artigo da especialização versão 1 entrega

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Universidade Federal de Pelotas Faculdade de Educação Programa de Pós-Graduação em Educação Formação Docente e Contemporaneidade Viviane Maciel da Silva Tavares Bioquímica e Arte: a simbiose contemporânea Artigo Pelotas 2009

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Page 1: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

Universidade Federal de Pelotas

Faculdade de Educação

Programa de Pós-Graduação em Educação

Formação Docente e Contemporaneidade

Viviane Maciel da Silva Tavares

Bioquímica e Arte: a simbiose contemporânea

Artigo

Pelotas

2009

Page 2: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

2

Viviane Maciel da Silva Tavares

Bioquímica e Arte: a simbiose contemporânea

Artigo apresentado ao Programa de Pós Graduação em Educação, da Universidade Federal de Pelotas, como requisito parcial para a obtenção do grau de Especialista em Educação. Área de Concentração: Formação Docente e Contemporaneidade.

Orientador: Eduardo Rocha

Pelotas

2009

Page 3: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

3

Viviane Maciel da Silva Tavares

Bioquímica e Arte: a simbiose contemporânea. 2009.

Artigo (Especialização em Educação) – Universidade Federal de Pelotas.

Programa de Pós-Graduação em Educação. Núcleo de Formação Docente e

Contemporaneidade.

Orientador: Eduardo Rocha

1. DNA. 2. Arte Contemporânea. 3.Química. 4. Bioarte. 5. Educação.

Page 4: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

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Sumário

Simbiose................................................................................................................. 5

Processos Químicos .............................................................................................. 6

Parte I: Formas Duras ............................................................................................ 9

No interior dos Cromossomos – Bioquímica .......................................................... 9

Emparelhamento de bases – a aproximação da fronteira .................................... 13

2218 Pares de Base .............................................................................................. 16

Parte II. Flexibilização da Forma .......................................................................... 20

Replicação Celular ............................................................................................... 20

Parte III: Formas Flexíveis.................................................................................... 24

A Fita Dupla da Molécula ..................................................................................... 24

A bioarte de Kac ................................................................................................... 26

Efeito da reação ................................................................................................... 32

Referências .......................................................................................................... 33

Page 5: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

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Simbiose

“relação mutuamente vantajosa entre dois ou mais organismos vivos de

espécies diferentes. Na relação simbiótica, os organismos agem

ativamente em conjunto para proveito mútuo, o que pode acarretar

especializações funcionais de cada espécie envolvida. A simbiose

também é chamada de protocooperação”

Fonte: http://www.todabiologia.com/dicionario/simbiose.htm

Figura 1: Imagem do livro Simbiose Fonte: http://www.audienciazero.org/eixo/images/stories/imagens/portugal/artecontemporanea/salomeSilva/simbiose/simbiose_02.jpg

Page 6: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

6

Processos Químicos

Diários de classe, receitas de bolo, coleções e metodologias são

ferramentas de tradução de processos de produção de sentido. Minha construção

começa em um processo consciente, de uma busca nem tão consciente assim,

por um “algo a mais” ainda não desvendado, ou, não bem elucidado na mente da

pesquisadora.

Este artigo é um relato, a partir de uma perspectiva que busca a

cartografia, de um primeiro encontro pouco confortável, o qual esbarra no

conceito duro, na forma estática, que se preocupa com a ética ao invés da

estética, e que busca pela lógica ao invés da sensação. Como a de deparar-se

com a coelha verde, “Ah brilha no escuro é?!? Por quê??? Com que objetivo???”.

Ou um segundo encontro forçoso, com um que de “Tah! Vamos olhar pra

isso então”, que resulta em borboletas de orquídeas, pelas mãos de uma artista.

Assim, de uma maneira ainda tímida, a cabeça inclina pra que o olhar se

dobre, e dobre também o pensamento. Pensamento agora atravessado por um

movimento novo, que perde a dimensão de Uno ao mesmo tempo em que se

esforça para ganhar dimensão de múltiplo.

É possível pensar cartografias como mapas, desenhos destinados a

representar o espaço, o lugar, seja ele geográfico ou conceitual. Para os

geógrafos cartografia é mapa, é comunicação e análise, seja ela visual, imagética,

fílmica, sonora, ou dos sentidos, das sensações. De localizar e sentir o mundo1.

Para Gilles Deleuze e Félix Guattari, os indivíduos ou grupos são

atravessados por verdadeiras linhas, fusos e meridianos distintos. Nossa

existência é uma espécie de geografia. Somos corpos cartográficos. Assim como

______________________________ 1 “Como forma de comunicação, a cartografia apresenta distorções da realidade, mas toda a

mensagem é uma mensagem distorcida da realidade, nenhuma é isenta. Toda ela é política. O que precisamos, é saber qual é a política de nossa cartografia, quais as minhas escolhas, meus caminhos e meus dejetos. In (Rocha, 2008)

Page 7: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

7

os mapas geográficos delimitam e registram territórios políticos, econômicos e

culturais, os indivíduos também são registrados e cruzados por linhas. Algumas

dessas linhas são postas do exterior para eles e não se cruzam, ao contrário,

separam-se e demarcam os seus próprios territórios. Outras são produtos do

acaso, mas há outras que devemos inventá-las, traçá-las, efetivamente, na vida.

Devemos inventar nossas próprias linhas de fuga. Mesmo que para alguns

indivíduos ou grupos nunca seja possível construí-las; Outros já as perderam. As

linhas de fuga são “uma questão de cartografia. Elas nos compõem, assim como

compõem nosso mapa. Elas se transformam e podem mesmo penetrar uma na

outra.”2

Todos nós usamos mapas, e os construímos na medida em que nos

localizamos em determinado território. Esta localização nos mapas pressupõe um

encontro, uma experiência, uma experimentação. Leitor e autor do mapa são

sujeitos ativos na comunicação cartográfica, devem lutar para isso. É preciso, na

montagem ou leitura de um mapa, estar à espreita, reparar, espiar, reinventar e,

de alguma forma, sentir a vida que passa por ali.

Carreados por estas linhas de fuga, chegam ao encontro do corpo outros

movimentos como a filosofia da diferença3 e com ela diversos materiais

colecionáveis vão se descortinando pra falar de uma nova tendência de produzir

ciência através da arte contemporânea, compondo assim mais um pontos de

orientação no mapa cartográfico. A professora, química, teórica, lógica, exata,

pesquisadora – molar – vai em busca de novas formas flexíveis e mutáveis,

também teóricas, mas pouco lógicas e nem um pouco exatas de pesquisa –

molecular – que conferem crescimento pessoal e prazer em colecionar, buscar,

conhecer, desvelar.

______________________________ 2 DELEUZE, Gilles & GUATTARI, Félix. (tradução de Aurélio Guerra Neto et alii). Mil platôs:

capitalismo e esquizofrenia, v. 3. Rio de Janeiro: ed.34, 1996.

3 Filosofia da diferença tem como importância o estudo da singularidade e da particularidade que

habita em cada pessoa. Por sua vez, a filosofia da diferença tem como entusiasmo criador os estudos dos antropólogos, pois se debruçam a estudar o fenômeno da diversidade, da pluralidade, da singularidade e das diferentes culturas. In: (http://www.overmundo.com.br/overblog/a-filosofia-da-diferenca)

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8

Nesta busca, várias coleções se formaram, dentre as quais podem ser destacadas:

Coleção de Filmes – Ficção Científica: A Ilha (2005), AI: Inteligência Artificial

(2001), Gattaca (1997), Jurassic Park (1993), THX 1138 (1967), Efeito borboleta

(2004), 2001 uma odisséia no espaço (1968), Sun shine – alerta solar (2007),

Laranja Mecânica (1971).

Coleção de Artistas Contemporâneos: Eduardo Kac, Lígia Clark, George

Gessert, Marta de Menezes, Oron Catts, entre outros.

Coleção de Autores Contemporâneos: Gilles Deleuze, Félix Guattari, Suely

Rolnik, Antonin Artaud, Pamela Champe, Bayardo Torres, Anne Calquelin, entre

outros.

Assim cada uma destas coleções produziu na pesquisadora um novo

encontro. Um encontro que pode dar-se com uma palavra, com uma obra de arte,

com um texto, com uma coisa, com um lugar. Um encontro provoca uma

oscilação no campo subjetivo, um deslocamento intensivo, uma ligeira ou grande

perda de referências, o que Deleuze e Guattari chamaram desterritorialização:

uma irrupção, uma sacudida ou desmoronamento de um território subjetivo, que

ocorre por efeito de pressões causadas pelas forças postas em movimento na

experiência mesma de se estar vivo.

Contagiada pelos perceptos produzidos pela arte contemporânea e pelo

movimento da bioarte que ela produz quando aliada à bioquímica, a professora vê

surgirem afectos em sua prática. De tal sorte que, ainda agora não se encontra de

vez na desordem, mas já permite, aceita e busca, por um pouco menos de ordem

no seu mundo e vê surgir em sua metodologia, menos método e mais cartografia.

Este artigo tem como intenção mostrar os dois lados desta fronteira do

conhecimento, aqui chamadas de formas duras e a partir deles tratar da bioarte,

chamada de forma flexível, enquanto um lugar habitável, como um novo estado

de devir.

Page 9: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

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Parte I: Formas Duras

No interior dos Cromossomos – Bioquímica

Ácido Desoxirribonucléico – DNA – uma estrutura molecular. Uma

descoberta estadunidense e britânica de 7 de Março de 1953, que lhes valeu o

Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1962. Menino para a química é um

polímero de unidades simples de pares de nucleotídeos4, cuja essência é formada

por açúcares e fosfatos intercalados unidos entre si. Ligados à molécula de

açúcar produz uma seqüência de quatro bases (Adenina, Citosina, Guanina,

Timina) ao longo da molécula de DNA que carrega a informação genética.

Pré-Adolescente para a biologia, dentro da célula, o DNA é organizado numa

estrutura chamada cromossoma5 e o conjunto de cromossomas de uma célula

forma o cariótipo6. O cariótipo se duplica antes da divisão celular e o seu DNA

dentro do núcleo.

Estas estruturas compactas guiam as interações entre o DNA e outras

proteínas7, ajudando a controlar que partes do DNA são transcritas. O DNA é

responsável pela transmissão das características hereditárias de cada espécie de

ser vivo, é único e provém de uma recombinação dos códigos dos pais doadores.

_____________________________

4 Nucleotídeos são compostos ricos em energia e que auxiliam os processos metabólicos,

principalmente as biossínteses, na maioria das células. Funcionam ainda como sinais químicos, respondendo assim a hormônios e outros estímulos extracelulares; eles são também componentes estruturais de cofatores enzimáticos, intermediários metabólicos e ácidos nucléicos. Os nucleóticos podem ser considerados os monômeros da DNA/RNA, sendo o polímero, o próprio DNA/RNA.

5 Cromossoma é uma longa sequência de DNA, que contém vários genes, e outras sequências

de nucleotídeos com funções específicas nas células dos seres vivos. 6 Cariótipo é o conjunto cromossômico ou a constante cromossômica diplóide (2n) de uma

espécie. Representa o número total de cromossomos de uma célula somática (do corpo), as células somáticas humanas apresentam 46 cromossomas. 7

Proteínas são compostos orgânicos de estrutura complexa, sintetizadas pelos organismos vivos através da condensação de um grande número de moléculas de alfa-aminoácidos, através de ligações denominadas ligações peptídicas. As proteínas são os componentes químicos mais importante do ponto de vista estrutural.

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Jovem então Bioquímica – de união, de interação – a química da célula. O

DNA dos seres vivos começou a ser manipulado em 1972. Inicialmente introdução

e eliminação de genes8 foram conseguidas apenas em microorganismos, mas

rapidamente passou a ser realizada em organismos mais complexos. O primeiro

mamífero geneticamente modificado surgiu no início dos anos oitenta (1981).

Permição então, para investigar a função e a localização dos genes e as

proteínas características de cada espécie.

Adulto agora é tronco9, base para o rizoma com o qual se torna possível

formar quaisquer novos organismos, sejam órgãos, tecidos, espécies.

Para Deleuze e Guattari, o rizoma funciona através de encontros e

agenciamentos, como um verdadeiro mapa das multiplicidades, “voltado para uma

experimentação ancorada no real”, aberto, desmontável, reversível, sujeito a

modificações permanentes, sempre com múltiplas entradas (DELEUZE &

GUATTARI, 1995). Assim como as estruturas recombinantes do DNA, onde os

pares de bases nitrogenadas podem ser substituídos, reorganizados,

redistribuídos, mutados, clonados, num copia e cola de pontes de hidrogênio10

rizomáticas.

Ainda segundo os autores, um rizoma não tem nem sujeito nem objeto,

senão unicamente determinações, tamanhos, dimensões, que não podem

aumentar sem que ela mude sua natureza, um sequenciamento genético que

muda sua natureza na medida em que aumentam suas conexões. Em um rizoma

__________________________________________________________

9 Gene é a unidade fundamental da hereditariedade. Cada gene é formado por uma sequência

específica de ácidos nucléicos (DNA e RNA). é um segmento de um cromossomo a que

corresponde um código distinto, uma informação para produzir uma determinada proteína ou

controlar uma característica, por exemplo, a cor dos olhos.

10 Tronco referência as células-tronco, também conhecidas como células-mãe ou células

estaminais, são células que possuem a melhor capacidade de se dividir dando origem a células

semelhantes às progenitoras. As células-tronco dos embriões têm ainda a capacidade de se

transformar, num processo também conhecido por diferenciação celular, em outros tecidos do

corpo, como ossos, nervos, músculos e sangue. Devido a essa característica, as células-tronco

são importantes, principalmente na aplicação terapêutica, sendo potencialmente úteis em terapias

de combate a doenças cardiovasculares, neurodegenerativas, diabetes tipo-1, acidentes

vasculares cerebrais, doenças hematológicas, traumas na medula espinhal e nefropatias.

Page 11: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

11

"O rizoma conecta um ponto qualquer com outro ponto

qualquer, e cada um de seus traços não remete

necessariamente a traços de mesma natureza, ele põe

em jogo regimes de signos muito diferentes, inclusive

estados de não-signos. O rizoma não se deixa reduzir

nem ao Uno nem ao múltiplo... Ele não é feito de

unidades, mas de dimensões, ou antes, de direções

movediças. Não tem começo nem fim, mas sempre um

meio, pelo qual ele cresce e transborda. Ele constitui

multiplicidades" (DELEUZE, 2000)

Figura 2: Representação tridimensional das bases de uma molécula de DNA. Fomte: http://www.chemicalgraphics.com/paul/images/DNA/gem-dna.jpg

l

Page 12: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

12

não há pontos ou posições como ocorre em uma estrutura de árvore, uma raiz.

Em um rizoma só há linhas (DELEUZE & GUATTARI, 1995).

A noção de unidade somente aparece quando se produz em uma

multiplicidade uma tomada de poder pelo significante, um processo de

correspondência de subjetivação. Um rizoma ou multiplicidade11 nunca se deixa

codificar, nunca dispõe de dimensão suplementar ao número de suas linhas, as

multiplicidades se definem por ele afora: pelas linhas abstratas, linhas de fuga ou

de desterritorialização, segundo a qual mudam de natureza ao conectarem-se

com outras (DELEUZE & GUATTARI, 1995).

___________________________________

10 Pontes de hidrogênio são interações que ocorrem entre os íons de hidrogênio e dois ou mais

átomos, de forma que o hidrogênio sirva de "elo" entre os átomos com os quais interage. São as

interações intermoleculares mais intensas, medidas tanto sob o ponto de vista energético quanto

sob o ponto de vista de distâncias inter atômicas, essa ligação se estabelece, sobretudo com os

elementos muito eletronegativos (F;O;N). A ligação intra molecular se faz na mesma molécula e a

intermolecular se faz entre duas moléculas.

11

Multiplicidade para os autores multiplicidades são enunciadas como encontros "A

multiplicidade não deve designar uma combinação de múltiplo e de um, mas, ao contrário, uma

organização própria do múltiplo enquanto tal, que não tem necessidade alguma da unidade para

formar um sistema." (DELEUZE, 1998).

Page 13: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

13

Emparelhamento de bases – a aproximação da fronteira

Cada tipo de base numa cadeia forma uma ligação com apenas um tipo de

base na outra cadeia. Este comportamento é designado de complementariedade

de bases. Assim, as purinas12 formam pontes de hidrogênio com pirimidinas13.

Este arranjo de dois nucleotídeos complementares na dupla hélice é chamado par

de base.

Além das pontes de hidrogênio entre as bases, as duas fitas são mantidas

juntas devido a forças geradas por interações hidrofóbicas14 entre as bases

empilhadas, a qual não é influenciada pela sequência do DNA. Como as pontes

de hidrogênio não são ligações covalentes15, podem ser quebradas e reunidas

com relativa facilidade. Como resultado desta complementariedade, toda a

informação contida numa das cadeias de DNA está também contida na outra, o

que é fundamental para a replicação do DNA.

Os dois tipos de pares de base formam diferentes números de ligações por

pontes de hidrogênio: A - T (Adenina e Timina) formam duas pontes de hidrogênio

enquanto que G - C (Guanina e Citosina) formam três pontes de hidrogênio.

Desta forma a interação entre Guanina e Citosina é mais forte que Adenina e

Timina. Como resultado, as percentagens de Guanina e de Citosina disponíveis

__________________________________

12

Purinas são compostos orgânicos heterociclícos de bases nitrogenadas compostas por um anel

aromático duplo, são as bases dos ácidos nucleicos, a adenina e a guanina. No DNA estas bases

unem-se às pirimidinas complementares.

13

Pirimidina são compostos orgânicos semelhantes ao benzeno, mas com um anel heterocíclico,

no qual dois átomos de nitrogénio substituem o carbono nas posições 1 e 3. Três das bases dos

ácidos nucleicos, a citosina, a timina e o uracila, são derivados pirimídicos.

14

Hidrofóbicas designam uma qualidade molecular em contato com a água, ou seja, compostos

hidrofóbicos são iminscíveis em água. Como exemplo podemos citar solventes orgânicos de longa

cadeia carbônica em contato com a água.

15

Ligação Covalente é caracterizada pelo compartilhamento de um ou mais pares de Elétrons

entre átomos, causando uma atração mútua entre eles, que mantêm a molécula resultante unida.

Átomos tendem a compartilhar elétrons de modo que suas camadas eletrônicas externas sejam

preenchidas e eles adquiram uma distribuição eletrônica mais estável. Ligações covalentes

normalmente ocorrem entre átomos com eletronegatividades similares e altas.

Page 14: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

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em uma dupla hélice de DNA determinam as forças de interação entre os dois

lados da cadeia de DNA. Conseqüentemente, podemos perceber que uma parte

da dupla cadeia de DNA pode ser separada facilmente, nas porções das

sequências com maior predomínio de A - T, tal como a T-A-T-A-A-T, para facilitar

a abertura da dupla cadeia quando da transcrição16. Eis os espaços no código.

Espaços no código que se localizam entre um meio caracterizado como

uma superfície fronteiriça a ser conquistada, a superfície que guarda os devires

que se desprenderam do fundo absoluto dos corpos e que estão por se

metamorfosear em acontecimento às coisas, aos objetos, aos códigos, aos

sujeitos. Tal fronteira – a se efetuar, é o sentido-acontecimento que, se chega a

delimitar as duas instâncias, o faz segundo a articulação de suas diferenças. Mais

que delimitá-las, separá-las, ele as conecta pela diferença17.

“Queremos pensar na diferença em si mesma e a relação do diferente com

o diferente, independente das formas da representação que as conduzem ao

Mesmo e as fazem passar pelo negativo” (DELEUZE, 2006). A filosofia da

diferença se debruça a estudar o fenômeno da diversidade, da pluralidade, da

singularidade e das diferentes culturas, sua presença brota a pedagogia que

___________________________ 16

Transcrição é o processo de formação do RNA a partir do DNA. Esse RNA formado é o RNAm

(RNA mensageiro), que tem como função "informar" ao RNAt (RNA transportador) a ordem correta

dos aminoácidos a serem sintetizados em proteínas. O processo é catalisado pela enzima RNA-

polimerase. Os fatores de transcrição (auxiliares da RNA-polimerase) são responsáveis por

romper as pontes de hidrogênio entre as bases nitrogenadas dos dois filamentos de DNA, como

se fosse um zíper. A partir deste momento, a enzima escolhe uma das fitas de DNA como molde

para se construir o RNAm, ligando bases nitrogenadas de RNA (adenina, citosina, uracila e

guanina) à essa fita de DNA. Ao se concluir essas ligações, o processo está completo. A enzima

destaca o filamento de RNA formado a partir do DNA, e volta a unir as duas fitas de DNA.

17

Nas palavras de Deleuze (1998): “As coisas e as proposições acham-se menos em uma

dualidade radical do que de um lado e de outro de uma fronteira representada pelo sentido. Esta

fronteira não os mistura, não os reúne (não há monismo tanto quanto não há dualismo), ela é,

antes, a articulação de sua diferença: corpo/linguagem”. O mirante de Deleuze tornar-se-á cada

vez mais claro: sua fronteira não será aquilo que irá delimitar, restringir, mas o que vai poder

relacionar e articular os diferentes. Essa diferença em si, diferença na estrutura, o que bota a

vazar o pensamento, do que não se pode controlar. A filosofia da diferença originada nos escritos

de Nietzsche, que considerados coletivamente, “ajudaram a moldar o discurso pós-moderno

diretamente, como no caso de Heidegger, Derrida, Foucault, Lyotard, Paul de Man, Deleuze e

Guattari„. In: (PETERS, 2000).

Page 15: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

15

respeita e cultiva o encontro dos distintos saberes. Cada ser humano é diferente e

carrega em si um determinado tipo de saber. É na diferença que está a

originalidade do pensamento bioquímico, o verdadeiro sentido e a riqueza de ser

gente e ter consciência dos mecanismos que movimentam o corpo.

Assim, por meio da fronteira, a dualidade aberta no código se estende e se

dissemina em cada um dos ramos: a bioquímica na arte, a arte na bioquímica. No

tocante às coisas, há certamente uma bioarte, o real que lhes constitui, mas há

também o atributo lógico que caracteriza o instante infinitivo de uma

transformação incorporal. Já quanto às proposições, os experimentos e os

movimentos de performace, mas temos também os encontros, que expressam os

acontecimentos (Deleuze, 1998).

Page 16: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

16

2218 Pares de Base

Quando se fala em arte contemporânea não é para designar tudo o que é

produzido no momento, e sim aquilo que nos propõe um pensamento sobre a

própria arte ou uma análise crítica da prática visual. “No contemporâneo, a

experiência da desestabilização encontra-se a tal ponto intensificada que ela não

mais se associa à doença; sua generalização a situa no âmbito de uma

normalidade. Essa experiência tende então a ser vivida como fragilidade. O medo

não é mais o de não conseguir configurar-se segundo um certo mapa, pois

múltiplos são os mapas possíveis. O medo agora é de não conseguir reconfigurar-

se de todo, de forma minimamente eficaz.”19

Como dispositivo de pensamento, a arte interroga e atribui novos sentidos

ao se apropriar de imagens e objetos, não só os que fazem parte da história da

arte, mas também as que habitam o cotidiano, por exemplo, a exposição Corpo

Humano: Real e Fascinante, que embora não tenha sido idealizada como uma

exposição de arte e sim como um movimento educacional, acaba por ganhar esta

amplitude, no momento em que causa um encontro, embora desconfortável, em

alguns observadores, ao ponto de ter sido proibida em alguns países.20

O belo contemporâneo não busca mais o novo, nem o espanto, como as

___________________________ 18

A Semana de Arte Moderna, também chamada de Semana de 22, ocorreu em São Paulo no

ano de 1922, de 11 a 18 de fevereiro, no Teatro Municipal. Durante os sete dias de exposição,

foram expostos quadros e apresentadas poesias, músicas e palestras sobre a modernidade.

A Semana de Arte Moderna representou uma verdadeira renovação de linguagem, na busca de

experimentação, na liberdade criadora da ruptura com o passado e até corporal, pois a arte

passou então da vanguarda, para o modernismo. O evento marcou época ao apresentar novas

idéias e conceitos artísticos, como a poesia através da declamação, que antes era só escrita; a

música por meio de concertos, que antes só havia cantores sem acompanhamento de orquestras

sinfônicas; e a arte plástica exibida em telas, esculturas e maquetes de arquitetura, com desenhos

arrojados e modernos. O adjetivo "novo" passou a ser marcado em todas estas manifestações que

propunha algo no mínimo curioso e de interesse.

Participaram da Semana nomes consagrados do modernismo brasileiro, como Mário de Andrade,

Oswald de Andrade, Víctor Brecheret, Anita Malfatti, Menotti Del Pichia, Sérgio Milliet, Heitor Villa-

Lobos entre outros. Fonte:http://pt.wikipedia.org/wiki/Semana_de_Arte_Moderna

19

Rolnick, Novas figuras do caos: mutações da subjetivação contemporânea. In: Caos e Ordem na

Filosofia e nas Ciências, org. Lucia Santaella e Jorge Albuquerque Vieira. Face e Fapesp, São

Paulo, 1999.

Page 17: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

17

vanguardas da primeira metade deste século: propõe o estranhamento ou o

questionamento da linguagem e sua leitura.

A Arte é então um Corpo-vibrátil, sensível aos efeitos da agitação e da

movimentação dos fluxos ambientais que nos atravessam no cotidiano. Corpo no

qual germinam estados intensivos e desconhecidos provocados pelas novas

composições que os fluxos, passeando para cá e para lá, vão fazendo e

desfazendo. De tempos em tempos, estes fluxos avolumam-se a tal ponto que

são capazes de produzir nos corpos uma germinação. Através dela, o corpo não

consegue mais expressar-se em sua atual figura, busca, pois novas formas, de

dizer, ser e conquistar.

Para Deleuze e Guatarri, essas novas formas podem ser chamadas de

conteúdos do corpo, e são substâncias que escorrem sobre tais corpos, partículas

submoleculares e subatômicas, intensidades puras, singularidades livres pré-

físicas e pré-vitais, que vão compor uma matéria, ou plano de consistência ou o

Corpo sem Órgãos, que se mostra como um corpo não-formado, não-organizado,

não-estratificado ou desestratificado, e que podem dar origem a novos e

diferentes formatos.

Na arte contemporânea o artista e obra se fazem simultaneamente, numa

inesgotável heterogênese. É através da criação que o artista opera na

materialidade de seu trabalho: aí se inscrevem as marcas de seu encontro

singular com a possibilidade de sua transmissão: ampliam-se na subjetividade do

receptor as chances de realizar ao seu modo um encontro, aproximar-se de seu

corpo-vibrátil e expor-se às suas exigências de criação.

___________________________ 20

Corpo Humano: Real e Fascinante, já percorreu 34 cidades em todo o mundo, tem uma

concepção diferenciada e inédita, desenvolvida em caráter prioritariamente educativo, sob direção

médica do norte-americano Dr. Roy Glover. "Corpo Humano: Real e Fascinante" recorre a 22

corpos e 225 órgãos verdadeiros para revelar - em todos os seus aspectos - o funcionamento do

corpo humano e seus sistemas. Para tanto, faz uso de uma técnica chamada polimerização, em

corpos adultos de homens e mulheres, para obter resultados que evidenciam com absoluta

precisão as variações e diferenças apresentadas por nossa espécie.

Todos os corpos e órgãos exibidos são de indivíduos acometidos de morte natural, que optaram

por participar de um programa de doação de seus próprios corpos em benefício da ciência e da

educação, realizado pela República Popular da China.

Page 18: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

18

“Dê-me portanto um corpo: esta é a

fórmula da reversão filosófica. O

corpo não é mais o obstáculo que

separa o pensamento de si mesmo,

aquilo que deve superar para

conseguir pensar. É, ao contrário,

aquilo em que ele mergulha ou deve

mergulhar, para atingir o impensado,

isto é, a vida." Gilles Deleuze

Page 19: Artigo Da Especialização Versão 1 Entrega

19

A arte é assim um sistema metabólico, em que estão combinados

organismos invisíveis que povoam nosso corpo em sua generosa vida celular;

corrente sanguínea de coragem de enfrentamento do trágico. De acordo com os

contextos históricos, varia o grau de permeabilidade da membrana entre esta

reserva de heterogênese e o resto dos organismos. O tanto que o corpo respira

seus ares, depende do quanto o artista metaboliza sua obra.

De outro lado, nosso corpo espectador tem se agitado mais do que nunca,

novas tecnologias de comunicação e informação, cada indivíduo é

permanentemente habitado por fluxos do planeta inteiro, o que multiplica as

hibridações aguçando consequentemente o engendramento de diferenças que

vibram no corpo. Assim, a disparidade entre a infinitude da produção de

diferenças e a finitude das formas tem se exacerbado cada vez mais, entre a

célula e o organismo não há mais quase intervalo, conforme nos alertava Lygia21

já nos anos sessenta; as formas são hoje mais efêmeras do que nunca. Em

outras palavras: muitos fluxos, muita hibridação, produção de diferença

intensificada é o que os artistas contemporâneos oferecem aos seus

espectadores;

_______________________________________

21 Lygia Clark (Belo Horizonte, 1920 – Rio de Janeiro, 1988) em 1947 dedica-se ao estudo de

escadas e desenhos de seus filhos. No ano de 1952, a artista expõe no Rio de Janeiro obras do

Grupo Frente. Em 1954 dedica-se ao estudo do espaço e da materialidade do ritmo, com a linha-

luz, como módulo construtor do plano. Em 1954, participa com a série “Composições”, da Bienal

de Veneza. Em 1959, integra a I Exposição de Arte Neoconcreta, Clark propõe com a sua obra,

que a pintura não se sustenta mais em seu suporte tradicional. Nas “Unidades, 1959”, moldura e

“espaço pictórico” Clark pinta a moldura da cor da tela, é o que a artista chama de “linha orgânica”.

Destas novas proposições nascem os “Casulos, 1959”, feitos em metal, o material permite que o

plano seja dobrado, dando tridimensionalidade ao plano. Em 1960, Lygia cria a série “Bichos”:

esculturas, feitas em alumínio, com dobradiças, que promovem a articulação das diferentes partes

que compõem o seu “corpo”. Em 1961, ganha o prêmio de melhor escultura na VI Bienal de São

Paulo. Na “Obra Mole, 1964”, “Caminhando, 1963” obteve grande destaque no cenário brasileiro.

Em 1968 apresenta, “A casa é o corpo", uma instalação de oito metros, que permite a passagem

das pessoas por seu interior, para que elas tenham a sensação de penetração, ovulação,

germinação e expulsão do ser vivo. O corpo dessexualizado é apresentado na série “roupa-corpo-

roupa: O Eu e o Tu, 1967”. Em 1972, as proposições “Arquiteturas biológicas, 1969", “Rede de

elástico, 1973", “Baba antropofágica, 1973" e “Relaxação, 1974". “Objetos relacionais": na

dualidade destes objetos (leves/pesados, moles/duros, cheios/vazios), Lygia trabalha o “arquivo de

memórias” dos seus pacientes, os seus medos e fragilidades, através do sensorial. Em 1983 é

publicado o “Livro Obra", que acompanha por meio de textos escritos pela própria artista e de

estruturas manipuláveis, a trajetória da obra de Lygia.

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20

Parte II. Flexibilização da Forma

Replicação Celular

As aproximações da Arte e da Ciência não são novas, historicamente vemos

estas tentativas de reprodução e de criação da arte amparadas nos avanços,

descobertas ou nas perspectivas do que busca a ciência. É através da química e

da biologia que o trinômio arte-ciência-tecnologia vem se estreitando,

especialmente ao longo do século XX, dando início a uma trajetória artística.

Essa aproximação fica mais evidente, ao fazermos um breve ensaio pelo

universo cinematográfico, em que nosso personagem DNA, é facilmente

encontrado, a colorir a imaginação de autores e diretores. Deleuze sobre o

cinema nos diz que como uma tabela de Mendeleiev em química, o cinema impõe

novos pontos de vista.

Na produção “The Island” de 2006 (título em português A Ilha), dirigido por

Michael Bay, o autor descreve uma trama em que a empresa de engenharia

genética Merrick Biotech, promete aos seus clientes proporcionar, pelo valor de

US$ 5 milhões a criação de um ser amorfo, insensível, enfim, uma "massa" que

tão somente serviria para produzir órgãos geneticamente idênticos ao do seu

investidor.

Porém, com o avanço das pesquisas demonstra que a perspectiva de

criação de um clone que pudesse servir para transplante somente seria bem

sucedida se este fosse realmente igual ao seu DNA doador, ou seja, um humano

que sente, tem fome, dor e sentimentos como qualquer pessoa.

Estes clones eram mantidos confinados em um complexo secreto de

aparência futurística, sob o pretexto de o planeta Terra ter sido atacado por um

vírus letal, após ter sido recoberto por água. Quando da necessidade de utilização

destes clones, era simulado no complexo um sorteio, através do qual o

beneficiário seria transferido a uma ilha, que supostamente, seria a última porção

de terra habitável no planeta.

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21

Uma interessante mescla de ficção científica22 mostra conceitos reais sendo

aproximados de situações hipotéticas, detêm a atenção dos espectadores durante

127 minutos recheados de suspense e ação. A fim de produzir uma atmosfera de

realismo um site foi desenvolvido na internet, no qual é possível consultar a

empresa responsável pela criação dos clones e simular a utilização dos serviços

(figura 4).

Deleuze citando Bergson nos diz que, "Temos visões quase instantâneas da

realidade que passa, e como elas são características desta realidade, basta-nos

alinhá-las ao longo de um devir abstrato, uniforme, invisível, situado no fundo do

aparelho do conhecimento... Percepção, intelecção, linguagem procedem em

geral assim. Quer se trate de pensar o devir, ou de o exprimir ou até de o

percepcionar, o que fazemos é apenas acionar uma espécie de cinematógrafo

interior."

Assim, a agora contemporânea simbiose DNA e Estrutura Molecular se

aceleraram e se complementam. Este engajamento dos artistas no mundo da

pesquisa científica sugere a impossibilidade da segregação DNA e Estrutura

Molecular, como fitas complementares de RNA que se sintetizam para formar um

novo código genético. A denominação que esta nova configuração de código

recebeu é Bioarte, arte biológica, arte genética.

_________________________________________

22

Outras referências de filmes de ficção científica ao longo da história: Dr. Jekyll and Mr. Hyde

(1931 – Rouben Manoulian): Para provar que o bem e o mal convivem nas pessoas, um médico

pesquisador desenvolve uma fórmula que o faz perder o controle de seu lado demoníaco; The

Invisible Man (1933 – James Whale): Um homem descobre a fórmula da invisibilidade e tenta

descobrir seu antídoto, para que possa vendê-la e ficar rico; The Fly (1986 – David Cronemberg):

Ao testar sua recentemente invenção, uma máquina de teletransporte, um cientista acidentalmente

deixa entrar uma mosca na câmara. Quando é mais uma vez materializado, seu corpo sofre

transformações genéticas irreversíveis; Jurassic Park (1993 – Steven Spielberg): Um milionário

vê seu parque de diversões, estrelado por dinossauros recriados por engenharia genética, sair do

controle quando uma falha humana os deixa livres pelo parque; Gattaca (1997 – Andew Niccol):

No futuro, apenas os homens criados geneticamente em laboratórios têm valor. Concebido

biologicamente, Vincent assume a identidade genética de um ex-atleta para conseguir destaque;

A.I. Artificial Intelligence (2001 – Steven Spielberg): No futuro, onde parte das terras foi inundada

pela elevação do nível dos mares e andróides convivem com os seres humanos, um cientista

resolve, após perder seu único filho, criar um robô com todas as características daquele - inclusive

a capacidade de pensar e sentir.

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Figura 4: Site oficial do filme A Ilha nos EUA

Fonte: http://www.theisland-themovie.com/ - acessado em junho de 2009.

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23

Figura 5: Imagem do filme “A Ilha Fonte: http://img92.imageshack.us/i/ilha1ez4.jpg/

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Parte III: Formas Flexíveis

A Fita Dupla da Molécula

As pesquisas biológicas circundam o DNA em vários níveis, desde sua

constituição molecular até os organismos populacionais dele derivados. Esta

manipulação de átomos através da introdução de ácidos nucléicos à estrutura

molecular do DNA, para a produção de organismos geneticamente competentes,

tem descortinado um nanouniverso para os amantes das cores e das formas, que

devido à relevância do dilema os têm recebido nas inserções arte/biologia.

Inserções estas que não são apenas emergentes, mas já diversificadas em

obras de um aspecto representativo dos contextos. Pesquisadores constroem

diferentes problemas e propõem diferentes soluções metodológicas, que vão de

performances, a escultura, robótica e bioengenharia. Dentre os artistas

contemporâneos que produzem movimentos na Bioarte, Eduardo Kac é um dos

mais citados.

Nesta movimentação não ocorre uma busca por reconstituir a vida social e

cultural, mas por fazê-lo na própria vida humana, por buscar suas ramificações

em variados sistemas de extensões tecnológicas, sua simulação de vida artificial

e de sua replicação resultante da decifração do genoma, ou seja, a referência a

um conceito que não captura a essência molecular, mas sua atmosfera é capaz

de aguçar potencialidades de efetuar um ritmo e uma sensação em seu

espectador.

A dupla articulação é tão variável que não podemos partir de um modelo

geral, mas apenas de um caso relativamente simples. Deleuze e Guatarri nos

contam que a primeira articulação escolheria ou colheria, nos fluxos-partículas

instáveis, unidades moleculares ou quase moleculares metaestáveis

(substâncias) às quais imporia uma ordem estatística de ligações e sucessões

(formas) (DELEUZE & GUATARRI, 1995).

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25

A segunda articulação instauraria estruturas estáveis, compactas e

funcionais (formas) e constituiria os compostos molares onde essas estruturas se

atualizam ao mesmo tempo (substâncias) (DELEUZE & GUATARRI, 1995).

Vê-se que as duas articulações não se dividem em uma para as

substâncias e outra para as formas. As substâncias não passam de matérias

formadas. As formas implicam um código, modos de codificação e descodificação.

As substâncias como matérias formadas se referem a territorialidades, a graus de

territorialização e desterritorialização. Mas há, justamente, código e territorialidade

para cada articulação, cada uma comportando por sua conta, forma e substância.

No momento, podia-se apenas dizer que a cada articulação correspondia um tipo

de segmentaridade ou de multiplicidade: um maleável, sobretudo molecular e

apenas ordenado; outro mais duro, molar e organizado (DELEUZE & GUATARRI,

1995).

Na verdade, embora a primeira articulação não deixasse de apresentar

interações sistemáticas, era sobretudo no nível da segunda que se produziam

fenômenos de centramento, unificação, totalização, integração, hierarquização,

finalização, que formavam uma sobrecodificação. Cada uma das duas

articulações estabelecia relações binárias entre seus próprios segmentos

(DELEUZE & GUATARRI, 1995). Assim nasce a Bioarte, uma fita dupla

indissociável originaria da associação. A força dos signos do universo da Bioarte

em um “ao meu redor” de cores, linhas e idéias que criam pela invenção e

imaginação.

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A bioarte de Kac

Eduardo Kac nasceu no Rio de Janeiro, formou-se em Comunicação Social

na PUC do Rio de Janeiro. No começo dos anos 80 ele criou uma série de

performances de conteúdo político e de humor em espaços públicos, que

resultaram no livro "Escracho". Produziu a partir de 1983 obras como a

holopoesia, e a holografia digital. Pioneiro da arte digital e transgênica, Kac

concebeu e desenvolveu arte da telepresença com robôs de controle remoto que

interagiam com os participantes, entre outros projetos estão "Ornitorrinco", "Rara

Avis", "A-positivo", "Time Capsule".

Inaugurando a "arte transgênica", Kac apresentou em 1999 a obra

"Genesis". Kac criou um “gene artista” sintético, produzido através de um trecho

do Velho Testamento transcrito para código Morse e depois de código Morse para

DNA. Neste código os traços representam a timina, os pontos a citosina, o espaço

entre as palavras a adenina e o espaço entre as letras a guanina; assim, tem-se

os quatro constituintes fundamentais do DNA, num "alfabeto" genético. A

sentença bíblica diz: "Deixe que o homem domine sobre os peixes do mar, sobre

as aves do céu e sobre todos os seres vivos que se movem na terra" (Gênese 1,

28). O gene foi introduzido em bactérias, que foram postas em placas de Petri. Na

galeria, as placas foram postas sobre uma caixa de luz ultravioleta controlada por

participantes remotos na Web. Ao acionar a luz UV, participantes causam

mutação do código genético e assim mudam o texto contido no corpo das

bactérias. Após a exposição, o gene foi lido e o texto mutante publicado no site de

Kac.

Kac gerou enorme polêmica internacional com sua obra "GFP Bunny"

(2000), que incluiu a criação, através de engenharia genética, de uma coelha com

GFP (figura 6), ou Proteína Fluorescente Verde, sob luz azul a coelha emite luz

verde. Kac chamou atenção para o fato de que a coelha é perfeitamente saudável

e que ele assumia responsabilidade por seu bem estar. Desde o princípio o

objetivo do artista era trazer a coelha para viver com ele e sua família em

Chicago.

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Figura 6: Alba Fonte: http://www.labjor.unicamp.br/comciencia/img/divulgacao/ar_cris/1_final.jpg

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Em 2001 Kac criou sua terceira obra transgênica, "O Oitavo Dia", uma

verdadeira ecologia de seres trasgênicos verdes, todos criados com GFP (figura

7). A obra, que se conectava à Internet de várias formas, ainda incluiu um robô

biológico, o segundo criado por Kac. Em seguida vieram as obras "Move 36"

(2002/04), e a série "Espécime do Segredo sobre Descobertas Maravilhosas"

(2006).

A mais recente obra de Eduardo Kac é chamada "História Natural do

Enigma" é um plantimal, uma nova forma de vida que Kac criou e que ele chama

"Edunia", a flor é um novo tipo de Petunia que Kac inventou e produziu através de

biologia molecular. A Edunia (figura 8) não é encontrada na natureza. Ela tem

veias vermelhas e pétalas cor de rosa. Um gene do artista é expresso em todas

as células de suas veias vermelhas, isto é, o gene de Kac produz uma proteína

somente na rede venosa da flor. O gene foi isolado e sequenciado a partir do

sangue do artista. As pétalas cor de rosa contra as quais as veias vermelhas são

vistas, são evocativas do próprio tom de pele rosada de Kac. O resultado desta

manipulação molecular é uma planta que cria a imagem viva de sangue humano

correndo nas veias de uma flor.

O gene que Kac selecionou de seu próprio genoma é responsável pela

identificação de corpos estranhos, ou seja, nesta obra é precisamente aquilo que

identifica e rejeita o outro que o artista integra no outro, criando assim uma nova

espécie de ser que é parcialmente flor e parcialmente humano. "História Natural

do Enigma" é uma reflexão sobre a contiguidade da vida entre as diferentes

espécies. Usa a vermelhidão do sangue e a vermelhidão das veias da planta

como um marcador do nosso patrimônio comum. Com a combinação do DNA

humano e o da planta em uma nova flor, de uma maneira visualmente dramática

(expressão em vermelho do DNA humano nas veias da flor), Kac faz brotar a

poética da contiguidade da vida entre as diferentes espécies.

Na expectativa de um futuro no qual Edunias sejam acessíveis e plantadas

por toda parte, Kac criou um conjunto de "Edunia Seed Packs" (Pacotes de

Sementes da Edunia), que estão incluídos na exposição. Os "Edunia Seed

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Figura 7: O Oitavo Dia Fonte: http://www.upenn.edu/pennnews/photos/704/mice.jpg

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Packs" contêm as sementes da Edunia e fazem parte da coleção permanente do

Museu de Arte Weisman.

Eduardo Kac demonstra em seu trabalho a simbiose que tentou-se

descrever neste artigo, pois explora de maneira muito interessante toda a

molaridade da bioquímica atrelada a molecularidade da arte contemporânea,

oportunizando que nosso rizoma crie novas linhas de fluxo para compor esta

cartografia. Na bioarte temos uma dupla articulação que traz em si um corpo

híbrido capaz de conter apenas os melhores genes das duas partes.

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Figura 8: Edunia – híbrido produzido a partir de um gene do artista. Fonte: http://www.ekac.org/nat.hist.enig.port.html

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Efeito da reação

Duarte (2005) nos conta sobre o conceito de fronteira em Deleuze e nele o

autor nos diz que fronteiras são sítios de exacerbação e de excesso, onde limites

são ultrapassados, novas dimensões descobertas, e reodenamentos

encaminhados.

Colocando-se neste lugar a professora/pesquisadora tem sua ordem se

perdendo aos poucos, pois habitando a fronteira ao longo destes meses, viu

surgir em seu pensamento espaços de ruptura e conflito, ambientes de

extremidades, crista e culminação, ao limite de precisar ser resgatada as vezes,

pela orientação gentil que diz: não esquece bioquímica é bioquímica, arte é arte e

filosofia é filosofia. Pois a originalidade criada pela via de multiplicação da

experiência produziu fusões de conceitos nem sempre mixáveis.

Nesses espaços de fronteira a imaginação se liberta, são lugares de devir;

“domínio das simbioses que coloca em jogo seres de escalas e reinos

inteiramente diferentes, sem qualquer filiação possível” (Deleuze, 1997), nesta

simbiose foi possível produzir a comunicação entre duas populações

heterogêneas que propagaram, povoaram e produziram um híbrido.

Aos poucos este devir deve involuir. No sentido de “formar um bloco que

corre segundo sua própria linha, „entre‟ os termos postos em jogo, e sob as

relações assinaláveis” (Deleuze, 1997), e neste involuir, nem retorna ao seu

estado inicial, nem segue habitando a instabilidade, mas passa a situar-se em um

novo território, que reconfigura uma prática pedagógica, agora buscando o

contexto ao invés da fórmula, afinal aprender e ensinar química não depende

apenas dos conceitos, dos diagramas e das fórmulas....mas depende também do

valor que cada conteúdo produz no cotidiano do indivíduo. Percebo que o velho

discurso de que “tudo tem química” ganha agora uma nova dimensão, pois prefiro

que meu aluno identifique e traga para a sala de aula uma matéria do jornal, ou

um recorte de revista, do que saiba construir o diagrama de Pauling .

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33

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