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Revista Identidade Oblata
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Revista Identidade Oblata, Curitiba, v.2, n.2, p. 01-61. Jul/Dez de 2014.
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Revista Identidade Oblata, Curitiba, v.2, n.2, p. 01-61. Jul/Dez de 2014.
Revista
IDENTIDADE OBLATA
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Revista Identidade Oblata, Curitiba, v.2, n.2, p. 01-61. Jul/Dez de 2014.
Revista Identidade Oblata
ISSN: 2358-6478
Publicação do Centro de Memória dos Oblatos de São José – Faculdade Padre João Bagozzi
Editoração:
Capa / Cover: Priory Comunicação
Planejamento Gráfico / Graphic Designer: Prof. Ms. Humberto Silvano Herrera Contreras
Revisão / Revision: Prof. Ms. Humberto Silvano Herrera Contreras
Bibliotecária / Librarian: Íris Labonde
As opiniões emitidas nos artigos são de inteira responsabilidade de seus autores.
All articles are full responsability of their authors.
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Lo scambio è chiesto.
Catalogação na fonte
Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte.
Revista Identidade Oblata / Congregação dos Oblatos de São José. Faculdade
Padre João Bagozzi. Centro de Memória Oblatos de São José. Curitiba, 2014.
v.2, n. 2, jul./dez. 2014.
Semestral
ISSN 2358-6478
1. Centro de Memória Oblatos de São José. Congregação dos Oblatos de São
José.
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Revista Identidade Oblata, Curitiba, v.2, n.2, p. 01-61. Jul/Dez de 2014.
Congregação dos Oblatos de São José
Presidente / President
Pe. Ailton Ferreira de Almeida, osj
Editor / Editor
Prof. Ms. Humberto Silvano Herrera Contreras
Comissão Editorial / Executive Commite
Ir. Leandro Antônio Scapini, osj
Prof. João Antônio Viesser - BAGOZZI
Comissão de Educação – Congregação Oblatos de São José
Todos os direitos reservados à Congregação dos Oblatos de São José.
A reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio ou processo,
sem a citação da fonte, constitui crime.
Correspondência / Letters
Centro de Memória Oblatos de São José
Faculdade Padre João Bagozzi
Rua Caetano Marchesisni, 952
Portão – Curitiba – Paraná
CEP.: 81070-110
E-mail: nipe@faculdadebagozzi.edu.br
Tel.: (41) 3521-2727
Copyright 2013
Congregação dos Oblatos de São José
Rua João Bettega, 796 Portão – Curitiba – Paraná
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Revista Identidade Oblata, Curitiba, v.2, n.2, p. 01-61. Jul/Dez de 2014.
Revista
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SUMÁRIO
Apresentação...............................................................................................................
Humberto Herrera
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Artigos do Dossiê: A Educação da Mente e do Coração
Projeto Educativo de São José Marello: educação do coração .................................
Pe. Miguel Piscopo, osj
9
O que Jesus diz aos educadores? ................................................................................
Pe. Mauro Negro, osj
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O amor como virtude educativa: reflexões filosóficas ..............................................
Denilson Aparecido Rossi
23
Família: para uma civilização do amor ……………………………………………..
Pe. Mário Guinzoni, osj
26
Documentos: Memórias da I Jornada da Educação Josefino-Marelliana
Discurso do Provincial aos Educadores .............................................................
Pe. Ailton Ferreira de Almeida, osj
Carta sobre o Núcleo de Pastoral da Educação Oblata ........................................
Pe. Ailton Ferreira de Almeida, osj
Mensagem da COSJ aos Educadores.........................................................................
Pe. José Antonio Bertolin, osj
Exposição Fotográfica “Educadores Oblatos: entre textos e imagens” .................
Equipe Centro de Memória Oblatos de São José
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Entrevista
Pe. Ciriaco Bandinu ....................................................................................................
Equipe Centro de Memória Oblatos de São José
53
Sobre a Revista Identidade Oblata .............................................................................
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Revista Identidade Oblata, Curitiba, v.2, n.2, p. 01-61. Jul/Dez de 2014.
APRESENTAÇÃO
A presente edição tem como tema do dossiê “A educação da mente e do coração”.
A escolha temática sintetiza uma das mensagens educativas que São José Marello
enunciou nas suas cartas episcopais no século XIX.
O tema do dossiê é resultado da reflexão realizada na I Jornada da Educação
Josefino-Marelliana, em outubro de 2014, por motivos da comemoração do dia do
educador.
Na seção Artigos apresentam-se inicialmente os três textos que fundamentaram a
mesa redonda da I Jornada. O primeiro deles é o texto de Pe. Miguel Piscopo, osj
intitulado Projeto Educativo de São José Marello: educação do coração no qual sintetiza
as principais ideias de São José Marello sobre a catequese, instrução escolar e a educação
dos jovens na família.
O segundo artigo, O que Jesus diz aos educadores? de autoria de Pe. Mauro
Negro, osj apresenta alguns elementos da mensagem de Jesus que podem orientar a
prática dos educadores. Na sequencia, o terceiro artigo intitulado O amor como virtude
educativa: reflexões filosóficas do Prof. Ms. Denilson Aparecido Rossi discute uma
concepção de ser humano e educação a partir da filosofia e aponta elementos de como e
para que educar, em vistas à compreensão da ideia de “educar com amor”.
O quarto artigo de autoria de Pe. Mário Guinzoni, osj intitulado Família: para
uma civilização do amor estuda o tema da família na perspectiva do testemunho e
pensamento de São José Marello. Reflete sobre os elementos essenciais para o cultivo da
convivência fraterna.
Na seção Documentos a revista apresenta quatro documentos que registram as
memórias da I Jornada da Educação Josefino-Marelliana. Entre os documentos está o
discurso do provincial aos educadores que foi proferido pelo Pe. Ailton Ferreira de
Almeida, osj e a mensagem aos educadores redigido pelo Pe. José Antonio Bertolin, osj
em comemoração ao Dia do Educador. Apresentam-se também a Carta sobre o Núcleo de
Pastoral da Educação Oblata e as imagens da exposição fotográfica “Educadores Oblatos:
entre textos e imagens”, que foi realizada no evento da I Jornada.
Também, o periódico, na seção Entrevista traz o relato do Pr. Ciriaco Bandinu, osj
sobre a sua trajetória religiosa e do seu protagonismo no Colégio e Faculdade Bagozzi, e
também do seu projeto no Centro Social Marello.
Boa leitura!
Humberto S. H. Contreras
Editor
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ARTIGOS DO DOSSIÊ:
RETRATOS DA EDUCAÇÃO OBLATA:
EXPERIÊNCIAS E ATUALIDADES
A
R
T
I
G
O
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Revista Identidade Oblata, Curitiba, v.2, n.2, p. 01-61. Jul/Dez de 2014.
PROJETO EDUCATIVO DE SÃO JOSÉ MARELLO:
EDUCAÇÃO DO CORAÇÃO
Pe. Miguel Piscopo, osj
1. Introdução
José Marello não escreveu nenhum tratado pedagógico e não deixou nenhuma
exposição, estudo ou conferência sobre o tema da educação, mas, nas suas Cartas,
encontramos traços claros e profundos que nos fazem entender sua alma de educador.
Precisamente na sua IV Carta Pastoral sobre “a instrução na escola e a educação
na família da juventude” (4 de fevereiro de 1982), encontramos um panorama sugestivo e
original de valores, princípios teóricos, princípios práticos e metodologias formativas. É
uma carta que nos oferece a síntese das finalidades, os valores, os meios e a metodologia
da instrução familiar. Nela encontramos as linhas inspiradoras que guiavam a obra
educadora e evangelizadora do Bispo de Acqui.
Marello era um pastor e, como tal, estava preocupado que os cristãos daquele
tempo não deixassem de ser “Sal e Luz” (Mt 5,13-16) das famílias e da sociedade, que
viviam numa atmosfera cultural antirreligiosa. Entra em diálogo com a cultura do seu
tempo, cultura indiferente à religião ou anticlerical. Não foge e não condena a
modernidade (como alguns bispos o faziam), mas nela abre caminhos de salvação.
Sofria muito vendo a corrupção da sociedade de seu tempo e, entrando em contato
com a juventude pobre e desesperada, decidiu dedicar sua vida a ela. Famoso é seu
“grito” escrito numa carta ao seu amigo o Pe. Delaude: “Ah Pobre juventude, por demais
abandonada e esquecida: pobre geração nova deixada sobremodo à própria sorte e
ainda muitíssimo caluniada ou, pelo menos, duramente julgada em tuas leviandades e em
tua generosidade mal contida, naquela necessidade de ação mal desenvolvida, de afetos
mal orientados, pelos quais, sem toda tua culpa, te afastas do reto caminha ‘Pobre
juventude’. Rezemos mui particularmente por ela!” (Carta nº 31).
Para entender e analisar melhor o conteúdo dessa carta, vamos dividir em três
partes.
2. Objetivo da Educação: formar cristãos virtuosos e excelentes cidadãos
Na segunda metade do ano de 1800, no Piemonte, o Estado assumia a tarefa
educativa construindo novas escolas, difundindo programas laicos em contra da religião e
formando parcialmente os alunos. Era, também, notável a ineficácia dos maestros, devido
à sua precária preparação. O Bispo José Marello, com seu coração de pastor e de
educador, mostra um grande interesse pela educação, sobretudo dos jovens. “Talvez
jamais como em nossos tempos se tem falado e escrito tanto da atenção devida à
juventude”. São as primeiras palavras da IV Carta Pastoral.
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A “filosofia educativa laica” das escolas públicas de seu tempo criava na sua alma
sensível “grandes e sérios temores”, mas graças às experiências da sua vida e ao estudo
dos pensadores e educadores contemporâneos, chega com “não menos esperanças” à
convicção que a educação, como caminho até a completa atuação das potencialidades
humanas, tem que partir de uma antropologia cristã. Inspirando-se no humanismo cristão
de São Francisco de Sales, elabora uma “filosofia educativa cristã” que consiste no
desenvolvimento integral do jovem em seu aspecto de “ser histórico” e em seu aspecto
de “ser partícipe da transcendência”.
Muito clara é a sua ideia sobre a finalidade da educação: “dar no tempo devido, o
justo desenvolvimento intelectual... O que ninguém pode negar é que cultivar só a
inteligência não basta e amiúde é prejudicial, se ao mesmo tempo não se educa
cristãmente o coração; e que, mesmo se as escolas vão multiplicando, os pais e mães
cristãos não se podem dispensar de, por um lado, pensar a quais professores estão
confiando os seus filhos e, por outro, fazer eles mesmos primeiramente tudo que podem e
devem para instruir e educar os seus filhos”.
O educador José Marello quer uma educação que forme ao homem, não somente
para a realidade temporal (cultura, profissão, família, sociedade...), senão, sobretudo, aos
valores sobrenaturais e à salvação eterna. Propõe o método preventivo, oferecido pela
tradição cristã e aplicado por Dom Bosco e outros educadores.
A educação humana e cristã para Marello é promoção integral. O papel de um bom
educador é prover que o jovem desenvolva: “não só as forças corporais, mas também e
principalmente das espirituais, pois ao corpo está unida a alma que vive de uma vida
própria e imortal e que se desenvolve e cresce... Criar o corpo... é coisa que fazem
também os animais... mas educar uma alma, isto é: iluminá-la com as luzes da verdade,
aquecê-la no fogo sagrado do amor divino, guia-la pelos caminhos do bem... este é um
ofício nobre e santo de homens e de cristãos, ministério grande que eleva os educadores
a representantes do Pai Celestial e à dignidade de seus colaboradores... Vocês devem
dar aos seus filhos aquela instrução que os introduza no reto caminho e os torne cristãos
virtuosos e ótimos cidadãos”.
São José Marello não enxergava uma contraposição entre ser cristão e ser virtuoso.
A cultura laica de seu tempo predicava esta tese e fazia de tudo para convencer aos
jovens para que ficassem fora e longe da Religião. Ele queria aproximar o Estado à Igreja
e a Igreja ao Estado.
3. Os primeiros artífices da educação: os pais de família
“Por isso, minhas palavras se dirigem especialmente a vocês, pais cristãos,
chamados por Deus à grande e formidável tarefa de criar uma família, mas não somente
a vocês; antes, eu gostaria que fossem bem recebidas também por aquelas tantas pessoas
que de algum modo participam da missão de vocês, como também por todos os que
possam ajuda-los no feliz cumprimento de uma obra que redunda em vantagem de todos
no tempo e na eternidade”.
Marello quer exortar sobre tudo aos Pais de Família a não minimizar a educação
cristã dos seus filhos, a cuidar dos conteúdos da instrução nas escolas públicas. Põe ao
centro da ação educativa a pessoa do jovem. Acredita que a educação é uma “questão de
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amor”, é educar ao amor de Deus e em consequência dos demais. Acredita que a vida
familiar e comunitária são indispensáveis instrumentos de construção pessoal e coletiva.
Olha com otimismo o compromisso educativo dos pais da sua Diocese e com
preocupação a campanha negativa da imprensa: “Nesta Diocese ainda são numerosas as
famílias nas quais o ministério da educação cristã dos filhos é dignamente exercido.
Estaríamos mesmo perdidos se a nossa juventude não tivesse encontrado nos cuidados
carinhosos, nos ensinamentos e nas correções úteis e salutares, e ainda mais nos ótimos
exemplos dos pais, a prevenção e o remédio contra as seduções do vício e contra o
veneno dos falsos princípios que hoje, principalmente através da imprensa, vão-se
multiplicando”.
Aos Pais de Família (e também a outros educadores) lhes exorta a ser verdadeiros
pontos de referência para seus filhos e aliados de Deus na tarefa educativa. É Deus que
deve educar o coração dos jovens por meio de seus educadores. O vínculo entre Deus e o
educador deve ser profundo e íntimo.
“Ó esposos cristãos, lembrem-se sempre que seus filhos são um depósito sagrado
que Deus lhes confiou, e do qual Ele mesmo haverá de pedir-lhes um dia contas
rigorosíssimas. É direito dos filhos serem circundados desde o nascimento dos cuidados
mais primorosos, e vocês pais tem o dever de prover a eles tudo quanto é necessário à
conservação e ao desenvolvimento das forças deles”.
A experiência de fidelidade e sintonia entre pais cristãos cria um lar estável, onde
se pode semear, no coração dos filhos, valores humanos e religiosos como o amor a
Deus, a paz e a não violência, o amor, a acolhida, o respeito, o perdão aos demais; a
honestidade, a justiça, a busca do bem comum, o cuidado dos mais fracos... A educação
dos filhos, que acontece na família desde a sua mais terna idade, é o fundamento de todas
as outras. “Há quem diz que os futuros destinos de um homem estão sobre os joelhos da
sua mãe. E é verdade, porque a boa semente posta no tempo oportuno por uma mãe
virtuosa no coração dos seus filhos não deixará de produzir um bom fruto; permanecerá,
talvez, infecundo por algum tempo, quase sufocado pelas paixões, sobretudo na idade
onde surgem tais instintos tempestuosos e ardentes, mas destinado a desenvolver-se mais
tarde, quando as circunstancias mais favoráveis e os anos maduros farão produzir em
grande abundancia, os preciosos frutos desejados”.
Mas, muitas vezes, o jovem vive em família sem contar realmente com ela. O
ambiente familiar deve caracterizar-se pela compreensão, pelo respeito, pela motivação
permanente e pelos retos que oferece a vida cada dia. Sem dúvida, o lar, para o jovem, é
o ambiente natural onde deve desenvolver-se e os pais devem criar um ambiente cheio de
alegria e simplicidade.
Para que tudo isto seja uma realidade, os pais (e os educadores) devem sentir-se
em si mesmos a “vocação e missão de educar”, dedicando-se aos jovens totalmente. Ao
jovem, principalmente na adolescência, não se lhe pode abandonar ou perder de vista
ainda que ele resista, já que nesse momento apenas se está abrindo a um mundo novo e a
busca da sua própria identidade. Há que ajudá-lo em cada momento, o acompanhamento
tem de ser a distância, respeitando a sua liberdade.
São José Marello insiste na sua carta que a tarefa de educar aos filhos lhe
corresponde naturalmente aos pais e que não pode ser substituída nem pela escola (ainda
quando seus filhos foram retamente dirigidos ao conhecimento das verdades cristãs e à
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prática das virtudes), nem pela Igreja (também se os sacerdotes e catequistas, no modo
pleno e com autoridade, transmitissem as verdades evangélicas).
“Vocês nãos deveriam esquecer-se jamais, ó pais cristãos, que em primeiro lugar
confiou a vocês o cuidado de seus filhos, exatamente porque são os seus. Nem todos os
pregadores, nem todos os professores do mundo nunca poderão ser tão úteis aos seus
filhos quanto vocês mesmos, pais e mães, se começarem a instruí-los, quando ainda não
puderam ir à Igreja e à escola... Vocês têm sobre os seus filhos uma influência muito
maior e mais profunda do que qualquer outra pessoa, e por isso as palavras de vocês
penetram mais intimamente na consciência deles e ali ficam mais eficazmente
impressas”.
O Fundador dos Oblatos de São José, conhecedor profundo das Sagradas
Escrituras, oferece aos Pais de Família o ícone de Tobit (Tob 1-14), que educou a seu
filho, desde a sua infância, a temer a Deus e a fugir do pecado. “O mesmo devem fazer os
pais cristãos, isto é: ancorados naquele áureo livro que é o Catecismo da Igreja
Católica, devem desde cedo instruir os filhos nas primeiras verdades e nos principais
mistérios da nossa Fé, ensinar-lhes a amar a Deus sobre todas as coisas, e estimulá-los a
observar a sua santa lei, não só pelo medo de serem castigados, mas pelo amor que Deus
merece de nossa parte e pela gratidão que lhe devemos.
Ressaltar o papel educativo dos Pais de família faz do Bispo Marello uma
personagem viva e atual. Talvez, hoje em dia, necessitam-se multiplicar escolas que
orientem aos Pais de família a educar aos seus filhos. Há necessidade, seja de parte do
Estado que da Igreja, de investir neste campo.
4. Princípios da pedagogia marelliana
Apresento agora, brevemente, os conselhos práticos e concretos que os
“missionários da educação” devem seguir segundo o educador e santo Bispo de Acqui.
4.1 Bom exemplo dos pais e dos educadores
O mandato que Marello dá aos Pais e Educadores: “Edificar aos seus filhos por
meio das obras boas e o bom exemplo. O caminho dos preceitos é longo; o dos exemplos
é curto e efetivo”.
Propõe aos adultos um caminho ético – religioso, de transparência e honradez
porque “...os pequenos são inocentes, por necessidade e por instinto inclinados à
imitação. Os filhos vivem ao seu redor e observam sobretudo vocês... Os exemplos mais
genuínos devem, portanto, partir de vocês. Todos os seus passos e as suas ações, mesmo
as menores, aos olhos de seus filhos são revestidas de uma qualidade e de uma
autoridade dignas de estima e quase sagrada. Por isso, suas vidas sejam para eles como
um livro sempre aberto”. Os jovens devem estar convencidos que “vocês não lhes
ensinam uma coisa da qual não estejam por primeiro bem convencidos... Não se iludam
de poder infundir na consciência deles por meio de palavras algum ensinamento que não
venha confirmado pelo exemplo”.
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4.2 O educador deve vigiar sobre si mesmo e sobre os jovens
Exorta o Bispo Marello: “estejam sempre vigilantes sobre vocês mesmos e sobre
os seus filhos. Não limitem sua atenção ao âmbito da casa onde moram, sigam seus
filhos em todos os passos, também fora de casa, porque acontece amiúde que um menino,
rodeado de mil cuidados dentro da família, por falta de vigilância fora de casa acabe
vítima das seduções de um companheiro mau e perca miseravelmente a sua inocência”.
Os jovens devem receber continuamente, em cada momento, em cada lugar, o bom
exemplo da parte de todos os adultos.
4.3 O educador deve conhecer o temperamento dos jovens
Entrar no mundo dos jovens, hoje, para muitos pais e adultos tornou-se uma
missão quase impossível. Os Padres estão muito preocupados com o trabalho, a carreira,
pelas múltiplas preocupações; os professores e educadores estão cansados e, muitas
vezes, desmotivados. Aos educadores São José Marello disse que: “devem pôr toda a
atenção e empenho em conhecer bem a índole dos próprios filhos e descobrir suas
inclinações, de modo a poder convenientemente reprimir e, se possível, sufocar desde
cedo as más inclinações e dar, em vez, amplo desenvolvimento e consistência às boas”.
Como bom educador, afirma que cada jovem tem seu caráter diferente “segundo
os temperamentos naturais de uns e outros, e logo podemos descobrir suas tendências,
por isso não convém usar o mesmo método e a mesma medida com todos. De fato,
encontramos temperamentos naturais ardentes que precisam ser moderados, e
temperamentos tímidos que precisam de encorajamento; não faltam temperamentos
indolentes que necessitam de estímulos, e os indóceis que é necessário dobrar com a
força, usando validamente a disciplina”.
São José Marello convida aos adultos a entrar profundamente no mundo dos
jovens e a saber ler as suas almas.
4.4 O educador deve saber corrigir sem falsas ternuras nem rigor excessivo
Não há que esquecer que, hoje, os jovens vivem numa sociedade que os anima ao
individualismo e que a cultura globalizada está produzindo uma geração de narcisistas
que se preocupa, em grande parte, por exibir suas próprias emoções até banalizar seus
sentimentos. Por isso, os educadores têm o sagrado dever de corrigir. “Afastem de vocês,
pais e mães e também educadores da juventude, afastem aquela falsa ternura que lhes
impede de dirigir oportunamente aos meninos e às meninas uma palavra de reprovação
ou de fazê-los derramar lágrimas”.
Exorta-lhes, logo, a não tolerar seus defeitos porque “os filhos abusando da
leviana complacência de vocês e tomando-a por uma tácita aprovação de sua conduta,
não só não corrigem, mas caem dia a dia em defeitos maiores. E Deus não permita que,
tornando-se incorrigíveis, sejam para vocês causa de aflição e de pranto, assim como
serão causa de remorso pela omissão de adverti-los seriamente e de corrigi-los no tempo
oportuno”.
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São José Marello demostra ser muito equilibrado quando aconselha ser
antirrigoroso e antilaxista ao mesmo tempo. “Com isso não queremos dizer que aos
meninos e meninas se deva mostra sempre um rosto sisudo e nada perdoar à distração
própria da idade deles. Certamente merecem censura aqueles pais que tratam seus filhos
com rigor excessivo, e nunca sabem repreendê-los de seus defeitos senão com palavras
ásperas e cheias de ameaças e de ira e até com maldições acompanhadas de castigos
brutais”.
Insistir sempre sobre os erros pode levar os jovens à surdez e pode neutralizar sua
capacidade de reflexão sobre o erro cometido. Há que ativar o diálogo e o jovem deve
sentir-se acolhido e valorizado. São Bento (480-547) recomendava que o educador
busque fazer-se amar antes de fazer-se temer. E São João Bosco (1815-1888) afirmava:
“Não basta aos jovens serem amados, mas devem tornar-se conscientes de que o são”.
O jovem, ao não sentir-se livre para falar, é levado a esconder-se e defender-se.
“Exceder faz mal, não é erro menor declarar eliminada da educação toda firmeza
e severidade de correção e de castigo e abandonar-se a uma indulgência cega que nunca
encontra nada que mereça nem castigo nem reprovação... isso é odiar os filhos sob a
aparência de amá-los e, por medo de contrariá-los, deixá-los crescer no vício e na
corrupção”.
Há que avaliar entre culpa e culpa e usar o mesmo rigor para todas as faltas é
injusto. “Que na hora e no lugar certos é importante usar a severidade, porém, sempre
dentro dos limites da prudência e da justa medida ao reprovar e ao castigar, a fim de
que o espírito de quem está em culpa não desanime, nem se deprima e não se obstine no
mal... Deve-se corrigir de tal maneira que o menino ou a menina, quando estiverem
calmos, possam entender na medida de suas possibilidades, que o castigo foi aplicado
somente para o bem deles e que foi razoável, não excessivo mais proporcional à culpa, e
não foi consequência de uma decisão arbitrária ou da raiva, mas sim efeito de justiça e
de amor somente”.
4.5 O educador deve estimular e premiar
É importante que os educadores ajudem aos jovens a percorrer o sendeiro de sua
vida com espírito de serenidade, fraternidade e desejo de bem. Por isso se faz necessário,
na ação educativa, dar elogios e prêmios proporcionados ao mérito:
“A recompensa deve ser dada com atenção, de modo a não suscitar no coração de
quem a recebe uma vã complacência e a perigosa exaltação do amor próprio e sim uma
doce satisfação e a santa alegria por ter conseguido cumprir fielmente o próprio dever e
por ter correspondido à vontade dos pais, reconhecida como a vontade mesma de Deus”.
4.6 Há que rezar para os educadores para que sejam santos e rezar para si mesmo
para ser bom educador
Por último, o Santo Bispo de Acqui exorta aos pais e educadores a não
desanimarem, também se tem que, continuamente, reprender algum jovem, ainda quando
todas as intervenções educativas pareçam quase inúteis. “Ó pais a quem toca um filho
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assim, reavivem a fé em Deus que tem nas mãos os corações de todos os homens, e
continuando a amar esses filhos, mesmo se ingratos e rebeldes, não se cansem de pedir a
Deus que na sua potencia e misericórdia faça aquilo que vocês não podem fazer... lhes
concederá o consolo de vê-los finalmente arrependidos”.
A oração é uma arma espiritual que se deve usar sempre e em todo momento
educativo: “Sejam ativos a respeito dos seus filhos: rezem por eles com fervor e fé,
façam-nos rezar e acostumar-se à oração. E não considerem, queridos pais,
desperdiçado o tempo empregado em acompanhar seus filhos ou em ajudá-los na
recitação cotidiana de suas orações. Rezem também por vocês mesmos, para que Deus
os ajude no cumprimento e dever de bem educar os filhos.... Trata-se para vocês de
criar verdadeiros adoradores para Deus; de encaminhar suas almas na via da
salvação”.
São José Marello estava convencido da eficácia da oração feita com fé e
disponibilidade a Deus. Assim conclui sua Carta: “Sem o auxílio da oração, quem
poderia esperar um êxito feliz a tão grande empresa? Qualquer um que deseje cumprir
zelosa e plenamente, mas, sobretudo com perseverança os próprios deveres, deverá ter
confiança em Deus e orar. A oração humilde e confiante nunca é rejeitada pela bondade
de Deus. Rezem, então, nestes tempos tristes e com tantas emergências; rezem pelas suas
necessidades temporais e eternas.... Rezem para que refloresça e cresça a fé católica, e
em toda a terra triunfe a verdade e a justiça”.
Sem pôr-se de joelhos diante de Deus não é possível educar bem aos filhos e
jovens.
5. Os Oblatos de São José: filhos de um educador
“Trabalha, trabalha para que a juventude melhore: também o pouco é muito, e
barrar o mal já é um grande bem” (Carta 30). São José Marello tinha no seu coração
uma grande “paixão” pelos jovens e a deixou em herança aos seus filhos espirituais. Nós,
os Oblatos de São José, temos uma grande missão na Igreja: educar aos jovens.
Dizem nossas Constituições: “Em nosso apostolado um setor muito privilegiado é
a educação cristã da juventude. Se é para todos uma obrigação o cuidado da juventude,
para os Oblatos é uma exigência de fidelidade ao espírito do Fundador” (60). Temos um
estilo peculiar de educar: “O compromisso apostólico de cada Oblato consiste em
alcançar um desenvolvimento harmônico das faculdades físicas, morais e intelectuais
dos jovens, mediante uma educação integral, buscando fazer que neles madure o sentido
da liberdade e da responsabilidade na comunidade. Esta obra alcançará seu êxito
somente se a educação à fé e à vida de graça leva aos jovens a um autentico testemunho
de vida cristã, que, paulatinamente, se transforme em manancial da finalidade da sua
própria existência” (Regulamento Geral 30).
Cada Oblato, para o jovem deve ser como um Padre que põe regras de vida, que o
mesmo vive, e indica o caminho que há que seguir; como uma Mãe sempre pronta a
acolhê-lo e perdoá-lo apesar dos erros; como um irmão mais velho disposto a caminhar
junto nas situações cotidianas da vida.
Para nós Oblatos, é importante descobrir os sendeiros para entrar no “mundo” dos
jovens e ganhar credibilidade para poder educá-los para a vida e para a busca de Deus. A
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eles queremos proporcionar “ambientes familiares”, onde podem tecer relações autenticas
feitas de verdadeiros sentimentos; onde, sobretudo, possam buscar ao verdadeiro Deus e
educar-se na fé para poder distanciar de seu coração as múltiplas e confusas propostas
que o “supermercado do sagrado” hoje lhes apresentam.
Queremos falar-lhes da necessidade de lutar contra o egoísmo, a ambição, o
orgulho, porque não seguem a lógica do Evangelho. Para nós, um dos melhores
ambientes para formar integralmente aos jovens é a escola. “A escola entra na finalidade
da Congregação, a qual deve incrementá-la sempre mais. O Oblato, no seu magistério
persegue os fins culturais da escola e, enquanto atende à formação humana dos seus
alunos, os educa a uma visão do homem e das coisas iluminada pela fé” (Constituições
67).
O primeiro aspecto do Carisma Apostólico de nossa Congregação tem sido
sempre, e hoje também é, “a educação moral e religiosa dos jovens nas várias atividades
sugeridas pelos tempos e lugares” (Constituições 3). É por isso que os jovens são o centro
de nossos interesses. Lemos na introdução do documento Paso a Paso (do II Congresso
Internacional de Pastoral da Juventude de 2015): “Nós Oblatos os amamos e os
estimamos, cremos em vocês e juntos queremos construir um mundo mais humano e mais
digno. Queremos sonhar, esperar, viver junto a vocês, por que são importantes e muito
queridos por nós... Nós perguntamos quais seriam os caminhos nos quais poderíamos
nos encontrar, quais estratégias teríamos que recorrer para nos sentir próximos a cada
um de vocês... queremos recolher suas esperanças, ilusões, propósitos e fazer junto a
vocês a história, sua história... Juntos a vocês queremos ser verdadeiros discípulos de
Jesus Cristo e alcançar que outros se sintam intimamente envolvidos, não com gestos
extraordinários, senão na cotidianidade. Jovens com os pés no chão, e os sonhos no
coração, passo a passo seguindo a Jesus”.
Para nós Oblatos, é fundamental o que diz o artigo 65 das Constituições: “A
Congregação caminha pelas sendas de Deus e conforme as diretrizes do Fundador, se
consegue preparar membros idôneos para a animação e educação da juventude”. Foi o
jovem sacerdote José Marello, em 1884, que, na sua cidade de Asti, fundou a primeira
escola dos Oblatos, o “Colégio de Santa Clara”. Começou com 20 alunos. Esta pequena
semente frutificou ao longo dos anos e em todo o mundo, onde se encontram os filhos do
Marello. Hoje, podemos contar com 35 escolas e quase 25.000 alunos.
6. Considerações Finais
Estimados, também em nossos dias, estamos, como no tempo de São José Marello,
em “emergência educativa”. Todos nos damos conta que há uma certa distancia entre nós
adultos e o mundo juvenil. “O mundo atual dos adultos não ilusiona nem entra nos
interesses dos jovens. E a denuncia maior que os jovens fazem a nossa civilização
consiste em seu desinteresse por ela; não querem nem acusar, não querem lutar,
simplesmente ignoram as instituições, as vozes da sociedade (Passo a Passo 4).
As novas gerações, a sua maneira, aprendem mais na rua, nas lanchonetes e
discotecas, nos chat de internet, Facebook e com os SMS, que nos lugares básicos da
vida como são a família, a escola, a paróquia. A formação dos jovens está sobre a
influência, muitas vezes negativas, dos meios de comunicação que orientam os nossos
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jovens ao consumismo, à exaltação do corpo, a brincar com os sentimentos dos outros, à
sexualidade livre.
Há que retornar a ganhar espaços na vida de nossos jovens se queremos de
verdade educá-los para a vida. Temos que partir das suas experiências concretas: das suas
alegrias e angustias, de seus critérios de juízo, de seus pontos de interesses, das suas
linhas de pensamento, das suas fontes inspiradoras e de seus modelos de vida.
Todos os que têm a missão de educar, Pais de Família, Professores, Animadores,
Sacerdotes e Religiosas temos que nos unir; temos que sair do nosso “silencio
educativo”, nossas desilusões e consciência da incapacidade para assumir juntos o reto
comprometedor da educação dos jovens, mas sobretudo pondo ao centro de nossos
interesses educativos a pessoa, cada jovem.
Temos que descobrir o valor da formação personalizada, que se situa no contexto
histórico de cada jovem e que leva a encher o coração de esperança e a oferecer-lhe
modelos coerentes de vida que os realize como pessoa. Temos que ajudar ao jovem a ter
sempre o olhar ao Céu: sem a visão de Deus e da fé não há educação integral, isto é, a
formação da mente e do coração, para fazer de cada jovem um bom cidadão e um bom
cristão.
O educador José Marello seguiu as pegadas de seu modelo São José, o educador
de Jesus Menino, Adolescente e Jovem. Dizia: “São José foi o primeiro na terra em
cuidar os interesses de Jesus: ele o cuidou infante e o protegeu pequeno e ocupou o
lugar de padre nos seus primeiros trinta anos de vida aqui na terra” (Carta 91). E junto
com o Santo Bispo de Acqui rezemos: “São José ensinai-nos a forma de cuidar dos
nossos alunos, que ele mesmo seja o nosso Guarda” (Carta 111).
Pe. Miguel Piscopo, osj
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O QUE JESUS DIZ AOS EDUCADORES?
Pe. Mauro Negro, osj
[1] O que Jesus tem a dizer para os educadores é, sem dúvida, um tema muito provocador
e, se observado de modo adequado, sob a perspectiva exegética, que é o meu principal
ambiente de pesquisa, absolutamente complexo. Este tema, sob o ponto de vista dos
estudos bíblicos, tem a ver com a investigação do Jesus Histórico, investigação que tem
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se desenvolvido intensamente nas últimas décadas, sendo uma das áreas mais
interessantes dentro das ciências bíblicas.
O que Jesus efetivamente disse ou transmitiu com ações e reações é uma busca
intensa e instigante que ocupa grande parte das academias teológicas e bíblicas, tendo
também influências paralelas na literatura, nas artes e em outras tantas ciências. É
interessante que se encontre, em bancas de jornais de rodoviárias e aeroportos, títulos que
sugerem que Jesus foi um psicólogo, um líder político, um membro de sociedades
secretas, um revolucionário, alguém que ensina a ganhar dinheiro… Nunca vi, entre os
livros de autoajuda e de ficção, algo que sugere uma vertente educativa para o
personagem Jesus. Ele é badalado, explorado direta ou indiretamente, até para fazer
fortuna, mas, raramente, para construir o ser humano na humildade, na sua verdadeira
essência que é ser imagem e semelhança de Deus.
[2] Isto posto, coloco-me a questão teórica a respeito do que poderia ser o argumento
fundamental de Jesus aos educadores e chego à conclusão que Jesus não poderia falar
algo muito diferente do que já falou em tempos passados e que podemos ver, ler e
aprender nos textos que chamamos de Evangelhos.
Não é de hoje que a curiosidade e a fantasia se mesclam e produzem obras
ficcionais, de maior ou menor valor, em torno à figura e à mensagem de Jesus Cristo. O
que devo aqui fazer, então, é buscar em fontes seguras e com argumento coerente, não
delirante, uma proposta de compreensão.
Jesus poderia dizer muitas e muitas coisas para os educadores. Primeiro,
pontuemos bem a questão: trata-se não apenas de “professores”, mas de “educadores” e
todos sabemos que há uma notável diferença entre estes dois conceitos. É seguro que
Jesus falaria para os educadores com muita atenção e intensidade, pois o educador vai ao
encontro do educando, mergulha no mistério de sua pessoa e, fazendo-a visível para si
mesmo, a liberta e conduz à verdade. Verdade de si, dos outros e de Deus. Se devemos
respeitar as diferenças religiosas e filosóficas então falemos não somente de Deus, mas
do “totalmente Outro”.
Jesus Cristo já falou aos educadores e já lhes deu o caminho a ser seguido. No
encontro dramático e doloroso com Pôncio Pilatos, naquela memorável primeira Sexta-
feira Santa, este Governador Romano pergunta a Jesus sobre a Verdade. “O que é a
verdade?”, ele inquere. Curiosamente, Jesus não lhe responde, o que pode parecer
omissão de sua parte. Mas Ele não o faz pois já havia indicado, no mesmo Evangelho
segundo João, o que é a Verdade. Em João 14,6 Ele afirma: “Eu sou o Caminho, a
Verdade e a Vida”. Prescindido de temas e assuntos que me são caros e despertariam,
certamente, o interesse de muitos, a palavra de Jesus a respeito da Verdade, que é
indicada como sendo Ele próprio, faz refletir sobre muitos conceitos modernos que estão
sendo comentados e até abusados em alguns ambientes.
[3] Desde que o polonês Bauman destacou o conceito e o intertextualizou, virou moda
falar de liquidez, aplicando a ideia a muitas áreas da circunstância humana. Assim
poderíamos falar, quem sabe, de “verdade líquida”, atualizando um conceito subjacente a
muitas práticas modernas e pós modernas que relativizam e subjetivizam a Verdade como
dependente do sujeito que a busca ou do objeto que supostamente a contém. Já não
estamos mais em um ambiente platônico onde a Verdade é a adequação do intelecto à
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ideia. Sabemos também que Tomás de Aquino e a clareza e método da Escolástica não
satisfaz mais os espíritos marcados pelo materialismo dialético. E, no fundo, isto tudo e
muito mais, que compõe o rico mosaico da cultura ocidental e mundial é eclipsado pela
ausência de paradigmas que reina no horizonte epistemológico. Isto se reflete nas muitas
dimensões que compõem o Fenômeno Humano. Por exemplo, na Política, como
recentemente pudemos perceber.
Teilhard de Chardin, com outros pensadores posteriores, chamava o mundo do
pensamento e dos conceitos, muito próprio do Ser Humano, com um neologismo, a
Noosfera. Talvez hoje, como nunca dantes, a Noosfera esteja tão rarefeita, podendo um
símbolo ter diversos significados. Umberto Eco e outros semióticos têm investigado esta
questão e, curiosamente, ampliado mais e mais o problema, demonstrando que ele toca a
própria amplitude da humanidade. Mas é possível que esta aparente fragilidade seja a
maior riqueza que temos, pois é a possibilidade de apresentar algo já antigo e seguro
como um argumento novo, ainda que acompanhado de tantos outros.
A palavra de Jesus relativa à Verdade e à sua essência, identificada com Ele
próprio, recorda e faz referência a uma palavra anterior, do mesmo texto joanino:
“Conhecereis a Verdade e ela vos fará livres”. Assim entramos em outro campo
conceitual de muito amplas consequências e compreensões: a Liberdade. Não é meu
interesse aqui discorrer sobre temas filosóficos e sua incidência sociológica e cultural, o
que seria muito interessante, seguramente. Mas sim apresentar um corte epistemológico
deste conjunto de argumentos que parecem, de algum modo, confluir. Verdade e
Liberdade, junto a Educação, sob a perspectiva da Palavra de Jesus, que não pode ser um
delírio ficcional. É uma tarefa complexa, como já anotei atrás.
[4] A palavra de Jesus sobre a Verdade, que é Ele próprio, e que conduz à Liberdade,
pode ser entendida por nós, atuais educadores em uma sociedade onde impera o efêmero,
como diria o filósofo Lipovetsky, como uma entrada decidida na História. O Concílio
Vaticano II, cuja realização completa nestes anos cinco décadas, pronunciou-se
intensamente sobre isso especialmente em dois textos: a Constituição Pastoral sobre a
Igreja no Mundo contemporâneo, Gaudium et Spes e, de modo especial para nós,
Educadores, na Declaração Gravissimum Educationis, sobre a necessidade da Educação
para a completa humanização da Pessoa. A Igreja afirma que a Educação faz bem para a
Pessoa e constrói a sociedade. E se a Educação for iluminada pela Verdade que é Jesus
Cristo, então ela conduz à Liberdade. Talvez aqui entre o que São José Marello, Bispo
Fundador dos Oblatos de São José chamava de “educação do coração”.
[5] Por isso, no início do processo de construção comunitária deste Núcleo de Educação,
ousando interpretar o que pode ser necessário para os que serão seus protagonistas,
partilho que Jesus poderia falar-lhes ou recomendar-lhes alguns pontos ou empenhos.
Talvez possamos dizer “tarefas”, “tarefas de casa”, “tarefas de vida”, parafraseando a
prática escolar. São elas:
[a] É preciso olhar o outro como semelhante, pois todos somos imagem e semelhança de
Deus. Esta imagem e semelhança se dá na posse da inteligência, da liberdade e da
vontade. Mas a cultura de massa tende a desumanizar a Pessoa, tornando-a consumidora
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fanática, acrítica de produtos de qualidade baixa, no mundo do comportamento, da moda,
da música, da tecnologia. É preciso educar o olhar, diria Jesus!
[b] É preciso conduzir para a comunicação entre Pessoas, não apenas troca de
informações. A facilidade e até vulgaridade com que podemos nos comunicar
constantemente, diuturnamente, esconde a fragilidade dos relacionamentos humanos. É
preciso educar o escutar, diria Jesus!
[c] Isto provoca a necessidade da apresentação de virtudes. Elas foram esquecidas:
respeito, reverência, silêncio, palavra dada, e tantas outras posturas e posições de fundo
que foram deixadas, pois os “deseducadores” televisivos, entre tantos, fizeram bem o seu
trabalho e hoje as novas gerações são irreverentes, tantas vezes inconsequentes. Não
inventaram isto tudo, apenas são presas disto como se este fosse o modelo para a vida. É
preciso educar os valores, diria Jesus!
[d] É necessário conduzir à cidadania. Uma simples cena vista por mim nos últimos dias
reforçou-me ainda mais a certeza da necessidade de cidadania. Uma mulher,
empobrecida, saiu de sua casa e, quase no meio da rua, jogou o seu lixo, ali, do jeito que
estava. Há menos de vinte metros havia um ponto de alagamento conhecido da região. E
quem de nós que não viu o ocupante do carro à frente jogar uma lata pela janela? A
cidadania começa nos pequenos gestos e isto é, fundamentalmente, caminho educacional.
É preciso educar o comportamento, diria Jesus!
[e] Estando em um ambiente confessional, ainda que não religioso, é indispensável que
tenhamos dois movimentos, e isto eu creio que Jesus diria com gosto e intensidade:
Primeiro, o diálogo com os diferentes, muito diálogo, muita abertura, o que não significa,
a princípio, debate ou aceitação passiva. Mas é preciso conhecer o outro e ser por ele
conhecido. Não desejo que o outro mude, mas que ele se exponha, como eu devo me
expor. É necessário dialogar com as Ciências, aprender e ensinar. Os possíveis
preconceitos que existem devem ser rompidos com diálogo intenso e sincero. Este núcleo
de educação é a possibilidade de um fórum fecundo. É preciso educar a compreensão,
diria Jesus!
[f] E sob este prisma, outro movimento: proposta. Na linguagem teológica, querigma,
palavra de origem grega que significa “anúncio”. É preciso anunciar, propor a Verdade
que acreditamos que é Jesus Cristo. Não impor, como alguns pensam de imediato. Sem
querer nivelar a questão e seu mérito, mas posso dizer que, se tantos chegam a me agredir
com suas propostas éticas, culturais e religiosas, por que eu não posso, educadamente,
coerentemente, propor um caminho e uma meta? É preciso educar o modo de viver, diria
Jesus!
[g] Por último, acho que Jesus diria aos Educadores, além de tudo isso, algo mais:
coerência entre o falar e o fazer. Talvez não sejamos professores em todo o tempo, mas
podemos ser educadores em tempo integral, isto na medida em que tivermos como
paradigma a Verdade. E ela, nós cremos, é Jesus Cristo. Se alguém a vê de modo
diferente, mas seguramente não oposto, pode-se chegar à comunhão com o bom senso e o
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respeito ao outro, na intensa vontade de fazer o caminho da vida frutificar em esperança.
É preciso educar a Fé e a Esperança, diria Jesus!
[6] Concluindo, desejo exortar a atitude de proposição. Ela tem três vertentes. [a] É
urgente permitir e estimular o crescimento cultural e humano de nossos educadores. [b] É
indispensável investir na sua promoção humana e profissional, pois as fraquezas nestas
áreas acarretam os conhecidos desânimos e desmotivação. [c] Os protagonistas deste
processo, de modo especial os Religiosos diretamente envolvidos, devem capacitar-se
intensamente para seu desempenho. Para tanto, será necessária a admissão de novos
paradigmas de formação e atuação para os quais todos devemos estar abertos.
É claro que Jesus poderia dizer muito mais e muito melhor do que aqui apresentei.
A arrogância de pôr-se esta tarefa só tem paralelo na sua extensão. A todos, muita
Verdade de Jesus!
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O AMOR COMO VIRTUDE EDUCATIVA: REFLEXÕES FILOSÓFICAS
Denilson Aparecido Rossi
1. Introdução
O desafio proposto, para o texto que segue, é apresentar o amor como uma virtude
educativa. Para tanto, pretende-se fazer uma reflexão filosófico-antropológica a partir da
categoria humana de espiritualidade, ou seja, de uma compreensão do ser humano como
sendo também um ser espiritual.
Antes de começar tal empreitada, é importante observar que a complexidade do
atual contexto, social e econômico, parece ter levado muitos gestores e/ou
administradores, de instituições educacionais, a terem como uma de suas principais
preocupações, a questão quantitativa da educação: número de alunos matriculados,
quantos deixaram a instituição, quantos entraram, quantos poderão entrar no próximo
semestre, quantidade de colaboradores necessários para suprir a demanda, que posição
ocupa junto aos órgãos avaliadores.
Nota-se, portanto, que tais preocupações são estritamente tangíveis. Mas, ocupar-
se do amor como virtude educativa e, naturalmente, como fomento de espiritualidade do
ser humano é uma questão intangível. Pois, não há como tocar ou medir o amor bem
como qualquer questão que compreende a espiritualidade humana.
Após as devidas ponderações, emerge algumas questões como norteadoras da
presente reflexão: Qual é a concepção de ser humano? Qual é a concepção de educação?
Como e para que educar?
2. Concepção de ser humano
Ao tratar qualquer tema correlacionado à educação, acredita-se ser indispensável
considerar qual é a concepção de ser humano que se tem como pressuposto. Neste
sentido, numa perspectiva antropológica, pode-se afirmar que “as tendências
educacionais são expressão de uma concepção de ser humano, de vida e de mundo, de
uma filosofia da educação” (OLIVEIRA, 2006, p. 41).
Como se concebe o ser humano? Conforme aponta Henrique C. Lima Vaz (2006),
Aristóteles entendia o homem como sendo um animal que fala e discorre (zôon logikón –
animal racional) e como animal político (zôon politikon). Já para os neurocientistas
materialistas (TEIXEIRA, 2012), o ser humano é apenas o resultado de sua composição
cerebral e não existe dimensão de consciência, de espiritualidade; estes defendem, ainda,
que a vida mental do ser humano é uma variação de estados químicos e físicos do cérebro
humano. Diferentemente é a concepção de Henrique C. Lima Vaz (2006), o qual defende
que somos ser de estrutura (corpo/psique/espírito) e relação (consigo mesmo/ com os
outros/ com a natureza/ com o transcendente).
É importante salientar que o modo como cada pessoa concebe o ser humano terá
influência direta em suas práticas educativas. Para quem, como Aristóteles, compreende
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o ser humano como sendo um animal racional e político, provavelmente sua maneira de
agir em relação ao processo educacional irá primar pela racionalização e politização do
conhecimento. Aqueles e aquelas que compreendem o humano somente à luz da
neurociência materialista, tenderão a lidar com as pessoas de uma forma empirista,
fisicalista e, consequentemente, reducionista. Quem concebe o ser humano como um ser
constituído por uma estrutura tridimensional (corpo, psique e espírito) e uma relação
multidimensional (consigo mesmo, com os outros, com a natureza e com o
transcendente), tenderá a pensar os processos educacionais a partir de uma visão mais
integral de si e do outro.
3. Concepção de educação
Ao olhar para as práticas cotidianas dos muitíssimos educadores do século XXI,
nota-se claramente que seu modo de lidar com os educandos está intrinsicamente ligado
às suas concepções de educação.
Na visão de muitos professores, a educação é uma oportunidade ímpar para se
passar preciosas informações aos seus alunos. Obviamente, tais profissionais não
conseguem avançar e, consequentemente, presos à repetição de dados, tendem a cair na
monotonia e desperta pouco interesse nos alunos.
Há profissionais que entendem a educação como um processo de ensino e
aprendizagem. Estes podem até favorecer a dinâmica de produção de conhecimento;
todavia, suas práticas ainda parecem ser insuficientes para atender às necessidades
daqueles que frequentam as atuais instituições educacionais.
No entanto, há educadores que enxergam os educandos como pessoas em processo
de formação. Estes buscam procedimentos que favoreçam a formação da pessoa na sua
integralidade. Pois, entendem que, além das preciosas informações, repetição de dados,
processo de ensino e aprendizagem, favorecimento da produção de conhecimento, são
necessárias práticas e posturas educativas que mediam a formação da pessoa para a vida,
de forma integral.
4. Educar com amor (como e para que educar?)
Ao se refletir sobre o como e para que educar, parte-se da concepção de um ser
humano constituído por uma estrutura que comporta e integra as dimensões do corpo, da
psique e do espírito, bem como as múltiplas relações que envolvem o seu ser e seu viver.
Assume-se uma concepção de educação voltada para a formação integral da pessoa, cuja
referência primeira é a “paidéia” grega (JAEGER, 1994). Trata-se de mediar, para e com
o outro, um processo de formação integral para a vida como um todo.
Neste sentido, os educadores devem assumir uma proposta de reflexão filosófica
que, segundo Demerval Saviani (2009, p. 28), deve ser compreendida “como uma
reflexão (radical, rigorosa e de conjunto) sobre problemas que a realidade educacional
apresenta”. Essa perspectiva faz com que a preocupação do educador vá muito além de
formar apenas profissionais desta ou daquela área do conhecimento, mas sim, atingir o
âmago da sua existência. O educador se compromete, assim, em participar da vida dos
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educandos de modo a elevá-los às suas mais altas possibilidades de ser no mundo e
relacionar-se consigo mesmo, com os outros humanos, com a natureza e o transcendente.
Acredita-se que uma educação pautada nestes moldes, filosófico-antropológico,
exige uma grande virtude educativa que, por sua vez, pressupõe uma relação afetiva e
espiritual: o amor. Sobre isso, ressalta-se o que diz alguns nobres educadores, tais como
Champagnat, Dom Bosco e Marello.
O educador francês, Marcelino Champagnat (1789-1840), dizia que “a educação é
uma obra de amor” e que, "para bem educar é preciso, antes de tudo, amar e amar todos
igualmente". Na mesma direção, o sacerdote e educador italiano, São João Bosco (1815-
1888), afirmava que “é impossível educar a juventude, se não lhes conquista a
confiança”. E, de fato, o “Sistema Preventivo de Dom Bosco”, que é fundamentado pela
tríade “razão, religião e amorevolezza [amor terno]” presume que há confiança na relação
entre educador e educandos. Tal confiança se constrói não na lógica do material, mas na
lógica da espiritualidade, isto é, do amor. Como dizia o próprio Dom Bosco: “não basta
que você ame os jovens, é preciso que eles se sintam amados”. Para completar tais
referências, ressalta-se aqui que, em uma de suas Cartas Pastorais, São José Marello
(1844-1895), também educador italiano, orienta as mães e os pais e os educadores,
dizendo que "educar é iluminar a mente e aquecer o coração no amor de Deus".
Portanto, acredita-se que uma educação comprometida com a formação integral,
para a vida como um todo, pressupõe, por parte do educador, uma condição de
espiritualidade, isto é, a capacidade de amar os educandos e o processo no qual estão
imersos. Indubitavelmente, educar é amar. Pois, só o amor nos permite voar nas asas da
esperança para descobrir novos horizontes de alegria e felicidade.
Referências
JAEGER, Werner Wilhelm. Paidéia: a formação do homem grego. 3 ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1994.
OLIVEIRA, Ivanilde Apoluceno de. Filosofia da educação: reflexões e debates.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.
SAVIANI, Dermeval. Educação: do senso comum à consciência filosófica. 18. ed.
Campinas, SP: Autores Associados, 2009.
TEIXEIRA, João de Fernandes. Filosofia do cérebro. São Paulo: Paulus, 2012.
VAZ, Henrique C. de Lima. Antropologia Filosófica. Vol. 1, 8.ed. São Paulo: Loyola,
2006.
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FAMÍLIA: PARA UMA CIVILIZAÇÃO DO AMOR
Pe. Mário Guinzoni, osj
1 . Introdução
Família e amor: duas realidades pensadas por Deus para caminharem juntas e
construírem um edifício espiritual e humanamente sólido e estável. Sabemos que este
sonho de Deus está longe de se realizar. A situação familiar, nos nossos dias, apresenta
sinais positivos, como uma consciência mais viva da liberdade pessoal, maior qualidade
nas relações interpessoais, valorização maior da mulher, procriação responsável,
redescoberta missionária da família etc. Apresenta, todavia, também fortes sinais de
decadência e degradação: uma visão errada de independência dos esposos entre si,
ambiguidades acerca da relação pais e filhos, o número grande de divórcios, a aceitação
“normal” do aborto, uma cultura contraceptiva que já faz parte do cotidiano da maioria
dos casais, e, muitas vezes, a falta de meios normais de sobrevivência: alimento, trabalho,
escola, casa, saúde. Luzes e sombras andam um pouco juntas.
Por onde “puxar o barco”? O que fazer e, sobretudo, onde atingir luzes para dar à
família maior saúde e santidade? O sínodo dos bispos deste ano será com certeza um
marco novo, aberto ao mundo, e, já nos debates preparatórios, aponta para novos rumos e
novas frentes pastorais.
E acreditamos que uma fonte de luz seja, para nós Oblatos de S. José, o nosso
carisma que encontra na Sagrada Família as bases sólidas para construir um edifício
seguro contra as sombras negativas que parecem fazer submergir a família.
2. A família e o Carisma dos Oblatos de S. José.
a) Tradicional espírito de família
Vejamos apenas alguns textos das nossas Constituições para nos introduzir no
assunto.
O texto mais conhecido: “Vivendo o tradicional espírito de família da
Congregação, os Confrades manifestam ao mundo a importância da vida
familiar e dão testemunho da unidade da Igreja e da realidade do Corpo Místico
de Cristo” (C nº 8).
“Como uma família unida em nome do Senhor, a comunidade religiosa goza de
sua presença, é imagem da vida trinitária e testemunha ao mundo a força do seu
amor” (C. 37 eco da LG 15 “Com efeito, mercê do amor de Deus difundido nos
corações pelo Espírito Santo (cfr. Rom. 5,5), a comunidade, como verdadeira
família, reunida em nome do Senhor, goza da Sua presença (cfr. Mt. 18,20).
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O fundamento do espírito de família nos confrades tem sua motivação profunda.
De fato as Constituições afirmam que a castidade (= amor) exige “uma
familiaridade íntima com Deus e a amizade pessoal com Cristo”(C. 18).
Além disso, o ambiente de nossas comunidades deve ser “recolhido, familiar,
sereno e acolhedor” (C.39)
“A sequela do Divino Mestre e a dedicação aos interesses de Jesus, na imitação
de São José exige a entrega fiel e obediente à Divina Providência, a prática das
virtudes da humildade e da simplicidade, a estima da vida escondida e operosa,
num genuíno espírito de família”. (Cost. n.81 - formação).
Claro que as mesmas Constituições querem acenar ao espírito de família quando
falam de amor mútuo, de vida comunitária, de vínculo de caridade, de apostolado vivido
em comunidade etc.
Bem, mas, papel aceita tudo e como viver concretamente este “tradicional espírito
de família”?
Os textos citados e bem conhecidos podem se tornar apenas letra morta sem vida.
Às vezes, escutamos frases como esta: “Onde foi parar o tradicional espírito de família?”.
Talvez nesta pergunta esteja embutido, além de uma crítica séria (ou amarga), um pouco
de saudade, um pouco de sonho e idealismo, um desejo que temos dentro de viver uma
VRCJ (Vida Religiosa Consagrada Josefina) testemunha para o mundo da família de
Nazaré, pois nela, os projetos de Cristo, de José e Maria, estavam harmonizados, e tudo
se realizou ao seu tempo, como também sugere sempre o artículo 8 já citado.
Espírito de família não existe por si nem por varinha mágica, mas, se constrói em
longos anos de aprendizado, de oração e de vida comunitária. Vejamos alguns exemplos.
Espírito de família brota e acontece: quando, há vida de oração pessoal ou
comunitária e a Eucaristia é celebrada e vivida, antes de tudo; quando se partilha o
apostolado, sem fazer pesar que “eu sou isto ou aquilo, e “aqui mando eu”...!”; quando-
mesmo que isto pareça estranho - os mestres da vida comunitária são as pessoas mais
difíceis, os doentes, os anciãos; quando o diálogo acontece normalmente, no respeito das
opiniões; quando o Superior coordena os sinais do ES na comunidade é defensor do frágil
e animador do caminho espiritual da mesma; quando todo o dinheiro comum é sempre
partilhado; quando a minha comunidade tem mais valor do que as pessoas “de fora”;
quando eu não busco ser o diferente ou invento projetos meus pessoais ou crio situações
já prontas; quando aceito o trabalho que me foi confiado, mesmo que não seja de meu
agrado, ou seja, mais humilde; quando deixamos as fofocas, e começamos o habito bom
de falar bem das pessoas ausentes; quando falamos diretamente com a pessoa sem “dar
recados”; quando valorizamos o trabalho dos outros e ficamos felizes sem invejas ou “dor
de cotovelo”, quando perdoamos e aceitamos o perdão em palavras ou em gestos; quando
perdemos tempo em cuidar de coisas simples da casa para torná-la mais bonita; quando
assumimos os encargos internos da comunidade (ecônomo, reitor, provincial) com o
mesmo entusiasmo que assumimos de pároco ou outro serviço pastoral de projeção;
quando valorizo a Congregação e não só o “meu” trabalho...
Exemplos poderiam continuar. Você mesmo pode achar outros, pois é exatamente
no dia a dia que o espírito de família acontece. Mas precisamos lembrar sempre que a fé
é o nosso motor, e que estamos num projeto de fé. Isto exige saber perder ou, às vezes,
adiar certos projetos pessoais, bons, úteis, mas que não podem ser executados no
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momento. Vale sempre o que lemos no Diário de Bice Graglia em 1887, que é
ensinamento do nosso Fundador: “É a caridade que deve animar todas as nossas ações;
ela reforça a fé, acresce a esperança, e nos une mais intimamente a Deus”.1
Só assim seremos todos construtores e não meros consumadores do Espírito de
Família.
3. O testemunho e o ensinamento do nosso pai e Fundador
É possível “auscultar” o coração do Fundador e descobrir o Tradicional Espírito de
Família o que ele tinha dentro de si e transmitiu aos primeiros Oblatos? De certa forma
sim. Neste texto, por motivos até de brevidade, vamos “garimpar” aqui e acolá apenas
suas cartas episcopais. Para Marello, a base de tudo é fé no Pai que reuniu os Oblatos na
“Casa de S. José” (Cartas de Fundação 108- 109).
Os membros da “Casa de S. José”, como na família de Nazaré, revestem-se de
várias características muito profundas e belas.
a) Partilha de afetos
Na carta escrita aos seus, em Asti, o dia depois da consagração episcopal, é toda
cheia de amor, afeto para sua Congregação. Começa com chamar a todos de
“queridíssimos” e de testemunhar: “quantas vezes me encontrei no meio deles com o
espírito” e depois de ter narrado um pouco sua experiência do dia anterior ele termina
dizendo: “aos Irmãos grandes e a todos os pequenos ‘caríssimos’, aos estudantes de alta
e baixa latinidade (as várias séries) incluídos aqueles que aspiram aos estudos das belas
letras, enfim a todos também às crianças da Casa um ‘vos abençoe’ com toda a força da
caridade que deve inflamar o coração de um novo Bispo”.2
As suas cartas episcopais são, muitas vezes, recheadas do afeto de quem de longe
não se esquece dos seus. Eis como envia os votos de feliz ano novo (1890) dizendo:
“agradeço de todo o coração os votos que me enviaram e queria recambiá-los um por
um. [...] Além do doce que que adoça a boca por um minuto deveria distribuir como de
costume um presente de maior duração... Mas como fazer? Jesus vem em minha ajuda.
Ele se encarrega de vir em meu nome no meio de vós. [...] Acolheis então este meu divino
mensageiro que vos traz um presente bem mais precioso daquele que vocês poderiam ter
esperado de mim”.3
O afeto o leva a ter preocupação com o futuro de sua família e é bem conhecida a
carta onde percebe que as trevas aumentam sobre a Família de S. José e diz: “Seja
1 Marello, Giuseppe. Scritti e insegnamenti del Venerabile Giuseppe Marello, organizado por P. Mário Pasetti, Asti:
Tipografia S. Giuseppe.1980. p.202. (Tradução do Padre Alberto Santiago). 2 Marello, Giuseppe. L. 166. Studi Marelliani- San Giuseppe Marello Epistolário II parte, Editore: Casa Generalizia
della Congregazione Oblati di S. Giuseppe, Roma, Anno 1 nn.3-4, Luglio\ Dicembre, p.431e 432, 2009.(Tradução
do autor) 3 Marello, Giuseppe. L. 201. Studi Marelliani- San Giuseppe Marello Epistolário II parte, Editore: Casa Generalizia
della Congregazione Oblati di S. Giuseppe, Roma, Anno 1 nn.3-4, Luglio\ Dicembre, p. 523, 2009.(Tradução do
autor)
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benditas as trevas quando as adensa a vontade do Senhor [...] Mas quando virá a luz?
Eis o segredo de Deus”4. A luz virá depois de sua morte e sabemos que num gesto
extremo de partilha e afeto, o Fundador partilhou até sua vida pela Casa de S. José. A
confirmação disto está no testemunho abalizado de Padre Rastero, confessor de Marello;
“Eu creio que o nosso bispo tenha oferecido sua vida ao Senhor para salvar o seu
Instituto”5. Ato supremos de afeto pela sua família.
b) Partilha dos bens espirituais
Família religiosa é, sobretudo, partilha de bens espirituais, afinal, o primeiro
sentido de viver em comunidade na VRC não é com certeza para trabalhar juntos, mas
para caminhar para a santidade. O Fundador, muitas vezes, alegrava-se, em Acqui, das
notícias que lhe chegavam de Asti e partilhava também seus desejos, seus problemas, seu
coração. Como exemplo entre vários, vai a carta do dia 20 de março de 1891, quando
agradece pelos votos recebidos no dia de S. José, seu onomástico: “Me chegaram em
ocasião do meu onomástico muitas promessas de orações e de ajudas espirituais. Penso
que destas caridosas ofertas sejam participados os queridos Oblatos como de uma
riqueza à qual eles também tem o direito. Do mesmo modo que eu comunico ‘omnia
mea” (tudo o que é meu) os Filhos de S. José comunicarão a mim “omnia sua” (tudo o
que é deles); e cada um poderá dizer: omnia mea vestra sunt et vestra mea, (tudo o que é
meu é vosso e tudo o que é vosso é meu) segundo o desejo de Jesus que os seus
discípulos sint consummati in unum" (sejam perfeitos na unidade Cfr. Jo 17,23) 6
c) Interessar-se e participar das mesmas alegrias e preocupações
Marello colocou em prática o texto paulino: “Alegrai-vos com os que se alegram e
chorai com os que choram”. (Rm 12,15). A sua empatia era total. "Vou muitas vezes em
espírito em santa Chiara para visitar os enfermos e iria pessoalmente se fosse possível..." 7E se alegrava com as pessoas: "Me alegro e agradeço a Deus de coração pela promoção
ao Sacerdócio de um Filho de S. José e fiquei contente no espírito das festas que se
realizaram em Santa Chiara nesta circunstância" 8E a frase conhecida: “Fico muito feliz
em saber eu que a alegria espiritual floresce entre os sacerdotes de S. José”.9
d) Indulgência e paciência
4 Ibidem L. 309 p.723 (tradução do autor)
5 Dalmaso, Severino, biografia del Beato Giuseppe Marello: Libreria Edtrice Vaticana, Cittá del Vaticano, 1997.
p.2180. (Tradução do autor) 6 Marello, Giuseppe. L. 239. Studi Marelliani- San Giuseppe Marello Epistolário II parte, Editore: Casa Generalizia
della Congregazione Oblati di S. Giuseppe, Roma, Anno 1 nn.3-4, Luglio\ Dicembre, p.598, 2009.(Tradução do
autor) 7 Ibidem L. 206, p .531.(Tradução do autor)
8 Ibidem. L.275.p 667 (Tradução do autor)
9 Ibidem, L 194, p. 502 (Traduçãoão do autor)
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O Fundador deu muitas provas na sua vida de paciência, muitas vezes, até heroica.
Bem conhecida é a frase que a Ir. Albertina registrou como conselho dele no seu diário:
“Quem tem paciência a todo instante, já faz bastante”10
, e que ele viveu a vida toda
desde a sua juventude. A paciência e indulgência do Fundador se manifestaram de forma
especial na complicada questão com a Pequena Casa do Cottolengo de Turim. Estava em
jogo sua família religiosa. Conseguiu manter a serenidade, a paz, sem nunca perder a
postura cristã de quem quer resolver as coisas no amor fraterno e sofre por não poder
encontrar um caminho de diálogo sem a intervenção da Autoridade de Roma.
Uma das suas últimas cartas é enviada ao advogado Felipe Graglia, pai das jovens
que ele seguia espiritualmente. Assim escreve: “faz certo tempo que problemas e
sofrimentos não me faltam e provêm de pessoas com a quais a qualquer custo teria
desejado proceder em perfeito acordo. Infelizmente, uma questão simples se tornou
complicada e agora não tem mais esperança de resolvê-la sem a Autoridade. Assim
permite o Senhor e seja feita sua amável vontade”11
. Estava já no fim de sua vida, pois, a
carta foi escrita no dia 28 de março de 1895 e mostra uma serenidade interior, fruto com
certeza, de uma longa caminhada espiritual.
e) Interessar-se pelo andamento da casa e de todos os membros
"Não digo mais nada de novo e posso assegurar que tenho no meu coração a
família de Santa Chiara juntamente com aquela de Acqui"12
. Nada de novo por que este
amor é na verdade “notícia velha” e bem conhecida pela sua família de Asti. Muitas
cartas mostram como ele se interessava em Acqui do andamento da situação de doentes,
de construções e reformas, citando nomes de pessoas, quase acompanhando cada um.
Como exemplo disso, podemos citar por inteira a carta 193. Mas há uma série de cartas
tão afetuosas como quando pede de saber as notas dos alunos (L. 195) ou quando sente
pela possível saída de um irmão e pelo dente do Irmão Paulo que não tem mais... (L. 196)
etc. Coisas pequenas ou simples! Mas o espírito de família é feito de miudezas de amor!
f) Em qualquer lugar onde se trabalha se trabalha em nome e para a Congregação
toda
Isto é verdadeiro na teoria, mas, na prática, cada um sabe como não é fácil viver o
espírito de família num lugar mais humilde e simples sem projeção. Numa carta muito
conhecida, encontramos duas frases que ilustram muito bem esta verdade: “Pobres
Josefinos do Hospício dos Crónicos, sacerdotes menores, não são nada, e não tem
nenhuma daquelas que se dizem posições para o futuro e, no entanto o Senhor, serve-se
também de vocês para o bem das almas” e, "enquanto um Filho de S. José trabalhava em
10
Marello, Giuseppe. Scritti e insegnamenti del Venerabile Giuseppe Marello, organizado por P. Mário Pasetti, Asti:
Tipografia S. Giuseppe.1980. p.196. (Tradução do Padre Alberto Santiago). 11
Marello, Giuseppe. L. 239. Studi Marelliani- San Giuseppe Marello Epistolário II parte, Editore: Casa
Generalizia della Congregazione Oblati di S. Giuseppe, Roma, Anno 1 nn.3-4, Luglio\ Dicembre, p.741.(Tradução
do autor) 12
Marello, Giuseppe. L. 87. Studi Marelliani- San Giuseppe Marello Epistolário II parte, Editore: Casa Generalizia
della Congregazione Oblati di S. Giuseppe, Roma, Anno 1 nn.3-4, Luglio\ Dicembre, p.483.(Tradução do autor)
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nome dos irmãos nas barrancas do Tanaro, estes labutavam em nome dele a Casabianca
e as bênçãos dos Céus desciam sobre todas as obras e sobre a inteira família dos
Operários".13
g) Acolhida e convivência fraterna
"Do dia 19 a 25, estarei em Strevi. Se um pequeno grupo quiser passar comigo
aquela semana de veraneio, será devidamente acolhido".14
Como o Fundador gostava de
acolher, tanto em Acqui quanto em Strevi, na casa de veraneio da diocese os irmãos da
família! Sobre isso, contam-se muitas anedotas dignas dos Fioretti de S. Francisco, como
aquele que conta Padre Patrício Garberoglio. Justamente na casa de Strevi, o Fundador
ajuda a ele, ainda muito jovem, a montar num burrico para distraí-lo,15
ou como o
“presente” de duas pedrinhas do Rio Bormida que envia para o pequeno Franco com o
convite de rezar e de ser bom.16
Coisa simples para dizer que todos estavam em seu
coração!
h) Oração mútua
"Os de Santa Chiara rezem a Deus que me venha em socorro entre muitas
angústias; e eu também continuarei a rezar para que prospere o número dos Evangélicos
Operários que o Pai celeste formou para si na Família de S. José". Uma oração lá e cá,
uma troca de corações e uma oração vocacional17
. Aliás, quase em todas as cartas
episcopais, pedia ou oferecia orações ou terminava com um desejo de bem ou uma
bênção. Só conferir!
i) Confiança no trabalho dos outros
Confiar no trabalho dos outros, e até incentivar, era prerrogativa do Fundador.
Vejamos: “Quantas coisas deveria acrescentar para os queridos irmãos, noviços,
aspirantes e especialmente para os sacerdotes. O trabalho cresce, não é verdade? Padre
João atrairá pessoas ao confessionário? E Padre Carandino o Secretário? E padre
Baratta ainda tem saúde para as suas peregrinações pastorais?”18
E esta explosão de
alegria: "Muito bem a padre Baratta que está adquirindo novos títulos pelo Breve de
missionário Apostólico. Santa Chiara é rica agora de tudo. Pregadores, Confessores,
Catequistas, Professores, Cultores das Artes, sem contar os Procuradores, Os
Ecônomos, Os Chefes de laboratórios, os Operários” 19
. 13
Ibidem. L. 241, p.602 (tradução do autor) 14
Ibidem, L.182, p 468 (Tradução do autor) 15
Padre Mário Páscolo, Al lampeggiatore, Studi e documetazioni Marelliane, Gráfica Mazzini. p. 129 16
Ibidem, p. 139 17
Marello, Giuseppe. L. 244. Studi Marelliani- San Giuseppe Marello Epistolário II parte, Editore: Casa
Generalizia della Congregazione Oblati di S. Giuseppe, Roma, Anno 1 nn.3-4, Luglio\ Dicembre, p.607.(Tradução
do autor). 18
Ibidem. L. 202. P. 526- 527 19
Ibidem. L. 235. P. 588.
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4. Perguntas para nossa vida pessoal e comunitária
Depois desta “passada”, ainda que rápida, no coração do Fundador, vem à mente o
poeta: “Coloquei a comida na tua frente, agora come por você mesmo” (Dante Alighieri,
Paraíso, Canto X, 24), lembrando que o Espírito de Família não é teoria, mas vida vivida,
mesmo na cruz de cada dia. Por isso, uns questionamentos podem nos ajudar.
a) A nível pessoal
A vida de família é construída por cada membro dela, pelo seu esforço, pelos seus
dons, pelo diálogo, perdão, oração. Avalie sua qualidade de vida de família no seu dia-dia
na sua comunidade: quais os seus pontos fortes que ajudam a construir família, e quais os
aspectos que são mais frágeis e que deveria reconsiderar e melhorar.
b) A nível comunitário
O Espírito de Família é patrimônio da Congregação, mas, concretamente, é vivido
nas nossas comunidades. Veja se em sua comunidade se percebe este espírito ou
prevalece ainda a fuga, o individualismo, o egoísmo, o protagonismo que abafa e destrói.
c) A nível de Congregação
A pertença à Congregação é, com certeza, um sinal de uma única família feita de
línguas, culturas, e jeitos diferentes de vivermos na “Casa de S. José”. Podemos nos
perguntar se amamos a Congregação e se o que acontece numa Província nos alegra ou
entristece como se isto acontecesse na nossa e se temos mesmo uma espécie de “auto-
estima Josefina” para transmitir às famílias, aos jovens e aos que vivem ao nosso redor.
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I JORNADA DA EDUCAÇÃO JOSEFINO-
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Discurso do Provincial aos Educadores
Curitiba, 14 de outubro de 2014.
Boa noite a todos e todas,
Saúdo-vos em nome de toda a Congregação dos Oblatos de São José!
É imensa a alegria de partilhar com vocês destas iniciativas que nutrem a nossa
mantenedora, principalmente pelo esforço dos seus leigos e colaboradores que partilham
do nosso carisma e missão institucional.
Quero, inicialmente, agradecer em nome da Província da Nossa Senhora do Rocio
aos superintendentes, diretores e a todas as lideranças que ocupam a função de gestão na
nossa faculdade, colégios e obras sociais. Agradeço de maneira especial a cada um e uma
de vocês, professores e colaboradores, que aceitaram o nosso convite e nos prestigiaram
com as suas presenças.
Desde o início do cristianismo, os discípulos se reuniam para discutir os desafios
do cotidiano, partilhar a fé e projetar os futuros da missão eclesial. No mesmo espírito,
nós hoje, nos reunimos nesta Jornada para renovar o nosso compromisso e missão da
Congregação no âmbito da educação. O cultivo da cultura organizacional de uma
instituição é garantia da sua vitalidade e pertinência no tempo. As nossas escolas e obras
sociais, não são alheias a isso, e pelo mesmo, precisam se esforçar continuamente em não
distanciar-se da nossa missão, visão e valores.
A relação entre gestão e espiritualidade, e sua necessária indissociabilidade na
gestão de instituições de ensino religiosas, constitui uma necessidade tanto no cultivo do
seu carisma fundacional, quanto da atualização da missão e redescoberta do seu papel na
sociedade.
O carisma compreende as qualidades que permitem e orientam o trabalho cristão,
isto é, constitui o caráter didático dos empreendimentos apostólicos das instituições
religiosas. Nesse sentido, a gestão, enquanto habilidade de liderar pessoas e coordenar
processos contribui na realização da missão.
A instituição religiosa nasceu de uma finalidade espiritual e, ao optar por oferecer
um serviço à sociedade, precisa potencializar, continuamente, a sua habilidade de
negociar, como uma habilidade de relacionamento no espaço social. Ao reconhecer-se
como empresa, tem o desafio de integrar a eficácia da gestão com os valores humanos e
espirituais, próprios do seu carisma.
Em síntese, a instituição religiosa precisa preocupar-se em, permanentemente,
atualizar sua fidelidade ao seu carisma fundacional, de forma coerente com a sua
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memória institucional e criativa que lhe permitam sustentar a sua missão e o seu negócio
nos atuais desafios e cenários econômicos.
A espiritualidade confere sabor e qualidade à gestão!
Sabemos, ainda, que as instituições não existem sem as pessoas. E, estas pessoas,
no caso das nossas instituições escolares e obras sociais, são vocês, educadores e
educadoras. A Congregação não pode ser omissa em não reconhecer que vocês são os
comunicadores desta nossa missão cristã. E, pelo mesmo, é que esta Jornada foi
preparada não com uma intenção academicista, mas, por uma motivação de agradecer a
cada um e uma de vocês a missão educativa que realizam nos seus diferentes cotidianos
das nossas instituições.
Se pudesse definir em poucas palavras o sentido desta Jornada, para nós
Congregação, seria: “educador e educadora, a Congregação é grata a você, além de um
vínculo empregatício, quer te dizer, hoje, neste espaço familiar e solene, que sem o
trabalho que você realiza, o nosso carisma na educação se extinguiria no tempo, e ainda
mais, não nos permitiria contar os quase 100 anos de história de educação no Brasil”.
Vocês são a nossa memória e a nossa identidade. E, como diz o texto bíblico:
“quero trazer à memória aquilo que me traz esperança”. O testemunho de vocês é o nosso
passado, presente e futuro. É a presença do espírito de Deus no tempo e espaços da nossa
Congregação.
Que São José continue indicando-nos e sustentando-nos no caminho da nossa
missão.
Muito obrigado! Eu e os meus confrades religiosos, somos gratos a vocês.
Deus abençoe a todos!
Pe. Ailton Ferreira de Almeida, osj
Padre Provincial - Província Nossa Senhora do Rocio
Brasil
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Carta sobre o Núcleo de Pastoral da Educação Oblata
Curitiba, 28 de Agosto de 2014 Memória de Santo Agostinho, Doutor da Igreja. Educador
Aos Educadores Oblatos de São José Padres, Irmãos, Freis, estudantes, Leigos Oblatos,
Diretores, Professores, Técnicos administrativos, Gestores de obras educacionais dos
Oblatos de São José
Prezados/as:
A Congregação dos Oblatos de São José foi fundada por um homem
comprometido com a Educação, ainda que em seu aspecto informal. São José Marello,
Presbítero na Diocese piemontesa de Asti, Itália, preocupou-se com a educação da
juventude. Se ele não montou uma estrutura de educação nem projetou uma pedagogia de
modo claro, por outro lado, esteve muito atento às necessidades de levar às novas
gerações algo mais do que benefícios materiais, ideologias políticas, diversões, etc. Do
seu modo, dentro dos limites de suas influências e no seu raio de ação, São José Marello
foi educador da juventude, desejando intensamente dar-lhe um horizonte de vida e de
identidade. Ele soube que o Cristianismo, com todos os seus limites, ainda era o modelo
mais coerente e rico de formação de Humanidade. Este modo de sentir e viver foi
transmitido aos seus discípulos, os Oblatos de São José. É neste modelo que os Oblatos
ainda creem e desejam progredir.
Desde sua fundação por São José Marello, a Congregação teve uma atenção
intensa e marcante na educação formal. Primeiramente, segundo o modelo do tempo,
orientando e animando os chamados “Oratórios Festivos”. Eram organizações feitas em
torno aos esportes e às manifestações artísticas comunitárias, como teatros e outras
atividades. Outro modo de educação foram os grupos de Catequese e instrução cristã.
Com o tempo e as necessidades, essas atividades educacionais foram crescendo e
criando notável importância, em especial na sociedade em que eram desenvolvidas. Foi
assim que, no Norte da Itália e em outros lugares, os Oblatos de São José marcaram
época com as atividades destes Oratórios. Muitos cidadãos importantes para a sociedade
italiana foram formados nestes ambientes. Neles também foram despertadas vocações
que se tornaram missionárias e por identidade de origem, educadoras.
Chegando ao Brasil em 1919, quase um século, os Oblatos rapidamente se
preocuparam em propor estruturas de educação. A Catequese, ainda acentuadamente
relacionada com o estudo do Catecismo, foi uma preocupação pastoral intensa e recebeu
os melhores esforços neste sentido. Mas houve também um empenho em propor uma
educação formal, algo que hoje seria chamado de integral: corpo e espírito, constituintes
do ser humano, no confronto com a Natureza, a História, as Matemáticas, as Físicas e as
Ciências da Vida.
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A história dos Oblatos de São José segue o curso de uma história de família. Altos
e baixos, conquistas, perdas, esperanças, esforços enormes, nem sempre bem observados
e valorizados, fazem com que estes quase cem anos de atividades sejam marcados pela
atuação de heroicos educadores. Foram Padres e Irmãos, ligados à Educação, que
construíram uma sólida reputação nesta área.
Pode-se citar aqui, nestas poucas linhas, alguns passos de notável importância na
história da Educação nesta Província dos Oblatos de São José. A criação do Colégio São
José, tão importante para sua época e ambiente que, por muito tempo foi identificado
como “pioneiro em Educação”. A criação do Colégio Padre João Bagozzi, com uma rica
história de crescimento, de autoafirmação, de superação e resiliência, própria dos que
acreditam na vida e têm esperança. O Centro de Educação Infantil “O Girassol”, com
a simpatia de sua existência e a marca de um carisma e presença na sociedade. A Creche
“Menino de Nazaré”, sinal de esforços de parceria com a sociedade civil e compromisso
com a infância. O Centro Social Marello, um espaço de valorização da vida e
construção da cidadania. A Faculdade Bagozzi, último rebento de uma árvore frondosa e
fértil em frutos, que marca sua presença não apenas em duas unidades, mas sobretudo na
imagem de sólida reputação, estrutura e formação. E isto pode ainda crescer, progredir e
mesmo frutificar em trabalhos e ambientes — para tanto é necessário desejo, empenho,
um pouco de sonho, ousadia e, sobretudo, Esperança e Fé.
O diálogo entre a Fé e a Cultura não é uma situação impossível ou ideal: ele pode
existir e é urgente que aconteça. As disciplinas exatas, biológicas e humanas podem ter,
sob a luz da Fé, um brilho diferente. Acontece que nos ambientes de educação formal isto
quase nunca ocorre. Pelo contrário, as visões parciais e caricaturais, quando não
caluniosas e mentirosas ocupam a atenção e a disposição dos que ensinam e deturpam a
Identidade da Igreja, sua Doutrina e História. É um direito dos que estão no processo da
Educação receber uma visão diferente do que ouvem. O educando não pode ser refém de
uma forma unilateral de enxergar a história, a vida, e de ter ideias. É por isso que a Igreja
deve zelar para que os que passam pelos ambientes educacionais que lhe são próprios,
propõe formas e meios de anunciar Jesus Cristo e a “alegria do Evangelho”, como ensina
o Papa Francisco. Todos têm direito de receber este anúncio e a Igreja, sendo a
Congregação dos Oblatos de São José uma parte da mesma, deseja anunciar, no respeito
ao pluralismo religioso, o Evangelho de Jesus Cristo e sua presença de Graça e Paz no
mundo. E o faz iluminando as Ciências e a Cultura.
O Santo Padre, Papa Bento XVI, ainda como Cardeal, na celebração de abertura
do Conclave que o escolheria como Sucessor de Pedro, afirmava que a sociedade
moderna está marcada pela “ditadura do relativismo”. Depois das filosofias extremas —
que alguns pensadores identificam como característica desta “era dos extremos” — se
estabeleceram e alternaram, o Homem não cresceu como pessoa livre, antes, ficou mais
limitado a um mundo onde ele é refém de sua própria vida. Marxismo por um lado,
socialismo real de outro, liberalismo absoluto como padrão de vida; um vago
espiritualismo ou uma religiosidade natural que cativa pela “fala mansa” e pelos lugares-
comuns de afetos não bem definidos… Isto sem falar da relatividade da Verdade, em
especial da Verdade religiosa, que fundamenta a Moral e propõe uma Ética coerente. A
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fragilidade disto tudo está, ao menos em parte, estampada na recente campanha política
para as eleições majoritárias de 2014.
Isto tudo, estes limites históricos e culturais, estes vícios e erros éticos, podem ser
superados com Educação. Por isso os Oblatos de São José desejam dedicar-se à ela com
empenho, capacidade, capacitação, gabarito, experiência, intensidade, paixão e fé. E
podem fazê-lo tendo como caminho programático alguns pontos que podem ser
expressos, ainda que de modo não articulado, nos itens a seguir.
É preciso que os Oblatos de São José, Padres e Irmãos, acompanhados pelos
Leigos empenhados na Educação, tenham determinadas posturas e busquem estes
caminhos, reforçados ou novos. A saber:
[a] Ultrapassar a dimensão da gestão física, dos prédios e demais construções. Ela
seguramente é importante e se hoje há espaços educacionais eles são devidos ao intenso
trabalho de Oblatos e seus colaboradores. Mas é preciso, sem deixar isto, mudar o foco
de atenção.
[b] Mergulhar na gestão de educadores, observando e envolvendo-se com seus
problemas, dificuldades, mas também com seus projetos, sonhos, trabalhos.
[c] Assumir postos e cargos explícitos de condução de obras educacionais, sem o receio
de uma imaturidade ou suposta inexperiência juvenil da parte dos que para isto são
designados. É preciso dar o espaço para os mais jovens, ainda que não sejam tão
experientes, pois em um dado momento, até inesperadamente, os experientes podem
perder a habilidade pela chegada dos anos.
[d] Além disso, é preciso renovar e os ambientes educacionais dos Oblatos de São José
que não são posse deste ou daquele Oblato, ainda que lhe devam a origem ou a
maturidade e até, em alguns casos, a sobrevivência.
[e] Deve-se entrar em sala de aula, seja no ensino fundamental, seja médio e, é claro,
superior. É necessário dialogar com a cultura, com o diferente. É preciso propor algo
como contraponto aos preconceitos hegemônicos sobre a Igreja Católica, sua Doutrina,
História e Instituições. É preciso, em sala de aula, no contato com os estudantes, fazer um
coerente, maduro anúncio de Jesus Cristo, sem afetação, sem pieguismo, no diálogo com
a Ciência e o mundo moderno.
[f] É urgente que se estabeleça programas de formação religiosa nas unidades de ensino
da Província, ainda que aberta às outras confissões. Isto não é uma escolha aleatória de
cada instituição, mas é necessidade indicada no Decreto Gra-vissimum educationis, nº
10b. Este tema é expressamente indicado para o ambiente de Faculdade. Precisam ser
informados sobre o que pensa a Igreja Católica. A omissão em introduzir ao pensamento
teológico os estudantes, inclusive do ensino superior, é séria e grave por parte da
Congregação.
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Claro que nem tudo isto é para todos Oblatos. Não serão todos os que se sentirão
chamados à gestão escolar; não serão todos os que terão facilidade de encarar uma sala de
aula; também não serão todos os Oblatos que irão partilhar, com Professores, as situações
quotidianas de uma Escola ou Faculdade. Mas todos os Oblatos entenderão que a
Educação é um projeto decisivo para a Congregação e que, de um modo formal ou não,
pastoral ou pessoal, ela é parte de sua identidade de Oblatos, na Igreja e no mundo.
É assim que, pensando nisto tudo e muito mais, a Congregação dos Oblatos de São
José, Província Nossa Senhora do Rocio, na pessoa de seu Provincial e com o apoio do
Conselho Provincial, propõe a criação de um Núcleo de Pastoral de Educação Oblata.
Isto pode ser um sonho, mas as escolas dos Oblatos, quando foram criadas, podem
também ter sido sonhadas… Hoje são realidades que marcam presença. Então, é
necessário dar um salto de qualidade.
É neste sentido que se propõe este Núcleo de Pastoral de Educação Oblata. Ele
deverá ser construído a partir das necessidades da Igreja e da sociedade, mas terá alguns
pontos e empenhos fundamentais que deverão ser perseguidos com intensidade e ânimo.
Ainda que de um modo um pouco geral são eles:
– Pesquisa e produção de textos que contribuam com a Educação e com os Educadores,
com amplitude e intensidade;
– Cultivo e investigação da memória educativa dos ambientes de educação formal e
pastoral mantido pelos Oblatos ou que despertem interesse e gerem possibilidades
culturais, históricas e científicas;
– Ampliação do conjunto da memória Oblata, sabendo que a história define a identidade;
– Capacitar Educadores, formais e pastorais, para o diálogo entre a Fé e a Cultura;
– Fornecimento de elementos para o progressivo crescimento da presença de Oblatos de
São José no ambiente da Educação, isto em várias frentes: direção, assessoria, magistério
direto, gestão.
A Congregação dos Oblatos de São José tem a identidade, perante o governo civil
brasileiro, de “instituição educacional”. Estes Padres e Irmãos não são, perante a
sociedade civil, Párocos e Vigários, mas agentes de Educação. Isto não significa que os
ambientes tradicionais de pastoral serão excluídos da atenção dos Oblatos. Mas significa
que os ambientes educacionais precisam de mais atenção, de mais presença dos
religiosos.
Todos os Oblatos são chamados a isto pela própria natureza do carisma: o
Escondimento e os cuidados dos interesses de Jesus. O Educador Oblato de São José
sabe seu lugar na sociedade, na Igreja, na Cultura, e busca ocupa-lo com sabedoria e
capacitação, cuidando para tê-la sempre mais e melhor.
E os Oblatos de São José, Padres e Irmãos, não estão sozinhos neste trabalho. Os
fiéis Leigos os acompanham com uma presença marcante e atuante. Em todos os
ambientes educacionais, sejam formais ou não, Leigos estão sempre partilhando as
situações acadêmicas, trabalhistas, pastorais, culturais com os Oblatos Padres e Irmãos.
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Como tais ambientes podem ser, por sua realidade, tensos e sempre são desafiadores, os
Leigos e os Religiosos Oblatos mantêm uma estreita colaboração no sentido de superar os
desafios que, constantemente, a sociedade, a cultura, a política, a economia e tantos
outros fatores impõem.
É tempo de fazer “pontes” entre educadores ou “ampliar” as que já existem. Nesta
atividade, seguramente múltipla, o Núcleo de Pastoral de Educação Oblata terá uma
importância enorme. Dependerá, entretanto, que os envolvidos estejam convencidos da
importância deste passo. Não poderá ser um sonho de um Provincial ou de um Conselho.
Não poderá se apresentar como uma possibilidade a mais, algo ad libitum, conforme o
desejo ou o sopro do vento… O Núcleo de Pastoral de Educação Oblata não poderá ser
um gueto onde um punhado de visionários iluminados por algum tipo de sabedoria
autoproclamada imporá sua visão de mundo e sistema de ação.
O Núcleo de Pastoral de Educação Oblata exigirá um esforço enorme de
“sinergia”, que todos sabem é a soma das energias, dos interesses, dos modos de ação e
interação. Trata-se de, seguindo a doutrina da Igreja Católica sobre a Educação, expressa
especialmente nos Documentos do Concílio Vaticano II, seguindo as orientações da
CNBB e da Congregação dos Oblatos de São José, ouvindo e usando de oportunos
instrumentos que, por serem tal, isto é, instrumentos, podem evoluir e mesmo ser
trocados sem dificuldades e assim fazer acontecer a Educação da Verdade e da Paz. Esta
é, certamente, a “educação do coração” esperada por São José Marello.
No Evangelho de João 8,32 lê-se: “…e conhecereis a Verdade e a Verdade vos
libertará”. A Verdade, importante conceito filosófico e teológico, não é apenas uma ideia
abstrata. É uma busca à qual o homem moderno e pós-moderno, mesmo sem o saber,
realiza, mesmo que de modo imperfeito. Então, para propô-la a quem a busca é
necessário conhecê-la. A isto o nascente Núcleo aspira e, com a soma dos esforços de
todos, Oblatos Padres, Irmãos e Leigos, e o apoio logístico e institucional da
Congregação, seguramente será realidade.
Então, Oblatos de São José, Padres, Irmãos, Freis, estudantes, Leigos. É tempo de
começar um projeto e nele investir esforços. Com a segurança de estar com José, pai e
educador de Jesus, pode-se ter a certeza que coisas boas e belas aparecerão.
Saudações
Pe. Ailton Ferreira de Almeida, OSJ
Provincial e Conselho Provincial
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Mensagem da COSJ aos Educadores
A razão pela qual estamos aqui nesta noite é das mais significativas para todos
nós, pois vem nos lembrar e fortificar a opção, e diria mais, a fidelidade de uma das
vertentes do exercício da Congregação dos Oblatos de São José que nasceu do coração de
seu fundador, São José Marello, e perpassa por mais de uma centena de anos em
diferentes continentes e lugares; trata-se do trabalho educacional dispensado com
simplicidade, mas também com muita dedicação e seriedade, nos corações de
inumeráveis crianças, jovens e adultos.
Tenho a certeza de que ninguém de nós se oporá à afirmação de que a educação é
um dos principais e mais importantes vetores da construção da sociedade. Bem dizia a
ex-ministro da educação e atual senador da República Cristovam Buarque, que a
educação promove, dentre outras coisas, a cidadania porque ajuda a criança, o jovem e o
adulto a deslumbram-se com as belezas do mundo, a indignar-se com as injustiças e a
inserirem-se nos meios sociais com uma atividade produtiva.
Pelo desejo ardente que o nosso fundador José Marello nutria pela educação das
pessoas, (e em seu tempo ele via com muita preocupação a necessidade da educação das
crianças e dos adolescentes), tornava-se irreversível para ele a necessidade de uma
parceria dos seus Oblatos com os leigos, e embora em seu tempo a palavra ‘leigo’ não
existisse, existia, contudo, o espírito dessa parceria, porque se sempre são elementos
definitivamente necessários para a existência e permanência da educação, a família, a
Igreja e o apoio da própria sociedade, os professores na categoria de leigos colaboradores
no campo oblato da educação sempre foram e hoje mais do que nunca são
indispensáveis.
Ao longo dos muitos anos dos Oblatos de São José já transcorridos em diferentes
realidades do nosso mundo, a escola, portanto, a educação, tem sido um dos lugares
referenciais para o exercício do empenho dos religiosos dessa instituição religiosa, e, se a
necessidade de educar foi e é a razão da existência das escolas oblatas, então, sem
dúvida, o seu maior patrimônio foram e são os professores, pois sem eles no passado, e
hoje sem vocês, não seria possível o espírito do fundador José Marello continuar
permeando com eficácia a vida de milhares de educandos não apenas aqui no Brasil, mas
também em outras partes do mundo em que a bandeira da educação desempenhada e
unida com a da promoção humana e do saber e dos valores cristãos, recebe uma
identidade estampada com um matiz bem nítido de Oblatos de São José.
Não podemos deixar de servir-nos da ocasião dessa Primeira Jornada da Educação
Josefino-Marelliana, para expressar em nome de cada religioso Oblato o reconhecimento
pela importância e o valor que cada um dos docentes e funcionários educadores oblatos
desempenham conosco na sagrada tarefa de educar. Cabe-nos aqui fazer três menções
que gostaria que fossem caladas no coração de cada um de vocês.
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A primeira é a importância que cada um de vocês, professores, tem na tarefa
educativa, pois o professor sempre foi e será um dos componentes indispensáveis na
formação do ser humano. Se é verdade que o ser humano busca e encontra em seus
primeiros anos de vida as suas referências em seus pais, é verdade também que em
seguida os seus modelos de vida são buscados e cristalizados na escola onde estão os
professores para acolhê-los, apoiá-los e guiá-los, e somente depois na sociedade. Cada
um de nós muito bem sabe e pôde experimentar que os nossos professores foram os
nossos mestres pela vida afora, pois nos ensinaram as coisas para a vida não apenas nos
quadros de giz ou nos livros, mas muito mais com suas presenças e exemplos.
Não resta dúvida que ser professor hoje é viver este tempo com grande
sensibilidade e consciência, esforçando-se para saber lidar com as diferenças, tendo
continuamente flexibilidade e ajudando os seus alunos a refletir, ponderar e optar com
critérios os valores para a vida. Se é verdade que no passado o professor recebia grande
consideração, sobretudo pela imagem respeitosa remetida a ele que os alunos recebiam
em suas famílias, hoje nas atuais famílias, muitas vezes desestruturadas e até
desinteressadas com a tarefa educativa, isso pouco acontece com frequência, o que
contribui para que a missão do professor se torne mais desafiadora, acarretada ainda mais
por causa da ausência dos pais na vida dos filhos ou devido a separação constante dos
casais e pela falta de referência deles para os filhos.
Por isso, caros professores, a missão que vocês têm não se resume
preponderantemente na transmissão de conteúdos, mas também na contribuição para a
formação integral de seus alunos, ensinando-lhes valores morais, sociais e religiosos
(muito mais para quem milita numa entidade religiosa e cristã), valores estes que antes
eram ensinados com certo esmero em família e aceitos com normalidade na vida dos
educandos. Os valores transmitidos por vocês farão com que os seus alunos se tornem
cidadãos conscientes de seus deveres e também de seus direitos perante a sociedade na
qual um dia serão chamados a serem protagonistas.
A segunda menção que deixo-lhes é a necessidade do empenho para beberem de
nossa fonte, fonte esta que chamamos josefino-Marelliana. A Congregação dos Oblatos
de São José tem um carisma muito rico e atual e que se encaixa perfeitamente nas
diversas circunstâncias das exigências do nosso mundo de hoje. Nós Oblatos dizemos que
o nosso carisma, surgido há mais de 136 anos, é riquíssimo graças ao espírito que o nosso
fundador São José Marello legou para os seus oblatos; um carisma para ser atuado em
resposta às exigências dos tempos proporcionando às pessoas serem iluminadas pelos
valores cristãos mediante a educação da mente e do coração.
Um dos aspectos luminoso que o Marello procurou nos transmitir foi o esforço
para a formação da juventude (e quando nos referimos ã juventude entendemos na mesma
proporção as crianças e os adolescentes); uma preocupação que ele teve presente e
atuante desde jovem sacerdote e depois como bispo e fundador; de fato, quando bispo da
diocese de Acqui tinha advertido a necessidade de Oratórios (organização para as
crianças e jovens conviverem, se divertirem e se formarem nos valores cristãos), com o
empenho e o desejo apostólico de ajudá-los, sobretudo os mais necessitados e pobres, a
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serem formados como futuros cidadãos por meio de uma educação permeada de valores e
do acompanhamento inclusive personalizado. Para o campo educativo nas escolas
Marello reservou uma grande parte de seu coração em vista do peculiar valor,
necessidade e importância que estas tinham em seu tempo, ainda mais necessárias num
período em que as escolas públicas da Itália tinham se tornado centros de ensino laical,
quase sempre anticlerical e contra a fé.
A respeito das fontes Josefino-marellianas é preciso que disponhamo-nos as
conhecê-las e consequentemente que as aprofundemos para que as escolas josefinas nas
quais vocês são os protagonistas possam dar continuidade ao desejo do fundador e
continuarem proporcionando fidelidade e esse espírito muito claro para os Oblatos e tão
necessário no terreno educacional de hoje.
Por fim, a terceira menção é de agradecimento em nome de todos os religiosos
Oblatos que contam com a força leiga e significativa de vocês em nossas instituições
educativas. Se nossas escolas Oblatas, ainda que poucas, são referências para a sociedade
onde estão presentes, o grande mérito desse reconhecimento deve-se graças à atuação dos
nossos professores e funcionários. Por isso, o nosso muito obrigado pelo empenho e
desempenho, pela dedicação e o profissionalismo, pelo respeito aos alunos e à instituição,
pelos exemplos de fé, de moral e de princípios, pela fidelidade à identidade de nossas
escolas nos seus princípios religiosos e espirituais. Obrigado por formarem uma família
conosco, a família educativa dos Oblatos de São José. Façamos nossa a oração do nosso
fundador: “Queira Deus que possamos nos manter sempre dignos de pertencer à
abençoada Família de São José e merecedores de receber o sustento diário das mãos do
seu Chefe”.
Pe. José Antonio Bertolin, OSJ
Diretor do Colégio São José, Apucarana - PR
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EXPOSIÇÃO FOTOGRÁFICA
“EDUCADORES OBLATOS: ENTRE TEXTOS E IMAGENS”
Equipe Centro de Memória dos Oblatos de São José
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ENTREVISTA
PE. CIRIACO BANDINU
Equipe Centro de Memória Oblatos de São José
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No dia 30 de janeiro de 2015, a equipe editorial da Revista Identidade Oblata
recebeu via e-mail questionário respondido pelo Pe. Ciriaco Bandinu. O sacerdote
italiano chegou ao Brasil em 26 de agosto de 1968 e, neste ano de 2015, após despedida
fraterna, retorna a Itália. A seguir apresentam-se as respostas do Pe. Ciriaco.
RIO: Pe. Ciriaco Bandinu, primeiramente, a equipe da Revista Identidade Oblata
agradece a sua disponibilidade em participar desta entrevista. Para iniciarmos: O
senhor poderia nos contar sua história antes de entrar para o seminário?
PE. CIRIACO: Na minha vida, sempre tive três dificuldades inconscientes
conscientes: escrever o meu diário, responder a entrevistas e falar na rádio e na
televisão. “Por insistência mais do que por obediência” aceitei esta entrevista-escrita.
“Eu sou eu mais as minhas circunstâncias”, dizia o jornalista sociólogo
existencialista espanhol José Garcia e Gasset. Portanto, “Eu sou Ciriaco mais as
minhas circunstâncias”. Nada mais verdadeiro. Porém, para nós cristãos, todas as
circunstâncias são acontecimentos providenciais. A existência, de fato, é sempre um
projeto amoroso de Deus.
Nasci na ilha mediterrânea da Sardegna, em Biti, no dia 10 de outubro de 1939, no
início da Segunda Guerra Mundial... Miquele Bandinu, o primeiro motorista de
caminhão da cidade, foi meu pai. Sebastiana, uma mulher de profunda e simples fé,
foi minha mãe. Faleceu aos 42 anos, em 1951, dando à luz o décimo filho, que
faleceu com ela por não querer abortar. Eu já estava longe, no seminário, em Asti,
onde havia entrado no dia 3 de outubro do mesmo ano. O médico, meu padrinho, me
disse que a mãe ofereceu a vida pela minha vocação sacerdotal e religiosa.
Quanto mais conheço as minhas “circunstâncias existenciais”, especialmente, a vida
dos pais e dos ancestrais, mais conheço a mim mesmo.
RIO: O senhor poderia descrever a sua trajetória religiosa?
PE. CIRIACO: A minha vida religiosa consagrada começou de uma forma
aparentemente “errada”. Em 1950, aos onze anos, entrei na Congregação dos
Vicentinos. A Providência quis que São Vicente de Paulo não tivesse paciência
comigo e não me quis em seu instituto por ser... sapeca e agitado demais e detestar o
bacalhau. José Marello me abriu as portas do seu instituto, apesar de ser... demais
agitado e sapeca e de não gostar de bacalhau.
Graças à perseverança e à fé de minha mãe e graças à compreensão dos Padres
Oblatos do Santuário de Nossa Senhora das Graças de Nuoro, entrei na Congregação
dos Josefinos e aqui ainda estou.
Padre Mauro, alguns dias atrás, no dia da despedida fraterna, em nome do Padre
Provincial Padre Ailton, assim falou: “Depois de décadas, vivendo, ensinando,
liderando, trabalhando entre nós, Padre Ciriaco conclui o empenho missionário
que iniciou há 50 anos”, para terminá-lo no mesmo lugar onde havia começado a
minha trajetória religioso-oblata. Em Nuoro, no Santuário Nossa Senhora das Graças,
acredito acabar este meu empenho missionário, a minha vocação humana, sacerdotal
e religiosa, uma história tecida pelo amor e pela infinita misericórdia de Deus.
Alguns sentirão saudade do Ciriaco, mas eu vou sentir saudades de muitos.
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Quando estudante de teologia, havia pedido aos superiores de ser missionário no
Brasil. O sonho ficou engavetado por dois anos, pois os superiores pensavam que eu
tinha jeito de trabalhar na formação. Com a morte trágica do Padre Severino Cerutti,
acontecida em 31 de janeiro de 1967, abriu-se uma vaga no internato do colégio em
Apucarana. Padre Magnone, Superior Geral, lembrou-se do meu sonho e, em 26 de
agosto de 1968, cheguei no Brasil. Fiquei dois anos em Apucarana, aprendendo a
língua portuguesa e ensinando Filosofia e Francês no colégio. Em janeiro de 1971,
fui escolhido para ser Mestre de Noviços, no seminário do Xaxim.
RIO: Pe. Ciriaco, o senhor esteve à frente do Colégio Bagozzi por muitos anos.
Poderia contar um pouco desta história?
PE. CIRIACO: Em 3 de agosto de 1971, às 10h, transpus pela primeira vez o limiar
do Bagozzi como superintendente. A “circunstância” foi a repentina volta de Padre
Dario para a Itália. No Bagozzi “veni, vidi, vinvi! - cheguei, gostei e... fiquei por quase
40 anos! De manhã, exercia a tarefa de Mestre, no Xaxim, entre os Noviços, e, de
tarde, fazia o meu noviciado educacional na Escola Imaculada Conceição e no
Ginásio Padre João Bagozzi. Em I973, houve a fusão e a nova realidade escolar se
chamou Colégio Padre João Bagozzi. Neste período, aprendi a fazer educação com
grandes educadores. Sem aqueles Mestres nunca teria entendido a arte de educar. Aos
poucos, comecei a entender também, conforme o pensar e o agir educativo de Dom
José Marello, que Educar é formar primeiramente “bons cristãos e honestos
cidadãos”.
Educar é muito mais que ensinar: a educação deve ser, necessariamente,
integral (abrangendo as três dimensões existenciais: o físico, a inteligência e o
espiritual, harmonizando na pessoa o elemento humano e o elemento divino),
integrada (a escola, o aluno, a família devem completar-se), integrante (inserindo a
escola, o aluno e a família na realidade social comunitária). A missão específica da
escola é educar à Verdade, objeto da inteligência, ao Bem, objeto da bondade, à
Beleza, da estética.
“Educar é educar para a fraternidade”, tornou-se o lema do Bagozzi por
décadas. Não é uma redundância. Sempre fiquei convencido que educar para a
fraternidade é a única forma plena de educar. Se para o filósofo ateu Sartre “L’enfer
sont lês outres – os outros são o inferno”, para nós cristãos “os outros são o irmão!”.
Articular, fraternalmente, os aspectos intelectuais e vocacionais com os aspectos físicos,
sociais, morais, criativos e espirituais das pessoas é o grande desafio da educação no
Bagozzi.
O específico de cada escola está no seu DNA, na sua inspiração primordial, na sua
espiritualidade, que se torna também a sua força e a sua glória. Consequentemente, o
específico do Bagozzi está em concretizar a ação educativa da Escola de José de Nazaré,
onde Jesus crescia, harmoniosamente e harmonicamente, em idade, em sabedoria e graça,
de forma integral, integrada e integrante, e que Marello, sem escrever nada sobre a teoria
da Pedagogia, soube vivê-la na prática, sintetizando-a nestes elementos:
a. Presença: o educador deve estar no meio dos educandos de forma direta ou
indireta, procurando uma relação sincera e interpessoal;
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b. Prevenção: a presença deve ser amorosa, contínua e vigilante;
c. Competência e capacidade de adaptação: conhecer a personalidade do educando,
descobrindo suas riquezas e talentos;
d. Formação religiosa: para Marello, não existe verdadeira educação sem a
dimensão religiosa;
e. Vida de oração: a pedagogia marelliana é orante.
Vivi a longa trajetória do Colégio, do Centro Social, da Creche Menino de
Nazaré e da Faculdade, com tremores e temores, com esperanças e apreensões. Cada etapa
era um desafio que gerava tormento em mim, na direção, no corpo docente e discente, em
todos os colaboradores e em todas as famílias. Por t er participado desta realidade
educativa, às vezes, chego a pensar que a minha pequenez pode ter significado alguma
coisa nesta história...
Na verdade, não fui eu que fiz parte da história do Bagozzi, mas é o Bagozzi que
fez parte da minha história. O Bagozzi continua e continuará existindo sem o Ciriaco,
mas o Ciriaco não pode continuar existindo sem a memória bagozziana.
RIO: Pe. Ciriaco, o senhor foi um dos protagonistas na fundação do Centro Social
Marello e assumiu a superintendência por muitos anos. Pode relatar como surgiu
esta obra e o que significa na atualidade para a Congregação?
PE.CIRIACO: Centro Social Marello: talvez a única “obra” da qual não me arrependo
de ter pensado, meditado e ajudado a... realizar. Sempre consciente que tudo foi pensado,
planejado e realizado pelo carisma do Santo Fundador e, portanto, pela vontade quase
que explícita dele. Dizer que “fui um dos protagonistas na fundação desta obra” está
certo, pois foram tantas pessoas que ajudaram a pensá-la, projetá-la e realizá-la. Esta
belíssima realidade nasceu da obrigação social que toda escola confessional tem e pela
caridade cristã para a qual toda família religiosa é instituída. Nasceu não à sombra do
Bagozzi, mas graças à sua força educativa e financeira. Não foi pensada e não nasceu
como obra assistencial (entregar o peixe), mas foi pensada e nasceu como obra solidária
(ensinar a pescar) e subsidiária (partilhar o peixe pescado). Uma obra eminentemente
formativa.
O amor ao estudo e o empenho educativo foram o fulcro ao redor do qual se
alimentou o crescimento físico, intelectual e espiritual de todos os adolescentes. Os
adolescentes foram os primeiros e os únicos sujeitos do CSM, pois, ao tempo do Marello,
os adolescentes eram a camada social “mais abandonada e esquecida, deixada
totalmente à própria sorte, afastada do reto caminho, julgada em suas leviandades e em
seus afetos mal orientados...” (C 29).
Os adolescentes do CSM nasciam, viviam e cresciam em situações precaríssimas,
sem nenhuma possibilidade e oportunidade de amadurecimento humano e espiritual. O
CSM, com a acolhida amorosa, com o acompanhamento escolar, com a iniciação
profissional, oferecia uma formação integral, integrada e integrante. Desenvolvia
capacidades e habilidades, reforçava o sentido da família. Oferecia uma formação
abrangente da pessoa, proporcionava uma reflexão sobre a realidade social e política
transformadora. Hoje, daqueles adolescentes, mais de 1500, estão inseridos na sociedade
e no mundo da família e do trabalho, sem traumas e sem revoltas, protagonistas da
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história, profundamente agradecidos à Congregação, a todos os funcionários e
voluntários do CSM, e também agradecidos ao Padre Ciriaco.
A Creche Menino de Nazaré, nasceu em outras “circunstâncias”, mas cresceu, se
desenvolveu e continua existindo à sombra do CSM, sendo, há décadas, parte integrante
do mesmo.
RIO: Pe. Ciriaco, o senhor participou ativamente da fundação da Faculdade
Bagozzi. Conte como surgiu a ideia e quais eram as intenções da Congregação?
PE.CIRIACO: A Faculdade Bagozzi é a natural consequência e sequência do Colégio
Bagozzi. Por nove anos, foi pensada, projetada e realizada, sempre dentro do carisma da
Congregação. Como a família é o ambiente natural onde o filho só dela se afasta quando
alcança a maturidade humana para formar outra família, assim também, numa dimensão
diferente, é hoje o Bagozzi: o aluno entra pequeno, ainda criancinha, e é acompanhado
em seu crescimento físico, intelectual e espiritual até a maturidade e profissão, preparado
para assumir a sua responsabilidade na sociedade e nela fazer história.
A formação profissionalizante e universitária contribui eficazmente para o
desenvolvimento e a evolução global da humanidade por meio de um ensino de
qualidade, de uma formação teórico-prática sólida e de uma formação ética e
humanística. A Faculdade Bagozzi, portanto, justifica-se por ser o ápice de toda uma
trajetória educativa, proporcionando ao aluno uma formação crítica e construtiva, dentro
dos princípios indispensáveis para a convivência social profissional e política. Eis, em
síntese, a sua missão e finalidade, a razão de seu existir:
- Proporcionar o saber integral, integrado e integrante, perseguindo um amplo
conhecimento do passado e do presente, para corrigir as injustiças e construir um futuro
mais fraterno;
- Promover a integração das dimensões do saber nas linhas do ser, pensar e agir da pessoa
e da sociedade, acreditando também que tudo é política, mas que a política não é tudo;
- Dialogar continuamente entre fé e razão.
Portanto, na Faculdade Bagozzi, em nenhum de seus cursos, conforme as
orientações da educação católica, nunca deveria faltar uma formação básica de Filosofia e
de Teologia. Sem isso, a Faculdade Bagozzi não tem razão de existir. É significativo que
o primeiro curso foi o de Filosofia, que nasceu por uma exigência circunstancial interna
da Congregação. O Mundo de Sofia, o Mundo da Ciência e o Mundo do Espírito devem
se complementar. Para um reto pensar e agir é necessária uma visão de conjunto que situe
o ser humano em sua justa relação com Deus, consigo mesmo, com as pessoas, com o
cosmos e com a natureza. O conhecimento simplesmente científico e profissional não é
suficiente para enxergar o porquê e o para quê da existência do todo e de nós.
Toda esta estrutura pedagógica e científica da Faculdade Bagozzi e do Colégio
Bagozzi, depende de quatro forças propulsoras e interdependentes:
- Do Carisma vivido e ensinado pela Entidade Mantenedora;
- Da competência do seu corpo diretivo;
- Da competência de seu corpo discente;
- Da consciência educativa e pedagógica dos alunos e suas famílias.
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RIO: Para o senhor, o que significa a Identidade Oblata?
PE.CIRIACO: Por muito tempo, pensou-se que a Identidade da Vida Religiosa estava
nas obras que a Instituição promovia. Hoje, a Identidade Religiosa, e, portanto, a
Identidade Oblata, não se sustenta mais a partir daquilo que ela faz. O mais importante
não é o que se faz, mas como se faz o que se faz. Portanto, nem o trabalho com a
juventude, nem a pastoral paroquial, nem as missões, nem a devoção a São José, nem a
escola são a nossa Identidade Oblata. O que diferencia as ordens e congregações é a sua
identidade. Antes o Cristo, em seguida, a Regra (Constituição e Regulamento). À luz do
Evangelho, cada Congregação tem seu jeito de ser, de pensar e de agir, tem a sua
especificidade, assim como cada flor tem seu perfume e sua cor.
A Identidade Oblata é a expressão prática da Vida Evangélica vivida na
específica espiritualidade do nosso carisma. O maior perigo da escola católica, e de
todas as pastorais da Vida Consagrada, esconde-se na incoerência da própria Instituição
em formar, simplesmente, profissionais e não educadores, em ser simples profissionais e
não apóstolos, e, consequentemente, na incoerência dos docentes e dos colaboradores,
que fazem parte integrante da Instituição, sem viver a pedagogia específica iluminada
pelo seu específico carisma e pela sua específica espiritualidade. Todo projeto pastoral
dos Oblatos, especialmente o educativo, deve ter a Identidade Oblata, que é a alma e o
suporte que dão vida e sentido ao nosso fazer. Esta alma e este suporte são o Carisma e
a Espiritualidade da nossa Instituição. Quando nós Oblatos falamos de Carisma e
Espiritualidade, logo devemos entrar na Escola de José de Nazaré e penetrar no seu
interior, vendo como ele vivia a sua missão de pai, de esposo e de trabalhador: sempre
sereno, na união com Deus, na humildade, no escondimento, na laboriosidade e no
silêncio. Harmonizar os nossos projetos pastorais e constitucionais com o jeito de São
José é sermos coerentes com a nossa Identidade Oblata.
RIO: Padre Ciriaco, poderia deixar uma mensagem final para os escritores e
leitores da Revista Identidade Oblata?
PE. CIRIACO: Sejam sempre coerentes com aquilo que se escreve e com aquilo que se
lê na Revista Identidade Oblata. Escrever por escrever a nada serve se o que se escreve
não transformar o nosso pensar, o nosso sentir e o nosso agir. Que Jesus, Único Mestre,
José de Nazaré, Exemplar Educador, e José Marello, Santo Fundador, sempre nos
acompanhem e nos inspirem! Amém!
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SOBRE A REVISTA
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Revista Identidade Oblata, Curitiba, v.2, n.2, p. 01-61. Jul/Dez de 2014.
SOBRE A REVISTA IDENTIDADE OBLATA
A Revista Identidade Oblata é uma revista de edição
semestral que tem como objetivo a publicação de pesquisas
sobre a presença e atuação da Congregação dos Oblatos de
São José no Brasil.
Surgiu com a intenção de contribuir na formação da
identidade dos religiosos oblatos por meio do registro escrito
e do estudo dos seus documentos e arquivos históricos.
A sua publicação vem somar os esforços do Centro de
Memória dos Oblatos de São José em ampliar a consciência
histórica tanto dos membros da Congregação dos Oblatos de
são José quanto dos participantes e colaboradores das
diferentes realidades missionárias e instituições paroquiais,
pastorais, educacionais e sociais.
Normas para Publicação
Os artigos, análise de documentos e outras propostas de trabalhos devem tratar de
temas relacionados com a identidade da Congregação dos Oblatos de São José, conforme
descrito nos objetivos desta Revista.
Os artigos não devem exceder 7.000 palavras. Devem ser apresentados em formato
eletrônico, compostos preferencialmente em Microsoft Word, com fonte Times New
Roman 12 e espaçamento simples entre parágrafos. A ABNT é a referência normativa
para artigos redigidos em português e a MLA (Modern Languages Association) para
publicações em outras línguas. Citações devem seguir o padrão autor-data.
Os artigos são de inteira responsabilidade de seus autores e a Revista não se
responsabilizará pelas opiniões expressas nos artigos assinados. A submissão de artigos
para publicação implica na cessão dos direitos autorais, sem ônus para a revista.
O autor receberá, como direito autoral, o respectivo fascículo. Os originais devem
ser enviados para o e-mail: nipe@faculdadebagozzi.edu.br.
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