autora: rosilene varotto¹ - diaadiaeducacao.pr.gov.br · uma atividade ampla que envolve...
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O mundo encantado das fábulas, leitura semiótica e intertextualidade na sala de aula
Autora: Rosilene Varotto¹
Orientadora: Suely Leite ²
RESUMO
O presente trabalho visa proporcionar ao aluno a leitura prazerosa e releitura crítica
do gênero fábula, misturando o linguístico, o textual e o conhecimento de mundo
para construir o sentido do texto. Dessa forma, o estudo da narrativa fabulística
ocorrerá em um contexto significativo, o que possibilita que os alunos desenvolvam
a leitura e a escrita de textos com intenção de ensinar, aconselhar, convencer,
divertir ou criticar, reconhecendo a importância da literatura infantil e a eficácia do
gênero fábulas na perspectiva da Semiótica Discursiva como estratégia de leitura.
Ao se trabalhar a fábula pelo viés da semiótica, é possível perceber informações
para buscar e analisar elementos escondidos nas profundezas textuais procurando
um amplo entendimento da funcionalidade do texto e suas intenções. Sendo assim,
o objeto de estudo da semiótica é o texto, entendido por dois pontos de vista
complementares: como um objeto de significação, com mecanismos sintáticos e
semânticos, que respondem pela produção de sentido; e como um objeto cultural de
comunicação, criado num determinado contexto e que dialoga com outros textos.
Trata-se de uma maneira pessoal de interpretar o valor do processo de
aprendizagem.
Palavras-chave: Leitura; Fábulas; Semiótica ______________________________ ¹ Especialização em Língua Portuguesa(FAFINJA/1988) ;Graduada em Letras Anglo-Portuguesas(CIPPEX,2008);Colégio Estadual Ary Borba Carneiro-Ensino Fundamental e Médio; Cargo: Professora, Disciplina: Língua Portuguesa. ² Doutora em Letras pela Universidade Estadual de Londrina.
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ABSTRACT
The present work aims to provide to the pupil the pleasant reading and critical
rereading of the gender fable, mixing the language, the textual and world knowledge
to construct the meaning of the text. This form, the study of the fabulistica narrative it
will occur in a significant context, what it makes possible that the pupils develop the
reading and the writing of texts with intention to teach, advise, convince, amuse or
criticize. Recognizing the importance of children's literature and the effectiveness of
the gender perspective in the fables of Semiotics Discourse as a strategy for reading.
When working the fable by the bias of semiotics, it is possible to perceive and
analyze information to find hidden depths textual elements seeking a broad
understanding of the functionality of the text and intentions. Thus, the object of
semiotics is the study of the text, understood by two complementary viewpoints: as
an object of meaning, syntactic and semantic mechanisms that are responsible for
the production of meaning, and as a cultural communication, created a given context
and in dialogue with other texts. This is a personal way of interpreting the value of the
learning process and use evidenced by reading.
Key-words: Reading; Fables; Semiotics 1 Introdução
A leitura é mais que o simples ato mecânico de tentar entender um conjunto
de letras que formam palavras, frases, orações, períodos, textos, livros e obras. É
uma atividade ampla que envolve capacidade de ler a semiótica do texto, que por
sua vez procura descrever e explicar o que o texto diz e como ele faz para dizer o
que diz. É através deste ato de ler que a imaginação e a criatividade desenvolvem
formas e permitem organizar textos e produzir mensagens tão ou mais
comunicativas que aquelas que foram lidas.
A semiótica estuda toda e qualquer linguagem, tendo por foco a produção e a
apreensão de sentido. Com isso, não pretende indicar o sentido, mas analisar como
ele emerge num campo de relações e em diferentes contextos sociais.
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Semioticamente o sentido não está pronto, ele precisa ser construído a partir das
marcas presentes no texto. Sendo assim, o objeto de estudo da semiótica é o texto,
entendido por dois pontos de vista complementares: como um objeto de significação,
com mecanismos sintáticos e semânticos, que respondem pela produção de sentido;
e como um objeto cultural de comunicação, criado num determinado contexto e que
dialoga com outros textos. Trata-se de uma maneira pessoal de interpretar o valor
do processo de aprendizagem e aproveitamento evidenciado pela leitura.
Por meio de textos fabulares de Esopo, Fedro, La Fontaine, Monteiro Lobato,
Millôr Fernandes e Paulo Paes e outros autores que constituem referência para o
estudo das fábulas. Essa diversidade entre autores de diferentes épocas permite
perceber que tal texto apresenta elementos regulares e ainda que nos textos
modernos haja a subversão em relação a valores considerados sólidos, a
construção discursiva apresenta um padrão.
Portanto, a leitura não é um processo linear que se desenvolve palavra por
palavra, mas sim um processo de interação entre leitor e texto. Leitura implica uma
interação entre o conhecimento prévio do leitor e os dados fornecidos pelo texto. A
compreensão de um texto somente é possível se o leitor possuir previamente
conhecimentos dos quais possa partilhar com o autor para processar as
informações.
Como diz Maria Izabel Cattani,(1992), em seu projeto de pesquisa envolvendo
a literatura infantil e a leitura na escola analisando a situação da leitura nas
propostas curriculares para o ensino de 1º grau leva-nos a uma reflexão mais ampla
sobre o papel da escola na formação da infância e a atividade do professor deve,
assim, orientar-se no sentido de promover a leitura entre alunos.A importância do
ato de ler a as proposições de trabalho sugeridas permitem-nos afirmar que a leitura
é pensada num processo total de percepção e interpretação dos sinais gráficos e
das relações de sentido que os mesmos guardam entre si.
Ler é, então, não é apenas decodificar palavras, mas concretar-se num processo compreensivo que deve chegar às ideias centrais, à influências, à descobertas dos pormenores, à conclusões. O ato de ler não objetiva apenas extrair significados do texto, pois esse significado muitas vezes não estão isoladamente somente. Ler é um ato inteligente e o leitor deve preencher as lacunas do texto.(CATTANI, 1992,p.26)
Trata-se, portanto, segundo essa autora, de um ato de profundidade em que o
conhecimento se sobrepõe ao entretenimento e alcança resultados mais eficientes
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no sentido de comunicar com qualidade, desde que se considere a interpretação do
que se lê.
É importante se levar em conta também os aspectos que envolvem a boa
coordenação de ideias e conhecimentos exposta por quem escreve. Não é possível
interpretar e aprender quando o sentido do que se escreve é disperso ou não se
encontra à altura do desenvolvimento intelectual ou cultural do leitor.
Refletindo sobre as colocações da autora Ângela Kleiman (2000), autora de
numerosos trabalhos sobre letramento, leitura e alfabetização de adultos,
percebemos algumas considerações sobre à importância da leitura e da formação
do leitor:
A compreensão de um texto é um processo que se caracteriza pela utilização de conhecimento prévio: o leitor utiliza na leitura o que ele já sabe, o conhecimento adquirido ao longo de sua vida. É mediante a interação de diversos níveis de conhecimento, como o conhecimento linguístico, o textual,o conhecimento de mundo,como o leitor consegue construir o sentido do texto. (KLEIMAN, 2000,p.20)
É preciso que escritor e leitor se integrem; o primeiro enviando mensagem e o
segundo captando-a ao ler. Só assim a leitura alcançará seu valor maior, que é o de
comunicar propagando conhecimentos.
Precisamos impulsionar o leitor a uma postura crítica perante a realidade e
oportunizar através da leitura a transformação da sua própria experiência de vida.
Para cumprir esse propósito, torna-se indispensável à organização do trabalho
escolar desde as séries iniciais, no intuito de fomentar no aluno, a capacidade de
compreensão do texto, identificar as ideias principais, inferir, problematizar, formular
hipóteses, reagir criticamente e confrontar argumentos. A falta desta organização
escolar acarreta prejuízo no desenvolvimento na formação do leitor crítico, pois este,
não adquire habilidades de compreensão e interpretação de texto, sendo assim,
torna-se um leitor que lê razoavelmente bem, mas não compreende o que leu. Tais
dificuldades de compreensão se estendem às demais disciplinas do currículo da
escola, ocasionando o fracasso escolar.
Nesse sentido argumenta Cagliari (1994, p.148):
A atividade fundamental desenvolvida pela escola para a formação dos alunos é a leitura. É muito mais saber ler do que saber escrever. O melhor que a escola pode oferecer aos alunos deve estar voltado para leitura. Se um aluno não se sair muito bem nas outras atividades, mas for um bom leitor, penso que a escola cumpriu em grande parte sua tarefa.
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Ler é um processo dinâmico no qual leitor e autor interagem mediados pelo
texto. Quando alguém lê, tem a possibilidade de inferir dados e situações, refletindo
após o ato de ler. Se a leitura é uma interação, precisamos identificar, na sala de
aula,a finalidade da leitura.Conhecendo esta finalidade poderemos entender a sua
importância, a sua necessidade, para que ela deixe de ser trabalhada como ato
mecânico sem sentido, sem objetivo.
Reconhecer a importância da literatura infantil e incentivar a formação do
hábito de leitura na idade em que todos os hábitos se formam, isto é, na infância, é
proposta deste trabalho, enfatizando o gênero literário fábulas, intitulado “O mundo
encantado das fábulas leitura semiótica e intertextualidade na sala de aula”. No
contexto educacional, sabemos da importância que as atividades lúdicas têm para o
desenvolvimento da criança. São frequentes os estudos que comprovam a
necessidade e os benefícios que os jogos, as brincadeiras e a literatura infantil têm
para a ampliação do imaginário do aluno/leitor. A literatura infantil é considerada
uma ferramenta poderosa para o aprendizado de conteúdos e comportamentos
socialmente valorizados, pois permite que as crianças vivenciem situações e
problemas, e assim possam interagir e superar situações consideradas difíceis.
Desse modo, a literatura infantil serve como objeto de formação da mentalidade das
crianças, no intuito de reafirmar valores e normas que assegurariam a formação de
indivíduos. Desde cedo, é preciso formar um leitor que tenha o envolvimento integral
com aquilo que lê, mas para isso, é preciso ajudá-lo a sentir liberdade e prazer ao
estar lendo.
2 Fundamentação Teórica
Os procedimentos utilizados na construção das bases necessárias para a
formação de leitores que se deseja, instrumentalizados para o efetivo exercício da
cidadania são as estratégias de leitura aplicadas nesta pesquisa, a partir de
narrativas curtas. Mas como tornar-se um leitor crítico se há falta de domínio e de
compreensão da língua e desse problema nascem inúmeros outros muitos deles
relacionados à leitura. Por isso, o professor procura como solução para o problema o
aperfeiçoamento dos métodos existentes, não percebendo que a leitura possui outra
natureza.
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A escola busca conhecer e desenvolver na criança as competências da leitura
e da escrita e como a literatura infantil pode influenciar de maneira positiva nesse
processo. Por ser um instrumento motivador e desafiador, a literatura infantil,
segundo Bakhtin (1992) é capaz de transformar o indivíduo em um sujeito ativo,
responsável pela sua aprendizagem, que sabe compreender o contexto em que vive
e modificá-lo de acordo com a sua necessidade.
Assim, pode-se considerar o ato de ler como um modo de interrogar a escrita,
por questionamentos, pela exploração dos textos, tendo, como resultado, a
formação do indivíduo, ao trazer, para seu universo, possibilidades de sentidos que
desafiam suas verdades, desestabilizando-o e o levando a se reestruturar.
Kleiman apresenta a leitura inserida no contexto social:
Quanto à concepção de leitura pressuposta nesse livro, consideramos esta uma prática social que remete a outros textos e outras leituras. Em outras palavras, ao lermos um texto, qualquer texto, colocamos em ação todo o nosso sistema de valores, crenças e atitudes que refletem o grupo social em que se deu nossa sociabilização primária, isto é, o grupo social em que fomos criados. (1998, p.10)
Embora tenha exposto a leitura como uma prática social, a autora vê
algumas causas, surgidas na escola, da desmotivação e desinteresse do aluno pela
leitura: a concepção sobre o texto, sobre a leitura e sobre o método.
Para ensinar a gostar de ler, é necessário mais do que inspiração, é preciso
transmitir paixão e amor pela leitura. Para isso, o professor precisa utilizar métodos
estimuladores associando a leitura ao prazer. A escolha do texto e sua relação com
outras linguagens e outros textos parece ser um caminho possível. O uso de música,
teatro, poesias, fábulas, histórias em quadrinhos, panfletos, noticiário de rádio ou
televisão, roda de leitura, questionários, propaganda, desenho, discussão e
parlendas, constituem-se em diferentes atividades que podem ser exploradas para a
formação do leitor.
Conforme é mencionado nas DCEs/LP:
Ler é familiarizar-se com diferentes textos produzidos em diversas esferas sociais - jornalística, artística, judiciária, científica, didático-pedagógica, cotidiana, midiática, literária, publicitária, etc. No processo de leitura, também é preciso considerar as linguagens não-verbais. A leitura de imagens, como: fotos, cartazes, propagandas, imagens digitais e virtuais, figuras que povoam com intensidade crescente nosso universo cotidiano, deve contemplar os multiletramentos. (PARANÁ, 2008, p.71).
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Enfim, para formar cidadãos críticos, reflexivos, entendedores de palavras
escritas e faladas, é preciso que escola, professores e pais estimulem o prazer pela
leitura, usando todos e variados métodos. Para que isso aconteça é preciso criar
um ambiente favorável nas escolas para incentivar o prazer pela leitura, podendo
assim ser levado para casa esse prazer e ser transmitido a outras pessoas. O papel
do professor é orientar as crianças sem restrições com os livros, podendo ser de
literatura, história em quadrinhos, contos de fadas, etc., ensinando-os a manusear
os livros com cuidado e respeito.
Compreende-se que o trabalho de incentivo a leitura por prazer precisa ser
mais estimulado em sala de aula, para que os alunos possam desenvolver a escrita
e a fala corretamente tendo um propósito não somente ler por ler, por isso nós
professores devemos dar um sentido social a essa aprendizagem.
Quando a criança ouve ou lê uma história e é capaz de comentar, indagar,
duvidar ou discutir sobre ela, realiza uma interação verbal, que neste caso, vem ao
encontro da noção de linguagem de Bakhtin (1992). Para ele, o confrontamento de
ideias, de pensamentos em relação aos textos, tem sempre um caráter coletivo,
social.
O conhecimento é adquirido na interlocução, o qual evolui por meio do
confronto, da contrariedade. Assim, a linguagem segundo Bakthin (1992) é
constitutiva, isto é, o sujeito constrói o seu pensamento, a partir do pensamento do
outro, portanto, uma linguagem dialógica.
“A vida é dialógica por natureza. Viver significa participar de um diálogo: interrogar, escutar, responder, concordar, etc. Neste diálogo, o homem participa todo e com toda a sua vida: com os olhos, os lábios, as mãos, a alma, o espírito, com o corpo todo, com as suas ações.” (BAKHTIN, 1992, p.149)
É partindo dessa visão da interação social e do diálogo, que se pretende
compreender a relevância da literatura infantil. Dentro desse universo, as fábulas se
apresentam como uma opção de trabalho com o dialogismo da linguagem.
Através dos tempos, muitos autores renomados se dedicaram a contar e
escrever fábulas: um gênero textual presente na sociedade há muito tempo, pois
tem mais de mil anos de existência e surgiu da necessidade do homem em contar
histórias de todos os tipos, que relatassem suas aventuras ou que explicassem os
fenômenos da natureza, umas que falavam do cotidiano, outras de seres mágicos,
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ou de animais ou objetos com qualidades humanas. Caracteriza-se por transmitir
algum ensinamento, para fazer alguma crítica, uma ironia etc.
Geralmente, no final das fábulas, aparece uma frase destacada, a moral da
história. Este gênero tem acompanhado a evolução da humanidade, sendo
produzidas de acordo com o que as pessoas de uma determinada época pensam
sobre o estilo de vida daquela sociedade. Assim, as fábulas têm servido como
registro histórico dos valores tidos como adequados ao longo dos tempos.
Segundo Platão e Fiorin:
A fábula é uma narração que se divide em duas partes: a narração propriamente dita, que é um texto figurativo,em que os personagens são animais,homens,etc.;e a moral,que é um texto temático,que reitera o significado da narração,indicando a leitura que dela se deva fazer.A fábula é sempre uma história de homem,mesmo quando os personagens são animais,pois estes falam,sentem paixões humanas,etc.,o que indica que são personificações dos seres humanos.O plano de leitura é sempre relativo à vida dos seres humanos. (1995, p.398)
A fábula pretende prender a atenção do leitor a uma situação central, vivida
por duas ou três personagens, e dela extrair a moral da história, que pode servir de
conselho, crítica ou sátira. Se lermos qualquer fábula com bastante atenção,
verificaremos que seu ensinamento não está na moral, mas no fato de desnudar as
estratégias de comunicação de que se valem os homens, ou então as contradições
que permeiam a vida humana. A alegoria mostra, de maneira explícita o que outras
narrações revelam implicitamente: os expedientes discursivos utilizados para
ludibriar os outros, para fazer nossos atos parecer o que não são, para camuflar
nossas reais intenções. A fábula deixa evidente que o discurso, muitas vezes, é
usado não para desvendar a realidade, mas para ocultá-la. Por meio dela, os alunos
poderão reconhecer ensinamentos e lições de moral refletindo sobre vícios e
virtudes humanas. Dessa forma, o estudo da narrativa fabulística ocorrerá em um
contexto significativo, o que possibilita que os alunos desenvolvam a leitura e a
escrita de textos com intenção de ensinar, aconselhar, convencer, divertir ou criticar.
Este projeto, através da leitura das fábulas, pretende ampliar a variedade de
textos lidos em sala de aula de Língua Portuguesa. A interação da obra com seus
ouvintes /leitores acontece durante a leitura e sintetiza-se nos comentários finais,
verificando-se, também, se os interlocutores aprenderam e entenderam as fábulas.
Quando as mesmas são lidas e discutidas, algumas verdades são aceitas e outras
são contestadas. A leitura é crítica e todas as verdades das fábulas passam pelo
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crivo da reflexão e do debate e, essa leitura abre novos horizontes para o
conhecimento.
Para fazer a leitura dos sentidos presentes nas fábulas utilizou-se a teoria
semiótica a qual, devido a sua amplitude, fornece recursos, técnicas e práticas
eficazes para a descoberta das significações (níveis fundamentais, narrativos e
discursivos).
Segundo Fiorin:
O percurso gerativo de sentido é uma sucessão de patamares, cada um dos quais
suscetível de receber uma descrição adequada, que mostra como se produz e se
interpreta o sentido ,num processo que vai do mais simples ao mais complexo [...]
Em cada um deles existe um componente sintático e um componente
semântico.(FIORIN,2006,p.20).
Partindo dessa premissa, pode se dizer que a semiótica é também uma
metodologia, pois através da análise sintático-semântica, permite percorrer
caminhos pelos sentidos no implícito do texto, fornecendo assim, pistas ao
investigador para que esse perceba as verdadeiras intenções do enunciador, e como
essas foram projetadas por ele no texto. Através da interação que a linguagem
proporciona o emissor sempre tenta fazer o enunciatário acreditar em sua verdade e
consequentemente agir sobre este, transformando suas crenças.
CONHECENDO UM POUCO MAIS SOBRE SEMIÓTICA
A semiótica tem procurado realizar uma investigação interna e externa do
texto, examinando- lhe os procedimentos da organização textual e, os mecanismos
enunciados de produção e de recepção de uma narrativa. A leitura remete ao texto e
à rede de significações. Semioticamente, a leitura é concebida como processo
discursivo de apreensão da significação, e o texto, compreendido como articulado
em vários níveis de sentido, sendo que o mais externo deles está em contato com o
mundo e consequentemente, com o leitor que apreende o sentido de mundo através
das leituras que faz.
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Temas e Figuras: Depreensão do Tema
Texto I - Elementos concretos: FIGURAS
Um asno vítima da fome e da sede, depois de longa caminhada, encontrou um campo de viçoso feno ao lado do qual corria um regato de límpidas águas. Consumido pela fome e pela sede, começou a hesitar, não sabendo se antes comia do feno e depois bebia da água ou se antes saciava a sede e depois aplacava a fome. Assim, perdido na indecisão, morreu de fome e de sede. (Fábula de Buridan, filósofo da Idade Média) (PLATÃO & FIORIN, 1995, p.71)
Texto II - Elementos abstratos: TEMAS
Um indivíduo, colocado diante de dois objetos igualmente desejados, pode ficar de tal forma indeciso que acaba por perder a ambos. Esses dois textos querem dizer basicamente a mesma coisa. No entanto, são estruturados de maneira diferentes Qual a diferença entre eles? O primeiro é mais concreto; o segundo mais abstrato. Mas por quê? O primeiro remete a elementos existentes no mundo natural: asno, campo, feno, regato, águas, etc. O segundo remete a elementos mais abstratos, que explicam certos aspectos da conduta humana: indivíduo, objetos igualmente desejados, indeciso. (PLATÃO & FIORIN, 1995, p.71).
Aos elementos concretos presentes no texto chamaremos figuras; aos
elementos abstratos denominaremos temas. Quando se diz que um texto é figurativo
ou temático, na verdade o que se quer dizer é que predominantemente, e não
exclusivamente, figurativo ou temático, pois em um texto figurativo ou pode aparecer
temas e vice versa. Assim, para entender um texto figurativo é preciso alcançar seu
nível temático. Se um leitor ingênuo, ao ler o primeiro texto apresentado permanece
apenas no nível figurativo, poderia dizer que o texto não passa de uma grosseira
mentira, pois os asnos não têm indecisões. Um leitor mais avisado, porém,
procuraria logo um significado mais amplo para o texto, que fosse além desses fatos
concretos e mentirosos. É necessário que o leitor decodifique os sinais que se
apresentam no texto. Serão pistas que irão auxiliá-lo a formar um sentido para aquilo
que está lendo. Esse modo de análise não parte e nem focaliza o contexto de
produção textual, nem a vida do autor-produtor da obra, o que interessa são os
efeitos de sentido e o processo de produção, os quais procuram seduzir o receptor.
Para se fazer a leitura de quaisquer tipos de textos, deve-se desenvolver nos
educandos, competência comunicativa, para que ele possa empregar
adequadamente a língua nas diversas situações de comunicação. Esse trabalho
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requer uma série de estratégias que precisam ser ensinadas e desenvolvidas. Para
que haja compreensão de um texto, deve haver uma interação entre os
conhecimentos do texto e os conhecimentos do leitor, o que garante a construção de
sentido para o texto que se lê.
Conceito de Texto para a Semiótica
Para Barros (2005):
Um texto define-se de duas formas que se completam: pela organização
ou estruturação que dele faz um todo de sentido, e como um objeto da
comunicação que se estabelece entre um destinador e um destinatário.
(Barros, 2005, p.7)
Para a teoria semiótica, texto é tudo aquilo que possui significação. Um texto
é produto de uma situação comunicativa, é uma unidade de sentido produzida por
uma ou mais linguagens. Ele deve ser tomado em seus aspectos internos (conteúdo
e enunciação) em primeiro lugar e depois, os aspectos externos (contexto sócio
histórico que diz respeito às ideias vigentes; os valores do momento histórico em
que o texto foi escrito, a ideologia da época).
3 Desenvolvimento e análise dos resultados
O projeto elaborado durante o Programa de desenvolvimento da Educação -
PDE. E a proposta de implementação foi desenvolvida no ano de 2011,de agosto a
novembro, no Colégio Estadual Ary Borba Carneiro, da cidade de Cândido de Abreu,
Paraná, foi aplicado com trinta e três alunos da 6ª série C do período matutino. O
gênero escolhido neste projeto foi a Fábula. O desenvolvimento do projeto foi feito
em três etapas: apresentação à equipe pedagógica e ao grupo de trabalho em rede-
GTR, aplicação em sala de aula e coleta de dados para a elaboração deste artigo.
Com objetivo de melhorar o ensino-aprendizagem desses alunos e questões além
da sala de aula, como a preocupação com o aprimoramento das ações sociais,
reflexões críticas acerca do que acontece no contexto escolar, a fábula foi o gênero
escolhido por seu caráter formativo e educativo.
Durante a apresentação da proposta e da produção didático-pedagógica aos
alunos, os professores da rede pública puderam apreciá-lo através do GTR (Grupo
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de Trabalho em Rede), que é uma capacitação a distância que traz muitos
benefícios para o professor em sua prática docente. Durante a realização das
atividades propostas no GTR os professores participantes interagiram e forneceram
subsídios ao professor-tutor para que o projeto e a unidade didática fossem
desenvolvidos com êxito.
A apresentação da proposta e da unidade didática para a Equipe Pedagógica
e Professores do colégio foram realizadas durante as atividades de Formação
Continuada no mês de agosto de 2011.
Decorrido um período de conhecimento e entrosamento entre professor e
alunos foi realizada a apresentação e a implementação do projeto. Iniciando com um
breve relato sobre o que é um gênero textual e mais especificamente o que é fábula,
foi explorado o conhecimento prévio que os alunos possuíam sobre o assunto,
ocasionando uma troca de informações.
Optou-se por distribuir a cada aluno uma cópia do material didático-
pedagógico produzido, uma Unidade Didática, onde foi realizada a explanação sobre
o gênero do discurso fábula. Realizada esta primeira etapa do trabalho, segue-se à
sequência, que foi desenvolvida como descritos a seguir:
3.1 Reconhecendo as fábulas e principais fabulistas
O projeto foi apresentado para os alunos no data show contando a história
das fábulas e suas características. Neste momento, a fim de reforçar o primeiro
contato dos alunos com o tema, bem como desenvolver a expressão oral. Realizou-
se um trabalho dirigido, escrevendo no quadro títulos de fábulas que são,
socialmente, mais comuns, mais conhecidas. Por meio dessa atividade foi possível
perceber que um texto possui uma multiplicidade de significações e também a
desenvolver sua competência textual por meio da análise do gênero textual fábula,
seus principais fabulistas e a época em que viveram, destacando Esopo, Jean de La
Fontaine e Monteiro Lobato. Os alunos leram algumas fábulas, fizeram várias
perguntas e se mostraram entusiasmados.
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3.2 Reconhecimento do gênero textual narrativo
Por meio de leitura feita pelos alunos para apropriação das características
típicas da fábula, levando-os a tomarem contato com o gênero, reconhecendo suas
características sócio comunicativas, propriedades funcionais, estilo e composição,
elementos da narrativa e foco narrativo. Logo após, analisou-se os motivos que
distingue a fábula das outras narrativas: construção simbólica do enredo, em que os
animais agem, sentem e pensam e a história sintetizada numa linha moral,
geralmente reproduzida por um provérbio ou um ditado popular.
3.3 Sistematização do conhecimento sobre o gênero
Através de uma sequência de atividades os alunos analisaram e praticaram
seus conhecimentos sobre o gênero:
- Os alunos receberam cópias das fábulas que foram analisadas;
- Promoveu-se uma conversa sobre a origem das fábulas e as mudanças estruturais
e ideológicas entre os autores;
- Promoveu-se leitura silenciosa e oral de várias fábulas, junto com os alunos,
ajudando-os a perceber as características que compõe este gênero: personagens
(animais com comportamentos, qualidades e características, as quais são
frequentemente comparadas às dos homens); vício ou defeito de caráter e virtude
que a fábula aborda; local (espaço) da história, moral e mensagem que traz.
Durante as atividades, a participação dos alunos foi elogiável e era notável
que estavam gostando da maneira como estava sendo conduzido o trabalho. Este
momento, fez com que a sala se tornasse o espaço da construção do conhecimento,
através das negociações feitas, nas interações professor-aluno, aluno-aluno, como
dispõe a DCE (2009, p.70).
As atividades desenvolvidas na sala serviram de apoio para tais negociações,
já que a participação dos alunos e o engajamento discursivo se faz de diversas
formas.
Durante os debates, explorava-se principalmente “a moral da fábula” fazendo
uma reflexão sobre o assunto e comparando a moral com o dia a dia do aluno e
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também para explorar o texto para que pudessem perceber o que está incutido nas
entrelinhas.
3.4 Intertextualidade e Análise do Discurso
Durante as atividades, buscou-se classificar a relação intertextual como
paráfrase, estilização ou paródia, apresentando comparações dos seguintes itens:
enredo, personagens, a galinha dos ovos de ouro, os ovos de ouro, a descoberta do
fato, a interação com o evento, a morte da galinha, a moral da fábula, figuras e
temas apresentados .Por meio deste estudo, discutimos também a presença dessa
fábula na cultura, além de procurar demonstrar a atualidade e adaptabilidade da
fábula esópica.
Plano de Conteúdo
No plano do conteúdo foram trabalhados os seguintes níveis:
Nível discursivo: tempo, espaço, atores, enunciador / enunciatário,
argumentação / persuasão, cena enunciativa, voz, tom de voz, caráter, ethos
(valores morais e sociais)
Nível narrativo: Sujeito e objeto de valor, destinador / destinatário,
manipulação, competência, performance, sanção.
Nível fundamental: Quadrado semiótico (termos em relação de contrariedade,
contradição e complementaridade) dêixis eufórica vs. dêixis disfórica.
Plano de Expressão
Já no plano da expressão foram enfatizados: paragrafação, tipo de letra,
recursos de coesão textual, sinais de pontuação, escolha lexical, fatos da sintaxe da
frase, integração de elementos visuais com verbais.
A junção do plano de conteúdo e do plano de expressão nos permite ler o
texto com mais eficácia, considerando a práxis enunciativa, que permeia todos os
níveis de produção e leitura do texto.
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Nível Fundamental
A semântica fundamental abriga as categorias semânticas que estão na base
da construção de um texto. Elas fundamentam-se numa diferença, numa oposição.
A fábula “A galinha dos ovos de ouro”, e suas versões que circulam nos meios
didáticos, por exemplo, que mostra as vantagens de ser ambicioso, explorador,
corrupto, pode ser construída a partir da oposição riqueza vs. pobreza (riqueza
proporcionada pelo dinheiro conseguido a qualquer custo), ou seja, termos de
euforia vs. disforia. O texto para análise na implementação “O Homem e a Galinha”,
da escritora Ruth Rocha, que abordam o tema “A Galinhas dos Ovos de Ouro”
(Esopo) . Como nos textos citados a possibilidade de enriquecer rapidamente é
facilmente percebida.
O texto “O Homem e a Galinha”, narra a história de um casal que tinha uma
galinha, que começou a botar ovos de ouro. Era uma galinha diferente. A mulher
começou a tratá-la bem, visto que ela botava ovos de ouro. O homem, como
proprietário e capitalista proíbe a mulher de dar alimentos “nobres” para a galinha. A
Galinha continuava a botar ovos de ouro, mesmo tratada com indiferença, até que
um dia, encontra o portão aberto e vai embora.
Analisando o tema desse texto, verifica-se que ele faz menção à sociedade
capitalista que é opressora; que a galinha possuía “mão de obra especializada”, pois
botava ovos diferentes – de ouro -e, portanto não era alienada, o que faltava para
ela era oportunidade, e quando esta apareceu ela foi embora.
Começando pelo nível narrativo, verificamos que há um sujeito – o homem –
que quer estar em conjunção com o objeto de valor – no caso os ovos de ouro que
representam riqueza, poder, ascensão social. A ação de colher ovos de ouro é vista
como um fazer que transforma, isto é, tudo que o dinheiro pode proporcionar.
Para entender a sintaxe narrativa do texto é preciso descrever as cenas,
determinando seus participantes e o papel que representam na história simulada.
Segundo Barros, a semiótica propõe uma narrativa como mudanças de estado,
operado pelo fazer transformador de um sujeito agindo sobre o mundo em busca de
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valores investidos nos objetos. A narrativa pela sua especificidade estabelece uma
série de ações entre um destinador e um destinatário, e os conflitos que permeiam
as relações entre os indivíduos. As estruturas fundamentais são ponto de partida do
percurso de geração de um texto.
Durante a efetivação das ações previstas foi realizado todo um trabalho sobre
as questões pertinentes aos textos, explorando o conhecimento prévio dos alunos e
proporcionando troca de informações com o grupo envolvido nas discussões em
sala de aula. No primeiro momento, muitos alunos apresentaram dificuldades. No
entanto, à medida que foram fazendo a releitura dos textos, as dificuldades foram
sendo amenizadas. Os exercícios ajudaram muito nessa busca de entendimento e,
algumas questões levaram os alunos a refletirem sobre questões sociais e éticas.
3.5 Percebendo diferentes intenções e conhecendo outros aspectos das fábulas
Como vimos anteriormente, quem conta ou escreve uma fábula tem alguma
intenção, seja de ensinar, aconselhar, convencer, divertir ou criticar. Além disso,
uma mesma fábula pode ser contada ou escrita de muitos modos diferentes; é o que
chamamos de versão. Vamos conferir essas informações trabalhando com a fábula
A cigarra e a formiga.
Tomamos o fato de existir um enunciador, sendo a maneira de o narrador
criar no texto os efeitos de subjetividade e aproximação. Embora saibamos que o
enunciador pode ser ao mesmo tempo o narrador e também autor. Enquanto for
lendo, preste atenção nas semelhanças e nas diferenças e nas diferentes intenções
que parecem estar por trás de cada fábula. É possível resgatar os elementos e
sentidos presentes em outros textos pois os sentidos não estão propriamente nos
textos, mas no interdiscurso que os atravessa.
A fábula “A cigarra e a(s) formiga(s)” é uma das muitas outras que tratam da
atividade do trabalho. Essa fábula traz a história de duas personagens: a cigarra e a
formiga. Aquela passa o verão cantando, enquanto essa se dedica à colheita de
suprimento alimentar para a garantia de sua sobrevivência no inverno. Com a
chegada da estação fria, a cigarra se vê desprovida de alimento e vai, então, ao
encontro da formiga, em busca de socorro. O desfecho da narrativa difere nas
diversas versões existentes, em virtude da incorporação de novos percursos
narrativos provenientes de diferentes visões de mundo. Ela tem estado presente
17
também em outras manifestações artísticas e culturais, além da literária, tais como,
pintura, desenho animado, charge, música, etc. Dentre as múltiplas manifestações
dessa fábula, este estudo privilegia a versão francesa, na tradução para o português
“A Cigarra e a Formiga” de La Fontaine, em cuja base encontra-se a ideia de que o
trabalho é algo necessário para que, num futuro próximo, se possa desfrutar da
"riqueza" acumulada por ele. O texto encaminha o leitor para essa interpretação ao
utilizar a figura da cigarra não-trabalhadora pedindo alimento e abrigo à formiga
trabalhadora, que conseguiu acumular essas riquezas - o tema trabalho está ligado
à ideia de sacrifício.
A categoria de pessoa está muito marcada no texto de La Fontaine (1992,
p.73) neste texto: há uma voz que aparentemente narra a história, mas que, pelos
termos utilizados, acaba se mostrando contra a atitude da cigarra. __”Obsequiosa,
certamente a formiga não seria”.__“Que fizeste até outro dia?”perguntou à
imprevidente” (.....) .O termo imprevidente marca bem a posição do narrador frente à
atividade da cigarra – que poderia ser considerada um não – trabalho, algo para se
envergonhar. A ideologia do trabalho presente neste texto é aquela que justifica o
trabalho sacrificante como uma atividade para a subsistência, não deixando espaço
para a leitura de que é possível haver o trabalho gratificante como meio de
subsistência. Além disso, o texto encaminha a leitura de que quem não trabalha é
vagabundo.
Em outras versões dessa fábula, como por exemplo, a de Monteiro Lobato,
observamos que, além de ter sido escrita ou reescrita baseando nos principais
fabulistas da tradição Esopo e La Fontaine apresentam as modificações mais
originais e radicais. O ponto de vista narrativo é completamente diferente e as
mudanças na estrutura fortalecem a coerência interna do texto. Depois do título
geral aparecem outros dois subtítulos: “A formiga boa” e “A formiga má”. Este último,
como confirma o próprio desenrolar do enredo, é uma referência clara à fábula
clássica.
Lobato, em sua versão brasileira da fábula, enfatiza a oposição entre uma
formiga boa (que acolhe a cigarra) e uma formiga má (não se interessa pelo
sofrimento daquela que passou o inverno cantando). Essa mudança enfática já é
uma marca de que não se trata apenas da tradução do texto de La Fontaine, pois
Monteiro Lobato insere marcas de sua autoria no texto, o que, consequentemente,
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faz surgir um novo leitor. Esse leitor torna-se um leitor cúmplice, pois seu
conhecimento é compartilhado com o do autor quando, por exemplo, este último
reinterpreta o sentido da fábula ao emprestar à formiga boa uma dose de
generosidade, quando, na verdade, o leitor espera pelo final tradicional.
A delegação de vozes no interior dos textos instaura a interpretação
pretendida pelo narrador, pois apresenta as justificativas para o acolhimento ou não
da cigarra. Este texto, diferente da versão da fábula de La Fontaine, permite que o
leitor reflita (sem cair no efeito ideológico de que o trabalho é um dever natural)
sobre as razões que levam uma pessoa a trabalhar. Ao mesmo tempo, permite que
se desfaça a idéia de que quem não trabalha é vagabundo, pois existem muitos
fatores que levam os indivíduos a não trabalharem – no caso da fábula de La
Fontaine, a cigarra não trabalha como a formiga, pois não lhe é “natural” trabalhar
desse modo. Em sua versão, Lobato estimula o leitor a não aceitar passivamente a
tradição e a repensá-la, revendo os valores que sustentam uma dada visão de
mundo.
O diálogo entre textos continua com o poema de José Paulo Paes “Sem
barra”, com a retomada da fábula de La Fontaine, amplia-se o retrato das duas
personagens: cigarra e formiga, não apenas ao mesmo tempo, mas também
direcionadas para interesses divergentes. Poema e fábula refletem formas diversas
de ver o mundo, a atividade humana e os papéis sociais.Na fábula (tradicional),as
personagens são retratadas como seres opostos e inimigos.No poema,a forma de
construir o texto sugere uma leitura aberta,com espaço para a conciliação,propondo
a aproximação entre a cigarra e a formiga,entre o canto e o trabalho. O poeta José
Paulo Paes, por um lado, homenageia a tradição .Por outro, lança sobre ela um
olhar questionador do homem contemporâneo.
Depois de se trabalhar as diferentes versões da mesma fábula, partiu-se para
o trabalho com a sequência figurativa de significações mais abstratas, inserindo-as
num campo de valores cognitivos, o que caracteriza a tematização. Tal significação
temática e abstrata pode também ser desenvolvida como uma unidade discursiva de
comentário que gera combinações figurativas da narrativa. É o caso da fábula e sua
moral. Na fábula, os aspectos figurativos são expandidos e, por sua vez,
condensados abstratamente na moral.
19
A semiótica também se liga com a leitura no nível discursivo do texto, o nível
da manifestação, que está relacionado com o mundo exterior ao texto, o contexto. A
dimensão figurativa do discurso (cigarra x formiga), (trabalho x arte) e ( trabalhar x
divertir) é responsável pela relação do discurso com o mundo, à medida que
estabelece, na leitura, uma relação imediata, uma semelhança, uma
correspondência entre as figuras semânticas que desfilam sob os olhos do leitor e as
do mundo.
O texto é construído em forma de narração – utiliza-se do pretérito para
construir seus versos – com discurso direto e a moral da história introduzidos pela
voz do narrador no final do texto. Podemos observar que a categoria enunciativa de
tempo é marcada através do tempo do trabalho – oposição entre verão = trabalho /
inverno = ócio. A partir desta instalação de um tempo mítico (fantástico), a historia é
narrada para o leitor, que a ouve e não encontra espaço para interpretações
diferentes da narrada.
Os textos selecionados (a fábula “A cigarra e a formiga”) em suas versões
deverão enfocar os mecanismos de construção de sentido estudado nas análises
das fábulas na teoria semiótica. Nas atividades propostas faremos levantamento de
figuras e temas na construção e organização de textos. São, portanto, os
procedimentos semânticos do discurso, a tematização e a figurativização. Para a
compreensão de um texto figurativo ou para a descoberta do seu tema é preciso que
o leitor tenha em mente que uma figura não tem significado em si mesma. Quando
sozinha ou isolada, ela sugere várias possibilidades de interpretações.
Os alunos foram convidados a ler: A cigarra e as formigas de Esopo, A cigarra
e a formiga de La Fontaine, A Formiga boa, A Formiga má de Monteiro Lobato e a
poesia “Sem barra”, de José Paulo Paes, para que a leitura fosse feita
individualmente. Em seguida, alguns alunos começaram a questionar sobre os
vocábulos desconhecidos. Foram, então, estimulados a compreendê-los pelo
contexto. Estranharam também o fato de serem duas histórias: a da “Formiga Boa” e
a da “Formiga Má”, e a intervenção do pessoal do sítio. Porém, logo perceberam a
distração em relação ao título, que traz o vocábulo formiga no plural. Todos
gostaram muito da releitura, o que despertou um grande interesse sobre as outras
fábulas do livro, com a curiosidade de saber se também havia intromissão, ou seja,
se a turminha criada por Monteiro Lobato dava sua opinião, concordando com o
20
conteúdo das histórias ou, então, contradizendo a moral proposta. Todas essas
leituras contribuíram para que os alunos percebessem como um único tema pode
ser desenvolvido de diversas maneiras, sem precisar recorrer a nomenclaturas de
teoria literária.
E eles gostaram das leituras, tendo em vista que todos participaram da
produção textual. É importante registrar um fato que ocorreu paralelamente ao que
fora planejado: os textos (fábulas) fizeram com que os alunos espontaneamente
pedissem para lê-lo como se fosse um texto dramático. Apesar da surpresa, o
resultado foi muito bom.
Finalizada a leitura da fábula de Lobato, antes da abordagem dos outros
textos, teve início uma conversa sobre a estrutura de “A cigarra e as formigas” e as
mudanças realizadas pelo escritor. Muitos se surpreenderam com a história da
formiga boa, mas muito mais com a moral presente na história da formiga má, pois
nunca tinham imaginado a cigarra como uma artista, e sim como uma preguiçosa.
Perceberam que, realmente, sem música a vida não teria a mesma graça. Pode-se
afirmar que esse foi o elemento que mais impressionou os alunos, tendo em vista o
posterior resultado do registro das impressões.
As produções foram variadas: em algumas permaneceu a questão da
moralidade, e em outras, as impressões estéticas marcaram profundamente. Houve
até a proposta de casamento entre as personagens. Muitos trouxeram a história
para seu cotidiano, o que resultou em moral com fundo religioso, ambientes de
extrema pobreza, viagem para lugares muito distantes. Houve até levantamento de
hipóteses que a cigarra ao ser chamada de vagabunda poderia processar a formiga
por calúnia e difamação .Dando ganho de causa na justiça e recebendo uma gorda
indenização (dinheiro).
Como estímulo à participação no projeto, promoveu-se uma confraternização
em que os alunos confeccionaram um marca página com a foto da turma e a
reprodução de várias fábulas. Esse marca página foi entregue aos convidados,
alunos da turma e funcionários da escola.
21
4 Conclusão
Esse projeto comprovou os desafios com os gêneros textuais em sala de
aula. Após sua aplicação e análise das produções inicial e final dos alunos,
percebeu-se que eles demonstraram uma significativa construção de conhecimento
no que se refere ao uso do discurso direto e à inserção de vozes de personagens no
texto (e não apenas a do narrador). Entretanto, foi possível perceber que o conteúdo
do gênero fábula não foi bem desenvolvido pelos alunos. A análise do conteúdo
temático veiculado nas produções finais parece mostrar que, em vez de caminhar no
sentido de abstrair, progressivamente, critérios da forma do gênero fábula, para,
depois, elaborar suas próprias escolhas temáticas, o aluno acabou copiando a
forma, utilizando frases simples, bastante artificiais, sem verdadeiramente
compreender o conteúdo temático envolvido na proposta de produção textual
trabalhada.
Volta-se aqui à questão dos diferentes níveis de aprendizagem das salas. Por
mais dificuldades que tenham apresentado na produção, todos se esforçaram para
realizar a leitura e para imaginar o que teria acontecido às personagens no momento
do registro.
Repensando a sequência didática apresentada, há resultados positivos em
determinados aspectos, mas precisaria ser revista para aprimorar outros. Percebeu-
se uma mudança positiva em relação ao modo como os alunos se interessaram
pelas atividades elaboradas na implementação, e a forma em que se expressaram
suas opiniões. Fazer com que o aluno demonstre sua participação, expressar suas
ideias, sem medo de estar cometendo algum deslize, estar tentando romper a sua
timidez. É visto que não se constrói um conhecimento só com conhecimentos
elaborados, à formação do pensamento crítico também se faz através de
indagações e incentivo à expressão de opiniões. Principiou-se, realmente, um
processo de letramento literário, porque houve leituras e produções efetivas, o que
levou os alunos para o mundo da leitura de modo lúdico, sem perder de vista a
especificidade do texto literário.
A sequência didática apresentada neste trabalho e aplicada em sala-de-aula,
com alunos da 6ª série do Ensino Fundamental de uma escola da Rede Pública
configura-se como uma proposta de ensino de leitura através da utilização de
22
estratégias que visam ensinar ao leitor aprendiz formas de interagir com o texto que
lhe possibilitem compreender o que está sendo lido.
Participar do Programa de Desenvolvimento Educacional foi uma experiência
excelente, na qual o crescimento e o desenvolvimento profissional foi percebido no
decorrer dos dois anos. Aprendemos a cada dia que as reflexões de o que ensinar
como ensinar são essenciais no processo de ensino aprendizado da língua
portuguesa. Concluímos que, pelos dados expostos e pelo saldo positivo, tal
experiência pode ser aplicada em várias realidades diferentes e em qualquer série
que se pretenda trabalhar o desenvolvimento da leitura e da escrita, agregando os
valores morais e éticos, a Fábula é sempre uma boa opção.
23
5 REFERÊNCIAS ALVES, Rubem: O escorpião e a rã. 5ª Ed. São Paulo: Edições Loyola, 2001.
BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. São Paulo. Martins Fontes,1992.
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Introdução à linguística. II. Princípios de Análise. São Paulo: Contexto, 2003.
BARROS, Diana Luz Pessoa de. Teoria Semiótica do Texto. São Paulo: Ática,
2005.
BISOGNIN, Tadeu Rossato, Descoberta e Construção: português: 5ª série. São
Paulo: FTD, 1994.
BRASIL, MEC e Secretaria de Educação Básica Programa de Formação Continuada
de Professores dos Anos/Séries Iniciais do Ensino Fundamental. Pró Letramento.
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CAGLIARI , Luiz Carlos. Alfabetização e Linguística .São Paulo. Scipione, 1994.
CATTANI, Maria Izabel. Leitura no 1º grau: uma proposta dos currículos. Porto
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FERNANDES. Mônica Teresinha Ottoboni Sucar. Trabalhando com os Gêneros do
Discurso: Narrar: Fábula. São Paulo: FTD, 2001.
FIORIN, José Luís. Linguagem e Ideologia. São Paulo: Ática, 1995.
_________, José Luiz. Elementos de Análise do Discurso. São Paulo: Contexto,
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FONTAINE, Jean de La. Fábulas Jean de La Fontaine, tradução Milton Amado e
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GOLDSTEIN Norma e DIAS Marinez. Linguagem e vida, 5ª série. São Paulo: Ática,
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KLEIMAN, Ângela. Texto e Leitor: aspectos cognitivos da leitura.Pontes, 2000.
24
LOBATO, M. Fábulas. São Paulo: Brasiliense, 2004.
PAES, José Paulo. Sem barra IN Olha o bicho. São Paulo: Ática, 1989.
PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares da
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PLATÃO, F.S e FIORIN, J.L. Para Entender o Texto Leitura e Redação. São
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ROCHA, Ruth, Enquanto o mundo pega fogo. 2ª Ed. Rio de Janeiro, Nova
Fronteira, 1984.
26
ANEXO 1
Sistematização do conhecimento sobre o gênero
Vamos conhecer um episódio da época de La Fontaine.
Leia com atenção.
Contam que La Fontaine era muito amigo do senhor Nicolas Fouquet. Fiel e dedicado ao rei da França, Luís XlV, Fouquet era Superintendente das Finanças, cargo subordinado ao Ministro das Finanças, senhor Jean Colbert. Colbert fez de tudo para afastar Fouquet do cargo, conseguindo, por fim,prendê-lo injustamente e sem direito a defesa. La Fontaine protestou em favor do amigo, publicando uma fábula muito lida nos salões frequentados pela nobreza. (FERNANDES, M.T.O.S., 2001.p.29)
Escolha entre as fábulas a seguir, contadas por La Fontaine, aquela que você acha representar
melhor a situação descrita.
A RÃ E O RATO Tal como diz Merlim, a si próprio se engana quem pensa o próximo enganar. Trata-se de verdade antiga e mais que humana, pois também se pode aplicar aos animais, conforme mostro neste conto. Um rato bem nutrido, muito gordo, a ponto de estourar, pois jamais cuidara de jejuar, saiu a espairecer. Foi a um brejo e, de pronto, abordou-o uma rã, fazendo esta proposta: _ “Vem até minha casa e um banquete hás de ter." O rato aceitou com prazer, mas a rã prosseguiu, pois estava disposta a falar: _ "Que delícia de banho! E vais ver panoramas fantásticos, coisas curiosas, raridades sem fim, plantas maravilhosas. Vais ter o que contar, um dia, a teus netinhos, sobre' as leis e os costumes desses teus vizinhos. Certa estou de que irás regressar amiúde ao palude." Prestes a mergulhar, hesita o rato: impede-o um pequeno detalhe: não nadava bem.
A rã, porém, inventa excelente remédio: prende a pata do rato, e sua pata, também, num talo de junco bem forte, e assim sai a puxá-lo. Por falta de sorte do rato, a rã queria era tirar-lhe a vida. Sem consideração ao direito das gentes, havia planejado trincá-lo entre os dentes (carne de rato gordo: a sua preferida); só bastava puxá-lo ao fundo da lagoa. Clama aos céus o infeliz, enquanto a rã caçoa. O rato se debate. A batalha é renhida. Há rebuliço e guinchos. Um milhafre passa, em sua aérea ronda, à procura de caça. Enxerga a confusão e investe velozmente contra o rato - e que presente: agarra a rã, juntamente! Não há de que se queixar. Quanta sorte! Que surpresa! Vai ter carne no jantar e peixe, de sobremesa! Não há vantagem alguma Em agir como embusteiro, Pois o feitiço costuma Virar contra o feiticeiro (LA FONTAINE, 1989, p.261)
O LOBO E O CORDEIRO
A razão do mais forte é a que vence ao final (nem sempre o Bem derrota o Mal).
27
Um cordeiro a sede matava nas águas limpas de um regato. Eis que se avista um lobo que por lá passava em forçado jejum, aventureiro inato, e lhe diz irritado: - "Que ousadia a tua, de. turvar, em pleno dia, a água que bebo! Hei de castigar-te!" _ "Majestade, permiti-me um aparte" diz o cordeiro. - "Vede que estou matando a sede, água a jusante, bem uns vinte passos adiante de onde vos encontrais. Assim, por conseguinte, para mim seria impossível. cometer tão grosseiro acinte."
_ "Mas turva, e ainda mais horrível foi que falaste mal de mim no ano passado." _ "Mas como poderia" - pergunta assustado o cordeiro -, "se eu não era nascido?" _ "Ah, não? Então deve ter sido teu irmão." __ "Peço-vos perdão mais uma vez, mas deve ser engano, pois eu não tenho mano." _ "Então, algum parente: teus tios, teus pais ... Cordeiros, cães, pastores, vós não me poupais; por isso, hei de vingar-me" _ e o leva até o recesso da mata, onde o esquarteja e come sem processo. (LA FONTAINE, 1989, p.99)
A RAPOSA E A CEGONHA
A Comadre Raposa, apesar de mesquinha, tinha lá seus momentos de delicadeza. Num dos tais, convidou a cegonha, vizinha, a partilhar da sua mesa. Constava a refeição de um caldo muito ralo, servido em prato raso. Não pôde prová-Io a cegonha, por causa do bico comprido. A raposa, em segundos, havia lambido todo o caldo. Querendo desforrar-se da raposa, a comadre um dia a convidou para um jantar. Ela aceitou com deleite do qual não fez disfarce. Na hora marcada, chegou à casa da anfitriã. Esta, com caprichoso afã, pedindo desculpas pelo transtorno, solicitou ajuda pra tirar do forno a carne, cujo cheiro enchia o ar. A raposa, gulosa, espiou o cozido: era carne moída - e a fome à apertar! Eis que a cegonha vira, num vaso comprido e de gargalo fino à beça, todo o conteúdo da travessa! O bico de uma entrava facilmente, mas o focinho da outra era bem diferente; assim, rabo entre as pernas, a correr, foi-se a raposa. Espertalhão, atente: quem hoje planta, amanhã vai colher! (LA FONTAINE, 1989, p.117)
As fábulas que você acabou de ler foram escritas por La Fontaine em versos. Escolha uma das
fábulas acima. Você deverá fazer uma adaptação escrevendo-a em prosa. Preste atenção na
organização do texto e as características do gênero textual “fábula”.
Qual é a moral da história? Comente-a
Formule uma situação que ocorra no mundo real baseando-se na fábula “O lobo e o cordeiro”.
Vamos ler os textos abaixo e reconhecer as características da fábula
O RATO E A RÃ
Um rato da terra, para sua infelicidade, tornou-se amigo de uma rã.
E a rã, premeditadamente, acorrentou a pata do rato à própria pata. “Primeiro foram comer trigo na terra e, depois de se aproximarem da margem de uma lagoa, a rã jogou o rato no fundo da água, enquanto ela própria ficou brincando na água, gritando:” brekekekecs!”.E o infeliz rato afogou-se e morreu, mas continuava emergindo, por estar preso à pata da rã. Um milhafre (gavião),ao ver isso, pegou o rato com suas garras. Mas a rã, presa pela corrente, seguiu-o e tornou-se ela também alimento para o milhafre.
MORALIDADE: Raramente os maus triunfam: se conseguem prejudicar os bons que neles se fiam, acham logo outro mau que os castiga.
(ESOPO, Tradução de Neide Smolka, p.138) O FRANGO, O GATO E O CAMUNDONGO Um jovem camundongo, sem experiência, quase comete uma imprudência, - conforme achou a mãe, ouvindo o seu relato: - "Quando eu transpus os montes das nossas fronteiras e entrei nas terras estrangeiras para aprender como age um rato, logo avistei dois seres de aspecto curioso. O primeiro, com um ar bondoso; o segundo, agressivo, de cara fechada, tendo uma voz esganiçada, uma coroa rubra e mole, e um braço estranho, que abre e fecha qual um fole. Em vez de cauda, esse animal tinha um penacho colossal!” O tenebroso monstro que ele descrevia, tão estranho que parecia provir da América, era um frango, tão somente. - "Ele batia os braços nos flancos, fazendo um alarido tão horrendo, que eu, mesmo sendo um rato intrépido e valente, pus-me a correr, cheio de medo, sem querer revê-lo tão cedo. Por causa disto é que não pude entabular conversa com o outro animal que, no seu aspecto geral, lembrava a nossa raça, em corpo e atitude: peludo, marchetado, cauda longa e aspecto de animal calmo e circunspecto, meigo, discreto,
de olhos verdes e brilhantes. Já ia falar-lhe, mas antes de ter dado dois passos, o estridente grito do monstro me pôs a correr." - "Meu filho" - diz a mãe -, "esse animal bonito, de tão distinto parecer, escuta bem o que te digo: é o nosso maior inimigo! O outro animal, de má aparência, nada nos faz. Numa emergência, pode até nos servir de boa refeição. Mas, para os gatos, somos iguaria rara. Por isto, guarda esta lição: não julgues ninguém pela cara." (LA FONTAINE,1989,p.361)
O CÃO E O OSSO Um dia, um cão ia atravessando uma ponte, carregando um osso na
boca. Olhando para baixo, viu sua própria imagem refletida na água.
Pensando ver outro cão, cobiçou-lhe logo o osso e pôs-se a latir. Mal, porém, abriu a boca, seu próprio osso caiu na água e se perdeu para sempre.
A fábula é própria para o homem ambicioso. (ESOPO, Trad. Neide Smolka, p.105).
1) Vimos três textos com mensagens e lições de vida. Tendo presentes tais histórias, com
quais das afirmações abaixo você concorda?
a. São pequenas histórias em que predominam os animais como personagens.
b. Os animais falam, cometem erros, são sábios ou tolos, bons ou maus.
c. Essas histórias têm um objetivo, um ensinamento.
d. Os animais agem como se fossem pessoas.
e. A intenção de tais narrativas é mostrar como os homens podem e devem agir.
f. Podem ser contadas tanto para crianças como para adultos.
g. A moral da história pode ser usada independentemente, como um provérbio.
h. Podemos chamar tais narrativas de fábulas. (Na dúvida, consulte o glossário.)
i. São contos de moral idade popular, uma lição de inteligência, de justiça, de
esperteza...
j. Certas histórias são retratos de pessoas.
k. Não são lições de história natural, mas de moral.
l. Estas histórias foram sendo formadas pela imaginação das pessoas.
m. Podemos considerar tais narrações como indiretas às pessoas.
n. A maioria mostra que o mundo é dos fortes e que a esperteza é o único meio de derrotar a força.
Você deve ter observado que todas estão corretas.
Resuma todas as afirmações anteriores numa frase, respondendo à Pergunta. O que é uma
fábula?
2) Escolha, entre os provérbios abaixo ,aquele(s) que poderia(m) traduzir a moral da fábula O CÃO E O OSSO.
( ) Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura.
( ) Quem muito quer, nada tem.
( ) Amor com amor de paga.
( ) Quem desdenha quer comprar.
( ) Mais vale um pássaro na Mao do que dois voando.
ANEXO 2 Intertextualidade e análise do discurso
Quem conta ou escreve uma fábula tem alguma intenção, seja de ensinar, aconselhar,
convencer, divertir ou criticar.
Uma mesma história pode ser contada ou escrita de muitos modos diferentes: é o que
chamamos de versão.
Os fabulistas podem contar uma mesma história para pessoas diferentes, num tempo
diferente, de um modo diferente e com intenções também diferentes.
Vamos analisar essas informações com a fábula A galinha dos ovos de ouro.
Os textos 1,2,3 e 5 estão na íntegra, isto é, não falta uma palavra, e são de Esopo, Jean de
La Fontaine, Monteiro Lobato e Ruth Rocha. O texto 4 versão de Millôr Fernandes são trechos da
recriação da fábula.
Uma pessoa tinha uma galinha que punha ovos de ouro. Crendo que ela tinha dentro do ventre um monte de ouro, matou-a e viu que ela era igual às outras galinhas. Na esperança de encontrar riqueza de uma só vez, ficou privado até de um pequeno ganho. Moral: Deve-se ficar contente com o que se tem e evitar a cobiça insaciável.
(ESOPO, Tradução Neide Smolka,1994,p.287)
Estrutura do texto:
Narrativa escrita em prosa;
Usa o discurso indireto em sua narrativa;
Citação do tempo: não há
MORAL: Deve-se ficar contente com o que se tem e evitar a cobiça insaciável .
Personagens:
Uma pessoa (não menciona sexo) ambiciosa, sem visão de negócios, tola, a busca por um ganho
rápido, pobre.
Galinha – ave, bota ovos de ouro, objeto de ganho rápido e fácil, morreu, galinha comum
Características figurativas: uma pessoa, galinha, morte da galinha, continuar pobre, ovos de ouro,
moral.
Temáticas: descoberta do fato, impaciência do dono ,decepção, ”ovos de ouro ”tema= objeto de
ganho rápido e fácil proporcionando vida farta e rica.
: 1. Os donos da Galinha eram pessoas ricas e poderosas?
2. Que tipo de benefício proporcionava a Galinha todos os dias para seus donos? 3. Por que aquelas pessoas resolveram sacrificar a Galinha? Elas lucraram com isso?
4. Você é capaz de dizer qual o sentimento que serviu de motivação para que sacrificassem o
animal? 5. Você seria capaz de descrever, com suas palavras, o significado da Moral da Fábula?
A cobiça excessiva põe tudo a perder. Para o provar , vou recorrer à conhecida fábula de uma galinha que apenas botava ovos de ouro. Seu corpo deveria conter um tesouro. Querendo ver o que ela lá dentro continha, seu dono a degolou e, abrindo-a, constatou que ela era igual às outras - e o sonho acabou Bela lição para os tratantes que só desejam lucro fácil e polpudo: de uma hora para outra podem perder tudo ficando mais pobres do que antes. (LA FONTAINE, 1989, p.329)
Estrutura do texto:
Narrativa escrita em verso narrador personagem: “vou recorrer...”
Usa o discurso indireto em sua narrativa;
Citação do tempo:
MORAL: sem moral
Personagens: - Dono da galinha, ambicioso ,sonhador ,desejoso de lucro fácil e rápido, curioso,
pobre.
-galinha – ave, bota ovos de ouro, objeto de ganho rápido e fácil, morreu degolada
Figurativas: dono da galinha, galinha, morte da galinha, continuar pobre, ovos de ouro.
Temáticas: impaciência do dono, decepção, ”ovos de ouro” tema= objeto de ganho rápido e fácil
proporcionando vida farta e rica.
João Impaciente descobriu no quintal uma galinha que punha ovos de ouro. Mas um por
semana apenas. Louco de alegria, disse à mulher:
- Estamos ricos! Esta galinha traz um tesouro no ovário. Mato-a e fico o mandão aqui
das redondezas.
- Por que matá-la, se conservando-a você obtém um ovo de ouro de sete em sete dias?
_ Não fosse eu João Impaciente!
Quer que me satisfaça com um ovo por semana quando posso conseguir a ninhada
inteira num momento?
E matou a galinha.
Dentro dela só havia tripas, como nas galinhas comuns, e João Impaciente, logrado,
continuou a marcar passo a vida inteira, morrendo sem vintém.
Quem não sabe esperar, pobre há de acabar. (LOBATO,1994, p.49)
Era uma vez um homem que tinha uma Galinha. Subitamente, em dia inesperado, a Galinha pôs um
ovo de ouro. Ouro! Outro dia, outro ovo. Outro ovo de ouro! O homem mal podia dormir. Esperava
todas as manhãs pelo ovo de ouro - clara,gema, gala, tudo de ouro! - que o tirava da miséria aos
poucos, e aos poucos o ia guindando ao miIionarísmo. O fato, que antigamente poderia passar
despercebido, na data de hoje atraía verdadeiras multidões.[...] (FERNANDES, M., 1976, p.98)
MORAL: CRIA GALINHAS E DEITA-TE NO NINHO.
Era uma vez um homem que tinha uma galinha.
Era uma galinha como as outras.
Um dia a galinha botou um ovo de ouro.
O homem ficou contente. Chamou a mulher:
- Olha o ovo que a galinha botou.
A mulher ficou contente:
– Vamos ficar ricos!
E a mulher começou a tratar bem da galinha.
Todos os dias a mulher dava mingau para a galinha.
Dava pão-de-ló, dava até sorvete.
E a galinha todos os dias botava um ovo de ouro.
Vai que o marido disse:
- Pra que este luxo todo com a galinha?
Nunca vi galinha comer pão-de-ló…
Muito menos sorvete! Vai que a mulher falou:
- É, mas esta é diferente. Ela bota ovos de ouro!
O marido não quis conversa:
- Acaba com isso, mulher. Galinha come é farelo.
Aí a mulher disse:
- E se ela não botar mais ovos de ouro?
- Bota sim! – o marido respondeu.
A mulher todos os dias dava farelo à galinha.
E a galinha botava um ovo de ouro.
Vai que o marido disse:
- Farelo está muito caro, mulher, um dinheirão!
A galinha pode muito bem comer milho.
- E se ela não botar mais ovos de ouro?
- Bota sim. – respondeu o marido.
Aí a mulher começou a dar milho pra galinha.
E todos os dias a galinha botava um ovo de ouro.
Vai que o marido disse:
- Pra que este luxo de dar milho pra galinha?
Ela que cate o de-comer no quintal!
- E se ela não botar mais ovos de ouro?
- Bota sim – o marido falou.
E a mulher soltou a galinha no quintal.
Ela catava sozinha a comida dela.
Todos os dias a galinha botava um ovo de ouro.
Um dia a galinha encontrou o portão aberto.
Foi embora e não voltou mais.
Dizem, eu não sei, que ela agora está
numa boa casa onde tratam dela a pão-de-ló.(ROCHA,1984,p.14-9)
Um patrão ganancioso tem um empregado que trabalha muito bem e lhe dá muito lucro.
Ele fica muito feliz com isso, mas não faz nada para melhorar a condição do empregado, para não
diminuir seu lucro.
Com o passar do tempo, o patrão acha que o custo do empregado ainda está alto, devendo
diminuí-lo, não obstante o bom trabalho que recebe.
Um dia, o empregado tem oportunidade de ir trabalhar em um lugar onde terá melhores condições
de trabalho e melhor remuneração.
Então, não perde a oportunidade, vai para onde poderá viver melhor.
Vamos discutir sobre o papel que as personagens do texto
"A Galinha dos Ovos de Ouro" podem representar em nossa sociedade atual.
Há alguma relação de identificação entre as personagens e as pessoas que vocês conhecem em
seu país, em sua cidade, em seu bairro?
Em grupos formados por 3 alunos respondam, por escrito, no caderno, as questões propostas
abaixo. Cada grupo elegerá um representante para apresentar as respostas formuladas pelo grupo.
1. O que o texto nos conta? Esta história pode acontecer no nosso cotidiano? Por quê?
2. As personagens da fábula não são identificadas por um nome. Comente este recurso discursivo.
3. Qual é o primeiro fato que acontece e que desencadeia outras situações vividas pelos
personagens?
4. O homem e a mulher agem da mesma forma com a galinha? Justifique a sua resposta.
5. Pode-se dizer que o homem estabelece uma relação de exploração, isto é, quer obter mais lucro
com poucos gastos. Com isto é mostrado no texto?
6. A mulher se preocupava com o bem estar da galinha, alimentando-a bem? Comente a sua
resposta.
7. A relação de submissão é representada no texto através de quais personagens? Explique a sua
resposta.
8. Qual é o clímax e o desfecho da história?
9. O que se pode aprender ao ler esta história?
10. Elementos da narrativa O que representa
a. A Galinha
b. O Homem
c. A Mulher
d. Botar ovos
e. Ovos de ouro
f. Pão-de-ló, mingau, sorvete
g. Milho
h. Farelo
i. Portão aberto
11. Por que a Galinha foi embora?
12. Podemos dizer que a galinha foi ingrata por que abandonou os seus donos?
13. Com base na leitura do texto, escreva uma lição de moral ou o que você aprendeu ao ler história
pode nos transmitir.
14. A avareza é representa nesta história através de qual personagem? Comprove a sua resposta
com base no texto 5.
15. A atitude de conformismo é representada no texto? Como?
16. Explique o uso do discurso direto no texto.
17. Apresente o tipo de narrador da história e explique por que a autora escolheu este recurso
discursivo.
18. A história narrada focaliza aspectos comuns das relações humanas. Exemplifique esta afirmativa
a partir de um exemplo de situação ou de um acontecimento que você tenha vivido ou presenciado.
Questão 1
Todos os dias a galinha bota um ovo de ouro. Botar ovos é o seu trabalho. O ovo de ouro é o produto do seu trabalho. No
entanto ele não pertence a galinha, mas ao dono, que, ao fim de um certo período, estará rico. Qual o tema que se pode extrair
dessas figuras?
Questão 2
Em troca do ovo de ouro (produto de seu trabalho), a dona dá sucessivamente a galinha: mingau, pão-de-ló e sorvete, farelo,
milho. No final, não lhe dá nada. A galinha tem de catar o de comer no quintal. O que significa as figuras mingau, pão-de-ló,
etc., considerando que elas constituem o que se recebe para produzir ovos de ouro?
Questão 3
As figuras mingau, sorvete, etc., mostram que a retribuição à galinha é cada vez menor, enquanto o fruto de seu trabalho
permanece constante (todos os dias bota um ovo de ouro). Como gasta cada vez menos com a galinha, o homem vai ficar
mais rico. Qual o tema que aparece sob essas figuras?
Questão 4
A Galinha foi embora porque quase não lhe davam nada em troca do que produzia. Dizem que está numa casa onde a tratam
a pão-de-ló. Essas figuras recobrem que sentido mais abstrato?
Questão 5
A mulher estava preocupada com o bem-estar da galinha quando a tratava com mingau, sorvete e pão-de-ló? Aponte no texto
uma frase que justifica sua resposta.
Questão 6
Se compararmos este texto de Ruth Rocha às fábulas poderemos transpor para as relações humanas. Que contextualização
verifica-se em um terceiro nível de leitura?
Questão 7 Nas fábulas, algumas características aparecem repetidas frequentemente determinando uma organização e um estilo próprios para esse gênero. Circule a letra que corresponda às características desse tipo de texto:
a. Inicia-se sempre com era uma vez;
b. São pequenas histórias em que predominam os animais como personagens;
c. Propõe a solução de enigmas, crimes ou mistérios;
d. Os animais agem como se fossem pessoas: falam, cometem erros, são
sábios ou tolos, bons ou maus;
e. Iniciam-se com um local, data e vocativo. Finalizam-se com saudação
de despedida;
f. O herói ou heroína sempre se sai bem no final;
g. É comum aparecer diálogos entre animais;
h. Presença de seres ou objetos mágicos;
i. Essas histórias terminam com uma moral, um ensinamento;
j. São oferecidas pistas que podem ajudar a solucionar um enigma;
k. Há uma comparação nas fábulas entre animais e qualidades ou defeitos próprios dos seres
humanos. Exemplo: raposa/esperteza, formiga/trabalho, leão/sabedoria.
l. As histórias se passam em castelos, com príncipes, bruxas e fadas.
m. São narrativas curtas que tratam de certas atitudes humanas como a disputa entre fortes e fracos,
a esperteza e a lerdeza, a ganância e a bondade, a gratidão e a avareza;
n. Podem ser vistas como um excelente exercício de reflexão do comportamento humano e não com
formas de passar “verdades” imutáveis.
ANEXO 3
Percebendo diferentes intenções e conhecendo outros aspectos das fábulas
Como vimos anteriormente, quem conta ou escreve uma fábula tem alguma intenção, seja de
ensinar, aconselhar, convencer, divertir ou criticar.
Além disso, uma mesma fábula pode ser contada ou escrita de muitos modos diferentes; é o
que chamamos de versão.
Vamos conferir essas informações trabalhando com a fábula A cigarra e a formiga.
Tomamos o fato de existir um enunciador, sendo a maneira de o narrador criar no texto os
efeitos de subjetividade e aproximação. Embora saibamos que o enunciador pode ser ao mesmo
tempo o narrador e também autor.
Enquanto for lendo, preste atenção nas semelhanças e nas diferenças e nas diferentes
intenções que parecem estar por trás de cada fábula.
No inverno, as formigas estavam fazendo secar grão molhado,
quando uma cigarra, faminta, lhes pediu algo para comer. “As formigas lhe disseram:” Por que, no verão, não reservaste também o teu alimento? A cigarra respondeu: ”Não tinha tempo, pois cantava melodiosamente”. E as formigas, rindo, disseram: ”Pois bem, se cantavas no verão dança agora no inverno”.
A fábula mostra que não se deve negligenciar em nenhum trabalho, para
evitar tristezas e perigos. (ESOPO. Tradução Neide Smolka, 1994, p.181)
Análise do texto 1: “A cigarra e a formiga” de Esopo
1. Qual era a intenção de Esopo ao contar está fábula?
Fazer as pessoas desistirem de cantar e dançar.
Aconselhar as pessoas a fazer o que é importante para as mesmas, senão, podem se ver em
apuros depois.
Convencer as pessoas de que não se deve ser egoísta.
2. Que trecho da fábula ajudou você a assinalar a resposta do exercício 1 ?
3. Pelo que você entendeu da leitura dessa fábula, quais seriam as características principais da
cigarra e da formiga?
4. Você acha que essas características têm alguma relação com o comportamento real dessas duas
espécies de animais? Explique.
5. Qual é a “moral” dessa fábula? Você concorda com ela? Por quê?
6. A cigarra é uma cantora. A formiga faz trabalhos braçais. Pense nas atividades dessas duas
personagens e discuta com os colegas: por que, para o autor dessa fábula, cantar não seria uma
forma de trabalho?
A cigarra, sem pensar em guardar, a cantar passou o verão. Eis que chega o inverno, e então, sem provisão na despensa, como saída, ela pensa em recorrer a uma amiga: sua vizinha, a formiga, pedindo a ela, emprestado,
algum grão, qualquer bocado, até o bom tempo voltar. __"Antes de acosto chegar, pode estar certa a Senhora: pago com juros, sem mora." Obsequiosa, certamente, a formiga não seria . __"Que fizeste até outro dia?" perguntou à imprevidente.
__"Eu cantava, sim, Senhora, noite e dia, sem tristeza." __"Tu cantavas? Que beleza! Muito bem: pois dança, agora... “
A cigarra, sem pensar em guardar, a cantar passou o verão. (LA FONTAINE, 1989, p.73)
A CIGARRA E AS FORMIGAS
Houve uma jovem cigarra que tinha o costume de chiar ao pé
dum formigueiro. Só parava quando cansadinha; e seu divertimento então era observar as formigas na eterna faina de abastecer as tulhas.
Mas o bom tempo afinal passou e vieram as chuvas. Os animais todos arrepiados, passavam o dia cochilando nas tocas.
A pobre cigarra, sem abrigo em seu galhinho seco e metida em grandes apuros, deliberou socorrer-se de alguém.
Manquitolando, com uma asa a arrastar, lá se dirigiu para o formigueiro. Bateu - tique, tique, tique...
Aparece uma formiga friorenta, embrulhada num xalinho de paina.
- Que quer? - perguntou, examinando a triste mendiga suja de lama e a tossir.
- Venho em busca de agasalho. O mau tempo não cessa e eu... A formiga olhou-a de alto a baixo. - E que fez durante o bom tempo, que não construiu sua casa? A pobre cigarra, toda tremendo, respondeu depois dum acesso
de tosse. - Eu cantava, bem sabe... - Ah!... Exclamou a formiga recordando-se. Era você então
quem cantava nessa árvore enquanto nós labutávamos para encher as tulhas?
- Isso mesmo, era eu... - Pois entre, amiguinha! Nunca poderemos esquecer as boas
horas que sua cantoria nos proporcionou. Aquele chiado nos distraía e aliviava o trabalho. Dizíamos sempre: que felicidade ter como vizinha tão gentil cantora! Entre, amiga, que aqui terá cama e mesa durante todo mau tempo.
A cigarra entrou, sarou da tosse e voltou a ser a alegre cantora dos dias de sol.
Existe neste mundo quem carregue o piano, mas também quem o toque e alegre o ser humano. (LOBATO, M. 1994, p.7)
Já houve, entretanto, uma formiga má que não soube compreender a cigarra e com dureza a repeliu de sua porta. Foi isso na Europa, em pleno inverno, quando a neve recobria o mundo com o seu cruel manto de gelo. A cigarra, como de costume, havia cantado sem parar o estio inteiro, e o inverno veio encontrá-la desprovida de tudo, sem casa onde abrigar-se, nem folhinhas que comesse. Desesperada, bateu à porta da formiga e implorou - emprestados, notem! - uns miseráveis restos de comida. Pagaria com juros altos aquela comida de empréstimo, logo que o tempo o permitisse. Mas a formiga era uma usurária sem entranhas. Além disso, invejosa. Como não soubesse cantar, tinha ódio à cigarra por vê-la querida de todos os seres. - Que fazia você durante o bom tempo? . - Eu ... eu cantava! _ “Cantava? Pois dance agora, vagabunda! – e fechou-lhe a porta no nariz. Resultado: a cigarra ali morreu entanguidinha; e quando voltou a primavera o mundo apresentava um aspecto mais triste. É que faltava na música do mundo o som estridente daquela cigarra morta por causa da avareza da formiga. Mas se a usurária morresse, quem daria pela falta dela? Os artistas __ poetas, pintores, músicos __. São as cigarras da humanidade. (LOBATO, M, 1994, p.8)
O poeta José Paulo Paes também escreveu uma versão para a fábula “A cigarra e a formiga”, não optou pelo jeito tradicional (em forma de prosa), mas por outra maneira (em forma de poesia).Veja como ficou.
SEM BARRA
Enquanto a formiga Carrega a comida Para o formigueiro, A cigarra canta, Canta o dia inteiro.
A formiga é só trabalho. A cigarra é só cantiga.
Mas sem a cantiga
Da cigarra Que distrai da fadiga,
Seria uma barra O trabalho da formiga! (PAES, 1993, p.47)
Apresentadas as Fábulas, “A Cigarra e a Formiga", com um trabalho sistematizado,
procurando comparar diferentes versões das mesmas. Junto com o (a) seu (sua) professor (converse
com os colegas sobre o seu conteúdo e suas características).
Reflita sobre os fatos narrados e relacionando-os ao nosso cotidiano, por meio de
questionamentos organizados pelo professor (a).
Em relação à fábula "A Cigarra e a Formiga" comente sobre a valorização do trabalho e do
lazer em nossa sociedade atual e em outros tempos, sobre o espírito de solidariedade, de
companheirismo, o valor das profissões e outros aspectos, sobre os contextos históricos em que foi
produzida.
As atividades propostas deverão relacionar a leitura feita a fatos do dia a dia. Deverá, ainda,
responder, em que medida a lição de moral contida na fábula se aplica (ou não) ao modo de vida da
sociedade contemporânea.
Dando sequência à atividade, será trabalhada a estrutura composicional do gênero fábula e
suas características específicas.
Para tanto, serão organizadas atividades orais e escritas sobre as fábulas escolhidas:
“A Cigarra e a Formiga” tais como:
O acontecimento da fábula ocorreu num cenário? Envolveu pessoas? Animais?
O que as personagens (animais) representam? Qual é o objetivo do autor, ao usar animais na
fábula?
Qual o tema, a problemática apresentada na fábula lida;
Quais provérbios fecharam as narrativas? O que eles ensinam?
A observação, por parte do aluno, do uso do discurso na fábula: discurso direto ou indireto?
Composição do enunciado e uso dos recursos: pontuação, travessões, dois pontos, aspas e sua
função neste e em outros contextos;
Narrador, personagens e outros elementos da narrativa;
Análise texto 5: “Sem Barra” de José Paulo Paes 1- O poeta concorda com a fábula “A cigarra e a formiga”? Justifique sua resposta.
2 - Você concorda com José Paulo Paes?
3 - O autor reescreveu a fábula a seu modo, criando um novo jeito de contar. Que tipo de texto ele
produziu? Que características observadas no texto, justificam sua resposta.
4 - Ele alterou somente a forma ou o conteúdo da fábula também?
5 - O que você percebeu sobre a posição do poeta? Ele concorda com a fábula “A cigarra e a
formiga”? Explique.
6 - No poema de José Paulo Paes, o canto da cigarra completa o trabalho da formiga; Nas versões
tradicionais lidas antes, o canto da cigarra é oposto ao trabalho da formiga. Assinale a resposta
correta:
A - A partir da comparação, podemos concluir que na versão do poeta:
( ) O trabalho do artista é menos importante que os demais trabalhos;
( ) O trabalho do artista é tão importante quanto qualquer outro trabalho.
B - Nas versões tradicionais:
( ) O trabalho do artista também é importante;
( ) Só o trabalho que produz bens materiais é importante.
7-Todo trabalho tem de ser mecânico e utilitário? Ou conviria criar condições para realizar
criativamente nosso trabalho?
8- Faça mais uma leitura silenciosa nas cinco fábulas apresentadas. Você estudou e aprendeu que
na construção dos textos vamos encontrar elementos temáticos e figurativos. Saber distingue-las é
muito importante. Podemos dizer, portanto, que há duas formas de dizer alguma coisa. Analise os
textos acima veja quais suas características:
Fábulas: Figurativas Temáticas
Texto 1
Texto 2
Texto 3
Texto 4
1) Observamos que as diferenças apontadas nas três versões se referem basicamente quanto à
extensão do texto e quanto à escolha das palavras empregadas. Portanto, responda:
a. Em qual dos textos o fabulista optou por uma forma mais simples e resumida de escrever,
mantendo o sentido original da fábula? Com que propósito?
b. Em qual versão a linguagem empregada se distancia mais do jeito de falar atual? Dê exemplos de
palavras e descubra um sinônimo para elas.
2) Nos textos 2 e 4, temos as seguintes palavras: provisão; obsequiosa, imprevidente; chiar; faina;
manquitolando. Releia as partes dos textos em que aparecem essas palavras e tente explicar o
significado de cada uma delas de acordo com o texto.
3) Provavelmente, o texto “A formiga boa”, de Monteiro Lobato, agradará mais as crianças do que o
texto de La Fontaine. Isto se deve não apenas ao fato de a história ter um final feliz. Que outros
elementos podemos encontrar no texto de Monteiro Lobato que podem justificar esta afirmação?
4) Comparando os textos 2 e 3, vemos que o assunto em discussão é o trabalho e o lazer. O que é
valorizado num e noutro texto? Justifique sua resposta.
5) E você, o que pensa sobre o trabalho e o lazer? Como cada um deve ser encarado em nossa
vida?
6) Em “[...] ela pensa em recorrer a uma amiga”, a que palavra dita anteriormente, no texto 2, o
pronome ela se refere? Por que o autor usou este recurso?
7) Observe, nos textos 2 e 3, a maneira como cada narrador marca a fala das personagens. Agora
responda: De que maneira essas falas são marcadas num e noutro texto? Reescreva as falas dos
personagens de cada texto, fazendo a inversão dessas marcas.
8) Agora é um bom momento para confrontar as várias versões (Jean de La Fontaine, Monteiro
Lobato e Millôr Fernandes) da fábula “A cigarra e a formiga” e analisar o contexto sócio-histórico em
que cada versão foi escrita. Suas atitudes, de modo geral, levam-no a acreditar que você está mais
para formiga ou para cigarra? Por quê?
ANEXO 4
Trabalhar com os valores vivenciados na família e/ou na escola: amizade, solidariedade, a
persistência e outros, e orientar o aluno para que, por exemplo, produza uma fábula onde possa
trabalhar tais temáticas, procurando, digamos aconselhar o interlocutor a tomar determinadas
atitudes.
Ao integrar-se com os colegas e com os enunciados lidos e discutidos construir a sua fábula,
chegando às suas conclusões.
Nesta fase, orientado pelo professor, você fará um pequeno roteiro, antes de redigir o seu
rascunho. Enfim, fará um esboço, através de tópicos.
Assim, a partir dos conhecimentos adquiridos e construídos sobre o gênero fábula, redigirá a
sua narrativa (fábula) levando em consideração alguns tópicos, podendo, antes, refletir e preencher
um roteiro que o leve a:
Deixar clara qual é a sua intenção, ao propor a fábula X;
Levantar quantas, quais e como serão as personagens propostas;
Que moral da história resumirá a intenção da fábula proposta;
Criar um narrador que conte o(s) acontecimento(s) como se tivesse visto a(s) cena(s) que
aconteceram na história;
Reler, relembrar as características de o enunciado fabular estudadas;
Reunir as informações e conhecimentos construídos e redigirá o primeiro rascunho, com
poucos parágrafos, observando os sinais de pontuação, bem como, criando os diálogos e
marcando as falas das personagens com aspas ou parágrafos e travessões;
Lembrar que a resolução do problema proposto deverá estar de acordo com a intenção e com
a moral da história;
Lembrar que a moral da história deverá estar articulada de modo explicativo ou por
intermédio de um provérbio (pode-se inclusive, pesquisar provérbios na bíblia ou citar
provérbios populares);
Criar um título para a sua produção;
Fazer uma revisão, uma leitura da sua produção escrita;
Como produtor, conferir se a sua produção está ou não bem elaborada. Para tanto, seguirá
um roteiro de avaliação e marcará um X ao lado de cada item citado no roteiro de avaliação.
E, como sugestão, citamos a seguir, um modelo de roteiro, elaborado por Mônica Terezinha
Ottoboni Sucar Fernandes, em sua obra “Trabalhando com os gêneros do discurso – narrar:
fábula”, que poderá ser utilizado.
Você sabe que o seu trabalho ainda não terminou. Como todo escritor, você vai conferir se a
sua obra está bem elaborada, antes de entregar para o editor, no caso, o (a) seu (sua) professor (a).
Para isso, você criou o roteiro de avaliação abaixo. Marque um X ao lado de cada item e veja
se necessário mudar alguma coisa:
De
acordo.
Preciso
melhorar.
1. As personagens da história são típicas de uma fábula?
2. O tempo da história é indeterminado como nas fabulas?
3. Na situação criada, as atitudes das personagens podem ser comparadas com
atitudes humanas?
4. A resolução está combinando com a sua intenção e com a moral da história?
5. A moral da história combina com a fábula e com a sua intenção?
6. Você reuniu varias informações em poucas orações, usando sinais de
pontuação?
7. Não há repetição da palavra e para unir as informações?
8. O narrador conta o que aconteceu como se tivesse visto a cena?
9. As falas das personagens aprecem sinalizadas com aspas ou parágrafo e
travessão?
10. Não há repetição de palavras para indicar as personagens?
Escreva aqui as palavras de que você tem dúvidas quanto à ortografia.
ANEXO 5
Lembrança da Implementação Didático-
Pedagógica de Língua Portuguesa:
O mundo encantado das fábulas, leitura
semiótica e intertextualidade na sala de aula
Alunos da 6ª série C e Professora Rosilene Varotto “Até aqui nos ajudou o Senhor.” I Samuel 7.12.
Col. Est. Ary Borba Carneir.EFM.Cândido de Abreu.
2011.
O Vento e o Sol
Fábula de Esopo - Fabulista grego do século V a.C
"O vento e o sol estavam disputando qual dos dois era o
mais forte. De repente, viram um viajante que vinha
caminhando.
- Sei como decidir nosso caso. Aquele que conseguir fazer
o viajante tirar o casaco, será o mais forte. Você começa,
propôs o sol, retirando-se para trás de uma nuvem. O
vento começou a soprar com toda a força. Quanto mais
soprava, mais o homem ajustava o casaco ao corpo.
Desesperado, então o vento retirou-se. O sol saiu de seu
esconderijo e brilhou com todo o esplendor sobre o
homem, que logo sentiu calor e despiu o paletó."
Moral: O amor constrói, a violência arruína.