cartilha - direitos humanos

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Direitos Humanos Módulo 8

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Direitos Humanos

Módulo 8

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O exercício pleno da cidadania só é possível quando os direitos humanos, isto é, aqueles que são atribuídos a qualquer ser humano, podem ser garantidos na prática. No Brasil, o Ministério Público passou a exercer um papel fundamental no que diz respeito a esse tema com a Constituição Federal de 1988. Foi a partir da “Constituição Cidadã”, assim chamada em função dos avanços trazidos, que o MP passou a ser uma das instituições encarregadas da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais. O objetivo do CapacitaPOA - sistema permanente de ensino é contribuir para o entendimento da atuação de órgãos estratégicos, como é o caso do Ministério Público em todos os seus níveis – Estadual, Federal, do Trabalho e Militar. A meta é preparar os participantes para trabalharem de forma cada vez mais integrada, cooperativa e solidária, propícia à consolidação de um sistema de participação e governança. Bom aprendizado!

Direitos Humanos e cidadania

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Direitos Humanos

Os filhos ainda estavam dormindo. Joana levantou, tomou café, se arrumou em silêncio e olhou pela janela: era madrugada, fazia frio. No sábado, eles podiam dormir até um pouco mais tarde, mas ela precisava ir para o trabalho, o primeiro que tinha conseguido com carteira assinada e direitos sociais, tudo certinho. Deixou um bilhete com algumas instruções e saiu.

Antes de tomar o ônibus, ainda olhou para a casa modesta e pensou: “É minha. Não importa que seja simples, que seja pequena, que seja longe: É minha. E meus filhos estão lá dentro.

Tem sido assim desde que mandou o Chicão embora. Sai com o coração na mão, não sabe o que ele pode aprontar. Fazia tempo que o marido não deixava dinheiro pra comprar uma caixa de leite que fosse. Não queria mais trabalhar, dizia que pagavam pouco, qualquer troquinho que achasse se metia no boteco do Amauri e bebia tudo. Pendurava. O Amauri vinha cobrar e Joana não tinha escolha. Desconfiava até que o Chicão andava metido com o tráfico, porque deu de circular por aí com o pessoal do ponto. Como era grande, pode ser que tenham pegado ele pra segurança.

Mas não queria um marido assim, preferia cuidar dos filhos sozinha. O pior é que o encosto ainda continuava lá, casado com ela sem estar, de verdade. De vez em quando, aparecia no barraco. Violento. Botando banca. Dizendo que ou voltava, ou levava as crianças com ele. Então, Joana tinha que ir para a casa da mãe uns dias, até baixar a poeira. Depois voltava, mais tranquila. Quando chegou na casa da patroa, quase se desmanchou com o

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peso do que estava sentindo.

A dona Inácia, que não era boba, percebeu que alguma coisa não ia bem.

– Credo, Joana, como tu estás quieta hoje! Aconteceu alguma coisa? – perguntou. Dona Inácia era da fronteira, usava os verbos bem certinho, como deve ser.

– Nada, não, dona Inácia. Coisa de mulher, preocupação...

– Então, desembucha. Sou mulher também, sei dessas coisas. Quem sabe não posso te ajudar?

Joana largou a vassoura. Enrolou a flanela na mão e desandou a chorar.

– É que o Chicão, dona Inácia, tá indo demais lá em casa. E tá ameaçando levar as crianças com ele. Bate na porta, chuta as paredes, diz que vai voltar. Um inferno! O que que eu faço?

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Direitos Humanos

Dona Inácia consolou a empregada.

– Minha filha, não sabia que a coisa estava feia assim. Por que vocês brigaram?

– Ele não queria fazer mais nada em casa, dona Inácia. Perdeu o emprego, passava o dia bebendo pelos cantos e acho que até tá metido com o pessoal do tráfico. Quando bebia, me ameaçava, ameaçava as crianças, chutava as cadeiras. Um inferno! O Jonatan, meu mais velho, tava ficando igual. Até que um dia eu troquei a fechadura da porta e não deixei ele entrar mais.

– Fizeste muito bem, minha filha. Mas não podes deixar a coisa assim...

– Assim como?

– Assim, solta no ar. Ele precisa ajudar a criar os filhos, ora.

– Não quero. Só quero me ver livre dele.

– Mas de jeito nenhum. Onde já se viu? Homem bota filho no mundo, depois se cansa e a mulher ainda diz que não precisa ajudar a cuidar? Precisa, sim.

– Não quero, dona Inácia. Depois vou ficar devendo pra ele, entende? Vai sair dizendo por aí que é ele quem cria os meus filhos, que bota comida em casa, que compra uniforme da escola, essas coisas. Sabe como é, o povo acaba acreditando. Mulher não tem vez, dona Inácia. O homem sempre tem razão.

– Mas deixa de bobagem, minha filha. Tu tens o direito de não querer mais ele e, ainda assim, cobrar a participação do Chicão na criação dos filhos. É um dever dele. E um direito teu.

Conforme a Constituição Federal, as mulheres têm assegurada a igualdade de direitos e oportunidades, sem que haja qualquer distinção entre homens e mulheres.

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O que são direitos humanos?Os direitos humanos são direitos básicos de todo e qualquer ser humano. De uma maneira mais ampla, podemos dizer que são quaisquer direitos atribuídos a um ser humano, seja este mulher, homem, criança, adolescente, trabalhador, presidiário, policial, negro, branco, indígena, idoso, pessoa com deficiência, etc. A garantia desses direitos, bem como o acesso a eles é o que permite alcançar a cidadania plena.

Ao longo da história, foram criados instrumentos internacionais que garantissem esses direitos, como a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948). Da mesma forma, eles passaram a ser incluídos nas legislações de alguns países, como na Constituição Federal do Brasil de 1988 - em especial os Títulos I, Dos Princípios Fundamentais, e o Título II, Dos Direitos e Garantias Fundamentais. No país, também existem outras leis voltadas aos direitos humanos (Estatuto do Idoso, Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei de Execuções Penais, etc).

Entre os principais temas e segmentos, estão:

Assistência social

Crianças e adolescentes

Educação

Idosos

Igualdade racial

Moradia

Meio ambiente

Mulheres

Pessoas com deficiência

Previdência Social

Saúde

Segurança alimentar

Segurança pública

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Direitos Humanos

A Lei Maria da Penha (Lei 11.340)

criminaliza a violência contra

a mulher, seja no âmbito privado

ou público (no trabalho, na rua,

em casa, etc). A lei não pune apenas

as agressões físicas e sexuais, mas também as

psicológicas, morais e patrimoniais.

– Não sei, não.

– Olha só, minha filha. Tem uma lei nova, de 2006, que se chama Lei Maria da Penha. Sabia? Conhece?

– Não, não sei de nada disso, dona Inácia.

– Pois é, minha filha. É uma lei que protege famílias como a tua, que são vítimas desses machões aí. Eles são muito valentes contra mulheres e crianças que não podem se defender. Mas eu queria ver eles levantarem a mão para um juiz. Ou para um policial.

– Polícia, dona Inácia?

– É, minha filha: Polícia. É o jeito de parar com esse tipo de coisa. Claro, ninguém gosta. É marido. Dormiu com a gente...

– Dona Inácia!!

– É pai dos teus filhos. Mas isso dá o direito de botar banca, de ser o machão da casa? Nem dinheiro ele leva pra dentro!

Dona Inácia começava a se exaltar.

– Mas Polícia?

– Está bem. Se não queres dar parte na Polícia, pelo menos procura o Ministério Público. Aposto que eles podem te ajudar.

– Não sei do que a senhora está falando, dona Inácia.

– Joana, é assim. Sabe a Justiça?

– Sei, sim, senhora.

– Pois então! O Ministério Público é uma parte da Justiça que cuida de manter os direitos da gente, entende?

– Não.

– Olha: a gente tem um monte de direitos garantidos na Constituição, né? Direito à educação, direito à igualdade, direito à informação, um monte de coisas. Então, quem cuida de garantir esses direitos para nós são os membros do Ministério Público. No teu caso, podes conversar com eles pra garantir teus direitos individuais, sobre os filhos, sobre a família, direito à guarda das crianças, essas coisas. E também garantir o

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cumprimento das leis, até os direitos dos consumidores.

– É mesmo?

– É. Quando o meu Quinzinho ficou doente, o plano de saúde não queria saber de fazer a cirurgia de próstata que ele precisava. Diziam que não tinha direito, que o plano não cobria, espernearam o quanto puderam. Mas o médico autorizou. Foi o doutor Marino que me alertou: “Dona Inácia, ele disse, seu marido tem o direito de ser atendido pelo plano de saúde, está na lei. Pede ajuda ao Ministério Público que eles emitem uma ordem judicial e o plano tem que acatar. E não é que aconteceu isso mesmo? O advogado encaminhou tudo.

– Puxa vida.

– Fiquei freguesa, minha filha. E eles não lidam só com direitos individuais ou sociais, não. Também denunciam crimes e até combatem a corrupção. Fora que também trabalham para garantir a manutenção da democracia. Estão sempre de orelha em pé.

– Eu não sabia disso. Mas o que um advogado pode fazer por mim, dona Inácia? Nem sei falar direito. Como é que vou explicar a minha situação pra eles?

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Direitos Humanos

O que o Ministério Público faz?O Ministério Público do Rio Grande do Sul atua em defesa da cidadania e dos direitos humanos por meio de seus promotores e procuradores de Justiça, que exercem suas atribuições nas mais diversas áreas e instâncias.

Questões relativas ao cidadão, como o direito à saúde, à assistência social, direitos dos idosos, direitos dos deficientes, direito à igualdade racial, orientação sexual e acesso à educação são exemplos de direitos humanos a serem defendidos pelo Ministério Público.

Para bem defender esses direitos dos cidadãos, o Ministério Público possui Promotorias de Justiça em todas as comarcas do Estado, sendo que em algumas cidades há Promotorias de Justiça Especializadas em Defesa Comunitária ou em Defesa dos Direitos Humanos.

Além dessa estrutura, o Ministério Público conta com o trabalho do Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos – órgão da Procuradoria-Geral de Justiça, responsável pelo apoio logístico aos agentes ministeriais com atuação na área da cidadania e dos direitos humanos.

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– Ah, eles nem ligam pra isso. Estão acostumados. No teu caso específico, minha filha, a lei pode assegurar que o Chicão se afaste da tua casa de uma vez. Tá na lei. Eles entregam uma notificação e ele não pode mais ir lá. Se for, pode ser preso.

– Nossa!

– Eles podem obrigar ele a frequentar programas de recuperação, entende? Ele pode estar precisando de um psicólogo, de um psiquiatra, de alguma ajuda especializada. Claro, homem sempre acha que isso é frescura. Mas com um empurrãozinho da lei, ele acaba indo e se ajudando. E ajudando a família toda.

– É.

– O Ministério Público pode também te ajudar com a pensão. Mesmo que ele declare que não tem salário, que não tem de onde tirar, tá lá no despacho: uma cesta básica por mês. Então, tem que se virar, se não vai em cana.

– Dona Inácia!

– É, cana, cadeia, vai ver o sol nascer quadrado. Isso é bom, porque tira ele daquela coisa sem compromisso. Tem que botar uma cesta básica por mês em casa, vai se virar, arranjar trabalho, algum jeito vai dar.

– Pois é.

Direitos da Criança e do AdolescenteEntre as muitas tarefas que o Ministério Público executa na área da infância e da juventude, estão assegurar o acesso das crianças e adolescentes à educação, combatendo a evasão escolar; zelar pelo direito à convivência familiar e comunitária; defendê-las contra todo tipo de violência e negligência, mesmo quando praticadas pelos próprios pais; atuar quando um adolescente comete ato infracional; garantir às crianças e adolescentes o atendimento à saúde que necessitarem, incluindo medicamentos; buscar em todos municípios a implantação do Conselho Tutelar e do Conselho de Direitos.

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Direitos Humanos

– Mas tem que estar com os documentos em dia: certidão de nascimento, certidão de casamento, carteira de identidade, comprovante de residência, CPF... É bom juntares tudo isso numa pastinha, para facilitar.

– E esse Ministério Público cuida de mais o quê? É que a minha menorzinha tem que fazer uma operação e eu não consigo vaga no SUS.

Documentos mínimos necessáriosRG/Carteira de identidade CPF (Certificado de Pessoa Física) Comprovante de endereço (menos telefone celular) Certidão de nascimento ou casamento

Junte também todos os documentos vinculados à sua causa, como notas fiscais (em caso de problemas comerciais), certificados de garantias, comprovantes de pagamentos, extratos bancários e carnês, entre outros. Quanto mais documentada estiver a sua situação, melhor poderá ser a defesa de seus direitos.

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O Brasil é um dos poucos países no mundo que garantem o direito à saúde para toda a população de forma gratuita, em qualquer situação que seja – prevenção, cura ou tratamento. Os atendimentos devem ser garantidos com qualidade, através do Sistema Único de Saúde (SUS), e nada pode ser cobrado.

– Ah, então vai lá. O direito à saúde também é constitucional, eles podem te ajudar a conseguir medicamentos, a fazer cirurgias, a ter consultas especializadas, a conseguir vaga em hospital. Os caras são danados.

– E a vila? O pessoal lá tem problema com luz, sabe? Tem muito gato, a Companhia não quer regularizar antes do loteamento ser legalizado, fica um empurra-empurra daqueles.

– Também cuidam disso. O direito à moradia também é constitucional, sabia?

– O que isso quer dizer, dona Inácia? A senhora usa uns termos difíceis...

– Quer dizer que todo mundo, todas as pessoas que nascem neste país têm direito a morar, mesmo que não sejam donas de nenhuma casa ou apartamento. Ou até de um terreno. Esses direitos têm que ser cobrados do Estado. Olha, tem que ver se a vila de vocês não é uma Aeis.

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Direitos Humanos

Dica!Depois de conhecer a história de Joana e conferir os conselhos da dona Inácia, é sua vez de ir atrás de mais informações sobre a atuação do Ministério Público no Rio Grande do Sul. No site da instituição (www.mp.rs.gov.br), você encontra informações sobre legislação e os endereços em todo o Estado para encaminhar denúncias, verbalmente ou por escrito, sobre violação dos direitos humanos que serão investigadas pelo MP. Na Capital, os encaminhamentos podem ser feitos para:

Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos de Porto Alegre Rua Santana, 440 - 7º Andar - Santana - CEP: 90040371(51) 3295.8911/8911e-mail: [email protected]

– Xi, danou-se. Agora que não entendo mais nada. O que a senhora falou aí, dona Inácia?

– Aeis, Joana. É Áreas Especiais de Interesse Social. Quando uma vila está localizada numa área onde a regularização é prioridade. Aí fica tudo mais fácil.

– Nossa.

– É muita coisa, Joana.

– Mas deve ser difícil falar com eles, né? Acho que não tenho nem roupa pra isso, dona Inácia!

A patroa deu uma risada gostosa e logo franziu o nariz.

– Que cheiro é esse, dona Inácia?

– Meu feijão!!!! – gritou a patroa. E saiu correndo para a cozinha.

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Expediente

Prefeitura Municipal de Porto Alegre

Secretaria de Coordenação Política e Governança Local

Produção: Signi - Estratégias para Sustentabilidade

Coordenação: Cristiane Ostermann (MTb 8256)

e Karen Mendes Santos (MTb 7816)

Edição: Carol Lopes

Textos: Flávio Ilha

Conselho Editorial: Adriana Burger, Adriana Furtado, Ana Paula Dixon, Beatriz Rosane Lang, Cézar Busatto, Débora Balzan Fleck, Eloisa Strehlau, Francesco Conti, Ilmo Wilges, Jandira Feijó, Jorge Barcellos, Júlio Pujol, Lisandro Wottrich, Luciano Fedozzi, Plinio Alexandre Zalewski Vargas, Ricardo Erig, Rodrigo Puggina, Simone Dani, Themis Regina Barreto Krumenauer e Valéria Bassani.

Projeto gráfico: Carolina Fillmann | Design de Maria

Diagramação: Daniela Olmos

Ilustrações: Marcelo Germano

Revisão: Press Revisão

Impressão: Hotprint

Tiragem: 1.500 exemplares

Apoio à produção das cartilhas: Departamento Municipal de Água e Esgotos - DMAE

Novembro | 2010

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