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Anuário da Produção Acadêmica Docente Vol. III, Nº. 5, Ano 2009
José Alberto Sallum Faculdade Anhanguera de Campinas unidade 3 [email protected]
CULTURA ORGANIZACIONAL1
RESUMO
Até meados dos anos 80, as organizações eram vistas como uma forma racional de coordenar e controlar um grupo de pessoas, possuindo níveis verticais, departamentos, além de relações de hierarquia e autoridade. Mas as organizações são mais do que isso e assumem personalidades próprias, assim como as pessoas que nelas trabalham, sendo locais onde existe um sistema de convicções compartilhado por todos os membros, ou seja, uma cultura. A criação de uma cultura começa com os fundadores da empresa, as ações dos dirigentes têm grande impacto sobre essa cultura e os funcionários da empresa podem tomar conhecimento dela através de histórias (relatos), rituais (atividades repetitivas), símbolos (objetos, ações ou eventos com significados especiais) e a linguagem (símbolos verbais), que contêm os valores culturais da organização. As normas e valores culturais transmitem informação social que pode influenciar o modo como as pessoas decidem comportar-se no trabalho, já que afetam diretamente o modo como os funcionários percebem a si mesmos, seu trabalho e a organização.
Palavras-Chave: comportamento organizacional; comprometimento organizacional; cultura organizacional; informação; valores.
ABSTRACT
Until the mid-80s, the organizations were seen as a rational way to coordinate and control a group of people, possessing vertical levels, departments, and relationships of hierarchy and authority. But organizations are more than that and assume personalities of their own, as well as the workers, and places where there is a belief system shared by all members, or a culture. The creation of a culture begins with the company's founders, the actions of leaders have a major impact on this culture and company employees can learn about it through stories (tales), rituals (repetitive activities), symbols (objects, actions, or events with special meanings) and language (verbal symbols), which contain the cultural values of the organization. The cultural norms and values that convey social information can influence how people decide to behave at work, since it directly affects the way employees perceive themselves, their work and organization.
Keywords: organizational behavior; organizational commitment; organizational culture; information; values.
1 Material da 2ª. aula da Disciplina Perfil Corporativo, Crenças e Valores, Programas Institucionais, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Didática e Metodologia do Ensino Superior – Programa Permanente de Capacitação Docente. Valinhos, SP: Anhanguera Educacional, 2009.
Anhanguera Educacional S.A. Correspondência/Contato
Alameda Maria Tereza, 2000 Valinhos, São Paulo CEP 13.278-181 [email protected]
Coordenação Instituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE
Informe Técnico Recebido em: 2/5/2009 Avaliado em: 9/2/2010
Publicação: 21 de abril de 2010
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CULTURA ORGANIZACIONAL
A idéia de enxergar as organizações como culturas, isto é, locais onde há um sistema de
convicções compartilhado por todos os membros, é um fenômeno relativamente recente.
Até meados dos anos 80, as organizações eram vistas como uma forma racional de
coordenar e controlar um grupo de pessoas, possuindo níveis verticais, departamentos,
relações de hierarquia e autoridade, e assim por diante. Mas as organizações são mais do
que isso, assumindo personalidades próprias, assim como as pessoas que nelas trabalham.
Podem ser rígidas ou flexíveis, hostis ou apoiadoras, inovadoras ou conservadoras.
Harvard e MIT estão no mesmo negócio – educação – e separadas fisicamente apenas pela
extensão do Charles River, mas cada qual possui um caráter e sentimento únicos, que vão
além de suas características estruturais.
É grande o reconhecimento de que a cultura desempenha importante papel na
vida dos membros das organizações. No entanto, é interessante notar que a origem da
cultura como variável independente que afeta as atitudes e o comportamento dos
funcionários pode ser encontrada há mais de 50 anos, junto com a noção de
institucionalização (SELZNICK, 1948). Quando uma organização de torna
institucionalizada, ela assume vida própria, independente de seus fundadores ou
quaisquer de seus membros; passa a ter valor por si mesma, independente dos bens e
serviços que produz. Marcas como Sony, Gillette, McDonald’s e Disney são exemplos de
organizações que sobreviveram aos seus fundadores e membros (ROBBINS, 2002).
Quando uma organização se institucionaliza, ela adquire imortalidade.
A institucionalização opera para produzir uma compreensão comum, entre os
membros da organização, sobre aquilo que é o comportamento apropriado e significativo
(ZUCKER, 1983). Assim, quando a organização adquire permanência institucional, os
modos aceitáveis de comportamento tornam-se auto-evidenciados para seus membros
(ROBBINS, 2002). Isso é o que faz a cultura organizacional.
Cultura organizacional é um conceito que se refere ao sistema de valores,
compartilhado pelos membros, de uma organização e que a difere de outra (BECKER,
1982). É um conjunto de características-chave que a organização valoriza. Atualmente,
existem sete características básicas que, em conjunto, capturam a essência da cultura de
uma organização (O’REILLY III et al., 1991).
a) Inovação e assunção de riscos, ou seja, o grau em que os funcionários são estimulados a inovarem ou assumirem riscos.
b) Atenção aos detalhes, isto é, o grau em que se espera que os funcionários demonstrem precisão, análise e atenção aos detalhes.
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c) Orientação para os resultados, ou o grau em que os dirigentes focam os resultados mais do que as técnicas ou processos empregados para o seu alcance.
d) Orientação para as pessoas, ou o grau em que as decisões dos dirigentes levam em consideração o efeito dos resultados sobre as pessoas dentro da organização.
e) Orientação para a equipe, ou seja, o grau em que as atividades de trabalho em equipe são organizadas mais em termos de equipes do que de indivíduos.
f) Agressividade, ou o grau em que as pessoas são competitivas, em vez de dóceis ou acomodadas.
g) Estabilidade, ou o grau em que as atividades organizacionais enfatizam a manutenção do status quo em contraste ao crescimento.
A avaliação da organização em termos dessas sete características revela,
portando, uma ilustração complexa da cultura organizacional. Esse quadro torna-se a base
dos sentimentos de compreensão compartilhada que os membros têm a respeito da
organização, de como as coisas são realizadas quanto à forma como todos devem se
comportar.
Segundo Robbins (2002), “a cultura organizacional se refere à maneira pela qual
os funcionários percebem as características da cultura da empresa, e não ao fato de
gostarem ou não delas”. É um termo descritivo, importante para diferenciar este conceito
do de satisfação com o trabalho (um conceito avaliatório).
A cultura organizacional representa a percepção comum mantida pelos
funcionários da organização, afinal, é um sistema compartilhado de valores. Ela é,
portanto, a maneira informal e compartilhada de perceber a vida e a participação na
organização, que mantém seus membros unidos e tem grande peso sobre o que pensam
sobre si mesmos e seu trabalho. Para Wagner III e Hollembeck (1999), “cultura é uma
força de coesão que influencia o modo como os membros da empresa percebem a
organização formal, seus comportamentos e a si mesmos”.
O reconhecimento de que a cultura organizacional possui propriedades comuns
não significa, entretanto, que não haja subculturas dentro das organizações. As grandes
organizações, em sua maioria, possuem uma cultura dominante e diversas subculturas
(JERMIER et al., 1991). A cultura dominante expressa os valores essenciais compartilhados
pela maioria dos membros da organização, é aquela a que nos referimos quando falamos
da cultura de uma organização. As subculturas tendem as ser desenvolvidas para refletir
problemas, situações ou experiências comuns a alguns de seus membros, e podem ser
definidas por designações de departamentos ou separação geográfica: o departamento de
compras, por exemplo, pode ter uma subcultura compartilhada unicamente por seus
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membros. Ela incluirá os valores essenciais da cultura dominante, além de valores
específicos daquele departamento (ROBBINS, 2002). A cultura dominante é de extrema
importância para o valor da cultura organizacional. É o aspecto do “valor compartilhado”
(ROBBINS, 2002) da cultura organizacional que a torna instrumento poderoso para
orientar e modelar o comportamento dos membros daquela organização.
Uma cultura organizacional forte é aquela em que os valores essenciais são
intensamente acatados e amplamente compartilhados (WIENER, 1988). Quanto mais
membros aceitarem os valores e quanto mais se comprometerem com eles, mais forte será
a cultura. Conseqüentemente, uma cultura forte tem influencia maior sobre o
comportamento dos seus membros (alto controle comportamental). Outra conseqüência é
o índice mais baixo de rotatividade da força de trabalho. Uma cultura forte demonstra
elevado grau de concordância entre seus membros em relação aos pontos de vista da
organização. Essa unanimidade gera coesão, lealdade e comprometimento organizacional,
qualidades que, por sua vez, reduzem a propensão dos funcionários a deixar a
organização (MOWDAY et al., 1982). Por fim, quanto mais forte a cultura organizacional,
menos os administradores precisam se preocupar em desenvolver regras e regulamentos
para orientar o comportamento dos funcionários; essa orientação é assimilada por eles à
medida que aceitam a cultura organizacional.
É importante destacar que as diferenças nacionais, a cultura de cada país,
precisam ser levadas em consideração para que se possa prever mais precisamente o
comportamento organizacional nas diversas nações (ROBBINS, 2002). Pesquisas indicam
que a cultura do país tem um impacto maior sobre os funcionários do que a cultura
organizacional (ADLER, 1997). Um exemplo: os funcionários da IBM em Munique são
mais influenciados pela cultura alemã do que pela cultura organizacional da IBM. Isso
quer dizer que, por mais forte que seja a cultura organizacional para modelar o
comportamento dos funcionários, a cultura do país sempre será mais influente.
A cultura desempenha diversas funções dentro de uma organização.
Primeiramente, tem o papel de distinguir uma organização de outras. Também
proporciona um senso de identidade aos membros da organização, facilita o
comprometimento com algo maior do que os interesses individuais de cada um e estimula
a estabilidade do sistema social (ROBBINS, 2002). A cultura é responsável por manter a
organização coesa, fornecendo padrões adequados para aquilo que os funcionários vão
fazer ou dizer; serve como sinalizador de sentido e mecanismo de controle que orienta as
atitudes e comportamentos dos funcionários.
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Para Deal e Kennedy (1983), “a cultura é, por definição, sutil, intangível, implícita
e sempre presente”. Toda organização desenvolve um conjunto básico de premissas,
convicções e regras implícitas que regem o comportamento cotidiano do trabalho. Até que
os recém-chegados aprendam as regras, eles não são considerados membros plenos da
organização. As transgressões cometidas pelos altos executivos ou funcionários de cargos
mais altos são desaprovadas unanimemente e fortemente punidas. A conformidade às
regras torna-se a base para a recompensa e a mobilidade ascendente. Quem recebe um
convite para se juntar a uma organização, quem tem o desempenho bem avaliado e quem
ganha uma promoção está fortemente influenciado pelo ajuste entre individuo e
organização, ou seja, as atitudes e comportamentos dos candidatos ou funcionários se
mostram compatíveis com a cultura organizacional.
A cultura melhora o comportamento organizacional e aumenta a consistência do
comportamento dos funcionários (ROBBINS, 2002). Esses são aspectos benéficos à
organização. Do ponto de vista do funcionário, a cultura é positiva porque reduz a
ambigüidade ao dizer a ele como as coisas devem ser feitas. Mas os aspectos
potencialmente negativos da cultura não podem ser ignorados, especialmente quando
afetam a eficácia da organização.
A cultura torna-se um problema quando os valores compartilhados não estão de
acordo com aqueles que podem melhorar a eficácia da organização. Isso acontece
geralmente quando o ambiente organizacional é dinâmico, ou seja, passa por rápidas
mudanças. Dessa forma, uma cultura arraigada pode não ser adequada. Quando o
ambiente organizacional é estático, a consistência do comportamento passa a ser um valor
positivo, mas pode se tornar um fardo e dificultar a resposta às mudanças no ambiente.
Assim, a cultura pode se tornar uma barreira às mudanças, quando não é adequada nem
eficaz para lidar com as novidades em seus ambientes.
A cultura pode se tornar também uma barreira à diversidade, quando elimina as
diferenças que pessoas com históricos diversos podem levar para a organização, sustenta
vieses institucionais ou se torna insensível às pessoas que são diferentes. Isso acontece
geralmente com culturas fortes, quando há a contratação de novos funcionários que não
são parecidos com a maioria dos membros da organização – por causa de raça, sexo,
deficiências ou outras diferenças. Isso cria um paradoxo, pois a instituição quer que os
novos funcionários aceitem os valores essenciais da cultura organizacional para se ajustar
à organização e, ainda, para serem aceitos pelos demais. Ao mesmo tempo, a organização
quer reconhecer e apoiar abertamente as diferenças que esses novos trabalhadores levam
para a empresa.
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A criação de uma cultura começa com os fundadores da empresa, os
responsáveis pelo principal impacto sobre a cultura inicial da organização. Não limitados
por costumes ou ideologias pregressas, eles têm a visão daquilo que a organização deve
ser. O processo de criação de uma cultura ocorre de três maneiras (SCHEIN, 1996):
primeiro, os fundadores só contratam e mantém funcionários que pensem e sintam as
coisas da mesma forma que eles, em seguida, doutrinam e socializam esses funcionários
de acordo com sua forma de pensar e sentir, por fim, o comportamento dos fundadores
age como modelo que encoraja os funcionários a se identificarem com ele e assimilarem
seus valores, convicções e premissas. Após o estabelecimento de uma cultura, existem
práticas dentro da organização que visam mantê-la viva, sendo as principais as práticas
de seleção, ações dos dirigentes e métodos de socialização.
A seleção tem como objetivo identificar e contratar indivíduos que tenham o
conhecimento, as habilidades e as capacidades necessários para o desempenho bem-
sucedido das atividades dentro da organização. Quando acontece de mais de um
candidato preencher tais requisitos ser identificado, a decisão final sobre quem será
contratado é significantemente influenciada pelo julgamento de quem parece mais bem
ajustado à organização, ou seja, possui valores consistentes com os da organização. Além
disso, o processo de seleção fornece aos candidatos informações sobre a organização,
eliminando, assim, aqueles que percebem algum conflito entre seus valores pessoais e os
da empresa, indivíduos que poderiam vir a desafiar ou atacar os valores essenciais da
organização.
As ações dos dirigentes têm grande impacto sobre a cultura organizacional
(HAMBRICK; MASON, 1984), já que pela sua forma de comportamento, os altos
executivos estabelecem normas que se espalham pela organização, sobre aspectos como
que riscos devem ser assumidos, quanta liberdade deve ser concedida aos funcionários,
qual a forma de se vestir, quais ações podem se reverter em recompensas, e assim por
diante.
Independentemente da qualidade do processo de seleção, os novos funcionários
ainda não estão totalmente adaptados e doutrinados sobre a cultura organizacional. A
organização precisa, então, ajudá-los a se adaptar (para evitar problemas em relação às
convicções e costumes vigentes na empresa devido a não familiarização com a cultura) à
nova cultura, processo conhecido como socialização (ALLEN; MEYER, 1990). A
socialização pode ser dividida em três estágios: pré-chegada, encontro e metamorfose
(VAN MAANEN; SCHEIN, 1977). O primeiro estágio – pré-chegada – envolve todo o
aprendizado que ocorre antes que o novo funcionário junte-se à organização, e o
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reconhecimento de que cada indivíduo chega com um conjunto de valores, atitudes e
expectativas. O segundo estágio – encontro – o novo membro vê o que a empresa é
realmente e confronta a possibilidade de que as expectativas (sobre o trabalho, os colegas,
o chefe e a organização de maneira geral) e a realidade podem não ser as mesmas. No
estágio final – metamorfose – esse indivíduo precisa resolver os possíveis problemas
surgidos no estágio do encontro, e as mudanças acontecem: o novo funcionário domina as
habilidades necessárias para seu trabalho, desempenha seus papéis e faz os ajustes
necessários para se adaptar aos valores e normas de seu grupo. Após esse processo de
socialização, incluindo seus três estágios, há um impacto sobre a produtividade do
funcionário, seu comprometimento com a organização e rotatividade, ou seja, sua decisão
final de continuar no emprego.
Após a formação de uma cultura organizacional, os funcionários da empresa
podem tomar conhecimento dela através de várias maneiras, sendo os principais as
histórias, os rituais, os símbolos e a linguagem.
As histórias são basicamente relatos de eventos passados que ilustram e
transmitem as normas e valores culturais mais profundos, geralmente conhecidas por
todos os funcionários (WAGNER III; HOLLEMBECK, 1999). Essas narrativas vinculam o
presente com o passado, oferecendo explicação e legitimidade às praticas vigentes
(PETTIGREW, 1979). Referem-se, na maior parte das vezes, a eventos ocorridos com
fundadores da empresa, quebra de regras, enormes sucessos, reduções de força de
trabalho, realocações de funcionários, reações a antigos erros, situações organizacionais
(BOJE, 1991). Quando os membros da organização contam histórias e pensam nas
mensagens que elas transmitem, os exemplos concretos facilitam a evocação posterior dos
conceitos apresentados (WAGNER III; HOLLEMBECK, 1999).
Rituais são seqüências repetitivas de atividades que expressam e reforçam os
valores fundamentais da organização, quais objetivos são mais importantes, quais pessoas
são importantes e quais são dispensáveis (KAMOCHE, 1995). Um ritual é, na verdade, um
rito – atividade cerimonial destinada a comunicar idéias específicas ou a realizar
determinados propósitos – regularmente repetido. Um dos mais conhecidos rituais
empresariais dos Estados Unidos é a premiação anual da Mary Kay Cosmetics (BEYER;
TRICE, 1987). As vendedoras são brindadas com diversos prêmios glamourosos, com base
em seu sucesso em relação às suas cotas de vendas. O ritual sinaliza para as vendedoras
que o fato de alcançar suas metas é importante e que, com trabalho duro, elas também
podem atingir o sucesso (ROBBINS, 2002).
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Os símbolos são objetos, ações ou eventos dotados de significados especiais que
permitem aos membros da organização trocar idéias complexas e mensagens emocionais.
Logotipos de empresas, bandeiras e marcas comerciais são símbolos prontamente
evocados (WAGNER III; HOLLEMBECK, 1999). O espaço físico da empresa, o tipo de
carro disponível para os executivos ou a forma como eles fazem suas viagens são também
outros exemplos de símbolos materiais vistos pelos funcionários como um sinalizador de
quem é importante, qual o grau de igualdade almejada pelos dirigentes e quais os tipos de
comportamento apropriados (ROBBINS, 2002). É evidente que os símbolos são
absolutamente necessários, ao transmitirem mensagens emocionais que não podem ser
facilmente expressas em palavras. Sem os símbolos, muitas normas e valores
fundamentais da cultura de uma organização não poderiam ser comunicados entre seus
membros (WAGNER III; HOLLEMBECK, 1999).
Ainda segundo Wagner III e Hollembeck (1999), a linguagem nada mais é que
um conjunto de símbolos verbais que, geralmente, reflete a cultura particular da
organização. Na Microsoft, por exemplo, desenvolveu-se a linguagem do “tecniquês”, em
grande parte graças à formação técnica de seu fundador, Bill Gates, e da mão-de-obra da
empresa. Hardcore (resistente) significa sério em relação ao trabalho. Uma situação confusa
ou ilógica é chamada de random (casual). As coisas que dão certo são super cool
(superlegais). (REBELLO; SCHWARTZ, 1992). Qualquer que seja a fonte do vocabulário
comum, o fato dele existir significa que há presença e aceitação de um conjunto de normas
e valores. Depois de assimilada, essa terminologia funciona como denominador comum
que une os membros de uma cultura ou subcultura (ROBBINS, 2002).
Goffee e Jones (1998) identificaram quatro tipos culturais distintos.
Primeiramente, existem duas dimensões por trás da cultura organizacional, classificadas
em duas categorias: elevadas ou baixas. A primeira dimensão é a sociabilidade, uma
medida do “clima de camaradagem”: uma alta sociabilidade significa que as pessoas
fazem favores umas às outras sem esperar por recompensas, que essas pessoas
relacionam-se de maneira amigável e carinhosa. A segunda dimensão é a solidariedade,
uma medida de orientação para a tarefa: alta solidariedade significa que as pessoas
podem abrir mão de seus vieses pessoais e se unirem na busca de interesses e objetivos
comuns. Associadas as dimensões, temos quatro tipos culturais: cultura de trabalho em
rede (elevada sociabilidade e baixa solidariedade: os membros vêem-se como familiares e
amigos, conhecem-se e gostam uns dos outros; estão sempre dispostos a ajudar e trocam
informações abertamente), cultura fragmentada (baixa sociabilidade e baixa
solidariedade: os membros são individualistas, o comprometimento é quase que
exclusivamente do individuo com suas próprias tarefas; os funcionários são julgados
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apenas quanto à sua produtividade e à qualidade de seu trabalho), cultura de
comunidade (elevada sociabilidade e elevada solidariedade: os membros valorizam tanto
a camaradagem quanto o desempenho, e há uma sensação de familiaridade ao mesmo
tempo em que existe um foco sobre a conquista dos objetivos; os líderes desse tipo de
cultura costumam ser inspiradores e carismáticos, com clara visão do futuro da
organização) e a cultura mercenária (baixa sociabilidade e elevada solidariedade: os
membros são ferozmente focados nos objetivos, intensos e determinados na conquista de
suas metas; têm fixação em realizar as coisas rapidamente e um poderoso senso de
propósito, não pretende apenas vencer, quer destruir o inimigo).
É importante destacar que, dentre os quatro tipos de cultura, não há melhor ou
pior. As quatro apresentam um lado negativo: a cultura de trabalho em rede pode levar à
tolerância com o desempenho fraco e à criação de “panelas” (devido ao foco na amizade),
a cultura fragmentada não apresenta coleguismo algum, é excessivamente crítica em
relação às pessoas, a cultura de comunidade pode consumir totalmente a vida das pessoas
(os líderes carismáticos freqüentemente buscam discípulos ao invés de seguidores,
resultando num clima de trabalho quase religioso) e a cultura mercenária pode levar ao
tratamento quase desumano das pessoas cujo desempenho é considerado fraco. Assim, é
necessário avaliar os pontos fracos e fortes de cada tipo de cultura, compará-los aos
valores e características dos futuros membros para saber se haveria o ajuste entre o
funcionário e a empresa. Se a pessoa é independente, não sente necessidade de fazer parte
de grupos, dificilmente se adaptaria a uma empresa como a Unilever, exemplo de cultura
de trabalho em rede. Por outro lado, a pessoa com boas habilidades sociais e empatia, que
gosta de fazer amizades íntimas no ambiente de trabalho, que não é obcecado por
eficiência e desempenho, é quase impossível haver afinidade com uma empresa como a
Mars, de cultura mercenária.
A cultura organizacional origina-se das maneiras informais e não oficiais de
proceder. Segundo Wagner III e Hollembeck (1999), “dentro de toda organização formal
de cargos prescritos e relações estruturais, encontra-se uma organização informal de
regras, procedimentos e interligações não oficiais”, que surge quando os funcionários
decidem, espontaneamente, realizar mudanças no modo de fazer as coisas. À medida que
esses ajustes moldam e alteram a maneira formal de proceder, aflora uma cultura de
atitudes e noções que passa a ser compartilhada entre colegas de trabalho.
Conseqüentemente, a cultura influencia as atitudes tomadas pelos funcionários e os
comportamentos que adotam no trabalho. As normas e valores culturais transmitem
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José Alberto Sallum
Coordenador dos cursos de Tecnologia em Gestão de Recursos Humanos da Faculdade Anhanguera de Campinas, unidades 2 e 3. Coordenador do curso especial da Faculdade Anhanguera de Campinas, unidade 3. Professor dos cursos de Administração de Empresas e Tecnologia em Gestão de Recursos Humanos. Psicólogo, atuando nas áreas de treinamento e desenvolvimento, gerenciamento de carreiras e gestão de pessoas.
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