as densidades da cor branca -...
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as densidades da cor branca
as densidades da cor branca
as densidades da cor branca
andré boniatti
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as densidades da cor branca
(o livro das lendas reais)
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as densidades da cor branca
(o livro das lendas reais)
1ª edição, (do autor)
2012
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andré boniatti
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primeiro sonho:
a lenda do nascimento da flor
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“Há no firmamento
Um frio lunar.
Um vento nevoento
Vem de ver o mar.”
(Fernando Pessoa)
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a primeira flor do mundo
antes disso,
o mundo era rocha; rocha
e exatidão medida,
como a med-
ida
do corpo
em fase de efervescência...
...reticência.
ninguém acreditara na forma (da pedra na rocha),
nem os cupins, nem o carmim do chão e do sol (da pedra na rocha),
e os anjos molharam as nuvens com
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mel
e suor;
— o céu ainda era o éden,
por hora.
e nasceu Deus na consciência do homem e,
do ponto central da pedra,
nasceram bolhas de sabão que fumacearam ao céu como ao hélio.
os senhores e as senhoras pasmaram! e uma formação
pouco rochosa
cravou os brotos por de
dentro
da rocha.
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clara como o algodão-doce rosa
era doce e
determinava a necessidade
da chuva do
céu.
(era a única flor
que nascera
agora
no mundo.)
o coração era rocha
do broto da flor
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houve a revolta das cores;
mas tudo era pra ser
cinza.
o fogo, contanto, incendiara tudo, e todos
gritavam, queimavam,
doíam,
— pela primeira vez no mundo a dor era absoluta e inexplicável.
de repente, um dos homens cravou
no peito
por sobre o coração
um punhal:
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o sangue vermelho escorrido
fizera-o perder o
palor;
a cor bordô das orelhas
e da ponta do nariz
no frio
fizera-o a
-inda
cheio de sonhos.
e a flor nasceu de novo, agora, da ponta dos dedos de um homem
mortal.
o vaso de estanho
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a mulher do réu,
a rainha,
porque o rei era culpado em razão do caos,
observou um vaso de estanho,
que a mãe do réu,
a rainha,
ganhara no bingo das bruxas. fora a primeira observação alquímica
para transformar a flor
em ferro:
o pecado mais grave do mundo.
a primeira liberdade dos deuses
a partir do nascimento da flor,
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o mundo tornou-se
estranho,
e havia estranhamento
por todos os lados, (de forma infame e assombrosa e
intemperantemente nervosa).
e, dos nervos da rocha, antes rocha, fizera-se assim o desejo,
a rosa; e de todos os modos
das bifurcações nervosas se aprendera a faltar, e a desejar
com o olhar, e a não
perdoar,
e assim se aprendera a doer e a
cantar.
e assim se fizera ao homem
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possível errar.
a descoberta da ciência
...contanto,
concebido o elemento químico
da pólvora, tamborosamente, à rosa, já se havia
criado
o canhão:
e pois
que houve a guerra, em razão da única flor (sólida)
nascida do centro da rocha,
onde escondido
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achava-se o fogo, achavam-se sonho, lava,
sexo
e calor.
o homem dos dedos de flor
mas o homem dos dedos de flor,
que cravara o coração com a
“faca”,
tinha as mãos de buquê,
e tinha lírios na boca.
com isso, plantara sementes (no xaxim das ideias dos homens)
erguendo, com o sangue vermelho,
a esperança:
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a densidade mais funda da cor.
o dilúvio
sobre as hastes do horizonte enegrecido
a terra levantou-se em poeira,
raivosa, a berrar,
como aos murros e aos socos,
e a engolir os astros e os rastros da luz e do céu.
o vento embriagara-se e bêbado, e cambo, e sedento, varrera
tudo
como aos braços do abismo,
ou de Deus
— enraivecido.
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a cor pura
quando então a pureza
deitara o seu véu (branco) sobre as fontes do encanto,
por ventura ali passava a diligência
da luz.
mediante ela, a mansidão se tornou colorida,
da reflexão do sol,
queimando os olhos como brasa
e anunciando,
— embora os dedos não quisessem tocar:
nascera o tempo
d’o vento
assoprar, e não mais parar.
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o tempo do cais
pr’aportar.
de dentro das tumbas (a canção apaixonada)
ouvi!
a canção agora sua.
a lua flutua
(branca).
ouvi!
a fruta resulta
oculta.
não fiqueis deitados, não fiqueis enterrados,
vinde à mansidão: ‘stão nascendo
campos. verdejando
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cores.
não é mais hora
de estarmos
deitados. a terra criou-nos braços
!estridentes!
agora é tempo de o braço erguer fortalezas. colher o fruto,
a terra dará o fruto,
ouvi!
são pássaros cor-de-paisagem. anus. unhas-de-gato.
tesourinhas. quero-queros. sabiás!
isso é o rio que corre no mato,
aliás!
são os sonhos da menina pureza,
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ela deitou o manto!
vinde! saí para fora das tumbas! acordai!
ouvi!
tem espadas cravadas no chão,
creio que sejam para
tomá-las.
vinde,
depressa.
ouvi!
talvez seja só hoje!
a madrugada de ovo (o dia seguinte ao amanhã)
os grilos
madrugavam cor de ovo,
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não brancos, cor
de gema;
dourada era a lua no céu.
tudo era assim, da cor de ouro, como se se quebrasse a casca das
aparências.
como se se por dentro tudo transparecesse, real, igual no que é
desigual.
e a olhar de longe havia um ser enternecido
de mil anos corridos,
um profeta do cosmos febril.
pusera-se, agora encarquilhado, a desdenhar o passado.
sorriu.
sabia que o sol amanhecia de novo,
revigorosamente.
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parte 2:
lendas do mundo anterior
o apêndice
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31
as estrelas do céu
Fez, pois, Deus o firmamento, e separou as águas que estavam
debaixo do firmamento das que estavam por cima do
firmamento. E assim foi.
(Gênesis, 1:7)
no tempo em que não havia maldade,
as borboletas que avoavam o céu,
um dia,
decidiram colorir
o mar negro da
noite.
— suicídio! assim indicou um comum.
pois quando as borboletas,
caídas na água,
banhavam suas asas
perdiam sua
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32
força.
não podiam
voar.
mas subiram em bando, eram brancas e amarelas,
e colaram-se às águas do céu:
e foi assim que se nasceram as estrelas,
que nos fazem
sonhar.
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33
os instintos vazios
depois que o sonho foi firmado
e que o sol passou a brilhar todas as manhãs,
a terra queria brotar o sentido;
o sentido mais íntimo:
o de nasc-
ser.
pois que naquele momento
só o nascer
salvaria o mundo da vaziez
de sentido:
a morte.
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34
e a natureza despiu-se
de seus instintos
vazios.
tornou
-se
mulher.
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35
os peixes do ar ou o primeiro conflito
os peixes,
naquele tempo,
moravam no céu, porque as nuvens
eram cheias;
e no chão não fazia água
nem chuva.
as barbatanas eram asas, a espinha era oca,
e as guelras respiravam (no ar),
às brânquias das
nuvens ,
as águas celestes.
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36
mas a terra, que era vazia,
queria (ambicionadamente)
os peixes
pra si,
e foi que, do centro
da rocha,
de dentro do miolo, fez queimar
o calor
causando
o derretimento aos rios.
as nuvens inchadas
começaram a tremer
(os vapores da terra as fizeram raivosas),
e os peixes, de medo, mergulharam
como planos descidos
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37
águias
gaivotas
se escondendo onde os pingos
nem os riscos de raios
do céu
jamais poderiam
medrar.
e a terra alcançou suas vaidades
nascendo flores no m
ar.
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38
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39
os ovos em flor
quando um dia, da inveja entre os peixes,
um espécime roubou
os ovos botados
dos outros
e enterrou-os em fossos
de areia e de terra, fora d’água,
e d’água fez
barro,
e fechou;
à semente,
chocaram-se coisas insanas,
como ao caos e à
confusão.
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40
e foi assim que os homens nasceram
e todas as plantas
e os corpos terrestres,
e, por isso, no fim,
hoje, tudo volta
a ser água:
tudo é capaz de voar,
liquidamente;
tudo é capaz de
nadar.
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as densidades da cor branca
andré boniatti
2012