Área temática: economia política internacional a inserÇÃo
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Área Temática: Economia Política Internacional
A INSERÇÃO CHINESA NO MERCADO INTERNACIONAL
Elizabeth Maciel Barros (UNB) Carlos Augusto da Silva Souza (UFPA)
Florianópolis, 29 e 30 de setembro de 2016.
A INSERÇÃO CHINESA NO MERCADO INTERNACIONAL
Elizabeth Maciel Barros Carlos Augusto da Silva Souza
Resumo: A República Popular da China (RPC) goza, atualmente, de uma indiscutível
situação de destaque no cenário internacional. Relevância esta que se dá em razão de que esse país iniciou sua ascensão pautada na conquista de mercados nos cinco continentes. Como ressalta Dupas (2007), com base em estatísticas das agências internacionais, a China desfrutou de um crescimento médio anual de 9% no período 1995 a 2000; e de 9,3%, no período 2000 a 2005; enquanto o Brasil, nesse mesmo intervalo de tempo, experimentava uma taxa de crescimento média de 2,5%. Este artigo, portanto, se propõe a discutir a ascensão do poder econômico da RPC no cenário internacional, antevendo o seu novo papel na geopolítica internacional, com destaque para as influências dessas transformações em escala global, mormente no que toca aos aspectos políticos e econômicos. O artigo está organizado da seguinte forma: a primeira seção explora alguns conceitos da Economia Política Internacional. A atenção se voltará para autores consagrados e devotados ao estudo da Economia Política Internacional (EPI). Na segunda seção, o artigo explora o histórico resumido da República Popular da China nas últimas décadas e na terceira seção o estudo focará a ascensão da China no Sistema Internacional em razão do seu dinamismo econômico no comércio exterior. Palavras-chave: China, Comércio Exterior.
1. Introdução
A República Popular da China (RPC) apresentou nas últimas décadas uma situação
de expressivo crescimento nas relações comerciais com os mais diversos países e expandiu
sua influência na economia internacional, exercendo capacidade de investimento em todos
os continentes que compõe a complexa geopolítica internacional. Na América Latina, a
China encontrou um ambiente favorável para ampliar sua rede de relacionamento comercial
devido à condição de subdesenvolvimento em que se encontravam todos os países desta
região. O Brasil se beneficiou desta condição transformando-se em um curto espaço de
tempo como um dos principais parceiros comerciais com a economia chinesa.
Como ressalta Dupas (2007), considerando as estatísticas das agências
internacionais, a China desfrutou de um crescimento médio anual de 9% no período 1995 a
2000; e de 9,3%, no período 2000 a 2005; enquanto o Brasil, nesse mesmo intervalo de
tempo, experimentava uma taxa de crescimento médio de 2,5%. A partir de 2005 com a
intensificação do comércio entre Brasil e China a economia brasileira começa a expandir
suas taxas de crescimento. Desta forma, este artigo se propõe a discutir a ascensão do
poder econômico da RPC no cenário internacional, antevendo o seu novo papel na
geopolítica internacional, com destaque para as influências dessas transformações em
escala global, sobretudo aos aspectos políticos e econômicos.
Para Viola e Lima (2013, p. 117), a ascensão chinesa representa uma das grandes
agitações vigentes no sistema internacional, pois suas conquistas devem-se ao poder
econômico que essa nova China hoje exerce, impactando cenário mundial, mormente em
razão da forma peculiar como essa potência administra suas relações de natureza política e
econômica no plano internacional. Devido a esse novo quadro geopolítico em processo de
construção, há que ser reconhecido pelos atores internacionais, ser o avanço do gigante
asiático vetor de grande influência na política mundial, aos poucos, começa a incomodar a
hegemonia centralizada dos Estados Unidos. A ascensão da China no mundo causou
pânico no sistema internacional, pelo fato de ter assumido um posto de alta relevância na
economia do planeta, em que pese seu modelo econômico de governança se apoiar no
capitalismo de Estado. Veiga e Rios (2015) ratifica que nenhuma região do mundo ficou
imune à ascensão da China ao status de potência econômica global. Sendo assim, este
artigo visa discutir a RPC que vem paulatinamente alcançando um crescimento econômico,
com grande capacidade de governança, planejando, formulando e desenvolvendo
estratégicas políticas econômicas.
Mundialmente, a China afirma sua capacidade de poder em governar, tanto no
plano interno como na esfera internacional, visto que o Estado chinês tem obtido mais poder
no âmbito das instituições multilaterais: ONU, Fundo Monetário Internacional (FMI), junto
aos países integrantes do G-20, por exemplo; além disso, a RPC está fechando acordos
bilaterais com muitos países espalhados pelos cinco continentes.
Neste ensaio, pretendemos definir alguns conceitos da Economia Política
Internacional ligada às Relações Internacionais, buscando inspiração em autores como
Roberto Gilpin, um realista devotado ao estudo da Economia Política Internacional. Idem
com Susan Strange, por sua teoria do poder estrutural, uma vez que, o poder hegemônico
determina as regras do poder no plano internacional. Paralelamente, faremos também um
breve histórico de a RPC, com destaque para sua trajetória de crescimento econômico.
2. Metodologia de investigação
Para efeito de construção de evidências para a pesquisa, inicialmente realizamos
um levantamento dos principais trabalhos sobre o tema a partir da busca em periódicos,
dissertações e teses produzidas no Brasil e no exterior em busca referenciada nas palavras
chaves ―china‖, ―comércio internacional‖ e ―relações comerciais‖, tendo por base procedural
a identificação de autores chaves da Economia Política Internacional e da literatura referente
ao avanço comercial chinês e suas relações comerciais com o Brasil. Tal levantamento
priorizou artigos, dissertações e teses publicados nos últimos três anos, com abrangência
nacional. O critério selecionar os livros foi o de acessibilidade em bibliotecas físicas e em
online. Quanto à abrangência do campo de atuação de Economia Política Internacional
(EPI), as obras nacionais e internacionais ao lado de trabalhos apresentados em eventos
científicos acresceram a pesquisa.
Após o levantamento das obras, usamos alguns critérios de seleção à realização do
artigo como: a) os trabalhos consagrados na literatura sobre o tema, com definições e/ou
revisões conceituais; b) obras clássicas para um melhor entendimento de críticas
conceituais e/ou metodológicas; c) trabalhos publicados em periódicos internacionais
consolidados, com resultados de pesquisas empíricas recentes; d) artigos recentes com uso
ou indicação de novos métodos para o estudo referente à ascensão econômica no da RPC
e, por fim, e) artigos recentes com uso ou indicação de novos métodos para o estudo das
Relações Internacionais. Sobre isto, nosso ensaio pretende responder questão seguinte:
quais as características marcantes da ascensão econômica da República Popular da China
no cenário internacional?
3. A Nova Economia Política Internacional e o papel do Estado
No desenvolvimento do tema, elucidamos sobre os conceitos de comércio exterior e
economia internacional, concebidos no campo das Relações Internacionais, versando os
temas de negociações e acordos comerciais internacionais, comércios regionais e
multilaterais, bem como fluxo de mercadorias entre países conforme os olhares de autores
relevantes para a compreensão do fenômeno estudado.
As teorias do comércio internacional em suas origens estão ligadas ao
desenvolvimento do capitalismo comercial a partir do século XVIII. Estas teorias advogavam
a vantagem da troca de produtos em escala internacional em relação à produção interna. Os
pensadores mercantilistas desta fase histórica justificavam o comércio internacional pela
ótica das diferenças na relação entre exportação e importação, ou seja, pela oportunidade
que o comércio oferecia aos países mais produtivos para obter um excedente na balança
comercial, de forma a melhorar o processo de acumulação de capital nacional. O comércio
era considerado a fonte da riqueza das nações e o superávit comercial deveria ser atingido
a qualquer custo. Para isso, os países pautaram seu comércio no controle do fluxo de
mercadorias de forma a sempre obter vantagens, mesmo que fosse para monopolizar as
fontes de produção e consumo.
A partir do século XIX, com o desenvolvimento do capitalismo industrial o conceito
de excedente comercial não era mais suficiente para explicar a relação comercial entre
países. Assim, para suplantar os velhos e obsoletos conceitos mercantilistas, surgem teorias
de pensadores no nascente ramo da economia política clássica, entre os quais as obras de
Adam Smith, David Ricardo e John Stuart Mill destacam-se. Adam Smith, por exemplo,
considerado o pai da Economia Política Clássica, a partir de sua obra intitulada A riqueza
das Nações publicada em 1776 reconheceu a necessidade de rever as teses do comércio
exterior estabelecidas na fase mercantilista e desenvolveu a teoria conhecida como ―Teoria
das Vantagens Absolutas‖.
Nesta interpretação, o comércio exterior é visualizado como um sistema de
vantagens recíprocas entre países e parte da ideia que cada nação deve se concentrar na
produção daqueles bens que lhe são mais favoráveis em termos de custos de produção.
Dessa forma, a lógica do raciocínio de Smith parte da seguinte formulação: se um país pode
produzir uma mercadoria a preço mais baixo que o outro, então, deveria canalizar seus
esforços para incentivar o desenvolvimento desta mercadoria e desestimular o investimento
em produtos que não tivesse vantagens quando comparado à produção desse mesmo
produto em outro país. Smith afirmava que a troca dos excedentes entre países só seria
vantajoso se os custos de produção para importar determinada mercadoria estivessem
compensados pela exportação de outra. A teoria das vantagens absolutas vai ser
completada pela teoria do liberalismo econômico, que defendia um sistema baseado em
trocas vantajosas entre países, sem a intervenção do estado, o próprio mercado dispunha
de mecanismos de autorregulação. Uma interpretação da presença real de uma ―mão
invisível‖ que de forma natural promoveria benefícios mútuos para todos os envolvidos nas
relações de troca. Os teóricos da economia política clássica defendiam a livre concorrência
baseado nas vantagens absolutas advindas da lei natural da oferta e da procura e, por isso,
a não necessidade de um Estado interventor.
A partir da década de 1950, entretanto, a teoria das vantagens absolutas começa a
ser questionada. Neste período como desdobramento dos efeitos da Segunda Guerra
Mundial, incidiu várias mudanças na ordem mundial que termina por impactar o sistema
internacional em relação às determinações dos interesses nacionais. Momento este que
surge uma corrente que se autointitula como realista, centrado na perspectiva de mundo
voltada à supremacia dos interesses nacionais sobre o comércio exterior. E, o estado passa
a ocupar o centro das decisões como o ator básico do sistema de mercado e passa atuar de
forma a regular e determinar os interesses dos fluxos de mercadorias. Com o avanço desse
processo entram em cena os atores não estatais: as empresas multinacionais, por exemplo,
preservando a base nacional, sujeitas à regulação e ao controle procedente do país de
origem. Porém, presenciamos um crescimento acelerado de investimentos diretos no
exterior fruto da globalização financeira. A este respeito Sara Souza se posiciona da
seguinte forma:
Con la emergencia de actores no-estatales en el escenario global, en particular empresas multinacionales, el papel tradicional y dominante del Estado se vio cuestionado. Los procesos de la globalización cambian las estructuras de poder internacionales y transforman la organización, la dis-tribución y la forma del poder estructural, en el sentido de que diferentes agentes pueden influir en territo rios muy distantes, gracias a la alta interconexión e interrelación entre los distintos sitios del mundo (HELD ET AL., 1999: 20 y 28; apud SOUSA, 2013).
A teoria realista passa novamente a ser contestada a partir da década de 1970 em
um quadro de crise internacional que questiona a aliança entre o Estado-nação e os
interesses de grupos multinacionais. Segundo Souza (2007) nesta fase, mudanças
profundas vinham alterando gradativamente a ordem internacional até então vigente. Entre
os principais fenômenos de alteração na geopolítica internacional como: a) fim do
antagonismo entre socialismo e capitalismo com o fim da guerra fria; b) valorização da
democracia em escala mundial; c) o desenvolvimento de uma rede de comunicação
instantânea que permite maior acesso às informações e aos centros decisórios; d) uma nova
revolução tecnológica em segmentos estratégicos (eletroeletrônica, informática,
biotecnologia, engenharia genética, robótica); e) processo de globalização que
internacionaliza a produção e o consumo e; f) o neoliberalismo que produz uma nova ordem
institucional marcada pela liberalização da economia e acirramento das disputas comerciais.
Por esta razão, os processos de expansão da competição em escala internacional
impuseram uma dupla pressão sobre os Estados que, por um lado, cresceu o desafio estatal
em proteger os seus cidadãos, dado que a lógica do mercado, privilegiado pela economia
neoliberal, favorecendo os segmentos mais fortes com maior organização política e bem
mais capitalizada; de outro, exigiu do Estado maior eficiência durante os investimentos
públicos a fim de aliviar as pressões sobre as empresas nacionais e facilitar sua
concorrência frente ao mercado internacional. Da mesma forma, a superação da crise e
nova ordem internacional marcado por mecanismos de atuação conjunta dos países
em um mercado globalização exigiu, em contrapartida, o estabelecimento de regras
estáveis que permitisse uma atuação mais livre dos agentes econômicos e, ao
mesmo tempo, pudesse corrigir reais distorções sobre práticas abusivas dos
agentes do mercado que afrontam o bom funcionamento da competição e o
interesse público em bases mais justas e competitivas.
Assim, em função da nova ordem econômica em curso, o impacto da globalização
somado à crise econômica global, promoveu o esgotamento do modelo de Estado
intervencionista e aliado de grupos transnacionais. O que exigiu que o novo padrão de
desenvolvimento repensasse o papel do Estado, sendo imprescindível o imediato
reconhecimento dos núcleos em que o mesmo deveria atuar: disciplina fiscal, através da
qual o Estado deve limitar seus gastos à arrecadação, eliminando o déficit público;
focalização dos gastos públicos em educação, saúde e infraestrutura; reforma tributária que
amplie a base sobre a qual incide a carga tributária, com maior peso nos impostos indiretos
e menor progressividade nos impostos diretos; liberalização financeira, com o fim de
restrições que impeçam instituições financeiras internacionais de atuar em igualdade com as
nacionais e o afastamento do Estado do setor; taxas de câmbio competitivo; liberalização do
comércio exterior, com redução de alíquotas de importação e estímulos à exportação,
visando a impulsionar a globalização da economia; eliminação de restrições ao capital
externo, permitindo investimento direto estrangeiro; privatização, com a venda de empresas
estatais e a desregulação, com redução da legislação de controle do processo econômico e
das relações trabalhistas.
Com o processo globalizante, a liderança americana no comércio internacional
sofreu mudanças significativas com a emergência de novos atores políticos e novas
lideranças globais e regionais. Um dos indicadores desta mudança está nas negociações
multilaterais no âmbito do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT), que reduziram as
barreiras no comércio internacional e alterações nas bases do acordo de Bretton Woods,
criador de o Fundo Monetário Internacional (FMI), tornando o dólar norte-americano
referência para a paridade das moedas e passando a ser a principal moeda reserva de
vários países.
Até a década de 1980 esses dólares eram depositados nos Estados Unidos,
criando o chamado mercado de eurodólares. Como o dólar era a moeda de referência para
o sistema de paridade fixa, o aumento da oferta gerou liquidez internacional, dando início a
um processo especulativo que gerou turbulência no mercado e, consequentemente, o medo
da desvalorização do dólar, motivando que em vários bancos centrais ocorresse a troca do
dólar por ouro para compor suas reservas, e, em decorrência disso a posição norte-
americana enfrentou certa, visto que em agosto de 1971 o presidente Nixon suspendeu a
conversibilidade do dólar em ouro. Os Estados Unidos enfrentavam além dos impactos da
quebra do sistema de Bretton Woods, o desgaste da Guerra do Vietnã (1959-1975) e da
crise do petróleo (1973); fatores que vieram a assinalar a necessidade de adotar estratégias
revigorantes dos ânimos dessa nação.
De fato, a economia política mundial, na atual conjuntura, é diferente daquela criada
pelos Estados Unidos do pós-guerra, em virtude de ter surgido um país hegemônico, pelo
qual assistimos uma nova maneira de entendermos a organização econômica e política que
determinou um novo modelo estrutural da relação Estado e mercado. Pois, o Estado e o
mercado são fatores importantes de mudanças no mundo contemporâneo, mostrando
alteração da eficiência na produção do poder e da riqueza. Entretanto, a partir da década de
1970, o mundo passa a se mover em direção a crises acarretadas pelo padrão dólar e Gilpin
(2002) se preocupava em responder ao novo cenário de mudanças. Ele acreditava que
todas as hegemonias são transitórias porque o custo para mantê-las é muito grande. A
década 70 afirmou um novo cenário na economia internacional acarretado pelos problemas
do padrão ouro, com vários autores buscando explicar estas transformações.
Strange (1988) procura mostrar que o Estado não era mais o centro do poder e
defendia o pressuposto de que a economia deveria ser estudada e analisada dentro do
sistema internacional, partindo-se da ideia de um poder estrutural. A partir de então, o
entendimento do que é sistema internacional passou a ser o das interrelações entre fatos
políticos e econômicos, vendo-os como algo integrado. Conforme a situação, a problemática
das relações internacionais pode ser mais bem entendida pela análise do comportamento de
outras instituições como as companhias petrolíferas, tráfico de armas ou a presença de
grupos como, por exemplo, a Anistia Internacional (STRANGE, 1996, p. 68. in ANDRADE,
2002, p. 14).
Para Gilpin (2002, p. 37), entre muitas de suas preocupações, ele parte da ideia
que analisa o Estado como um ente gerenciador no contexto internacional das relações
estado-mercado. O Estado como centro de poder, isso porque, os mercados dependem do
Estado para poder governar, administrar a organização estatal, ou seja, baseado na
concepção realista de que o Estado deveria controlar o mercado. Uma de suas
preocupações básicas era em relação aos impactos que a economia global poderia causar
afetando as relações entre os Estados. O modo pelo qual os estados podem exercer
influência nas forças de mercado para obterem ganhos de maximização de vantagens nas
relações Estados versus mercados: ―o mercado aumenta a alocação eficiente dos recursos
existentes. O crescimento econômico existe porque o mercado promove uma redistribuição,
de terra, trabalho e capital, orientando-se para aquelas atividades mais competitivas‖. No
que consiste em explicar as mudanças do sistema internacional. Gilpin identifica três
tradições que devem ser levadas em conta para exercitar os diferentes níveis de análise.
Na primeira, temos a Teoria Liberal: o liberalismo derivado do Iluminismo, tendo
como seu principal ícone Adam Smith, em momentos pautados no início da industrialização
quando há um esforço impetuoso à abertura de novos mercados. Mas, existia excesso de
regulamentações relativas à liberdade comercial e industrial. Smith era contra a intervenção
excessiva do governo na economia, era contra o monopólio concedido pelo Estado a
algumas grandes companhias, defendendo assim postulações próprias da política
mercantilista em voga naquele início da Revolução Industrial. A argumentação em favor da
livre iniciativa ganharia apoio do empresariado que estava lutando exatamente pela
consolidação dessa política. Na segunda, temos o Nacionalismo Econômico, abalizada na
economia política internacional, de fundo realista, tendo como ponto central postulação de
que as atividades econômicas devem estar subordinadas ao fortalecimento dos Estados,
sendo que esses Estados disputam poder no cenário internacional, que pelo bem estar de
seus cidadãos, quer em favor de sua autonomia mediante ações articulada de dominação
dos mercados interno e externo. Um ponto importante dos nacionalistas é a industrialização
pautada em grandes corporações (GILPIN, 2002, p. 51; SOUSA, 2013, p. 69).
A terceira teoria, a Marxista, é centrada no estudo da anatomia do modo de
produção capitalista. O marxismo desvendou a lei principal desse sistema e forneceu a base
doutrinária para o pensamento revolucionário socialista do século XIX. A visão econômica
política passou a ver o capitalismo como um modo de produção historicamente determinado,
sujeito a um processo de superação. A teoria marxista acredita que a economia é
caracterizada por concorrência ou luta entre capitalistas e trabalhadores, na versão política,
a luta continuada entre oprimidos e opressores (GILPIN, 2002, p. 51; SOUSA, 2013, p. 70).
Foi na transição da economia com forte centralização do estado para uma economia
globalizada na década de 1960 à de 1990 que a China encontrou um ambiente favorável
para se fortalecer e assumir uma posição destacada na economia internacional.
4. Os Novos Caminhos da República Popular da China
No governo Deng Xiaoping, observa-se que a China deu um salto, modificando sua
maneira tradicional, saiu do seu isolamento para restabelecer pactos com nações
capitalistas, pois precisava ter apoio em sua nova empreitada de modernização econômica,
almejando sempre a estabilidade política. Chung (2005, p. 158) comenta que os políticos
chineses referem-se à China como um modelo de ―economia socialista de mercado‖. Isso
para explicar o avanço da RPC pela opção feita por ela, para justificar a sua decisão em
aceitar o capitalismo que impera no mundo. Para Viola e Lima (2013), a tradição do
isolamento chinês deve-se ao seu nacionalismo, sendo a China considerada historicamente
uma nação clássica e uma das civilizações mais antigas que o mundo veio a conhecer.
Acresce ainda o fato de sua imensa população ocupar um grande espaço territorial propício
a sustentação de uma economia de proporções gigantescas. Esse nacionalismo tem ainda
por fundamento o rigor educacional lastreado no pensamento do filosofo Confúcio, pleno de
similaridades com a teoria construtivista.
No aspecto ligado a relações exteriores, a progressiva expansão da China leva em
conta os aspectos econômicos e políticos internacionais que permitiram a expansão de sua
economia de modo a adquirir relevância neste novo cenário, o que é visto no início do
século XXI. Galgando uma posição confortável na escala hierárquica no sistema mundial,
acumulando Know-how para participar nas mesas de negociações de vários conflitos
mundiais, tanto na esfera econômica como na política internacional. A China chegou a
alcançar um lugar de destaque como potência global em 1890, mas, perdeu o título para os
Estado Unidos. A ascensão chinesa começa a se consolidar como a maior economia no
mundo a partir da década de 1990, deixando os estadunidenses em alerta, pois, tornou-se a
segunda maior economia. A esse respeito Lyrio (2010, p. 17) relata que no seu percurso
histórico até o século XV a China possuía ―a maior renda per capita do mundo e a liderança
em termos de inovação tecnológica. Embora a renda per capita do continente europeu tenha
superado a chinesa por volta de 1500, a China continuou a deter o maior produto nacional
até começos do século XIX‖.
A china passou por várias revoluções que culminaram com o seu declínio. Todavia,
com Deng Xiaoping assumindo o poder em 1978, foi possível reestruturar o pensamento
chinês e estabelecer novas normas e metas internas de desenvolvimento econômico, com
projeção internacional, tendo por objetivo transformar o país por meio da liberalização
econômica; isto é, mudando a vida dos chineses, na maioria pobres, para transformar a
China em uma grande nação, mesmo que isso mudasse um pouco os rumos do ideal estatal
socialista. Sem dúvida Deng almejava um sistema econômico a fim de a China tornar-se
uma nação poderosa em meados do século XXI. Para isto, o líder chinês adotou uma
―construção e modernização socialista por meio da adoção do programa das quatro
modernizações (agricultura, indústria, defesa nacional e ciência e técnica), com ênfase
inicial colocada na agricultura e nas zonas rurais‖ (CINTRA, 2013, p. 16).
Os dados mostram que a abertura da economia chinesa nos anos 70 foi
paulatinamente conquistando o mercado mundial, com a sua participação nas zonas
econômicas especiais (ZEE) que abrangiam o litoral oriental da China com o intuito de
receber empresas internacionais. A consolidação da República Popular da China foi
afirmada com seus projetos de desenvolvimento, sem esquecer um fator de produção
importante, a energia, providenciando, assim, a construção da maior Hidroelétrica do
mundo, a ―Três Gargantas‖. Em outras palavras, a China no período compreendido 1949 a
1970 estava praticamente alheia ao mundo capitalista devido ao bloqueio econômico,
político e militar imposto pelos USA. Todavia, com o fim do bloqueio em 1971,
imediatamente, a China converge para iniciar a forte utilização da sua capacidade produtiva
em benefício de sua inserção no mercado internacional. Naquele momento, ela dava
prosseguimento a sua Abertura Comercial iniciada desde 1979. É fato que a China aliava-se
e nem participava de nenhum tipo de corrida armamentista, logo, era avessa ao
expansionismo militar, opondo-se à agressão territorial e às intervenções nos assuntos
internacionais dos demais países. Sendo crucial ―para a crescente presença da China no
cenário internacional, nas últimas duas décadas do século XX e no início do século XXI, foi
sua política de abertura econômica e comercial em 1979‖, segundo Pomar (2003, p. 147).
Depois da criação das Zonas Econômicas Especiais (ZEE) e numerosos portos, foi
intensificada a atuação da diplomacia chinesa. Esse planejamento veio a partir da década
de 1980, com a implantação de mais cinco zonas Econômicas. Em 1984, a China inaugurou
mais de quatorze cidades litorâneas com os portos. No ano seguinte, foram implementados
os deltas dos rios, com todos esses empreendimentos situados no litoral chinês por objetivo
inaugurar uma faixa aberta ao comércio exterior (POMAR, 2003). As ZEE atraíram
investidores estrangeiros que promoveram a abertura de tecnologias e de métodos
modernos de administração na China para ―criar um fluxo de exportações, gerador de
divisas, encorajados por vendas sem impostos, tarifas menores, infraestrutura moderna,
legislação trabalhista e salarial flexível e menos burocracia‖ (CINTRA, 2013, p. 17).
Em 1990 a abertura internacional continua com mais altivez, pois temos, com os
investimentos internacionais, uma nova zona econômica e financeira de Pudong, em
Xangai. Ou seja, foram intensificadas quinze zonas de desenvolvimento econômico e
tecnológico e 53 zonas de desenvolvimento industrial de altas e novas tecnologias. A China
intensificou as operações no mercado financeiro, operando com bancos estrangeiros. Além
disso, atraiu investimentos estrangeiros usando a redução e isenção de impostos
aduaneiros e sobre a renda (POMAR, 2003). Também, foi respeitável o crescimento dos
Investimentos Diretos Externos: entre 1981 e 2007 o ingresso de IDE na China saltou de
US$ 265 milhões para US$ 138 bilhões (CINTRA, 2013). Em 2002, ―o total de investimentos
externos diretos na China havia alcançado US$ 600 bilhões e ela passou os Estados
Unidos, pela primeira vez na história, como a principal receptora de investimentos externos‖
(POMAR, 2003, p. 149). Um dado alarmante e positivo pelo lado chinês foi quanto ao seu
comércio internacional, isso porque alcançou a nona posição no ranking mundial. Ela havia
saltado de US$ 1,13 bilhão no ano de 1950, para US$ 400 bilhões em 2000. O país já
comercializava com 228 nações e, como consequência, desse avanço, modificou-se sua
pauta de exportações, como podemos averiguar pela comparação bens primários versus
bens industriais:
Tabela 1 – Matriz produtiva chinesa entre 1958 e 1998
ANO 1958 1998
Produtos primários 3,5 1,2
Produtos industriais 6,5 8,8
Fonte: Wladimir Pomar, 2003, p.150. Feito pela autora.
No que tange as relações comerciais, a China intensificou cada vez mais sua
presença no plano internacional, isso porque, as empresas chinesas utilizavam na sua linha
de montagem de produção de bens duráveis, matérias–primas importadas. Assim, passou a
utilizar métodos de sistemas regulados utilizando, como créditos, cotas e tarifas
alfandegárias.
O paradigma China versus investidores mudou uma vez que houve a
implementação de tarifas menores, uma maior flexibilidade das leis trabalhistas e das leis
ambientais. Isso tudo veio a causar um desconforto para o preço no mercado mundial,
porque esses fatores contribuíram para a perda de competitividade em todos os mercados
em que a China entrou nas disputas, conforme Moreno (2015) e Pomar (2003). E, os
problemas de preços apareceram no Brasil e nos Estados Unidos. Isso porque os preços da
China eram impulsionados por vantagens comparativas artificialmente criadas. Entretanto,
em face do custo de oportunidade das empresas norte-americanas, estas acabam lucrando
por terem colocado seus tentáculos no mercado chinês. Por exemplo: Apple, General
Eletrics, General Motors, Caterpillar, Nike, Procter&Gamble, CocaCola, Pepsico,
McDonald´s, sem esquecer a rede varejista Walmart, presente há 18 anos no mercado
chinês (MORENO, 2015).
Um ponto a destacar é que as empresas chinesas têm mais liberdades para escoar
a sua produção de produtos manufaturados por uma gama de países; o governo chinês não
possui muitos entraves burocráticos. O que para Chung (2015, p. 159) significa que
dependência e disponibilidade de capital enorme no governo a fundo perdido incitam que
―empresas governamentais da China não se preocupem muito com o lucro, e com isso têm
mais flexibilidade para vender mercadorias abaixo do custo. Isso contradiz a definição de
economia de mercado‖.
A China, de acordo com Pomar (2003), com o intuito de conquistar uma maior
participação econômica com outros países, firmou projetos de cooperação econômica e
tecnológica. Em 2000, detinha 1.700 projetos em 136 países, nas áreas de agricultura,
silvicultura, recursos hídricos, transporte, metalúrgicas, entre outros. Um dado que chama
atenção com relação ao comércio bilateral Brasil-China. Em 1997, o total foi de 2 bilhões,
em 2002 foi de 3,8 bilhões. Sendo que o Brasil exportou aviões, minério de ferro, aço e soja
em grãos; para o chinês, a exportação para o Brasil correspondeu a carvão coque e
produtos químicos e diversas mercadorias de bens de consumo de uso durável.
5. Fatores da Inserção Chinesa no Mundo
A partir de 2010, a China passou a ser a 2ª economia do mundo, ultrapassando o
Japão que permaneceu nessa posição por quatro décadas e meia. Em decorrência desse
inusitado avanço, o país emergiu no mercado internacional como ator estatal diferenciado
pelo gigantismo de seus excedentes comerciais que lhe facultam poder financeiro global. E
assim, financiar investimentos de todos os tipos, nos mais diversos países, seja na esfera
real da produção de energia, seja em produtos de base (infraestrutura, obras públicas,
equipamentos de telecomunicações).
Segundo Veiga e Rios (2015, p. 28), os dados revelam que o Brasil foi o principal
destino dos investimentos atingidos entre 2010 e 2013, com 41% do total, seguido de
Argentina (21,7%), Venezuela (11,7%), Equador (10,9%) e Peru (8,7%). O crescimento
econômico chinês vem sendo provocado em parte pela utilização extensiva de fatores
subutilizados, como parece ser o caso dos camponeses antes ocupados em lavoura de
subsistência. Camponeses que migram em massa para as grandes e médias cidades para
trabalhar na indústria e no setor de serviços, constituindo uma mão de obra medianamente
qualificada e barata, com horizonte de consumo ainda restrito, razão maior da elevada
poupança interna desse país, variável macroeconômica que parece ser explicativa do
acelerado crescimento do mercado Chinês (LYRIO, 2010, p. 36-38).
O Relatório do Banco Mundial de 2013 (World Development Indicators, 2013),
mostra que apesar de importante o preço da mão de obra não foi o único fator explicativo do
crescimento da economia chinesa, dado que outros países, sobretudo os africanos, apesar
de contarem com grandes excedentes desse fator, não experimentam taxas de crescimento
de suas economias sequer razoáveis. Lyrio (2010) comenta que outras variáveis explicam o
fenômeno chinês como: o nível de escolaridade da população e a existência de uma
estrutura de transporte, comunicação e energia compatíveis com as exigências de seu
avanço industrial e econômico. Este faz referencia ao Wei-Wei Zhang, professor da
Universidade de Tsinghua, que defende a lógica de planejamento chinês em buscar uma
ordenação sequencial dos investimentos em infraestrutura, com o propósito único de evitar
gargalos. Segue o trecho inspirado nas declarações do professor Wei-Wei Zhang:
[...] o segredo do sucesso das reformas chinesas foi o seu correto sequenciamento, o acerto em estabelecer ordens e prioridades, com reformas fáceis antes das difíceis, rurais antes das urbanas, nas cidades costeiras antes das interioranas, reformas econômicas antes das políticas, tudo dentro de um quadro de experimentalismo e gradualismo com paulatina reincorporação de elementos de competição (LYRIO, 2010, p. 38).
Com efeito, ante essa estratégia de planejamento associada ao relacionamento
internacional, sugere reproduzir, em análise, a essência dos argumentos do governo chinês
quando proclama ser uma de suas premissas de política externa o desenvolvimento e a
modernização, em sincronia com a preservação de uma ordem mundial pacífica e alheia à
pretensão hegemônica, ou seja, à ascensão pacífica e compartilhada.
Em favor dos efeitos do crescimento chinês, seguem-se as estatísticas do
desempenho das economias asiáticas na primeira década do século XXI. Com efeito, pela
análise dos dados é possível perceber a liderança chinesa nesse processo ciclotímico. A
propósito, a Tabela 1 ilustra a sincronia de comportamento das economias asiáticas,
comparativamente às não asiáticas, neste caso Brasil, China e Estados Unidos, para os
anos 2009 a 2012:
Tabela 2. Taxa de crescimento anual do PIB da China em relação a outros países
Países 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012
China 10,1 11,3 12,7 14,2 9,6 9,2 10,4 9,3 7,8
Índia 7,85 9,28 9,26 9,8 3,89 8,48 10,55 6,33 3,24
Indonésia 5,03 5,69 5,5 6,35 6,01 4,63 6,22 6,49 6,23
Coreia do Sul 4,62 3,96 5,18 5,11 2,3 0,32 6,32 3,68 2,04
Malásia 6,78 5,33 5,58 6,3 4,83 -1,51 7,15 5,08 5,61
Japão 2,36 1,3 1,69 2,19 -1,04 -5,53 4,65 -0,57 1,94 Brasil 5,71 3,16 3,96 6,1 5,17 -0,33 7.53 2,73 0,87
União Europeia 2,26 2,48 2,6 2,63 4,2 0,8 1,81 3,31 2,72
Estados Unidos 3,48 3,08 2,66 1,91 -0,36 -3,11 2,38 1,8 2,21
Fonte: Banco Mundial, 2013, PIB; (World Development, 2013) (Taxa de crescimento anual %). Elaboração própria.
Um rápido olhar nos dados acima confirma que tanto os países asiáticos, incluindo
a China, quanto a União Europeia e o Brasil, sofreram o impacto negativo da abrupta
desaceleração da economia americana a partir de 2008. O desastre atingiu essas
economias, com a União Europeia declinando acentuadamente em seu crescimento
econômico a partir de 2009, refletindo de certa maneira as assimetrias entre Alemanha,
França e outros países europeus semiperiféricos, identificados pelo acrônimo de PIIGS
(Portugal, Itália, Irlanda, Grécia, Espanha). A Tabela 2 espelha a sincronia do crescimento
econômico entre China, Brasil e Estados Unidos, tendo por referência a taxa de crescimento
anual do PIB de cada um desses países no período 2004 a 2012. Nesse particular, há que
considerar que embora a China tenha desfrutado de crescimento forte no início do século
XXI, passou a partir de 2008, com a crise financeira mundial, a apresentar forte redução em
seu crescimento, com as taxas passando de uma média anual de 12%, entre 2004 e 2007,
para 9% de 2008 a 2012, uma queda de aproximadamente -23%; com o Brasil, no mesmo
intervalo, caindo de 4,7% para 3%, implicando redução de -33%. Nos Estados Unidos,
entretanto, o impacto da crise foi maior por derrubar a taxa de crescimento de sua economia
de 2,78%% para 0,58%, uma queda de -79%.
6. O Binômio China–Estados Unidos e Seus Desdobramentos
O binômio China e Estados Unidos teve marcos de negociações por volta da
década de 2000, quando as transações bilaterais foram acordadas, uma vez que a China
estava no mercado mundial como principal produtor de manufaturas de moderna tecnologia
para abastecer o mercado interno americano. O Império chinês precisava não só dos EUA,
mas também, de outros mercados, cuja necessidade era a de matérias-primas, petróleo,
produtos agrícolas, e assim buscou em outros países, como Japão, Coréia e Brasil o
atendimento de seus interesses. Acarretou em procura desenfreada por insumos deu-se nos
continentes: Asiático, Africano, Europeu e Americano. Com esta avidez chinesa emergindo
no âmbito das relações internacionais, várias forças econômicas e políticas, que causam
mudanças na configuração da atual conjuntura do sistema político e econômico global,
começaram a se delinear às novas ações estratégicas de atores em disputa do poder
mundial, entre os quais, além de a China, a Rússia e a Índia.
Mesmo com esse novo cenário em construção, podemos dizer que o mundo ainda
continua unipolar, em virtude dos Estados Unidos se manterem na liderança, com elevado
poder econômico, político e militar. Por conseguinte, o atual sistema internacional, unipolar,
liderado pelos Estados Unidos, está sendo ameaçado, antes pelo poderio do império
japonês, agora pela China.
Quando a China tornou-se a segunda maior economia global, em virtude da crise
internacional de 2008, intensificou seu grau de assertividade como potência regional. No
binômio, China e Estados Unidos, tendo como referência os anos de 2000 e 2010, apenas
para mostrar que a dinâmica das exportações e importações mundiais interfere na balança
para o cálculo final. A China passou à condição de maior exportador e de segundo maior
importador mundial, em um curto período de tempo. Em 2000, a exportação da China
totalizava 3,9% do total mundial, ascendendo a 10,4% em 2010; enquanto as importações
passaram de 3,4% em 2000, para 9,4% em 2010. Por outro lado, os Estados Unidos
declinaram em virtude da crise internacional que afetou sua economia. Ou seja, em 2000 as
exportações alcançaram 12,3%, caindo para 8,7%, em 2010. As importações, nesse mesmo
período, passaram de 19,1% para 13,0% no comércio mundial.
Tabela 3. Participação nas exportações e importações globais em US$ correntes Estados Unidos e China, 2000 e 2010 (%)
Ano Exportações Importações
China
2000 3,9 3,4
2010 10,4 9,0 Estados Unidos
2000 12,3 19,1
2010 8,7 13,0
Fonte: IPEA. Elaboração do autor (acumulado nos três primeiros trimestres do ano)
Cf. Bacelette, 2014.
7. A Desaceleração da Economia Chinesa e seus efeitos na Economia internacional
A economia chinesa, desde 2008, vem apresentando sinais de desaceleração
saindo de uma taxa de crescimento de 14,2 em 2007 para 6,9 em 2015. Isto tem
preocupado bastante os países que dependem do vigor da China para continuar crescendo.
Ela se constituiu nas duas últimas décadas como o principal movimentador de capitais entre
as economias emergentes e entre os países desenvolvidos. Com a desaceleração os
mercados internacionais sofrem graves consequências, pois há uma fuga de ativos
considerados arriscados e uma derrubada das ações de diversas companhias que
dependem da china nas bolsas de valores internacionais. Tem-se adotado uma medida pelo
governo chinês de correção do sistema financeiro como forma de incentivar a retomada de
capitais nas companhias chinesas resultou em afastar os poupadores, atraindo capital
especulativo; o que pode agravar ainda mais a crise de confiança e recuperação financeira
daquele país.
Para o Brasil, a desaceleração da economia chinesa é preocupante, pois a China
constitui-se como o principal comprador do Brasil, sendo responsável direto por 18% de
todas as nossas exportações. O volume exportado do minério de ferro, que se traduz como
um dos principais produtos de comércio com a China caiu quase pela metade entre 2012 e
2015, segundo dados do Ministério da Indústria e Comércio do Brasil. Com a diminuição da
demanda o efeito direto é a redução no preço do minério de ferro no mercado internacional.
Além disso, a indústria sem perspectiva de mercado passa a produzir cada vez menos
gerando desemprego e queda nos investimentos e no saldo da balança comercial. Da
mesma forma, as ações de nossas empresas tendem a cair no mercado de ações
agravando ainda mais a crise econômica do Brasil. A empresa Vale, por exemplo, obteve
queda de cerca de 40% no valor de suas ações entre 2014 e 2015.
Gráfico 1 – Taxas de crescimento da China entre 1990 e 2015
Por outro lado, há intensa instabilidade no fluxo de capitais através das bolsas de
valores. A instabilidade na Bolsa da China é constante e caiu duas vezes num volume de
cerca de 7% no primeiro semestre do ano passado. Isto também afeta diretamente o
mercado brasileiro, pois acende um sinal de alerta sobre os mercados emergentes;
investidores tendem a retirar dinheiro desses países, derrubando as moedas locais. O real,
por exemplo, sofreu desvalorização de 48,5% em relação ao dólar no ano passado devido
aos constantes déficits em nossa balança comercial em moeda estrangeira, se
desvalorizou 48,5% em relação ao dólar no ano passado. Com real mais fraco e dólar mais
forte, há um aumento no preço de produtos importados ou com componentes importados, e
uma consequente pressão sobre a inflação. Em 2015, o Brasil viu a alta de preços atingirem
10,67% na maior alta desde 2012, o que afeta ainda mais a crise que o país vem
atravessando desde 2013.
8. Considerações Finais
Na nova roupagem do século XXI, estão ocorrendo grandes transformações na
ordem política internacional, tanto na área, econômica como também na política. Referimo-
nos a predominâncias de algumas nações como Índia, China, Rússia e África do Sul. Assim
como o Brasil, mesmo classificado como uma potência emergente, que tem grandes
desafios para alcançar o grau de governabilidade internacional compatível com sua
extensão territorial e com o tamanho de sua população. Neste cenário de disputa global, a
China emerge com muita visibilidade na nova ordem global para alcançar o tão desejado
crescimento, magnificando seu poder econômico e político internacionais; ao tempo em que
o Brasil vem a reboque nas transações de comércio bilateral. Isto para Ramanzini Jr. e
Ribeiro (2013) significa que, a partir de 2003, a relação com a China ganha uma renovada
centralidade na agenda de política externa brasileira, ao mesmo tempo em que há a
inclusão da América Latina e do Sul na nova estratégia de inserção internacional de Pequim.
Em início de 2013, o Brasil reiniciou o seu relacionamento comercial bilateral com a
China, animado a participar mais intensamente do comércio bilateral, tendo em vista que a
China necessitava de recursos naturais, como as commodities agrícolas, minerais. Nessa
busca, a China viu no Brasil o potencial quase que suficiente para suprir sua demanda por
commodities, fator determinante na ampliação desse arranjo comercial e político que
resultou em maior cooperação entre os dois países que, por sua vez, a grande demanda
chinesa por matérias-primas levou ao aumento de sua capacidade produtiva, gerando a fase
que a conduz ao plano da internacionalização de suas empresas. É fato que além do Brasil,
a China ampliou suas atividades de comércio com a África e com a América Latina.
Analisando pelo lado brasileiro, Ramanzini Jr. e Ribeiro (2013) abordam que o
binômio Brasil versus China começa a se fortalecer a partir dos anos 2000, em que pese à
multipolaridade no sistema internacional. Ainda segundo os autores, a premissa de que a
médio e longo prazo os Estados Unidos estariam perdendo o seu posto de liderança no
sistema internacional, por atravessar apertos de ordem financeira de soft power, em razão
de seu envolvimento para resolver conflitos internacionais. Isto é, pelo lado Chinês,
constatou-se a universalização dos seus objetivos de política externa, na busca de novos
mercados para suprir seu mercado interno, especialmente no tocante ao suprimento de
recursos naturais como as commodities agrícolas e minerais, já referidas.
De tal forma que os fatos importantes ocorreram para o Brasil nos anos 2009 e
2010, isso porque em 2009 a China passou a ser no âmbito comercial internacional o seu
principal parceiro, e, em 2010 o seu maior investidor. Uma nova fase inicia-se na economia
brasileira, pautada no comércio bilateral, uma vez que o Brasil recebia do comércio chinês
produtos manufaturados de baixo custo e exportava, para a China, matérias–primas.
(HUGUENEY, 2011).
Aliás, Ramanzini Jr. e Ribeiro (2013) chamam atenção ao fato desses dois países
estarem hoje interligados. A relação bilateral de cooperação econômico-comercial entre
China e Brasil se solidifica cada vez mais em razão de que, a República Popular da China
se declara disposta a fazer acordos comerciais para explorar as potencialidades brasileiras,
ampliando cada vez mais essas relações e, assim, otimizando a pauta de exportação e
importação rumo à cooperação mútua. Com esse status de superpotência a China, mesmo
sendo um país classificado como emergente, cresce a cada dia de importância na esfera
mundial. Portanto, compreender melhor essa etapa das relações internacionais nos remete
a valorização dos estudos que nesse campo estão ainda por acontecer, atualmente,
representado em um desafio permanente das Relações Internacionais. O que nos deixa a
ideia de ser preciso as inferências não só com respeito ao papel da China, mas também
quanto ao papel dos outros países emergentes, sendo fator importantíssimo nesse campo
incipiente de investigação, devendo ainda estudar as relações sino-brasileiras, sem
esquecer o poder que exerce os Estados Unidos enquanto potencia econômica, política e
militar, que aparenta estar incomodado com a inserção da China na composição estratégica
internacional.
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