avaliaÇÃo da colinesterase em intoxicados por aldicarb atendidos pelo ciave, 1999 a 2001

97
UNIVERSIDADE CATÓLICA DO SALVADOR INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS CENTRO DE PESQUISAS E EXTENSÃO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ANÁLISES CLÍNICAS AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE DE COLINESTERASE SÉRICA EM PACIENTES INTOXICADOS POR ALDICARB ATENDIDOS PELO CIAVE-BA, 1999 A 2001 Jucelino Nery da Conceição Filho Salvador – Bahia 2002

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Monografia apresentada no curso de especialização em Análises Clínicas na UCSal (Bahia). Apresenta como tema a avaliação da colinesterase plasmática nas intoxicações pelo "chumbinho" (aldicarb).

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  • UNIVERSIDADE CATLICA DO SALVADOR INSTITUTO DE CINCIAS BIOLGICAS CENTRO DE PESQUISAS E EXTENSO CURSO DE ESPECIALIZAO EM ANLISES CLNICAS

    AVALIAO DA ATIVIDADE DE COLINESTERASE SRICA EM PACIENTES INTOXICADOS POR ALDICARB

    ATENDIDOS PELO CIAVE-BA, 1999 A 2001

    Jucelino Nery da Conceio Filho

    Salvador Bahia

    2002

  • UNIVERSIDADE CATLICA DO SALVADOR - UCSal INSTITUTO DE CINCIAS BIOLGICAS - ICB

    CENTRO DE PESQUISA E EXTENSO - CEPEX CURSO DE ESPECIALIZAO EM ANLISES CLNICAS

    AVALIAO DA ATIVIDADE DE COLINESTERASE SRICA EM PACIENTES INTOXICADOS POR ALDICARB

    ATENDIDOS PELO CIAVE-BA, 1999 A 2001

    Jucelino Nery da Conceio Filho

    Orientador: Profa. Luzimar Gonzaga Fernandez

    Salvador Bahia

    2002

    Monografia apresentada ao Centro de Pesquisa e Extenso referente ao II Curso de Especializao em Anlises Clnicas para obteno do grau de especialista .

  • Ficha Catalogrfica elaborada pela Biblioteca do CPqGM/FIOCRUZ Salvador Bahia.

    Conceio Filho, Jucelino Nery da C744a Avaliao da atividade de colinesterase srica em pacientes intoxicados

    por Aldicarb atendidos pelo CIAVE-Ba, 1999 a 2001 / Jucelino Nery da Conceio Filho. _ Salvador: Universidade Catlica do Salvador / Instituto de Cincias Biolgicas / Centro de Pesquisas e Extenso CEPEX, 2002. 96p.:ils.

    Monografia (Curso de Especializao em Anlises Clnicas)- Universidade Catlica do Salvador, 2002.

    1. Intoxicao. 2. Aldicarb. 3. Inibidores de colinesterase. 4. Butirilcolinesterase. 5. Bahia. I. Ttulo.

    CDU 616-099(813.8)

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus por ter me possibilitado crescer e alcanar meus objetivos, superando com resignao todos os obstculos encontrados.

    Aos meus pais por estarem sempre presentes, orientando-me e apoiando-me

    em todos os momentos difceis.

    minha noiva Rosemeire por me apoiar e incentivar na concretizao de mais um objetivo.

    s estagirias de Farmcia Nivia, Naza e Adlani por terem contribudo na coleta de dados, os quais resultaram neste trabalho.

    quela que me auxiliou com um sorriso e ateno: Ana Maria, bibliotecria da FIOCRUZ.

    Agradeo, por fim, professora Luzimar Fernandez a qual contribuiu para a

    concretizao deste trabalho.

  • SUMRIO

    LISTA DE ABREVIATURAS ........................................................... v

    NDICE DE FIGURAS ..................................................................... vii

    NDICE DE TABELAS ..................................................................... iv

    RESUMO ......................................................................................... 11

    I INTRODUO ................................................................................ 12

    1 COLINESTERASES ........................................................................ 15

    2 INSETICIDAS INIBIDORES DE COLINESTERASE ...................... 31

    2.1 Toxicocintica dos Carbamatos ................................................... 34

    2.1.1 Biotransformao .......................................................................... 36

    2.1.2 Eliminao ...................................................................................... 37

    2.2 Toxicodinmica .............................................................................. 37

    2.2.1 Toxicidade e mecanismo de ao txica .................................... 37

    3. OBJETIVOS .................................................................................... 41

    4. Objetivo Geral................................................................................. 41

    4.1 Objetivos Especficos.................................................................... 41

    4.2 JUSTIFICATIVAS............................................................................ 42

    5 METODOLOGIA .............................................................................. 43

    5.1 Mtodos Existentes para Determinao da Atividade da Colinesterase ................................................................................

    43

    5.1.1 Mtodos de campo ........................................................................ 45

    5.1.2 Mtodos de execuo em laboratrio ......................................... 46

  • 5.1.2.1 Mtodos que detectam a formao de cido .............................. 46

    5.1.2.2 Mtodos que detectam a formao de colina ............................. 48

    5.1.2.3 Mtodos que detectam a formao de tiocolina ......................... 49

    5.2 Amostragem ................................................................................... 52

    5.3 Coleta, Preparao e Armazenamento das Amostras Biolgicas .......................................................................................

    53

    5.4 Procedimentos Analticos ............................................................. 53

    5.5 Anlise Estatstica ......................................................................... 57

    6 RESULTADOS E DISCUSSO....................................................... 59

    7 CONSIDERAES FINAIS ............................................................ 72

    8 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS................................................ 74

    ANEXO I........................................................................................... 83

    APNDICE I .................................................................................... 91

    APNDICE II ................................................................................... 92

    APNDICE III .................................................................................. 93

  • LISTA DE ABREVIATURAS

    1. ACh Acetilcolina

    2. AChE Acetilcolinesterase

    3. ANVISA Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria

    4. AOAC Association Official Analytical Chemistry

    5. BuChE Butirilcolinesterase

    6. BuChEA alelo Butirilcolinesterase atpico ou dibucana-resistente

    7. BuChEF alelo Butirilcolinesterase fluoreto-resistente

    8. BuChES alelo Butirilcolinesterase silencioso

    9. BuChEU alelo Butirilcolinesterase usual ou normal

    10. CAS Chemical Abstracts Substance

    11. ChE Colinesterase

    12. CIAVE-BA Centro de Informaces Antiveneno da Bahia

    13. CIT/RS Centro de Informaes Toxicolgicas do Estado do Rio Grande do Sul

    14. COC Cocana

    15. DL50 Dose letal mdia

    16. DTNB 5,5'-ditiobis-2-nitrobenzico

    17. E.C. Enzymes Commission

    18. EDTA cido etilenodiamino tetractico

    19. FAD Flavina-adenina-dinucleotdeo

    20. FIOCRUZ Fundao Osvaldo Cruz

    21. IBMP ndice Biolgico Mximo Permitido

    22. IFCC International Federation of Clinical Chemistry

    23. OF Organofosforados

    24. OMS Organizao Mundial de Sade

    25. PAPS 3-fosfoadenosina-5-fosfossulfato

    26. pH Potencial de hidrognio

    27. S.I. Sistema Internacional

    28. SINITOX Sistema Nacional de Informaes Txico-Farmacolgicas

    29. SNA Sistema nervoso autnomo

    30. SNC Sistema nervoso central

    31. UDPGA Urodindifosfatoglicurnico

    32. U.I. Unidade Internacional de Enzima

  • NDICE DE FIGURAS

    Figura 1 Embalagem do produto aldicarb comercializado clandestinamente como raticida conhecido por Chumbinho ( esquerda) e detalhe do aspecto dos grnulos que medem de 0,3 a 1,0 mm ( direita) ...............................................................

    13

    Figura 2 Venda de raticidas clandestinos por vendedor ambulante no comrcio de Salvador. Eficcia dos produtos vendidos, arsnico e chumbinho, exaltados pela exposio de ratos secos com laos pretos no pescoo.............................................

    14

    Figura 3 Reao de hidrlise da acetilcolina catalisada pela acetilcolinesterase (AChE)...........................................................

    15

    Figura 4 Representao esquemtica da juno neuromuscular (ACh = acetilcolina; AChE = acetilcolinesterase).....................................

    16

    Figura 5 Comparao entre uma juno neuromuscular em repouso (a) e ativada causando contrao muscular (b). Os canais com acesso esto numerados na sequncia em que se abrem..........

    18

    Figura 6 O receptor de acetilcolina (AChR) em ao. Esta protena tem cinco subunidades, duas das quais so idnticas (2). Duas molculas de acetilcolina (ACh) ligam-se ao receptor, uma em cada subunidade. O canal ser aberto quando a acetilcolina se ligar ao receptor............................................................................

    19

    Figura 7 Estrutura bsica dos carbamatos: ster do cido N-metilcarbmico. O substituto R denota a variedade de grupos ligados diretamente......................................................................

    32 Figura 8 Ismeros geomtricos do aldicarb................................................ 34

  • Figura 9 Metabolismo do aldicarb...............................................................

    36

    Figura 10 Reaes que ocorrem na dosagem da BuChE atravs do mtodo de Ellman.........................................................................

    54

    Figura 11 Curva de padres de butirilcolinesterase com concentraes respectivas de 0 (branco) UI/mL; 3,5 UI/mL; 7,0 UI/mL; 10,5 UI/mL; e, 14,0 UI/mL....................................................................

    55

    Figura 12 Espectrofotometro Coleman modelo 35D, faixa espectral de 335 a 850 nm, utilizado pelo Laboratrio de Toxicologia do CIAVE-Ba.....................................................................................

    57

    Figura 13 A gravidade da intoxicao apresenta relao inversa com a atividade da BuChE. Quanto menor a atividade enzimtica, maior a gravidade. A disperso (rea em vermelho) est correlacionada inversamente com a gravidade, isto ,uma maior gravidade representa uma menor disperso da atividade enzimtica....................................................................................

    66

    Figura 14 Concentraes da atividade de BuChE de 339 pacientes atendidos pelo CIAVE-BA durante o perodo de 1999 a 2001.....

    67

    Figura 15 Atividades da colinesterase srica encontrada dos pacientes do sexo masculino (a esquerda) e feminino ( direita) em funo do tempo e valores estimados......................................................

    69

    Figura 16 Modelo terico tridimensional da butirilcolinesterase humana.....

    91

    Figura 17 Sequncia de aminocidos da butirilcolinesterase humana......... 92

  • NDICE DE TABELAS

    Tabela 1 Relao dos substratos das colinesterases do sangue ..............

    21

    Tabela 2 Caracterizao dos principais tipos de butirilcolinesterase .........

    25

    Tabela 3 Enfermidades e condies que modificam os nveis da BuChE .........................................................................................

    29

    Tabela 4 Inseticidas carbamatos por classe toxicolgica e seu nome comercial ..........................................................................

    33

    Tabela 5 Frmula Estrutural e valores de DL50 aguda de alguns inseticidas carbamatos ................................................................

    38

    Tabela 6 Atividade enzimtica da colinesterase srica e sexo dos pacientes intoxicados por aldicarb atendidos pelo CIAVE-Ba, 1999-2001....................................................................................

    59

    Tabela 7 Gravidade da intoxicao nos 339 pacientes atendidos pelo CIAVE (1997-2001) distribudos de acordo com o sexo .............

    60

    Tabela 8 Coeficientes de correlao de Pearson entre as variveis idade, tempo decorrido e atividade da BuChE ............................

    61

    Tabela 9 Causas das 339 intoxicaes atendidas pelo CIAVE-Ba.

    62

    Tabela 10 Evoluo das intoxicaes por aldicarb correlacionado com o sexo .............................................................................................

    62 Tabela 11 Evoluo do quadro clnico e faixa etria dos pacientes ............. 63

  • Tabela 12 Alterao da atividade enzimtica e faixa etria dos pacientes...

    63

    Tabela 13 N de determinaes laboratoriais da atividade da BuChE. Realizadas nos pacientes intoxicados por aldicarb e atendidos pelo CIAVE-BA no perodo de 1999 a 2001 ...............

    64

    Tabela 14 Correlao dos nveis de BuChE e a gravidade do quadro em pacientes com dosagens alteradas .............................................

    65

    Tabela 15 Pacientes com inibio da atividade da BuChE persistente por mais de 48 horas .........................................................................

    68

    Tabela 16 Estimativa da atividade enzimtica em funo do tempo decorrido entre a ingesto e a coleta da amostra, atravs da aplicao de equaes cbicas ...................................................

    70

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 11

    RESUMO

    A comercializao de pesticidas agrcolas como raticida tem sido responsvel por um nmero elevado de intoxicaes no Brasil. Entre os anos de 1997 e 1999, os raticidas foram responsveis por 11,3% do total das intoxicaes humanas registradas pelo Sistema Nacional de Informaes Txico-Farmacolgicas (SINITOX). Na Bahia, foram registrados 2.971 casos de intoxicao por estes produtos no perodo de 1997 a 2001, sendo que 1.154 ocorreram s neste ltimo ano. O aldicarb, um pesticida carbamato de elevada toxicidade, figurou como a principal substncia comercializada clandestinamente como raticida. Esta fcil disponibilidade no mercado tem gerado um aumento no nmero de intoxicaes, criando, consequentemente, um grande problema de sade pblica. Este trabalho avalia a importncia da dosagem da atividade da colinesterase srica no diagnstico da intoxicao aguda por este pesticida atravs do mtodo de Ellman modificado por Dietz, at 24 horas do acidente. A amostragem foi constituda das dosagens de atividade de colinesterase srica realizadas pelo CIAVE-BA, no perodo de janeiro de 1999 a dezembro de 2001, referentes a 339 casos de intoxicao aguda por aldicarb. 75,8% dos pacientes estudados apresentaram nveis anormais de butirilcolinesterase (BuChE). Dentre os casos graves, 75,0% tiveram valores entre 0 a 4 U.I./mL. Observou-se ausncia de sinais e/ou sintomas em 4,2% dos 339 pacientes, sendo que cinco pacientes apresentaram a atividade da colinesterase srica alterada. A mdia dos valores das dosagens iniciais foi de 3,1 UI/mL, com uma faixa de variao de < 0,4 a 13,4 UI/mL. O tempo mdio entre a ingesto do aldicarb e a coleta de sangue para a dosagem da atividade enzimtica foi de 14,5 horas. Foram observados 9 pacientes com uma inibio da BuChE persistente por mais de 48 horas aps a ingesto do aldicarb.

    Palavras-Chaves: Aldicarb, carbamatos, butirilcolinesterase, colinesterase, inibidores de colinesterase.

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 12

    I INTRODUO

    No Brasil, foram registrados 217.684 casos de intoxicao humana entre os anos de

    1997 e 1999, com uma mdia anual de 75.561 ocorrncias. Deste total, 11,3% foram

    causadas por raticidas (FIOCRUZ, 1998 ; FIOCRUZ, 1999 ; FIOCRUZ, 2000 ). Registros do Centro de Informaes Antiveneno da Bahia (CIAVE-BA), centro de referncia em Toxicologia no Estado, apresentaram 2.971 notificaes de

    intoxicao por estes produtos no perodo de 1997 a 2001. Entre 1 de janeiro a 31 de dezembro de 2001, foram notificados 1.154 casos provocados por raticidas, dos

    quais 740 (64,1%) pacientes se intoxicaram com aldicarb e 30 destes evoluram para bito.

    A legislao em vigor (Lei n 7.802, de 11 de julho de 1989, regulamentada pelo Decreto n 98.816, de 11 de janeiro de 1990) que regula o uso e comercializao de pesticidas, includos a os raticidas, determina como uso legal na composio de

    rodenticidas apenas os derivados cumarnicos, tendo em vista a sua baixa

    toxicidade para o homem (ARRUDA, 1999). Contudo, tm-se verificado o emprego de substncias de elevado poder txico como o fluoracetato, arsnio, compostos

    organofosforados (OF) e aldicarb, ilustrado na figura 1 (comercializado sob o nome de Chumbinho e Japan), na formulao de produtos vendidos clandestinamente como raticida (LIMA & SPINELLI, 1997; ELLENHORN, 2001). Como forma de controle, a legislao determina que a sua venda seja feita em casas especializadas

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 13

    e sob apresentao de receiturio agronmico (ARRUDA, 1999).

    Estes produtos de elevada toxicidade so comercializados de forma clandestina em

    diversas cidades do Brasil como raticidas, sendo responsvel por grandes nmeros

    de intoxicaes e bitos (LIMA & SPINELLI, 1997; CONCEIO FILHO, 1997; MARTINS et al., 2000; ANDRADE FILHO, 2001; GUIMARES et al., 2001;

    CONCEIO FILHO, 2001; ELLENHORN, 2001). Esta comercializao tem aumentado anualmente, gerando um srio problema de sade pblica. Entre os

    anos de 1998 e 2001 houve um aumento de 37 para 58 pontos de venda nas

    principais reas de comrcio em Salvador (figura 2), com nmeros de bitos por raticidas nesta cidade de 10 (4,9%), 10 (3,1%), 29 (4,5%) e 12 (1,8%), respectivamente em 1998, 1999, 2000 e 2001 (CONCEIO FILHO, 2001). A substncia mais utilizada ilegalmente como rodenticida tem sido o aldicarb, um

    Figura 1 Embalagem do produto aldicarb comercializado clandestinamente como raticida conhecido por Chumbinho ( esquerda) e detalhe do aspecto dos grnulos que medem de 0,3 a 1,0 mm ( direita). Fonte: fotos do Autor.

    Foto: Jucelino Filho Foto: Jucelino Filho

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 14

    potente inibidor de colinesterase pertencente ao grupo dos carbamatos.

    Vrias tm sido as metodologias empregadas no diagnstico das intoxicaes

    por inibidores da colinesterase, atravs da determinao da atividade enzimtica.

    Dentre elas, destaca-se o mtodo de Ellman o qual atualmente recomendado pela

    Organizao Mundial de Sade ( OMS, 1991; SILVA, 1996).

    Figura 2 - Venda de raticidas clandestinos por vendedor ambulante no comrcio de Salvador. Eficcia dos produtos vendidos, arsnico e chumbinho, exaltados pela exposio de ratos secos com laos pretos no pescoo.

    FONTE: CONCEIO FILHO, 1997.

    Foto: Jucelino Filho

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 15

    1. COLINESTERASES

    A atividade colinestersica derivada da ao de duas enzimas distintas: a

    butirilcolinesterase (E.C. 3.1.1.8, colinesterase srica ou plasmtica, colinesterase no especfica, pseudocolinesterase, acilcolina acil - hidrolase ou BuChE ) e a acetilcolinesterase (E.C. 3.1.1.7, colinesterase verdadeira, colinesterase eritrocitria ou AChE) (MACQUEEN, 1973; KUTTY, 1980; OKSANA, 1987; OMS, 1991; ROSATTI et al., 1995; OLIVEIRA-SILVA, 2001), responsvel pela hidrlise do mais importante neurotransmissor das junes sinpticas, a acetilcolina (ACh) (Figuras 3 e 4).

    Figura 3 Reao de hidrlise da acetilcolina catalisada pela acetilcolinesterase (AChE). Fonte: KAPLAN, 1992

    Este neurotransmissor do sistema nervoso autnomo (SNA) armazenado em vesculas existentes no citoplasma da terminao nervosa e antes da membrana

    sinptica (OMS, 1991) (Figura 4). especialmente liberado nas terminaes pr-ganglionares simpticas e parassimpticas, responsveis pelas aes nicotnicas.

    As fibras nervosas parassimpticas ps-ganglionares tambm liberam a acetilcolina,

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 16

    sendo seus efeitos reproduzidos pela muscarina e suprimidos pela atropina. A ACh

    tambm o neurotransmissor liberado pelos nervos somticos que inervam a

    musculatura esqueltica voluntria (OGA, 1996).

    Figura 4 - Representao esquemtica da juno neuromuscular (ACh = acetilcolina; AChE = acetilcolinesterase).

    FONTE: modificado de LARINI, 1979.

    A transmisso de um estmulo nervoso feita atravs de modificaes na

    concentrao dos ons (LARINI, 1979). Quando um estmulo nervoso se propaga pelo axnio, a membrana despolarizada acelera a liberao da acetilcolina, em

    decorrncia da alterao eltrica gerada. Esta liberao depende das concentraes

    extracelulares de clcio e magnsio bivalentes (OGA, 1996). A ACh liberada se liga a um receptor colinrgico especfico, o qual consiste numa molcula protica com

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 17

    alta afinidade pelo neurotransmissor situado na membrana ps-sinptica da prxima

    fibra nervosa. Pela ao da ACh se modifica a conformao desta molcula protica,

    facilitando a formao de numerosos espaos na membrana ps-sinptica. Os

    ctions de sdio e potssio penetram atravs destes espaos e produzem uma

    despolarizao desta membrana, continuando assim o impulso nervoso (OMS, 1991).

    A figura 5 mostra uma juno neuromuscular em repouso e outra ativada durante uma contrao muscular. Dos quatro canais com acesso que desempenham esse

    processo, um com acesso para ligantes e trs so com acesso de voltagem: (1) um canal de Ca2+ na membrana plasmtica do neurnio; (2) um canal de Na+ na membrana plasmtica da clula muscular esqueltica; e, (3) Um canal de Ca2+ no sistema intracelular de membranas da clula muscular esqueltica. O canal com

    acesso para ligante na membrana plasmtica da clula muscular esqueltica

    aberto pela ligao do neurotransmissor acetilcolina. Ao ser aberto, este canal

    permite a entrada de Na+ no interior da clula muscular e a sada de K+, ambos na

    direo de seus respectivos gradientes de concentrao (CAMPBELL, 2000).

    Aps a transmisso do impulso nervoso, a ACh deve ser removida da fenda

    sinptica para permitir a recuperao do receptor ou para evitar respostas repetitivas

    e descontroladas decorrente de um nico estmulo. A ao da acetilcolina, na funo

    normal do sistema nervoso, deve ser muito curta, em torno de 1/500 segundos. A

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 18

    remoo feita rapidamente atravs da hidrlise do composto pela ao da

    acetilcolinesterase, havendo formao de colina e cido actico. A colina

    reutilizada na sntese da ACh (LARINI, 1979; OMS, 1991; OGA, 1996).

    Figura 5 Comparao entre uma juno neuromuscular em repouso (a) e ativada causando contrao muscular (b). Os canais com acesso esto numerados na sequncia em que se abrem. Fonte: CAMPBELL, 2000.

    O receptor da acetilcolina uma protena grande com cinco subunidades, duas das

    quais so idnticas, sendo sua composio designada como 2. Sabe-se que

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 19

    duas molculas da acetilcolina se ligam ao receptor, uma em cada subunidade

    (Figura 6). Quando a acetilcolina se liga ao receptor, o canal se abre. O stio de ligao de cada subunidade parte de uma regio hidroflica de uma protena muito

    hidrofbica que atravessa a membrana.

    Figura 6 - O receptor de acetilcolina (AChR) em ao. Esta protena tem cinco subunidades, duas das quais so idnticas (2). Duas molculas de acetilcolina (ACh) ligam-se ao receptor, uma em cada subunidade. O canal ser aberto quando a acetilcolina se ligar ao receptor. Fonte: CAMPBELL, 2000.

    A acetilcolinesterase e a butirilcolinesterase apresentam diferenas cinticas,

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 20

    estruturais e diferentes processos de sntese. A AChE encontrada, principalmente,

    nas sinapses do sistema nervoso central, perifrico, parassimptico, juno neuromuscular e membrana das hemcias. A sua sntese ocorre durante a

    hematopoese. A BuChE, com peso molecular de 360.000 daltons, sintetizada no

    fgado e levada, de forma contnua, para a corrente sangunea. Est presente no

    plasma ou soro, no intestino, mas em pouca concentrao no sistema nervoso

    central e perifrico. Estes dois sistemas apresentam meias-vidas bastante

    diferenciadas, ou seja, trs meses para a acetilcolinesterase e, aproximadamente, uma semana para a butirilcolinesterase. Esta diferena tem sido proposta como uma

    forma til para diferenciar temporalmente as intoxicaes (OGA, 1996, OLIVEIRA-SILVA, 2001).

    A acetilcolinesterase tem afinidade, quase que especfica, para a acetilcolina,

    embora possa hidrolisar diversos steres sintticos (tabela 1).

    A BuChE conhecida desde 1932 como uma enzima que hidrolisa steres de

    colina. Esta enzima foi denominada de pseudocolinesterase por Mendel e Rudney

    em 1943 por duvidarem da possibilidade da butirilcolinesterase fazer parte essencial

    na hidrlise da acetilcolina in vivo (OKSANA, 1987). Alm da ACh, hidrolisa uma gama bastante varivel de steres sintticos e naturais (tabela 1), como por exemplo, os steres do cido carbmico, a butirilcolina, a benzilcolina, vrias drogas

    anestsicas, cocana, herona e outros steres (como o mivacurium e o

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 21

    suxametnio). A sua verdadeira funo fisiolgica ainda desconhecida, sendo aventadas muitas teorias (CARRAZA, 1989; OMS, 1991; KAPLAN, 1992; ROSATTI et al., 1995; LOTTI, 1995; Mc QUEEN, 1995; FELDMAN, 1997; McGEHEE et al.,

    2000; BORGES-OSRIO, 2001).

    Tabela 1. Relao dos substratos das colinesterases do sangue.

    SUBSTRATO HIDROLISADO

    CINTICA COM ACETILCOLINA

    ENZIMA

    Ponto de origem no

    sangue Acetil-colina

    Acetilbeta- metilcolina

    Butiril- colina

    Benzoil- colina

    Concentrao tima

    Inibio por

    excesso

    AChE

    Hemcias

    +

    +

    -

    -

    3 x 10-3

    +

    BuChE Plasma /

    soro

    +

    -

    +

    +

    2 x 10-2

    -

    AChE= acetilcolinesterase; BuChE=butirilcolinesterase Fonte: Adaptado de Henry, 1989.

    Existe uma boa correlao entre a inibio da ChE e a intoxicao por

    organofosforados e carbamatos. A colinesterase eritrocitria a que apresenta

    melhor especificidade e sensibilidade em relao gravidade do quadro clnico, pois

    reflete melhor a atividade da enzima no sistema nervoso, visto que apresenta

    similaridade funcional com a enzima que se encontra nas placas motoras e nas

    sinapses. A AChE afetada mais tardiamente (ROSATTI et al., 1995; OGA, 1996). Entretanto, a colinesterase srica ou plasmtica, em alguns casos, mais utilizada

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 22

    por ser um bom indicador de exposio e apresentar praticidade na sua execuo

    (ROSATTI et al., 1995). A sua dosagem considerada o exame mais indicado para o diagnstico de intoxicaes agudas por anticolinestersicos (organofosforados, carbamatos, prostigmina, dentre outros), mas com pouco valor para a avaliao da intoxicao crnica, uma vez que afetada primeiramente e regenerada mais

    rapidamente (OMS, 1991; OGA, 1996).

    Durante os ltimos dez anos, muitas informaes foram obtidas sobre a biologia

    molecular e gentica da acetilcolinesterase e butirilcolinesterase, enzimas distintas

    codificadas por dois diferentes, mas correlacionados, genes. Tm-se estabelecido

    que a BuChE includa por um nico gen o qual corresponde ao locus E1.

    Atualmente, j se conhece a sequncia completa dos aminocidos da colinesterase srica humana e a localizao das pontes de dissulfeto dentro da sequncia. A base

    molecular de muitas variantes desta enzima tem sido descrita de forma detalhada.

    Relata-se a possibilidade de ocorrerem mutaes mltiplas dentro de um nico gen

    da BuChE ou poder haver combinao de mutaes. Pelo menos onze variantes de

    BuChE humana j foram identificadas (OKSANA, 1987; McQUEEN, 1995).

    A ocorrncia de mutaes atpicas da BuChE tem sido muito estudada. Estas

    alteraes genticas resultam em deficincia na atividade enzimtica. Os pacientes

    com variantes da butirilcolinesterase (Tabela 2) podem exibir marcadamente paralisia prolongada aps a administrao de succinilcolina, suxametnio ou

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 23

    mivacurium (CHARLES, 2002). Estes relaxantes musculares utilizados em pr-operatrio, levam paralisia dos msculos estriados, por poucos minutos, e logo em

    seguida so metabolisados pela colinesterase normal. Quando o paciente apresenta

    esta enzima com a sua atividade diminuda ou ausente, a paralisia poder ter seu

    efeito prolongado levando a uma apnia por meia-hora ou mais, com risco de bito

    (BORGES-OSRIO, 2001) .

    Esta diferena na reao aos relaxantes musculares decorre de alteraes de alelos

    mltiplos codominantes, pertencentes ao loco BuChE. A localizao se d no brao

    longo do cromossomo 3 (3q). Segundo MACQUEEN & PLAUT (1973), JANEWAY (1980), HENRY (1989) e BORGES-OSRIO (2001), os alelos mais conhecidos so:

    o BuChE usual ou normal (BuChEU), o atpico ou dibucana-resistente (BuChEA),

    o silencioso (BCHES) e o fluoreto-resistente (BuChEF). Os gens que controlam a

    sua sntese so alelos um em relao ao outro. A forma usual, em homozigose

    (BuChEU/BuChEU) ou heterozigose com o alelo BuChES (BuChEU / BuChES ),

    determina a butirilcolinesterase normal, que o tipo mais frequente em todas as

    populaes. Os homozigotos atpicos tm nveis muito mais baixos de ChE.

    A hidrlise da cocana (COC) pela butirilcolinesterase ocorre lentamente. As suas variantes prolongam a meia-vida desta droga no organismo, com raros problemas

    clnicos. Entretanto, quando do uso continuado da COC, principalmente sob formas

    de absoro rpida, como o crack, acumulam-se nveis txicos da droga, podendo

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 24

    levar morte, o que mais frequente entre os homozigotos e heterozigotos

    compostos para as variantes da butirilcolinesterase.

    A dibucana, em concentrao padro, causa 80% de inibio da enzima normal,

    66% de inibio no heterozigoto (BuChEU / BuChEA) e 22% no homozigoto

    (BuChEA / BuChEA). O alelo BuChEF determina em homozigose (BuChEF /

    BuChEF) uma esterase resistente inibio pelo fluoreto de sdio, mas no

    dibucana. O alelo BuChES (gen silencioso) leva a uma esterase completamente

    inativa e os seu homozigotos altamente sensveis ao suxametnio. Os indivduos

    que apresentam o soro destitudo de qualquer atividade de ChE apresentam o gen

    silencioso. Este contm uma protena similar enzima normal mas sem a sua

    atividade (JANEWAY, 1980).

    BORGES-OSRIO (2001) relata ainda a existncia de mais duas variantes da butirilcolinesterase: K e J que diferem entre si quanto ao cdon alterado e

    apresentam 66% e 33% de atividade, respectivamente. Mas, todas as demais

    caractersticas da variante K esto presentes em todas as variantes J, bem como

    90% das variantes atpicas.

    Um baixo nvel de BuChE ou mesmo a sua ausncia completa perfeitamente

    compatvel com o desenvolvimento normal. Nestes casos, somente quando se

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 25

    administra succinilcolina e outras drogas afins que podem ocorrer problemas.

    Tabela 2. Caracterizao dos principais tipos de butirilcolinesterase.

    Tipo de BuChE Fentipos Gentipos Alterao do cdon (DNA)

    Alterao do aminocido

    Usual (U)

    Normal

    BuChEU/BuChEU

    Nenhuma

    Nenhuma

    Atpica (A) Dibucana-resistente BuChEA/BuChEA 70 GAT GCT Asp Gli

    Silenciosa 1 (S1) Sem atividade BuChES/BuChES 117 GGG GGAG Gli mmlc

    Silenciosa 2 (S2) Sem atividade BuChES/BuChES 6 ATT TT Ile mmlc

    Silenciosa 3 (S3) Sem atividade BuChES/BuChES 500 TAT TAA Tir cf

    Fluoreto 1 (F1) Fluoreto-resistente BuChEF/BuChEF 243 AGC ATG Tre Met

    Fluoreto 2 (F2) Fluoreto-resistente BuChEF/BuChEF 390 GGT GTT Gli Val

    Variante K (K) 66% de atividade BuChEK/BuChEK 539 GCA ACA Ala Tre

    Variante J (J) 33% de atividade BuChEJ/BuChEJ 497 GAA GTA Glu Val

    Mmlc = mutao com mudana na leitura do cdigo; cf = cdon finalizador. Fonte: BORGES-OSRIO, 2001.

    Entre os pacientes que apresentam apnia prolongada decorrente do uso do

    suxametnio, geralmente, 10% tm butiril-colinesterase intermediria (heterozigoto),

    5% apresentam o tipo intermedirio-fluoreto (BCHEA / BCHEF) e em torno de 1/3

    tem a enzima com atividade normal, no se sabendo o porqu da sensibilidade

    destes ao relaxante muscular (BORGES-OSRIO, 2001).

    Existe a hiptese de que o alelo atpico (BCHEA ) possua uma vantagem seletiva em

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 26

    funo da sua considervel frequncia: judeus orientais, 10%; caucasides norte-americanos e brasileiros, 2 a 3%; brasileiros miscigenados, 1,5%; e entre negrides

    e mongolides de outras populaes, menos de 1%. Neste caso, sendo a enzima

    mutante menos sensvel aos anticolinestersicos, os seus portadores seriam mais

    resistentes ao envenenamento da solanina (um glicoalcalide txico natural presente em plantas do gnero Solanaceas, como batatas verdes e tomates) (MACQUEEN & PLAUT, 1973; JANEWAY, 1980; HENRY, 1989; BORGES-OSRIO, 2001).

    Hada e colaboradores (1985) estudaram a ocorrncia de alterao isoenzmica em membros de uma famlia que apresentavam hipercolinesterasemia. A eletroforese

    de gradiente em gel de poliacrilamida mostrou que indivduos controle normal tinham

    sete isoenzimas, mas todos os membros com hipercolinesterasemia desta famlia

    tinham duas isoenzimas adicionais. As propriedades enzimticas dos membros

    afetados eram similar quelas dos indivduos normais. A hipercolinesterasemia

    nesta famlia seria resultante de um nmero aumentado de molculas da enzima,

    entretanto, a causa desta alterao isoenzimtica permanece obscura (HADA, 1985).

    Os nveis de colinesterase so dependentes da idade e do sexo. Os nveis sricos

    so geralmente mais baixos no sexo feminino que no masculino. A colinesterase

    decresce com a idade, esta diminuio mais acentuada entre 10 e 20 anos de

    idade (MACQUEEN, 1973). A variao individual da colinesterase eritrocitria oscila

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 27

    em torno de 10%, enquanto a oscilao na plasmtica corresponde a uma mdia de

    14,5% (OGA ,1996). Existem discordncia em relao aos intervalos de referncia para a atividade de colinesterase em Pediatria, mas, genericamente, pode-se

    considerar que a atividade baixa ao nascimento, em torno de 25% dos

    observados no adulto, mantendo-se assim at os seis meses, quando comea a

    aumentar, atingindo aos cinco anos, nveis cerca de 30 a 50% mais elevados do que

    os do adulto. A partir dessa idade comeam a se reduzir gradualmente (CARRAZA, 1989; OMS, 1991).

    Alguns outros fatores, alm do sexo e idade, podem influenciar os nveis da

    atividade da colinesterase. Existem referncias de que os nveis da BuChE em

    pessoas negras so mais baixos que em brancas do mesmo sexo. A desnutrio

    pode alterar o processo de biotransformao das substncias txicas mediante a

    inibio das enzimas microssmicas (OMS, 1991). Tm-se demonstrado que a toxicidade oral de vrios pesticidas maior em animais mantidos com dietas

    deficientes em protenas. Em mulheres, o estado hormonal (puberdade ou menopausa), o estado gentico e o uso de contraceptivos orais so fatores responsveis por variaes na atividade da BuChE (LEPAGE et al., 1985; EVANS et al., 1988). SIDELL & KAMINSKIS (1975) desenvolveram um trabalho onde constataram a variao nos nveis da BuChE entre homens e mulheres: homens nas

    primeiras seis dcadas de vida tiveram a atividade da colinesterase plasmtica mais

    alta que as mulheres; nveis mais altos da enzima foram encontrados entre as

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 28

    mulheres que faziam uso de contraceptivos orais quando comparadas com o grupo

    que no o utilizava. Refere ainda que no foi observado diferena entre os sexos

    aps os sessenta anos de idade, bem como houve um aumento da atividade

    enzimtica com o aumento da idade em ambos os sexos at os 60 anos. A tabela 3

    apresenta condies que modificam os nveis da atividade da BuChE.

    A aplicao clnica da medida da colinesterase srica no diagnstico da exposio a

    agentes anticolinestersicos (organofosforados e carbamatos) requer uma boa compreenso das variaes inter e intra-individuais, bem como conhecimento do

    tempo decorrido entre a exposio e a medida da atividade enzimtica. Durante

    algum tempo, a determinao desta enzima foi utilizada no diagnstico de doenas

    hepticas, por ela ser sintetizada neste rgo. Entretanto, deixou-se de utiliz-la com

    esta finalidade pelo fato da enzima poder ser afetada por um grande nmero de

    processos patolgicos hepticos e extra-hepticos, como hepatite, cirrose, uremia,

    cncer, alergias e policitemias (Tabela 3) (CARRAZA, 1989; McQUEEN, 1995; ANDRADE FILHO et al., 2001).

    No Brasil, o Ministrio do Trabalho regulamentou atravs da Norma Legal de 1983

    (NR-7, anexo 11), como ndice Biolgico Mximo Permitido (IBMP) uma inibio da atividade da AChE, plasmtica ou eritrocitria, em 50%. Contudo, a reduo na

    atividade da enzima de 30% em relao ao valor de pr-exposio indicativa da

    necessidade de vigilncia sanitria. Por este motivo, diversos Organismos

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 29

    internacionais recomendam este valor como IBMP (OGA, 1996).

    Tabela 3. Enfermidades e condies que modificam os nveis da BuChE.

    FATORES QUE LEVAM DIMINUIO DA

    a) Patologia ou condio:

    - anemias crnicas - carcinoma - desnutrio - dilise renal - enfermidades crnicas debilitantes - enfermidades do colgeno - enfermidades hepticas (hepatite aguda,

    (cncer heptico) - enfermidade trofoblstica - epilepsia

    ATIVIDADE:

    - febre reumtica - hiperpirexia - infarto do miocrdio - infeces agudas - mixedema - queimaduras - sndrome de choque txico - ttano - tuberculose - uremia

    b) Tratamento:

    - contraceptivos orais - derivao cardiopulmonar - ciclofosfamida - clorpromazina - corticides - drogas anticncer

    - estrgenos - fisostigmina - inibidores da monoamino oxidase - neostigmina - plasmaferese - propranolol e beta bloqueadores

    c) Outro:

    - raios X

    FATORES QUE LEVAM AO AUMENTO DA ATIVIDADE:

    - alcoolismo - artrite - asma brnquica - bcio nodular - diabetes - esquizofrenia - estados de ansiedade

    - hiperlipemia - hipertenso essencial - nefrose - obesidade - psorase - tirotoxicose - uso de benzodiazepnicos

    FONTE: modificado de OMS, 1991.

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 30

    Quando no conhecido o valor de pr-exposio, pode-se utilizar os valores de

    referncia para uma populao no exposta ou o valor obtido aps o afastamento

    integral do trabalhador de suas atividades, durante um perodo mnimo de 24 horas.

    Na avaliao da exposio ocupacional aos carbamatos, a amostra de sangue deve

    ser coletada durante a exposio do trabalhador (OGA, 1996).

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 31

    2. INSETICIDAS INIBIDORES DE COLINESTERASE

    Os compostos inibidores de colinesterase tm origem em duas classes qumicas

    diferentes, os steres do cido fosfrico ou fosforotiico (organofosforados) e os steres do cido carbmico, ou mais particularmente do cido N-metilcarbmico

    (figura 7), carbamatos, (LARINI, 1993; OGA, 1996; THIESEN, 1998; KLAASSEN, 2001), os quais vm sendo utilizados e desenvolvidos desde o sculo XIX como pesticidas e distinguem-se dos demais praguicidas pelo seu mecanismo de ao

    (THIESEN, 1998; ANDRADE FILHO, 2001). Os organofosforados e os carbamatos so responsveis pelo maior nmero de intoxicaes no meio rural (OLIVEIRA-SILVA, 2001). Os compostos organofosforados foram empregados durante a Segunda Guerra Mundial como agente qumico (ANDRADE FILHO, 2001). Os carbamatos, por sua vez, so utilizados desde 1947 como inseticidas em funo de

    suas propriedades inibitrias sobre a colinesterase dos insetos (SCHVARTSMAN, 1991). Atualmente, fazem parte da composio dos milhares de produtos existentes no mercado, cerca de 200 diferentes inseticidas dos steres organofosforados e

    aproximadamente 25 steres do cido carbmico (KLAASSEN, 2001).

    Dentre o grupo dos carbamatos os principais representantes so apresentados na

    Tabela 4. Estes inseticidas, quando puros, so slidos, quase sempre de colorao

    branca, muito pouco solveis na gua e solveis na maioria dos solventes

    orgnicos. So estveis em condies normais de armazenamento, porm instveis

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 32

    em temperaturas elevadas e em meio alcalino (OGA, 1996; LARINI, 1993).

    Figura 7. Estrutura bsica dos carbamatos: ster do cido N-metilcarbmico. O substituto R denota a variedade de grupos ligados diretamente.

    Fonte: Klaassen & Watkins III, 2001.

    O aldicarb, cujos principais nomes qumicos so 2-metil-2 (metiltio) propanal-O-(metilamino) carbonil oxima e 2-metil-2-(metiltio) propionaldeide O-(metilcarbamoil) oxime, com cdigo no Chemical Abstracts Substance (CAS) 116-06-3, constitui uma substncia cristalina proveniente do ter isoproplico, com peso molecular

    190,25, frmula bruta C7H14N2O2S, produzido desde 1965, de uso restrito,

    comercializado na forma de grnulos de gesso recobertos ou impregnados com o

    ingrediente ativo com 15% massa/massa (150g do ingrediente ativo/Kg) de aldicarb (figura 1), mais um agente de coeso, sob o nome comercial de TEMIK, indicado como inseticida, acaricida e nematicida sistmico de emprego agropecurio em

    culturas de algodo, batata, cana-de-acar, caf, citros e feijo. Possui alta toxicidade, pertencendo classe toxicolgica I. O seu uso domissanitrio proibido

    por lei. (UNEP/ILO/WHO, 1979; RISHER, 1991; LIMA & SPINELLI, 1997; ARRUDA, 1999; RAGOUCI-SENGLER et al., 2000; ANVISA, 2001; AVENTIS, 2001;

    MICROMEDEX, 2002).

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 33

    Este pesticida de uso exclusivamente agrcola e deve ser aplicado no solo (ILSI, 1995; RAGOUCI-SENGLER et al., 2000; ANVISA, 2001). Apresenta uma persistncia curta no ambiente e se degrada em seus sulfxidos e produtos no

    txicos (RAGOUCI-SENGLER et al., 2000; ANVISA, 2001; AVENTIS, 2001), com elevado poder de inibio da acetilcolinesterase levando a importantes

    manifestaes colinrgicas e do sistema nervoso central (SNC) (CIT/RS, 1999).

    Tabela 4. Inseticidas carbamatos por classe toxicolgica e seu nome comercial.

    CLASSE TOXICOLGICA

    NOME TCNICO

    NOME COMERCIAL

    Aldicarb Temik Oxamyl Vydate-L Carbofuran Furadan Benfuracarb Oncol, Furacon Methomyl Lannate

    Extremamente Txico

    Formetanate Carzol Aminocarb Matacil Dimetilan Snip Fly Bands Dimetan Dimetan Dioxacarb Elocron, Famid Methiocarb Mesurol Propoxur Baygon

    Altamente Txico

    Bendiocarb Ficam Pirimicarb Pirimor Bufencarb Bux MTMC Tsumacide MPMC Meobal Isoprocarb Etrofolan

    Moderadamente Txico

    Carbaryl Sevin

    FONTE: adaptado de MICROMEDEX, 2002.

    O aldicarb tem dois ismeros geomtricos conforme mostrado na Figura 8. O

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 34

    produto comercial uma mistura destes dois ismeros. No conhecido, ainda, qual

    deles o mais ativo (RISHER & CHOUDHURY, 1991).

    Figura 8 Ismeros geomtricos do aldicarb. Fonte: RISHER & CHOUDHURY, 1991.

    2.1 Toxicocintica dos Carbamatos

    A exposio drmica aos carbamatos torna-se crtica quando o organismo se

    encontra em temperatura ambiente elevada. De acordo com alguns estudos

    realizados, alguns carbamatos e seus metablitos tm sido encontrados no leite de

    mes a eles expostas, bem como seus resduos em produtos comestveis, quando

    aplicados como inseticidas em hortifrutigranjeiros (ELLENHORN, 2001; MICROMEDEX, 2002).

    Assim como os organofosforados, os carbamatos so absorvidos por via cutnea,

    oral e respiratria. Contudo, apresentam baixa toxicidade por via drmica

    (excetuando-se o aldicarb que muito txico tanto por via oral quanto por via drmica) (SCHVARTSMAN, 1991). A absoro por via oral ocorre nas intoxicaes

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 35

    agudas acidentais, nas tentativas de suicdio, sendo, assim, a principal via implicada

    nos casos atendidos nos servios de emergncia. As intoxicaes ocupacionais

    ocorrem, geralmente, atravs das vias drmica e respiratria (OGA, 1996; ELLENHORN, 2001).

    O aldicarb prontamente absorvido por via oral, distribudo amplamente pelo

    organismo e rapidamente biotransformado. Seus produtos de biotransformao so

    excretados principalmente na urina (80%) dentro de 24 horas, no havendo armazenamento nos tecidos.

    2.1.1 Biotransformao

    As principais reaes de biotransformao dos carbamatos compreendem: hidrlise;

    hidroxilao do grupamento N-metil, com formao de compostos com menor

    toxicidade; hidroxilao do anel aromtico; N-demetilao, e conjugao com o UDPGA e PAPS, especialmente dos compostos hidroxilados (OGA, 1996; ELLENHORN, 2001).

    Vias metablicas similares tipo monoxigenases FAD-dependentes so utilizadas por

    vrios carbamatos. So rapidamente degradados em oximas, sulfxidos, sulfo e

    acetonitrilas e CO2. O aldicarb, por exemplo, inicialmente oxidado resultando em

    metablitos ativos sulfxido e sulfona. Por hidrlise, resultam em oximas, nitritos,

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 36

    amidos, cidos e lcoois (sem atividade) (Figura 9). Em plantas, o metablito sulfxido 10 a 20 vezes mais ativo como inibidor de colinesterase que o aldicarb

    no metabolizado (UNEP/ILO/WHO, 1979; WATSON, 1992; CIT/RS, 1999; ELLENHORN, 2001).

    Os carbamatos, em sua maioria, no causam sintomatologia exuberante a nvel de

    sistema nervoso central (SNC). Contudo, quando esses sinais se fazem presente, so considerados sinais de gravidade (ELLENHORN, 2001).

    Figura 9 Metabolimo do aldicarb. Fontes: UNEP/ILO/WHO, 1979; WATSON, 1992.

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 37

    2.1.2 Eliminao

    A eliminao dos carbamatos ocorre principalmente pelas fezes e urina. Outra via

    utilizada a biliar. No caso do aldicarb, cerca de 30% excretado pela bile na forma

    conjugada. Atravs desta via de eliminao, ocorre circulao entero-heptica, prolongando a sintomatologia (ELLENHORN, 2001).

    2.2 Toxicodinmica

    2.2.1 Toxicidade e mecanismo de ao txica

    A quantidade necessria, em mg.Kg-1 de peso corpreo, para provocar a morte de

    50% de um lote de animais submetidos experincia que expressa a toxicidade

    aguda de um composto denominada de dose letal mdia, sendo representada por

    DL50 (LARINI 1987). Na literatura, h uma grande variao nos valores da DL50 do aldicarb por via oral em ratos. De acordo com o Registry of Toxic Effects of

    Chemical Substances (RTECS) de Cincinnati, Ohio, este valor de 0,5 mg/Kg. HAYES, em 1982, referiu como DL50 do aldicarb a faixa de 0.6-0.8 mg/kg

    (MICROMEDEX, 2002). A Tabela 4 mostra a dose letal mdia de alguns carbamatos.

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 38

    Tabela 5. Frmula estrutural e valores de DL50 aguda de alguns inseticidas carbamatos.

    DL50 (mg/Kg) em ratos Inseticida Frmula Estrutural Via oral Via

    drmica Carbaril

    500 - 800 5.000

    Propoxur

    80 190 2.000

    Moban

    115 150 2.000

    Carbofuran

    5 13 1.000

    Aldicarb

    0,5 1,2 3 10

    Fonte: Modificado de OGA, 1996.

    A toxicidade dos carbamatos, assim como os organofosforados, decorre dos seus

    efeitos inibitrios sobre a acetilcolinesterase no sistema nervoso, levando ao

    acmulo de acetilcolina nas sinapses e junes mioneurais com consequentes sinais e sintomas muscarnicos, nicotnicos e do SNC. O que os difere dos OF a durao

    e a intensidade de sua ao, uma vez que estes se ligam de uma forma irreversvel

    enzima (OGA, 1996). Os carbamatos, por serem substratos fracos para a colinesterase, ligam-se apenas temporariamente e, aps um perodo de

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 39

    regenerao de aproximadamente trinta minutos, ocorre descarbamilao da enzima

    inibida, a acetilcolinesterase N-metilcarbamilada (THIESEN, 1998). Por este motivo, muitas vezes, no se consegue diagnosticar a exposio a carbamatos atravs da

    dosagem da atividade desta enzima, diferentemente dos organofosforados que

    promovem uma ligao irreversvel (SCHVARTSMAN, 1991; ROSATTI et al., 1995; RAGOUCI-SENGLER et al., 2000; AVENTIS, 2001). Este conceito de que os inseticidas carbamatos so inibidores reversveis da AChE no estritamente

    correto porque implica que o composto seja dissociado da enzima de maneira intacta quando, na realidade, isso no ocorre. Eles se ligam covalentemente ao stio

    estersico da enzima sendo hidrolisados de maneira similar hidrlise da

    acetilcolina (LARINI, 1993).

    A inibio da AChE determina o acmulo de acetilcolina, levando ao surgimento de

    sintomatologia polimorfa e, frequentemente, grave com clicas abdominais,

    nuseas, vmitos, sialorria, lacrimejamento e sudorese excessiva; aumento do peristaltismo intestinal e incontinncia urinria; viso borrada, distrbios da

    acomodao visual e miose puntiforme bilateral; bradicardia; acmulo de secrees

    brnquicas, s vezes com aspecto de edema agudo. Nota-se, tambm, sintomas

    tipo nicotnicos caracterizados por tremores, fasciculaes e espasmos musculares,

    incoordenao dos movimentos, flacidez e paralisia muscular. Ocorrem, ainda,

    cefalia, tontura e, nos casos mais graves, confuso mental, convulses e coma

    (SCHVARTSMAN, 1991). Os carbamatos podem produzir, tambm, outros efeitos

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 40

    bioqumicos como um decrscimo da atividade metablica do fgado, decrscimo na

    sntese cerebral de fosfolipdios, alteraes dos nveis de serotonina no sangue e

    reduo de atividade da glndula tireide (OGA, 1996).

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 41

    3. OBJETIVOS

    3.1 Geral

    Este trabalho visa avaliar a relevncia da dosagem da atividade da colinesterase

    srica no diagnstico das intoxicaes agudas por aldicarb em amostras de sangue

    coletadas nas primeiras vinte e quatro horas aps o acidente.

    3.2 Especficos

    - Conhecer o perfil epidemiolgico das intoxicaes por aldicab registradas no

    Centro de Informaes Antiveneno da Bahia durante o perodo de 1979 a 2001.

    - Avaliar a influncia das variveis sexo, idade, gravidade da intoxicao e

    tempo decorrido da exposio sobre a atividade da colinesterase srica;

    - Determinar o grau de inibio da atividade da colinesterase srica dos

    pacientes atendidos pelo CIAVE-BA no perodo de janeiro de 1999 a dezembro de 2001.

    - Gerar subsdios para uma melhor compreenso e interpretao da atividade

    da butirilcolinesterase nas intoxicaes agudas por aldicarb.

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 42

    4. JUSTIFICATIVA

    Nos ltimos anos, tm-se verificado na Bahia, assim como em outras capitais

    brasileiras, um nmero crescente de intoxicaes por aldicarb, um carbamato de

    elevado poder txico e produzido com fim agrcola. Este produto vem sendo

    comercializado clandestinamente como raticida denominado de chumbinho atravs

    do comrcio informal. De fcil disponibilidade no mercado, o aldicarb est presente

    em muitos lares onde tem provocado acidentes envolvendo crianas, alm de ser

    utilizado por indivduos que objetivam o homicdio ou suicdio.

    A determinao da atividade da BuChE utilizada no diagnstico das intoxicaes

    agudas pelo carbamato, por este motivo, faz-se necessrio conhecer os fatores que

    modificam esta atividade, bem como interpretar corretamente os valores obtidos.

    A ligao dos carbamatos colinesterase srica reversvel, espontnea e de curta

    durao, o que dificulta o diagnstico laboratorial atravs da determinao da

    atividade desta enzima (SCHVARTSMAN, 1991; ROSATTI et al., 1995; RAGOUCI-SENGLER et al., 2000). Entretanto, o autor verificou na prtica que, em alguns casos, possvel diagnosticar a intoxicao mesmo tendo decorrido tempo superior

    a 24 horas.

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 43

    5. METODOLOGIA

    5.1 Mtodos Existentes para Determinao da Atividade da Colinesterase

    Existem vrios mtodos que podem ser utilizados para a determinao da atividade

    da colinesterase do sangue total ou, separadamente, no plasma (ou soro) e nas hemcias. Para a escolha de um mtodo, aspectos importantes devem ser

    observados como a infra-estrutura disponvel, custo, capacitao de pessoal e o

    objetivo das anlises seja a vigilncia epidemiolgica ou ocupacional, o diagnstico em emergncias, etc.

    Para a execuo das anlises, algumas condies devem ser estabelecidas: dentre

    elas, o pH do meio e a temperatura em que o ensaio realizado, pois podem

    influenciar a atividade enzimtica (SILVA, 1996).

    O pH ideal para a atividade da colinesterase plasmtica in vitro se situa na faixa de

    8,0 a 8,5, enquanto que para a eritrocitria varia de 7,5 a 8,0. Possivelmente, para

    valores de pH inferiores aos citados ir ocorrer a protonao dos aminocidos dos

    stios ativos da enzima, com perda de atividade. Desta forma, a maioria dos mtodos

    descritos na literatura para a realizao dos ensaios recomenda a utilizao de

    meios tamponados nestas faixas de pH (SILVA, 1996).

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 44

    As temperaturas acima de 60C provocam desnaturao protica levando perda

    total da atividade enzimtica. A International Federation of Clinical Chemistry

    (IFCC) recomenda a temperatura de 30oC, entretanto, utiliza-se normalmente as temperaturas entre 20oC e 40oC nos mtodos de determinao da atividade de

    colinesterases sangneas. Tabelas com fatores de correo podem ser utilizadas

    em situaes onde no se consegue realizar os ensaios temperatura controlada

    (SILVA, 1996).

    Os mtodos para determinao da atividade das colinesterases sangneas

    baseiam-se na reao in vitro da hidrlise dos steres da colina, a exemplo do que

    ocorre nos organismos vivos, ou seja, determina-se a presena dos produtos de degradao do substrato atravs da utilizao de diferentes recursos laboratoriais.

    Os principais produtos obtidos so: a tiocolina, a colina e o cido actico (SILVA, 1996).

    Vrios mtodos foram propostos para a determinao da atividade de colinesterases

    sangneas desde a dcada de 20, podendo ser divididos em dois tipos:

    - de execuo restrita a laboratrios: so mais elaborados, sensveis e precisos.

    - mtodos de campo: so aqueles que podem ser executados fora do laboratrio.

    Os testes de campo so utilizados, geralmente, com o objetivo de avaliar a exposio de indivduos expostos a pesticidas inibidores da enzima, permitindo,

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 45

    assim, identificar situaes de risco de intoxicao. No caso de se diagnosticar

    estas situaes, os indivduos devem ser submetidos a exames mais precisos e

    exatos em laboratrio (SILVA, 1996).

    Os principais mtodos utilizados so os seguintes:

    5.1.1 Mtodos de campo

    Os mtodos de campo, geralmente, so adaptaes feitas a partir de mtodos de

    execuo em laboratrio, como por exemplo, o espectrofotomtrico. So

    encontrados na forma de kits e so utilizados atravs de aparelhagem porttil.

    Alguns fatores de correo so utilizados nestes mtodos para compensar o banho

    de gua a temperatura constante para realizao da hidrlise (SILVA, 1996). Como exemplo temos o mtodo de Edson, com o comparador colorimtrico de

    Lovibond, o qual tem a vantagem de ser muito prtico, rpido e de poder ser feito em

    condies de campo. Este mtodo tem sido muito utilizado pela Organizao

    Mundial de Sade (OMS) atravs do kit denominado Lovibond Cholinesterase Field kit (Tintometer CO. Ltd., London, U.K.). Este mtodo utiliza um disco contendo uma srie de nove padres, em vidro, de cores similares quelas obtidas pela mistura

    que vai do verde at o laranja (SILVA, 1996; BRASIL, 1997).

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 46

    5.1.2 Mtodos de execuo em laboratrio

    5.1.2.1 Mtodos que detectam a formao de cido

    a. Manomtricos

    Warburg preconizou um dos primeiros mtodos de laboratrio a ser utilizado para a

    dosagem da colinesterase: o manomtrico. Este bastante sensvel, com uma

    preciso da ordem de 1% de coeficiente de variao. A hidrlise dos steres da

    colina, utilizados como substrato, ocorre na presena de um tampo cido

    carbnico-bicarbonato. O cido liberado reage com o on bicarbonato para formar

    cido carbnico, de acordo com as reaes a seguir:

    CH3COOH + NaHCO3 CH3COONa + H2CO3

    H2CO3 CO2 + H2O

    Assim, o CO2 produzido pela dissociao do H2CO3 medido atravs de um

    manmetro. Em virtude de exigir pessoal tcnico e equipamentos especializados

    este mtodo no utilizado atualmente, apesar de ser um mtodo sensvel (SILVA, 1996).

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 47

    b. Potenciomtricos

    Neste mtodo, a atividade da colinesterase medida em funo da variao de pH

    resultante da liberao de cido actico numa soluo, quando a enzima

    presente na amostra (plasma ou eritrcitos) hidrolisa o substrato acetilcolina. Destaca-se aqui o procedimento proposto por MICHEL, no qual os valores de pH

    so determinados atravs de um aparelho medidor de pH, a reao realizada em

    meio tamponado (pH 8,0 para plasma e 8,1 para eritrcitos) e a atividade da enzima expressa em variao de pH por hora (pH/hora). Este mtodo bastante sensvel, tendo a vantagem de poder ser realizado em plasma ou eritrcitos, separadamente

    (SILVA, 1996).

    c. Titulomtricos

    Vrios mtodos colorimtricos tm sido desenvolvidos nos quais se utiliza

    indicadores de pH para a medida da atividade da enzima (MACQUEEN, 1973). Os mtodos titulomtricos para determinao da atividade de colinesterases

    sangneas baseiam-se na titulao do cido liberado na hidrlise do ster da colina

    com uma base padronizada (KAPLAN, 1992; SILVA, 1996).

    Dentre eles, o mtodo mais conhecido o descrito por NABB & WHITFIELD, que

    pode ser realizado tanto em eritrcitos como em plasma.

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 48

    KAMARIC & OMANS utilizaram metodologia semelhante na determinao da

    atividade da butirilcolinesterase em plasma e fgado de ratos, titulando-se o cido

    propinico e utilizando a propionilcolina como substrato (SILVA, 1996).

    d. Espectrofotomtricos

    BIGGS e cols. desenvolveram um mtodo onde preconizam o azul de bromotimol

    (indicador de pH) como agente cromognico. O corante sofre mudana de cor na presena do cido actico e a sua intensidade depende da maior ou menor

    quantidade de cido, fornecendo diferenas na absorvncia lida em 620 nm. Este

    mtodo foi proposto para sangue total e plasma e apresenta a vantagem de no

    sofrer interferncia da banda de absoro da hemoglobina (SILVA, 1996).

    Um outro indicador de pH foi utilizado por CARAWAY na medida da atividade

    enzimtica em soro, o vermelho de fenol. O princpio o mesmo do mtodo

    descrito anteriormente, ou seja, quanto maior a atividade da enzima, maior ser a quantidade de cido formado e mais intensa ser a mudana de cor do indicador,

    resultando um menor valor de absorbncia registrado (SILVA, 1996).

    5.1.2.2 Mtodos que detectam a formao de colina

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 49

    a. Espectrofotomtricos

    Um dos mtodos espectrofotomtricos muito utilizado tem como princpio a liberao

    de colina atravs da hidrlise da acetilcolina, sendo oxidada pela colina oxidase,

    havendo formao de perxido de hidrognio. Este, interage com a enzima

    peroxidase, formando um composto rseo, na presena de fenol e 4-aminoantipirina,

    que absorve em 500 nm. Diversos autores j utilizaram mtodos baseados neste fundamento, com diversos objetivos. o caso de FAYE & EVANS que utilizaram uma metodologia semelhante para determinao da enzima no soro humano,

    utilizando a succinildicolina como substrato, objetivando determinar idiossincrasias decorrentes das variantes genticas. Acredita-se que este substrato, a exemplo da

    succinilcolina, no seja hidrolisado pelas variantes enzimticas (SILVA, 1996).

    5.1.2.3 Mtodos que detectam a formao de tiocolina

    a. Fluorimtricos

    Outro mtodo tambm utilizado na determinao da atividade de colinesterases a

    fluorimetria. Estes mtodos se baseiam ou na hidrlise de substratos fluorescentes,

    formando produtos no fluorescentes, ou vice-versa (SILVA, 1996).

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 50

    Um mtodo onde a tiocolina liberada na hidrlise do substrato reage com uma

    maleimida fluorognica, gerando um composto de intensa fluorescncia azul foi

    descrito por PARVARI e col. (SILVA, 1996).

    b. Espectrofotomtricos

    O mtodo mais utilizado atualmente em laboratrios de Toxicologia o

    espectrofotomtrico proposto por ELLMAN e colaboradores com suas diversas

    modificaes, tendo como princpio a hidrlise de um substrato ster da tiocolina

    (como a acetiltiocolina) pela enzima presente nos eritrcitos, ou no plasma, com a consequente liberao de tiocolina. Esta, ao reagir com o cido 5,5-ditiobis-2-

    nitrobenzico (DTNB), produz um composto colorido que absorve luz em 412 nm. Consiste num mtodo rpido e sensvel, que pode ser realizado com segurana nas

    fraes do sangue (SILVA, 1996).

    Diversas adaptaes foram propostas para o mtodo de ELLMAN e colaboradores

    em relao concentrao e tipos diferentes de substratos (como a butiriltiocolina ou propioniltiocolina, por exemplo), adaptaes do mtodo para uso no campo, determinao em meio de temperatura controlada e ao tipo de tampo. A utilizao

    da propioniltiocolina como substrato foi proposta em decorrncia desta ser

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 51

    hidrolisada com a mesma intensidade tanto pela enzima plasmtica quanto

    eritrocitria (SILVA, 1996).

    A Association Official Analytical Chemistry (AOAC) recomenda como mtodo de referncia o de ELLMAN e colaboradores com modificao proposta por HARLIN &

    ROSS, onde efetuaram alteraes referentes diluio da amostra e concentrao

    de DTNB adicionada ao ensaio (SILVA, 1996). Observaram, ainda, que quando a temperatura se situa entre 22,0C e 25,5C, a diferena entre os resultados

    insignificante.

    O mtodo descrito por Ellman o mtodo mais recomendvel devido facilidade de

    adaptao maioria dos espectrofotmetros de laboratrio (KAPLAN, 1992). Este mtodo, assim como as suas subseqentes adaptaes sugeridas, apresenta uma

    relao direta entre atividade enzimtica e a leitura espectrofotomtrica, ou seja, o aumento da absorvncia diretamente proporcional a atividade da enzima, de

    acordo com a lei de Lambert-Beer (SILVA, 1996).

    Este mtodo pode ser utilizado tanto para a dosagem da atividade da AChE quanto

    da BuChE. Para a determinao atividade da acetilcolinesterase, aps a

    centrifugao da amostra e posterior descarte do sobrenadante, as membranas dos

    eritrcitos existentes no precipitado so ressuspensas em tampo de lise, cujo processo repetido por duas vezes. O precipitado final suspenso em 0,5mL de

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 52

    soluo tampo de fosfato 0,12M, pH 7,6 (tampo de anlise). A finalidade deste processo eliminar toda a hemoglobina presente nas hemcias. A partir da o

    procedimento o mesmo dado para a determinao da atividade da

    butirilcolinesterase, exceto que se recomenda a acetiltiocolina ao invs da

    propioniltiocolina ou butiriltiocolina (OLIVEIRA-SILVA, 2001).

    A automao destes mtodos tem sido descrita na literatura, onde equipamentos

    como o analisador COBAS-Bio foram utilizados (LEWIS et al, 1981; RATNAIKE et al, 1987).

    5.2 Amostragem

    Este estudo foi realizado a partir das fichas de atendimento (Anexo 2) de casos de Intoxicao ocorridos na Bahia, no perodo de janeiro de 1999 a dezembro de 2001, pelo Centro de Informaes Antiveneno (CIAVE), centro de referncia em intoxicaes da Secretaria da Sade do Estado da Bahia.

    Foram utilizadas na anlise as informaes de 339 casos de intoxicao por aldicarb

    do total de 384 casos registrados. Os 45 casos restantes foram excludos por no ter

    sido confirmada a utilizao do aldicarb, no terem resultados da dosagem da

    atividade da BuChE e no constar data e/ou horrio de coleta da amostra de

    sangue. Entre os excludos pela no confirmao do uso do produto, as suas

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 53

    respectivas fichas no tinham relato do nome ou descrio do mesmo pelo paciente

    ou familiares, havendo apenas a suspeita diagnstica.

    As variveis trabalhadas foram sexo, idade do paciente, circunstncia (causa), gravidade do quadro clnico, tempo decorrido entre o acidente e a coleta de sangue

    para o exame laboratorial e a dosagem da atividade da colinesterase srica. Os

    valores da dosagem da atividade enzimtica foi obtida a partir do livro de registro de

    anlises do Laboratrio de Toxicologia de Urgncia do CIAVE.

    5.3 Coleta, Preparao e Armazenamento das Amostras Biolgicas

    As amostras de sangue foram coletadas com seringa plstica descartvel e

    acondicionadas em tubos secos (sem anticoagulante). Aps a coagulao, as amostras foram centrifugadas a 2.000 rpm por 10 minutos e o soro foi separado.

    Quando da impossibilidade de execuo da anlise de imediato, este era

    armazenado em refrigerador at o momento da dosagem.

    5.4 Procedimentos Analticos

    As dosagens foram feitas em soro atravs do kit comercial marca DOLES (2001), mtodo colorimtrico, baseado no mtodo de Ellman modificado por Dietz

    (MACQUEEN, 1973), que utiliza como amostra o soro ou plasma (utilizando-se

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 54

    EDTA ou heparina como anticoagulante). A reao est descrita na figura 10.

    ChE

    1. C2H5-C-S-C-H2CH2N(CH3)3 + H2O C2H5-COOH + HS-CH2CH2-N+(CH3)3 propioniltiocolina cido propinico tiocolina

    Figura 10. Reaes que ocorrem na dosagem da BuChE atravs do mtodo de Ellman. Fonte: KAPLAN, 1992.

    Emprega-se como substrato o iodeto de propioniltiocolina (produz uma atividade 27% maior que o iodeto de butiriltiocolina a 37C e d leituras inferiores nos

    brancos). O uso deste substrato facilita a discriminao entre alguns fentipos comuns de colinesterase. Tm-se registro de variao entre corridas de 3%. O

    reagente de cor o 5,5-ditiobis-(cido 2-nitrobenzico), o DNTB, em tampo fosfato pH 7,6 (KAPLAN, 1992). O cido 5-tio-2-nitrobenzico resultante da reao consiste num composto amarelo (figura 11), de absoro mxima a 410nm (KAPLAN, 1992), estvel por 15 minutos, temperatura ambiente (20-30C) (SILVA, 1996). O DNTB fotossensvel, conforme foi demonstrado atravs de experimento citado por

    WALMSLEY e colaboradores, onde o comprimento de onda de luz que produziu a

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 55

    taxa mxima de mudana de absorbncia coincidiu com o pico de absorbncia do

    DNTB, e este foi bem separado do pico do tionitrobenzoato.

    Figura 11. Curva de padres de butirilcolinesterase com concentraes respectivas de 0 (branco) UI/mL; 3,5 UI/mL; 7,0 UI/mL; 10,5 UI/mL; e, 14,0 UI/mL. Fonte: foto do autor.

    O clculo da atividade da colinesterase pode ser feito atravs da frmula:

    Sendo, At a absorbncia do teste, Ap a absorbncia do padro e 7 (U.I. / mL) a sua

    concentrao.

    Por questo de praticidade, utiliza-se um fator de calibrao no clculo da

    colinesterase. Este fator determinado na abertura de cada kit atravs de padro

    Foto: Jucelino Filho

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 56

    no intervalo de linearidade da metodologia adotada (a reao linear at 14 U.I./mL).

    Clculo do Fator:

    Concentrao do Padro Fator (F) = --------------------------------- Onde, P(mdia) = mdia das leituras do padro absorbncia P(mdia) (feito em triplicata).

    Desta forma, calcula-se:

    Colinesterase (U.I./mL) = T x Fator (F) Onde, T = absorbncia do teste.

    O resultado expresso de acordo com o Sistema Internacional (S.I.), ou seja, em Unidade Internacional por mililitro (U.I./mL), onde uma U.I. de colinesterase a

    quantidade de enzima que hidrolisa um mol de substrato/minuto/mL de soro numa

    temperatura de 37C.

    Os valores de referncia deste mtodo so diferenciados, de acordo com o sexo:

    - sexo feminino: 5,0 10,5 U.I./mL

    - sexo masculino: 6,1 12,1 U.I./mL

    A presente metodologia especfica para a determinao da colinesterase e o seu

    limite de deteco de 0,4 U.I./mL de colinesterase a 410 nm. As dosagens foram

    realizadas em espectrofotmetro digital marca Coleman, modelo 35D (figura 12).

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 57

    Figura 12. Espectrofotmetro digital marca Coleman, modelo 35D, faixa espectral de 335 a 850 nm, utilizado pelo Laboratrio de Toxicologia do CIAVE-Ba.

    5.5 Anlise Estatstica

    A anlise estatstica foi realizada atravs do programa Statistical Package for Social

    Sciences (SPSS), verso 9.0 para Windows. Os dados estatsticos descritivos incluram: anlise univariada; cruzamentos entre as variveis com o objetivo de observar relao de dependncia, atravs do qui quadrado; teste de Anova (anlise de varincia) para se observar igualdade de mdia da atividade enzimtica; teste t de student; e, correlao de Pearson, utilizada para verificar a relao entre as

    variveis idade, tempo decorrido e atividade enzimtica. O intervalo de confiana

    para a mdia das variveis sexo, tempo decorrido e atividade da colinesterase foi

    calculado atravs da frmula abaixo para 0,5% de confiana.

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 58

    Para o coeficiente da correlao de Pearson, calculou-se atravs da frmula:

    Utilizou-se o modelo de regresso com o objetivo de obter uma equao que se adequasse relao entre o tempo decorrido da exposio coleta do material

    biolgico para anlise e a atividade enzimtica, de forma que se pudesse estimar o

    grau de inibio da colinesterase srica em funo do tempo. O modelo que mais se

    adequou foi o cbico, com teste para os coeficientes com significncia de 5%.

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 59

    6. RESULTADOS E DISCUSSO

    No perodo de janeiro de 1999 a dezembro de 2001, o Laboratrio de Toxicologia de Urgncia do CIAVE realizou dosagens de atividade da colinesterase srica

    referentes a 899 casos de intoxicao aguda. Destes, 384 foram decorrentes da

    ingesto de aldicarb, pesticida de uso agropecurio comercializado ilegalmente

    como raticida, sendo esta a amostragem inicial do estudo. Destes casos, quarenta e

    cinco foram excludos por no disporem de dados referentes hora do acidente e/ou

    ao tempo decorrido entre a ocorrncia da ingesto e a coleta da amostra de sangue

    para o diagnstico laboratorial da intoxicao. A amostra estudada constituda de

    339 pacientes (Tabela 6 e Anexo I).

    Tabela 6. Atividade enzimtica da colinesterase srica e sexo dos pacientes intoxicados por aldicarb atendidos pelo CIAVE-Ba, 1999-2001.

    Atividade Enzimtica

    SEXO Total Feminino Masculino

    ALTERADA n 151 106 257 % 58,8 41,2 100,0

    NORMAL n 54 28 82 % 65,9 34,1 100,0

    Total n 205 134 339

    % 60,5 39,5 100,0

    (p=0,252 : independente)

    Dos 339 pacientes estudados, 205 foram do sexo feminino e 134 do sexo masculino,

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 60

    como indicado na Tabela 6.

    A Tabela 7 apresenta a gravidade da intoxicao distribuda por sexo, onde 41,6%

    tiveram intoxicao moderada e 33% foram moderada. Os nmeros aqui observados

    ratificam a literatura quanto a toxicidade do aldicarb. No foram observadas

    diferenas significativas (p=0,576) da gravidade do quadro clnico entre homens e mulheres.

    Tabela 7. Gravidade da intoxicao nos 339 pacientes atendidos pelo CIAVE (1997-2001) distribudos de acordo com o sexo.

    Sexo GRAVIDADE DA INTOXICAO Total Leve Moderada Grave

    Feminino n 56 84 65 205 % 27,3 41,0 31,7 100,0

    Masculino n 30 57 47 134 % 22,4 42,5 35,1 100,0

    Total n 86 141 112 339

    % 25,4 41,6 33,0 100,0

    (teste t student, p=0,576).

    As faixas etrias com maior ocorrncia foram entre 10 a 20 anos (41,0%) e entre 20 a 30 anos (25,7%). A idade mdia encontrada foi 22,3 anos com intervalo de 20,7 e 23,9 anos, com nvel de 95% de confiana. Metade (50,2%) dos pacientes do sexo feminino tinham entre 10 a 20 anos de idade.

    A anlise estatstica no mostrou significncia entre o sexo do paciente e a inibio

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 61

    da atividade enzimtica, onde encontrou-se p=0,252 (Tabela 6).

    Pelo coeficiente de correlao de Pearson (Tabela 8), observa-se que no existe correlao, com significncia de 1%, entre a idade do indivduo e tempo decorrido da

    exposio. A idade mostrou-se correlacionada negativamente com a atividade da

    BuChE, ou seja, quanto maior a idade menor a atividade, considerando-se uma significncia de 5%. A maior significncia para a correlao foi entre o tempo

    decorrido da exposio e a atividade da BuChE. Isto representa que, quanto maior

    for o tempo decorrido, maior ser a atividade enzimtica.

    Tabela 8. Coeficientes de correlao de Pearson entre as variveis idade, tempo decorrido e atividade da BuChE.

    Idade Tempo decorrido

    Atividadeda BuChE

    Idade 1,000 0,007* -0,123**

    Tempo decorrido 0,007 1,000 0,396

    * A Correlao significativa, p=0,05. ** A Correlao significativa, p=0,01.

    Foi observado uma relao significativa (p

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 62

    Tabela 9. Causas das 339 intoxicaes atendidas pelo CIAVE-Ba.

    SEXO CAUSA

    Acidente Homicdio

    Ignorado Tentativa de

    suicdio TOTAL

    Feminino n 13 2 3 187 205

    % 6,3 1,0 1,5 91,2 100,0

    Masculino n 29 3 9 93 134

    % 21,6 2,2 6,7 69,4 100,0

    Total n 42 5 12 280 339% 12,4 1,5 3,5 82,6 100,0

    (p

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 63

    etria e a evoluo da intoxicao (Tabela 11).

    Tabela 11. Evoluo do quadro clnico e faixa etria dos pacientes.

    Evoluo Faixa etaria Total Ate 10 >10 a 20 >20 a 30 >30 a 40 >40 IGN

    Cura 32 136 84 48 3 26 329 9,7% 41,3% 25,5% 14,6% 0,9% 7,9% 100,0%

    bito 1 2 1 - - 2 6 16,7% 33,3% 16,7% - - 33,3% 100,0%

    Ignorado - 1 2 - - 1 4 - 25,0% 50,0% - - 25,0% 100,0%

    Total 33 139 87 48 3 29 339 9,7% 41,0% 25,7% 14,2% 0,9% 8,6% 100,0%

    (p=0,492 independente)

    Quanto associao entre a faixa etria e o grau de inibio da atividade da BuChE,

    no se observou significncia estatstica entre estas variveis (Tabela 12).

    Tabela 12. Alterao da atividade enzimtica e faixa etria dos pacientes.

    Atividade enzimtica Faixa etria

    Total

    Ate 10 >10 a 20 >20 a 30 >30 a 40 >40 IGN

    ALTERADA 20 110 64 39 2 22 2577,8% 42,8% 24,9% 15,2% 0,8% 8,6% 100,0%

    NORMAL 13 29 23 9 1 7 8215,9% 35,4% 28,0% 11,0% 1,2% 8,5% 100,0%

    Total 33 139 87 48 3 29 3399,7% 41,0% 25,7% 14,2% 0,9% 8,6% 100,0%

    (p=0,292 independente)

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 64

    Em duzentos e cinquenta e cinco pacientes, realizou-se apenas uma dosagem da

    atividade da butirilcolinesterase, enquanto que em 77 dos pacientes foram

    realizadas duas determinaes e 03 dosagens foram feitas para apenas sete

    pacientes, conforme mostrado na tabela 13.

    Tabela 13. N de determinaes laboratoriais da atividade da BuChE. Realizadas nos pacientes intoxicados por aldicarb e atendidos pelo CIAVE-BA no perodo de 1999 a 2001.

    CASOS N de determinaes de BuChE

    n % 1 255 75,2 2 77 22,7

    3 7 2,1 TOTAL 339 100,0

    Fonte: CIAVE

    Nveis anormais de BuChE foram apresentados por 257 pacientes (75,8%) (Tabela 12). A mdia dos valores da atividade da butirilcolinesterase nas primeiras dosagens foi de 3,1 UI/mL, com uma faixa de variao de < 0,4 a 13,4 UI/mL. A distribuio

    dos casos de acordo com a atividade enzimtica encontrada e a gravidade da

    intoxicao esto representadas na Figura 14 e na Tabela 14, respectivamente. A

    maioria dos pacientes (52,5%) apresentaram nveis de atividade da colinesterase srica na faixa entre 0 a 2 UI/mL. Por sua vez, a faixa compreendida de 2 a 4

    U.I./mL apresentou um percentual de 12,7 dos pacientes avaliados. Cinquenta e trs

    pacientes (15,6%) apresentaram nveis de colinesterase entre 4 a 6 U.I./mL. 19,2% tiveram resultados superiores a 6 U.I./mL.

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 65

    Tabela 14. Correlao dos nveis de BuChE e a gravidade do quadro em pacientes com dosagens alteradas.

    GRAVIDADE DO CASO LEVE MODERADO GRAVE

    TOTAL Atividade da

    BuChE (UI/mL)

    n % n % n % n % 0 | 2 32 37,2 72 51,1 74 66,1 178 52,5 2 | 4 14 16,3 19 13,5 10 8,9 43 12,7 4 | 6 15 17,4 24 17,0 14 12,5 53 15,6 6 | 8 14 16,3 13 9,2 8 7,1 35 10,3 8 | 10 9 10,5 8 5,7 3 2,7 20 5,9 10 | 12 1 1,2 2 1,4 1 0,9 4 1,2 12 | 14 1 1,2 3 2,1 2 1,8 6 1,8 TOTAL 86 25,4 141 41,6 112 33,0 339 100,0

    Fonte: CIAVE

    Os casos de intoxicao, quanto gravidade, foram: a) leves, com uma frequncia de 25,4% do total de pacientes; b) moderados, com 41,6%; e, c) graves, que corresponderam a 33,0% do total de pacientes analisados. 75,0% dos casos graves

    apresentaram valores de atividade da BuChE srica entre 0 a 4 U.I./mL. A Tabela 14

    mostra que 46 pacientes com quadro leve de intoxicao apresentaram atividade

    enzimtica entre 0 a 4 U.I./mL, correspondendo a 53,5% dos casos compreendidos

    nesta faixa.

    Atravs da anlise dos resultados e a mdia dos valores de atividade enzimtica,

    verifica-se que h uma relao inversa entre a gravidade da intoxicao e a

    atividade da colinesterase srica, com diferena estatstica significante (p=0,001). Isto pode ser demonstrado atravs do teste de Anova na figura 13.

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 66

    Figura 13. A gravidade da intoxicao apresenta relao inversa com a atividade da BuChE. Quanto menor a atividade enzimtica, maior a gravidade. A disperso (rea em vermelho) est correlacionada inversa- mente com a gravidade, isto , uma maior gravidade representa uma menor disperso da atividade enzimtica.

    Dentre as referncias consultadas, apenas a publicao da OMS/OPAS (1991) refere existir uma boa relao dos efeitos colinrgicos agudos na intoxicao grave

    com o grau de inibio da colinesterase no soro, alm da existente nos glbulos

    vermelhos. Contudo, ressalta que, na exposio prolongada, esta associao deixa

    de existir.

    Os primeiros valores medidos da atividade da BuChE aps a ingesto do aldicarb

    (mdia de 14,1 horas; faixa de 0,4-13,1 UI/mL) em 65,4% dos pacientes do sexo

  • Jucelino Nery da Conceio Filho 67

    feminino apresentaram valores inferiores a 80% dos valores normais (5,0 -10,5 UI/mL). O sexo masculino (mdia de 15,1 horas; faixa de 0,4 -13,4 UI/mL), por sua vez, correspondeu a 65,2% dos pacientes com mais de 80% de inibio em relao

    aos valores de referncia (6,1-12,1 UI/mL).

    0

    20

    40

    60

    80

    100

    120

    140

    160

    180

    0 |-- 2 2 |-- 4 4 |-- 6 6 |-- 8 8 |--10 10 |--12 12 |--14

    Concentrao (U.I./mL)

    n

    Figura 14. Concentraes da atividade de BuChE de 339 pacientes atendidos pelo CIAVE-BA durante o perodo de 1999 a 2001.

    Treze pacientes (4,