carvalho, josé murilo de. unificação da elite o domínio dos magistrados

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CARVALHO, José Murilo de. Unificação da elite: o domínio dos magistrados. “À educação superior veio somar-se outro fator que contribuiu para dar unidade à elite imperial – a ocupação” (p. 83). Ocupação pode constituir importante elemento de unificação mediante a transmissão de valores, de treinamento e dos interesses materiais em que se baseia. Recrutamento dos membros da elite de poucas ocupações = homogeneidade ideológica, de habilidades e interesses. Ocupação – indicador de classe social / Problema na pesquisa – ocupação múltipla. Economia agrário-exportadora-escravista → sistema de divisão do trabalho simplificado → poucas e insuficientes alternativas ocupacionais. Dados sobre a estrutura ocupacional da época: *peso da população rural em relação a urbana (Urbana 8,49% em 1823; 10,41% em 1872; 9,54% em 1890 e 11,04% em 1900), *50% da pop. urbana se concentrava em 3 capitais: Rio de Janeiro, Salvador e Recife, *vasto predomínio da economia agropecuária, um setor urbano dominado por atividades terciárias e um secundário quase inexistente. ‘’Nessa estrutura já simplificada, a fonte de recrutamento da elite nacional era ainda mais simplificada. Pouquíssimos políticos saíam do secundário e poucos eram simplesmente proprietários rurais. O grosso vinha do terciário, particularmente da administração e das profissões liberais e, subsidiariamente, dos capitalistas e proprietários’’ (p. 85). Quase toda a elite possuía nível superior, somente 8% não possuíam → 1600 pessoas, ou seja, 0,1% da população total. Grupo formado de: advogados, juízes, procuradores, padres, médicos, cirurgiões, professores, homens de letras, oficiais militares, altos funcionários públicos e da parte reduzida de capitalistas e proprietários. Desse grupo saiu 95% dos ministros, 90% dos deputados, 85% dos senadores e 100% dos conselheiros de Estado. “Estado se constituía no maior empregador dos letrados que ele próprio formava. A elite política refletiu, então, essa característica com a profunda consequência de tender a fundir-se com a burocracia” (p. 85). Elite política era pouco representativa da população em geral. Magistrados → perfeita combinação de elementos intelectuais, ideológicos e práticos favoráveis ao estatismo, ou seja, para a execução de tarefas de Estado na fase inicial de acumulação de poder. Segundo o autor eles foram ‘’os mais completos construtores do Estado no Império’’, tinham experiência na aplicação da lei. Autor divide a elite política em grupos: 1 – Governo empregados públicos, magistrados, militares, diplomatas e ‘’políticos’’ (pessoas com intensa e longa trajetória política), 2 - Profissionais liberais mais próximos do Estado → advogados, 3 – Profissionais liberais mais longe do Estado : médicos, engenheiros, professores de ensino superior e jornalistas, 4 – Economia : proprietários rurais, comerciantes, banqueiros e industriais (grupo menos preparado em termos de socialização e treinamento). Advogados → grosso dos profissionais liberais, quase todos educados no Brasil diferente dos magistrados que foram educados em Coimbra, instrumento de interesses individuais ou de grupos enquanto o magistrado é um empregado público encarregado de defender os interesses da ordem e aplicar a lei. “Houve sem dúvida uma redução da orientação estatizante e da capacidade para a construção. Mas não foi mudança radical na medida em que permaneceu até o fim a formação jurídica’’ (p.90). “Em linhas gerais, pode-se dizer que houve uma clara passagem de um domínio de funcionários públicos no início para um domínio de profissionais liberais no final, crescendo o ritmo da mudança após 1853’’ (p.90)”.

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CARVALHO, Jos Murilo de. Unificao da elite: o domnio dos magistrados. educao superior veio somar-se outro fator que contribuiu para dar unidade elite imperial a ocupao (p. 83). Ocupao pode constituir importante elemento de unificao mediante a transmisso de valores, de treinamento e dos interesses materiais em que se baseia.

Recrutamento dos membros da elite de poucas ocupaes = homogeneidade ideolgica, de habilidades e interesses.

Ocupao indicador de classe social / Problema na pesquisa ocupao mltipla. Economia agrrio-exportadora-escravista sistema de diviso do trabalho simplificado poucas e insuficientes alternativas ocupacionais. Dados sobre a estrutura ocupacional da poca: *peso da populao rural em relao a urbana (Urbana 8,49% em 1823; 10,41% em 1872; 9,54% em 1890 e 11,04% em 1900), *50% da pop. urbana se concentrava em 3 capitais: Rio de Janeiro, Salvador e Recife, *vasto predomnio da economia agropecuria, um setor urbano dominado por atividades tercirias e um secundrio quase inexistente.Nessa estrutura j simplificada, a fonte de recrutamento da elite nacional era ainda mais simplificada. Pouqussimos polticos saam do secundrio e poucos eram simplesmente proprietrios rurais. O grosso vinha do tercirio, particularmente da administrao e das profisses liberais e, subsidiariamente, dos capitalistas e proprietrios (p. 85). Quase toda a elite possua nvel superior, somente 8% no possuam 1600 pessoas, ou seja, 0,1% da populao total. Grupo formado de: advogados, juzes, procuradores, padres, mdicos, cirurgies, professores, homens de letras, oficiais militares, altos funcionrios pblicos e da parte reduzida de capitalistas e proprietrios. Desse grupo saiu 95% dos ministros, 90% dos deputados, 85% dos senadores e 100% dos conselheiros de Estado. Estado se constitua no maior empregador dos letrados que ele prprio formava. A elite poltica refletiu, ento, essa caracterstica com a profunda consequncia de tender a fundir-se com a burocracia (p. 85). Elite poltica era pouco representativa da populao em geral. Magistrados perfeita combinao de elementos intelectuais, ideolgicos e prticos favorveis ao estatismo, ou seja, para a execuo de tarefas de Estado na fase inicial de acumulao de poder. Segundo o autor eles foram os mais completos construtores do Estado no Imprio, tinham experincia na aplicao da lei. Autor divide a elite poltica em grupos: 1 Governo empregados pblicos, magistrados, militares, diplomatas e polticos (pessoas com intensa e longa trajetria poltica), 2 - Profissionais liberais mais prximos do Estado advogados, 3 Profissionais liberais mais longe do Estado: mdicos, engenheiros, professores de ensino superior e jornalistas, 4 Economia: proprietrios rurais, comerciantes, banqueiros e industriais (grupo menos preparado em termos de socializao e treinamento). Advogados grosso dos profissionais liberais, quase todos educados no Brasil diferente dos magistrados que foram educados em Coimbra, instrumento de interesses individuais ou de grupos enquanto o magistrado um empregado pblico encarregado de defender os interesses da ordem e aplicar a lei.Houve sem dvida uma reduo da orientao estatizante e da capacidade para a construo. Mas no foi mudana radical na medida em que permaneceu at o fim a formao jurdica (p.90). Em linhas gerais, pode-se dizer que houve uma clara passagem de um domnio de funcionrios pblicos no incio para um domnio de profissionais liberais no final, crescendo o ritmo da mudana aps 1853 (p.90).Outra mudana importante deu-se com relao presena dos militares, que foi substancial no Primeiro Reinado e na Regncia, mas reduziu-se depois rapidamente, para ressurgir de leve no perodo que abrange a Guerra do Paraguai (p.91).

Senadores maior presena de fazendeiros sem instruo, possuam em grau menor do que os conselheiros e ministros aquelas caractersticas de treinamento e socializao, caracterizaram-se por um comportamento mais rgido e conservador, fator de bloqueio de reformas e de desgaste do prprio sistema poltico..Elite poltica e posse da terra o autor considera donos de terra todos os oficiais de ordenana, capites-mores, sargentos-mores, morgados, bares e oficiais da Guarda Nacional essas posies eram geralmente ocupadas por fazendeiros ou por comerciantes. Considera tambm como donos de terras filhos e genros de quem o fosse. Ministros ligados propriedade no excederam 50% ao longo de todo o perodo, assim devemos ter cautela quanto a afirmao do predomnio inconteste dos fazendeiros na elite. Cerca de 50% dos magistrados e advogados tinham ligao direta ou indireta com a propriedade rural e uma porcentagem muito menor a tinha com o comrcio, porm isso no ocorre com os militares e que, aliada ao tipo de educao que recebiam tornaria possvel o surgimento de uma contra-elite dentro da prpria burocracia estatal. Tambm o fato de um magistrado ser filho ou genro de um senhor de engenho no implicava necessariamente um comportamento diferente dos interesses de classe, at porque muitos filhos de fazendeiros dependiam do emprego como magistrado para sobreviver. Por causa de sua dependncia financeira em relao ao emprego pblico, essas pessoas tinham tambm um interesse material muito concreto na manuteno e expanso da burocracia (p. 101).