anais grupo 3 - políticas públicas e reforma agrária
TRANSCRIPT
ISBN 9787-85-98571-14-0
ANAIS Grupo 3 - Políticas Públicas e Reforma
Agrária
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CAMPUS – MOSSORÓ/RN
COMISSÃO ORGANIZADORA NACIONAL
Marcelo José Braga (UFV)
Presidente da SOBER
José Eustáquio Ribeiro Vieira Filho (IPEA)
Diretor Executivo
Elza N. Anjos
Secretária da SOBER
João Ricardo F. de Lima (EMBRAPA)
Vice-Presidente Região Nordeste
Comissão Organizadora Local
Emanoel Márcio Nunes (UERN)
Coordenador Geral
Márcia Regina Farias da Silva (UERN)
Coordenadora Adjunta
Andreya Raquel Medeiros de França (UERN)
Jéssica Samara Soares de Lima (UERN)
Assessoras
Infraestrutura
Nathália Grace de Sousa Fialho (UERN)
Jacinta de Fátima Martins Malala (UERN)
Genivalda Cordeiro da Costa (UERN)
Raimunda Maria Marques de Azevedo (UERN)
Comunicação
Ionara Jane de Araújo (UERN)
Francisca Suerda Soares de Oliveira (UERN)
Etevaldo Almeida Silva (UERN)
Michele de Sousa (UERN)
Finanças
Lilian Medeiros da Silva (UERN)
Jéssica Samara Soares de Lima (UERN)
Programação Científica
Josivan Barbosa Menezes Feitoza
Vinicius Claudino de Sá
Paulo Sidney Paulo Sidney Gomes Silva
Secretaria Executiva
Cleide Regina Ferreira e Silva
Andreya Raquel Medeiros de França
Ienilton Alves Gurgel
Ana Cristina Nogueira Maia
Transporte
Alexandre Henrique Pompeu Fernandes
Bruno José Bezerra da Silva
Comissão Científica
Coordenador Titular: Marcia Regina da Silva Farias (UERN)
Coordenador Adjunta: Elizabeth Stradiotto Siqueira (UFERSA)
Grupo 1: Meio ambiente, Desenvolvimento Sustentável e Agroecologia
Coordenador Titular: Marcia Regina da Silva Farias (UERN) Coordenador Adjunta: Zoraide Souza Pessoa (UFRN)
Grupo 2: Agricultura Familiar e Ruralidade
Coordenador Titular: Joacir Rufino de Aquino (UERN)
Coordenador Adjunta: Genivalda Cordeiro da Costa (UERN)
Grupo 3: Políticas Públicas e Reforma Agrária Coordenador Titular: Joana Tereza Vaz de Moura (UFRN)
Coordenador Adjunta: Jacimara Villar Forbeloni (UFERSA)
Grupo 4: Empreendedorismo, Cooperativismo e Associativismo no meio rural
Coordenador Titular: Paulo Sidney Gomes Silva (IFRN) Coordenador Adjunto: Washington José de Souza (UFRN)
Grupo 5: Agronegócio, Mercados e Comercialização
Coordenador Titular: João Batista de Freitas (UERN) Coordenador Adjunto: Josivan Barbosa de Menezes Feitoza (UFERSA)
Grupo 6: Gestão Social Coordenador Titular: Elizabeth Stradiotto Siqueira (UFERSA)
Coordenador Adjunta: Lílian Caporlíngua Giesta (UFERSA)
Grupo 7: Tecnologia, Inovação e Extensão para o campo Coordenador Titular: Vinícius Claudino de Sá (UERN)
Coordenador Adjunto: Valdemar Siqueira Filho (UFERSA)
Grupo 8: Desenvolvimento Rural, Territorial e Regional
Coordenador Titular: Joseney Rodrigues de Queiroz Dantas (UERN)
Coordenador Adjunta: Larissa da Silva Ferreira Alves (UERN)
Grupo 9: Turismo rural e políticas públicas
Coordenador Titular: Raimunda Maria Marques de Azevedo (UERN) Coordenador Adjunta: Michele de Sousa (UERN)
Grupo 10: Assuntos emergentes
Coordenador Titular: Marcia Regina da Silva Farias (UERN) Coordenador Adjunta: Elizabeth Stradiotto Siqueira (UFERSA)
PARECERISTAS
Abdon Silva Ribeiro da Cunha
Agostinha Mafalda Barra de Oliveira
Alcides Leão Santos Júnior
Alex Bruno Ferreira Marques do Nascimento
Alfredo Marcelo Grigio
Ana Augusta da Silva Campos
Ana Claudia Machado Padilha
Ana Cristina Nogueira Maia
Andrea Kaliany Costa Lima
Augusto Carlos Avelino Teixeira de Carvalho
Boanerges Barreto de Freitas Filho
Carlos Alano Soares de Almeida
Carlos José Bezerra de Morais
Daniela Viegas da Costa Nascimento
Diego Philipe de Oliveira Godeiro
Eliane Pinheiro de Sousa
Elizabeth Stradiotto Siqueira
Érica Priscilla Carvalho de Lima
Erlaine Binotto
Fabio Chaves Nobre
Fagner Moura da Costa
Fernando Bastos Costa
Francisca Elizonete Souza
Francisco do O’ de Lima Júnior
Francisco Fransualdo de Azevedo
Francisco Jean Carlos de Souza Sampaio
Guilherme Smaniotto Tres
Iriane Teresa de Araújo
Jacimara Villar Forbeloni
Jaime dos Santos da Silva
Jairo Bezerra da Silva
Joana Tereza Vaz de Moura
João Batista de Freitas
Joaquim de Araújo
Jordana Marques Kneipp
José Paulo de Sousa
Joseney Rodrigues de Queiroz Dantas
Josivan Barbosa Menezes Feitoza
Jovelina Silva Santos
Juarez Azevedo de Paiva
Júnia Fátima do Carmo Guerra
Kézia Viana Gonçalves
Larissa da Silva Ferreira Alves
Leandro Trigueiro Fernandes
Liana Holanda Nepomuceno Nobre
Libânia Maria Braga
Luciana Holanda Nepomuceno
Luciano Celso Brandão Guerreiro Barbosa
Ludimilla Carvalho Serafim de Oliveira
Luís Abel da Silva Filho
Marcia Regina Farias da Silva
Marcio Furukava
Maria de Fátima Diógenes Fernandes
Maria de Lourdes Fernandes de Medeiros
Maria de Lourdes Fernandes de Medeiros
Maria Odete Alves
Marlene Medeiros
Marta Aurélia Dantas de Lacerda
Maurício Miranda
Maxwell dos Santos Celestino
Mayra Fernandes Nobre
Melissa Rafaela Costa Pimenta
Michelangelo de Oliveira Silva
Miguel Henrique da Cunha Filho
Monikely Silva
Napie Galve Araujo Silva
Nerize Laurentino Ramos
Nildo da Silva Dias
Paulo Sidney Gomes Silva
Rafael Junior dos Santos Figueiredo Salgado
Raimundo Inácio da Silva Filho
Ricardo Sávio Trigueiro de Morais
Roberto Marinho Alves da Silva
Rogério Pires da Cruz
Ronie Cleber de Souza
Rosana Silva de França
Rusiano Paulino de Oliveira Sérgio Luiz Freire Costa
Sidcley D’sordi Alves Alegrini da Silva
Sidnéia Maia de Oliveira Rego
Silvana Nunes de Queiroz
Thaiseany de Freitas Rego
Thiago Ferreira Dias
Valdemar Siqueira Filho
Vania de Fatima Barros Estivalete
Vanuza Maria Pontes Sena
Vinícius Claudino de Sá
Washington José de Souza
Yasmine Santos Mansur
Yuri de Lima Padilha
Zoraide Souza Pessoa
11º Congresso da Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia
Rural/Nordeste
Anais do XI Congresso Regional da SOBER Nordeste –
Mossoró: Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN),
novembro, 2016.
Inclui bibliografia
ISBN 9787-85-98571-14-0
Modo de acesso: http://www.sobernordeste2016.com.br em Anais dos eventos
1. Economia 2. Desenvolvimento Rural e Regional 3. Gestão Ambiental
4. Territorialidade – Brasil – Congressos.
Realização
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN
Campus Mossoró
Núcleo de Extensão em Desenvolvimento Territorial
NEDET/UERN
Apoio
Universidade Federal Rural do Semi-árido - UFERSA
Financiamento
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES
Banco do Nordeste do Brasil – BNB
Conselho Regional de Economia do Rio Grande do Norte–CORECON/RN
Apresentação
O congresso SOBER NORDESTE acontece a cada ano em uma instituição localizada na
região Nordeste do Brasil, desde 2006, tendo como objetivo geral discutir temas
relevantes da agricultura e do agronegócio e contribuir para o desenvolvimento do setor
rural do país. O evento consolida sua importância com a realização da sua décima
primeira edição, pautada pela discussão de temas como: política agrícola; geração e
transferência de tecnologia; meio ambiente; pobreza rural; educação no campo; reforma
agrária; novas experiências de desenvolvimento e outros. O XI Congresso da Sociedade
Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural (SOBER), em sua versão
regional, ocorrerá entre os dias 16 e 18 de novembro de 2016, na Universidade Estadual
do Rio Grande do Norte, em Mossoró-RN. A proposta é importante por vários motivos:
(1) trazer para o público alvo da Região a experiência de um congresso já conceituado,
oportunizando a uma instituição de ensino superior (IES) do interior a colaborar e
participar de um evento que, embora regional, tem abrangência nacional; (2) oportunizar
a aproximação entre os integrantes dos diversos núcleos/departamentos e diversas IES da
região; (3) ampliar o debate com os poderes públicos locais e atores sociais acerca das
questões que permeiam o rural no contexto contemporâneo.
Comissão Organizadora
Mossoró/RN, novembro de 2016
PROGRAMAÇÃO XI SOBER NORDESTE 2016
MOSSORÓ/RN
16 de Novembro de 2016
Local: Faculdade de Ciências Econômicas – FACEM/UERN
12:30h - Credenciamento
13h–16:30h - Minicursos
“Uso do STATA para extração e análise de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD/IBGE)”
Dr. João Ricardo Ferreira de Lima (EMBRAPA)
“Geotecnologias na geração de plantas Georreferenciadas de imóveis rurais”
Ms. Hermínio Sabino de Oliveira Junior (HS Geotec)
“Análise de Redes Socioeconômicas: Conceitos, aplicações e Método”
Dr. Thales Augusto Medeiros Penha (UFRN)
“Contabilidade e Finanças para Cooperativas”
Esp. Jorge Fernandes Jales Neto (UERN/IFRN)
Local: Teatro Municipal Dix Huit Rosado
18:30h-20h - Credenciamento
19h-20h - Sessão Solene de Abertura
20h-21:30h - Conferência Magna “Desenvolvimento Territorial, Políticas Públicas e
Sustentabilidade: Novos olhares sobre o Nordeste Rural”
Prof. Dr. Guilherme Costa Delgado (IPEA)
21:30h-23h - Coquetel de Abertura
21:00h-23h - Exposição “ É tempo de Margaridas”.
17 de Novembro de 2016
Local: FACEM/UERN
08h -10h - Apresentação de Trabalhos (Oral)
10h-10:30h - Coffe Break
10:30h-12h - Mesa Redonda “Análise da Gestão Social na Política do Desenvolvimento
Territorial do Nordeste” (Local: Auditório da Faculdade de Música/UERN)
Palestrantes: Márcio de Matos Canielo (UFCG)
Betty Nogueira Rocha (UFRRJ)
Elisabete Stradiotto Siqueira (UFERSA)
Vinícius Claudino de Sá (UERN)
10:30h-12h - Mesa Redonda “Cadeias Globais, Políticas Públicas e Trabalho descente na
fruticultura irrigada”. (Local: Auditório da FAFIC/UERN)
Palestrantes: Manoel Cândido da Costa (FETARN)
Thales Augusto Medeiros Penha (UFRN)
Josivan Barbosa Menezes Feitosa (UFERSA)
Marcellus Luiz Bezerra Fernandes Junior (Agrícola Famosa)
14h – 16h - Apresentação de Trabalhos (Oral)
16h - 16:30h Coffee Break
16:30h - 18h Mesa Redonda “Agricultura familiar, sustentabilidade e políticas públicas
no contexto do Desenvolvimento do Nordeste” (Local: Auditório da Faculdade de
Música/UERN)
Palestrantes: Maria Odete Alves (ETENE-BNB)
Joacir Rufino de Aquino (UERN)
Aldenor Gomes da Silva (UFRN)
João Ricardo Ferreira de Lima (EMBRAPA)
16:30h - 18h Mesa Redonda “Experiências de Desenvolvimento Territorial no Nordeste”
(Local: Auditório da FAFIC/UERN)
Palestrantes: Ildes Ferreira de Oliveira (UEFS)
Itaan de Jesus Pastor Santos (UEMA)
Emanoel Márcio Nunes (UERN)
Joseney Rodrigues de Queiroz Dantas (UERN)
20:30h Jantar de Confraternização (Por Adesão)
Local: Josué Recepções
18 de Novembro de 2016
Local: UFERSA
8h – 10h Apresentação de Trabalhos (Pôster)
10h – 10:30h Coffee Break
10:30h – 12h Mesa Redonda: “A dinâmica sustentável e o potencial dos Arranjos
Produtivos Locais (APLs) do Nordeste”. (Local: Auditório da CTARN)
Palestrantes: Amilcar Baiardi (UFRB)
Tales Wanderley Vital (UFRPE)
Marcia Regina Farias da Silva (UERN)
12h Encerramento
SUMÁRIO
GRUPO 3 – POLÍTICAS PÚBLICAS E REFORMA AGRÁRIA ............................. 878
A CONSOLIDAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA PROGRAMA UM MILHÃO DE
CISTERNAS NO SEMIÁRIDO POTIGUAR .................................................................. 879
A IMPORTÂNCIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PNAE E PAA PARA O
FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA FAMILIAR: UM ESTUDO DE CASO DA
ASSOCIAÇÃO DE PRODUTORES RURAIS DO NÚCLEO VI – PETROLINA /PE. . 894
A IMPORTÂNCIA DO COMPLEXO AGROINDUSTRIAL DE PETROLINA/JUAZEIRO
PARA O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE.............908
A REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DAS TERRAS QUILOMBOLAS DO PIAUÍ E OS
ENTRAVES PARA A CONCRETIZAÇÃO DA POLÍTICA .......................................... 927
A RELAÇÃO ENTRE A ENTRESSAFRA AÇUCAREIRA E A VIOLÊNCIA NA ZONA
DA MATA PERNAMBUCANA, NO PERÍODO ENTRE 2006 E 2015 ........................ 946
AGRICULTURA FAMILIAR, COMERCIALIZAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS PARA
O RURAL NO TERRITÓRIO DO MATO GRANDE - RN ............................................ 963
ANÁLISE DA OPERACIONALIZAÇÃO DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE
ALIMENTOS NO MUNICÍPIO DE LUCRÉCIA-RN ..................................................... 984
AVALIAÇÃODA QUALIDADE DE VIDA E NÍVEL DE SATISFAÇÃO DOS
BENEFICIÁRIOS E NÃO BENEFICIÁRIOS DO PNCF NO MUNICÍPIO DO CRATO –
CEARÁ ........................................................................................................................... 1004
AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ACESSO A MERCADO PELOS
PRODUTORES RURAIS NOS TERRITÓRIOS DA CIDADANIA..............................1024
COMPOSIÇÃO DE RENDA NAS ÁREAS DE ASSENTAMENTOS NO MUNICÍPIO DE
MOSSORÓ/RN: ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO E DA CAPACIDADE PRODUTIVA
......................................................................................................................................... 1040
ESTUDO DA EXECUÇÃO DO PROGRAMA P1+2 E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A
SEGURANÇA ALIMENTAR DAS FAMILIAS BENEFICIADAS NO MUNICÍPIO DE
IGUATU, CEARÁ NO PERÍODO DE 2015. ................................................................. 1060
INSERÇÃO DA AGRICULTURA FAMILIAR NO MERCADO DE COMPRAS
GOVERNAMENTAIS: ANÁLISE A PARTIR DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE
ALIMENTOS MODALIDADE COMPRA INSTITUCIONAL .................................... 1080
MECANISMOS RECENTES DE POLÍTICA AGRÍCOLA: O PROGRAMA GARANTIA-
SAFRA NOS TERRITÓRIOS DO RIO GRANDE DO NORTE................................... 1100
O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA E A POLÍTICA DE DESCENTRALIZAÇÃO:
IMPACTOS SOBRE A POBREZA NO “NORDESTE RURAL” E PARAÍBA ........... 1117
O PROGRAMA NACIONAL DE CREDITO FUNDIÁRIO NO NORDESTE
BRASILEIRO: UMA ANÁLISE DO PERÍODO DE 2005 A 2015 .............................. 1133
PERCALÇOS E AVANÇOS DA ASSISTÊNCIA TÉCNICA E EXTENSÃO RURAL NO
BRASIL ........................................................................................................................... 1155
POLÍTICAS PÚBLICAS E A SECA: UMA ANÁLISE SOBRE O SEMIÁRIDO
NORDESTINO ............................................................................................................... 1171
POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A AGRICULTURA FAMILIAR: UMA ANÁLISE DO
PROGRAMA NACIONAL DE FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA FAMILIAR
(PRONAF) NO TERRITÓRIO SERTÃO CENTRAL CABUGI E LITORAL NORTE/RN
......................................................................................................................................... 1184
POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA
FAMILIAR NO MUNICÍPIO DE MOSSORÓ: UMA AVAIAÇÃO SOBRE O PNAE NO
PERÍODO DE 2011 A 2014 ........................................................................................... 1201
PROGRAMAS PÚBLICOS E ESTRATÉGIAS DE CONVIVÊNCIA COM O
SEMIÁRIDO: UM ESTUDO DE CASO NO MUNICÍPIO DE JEQUITINHONHA-MG
......................................................................................................................................... 1221
REFORMA AGRÁRIA E ASSENTAMENTOS RURAIS: UMA BREVE ANÁLISE DE
SUA ABORDAGEM NO LIVRO DIDÁTICO DE GEOGRAFIA ............................... 1239
REFORMA AGRÁRIA E ESTRUTURA FUNDIÁRIA DO RIO GRANDE DO NORTE
........................................................................................................................................... 125
REFORMA AGRÁRIA NO BRASIL: ASPECTOS HISTÓRICOS SOBRE O PAPEL DO
ESTADO E AS CONDIÇÕES DE REPRODUÇÃO SOCIAL ...................................... 1275
UMA ANÁLISE DOS PROGRAMAS DE REFORMA AGRÁRIA E DE CRÉDITO
FUNDIÁRIO NO BRASIL: PERÍODO 2003-2014 ....................................................... 1289
GRUPO 3
Políticas Públicas e Reforma Agrária
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SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
A CONSOLIDAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA PROGRAMA UM MILHÃO DE CISTERNAS NO SEMIÁRIDO POTIGUAR
Autor(as): Camila Kayssa Targino Dutra; Cimone Rozendo de Souza Filiação: UFRN E-mail: [email protected]; [email protected]
Grupo de Pesquisa: Grupo 3. Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo A política pública Programa Um Milhão de Cisternas – P1MC surgiu a partir da criação da ASA no final dos anos 1990, e começou a ser implantada na região semiárida por volta de 2001, emergiu com as reivindicações da sociedade civil e movimentos sociais, revelando a possibilidade de práticas simples, mas que contribuem para ampliar a disponibilidade de água na região semiárida, baseada na construção de cisternas de placas, Tecnologias Sociais de captação e armazenamento de águas pluviais, a partir do telhado do beneficiado. O trabalho foi realizado com base em revisão de literatura, bem como foram realizadas entrevistas semiestruturadas em comunidades da zona rural de Apodi-RN com os beneficiados da Tecnologia Social. Os resultados encontrados informam que há necessidade de complementariedade à política já implantada com uma maior contrapartida do Estado, no sentido de agir para além das ações emergenciais comumente realizadas em período de escassez de água, apesar de uma notável mudança na zona rural de Apodi, como a descentralização do acesso à agua, o sucesso do programa também está relacionado com as ocorrências naturais de chuvas, uma vez que, não ocorrendo a quantidade de precipitação esperada, faz-se necessário a adequação de outros meios para obtenção do acesso à água. Palavras-chave: ASA. P1MC. Movimentos Sociais. Política Pública. Abstract The Public policy program One Million Cisterns - P1MC arose from the creation of the ASA in the late 1990s, and began to be implemented in the semiarid region by 2001, emerged from the demands of civil society and social movements, revealing the possibility of simple practices, but which contribute to increasing the availability of water in the semiarid region, based on building boards cistern, Social Technologies of capture and storage of rainwater from the roof of the benefited. The study was conducted based on literature review and semi-structured interviews what were conducted in rural communities of Apodi-RN with the beneficiaries of Social Technology. The results report that there is need for complementing the already implemented policy with a higher return for the State, this is, to act beyond emergency actions commonly performed in times of water shortage, despite a noticeable change in countryside of Apodi, as the decentralization of access to water, the program's success is also related to the natural occurrence of rainfall, since not occurring the amount of expected rainfall, it is necessary the appropriateness of other means for obtaining access to water. Key words: ASA. P1MC. Social movements. Public policy.
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SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
1. Introdução
A Articulação do Semiárido Brasileiro – ASA surgiu em 1999 como resultado do
Fórum Paralelo ocorrido durante a terceira Conferência das Partes da Convenção das Nações
Unidas de Combate à Desertificação – COP III em Recife-PE e tem como marco principal, a
Declaração do Semiárido, Carta Política que compreende as diretrizes, objetivos e
fundamentos norteadores da ASA (ASA, 2015).
A criação da ASA e do Programa P1MC está intimamente relacionada com as
mobilizações sociais que aconteceram anteriormente à sua formação, dentre elas está a
ocupação da SUDENE ocorrida em 1993 por entidades organizadas, como a Confederação
Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG, Movimento Sindical dos
Trabalhadores Rurais – MSTR, bem como agricultores e agricultoras que exigiam do governo
providências imediatas para combater a fome e a falta d’água (SILVA et al, 1996).
Nesse contexto, é ressaltado por Cordeiro (2013) que a trajetória dos movimentos
sociais organizados nas últimas décadas desembocou na construção de projetos alternativos
em meio às ações de enfrentamento ao modelo dominante de desenvolvimento, imposto ao
meio rural brasileiro.
As ações das quais fala Cordeiro (2013) são também evidenciadas por Rozendo (2011)
ao dizer que os espaços rurais têm se tornado objeto de uma multiplicidade de estratégias de
desenvolvimento, promovidas tanto pelo Estado quanto por atores sociais ligados a ONGs
e/ou as organizações representativas das populações rurais com foco nas demandas
ambientais.
Tais modificações são sentidas diante das diferentes propostas de enfrentamento dos
períodos de escassez hídrica para a região semiárida brasileira. Após várias décadas de
políticas públicas pautadas no combate à seca, como é evidenciado por Silva (2007) e
Passador e Passador (2010), a ASA é organizada a partir de ações que partem da Convivência
com o Semiárido, como bem trabalhado por Malvezzi (2007), isto é, em ações que se
fortalecem a partir das características intrínsecas a região, como a pouca disponibilidade de
água.
Dessa maneira, a partir do uso de Tecnologias Sociais, a ASA lança a proposta de
construir Um Milhão de Cisternas na região semiárida brasileira. O desenvolvimento da
Tecnologia foi para a captação e armazenamento de águas pluviais, com o objetivo de garantir
a água para consumo humano, bem como, promover a descentralização do acesso à água. Para
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SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
Barros (2009, p. 08), a “Tecnologia Social compreende produtos, técnicas ou metodologias,
reaplicáveis desenvolvidas em interação com a comunidade e que representem efetivas
soluções de transformação social”.
A realização do trabalho tem por objetivo fazer uma análise da política pública P1MC
implantada em Apodi-RN. A proposta é compreender seus efeitos enquanto estratégia de
convivência com o semiárido para os agricultores, agricultoras familiares e os residentes na
zona rural de Apodi.
Para a realização desse estudo foi feito um levantamento bibliográfico das políticas
públicas implantadas na região semiárida brasileira de combate à seca, além de revisão
literária a respeito de diferentes perspectivas de políticas públicas que estão pautadas em
outras ações, como a “Convivência com o Semiárido”, da qual a ASA faz parte. A partir
desses dados teóricos foram realizadas entrevistas semiestruturadas junto com os atores
sociais envolvidos, as famílias beneficiadas com o P1MC bem como, com os técnicos
envolvidos no processo de implantação das Tecnologias Sociais em 3 comunidades da zona
rural de Apodi-RN, Agrovila Palmares, Santa Cruz e Bamburral.
2. Formação da Articulação do Semiárido Brasileiro – ASA e o Programa Um Milhão de
Cisternas – P1MC
A convivência com o semiárido revela mudança de paradigma no que diz respeito as
políticas públicas voltadas para o Nordeste Brasileiro no final dos anos 1990. Revela também,
as mudanças provocadas pelas mobilizações sociais ocorridas anteriormente a criação da
ASA, importantes por propiciarem um olhar diferente ao semiárido.
No sentido de analisar as políticas públicas de combate à seca desenvolvidas na região
semiárida brasileira, é importante resgatar o próprio conceito de política pública. Em suma, ao
tratar da temática Brum (1993, p. 167) assevera que “as políticas constituem produtos dos
processos de tomada de decisão do Estado frente a determinados problemas. As mesmas se
compõem de decisões, ações e omissões dos organismos governamentais responsáveis”.
Em complemento a proposta de Brum (1993), Souza (2006, p. 26) aduz que: “política
pública como o campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, “colocar o governo em
ação” e/ou analisar essa ação e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas
ações”.
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SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
Ainda segundo Souza (2006), a formulação de políticas públicas constitui-se no
estágio em que os governos democráticos traduzem seus propósitos e plataformas eleitorais
em programas e ações que produzirão resultados ou mudanças no mundo real, sendo esse o
conceito adotado para esta pesquisa.
As políticas públicas desenvolvidas para a Região Nordeste foram marcadas pela
centralização e fragmentação das ações, e se concretizava com a criação de órgãos nacionais
para o combate à seca como o DNOCS – Departamento Nacional de Obras Contra as Secas,
os quais se transformavam em objeto de disputas políticas entre os diversos segmentos da
elite rural. A ação desenvolvida por esses órgãos limitava-se à construção de grandes açudes
públicos, perenizando grandes extensões de rios, sobretudo a construção de milhares de
pequenos e médios açudes dentro de propriedades privadas, de forma a assegurar água para a
produção agropecuária e o funcionamento de agroindústrias (PASSADOR e PASSADOR,
2009).
Apesar das várias políticas públicas implantadas ao longo da história do Nordeste
semiárido, o que se observa é que elas se revelaram incompletas e desintegradas, pois a cada
governo interromperam-se ou alteraram-se os projetos do governo anterior (PASSADOR e
PASSADOR, 2009), destacando-se ações baseadas, sobretudo, no combate á seca.
Nesse sentido, Silva (2007) defende que a intervenção governamental no semiárido
brasileiro, em grande parte, tem sido orientada por três dimensões que se combinam no
combate à seca e aos seus efeitos: a finalidade da exploração econômica; a visão fragmentada
e tecnicista da realidade local; e o proveito político dos dois elementos anteriores em
benefício das elites políticas e econômicas regionais.
As políticas públicas até então voltadas para o semiáriado estavam baseadas no
combate à seca, que “também expressa o distanciamento ou o estranhamento entre o ser
humano e uma terra e climas amaldiçoados” (SILVA, 2007, p. 474) e abre caminho para a
emergência de outro paradigma, o da convivência com o semiárido.
Para compreender o que vem a ser a convivência com o semiárido, Malvezzi (2007)
antes, expõe que a imagem difundida do Semiárido, como clima, sempre foi distorcida,
vendeu-se a idéia de uma região árida, não semiárida, é como se não chovesse, como se o solo
estivesse sempre calcinado, como se as matas fossem secas e as estiagens durassem anos. É
um ponto de vista, ao mesmo tempo, real e ideológico, que muitas vezes serve para que se
atribua à natureza problemas políticos, sociais e culturais, historicamente construídos. E
conclui o autor que:
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SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
O segredo da convivência está em compreender como o clima funciona e adequar-se a ele. Não se trata mais de “acabar com a seca”, mas de adaptar-se de forma inteligente. É preciso interferir no ambiente, é claro, mas respeitando as leis de um ecossistema que, embora frágil, tem riquezas surpreendentes (MALVEZZI, 2007, p. 12).
Tomando como base a convivência com o semiárido, a Articulação do Semiárido
Brasileiro tem o seu surgimento diretamente relacionado ao processo de mobilização e
fortalecimento da sociedade civil no início da década de 1990. Nesse contexto, é importante
observar que na década de 1990 ocorreram dois importantes acontecimentos relacionados com
as políticas públicas até então direcionadas ao Nordeste para o combate à seca.
No que diz respeito ao primeiro acontecimento Silva (2007) traz que, em março de
1993, milhares de trabalhadores rurais organizados pelo movimento sindical rural,
associações, cooperativas e ONGs, realizaram ato público em Recife e ocuparam a sede da
SUDENE, exigindo providências imediatas na situação de seca e ações permanentes para
desenvolvimento do semiárido.
O segundo e importante acontecimento deu-se no ano de 1999, quando acontecia em
Recife a III Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas de Combate à
Desertificação – COP III, em que foi organizando um fórum paralelo, para dar espaço às
discussões da sociedade civil. Durante a organização desse evento paralelo, começa a se
articular a ASA, primeiro com poucas organizações, que desde julho de 1999 estavam
envolvidas na preparação do fórum paralelo, depois como uma grande reunião, contando 65
participantes de 11 estados, a ASA se constituiu com um caráter de promotora do
desenvolvimento regional, como um fórum de organizações da sociedade civil para lutar pelo
desenvolvimento social, econômico, politico e cultural (ASA apud, FERREIRA, 2009).
A ASA e o Programa Um Milhão de Cisternas – P1MC nascem quase que
simultaneamente no final dos anos 1990. O lançamento do P1MC se dá no início dos anos
2000 em todo o semiárido brasileiro tendo como objetivo atender a uma necessidade básica da
população que vive no campo: água de beber, que é feito através do armazenamento da água
da chuva em cisternas construídas com placas de cimento ao lado de cada residência, as
famílias que vivem na zona rural dos municípios do semiárido passam a ter água potável para
consumo próprio (ASA, 2015).
A cisterna implantada pela ASA caracteriza-se por ser uma Tecnologia Social, que de
acordo com Otterloo (2009, p. 08) “compreende produtos, técnicas ou metodologias,
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reaplicáveis, desenvolvidas em interação com a comunidade e que representem efetivas
soluções de transformação social”.
Santos e Rozendo (2015) afirmam que essas tecnologias (sociais) têm o objetivo de
criar e implantar soluções para problemas socioeconômicos em regiões economicamente
fragilizadas, buscando a geração de trabalho e renda através da apropriação do potencial de
cada localidade.
Concretamente a ASA se materializa fundamentalmente no Programa de Formação e
Mobilização Social para Convivência com o Semiárido, que se desenvolve com: o P1MC –
manifestando-se fisicamente na construção da cisterna de 16 mil litros da água para consumo
humano (conforme Figura 01) e o Programa Uma Terra Duas Águas – P1+2. Alguns anos
após o lançamento do P1MC, a ASA decide implantar outro programa, tendo em vista que a
cisterna do programa anterior – P1MC – garante a água do consumo humano, mas é
insuficiente para manter pequenos cultivos e a hidratação animal.
Figura 01. Cisterna de Placas de 16 mil litros.
Fonte: ASA (2015).
Nesse contexto, é lançado no ano de 2007 o programa P1+2 – Programa Uma Terra
Duas Águas, em que o “1” significa a Terra e o “2” diz respeito às duas águas – para o
consumo humano e a destinada para pequena agricultura (ASA, 2015). Para o recebimento
das tecnologias integrantes do P1+2 é necessário, além dos requisitos expostos adiante, que o
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beneficiado já possua a tecnologia social P1MC. O programa P1+2 é constituído por sete
tecnologias: Cisterna-calçadão; Cisterna-enxurrada; Barragem subterrânea; Tanque de pedra
ou caldeirão; Bomba d’água popular; Barreiro-trincheira e a Barraginha (ASA, 2016).
No que diz respeito às condições mínimas para a família ser beneficiada com o(s)
programa(s), a ASA estipula que é basicamente distribuída em duas etapas, a primeira é o
cadastramento e seleção de famílias e o segundo é a capacitação que se divide em mais três
etapas: a primeira diz respeito ao Curso de Gerenciamento de Recursos Hídricos; a segunda é
a capacitação das comissões municipais e a terceira é a capacitação de pedreiros em
construção de cisternas domiciliares (ASA, 2015), importante é o destaque para a organização
das comunidades em associações, isto é, para o recebimento da Tecnologia Social, é
necessário que o beneficiado esteja associado a Associação Comunitária da comunidade.
O programa P1MC com o objetivo de construir um milhão de cisternas na região
semiárida brasileira, desde a sua implantação, já construiu 588.935 (quinhentos e oitenta e
oito mil, novecentas e trinta e cinco) cisternas com capacidade de armazenamento de 16 mil
litros de água, em todos os estados e municípios integrantes do semiárido, beneficiando cerca
de mais de 2.408,868 (dois milhões quatrocentos e oito mil, oitocentas e sessenta e oito)
pessoas (ASA, 2016). A seguir, o Programa é visto com mais detalhes no município de Apodi-
RN.
2.1. O Programa P1MC em Apodi-RN
O município de Apodi encontra-se situado a 357 km da Capital do Rio Grande do
Norte, localizando-se sobre a formação rochosa Chapada do Apodi na mesorregião do oeste
potiguar limitando-se no mesmo sentido com o estado do Ceará, ao norte com o município de
Governador Dix-Sept Rosado, a leste com os municípios de Felipe Guerra e Caraúbas e no
sentido sul com os municípios de Severiano Melo, Itaú e Umarizal (IBGE, 2010), conforme
Figura 02:
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Figura 02. Mapa de localização da área de estudo.
Mapa realizado no programa ArcMap 10.3 e elaborado por Fernanda Lourenço (2013).
Apodi possui uma característica marcante, de acordo com dados obtidos do IBGE
(2010) cerca de 50% dos habitantes, de um total de 34.743 (trinta e quatro mil, setecentos e
quarenta e três) mil, residem no meio rural, abrangendo moradores rurais, trabalhadores do
campo e agricultores e agricultoras familiares. É notável o número de comunidades rurais, de
acordo com o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Apodi – STTR são
aproximadamente 100, e elas se encontram distribuídas no município nas quatro regiões:
Região da Pedra, Região do Vale, Região da Areia e Região da Chapada. Esta última é a
maior em termos de extensão e de número de comunidades (PONTES, 2012).
Ainda em relação a divisão de Apodi em quatro regiões, no trabalho realizado por
Santana e Alloufa (2011), a partir de características de solos, relevo, geologia e hidrografia,
foi realizado o Zoneamento Agroecológico, pelo qual delimitou quatro regiões do município:
Chapada do Apodi, Planície Central, Sertão do Apodi e Vale do Apodi, que corresponde com
as regiões apresentadas por Pontes (2012).
O considerável número de habitantes residentes na área rural indica uma ligação direta
com a agricultura. Pontes (2012) afirma que é importante considerar também que o destaque
para a produção da agricultura familiar nas comunidades rurais da Chapada do Apodi-RN é
fruto de um processo histórico que teve início entre os anos 1970 e 1980, baseado em um
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processo de organização popular, dos movimentos dos trabalhadores e trabalhadoras rurais a
partir de um trabalho com a igreja católica, das Comunidades Eclesiais de Base (CEB).
Hoje a região tem assentamentos frutos da luta pela reforma agrária, assim, uma região
predominantemente de latifúndio, passou a ser de pequenos agricultores e agricultoras
familiares, seja em áreas de assentamentos ou comunidades. Advindo dessas mudanças
começou um trabalho, sobretudo, nos assentamentos, de organização e fortalecimento da
produção da agricultura familiar com uma nova visão: uma nova compreensão do semiárido e
um novo entendimento de desenvolvimento (PONTES, 2012).
Em Apodi existem muitas organizações sociais, além do STTR, há duas Cooperativas
a Cooperativa Potiguar de Apicultura e Desenvolvimento Sustentável - COOPAPI e a
Cooperativa de Agricultura Familiar de Apodi - COOAFAP, mais de 50 Associações
Comunitárias, mais de 20 grupos de mulheres (inseridos na Comissão de Mulheres do STTR
de Apodi) e a Associação dos Produtores de Arroz do Vale do Apodi – APAVA (OLIVEIRA et
al., 2013).
Está localizado também neste município, desde o final dos anos 1990, o Centro de
Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura Familiar – Terra Viva, uma Organização Não
Governamental – ONG que atua na Assessoria Técnico-Gerencial com objetivo ao
Desenvolvimento Local Sustentável, utilizando-se de Tecnologias alternativas como
incentivador de práticas agroecológicas e solidárias, respeitando as relações de gênero e de
geração (CENTRO TERRA VIVA, 2015).
Dentre as tecnologias sociais, trabalhadas por essa ONG tem-se o gerenciamento,
captação e implantação do P1MC, P1+2 e outros em fase de implantação como o: “Cisternas
nas Escolas e Sementes do Semiárido”, nas comunidades rurais do município de Apodi em
direta relação com a ASA.
De acordo com os dados provenientes do Centro Terra Viva e a ASA, já foram
implantadas em Apodi cerca 2.664 (duas mil seiscentas e sessenta e quatro) Tecnologias
integrantes do programa P1MC e aproximadamente 370 (trezentas e setenta) do P1+2 que
ainda está em fase de implantação.
O quadro a seguir mostra a quantidade de Tecnologias Sociais construídas em toda a
região semiárida brasileira e também em Apodi-RN:
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Quadro 01. Número de Tecnologias Sociais P1MC e P1+2.
Tecnologias sociais no Semiárido Brasileiro Tecnologias sociais em Apodi-RN Nº Tecnologia Social Nº de TS implantadas Nº de TS implantadas 1 P1MC 588.935 2.664 Nº total de
beneficiados 2.408,868 10.193
P1+2
1 Cisterna-calçadão 48.125 152 2 Cisterna-enxurrada 27.763 113 3 Barragem subterrânea 1.419 11 4 Tanque de pedra ou
caldeirão 823 1
5 Bomba d’água
popular 495 -
6 Barreiro-trincheira 9.814 86 7 Barraginha 1.812 6 Total 90.251 369 Nº total de
beneficiados do P1+2 379.756 1.329
Fonte: Autoria própria a partir de dados provenientes da ASA (2016) e o Centro Terra Viva (2015).
A trajetória do processo de implantação do Programa P1MC não se deu uniformemente
em toda a zona rural de Apodi, algumas comunidades foram atendidas e beneficiadas tão logo
quando o Programa surgiu, no início dos anos 2000, como as Comunidades aqui estudadas
Bamburral e Santa Cruz, e outras passaram a receber a Tecnologia entre os anos de
2011/2012, sendo essa a situação da Agrovila Palmares. Nesse contexto, características físicas
da própria comunidade devem ser amplamente verificadas, podendo influenciar na aquisição
ou não das Tecnologias.
Como bem relatado pelos beneficiados, a comunidade Bamburral possui poços
perfurados para abastecimento, mas a qualidade da água é considerada imprópria para
consumo, restando aos moradores o abastecimento por carro-pipa e as cisternas com água
captadas das chuvas do início do corrente ano, a implantação das Tecnologias deu-se em
meados dos anos 2000, a comunidade ainda possui um considerável número de Tecnologias
integrantes do programa P1+2.
A comunidade Santa Cruz caracteriza-se por estar situada próxima a Barragem Santa
Cruz, todavia o acesso à agua dá-se por meio de carro-pipa e pelas cisternas do programa
P1MC, não há implantação de Tecnologias do Programa P1+2. Tal fato possibilitou o
questionamento se os moradores possuíam acesso às águas da referida Barragem, a
agricultora residente em Santa Cruz assim respondeu:
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A barragem foi construída no ano de 2000, foi construída mais por influência de políticos, hoje temos mais consciência de que ela foi construída pensando mais no agronegócio, devido à estiagem que estamos vivendo há quase cinco anos, o fato da comporta da barragem está aberta se torna muito útil para as pessoas que produzem nas margens dos rios em suas casas, esse é o lado positivo e até então foi o único benefício que ela mostrou, mas agora se desfaz, está ameaçado porque o governo do estado já veio fazer uma fiscalização do uso da água da barragem. Se os pequenos produtores não tiverem a outorga com relação ao uso da água podem ser multados e ter seus materiais que puxam a água da barragem apreendidos por falta da outorga. Aí que a gente vê que essa barragem não foi constituída pelos pequenos agricultores e que beneficia mais o pessoal do agronegócio.
De acordo com o relato, percebe-se que a existência por si só de um grande
reservatório de água não garante o livre acesso, bem como o uso dessa água. Foi também
informado pelos agricultores que o processo para o recebimento da Outorga de uso é
dispendioso, e está fora do orçamento familiar.
A Agrovila Palmares localiza-se na região da Chapada, a 5 km do Distrito de
Soledade, surgiu em 1998 a partir de um projeto piloto realizado com 30 famílias pela Força
Sindical e o Sindicato dos Metalúrgicos da Bélgica, no ano de 2000 as terras do projeto foram
doadas para as famílias. A Agrovila ainda possui um poço para abastecimento de água e caixa
d’água de armazenamento elevada e distribuição encanada para as residências, que são cerca
de 30.
A situação hídrica da Agrovila é considerada boa pelos beneficiados, e o fato de terem
poço contribuiu para que fossem contemplados com as cisternas do Programa P1MC apenas
nos anos de 2011/2012, tal fato é relatado pela agricultora de Palmares quando informa que
passaram a ser beneficiadas porque participaram dos cursos de capacitação e também “porque
as outras comunidades que precisavam já tinham recebido”. Ainda não há nenhuma
implantação de Tecnologias do Programa P1+2, em razão das características físicas do local, a
Agrovila Palmares localiza-se sobre o Lajedo de Soledade, o que torna inviável a perfuração.
O processo de implantação desses programas formulados pela ASA contribui para
fortalecer mais ainda a organização social presente em Apodi, em que Vieira (2013) destaca
que há a percepção da existência de uma forte organização social, identidade compartilhada e
de engajamento social dos agentes, não sendo esta qualidade creditada ao território do Sertão
do Apodi, com seus 17 municípios, essa é característica, quase sempre, é creditada ao
município que dá nome ao território.
Dessa maneira, a Organização Social é vista aqui, como fator aglutinante de
reivindicações sociais, de lutas e conquistas de direitos e também, por políticas públicas
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melhores direcionadas á região semiárida, bem como, à região da Chapada do Apodi,
conforme, fica claro na transcrição a seguir do Presidente do STTR:
É, o município de Apodi ele chama atenção devido esse nível de organização social né? Que ele tem muito grande, nós temos aqui eu que acho que no município de Apodi, mais de 60 associações comunitárias fundadas, algumas eu digo que algumas dessas 60 têm 45 a 50 funcionando né, se reunindo todos os meses na comunidade, discutindo as problemáticas da comunidade e participando da reunião do fórum aqui né que eles trazem os problemas de debate de enfrentamento desses problemas então, (...) o nível de organização, ele se dá devido essa base organizada (Presidente do STTR, 2016).
As ações promovidas pela ASA também propiciaram oportunidades para que os
beneficiados pudessem se organizar melhor e participar mais ativamente da própria
organização das comunidades, conforme relatado por um beneficiado da comunidade Santa
Cruz, ao ser questionado se já era associado à Associação Comunitária antes de receber
cisterna, o mesmo respondeu: “não, me associei justamente para receber”.
A agricultura da comunidade Bamburral beneficiada com a Tecnologia Social P1MC e
uma Barragem Subterrânea integrante do P1+2 ressalta que “o fato de a comunidade ser
organizada possibilitou o processo de aquisição das cisternas acontecer”.
Nesse contexto, onde se discute a organização social e aquisição das Tecnologias
Sociais provenientes da ASA, a agricultora beneficiada da Comunidade Santa Cruz assim
revela como se deu o processo de recebimento Tecnologias Sociais, ressaltando o processo de
organização envolvido:
O cadastramento e recebimento da cisterna foi realizado de um modo mais coletivo e dinamizado, as discussões iam para o fórum das associações que fica no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Apodi, as associações se reúnem uma vez por mês e os projetos são realizados de acordo com as demandas que surgem. Os chefes de cada comunidades foram levados, aí o júri observa os critérios pra ver quais eram as prioridades em relação ao recebimento e a implantação do projeto de cisterna, geralmente comunidades com maior número de idosos e crianças eram favorecidas mais rapidamente, neste momento algumas famílias foram contempladas devido à demanda que era muito grande. Como as etapas não atendiam a todas as regiões, as mais secas eram mais rapidamente contempladas devido à carência de água para beber e cozinhar.
O programa de Convivência com o Semiárido presente na Declaração do Semiárido
(1999) é formado por ações que incluem desde o fortalecimento da agricultura familiar
(conforme as ações do Programa P1+2), como também a universalização do abastecimento
em água para beber e cozinhar através de Tecnologias simples como a cisterna de placas de
cimento de 16 mil litros.
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A universalização da qual fala a Declaração passa pelo processo de descentralização
do acesso à água proporcionado pelas cisternas e demais ações da ASA, no momento em que
é possibilitado ao beneficiado outra maneira obter água para as atividades mais básicas, como
beber e cozinhar, tal modificação reflete-se no cotidiano, sobretudo, para as mulheres
beneficiadas, como foi relatado pela agricultora residente na comunidade Bamburral: “antes
das cisternas não tinha água encanada, a gente ia buscar água de „roladeira‟ praticamente
todos os dias e depois que chegou a cisterna é muito bom, antes das cisternas ia pegar água
em propriedades vizinhas, puxando água de cacimbão”, mas, tal relato também se faz
presente na fala de mulheres entrevistadas em Palmares e Santa Cruz.
Com reservatórios de água com capacidade de armazenamento de até 16 mil litros,
localizadas ao lado da residência dos beneficiados, não é mais necessário buscar a água em
outras propriedades, tais modificações revelam também certa autonomia dos beneficiados,
sobretudo, pela descentralização do acesso à água.
3. Considerações Finais
A formação da ASA revela a existência de um caminho alternativo de luta conquistado
através da organização da sociedade civil e movimentos sociais, e ações que se tornam
importantes na formulação de programas sociais adequados para a região Nordeste e estados
abrangidos pelo clima semiárido. Através da Articulação do Semiárido e do Programa P1MC,
no final dos anos 1990 e início dos anos 2000 caminhos diversos foram percorridos no intuito
de promover e executar outras intervenções no semiárido brasileiro, firmado sob o olhar da
convivência com o semiárido.
A Articulação do Semiárido e os programas criados pela mesma e implantados na
região semiárida do Brasil contribuíram para a existência de perceptíveis modificações no
modo de viver das pessoas beneficiadas, pois, não há mais a necessidade de ir à propriedade
de terceiros para a obtenção de água para as atividades mais básicas como beber e cozinhar,
além de propiciar uma organização social vivenciado na zona rural de Apodi-RN.
Além de contribuir para um maior engajamento social nas comunidades, os
beneficiados passam a participar mais ativamente na construção e empenho de outras
demandas sociais, também necessárias e urgentes na realidade brasileira, como além do
acesso à água, há também o anseio pelo acesso a terra.
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A IMPORTÂNCIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PNAE E PAA PARA O FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA FAMILIAR: UM ESTUDO DE CASO DA
ASSOCIAÇÃO DE PRODUTORES RURAIS DO NÚCLEO VI – PETROLINA /PE.
THE IMPORTANCE OF PUBLIC POLICY PNAE and PAA FOR STRENGTHENING FAMILY FARMING: A CASE STUDY OF THE ASSOCIATION OF FARMERS
CORE VI - PETROLINA / PE.
Autor(es): Joelma Fabiana Barros da Silva Filiação: Maria de Lourdes Barros da Silva e José Fabiano da Silva E-mail: [email protected] Autor(es): Mário Eugênio Paula de Lima Filiação: Romilda Maria Paula de Lima e Irineu Martins de Lima E-mail: [email protected]
GT3: Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo Este trabalho tem por objetivo trazer conceitos sobre políticas públicas e mostrar os benefícios e as vantagens que os Programas PNAE e PAA trouxeram para o fortalecimento da agricultura familiar, em especial, dos agricultores da Associação de Produtores Rurais do Núcleo VI – APRNVI no município de Petrolina/PE. O estudo está centrado em identificar quais os efeitos destas políticas públicas na agricultura familiar e na organização de estudo. As políticas públicas PAA e PNAE têm aprovação unânime pelos agricultores familiares e declaram que na suposição de suspensão destas políticas públicas haverá reflexos graves no sistema produtivo. A contribuição das Políticas Públicas de Aquisição de Alimentos para o desenvolvimento dos agricultores familiares, e de sua organização. Os agricultores familiares têm um aumento, diversificação e melhoria da distribuição da renda durante o ano, garantias de mercado e comercialização, e a manutenção da propriedade no equilíbrio financeiro e das famílias na produção agropecuária. A associação dos produtores consegue melhorar a sua estrutura de organização, aumentar o faturamento e acessar novos canais de comercialização. Palavras chaves: Políticas públicas; PNAE e PAA; Agricultura familiar. Abstract This work aims to bring concepts of public policy and show the benefits and advantages that PNAE Programs and PAA brought to the strengthening of family agriculture, especially farmers of the Farmers Association Core VI - APRNVI in the city of Petrolina / PE. The study is focused on identifying what the effects of these policies on family agriculture and study organization. Public policies PAA and PNAE have unanimous approval by farmers and declare that the suspension of assumption of these policies there will be serious consequences in the productive system. The contribution of Public Food Procurement Policies for the development of family farmers, and their organization. The farmers have an increase, diversification and improvement of income distribution during the year, warranties of merchantability and marketing, and maintenance of property in financial balance and families in agricultural production. The association of producers can improve their organizational structure, increase revenues and access to new marketing channels. Key words: Public Policies; PNAE and PAA; Family Agriculture.
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1. INTRODUÇÃO
O presente artigo tem por finalidade analisar os programas públicos nacionais
voltados para a ascensão da agricultura familiar, como os Programas PAA e PNAE e seus
efeitos para o desenvolvimento da agricultura familiar local, estudando o caso da Associação
de Produtores Rurais do Núcleo VI em Petrolina – PE.
Para dar início, vale dizer que Petrolina é uma cidade do sertão de Pernambuco
conhecida nacional e internacionalmente como polo da fruticultura irrigada. Nos últimos anos
vem crescendo economicamente e com isso gerando um desenvolvimento local e nacional. Com
essa visão de crescimento as políticas públicas voltadas para esse setor têm sido um ponto
positivo para a região.
Dentro dessas políticas identifica-se o Programa de Aquisição de Alimentos PAA e o
Programa Nacional de Alimentação Escolar PNAE, que em Petrolina teve como a primeira
beneficiaria nesses programas a Associação dos Produtores Rurais no Núcleo VI, situada no
Perímetro Irrigado Senador Nilo Coelho, beneficiando 48 instituições sócias que começaram a
receber gratuitamente os produtos que eram fornecidos pela APRNVI (Associação de
Produtores Rurais do Núcleo VI), e que era conduzida pela CONAB – Companhia Nacional de
Abastecimento, gestora do Programa PAA.
Desta forma, o objetivo geral deste artigo é apresentar um estudo sobre a importância
das políticas públicas PNAE e PAA para o fortalecimento da agricultura familiar da associação
de produtores rurais do Núcleo VI – Petrolina /PE. Especificamente, trata de conhecer as
políticas públicas PAA e PNA; entender os processos que configuram a agricultura familiar;
relacionar o perfil dos produtores rurais do objeto de estudo; identificar a produção do núcleo
VI de Petrolina e verificar a importância das políticas públicas para o fortalecimento da
agricultura familiar na Associação dos Produtores Rurais do Núcleo VI em Petrolina.
Por isso, este estudo tem relevância porque apresenta para Associação em voga, e
consequentemente para a sociedade em geral, a importância que os programas governamentais
PAA e PNAE trouxeram de benefícios para a agricultura familiar.
Segundo Ramos (2005, p.8):
Com a inserção da agricultura familiar nas políticas públicas este segmento produtor passa a ser visto não somente como imprescindível ao abastecimento e à segurança alimentar para combater a fome, pobreza e miséria, mas também como alternativa ao desenvolvimento local e territorial, através da geração de emprego e melhoria na renda. Isso porque as políticas sociais rurais, além de ter seu foco na redução da pobreza e das desigualdades sociais, também
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intervêm na dinâmica econômica territorial contribuindo para promover o desenvolvimento local a geração de renda e a inclusão social.
Desse modo, fica claro que a criação de políticas públicas com o propósito de apoiar à
produção familiar agrícola tem se mostrado uma ferramenta eficaz para dinamizar a economia
de muitas cidades brasileiras, em especial as famílias assentadas e cerqueiras do sertão. Com
isso os programas governamentais PAA e PNAE têm sido o gerador potencial para a diminuição
da desigualdade social e miséria em regiões rurais que passam por uma fase de estagnação
econômica.
E para que os objetivos sejam atingidos se faz mister uma série de ações metodológicas,
quais sejam:
Realização de pesquisas bibliográficas para conhecer as políticas públicas PAA e
PNAE.
Pesquisa bibliográfica para entender os processos que configuram a agricultura familiar.
Aplicação de entrevistas semiestruturada para conseguir traçar o perfil dos produtores
rurais e para verificar a importância das políticas públicas para o fortalecimento da
agricultura familiar na Associação dos Produtores Rurais do Núcleo VI em Petrolina.
Realização de pesquisas documentais nos bancos de dados do DINIC e da APRNVI
para se identificar a produção do núcleo VI de Petrolina.
Criação de planilhas e gráficos demostrar os benefícios que os programas PAA e PNAE
trouxeram para os produtores familiares da Associação objeto de estudo.
Após o desenvolvimento dessas ações é que foi possível ter o conhecimento real da
importância e influência das políticas públicas PNAE e PAA para o fortalecimento da
agricultura familiar da associação de produtores rurais do Núcleo VI – Petrolina /PE
2. POLÍTICAS PÚBLICAS DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS
Os programas PAA e PNAE estão diretamente ligados ao Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF. Programa esse que dá acesso a recursos e
financeiros para desenvolvimento da agricultura familiar.
De acordo com Guanziroli e Basco (2010), até o início da década 90, não havia nenhuma
política pública no Brasil, voltada para o fortalecimento da agricultura familiar. Surge essa
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demanda em 1966, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar –
PRONAF, que é a primeira política totalmente voltada para unidades produtoras familiares.
Nessa perspectiva Manfiolli (2004), diz que políticas públicas o conjunto de programas,
ações que o Estado, desenvolve no intuito promover melhorias para determinados seguimentos
da sociedade.
Conforme Cunha e Cunha (2002), as políticas públicas têm sido criadas pelo Estado
como respostas às demandas que emergem da sociedade e do seu próprio interior, representando
o compromisso público de atuação numa determinada área em longo prazo. “É mediante as
políticas públicas que são distribuídos ou redistribuídos bens e serviços sociais, em resposta às
demandas da sociedade. Por isso, o direito que as fundamenta é um direito coletivo e não
individual”. (PEREIRA, 1996, apud DEGENNSZAJH, 2000, p. 59).
Com isso, pode ser afirmado que as políticas públicas geram crescimento e
desenvolvimento para o setor para o qual foi determinado quando essa é gerida de forma
responsável, transferindo os recursos para se suprir as necessidades ilimitadas dos determinados
setores da nossa sociedade.
2.1 PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS – PAA
Para o Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA (2016) o Programa de Aquisição
de Alimentos (PAA), é um das ações do programa Fome Zero, do Governo Federal, o PAA
beneficia populações em situação de incerteza alimentar e nutricional e promove a diminuição
do êxodo rural gerando o fortalecendo da agricultura familiar. O programa foi criado em 2003
e atualizado pela Lei no 12.512/2011, regula que os órgãos públicos federais, estaduais e
municipais podem adquirir os alimentos diretamente das unidades produtoras.
Conforme Antunes e Hespanhol (2011), o PAA foi desenvolvido em um período de
transformação nas políticas públicas voltadas para o meio rural. Estas transformações
iniciaram-se, principalmente na década de 1990, com a ampliação dos direitos previdenciários,
a partir das modificações previstas na Constituição de 1988. As autoras ainda complementam
dizendo que o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar foi outro
importante marco, contribuindo para a valorização do segmento familiar.
De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social – MDS (2016), o Programa de
Aquisição de Alimentos – PAA possui duas finalidades básicas: promover o ingresso à
alimentação e incentivar a agricultura familiar. Para a obtenção desses dois objetivos, o
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Programa compra alimentos produzidos pela agricultura familiar, com dispensa de licitação, e
os designa às pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional e àquelas atendidas
pela rede sócio assistencial e pelos equipamentos públicos de alimentação e nutrição.
Ainda tomando como base o Ministério do Desenvolvimento Social – MDS (2016), o
PAA contribui também para a composição de estoques públicos de alimentos produzidos por
agricultores familiares e para a formação de estoques pelas organizações da agricultura familiar.
Além disso, o Programa promove o abastecimento alimentar por meio de compras
governamentais de alimentos; fortalece circuitos locais e regionais e também redes de
comercialização; valoriza a biodiversidade e a produção orgânica e agroecológica de alimentos;
incentiva hábitos alimentares saudáveis e estimula o associativismo e o cooperativismo.
Para Hespanhol (2013), a particularidade do programa é sua flexibilidade, já que se
acomodar-se às necessidades regionais. Segundo a autora, para participar do programa os
produtores rurais devem apresentar o Documento de Aptidão ao PRONAF (DAP) e estarem,
preferencialmente, organizados em cooperativas, associações ou grupos de interesse informais
com, no mínimo, cinco agricultores.
O PAA no município de Petrolina-PE é executado pela Secretaria de Desenvolvimento
Social e Cidadania (SEDESC) e os recursos para a compra da produção dos agricultores
familiares são disponibilizados pelo Ministério de Desenvolvimento Social (MDS). Os
alimentos adquiridos no âmbito do município de Petrolina são destinados a ações de
alimentação empreendidas por entidades da rede sócio assistencial em recintos públicos de
alimentação e nutrição como Restaurantes Populares, Cozinhas Comunitárias e Banco de
Alimentos. Entre as entidades que participam do Programa de Aquisição de Alimentos estão a
APAMI, APAE, PETRAPE, CEMAM, a Pastoral da Criança e a Casa de Passagem Bom
Samaritano (SEDESC, 2016).
É correto afirmar que a SEDESC aderiu ao PAA no ano de 2010 e três anos depois já
contava com 480 pequenos agricultores fornecedores de frutas, verduras, polpa de frutas, doces,
bolos, mel de abelha e carnes de aves, peixes, caprinos e suínos. Em 2016, a proposta do
contrato do PAA para o município de Petrolina-PE foi de R$ 2.156.000,00 (dois milhões cento
e cinquenta e seis mil reais) distribuídos entre os 490 pequenos produtores das áreas de sequeiro,
irrigada e ribeirinha do rio São Francisco (SEDESC, 2016).
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2. 2 PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR (PNAE)
De acordo Saraiva et al (2013), o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)
é a política pública mais antiga do Brasil. Implantado em 1955, com o objetivo de contribuir
para o crescimento, a aprendizagem, aumentando o rendimento escolar dos alunos e a mudança
hábitos de alimentações saudáveis.
São beneficiados pelo Programa todos os alunos da educação básica (educação infantil,
ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos) devidamente matriculados
em escolas públicas, filantrópicas e em entidades comunitárias (conveniadas com o poder
público) por meio da transferência de recursos financeiros do Fundo Nacional de
Desenvolvimento Educacional (FNDE).
Segundo o FNDE, o PNAE tem caráter suplementar, como prevê o artigo 208, incisos
IV e VII, da Constituição Federal, quando determina que é obrigação do Estado, incluindo as
três esferas: União, Estado e Município, garantir "educação infantil, em creche e pré-escola, às
crianças até cinco anos de idade" (inciso IV) e atender ao aluno, em todas as etapas da educação
básica, por meio de programas suplementares de material didático escolar, transporte,
alimentação e assistência à saúde" (inciso VII).
Conforme o artigo 14º da Lei Federal nº 11.947, estabelecer que do repasse feito pelo
FNDE no que se referi ao PNAE, no mínimo 30% (trinta por cento) obrigatoriamente deverão
ser usados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do
empreendedor familiar rural ou de suas organizações, dando-se preferência os assentamentos
da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas.
Para Saraiva et al (2013), a união entre agricultores familiares e consumidores tem
gerado uma relação baseada em princípios de sustentabilidade, motivando a diminuição do
êxodo rural e contribuindo para o crescimento e desenvolvimento rural e urbano. Quando a Lei
torna obrigatória a compra de alimentos da agricultura familiar auxilia o produtor quanto à
aquisição de alimentos, dando a ele a certeza que sua produção será vendida e que preço
praticado e aquele estabelecido na chamada pública e não por processo licitatório. (SARAIVA
et al, 2013).
O repasse é feito do Governo Federal diretamente aos estados e municípios, com base
no Censo Escolar realizado no ano anterior ao do atendimento. O Programa é acompanhado e
fiscalizado diretamente pela sociedade, por meio dos Conselhos de Alimentação Escolar
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(CAE), pelo FNDE, pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pela Controladoria Geral da
União (CGU) e pelo Ministério Público.
O repasse dos recursos é feito diretamente aos estados e municípios, com base no censo escolar realizado no ano anterior ao do atendimento, sendo as prefeituras e as escolas estaduais responsáveis pelo gerenciamento da alimentação escolar. Atualmente os estados podem delegar a seus municípios a responsabilidade pelo atendimento aos alunos matriculados nos estabelecimentos estaduais de ensino localizados nas suas respectivas áreas de jurisdição, entendendo-se na Resolução nº 38 de 16 de julho de 2009, como delegação de rede da alimentação escolar e, nesse caso, autorizar expressamente o repasse direto do FNDE ao município da correspondente parcela de recursos. Para tanto, é necessário o consentimento da Prefeitura Municipal. (COELHO, 2012, p. 42).
De acordo com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (2016), o valor
repassado pela União para Estados e Municípios é de R$0,50 por aluno/dia, para cada aluno
matriculado na pré-escola e R$0,50 por aluno/dia para cada aluno matriculado em turmas de
ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos. Creches recebem R$1,00
por aluno/dia e escolas indígenas e quilombolas recebem R$0,60 por aluno/dia. As escolas que
oferecem ensino integral R$01,00. Por intermédio do Programa Mais Educação, recebem
R$0,90 por aluno/dia. Ensino fundamental, médio e educação de jovens e adultos: R$ 0,30 e
alunos que frequentam o Atendimento Educacional Especializado no contra turno: R$ 0,50.
O Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE estimula o desenvolvimento
econômico e sustentável das comunidades.
Afirma Turpin (2008) apud Coelho (2012) que o PNAE tem sido o maior programa
suplementação alimentar na América Latina, trazendo como pontos positivos o tempo de
atuação, a continuidade, o caráter universal, o número de alunos atendidos e a quantidade de
investimentos realizados.
Conforme informações do Portal Deepask, em 2014, o valor repassado do PNAE para
o município de Petrolina-PE foi de R$ 5.185.796,00 (cinco bilhões cento e oitenta e cinco mil
setecentos e noventa e seis reais), que favoreceu a 259 escolas, beneficiando aos 79.760 alunos.
3. OBJETO DE ESTUDO: APRNVI
Localizada no Perímetro Irrigado Senador Nilo Coelho no município de
Petrolina-PE, a Associação dos Produtores Rurais do Núcleo VI – APRNVI, segundo
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disposições regidas em seu Estatuto “tem por objetivo a prestação de qualquer serviço que possa
contribuir para o fomento e racionalização das atividades econômicas, sociais, educacionais e
culturais dos seus associados”; visando representar os associados, em juízo ou fora dele,
defendendo seus direitos e interesses.
Constituída como sociedade civil sem fins lucrativos, no formato de “associação de
pequenos produtores rurais”, a APRNVI, atua sob os princípios associativos de cooperação,
com estrutura administrativa definida pelos cargos diretivos de: Presidente, Vice-Presidente,
Tesoureiro e Secretário, todos eleitos em assembleia geral por maioria simples de votos.
Atualmente a Instituição conta com sessenta e seis, pequenos produtores rurais
associados, com base na agricultura familiar produzindo banana, melancia, goiaba, manga,
macaxeira, abóbora e mamão, maracujá. Parte dessa produção é destinada aos programas PAA
- Programa de Aquisição de Alimentos e PNAE - Programa Nacional de Alimentação Escolar
e a outra é destinada ao comércio local.
É papel da APRNVI, desenvolver o trabalho de coordenação e distribuição do plantio
dos diferentes produtos contratados, visando coincidir a colheita com o período de entrega das
mercadorias, segundo os contratos com os programas, além de organizar, controlar e efetivar o
processo de entrega.
Em 2016, o PAA formalizou contratação no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais)
para diferentes produtos, distribuídos entre vinte associados e o PNAE um contrato no valor de
R$ 671.297,10 (seiscentos e setenta e um mil duzentos e noventa e sete reais e dez centavos)
distribuídos entre trinta e sete associados, com o valor máximo individual de R$ 20.000,00
(vinte mil reais) por ano.
Considerando-se que a DAP é designada por pessoa e não por lote, implica-se que
famílias com filhos de maior idade podem formalizar dois ou mais contratos por programa
(PAA e PNAE), o que melhor viabiliza a comercialização da produção. Vale ressaltar que, os
associados participantes do PAA também estão inseridos no PNAE. Os demais associados não
participantes dos programas comercializam seus produtos com o mercado.
4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
A Associação de Produtores Rurais do Núcleo VI é constituída por sessenta e seis
associados, sendo que trinta e sete destes participam dos programas PAA e PNAE,
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representando a população da pesquisa realizada. Destes, vinte associados representaram a
amostra efetivamente analisada, ou seja, 54,05% da população.
O levantamento das informações revelou que 80% dos entrevistados são homens e 20%
mulheres, sendo 80% casados. Esse número expressivo representa que os homens continuam
dominando a lida no campo. Destes, 40% têm mais de 70 anos, percentual relativamente
elevado, considerando que a idade média dos brasileiros é de 74,9 anos, segundo IBGE para o
ano de 2013 (UOL, 2014) e representa que os jovens não estão mantendo suas atividades no
campo seguindo seus pais e familiares.
Das pessoas ouvidas todas trabalham, no mínimo há seis anos, com agricultura, dos
quais 70% tem mais de vinte e seis anos de experiência. Destes, 90% residem na comunidade
do Núcleo VI, característica típica da agricultura familiar. Desta forma, é possível afirmar que
a experiência é muito grande entre os entrevistados.
Segundo o grau de instrução dos participantes da amostra, a pesquisa revelou que 20%
não possui escolaridade, 30% tem o ensino fundamental I, 40% cursaram o ensino médio e 10%
possui ensino superior, o que parece bastante razoável, visto que 40% dos entrevistados
possuem mais de setenta anos, o que é corroborado por dados do IBGE (2010) ao apresentar
80,1% da população com mais de setenta anos com pouca ou nenhuma instrução.
Quanto à renda familiar foi verificado que depois participação nos Programas não há
um só produtor com renda familiar mensal acima de quinze salários mínimos ou até um salário
mínimo. Pois 30% entram na categoria de um a quatro salários mínimos, 40% na categoria de
cinco a sete salários mínimos e 30% de sete a quinze salários mínimos. Destes, 50% possui
apenas renda da atividade agrícola, enquanto 50% apresenta renda alternativa, onde 50% têm a
renda complementada com aposentadoria, 5% de atividade de serviço público e 15% de outras
fontes. Isso mostra que, o fato da metade apresentar outras rendas representa que só a atividade
no campo não está suprindo plenamente a condição de renda do agricultor desta Associação.
A associação conseguiu melhorar a sua estrutura física, e organização, aumentou o
faturamento e vem buscando acessar novos canais de comercialização. As políticas públicas
PAA e PNAE têm aprovação unânime pelos agricultores familiares e revelam que na hipótese
de interrupção destas políticas públicas haverá reflexos graves no sistema produtivo e social.
Em relação ao trabalho desenvolvido pela Associação, 40% considerou como excelente,
50% bom e apenas 10% ruim, o que demonstra alto índice de satisfação dos associados
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participantes dos programas PAA e PNAE, reconhecendo a importância dos serviços prestados
pela Associação.
A motivação que induziu aos associados a participarem dos programas PAA e PNAE,
segundo as respostas dos questionários, foram: o preço atrativo das mercadorias definido em
contrato (40%), a segurança de recebimento dos pagamentos (50%) e 10% por outros motivos.
Apesar dos associados terem sido atraídos, na decisão de participar dos programas, pelo
preço das mercadorias e pela garantia do recebimento, 90% e 80% dos associados consideram
baixo o valor que o PAA municipal repassa por DAP (Declaração de Aptidão ao Pronaf) a cada
produtor, que é entre R$ 5.000,00 a R$ 5.500.00, esse foi o valor trabalhado esse ano de 2016.
No PNAE municipal desde 2014 que o valor é R$ 20.000,00 por DAP. Não obstante, 85% das
pessoas formalizaram dois ou mais contratos por propriedade. Essa condição eleva a
participação desses programas na renda total das famílias.
Foi perguntado ainda se houve acréscimo da renda depois que iniciaram a participação
nos programas. Então, 100% afirmaram que sim. Como mostra o gráfico que segue.
Fonte: APRNVI – Associação dos Produtores Rurais VI, 2016.
Dos sessenta e seis sócios, 40% são formados por cinco famílias, sendo que cada um
deles tem mais de quatro sócios, logo o valor por família gera um aumento significativo na
renda, gerando qualidade de vida, crescimento e desenvolvimento local.
20
35
55
ANO 2014 ANO 2015 ANO 2016
Acréscimo da Renda dos Produtores da APRNVI %
903
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Tabela 1. Participação da APRNVI no Programa PAA em 2014 - 2016
PARTICIPAÇÃO DA APRNVI NO PROGRAMA PAA - 2014 A 2016
ANOS/QUANT.MESES Nº DE SOCIOS VALOR POR
DAP VALOR TOTAL
ANO -2014 15 R$ 4.500 67.500 4 MESES
ANO -2015 16 R$ 4.500 R$ 72.000 4 MESES
ANO -2016
20 R$ 5.000 R$ 100.000 6 MESES Fonte: APRNVI – Associação dos Produtores Rurais VI, 2016.
O Programa PAA para a Associação dos Produtores Rurais tem gerado um estímulo
para seus sócios, visto que o preço dos produtos chega até duas a três vezes o valor de mercado.
O único fator negativo é o valor por DAP que é pago a cada produtor.
Tabela 2. Projeto de Venda da APRNVI no Programa PNAE em 2014 - 2016
PROJETOS DE VENDA DA APRNVI NO PROGRAMA PNAE - 2014 A 2016
ANOS/QUANT.MESES Nº DE
SOCIOS VALOR POR
DAP VALOR TOTAL ANO -2014
66 R$ 20.000 R$ 1.320.000,00 8 MESES ANO -2015
37 R$ 20.000 R$ 740.000 9 MESES ANO -2016
37 R$ 20.000 R$740.000 9 MESES Fonte: APRNVI – Associação dos Produtores Rurais VI, 2016.
Os dados da Tabela 2 mostram os valores de contratos que a APRNVI assinou com a
Prefeitura Municipal nesses três últimos anos. Porém, vale ressaltar que os valores contratados
nunca passaram de 60%. Por esse motivo gerou a diminuição da participação dos produtores
no programa, visto que o órgão executor não comprava a produção estabelecida no contrato.
Contudo, os que continuaram no programa dizem que hoje eles conseguem entregar um
percentual maior devido a redução dos participantes.
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Tabela 3. Os Programas PAA e PNAE em Petrolina no ano de 2015
PROGRAMAS PAA PNAE Produtor/Ano/DAP $ 5.000 R$ 20.000
Produtores Atendidos 491 397 Valor Contratado
(Empenhado) R$ 2.156.123,08
R$ 1.560.000,00
Valor Real da DAP/Produtor R$ 4.391,29 R$ 3.929,47 Entidades/Escolas 48 140
Fonte: Dados de Pesquisa - Prefeitura Municipal de Petrolina (Responsáveis dos Programas),
2015. Os dados da tabela 3, demostram quão efetivo foi o Programa PAA em relação ao
PNAE, visto que esse comprou 88% da produção ofertada pelo produtor ao programa.
A Secretaria de Educação de Petrolina que é responsável pelo PNAE municipal,
informou que o número de produtores inscrito em 2015 foi bem maior que os anos anteriores.
Porém, vale dizer que, o programa não é para todos os que se inscrevem e sim para as entidades
que estão habilitadas, dentro das normais que gerem a Lei do PNAE.
CONCLUSÃO
O presente artigo teve como objetivo analisar a importância das Políticas Públicas (PAA
e PNAE) para o fortalecimento da Agricultura Familiar, em especial para os produtores
associados da APRNVI. A participação da referida organização nos Programas de Aquisição
de Alimentos, representam um marco importante para a mesma, sendo ela a primeira entidade
a participar dos dois programas em Petrolina-PE.
Ao garantir a compra da produção familiar, com preços diferenciados dos praticados no
mercado local, estas políticas possibilitam maior equilíbrio à atividade agrícola e melhoram a
renda dos produtores participantes dos programas. O incremento financeiro garante a circulação
de dinheiro na economia da própria região e na comunidade onde os produtores estão inseridos.
Percebe-se facilmente uma melhoria na qualidade de vida. Nota-se ainda que os
participantes no decorrer dos anos puderam trocar as carroças pelos carros, bicicletas por motos,
puderam reformar e ampliar as residências, pagam escola e/ou cursos para os filhos, e possibilita
também o custeio e a manutenção da própria atividade agrícola.
O estudo revela ainda que os produtores preferem participar do PAA, pois o mesmo tem
seus preços mais vantajosos para alguns produtos do que o PNAE e, além disso, o limite de
compra é no mínimo 88% do valor total contratado. A desvantagem do primeiro em relação ao
segundo é o valor da DAP praticado no município, pois tem o seu limite em 5 mil reais, onde o
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outro chega a 20 mil reais. Outra vantagem é que o valor de cada produtor é pago em conta
pessoal, aberta com finalidade exclusiva para pagamento do programa. Já o PNAE tem sua
desvantagem no montante de compra que chega apenas a 60% a pesar do valor da DAP ser
maior.
Assim, pode-se concluir que as políticas públicas analisadas neste artigo se vêm
mostrando impulsionadoras do desenvolvimento da agricultura familiar local.
REFERÊNCIAS
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A IMPORTÂNCIA DO COMPLEXO AGROINDUSTRIAL DE
PETROLINA/JUAZEIRO PARA O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE
THE IMPORTANCE OF AGROINDUSTRIAL COMPLEX PETROLINA / JUAZEIRO FOR NORTHEAST DEVELOPMENT
Autor 1: KASSIA LARISSA ABRANTES ALVES Filiação: Graduanda em Ciências Econômicas- UFCG E-mail: [email protected] Autor 2: ALUNILDA JANUNCIO DE OLIVEIRA Filiação: Professora Drª do Curso de Ciências Econômicas - UFCG E-mail: [email protected] Autor 3: MATTHEUS RODRIGUES DA SILVA Filiação: Graduando em Ciências Econômicas- UFCG E-mail: [email protected] Autor 4: SHAYANNE SILVANA ALVES DA SILVA Filiação: Graduanda em Ciências Econômicas- UFCG E-mail: [email protected]
Grupo de Pesquisa: POLÍTICAS PÚBLICAS E REFORMA AGRÁRIA
Resumo Este artigo tem como objetivo verificar a importância do polo agroindustrial de Petrolina/Juazeiro para o desenvolvimento da região Nordeste através da agricultura de irrigação, utilizando informações da produção e indicadores sociais. O polo é composto por oito cidades dos estados de Pernambuco e Bahia, porém os dados apresentados estão relacionados às cidades de Petrolina e Juazeiro, por serem consideradas as mais representativas dentro da região. A pesquisa tem caráter descritivo e exploratório que expõe as políticas de incentivo que possibilitaram o surgimento do polo, como também suas características de produção, localização, investimentos e exportação. Para analisar a produção e exportação da atividade agrícola irrigada do polo, a cultura da manga recebeu um destaque especial no nosso trabalho pelo espaço de comercialização conquistado ao longo do tempo. Para tanto, o trabalho foi elaborado através dos procedimentos técnicos da pesquisa bibliográfica, utilizando fontes de dados secundários, tais como: livros, artigos e periódicos. Portanto, os resultados finais desta pesquisa evidenciam diante da análise dos indicadores socioeconômicos, que a consolidação e expansão das práticas de irrigação integrada à indústria trouxeram transformações expressivas não apenas para a produção e o processo produtivo do polo, mas, também, impactos sobre a renda e o emprego, fazendo com que a microrregião alcançasse um forte dinamismo econômico a partir de meados da década de 1990. Identificamos também, que alguns desafios devem ser enfrentados com vistas a garantir o desenvolvimento da região, como a capacitação técnica dos pequenos produtores e colonos, e o aperfeiçoamento de políticas que tenham como objetivo promover uma melhora nos indicadores sociais da sua população.
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Palavras-chave: Polo Agroindustrial Petrolina/Juazeiro. Fruticultura. Indicadores Sociais. Manga e Desenvolvimento Econômico. Abstract This article aims to check the importance of the agroindustry pole Petrolina / Juazeiro for the development of the Northeast region through irrigated agriculture, using information from the production and social indicators. The pole consists of eight cities in the states of Pernambuco and Bahia, but the data presented are related to the cities of Petrolina and Juazeiro, because they are considered the most representative cities in the region. The research is descriptive and exploratory, which exposes incentive policies that made possible the emergence of polo, as well as their production characteristics, location, investment and export. To analyze the production and export of irrigated agriculture polo, the mango crop received special emphasis in our work by commercialization space won over time. Therefore, the work was elaborate done through the technical procedures of the literature, using secondary data sources, such as: books, articles and periodicals. Therefore, the final results of this research showed on the analysis of socio-economic indicators, the consolidation and expansion of integrated irrigation practices to the industry brought significant changes not only for the production and the productive process polo, but, also, impacts on income and employment, causing the micro-region reached a strong economic momentum from the mid-1990s. We also identified, some challenges must be addressed in order to ensure the development of the region, as the technical training of small farmers and settlers, and improvement of policies that aim to promote an improvement in social indicators of its population. Key words: Agroindustry Pole Petrolina / Juazeiro. Fruit Crop. Social Indicators. Mango. EconomicDevelopment. 1. INTRODUÇÃO
O polo agroindustrial de Petrolina/Juazeiro surgiu nos anos de 1970 devido a uma
serie de incentivos, programas e medidas governamentais que buscavam estimular a
industrialização da região Nordeste como forma de superar as dificuldades geradas pela velha
base agroexportadora nordestina. Formado pelos municípios: Petrolina, Lagoa Grande, Santa
Maria da Boa Vista, Orocó, em Pernambuco; Juazeiro, Sobradinho, Casa Nova e Curaçá, na
Bahia. O polo é especializado na produção da fruticultura, baseada em grandes projetos de
irrigação, localizado no semiárido nordestino e no Baixo Médio São Francisco e sempre foi
um ponto de ligamento entre o sertão da regional Nordeste e o Norte de Minas Gerais,
favorecendo as relações comerciais entre as regiões através da rede rodoferroviária e pluvial.
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Diante disso, este artigo tem como objetivo verificar a importância do polo
agroindustrial de Petrolina/Juazeiro para o desenvolvimento da região Nordeste através da
agricultura de irrigação, utilizando informações das políticas de incentivo que possibilitaram o
surgimento do polo, as características de produção, localização, investimentos, exportação.
Para analisar a produção e exportação da atividade agrícola irrigada do polo, a cultura da
manga recebeu um destaque especial no nosso trabalho pelo espaço de comercialização
conquistado ao longo do tempo. O polo é composto por oito cidades dos estados de
Pernambuco e Bahia, porém os dados apresentados estão relacionados às cidades de Petrolina
e Juazeiro, por serem consideradas as mais representativas dentro da região
O trabalho está dividido, além dessa introdução, em uma seção de referencial teórico
dividida em quatro subseções: a primeira aborda as políticas públicas do setor agrícola,
fazendo uma análise histórica da atuação do governo e do desempenho de órgãos responsáveis
por incentivar o caráter industrial da região Nordeste, a exemplo da Superintendência de
Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), desde anos 1950 até o nascimento do polo em
meados dos anos 1970. Na segunda subseção são apresentadas as características do polo
agroindustrial de Petrolina/Juazeiro, dentre essas: o seu perfil agroindustrial, seu objetivo,
localização, transformações agrícolas, diversificação produtiva e estrutura; na terceira
subseção são mostradas as formas de comercialização dos principais produtos; na quarta
subseção é demonstrada a participação do estado, sobretudo na questão de investimentos ao
setor. A seção seguinte expõe a metodologia aplicada na realização do presente trabalho. A
quarta seção mostra os resultados da nossa análise relacionada às consequências da atuação do
setor público no polo, a distribuição das terras e os indicadores sociais, baseados na análise
temporal de implantação do polo para as duas cidades mais representativas: Petrolina (PE) e
Juazeiro (BA). Os indicadores utilizados neste trabalho foram população, concentração da
população, Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), emprego e renda,
educação, saúde e habitação. Por fim, apresentamos as considerações finais baseadas em tudo
que foi exposto.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Políticas públicas para o setor agrícola.
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A década de 50 é marcada por uma mudança na condução da política econômica para
a região Nordeste, antes caracterizada por políticas assistencialistas, onde as oligarquias
regionais utilizavam os fundos públicos para a manutenção de seus interesses econômicos. O
A seca e a pobreza do Nordeste eram tidas como o maior problema que a região enfrentava.
Por isso mesmo, as propostas e as medidas para a sua solução correspondiam à construção de
grandes açudes e distribuição de cesta básica para a população. Esse modo de enxergar o
Nordeste afetava o processo de formulação das políticas econômicas para a região, que de
forma geral sempre se concretizava em políticas de cunho assistencialista. Isso só veio a
mudar em 1956, com a criação do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste
(GTDN), que elaborou um documento recomendando a resolução dos problemas nordestinos
ao governo federal por outro prisma. Segundo o documento, além de todos os problemas
naturais existentes no Nordeste, havia um problema ainda mais grave: as condições de
subsistência do local. Para amenizar esses efeitos o GTDN diagnosticou que não necessitava
apenas construir açudes, a verdadeira solução seria a implementação ações para que a região
tivesse condições e meios para assegurar renda a sua população, crescimento e produtividade
local.
Dessa forma no final dos anos 50, o GTDN fundamentou a estratégia inicial de ação da
SUDENE que tinha como objetivo estimular a industrialização no Nordeste como forma de
superar as dificuldades geradas pela velha base agroexportadora nordestina. Assim, nos anos
de 1960 são implantados os perímetros de irrigação, entre eles os mais importantes:
Bebedouros e Nilo Coelho, que possibilitaram a oportunidade de novas formas de
comercialização para o Nordeste, de modernização da agricultura local e melhorias na
qualidade de vida da população. Essas medidas foram impulsionadas por incentivos fiscais,
investimentos de empresas estatais (como PETROBRÁS e a Vale do Rio Doce),
complementados por créditos bancários (do BNDES1 e BNB2) e financiamentos próprios de
empresas locais, nacionais e multinacionais, que proporcionaram que a dinâmica da atividade
urbana ganhasse crescente espaço dentro das atividades econômicas nordestinas. (ARAÚJO,
1995).
A partir de então, nos anos 70 temos a consolidação do polo, baseado na implantação
de grandes projetos de irrigação, que deram espaço ao cultivo da fruticultura, ou seja, neste
1Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social. 2Banco do Nordeste do Brasil.
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momento se reduzia a produção dos cultivos tradicionais como algodão, mamona, mandioca,
sisal e outros e se investiam nas culturas de frutas como mamão, manga, melancia, uva,
tomate que passaram a apresentar alto valor de mercado e peso crescente na produção
regional. (ARAÚJO, 1995).
2.2 O polo agroindustrial de Petrolina/Juazeiro.
O polo agroindustrial de Petrolina/Juazeiro é formado pelos municípios: Petrolina, Lagoa
Grande, Santa Maria da Boa Vista, Orocó, em Pernambuco; Juazeiro, Sobradinho, Casa Nova
e Curaçá, na Bahia, ou seja, podemos definir como um conjunto de cidades que formaram um
polo dinâmico de cultivo e produção da fruticultura e que utiliza técnicas de irrigação no seu
processo produtivo. Esse polo tem como objetivo, produzir para exportar no intuito de suprir a
demanda do mercado externo, mas também tem grande representação no mercado interno. É
caracterizado como ‘‘agroindustrial’’ por se tratar do cultivo de elementos agrícolas, porém
inserida dentro de mecanismo e processos industriais.
Entre os anos 1970 a 1985 podemos observar o crescente desenvolvimento no que diz
respeito às transformações agrícolas, onde houve aumentos consideráveis de áreas dedicadas à
exploração de lavouras e da redução de áreas para a pecuária extensiva, como também os
grandes investimentos do governo federal, que foram direcionados, principalmente, a
infraestrutura e possibilitou o desenvolvimento do polo, como também a expansão das
atividades nele realizadas. (SILVA; REZENDE; SILVA, 2000).
Após 1985 se inicia um novo ciclo de transformações agrícolas, baseado em um notável
aumento do grau de diversificação da pauta produtiva, com destaque para a ascensão das
fruticulturas permanentes, especialmente as da uva, banana e manga. Ao longo desses anos
verificou-se que os preços das frutas tinham maior competitividade no mercado internacional
do que os preços das commodities, por exemplo. Com isso, o governo passa a direcionar mais
recursos para fruticultura, e esses produtos passam a adentrar, de forma considerável, na nossa
pauta de exportações, abrangendo uma estrutura voltada para o mercado, bem consolidada e
suficientemente dinâmica para suprir as necessidades do mercado interno e externo. (SILVA;
REZENDE; SILVA, 2000).
De acordo com o Censo Agropecuário (1985) o polo contava com 32,6 mil
estabelecimentos agropecuários que abrangiam uma área de 1.138.000 hectares. Desta área
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total 12% é destinado as plantações de lavouras. Os produtos que mais utilizavam o recurso
da irrigação artificial foram: cana-de-açúcar, banana, melancia, uva, tomate e melão,
correspondendo a 80% dessa área.
Dentre os responsáveis pela produção do polo podemos dividi-los em duas classes: os
colonos e os grandes produtores. A distinção entre eles é que os colonos são pequenos
produtores, que não utilizam tecnologia avançada e devido à baixa produtividade não
conseguem competir frente ao mercado internacional. Já os grandes produtores dispõem de
grandes extensões de terra, tecnologia de ponta e são altamente competitivos no mercado
exterior, por conhecer e conseguir se adequar as exigências técnicas, ambientais e as
preferências desse mercado.
No final da década de 80 diante da crise fiscal brasileira o governo rompe com sua
postura paternalista, no que se refere às assistências e benefícios que o estado cedia ao polo,
afetando principalmente os colonos, que não buscavam meios de aumentar sua
competitividade, pois, estavam mal-acostumados e acomodados com o protecionismo e
paternalismo do estado.
Nos anos seguintes da década de 1990, além dos problemas internos, temos um
agravamento da crise no país e a intensificação do processo de abertura comercial, diante
desse cenário os pequenos e grandes produtores se viram na necessidade de se organizar para
enfrentar os efeitos gerados por esses entraves, enquanto, os grandes produtores por terem
mais conhecimentos e capacitação e por conhecer as necessidades de se aperfeiçoar,
conseguiram se organizar facilmente, buscando competir no mercado internacional via
exportações. Já os pequenos produtores tiveram inúmeras dificuldades de se modernizar,
devido à falta de incentivo governamental ao qual estavam acostumados receber, assim,
apenas muitos anos depois foi que eles conseguiram se organizar e melhorar seu desempenho
na produção através da criação de associações e cooperativas, porém não obtiveram tanto
êxito quando comparados aos grandes produtores. (OLIVEIRA; SANTOS, 2016).
2.3 Formas de comercialização da produção
O polo tem como finalidade comercializar sua produção, sobretudo do setor da
fruticultura, que são os bens produzidos com maior ênfase na região, para isso possui formas
de comercialização dos principais produtos que se classificam em três segmentos:
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1) A produção in natura voltada ao mercado interno
2) A produção in natura voltada ao mercado externo.
3) A produção de matérias-primas agroindustriais para o mercado interno.
Os produtos gerados no polo têm grande aceitação frente ao mercado internacional, às
exportações são feitas com o produto in natura, que representa os produtos que não passaram
por modificações ou as matérias-primas agroindustriais, que correspondem aos produtos
processados em forma de polpa, doces e sucos. Na fruticultura os produtos que mais se
destacam em termos de produção e comercialização são a manga e a uva. Os principais
destinos para os produtos exportados são: Estados Unidos, Reino Unido, China, França,
Alemanha, Canadá e Argentina, enquanto o principal mercado dos produtos comercializados
internamente é a própria região Nordeste. (DE LACERDA; DE LACERDA, 2004).
2.4 Participação do Estado.
O que se constata após a implantação da agricultura irrigada no pólo é uma significativa
mudança nos municípios, mais precisamente, em meados da década de 1980: o que antes era
uma região pobre, seca, baseada na agricultura de subsistência, se tornou uma região
dinâmica, produtora de bens diferenciados, que atende não só o mercado interno, mas também
o mercado externo. Esse novo rumo, do atrasado para o dinâmico, ocorreu com o apoio de
impulsos externos, mais precisamente pela intervenção do governo, como destaca Pereira e
Carmo (2010), embora esse não seja o único fator determinante do sucesso da implementação
da irrigação no polo.
Certamente, o Estado teve papel fundamental para a ascensão do Polo, sobretudo por atuar
em áreas estratégicas que poderiam vir a estrangular o seu processo de crescimento. De
acordo com Ortega e Sobel (2011), esses investimentos podem ser divididos em três
categorias:
Investimentos em infraestrutura – Estes foram muito importantes para que o polo se
desenvolvesse e conseguisse se expandir em termos de produção e obtenção de novos
mercados. Aqui se destacam a criação da ponte Presidente Dutra, que liga as cidades
de Petrolina e Juazeiro, a criação do aeroporto de Petrolina, a barragem de Sobradinho
e a construção de rodovias que interligavam o polo ao resto do país;
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Investimentos em irrigação – Antes de iniciar os projetos de irrigação toda a área foi
mapeada e estudada e só foi efetivada quando os estudos apontaram a viabilidade da
implantação;
Políticas de incentivo ao setor privado – Foram criadas condições para atrair o setor
privado para o polo, destacando os incentivos fiscais, por meio do estado e do governo
e incentivos financeiros como a utilização de recursos do Fundo de
Investimentos do Nordeste (FINOR) e do Fundo Constitucional
de Financiamento do Nordeste (FNE).
Os investimentos em infraestrutura correspondem aos incentivos e melhorias no setor de
transportes, fornecimento de energia, setor de comunicação. Esses investimentos favoreceram
ainda mais a região que já era privilegiada, por ser a porta de acesso entre o sertão nordestino
e o norte de Minas Gerais, deste modo acabou se tornando um importante ponto de ligação
das redes de transporte rodoferroviário e pluvial desempenhando a função de entreposto
comercial, e ascendendo ainda mais após os investimentos em irrigação realizados nos anos
70. (DE LACERDA; DE LACERDA, 2004).
Os investimentos em irrigação, ou seja, os grandes projetos de irrigação possibilitaram o
cultivo e desenvolvimento da fruticultura na região que é localizada no semiárido nordestino e
no Baixo Médio do São Francisco, por apresentarem aspectos favoráveis para a cultura desses
produtos como a disponibilidade de área, água e um clima favorável. Através da execução
desses projetos houve na região do polo uma intensificação na produção, especialmente das
frutas tropicais fazendo com que a região viesse a se tornar a principal região exportadora de
frutas frescas, com maior ênfase para a produção da manga e da uva (DE LACERDA; DE
LACERDA, 2004).
Quanto às políticas de incentivo ao setor privado, que também eram custeadas pelo
estado visando a atrair os investimentos privados, podemos destacar os benefícios financeiros
e fiscais, oferecidos desde o início dos anos 1970 e intensificados durante a década de 1980.
Entre estes incentivos, destacam-se o Programa de Assistência Financeira à Agroindústria e à
Indústria de Insumos, Máquinas, Tratores e Implementos Agrícolas (PROTERRA/PAFAI), o
Programa de Desenvolvimento da Agroindústria do Nordeste (PDAN), o Programa de
Desenvolvimento Agroindustrial (PRODAGRI) e o Programa Nacional de Assistência à
Agroindústria (PRONAGRI). Estes programas contaram com recursos do Fundo de
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Investimentos do Nordeste (FINOR) e do Fundo Constitucional de Financiamento do
Nordeste (FNE) (SUDENE, 1995). Apud (ORTEGA; SOBEL, 2011).
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A presente pesquisa tem caráter descritivo por buscar descrever as variáveis que
afetam o objeto estudado e exploratório por buscar uma maior familiaridade com o tema
exposto, no caso deste trabalho, as políticas de incentivo que possibilitaram o surgimento do
polo, como também suas características de produção, localização, investimentos e exportação.
Para tanto, de acordo com os procedimentos de coleta de dados e fontes de informação,
utilizamos como procedimento técnico a pesquisa bibliográfica, que se caracteriza como uma
pesquisa que utiliza fonte de dados secundários, ou seja, materiais já publicados, como livros,
artigos e periódicos (GIL, 2002). Os dados utilizados para mensurar os indicadores sociais
foram da Companhia do Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba
(CODEVASF) e do Atlas do Desenvolvimento Humano, para analisar a produção da manga
se utilizou dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
4. RESULTADOS
4.1 Consequências da atuação do setor público no polo.
Um dos aspectos mais significativos da ausência da atuação do setor público no polo
refere-se a um conjunto de deficiências do setor para prover os investimentos necessários à
capacitação e especialização da mão de obra local. Nestes termos, fica evidenciado, que os
bons resultados no âmbito da produção e exportação desses produtos se devem a
características de ordem natural, como a disponibilidade de terras que com a utilização da
irrigação, com a água de boa qualidade do São Francisco, torna a terra bastante fértil.
Durante anos, o Poder Público procurou focar, sua atuação no Polo, na geração de
condições infra estruturais favoráveis à produção em grande escala da agricultura irrigada,
concentrando seus investimentos para essa produção, deixando de lado uma questão
primordial que foi a capacitação dos colonos, que por não ter acesso a informação, ao crédito
e aos financiamentos públicos tinham uma dificuldade enorme de aperfeiçoar os seus
processos produtivos.
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A estratégia de desenvolvimento implementada no polo Petrolina-Juazeiro exemplifica
um caso típico de economia que deve seu dinamismo ligado a fatores externos à região,
ligados essencialmente a participação do estado, imprimindo condições para que o polo
passasse a crescer e desenvolver mecanismos próprios para o seu desenvolvimento. Como
resultado ocorreu fortes impactos sobre a renda e o emprego, fazendo com que a microrregião
alcançasse um forte dinamismo econômico, passando, a partir de meados da década de 1990,
a se destacar no contexto nacional como o maior polo produtor de frutas tropicais do Brasil
(ORTEGA; SOBEL, 2011).
4.2. Importância para o setor frutícola
O polo Juazeiro/Petrolina é considerado como um dos mais bem-sucedidos polos de
irrigação implantados, e atualmente possui os municípios com a maior participação no setor
frutícola nacional, como pode ser visto na TAB.1. O primeiro destaque significativo é que o
município de Petrolina (PE) (conhecido como a cidade das frutas) é o maior produtor e detém
a maior participação no valor da produção nacional do setor frutícola. Outro dado observado
refere-se ao município de Casa Nova (BA) que se destaca pela produção de vinho, e no ano de
2014 conseguiu superar o município de Juazeiro (BA) que despontou como o sétimo
município com mais participação no setor. Observa-se ainda que os municípios de Lagoa
Grande (18º) e Santa Maria da Boa Vista (23º) figurando entre os municípios mais
importantes do setor. Os demais municípios do polo não figuraram entre os 50 com os
maiores valores de produção.
Tabela 1 – Relação dos municípios do polo Petrolina/Juazeiro com o setor frutícola brasileiro
Municípios Posição no
ranking nacional
Área Colhida (em hectares)
Valor da produção
(1 000 R$)
Participação no total do valor da produção
nacional (%) Petrolina(PE) 1º 19 002 470 289 1,80
Casa Nova(BA) 5º 8 126 203 863 0,80 Juazeiro(BA) 7º 6 132 189 740 0,70
Lagoa Grande(PE) 18º 1 930 133 079 0,50 Santa Maria da Boa
Vista(PE) 23° 5 123 119 484 0,50
Fonte: Adaptado. IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Agropecuária, Produção Agrícola Municipal 2014
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Vimos que cinco dos oito municípios figuram entre os municípios com maior
participação no setor frutícola e desempenham um papel importante, atuando não só na oferta
interna quanto externa, então de forma agregada o polo é de extrema importância para o país.
4.3. Importância da Manga
A manga da região Nordeste foi uma das culturas agrícolas mais beneficiadas com os
incentivos governamentais na criação de infraestrutura hídrica, pois, esse fator beneficiou a
expansão das áreas de cultivo. O volume de sua produção apresenta os melhores rendimentos
e qualidade se comparado com outras regiões do Brasil. Sua importância na pauta exportadora
brasileira advém das adequações do mercado externo, ocupando a sétima posição entre as
culturas cultivadas em todo o mundo e a terceira das regiões tropicais. (DE LACERDA; DE
LACERDA, 2004).
Esse produto passou a ser cultivado no início dos anos 90 no polo e já no ano de 1995 a
manga registrou o segundo lugar na pauta exportadora brasileira, correspondendo a 20% das
exportações gerais e gerando uma receita de US$ 22 milhões. No que diz respeito às
exportações, representou 85% do total da exportação de manga do país. Sua produção
registrada em 1999 foi de 98 mil toneladas/ano e o crescimento alcançado ao longo da década
de 1990 correspondeu a 1014%. (DE LACERDA; DE LACERDA, 2004).
Tabela 2 - Produção de manga a nível nacional, regional local no ano de 2012.
Localidade Área Colhida (ha) Quantidade
produzida (t) Rendimento
Médio (kg/ha)
Brasil 73310 1175735 16038 Nordeste 50169 782365 15595
Petrolina (PE) 7900 173800 22000 Juazeiro (BA) 8210 205250 25000
Fonte: IBGE/PAM (2014)
De acordo com a TAB.2, no ano de 2012 a colheita brasileira da manga foi de 73310
hectares (ha) como podemos observar na TAB.2, registrando uma produção de 1175735
toneladas (t), sendo o Nordeste a região brasileira mais produtiva no cultivo dessa fruta,
apresentando um rendimento médio (kg/ha) de 15595. Os municípios Petrolina (PE) e
Juazeiro (BA) que compõem o polo são os mais representativos em termos de
desenvolvimento e de produção da manga. Ao compararmos as duas cidades, percebemos um
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melhor desempenho na quantidade produzida no município de Juazeiro que registrou o total
de 205250 t, como também a área colhida foi mais elevada totalizando 8210 ha, mesmo assim
a cidade de Petrolina também apresenta bons resultados para o cultivo do produto, onde sua
área colhida corresponde a 7900 ha e a quantidade produtiva equivale a 173800 t.
A manga produzida é destinada ao consumo e comercialização do mercado interno e
externo, tendo como principais importadores: Estados Unidos, Reino Unido e China.
4.4. A distribuição de terras do polo agroindustrial Juazeiro/Petrolina.
Atualmente, estão em funcionamento seis perímetros de irrigação são eles: Bebedouro,
Senador Nilo Coelho em Petrolina e Curaçá, Maniçoba, Tourão e Mandacaru em Juazeiro,
onde se distribuem em lote familiar e empresarial. (CODEVASF, 2010)
Segundo a Codevasf (2015), a ocupação dos lotes familiares e empresarial dar-se
mediante processo licitatório, de acordo com as Normas de Ocupação – NOR- 501, que se
trata de um documento que constitui todos os procedimentos a serem feitos no processo de
ocupação pública de irrigação. O total da área irrigada dos seis perímetros totaliza 43.506 ha,
onde destes, 17.741ha são de lotes familiares e 25.765ha são de lotes empresariais.
(CADEVASF, 2015).
4.5. Indicadores socioeconômicos no polo Petrolina-Juazeiro.
O fato dos investimentos públicos terem ocorrido de forma bastante concentrada nos
municípios de Petrolina e Juazeiro, ocasionou disparidade, destes, com os demais municípios
do Submédio quanto à qualidade de vida da população e à geração de renda agregada. Por esta
razão, ocorreu uma forte migração populacional dos demais municípios do semiárido em
direção aos principais centros urbanos do polo, reduzindo drasticamente os benefícios
econômicos e sociais adquiridos. Devido a estes fatores, para análise dos indicadores
socioeconômicos, foi feito um comparativo entre os municípios de Petrolina/Juazeiro, já que
estes foram os que mais receberam investimento e ocupam um lugar de crescente importância
e representatividade no polo agroindustrial.
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Tabela 3 – Indicadores socioeconômicos dos municípios de Petrolina e Juazeiro no ano de 2010
Localidade IDHM Índice de GINI Petrolina(PE) 0,697 0,6253 Juazeiro(BA) 0,677 0,5723
Fonte: Atlas de desenvolvimento humano e pela plataforma virtual DATASUS do ministério da saúde.
Temos na TAB.3 informações referentes ao índice de desenvolvimento humano municipal
(IDHM)3 e ao índice de GINI4, através desses indicadores podemos notar que as duas cidades
se encontram em uma situação média, onde nem possuem taxas muito altas de concentração
da renda e baixas de desenvolvimento, mas também não são municípios com alto grau de
desenvolvimento e baixa concentração de renda.
4.6.Dados populacionais e demográficos.
A TAB.4 mostra dados populacionais e característicos dos municípios de Petrolina e
Juazeiro em 2010. É possível notar uma maior concentração populacional no município de
Petrolina, e os dois municípios possuem ema característica comum que é uma população
urbana muito superior à população rural.
Fonte: Atlas de desenvolvimento,2016
3 O IDHM é uma medida composta de indicadores de três dimensões do desenvolvimento humano: longevidade, educação e renda. O índice varia de 0 a 1. Quanto mais próximo de 1, maior o desenvolvimento humano. 4 O Índice de Gini mede o a desigualdade de renda, e utiliza o intervalo de 0 a 1, quanto mais próximo de 0 maior o nível de desigualdade e quanto mais próximo de 1 menor é a desigualdade de renda.
Localidade Densidade
demográfica Área Km²
População Rural Urbana
Petrolina(PE) 64,3hab/Km² 4572,76 293.962hab. 25,43% 74,57%
Juazeiro(BA) 30,67hab/Km² 6454,25 197.965 hab. 18,79% 81,21%
Tabela4 - Dados populacionais para os municípios de Juazeiro e Petrolina no ano de 2010.
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4.7.Evolução do Emprego e da Renda.
A partir dos dados apresentados na TAB.5 podemos notar que os municípios de
Petrolina/Juazeiro apresentaram tendências semelhantes quanto à evolução dos índices dos
setores entre 2003 a 2010. A participação da indústria caiu significativamente, principalmente
em Juazeiro, enquanto a construção civil teve um aumento significativo das duas localidades.
Já o comercio teve uma pequena diminuição em Petrolina e um pequeno aumento em
Juazeiro. O setor de serviços em Petrolina teve uma pequena queda, já no município de
Juazeiro teve um aumento. Por fim, o setor agropecuário teve uma pequena diminuição nos
dois municípios. Quanto ao emprego por setor vemos que teve uma diminuição no setor
industrial e no setor agropecuário, houve um aumento no setor de construção civil, e o setor
de comercio houve uma diminuição de empregos em Petrolina, e uma leve melhora em
Juazeiro.
Tabela 5 – Empregos por setor nas cidades de Juazeiro e Petrolina 2003 - 2010
Localidade Ano Indust. Constr.Civil Comercio Serviços Agropec.
Petrolina 2003 6,8% 3,7% 23,6% 38,9% 26,98%
2010 5,42% 7,90% 18,74% 37,07% 25,42%
Juazeiro 2003 22,4% 3,2% 18,8% 33,9% 21,8%
2010 5,28% 7,35% 20,53% 38,66% 21,73%
Fonte: Atlas de desenvolvimento humano,2010
Como pode ser visto na TAB.6, a renda per capita média de Juazeiro cresceu de R$
354,06, em 2000, para R$ 476,58, em 2010. Isso equivale a uma taxa média anual de
crescimento nesse período de 3,02%, entre 2000 e 2010. Já renda per capita média de
Petrolina cresceu de R$ 404,40, em 2000, para R$ 605,06, em 2010. Isso equivale a uma taxa
média anual de crescimento nesse período de 4,11%, entre 2000 e 2010.
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Tabela 6– Renda per captados municípios de Juazeiro e Petrolina 2000-2010
Localidade Ano Renda per capta
Petrolina 2000 404,40
2010 605,06
Juazeiro 2000 354,06
2010 476,58 Fonte: Atlas de desenvolvimento humano,2010.
4.8.Educação
A educação é considerada uma variável de grande importância para o desenvolvimento
de uma região, tem relação direta com o nível de renda, pois com um maior grau de instrução
existe a possibilidade de aumento da renda é bem maior.
Tabela 7 – Níveis de escolaridade dos municípios de Juazeiro e Petrolina 1991-2010
Localidade Ano Analfabeto Fund.
Completo Fund.
Incompleto Médio
Completo Superior Completo
Petrolina 1991 32,02% 8,2% 43,04% 11,34% 5,43%
2000 22,48% 10,64% 44,54% 16,32% 6,02% 2010 15,39% 13,39% 35,01% 26,75% 9,5%
Juazeiro 1991 33,76% 6,91% 44,64% 11,42% 3,27%
2000 25,49% 9,34% 44,30% 16,62% 4,25% 2010 16,87% 13,84% 36,35% 26,18% 6,73%
Fonte: Atlas de desenvolvimento humano, 2010
A TAB.7 apresenta alguns indicadores relativos à educação, considerando a população
dos municípios com 25 anos ou mais de idade, mostrando que entre 1991 e 2010 os
municípios de Petrolina e Juazeiro obtiveram um aumento dos indicadores educacionais. No
entanto, segundo o Atlas do desenvolvimento (2016), no Brasil em 2010 os percentuais desses
indicadores são respectivamente: 11,82% para o analfabetismo, 50,75% para o fundamental
completo, 35,83% para o médio completo e 11,27% para o superior completo.
4.9.Saúde e Habitação
A TAB.8 apresenta indicadores relativos à qualidade e oferta de serviços de saúde nos
municípios de Petrolina e Juazeiro, é possível notar que houve uma melhora na qualidade de
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vida dos mesmos, observando entre 1991 e 2010 podemos notar que houve um aumento no
indicador de esperança de vida ao nascer, uma diminuição expressiva da taxa de mortalidade
de até 1 (um) ano e até 5 (cinco) anos por mil nascidos, e uma diminuição na taxa de
fecundidade nos dois municípios.
Tabela 8 – Indicadores de saúde dos municípios de Petrolina e Juazeiro 1991-2010
Localidade Ano Esperança de vida ao nascer
(em anos)
Mortalidade até 1 ano de idade
(por mil nascidos vivos)
Mortalidade até 5 anos de idade
(por mil nascidos vivos)
Taxa de fecundidade total (filhos por mulher)
Petrolina(PE) 1991 65,6 42,8 53,6 3,0 2000 70,4 35,9 39,9 2,7 2010 73 18,7 20,2 2,2
Juazeiro(BA) 1991 58,3 77,1 98,6 2,9 2000 65,1 42,1 53,9 2,5 2010 72,8 20,1 16,2 2,1
Fonte: Atlas de desenvolvimento humano, 2010.
No que se refere à Habitação, nota-se pela TAB.9, que entre 1991 e 2010 houve um
aumento significativo no percentual da população com água encanada e quase toda a
população possui energia elétrica nos dois municípios, tais resultados configuram um avanço
significativo tendo em vista que estes serviços são considerados serviços básicos e necessários
para a população.
Tabela 9 – Indicadores de habitação dos municípios de Juazeiro e Petrolina 1991-2010
Localidade Ano % da população em domicílios com água
encanada
% da população em domicílios com energia
elétrica
Petrolina(PE) 1991 70,32 87,30 2000 76,21 96,95 2010 91,95 99,18
Juazeiro(BA) 1991 66,61 85,46 2000 71,16 92,43 2010 91,48 99,48
Fonte: Atlas de desenvolvimento humano, 2010
De acordo com a SUDENE (1995), já a partir da década de 1990, o forte crescimento
populacional nestes dois municípios, assim como o seu acelerado processo de urbanização,
vem produzindo patamares de expansão da demanda por estes serviços de forma crescente,
fazendo com que os esforços em abastecer as cidades de serviços habitacionais estejam cada
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vez mais difíceis de serem alcançados. Em suma, apesar da melhoria observada nas condições
habitacionais das localidades analisadas, estas ainda se apresentam em condições que requer
um maior cuidado e atenção especial das políticas públicas.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dada à atuação do polo Agroindustrial de Petrolina/Juazeiro, o presente estudo teve
como objetivo verificar sua importância para o desenvolvimento da região, destacando os
projetos de irrigação como o grande motor da expansão recente da fruticultura no Nordeste
brasileiro.
Conforme se verificou as políticas implantadas ao decorrer das décadas de 50 e 60 em
conjunto aos investimentos estatais em infraestrutura e irrigação foram essenciais para o
nascimento e desenvolvimento do polo, pois possibilitaram a expansão em termos de
produção e obtenção de novos mercados e melhorias nos setores de transportes, comunicação
e energia da região.
Os anos de 1970 a 1985 marcam a crescente onda de desenvolvimento no que diz
respeito às transformações agrícolas. Nesse período, houve um aumento considerável de áreas
dedicas a lavouras e uma redução de áreas destinadas para a atividade de pecuária extensiva.
Após 1985 se inicia um novo ciclo de transformações agrícolas baseadas agora no cultivo da
fruticultura, ou seja, a uva, a banana, a manga tem sua produção intensificada, porque seus
preços possuem maior competitividade frente a outros produtos no mercado internacional.
Com destaque especial, utilizamos a manga que é um dos principais produtos produzidos e de
grande representação na pauta exportadora do polo e também na pauta brasileira.
Diante dos dados dos indicadores sociais apresentados para as cidades de Petrolina
(PE) e Juazeiro (BA), notamos que os investimentos públicos se concentraram nesses dois
municípios possibilitando uma maior representatividade destes frente aos demais. De forma
geral, podemos concluir da análise dos indicadores que existem melhorias significativas na
região, pois, a inserção do polo trouxe desenvolvimento e possibilitou benefícios na qualidade
de vida da população. Através das atividades econômicas notamos, embora pequena, a
evolução do emprego e da renda, que apresenta impactos diferentes se considerar as duas
classes de produtores: pequenos e grandes. Importa salientar, que os efeitos desse indicador
também são influenciados por características do mercado interno e externo. Portanto, os
resultados obtidos partem da interação desses mecanismos mostrando desempenhos elevados
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e outros considerados apenas bons para o período. Indicadores de educação, saúde e habitação
também demonstram melhorias, O avanço na educação se configura em um fator muito
importante, já que esta variável possui um efeito multiplicador que se reflete em toda a
sociedade: na saúde, através dos dados observados, temos um aumento na esperança de vida
dos moradores do local, na habitação podemos concluir que houve melhorias, porém, as
condições habitacionais ainda necessitam de uma atenção especial das políticas públicas.
Embora tenhamos constatado que houve uma evolução considerável nas variáveis que
compõe o lado social do polo, ainda há muito que melhorar, tendo em vista que quando
comparada à evolução nos níveis de produção, é possível notar certa disparidade já que
estamos falando de uma região que vem ao longo do tempo se consolidando como uma região
com efetiva participação no comércio exterior de produtos frutícolas, mas que apresenta uma
disparidade significativa entre os colonos e os grandes proprietários, em questões como
capacitação técnica da mão de obra e acesso a empréstimos e financiamentos, tornando difícil
a adoção de novas tecnologias e aumento da competitividade por parte dos colonos.
Finalmente, como forma de contribuir com estudos futuros, sugerimos novas
pesquisas utilizando outros indicadores sociais, como a violência, por exemplo. Sugerimos
ainda, dar sequência a este estudo, enfocando a competitividade do setor da fruticultura e o
meio ambiente, baseado nos principais produtos que a região fornece ou que possui maior
representação das exportações.
6. REFERÊNCIAS
ARAÚJO. Tania Bacelar de. Nordeste, Nordeste: Que Nordeste?.In: AFFONSO, Rui de Brito Álvares. SILVA, Pedro Luiz Barros. Org(s). Desigualdades Regionais e Desenvolvimento. São Paulo: FUNDAP: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1995.125-156. ATLAS DO DESENVOLVIMENTO HUMANO NO BRASIL. Disponível em: <http://www.atlasbrasil.org.br/2013/> Acesso em: set. 2016. CODEVASF. Companhia de desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba. Disponível em: <www.codevasf.gov.br > Acesso em: set. 2016. DATASUS. Disponível em: <http://datasus.saude.gov.br> Acesso em: set.2016
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DE LACERDA, Marta Aurélia Dantas; DE LACERDA, Rogério Dantas. O cluster da fruticultura no polo Petrolina/Juazeiro. Revista de Biologia e Ciências da Terra, v. 4, n. 1, 2004. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br /home/ > Acesso: set. 2016. OLIVEIRA, Renata Sibéria de; SANTOS, Josefa de Lisboa. As políticas de Desenvolvimento para a região Nordeste: Os distritos irrigados bebedouro e senador Nilo Coelho, no município de Petrolina no Estado de Pernambuco. Disponível em: < http://www.uff.br/vsinga/trabalhos/Trabalhos%20Completos/RENATA%20SIBERIA%20DE%20OLIVEIRA.pdf> Acesso em: set. 2016. ORTEGA, Antônio César; SOBEL, Tiago Farias. Desenvolvimento territorial e perímetros irrigados: avaliação das políticas governamentais implantadas nos perímetros irrigados Bebedouro e Nilo Coelho em Petrolina (PE). Planejamento e Políticas Públicas, v. 2, n. 35, 2011. PEREIRA, Monica Aparecida Tom; DO CARMO, Roberto Luiz. Da Agricultura de Sequeiro a Fruticultura Irrigada: Condicionante Associados ao Dinamismo Regional no Contexto de Petrolina-PE e Juazeiro-BA. Trabalho Apresentado no XVII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, Realizado em Caxambu-MG-Brasil. de, v. 20. SILVA, JMA da; REZENDE, Alberto Martins; SILVA, CAB da. Condicionantes do desenvolvimento do polo agroindustrial de Petrolina/Juazeiro. Revista Econômica do Nordeste, Fortaleza, v. 31, n. 1, p. 48-64, 2000. SOBEL, Thiago Farias; ORTEGA, Antônio César. Estratégias de desenvolvimento territorial: o caso do polo Petrolina-Juazeiro. UFPE/PIMES, RECIFE, PE, BRASIL, 2012. SOBEL, Tiago Farias; ORTEGA, Antônio César. Evolução e situação atual do Pólo Petrolina-Juazeiro: uma análise a partir dos indicadores socioeconômicos. In: CONGRESSO DA SOBER" Conhecimentos para Agricultura do Futuro. 2007.
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A REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DAS TERRAS QUILOMBOLAS DO PIAUÍ E OS ENTRAVES PARA A CONCRETIZAÇÃO DA POLÍTICA
THE REGULARIZATION EARTHS PIAUÍ QUILOMBOLAS AND BARRIERS FOR POLICY IMPLEMENTATION
Autores: Patrícia Macedo Ferreira; Lincoln Moraes de Souza. Filiação: Universidade Federal do Rio Grande do Norte/Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais/ Grupo Interdisciplinar de Estudos e Avaliação de Políticas Públicas – GIAPP E-mail: [email protected]; [email protected].
Grupo de Pesquisa: Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo Apesar do avanço jurídico-institucional no âmbito da política de regularização fundiária de territórios quilombolas, passados 27 anos da edição do artigo 68 do ADCT da CF/1988, que define que o Estado deveria emitir os títulos de propriedade aos remanescentes das comunidades dos quilombos e 12 anos da publicação do Decreto Federal Nº. 4887/2003, que atribui competência ao MDA por meio do INCRA para a execução do procedimento de titulação, observa-se que os resultados não são satisfatórios. O Piauí é o terceiro estado do Nordeste com a maior demanda de titulação desses territórios, tem 64 processos e apenas 5 comunidades tituladas. O movimento social, a comunidade quilombola e outros setores estão insatisfeitos e criticam as falhas no processo de titulação, cuja morosidade na obtenção dos títulos coletivos da terra deixa as comunidades impedidas de acessar a outras políticas públicas. Palavras-chave: Política Pública; Territórios; Regularização Fundiária; Comunidades Quilombolas. Abstract Despite the legal and institutional progress within the land regularization policy quilombo territories, after 27 years of article edition 68 of the CF ADCT / 1988, which states that the State should issue land titles to the remnants of quilombo communities and 12 years of the publication of Federal Decree no. 4887/2003, which empowers the MDA through INCRA for the implementation of titration procedure, it is observed that the results are not satisfactory. Piaui is the third northeastern state with the highest demand for titling these territories, it has 64 cases and only 5 titled communities. The social movement, the quilombo community and other sectors are unhappy and criticize the flaws in the titration process, the delay in obtaining collective land titles leaves communities blocked from the other public policies.
Key words: Policy; territories; Land regularization; Quilombo communities.
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1. Introdução
A promulgação da Constituição Federal Brasileira de 1988 é um marco histórico
na luta das comunidades quilombolas pela propriedade de seus territórios, pois define em seu
artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias que: “Aos remanescentes das
comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade
definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”. O Estado fica obrigado a
implementar a política de titulação de quilombos, como forma de promover uma reparação
étnico-territorial.
Apesar do avanço jurídico-institucional, passados 27 anos desta definição
constitucional e 12 anos da publicação do Decreto Federal Nº. 4887/2003, observa-se que os
resultados não são satisfatórios. O movimento social e outros grupos estão insatisfeitos e
criticam as falhas na titulação de terras de quilombolas, cuja morosidade na obtenção dos títulos
coletivos da terra deixa as comunidades impedidas de acessar a outras políticas públicas.
Este artigo é parte de pesquisa em andamento no âmbito do Programa de Pós-
Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN e tem
por objetivo geral avaliar o processo de implementação da política pública de regularização
fundiária de territórios quilombolas no Estado do Piauí desde 1988 até os dias atuais, a partir
do referencial empírico na Comunidade Contente, situada no município de Paulistana - PI.
Os constantes questionamentos das comunidades quilombolas, movimentos
sociais, algumas instituições públicas, mediadores e pesquisadores acerca dos resultados da
política de regularização das áreas ocupadas por remanescentes de quilombos nos motiva a
buscar compreender de que forma as ações são efetuadas localmente e quais as expectativas
geradas em torno dessa política.
Como questão central e ampla da pesquisa, podemos apontar: como está o
processo de implementação da política fundiária na Comunidade Quilombola Contente? Outras
questões vinculadas à primeira também devem ser indicadas, tais como: o que de concreto dela
sucedeu-se no estado do Piauí, no período de 1988 até o momento? A legislação quilombola
atual atende as expectativas do seu público-alvo ou está aquém do previsto? Quais são as
facilidades e os entraves existentes nos processos de titulação de quilombos? Os resultados
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podem contribuir para o maior conhecimento da política fundiária, das comunidades
quilombolas, instituições públicas e sociedade civil sobre como está sendo implementado o
processo de titulação destes territórios étnicos, possibilitando seu aprimoramento e melhoria,
conferindo visibilidade às comunidades e demais atores sociais envolvidos na temática.
2. Territórios Quilombolas e Direitos Fundiários no Brasil O direito ao título coletivo das terras tradicionalmente ocupadas por descentes
dos antigos quilombos apenas foi reconhecido, formalmente, um século após a abolição formal
da escravidão no Brasil. A Constituição Federal de 1988, através do artigo 68 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias/ADCT, reconhece o direito à propriedade definitiva
das terras ocupadas por remanescentes de quilombos, mas ainda existem entraves para a sua
efetivação.
O processo de reconhecimento, identificação, delimitação, demarcação,
desintrusão, titulação e registro dos territórios quilombolas é regulamentado pelo Decreto
Presidencial nº. 4.887 de 20 de novembro de 2003, que atribui competência para a execução do
procedimento de titulação ao Ministério do Desenvolvimento Agrário/MDA, por meio do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária/INCRA, sem prejuízo de competência
concorrente dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Na estrutura regimental do
INCRA, esta temática é tratada pela Coordenação Geral de Regularização de Territórios
Quilombolas/DFQ, da Diretoria de Ordenamento da Estrutura Fundiária, e, nas
Superintendências Regionais, pelos Serviços de Regularização de Territórios Quilombolas.
O referido decreto também traz em seu artigo 2º a definição do público-alvo
dessa política, bem como estabelece o critério de autoidentificação como o que deverá ser
adotado para a sua efetivação:
Consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos, para os fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida.
Esse critério que tem a consciência individual e coletiva como critério
fundamental para participação da política quilombola está em consonância com a Convenção
nº 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, que foi ratificada pelo Congresso
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Nacional através do Decreto Legislativo nº 143, de 20 de junho de 2002, e promulgada pelo
Decreto Presidencial nº 5.051, de 19 de abril de 2004, apresentando status constitucional.
A Instrução Normativa nº. 57/2009 do INCRA é a que atualmente está em vigor
para normatizar as etapas administrativas que deverão ser realizadas pela autarquia tendo em
vista à regularização fundiária das terras de quilombolas. O INCRA, por meio de sua
superintendência estadual, realiza os estudos tendo em vista a elaboração de um Relatório
Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) referente aos territórios quilombolas com
processo aberto na autarquia e com certidões de autorreconhecimento emitidas pela Fundação
Cultural Palmares (FCP). Esta peça técnica, produzida através de trabalho interdisciplinar, é
fundamental no processo de titulação, sendo composta pelos seguintes documentos: relatório
antropológico, relatório agroambiental, descrição da situação fundiária, planta e memorial
descritivo, cadastros de famílias, levantamento de sobreposições com outras áreas de interesses
públicos ou privados, pareceres conclusivos da área técnica e jurídica.
Antropólogos, sociólogos, agrônomos, cartógrafos, técnicos de cadastro e
profissionais com outras habilitações ligadas a questão agrária, desde então, são cada vez mais
requisitados pelas instituições do Estado incumbidas de aplicar a política em favor dos grupos
sociais quilombolas, contribuindo para o aprofundamento teórico e metodológico do tema e
para a execução da política quilombola, seja no enfrentamento de conflitos sociais que ameaçam
direitos e garantia de posse, seja na composição de equipes interdisciplinares necessárias para
a elaboração desses relatórios que identificam e delimitam esses territórios étnicos.
Após as diversas etapas administrativas que devem ocorrer posterior a
publicação do RTID, como a fase contestatória, publicação de portaria de reconhecimento do
território e do decreto presidencial de desapropriação dos imóveis que possam incidir na área,
os títulos são emitidos em nome de associação legalmente constituída pela comunidade,
constando nele obrigatoriamente cláusulas de inalienabilidade, imprescritibilidade,
indivisibilidade e impenhorabilidade, o que em tese significa que todos os quilombolas poderão
usufruir do território, mas a área titulada não retornará ao mercado de terras.
Esse reconhecimento de domínio tem caráter peculiar que o distingue da
regularização fundiária da posse agrária tradicional e dos assentamentos da reforma agrária,
como bem conceitua Girolamo Trecanni (2006, p. 156):
Temos uma realidade fática e jurídica diferente da posse reconhecida pelo nosso Direito Civil, que pressupõe a exclusividade de uso do imóvel por uma
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única pessoa ou família. Difere, também, da posse agrária tradicional cujos elementos clássicos para sua legitimação estavam previstos já na Lei de Terras (Lei nº. 601/1850) e legislações posteriores: a cultura efetiva e a morada habitual. Temos aqui a incorporação de outros elementos que garantem a reprodução física, social, econômica e cultural (art. 2º, § 3º do Decreto 4.887/03), os detentores de recursos ambientais, os necessários à preservação dos seus costumes, tradições, cultura, lazer, os destinados aos cultos religiosos e os sítios que contenham reminiscências históricas dos antigos quilombos (Art. 4º da IN INCRA nº 20/05).
A regularização de territórios quilombolas “trata de uma forma étnica de acesso
à terra que engloba elementos de direito agrário, com direito étnico e ambiental” e o Estado, ao
se reconhecer pluriétnico, deve proteger as expressões étnicas que o originaram (TRECANNI,
2006, p. 131). É possível compreender a importância dessa política de reparação étnico-
territorial ao perceber que na formação social do Brasil, o fator étnico não foi incorporado de
forma a refletir na estrutura fundiária. O Estado deixou de reconhecer não só os territórios
quilombolas, mas outras formas de uso comum da terra, que configuram outras identidades
coletivas, como a das quebradeiras de coco babaçu e dos ribeirinhos (ALMEIDA, 2002, p. 72).
Para Trecanni (2006), nessa espécie de nova demanda, para além de rememorar
o passado, reconhecer esse direito perpassa por dois desafios: definir o que são quilombos e
conhecer e identificar o número de comunidades quilombolas existentes no Brasil. É o ponto
de partida para a concretização do direito à “terra quilombola”, “terras de preto”, “terras de
santos”, “território negro”: terras tradicionalmente ocupadas.
É importante destacar a necessidade de transparência e divulgação dessa política
que é relativamente recente. Nesta diretiva, segundo o INCRA:
O desconhecimento por parte dos destinatários das políticas públicas que o Estado deve lhes prestar não pode ser usado contra estes no momento em que descobrem os meios para acessá-las. É inimaginável concebermos que uma comunidade negra rural poderia declarar-se como quilombola espontaneamente sem ter conhecimento da legislação que lhe garante direitos. Ressalta-se ainda que o fato de a política de regularização fundiária quilombola ser uma iniciativa recente, cujo decreto de regulamentação data do ano de 2003, é necessário realizar um trabalho de conscientização desse segmento de seus direitos.1
1 Disponível em: http://www.incra.gov.br/sites/default/files/incra-perguntasrespostas-a4.pdf. Acesso em 30/09/2016.
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O conceito de quilombo precisou ser ampliado e ressignificado para a efetivação
de direitos, distinguindo as comunidades de escravos fugidos, fenômeno histórico do período
escravocrata, do quilombo contemporâneo, aquele que tem a capacidade de autodefinir-se como
tal e a consciência do direito étnico, assumindo posição reivindicativa perante o Estado, por
meio de suas organizações (ALMEIDA, 2004 apud ACEVEDO, 2004, p.12). Assim, é possível
compreender a instrumentalização da identidade pelos movimentos sociais como luta contra
determinadas injustiças sociais relacionadas à condição identitária e pela objetivação de
direitos. O quilombo na contemporaneidade refere-se a novas formas de resistência social,
enquanto a identidade quilombola emerge de um contexto interétnico (ODWYER, 2002).
Barth (2000) situa a construção da identidade numa relação de oposição entre
grupos sociais em contato, devendo ser entendido através das relações entre eles. É no interior
das trocas sociais que ela se constrói e reconstrói, já que não existe unicamente para si, mas
sempre em relação a uma outra. De acordo com Cuche (2002), é a injustiça que provoca nos
membros de grupo vítima de discriminação o sentimento de pertencimento à coletividade,
movida pela necessidade de solidariedade desses indivíduos na luta pelo reconhecimento.
O caráter flutuante, multidimensional e dinâmico da identidade é apontado por
Denys Cuche (2002) como aspecto que dificulta a definição de identidades particulares e querer
reduzi-la a uma definição “pura” seria desconsiderar que todo grupo social é heterogêneo. Para
o autor, as ciências sociais não podem definir uma ou outra identidade cultural de forma
irrefutável e justa, esse não é o papel da sociologia, antropologia, história ou outra disciplina.
Pois ao admitirmos que a identidade é uma construção social, o papel do cientista é explicar
processos de identificação sem julgá-los.
Nesse sentido, Stuart Hall (2011, p. 63) ao definir etnia como conceito usado
para falar de características culturais partilhadas por um povo, como a língua, a religião,
costumes, sentimento de “pertença” ou de “lugar”, tradições, etc., afirma que no mundo
moderno é difícil falar de nação composta por um único povo, cultura ou etnia. Para o autor,
não dá para unificar a identidade nacional em torno de uma cultura ou identidade, pois “as
nações modernas são, todas, híbridos culturais”.
A identidade étnica tem sido diferenciada de outras formas de identidades
coletivas por ser orientada para um passado que se representa através da memória coletiva. De
acordo com Clóvis Moura (1994, p. 156):
932
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(...) identidade étnica é um nível de consciência individual ou grupal das suas origens ancestrais capaz de determinar a aceitação, reconhecimento e sua auto-afirmação social e cultural a partir desse nível de consciência alcançado. A partir daí o agente conscientizado passa a contrapor-se aos outros indivíduos, grupos ou segmentos que veem na etnia a que pertence uma marca inferiorizada. Essa identidade possui uma dinâmica sócio-cultural capaz de determinar a organização de grupos ou segmentos dispostos a conservar e desenvolver os seus valores e padrões étnicos entrando em fricção com os grupos etnocêntricos que os marcaram. Mas, numa sociedade poliétnica e ao mesmo tempo organizada em classes e estratos com elementos de diversas etnias em posições diferentes e mesmo antagônicas, essa identidade pode adquirir diversos níveis desde a agressividade até a diluição no corpus da cultura ou da sociedade abrangente.
Para a preservação da identidade, cultura, modo de vida e a proteção dos bens
materiais e imateriais dos grupos étnicos quilombolas, a regularização fundiária se manifesta
como medida importante, imprescindível para a materialização da garantia constitucional do
acesso à terra por essas comunidades. Representa a segurança jurídica necessária ao
desenvolvimento dos quilombos em territórios que possuem espécie de “vínculo umbilical”.
Ocorre que ao se assumir como parte de um grupo étnico e por ele ser reconhecido, o indivíduo
submete-se a lógica, regras e práticas sociais comum desse grupo. No caso dos quilombolas,
trata-se de grupo étnico camponês com existência fundamentada no uso prático, simbólico e
cultural de determinado território que possui importância fundamental para sua reprodução
física e social, com o uso tradicional da terra preocupado com as futuras gerações.
O direito ao território é condição imprescindível para a concretização dos demais
direitos das comunidades quilombolas do Brasil. A ausência do título representa ameaça a essas
comunidades. A expansão dos agronegócios, a intensificação das obras de infraestrutura,
grandes projetos governamentais e os interesses empresariais demandam cada vez mais maiores
porções de terras e aumentam a pressão sobre as terras tradicionalmente ocupadas (ALMEIDA,
2011).
Em pesquisa realizada nas comunidades quilombolas Vila São João e Buriti,
situadas nos municípios de Campo Largo do Piauí e Matias Olímpio/PI, que resultou em
relatório antropológico do RTID desse território, foi constatado a importância da titulação das
terras para esses grupos, como forma de gerar segurança jurídica aos quilombolas, redução de
conflitos existentes e, principalmente, a proteção da cultura e da identidade coletiva:
Os membros que moram em outras localidades próximas externas ao território em virtude da dramática condição da comunidade que está atualmente
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espremida em pequena área nas proximidades do Rio Parnaíba e em terras estaduais na chapada, também são considerados como pertencentes ao território. Esses outros núcleos populacionais, ainda que estejam fora do território, podem ser considerados uma extensão sociocultural do quilombo pesquisado. Prova disso, é o fato de que os que, por motivos alheios à vontade do grupo, saem do território, têm permissão concedida pela comunidade para retornarem à medida em que se reduz a tensão na área. Várias famílias que saíram, aguardam a titulação e o livre acesso a todo o território para que seja possível voltarem a morar e trabalhar, com condições adequadas para sua reprodução física, social, econômica e cultural. (FERREIRA e SILVA JÚNIOR, 2015, p. 107).
Para o conceito de territorialidade, no que tange aos grupos étnicos
autoatribuídos e sua relação com a terra, nos nortearemos pelo instrumento legal Decreto Nº.
4887/2003, que em seu art. 2º afirma que “são terras ocupadas por remanescentes das
comunidades dos quilombos as utilizadas para a garantia de sua reprodução física, social,
econômica e cultural”. A Convenção Nº. 169 da OIT, em seu artigo 13º, inciso 2º, diz que: “A
utilização do termo ‘terras’ nos Artigos 15 e 16 deverá incluir o conceito de territórios, o que
abrange a totalidade do habitat das regiões que os povos interessados ocupam ou utilizam de
alguma outra forma”.
A legislação quilombola permite a esses grupos étnicos o direito de reivindicar
o título das terras ocupadas por seus ancestrais, mas que estão em propriedade ou posse de
terceiros. Os títulos emitidos reduzem os conflitos no campo ao promoverem segurança jurídica
aos quilombolas. A garantia do acesso à terra é condição sine qua non para a constituição da
identidade quilombola. A morosidade na obtenção dos títulos coletivos desses territórios
representa ameaça às expressões culturais e à reprodução física, social e cultural desses grupos.
As comunidades, ao tomarem consciência de sua cultura e identidade étnica,
reconhecendo-se quilombolas, sujeitos de direito, passam a reivindicar no campo social e
jurídico o que foi estabelecido na Constituição Federal de 1988: a titularidade do domínio sobre
as terras tradicionalmente ocupadas. O Poder Público tem o dever constitucional de construir
políticas públicas que se destinem ao reconhecimento dessas comunidades, bem como a
identificação, delimitação, demarcação, desintrusão, titulação e registro de suas terras. As
demandas têm sido crescentes nos órgãos públicos competentes para coordenar e executar essas
ações e a morosidade na conclusão desses processos é preocupante.
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3. A política pública e os processos de regularização fundiária de territórios quilombolas no Piauí: o caso da Comunidade Contente
No Brasil, existem atualmente 1.533 processos abertos de comunidades
quilombolas no INCRA, mas apenas 148 territórios foram titulados total ou parcialmente2. A
maior parte dessa demanda está concentrada no Nordeste, com 57% do total de processos
abertos. O Piauí, terceiro estado da região com a maior demanda, tem 64 processos de
comunidades quilombolas em andamento. Destas, apenas 5 comunidades foram tituladas, mas
ainda não tiveram seus títulos levados a registro em cartório 3. É preocupante o fato de que a
maioria desses processos tenham sido abertos há mais de uma década e muitos ainda se
encontram em fase inicial, sem previsão para a elaboração dos Relatórios Técnicos de
Identificação e Delimitação – RTID.
O Estado, ao estabelecer um procedimento moroso de titulação, com etapas
administrativas complexas e demoradas, pode oferecer danos às comunidades que ficam
vulneráveis com a ausência dos títulos de suas terras, estando sujeitas à ingerência de terceiros
e por vezes do próprio Estado, pois empresas do agronegócio, projetos de energia eólica,
mineração, madeireiras, carvoarias e as grandes obras avançam e invadem os espaços, cortam
territórios e expulsam os ocupantes tradicionais de seus espaços identitários.
É importante destacar que além dos órgãos federais como o INCRA e a SPU,
também cabe aos Estados e Municípios emitirem títulos em nome de comunidades que estão
situadas em áreas de sua gestão. Os processos de regularização de territórios compostos por
terras estaduais e/ou municipais, deverão ser transferidos do INCRA para esses entes. Possuem
legislação específica para tanto, os Estados do Piauí, Pará, Bahia, Maranhão, Mato Grosso do
Sul, Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso, Goiás, Espírito Santo, Sergipe, Rio Grande do
Sul e Santa Catarina4.
2 Há territórios constituídos por mais de um imóvel particular, que devem ser avaliados separadamente após publicação do decreto de desapropriação com ação própria ajuizada. O INCRA, visando garantir a celeridade processual, realiza a destinação do imóvel com títulos parciais do território de acordo com a sentença de cada ação, somente unificando em uma única matrícula quando todos os títulos parciais são emitidos.
3 Dados da Coordenação Geral de Regularização de Territórios Quilombolas/DFQ, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária/INCRA, atualizados em 05/02/2016, no site oficial do INCRA.
4 Disponível em: http://www.incra.gov.br/sites/default/files/incra-perguntasrespostas-a4.pdf . Acesso em 30/09/2016.
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O caso da Comunidade Contente, situada no município de Paulistana, localizada
no sudeste do estado, região em que há grande demanda de quilombos a serem regularizados, é
emblemático. Constituída por 47 famílias, teve sua certidão de autorreconhecimento como
remanescente de quilombos emitida pela Fundação Cultural Palmares – FCP em 2010 e tem
processo de titulação em andamento junto ao INCRA desde 2011, estando em fase de
elaboração de RTID desde 2011.
Atualmente, vivencia violações de direitos garantidos às populações tradicionais
ante a instalação da Ferrovia Transnordestina, obra do Programa de Aceleração do Crescimento
– PAC do Governo Federal em parceria com os Governos Estaduais do Ceará, Piauí e
Pernambuco. Ocorreram deslocamentos compulsórios de famílias, destruição de bens materiais
e imateriais, indenizações irrisórias e sonegação da consulta prévia aos povos e comunidades
tradicionais, prevista na Convenção nº. 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT5.
A pesquisa na Comunidade Contente objetiva avaliar o processo de
regularização fundiária de suas terras, identificando quais as alterações têm ocorrido nas
práticas do grupo ao longo das etapas desse processo, quais tipos de efeitos ou impactos têm
sofrido em seu território decorrentes da ausência do título coletivo e quais os avanços e entraves
legais e operacionais identificados no caminho até a titulação. Será importante avaliar, também,
o papel dos órgãos executores e outras instituições ou entidades envolvidas nesses processos,
movimentos sociais e entidades articuladoras e mediadoras do diálogo entre essas comunidades
e o Estado.
A política de regularização fundiária de quilombos é relativamente recente, mas
já tem enfrentado fortes embates com grupos de interesses contrários à sua implementação,
tanto no campo como no parlamento. De acordo com Sônia Miriam Draibe (2001, p. 26):
As políticas ou os programas têm vida. Nascem, crescem, transformam-se, reformam-se. Eventualmente estagnam, às vezes morrem. Percorrem, então, um ciclo vital, um processo de desenvolvimento, de maturação e, alguns deles, de envelhecimento ou decrepitude. É este ciclo (ou alguns de seus momentos) que constitui o objeto das avaliações de processos.
5 Informações obtidas através de “Carta aberta à sociedade brasileira ante as violações dos direitos de comunidades
quilombolas pela ferrovia Transnordestina”, de 21/06/2015, em que assinam as Comunidades Contente e Barro
Vermelho, pesquisadores e entidades de assessoria.
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A fase de implementação de uma política “está mais ligada diretamente à
efetivação da política, especialmente envolvendo a sua materialização em programas e projetos,
a normatização legal, a disponibilidade financeira” (SOUZA, 2009, p. 35). Nesse sentido, a
avaliação do processo de implementação da política pública que visa garantir direitos étnicos-
territoriais de comunidades quilombolas, interessa não apenas para as funções de planejamento,
gestão governamental e para os atores que executam a política, mas, em especial, para os
sujeitos do direito garantido pela Constituição Federal Brasileira de 1988.
Para Figueiredo e Figueiredo (1986, p. 110-111), a importância da avaliação de
processo é porque durante a elaboração de um programa ou política pública é impossível prever
entravas, problemas e conflitos, estes só serão percebidos ao longo da implementação, ocasião
em que há possibilidade de monitoramento e controle do efeito desejado, possibilitando
identificar se o programa está sendo ou já foi implementado em conformidade com as diretrizes
de sua execução e se o produto atingirá ou já atingiu as metas desejadas.
4. A Política Fundiária Quilombola e o momento atual: algumas observações
As comunidades quilombolas são grupos étnicos que se autodefinem a partir de
relações específicas com a terra que tradicionalmente ocupam, de relações de parentesco,
tradições e práticas sociais e culturais próprias, bem como uma ancestralidade comum ligada a
identidade negra.
Estima-se que existam no Brasil mais de três mil comunidades quilombolas,
sendo que 1533 possuem atualmente processos abertos no INCRA tendo em vista a titulação de
seus territórios. Ainda que essas comunidades descendentes de antigos quilombos possam estar
em espaços rurais ou urbanos, os dados apontam para uma predominância desses grupos no
meio rural (BRANDÃO et al., 2010).
De acordo com informações do INCRA, no Brasil existem atualmente 207 títulos
emitidos que regularizam 1.040.506,7765 hectares que são envolvidos por 148 territórios,
compostos no total por 238 comunidades e 15.719 famílias quilombolas. Esses títulos foram
expedidos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária/INCRA; Secretaria de
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Patrimônio da União/SPU; Fundação Cultural Palmares/FCP; diversos Institutos de Terras
Estaduais (PA, BA, RJ, MA, SP, MS, PI); e Companhia Energética de Minas Gerais-CEMIG6.
A área total titulada para os territórios quilombolas (10.405 Km²) representa
apenas 0,1221% território nacional (8.515.767 Km²). Logo, não podemos afirmar que a
destinação desta pequena porção de terras a um determinado grupo possa representar um
entrave para o desenvolvimento da nação. Tampouco se pode afirmar que tal política pública
exclui terras que deveriam ser destinadas a produção agrícola, já que estudos realizados por
órgãos governamentais apontam que a maioria das comunidades quilombolas são rurais e têm
a agricultura como atividade principal voltada para a subsistência dessas comunidades e para o
mercado local7.
De acordo com Silva (2013), as comunidades quilombolas podem ser entendidas
como variante do campesinato brasileiro que se diferencia dos demais camponeses no que se
refere a apropriação da terra e de seus recursos naturais, pois esta ocorre de forma comum,
porém com normas específicas, que são internas do grupo e encontra-se à margem da lógica do
sistema capitalista. Para a autora:
...os camponeses, historicamente, foram impactados pelos projetos de desenvolvimento no Brasil, que entendiam suas formas específicas de vida e trabalho como ‘atrasadas’, ‘arcaicas’, sendo um dos motivos para o
‘subdesenvolvimento’ do país. Para os quilombolas não foi diferente, uma vez
que as intervenções do Estado sobre tais grupos étnicos, nessa orientação, se constituíam como uma ameaça à ocupação tradicional de suas terras (p.322).
Estudiosos da questão agrária apontam que esta não tem sido objeto de
preocupação no Brasil em um contexto de desenvolvimento de um capitalismo predatório. De
acordo com Horácio Martins de Carvalho (2003, p. 101), pressões de movimentos sociais do
campo e da cidade têm sido absorvidas com facilidade pelas classes dominantes e caracteriza
as propostas governamentais do período de 1964-2003 como mero jogos políticos, com
possibilidade de intervenção reformista no agrário nula. Nesse sentido, o autor afirma que:
6 Disponível em: http://www.incra.gov.br/sites/default/files/incra-perguntasrespostas-a4.pdf. Acesso em 30/09/2016.
7 Disponível em: http://www.incra.gov.br/sites/default/files/incra-perguntasrespostas-a4.pdf. Acesso em 30/09/2016.
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Sob o paradigma neoliberal reinante no Brasil a propriedade privada e, em particular, a propriedade privada da terra tornou-se objeto de cobiça similar ao período colonial quando se estabeleceram as sesmarias. Essa apropriação de grandes parcelas de terras rurais é considerada pela ideologia dominante como necessária à expansão do grande capital no campo e do agronegócio burguês, este ideologicamente portador de um comportamento moderno (p. 104).
Ariovaldo Umbelino de Oliveira (2015, p. 30) também afirma que há muito
tempo a reforma agrária não é prioridade de governo. E é em decorrência dessa omissão, que
para ele são crescentes os conflitos no campo. Os principais atingidos são camponeses,
remanescentes de quilombolas e povos indígenas. Os dados mais recentes apontam para 1.217
casos de conflitos identificados no campo em 2015, o que representa cerca de três conflitos por
dia, envolvendo ao todo 816 mil pessoas. Além disso, foram 50 assassinatos no campo.
Na caracterização dos conflitos, Oliveira (2015, p. 39) destaca que a luta dos
camponeses, remanescentes de quilombolas e povos indígenas é pela terra ou territórios, seja
para entrar ou para neles permanecer:
Esses sujeitos sociais formados pela classe camponesa e os povos indígenas e quilombolas comandaram a luta contra os proprietários de terra latifundiários e/ou os capitalistas que atuam no campo. Reiterando, no Brasil, a classe camponesa luta pelo acesso à terra ou para nela ficar, e os povos indígenas e quilombolas lutam pelas demarcações de seus territórios de vida.
Da análise de 763 conflitos por terra e território ocorridos em 2015, Oliveira
(2015, p. 38-39) conclui que 33,2% representa camponeses posseiros incluindo diversas
identidades nessa condição; 28% envolve camponeses sem terra e 14,3% camponeses
assentados ou proprietários. Na sequência, 13,1% envolvem povos indígenas e 10,1%
quilombolas, ambos na luta pela demarcação de seus territórios.
Outras agressões aos quilombolas são coordenadas no parlamento pela bancada
ruralista através da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIN nº. 3239 que tem por objetivo
derrubar o Decreto Federal nº. 4887/2003, que atribui competência ao MDA por meio do
INCRA para a titulação dos territórios, bem como regulamenta esses processos de
regularização; também ocorrem através de Proposta de Emenda à Constituição nº. 215 – PEC
215, que tramita atualmente na Câmara e tem por objetivo transferir do Executivo para o
Legislativo a competência para a demarcação de terras indígenas e quilombolas; e mais
recentemente na forma de uma Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI instalada no dia
28/10/2015 com o objetivo de investigar a atuação da FUNAI e do INCRA na demarcação de
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terras indígenas e de remanescentes de quilombos, que foi extinta no dia 19/08/2016 sem
produção de relatórios e reaberta na madrugada do dia 30/08/2016.
A primeira titulação de quilombo no Brasil apenas ocorreu em novembro de
1995, sete anos após a promulgação da Constituição Federal de 1988. Os 148 territórios
quilombolas titulados através da efetivação do seu artigo 68 do ADCT, por meio de títulos
federais e estaduais, são distribuídos por Governo da seguinte forma: FHC (41); LULA (66); e
DILMA (41). Diante da demanda crescente, esse número ainda é limitado, o que demonstra
dificuldades na concretização do direito ao reconhecimento do domínio das terras ocupadas por
essas comunidades.
O Decreto 4887/2003 resultou de amplos debates no Governo Lula e atualmente
é o principal instrumento normativo que regulamenta as etapas administrativas de
reconhecimento dos territórios quilombolas. O referido decreto presidencial revogou o anterior
nº 3912/2001, que havia sido criado no Governo FHC, o que representou a superação da
perspectiva conceitual que inviabilizava o desenvolvimento da política e transferiu do
Ministério da Cultura para o Ministério do Desenvolvimento Agrária, por meio do INCRA, a
competência para a identificação, demarcação, delimitação e titulação dos quilombos, em
virtude da falta de estrutura operacional e institucional do Ministério da Cultura para tratar de
questões fundiárias. Porém, o atual decreto também apresenta sérias falhas no que se refere ao
excesso de procedimentos morosos.
O recuo da política quilombola ocorreu recentemente através de “canetadas”,
efetivando retrocessos que já vinham sendo desenhados, em uma tentativa de se restaurar sua
inviabilidade operacional. As recentes indefinições na política de regularização fundiária das
terras quilombolas em curso no corrente ano são preocupantes. É que em menos de um mês do
governo até então interino de Michel Temer (PMDB), empossado em 12/05/2016, após
afastamento da Presidente Dilma Rousseff (PT), foram realizadas sucessivas mudanças que
permeou de mais incertezas a política quilombola.
No mesmo dia de sua posse, Temer passou a competência da regularização
fundiária dos territórios quilombolas para o novo Ministério da Educação e Cultura, através de
Medida Provisória nº. 726, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos
Ministérios, publicada em edição extra do Diário Oficial da União. Tal atribuição até então era
do INCRA vinculado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, agora extinto. Observa-se a
tentativa de retorno ao já superado entendimento que havia no Governo FHC que impunha
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atribuições fundiárias estranhas ao papel que deve ser desempenhado pelo Ministério da
Cultura.
Em 20/05/2016 a Medida Provisória 726 é retificada e a competência da
identificação, reconhecimento, delimitação e demarcação das terras quilombolas é mantida no
INCRA, ao passar a missão para o novo Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário.
A última medida até então adotada que promove mudanças nessa política
ocorreu em 27/05/2016, por meio do Decreto 8.780/2016, transferindo para a Casa Civil a
competência de titulação dos territórios quilombolas, reforma agrária e promoção do
desenvolvimento sustentável dos agricultores familiares.
Após encerramento do processo de impeachment no dia 31/08/2016, que
culminou na perda do mandato presidencial de Dilma Rousseff, a Presidência da República é
assumida por Michel Temer que já em 29/09/2016, sanciona lei que oficializa a reforma
administrativa que promove mudanças na estrutura do Executivo Federal realizada enquanto
assumiu interinamente, entre as quais estão as que foram citadas e que afetam diretamente a
política de regularização fundiária de áreas quilombolas.
Se os processos de titulação de quilombos já vivenciavam entraves políticos e
institucionais, o que reflete nas dificuldades enfrentadas pelas famílias quilombolas no campo
decorrentes da ausência do título de suas terras, o sentimento de incerteza com o futuro da
política quilombola só tende a aumentar diante das constantes mudanças ocorridas sem qualquer
transparência e discussões com o público-alvo, implementadores e sociedade civil, em uma
tentativa de anular todo o processo de lutas políticas ocorrido em torno da temática.
Conclusão
Este trabalho busca abordar o problema da defasagem da política de
regularização fundiária de territórios quilombolas no estado do Piauí. A Constituição Federal
Brasileira de 1988 é de fato um marco na história da luta das comunidades quilombolas pela
propriedade de seus territórios, pois é através dela que o Estado passa a ser obrigado a
reconhecer os títulos das terras ocupadas por esse grupo social, numa espécie de reparação
étnico-territorial, reconhecimento formal de um direito secularmente negado.
Porém, apesar do avanço jurídico-institucional, os resultados não são
satisfatórios. O movimento social e outros grupos estão insatisfeitos e criticam as falhas na
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titulação de terras de quilombolas, cuja morosidade na obtenção dos títulos coletivos da terra
deixa as comunidades impedidas de acessar a outras políticas públicas.
No Brasil, existem milhares de comunidades quilombolas aguardando seus
títulos, cujos processos de regularização ocorrem a passos lentos. No Piauí, terceiro estado da
região com a maior demanda, com 64 processos de comunidades quilombolas em andamento,
apenas 5 comunidades foram tituladas, mas ainda não tiveram seus títulos levados a registro em
cartório e a maioria dos processos foram abertos há mais de uma década, estando ainda em fase
inicial, sem previsão para a elaboração dos Relatórios Técnicos de Identificação e Delimitação
– RTID.
De acordo com estudiosos da questão agrária, é em decorrência da omissão do
Estado que crescem os conflitos no campo, sendo os principais atingidos atualmente, os
camponeses, remanescentes de quilombolas e povos indígenas. Nesse sentido, o caso da
Comunidade Contente, situada no município de Paulistana – PI, é emblemático, pois enquanto
aguarda o recebimento do título de suas terras, vivencia uma série de violações de direitos
garantidos às populações tradicionais ante a instalação da Ferrovia Transnordestina, obra do
Programa de Aceleração do Crescimento – PAC do Governo Federal em parceria com os
Governos Estaduais do Ceará, Piauí e Pernambuco.
A política de regularização fundiária de quilombos é relativamente recente, mas
já tem enfrentado fortes embates com grupos de interesses contrários à sua implementação,
tanto no campo como no parlamento. A falta da titulação para a maioria das comunidades
quilombolas provoca dificuldades de acesso a outras políticas públicas e insegurança em face
dos avanços de outros agentes econômicos que cobiçam as terras. Diante das constantes
mudanças recentes, sem qualquer transparência e diálogo com os envolvidos, permanece a
incerteza sobre o futuro da política quilombola.
Mesmo diante de um cenário adverso, comunidades tradicionais organizam-se
em torno de suas lutas, cobram resultados, ocupam espaços e resistem no campo. Nesse sentido,
urge a necessidade de uma avaliação do processo de implementação da política pública que visa
garantir direitos étnicos-territoriais de comunidades quilombolas, pois esta interessa não apenas
para as funções de planejamento, gestão governamental e para os atores que executam a política,
mas para o seu público-alvo.
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Mossoró - RN, 16 a 18 de Novembro de 2016
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SILVA, Josiane Cristina Cardoso da. Neodesenvolvimentismo e Comunidades Quilombolas: uma questão ausente? R. Pol. Públ., São Luís, v. 17, n.2, p. 319-327, jul./dez. 2013. SOUZA, A. S. R.; OLIVEIRA, A. L. A. L.; LARA, A. M. S. A posse de terras quilombolas na região metropolitana de Belo Horizonte Jus Navegandi, 2010. Disponível em: http://jus.uol.com.br/revista/texto/17043. Acesso em 10/08/2015. SOUZA, Lincoln Moraes de. Políticas públicas: introdução às atividades e análise. Natal, RN: EDUFRN, 2009. TRECCANI, Girolamo Domenico. Terras de Quilombo: caminhos e entraves do processo de titulação. Belém: 2006.
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Mossoró - RN, 16 a 18 de Novembro de 2016 SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
A Relação entre a Entressafra Açucareira e a Violência na Zona da
Mata Pernambucana, no período entre 2006 e 2015
The relationship between the off season Sugar and Violence in the
Pernambuco Zona da Mata, in the period between 2006 and 2015
Autor(es): Ana Carolina Wanderley Beltrão / Joabe Robson Teixeira Fonseca / André de Souza Melo (Orientador) Filiação: Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE E-mail: [email protected] / [email protected] / [email protected]
Grupo de Trabalho: Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo Este artigo analisa se a dinâmica econômica sazonal da produção de cana de açúcar na Zona
da Mata Pernambucana, no período entre 2006 e 2015, aumenta a violência na região. Baseia-
se na importância socioeconômica da produção de cana de açúcar para o estado, a localidade e
as famílias envolvidas nessas atividades, considerando a criminalidade como uma
externalidade negativa do período da entressafra. Utiliza as variáveis de quantidade produzida
de cana de açúcar como uma proxy da dinâmica econômica da Zona da Mata Pernambucana,
refletindo a geração de renda e o indicador de Crime Violento Letal Intencional (CVLI) para
medir a violência, através do modelo de Vetores Autorregressivos (VAR). No entanto, os
resultados apontam que existe uma relação inversa entre esses indicadores, ou seja, no período
de entressafra açucareira ocorre uma tendência à redução do CVLI.
Palavras-chave: Produção de Cana de Açúcar, Entressafra, Violência, Crime Violento Letal Intencional (CVLI). Abstract This article analyzes if the seasonal economic dynamics of sugar cane production in
Pernambuco Forest Zone between 2006 and 2015, increased violence in the region. It’s based
on socio-economic importance of the production of sugar cane to the state, the town and the
families involved in such activity, considering the crime as a negative externality of the off
season period. Uses the number of variables produced from sugar cane as a proxy of
economic dynamics of Pernambuco forest area reflecting the generation of income and the
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indicator Violent Murder Lethal Intentional (VMLI) to measure violence by the vectors
autoregressive model (VAR). However, the results indicate that there is an inverse
relationship between those Indicators: the off season is a tendency to reduce the VMLI.
Key words: Sugar Cane Production, Off Season, Violence, Murder Lethal Intentional (VMLI).
1. Introdução
Historicamente, desde o período colonial, a cana de açúcar tem um importante
papel na economia pernambucana. Apesar dos períodos de auge e crise da produção
canavieira e mesmo considerando a mudança em curso na estrutura produtiva do Estado, a
cana de açúcar continua representando um significativo desempenho na dinâmica econômica
de Pernambuco, no que tange à mão de obra ocupada na atividade, terra e capital envolvidos,
além de seus resultados impactando nas exportações do Estado, remuneração dos
trabalhadores e seus efeitos sociais.
Em Pernambuco, a Zona da Mata responde pela maior parte da produção
açucareira. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na
pesquisa de Produção Agrícola Municipal (PAM), 84,0% da produção de cana de açúcar no
estado foi realizada na Zona da Mata (17.595.676 toneladas). Em 2014, embora a quantidade
produzida tenha diminuído um pouco nessa localidade (passou para 15.417.362 toneladas) e
outras regiões como a Metropolitana e o Agreste tenham aumentado sua participação, a Zona
da Mata ainda representou 77,0% da produção de cana de açúcar do estado.
Embora a maior parte da produção de açúcar ocorra na Zona da Mata, de acordo
com informações do Ministério do Desenvolvimento da Indústria e Comércio (MDIC), em
2006, o açúcar e seus derivados representaram mais de 30,0% das exportações de
Pernambuco. Embora esse percentual venha diminuindo ao longo do tempo na pauta de
exportações, sua contribuição ainda é expressiva para o estado.
De acordo com dados do Censo Demográfico 2010, a Zona da Mata
Pernambucana apresenta maior contingente relativo de população na zona rural (31,0%) do
que a média do Estado (23,5%) e maior incidência de extrema pobreza em relação à
população total na zona rural, também comparativamente à extrema pobreza no estado. Além
de um importante número de trabalhadores envolvidos em atividades ligadas ao segmento
sucroalcooleiro, como o cultivo de cana de açúcar e o beneficiamento de seus derivados como
a fabricação de açúcar bruto, açúcar refinado e do álcool.
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No entanto, a atividade canavieira, como muitas culturas agrícolas, apresenta
períodos de safra e entressafra, sendo esta última caracterizada por grande contingente de mão
de obra desocupada, tanto dos trabalhadores locais como do fluxo migratório que acorre aos
municípios para o trabalho no período de safra. Esse período de inatividade pode gerar sérios
impactos socioeconômicos na região, considerando a forte diminuição na renda dos
trabalhadores e seus efeitos multiplicadores na economia local, como o comércio.
Dessa forma, esse artigo objetiva verificar, empiricamente, se a dinâmica
econômica sazonal da produção de cana de açúcar na Zona da Mata Pernambucana, no
período entre 2006 e 2015, aumenta a violência na região. Embora existam diversos debates
sobre a relação entre renda e violência, ou mesmo desigualdade de renda e violência, na
literatura pesquisada não foi encontrado nenhum estudo que observe essa relação na região
enfocada nesse artigo.
Para efeito de análise, mesmo que as flutuações no preço impactem a renda
advinda de cana de açúcar e seus derivados, no presente trabalho, por questões práticas e de
acordo com seu objetivo, foi adotado o preço como uma variável constante, passando a
quantidade produzida a ser considerada uma proxy da dinâmica econômica da zona da mata
pernambucana, refletindo, portanto, a geração de renda derivada dessa atividade. Para o
diagnóstico da violência foi utilizado o indicador de Crime Violento Letal Intencional
(CVLI), utilizado pelo Governo do Estado de Pernambuco para acompanhamento dos níveis
de criminalidade no Estado e para a elaboração de políticas públicas de mitigação à violência.
A ferramenta econométrica escolhida para o estudo se baseia no modelo de Vetores
Autorregressivos (VAR) para captar a relação das variáveis e suas intercausalidades.
2. Revisão de Literatura
O desemprego cíclico é mais frequente em áreas rurais e nas entressafras. Na
maioria das vezes são severos, temporários e generalizados.
Castro (2007) ressalta que o Governo de Pernambuco estuda medidas que visam
reduzir o fluxo de mão de obra sazonal para os municípios e, ainda, extinguir os casos de
utilização de mão de obra em condições análogas ao de trabalho escravo – situações que
constantemente são denunciadas.
Isso porque, de acordo com o autor, como mão de obra para a colheita manual, as
indústrias precisam importar trabalhadores de municípios vizinhos e até mesmo de outros
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4
estados, o que aumenta, com o fim da colheita, os índices de criminalidade e problemas
sociais nestas cidades.
Com o processo de expansão canavieira, os fluxos migratórios tendem a se
acentuar, em função de fases distintas da colheita da cana de açúcar no país e por falta de
opção de trabalho rural.
Estudo publicado por Campos et al. (2007) faz uma caracterização dos cortadores
de cana da Zona da Mata de Pernambuco através de pesquisa de campo e observou que, em
média, os cortadores entrevistados trabalham na atividade do corte há cerca de 15 anos,
apresentando idade média de 34 anos, recebendo, aproximadamente R$ 434,00 líquidos por
mês (em valores R$ de 2007) e a grande maioria dos entrevistados tem o corte da cana como
sua única atividade de trabalho.
Durante a época da colheita, apenas 4,5% desses exercem uma atividade
secundária para complementar a renda. Observou ainda que, de uma maneira geral, seja na
safra ou entressafra, os entrevistados têm na atividade canavieira sua ocupação principal, já
que cerca de 74% deles nunca conseguiram outro trabalho assalariado além do corte da cana.
Dentre aqueles que um dia tiveram outro tipo de trabalho, 26% empregaram-se
principalmente na construção civil e prestação de serviços.
Ainda segundo esse estudo, o trabalho do corte da cana é realizado quase que
exclusivamente por homens: 98,8% dos entrevistados eram do sexo masculino. A renda média
familiar e a renda per capita dos cortadores de cana pesquisados são inferiores àquelas
observadas para a população da Zona da Mata do Estado. Uma das fontes da renda média
familiar são os benefícios concedidos pelos programas governamentais de transferência de
renda.
Apesar de haver uma predominância dos domicílios na zona rural (55,9%),
registrou-se um percentual significativo de 44,1% de cortadores habitando em áreas urbanas.
De uma maneira geral, observa-se que a maioria dos cortadores de cana tende a morar no
mesmo município em que se encontra trabalhando. Contudo, há percentuais expressivos que
revelam um certo grau de mobilidade da mão de obra na atividade canavieira. Na maior parte
dos casos, essa mobilidade ocorre entre municípios vizinhos.
Ao final do período da colheita, cerca de 94% dos cortadores entrevistados são
dispensados pela usina/engenho. Os que permanecem vinculados à propriedade podem ser
considerados empregados “fixos”, já que trabalham em média 5,5 meses, tempo que coincide
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com a duração da entressafra. Dentre os que são dispensados, a grande maioria não consegue
trabalho após o corte da cana, representando 53% do total.
Nesta época de entressafra, a renda média familiar cai de R$ 622,28 (no período
de corte) para R$ 294,74, e as principais fontes de renda advêm dos rendimentos de trabalho
(sobretudo agropecuário), programas governamentais e vendas do excedente produzido para
subsistência em feiras locais.
Dificuldades relativas à escolaridade e capacitação profissional foram
mencionadas pelos entrevistados como os principais empecilhos na obtenção de emprego na
entressafra. A maioria dos entrevistados (46,60%) tem escolaridade concluída da 1ª à 4ª série.
O percentual de analfabetos entre os cortadores entrevistados, assinando ou não o nome, é de
30,70%.
De acordo com Soares (2003), os chamados trabalhadores estáveis residiam no
passado em áreas das usinas. Hoje, a grande maioria vive na periferia das cidades e se
deslocam muito cedo para o trabalho levando sua comida, a “bóia-fria”. Já os safristas são
grupos que, no período da safra, saem em direção à área canavieira em busca de trabalho,
sendo contratados por um período determinado, ou seja, durante a safra da cana e colocados
em instalações que nem sempre possuem condições dignas de alojamento. Um dado
importante é que muitos dos que vivem nas periferias das cidades não são só trabalhadores
estáveis, mas também safristas que ficaram desempregados no final da safra.
Graziano da Silva (1998) define o volante como um trabalhador agrícola
temporário que é fundamentalmente um proletário, ou seja, um trabalhador desprovido dos
meios de produção e, enquanto tal, obrigado a vender sua força de trabalho para garantir a
subsistência, como é o operário urbano e/ou o trabalhador rural assalariado permanente. Estes
trabalhadores estão relacionados, principalmente, às funções agrícolas gerais, como plantio,
colheita, irrigação e controle de pragas da cana, ou seja, a mão de obra com baixa
qualificação.
Com referência às relações econômicas e a criminalidade, Araújo (2007)
menciona que uma das preocupações da Economia do Crime é determinar quais fatores levam
um indivíduo a cometer crimes, verificando o impacto de variáveis socioeconômicas sobre a
oferta do crime, tais como: renda, desemprego, desigualdade de renda, idade, eficiência da
polícia e da justiça, entre outras.
Diante desse quadro desenhado da violência, há de se considerar que as
transformações sociais decorrentes da expansão canavieira atingem a violência no campo e
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urbana, ou melhor, as fronteiras entre essas duas violências já não existem mais, a partir do
momento em que o trabalhador rural passou a morar na cidade. Xavier (2010) analisou que
em Goianésia – Goiás, praticamente todos os “bóias-frias”, trabalhadores temporários
empregados no campo, moram nos bairros que foram criados no intuito de que pudessem
habitá-los.
Soares (2000), no entanto, adverte que quem atribui o envolvimento com o crime
a necessidades econômicas frequentemente esquece o papel que a cultura, os valores, as
normas sociais e os símbolos desempenham. "A autoestima é tão importante para a
sobrevivência humana quanto um prato de comida”.
De fato, a dinâmica econômica, na qual se considera a geração de renda como
aspecto central, e sua relação com a criminalidade suscitam inúmeros debates que analisam os
diversos aspectos envolvidos no bem-estar da população e na propensão à violência.
3. Metodologia
A seguir serão apresentadas as variáveis utilizadas nesse trabalho, bem como o
procedimento metodológico do teste econométrico para avaliação da relação de causalidade
entre a dinâmica da cana de açúcar com a violência na Zona da Mata Pernambucana,
utilizando dados no período entre janeiro de 2006 até dezembro de 2015.
3.1. Variáveis Selecionadas
Para a realização desse estudo foram utilizadas duas variáveis: quantidade
produzida e crimes violentos letais intencionais. A primeira variável, uma vez que não estava
disponível em valores mensais, foi construída com base em pesquisas do IBGE, o Censo
Agropecuário 2006, que proporcionou a distribuição, ou seja, o peso a ser considerado para os
valores mensais produzidos da cana de açúcar. Em seguida, foi utilizada a pesquisa de
Produção Agrícola Municipal (PAM), para a informação referente à quantidade produzida no
período entre 2006 e 2014, e o Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (LSPA),
para a estimação da quantidade produzida em 2015, vez que até o presente momento a PAM
não havia divulgado os valores para esse ano. Dessa forma, foi realizada uma ponderação
entre os dados de produção e estimação anuais da PAM e da LSPA com o peso proporcionado
pelo Censo Agropecuário 2006 para estimar os valores mensais da quantidade produzida.
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De acordo com o IBGE, o Censo Agropecuário 2006 teve por objetivo retratar a
realidade do Brasil Agrário, buscando a uma melhor identificação que capte a dinâmica dos
meios produtivos e do uso da terra, a variabilidade nas relações de trabalho e ocupação, entre
outras variáveis. Quanto aos conceitos utilizados, o censo utiliza as premissas sugeridas no
Programa del Censo Agropecuario Mundial 2010, elaborado pela Organização das Nações
Unidas para a Agricultura e Alimentação (Food and Agriculture Organization - FAO) em
2007; as categorizações da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE 2.0,
elaborada pelo IBGE, em 2007, conforme a Clasificación Industrial Internacional Uniforme
de todas las Actividades Económicas - CIIU; e as orientações dos membros da Comissão
Consultiva do Censo Agropecuário 2006. A PAM é uma pesquisa anual que fornece
informações estatísticas sobre quantidade produzida, área plantada e colhida, rendimento
médio e valor da produção agrícola e a LSPA tem periodicidade mensal sobre previsão e
acompanhamento de safras agrícolas, com estimativas de produção, rendimento médio e áreas
plantadas e colhidas, tendo como unidade de coleta os municípios.
O indicador de CVLI é divulgado mensalmente, desde janeiro de 2006, e prioriza
os crimes que atentam contra a vida. Embora no Brasil não exista uma metodologia unificada
para a elaboração desse indicador, em geral, segue-se os critérios adotados pela Secretaria
Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça (SENASP/MJ), divulgados no
documento Análise das ocorrências registradas pelas Polícias Civis (Janeiro de 2004 a
Dezembro de 2005), do Ministério da Justiça. Em Pernambuco, esses critérios agrupam o
homicídio doloso, o roubo seguido de morte (latrocínio) e a lesão corporal seguida de morte
como as principais formas de CVLI e são utilizados pelo governo do estado como um
importante instrumento para mensurar a violência e desenhar políticas para o Programa Pacto
pela Vida, mediante o cálculo da Taxa de Criminalidade Violenta Letal e Intencional.
Conforme descrição do Anuário da Criminalidade de 2014, a Taxa de
Criminalidade Violenta Letal e Intencional representa um coeficiente entre o número de
vítimas de CVLI e a população de determinada região, ponderada por 100 mil, tornando
comparáveis os níveis de criminalidade em diferentes tamanhos de população, uma vez que
estabelece um critério de proporcionalidade. As projeções mensais de população são obtidas
por interpolação dos dados dos Censos Demográficos de 2000 e 2010, do IBGE, com data de
referência de 1º de agosto. Os dados são colhidos a partir dos bancos de dados sobre violência
da Secretaria de Defesa Social (SDS-PE), repassados à Agência Estadual de Planejamento e
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Pesquisas de Pernambuco (Agência Condepe/Fidem) para os cálculos e análises e,
posteriormente, são divulgados nos portais da Agência Condepe/Fidem e da SDS-PE.
Para esse artigo, foram priorizados os dados referentes ao número de vítimas de
CVLI das Regiões de Desenvolvimento da Mata Sul e Mata Norte Pernambucanas,
caracterizando, assim, a Zona da Mata do estado, conforme critério adotado pela Agência
Condepe/Fidem.
3.2. Método Utilizado no Teste Econométrico
Como exposto na introdução, a metodologia adotada nesse artigo para análise das
séries temporais foi o modelo autorregressivo vetorial (VAR), difundido rapidamente após
artigo clássico de Sims (1980), e ainda bastante utilizado nas análises empíricas da
macroeconomia, por permitir a observação do comportamento das interrelações entre
múltiplas variáveis a partir de um conjunto mínimo de restrições de identificação.
As correlações observadas entre as variáveis estudadas são estimadas através do
VAR na forma reduzida e a identificação é realizada, posteriormente, através da recuperação
do VAR estrutural por meio da decomposição de Cholesky. Como indica Cavalcanti (2010), a
identificação do VAR estrutural é feita considerando duas restrições: supõe-se que os choques
estruturais não são correlacionados contemporaneamente e que um dos coeficientes seja igual
a zero, impondo uma ordenação de causalidade contemporânea entre as variáveis. Assim, o
modelo é identificado e é possível passar à análise das interrelações por meio de funções de
resposta a impulso e decomposição de variância dos erros de previsão do modelo.
Ainda segundo Cavalcanti (2010) a decomposição de Cholesky impõe uma
estrutura recursiva à matriz de relações contemporâneas entre as variáveis do modelo – de
modo que a primeira variável não seja afetada contemporaneamente por nenhuma das demais,
a segunda seja afetada apenas pela primeira, a terceira seja afetada pelas primeiras duas, e
assim por diante. Ao pesquisador caberia apenas selecionar a “ordenação causal” adequada
das variáveis sob análise. No presente caso, no entanto, embora já tenha-se partido da hipótese
de que a dinâmica produtiva do açúcar, dada pela quantidade produzida afete o CVLI, foi
utilizado o Teste de Granger com o objetivo de identificar a relação de causalidade entre essas
variáveis, pois nesse método a ordenação de causalidade da decomposição de Cholesky é
definida pelos resultados de causalidade do teste de Granger, no qual tem-se a hipótese de que
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9
a ausência de causalidade, no sentido de Granger, de uma variável em relação a outra indique
a ausência de efeito contemporâneo da primeira sobre a segunda variável.
Partindo propriamente para o passo a passo metodológico utilizado nesse trabalho
foi realizado inicialmente, o Teste de DicKey-Fuller Aumentado (ADF) para verificar a
presença de raiz unitária nas séries estudadas. A quantidade produzida indicou presença de
raiz unitária, o que causaria um viés negativo na estimação, para evitar esse problema, foi
realizado um procedimento de diferenciação, após o qual realizou-se novamente o Teste de
DicKey-Fuller Aumentado (ADF), não sendo então verificada presença de raiz unitária na
quantidade produzida. O CVLI não apresentou raiz unitária.
Estando agora as duas séries
em processo de estacionariedade, foi
realizado procedimento utilizando o
critério de Schwarz para estimar o modelo
que maximize a probabilidade de escolha
do melhor modelo, ou seja, o modelo que
apresente o melhor ajuste.
4. Resultados
No Teste de Granger, a hipótese nula é de que a variável causal “não causa” a
variável dependente. Para atender ao objetivo desse trabalho, a quantidade produzida foi
adotada como variável causal e o CVLI foi adotado como variável dependente. Nos
resultados, foi observado que, no sentido de Granger, a quantidade produzida da cana de
açúcar afeta a violência, adotado como o indicador de CVLI, considerando uma significância
de 0,5%.
Número de
defasagens segundo
critério de Schwarz
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Coeficientes dos Resíduos para CVLI como variável dependente:
Para efeito de informação, seguem os resultados para o Teste de Granger
(significância de 0,5%) e os coeficientes dos resíduos, utilizando a quantidade produzida
como variável dependente.
Em seguida, foram realizados os procedimentos para a decomposição de variância
e a função impulso resposta.
A decomposição da variância dos erros de previsão mostra a evolução do
comportamento dinâmico apresentado pelas variáveis dos sistemas, ao longo do tempo, isto é,
permite separar a variância dos erros de previsão para cada variável em componentes que
podem ser atribuídos por ela própria e pelas demais variáveis endógenas, isoladamente,
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apresentando, em termos percentuais, qual o efeito que um choque não antecipado sobre
determinada variável tem sobre ela própria e as demais variáveis pertencentes ao sistema
(MARGARIDO et al., 2002, p. 78).
Os resultados para a decomposição da variância, considerando choque na
quantidade produzida (para 40 observações) apontam para uma relação entre esta e os
indicadores de CVLI, que ao longo do tempo, acompanham os períodos de safra e entressafra.
Decomposition of Variance for Series CVLI
Step Std Error CANA CVLI 1 8.38 0.274 99.726 2 8.59 0.657 99.343 3 8.85 2.719 97.281 4 9.27 6.790 93.210 5 9.69 8.393 91.607 6 10.11 9.010 90.990 7 10.61 9.476 90.524 8 10.77 9.422 90.578 9 10.94 9.149 90.851 10 11.15 8.839 91.161 11 11.39 8.475 91.525 12 11.67 8.115 91.885 13 11.97 7.979 92.021 14 12.27 8.205 91.795 15 12.59 8.662 91.338 16 12.93 9.285 90.715 17 13.23 9.847 90.153 18 13.50 10.156 89.844 19 13.72 10.224 89.776 20 13.91 10.125 89.875
Step Std Error CANA CVLI 21 14.10 9.932 90.068 22 14.29 9.707 90.293 23 14.49 9.490 90.510 24 14.71 9.323 90.677 25 14.95 9.260 90.740 26 15.20 9.340 90.660 27 15.46 9.547 90.453 28 15.71 9.803 90.197 29 15.95 10.017 89.983 30 16.16 10.131 89.869 31 16.36 10.134 89.866 32 16.54 10.055 89.945 33 16.71 9.931 90.069 34 16.89 9.793 90.207 35 17.07 9.667 90.333 36 17.27 9.578 90.422 37 17.47 9.553 90.447 38 17.69 9.603 90.397 39 17.91 9.707 90.293 40 18.12 9.828 90.172
Também foi calculada a decomposição de variância considerando a relação entre
o CVLI e o comportamento da quantidade produzida de cana de açúcar.
Decomposition of Variance for Series CANA
Step Std Error CANA CVLI 1 1112072.42 100.000 0.000 2 1113841.86 99.991 0.009 3 1124309.55 99.156 0.844 4 1204875.16 91.195 8.805 5 1263226.00 88.453 11.547 6 1337503.86 88.082 11.918 7 1383953.82 88.317 11.683
Step Std Error CANA CVLI 8 1420045.54 87.901 12.099 9 1443254.51 88.280 11.720 10 1443625.28 88.251 11.749 11 1455790.72 88.444 11.556 12 1473200.60 88.661 11.339 13 1498029.11 89.023 10.977 14 1518896.00 89.115 10.885
956
12
15 1526792.91 88.647 11.353 16 1534477.27 87.875 12.125 17 1552669.97 87.034 12.966 18 1581245.22 86.500 13.500 19 1610125.34 86.431 13.569 20 1626897.99 86.479 13.521 21 1631204.32 86.493 13.507 22 1631226.55 86.492 13.508 23 1635189.79 86.556 13.444 24 1645081.74 86.715 13.285 25 1655716.94 86.838 13.162 26 1662503.24 86.755 13.245 27 1666538.63 86.400 13.600
28 1672833.70 85.881 14.119 29 1684991.86 85.413 14.587 30 1700968.16 85.131 14.869 31 1714938.59 85.017 14.983 32 1722602.81 84.980 15.020 33 1724471.44 84.952 15.048 34 1724735.87 84.936 15.064 35 1727041.19 84.961 15.039 36 1731629.72 85.007 14.993 37 1736334.46 84.990 15.010 38 1739692.52 84.834 15.166 39 1742782.01 84.534 15.466 40 1747981.17 84.174 15.826
A função impulso resposta delineia o comportamento das séries incluídas no
modelo VAR em resposta a choques ou mudanças provocadas por variáveis residuais.
Conforme pode ser observado no gráfico a seguir, um choque na quantidade
produzida na cana de açúcar (caracterizada como a variável CANA) afeta inversamente o
CVLI. Esse movimento demonstra que as respostas às mudanças ocorridas na dinâmica
econômica da produção de cana de açúcar na zona da mata pernambucana, variações
comumente caracterizadas pelo período de safra e entressafra, causam movimentos contrários
na violência, dada pelo CVLI. Ou seja, no período de entressafra, o CVLI tende a diminuir e,
consequentemente, no período de safra, o CVLI tende a aumentar.
Abaixo é apresentado o gráfico de choques dados no CVLI e sua relação com a
quantidade produzida de cana de açúcar. Observa-se que o choque na violência só afeta a
quantidade produzida em um período inicial, não tendo interrelação ao longo do tempo.
957
13
Os valores resultantes da função impulso resposta corroboram o demonstrado nos
gráficos, expondo, no primeiro caso, a resposta para choques na quantidade produzida
(CANA) e depois, a resposta a choques no CVLI.
Responses to Shock in CANA
Entry CANA CVLI 1 1112072.4 -0.4389086 2 -61863.5 -0.5403238 3 113463.0 -1.2822083 4 265499.3 -1.9260838 5 -295958.6 -1.4291515 6 -405255.4 -1.1541517 7 -340358.7 -1.2034384 8 -284563.6 -0.5109517 9 -257512.2 -0.1914123 10 -18356.4 -0.1863020 11 187714.2 -0.0905215 12 223162.0 -0.2233352 13 271184.2 -0.6221515 14 241169.7 -0.9519871 15 102599.9 -1.1787235 16 -51706.9 -1.3341484 17 -170473.5 -1.3143609 18 -254160.3 -1.1203768 19 -279162.5 -0.8631449 20 -219528.5 -0.5979106
Entry CANA CVLI 21 -111891.1 -0.3815875 22 5927.6 -0.2834683 23 113643.9 -0.3299023 24 179974.6 -0.4900958 25 183827.5 -0.7135282 26 131422.7 -0.9425871 27 42453.8 -1.1126965 28 -60167.0 -1.1784424 29 -147622.1 -1.1318669 30 -195015.7 -0.9929496 31 -193080.1 -0.8027171 32 -145952.3 -0.6168593 33 -68074.9 -0.4870393 34 17559.1 -0.4443485 35 86674.8 -0.4953031 36 121797.7 -0.6216065 37 115655.3 -0.7845931 38 72049.4 -0.9378805 39 5003.3 -1.0411378 40 -65739.1 -1.0697029
958
14
Responses to Shock in CVLI
Entry CANA CVLI 1 0.0 8.3658881 2 -10560.3 1.7994039 3 -102734.8 1.7135123 4 342289.8 1.9972202 5 237537.9 2.4211526 6 170131.4 2.6504759 7 102798.8 2.9674330 8 142213.6 1.7778783 9 11904.4 1.9541408 10 -27081.3 2.1352397 11 -6005.3 2.3304719 12 -34527.5 2.5148503 13 -15176.9 2.6056157 14 69217.1 2.4878151 15 116296.1 2.5890648 16 144396.3 2.6000749 17 164627.9 2.5056026 18 157971.4 2.4020496 19 119312.4 2.3114944 20 78107.0 2.2380100 Entry CANA CVLI 21 38869.7 2.2547564 22 6113.9 2.3132708 23 -5538.2 2.3870823 24 7577.5 2.4699335 25 36223.0 2.5456938 26 72432.7 2.5885854 27 107850.2 2.5927850 28 131914.9 2.5575064 29 137959.0 2.4954121 30 126743.7 2.4267301 31 102184.8 2.3728505 32 71021.1 2.3480021 33 42510.2 2.3573814 34 24571.7 2.3970430 35 21092.8 2.4562311 36 32179.9 2.5186366 37 54219.3 2.5679765 38 80508.1 2.5927617 39 103605.3 2.5886232 40 117589.9 2.5592094
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5. Conclusão
O presente trabalho mostrou o efeito causal entre a dinâmica econômica
açucareira na Zona da Mata de Pernambuco e a violência, dado pelas variáveis de quantidade
produzida da cana de açúcar e de crime violento letal intencional (CVLI), considerando a
primeira como a variável independente e a segunda como a variável dependente. Os
resultados apontam que existe uma relação inversa entre esses indicadores, ou seja, no período
de entressafra ocorre uma tendência à redução do CVLI, e no período de safra, ocorre um
efeito potencial de aumento da CVLI.
Esse movimento é contrário à hipótese inicial que considerava o aumento da
criminalidade para o período de entressafra, mas contribui significativamente com a literatura
sobre esse tema, considerando a escassez de estudos dessa questão na região estudada.
Outrossim, levando em conta as características de implantação da cana de açúcar,
que remontam ao período colonial e perduram até a atualidade, como o uso intensivo de mão
de obra, monocultura em grandes extensões de terra e produção voltada para o comércio
internacional que agravam a desigualdade intrarregional, além da importância que essa
atividade ainda representa para o Estado e para os atores envolvidos direta e indiretamente,
como os trabalhadores e suas famílias, há um expressivo espaço para a intensificação de
estudos sobre essa temática, sobretudo quando a violência impacta diretamente na qualidade
de vida da população.
Na verdade, a relação observada nesse artigo pode ser testada em outras culturas
temporárias que apresentem relevância para as localidades. Contudo, a dinâmica econômica e
a renda resultante devem ser observadas como o reflexo da possibilidade de acesso a bens e
serviços, não sendo os únicos fatores que influenciem a violência. As questões determinantes
da criminalidade podem estar associadas a derivativos da renda e de temas sociais como a
pobreza, a fome, desemprego, desigualdades e frustrações frequentes pela ostentação de
riqueza de poucos. Além de fatores institucionais (omissão do Estado na prevenção e na
repressão da violência), de prevenção (escolas, moradia, saúde pública, transportes públicos
ineficientes) e de repressão (polícia, justiça e sistema penitenciário).
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AGRICULTURA FAMILIAR, COMERCIALIZAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS
PARA O RURAL NO TERRITÓRIO DO MATO GRANDE - RN
Autores: Jenair Alves da Silva, Gustavo Rodrigues Costa, João Paulo da Silva Costa, Maryelle Campos da Silva e Valéria Sayomara do Nascimento Silva.
Filiação: Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Email: [email protected], [email protected], [email protected], [email protected], [email protected].
Grupo de Pesquisa: Laboratório de Estudos Rurais - Departamento de Políticas Públicas/UFRN.
Resumo: O presente trabalho trata dos resultados iniciais de pesquisa de campo sobre agricultura familiar, comercialização e acesso às políticas públicas para o desenvolvimento rural em cinco municípios do território do Mato Grande – RN. Foram pesquisados seis assentamentos e duas comunidades rurais com um total de 60 agricultores familiares entrevistados. Entre os principais resultados encontrados sobre o contexto das áreas pesquisadas estão as dificuldades de acesso aos recursos hídricos, assessoria técnica insuficiente, dificuldades de escoamento da produção e baixo acesso às políticas públicas como PRONAF, PNAE e PAA.
Palavras-chave: Agricultura Familiar; Comercialização; Políticas Públicas; Território; Mato Grande-RN.
Abstract: This work deals with the initial results of field research on family agriculture, trade and access to public policies for rural development in five municipalities of the territory of Mato Grande - RN. We surveyed six rural settlements and two rural communities with a total of 60 family farmers interviewed. Among the main findings on the context of the surveyed areas are the difficulties of access to water resources, insufficient technical advice, difficulties in disposing of production and low access to public policies as PRONAF, PNAE and PAA.
Key words: Family farming; Commercialization; Public policy; Territory; Mato Grande-RN.
1. Introdução
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O Mato Grande é uma das dez áreas envolvidos na estratégia de Territórios da
Cidadania no Rio Grande do Norte. Esse território envolve quinze municípios, sendo eles:
Bento Fernandes, Caiçara do Norte, Ceará-Mirim, Jandaíra, João Câmara, Maxaranguape,
Parazinho, Pedra Grande, Poço Branco, Pureza, Rio do Fogo, São Bento do Norte, São
Miguel do Gostoso, Taipu e Touros.
A população total do Mato Grande, segundo IBGE (2010) é de 223.761 habitantes, dos
quais 114.246 vivem na área rural, o que corresponde a 51,06% do total. Além disso, possui
um potencial para o desenvolvimento das atividades ligadas a agricultura familiar,
considerando que uma extensa área do território é composta por comunidades rurais,
assentamentos da reforma agrária e uma comunidade quilombola, nas quais vivem 6.665
agricultores familiares e 5.161 famílias assentadas.
O desenvolvimento territorial é multidimensional, porém, especificamente se tratando
do Território do Mato Grande/RN é fundamental aprofundar-se em questões em torno da
agricultura familiar, como a sua relação com a reforma agrária, a comercialização e as
políticas públicas para o meio rural, em especial as políticas de acesso aos mercados
institucionais, como parte essencial para compreender o desenvolvimento nas diversas
dimensões, sobretudo a econômica e social.
O presente trabalho buscou, nesse primeiro momento, explorar e descrever os primeiros
resultados da pesquisa de campo realizada em cinco municípios desse território: Jandaíra,
João Câmara, Parazinho, Pureza e São Miguel do Gostoso, no período março a agosto de
2016, especificamente em seis assentamentos e duas comunidades rurais dessa área
selecionada, nas quais 60 agricultores familiares foram entrevistados. Diversos são os desafios
para o desenvolvimento das localidades estudadas, os quais serão abordados ao longo deste
artigo, a partir da realidade trazida por aqueles que vivenciam o rural cotidianamente.
2. Reforma Agrária, Ruralidade, Agricultura Familiar, Comercialização e Políticas
Públicas no Brasil e Rio Grande do Norte.
Para uma maior compreensão sobre a pesquisa de campo que envolve esse trabalho,
bem como os resultados aqui apresentados, se faz necessário expor um breve histórico sobre a
Reforma Agrária e a Ruralidade no Brasil.
A questão da Reforma Agrária é ainda uma barreira a ser transposta para que realmente
ocorra uma distribuição, remanejamento da terra e do seu uso apropriado. Ocorre uma
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frustração camponesa em relação as inúmeras tentativas de realizar uma Reforma Agrária
justa e eficiente, além de haver uma utilização equivocada dessa reforma como um
instrumento de desenvolvimento do rural. Concordamos com o pensamento de Romeiro
(2013) ao afirmar que:
“As características de mais de quatro séculos de desenvolvimento agropecuário no Brasil podem ser assim resumidas: de um lado, grande sucesso comercial das culturas de exportação e, de outro, escassez relativa de gêneros alimentícios, exploração predatória da natureza, escravização da mão de obra, seguida de precárias condições de acesso à terra e de emprego, escassez relativa de alimentos e excedente estrutural de mão de obra, num país com a maior área agrícola potencial do planeta (quatro vezes a área agrícola chinesa).” (ROMEIRO, 2013, pag. 140)
Essa dinâmica gera um sistema de processo de crescimento do produto no rural
priorizando apenas a produção de commodities agrícolas e deixando à margem desse processo
a produção de alimentos que não se encaixa nesse padrão como observou Romeiro (2013) que
aponta que a produção de alimentos ocupa áreas residuais não ocupadas pela agricultura de
exportação (seja no interior da grande propriedade ou na sua periferia) ou áreas ainda não
ambicionadas por interesses mais poderosos (fronteira agrícola). A consequência disso é o
caráter precário da posse e do uso da terra para a produção de alimentos, gerando
instabilidade na produção e problemas crônicos de abastecimento que se observam desde o
século XVII, como aponta no trecho abaixo:
“Desde a abolição da escravatura, o Brasil perdeu várias oportunidades históricas de resolver sua questão agrária, garantindo amplo acesso à terra para a população rural. Infelizmente, as elites dominantes, tradicionalmente piratas e irresponsáveis, sempre conseguiram bloquear as tentativas de solução propostas por uma minoria lúcida e responsável, que percebia claramente as consequências em longo prazo da brutal concentração dos recursos fundiários nas mãos de uma ínfima minoria de proprietários “devoradores de terras e de gente”. Essas consequências são vividas hoje, de forma dramática, principalmente pelas populações das grandes regiões metropolitanas, sob a forma do caos urbano [...] (ROMEIRO, 2013, pag.150).”
Considerando o que envolve o movimento da sociedade nos dias atuais e a luta pela
consolidação da democracia no país, pensamos que há uma demonstração de que, “apesar da
marginalização econômica e cultural a que foi submetida grande parte da população, ela
conseguiu se organizar e lutar cada vez mais eficazmente por seus direitos” (ROMEIRO,
2013). Na questão agrária observamos que as conquistas têm sido as mais difíceis, há alguns
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avanços, mas também existem vários retrocessos, além de decisões e medidas que chegam já
tardiamente quando não há mais um alinhamento com a realidade.
O setor agrícola necessita de uma transformação onde ela seja uma fonte importante de
emprego, pois os movimentos sociais terão muitos empecilhos em traduzir os novos direitos
conquistados em efetiva melhoria de qualidade de vida. Para juventude rural, os desafios de
criar condições de produzir e gerar renda para manter uma autonomia econômica é um fator
que, ainda hoje, influencia na decisão de sair do meio rural e procurar oportunidades nas
cidades (Castro, 2009). Outro fator de expulsão do campo é a qualidade de vida, conforme
afirma Romeiro (2013) que no meio urbano, mesmo a qualidade de vida da população que
ocupa predominantemente a periferia e permanece em subempregos, pode ser considerada
como melhores em relação às condições de vida de quem está no rural, com as condições de
trabalho diferentes e, além disso, o agricultor tende a enfrentar diversos desafios, desde a
violência dos grandes latifundiários e proprietários de terra, à falta de assistência médica e
escolar para si e sua família. A partir dessa consideração, os moradores das áreas rurais
permanecem com a prática de sair dos seus municípios e distritos de origem para procurar
oportunidades de se estabelecerem nos centros urbanos, mesmo com a qualidade de vida
questionável que estas áreas oferecem.
Ruralidade pode ser considerada uma espécie de renovação da categoria do rural, porém
suas definições extrapolam essa conotação. Ainda que o sistema institucional e político
brasileiro conceba o reconhecimento do espaço rural como algo dissociado de características e
modos de vida urbanos. Nos últimos anos os cientistas sociais realizaram diversas discussões
sobre o termo ruralidade, com o objetivo de construir uma nova concepção onde não definisse
o rural como um local de “baixa mobilidade, reduzida estratificação social, forte autonomia,
dependência da agricultura, colocando-o em oposição ao urbano, conforme preconizado pela
definição clássica de Sorokin, Zimmerman e Galpi (1929) e Solari (1973)” (Schneider, 2009,
pág. 34). A existência de uma interação ativa e recíproca do rural com o urbano e vice-versa
já não é uma questão que divide opiniões entre os estudiosos. Embora não exista acordo em
relação ao modo de classificar e definir o conteúdo e a extensão da ruralidade, há consenso de
que os processos sociais, as dinâmicas econômicas (produtivas e tecnológicas) e os traços
culturais que ocorrem no espaço rural são fluídos, permeáveis, transpassados e de algum
modo integrados à sociedade contemporânea (Schneider, 2009, pág. 35). Sendo assim a ideia
ultrapassada de que o urbano está associado ao progresso, à integração e à modernidade, e o
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rural ao atraso, isolamento e ao tradicional já não faz mais sentido e não devemos basear
nossas observações e estudos nesse modelo defasado.
A sociedade brasileira parece ter hoje um olhar novo sobre o meio rural. Visto em dado
momento como a fonte de problemas – desenraizamento, miséria, isolamento, currais
eleitorais etc. – surgem, aqui e ali, indícios de que o meio rural é percebido igualmente como
portador de “soluções”. Esta percepção positiva crescente, real ou imaginária, encontra no
meio rural alternativas para o problema do emprego (reivindicação pela terra, inclusive dos
que dela haviam sido expulsos), para a melhoria da qualidade de vida, através de contatos
mais diretos e intensos com a natureza, de forma intermitente (turismo rural) ou permanente
(residência rural) e através do aprofundamento de relações sociais mais pessoais, tidas como
predominantes entre os habitantes do campo.
A ruralidade, o desenvolvimento rural, e o desenvolvimento local no Brasil moderno são
hoje temas em debate na comunidade acadêmica, entre militantes de movimentos e
organizações sociais e entre responsáveis pelas políticas públicas voltadas para a agricultura e
o meio rural (Wanderley, 2001).
A Agricultura Familiar não é propriamente um termo novo, mas seu uso recente, com
ampla penetração nos meios acadêmicos, nas políticas de governo e nos movimentos sociais,
adquire novas significações.
Para Carmo (2000), a agricultura familiar é aquela em que a gestão, a unidade produtiva
e os investimentos nela realizados são feitos por indivíduos que mantêm entre si laços de
consanguinidade ou de união, e onde a maior parte do trabalho é fornecida pelos membros da
família. Os assentamentos e comunidades pesquisados possuem tal característica, onde a
produção agrícola é realizada predominantemente pelo núcleo familiar e que utilizam
predominantemente mão de obra da própria família nas atividades econômicas de propriedade
e possuem uma parte da renda familiar proveniente das atividades agropecuárias
desenvolvidas no estabelecimento.
Segundo a Constituição Brasileira (1988), atualizada na Lei nº 11.326 de julho de 2006,
considera-se agricultor familiar aquele que desenvolve atividades econômicas no meio rural e
que atende alguns requisitos básicos, tais como: não possuir propriedade rural maior que 4
módulos fiscais (o módulo fiscal é uma unidade territorial agrária, fixada para cada município
brasileiro baseada na Lei Federal nº 6.746/79). O módulo fiscal varia de 5 a 100 hectares,
conforme regulamentação municipal, e nas localidades pesquisadas neste trabalho o módulo
rural varia entre 25 e 30 hectares.
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A agricultura familiar no Brasil tem importância peculiar devido a grande produção de
alimentos que essa atividade realiza, pois, na maioria dos casos, os agricultores familiares não
direcionam suas mercadorias ao mercado externo, mas sim para o atendimento imediato de
seu consumo. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA (2015) a agricultura
familiar é a principal responsável pela comida que chega às mesas das famílias brasileiras, e
responde por cerca de 70% dos alimentos consumidos em todo o país, que abastece o mercado
brasileiro com produtos tais quais mandioca (87%), feijão (70%), carne suína (59%), leite
(58%), carne de aves (50%) e milho (46%) são alguns grupos de alimentos com forte presença
da agricultura familiar na produção.
Uma das principais lutas dos agricultores familiares é a realização de uma reforma
agrária que gere trabalho e renda. Dos 53.306 km² de todo o território do Rio Grande do
Norte, 90% estão no semiárido. Nesta área há cerca de 91 mil estabelecimentos agrícolas,
sendo 87% de agricultores familiares (MDA, 2015).
Os desafios em torno da produção da agricultura familiar no Rio Grande do Norte, dar-
se enfaticamente a fatores como falta de recursos hídricos em grande parte da área rural
devido a configuração geográfica do estado. Sabe-se que o Estado do Rio Grande do Norte
apresenta-se como um dos mais carentes do Nordeste em oferta hídrica, o que decorre de uma
associação de fatores tais como: ter 90,69% do seu território inserido no semiárido (48.343,60
Km²), o que corresponde a 4,55% do semiárido nordestino; depender de um regime
pluviométrico extremamente irregular, de um meio físico que, em grande parte de sua
superfície, não possibilita a acumulação das águas das chuvas (áreas sedimentares do
semiárido), acrescentada de uma crescente demanda para os programas de abastecimento
público e projetos de irrigação, aliada as dificuldades em gestão dos recursos hídricos em
adequar demandas e possibilidades de uso da água.
Segundo o Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável do Território do
Mato Grande (2009), esse fator implica na predominância de cultivares que se adequam em
sistema de sequeiro, e em solos de fertilidades relativamente baixas. Ressalta-se que esse fator
foi observado em todos os assentamentos e comunidades pesquisados, onde cultivares como
feijão, macaxeira e milho possuem predominância na agricultura familiar desenvolvida.
Como ponto importante para a discussão do desenvolvimento da agricultura familiar e o
desenvolvimento territorial, as políticas públicas, entendidas por Peters (1986) como sendo a
soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou através de delegação, e que
influenciam a vida dos cidadãos, e Souza (2006) entendida também como o estudo dessas
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ações (planos, programas e projetos) que almejam o desenvolvimento de uma sociedade onde
o governo tem o papel de transformar ou fomentar essa transformação através de ações
públicas, devem ser analisadas na perspectiva de identificar sua efetividade e impacto.
Como ponto importante para a discussão do desenvolvimento da agricultura familiar e o
desenvolvimento territorial, as políticas públicas, entendidas por Peters (1986) como sendo a
soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou através de delegação, e que
influenciam a vida dos cidadãos, e Souza (2006) entendida também como o estudo dessas
ações (planos, programas e projetos) que almejam o desenvolvimento de uma sociedade onde
o governo tem o papel de transformar ou fomentar essa transformação através de ações
públicas, devem ser analisadas na perspectiva de identificar sua efetividade e impacto.
Na perspectiva de discutir sobre a agricultura familiar e suas conexões, é importante
também conceituar mercado. No início da nossa história, o que existia era apenas a troca de
bens que se necessitava naquele momento, sem nenhum valor agregado, com o passar dos
anos e das revoluções econômicas, os bens de consumo ganharam valores diferentes, até que
chegamos a desenvolver regulações para as trocas, desenvolvendo moedas e ambientes
propícios para essas trocas, os chamados comércios, dentro da perspectiva do sistema
capitalista (Harvey, 2013). O mercado continua sendo compreendido como um ambiente de
trocas de bens e serviços, sendo no conceito mais próximo da Economia o mercado como uma
instituição que estabelece a relação entre os vendedores e compradores, formando um
ambiente propício ao comércio, e não se descarta sua importância para o desenvolvimento do
sistema econômico vigente.
É importante considerar que algumas parcelas da sociedade têm a dificuldade de se
inserir no mercado e o governo precisa encontrar formas de inseri-las, o que seria o papel do
desenvolvimento dos mercados institucionais, que são aquisições diretas realizadas pelo
Estado onde não tem fins lucrativos diretos para ele, apenas para o vendedor, garantindo a
saída do produto e para que sua margem de lucro não seja prejudicada pelos setores de
comércio dando uma certa autonomia ao vendedor, assim, é uma maneira de fortalecer um
nicho da sociedade que tenha dificuldades de se inserir no livre mercado e, na maioria das
vezes, essa é a única fonte de renda dessa parcela da sociedade (Triches; Scheneider, 2012).
Por mais que não seja uma prática recente, os mercados institucionais hoje surgiram
através do Programa de Aquisição de Alimentos em 2003 e o Programa Nacional de
Alimentação Escolar em 2009, ambos na política pública com a perspectiva de assegurar e
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fomentar a agricultura familiar e a segurança alimentar (Rozendo; Bastos; Molina, 2013) e
esta tem sido uma atitude governamental de suma importância para a agricultura familiar.
O PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), é uma ação do Governo Federal,
criada em 2003, assim como diversas outras políticas, para combater a fome e a pobreza no
Brasil e, consequentemente, para fortalecer a agricultura familiar, via mecanismos de
comercialização, a partir de editais públicos, favorecendo a venda direta de produtos de
agricultores familiares ou de suas organizações, como associações e cooperativas.
Instituído pela Lei nº 11.947/2009, o Programa Nacional de Alimentação Escolar -
PNAE prevê a compra de alimentos da agricultura familiar para serem servidos nas escolas da
rede pública de ensino, utilizando a sistemática de compra direta (MDA, 2015). A compra
desses alimentos é, de preferência, realizada no município em que as escolas estão instaladas,
fortalecendo os agricultores locais, priorizando os assentamentos de reforma agrária, as
comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas, aumentando e diversificando
a renda dos agricultores familiares (MDA, 2015)
O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF tem o
objetivo do fortalecimento do agricultor familiar, através de diversas linhas de créditos
voltada para os agricultores que compõem a unidades familiares de produção, e para acessá-lo
precisa comprovar que o agricultor compõe um núcleo familiar de produção através da DAP
Documento de Aptidão ao PRONAF.
Necessário para acessar às políticas públicas de crédito no meio rural, o Documento de
Aptidão ao Pronaf - DAP, se torna um documento de grande importância para o agricultor
familiar, pois, com ele o agricultor tem acesso às diversas modalidades do PRONAF e outras
políticas públicas, que são linhas de financiamento de projetos - custeio e capital, que podem
contribuir para alavancar a produção. Podemos observar dados sobre a DAP no Quadro 1.
Quadro 1: Dados da agricultura familiar nos municípios pesquisados.
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Município
Pessoas ocupadas na Agricultura
Familiar
DAP - Pessoa Física
Jandaíra 489 413
João Câmara 2.291 1.994
Parazinho 237 331
Pureza 1.662 483
São Miguel do Gostoso 1.475 2.247
Total 6.154 5.468
DADOS DA AGRICULTURA FAMILIAR
Fonte: SAF/MDA (jan/2015); IBGE, Censo Agropecuário (2006)
Os dados se mostram onde em quase todos os municípios, uma discrepância entre o
número de pessoas vivendo da agricultura familiar e o número de pessoas que possuem a
DAP, onde essa discrepância é maior em Pureza, onde apenas 29% possuem a DAP.
Por outro lado, os mercados não institucionalizados pelas políticas públicas são os mais
abertos e podem ser notados por diversos olhares onde estejam instalados. Os modelos
diversificados de comercialização, segundo Darolt et. al. (2013), podem ser chamados de
circuitos longos ou curtos e fazem com que estabelecimentos e demais espaços diversificados
de venda apresentem uma oferta mais dinamizada ao público consumidor e assim faz com que
diferentes alternativas de produção e comercialização sejam mais valorizadas a partir do seu
potencial econômico.
As redes de comercialização mais próximas (que podem ser entendidas também como
circuitos curtos) envolvem as feiras, quitandas, mercadinhos e demais espaços que
proporcionam a venda direta de itens provenientes da agricultura familiar e são muitas vezes
responsáveis por servir como um canal para dar destino a produção agrícola de assentamentos
e comunidades rurais.
Segundo Darolt et. al. (2013), no Brasil ainda não há uma definição oficial para circuitos
curtos, mas o que se sabe é que o conceito aponta para uma proximidade entre produtores e
consumidores. Isso reforça bastante as relações de fortalecimento no âmbito rural a partir do
momento em que há uma relação mais concreta entre o produtor e o consumidor final, já que
a venda passa a ocorrer de modo direto, ou seja, sem intermédio de terceiros durante a fase de
comercialização, o que faz com que o processo seja facilitado consideravelmente.
Dentre os espaços mais comuns de comercialização não institucionalizados, no Mato
Grande, podemos citar como exemplo a venda na propriedade, em feiras, supermercados,
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mercadinhos, entre outros tipos. No Rio Grande do Norte há diversas experiências de feiras
ligadas a agricultura familiar, inclusive um Centro de Distribuição de Produtos da Agricultura
Familiar, na capital Natal, porém múltiplos fatores interferem na distribuição do excedente da
produção nesses pontos.
Entre os desafios para a comercialização, podemos citar alguns exemplos que são
recorrentes na região estudada como é o caso da falta de compradores e de local adequado
para a venda dos produtos. No entanto, a figura do atravessador surge desempenhando um
papel que a princípio parece resolver as dificuldades relacionadas à comercialização e com
isso acaba ganhando a confiança dos produtores que repassam a produção a um custo abaixo
do mercado, porém, tendo a certeza da venda. Práticas desse tipo acabam por criar um modelo
de dependência, estagnação e de exploração indireta. A falta de conhecimento sobre políticas
públicas voltadas para o meio rural assim como sobre outros mecanismos que auxiliam no
processo de produção e comercialização é um grande problema que precisa ser enfrentado
coletivamente.
3. Metodologia
O presente trabalho é fruto do Projeto de Extensão Compartilhando Saberes, executado
pelo Laboratório de Estudos Rurais – UFRN, que objetiva fomentar as discussões em torno do
tema de juventude e os desafios da sucessão rural no Território do Mato Grande.
Considerando que o fortalecimento da agricultura familiar, as redes de comercialização
da produção – agrícola e não-agrícola e as políticas públicas no meio rural, são fundamentais
para compor as condições necessárias para o desenvolvimento surgiu a seguinte inquietação:
Como tem se dado as condições que envolvem a produção da agricultura familiar, sua
comercialização e o acesso aos mercados institucionais nos municípios do Território do Mato
Grande?
Na perspectiva de responder a essa questão, desenhou-se uma pesquisa de campo, que
propôs aproximar-se da percepção dos agricultores familiares sobre as suas condições de
produção e comercialização. Para tanto, foram aplicados questionários junto aos agricultores e
agricultoras, e realizadas entrevistas com lideranças de associações comunitárias. De forma a
complementar os dados, também foram coletados dados secundários.
A pesquisa se deu nos municípios de Jandaíra, João Câmara, Parazinho, Pureza e São
Miguel do Gostoso, com o detalhamento da mostra seguido no Quadro 2:
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Quadro 2: Detalhamento da mostra da pesquisa de campo:
Municí-pioAssenta-
mentoComuni-
dade Rural
Nº de questio-nários
aplicados
Nº de mulhe-res entre-vistadas
Nº de homens entre-
vistados
Nº de jovens entre-
vistados
% mulhe-res entrevis-
tadas
% de jovens
entrevis-tados
Jandaíra Guarapes - 11 4 7 1 36,36% 9,09%
João CâmaraMaria das
Graças- 10 5 5 0 50,00% 0,00%
1º de junho - 11 8 3 1 72,73% 9,09%
Pereiros - 3 2 1 0 66,67% 0,00%
Canafístula 5 3 2 2 60,00% 40,00%
-Bebida Velha
5 2 3 2 40,00% 40,00%
Arizona - 10 4 6 3 40,00% 30,00%
- Tabua 5 3 2 0 60,00% 0,00%
Total 60 31 29 9 51,67% 15,00%
DETALHAMENTO DA MOSTRA DA PESQUISA DE CAMPO
Parazinho
Pureza
São Miguel do Gostoso
Fonte: Produção dos autores.
Como pode ser observado na Tabela 1, nos cinco municípios foco da pesquisa foram
coletadas amostras em seis assentamentos e duas comunidades rurais. A coleta de dados
primários se deu no período de março a agosto de 2016 e resultou na aplicação total de 60
entrevistas, que incluem agricultores/produtores e lideranças de organizações comunitárias.
As mulheres representam 51,67% do público pesquisado e os jovens, de 15 a 29 anos,
representam 15%.
As análises foram feitas, nesse primeiro momento da pesquisa (que continua em curso
após esse trabalho), de forma exploratória e descritiva. Ainda assim, a mirada sobre o material
coletado percorre a análise de discurso alinhada à análise de conteúdo (Rocha e Deusdará,
2005). A análise de conteúdo aqui mede principalmente a frequência, considerando as
perguntas fechadas do questionário estruturado. As perguntas abertas permitem para os
entrevistados liberdade para demonstrar suas realidades, e a partir desse material gravado e
transcrito, iniciamos o trabalho de análise de discurso. Assim, no trabalho que se segue,
busca-se responder à pergunta de partida a partir das informações sistematizadas da pesquisa
de campo e relacionar criticamente aos dados secundários coletados juntos aos órgãos
públicos responsáveis pelas políticas de apoio ao desenvolvimento no território do Mato
Grande – RN.
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4. Resultados e Discussões
Agricultura Familiar e Produção Agrícola
Em relação ao desenvolvimento da agricultura familiar, percebemos que as
comunidades pesquisadas possuem intersecções, tais como o sistema de produção. E em toda
a amostra há predominância e consorciação de cultura, a produção dar-se em sistema de
sequeiro, e o acesso a água para o consumo básico é bastante precário.
Em todos os municípios pesquisados foram observadas cisternas como reservatórios
para água potável, como também a presença de poços onde a qualidade da água é inferior,
com predominância salina, sendo utilizada para o uso doméstico e consumo animal. O uso da
água dos poços, segundos relatos dos entrevistados, é inviável para irrigação pois os teores de
sódios são elevados e seria necessário um processo de dessalinização para o uso. Um caso
particular é o assentamento Arizona, em São Miguel do Gostoso, onde o mesmo foi
contemplado pelo Projeto Adutora Boqueirão, e a água fornecida no assentamento é de boa
qualidade.
“Quanto a fonte hídrica, é ideal para consumo? É ideal, temos uma das melhores
águas região e que é tratada pela CAERN, então tem todo um monitoramento.”
(Evanilson Tenório Eleodório, Assentamento Arizona - São Miguel do Gostoso)
Mesmo tendo água disponível no Assentamento Arizona, há restrições quanto ao seu
uso para irrigação. Segundo os agricultores entrevistados, isso dar-se devido a longa extensão
de assentamentos rurais que a adutora contempla, com isso o uso para diferentes fins que não
fosse o consumo impossibilitaria a chegada de água potável no assentamento sendo relatado
dificuldades de infraestrutura e vazão/volume de água. Há inclusive uma fiscalização,
segundo os agricultores, realizada pela CAERN - Centro de Abastecimento de Água e Esgoto
do Rio Grande do Norte quanto a quantidade de água utilizada em cada casa para que o
recurso hídrico não seja utilizado para outros fins que não seja o consumo humano.
É importante ressaltar que a dificuldade de acesso a água foi relatada em 75% dos
assentamentos e comunidades pesquisadas, dada a relevância desse item na produção agrícola.
Por via de conclusão quanto aos limites hídricos encontrados na área pesquisada, podemos
considerar a ausência desse insumo como causa fundamental da baixa produção agrícola,
dado que, em sua maioria, esta fica submetida ao sistema de sequeiro, dependente da
ocorrência do regime pluviométrico na área, normalmente concentrado em curtos períodos de
tempo.
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Nas nossas visitas aos assentamentos foi observado que a maioria das casas têm
cisternas para o consumo próprio de água, mostrando a eficácia do programa Um Milhão de
Cisternas (P1MC), que faz parte do Programa de Formação e Mobilização Social para a
Convivência com o Semiárido. O P1MC visa trazer água potável, melhorando a qualidade de
vida das pessoas, fator muito importante para a região pesquisada, dado que a água dos poços
existentes nos assentamentos no Mato Grande é imprópria para o consumo humano, como já
tratado anteriormente.
Durante a pesquisa de campo, quando foi questionada a atuação da assistência técnica,
quando, unanimemente foram relatadas as falhas desse serviço público. Constatou-se que nos
cincos municípios pesquisados não existe a efetiva e participativa atuação desse serviço.
Apenas no caso de Jandaíra, mais precisamente do Assentamento Guarapes, Distrito de
Parazinho, no assentamento 1° de junho houve uma distribuição de sementes, fora do prazo
em que os produtores costumam realizar os plantios. Segundo os pesquisados essas
distribuições são feitas por um técnico vinculado a EMATER -Empresa de Assistência
Técnica e Extensão Rural
É notória a insatisfação dos produtores ao serem questionados quanto a assistência
técnica, são enfáticos ao dizer que não possuem esse recurso. Isto se contrapõe aos dados
fornecidos pelo Ministério de Desenvolvimento Agrário - MDA (2015) citados no Quadro 3.
Quadro 3: Distribuição de ATER por municípios.
MunicípioATER Nº de
TécnicosJandaíra 13
João Câmara 13
Parazinho 13
Pureza 9
São Miguel do Gostoso 7
Total 55
Distribuição de ATER por municípios
Fonte: SIATER/MDA (jan/2015)
A falta de assistência técnica é um fator determinante para o desenvolvimento da
agricultura familiar, segundo os estudos de CASTRO (2015) os reflexos podem ser
observados em todo o sistema produtivo. Sem orientação adequada o produtor familiar pode
fazer uso indiscriminado de agrotóxico na produção, usar misturas domésticas, que em sua
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maioria é feita com carrapaticida diluído na água e aplicado diretamente nas plantas,
conforme constatado em nossas visitas.
Quanto ao uso de agroquímicos, a pesquisa revelou que 100% daqueles agricultores que
utilizavam em sua produção esses tipos de produtos, os obtinham em casas de ração, casas de
produtos agropecuários e feiras livres como principais canais de comercialização de insumos.
“O Barrage [carrapaticida] não ofende não. Só ofende mes mo a lagarta. Somente, não ofende mais a ninguém.” (Dalvaneide Bandeira da Silva Neta, Assentamento
Guarapes - Jandaíra/RN, 2016)
Quando questionados sobre os cuidados tomados durante o uso, com o solo e com a
proteção pessoal, a maior parte dos entrevistados, cerca de 60% daqueles que fazem uso,
dizem não se preocuparem, pois, “o veneno” não oferece dano algum à sua saúde, conforme
relato da entrevista anterior. Os produtores que tomam cuidados na utilização, relataram o uso
para esse fim, de uma roupa mais resistente, óculos e boné e aplicam “a favor do vento” para
evitar a inalação, porém estes cuidados mínimos são tomados apenas por 40% dos
entrevistados.
Comercialização da Produção Local
Os dados relacionados sobre a comercialização são bastante diversificados, se
compararmos inclusive entre as comunidades de um mesmo município. Cada assentamento e
comunidade rural apresenta características bem particulares e que por algumas vezes são bem
diferenciadas das localidades próximas, seja em relação à irrigação em lote, ao fato de fazer
acesso às políticas públicas ou mesmo ao se tratar da venda da produção à atravessadores.
Fatores como clima, assistência técnica e desconhecimento dos programas governamentais
também acabam por influenciar em todo um ciclo produtivo e de escoamento da produção.
A pesquisa mostra que a maior parte dos entrevistados comercializa a produção agrícola
para atravessadores e que uma quantidade considerável de famílias não comercializa. O fato
de não vender o que é produzido se caracteriza por não atingir uma produtividade capaz de
gerar excedente, fator decorrente então da baixa ocorrência de chuvas na região e pela falta de
irrigação na maioria dos lugares pesquisados (essa foi a maior dificuldade apresentada pelos
produtores).
A produção excedente, quando ocorre, dificilmente consegue se manter em um bom
padrão de qualidade. Os produtores relataram que não há como ter uma certeza de quanto irão
produzir em cada safra, já que os fatores de produção como tecnologia, insumos, informações
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técnicas e crédito, ainda não estão ao alcance da maioria. Muitas famílias não conseguem
produzir o suficiente para se alimentar por um período maior que poucos meses depois da
colheita. Dessa forma, a pluriatividade torna-se uma realidade em praticamente todas as
comunidades, tendo o intuito de complementar a renda e alimentação. A produção excedente
que é destinada à venda, quando não consegue ser escoada, acaba sendo consumida na própria
casa dos produtores e quando isso não acontece, os alimentos são repassados pra outras
famílias, o que é bastante comum no meio rural. As frutas colhidas nos quintais e lotes dos
agricultores de acordo com a sazonalidade, são em sua maioria consumidas no próprio
ambiente familiar, pouca coisa é direcionada à comercialização.
A desenvoltura do pequeno produtor passa a ser um fator importante para o seu sucesso
comercial. Não basta saber apenas enfrentar os problemas existentes na fase de produção,
todo o processo vivido no período pós-colheita acaba sendo desafiador. Problemas como: a
falta de compradores, falta de lugar apropriado para a venda e a ausência de uma estrutura
adequada para acondicionamento dos produtos, foram os mais citados dentro da pesquisa.
A inexistência de locais que comportem um tipo de venda direta, por exemplo, faz com
que os produtores dependam da figura do atravessador, que surge desempenhando um papel
que, nessas condições, Ludtke (2007) rotula como ‘um mal necessário’. Isso porque, a
princípio, mesmo obtendo lucro facilitado às custas do agricultor familiar, dada a dispersão, o
isolamento, a falta de transporte apropriado, além da dificuldade de beneficiamento e de
armazenamento, a presença desses atravessadores, em muitos casos, se constitui entre as
escassas alternativas de geração de renda na família para sua reprodução.
Conhecimento e acesso às Políticas Públicas
Considerando que as políticas públicas são essenciais para o fortalecimento e autonomia
da agricultora familiar, o que se pode constatar a partir desta pesquisa, é um baixo acesso às
políticas públicas voltadas aos agricultores familiares, devido principalmente a uma série de
fatores apontados e por eles e observados.
A partir das informações coletadas nos municípios de Pureza, São Miguel do Gostoso,
João Câmara, Jandaíra e Parazinho, pôde-se ter um panorama das políticas públicas mais
conhecidas e mais acessadas pelas comunidades rurais e assentamentos, e constatar uma certa
homogeneidade de informação entre os municípios. Para os produtores entrevistados em
Pureza, as políticas mais acessadas são principalmente as de mercado institucional, como
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PAA (Programa de Aquisição de Alimentos) e o PNAE (Programa Nacional de Alimentação
Escolar).
O PNAE apresenta-se como a política mais conhecida entre os entrevistados, 60%
conhecem, em seguida vem o PAA com 50%, e em terceiro, o PRONAF (Programa Nacional
de Fortalecimento da Agricultura Familiar), com 30%, porém isso não significa que as
políticas públicas ligadas aos mercados institucionais sejam as mais acessadas. Na verdade, a
política mais acessada é o PRONAF - 30% dos entrevistados já acessaram pelo menos uma
vez, e essa também é a mesma porcentagem de produtores que não acessam a nenhuma
política - 30%. No que ser refere ao PRONAF Jovem, ao PAA e ao PNAE, estes são
acessados por 20% dos produtores.
A pesquisa revelou que muitos agricultores diziam não possuir a DAP – Documento de
Aptidão ao PRONAF, onde uma parte significativa não sabe da sua existência ou não saber
para quê é utilizado, como podemos observar no discurso de uma entrevista, “Eu não sei nem
o que é, eu não tenho isso não” (Francisca, Assentamento Maria das Graças – João Câmara/RN,
2016), quando foi perguntada sobre possuía a DAP. Sabe-se que a DAP também é um dos
documentos solicitados em editais de participação no PAA e PNAE, portanto sua ausência
também pode ser um limitador para o acesso aos mercados institucionais e outros programas.
Quanto às políticas públicas de modo mais abrangente (não específicas do meio rural)
50% dos entrevistados conhecem Bolsa Família. Em São Miguel do Gostoso, os dados
coletados nos mostram que a realidade é outra, onde o Seguro Safra é o programa mais
conhecido entre os produtores. Todos os entrevistados (100%) conhecem esse programa, e em
seguida, vem o PRONAF, do qual 62,5% dos produtores já ouviram falar; em terceiro vem o
PNAE, 37%. Com 87,5%, o Seguro Safra é a política mais acessada, em seguida vem o
PRONAF e o PNAE com 25%, e 12,5%, respectivamente. Entre os agricultores que
participaram da pesquisa todos conhecem e são beneficiários do Bolsa Família.
Em João Câmara, os números de acesso preocupam, pois 77% dos assentados conhecem
o PRONAF, mas nenhum diz ter acessado o programa, e 22% conhecem o PAA, mas também
nenhum agricultor o acessou, e o PNAE, nenhum conhece ou acessa. Já o Segura Safra, 88%
conhecem e mas apenas 11% acessam.
Podemos considerar que os dados que demonstram o resultado quanto ao baixo acesso
ao acesso aos programas como PAA e PNAE, também devido ao fato de que, especificamente
no Assentamento Maria das Graças – João Câmara/RN, os assentados não puderam, até a data
da pesquisa, obter a autorização do órgão estadual Instituto de Desenvolvimento Sustentável e
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Meio Ambiente - IDEMA-RN para limpar o lote e cultivar. Razão porque as produções desta
comunidade serem inexpressivas, utilizadas apenas para o consumo, produto do cultivo de
áreas próximas às casas e de quintais.
Em Jandaíra, 77% dos entrevistados conhecem o PRONAF e 66% dizem ter acesso, já
os programas PAA e o PNAE são conhecidos pelo mesmo número na população pesquisada
(22%), mas o dado é que nenhum agricultor consegue acessá-los. Quanto ao Seguro Safra,
100% dos entrevistados têm conhecimento da sua existência e 55% têm acesso. Jandaíra
mostra também que cerca de 33% dos agricultores não acessam nenhuma política, nem
mesmo a política de transferência de renda do Bolsa Família.
Em Parazinho, 46% dos entrevistados conhecem o PRONAF, porém nenhum produtor
tem acesso; referente ao PAA, apenas 15% conhecem, e também nenhum acessa; o PNAE,
15% dos agricultores conhecem, mas outra vez nenhum agricultor acessou de fato; e, o
Seguro Safra, todos conhecem e 85% conseguem acesso.
O levantamento demonstrou que a falta de informação não é o único obstáculo para os
agricultores familiares acessarem essas políticas, pois das cinco cidades pesquisadas, apenas
uma, Pureza, tinha irrigação completa dos lotes, as outras 4 (São Miguel do Gostoso, João
Câmara, Jandaíra e Parazinho) não tinham irrigação, e devido aos quase 6 anos de seca
(baixos índices pluviométricos), a produção é quase zero, impossibilitando esses agricultores
de comercializar sua produção, não podendo acessar as políticas/programas de mercados
institucionais.
As OSCIPs (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), Organizações Não
Governamentais - ONGs e os Movimentos Sociais, em geral, mostram a sua importância na
divulgação das informações para a comunidade na área pesquisada. Em Pureza, São Miguel
do Gostoso e João Câmara, a maioria das políticas rurais chegam aos moradores através
dessas organizações. Quando as chamadas públicas são abertas, essas instituições e grupos se
empenham na organização das comunidades para cadastros de políticas; percebe-se que onde
essas entidades estão presentes a comunidade se torna mais articulada, como podemos
observar na comunidade rural de Bebida Velha, localizada no município de Pureza; onde se
encontravam associações e cooperativas junto às comunidades, todas conheciam as políticas
de acesso aos mercados institucionais e as acessavam.
O papel das lideranças no desenvolvimento comunitário
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Ao longo da pesquisa entrevistou-se também as lideranças de cada comunidade e assim
obtivemos respostas sobre o processo de fundação e organização política local. Em algumas
comunidades é notório que a mobilização social passou a ocorrer com menos intensidade nos
últimos tempos, resultado, em parte, por uma acomodação derivada da conquista da terra e de
demais bens e por outro lado, por falta de interesse sobre questões sociais e políticas públicas.
No entanto, as lideranças políticas das comunidades, que na maioria das vezes são os
presidentes das associações comunitárias, têm o papel de exercer, além da função
representativa, o caráter de formador/educador para que os moradores, associados jovens,
possam ter o mínimo de conhecimento sobre organização popular, que reivindica seus direitos
através do controle social. Isso não ocorre em algumas das comunidades pesquisadas.
Nas cidades de Jandaíra e Parazinho, por exemplo, pode-se notar um distanciamento das
lideranças com a comunidade, onde a maioria das pessoas só conheciam as políticas através
das instituições governamentais, como a EMATER e INCRA, quando essas iam aos
municípios realizar algum tipo de cadastro para o acesso às políticas, na parte dos mercados
institucionais (PAA, PNAE).
As dificuldades de acessar as políticas em todos os municípios são as mesmas, desde a
falta de informação para saber se a política existe e de como acessá-la, o processo burocrático
em si, os prazos e detalhamento das chamadas públicas (se for o caso), dentre outros. Alguns
produtores durante a pesquisa relataram um determinado “apadrinhamento político”, onde as
informações sobre editais e chamadas públicas são privilegiadas para alguns que têm algum
tipo de contato próximo com o poder público.
Além disso, os agricultores familiares entrevistados também reconhecem que sua
organização ainda é incipiente e de que não é interesse de toda a comunidade em participar
das reuniões das associações, onde essas informações são repassadas. Também foi observada
a falta de lideranças ativas nos assentamentos; nas entrevistas com presidentes de associações
e líderes de sindicatos, evidenciou-se um certo despreparo e falta de conhecimento da
importância do seu papel e o que lhe compete naquela comunidade, sendo que algumas das
lideranças, representantes das comunidades/assentamentos pesquisados, não residiam no
local, o que faz com que não entenda ou não esteja próximo das demandas locais.
Quando se pergunta sobre opinião dos produtores acerca das políticas acessadas e em
que elas poderiam ser melhoradas, os entrevistados retornavam a reclamar da falta de
informação, reforçando a ideia das fracas lideranças, mas os agricultores sugerem que o papel
é do governo em divulgar essas informações, de que as políticas existem e o que é preciso
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para acessá-las. Os entraves burocráticos muitas vezes é o que faz com que os agricultores
fiquem de fora das políticas, além de exigências pouco possível de realizar sem orientação
técnica.
5. Conclusões
Diante dos resultados obtidos e analisados chegamos à conclusão que os municípios
pesquisados – Jandaíra, João Câmara, Parazinho, Pureza e São Miguel do Gostoso – possui
um modelo de agricultura familiar ainda em desenvolvimento, sobretudo nos assentamentos
pesquisados.
Como apontado anteriormente, diversos fatores contribuem para tal cenário discutido
nesse trabalho, entre eles os poucos recursos disponíveis para que as famílias ampliem a
produção agrícola, como os baixos índices pluviométricos na região (típico do Semiárido),
baixo acesso aos recursos hídricos suficientes para irrigação, além da ausência da assistência
técnica. As condições de apoio à produção nos assentamentos da reforma agrária pesquisados
também são precárias, mesmo o assentamento mais jovem tendo em torno de 5 anos, as
famílias ainda aguardam pelas licenças para tratar a terra e produzir devidamente, além de
morosidade no acesso às políticas de fomento.
A consequência da baixa produtividade também se reflete na comercialização dos
produtos da agricultura familiar. No Mato Grande, os circuitos curtos de comercialização
composto em sua maioria por feiras livres representam grande parte dos pontos de
comercialização dos agricultores familiares entrevistados, porém, os atravessadores ainda
estão presentes na rede de comercialização.
Sobre o acesso às políticas como PAA, PNAE, PRONAF, chama a atenção a difusão
sobre a existência dessas políticas em todos os municípios pesquisados, porém, ao se tratar de
acesso, verificamos que os números ainda são muito baixos, sendo um desafio não apenas as
questões ligadas à produção, mas também à burocracia – editais, projetos, documentos – que
pode, de certa forma, afastar os produtores locais.
De modo geral, vimos que as comunidades e assentamentos sujeitos desse trabalho,
fazem ainda pouco uso das políticas públicas voltadas para o meio rural e que existem vários
gargalos que devem ser enfrentados para que possa ocorrer um pleno desenvolvimento local,
oportunizando uma ampliação e fortalecimento da agricultura familiar, a partir do suporte à
produção agrícola atrelada à sua comercialização, geração de renda e garantia de direitos.
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ANÁLISE DA OPERACIONALIZAÇÃO DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE
ALIMENTOS NO MUNICÍPIO DE LUCRÉCIA-RN
Grupo de Pesquisa: Políticas Públicas e Reforma Agrária José Marcione da Costa Mestrando do Programa de Pós-graduação em Administração e Desenvolvimento Rural / Universidade Federal Rural de Pernambuco [email protected] Abdon Silva Ribeiro da Cunha Doutorando do Programa de Pós-graduação em Administração - Universidade Federal do Rio Grande do Norte / Professor substituto do IFRN [email protected] Letícia Alves de Melo Mestranda do Programa de Pós-graduação em Administração e Desenvolvimento Rural / Universidade Federal Rural de Pernambuco [email protected] Tales Wanderley Vital Doutor em Economia / Prof. Do Programa de Pós-graduação em Administração e Desenvolvimento Rural / Universidade Federal Rural de Pernambuco [email protected] Resumo As políticas públicas destinadas à agricultura familiar sempre foram objeto de grandes discussões tanto no meio social como no acadêmico. Assim, devido a isso, atentou-se para tal temática para ser discutida neste trabalho que tem como objetivo principal analisar a operacionalização do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) no município de Lucrécia-RN sob a ótica do gestor local e dos agricultores beneficiários fornecedores do programa. A metodologia empregada neste trabalho foi sustentada no método qualitativo em relação ao processo, exploratório e descritivo quanto aos objetivos e um estudo de caso quanto a sua modalidade. O instrumento de coleta de dados utilizado na pesquisa, no caso a entrevista, levantou informações referentes tanto à forma de atuação do programa no município como também a percepção da execução do PAA de acordo com os beneficiários fornecedores. Constatou-se por meio da pesquisa de campo que no município de Lucrécia-RN o PAA apresenta importantes resultados tanto em termos de geração de renda quanto na melhoria da qualidade de vida para as famílias dos beneficiários fornecedores, caracterizando-se como um programa de elevada relevância para os agricultores pesquisados. Palavras-chave: Políticas públicas. Programa Aquisição de Alimentos. Agricultura familiar.
ANALYSIS OF FOOD ACQUISITION PROGRAM OPERATIONALIZATION IN MUNICIPALITY OF LUCRÉCIA-RN
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Abstract Public policies for family farming have always been the main object for discussions as in the social media as the academic. Consequently, because of this, it was decided to write down about this topic for being discussed in this work that has as main aim to analyze the implementation of the Food Acquisition Program (PAA) in Lucrécia-RN city from the perspective of the local manager and beneficiary farmers program suppliers. The methodology used in this work was supported in the qualitative method in relation to the process exploratory and descriptive about the objectives, and a case study as its modality. The data collection instrument used in the research, specifically in the interview, raised information both about form of program activities in the municipality as well as the perception of PAA implementation agreement with beneficiaries suppliers. It was found by means of field research, that in municipality Lucrécia/RN, the PAA presents important results both in terms of generating income and improving the quality of life for families suppliers beneficiaries, characterizing itself as a high-program relevant to the surveyed farmers. Key words: Public Policy, Food Acquisition Program, Family Agriculture.
1. Introdução A partir de meados dos anos 1990, o meio rural brasileiro passou por um conjunto de
expressivas transformações no que se refere à construção de políticas públicas destinadas a
agricultura familiar, sendo que até aquela época este termo sequer existia tendo em vista que
essa classe social era normalmente conceituada como agricultores de subsistência, produtores
familiares ou pequenos produtores.
Traçando de forma breve o cenário existente até então, baseando-se no pensamento de
Mattei (2014), pode-se afirmar que os agricultores familiares eram ainda um segmento social
que estava à margem dos debates da agenda governamental brasileira em se tratando da
formulação de políticas públicas de grande abrangência.
Segundo Müller (2007) o que existia até então eram algumas ações de apoio
promovidas pelo Estado que visavam incentivar a produção por meio da concessão de crédito,
garantir a renda dos produtores por meio da Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM),
promover a inovação científica e tecnológica em parceira com a Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e prestar assistência técnica especializada por meio do
Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER).
Esse contexto começou a ser transformado a partir do momento em que os atores sociais
rurais, dentre eles os trabalhadores rurais ligados à Confederação Nacional dos Trabalhadores
da Agricultura (CONTAG) e ao Departamento Nacional de Trabalhadores Rurais da Central
Única dos Trabalhadores (DNTR/CUT) passaram a reivindicar do Estado a formulação de
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políticas de desenvolvimento consistentes para os pequenos produtores rurais (SCHNEIDER,
CAZELLA e MATTEI, 2004).
Assim, como uma resposta as reivindicações do movimento sindical rural, foi criado o
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). O PRONAF
representa um importante marco, uma legitimação da categoria dos agricultores familiares que
por muitos anos lutaram pelo o seu reconhecimento. Como afirmaram Schneider, Cazella e
Mattei (2004, p. 23), "o programa nasceu com a finalidade de prover crédito agrícola e apoio
institucional aos pequenos produtores rurais que vinham sendo alijados das políticas públicas
até então existentes e encontravam sérias dificuldades de se manter no campo". Além do
PRONAF, destaca-se entre as políticas de desenvolvimento rural a criação do Programa de
Aquisição de Alimentos (PAA), programa esse que se constitui como o objeto de pesquisa do
presente trabalho.
O PAA foi instituído pela Lei 10.696, de 02 de julho de 2003 tendo sido criado dentro
de um amplo conjunto de políticas que estruturavam o Programa Fome Zero (PFZ). O PAA
surgiu “com a finalidade de incentivar a agricultura familiar, compreendendo ações
vinculadas à distribuição de produtos agropecuários para pessoas em situação de insegurança
alimentar e à formação de estoques estratégicos.” (BRASIL, 2003). Perante esse contexto,
emerge a importância da avaliação das políticas públicas e programas governamentais, pois,
por meio dessas avaliações torna-se possível identificar anomalias que possam comprometer a
eficiência dos gastos públicos.
Assim, diante do exposto, surge a indagação norteadora desta pesquisa: qual a
percepção do gestor local e dos beneficiários fornecedores da operacionalização do Programa
de Aquisição de Alimentos (PAA) no município de Lucrécia-RN?
Com o intuito de responder a problemática deste trabalho foi determinado como
objetivo geral da pesquisa analisar a operacionalização do Programa de Aquisição de
Alimentos (PAA) no município de Lucrécia-RN sob a ótica do gestor local e dos agricultores
beneficiários fornecedores do programa. Para se alcançar o objetivo geral, foram
estabelecidos como objetivos específicos: verificar a forma de atuação do PAA no município
de Lucrécia-RN, caracterizar o perfil dos beneficiários fornecedores e identificar possíveis
benefícios e deficiências do programa como forma de acompanhamento e avaliação da
política pública.
Portanto, com o intuito de responder a indagação apresentada nesta pesquisa, este artigo
estruturou-se em cinco tópicos incluindo a presente introdução. No tópico dois, buscou-se
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uma discussão teórico-conceitual a respeito de dois temas, sendo eles: Políticas Públicas:
origem, principais precursores e conceitos básicos e Agricultura Familiar e o PAA. No
terceiro abordam-se os principais aspectos metodológicos que caracterizaram este trabalho,
incluindo o tipo de pesquisa e os principais instrumentos e técnicas de coleta e análise dos
dados. O quarto tópico dedica-se a apresentação e análise dos resultados da pesquisa e, no
quinto e ultimo capítulo deste artigo, são apresentadas às considerações finais a respeito deste
trabalho.
2. Referencial Teórico 2.1. Políticas Públicas: origem, principais precursores e conceitos básicos
Tratando da origem da área de políticas públicas, Souza (2006) esclarece que ela surgiu
nos Estados Unidos da América (EUA) por meio do desenvolvimento de estudos que tinham
como propósito verificar a atuação dos governos, enquanto que na Europa a preocupação
maior ainda estava em teorizar o papel do Estado e do governo. Esse período em que se
realizaram esses estudos iniciais sobre a ação dos governos nos EUA confunde-se também
com a época da introdução dessa matéria como tema tratado em disciplinas acadêmicas nas
universidades americanas, podendo-se concluir diante disso que o início dos estudos relativos
a esta área e sua adoção nos bancos universitários ocorreram quase que concomitantemente.
Quanto aos precursores do campo das políticas públicas, Souza (2006) destaca quatro
nomes como os mais importantes para o desenvolvimento da área no decorrer dos anos, sendo
eles: Harold D. Laswell, Hebert Simon, Charles E. Lindblom e D. Easton. As contribuições
que cada um desses estudiosos ofereceu serão resumidamente apresentadas no quadro 1 a
seguir:
Quadro 1: Principais precursores da área de políticas públicas
PRECURSOR CONTRIBUIÇÃO
Harold D. Laswell (1936)
“introduz a expressão policy analysis (análise de política pública), ainda nos anos 30, como forma de conciliar conhecimento científico/acadêmico com a produção empírica dos governos e também como forma de estabelecer o diálogo entre cientistas sociais, grupos de interesse e governo.” (SOUZA, 2006, p. 23).
Herbert A. Simon (1957)
“introduziu o conceito de racionalidade limitada dos decisores públicos
(policy makers), argumentando, todavia, que a limitação da racionalidade poderia ser minimizada pelo conhecimento racional.” (SOUZA, 2006, p.
23).
Charles E. Lindblom (1959; 1979)
“questionou a ênfase no racionalismo de Laswell e Simon e propôs a
incorporação de outras variáveis à formulação e à análise de políticas públicas, tais como as relações de poder e a integração entre as diferentes fases do processo decisório o que não teria necessariamente um fim ou
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um princípio.” (SOUZA, 2006, p. 24).
D. Easton (1965) “contribuiu para a área ao definir a política pública como um sistema, ou
seja, como uma relação entre formulação, resultados e o ambiente.” (SOUZA, 2006, p. 24).
Fonte: Elaborado pelos autores
No que se refere aos conceitos básicos de políticas públicas, para que se tenha uma
melhor compreensão do seu significado, faz-se necessário o esclarecimento de dois termos
oriundos da língua inglesa que elucidam de forma prática e conceitual o complexo processo
de elaboração e implantação de políticas públicas, sendo eles politics e policy. Esses dois
termos, apesar de possuírem sentidos teóricos distintos, se complementam na prática e se
referem a duas dimensões de significação que são essenciais para a compreensão dos estudos
das políticas públicas, sendo elas a dimensão processual e material respectivamente.
A dimensão processual (politics) envolve questões como as reinvindicações dos atores
sociais, o debate dos parlamentares a respeito das exigências feitas pela sociedade, o diálogo
entre os grupos de trabalhos constituídos pelos protestantes, os representantes do governo e os
congressistas, enfim, todo o ciclo de discussão que é construído com o objetivo de
reestabelecer a ordem social e encerrar às relações conflituosas (RUA, 2012). Já a dimensão
prática ou material (policy), conforme explica Rua (2012, p. 17), “significa a atividade do
governo de desenvolver políticas públicas, a partir do processo da política.” Diante disso,
pode-se concluir que a atividade política (politics) se refere às questões mais abstratas,
enquanto que o desenvolvimento de políticas públicas (policys) é inerente aos conteúdos
concretos da política, as ações e as decisões tomadas (ou não tomadas) para a resolução dos
conflitos e da desordem existente na sociedade.
Assim, perante esse contexto, conceituando políticas públicas, segundo Gerston (1997
apud CAVALCANTI, 2007, p. 22) ela é definida como a:
[...] combinação de decisões básicas, compromissos, e ações feitos por esses que ocupam ou afetam as posições de autoridade no governo. Na maioria dos exemplos, estes arranjos são os resultados de interações entre esses que exigem mudança, entre os que tomam decisões, e pelos que são afetados pela política em questão. As determinações feitas por esses em posições de autoridade legítima – geralmente, em um ou mais de um escritório públicos no governo – está sujeito a um possível redirecionamento em resposta a pressões do que estão fora do governo como também de outros dentro de governo.
Outro conceito de política pública é apresentado por Parra Ramirez (2003, p. 104) ao
afirmar que “a política pública traduz a ação das autoridades públicas no interior da
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sociedade, a qual é por sua vez transformada em programas governamentais.”1 Enquanto o
primeiro autor enfatiza mais o processo desde a formulação até implantação de políticas
públicas como algo interativo entre todos os atores envolvidos, o segundo já expõe o seu
pensamento de uma forma mais objetiva, traduzindo a ação do governo na sociedade por meio
da implantação de programas de interesse social.
Portanto, pode-se concluir que as políticas públicas como um instrumento de ação do
Estado são utilizadas para manter a ordem social, sendo a mais legitima forma de expressão
do Estado em ação e, como área de conhecimento, as políticas públicas representam a análise
e o debate crítico das ações governamentais.
2.2. Agricultura Familiar e o Programa de Aquisição de Alimentos
Para fins deste trabalho, de forma prática e objetiva, será adotado o conceito de
agricultor familiar, aquele expresso na Lei nº 11.326 de 24 de julho de 2006, que estabelece as
diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos
Familiares Rurais. O artigo fundamental da lei que caracteriza os agricultores familiares é
apresentado a seguir com os seus respectivos incisos:
Art. 3o Para os efeitos desta Lei, considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos: I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo; IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família. (BRASIL, 2006).
No Brasil diversas políticas públicas foram criadas nos últimos anos com o intuito de
fomentar o desenvolvimento socioeconômico do agricultor familiar. Citando algumas delas
pode-se destacar o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), o Programa de
Garantia da Atividade Agropecuária (PROAGRO), o Programa de Garantia de Preços para a
Agricultura Familiar (PGPAF), o PRONAF, o Programa Garantia Safra que é uma ação do
PRONAF, dentre outros. No entanto, este trabalho limitar-se-á ao aprofundamento do PAA.
1 Texto traduzido da versão original pelos autores do trabalho.
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Assim, dando maior ênfase ao PAA, devido ao fato deste programa ser o objeto de
estudo deste trabalho, têm-se que suas finalidades são segundo Brasil (2014):
I - incentivar a agricultura familiar, promovendo a sua inclusão econômica e social, com fomento à produção com sustentabilidade, incentivo ao processamento da produção e à geração de renda; II - incentivar o consumo e a valorização dos alimentos produzidos pela agricultura familiar; III - promover o acesso à alimentação, em quantidade, qualidade e regularidade necessárias, às pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional, sob a perspectiva do direito humano à alimentação adequada e saudável; IV - promover o abastecimento alimentar por meio de compras governamentais, inclusive para prover a alimentação escolar, quando necessário, nos âmbitos municipal, estadual, distrital e federal, e nas áreas abrangidas por consórcios públicos; V - constituir estoques públicos de alimentos produzidos por agricultores familiares; VI - apoiar a formação de estoques pelas cooperativas e demais organizações formais da agricultura familiar; VII - fortalecer circuitos locais e regionais e redes de comercialização; VIII - promover e valorizar a biodiversidade e a produção orgânica e agroecológica de alimentos, incentivar hábitos alimentares saudáveis em nível local e regional; e IX - estimular o cooperativismo e o associativismo. (BRASIL, 2014)
Fazendo uma breve análise das finalidades do programa, pode-se perceber o destaque
dado ao incentivo e a manutenção da produção realizada pelos pequenos agricultores e
também a necessidade de promover a segurança alimentar e nutricional das pessoas em
situação de insegurança alimentar.
Com o intuito de facilitar todo o processo logístico de escoamento da produção e
controlar a comercialização dos produtos, o programa foi dividido em algumas modalidades
que se distinguem quanto aos bens praticados nas operações bem como quanto aos
fornecedores que podem ser individuais ou cooperativas. A denominação e uma breve
descrição dos objetivos e da forma de operação de cada uma das modalidades do programa
são apresentadas no quadro 2 a seguir:
Quadro 2: Modalidades do programa de aquisição de alimentos MODALIDADE OBJETIVOS E FUNCIONAMENTO
Compra com Doação Simultânea
Compra de alimentos diversos e doação simultânea às entidades da rede socioassistencial, aos equipamentos públicos de alimentação e nutrição e, em condições específicas definidas pelo Grupo Gestor do Programa de Aquisição de Alimentos - GGPAA, à rede pública e filantrópica de ensino, com o objetivo de atender demandas locais de suplementação alimentar de pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional.
Incentivo à Produção e ao
Consumo de Leite
Compra de leite que, após processamento, é doado aos beneficiários consumidores com o objetivo de atender às demandas locais de suplementação alimentar de pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional. Esta modalidade é executada somente nos estados do Nordeste e no norte de Minas Gerais.
Compra Direta Compra de produtos definidos pelo GGPAA, com o objetivo de sustentar preços,
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atender às demandas de programas de acesso à alimentação, às necessidades das redes socioassistenciais e para constituir estoques públicos.
Apoio à Formação de Estoques
Apoio financeiro para a constituição de estoques de alimentos por organizações fornecedoras, para posterior comercialização e devolução de recursos ao poder público ou destinação aos estoques públicos.
Compra Institucional
Aquisição voltada para o atendimento às demandas de consumo de alimentos por parte da união, estados, distrito federal e municípios, com recursos financeiros próprios. Por esta modalidade poderão ser abastecidos hospitais públicos, quartéis, presídios e restaurantes universitários, dentre outros.
Fonte: Elaborado pelos autores com base em Brasil (2014)
Por fim, classificando o público beneficiário do PAA, ele se subdivide em dois, sendo
eles os beneficiários fornecedores e os beneficiários consumidores. Os primeiros são os
agricultores familiares que produzem os produtos fornecidos ao programa, sendo que eles
participam de forma individual ou por meio das cooperativas das quais fazem parte e o
segundo grupo é composto pelas pessoas que se encontram em situação de insegurança
alimentar e são atendidos pela rede socioassistencial do programa (BRASIL, 2012).
3. METODOLOGIA DA PESQUISA Nesta seção são apresentadas as questões relativas aos procedimentos metodológicos
utilizados nesta pesquisa, caracterizando o tipo da pesquisa, os sujeitos pesquisados, os
instrumentos e técnicas de coleta de dados e as técnicas de análise dos dados.
Assim, caracterizando a pesquisa, no que se refere ao seu tipo, este estudo pode ser
considerado predominantemente qualitativo quanto ao seu método. De acordo com Collis e
Hussey (2005, p. 26) o método qualitativo “é mais subjetivo e envolve examinar e refletir as
percepções para obter um entendimento de atividades sociais e humanas”. Vale considerar
que neste estudo serão apresentados alguns gráficos que expõem dados quantitativos, porém a
análise desses dados sob uma perspectiva da compreensão do fenômeno estudado faz com que
a pesquisa não perca a tipologia aqui determinada.
Quanto aos objetivos, pode-se considerar uma pesquisa descritiva, tendo em vista que
procurou descrever com um elevado grau de profundidade as principais características de um
fenômeno e de uma determinada realidade (ANDRADE, 2009).
No que concerne a sua modalidade, pode-se caracteriza-la como um estudo de caso que,
segundo Gil (2009, p. 58) “é caracterizado pelo estudo profundo e exaustivo de um ou de
poucos objetos, de maneira a permitir o seu conhecimento amplo e detalhado, tarefa
praticamente impossível mediante os outros tipos de delineamentos considerados”. Assim, no
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contexto deste trabalho, o objeto que será aprofundado trata-se do PAA no município de
Lucrécia-RN.
Já no que diz respeito às técnicas e instrumentos de coleta de dados, considera-se que
este estudo foi dividido em duas etapas, sendo a primeira delas direcionada ao gestor local do
PAA no município pesquisado e a segunda com os beneficiários fornecedores do programa,
conforme detalhado a seguir.
Na primeira etapa foi realizada uma entrevista semiestruturada com a técnica da
EMATER no município de Lucrécia-RN com o objetivo de levantar informações referentes à
forma de atuação do PAA. A entrevista seguiu um roteiro pré-estabelecido, fato que não
justifica o rígido seguimento da ordem determinada, sendo que no decorrer da conversa
poderia existir a abertura para outros questionamentos que surgissem em decorrência do
roteiro, porém sem perder o foco central da investigação.
Dentre os temas que compuseram o roteiro da entrevista na primeira etapa do
levantamento dos dados pode-se citar a relação do entrevistado com o programa por meio do
seu tempo de atuação e suas atribuições, o histórico do PAA no município, como se deu o
processo de implantação do programa, as modalidades do programa, os gêneros alimentícios
adquiridos, as instituições beneficiadas, os valores que já foram transferidos aos beneficiários
e outros aspectos que caracterizam o PAA. O roteiro da entrevista foi estabelecido com base
no manual operativo do programa (BRASIL, 2014).
Na segunda parte também foi utilizada a entrevista para a coleta dos dados. O roteiro da
entrevista foi composto por 16 questões, sendo que nesta fase os sujeitos entrevistados foram
os beneficiários fornecedores do programa PAA. Destaca-se ainda que as entrevistas foram
realizadas entre os dias 10, 11 e 12 de novembro de 2015 com seis agricultores, sendo que
esses foram codificados no texto como A, B, C, D, E e F. O roteiro da entrevista foi
seccionado em seis módulos, conforme o quadro 3:
Quadro 3: Módulos constituintes do roteiro das entrevistas feitas aos beneficiários fornecedores
MÓDULO TEMÁTICAS QUESTÕES
Módulo 1 Caracterização do Perfil dos
Beneficiários
1 - Gênero; 2 - Idade; 3 - Estado civil; 4 – Número de membros da família; e 5 - Escolaridade.
Módulo 2 Caracterização da Propriedade 6 - Tamanho da área; e 7 - Forma de apropriação da terra.
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Módulo 3 Avaliação Econômica 8 - Aumento da renda; e 9 - Preços pagos pelos produtos.
Módulo 4 Avaliação Social
10 - Melhoria na qualidade de vida; e 11 - Melhoria na dieta alimentar.
Módulo 5 Avaliação Política
12 - Importância desse tipo de política; e 13 - Necessidade de continuidade do programa.
Módulo 6 Avaliação Geral do Programa
14 - Pontos negativos; 15 - Pontos positivos; e 16 - Satisfação de um modo geral.
Fonte: Elaborado pelos autores
Para a elaboração do roteiro da entrevista, o manual operativo do PAA (BRASIL, 2014)
também foi a referencia basilar para a constituição das perguntas direcionadas aos
beneficiários fornecedores do programa.
No que concerne à forma de tratamento e análise dos dados, na primeira etapa desta
pesquisa na qual foi realizada uma entrevista semiestruturada com o gestor local do programa,
foi realizada a análise de conteúdo e na segunda etapa na qual foram realizadas entrevistas
com os beneficiários fornecedores do programa, fez-se uso da estatística descritiva e da
análise de conteúdo. Caracterizando a estratégia de análise de conteúdo, Mozzato e
Grzybovski (2011, p. 734) afirmam que “é um conjunto de técnicas de análise de
comunicações, que tem como objetivo ultrapassar as incertezas e enriquecer a leitura dos
dados coletados”. Assim, pode-se entender que a análise de conteúdo tem como fim dar
sentido ao que é comunicado, buscando-se identificar de maneira critica o que foi dito.
4. ANÁLISE DOS RESULTADOS Este capítulo tem o objetivo de analisar e discutir os dados coletados na pesquisa. Como
informado anteriormente, será utilizada a técnica de análise de conteúdo e estatística
descritiva e o capítulo será dividido em duas partes, sendo que a primeira objetiva caracterizar
a forma de atuação do programa no município e a segunda busca verificar a execução do PAA
sob a ótica dos beneficiários fornecedores.
4.1 Características de Atuação do PAA de Acordo com o Gestor Local
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Para caracterizar a forma de atuação do PAA no município de Lucrécia-Rn foi realizada
uma entrevista com Francisca Juliane Soares de Rezende que ocupa o cargo de Analista em
Extensão Rural, lotada na EMATER do município de Lucrécia-RN desde dezembro de 2010.
Quanto as suas atribuições no PAA deste município ela informou que é responsável por
cadastrar os agricultores interessados em fornecer seus produtos oriundos da agricultura
familiar, coletar os dados de produção e documentação geral – DAP, RG, CPF, comprovante
de residência e elaborar planilhas de empenho.
Quando indagada sobre o período em que o PAA foi implantado no município de
Lucrécia-RN Juliane afirmou que não sabia ao certo, pois não trabalhava no município na
época. Mas acreditava que a primeira vez que o programa começou a operar foi no ano de
2006 por meio da prática da modalidade compra direta. Informou ainda que o processo de
implantação se deu através de parceria entre a prefeitura municipal, a EMATER, associações
locais e as entidades recebedoras, e que atualmente o programa opera com as modalidades
compra direta e compra com doação simultânea.
No que se refere às instituições beneficiadas com os alimentos adquiridos por meio do
programa, Juliane informou que são as escolas da rede estadual e municipal, entidades
socioassistenciais e o hospital do município. Essas instituições recebem gêneros alimentícios
como carne bovina, caprina, ovina e de aves, e também frutas, verduras e hortaliças.
Por fim, quanto à logística de distribuição dos produtos, Juliane afirmou que:
A compra e a entrega dos produtos são feitos na Central de recebimento. É um local cedido pela prefeitura devidamente identificado com uma placa e com equipamentos tais como, balança, freezer e outros utensílios. Os agricultores são informados sobre a quantidade de produtos a serem entregues semanalmente e o horário da entrega. As entidades beneficiadas são informadas quanto ao dia e a hora da entrega dos produtos e são responsáveis por irem buscá-los na central. (FALA DE JULIANE).
4.2 Execução do PAA Sob a Ótica dos Beneficiários Fornecedores Incialmente buscou-se fazer uma caracterização do perfil dos beneficiários fornecedores
do PAA no município de Lucrécia-RN, levantando dados a respeito do gênero, idade, estado
civil, número de membros da família e grau de escolaridade. Quanto a esses questionamentos
foram obtidos os resultados que serão apresentados nas tabelas a seguir.
Na tabela 1 apresenta-se a distribuição dos agricultores pesquisados quanto ao gênero,
conforme mostrado a seguir:
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Tabela 1: Gênero dos beneficiários fornecedores do PAA Gênero
Masculino 4 Feminino 2
Total 6 Fonte: Elaborado pelos autores
De acordo com a tabela 1 percebe-se que há uma maioria de agricultores do sexo
masculino, sendo quatro entre os seis entrevistados. Além disso, foi possível identificar no
processo da pesquisa que, apesar de ser o nome da mulher cadastrado no programa, o homem
que executa efetivamente as atividades de produção no campo.
A tabela 2 faz uma análise quanto ao gênero e idade dos agricultores entrevistados,
conforme exposto a seguir:
Tabela 2: Idade dos beneficiários fornecedores do PAA Idade Gênero Até 19 anos
De 20 a 29 anos
De 30 a 39 anos
De 40 a 49 anos
A partir de 50 anos Frequência
Masculino 0 0 1 3 0 4 Feminino 0 0 1 1 0 2
Total 0 0 2 4 0 6 Fonte: Elaborado pelos autores
Observa-se na tabela 2 que dos seis entrevistados, dois estão entre a faixa etária de 30 a
39 anos e os outros quatro estão entre 40 e 49 anos. Esse fato pode ser justificado por ser a
faixa etária compreendida entre os 30 e 50 anos, um período no qual as pessoas já estão
vivendo de forma independente, ou seja, já constituíram suas famílias e ainda não estão
aposentados. Desta forma, buscam a agricultura como uma forma de obter a renda necessária
para a manutenção das famílias.
A seguir, a tabela 3 apresenta a distribuição dos agricultores conforme informações
coletadas na pesquisa no que se refere ao estado civil e gênero:
Tabela 3: Estado civil dos beneficiários fornecedores do PAA Est. Civil Gênero
Solteiro(a) Casado(a) Divorciado(a) Viúvo(a) União
Estável Frequência
Masculino 0 3 0 0 1 4 Feminino 0 2 0 0 0 2
Total 0 5 0 0 1 6 Fonte: Elaborado pelos autores
Por meio da análise da tabela pode-se verificar que nenhum dos entrevistados da
pesquisa possui o estado civil de solteiro(a), fato que é considerado comum em pequenas
comunidades rurais, considerando que todos os entrevistados residiam na zona rural do
município de Lucrécia-RN. Acrescenta-se a isso o estimulo do desejo de se projetar algo em
família.
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Dando continuidade a caracterização do perfil dos agricultores, a tabela 4 a seguir
apresenta o número de membros das famílias de cada um dos entrevistados e também uma
média geral das famílias:
Tabela 4: Número de membros na família dos beneficiários fornecedores do PAA Número de Membros na Família
Agricultora A 2 pessoas Agricultora B 3 pessoas Agricultor C 5 pessoas Agricultor D 4 pessoas Agricultor E 3 pessoas Agricultor F 4 pessoas
Média 3,5 pessoas Fonte: Elaborado pelos autores
Quanto ao número de membros nas famílias dos agricultores, percebe-se que há uma
influência do atual contexto familiar existente em todo o mundo, no qual existe uma tendência
para a constituição de famílias com um baixo número de membros. Esse fato se confirma por
meio da verificação da média obtida entre as famílias que foi de 3,5 pessoas.
Finalizando a caracterização do perfil dos beneficiários fornecedores do PAA no
município de Lucrécia-RN, foram foi analisada a variável gênero x grau de escolaridade,
conforme apresentado na tabela 5, a seguir:
Tabela 5: Grau de escolaridade dos beneficiários fornecedores do PAA
Escolaridade Gênero
Pri
már
io
Inc.
(1ª
a 7
ª sé
rie)
Pri
. Com
. (1
ª a
8ª s
érie
)
Méd
io I
mc.
(1
ª e 2
ª sé
rie)
Méd
io
Com
p. (
1ª a
3ª
sér
ie)
Supe
rior
In
com
plet
o
Supe
rior
C
ompl
eto
Fre
quên
cia
Masculino 3 0 1 0 0 0 4 Feminino 0 0 0 1 0 1 2
Total 3 0 1 1 0 1 6 Fonte: Elaborado pelos autores
Em relação ao grau de escolaridade dos beneficiários fornecedores, foi constatado um
fato interessante resultante do cruzamento dos dados relativos ao gênero e grau de
escolaridade dos sujeitos entrevistados. Analisando a tabela 5 pode-se constatar que, enquanto
os quatro agricultores do gênero masculino não concluíram o ensino médio, sendo que três
desses cursaram apenas o primário de forma incompleta, as duas agricultoras tiveram uma
vida estudantil mais prolongada, tendo uma delas concluído o ensino médio e a outra o ensino
superior. Como informado anteriormente que as duas beneficiárias apenas tem o seu nome
cadastrado, mas que os seus cônjuges exercem as atividades de produção, pode-se concluir
que a jornada de trabalho no campo dificulta o processo de aprendizagem dos agricultores do
sexo masculino, caso que culmina com a desistência da vida escolar.
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Também se considerou pertinente o levantamento de informações inerentes à
caracterização da propriedade na qual os agricultores trabalham, questionando quanto ao
tamanho da área e a forma de apropriação da terra, obtendo-se os resultados a seguir:
A tabela 6 apresenta a área das propriedades nas quais os beneficiários fornecedores do
PAA em Lucrécia-RN exercem suas atividades de produção:
Tabela 6: Área da propriedade dos beneficiários fornecedores do PAA Área da Propriedade
Agricultora A 7,5 hectares Agricultora B 5 hectares Agricultor C 25 x 35 metros Agricultor D 20 hectares Agricultor E 18 hectares Agricultor F 1 hectare
Fonte: Elaborado pelos autores
Percebe-se que há uma grande variação em relação às áreas das propriedades dos
agricultores. Esse fator pode se relacionar com os gêneros alimentícios que são oferecidos por
cada um dos beneficiários fornecedores, ou seja, aqueles que possuem uma área da
propriedade menor podem produzir hortaliças. Já aqueles que trabalham em áreas maiores,
podem criar rebanhos bovinos ou caprinos, por exemplo.
E quanto à forma de apropriação das terras, a tabela 7 a seguir expõe as informações
obtidas nas entrevistas:
Tabela 7: Forma de apropriação da terra dos beneficiários fornecedores do PAA Forma de Apropriação da Terra
Própria 3 Arrendada 3
Total 6 Fonte: Elaborado pelos autores
Verifica-se na tabela 7 que, em relação à forma de apropriação das terras nas quais os
beneficiários fornecedores produzem os gêneros alimentícios que são distribuídos para o
PAA, três deles ou são proprietários da terra ou pertencem ao pai ou mãe. Nessas situações
também foi considerado como própria. Os outros três agricultores trabalham em terras
arrendadas, com acordos firmados de maneira informal.
Nesta etapa do estudo, as análises são direcionadas para o diagnóstico da variável
econômica do PAA, sendo que se buscou verificar o impacto do programa quanto ao aumento
da renda e aos preços pagos pelos produtos.
No que se refere ao aumento da renda, é evidente o impacto positivo causado pelo
programa na vida dos agricultores. As citações a seguir revelam o ponto de vista dos
agricultores entrevistados:
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Com certeza sim. Rapaz melhorou bastante depois do compra direta por que era uma renda que a gente arrumou que não tinha antes né. Por que hoje em dia aqui no setor da gente que vive diretamente da agricultura praticamente se for só da agricultura de que produz morre de fome porque não tem. Serviu de ajuda pra nós. Uma ajuda grande do compra direta2 por que é uma coisa que a gente vende o que tem. Por exemplo: mamão, um pezinho de jerimum que eu tinha aqui e vendi, manga, hortaliça, coente, alface a gente planta ali. Muito bom (AGRICULTOR E).
Outro agricultor ainda afirmou o seguinte: “Com certeza. Melhorou muito. Me ajudou
muito. Melhorou minha renda certo, meu custo de vida. Ficou mais fácil com esse programa”
(AGRICULTOR D).
Quanto aos preços pagos pelo programa houve alguns pontos de divergência nas falas
dos agricultores. Nas palavras de um dos agricultores os preços pagos deveriam ser mais
elevados devido ao fato de não se utilizar agrotóxicos na produção dos alimentos: “No meu
caso não é não por que a gente trabalha sem nenhum tipo de veneno ai tem que vender pelo
preço dos outro. Quer dizer que no meu caso não é justo não por que tinha que ser pelo ao
menos um pouco a mais né.” (AGRICULTOR F). Em contrapartida, outros agricultores
consideram os preços justos e melhores do que os praticados no mercado, conforme fala a
seguir: “É justo os preços. É bem melhor que o mercado.” (AGRICULTOR B).
Objetivou-se também avaliar a efetividade do programa quanto ao seu aspecto social,
verificando o seu impacto quanto a melhoria da qualidade de vida e da dieta alimenta dos
beneficiários fornecedores do PAA no município de Lucrécia-RN.
Quanto à melhoria da qualidade de vida, foi constado que o programa proporcionou
algumas conquistas para as famílias dos beneficiários fornecedores que influenciaram
positivamente suas vidas quanto a este aspecto. O agricultor C fez a seguinte declaração:
Teve. Como melhorou a renda né. Nós tivemos condições de conquistar algumas coisinhas né? Houve um aumento na feira mensal, conseguimos adquirir alguns móveis pra casa como trocar de geladeira, um freezer por que nós também trabalhamos com a produção de polpa. (AGRICULTOR C).
Contribuindo para uma avaliação positiva do impacto do programa quanto à melhoria
da qualidade de vida, também vai de encontro à afirmação anterior a fala do agricultor F, que
disse o seguinte: “Sim, melhorou muito. Até ajudou a eu construir uma casinha na rua. Mudou
muita coisa, ajudou eu a comprar uma moto. Tudo através desse programa.” (AGRICULTOR,
2 Torna-se oportuno esclarecer que quando os agricultores se referem ao Programa de Aquisição de Alimentos eles mencionam a modalidade do programa, no caso compra direta, e não o PAA como um todo.
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F). Quanto a esse aspecto apenas a agricultora A fez um relato negativo, afirmando que: “Se
fosse uma coisa constante né? Mas não alterou muita coisa não.” (AGRICULTORA A).
No que concerne à melhoria na dieta alimentar da família dos agricultores entrevistados,
com exceção da agricultora A que afirmou simplesmente que “Não.”, as falas dos demais
agricultores convergem para a construção do sentido de que o programa os incentivou a
produzir mais, assim eles também consomem dos alimentos que produzem. A fala a seguir
expõe esse sentido: “Sim, proporcionou. Por que ai no que a gente planta e vende sempre vai
se alimentando também do que planta né, do que produz.” (AGRICULTOR E).
Considerou-se ainda relevante fazer uma avaliação política do PAA, levando em conta a
importância desse tipo de política pública na visão dos beneficiários fornecedores e a
necessidade de continuidade do programa para as famílias dos agricultores pesquisados.
Em relação à importância desse tipo de política pública, o agricultor D colocou em
destaque o incentivo que o programa proporciona para a continuidade da produção no campo,
conforme relato a seguir: “Por que é uma chance que a gente não tinha antes né. E ai é uma
chance pra gente desenvolver e plantar. Fez um incentivo pra gente plantar mais, pra gente ter
uma renda melhor né.” (AGRICULTOR D).
Já o agricultor E, pôs em pauta a geração de renda ocasionada por meio do PAA, como
apresentado a seguir: “Rapaz a importância é a renda que gera, uma rendinha a mais. Por que
o meio de vida pra nós é difícil agora na seca né, ai o compra direta é um ganho extra que a
gente não tem.” (AGRICULTOR E).
Quando indagados sobre a necessidade de continuidade do programa os agricultores
foram unanimes em afirmar que existe a necessidade de continuação do PAA, principalmente
por proporcionar uma rota de comércio, um mercado garantido para os produtos oriundos da
agricultura familiar. A agricultora A relatou o seguinte: “Eu acredito que sim por que você
produz e já tem o destino certo de sua produção né, que vai ser garantido na compra.”.
Também ressaltando esse aspecto, o agricultor E afirmou que:
É necessário e muito importante homi. É por que ajuda muito como eu tô falando a você ajudou muito. Num tempo desse de crise em que tá essa seca grande ai. Ai o compra direta rapaz qualquer coisinha que você tem ali, que você produz você vende direto no compra direta, por que às vezes na cidade da gente não tem comércio, ai o compra direta ajuda muito.
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Por fim, buscou-se fazer um levantamento dos principais pontos positivos e negativos
do programa na visão dos beneficiários fornecedores, bem como uma avaliação geral do nível
de satisfação dos agricultores com o PAA no município de Lucrécia-RN.
Em relação aos pontos positivos, algumas questões foram colocadas em destaque como
a certeza de haver um mercado para os produtos do pequeno agricultor conforme afirmação
da agricultora A ao dizer que: “O ponto positivo é essa questão da garantia da produção, que
você produz e já tem a certeza da venda”. Já o agricultor C colocou em questão a valorização
do pequeno produtor e a geração de renda para as famílias, fato que se verifica na seguinte
afirmação: “A valorização do pequeno agricultor, uma melhoria na renda familiar.”
Em contrapartida, o principal ponto negativo observado na fala dos agricultores foi o
fato do programa operar apenas em determinados períodos do ano, ou seja, a existência de
uma descontinuidade em certos meses afeta negativamente tanto a produção quanto a
estabilidade financeira dos pequenos agricultores. As falas apresentadas a seguir caracterizam
essa questão. O agricultor F disse: “O ponto negativo que tem é que a gente não trabalha o
ano todo.”. Corroborando com a afirmação anterior, o agricultor D relatou que: “Seria bom se
fosse o ano todo né funcionando. Por que ai quando vem funcionar é só durante dois mês, três
mês né, quatro mês às vezes, ai seria bom se continuasse o ano todo e que viesse direto.”
A questão geral que apresenta o grau de satisfação dos beneficiários fornecedores em
relação ao Programa de Aquisição de Alimentos mostrou um nível elevado de satisfação por
parte dos agricultores. Apenas a agricultora A classificou o programa como regular:
“Podemos dizer assim que é regular por que não acontece como deveria ser e também não
atender a todas as necessidades.” Porém os demais agricultores qualificaram o PAA como
bom, muito bom ou ótimo, conforme apresentado a seguir: “É muito bom. Bom mesmo.”
(AGRICULTOR F).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente trabalho teve como objetivo principal analisar a operacionalização do
Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) no município de Lucrécia-RN sob a ótica do
gestor local e dos agricultores beneficiários fornecedores do programa. Buscando de forma
específica verificar a forma de atuação do PAA no município de Lucrécia-RN, caracterizar o
perfil dos beneficiários fornecedores e identificar possíveis benefícios e deficiências do
programa como forma de acompanhamento e avaliação da política pública.
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No âmbito econômico, foi perceptível nas conversas realizadas com os agricultores que
o PAA exerce um importante papel na geração de renda para os agricultores cadastrados no
programa. A criação de uma nova via de comercialização dos seus produtos, que outrora eram
comercializados apenas com atravessadores que ofereciam preços muito abaixo dos exercidos
pelo mercado, gerou uma elevação nos preços praticados. Mesmo com algumas considerações
feitas por um dos agricultores que acreditava que os preços poderiam ser melhores por não se
utilizar agrotóxicos na produção, ficou perceptível a abertura da possibilidade de venda com
segurança e melhores preços dos diversos gêneros alimentícios produzidos para fornecimento
ao PAA.
Outro fato notado nesta pesquisa refere-se à questão social vivenciada pelos
agricultores. Quanto a isso, foi realizada uma avaliação positiva referente à melhoria da
qualidade de vida e da dieta alimentar das famílias dos beneficiários fornecedores. Foi
observado nos diálogos que a geração de renda proporcionada pelo programa possibilitou
algumas conquistas pessoais que ocasionaram uma melhoria da qualidade de vida e
incentivou o aumento da produção dos gêneros alimentícios, fazendo com que fosse possível
se alimentar também daquilo que era produzido.
Ressalta-se também a importância do programa no campo político, sendo o PAA um
programa de grande relevância para a fixação do homem no campo, bem como para a
valorização do pequeno agricultor. Foi perceptível no discurso da maioria dos entrevistados a
motivação em fazer parte do programa e de poder usufruir dos seus benefícios.
No entanto, apesar dos agricultores se mostrarem satisfeitos com a sua participação no
PAA, tendo a grande maioria o avaliado de forma positiva, constatou-se como principal fator
negativo do programa a sua descontinuidade por longos períodos do ano, fato que prejudica a
produção e, consequentemente, acarreta uma desestabilização financeira para os beneficiários
fornecedores. Desta forma, sugere-se como uma ação que fortaleceria ainda mais a eficiência
do programa, um aumento do limite anual para cada agricultor, sendo esse repasse realizado
de forma contínua no decorrer do ano.
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http://www.mda.gov.br/sitemda/sites/sitemda/files/user_arquivos_64/CARTILHA_PAA_FINAL.pdf> Acesso em: 06 set. 2015. CAVALCANTI, P. A. Sistematizando e Comparando os Enfoques de Avaliação e de Análise de Políticas Públicas: uma contribuição para a área educacional. 2007. 289 f. Tese (Doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, Campinas-SP: 2007. COLLIS, J.; HUSSEY, R. Pesquisa em Administração: um guia prático para alunos de graduação e pós-graduação. 2ª ed. Porto Alegre: Bookman, 2005. GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas 2009. MATTEI, L. O papel e a importância da agricultura familiar no desenvolvimento rural brasileiro contemporâneo. Revista Econômica do Nordeste, v. 45, p. 71-79, 2014. MOZZATO, A. R.; GRZYBOVSKI, D. Análise de Conteúdo como Técnica de Análise de Dados Qualitativos no Campo da Administração: potencial e desafios. RAC, Curitiba, v. 15, n. 4, p. 731-747, Jul./Ago. 2011. MÜLLER, A. L. A construção das políticas públicas para a agricultura familiar no Brasil: o caso do Programa de Aquisição de Alimentos. 2007. 128 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Rural) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Ciências Econômicas, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural, Porto Alegre, 2007. PARRA RAMÍREZ, E. El estado en acción: la aplicación del modelo de análisis de políticas públicas. In: Revista Reflexión Política. Colombia: Universidad Autónoma de Bucaramanga, n. 9, p. 102-112, Jun.2003. RUA, M. das G. Políticas Públicas. 2ª ed. reimp. Florianópolis: Departamento de Ciências da Administração – UFRGS, 2012.
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SCHNEIDER, S.; CAZELLA, A.; MATTEI, L. Histórico, caracterização e dinâmica recente do Pronaf-Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar. In: SCHNEIDER, S.; SILVA, M. K.; MARQUES, P. E. M. (Orgs.) Políticas públicas e participação social no Brasil rural. Porto Alegre (RS): Editora da UFRGS, 2004. p. 21-49. SOUZA, C. Políticas Públicas: uma revisão da literatura. Sociologias, Porto Alegre, ano 8, nº 16, p. 20-45, jul/dez. 2006.
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AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA E NÍVEL DE SATISFAÇÃO DOS BENEFICIÁRIOS E NÃO BENEFICIÁRIOS DO PNCF NO
MUNICÍPIO DO CRATO – CEARÁ EVALUATION OF QUALITY OF LIFE AND LEVEL OF SATISFACTION OF THE
BENEFICIARIES AND NOT BENEFICIARIES OF THE PNCF IN THE MUNICIPALITY OF CRATO – CEARÁ
Wellington Rodrigues da Silva (Universidade Regional do Cariri - URCA) - [email protected] Graduando em Ciências Econômicas - URCA Marcos Antônio de Brito (Universidade Federal de Viçosa – UFV) - [email protected] Doutor em Economia Aplicada pela Universidade Federal de Viçosa – UFV. Professor Adjunto da Universidade Regional do Cariri – URCA.
Grupo de Pesquisa: Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo
Este trabalho tem como objetivo avaliar a qualidade de vida dos beneficiários e não
beneficiários do Programa Nacional de Crédito Fundiário – PNCF, categoria Combate à
Pobreza Rural – CPR, no município do Crato – CE, utilizando medidas de acesso a bens
duráveis, acesso à educação, comunicação, transporte, residência, alimentação, acesso à água,
acesso a saúde, energia elétrica, lazer, saneamento básico, poupança, imóvel rural e bens
materiais; além de analisar a satisfação por parte dos beneficiários em relação ao Programa. Em
princípio, buscou-se medir erroneamente a qualidade de vida de uma sociedade pelo PIB per
capita, no entanto, segundo Brito (2004) esse indicador é uma ferramenta de medição dos
indicadores econômicos, e devido a isso mede apenas o crescimento econômico. Por isso, uma
forma mais eficiente para avaliar a qualidade de vida deve contemplar variáveis
socioeconômicas, com a criação de índices de qualidade de vida multidimensionais. Para tanto,
optou-se em utilizar nesse artigo o Índice de Qualidade de Vida dos Beneficiários (IQVB) e
não Beneficiários (IQVN) do PNCF, na categoria CPR, com valores que variam de 0 a 1, onde,
quanto mais próximo de 1, o entrevistado apresenta alto nível de qualidade de vida, e quanto
mais próximo de 0, baixa qualidade de vida, de tal forma que possa comparar os resultados.
Posto isto, pode-se concluir que a maioria dos entrevistados é do sexo masculino, tem o ensino
fundamental incompleto, tem estado civil casado, apresenta cor parda ou preta e a maioria tem
de 40 a 60 anos de experiência na agricultura. Quanto à qualidade de vida, o grupo de
Beneficiários do PNCF apresentou resultado dentro do intervalo de média qualidade de vida,
mas próximo ao limite de baixa qualidade de vida. Por outro lado, para o grupo de não
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Beneficiários do PNCF, Índice está dentro do intervalo de baixa qualidade de vida. Não
obstante, os beneficiários do PNCF mostram-se satisfeitos em relação aos serviços prestados
pelo Programa.
Palavras-Chaves: Qualidade de Vida; Beneficiários; Crédito Fundiário.
Abstract
This study aims to evaluate the quality of life of beneficiaries and non-beneficiaries of the
National Program of Land Credit - PNCF, category Fighting Rural Poverty - CPR, in the
municipality of Crato - CE, using measures of access to durable goods, access to education ,
communication, transportation, residence, food, access to water, access to health, electricity,
recreation, sanitation, saving, rural property and material goods; besides analyzing the
satisfaction of the beneficiaries in relation to the Program. In principle, we sought to
erroneously measure the quality of life of a society by GDP per capita, however, according to
Brito (2004), this indicator is a measuring tool of economic indicators, and because of this only
measures economic growth. Therefore, a more efficient way to evaluate the quality of life should
include socioeconomic variables, with the creation of quality indices of multidimensional life.
Therefore, it was decided to use this article Quality of live of the Beneficiaries Index (IQVB)
and not Beneficiaries (IQVN) of PNCF in the category CPR, with values ranging from 0 to 1,
where the closer to 1 , the respondent has a high level of quality of life, and the closer to 0, low
quality of life, so that you can compare the results. That said, it can be concluded that the
majority of respondents are male, has not completed elementary school, has married marital
status, has brown or black color and most have 40 to 60 years of experience in agriculture.
Regarding quality of life, the Beneficiaries group PNCF presented results within the average
quality of life range, but near the low quality of life limit. On the other hand, to the group of
non Beneficiaries of PNCF, Index is within the low quality of life range. However, the
beneficiaries of PNCF were satisfied with the services provided by the Program.
Key Words: Quality of Life; beneficiaries; Land Credit
1. Introdução
Há muito tempo, a análise da qualidade de vida vem sendo objeto de estudo de muitos
pesquisadores. Dessa forma, muitas pesquisas estão sendo desenvolvidas com o objetivo de
criar índices para avaliar a situação das condições de vida de comunidades ou grupos
populacionais. Assim, buscam-se várias maneiras de mensurar a qualidade de vida e o bem-
1005
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estar da população, onde algumas dessas análises são utilizadas para a implementação de
políticas públicas voltadas à melhoria das condições de vida das pessoas, sendo realizadas pelos
gestores públicos, em nível federal, estadual e municipal.
Uma das medidas utilizadas no Brasil para mensurar a qualidade de vida da população
é o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Esse índice é composto de três dimensões
básicas do desenvolvimento humano: i) longevidade, na qual analisa a esperança de vida da
população; ii) a escolaridade, isto é, os anos de estudos e conhecimento adquirido pelas pessoas;
iii) pelo PIB per capita, que verifica a relação entre condições de vida e renda obtida pelo
indivíduo. Esse índice varia de 0 a 1,0, sendo que quanto mais próximo de 0, baixo IDH, e
quanto mais próximo de 1,0, alto IDH (PNUD, 2015).
Com a criação de índices, objetivando analisar vários aspectos socioeconômicos da
população, Amaral et al. (2015) criaram o Índice de Pobreza Multidimensional (IPM), um
índice sintético, com a intenção de analisar a pobreza no estado do Ceará sob uma perspectiva
multidimensional, isto é, utilizando um conjunto de indicadores com base nas variáveis
comtempladas pelo PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento).
Nesse sentido, a questão da pobreza ainda é muito pertinente no país, principalmente
nos estados do norte e nordeste, por serem regiões em fase de desenvolvimento e por agregarem
uma população humilde, pobre e com predominância da população rural, o que leva a população
a apresentar uma baixa qualidade de vida em vários indicadores. Segundo o Banco Mundial
(1999), citado por Brito (2004), o Estado do Ceará deve buscar meios de reduzir a pobreza do
meio rural através dos projetos destinados ao pequeno agricultor.
Sendo assim o Governo do Estado do Ceará, com o apoio do Banco Mundial, no ano de
1995, criou o chamado Projeto São José, que tem por objetivo a implementação de ações
voltada às comunidades rurais mais pobres, gerando emprego e renda, promovendo acesso a
serviços básicos e à infraestrutura como meios de reduzir a pobreza no campo (AMARAL et
al. 2015). Amaral et al. (2015) citam que o projeto é muito importante, pois a maioria dos
estudos sobre pobreza estão relacionados à população rural.
O governo federal também vem buscando de várias formas mitigar a pobreza no país.
Para isso, utiliza programas sociais, sejam eles de combate à pobreza, melhoria da educação,
da saúde, dentre outros que contemplam o quadro de políticas públicas no país.
Dentre esses programas, foi criado em 2003 o Programa Nacional de Crédito Fundiário
– PNCF. Esse programa visa um conjunto de ações por meio de financiamento do crédito
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fundiário, sendo elas, acesso à terra e investimentos básicos produtivos, possibilitando
reestruturação de imóveis adquiridos com recursos do Fundo de Terras e da Reforma Agrária
(PNCF, 2009). Segundo Sparovek (2007) esse programa busca como resultado, aumento da
renda das famílias e melhoria nas condições de vida das comunidades rurais, proporcionado
pela aquisição de terras, investimentos produtivos e infraestrutura.
Existem três linhas de financiamento e acesso ao crédito do PNCF, quais sejam:
Combate à Pobreza Rural (CPR), Nossa Primeira Terra (NPT) e Consolidação da Agricultura
Familiar (CAP). Segundo o PNCF (2009), a linha de financiamento Combate à Pobreza Rural,
também denominada CPR, busca reduzir a pobreza no meio rural, proporcionando aos
trabalhadores rurais mais pobres o maior acesso à terra. Os trabalhadores que buscam se tornar
beneficiários do programa, principalmente da categoria CPR, devem ser trabalhadores rurais
sem acesso à terra ou pequenos trabalhadores rurais com escasso acesso à terra.
Posto isto, o principal objetivo desse trabalho é avaliar a qualidade de vida dos
beneficiários e não beneficiários do PNCF no município do Crato – CE, e como objetivos
específicos: traçar o perfil socioeconômico dos entrevistados; mensurar a qualidade de vida
utilizando medidas de bens duráveis, acesso à educação, comunicação, transporte, residência,
alimentação, acesso a água, acesso a saúde, energia elétrica, lazer, saneamento básico,
poupança, imóvel rural e bens materiais; e, por fim, analisar a satisfação por parte dos
beneficiários em relação ao programa.
Este trabalho está estruturado em quatro tópicos, além desta introdução. O tópico dois
descreve a metodologia, onde está inserida a conceituação de qualidade de vida, métodos
utilizados, fonte de dados e área de estudo. No tópico três são apresentados os resultados e
discussões. No tópico quatro são apresentadas as considerações finais.
2. Metodologia
2.1. Área de estudo
Segundo o IPECE1 (2015), o município do Crato está localizado no sul do Ceará, na
microrregião do cariri, fazendo parte da Região Metropolitana do Cariri - RMC e também da
conurbação Crajubar, assim denominada pela união desse município com Juazeiro do Norte e
Barbalha. Possui área territorial de 1.009,20 Km2 e limita-se com os municípios de Caririaçu e
Farias Brito ao norte; o estado de Pernambuco e Barbalha ao sul; Juazeiro do Norte, ao leste; e
1 Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará.
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Nova Olinda e Santana do Cariri, ao oeste. Possui uma população estimada em 128.680
habitantes, sendo cerca de 83,11% residentes na zona urbana e 16,89% na zona rural. Seu clima
é tropical quente semiárido, brando e tropical quente sub-úmido e apresenta período chuvoso
do mês de janeiro até maio.
2.2. Qualidade de vida: aspectos conceituais e referencial teórico
O conceito de qualidade de vida ainda é muito discutido por estudiosos, pois o mesmo
não apresenta uma definição concreta e dessa forma utilizam significados envolvendo, tanto
aspectos materiais, como de bem estar físico. Minayo et al. (2000) propõem que “Qualidade
de vida é uma noção eminentemente humana, que tem sido aproximada ao grau de satisfação
encontrado na vida familiar, amorosa, social e ambiental e à própria estética existencial.
Pressupõe a capacidade de efetuar uma síntese cultural de todos os elementos que determinada
sociedade considera seu padrão de conforto e bem-estar. ”
Muitas das análises científicas e governamentais acerca do termo qualidade de vida
podem acomodar a discussão, e por isso restringir a busca por melhores conceitos, tornando as
ideias impostas pelo Estado sempre aceitas, dessa forma deve-se investigar os fatores como
aspectos históricos, socioeconômicos, do ambiente e da inserção no mundo relevantes na
percepção das pessoas afim de que exista uma reflexão ampla sobre o assunto. (PEREIRA et
al., 2002).
Ainda sobre o conceito de qualidade de vida, Brito (2004) diz que “Qualidade de vida
pode ser entendida também como a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto
da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas,
padrões e preocupações”.
Em princípio, buscou-se medir erroneamente a qualidade de vida de uma sociedade pelo
PIB per capita, no entanto, segundo Brito (2004) esse indicador é uma ferramenta de medição
dos indicadores econômicos, e devido a isso mede apenas o crescimento econômico.
Para Herculano (2000) existem duas maneiras de avaliar ou mensurar a qualidade de
vida de uma população: 1) examinando os recursos disponíveis de uma sociedade e como os
mesmos podem utilizar esses recursos para satisfazer suas necessidades e 2) avaliando as
necessidades da população, através de suas satisfações.
Outros estudiosos mensuram a qualidade de vida com relação às políticas públicas,
como por exemplo, o estudo sobre a qualidade de vida dos pronafianos e não-pronafianos na
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categoria C do Pronaf, onde Maia e Sousa (2007) criaram os IQVP (Índice de Qualidade de
Vida dos Pronafianos na categoria C-Custeio) e o IQVN (Índice de Qualidade de Vida dos Não-
Pronafianos) e nesses índices foram levados em consideração as variáveis, educação, saúde,
moradia, aspectos sanitários, aspectos econômicos e alimentação.
Vários autores enfatizam que o principal indicador de qualidade de vida utilizado em
estudos é o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) que é proposto pelo PNUD (Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento). Segundo Pereira et al. (2012), o IDH é um dos
indicadores mais fáceis de medir a qualidade de vida de grandes populações. Esse índice é
utilizado em vários países, e, no Brasil, é usado desde 1990. Esse Índice abrange três dimensões
do desenvolvimento, que são educação, saúde e renda (PNUD, 2015).
2.3. Métodos Analíticos
2.3.1. Analise tabular e descritiva
Como um dos objetivos desse trabalho é traçar o perfil socioeconômico dos
beneficiários e não beneficiários do PNCF, na categoria CPR, no município do Crato – CE.
Fez-se primeiramente uma análise tabular e descritiva das variáveis econômicas, culturais e
sociais dos entrevistados na pesquisa, trançando assim o perfil dos beneficiários e não
beneficiários do Programa.
2.3.2. Determinação do Índice de Qualidade de Vida dos Beneficiários (IQVB) e dos Não
Beneficiários (IQVN) do PNCF, a partir da média ponderada.
O trabalho busca como objetivo principal avaliar a qualidade de vida dos beneficiários
e não beneficiários do PNCF no município do Crato-CE.
Para determinação dos Índices de Qualidade de Vida dos Beneficiários (IQVB) e Não
Beneficiários (IQVN), buscou-se utilizar o método linear, assim como Barbosa et al (2009),
Brito (2004), Khan e Silva (2002) e Maia e Sousa (2007), que utilizaram como referência básica
em seus estudos, o trabalho de Fernandes (1997), que utiliza vários indicadores e agrega todos
para mensurar a qualidade de vida.
Geralmente, quando se trabalha com qualidade de vida, associa-se essa mensuração a
indicadores como saúde, educação, saneamento básico, habitação, condições de alimentação,
bens duráveis, bens materiais, transporte, meios de comunicação, lazer e renda. Dessa forma,
será feita a analise através da agregação desses indicadores.
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O Índice apresenta como procedimento metodológico os seguintes passos:
primeiramente determinar os indicadores que serão utilizados no modelo e seus escores; depois
será feita uma formação de postos, em ordem crescente, os quais serão classificados do ponto
onde o indicador é pior até onde ele apresenta o melhor resultado, atribuindo-lhes escores. De
acordo com Khan e Silva (2002), os pesos utilizados representam cogitações feitas pelos
autores, no qual usará de acordo a satisfação do entrevistado e que correlacione à qualidade de
vida.
Neste trabalho, foram atribuídos escores referentes aos indicadores utilizados. Os
escores assumiram valores de 0 a 3 para mostrar a situação dos beneficiários e não beneficiários
do Programa na escala crescente de posto. Foi atribuído também um peso relativo que variou
de 1 a 3: um era representativo de pouco satisfeito, 2 para satisfeito e 3 para muito satisfeito.
Dessa forma podemos definir o Índice de Qualidade de Vida dos Beneficiários (IQVB)
e dos Não Beneficiários (IQVN) do PNCF, partindo dos termos da equação (1):
n
pm
kk
m
kkp
E
EIQVB
n 1
1
1
max
1 (1)
Já para analisar a função de cada indicador do Índice de Qualidade de Vida dos
Beneficiários-IQVB, podemos representar algebricamente com a equação (2):
m
kk
n
p
n
pkp
k
E
EC
11
1
max (2)
Onde:
IQVB = Índice de Qualidade de Vida dos Beneficiários; Ekp = escore do k-ésimo indicador,
obtido pelo p-ésimo beneficiário; k = 1, 2, 3, ... , m; p = 1, 2, 3, ..., n; Emaxk = escore máximo
do k-ésimo indicador; Ck = contribuição do indicador k no Índice de Qualidade de Vida; n =
número de beneficiários, e m = número de indicadores.
Dessa forma, podemos classificar o Índice de Qualidade de Vida dos Beneficiários
(IQVB), com valores que variam de 0 a 1, onde, quanto mais próximo de 1, o beneficiário
apresenta alto nível de qualidade de vida, e quanto mais próximo de 0, baixa qualidade de vida.
Sendo assim, estabeleceram critérios, nos quais se encontram nos seguintes limites:
Baixa qualidade de vida.....................................................0 IQVB 0,5;
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Média qualidade de vida ...................................................0,5 IQVB 0,8;
Alta qualidade de vida........................................................0,8 IQVB 1.
2.3.2.1. Consolidação das variáveis utilizadas no cálculo do Índice de Qualidade de Vida dos
Beneficiários – IQVB e não Beneficiários – IQVN, do PNCF
Neste tópico serão mostradas as variáveis utilizadas no modelo, para mensuração do
Índice de Qualidade de Vida dos Beneficiários – IQVB e Não Beneficiários – IQVN, do PNCF.
Consideraram-se os seguintes indicadores: 1) Bens Duráveis; 2) Acesso à educação; 3)
Comunicação; 4) Transporte; 5) Residência; 6) Alimentação; 7) Acesso a água; 8) Acesso a
saúde; 9) Energia Elétrica; 10) Lazer; 11) Saneamento básico; 12) Poupança; 13) Imóvel rural
e 14) Bens materiais.
2.3.3. Determinação do Índice de Satisfação dos Beneficiários do PNCF (ISB)
Neste tópico será apresentado o modelo matemático utilizado para medir o nível de
satisfação dos beneficiários do PNCF, no município do Crato – CE, bem como alcançar um dos
objetivos específicos do trabalho.
Para mensurar esse índice foi levado em consideração variáveis relacionadas a serviços
prestados pelo programa, utilizando a opinião dos beneficiários a respeito do mesmo. Segundo
Khan e Silva (2002) alguns indicadores de serviços ainda são utilizados sem levar em
consideração a participação do indivíduo na definição de satisfação, bem como não pode ser
totalmente ignorado quando se leva em consideração satisfação dos clientes por determinada
empresa ou programa.
Assim sendo, para determinar o nível de satisfação dos beneficiários do PNCF, foi
utilizado como referência o trabalho feito por Khan e Silva (2002), onde eles criam o índice de
satisfação dos produtores rurais com os serviços prestados pela EMATERCE nos municípios
de Iguatu, Cedro, Quixadá, Baturité, Acaraú, Trairi e São Gonçalo do Amarante.
Dessa forma, alguns indicadores referentes a serviços do programa foram mensurados,
e atribuídos escores e pesos. Para determinar o nível de satisfação foram utilizados os seguintes
escores e pesos, buscando analisar do beneficiário qual seu nível de satisfação como:
Pouco satisfeito – 1 Satisfeito – 2 Muito satisfeito – 3
Assim o Índice de Satisfação dos Beneficiários do PNCF foi calculado pela seguinte
equação:
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ISB =𝟏
𝒇∑𝑺i
𝒇
𝒊=𝟏
Com
Onde:
ISB= Índice de Satisfação dos Beneficiários do PNCF; Si = Índice de satisfação dos
beneficiários em relação ao indicador i; i = 1, 2, ..., f, número de indicadores; Puj = peso da
u-ésima variável, definido pelo j-ésimo beneficiário; Pmaxu = peso máximo da u-ésima
variável; Euj = escore da u-ésima variável obtido pelo j-ésimo beneficiário; Emaxu = escore
máximo da u-ésima variável; u = 1, 2, 3, ... , r; j = 1, 2, 3, ..., n; n = número de beneficiários;
r = número de variáveis.
O valor do índice varia de 0 a 1, sendo que quanto mais próximo de 1, mais satisfeito
o beneficiário está com o Programa, já quanto mais próximo de 0, menos insatisfeito o
beneficiário está com os serviços prestados. Para analisar o Índice de Satisfação dos
Beneficiários, optou-se por utilizar os seguintes critérios:
Pouco satisfatório...0 < ISB ≤ 0,5;
Satisfatório...0,5 < ISB ≤ 0,8;
Muito satisfatório...0,8 < ISB ≤ 1.
2.3.3.1. Consolidação das variáveis utilizadas no cálculo do Índice de Satisfação dos
beneficiários – ISB, do PNCF.
Neste tópico serão mostradas as variáveis utilizadas no modelo, para mensuração do
Índice de Satisfação dos Beneficiários – ISB, do PNCF. Consideraram-se os seguintes
indicadores: 1) Valor liberado; 2) Prazo de financiamento; 3) Prazo de carência; 4) Taxa de
juros; 5) Valor da prestação; 6) Tipo e tamanho do imóvel adquirido; 7) Prazo para a liberação
do recurso; 8) Atendimento do responsável pelo Programa no Banco; 9) Exigências burocráticas
com documentação; 10) Acompanhamento pós-liberação do recurso; 11) Assistência técnica.
2.4. Fonte dos dados
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Os dados utilizados na pesquisa são de origem primária, provenientes da aplicação de
questionários aos agricultores, beneficiários e não beneficiários, do PNCF, na modalidade CPR,
no município do Crato-CE, e que foram aplicados nas associações de agricultores rurais dos
sítios Malhada e Jenipapo, onde compreendem agricultores beneficiários. Já em relação aos não
beneficiários, foram entrevistados agricultores que moravam próximos a essas comunidades. O
período de aplicação foi do dia 3 de março à 7 de abril de 2016. A pesquisa contou com 51
entrevistados, sendo 25 beneficiários do PNCF e 26 não beneficiários.
3. Resultados e discussões
Nesta seção serão analisados os resultados obtidos com relação aos entrevistados na
pesquisa, traçando o perfil socioeconômico e mensurando a qualidade de vida dos beneficiários
e não beneficiários do PNCF, na linha CPR, no município do Crato – CE.
3.1. Perfil socioeconômico dos beneficiários e não beneficiários do PNCF
3.1.1. Idade
Com relação às informações sobre a faixa etária dos beneficiários e não beneficiários,
pode-se ver a distribuição na Tabela 1. Observa-se que há maior presença de beneficiários na
faixa etária de 50 a 70 anos (60%). No que concerne aos não beneficiários, nota-se que há maior
incidência na faixa etária de 50 a 60 anos (46,15%). Em linhas gerais, a média de idade dos
beneficiários e não beneficiários é de 54,08 e 52,65 anos, respectivamente. Portanto, trata-se de
grupos de pessoas bastante experientes na agropecuária.
Tabela 1 – Distribuição absoluta e relativa dos beneficiários e não beneficiários do PNCF,
segundo a faixa etária, no município do Crato-CE, 2016.
Faixa Etária (em anos) Beneficiários Não Beneficiários
N % N %
30 ─┤ 40 3 12,00 7 26,92
40 ─┤ 50 6 24,00 1 3,85
50 ─┤ 60 8 32,00 12 46,15
60 ─┤ 70 7 28,00 2 7,70
≥ 70 1 4,00 4 15,38
1013
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SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
Total 25 100,00 26 100,00 Fonte: Resultados da Pesquisa
3.1.2. Sexo
De acordo com o sexo, pode-se observar os dados da distribuição na Tabela 2. Observa-
se predominância de entrevistados do sexo masculino, onde 92% dos entrevistados
beneficiários do PNCF, na categoria CPR, são do sexo masculino e 8% do sexo feminino,
enquanto que para o grupo dos não beneficiários do sexo masculino e feminino, esse percentual
é de 84,62% e 15,38%, respectivamente.
Tabela 2 – Distribuição absoluta e relativa dos beneficiários e não beneficiários do PNCF,
segundo o sexo, no município do Crato-CE, 2016.
Sexo Beneficiários Não Beneficiários
n % n %
Feminino 2 8,00 4 15,38
Masculino 23 92,00 22 84,62
Total 25 100,00 26 100,00
Fonte: Resultados da Pesquisa
3.1.3. Escolaridade
A Tabela 3 apresenta informações sobre o nível de instrução dos beneficiários e não
beneficiários do PNCF. Observa-se maior concentração de pessoas com o ensino fundamental
incompleto, tanto para beneficiários (44%) quanto para não beneficiários (34,62%). Não
obstante, vale destacar que 28% dos beneficiários e apenas 7,69% dos não beneficiários
concluíram o ensino médio. Em contrapartida, 30,77% dos não beneficiários não tiveram
instrução, isto é, nunca estudaram. Já com relação ler e escrever os dados apresentam-se bem
próximos, 12% dos beneficiários e 11,54% dos não beneficiários.
Tabela 3 – Distribuição absoluta e relativa dos beneficiários e não beneficiários do PNCF,
segundo o nível de instrução, no município de Crato-CE, 2016.
Nível de instrução Beneficiários Não Beneficiários
n % N %
Sem instrução - - 8 30,77
Lê e escreve 3 12,00 3 11,54
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Mossoró - RN, 16 a 18 de Novembro de 2016
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Ensino fundamental incompleto 11 44,00 9 34,62
Ensino fundamental completo 2 8,00 3 11,54
Ensino médio incompleto 2 8,00 1 3,85
Ensino médio completo 7 28,00 2 7,69
Total 25 100,00 26 100,00
Fonte: Resultados da Pesquisa
3.1.4. Estado Civil
Na Tabela 4 são apresentados os resultados acerca do estado civil dos beneficiários e
não beneficiários do PNCF. Nota-se que 84% dos beneficiários são casados, enquanto para o
grupo de não beneficiários esse percentual cai para 73,08%. Pode-se observar que o percentual
de solteiros é muito próximo, tanto para os beneficiários (12%), quanto para os não
beneficiários (11,54%).
Tabela 4 – Distribuição absoluta e relativa dos beneficiários e não beneficiários do PNCF,
segundo o estado civil, no município de Crato-CE, 2016.
Estado civil Beneficiários Não Beneficiários n % N %
Casado 21 84,00 19 73,08
Solteiro 3 12,00 3 11,54
Separado - - 2 7,69
Viúvo 1 4,00 2 7,69
Total 25 100,00 26 100,00
Fonte: Resultados da Pesquisa
3.1.5. Raça
Os resultados expressos com relação à raça/cor estão expostos na Tabela 5. Como visto,
há predominância de pessoas da cor preta para o grupo dos beneficiários e da cor parda para o
grupo dos não beneficiários. De acordo com a cor do grupo dos beneficiários, 80% são da cor
preta e 20% da cor parda, enquanto isso, para o grupo dos não beneficiários a cor parda é
predominante e apresenta 57,69% e a cor preta apresenta 34,62%.
Tabela 5 – Distribuição absoluta e relativa dos beneficiários e não beneficiários do PNCF,
segundo a raça, no município do Crato-CE, 2016.
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Raça Beneficiários Não Beneficiários
N % N %
Parda 5 20,00 15 57,69
Branca - - 2 7,69
Preta 20 80,00 9 34,62
Não especificada - - - -
Total 25 100,00 26 100,00 Fonte: Resultados da Pesquisa
3.1.6. Tradição na agricultura
No tocante à tradição na agricultura a Tabela 6 mostra que a maior frequência para o
grupo de beneficiários e não beneficiários encontra-se na faixa de 40 a 60 anos de experiência,
com 56% dos beneficiários 53,85% dos não beneficiários. Contudo, a média de experiência na
agricultura para o grupo de beneficiários é de 45,24 anos e para o grupo de não beneficiários é
de 43,96 anos. Isso mostra que os beneficiários e não beneficiários são compostos de pessoas
experientes na agricultura, e com relação às pesquisas foi visto que a maioria dos entrevistados
nunca trabalhou em outra atividade que não fosse ligada a agricultura.
Tabela 6 – Distribuição absoluta e relativa dos beneficiários e não beneficiários do PNCF,
segundo a tradição na agricultura, no município do Crato-CE, 2016.
Experiência (em anos) Beneficiários Não Beneficiários
N % N %
20 ─┤ 30 3 12,00 7 26,92
30 ─┤ 40 5 20,00 1 3,85
40 ─┤ 50 7 28,00 8 30,77
50 ─┤ 60 7 28,00 6 23,08
≥ 60 3 12,00 4 15,38
Total 25 100,00 26 100,00 Fonte: Resultados da Pesquisa
3.2. Qualidade de vida dos beneficiários e não beneficiários do PNCF
Neste tópico serão abordados os indicadores utilizados para mensuração do Índice de
Qualidade de Vida dos Beneficiários e Não beneficiários do PNCF no município do Crato –
CE, sendo utilizados 14 indicadores: bens duráveis, acesso à educação, comunicação,
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Mossoró - RN, 16 a 18 de Novembro de 2016
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transporte, residência, alimentação, acesso a água, acesso a saúde, energia elétrica, lazer,
saneamento básico, poupança, imóvel rural e bens materiais. Para cada variável foi atribuído
um escore (existência ou ausência) e um peso (nível de satisfação).
3.2.1. Considerações sobre os indicadores escolhidos para a mensuração do Índice de
Qualidade de Vida dos Beneficiários e Não Beneficiários do PNCF.
A Tabela 7 apresenta os resultados referentes a cada indicador utilizado para mensurar
a qualidade de vida dos beneficiários e não beneficiários do PNCF no município do Crato – CE.
Como foi dito, para cada indicador haveria uma variação de 0 a 1.
Conforme os dados da Tabela 7 pode-se verificar que de acordo com os beneficiários,
os indicadores que apresentaram melhores índices foram residência (0.7467), energia elétrica
(0.7467) e imóvel rural (0.7467). Isso mostra a influência do Programa na vida dos
beneficiários, pois de acordo com os entrevistados, o Programa garantiu acesso a casas de
qualidade, com ótima infraestrutura, local para plantio para as comunidades que aderiram ao
Programa e energia elétrica, por ser um meio indispensável à população, e que também veio
por meio do acesso ao Programa.
Já para o grupo de não beneficiários, os melhores indicadores foram energia elétrica
(0.7051), residência (0.6987), alimentação (0.6923) e bens duráveis (0.6923). Esse resultado é
atribuído em consequência dos não beneficiários se localizarem em vilas mais próximas aos
distritos, e por isso terem mais acesso aos serviços como energia elétrica, bem como residências
próprias, e ter maior oferta de produtos alimentícios e bens duráveis.
Tabela 7 – Participação dos indicadores na composição do Índice de Qualidade de Vida dos
Beneficiários e não Beneficiários do PNCF, no município do Crato-CE, 2016.
Indicador IQVB IQVN
Valor absoluto
Valor relativo IQVBi
Valor absoluto
Valor relativo IQVNi
Bens duráveis 0.0514 10.2825 0.7200 0.0495 11.3326 0.6923 Acesso à educação 0.0450 8.1879 0.5733 0.0458 10.4932 0.6410 Comunicação 0.0397 7.9340 0.5556 0.0394 9.0241 0.5513 Transporte 0.0171 3.4275 0.2400 0.0142 3.2529 0.1987 Residência 0.0533 10.6633 0.7467 0.0499 11.4376 0.6987 Alimentação 0.0476 9.5208 0.6667 0.0495 11.3326 0.6923 Acesso a água 0.0291 5.8077 0.4067 0.0275 6.2959 0.3846 Acesso a saúde 0.0229 4.5700 0.3200 0.0064 1.4691 0.0897 Energia elétrica 0.0533 10.6633 0.7467 0.0504 11.5425 0.7051
1017
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Lazer 0.0124 2.4754 0.1733 0.0101 2.3085 0.1410 Saneamento básico 0.0230 4.1892 0.2933 0.0252 5.7713 0.3526 Poupança 0.0143 2.8562 0.2000 0.0018 0.4197 0.0256 Imóvel rural 0.0533 10.6633 0.7467 0.0202 4.6170 0.2821 Bens materiais 0.0438 8.7591 0.6133 0.0467 10.7030 0.6539 Total 0.5002 100.00 0.5002 0.4364 100.00 0.4364
Fonte: Resultados da Pesquisa Com relação aos beneficiários, os piores indicadores, que foram, lazer (0.1733),
poupança (0.2) e transporte (0.24). Para o grupo de não beneficiários os piores índices foram
poupança (0.0256), acesso à saúde (0.0897) e lazer (0.1410) (TABELA 7).
Completando essa análise, pode-se observar que oito indicadores encontram-se no
intervalo de média qualidade de vida para o grupo dos beneficiários (Residência, energia
elétrica, imóvel rural, bens duráveis, alimentação, bens materiais, acesso à educação e
comunicação). Para o grupo de não beneficiários, verifica-se que dos oito indicadores
apresentados acima, sete encontram-se nesse intervalo, com exceção do indicador imóvel rural.
Dessa forma fica claro que quem teve acesso ao programa possui um local pra plantio e
produção agrícola, a fim de melhorar a renda da família.
Posto isto, observou-se que o Índice de Qualidade de Vida dos Beneficiários do PNCF
(IQVB) apresentou o resultado de 0,5002, portanto dentro do intervalo de média qualidade de
vida e no limite para baixa qualidade de vida. Por outro lado, Índice de Qualidade de Vida dos
não Beneficiários do PNCF (IQVN) foi de 0,4364, dentro do intervalo de baixa qualidade de
vida.
Outra análise que pode ser feita é com relação ao nível de qualidade de vida dos
entrevistados. Nessa análise foi visto que 52% dos beneficiários encontram-se dentro do
intervalo de baixa qualidade de vida, enquanto que os outros 48% estão no intervalo
considerado de média qualidade de vida. Para o grupo de não beneficiários 80.77%
encontraram-se no intervalo correspondente à baixa qualidade de vida, enquanto que apenas
19.03% estão no intervalo de média qualidade de vida (TABELA 8).
Tabela 8 – Distribuição absoluta e relativa dos beneficiários e não beneficiários do PNCF,
segundo o nível de qualidade de vida, no município do Crato-CE, 2016.
Qualidade de vida Beneficiários Não beneficiários Quantidade % Quantidade %
Baixa 13 52 21 80.77 Média 12 48 5 19.03
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Alta - - - - Total 25 100 26 100
Fonte: Resultados da Pesquisa
3.2. Nível de Satisfação dos beneficiários do PNCF
Nesse Tópico será feita uma abordagem a respeito dos serviços prestados pelo PNCF,
de acordo com o nível de satisfação dos beneficiários, tendo como resultado o Índice de
Satisfação dos Beneficiários (ISB), tendo como base onze indicadores. Esse índice tem como
objetivo analisar a relação dos serviços prestados e a satisfação dos beneficiários do Programa.
3.2.2. Considerações sobre os indicadores escolhidos para a mensuração do Índice de
Satisfação dos Beneficiários do PNCF.
A Tabela 9 apresenta os resultados referentes a cada indicador utilizado para mensurar
o nível de satisfação dos beneficiários do PNCF no município do Crato – CE. Nesse índice será
utilizado o mesmo critério empregado na determinação Índice de Qualidade de Vida, desta
forma, cada indicador obteve um valor que varia de 0 a 1.
Assim, nota-se que os serviços mais bem avaliados pelos beneficiários foram taxa de
juros (0.7333), valor da prestação (0.7333) e prazo de carência (0.7067). Essa boa classificação
da taxa de juros se dá pelo fato de ser relativamente baixo para quem participa do Programa, já
que os indivíduos participantes são oriundos de locais pobres e que não apresentam boas
condições para financiamento com altas taxas de juros.
Os piores indicadores analisados foram assistência técnica (0.4130) e acompanhamento
pós-liberação do recurso (0.4533). Segundo os entrevistados, houve acompanhamento apenas
no início da implantação do Programa, e assistência técnica. Atualmente, são poucas as vezes
que algum responsável da Ematerce visita os beneficiários. Dessa forma os entrevistados
demonstraram insatisfação com esses serviços.
Posto isto, verificou-se que o Índice de Satisfação dos Beneficiários do PNCF (ISB)
apresentou o resultado de 0,6242, configurando-se dentro do intervalo de médio nível de
satisfação com o Programa, demonstrando que os serviços prestados pelo PNCF aos
beneficiários é satisfatório.
Tabela 9 – Participação dos indicadores na composição do Índice de Satisfação dos
Beneficiários do PNCF, no município do Crato-CE, 2016.
Indicador ISBi %
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Valor liberado 0.6933 10.0971 Prazo de financiamento 0.6800 9.9029 Prazo de carência 0.7067 10.2913 Taxa de juros 0.7333 10.6796 Valor da prestação 0.7333 10.6796 Tipo e tamanho do imóvel adquirido 0.6667 9.7087 Prazo para a liberação do recurso 0.6400 9.3204 Atendimento do responsável pelo Programa no Banco 0.6533 9.5146 Exigências burocráticas com documentação 0.4933 7.1845 Acompanhamento pós-liberação do recurso 0.4533 6.6019 Assistência técnica. 0.4130 6.0194 ISB 0.6242 100.00
Fonte: Resultados da Pesquisa
Outra análise feita foi com relação ao nível de satisfação de cada beneficiário. Nessa
análise foi visto que 12% dos beneficiários encontram-se pouco satisfeitos, 84% estão
satisfeitos e apenas 4% estão muito satisfeitos com os serviços prestados pelo Programa.
Tabela 10 – Distribuição absoluta e relativa dos beneficiários do PNCF, segundo o nível de
satisfação com o programa, no município do Crato-CE
Satisfação com o programa Beneficiários
Quantidade % Baixa 3 12 Média 21 84 Alta 1 4 Total 25 100
Fonte: Resultados da Pesquisa
4. Considerações Finais
Com base nos resultados obtidos neste trabalho, pode-se concluir que de acordo com o
perfil socioeconômico dos beneficiários e não beneficiários do PNCF, há maior presença de
beneficiários e não beneficiários na faixa de 50 a 70 anos, predominância do sexo masculino,
escolaridade de ensino fundamental incompleto, maioria de ambos os grupos é de casados, a
maioria dos beneficiários apresentaram cor preta e os não beneficiários cor parda e a experiência
na agricultura encontra-se na faixa de 40 a 60 anos.
Buscando mensurar a qualidade de vida dos beneficiários e não beneficiários do PNCF,
foram utilizados o IQVB e IQVN, nesses índices foram utilizados quatorze indicadores. Esses
indicadores foram construídos por meio de um método linear e de uma média aritmética.
Analisando os indicadores que apresentaram maior participação no Índice de Qualidade
de Vida dos Beneficiários-IQVB, pode-se inferir que residência, imóvel rural e energia elétrica
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foram os que apresentaram os melhores índices, isso se dá pelo fato do agricultor ter sido
beneficiado com área rural, residência própria e serviço de energia elétrica, proporcionado pela
adesão ao Programa. Já com relação ao Índice de Qualidade de Vida dos Não beneficiários-
IQVN, os melhores indicadores foram energia elétrica, residência, alimentação e bens duráveis.
Considerando os piores indicadores de cada grupo, pode-se verificar que lazer,
poupança, e transportes foram as variáveis que menos contribuem para qualidade de vida dos
beneficiários. Já para o grupo de não beneficiários os piores indicadores foram poupança,
acesso a saúde e lazer. Segundo entrevistados de ambos os grupos, o indicador lazer é pouco
satisfatório, pois a comunidade onde vivem não há nenhuma forma de diversão, da mesma
forma é o indicador poupança, que segundo eles, a pouca remuneração que recebem, eles
utilizam para o consumo de bens essenciais, dificultando a acumulação do dinheiro.
Verificou-se que oito indicadores (bens duráveis, acesso à educação, comunicação,
residência, alimentação, energia elétrica, imóvel rural e bens materiais) que compõem o IQVB
estão no intervalo de média qualidade de vida, e os demais (transporte, acesso a água, acesso a
saúde, lazer, saneamento básico e poupança) estão no intervalo de baixa qualidade de vida. Já
para o IQVN, sete indicadores (bens duráveis, acesso à educação, comunicação, residência,
alimentação, energia elétrica e bens materiais) estão dentro do intervalo de média qualidade de
vida e sete (transporte, acesso à água, acesso a saúde, lazer, saneamento básico, imóvel rural e
poupança) no intervalo de baixa qualidade de vida.
Com relação ao nível de qualidade de vida dos entrevistados, foi visto que pouco mais
da metade dos beneficiários encontram-se dentro do intervalo de baixa qualidade de vida,
enquanto que o restante está no intervalo considerado média qualidade de vida. Para o grupo de
não beneficiários a esmagadora maioria encontraram-se no intervalo correspondente à baixa
qualidade de vida, enquanto que menos de 1∕5 está no intervalo de média qualidade de vida.
Dessa forma, observou-se que o Índice de Qualidade de Vida dos Beneficiários do
PNCF (IQVB) apresentou resultado dentro do intervalo de média qualidade de vida e no limite
para baixa qualidade de vida. Enquanto que para Índice de Qualidade de Vida dos não
Beneficiários do PNCF (IQVN) foi dentro do intervalo de média qualidade de vida.
Buscou-se também analisar a satisfação dos beneficiários com relação a alguns serviços
prestados pelo Programa, utilizando o Índice de Satisfação dos Beneficiários (ISB), no qual
utilizou-se onze variáveis, com ênfase nos serviços prestados. Após a mensuração desse índice,
foi visto que os melhores indicadores que compõem o Índice de Satisfação dos Beneficiários
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foram prazo de carência, taxa de juros e valor da prestação, e os piores indicadores foram
assistência técnica e acompanhamento pós-liberação do recurso. Junto a essa análise foi visto
que oito indicadores (valor liberado, prazo de financiamento, prazo de carência, taxa de juros,
valor da prestação, tipo e tamanho do imóvel adquirido, prazo para a liberação do recurso,
atendimento do responsável pelo Programa no Banco) encontraram-se no intervalo considerado
satisfatório para os beneficiários, enquanto que apenas três indicadores (exigências burocráticas
com documentação, acompanhamento pós-liberação do recurso e assistência técnica) foram
pouco satisfatórios. Já de acordo com o nível de satisfação de cada beneficiário, foi observado
que a maioria encontra-se satisfeito com os serviços prestados pelo programa, sendo o Índice
de Satisfação dos Beneficiários do PNCF (ISB) configurado dentro do intervalo de média
satisfação com o Programa.
Concluindo, vê-se que o programa ocasionou melhora na qualidade de vida dos seus
beneficiários, muitos indicadores de bem estar foram considerados de média qualidade de vida,
o Programa possibilitou acesso a mais bens e serviços nas comunidades, além de prover
recursos para melhoria da renda das famílias.
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SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
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AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ACESSO A MERCADO PELOS
PRODUTORES RURAIS NOS TERRITÓRIOS DA CIDADANIA
ASSESSING ACCESS PUBLIC POLICY BY MARKETFARMERS IN THE TERRITORIES OF CITIZENSHIP
GT 3 - Políticas Públicas e Reforma Agrária
Ionara Jane de Araújo. Economista. Mestre em Economia Rural, pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Bolsista EXP-B do CNPq, na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (FACEM/UERN). E-mail: [email protected] Melissa Rafaela Costa Pimenta. Graduada em Ciências Sociais (UERN).Especialista em Filosofia (UERN)Especialista em Gestão Ambiental (UERN). Mestre em Ciências Sociais (UFRN). Docente do Curso de Gestão Ambiental (UERN/FACEM/DGA). Email: [email protected] Maria de Jesus Gomes de Lima. Economista. Mestre em economia rural , pela Universidade Federal do Ceará. Doutoranda em desenvolvimento e meio ambiente pela Universidade Federal do Ceará. [email protected] Isabelle Almeida de Olivira. Economista. Mestre em ciências ambientais. E-mail: [email protected]
RESUMO O Programa de Aquisição Alimentar (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) têm como um dos objetivos a inserção de produtos da agricultura familiar, no mercado institucional. Esse artigo apresenta a análise a partir da avaliação de três grupos de produtores quanto o acesso a mercado. Na metodologia, os dados utilizados são de origens secundárias, obtidos a partir do banco de dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) na construção do Índice de Condição de Vida para o Rio Grande do Norte, as informações são de 2010 e contemplando três territórios e 25 municípios. A fim de dividir os produtores em três grupos, foram realizados dois procedimentos metodológicos, primeiro foi construído o índice de condição de vida dos produtores, em seguida foi realizado o agrupamento dos produtores de acordo com o respectivo índice, por meio do método não hierárquico k-médias, do software SPSS 20. Ao dividir a amostra pode se perceber que há uma fragilidade nas ações de mercado institucionais, . Os mercados institucionais devem estar cada vez mais presentes no fortalecimento da agricultura familiar, pois mais de 90% dos produtores do grupo mais frágil da analise, avaliou o acesso a mercados entre regular e péssimo. Por fim, é necessária uma aproximação efetiva entre os programas e os produtores, visando a integração com as ações de mercado. Palavras-chave: Agricultura familiar. Mercado. Políticas públicas.
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ABSTRACT The Food Acquisition Program (PAA) and the National School Feeding Programme (PNAE) have one of the objectives the product integration of family agriculture in the institutional market. This article presents an analysis based on the evaluation of three groups of producers and access to market. In the methodology, the data used are secondary sources, obtained from the Ministry database of Agrarian Development (MDA) in the construction of Living Conditions Index for Rio Grande do Norte, the information is 2010 and covering three territories and 25 municipalities. In order to divide the producers into three groups, were two methodological procedures, first was built the condition of life index of producers, then it was carried out by the group of producers in accordance with the respective index, through non-hierarchical method k -médias, SPSS software 20. by dividing the sample can be seen that there is a weakness in the institutional market shares. Institutional markets should be increasingly present in the strengthening of family farming, as more than 90% of the producers of the most fragile group analysis assessed the market access between regular and bad. Finally, an effective approach between programs and producers to integrate with the stock market is required. Keywords: Family agriculture. Stock market. Public policies.
1 INTRODUÇÃO
As políticas públicas direcionadas ao meio rural no Brasil têm como uma das suas
diretrizes promover o crescimento econômico, relativo à aceleração do processo de
industrialização. Em meio ao processo, se caracterizavam por seu caráter setorial, destinando-
se ao crescimento do volume produtivo e dos índices de produtividade, em consequência da
agregação de inovações tecnológicas pela atividade agropecuária. Como o espaço rural era
uma área destinada às atividades relacionadas à agricultura latifundiária, esse processo
deixava os pequenos produtores e trabalhadores rurais preteridos, pois a política era voltada
para interesses econômicos dominantes (HESPANHOL, 2008).
As orientações das políticas públicas devem ser de acordo com as demandas
expressadas pelas comunidades e organizações, reconhecendo as particularidades de cada
território e ofertando instrumentos de desenvolvimento que atendam a essas características
(BRASIL, 2003). De acordo com Delgado (2007), as políticas públicas territoriais em sua
maioria buscam reduzir a pobreza e a diferenciação social e territorial, mediante o incentivo à
ação coletiva voltada para a realização de projetos de acumulação de renda compatíveis com
os ativos culturais locais e respeitosos do meio ambiente. No tocante as politicas de combate à
fome, nas últimas décadas, o Brasil vem ganhando reconhecimento mundial por suas
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iniciativas bem-sucedidas. Parte desse sucesso deve-se às políticas que permitem a vinculação
da oferta dos pequenos agricultores às necessidades de aquisição institucional para programas
de segurança que trabalham com alimentos. Essa estratégia de comercialização para os
pequenos agricultores foi discutida no relatório produzido pelo Centro de Excelência contra a
Fome do Programa Mundial de Alimentos (PMA) e o Centro Internacional de Políticas para o
Crescimento Inclusivo (IPC-IG), ambos vinculados à Organização das Nações Unidas (ONU).
Conforme Souza (2009) o estudo das políticas públicas seria a descrição e explicação
das causas determinantes e consequências das atividades governamentais. E também, a
avaliação das consequências das políticas públicas sobre a sociedade, sejam previstas ou não.
Para tanto, a análise será conduzida objetivando a partir da avaliação de três grupos de
produtores quanto o acesso a mercado, identificar medidas ou ações que possam melhorar
esse ingresso, se destacando para esse gargalo o Programa de Aquisição Alimentar (PAA) e o
Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Além das politicas é pertinente
considerar alguns desafios que possam explicar a realidade entre os beneficiários, o mercado e
as politicas públicas. O recorte realizado no artigo foram os Territórios da Cidadania do Rio
Grande do Norte.
Essas politicas tem como estratégia a inserção de produtos da agricultura familiar no
mercado institucional, tendo como uma de suas ações viabilizarem a comercialização dos
produtos dos agricultores familiares. Tendo em vista a importância que esses programas
podem desempenhar como uma política diferenciada, considerando sua implementação em
escala nacional, como da sua operacionalização num contexto específico.
2 MERCADOS INSTITUCIONAIS
Entre as principais dificuldades enfrentadas pela agricultura familiar, esta a inserção
dos seus produtos nas cadeias produtivas e a comercialização destes a um preço justo, isso se
agrava muitas vezes pela falta de organização produtiva e a inexistência de assessoria técnica
nos processos de produção e acesso a mercados, essa fragilidade na comercialização dos
produtos pelos agricultores é um dos principais inibidores do desenvolvimento da agricultura
familiar.
Nos últimos anos podemos destacar algumas estratégias de produção integrada com a
comercialização direta dos produtos, as feiras de produtos orgânicos/agroecológicos, a entrega
direta de cestas de produtos e as cooperativas de consumo são alguns exemplos de iniciativas
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que buscam reduzir a distância entre produtores e consumidores, tendo como principal função
a valorização dos circuitos locais de comercialização, priorizando o desenvolvimento local e
territorial.
Nessa dinâmica, a abordagem sobre o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o
Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), ambos inseridos no bojo das políticas
destinadas a garantir a segurança alimentar, têm como estratégia a inserção de produtos da
agricultura familiar no mercado institucional. As ações desses programas preveem: a)
viabilizar da comercialização dos produtos dos agricultores familiares; b) incentivar os
agricultores na produção de alimentos; c) fazer avançar e fortalecer a produção orgânica; e, d)
fortalecer a organização das entidades da agricultura familiar. Apesar dos desafios as políticas
públicas de fomento a inserção dos produtores da agricultura familiar no mercado interno tem
sido viabilizada com o passar dos anos. Acredita-se que essas políticas configurem o maior
programa de compras institucionais do mundo. Numa abordagem não assistencialista, o PAA
criou mercados até então inexistentes e alterou a relação entre produtores e intermediários.
Além disso, esses programas também favorecem a organização coletiva dos
agricultores familiares em associações e cooperativas e lhes oferece o apoio e os incentivos
necessários para melhorarem a qualidade de seus produtos. O PAA adquire alimentos para
formação de estoque/armazenamento, regulação de preços e assistência alimentar a grupos
vulneráveis. O PNAE investe exclusivamente em merendas escolares como forma de
promover a segurança alimentar, manter as crianças matriculadas com bom desempenho na
escola, e fortalecer as atividades agrícolas dos pequenos agricultores.
O PAA foi criado em julho de 2003, por meio do artigo 19 da Lei Nº. 10.696, e define-
se enquanto um programa intersetorial. Buscando incentivar a agricultura familiar através de
ações vinculadas à distribuição de alimentos de origem agropecuária aos grupos sociais em
situação de insegurança alimentar, além de facilitar o processo de comercialização no âmbito
local e promover a formação de estoques estratégicos de alimentos (MATTEI, 2007).
Entre 1976 a 1984 o PNAE foi uma das principais intervenções do II Programa
Nacional de Alimentação e Nutrição (PRONAN), sob a gestão do Instituto Nacional de
Alimentação e Nutrição (INAN), autarquia vinculada ao Ministério da Saúde (MS). Onde
após algumas décadas, de acordo com Peixinho (2013), avanços importantes foram
verificados para o PNAE, principalmente a partir de 2003, quando o programa Fome Zero foi
adotado com o objetivo de combater a fome e a pobreza. Algumas questões foram reforçadas
pelo Sistema de Segurança Alimentar e Nutrição do governo, entre elas a necessidade de que
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os produtos sejam adquiridos de produtores locais. Outros pontos contribuíram para fortalecer
a demanda local, sendo eles, a prestação de contas e a participação social por meio dos
Conselhos de Alimentação Escolar (CAE) em âmbito municipal, e o trabalho do nutricionista
como pessoa responsável pelo cardápio escolar.
3 METODOLOGIA
3.1 Natureza e fonte dos dados
Os dados são de origens secundárias, obtidos a partir do banco de dados do Ministério
do Desenvolvimento Agrário (MDA) na construção do Índice de Condição de Vida para o Rio
Grande do Norte, as informações são de 2010 e contemplando três territórios e 25 municípios,
selecionados pela metodologia do referido órgão:
Açu-Mossoró
O Território da Cidadania Açu-Mossoró (Figura 1) localiza-se no noroeste do Estado
do Rio Grande do Norte (RN), abrangendo uma área de 8.105,10 km². É constituído por
quatorze municípios (Portal da cidadania 2011), dos quais Assu, Areia Branca, Baraúnas,
Grossos, Mossoró e Serra do Mel fazem parte da amostra analisada. O território agrega uma
população total de 455.589 habitantes, dos quais 87.030 vivem na área rural. Foi um dos três
primeiros territórios selecionados no Rio Grande do Norte, com base no menor Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH), no reduzido dinamismo econômico e no número de
assentamentos da reforma agrária, de agricultores familiares, de famílias de pescadores, de
beneficiários do Programa Bolsa Família, além da apreciação sobre o Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) (Programa Territorial de Desenvolvimento
Rural Sustentável (PTDRS), 2010)
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Fonte: Plano de Desenvolvimento Territorial Rural (PTDRS)- Açu –Mossoró (2010) Sertão do Apodi
O Território da Cidadania Sertão do Apodi (Figura 2) abrange a área de 8.280,20 km²,
sendo formado por 17 municípios dos quais Augusto Severo, Caraúbas, Felipe Guerra, Itaú,
Paraú, Severiano Melo, Triunfo Potiguar, Upanema e Apodi fazem parte da amostra
analisada. A população total do território é de 157.247 habitantes dos quais, 55.790 vivem na
área rural, o que corresponde a 35,48% do total (PORTAL DA CIDADANIA, 2013). De
acordo com o Relatório Analítico da Célula de Acompanhamento e Informação do Território
do Sertão do Apodi (2011), o Território está localizado na Zona Homogênea do Estado do Rio
Grande do Norte, denominada Médio Oeste, no semiárido nordestino. Por ter a população
total de seus municípios inferior ou igual a 50 mil habitantes o SDT/MDA considera o
território tipicamente rural.
Figura 1- Território Açu-Mossoró no Estado do Rio Grande do Norte - Brasil
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Fonte: Plano de Desenvolvimento Territorial Rural (PTDRS)- Sertão do Apodi (2010)
Mato Grande
O território de Mato Grande (Figura 3) é composto por dezesseis municípios dos quais
Bento Fernandes, Ceará Mirim, Jandaíra, Poço Branco, Pureza, Taipu, Touros, João Câmara,
São Miguel do Gostoso e Maxaranguape fazem parte da análise. A região ocupa uma área de
5.758,60 km2 e está localizado a noroeste da capital, Natal. A população total do território é
de 223.761 habitantes, dos quais 114.246 vivem na área rural, o que corresponde a 51,06% do
total (PORTAL DA CIDADANIA, 2013). Um dos fatores limitantes para o desenvolvimento
segundo o Plano de Desenvolvimento Territorial Rural (PTDRS) do Mato Grande (2010), é a
escassez e irregularidades das chuvas, bem como as características da superfície, relevo e
drenagem que dificultam e até impossibilitam a acumulação da água na superfície. No
contexto geográfico, o território está circundado, ao norte, pelo Oceano Atlântico, formando
uma faixa litorânea que envolve 08 (oito) municípios; a leste, pelo Território Terras dos
Potiguaras, que tem como polo de influência a Área Metropolitana de Natal. Limita-se à
oeste, com o Território Sertão Central Cabugi e Litoral Norte; e, ao sul, com o Território do
Potengi.
Figura 2 - Território Sertão do Apodi no Estado do Rio Grande do Norte - Brasil
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Fonte: Plano de Desenvolvimento Territorial Rural (PTDRS)- Mato Grande (2010)
3.2 Método de análise
Para analisar a avaliação dos produtores, quanto ao acesso a mercados, optou-se em
construir um agrupamento da amostra, podendo dessa forma comparar os grupos de
produtores. A fim de dividir os produtores em três grupos, foram realizados dois
procedimentos metodológicos, primeiro foi construído o índice de condição de vida dos
produtores, em seguida foi realizado o agrupamento dos produtores de acordo com o
respectivo índice, por meio do método não hierárquico k-médias, do software SPSS 20.
Para obter o índice para cada produtor, dado o perfil do banco de dados, foi calculado
primeiro um sub-índice para cada dimensão, conforme exposto abaixo:
8
1max
8
1
ii
iij
mj
E
EI
Figura 3 - Território Mato Grande no Estado do Rio Grande do Norte - Brasil
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Onde:
Imj = sub-índice calculado para a m-ésima instância do j-ésimo produtor, sendo
m=1,2 e 3 e j= 1,2,...,592;
Eij = valor do i-ésimo indicador, obtido pelo j-ésimo produtor ;
Emaxi = valor máximo obtido pelo indicador i, em que o valor máximo possível
para cada indicador será sempre 5.
m = dimensões de condições de vida (1,...,3)
j = produtores inseridos nos territórios ( 1,..., 592)
i = indicador componente da instância avaliada (1,...,8)
Após o cálculo do sub-índice para cada instância, foi calculado o Índice de Condição
de Vida dos Produtores rurais com atividade agrícola (ICVP) que residem nos municípios que
fazem parte dos Territórios da Cidadania do Rio Grande do Norte.
3
13
1
mmjj IICVP
Com o ICVP calculado, aplicou-se o método supracitado, dividindo a base de dados
em três grupos: Produtores com menores níveis de condição de vida; Produtores com níveis
intermediários de condição de vida e Produtores com maiores níveis de condição de vida.
Dessa forma pode-se realizar a análise da variável de acesso a mercados, através da tipologia
dos produtores.
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1 Agrupamento e características dos produtores
Quando aplicou-se os métodos apresentados, a distribuição dos produtores se
estabeleceu como exposto na Tabela 1, onde mais de 70% se agruparam nas classes média e
alta, de acordo com a avaliação dos mesmos quanto a sua condição de vida.
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Tabela 1 – Classes do Índice de Condição de Vida dos Produtores rurais com atividade agrícola do Rio Grande do Norte que residem nos municípios inseridos no programa Territórios da Cidadania.
Classes Freq. Ab. Freq. Rel.
Baixo 131 22,13%
Médio 317 53,55%
Alto 144 24,32%
Total 592 100%
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do MDA/SDT
Antes de apresentar o resultado da avaliação de cada grupo, é válido ressaltar suas
características, pois se faz necessário para correlacionar os grupos e os resultados das políticas
PAA e PNAE, no tocante ao acesso ao mercado.
Ao avaliar os grupos, observou-se que os mesmos não se diferenciam quanto a
quantidade de pessoas que residem nos domicílios, que são quatro em média. Quanto ao local
de trabalho, há uma discrepância entre eles, o grupo baixo se destaque por ter a maior
proporção de pessoas em seus domicílios que trabalham apenas fora, e a maior proporção que
concilia o trabalho na produção e fora dela. Já o grupo com índice médio obteve a menor
proporção de pessoas que trabalham apenas no domicílio, diferenciando do grupo com índice
alto que no seu total há ao menos uma pessoa que trabalha apenas na unidade de produção.
A escolaridade dos grupos foi mais uma característica verificada, uma vez que, de
acordo com Almeida, Gutierrez e Marques (2012), a capacidade de ler e escrever abre espaço
para a oportunidade de emprego, para o acesso a informações e ainda possibilita maior
integração social, podendo interferir diretamente na percepção dos indivíduos. Essa foi uma
característica que diferenciou consideravelmente os grupos, quando questionados sobre a
escolaridade dos membros das famílias, quase 90% dos entrevistados que se agruparam no
grupo baixo responderam que nem todos os adultos da residência tinha concluído o ensino
fundamental, e desse total mais de 50% não era alfabetizado. A realidade do grupo médio não
tem uma diferença considerável quando comparado ao grupo anterior. As melhores condições
de níveis educacionais foram para o grupo alto, com 40% de não concluintes do ensino
fundamental.
4.2 Avaliação dos produtores nas condições de acesso a mercado
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Após realizar o agrupamento dos produtores, houve uma heterogeneidade entre os
grupos, ver Gráfico 1. Uma vez que o resultado é de acordo com a opinião dos produtores as
características de cada, é importante para saber se sua avaliação esta ligada a algum aspecto
dos grupos.
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do MDA/SDT
Como já exposto, o grupo com proporção mais semelhante nas respostas foi o médio,
onde se aglomerou mais de 50% dos produtores. Ao observar a distribuição realizada no
referido grupo, nota-se que houve uma divisão quase igualitária, o que reflete opiniões
divididas para um grupo homogêneo. Entretanto, apenas 30,3% dos produtores avaliaram essa
estratégia de mercado de forma positiva, o que reflete a fragilidade do acesso aos mercados
institucionais.
O grupo baixo são os produtores com os menores níveis de condição de vida, e tem
por característica indivíduos voltados para atividades fora do domicílio, essa realidade pode
ser reflexo das dificuldades encontradas pelo grupo para escoar seus produtos, pois em mais
de 50% as opiniões foram negativas. Uma alta proporção na categoria ruim e péssima, não foi
verificada nos outros grupos, essa situação é preocupante nesse conjunto especifico por serem
de acordo com as características os mais frágeis, tendo dessa forma que visualizar quais
dificuldades está deixando esses produtores fora do mercado.
No grupo alto, apenas 10,4% dos produtores classificaram o acesso ao mercado como
ruim ou péssima, sendo este um grupo que em todo domicílio pelo menos um membro
Baixo Médio Alto
64,1%
30,9% 10,4%
29,0%
38,8%
26,4%
6,9%
30,3%
63,2%
Ruim e Péssima Regular Boa e Ótima
Gráfico 1 – Condições de acesso a mercados, comparação entre os grupos do ICVP
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trabalha só na produção. De acordo com as informações, observa-se que em um mesmo
estado existem fragilidades em determinados grupos que precisam ser detectadas.
Vários fatores podem melhorar o acesso a mercado nos territórios, podendo
reverter as avaliações dos produtores quanto a esse ponto estratégico, tanto para compra
quanto no escoamento dos produtos. Verificou-se que na maioria dos cenários deve haver
uma reestruturação da infraestrutura de estradas, a promoção da organização dos produtores e
a diversificação da produção, podendo dessa forma se fortalecer para atingir os mercados
disponíveis como os institucionais, que são voltados para a demanda desse público.
As cooperativas e associações são umas das soluções para melhorar o acesso a
mercados, pois com esses arranjos sociais os agricultores se organizam em vendas coletivas.
De acordo com a cartilha de Estratégias de Acesso a Mercados da Agricultura Familiar
(2013), no desafio de produzir e comercializar, os produtores se deparam com as exigências
dos grandes varejos, obrigando-se a entregar sua produção a preços que, na maioria das vezes,
sequer cobrem os custos de produção. Ao se organizarem em cooperativas ou associações,
eles podem estabelecer preço e atender maiores demandas. A alternativa buscada para
diminuir a concorrência desigual foi a criação dos mercados institucionais que compram as
mercadorias da agricultura familiar a preço de mercado. Essa organização tem impactos na
oferta, podendo suprir vários mercados.
Entretanto, o que se observa nos territórios do Rio Grande do Norte é que as
unidades familiares produzem de forma individual, sendo essa realidade uma característica de
todos os grupos da análise. A Tabela 2 informa que em média 83,56% dos produtores dos três
grupos nunca venderam seus produtos para cooperativas ou por meio de associações.
Tabela 2 – Frequência da venda dos produtos para cooperativas e associações, por categorias do ICVP
Você vende seus produtos para cooperativas
ou por meio de associações?
Baixo Médio Alto
Nunca 86,25% 83,25% 81,18%
Às vezes 11,25% 12,9% 8%
Sempre 2,5% 3,85% 10,82%
Total 100% 100% 100%
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do MDA/SDT.
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As informações referentes à avaliação do comércio podem ser verificadas na
Tabela 3. Para o grupo com índice baixo, o fator que obteve resultado mais ineficiente foi às
condições de compra de insumos. O melhor fator considerado foi à atuação de intermediários,
refletindo a situação da Tabela 2, ou seja, a produção fragmentada atrai os atravessadores.
Mesmo que os intermediários não paguem um preço justo pelo produto, a boa avaliação pode
ser explicada pela garantia que os produtores têm em vender seus produtos, e é nessa
dependência no escoamento da produção que se percebe a necessidade de políticas como PAA
e PNAE no estímulo a venda direta, por meio do acesso ao mercado.
Tabela 3 – Avaliação do comércio das famílias que produzem também para vender, por categoria do ICVP
Baixo Médio Alto
Como avalia a atuação de
intermediários/atravessadores?
Mais para ruim 70% 63% 51%
Mais para bom 30% 37% 49%
Como avalia as condições para ir até os
mercados?
Mais para ruim 79% 58% 58%
Mais para bom 21% 42% 43%
Como avalia as condições para a compra
de insumos (sementes, adubo,
medicamento, rações, equipamentos.)?
Mais para ruim 85% 60% 39%
Mais para bom 15% 40% 61%
Como avalia a venda de produtos? Mais para ruim 76% 55% 42%
Mais para bom 24% 45% 58%
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do MDA/SDT
A participação dos atravessadores na cadeia produtiva de pequenos produtores
provoca uma redução em sua receita líquida, e consequentemente no subdesenvolvimento
socioeconômico. Esta redução é mais grave para pequenos produtores que produzem e
comercializam individualmente (OLIVEIRA; MAYORGA, 2005).
No grupo médio, o melhor fator foi à venda de produtos e o pior foi a atuação de
atravessadores. No grupo alto, o pior fator apontado foram às condições de ir até o mercado,
nesse critério se considera à distância e a facilidade de deslocamento, ou seja, esse grupo
avalia a infraestrutura de estrada e transporte como um fator negativo para a comercialização.
Outro fator destacado na melhora no acesso a mercado foi a diversidade na
produção agrícola, esta se tornou uma alternativa que contribui para melhores resultados
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financeiros e manutenção alimentar das famílias rurais. Entre os grupos avaliados no trabalho,
essa variação não foi verificada em grandes proporções. Quase 50% dos produtores do grupo
alto declararam que a diversidade agrícola da propriedade está entre, mais ou menos e nada
variada. Esse resultado aumenta quando se analisam os demais grupos, no baixo esse valor
subiu para mais de 80%. Denardi (2001) destaca alguns pontos importantes para que a
produção rural possa se diversificar: desenvolvimento de sistemas de produção sustentável,
aproveitamento de nichos e diversificação de produtos, sendo a diversificação indispensável à
sobrevivência e competitividade dos territórios, pois mantém a população ao criar mercado de
trabalho.
Além dos desafios destacados a serem superados pela agricultura familiar quanto
o acesso a mercados, as condições para obter benefícios das políticas públicas também é
determinante para os grupos. A avaliação dos produtores não foi positiva para nenhum grupo,
em 70%, 50,5% e 26,4% dos produtores baixo, médio e alto respectivamente, declararam que
o acesso a políticas públicas é complicado e muito complicado. Sendo um ponto a ser
trabalhado nas políticas institucionais de acesso a mercado pelos programas PAA e PNAE.
5 CONCLUSÃO
Alimentos de compras públicas trazem benefícios importantes para os pequenos
produtores, uma vez que é o acesso a um mercado garantido com um preço previsível. Tendo
um mercado estável e, portanto, menos renda variável, incentiva o aumento do investimento
da exploração. No caso do Brasil também promove práticas de produção sustentáveis por
meio de incentivos financeiros especiais. Além disso, incentiva a melhoria na qualidade do
produto e segurança alimentar, pois, a fim de participar dos programas de agricultores têm de
cumprir com os níveis normais exigidos, e fortalecer as associações de produtores através do
qual as compra são normalmente canalizadas (ARIAS et al, 2013 apud CHMIELEWSKA;
SOUZA, 2010).
Os programas como PAA e PNAE tem uma forte influencia na dinâmica das
políticas voltadas a agricultura familiar. Ao dividir a amostra em três grupos com
características diferentes pode se perceber que há uma fragilidade nas ações de mercado
institucionais, principalmente para os grupos mais frágeis, refletido na avalição dos
produtores quanto o acesso a mercados. Os mercados institucionais devem estar cada vez
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mais presentes no fortalecimento da agricultura familiar, pois mais de 90% dos produtores do
grupo mais frágil da analise, avaliou o acesso a mercados entre regular e péssimo.
Nesse formato, o PAA e o PNAE são modelos que promovem a interação entre
produtores agricultores familiares e consumidores, fazendo a ligação entre campo e cidade, as
compras institucionais se mostram como uma importante ferramenta de apoio ao acesso a
mercados diretos e fortalecimento das cadeias produtivas, como também a garantia de
alimentos seguros para uma população que sofre continuamente ou momentaneamente de
situação de insegurança alimentar, contribuindo socialmente e economicamente para a
superação desses problemas.
Todos os três grupos não avaliam de forma positiva a integração nas políticas com
a implementação dos programas nas ações de mercado, sendo este um ponto a ser trabalhado
a fim de melhorar a aproximação efetiva com os produtores.
REFERÊNCIAS ALMEIDA, Marcos Antonio Bettine de; GUTIERREZ Gustavo Luis; MARQUES Renato. Qualidade de vida: definição, conceitos e interfaces com outras áreas de pesquisa. São Paulo: Escola de Artes, Ciências e Humanidades - EACH/USP, 2012. ARIAS P.; HALLAM D.; KRIVONOS E.; MORRISON J. Smallholder integration in changing food markets, (FAO) Food and Agriculture Organization of the United Nations: Rome, 2013, 48 p BRASIL, MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO. Referências para o desenvolvimento territorial sustentável. Brasília. 2003. DELGADO, Nelson Giordano; BONNAL Philippe; LEITE, Sérgio pereira. Desenvolvimento territorial: articulação de políticas públicas e atores sociais. Rio de janeiro. 2007. DENARDI, Reni Antonio. Agricultura familiar e políticas públicas: alguns dilemas e desafios para o desenvolvimento rural sustentável. Porto Alegre, 2001. FUNDAÇÃO BANCO DO BRASIL. Estratégias de Acesso a Mercados para Agricultura Familiar. Brasília, 2013. HESPANHOL, Rosangela Aparecida de Medeiros. Mudança na concepção das políticas públicas para o campo brasileiro: o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). In: X Colóquio Internacional de Geocrítica, 2008, Barcelona - Espanha. Anais do X Colóquio Internacional de Geocrítica. Barcelona - Espanha: Universidad de Barcelona, 2008. v. 01. p. 01-15.
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MATTEI, L. Políticas públicas de combate à fome: o caso do Programa de Aquisição de Alimentos da agricultura familiar no Estado de Santa Catarina. Sociedade e desenvolvimento rural, v. 1, n. 1, 2007. OLIVEIRA, Antonio Dimas Simão de; MAYORGA, Maria Irles de Oliveira. Os impactos da participação do atravessador na economia do setor agrícola: Um estudo de caso. In: XLIII CONGRESSO DA SOBER. Ribeirão Preto, 2005. PEIXINHO, Albaneide Maria Lima. A trajetória do Programa Nacional de Alimentação Escolar no período de 2003-2010: relato do gestor nacional. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro , v. 18, n. 4, Abr. 2013 Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141381232013000400002&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 20 set. 2013. SOUZA, Linconl Moraes de. Políticas públicas: introdução às atividades e análise. Natal/RN: EDUFRN, 2009.
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COMPOSIÇÃO DE RENDA NAS ÁREAS DE ASSENTAMENTOS NO MUNICÍPIO
DE MOSSORÓ/RN: ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO E DA CAPACIDADE
PRODUTIVA
Autor(es): Leovigildo Cavalcanti de Albuquerque Neto; Maria Elza de Andrade
Filiação: Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN; Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN E-mail: [email protected]; [email protected]
Grupo de Pesquisa: Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo
Este artigo tem como objetivo analisar o processo de formação de renda dos assentamentos Paulo Freire, Independência e Sussuarana no município de Mossoró no Estado do Rio Grande do Norte. Metodologicamente, a análise teve como parâmetro a pesquisa realizada pela FAO no ano de 1994, incluindo-se novas categorias de renda, quanto ao seu processo de formação. Foram aplicados questionários com 20 famílias (20% do total) e contextualizadas a renda obtida pelas mesmas entre os anos de 2012 e 2013. Os resultados indicam vulnerabilidades quando ao funcionamento e infraestrutura dos assentamentos. No que se refere a renda, verificou-se uma dependência elevada das transferências (rendas previdenciárias e doações) e de trabalhos realizados fora do assentamento (renda outros trabalhos), o que suscita uma discussão, quanto ao caráter produtivo destas áreas de assentamentos.
Palavras-chave: Assentamentos; Reforma Agrária; Renda
Abstract
This article aims to analyze the process of income formation of settlements Paulo Freire, Independence and Sussuarana in the city of Mossoro State of Rio Grande do Norte. Methodologically, the analysis was based on research conducted by FAO in 1994, including new categories of income and their training process. Questionnaires were applied to 20 families (20% of total) and contextualized the income generated by families between the years 2012 and 2013. The results indicate vulnerabilities when operation and infrastructure of the settlements. As regards income, there was a high dependence on transfers (social security income and donations) and work done outside the settlement (income other works), which raises a discussion about the character of these productive areas of settlements. Key words: settlements; Land reform; Income.
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1. Introdução
A intensificação da luta pela terra ocorrida no Brasil nas últimas décadas contribuiu para
o surgimento dos Assentamentos Rurais e está diretamente relacionada com a questão agrária
brasileira, marcada pela estrutura fundiária concentrada e intervenções políticas que acentuaram
as desigualdades sociais, pautada num desenvolvimento econômico voltado para a
agroindústria em detrimento de ações que privilegiam a Reforma Agrária.
A garantia de sucesso dos assentamentos não é determinada apenas pelo acesso a terra,
para que seja possível, é necessário desenvolver políticas não apenas de aspecto produtivo, mas
também sociais, com acesso a infraestrutura produtiva e social. O desenvolvimento de
estratégias de organização produtiva, comercialização, gestão e efetivamente o êxito dos
assentamentos será uma consequência da incorporação de inovações, ou propriamente, de como
se fomentará localmente as estratégias e ações.
Os assentamentos devem ser encarados como elementos práticos de fixar o trabalhador
no campo, contribuindo para sua auto sustentação juntamente com sua família, no entanto, a
realidade agrícola, demonstrada por meio de pesquisas e estudos científicos, evidencia, que
muitas vezes, os assentamentos não estão sendo capazes de produzir nem o suficiente para o
autoconsumo, principalmente devido a predominância da tradicional prática de um agricultura
de sequeiro. O município de Mossoró, assim como em alguns estados do Nordeste, ocorre com
frequência períodos de escassez de chuvas e secas, que dificultam o sucesso num tipo de
agricultura que não tenha a prática da técnica da cultura de irrigação.
Neste contexto, um estudo que aborde a formação/composição de renda em áreas de
assentamentos no município de Mossoró, abre uma discussão sobre a reforma agrária em
regiões semiáridas e a capacidade de “sustentabilidade” no que se referem os seus mais diversos
aspectos, inclusive da capacidade de organização do trabalho e os resultantes produtivos que o
possibilitariam numa inserção do mercado.
Especificamente, este artigo tem como objetivo o analisar o processo de formação de
renda dos assentamentos Paulo Freire, Independência e Sussuarana no município de Mossoró
no Estado do Rio Grande do Norte, os três sobre responsabilidade do Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (INCRA). O foco principal será a identificação da
execução/organização do trabalho nas áreas dos assentamentos (dentro e fora), utilizando como
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parâmetro, a metodologia utilizada pela pesquisa da FAO – Food and Agriculture Organizat ion
of the United Nations - (ROMEIRO, 1994) no processo de produção, emprego e organização
produtiva.
2. Sustentabilidade em áreas de Assentamentos de Reforma Agrária
A literatura mostra que a reforma agrária, não obstante alguns resultados insatisfatór ios,
tem contribuído de uma maneira geral para a melhoria de alguns aspectos sociais no tocante ao
acesso a terra, a moradia e melhora de autoestima do pequeno produtor, sendo considerado
positiva, inclusive quando comparando a situação anterior na qual se encontrava o referido
assentado e sua família antes da deflagração deste processo.
Segundo Spavorek (2003, p.37):
“Essas perspectivas reforçam o potencial ainda latente da
reforma agrária como sendo um meio eficiente e sustentável de
combater a pobreza, melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores
rurais e da população urbana, gerando, também, desenvolvimento
econômico e melhorando a distribuição de renda numa escala ampla e
realista.”
No tocante a sustentabilidade dos Projetos de Assentamentos, Costa Neto e Anjos (s/d,
p.03) enfocam as dimensões sociais da sustentabilidade – incluídos os elementos de qualidade
de vida - em assentamentos rurais no Brasil:
(...) não se pode perder de vista que os problemas sociais
relacionados com a agricultura - como a concentração fundiária e a
concentração de rendas, as precárias condições de trabalho ou mesmo a
fome e a miséria – são problemas muito mais antigos. E o processo
histórico que resultou nas atuais discussões sobre a noção de
sustentabilidade tem origem no agravamento dos problemas
ambientais, principalmente a erosão dos solos, a contaminação dos
recursos hídricos e a destruição das florestas. Portanto, parece coerente
a „inclinação‟ para as questões naturais.
O desenvolvimento sustentável não se refere a uma meta tangível, a qual se pode
alcançar num tempo específico e determinado, mas refere-se à “a la posibilidad de mantener un
equilibrio entre factores que explican un cierto nivel de desarrollo del ser humano, nível que es
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siempre transitorio, en evolución y, al menos en teoría, debería ser siempre conducente a
mejorar La calidad de vida de los seres humanos” (DOUROJEANNI, 1999, p.03)
O processo de reforma agrária pode ser entendido como um elemento de transformação
integral de um território, que afeta inúmeros componentes de cunho social, econômico, cultura l,
ambiental, etc. Entende-se que este processo de transformação avança quando se adotam novos
paradigmas (não apenas produtivistas).
A instalação de uma área de assentamento, em primeira instância, se constitui em uma
política redistributiva de caráter socioeconômico; posteriormente, configura-se em instrumento
centrado em uma multiplicidade de enfoques relacionados com a sustentabilidade e o
desenvolvimento humano e territorial.
Assim, é de fundamental importância ter como referência a existência de diferentes
recortes territoriais em uma mesma espacialidade, construídos a partir dos assentamentos,
entendidos como áreas de influência e de constituição de determinadas redes de relaçõe s
econômicas, sociais e políticas - que podem coincidir com um município, com um conjunto de
municípios ou ainda com partes deles.
Com isso, assume-se que há processos múltiplos a serem considerados que antecedem
o assentamento, são concomitantes a ele e o sucedem. Ou seja, falar em impactos regionais dos
assentamentos rurais implica perceber diferentes dimensões e escalas de influência destas
relações sociais, econômicas, políticas e ambientais, que se desenvolvem como um processo,
em espaços e tempos marcados e delimitados pela própria criação dos assentamentos, mas que
levam à necessidade de atentar para as condições anteriores da "região" dos assentados (LEITE,
1998)
Segundo Leite (1998, p.18), o processo de reforma agrária oferece uma congruênc ia
entre o crescimento e o desenvolvimento econômico e social, quando compatibilizado a
“administração do fluxo de famílias assentadas e do estoque de patrimônio fundiá r io
(arrecadado ou a ser arrecadado) em um compasso mais estreito ” , aferindo-se com mais
percepção os impactos “locais/regionais” em razão da criação de novas áreas de assentamentos
e consequentemente da execução das estratégias de desenvolvimento local, principalmente
quando observado a capacidade de inovação dos agentes sociais/coletividade dos
assentamentos.
Um dos aspectos a considerar na execução de um programa de reforma agrária é o
fomento a instrumentos que possibilitem a diminuição da pobreza rural, dotando as famílias
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assentadas de fatores de produção, que potencialmente contribuirão na formação de uma
segurança alimentar (através da geração de renda de autoconsumo). Ademais, considera-se que
o papel das áreas de assentamentos, além de cumprir esta função social, também pode
incorporar a possibilidade de geração de renda que permita a incorporação destas famílias a um
mercado de massas.
3. Metodologia
Para o alcance dos objetivos propostos optou-se por utilizar a metodologia adotada pela
FAO no ano de 1994. A renda, dada sua importância dentro do modelo utilizado na pesquisa, é
concebida segundo Guanziroli (1994) como “bom indicador de desempenho econômico, tanto
em termos de eficiência como em termos comparativos, isto é, de custos de oportunidade”.
Seguindo a FAO, a renda é composta por várias categorias, assim postas e definidas
(Albuquerque Neto, p 13):
a) Renda Agrícola Líquida Monetária: é a renda obtida com a venda dos
produtos agrícolas, segundo os preços declarados pelos assentados
(indexados pelo IGP/FGVDI), diminuída dos correspondentes custos de
produção, também avaliados pelos valores declarados nas entrevistas;
b) Renda Animal Líquida Monetária: é a renda obtida com a venda dos
animais e derivados, diminuída dos seus correspondentes custos de
produção (avaliação idem ao ponto anterior);
c) Renda de Autoconsumo: é a renda gerada pela atividade de consumo
de sua própria produção; as quantidades consumidas (segundo
declaração) foram avaliadas de acordo com os mesmos preços de venda
da produção; ou seja, trata-se da renda que o agricultor obteria se
vendesse, ao invés de consumir esta parcela da produção;
d) Renda de Outros Trabalhos: incluem-se aqui os salários obtidos
como remuneração por empregos temporários ou permanentes dos
membros da família;
e) Renda de Outras Receitas: são as vendas ocasionais de produtos não-
agrícolas, como por exemplo, madeira, carvão, extrativismo pequeno
comércio, artesanato.
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No tocante a composição/obtenção da renda nos assentamentos de reforma agrária, foram
incluídas duas outras categorias na análise, conforme adotado por Albuqueque Neto (2011,
p.14):
f) Renda Previdenciária: rendas oriundas de aposentadorias e/ou
benefícios auferidos pelos membros da família.
g) Renda Programas Sociais/Doações: rendas oriundas de programas
sociais e/ou doações auferidas pelos membros da família.
No Estado do Rio Grande do Norte, o município de Mossoró tem intensificado sua
política de reforma agrária, contando com 33 projetos de assentamentos, dos quais foram
definidos três Assentamentos do município sob a responsabilidade do INCRA – Sussuarana,
Padre Freire e Independência-, que cumpriam o enquadramento geral do estudo da FAO, com
o intuito de contribuir para diagnosticar possíveis entraves que possam ser superados para a
promoção do desenvolvimento rural sustentável.
A composição da base de dados se estabeleceu a partir de 20 famílias, correspondendo
a um total de 20% do número total de famílias por assentamento. O instrumento de coleta de
dados estruturou-se em diversas partes. Na primeira parte foram coletados os dados pessoais
dos assentados, quanto ao local de moradia (tipo e condições da residência), idade, sexo, nível
de escolaridade, tempo no assentamento. Na segunda parte do questionário, procurou-se
identificar onde foi gerado cada um dos tipos de rendas (dentro e fora do assentamento), assim
como saber os diversos tipos rendas auferidas mediante transferências governamentais. Na
terceira parte, buscou-se compreender as relações produtivas do assentado e suas práticas
agrícolas utilizadas usualmente; e na quarta parte, perguntas abertas sobre o processo de
funcionamento dos assentamentos, bem como das práticas utilizadas pelos responsáveis pela
política de reforma agrária.
No assentamento Independência 7 (sete) famílias foram entrevistadas e o Paulo Freire
com 11 (onze), No Sussuarana foram entrevistadas 2 (duas) famílias na vila agrícola do
assentamento, conforme distribuição espacial do referido assentamento, onde o quadro
apresentado foi de preocupação, mediante o fato que dos assentamentos visitados, o mesmo
dispunha da pior infraestrutura, principalmente quanto a da falta de água.
Todo o estudo teve como parâmetro o salário mínimo (de 2012), como base de rendas
auferidas pelas famílias no ano de 2012 e 2013 (tendo-se uma média dos 02 anos pesquisados).
A utilização desta unidade de referência, contribui para a identificação dos valores percebidos,
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não apenas das chamadas transferências diretas, mas também para mensurar o consumo, e a
venda agrícola e animal (quando possível de serem realizadas), ou mesmo da realização de
atividade remunerada fora do assentamento.
4 Resultados e discursões
4.1 Caracterização geral e de infraestrutura
No que se refere ao perfil informal dos assentados, em sua maior parte tem idade igual
ou superior aos 55 anos e possuem alguma renda vinda de aposentadoria/benefício, e quase
todos foram unânimes em afirmar que tinham experiência na lida do campo, e já viviam ou
trabalhavam na região antes de irem morar no assentamento.
A condição de moradia se constitui um dado significativo no processo de construção de
um povo. No caso dos assentamentos da amostra todos são providos de casa de alvenaria em
estado razoável de conservação, encontrando-se quase todas rebocadas, sendo algumas em
estágio mais avançado de melhorias, seguindo um padrão que oferece um conforto regular para
a família do assentado, constando um nível satisfatório em quase todas as moradias.
Tabela 1 - Tipo de moradia e infraestrutura nos assentamentos pesquisados.
Assentamento
Tipo de moradia e Infraestrutura disponibilizada na Vila dos Assentamentos
Tipo de moradia
(Alvenaria)
Fornecimento de Água
Encanada
Saneamento
Básico
Fornecimento de
Energia Elétrica
Com
Reboco
Sem
Reboco Água Sem Água Sem Esgoto Energia
Sussuarana 0% 100,00% 0,00% 100,00% 100,00% 100,00%
Independência 71,43% 28,57% 100,00% 0,00% 100,00% 100,00%
Paulo Freira 27,27% 72,73% 100,00% 0,00% 100,00% 100,00%
Fonte: Pesquisa de campo realizada com as famílias assentadas.
No que se diz respeito ao acesso a água potável, o seu abastecimento é um dos maiores
problemas enfrentados pelos estabelecimentos, mostrando-se precária em quase totalidade da
amostra, sendo fato que mesmo nos assentamentos que possuem água encanada o tratamento
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da água é ineficaz quanto à qualidade e quantidade ofertadas em todos os assentamentos onde
é distribuída de forma escassa e sem periodicidade determinada.
A energia elétrica está presente em todos os assentamentos com índices de 100%, fato
este que pode proporcionar um tipo de lazer aos estabelecimentos levando em consideração a
compra de aparelhos de TV, ou até mesmo aparelhos eletrônicos e eletrodomésticos.
O acesso à comunicação passa a ser cada dia mais valorizado, e se faz presente e também
necessária na vida da população de assentados, por exemplo, a televisão se configura como um
meio de informação importante nos assentamentos rurais, visto que possibilita a comunicação
destes fora da comunidade que vivem, além de ser utilizada como uma alternativa de lazer,
outra forma de comunicação são os telefones públicos e o acesso à internet.
Outro quesito no que se refere à infraestrutura é a ausência de tratamento sanitário tanto
para os resíduos líquidos quanto para os resíduos sólidos produzidos nas áreas de assentamento.
O problema se agrava devido à contaminação de solos e disseminação de doenças em
decorrência do não tratamento dos dejetos ali produzidos.
A educação e a saúde também são indicadores sociais responsáveis pela qualidade de
vida da população, nesse sentido há a existência de escolas no âmbito dos ciclos iniciais do
ensino fundamental, onde os alunos do 6º ao 9º ano e os que precisam fazer o ensino médio vão
estudar na zona urbana deslocando-se em carros que são pagos pela prefeitura. Essa carência
quanto à educação reflete de forma clara nos índices de escolaridade da população entrevistada,
mostrando-se bastante baixo, onde nossa pesquisa de campo identificou que 13% eram
analfabetos; 76% tinham apenas o 1º grau incompleto; 11% tinham 1º completo. Indicando que
é necessário efetuar políticas de combate ao analfabetismo, principalmente no tocante a
programas de alfabetização para adultos.
No tocante a saúde, os assentamentos não contam com postos de saúde onde as
emergências possam ser atendidas, apenas um médico se apresenta ao estabelecimento uma vez
por mês ou contam com um agente de saúde que dependendo da necessidade encaminha o
paciente para zona urbana ou comunidades rurais mais próximas com melhores condições.
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4.2 Composição de Renda em áreas de Assentamento no município de Mossoró
Os sistemas produtivos locais operam com base em relações de trabalho peculiares
diretamente relacionadas com o ambiente social e com a estrutura econômica, permitindo,
assim, uma articulação da produção agropecuária com o modo de vida local.
A partir do momento em que as atividades não agrícolas se tornam a principal fonte de
renda permanente da família, além de se alterar a divisão do trabalho, redefine-se, também, uma
série de relações.
Tabela 2 -Renda média dos assentamentos em salário-mínimo/percentual da renda por
atividades (2012 e 2013)
Assentamento Paulo Freire Sussuarana Independência Média
Renda Agrícola Líquida 0,00 0,00 0,00 0,00
0,00% 0,00% 0,00% 0,00%
Renda Animal Líquida 0,21 0,03 0,08 0,10
11,42% 1,27% 4,83% 5,84%
Renda Consumo
0,09 0,14 0,19 0,14
4,64% 6,61% 11,66% 7,64%
Outros Trabalhos
0,73 1,25 0,29 0,76
39,51% 57,58% 17,33% 38,14%
Outras Receitas
0,00 0,00 0,08 0,03
0,00% 0,00% 5,09% 1,69%
Receita Previdenciária
0,73 0,75 0,86 0,78
39,51% 34,55% 51,98% 42,01%
Receita Programas Sociais e/ou Doações
0,09 0,00 0,15 0,08
4,91% 0,00% 9,12% 4,67%
Renda Média Mensal* 1,84 2,17 1,65 1,88
Fonte: Pesquisa de campo realizada com as famílias assentadas no período de janeiro de 2013 a janeiro de 2014. Obs:* Valor médio nominal dos Salários Mínimos de 2012( R$ 622,00) e 2013 (R$ 678,00).
Neste sentido, numa situação de crise da agricultura (citando o caso dos anos de 2012 e
2013 dada a ocorrência de seca), a alternativa dos assentados foi de se inserirem em atividades
rurais não meramente agrícolas e que oferecem uma maior remuneração, através da integração
de atividades. Desta maneira, segue-se fazendo uma análise de cada uma das rendas, aportando
dados e informações do que foi pesquisado em cada um dos assentamentos.
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4.2.1 Renda Agrícola
Na região de semiárido dois tipos de práticas culturais agrícolas são mais utilizados, são
a cultura de sequeiro, considerada a tradicional, dependente da chuva, geralmente é realizada
no período de consolidação do inverno, onde se procura utilizar culturas com ciclo de produção
curta e a cultura agrícola irrigada que tem por objetivo o fornecimento controlado de água para
as plantas em quantidade suficiente e no momento certo.
Nos assentamentos pesquisados nenhum deles possui o tipo de plantação irrigada,
predominando a prática de sequeiro, no qual ocorre em frequência em períodos de chuva, o que
dificulta o sucesso em estabelecimentos que não tenha por base a técnica da irrigação.
Os assentamentos, de uma forma geral, apresentam uma dificuldade quase extrema de
formar receita agrícola sendo que fundamentalmente a produção é dependente de condições
meteorológicas. Apesar da produção não ter sido suficiente para ser vendida, ainda foi
concebida parte ao autoconsumo e o restante da plantação como base da alimentação para os
animais. As práticas desempenhadas no processo produtivo nos Assentamentos pesquisados são
consideradas segundo as famílias, difíceis de serem executadas, seja por abandono dos órgãos
responsáveis na condução de políticas da reforma agrária, seja pela própria falta de
comprometimento/condições dos que estão instalados no referido assentamento.
4.2.2 Renda Animal
Compondo-se de diversas características produtivas e tipos de animais, tais como
bovinos, caprinos, ovinos, suínos, equinos, aves e, etc. Nas áreas dos assentamentos a produção
animal apresentam algumas características gerais, nas quais os animais não apresentam uma
caracterização racial uniforme, ou seja, sem padrão definido, e que por esta razão apresentam
uma taxa de conversão alimentar baixa; são criados, em geral, de forma extensiva, soltos nos
lotes individuais ou na parte coletiva, e em alguns casos adentram inclusive na área de
preservação ambiental; quase todas as instalações são precárias, não possuem controle sanitário,
nutricional e veterinário.
Geralmente a utilização das áreas coletivas para a criação é comum. A produção animal
apresenta como origem tanto o sistema extensivo (área comunitária do assentamento e/ou área
de preservação), como o sistema intensivo (área individual dos assentamentos). Onde em sua
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maior parte os animais nas áreas de assentamento são vistos como um tipo de poupança viva,
para uma eventual necessidade financeira ou como utilização de consumo próprio, e não como
um produto a qual sua maior finalidade seria o mercado.
Para uma análise geral, apresenta-se na tabela 3 a composição de renda animal nas áreas
de assentamento pesquisadas no município de Mossoró.
Tabela 3 - Composição Média da renda animal nos assentamentos no ano de 2012/2013.
Assentamento
Renda
Animal total em Salários
mínimos*
Média Mensal
por Assentado estimada**
% da
Renda
Total S.M.
Padre Freire 27,75 0,21 6,90%
Sussuarana 0,66 0,03 1,27%
Independdência 6,69 0,08 4,83%
Fonte: Fonte: Pesquisa de campo realizada com as famílias assentadas no período de janeiro de 2013 a janeiro de 2014. Obs:* Valor médio nominal dos Salários Mínimos de 2012( R$ 622,00) e 2013 (R$ 678,00). ** Média Mensal por Assentados = (Renda Animal total/Nº de assentados )/12 meses .
O criatório de animais desenvolvido no assentamento Paulo Freire como nos demais
assentamentos, o tripé da base para a produção da renda é ovino/suíno/caprinos e aves,
predominando neste caso a criação de caprinos, visualizando-se também a utilização de cabras
na venda do leite destes animais, que segundo afirma um dos assentados apresentam maio r
rentabilidade até mesmo que o leite de vaca.
O assentamento Sussuarana, mesmo apresentando todas as dificuldades de
infraestrutura, ainda se mostra capaz de produzir um mínimo para o próprio consumo de
pequenos animais como ovinos, caprinos e aves.
A pauta da renda animal no Assentamento Independência apresenta a criação de aves
(neste caso galinhas), ovinos e caprinos, Mesmo existindo a criação de animais de pequeno
porte, verificou-se praticamente as mesmas características entre os assentamentos: anima is com
baixa produtividade e soltos na zona comunitária, encontrando-se em diferente situação os
suínos e as aves, pois precisam de uma atenção diferenciada.
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Portanto, os assentamentos mostram um baixo aproveitamento, não apenas no aspecto
da renda agrícola, mas também no desenvolvimento da renda animal. Demonstrando
fragilidade, quanto as principais atividades com capacidade de inserção no mercado.
4.2.3 Renda Consumo
A formação da renda consumo, corresponde a mais importante parcela da renda total
constituída dentro de um assentamento. É a renda gerada pela atividade de consumo de sua
própria produção (produção de subsistência); as quantidades consumidas (segundo declaração)
foram avaliadas de acordo com os mesmos preços de venda da produção; ou seja, trata-se da
renda que o agricultor obteria se vendesse ao invés de consumir esta parcela da produção.
Os dados obtidos com a pesquisa quanto a renda autoconsumo podem ser vistos na
tabela abaixo.
Tabela 4 - Composição da renda média autoconsumo nos assentamentos no ano de 2012
e 2013.
Assentamento
Renda
Consumo em Salários
mínimos*
Média Mensal
por Assentado estimada**
% da
Renda
Total S.M.
Paulo Freire 11,25 0,09 4,64%
Sussuarana 3,44 0,14 6,61%
Independencia 16,15 0,19 11,66%
Fonte: Pesquisa de campo realizada com as famílias assentadas no período de janeiro de 2013 a janeiro de 2014. Obs:* Valor médio nominal dos Salários Mínimos de 2012( R$ 622,00) e 2013 (R$ 678,00). ** Média Mensal por Assentados = (Renda Autoconsumo total/Nº de assentados )/12 meses.
O processo de formação da renda consumo nos estabelecimentos apresentaram dois
tipos de atividades a criação de animais e a atividade agrícola.
No assentamento Paulo Freire, a Renda Consumo tem uma formação composta por
Criação de Animais (45,45%) e Atividades Agrícolas (54,55%). Quanto ao consumo de
animais, temos um relativo consumo de pequenos animais (ovinos, caprinos e aves),
significando uma dieta relativamente regular. No caso dos caprinos, esta frequência é maior, e
ocorre geralmente em período de inverno, onde os animais estão mais gordos e são sacrificados,
sendo consumida uma parte, armazenada outra e a parte restante vendida.
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No assentamento Sussuarana a renda consumo tem uma formação composta somente
por criação de animais, em razão as irregularidades da chuva, prejudicando o plantio, e que
apresentam a seguinte pauta na prática do autoconsumo. Quanto a formação da renda consumo
no assentamento Independência a renda é composta por Criação de Animais (45,45%) e
Atividades Agrícolas (54,55%),
Os resultados indicam que a realização de uma reforma agrária efetiva, passe
necessariamente pelo fortalecimento, incentivo, bem como pela dotação aos assentados de
meios e ferramentas para pratica do autoconsumo, além do mais óbvio, demonstrar ao assentado
que isto geraria a ele uma melhor qualidade de vida.
4.2.4 Renda de outros Trabalhos
Considerando que a maioria dos agricultores trabalham no assentamento em agricultura
de subsistência, dada as condiçoes das irregularidades pluviais que não permitiram um bom
aproveitamento na produção, estes não conseguiram obter renda suficiente para sobrevivênc ia
da família, sendo necessario procurar uma outra fonte de renda além das atividades
agropecuárias.
O volume de renda gerada nos assentamentos carece de observações particulares, tanto
de sua forma de integração, quanto de sua inserção ao mercado laboral, de cunho urbano como
demonstram a tabela 5.
Tabela 5 - Composição da renda média outros trabalhos nos assentamentos no ano de
2012 e 2013.
Assentamento
Renda
Outros Trabalhos em
Salários mínimos*
Média Mensal
por Assentado estimada**
% da
Renda
Total S.M.
Paulo Freire 96,00 0,73 39,51%
Sussuarana 30,00 1,25 57,58%
Independência 24,00 0,29 17,33%
Fonte: Pesquisa de campo realizada com as famílias assentadas no período de janeiro de 2013 a janeiro de 2014. Obs:* Valor médio nominal dos Salários Mínimos de 2012( R$ 622,00) e 2013 (R$ 678,00).
** Média Mensal por Assentados = (Renda Outros trabalhos total/Nº de assentados )/12 meses
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Este tipo de renda se compõe basicamente em três categorias de trabalho, a) Diaristas
e/ou autônomos, que são os trabalhos executados fundamentalmente em áreas próximas aos
assentamentos, de cunho agrícola ou que executam trabalhos com certa frequência em
atividades voltadas para a prestação de serviços, além dos que exercem atividades no setor
informal; b) contrato temporário, composta de pessoas que trabalham para as chamadas
empresas prestadoras de serviços e; c) trabalho permanente, que agrega os funcionár ios
públicos, comerciários, ou empregados de setores industriais.
Os resultados demonstram que mesmo sendo praticamente consolidado o assentamento
Paulo Freire, o mesmo ainda não foi capaz de criar uma base produtiva, voltada especificamente
para as chamadas rendas agrícolas, o que pressupõe uma série de interferências do meio
urbano/programas de transferência de renda, no processo produtivo dos assentamentos que leva,
em suma, a vulnerabilidade extrema quanto a papel da terra como fator de produção.
A geração de renda oriunda de outros trabalhos no assentamento Independência
solidifica a contextualização do novo rural e da consequente simbiose entre o rural e urbano,
ficando cada vez mais difícil quantificar, determinar ou mesmo abstrair o que é gerado ou
produzido de atividades agropecuárias.
A facilidade de acesso para a sede município Mossoró, contribui bastante para o
deslocamento desses assentados em busca de empregos no meio urbano.
A realidade do assentamento Sussuarana é evidentemente aterradora, especialmente
quando se verificou a desmobilização produtiva (agrícola e animal), inclusive com a
prerrogativa das condições de infraestrutura que desmotivam qualquer tipo de ação por parte
dos assentados.
Assim como os demais assentamentos, o assentamento Sussuarana passa por um
processo de descaracterização produtiva (agrícola e animal), o que leva a uma consequente
dependência de outros tipos de renda para garantir a sobrevivência do assentado, nesse caso,
voltados para o emprego formal, em especial, em atividades não agrícolas.
A distribuição das ocupações dos assentados centra-se especificamente em setores
distintos da atividade agrícola. Tais resultados nos leva a expressar, na realidade, o
descontentamento com as políticas públicas, em especial as agrícolas, de forma eu praticamente
“obriga” os assentados a incorporem em atividades que proporcionem algum tipo de
rendimento.
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4.2.5 Renda de outras Receitas
A formação de rendas outras receitas são derivadas das vendas ocasionais de produtos
não agrícolas, como por exemplo, madeira, carvão, extrativismo pequeno comércio, artesanato.
Conforme tabela 06, apenas o assentamento Independência realiza algum tipo de
atividade que gera um tipo de renda.
Tabela 6 - Composição da renda média outras receitas nos assentamentos no ano de
2012 e 2013.
Assentamento
Renda
Outras Receitas
em Salários mínimos*
Média Mensal
por Assentado estimada**
% da
Renda
Total S.M.
Paulo Freire 0,0 0,00 0,0%
Sussuarana 0,0 0,00 0,0%
Independência 7,05 0,08 5,09%
Fonte: Pesquisa de campo realizada com as famílias assentadas no período de janeiro de 2013 a janeiro de 2014. Obs:* Valor médio nominal dos Salários Mínimos de 2012( R$ 622,00) e 2013 (R$ 678,00). ** Média Mensal por Assentados = (Renda Outras receitas total/Nº de assentados )/12 meses.
A atividade realizada nesta categoria foi a extração de pedra de calcário, utilizada
também como fonte de renda alternativa para subsistência. Mostrando a vulnerabilidade dos
assentamentos no que diz respeito à utilização dos recursos naturais.
4.2.6 Renda Previdenciária
O processo de formação da Renda Previdenciária é oriundo de aposentadorias/pensões
e ou auxílios auferidos pelos membros da família e se constitui no mais importante tipo de renda
para os assentamentos pesquisados.
Conforme pode-se constatar na pesquisa, a aposentadoria serve como sustentáculo
familiar, principalmente como forma de diminuição da pobreza. A resposta a esta questão,
afirmativa entre 90% dos entrevistados que a aposentadoria os motiva a permanecer na área
rural, deixa claro que o benefício é um fator fundamental para a permanência de muitas famílias
no meio rural, pois se constitui em política efetiva que garante renda mínima ao aposentado e à
sua família, impedindo o aumento do êxodo rural. A garantia de renda mínima é fundamenta l
no meio rural, já que gera estabilidade, condição que a atividade agrícola não proporciona
devido às oscilações climáticas, pragas, crises econômicas, etc.
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Tabela 7 - Composição da renda média previdenciária nos assentamentos no ano de
2012 e 2013.
Assentamento
Renda
Previdenciária total em
Salários mínimos*
Média Mensal
por Assentado estimada** % da Renda
Total S.M.
Paulo Freire 96,00 0,73 39,51%
Sussuarana 18,00 0,75 34,55%
Independência 72,00 0,15 9,12%
Fonte: Pesquisa de campo realizada com as famílias assentadas no período de janeiro de 2013 a janeiro de 2014. Obs:* Valor médio nominal dos Salários Mínimos de 2012( R$ 622,00) e 2013 (R$ 678,00). ** Média Mensal por Assentados = (Renda Previdenciária total/Nº de assentados )/12 meses
Os dados da tabela 8 demonstram o peso das duas últimas faixas etárias na formação da
renda. A análise procedente de tais dados demonstra o envelhecimento dos assentamentos, sem
que haja necessariamente uma reposição da força de trabalho a executar atividades
agropecuárias, estejam estas atividades ligadas a renda agrícolas ou não agrícolas, dentro do
assentamento, levando em conta que muitos dos filhos de assentados buscam a vida na cidade
ou migram para outros lugares, a procura de alternativas de renda, não possibilitando ao
assentado de utilizar a chamada mão de obra familiar, tão usualmente conhecida.
Tabela 8 Concentração de renda média por faixa etária nos assentamentos em 2012 e 2013
Fonte: Pesquisa de campo realizada com as famílias assentadas no período de janeiro de 2013 a janeiro de 2014.
Obs:* Valor médio nominal dos Salários Mínimos de 2012 (R$ 622,00) e 2013 (R$ 678,00).
Assentamentos Paulo Freire Sussuarana Independência Total
Faixa
Etária
Renda
Total*
Renda
%
Renda
Total*
Renda
%
Renda
Total*
Renda
%
Renda
Total*
Renda
%
18-25 0,00 0,00% 0,00% 19,34 13,96% 19,34 4,65%
26-35 21,94 9,03% 0,00 0,00% 0,00 0,00% 21,94 3,01%
36-45 5,79 2,38% 0,00 0,00% 0,00 0,00% 5,79 0,8%
46-55 121,23 49,90% 0,00 0,00% 12,00 8,66% 133,23 19,52%
56-65 36,55 15,04% 20,39 39,12% 32,77 23,66% 89,71 25,94%
Acima de 65 57,45 23,65% 31,72 60,88% 74,41 53,72% 163,58 46,08%
Total 242,96 100,0% 52,11 100,0% 138,52 100,00% 433,59 100,0%
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A renda gerada a partir do processo de formação das rendas previdenciárias, engloba
quase toda a renda gerada dentro dos assentamentos, e por muitas vezes torna-se a única renda
a qual dispõem os assentados, refletindo muitas vezes, na improdutividade das demais rendas.
Do total dos assentados entrevistados 57,89% receberam algum tipo de renda previdenciá r ia.
Deste montante que recebeu algum tipo de renda previdenciária, 60% receberam uma renda e
40% receberam duas rendas. Verificou-se também que 50% das rendas geradas era de origem
da aposentadoria rural.
No Assentamento Paulo Freire comprova-se a elevada dependência dos recursos da
previdência social (aposentadorias/auxílios/pensões), advindas praticamente de aposentadorias
rurais (75%), com uma pequena exceção, um pequeno percentual de aposentadorias urbanas
(25%).
O papel destas rendas no assentamento Sussuarana minimiza as vulnerabilidades
econômicas para compensar a falta de formação de rendas agrícolas, já que a pouca produção
existente se vincula ao consumo.
Em razão do estado precário do estabelecimento, a renda previdenciária representa
praticamente o único suporte dentro do assentamento. As maiores rendas do assentamento são
formadas basicamente por pessoas que recebem aposentadorias e quando somados os
benefícios/doações e rendas de outros trabalhos, estes percentuais beiram quase a sua totalidade.
O tipo de aposentadoria baseia-se praticamente em pensão por invalidez, conforme o tamanho
da amostra (20%).
No processo de formação da renda previdenciária no assentamento Independência,
percebe-se um número elevado de aposentados rural (43%). Pensão vitalícia e acidente de
trabalhos correspondem a 28% e 29% dos benefícios recebidos pelos assentados.
4.2.7 Renda de Programas Sociais e/ou Doações
Baseando-se na tabela 9, verifica-se que a formação de renda programas sociais e/ou
doações nos assentamentos, mesmo acontecendo um volume de menor proporção, ainda está
presente nos assentamentos.
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Tabela 9 - Composição da renda média programas sociais e/ou doações nos assentamentos
no ano de 2012 e 2013.
Assentamento
Renda
Benefícios total em Salários
mínimos*
Média Mensal
por Assentado estimada**
% da
Renda
Total S.M.
Paulo Freire 11,93 0,09 4,91%
Sussuarana 0,00 0,00 0,00%
Independência 12,64 0,15 9,12%
Fonte: Pesquisa de campo. Obs:* Valor médio nominal dos Salários Mínimos de 2012( R$ 622,00) e 2013 (R$ 678,00). ** Média Mensal por Assentados = (Programas Sociais e/ou Doações total/Nº de assentados )/12 meses.
No tocante a composição da renda programas sociais e/ou doações nos assentamentos
pesquisados, todas foram de caráter particular (familiares), como forma de complementação da
renda e garantia do mínimo em termos de segurança alimentar na família. É possível que
existam famílias que são contempladas com mais de um benefício, porém até o momento da
pesquisa, não foi identificado nenhum programa social diferente do Bolsa Família, que tem seus
condicionantes em relação ao número de filhos em idade escolar.
Esta situação na qual vivem estas famílias no Brasil, em geral, também é reproduzida
nas áreas de assentamentos, com maior intensidade, especificamente diante de tudo que foi
abordado quanto à geração de rendas.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Melhorar as condições de sustentabilidade nos assentamentos de reforma agrária é algo
inclui, não apenas a melhora da capacidade produtiva, mas também a inclusão de novas
tecnologias, que estejam ao alcance das famílias assentadas e que possam gerar renda. Dessa
forma, diversas políticas se qualificam como necessárias, especificamente as que levam em
conta o período da estiagem, para que assim sejam desenvolvidos programas que incorporem a
mão de obra das áreas de assentamento, para garantir uma renda que possibilite aos mesmos
um pouco de recursos para investimento em insumos e equipamentos a serem aplicados no
período de chuvas, considerando as condições de desenvolvimento nas áreas de semiárido.
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A infraestrutura apesar de não ser totalmente determinante no processo de
funcionamentos dos assentamentos, mas somando-se às dificuldades de estabelecimento na
terra e àquelas mais gerais enfrentadas pela agricultura familiar, tem efeitos graves sobre a vida
dos assentados e sobre a produção, principalmente em relação ao assentamento Sussuarana que
entre os três pesquisados, foi o que apresentou maior precariedade não dispondo ao menos de
água encanada.
A falta de conhecimento e a pouca disponibilidade de recursos para produzir, é o
principal entrave do desenvolvimento das áreas de assentamento, pois deixa a desejar uma
capacitação dos agricultores para a organização e gestão de todo o processo produtivo.
Fica ainda comprovada a dependência de um elevado número de famílias que obtinha
recursos de rendas não agrícolas, em geral, provenientes de transferências governamenta is
(rendas previdenciárias e benefícios sociais). Sendo esta renda, principalmente a renda
previdenciária, a única fonte de renda de algumas famílias, em razão das inúmeras dificuldades
encontradas existentes no quesito de conseguir sobreviver somente das renda agrícola,
permitindo aos assentados a manutenção das famílias durante os períodos de frustração de safra.
Isto significa dizer que os assentamentos, de certa forma não se mostram ainda capazes
de criar uma base produtiva, voltada especificamente para as chamadas rendas agrícolas, o que
pressupõe uma série de interferências do meio urbano e programas de transferência de renda,
no processo produtivo dos assentamentos que leva, em suma, a vulnerabilidade extrema quanto
a papel da terra como fator de produção.
Portanto um programa de desenvolvimento rural deve considerar não apenas a
agricultura, mas também outras atividades que possam gerar renda para as famílias, sejam elas
ligadas à agricultura ou não. Vale ressaltar que embora as rendas previdenciárias sejam
importantes e necessárias para a manutenção da família e da propriedade, elas não podem ser
vistas como solução para os problemas de geração de renda no setor rural, nem como único
meio de sobrevivência das famílias, pois se constitui num risco para as gerações futuras
dependentes dos aposentados da família.
Diante da pesquisa realizada, pode-se verificar a urgência de que assentamentos
produzam uma qualidade de vida satisfatória e superem seus problemas mais emergentes,
portanto, fica clara, a necessidade que as diversas instâncias do Estado e os agentes sociais
articule-se em prol de medidas que conduzam a construção do desenvolvimento sustentáve l
nessas comunidades, objetivando um conjunto de medidas que contemplem projetos
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comprometidos com a sustentabilidade dos sistemas produtivos, com mecanismos que
possibilitem uma melhora na qualidade de vida dos assentados e com o processo educativo das
famílias, estimulando-as à organização e à construção de uma identidade coletiva.
Por fim, compreende-se com a realização deste trabalho que o processo de reforma
agrária necessita ajustar-se às demandas não apenas de determinadas regiões, mas ajustar-se à
realidade social de cada assentamento, sendo fundamentalmente necessário um aprimoramento
do capital humano ali, bem como de prover estes assentamentos de infraestrutura, assistência
técnica e fornecer instrumentos creditícios mais que facilitem a utilização de tecnologia e
possibilitem a produção em uma maior frequência e volume, incorporando também valor a esta
produção.
6 REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE NETO, L.C. Composição de renda nas áreas de assentamento do INCRA no Estado do Rio Grande do Norte, no município de Mossoró: um caminho ao desenvolvimento includente e sustentável? Trabalho de Conclusão de Curso (doutorado) (2011): Faculdade de Geografia e História – Universidade de Salamanca, Espanha, 2011
COSTA NETO, C.; ANJOS, M. B. Dimensões sociais da sustentabilidade em assentamentos rurais no Brasil: um enfoque teórico-metodológico. s.d. 15p.
DOUROJEANNI, Axel. La dinámica del desarrollo sustenable y sostenible. Comisión Económica para América Latina y Caribe (CEPAL), LC/R 1925, Santigado do Chile, julio, 1999.
GUANZIROLI, C. E,. Principais Indicadores Sócio-Econômicos dos Assentamentos de reforma agrária. In: ROMEIRO, A. (et. ali). Reforma agrária : produção, emprego e renda : o relatório da FAO em debate - Petrópolis, RJ: Vozes ; Rio de Janeiro;: IBASE. 1994, p.16.
LEITE, S.. Autoconsumo e sustentabilidade na agricultura familiar: uma aproximação à experiência brasileira, Unicamp, outubro de 2003.
SPAROVEK, G. A qualidade dos assentamentos de reforma agrária brasileira. SPAROVEK, G. (Org.). São Paulo: Páginas & Letras, 2003. 167p.
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ESTUDO DA EXECUÇÃO DO PROGRAMA P1+2 E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A
SEGURANÇA ALIMENTAR DAS FAMILIAS BENEFICIADAS NO MUNICÍPIO DE
IGUATU, CEARÁ NO PERÍODO DE 2015.
STUDY OF THE IMPLEMENTATION OF THE PROGRAMME P1 + 2 AND
CONTRIBUTION TO YOUR FOOD SECURITY OF FAMILIES BENEFITED THE
IGUATU MUNICIPALITY, CEARÁ IN 2015 PERIOD.
IONARA KELLY DE LIMA SANTOS Graduanda em Ciências Econômicas pela Universidade Regional do Cariri (URCA), campus Iguatu, Ceará. E-mail: [email protected] MIRIAN RAQUEL DO NASCIMENTO FERNANDES Graduanda em Ciências Econômicas pela Universidade Regional do Cariri (URCA), campus Iguatu, Ceará. E-mail: [email protected] OTÁCIO PEREIRA GOMES Mestre em Economia Rural Pela Universidade Federal do Ceará (MAER/UFC) Professor Temporário da Universidade Regional do Cariri (URCA), campus Iguatu, Ceará. E-mail: [email protected]
Grupo de Pesquisa: Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo Objetiva-se mostrar a execução do programa P1+2, (Uma Terra e Duas Águas) no município de Iguatu – CE no ano de 2015. O P1+2 é um Programa de Formação e Mobilização Social para Convivência com o Semiárido da ASA Brasil (Articulação no Semiárido Brasileiro), que aposta na implementação de tecnologias estruturantes e de pequeno porte que promovem a segurança alimentar e nutricional de famílias que residem no semiárido, contrariando as ações históricas de combate à seca, como a construção de grandes obras hídricas, fomentando a construção de processos participativos de desenvolvimento rural, promovendo a soberania, a segurança alimentar e nutricional às famílias agricultoras, através do acesso e manejo adequado dos recursos hídricos para produção. Os dados foram de origem primária e a forma de obtenção foi através dos cadastros fornecidos pelo Instituto Elo Amigo, organização social ligada a rede ASA que executa o P1+2 e diversos outros programas de apoio ao desenvolvimento da agricultura familiar agroecológica na região. A população alvo corresponde a cem (100) beneficiários atendidos no município. O método de análise consistiu em estatística descritiva e para a operacionalização dos dados foi utilizado o software Stata12. Com relação ao programa P1+2 os resultados mostram que 92% das cisternas do P1+2 captaram água após o primeiro período de chuvas e 8% não captaram água, e destas que captaram, 42% afirmaram que as cisternas estavam cheias. Em relação à finalidade do
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programa, os resultados apontam que 53% dos beneficiários estavam utilizando a água da cisterna exclusivamente para produção, 16% não estavam produzindo, mas sim estocando água para o período de estiagem e os demais estavam usando a água para produção e/ou uso doméstico. Conclui-se que o programa desenvolvido apresenta resultados satisfatórios, tendo em vista os bons níveis produção de alimentos exibidos mesmo diante do receio das famílias em utilizarem a água temendo a perduração da estiagem na região. Palavras-Chave: Segurança Alimentar; ASA; P1+2; Políticas Públicas;
Abstract It aims to show the execution of P1 + 2 program (One Land and Two Waters) in the city of Iguatu - CE in 2015. P1 + 2 is a Training and Social Mobilization for Coexistence with the Semi-Arid ASA Brazil (Articulation in the Brazilian Semi-Arid), which focuses on the implementation of structuring technologies and small that promote food and nutritional security of families residing in the semiarid region, against the historical actions to combat drought, such as the construction of large water works, fostering building participatory processes of rural development, promoting sovereignty, food security and nutrition for farming families through access and proper management of water resources for production. The data were of primary origin and how to obtain was through the records provided by Elo Institute Friend, social organization linked to ASA network running P1 + 2 and several other programs to support the development of agro-ecological family farming in the region. The target population corresponds to one hundred (100) beneficiaries attended in the city. The method of analysis consisted of descriptive statistics and for the operationalization of the data was used Stata12 software. Regarding the program P1 + 2 the results show that 92% of tanks P1 + 2 captured water after the first rainy season and 8% failed to grasp water, and those that captured 42% said that the tanks were full. Regarding the program's purpose, the results indicate that 53% of beneficiaries were using the water tank exclusively for production, 16% were not producing, but stocking up on water for the dry season and the others were using water for production and / or household. It is concluded that the developed program produces satisfactory results, given the good levels of food production displayed even before the families of fear in using the water fearing perduração the drought in the region. Key words: Food Safety; ASA; P1 + 2; Public policy; ;
1. Introdução
Durante muitos anos, as políticas para desenvolvimento do Nordeste não passavam de
práticas emergenciais, que não davam nenhuma condição de autonomia ou independência
para a maior parte do povo nordestino, tornando cada vez maior à busca por ajuda do
governo, mesmo sabendo que o que era oferecido só amenizaria a situação dessas pessoas por
pouco tempo e que isso, perduraria até a mudança ideológica de que o fenômeno da seca não
se combate, mas se aprende a conviver. Por isso que, com o passar dos anos, cansados de
sofrer, a sociedade civil do semiárido se organizou, nascendo assim a Articulação do
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Semiárido Brasileiro (ASA, 1999) para iniciar um árduo trabalho de condicionar o homem e a
mulher sertaneja a ser um articulador na luta para o desenvolvimento formando-os e lhes
dando condições para ser conhecedor dos seus direitos como cidadão brasileiro.
Um dos primeiros passos da ASA foi garantir ao homem do campo água de qualidade
para beber e cozinhar, principalmente nos períodos de estiagem, instituindo-se o Programa
Um Milhão de Cisternas (P1MC, 2003). Posteriormente, se viu que apesar dos bons
resultados alcançados por esse projeto deveria se ir mais além, como algo que desce
condições às pessoas do semiárido de produzir seu próprio alimento garantindo a sua
soberania alimentar além de possibilitar colocar em prática seus conhecimentos como
produtores e gestores com a importância da preservação ambiental, surgindo então o
Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2, 2007). .
O numeral 1(um) significa a luta pela terra suficiente para que nela sejam
desenvolvidos processos produtivos, visando a segurança alimentar e nutricional, e o 2
corresponde a duas formas de utilização da água – a potável para consumo humano, e água
para produção agropecuária de forma que as famílias de agricultores vivam dignamente em
seus locais de origem.
O P1+2 fundamenta-se também na construção do conhecimento a partir de
experiências em curso, tendo com o pressuposto a socialização e a troca de conhecimentos, de
forma horizontal e socialmente construída o programa promove intercâmbios de agricultor
para agricultor e deles com os técnicos. Esses momentos de partilha acontecem entre
comunidades, municípios e territórios. Também são promovidos intercâmbios entre os
estados, fazendo circular o conhecimento produzido nos diversos lugares de todo o Semiárido.
Em decorrência das secas, mortes eram comuns na região semiárida brasileira,
especialmente a morte de crianças. “Um genocídio praticado pelo Estado”, como afirmava o
sociólogo Herbert José de Sousa, o Betinho. A partir dos programas “Fome Zero” e “Brasil
sem Miséria”, para os quais a ASA e suas organizações tiveram a oportunidade de propor
várias ações que, assumidas hoje como políticas de governo e até mesmo como Políticas
Públicas, transformam a realidade na região.
Tendo isso em vista, pode-se indagar a seguinte problemática: Através de uma
agricultura sustentável, o Programa P1+2 está proporcionando algumas mudanças e/ou
benefícios na vida das famílias beneficiadas e do meio ambiente onde elas vivem? Existem
influência do programa P1+2, na garantia da soberania alimentar para seus beneficiários?
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O fato é que entre 2010 e 2014 o Semiárido atravessou a maior estiagem dos últimos
60 anos, sem haver uma só morte humana decorrente da seca, embora tenha se deparado com
morte de animais, dizimação de sementes e outros problemas. Isso vem como resultado da
luta do povo por seus direitos diante de toda a sociedade brasileira, mostrando ao Estado que
através de projetos eficazes, a realidade do semiárido pode deixar de ser tão trágica, como em
períodos anteriores durante seus polígonos de seca.
Nessa perspectiva, o desenvolvimento de projetos fundamentais para a sobrevivência
digna do homem e da mulher no semiárido brasileiro é tido como essencial para regiões
dependentes de políticas públicas, assim, este estudo possui uma grande importância social,
econômica e ambiental, de forma a mostrar os resultados advindos do programa.
2. Referencial teórico
2.1. Semiárido: realidade e práticas históricas vivenciadas na região
A construção da proposta de convivência com o semiárido tem suas iniciativas vindas
de centros de pesquisa, como a EMBRAPA, e das organizações não governamentais que vêm
desenvolvendo projetos nas áreas de recursos hídricos, produtivos e socioculturais em áreas
do semiárido brasileiro desde o início da década de 1980. A proposta ganhou impulso
significativo no final da década de 1990, com a criação da Articulação no Semiárido (ASA).
Um grande ponto trazido pela implantação dessas tecnologias sociais de convivência
com o semiárido é relação de desenvolvimento sustentável rural estabelecido através da
formação dos beneficiários, onde os mesmos recebem capacitação para melhor gerir e ampliar
seus recursos disponíveis e preservar a tecnologia recebida, amplia-los, resultando em
preservação da fauna e flora, assim também como da água e dos alimentos de qualidade que
produziram para as suas famílias lhes garantindo água para consumir e produzir alimentos
livres da utilização de venenos e agrotóxicos, entre outros meios agravantes para a saúde das
pessoas.
A sustentabilidade envolve desenvolvimento econômico, social e respeito ao equilíbrio
e às limitações dos recursos naturais. De acordo com o relatório da Comissão Mundial sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada pela ONU em 1983, o desenvolvimento
sustentável visa "ao atendimento das necessidades do presente, sem comprometer a
possibilidade de as gerações futuras atenderem às próprias necessidades".
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O programa de Alimentação Saudável no Semiárido fala sobre a importância dos
agricultores e das agricultoras da região a produzirem alimentos saudáveis, de forma
agroecológica. Essa forma de produção favorece a saúde de quem consome esses alimentos.
A valorização da captação e armazenamento adequado da água de chuva é apenas o
início de uma mudança cultural que se pretende construir na região. Ao lado das cisternas
para abastecimento familiar, a Articulação do Semiárido vem disseminando práticas e
tecnologias apropriadas de manejo de recursos hídricos e de agroecologia que fortalecem a
agricultura familiar.
Segundo Brasileiro (2009, p.4):
O bioma caatinga vem despertando cada vez mais o interesse, principalmente, de pesquisadores e cientistas que trabalham com áreas em processo de desertificação, pois observa- se uma tendência à expansão de áreas desérticas. O avanço do processo de degradação ambiental na região deve-se a vários fatores, entre os quais, destacam-se: as práticas agrícolas inadequadas, o desmatamento, a infertilidade e a compactação do solo, os processos erosivos, e a salinização de algumas áreas[...]. As comunidades rurais do semiárido estão cada vez mais empenhadas em conservar o pouco da vegetação caatinga ainda existente. Essa preocupação pode ser percebida nas mais variadas experiências e relatos que foram destacados. Além da adesão a técnicas de desenvolvimento rural sustentável, supõe-se também estar nascendo um novo conceito da relação ser humano e natureza. Esse conceito procura aproximar as comunidades da biodiversidade existente no bioma caatinga através de manejos mais adequados e de uma convivência mais harmoniosa.
“A agroecologia desenvolvida no semiárido consolida-se na medida em que os
agricultores familiares nutrem-se de uma visão mais aprofundada de sua relação com o meio
[...]” (BRASILEIRO, 2009, p.9).
Segundo a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional – LOSAN (Lei nº
11.346, de 15 de setembro de 2006), por Segurança Alimentar e Nutricional - SAN entende-se
a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em
quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo
como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e
que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis.
De acordo com o plano nacional de segurança alimentar – BRASIL (2011) “o Brasil
tem realizado grandes avanços no campo da segurança alimentar e nutricional desde 2003,
quando lançada a Estratégia Fome Zero. Ao eleger como prioridade o combate à fome e à
pobreza, o Governo Federal fortaleceu e criou políticas públicas que se mostraram efetivas
para a melhoria das condições sociais e de alimentação dos grupos sociais mais vulneráveis.
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Igualmente importante foi o processo de institucionalização desta política, que se inicia com a
promulgação da Lei nº 11.346/2006, a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional
(LOSAN), que criou o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) e
estabeleceu as bases para a construção da Política e do Plano Nacional de Segurança
Alimentar e Nutricional”.
Atualmente uma das maiores dificuldades encontradas pelas famílias do semiárido
brasileiro é o acesso à água para manutenção de suas vidas, para atividades domesticas e
econômicas. Essa dificuldade secular já relatada em diversas obras por autores como José
Guimarães Duque, Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz entre tantos outros, que relataram de
forma ficcional a real história do flagelo das famílias pela incidência das secas. Secas essas
que se consagraram como meio de dominação dos coronéis e ocasionando consequentemente
o maior atraso no desenvolvimento social e econômico das famílias que dominadas pelos mais
poderosos, se submetiam a aceitação de uma vida de miséria. A situação desenvolvimentista
do Nordeste, território dominante dentro da região semiárida vem mudando nos últimos anos,
em um comparativo com as demais regiões brasileiras.
Segundo pesquisas o Nordeste é a região que mais tem se desenvolvido nos últimos
anos, porém a grande questão é mensurar os resultados obtidos para a renda per capita dessas
famílias, o acesso aos direito sociais básicos: cultura, lazer, educação, moradia e saúde e
principalmente medir o nível de independência financeira econômica dessas famílias quanto
aos recursos governamentais dispostos às mesmas, os famosos projetos de bolsões que
dificilmente geram algum retorno econômico para as famílias que se beneficiam dos mesmos.
As famílias beneficiadas pelo P1+2 são famílias oriundas da Agricultura familiar, que
a partir de uma dinâmica metodológica do projeto são identificadas em escala que segue a
seguinte ordem: estadual, regional, municipal, territorial local e comunitária.
Quanto ao acesso à água, são nas regiões Norte e Nordeste que identificam-se os
índices mais baixos de domicílios atendidos por rede geral de abastecimento de água no total
de domicílios (58% e 78%, respectivamente), enquanto a região Sudeste tem o mais alto
índice de domicílios atendidos por rede geral de abastecimento de água no total de domicílios
(92%). A região Centro-Oeste apresenta o mais baixo índice de domicílios dotados de
esgotamento sanitário por rede de esgoto ou fossa séptica no total de domicílios (48%). O
Nordeste vem em seguida (55%) e a região Sudeste apresenta a melhor posição (IBGE, 2009).
Mais de 1,9 milhão de famílias de agricultores familiares e 390 mil famílias de
assentados da reforma agrária acessaram as políticas do Plano Brasil Sem Miséria, desde a sua
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criação em 2011. Elas saíram da extrema pobreza e tiveram acesso à água para beber e
produzir, à energia elétrica, à assistência técnica e recursos não reembolsáveis, e a mercados
para comercialização da produção, graças às ações do eixo de inclusão produtiva rural do
plano (Ascom/MDS).
Ao retirar milhões de famílias da extrema pobreza, o Brasil Sem Miséria foi
determinante para a saída do país do mapa da fome. O Brasil é destaque no “Relatório de
Insegurança Alimentar no Mundo” de 2014, da Organização das Nações Unidas para
Agricultura e Alimentação (FAO), por ter construído uma estratégia de combate à fome e ter
reduzido de forma muito expressiva a desnutrição e subalimentação nos últimos anos.
Com o Brasil Sem Miséria, as famílias agricultoras puderam acessar diferentes
programas, entre eles, o programa Água para Todos, que entregou 1,2 milhão de cisternas de
água para consumo humano no Semiárido e 121,4 mil tecnologias sociais voltadas à produção
de alimentos. Já o Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais garantiu que 354
mil famílias recebessem assistência técnica para aumentar a produção e melhorar a renda.
Destes, 171,5 mil famílias passaram por todo o processo de assistência técnica e receberam os
recursos financeiros do programa (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E
COMBATE À FOME, 2015).
As cisternas são soluções simples para captar e armazenar água da chuva, tanto para
consumo humano, amenizando os efeitos da seca prolongada. Com a tecnologia é possível
que uma família de cinco pessoas possa conviver com a estiagem por até oito meses, dentre
outros benefícios, melhores condições de saúde. Além disso, reduzem o tempo e o esforço
gastos nos deslocamentos das famílias para a obtenção de água, destaca o secretário nacional
de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
Fome (MDS), Arnoldo de Campos (2014).
2.2. Aspectos sobre a segurança alimentar
Alimentação é base da estrutura humana, é dela onde tiramos a energia que nosso
corpo precisa para desenvolvermos nossas atividades básicas diárias, é base para manutenção
da saúde física e mental das pessoas influenciando totalmente em uma melhor qualidade de
vida. Conforme Hipócrates1, já dizia, “faça de seu alimento um remédio que dele não
1 Hipócrates ver em: http://pensador.uol.com.br/frase/MTE3MDU0/
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precisará.” A garantia de uma alimentação de adequada tem toda influência no nível de
qualidade de vida das pessoas e por esse motivo as políticas públicas devem ser mais
perspicazes no desenvolvimento de planos e ações que viabilizem esse acesso de forma mais
concreta dando meios para melhoria de vida das famílias mais vulneráveis.
Diante da realidade pragmática vivida pelas famílias do semiárido de escassez de
recursos, o projeto P1MC já garante as famílias beneficiadas, acesso a água para beber e
cozinhar, mas não dá parâmetro suficiente para garantir água para a produção de alimentos
para sustentar essas famílias do semiárido, tendo essa visão da realidade trágica a ASA vem
desenvolvendo o projeto que é justamente a continuidade do projeto um milhão de cisternas,
que é o projeto P1+2. O mesmo busca através de tecnologias sociais garantir as famílias já
beneficiadas pelo projeto P1MC, uma nova estrutura que ofereça condições para a produção
de alimentos, tornando-as mais soberanos no tocante a segurança alimentar.
A importância de se conhecer bem o conceito de Segurança e soberania nos coloca a
par de nossas responsabilidades e desafios como seres transformadores e construtores da
história, considerando as palavras de Smith, “nenhuma sociedade pode ser florescente e feliz,
dos quais a maior parte dos membros são pobres e miseráveis” (RIQUEZA DAS NAÇÕES,
1776, p. 129).
Na Cúpula Mundial da Alimentação realizada pela Organização para Alimentação e
Agricultura (FAO), em Roma no ano de 1996, nesse evento foi aprovada a Declaração e um
Plano de Ação destinados a combater a fome no mundo, no mesmo ambiente foi abordado o
conceito de soberania e segurança alimentar em prol do desenvolver de questões que
pudessem garantir o desenvolvimento integral do ser humano.
Para a FAO (2014):
O maior desafio da segurança alimentar hoje é o acesso à alimentação adequada e saudável, que seja dada de forma permanente e sustentável, como articulado claramente pela construção da Política de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) no Brasil. Esse desafio envolve a institucionalização e a gestão do Sistema Nacional de SAN (SISAN) com a missão de fortalecer a noção do direito humano à alimentação adequada vista por meio de programas e ações públicas. No entanto, a consolidação das formas de proteção, respeito, provimento e exigibilidade do direito à alimentação não constitui uma tarefa simples. Fica ainda muito mais complexa se for vista qualitativamente como a promoção de uma alimentação adequada e saudável. É importante pensar na criação de um amplo programa de educação alimentar que contemple e incentive hábitos alimentares mais saudáveis. Para tal, é preciso fortalecer os instrumentos de regulação no Brasil. Isso deve ocorrer dentro do contexto de uma política de abastecimento alimentar fundamentada em alimentos frescos, produzidos localmente, a menor custo, mais qualidade e diversidade.
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Considerando a preocupação apresentada pela Organização para Alimentação e
Agricultura (FAO) e analisando a importância da segurança alimentar, levando em conta que
o abastecimento de alimentos tem importância estratégica decisiva para a preservação dos
interesses de cada país, de tal forma a se tornar um caso de Segurança Nacional, uma vez que
a falta ou deficiência de alimentos nas dimensões geográficas de uma nação quebra a base
estrutural do seu povo, tornando a nação mais vulnerável interna e externamente, podemos
citar como exemplo países do continente africano, considerado o território mais miserável do
mundo.
Tendo em vista a relevância do assunto devem ser enfatizadas questões que abordem
sobre o nível desenvolvimentista do país no tocante a ações de políticas públicas voltadas para
a resolução, prevenção e combate a esse problema principalmente na região semiárida
brasileira.
A segurança alimentar está diretamente ligada à soberania alimentar uma vez que é
reconhecido ao ser humano o direito de liberdade e desenvolvimento. O Direito Humano à
Alimentação Adequada-DHAA, defende duas dimensões: o direito de estar livre da fome e o
direito à alimentação adequada.
“Os principais conceitos empregados na definição de Direito Humano à Alimentação Adequada são disponibilidade de alimentos, adequação, acessibilidade e estabilidade do acesso a alimentos produzidos e consumidos de forma soberana, sustentável, digna e emancipatória. Uma abordagem de direitos humanos também requer ações específicas, para contextos específicos. Assim, é fundamentação adoção de ações afirmativas e políticas que considerem a dimensão de gênero, raça, geração e etnia” (SEGURANÇA ALIMETAR E NUTRICONAL, 2013).
Sendo assim, os trabalhos e projetos a serem executados como mediação ou resolução
das problemáticas surgidas não devem ser construídos somente apenas para apresentação de
uma evolução sustentável voltados apenas à segurança alimentar porque assim ainda haverá
continuidade na dependência das pessoas ao acesso ao alimento, por isso a importância
também da construção da soberania alimentar.
Segundo Freire (2011):
Já foi constatado em nível mundial que o alimento é usado como forma absoluta de dominação de um ser humano sobre outro ou de um Estado sobre outro, justificando a importância deste tema, tornando-o em um assunto que merece ser discutido sistematicamente, buscando soluções.
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E por isso é que o projeto P1+2, devendo a construção dessa população soberana e
sustentável possa ser autônoma sem medo de tomar decisões.
3. Metodologia
Para a realização desta etapa da pesquisa, foi lançada mão da pesquisa empírica, que
consiste naquela que relaciona processos de interação face a face, isto é, possibilita que o
pesquisador não isole sua pesquisa somente em livros, mas sim que visualize in loco o
problema pesquisado.
O campo desta pesquisa foi o município de Iguatu, que se localizada a 380
quilômetros da cidade de Fortaleza, no estado do Ceará. Iguatu se encontra na microrregião
do Centro Sul. Neste sentido, esta etapa de pesquisa visa o reconhecimento de componentes
individuais por meio de distintos ângulos e dados.
Os dados foram de origem primária e a forma de obtenção foi através dos cadastros
fornecidos pelo Instituto Elo Amigo, organização social ligada a rede ASA que executa o
P1+2 e diversos outros programas de apoio ao desenvolvimento da agricultura familiar
agroecológica na região. A população alvo corresponde a cem (100) beneficiários atendidos
pelo instituto no município em questão.
O método de análise consistiu na apresentação de tabelas de distribuição de frequência
de forma que se possam extrair o máximo de informações necessárias para o estudo em
questão. Para a operacionalização dos dados foi utilizado o software Stata12.
4. Resultados e discussão
4.1. Características dos beneficiários do programa P1+2 no município de Iguatu, Ceará.
A análise realizada a partir da coleta dos dados foi no sentido de caracterizar o perfil
dos beneficiários do programa P1+2 no município de Iguatu, Ceará, objetivando a partir dos
entrevistados de forma clara, evidenciar características entre eles com relação ao programa.
Foram utilizados um total de cem (100) indivíduos para fazerem parte do estudo,
correspondendo ao total da amostra.
De acordo com os dados da Tabela 1, pode-se observar que os beneficiários do
programa em sua maioria são compostos por pessoas do sexo feminino representando um
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percentual de 60% do total de entrevistados. Já os indivíduos do sexo masculino representam
40% dos beneficiários.
Tabela 1- Distribuição percentual do gênero dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
SEXO Freq. Percent Cum. Masculino 40 40.00 40.00 Feminino 60 60.00 100.00
Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Na composição familiar dos beneficiários em relação à quantidade de pessoas,
observa-se que 5% das famílias possuem apenas um integrante, 19% dois integrantes, 25%
três integrantes, 28% quatro integrantes, 12% cinco, 3% sete, e as famílias com oito ou dez
membros correspondem a 1% cada uma. Ou seja, em sua maioria as famílias são compostas
por três a quatro membros.
Tabela 2- Distribuição percentual da composição familiar dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
TAMANHO DA FAMÍLIA Freq. Percent Cum. 1 5 5.00 5.00 2 19 19.00 24.00 3 25 25.00 49.00 4 28 28.00 77.00 5 12 12.00 89.00 6 6 6.00 95.00 7 3 3.00 98.00 8 1 1.00 99.00 10 1 1.00 100.00
Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Quando analisados os resultados da Tabela 3, observa-se que em relação à raça dos
beneficiários, observa-se que 44% dos beneficiários se consideraram como brancos, 21% se
consideraram como pretos e 35% se consideraram pardos.
Tabela 3- Distribuição percentual por raça dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
RAÇA DO BENEFICIÁRIO Freq. Percent Cum.
Branca 44 44.00 44.00 Preta 21 21.00 65.00 Parda 35 35.00 100.00 Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
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Com relação à escolaridade do chefe da família dos beneficiários, pode-se observar
que 36% são analfabetos, 26% sabem ler e escrever, 14% possuem ensino fundamental
incompleto, 8% ensino fundamental completo, 10% ensino médio completo, e apenas 6%
médio completo. Nenhum dos chefes das famílias possui ensino superior completo ou
incompleto e 76% como mostra a frequência acumulada não possuem o ensino fundamental
completo (Tabela 4).
Tabela 4- Distribuição percentual da escolaridade do chefe da família dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
ESCOLARIDADE DO CHEFE DA FAMÍLIA
Freq. Percent Cum.
Analfabeto 36 36.00 36.00 Sabe ler e escrever 26 26.00 62.00 Fund. Incompleto 14 14.00 76.00 Fund. Completo 8 8.00 84.00
Médio incompleto 10 10.00 94.00 Médio completo 6 6.00 100.00
Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Os resultados da Tabela 5 abaixo, onde mostra o percentual dos beneficiários em
relação ao tipo de benefício indicam que 12% não possuem benefício ou não possuem
nenhum tipo benefício, 29% dos beneficiários são contemplados com aposentadoria e em sua
maioria 59% são beneficiados com o programa bolsa família.
Tabela 5- Distribuição percentual por tipo de benefício dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
TIPO DE BENEFICIO Freq. Percent Cum. Não 12 12.00 12.00
Aposentadoria 29 29.00 41.00 Bolsa família 59 59.00 100.00
Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Segundo os resultados da Tabela 6, dos beneficiários em estudo 3% não participam de
qualquer organização social, a grande maioria, em torno de 90% tem participação em
associação comunitária, 6% destes participam de sindicato rural e apenas 1% participa de
grupo pastoral.
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Tabela 6- Distribuição percentual da participação em organização social dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
PART. EM ORG. SOCIAL Freq. Percent Cum. Não 3 3.00 3.00
Assoc. Comunitária 90 90.00 93.00 Sindicato rural 6 6.00 99.00 Grupo pastoral 1 1.00 100.00
Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
A Tabela 7 que mostra o percentual dos beneficiários do P1+2 em relação à sua
atividade principal. Os resultados indicam que em sua maioria, a principal atividade dos
beneficiários e suas famílias é a prática da agricultura com um percentual de 96%. Os 4%
restantes tem como atividade a prática agropecuária.
Tabela 7- Distribuição percentual da atividade principal dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
PRINCIPAL ATIVIDADE Freq. Percent Cum. Agricultura 96 96.00 96.00
Agropecuária 4 4.00 100.00 Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
A Tabela 8 abaixo indica a principal cultura do roçado. Assim, o resultado mostra que
a principal cultura de roçado dos beneficiários e suas famílias é a de milho e feijão
representando um percentual de 98%. Em sua minoria, apenas 2% dos beneficiários possuem
no roçado a abóbora como cultura principal.
Tabela 8- Distribuição percentual da cultura principal de roçado dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
PRINCIPAL CULTURA DE ROÇADO Freq. Percent Cum. Milho/feijão 98 98.00 98.00
Abobora 2 2.00 100.00 Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Os resultados da Tabela 9 mostram que em sua maioria, cerca de 35% dos
beneficiários e suas famílias não possuem culturas animais, 32% tem cultura animal de
bovinos, 20% de ovinos, 10% de caprinos, e apenas 3% possuem outras culturas animais.
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Tabela 9- Distribuição percentual das principais culturas animais dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
PRINCIPAIS CULTURAS ANIMAIS
Freq. Percent Cum.
Não 35 35.00 35.00 Bovino 32 32.00 67.00 Caprino 10 10.00 77.00 Ovino 20 20.00 97.00 Outros 3 3.00 100.00 Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
A Tabela 10 mostra a distribuição percentual da assistência técnica. Os resultados
mostram que 71% dos beneficiários nunca possuíram nenhuma assistência técnica, 19%
obtiveram assistência técnica da EMATERCE, e 5% tiveram assistência técnica de sindicatos
ou outros cada um respectivamente.
Tabela 10- Distribuição percentual da Assistência Técnica dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
ASSISTÊNCIA TÉCNICA Freq. Percent Cum. Não 71 71.00 71.00
Emater 19 19.00 90.00 Sindicato 5 5.00 95.00
Outros 5 5.00 100.00 Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Em relação ao acesso de crédito dos beneficiários, os resultados mostram que 50%
nunca acessaram nenhum tipo de crédito, 30% acessaram crédito do PRONAF B, 13%
tiveram acesso ao PRONAF C, 5% tiveram acesso ao PRONAF AC e seguidos de apenas 1%
cada, pelo acesso ao crédito do PRONAF D e PRONAF S ARIDO (Tabela 11).
Tabela 11- Distribuição percentual do acesso ao crédito dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
JÁ ACESSOU CRÉDITO? Freq. Percent Cum. NÃO 50 50.00 50.00
PRONAF B 30 30.00 80.00 PRONAF C 13 13.00 93.00 PRONAF D 1 1.00 94.00
PRONAF MC 5 5.00 99.00 PRONAF S ARIDO 1 1.00 100.00
Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
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A Tabela 12 diz respeito ao percentual dos beneficiários em relação as dificuldades de
acesso ao crédito. De acordo com os resultados pode-se perceber que 96% dos beneficiários
nunca possuíram nenhuma dificuldade para ter acesso a credito, apenas 1% possui
dificuldades por questões burocráticas e 3% por insuficiência de informações.
Tabela 12- Distribuição percentual das dificuldades de acesso ao crédito dos Beneficiários do
P1+2, Iguatu, Ceará, 2016. DIFICULDADE DE CRÉDITO Freq. Percent Cum.
Não 96 96.00 96.00 Burocracia 1 1.00 97.00 Informação 3 3.00 100.00
Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Ainda em relação aos resultados da pesquisa, mostram que 53% dos entrevistados que
já acessaram crédito acessariam novamente e 47% não voltariam a acessar crédito e destes
pose-se dizer que 97% dos entrevistados que já acessaram crédito não tiveram dificuldades
para quitação e apenas 3% enfrentaram dificuldades para pagar o crédito.
Tabela 13- Distribuição percentual da participação em organização social dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
Tipo Benefício Participação em organização social
NÃO ASSOCIAÇÃO
COMUNITARIA SINDICATO
GRUPO PASTORAL
Total
NÃO 1 11 0 0 12 APOSENTADORIA 0 27 2 0 29 BOLSA FAMÍLIA 2 52 4 1 59
Total 3 90 6 1 100
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Os resultados da Tabela 13 acima mostram que 90% dos entrevistados tem
participação em organizações sociais em associação comunitária, sendo que 57,77% são
beneficiários do Programa Bolsa Família e 30% aposentados.
Quando perguntados se acessariam o crédito novamente, os resultados apontam que
98% dos beneficiários que não acessaram crédito não acessariam novamente, 100% dos
beneficiários que acessaram crédito do PRONAF B acessariam crédito novamente e 76,92%
dos beneficiários que acessaram o PRONAF C acessariam crédito novamente.
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Com relação a participação social por atividade principal, os resultados indicam que
97,77% dos beneficiários que participam de associações comunitárias tem como principal
atividade a agropecuária.
4.2. Resultados em relação ao programa P1+2
Os resultados da Tabela 14 mostram a distribuição percentual dos beneficiários que
captaram água na tecnologia implementada pelo programa. Os resultados mostram que 92%
das Cisterna do P1+2 captaram água após o primeiro período de chuvas 8% não captaram
agua.
Tabela 14- Distribuição percentual da captação de água dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
CAPTAÇÃO Freq. Percent Cum. Sim 92 92.00 92.00 Não 8 8.00 100.00 Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Em relação a Tabela 15, pode-se observar que 42% das cisternas estavam cheias, 31%
com a metade da capacidade de captação e 19% das cisternas estavam com 1/4 da capacidade
de captação de água.
Tabela 15- Distribuição percentual do Nível de Captação de Água dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
NÍVEL Freq. Percent Cum. Cheia 42 42.00 42.00 Meia 31 31.00 73.00
¼ 19 19.00 92.00 Vazia 8 8.00 100.00 Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Os resultados da Tabela 16 abaixo mostram que 53% dos beneficiários responderam
que estavam utilizando a água da cisterna exclusivamente para produção, 16% não estavam
produzindo, mas sim estocando água para o período de estiagem, 13% estavam usando a água
para produção e uso doméstico e 10% estavam utilizando a água somente para o uso
doméstico.
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Tabela 16- Distribuição percentual do Aproveitamento da Água dos Beneficiários do P1+2,
Iguatu, Ceará, 2016. APROVEITAMENTO
DA AGUA Freq. Percent Cum.
Doméstico 10 10.00 10.00 Produção 53 53.00 63.00
Produção /domestico 13 13.00 76.00 Estoque 16 16.00 92.00 Vazia 8 8.00 100.00 Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Com relação ao uso da água para fins de produção, pode-se dizer que 48% dos
beneficiários responderam que estavam utilizando a água da cisterna exclusivamente para
produção vegetal, 5% estavam somente com produção animal e 13% estavam usando a água
para produção animal e vegetal (Tabela 17).
Tabela 17- Distribuição percentual do Tipo de Produção dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
TIPO DE PRODUÇÃO
Freq. Percent Cum.
Animal 5 5.00 5.00 Vegetal 48 48.00 53.00
Animal/Vegetal 13 13.00 66.00 Sem Produção 34 34.00 100.00
Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
Os resultados da Tabela 18 abaixo mostram que 27% dos beneficiários responderam
que estavam utilizando a água da cisterna exclusivamente para produção de hortaliças, 6%
estavam somente com produção de frutas, 28% estavam usando a água para produção de
hortaliças e frutas simultaneamente.
Tabela 18: Distribuição percentual do Tipo de Produção Vegetal dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
PRODUÇÃO VEGETAL Freq. Percent Cum. Hortaliças 27 27.00 27.00
Frutas 6 6.00 33.00 Hort./Frutas 28 28.00 61.00
Sem produção 39 39.00 100.00 Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
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Quando analisado em relação ao tipo de produção animal na Tabela 19 abaixo, pode-
se constatar que 16% dos beneficiários responderam que estavam utilizando a água da cisterna
para produção de aves, 2% estavam somente com produção de pequenos animais e 82% dos
beneficiários não optaram pela produção de animais ou não tinham água para produção.
Tabela 19- Distribuição percentual do Tipo de Produção Animal dos Beneficiários do P1+2, Iguatu, Ceará, 2016.
PRODUÇÃO ANIMAL Freq. Percent Cum. Aves 16 16.00 16.00
Peq. Animais 2 2.00 18.00 Sem Produção 82 82.00
Total 100 100.00
Fonte: Dados da pesquisa (2016)
A distribuição do destino da produção dos beneficiários do P1+2 no município de
Iguatu, assim os resultados indicam que 60% dos beneficiários responderam que estavam
consumindo a produção, 6% estavam consumindo e vendendo o excedente da produção e
34% não estavam produzindo ou por estarem usando a água para uso doméstico, estoque ou
por não terem água.
5. Considerações finais
O programa P1+2 segue em defesa da garantia e soberania alimentar, considerando
acesso a alimentação saudável um ponto crucial para o desenvolvimento do ser humano, e
tendo em vista ainda ser direito humano básico e reconhecido pela Constituição Federal
brasileira. O programa ainda auxilia na formação dos seus beneficiários lhe capacitando e lhes
dando oportunidades de conhecer experiências de outras famílias já beneficiadas e que
mudaram suas vidas a partir do desenvolvimento e ampliação do projeto, que a principio e
primordialmente segue objetivo de geração de alimentos consumo familiar, mas possibilita a
venda do excedente de alimentos gerados pelas mesmas lhes dando assim uma nova fonte de
renda. O programa desenvolvido apresenta resultados consideráveis, tendo em vista os níveis
produção de alimentos exibidos mesmo diante do receio das famílias em utilizarem a água
temendo a perduração da estiagem na região.
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Referências
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BRASILEIRO, Robson S. Alternativas de desenvolvimento sustentável no semiárido nordestino: da degradação à conservação. Recife-PE, Março/Maio, 2009.
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Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – 2012/2015. Disponível em: < www.mds.gov.br/segurancaalimentar > Acesso em: 09 de Julho de 2015.
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SILVA, R. M. A. ENTRE DOIS PARADIGMAS: combate à seca e convivência com o semiárido. Sociedade e Estado, Brasília, v. 18, n. 1/2, p. 361-385, jan./dez. 2003.
Soberania Alimentar. Disponível em: <http://fase.org.br/pt/o-que-fazemos/soberania-alimentar/> Acesso em: 20 de junho de 2016.
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INSERÇÃO DA AGRICULTURA FAMILIAR NO MERCADO DE COMPRAS
GOVERNAMENTAIS: Análise a partir do Programa de Aquisição de Alimentos
modalidade Compra Institucional
Autor: Rafael Junior dos Santos Figueiredo Salgado1, Edson Arlindo da Silva2,
Nathalie Abreu Fidelis da Silva2, Washington José de Souza1.
Filiação: 1Universidade Federal do Rio Grande do Norte; 2Universidade Federal de Viçosa
E-mail: [email protected]
Grupo de Pesquisa: Políticas Públicas e Reforma Agrária Resumo A criação do Programa de Aquisição de Alimentos, em 2003, abriu possibilidades para a agricultura familiar acessar o mercado institucional de alimentos, se apresentando como política inovadora e com grande potencial de transformação socioeconômica em âmbito local e regional. Dada a importância do programa e as modificações pelas quais ele tem passado buscou-se analisar o processo de inserção dos agricultores familiares ao programa na modalidade Compra Institucional no contexto de implementação da Universidade Federal de Viçosa. Para o desenvolvimento da pesquisa foram realizadas entrevistas com agricultores familiares, representantes de suas organizações e representantes da sociedade civil. Os dados foram analisados pela técnica Análise de Conteúdo. Verificou-se que os vínculos estabelecidos pelos agricultores e suas organizações com entidades de assessoramento e apoio foram elos fundamentais para mobilizar os agricultores e viabilizar a participação destes no programa. Demonstrando que a rede social em que estes agricultores estão inseridos no plano local influenciou no acesso à política pública do PAA. Palavras-chave: Agricultura Familiar, Programa de Aquisição de Alimentos, Mercado, Compra Institucional, Universidade Federal de Viçosa Abstract The creation of the Food Acquisition Program in 2003 has opened opportunities for family farmers to access the institutional food market, it is presenting as innovative, with great potential for socio-economic transformation in local and regional policy. Given the importance of the program and the changes for which it has passed we sought to analyze the integration process of family farmers to the program in Institutional Purchase modality in the implementation context of the Federal University of Viçosa. For development this research, interviews were conducted with farmers, representatives of their organizations and representatives of civil society. The data were analyzed using content analysis. It was found that the contact established by farmers and their organizations with advisory bodies and support were key links to mobilize farmers and facilitate their participation in the program. It is showing that social network where these farmers are influenced to the PAA public policy access. Key words: Family Agriculture, Food Acquisition Program, marketplace, Institutional Purchase, Federal University of Viçosa
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1. Introdução
Políticas públicas de fortalecimento da agricultura familiar têm sido formuladas e
implementadas, como por exemplo, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura
Familiar (PRONAF), que surgiu por meio da reivindicação de movimentos sociais ligados à
agricultura familiar, buscando facilitar o acesso desse segmento ao crédito, e principalmente,
aumentar a capacidade produtiva, a geração de emprego e a melhoria da renda destes
agricultores.
Embora essas políticas tenham como público alvo a agricultura familiar, elas se
destinam prioritariamente às atividades de custeio e/ou investimento e pouco beneficiam a
comercialização dos produtos agrícolas. Desta forma, houve a necessidade da criação de um
programa que priorizasse a comercialização dos produtos oriundos da agricultura familiar.
Neste contexto, em 2003, por meio da Lei Federal n. 10.696, foi criado o Programa de Aquisição
de Alimentos (PAA). O programa cumpre um importante papel na comercialização de produtos
da agricultura familiar tendo em vista que proporciona sua inserção a um mercado institucional.
Ao eleger a agricultura familiar como protagonista do abastecimento dos mercados
institucionais, o programa se apresenta como opção estratégica na indução de uma nova
dinâmica de desenvolvimento rural, desenvolvimento territorial endógeno e oportunidades aos
agricultores familiares, com potencial de promover a inclusão social, a segurança alimentar, o
combate à pobreza e a redução das desigualdades (ANJOS; BECKER, 2014; DIAS et al., 2013).
Estas oportunidades se concretizam no cotidiano da agricultura familiar, de suas organizações,
dos mediadores sociais que a apoiam, como também dos gestores públicos que buscam
operacionalizar os programas em desafios à realização de suas intenções e objetivos (DUARTE;
DIAS, 2012; SILVA; DIAS; SILVA, 2014).
Estas oportunidades são potencializadas pela inclusão de uma nova modalidade ao
programa, denominada Compra Institucional (PAA-CI) e posteriormente por decreto presente
no Plano Safra da Agricultura Familiar 2015/2016 determinando a todos os órgãos da União
que recebam recursos para compra de alimentos a aplicação de, no mínimo, 30% para compra
da agricultura familiar a partir de 2016. Estas ações aumentam expressivamente a possibilidade
de abrangência da compra institucional da agricultura familiar e permite o acesso a um mercado
potencial de R$ 7 bilhões anuais (BRASIL, 2015).
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Na ausência de trabalhos que analisem a modalidade Compra Institucional e dada a
importância de avaliar a implementação do PAA a nível local e regional, este estudo torna-se
relevante. O enfoque nos agricultores familiares, principalmente na forma de organização
coletiva em nível local para o acesso a política pública, é bastante recente e poucos estudos têm
sido desenvolvidos no sentido de pesquisar a qualidade das ações empreendidas e os efeitos
locais nas organizações que operacionalizam essas políticas públicas (FREITAS et al., 2011).
Em decorrência, o objetivo principal deste trabalho é analisar o processo de inserção
dos agricultores familiares no Programa de Aquisição de Alimentos, modalidade Compra
Institucional, implementado pela Universidade Federal de Viçosa. Entender os mercados e a
forma que os agricultores se relacionam com eles tem ganhado relevância nos estudos sobre
desenvolvimento rural e sobre o “mundo” rural, uma vez que os agricultores familiares
contemporâneos se encontram intrinsecamente ligados aos mercados e sua reprodução social
depende das relações estabelecidas com estes (GAZOLLA; PELEGRINI; CADONÁ, 2010).
Para tanto, no primeiro momento traçou-se a trajetória das organizações, caracterizando-as e
analisando os mercados acessados.
2. O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)
O Programa de Aquisição de Alimentos foi instituído pelo Art. 19 da Lei Federal n.
10.696, de 2 de julho de 2003, sendo regulamentado pelo Decreto n. 6.447, de 07 de maio de
2008, a partir de uma articulação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
(CONSEA). Essa Lei desburocratizou o processo de aquisições de produtos da agricultura
familiar para atender os programas públicos, ao dispensar as regras de licitação, possibilitando
uma maior presença do Estado no apoio aos processos de comercialização da produção dos
agricultores familiares (MATTEI, 2007). Seu objetivo principal está inserido na concepção de
desenvolvimento rural, sendo seu público alvo os agricultores familiares, incidindo sobre o
principal entrave para o desenvolvimento desses agricultores: a comercialização dos produtos.
O PAA avançou de forma a complementar as ações das políticas de segurança alimentar
e nutricional, e se consolidou como um polo organizador das demandas institucionais dos
produtos da agricultura familiar. O programa contribui com a geração de renda para os
agricultores familiares e, complementarmente, a melhorar as condições de alimentação das
pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade social ou em situação de insegurança
alimentar (PERACI; BITTENCOURT, 2010).
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Inicialmente o PAA apresentou certa “timidez” dadas às mudanças políticas, como
extinção do MESA e em virtude do fato de ser compreendido a partir da lógica de um projeto
piloto pelas organizações da agricultura familiar (MULLER, 2007). Entretanto, o programa
ganhou importante projeção, a partir da sua expansão, da exposição dos seus resultados
relacionados às dinâmicas locais e ao fortalecimento da agricultura familiar, e dado ao crescente
debate sobre a construção social dos mercados (GRISA; SCHNEIDER, 2014).
Recentemente, por meio da Resolução GGPAA Nº 50 de 2012, da Secretaria Nacional
de Segurança Alimentar e Nutricional, foi estabelecida uma nova modalidade ao PAA, que
amplia as possibilidades de mercados. Trata-se da Compra Institucional que permite aos
estados, municípios e órgãos federais da administração direta e indireta adquirir produtos da
agricultura familiar por meio de chamadas públicas, com seus próprios recursos, com dispensa
de licitação. Esta modalidade dá acesso aos mercados alimentares demandados por hospitais,
quartéis, presídios, restaurantes universitários, refeitórios de creches e escolas filantrópicas
entre outros.
Em 2015, outra medida relacionada à modalidade Compra Instrucional veio ampliar e
fortalecer o PAA. O decreto Nº 8.473, de 22 de junho de 2015 estabeleceu que do total de
recursos destinados à aquisição de gêneros alimentos pelos órgãos e entidades da Administração
Pública Federal, pelo menos 30% deveram ser destinados à aquisição de produtos de
agricultores familiares. Tal como o PNAE, a vinculação de uma porcentagem mínima de
aquisição da agricultura familiar viabiliza a expansão dos mercados institucionais.
Atualmente os ministérios da Educação, da Saúde e da Defesa já adquirem alimentos
por meio da modalidade Compra Institucional para abastecimento de restaurantes
universitários, como é o caso das universidades federais de Viçosa (UFV), do Paraná (UFRP)
e de Santa Maria (UFSM).
Estas iniciativas do Governo Federal têm estimulado governos estaduais a criar seus
próprios mecanismos de compras públicas e têm estimulado as organizações da agricultura
familiar a demandarem e construírem novos mercados públicos e privados (GRISA;
SCHNEIDER, 2014).
O PAA rompeu com importantes barreiras institucionais, a exemplo da Lei de
Licitações, desencadeando uma nova trajetória para os mercados institucionais para a
agricultura familiar, fortalecida em 2009 com as mudanças no Programa Nacional de
Alimentação Escolar (PNAE) e a criação da Lei nº 11.947 (GRISA; SCHNEIDER, 2014),
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aprovada em 16 de junho de 2009, que estabeleceu que um mínimo de 30% dos recursos do
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação enviados aos municípios por meio do PNAE
devem ser destinados à aquisição de alimentos produzidos pela agricultura familiar, o que
ampliou significativamente o mercado institucional.
3. Procedimentos Metodológicos
Esta pesquisa tem caráter exploratório e descritivo. Segundo Gil (2010), as pesquisas
exploratórias visam prover o pesquisador de um maior conhecimento sobre o tema ou problema
de pesquisa em perspectiva. Já a pesquisa descritiva busca prover o pesquisador com dados e
informações sobre as características de grupos, estimar proporções de determinadas
características e verificar a existência de relações entre as variáveis estudadas (MATTAR,
2005). Neste contexto, o escopo descritivo da pesquisa será realizado nas incursões a campo,
onde serão traçadas as características dos grupos de agricultores familiares envolvidos e suas
percepções. Com base nas características e objetivos desta pesquisa, bem como na natureza do
objeto, ela teve uma abordagem qualitativa.
Foi utilizada neste estudo a metodologia qualitativa de estudo de caso. Para Gil (2010),
o procedimento técnico de estudo de caso proporciona uma visão geral acerca do problema
pesquisado, além de oferecer a possibilidade de detectar fatores que influenciam ou são
influenciados por ele. É recomendado quando envolve um estudo profundo e exaustivo de um
ou poucos objetivos de maneira que se permita o amplo e detalhado conhecimento.
A seleção do caso estudado se deu de forma intencional. Foi determinante para a escolha
da UFV, o fato de ser a segunda instituição federal de ensino (IFE) do Brasil a implantar o
programa e a única IFE do estado de Minas Gerais a operacionaliza-lo, em um rol de apenas
quatros universidades federais que estão operacionalizando o PAA.
Foram utilizadas técnicas de coleta de dados através de dados secundários, análises
documentais e entrevistas semiestruturadas. Segundo Yin (2010), entrevistas são usualmente
aplicadas em estudos sobre questões de avaliação subjetiva, tema chave deste trabalho. O autor
defende a entrevista como uma das principais fontes de informação para um estudo de caso,
porque a maioria delas trata das questões humanas e ao serem registradas e analisadas aos olhos
de pesquisadores específicos e respondentes bem informados, podem dar interpretações
importantes para uma determinada situação.
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Foi empregada a técnica de categorização na análise das entrevistas, utilizada,
particularmente, em pesquisas do tipo qualitativo (RICHARDSON, 2010). Para Bardin (2011,
p.145), “a categorização é uma operação de classificação de elementos constitutivos de um
conjunto por diferenciação, e em seguida, por reagrupamento segundo o gênero (analogia), com
os critérios previamente definidos”. Portanto, as respostas foram categorizadas mediante suas
características incomuns para cada uma das entrevistas realizadas.
Os dados foram coletados no período de 24 de setembro a 30 de novembro de 2015, por
meio de entrevistas com os agricultores familiares que acessaram o programa, suas
organizações, representante do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável e
do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Viçosa, representantes da EMATER, da Incubadora
Tecnológica de Cooperativas Populares da UFV (ITCP/UFV), Centro de Tecnologias
Alternativas da Zona da Mata (CTA-ZM) e União Nacional de Cooperativas da Agricultura
Familiar e Economia Solidária (UNICAFS).
4. As organizações coletivas da agricultura familiar: surgimento, inserção no PAA –
Compra Institucional e sua operacionalização
Entre os anos de 2013 e 2015 forneceram alimentos, por intermédio da Chamada
Pública, agricultores vinculados a três diferentes organizações da agricultura familiar (Quadro
1).
Quadro 1: Relação das organizações fornecedoras do Programa de Aquisição de Alimentos da
UFV
Organização Ano Produto Cooperativa de Produção da Economia Solidária de Tombos (COOPROSOL)
2015 Pó de café, banana, feijão carioca e feijão vermelho 2014 Pó de café
Associação dos Agricultores Familiares de Araponga (AFA)
2014 Banana 2013 Banana
Associação de Produtores de Agroartesanato de Viçosa (ASSOV)
2013 Pó de Café, feijão vermelho
Fonte: elaboração própria.
Buscou-se descrever e identificar o tipo de mercado que essas organizações acessam e
priorizam, com base na tipologia elaborada por Wilkinson (2008), sintetizada no Quadro 2.
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Quadro 2: Tipologia dos Mercados na Agricultura Familiar
Mercado Perfil Desafios Commodities Velhos e novos mercados locais e a
distância Padronização, legislação, qualidade mínima e escala
Especialidades (agroindústrias de sucos, frigoríficos)
Discriminado por grande associação com localidade/tradição
Concorrência de novos entrantes
Orgânicos Grau de associação à saúde e/ou a um modo específico de produção
Certificação, escala pesquisa
Artesanais Denominação de origem ou não Qualidade, normas técnicas, autenticidade, ação coletiva
Solidários Identificação ou não com a agricultura familiar, mercados de alta e baixa renda
Escala, variedade, qualidade
Institucionais Licitações, oferta para varejo Qualidade, variedade, escala Fonte: Wilkinson (2008, p. 17).
4.1. A experiência da ASSOV
A Associação de Produtores de Agroartesanato de Viçosa foi fundada em 1997 e,
segundo seu representante, foi criada para ampliar o “negócio” rural, através da organização de
artesãos, agricultores patronais e agricultores familiares.
Atualmente a associação conta com 62 sócios atuantes, todos da agricultura familiar e
majoritariamente pertencentes ao município de Viçosa. Estes produzem principalmente
hortifrutigranjeiros, queijos, doces em compotas e quitandas, sendo o principal produto
comercializado no mercado local o queijo. O PNAE é o principal mercado de comercialização,
em termos de quantidade e valor vendido, exceto para os produtores de queijo que possui o
mercado convencional como principal destino de sua produção.
Com base na tipificação de mercados de Wilkinson (2008) identificou-se que a ASSOV
acessa três diferentes tipos de mercados: o mercado artesanal, através da produção e venda de
produtos do artesanato; o mercado solidário, uma vez que a associação possui identificação com
a agricultura familiar; e o mercado institucional, por meio da comercialização dos seus produtos
para o PNAE e o PAA.
A associação tomou conhecimento do PAA da Universidade Federal de Viçosa por meio
da EMATER, através da divulgação da Chamada Pública, e através do evento de lançamento
do programa na instituição. Apesar da maciça presença dos agricultores, houve pouco interesse
devido à pequena quantidade demandada inicialmente. Os agricultores da instituição chegaram
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a fornecer pó de café e feijão na primeira Chamada Pública. Para elaborar a proposta de
fornecimento houve um processo de conscientização junto aos agricultores quanto ao preço,
quantidade e, principalmente, qualidade dos produtos demandados, que passariam por testes
por meio de amostra.
Apesar de o valor total comercializado ser pequeno, para a presidente da ASSOV, esse
valor foi representativo para o cotidiano das famílias que forneceram. Para estes agricultores,
fornecer ao PAA, mesmo que a um preço e quantidade mínimos, representou uma porta de
entrada para iniciar o processo de comercialização com a Universidade Federal de Viçosa.
Os agricultores da ASSOV também chegaram a comercializar com a UFV fora do PAA,
fornecendo lanches para alguns eventos, atividades e reuniões comemorativas nos
departamentos da instituição, principalmente as realizadas pela Pró-Reitoria de Assuntos
Comunitários. Neste sentido observou-se que, através de contatos permitidos pelo PAA, foram
viabilizados outros mercados para os produtos da associação.
No primeiro edital, em 2013, os agricultores apresentaram propostas de forma
individual. A partir de 2014 as propostas foram apresentadas via ASSOV, porém, o agricultor
era o responsável pela organização da documentação, assessorado pela EMATER. As trocas de
informações não perpassaram pela associação, a comunicação foi estabelecida diretamente
entre agricultor fornecedor, EMATER e universidade.
Segundo a representante da associação, o preço pago pelos produtos é compensador,
apesar do preço do pó de café estar abaixo do preço de mercado. Ainda segundo a entrevistada,
isso ocorre devido aos preços dos produtos no município de Viçosa serem altos, em comparação
a outras regiões, em função do custo de vida e da mão de obra na cidade, que eleva o custo de
produção e consequentemente o preço de venda.
Ainda há um desconhecimento de como funciona o processo de Chamada Pública, que
no caso da UFV, se assemelha a uma licitação, onde os preços são definidos pelos fornecedores,
tendo como base um preço de referência, e ganha aquele que apresentar o menor preço. Para a
entrevistada deveria haver um processo de negociação dos preços e a prioridade deveria ser
para a região, segundo ela, esta é uma barreira para operacionalizar o PAA-CI. Outra barreira
apontada foi a falta de comunicação da universidade com os agricultores.
Por meio da publicidade proporcionada pelo PAA-CI, verificou-se que a
comercialização com o programa tem contribuído para o reconhecimento dessa categoria social
e para uma valorização simbólica do agricultor familiar no contexto da instituição e nos
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municípios destes agricultores. Para um dos agricultores participantes entrevistados, a venda
para o PAA “Abre todinho o mercado, porque as pessoas sabendo, aí com o passar do ano, os
colegas da gente que trabalha na cidade, parente da gente que trabalha lá já vê no jornalzim [...]
vem contando da gente [...]”. Porém, os benefícios concretos em termos de renda, qualidade de
vida, produção e preço ainda não é percebido, principalmente pelo valor e quantidades
demandadas pela universidade serem baixos e consequentemente pouco impactam na renda.
Percebeu-se também uma decepção em função disso, uma vez que a expectativa era que a
universidade iria demandar grande quantidade de alimentos e que isso poderia transformar a
dinâmica de comercialização local.
Para a representante da ASSOV, a participação no PAA não permitiu à associação
acessar outros mercados e também não impactou na economia local/regional, em função do
baixo valor comercializado, mas existe uma perspectiva de aumento da demanda da instituição
em função da obrigatoriedade de comprar no mínimo 30% de produtos da agricultura familiar,
a partir de 2016. Apesar da expectativa, reconhece que ainda há dificuldade da agricultura
familiar da região em abastecer o mercado do RU na qualidade, padrão e quantidades
demandadas. Esta dificuldade estaria, no entendimento da entrevistada, relacionada à falta de
organização da agricultura familiar na região e às exigências por parte da universidade e do
Restaurante Universitário, que demandam produtos com padrão e qualidade tipo CEASA.
Tal como constatado por Costa, Amorim Junior e Silva (2015), observou-se que apesar
do mercado institucional ser definido como “diferenciado”, os padrões estabelecidos para os
produtos são como nos mercados de commodities, o que significa formatos negociados e
definidos para substituir a diversificação do produto e da produção. Para Wilkinson (2008),
estes são padrões que interessam aos grupos dominantes e que são institucionalizados como
referência. Isto indica a necessidade da instituição buscar dialogar com essa categoria social e
promover ações para tentar adequar os aspectos normativos do PAA às realidades da agricultura
familiar na região, estabelecendo novos padrões de mercado (SILVA; SILVA, 2011).
Buscando superar as dificuldades e barreiras, os produtores da associação estão se
mobilizando para constituir uma cooperativa, vislumbrando a possibilidade de fornecer para a
UFV, atender ao PAA estadual e em função de determinações legais (Lei 10.406 de 2002) que
estabelece que as associações não tenham finalidade econômica, o que pode inviabilizar a
comercialização via associação.
O Quadro 3 resume os principais apontamentos feitos pela ASSOV sobre o PAA:
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Quadro 3: Motivação, pontos negativos e positivos elencados pela ASSOV
Motivação, pontos negativos e positivos elencados pela ASSOV Motivação para fornecer ao PAA
Garantia de recebimento; Acesso ao mercado da UFV.
Pontos negativos/limitações Valor e quantidade comercializados baixos; Custo da mão de obra na região; Desconhecimento dos procedimentos da Chamada Pública; Falta de comunicação/diálogo da universidade com os agricultores; Inviabilidade de negociação de preços; Padrão de mercado tipo commodities; Desconsideração das especificidades da produção de alimentos local.
Pontos positivos/potencialidades Mercado garantido; Acesso ao mercado da UFV; Preço pago compensador; Melhoria na renda familiar; Reconhecimento e valorização simbólica da agricultura familiar.
Fonte: resultados da pesquisa.
4.2. A experiência da COOPROSOL
Constituída e consolidada em 2009, a COOPROSOL teve seu processo organizativo
iniciado no ano 2000, quando 20 famílias se organizaram informalmente para adquirir de forma
coletiva insumos e rações e para comercializar produtos alimentícios. No ano de 2004, em
contato com cursos de associativismo e cooperativismo, o grupo fundou a Cooperativa de
Crédito Rural com Interação Solidária (CRESOL) Tombos, cooperativa de crédito da
agricultura familiar, com o objetivo de facilitar o acesso dos agricultores familiares às linhas de
crédito.
Todavia, a organização da produção e o acesso a mercados para escoamento dos
produtos ainda eram feitos de forma individualizada, o que se constituía um entrave para os
produtores. Buscando superar essa barreira, em 2008, o grupo se vinculou à Associação dos
Produtores Independentes de Tombos (APRIT) que começou a desenvolver um trabalho em
conjunto para escoar a produção dos agricultores. Neste momento surge ainda um grupo de
mulheres agricultoras produzindo artesanato e fornecendo para o Projeto Tamar. A APRIT
insere a produção de seus associados no mercado local, porém, em função da possibilidade de
fornecer para o PNAE e por determinações legais (Lei 10.406 de 2002, Novo Código Civil) que
estabelece que as associações não tenham finalidade econômica, surgiu a necessidade de
constituir, em junho de 2009, a COOPROSOL.
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Atualmente a COOPROSOL conta com 164 cooperados. Seu foco de atuação hoje é
voltado para a comercialização de frutas e hortaliças, intermediação de compra e venda de
insumos agrícolas entre o fornecedor e cooperado, produção de mudas de hortaliças e produção
de artesanatos. A cooperativa também beneficia o café em torrado e moído, que se constitui no
maior mercado em relação ao valor comercializado e conta ainda com um portfólio de 40 tipos
de produtos que são destinados ao município de Tombos e cidades vizinhas através do Programa
Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), parte da produção é destinada aos supermercados
do município e região.
Tendo como base a tipificação de mercados de Wilkinson (2008) a COOPROSOL
acessa quatro diferentes tipos de mercados: o mercado de commodities, por meio da venda de
café; o mercado artesanal, através da produção e venda de produtos do artesanato,
principalmente para o Projeto Tamar; o mercado solidário, uma vez que a associação possui
identificação com a agricultura familiar e com a economia solidária; e o mercado institucional,
por meio da comercialização dos seus produtos para o PNAE e o PAA.
O principal mercado da cooperativa é o PNAE, através do qual são comercializados
principalmente produtos hortifrutigranjeiros, destacando-se as verduras, legumes e frutas. A
COOPROSOL apresenta uma participação bastante independente e consolidada no mercado
local, pois comercializa no âmbito local e regional, levando em consideração as vendas
realizadas para o PNAE e PAA.
A cooperativa buscou fornecer para o PAA-CI vislumbrando um novo mercado para os
produtos dos seus cooperados. Para o processo de seleção dos agricultores é feito um
mapeamento de produção e da possibilidade de ampliação e aqueles que têm potencial para
aumentar o valor de venda são selecionados. Observou-se que havia vínculo de parentesco entre
agricultor fornecedor e presidente da cooperativa, indicando, tal como enfatizado por
Wanderley (2002), que os vínculos e laços de amizade podem ser fundamentais para acessar o
mercado do PAA.
A participação de organizações como o CTA-ZM e ITCP-UFV, em parceria com a UFV,
junto às organizações da agricultura familiar da região para coleta de preços, permitiu a
formulação de um preço de referência mais próximo dos preços praticados na comercialização
dos produtos na Zona da Mata. Neste sentido, o presidente da cooperativa vê como importante
a presença de movimentos sociais e de entidades de apoio e assessoramento no processo de
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acesso às políticas públicas, principalmente por estas desempenharem um papel de
intermediadoras entre a cooperativa e a universidade.
Estas organizações contribuíram no processo de negociação e definição dos produtos
que a região poderia ofertar e na construção do calendário de entrega desses produtos. Também
auxiliaram a sensibilizar os produtores da importância e das potencialidades que poderiam
surgir com a participação no mercado institucional do PAA. Exerceram um papel de
articuladoras construindo um canal de diálogo entre a UFV e as organizações da agricultura
familiar.
O processo de comercialização do PAA na COOPROSOL está alicerçado na relação de
compra e venda com o agricultor familiar. Neste caso, a cooperativa compra do produtor o
produto demandado pelo programa e, sobre este, inclui os custos administrativos, logístico e
fiscal, assumindo protagonismo no fornecimento e diálogo com a universidade.
No início os agricultores viram o fornecimento para a universidade com desconfiança,
em virtude do descrédito com alguns programas governamentais, tal como o PAA na
modalidade Compra com Doação Simultânea. O descrédito com esta modalidade pode estar
relacionado às limitações e obstáculos apontados pela literatura, tais como o atraso na liberação
de recursos (CURRALERO; SANTANA, 2007); dificuldades relacionadas à operacionalização
do programa (SALGADO; DIAS, 2013); falta de articulação com outros programas
direcionados à agricultura familiar (MARQUES; MOAL; ANDRADE, 2014), entre outras
limitações que minam a credibilidade do programa. Entretanto, os produtores viram a
possibilidade de fornecer a um mercado crescente e se mobilizaram para participar do mercado
do PAA, porém, ainda conhecem muito pouco da universidade e de seus processos. A frase a
seguir ilustra bem essa questão: “Até então havia uma muralha entre nós e a universidade. A
partir de então começa a quebrar um pouco esse paradigma, conhecer um pouco mais, o fato de
ser parceiro” (Representante da COOPROSOL).
O acesso a outros mercados é visto como uma possibilidade, uma vez que as exigências
da instituição em relação à padronização e qualidade são fatores que garantem que aquele
produto fornecido também possa ser comercializado para outros mercados, principalmente os
tradicionais.
A participação no PAA trouxe ganhos para a cooperativa, principalmente relacionado
ao aumento do capital de giro, uma vez que aproximadamente 30% do valor do contrato
permanece na cooperativa, já que é ela quem assume toda a responsabilidade sobre parte do
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beneficiamento do produto, embalagem, rotulagem e transporte. Além desses serviços, a
cooperativa fornece apoio aos associados por meio da disponibilização de um técnico agrícola,
cursos de capacitação, emissão de nota fiscal e intermediação da venda e da compra de insumos.
O impacto na economia local, em termos da dinamização econômica e social, não é
percebido pelo representante da COOPROSOL, pois o valor comercializado foi muito pequeno.
Porém, ressalta que para os produtores que forneceram, houve impacto positivo, principalmente
na composição da renda dessas famílias. O mercado seguro e garantido também foi outro
aspecto positivo apontado pelo entrevistado. Ele acredita no potencial do programa para
dinamizar a economia local e regional e incentivar os produtores a permanecer no campo. Para
Deves, Rambo e Fillipi (2010), se as políticas públicas forem aplicadas corretamente no
desenvolvimento equilibrado e sustentado dos agricultores beneficiados, possibilitará a geração
de renda e diversificação produtiva, o que contribui para dinamização da economia nos
municípios.
Avaliando o PAA, o entrevistado afirma que o programa abriu um canal direto de
comunicação e diálogo com a UFV. Apesar dos benefícios propiciados, ele considera que
programa deve ser aprimorado, uma vez que o processo de licitação traz insegurança aos
agricultores e a cooperativa, que não podem se planejar para fornecer, por não saber quem
poderá ganhar a Chamada Pública. A falta de continuidade do programa é um entrave, uma vez
que este é um fator importante para incentivar e motivar o agricultor a participar desse mercado.
Eles esperam ainda, que o valor de comercialização aumente e que outras organizações
tenham oportunidade de participar e acessar o PAA, ampliando o quadro de agricultores
beneficiados, dinamizando informações, aumentando as atividades agropecuárias e
desenvolvendo a região. Apesar desta perspectiva, até a data de finalização da pesquisa, não
havia nenhum direcionamento quanto ao próximo edital, apesar da obrigatoriedade de compra
de 30% da agricultura familiar a partir de janeiro de 2016.
Buscando superar limitações referentes à impossibilidade de participação de várias
organizações, a COOPROSOL e as demais cooperativas filiadas à União das Cooperativas da
Agricultura Familiar e Economia Solidária (UNICAFS) estão se mobilizando com o objetivo
de criar uma “Central de Comercialização”, que agrupará de 10 a 20 cooperativas filiadas. Será
esta central que participará da Chamada Pública e poderá direcionar a entrega a UFV entre as
cooperativas filiadas, de acordo com a capacidade de produção. Essa estratégia visa superar o
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gargalo referente à competição entre as cooperativas da região e ampliar as oportunidades para
os cooperados.
O Quadro 4 resume os principais apontamentos feitos pela COOPROSOL sobre o PAA.
Quadro 4: Motivação, pontos negativos e positivos elencados pela COOPROSOL
Motivação, pontos negativos e positivos elencados pela COOPROSOL Motivação para fornecer ao PAA
Acesso a um novo mercado. Pontos negativos/limitações
Baixo volume de comercialização; Custo de logística; Atendimento a exigências fitossanitárias; Descrédito com programas governamentais; A Chamada Pública nos moldes de licitação traz insegurança; Descontinuidade de fornecimento ao programa.
Pontos positivos/potencialidades Incentivo ao investimento; Potencial de comercialização; Acesso a outros mercados; Aumento capital de giro; Melhoria na renda familiar; Abertura de um canal direto de comunicação e diálogo com a UFV.
Fonte: resultados da pesquisa.
4.3. A experiência da AFA
A Associação de Agricultores Familiares de Araponga (AFA) foi fundada em 1998 com
o objetivo de atender a uma demanda de compra coletiva de insumos e promover a
comercialização coletiva da diversidade produzida pelos agricultores familiares. Atualmente
possui 56 associados exclusivamente da agricultura familiar.
O principal mercado de comercialização da associação é o PNAE. Apesar do lucro em
vender para esse mercado não ser grande, ele proporciona um alto giro de produtos. A
associação possui ainda um mercado próprio que comercializa somente produtos
agroecológicos dos sócios. É cobrada uma taxa de 20% para cada produto vendido para
manutenção do mercadinho. Possuem uma marca denominada “Pedra Redonda”, é a única
marca registrada da associação.
A realização da venda direta na própria sede da associação traz ganhos aos agricultores,
uma vez que os consumidores buscam os produtos, diminuindo os custos de comercialização e
de transação para a associação. Isso demonstra a confiança destes atores em relação a estes
produtos e a menção a “qualidade superior” é seguidamente enunciada como motivos para as
suas compras (WILKINSON, 2008). A venda direta na propriedade, na sede da organização ou
na feira de produtores também permite a articulação entre o sistema de intercâmbio mercantil e
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o sistema de reciprocidade, uma vez que há relação comercial, mas também relação física e
humana direta entre os produtores e consumidores (SABOURIN, 2008).
Os principais mercados acessados pela AFA, com base na tipificação de mercados de
Wilkinson (2008), são: o mercado de commodities, por meio da venda do café; o mercado
orgânico, já que o histórico da associação e do município têm levado os agricultores a produzir
e comercializar este tipo de produto; o mercado solidário, uma vez que a associação possui
identificação com a agricultura familiar; e o mercado institucional, por meio da comercialização
dos seus produtos para o PNAE e o PAA.
A associação assumiu responsabilidade sobre a confecção da proposta de compra do
PAA e sobre todo o processo burocrático no que diz respeito à Chamada Pública. Como forma
de cobrir seus custos operacionais e administrativos, ela cobra 20% sobre o valor de venda do
produto. A entrega fica a cargo do produtor. Percebe-se que a associação assume protagonismo
apenas no processo burocrático, ao qual a maioria dos agricultores são avessos e o agricultor
detêm a responsabilidade sobre a operacionalização da entrega.
O fornecimento para o PAA foi possível através de uma parceria entre a AFA e
produtores de café da comunidade do Salazar e suporte de pesquisadores, professores da UFV
e técnicos da EMATER. Esta comunidade também possui parceria com a ITCP-UFV e participa
de projetos junto a UFV para o acompanhamento das lavouras de café. Segundo Campos (2014)
a comunidade do Salazar tem como principal característica ser povoada por pequenos sitiantes
e meeiros. Em seu estudo a autora constatou que as lideranças da comunidade reclamaram da
falta de envolvimento efetivo dos representantes da comunidade junto a AFA. Observou-se que
o PAA possibilitou uma aproximação entre esta comunidade e a associação.
A entrevistada relata que esse distanciamento entre esta comunidade e a associação foi
superado quando os projetos de produção agroecológica e estruturação de uma marca para
comercialização não deu certo, fazendo com que os agricultores tivessem que recorrer à
associação para comercializar seus produtos. Corroborando, um entrevistado de Campos (2014)
opina sobre este distanciamento “[...] é por que as pessoas já têm tudo o que querem, eles acham
que não precisam mais lutar pelo seu direito ou é porque eles se acomodaram, e... Ah! Tem um
grupinho lá para lutar para mim, para que eu vou esquentar?”.
A busca de associativismo para acessar o PAA está relacionada também com os critérios
de priorização do programa em caso de empate nos preços. Há preferência para organizações
formais de agricultores familiares sobre grupos informais e fornecedores individuais.
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A representante apresentou como barreira o processo de articulação entre a associação
e o produtor, pois o agricultor tende a dar prioridade aos seus compromissos com a produção,
colheita e cultivo dos produtos e pouco se envolvem na parte burocrática. Como a associação
assumia o compromisso de entregar os produtos, esse diálogo entre a entidade e os produtores
demandava atenção para que os compromissos assumidos fossem efetivados. A associação teve
apoio e assessoria da ITCP-UFV na preparação dos documentos para enviar a proposta de
venda. Denota-se que, além de um canal direto com a universidade, a ITCP-UFV assumiu papel
de assessoramento junto à AFA.
A falta de infraestrutura também foi uma limitação, os agricultores não possuíam caixa
adequada para transportar a banana e a associação não possui veículo próprio para entrega. No
caso da banana, a ausência de uma câmara de climatização trouxe dificuldades para entregar o
produto no padrão exigido pela universidade, com 60 a 70% de maturação.
Os agricultores sócios que tinham o produto no padrão e qualidade demandados pela
UFV e tinham interesse em participar da Chamada Pública, foram convidados a participar da
proposta de entrega. No caso especifico do café, como o produto era oriundo de uma
comunidade especifica formada por vários agricultores, a escolha se deu por meio de indicação
dos agricultores que estavam aptos a fornecer, ou seja, que tinham DAP válida. No caso da
banana foram selecionados aqueles que tinham interesse de fornecer e que estavam mais bem
organizados, pois o fornecimento deste produto exige atenção quanto à escala de produção,
período de maturação e logística de entrega, que é feita pelo próprio agricultor.
Todos os agricultores que forneceram ao PAA pela AFA em 2015 possuíam grau de
parentesco entre si e cultivam os produtos em parceria. A aliança entre parentes e o trabalho
coletivo são importantes para a inserção nos mercados, segundo Radomsky e Schneider (2007)
estas se constituem em relações de reciprocidade, que resulta em confiança, permitindo que os
indivíduos se lancem em novos empreendimentos, que sozinhos talvez não estivessem
dispostos.
A entrevistada acredita que o PAA não conduziu os agricultores a outros mercados, mas
eles estão buscando formas alternativas de comercialização, têm apostado principalmente no
mercado local. Como iniciativa, estão construindo uma rede de consumidores agroecológicos
no município de Araponga para escoar a produção. Além disso, estão criando uma cooperativa
de produção para poder continuar comercializando. A partir de 2016 toda a venda será feita via
cooperativa denominada Cooperativa dos Agricultores e Agricultoras Familiares e Economia
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Solidária de Araponga (COOAFA). Porém, não há a pretensão de acabar com a associação, esta
desempenharia um papel mais informal de venda direta ao consumidor, através do mercadinho
e da rede, já a cooperativa assumiria os contratos formais, tais como o PNAE e PAA.
A experiência de fornecer para a Universidade Federal de Viçosa permitiu a associação
vencer uma das principais dificuldades da agricultura familiar, a comercialização de seus
produtos. Participar e conseguir comercializar com a UFV trouxe avanços para a associação,
principalmente em relação à valorização e divulgação do produto da agricultura familiar e do
produto agroecológico. A geração de renda, mesmo que mínima, foi importante, além do status
adquirido pela associação junto ao mercado local e aos clientes.
Segundo a entrevistada, o PAA trouxe mudanças para a economia local, pois é um
mercado de extrema importância para aqueles que forneceram, não havendo mercado
alternativo para a produção excedente na região. O programa permitiu, também, aumento na
renda dos agricultores.
Avaliando o programa, a representante da AFA acredita que o PAA avançou
sobremaneira, principalmente na questão do preço, que melhorou muito. O programa estimulou
o aumento na produção dos agricultores, representando o único mercado para o excedente de
produção. Têm expectativa que o programa continue melhorando, principalmente no processo
de diálogo e de negociação e espera que haja aumento na quantidade demandada dos produtos
e também na diversificação. O Quadro 5 resume os principais apontamentos feitos pela AFA
sobre o PAA-CI.
Quadro 5: Motivação, pontos negativos e positivos elencados pela AFA
Motivação, pontos negativos e positivos elencados pela AFA Motivação para fornecer ao PAA
Inserção em um novo mercado; Escoar excesso de produção.
Pontos negativos/limitações Chamada Pública nos moldes de licitação traz insegurança; No início os preços eram baixos; Custo da mão de obra na região; O PAA-CI como único mercado alternativo para escoar excedente de produção.
Pontos positivos/potencialidades Aproximação entre comunidades locais e a associação; Atualmente os preços são compensatórios; Dificuldades de articulação entre a associação e o agricultor; Falta de infraestrutura (veículo próprio, câmara de climatização) da associação; Valorização e divulgação do produto da agricultura familiar; Impactos positivos na economia local por meio do aumento de renda dos agricultores
Fonte: resultados da pesquisa.
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5. Considerações Finais
Constatou-se que a trajetória e estrutura organizacional das organizações coletivas que
acessaram o PAA foram importantes para permitir o estabelecimento de vínculos dos
agricultores e suas organizações com entidades de assessoramento e apoio, tais como CTA-ZM,
ITCP-UFV e EMATER-MG, que foram elos fundamentais para mobilizar os agricultores,
divulgar o PAA, auxiliar na confecção das propostas e levar à universidade as demandas desta
categoria social, exercendo papel de mediadores e prestando assessoria.
Observou-se que os agricultores, por meio de suas organizações, conseguiram articular
suas iniciativas com as oportunidades geradas pelo PAA, acompanhando seu processo de
implementação. Constatou-se que, em função do programa, estes mesmos agricultores estão
buscando estratégias de comercialização diferenciadas para obter uma melhor remuneração de
seus produtos, escoar o excesso de produção e superar as barreiras encontradas para acessar e
operacionalizar o PAA. Neste sentido, estão visualizando formas de organização coletivas que
procurem superar as dificuldades do associativismo e cooperativismo tradicional.
Por ser tratar de uma política de apoio à comercialização para a agricultura familiar, o
PAA exige regularidade de oferta e importante organização logística. Nesta perspectiva,
observou-se que o programa tem representando maior oportunidade para aqueles segmentos da
agricultura familiar que possuem uma melhor estrutura produtiva e capacidade organizativa.
As experiências de comercialização via PAA têm fortalecido, mesmo que de forma
incipiente, a comercialização a nível local e regional, se apresentando como uma importante
ferramenta de fortalecimento e valorização da agricultura familiar. Têm possibilitado, também,
o fortalecimento das organizações coletivas e o aperfeiçoamento dos processos de planejamento
e gestão, contribuindo para a ampliação da rede de relações sociais de cooperação e apoio.
Apesar de ainda não se observar diversificação expressiva da produção para
fornecimento ao programa, pode-se concluir que o incentivo propiciado pelo programa tem
levado os agricultores, tradicionais produtores de café, a buscar alternativas de cultivo e até
consórcios entre as culturas, conferindo maior segurança contra as recorrentes crises do
mercado do café e consequente diversificação da produção.
A necessidade de ampliação da infraestrutura nas áreas rurais, tais como estradas,
telefonia e internet ainda é um desafio para o programa, as quais podem potencializar os
resultados já manifestos ou romper com barreiras importantes que bloqueiam o acesso e
expansão das ações governamentais por meio das políticas públicas.
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Apesar de suas limitações, denota-se que o PAA tem contribuído para o fortalecimento
das condições socioeconômicas dos agricultores familiares, e para romper com a imagem de
atraso associado ao rural. O programa fornece instrumentos que potencializam as atividades
econômicas locais, notadamente as atividades agrícolas, valorizando o rural principalmente
como um espaço de trabalho e geração de renda.
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MECANISMOS RECENTES DE POLÍTICA AGRÍCOLA: o Programa Garantia-Safra nos territórios do Rio Grande do Norte.
MECHANISMS RECENT AGRICULTURAL POLICY: Garantia-Safra Program in
Rio Grande do Norte Territories.
Mônica Soares Cruz. Economista. Graduada e Mestre em Economia pela a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Bolsista EXP-B do CNPq, na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (FACEM/UERN), e-mail: [email protected] Emanoel Márcio Nunes. Economista. Professor do Departamento de Economia da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). Mestre em Economia pela Universidade Federal de Uberlândia (IE/UFU). Doutor em Desenvolvimento Rural pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PGDR/UFRGS), e-mail: [email protected] Magnalda Fontoura. Pedagoga. Graduada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Especialista em Desenvolvimento Rural Sustentável pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG). Sub coordenadora da Agricultura Familiar (SAPE/RN), e-mail: [email protected]
Grupo de Pesquisa 03: Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo O Programa Garantia-Safra é um instrumento de política agrícola que tem com objetivo garantir uma renda mínima aos agricultores familiares do Semiárido brasileiro, que perdem suas safras por causa das secas ou excesso de chuvas. O Rio Grande do Norte destaca-se pelo aumento expressivo de adesões nos dez anos, e o Garantia-Safra tem assegurado um grande número de famílias, tendo visto que dos 167 municípios potiguares, 147 pertencem ao Semiárido. No entanto, os impactos positivos dessa política abrangem não só agricultores familiares, mas transborda contribuindo para o fortalecimento da economia dos municípios e do Estado. Porém, existem muitos desafios, a exemplo da universalização dos agricultores familiares; adimplência dos entes federativos; fortalecimentos dos Conselhos Municipais, entre outros. Palavras-chave: Programa Garantia-Safra; Rio Grande do Norte; Territórios; Desafios. Abstract The Garantia-Safra Program is an agricultural policy instrument that has the objective to ensure a minimum income for farmers in the Brazilian semiarid, who lose their crops because of drought or excessive rainfall. The Rio Grande do Norte is distinguished by significant increase in membership in the ten years, and Garantia-Safra has secured a large number of families, having seen that the 167 municipalities potiguares, 147 belong to the Semi-Arid. However, the positive impacts of this policy include not only farmers, but overflows contributing to the strengthening of the economy of the municipalities and the state. However, there are many challenges, such as the universalization of family farmers; timely payments of federal entities; invigoration of the Municipal Councils, among others. Key words: Garantia-Safra Program; Rio Grande do Norte; Territories; Challenges.
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1. Introdução
O seguro agrícola no Brasil vem se ampliando desde suas primeiras experiências, em meados da década de 1930. Dentre, todas as Regiões do Brasil, mais precisamente a região semiárida brasileira, apresenta características climáticas que afetam frequentemente a sua produção. É um fato histórico e recorrente que essa população enfrenta dificuldades decorridas das constantes secas.
A partir desse cenário, o Estado passou a intervir na Região, com a criação da Inspetoria de Obras Contra as Secas (IOCS), posteriormente IFOCS e, finalmente, DNOCS. Mas, de acordo com Furtado (1989), essas políticas públicas foram limitadas, pois só se preocupavam em resolver o problema da escassez de água e da migração populacional para os centros urbanos na época da seca, ou seja, eram políticas públicas de caráter assistencialista e meramente compensatórias que só asseguravam a reprodução do quadro existente. Outras iniciativas também foram promovidas pelo Estado, como a criação da SUDENE, entre inúmeras outras. No entanto, nenhuma dessas inúmeras ações propiciou a convivência com a seca.
A partir da Safra de 2002/2003, com o intuito de modificar o caráter emergencialista das políticas de combate às secas e torná-las permanentes foi criado por meio do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), o Seguro-Safra, posteriormente denominado de Garantia-Safra. Apesar do nome, este instrumento não é um seguro, mas sim um programa assistencialista com o objetivo de garantir uma renda mínima aos agricultores familiares da região Nordeste, do semi-árido do Estado de Minas Gerais (norte de Minas Gerais e Vale do Jequitinhonha), da região Norte do Espírito Santo e nos municípios sujeitos a estado de calamidade ou situação de emergência em razão do fenômeno da estiagem.
Depois de mais de uma década de Programa, este apresenta resultados importantes e mais desafios a serem vencidos. Diante disso, este trabalho tem como objetivo analisar o Programa Garantia-Safra desde a sua implantação até atualmente, analisando mais especificamente o seu desempenho nos Territórios do Estado do Rio Grande do Norte.
Acredita-se que o Programa seja fundamental para os agricultores familiares do semiárido brasileiro. A metodologia utilizada para alcançar o objetivo deste artigo é a pesquisa bibliográfica e documental, com a utilização de dados secundários e análise com estatística descritiva.
Este trabalho está composto por esta introdução, seguido do referencial teórico sobre a evolução do seguro rural no Brasil, logo após a descrição do Programa Garantia-Safra, seguida da apresentação e discussão dos resultados sobre o Programa, por fim as considerações finais e as referências bibliográficas. 2. A EVOLUÇÃO DO SEGURO RURAL NO BRASIL
No Brasil, o setor agrícola é historicamente importante, principalmente no aspecto socioeconômico. No entanto, a diversidade climática existente em todo o país, faz com que esse setor sofra com grandes percas. A Região Centro-Sul marcada por enchentes, chuvas de granizo, geadas e a Região Nordestina, quase que em sua totalidade semiárida, com as constantes secas. Por tanto faz-se necessário políticas públicas e recursos para tentar amenizar este problema.
No final da década de 1930, no Estado de São Paulo deu-se início a uma das primeiras experiências com o seguro agrícola no país, através da criação do seguro contra granizo. Originando a Carteira de Seguro Contra o Granizo, sob a forma de fundos. Posteriormente,
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em 1948 foi criada a Carteira Agrícola de Seguros Contra o Granizo que ficou sob a administração da Comissão de Produção Agropecuária (CPA) e vinculada a Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo. Em 1954, o governo federal sancionou a Lei do Seguro Agrário, Lei n° 2.168/54, que estabeleceu as normas para a instituição do seguro agrário no país (OZAKI, 2008).
Em se tratando da Região Nordestina, até a década de 1950, algumas tentativas de solucionar os seus problemas já tinham sido realizadas pelo Estado brasileiro, como por exemplo: a criação da Inspetoria de Obras Contra as Secas (IOCS), posteriormente IFOCS e, finalmente, DNOCS. Mas, de acordo com Furtado (1989), essas políticas públicas foram limitadas, pois só se preocupavam em resolver o problema da escassez de água e da migração populacional para os centros urbanos na época da seca, ou seja, eram políticas públicas de caráter assistencialista e meramente compensatórias que só asseguravam a reprodução do quadro existente.
Isso só demostrou que a importância do setor agrícola não tem tido o olhar necessário por parte do governo, tanto no aporte de recursos quanto na implantação de políticas públicas necessárias. Isso se traduz com o seguro agrícola, pois enquanto a Região Centro-Sul durante a década de 50, 60 e 70 criou e geriu vários tipos de seguros agrícolas. A região Nordestina sofria com a migração do setor rural para o setor urbano decorrido da procura desses trabalhadores rurais por melhores condições de vida no urbano, urbanizando assim a mão-de-obra que antes era agrícola.
Contudo, o problema da migração já era existente, principalmente nos períodos de seca, devido à própria característica intrínseca da região, herdada desde sua forma de colonização, onde ocorreu a concentração de terras formando os latifúndios, junto com a exploração da mão-de-obra escrava, e que tinha como principal atividade a agroexportação de poucos produtos primários, gerando um baixo dinamismo no nível da atividade, tornando-a frágil economicamente.
Como se pode observar no Gráfico 1, pela evolução da população rural e urbana na região nordestina, no período de 1950 à 2011, a região passou por enormes mudanças, deixando explícito o processo de migração e urbanização. Pois, em 1950, a população rural era quase 75% da população nordestina. No entanto, em 2011, observa-se o contrário, a população urbana que era de quase 75% em relação a toda a população nordestina. Gráfico 1 – População nordestina rural e urbana (1950/2011).
Fonte: Elaboração dos autores com base nos dados do IBGE.
26,40%
73,60%
1950
URBANO RURAL
73,66%
26,34%
2011
URBANO RURAL
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Em 1973, o governo Federal voltou a olhar novamente para a proteção ao setor agrícola, criando o Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro) visando atender aos pequenos e médios produtores com o objetivo de garante a exoneração de obrigações financeiras relativas a operação de crédito rural de custeio, caso houvesse perca da produção por fenômenos naturais, pragas e doenças (MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, 2016). No decorrer das décadas o Proagro passou por inúmeras dificuldades, acarretando até em descrença por parte dos produtores, mas resistiu, passou por reformulações, tornando-se um importante instrumento da política agrícola (BAUINAIN e VIEIRA, 2011).
O início do século XXI, o governo federal criou dois programas de apoio ao produtor rural brasileiro: o Proagro Mais e o Garantia- Safra.
Em 2004 foi criado o “Proagro Mais”, seguro público destinado a atender os pequenos
produtores vinculados ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) nas operações de custeio agrícola, que passou a cobrir também as parcelas de custeio rural e investimento, financiadas ou de recursos próprios, na forma estabelecida pelo CMN, conforme estabelecido pela Lei nº 12.058/2009 (MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, 2016). O Proagro Mais constitui um programa governamental de apoio à produção agrícola e vem se afirmando como importante instrumento de apoio a agricultura familiar em meio a tantas adversidades.
A partir do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), no ano de 2002, a agricultura familiar da Região semiárida foi contemplada como um novo instrumento de apoio, o Seguro-Safra, posteriormente denominado o Garantia-Safra.
3. O PROGRAMA GARANTIA-SAFRA
Historicamente, a população do semiárido brasileiro enfrenta dificuldades decorridas das constantes secas. A partir desse cenário, o Estado passou a intervir na região, porém as ações só aconteceram de maneira emergencial, tentando combater os seus efeitos. A partir da Safra de 2002/2003, com o intuito de modificar o caráter emergencialista das políticas de combate às secas e torná-las permanentes foi criado por meio do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), o Seguro-Safra, posteriormente denominado de Garantia-Safra (BRASIL, 2006).
Instituído pela Lei nº 10.420 de 10 de abril de 2002, o Programa tinha como objetivo inicial beneficiar os agricultores familiares da Região Semiárida brasileira, delimitada de acordo com a área de atuação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), que abrange desde a região Nordeste, norte do Estado de Minas Gerais, Vale do Mucuri, Vale do Jequitinhonha e norte do Estado do Espírito Santo (somente os Municípios referidos na Lei nº 9.690, de 15 de julho de 1998) (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2016).
A característica principal do Garantia-Safra é garantir uma renda mínima aos agricultores familiares do semiárido, que sofrem constantemente com a perda parcial e muitas vezes total da safra por causa da estiagem e concomitantemente incentivá-los a conviver com as características do Semiárido, assegurando-os também na tentativa de tornar permanente a atividade agrícola e sua sobrevivência no rural. Reconhecendo assim, o fenômeno cíclico das irregularidades das chuvas como característica intrínseca da Região. Entretanto, em 2008, o Projeto de Lei 3359 estendeu o benefício aos agricultores atingidos por outro fenômeno, o das enchentes (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2016). Apesar de o semiárido padecer mais frequentemente com a seca, eventualmente os municípios são atingidos por intensas
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precipitações pluviométricas que afetam a produção e ocasionam perdas significativas para a sobrevivência dos agricultores familiares e dos municípios.
Para tanto, foi constituído na criação do Programa, o Fundo Garantia-Safra, gerido conjuntamente pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e a Caixa Econômica Federal (CEF). No qual, os agricultores familiares e os três Entes Federativos (os Municípios, os Estados e a União) contribuem com recursos financeiros para a sua composição (BRASIL, 2008). No Artigo 6º, da Lei nº 10.420/2002, o agricultor que aderir ao Programa contribui anualmente com 1% do valor total do benefício previsto para o ano da safra. O Município contribui com 3% do valor total do benefício previsto por cada agricultor aderido. O Estado contribui com 6% do valor total do benefício previsto por cada agricultor aderido. E a União contribui com 20% do valor total do benefício previsto por cada agricultor aderido.
A coordenação geral do Programa a nível Federal é de responsabilidade da Secretaria da Agricultura Familiar (SAF). A estrutura de gestão do Programa é composta por um Comitê Gestor do Garantia-Safra1, pelos Conselhos Estaduais de Desenvolvimento Rural e os Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural (ou similar). Contando ainda com uma estrutura operacional em cada Estado e Município participante. A nível de coordenação estadual, geralmente a responsável é a Secretaria da Agricultura ou do Desenvolvimento Rural. Na Coordenação Municipal são as Prefeituras Municipais ou a Secretaria Municipal de Agricultura. E conta ainda com o apoio de Instituições de ATER oficiais e sindicatos.
Anualmente, o Comitê Gestor do Garantia-Safra reúne-se para definir o valor do benefício a ser pago a cada agricultor no ano subsequente, as quantidades de cotas a serem disponibilizadas para os Estados, o cronograma anual do Programa, os critérios para a participação e possíveis alterações no calendário de plantio. A cada ano o valor do benefício e as porcentagens dos aportes podem mudar conforme a reunião do Comitê Gestor. Outra observação é que caso haja uma forte seca e faltem recursos no Fundo para cobrir todos os aderidos é de responsabilidade da União arcar com a complementação necessária para beneficiar a todos os participantes do Programa. Para participar do Garantia-Safra, é necessário que, anualmente antes do plantio, os agricultores familiares, os municípios e Estados façam adesão ao Programa seguindo as etapas abaixo (BRASIL, 2008): Quadro 1- Etapas do Programa Garantia-Safra.
Fonte: Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário.
1 Participam deste comitê os Governos Estaduais, Confederação Nacional dos Municípios, INMET, Embrapa, CEF, Ministérios: MF, MPOG, MDS, MIN, MAPA, Casa Civil, Contag, Fetraf, Rede ASA.
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Primeiramente, acontece a adesão dos Estados ao Programa a partir da assinatura de Termo de Adesão junto a União, representada pela Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário. No qual, assumem o compromisso de contribuir ao Fundo Garantia-safra com o valor que lhe é devido e coordenar a implementação do Programa no seu Estado. Posteriormente, os Municípios aderem ao Programa mediante assinatura de Termo de Adesão junto aos seus respectivos Governos Estaduais. Comprometendo-se a destinar ao Fundo Garantia-safra o valor referente a sua contribuição, realizar divulgação do Programa nos seus Municípios e mobilizar os Conselhos Municipais Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS) e as ATERs para participarem das etapas.
Em seguida, inicia-se o processo de inclusão dos agricultores familiares. Porém, para realizar a adesão, os agricultores precisam ter os seguintes requisitos: Ser agricultor familiar nos moldes do PRONAF2; Ter renda bruta familiar mensal de até 1,5 salário mínimo (excluídos os benefícios previdenciários rurais); Cultivar áreas não irrigadas; Efetuar a adesão ao Garantia-Safra antes do plantio; e, cultivar área entre 0,6 e 5 hectares de arroz, algodão, feijão, mandioca e milho (a exceção são para os agricultores que participam do Programa Biodiesel do Governo Federal, eles podem aderir ao Garantia-Safra, entretanto devem plantar no mínimo 1,5 hectares de consórcio de feijão com mamona).
Atendido os requisitos, o agricultor precisa se inscrever no Programa. Onde, a partir de 2006, é realizada através da Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) eletrônica. A etapa seguinte é a análise da lista de agricultores inscritos/selecionados3 pelo Conselho Municipal Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS) ou similar, no qual é examinada a veracidade das informações dos agricultores. Homologados pelo o Conselho, os agricultores aptos a participar do Programa receberá da sua Prefeitura ou da Secretaria Municipal de Agricultura um boleto bancário para realizar o pagamento da sua contribuição ao Fundo Garantia-Safra nas agências da Caixa Econômica Federal ou nas casas lotéricas. Só é a partir do pagamento que agricultor fica assegurado da sua adesão ao Garantia-Safra.
Vencidas essas etapas, caso a Prefeitura detecte perda da produção agrícola municipal, o gestor do município deverá apresentar a SAF, por meio do Sistema Garantia-Safra → Verificação de Perdas, a solicitação de vistoria e indicação do técnico vistoriador. A
solicitação de vistoria deve ser realizada no período estabelecido pelo Comitê Gestor do Fundo Garantia-Safra, entre o 60º dia após o início e o 60º dia após o término do calendário agrícola, qualquer solicitação fora desse prazo perderá a vistoria e por consequência o seguro. A vistoria acontece por uma amostra aleatória dos agricultores participantes do Garantia-Safra no município, onde o técnico responsável realiza os laudos de plantio e colheita com os agricultores selecionados e posteriormente encaminha-os a SAF via Sistema Garantia-Safra → Verificação de Perda. O não envio dos laudos pelo técnico vistoriador dentro dos prazos torna o município inapto ao direito do benefício Garantia-Safra para a safra requerida.
2 A Lei nº 11.326/2006 definiu que o agricultor familiar é aquele que atende aos seguintes requisitos: I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo; IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2016). 3 Os agricultores inscritos participam de um processo, via sistema eletrônico de gerenciamento do Garantia-Safra, de classificação considerando os seguintes critérios por ordem assim citados: Famílias com menor renda per capita; Famílias sustentadas pela mulher; Famílias com presença de portadores de necessidades especiais; Famílias participantes do Programa Biodiesel do Governo Federal, que plantam consórcio feijão x mamona; Famílias não proprietárias do imóvel rural. A partir disso, resulta uma lista de selecionados por ordem de classificação.
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A partir dos laudos, a SAF consolida os dados do técnico vistoriador por município, consulta os dados pluviométricos e os indicadores agroclimáticos fornecidos pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) ou por outros órgãos oficiais de meteorologia para o município, além dos dados da produtividade esperada da Pesquisa Agrícola Municipal (PAM), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e com base na consolidação desses dados é calculado percentual de perda dos municípios. Os agricultores aderidos ao Programa Garantia-Safra só receberão um benefício por ano-safra, caso seja constatado a perca de no mínimo 50% do conjunto da produção total de arroz, feijão, milho, mandioca ou algodão no seu município, em razão dos fenômenos da seca ou excesso hídrico.
Além disso, o município e o Estado tem que efetuar os aportes financeiros ao Fundo Garantia-Safra nos prazos legais, pois a inadimplência de um ou do outro faz com que os agricultores não sejam beneficiados, trazendo prejuízos tanto os agricultores quanto ao município. O benefício é pago pela Caixa Econômica Federal, sendo realizado em cinco parcelas mensais através do Cartão do Cidadão ou Cartão Bolsa Família que traz o número de identificação social (NIS) (CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, 2016). 4. RESULTADO E DISCUSSÃO: Evolução do Programa Garantia-Safra
O Programa Garantia-safra, desde sua criação, já beneficiou milhares de famílias. Ele
desponta como um grande aliado dos agricultores familiares no momento mais difícil, o das mudanças climáticas. Como constatado na Tabela 1, pelo o expressivo e crescentemente contínuo número de aderidos ao longo dos anos, confirmando a efetividade e a importância do Programa.
Tabela 1- Evolução das adesões dos agricultores familiares no Programa Garantia-Safra no Nordeste.
Estado/Ano 2002/03 2003/04 2004/05 2005/06 2006/07 2007/08 2008/09 2009/10 2010/11 2011/12 2012/13
Alagoas 189 6.988 11.051 11.479 0 5.730 3.032 10.881 12.735 20.786 30.362
Bahia 0 7.000 8.907 9.148 6.063 15.176 22.645 64.879 114.757 149.697 204.284
Ceará 108.950 36.106 128.663 160.012 172.931 285.363 260.687 290.105 272.581 239.982 303.887
Maranhão 0 0 0 0 0 118 6.036 5.153 11.410 12.890 15.928
Minas Gerais
0 26.577 8.563 7.102 812 4.326 9.783 10.942 19.796 19.251 25.160
Paraíba 29.972 37.562 49.755 54.791 59.310 74.345 83.329 82.205 81.083 86.367 98.327
Pernambuco 27.696 28.879 31.908 46.264 52.899 78.275 78.216 90.528 98.967 102.684 126.992
Piauí 18.761 12.602 23.543 38.206 34.210 63.286 55.848 68.316 84.452 89.870 105.173
Rio Grande do Norte
0 3.155 8.613 12.005 8.461 14.087 16.707 25.298 31.209 37.138 49.349
Sergipe 14.724 18.970 16.858 17.577 11.635 17.900 16.942 13.495 10.930 12.791 18.092
Total 200.292 177.839 287.861 356.584 346.321 558.606 553.225 661.802 737.920 771.456 977.554
Fonte: SAF/Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário.
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Atualmente quase todos os Estados cobertos pelo Programa estão aderidos, destacando-se o Ceará que lidera o número de adesões desde o primeiro ano e a Bahia com uma maior participação mais recentemente. Observa-se nos demais Estados, uma constante participação no decorrer dos anos, além da crescente evolução das adesões, com efetiva participação, em sua maioria, dos Estados nordestinos. Uma vez que, Minas Gerais ocupou na safra 2012/2013, o 8° lugar no número de adesões entre os dez Estados participantes, e em sua trajetória, apesar de participar desde o segundo ano do Programa, sua evolução no número de adesões não foi muito crescente. Um outro Estado é o Espírito Santo, que está contemplado pelo Programa com 28 municípios, mas segundo os dados, nunca nenhum município fez adesão ao Programa.
No entanto, deve-se evidenciar a importância dos Estados e dos Municípios na consolidação do Garantia-Safra, já que sem a adesão deles primeiramente, os agricultores não poderiam participar. Como se sabe, as condições naturais climáticas são um risco que o produtor assume, e as características da região semiárida desfavoráveis só aumentam a propensão ao risco, levando o agricultor a não plantar em determinadas safras ou plantar e perder tudo, e sem sua produção e renda não dá para sobreviver, obrigando-o a procurar outros meios de sobrevivência que vai desde abandono do trabalho agrícola por outros trabalhos, muitas vezes não-agrícolas precarizados, até o abandono do rural tornando-se urbano, e em sua maioria, mais um problema social.
Em razão disso, as políticas públicas vem se mostrando grandes aliadas dos Municípios e dos Estados. Elas tentam minimizar a falha de mercado que é gerada pela impossibilidade do seguro privado para a agricultura, pois as seguradoras privadas não criam uma carteira devido ao alto custo. Havendo uma resposta por parte dos municípios e Estados brasileiros que vem aderindo aos programas, mobilizando seus atores, e assim contribuindo para a sua melhoria. Pois, a segurança de uma renda e a circulação desta, como acontece com o Programa Garantia-Safra, traz não só benefícios endógenos, mas também, exógenos.
É perceptível no rural as mudanças ocasionadas por essas políticas, durante a pior seca dos últimos 50 anos, que ainda está ocorrendo na Região, constata-se uma redução drástica da produção e do rebanho. Porém, os agricultores familiares, em sua maioria, não recorreram ao êxodo e nem criticaram a questão da sua sobrevivência, mas sim de outros fatores, como: a falta de água e a falta de alimentação para o gado. Revelando a importância dessas políticas e a sua eficácia para o Nordeste brasileiro.
Dentre estes programas, o Garantia-Safra se tornou um importante mecanismo de política pública na tentativa de minimizar os efeitos da seca e das enchentes. Tanto, que foram ampliadas nas últimas safras (2011/2012 e 2012/2013) parcelas adicionais subsequentes ao valor do benefício, para minimizar os efeitos da seca que assolou a Região Nordestina.
Os municípios também se destacam na participação ao Programa, como pode-se observar no Gráfico 2. A crescente adesão dos municípios é constatada em todos os Estados. Comparando a quantidade de municípios que estão contemplados pelo Programa e os que aderiram, observa-se que em alguns Estados é quase total a adesão, como o Ceará, o Rio Grande do Norte, a Paraíba e o Piauí.
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Gráfico 2- Número de municípios aderidos ao Programa Garantia-Safra de 2002 a 2013.
Fonte: SAF/Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário.
De 184 municípios contemplados pelo o Programa no Estado do Ceará, 178, ou seja, cerca de 96,7% deles fizeram a adesão na safra 2012/2013. No Rio Grande do Norte, aderiram 83,8% dos municípios, na Paraíba, 79,3% e no Piauí, 75,4%. Além do mais, observando o total das adesões para a safra 2012/2013 tem-se 1.118 municípios aderidos. Porém, a grande adesão de todos ao Programa não estava sendo suficiente para garantir todos os recursos necessários para o Fundo Garantia-safra, principalmente nos anos de mudanças climáticas, como por exemplo, na safra 2011/2012 que ocorreu uma grande seca. Gráfico 3- Número de agricultores aderidos ao Programa Garantia-safra e o número de agricultores indenizados, desde a safra 2002/2003 a 2011/2012.
Fonte: SAF/Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário.
0
25
5075
100
125
150
175200
225
Alagoas (102) Bahia (417) Ceará (184)
Maranhão (217) Minas Gerais (168) Paraíba (223)
Pernambuco (185) Piauí (224) Rio Grande do Norte (167)
Sergipe (75)
200.292 177.839
287.861 356.584 346.321
558.606 553.225
661.802 737.920 771.456
85.056 75.810
211.339
106.081
316.529
182.147
423.538
639.227
166.935
769.023
0
200.000
400.000
600.000
800.000
N° de agricultores aderidos N° de agricultores idenizados
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. Como pode-se observar no gráfico 3, em todas as safras ocorrem indenizações, em alguns anos em maiores proporções podendo chegar a quase 100% (2011/2012, 2009/2010, 2006/2007) e em outros nem tanto, em torno de 23%, como a safra 2010/2011. Apesar dessa variação no decorrer dos anos, a relação número de agricultores indenizados por número de agricultores aderidos fica, em média, em torno de 60%. Este número mostra-se bastante alto quando comparado aos aportes, pois somando os percentuais dos aportes do agricultor (1%), Município (3%), Estado (6%) e União (20%) totalizam só 30% do valor do benefício.
Portanto, foi necessário mudar o percentual do aporte, dobrando em quatro anos o valor do percentual para cada contribuinte (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2016). A partir da safra 2012/2013, o agricultor contribuiu com 1,25% do valor total do benefício, o município com 3,75%, o Estado com 7,5% e a União 25%. Na safra 2013/2014, o agricultor contribuiu com 1,5% do valor total do benefício, o município com 4,5%, o Estado com 9% e a União 30%. Para safra 2014/2015, o agricultor contribuirá com 1,75% do valor total do benefício, o município com 5,25%, o Estado com 10,5% e a União 35%. Para safra 2015/2016, o agricultor contribuirá com 2% do valor total do benefício, o município com 6%, o Estado com 12% e a União 40%.
Na tabela 2 apresenta-se o valor em reais de cada contribuinte ao Fundo durante todos os anos do Programa, podendo-se observar os valores dos aportes e a gradativa participação em reais de cada aderido. Ademais, conjuntamente com a Tabela1 e Gráfico 2 torna-se possível mensurar o montante de recursos destinados ao Fundo, além disso ainda pode-se observar no Gráfico 3, a relação entre o número de agricultores aderidos ao Programa Garantia-safra e o número de agricultores indenizados. Tabela 2- Valor dos aportes realizado em cada safra para o Fundo Garantia-Safra.
Ano/ Aporte Agricultor Município Estado União Valor total do
benefício
2002-2003 R$ 4,75 R$ 14,25 R$ 28,50 R$ 95,00 R$ 475,00
2003-2004 R$ 5,50 R$ 16,50 R$ 33,00 R$ 110,00 R$ 550,00
2004-2005 R$ 5,50 R$ 16,50 R$ 33,00 R$ 110,00 R$ 550,00
2005-2006 R$ 5,50 R$ 16,50 R$ 33,00 R$ 110,00 R$ 550,00
2006-2007 R$ 5,50 R$ 16,50 R$ 33,00 R$ 110,00 R$ 550,00
2007-2008 R$ 5,50 R$ 16,50 R$ 33,00 R$ 110,00 R$ 550,00
2008-2009 R$ 5,50 R$ 16,50 R$ 33,00 R$ 110,00 R$ 550,00
2009-2010 R$ 6,00 R$ 18,00 R$ 36,00 R$ 120,00 R$ 600,00
2010-2011 R$ 6,40 R$ 19,20 R$ 38,40 R$ 128,00 R$ 640,00
2011-2012 R$ 6,80 R$ 20,40 R$ 40,80 R$ 136,00 R$ 680,00
2012-2013 R$ 9,50 R$ 28,50 R$ 57,00 R$ 190,00 R$ 760,00
2013-2014 R$ 12,75 R$ 38,25 R$ 76,50 R$ 255,00 R$ 850,00
Fonte: SAF/Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário. .
Contudo, destaca-se como objetivo deste trabalho, avaliar o Programa Garantia-Safra no Estado do Rio Grande do Norte, partindo do princípio da importância e da efetiva participação deste no Programa.
O Programa Garantia-Safra no Rio Grande do Norte é dividido em duas regiões, como pode-se observar no mapa 1: a região I que abrange os Territórios: Alto Oeste, Sertão do Apodi, Açu/Mossoró e Seridó. E a região II, que é composta pelos os Territórios: Sertão Central Cabugi e Litoral Norte, Mato Grande, Potengi, Trairi, Agreste Litoral Sul e Terra dos
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Potiguaras. No qual, cada região possui data diferente para o plantio e para o calendário de adesão.
Mapa 1- Municípios do Rio Grande do Norte aderidos ao Programa Garantia-Safra 2013-2014.
Fonte: SAF/Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário. Gráfico 4- Evolução das adesões dos agricultores ao Programa Garantia-Safra no Estado do Rio Grande do Norte de 2003 a 2014.
Fonte: SAF/Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário.
0 3.155
8.613 12.005
8.461
14.087 16.707
25.298
31.209
37.138
49.349
58.183
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. O Estado aderiu ao Garantia-safra desde a safra 2003/2004, aumentando expressivamente o número de adesões ao longo do Programa, como pode-se constatar no Gráfico 4. Iniciou sua participação com 3.155 agricultores familiares aderidos, e na safra 2013/2014 foram 58.183 aderidos.
Em se tratando dos municípios, constata-se uma grande evolução no número de adesões ao Programa, de acordo com o Gráfico 2. No primeiro ano de participação, só 7 municípios aderiram, mas na safra 2013/2014 a adesão foi de 150 dos 167 municípios comtemplados pelo Programa, tornando-se o segundo Estado de maior adesão ao Garantia-Safra, com participação de 83,8% dos municípios.
No entanto, dois entre todos os municípios do semi-árido do Rio Grande do Norte destacam-se no Mapa 1, Paraú e Galinhos, por não estarem aderidos ao Programa em meio a adesão de toda a Região, no qual eles pertencem. O município de Paraú tentou participar na última safra dos dados, porém só conseguiu escrever 38 agricultores familiares, onde é preciso, segundo as regras do Programa, de no mínimo 50 inscrições. Já o município de Galinhos ainda não aderiu, segundo os dados apresentados.
A nível de Territórios, de acordo com o Gráfico 5, dois se destacam no total de adesões de agricultores no Programa Garantia-Safra entre os 10 existentes ao longo da participação do Estado, são: Seridó (18,6%) e Potengi (18,3%). O Potengi destaca-se como o primeiro Território a comtemplar todos os seus municípios no Programa. O Seridó se destaca por ter historicamente o maior número de adesões, participar ativamente desde o início do Programa e ter abrangido na última safra todos os seus municípios no Garantia-Safra. Gráfico 5- Total do número de adesões dos agricultores ao Programa Garanti-Safra por Territórios no Estado do Rio Grande do Norte de 2004 a 2013.
Fonte: SAF/Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário. .
Apesar da região II possuir dois territórios de menores adesões, o Terra dos Potiguaras (0,3%) e o Agreste Litoral Sul (2,3%), é esta a região com maior participação (63,1%) contra 36,9% da região I. Ela possui uma faixa litorânea que permitem aos municípios desses dois territórios não recorrem ao Programa, como pode-se observar no Mapa 1. Além disso, ela contempla o Território Terra dos Potiguaras, que tem como característica a
27.023 22.580
8.194
18.238
38.224
22.509
37.730
4.763
26.152
603
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pouca participação na produção agrícola, com exceção de Macaíba, por se tratar da Capital do Estado e do transbordamento urbano para os municípios vizinhos.
Na Região I, destacam-se os Territórios: Açu-Mossoró (13,1%) e Sertão do Apodi (11%) com as maiores adesões, e participando continuamente desde o início do Garantia-Safra. O crescente número de adesões ao Garantia-safra no Estado do Rio Grande do Norte tanto por parte dos agricultores familiares quanto por parte dos municípios deve-se por vários motivos. Primeiramente, a característica principal da política que é assegurar uma renda mínima aos agricultores que perderam sua produção por conta da estiagem ou da enchente, tentando garantir assim, a sua sobrevivência.
No Estado, 147 dos 167 municípios pertencem ao semiárido, logo o risco de praticar a atividade agrícola é alto (SUDENE, 2016). Isto é historicamente vivenciado pelo o Estado, que sofre com grandes secas que assolam toda a produção e o gado.
Este cenário, resulta ao produtor, principalmente ao agricultor familiar potiguar, um trade-off, no qual ou ele resiste e convive com o alto risco das condições climáticas do semiárido e fica suscetível a uma perca parcial ou total da safra, muitas vezes sequenciada por vários anos ou ele abandona o rural e vai para o urbano. Ainda existe uma terceira opção, que vem acontecendo nas últimas décadas, ele deixa de ser produtor e torna-se um trabalhador não-agrícola residente no rural, porém as oportunidades de emprego são pequenas e na maioria das vezes precárias, no entanto ao optar por esta alternativa, ele se depara com outras dificuldades, como a falta de qualidade na educação, saúde, segurança, enfim requisitos básicos de cidadão.
Outro motivo é a participação do Estado e dos municípios mobilizando seus atores (Conselho Estadual, Conselhos municipais, ATERs, gestores, sindicatos, entre outros), acreditando na política, pagando os seus aportes no prazo, eliminando assim a inadimplência, pois o município ou Estado devedor torna os agricultores aderidos proibidos de receberem o benefício, podendo até ficar vetado de participar da safra seguinte enquanto não estiver adimplente. Segundo os dados da SAF/ Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário, o Estado do Rio Grande do Norte e todos os municípios participantes estavam adimplentes para a safra 2012/2013.
Outro motivo é a importância desse instrumento de política pública não só para os agricultores familiares potiguares, mas também para a toda a população, os municípios e o Estado. No sentido que, protegendo os agricultores contra as perdas causadas principalmente pelas secas, eles ficam assegurados para permanecer na atividade agrícola e no rural.
Além do mais, este benefício gera um impacto econômico para os municípios potiguares, em sua maioria, pequenos e detentores de pouca receita. A circulação da renda aquece a economia local e também evita a dependência com o poder público, a prefeitura, para garantir a sobrevivência das famílias atingidas. Só na safra 2011/2012, o Estado recebeu do Garantia-Safra R$ 25.253.840,00. Além disso, neste ano houve uma prorrogação de 8 meses do benefício, devido a grande seca, resultando em mais R$ 41.594.560,00, totalizando para esta safra um montante R$ 66.848.400,00. Este volume de recursos resulta em um efeito econômico muito positivo para cada agricultor familiar, além dos seus transbordamentos para o município, destacando-se em número a importância deste instrumento de política para o Rio Grande do Norte.
Como pode-se observar no Gráfico 6, milhares de agricultores familiares potiguares já foram beneficiados pelo Programa Garantia-Safra. Apesar de não ser possível mensurar o impacto econômico deste montante de renda para as famílias, municípios e Estado, é possível afirmar que esta renda já garantiu a reposição parcial ou total de perdas, permitiu a continuidade do plantio da próxima safra, contribuiu para a sobrevivência de famílias, incentivou a permanência no campo e na atividade agrícola.
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Gráfico 6- Número de agricultores aderidos ao Programa Garanti-Safra e número de agricultores indenizados pelo o Programa no Rio Grande do Norte de 2003 a 2012.
Fonte: SAF/Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário. . 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Programa Garantia-Safra tornou-se um importante instrumento de política agrícola
para o Semiárido brasileiro. Ele incluiu permanentemente na Agenda Regional a ocorrência do fenômeno da seca, e posteriormente, da enchente e suas consequências, fomentando a necessidade de políticas públicas eficazes e permanentes de convivência com o Semiárido. Compreendendo esses fenômenos como fatores de alto risco para a manutenção da atividade econômica e sobrevivência dos agricultores familiares, devido a sua frágil estrutura de renda, acarretando em prejuízos econômicos e sociais no âmbito dos municípios até do Estado.
O Garantia-Safra vem desde sua criação passando por implantações, resultando em melhorias para os beneficiários. Uma delas foi em 2006, quando aderiu a DAP eletrônica para a realização das inscrições dos agricultores. Em 2008, incluiu ao Programa os municípios que são sujeitos a perda das safras por causa de enchentes. Em 2012, tornou aptos os agricultores familiares de municípios situados fora da área da SUDENE, desde que os municípios comprovem serem sujeitos à perda de safra em razão da seca ou do excesso hídrico. Essa ampliação do benefício permitiu a outras regiões brasileiras participarem do Garantia-Safra, o Estado do Rio Grande do Sul foi o primeiro a aderir. Foi realizado um levantamento dos municípios e 237 tornaram-se aptos a adesão, sendo disponibilizadas 10 mil cotas para o Estado.
Avançou também no aumento gradativo do número de cotas e no aumento do número de famílias beneficiadas. Tornou-se o maior seguro de renda para a agricultura familiar no mundo. Além disso, ele identifica os agricultores mais vulneráveis, os agricultores familiares, minimizando os efeitos das adversidades para as famílias de baixa renda. Fortalecendo a renda e a economia local nos momentos de seca ou de excesso hídrico. Assegura a manutenção do agricultor e sua permanência no campo, cria a possibilidade de continuar com o cultivo, pois uma vez assegurado dificilmente o agricultor não irá plantar, além de ser utilizado pelo agricultor, muitas vezes, como parte do recurso financeiro para a
0 3149
8.613 12.005
8.461
14.087 16.707
25.298
31.209
37.138
0 0
4.046 4.460 7.786 6.927
15.419
23.387
892
37.138
0
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
30.000
35.000
40.000
N° de agricultores aderidos Nº de agricultores idenizados
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próxima safra. Outro ponto positivo é a inclusão dos três Entes Federativos (Municípios, Estados e a União) na construção de um mecanismo permanente e institucionalizado de segurança ao agricultor familiar do semiárido. Já que historicamente, a União, sempre tomou para si toda a responsabilidade de minimizar os efeitos dos fenômenos, principalmente das secas. Com o Garantia-Safra, a União, compromete Estados e Municípios a se responsabilizarem por um problema histórico que atinge principalmente a Região Nordeste que sempre foi resolvido com ações emergenciais custeadas unicamente pela União.
Evidentemente para isto houve e ainda há um processo de sensibilização dos gestores municipais e estaduais, no qual a sociedade civil exerce papel determinante. No entanto, pôde-se observar que no decorrer do Programa, os Estados e Municípios vêm afirmando a sua participação e tendo um papel importante para a eficácia do Programa.
Esta política constata a importância do apoio das políticas públicas para os agricultores familiares e para a Região Nordestina. Legitimada pelos agricultores aderidos que defendem a sua continuidade enumerando inúmeras vantagens, dentre elas, a segurança de uma renda.
Entretanto, ainda são vários os desafios a serem vencidos. Um deles é a inclusão de todos os agricultores familiares que sofrem com as mudanças climáticas no Garantia-Safra, ou seja, a universalização do Programa. Isto pode acontecer através do aumento da participação dos assentados, da migração dos agricultores que recebem o benefício do Programa Bolsa Estiagem para o Garantia-Safra, evidentemente obedecendo aos critérios de adesão do Programa, e por último o aumento no número de cotas disponibilizadas pelos municípios e Estados.
Apesar do expressivo aumento no número de cotas disponibilizadas, desde a existência do Programa, ainda é recorrente a situação de agricultores aptos a adesão não serem contemplados, devido ao número de cotas serem menores do que o número de agricultores. Dois fatores ocasionam este problema, o primeiro é a falta de recurso dos municípios e/ou Estados e até da União para o pagamento dos aportes. O segundo deve-se as regras do Programa, que prioriza os municípios mais sujeitos a ocorrências das estiagens e do excesso hídrico, e define a quantidade de cotas a partir do Censo Agropecuário de 2006, da demanda municipal e da eficiência das cotas da última safra. Para tentar contornar o problema da defasagem do Censo Agropecuário, há uma única possibilidade, que é apresentar a SAF uma comprovação técnica através de documentos justificando a ampliação do número de agricultores após a realização do Censo Agropecuário, além disso, o gestor municipal deve assumir o compromisso da ampliação das cotas, pois gera um maior aporte.
É fundamental o compromisso dos Municípios e dos Estados para o Programa, pois ele não atinge seu objetivo se houver inadimplência. O não pagamento dos aportes geralmente acontece durante as safras por alguns municípios até Estados, porém isto vem sendo combatido, por exemplo o Rio Grande do Norte já foi um Estado devedor, mas atualmente está adimplente. A regularização dos aportes atrasados é sempre realizada, pois os gestores reconhecem os benefícios do Programa.
Outro desafio são os Conselhos Municipais. No Estado do Rio Grande do Norte, alguns encontram-se precários de gestão, não garantindo o controle social necessário para a eficácia do Programa. Para evitar irregularidades no Programa, o Tribunal de Contas da União e a Controladoria Geral da União já realizaram fiscalizações, no qual cruzaram os dados do Programa Garantia-Safra com os dados de outros sistemas, como o da Receita Federal, RAIS, SIAPE, SIAFI, TSE, SEFAZ-SP, SUDENE, RENAVAM.
Após este cruzamento verificou-se que existiam indícios de irregularidades de um pequeno percentual de agricultores aderidos, onde foi encaminhado a Secretaria Especial de
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Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário a listagem com recomendações para averiguação e dotação de medidas cabíveis. Os agricultores indiciados tiveram seus benefícios bloqueados e só depois de regularizarem junto ao Conselho Municipal, puderam receber os seus benefícios.
Outros entraves enfrentados pelo Programa são os problemas com o sistema técnico e com os órgãos participantes. No Rio Grande do Norte, o sistema já foi responsável por inúmeras falhas, tanto por incompatibilidade dos dados quanto por a não adesão de agricultores aptos ou até o não pagamento do benefício para agricultores aderidos. Em se tratando dos órgãos, deve-se cobrar uma maior eficiência para a verificação de perdas por excesso hídrico, incluindo outros órgãos que possam ter indicadores de maiores abrangências e que repassem com transparências as informações necessárias. Outro desafio necessário e também um avanço, seria incluir os agricultores familiares irrigantes no Garantia-Safra. Apesar de comporem um pequeno percentual, eles também são afetados pelas condições climáticas.
Por último, não menos importante, é a implementação do Artigo 6-A da Lei 10.420, no qual para aumentar a eficácia do Programa Garantia-Safra, a União, os Estados e os Municípios devem: introduzir tecnologias, culturas e animais adaptados ao condições do Semiárido; estimular o associativismo e cooperativismo; promover a capacitação e a profissionalização dos agricultores familiares; e, ampliar o acesso dos agricultores familiares ao crédito rural. Se esta condição fosse obedecida, o Programa seria um ótimo instrumento não só de renda, mas de uma melhor qualidade de vida para as famílias beneficiadas.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAUINAIN, A.M.; VIEIRA, P.A. Seguro Agrícola no Brasil: desafios e potencialidades. Revista brasileira de risco e seguro. Rio de Janeiro, v.7, n.13, p. 39-68, abr./set., 2011. BRASIL: Ministério do Desenvolvimento Agrário, PRONAF - Cartilha do Programa Garantia-Safra. Brasília: Pronaf/SAF/MDA, 2006, 11 p. BRASIL: Ministério do Desenvolvimento Agrário, PRONAF - Cartilha do Programa Garantia-Safra. Brasília: Pronaf/SAF/MDA, 2008, 20 p. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF. Disponível em: http://www.caixa.gov.br/Voce/social/Transferencia/garantia_safra/index.asp. Acesso em: 10 de abril, 2016. CÂMARA DOS DEPUTADOS. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=393189. Acesso em: 02 de abril, 2016. FURTADO, C. M. A Fantasia Desfeita. Rio de Janeiro: Paz e Terra S/A, 1989. MINISTÉRIO DA AGRICULTURA. Disponível em: http://www.agricultura.gov.br/politica-agricola/zoneamento-agricola/proagro. Acesso em: 03 de abril, 2016. MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO – MDA/SAF . Disponível em: http://portal.mda.gov.br/portal/saf/programas/garantiasafra. Acesso em: 01 de abril, 2016.
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OZAKI, Vitor A. Em busca de um novo paradigma para o seguro rural no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, v. 46, n. 1, p. 97-119, jan./mar. 2008. PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10420.htm. Acesso em: 01 de abril, 2016. PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11326.htm. Acesso em: 09 de abril, 2016. PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12766.htm. Acesso em: 02 de maio, 2016. SUPERINTENDÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE – SUDENE. Disponível em: http://www.sudene.gov.br/acesso-a-informacao/institucional/area-de-atuacao-da-sudene. Acesso em: 03 de abril, 2016.
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O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA E A POLÍTICA DE DESCENTRALIZAÇÃO: IMPACTOS SOBRE A POBREZA NO “NORDESTE RURAL” E PARAÍBA
THE BOLSA FAMÍLIA PROGRAM AND DECENTRALIZATION POLICY:
IMPACTS ON POVERTY IN "RURAL NORTHEAST" AND PARAÍBA
Autores: Dayane Maximiano da Silva1; Rhyanne Karoline Alencar de Lima2; Andrew Lucas Marcolino dos Santos Pinto3; Laércio Damiane Cerqueira da Silva4 Filiação: Universidade Federal da Paraíba (UFPB) E-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected].
Grupo de Pesquisa: GT3 – POLÍTICAS PÚBLICAS E REFORMA AGRÁRIA
Resumo O estudo avalia a política pública de combate à pobreza, no tocante ao Programa Bolsa Família, nos municípios rurais da Região Nordeste e na Paraíba entre 2010 e 2015. Este programa tem a participação dos três níveis de governo com o intuito reduzir o número de pobres e indigentes. Apesar do número absoluto de pobres ter se reduzido, a Região Nordeste ainda apresenta municípios, sobretudo na zona rural, com índices de pobreza e desenvolvimento humano semelhantes a países de extrema desigualdade e atraso econômico. Utiliza-se um modelo teórico que pressupõe o grau de consciência política dos cidadãos, o número de pobres e a influência da elite local no volume de transferências. Com base em um modelo econométrico de estimação em painel e o índice de concentração de Hirschman – Herfindahl chega-se à conclusão que as elites locais influenciam o volume de benefícios concedidos, e que o percentual de pobres rurais possui impacto negativo sobre a distribuição dos recursos. Apesar das limitações apontadas, não se pode negar que os níveis de pobreza se reduziram na região. Palavras-chave: Bolsa Família; Nordeste Rural; Pobreza. Abstract The study evaluates the public policy to combat poverty, with regard to the Bolsa Família Program in the rural towns of the Northeast and Paraíba between 2010 and 2015. This program has the participation of the three levels of government in order to reduce the number of poor and destitute in the country. Although the absolute number of poor have been reduced, the Northeast still has municipalities, especially in rural areas, with poverty rates and human development similar to countries of extreme inequality and economic backwardness. It is used a theoretical model assumes that the level of political consciousness of citizens, the number of poor and the influence of the local elite in the volume of transfers. Based on an econometric model estimation panel and Hirschman concentration index - Herfindahl comes to the conclusion that local elites influence the amount of benefits granted, and that the percentage of rural poor has negative impact on the distribution of resources . Spite of the limitations, we can not deny that poverty levels were reduced in the region. Keywords: Bolsa Família; Rural Northeast; Poverty.
1 Graduanda em Economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) 2 Graduanda em Economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). 3 Graduando em Economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). 4 Doutor em Economia, Professor do Departamento de Economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
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1. INTRODUÇÃO
O Brasil é um dos países com maior desigualdade no mundo. Segundo o relatório do
Desenvolvimento Humano divulgado pelo Programa das Nações Unidades para o
Desenvolvimento (Pnud) de 2011, o Brasil está posição 84º entre 187 países avaliados pelo
IDH5. O índice para o Brasil está na casa de 0,718, considerado de Desenvolvimento Humano
Elevado, apesar disto temos o 20º IDH da América Latina, ficando atrás de países como Chile
(44º), Argentina (45º), Bahamas (53º), Panamá (58º), Antígua e Barbuda (60º) e Trinidad e
Tobago (62º). Uma das faces mais dramáticas dessa assimetria é o enorme contingente
populacional abaixo da linha de pobreza. Segundo estimativa do IPEA (2009), o País possuía
em 2009 mais de 14 milhões de pobres6. Dada a diversidade regional e o tamanho da nação,
as diferenças entre as localidades são acentuadas, o que torna a concentração de renda
também uma questão de extrema desigualdade regional.
A temática da redução da pobreza tem sido objeto de estudo e de preocupações
constantes, principalmente por sua persistência e concentração espacial. Diante dessa
realidade, programas de transferência de renda com vistas à redução da pobreza começaram a
ser adotados no Brasil desde 2001, a partir de experiências locais com programas a la bolsa
escola7. Estudos têm mostrado que a proporção de pobres está se reduzindo, resultado, entre
outros fatores, de taxas mais elevadas de crescimento, da estabilidade econômica e das
políticas sociais, principalmente após a Constituição de 1988.
Uma das ações de destaque na atualidade em relação à redução da pobreza no Brasil é
o Programa Bolsa Família. Seu objetivo é contribuir para o desenvolvimento do núcleo
familiar. As famílias são inscritas no Cadastro Único dos Programas Sociais do Governo
Federal (CadÚnico) e classificadas como pobres, quando a renda per capita está entre
R$85,01 e R$170,00, e extremamente pobres, quando a renda per capita vai até R$ 85,00.
Os benefícios do Programa Bolsa Família variam de R$39 a R$ 195,00 de acordo com
a renda per capita da família e com o número de crianças e adolescente com até 17 anos,
possuindo quatro tipos de benefícios: básico, variável, variável vinculado ao adolescente e a
variável de caráter extraordinário. O tamanho, proporções e agentes envolvidos, caracterizam
5 O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) encontra-se em uma escala de [0,1], sendo utilizado para indicar qualidade de vida e desenvolvimento econômico-social, a partir da análise qualitativa de indicadores de renda, educação e saúde basicamente. 6 O estudo considera pobres os que têm renda mensal de até meio salário mínimo. 7 Programas onde a famílias de baixa renda recebem um valor mensal vinculado à frequência dos filhos à escola.
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o programa como federativo em todos os seus aspectos. As transferências federais para
estados e municípios realizarem o programa. Nesse sentido, ressalta-se a importância dos
governos locais na identificação dos problemas e necessidades da população, já que parte da
administração do programa é de ordem municipal, uma vez que são as localidades que
identificam, caracterizam e realizam os cadastros das famílias candidatas a receber o
benefício.
Nos últimos anos, o avanço na abrangência do programa é nítido. Em outubro de 2003
o número de famílias atendidas foi de 1,2 milhões; em dezembro de 2005 foi de 8,7 milhões e
em julho de 2006 11,1 milhões, e em 2016 já passam de 50 milhões de beneficiários, segundo
informações do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) e do Instituto de Pesquisas
Econômicas Aplicadas (IPEA). Os mapas que integram a Figura 1 representam a distribuição
espacial da cobertura do programa, contabilizada como a razão entre o número de famílias
beneficiárias e o número estimado de famílias pobres no período.
Figura 1: Cobertura do Programa Bolsa Família: outubro-2003, dezembro-2005, julho-2016. Fonte: MDS/SAGI e IPEA.
O crescimento exponencial do programa em um curto período de tempo produz um
duplo efeito: ao mesmo tempo em que a expansão o torna mais significativo, abre brechas
para possíveis casos de corrupção, desvio de recursos e uso político, uma vez que o programa
concede um grande poder ao prefeito, que pode usar disso para ganhos eleitorais.
Alguns autores, a exemplo de Carvalho (2006), enfatizam também o fato das
transferências gerarem externalidades negativas, como a acomodação das famílias em receber
o benefício. Ao ter uma renda garantida pela transferência, as famílias seriam desestimuladas
a procurar emprego e chegariam a preferir continuar na situação de pobreza, para continuar a
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receber os benefícios. Por outro lado, Schwartzman (2005) considera o valor do benefício tão
pequeno que não seria suficiente para gerar esse tipo de problema. Apesar do valor reduzido,
Schwartzman (2005) considera que o programa é mal focalizado, atendendo pessoas pobres e
outras que não necessariamente são pobres, considerando que o padrão de vida de algumas
famílias não é expresso com clareza na PNAD.
Hoffmann (2006) afirma que as transferências tiveram um impacto de 28% na redução
da desigualdade ente 1998 e 2004, sendo que no Nordeste esse valor foi de 66% no mesmo
período. Ao lado das preocupações expostas, existem algumas outras até agora menos
exploradas, que surgem do caráter federativo da condução do programa Bolsa Família e de
suas inevitáveis repercussões regionais.
No sentido de avançar nessas questões, a proposta deste estudo é analisar como as
inter-relações que surgem no seio do programa repercutem na sua condução e verificar se, de
fato, as políticas de combate à pobreza do governo federal têm tido resultados relevantes
sobre as desigualdades regionais. Em outras palavras, a pesquisa objetiva avaliar a política do
Programa Bolsa Família nos municípios rurais da Região Nordeste, entre 2010 e 2015 e
verificar se este é eficaz na redução do número de pobres e indigentes na região, bem como na
concentração da renda.
2. POLÍTICAS DE COMBATE À POBREZA E AS QUESTÕES FEDERATIVAS
Descentralização é um processo que delega a unidades federativas subnacionais
autoridade sobre o planejamento e a tomada de decisão, com o objetivo de melhora da atuação
do setor público. Segundo o Banco Mundial, descentralizar é transferir autoridade e
responsabilidade de questões públicas do governo central a governos locais ou intermediários
(WORLD BANK, 2002). Assim, um dos pontos a favor da descentralização de programas
públicos é que os governos locais estão mais próximos dos eleitores e mais sujeitos a pressões
populares. Isso possibilita aos governos melhor identificação das prioridades locais e ao povo
maior percepção de resultados.
Entretanto, descentralizar implica hierarquizar, tornando o sistema de governo uma
pirâmide cujo topo é o governo central. Quando o processo é implementado em ambientes
com intensas diferenças econômicas e sociais, como acontece no Brasil, surge a necessidade
da criação de transferências intergovernamentais, com o intuito de corrigir eventuais
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desequilíbrios entre as localidades, possibilitando se não iguais, semelhantes serviços para a
sociedade, na tentativa de fornecer desenvolvimento homogêneo para as unidades locais.
A presença das transferências, no entanto, faz surgir uma série de outras preocupações
que não podem ser desconsideradas no desenho de qualquer política pública. A primeira
preocupação de natureza federativa que um programa dessa magnitude faz surgir envolve o
jogo de influência entre as esferas federativas. Isso acontece porque as unidades federativas
com maior influência sobre o governo central tendem a receber mais recursos em comparação
com as outras unidades da federação. Goodspeed (2002), por exemplo, desenvolve um
modelo teórico onde o governo central que concede socorro financeiro devido a
endividamentos para as unidades com maior peso eleitoral. A influência refere-se tanto à
importância política como financeira sobre o governo central e tende a ser benéfica às
unidades maiores, mais ricas e articuladas.
Um segundo ponto importante é que os governos locais podem ser alvo mais fácil de
grupos de interesse. Governos de municípios pequenos tendem a ser bastante influenciados
pelas elites locais, que teriam a possibilidade de desviar os programas públicos para benefício
próprio, em detrimento da minoria pobre8. Essa influência seria o reflexo, entre outros fatores,
do poder econômico, que na maioria das pequenas cidades é exercido por uma reduzida
parcela da população. Cabe ressaltar aqui que não se trata necessariamente de corrupção, mas
sim de influência política da elite como mecanismos de desvio dos serviços em seu
favorecimento.
Alguns textos como Galasso & Ravallion (2000) e Lanjouw & Ravallion (1999)
também apresentam esta idéia. Estudos como os de Gaiha & Kulkarni (2002), aplicados na
Índia, mostram que parte significativa dos recursos de programas de combate à pobreza no
país foram desviados. A realidade não é tão diferente no Brasil. Conforme argumenta Tendler
(1997, apud Bardhan & Mookherjee, 2005), o principal obstáculo para melhorias no sistema
de saúde no Ceará seria a influência da elite local.
Assim, percebe-se que a alocação dos recursos e os respectivos resultados dos
programas de combate à pobreza em ambientes descentralizados sofrerão influência tanto da
disputa entre os membros federativos, como dependerá da capacidade dos governos locais de
receber os benefícios e destiná-los de forma correta.
8 A esse respeito, ver o modelo de Bardhan e Mookherjee, 2005.
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3. A POBREZA NO NORDESTE RURAL
Vários fatores, ao longo dos anos, contribuem para a persistência da pobreza na região
Nordeste (atraso tecnológico em relação a outros estados, pouca modificação da agricultura e
da indústria as graves secas) devido a esses fatores é necessária à intervenção do Governo
com políticas públicas sociais, a fim de reduzir as desigualdades entre os estados.
No entanto, nos últimos anos tem-se notado uma diminuição da pobreza e da extrema
pobreza tanto no meio urbano quanto no âmbito rural. O resultado disso pode, em grande
parte, ser creditado a programas sociais do Governo Federal como o Bolsa Família, o
Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar (Pronaf).
Nesse tópico, explora-se variáveis relacionadas à desigualdade e pobreza. O primeiro
dado analisado tem como base no salário mínimo de 2015 (R$ 788,00) e refere-se à proporção
da população rural com renda domiciliar de até meio salário mínimo. A região Nordeste é a
região com maior proporção de pessoas na zona rural com baixa renda, onde (Figura 2) 56 %
da população sobrevive com até meio salário mínimo, mostrando uma maior necessidade de
políticas públicas nessas áreas que promovam a melhor condição de vida.
Figura 2: Proporção de pessoas em zonas rurais com baixa renda (%) em 2015 Fonte: elaboração própria
Conforme a evolução verificada no índice de Gini, Figura 3, que mede o nível de
desigualdade de renda em uma determinada região com valores de 0 a 1 - onde quanto mais
próximo de 1 for maior será o grau de concentração de renda - temos para as cidades rurais
da região Nordeste, durante o período de 1995 a 2015, uma pequena melhora nos índices de
desigualdade da região onde o índice de Gini passa de 0,66 para 0,63.
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Figura 3- Nordeste rural: Índice de Gini Fonte: Elaboração própria com dados do IPEA (2015).
Porém, quando analisado o indice razão de renda da região no período, temos que a
melhora nos níveis de desigualdade da zona rural da região não implica em menor grau de
concentração de renda (ver figura 4). Esse indice mostra que de 1995 a 2015, o número de
vezes em que a os 20% mais ricos da população urbana da região ganham em relação aos 20%
mais pobres da zona rural passou de 27,04 para 34,84.
Contudo, no ano 2000, o grau de concentração de renda da população rural era muito
mais impactante do que o observado inicialmente no ano de 1995, pois, nesse período do
ponto de vista macroeconômico a conjuntura nacional não era favoravel a promoção de
emprego e renda, e isso repercutia em todas as regiões do país.
O câmbio encontrava-se em patamar desvalorizado em razão da fuga de capitais em
2000, que tinham como razão o aumento do risco nos países emergentes motivada pelas crises
no México, Rússia e Argentina, o que impactava no nivel de preços da economia, levando
ainda mais a taxa de juros que deveriam manter o cambio em equilibrio, levando a uma perda
de renda e aumento do nível de desemprego no Brasil.
Figura 4- Razão de Renda dos mais ricos urbanos e mais pobres rurais Fonte: Elaboração própria com dados do IPEA (2015).
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Com base na tabela 1, pode-se verificar que na Região Nordeste, são nos estados
considerados de maior dinamismo econômico onde se encontram o maior número de famílias
beneficiadas com o programa social do Bolsa Família e consequentemente os maiores
repassados com o programa. Para exemplificação na Bahia encontram-se quase 1.800.000
famílias beneficiadas com o programa e o valor agregado do repasse para o Estado é de
aproximadamente R$ 296 milhões, enquanto que no Estado da Paraíba encontram-se
aproximadamente 500.000 famílias beneficiadas ao custo agregado de aproximadamente
R$ 89,6 milhões.
Tabela 1: Pagamento do Bolsa Família
Estados Famílias Beneficiadas Total de repasses
Alagoas 418.405 70.288.581,00
Bahia 1.797.610 295.855.438,00
Ceará 1.075.853 173.278.958,00
Maranhão 952.131 180.221.042,00
Paraíba 506.704 89.607.489,00
Pernambuco 1.116.657 179.455.100,00
Piauí 443.346 82.155.977,00
Rio Grande do Norte 356.405 57.246.186,00
Sergipe 269.296 41.491.218,00
Fonte: MDS/ sagi data
Segundo CALDAS (2015), a linha de pobreza para a região Nordeste na zona urbana
em 2009 foi de R$201,03 mensais por pessoa, enquanto que a linha de indigência por ser
calculada como metade da linha da pobreza foi de R$100,51 mensais por pessoa. Já na zona
rural, a linha de pobreza no mesmo período foi de R$ 179,29 mensais por pessoa, e a linha de
indigência foi de R$ 89,65 mensais por pessoa.
CALDAS (2015) afirma ainda que apenas 61,16% dos domicílios na área urbana da
região Nordeste estavam acima da linha da pobreza, e 76,75% possuem renda acima da linha
de indigência de um total de 11.439.989 situados na área urbana da região. Quanto aos
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domicílios situados na área rural, de um total de 3.922.384, apenas 22, 36% encontravam-se
acima da linha da pobreza, e 30,75% acima da linha de indigência.
4. O MODELO DE CONCENTRAÇÃO E ESTIMAÇÃO ECONOMÉTRICA
Para tratar das questões levantadas, o presente trabalho seguirá uma dupla orientação
metodológica. Inicialmente, serão calculados e comparados índices de concentração, tanto
para a pobreza nas cidades de cada estado do Nordeste, como para a destinação dos recursos
do Programa Bolsa Família entre as Regiões do Nordeste. Objetiva-se com isso verificar se o
programa está contribuindo não só para a diminuição das desigualdades interpessoais de
renda, do ponto de vista regional, mas se também colabora com a redução das assimetrias
espaciais, diga-se urbanas e rurais9, de condições econômicas e sociais. A motivação desta
verificação reporta-se à questão da influência das unidades eleitoralmente mais influentes
sobre a distribuição espacial dos recursos.
O índice de concentração Hirschman – Herfindahl (índice HH) é normalmente
utilizado pelos economistas industriais para medir a concentração do mercado. Segundo
Jannuzzi e Santos (2006), foi introduzido na década de 1940 como indicador de viés de
mercado10. O índice será aqui empregado para medir a concentração das transferências, sendo
calculado da seguinte maneira:
(1)
Onde representa os valores do programa para o estado i, com ; e representa
a soma dos valores totais do programa de todos os estados no ano j, com . Cada
representa a participação da localidade no montante total de recursos liberados no ano. Já o
índice HH representa o nível de concentração da cidade no volume de recursos liberados no
período 2010-2015. A classificação é a seguinte: para , não há concentração de
transferências; se , há concentração moderada; se o valor
considera-se altamente concentrado. A variável designa a participação do benefício em
9 Para este trabalho, considera-se rurais, os municípios de cada estado com taxa de urbanização menor que 70%. 10 Mercado tendencioso, que favorece determinado setor ou setores.
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determinado período. Por exemplo, pode também ser considerado como a participação do
estado no montante total dos recursos. O índice HH representa aqui a soma dos quadrados das
participações dos estados de cada ano da análise.
Na segunda vertente metodológica, estimar-se-á um modelo econométrico com dados
em painel para observar quais variáveis mais influenciam na distribuição dos recursos do
Bolsa Família: a pobreza ou a pressão das elites locais. Aborda-se, com isso, a questão da
possível captura pelas elites locais das verbas envolvidas no programa. Um painel geral é
configurado da seguinte maneira:
(2)
Neste formato, o subscrito i indica os diferentes municípios e o subscrito t indica os
anos da análise. O valor de refere-se ao valor do intercepto e representa o valor do
coeficiente angular da k-ésima variável explicativa. Para designar pobreza, utilizou-se o
percentual de pobres, definido pelo IPEADATA como a proporção de pessoas com renda
familiar per capita inferior à linha de pobreza. Já a variável elite é representada pela razão
entre os anos de estudos e a idade das pessoas acima de 25 nos de idade, também disponível
no site do IPEADATA. A variável bolsa família foi considerada a partir dos dados
disponíveis sobre o programa no site da transparência do Governo Federal, sendo utilizados
os valores correspondentes aos anos de 2010 a 2015 para as 1793 municípios do Nordeste. A
estimação será a seguinte:
(3)
Onde: βi são os parâmetros a serem estimados; Pobreza e Elite são as variáveis explicativas e
u é o termo de erro. Ademais, foram feitos testes que pudessem detectar/eliminar problemas
de especificação do modelo.
5 APLICAÇÃO DA METODOLOGIA E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
A Tabela 2 apresenta os resultados do cálculo dos índices de concentração estadual
dos recursos do Programa Bolsa Família para os estados do Nordeste.
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Tabela 2 - Nordeste: Concentração das Transferências no período 2010-2015
REGIÃO NORDESTE 17,257 17,497 17,537 18,677 19,007 17,797 171,522
Alagoas 2,213 2,453 2,493 3,633 3,963 2,753 24,153
Bahia 1,07 1,31 1,35 2,49 2,82 1,61 4,176
Ceará 1,115 1,355 1,395 2,535 2,865 1,655 5,258
Maranhão 1,922 2,162 2,202 3,342 3,672 2,462 15,031
Paraíba 1,401 1,641 1,681 2,821 3,151 1,941 9,13
Pernambuco 2,33 2,57 2,61 3,75 4,08 2,87 19,331
Piauí 2,773 3,013 3,053 4,193 4,523 3,313 30,076
Rio Grande do Norte 3,162 3,402 3,442 4,582 4,912 3,702 49,258
Sergipe 1,272 1,512 1,552 2,692 3,022 1,812 7,189
Fonte: http://www.portaltransparencia.gov.br/ e DATASUS. Elaboração própria.
Verifica-se que há concentração na liberação de recursos entre os estados, todavia a
concentração é generalizada. O Índice HH indica concentração para valores maiores do que 1
(um), a maioria das unidades federativas do Nordeste apresentou HH > 1. Os estados com
maior concentração dos benefícios são Rio Grande do Norte (49,25), Piauí (30,076) e Alagoas
(24,153).
Para entender o foco dessa concentração de recursos, foram selecionados apenas os
municípios rurais por estado, ou seja, os municípios com taxa de urbanização menor que 70%,
para análise da relação da concentração das transferências pela concentração do número de
pobres – tabela 3. Os resultados então corroboram com os dados anteriores.
Tabela 3- Relação de Concentração das Transferências por Concentração de pobres nos municípios rurais para Estados do Nordeste no ano de 2015 (em reais)
REGIÃO NORDESTE Alagoas 411,27
Bahia 319,53
Ceará 425,81
Maranhão 368,54
Paraíba 399,21
Pernambuco 498,93
Piauí 432,72
Rio Grande do Norte 673,21
Sergipe 298,73 Fonte: http://www.portaltransparencia.gov.br/ e DATASUS. Elaboração própria.
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O Estado do Rio Grande do Norte possui o maior valor de transferências por “pobres
rurais” (R$ 673,21). Em comparação com Sergipe, que possui o valor de R$ 298,73, por
exemplo, o valor apresentado pelo estado do Rio Grande do Norte é passível de
questionamento, uma vez que Sergipe possui um número maior de pobres nas zonas rurais do
que o Rio Grande do Norte e, no entanto o valor das transferências é inferior.
Outros valores também são cabíveis de observação minuciosa: os resultados da
estimação econométrica, que buscou avaliar quais variáveis exercem maior impacto
estatístico, agora considerando todos os municípios, sobre a distribuição dos recursos do
Programa Bolsa Família são apresentados a seguir. Após os testes de especificação, o modelo
foi estimado com efeitos fixos e apresentou a seguinte configuração:
Tabela 4- Resultado da Estimação do modelo de painel para o Brasil
Coeficiente
-5,27 -6,01
7,33 9,21
-0,67 -3,22
0,91
1,73
Fonte: Elaboração própria
O resultado permite constatar que, a um nível de significância de 5%, todas as
variáveis são significativas estatisticamente e o modelo obteve um bom ajustamento. O
resultado para a variável elite confirma a hipótese de que nos municípios nordestinos, por
estado, a elite realmente influencia o programa, sendo o seu efeito marginal positivo, o que
permite inferir que melhorias na variável geram variações positivas no montante de
transferências.
O que mais intriga nos resultados, no entanto, é o parâmetro associado à variável
pobreza, no caso, a proporção de pobres. O sinal negativo obtido contraria diretamente o
intuito do programa, demonstrando que, quanto maior for a pobreza local, com maior
concentração nas zonas rurais, menores serão as transferências.
Em resumo, os resultados permitem observar que não há focalização dos benefícios do
programa, quando se sabe que a pobreza no País é espacialmente localizada. Por outro lado,
há a sinalização clara de viés na distribuição do benefício para localidades menos
necessitadas.
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5.1 A PARAIBA
O Estado paraibano apresentou HH de 9,130, valor dentro da escala de concentração,
mas em comparação aos outros estados do nordeste é o menos concentrado. Com relação ao
valor das transferências por número de pobres também se verifica que a Paraíba só fica atrás
de Sergipe e Bahia, conforme a tabela 5.
Tabela 5- Indicadores para a Bahia em comparação com o Nordeste
ESTADO Pobres % Transferências % Transferência/pobres HH
Alagoas 4,11% 6,09% R$ 411,27 24,153 Bahia 35,59% 25,49% R$ 319,53 4,176 Ceará 21,28% 15,88% R$ 425,81 5,258 Maranhão 10,82% 13,92% R$ 368,54 15,031 PARAÍBA 7,97% 7,47% R$ 399,21 9,13 Pernambuco 10,11% 15,77% R$ 498,93 19,331 Piauí 3,63% 6,75% R$ 432,72 30,076 Rio Grande do Norte 2,44% 5,17% R$ 673,21 49,258 Sergipe 4,05% 3,45% R$ 298,73 7,189
Fonte: Elaboração própria.
A Paraíba possui em relação aos outros estados do Nordeste, a quinta menor proporção
de população rural pobre, ou seja, 7,97% da população na linha de pobreza na Região, o que
justifica receber 7,47% das transferências do Programa Bolsa Família destinadas ao Nordeste.
Apesar disto, o Estado não apresenta concentração, refletindo uma distribuição eficiente dos
recursos.
Entretanto, em comparação com os outros estados recebe um volume menor de
recursos por pobres rurais, R$ 399,21 enquanto que estados recebem até mais de duas vezes
este valor. Este fato é confirmado pelo índice HH que representa a concentração, mostrando
que por receber um volume menor de recursos/pobre apresenta o menor valor de concentração
dos recursos. Para a Paraíba, averígua-se que possui a quinta população pobre rural do
nordeste e ao mesmo tempo recebe recursos maiores que a Bahia, por exemplo, que tem
maior percentual de pobre rural. Entretanto, a relação entre recursos/pobres no estado é
inferior a todo o nordeste, logo, não apresenta concentração medida pelo índice HH.
6 CONCLUSÕES
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O trabalho procurou analisar o Programa Bolsa Família de combate à pobreza, com
vistas a verificar se a descentralização da política, com a participação das três esferas de
governo, gera impactos distorcivos sobre a alocação e a distribuição regional e espacial dos
recursos.
A análise confirmou a influencia das elites locais sobre o volume de benefícios
concedidos, e que o percentual de pobres rurais possui impacto negativo sobre a distribuição
dos recursos. Em outras palavras, a estimação realizada permite afirmar que os recursos são
menores tanto mais pobre é a região, o que representa uma inversão total dos objetivos
explícitos do programa. Assim, torna-se necessária uma reavaliação do mecanismo de
repasses do Programa Bolsa Família, com uma mudança de foco, para que seus objetivos
sejam alcançados em plenitude.
Para o Estado da Paraíba, levanta-se o questionamento sobre o volume total de
recursos recebidos em razão do número de pobres. Não se objetiva aqui afirmar que o volume
de recursos em média para o nordeste é exorbitante, mas sim distribuição desigual, na análise
referente ao número de pobres nos municípios rurais.
Um fato intrigante é que, apesar dos recursos do Programa possuir um, alguns estados
apresentam recursos em média superiores a este, como Alagoas, Pernambuco, Piauí e Rio
Grande do Norte. O evento pode ter como justificativa a atração de recursos pelos governos
locais destes estados, sendo estes mais influentes em suas políticas de renda e
desenvolvimento.
Apesar das limitações apontadas, não se pode negar que os níveis de pobreza se
reduziram na região. Mas, a despeito da boa intenção do Programa, também não se pode
atribuir a diminuição integralmente ao sucesso do modelo adotado para combater a pobreza.
Porém, a política de distribuir renda é apenas uma tentativa, muitas vezes contestada, de
solucionar um problema de curto prazo. Apenas aperfeiçoando o desenho federativo e seus
mecanismos de transferência, pode-se vencer a tarefa árdua de transformar o gasto de curto
prazo em investimentos que retornem na forma empregos sustentáveis.
REFERÊNCIAS BARDHAN, Pranab; MOOKHERJEE, Dilip. Decentralizing Anti-Poverty Program Delivery in Developing Countries. 2005. BEGHIN, N. Notas sobre Desigualdade e Pobreza no Brasil: Situação Atual e Desafios. Oxfam International. jun. 2008 . Disponível em: http://www.oxfam.org.uk.
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O PROGRAMA NACIONAL DE CREDITO FUNDIÁRIO NO NORDESTE
BRASILEIRO: UMA ANÁLISE DO PERÍODO DE 2005 A 2015
Autores: Maria Silne da Silva Galdino1; João Bosco de Noronha Filho2; Elayne Ingrid Alves Gomes3; Eliane Pinheiro de Sousa4. Filiação: Universidade Regional do Cariri (URCA). E-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]
Grupo de Pesquisa: 3. POLÍTICAS PÚBLICAS E REFORMA AGRÁRIA
Resumo
O Programa Nacional do Crédito Fundiário (PNCF) caracteriza-se como um conjunto de
ações que promove o acesso à terra aos trabalhadores rurais sem terra por meio do crédito
fundiário. Em face da relevância desse programa no Nordeste brasileiro, este estudo objetiva
analisar seus resultados nessa região no período de 2005 a 2015. Para isso, utilizou-se análise
tabular e descritiva do número de famílias beneficiárias, do número de propostas, da área
financiada e dos valores do Subprojeto para Infraestrutura Coletiva (SIC) e Subprojeto de
Aquisição de Terras (SAT). Os resultados indicaram que a região Nordeste se destaca com o
maior número de famílias atendidas durante o período estudado, sendo que os estados do
Piauí e de Alagoas obtiveram, respectivamente, o maior e o menor número de famílias
atendidas. Esta região também obteve a maior quantidade de área financiada e o maior valor
na obtenção do SAT em termos comparativos com as demais regiões brasileiras. Embora
tenha ocorrido uma oscilação nos resultados de todos os indicadores durante o período
analisado, constata-se que houve um decréscimo expressivo ao se comparar os dados de 2005
com 2015.
Palavras-chave: crédito fundiário; Programa Nacional de Crédito Fundiário; Nordeste
brasileiro.
Abstract
The National Land Acquisition Credit Program (PNCF) is characterized as a set of actions
that promotes the access to the land to landless workers through land acquisition credit. In
the face of the relevance of this program in the Brazilian Northeast, this study aims to analyze
the results of the PNCF in this region in the period from 2005 to 2015. In order to fulfill this
goal, it was used tabular and descriptive analysis of the number of beneficiary families, of the
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number of proposals, of the funded areas and of the amounts of the Subproject for Collective
Infrastructure (SIC) and Subproject for Land Acquisition (SAT). The results indicated that the
Northeastern region stands out exhibiting the largest number of families served during the
period under study, with the states of Piauí and Alagoas exhibiting, respectively, the largest
and the smallest number of families served. This region also exhibited the largest amount of
funded area and the largest amount of the SAT when compared with the other Brazilian
regions. Although there has been an oscillation during the period under analysis, one may
observe that there has been a significant decrease when comparing the 2005 and the 2015
data.
Keywords: land acquisition credit; National Land Acquisition Credit Program; Brazilian
Northeast.
1. Introdução Um dos grandes problemas enfrentados pela população brasileira é, sem dúvida, a
elevada concentração fundiária. O país convive com essa questão desde a sua colonização
quando o sistema de capitanias hereditárias foi dividido entre pequenos donatários para sua
exploração. É nesse sentido que Carvalho (2010) afirma que, quando se estuda a distribuição
de terras brasileira, verifica-se que teve essa desigualdade na sua distribuição, desde que o
país ainda era uma colônia. Primeiro, com o sistema capitanias hereditárias, e depois com as
sesmarias, que acabou dando origem aos grandes latifúndios do país. Assim, percebe-se que
esse problema é resultado de um processo histórico consolidado, baseando-se nas grandes
propriedades fundiárias, e na execução de um modelo de desenvolvimento altamente
concentrador e excludente.
Essa disparidade dificulta o desenvolvimento no meio rural, e, para que haja esse
desenvolvimento, essa questão precisa ser superada. No entanto, isso só será possível por
meio de uma redistribuição dessas terras, ou seja, com a realização da reforma agrária. Dessa
forma, a realização de reforma agrária é uma questão de inclusão social e de justiça, e que
exige uma tomada de decisões de toda sociedade, visando alcançar o desenvolvimento pleno
do país (MORAIS, 2013). Assim, uma reforma agrária seria um grande salto histórico, uma
vez que geraria mudanças significativas para a sociedade ao mesmo tempo em que viabilizaria
um maior desenvolvimento no meio rural.
Apesar de sua notável importância, essa redistribuição de terras no Brasil vem
ocorrendo de forma lenta, pois há uma resistência em efetivá-la, uma vez que se colide com
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os interesses de grandes latifundiários. Diante disso, Greenhalgh (1996, p. 74) concluiu que
“talvez o Brasil seja o único e o último país de dimensões continentais que ainda resiste à
Reforma Agrária, e que ainda tenta, enfim, a ela se opor”.
A partir do final da década de 1950 e meados da década de 1960, a questão agrária
ganhou dimensões nacionais, passando a ser pauta não só nas discussões políticas, mas
também em outros setores da sociedade, como econômica e acadêmica. Nesse período, foi
elaborado o Estatuto da Terra de 1964 ou Lei nº 4.504 de 30/11/1964 e foram criados órgãos
destinados à questão agrária, que visavam o desenvolvimento agrário, e uma redistribuição
fundiária. No entanto, isso não se concretizou, ficando claro que essas medidas visavam
apenas conter os conflitos camponeses que se expandiam nesse período.
Após a década de 1960, essa questão manteve-se silenciada por muito tempo e
somente, em 1980, é que volta à tona com a intensificação dos conflitos no campo, de uma
forma bem mais estruturada por meio da revitalização dos Sindicatos dos Trabalhadores
Rurais, o apoio da igreja através da Comissão Pastoral da Terra e o surgimento do Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Assim, para conter essas mobilizações, o governo
lançou o primeiro Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA). No entanto, mais uma vez os
resultados do plano não atenderam as reivindicações básicas dos camponeses (DINIZ, 2010).
Aspirando resolver essa questão em meados da década de 1990, uma nova proposta de
reforma foi inserida no Brasil, baseada nos ideais do Banco Mundial e financiada pelo
mesmo. Foi iniciado um novo modelo de reforma agrária através do crédito fundiário. Esse
modelo é denominado reforma agrária de mercado, em que o governo disponibiliza uma linha
de crédito para agricultores sem terra ou com pouca terra com o intuito de financiar a sua
compra para moradia e exploração (SAUER; PEREIRA, 2006).
O projeto foi implementado inicialmente no estado do Ceará por meio da “reforma
agrária solidária”, que era caracterizada pela compra e venda de terras através de sindicatos e
associações. Alguns meses depois dessa experiência no Ceará, originou-se o projeto piloto
Cédula da Terra. Dessa forma, essa experiência cearense foi estendida para outros estados
nordestinos, como Pernambuco, Bahia, Maranhão e também para a região norte no estado de
Minas Gerais. Entre 1997 e 2002, o programa Cédula da Terra foi executado a nível nacional,
tendo como base o programa Reforma Agrária Solidária, implementado no Ceará e teve
continuidade no governo seguinte com a execução do Programa Nacional do Crédito
Fundiário (PNCF) (PEREIRA; SAUER, 2011).
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O Programa Nacional do Crédito Fundiário (PNCF) teve início no governo de Luís
Inácio Lula da Silva, disponibilizando três grandes linhas de crédito, uma destinada à
Consolidação da Agricultura Familiar (CAF), outra para os programas Combate da Pobreza
Rural (CPR) e Nossa Primeira Terra (NPT) (LIMA 2011). Com o acesso a terra e aos
investimentos disponibilizados, o programa contribui para a diminuição da pobreza rural por
meio da geração de emprego e aumento da renda rural. Nesse sentido, o manual de operações
do CAF define o Programa Nacional do Crédito Fundiário (PNCF) como “um conjunto de
ações que visa, por intermédio do crédito fundiário, a promoção do acesso a terra e
investimentos básicos e produtivos, que permitam estruturar os imóveis adquiridos com
recursos do fundo de terras e da reforma agrária [...]” (PNCF, 2005, p.10).
Dessa forma, o presente trabalho tem como objetivo principal analisar os resultados do
Programa Nacional de Crédito Fundiário no Nordeste brasileiro no período de 2005 a 2015.
Especificamente, pretende-se avaliar a questão agrária brasileira e seus desdobramentos ao
longo dos anos; discorrer acerca da trajetória dos programas de crédito fundiário implantados
no país e caracterizar o Programa Nacional do Crédito Fundiário.
Para atender a tais objetivos, utilizou-se o método descritivo, que busca por meio da
análise de dados e levantamento bibliográfico descrever as características do Programa
Nacional do Credito Fundiário (PNCF). Quanto aos dados analisados, foram coletados através
do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), para o período de 2005 a 2015.
Além dessa seção introdutória, o trabalho conta com outras cinco seções. A segunda
traz uma breve discussão histórica acerca da questão agrária brasileira. A terceira explicita
uma contextualização da trajetória dos programas de crédito fundiário implantados no Brasil.
A quarta caracteriza o Programa Nacional do Crédito Fundiário. Em seguida, são
apresentados e analisados os resultados do PNCF e a última seção destina as considerações
finais.
2. A questão agrária brasileira
Sabe-se que, desde o princípio, houve desigualdades na distribuição de terras. Para
deixar evidente, bastar recordar que, durante a colonização portuguesa, foi instituído o regime
de capitanias hereditárias, sistema de gerência territorial, que consistia em dividir o território
brasileiro em grandes faixas e entregar a administração de particulares, e o sistema de
sesmarias, lotes de terras menores, que eram doados com o intuito de principalmente tornar a
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terra produtiva. Em ambos os casos, foram concedidas grandes extensões de terras a alguns
poucos privilegiados (OLIVEIRA, 2001).
Diversas tentativas para resolver essa questão foram desenvolvidas no Brasil. A
primeira foi a Lei das Terras, em 1850. Essa lei determinou parâmetros e normas sobre posse,
manutenção, uso e comercialização de terras. Seus objetivos foram estabelecer a compra
como única forma de obtenção de terras públicas, arrecadar mais impostos e taxas com a
criação da necessidade de registro e demarcação de terras, dificultar a compra ou posse de
terras por pessoas pobres, tirando das terras o caráter social, sendo mero bem comercial.
Como consequência, manteve a concentração de terras, aumentou o poder oligárquico,
favoreceu a economia cafeeira e a entrada de mão-de-obra estrangeira (CRUZ, 2005).
Ao analisar a questão agrária brasileira, Condé (2006) destaca a importância do
período do regime militar para essa questão, uma vez que foi nessa época que houve a
primeira tentativa da criação de uma lei que viabilizasse a realização da reforma agrária,
diante de uma conjuntura política marcada por pressões de movimentos que lutam pela
reforma agrária e conflitos de camponeses. Para apaziguar tais conflitos, foi elaborada a
primeira e mais completa lei relacionada à reforma agrária, o Estatuto da Terra de 1964,
criado de diversos órgãos, como o Instituto Brasileiro de Reforma Agrária (IBRA), o Instituto
Nacional de Desenvolvimento Agrário (INDA), a Empresa de Assistência Técnica e Extensão
Rural (EMBRATER) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), que
objetivavam desenvolvimento agrário e reforma agrária. Em 1970, esses órgãos foram
extintos, originando o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
A respeito do Estatuto da Terra, Medeiros (2003) afirma que a lei tinha dois objetivos
centrais: realizar reforma agrária e modernizar a agricultura. Quanto ao primeiro objetivo,
pouco foi feito, uma vez que as desapropriações ocorridas no período foram inexpressivas.
Em relação ao segundo objetivo, de certa forma foi atingido, pois, nesse período, esse setor
ganhou um destaque no cenário nacional, porém o que houve não foi o desenvolvimento da
agricultura de um modo geral, e sim uma modernização tecnológica no campo, em que os
interesses dos grandes latifundiários, com a concessão de subsídios e incentivos fiscais teve
um considerável avanço da agricultura nas grandes propriedades, enquanto os pequenos
estabelecimentos ficaram aquém desse desenvolvimento. Na realidade, esse Estatuto
prevalece até hoje, porém ainda não foi posto em prática.
Outro marco em relação às políticas destinadas à questão agraria foi o lançamento do I
Plano Nacional de Reforma Agrária (I PNRA), em 1985, porém essa tentativa de resolver a
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problemática foi mais uma vez fracassada, pois, conforme Medeiros (2003), no final de 1989,
somente 82.689 famílias foram assentadas em pouco mais de 4,5 milhões de hectares, um
número bastante inferior à meta esperada. Dessa forma, essas estratégias utilizadas não foram
suficientes para mudar os aspectos fundiários do país.
Buscando mudar essa disparidade na estrutura fundiária do país, na década de 1990,
foi inserida uma nova proposta de redistribuição dessas terras, por meio do crédito fundiário,
denominado reforma agrária de mercado. Baseado nos ideais neoliberais do Banco Mundial e
financiado pelo mesmo, esse modelo de reforma agrária assistida pelo mercado (RAAM)
tinha como principal característica a mercantilização das terras, cujo principal objetivo era
realizar uma reestruturação fundiária de forma rápida e desburocratizada, já que a burocracia
era tida como principal entrave na execução da reforma agrária por desapropriação (SAUER
2004). Assim, pautado no discurso de que era preciso “reformar a reforma agrária”
(CARDOSO, 1995, p. 25), e visando desenvolver o “novo mundo rural”, deu-se início a
política de reforma agrária de mercado no país.
3. Caracterização dos programas de crédito fundiário
A reforma agraria de mercado é um modelo promovido pelo Banco Mundial para
países em desenvolvimento e com alta concentração fundiária e começou a ser executado no
Brasil em meados da década de 1990 durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. De
acordo com Sauer (2004), a política mantinha as mesmas diretrizes da reforma agrária por
desapropriação que era, por um lado, distribuir terra a pequenos agricultores e trabalhadores
sem terra; de outro, aliviar pontual e seletivamente a pobreza rural, o que difere esses dois
tipos de reforma é o modo como é executada. Nesse sentido, Sauer e Pereira (2006) afirmam
que a reforma agrária distributiva consiste numa ação do governo onde terras privadas que
não cumprem a sua função social são desapropriadas mediante indenização abaixo do preço
de mercado. Isso se torna um processo lento, devido à burocracia na sua execução. Já a
reforma via mercantilização das terras é fruto de uma negociação voluntária entre o próprio
agricultor e o proprietário da terra, em que o governo disponibiliza uma linha de crédito para
que esse agricultor possa comprar essa terra. Além do financiamento para a compra da terra,
são acrescidos recursos e subsídios para investimentos na propriedade, uma vez que não basta
distribuir a terra, é necessário oferecer condições para que possa haver desenvolvimento
nessas propriedades adquiridas.
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O primeiro projeto executado e que serviu de base para os adotados posteriormente foi
a Reforma Agrária Solidária, também conhecida como Projeto São José (PSJ), implantado em
1997 e executado somente no estado do Ceará. A escolha do estado como pioneiro na
execução da reforma agrária de mercado pode ser atribuída ao elevado índice de
desigualdades sociais registrada na região e alta concentração fundiária, ponto característico
do estado. Este projeto resultou de um acordo entre o Banco Mundial (BIRD) e o Governo do
Estado por meio do Convênio de Cooperação Técnica com o Banco do Nordeste do Brasil.
Para Juvencio (2011, p.7), “esse investimento se consolidou no financiamento de 44 imóveis,
distribuídos no Ceará, atendendo 694 famílias, em 23.700 ha”. O PSJ tinha como meta
atender por volta de 800 famílias em 40.000 hectares no intervalo de um ano, todavia tal
aspiração não se realizou devido à elevação do preço médio real dos imóveis comparado aos
estimados para adquirir.
Tendo como base o Programa São José, surge no mesmo período o Programa Cédula
da Terra (PCT). Inicialmente a meta era atender 15 mil famílias. No período de três anos, a
abrangência do programa foi os estados de Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco e o norte de
Minas Gerais. O PCT tinha três objetivos essenciais: promover a redução da pobreza por
consequência da elevação da renda, aumentar a produtividade agrícola e tentar incorporar o
modelo de reforma agrária de mercado como alternativa ao modelo de reforma agrária
tradicional (LIMA, 2008).
Lima (2008) descreve também as características do programa, que tinha como recursos
iniciais o valor de US$ 150 milhões, para identificar possíveis beneficiários e, para as
condições de acesso, são analisadas as características gerais da população. A participação era
apenas associativa e as próprias associações escolhiam os beneficiários, o limite de crédito era
de US$ 11.200 para cada família. O PCT era formado pelo Subprojeto de Aquisição de Terras
(SAT) e pelo Subprojeto de Investimentos Comunitários (SIC), sendo o primeiro utilizado
para comprar a terra e o segundo para investimentos nas áreas de infraestrutura e produção
social. O objetivo do SAT é financiar a obtenção da terra mediante negociação dos próprios
beneficiários com o dono da propriedade por meio de uma associação e auxílio de órgãos
governamentais, já o SIC disponibiliza crédito destinado à melhoria da propriedade adquirida,
como também para o aumento da capacidade produtiva do imóvel, elevando assim a
produtividade e o nível de emprego e renda dos beneficiários.
Outro programa que fazia parte das diretrizes da reforma agrária de mercado era o
Banco da Terra, lançado em 1999 pela lei complementar nº 93, sancionada em 04 de fevereiro
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de 1998 e regulamentada pelo decreto nº 3.207 de 13 de abril de 1999. Esse programa objetiva
financiar a compra de terras e infraestrutura básica para os trabalhadores rurais.
Para a inserção de famílias no Banco da Terra, é necessário o cumprimento de
algumas normas. Tais critérios são idênticos aos do Programa Cédula da Terra. Quanto à
administração, também é descentralizada e conta com a participação de instituições
governamentais, como o Ministério do Desenvolvimento Agrário, a Secretaria de
Reordenamento Agrário e a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (SANTOS,
2012).
4. Programa Nacional do Crédito Fundiário (PNCF)
Os programas de crédito adotados anteriormente sofreram severas críticas por parte
dos movimentos que lutam pela posse da terra. De acordo com eles, o funcionamento desses
programas de crédito fundiário geraria aumento do preço da terra por conta da elevação da
demanda, além de contribuir para o acréscimo do endividamento dos beneficiários, uma vez
que todos os recursos disponibilizados eram reembolsáveis. Dessa forma, as lideranças desses
movimentos alegavam que, ao executar tais políticas, o governo estaria abrindo mão da
condução da reforma agrária tornando a questão agrária um mero objeto do capitalismo. É
nessa conjuntura marcada por pressões desses movimentos aliada aos conflitos no campo, que
Luiz Inácio Lula da Silva assume o governo e com isso aumentou as expectativas que essa
questão agrária fosse definitivamente solucionada, uma vez que o então governo era
integrante desses movimentos sociais (SANTOS, 2012).
No entanto, o governo não fez grandes alterações no que diz respeito à perspectiva de
reforma agrária, o que houve foi uma continuação das medidas que vinham sendo executadas.
Dessa forma, dando continuidade aos projetos de reforma agrária de mercado, no início de
2003, foi lançado o Programa Nacional do Crédito Fundiário (PNCF), que, conforme Lima
(2011), manteve as mesmas características dos programas anteriores, ou seja, o mesmo
programa apenas com pequenas modificações e com nomenclatura diferente. Nesse sentido, o
manual de operações do Programa Nacional do Crédito Fundiário (PNCF) define o programa
como um conjunto de ações que visa, por intermédio do crédito fundiário, a promoção do
acesso a terra e investimentos básicos e produtivos, que permitam estruturar os imóveis
adquiridos com recursos do fundo de terras e da reforma agrária [...] (PNCF, 2005, p.10).
Galindo et al. (2015) afirmam que o objetivo fundamental do PNCF é, através do
acesso a terra, contribuir para uma melhoria de vida no campo, uma vez que a promoção da
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terra acarretaria numa elevação da produção. Dessa forma, o trabalhador rural passa a
produzir tanto para o autoconsumo, como também para a comercialização, colaborando para a
redução da pobreza rural. Outro foco do programa é a agricultura familiar que vem ganhando
destaque nos últimos anos. Assim, o programa disponibiliza uma linha de crédito destinada
especificamente para este setor, denominado CAF (Consolidação da Agricultura Familiar),
que contempla agricultores sem terra. Além do CAF, são disponibilizadas outras linhas de
crédito para a compra da terra, como a CPR (Combate à Pobreza Rural), que contempla os
agricultores mais pobres e a NPT (Nossa Primeira Terra), que atende aos jovens de 18 a 28
anos. Dessa forma, segundo Brito (2013, p. 26), “o CPR é a linha de financiamento mais
robusta, representando pelo menos 80% do total de beneficiários”.
A linha CAF atende, em geral, agricultores que já estão instalados na terra, sejam
como meeiros e arrendatários, ou ainda os que já possuem uma pequena faixa de terra, os
minifúndios e querem aumentar ainda mais sua área. A linha de crédito era formada por dois
componentes básicos: Subprojeto de Aquisição de Terras (SAT), componente de acesso a
terra e Subprojeto de Investimentos Coletivos (SIC), componente de investimentos. Em
ambos os casos, utilizam recursos reembolsáveis e o financiamento tanto pode ser adquirido
individualmente como de forma coletiva (SANTOS, 2012). Para obter o crédito, o agricultor
precisa basicamente atender ao requisito de ter: “renda familiar anual de até R$ 30 mil e
patrimônio anual inferior a R$ 60 mil” (PNCF, 2010).
A linha CPR é voltada para atender os anseios de pequenos agricultores por terra. O
público alcançado concentra-se principalmente na região Nordeste, e possui as mesmas
características do CAF, porém somente os recursos destinados à compra da terra são saldados.
A fonte de recursos advém do fundo de terras e da reforma agrária. Dessa forma, esta linha de
crédito proporciona recursos para que os agricultores tenham um incentivo no sentido de
desenvolver sua produção, além de disponibilizar recursos necessários para investir na sua
moradia e melhorar a infraestrutura da propriedade adquirida. Já a aquisição só pode ser feita
de forma coletiva, por meio de associações ou cooperativas. Quanto ao valor recebido por
cada família, este não é fixo, é instituído conforme o teto de cada região, tendo um limite de
R$ 40 mil por beneficiário (LIMA, 2011).
Nessa perspectiva, Lima et al. (2013, p. 35) definem que o Combate à Pobreza Rural
(CPR) é uma linha do PNCF realizada com o intuito de apoiar os agricultores familiares mais
pobres (com menor renda familiar anual e menor patrimônio) e a Consolidação da Agricultura
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Familiar (CAF) é uma linha do PNCF que busca apoiar agricultores familiares pobres, que
dispõem de renda e patrimônio maiores dos que os agricultores atendidos pelo CPR.
Em relação à abordagem da temática, poucos estudos avaliaram os resultados do
PNCF. Dentre eles, destacam-se os estudos de Lima (2011), Brito (2013), Santos e Petsch
(2013), Galindo et al. (2015) e Sá et al. (2015). Desses estudos, três se preocuparam em aferir
os impactos do programa sobre o bem-estar das famílias beneficiadas sob a ótica da linha de
financiamento CAF, na região Sul do Brasil (LIMA, 2011), sobre a renda agropecuária e
patrimônio, além de mensurar a qualidade de vida dos seus beneficiários (BRITO, 2013) e
sobre o valor bruto da produção agropecuária (VBPA) entre 2006 e 2012 (GALINDO et al.,
2015). Santos e Petsch (2013) avaliaram a atuação do programa nas regiões brasileiras no
período de 2002 a 2012, analisando a quantia de recursos investidos na política e Sá et al.
(2015) objetivavam delinear o perfil dos assentamentos do Programa Nacional do Crédito
Fundiário coordenados pelo Instituto de Terras e Reforma Agrária do Estado de Pernambuco
(ITERPE) no município de Serra Talhada – PE.
Quanto aos resultados obtidos, Lima (2011) verificou que o programa gerou impacto
positivo aos beneficiários, pois tanto as variáveis de renda quanto de patrimônio registraram
resultados positivos. No entanto, em relação à infraestrutura da moradia, o acesso à rede
coletora de esgoto, o acesso à água e a energia elétrica não mudaram entre os períodos
analisados. Percebeu-se também um aumento importante na proporção de famílias
beneficiadas que possuem casa própria após o período de tratamento do programa. Portanto,
constatou que existem indícios de que a linha de financiamento CAF vem cumprindo um
papel importante para os beneficiários do programa na região Sul, gerando impactos positivos
no bem-estar das famílias beneficiadas.
Para Brito (2013), o programa proporcionou elevado aumento na renda agropecuária,
no período de 2006 a 2010, no entanto por falta de incentivos decresceu posteriormente. Em
relação ao patrimônio, o impacto do PNCF foi bem resumido para o mesmo o período, logo
conclui que o PNCF só gera impacto positivo e significativo a partir do quarto ano de
aquisição da terra pelo beneficiário. Em sua concepção, esse impasse poderia ser resolvido se
aumentasse a carência para quatro anos, a fim de que os beneficiários possam ter condições
financeiras para quitar as parcelas do financiamento do crédito fundiário. Quanto à qualidade
de vida, constatou-se que o grupo de beneficiários apresentou resultados melhores para a
maioria dos indicadores de qualidade de vida, enquanto o grupo de não beneficiários mostrou
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resultados próximos ao limite de baixa qualidade de vida, concluindo que o programa gerou
impactos positivos para os seus beneficiários.
Santos e Petsch (2013) buscaram identificar os montantes investidos no PNCF nos dez
primeiros anos de sua execução. Para isso, os autores analisaram diversas variáveis como o
número de operações, número de famílias beneficiadas, total de áreas adquiridas, valor gasto
com aquisição de terras (SAT – Subprojeto para Aquisição de Terras) e infraestrutura básica
(SIB – Subprojeto para Infraestrutura Básica), valor gasto com infraestrutura comunitária
(SIC – Subprojeto para Infraestrutura Coletiva). Este estudo destacou as particularidades de
cada região, apontando o Nordeste como a região com maior carência pelo programa, tendo
maior demanda por financiamento da linha de Combate à Pobreza Rural, enquanto o Sul se
destaca com mais projetos da linha CAF. Assim, constataram que apesar do PNCF ter
destinado recursos visando abrandar a questão do acesso a terras nas regiões brasileiras, ainda
não é uma política que tenha resolvido o problema de forma definitiva e que de fato são
necessárias alternativas adicionais para solucionar essa questão.
Galindo et al. (2015) analisaram os impactos do PNCF no valor bruto da produção
agropecuária nas cinco macrorregiões brasileiras. Os resultados revelaram que o programa
não registrou impacto quando foram considerados todos os tipos de trabalhadores rurais,
porém no caso de grupos mais homogêneos de produtores, o PNCF indicou impacto positivo
entre o grupo de trabalhadores rurais de mais baixos recursos (PRONAF A).
Por fim, o estudo de Sá et al. (2015), realizado no município de Serra Talhada – PE,
mostrou que alguns assentados foram beneficiários de programas que antecederam ao PNCF,
sendo que 71% participam do PNCF, 23% do Banco da Terra e 6% do antigo Cédula da
Terra. Esses dois últimos estão relacionados às associações formadas antes de 2003. Apesar
das precárias condições de educação e saúde, tais autores verificaram que o PNCF tem sido
um programa essencial para a região, uma vez que, em conjunto com outros programas
governamentais, tem propiciado melhoria na renda familiar e na qualidade de vida do
agricultor associado beneficiário.
Dessa forma, o presente estudo colabora para um melhor entendimento acerca não só
do PNCF, como também da questão agrária brasileira como um todo, uma vez que traz um
retrospecto abrangente sobre o assunto. Assim, é de suma importância a sua abordagem, visto
que apesar de ser uma temática antiga, ainda é pouco explorada. Com isso, percebe-se a
relevância da pesquisa, pois aborda questões importantes, para diversos segmentos da
sociedade, impulsionando assim uma maior exploração do tema.
1143
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5. Resultados e discussão
Nesta seção, são apresentados e discutidos os dados referentes ao Programa Nacional
de Crédito Fundiário (PNCF) correspondente ao período de 2005 a 2015. Na Tabela 1,
mostra-se a participação das famílias durante esse período considerado. Conforme se observa,
o Nordeste se destaca como a região que deteve o maior número de famílias atendidas pelo
programa, sendo que a participação relativa oscilou durante o período analisado. Em 2005,
parcela majoritária das famílias se encontrava no Nordeste, ao passo que, em 2013, somente
cerca de 20% faziam parte desta região.
Tabela 1 – Participação absoluta e relativa das famílias atendidas pelo Fundo de Terras
Ano Nordeste Demais regiões Brasil
No de famílias % No de famílias %
2005 6.712 70,60 2.795 29,40 9.507
2006 9.027 54,70 7.475 45,30 16.502
2007 8.083 48,50 8.582 51,50 16.665
2008 5.565 48,15 5.992 51,85 11.557
2009 1.776 27,67 4.643 72,33 6.419
2010 3.038 46,48 3.498 53,52 6.536
2011 2.537 41,39 3.592 58,61 6.129
2012 1.066 25,53 3.109 74,47 4.175
2013 392 20,71 1.501 79,29 1.893
2014 609 36,71 1.050 63,29 1.659
2015 921 46,73 1.050 53,27 1.971
Total 39.726 47,86 43.287 52,14 83.013
Fonte: Elaborada pelos autores, com base nos dados do Ministério Desenvolvimento Agrário (2016).
É relevante destacar que, do total de 39.726 famílias atendidas durante o período
analisado, o maior número de famílias assistidas está concentrado no estado do Piauí com
13.727 famílias. Em contrapartida, o estado de Alagoas obteve o menor número de famílias
beneficiadas com apenas 1.789 famílias durante esse período. Em média, o número de
famílias atendidas nessa região foi de 3.611 famílias, representando a região com maior média
de famílias assistidas, que excede em mais da metade a média do Brasil, que foi de 7.043.
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A Tabela 2 exibe o número de propostas em termos absolutos e relativos. Os dados
indicam que a média de propostas para os nove estados do Nordeste foi de 563, sendo a
terceira região com o maior número total e médio de propostas, ficando atrás da região
Centro-Oeste e da região Sul. A maior quantidade de propostas referentes à região Nordeste
ocorreu, em 2008, com 1.141 propostas, já a menor se refere ao ano de 2013 com apenas 83
propostas, que não chega nem a 8% das propostas em termos nacionais.
Tabela 2 – Participação absoluta e relativa do número de propostas do Fundo de Terras
Ano Nordeste Demais regiões Brasil
No de propostas % No de propostas %
2005 376 17,18 1.812 82,82 2.188
2006 543 7,55 6.653 92,45 7.196
2007 692 8,96 7.035 91,04 7.727
2008 1.141 18,87 4.907 81,13 6.048
2009 1.014 19,56 4.171 80,44 5.185
2010 946 23,63 3.058 76,37 4.004
2011 849 25,23 2.516 74,77 3.365
2012 308 10,79 2.547 89,21 2.855
2013 83 7,89 969 92,11 1.052
2014 139 15,67 748 84,33 887
2015 104 12,12 754 87,88 858
Total 6.195 14,98 35.170 85,02 41.365
Fonte: Elaborada pelos autores, com base nos dados do Ministério Desenvolvimento Agrário (2016).
A Tabela 3 informa as áreas da região Nordeste e das demais regiões subsidiadas pelo
Fundo de Terras. Como se percebe, a região Nordeste se destaca com a maior área em
hectares financiada com total de 1.412.348 ha durante o período de 2005 a 2015, obtendo uma
média de 128.395 ha. O Estado com maior área financiada corresponde ao Piauí com 369.587
ha, já o Estado com menor quantidade de hectares financiados se refere a Alagoas com 17.988
ha. A maior quantidade de terras obtidas com o financiamento foi no ano de 2011 com
611.016 ha e a menor em 2013 com 8.541 ha. A quantidade de hectares por famílias para essa
região foi de aproximadamente 35,55.
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Tabela 3 – Contribuição do Fundo de Terras para o financiamento de terras com a
participação do PNCF
Ano Nordeste Demais regiões Brasil
Área (ha.) % Área (ha.) %
2005 141.986 84,90 25.247 15,10 167.233
2006 183.285 73,86 64.868 26,14 248.153
2007 164.943 60,30 108.604 39,70 273.547
2008 120.581 61,56 75.309 38,44 195.890
2009 53.614 54,56 44.657 45,44 98.271
2010 73.241 71,10 29.765 28,90 103.006
2011 611.016 94,46 35.813 5,54 646.829
2012 23.857 16,71 118.945 83,29 142.802
2013 8.541 40,80 12.391 59,20 20.932
2014 12.933 60,83 8.329 39,17 21.262
2015 18.351 65,92 9.489 34,08 27.840
Total 1.412.348 72,59 533.417 27,41 1.945.765
Fonte: Elaborada pelos autores, com base nos dados do Ministério Desenvolvimento Agrário (2016).
A Tabela 4 revela o valor gasto com infraestrutura comunitária (SIC – Subprojeto para
Infraestrutura Coletiva) e o valor gasto com aquisição de terras (SAT – Subprojeto para
Aquisição de Terras). Verifica-se que, para a região Nordeste, os três primeiros anos da série
apresentaram um crescente investimento do valor SIC, em termos absolutos. Isso pode estar
associado ao aumento do número de propostas nesses três anos. O valor gasto total com o SIC
durante o período de 2005 a 2015 foi de R$ 506.809.911, com uma média de R$ 46.073.628,
em que se destaca o ano de 2007 com investimento de R$ 81.705.773 e o menor investimento
ocorreu, em 2013, com R$ 9.322.767. Esse ano também foi marcado pela menor participação
relativa da região Nordeste. O gasto por família foi de aproximadamente R$12.757,64 e
R$ 358,84 por hectares de área.
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Tabela 4 – Participação absoluta e relativa dos valores SIC e SAT
Ano
Valores SIC Valores SAT
Nordeste Demais regiões Nordeste Demais regiões
Absoluta % Absoluta % Absoluta % Absoluta %
2005 62.688.532 84,29 11.684.485 15,71 32.035.562 28,07 82.100.457 71,93
2006 65.459.816 52,75 58.633.901 47,25 109.451.281 98,10 2.114.237 1,90
2007 81.705.773 18,63 356.908.191 81,37 45.562.876 92,40 3.746.546 7,60
2008 75.440.843 24,01 238.772.640 75,99 40.718.940 94,50 2.370.146 5,50
2009 47.475.963 21,32 175.233.225 78,68 13.131.804 96,26 509.765 3,74
2010 52.933.874 28,80 130.892.073 71,20 40.363.091 97,61 986.453 2,39
2011 55.257.189 29,67 131.010.739 70,33 44.733.453 91,15 4.341.373 8,85
2012 22.361.089 12,71 153.514.295 87,29 21.489.914 68,58 9.847.499 31,42
2013 9.322.767 7,62 112.944.353 92,38 14.805.825 40,80 21.480.143 59,20
2014 10.307.147 17,43 48.815.982 82,57 8.866.366 71,32 3.565.986 28,68
2015 23.856.918 32,44 49.674.367 67,56 21.837.760 86,64 3.367.072 13,36
Total 506.809.911 25,65 1.468.715.619 74,35 392.996.872 74,51 134.429.677 25,49
Fonte: Elaborada pelos autores, com base nos dados do Ministério Desenvolvimento Agrário (2016).
Quanto ao valor SAT investido, observa-se que foi de R$ 392.996.872 na região
Nordeste, com média de R$ 35.726,99. Em todos os anos da série, nota-se que parcela
majoritária prevalece na região Nordeste, sendo que o ano com maior investimento foi 2006
(R$ 109.451.281) e com menor investimento foi 2014 (R$ 8.866.366). Ademais, o valor SAT
investido por família foi de aproximadamente R$ 9.892.686 e R$ 278.257,81 por hectares de
área.
6. Considerações finais
Os resultados deste estudo sinalizam que distintos recursos vêm sendo aplicados por
meio do PNCF, visando abrandar a problemática da questão agrária. Dentre as regiões
brasileiras, o Nordeste destaca-se como o de maior demanda por esses recursos, fato que se
deve tanto a alta concentração fundiária, como também ao elevado nível de desigualdades
sociais no campo, o que torna a região mais carente por políticas públicas voltadas a esse
setor.
A região Nordeste lidera a obtenção de Subprojeto de Aquisição de Terra (SAT). Em
relação ao número de famílias beneficiadas, percebe que, ao longo dos anos, vem diminuindo
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gradativamente, o que indica que a política precisa de uma análise por parte dos articuladores
que conduzem o programa, uma vez que a demanda por terra ainda é bastante elevada,
enquanto o número de famílias atendidas vem diminuindo.
No entanto, contata-se que, apesar das falhas na execução, o programa tem potencial
para atenuar essa questão da concentração fundiária, pois se apresenta como um artifício
importante, capaz de reduzir a pobreza, a centralização de terra e renda e as desigualdades
presentes no meio rural.
Levando-se em consideração os resultados obtidos neste estudo, recomenda-se uma
maior atenção no que diz respeito às particularidades presentes em cada região, não
desconsiderando o fato que apesar de ser um programa executado a nível nacional, cada
região deve ser estudada atentando essa heterogeneidade característica do país principalmente
no que se refere à disparidade tão comum entre as regiões Nordeste e Sul. Vale ainda ressaltar
a importância de novos estudos que investiguem políticas inovadoras, ou até mesmo políticas
complementares ao PNCF, visando minimizar essa problemática presente no meio rural.
Referências
BRITO, M. A. Impactos do Programa Nacional de Crédito Fundiário sobre a renda, o
patrimônio e a qualidade de vida no sertão nordestino. 148 p. Tese (Doutorado em
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PERCALÇOS E AVANÇOS DA ASSISTÊNCIA TÉCNICA E EXTENSÃO
RURAL NO BRASIL
MISHAPS AND TECHNICAL ASSISTANCE ADVANCES AND RURAL EXTENSION IN BRAZIL
Bárbara Denise Ferreira Gonçalves Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Administração e Desenvolvimento Rural [email protected]
Tales Wanderley Vital Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE | Professor do Departamento de Ciências Econômicas e do Programa de Pós-Graduação em Administração e Desenvolvimento Rural [email protected]
Grupo de Pesquisa: Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo A história da Extensão Rural no Brasil tem como um dos seus marcos referenciais, o ano de 1948, no qual institucionalizou-se esse serviço que foi impulsionado pela família americana Rockfeller culminando na fundação da Associação de Crédito e Assistência Rural no Estado de Minas Gerais. O contexto dos acontecimentos ao longo do tempo possibilita compreender as importantes mudanças no cenário da extensão rural marcadas pela atuação do Estado, bem como a superação do modelo norte-americano que se instalou, a reestruturação pela qual o país passou e o atual cenário da extensão rural. Nesta perspectiva, este trabalho analisa a trajetória da extensão rural no Brasil no período de 1929 até 2015 através do método histórico, através do qual destaca as transformações ocorridas ao longo do tempo neste importante setor, até chegar à situação atual caracterizada pela política pública vigente voltada para as famílias agricultoras que vivem e trabalham no meio rural. Palavras-chave: Extensão rural; assistência técnica, transformações. Abstract The history of Rural Extension in Brazil has as one of its benchmarks the year 1948, which was institutionalized this service that was driven by the American family Rockfeller culminating in the founding of the Association of Credit and Rural Assistance in the State of Minas Gerais. The context of events over time makes it possible to understand the major changes in the landscape of rural extension marked by state action, as well as overcoming the American model that is installed, the restructuring in which the country has passed and the current extent of scenario rural. In this perspective, this paper analyzes the trajectory of extension in Brazil in the 1929 period 2015 through the historical method by which highlights the changes that have occurred over time in this important sector, to reach the current situation characterized by facing current public policy to farming families who live and work in rural areas. Keywords: Rural extension; technical assistance transformations.
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1. INTRODUÇÃO
Assistência técnica rural é um trabalho de orientação aos agricultores que tem por
objetivo, principalmente, a resolução de problemas relacionados com a produção e a
distribuição de bens, por sua vez, procura melhorar a capacidade produtiva de famílias que
vivem em unidades rurais. Desse modo, a assistência técnica é realizada através da extensão
rural, um serviço de educação não formal de caráter continuado, que promove processos de
gestão, produção, beneficiamento e comercialização dos produtos e dos serviços
agropecuários (ASBRAER, 2012).
Extensão rural significa o ato de levar ou transmitir conhecimentos de sua fonte
geradora ao receptor final, o público rural. Trata-se de um processo educativo de comunicação
de conhecimentos de qualquer natureza, sejam conhecimentos técnicos ou não. Neste caso, a
extensão rural difere conceitualmente da assistência técnica pelo fato de que esta não tem,
necessariamente, um caráter educativo, pois visa somente resolver problemas específicos,
pontuais, sem capacitar o produtor rural. E é por ter um caráter educativo que o serviço de
extensão rural é, normalmente, desempenhado pelas instituições públicas de Assistência
Técnica e Extensão Rural – ATER, organizações não governamentais, e cooperativas, mas
que também prestam assistência técnica (PEIXOTO, 2008).
O principal objetivo dos serviços de ATER é melhorar a renda e a qualidade de vida
das famílias rurais, por meio do aperfeiçoamento dos sistemas de produção, do mecanismo de
acesso a recursos, serviços e renda, de forma sustentável. Na grande maioria das vezes estas
ações consistem em visitas técnicas para identificar as necessidades e potencialidades de cada
família rural produtora a fim de aprimorar os sistemas de produção, orientar o uso de recursos
de forma sustentável (MDA, 2016).
Os serviços de ATER são importantes para a agricultura porque potencializam as
atividades produtivas agrícolas voltadas à oferta de alimentos sadios e matérias primas, bem
como apoia estratégias de comercialização estimulando a geração de renda e contribuindo
para o desenvolvimento rural sustentável (DATER, 2007).
A presença da extensão rural no Brasil está em mais de 5.200 municípios, com um
grupo de aproximadamente 16 mil extensionistas no campo, representando uma massa crítica
que leva a extensão rural a cerca de 1,6 milhão de agricultores. Além desse contingente, há
ainda, cerca de 10 mil técnicos de organizações não governamentais, empresas privadas,
cooperativas e servidores de alguns municípios atuando na prestação deste serviço, o que
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soma em torno de 26 mil extensionistas (BRITO, 2015).
Todavia, por estar presente em mais de 5.200 municípios, a extensão rural e os
serviços de assistência técnica abrange, nos vários Estados, uma gama extremamente
diferenciada de realidades, o que ocasiona no grande desafio de visualizar as metodologias de
atuação no campo, tanto no nível regional como no estadual. Em função disso, a sistemática
de planejamento dos serviços de ATER passou a ser fundamentada em diagnósticos
participativos feitos em conjunto com outras parcerias e com a participação direta da
população buscando a superação desse problema (BRITO, 2015). Assim, as ações da ATER
buscam privilegiar as atividades do ser humano por meio da valorização de saberes, populares
e científicos, na construção do conhecimento focando em resultados concretos na vida das
famílias, além de criar instrumentos metodológicos apropriados à realidade (OLIVEIRA e
SILVA, 2010 in SIDERSKY, et al., 2010).
No Brasil, atualmente a extensão rural pública encontra apoio na Política Nacional de
Assistência Técnica e Extensão Rural – PNATER que estipula que os serviços públicos de
ATER deverão ser executados mediante o uso de metodologias participativas, com os seus
agentes atuando como animadores e facilitadores de processos de desenvolvimento rural
sustentável. Ao mesmo tempo, as ações de ATER deverão resgatar e interagir com os
conhecimentos dos agricultores familiares e demais povos que vivem e trabalham no campo
em regime de economia familiar, e estimular o uso sustentável dos recursos locais (MDA,
2015). Contudo, com o propósito de melhor compreender esse processo de ATER é
necessário verificar a evolução da assistência técnica e da extensão rural no Brasil. Este
trabalho procura expor a trajetória dos principais acontecimentos que caracterizam as
dificuldades e os avanços desses serviços.
O problema de pesquisa concentra-se em analisar como o serviço de assistência
técnica e extensão rural foi instalado e evoluiu no Brasil. Nesta perspectiva, o objetivo é
verificar a evolução e transformações ocorridas no serviço de assistência técnica e extensão
rural no Brasil no período de 1929 até 2015.
2. ASPECTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS
Diversos autores têm analisado a trajetória da extensão rural no País, cada qual
enfatizando um determinado aspecto importante desse serviço, bem como do serviço de
assistência técnica rural.
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Peixoto (2008) analisa a extensão rural no Brasil com ênfase na abordagem histórica
da legislação e descreve como a legislação brasileira tratou os serviços de assistência técnica e
extensão rural (ATER) ao longo do século XX e do atual, construindo assim o quadro de
evolução da legislação e das estruturas institucionais de ATER Federal.
Pinto (2009) realiza uma análise da evolução da extensão rural no Brasil a partir da
disseminação de conhecimentos extensionistas no território nacional. Esse autor descreve a
importância da forma como é realizada a extensão rural para aumentar o potencial de
produção no meio rural, coloca que é essencial que os conhecimentos dos extensionistas passe
por um treinamento que inclua educação, método e incentivo.
Oliveira (2013) analisa a extensão rural no Brasil no período de 1948 a 1974 e enfatiza
o extensionismo como uma política nacional com a criação da Associação Brasileira de
Crédito e Assistência Rural – ABCAR. Durante essa trajetória expõe fatos relevantes, entre
eles, a extensão rural atuar como veículo de propagação das técnicas agrícolas aos pequenos
produtores. O mesmo fecha a sua análise com a conclusão de que, ao mesmo tempo em que a
ABCAR foi extinta, em 1974, consolidou-se uma nova orientação para a extensão rural no
Brasil que consistiu em desenvolver um extensionismo que revertesse a desigualdade no
campo considerando que essa desigualdade está muito presente.
Este trabalho procura analisar a trajetória da extensão rural no Brasil a partir dos
momentos históricos que descrevem as transformações pelas quais esse serviço passou. São
apresentadas não apenas as duas fases distintas de implantação da extensão rural no País. A
primeira promovida por iniciativa do Grupo Rockfeller e a segunda pelo Governo Brasileiro,
mas também as principais ações que antecederam a institucionalização desse serviço, ou seja,
as primeiras ações de extensão rural no Brasil, e demais etapas e momentos que construíram a
trajetória até a contemporaneidade.
A perspectiva histórica descreve a evolução do objeto pesquisado através de etapas ou
de sucessões cronológicas. Segundo Rüsen (2007), esse método histórico compreende duas
operações: análise e síntese, esta última relativa aos resultados. A análise, por sua vez, consta
de três operações: a heurística, a crítica e a hermenêutica, cujos significados e aplicações à
assistência técnica e a extensão rural (Figura 1) estão relatadas adiante.
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Figura 1- Etapas dos procedimentos ou operações utilizadas na pesquisa
Fonte: RÜSEN, 2007 (adaptado pelos autores).
Em continuidade, para aplicação do modelo histórico-analítico foram elegidas cinco
etapas:
I. Fase humano assistencialista: A primeira fase da extensão rural no Brasil, que
prevaleceu de 1948 a 1960 apresenta o histórico das ações dos serviços de extensão rural
direcionados para a criação do crédito agrícola e a busca da transformação da agricultura
brasileira no contexto da modernização e desenvolvimento;
II. Fase difusionismo produtivista: A segunda fase da extensão rural no Brasil, que
prevaleceu desde 1964 até 1980, e que possibilitou construir uma análise em cima de um
APLICAÇÃO À PESQUISA
OPERAÇÕES O QUE FAZ
HEURÍSTICA
HERMENÊUTICA
CRÍTICA
A heurística é o primeiro procedimento a ser realizado durante a pesquisa histórica, na qual se levanta as fontes de informação necessárias à análise.
A pesquisa foi realizada a partir de bibliografias especializadas, através das quais se puderam referenciar autores da literatura que abordam o tema em questão.
Trata-se de realizar a crítica das fontes, garimpar as informações que manifestam o passado e avaliar a legitimidade ou não das versões.
Uma vez disposto o conjunto das fontes de informação, realizou-se uma comparação dos documentos e concluiu-se que as informações são verídicas.
Realiza-se a organização do contexto histórico dos fatos interligando-os em uma sequência temporal a fim de dar sentido e responder a questões inicialmente levantadas.
O contexto histórico da instalação e evolução dos serviços de assistência técnica e extensão rural foram organizados em fases que caracterizam a trajetória e interliga os fatos ao longo do tempo.
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momento de grande expansão do serviço de extensão rural no país, ocorrido com a fundação
da Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural – EMBRATER, bem como os
principais planos de desenvolvimento econômico e social, e a grande crise fiscal ao final da
década de 80 e sua relação com o desmantelo da extensão rural na década de 90.
III. Era do humanismo crítico: aborda a nova metodologia de realização da extensão
rural adotada pelos extensionistas, o planejamento participativo entre os assessores e os
produtores rurais. Esse momento, entre as décadas de 80 a 90, foi decisivo nas mudanças
rurais no Brasil e que, serviram de inspiração para a forma de realizar o extensionismo rural
nos dias atuais.
IV. Década de 90: aborda a formalização da extinção da EMBRATER e suas
consequências como o enfraquecimento do extensionismo público no país decorrente da
desarticulação da ATER, e a consequente vulgarização das empresas privadas de ATER.
V. Pós-década de 90 e cenário contemporâneo: discute os aspectos de reestruturação
da extensão rural no país a partir da Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão
Rural.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 - O período entre o final dos anos 20 e os anos 40
Muito antes das ações de institucionalização da extensão rural ter sido implantadas no
Brasil, devido a lideradas como Nelson Rockfeller, conforme foi citado por Ribeiro (2000),
aconteceram as primeiras experiências extensionistas realizadas por professores americanos
em Viçosa (MG), Santa Rita do Passa Quatro e São José do Rio Pardo (SP), onde agricultores
e técnicos foram se familiarizando com esse vocabulário e com essa mentalidade extensionista
e conheceriam, anos depois, uma das mais importantes intervenções públicas para o
desenvolvimento do meio rural, o serviço de Extensão Rural, oficializado em 1948, e que se
expandiu, pouco a pouco, por todo o território nacional. A Tabela 1 a seguir descreve estas
ações.
Tabela 1. Primeiras Iniciativas Extensionistas no Brasil entre os anos de 1920 e 1940
PERÍODO ACONTECIMENTOS IMPORTANTES
O marco inicial no
ano de 1929
A primeira ação institucionalizada de extensão rural no Brasil foi a
Semana do Fazendeiro, realizada pela primeira vez em 1929, pela
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então Escola Superior de Agricultura de Viçosa (atual Universidade
Federal de Viçosa), com diversos cursos de extensão e palestras.
Todavia, embora o evento seja realizado até os dias de hoje e receba
visitantes de todo o país, tem periodicidade anual e o maior impacto
é local e regional (PEIXOTO, 2008).
Inicio da década de
30
Ocupação da área central do país intensificada devido ao
desenvolvimento do setor industrial aliado ao processo de
urbanização com o consequente crescimento da demanda de
alimentos e matérias primas (PEIXOTO, 2008).
Década de 40
Realização de Semanas Ruralistas através de cooperação entre o
Ministério da Agricultura e Secretarias de Estado. Durante tais
eventos, técnicos se deslocavam para municípios do interior e
ministravam palestras (OLINGER, 1996).
Criação de mais de 200 Postos Agropecuários sob a
responsabilidade do Ministério da Agricultura, com a finalidade de
constituírem-se como pequenas fazendas demonstrativas de
tecnologias agropecuárias (OLINGER, 1996).
Fonte: Elaborada pelos autores, 2016.
3.2 - Fase Humano Assistencialista
As origens e histórico das ações dos serviços de extensão rural no Brasil para muitos
estudiosos dividem-se em duas fases. A primeira, chamada humanismo assistencialista, que
prevaleceu de 1948 até o início da década de 1960. Lisita (2005) descreveu a fase humano
assistencialista tendo o extensionista como objetivo aumentar a produtividade agrícola e,
consequentemente, melhorar o bem estar das famílias rurais com aumento da renda e
diminuição do esforço de trabalho necessário para produzir pela absorção de novas
tecnologias. No entanto, embora considerados os aspectos humanos, nesta época os
extensionistas procediam com metodologias que atendiam às necessidades imediatas, mas não
capacitavam os agricultores com consciência crítica para enfrentarem situações adversas.
A Tabela 2 apresenta os principais fatos históricos que marcaram a Fase Humano
Assistencialista.
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Tabela 2. Fase Humano Assistencialista (1948 – 1960)
PERÍODO ACONTECIMENTOS IMPORTANTES
Ano 1948
Criada a Associação de Crédito e Assistência Rural – ACAR,
no Estado de Minas Gerais, destinada a atuar em prol da
melhoria das condições econômicas e sociais da vida rural. A
ACAR foi inspirada no modelo norte-americano e implantada
primeiramente em Minas Gerais, onde recebeu financiamentos
do Governo mineiro e da Associação Internacional Americana –
AIA, pertencente à família Rockefeller (PINTO, 2008).
O Governador de Minas Gerais, Dr. Milton Campos, em 1948,
assinou um acordo com a AIA, estabelecendo a Associação de
Crédito e Assistência Rural – ACAR, o qual teve
prosseguimento no Governo Estadual do médico Juscelino
Kubitscheck (PINTO, 2008).
Ano 1949
Início das atividades da ACAR. Aqui, introduzia-se em todo o
Brasil, a ideia extensionista, com o objetivo de trabalhar pela
promoção do homem rural (LISITA, 2005).
Ao longo das décadas de
50 a 60
Criação das Associações de Crédito e Assistência Rural –
ACAR nos Estados, todas elas eram entidades civis, sem fins
lucrativos, que prestavam serviços de extensão rural e elaborava
projetos técnicos para obtenção de crédito junto aos agentes
financeiros (PEIXOTO, 2008).
Ano 1954
Baseado nos bons resultados obtidos pela ACAR – MG,
Juscelino Kubitschek assinou em 1954 um acordo com o
governo norte-americano e criou no estado de Minas Gerais o
Escritório Técnico de Agricultura – ETA visando uma
cooperação técnico-financeira para execução de projetos de
desenvolvimento rural. Nos anos seguintes diversos escritórios
foram criados nos estados, tendo em muitos casos sido as
origens de ACARs no respectivos estados (PEIXOTO, 2008).
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Surge a Associação Nordestina de Crédito e Assistência Rural –
ANCAR. Devido à criação do Banco do Nordeste do Brasil,
com sede em Fortaleza, em 1954, um grupo de líderes e
autoridades resolveu criar uma entidade nos moldes da ACAR,
porém de âmbito regional, abrangendo os oitos Estados do
Polígono das Secas: Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte,
Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia (OLIVEIRA,
2013).
Ano 1956
O governo nacional de Juscelino Kubitschek propôs a criação
da Associação Brasileira de Crédito e Assistência Rural –
ABCAR, substituta do ETA, juntamente com as ACARs,
formava o então chamado Sistema ABCAR, também conhecido
e tratado na legislação como Sistema Brasileiro de Extensão
Rural – SIBER (PEIXOTO, 2009).
Década de 60
Início da grande transformação da agricultura brasileira:
inserção no contexto da modernização do País acompanhando
os projetos introduzidos pelo Governo de Juscelino Kubitschek
(SILVA, 2000).
Fonte: Elaborada pelos autores, 2016.
Acerca do processo de nacionalização da ACAR, Pinto (2008) relata que o Presidente
Juscelino Kubitschek desejava fazer para o Brasil o mesmo que fizera para o seu estado de
Minas Gerais e assim propôs a sigla ANCAR para a instituição a ser nacionalizada. Em 1956,
Advertido que o “N” da sigla proposta já existia e significava Nordeste, propôs então a de
ABCAR – Associação Brasileira de Crédito e Assistência Rural, assim, estava criado o
Sistema Nacional de Crédito e Assistência Rural.
Em consequência disso, ao final da década de 1950 os serviços de ATER já se
encontravam presentes na metade dos Estados brasileiros, concentrados principalmente nas
regiões Sul e Sudeste (em todos os estados dessas regiões) e expandindo-se para os estados do
Nordeste (CE, PE, BA, RN, PB) e Centro-oeste (GO), tendo- se constituido um importante
aparelho ideológico de educação para o progresso técnico e de subordinação ao modelo de
desenvolvimento urbano-industrial (CAPORAL, 1998).
1159
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Aqui, é importante destacar que, uma vez a extensão rural tendo por objetivo gerar
tecnologias necessárias ao desenvolvimento da agricultura, foi através dos programas de
extensão rural patrocinados pelo Estado, em conformidade com a política de modernização da
agricultura, que a educação rural ganhou ainda mais importância na perspectiva de ter uma
continuidade nas décadas seguintes (FREITAS 2007, In MARTINS, 2013).
Foi ao longo das décadas de 50 e 60 que aconteceu a institucionalização efetiva de um
serviço de assistência técnica e extensão rural no País, que se deu a partir da criação, nos
Estados, das Associações de Crédito e Assistência Rural – ACAR, coordenadas pela
Associação Brasileira de Crédito e Assistência Rural – ABCAR.
De acordo com Hespanhol (1997), foi pretendendo modernizar o setor agropecuário e a
produtividade de suas atividades, que a década de 50 marcada pela criação das ACARs nos
estados brasileiros, impulsionou a elaboração de projetos técnicos para o acesso dos
agricultores ao crédito subsidiado, principal instrumento de política agrícola para as próximas
décadas 1960 a 1980. Na década de 60 a agricultura brasileira passou por uma transformação
muito importante que lhe inseriu no contexto da modernização e do desenvolvimento do país.
3.3 - Fase Difusionismo Produtivista
Para muitos autores, a segunda fase da extensão rural no Brasil, chamada de
Difusionismo Produtivista, prevaleceu desde 1964 até 1980, cujos fatos estão apresentados na
Tabela 3. De acordo com a bibliografia referenciada a esta fase, a mesma é definida como a
fase que orientou as ações dos extensionistas num período de abundância de crédito agrícola
subsidiado baseando-se na aquisição, por parte dos produtores, de um pacote tecnológico
modernizante, com uso intensivo de capital - máquinas e insumos industrializados.
Tabela 3. Fase Difusionismo Produtivista (1964 – 1980)
PERÍODO ACONTECIMENTOS IMPORTANTES
Décadas de 60 e 70
Com base em pacotes tecnológicos foram implantados diversos
projetos, objetivando com isso acelerar o desenvolvimento nacional
a partir da difusão de tecnologias agrícolas (ALVES, 2014).
A partir dos anos 70 Incentivos governamentais dos programas de desenvolvimento
regional (SILVA, 2000).
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Ano 1973
Criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária –
EMBRAPA, responsável pela geração de tecnologias agrícolas com
seus diversos centros e unidades de pesquisas regionais, atuando na
esfera estadual (ALVES, 2014).
Anos entre 1974 -
1979
Durante o Governo de Ernesto Geisel, os serviços foram estatizados,
sendo criado o Sistema Brasileiro de Assistência Técnica e Extensão
Rural – SIBRATER, coordenado pela Empresa Brasileira de
Assistência Técnica e Extensão Rural – EMBRATER. Os serviços
eram executados pelas diversas organizações nos Estados
(MDA/DATER, 2015).
Anos entre 1974 -
1975
Instituição da Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão
Rural – EMBRATER que, por sua vez, incorporou a ABCAR e seu
patrimônio e se tornou o braço forte do Estado no campo
(CAPORAL, 1998).
Criado o Sistema Brasileiro de Assistência Técnica e Extensão Rural
– SIBRATER, durante o Governo de Ernesto Geisel (1974-1979),
coordenado pela EMBRATER com a finalidade de implementar a
Política Nacional de ATER – PNATER (DIESEL, et al; 2008).
Criada a Comissão Nacional de Pesquisa Agropecuária e de
Assistência Técnica e Extensão Rural – COMPATER, no Ministério
da Agricultura, a fim de promover e garantir a articulação entre a
EMBRATER e a EMBRAPA (HESPANHOL, 1997).
Início da década de
80
O Estado brasileiro passou por uma profunda crise fiscal, que teve
impactos diretos nas políticas de modernização agrícola até então
adotadas e, consequentemente, no extensionismo rural (DINIZ e
HESPANHOL, 2013).
Ano 1980
Inicia-se o processo de privatização que persiste até os dias de hoje
(DIESEL, et al; 2008).
Surgimento do movimento social extensionista. Resultou na criação
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da Federação das Associações e Sindicatos dos Trabalhadores de
Assistência Técnica e Extensão Rural (LISITA, 2005).
Fonte: Elaborada pelos autores, 2016.
Para Lisita (2005), essa fase caracterizou-se pela criação de diversos planos e projetos
de desenvolvimento implantados nas décadas de 60 e 70 (SILVA, 2000). A extensão rural
servia como instrumento para a introdução do homem do campo na dinâmica da economia de
mercado, ao passo que buscava mudar a mentalidade dos produtores fazendo com que estes
adotassem as tecnologias agrícolas e consequentemente aumentasse a produtividade na
agricultura. Como consequência dessas ações teve-se um grande salto no serviço de extensão
rural. Em 1960 apenas 10% dos municípios no Brasil contavam com esse serviço tendo
alcançado 77,7% dos municípios em 1980. Todavia, como o papel dos extensionistas era
condicionado ao crédito agrícola, os pequenos agricultores familiares que não tiveram acesso
ao crédito também ficaram à margem do serviço de extensão rural.
Em 1973 foi criada pelo Governo Federal a Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária – EMBRAPA, responsável pela geração de tecnologias agrícolas que os
agricultores pudessem utilizar, além de outros objetivos como enfrentar problemas graves
com produtos do abastecimento, expandir e diversificar as exportações (ALVES, 2014).
Em 1974, segundo Caporal (1998), foi instituída a Empresa Brasileira de Assistência
Técnica e Extensão Rural – EMBRATER que ocasionou em uma grande expansão do serviço
de extensão rural no país. Além disso, uma vez a EMBRATER tendo incorporado a ABCAR,
todas as ACARS nos estados se transformaram em Empresas Estaduais de Assistência
Técnica e Extensão Rural – EMATERs, condição exigida para terem acesso às fontes de
recursos da EMBRATER.
Ainda, entre 1974 e 1979, durante o Governo de Ernesto Geisel, também foi criado o
Sistema Brasileiro de Assistência Técnica e Extensão Rural – SIBRATER onde os serviços
foram estatizados e executados pelas diversas organizações nos Estados; e, no Ministério da
Agricultura, foi criada a Comissão Nacional de Pesquisa Agropecuária e de Assistência
Técnica e Extensão Rural – COMPATER que buscava promover e garantir a articulação entre
a EMBRATER e a EMBRAPA.
A fase difusionismo produtivista, mesmo tendo sido marcada por um poderoso
instrumento de política agrícola, a EMBRATER, mas também é caracterizada pela crise fiscal
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no início da década de 1980 e que impactou nas políticas de modernização agrícola e na
extensão rural, a tal ponto que, segundo Diniz e Hespanhol (2013), ainda sim tenham sido
alcançados grandes êxitos no campo, mas a modernização da agricultura se caracterizou como
um processo extremante desigual onde os grandes produtores e as regiões mais desenvolvidas
foram favorecidos, o que contribuiu para acentuar ainda mais a concentração fundiária e expulsar
milhões de famílias do campo para a cidade.
Em consequência da luta de movimentos na década de 80, no início do século XXI,
iniciou-se uma nova fase da extensão rural no Brasil, quando o Estado retomou seu
compromisso com a extensão rural através de uma nova política pública extensionista que
promoveu avanços tendo o desenvolvimento sustentável como estrutura da prática
extensionista que, utilizando de metodologias participativas, direciona-se à agricultura
familiar e à transição agroecológica (DINIZ e HESPANHOL, 2013).
É importante destacar, conforme Diesel et al (2008), que no começo dos anos 1980,
devido principalmente ao término do crédito agrícola subsidiado, teve início o processo de
privatização que persiste até os dias de hoje. De igual maneira, também surgiu o movimento
social extensionista que resultou na criação da Federação das Associações e Sindicatos dos
Trabalhadores de Assistência Técnica e Extensão Rural.
3.4 - Humanísmo Crítico e a Década de 90
A partir do início dos anos 80 frente a uma crise fiscal, iniciou-se uma nova proposta de
extensão rural no Brasil que, segundo Lisita (2005), buscou se orientar no planejamento
participativo como um instrumento de ligação entre os assessores e os produtores rurais. Essa
fase foi chamada de humanismo crítico na qual as metodologias de intervenção rural
apoiavam-se em princípios participativos que consideravam os aspectos culturais do público
alvo.
Santos (2008) refletiu essa forma de realizar a extensão rural como fundamental no
processo de superação do modelo norte-americano instalado, tendo em vista que a grande
diferença de orientação entre as metodologias de extensão nas fases do difusionismo
produtivista e do humanismo crítico é a questão da participação ativa dos agricultores.
Participação esta que tornou possível realizar as atividades produtivas agropecuárias entre um
meio natural e técnico dos espaços rurais, onde os aspectos culturais dos agricultores
mencionados por Lista (2005) foram essenciais para viabilizar as relações estabelecidas entre
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esses dois meios.
Ao final da década de 80, esta proposta de planejamento levou o país a reordenar as
oportunidades, de forma que as questões como reforma agrária, agricultura familiar, crédito
específico para a reforma agrária e agricultura familiar, e especialização da extensão rural na
agricultura familiar, passaram a ser tratadas pelas políticas públicas com maior intensidade
(ALVES, 2014).
No início da década de 90 tem-se a formalização da extinção da EMBRATER que já
não operava deste a segunda metade dos anos 80, o que refoçou a desarticulação do sistema
oficial de ATER pública. Nesse período foi criada a Associação Brasileira das Entidades
Estaduais de Assistência Técnica e Extensão Rural – ASBRAER e as funções da
EMBRATER foram assumidas pela EMBRAPA (ALVES, 2014).
A Tabela 4 expõe os principais acontecimentos da extensão rural que marcaram a
década de 90.
Tabela 4. Marcos referenciais da Extensão Rural na década de 90
PERÍODO ACONTECIMENTOS IMPORTANTES
Ano 1990
Extinção da EMBRATER . Criada a Associação Brasileira das Entidades
Estaduais de Assistência Técnica e Extensão Rural – ASBRAER. Hoje,
presente em todo o território nacional, por meio de 27 entidades
associadas e ligadas aos governos estaduais (MDA, 2015).
Anos entre 1990
e 1992
No período da gestão do Governo Collor de Mello (1990-1992), a
EMBRAPA assumiu as funções da EMBRATER devido à sua extinção
(ALVES, 2014).
Início da década
de 90
O estado passou por um profundo processo de desmontagem do aparato
de intervenções no meio rural (DELGADO, 2001 In DINIZ E
HESPANHOL, 2013).
Dentre estes processos, destacou-se o término do financiamento à ATER
pública e a consequente extinção do Sistema Brasileiro de Assistencia
Tecnica e Extensão Rural (SIBRATER), o que ocasionou a
desorganização, enfraquecimento e desmonte do extensionismo público
no Brasil (CAPORAL, 1998 In Diniz e Hespanhol, 2013).
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Entre as anos de
1990 a 1993
Em vários Estados do país as EMATERs entraram em uma crise
profunda, pois eram subsidiárias de recursos federais, tendo sido os
repasses cortados integralmente (PEIXOTO, 2009).
Ano de 1994 Criação do Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural –
DATER, no Ministério da Agricultura, do Abastecimento e Reforma
Agrária (PEIXOTO, 2009).
Meados da
década de 90
Retomada de investimentos em extensão rural no Brasil e atuação da
ação extensionista, após o momento mais crítico pelo qual o extensão
pública passou com a retirada da EMBRATER (DEPONTI et al., 2014).
Ano de 1999
A partir da criação do MDA as atribuições legais de ATER passaram a
ser competência dos dois ministérios: MDA e Ministério da Agricultura
e Abastecimento (PEIXOTO, 2009).
Fonte: Elaborada pelos autores, 2016.
A extensão rural passava a vivenciar uma crise sem precedentes em sua história, e que
somente no início do século XXI viria a ser revertida, mas até lá os municípios e os estados
mais pobres do país foram afetados com maior intensidade (JORNAL BRASIL DE FATO,
2014). O reflexo da desarticulação do sistema oficial de ATER pública no país provocou
situações de extinção de empresas, e inclusive a fusão entre a extensão com pesquisa como
forma de sobrevivência da extensão rural. Tal situação foi uma das responsáveis por precipitar
o ingresso e a maior participação de outros agentes não estatais na extensão rural, como as
organizações não governamentais – ONGs, propiciando a vulgarização dos serviços privados
de ATER (DEPONTI et al.; p. 244).
3.5 – Pós-Década de 90 e Cenário Contemporâneo
Somente no início do século XXI, quando o Govervo Federal passou a reassumir
compromisso com a ATER é que aconteceu um processo de reversão da crise enfrentada nas
duas últimas décadas. O movimento de repensar instituído em meados da década de 1980,
caracterizado pela fase humanismo crítico, de acordo com o MDA (2015), inspirou a criação
de uma nova política pública extensionista e propôs como eixo orientador da prática
extensionista o desenvolvimento sustentável centrado no uso de metodologias participativas e
voltado à agricultura familiar e à transição agroecológica. Inicia-se assim, uma nova fase da
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extensão rural no Brasil.
O Censo Agropecuário 2006, que se constitui a base de dados mais atualizada e
completa que se tem disponível sobre a agricultura e as atividades agropecuárias no Brasil,
destaca o grande salto no investimento em extensão rural acontecido em sete anos, 2003 a
2009, conforme descrito na Tabela 5, o que ajuda a compreender as relações entre a mudança
nomeio rural nesta última década e, a contribuição da ação extensionista.
Tabela 5. Pós-Década de 90 e Cenário Contemporâneo
PERÍODO ACONTECIMENTOS IMPORTANTES
Metade dos
anos 2000
O efeito e papel da ação extensionista tornaram-se mais visíveis devido a
dois motivos: i) aumento do número de extensionistas em ação e; ii)
ampliação do orçamento público destinado à extensão rural (DEPONTI, et
al; 2008).
Ano de 2002
27 instituições Estaduais de ATER constituídas e funcionando; 495 ONGs
ligadas ao campo; 498 instituições como STR, federações, MST e
Associações; 867 cooperativas de produção agropecuária; 397 instituições
de ensino e pesquisa; 131 cooperativas de crédito; 78 agroindústrias. Ao
total, havia 1.031 entidades de desenvolvimento rural (Cooperação Técnica
MDA-FAO em 2002).
Ano de 2003
Abertura da elaboração do Documento que lançou a PNATER, construída
em parceria com as organizações governamentais e não governamentais de
ATER e a sociedade civil organizada (MDA, 2015).
Ano de 2004
Lançada em maio de 2004, a PNATER definiu as diretrizes para a
elaboração do Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural
– PRONATER, elaborado em 2005 (PEIXOTO, 2009).
Entre os
anos 2002 a
2005
Entidades de Desenvolvimento Rural: em 2002 havia 1.031 entidades de
desenvolvimento rural. Esse número passou para 1.732 em 2005, um
crescimento de 70%. Associações de Produtores Rurais: passou de 24.896
associações em 2002 para 34.830 em 2005, um aumento de 40% (CANAL
RURAL, 2014 In Pesquisa do IPEA).
Anos entre Referente ao orçamento financeiro destinado à extensão rural, os
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2003 a 2009 investimentos passaram de R$ 42,00 milhões em 2003 para R$ 482,00
milhões em 2013, correspondendo a um crescimento de mais de 1.000% em
sete anos (DEPONTI, et al; 2008).
Ano 2010
Criação da Lei de Assistência Técnica e Extensão Rural (Lei nº 12.188/10)
que passou a ser o novo e renovado marco legal da Política Nacional de
Assistência Técnica e Extensão Rural – PNATER (DEPONTI, et al; 2008).
Ano 2013
Criação da Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural –
ANATER (MDA, 2014).
O Governo contava com 757 entidades de ATER registradas no MDA, o
mesmo lançou 17 chamadas públicas para contratação de serviços para
atender mais 161,4 mil famílias em 2014, totalizando R$ 260,9 milhões
(MDA, 2014).
Ano 2014
Investimento total de R$ 18,9 milhões para atender, com serviços de ATER,
cinco mil famílias quilombolas em situação de extrema pobreza do Amapá,
Bahia, Mato Grosso, Minas Gerais e Pará (NAVARO, 2014).
Ano 2015
230 mil novas famílias de agricultores familiares foram atendidas com
assistência técnica focada na produção sustentável de base agroecológica e o
início de um processo de diálogo com os jovens rurais, organizado pela
Confederação Nacional dos Trabalhadores e das Trabalhadoras na
Agricultura, teve como resultado um conjunto de medidas como a ATER
para 22,8 mil jovens de 23 estados brasileiros, Cooperativas e Associações
da Juventude Rural com foco na agroecologia e na questão de gênero
(MDA, 2015).
Fonte: Elaborada pelos autores, 2016.
As Associações de assistência técnica e extensão rural (ATERs) foram recriadas além da
ampliação das formas de extensão para modelos de empresas público-privadas, como no Rio
Grande do Sul – MG e em alguns estados do Nordeste, o que permitiu a contratação de novos
extensionistas. Em 2003, o governo federal passou a ter uma preocupação com a reorientação
e a redefinição da extensão rural, dando abertura à elaboração do documento que lançou, em
2004, a Lei de ATER ,Lei nº 12.188/10 (DEPONTI et al., 2014 p. 442 In SCHNEIDER et al.,
2014).
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4. CONCLUSÃO
Após ter sido praticamente extinta na década de 90, a extensão rural pública hoje
ensaia uma nítida reestruturação, encontrando apoio na Política Nacional de Assistência
Técnica e Extensão Rural elaborada a partir dos princípios do desenvolvimento sustentável, o
que propicia a oportunidade, neste inicio de século, de solidificar uma nova fase de
fortalecimento deste importante serviço de modernização da agricultura brasileira.
A busca da transformação da agricultura no país no contexto da modernização e
desenvolvimento com uma grande expansão do serviço de extensão rural, samados à visão
humanista, representa a perspectiva de uma nova forma de realização da extensão rural que
está sendo possível de ser colocada em prática, fortalecida por dois eixos orientadores: i) o
eixo vinculado ao desenvolvimento sustentável que apesar das limitações institucionais, tenta
transformar a extensão rural adequando cada vez mais às muitas realidades regionais e locais;
e; ii) o eixo das novas metodologias e práticas extensionistas, que almejam a transformação
no meio rural tendo como elo a assistência técnica rural, o conhecimento e a participação dos
agricultores e suas famílias.
O serviço de ATER instalado no país passou por diversas fases desde o modelo norte-
americano inicialmente instalado. O caminho pela via pública pelo qual tem passado esse
serviço, foi inicialmente de apoio, depois de negação, tendo nos últimos anos voltado a ter
prioridade dentro da política publica de modernização da agricultura.
As mudanças rurais no país ganham uma nova visibilidade e permite aprofundar a
compreensão de debilidades e potenciais. Pode-se afirmar que de concreto deve-se reconhecer
um importante avanço com a chegada deste serviço extensão e de outros serviços, a grupos
sociais mais vulneráveis e raramente contemplados, dentre eles destaca-se os grupos de
mulheres, jovens, populações tradicionais como descendentes de quilombolas, aquicultores
familiares.
Por outro lado, em se tratando da pesquisa, universidades e movimentos sociais, têm
procurado superar o desafio de criar estratégias para colocar em prática metodologias
participativas de ATER, que incluam os agricultores familiares desde a concepção até a
aplicação das tecnologias, transformando-os em agentes de suas próprias transformações ao
invés de meros “receptores” de informações.
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POLÍTICAS PÚBLICAS E A SECA: UMA ANÁLISE SOBRE O SEMIÁRIDO
NORDESTINO
Silvia Regina Santos de Medeiros - Bacharelanda em Administração Ufersa Email: [email protected] Tassiana Moraes Araújo Albertin -Bacharelanda em Administração Ufersa Email: [email protected] Luiza Maria Alves da Silva - Bacharelanda em Administração Ufersa Email: [email protected] Elisabete Stradiotto Siqueira – UFERSA Email: [email protected]
Grupo 3. Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo O objetivo do artigo é analisar como as políticas públicas tem tratado a questão da seca no
Nordeste considerando a perspectiva de diminuir as consequências do seu impacto na região e
na vida de seus moradores. Este trabalho está apoiado em revisão bibliográfica, identificando
as soluções e avaliando seus resultados. A pesquisa evidenciou lógicas e os pensamentos dos
principais intelectuais, que deram suporte à essas políticas, objetos de análise e discussão. As
políticas públicas estão sendo desenvolvidas com a finalidade de resolver e diminuir os
impactos causados pela seca tem duas vertentes distintas, a primeira que enfatiza o combate à
seca e a segunda que trata o convívio com ela. Os dados indicam que a questão da seca é
cultural, econômica, social e política. Muitas das políticas foram desenvolvidas favorecendo
grupos sociais específicos, sendo que os moradores atingidos nem sempre foram os principa is
beneficiados.
Palavras-chave: seca - nordeste - políticas públicas.
Abstract
The objective of this article is to analyze how public policy has addressed the issue of drought in the
northeast considering the prospect of reducing the consequences of their impact on the region and the
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lives of its residents. This work is supported by literature review, identifying solutions and evaluating
their results. The research showed logic and thoughts of the main intellectuals who supported the these
policies, objects of analysis and discussion. Public policies are being developed in order to address and
reduce the impacts caused by drought has two distinct parts, the first which emphasizes combating
drought and the second one is living with her. The data indicate that the issue of drought is cultural,
economic, social and political. Many of the policies were developed favoring specific social groups, and
residents affected were not always benefit the most.
Keywords: dry - northeast - public policy.
1. Introdução
Este artigo é resultado de pesquisas bibliográfica sobre um dos fenômenos naturais
frequente em algumas regiões que sofrem a falta ou irregularidade de chuva: a seca. Este
fenômeno, provoca efeitos tanto em dimensões econômicas, sociais, técnicas e políticas. No
Brasil afeta, com mais veemência, a população nordestina, mas também está presente na na
forma de estiagem região sudeste (SILVA, 2006).
Entre 1991 e 2012, o Brasil tem sido atingido pelas secas que assolaram alguns de seus
estados como demonstra o gráfico 1. Na região Nordeste esse fenômeno é recorrente e atinge
mais duramente a população, pois tratar-se de uma região onde prevalece a continuidade das
altas temperaturas e a falta e/ou má distribuição de chuvas há séculos. Apesar de enfrentarem
este fenômeno rotineiramente, os habitantes e representantes do local não se adaptam a
convivência com a seca, sendo que interesses de grupos políticos tem utilizado as políticas
públicas para beneficiar alguns grupos sociais em detrimentos de outros que detém o poder
econômico (BARROS, 2013).
Gráfico 1 - Registros de ocorrências de estiagem e seca em todo o Brasil segundo
S2ID - entre 1991 e 2012
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Como demonstra o gráfico 1 a maior parte de registros concentrada nos anos 2012 (2489
registros), 2005 (1874 registros), 2002 (1226 registros) e 2011 (1480 registros).
Diante da inconformidade e da continuidade da seca, há centenas de anos o Estado
interviu, promovendo a criação das denominadas Políticas Públicas: um conjunto de ações do
governo que irão produzir efeitos específicos (SOUZA, 2006).
Diante das exposições acima, o objetivo do ensaio é analisar as políticas públicas de
combate às secas implementadas no Nordeste ao longo dos séculos XX e XXI, por meio de
leituras acerca do assunto, bem como investigar se essas políticas conseguiram concretizar seus
objetivos.
2. Seca x Desenvolvimento Econômico
A ocupação do semiárido nordestino deu-se com a ocupação de grandes fazendas, que
tinha como ponto forte a criação de gado. Com isso surgiu a grande indústria charque, que até
hoje faz parte da culinária nordestina (SILVA, 2006). Outras culturas também marcaram o
semiárido, como a cana-de-açúcar que segundo (CENTEC, 2004) foi à matéria-prima que
alimentou a mais importante indústria no País durante o largo período em que o açúcar
brasileiro superava a produção das outras regiões canavieiras do mundo.
Diante dos problemas com localização e transporte a agricultura de subsistências tornou-
se uma alternativa de desenvolvimento para o semiárido. Um pouco mais tarde, no século
XVIII, surgiu cotonicultura que conseguia suportar os períodos de estiagem vividos pela região.
Contudo, quando despertou interesse das exportações, o algodão, que antes era uma boa fonte
de renda para os pequenos produtores, passou a gerar a exploração dos mesmos por parte dos
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grandes latifundiários que detinham as intermediações comercias com as empresas interessadas
no produto (SILVA, 2006, p. 41).
Em decorrência dos declínios dos ciclos produtivos e incidente exploração, a partir do
século XIX o Nordeste passou a vivenciar um papel de dispersor de população, passando a ter
altos índices de emigrações, em função da carência de infraestrutura e de projetos de
desenvolvimento que incluam as camadas mais populares, e essa situação foi agravada pelas
secas sazonais e a grande concentração fundiária (PACIFICO, 2015).
Como pode-se perceber o semiárido foi marcado por ciclos de culturas, que tiveram seus
declínios, e que acabaram por beneficiar os grandes latifundiários da região, que se
aproveitavam dos pequenos produtores (Mapa 1). As oligarquias sertanejas, atribuiam a seca o
fator de atraso do desenvolvimento econômico, e estas ainda tiraram proveito dessa situação,
pois beneficiaram-se das ações governamentais voltadas para a assistência a períodos de seca.
Mapa 1 – Economia do século XVIII
Fonte : Geografalando, 2013.
Com o declínio da cana-de-açúcar, o Nordeste perdeu o posto de região concentradora
de poder e riquezas, mas os engenhos de cana deixaram um legado de práticas políticas que
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resistem até os dias atuais, com a imposição de interesses de famílias tradicionais e grupos
ligados ao agronegócio, gerando assim a concentração de terras e de riquezas (SILVA, 2016).
No que tange a cultura do algodão, o aumento da procura por parte do mercado externo
aumentou a exploração dos pequenos produtores pelos grandes fazendeiros que atuavam como
intermediários comerciais das empresas (SILVA, 2006, p. 42). As estiagens contribuíram para
o seu declínio, contudo a insegurança dos sertões também perturbou a evolução agrícola. Em
sua obra Djacir Menezes (1970) destaca que além dos fenômenos climáticos, as disputas pelas
concessões de sesmarias ocasionaram disputas violentas entre famílias e proprietários de terras
nordestinas.
Sendo assim, as políticas que vieram a ser desenvolvidas no nordeste brasileiro, bem
como os órgãos responsáveis pelo cumprimento dessas políticas, acabariam por se sujeitar as
subordinações de grandes políticos e latifundiários da região. O DNOCS, por exemplo, segundo
(FURTADO, 1997, p. 86):
As máquinas e equipamentos do DNOCS eram utilizados por fazendeiros ao seu bel-prazer. Nas terras irrigadas com água dos açudes construídos e mantidos pelo governo federal, produzia-se para o mercado do litoral úmido, e em benefício de alguns fazendeiros que pagavam salários de fome.
Esse cenário tem produzido na região um quadro de desigualdades sociais,
caracterizando a região como lugar de atraso econômico e social, contudo, questiona-se até que
ponto essa é uma estratégia de manutenção do poder das oligarquias locais que sobrevivem
desse processo de exploração.
3. Políticas Públicas
Muitas são as ações propostas pelos representantes políticos direcionadas a sociedade
que são denominadas políticas públicas, e tem como finalidade prevenir, combater e/ou
diminuir algum problema reincidente.
O conceito de “políticas” está ligado a estratégias governamentais direcionadas a um assunto ou problema com o intuito de solucioná-lo. São consideradas “públicas”, quando essas ações são comandadas por integrantes estatais, com o objetivo de alterar as soluções sociais existentes (GONÇALVES, 2012, p.13).
Com a democratização do Estado e a evolução da sociedade, as preocupações passaram
a ganhar novos focos. A segurança pública não é mais o foco exclusivo do Estado, agora ele
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passa a se comprometer também com ações que garantam o bem-estar e o bem comum da
sociedade. E é justamente pensando em atingir o bem-estar da sociedade e o bem comum, que
o Estado lança seu instrumento de Políticas Públicas (GONÇALVES, 2012, p. 14).
Políticas públicas são as ações, práticas, diretrizes fundadas em leis e empreendidas como funções de Estado por um governo, para resolver questões gerais e específicas da sociedade (HEIDMANN, 2006, p.29).
As políticas públicas são criadas com a finalidade de atender a demanda que emergem da
sociedade, e é um compromisso público expresso para atuar em uma determinada área a longo
prazo. De fato, todos nós somos ou já fomos incluídos em alguma política pública. Dessa forma,
mesmo existindo várias definições para Políticas Públicas, todas deveriam conduzir ao mesmo
raciocínio: decisões de governos, voltadas para o bem-estar da sociedade.
Importante termos a consciência de que a prática de uma determinada política pública
afetará a vida de todos, e representa naquele momento uma grande preocupação do governo e
seu esforço em mudar/evoluir naquela situação (CORTEZ, 2012, p. 16).
Contudo o Estado, como gestor das políticas públicas não é um espaço neutro, portanto,
tais políticas estão sujeitas as coalizões de poder que disputam o espaço público e seus recursos.
3. 1 Políticas públicas desenvolvidas no Nordeste ao longo dos séculos XX e XXI
A seca no Nordeste só ganhou notoriedade depois da “Grande Seca”, umas das mais
graves e lembradas, período marcado pelos anos seguidos sem chuvas, com perdas de
plantações, morte das criações e muita miséria. Durante os anos de 1877 morreram centenas de
milhares de pessoas consequentes da extrema seca. A partir daí, as políticas públicas de
secas iniciaram seus trabalhos no nordeste (SILVA, 2006).
As políticas públicas que tratam de alguma forma a questão da seca podem ser datadas
desde a década de 1970, conforme demonstra a (Tabela 1).
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As primeiras ações do governo sobre estas políticas são datadas na década de 10, com a
criação do IOCS (Inspetoria de Obras Contra as Secas), na gestão de Nilo Peçanha. Ao longo
das décadas, outros órgãos surgiram e outros foram extintos.
Mais tarde, outras iniciativas também foram tomadas, várias delas incentivadas
diretamente pelo Estado, como a criação do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), após
elaboração do Planejamento de Combate às Secas (BRASIL...,1953), cujo objetivo era
redimensionar ações de enfrentamento contra a seca no Nordeste. Contudo, o BNB não obteve
muito sucesso, acabou sendo capturado pela oligarquia algodoeira da região, deixando de
atender a pequenos produtores. Sua atuação foi modificada com a criação da SUDENE, que
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passou a fazer financiamentos a longo prazo e dar suporte as políticas de desenvolvimento do
Nordeste (SILVA, 2006)
Na década de 1950, com o agravamento da seca, foi criado o Grupo de Trabalho para o
Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), que visava a industrialização da Região Nordeste, com
o modelo de substituição de importações. Este desenvolveu vários estudos entre eles definiu a
necessidade de uma reorganização da agricultura do semiárido, gerando um reordenamento
agrário e redimensionamento dos investimentos, ferindo os interesses das oligarquias
nordestinas. Outra constatação do GTDN foi que as ações governamentais tanto de curto como
de longo prazo não estavam atendendo as expectativas do combate às secas. O que estava
acontecendo era retenção da população, devido à doação de alimentos no período de estiagem;
bem como, incentivo a pecuária com a implementação das barragens (através do DNOCS), e
mais uma vez beneficiava somente os grandes latifundiários que detinham rebanhos
exorbitantes de bovinos (SILVA, 2006).
Após os diagnósticos e recomendações do GTDN, o governo federal propôs a criação da
SUDENE, esse órgão deveria atuar de forma a tornar mais autônomo os Estados da região
Nordeste. Isso provocou grande insatisfação por parte da sociedade oligárquica nordestina, que
já estava aborrecida com o diagnóstico e propostas do GTDN (SILVA, 2006).
Silva (2006) afirma que mesmo com conspirações contra o sua atuação, a SUDENE teve
um grande papel no desenvolvimento das políticas publicas no semiárido nordestino. Sua
atuação foi primordial para promover a aglutinação e a formação de uma capacidade técnica e
política especializada para a condução dos programas regionais, fazendo parcerias com
instituições de ensino, promovendo cursos de capacitação e apoio a pesquisas sobre o Nordeste,
com a intenção facilitar o desenvolvimento de técnicas apropriadas para os recursos nordestinos
e inserção do Nordeste nos mercados nacional e internacional.
A SUDENE tornava‐se um marco a respeito do fenômeno das secas no Nordeste, pois
não creditava ao clima a condição econômica e social da região, via esses problemas como
resultados. Com isso, gerou um paradigma completamente oposto em relação aos outros órgãos
que tratavam de ações intervencionistas (SILVA, 2006).
Outra iniciativa que deve ser destacada foi à implantação do Centro de Pesquisa
Agropecuária do Trópico Semiárido (CPATSA), criada em 19975 em vínculo com a Empresa
Brasileira de Agropecuária (EMBRAPA). Desde sua criação a CPATSA tem desenvolvido
estudos e pesquisa voltados para a criação de sistemas agrícolas mais adequados para o
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semiárido e que em consideração a sua sustentabilidade. Os seus projetos priorizam o
desenvolvimento de sistemas de produção para áreas irrigadas, e para áreas de sequeiro e de
manejo da caatinga. No que tange a pecuária o centro vem desenvolvendo esforços no sentido
identificar sistemas de produção animal que sejam eficazes e adequados para a realidade da
região. Tem sido realizados estudos sobre o potencial forrageiro da caatinga, tendo destaque
para as alternativas de suplementação alimentar de animais em período de seca (Figura 1).
Figura 1 - Palma forrageira como fonte de alimentação para a caprinocultura.
Fonte: Embrapa, 2015.
O manejo da caatinga é das alternativas que ao poucos estão substituindo essas políticas
conservadoras que visam engrandecer grandes latifundiários. Duque (2004, apud SILVA, 2006)
faz críticas ao desenvolvimento voltado para os modelos ortodoxos, cujos objetivos não estão
voltados para satisfazer os anseios de populações pobres que habitam regiões atrasadas. O tipo
de desenvolvimento ideal seria aquele que promovesse a elevação de renda e padrão de vida
dos nordestinos (SILVA, 2006, p. 123).
Ainda falando de Duque, o mesmo propõe que os recursos naturais devem ser entendidos
como uma grande vantagem e combinados com os avanços tecnológicos. A sustentabilidade
depende de uma mudança de mentalidade em relação às suas características ambientais e
mudanças nas práticas e usos desses recursos naturais (SILVA, 2006, p. 123).
Outra proposta defendida por Duque é a cultura xerófila como forma de gestão do
ambiente natural. Devendo ser acompanhada de uma série de um sistema que promova o
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manejo adequado do solo, o uso apropriado da água das chuvas, dentre outros aspectos ligados
ao uso adequado da caatinga (SILVA, 2006, p. 126).
Contudo essas políticas ainda estão aos poucos sendo incorporadas, pois vão de encontro
com os objetivos de grandes grupos políticos ligados as grandes oligarquias do Nordeste.
4. Desenvolvimento de um sertão pobre
Desde o final do século XIX a irrigação tem sido tratada como a capacidade de
transformar o semiárido e promover seu desenvolvimento. Devido seu clima ser favorável à
produção de algumas culturas irrigadas, o semiárido tornou-se um potencial competitivo capaz
de atender as exigências do mercado interno e, principalmente, do externo, como a Europa e
América do Norte (SILVA, 2006, p. 68).
Devido a tentativas fracassadas de implantação da irrigação nas bacias dos açudes
públicos, a agricultura irrigada passou a ser a principal prioridade do governo. No final de 1960
foi criado o Programa Plurianual de Irrigação (PPI), durante sua primeira fase priorizou a
manifestação da iniciativa privada para a irrigação e drenagem. Nesse período começou-se a
implantar os chamados perímetros irrigados definidos como:
Projetos públicos de irrigação cuja infraestrutura é projetada, implantada e operada, direta ou indiretamente, sob a responsabilidade do Poder Público. Podem ser destinados à exploração agrícola de interesse social predominante – lote familiar – ou mistos, de interesse social e empresarial (SEMARH, 2016).
Além dos perímetros, açudes e barragens foram construídos pelo DNOCS, com o objetivo
de fomentar a agricultura irrigada. O investimento no setor agrícola permitiu a criação de 14
pólos de desenvolvimento com agricultura irrigada no Nordeste, constituindo um novo modelo
produtivo no semiárido (SILVA, 2006, p. 71).
Nos polos de fruticultura irrigada, as atividades de subsistência foram substituídas pela
agroindústria com produção voltada para o exterior, com uso de tecnologia avançada e trabalho
assalariado. Devido a mão de obra barata no semiárido e incentivos por parte do Estado, a
instalação de diversas multinacionais no Nordeste não apresentou obstáculos. Essas empresas
apesar de certa forma, alavancar a economia das regiões onde se instalaram, promoveram
diversos impactos ambientais. Estudos apontam que a irrigação tem provocado à salinização
dos solos, para Christofidis (2001, p.182):
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No semiárido brasileiro, as informações das entidades publicas que têm responsabilidade pela irrigação, CODEVASF e DNOCS, situam a área salinizada decorrente da irrigação em 5.500 ha.
A salinização é provocada pela irrigação, outros fatores também são afetados, como
aumento da erosão dos solos, degradação de mananciais, além de prejuízos socioeconômicos.
4.1 Novos olhares para o semiárido
A convivência com a seca tem sido uma das alternativas propostas para promover o
desenvolvimento sustentável no semiárido. Acredita-se que combater um fenômeno, a seca, não
é a melhor alternativa, o desenvolvimento de políticas públicas que viabilizem essa convivênc ia
do homem com o meio ambiente em que está inserido é o ideal. O avanço da biologia,
principalmente da ecologia, permite esse reconhecimento da reciprocidade entre os diversos
seres vivos como condição de equilíbrio (SILVA, 2006).
Atualmente pode-se perceber os avanços relacionados às tecnologias hídricas
consideradas adequadas para o semiárido. Essas tecnologias valorizam a captação e
armazenamento da água por meio de cisternas, pequenas barragens e outros equipamentos de
uso familiar e comunitário; além da produção de mudas para recuperação de matas ciliares,
formação para manejo de recursos hídricos, evitando desperdício de poluição, e para o manejo
solo evitando o assoreamento. Não obstante o uso do potencial forrageiro da caatinga na
alimentação de animais (SILVA, 2006, p. 68).
Estudiosos defendem um desenvolvimento que ao mesmo tempo promova a convivênc ia
como semiárido:
[...] promover o desenvolvimento fundado na convivência com a semi-aridez e criar oportunidades de inserção produtiva eficaz para os seus habitantes (CARVALHO et al, 2013, P. 14).
Algumas alternativas são propostas, entre elas: atividades agrícolas irrigadas e de
sequeiro (agave, carnaúba) e melhoria da pecuária de pequenos animais (caprinos e ovinos),
junto à pesca interior, constituem possibilidades econômicas efetivas (SILVA, 2006).
A sustentabilidade é vital para recuperação e conservação dos recursos naturais do
semiárido. Tecnologias e práticas que envolvam o manejo desses recursos requerem uso
apropriado, levando em consideração as potencialidades e fragilidades da região. O uso de
policulturas ao invés de monoculturas, essa combinação é dos segredos para a convivência com
os ecossistemas.
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Um dos grandes desafios do semiárido é essa combinação dos valores e princípios da
convivência com a viabilização das atividades econômicas necessárias para um
desenvolvimento voltado para a sustentabilidade. É preciso amadurecer a ideia de que não é o
ambiente que deve ser modificado ou adaptado as atividades produtivas; mas as práticas que
adequar-se a ele. Para garantir a perpetuidade, a população necessita aprender a viver em
harmonia com o seu meio, buscando adaptar-se ao seu habitat, e não promover uma relação de
estranhamento ou combate (SILVA, 2006, p. 124).
5. Considerações finais
Diante do que discorrido ao longo do ensaio, percebe-se que as políticas públicas de
combate às secas, desenvolvidas no semiárido nordestino, ainda não foram capazes gerar os
resultados esperados desde sua implantação. Provavelmente, seu insucesso esteja atrelado aos
conflitos de interesses, sobretudo entre as oligarquias nordestinas, e as formas como o
fenômeno e visto pelo Estado.
O mais interessante seria promover políticas que almejassem a convivência do homem
com a seca, e não a promoção de um combate entre ambos, pois a seca é um fenômeno natural
que persiste a séculos do semiárido. Os avanços dessa perspectiva de pensamento ainda são
tímidos, contudo, ao menos já estão saindo, aos poucos, do papel e indo para a prática em
algumas regiões do semiárido.
6. Referências
BARROS, J. N. Técnicas sobre as secas: uma análise contemporânea de poder e conflito social no Nordeste. Anais: Encontros Nacionais da ANPUR, v. 15, 2013.
CARVALHO, M.M., BUENO, R.C.O.de F., CARVALHO, L.C., Godoy, A.F., FAVORETO, A.L. Importância econômica e generalidades para o controle de telchin licus drury, 1773 (lepidoptera: castniidae) em cana-de açucar. Enciclopédia Biosfera, Centro Científico Conhecer, v.9, n.17; Goiânia, 2013.
CHRISTOFIDIS, D. Olhares sobre a politica de recursos hídricos no Brasil: o caso da Bacia do Rio São Francisco. 2001. 430 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Sustentável) – Universidade de Brasília, Centro de Desenvolvimento Sustentável, Brasília, DF.
GONÇALVES, H.A.C. Políticas públicas e aspectos legais . Pós-Graduação Planejamento e Gestão de trânsito - EaD. Maringá-PR, 2012.
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HEIDMANN, F. G. Do sonho do progresso às políticas de desenvolvimento. IN: HEIDMENN, F. G.; SALM, J. F. Políticas públicas e desenvolvimento. Brasília: UnB, 2006. p.23-39.
MENEZES, D. O outro Nordeste: ensaio sobre a evolução social e política do Nordeste da" civilização do couro" e suas implicações históricas nos problemas gerais . Editôra Artenova, 1970.
PACIFICO, D. A. Território e pobreza: uma leitura histórica do espaço geográfico e da inscrição da pobreza rural. Revista Desenvolvimento Social, v. 1, n. 14, p. 139, 2015.
SILVA, Roberto. Entre o combate à seca e a convivência com o semi-árido; transições paradigmáticas e sustentabilidade do desenvolvimento. Tese de Doutorado. Centro de Desenvolvimento Sustentável, Universidade de Brasília. Brasilia, 2006
SOUZA, Celina et al. Políticas públicas: uma revisão da literatura. Sociologias, v. 8, n. 16, p. 20-45, 2006.
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POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A AGRICULTURA FAMILIAR: uma análise do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no Território
Sertão Central Cabugi e Litoral Norte/RN
PUBLIC POLICIES FOR THE FAMILY FARM: an analysis of the National Program for Strengthening Family Agriculture (PRONAF) in the Territory Sertão Central Cabugi e Litoral
Norte/RN
Grupo de Pesquisa: Políticas Públicas e Reforma Agrária
Francisca Suerda Soares de Oliveira. Economista. Graduada e Mestre em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Bolsista EXP-B do CNPq, na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (FACEM/UERN), e-mail: [email protected] Emanoel Márcio Nunes. Economista. Professor do Departamento de Economia da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). Mestre em Economia pela Universidade Federal de Uberlândia (IE/UFU). Doutor em Desenvolvimento Rural pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PGDR/UFRGS). [email protected] João Matos Filho. Engenheiro Agrônomo. Professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Especialista em Formulação e Avaliação de Políticas Agrícolas (UNICAMP). Mestre em Administração (UFRN) e Doutor em Economia (UNICAMP). [email protected]
Resumo O século XX é marcado pelas significativas transformações impulsionadas pela liberalização econômica, desregulamentação financeira, reformulação do papel do Estado, revolução tecnológica e as novas formas de produção, no geral pela globalização e mundialização dos capitais. Nesse contexto, o Estado assumiu papel central como agente promotor do desenvolvimento nacional, para isso, a formulação e implementação das políticas públicas tornou-se importante instrumento de atuação estatal. O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar surgi no conturbado cenário da década de 1990, com o objetivo de “promover o desenvolvimento sustentável do segmento rural constituído pelos agricultores
familiares, de modo a propiciar-lhes o aumento da capacidade produtiva, a geração de emprego e a melhoria de renda”. O objetivo deste artigo é analisar a evolução e a dinâmica do Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF no Território Sertão Central Cabugi e Litoral Norte/RN. Para alcançar os fins proposto pelo artigo foram utilizadas pesquisas bibliográfica e documental, além da análise de dados secundários com base em procedimentos de estatística descritiva. Verificou-se que ao longo do período analisado nesse artigo (2013 a 2016) o número de contratos firmados e recursos do programa no Território têm sido decrescente. Além disso, constatamos ao longo do estudo que há um direcionamento dos recursos do programa no território para finalidade investimento e quase exclusivamente para as atividades da pecuária. Palavras-chave: Política Pública; Território Sertão Central Cabugi e Litoral Norte/RN; PRONAF; Crédito Rural.
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Abstract The twentieth century was marked by significant changes driven by economic liberalization, financial deregulation, reshaping the state's role, technological revolution and the new forms of production, overall globalization and globalization of capital. In this context, the state assumed a central role as the national development promoting agent for this, the formulation and implementation of public policies has become an important instrument of state action. The National Programme for Strengthening Family Agriculture came up in the troubled scenario of the 1990s, in order to "promote sustainable development of the rural segment formed by family farmers in order to provide them with the increase in production capacity, employment generation and the improvement of incom ". The aim of this paper is to analyze the evolution and dynamics of the National Program for Strengthening Family Agriculture - PRONAF in the Territory Sertão Central Cabugi e Litoral Norte/RN. For the purposes proposed by the article were used bibliographical and documentary research, as well as secondary data analysis based on descriptive statistical procedures. It was found that over the period analyzed in this article (2013-2016) the number of signed contracts and program resources in the territory have been decreasing. In addition, we found during the study that there is a direction of program resources in the territory for investment purpose and almost exclusively to the activities of livestock. Key words: Public policy; Territory Sertão Central Cabugi e Litoral Norte/RN; PRONAF; Rural Credit.
1. Introdução
O processo de modernização da agricultura, iniciado na Europa, seguido pelos Estados
Unidos e difundido para os países da América Latina, particularmente o Brasil, a partir da década
de 1950, impulsionou a transformação da agricultura artesanal – caracterizada pela utilização dos
fatores endógenos de produção e pelo conhecimento passado de geração a geração – numa
agricultura moderna, intensiva e mecanizada.
A substituição de fatores tradicionais, obtidos com base no conhecimento transmitido de
geração em geração, por fatores modernos, fruto do conhecimento científico, seria então a chave
para uma nova etapa do desenvolvimento agrícola, pois com o persistente aumento da
produtividade e da oferta de produtos de origem vegetal e animal, poderiam as famílias deixar
que seus filhos fossem para as cidades sem que a oferta agrícola entrasse em declínio e os preços
dos alimentos se elevassem, sufocando as possibilidades do desenvolvimento da indústria e dos
serviços urbanos (SCHULTZ, 1964).
Esta nova concepção de agricultura – baseada no conhecimento científico de plantas e
animais, na produção de sementes híbridas, no uso intensivo de insumos, máquinas e
equipamentos de origem industrial, e na especialização e produção em escala – resultou na
emergência e na difusão de um novo padrão de produção agropecuária, conhecido como
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agricultura moderna ou Green Revolution (Revolução Verde), que passou a funcionar como uma
espécie de idéia-guia para o desenho de novas organizações e sistemas de geração, adaptação e
difusão de tecnologias agropecuárias e de economia agrícola e administração rural em todo o
mundo.
A intervenção do Estado foi fundamental para viabilizar as transformações ocorridas na
agricultura brasileira, ao impulsionar sua realização a partir da criação de políticas de crédito
rural, garantia de preços e tecnologia agropecuária, implementadas, respectivamente, pelas
seguintes instituições: agências oficiais de crédito, notadamente o Banco do Brasil e o Banco do
Nordeste; Comissão de Financiamento da Produção (CFP); Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (EMBRAPA) e seus centros e Empresas Estaduais de Pesquisa Agropecuária;
Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMBRATER) e Empresas
Estaduais de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATERs).
Todavia, dadas as suas características diferenciadas de produção e organização social,
a agricultura familiar encontrou grandes dificuldades para se inserir neste modelo de
modernização dominado pelas empresas de produção de insumos, máquinas e equipamentos
agrícolas e, por outro lado, pelas indústrias processadoras de alimentos e matérias-primas
oriundas da agricultura. Por isto a agricultura familiar apresenta distintas formas de organização
da produção que vão desde aquelas que produzem apenas para o autoconsumo, até aquelas
totalmente integradas ao mercado de commodities agropecuárias.
A heterogeneidade do mundo rural e, em particular, as transformações ocorridas com
a modernização agrícola e a permanência de distintos tipos de agricultura, resultaram na
conformação de demandas diferenciadas de políticas públicas para responder à nova
configuração do mundo rural ou ao que vem sendo chamado na literatura contemporânea, o
“novo rural brasileiro”. Podem ser elas de natureza macroeconômica – política econômica,
cambial, monetária, fiscal e comercial, isolada ou combinada – ou constituídas por políticas
específicas – regionais ou setoriais – destinadas a estimular, desestimular ou regular as
atividades econômicas e o comportamento dos agentes nos diversos setores da economia, e, em
particular na agropecuária.
Dentre os instrumentos de políticas setoriais mais importantes para a agricultura
brasileira podem ser destacados: Crédito Rural; Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar (PRONAF); Programa de Aquisição de Alimentos (PAA); Política
Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER); Política Nacional de
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Agroecologia e Produção Orgânica (PLANAPO); Programa Nacional de Reforma Agrária
(PNRA); Política de Preços Mínimos e Comercialização; Política de Seguro Rural; Política
Nacional de Defesa Agropecuária; Política de Reforma Agrária; e, Política de Biotecnologia.
A literatura relativa à implementação dessas políticas, particularmente do crédito rural,
tem mostrado que a oferta de crédito tem se dado de forma bastante diferenciada entre regiões,
estados e municípios, em particular no caso do PRONAF, observamos que o programa tem
apresentado diferentes resultados de uma região para outra. Diante do exposto, o objetivo deste
artigo é analisar a evolução e a dinâmica do Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar – PRONAF no Território Sertão Central Cabugi e Litoral Norte/RN.
A metodologia utilizada compreendeu dois tipos básicos de pesquisa: a bibliográfica e
a documental, complementada com estatística descritiva. A primeira foi utilizada para a revisão
da literatura, enquanto a segunda possibilitou a obtenção das informações relativas aos
objetivos e às normas que orientam a execução do PRONAF. Em seguida, as informações
quantitativas expressas em valores foram organizadas sistematicamente em séries históricas. Os
dados foram coletados na Matriz de Dados do Crédito Rural - MDCR no site do Banco Central
- BACEN.
Para operacionalização da metodologia e alcance do objetivo acima estabelecido, o
artigo está composto de dois itens além desta introdução. O item 1, realiza uma abordagem
teórica do campo de estudo das políticas públicas. O item 2, expõe a trajetória e os principais
resultados do PRONAF no Território Sertão Central Cabugi e Litoral Norte/RN. Por fim, são
apresentadas as considerações finais do estudo.
2. Discorrendo sobre o universo de estudo das políticas públicas: conceitos, classificação e relação com o desenvolvimento local
Existem problemas que por sua natureza afetam a um agricultor isoladamente como a
falta de oportunidade de emprego para um ou mais dos seus filhos, enquanto outros afetam a
todos os agricultores que têm terra insuficiente para produzir e viver uma vida digna, o que
decorre da concentração fundiária, da desigualdade na distribuição de renda e da falta de
oportunidades de emprego no campo.
Os primeiros são problemas privados, que se resolvem na esfera do mercado, enquanto
os últimos são problemas públicos, cuja solução requer a intervenção ou a regulação do Estado.
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Portando, a ação pública torna-se necessária diante da existência de problemas públicos, ou
seja, daqueles problemas que não somente afetam um grande número de pessoas, mas, além
disto, que entram na agenda dos governos e são por eles formulados, legitimados, financiados
e implementados.
Compreender a origem da área de conhecimento da política pública é, portanto,
essencial e indispensável para o melhor entendimento sobre seus desdobramentos. O campo de
estudo das políticas públicas é em geral reconhecido como uma subárea da Ciência Política. No
entanto, é mais correto considerá-la como campo de estudo de caráter multidisciplinar que se
alimenta de diversas áreas do conhecimento, entre as quais se incluem a Ciência Política, a
Economia, o Direito e a Administração. (DIAS; MATOS, 2012).
Na Europa, a área de conhecimento decorreu de um desdobramento de teorias
explicativas sobre o papel do Estado. Conforme a literatura dos anos 1980 e 1990, uma política
pública, é o resultado de ações praticadas pelo Estado e da sua mais importante instituição, o
governo. Verificava-se, assim, a centralidade do Estado como único e principal ator produtor
de políticas públicas. Esta análise tornar-se semelhante com a abordagem estatista, que defende
a hipótese de monopólio de atores estatais na promoção de políticas públicas. Nessa vertente, o
que determina se uma política é ou não “pública” é a personalidade de seu criador. Portanto, só
é considerada política pública, políticas cujo ator protagonista seja ator estatal (SOUZA, 2006).
Nos EUA, diferentemente da Europa, o campo de conhecimento já havia surgido como
resultado das discussões acerca do papel das ações governamentais e suas implicações para a
sociedade civil. Assim, políticas públicas não se limitam apenas a projetos, incentivos, políticas
e ações cujo ator protagonista seja o Estado, mas também a sociedade civil e as demais
organizações que participam do processo de construção das políticas públicas.
Recentemente, tanto na Europa quanto nos EUA o estudo das políticas públicas
assemelha-se à abordagem multicêntrica, onde as organizações privadas, organismos
governamentais ou não governamentais, juntamente com atores estatais são responsáveis pelo
processo produtor da política. Sendo assim a definição da política pública não está na
personificação do ator criador, mas ao problema que se é enfrentado, considerando política
pública aquelas ações que são pensadas para resolver problemas que são considerados públicos,
independente se o tomador de decisão tenha personalidade jurídica estatal ou não estatal
(SOUZA, 2006).
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Muitos são os entraves e discussões que cercam o debate teórico da área de
conhecimento do que é uma política pública, principalmente os limites acerca de uma definição
uniforme e geral sobre o que pode ser considerado e o que é de fato uma política pública, e
quais seus atores relevantes. Assim, para auxiliar na compreensão será esboçado abaixo de
forma sucinta algumas das definições acerca do que seja uma política pública, e, em seguida,
algumas tipologias de políticas públicas para orientar as análises da política analisada, isto é, o
PRONAF.
Conforme Souza (2006), as definições do que seja uma política pública são bastante
diferenciadas: campo dentro do estudo da política que analisa o governo à luz de grandes
questões públicas (MEAD, 1995); conjunto de ações do governo que irão produzir efeitos
específicos (LYNN, 1980); soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou através
de delegação, e que influenciam a vida dos cidadãos (PETERS, 1986); aquilo que o governo
decide fazer ou não fazer (DYE, 1984).
Muitas são as razões que justificam a existência de uma política pública. Podem elas
buscar a eficiência econômica, minimizar a pobreza, evitar a exclusão social e fomentar a
igualdade social. Mas, sem dúvidas, trata-se de um conjunto de decisões que buscam orientar e
manter o equilíbrio social, gerando mecanismos equilibradores ou não para modificar o atual
panorama (SOBOTTKA, 2006, p. 1).
De maneira geral as políticas podem ser caracterizadas em quatro dimensões: i) no
âmbito institucional é uma decisão elaborada por uma autoridade legal; ii) no plano decisório,
é um conjunto sequenciado de decisões numa situação específica e surge como uma resposta a
um problema ou necessidade; na dimensão comportamental, é a escolha de fazer ou não fazer,
mas uma política é, acima de tudo, um curso de ação e não apenas uma decisão singular; iv)
por fim, tem um sentido causal, na medida em que, são os produtos de ações que têm efeitos
no sistema político e social (SARAVIA; FERRAREZI, 2006, p.31).
De acordo com Lowi (1964), as políticas públicas são mecanismos de intervenção e
regulamentação estatal que além das distintas áreas de atuação assumem diferenciações
conceituais que resultam em quatro grandes tipos:
i) Distributivas – geram benefícios concentrados para alguns grupos de atores e custos
para toda a coletividade;
ii) Redistributivas – concedem benefícios concentrados para algumas categorias e
implicam custos concentrados sobre outras categorias;
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iii) Regulatórias – estabelecem padrões de comportamento, serviço ou produto para
atores públicos e privados; e
iv) Constitutivas – constitui-se por regras sobre os poderes, são aquelas políticas que
definem as competências, jurisdições e regras do “jogo”.
Figura 1: Tipos de Políticas Públicas
Fonte: Adaptado de Flexor e Leite (2006, p. 16).
Considerando os diversos tipos de políticas públicas, a promoção de desenvolvimento
sustentável e duradouro num segmento social, muitas vezes, tão fragilizado como é o caso da
agricultura familiar brasileira, particularmente a nordestina, requer um conjunto
combinado/articulado de políticas públicas (políticas de oferta e demanda), que levem em
consideração a sua principal característica, a diferenciação social, no que concerne as ideias,
valores, interesses, preferências, culturas, condições socioambientais e econômicas.
Como argumenta Brose (1999, p. 58), o desenvolvimento local, baseado na agricultura
familiar, depende fundamentalmente da intervenção estatal, regulando as assimetrias do
mercado através de políticas públicas. Se deixada à própria sorte frente às forças de mercado, a
agricultura familiar se transforma em alvo fácil de monopólios e intermediários que se
apropriam do valor agregado da produção.
Historicamente, são muitas as dificuldades que podem ser elencadas para a promoção
do desenvolvimento da produção agrícola familiar no Brasil, entre elas: baixa capitalização;
acesso a linhas de crédito oficiais e à tecnologia; disparidades produtivas inter e intra-regionais;
acesso à assistência técnica à produção rural; e acesso aos mercados modernos. Algumas
características são comuns a um grande universo de pequenos agricultores familiares:
multisetorialidade rural; diversidade produtiva (através de sistemas integrados de produção
Distributivas
•Crédito Rural•PAA•Mais Alimentos•Subsídios•Incentivos•Renúncias fiscais
Redistributivas
•Cotas raciais•Reforma Agrária•Transferência renda• Bolsa Família
Regulatórias
•Segurança alimentar•Preços Mínimos• Comércio Exterior• Política Sanitária• Meio Ambiente•Tributação
Institucionais
•Conselhos Gestores•Ministérios•Secretarias•Conferências
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animal, vegetal e manejo florestal); e tipo de mão-de-obra utilizada na produção. (BIANCHINI,
2005).
Portanto, é norteado por esse sentimento de preocupação crescente e aprofundamento
do conflito econômico e social da agricultura familiar, que ações governamentais,
implementadas e gerenciadas pelo Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), vêm sendo
elaboradas, no intuito de assegurar o modo de vida, e manter esses agricultores no campo.
Porém, é somente a partir dos anos 1990, que se percebe um aumento significativo do
desenvolvimento de programas de apoio específico para esta categoria, em destaque, o
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, principal política pública de
apoio aos agricultores familiares. Na verdade, o PRONAF foi a primeira política pública que
colocou o agricultor familiar como protagonista do processo de desenvolvimento rural.
3. RESULTADOS E DISCUSSÕES: uma análise da evolução, magnitude e dinâmica do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no Território do Sertão Central Cabugi e Litoral Norte/RN
3.1. Caracterização do Território
O Território do Sertão Central Cabugi e Litoral Norte1 (RN), possui uma área de
5.215,156 Km², sendo constituído por 10 municípios: Afonso Bezerra, Angicos, Caiçara do
Rio do Vento, Fernando Pedroza, Galinhos, Guamaré, Lajes, Macau, Pedra Preta e Pedro
Avelino. Conforme mostra a figura 1, o Território está localizado geograficamente, na porção
central do estado do Rio Grande do Norte, e lhe é atribuído os seguintes limites: ao norte é
banhado pelo oceano atlântico, ao leste com o território Mato Grande, a oeste com o Território
Açu-Mossoró e ao Sul, com o Território do Seridó e o Território do Potengi.
Segundo dados do IBGE (2015), o Território possui uma população de 92.242
habitantes, destes 30.626 habitantes residem na zona rural, 33,2% e 61.616 residem na zona
urbana, 67,8%. O clima predominante no Território, em cerca de 75% de toda sua área, é do
tipo Semiárido, caracterizado por precipitações pluviométricas inferiores a 800 milímetros
anuais com evaporação superior aos 2.000 milímetros por ano, exceto nas proximidades do
litoral norte onde as precipitações pluviométricas variam entre 1.000mm e 1.500mm anuais,
1 Considerado como Território Rural “novo”, foi constituído em 2008, mas reconhecido pela SDT/MDA, apenas
em 2013.
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consequência da influência dos climas subsumidos secos e subsumidos. A vegetação é
predominantemente a caatinga.
O Território do Sertão Central Cabugi e Litoral Norte apresenta uma diversidade
econômica que possibilita a geração de emprego e renda, baseando em atividades como o
turismo, agricultura de sequeiro (feijão, milho, mandioca e castanha-de-caju), fruticultura
irrigada, pesca e aquicultura, carcinicultura, pecuária, caprinovinocultura, apicultura,
exploração de sal marinho, de petróleo e de gás natural. Além dessas atividades destacam-se o
comércio, nas cidades litorâneas e o setor industrial com destaque para a atividade ceramista e
mineral. No caso da mineração o Território destaca-se com a exploração de minérios o ferro,
quartzito, calcário, dentre outros, como também a extração e beneficiamento de minerais de
pegmatitos e pedras preciosas e semipreciosas como turmalina e águas marinhas. Outra
atividade que vem ganhando espaço nessa conjuntura é a economia solidária.
Figura 2: Mapa do Território Rural Sertão Central Cabugi e Litoral Norte (RN).
Fonte: CGMA/SDT/MDA, 2015.
A principal fonte de renda das famílias dos subespaços rurais dá-se especialmente a
partir da agricultura familiar. As ocupações oriundas das atividades desenvolvidas pela
agricultura familiar têm se mostrado como uma alternativa pertinente para geração de renda das
famílias que residem no Território. Conforme mostra Abramovay (1998), a agricultura familiar
é uma forma viável de luta contra a pobreza, contribuindo com a produção de alimentos e
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matérias-primas, utilizando práticas de cultivo artesanais, policultura que acaba por colaborar
com a produção ecológica sustentável. Ademais, a agricultura familiar aliada à produção de
várias culturas e cadeias produtivas como hortaliças, cajucultura, criação de animais e a
apicultura, além de atividades não agrícolas como o artesanato, tornou-se uma estratégica
concreta de desenvolvimento local.
Dentre as principais atividades econômicas do Território, as atividades agropecuárias
são as que possuem maiores impactos, em especial a ovinocaprinocultura e a produção de gado
leiteiro, seguida da piscicultura e da produção de mel em pequena escala. A produção da
ovinocaprinocultura se dá pelo sistema extensivo de manejo, utilizando a caatinga nativa como
suporte forrageiro, também conhecido como Sistema Tradicional, caracterizado pela criação de
animais sem raça definida, com baixa produtividade. Na parte litorânea destaca-se o pescado
artesanal, tendo a sardinha como principal produto. Portanto, o setor agropecuário se constitui
como o principal vetor econômico de desenvolvimento do Território.
3.2. Analisando os dados do PRONAF no Território
A agricultura familiar do Rio Grande do Norte vem sendo objeto de estudo frequente de
pesquisadores, instituições governamentais ou não governamentais, públicas e privadas. Na
verdade, há um esforço para melhor caracterizar esse estado, na tentativa de preencher
importantes e fundamentais lacunas, a fim de desenhar políticas públicas específicas as
demandas existentes dessa população.
De acordo com os dados do Censo Agropecuário 2006, no Rio Grande do Norte existem
cerca de 71.210 estabelecimentos da agricultura familiar, 85,74% dos estabelecimentos do RN
são propriedades da agricultura familiar - Lei 11.326, ocupando uma área de aproximadamente
1.046.070 hectares, aproximadamente 32,82% da área rural do estado. No Território em estudo,
os dados do Censo Agropecuário 2016 constatou a existência de 2.416 estabelecimentos da
agricultura familiar, ocupando uma área de 65.637 hectares.
Considerando que o Território tem a agropecuária como importante fonte de renda e
emprego, a seguir veremos o comportamento da principal política pública de crédito rural
específica para agricultura familiar, o PRONAF. Com auxílio da tabela 1, verificamos que
houve um comportamento decrescente tanto no número de contratos quanto no valor financiado
pelo PRONAF nos anos de 2013 a 2016. Em 2013, foram firmados 2.498 contratos no
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Território, após três anos, em 2016 não ultrapassou 1.000 contratos, um decréscimo de mais de
60%.
Tabela 1: Número de contratos e montante de recursos do PRONAF no Território Sertão Central Cabugi e Litoral Norte (2013-2016)
Ano Agrícola Pecuária Total contratos recursos contratos recursos contratos recursos
2013 659 1.945.351,44 1839 9.045.596,15 2498 10.990.947,59
2014 157 688.862,25 1839 10.159.204,11 1996 10.848.066,36
2015 56 123.175,22 1470 7.798.714,92 1526 7.921.890,14
2016* 6 157.628,40 950 4.453.233,46 956 4.610.861,86 Fonte: BACEN- Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração Própria * Dados de janeiro a agosto de 2016.
Conforme observamos, ano após ano menor volume de recursos do PRONAF são
acessados pelos agricultores (as) familiares do Território, apesar de ser uma política que tem
apresentado montante de recursos ofertado crescente, tanto no âmbito nacional, quanto na esfera
regional e estadual. Esse declínio na utilização do PRONAF pode ser explicado por fatores
como: burocracia bancária e dificuldades no acesso e liberação do crédito, atraso na
operacionalização do financiamento por parte dos mediadores, inexistência ou a insuficiência
de assistência técnica continuada, falta de garantias, longo período de seca.
Gráfico 1: Divisão dos contratos do PRONAF alocados no Território Sertão Central Cabugi e Litoral Norte, por atividade (2013-2016)
Fonte: BACEN- Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração Própria * Dados de janeiro a agosto de 2016.
2013 2014 2015 2016*
Pecuária 1839 1839 1470 950
Agrícola 659 157 56 6
0
500
1000
1500
2000
Contratos Firmados
Agrícola Pecuária
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O gráfico 1 ilustra o direcionamento dos contratos do programa, quase exclusivamente,
para as atividades da pecuária. Em todos os anos da série analisada mais de 70% dos contratos
e recursos do PRONAF no Território foram direcionados para a pecuária, nos anos de 2014 a
2016 esse percentual ultrapassa os 90%. A atividade pecuária e seu arranjo de condições e
variáveis que são próprias dessa atividade (menor risco e sazonalidade, maior resistência) e o
ambiente natural norte-rio-grandense, em particular do Território, permitem que seus resultados
sejam mais sensíveis às políticas de estímulo ao crescimento, nesse caso, a política de crédito
do PRONAF.
Por sua vez, a atividade agrícola está imersa num espaço natural, marcado por suas
restrições mútuas, interações e interdependência, cujo ajustamento não é algo facilmente
alcançado, uma vez que continuamos a depender da ação incontrolável das forças da natureza,
como chuva, sol, vento, condições do solo. Portanto, a atividade agrícola é altamente
condicionada a rigidez natural do meio ambiente, dificultando as elevações na produção apenas
com políticas pontuais, no caso o PRONAF.
Gráfico 2: Média percentual dos recursos do PRONAF no Território, por finalidade (2013-2016*)
Fonte: BACEN- Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração própria * Dados de janeiro a agosto de 2016
No Território, assim como ocorre na maior parte das regiões/estados/municípios menos
capitalizados do Brasil, quase totalidade dos recursos da política de crédito rural do PRONAF
são direcionados para operações de investimento. No somatório de 2013 a 2016, 82% do
Custeio18%
Investimento82%
Comercialização0%
Custeio Investimento Comercialização
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volume de recursos do PRONAF contratado foram para operações de investimento, enquanto
apenas 18% para operações de custeio, seja ele agrícola ou pecuária. Nesse sentido, diferente
das operações de custeio e comercialização, os empréstimos para investimento possuem prazo
para pagamento maior, portanto maior o período que o agricultor familiar permanece
endividado, além disso, são empréstimos que apresentam fluxo de capital menos dinâmico; o
montante financeiro emprestado demora mais tempo para voltar ao circuito do sistema
financeiro.
Gráfico 3: Dinâmica dos contratos (pecuária + agrícola) firmados do PRONAF no Território Sertão Central Cabugi e Litoral Norte, por município (2013-2016)
Fonte: BACEN- Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração Própria * Dados de janeiro a agosto de 2016.
Conforme tínhamos observados acima, o PRONAF vem a cada ano apresentando
valores e contratos decrescente, o gráfico 3 expõe esse fenômeno nos municípios que compõem
o território. Todos os municípios, sem exceções, apresentaram ao longo dos anos 2013 a 2016
um declínio na utilização do programa.
No somatório de 2013 a 2016 foram firmados 6.976 contratos, sendo 1.505 em Afonso
Bezerra (21,57%), 1.438 em Pedro Avelino (20,61%), 690 em Guamaré (9,89%), 611 em
Angicos (8,76%), 830 em lajes (11,90%), 632 em Caiçara do Rio do Vento (9,06%), 224 em
Macau (3,20%), 348 em Fernando Pedroza (5%), 569 em Pedra Preta (8,16%) e 129 em
Galinhos (1,85%).
0
100
200
300
400
500
600
AfonsoBezerra
PedroAvelino
Guamaré Angicos Lajes Caiçarado Rio do
Vento
Macau FernandoPedroza
PedraPreta
Galinhos
2013 2014 2015 2016*
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Os municípios do Território que mais contratam operações do PRONAF são Afonso
Bezerra, Lajes e Pedro Avelino, juntos responderam por mais de 50% dos contratos do
programa no Território. No Território, esses municípios são os que apresentam maior número
de estabelecimentos agropecuários da agricultura familiar, por conseguinte, maior extensão de
terras (em hectares) rurais da agricultura familiar, aproximadamente 65% do total de
estabelecimentos agropecuários e terras da agricultora familiar do Território.
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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O PRONAF como política pública específica para agricultura familiar, que
historicamente sempre foi marginalizada pelas políticas públicas para o meio rural brasileiro,
representou um marco na política agrícola brasileira, e, portanto, é considerado um avanço sem
precedentes no país. Anualmente, a cada plano safra, o PRONAF se consolida como
instrumento transformador dessa categoria. A exemplo, podemos verificar o crescimento
acelerado de recursos disponibilizados e dos beneficiários que continuamente firmam novos
contratos. Contudo, apesar das muitas mudanças de operacionalização e implementação, o
programa necessita de importantes ajustes para que de fato consiga cumprir seus objetivos
básicos, inclusão dos agricultores familiares, e, portanto, redução das desigualdades sociais no
campo.
Muitos são os entraves a serem superados, considerando que a questão do
desenvolvimento rural sustentável é bastante complexa, porém não pode minimizar o quanto
significativo é a distribuição de crédito. Todavia, para que o crédito cumpra sua função de
eficiência econômica e justiça distributiva em maior plenitude, existem fatores estruturais e
institucionais a serem superados. Destacam-se entre esses fatores: a concentração fundiária; a
pequena área das unidades familiares de produção; e, consequentemente, a sua baixa capacidade
de produção e absorção de crédito dos estabelecimentos familiares nos municípios mais
descapitalizados.
No Território Sertão Central Cabugi e Litoral Norte a atuação do programa é ainda mais
preocupante, verifica-se que há uma tendência descendente, dentre outros, alguns elementos
que justificam esse declínio deve-se: burocracia bancária e dificuldades no acesso e liberação
do crédito, atraso na operacionalização do financiamento por parte dos mediadores, inexistência
ou a insuficiência de assistência técnica continuada, falta de garantias, longo período de seca e
o elevado nível de inadimplência, que consequentemente impulsiona a redução do público
potencial do estado, uma vez, que a grande maioria dos possíveis beneficiários já estão com o
“nome sujo” na cartilha de crédito, e não conseguem acessar novas linhas de financiamento,
custeio ou investimento.
Na verdade, o sucesso do PRONAF como política desenvolvimentista e redutora das
desigualdades sociais no campo, está condicionado a um raio de ações não previstas no desenho
normativo do programa, que vão desde sua operacionalização, normas, concepção,
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(re)definição do público-alvo e atores. Acima de tudo, a formulação de políticas públicas
combinadas, principalmente uma reforma educacional, que levem em consideração as
diferentes realidades que marca a agricultura familiar brasileira nos territórios rurais do Brasil.
5. REFERÊNCIAS
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POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA
FAMILIAR NO MUNICÍPIO DE MOSSORÓ: UMA AVAIAÇÃO SOBRE O PNAE NO PERÍODO DE 2011 A 2014
Claudiany Mayara da Silva Filiação: Aluna do Curso de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - UERN E-mail: [email protected] Leonildo Tchapas Filiação: Professor do Curso de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN E-mail: [email protected] Vanusa Alves Resende Filiação: Professora do Curso de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN E-mail: [email protected]
Grupo de Pesquisa: Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo A agricultura familiar ao decorrer dos anos está contribuindo cada vez mais para o
desenvolvimento do Brasil, onde a mesma é compreendida a partir do momento em que a
família desempenha atividades no meio rural, sendo ela a proprietária dos meios de produção,
da mão-de-obra, e responsável por todo o processo produtivo. O Governo Federal com o
objetivo de estimular a produção dos agricultores familiares, vem criando mecanismo que
possibilita uma melhor comercialização dos produtos gerados no meio rural, um dos programas
criados pelo governo com a finalidade de contribuir para o aumento do escoamento dos
produtos, foi o Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. De acordo com dados
obtidos pelo (BRASIL/FNDE, 2016), constata que o Programa Nacional da Alimentação
Escolar no município de Mossoró-RN, durante os últimos três anos, atende a um número de
67.041 alunos, referente a aproximadamente ao atendimento de 105 escolas da rede pública em
cada ano, onde seu público alvo são as creches, pré-escola, ensino fundamental, e a educação
de jovens e adultos. Esse programa busca contribuir para o crescimento, desenvolvimento, a
aprendizagem, o rendimento escolar e a formação de hábitos alimentares saudáveis dos alunos,
pois a maioria dos alimentos básicos que são fornecidos para a merenda escolar são gerados na
agricultura familiar e eles apresentam boas qualidades por ser considerado adequados a
alimentação. O estudo foi realizado no município de Mossoró localizado no Estado do Rio
Grande do Norte, em que a pesquisa compreendera os anos de 2011 a 2014 como período de
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análise, buscando avaliar a contribuição do Programa Nacional de Alimentação Escolar- PNAE
para o fortalecimento da agricultura familiar no município de Mossoró. A avaliação do
Programa Nacional da Alimentação Escolar no município de Mossoró localizado no Estado do
Rio Grande do Norte, se deu de forma consistente, através do indicador de desempenho
construído no artigo o IDAAF, em que possibilitou chegar a um resultado convincente de que
o município em análise não estaria cumprindo a lei estabelecida pelo Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação.
Palavras-chave: Políticas públicas. Agricultura Familiar. PNAE. Abstract Family farming to over the years is increasingly contributing to the development of Brazil,
where it is understood from the moment that the family plays activities in rural areas, it is the
owner of the means of production, of labor, -obra, and responsible for the entire production
process. The Federal Government in order to stimulate the production of family farmers, is
creating a mechanism enabling better marketing of products generated in rural areas, one of the
programs created by the government in order to contribute to increasing the disposal of
products, was the National School Meal program - PNAE. According to data obtained by
(BRAZIL / ENDF, 2016), notes that the School Feeding National Program in the municipality
of Mossoró-RN, during the last three years, serves a number of 67,041 students, referring to
about service 105 public schools each year where your target audience is day care, preschool,
elementary school, and adult education. This program seeks to contribute to the growth,
development, learning, school performance and the formation of healthy eating habits of
students, since most food staples that are provided for school meals are generated in family
farming and they have good qualities for It is considered suitable feed. The study was conducted
in the city of Mossoro located in the state of Rio Grande do Norte, where the research
understood the years 2011-2014 as a period of analysis, seeking to evaluate the contribution of
Escolar- PNAE National Food Program to strengthen agriculture family in the city of Mossoro.
Evaluation of School Feeding National Program in the city of Mossoro located in the state of
Rio Grande do Norte, has consistently, through the performance indicator built in the article the
IDAAF where possible reach a convincing result that the municipality in question would not
be complying with the law established by the National School Feeding Fund
Key words: Public policy. Family farming. PNAE.
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1. Introdução
No Brasil a maioria dos alimentos consumidos na mesa dos brasileiros é oriunda da
agricultura familiar, com isso a mesma passa a assumir um papel de grande relevância na
segurança alimentar do País, contribuindo para a criação de novos empregos e como
consequência a geração de renda e riqueza para o Brasil. A agricultura familiar ao decorrer dos
anos está contribuindo cada vez mais para o desenvolvimento do Brasil, é compreendida a partir
do momento em que a família desempenha atividades no meio rural, sendo ela a proprietária
dos meios de produção, da mão-de-obra, e responsável por todo o processo produtivo (BRASIL/
FNDE, 2016).
O Governo Federal com o objetivo de estimular a produção dos agricultores familiares,
criou mecanismo que possibilitassem uma melhor comercialização dos produtos gerados no
meio rural, um dos programas criados pelo governo com a finalidade de contribuir para o
aumento do escoamento dos produtos, foi o Programa Nacional de Alimentação Escolar -
PNAE, que surgiu no ano de 1955, mas de acordo com o Fundo Nacional de Desenvolvimento
da Educação - FNDE, somente após a promulgação da Constituição Federal em 1988, assegurou
o direito à alimentação escolar a todos os alunos da rede pública de ensino. O Programa
Nacional de Alimentação Escolar - PNAE atende a 42,6 milhões de estudantes da educação
básica e de jovens e adultos, por meio de mais de 50 milhões de refeições por dia, com um
volume de recurso de R$ 3,8 bilhões ao ano, ou seja, o programa proporciona um
desenvolvimento do País (AGROLINK, 2016).
Dessa forma a agricultura familiar possui uma relação consistente com o PNAE, onde a
Lei nº 11.947 de 16 de junho de 2009, determina que 70% (setenta por cento) dos recursos
transferidos pelo Governo Federal para o Programa Nacional de Alimentação Escolar sejam
exclusivamente destinados a compra de produtos básicos e os 30 % (trinta por cento), restante
para a aquisição de produtos da agricultura familiar local (BRASIL, 2009). De acordo com o
manual da agricultura familiar fornecido pelo FNDE, o programa incorpora elementos
relacionados à produção, acesso e consumo, com o objetivo de oferecer alimentação saudável
aos alunos de escolas públicas da educação básica do Brasil e estimular a agricultura familiar
nacional, com isso esse repasse acaba ocasionando a geração de emprego e renda, já que se
estima uma quantidade maior de alimentos produzidos para poder atender a demanda,
contribuindo assim para o desenvolvimento local da cidade de Mossoró.
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O PNAE é considerado um dos programas mais antigo do Governo Federal, e o município
de Mossoró-RN, foi o primeiro do Estado do Rio Grande do Norte a aderir esse programa, antes
mesmo dos anos 2000 a cidade já contava com o repasse financeiro do Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação, o município conta com uma gestão mista, uma parte da
educação básica é centralizada e a outra é descentralizada, na centralizada são atendidas as
creches, os recursos são direcionados a prefeitura e ela mesmo se responsabiliza para realizar
as compras da merenda escolar e fazer a entrega, já na descentralizada é responsável pelas
escolas de educação básica os recursos são repassados diretamente para os seus diretores, e eles
se encarregam de fazer as compras para a merenda escolar.
Diante do Exposto este trabalho busca avaliar a execução do PNAE, no município de
Mossoró no período de 2011 a 2014, de forma que possa verificar a contribuição para o
fortalecimento da agricultura familiar na cidade, através de indicadores de desempenho,
possibilitando chegar a resposta do seguinte questionamento: o município de Mossoró está
cumprindo a determinação da lei nº 11.947 de 16 de junho de 2009? Portanto, tem-se como
objetivo geral avaliar a execução do PNAE, e sua contribuição para o fortalecimento da
agricultura familiar no município de Mossoró-RN durante o período de 2011 a 2014.
E como objetivos específicos: Verificar o valor dos recursos transferidos pelo Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação, para o PNAE do município de Mossoró no período
de 2011 a 2014, apontar o número de escolas e alunos atendidos no município no período de
2011 a 2014, mensurar indicadores de desempenho para verificar a eficiência do PNAE em
Mossoró, averiguar se a aquisição dos produtos da merenda escolar junto a agricultura familiar
está atendendo ao percentual que determina a Lei nº 11.947 de 16 de junho de 2009.
Quanto a metodologia desse artigo, se configura em uma pesquisa de caráter exploratória
e descritiva. O processo da coleta de dados se estendeu por dois momentos, o primeiro foi na
obtenção de dados secundários, através de sites, artigos, normas legais e o segundo por meio
de dados primários, onde foi realizada entrevistas na Secretaria de Educação do município de
Mossoró com os responsáveis pelo programa, em umas das cooperativas que fornecem para o
programa e também com algumas diretoras das escolas municipais que são atendidas pelo
PNAE. Além desta introdução, esse artigo está estruturado em mais três momentos, o primeiro
aborda o referencial teórico utilizado nesta pesquisa, a fim de aprofundar sobre o tema exposto,
apresentando os principais conceitos, como o que seria: agricultura familiar; políticas públicas;
PNAE. E no segundo, demostra a metodologia utilizada para chegar ao questionamento inicial
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do trabalho e no terceiro a apresentação da análise dos dados obtidos em todo o período desta
pesquisa e finalmente foi apresentado a conclusão.
2. REFENCIAL TEÓRICO
2.1 Políticas Públicas: Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)
Entende-se o termo políticas públicas como a soma das atividades dos governos, que
agem diretamente ou através de delegação, e que influenciam a vida dos cidadãos (SOUZA,
2006). Em que seu papel fundamental consiste em solucionar os problemas da sociedade, ou
seja, é um conjunto de ações que são desenvolvidas pelo Governo de forma direta ou indireta,
em que busca assegurar o direito de uma cidadania.
Então de uma forma resumida compreende-se a política pública como o campo do
conhecimento que busca, ao mesmo tempo, “colocar o governo em ação” e/ou analisar essa
ação (variável independente) e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas
ações (variável dependente). A formulação de políticas públicas se constitui no estágio em que
os governos democráticos traduzem seus propósitos e plataformas eleitorais em programas e
ações que produzirão resultados ou mudanças no mundo real (SOUZA, 2016).
Para Campos (2010) uma política pública é resultante da atividade política para
compreender um conjunto de decisões e ações envolvendo os bens públicos. E, uma política
pública envolve mais do que uma decisão e requer ações estrategicamente selecionadas para
programar as decisões tomadas. Portanto, compreende que Política Pública é a ação do poder
público respondendo a demanda da população, e que prevalece o interesse da coletividade.
Com isso Teixeira (2014) diz que as políticas públicas busca responder a demandas,
principalmente dos setores marginalizados da sociedade, considerados como vulneráveis. Essas
demandas são interpretadas por aqueles que ocupam o poder, mas influenciadas por uma agenda
que se cria na sociedade civil através da pressão e mobilização social, visando ampliar e efetivar
direitos de cidadania, também gestados nas lutas sociais e que passam a ser reconhecidos
institucionalmente. A partir desses conceitos de políticas públicas apresentados acima percebe
que esse tipo de políticas é de suma importância, segundo Stolarski e Castro (2007), há mais de
50 anos nascia no Brasil uma política educacional voltada para a merenda escolar, na qual a
partir dela se originou o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), com isso essa
política representa um dos maiores programas de merenda escolar voltado para a educação
básica no País e o maior da América do Sul. No ano de 2008, os beneficiados pelo programa
diariamente em todo o País ultrapassavam a casa dos 36 milhões de alunos, somando um
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investimento total de 1,6 bilhão de reais por ano. O objetivo principal do programa é distribuir
uma refeição/aluno do ensino básico da rede pública de ensino nos 200 dias letivos de forma
universalizada, suprindo as necessidades nutricionais referentes ao período em que o mesmo
estiver na escola. Desta forma, pressupõe que a alimentação escolar propicie ao aluno um estado
fisiológico adequado à aprendizagem, ao mesmo tempo em que é criado um forte atrativo à
frequência deste (STOLARSKI e CASTRO 2007).
Essa política pública também contribui para o fortalecimento da agricultura familiar,
fazendo com que ocorra uma maior comercialização dos produtos gerados no meio rural, pois
os recursos que são repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação,
determina que os alimentos fornecidos ao programa na maior parte deve ser adquiridos da
agricultura familiar, de acordo com Brasil (2016, p. 1), destacando na seguinte Lei nº 11.947
de 16 de junho de 2009 no art 2º, uma diretriz relacionada a agricultura familiar, onde diz que
o apoio ao desenvolvimento sustentável, com incentivos para a aquisição de gêneros
alimentícios diversificados, produzidos em âmbito local e preferencialmente pela agricultura
familiar e pelos empreendedores familiares rurais, priorizando as comunidades tradicionais
indígenas e de remanescentes de quilombos.
Tendo em vista que o Governo Federal com o intuito de assegurar a alimentação escolar
no País, criou o Programa Nacional de Alimentação Escolar em que popularmente é conhecido
como merenda escolar, o mesmo é gerenciado pelo FNDE que é vinculado ao ministério da
Educação, em que visa a transferência de recursos financeiros aos Estados, Municípios e
Distrito Federal, com o objetivo de garantir a segurança alimentar nas escolas da rede pública
(FNDE, 2016).
De acordo com o (FNDE, 2016), esse programa tem origem no início da década de 40,
quando o então Instituto de Nutrição defendia a proposta de o Governo Federal oferecer
alimentação escolar. Entretanto, não foi possível concretizá-la, por indisponibilidade de
recursos financeiros. Mas com a promulgação da Constituição Federal, em 1988, ficou
assegurado o direito à alimentação escolar a todos os alunos do ensino fundamental por meio
de programa suplementar de alimentação escolar a ser oferecido pelos governos federal,
estaduais e municipais.
O PNAE passou por diversas mudanças para chegar a ser considerado de grande
relevância para o País conforme ressalta Azevedo (2014), esse programa sofreu algumas
alterações após a Constituição de 1988. O modelo operacional do Programa passou a ser
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descentralizado, desde a criação até 1993 o mesmo funcionou de forma centralizada, de modo
que, o órgão administrador elaborava os cardápios, adquiria os alimentos por meio de processo
licitatório e contratava empresa responsável para fiscalizar a qualidade dos alimentos, além de
se responsabilizar pela distribuição dos alimentos em todo o país. Outra mudança importante
no programa foi a expansão dele para toda a educação básica, e a criação de um órgão
responsável pela distribuição da alimentação escolar em cada município o CAE (Conselho de
Alimentação Escolar).
Esse programa contribui para o crescimento, desenvolvimento, a aprendizagem, o
rendimento escolar e a formação de hábitos alimentares saudáveis dos alunos, pois a maioria
dos alimentos básicos que são fornecidos para a merenda escolar são gerados na agricultura
familiar e eles apresentam boas qualidades e por ser considerado adequados a alimentação.
2.2 Agricultura Familiar
Após os anos 60 se instituía no País um modelo de desenvolvimento econômico, o qual
rompia com a estrutura de economia primaria exportadora e rural tornando-a industrial e urbana,
com isso se iniciava grandes transformações na agropecuária nacional, e referente a essas
transformações se observa um avanço no processo de modernização da agropecuária, então foi
nesse processo de modernização conservadora que foi se materializando e constituindo duas
grandes categorias de trabalhadores no meio rural, isto é, os assalariados, que venderam sua
força de trabalho no mercado em troca de salários e por tempo determinado, e os agricultores
familiares que alocaram sua força de trabalho em estabelecimentos agropecuários da família
(PIRES, 2014). Com isso é necessária uma discussão para compreender o que é agricultura
familiar, sua importância para o desenvolvimento econômico do País, e também entender as
políticas públicas voltadas para melhorar o fortalecimento dessa classe.
De acordo com Novaes (2010), a agricultura familiar desempenha um papel
fundamental, gerando grande parte dos alimentos básicos, que são consumidos na mesa dos
brasileiros. Existem diversos conceitos referentes à agricultura familiar, onde os mais utilizados
para abordar esse assunto destacam que o mesmo consiste em uma atividade agrícola
desenvolvida por uma família que habita no meio rural, onde a mão-de-obra desempenhada
para a geração de renda e riqueza é proveniente de todos os membros que compõem o quadro
familiar. Já para Alves (1997) a agricultura familiar é definida pelo governo como sendo um
subconjunto da agricultura, da qual o proprietário administra e trabalha no estabelecimento, em
conjunto com a família. Outro autor aborda que o conceito de agricultura familiar se designa na
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mão-de-obra utilizada, no tamanho da propriedade, na direção dos trabalhos e na renda gerada
pela atividade agrícola (TINOCO, 2008).
A agricultura familiar ao passar dos anos está perdendo cada vez mais o caráter de
subsistência, onde as famílias deixam de produzir somente para o consumo, e desempenham
atividade visando a complementação da renda, onde a mesma se dá de forma mais organizada,
em que busca uma melhor comercialização dos seus produtos, com isso todos os membros da
família se torna responsável pelo processo produtivo, desde a gestão até o trabalho propriamente
dito, com isso Carmo (1999), citado por Tinoco (2008), faz uma abordagem do perfil da
agricultura brasileira e descreve a agricultura familiar como forma de organização produtiva
em que os critérios adotados para orientar as decisões relativas a exploração agrícola não se
subordinam unicamente pelo ângulo da produção/rentabilidade econômica, mas levam em
consideração também as necessidades e objetivos da família. Contrariando o modelo patronal
no qual há completa separação entre gestão e trabalho, no modelo familiar estes fatores estão
intimamente relacionados.
Diante da abordagem de agricultura familiar é fundamental o papel do agricultor
familiar. Então é considerado agricultor familiar, aquele que é responsável pela execução de
atividades desempenhadas no meio rural ou em localidades próximas, a mão-de-obra utilizada
é genuinamente da família, exceto aqueles membros que não estão aptos ao trabalho, como no
caso de crianças, por não apresentarem idades suficientes para tal função ou quaisquer outros
membros da família que se encontre em condições desfavoráveis, com isso Brasil (2006),
referente à lei n° 11.326, de 24 de julho de 2006 do art 3º diz que só é considerado agricultor
familiar àqueles que atendam aos seguintes requisitos:
Não detenha, a qualquer título, para área maior do que quatro módulos
fiscais; utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas
atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento;
tenha percentual mínimo de renda familiar originada de atividade
econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma
definida pelo Poder Executivo; dirija seu estabelecimento ou
empreendimento com sua família. (BRASIL, 2006, p. 1).
A agricultura familiar desenvolve um papel fundamental no desenvolvimento social e
no crescimento equilibrado do País, consistindo em um setor de expansão, pois ele é
responsável por garantir a segurança alimentar, e por movimentar bilhões de reais, bem como
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a preservação dos alimentos considerados tradicionais ao consumo, e também por apresentar
alimentos com características saudáveis, e com um padrão de qualidade superior aos que não
são produzidos por esta prática, possibilitando uma alimentação balanceada aos seus
consumidores (MDA, 2016). Com isso percebe-se que a agricultura desempenha um
desenvolvimento mais democrata, no qual os alimentos produzidos podem ser vendidos a um
preço acessível, onde aqueles que se encontra com um poder aquisitivo baixo pode adquiri-los,
assegurando a alimentação dessas pessoas.
A grande participação desse setor na economia, fez com que possibilitasse uma redução
do êxodo rural, e diversos empregos fossem gerados, acarretando uma geração e distribuição
de renda, o governo visando uma diminuição das desigualdades e uma melhoria no bem-estar
das famílias que compõem o meio rural, vem inserindo políticas públicas de modo a facilitar a
inserção dessas famílias na sociedade, tendo como objetivo primordial o combate à fome e
geração de emprego e renda. Essas políticas são voltadas tanto para a produção como para a
comercialização.
Uma das políticas que se encaixa nessa discussão é a do Programa Nacional de
alimentação Escolar (PNAE) este encontro da alimentação escolar com a agricultura familiar
tem promovido uma importante transformação na alimentação escolar, ao permitir que
alimentos saudáveis e com vínculo regional, produzidos diretamente pela agricultura familiar,
possam ser consumidos diariamente pelos alunos da rede pública de todo o Brasil. A agricultura
familiar passou a ser considerado o principal instrumento de acessão ao desenvolvimento e
contribuindo também para a redução das desigualdades regionais (FNDE, 2016).
2.3 Políticas Públicas Para a Agricultura Familiar
As políticas públicas voltadas para o atendimento das necessidades específicas do
segmento social de agricultores familiares, só passaram a existir após a década de 90, e mesmo
assim era caracterizada de modo meramente instrumental e bastante impreciso no âmbito da
burocracia estatal brasileira, (MATTEI, 2014).
Diante dessa situação Mattei (2014), ressalta que o Governo Federal em 1996 criou o
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), em que buscaria
atender uma antiga reivindicação das organizações dos trabalhadores rurais, onde demandavam
a formulação e implantação de políticas de desenvolvimento rural específica para o maior
segmento da agricultura brasileira, porém é o mais fragilizado em termos de capacidade técnica
e de inserção nos mercados agropecuários.
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O Pronaf trata-se de um programa do Governo Federal cuja finalidade, de acordo com
seu decreto de criação (Decreto 1.946, de 28 de junho de 1996) é promover o desenvolvimento
sustentável do segmento rural constituído pelos agricultores familiares, de modo a propiciar o
aumento da capacidade produtiva, a geração de empregos e a melhoria de renda (CONTI e
ROITMAN 2011). O Pronaf é uma política de crédito destinada ao produtor rural, atualmente
está sob a gestão do Ministério do Desenvolvimento Agrário, em que firma tanto com a
produção e a comercialização dos produtos da agricultura familiar.
O Ministério do desenvolvimento Agrário aborda que o acesso ao Pronaf se inicia na
discussão da família sobre a necessidade do crédito, seja ele para o custeio da safra ou atividade
agroindustrial, seja para o investimento em máquinas, equipamentos ou infraestrutura de
produção e serviços agropecuários ou não agropecuários.
Visando a comercialização dos produtos gerados na agricultura familiar o Governo
Federal criou duas políticas públicas destinada ao escoamento dos produtos gerados na
agricultura familiar são elas o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), e o Programa
Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), os dois programas têm como objetivo ajudar os
produtores rurais a comercializar seus produtos, conforme ressalta o Ministério do
Desenvolvimento Agrário (MDA, 2016), dizendo que o Programa de Aquisição de Alimentos
(PAA) é uma ação do Governo Federal para colaborar com o enfrentamento da fome e da
pobreza no Brasil e, ao mesmo tempo, fortalecer a agricultura familiar. Para isso, o programa
utiliza mecanismos de comercialização que favorecem a aquisição direta de produtos de
agricultores familiares ou de suas organizações, estimulando os processos de agregação de valor
à produção.
Ainda relacionado com o MDA o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)
prevê o uso de no mínimo 30% dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação para a alimentação escolar, na compra de alimentos da
agricultura familiar para serem servidos nas escolas da rede pública de ensino.
A aquisição de gêneros alimentícios é realizada, sempre que possível, no mesmo
município das escolas, priorizando os assentamentos de reforma agrária, as comunidades
tradicionais indígenas e comunidades quilombolas. Esses dois programas servem como
fortalecimento para a agricultura familiar, uma vez que os produtores rurais que participam do
mesmo se certificam da garantia de comercialização de seus produtos.
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O incentivo a agricultura familiar é de grande relevância, pois a mesma contribui de
certa forma para a redução da pobreza, diminuição do êxodo rural, e também é responsável por
contribuir para a segurança alimentar do País, fornecendo os alimentos considerados essenciais
ao consumo nas mesas dos brasileiros.
3. METODOLOGIA
O presente estudo foi realizado no município de Mossoró localizado no Estado do Rio
Grande do Norte, a pesquisa compreendera os anos de 2011 a 2014 como período de análise,
buscando avaliar Programa Nacional de Alimentação Escolar- PNAE, e verificar se o PNAE
está contribuindo para o fortalecimento da agricultura familiar no município de Mossoró.
Os dados utilizados neste trabalho, são de origem primaria, pois foi realizada entrevistas
aos responsáveis pelo programa, mais precisamente no Conselho de Alimentação Escolar da
cidade de Mossoró, que fica localizada na secretaria de educação do referido município, para a
obtenção de dados como: valores que são transferidos para o município de Mossoró através do
PNAE e também os valores das aquisições da agricultura familiar durante os anos de 2011 a
2014 e também secundários fornecidos pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP).
O método será através da construção de indicadores de desempenho, que de acordo com
Tribunal de Contas da União (TCU), boletim nº 40 (2000), descreve como se constituindo em
um número, percentagem ou razão que mede um aspecto de desempenho, com o objetivo de
comparar esta medida com metas preestabelecidas.
Um dos indicadores construídos nessa pesquisa tem como objetivo demostrar se a
porcentagem que determina a lei nº 11.947 de 16 de junho de 2009 está sendo obedecida no
município de Mossoró, com isso temos o seguinte: indicador da aquisição da agricultura
familiar (IDAAF), o mesmo é descrito pela fórmula abaixo.
IDAAF= VALOR DAS AQUISIÇÕES/ VALOR TRANSFERIDO x 100
E também através do indicador de verificação da universalidade (IVU), que tem por
objetivo mostrar a porcentagem de alunos que são beneficiados pelo programa de alimentação
escolar no município de Mossoró, e se atende as expectativas que é estimada pelo FNDE, para
isso temos a seguinte formula:
IVU= BASE DE CALCULO/ TOTAL DE ALUNOS ATENDIDOS x 100
O tipo de pesquisa é de caráter exploratória e descritiva, pois o primeiro tem como
propósito proporcionar uma maior familiaridade com o problema a ser estudado, buscando
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torná-lo mais explícito ou também atuando na construção de hipóteses, onde a forma de
planejamento apresenta um caráter flexível, considerando diversos aspectos relativos ao fato ou
fenômeno estudado, já a descritiva seu objetivo principal é determinar certas dimensões , onde
procura-se descrever situações de mercado com base em dados primários, podendo ser
elaborada com a finalidade de identificar possíveis relações entre variáveis (GIL, 2010).
4. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS
Nos itens abaixo temos os resultados referentes aos dados obtidos por meio de
entrevistas realizadas com os responsáveis pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar
no município de Mossoró durante os anos de 2011 a 2014, e também a partir de dados
secundários encontrados no site do INEP.
4.1 Transferências dos recursos do FNDE para o PNAE no município de Mossoró
durante o período de 2011 a 2014
Para a obtenção destes dados foi realizada uma pesquisa de campo, onde a mesma contou
com a realização de entrevistas com os responsáveis do PNAE no Município em análise, acerca
dos resultados do programa durante o período de 2011 a 2014, mais precisamente aos
colaboradores do CAE. O valor do repasse é efetuado de acordo com o levantamento dos alunos
matriculados na rede pública de ensino, referente a quantidade de alunos matriculados no
período anterior. O Gráfico abaixo mostra os valores do repasse nesse período:
Gráfico 1: Valores transferido para o PNAE em Mossoró de 2011 a 2014
Fonte: Elaborada pelo autor com base nos dados da Secretaria da Educação
PMM, (2016).
O gráfico 1 mostra um crescimento no valor do repasse no período em análise, isso se
deu devido à expansão de alunos matriculados no ano anterior, embora no ano vigente o número
de alunos seja maior ou menor, o cálculo para determinar o valor a ser destinado ao município,
sempre será realizado com base no censo realizado um ano antes (fonte).
2011 2012 2013 2014
1.928.160,002.224.536,00
2.447.722,00 2.789.176,00
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O censo de 2011 constatou 20.260 alunos matriculados, mais o repasse foi realizado em cima
de 19.938, pois era a quantidade de alunos no ano de 2010. Já em 2012 se tinha 21.431 alunos
na rede pública de ensino, e o valor do repasse foi estimado em relação a 2011, que apresentava
uma quantidade menor, assim também ocorre o mesmo para 2013 e 2014. Dentre os quatros
anos analisados o ano de 2014 foi o que chamou mais atenção, pois a quantidade de alunos é
inferior aos dos outros anos, só não é menor que o de 2011, mais mesmo assim obteve o maior
repasse, em razão do censo realizado em 2013, apresentando a maior quantidade de alunos
matriculados durante todo o período em análise (BRASIL, 2016).
De acordo com informações adquiridas na Secretaria de Educação, a Prefeitura
Municipal de Mossoró não complementa o recurso que a União repassa para a alimentação
escolar, ficando assim o Governo Federal com a responsabilidade de garantir a merenda escolar
na escola pública.
4.2 Alunos da educação básica atendidos pelo PNAE
Tendo em vista que o repasse para o PNAE só é realizado quando o município apresenta
a quantidade de alunos matriculados no ano anterior, do período a ser transferido o valor para
a alimentação escolar. Diante disso o gráfico abaixo mostra o censo realizado no ano de 2010,
para fazer o cálculo do repasse que deve ser destinado em 2011, da mesma forma ocorre com
os outros anos.
Gráfico 2: Alunos Matriculados- censo escolar
Fonte: Elaborada pelo autor com base nos dados do INEP (2016).
No gráfico apresentado acima temos a quantidade de alunos matriculados na rede
pública municipal de ensino, somando assim 83.238, onde o FNDE determina que para o PNAE
apresentar uma universalidade, o programa deve atender todos os alunos matriculados,
2010 2011 2012 2013 2014
19.93820.259
21.43121.610
21.087
1213
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conforme o registro no censo escolar, com isso no gráfico 5 se percebe um crescimento durante
os anos em analise, onde 2013 apresentou a maior quantidade de alunos, toma-se por base esses
anos, pois é através deles que foi realizado o cálculo do repasse, (INEP, 2016).
Apesar de ocorrer um crescimento na quantidade de alunos, houve uma redução na
quantidade de escolas que são as clientelas atendidas, como por exemplo o ano de 2011 eram
110 escolas beneficiadas pelo programa, no ano seguinte caiu para 108 escolas, em 2013
ocorreu um aumento de uma escola, atendendo assim 109, voltando a cair novamente em 2014,
para 102. Mas essa redução não é considerada drástica pela secretaria da educação, segundo
informações obtidas na mesma, essas reduções ocorreram devido a questão da estrutura, e como
objetivo da rede básica de ensino é propiciar um local adequado para aprendizagem, chegarão
a conclusão que o fechamento seria a melhor alternativa, mas os alunos dessas escolas foram
transferidos para outra que tinha estrutura para atendê-los.
4.3 Mensuração dos indicadores de desempenho
Gráfico 3: Indicador da Aquisição da Agricultura Familiar (IDAAF)
Fonte: Elaborada pelo autor com base nos dados da Secretaria da educação PMM, (2016).
No gráfico acima, é apresentado o cálculo do indicador de desempenho, através da
seguinte formula: IDAAF= VALOR DAS AQUISIÇÕES/ VALOR TRANSFERIDO x 100,
em que o mesmo busca mostrar se a porcentagem que determina a Lei nº 11.947 de junho de
2009 está sendo obedecida em Mossoró, ou seja se o município está destinando 30% do que é
repassado pelo FNDE para o PNAE, em aquisições diretas da agricultura familiar.
Acima, como demonstra o gráfico é evidente o descumprimento da lei, pois em todo o
período da análise, o município apresenta uma porcentagem menor que a determinada, tendo
2011 2012 2013 2014
1.928.160,00
2.224.536,002.447.722,00
2.789.640,00
432.077,31 489.402,81295.479,41 366.434,46
22,41% 22,00% 12,07% 13,14%
Valor Transferido Valor Aquisitivo da Agricultura Familiar IDAAF
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em vista que o ano que se aproximou mais foi o de 2011. Mas essa porcentagem é dispensada
quando ocorre alguma irregularidade na aquisição dos produtos advindo da agricultura familiar
local, em uma entrevista realizada a diretora do Conselho de Alimentação Escolar, a mesma
ressaltou que durante esses anos a lei não foi obedecida, devido os agricultores familiares, tanto
independente quanto associado a cooperativa apresentarem condições inadequadas para que
fosse efetuada a compra, uma das razões era que eles não emitiam o documento fiscal e também
não portava do selo de segurança sanitária, onde são fundamentais para que se possa realizar a
compra. Um dos manuais disponibilizados pelo FNDE diz que o percentual mínimo deverá ser
observado nas aquisições efetuadas por todas as Entidades Executoras, e sua obrigatoriedade é
dispensada pelo FNDE somente quando apresenta uma das seguintes questões: impossibilidade
de emissão do documento fiscal correspondente, inviabilidade de fornecimento regular e
constante dos gêneros alimentícios, desde que respeitada a sazonalidade dos produtos, as
condições higiênico-sanitárias inadequadas, isto é, que estejam em desacordo com o disposto
no art. 33 da Resolução nº 26, de 17 de junho de 2013, com isso as mesma precisam ser
comprovadas pela Entidade Executora na prestação de contas (BRASL, 2016).
Para medir o desempenho do PNAE em Mossoró também foi utilizado o indicador de
verificação da universalidade (IVU), que tem por objetivo mostrar a porcentagem de alunos que
são beneficiados pelo programa de alimentação escolar no município de Mossoró, e se atende
as expectativas que é estimada pelo FNDE, e foi obtido através da seguinte formula: IVU=
NUMERO DE CLIENTELA ATENDIDA/ TOTAL DE ALUNOS MATRICULADOS x 100.
A universalidade consiste em beneficiar todos os alunos cadastrado no censo escolar,
independente da condição social, raça, cor e etnia.
Tabela 1: Indicador de verificação da universalidade- IVU
Ano Base de cálculo Alunos atendidos- PNAE IVU %
2011 19.938 20.259 98,42
2012 20.259 21.431 94,53
2013 21.431 21.610 99,17
2014 21.610 21.087 102,48
Fonte: elaborada pelo autor com base nos dados do INEP, (2016).
Na tabela 1 foi apresentado o cálculo do IVU, que tem como objetivo demostrar se o
programa está atendendo todos os alunos do ensino básico da rede pública, a quantidade desses
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alunos é obtida através do censo realizado todos os anos, a base de cálculo que demonstra a
tabela 2, diz respeito ao censo do ano anterior ao da análise que nesse trabalho é a partir de
2011 até o ano de 2014, dessa maneira é fator essencial para realizar o cálculo da universalidade,
e os alunos atendidos, são os que estão matriculados e sendo beneficiados no ano da pesquisa.
O FNDE estima que todos os alunos inseridos na educação básica da rede pública, sejam
atendidos pelo PNAE, ou seja, que a merenda escolar beneficie todos os alunos, com isso busca
a atingir a porcentagem de 100% dos alunos que recebem diariamente a merenda escolar, para
que seja considerado como um programa que apresenta universalidade no atendimento.
Na tabela acima é notório que apenas o ano de 2014 atendeu a porcentagem que o FNDE
estima para se obter universalidade no atendimento, pois no ano de 2013 a quantidade de
aluno era maior em relação a de 2014, os outros anos apresentam uma porcentagem abaixo da
que é considerada como eficiente, mas de acordo com informações obtidas através das
entrevistas realizadas com os responsáveis pelo programa, o município não consegue ser
eficientes todos os ano da analise devido o cálculo do repasse ser realizado de acordo com o
censo do ano anterior, isso acaba prejudicando o atendimento, pois no ano vigente sempre
ocorre uma quantidade maior de alunos matriculados, onde acaba reduzindo também a
qualidade da alimentação ofertada, em que se tem um valor para a compra inferior ao número
de alunos matriculados.
Ainda relacionado com o atendimento do PNAE, uma entrevista realizada com a diretora
de uma das escolas beneficiadas pelo programa, informou que eles se desdobram para conseguir
oferecer a alimentação escolar, mesmo com um recurso inferior em relação a quantidade de
alunos, a escola consegue fornecer a alimentação escolar para todos os alunos matriculados,
embora reduza alguns itens que seriam essenciais a alimentação escolar
5. CONCLUSÃO
Nesse artigo buscou-se responder o seguinte problema: o município de Mossoró está
cumprindo a determinação da lei nº 11.947 de 16 de junho de 2009? a resposta foi obtida
através de entrevistas realizadas com os responsáveis pelo programa na cidade de Mossoró,
diante dos dados apresentados nessa pesquisa, podemos chegar à conclusão que no período em
que se realizou a pesquisa entre os anos de 2011 até 2014, se constatou o descumprimento da
lei que o FNDE determina, ou seja em Mossoró o PNAE não estava atuando de forma
satisfatória, pois a partir do momento que não se cumpre a lei, é impossível uma inclusão dos
alimentos que são gerados na agricultura familiar da cidade, reduzindo assim, o escoamento da
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produção, o emprego e a geração de renda para os agricultores familiares, tendo em vista que é
um dos principais programas do Governo Federal para a comercialização dos alimentos que são
produzidos pela agricultura familiar no Brasil, pois o mesmo é entendido como uma forma de
garantia para essas pessoas que se enquadra como agricultor familiar.
Mas de acordo com informações adquiridas com a diretora do programa, Mossoró só
não cumpriu devido as irregularidades apresentadas por parte dos agricultores associados as
cooperativas, e nesse caso o FNDE dispensa os 30% que deve ser utilizado para a compra direta
da agricultura familiar, uma das razões para o descumprimento da referida lei, era que eles não
emitiam o documento fiscal e também não portava do selo de segurança sanitária, onde são
fundamentais para que se possa realizar a compra. As questões da emissão das notas fiscais são
mais complicadas para o agricultor individual, devido à grande burocracia exigida pela
prefeitura, fazendo com que na maioria das vezes o agricultor desista de concorrer a chamada
pública, e também as dificuldades de participar das licitações devido à falta de preço em relação
a concorrência, já para as cooperativas, como elas dispõe de uma melhor organização e
planejamento facilita a emissão das notas fiscais.
Uma proposta para esse problema seria um maior diálogo entre os gestores municipais
e os agricultores familiares, de forma que pudessem entrar em um acordo que beneficiasse as
partes envolvidas no PNAE , os gestores investiam mais na agricultura familiar, facilitando a
emissão do documento necessário para aquisição dos produtos, fornecendo também parcerias
com a questão da logística, já que os transportes são caros e os agricultores não conseguem
obter, seria necessário também investimentos na infraestrutura dos empreendimentos rurais,
dessa forma os agricultores ficariam responsáveis pela entrega regular e em condições
adequadas dos alimentos, tendo em vista que essa era uma das soluções para o município
contribuir de forma satisfatória para impulsionar a agricultura familiar local.
A cidade de Mossoró durante esses anos, mesmo não cumprindo a determinação da lei,
o repasse para a merenda escolar todos os anos eram efetuados, chegando a mostrar um
crescimento, onde no ano de 2014 chegou a casa de 2.789.176,00 milhões, com a continuidade
do valor transferido, o PNAE é considerado de suma importância para a cidade, pois alguns
alunos que são atendidos pelo programa tem a merenda escolar como a sua única refeição do
dia, ressaltou a diretora de uma das escolas entrevistadas.
O PNAE em Mossoró atende a uma quantidade de alunos estimada em
aproximadamente a 83.238 durante os anos de 2011 a 2014, mas somente o ano de 2014 chegou
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a atender de forma universalizada, ou seja, todos os alunos cadastrados no censo escolar, através
de informações obtidas com as entrevistas, o grande problema de não atender a todos os alunos
é devido o repasse ser efetuado em relação ao censo realizado no ano anterior do atendimento,
onde em quase todos os anos da analise o ano atendido apresentou uma maior quantidade de
alunos, dificultando assim o atendimento, uma solução seria que o valor fosse calculado com
base nos estudantes matriculados no ano do atendimento, dessa forma atingiria a
universalidade.
Diante dos indicadores apresentados nessa pesquisa chega-se à conclusão que o
desempenho do PNAE em Mossoró não está sendo totalmente satisfatório, no primeiro que é o
IDAAF, nota-se o descumprimento da lei 11.947 de 16 de junho de 2009, fazendo com que não
contribua para o fortalecimento da agricultura familiar local, mesmo o FNDE dispensando a
porcentagem quando ocorre alguma irregularidade, não se deve deixar a agricultura familiar
sem comercialização, pois se um dos objetivos do programa é uma maior inserção dos produtos
da agricultura familiar. E o segundo diz respeito a universalização, e em Mossoró, somente um
dos anos em analise chegou a cumprir o atendimento a todos os alunos da educação básica, com
isso não está sendo obedecidos um dos princípios básicos do PNAE, que é a universalização.
REFERÊNCIAS
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SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
PROGRAMAS PÚBLICOS E ESTRATÉGIAS DE CONVIVÊNCIA COM O
SEMIÁRIDO: um estudo de caso no município de Jequitinhonha-MG1
PUBLIC PROGRAMS AND COPING STRATEGIES WITH SEMIARID CONDITIONS: a case study in the municipality of Jequitinhonha-MG
Autor(es): Jeter Liano Silva; Eduardo Magalhães Ribeiro
Filiação: Programa de Pós-Graduação em Sociedade, Ambiente e Território UFMG/UNIMONTES, Montes Claros-MG, Brasil.
E-mail: [email protected]; [email protected]
Grupo de Pesquisa: 3. Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo O semiárido brasileiro é uma vasta região de 969.589,4 quilômetros quadrados, povoada por 44.863.468 habitantes, caracterizada pelo clima quente e seco, com índices de precipitação entre 400 e 800 mm anuais. Em 2005 o Ministério da Integração Nacional re-delimitou o denominado “novo semiárido brasileiro”. O município de Jequitinhonha-MG está inserido na Nova Delimitação do Semiárido Brasileiro. Nesta região, como em todo o semiárido, as secas têm trazido dificuldades. Para enfrentá-las, a sociedade civil e o setor público ao longo do tempo criaram estratégias, programas, medidas e técnicas que têm graus maiores ou menores de eficiência e são capturados, e avaliados pela população de formas diferentes em um contexto de estratégias particulares de convivência com a seca. O objetivo deste artigo é analisar os programas adotados por instituições públicas para a convivência com o período de seca na região rural do município de Jequitinhonha, situado no semiárido de Minas Gerais. Procura, ainda, compreender essas estratégias e programas analisando-os sob o ponto de vista da funcionalidade, efetividade e aceitação pela população atendida. Trata-se de uma pesquisa qualitativa que reúne coleta de informações institucionais e levantamento bibliográfico que discutem as estratégias e programas públicos de convivência com o semiárido. Foram realizadas entrevistas em seis instituições que desenvolvem programas e ações de convivência e combate à seca no município de Jequitinhonha – MG. Os resultados da pesquisa mostraram que as famílias de agricultores captam todos os programas que chegam até eles e fazem uso destes conforme estratégias e metodologias definidas o âmbito da comunidade e da família. As tecnologias sociais, executadas pela Cáritas em Jequitinhonha - MG, se mostraram mais satisfatórias, tanto do ponto de vista da população quanto na análise de todas as instituições pesquisadas. Palavras-chave: semiárido, seca, programas públicos, Jequitinhonha Abstract Brazilian semiarid region is a wide territory of 969.589,4 squared quilometres populated by 44.863,468 people, characterized by the hot and dry weather with rainfall indices between 400 and 800mm for year. In 2005 the ministry of national integration redelimitaded the called “new
Brazilian semiarid”.The city of Jequitinhonha –MG is included in the new Brazilian semiarid
1 Este trabalho recebeu apoio do CNPq.
1221
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delimitation. In this region, as in all semiarid, the drought has brought some difficulties. To face it the civil society and the government has been developed some strategies, programs, attitudes and techniques that work in greater or lesser degree of efficiency and measured by population in different ways in a context of particular strategies of living through the drought. The purpose of this article is to analyze the programs adopted by public institutions to help the population to live through the dry period in the rural region of the city of Jequitinhonha, in the semiarid of Minas Gerais. It also purposes to understand these strategies and programs analyzing it by the point of view of the functionality effectiveness and acceptance by the served population .It’s about a qualitative research that complains collection of institutional information and bibliographic survey that talks about strategies and public programs for living in semiarid. Interviews were conducted in 6 institutions that develop programs and actions to face the drought in Jequitinhonha-mg. Research results have shown that families of farmers capture all the resources that come to them and make use of these strategies and methodologies as defined in the framework of community and family. The social technologies executed by “Cáritas”in Jequitinhonha –MG are the most satisfactory by the point of view of the population as the analysis of all the surveyed institutions. Keywords: semiarid, drought, public programs, Jequitinhonha.
1. Introdução
O semiárido brasileiro é uma vasta região de 969.589,4 quilômetros quadrados,
povoada por 44.863.468 habitantes, caracterizada pelo clima quente e seco, com índices de
precipitação entre 400 e 800 mm anuais. Porém, este fator não é o principal responsável pelas
condições climáticas críticas da região: acontece que as poucas chuvas que ocorrem no território
se distribuem de forma irregular e em curtos períodos de tempo. Os prolongados períodos de
secas provocam queda na produção de alimentos e consequentemente ciclos de insuficiência na
quantidade e na qualidade alimentar da população, além de problemas ambientais e
comprometimento de renda, com consequências diretas sobre as condições de vida e de
permanência nesta região.
Após períodos de fortes secas registrados no país desde o século XIX, diversos estudos
foram feitos abordando a temática e influenciando programas que propõem “combate” ou
“convívio” com as secas. Vários autores analisaram os problemas do semiárido, inclusive os
problemas de migração ocorridos em razão das secas e as consequentes dificuldades de sustento
para as famílias nas regiões rurais. São justamente os assalariados rurais, pequenos produtores
e agricultores familiares os que mais sofrem as consequências das secas no semiárido.
Parte do vale do rio Jequitinhonha mineiro está incluído no semiárido brasileiro. Em
2005 o Ministério da Integração Nacional re-delimitou o denominado “novo semiárido
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brasileiro” por meio da Portaria Interministerial n°6, de 29 de março de 2004, abrangendo 1.133
municípios brasileiros, sendo 85 destes no estado de Minas Gerais e 31 no vale do
Jequitinhonha. Nesta região, como em todo o semiárido, as secas têm trazido dificuldades. Para
enfrentá-las, a sociedade civil e o setor público ao longo do tempo criaram estratégias,
programas, medidas e técnicas que têm graus maiores ou menores de eficiência e são
capturados, e avaliados pela população de formas diferentes em um contexto de estratégias
particulares de convivência com a seca.
Deste modo, o objetivo deste artigo é analisar os programas adotados por instituições públicas
para a convivência com o período de seca na região rural do município de Jequitinhonha,
situado no semiárido de Minas Gerais. Procura, ainda, compreender essas estratégias e
programas analisando-os sob o ponto de vista da funcionalidade, efetividade e aceitação pela
população atendida.
2. Metodologia
Trata-se de uma pesquisa qualitativa que reúne coleta de informações institucionais e
levantamento bibliográfico que discutem as estratégias e programas públicos de convivência
com o semiárido. Além do embasamento teórico foram utilizadas para a pesquisa entrevistas
realizadas em instituições no município de Jequitinhonha-MG.
Foram realizadas entrevistas em seis instituições públicas que lidam direta ou
indiretamente com os programas e ações de convivência com a seca no município de
Jequitinhonha-MG: a Cáritas Diocesana de Almenara, a Secretaria Municipal de
Desenvolvimento Econômico e Sustentável, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Jequitinhonha, o Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável - CMDRS, a
Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural – Emater e o Instituto de Desenvolvimento
do Norte e Nordeste de Minas Gerais - Idene. Buscou-se responder às seguintes questões:
1. A instituição desenvolve ações ou programas específicos para a convivência com a
seca? Quais?
2. Como funciona cada ação?
3. Como as famílias avaliam as ações?
4. Como são definidos os grupos prioritários para as ações de combate e convivência com
a seca?
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5. Quais ações são mais bem recebidas pelas famílias?
Após a realização das entrevistas as informações coletadas foram sistematizadas
permitindo Identificar as estratégias e programas analisando-os sob o ponto de vista da
funcionalidade, efetividade e aceitação pela população atendida bem como levantar as
instituições públicas e privadas que desenvolvem estratégias e programas de convivência com
o semiárido na região de Jequitinhonha-MG.
2.1 Caracterização do município de Jequitinhonha-MG
Jequitinhonha-MG é um município com população total no ano de 2010 de 24.131
habitantes. O município possui área territorial de 3.514,216 Km² e densidade demográfica de
6,87 habitantes por Km² no ano de 2010. O município possui população residente rural de 7.070
pessoas e urbana de 17.061 pessoas com Índice de Desenvolvimento Humano Médio – IDHM
igual a 0,615 ocupando a 3796ª posição entre os 5.565 municípios brasileiros segundo o IDHM
(IBGE, 2016).
Município de Jequitinhonha-MG Fonte: IBGE, 2016.
O município de Jequitinhonha-MG está inserido na Nova Delimitação do Semiárido
Brasileiro.
3. Referencial Teórico
3.1 Semiárido
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O clima semiárido é identificado pelo baixo índice de precipitação e pela
irregularidade temporal e espacial com que ocorrem as escassas chuvas. Além disso,
historicamente, fatores políticos, sociais e culturais estão combinados ao contexto do semiárido
brasileiro: entre outros, Silva (2006) relata que as regiões semiáridas são caracterizadas pela
aridez do clima, pelas irregularidades pluviométricas e pela pobreza orgânica dos solos,
afirmando também que o semiárido é marcado por contradições e injustiças sociais.
No semiárido brasileiro sempre estiveram relacionadas a seca e a pobreza, ambas
associadas à região Nordeste do país, numa relação instituída por Euclides da Cunha (1973)2,
no começo do século XX, que em “Os sertões” construiu uma imagem da seca que antecede ao
uso corrente do conceito de semiárido, baseando-se em suas experiências vividas na região
durante a Guerra de Canudos (outubro de 1896 a julho de 1897).
Segundo Silva (2006) o semiárido brasileiro historicamente foi identificado com o
Nordeste das secas e sertão. Os investimentos do Estado na região para o chamado combate às
secas, porém, exigiu a delimitação oficial da região semiárida, e desde 1936 vêm sendo feitos
esforços para delimitá-lo, e desde a criação do Polígono das Secas foi ganhando consistência.
O Ministério da Integração Nacional (MI) lançou em 2005 a Nova Delimitação do
semiárido Brasileiro. O documento base criado pelo MI, propunha um novo levantamento da
região a ser institucionalizada como semiárido nacional, considerando não somente a falta de
chuvas como fator crucial para inclusão de determinada região na área de abrangência do
semiárido, mas também a irregularidade da distribuição espacial e temporal pluviométrica. O
documento relata que:
Os conhecimentos acumulados sobre o clima permitem concluir não ser a falta de chuvas a responsável pela oferta insuficiente de água na região, mas sua má distribuição, associada a uma alta taxa de evapotranspiração, que resultam no fenômeno da seca, a qual periodicamente assola a população da região. (BRASIL, 2005, p. 2)
2.2 Combate à seca e convivência com o semiárido
As ações de combate à seca por parte do Estado se institucionalizaram com a criação
da Inspetoria de Obras Contra as secas - IOCS em 1909. A partir de então, obras pontuais como
a construção de açudes, barragens, abertura de poços e construção de estradas, além de diversos
2 Ver: Euclides da Cunha. Os sertões. Vol.1. Editora Três. São Paulo - SP, 1973.
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estudos e levantamentos técnicos científicos à respeito das peculiaridades físicas ambientais da
região foram realizados (SILVA, 2006).
O uso deste termo “combate à seca”, porém, tem sido questionado por pesquisadores
e movimentos sociais. Para Silva (2006), em diálogo com Manuel Correia de Andrade, as ações
do Estado para o semiárido sempre foram conservadoras e paliativas; tais ações concentravam-
se exclusivamente na seca e “omitiam questões fundamentais da região, como o do acesso à
propriedade de terra por parte dos agricultores” (SILVA, 2006, p. 154). Tais ações, feitas em
desconexão com as características culturais e sociais da região, não foram exitosos para a
população da região (SILVA, 2006).
Ribeiro e outros (2005) em estudo sobre gestão, uso e conservação de recursos naturais
em comunidades rurais do Alto Jequitinhonha, traz uma visão de como as comunidades rurais
se relacionam com os recursos naturais mostrando que, para a definição de políticas públicas
que venham interferir nesses locais, é necessário conhecer estas relações e suas peculiaridades.
Foi da perspectiva crítica ao combate à seca que, conforme Silva (2006), originou-se
a proposta de convivência com o semiárido. Surgiu como uma proposta de inovações
apropriadas e adaptadas à região, considerando as peculiaridades ambientais, socioculturais e
econômicas do semiárido. Neste contexto que surgiu a proposta da convivência com o
semiárido.
Silva (2006) analisou diversas ações que, a partir da década de 1990, se intensificaram
e clamaram por mudanças por parte do Estado na abordagem do problema das secas. A
sociedade civil organizada, por meio de ONG's, sindicatos de trabalhadores rurais, associações
e cooperativas cobraram medidas imediatas e ações permanentes para a convivência com a seca.
2.3 Semiárido de Minas Gerais
A Nova Delimitação do semiárido Brasileiro assinada pelo então ministro da
Integração Nacional no ano de 2005, na cidade de Almenara – MG, teve Minas Gerais como o
estado com maior número de municípios incluídos em relação à delimitação anterior, de 40 para
85 municípios, dos quais 31 se encontram na região do Vale do Jequitinhonha (BRASIL, 2005).
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O estado de Minas Gerais3 tem 103.590,00 Km² de semiárido, o que representa 51,7 % de área
total do estado e 10,5% de toda a região semiárida nacional (BRASIL, 2005).
O semiárido de Minas Gerais estende-se por parte das regiões Norte e Vale do
Jequitinhonha. Cada região possui suas peculiaridades e, compreender o semiárido mineiro,
requer entender as peculiaridades micro locais, inclusive as dimensões da agricultura familiar.
Para Ribeiro e outros (2007) a agricultura familiar do vale do Jequitinhonha é
composta por lavradores bem organizados e sua agricultura baseia-se no trabalho familiar, não
coadunam com o sistema, adubo, trator e veneno. Galizoni (2005) afirma que há uma relação
conflitante na tríade “grande empreendimento consumidor - regulação comunitária - água”. Os
principais impactos ambientais relacionados à água no semiárido estão ligados à concentração
e uso dos recursos hídricos, que caracterizam os grandes projetos hídricos - irrigação, geração
de energia, consumo industrial. A autora fez uma relação entre os projetos desenvolvimentistas
da “Revolução Verde” e o descaminho das relações sustentáveis entre sociedade e ambiente,
com impactos, principalmente, sobre a agricultura familiar.
2.5 Programas públicos no Vale do Jequitinhonha Mineiro
Ribeiro e outros (2007) escreveram sobre a agricultura familiar e programas de
desenvolvimento rural no Alto Jequitinhonha. O texto analisa as intervenções do Estado por
meio de políticas públicas e como essas políticas se relacionam com a agricultura familiar: essas
políticas públicas sempre se pautaram na teoria desenvolvimentista, baseada na extrema
necessidade de trazer um rompimento com o modelo de produção local tido pelo Estado como
atrasado e não lucrativo.
Em contraponto, Ribeiro e outros (2007) e Galizoni e outros (2013) mostram que as
famílias de lavradores possuem capacidade para, com o conhecimento das peculiaridades
locais, estabelecer e participar do estabelecimento de políticas públicas que sejam mais
adequadas para sua própria localidade. Além disso, há a necessidade de articulação das
estratégias do Estado com as estratégias das famílias, pois, muitas vezes, as políticas são
definidas fora do contexto local, por técnicos que não possuem um conhecimento da realidade
da população.
3 Dados de tabela do documento da Nova Delimitação do Semiárido. BRASIL (2005). Disponível em: <http://www.mi.gov.br/c/document_library/get_file?uuid=0aa2b9b5-aa4d-4b55-a6e1-82faf0762763&groupId=24915>. Acesso em 23 de jun. de 2016.
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4. RESULTADOS
4.1 Ações da Cáritas Diocesana de Almenara – Baixo Jequitinhonha
A Cáritas Diocesana de Almenara – Baixo Jequitinhonha, é uma instituição da
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB, que atua junto às populações em sua luta
contra as desigualdades. A Cáritas trabalha “na perspectiva da Solidariedade Libertadora,
promovendo a organização social e comunitária, mobilização e lutas por direitos historicamente
negados ao povo do campo e da cidade” (CÁRITAS, 2016).
A instituição executa três ações diferentes de convivência com a seca em
Jequitinhonha: o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC), o Programa Uma Terra Duas
águas (P1+2) e o Programa Sementes do Semiárido (casas de sementes), todos em parceria com
a Articulação Semiárido Brasileiro - ASA e Governo Federal. Os programas são desenvolvidos
pela ASA que planeja e capta os recursos, a Cáritas executa as ações dos programas ao nível do
município e região.
4.1.1 O Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o
Semiárido: Um Milhão de Cisternas - P1MC
O P1MC, segundo a ASA (2016a) é o primeiro programa da instituição, desenvolvido
no início dos anos 2000, visando atender à necessidade básica da população que vive no campo:
água de beber. São construídas cisternas de placas de cimento de 16 mil litros com a seguinte
metodologia:
Através do armazenamento da água da chuva em cisternas construídas com placas de cimento ao lado de cada casa, as famílias que vivem na zona rural dos municípios do Semiárido passam a ter água potável a alguns passos. Não se faz mais necessário o sacrifício do deslocamento de quilômetros para buscar água para fazer um café, cozinhar e beber (ASA, 2016a).
A Cáritas executa o programa na região há cerca de 4 anos. As famílias a serem
beneficiadas pelo programa são selecionadas por meio de comissões municipais, que por sua
vez são definidas com a participação de entidades de representação da comunidade como o
Sindicato dos Trabalhadores Rurais e o CMDRS. Os critérios de seleção envolvem não somente
as questões naturais, mas também questões sociais, formatos de família e produção. Apesar de
a escolha passar sempre pelo crivo das representações sociais a nível local e da comunidade, o
programa não consegue atender a todos os que necessitam e ocorrem alguns conflitos em torno
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da necessidade de água, que são objeto de discussão frequente em reuniões e encontros das
comunidades.
O P1MC é executado com a participação efetiva das famílias e da comunidade, desde
a escolha dos beneficiados até a construção das “caixas”, como são chamadas as cisternas de
placas na região. Há todo um contexto de capacitação e difusão do conhecimento, estratégias e
tecnologias sociais de convivência com o semiárido. Agricultoras e agricultores são capacitados
sobre como “cuidar” da água das cisternas de placa, como aproveitar as chuvas e manter esta
água durante o período de estiagem. Além disso, os pedreiros que trabalham na construção das
cisternas são os próprios moradores das comunidades, que são capacitados para executar o
trabalho.
A Cáritas avalia o programa como uma das principais tecnologias de convivência com
o semiárido, pois traz não só a agua, mas o protagonismo das famílias, sua independência nos
momentos de escassez. A água sempre foi moeda de troca em eleições, ferramenta de
dominação demonstração de poder em regiões onde o recurso é escasso. As cisternas do P1MC
permitem que as famílias tenham a “sua água”, se organizando pela melhoria na qualidade de
vida, sonhando e planejando sua vida no campo. Esta importância do P1MC também aparece
no olhar das famílias e ficou evidente na fala de um agricultor durante uma conversa no
Sindicato dos Trabalhadores Rurais, referindo-se ao P1MC e P1+2, executados pela Cáritas.
“Na fome e na sede de água, os programas que mais adaptaram e podem gerar
mais recursos através deles são esses dois, porque você pode recompensar o que muitas vezes não tem: no caso a água. O poço artesiano e a barragem, não têm como.” (Fala do agricultor, Sr. Joel).
4.1.2 Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido:
Uma Terra e Duas Águas - P1+2
Assim como o P1MC o P1+2 é um programa da ASA executada em Jequitinhonha
pela Cáritas. Também tem como metodologia o armazenamento de água de chuva em
reservatórios, porém em maior quantidade com o objetivo de utilizar-se na produção de
alimentos da família. A ASA afirma que o programa “visa à segurança alimentar e nutricional
das famílias agricultoras do Semiárido em situações de insegurança alimentar, a
sustentabilidade ambiental, social, cultural e econômica” (ASA, 2016b). O programa é
composto por diferentes tecnologias de armazenamento de água: cisterna calçadão, barragem
subterrânea, tanque de pedra ou caldeirão, barreiro-trincheira, barraginha e cisterna-enxurrada.
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O P1+2 é uma continuidade do P1MC. As famílias recebem agua para a produção e
animais. Um dos critérios de escolha das famílias beneficiadas, além daqueles já utilizados para
o P1MC, é que sendo essa uma segunda água, a família já deve possuir a primeira água, par o
consumo humano. Em Jequitinhonha já foram implantadas as tecnologias: cisterna calçadão, a
de enxurrada, o barreiro trincheira e a cisterna subterrânea. É uma agua somente para produção
não sendo própria para o consumo humano.
O programa é visto como uma forma complementar ao P1MC, buscando afirmar a
soberania alimentar das famílias de agricultores, subsidiando lhes a produção no campo. As
tecnologias são definidas por questões ambientais (topografia e solo) e construídas por pessoas
da própria comunidade capacitadas para o trabalho. Em Jequitinhonha há a contrapartida das
famílias na fase de aterro da cisterna de 52 mil litros (parcialmente aterrada no solo). O P1+2
permite às famílias acesso à alimentação de qualidade e geração de renda por meio dos produtos
da agricultura familiar.
4.1.3 Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido:
Manejo da Agrobiodiversidade – Sementes do Semiárido
Segundo a ASA (2016c) o “Programa Sementes do semiárido”, lançado em 2015,
reforça a cultura do estoque, com sementes crioulas, afirmando que “além de infraestrutura para
estocar água para beber e produzir, as famílias serão apoiadas na sua prática de guardiães das
sementes crioulas”.
A Cáritas em Jequitinhonha executa o programa em duas comunidades, Brejão e
Córrego São Pedro. O programa dá autonomia aos guardiões das sementes e aos agricultores
no gerenciamento da casa de sementes. O formato do programa permite a inserção e
manutenção de produtos tradicionais, locais, de boa qualidade e adaptados à região. A
comunidade desenvolve sua própria dinâmica do uso da casa de sementes compreendendo este
como um espaço coletivo e que deve ser mantido por eles. As sementes são disponibilizadas
para os agricultores que mantêm o compromisso de devolver em dobro a medida utilizada.
Os guardiões (agricultores responsáveis pelas sementes) são capacitados e
incentivados ao resgate das sementes crioulas. Algumas comunidades, em parceria com o
Banco Nacional do Desenvolvimento-BNDS tiveram apoio na construção da estrutura física da
casa de sementes. O programa contribui para a manutenção da tradição dos agricultores e
valorização da cultura alimentar da região. Além disso, o projeto subsidia os agricultores com
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fornecimento de sementes, de boa qualidade, mais resistentes ao clima e adaptadas á região, no
período de escassez.
4.2 Ações da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Sustentável
Em entrevista com o secretário municipal de desenvolvimento econômico e
sustentável foram identificadas algumas ações de convivência e obras de combate à seca. No
âmbito da secretaria ainda não há a efetivação de grandes projetos, mas sim ações pontuais e
emergenciais. A administração municipal executa abertura de poços artesianos, auxilia a Cáritas
em algumas etapas do P1MC, executa um projeto de cercamento de nascentes, faz a construção
de algumas barraginhas e atende às comunidades com o caminhão pipa.
4.2.1 O Caminhão Pipa
É uma das principais, senão a principal ação do município, para o “enfrentamento” da
escassez de água em Jequitinhonha. O município recebeu um caminhão pipa da segunda fase
do Programa de Aceleração do Crescimento, o chamado PAC 2 terceiriza outros 2 caminhões
a um custo de cerca de 3500 R$ por mês de trabalho e, em períodos mais críticos, recebe ajuda
do Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais - DER/MG, que empresta mais
caminhões pipa.
É uma alternativa de alto custo e difícil monitoramento e controle. Nem sempre é
possível fiscalizar se a água que está abastecendo os caminhões e sendo levada às comunidades
é de boa qualidade. Muitas vezes a água sai bruta do rio Jequitinhonha. A demanda das
comunidades é feita pelo contato direto entre representantes das associações e o secretário
municipal de desenvolvimento econômico e sustentável e em reuniões com o CMDRS. Com a
escassez de água dos últimos anos todas as comunidades do município têm demandado, em
algum momento, o auxílio do caminhão pipa.
É feito um roteiro de comunidades a serem atendidas durante o mês e cada caminhão
deve seguir uma rota até que todos sejam atendidos. Esta metodologia de “combate” a seca
sempre é causadora de conflitos e disputas pela água. Seja pela incapacidade de se atender à
toda a população, seja pela baixa qualidade da água e, principalmente, pela dotação de cunho
político que se imprime à água, pelo domínio da máquina que executa a ação.
A água do pipa, não traz a sensação de pertencimento, de patrimônio, por parte das
famílias. É uma ação estritamente emergencial e que, dentro das estratégias dos agricultores,
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têm se fundido com as tecnologias do P1MC. Muitos agricultores, na falta de chuva, abastecem
suas “caixas” (cisternas de placa do P1MC) com a água de baixa qualidade coletada do rio
Jequitinhonha.
O secretário municipal de desenvolvimento econômico e sustentável afirma que são
cerca de 760 pessoas atendidas pelo caminhão pipa na zona rural de Jequitinhonha. Não há
contrapartida das comunidades e sempre há conflitos, e quando questionado sobre a eficácia da
ferramenta o secretário afirma que:
“Não é eficaz, água é bruta, foge do foco do programa da caritas, pois vai para cisternas (do P1MC), o custo é altíssimo, não há disponibilidade de água sempre, tem quebras de caminhão, existem vários problemas. Outras alternativas resolveriam de forma definitiva” (fala do secretário municipal de
desenvolvimento econômico e sustentável).
4.2.2 Poço
A abertura de poço artesiano também é uma “obra” executada pelo município. Alguns
poços perfurados pela Fundação Nacional de Saúde - FUNASA em períodos anteriores e que
estavam “parados” estão sendo reaproveitados pelo município, que busca dar continuidade à
obra. O poço parece ser uma alternativa mais viável que o caminhão pipa, porém a região possui
peculiaridades ambientais que tornam a água do poço, em grande parte dos casos, salobra, de
baixa qualidade ou com vazão nula. Atualmente o município contabiliza 4 poços funcionando,
além de outros poços de iniciativa do Idene.
A principal reclamação dos agricultores em relação ao poço é referente à baixa
qualidade da água fornecida pelos poços na região, tanto que, segundo a fala do presidente do
CMDRS, de todos os poços perfurados, apenas uma está utilizando a água do poço. Muitas
vezes as obras são executadas em etapas diferentes, por empresas diferentes e anacronicamente.
É comum poços que foram abertos sem a sondagem adequada do solo e verificação de
disponibilidade hídrica ou, em alguns casos, impossibilitados do uso pela falta da rede
hidráulica.
4.2.3 Barraginhas
As barragens para contenção de água pluvial em declividade, chamada barraginhas,
objetivam coletar a água de enxurrada retendo-a por determinado período permitindo o
abastecimento do lençol subterrâneo e reduzindo os impactos causados pela energia cinética
das enxurradas.
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É uma alternativa barata e simples, que foram implantadas em Jequitinhonha ao longo
de estradas vicinais, em parceria com a Rural Minas. Há o reconhecimento da importância dessa
alternativa para a reposição da água subterrânea, porém a medida traz retorno em longo prazo,
o que não interfere diretamente na necessidade imediata das famílias no acesso à agua para
beber e produzir. A definição dos locais de construção das barraginhas em Jequitinhonha é feita
baseada em parâmetros unicamente técnicos, como declividade do terreno e espaço para
construção.
Não há formas de avaliação e participação das comunidades e suas representações em
relação a essa alternativa.
4.2.4 Cercamento de Nascentes
O projeto intitulado “Jequiti + Verde” é desenvolvido pelo município em parceria com
a Companhia Energética de Minas Gerais-CEMIG, conta com 150 agricultores cadastrados e
29 já beneficiados nas comunidades de Taquaril, Krant, Maranhão, Brejão e Craunilha. O
cercamento custa em torno de 3000 reais por nascente, fora o plantio, que é subsidiado por um
viveiro de mudas municipal que distribui gratuitamente as mudas para os agricultores.
Há, por parte dos agricultores, alguma resistência ao cercamento em relação às outras
alternativas, pois é solução de médio e longo prazo, é preferível pela comunidade outra
alternativa, uma solução imediatista.
A Prefeitura executa a compensação que a CEMIG deve fazer por desmatar áreas da
rede. Mais de 100 famílias já se cadastraram, mostrando interesse pelo projeto. O projeto
envolve as secretarias de Obras e de desenvolvimento econômico e sustentável, a CEMIG e o
Instituto Estadual de Florestas – IEF, com o envolvimento de cerca de 20 pessoas entre técnicos
e funcionários do viveiro de mudas.
Esta alternativa permite a recuperação de nascentes evitando o acesso de animais e a
degradação da mata ciliar, o que permitirá a oferta de água de boa qualidade para as famílias de
agricultores.
4.3 Ações do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jequitinhonha-MG
Em entrevista com o presidente do sindicato percebeu-se que não existem obras e
tecnologias específicas executadas pelo sindicato para a convivência com a seca na região. O
sindicato organiza reuniões, participa dos espaços de discussão, é o elo entre as famílias e as
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instituições que executam as ações. O sindicato levanta demandas e orienta os trabalhadores
sobre como utilizar e acessar os programas e benefícios.
O sindicato foi criado há mais de 50 anos em Jequitinhonha para a luta por direitos, ocupava, movimentava em lutas. Atualmente faz diálogo com governantes, insere-se na política. Atualmente, ainda é de luta, porém negocia diretamente com as lideranças políticas (fala do presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jequitinhonha-MG).
O sindicato participa como parceiro das instituições nos programas, ações e
desenvolvimento de tecnologias de convivência com a seca, principalmente dentro do CMDRS
e diretamente com as famílias orientando os trabalhadores. O sindicato é mediador entre as
famílias rurais e os programas. Ajuda na aceitação, orientação e como facilitador na execução
das ações das demais instituições. Não é executor, tem função social.
Para o sindicato cada ação tem seu papel. Existem críticas porque a gestão final do
programa depende da família e muitos não sabem usar. Não compreendem, precisam de um
acompanhamento e discussão após implantação. Além disso, na avaliação do presidente do
sindicato as comunidades reclamam de muitos, mas aceitam todos os programas trazidos pelas
instituições. Avalia ainda que “o melhor programa é o das cisternas (P1MC). São bons
reservatórios. Se a caixa secar o caminhão pipa enche” (fala do presidente do sindicato).
4.4 Ações do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável – CMDRS
Assim como o Sindicato dos Trabalhadores Rurais, o CMDRS não é instituição
executora de ações de convivência com a seca em Jequitinhonha. O conselho gerencia e delibera
sobre as políticas públicas, faz propostas, discute as ações e media entre representação da
sociedade civil organizada e instituições públicas. O CMDRS avalia como fundamental todos
os programas e ações desenvolvidas pelas instituições em Jequitinhonha para a convivência
com a seca e ressalta, na fala do presidente do conselho, que não são suficientes para atender
aos asseios das comunidades.
O conselho reconhece ainda como é indispensável a atuação da Cáritas na região. “O
programa das cisternas ajuda em 90 % dos casos. Mas é prejudicado pela falta de chuva. O que
acontece é que estão usando agua do pipa, que não era o previsto, mas resolve” (fala do
presidente do CMDRS).
O CMDRS monta comissões para monitorar as ações das instituições na região rural,
porém falta-lhes o poder de interferir ao nível da família. Das 30 comunidades ativas do
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município o conselho 27 possuem representação no conselho. Todas as instituições que
desenvolvem programas de convivência com a seca na região participam e são parceiras do
CMDRS.
O conselho exerce papel fundamental na relação entre as comunidades rurais e as
instituições públicas. Os anseios da população são levados ao CMDRS, que os acata, e delibera
sobre programas e projetos públicos para as comunidades, sendo decisivo, principalmente na
eleição das prioridades e grupos em situação de extrema necessidade.
4.5 Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural – Emater
Das ações relacionadas com a convivência com a seca em Jequitinhonha, a Emater
executou o projeto Minas Sem Fome que, segundo o técnico da empresa, atende a quatro
comunidades no município. No minas sem fome já foram executados quatro projetos de agua
com captação em rios e nascentes e alguns poços artesianos. O último foi feito em 2013, na
comunidade de Maranhão. Segundo a fala do técnico da Emater:
[...] os programas vêm para mitigar, e não para resolver, quanto aos poços, a água é salobra. Existem muitos problemas com o poço comunitário, dificuldade para pagar a luz em conjunto, deveria ter um poço para cada um (fala do técnico da Emater).
Percebe-se que as ações emergenciais não são capazes de resolver a escassez de água,
apenas mitigam, resolve de forma momentânea ou paliativamente o problema. Assim como as
ações do município, a abertura de poço não se mostrou como solução ou proposta eficaz de
convivência com o período de seca aguda.
4.6 Instituto de Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas Gerais – Idene
Segundo o gerente do Idene em Jequitinhonha, algumas ações foram implementadas
há cerca de dois anos na região. No baixo Jequitinhonha existiam diferentes ações, mas não
eram específicas para a seca. Existia trabalho de perfuração de poço e algumas cisternas que
foram executadas pela caritas. Há cinco anos atrás muitos não queriam as cisternas, havia uma
certa resistência. Porém nos últimos três anos a seca se intensificou. Hoje a seca é geral. Todas
as regiões do baixo Jequitinhonha estão passando por seca.
Recentemente o governo lançou o Agua para Todos, que usa diferentes tecnologias
para captação de água seja superficial, subterrânea, de nascentes, etc. Porém o programa não
foi executado por completo. Foram 7 ações do programa: 3 poços perfurados e 4 sistemas de
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captação superficial. Dos poços perfurados nenhum está em funcionamento no município de
Jequitinhonha.
Há também o Plano de Urgência para Enfrentamento da Seca, que também prevê a
captação de água em poços artesianos. O projeto é executado no município por empresas que
são contratadas diretamente pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento e Integração do
Norte e Nordeste de Minas Gerais – SEDINOR, não há a participação local efetiva nas ações,
conforme se percebe na fala do gerente do Idene em Jequitinhonha:
A participação local é somente nas discussões com as entidades. A execução é direta com o Estado. Contratam de lá as empresas que perfuram os poços. A prefeitura entra em contrapartida na finalização dos poços. O idene a nível regional apenas articula definição de locais, documentação, parcerias. A contratação é direta estado-empresas. A prefeitura faz a instalação final dos tubos. As caixas de plástico estão sendo usadas para deposito coletivo da agua dos poços (fala do gerente do Idene em Jequitinhonha-MG).
Até o momento foram perfurados 5 poços em Jequitinhonha pelo Plano de Urgência
para Enfrentamento da Seca e, como nos demais poços perfurados, causam conflitos e
dificuldades. As famílias não recebem água de qualidade, por questões ambientais a água de
alguns poços da região é rica em sais (salobra) o que decai sua qualidade para o consumo.
Muitos poços são abertos e ficam inutilizados.
Assim como em casos anteriores, na análise do gerente do Idene em Jequitinhonha,
dentre todas as alternativas das diferentes instituições, as famílias avaliam como mais eficaz os
programas executados pela Cáritas. Segundo a fala do próprio gerente “a cisterna chega
diretamente para a família. Atendem melhor à família. Mas dependem da chuva. Então usam o
pipa, mas o município não dá conta. Há um período crítico de cerca de 3 meses”.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa demonstrou que as famílias de agricultoras e agricultores das comunidades
rurais de Jequitinhonha – MG possuem estratégias peculiares de lidarem com os diferentes
programas a ações públicas de convivência com o semiárido. As instituições planejam, captam
recursos e gerenciam as tecnologias, ações e obras de convivência com a seca, porém a forma
como estas ações serão capturadas é definida ao nível da comunidade e da família.
Os programas desenvolvidos pelas instituições revelam como foram planejados e qual
a verdadeira finalidade. Percebe-se que as ações criadas fora do contexto local, sem a
participação da sociedade civil organizada e desvinculada das representações das comunidades
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rurais, não são eficazes tanto do ponto de vista das famílias quanto das próprias entidades que
executam. As tecnologias sociais que compõem as ações da Cáritas em Jequitinhonha,
mostraram-se como alternativa mais eficiente na avaliação das instituições pesquisadas. Não se
trata do fato de serem programas de uma ou outra instituição. O que torna as tecnologias sociais
tão eficientes é o fato de existirem sob um contexto de discussão e participação da comunidade
e das famílias. Além disso, sistemas que permitem às famílias a autonomia em relação à agua,
torna-os independentes das “obras contra a seca”, que frequentemente são utilizadas como vetor
político e de poder.
As instituições públicas, principalmente o Estado, devem compreender como as
famílias rurais se posicionam frente aos diferentes métodos que são ofertados a eles para a
convivência com a seca. Este posicionamento é o melhor indicador de onde investir os recursos
e as ações públicas.
Referências Bibliográficas
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de Brasília. Brasília-DF, 2006.
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Mossoró - RN, 16 a 18 de Novembro de 2016
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REFORMA AGRÁRIA E ASSENTAMENTOS RURAIS: UMA BREVE ANÁLISE DE
SUA ABORDAGEM NO LIVRO DIDÁTICO DE GEOGRAFIA
LAND REFORM AND RURAL SETTLEMENTS: A BRIEF ANALYSIS APPROACH
YOUR BOOK IN TEACHING OF GEOGRAPHY
VERONEIDE MARIA DE OLIVEIRA
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE – UERN.
ANTÔNIA ROBERTA TARGINO DA COSTA
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE – UERN.
RAÍSSA LOPES DE SOUZA
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE – UERN.
MARIA JOSÉ COSTA FERNANDES
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE – UERN.
Grupo de Pesquisa: Políticas Públicas e Reforma Agrária
RESUMO:
Este trabalho tem como objetivo principal fazer uma breve análise do tema Reforma Agrária e
Assentamentos Rurais bem como demonstrar como esse assunto é tratado no livro didático de
Geografia do Ensino Médio. Utilizando como base o livro adotado pela Escola Estadual
Moreira Dias, Mossoró, RN. Destinado pelos Parâmetros Nacionais do Livro Didático para os
anos de 2015, 2016 e 2017. Atentando para os aspectos relacionados: a linhas de abordagem
do tema, figuras, gráficos e tabelas e os níveis de atividades propostas. A base metodológica
para elaboração do mesmo se deu por meio de revisão bibliográfica, realizada em livros,
dissertações e artigos, consultas em sites, levantamento este realizado em banco de dados
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SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
digitais e em biblioteca da universidade relacionados aos temas Reforma Agrária e
Assentamentos Rurais. Para concretização desse estudo realizou-se a análise do conteúdo
Reforma Agrária e Assentamentos Rurais abordado no livro didático adotado para o 3º ano do
Ensino Médio pela Escola Estadual Moreira Dias, Mossoró, RN. Por meio desta análise
podemos concluir que os autores da obra contribuem para o estudo dessa temática no ensino
da geografia, no entanto, o intuito deste trabalho é avaliar como este conteúdo foi abordado,
apontando os pontos positivos e em quais pontos essa abordagem pode ser revista de forma a
contribuir para a melhor apresentação do mesmo, para uso do profissional da educação e
principalmente para que venha proporcionar o melhor aprendizado do aluno.
Palavras-chave: Reforma Agrária. Assentamentos Rurais. Livro Didático.
ABSTRACT:
This work aims to make a brief analysis of the Agrarian Reform and Rural Settlements theme
and demonstrate how this issue is treated in the textbook of high school geography. Using as a
basis the book adopted by the State School Moreira Dias, Mossoro, RN. Designed by the
National Textbook parameters for the years 2015, 2016 and 2017. Paying attention to related
issues: the lines of approach to the subject, figures, graphs and tables and levels of proposed
activities. The methodological basis for preparing it was through a literature review, carried
out in books, essays and articles, consultations on websites, this survey conducted in digital
database and library of the university related to the themes Agrarian Reform and Rural
Settlements. To achieve this study was performed to analyze the content of Agrarian Reform
and Rural Settlements covered in the textbook adopted for the 3rd year of high school by the
State School Moreira Dias, Mossoro, RN. Through this analysis we can conclude that the
authors of the work contribute to the study of this theme in the teaching of geography,
however, the aim of this study is to assess how this content was addressed, pointing out the
positives and what points this approach can be reviewed in order to contribute to a better
presentation of the product, for professional use of education and especially so will provide
the best student learning.
Key words: Land reform. Rural Settlements. Textbook
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1. INTRODUÇÃO
O Brasil é um país marcado por desigualdades sociais e dentre as questões mais
complexas está à discussão da Reforma Agrária e dos Assentamentos Rurais. Diante a
importância dessa temática para a sociedade brasileira, somos levados a refletir qual a
importância que vem sendo dada a esse conteúdo no ensino da geografia, principalmente no
que refere a sua abordagem no ensino básico do país, mais especificamente no Ensino Médio,
fase em que o aluno já tem formulado muitos conceitos e precisa ter uma visão mais ampla e
crítica do mundo em que está inserido.
Sendo assim, este trabalho tem como objetivo principal fazer uma breve análise
sobre os aspectos relacionados ao tema Reforma Agrária e Assentamentos rurais bem como
analisar como esse assunto é tratado no livro Didático de Geografia do Ensino Médio.
Utilizando como base o livro adotado pela Escola Estadual Moreira Dias, Mossoró, RN.
Destinado pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) para os anos de 2015, 2016 e
2017. Atentando para os aspectos relacionados: a linhas de abordagem do tema, figuras,
gráficos, tabelas e os níveis de atividades propostas.
2. REFORMA AGRÁRIA
De acordo com Fernandes, (2008, p. 74), “reforma agrária é uma política territorial
que serve para minimizar a questão agrária”. Para Oliveira (2007), a reforma agrária aparece
historicamente no capitalismo como uma necessidade conjuntural de o capital resolver a
questão social resultante da concentração de terras.
Ainda segundo o autor:
A Reforma Agrária aparece na História, em geral, relacionada simultaneamente, às lutas, revoltas ou mesmo revoluções camponesas, e às ações de governos visando modificar a estrutura agrária de regiões ou países. No primeiro caso, a idéia central de reforma agrária está mais relacionada a idéia de revolução agrária, enquanto que no segundo, está mais relacionada a idéia de reforma propriamente dita. (OLIVEIRA, 2007, p. 67-68).
Lutar pela reforma agrária significa lutar por todas as dimensões do território, entre
elas a tecnologia, o mercado, a educação, saúde e, principalmente, contra o capital que
procura tomar o controle dos territórios do campesinato. (FERNANDES, 2008, p. 76).
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Foi, portanto, com as Ligas Camponesas, nas décadas de 1940 a 1960, que a luta pela
reforma agrária no Brasil ganhou dimensão nacional. Nascidas muitas vezes como sociedade
beneficente dos defuntos, as Ligas foram organizando, principalmente no Nordeste brasileiro,
a luta dos camponeses foreiros, moradores, rendeiros, pequenos proprietários e trabalhadores
assalariados rurais da Zona da Mata, contra o latifúndio. (OLIVEIRA, 2007. p.106).
“A partir de 1964, com o Golpe Militar os problemas agrários se agravaram e o
debate sobre a Reforma Agrária sofreu um retrocesso. A Ditadura simbolizou a aliança entre
terra e capital no plano político econômico, pois foi imposta uma forte repressão policial e
militar aos que defendiam a Reforma Agrária” (COSTA, 2005, p. 53).
Medeiros (1989), sobre esse fato discorre:
Após o golpe de 31 de março de 1964, as lutas no campo e na cidade entraram em refluxo, frente à repressão que passaram a enfrentar. No entanto, sob a tutela militar, iniciou-se uma série de reformas, de caráter modernizador da economia e da sociedade, algumas delas demandadas no pré-64. Foi o caso da reforma bancária, universitária, administrativa e até mesmo da reforma agrária, que ganhou corpo legal através do Estatuto da Terra. (MEDEIROS, 1989, p. 83).
Aprovado pelo Congresso Nacional “o Estatuto da Terra (Lei nº 4.504 /1964) regula
os direitos e obrigações referentes aos bens imóveis rurais, para os fins de execução da
Reforma Agrária e promoção da Política Agrícola” (BRASIL, 1964, p.1).
§ 1º Considera-se Reforma Agrária o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento de produtividade. § 2º Entende-se por Política Agrícola o conjunto de providências de amparo à propriedade da terra, que se destinem a orientar, no interesse da economia rural, as atividades agropecuárias, seja no sentido de garantir-lhes o pleno emprego, seja no de harmonizá-las com o processo de industrialização do País (BRASIL, 1964, p.1).
Vejamos através do pensamento de Oliveira (2007) que a aprovação do Estatuto não
passou de uma manobra para acalmar os ânimos dos camponeses em luta, sedentos por
transformações.
A realidade passava a mostrar que, uma vez desarticulada a organização popular dos trabalhadores, o Estado, através de sua estrutura burocrática, iria realizar a tão esperada reforma agrária. Ledo engano, pois foi o próprio Ministro do Planejamento do então governo militar, Roberto Campos, quem garantiria aos congressistas latifundiários que a lei era para ser aprovada, mas não para ser colocada em prática. A história dos 20 anos de governos militares mostrou que tudo não passou de “uma
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farsa histórica”, pois, apenas na década de 1980, foi que o governo elaborou o Plano
Nacional da Reforma Agrária — instrumento definidor da política de implementação da reforma agrária (OLIVEIRA, 2007, p.121).
Com base na citação anterior podemos inferir, mediante o pensamento de Oliveira
(2007), que a aprovação do Estatuto da Terra não surtiu os efeitos necessários na política de
reforma agrária no Brasil, no item a seguir, iremos analisar a questão no Estado do Rio
Grande do Norte.
2.1 REFORMA AGRÁRIA NO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
O Território norte-rio-grandense é marcado pela grande concentração fundiária, este
terreno que foi um dos cenários de implantação do sistema de sesmarias na época da
colonização do país, herdou está herança deste período.
Daí as barreiras para se implantar também nesse espaço do território brasileiro um
plano de Reforma Agrária a contento, que venha colaborar para a melhor distribuição das
terras entre os que nele vivem.
Referindo-se a Reforma Agrária no Rio Grande do Norte, França Segundo e
Fernandes (2014) declaram:
Semelhante à reforma agrária praticada no Brasil ao longo dos anos, a reforma agrária no Estado do Rio Grande do Norte também foi marcada pelo empenho, luta e mobilização dos trabalhadores sem-terra, que ao longo dos anos, conseguiram avançar com o processo de ocupação/desapropriação mesmo em meio a um contexto de segregação e violência. O Rio Grande do Norte é e sempre foi marcado por uma estrutura agrária extremamente concentradora, onde as políticas de reforma agrária não têm se concretizado de maneira eficaz (FRANÇA SEGUNDO e FERNANDES 2014, p. 42).
Os movimentos sociais de luta pela terra tiveram papel importante no processo de
reforma agrária do Estado. Por meio da articulação com outras instituições sociais e das
disputas por terra no Rio Grande do Norte, que se intensificaram principalmente entre as
décadas de 1980 e 1990.
O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) foi um dos movimentos que participaram ativamente da luta pela reforma agrária no RN, contudo sem estabelecer alianças mais efetivas com outras instituições, contrário ao que fizera as Ligas Camponesas, quando articulou-se com a Igreja e com o PCB, anos anteriores. De certa forma, o isolamento do MST inibiu a sua atuação, já que outras instituições
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já tinham maior conhecimento acerca da realidade agrária do RN (FRANÇA SEGUNDO e FERNANDES, 2014, p. 43).
Para Fernandes (2009, p. 22) “a Reforma Agrária no RN não é uniforme, passa por
uma base física e social, necessitando, ainda, de ações mais comprometidas com mudanças”.
Sobre este pensamento entendemos que não podemos reduzir a política de reforma agrária ao
simples assentamento de famílias, está deve compreender toda uma estrutura de assistência
social, técnica e econômica, que permita o sucesso do projeto de assentamento bem como a
qualidade de vida dos assentados.
Diversos são os problemas da atual política de reforma agrária. Um deles, é que à
medida que os assentamentos rurais vão sendo criados, não são criadas estruturas que visem
dar assistência ao trabalhador rural. Em muitos casos, as famílias são assentadas e logo após
esquecidas. (FRANÇA SEGUNDO E FERNANDES 2014. P. 47)
A Reforma Agrária implementada no RN, até o presente, possui caráter de uma
política compensatória, não respondendo, portanto, às demandas reais de reprodução social
dos assentados, constituindo-se, assim, numa política que não permite aos assentados fazerem
valer completamente a sua cidadania (FERNANDES, M.J, 2009, p.22).
Diante esse arranjo estrutural a reforma agrária é algo que se faz necessário, para
melhoria do quadro das desigualdades e da marginalidade que apresenta o Estado.
3. DISCUTINDO SOBRE ASSENTAMENTOS RURAIS
De acordo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA),
basicamente, o assentamento rural é um conjunto de unidades agrícolas independentes entre
si, instaladas pelo INCRA onde originalmente existia um imóvel rural que pertencia a um
único proprietário. Cada uma dessas unidades, chamadas de parcelas, lotes ou glebas é
entregue a uma família sem condições econômicas para adquirir e manter um imóvel rural por
outras vias. Sendo que a quantidade de glebas num assentamento depende da capacidade da
terra de comportar e sustentar as famílias assentadas. O tamanho e a localização de cada lote é
determinado pela geografia do terreno e pelas condições produtivas que o local oferece.
De maneira genérica, os assentamentos rurais podem ser definidos como a criação de
novas unidades de produção agrícola, por meio de políticas governamentais visando o
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reordenamento do uso da terra, em benefício de trabalhadores rurais sem terra ou com pouca
terra (BERGAMASCO E NORDER 1996 apud SOUZA e BERGAMASCO, 2011).
De acordo com o INCRA “os trabalhadores rurais que recebem o lote comprometem-
se a morar na parcela e a explorá-la para seu sustento, utilizando exclusivamente a mão de
obra familiar”. O que contribui para ampliação e fortalecimento da agricultura familiar.
A respeito da importância desses assentamentos para o fortalecimento da agricultura
familiar Souza e Bergamasco 2011, destacam:
E mais, a idealização da agricultura familiar, na qual se inserem os assentamentos rurais, supõe uma lógica específica de reprodução da unidade familiar de produção dentro do universo capitalista. Assim, os assentamentos podem estabelecer locais privilegiados de experiências tecnológicas pouco rentáveis em termos contábeis de empresas capitalistas, mas perfeitamente rentáveis em termos da economia familiar dos agricultores. (SOUZA e BERGAMASCO, 2011, p.2).
Sobre a criação de assentamentos no Rio Grande do Norte, Fernandes (2009) afirma:
Semelhante ao que ocorre em outras áreas do País, o RN passou por um processo de criação de Assentamentos Rurais nos últimos anos, sobretudo a partir de 1995 mas este tem se mostrado, ainda, insuficiente para provocar alterações profundas na estrutura fundiária do Estado. Dentre os diversos elementos explicativos para este aumento de desapropriações, ressalta-se a crise agropecuária no Estado, associada à ocorrência de várias secas, tornando vantajoso para alguns fazendeiros venderem suas propriedades para o governo, com a finalidade de desapropriar para fins de Reforma Agrária, tendo em vista que as indenizações pagas pelo INCRA foram muito elevadas (FERNANDES, 2009, p. 18-19).
Ainda de acordo com Fernandes (2009, p. 18), “A criação desses Assentamentos
Rurais no Estado obedece a critérios nacionais previamente estabelecidos pelo INCRA, que
consistem das seguintes etapas: vistoria, desapropriação, emissão de títulos, seleção e
cadastramento dos agricultores contemplados, liberação de créditos e transferência de posse
para os beneficiários.”
Dados do DATALUTA (2014) mostram que do ano de 1979 até o ano de 2014
apenas 297 assentamentos foram implantados no Estado no Rio Grande do Norte.
Beneficiando um número de 20.748 famílias, ocupando uma área somente de 0,6% do Estado.
Sendo a Microrregião de Mossoró a que apresenta a maior concentração de
assentamentos. Destacando-se também as Microrregiões: Chapada do Apodi, Baixa Verde,
Litoral Nordeste e Vale do Assu.
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Sobre este fato, Fernandes (2009), comenta:
Essa distribuição pode ser entendida se levarmos em consideração questões de ordem histórica e fisiográfica. As Microrregiões de Mossoró, Chapada do Apodi e Vale do Assu estão localizadas na chamada Mesorregião do Oeste Potiguar que apresenta, em sua maioria, solos de origem sedimentar, clima quente e abundantes recursos hídricos em seu subsolo, além da maior barragem do RN, a Armando Ribeiro Gonçalves, que comporta um significativo volume de água. Esse conjunto de fatores resulta numa área propícia para o desenvolvimento da agricultura, pela fertilidade natural dos solos. É bom lembrar que observamos, justamente nessas Microrregiões, a presença mais significativa de empresas do ramo da fruticultura irrigada, as quais têm uma produção totalmente voltada para exportação. Essas áreas também são marcadas pela presença atuante de Movimentos Sociais de luta pela Reforma Agrária, como o MST e principalmente a CPT OESTANA, ambos com uma influência muito significativa junto aos agricultores (FERNANDES, M.J, 2009, p. 19-20).
De acordo com Costa (2005), as Microrregiões de Pau dos Ferros, Seridó Oriental e
Umarizal, apresentam números insignificantes dos Assentamentos do RN em seus
respectivos territórios. Dentre os vários aspectos que contribuem para esse fato está a
localização dessas Microrregiões em áreas com adversidades climáticas mais acentuadas,
associadas a uma menor atuação dos Movimentos que encabeçam a luta pela terra. E ainda a
presença muito forte do latifúndio, atrelado ao sistema boi x algodão e as relações de poder
que foram sendo desenvolvidas por fortes oligarquias, as quais assumiram não só o poder
local e regional, mas também estadual.
Os Assentamentos, que não apresentaram a agricultura como atividade econômica
preponderante, têm sua fonte de renda proveniente de outras atividades como pecuária,
fruticultura irrigada, produção de cal e outras (COSTA, 2005, p. 101).
Ainda de acordo com Costa (2005), a questão produtiva nos Assentamentos poderia
ser melhorada se tivesse uma assistência técnica eficiente. Esta deveria ser um serviço
presente em todos os Assentamentos, pois é um item indispensável para o sucesso produtivo
destes. A assistência técnica que está sendo praticada nos Assentamentos (quando ela existe)
deveria ser revista pelo Poder Público, pois se constitui num fator primordial para ajudar no
desenvolvimento produtivo. O próprio INCRA deveria dar mais atenção a esse aspecto e
aumentar o número de técnicos disponíveis para o trabalho junto aos assentados, adequando
os projetos à realidade de cada área.
É comum encontrar Assentamentos no Rio Grande do Norte com grande
precariedade marcada por inúmeros problemas que vão desde a falta d’água até à precariedade
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Mossoró - RN, 16 a 18 de Novembro de 2016
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
da infra-estrutura e presença de serviços, sobretudo com relação à serviços básicos como
educação e saúde (FERNANDES, 2009, p. 22-23).
Com o intuito de analisar como os conteúdos referentes a reforma agrária e
assentamentos rurais são trabalhados nas escolas, fizemos uma breve análise de uma Coleção
de Livros Didático de uma escola pública de Mossoró, que mostraremos a seguir.
4. ANÁLISE DO CONTEÚDO REFORMA AGRÁRIA E ASSENTAMENTOS
RURAIS NO LIVRO DIDÁTICO DE GEOGRAFIA DO 3º ANO DO ENSINO MÉDIO
O livro didático é instrumento importantíssimo de ensino e de aprendizagem formal.
Embora não seja o único material de que professores e alunos vão valer-se no processo de
ensino e aprendizagem, ele pode ser decisivo para a qualidade do aprendizado resultante das
atividades escolares (LAJOLO, 1996). Corroborando com o pensamento da autora é que
vemos a relevância de se analisar como a temática aqui em discussão é abordada nesta
ferramenta de ensino.
Para tanto, utilizou-se para essa análise o livro: Fronteiras da Globalização. O
Espaço Brasileiro: Natureza e Trabalho (Figura 01), dos autores Lúcia Marina Alves de
Almeida e Tércio Barbosa Rigolin. Uma obra da editora Ática do ano de 2013. Sendo
destinado para as séries do 3º ano do Ensino Médio.
(Figura 01): Livro analisado. Fonte: Almeida e Rigolin (2013).
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O livro é dividido em seis unidades. O tema Reforma Agrária é tratado na Unidade
Cinco: Atividades Primárias no Brasil. No capítulo dezessete intitulado A Estrutura Fundiária
no Brasil. Este capítulo é subdivido em: Características da Estrutura Fundiária Brasileira,
Conflitos no campo, As relações de trabalho no campo e Refletindo sobre o conteúdo. São
oito páginas que tratam desta temática e mais uma destinada a propostas de exercícios
relacionados ao memo.
No subcapítulo: Características da estrutura fundiária brasileira, os autores fazem
referência as grandes concentrações de terra que é marca da estrutura fundiária do país,
trazem dados atualizados que apontam e comprovam a afirmativa. Remetem-se ao processo
histórico de adoção das sesmarias na época de colonização do país para afirmarem que o
processo de concentração de terra se dá desde o Brasil Colônia, e persiste até os dias atuais
por meio da predominância dos latifúndios.
A crítica aqui se faz pelo fato de que essa abordagem histórica do processo de
acúmulo de terras por uma minoria privilegiada ocorre de forma muito sucinta. Os Autores
não fazem um resgate histórico desse processo de apropriação das terras, abordam o sistema
de capitanias hereditárias, porém, não se referem aos processos de grilagem de terras,
posseiros entre outros que compreendem o sistema de posse histórico de terras no Brasil após
o período colonial. No subtema conflitos no campo eles apresentam o significado destes
termos, porém, não fazem uma associação ao processo histórico.
Eles ainda apontam algumas problemáticas resultantes do atual estágio de
distribuição de terras no país, tais como: terras ociosas enquanto grande parcela da população
detém de pouquíssimos espaços para plantar, o êxodo rural decorrente da modernização das
atividades do campo, e suas consequências; o desemprego e o subemprego, a ocupação de
áreas de riscos por essa população nas periferias das cidades e ainda mencionam o aumento de
conflitos sociais no campo.
Fazem um breve relato sobre a Lei de Terra de 1850 e o Estatuto de Terras de 1964.
Os autores no texto declaram: “Porém, mesmo com as resoluções da constituição de 1988, a
reforma agrária no Brasil ocorreu em ritmo muito vagaroso”. (ALMEIDA e RIGOLIN 2013,
p. 193).
Essa afirmativa dos autores nos leva a ver o processo de reforma agrária no Brasil
como algo que teve início, meio e fim, que se concretizou, quando na verdade esse se alastra
por anos no Brasil, nunca se concretizou de fato, uma política de reforma agrária capaz de
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solucionar os problemas fundiários do país nunca foi implantada. O que se nota é a adoção de
medidas tímidas como o assentamento de algumas famílias, após longos períodos de luta por
áreas de terras ociosas. Não podemos reduzir a reforma agrária a essas pequenas medidas, está
é bem mais complexa objetiva promover mudanças na organização fundiária do país, visa
promover igualdade social por meio de uma divisão mais justa de Terras.
Os autores não fazem menção a UDR, União Democrática Ruralista, “organização
dos latifundiários criada para defender seus privilégios e interesses. Em 1988, essa
organização conseguiu minar a criação de uma lei de reforma agrária no processo constituinte
e inviabilizou a solução da questão agrária”. (FERNANDES, 2000, p.14). Consideramos que
a organização deveria ser mencionada pelo fato da barreira que sempre representou para
implantação de uma política plena de reforma agrária e por sempre sair vitoriosa em
detrimento dos interesses populares.
No item Conflitos no campo os autores fazem apenas uma breve menção a alguns
movimentos de luta no campo. Citam as Ligas camponesas, definida pelos mesmos como a
expressão máxima da organização dos trabalhadores rurais. Cita seu local de origem e que a
mesma foi combatida pelo regime militar. O mesmo ocorre com o MST (Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra), apresentam seu local e ano de origem, definindo como um
movimento que tem como objetivo fazer uma reforma agrária rápida e justa.
Consideramos muito limitadas as informações diante a importância desses
movimentos no contexto das lutas pela terra. E das conquistas que vem se dando na sociedade
pela ação desses movimentos. Sentimos falta da menção de outros movimentos de destaque
no conflito no campo como: Canudos, Contestado, O Cangaço. Estes últimos movimentos que
ocorreram entre os séculos XIX e XX, em meio à revolta dos camponeses com a expansão
dos latifúndios no país e a exploração no campo brasileiro.
No item Relações de Trabalho no Campo os autores iniciam trazendo dados do ano
de 2011 que afirmam que 16 milhões de pessoas, o equivalente a 15,7% da população
brasileira encontravam-se ocupadas com atividades agrícolas, trabalhando na agricultura
familiar e na agricultura patronal. Porém, não apresentam as fontes dessa pesquisa. E esses
dados aparecem soltos dentro do texto, pois, eles só apresentam esse dado não fazem uma
análise do que isso representa no contexto agrário do país, se esse número é expressivo para
um país de dimensão territorial continental e populoso como o Brasil, e se não é um número
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expressivo, quais as causas e implicâncias desses números. Também não comparam-no com
outros períodos.
Em seguida se limitam a explicar os termos do que consideram como as principais
relações de trabalho no campo: trabalho assalariado temporal, (aqui os autores relatam que
esta é a relação de trabalho mais comum no campo brasileiro e que o predomínio desse tipo
de regime trabalhista é consequência do modo de produção capitalista), trabalho familiar
(destacam o abandono do campo por algumas famílias em decorrência da falta de capital para
investir na lavoura e das periódicas secas), arrendamento, parceria, escravidão por dívida e
trabalho infantil.
O texto pouco menciona a questão dos assentamentos, não aborda suas tipologias,
características. Apenas traz um gráfico que mostra o número de famílias assentadas entre os
anos de 1995 e 2010.
4.1 LINHA DE ABORDAGEM DAS FIGURAS, GRÁFICOS E TABELAS
Os autores trazem algumas imagens, para ilustrar o texto, essas são de boa qualidade
no que se refere à apresentação. Trazem suas fontes e um título. Como podemos ver abaixo
nas imagens extraídas do livro.
(Figura 02): Plantação de algodão na chapada dos Parecis, Campo Novo dos Parecis, Mato Grosso 2012. (à
esquerda) (Figura 03): Acampamento MST. (à direita). Fonte: Almeida e Rigolin (2013).
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(Figura 04): Integrantes do MST protestam em frente ao Supremo Tribunal Federal, em Brasília, contra o assassinato de 21 sem-terra em Eldorado dos Carajás, em 1996. Fonte: Almeida e Rigolin (2013).
Isso é positivo, pois, possibilita ao aluno a visão concreta de alguns fatos que
envolvem a temática, cabendo ao professor a possibilidade de relacionar com a realidade. Os
autores se utilizam de gráficos e tabelas para tratarem da temática como podemos observar
nas figuras logo abaixo.
(Figura 05): Área destinada à reforma agrária-1995-2010 (em milhões de ha) (à esquerda). (Figura 06): Brasil:
Conflitos pela posse de terras. (à direita). Fonte: Almeida e Rigolin (2013).
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Este fato é positivo, pois, contribui para ilustrar algumas afirmações presentes no
texto. O que podemos destacar como negativo é que tanto as imagens quanto os gráficos e
tabelas não são explorados dentro do texto. Não se faz a relação destes elementos com o
conteúdo, como se estivessem soltos no texto, mesmo sendo para alunos de ensino médio que
já tem alguns conceitos formados, consideramos que algumas dessas imagens não são alto
explicativas, mesmo em meio ao mundo informacional devemos consideram a possibilidade
de este meio estar sendo a primeira forma de contato desses alunos com esse tema, a pesar de
ser um tema bastante discutido na sociedade pode não ser algo que tenha despertado ainda a
curiosidade dos jovens, que geralmente é o público alvo atingido e a quem se destina este
livro.
O livro traz como proposta de atividade a análise de um poema e de textos
informativos que tratam da temática, o que podemos considerar como um fato positivo, a
utilização desses novos elementos que vem acrescentar informações, levando o aluno a
analisar como o tema pode ser abordado através de diferentes formas textuais. A proposta de
exercícios do livro em análise pode ser visualizada na (figura 07) logo abaixo:
(Figura 07): Proposta de exercícios. Fonte: Almeida e Rigolin, (2013).
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Ao estimular o aluno a identificar a abordagem do conteúdo através do poema
(exercício 1, figura 07), os autores mostram que podemos falar de um mesmo conteúdo por
meio de diferentes abordagens, usando elementos que se fazem presentes no dia a dia do
aluno, levando-o a ter uma visão crítica, a fazer uma leitura agora, dos elementos que se
fazem presentes no seu cotidiano, no caso os autores utilizam um poema, mas poderia
também ser um filme, uma música, uma charge etc.
Quanto aos textos informativos (exercícios 2 e 3, figura 07), são interessantes, pois,
eles complementam o assunto já abordado anteriormente e a proposta agora é levar o aluno a
mostrar o seu pensamento, a sua compreensão sobre o tema após a leitura do conteúdo. É
relevante visto que busca o despertar do aluno sobre a temática, leva-o a refletir, analisar, a
emitir sua opinião e a formular seus próprios conceitos sobre a questão em foco. Não ficando
somente nos tradicionais exercícios de respostas fechadas e que já estão prontas no corpo do
texto didático.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho buscou apresentar uma breve síntese sobre aspectos relacionados aos
temas Reforma Agrária e Assentamentos rurais e também se propôs a fazer uma análise de
como esse assunto é tratado no livro Didático do Ensino Médio. Utilizando como base o livro:
Fronteiras da Globalização. O Espaço Brasileiro: Natureza e Trabalho, dos autores Lúcia
Marina Alves de Almeida e Tércio Barbosa Rigolin, adotado pela Escola Estadual Moreira
Dias Mossoró, RN para o ensino do 3º ano do Ensino Médio.
Constatou-se a partir desse estudo que alguns conteúdos relacionados à reforma
agrária são abordados de forma superficial e descritiva. Como é o caso da abordagem
histórica do processo de acúmulo de terras no Brasil que é feito de forma sucinta, ainda os
movimentos de luta no campo, onde não se faz uma associação ao processo histórico e não
são analisados visto a sua importância para o combate da estrutura fundiária do país, ainda os
assentamentos rurais que são tratados apenas com dados de assentamentos sem receber
definições, tipologias, características. Outros temas importantes não foram abordados como é
caso da União Democrática Ruralista que se apresenta como um empecilho para a política de
reforma agrária.
Podemos concluir que os autores da obra contribuem para o estudo dessa temática no
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ensino da geografia, no entanto, o intuito deste trabalho é avaliar como este foi abordado, de
forma a apontar os pontos considerados positivos e em quais pontos essa abordagem pode ser
revista de forma a contribuir para a melhor apresentação do mesmo para uso do profissional
da educação e principalmente para que venha proporcionar o melhor aprendizado do aluno.
6 REFERÊNCIAS
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natureza e trabalho. 2ª Ed. Ática. São Paulo, 2013. 272p. p.189-197.
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outras providências. Disponível em: <www.planalto.gov.br/legislacao>. Acesso em: 14 mai.
2016.
BERGAMASCO, Sonia Maria Pessoa Pereira; NORDER, Luis Antonio Cabello. O que são
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Assentamentos Rurais no Território Potiguar. In: XIX ENCONTRO NACIONAL DE
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SOUZA, Vanilde Ferreira; BERGAMASCO, Sônia M. Pessoa Pereira. Reforma Agrária e
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REFORMA AGRÁRIA E ESTRUTURA FUNDIÁRIA DO RIO GRANDE DO NORTE
LAND REFORM AND LAND STRUCTURE OF RIO GRANDE DO NORTE
Autor: Meire Eugênia Duarte Filiação: Universidade do Estado do Rio Grande do Norte E-mail: [email protected] Autor: Valdineide Menezes de Lima Filiação: Universidade do Estado do Rio Grande do Norte E-mail: [email protected] Autor: Genivalda Cordeiro da Costa Filiação: Universidade do Estado do Rio Grande do Norte E-mail: [email protected] Autor: Zezineto Mendes de Oliveira Filiação: Universidade do Estado do Rio Grande do Norte E-mail: [email protected]
Grupo de Pesquisa: Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo: A desigualdade da estrutura fundiária brasileira representa um dos principais problemas do meio rural, isso porque interfere diretamente na quantidade de postos de trabalho, valor de salários e, automaticamente, nas condições de trabalho e o modo de vida dos trabalhadores rurais. A problemática referente à distribuição da terra no Brasil é produto histórico, resultado do modo como no passado ocorreu a posse e o uso de terras ou como foram concedidas. Deste modo o Estado é pressionado à adoção de políticas públicas direcionadas ao desenvolvimento socioeconômico da população sem-terra e/ou rural, por meio da reestruturação fundiária do país dando início à discussão do Estatuto da Terra e posteriormente a construção dos Planos Nacionais de Reforma Agrária. Este trabalho tem por objetivo geral verificar se os programas de Reforma Agrária contribuíram para a redução da concentração de terra no estado do Rio Grande Norte no período de 1975 a 2014. Os dados utilizados são secundários, coletados junto aos órgãos governamentais, mais precisamente IBGE, INCRA, MDA. A metodologia empregada para mensurar os níveis de concentração foi o Índice de Gini. Após a análise dos dados verificou-se que o estado foi beneficiado com a criação de 298 assentamentos até o ano de 2014, o que beneficiou cerca de 20 mil famílias. Contudo observou-se que o quadro geral do Rio Grande do Norte não apresentou mudanças significativas em relação à estrutura fundiária, a qual se manteve com elevada concentração de terra, como demonstra o índice de Gini que foi de 0,8176 em 1975 e 0,7807 em 2006 estando classificado como “Concentração forte ou Muito forte”.
Palavras-chave: Reforma agrária. Estrutura agrária. Concentração de terra. Índice de Gini. Rio Grande do Norte.
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Abstract: The inequality of the Brazilian agrarian structure is one of the main problems of the rural areas, because it directly affects the amount of jobs, wage value and automatically working conditions and the way of life of rural workers. The problem related to land distribution in Brazil is a historical problem, the result of the way in the past was the possession and use of land or they were granted. Thus the state is pressed to the adoption of public policies directed to the socioeconomic development of the landless population and/or rural, through the land restructuring of the country initiating the Land Statute of discussion and later the construction of the National Plan for Agrarian Reform. This work has the objective to check whether the programs of land reform contributed to the reduction of land concentration in the state of Rio Grande do Norte since 1975 to 2014. The data used are secondary, collected from government agencies, but precisely IBGE, INCRA, MDA. The methodology used to measure the concentration levels was the Gini Index. After analyzing the data it was found that the state benefited from the creation of 298 settlements by the year 2014, which benefited about 20 thousand families. However it was observed that the overall picture of Rio Grande do Norte no significant changes in relation to land ownership, which is maintained with a high concentration of land, as shown by the Gini index, which was 0,8176 in 1975 and 0, 7807 in 2006 and classified as "strong concentration or very strong."
Key words: Agrarian reform. Agrarian structure. Land concentration. Gini index. Large northern river.
1. Introdução
Existe certo consenso entre os autores acerca da concepção de que desde o princípio o
Brasil foi inserido na dinâmica do capitalismo mundial. Na origem dos problemas fundiários
está à especificidade do regime de apropriação das terras realizado pelos portugueses e do
modelo de ocupação do território desde a chegada dos portugueses. Com efeito, o modelo do
“exclusivo metropolitano” determinou a forma de organização fundiária do Brasil. A partir das
capitanias hereditárias consolidou-se não apenas a concentração de terras, mas também a
relação latifúndio-minifúndio que viria a caracterizar tanto a estrutura fundiária quanto a
dinâmica agrária brasileira. Com o passar do tempo, sem uma legislação específica, o quadro
fundiário torna-se cada vez mais tumultuado (ALMEIDA, 2009).
De um lado, um pequeno número de grandes proprietários de terras, os latifundiários,
que monopolizam a maior parte das propriedades rurais, e no outro extremo, um grande número
de proprietários de pequenas propriedades rurais, os minifúndios, tão pequenos que muitas
vezes não conseguem garantir a subsistência familiar, portanto a organização do espaço atual
brasileiro resulta do encadeamento de ações executadas ao longo da história do país,
provocando inúmeros problemas sociais e econômicos que tem se perpetuado por décadas.
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O problema da ausência de acesso à terra pelos trabalhadores rurais pobres, tem
persistido em muitos países em desenvolvimento não obstante as numerosas iniciativas de
reforma agrária. Depois de estar fora das agendas políticas desde os anos setenta do século
passado, a discussão acadêmica e política sobre a reforma agrária tem voltado com maior
intensidade (ALMEIDA, 2009). O Governo Federal implantou em 1985 o primeiro Plano
Nacional de Reforma Agrária, com o intuito de modificar essa realidade, que decorre por quatro
séculos. A reorganização da estrutura fundiária apresenta-se como instrumento de
democratização da riqueza, e surge objetivando a implantação de políticas públicas que visem
uma melhor distribuição de rendas para as classes menos favorecida.
O primeiro Plano Nacional de Reforma Agrária, da Nova República – I PNRA (1985
- 1989), tem como objetivo principal a alteração da estrutura fundiária do País. O documento
apresenta os problemas gerados pela concentração da propriedade rural e as formas efetivas de
combatê-los. Assegurava também mecanismos para que fossem consideradas as diferentes
expressões culturais dos trabalhadores, notadamente quanto às formas de exploração das terras
(BARQUETE, 2005).
O segundo Plano Nacional de Reforma Agrária foi apresentado em novembro de 2003,
além de garantir o acesso à terra, previa ações para que as famílias pudessem produzir, gerar
renda e ter acesso aos demais direitos fundamentais, como saúde e educação, energia e
saneamento. O plano expressava uma visão ampliada de Reforma Agrária que pretendia mudar
a estrutura agrária brasileira. Através da democratização do acesso à terra, desconcentrando a
estrutura fundiária, e ações dirigidas a impulsionar uma nova estrutura produtiva, fortalecendo
os assentados da Reforma Agrária, a agricultura familiar, as comunidades rurais tradicionais e
superando a desigualdade de gênero (MDA, 2003).
Esse panorama nacional teve seus reflexos no Rio Grande do Norte, estado marcado
pela herança deixada pelas Sesmarias, com a existência de latifundiários e parcela considerável
da população, sobretudo a de condições financeiras precárias, que historicamente ficaram a
margem do processo e almejam o acesso à terra. A história revela que o RN também foi palco
de luta com a atuação de Movimentos Sociais, que indignados com a situação apoiaram os
trabalhadores rurais, através dos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais (STR’s), Comissão
Pastoral da Terra (CPT) e mais recentemente com o MST (COSTA, 2009).
Diante deste cenário, o objetivo geral desta pesquisa é avaliar se os Planos Nacionais
de Reforma Agrária reduziram a concentração de terras no RN. Os dados utilizados são
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secundários, coletados junto aos órgãos governamentais, mas precisamente IBGE, INCRA,
MDA. A metodologia empregada para mensurar os níveis de concentração foi o Índice de Gini.
Os aspectos teóricos que fundamentam este estudo tem por base os trabalhos de Texeira (2002),
Moura (2008), Sousa (2000), Souza (2006) Hoffmann (1991) e outros.
2 Políticas Públicas
As políticas públicas são a totalidade de ações, metas e planos que os governos
(nacionais, estaduais ou municipais) elaboram para alcançar o bem estar da população e garantir
os direitos sociais dos cidadãos, caracterizando-se como um compromisso público, que visa
atender as demandas da sociedade, principalmente dos setores marginalizados, considerados
como vulneráveis. Essas demandas são interpretadas por aqueles que ocupam o poder, mas
influenciadas pela sociedade civil através da pressão e mobilização social (DUARTE, 2012).
As políticas públicas compreendem, em seu regime de produção e implantação e,
especialmente, em seus resultados, formas de desempenho do poder político, abrangendo a
distribuição e redistribuição de poder. Para que sejam consideradas públicas, em sua construção
é necessário identificar a quem se destinam os resultados ou benefícios, e se o seu processo de
elaboração e avaliação é submetido ao debate público (SEBRAE, 2008).
Pode-se, então, definir política pública como o campo do conhecimento que busca, ao
mesmo tempo, “colocar o governo em ação” e/ou analisar essa ação e, quando necessário,
propor mudanças no rumo ou curso dessas ações. Após avaliadas e formuladas, as políticas
estendem-se em planos, programas, projetos, bases de dados ou sistema de informação e
pesquisas. Depois que colocadas em ação, ficam então submetidas a sistemas de
acompanhamento e avaliação (SOUZA, 2006).
Portanto, as políticas públicas são um conjunto de ações que devem ser desenvolvidas
pelo município, estado e união para atender necessidades básicas da sociedade, com os bens e
serviços que garantam uma vida digna; promover a reprodução e acumulação de capital na
esfera produtiva; compensar desajustes sociais criados por ações do Estado e do capital; ampliar
e efetivar direitos de cidadania que são conquistados nas lutas sociais; responder a demandas
dos setores da sociedade considerados como mais vulneráveis; regular os conflitos entre
interesses de classes e grupos.
Sendo o poder uma relação social que envolve atores com projetos e interesses
diferenciados e até contraditórios, há uma necessidade de mediações sociais e institucionais,
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para que se possa obter um mínimo de consenso e, assim, as políticas públicas possam ser
legitimadas, proporcionando resultados e obtendo eficácia.
3 Estrutura fundiária Brasileira
A estrutura fundiária corresponde ao modo como as propriedades agrárias de uma área
ou país estão organizados no território, isto é, seu número, tamanho e distribuição social
(ESTRUTURA FUNDIÁRIA, 2011). A expressão estrutura agrária revela a forma de acesso à
propriedade da terra e à exploração da mesma, indicando as relações entre os proprietários e os
não proprietários, a forma como a população se distribuem pela superfície da terra.
Quando estudamos historicamente a estrutura fundiária no Brasil, verificamos que desde
o princípio da colonização essa distribuição foi desigual. Segundo muitos estudiosos esse
problema iniciou-se a partir da colonização (1530), com a formação das capitanias hereditárias
e do sistema de sesmarias. Essa política de aquisição da terra formou vários latifúndios. Com a
independência do Brasil, a demarcação de imóveis rurais ocorreu através da lei do mais forte,
resultando em grande violência e concentração de terras para poucos proprietários, sendo esse
problema prolongado até os dias atuais (GUEDES, 2015).
Resultante também, desse histórico de ocupação colonial e pela sua forma de ocupação
recente, o Brasil apresenta uma estrutura fundiária extremamente concentrada, vista com uma
abrangência nacional, mas geograficamente muito diferenciada, tanto em seu uso, como em sua
posse, quando analisada pelas suas grandes regiões. Segundo o Cadastro do Incra, no estrato de
área até 10 ha encontram-se 31,6% do total de imóveis que correspondem a apenas 1,8% da
área total. Os imóveis com área superior a 2.000 ha correspondem a apenas 0,8% do número
total de imóveis, mas ocupam 31,6% da área total (MDA, 2003, p. 11)
Pedro Ramos (2001, p. 02) após a realização de um minucioso estudo chegou a
conclusão de que são as alterações na estrutura fundiária, que permitem associar
desenvolvimento socioeconômico com desenvolvimento agrário-agrícola. Isto apenas pode
ocorrer na esfera da Política, exatamente porque as especificidades da agropecuária constituem
a justificativa para as políticas (públicas) a ela voltadas, as quais são, ao mesmo tempo, políticas
para aquele desenvolvimento (RAMOS, 2001). Portanto é necessário que políticas aplicadas
sejam específicas, pois tratam de aspectos particulares e visam a objetivos distintos, e destinam-
se a manter e/ou a alterar realidades ou situações concretas.
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Uma estrutura fundiária distribuída de forma inadequada traz consigo um
desencadeamento de consequências, interferindo diretamente, por exemplo, na oferta de
trabalho, valor de salários, nas condições de trabalho, no incentivo a educação entre outros.
Logo se faz necessário a realização de uma reforma agrária, para tentar amenizar a má
distribuição de terras, através de modificações no regime de posse e uso, atendendo aos
princípios de justiça social e aumento da produtividade.
A Reforma Agrária é necessária pela gravidade da questão agrária expressada pelos
conflitos no campo e por uma forte demanda social, mas, principalmente, pela sua contribuição
para a superação da desigualdade e a exclusão social de parte significativa da população rural
(DUARTE, 2012).
4 Política de Reforma Agrária
Cada vez mais se intensifica o debate e as discussões sobre a Reforma Agrária,
principalmente no âmbito das dinâmicas de desenvolvimento rural. Entretanto, as observações
geralmente postas sobre o processo de reforma agrária é que a mesma é unicamente uma política
de oferta de terras para famílias excluídas do processo produtivo de mercado. Esta análise em
síntese é equivocada, dadas às configurações que permeiam o processo permitirem a
modificação de uma série de elementos da sociedade nas mais diversas áreas social, ambiental,
econômica e cultural.
Geralmente o termo Reforma Agrária é usado para fazer referência a uma intervenção
estatal com a finalidade de reorganizar o espaço rural, que inclui tanto a redistribuição da terra
quanto a garantia de melhores condições de vida para as famílias assentadas. Com esse intuito,
o Estado compra ou desapropria terras de proprietários que possuem grandes extensões de terra
onde a maior parte aproveitável não é utilizada, distribuindo lotes de terras para famílias
camponesas (MOURA, 2008).
A Reforma agrária é um processo que se faz necessário devido à grande concentração
de terras e é definida no Estatuto da Terra, (Lei nº 4504/64, em seu artigo 1° como “conjunto de
medidas para promover a melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de
posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento da produtividade”
(Estatuto da Terra, Lei nº 4504/64).
Neste sentido, o processo de reforma agrária é um apelo aos anseios de justiça social
que contemplam as sociedades, quanto à dotação de diversos mecanismos de sobrevivência,
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incluindo a posse de fatores de produção para as populações consideradas excluídas. A primeira
atuação decisiva observada na sociedade brasileira dá-se em 1985 com a elaboração do primeiro
PNRA, objetivando criar assentamentos para os trabalhadores rurais com vistas a mudar a
estrutura agrária do país e assegurar a qualidade de vida da população rural.
O que o Incra busca com a reforma agrária atualmente desenvolvida no país é a
implantação de um modelo de assentamento rural baseado na viabilidade econômica, na
sustentabilidade ambiental e no desenvolvimento territorial. Para tanto, o Incra adota
instrumentos fundiários adequados a cada público e a cada região e a está realizando uma
adequação institucional e normativa para a intervenção rápida e eficiente dos instrumentos
agrários (INCRA, 2011).
Segundo o INCRA (2011), a reforma agrária deve proporcionar: a desconcentração e
a democratização da estrutura fundiária; a produção de alimentos básicos; a geração de
ocupação e renda; o combate à fome e à miséria; a diversificação do comércio e dos serviços
no meio rural; a interiorização dos serviços públicos básicos; a redução da migração campo-
cidade; a democratização das estruturas de poder; e a promoção da cidadania e da justiça social.
Entre as diversas medidas reguladas pelas reforma agraria destacam-se: o sistema
econômico que busca a geração de excedentes através do aumento da produção e da
produtividade da agricultura e da agroindústria; democratização das terras e dos meios de
produção, em que a terra deve ser entendida como um bem da natureza a serviço de toda a
sociedade; e uma nova política agrícola que é o conjunto de medidas e instrumentos de que o
governo dispõe para estimular a produção agropecuária, objetivando o aumento da renda dos
pequenos e médios produtores de alimentos.
5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
5.1 Número e Tamanho dos Estabelecimentos Agropecuários no RN
A tabela abaixo mostra as informações sobre a estrutura fundiária no período de 1975
a 2006. Observou-se que em geral, foi mantida a concentração de modo que no decorrer do
período predominou a ocorrência de um grande número de pequenos estabelecimentos, porém
ocupando uma pequena parcela da área total, enquanto que um número pequeno de grandes
proprietários dominava grande parcela das terras.
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Tabela 02: Estrutura Fundiária do RN – 1975 / 1985 / 1995 e 2006
ANO Rio Grande do Norte
1975
Grupo de áreas (em ha)
Número de estabelecimentos % Área dos estabelecimentos (ha) %
Menos de 10 há 67.910 64,77 195.484 4,47
10 a menos de 100 há 29.723 28,35 936.369 21,40
100 a menos de 1000 há 6.583 6,28 1.747.942 39,94
1000 ha e mais 603 0,58 1.496.566 34,20
TOTAL 104.842 100,00 4.376.359 100,00
1985
Menos de 10 há 75.606 65,33 207.919 4,74
10 a menos de 100 há 32.558 28,13 1.038.381 23,69
100 a menos de 1000 há 6.974 6,03 1.886.494 43,04
1000 ha e mais 598 0,52 1.250.219 28,52
TOTAL 115.736 100,00 4.383.018 100,00
1995
Menos de 10 há 57.958 63,43 155.526 4,17
10 a menos de 100 há 26.355 28,84 851.455 22,81
100 a menos de 1000 há 6.171 6,75 1.670.287 44,74
1000 ha e mais 492 0,54 1.056.254 28,29
TOTAL 91.376 100,00 3.733.521 100,00
2006
Menos de 10 há 43.666 52,58 128.892 4,04
10 a menos de 100 há 29.491 35,51 856.843 26,88
100 a menos de 1000 há 5.113 6,16 1.411.913 44,29
1000 ha e mais 404 0,49 790.280 24,79
TOTAL 83.053 100,00 3.187.928 100,00
Fonte: CENSO DEMOGRÁFICO / IBGE
Em 1975, as propriedades com menos de 10 hectares correspondiam a 64,77% do
número total de estabelecimentos, ocupando somente 4,47% da área total ocupada, enquanto as
propriedades com mais de 1.000 hectares correspondiam a 0,58% dos estabelecimentos,
ocupando uma área de 34,20%. Já em 2006, 52,58% do número desses estabelecimentos
ocupavam 4,04% da área total e os 0,49% dos estabelecimentos com áreas acima de 1000
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hectares ocupavam 24,79% da área total. Portanto, com base nos dados apresentados, pode-se
concluir que, durante o período em análise, houve poucas modificações na estrutura fundiária
do estado do Rio Grande do Norte.
5.2 Número de Assentamentos Criados, Área ocupada e Famílias Assentadas no Rio
Grande do Norte, de 1975 a 2014
Os assentamentos são considerados espaços, onde os problemas sociais poderão
caminhar de forma sustentável e permanente, um modelo de desenvolvimento rural socialmente
mais igualitário. Esta particularidade da agricultura familiar ganha destaque diante dos elevados
riscos da atividade agrícola exclusivamente comercial; grande parte dos pequenos agricultores
familiares prefere organizar sua produção de forma a obter maior segurança do que maior
rentabilidade com maior risco (BERGAMASCO E NORDER, 1996).
Para reduzir o nível de concentração das terras, os Planos Nacionais de Reforma
Agrária tinham em suas metas a criação de milhões de assentamentos, que possibilitaria ao
trabalhador a inserção no mercado, através da produção gerada em seu próprio lote, gerando
um acesso, a moradia, saúde e educação. A tabela abaixo representa os municípios do estado
do RN, a área e o número de famílias assentadas de cada um.
Tabela 03- Municípios, áreas e famílias assentadas por município do RN
RESULTADO DA REFORMA AGRÁRIA NO RIO GRANDE DO NORTE 1974 A 2014
Municípios Área Em (Há) Nº De Famílias Assentadas
Touros 38.677,48 1.049
Parelhas 384,00 0
Ipanguaçu 21.860,71 778
Pedro Avelino 9.514,03 287
Mossoró 70.808,23 3.248
Rio do Fogo 1.633,00 72
São Bento do Norte 13.780,26 420
Governador Dix-Sept Rosado 23.417,50 687
João Câmara 23.015,57 878
Riachuelo 8.285,02 269
Poço Branco 2.850,18 162
Bento Fernades 6.990,86 308
Pureza 8.998,21 252
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Caiçara do Norte 6.235,84 161
Porto do Mangue 14.740,09 551
Caraúbas 9.614,82 314
Areia Branca 10.022,77 296
Baraúna 10.438,41 513
Cerro Cora 5.882,05 235
Ceará Mirim 11.676,71 923
Apodi 13.938,81 529
Parazinho 3.457,81 170
Upanema 32.052,63 1.137
Taipu 3.365,48 186
Carnaubais 16.517,25 588
Maxaranguape 2.565,53 236
São Rafael 7.678,00 205
São José do Seridó 1.916,00 63
Ielmo Marinho 6.041,54 158
Lajes 5.466,99 218
Jardim do Seridó 2.557,00 0
Senador Eloi de Souza 6.739,72 247
Espírito Santo 1.102,53 57
Guamaré 6.446,14 237
Acaré 378,00 0
Lagoa Nova 4.321,23 246
São Miguel do Gostoso 7.791,27 89
Nilsia Floresta 378,54 0
Macau 5.939,82 181
Pedra Preta 5.972,06 150
Santana do Matos 6.242,45 212
Currais Novos 657,41 36
Galinhos 2.430,00 101
Açu 8.551,96 249
Pedra Grande 3.935,12 124
Afonso Bezerra 17.355,79 564
São Pedro 684,13 20
Serra Caiáda 4.010,72 170
Jandaíra 3.004,89 121
Tangara 5.024,86 182
Florania 2.830,33 199
Tenente Laurentin 721,00 25
Umarizal 1.489,03 50
Japi 6.210,29 279
São José do Mipibu 670,50 106
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Itaú 954,79 30
Augusto Severo 3.972,13 82
Sítio Novo 1.278,51 51
São Paulo do Potengi 1.590,03 54
Santa Cruz 1.270,61 58
Januário Cicco 1.396,81 41
Lagoa de Velhos 8.364,91 240
Paraú 1.903,65 34
Pendencias 1.188,00 33
Nova Cruz 1.931,89 60
Angicos 1.258,53 45
Barcelona 874,34 29
São José dos Campos 1.648,22 54
Macaíba 5.614,20 419
Total 529.523,1726 20.224
FONTE: Elaborada pelo autor. Relação de Projetos de Reforma agrária. INCRA, 2015.
A tabela mostra a relação dos municípios do RN que foram beneficiados com os
assentamentos implantados através da Reforma Agrária. Os dados revelam que entre o ano de
2006 e 2014 foram distribuídas através da reforma agrária um total de 529.523,1726 hectares
em 69 municípios do Estado, nas quais foram assentadas 20.224 famílias. O município que
teve o maior número famílias assentadas foi o de Mossoró com um número de 3.248 tendo em
vista que o mesmo apresenta a maior área, sendo de 70.808,231ha e também um número maior
de habitantes. O segundo município mais beneficiado é o município de Upanema com um
número de 1.137 famílias assentadas, apesar de sua área ser aproximadamente 95% menor que
a área do município de Mossoró, quase 50% de sua população encontra-se na zona rural, por
isso um número bastante significativo. Percebe-se também que alguns municípios fora m
alcançados pela reforma agrária, entretanto não houve nenhuma família assentada, como
Parelha, Jardim do Seridó, Acari e Nísia floresta, destes, Nísia é o que possui maior população,
sendo aproximadamente 24 mil habitantes inclusive mais de 50% dos residentes vivem na zona
rural, demandando assim uma atenção significativa, contudo não foi houve concretização
(IBGE, 2007).
O gráfico abaixo mostra o número de assentamentos implantados no Estado do Rio
Grande do Norte e o total acumulado de assentamentos no período em análise.
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Gráfico 01- Número de Assentamentos
No ano de 1975 foi implantado apenas 01 assentamento, neste período as discussões
sobre reforma agrária ainda eram muito recentes, e o campo passava por sérios problemas de
desemprego, ociosidade de terras e miséria. Entre 1985 e 2004, percebe-se um elevado aumento
no número de assentamentos implantados para 38, esse foi o período do I PNRA (1985 – 1989),
que buscava atingir suas metas com a implantação de novos projetos de assentamentos. No
primeiro ano do II PNRA (2003), entre 1995 e 2004 há um número bem maior de assentamentos
implantados, entretanto a partir de 2005 ocorre um decréscimo, pois o segundo plano, apesar
de ter como meta assentar cerca de 400 mil famílias, tinha como prioridade qualificar os
assentamentos já existentes, para manter o homem no campo e não apenas assentar novos
indivíduos.
1975 - 19841985 - 1994
1995 – 20042005 – 2014
1 37
221
39
138
259298
Assentamentos Implantados Total de Assentamentos
FONTE: Elaborada pelo autor. Relação de Projetos de Reforma agrária. INCRA, 2015.
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Gráfico 02- Famílias assentadas
No gráfico 02 podemos observar a quantidade de famílias assentadas, os números
seguem quase na mesma proporção que a quantidade de assentamentos implantados, significa
que a medida que se implantavam os assentamentos, as famílias iam sendo realocadas nos
mesmos. Os assentamentos rurais apresentam-se com um papel importante de desenvolvimento
social, econômico, cultural e ambiental, pois proporcionam ao pequeno agricultor
possibilidades de desenvolvimento, refletindo em um desenvolvimento local, regional e
nacional, permitem que os poucos recursos produtivos, inclusive a quantidade e qualidade da
terra, sejam utilizados mais adequadamente por todos, além de reforçar sua capacidade de
reivindicação para resolver problemas sociais e econômicos.
1975 - 19841985 - 1994
1995 – 20042005 – 2014
0 2.369
15.375
2.480
0 2.369
17.744 20.224
Famílias Assentadas Total de Famílias Assentadas
FONTE: Elaborada pelo autor. Relação de Projetos de Reforma agrária. INCRA, 2015.
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Gráfico 03: Área ocupada
FONTE: Elaborada pelo autor. Relação de Projetos de Reforma agrária. INCRA, 2015.
Em relação à área ocupada percebe-se um aumento da capacidade no período entre
1995 e 2014, isso devido aos investimentos na criação de novos assentamentos. O aumento
mais significativo entre o primeiro e o segundo período representado, tendo aproximadamente
uma variação de 700% da área total ocupada, já entre o segundo e terceiro período houve um
acréscimo de aproximadamente 600%, e até o ultimo período o aumento não foi tão
significativo quanto no primeiro, visto que o foco principal era qualificar os assentamentos.
4.3 Mensuração da Concentração de Terra no Rio Grande do Norte
O Índice de Gini foi utilizado para medir a concentração da terra no estado do Rio
Grande do Norte. Ressalta-se que de acordo com a base de dados e a metodologia utilizada o
resultado em relação ao índice pode variar.
No período de 1975 a 2006, os resultados obtidos, apresentados na Tabela 04
demonstram alto grau de concentração, expresso por 0,8176, em 1975, e por 0,7807, em 2006.
A distribuição de terras é mais concentrada quanto mais próximo este índice estiver da unidade,
ou seja, poucos estabelecimentos agropecuários concentram um alto percentual de terras,
conforme observado na Tabela 01.
1975 - 19841985 - 1994
1995 – 20042005 – 2014
10.405,00 71821,3113
371445,3713
75851,49
10.405,00 82.226,3113
453.671,6826529.523,1726
Área Ocupada (há) Total da Área Ocupada (há)
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Tabela 04 - Índice de Gini no RN
ANO INDICE DE GINI 1975 0,8176
1985 0,7675
1995 0,8070
2006 0,7807 FONTE: Elaborada pelo autor. Relação de Projetos de Reforma agrária/IBGE.
A tabela 04 mostra a redução de 0,0369 no Índice de Gini, entre o período inicial e final
da pesquisa, ou seja, houve uma redução na concentração, apesar de não ser um valor muito
significativo, essa redução ocorreu devido ao número de assentamentos criados, através dos
Planos de Reforma Agrária, que tinham como objetivo criar assentamentos e fazer dos mesmos
espaços de produção e qualidade de vida integrada ao desenvolvimento territorial, buscando
promover também equidade territorial.
Gráfico 04: Índice de Gini
FONTE: Elaborada pelo autor. Relação de Projetos de Reforma agrária. IBGE/SIDRA.
Podemos afirmar que o I e II PNRA, não foram capazes de reduzir de forma
significativa a concentração da terra no Estado do Rio Grande do Norte, pois o índice continuou
próximo a 1, o que significa que existe ainda uma disparidade significativa. A classificação do
território norte-rio-grandense, segundo a tabela 01 se enquadra em “concentração forte a muito
forte” tendo em vista que os valores ficaram entre 0,701 a 0,900, portanto o gráfico confirma o
que já foi citado anteriormente acerca da estrutura agrária, isto é, mesmo após a implementação
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
1975 1985 1995 2006
0,8176
0,76750,8070 0,7807
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dos dois Planos Nacionais de Reforma Agrária, e sua politica de assentamentos, a concentração
de terras persiste praticamente inalterada.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A elevada concentração da estrutura fundiária brasileira dá origem a relações
econômicas, sociais, políticas e culturais cristalizadas em um modelo agrícola inibidor de um
desenvolvimento econômico, com justiça social e cidadania para a população rural. A
desigualdade estrutural fundiária interfere diretamente na quantidade de postos de trabalho,
valor de salários nas condições e qualidade de trabalho e o modo de vida dos trabalhadores
rurais. Por isso, a imprescindibilidade de um processo de reforma agrária para promover uma
melhor distribuição da terra, através de modificações no regime de posse e uso. Esta pesquisa
teve como objetivo geral avaliar se a implantação das políticas de Reforma agrária reduziu a
concentração de terras no RN no período de 1975 a 2014.
De acordo com os dados coletados e com o Índice de Gini calculado chegou-se os
seguintes resultados:
• No Rio Grande do Norte, a concentração de terras está classificada entre forte e
muito forte, o que pode ser comprovado pelo cálculo do Índice de Gini, que para
o período em análise apresenta as seguintes variações: no ano de 1975 é de
0,8176, no ano de 1985 praticamente não há alteração sendo de 0,7675. No ano
de 1995 há uma pequena alteração chegando á 0,8070 e em 2006 atinge 0,7807.
• Apesar do RN ter sido beneficiado pela política de Reforma Agrária que resultou
na criação de 298 projetos de assentamentos e com cerca de 20.224 famílias
beneficiadas no período de 1975 a 2014, e que ocupam uma área de
529.523,1726 ha, apesar de diminuir um pouco ao longo dos anos a concentração
de terras permaneceu muito forte no período analisado.
Após analisar a questão agrária, é possível afirmar que os programas de Reforma
Agrária não contribuíram para uma redução significativa da concentração da terra no estado
durante o período de 1975 a 2014. Os Planos de Reforma Agrária tinham metas de beneficiar
milhões de famílias, contudo os resultados obtidos foram inferiores. Através da avaliação dos
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valores obtidos com o índice de Gini (mesmo após a implantação do I PNRA e do II PRNA)
percebe-se que o objetivo geral proposto pela Reforma Agrária não foi alcançada, haja vista
que seria promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse
e uso.
Tão somente através de um programa estruturado de Reforma Agrária, de caráter
abrangente e com vistas ao desenvolvimento econômico seria possível mudar a realidade atual,
pois, além de modificar a estrutura fundiária, o país contaria com maiores níveis de produção,
gerando externalidades positivas à economia e maior bem estar social à população brasileira.
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REFORMA AGRÁRIA NO BRASIL: ASPECTOS HISTÓRICOS SOBRE O PAPEL
DO ESTADO E AS CONDIÇÕES DE REPRODUÇÃO SOCIAL
LAND REFORM IN BRAZIL: HISTORICAL ASPECTS OF THE STATE'S ROLE AND CONDITIONS OF SOCIAL REPRODUCTION
Jackson Rayron Monteiro Discente da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - UERN [email protected]
Carlos André Azevedo do Nascimento Discente da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN [email protected]
Joseney Rodrigues de Queiroz Dantas Docente da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN [email protected]
Grupo de Pesquisa: Reforma Agrária e Políticas Públicas
Resumo
A discussão sobre Reforma Agrária no Brasil só toma corpo e força em meados da segunda metade do século XX contando. Tal evidência temática conta com o apoio de movimentos de massa como as Ligas Camponesas do Nordeste que, insatisfeitas com a má distribuição de terra e com as miseráveis condições de reprodução social, buscam de forma subversiva atrair a atenção do Estado para as questões estruturais da sociedade em que vivem. Todavia, a discussão sobre a má distribuição de renda num organismo social, atravessa eras passadas que se configuram como formas de propriedade. Assim, o objetivo do presente trabalho é apresentar o desenvolvimento da discussão sobre reforma agrária no Brasil evidenciando os rebatimentos desta no que se refere a estrutura fundiária e as condições de reprodução social. Tomando por base os textos de Marx foi feita uma análise dialético-histórica sobre essas formas de configuração social que tendem a evoluir de acordo com o desenvolvimento das forças produtivas da sociedade. A conclusão imediata que se tem sobre essas análises é que: com o advento do capitalismo a concentração da estrutura fundiária ganha forças nunca vistas, tendência essa que tende a se perpetuar por todo o globo incluindo o Novo-Mundo. Outro enfoque que foi dado ao presente trabalho foi sobre o papel do Estado no seio da discussão agrária principalmente no que se refere ao seu posicionamento enquanto organizador social. Sobre as condições de reprodução social, o presente artigo apresenta perfunctoriamente como estas se encontram no interior da classe formada pelos trabalhadores sem-terra esboçando aspectos sobre a sua melhoria ou degradação.
Palavras-chave: Reforma Agrária. Estado. Terra. Reprodução Social. Trabalhador Rural.
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Abstract The discussion on Agrarian Reform in Brazil only takes shape and strength in the middle of the second half of the twentieth century counting. Such thematic evidence has the support of mass movements like the Northeast Peasant Leagues that dissatisfied with the poor distribution of land and the miserable conditions of social reproduction, seek subversively to attract the state's attention to the structural issues of society in which they live. However, the discussion about the maldistribution of income in a social organism, through past eras that constitute forms of property. Thus, the objective of this paper is to present the development of the discussion on land reform in Brazil showing your aftermaths in what it refers to agrarian structure and the reproduction conditions social. Through Marx's writings there was obtained a dialectical-historical analysis of these forms of social configuration that tend to evolve according to the development of the productive forces of society. The immediate conclusion that we have on this analysis is that: with the advent of capitalism the concentration of land ownership structure gains strength never seen, a trend that tends to perpetuate itself across the globe including New-World. Another approach that has been given to this work has been on the state's role within the agrarian discussion especially with regard to its positioning as a social organizer. On the conditions of social reproduction, this paper presents perfunctorily as these are within the class formed by landless workers outlining aspects of its improvement or degradation. Key words: Land Reform. State. Earth. Social Reproduction. Rural Worker.
1. Introdução
A má distribuição dos fatores de produção numa sociedade parece ter sua gênese bem
antes da introdução do modo de produção capitalista à medida que os outros modos de produção
precedentes sempre possuíram no seu âmago um caráter concentrador. Na sua síntese histórico-
dialética sobre o desenvolvimento das formas de propriedade, o filósofo alemão Karl Marx já
observa que na fase posterior a propriedade tribal a concentração dos fatores de produção só
tende a aumentar, sendo o trabalho - juntamente com a terra - um dos primeiros fatores que
passam a compor a propriedade privada comunitária sob a forma de trabalho escravo: é a forma
escravista da propriedade.
Sem embargo, toda essa dialética das formas de propriedade – apesar de concentradoras
– significam um avanço na configuração estrutural da sociedade, pois é a partir dessas
conjunturas que passam a se formar no corpo social um aparato político-dirigente capaz de
tomar decisões de planejamento e de organização coletiva. A esse corpo de organização social
dá-se o nome de Estado, ser que, apesar de pertencer à uma ordem abstrata, está presente em
todo o proceder de uma nação seja nos aspectos políticos ou econômicos. É também a partir
dessa primeira privatização do ser humano como escravo que se inicia o processo de
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contradições e conflitos entre interesses diversos, sendo o principal deles o que se materializa
entre o campo e a cidade. Outro confronto que se desenvolve no seio do escravismo é o que se
observa entre os setores que se responsabilizam pela circulação do excedente econômico, sendo
tais organismos o comércio marítimo e o comércio industrial. Infere-se a partir de tais
afirmações que o aparato público na forma de Estado, em pleno exercício, é quem deve procurar
propostas pragmáticas para a resolução dos problemas que envolvem os principais atores da
sociedade.
Foram fundamentadas por essas condições políticas, sociais e econômicas que se
desenvolveram civilizações que ganharam eminente significado histórico como o Egito e a
Roma Antiga, por exemplo. Até hoje as práxis dessas civilizações são investigadas e retratadas
principalmente pelas artes cinematográfica e plástica sendo que são a partir dessas
manifestações artísticas que se obtêm uma perspectiva de caráter bruxuleante sobre como
funcionavam as distintas relações entre os indivíduos em uma época infinitamente anterior à
geração presente.
Na sua obra conjunta com o filósofo Friedrich Engels intitulada “A Ideologia Alemã”
Marx faz a seguinte análise sobre as afirmações supracitadas:
Ao lado da propriedade comunitária desenvolve-se a propriedade privada móvel e, mais tarde, a imóvel, que se desenvolve como uma forma anormal e subordinada à propriedade comunitária. Apenas em coletividade os cidadãos exercem o seu poder sobre os escravos que trabalham para eles, estando, por isso, ligados à forma de propriedade comunitária. É a propriedade privada comum dos cidadãos que os obrigam a conservar esta forma natural de associação. Assim, toda a estrutura social que nela se baseia, e com ela o poder do povo, decai, à medida que se desenvolve, principalmente, a propriedade privada imobiliária. A divisão do trabalho está mais desenvolvida. Encontramos já a oposição entre cidade e campo, e mais tarde a oposição entre Estados que representam os interesses do campo e os que representam os interesses da cidade. Mesmo no interior das cidades encontramos oposição entre o comércio marítimo e a indústria. As relações de classe entre cidadãos e escravos atingem seu maior desenvolvimento (MARX, 2005, p. 20-21).
Ao tratar do feudalismo - forma de propriedade posterior ao escravismo - Marx faz uma
análise sobre a configuração da estrutura fundiária que se consubstanciou no período das
conquistas dos bárbaros que culminou na depreciação do Império Romano. É nesse período que
a concentração fundiária passa se solidificar junto com o desaparecimento do antigo escravo e
trazendo no seu bojo uma nova classe de produtores diretos: os camponeses (Marx, 2005). Em
tal estrutura econômico-social o Estado se encontra em mãos de monarcas que detêm o poder
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sobre os servos. Nesse período monarca o Estado governado à mão-de-ferro é predominante
como bem elencou um rei do século XVII Luíz XIV "L'État c'est moi" ou "O Estado sou eu".
Fundamenta-se assim que no feudalismo o Estado estava a serviço da classe dominadora: a
monarquia.
O interessante é notar que os camponeses detinham uma parcela da estrutura fundiária
que servia para a extração dos meios de subsistência destinados a sua reprodução enquanto ser
e enquanto classe - o que se entende como reprodução social. No entanto, com o advento do
modo de produção capitalista a expulsão dos camponeses de suas terras se torna imprescindível
para o desenvolvimento das forças produtivas do capital e para a formação de um fundamento
mister para uma acumulação inicial, que Marx denomina de "Processo de Acumulação
Primitiva”. Nesse contexto histórico a classe trabalhadora direta, o camponês, se encontra por
inteiro desprovido de meios de produção capazes de o reproduzir socialmente. É aí que ocorre,
principalmente nos territórios da Europa Ocidental, a expropriação da propriedade do
trabalhador: a separação entre o trabalhador e o seu fator de produção que culmina na
transformação do primeiro em possuidor apenas da sua capacidade de trabalho, é a
transformação do camponês em proletário. Quanto à riqueza, esta se concentra em sua
totalidade nas mãos de uma classe dominante (Marx, 2005).
Numa perspectiva histórica, o Brasil aparece como continuação desta concentração de
riqueza. Foi como colônia portuguesa que foi decretado no reinado de Dom João III, a lei das
capitanias hereditárias que destinaram toda a parte da terra do território brasileiro pertencente
a Portugal previsto no Tratado de Tordesilhas a um grupo de pequenos nobres portugueses que
se apossaram do fator terra de forma vitalícia e que passariam tais posses para as suas gerações
futuras pelas vias da hereditariedade. Sobre a formação de uma classe produtora direta, essa foi
constituída por aborígenes e escravos africanos que conseguiram a liberdade em meados do
século XIX com a Lei Áurea e se tornaram trabalhadores rurais ou urbanos que, a partir de
1950, devido à grande concentração fundiária e escassas condições de reprodução social, se
organizaram para pleitear uma reforma agrária no Brasil que modificasse a estrutura fundiária
do país.
Nesse ínterim, o objetivo do presente trabalho é apresentar o desenvolvimento da
discussão sobre reforma agrária no Brasil evidenciando os impasses desta e sua contingente
eficiência no que se refere a modificação da estrutura fundiária e a melhoria das condições de
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reprodução social.
A pesquisa é em sua totalidade de cunho bibliográfico. Bibliografia essa que traz luz
sobre as condições históricas, sociais e materiais que fundamentam o procedimento da
concentração do fator terra nos países do Velho e do Novo-Mundo.
A bibliografia que evidencia com mais precisão a discussão sobre reforma agrária no
Brasil é de produção acadêmica recente e está publicada em anais de eventos brasileiros que
tratam com exclusividade o tema. Entre os autores que serão utilizados no presente trabalho
podem ser citados o Mattei (2012) e Engelmann e Gil (2012).
2 A questão agrária no Brasil: do fim do Estado Novo ao Governo FHC
Antes de se discutir a questão agrária no Brasil é de primeira necessidade a apresentação
do conceito de “Reforma Agrária” que em muito se diferencia das políticas de assentamentos
que ganharam força no país a partir da segunda metade dos anos 1990. Em suma, reforma
agrária significa uma mudança na estrutura fundiária de um país a partir da qual se conquista a
democratização do uso da terra e a desconcentração desse fator por intermédio da
desapropriação dos grandes latifundiários que possuem propriedades de grande dimensão.
Sobre isso MATEI (2012) analisa:
A reforma agrária significa uma modificação radical da estrutura agrária de um país, de tal modo que o acesso à terra seja democratizado e, consequentemente, contribua para melhorar o nível de distribuição da riqueza gerada pela população rural. Por isso, entende-se que a distribuição igualitária da propriedade da terra é um dos indicadores mais importantes para se medir o caráter democrático ou não de sociedades que se constituíram a partir de bases agrárias, como é o caso da sociedade brasileira.
No Brasil a discussão sobre as problemáticas agrárias se inicia a partir dos anos 1950
quando o país estava sob o governo do presidente Eurico Gaspar Dutra que assume a
presidência ainda em 1945 com a retirada de Vargas e o fim do período ditatorial conhecido
como Estado Novo. Mas só é a partir de 1955, quando os movimentos sociais –especialmente,
as Ligas Camponesas do Nordeste – começam a reivindicar a reforma agrária, que o movimento
ganha corpo mais eminente.
É nos anos 1960, que se inicia sob a presidência de Juscelino Kubitschek, que tais
movimentos passam a ter maior apoio político por alguns representantes sociais junto ao corpo
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político brasileiro. Um desses momentos foi durante a campanha para presidente da república
ainda nos anos 1960, quando o candidato apoiado pela UDN Jânio Quadros é eleito, mas não
consegue eleger o seu vice, sendo o vice do governo eleito pelo povo o candidato João Goulart
que recebeu apoio do então ex-presidente JK e das fileiras progressistas da sociedade brasileira.
Logo após a renúncia de Quadros em 1961, Goulart assume a presidência e, por não representar
os interesses das oligarquias latifundiárias e industriais, tem os poderes limitados por um regime
parlamentarista instituído antes de este assumir definitivamente o governo. Após convocar um
plebiscito que colocaria o regime presidencialista em votação, este é obtido pelo voto da maioria
da população. Instituído novamente o presidencialismo João Goulart tenta executar o Plano
Trienal elaborado pelo então ministro do planejamento Celso Furtado. O Plano Trienal além de
conter diagnósticos sobre a conjuntura econômica do país ainda propunha as chamadas
Reformas de Base. Uma dessas reformas era a reforma agrária que pretendia modificar a
estrutura fundiária do país e, com isso, reduzir o grau de desigualdade ampliando as condições
de reprodução social dos trabalhadores rurais. Já nos primeiros meses de 1964 a reforma agrária
foi anunciada e recebeu grande apoio da ala progressista, já a casta conservadora formada por
grandes latifundiários, industriais e militares repudiaram com veemência esse comportamento.
A ideia progressista aumentou ainda mais a insatisfação dos conservadores em relação ao
governo Goulart, procedimento esse que alcançou seu ponto máximo na tomada do poder pelos
militares em 31 de Abril de 1964. No governo militar, que durou aproximadamente 21 anos,
foram negligenciadas reformas que viabilizavam maior bem-estar social para as classes menos
favorecidas. Foi nesse período que houve a criminalização de movimentos que buscavam tais
modificações na estrutura econômica do país. A forte repressão social na Ditadura Militar
representou uma grande perda para os trabalhadores e ativistas rurais.
Com a redemocratização do país em 1985 a discussão sobre reforma agrária volta à tona
a partir das pressões sociais de grupos organizados como o Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra, o MST. Constituiu também para essa temática, a Constituição Federal de
1988 que assegura a expropriação de terras por parte do Estado desde que a primeira não esteja
realizando a sua obrigação social: produzir. Foi também nos primeiros anos pós-
redemocratização que foi elaborado o I Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA) durante o
governo Sarney, programa que pretendia assentar em torno de 1,4 milhão de famílias. Sem
embargo, as alianças que o governo possuía com os grandes latifundiários penalizaram
significativamente o sonho agrário sendo assentadas nesse período pouco menos de 85 mil
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famílias (Mattei, 2012). O Estado brasileiro em todos nesses contextos supracitados cumpre
com eficiência a manutenção dos interesses da classe dominante.
O início dos anos 1990 foi marcado nos seus dois primeiros anos pelo governo de
Fernando Collor. As políticas agrárias nessa época foram claramente negligenciadas. Uma
prova disso foi a previsão de assentamento de apenas 500 mil famílias e a extinção do Ministério
da Reforma Agrária em seguida. Outro fato que favoreceu tais decisões foi a onda neoliberal
que se perpetuou desde o início da década, o que deixou claro que a reforma agrária não faria
parte do leque de prioridades do governo. Após o impedimento do governo Collor em fins de
1992 o seu vice Itamar Franco assume a presidência da República, e anuncia um programa de
reforma agrária que assentaria de início 80 mil famílias. No entanto, foram assentadas pouco
menos de 23 mil famílias o que leva a conclusão de que no período que compreende os anos de
1990 a 1994 pouca importância foi dada às políticas agrárias (Mattei, 2012), o que significa
dizer que a melhoria das condições de subsistência das classes rurais foi negligenciada.
Após a era Collor-Itamar Franco, assume a Presidência da República o candidato do
Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) Fernando Henrique Cardoso. Desde o início
do seu governo não esquadrinhava a reforma agrária apenas como uma forma de aumentar a
produção agrícola, mas como um mecanismo de aumentar significativamente a produtividade
dos trabalhadores rurais. Numa análise perfunctória, extrai-se que a política agrária proposta
por Fernando Henrique Cardoso resultaria numa externalidade que proporcionaria melhores
condições de subsistência para a classe formada pelos trabalhadores rurais. A avalição da
estrutura da legislação sobre a desapropriação de terras também foi efetuada nessa
administração junto com uma reconstrução dos impostos que tributavam propriedades
fundiárias. Segundo Mattei (2012) essas modificações serviram como ferramentas que
substituiriam a perspectiva antiga da discussão fundiária por uma visão mais moderna de
políticas públicas direcionadas para a sociedade como um todo o que fez o governo assumir o
compromisso de assentar 283 mil famílias.
O segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (1998-2002) foi marcado por uma
espécie de desilusão social onde a política agrária proposta não possuía mais um viés de
desapropriação, mas uma reforma que permitia “o fluir” do neoliberalismo para as questões
estruturais das condições materiais de produção social. Nesse sentido as políticas do segundo
mandato de FHC foram marcadas pelas saídas mercantis que abandonaram por completo o
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verdadeiro significado da reforma agrária. Ganharam notoriedade nesse período programas
como o Banco da Terra e Cédula da Terra. Em síntese, o governo FHC como um todo não
contribuiu eficientemente para a consubstanciação de uma reforma agrária plena dando
continuidade às falhas tentativas já evidenciadas desde a redemocratização do país, tentativas
essas que contribuíram para a tendência concentradora de terras existente no Brasil. Apesar da
continuidade de tal tendência deve-se evidenciar que as políticas de assentamentos dos
governos FHC I e II foram as que mais assentaram famílias desde a redemocratização até o
final do seu segundo mandato, em 2002. Mattei (2012) sintetiza:
Em síntese, o período 1995-2002 foi marcado por grandes contradições sobre ações governamentais na esfera agrária. Enquanto o governo FHC afirmava estar fazendo a maior “reforma agrária do mundo”, dados do Censo Agropecuário do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostraram que, na década de 1990, aproximadamente 450 mil propriedades rurais, em sua maioria com áreas inferiores a 10 hectares, haviam desaparecido, confirmando a continuidade de tendência de concentração da terra no país e mantendo o paradoxo do problema agrário brasileiro.
3 Reforma agraria nos governos Lula-Dilma
Foi no final das eleições de 2001 que os movimentos sociais dilataram suas esperanças
no que se refere a um novo começo de conquistas sociais e novas condições de vida. A vitória
da chapa progressista formada pelo sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva do Partido dos
Trabalhadores (PT) como Presidente e por José Alencar do Partido do Movimento Democrático
Brasileiro (PMDB) como vice, parecia assumir um compromisso de ganhos significativos para
as pautas sociais e, por isso, contou com um amparo de sobremodo significativo das massas
rurais durante o seu governo que se inicia no ano de 2002.
Evidenciando os aspectos econômicos, o governo Lula I foi marcado por uma grande
expansão na dinâmica comercial externa. A elevação dos preços das commodities garantiram
ao Brasil ganhos reais significativos tanto no setor agrário exportador como na produção de
petróleo que valorizou de sobremodo a estatal Petrobras. Por esses caminhos, entende-se que o
primeiro mandato do presidente conta com a dinâmica do comércio internacional como aliada
importante que irá influenciar as tomadas de decisões da administração pública.
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No que se refere à reforma agrária, objetiva-se no governo Lula que este não daria
prioridade adequada ao programa agrário inicialmente proposto pelo Partido dos Trabalhadores,
sendo enfatizada uma melhor estruturação dos assentamentos já criados durante os outros
governos. Como resultado dessa conduta, poucas inversões foram feitas na ação de
desapropriação de novas áreas. Ainda no que no primeiro mandato do presidente Lula tenha
sido aprovado o II Programa Nacional de Reforma Agrária (II PNRA), não obstante esse plano
foi mais usado no sentido de realização de novos assentamentos principalmente em áreas de
grandes conflitos agrários e não propiciou uma plena reestruturação agrária no país, o que deu
continuidade à perpetuação da estrutura fundiária existente até o aquele momento.
Uma explicação para essa modificação de postura pode ser esclarecida pela própria
modificação do Programa Agrário do PT que mudou significativamente do primeiro programa
elaborado em 1989, para o segundo arquitetado em 2002. Engelmann e Gil (2012) lançam luz
sobre essa modificação na seguinte contribuição:
Ao analisarmos o Programa Agrário do PT de 1989, percebe-se que este propõe a realização da reforma agrária para eliminação da concentração da terra e desenvolvimento da agricultura e da economia: “A reforma agrária é indispensável
para a construção de uma sociedade mais justa e democrática. Visa, (...), romper o monopólio da terra e lançar as bases de um padrão de desenvolvimento para a agricultura e toda a economia brasileira.” (Programa Agrário do PT, 1989, apud ENGELMANN, 2012, p. 05)
Já no Programa Agrário de Campanha de 2002, o PT passa a considerar a reforma agrária como uma política para o desenvolvimento rural, baseada em desapropriação de terras improdutivas; conciliada a produção de alimentos para combate a pobreza e a recuperação dos assentamentos, com infra-estrutura social, econômica, assistência técnica e créditos agrícolas. (Programa Agrário da Campanha Presidencial do PT, 2002, apud ENGELMANN, 2012, p. 05).
Por essa perspectiva pode-se entender que o novo programa agrário do PT busca
solucionar principalmente os problemas relacionados ao combate à pobreza e a fome, onde se
pode citar como exemplo o programa Fome Zero. Sendo assim, a reforma agrária passa a ser
vista como uma alternativa estruturante para assegurar o direito à alimentação da população
brasileira, perdendo-se de vista o verdadeiro sentido da reforma: a democratização do fator terra
que resulta numa redução das desigualdades sociais através da desconcentração da estrutura
fundiária. A continuidade desse pensamento durante os oito anos do governo Lula fez com que
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a política agrária deste mantivesse uma estrutura agrária com grandes latifundiários e uma
desigualdade social evidente a qualquer ótica.
Segundo Fernandes (2012) a reforma agrária durante o governo Lula – entendido por
alguns autores como pós-neoliberal – acontece, porém de forma parcial. A não totalidade da
reforma agrária brasileira nesse período é impossibilitada por questões estruturais que, segundo
o autor, foram negligenciadas pelo governo. São elas: a manutenção do campesinato em estado
permanente de subalternidade ao capitalismo e a insuficiência de políticas públicas de
desenvolvimento para a agricultura camponesa. Ao se tratar da subalternidade do campesinato
ao capitalismo, o autor chama a atenção para a hegemonia do agronegócio que, segundo ele, é
derivado do modelo norte-americano denominado de agribusiness que é o trabalho em conjunto
dos sistemas agrícolas, pecuário, industrial, financeiro e também tecnológico. Seguindo as
veredas do agribusiness o agronegócio aparece como o a expressão capitalista da modernização
agrícola que vem se apropriando dos latifúndios e das terras do campesinato. A despeito disso,
o agronegócio é a principal força drenadora dos créditos destinados à produção agrícola (85%)
suscitando a baixa disponibilidade de crédito para a agricultura familiar. Sendo assim, a
hegemonia do agronegócio, o agribusiness à brasileira, é percebida como uma grande barreira
à realização da reforma agrária, pois tal modelo não admite a democratização da terra já que
esta ameaça os interesses dos grandes latifundiários que se empenham cada vez mais na
radicalização do modelo agroexportador logrando ao campesinato uma vida de subalternidade
ao capital (FERNANDES, 2013). Por essas vias de pensamento pode-se enxergar que a
principal falha do governo Lula, no que diz respeito à reforma agrária, foi não ter declarado
uma guerra institucional contra a hegemonia do agronegócio no território agrícola brasileiro.
Ainda com esses descaminhos os governos Lula I e II conseguiram assentar um número
considerável de famílias que se aproximou de 519 mil. Sem embargo, um dos grandes
problemas desses assentamentos é a falta de estrutura existente nestes e os solos que muitas das
vezes se encontram exauridos pelo intenso uso passado. Tais causas têm levado a um grande
número de evasões dos assentamentos, expondo assim a despreocupação dos governos com a
preparação das condições de reprodução social desses indivíduos que vivem à margem de uma
vida digna por não possuírem uma parcela de terra capaz de produzir os meios de subsistência
indispensáveis para lhes garantirem a sua perpetuação enquanto classe e enquanto seres
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emancipadores de si mesmos. A tabela 01 apresenta a área desapropriada, as famílias
beneficiadas e o número de assentamentos no período 2003-2015.
Tabela 01: Número de assentados, famílias e área (2003-2015)
Ano Área (há) Famílias Assentamentos
2003 4.526.137,53 36.301 320
2004 4.687.393,13 81.254 454
2005 13.437.557,70 127.506 869
2006 9.237.948,56 136.358 672
2007 5.747.067,64 67.535 389
2008 4.143.245,69 70.157 331
2009 4.633.822,00 55.498 299
2010 1.878.007,52 39.479 210
2011 1.902.883,90 22.021 109
2012 322.314,14 23.075 117
2013 315.573,91 30.239 132
2014 415.436,38 32.019 145
2015 206.541,97 26.335 81
Total 51.453.930,07 747.777 4.128
FONTE: Elaboração própria com dados obtidos no INCRA (2016)
Apesar dos avanços em relação a períodos anteriores, os governos Lula, mesmo sendo
de viés progressista e tendo contribuído significativamente com a melhoria da educação do país
junto com a retirada de muitas famílias da linha da pobreza, não conseguiu implantar uma
reforma agrária plena com desapropriação de terras que não cumprem a sua função social. A
última presidente do PT, Dilma Rousseff, também deu continuidade a essa política de
assentamentos que não reestruturam a situação agrária apesar de ter mantido gastos públicos
que garantiram a manutenção de programas sociais. Sendo assim – quanto ao comportamento
do Estado – conclui-se que a estrutura estatal brasileira ainda teme o enfrentamento direto junto
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a classe dominante seja por razões de composição política ou razões econômicas, o que significa
que o Estado atua como gestor dos interesses apenas da parte dirigente desse elenco coletivo
denominado de sociedade.
4 Considerações finais
As desigualdades sociais resultantes da má distribuição de fatores não necessariamente
podem ser apontadas como causa do advento do capitalismo. Como foi observado no decorrer
do trabalho, as antigas formas de propriedade já fomentavam certo grau de concentração de
fatores, o que contribuiu para o surgimento para o futuro de uma classe desprovida de meios de
produção.
Os primeiros fatores que surgiram como propriedades privadas comunitárias foram a
terra e o trabalho, sendo este último evidenciado na forma de propriedade conhecida por
escravista. Com o contínuo desenvolvimento das forças produtivas que culminariam na forma
da propriedade feudal a terra passa ser um fator de extrema importância para a reprodução social
dos indivíduos daquele período. É nessa época onde o antigo escravo aparece na forma de
camponês, produtor direto do modo de produção vigente, e que detém uma parcela de terra que
produz os seus meios de subsistência.
É com o advento do capitalismo que há a total separação entre o produtor direto e os
seus meios de produção. Um exemplo analisado no texto foram as expropriações de terras
camponesas na Europa que transformaram o camponês em um ser que possui apenas a sua
capacidade de trabalho que pode ser comercializada no mercado como qualquer mercadoria.
Esse processo ficou conhecido como Acumulação Primitiva, que lançou os fundamentos da
produção propriamente capitalista e concentrou a estrutura fundiária europeias nas mãos de uma
burguesia nascente.
É com esse intuito concentrador e cumulativo, no que se refere a riqueza, que a coroa
portuguesa passa a nomear os proprietários das terras brasileiras através da lei das capitanias
hereditárias. Essa estruturação fundiária dar origem à concentração de terras que persiste até
hoje no Brasil.
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A discussão agrária no Brasil só ganha forma e força no período que compreende entre
os anos 1950-1960, momento em que o país passa por violentas modificações políticas e sociais.
Como exemplo pode-se citar o golpe de 1964 que retirou Goulart da presidência e abandonou
completamente a causa agrária do país e ainda criminalizou os movimentos sociais que
divergiam do sistema.
Do período que vai da redemocratização do Brasil até o governo Dilma I percebe-se
grandes desvios do que realmente se pode chamar de reforma agrária. Os assentamentos que se
observam desde Sarney nunca modificaram verdadeiramente a estrutura fundiária do país
apesar do PNRA elaborado no seu governo. Foi observado que, no que se refere as políticas de
assentamentos, os governos FHC I, II e Lula I, II foram os mais significativos. Juntos, esses
governos conseguiram assentar mais de 1,2 milhão de famílias. Tomando os governos do PTde
Lula I até Dilma I observou-se mudanças nas propostas agrárias devido à modificação do
Programa Agrário do partido. Para fins de análise, foi observado que todos os governos pós-
redemocratização, inclusive o período PT, foram incapazes de enfrentar a burguesia e garantir
uma reforma agrária plena. Sejam por questões políticas ou econômicas, o comportamento do
Estado contribuiu amplamente para a manutenção da estrutura agrária concentradora que o país
possui hoje.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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MANDEL, Ernest. O Capitalismo Tardio. São Paulo: Abril Cultural, 1982.
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__________. A Ideologia Alemã. São Paulo: Centauro, 2005.
MATTEI, Lauro Francisco. A Reforma Agrária Brasileira: Evolução das famílias assentadas no período Pós-Redemocratização do País. Estudos Sociedade e Agricultura (UFRRJ), v. 1, p. 301-325, 2012.
SADER, Emir (organizador). 10 anos de governos pós-neoliberais no Brasil: Lula e Dilma. São Paulo: Boitempo; Rio de Janeiro: FLACSO BRASIL, 2013
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UMA ANÁLISE DOS PROGRAMAS DE REFORMA AGRÁRIA E DE CRÉDITO
FUNDIÁRIO NO BRASIL: PERÍODO 2003-2014
AN ANALYSIS OF PROGRAMS AND AGRARIAN REFORM LAND CREDIT IN
BRAZIL: PERIOD 2003-2014
Letícia Alves de Melo Mestranda do Programa de Pós-graduação em Administração e Desenvolvimento Rural/ Universidade Federal Rural de Pernambuco [email protected] Tales Wanderley Vital Doutor em Economia/ Prof. Do Programa de Pós-graduação em Administração e Desenvolvimento Rural / Universidade Federal Rural de Pernambuco [email protected] Romilson Marques Cabral Doutor em Administração / Prof. do Programa de Pós-graduação em Administração e Desenvolvimento Rural / Universidade Federal Rural de Pernambuco [email protected] José Marcione da Costa Mestrando do Programa de Pós-graduação em Administração e Desenvolvimento Rural/ Universidade Federal Rural de Pernambuco [email protected]
Grupo de Pesquisa: GT3- Políticas Públicas e Reforma Agrária
Resumo
O presente artigo analisa a evolução do acesso à terra no Brasil, no período de 2003 a 2014, a
partir de dois Programas: 1) Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA), executado pelo
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA); e o 2) Programa Nacional de
Crédito Fundiário (PNCF). Quanto ao método, a pesquisa caracteriza-se como exploratória.
Para tanto foi realizado levantamento bibliográfico sobre reforma agrária, política fundiária e
assentamentos rurais. As fontes de dados são do Ministério do Desenvolvimento Agrário
(MDA) e do INCRA. Na análise dos dados foi feita uma abordagem através do modelo
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dinâmico comparativo. Os resultados apontam que o número de operações realizadas por
meio do PNCF, no período analisado foi mais elevado do que o número de assentamentos do
PNRA - INCRA. Já em relação ao número de famílias que tiveram acesso a terras através do
PNRA foi mais elevado que o número de famílias beneficiadas através do PNCF.
Palavras-chave: Acesso à terra; reforma agrária; crédito fundiário; assentamentos rurais.
Abstract
This article analyzes the evolution of access to land in Brazil in the period 2003-2014, from
two programs: 1) National Program for Agrarian Reform (NARP), run by the National
Institute of Colonization and Agrarian Reform (INCRA); and 2) National Program for Land
Credit (PNCF). As for the method, the research is characterized as exploratory. The
participants had to literature on land reform, land policy and rural settlements. Data sources
are the Ministry of Agrarian Development (MDA) and INCRA. In the analysis of the data was
made an approach through comparative dynamic model. The results show that the number of
transactions carried out through the PNCF, in the analyzed period was higher than the number
of PNRA settlements - INCRA. In relation to the number of families who had access to land
through the NARP was higher than the number of families benefited by PNCF.
Key words: Access to land; agrarian reform; credit land; rural settlements.
1. Introdução
A distribuição de terras no Brasil iniciou-se no período do Brasil imperial. Nesse
período, compreendido entre 1822-1950, o império português adotou o sistema de sesmarias,
que era semelhante ao utilizado no próprio reino em Portugal. O sistema de sesmarias
objetivava a entrega de lotes de terra àqueles que tivessem condições de produzir nela. Porém
a terras pertenciam ao Rei de Portugal, e aos sesmeiros era concedido apenas o direito a posse
e não a propriedade (COVOLAN; GONZALEZ, 2008, p. 5813).
Ao fim do período das sesmarias, foi aprovada a Lei das Terras, que segundo
Rezende e Guedes (s.d) tinha dentre os seus objetivos ordenar a apropriação territorial no
Brasil, acabar com a posse e criar um setor agrícola de pequenos proprietários. Tais autores
chegam a afirmar que essa lei era necessária para resolução dos conflitos que se
intensificavam nas questões ligadas a indefinição do direito à terra, que envolviam os
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proprietários particulares em brigas familiares e crimes no campo. Embora a lei, buscasse
atenuar a centralização que predominara no império, sua efetividade foi baixa e sucedeu-se
um forte movimento favorável a descentralização das terras (REZENDE; GUEDES, s.d., p.
18). A descentralização de terras no Brasil é uma luta histórica, que percorre décadas e por
vezes envolve questões políticas, econômicas e sociais.
De acordo com Sorj (1998, p. 28) o auge das mobilizações sociais no campo
brasileiro em favor da reforma agrária ocorreu pouco antes do golpe de 1964 o qual reprimiu
as organizações políticas rurais. No Nordeste brasileiro essas lutas foram travadas pelas Ligas
Camponesas, liderada por Francisco Julião e pelo Partido Comunista. Após o golpe cívico -
militar de 1964, o conflito em torno da questão fundiária foi produto de forças contraditórias.
Tudo fôra resolvido, do típico jeito brasileiro, de um lado os militares, de outro as elites
dominantes. O Estatuto da Terra foi fruto desse entendimento. O ônus ficou com o Estado e o
bônus, com as classes dominantes.
Neste sentido, para Holffman e Ney (2010, p. 16) uma desigualdade fundiária
elevada é caracterizada pelo fato de haver uma grande proporção da área total ocupada por
uma pequena proporção dos estabelecimentos. Também Fernandes, Gonçalves e Welch
(2012, p. 13), afirmam após analisar e comparar dados entre participação dos
estabelecimentos na produção total, que a concentração territorial explicita a concentração de
riquezas e do controle do capital. Os autores afirmam ainda que a concentração é marca forte
no campo brasileiro, sendo também afirmado por Sorj (1998, p. 25), ao dizer que a luta pela
terra e a desapropriação e distribuição da grande propriedade fundiária percorre a história
recente do país.
Assim, objetivando o acesso à terra, pelos diferentes públicos, políticas de
reforma agrária buscaram promover a democratização do acesso a terra, no entanto nem
sempre atingiram seus objetivos. Muitas vezes, a luta pelo acesso a terra se dá através de
mobilizações sociais em prol da reforma agrária.
Nesse novo contexto de redistribuição de terras, pela via de colonização, surgem os
assentamentos rurais, e dentro deles os assentados, que segundo Sorj (1998, p. 37), dividem-
se em duas categorias: os assentados cujos lotes geram níveis mínimos de subsistência, sem
capacidade de se transformar em empresas rurais geradoras de maiores níveis de renda, e os
que conseguem se transformar em empresas rurais absorvedoras de tecnologia e geradoras de
níveis mais altos de renda.
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Para o INCRA (2016), assentamento rural é basicamente um conjunto de unidades
agrícolas independentes entre si, instaladas por esse instituto onde originalmente existia um
imóvel rural que pertencia a um único proprietário. Cada uma dessas unidades, chamadas de
parcelas, lotes ou glebas, o INCRA entrega a uma família sem condições econômicas para
adquirir e manter um imóvel rural por outras vias. A quantidade de glebas num assentamento
depende da capacidade da terra de comportar e sustentar as famílias assentadas. O tamanho e
a localização de cada lote são determinados pela geografia do terreno e pelas condições
produtivas que o local oferece.
Um assentamento funciona da seguinte forma: os trabalhadores rurais que
recebem o lote comprometem-se a morar na parcela ou próximo e a explorá-la para seu
sustento, utilizando a mão de obra familiar. Esses parceleiros contam (ou deveriam contar)
com crédito, assistência técnica, infraestrutura e outros benefícios de apoio ao
desenvolvimento das famílias assentadas. Até que possuam a escritura do lote, os assentados e
a terra recebida estarão vinculados ao INCRA. Portanto, sem portar a escritura do lote em seu
nome, os beneficiados não poderão; vender, alugar, doar, arrendar ou emprestar sua terra a
terceiros. Importante salientar que os assentados pagam pela terra que receberam do INCRA e
pelos créditos contratados, contudo há dificuldade de se emancipar os muitos assentamentos,
muitos deles já têm mais de 20 anos. Além da distribuição de terras, com a criação dos
assentamentos da reforma agrária o INCRA garante condições de moradia, produção familiar,
e a segurança alimentar de famílias assentadas na zona rural.
Em relação ao Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF), esse surge com o
propósito de viabilizar o acesso à terra, através da concessão de um empréstimo ao agricultor,
a fim de que esse obtenha a terra para trabalhar, em condições acessíveis e pague por ela no
longo prazo. O PNCF iniciou com a meta de atingir 130 mil famílias, esse programa foi
inspirado nas diretrizes agrárias do Banco Mundial (CARVALHO, 2010, p. 411). Para esse
banco de desenvolvimento, tal programa possui a seguinte justificativa:
Ações voltadas ao crédito fundiário justificam-se devido ao fato de que
70% da pobreza mundial está localizada no meio rural, e de que a
propriedade da terra é concentrada em virtude de um mercado pouco
dinâmico e de que seria necessário buscar formas alternativas de acesso à
terra com custos mais baixos do que a reforma agrária. (BANCO
MUNDIAL apud TORRENS, 2011, p. 27)
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Esses custos se tornam mais baixos para os proprietários de terras, mas não para
os agricultores assentados, podendo ser considerado uma forma de transferência de
responsabilidade. Ainda na mesma perspectiva Delgado (2005), afirma que crédito fundiário é
um instrumento clássico do mercado e normalmente seria excepcional na Reforma Agrária
pois consome recurso fiscal elevado e ainda valoriza os patrimônios fundiários. Tal afirmação
evidencia o caráter capitalista que envolve o Programa Nacional de Crédito Fundiário -
PNCF.
Pelo exposto, este artigo busca responder a seguinte questão: Como se deu a
evolução dos assentamentos rurais e das famílias assentadas através do Programa de Reforma
Agrária executado pelo INCRA, e através do PNCF? Para responder a esta pergunta, foi
delineado como objetivo geral analisar o grau de acesso ao PNPF e ao Programa de Reforma
Agrária no Brasil tendo como unidade de análise os assentamentos rurais e as famílias
assentadas. Vale ressaltar que utilizar-se-á neste trabalho a tipologia de assentamento a
caracterizada e reconhecida pelo INCRA, a qual são os assentados beneficiários da reforma
agrária.
Para este propósito tornou-se necessário compreender a priori as Políticas
Públicas, e as Políticas Agrárias, fazer a caracterização do Programa Nacional de Reforma
Agrária (PNRA), bem como do Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF), e entender
seus objetivos e avanços. Em seguida, comparar os resultados alcançados nesses dois
programas a partir da data de Criação do PNCF, o que compreende o período de 2003 a 2014.
Sendo organizados desta forma os tópicos seguintes deste artigo.
2. Materiais e Métodos
Levando em consideração o objetivo deste trabalho, a pesquisa tem o caráter
exploratório com viés quantitativo. A pesquisa exploratória caracteriza-se pela ausência de
um maior aprofundamento, mas permite uma primeira compreensão do fenômeno pesquisado,
podendo posteriormente esse conhecimento ser aprofundado. Para atender esse fenômeno foi
realizado um estudo dinâmico comparado, entre o acesso a terra através do PNCF e PNRA,
onde foi procedido um levantamento de dados secundários relativos a todos os assentamentos
criados através desses programas no período de 2003 a 2014. O modelo dinâmico procura
identificar os fatores determinantes da evolução desses programas (NETO, 2002).
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No tocante à natureza dos dados, esses foram de origem pública, mais
especificamente os produzidos pelas seguintes instituições: o Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (INCRA); e o Ministério do Desenvolvimento Agrário
(MDA). Para compreender a evolução do acesso à terra através dos assentamentos no Brasil,
utilizamos dados e informações geradas pelo INCRA, que apresenta a distribuição dos
projetos de assentamento e das famílias assentadas até 28 de agosto de 2015. Já para entender
a evolução do acesso à terra através do PNCF foram utilizados os dados disponibilizados pelo
MDA, através do Painel de Indicadores de 26 jan. 2016 – Balanço 2014, o qual evidencia o
número de operações por modalidade de financiamento desde 2003 até 2014.
O procedimento metodológico da pesquisa foi documental e bibliográfico,
utilizando dados técnicos oficiais e fazendo um levantamento bibliográfico que permitiu a
apresentação de dados e de informações articuladas relativas a evolução desses programas,
como será visto.
3. Revisão de Literatura
Políticas públicas são diretrizes, princípios norteadores de ação do poder público;
regras e procedimentos para as relações entre poder público e sociedade, compreendendo
mediações entre atores da sociedade e do Estado.
Para Souza (2006, p. 5), política pública é: “o campo do conhecimento que busca,
ao mesmo tempo, ‘colocar o governo em ação’ e/ou analisar essa ação (variável
independente) e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas ações
(variável dependente) ”. Sendo assim, é possível concluir que a política pública, consiste
numa ação do poder público a fim de resolver um problema na sociedade ou mesmo evitá-lo.
Para a mesma autora, as políticas consistem num ciclo deliberativo, com os seguintes
estágios: definição de agenda, identificação de alternativas, avaliação das opções, seleção das
opções, implementação e avaliação. Esse último estágio, pode ofertar informações relevantes
sobre a política, subsidiando decisões sobre ela.
Quantos aos tipos de políticas existem vários, dentre eles é possível destacar as políticas
agrárias, dentro das quais se insere a política agrária.
A política agrária representa a ação do setor público no meio agrário, e isto
envolve política agrícola, política fundiária e de reforma agrária. A tipologia desta política
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caracteriza-se como uma política redistributiva, pois busca a redistribuição das terras
(ROMANO, 2011, p. 152).
A partir do último Censo agropecuário, realizado em 2006, uma gama de temas
entrou nas pautas de discussão, entre eles o acesso a políticas públicas do campo, ou seja,
entre elas a agrária. Sendo o acesso à terra um desses temas, e com a relevância que se
estende até os dias atuais, pois os indicadores apontam a desigualdade na estrutura fundiária
do país. Para atenuar esta desigualdade a integração de políticas públicas no campo
desempenha um papel fundamental na implantação e funcionamento dos assentamentos
rurais, pois mais que o aspecto quantitativo o qualitativo também precisa ser considerado.
Assim, além da PNRA e PNCF, os assentados podem ter acesso ao Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), ao Programa de Desenvolvimento
Solidário (PDS), o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e ao Programa Nacional de
Alimentação Escolar (PNAE). No rol das políticas públicas para o campo, será analisado o
PNRA no Brasil e em seguida o PNCF, sob a égide do acesso à terra que de acordo com
Buainain e Pires (2003, p. 36), caracteriza-se como um dos fatores estruturais que respondem
pela desigualdade social e pobreza rural e urbana que caracteriza o país. A seguir é abordado
alguns aspectos operacionais de acesso à terra pelo PNRA e pelo PNCF.
Programa Nacional de Reforma Agrária no Brasil
A reforma agrária no Brasil, segundo o Estatuto da Terra (1964), é o conjunto de
medidas para promover a melhor distribuição da terra mediante modificações no regime de
posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social, desenvolvimento rural
sustentável e aumento de produção. E segundo o INCRA a reforma agrária proporciona:
desconcentração e democratização da estrutura fundiária; produção de alimentos básicos;
geração de ocupação e renda; combate à fome e à miséria; interiorização dos serviços
públicos básicos; redução da migração campo-cidade, promoção da cidadania e da justiça
social; diversificação do comércio e dos serviços no meio rural; democratização das estruturas
de poder. Neste sentido Girardi e Fernandes (2008, p. 78) seguiram o princípio de que uma
reforma agrária completa no Brasil deve, simultaneamente, reformar a estrutura fundiária do
país, possibilitar o acesso dos camponeses à terra e fornecer-lhes condições básicas de vida e
produção. Os autores citados afirmam que a reforma agrária é uma necessidade
historicamente defendida para a resolução dos problemas agrários no Brasil. Nos sucessivos
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governos deste período, as ações de reforma agrária no Brasil têm sido baseadas
principalmente nas políticas de criação de assentamentos rurais e de concessão de crédito aos
camponeses.
Para realizar a reforma agrária no país foi criada por parte do governo a Política
Nacional de Reforma Agrária. Esta política visa à distribuição de terras mediante cadastro
através do INCRA. Este órgão busca com a reforma agrária atualmente desenvolvida no país a
implantação de um modelo de assentamento rural baseado na viabilidade econômica, na
sustentabilidade ambiental e o desenvolvimento territorial (INCRA, 2016). Para tanto, esse
Instituto adota instrumentos fundiários adequados a cada público e a cada região e está
realizando uma adequação institucional e normativa para a intervenção rápida e eficiente dos
instrumentos agrários. A reforma agrária implica também no forte envolvimento dos governos
estaduais e municipais.
Atendendo às diretrizes estabelecidas no II Programa Nacional de Reforma
Agrária, implantado em 2003, a reforma agrária é parte de um projeto nacional de
desenvolvimento, massivo e de qualidade, geradora de trabalho e produtora de alimentos.
Girardi e Fernandes (2003, p. 79) afirmam que em 2003, após a eleição do
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, houve crescimento substancial das ocupações e,
consequentemente, dos assentamentos. Diante disso, para conter as invasões das terras no país
a partir das ações dos movimentos sociais, em 2003 o Governo juntamente com o Banco
Mundial criou o Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF). Apesar do crédito para o
trabalhador rural ter sido previsto desde o Estatuto da Terra em 1964, só a partir desse
programa foi de fato consolidado em todo país, embora houvesse algumas práticas isoladas
em alguns estados, destacando-se o Estado do Ceará.
Em contraste, Fernandes, Gonçalves e Welch (2012, p.43) afirmam que a
ocupação de terra pelos Sem Terra vêm sendo uma importante forma de pressão para a
realização da reforma agrária, que resultou em assentamentos em todo o território nacional.
Em relação aos beneficiários das terras, a atuação do INCRA no campo é norteada
pela promoção da igualdade de gênero na reforma agrária, além do direito à educação, à
cultura e à seguridade social nas áreas reformadas. O trabalho do INCRA contribui para dotar
o Estado dos instrumentos necessários para gerir o território nacional. Dados da Reforma
Agrária disponibilizados pelo INCRA, relativos ao período de 2003-2014 apontam 9.256
assentamentos criados e 88.314.875 hectares de área reformada. Ou seja, o INCRA ao
executar a PNRA no país, têm promovido o acesso à terra. Outra forma de acesso à terra no
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âmbito nacional, por famílias rurais sem terra, ou com pouca terra, como já referido, é através
do PNCF, o qual é tratado a seguir.
Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF)
O Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF) foi criado pelo Decreto nº
4.892, de 25 de novembro de 2003, e buscou unificar outros programas existentes de âmbito
semelhante que vinham sendo implementados e modificados desde 1997 (Projeto São José,
Cédula da Terra e Banco da Terra). O IPEA (2015, p. 7) afirma que o PNCF, oferece a
oportunidade para que, por meio de um financiamento, trabalhadores do meio rural com
pouca ou nenhuma terra tenham condições de adquirir um imóvel rural. Ou seja, o PNFC é
formado por um conjunto de políticas públicas que visam, por intermédio de crédito
fundiário, a promoção do acesso à terra e a investimentos básicos e produtivos, que permitam
estruturar os imóveis adquiridos com recursos do Fundo de Terras e da Reforma Agrária.
Para o INCRA, imóveis rurais são caracterizados por áreas contínuas, e podem ser
classificados em: minifúndio, propriedade familiar, empresa rural, latifúndio por dimensão e
latifúndio por exploração. Dados de setembro de 2015, obtidos do sistema da Receita Federal,
o Cadastro de Imóveis Rurais (CAFIR), indicam que existem 7.442.515 imóveis rurais ativos,
e destes 5.968.638 – ou seja, 80,2% possuem unidades com área de até 50 hectares.
Criado também para atender os anseios de trabalhadores e famílias rurais, o PNCF
se apoia em três modalidades de financiamento, as quais estão especificadas na tabela 1 a
seguir.
Tabela 1 – Modalidades de Financiamento do PNCF.
Modalidade de
Financiamento
Aplicação Utilização
Combate à Pobreza
Rural (CPR),
Dirigida aos trabalhadores
rurais mais pobres, que estão
inscritos no Cadastro Único.
- Aquisição da terra (Subprojeto
de Aquisição de Terras - SAT);
- Para projetos comunitários
(Subprojeto de Infraestrutura
Comunitário - SIC).
Consolidação da Atende agricultores que - Aquisição da terra (SAT);
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Agricultura Familiar
(CAF),
geralmente já estão na terra ou
ainda os que possuem
minifúndios e querem
aumentar suas áreas.
- Para investimentos básicos
(SIB), destinados a estruturação
produtiva.
Nossa Primeira Terra
(NPT),
Destinada a jovens rurais,
filhos e filhas de agricultores,
estudantes de escolas
agrotécnicas e centros
familiares de formação por
alternância, com idade entre 18
e 29 anos, que queiram
viabilizar o próprio projeto de
vida no meio rural.
- Aquisição de terra (SAT)
Fonte: MDA-Cartilha PNCF (s.d.).
Elaboração: Pelos autores
Além dessas modalidades, para atingir seus objetivos o PNCF tem fomentado
outras modalidades de financiamentos com ações específicas, visando atender segmentos
sociais com maior vulnerabilidade, sendo essas modalidades: Terra Negra Brasil (TNB), para
negros-não quilombolas; PNCF-Mulher – para fortalecer o papel da mulher trabalhadora rural
e agrícola; e PNCF-Juventude: busca ampliar a participação de jovens no âmbito do PNCF.
Apesar de seu alcance no rol de políticas públicas para o setor agrário, este programa busca
incluir camadas sociais historicamente excluídas socialmente, como é o caso de negros,
mulheres e jovens que residem no campo.
Para implantação do PNCF é necessário um conjunto de atividades, envolvendo
um complexo e abrangente arranjo institucional, com órgãos da esfera federal, estadual e
municipal. Além disto, a rede de apoio da sociedade civil é extensa e composta pelo
movimento sindical, terceiro setor e lideranças rurais. Sistemas de apoio gerencial atuam em
diversas esferas de decisão e condução do programa. Neste sentido, os princípios básicos do
PNCF são: transparência, descentralização; participação e controle social.
4. Breve Análise e Discussão dos Dados
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Neste tópico é tratado o desempenho comparativo dos programas PNRA-INCRA
e PNCF, no período (2003-2014).
Assentamentos Criados pelos Programas
Pelo Gráfico 1, observa-se que em 2003 e entre 2005 a 2007, elevou-se significativamente o
número de operações (incluindo aquisição de terras) através do PNCF. No entanto, o período
posterior apresentou diminuição constante até 2014. Já o número de assentamentos pelo
INCRA tem uma pequena elevação entre os anos de 2005 e 2006 para adquirir certa
regularidade até 2014, último ano do período analisado. Pode-se concluir que o PNCF no
período atendeu de forma significativa um maior número de Associações demandantes de
terras, resultando num maior numero de assentamentos através dessa modalidade.
Gráfico 1: Comparação entre o nº assentamentos pelo INCRA e operações do PNCF no Brasil
(2003 a 2014)
Fontes: MDA e INCRA (2003 a 2014). Elaborado pelos autores.
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Famílias beneficiadas pelos assentamentos dos Programas
Fazendo uma análise comparativa entre o PNCF e o PNRA, no período de 2003 a
2014 em relação ao número de famílias atendidas. Pelo Gráfico 2 a seguir, constata-se que o
PNRA foi o programa que mais incorporou famílias no processo de obtenção da posse da
terra. Nesse período, foram beneficiadas 469.801 famílias pelos dois programas. Desse total
o PNRA permitiu acesso a 372.471 (79,3%) famílias, enquanto pelo PNCF foram atendidas
apenas 97.330 (20,7%) famílias. Conclui-se que apesar da compra de terras pelo PNCF ter
sido intensa, foi direcionada para pequenas áreas, cada uma delas com pouco número de
beneficiários. Enquanto o PNRA mesmo com um número de assentamento no período, devido
o tamanho de cada assentamento, isso permitiu assentar um significativo número de
beneficiários.
Gráfico 2: Comparação entre o número de famílias beneficiadas pelos assentamentos pelo
PNRA (INCRA) e pelo PNCF-Brasil (2003 a 014)
Fontes: MDA e INCRA ( 2003 a 2014). Elaborado pelos autores.
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Por outro lado, o Gráfico 3 mostra uma concentração de famílias assentadas pelo
PNRA, em dois estados da região Norte, Amazonas e o Pará. E no Nordeste nos estados do
Maranhão, Bahia e Pernambuco. Note-se que no estado do Pará os beneficiários chegam
próximo de 140.000, ou seja, cerca de 37,6% do total de 372.471 beneficiários, no período de
2003 a 2014. A explicação por essa concentração maior de assentados em estados de maior
extensão territorial (Amazonas, Pará, Maranhão e Bahia) pode ser atribuído ao fato de esses
estados possuírem mais terras disponíveis para reforma agrária por se encontrar propriedades
com baixa ocupação, baixa produção e produtividade ou sem produção alguma.
Estrategicamente esse fenômeno torna-se importante por permitir a ocupação de terras pelas
famílias em vazios territoriais em territórios fortemente cobiçados e com grandes potencias de
garantir sua segurança alimentar.
A maior intensidade dessas ocupações nesses territórios deve-se a atuação dos
movimentos sociais a exemplo do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)
que tem forçado a ocupação de terras ociosas. Esse deve ser também o caso do estado de
Pernambuco que possui mais de 80% de terras no semiárido, portanto com maior dificuldade
de produção e com baixa ocupação, sendo, contudo, ocupada com assentamentos. Também na
zona da mata desse estado vêm ocorrendo assentamentos em engenhos e usinas em função da
crise recente da indústria açucareira, já que essas terras se tornam improdutivas e a ocupação
se dá quando a terra não está cumprindo sua função social.
Gráfico 3: Número de famílias assentadas pelo PNRA (INCRA) por UF (2003 a 2014)
Fonte: Elaboração pelos autores com base nos dados do Ministério do Desenvolvimento
Agrário, no período de 2003 a 2014.
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Embora questões estruturais possam existir nos assentamentos, é fato que as
famílias estão sendo beneficiadas com a reforma agrária no Brasil. Vale ressaltar que a
capacidade do número de famílias por assentamento é determinada pela área adquirida ou
desapropriada e o tipo de uso previsto para essa área. E embora o PNCF tenha beneficiado um
número de famílias inferior ao do PNRA - INCRA esse programa é um importante
instrumento de política pública, sendo considerável o volume de recursos empregado nos
financiamentos, a quantidade de beneficiários atendida, bem como a área adquirida.
Contudo, apesar de todo esse esforço de distribuição de terras, pelos dados do
INCRA, o índice de Gini da estrutura fundiária brasileira era de 0,816 em 2003, o que
demonstrava a alta concentração da terra no país, já que quanto mais próximo de um, maior é
a concentração. Em 2012, esse índice aumentou, chegando a 0,843, evidenciando que a
concentração de terras elevou-se, aumentando ainda mais a desigualdade.
5. Considerações Finais
O presente trabalho é uma tentativa de análise da evolução do acesso à terra por
meio de políticas públicas agrárias, sendo elas o PNRA e o PNCF, durante o período de 2003
a 2010. Diante da breve análise precedida, a fim de entender como se deu a evolução dos
assentamentos rurais e das famílias assentadas através do Programa Nacional de Reforma
Agrária – PNRA executado pelo INCRA, e o Programa Nacional de Crédito Fundiário –
PNCF, pode se concluir que no Brasil, a Política de Reforma agrária estabelecida pelos Planos
Nacionais de Reforma Agrária, I e II, do Ministério do Desenvolvimento Agrário tem se
consolidado, proporcionando o acesso a terras, através dos Programas de Crédito Fundiário e
de Reforma Agrária.
Apesar de existirem tais políticas, o índice de Gini alto em relação a concentração
fundiária no Brasil, persiste como fator preocupante, pois os números revelam que as famílias
beneficiadas através dos assentamentos não têm aumentado nos anos recentes, algo que requer
reformulações por parte do estado em prol da viabilização do acesso à terra através de
políticas públicas.
Considerando as limitações dessa pesquisa, por ter caráter eminentemente
exploratório muitas questões são suscitadas e ainda não respondidas. Sugerem-se pesquisas
que abordem os aspectos qualitativos desses programas relacionados ao acesso às terras, nas
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suas diversas modalidades. Por exemplo, relacionadas às questões dos diferentes tipos de
crédito do PNCF. Além disso, como as características regionais de cada estado afetam a
dinâmica dos programas, a força dos movimentos sociais nesses locais entre outros aspectos,
bem como os impactos das ações do governo sobre a criação e estruturação dos
assentamentos.
Referências
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