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oje, dia 23 de janeiro de 2012, acabei de fazer uma pesquisa na se-ção de livros do site da Amazon. Usei a palavra “branding” no mecanis-

mo de busca. Obtive 3.403 resultados, entre publicações e outros documentos relativos ao tema. Eu pensei conhecer muitos, mas estava familiarizado, na verdade, com apenas algumas dezenas deles, que constituem uma parte insig-nificante do material impresso a esse respeito.

Afinal, o que é branding? Gestão de marcas ou branding deixou de ser um compromisso passageiro, um mo-vimento da moda, uma preocupação cosmética de designers e profissio-nais de comunicação. Também não é mais uma elaboração intelectual e filosófica sem comprometimento com o bottom line.

O branding tem se transformado rapidamente em uma ferramenta de gestão nas empresas. Um estudo que realizamos há pouco mostra quanto

os CEOs brasileiros estão ansiosos por ver esse instrumento –e suas ma-nifestações– aplicado no dia a dia da organização.

Na medida em que o valor das mar-cas representa uma fração substancial do valor da empresa como um todo ou de sua capitalização de mercado, não existe mais justificativas para que elas façam parte apenas da descrição de cargo dos profissionais de marketing.

Hoje, o branding é o instrumento de gestão potencialmente mais eficaz na construção de valor e de sustenta-bilidade na vida das organizações. A história das empresas nos mercados caminhou de uma disputa entre pro-dutos para uma concorrência das res-pectivas formas de propaganda e co-municação até chegar ao estágio que começamos a descortinar: uma com-petição entre as realidades simbólicas de suas marcas.

O branding é, em certo sentido, a continuação e a negação da Revolução Industrial. É a continuação por se tratar da forma suprema de relacionamento

H

indo muito além da retórica que

Hoje envolve o branding, jaime

troiano, pioneiro da área no

brasil, propõe um processo para

que ele possa ser internalizado

na organização e contribua

para sua real sustentabilidade

sinoPse

•Deram-secontadequeumamarcapoderesponderpor70%dovalordeumnegócio,oqueexplicaporqueagestãodemarcas,jápopularizadapelotermoeminglês“branding”,virouumafebre.Noentanto,essaferramentagerencialeseupotencialprecisamserentendidos–eaplicados–commaisprofundidade.Obrandingpodesustentarumaempresanolongoprazoe,porisso,deveriasersemprepautadaliderança,oqueraramenteé.

•Estánahoradeagestãodemarcasserincluídaemtodososprocessosempresariaiseserinternalizadanaorganização,oquepodeserfeitopormeiodequatropassosfundamentais,queincluemsuapriorizaçãopelaaltagerência,menorvaidadecorporativa,humildadeparaprestaratençãoaoqueacontecenomercadoepreservaçãodaidentidade.

•Emparalelo,éprecisoqueosgestoressaibamutilizarcorretamenteascincoprincipaisferramentasdebranding:extensãodemarca,arquiteturademarca,reputaçãocorporativa,valoreconômicoepropósito.Porexemplo,opropósitopodetornaraempresaimuneaesforçosdecópiapelosrivais,poisemergedascaracterísticasúnicasdaalmadeumaorganização.Delevema“excelênciadealma”,ou“soulfulexcellence”,maispoderosadoqueaexcelênciaoperacional.

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entre produção e consumo. Por outro lado, é a negação porque branding é o princípio da desmaterialização da eco-nomia, em que cada vez mais operare-mos com bits simbólicos e menos com átomos, em todas as relações com os stakeholders das empresas.

Por tudo isso, o branding deveria ser sempre pauta da sala do board. Porém a verdade é que ainda não é, ou é muito pouco –especialmente no Brasil.

Como o branding pode se constituir em um processo internalizado dentro das organizações? Como sua cultura pode penetrar e se enraizar nos outros processos de gestão dos negócios?

As recomendações seguintes não são uma “receita de bolo”, mas quem as pratica sabe que o poder de negócio e de relacionamento de suas marcas com o mercado e com o público in-terno passa a ser muito maior e muito mais sustentável:

a. Faça a conversão e garanta que seja percebida por todos. Esta é a primeira e talvez a mais essencial de todas as recomendações. Se a orga-nização e, principalmente, seus exe-cutivos-chave não tiverem consciên-cia da necessidade de levar temas de branding para a sala do board, nada vai acontecer. Ele vai continuar feu-dalizado em algum departamento, provavelmente marketing ou comu-nicação corporativa. Sem uma autên-tica conversão, com o devido ritual, o branding acabará tendo apenas um papel cosmético e periférico.

B. abandone a vaidade corporativa. Marcas não resistem a desaforos e um dos piores é a vaidade corpora-tiva. É em nome dela que a marca assume ares de soberba e de injus-tificada arrogância. Por exemplo:

quando a marca se aventura em novos mercados de produtos e ser-viços sem ter licença perceptual ou autoridade reconhecida para isso. O mercado está cheio de casos de marcas de boa estatura que, movidas por vaidade corporativa, sentem-se no direito de atuar em áreas novas em que não são reconhecidas como players naturais.

c. Vivencie permanente e humilde-mente seu mercado. Louis Gerstner (ex-CEO da IBM) disse algumas ve-zes o seguinte: “A desk is a dangerous place from which to view the world”.

Nem sei se, originalmente, a frase é dele, mas está pendurada na parede de nosso escritório para eu olhar to-dos os dias. O branding é um proces-so alimentado por um conhecimento real dos clientes, consumidores e stakeholders em geral. Grandes líde-res de empresas aéreas vivem dentro de aviões; profissionais do mercado de consumo adoram conviver com supermercados. O contato com o mundo real ensina tanto quanto o que nos chega pela tela dos compu-tadores. O branding não é uma cons-trução filosófica, ou “intelectualoide”, de sacerdotes e iniciados. É uma for-mulação que deriva de uma profunda experiência daqueles a quem a marca se dirige.

D. não deixe de preservar a identi-dade. O branding é uma forma cri-teriosa de proteger as conquistas simbólicas da marca. Nada mais ne-fasto para a vida das marcas do que a confusão. E o crescimento das em-presas, seus processos de aquisição e fusão, tem criado uma arquitetura de marcas confusa, que muitas vezes parece mais uma casa com “puxadi-

nhos”. A posição das marcas, umas em relação às outras, complica-se. As hierarquias perdem a limpidez. Forma-se o que nós, do Grupo Troia-no de Branding, costumamos cha-mar de “surubrand”. É uma expres-são tão feia quanto fácil de entender. O “surubrand” compromete a pre-servação da identidade.

Uma vez adotadas essas diretrizes principais, a empresa deve saber utili-zar da melhor maneira as ferramentas do branding.

cinco Ferramentas-cHaVeFrequentemente, há uma visão român-tica e um viés filosófico que alimentam o pensamento de branding em nosso mercado, como já indiquei antes. Po-rém não há como o branding se trans-formar em uma atividade que tenha os pés no chão se, além de uma visão mais conceitual, não estiver apoiado também em ferramentas operacionais de trabalho. São elas que transformam a gestão de marcas num processo com começo, meio e fim. São elas que po-tencializam a vida das marcas e sua capacidade de ser uma suprema ferra-menta de negócios.

Quero apresentar cinco ferramentas essenciais para quem quer se envolver com o branding nas organizações e praticá-lo de forma consistente e eficaz.

1. extensão De marcaMuitas vezes, processos de extensão de marca ainda lembram a sequência do Mickey no filme Fantasia, de Walt Dis-ney –a inesquecível ideia de um per-sonagem que, ao som de O aprendiz de feiticeiro (música de Paul Dukas), ordena magicamente que algumas vassouras transportem baldes de água para ele. O resultado todos conhecem: as vassouras escapam a seu comando, fruto de sua inexperiência como má-gico, multiplicam-se e causam uma grande enchente.

Extensão de marca (brand exten-sion ou brand stretch, em inglês) é um tema que está na agenda de nove entre dez diretores de marketing da atuali-

são as ferramentas operacionais de trabalHo que transformam a gestão de marcas em um processo com começo, meio e fim

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a ferramenta que tem se mostrado mais eficiente para explorar novos territórios de atuação de uma marca de produtos ou de serviços é o que denominamos de “brand sun” (sol da marca).

o “brand sun” nos indica qual é a proximidade de percepção entre a marca e as novas áreas de produtos ou serviços nas quais ela pretende atuar. a primeira onda do brand sun é onde residem as principais oportunidades de mercado para a extensão da marca e o lugar em que os investimentos mercadológicos e de comunicação para a introdução de novos produtos da marca são mais compen-sadores. quanto mais distante da marca, que é como um sol na ilustração, mais improvável é o êxito do lançamento de um novo produto.

Há armadilhas que espreitam a marca nos novos territórios para onde ela está se deslocando, e é por isso que nem sempre as extensões são bem-sucedidas. algumas providências são essenciais para escapar desses perigos potenciais, embora não constituam nenhuma bula de remédio:

a primeira e mais crítica: identificar se a marca tem, de fato, natural autori-dade para atuar no novo mercado. é o que denominamos de regra da afinida-de, cuja resposta nos é dada pelo brand sun. a segunda providência é obedecer à regra da velocidade. não é possível aco-

modar na cabeça dos consumidores uma avalanche de novos produtos em pouco tempo. grandes empresas que tentaram (e algumas continuam ten-tando) não tiveram sucesso e foram obrigadas a voltar atrás. a terceira armadilha é supor que extensão de marca só funciona bem quan-

do há uma proximidade física ou industrial entre os novos produtos e o terri-tório original da marca. as fronteiras para extensões de marca não precisam, necessariamente, se esgotar no plano físico e obedecer a critérios industriais. a vizinhança não tem de estar atrelada a alguma característica física do pro-duto. uma caneta bic, um isqueiro bic e um aparelho de barbear bic são mui-to diferentes do ponto de vista industrial, mas têm algo que os aproxima, que é a ideia de produtos convenientes e, principalmente, descartáveis.

dade (ou, ao menos, deveria estar). E também na pauta de preocupações de CEOs, diretores de planejamento e di-retores financeiros.

Não é difícil entender o porquê. Há uma necessidade darwiniana de crescimento nas organizações atuais. Tudo indica que crescimento é um dos dispositivos de adaptação e seleção natural. Não crescer é um sinal de que algo não vai bem. Porém estratégias de crescimento são uma equação que admite múltiplas solu-ções. De todas as múltiplas soluções, uma delas é a extensão de marca, o que significa utilizar a mesma pla-taforma de reconhecimento que a marca já tem no mercado. Depois de longos períodos de investimentos in-tensivos na construção de uma fran-quia sólida, nada mais natural do que aproveitá-la para expandir negócios em outras áreas de produto.

Utilizar processos de extensão de marca para desenvolver novos negó-cios é, de alguma forma, acelerar o retorno sobre investimentos feitos na construção da marca.

No entanto, é preciso não confundir extensão de marca (brand extension) com extensão de linha. Extensão de li-nha é algo mais simples, que não tira a marca de seu habitat natural. Um fa-bricante de sucos que lança um novo sabor ou um fabricante de televisores que coloca no mercado um modelo maior ou com funcionalidades mais modernas estão praticando extensões de linha. Ou seja, eles conduziram um processo de ampliação de negócios dentro do mesmo território original.

Apesar das dificuldades e ameaças, as recompensas das extensões de mar-ca são enormes como uma ferramenta de expansão de negócios. É fácil enten-der os motivos disso:

• o primeiro deles é a comparação entre os custos envolvidos nesse processo e os que são necessários para começar uma nova marca do zero. O movimento frenético de ex-tensões de marca demonstrou que as empresas optaram por esse ca-

brand sun, a extensão De marca consistente

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BrandSunProdutoS maiS

identificadoScom a marca

ProdutoS menoSidentificadoScom a marca

marca--mãe

fonte: Grupo Troiano de Branding.

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moDelos De arquitetura De marca

minho e não apenas pelo da cria-ção de outras marcas. Aliás, há um bom tempo cultivo a hipótese de que o século 20 foi o momento em que as grandes marcas que conhe-cemos surgiram. O século 21, ao contrário disso, parece que será o da multiplicação da família de pro-dutos dessas marcas.

• o segundo motivo que torna a ex-tensão de marca um processo muito atraente e tentador é o fato de que ela pode fortalecer a própria marca- -mãe. Extensões não são apenas

uma ferramenta de abertura de no-vos territórios para os produtos da marca. São também um dispositivo para o desenvolvimento do poder da marca original. Trata-se de uma engenhosa ferramenta para incre-mentar o valor desse ativo –e não só de um ponto de vista mercadológico, mas também financeiro.

• o terceiro motivo se aplica particu-larmente ao mercado business-to- -consumer. Espaço para colocação de produtos no varejo é uma con-quista cada vez mais árdua. Marcas já existentes, que disponham de re-conhecimento e prestígio, têm muito mais abertura para conquistar espa-ços. Sua “folha corrida” é uma ga-rantia antecipada de resultados.

• o quarto e último motivo é o re-lacionamento com consumidores e a noção de customer equity. Como fazer para gerar mais negócios com um número menor de consumido-res? Fazendo com que a marca pos-sa acompanhá-los em outras cate-gorias de produtos ou serviços além daquela em que atua originalmente. Extensões de marca incrementam o customer equity, ou seja, aumentam o valor que cada cliente ou consu-midor tem para a empresa. E, por isso, deslocam o eixo de preocupa-ções mercadológicas da disputa por

market share para um esforço de consolidação de relações duráveis.

2. arquitetura De marcaEssa é a segunda ferramenta no dia a dia do branding. O que chama-mos de arquitetura de marca é a forma pela qual se organiza o rela-cionamento entre as marcas de uma empresa, tanto as de produto ou de serviços como o vínculo que elas es-tabelecem com a marca corporativa. A falta de processos consistentes e de atenção cuidadosa tem gerado o que eu chamei antes de “surubrand” em várias organizações: uma desor-dem arquitetônica na composição das marcas.

Ao longo dos últimos 20 anos, a arquitetura das marcas corporati-

vas e das marcas de suas famílias de produtos tem sido fortemente abalada e deteriorada. Nesse perío-do, alguns fatores vêm contribuindo para o fenômeno:

• Fator i: a multiplicação de fusões, aquisições e reconstituições corpo-rativas. Esses processos conturbam sempre a ordem preexistente na po-sição relativa das marcas e de suas identidades. E o restabelecimento da ordem nem sempre é a primeira providência que se toma. Entretanto, cuidado! Não é uma solução de de-sign gráfico que resolve o problema.• Fator ii: a expansão e, muitas ve-zes, a exacerbação no uso de unida-des de negócios dentro das empre-sas já existentes. Em muitos casos, a fragmentação da marca corporativa é fruto de uma exagerada indepen-dência das unidades de negócios com suas identidades. • Fator iii: o saudável efeito do crescimento tem, muitas vezes, efeitos colaterais não tão saudáveis, como a própria desorganização da arquitetura das marcas.

Ainda que haja vários modelos híbri-dos de arquitetura para organizar as relações entre as marcas de uma em-presa, quatro são mais representativos em nosso mercado –e a opção por um deles exige um pensamento con-ceitual acima de tudo, além de uma permanente vigilância contra aqueles fatores de desestabilização que indi-quei acima:

i. modelo monolítico: todos os pro-dutos da empresa são representados

a arquitetura das marcas das empresas tem sido fortemente abalada pelo crescimento, em especial nas fusões e aquisições

monolítico aDitiVo De inDePenDência De PaterniDaDe

A mesma marca corporativa denomina todos os produtos e serviços

As marcas operam juntas e têm origens e histórias distintas

A marca corporativa e as de produtos e serviços têm expressões próprias

A marca corporativa dá endosso para as marcas de produtos e serviços

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pela própria marca corporativa (Bra-desco, Audi...). Trata-se de um mode-lo extremamente poderoso, difundi-do historicamente, ainda que nem sempre fácil de administrar. Tanto é que um deslize em uma linha de produtos respinga no conjunto todo. É o efeito “spillover”, a que se refe-rem os teóricos do assunto.ii. modelo aditivo: as marcas ou empresas que se integram somam suas identidades; lembre-se dos in-termináveis nomes de empresas de advocacia. Ocorre quando ninguém tem coragem de abandonar uma das identidades originais. Você se lembra do HSBC Bamerindus? Ou, há não muito tempo, Knorr Cica? É um modelo comum nos processos de transição.iii. modelo de independência: cada uma das marcas de produtos da empresa tem autonomia em rela-ção às demais, chegando mesmo a competir entre si. E, importante, o mercado normalmente desconhece o parentesco entre elas. É o caso, por exemplo, da rede Accor de hotéis, com suas marcas Sofitel, Pullman, Novotel, Mercure etc., ou das cerve-jas da Ambev.iv. modelo de paternidade: trata-se de uma arquitetura em que a mar-ca de uma linha de serviços ou de produtos tem a assinatura (endor-sement ou endosso) da identidade corporativa. É o Fiesta da Ford, o Leite Moça da Nestlé, e assim por diante. Inevitável nos lembrarmos da Unilever, que, de uma forma muito organizada, migrou de seu clássico modelo de independên-cia, que praticou por décadas, para esse modelo de paternidade sina-lizado por seu icônico U. E tudo indica que a P&G iniciou a mesma trilha também no Brasil.

Arquitetura de marca é uma ferra-menta para tornar claras, a todos os stakeholders, as relações entre as mar-cas e exige uma atenção contínua, já que os fatores desestabilizadores estão presentes o tempo todo na empresa.

3. rePutação corPoratiVa As marcas corporativas foram, durante muitas décadas, figuras pálidas, en-sombrecidas, de caráter exclusivamen-te institucional. Encontrar ou descobrir o nome do fabricante por trás de deter-minada marca de produto era procurar agulha no palheiro.

Tudo isso mudou muito. As marcas corporativas adquiriram maior prota-gonismo na relação da empresa com todos seus stakeholders. A própria co-municação corporativa deixou de ser uma verba de ocasiões comemorativas apenas e integrou a rotina de relacio-namento com o mercado. (Vale dizer que em momento algum isso signi-ficou um achatamento relevante das marcas de produtos.)

Por tudo isso, nada mais atual do que falar de uma ferramenta que é o branding corporativo [veja entrevista

de Luiz Carlos Dutra, da Unilever, na HSM Management nº 90, página 30]. É dele que depende muito o prestígio ou a reputação que as marcas repre-sentantes de uma organização têm.

A reputação da marca corporativa tem benefícios e funções que só ela pode desempenhar:

• Ela dá paternidade ou endosso às marcas de produtos e serviços.• Concentra e corporifica melhor que ninguém os valores, princípios e pro-pósito que pautam a organização.• Dá uma clara resposta à pergunta sobre quem assina e está por trás das marcas de produtos e serviços –aliás, uma das perguntas mais habituais hoje em dia entre consumidores.• Contribui para alinhar estrategica-mente as relações da empresa com os stakeholders.

A pedido de HSMManagement, Jaime Troiano identificou algumas das principais verdades e mentiras praticadas hoje no mercado brasileiro sob o nome de bran-ding. Confira se você já tomou uma por outra, caindo vítima de alguma delas (e só consulte a resposta depois):

resposta: 1.mentira, 2.mentira, 3.verdade, 4.verdade, 5.mentira, 6.verdade, 7.mentira, 8.verdade.

teste: VerDaDe ou mentira?

1. deve-se ficar permanentemente atento para que os Kpis (indicadores-chave de desempenho, na sigla em inglês) não adquiram importância desproporcional no branding, porque assim tendem a contaminar a filosofia da marca.

2. agências de propaganda não devem se envolver em branding, por estarem comprometidas essencialmente com a receita derivada dos processos de comunicação.

3. políticas de branding profissionais e eficazes precisam contar com o envolvimento granular de todos os segmentos da organização; ainda que alguns grupos de profissionais sejam os operadores do processo, o branding é de todos.

4. os operadores mais preparados e envolvidos com o branding continuam a ser os gestores de marketing.

5. o branding alimenta o poder das marcas principalmente fora da organização.

6. é inevitável que o branding ande de mãos dadas com a accountability.

7. o branding é algo que se resolve, essencialmente, com formulações de design.

8. no branding, como em toda religião nascente, encantamento e rigidez sacerdotal são maiores do que a compreensão da doutrina.

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• Cria relações mais estáveis com clientes e fornecedores.• É fonte de orgulho motivacional.

Bem, mas tudo isso se intui, dirá o atento leitor! Sim, mais impor-tante é a ferramenta processual para administrar a reputação da marca corporativa. Em um estudo que conduzimos anualmente com a revista Época Negócios, são ava-liadas mais de 200 corporações que operam no País, muitas delas com ações cotadas na bolsa de valores. O indicador de reputação que uti-lizamos é fruto de entrevistas on-line realizadas com uma amostra de 15 mil pessoas distribuídas pelo Brasil. O cálculo desse indicador é uma média ponderada de:

• Qualidade de produtos e serviços. • Compromissos sociais e ambientais.

• Evolução da empresa. • Padrões de comportamento ético. • Admiração gerada pela empresa.• Capacidade de inovação reconhecida.

Por meio dessa ferramenta, é possível identificar as linhas de força e as fragi-lidades da reputação corporativa, tanto entre empresas cujas marcas disputam o mesmo mercado como em mercados distintos.

O estudo que conduzimos pelo quarto ano consecutivo nos permitiu comprovar algo que é supremamen-te valioso para o branding corporati-vo, algo que nossa intuição dizia ser verdadeiro, mas que ainda dependia de uma comprovação sólida: a re-putação da marca corporativa está relacionada com algo muito tangível e fundamental aos negócios, que é a performance das empresas no mer-cado de capitais. Hoje nós dispomos

da evidência de que ter marcas de reputação e ter melhor desempenho na bolsa de valores são coisas que caminham juntas. Reputação não é algo sem substância concreta que apenas alimenta a vaidade corpora-tiva dos gestores.

O que identificamos é uma indiscutí-vel relação entre performance na bolsa e o indicador de reputação da marca corporativa. O gráfico ao lado compro-va a conclusão:

em primeiro lugar: o grupo das marcas cujo indicador de reputação é maior (linha verde) tem empresas, em média, com maior valor de mer-cado. E vice-versa: onde a reputação é mais baixa, o desempenho na bol-sa e a capitalização de mercado são menores.

em segundo lugar: as empresas des-se mesmo grupo, aquelas com marcas de maior reputação, recuperaram-se da crise de 2008 mais rapidamente que as de reputação, em média, mais baixa (linha avermelhada). Ou seja, podemos supor que o prestígio da marca corpo-rativa em si não impede que baques ocorram, mas a retomada do fôlego para elas é mais rápida.

Tudo o que já sabíamos sobre geren-ciamento das marcas corporativas dei-xa ainda mais evidente que ele merece um espaço definitivo na sala do board.

4. Valor econômicoA contribuição do valor dos intan-gíveis no valor total do negócio de uma organização passou a ser subs-tancial e não é mais possível olhar para eles como um adereço cosmé-tico. Por exemplo, na relação entre valor patrimonial e valor de merca-do de 60 empresas listadas na Bo-vespa, feita recentemente, aferimos uma razão média igual a, aproxi-madamente, três, entre o valor de mercado e o patrimonial. Ou seja, o mercado percebe a existência de um conjunto de ativos não incor-porados ao balanço que cria esse múltiplo de três, fazendo com que

marcas de bens de consumo respondem por 25% a 30% do valor de um negócio; no caso de produtos de imagem, o percentual vai a 50%

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Empresasdemaior prestígio Empresasdemenorprestígio

76 75

101

65

13 13 1013

Valo

r D

e m

erca

Do

(Bi r

$)

2008 2009 2010 2011

ano

o branding e as bolsas de valores

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a empresa valha três vezes mais do que seu valor contábil.

Marcas pertencem a esse precioso pacote de intangíveis. Em muitos ca-sos, são um “primus inter pares”, ou seja, seu valor isolado, auditado devi-damente, constitui o maior entre todos os intangíveis. Os indicadores que te-mos mostram quanto, em média, o va-lor econômico das marcas representa no valor total de um negócio:

•Marcas de produtos B2B: entre 10% e 15%.•Marcas de produtos de consumo em geral: 25% a 30%.•Marcas de produtos de imagem: em torno de 50%.•Marcas de produtos de autoexpres-são: 70% ou mais.

Essas porcentagens (participação da marca no valor do negócio como um todo) são o que, efetivamente, chama-se “brand equity”.

Até hoje, o cálculo do valor econômi-co das marcas é um processo episódico na vida das empresas. Uma avaliação realizada com 50 grandes organiza-ções no Brasil revelou que, no máxi-mo, uma entre dez realiza com alguma regularidade procedimentos técnicos para aferir o valor de suas marcas. E mais uma informação curiosa: em ne-nhum dos casos essa iniciativa é toma-da pela área de marketing.

Esse tipo de cálculo tem sido trata-do como uma eventualidade, muitas vezes associada a processos de pros-pecção, compra e venda de marcas; ocorre, por exemplo, quando empre-

sas internacionais precisam se desfa-zer de ativos locais.

Porém há sinais no horizonte de que o caráter eventual dessa iniciativa, des-sa ferramenta de branding, deverá se transformar em algo mais rotineiro, num futuro não muito distante:

1.A mudança na legislação sobre a aferição e registro do valor de intan-gíveis nos balanços. 2.A pressão pela utilização de mé-tricas de eficácia. Na área de marke-ting, essa exigência –que parte da alta direção e da área financeira– é cada dia mais intensa. Durante mui-to tempo, profissionais de marketing apostaram numa suposta impossi-bilidade de aferir o retorno sobre o investimento em marketing. Isso não

FATORDEFORÇADAMARCA(FFM)

RISCODAMARCA(RM)

TAXADEDESCONTODAMARCA(TDM)

Fluxo de caixa dos produtos que usaram a

marca

Valor econômico adicionado

Fluxo de caixa gerado pela marca

VALORECONÔMICODAMARCA

Análise demercado

Dadosfinanceiros

CUSTODOCAPITALEMPREGADO

COEFICIENTEDEPARTICIPAÇÃODAMARCA(CPM)

MetoDologiA troiAno De vAlor DA MArcA

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é mais verdade, mesmo que as meto-dologias para tanto ainda não sejam as mais científicas. O professor Don Schultz, da Kellogg School of Ma-nagement, em Chicago, repetiu ad nauseam a seguinte provocação: “Se os profissionais de marketing não acordarem, os gestores financeiros administrarão as marcas e não eles”. 3. O terceiro fator é tão importante quanto os dois primeiros: a avaliação econômica de um ativo como marca, quando realizada periodicamente, fornece um precioso indicador sobre a saúde da gestão como um todo. Se não fosse útil para mais nada, seria um dispositivo adicional esclarece-dor para atender a algumas expecta-tivas de acionistas e investidores.

Os caminhos mais utilizados e mais bem-aceitos atualmente para o cálculo do valor econômico de marcas estão inspirados em metodologias consagra-das pelos gestores financeiros e são ro-tineiramente divulgados na imprensa. O maior pecado da maioria, contudo, costuma ser uma apressada aferição desse valor, com base apenas em da-dos de balanço publicados por empre-sas de capital aberto. Isso tem levado ao surgimento de rankings muito dís-pares entre diversas empresas avalia-doras, o que reforça a suspeição sobre o poder dessas técnicas de medida. E dá um motivo a mais para desestimu-lar seu uso. (Na Troiano, temos nossa

metodologia, que cruza os dados finan-ceiros e a análise de mercado, como se vê no gráfico da página anterior.)

5. ProPÓsito Se sua marca deixasse de existir ama-nhã, o que o mundo perderia? Essa é uma pergunta ao mesmo tempo pro-vocativa e transformadora, porque propósito talvez seja a ferramenta primordial do branding.

Quando não há um propósito para que a marca ou a empresa exista, seu desaparecimento não causa um vazio no mercado onde atua. Um eventual vá-cuo é rapidamente ocupado pelos com-petidores e sem qualquer sentimento de luto de clientes e consumidores.

Propósito é algo diferente de missão, visão, valores. Aliás, fizemos uma rápi-da pesquisa nos websites de 50 empre-sas, coletando suas missões e valores. Em geral, foram quase sempre as mes-mas palavras, em ordens distintas, as usadas para formular as missões e as visões das organizações. Tenho a im-pressão de que, se trocássemos os qua-dros pendurados nas paredes de uma empresa para outra de madrugada, os funcionários, ao chegarem, não perce-

beriam a mudança. Propósito, ao con-trário, tem um aspecto único, porque nasce da alma da empresa e não de sua comparação com os concorrentes. É a matéria-prima simbólica responsável por sua fundação, o sonho original que inspira sua existência.

Em um nível pessoal, propósito é o que dá sentido para nossa vida e nos move adiante. Propósito é aquilo que nos faz acordar mais motivados para ir trabalhar: não apenas porque esta-mos sendo bem pagos, mas porque, sinceramente, sentimos que fazemos a diferença no mundo. Como disse um amigo meu: “Propósito acaba com a crise do domingo à noite”. E ele me ex-plicou. No domingo à noite, durante o programa Fantástico, da TV Globo, ele ficava sofrendo por antecipação com o retorno à empresa no dia seguinte e com a longa semana pela frente. Quan-do, porém, em outra organização, ele entendeu que havia um propósito que o motivava e que dinamizava seu tra-balho, o domingo à noite passou a ter outro sabor em sua vida.

Propósito é o significado maior que organiza todos os outros relacionados a uma marca corporativa. Propósito, em resumo, é a declaração de como a empresa pretende contribuir para a humanidade.

Organizações que articulam elemen-tos de sua alma na construção de um propósito relevante e distinto atingem o que nós chamamos de “soulful ex-cellence” ou excelência de alma. Esse conceito soma-se ao de excelência ope-racional, termo mais frequentemente discutido no dia a dia empresarial para caracterizar as companhias realmente de sucesso.

Excelência operacional pode ser copiada, porém, e de fato é, todos os dias, cada vez mais rapidamente, daí a fundamental importância da “soulful

os DiFerenciais De uma marca com ProPÓsito

Posicionamento ProPÓsito

ponto de diferença ponto de vista

construída a partir de fora construída a partir de dentro

competitiva distintiva

empregados mensageiros

“contrato” com o cliente aliança com o cliente

próximo trimestre próxima década

propósito é bem diferente de missão, visão, valores ou posicionamento; ele declara a contribuição da empresa para a Humanidade

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Hsm management

excellence”: ela é imune a esforços de cópia pelos rivais, pois emerge das características únicas da alma de uma empresa, dos sonhos dos fundadores, do que a torna autên-tica e indispensável para o mundo.

Propósito também é bem dife-rente de posicionamento, como é praticado em marketing. Ao definir-mos posicionamento, é natural que olhemos para fora, a fim de desco-brir que espaço ocuparemos, como em geral fazem os segundos filhos quando começam a crescer e têm a referência do irmão que nasceu antes. Para identificar o propósito, temos de olhar para dentro da orga-nização, para sua história, para o que imaginaram seus fundadores. Mais ou menos como fazem os primei-ros filhos, que precisam olhar para a própria família e para si mesmos.

sem esPerar Pelo consensoSerá o branding a nova face do mar-keting? Ou trata-se apenas da exten-são do que as empresas mais crite-riosas com o gerenciamento de suas marcas já fazem há muito tempo? Quem sabe não é apenas o processo intelectual que rege o planejamento de comunicação? Será uma ferra-menta de gestão eficaz?

Poderia estender essa lista de ques-tões, mas não é o caso. Mesmo sem resposta definitiva para elas, o ges-tor de bom senso consegue observar quando o branding é tratado de forma consistente e profissional e quando é obra de paraquedistas, que oferecem soluções pasteurizadas em vez de es-pecíficas para cada empresa.

Não serão a falta de uma definição consensual e o excesso de retórica que impedirão o branding de ser internali-zado na gestão das empresas. É como na astronomia: o pobre Plutão deixou de ser definido como planeta, mas con-tinua girando por lá, catalogado como o corpo celeste 134340, não?

Jaime troiano traz seu curso Para a Hsm eDucação

Professores: Jaime Troiano, Cecília Russo, Renata Natacci e Ricardo Klein, do Grupo Troiano de Branding, Fernan-do Jucá (Atingire), Luís Rasquilha (AYR Consulting, Trends & Innovation).quando: junho a setembro de 2012, com aulas às segundas-feirasdas 19h30 às 22h30.onde: HSM Educação: World Trade Center São Paulo – Av. das Nações Unidas 12.551 – 4º andar. São Paulo – SP.Vagas: 55.mais informações:www.cursodebranding.com.br

Com formação em engenharia química pela Faculdade de Engenharia Indus-trial (FEI) e em sociologia pela Universi-dade de São Paulo (USP), Jaime Troiano atuou por muitos anos como executivo sênior de agências como Young & Rubicam, MPM-Lintas e BBDO, na es-fera do Brasil e da América Latina, até fundar, há 19 anos, seu Grupo Troiano de Branding. Foi assim que ofereceu as primeiras discussões estruturadas sobre o tema, construiu cases mundiais e antecipou as maiores tendências de marcas do cenário nacional.

Em 2008, Jaime Troiano e sua equipe começaram a ensinar os executivos brasileiros sobre branding em um pro-grama desenhado para ser completo. O curso chega a sua terceira edição em junho, agora em uma parceria com a HSM Educação. Com uma carga horária total de 36 horas, ele se destina a profissionais das áreas de marketing, comunicação e negócios em geral, pre-ferencialmente com mais de cinco anos de experiência profissional específica.

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46 Hsmmanagement 91 • março-abril 2012 hsmmanagement.com.br