometimento dos indivíduos com as substâncias psicoativas, percebendo-se
nas falas dos sujeitos que houve um afastamento das questões do cotidiano como,
estudar, trabalhar , passear, enfim cuidar da família, os sujeitos se encontram tão
afetados que não tem domínio sobre o uso e suas implicações com isso acarreta
inúmeras consequências como isolamento, alienação do ser, problemas familiares,
conforme relatos abaixo:
[...] fazia coisa que eu nunca tinha feito, eu nunca pensei que um dia eu podia fazer né por causa da droga, mas o crack fez eu fazer isso ai, fez eu desinteressar pelo trabalho, fez com que eu quase perdesse minha família, minha mulher, trouxe muitas consequências (RUBI, 33 anos)
[...] eu trabalhava em função do crack, como eu falei nunca me envolvi com polícia nem cheguei a mora na rua, graça a Deus, mas em compensação tudo que eu ganhava no meu trabalho era para o crack, eu já não conseguia ter mais objetos pessoais, como roupa, calçado, celular coisas que meus amigos tinham[...] eu passei também a não querer mais me divertir, eu trocava momentos com meus amigos para ficar usando crack, eu não dava mais importância em sai com eles (TURMALINA, 24 anos).
A percepção dos entrevistados referente ao tratamento residencial, referiram-
se às dificuldades e as possibilidades que o tratamento dispõe, em relação às
dificuldades está a questão de lidar com abstinência8 e a fissura9 principalmente nos
primeiros dias dentro da casa; em relação à adaptação, todos relataram a grande
8 Abstinência A síndrome de abstinência é um conjunto de sinais e sintomas decorrentes da falta da
substância no organismo, caracterizando-se por sensações de mal-estar e diferentes graus de sofrimento mental e físicos que variam de acordo com cada tipo de droga. 9 Fissura refere-se a um desejo profundo de consumir uma substancia psicoativa, associado a
intenção de repetir a experiência dos efeitos. Sendo geralmente, acompanhada de alteração do humor, do comportamento e da cognição.
61
contribuição dos profissionais da instituição em relação ao manejo da fissura
principalmente nos primeiros dias, quando acontece uma maior evasão.
As atividades utilizadas pelos profissionais no início do tratamento dizem
respeito à compreensão dos efeitos das drogas no organismo, levando-os a refletir
os motivos do uso, desenvolvem atividades com a finalidade de “controlar” o desejo
para não usarem, são questões trabalhadas nos grupos que acontecem diariamente
na instituição, mas segundo Ribeiro (2012) afirma que “a vulnerabilidade crônica a
recaídas é um desafio no tratamento do dependente químico”, neste sentido o
tratamento requer além de técnicas o uso de farmacológicos.
3.3 Tratamento residencial como possibilidade
Na percepção dos entrevistados, o trabalho desenvolvido dentro da instituição
não contempla apenas ficar longe das drogas, mas implica em recuperar o tempo
perdido, ter metas, voltar a acreditar em si mesmo, logo, é neste sentido que eles
abordam a importância das atividades ligadas à área educacional, a convivência, a
recuperação da autoestima e da sociabilidade em todos os aspectos, de acordo com
as falas dos próprios residentes “a ajuda dos profissionais, o interesse pelos estudos
e a convivência boa que eu tive sempre na casa” (Rubi, 33 anos), demonstram que o
tratamento oferecido tem impactos na vida dos indivíduos que tem problemas
relacionados com o crack “no início foi difícil que tinha fissura, falei com os
profissionais, ai já tava querendo ir embora, ai eu disse pra Dra. aqui e ela disse que
ia passar e realmente passou” (Diamante, 33 anos).
Ao serem perguntados em relação às atividades desenvolvidas, mencionaram
as que mais tinham afinidade.
[...] as atividades que eu mais gostava era a Terapia ocupacional, e a laborterapia, podia me colocar em qualquer canto que eu gostava, de pintura [...] (Diamante, 33 anos)
[...] uma coisa que eu não faço mais é menti...isso ai que fez eu aprender nos cultos, ser sincero falar a verdade mesmo que doa, eu tô bem espiritualmente...(Rubi, 33 anos)
Embora tenha percebido que há um número considerável de alta administrativa
nos primeiros dias de “internação” seja alta a pedido ou por terem sido desligados
62
por infligirem as normas de convivência da instituição, há um consenso com Ribeiro
(2012) em relação ao esse perfil que os “usuários dessas substâncias apresentam
maiores índices de abandono e, quando internados, apresentam piores índices
sociais”. Percebe-se uma complexidade em relação à busca pelo tratamento e
também em relação à continuidade, isso ocorre por causa da ação do crack no
sistema nervoso central.
Quando indagados em relação às primeiras saídas, mostraram-se
entusiasmados e otimistas, relatando que foram recebidos pelas famílias, com muito
amor, carinho e compreensão. Portanto, percebe-se nas falas e no semblante deles
que foram tratados de maneira afetiva, embora advindos de um contexto fragilizado
e relações adoecidas por causa do uso, a volta ao lar depois de alguns meses
afastado é uma possibilidade de inicio de vida ou período longe do mundo das
drogas. Conforme informe dos próprios entrevistados que segue:
Eu senti tudo diferente, tudo novo, quando cheguei em casa minha mãe de boa comigo, mais carinhosa, tratado super bem, pela minha mãe, antes eu não tinha esse afeto, carinho por ela, ela sempre teve mas eu não ligava, não dava tanta importância pra essas coisas não- só quando tá aqui dentro a gente vai saber o valor né [...] (DIAMANTE, 33 anos)
[...] a sensação era boa de alivio você chegar em casa não ter ninguém com a cara emburrada pra você, não ter ninguém pra dizer coisa, discutir, criticar que nem antigamente tinha né! Foi uma sensação muito boa (TOPÁZIO, 24 anos)
Segundo Ganev e Lima (2011), mencionam que o fato dos indivíduos estarem
sóbrios não significa que haja um resgate das relações que foram anteriormente
rompidas por causa da situação de uso e suas alusões como mentira, raiva,
ressentimento, ciúme, mas é importante ressaltar aqui, a importância do trabalho
desenvolvido junto às famílias, no sentido de ter nesta o referencial de
comportamento, atitudes e apoio para continuidade no processo de tratamento e
reinserção social, logo é ter na família uma possibilidade de ficar “seguro”.
De acordo com as falas dos entrevistados, houve mudanças significativas em
relação às atitudes dos familiares. Mudaram o modo de agir, passaram a tratá-los de
forma carinhosa com atitude de respeito, havia mudança até na maneira de olhar,
assim passaram a viver de forma harmoniosa, não apenas por causa da abstinência,
os motivos vão além, segundo os mesmos, isso ocorre por parte dos familiares, por
63
compreenderem que existe um compromisso, uma busca pela superação, por um
novo estilo de vida longe das drogas.
Logo, compreendemos a importância do trabalho desenvolvido dentro da
instituição com os familiares, sendo considerado primordial para o sucesso do
tratamento. Assim, é imprescindível e notório o acompanhamento das famílias por
parte da equipe técnica, em especial dos assistentes sociais que atuam nos
atendimentos individuais e grupais no sentido de restabelecer, fortalecer e
acompanhar todo o processo de tratamento, recuperação e reinserção a nível
familiar, conforme menciona Domingos e Machado (s/d, p.1) “com a questão do uso
e abuso de drogas se percebe o alcance cada vez maior de consequências
generalizadas na vida social das pessoas, na desagregação familiar”. Portanto,
percebe-se que a família tem sua responsabilidade no sentido de influência tanto em
nível de experimentação do uso como sendo responsável no positivamente para
cuidar.
3.4 Dificuldades e possibilidades que envolvem o processo de
reinserção social
Questionados sobre as dificuldades que envolvem o processo de reinserção
social, os entrevistados, de início, não compreendiam o significado do termo
“reinserção social”, em que se fez necessária uma explicação breve, e discorreram
sobre as principais dificuldades, dentre elas todos foram unânimes em admitir o
medo da recaída, a dificuldade perpassa pela falta de oportunidade em arrumar
emprego, “eu não sei não, qualquer hora lá fora muitas tentação né, eu ainda fico
com aquele receio, a falta de uma ocupação é difícil [...]” (Rubi,33 anos). Outro fator
de grande inquietação é em relação às amizades; disseram ter receio e
demonstraram não saber como lidar com essa situação, “minha maior dificuldade é
os amigos...” (Topázio, 24 anos) as falas descrevem o medo de voltar a usar e
abordam acerca das estratégias possíveis para não voltar à situação de uso.
A fuga, o evitamento, ter uma ocupação com alguma atividade que substitua o
uso da droga, a determinação pessoal de não voltar ao consumo, o apoio da família,
foram algumas considerações feitas pelos jovens como principais motivos para
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permanecer longe das drogas. Neste sentido, conclui-se que a ocupação do tempo
com atividades que proporcionem algum tipo de prazer/ satisfação e a continuidade
no atendimento com profissionais da área são prerrogativas para um processo
contínuo de reinserção social, destaque para as falas deles.
[...] eu tenho medo sim, esse medo venha pra me despertar isso, querer distancia do crack e consequência do mundo que o crack, envolve que é as pessoas que usam, os lugares e quando alimento isso em mim, eu acredito que vai dar certo (TURMALINA,23 anos)
Conforme Ganev e Lima (2011), “reinserção social inicia-se no primeiro
atendimento quando o dependente busca ajuda” neste sentido percebe-se nas falas
dos entrevistados que houve um regaste de vida, possibilidade de voltar a acreditar
em si mesmo, é visível o compromisso dos profissionais do DJC no atendimento
aos dependentes químicos de forma integral, sem discriminação com a finalidade de
trabalhar questões relacionadas ao restabelecimento ou regaste sócio familiar.
A abordagem acontece de forma clara; a relação desenvolvida pela equipe
multidisciplinar, no trato com os residentes, conhecer suas percepções em relação
ao desejo de parar ou não de usar drogas, nos atendimentos individuais e de grupo,
é considerado a história de vida de cada indivíduo, oriundo das mais complexas
realidades sociais, de ambientes conflituosos, com relações familiares arrasadas,
indivíduos excluídos socialmente, neste sentido o trabalho desenvolvido perpassa
para possibilidade do individuo voltar a acreditar primeiro em si mesmo, conforme
relata a citação abaixo que, a partir dos primeiros dias em tratamento, os
dependentes vão fazendo planos para o futuro.
À medida que vão resgatando o vigor físico, intelectual e emocional, redescobrem-se como sujeitos capazes de transformar a própria realidade e retomam a capacidade de fazer planos, sonhar e ter esperança em reconstituir suas vidas, seus casamentos, suas famílias...A volta aos bancos escolares e a conquista de um emprego, tão logo saiam da Instituição, geralmente faz parte desses sonhos (COSTA, 2001,p. 238).
Diante disso, ao serem abordados em relação às perspectivas para o futuro,
todos falaram em trabalhar, constituir família, estudar e ficarem longe das drogas
conforme as falas abaixo:
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[...] eu queria colocar um negócio pra mim, não queria trabalhar pros outros, uma coisinha que eu não gosto é de ficar todo tempo sendo mandado [...] (DIAMANTE).
[...] Pretendo trabalhar e comprar uma casa pra mim, depois comprar uma moto e arrumar uma pessoa pra mim se casar é isso que pretendo [...] uma vida sossegada, sem bebida e sem drogas [...] (TURMALINA).
[...] meus planos para o futuro é terminar meus estudos, conseguir um emprego, e arrumar uma casa para construir família [...] expectativa em arrumar um emprego, minha estratégia é essa arrumar um emprego [...] meu maior medo é voltar de novo e fazer mais nada da minha vida! já tá boa assim sem usar, quero mais não, essa desgraça não, não me trouxe nada de bom, mas as vezes vou mentir não bate uns pensamento[...] (RUBI).
Neste cenário de novas possibilidades, é necessário entendermos, segundo
Ganev e Lima (2011), que há duas questões importantes que devem ser analisadas:
a primeira diz respeito ao isolamento do próprio sujeito, “que ocorre a partir do
dependente consigo mesmo”, devido a dependência, em especial a do crack, e a
outra é a exclusão social que é “ o alijamento de milhões de cidadãos de condições
mínimas de trabalho, educação , moradia, saúde , transporte” e assim, o dependente
químico se encontra numa maior vulnerabilidade, estando excluído das duas
dimensões.
Logo, faz-se necessário pensarmos em uma dupla dimensão de reinserção, a
primeira diz respeito ao próprio individuo, a autotransformação sendo protagonista
das suas escolhas, no restabelecimento da auto estima e da rede social, questões
que foram trabalhadas durante o período de tratamento, e a exclusão social é a
dimensão estrutural que a sociedade moderna impõe a uma classe. Assim,
percebemos nas falas, que há uma expectativa e uma pretensão, sendo objetivos ou
vontades inerentes aos próprios sujeitos em tratamento, que devem ser otimizadas
pelos profissionais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta monografia almejava investigar as perspectivas dos usuários de crack em
tratamento residencial na comunidade terapêutica Desafio Jovem do Ceará Dr. Silas
Munguba, a respeito do processo de reinserção social. O objetivo era conhecer a
percepção dos indivíduos sobre o processo de Reinserção Social. - verificar a
contribuição deste modelo de tratamento para processo de Reinserção Social. -
apontar as dificuldades que envolvem o processo de Reinserção Social.
Percebe-se na construção desse trabalho, que o surgimento do fenômeno
crack a cerca de vinte anos no Brasil acarretou inúmeros problemas em todas as
áreas, seja na saúde, na educação, segurança pública e está mais visível na
população despossuída do básico.
A dependência química é considerada uma doença progressiva, incurável, e
com danos psicossociais para os indivíduos que a desenvolvem. No entanto, só
ocorre a dependência se houver experimentação, e como relatos dos entrevistados
no capitulo anterior, é na adolescência que acontece “a descoberta da droga” que
pode acarretar na dependência ou não, varia conforme a personalidade do individuo,
a família, o meio no qual está inserido são fatores decisivos para desenvolver o uso
abusivo.
Um fato que nos chama muito a atenção é a relação dos dependentes
químicos com as substâncias psicoativas desde muito cedo, por diversos fatores a
disponibilidade da droga no mercado “negro”, o fácil acesso, a influência de amigos,
a negligência da família são questões que merecem uma reflexão para discutimos o
processo de reinserção social.
Em relação ao tratamento, é importante situar que o usuário de crack, na
maioria das vezes não busca por tratamento no inicio do uso, mas ao serem
“convencidos” por familiares dos problemas que os envolve, tende a aceitar o
tratamento, porém é importante dizer que para tal ato é necessário um
comprometimento maior em todas as dimensões da vida dos individuo.
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Logo, o tratamento residencial, em uma Comunidade Terapêutica, surge como
uma possibilidade de tratar o usuário de crack, no manejo com a fissura, no regaste
de laços sociais, construção de projeto de vida, é de suma importância o trabalho
desenvolvido pela instituição, pela equipe principalmente nos primeiros dias, pois
são considerados os mais difíceis devido a consequências do crack no organismo. A
equipe trabalha com os residentes no sentido de que os efeitos sejam amenizados;
ressaltam-se aqui os grupos e atendimentos individuais feitos pela equipe ao
estabelecimento de metas para que os objetivos finais que é o projeto de vida sejam
atingidos.
Assim, em relação às perspectivas no que concerne às dificuldades que
envolvem o processo de reinserção social, percebe-se que são vários os fatores
desafiadores, como a manutenção do tratamento, há uma inquietação em relação às
amizades da ativa, o medo da recaída, a falta de emprego, são fatores muito
presente nas falas dos residentes, assim percebe-se que há uma preocupação do
seu retorno ao lar após o tratamento residencial, há um receio por parte dos
residentes, no que diz respeito a falta de oportunidade no mercado de trabalho, ao
ciclos de amizades, novos hábitos, novos vínculos sociais e comunitário, são
questões que implicam um acompanhamento diferenciado.
Nesse sentido, no que diz respeito à reinserção social, percebemos que os
residentes da Comunidade Terapêutica Desafio Jovem são homens jovens que
abandonaram os estudos há muito tempo e não têm uma qualificação profissional,
começaram a fazer uso de droga muito jovens e apresentam um comprometimento
com o crack. Ao aderirem ao tratamento, eles têm a oportunidade de concluírem os
estudos, na expectativa de conseguirem um emprego e transformar a própria
realidade social.
No entanto, não é um processo fácil, mas é lento e gradual. Faz-se necessário
o apoio da família e Políticas públicas efetivas que garantam a esta população o
direito de começar uma nova etapa da vida, longe das drogas. Nota-se que o
processo de reinserção social requer uma compreensão para além dos aspectos
individuais; ela perpassa por várias dimensões, familiares e sociais dos indivíduos
envolvidos com a problemática do crack.
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SILVA, Claudio Jerônimo. Critério de diagnóstico e classificação. In: DIEL, Alessandra; CORDEIRO, Daniel C.; LARANJEIRA, Ronaldo. (Orgs.). Dependência química: Prevenção, Tratamento e Políticas Publicas. São Paulo: Artemed, 2011.
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APÊNDICE
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TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu, Elenice Araújo Andrade, vou desenvolver uma pesquisa para obtenção
do título de graduada em Serviço Social na Faculdade Cearense (FAC), junto ao
residente do Desafio Jovem do Ceará. Convido-o a participar, mas você não é
obrigado a isso. Você tem o direito de não participar desta pesquisa. A sua recusa
não será motivo de nenhuma restrição futura de acesso aos serviços prestados no
Desafio Jovem do Ceará e, caso consinta em participar, a qualquer momento poderá
desistir e se retirar sem nenhum constrangimento.
A pesquisa tem como objetivo: Analisar as perspectivas dos usuários de
crack em tratamento em uma comunidade terapêutica acerca do processo de
reinserção social as informações serão obtidas através de uma entrevista, realizada
em sala reservada e os seus dados pessoais serão mantidos totalmente sob sigilo.
A entrevista constará de perguntas a respeito de seu tratamento no Desafio
Jovem do Ceará, sua percepção sobre o processo de reinserção social, as
dificuldades que envolvem este processo a contribuição das atividades promovidas
por este modelo de tratamento para o seu processo de Reinserção Social. Terá a
duração de cerca uma hora. As entrevistas serão gravadas para melhorar a
qualidade dos dados. A gravação da entrevista é imprescindível para sua
participação neste projeto. As entrevistas serão transcritas. Seu nome não será
gravado nem será usado na transcrição da entrevista. Não usaremos nenhum tipo
de informação que possa levar à sua identificação. Você pode desistir de participar a
qualquer momento e a entrevista será desgravada na hora.
Esta pesquisa não oferece qualquer risco para sua relação social, familiar,
profissional e de segurança nem para a sua saúde. Mas como benefício, poderá
contribuir para a ampliação do conhecimento na área da dependência química que
se refere à Reinserção Social; e para o aperfeiçoamento de Politicas Públicas que
beneficie a esta população a prática profissional do Assistente Social que atua nessa
área. Como responsável pela coleta de dados, estarei disponível para esclarecer
suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, no telefone (85) 3052-7211 e
através do e-mail [email protected] você preferir, também pode
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contatar minha orientadora Professora Verbena Paula Sandy, professora da
Faculdade Cearense através do telefone (85) 3052 7212
Consentimento Pós–Informação
Eu,___________________________________________________________,
fui informado sobre o que o pesquisador quer fazer e porque precisa da minha
colaboração, e entendi a explicação. Por isso, eu concordo em participar do projeto,
sabendo que não vou ganhar nada e que posso sair quando quiser. Este documento
é emitido em duas vias que serão ambas assinadas por mim e pelo pesquisador,
ficando uma via com cada um de nós.
________________________________________Data: ___/ ____/ ____
Assinatura do Participante
__________________________________________
Assinatura do Pesquisador Responsável
Fortaleza, ____de_________de 2013.
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CARTA DE APRESENTAÇÃO Á PRESIDENTA DO DESAFIO JOVEM DO CEARÁ
ATT: Tereza Cristina Henriques Munguba
Estamos encaminhando ao Desafio Jovem do Ceará o protocolo exigido
para aprovação do projeto de pesquisa: “as perspectivas dos usuários de crack em
tratamento em uma comunidade terapêutica acerca do processo de Reinserção
Social”.
Os pesquisadores envolvidos são: Verbena Paula Sandy (Responsável) e a
Elenice Araújo Andrade (participante). Este trabalho é pré-requisito para conclusão
do curso de graduação em Serviço Social, da faculdade Cearense (FAC), que está
sob coordenação de Elaine Nunes de Carvalho.
Esta pesquisa tem por objetivo analisar as Perspectivas dos Usuários de
Crack em tratamento em uma Comunidade Terapêutica acerca do processo de
reinserção social. Nesse sentido, temos por objetivos específicos: conhecer a
percepção dos indivíduos sobre o processo de Reinserção Social. - verificar a
contribuição deste modelo de tratamento para processo de Reinserção Social. -
apontar as dificuldades que envolvem o processo de Reinserção Social.
Ratificamos, enquanto pesquisadores, nossa responsabilidade acerca das
informações teórico-metodológicas expressas nos documentos apresentados.
Estamos cientes do que nos compete quanto ao objetivo e resultados da pesquisa.
80
Portanto, solicitamos o parecer da presidenta para a realização da pesquisa.
Caso haja parecer desfavorável ou pendência, nos disponibilizamos para correções
e alterações.
__________________________________________
Elenice Araújo Andrade
(Orientanda)
Eu, Verbena Paula Sandy, orientador (a), declaro estar ciente do projeto de
pesquisa supracitado, me comprometendo a orientar a pesquisadora acima.
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TERMO DE COMPROMISSO PARA UTILIZAÇÃO
DE DADOS DE PRONTUÁRIOS
Os pesquisadores do projeto de pesquisa “As Perspectivas dos Usuários de
Crack em tratamento em uma Comunidade Terapêutica acerca do processo de
reinserção social” Se comprometem a preservar a privacidade dos participantes
cujos dados serão coletados em prontuários, bases de dados do Desafio Jovem do
Ceará. Concordam, e assumem a responsabilidade, de que estas informações serão
utilizadas única e exclusivamente para execução do presente projeto.
Comprometem-se ainda a fazer divulgação das informações coletadas somente de
forma anônima.
Fortaleza, 19 de agosto de 2013.
Verbena Paula Sandy
Orientadora
-----------------------------------------------------------------------
Elenice Araújo Andrade
Orientanda
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ANEXOS
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DESAFIO JOVEM DO CEARÁ
DECLARAÇÃO
Eu, Tereza Cristina Henriques Munguba, presidente da Instituição Desafio
Jovem do Ceará, declaro para devidos fins, que Elenice Araújo Andrade está
autorizada a realizar pesquisa nesta Instituição para fins de estudo, estando ciente
quanto aos objetivos e resultados da mesma.
Fortaleza, 03 de Setembro de 2013.
_______________________________________________
Tereza Cristina Henriques Munguba
Presidente da Instituição,