nacionalismo. ideologia e política no brasil
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iv
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE FILOSOFIA E CI_NCIAS HUMANAS
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CI_NCIAS SOCIAIS
NACIONALISMO: IDEOLOGIA E POLµTICA NO BRASIL (1953-1964)
ANTONIO CµCERO CASSIANO SOUSA
Dissertaç_o apresentada ao
Instituto de Filosofia e
Ciências Sociais da
Universidade Federal do
Rio de Janeiro como
requisito para obtenç_o do
grau de Mestre em
História.
Orientador: Prof. Dr. Afonso Carlos Marques dos Santos
iv
Rio de Janeiro, 1993
NACIONALISMO: IDEOLOGIA E POLµTICA NO BRASIL (1953-1964)
Dissertaç_o submetida ao corpo docente
do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito
parcial à obtenç_o do GRAU DE MESTRE.
Aprovada por:
Prof._____________________________________________.
(Presidente da Bancada)
Prof._____________________________________________.
Prof._____________________________________________.
Rio de Janeiro
iv Dezembro de 1993
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+
¦
¦
¦SOUSA, Antonio Cícero Cassiano. ¦
¦
¦
¦Nacionalismo: Ideologia e Política no Brasil (1953 - ¦
¦1954). Rio de Janeiro, UFRJ - IFCS, 1993. ¦
¦
¦
¦Dissertaç_o: Mestre em História ¦
¦
¦
¦ 1. Brasil República 2. Nacionalismo ¦
¦ 3. Reformas sociais 4. Antiimperialismo ¦
¦
¦
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+
iv
AGRADECIMENTOS
A elaboraç_o das dissertaç•es universitárias s_o
cercadas por uma certa clausura, muitas vezes, necessária,
outras tantas, exagerada. O esforço para se fugir desta
tendência, certamente, é responsável por quanto possam ter de
sintonia com o fazer coletivo, com a aventura cotidiana do
homem. Os agradecimentos s_o tentativas limitadas de
reconhecimento de t_o importante contribuiç_o.
As bolsas de estudo concedidas pelo CNPq (Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico),
durante parte considerável da elaboraç_o da dissertaç_o, e
pela FAPERJ (Fundaç_o de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio
de Janeiro), na fase de conclus_o, foram essenciais à criaç_o
de condiç•es de trabalho que permitiram sua conclus_o.
Do convívio com o professor Afonso Carlos Marques dos
Santos, orientador deste trabalho, ficam marcas indeléveis na
minha formaç_o: rigor profissional incomparável, aliado à
generosidade e à paciência com que sempre recebeu as
limitaç•es e tropeços nesta caminhada.
Foram importantes aliados, criando um ambiente de
estímulo e seriedade, professores do Instituto de Filosofia e
Ciências Sociais da UFRJ, como Francisco Teixeira Vinhosa e
José Luiz Werneck da Silva, autores de valiosas sugest•es
quando da defesa do projeto. O professor Olavo Brasil de Lima
Jr., na ocasi_o
professor do IUPERJ (Instituto Universitário de Pesquisas do
Rio
v de Janeiro), indicou importantes caminhos a seguir na análise
que fez do projeto; também nesta fase, as sugest•es e críticas
do professor Sheldon Maram, da Universidade do Estado da
Califórnia, EUA, foram norteadoras de importante
desenvolvimento. Também os professores Nilson Araújo de Souza
(UFMS) e Daniel Aar_o Reis Filho (UFF) forneceram valiosos
subsídios e sugest•es na etapa final do projeto.
O ambiente de estímulo e seriedade do qual fui beneficiário
deve-se, por outro lado, aos colegas e amigos do Curso de
Mestrado: Elaine Rosa, Maria Ana Qualigno, Margarete da Silva,
Dilma Cabral Costa, Paulo Knauss de Mendonça, Luís e Dilma
Andrade.
No magistério, a companhia de colegas, que mesmo em
condiç•es de trabalho adversas acreditam e apostam na
valorizaç_o profissional: Demartone Silva Gomes, Dilson da
Silveira, Francisco Palomanes Martinho, Jairo José Reis da
Silva, Carlos Gabriel Guimar_es, Alberto Ribeiro da Silva, Maria
das Graças Lisboa Pereira, Newton Augusto C. de Oliveira e Lúcia
Melo.
Quero agradecer a Barbosa Lima Sobrinho e Osny Duarte
Pereira, símbolos da nacionalidade, as sugest•es e a forma
carinhosa com a qual fui recebido para as entrevistas.
Sou grato a tantos outros amigos, que n_o se indispuseram
completamente com o autor, tantas vezes acometido da inclinaç_o
para a clausura: Maria Geralda de Miranda, Miguel Alves
Ferreira, Jonatan da Silva Lima, Maria Pinto Cecílio, Cláudio
Ferme, Etelvina Lisboa Pereira, Claudinei de Castro, Eleutéria
Amora, Maria José Dantas e Maria das Graças Coelho.
Agradeço a atenç_o dos funcionários da Secretaria de Pós-
Graduaç_o de História do IFCS; e dos digitadores responsáveis
pela cópia final deste trabalho: Eli e Renato Reis.
Em casa, agradeço o apoio e o interesse de Gonçalo,
Liduvina, José Carlos, Marta, Francisco e Marlene.
Por último, mas n_o menos importante, reconfortado pela
presença carinhosa e companheira de Aparecida Tiradentes dos
Santos, sempre paciente e inspirada nas sugest•es e co-autora do
anexo sobre as organizaç•es nacionalistas.
vi
Para meus pais, pelo apoio
primordial.
Para Rodrigo e Felipe, acreditando
na pátria mais generosa que virá.
vii E aos homens e mulheres
comprometidos com a luta pela
liberdade dos povos.
RESUMO
O tema deste trabalho é o movimento nacionalista no Brasil,
no período que vai de 1953 a 1964. Tem como objetivo analisar as
organizaç•es nacionalistas, os líderes e o discurso voltado para
sensibilizar as massas; mesmo analisando o discurso do Estado, a
ênfase se localiza nas aç•es oriundas da sociedade civil,
verificando diferentes graus de relacionamento entre ambos, em
particular, observando a perspectiva popular de apreens_o do
nacional. Desta forma, demonstrando a compatibilidade da quest_o
nacional com a teoria das classes sociais.
A construç_o simbólica será elemento importante nesta
análise: como elo unificador da vis_o de mundo subjacente ao
discurso, e como elemento-chave na popularizaç_o do
nacionalismo.
A hipótese central apresentada é que, nos anos cinqüenta, o
movimento nacionalista elabora programa bastante articulado e de
forte apelo popular, cujo maior exemplo é a criaç_o da
Petrobrás, em 1953.
Os nacionalistas elaboram discurso e desenvolvem aç•es
sintonizadas com as lutas antiimperialistas que ocorrem em todo
o mundo. Noprimeiro momento, desenvolve-se a luta pelo monopólio
estatal de energia, seguindo-se a fase onde o Estado detém a
iniciativa das aç•es - s_o os anos JK. Por último, o projeto
nacional-popular atinge o seu ponto máximo de amadurecimento.
O aumento da presença do Estado na gest_o econômica,
acompanhado da intensificaç_o da participaç_o popular, dilui o
aspecto de "ideologia de Estado" do nacionalismo e aprofunda as
contradiç•es entre o projeto nacional-popular e o processo de
expans_o estrangeira no país, tendo como desfecho o golpe
militar de 1964, quando saem vitoriosas as forças ligadas a este
outro projeto.
ix
ABSTRACT
The theme of this work is the nationalistic movement in
Brazil, during the period from 1953 to 1964. Having as its aim
to analyze the nationalistic organizations, the leaders and the
speech which was directed to touch the popular masses; even in
an analysis of the State's speech, the emphasis is placed in the
action originated in the society, being verified different
degrees of relationship between both, specifically, observing
the popular perspective to apprehend the national. Thus, showing
the compatibility of the national question with the theory of
the social classes.
The symbolic construction will be an important element in
this analysis: as an unifying link of the world's vision
underlying the speech and as a key element in the popularization
of nationalism.
The presented central hypothesis is that, in the 50's, the
nationalistic movement develop a very articulate programme with
a strong popular appeal, of which the best example is the
creation of Petrobrás, in 1953.
The nationalists elaborate speech and develop action tuned
in with the antiimperialist fight which were happening all over
the world. In the first movement, the fight for the State
monopoly of energy is developed, being followed by a phase where
the State hold the initiative in the action - those are the
Juscelino Kubitschek's years. And at last the popular national
project reach its maximum matureness grade.
The State's presence increase in the economics conduct
together with intensification of popular participation, dilute
the "State's ideology" aspect of nationalism and strengthen the
contradictions between the popular national project and the
process of foreing expansion in the country, having as an
outcome the military coup of 1964, when are victorious the
forces coonected to another project.
xi
SUM°RIO
INTRODUÇ_O .......................................... 01
1. PROGRAMA E MITO .................................. 17
1.1. A carta-testamento: simbologia e programa ... 18
1.2. As origens da simbologia ................... 30
1.3. A luta pelo monopólio estatal de energia .... 34
1.3.1. A Petrobrás: potencializaç_o de
nossas riquezas ...................... 34
1.3.2. Eletrobrás: obstáculos maiores ....... 41
1.3.3. °tomo: a autonomia adiada ............ 45
2. A FORMAÇ_O DA OPINI_O ............................ 56
2.1. JK: que nacionalismo ? ...................... 58
2.2. O nacionalismo nos partidos ................. 61
2.3. Asorganizaç•es nacionalistas:estruturae
aç_o......................................... 68
2.4. A nova marcha para oeste .................... 73
2.4.1. Plano de Metas: o Estadono planejamento
......................... 73
2.4.2. Brasília: meta-síntese enovo símbolo
.............................. 75
2.4.3. Entre o passado e futuro ............. 78
xii 3. MASSAS E PODER ................................... 88
3.1. A campanha pelas reformas de base ........... 88
3.1.1. O controle do capital estrangeiro .... 92
3.1.2. Jango: entre os planos doFMI e o
"Caminho Brasileiro" ................ 102
3.1.3. A nacionalizaç_o das refinarias:a
ampliaç_o do monopólio ............... 105
3.2. O projeto nacional-popular e o golpe de
1964 ........................................
107
CONCLUS_ES .......................................... 117
REFER_NCIAS BIBLIOGR°FICAS .......................... 122
ANEXOS .............................................. 134
8
INTRODUÇÃO
Je confesse avoir éprouvé, au
cours des annés de travail dont
voici le resultat, et ce à
maints reprises, la menace d'un
engloutissement.
Jean Plumyène
Com estas palavras o historiador francês definiu as
dificuldades enfrentadas na elaboração de sua obra Les
nations romantiques. Histoire du nationalisme: le XIXe
siécle. O estudo da questão nacional apresenta desafios desde
o primeiro momento: alguns autores chegam a negar a
possibilidade de conferir a noções como nação e povo um
status científico (01). O historiador inglês, Eric Hobsbawn,
autor de valiosas contribuições ao estudo do tema, afirma:
"As discussões em torno desse tema sensível são tão
apaixonadas, densas e confusas que a primeira tarefa do
historiador é desemaranhá-las para que o fenômeno em si
possa ser visto" (02).
Ao mesmo tempo que apresenta tais restrições, o estudo
das nações e do nacionalismo, pela sua historicidade latente,
exige a perspectiva do historiador, sem a qual correr-se-á o
risco de se deixar enganar pelos mitos nacionais. As nações
modernas procuram localizar suas origens na mais remota
antigüidade, ao se afirmarem como o oposto do construído, não
necessitariam de definições. Tão recentes na história dos
homens, parecem eternas.
8
Acompanhar a evolução dos referidos conceitos permitirá
que se afaste o anacronismo, tornando possível pensar
historicamente a nação e os nacionalismos
A naç_o, como nós a vislumbramos ainda hoje, é criaç_o
dos tempos modernos. Encontramos, entre os pensadores da
Ilustraç_o e na geraç_o que os sucedeu, reflex•es sobre o que
se pode chamar de idéia de naç_o. Por um lado, a ênfase do
político na construç_o da naç_o, presente em Rosseau e Kant;
por outro, a subordinaç_o da política ao âmbito da cultura,
presente na obra de Herder e Fichte (03). Neste momento a
idéia de naç_o está vinculada à consolidaç_o dos anseios da
burguesia em oposiç_o aos particularismos do feudalismo. É o
momento de formaç_o dos Estados-nacionais, em que se associam
as idéias de autodeterminaç_o, liberdade individual e
soberania popular. Com o intuito de ressaltar aspectos apenas
essenciais, sem estabelecer limites muito rígidos, esta fase
vai até meados do século XIX (04).
No segundo momento, a naç_o é incorporada ao discurso
progressivamente mais excludente das classes dominantes. As
classes populares s_o alijadas dos projetos de construç_o das
naç•es. É sintomático que a palavra nacionalismo surja ligada
à xenofobia e ao anti-semitismo, no final do século XIX (05).
Para Hobsbawn, o nacionalismo nasce ambíguo, pois ao mesmo
tempo que defende o direito à autodeterminaç_o, sugere que,
através de seu libertador nacional, conduziria os outros
povos também à liberdade. Tal atitude foi adaptada às
políticas conservadoras e imperialistas do final do século
XIX e início do século XX (06).
É neste quadro que a II Internacional (1889-1914) vai
desenvolver seu debate em torno da chamada quest_o nacional,
em que as matrizes da ênfase na política ou na cultura,
herdeiras do Iluminismo, nortear_o vis•es polarizadoras do
debate. De um lado Lenin (1870-1924) e o grupo a ele ligado;
de outro, os social- democratas austríacos, onde se sobressai
Otto Bauer (1881-1938).
Bauer dá um caráter historicista à sua obra que a faz
possuir um valor inegável. Situando-se no terreno do
materialismo histórico, se op•e ao conservadorismo burguês
dos mitos da "naç_o eterna" e do racismo. Para Otto Bauer, o
que distingüe uma nacionalidade da outra é o caráter nacional
(07). Josef Stálin (1879-1953), em artigo de 1913 (08) se
oporá a este reducionismo da naç_o à comunidade de cultura.
8
Outra importante participante deste debate foi Rosa
Luxemburg (1871-1919). Embora tenha escrito anteriormente
sobre o tema (09), somente a partir da coletânea de artigos
redigidos entre 1908 e 1909 tem início sua polêmica com
Lenin. O ponto de partida de Rosa e Lenin é o mesmo. Ambos
defendem o internacionalismo proletário como elemento que
supera as diferenças nacionais. A polêmica surge com a
descrença de Rosa Luxemburg nas possibilidades do
proletariado dar outro caráter ao Estado burguês (10). No
entanto, é necessário não generalizar as opiniões da autora
sobre o caso polonês. Nas suas formulações não há
incompatibilidade entre questão nacional e socialismo (11).
Lenin se destaca na medida em que compreende melhor a
ligação dialética entre internacionalismo e o direito de
autodeterminação nacional. Por outro lado, sua percepção da
historicidade do conceito de nação se traduz na sua aguda
sensibilidade para "saisir et souligne, dans chaque problème,
dans chaque contradiction, son aspect politique (...). C'est
cet aspect méthodologique que explique (entre autres)
l'impressionante actualité de la pensée de Lénine au XXe
siècle, période de l'imperialisme..." (12) (grifos do autor).
No ensaio O imperialismo, fase superior do capitalismo,
escrito em 1916, Lenin apresenta a outra face da
autodeterminação das nações - o fenômeno do imperialismo. O
autor se propõe a analisar "os laços e as relações recíprocas
existentes entre as particularidades econômicas fundamentais
do imperialismo (13) (grifos do autor). Hannah Arendt, de
certa forma, amplia este quadro de observações, ressaltando:
"A expansão como objetivo permanente e supremo da
política é a idéia central do imperialismo. Não implica
em pilhagem temporária nem na assimilação duradoura,
características da conquista" (14).
Tanto Lenin como Arendt percebem como nacionalismo e
imperialismo se relacionam dialeticamente, são faces da mesma
moeda, chegando o primeiro a distingüir nacionalismo e
autodeterminação,Lenin não usa o termo nacionalismo por sua
vinculação à xenofobia, em outra ocasião refere-se ao nacionalismo
das nações oprimidas e nacionalismo das nações opressoras (15).
Hannah Arendt vai observar como facilmente o nacionalismo da
segunda metade do século XIX se transformou em imperialismo,
graças à expansão justificada como interesse comum da nação (16).
8
A emergência das massas na política, a partir da segunda
metade do século XIX, marca a transformação da idéia de nação
em força política, assinalando o surgimento do nacionalismo
(17). A entrada em cena das classes populares remete a duas
questões: a manipulação da memória coletiva pelas classes
dominantes, constituindo o que Antônio Gramsci chama
de "biografia" nacional, com o objetivo de coesionar o
conjunto da nação em torno do sentimento nacional, e, por
outro lado, a possibilidade da apreensão da memória nacional
numa perspectiva popular (18). Gramsci observa que em muitas
línguas, "nacional" e "popular" são sinônimos, ou quase, como
nos casos alemão e russo. Para o autor, nação deve se
subordinar ao povo. Estas duas questões estão presentes na
obra de Gramsci, tanto a crítica a esta concepção romântica
da nação, como a possibilidade da construção do nacional-
popular.
A apreensão do nacional pelas classes populares
corresponde ao terceiro momento da questão nacional, quando
se torna instrumento na história da libertação política,
tanto na Europa (países eslavos, bálticos, escandinavos,
balcânicos), como na África e Ásia (19). Na América Latina e
Caribe, a construção desse projeto nacional-popular traduzir-
se-á em programas voltados para a independência econômica e à
cultura popular. Para Gramsci, só é nacional o que é popular,
e lembra autores que são compreendidos por sua
universalidade, como Shakespeare, Victor Hugo ou Tolstói,
preocupados em "captar no saber e na consciência populares
instantes de `revelação' que alteram a visão de mundo do
artista ou do intelectual..." (20). Esta leitura de Antonio
Gramsci, do nacional, associa-o às concepções predominantes
na época da II Internacional, quanto a historicidade com que
é necessário circunscrever o fato nacional, o que traz como
conseqüência a possibilidade da apreensão do nacional pelas
classes populares, ou como, na terminologia dos marxistas da
II Internacional, a questão nacional do proletariado.
Entre nós, a literatura sobre a questão nacional nos
anos cinqüenta é fortemente marcada por profunda desconfiança
em projetos que partam do Estado. De tal forma este tem sido
o alvo privilegiado nas análises. Temos os trabalhos de Caio
Navarro de Toledo, ISEB: Fábrica de Ideologias (21),
analisando a produção teórica elaborada pelos intelectuais
vinculados a esta instituição subordinada ao Ministério da
Educação e Cultura. Temos a obra de Gabriel Cohn, Petróleo e
nacionalismo, procurando interpretar o processo que conduziu
à entrada do Estado nesta área da economia nacional a partir
das relações entre os diversos grupos sociais envolvidos na
formulação do projeto: técnicos, políticos e militares, no
8
entanto, não temos ainda a história da campanha "o petróleo é
nosso", como também é incipiente a produção acerca das
manifestações de cultura popular do período (22).
A relação história e cultura tem sido analisada por
diversos autores. Para os objetivos do presente trabalho,
observaremos as contribuições de Carlos Guilherme Mota,
Ideologia da cultura brasileira; Renato Ortiz, Cultura
brasileira e identidade nacional; e Lúcia Lippi de Oliveira,
A Questão Nacional na Primeira República (23). Tanto Carlos
Guilherme Mota, como Renato Ortiz, excluem a possibilidade da
questão nacional ser compatível com a teoria marxista das
classes sociais. Ortiz refere-se a uma pluralidade de
identidades, construídas por diferentes grupos sociais.
Carlos G. Mota ressaltará o componente ideológico do aposto
nacional, considerando consciência de classe como conceito
analítico. Não me parece uma boa forma de resolver a questão.
Os dois conceitos são ideológicos e os dois podem ser
científicos. O trabalho de Lucia Lippi de Oliveira fica no
meio do caminho: não vê a questão nacional como elemento que
obscureça o conflito de classes, mas deixa claro que o
nacionalismo não "trabalha com aquilo que distingüe os homens
no espaço social". Ora, se não distingüe, uniformiza e
manipula, mas a serviço de quem ?
Arrisco-me a dizer que estes trabalhos, em particular o
último, não atentam suficientemente para esta nova dimensão
do espaço, ampliada progressivamente desde os tempos
modernos, o espaço das relações internacionais, onde nações
e organizações transnacionais se interagem, onde
nacionalismos e imperialismos medem força.
Outra reflexão sobre o tema extremamente influente é a
realizada por Marilena Chauí, que procura ressaltar o uso do
nacional associado ao discurso do poder, ou seja, do Estado
Nacional,
"pois a ideologia nacionalista é o instrumento poderoso
da unificação social, não só porque fornece a ilusão da
comunidade indivisa (a nação), mas também porque permite
colocar a divisão fora do campo nacional, isto é, na
nação estrangeira" (24).
8
O que a autora não atenta é que a partir do século XX,
em particular a partir do após II Guerra, o discurso do poder
não é mais exclusivamente o do Estado nacional. Pelo
contrário, as fronteiras nacionais começam a oferecer
empecilhos à expansão de organizações transnacionais.
Finalizando esta revisão bibliográfica, quero mencionar
dois trabalhos que possuem o mérito de situar a questão
nacional como força impulsionadora de transformações em
nossa época, à medida que se torna elemento de mobilização
popular. Trata-se de Nationalism in Brazil, de Bradford
Burns; e Presença dos Estados Unidos no Brasil, de Luiz
Alberto Moniz Bandeira. Embora com limitaç•es de proposta e
método, respectivamente, as duas obras se situam afinadas com
as reflex•es de Hobsbawn, Hans Kohn e Benedict Anderson sobre
o uso da quest_o nacional pelos movimentos de libertaç_o do
século XX (25).
O tema deste trabalho é o movimento nacionalista do
Brasil no período que vai de 1953 a 1964. Analisa as
organizaç•es sociais, os líderes e o discurso destinado a
promover coes_o em torno das teses nacionalistas; e enfatiza
as aç•es oriundas da sociedade, verificando diferentes graus
de relacionamento com o Estado, mas ressaltando a perspectiva
popular de apreens_o do nacional. Desta forma, pretendo
demonstrar a viabilidade de uma teoria das classes sociais,
em que a quest_o nacional seja importante elemento de
compreens_o.
A relaç_o classe e naç_o foi abordada a partir de dois
pressupostos: toda identidade é uma construç_o simbólica,
portanto, mito e símbolo ser_o elementos-chave na compreens_o
da formaç_o da consciência nacional. Por outro lado, a
identidade é uma imagem construída na relaç_o com o outro.
Portanto, a naç_o é construída, nessa fase, no enfrentamento
com o imperialismo, ou seja, este é o locus de sua
inteligibilidade.
No caso analisado o discurso dominante tem como base a
afirmaç_o da incapacidade de construç_o de um modelo
econômico em que a potencializaç_o das capacidades internas
seja efetivada. A construç_o do projeto nacional-popular será
o parâmetro para a compreens_o das vicissitudes do movimento
nacionalista.
8
Outro conceito fundamental na abordagem é o de
ideologia, observado na sua relaç_o com a estrutura econômica
e na possibilidade de se tornar saber universalizante,
deixando, portanto, de ser saber exclusivamente ideológico.
Quanto ao primeiro aspecto, é necessário observar a
possibilidade da ideologia se articular e se rearticular n_o
somente como resposta ao "real", mas também como conhecimento
que se volta para a realidade na forma de projetos de
manutenç_o ou transformaç_o da ordem (26).
Adam Schaff, comentando a relaç_o sujeito-objeto, fala
sobre a interaç_o entre esses dois pólos, tanto um como o
outro mantêm sua existência objetiva e real e exercem
influência mútua:
"Estainteraç_o produz-se no enquadramento da prática
social do sujeito que apreende o objeto na - e pela -
sua atividade" (27).
A quest_o nacional quando examinada neste trabalho é
vista, portanto, como resposta a condiç•es materiais que
impedem a consolidaç_o do projeto nacional-popular e como
discurso que aponta para a sua construç_o. A ideologia, no
momento em que assume seu caráter universalizante, torna-se
vis_o de mundo, forma superadora do real. A produç_o do
pensamento está, assim, sempre conectada com as modificaç•es
na vida social e material(28).
Sobre este fenômeno da reduç_o e ampliaç_o do horizonte
das ideologias, nos momentos de exercício do poder e de
conquista de ades•es, assim se refere Karl Marx:
"Com efeito,cada nova classe que toma o lugar da que
dominava antes dela é obrigada, para alcançar os fins a
que se prop•e, a apresentar seus interesses como sendo
interesse comum de todos os membros da sociedade, isto
é, para expressar isso mesmo em termos ideais: é
obrigada a emprestar às suas idéias a forma de
universalidade, e apresentá-las como sendo as únicas
racionais, as únicas universalmente válidas" (29).
8
Outro obstáculo à compreens_o dos processos políticos e
sociais do período tem sido a preocupaç_o obsessiva de alguns
autores com a forma. Na análise governantes-governados,
insiste- se no conceito de populismo como elemento
explicativo maior para o período (30). Esta ênfase na relaç_o
líder-massa obscurece a mobilizaç_o popular e o programa
nacionalista. Francisco Weffort vê a importância do movimento
nacionalista como movimento de massa, mas o desqualifica em
seguida "por emergir ao nível do Estado" (31). Pretendo
demonstrar que esta mobilizaç_o, em boa parte, se deu fora
das estruturas do Estado, e quando a intercessão Estado-
massas aconteceu foi com base em identificações
significativas e mutuamente enriquecedoras. O autor, ao
insistir que o populismo "só pode ser compreendido
adequadamente como expressão de interesses determinados de
classe" (32) (grifos do autor) quer, na verdade, afirmar que
a teoria de classes prescinde da premissa nacional (33).
O objetivo deste trabalho é, portanto, compreender a
elaboração do discurso nacionalista e sua busca de adesão,
observando a construção simbólica como elemento unificador da
visão de mundo a ele subjacente. A hipótese central é que o
nacionalismo constitui o nexo dos variados projetos,
discursos e elementos ideológicos que ocupam a cena política
do período que vai de 1953, ano de criação da Petrobrás, até
1964, quando o golpe militar interrompe o processo de
mobilização popular em torno das reformas de base, lapso
referido neste trabalho como anos cinqüenta, fazendo analogia
com a periodização de Frederic Jameson para os anos sessenta,
que considera plausível situar seu final em torno de 1972-
1974 (34).
A busca de adesão em larga escala supõe a necessidade do
uso de formas de comunicação de amplo alcance. A presente
pesquisa procurou, portanto, privilegiar fontes com tal
característica, a saber: o texto jornalístico, o discurso
político e o texto científico de divulgação.
Os dois jornais pesquisados apresentam perfis inovadores,
objetivando atingir as amplas massas da população: ambos
nacionalistas, sendo a Última Hora (1951-1991) mais vinculado
ao nacionalismo oficial. Já O Semanário (1956-1964), mais
independente. Assinale-se que o primeiro apresentou uma
proposta estética revolucionária para a época. Até a Última
Hora, os jornais editados no Brasil não eram para ser lidos
pelas classes populares
8
O debate em torno dos projetos de construção nacional
exige um certo nível de aprofundamento e permanência da
informação que os jornais não possuem. Desenvolve-se uma
literatura engajada na defesa do nacionalismo, de
características bem variadas, desde as antologias da Editora
Fulgor, até os ensaios da Coleção Cadernos do Povo
Brasileiro.
Como preocupação metodológica mais ampla, a abordagem
das fontes pressupõe o conhecimento histórico como
construção, algo muito óbvio, pois característico de todo
conhecimento, mas no caso da história, um alerta não-
desnecessário, já que suas categorias encarnam-se no processo
histórico e são atingidas pelas mudanças que no seu decorrer
acontecem. Precisa, portanto, o historiador, promover uma
reflexão incessante sobre seu objeto, nas palavras de Ernst
Cassirer:
"não são coisas nem acontecimentos, porém documentos ou
monumentos os primeiros e imediatos objetos de nosso
conhecimento científico" (35).
8
NOTAS
(01) Na defesa desse ponto de vista, ver, entre outros, Luiz
Felipe Baêta Neves, As Máscaras da Totalidade
Totalitária: memória e produç_o sociais, Rio de Janeiro,
Forense Universitária, 1988, e Francisco Weffort, O
populismo na política brasileira, 3ª ed., Rio de
Janeiro, Paz e Terra, 1980.
(02)HOBSBAWN, Eric. A Era dos Impérios: 1875-1914. 2ª ed.
Traduç_o Sieni Maria Campos e Yolanda Steidel de Toledo.
Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988, p. 92.
(03)OLIVEIRA, Lúcia Lippi de . A Quest_o Nacinal da Primeira
República. S_o Paulo, Brasiliense, 1990, pp. 32-42.
(04)Encontramos essa periodizaç_o em diversos autores: Hans
Kohn, verbete Nacionalismo, David Sills (dir.)
Enciclopedia Internacional de las Ciencias Sociales,
Madrid, Aguilar Ediciones, 1975, pp. 306-310; Eric J.
Hobsbawn, Naç•es e nacionalismo desde 1780, traduç_o de
maria Celia Paoli e Anna Maria Quirino , Rio de Janeiro,
Paz e Terra, 1990; Benedict Anderson, Naç_o e
Consciência Nacional, traduç_o Lolio L. de Oliveira, S_o
Paulo, °tica, 1989; Rogério Cerqueira Leite, Quem tem
medo do nacionalismo, S_o Paulo, Brasiliense, 1983. É
necessário registrar que Hans Kohn se equivoca ao
considerar a primeira fase já nacinalismo, quando trata-
se do surgimento da idéia de naç_o.
(05)HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Impérios, op. cit., pp. 203-
204.
(06)HOBSBAWN, Eric J. A Era das Revoluç•es: 1789-1848.
Traduç_o de Maria Tereza L. Teixeira e Marcos Penchel.
3ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1981, pp. 152-153.
(07)LOWY, Michael. Le probleme de l'histoire: Remarques de
théorie et de méthode. In HAUPT, Georges et al. (org.)
8
Les marxistes et la question nationale; 1848-1914.
Paris, Maspero, 1974, p. 385.
(08)STALIN, J. O marxismo e a questão nacional. In Obras,
vol. 2. Rio de Janeiro, Editorial Vitória, 1952.
(09)Na coletânea Les marxistes et la question nationale, são
transcritos dois textos desse período.
(10)LUXEMBURG, Rosa. A Questão Nacional e a Autonomia.
Tradução de Antonio R. Bertelli. Belo Horizonte, Oficina
de Livros, 1988, p. 64.
(11) O que podemos observar em Rosa Luxemburg é uma certa
descrença quanto à possibilidade dos Estados nacionais
constituírem-se em espaço para a luta antiimperialista,
para a autora as nações são invólucros vazios "dans
lesquels chaque periode historique et les rapports de
classes dans chaque pays coulent un contenu materiel
particuler", tal afirmação a afasta da visão que procura
enfatizar a historicidade do conceito de nação, a nação
não pode ser um invólucro vazio, pois a cada nova
situação apresenta o aspecto material anterior. Cf.
Fragment
In Oeuvres II (Écrits politiques, 1917-1918).
Présentation et traduction nouvelle de Claudie Weill.
Paris, Maspero, 1971, pp. 95-96.
(12)LOWY, Michael. Op. cit. pp. 388-389.
(13)LÉNINE, V. I. O imperialismo, fase superior do
capitalismo (ensaio popular). In Obras escolhidas, vol.
1. São Paulo, Alfa-Ômega, 1982, p. 586.
(14)ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo. Tradução de
Roberto Raposo. São Paulo, Companhia das Letras, 1989,
p. 155.
(15)Para Lenin, o termo autodeterminação nacional evita a
ambigüidade de nacionalismo, que pode significar a
opressão das nações mais fortes sobre as mais fracas.
Cf. Sobre o direito dos povos à autodeterminação, in
Obras escolhidas, op. cit., vol. 1, p. 542, e sobre a
questão das nacionalidades ou da "autonomização", op. p.
650.
8
(16)ARENDT, Hannah. Op. cit. pp. 182-183.
(17)HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Impérios, op. cit., p. 127.
(18)Para acompanhar esta abordagem ver Antonio Gramsci,
respectivamente, em El "risorgimento". Traduç_o de
Manlio Macri, Buenos Aires, Granica, 1974, pp. 91, e
Literatura e Vida Nacional. Traduç_o
Rio de Janeiro, Civilizaç_o Brasileira, 1978, pp. 105-
106.
(19)BOSI, Alfredo. Um testemunho do presente (prefácio). In
MOTA, Carlos Gulherme. Ideologia da Cultura Brasileira.
4ª ed., S_o Paulo, °tica, 1980, p.
(20)GRAMSCI, Antonio. Literatura e Vida Nacional. Op. cit.,
p.
(21)TOLEDO, Caio Navarro de. ISEB: Fábrica de Ideologias. 2ª
ed., S_o Paulo, °tica, 1982.
(22)COHN, Gabriel. Petróleo e nacionalismo. S_o Paulo, Difel,
1968. Sobre a campanha "o petróleo é nosso" temos a
síntese de Gerson Moura, A campanha do petróleo, S_o Paulo,
Brasiliense, 1986, Coleç_o Tudo é História, e O petróleo é
nosso, de Maria Augusta Tibiriçá de Miranda, Petrópolis,
Vozes, 1983, memorial que descreve a mobilizaç_o popular.
(23)ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional.
2ª ed., S_o Paulo, Brasiliense, 1986.
(24)CHAUµ, Marilena. Cultura e democracia: o discurso
competente e outras falas. 5ª ed., S_o Paulo, Cortez,
1990, p.21.
(25)BURNS, E. Bradford. Nationalism in Brazil: a historical
survey. New York, Frederick Praeger Publishers, 1968;
BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. Presença dos Estados
8
Unidos no Brasil. (séculos de história). 2ª ed., Rio de
Janeiro, Civilizaç_o Brasileira, 1978.
(26)LEFORT, Claude. As formas da história. Traduç_o de Luiz
Roberto S. Fortes e Marilena Chauí. 2ª ed., S_o Paulo,
Brasiliense, 1990, p. 298.
(27)SCHAFF, Adam. História e Verdade. Traduç_o de Maria Paula
Duarte. S_o Paulo, Martins Fontes, 1897, pp. 75-76.
(28)VILAR, Pierre. Marx e a História. In Hobsbawn, Eric.
(org.). História do Marxismo. Vol. 1, Rio de Janeiro,
Paz e Terra, 1983, p. 107.
(29)MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. A ideologia alem_ (I
Feurbach). Traduç_o de José Carlos Bruni e Marco A.
Nogueira. 8ª ed., S_o Paulo, Hucitec, 1991, p. 74.
(30)Para a análise do populismo consideramos principalmente
Francisco Weffort, O populismo na política brasileira,
3ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1980, e Sindicatos
e Política, tese de livre-docência, S_o Paulo, USP,
1972; Octavio Ianni, O Colapso do Populismo no Brasil,
4ª ed., Rio de Janeiro, Civilizaç_o Brasileira, 1978; o
trabalho de Angela de Castro Gomes, A invenç_o do
trabalhismo. S_o Paulo, Vértice, 1988, contribui para o
início de revis_o desse quadro conceitual.
(31)WEFFORT, Francisco. Sindicatos e Política. Tese
apresentada para concurso de livre-docência. S_o Paulo,
USP, 1972, p. IV 7.
(32)WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira.
Op. cit., p. 26.
(33)MORAES, Jo_o Quartim de. Le statut theorique de la notion
de dependance. In IV Seminaire Latino-Americain, CETIM,
Genève, abril de 1972. O autor critica tanto às formulaç•es
de Fernando H. Cardoso como as de Francisco Weffort. Para
8
Quartim de Moraes, Cardoso n_o critica a noç_o de "situaç_o
concreta de dependência", caindo num certo empirismo. Já a
Weffort a crítica é a partir do ponto de vista abstrato.
(34)JAMESON, Friedrich. Periodizando os anos 60. In HOLLANDA,
Heloísa Buarque de (org.). Pós-modernismo e política.
Rio de Janeiro, Rocco, 1991, p. 89.
(35)CASSIRER, Ernst. Antropologia filosófica. 2ª ed., S_o
Paulo, Mestre Jou, 1977, p. 277.
8
CAPµTULO I
PROGRAMA E MITO
"As naç•es todas s_o
mistérios. Cada uma é todo
o mundo a sós. _ m_e de
reis e avó de impérios,
vela por nós!"
Fernando
Pessoa
O nacionalismo, no Brasil, em meados da década de
cinqüenta, vive um momento de afirmaç_o. Há dois marcos desse
fortalecimento: a criaç_o da Petrobrás, em 3 de outubro de
1953 e a morte do presidente Getúlio Vargas em 24 de agosto
de 1954. Esses dois fatos est_o carregados de significados
para o programa nacionalista e sua simbologia. S_o os dois
símbolos maiores e em torno deles, constelaç•es se formam,
como as tentativas de construç_o simbólica a partir do
caráter nacional, quando se procura eleger o povo como
símbolo da naç_o. A retomada do culto aos heróis republicanos
pelos nacionalistas será outro elemento de análise do esforço
que empreenderam os nacionalistas para popularizar suas
idéias.
A busca de símbolos por parte dos nacionalistas, na
acirrada batalha dessa etapa da construç_o da naç_o,
sintetiza com dramaticidade como povo e governantes viveram
suas contradiç•es.
1.1. A carta-testamento: simbologia e programa
O documento histórico mais significativo desse período
éa carta-testamento. O gesto final de Vargas e sua última
mensagem abrem uma fenda entre as duas facç•es em luta:
8
nacionalistas e n_o-nacionalistas, e oferecem aos primeiros
sua bandeira de maior significado, agora rota e manchada de
sangue. Como n_o- nacionalistas identifico todos aqueles que
conservam um discurso de maior ou menor alinhamento com as
naç•es de industrializaç_o mais antiga, notadamente, os
Estados Unidos da América.
Morto, Vargas se transforma em bandeira. Anteriormente,
nem entre os nacionalistas tinha apoio integral. Aqueles
ligados à campanha "o petróleo é nosso" apontavam as
violências policiais, durante seu governo. Afirmam que Vargas
procurava atender às reivindicaç•es dos trustes e comprovam
ligaç•es de seus ministérios com essas corporaç•es. Nem a
criaç_o da Petrobrás é considerada, por esses setores, como
sua realizaç_o. Afirma-se, sempre, que cedeu à press_o da
opini_o pública (01).
Nelson Werneck Sodré compara Vargas a Kubitschek, ao
comentar sua posiç_o favorável à posse de JK:
"Desejava a sua posse por uma quest_o de princípio, como
desejara que Vargas cumprisse o seu mandato até o fim,
apesar de ter sérias raz•es pessoais para desejar o
contrário" (02).
Essas duas opini•es ilustram o grau de isolamento em que
se encontrava o presidente. O sucesso administrativo do
governo n_o consubstanciava-se em sucesso político. E o seu
programa político era considerado limitado pelos
nacionalistas. E qual era esse programa ?
Desde a campanha presidencial de 1950, a quest_o
nacional esteve presente nos discursos de Vargas, formando
com a reforma social o binômio da campanha (03). Esse
nacionalismo, no entanto, n_o visa a impedir a entrada do
capital estrangeiro. Vargas fala, sempre, em controle, ou
melhor, ressalta, sempre, este aspecto.
O jornal _ltima Hora, ao fazer um balanço do governo
Vargas, durante o ano de 1953, e prospectivas para o ano de
1954, apresenta este ano como o "ano decisivo para a
emancipaç_o econômica do Brasil", justificando:
8
"em fevereiro começará a funcionar, com aço fabricado na
própria usina, aço brasileiro, o segundo alto forno de
Volta Redonda, maior e com mais capacidade de produção
que o primeiro. A Companhia Hidrelétrica do Vale de São
Francisco iniciará praticamente as suas atividades..."
Cita também a Petrobrás, já estruturada e com verbas
aprovadas pelo Congresso. E conclui com a perspectiva do
projeto da Eletrobrás:
"organizada nos mesmos moldes da Petrobrás, o que
facultará ao país as maiores possibilidades de progresso
no que diz respeito à energia elétrica, problema dos
mais importantes na atual conjuntura" (04).
Nesse mesmo ano, Vargas recomendara ao Ministro da
Fazenda, Oswaldo Aranha, levantamento sobre a atuação do
capital estrangeiro no Brasil. O resultado desse trabalho
aparece no discurso de 31 de janeiro de 1954. Para Nelson
Werneck Sodré esse discurso
"desvendou o problema da remessa de lucros das empresas
estrangeiras instaladas no Brasil, na quase totalidade,
meras dependentes ou representantes dos grandes
monopólios norte-americanos. Era libelo candente, cheio
de dados concretos, mostrando a terrível chaga cancerosa
que nos corroía a vitalidade econômica e financeira.
Constituía espetáculo escandaloso e inédito ver o
próprio Presidente da República denunciar à Nação, em
pronunciamento sensacional, a exploração a que vínhamos
sendo submetidos." (05)
Vargas inicia o discurso afirmando: "Posso hoje anunciar
o meu programa de governo, programa que venho executando em
silêncio e só não o anunciei previamente porque os debates
teriam impedido sua realização." E mais adiante define sua
posição frente ao capital estrangeiro:
8
"Eu não pretendo nacionalizar nem os bens nem o capital
estrangeiro. Não pretendo encampar nem desapropriar
empresas. O que tenho o dever de evitar é a
desnacionalização do Brasil" (05a).
Desde a campanha presidencial, e desdobrando-se nos
discursos e decretos referentes ao tema, consolida-se a
posição de Vargas em defesa do controle do capital
estrangeiro, denunciando seu caráter espoliativo. No entanto,
não exclui a possibilidade de sua participação no processo de
industrialização em curso (06). Reside aqui o ponto de
separação entre o presidente e os nacionalistas militantes.
Os nacionalistas podem ser definidos por sua atuação em
duas esferas distintas: uma, voltada para a ação de persuasão
no interior do aparelho de Estado, nos Ministérios,
Comissões, Assessorias etc.; outra, dedicada à ação externa
de formação da "opinião pública". Rômulo de Almeida (Assessor
Econômico de Vargas) e Gondin da Fonseca (funcionário
aposentado do Banco do Brasil e jornalista) são,
respectivamente, exemplos dessa dupla atuação (07).
Forçosamente, Vargas estará mais próximo dessa primeira
corrente, e encontrará, na segunda, críticas à sua moderação
e conciliação.
São desse período decretos restritivos ao capital
estrangeiro. O primeiro, de janeiro de 1953; o outro, de
janeiro de 1954. Em 1952, o governo Vargas já apresentara um
decreto limitando a remessa de lucros. Essas atitudes
repercutem nas relações Brasil-Estados Unidos. A partir de
então, surgem modificações na política estadunidense,
interrompe-se a política de financiamento de governo a
governo e passa-se a incentivar os investimentos de grandes
capitais privados. Desta forma inviabiliza-se a concessão de
empréstimos negociados pela Comissão Mista Brasil-Estados
Unidos (08).
Nelson Werneck Sodré considera o posicionamento frente
ao capital estrangeiro fator relevante para a crise política
que se desencadeia a partir de meados de 1953 (09). Cibilis
da Rocha Viana vai na mesma direção:
8
"Só o temor dos grupos internacionais e nacionais de que
se consolidasse definitivamente a experiência brasileira
de desenvolvimento autônomo, sem dependência do
capitalismo monopolista multinacional, poderia
justificar toda uma série de ações coordenadas, visando
desestabilizar o Governo" (10).
No nacionalismo de Vargas encontra-se a preocupação com
a formação da unidade nacional necessária para enfrentamento
ao imperialismo. Era necessária a união nacional capaz de
fazer "uma só Nação das duas que hoje existem justapostas e
separadas, trazer enfim para o efetivo abrigo da Bandeira da
Pátria aqueles que até hoje só conhecem dos seus concidadão
mais felizes a indiferença ou a opressão" (11). As palavras
de Vargas, no século XX, se assemelham às críticas do então
futuro primeiro-ministro inglês Disraeli, quando denuncia as
"duas nações" que dividem a Grã-Bretanha no século XIX: de um
lado, a dos ricos; de outro, a dos pobres.
O antagonismo entre os que desejam o desenvolvimento
internacionalizado e os que pretendem o desenvolvimento
econômico independente se intensifica a partir de 1954 (12).
As medidas nacionalistas de Vargas fortalecem essa segunda
opção. No entanto, não são suficientes para garantir-lhe o
apoio de que necessita.
As insatisfações caminham, progressivamente, para um
único ponto: Vargas. A crise se resolve com sua redução na
pessoa do presidente:
"É em Vargas que se concentram os esforços de reviso
política, transformando-o em fonte de todas as
desavenças. Da forma como foi reduzida a crise, o
suicídio de Vargas acaba por esvaziá-la rapidamente, já
que desaparecerá o elemento ao qual foram imputadas
todas as causas de todos os problemas" (13).
8
As razões da crise se encontram, por sua vez, no
amadurecimento do programa nacionalista que Vargas expressa e
que pulsa nos movimentos nacionalistas, cuja expressão maior
é a campanha "o petróleo é nosso" e nas formulações dos
técnicos ligados à burocracia, onde se destaca a Assessoria
Econômica do segundo governo Vargas e o pessoal técnico-
militar.
No Congresso, as investigações contra Vargas adquirem
tons fortes em dois momentos: a Comissão Parlamentar de
Inquérito que investigou o jornal Última Hora e o pedido de
impeachment.
A Última Hora fora fundada em 1951, por Samuel Wainer,
primeiramente, circulando no Rio de Janeiro, depois São Paulo
e outros estados. Era decididamente o único jornal pró-
Vargas, embora não fosse o único nacionalista. Na grande
imprensa, o Diário de Notícias assumiu a defesa do monopólio
estatal do petróleo, e havia jornais nacionalistas que
mantinham uma certa distância dos governos, como O Semanário,
fundado em 1956, por Oswaldo Costa. A ligação da Última Hora
com o governo Vargas era muito grande: parte do financiamento
que permitiu sua fundação foi conseguida no Banco do Brasil.
A oposição usa este argumento para apurar possíveis
irregularidades. Em abril de 1953, instala-se a Comissão
Parlamentar de Inquérito que até início de 1954 foi um foco
de acusações contra o governo (14).
O pedido de impeachment apresentado no início de 1954,
pela União Democrática Nacional, tem um desfecho favorável ao
governo: comprova-se que não havia uma coalizão oposicionista
no Congresso capaz de derrotá-lo.
No dia 5 de agosto de 1954, ocorre o atentado da Rua
Toneleros, onde morre o major Rubens Vaz e Carlos Lacerda sai
ferido. Samuel Wainer assim descreve o impacto do
acontecimento:
"De certa forma, a tormenta apanhou os getulistas
desprevenidos. ...Depois de ver derrotada no Congresso a
proposta de impeachment de Vargas, a UDN dava a
impressão de cansaço. O antigetulismo parecia exaurido,
sem argumentos, abatido pela resistência de um homem
que apesar do assédio, continuava no poder (15).
8
A partir de então a crise se agrava progressivamente. O
próprio presidente passa a acalentar a idéia da resistência
com o sacrifício da sua vida. Aproximadamente quinze dias
antes de 24 de agosto, fora encontrada parte de uma das
versões da carta - testamento, onde estava escrito: "_ sanha
dos meus inimigos deixo o legado da minha morte". Na verdade,
não se trata de um bilhete, mas de uma versão mais pessoal da
carta (16).
A outra versão, aquela que seria divulgada amplamente,
escrita com a ajuda de Maciel Filho, era uma declaração de
resistência. Assim comenta o seu ministro da Justiça,
Tancredo Neves:
"Quando hoje a gente lê a carta, percebe que ela tanto
serve para justificar uma resistência ou um gesto de
bravura. Toda a nossa conversa um pouco antes da reunião
ministerial era uma conversa de resistência. É curioso.
Ele não foi para a reunião com o espírito do suicídio. A
idéia se implantou nele depois da reunião. Foi ali que
os ministros militares o decepcionaram. Foi sobretudo
isso, foi o balanço que ele fez da reunião. Ele era um
homem acuado " (17).
Às 8 horas da manhã do dia 24 de agosto, Vargas recebe o
ultimato das Forças Armadas, que na verdade era a sua
deposição, pois o pedido de licença apresentado não fora
aceito. Depois de ir ao seu escritório, volta aos aposentos,
e com um tiro no peito atinge o coração. Amarrara o seu
cadáver ao lado de seus assassinos (18).
A cópia divulgada foi a datilografada, que estava
encostada no abajur da mesa de cabeceira. A carta é lida por
Oswaldo Aranha para os presentes e depois, por telefone, para
a Rádio Nacional, antes das 9 horas. Passa, depois, a ser
irradiada para todo o país. O major Fitipaldi, ajudante de
ordens de Getúlio, que encontrara quinze dias antes as
anotações manuscritas de memória, referidas acima, de memória
reproduziu a frase para Vitor Costa, diretor da Rádio
Nacional (19). Era acendido nas ondas do rádio o estopim da
reação. Note-se que desde 21 de agosto, tiveram início os
8
programas radiofônicos do jornalista Eloy Dutra, em defesa de
Vargas, na rádio Mayrink Veiga (20).
O depoimento de José Américo de Almeida, escritor e
ministro da Viação do segundo governo de Vargas, ilustra as
primeiras reações à morte do presidente:
"Atingindo o palácio, rompi a onda, vendo máscaras
convulsivas e ouvindo exclamações de desespero. Filhos
do sul, afeitos a lutas mortais, em espasmos de
sensibilidades trituradas, não continham o pranto. Nunca
vi tanta lágrima. O quanto pode um ser humano sofrer,
sofria essa gente amargurada, numa dor sufocada ou
rebentando em soluços que explodiam como urros de
maldição. E lá fora, as multidões inconsoláveis
esperavam a visitação - a hora funesta dos desmaios
coletivos, decorações que não resistiam à brutalidade do
choque" (21).
Perpetrado seu último ato de vontade, Vargas desencadeia
a força subterrânea e contida da massa. Completara-se a
construção simbólica em torno de sua figura (22). Esta
síntese está muito próxima do conceito de mito como função
criadora de Georges Sorel (1847 - 1922), complexo de metas
remotas, de tensas disposições morais e a espera de um
sucesso apocalíptico... um sistema de valores e um panorama
do mundo, que inspiram e orientam os governantes ou os
aspirantes ao governo (23). Esta "animação criadora" irrompeu
às ruas das principais capitais do país. O seu gesto
paralisou os adversários e pôs em ação os seus aliados - o
povo.
Assim Samuel Wainer narra a passagem de um grupo pela
sede da Última Hora:
"Nesse momento, comecei a ouvir um rugido, feito de
milhares de vozes, que vinha das bandas da Candelária.
Olhei pela janela e vi uma multidão de manifestantes
descalços, subnutridos, feios. Gritavam Getúlio!, e
reconheci o mesmo urro medonho, assustador, com o qual
me familiarizara durante a campanha eleitoral de 1950. A
massa estacou diante do prédio da Última Hora e
exigiu que eu lhe falasse" (24).
8
A mensagem de Vargas tem grande eficácia. O gesto e o
conteúdo da carta-testamento constroem o maior mito político
da nossa história contemporânea. Pode-se afirmar que havia um
código já inscrito no imaginário, construído desde o Estado
Novo, que permitiu que a fagulha pusesse fogo na pradaria. Na
raiz do racional está o irracional; Raoul Girardet, na sua
análise dos mitos políticos de nosso tempo, chama a atenção
para o elemento acidental, a crise, a momentos de tensão e
marginalização. E, ressalta a importância da permanência
quando da figura do líder na cena política, de forma que
torne possível uma razoável sedimentação no imaginário.
Assim, o discurso de Vargas encontra ressonância estrondosa
no sentimento nacionalista latente. Girardet afirma que não
atentar para o aspecto da sacralização da política, a partir
do século XX, é correr o risco de pouco compreender a
história desse período (25).
Vargas encarna com radicalidade, nos seus últimos
momentos, o mito do salvador. Na carta-testamento assume esta
forma de exercício da autoridade política definida pelos
latinos como gravitas, "a firmeza na provação, a experiência,
a prudência, o sangue-frio, o comedimento, a moderação" (26).
Um elemento essencial, nesse modelo, é a sua doação à pátria.
Vargas ressalta este aspecto:
"Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora,
resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo
suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a
mim mesmo, para defender o povo que agora se queda
desamparado. Nada mais vos posso dar a não ser meu
sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém,
querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço
em holocausto a minha vida" (27). (os grifos são meus)
Os últimos gestos do presidente apontam sua obstinação
em resolver a crise de seu modo, caso o apoio militar lhe
faltasse. Miguel Teixeira, amigo com o qual prezava
intimidade e confiança, transmitira-lhe, no dia anterior, o
pensamento de Oswaldo Aranha, de reunir um grupo decidido a
resistir até a morte em caso de ataque. "Como Miguel Teixeira
insistisse, Getúlio perdeu a serenidade e, com punho cerrado
junto à face do amigo, disse: "Isto é um assunto pessoal meu"
(28). A convergência das insatisfações sobre ele,
exclusivamente, colabora para fortalecer a idéia de que a
saída para a crise se daria com o sacrifício de sua vida. Não
8
é uma fuga, pois agora Vargas, nas suas palavras, se encarna
na história e se oferece como estandarte de guerra:
"Escolho este meio de estar sempre ao vosso lado. Quando
a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a
energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos
vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para
a ação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome
será a vossa bandeira de luta" (29).
Vargas tem consciência da importância simbólica de seu
gesto e empresta seu nome àquela luta, o qual será a bandeira
daqueles que a prosseguiriam.
Na carta-testamento, Vargas também define seu pensamento
político no que diz respeito ao modelo econômico. Ali estão
as principais realizações de seu governo e, de forma
contundente, os obstáculos enfrentados. Enfatiza a criação da
Petrobrás:
"Quis criar a liberdade nacional na potencializado das
nossas riquezas através da Petrobrás. Mal começa esta a
funcionar, a onda de agitação se avoluma" (30).
No Congresso, encontram obstáculos a lei de lucros
extraordinários e o projeto de criação da estatal do setor
elétrico:
"A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero....A lei
de lucros extraordinários foi detida no Congresso.
...Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até
500% ao ano. Nas declarações de valores do que
importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100
milhos de dólares por ano" (31).
Esses dois pontos, mais a questão da política nuclear,
não tratada por Vargas, serão analisados a seguir.
8
O nome Getúlio e a carta são brandidos como armas de
guerra nas ruas das principais cidades do país e, no enterro,
em São Borja. E em pouco tempo já começam a merecer
interpretações por parte dos nacionalistas.
Os Cadernos do Nosso Tempo, publicação do IBESP
(Instituto Brasileiro de Estudos Sociais e Políticos), um
antecessor do ISEB, no início de 1955 apresentam sua análise,
provavelmente de autoria de Hélio Jaguaribe, em que o
articulista argumenta que o suicídio de Vargas mostrou que "o
móvel real da luta contra o Presidente Vargas e o golpe que o
havia deposto era o interesse de classe das forças
reacionárias e anti-nacionais." O gesto do presidente, por
sua vez, representa a
"luta pela emancipação econômica e social do país e,
dentro deste, de suas classes não possuidoras. Essa
mesma é também a significação que lhes dão as massas
trabalhadoras. E o que emprestou ao Presidente Vargas
esse caráter mítico de que ele se revestiu é justamente
o fato de sua vida e sua obra serem consideradas, pela
massa, de uma forma objetiva e a-histórica, como algo
que vai no puro plano da sua significação simbólica,
independentemente de suas motivações" (32).
Os membros do IBESP se situam no setor que chamei
anteriormente de técnico-burocrático do nacionalismo,
distingüindo-se dos militantes. Como já afirmei, esse setor
tem ligações mais estreitas com o Estado, é de se esperar,
portanto, mais fácil assimilação da simbologia getuliana. O
autor adverte para as limitações do programa. Falta
fundamentação teórica e aponta a solução:
"a partir desse mito, se a burguesia industrial e a
intelligentzia técnica exercerem o papel a que
historicamente estão convocados, poder-se-á empreender
com base ideológica, orientação programática e
organização política, uma ação transformadora no Brasil"
(33).
8
Escrito ainda no calor dos acontecimentos, mas
conservando o mesmo conteúdo favorável, há o artigo de Oswald
de Andrade, no Correio da Manhã, em que afirma que o
"pistoleiro" Vargas atingira "ponto extremamente importante
do momento nacional, particularmente quando conclama à luta
contra os imperialismos. " O escritor destaca que Getúlio
aponta "em testamento, um caminho que deve ser seguido - o da
luta pela emancipação nacional" (34).
O impacto da carta pode ser aquilatado nos esforços para
impedir sua divulgação e a tentativa de questionar sua
autenticidade. Ali estão a construção simbólica do
nacionalismo no seu ponto máximo e a síntese de suas
principais conquistas e obstáculos, além da identificação
clara do inimigo: o imperialismo. A partir de então, a carta
torna-se programa do PTB e parâmetro para pesar a conduta de
seus membros. Em 1957, no seu discurso na Convenção do
partido, João Goulart procura desfazer os rumores que davam
como tendo renegado o nacionalismo, depois de visita aos
Estados Unidos. Goulart afirma que o seu vade-mecum político
continuava sendo a carta-testamento de Getúlio (35). O
jornalista José Clemente, comentando o apoio do petebista
Souza Neves a Jânio e Costa Lima, que teriam cento e
cinqüenta milhões para gastar na campanha eleitoral, diz que
esse dinheiro é suficiente para "esses petebistas das
Arábias" arquivarem a carta de Getúlio (36).
A carta-testamento adquire, assim, uma função ritual. Na
estreita aproximação do mito à memória coletiva, sua divulgação
e o ritual de sua leitura no aniversário de morte de Vargas,
demonstram seu prestígio entre o povo. A memória nacional, ao
contrário da memória coletiva é produto da história social e
não da simples ritualização da tradição (37).
1.2. As origens da simbologia
As representações da nação podem voltar-se para formas
objetivas como as bandeiras, hinos nacionais, elementos da
natureza, como também podemos ter a nação representada como
povo (38). A possibilidade de associação simbólica entre
nação e povo encontra obstáculos, pois qual seria o caráter
nacional do povo brasileiro ? (39). Não teremos, portanto,
símbolos nacionais que possam dar conta deste aspecto da
representação.
8
Os nacionalistas buscarão seus símbolos na história
republicana, de forma direta, remetendo-se à sua instauração,
ou aos movimentos anti-coloniais do século XVIII, destacando-
se aqui a figura de Tiradentes (40).
É razoavelmente aceito que todo simbolismo se edifica
sobre as ruínas dos edifícios simbólicos precedentes (41).
Faz-se, necessário, portanto, observar a que valores tal
simbologia se remete.
Nos precursores e fundadores da República busca-se
inspiração. Suas qualidades como, coragem, serenidade, devem
ser imitadas. Anualmente, por ocasião do aniversário de morte
de Floriano Peixoto, o jornal O Semanário noticia as
solenidades alusivas à data. Essas solenidades são
organizadas pela Associação Benjamin Constant, Deodoro e
Floriano (ABCDEF), o Partido Socialista, o Movimento
Nacionalista Brasileiro e os Sindicatos dos Gráficos,
Bancários, Metalúrgicos e Aeroviários. É sempre lembrada a
resposta dada por Floriano à pergunta sobre como receberia a
intervenção estrangeira na Revolta da Armada: "À bala!" Para
o jornal, essa frase "exprime a energia com que os patriotas
nacionais e democratas devem liqüidar no território nacional
o capital estrangeiro colonizador..." (42).
O aniversário de morte de Tiradentes merece, também, a
mesma ritualização. Para E. R. Leach, o ritual é uma forma
privilegiada de comunicação, onde o código é decifrado na
recriação do fato, estabelecendo dessa forma sua força (43).
No dia 21 de abril de 1954, a Última Hora apresenta em
sua primeira página editorial alusivo à morte de Tiradentes.
Diz inicialmente que, por muito tempo, "este acontecimento
foi esquecido, porque sob o manto da independência política
dominavam o país remanescências muito fortes do nosso passado
colonial." Referindo-se à capacidade atual do povo vencer
seus opressores: "Sabe (o povo) que a liberdade não é uma
coisa abstrata, uma mera aspiração moral. Sabe que a
liberdade política só será completa quando a nação se sentir
livre da opressão econômica". Cita Volta Redonda, Petrobrás e
a futura Eletrobrás; a luta pela liberdade começa com a
exploração de nossas riquezas. E conclui: "Enfrentamos, com
serenidade, os perigos, como Tiradentes os enfrentou, em sua
época, até o sacrifício extremo. E temos fé que, desta vez,
os traidores, - ninguém se iluda - levarão a pior" (44). O
editorial é acompanhado por ilustrações do enforcamento de
Tiradentes: altivo, parece desafiar seus algozes. Os
nacionalistas se inclinam, portanto, para uma interpretação
8
da figura de Tiradentes que se afasta da de Cristo, pelo
menos do Cristo "adocicado da maioria das representações"
(45).
No seu discurso em Ouro Preto, por ocasião do dia 21,
Vargas também associa Tiradentes e luta nacionalista:
"É ainda a mesma bandeira (a de Tiradentes) que estamos
empunhando na luta dos nossos dias pelos supremos
interesses do Brasil. Apenas não combatemos hoje a
tirania colonial e a prepotência da metrópole longínqua.
A luta dos nossos dias é a de um governo legitimamente
constituído, de base nacionalista e popular, contra a
mentalidade negativista, que descrê do nosso futuro, das
nossas possibilidades e reservas, da capacidade criadora
da nossa gente, enfim, que não acredita no Brasil" (46).
Os movimentos nacionalistas, na década decinqüenta,est_o
preocupados com a busca das origens. Há uma intenç_o de
reconstruir ideologicamente a naç_o. A construç_o simbólica
está a serviço de um fim:a luta antiimperialista. Os heróis
nacionais d_o sentido a essa luta. N_o se trata de simples
exaltaç_o da grandeza passada (47).
Os anos cinqüenta se apresentam como retomada da luta
nacionalista. A possibilidade e o fracasso os fazem anos de
afirmaç_o e crise, renascimento e morte.É um momento de
intensa busca dos sinais e símbolos que possam auxiliar no
enfrentamento dos desafios. Como disse Marx,é nesses momentos
que "os homens conjuram ansiosamente em seu auxílio os
espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os
gritos de guerra e as roupagens, a fim de apresentar-se nessa
linguagem emprestada" (48). Assim como os revolucionários de
1789, na França, vestiram-se no passado romano, os
nacionalistas dos anos cinqüenta foram buscar nos primórdios
da República, inspiração para seus símbolos.
Os nacionalistas acreditam em valores e perspectivas
para a sociedade que os fazem se preocupar com a construção
da identidade nacional. A valorização da identidade está
vinculada ao seu programa político de transformação. O poder
que a construção da auto-imagem positiva possui, ou seja, sua
8
potencialidade em acionar mudanças, é assim sintetizada por
Jurandir Freire Costa:
"A imagem que temos de nossa identidade
nacionalé uma espécie de profecia que seauto-realiza.
Quanto mais desmoralizamos nossa identidade, mais nos
convencemos de que somos cidadãos inviáveis e mais
contribuímos para convencer os outros de que nada
podemos fazer para mudar o status quo" (49).
1.3. A luta pelo monopólio estatal de energia
1.3.1. Petrobrás: "potencialização das nossas riquezas"
A criação da Petrobrás é a maior realização do
nacionalismo no Brasil. É mito de progressiva carga
simbólica, fortalecendo a intocabilidade do monopólio estatal
do petróleo, que se mantém inabalável mesmo em tempos de onda
privatizante, como os atuais. É realização de mais de trinta
anos de luta, considerando as tentativas de exploração por
particulares na década de vinte.
A produção historiográfica sobre o petróleo no Brasil,
embora razoável, ainda não contempla uma história da campanha
"o petróleo é nosso" (50). Gabriel Cohn, em Petróleo e
Nacionalismo, aborda a criação da Petrobrás a partir das
relações significativas entre os diversos grupos sociais
envolvidos no processo: técnicos, políticos e militares.
Gerson Moura, em A Campanha do Petróleo, elabora uma síntese
do tema, registrando com relevo a participação popular.
A mobilização popular teve início em 1947 com as célebres
conferências patrocinadas pelo Clube Militar, e atinge seu auge
em 1953, com a criação da Petrobrás. Nos limites desse
trabalho, a intenção é observar em linhas gerais como os
nacionalistas defenderam e ampliaram sua conquista.
Pode-se afirmar que a campanha "o petróleo é nosso" não
acabou na criação da empresa estatal. Prosseguiu em duas
frentes: na consolidação da empresa e na construção simbólica.
8
Gondin da Fonseca alerta para a necessidade de a
campanha em prol do monopólio estatal da energia (petróleo,
eletricidade e átomo) prosseguir. Reconhece estarem os
antinacionalistas "derrotados e sem prestígio na consciência
do povo", mas dispõem ainda de uma grande força:
"dispõem os antinacionalistas, por enquanto, de todas as
estações de rádio cariocas e paulistanas, que penetram
no país inteiro; de todas as tevês; e da imensa maioria
dos jornais. Três governadores de grandes unidades
federativas - Jânio Quadros, Ildo Meneghetti e Cordeiro
de Farias - confessam-se entreguistas rubros,
escrachados, patriotas da Standard, entusiastas de "o
petróleo é deles" (51). (Esta crônica foi escrita,
provavelmente, em 1956.)
O projeto da Petrobrás foi debatido quase linha por
linha, no Congresso. Primeiramente analiso a repercussão
na opinião pública; a seguir, detenho-me no papel das
organizações nacionalistas e dos partidos na sua
criação.
Apenas dois jornais da chamada grande imprensa
defenderam o monopólio estatal do petróleo: a Última Hora e
o Diário de Notícias. No Diário de Notícias escreviam
defendendo apaixonadamente o monopólio do petróleo, Rafael
Correia de Oliveira e Osvaldo Borba. Barbosa Lima Sobrinho
afirma que suas crônicas não deixaram de influir no
posicionamento da UDN sobre o tema (52). Na Última Hora,
além da posição editoral clara do seu proprietário (53),
Francisco de Assis Barbosa mantém em coluna diária
incessante defesa do monopólio.
Os diversos depoimentos de sindicalistas alertando
para as conseqüências da demora na criação da Petrobrás,
demonstram a sua importância para os trabalhadores. No
setor de transportes, a preocupação com o possível
racionamento de gasolina e outros subprodutos petrolíferos
teria repercussões no transporte de massa. Em entrevista ao
jornal Última Hora, o diretor da Central do Brasil afirma:
8
"Aqui, por exemplo a Central do Brasil terá que sofrer
as suas duras conseqüências. Diminuindo a
circulação dos veículos auto-motivos coletivos, nossas
composições seriam mais procuradas pela população. E
sinceramente, não haveria capacidade para satisfazer a
circulação dos passageiros. Incentivar, portanto os
transportes - e para isso o petróleo entra em cena com
a sua grande parcela - é um dos imperativos do
momento. E a Petrobrás vem ao encontro dessa
emergência" (54).
O presidente do Sindicato dos Condutores Autônomos de
Veículos alerta para a ameaça de desemprego, caso o
racionamento de combustíveis e óleos lubrificantes seja
imposto. Diz que 150.000 trabalhadores podem ser atingidos.
O sindicalista diz que "há falta de patriotismo da parte dos
parlamentares que estão bloqueando o projeto do ouro negro."
Propõe a unidade de todos os grupos, partidos políticos,
"todas as correntes democráticas", para resolver o problema
do petróleo (55).
Procura-se, também, popularizar a discussão recorrendo
ao rádio. No programa Problemas e Soluções, transmitido pela
Rede Continental, aborda-se a questão do petróleo. O programa
reproduz trechos de estudiosos do assunto, como Roy Nash,
Essad Bey, Anton Zischlka, Luiz Fisher e Monteiro Lobato.
Esses autores ressaltam, por um lado, o potencial petrolífero
do Brasil, seja, por outro, as vicissitudes dos pioneiros na
exploração do petróleo no seu enfrentamento com os trustes do
petróleo: Standard Oil e a Royal Dutch & Shell (56).
No inicio da década de trinta os estudos realizados pelo
geólogo Vitor Oppenheim fortaleceram a tese da não-existência
de petróleo no subsolo brasileiro. Depois da abertura do
primeiro poço, em 1939, acrescente-se um novo elemento à
polêmica: quem teria as melhores condições de realizar sua
exploração - Estado ou a iniciativa privada ? (57). Em vista
disso a Última Hora mantém, durante o ano de 1953, constante
noticiário sobre a descoberta de novos poços. Assim,
apresenta argumento incontestável na defesa da existência e
viabilidade de sua exploração pelo Estado.
O início das perfurações do primeiro poço de petróleo do
Paraná é saudado pelo jornal. O engenheiro Plínio Catanhede,
presidente do CNP (Conselho Nacional de Petróleo), comunica
ao presidente Vargas a descoberta. O jornal registra que o
8
fato de companhias estrangeiras terem pesquisado e arrendado
terras neste estado é forte indício da existência de petróleo
(58). Em visita a poços petrolíferos da Bahia, o governador
Amaral Peixoto defende a participação de entidades privadas
de capital nacional na exploração, e ainda, "não só o Governo
como as firmas comerciais, deveriam ter o direito de
contratar com entidades estrangeiras em matéria de serviço"
(59). O governador Amaral Peixoto não era um nacionalista,
isto mostra que a peregrinação aos poços de petróleo seduzia
amplos setores. Em visita aos poços de Candeias e à refinaria
de Mataripe, Bahia, o General Juarez Távora, comandante da
Escola Superior de Guerra, afirma:
"Desde que o Governo encontre a solução política que
julgue ideal para a questão petrolífera, deveremos
apoiá-lo, intransigentemente, para que o mesmo execute a
obra" (60).
A questão já adquirira um nível tal de amadurecimento,
que mesmo setores não decididos pelo monopólio estatal do
petróleo já se inclinavam a apoiá-lo.
Nesta mesma visita, pode-se observar como o contato com
o petróleo, vê-lo jorrar, sujar as mãos no líquido que brota
da terra, adquire um tom de adesão à causa, de conversão.
Como a água do batismo, assinalando a conversão de novos
fiéis, o petróleo jorrando comprova a velha tese da
existência e seduz para a outra - a do monopólio estatal. O
general estava acompanhado de alunos da Escola, que
aplaudiram calorosamente seu discurso. O jornal detalha o
contato dos visitantes com o petróleo:
"A despeito de se tratar de um jorro simples, despido
de espetaculosidade, pois o C-50 (poço de petróleo)é
bombeado, foi indisfarçável a alegria e o entusiasmo que
contaminou a todos aqueles que apreciavam, pela primeira
vez, jorrar o petróleo brasileiro. Almirantes, generais,
brigadeiros, diplomatas, legisladores, enfim, todos os
membros da comitiva da ESG externaram a sua satisfação
ante o espetáculo que, para alguns, até então, estava no
campo da fantasia" (61).
8
Na Bahia, vários poços são inaugurados nesse ano, e em
dezembro, o engenheiro Plínio Catanhede comunica ao
presidente Vargas a descoberta de lençol petrolífero na
região do Rio Madeira, na Amazônia (62).
Poços e lençóis vão sendo descobertos. O líquido, enfim,
brotando do chão coroa a grande campanha: a primeira página
de Última Hora da edição que anunciou a fundação da Petrobrás
trazia a manchete: FUNDADA A PETROBRÁS. Abaixo uma grande
foto de Getúlio com as mãos banhadas de petróleo. Roberto
Silveira, vice- governador do Estado do Rio de Janeiro,
eleito em 1954, usa um archote iluminado com petróleo da
Bahia, nas manifestações em que participa (63).
Popularizar a campanha é um desafio constante. Após a
criação da Petrobrás, não se trata mais de provar a
existência do petróleo, mas sim da viabilidade da empresa, de
nacionalizar a importação do petróleo bruto e a distribuição.
Quanto à popularização da campanha, o Diretório Central dos
Estudantes da Universidade do Brasil decide recomendar aos
acadêmicos "que erguessem torres simbólicas de petróleo". A
nota distribuída aos jornais e nas escolas superiores, em
janeiro de 1955, afirma: "refletindo os mais puros
sentimentos patrióticos da mocidade acadêmica" e "a despeito
de todas as calúnias, da deturpação de fatos e dados visando
mistificar a opinião pública nacional e criar um clima de
ceticismo e descrença em nossas possibilidades", "os
estudantes resolveram intensificar a campanha pela tese
nacionalista na exploração do petróleo, juntamente com todo o
Povo brasileiro" (64). Atente-se para o fato de que os
estudantes dizem intensificar a campanha, não a consideravam,
de forma alguma, encerrada.
O jornal O Semanário passa, a partir de então, a
noticiar as inaugurações das torres simbólicas. No Rio de
Janeiro, o Centro Acadêmico Cândido de Oliveira inaugura, em
início de julho de 1957, torre de petróleo na Cinelândia,
"que pretende ser marco da luta pela emancipação econômica do
povo brasileiro", segundo o jornal (65). Em Alagoas, durante
uma semana nacionalista, várias autoridades locais e
representantes da Frente Nacionalista Brasileira discursam
junto a uma torre de petróleo (66). Em várias cidades do
Brasil são inauguradas torres de petróleo. Em São Paulo, é
inaugurada, no Largo de São Francisco, no dia 9 de maio de
1958, no quinto aniversário do início dos trabalhos da
Petrobrás.
8
Na cidade de São João da Boa Vista, São Paulo, por
ocasião de um comício de Carlos Lacerda, os nacionalistas
colocaram faixa de 4 metros na torre simbólica e mandaram
imprimir e distribuíram milhares de cópias da carta-
testamento (67).
A nota recomendava, também, a realização de debates e
exposições. Em janeiro de 1958, a UNE (União Nacional dos
Estudantes) organiza exposição de produtos nacionais na
Cinelândia, com stands e exibição de filmes ao ar livre.
Participam a Petrobrás, a Companhia Siderúrgica Nacional, a
Fábrica Nacional de Motores, o Instituto Nacional do Mate, o
Instituto Brasileiro do Café e o Departamento de Caça e Pesca
(68).
Ao encerrar esta seção, duas notas: primeira, a campanha
da tese do monopólio estatal do petróleo prossegue após a
criação da Petrobrás, e se desdobra para outras
reivindicações, como procuro mostrar a seguir. Segunda nota:
a historiografia sobre o petróleo procura dissociar a criação
da Petrobrás dos interesses populares. Luciano Martins afirma
que o estabelecimento do monopólio nada acrescentou à vida
das classes populares, "le monopole d'Etat sur le pétrole ne
peut pas être considéré comme une `revendication des masses',
y compris parce qu'il n'apporte rien à leur situation" (69).
O movimento não só foi massivo e influente (Barbosa Lima
Sobrinho atribui a aprovação do monopólio, em boa parte, à
influência que a campanha nacionalista teve na eleição de
deputados e senadores comprometidos com sua causa) (70), como
procurou formas de popularização de suas idéias nas torres
simbólicas de petróleo, nos debates, exposiç•es e na imprensa
nacionalista.
1.3.2. Eletrobrás: obstáculos maiores
"A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero". Assim
Vargas se refere à questão da energia elétrica na sua carta-
testamento.
Durante a Segunda Guerra, a impossibilidade de
importação tornou obsoletos e antieconômicos os equipamentos
das empresas de energia elétrica. Por outro lado, o Estado
mantinha controle sobre as tarifas. Desta forma, não tinham,
os grupos estrangeiros, controladores do setor -- Light e
8
American Power, interesse em fazer investimentos capazes de
assegurar o fornecimento de energia elétrica que o país
precisava (71).
O grupo canadense-estadunidense Brazilian Traction Light
& Power Co. Ltda era responsável pelo suprimento de energia
elétrica no eixo Rio-São Paulo, e o grupo estadunidense
American & Foreign Power C. (AMFORP) atuava em outras áreas
vitais, como o interior dos estados de São Paulo e do Rio de
Janeiro, Porto Alegre, Pelotas, Salvador, Recife, Natal e
Vitória (72).
Em 1951, os estudos da Comissão Mista Brasil-Estados
Unidos destacaram o déficit energético brasileiro; decide,
então, o governo, confiar à Assessoria Econômica da
Presidência a tarefa de equacionar o problema da energia
elétrica. Em dezembro de 1953, Vargas denuncia o obsoletismo
do sistema de concessões, responsabilizando-o pelo atraso no
desenvolvimento industrial do país. A Última Hora apresenta
as repercussões do discurso do presidente. Destaca a opinião
do líder da corrente nacionalista (embora a Frente
Parlamentar Nacionalista não tivesse sido criada, nota-se a
existência de alguma articulação entre os deputados
nacionalistas) Lúcio Bittencourt(PTB-MG). O deputado teme
pela segurança do governo, "uma vez que a ação corruptora dos
trustes é tão poderosa que não será impossível se conseguir a
repetição do golpe de 45, no qual se vê nítido o dedo
americano" (73).
Vargas envia projetos ao Congresso criando o Plano
Nacional de Eletrificação e a Eletrobrás. Em 31 de agosto de
1954, já estava constituído o Fundo Federal da Eletrificação.
Criado pela Lei nº 2308, este fundo foi gerido pelo BNDE até
a criação da Eletrobrás (1962) (74).
O principal obstáculo à criação da Eletrobrás era o fato
de que um grupo estrangeiro que dominava o processo de
produção de energia elétrica nos principais centros
econômicos do país -- a Light, possuía uma influência muito
grande dentro do governo Vargas (75) e no Congresso. O
ministro da Fazenda de Vargas, Oswaldo Aranha, e a cúpula do
BNDE também puseram obstáculo à criação da empresa (76).
O projeto permanece anos no Senado. No governo JK, a
política adotada contraria a orientação de Vargas. Barbosa
Lima Sobrinho diz que o governo Kubitschek destruiu a
primeira parte do plano de eletrificação, desviando recursos
8
nacionais, oriundos da taxa de eletrificação, para a
indústria estrangeira (Pirelli e Standard Eletric). Da mesma
forma se beneficiou a Light e a Bond and Share (ligada à
AMFORP), "prestando-se o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico a esse trabalho de desnacionalização... Furnas é um
capítulo vergonhoso de entreguismo, quando deveria ser uma
obra nacional, como Três Marias ou Paulo Afonso" (77). Osny
Duarte Pereira faz as mesmas críticas. Cita Lucas Lopes, que
nesse período (1957) era presidente do BNDE e define assim a
política de JK para o setor:
"O governo vem apoiando financeiramente a indústria
privada de eletricidade e remeteu ao Congresso um
projeto de lei que propõe medidas capazes de
restabelecer o interesse dos capitais privados nesse
setor... O governo concorda com a criação da
Eletrobrás, mas não pretende fazer dela um órgão de
monopólio estatal..."
Osny Pereira afirma que o governo constrói usinas para a
Light e Bond and Share distribuírem energia elétrica.Cita
Franklin D. Roosevelt, presidente dos Estados Unidos, fonte
absolutamente fora de suspeição, buscando argumentos: "Nunca,
enquanto eu for presidente dos Estados Unidos, o Governo
Federal abandonará sua soberania sobre as fontes de energia"
(78).
Osny Duarte Pereira afirma que foram introduzidas
emendas que desvirtuaram completamente o projeto original da
Eletrobrás. Refere-se, sobremodo, à emenda que permite
desmembrar centrais elétricas da Eletrobrás para entregá-las
aos trustes.
Comenta sobre a possibilidade de JK reverter esse
quadro:
"Ainda bem, que o Sr. Presidente da República é
permeável a esses sentimentos populares. Eis porque
ainda se espera um gesto de defesa da soberania
nacional, vetando o farrapo de Eletrobrás que transita
no Senado" (79).
8
A criação da Eletrobrás não despertou nenhuma campanha
popular, como a "o petróleo é nosso". Gondin da Fonseca chega
a falar da campanha pelo monopólio estatal da energia
(incluindo eletricidade e átomo) mas isto não é suficiente
para popularizá- la. Ela foi quase, exclusivamente, uma
batalha decidida no âmbito da burocracia.
Há apenas um momento em que essa luta encontra apoio das
massas, fazendo lembrar as concentraç•es populares da
campanha "o petróleo é nosso". Foi quando o governador do Rio
Grande do Sul, Leonel Brizola, encampou a Companhia de
Energia Elétrica Rio- Grandense, em março de 1959, pelo preço
simbólico de um cruzeiro. A Companhia era controlada pela
Bond and Share (holding filiada à AMFORP, que, por sua vez,
era ligada ao grupo Morgan). No ato da encampação, o
Secretário de Viação mandou hastear a bandeira nacional no
edifício, sob os aplausos da multidão reunida em frente ao
prédio (80).
A luta contra a Companhia vinha desde o governo Valter
Jobim. Peritos do governo do Rio Grande do Sul fizeram
tombamento dos bens da companhia e constataram a existência
de lucros estrondosos. Como explicar o serviço de péssima
qualidade dispensado ao povo riograndense ?
Barbosa Lima Sobrinho apóia a atitude do governador:
"Se o Brasil não tem o direito de se libertar dessa
situação e se, no estabelecer a indenização devida aos
mercadores de energia, não puder invalidar ou deixar de
lado as espertezas e as fraudes de contabilidade com que
se constituiu, à custa dos usuários, isto é, dos
brasileiros, um patrimônio fictício, fruto de lucros
exorbitantes dissimulados numa escrita de hábeis
extorsionários, seria então, o caso de revogar a lei do
13 de maio e de voltar para o tronco e as senzalas..."
(81).
Como se vê, trata-se de enfrentamento muito mais
complexo do que o do petróleo. Os grupos estrangeiros já
estavam implantados internamente, com apoio em diversos
setores da sociedade e da administração. O governador Leonel
8
Brizola, por sua atitude ousada, começa a se destacar como
líder nacionalista.
O deputado Euzébio Rocha, autor do substitutivo ao
projeto que criou a Petrobrás, tentara, sem sucesso, encampar
a Light. Na sua justificativa, o deputado "faz referências à
capacidade realizadora dos brasileiros, que certos grupos
procuram diminuir justamente para deixar nossas principais
fontes de riquezas exploradas por trustes estrangeiros". Cita
Volta Redonda, como exemplo de que a iniciativa estatal pode
e deve, em certos setores, se transformar em instrumentos do
progresso do país." A seguir associa industrialização,
distribuição e consumo de energia elétrica. Cita o presidente
dos Estados Unidos no período de 1933-1945, Franklin
Roosevelt, transformado em ideólogo do nacionalismo
brasileiro:
"a energia elétrica é alguma coisa mais do que
necessidade. Ela é o verdadeiro sangue vital de uma
nação industrial, sangue que deve correr abundantemente
e sem interrupção, se se quiser conservar o bem estar
social e a energia de uma nação" (82).
O projeto é aprovado na Câmara em 1960. Em 11 de junho
de 1962, João Goulart cria a Centrais Elétricas Brasileiras -
Eletrobrás. Mas a consolidação da empresa levará anos,
somente nos governos militares ela tem início.
1.3.3. Átomo: a autonomia adiada
Por que a questão nuclear não merece nenhuma referência
de Getúlio, na carta-testamento ? O presidente não quer
comentar a grande derrota de sua política nacionalista. Em
1952 e 1954, o Brasil assinara com os Estados Unidos acordos
extremamente prejudiciais a uma política autônoma no setor
(83).
O acordo de 1952 implicava a exportação de monazita e
óxido de tório (o tório, extraído da monazita, junto com o
8
urânio, é um dos minerais usados na produção de energia
nuclear) sem as compensações específicas pleiteadas pelo
Conselho Nacional de Pesquisas (CNP). Este princípio, das
compensações específicas, fora incorporado à nossa política
para o setor, em 1951, quando da criação do CNP. Significa
que o país deveria barganhar a venda de minerais atômicos
para obter informações técnicas e equipamentos. Outro
princípio também fora incorporado: haveria liberdade de
relações com outros povos, além de nosso tradicional aliado
da América do Norte. No acordo de 1952, estes dois princípios
foram derrubados.
O período é de certa tensão nas relações Brasil-Estados
Unidos. O Acordo Militar Brasil-Estados Unidos, assinado em
1952, determinava a venda de nossos minerais atômicos "in
natura" e a baixos preços, além de alinhamento incondicional
a qualquer ação de guerra dos EUA (84). Outro fator de tensão
foi a solicitação da Organização das Nações Unidas de envio
de tropas brasileiras para combater na Coréia.
A política de desenvolvimento autônomo para a energia
atômica, por ser secreta, não pôde contar com a mobilização
popular para sua sustentação. A virtual participação na
guerra, no entanto, foi repudiada com manifestações populares
no Rio de Janeiro e São Paulo (85). Embora o ministro das
Relações Exteriores de Vargas, João Neves da Fontoura, negue,
as pressões do governo dos Estados Unidos para que o Brasil
envie tropas à Coréia exigiriam atitude mais firme que a
adotada pelo ministro (86). O Brasil acaba aceitando a
situação criada pelos Estados Unidos: ou participação na
guerra ou recuo na política nuclear autônoma.
Em 1954, novo recuo: reclamando do não cumprimento, por
parte dos Estados Unidos, de parte do acordo que implicava a
compra de sais de terras raras, o governo brasileiro assina
novo acordo, trocando areias monazíticas, derivados de terras
raras e tório por trigo (87).
O principal idealizador da orientação autônoma para a
política atômica foi o Almirante Álvaro Alberto, fundador e
primeiro presidente do CNP. Álvaro Alberto procurou
estabelecer relações com outros países, já que os Estados
Unidos só se dispunham a fornecer informações e tecnologias
ultrapassadas:
"desde que iniciamos nossas conversações com a Comissão
de Energia Atômica dos EUA, foi-nos invariavelmente
8
afirmada a impossibilidade de qualquer forma
interessante de cooperação no terreno da tecnologia de
reatores, a não ser o que já fora
`desclassificado'..."(88)
Em 1953, Álvaro Alberto obtém, na França, uma usina de
produção de urânio puro; e na Alemanha, uma usina de
separação de isótopos. Com estas duas usinas o Brasil estaria
em condições de iniciar sua indústria de energia atômica .
Álvaro Alberto afirma que agiu em sintonia com o presidente
Vargas:
"Não foi somente em face das dificuldades de ordem legal
para as quais apelavam os membros da Comissão de Energia
Atômica dos EUA, que eu tomei essa providência... Tomei
essa providência por determinação do Presidente da
República, Sr. Getúlio Vargas, que foi um grande
patriota, um homem de cultura extremamente ampla e
percuciente (89).
Contudo, nada disso se concretizou. O governo Café
Filho, sob pressão de funcionários do governo dos Estados
Unidos, altera a política atômica em dois pontos essenciais:
retira do CNP o papel de negociar externamente e concede
tratamento preferencial aos EUA. Procura, também,
desestabilizar a atuação de Álvaro Alberto à frente do CNP,
levando-o a se exonerar do cargo em 2 de março de 1955 (89).
O caráter secreto dessa política torna difícil seu
trato junto às massas. Aí está uma razão para o silêncio de
Vargas. No entanto, o saldo negativo da política de seu
governo no setor, embora a opinião do presidente fosse
nacionalista, como atesta Álvaro Alberto, também o leva a
silenciar. Mas porque a opinião do presidente não se impõe ?
Os setores contrários à política autônoma estavam com
posições chaves na administração. A Orquima Estabelecimentos
Industriais Reunidos, empresa que monopolizava a maioria das
jazidas litorâneas de monazita e se opunha à referida
política, tinha um ministro no governo, o empresário paulista
Horácio Láfer, Ministro da Fazenda até 1953. Como a Light
tinha em Alzira Vargas do Amaral Peixoto sua representante
(90), na política nuclear encontra-se o governo Vargas também
8
enfraquecido internamente e não conta com a possibilidade de
um movimento de massas.
Até agora procurei mostrar como o apoio popular era
vital à afirmação do programa nacionalista. Onde foi possível
mobilizar amplas massas o programa foi vitorioso (caso da
Petrobrás). Nos outros setores (energia elétrica e energia
atômica) os projetos foram adiados. O projeto vitorioso,
ancorado numa tradição simbólica anterior, por sua vez funda
novos significados, como demonstram as inaugurações das
torres simbólicas, no período, e o lema "o petróleo é nosso",
até hoje. Apesar do adiamento da autonomia nos setores
elétrico e nuclear, este primeiro momento assinala
fortalecimento do nacionalismo. A associação nacionalismo e
política de massas, à medida que se desenvolve, cria tensões
e faz o programa aprofundar-se em aspectos essenciais, como
procurarei mostrar a seguir.
8
NOTAS
(01) MIRANDA, Maria Augusta Tibiriçá. O Petróleo é Nosso. A
luta contra o "entreguismo", pelo monopólio estatal.
Petrópolis, Vozes, 1983, p. 399.
(02) SODRÉ, Nelson Werneck. Do Estado Novo Ditadura Militar.
Memórias de um soldado. 2ª ed., Petrópolis, Vozes,
1988, pp. 192-193.
(03) LIMA SOBRINHO, Alexandre José Barbosa. Entrevista
concedida ao autor, 1992.
(04) Última Hora, 31/12/53.
(05) SODRÉ, Nelson Werneck. Do Estado Novo à Ditadura
Militar. Memórias de um soldado. 2ª ed., Petrópolis,
Vozes, 1988, p. 134.
(05a) Op. cit., p.137.
(06) Maria Celina S. D'Araújo em O Segundo Governo Vargas
(1951- 1954), Rio de Janeiro, Zahar, 1982, pp. 100-102,
afirma que o nacionalismo de Vargas não teria força para
conter a entrada do capital estrangeiro, ora Vargas não
pretende conter a entrada do capital estrangeiro, ele
quer controlá-lo.
(07) SAES, Décio. Classe média e política no Brasil. In:
FAUSTO, Boris. (org.) História Geral da Civilização
Brasileira, tomo III, vol. 10, São Paulo, Bertrand,
1986, p. 404.
(08) D'ARAÚJO, Maria Celina S. op. cit., p. 26.
(09) SODRÉ, Nelson Werneck. op. cit., pp. 134-138.
(10) VIANA, Cibilis da Rocha. Reformas de Base e Política
Nacionalista de Desenvolvimento - de Getúlio a Jango.
Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1980, p. 64.
8
(11) CARVALHO, Maria Isabel Valladão de. Ideologia e discurso
político: os projetos governamentais no período de 45 a
64. São Paulo, Tese de Doutorado, USP, 1989, p. 62. A
autora tem como elemento de análise as mensagens
presidenciais enviadas anualmente ao Congresso.
(12) IANNI, Octavio. O Colapso do Populismo no Brasil. 4ª ed.
Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1978, pp. 66-68.
(13) D'ARAÚJO, Maria Celina S. Op. cit., p. 168.
(14) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alves de (coord.).
Fundação Getúlio Vargas. Centro de Pesquisa e
Documentação de História Contemporânea. Dicionário
Histórico-Biográfico Brasileiro: 1930-1983. Rio de
Janeiro, Ed. Forense Universitária: FGV/CPDOC.
Financiamento de Estudos e Projetos. FINEP, 1984. pp.
3.390-3.394, vol. 4. Ver também WAINER, Samuel. Minha
Razão de Viver. Rio de Janeiro, Record, pp. 189-204.
(15) WAINER, Samuel. Op. cit., p. 199.
(16) Rubem Fonseca, em seu romance Agosto corrobora essa
versão do bilhete afirmando que ele é falso. Na verdade,
o major Fitipaldi, ajudante-de-ordens de Getúlio,
encontrara anotações da carta de cunho mais pessoal que
o presidente preparava, juntamente com a outra,
divulgada amplamente. Cf. SILVA, Hélio. 1954: um tiro no
coração. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1978,
p. 291, e PEIXOTO, Alzira Vargas do Amaral. Entrevista
Jornal do Brasil, 28/7/91.
(17) LIMA, Valentina da Rocha. (Coord.) Getúlio: uma história
oral. Rio de Janeiro, Record, 1986, p. 262.
(18) Esta foi uma expressão usada por Vargas em conversa com
Euzébio Rocha, questionado pelo deputado sobre a
situação, respondera: "Você não sabe como os
árabes punem os assassinos ?" Cf. LIMA, Valentina da
Rocha. Op. cit., p. 266.
(19) PEIXOTO, Alzira Vargas do Amaral. Op. cit.
(20) O Semanário, nº 93, de 15 a 21/01/58.
8
(21) SILVA, Hélio. Op. cit., pp. 280-281.
(22) Para uma síntese da construção mítica de Vargas no
período do Estado Novo ver LENHARO, Alcir. Sacralização
da política. São Paulo, Papirus/Ed. da Unicamp,1986, e
VELLOSO, Mônica Pimenta. Cultura e poder político, In:
Estado Novo, Ideologia e Poder, Rio de Janeiro, 1982.
(23) SILVA, Benedito. (coord. geral) Dicionário deCiências
Sociais. 2º ed., Rio de Janeiro, Ed. da Fundação Getúlio
Vargas, 1987, pp. 768-769.
(24) WAINER, Samuel. Op. cit., p. 206.
(25) GIRARDET, Raoul. Mitos e mitologias políticas. Trad. de
Maria Lúcia Machado. Rio de Janeiro, Cia. das Letras,
1987, p. 191.
(26) Idem, op. cit., p. 174.
(27) SILVA, Hélio. Op. cit., p. 348.
(28) Idem, ibidem, p. 268.
(29) Ibidem, p. 348.
(30) Ibidem, p. 347.
(31) Ibidem, p. 347.
(32) Cadernos do Nosso Tempo, nº 3, jan-mar. 1955,
IBESP,
pp. 21-22.
(33) Op. cit., p. 22.
(34) SILVA, Hélio. Op. cit., pp. 364-365.
(35) O Semanário, nº 79, de 10 a 17/10/57.
(36) O Semanário, nº 90, de 26 a 02/10/57.
8
(37) ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional.
2ª ed., São Paulo, Brasiliense, 1986, p. 135.
(38) HOBSBAWN, Eric. A Produção em Massa de Tradições:
Europa, 1879 a 1914. In: HOBSBAWN, E. e RANGER, T.
(org.) A invenção das tradições. Rio de Janeiro, Paz e
Terra, 1984, p. 284.
(39) RODRIGUES, José Honório. Aspirações nacionais. 2ª ed.,
São Paulo, Fulgor, 1965, p. 19-20.
(40) José Murilo de Carvalho, em A formação das almas, Rio de
Janeiro, Cia. das Letras, 1990, analisa a batalha
historiográfica em torno da figura de Tiradentes.
(41) CASTORIADIS, Cornelius. A instituição imaginária da
sociedade. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986, p. 147.
(42) O Semanário, nº 264, de 14 a 21/07/61.
(43) SILVA, Benedito. Op. cit., pp. 1081 e 1082.
(44) Última Hora, 22/04/54.
(45) CARVALHO, José Murilo de. Op. cit., p. 65.
(46) Última Hora, 22/04/54.
(47) Raoul Girardet critica o que chama de movimentos
nacionalisteiros, obcecados por esta busca das origens.
Parece-me que essa busca das origens, a mitificação dos
heróis, não é em si, politicamente, condenável. O
questionamento deve se dar em torno dos valores
embutidos na reconstrução simbólica. O Tiradentes
altivo, mesmo subversivo, se vincula à causa da
independência nacional.
Cf. GIRARDET, R. Op. cit., p. 104.
(48) MARX, Karl. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. In: Os
pensadores. 2ª ed., São Paulo, Abril Cultural, 1978, p.
329.
8
(49) COSTA, Jurandir Freire. Ser ou não ser brasileiros. In
Super-interessante, nº 5, novembro de 1991, São Paulo,
Editora Abril, p. 35.
(50) COHN, Gabriel. Petróleo e nacionalismo. São Paulo,
Difel, 1968.
(51) FONSECA, Gondin da. Senhor Deus dos Desgraçados! São
Paulo, Fulgor, 1958 (?), p. 175.
(52) LIMA SOBRINHO, Alexandre José Barbosa.Entrevista
concedida ao autor, 1992.
(53) SamuelWainer é alvo de críticas por parte de alguns
nacionalistas. Oswaldo Costa desconfia do seu
nacionalismo em vista de ligaç•es com João Neves da
Fontoura, ministro das Relaç•es Exteriores de Vargas até
1953, considerado entreguistapor aqueles. O jornal,
também destoa de seus pares quando apóia o Acordo
Militar Brasil-Estados Unidos. Cf. PASSOS, Gabriel
(org.) Antologia nacionalista: Brasileiros contra o
Brasil. São Paulo, Fulgor, 1958, p. 189, e _ltima Hora,
de 12/01/53, 15/01/53, 24/03/53 e 1º/06/53.
(54) _ltima Hora, 25/02/53.
(55) _ltima Hora, 20/02/53.
(56) _ltima Hora, 1º/09/53.
(57) Segundo Gondin da Fonseca, Monteiro Lobato (1882-1948)
se op•em ao programa nacionalista ao defender a
participação da iniciativa privada nacional na
exploração do petróleo. Para o jornalista, não seria
mais possível repetiraexperiência americana, quando
centenas de empresas se formaram para atuar no
setor,pois o grau de monopolização já atingira, no
início do século XX índices bastantes elevados.Cf.
FONSECA, Gondin da, Que sabe você sobre petróleo. Op.
cit., paffim.
(58) _ltima Hora, 08/07/53.
8
(59) _ltima Hora, 10/07/53.
(60) _ltima Hora, 17/07/53.
(61) _ltima Hora, 17/07/53.
(62) _ltima Hora, 17/07/53.
(63) O Semanário, nº 99, de 6 a 12/03/58.
(64) MIRANDA, Maria Augusta Tibiriçá. O Petróleo é Nosso. A
luta contra o "entreguismo", pelo monopólio estatal.
Petrópolis, Vozes, 1983, p. 408.
(65) O Semanário, nº 65, de 9 a 15/07/57.
(66) O Semanário, nº 80, de 17 a 24/10/57.
(67) O Semanário, nº 88, de 12 a 19/12/57.
(68) O Semanário, nº 88, de 12 a 19/12/57.
(69) MARTINS,Luciano. Pouvoir et développment économique--
formation etévolution des structures politiques
auBrésil. Paris, Antropus, 1976, pp. 348-349.
(70) LIMA SOBRINHO, Alexandre José Barbosa. Op. cit.
(71) VIANA, Cibilis da Rocha. Reformas de Base e a Política
Nacionalista de Desenvolvimento -- de Getúlio a Jango.
Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1980, pp. 46-47.
(72) ABREU, Alzira Alves de e BELOCH, Israel. Op. cit., pp.
1164- 1166, vol. 2.
(73) _ltima Hora, 21/12/53.
(74) VIANNA, Cibilis da Rocha. Op. cit., pp. 46-47.
(75) Osny Duarte Pereira comenta que o fato de Alzira Vargas
do Amaral Peixoto ser advogada da Light criava
dificuldades para a atuação de Vargas. Cf. entrevista
concedida ao autor.
8
(76) LIMA SOBRINHO, A. J. Barbosa. Desde quando somos
nacionalistas ? Rio de Janeiro, Civilização
Brasileira, 1963, p. 90.
(77) PEREIRA, Osny D. Estudos Nacionalistas: as cadeias do
imperialismo. 2ª ed., Rio de Janeiro, Conquista, 1962.
(2 vol.), pp. 79-82.
(78) PEREIRA, Osny. Op. cit., p. 185.
(79) Idem, ibidem.
(80) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Estudos Nacionalistas. Rio de
Janeiro, Civilização Brasileira, 1981, p. 37.
(81) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Op. cit., p. 42.
(82) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Op. cit., p.
(83) SALLES, Dagoberto. As razões do nacionalismo. São Paulo,
Fulgor, 1959, pp. 88 e 94-95. O livro traz o relatório
da Comissão Parlamentar de Inquérito da energia atômica
instaurada em 1956 no Congresso Nacional. Boa parte dos
dados apresentados nessa seção foram extraídos desse
relatório, de autoria do deputado Dagoberto Salles, do
PSD de São Paulo.
(84) SALLES, Dagoberto. Op. cit., pp. 94-95.
(85) Última Hora, 12/01/53, 15/02/53 e 24/03/53.
(86) Cf. SALLES, Dagoberto. As razões do nacionalismo. São
Paulo, Fulgor, 1959, pp. 77-78.
(87) SALLES, Dagoberto. Ibidem, p. 98-99.
(88) Idem, ibidem, pp. 98-99.
(89) SALLES, Dagoberto. Op. cit., p.107.
8
CAPµTULO II
A FORMAÇão DA OPINIão
Farei um cântico aestes
Estados a fim de que
nenhum Estado fique
sujeito a outro em
circunstância alguma..."
Walt
Whitman
A morte de Getúlio exige dos nacionalistas
aperfeiçoamento na sua ação junto às massas. Era necessário
conquistá-las para levar adiante seus propósitos políticos. O
debate é intenso e parte de seus protagonistas, como
assinalei no capítulo anterior, toma emprestado do passado as
roupagens que lhes vão conferir maior brilho e força.
Marilena Chauí diz que o leitor dos discursos, livros,
revistas e panfletos produzidos nesse período, tem a
impressão de ter sido "empurrado até Paris, levado aos clubes
jacobinos e girondinos, à Assembléia Nacional, à Bastilha --
a retórica brasileira era a imitação com pitadas de marxismo
e de desenvolvimentismo cepalino, da Revolução Francesa"
(01).Chauí encontra no uso de express•es como "vontade do
povo" e os "magnos interesses da nação", a evidência desse
recurso ao quadro conceitual originário do Iluminismo.
8
Os autores nacionalistas fazem questão de frisar que se
dirigem ao povo, "às amplas massas da população" (02).
Aguinaldo Marques explicita, assim, os objetivos de seu
livro:
"Que os brasileiros de todas as profiss•es, desde o
maishumilde operário até o mais altamente colocado na
pirâmidecultural e social... de todasastendências
políticas e religiosas, mas unidos pelo sentimento comum
de amorà Pátria e a seu povo, leiam-no e meditem" (03).
Sérgio Magalhães, deputado pelo PTB/DF, não está
preocupado em discutir com "economistas, administradores e
parlamentares, mas sobretudo na esperança de desvendar para
um grande contingente de brasileiros... a trama interna da
atual conjuntura econômico-financeira e suas perspectivas"
(04). Não se dirigem a uma classe social em particular, mas
ao conjunto dos cidadãos -- ao povo.
A análise do discurso oficial relativo ao período tem
sido extremamente crítica quanto ao uso de conceitos como
"povo" ou "trabalhador do Brasil". Afirma-se que, desta
forma, eliminar-se- ía diferenciaç•es essenciais, como as
diferenças de classes sociais, estabelecendo-se que a idéia
de "povo" resistiria a qualquer tentativa de definição
científica (05).
O conceito de povo se vincula ao exercício da
cidadania, constituindo-se daqueles conscientes, ou
virtualmente conscientes, de seus direitos, encontrando-se
assim o direito de autodeterminação dos povos no palco das
lutas pela ampliação da cidadania (06).
Para os nacionalistas, todos os cidadãos estão,
potencialmente, inclinados a se constituirem em povo. Gondin
da Fonseca revela uma inquebrantável fé no poder da
racionalidade. Acredita que não raro o posicionamento
antinacionalista é fruto da ignorância. Diz que não duvida da
honestidade de Juscelino, mas duvida de sua inteligência
(refere-se à mensagem que o presidente enviara reavaliando os
ativos das empresas de energia elétrica). O jornalista
comenta assim o papel dos nacionalistas:
"Esmagar a ignorância é, na realidade,o dever detodo
8
nacionalista. Indivíduos há que não podem ser
recuperados, porque estão velhos demais para mudar de
rumo. Outros podem todavia" (07).
Portanto, estão dispostos até mesmo a convencer aqueles
a que consideram "entreguistas".
2.1. JK: que nacionalismo ?
A presença de Juscelino na cena política nacional, a
partir de 1956, cria um novo referencial. Depois de Vargas,
responsável por ter legado uma forte herança nacionalista,
quais seriam as definiç•es do novo presidente nesse campo ?
"O nacionalismo que eu adoto é aquele que se baseia no
nosso desenvolvimento" (08). JK faz questão de frisar que seu
nacionalismo não se confunde com "outros". Assumindo o
discurso nacionalista está interessado em assegurar apoio na
sociedade, mobilizada pelo nacionalismo. JK afirma que o seu
nacionalismo é racional, em oposição ao emocional dos seus
adversários: "Não somos isolacionistas, não somos xenófobos,
não somos prisioneiros de nenhuma atitude mesquinha de inveja
e de nenhum sentimento estreito de temor ou rancor ante
outros povos, ante qualquer outro povo..." (09). O
nacionalismo de JK, ao enfatizar o crescimento econômico,
dilui o aspecto da relação com as naç•es mais poderosas.
Miriam Limoeiro Cardoso afirma que:
"esta visão obscurece as contradiç•es, pois o que estava
em jogo no debate político do período não eram as
relaç•es com os `outros povos' em geral, tratava-se de
discussão de relaç•es específicas de dependência a
determinado tipo de naç•es estrangeiras, especialmente
através do intercâmbio de capital, discussão essa
centrada, na época, na remessa de lucros para o exterior
e na `sangria' que isto representava para a economia
nacional" (10).
A industrialização é a solução para todos os males da
nação. Esta visão da industrialização a qualquer preço,
fazendo concess•es ao capital estrangeiro em pontos como
mineração, indústria automobilística e a cessão do território
de Fernando de Noronha para os Estados Unidos, para que
construa ali uma base de mísseis teleguiados, faz com que os
nacionalistas façam-lhe pesadas restriç•es. Nelson Werneck
Sodré afirma que o governo JK está quase integralmente
subordinado ao imperialismo (11).
8
Oswaldo Costa, jornalista proprietário de O Semanário,
comenta entrevista de JK à Última Hora, em que o presidente,
questionado sobre que rumos teria o monopólio estatal do
petróleo no seu governo, limitara-se a dizer que a Petrobrás
era lei e, portanto, cabia-lhe cumprir a lei. O jornalista
argumenta que não basta que o chefe de Estado afirme que é
pela Constituição, "porque há uma Constituição - tinha graça
se não o estivesse - mas se é constitucional. Isso é o que
importa. Ser pela Petrobrás `porque a Petrobrás é lei', meu
caro presidente, é confessar-se, na prática, `contra a
Petrobrás'" (12).
Há um setor do nacionalismo que não se alinha numa
postura crítica a JK. No ISEB ocorre uma nítida divisão:
Hélio Jaguaribe e Roland Corbisier mantêm-se fiéis à
orientação do presidente. Osny Duarte Pereira, Nelson Werneck
Sodré e Álvaro Vieira Pinto manifestarão seu desacordo diante
do "entreguismo" ou da "baixa taxa de consciência
nacionalista" do governo JK (13). No Congresso não se
encontra essa nitidez. Diante do avanço da indústria
automobilística estrangeira alguns deputados admitem
resignados que "não há outra saída" (14). Outros, como Josué
de Castro (PTB/PE), procuram defender o governo JK da
acusação de dirigismo econômico excessivo, vinda,
ironicamente, dos setores antinacionalistas. Segundo o
deputado, estes setores pretendem dominar a petroquímica, e
desta forma fazer do petróleo substituto do café, isto é,
"simples produto primário, para ser transformado no interesse
desses grupos internacionais e não no da economia do País". O
resultado da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre energia
atômica também é favorável à política de Juscelino no setor.
Mas mesmo esse apoio no Congresso é descendente no final de
seu governo, pois afasta-se da Ala Moça do PSD, de onde vinha
o apoio de pessedistas nacionalistas (15), coincidindo com o
amadurecimento do PTB nessas questões.
O termo desenvolvimentismo é de uso corrente a partir
dos anos cinqüenta, entre vários economistas que vêem, na
ajuda externa e na injeção de capitais estrangeiros, as
condições necessárias ao desenvolvimento econômico (16).
Juscelino foi o responsável por sua divulgação entre nós,
associando o termo às suas realizações. Miriam Limoeiro
Cardoso define desenvolvimentismo como, simplesmente, a
ideologia do crescimento econômico a qualquer preço,
"excluídos unicamente os meios que contrariam ideologicamente
a ordem vigente" (17). Esta ênfase na necessidade de capitais
externos distingüe o desenvolvimentismo do nacionalismo. Os
nacionalistas adotarão a tese "o capital se faz em casa"
(18). O desenvolvimentismo tratava de capturar a mística do
8
nacionalismo para implementar políticas que se afastavam dos
princípios de defesa da autonomia e independência nacional. O
aumento do nível de emprego e os aspectos "modernizantes"
trazidos pela instalação da indústria automobilística e de
eletrodomésticos criaram o clima de otimismo traduzido nessa
construção da memória coletiva sobre o período, sintetizada
pela expressão "anos dourados". Para tanto, contribuíram as
realizaç•es imediatas do governo, mesmo com implicaç•es
graves para o chamado programa nacionalista, e a
personalidade do presidente, "efusiva, espontânea e aberta"
(19), responsável por transmitir a crença nas possibilidades
do país a amplos setores da sociedade. E Brasília talvez seja
a prova maior que o presidente tenha apresentado dessa
potencialidade e o símbolo novo a contribuir para a
construção mítica de um tempo a ser resgatado.
2.2. O nacionalismo nos partidos
De que forma este debate se refletiu no sistema político
? A campanha "o petróleo é nosso" é um exemplo de que é
possível atingir amplos setores da população com teses
nacionalistas. Criada a Petrobrás, novos desafios surgem e
paira no ar uma interrogação sobre o que entendem as massas
de nacionalismo. Pesquisa de opinião pública divulgada na
época, aponta que apenas 7% da população urbana e 1% da rural
conhecem o nacionalismo e o adotam como ideologia. A maioria
dos "nacionalistas declarados" tem educação universitária e é
oriunda da classe média residente nas grandes cidades (20).
Osny Duarte Pereira apresenta outro dado para mostrar a
"amplitude da consciência nacionalista". Na Delegacia de
Ordem Política e Social havia, em 1958, 800.000 fichas de
cidadãos tidos como comunistas. Os dados são significativos
já que os adversários dos monopólios são ali considerados
comunistas (21).
A forte penetração do nacionalismo nos setores médios
leva os partidos a considerarem de forma cuidadosa seu
posicionamento frente a quest•es respaldadas em tal programa.
O caso da UDN é ilustrativo. Este partido abriga notórias
figuras contrárias ao nacionalismo, como Carlos Lacerda,
Juarez Távora e outros. No entanto, em 1957, segundo Gabriel
Passos (UDN/MG), teria um programa com "perfeita linha
nacionalista" (22). E na discussão sobre a criação da
Petrobrás, a UDN, por intermédio do deputado Bilac Pinto,
apresenta projeto favorável ao monopólio. Como já afirmei, a
atuação de jornalistas ligados a UDN, em defesa do monopólio
estatal, muito contribuiu para esse posicionamento do partido
(23). Como a UDN, o PSD também tinha sua ala reformista, a
8
chamada Ala Moça, que via de regra assumia posiç•es
nacionalistas.
Barbosa Lima Sobrinho, no entanto, relativiza esse
nacionalismo: na aprovação do projeto que criou a Petrobrás,
a UDN e o PSD compareceram profundamente desfalcados na
votação de uma emenda essencial -- a que se referia à
participação de empresas estrangeiras no trabalho de
pesquisa:
PSD ....... 42%
UDN ....... 37%
PTB ....... 54%
PR ....... 81%
PSP ....... 29%
Fonte: LIMA SOBRINHO, B. Estudos nacionalistas, p. 145.
O PTB é o partido que tem maior definição quanto ao
nacionalismo. Esta afirmação não tem como base o programa (o
da UDN também era nacionalista), mas sim o comportamento de
seus parlamentares. As eleiç•es de 1954 e 1958 fizeram surgir
parlamentares dispostos a imprimir atuação comprometida com
nacionalismo e reformas sociais, em particular a
reforma agrária (24). O PTB, especialmente, vai se beneficiar
com esta tendência: 60% dos parlamentares que fundam a Frente
Parlamentar Nacionalista, em 1956, pertencem a esta
agremiação (25).
Na XI Convenção Nacional, instalada em 1º de maio de
1959, o PTB aprova várias moç•es, entre outras, a condenação
à internacionalização da Amazônia. O Plano de Ação Política,
também aprovado na convenção, contém vários ítens
nacionalistas (26). As moç•es aprovadas na XII Convenção,
realizada em 1960, também possuem essa preocupação:
"proibição da exportação demanganês,proibiçãodas
nacionalizaç•es suspeitas", como aquelas propostas para
a Standard Oil e Light and Power, comotambém, `proibição
ao capital estrangeiro de atuar no setor farmacêutico e
defesa da Petrobrás'" (27).
8
O PTB era o partido com maior definição quanto ao
nacionalismo, mas havia entre as outras agremiações uma certa
concordância em aspectos importantes.
A forma como se desenvolveu o debate em torno do projeto
de criação da Petrobrás apresenta sinais de que se busca a
negociação. Euzébio Rocha (PTB/SP) apresenta seu substitutivo
antes a Vargas, que o apóia. Fica claro que a apresentação
pelo Executivo de projeto tão moderado fazia parte de uma
estratégia para facilitar sua aprovação.
Na concepção de Maria do Carmo Campello de Souza, a
aprovação do substitutivo de Euzébio Rocha é uma grande
exceção. A regra é o afastamento dos partidos de formulações
sobre o econômico. Reconhece, inicialmente, as peculiaridades
que assumem as questões econômico-financeiras no processo
legislativo. A matéria econômico-financeira é freqüentemente
indivisível no essencial. A autora compara com uma lei de
diretrizes e bases para a educação, que poderá ser
desmembrada em vários itens, votados separadamente. Tal
caráter retira as decisões do campo econômico-financeiro da
esfera político-partidária, situando-as no âmbito da
burocracia estatal, contribuindo, desta forma, para exagerar-
se o caráter de autonomia dos órgãos técnicos do governo
(28).
Como já afirmei, as eleições de 1954 e 1958 trouxeram
para o Congresso deputados comprometidos com o programa
nacionalista. Analisando os resultados das eleições de 1958
(legislativo e executivo estaduais), O Semanário reconhece na
eleição de Chagas Rodrigues (UDN/PTB) no Piauí; Cid Sampaio
(Coligação Oposições Unidas UDN/PTB/PSP/PTN/PSB), em
Pernambuco; Roberto da Silveira (PTB/PDC/UDN/PSB), no Estado
do Rio; Gilberto Mestrinho (PTB/PST/PSB), no Amazonas; e
Leonel Brizola (PTB), no Rio Grande do Sul, importante
vitória das "forças populares e nacionalistas". Para o
legislativo federal as votações de Fernando Ferrari (PTB), no
Rio Grande do Sul; e Josué de Castro (PTB), em Pernambuco,
são destacadas. Ferrari suplantava Carlos Lacerda como o
deputado mais votado do país, e Josué de Castro obtivera a
maior votação para deputado até agora registrada em todo o
Nordeste. Segundo o artigo, "o pleito de 3 de outubro
transgrediu os limites do puro e simples partidarismo para
transformar-se num divisor de águas: de um lado, o
nacionalismo; de outro, o entreguismo" (29).
8
A eleição de Juscelino pode ser vista como parte da
tendência assinalada anteriormente. Juscelino Kubitschek
vence as eleições de 1955 beneficiado pelo fortalecimento do
PSD e PTB após a morte de Getúlio (30). A herança getulista
incorpora-se aos partidos ligados à sua trajetória. Segundo
Amaral Peixoto, Vargas via com simpatia o nome de Juscelino.
Vencidas as resistências no interior de seu partido (há no
PSD um grupo disposto a impedir o prosseguimento da política
de Vargas), JK lança-se à campanha (31).
Convêm mencionar que a ajuda eleitoral do PTB e do PC
foi significativa. A pequena diferença entre Juscelino e
Juarez Távora deve ser debitada a estes dois partidos. Note-
se que as eleições de presidente e vice-presidente eram
separadas e João Goulart obteve mais votos que o seu
companheiro de chapa.
Outro elemento que ajudou a campanha de Juscelino foi a
apresentação de programa definindo suas propostas para
demandas da sociedade.
Já em 1960 a herança getulista se encontra razoavelmente
diluída, pois Juscelino não quer influir diretamente na
sucessão; tem os olhos voltados para 1965, e dentro de sua
estratégia o ideal é que surja um candidato de "união
nacional" (32).
O PTB, na sua XI Convenção Nacional, cogita lançar João
Goulart candidato a presidente. Jango vê com cautela tal
proposta e a convenção termina aprovando resolução que
condiciona o apoio do Partido à aceitação do programa
reformista. E este candidato será o Marechal Lott,
transformado no candidato do movimento nacionalista. A
campanha de Lott foi fomentada pela Ala Moça do PSD (grupo
que pregava a renovação do PSD, aproximando-o do programa
nacionalista). A Frente Parlamentar Nacionalista e a fração
novembrista, formada por civis e militares que participaram
ou apoiaram o movimento de 11 de novembro (33).
As campanhas eleitorais são vistas pelos nacionalistas,
independente do resultado, com otimismo. Acreditam que
tiveram êxito na campanha presidencial de 1960, quando foi
eleito Jânio Quadros:
8
"o Nacionalismo ganhou em meses o que ele levaria anos,
talvez, para conquistar. Hoje, ele é, inegavelmente, a
grande força - poderosa e incontrastável - com que os
partidos e os candidatos terão que contar daqui por
diante, nos prélios eleitorais. Milhões e milhões de
brasileiros não apenas tomaram conhecimento de seu
programa como se solidarizaram com ele" (34).
O próprio candidato das forças que se alinham na defesa
do capital estrangeiro diz ser seu objetivo
"disciplinar a remessa de rendimentos para o exterior,
que se processa de forma imoderada, irracional e
intermitente e se constitui num fator permanente de
descapitalização e sangria de divisas" (35).
Osny Duarte Pereira afirma que a defesa do nacionalismo
virou condição para que o parlamentar seja eleito (36).
O espaço dos partidos é pequeno para o movimento
nacionalista. Desde a campanha "o petróleo é nosso" dois
instrumentos têm sido usados pelos nacionalistas na batalha
pela conquista de adesão: organizaç•es não-partidárias, cujo
exemplo pioneiro é o Centro de Estudos e Defesa do Petróleo,
criado em 1948 e a imprensa, desempenhando, desde então,
papel de destaque.
Os nacionalistas insistem em frisar que não estão numa
campanha "somente sentimental". As forças que combatem são
poderosas -- os trustes e monopólios. Desta forma é
necessário razão e conhecimento da realidade brasileira (37).
Estamos de volta, na expressão de Marilena Chauí, aos clubes
jacobinos.
Adotam uma concepção de ideologia próxima, nesse momento
de conquista de ades•es, de concepção de mundo. Para
integrar as diferentes classes sociais no seu projeto
apresentam a promessa de atender os anseios dos setores
8
sociais abrigados na unidade nação. Isto significa que as
classes sociais podem ampliar a noção de ideologia, de
programa sócio-político; torna-se concepção de mundo. Esta
ampliação se dá para que suas idéias adquiram a forma de
universalidade e possam "apresentá-las como sendo as únicas
racionais, as únicas universalmente válidas" (38). No
movimento nacionalista há aqueles que vêem a questão nacional
apenas como elemento de uma concepção de mundo mais ampla --
os marxistas. Há outros que adotam o nacionalismo como a
concepção de mundo -- os nacionalistas "stricto sensu".
2.3. As organizaç•es nacionalistas: estrutura e ação
Durante o governo JK cresce a convicção de que é preciso
organizar o movimento nacionalista, de forma que pressione os
centros de decisão. Guerreiro Ramos assim se refere a esta
necessidade:
"o movimento nacional ora em organização deveria tornar-
se uma instituição militante, de ação contínua, com o
objetivo de dar a base popular necessária para a
realização do desenvolvimento econômico" (39).
Este desafio é aceito pelo movimento. De 1954 a 1962
foram criadas nada menos que treze organizaç•es destinadas a
realizar tal objetivo no território nacional.
A análise sumária da composição social de suas
diretorias reafirma a presença maciça da classe média: delas
participam, preponderantemente, militares, professores e
estudantes universitários, parlamentares e outros
profissionais de nível superior, como jornalistas e
advogados. O jornalista Clóvis Marques descreve a rotina de
trabalho de um desses grupos: inicialmente se organizam em
equipes de estudo que elaboram relatórios e os exp•em ao
grupo. Esses resultados são arquivados e tornam-se fonte de
consulta freqüente. O grupo costuma fornecer oradores para
comícios, preletores para sindicatos, orientadores de cursos
para centros acadêmicos, colaboração para jornais etc. O
autor levanta a possibilidade de que grupos assim organizados
ampliassem suas atividades, passando a assessorar
parlamentares, organizaç•es de industriais, sindicais etc. O
ISEB, organização criada por intelectuais nacionalistas, em
8
1955, chegou a ser considerada pela Frente Parlamentar
Nacionalista como seu órgão de assessoria, já que os partidos
tinham pouca formulação e não agiam de forma coordenada na
hora de discutir quest•es polêmicas (40).
Ao lado da atividade de reflexão e elaboração de estudos
sobre os chamados problemas nacionais, onde se destaquem os
debates e cursos realizados pelo ISEB e as atividades
desenvolvidas pelo CPC (Centro Popular de Cultura),há o
trabalho de mobilização de massas dos comícios e passeatas.
Em 1957, a Frente Nacionalista Brasileira, criada em
1956, por estudantes vinculados à UNE, preparou a "Marcha ao
Catete", em que entregou ao presidente Juscelino memorial com
suas reivindicações de baixa do custo de vida, defesa da
Petrobrás e independência econômica. O Semanário afirma que:
"os entreguistas tudo fizeram para que a manifestação
não se realizasse. Os jornais divulgaram que a marcha
tinha sido suspensa, faixas pregadas pela UNE,
convocando para o ato, foram arrancadas. Os sindicatos
operários foram advertidos pela Delegacia de Ordem
Política e Social de que "não tinham licença para
comparecer à demonstração dos estudantes" (41).
A manifestação contou com um desfile de carros
nacionais, faixas, cartazes e discursos aludiam à Petrobrás,
à indústria automobilística nacional e condenavam a entrega
do território de Fernando de Noronha aos Estados Unidos (42).
Em resposta à manifestação, JK assegura que:
"O petróleo brasileiro será sempre por nós explorado!
Defenderemos os minerais atômicos, as fontes de energia
em prol do Brasil. Defenderemos palmo a palmo nosso
território Juro que o governo defenderá
intransigentemente o Brasil na realização de sua obra
econômica" (43).
Outra expressiva manifestação de massas foi organizada
pela Frente de Novembro, organização criada em março de 1956,
congregando militares, petebistas, sindicalistas, comunistas
8
e parlamentares, com o objetivo de dar conteúdo político ao
movimento que assegurara a normalidade constitucional em 11
de novembro de 1955 (44). A manifestação, realizada em frente
ao Ministério da Guerra, contou com a presença de 15 mil
pessoas. As declarações do presidente da Frente, Coronel Nemo
Canabarro, alusivas à divisão nas Forças Armadas, têm como
conseqüência sua prisão e o fechamento da organização (45).
A Liga de Emancipação Nacional, fundada em 1954, por
membros do Centro de Estudos e Defesa do Petróleo, também
encontra
dificuldades no relacionamento com o governo JK, sendo
extinta em junho de 1956.
A presença de comunistas nessas organizaç•es serviu, em
alguns casos, para justificar seu fechamento, mas é exagero
pensar que as controlassem (46). Essas organizaç•es contam
com a expressiva participação de nacionalistas, que deixam
claro a intenção de se situarem acima das polarizaç•es entre
capitalismo e socialismo (47). O deputado Neiva Moreira
(PSP/MA), membro da Frente Parlamentar Nacionalista, procura
desfazer essa corrente acusação dos adversários do
nacionalismo, de que este teria se convertido em instrumento
do comunismo. Diz que o próprio Partido Comunista alertara
seus membros para o perigo do desvio nacionalista (48).
Observa-se que os nacionalistas fogem de uma etiqueta
muito restrita que revele associação com o comunismo. Assim,
pretendem evitar a partidarização do movimento. Neiva Moreira
observa ainda que a fundação de um partido nacionalista
criaria dificuldades eliminando da luta "forças muito
atuantes que já se entrosam nas organizaç•es políticas
existentes" (49).
As manifestaç•es de massa e sua relação com Estado,
permeada por tentativas de diálogo e conflitos que, em duas
ocasi•es, terminam com o silenciamento do discurso
reivindicativo, apresentam o nacionalismo emergindo fora do
Estado (50). Este dado precisa ser considerado na tentativa
de compreensão do debate ideológico do Brasil dos anos
cinqüenta, orientado até hoje por uma historiografia
desatenta para as manifestaç•es da sociedade civil.
8
Intensificando a ofensiva nacionalista, a partir de
1957, O Semanário inicia a campanha "Compre artigos
nacionais". Argumenta que boa parte dos lucros obtidos por
empresas estrangeiras são remetidos para fora do país via
pagamento de royalty. O jornalista afirma que paga-se essa
taxa, simplesmente, para se "usar determinada marca, como se
você fizesse muita questão disso". Arremata dizendo: "E a
indústria nacional não fica nada a dever à indústria
estrangeira, na qualidade de seus produtos. Em alguns casos,
até a qualidade é superior." O jornal promete publicar,
progressivamente, quais produtos industriais pertencem à
indústria de capital estrangeiro e multinacional (52) (os
grifos são do jornalista).
Disp•e-se o jornal a enfrentar o chamado complexo
colonial que tende a valorizar o que é estrangeiro. Barbosa
Lima Sobrinho diz que este sentimento existe em todas as ex-
colônias. No Brasil não existiria um sentimento profundo de
independência nacional: "entre nós ainda há um complexo
colonial, contra o qual precisamos lutar" (53). Por outro
lado, a impetuosidade do império em demonstrar seu poder é
vista pelo nacionalismo tanto como complexo de inferioridade,
resultado da "luta contra as dúvidas íntimas, de que ainda
não se libertou, como pode ser a expansão de uma vaidade, que
ainda não se acostumou de todo com as posiç•es conquistadas"
(54).
Intervindo na polêmica entre Gabriel Passos, deputado
pela UDN/MG e Jânio Quadros, na ocasião deputado pelo PTB/PN,
que atacava a construção da estrada Belém-Brasília, não
vendo sentido na construção de uma estrada no meio do mato,
chamando-a de "caminho de onças", imediatamente O Semanário
responde, investindo o animal de características valorizadas
na concepção do jornal, como "resistência ao agressor", "amor
à liberdade". Em tom de ironia, elege a onça símbolo do
nacionalismo, "melhor símbolo, portanto, não pode ser
encontrado para nossa luta do que esse nobre e belo animal,
rápido no ataque, encarniçado da defesa, corajoso, resoluto,
indomável." E concluiu: "A onça é nossa! E vem aí para
engolir os trustes estrangeiros, os entreguistas, os
traficantes de influência, os negocistas... (55).
A marcha desse debate aponta a consolidação do
nacionalismo como centro da polarização ideológica. No
governo JK chega-se ao auge desse processo, com o surgimento
de um novo personagem central, depois de Vargas, -- JK -- e
uma resposta à radicalização do nacionalismo -- o
desenvolvimentismo.
8
2.4. A nova marcha para oeste
"... só a cidade moderna oferece ao espírito humano um
ambiente onde ele pode ter consciência de si mesmo."
(Hegel)
"Os homens não são feitos para ser amontoados em
formigueiros.Quanto mais se juntam, mais se corrompem.
As cidades são o abismo da espécie humana."
(Rosseau)
2.4.1. Plano de Metas: o Estado no planejamento
A decisão de construir Brasília é atribuída ao acaso de
um comício em Goiás, no meio da campanha presidencial.
Questionado por um cidadão sobre sua decisão de cumprir a
Constituição (a Carta de 1891 estabelecia a transferência da
capital), o então candidato a presidente, Juscelino
Kubitschek, assim respondeu:
"Acabode prometer que cumprirei, na íntegra, a
Constituição, e não vejo razão para ignorar esse
dispositivo.Durantemeu qüinqüênio,farei a mudançada sede
do Governo e construirei a nova capital" (56).
O programa de governo, no entanto, já era obra bem
pensada, e foi apresentado no decorrer da campanha: era o que
passou a se chamar, no governo, Plano de Metas, sendo
Brasília eleita como a meta-síntese.
O Plano de Metas nasce sem vínculos maiores com os
partidos. A equipe de técnicos que elaborou o Plano foi
chefiada por Lucas Lopes, do PSD de Minas Gerais e antigo
colaborador de Kubitschek, e contou com a presença de membros
da assessoria econômica de Vargas (57). As inspiraç•es
primeiras do Plano partiram das análises do grupo CEPAL -
BNDE (Comissão Econômica para a América Latina da Organização
das Naç•es Unidas e Banco Nacional do Desenvolvimento
Econômico). Constituía-se de 31 metas, distribuídas em seis
grandes grupos: energia, transportes, alimentação, indústrias
de base, educação, e a meta-síntese: Brasília.
8
A grande inovação do Plano de Metas consistiu na
ampliação da racionalidade do sistema administrativo. O Plano
tinha uma visão integrada do conjunto da economia e pretendia
planejar de forma consistente o processo de substituição de
importaç•es. O controle do processo estava garantido com a
criação dos órgãos de administração paralela, instrumentos
mais ágeis, diferentes da tradicional máquina administrativa
(58).
A abertura ao capital estrangeiro e concess•es às
corporaç•es transnacionais são consideradas atitudes
condenáveis do ponto de vista nacionalista. No entanto, JK
consegue, de certa forma, neutralizar a oposição no
Congresso. No debate sobre a instalação da indústria
automobilística no Brasil, o deputado Dagoberto Salles
(PSD/SP), membro da Frente Parlamentar Nacionalista,
reconhece que deve-se apoiar sua instalação porque "não há
outra saída" (59). Barbosa Lima Sobrinho sustenta que havia
uma possibilidade de certa autonomia nessa área com o
fortalecimento da Fábrica Nacional de Motores (60).
Desde o governo Vargas há o projeto de construção de uma
indústria automobilística nacional. Em 1953, a Comissão
Nacional de Desenvolvimento Industrial já estabelecera a
proibição de importação de veículos montados (61). Este
projeto estaria sendo inviabilizado com a má administração da
FNM. O deputado Ortiz Borges (PTB/RS), da Frente Parlamentar
Nacionalista, apresenta, em 1963, projeto de lei
estabelecendo o controle governamental sobre a produção e os
preços da indústria automobilística. O projeto tem como
objetivo corrigir distorç•es dessa indústria e fortalecer a
Fábrica Nacional de Motores (62). No entanto, no governo JK,
assistimos ao enfraquecimento da capacidade decisória do
Congresso e uma certa perplexidade da FPN (63). Os
nacionalistas fora do Parlamento parecem acreditar que é
possível industrializar-se recorrendo a recursos técnicos e
equipamentos estrangeiros, e, ainda, que esta indústria pode
ser genuinamente nacional. Para ressaltar a importância do
controle nesse intercâmbio, Caio Prado Júnior lembra que os
primeiros grandes empreendimentos industriais na União
Soviética foram realizados pelos trustes. A Ford Motor
Company instalou a primeira indústria automobilistica e a
usina hidrelétrica de Dnieper foi construída pela firma
inglesa Metropolitan Vickers (64).
8
2.4.2. Brasília: meta-síntese e novo símbolo
Francisco Adolfo de Varnhagen, historiador e diplomata,
depois Visconde de Porto Seguro, é o responsável pela
divulgação contemporânea da idéia de construção de Brasília
(História Geral do Brasil, tomo II, 1834, p. 814) (65).
Varnhagem viaja ao interior do país para estudar as
possibilidades de colonização. Em 1877 escreve ao Ministério
da Agricultura louvando as condições propícias encontradas
(66) para a construção da nova capital.
Brasília situa-se, portanto, na onda de reformas
racionalizantes que atingiu, no final do século XIX e início
do século XX, cidades com Paris, Viena, São Petersburgo e Rio
de Janeiro. Belo Horizonte e Brasília representam o auge da
onda, pois trata-se não apenas de reformar, mas de se
construir novas cidades (67). Essas modificações na estrutura
espacial representam o esforço de racionalidade em altíssimo
grau: toma o Estado a decisão de reordenar o território para
melhor assegurar sua ação sobre a sociedade.
A defesa da soberania nacional talvez seja o argumento
mais consolidado para justificar a transferência da capital -
- a defesa da soberania, ao lado da defesa de um espaço
racionalizado e higienizado para o exercício do poder. O Rio
de Janeiro era freqüentemente identificado na imagem negativa
da desordem e luxúria. O nacionalista J. R. Vasconcelos
associa Rio de Janeiro ao "gozo mundano". O contato com a
natureza será capaz de regenerar "os homens do governo e
funcionários", que em Brasília "estarão em contato com o
verdadeiro Brasil, o Brasil dos cerrados, dos sertões, das
florestas, da natureza agreste que precisa ser transformada"
(68). O Rio de Janeiro representa a "cultura colonial e
litorânea" (69). Nesta concepção, as reformas de Pereira
Passos, realizadas no início do século, parecem ter sido
insuficientes para dotá-lo da racionalidade requerida. Celso
Furtado afirma que a conquista desse imenso território,
8
possibilitada pela construção de Brasília, significa romper
com as fronteiras que a economia colonial nos legou (70).
Já a defesa da soberania situa-se na "marcha para o
oeste": um de nossos primeiros cronistas já alertara para a
nociva tendência de "permanecermos como caranguejos aferrados
ao litoral" (71). O litoral, o oceano, é considerado fator
dispersivo e cosmopolita, o nacionalista luso-brasileiro Leão
Cunha, citando Malheiro Dias, afirma:
"foium prodígio `haver conseguido no contacto
desnacionalizador, cosmopolita do oceano' fundar e
desenvolver... vivaz e resistente nacionalismo nessa
fímbria de praias'... Brasília é mais uma bandeira.A
última, a mais espetacular, a mais futurante bandeira
lusíada" (72).
A "marcha para o oeste" constitui esse sonho, até então
sempre adiado, de reviver as bandeiras, agora ocupando
efetivamente as terras conquistadas na primeira expansão:
"graças à construção de Brasília começou de fato no Brasil a
realização do velho sonho da "marcha para oeste", levando a
civilização ao recôndito de regi•es que até há pouco eram
gigantescos vazios demográficos, sobre os quais se voltavam
de quando em quando os apetites de potências imperialistas"
(73). A conquista do interior significa ir de encontro aos
"legítimos interesses nacionais", é também deixar de
privilegiar a população que vive no litoral (74). A oposição
à construção de Brasília só pode situar-se, portanto, "no
conservadorismo das minorias alienadas, voltadas para a
Europa" (75).
Outro artigo, publicado em O Semanário, situa a
construção de Brasília como marco na delimitação de nossas
fronteiras, ressaltando sua importância na garantia da
soberania do Brasil na Amazônia. A ameaça de perda de
soberania na Amazônia era antiga denúncia de nacionalistas
como Artur Bernades e Artur Cesar Ferreira Reis. Em palestra
pronunciada em Três Rios, Plínio de Abreu Ramos afirma que a
construção de Brasília vai garantir a conquista da "zona mais
rica e ainda inexplorada do terrítório nacional, e desta
forma "evitar a ameaça que pesou sobre a Amazônia durante o
governo Dutra" (76).
2.4.3. Entre o passado e o futuro
8
Brasília apresenta, na sua relação com o tempo, um
paradoxo. Ao mesmo tempo em que se vincula ao futuro, ao se
constituir símbolo do desenvolvimento, a principal inspiração
de sua concepção estética é a arquitetura colonial. Pietro
Maria Bardi afirma que Niemeyer projetou a Praça dos Três
Poderes com a mesma impetuosidade que distingüiu suas
experiências anteriores no desenvolvimento das formas do
Barroco Romântico. Bardi reconhece Niemeyer como legítimo
herdeiro dos mestres barrocos (77). A herança barroca também
está presente nas esculturas realizadas por Alfredo
Ceschiatti. Esta presença se faz notar no Anjo e nos
Evangelistas que o escultor situou dentro e fora da Catedral
de Brasília. Por sua vez, os vitrais de Marianne Peretti
incorporaram amplas curvas, substituindo a tradicional
rigidez dos vitrais tradicionais (78).
Niemeyer, comentando as soluç•es que deu para os
palácios da Praça dos Três Poderes e a praça no seu conjunto,
diz que suas formas puras e geométricas garantiram
características próprias e inéditas e "uma ligação com a
velha arquitetura do Brasil Colonial; não com a utilização
simplista de elementos daquela época, mas exprimindo a mesma
intensão plástica, o mesmo amor pelas curvas e pelas formas
ricas e apuradas que tão bem a caracterizaram" (79).
A construção de uma nova cidade, com tão alto grau de
vínculo a um projeto político, ressalta a indissociabilidade
entre espaço e tempo. Para Stamo Papadaki, a cidade deveria
tentar realizar o tempo-espaço antropocêntrico -- em oposição
ao labirinto das cidades não-planejadas. Brasília surge como
cidade que não se contenta somente em crescer; busca suas
raízes no passado remoto da humanidade. "Com seus galhos
abertos em direção ao futuro, é todo um presente sem fim, sem
interrupção; o futuro já teve início e o homem histórico,
sobrecarregado, poderia deter-se aí e descansar" (80).
No presente ela coincide com a construção da "grande
nação", com o "despertar da consciência nacional" (81).
Certamente ela é um dos principais responsáveis pelo clima de
otimismo que caracterizou aquele período. O país revelava
uma potencialidade que impressionava os observadores
estrangeiros:
8
"ver serem realizadas com tanto vigor as obras atuais de
Brasília, poucos meses depois de traçados os planos para
as mesmas, representa realmente, uma experiência
alentadora para qualquer europeu. No Velho Mundo não
estamos acostumados, absolutamente, à execução tão
rápida e tão confiante de uma idéia" (82).
Roland Corbisier vê a construção de Brasília implicada
na lógica do processo de emancipação econômica e cultural.
Se assim não fosse, o governo "não teria encontrado forças
para vencer os poderosos interesses, as forças da rotina e da
inércia, o pessimismo e o desalento que, desde o início
procuraram desacreditar e impedir a realização da meta-
síntese..." (83). Nas festas de inauguração de Brasília, o
presidente parece vingar-se desses adversários representando-
os na figura do velho que na encenação denominada A Alegoria
das Três Capitais representa a rotina:
"recortado sobre o modelo daquele velho do Restelo que,
no poema de Camões, se opõe à partida de Vasco da Gama,
é semelhante em tudo a muitos deputados e senadores
contra os quais tive que lutar, para fazer a
transferência da capital" (84).
O sonho da cidade democrática, no entanto, não se
realiza. As contradições do país também ali se reproduzem.
Depois de um ano de inaugurada, Nelson Werneck Sodré assim vê
sua evolução:
"Brasília é o Brasil, em que convizinham e antagonizam o
velho e o novo, o grande e o pequeno... Representa e
retrata o Brasil que estamos vivendo, por isto mesmo. E
por isto mesmo, depois de um ano, nela aparecem o
desemprego, a miséria, a favela. Ela avançou no tempo
como concretização política e como arte, mas não podia
avançar no tempo como solução social " (85).
Osny Duarte Pereira vê no aparecimento dessas
contradições, isto é, nos contrastes entre as condições
oferecidas no Plano Piloto e as favelas da periferia, o fator
8
de despertar para uma nova consciência: a consciência da
defesa dos interesses nacionais (86).
Do seu desenho arquitetônico, o traçado mais
popularizado talvez tenha sido o das colunas do Palácio da
Alvorada; aquelas colunas que dão a impressão de flutuarem
sob o chão. A forma das colunas foi largamente difundida em
marcas industriais, capas de revistas, livros, azulejos etc.
Parece aqui encontrar-se o signo que trouxe maior significado
à industrialização ocorrida no período. Vinhas de Queiroz faz
uma interessante análise do significado da palavra alvorada e
do desenho das colunas:
"possui(a palavra) conotações desenvolvimentistas, liga-se a
idéia de surgimento de um novoBrasil
industrializado.Essas concepç•es não serão sincrônicas
ao próprio desenho das curvas que caracterizam o
palácio ? Ou,demaneiramaisgeral, os edifícios de
Brasília não serão um signo de uma filosofia do
desenvolvimento e da própria história social do Brasil
contemporâneo ?" (87).
Outro visitante estrangeiro parece ter tido essa mesma
impressão: "Au cours de leur développement,les grandes
nations ont souvent leur symbole, et sans doute Brasília est-
elle un symbole de cette sorte" (88).
Tanto Brasília como a política de industrialização de JK
e a personalidade política do presidente se constróem com
base na ponte entre o velho e o novo. Niemeyer busca na curva
e na pureza das formas do Barroco o aspecto da tradição que
incorpora na nova arquitetura. A industrialização e a
conquista do interior se remetem ao tempo das bandeiras e do
velho sonho da "marcha para o oeste". Já a personalidade de
JK incorpora seu estilo moderno de administração e
reminiscências do folclore mineiro. São mitos e projetos que,
atualizados, funcionam como elemento coesionador de
intenç•es; em torno de Brasília, os nacionalistas se
unificaram. Não há nenhuma voz discordante; fazem-se
observaç•es para a inevitabilidade da reprodução das
contradiç•es sociais na nova capital, mas o apoio é unânime.
A oposição se limita aos seus tradicionais adversários.
8
NOTAS
(01) CHAUÍ, Marilena. Cultura e democracia: o discurso
competente e outras falas. 5ª ed., São Paulo, 1990, p.
107.
(02) BASBAUM, Leôncio. Caminhos brasileiros do
desenvolvimento. São Paulo, Fulgor, 1960, p. 8.
(03) MARQUES, Aguinaldo. Fundamentos do nacionalismo. São
Paulo, Fulgor, 1960, p. 14.
(04) MAGALHÃES, Sérgio. Problemas do desenvolvimento
econômico. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1960,
p. 4.
(05) Cf. nota nº 01 da introdução ao presente trabalho.
(06) SILVA, Benedito (coord. geral). Dicionário de Ciências
Sociais. 2ª ed., Rio de Janeiro, Ed. da Fundação Getúlio
Vargas, 1987, pp. 953-955.
(07) O Semanário, nº 74, de 04 a 11/09/57.
(08) KUBITSCHEK, Juscelino. A marcha do amanhecer. São Paulo,
Bestseller, 1962, p. 114.
(09) JK - Discursos, 1956, 720, p. 234, apud Cardoso, Miriam
L. Ideologia do Desenvolvimento: JK-JQ. 2ª ed., Rio de
Janeiro, Paz e Terra, 1978, p. 196.
(10) CARDOSO, Miriam L. Op. cit., p. 196.
(11) SODRÉ, Nelson Werneck. Do Estado Novo à Ditadura
Militar; Memórias de um soldado. 2ª ed., Petrópolis,
Vozes, 1988, p. 214.
8
(12) O Semanário, nº 65, de 04 a 11/07/57.
(13) TOLEDO, Caio Navarro de. ISEB: Fábrica de Ideologias. 2ª
ed., São Paulo, °tica, 1982, p. 149.
(14) CASTRO, Josué de. Dirigismo econômico e
nacionalismo. (Discurso proferido na Câmara Federal em
20/07/57)Riode Janeiro, Imprensa Nacional, 1957, p. 11.
(15) MARAM, Sheldon. Op. cit., p. 107.
(16) BOUDON, Raymond. Ideologia. São Paulo, °tica, 1989, pp.
225- 226.
(17) CARDOSO, Miriam L. Op. cit., p. 421.
(18) Esta expressão foi cunhada por Ragnar Nurkse, Problemas
de Formación de Capital, México, 1955.
(19) MARAM, Sheldon. Op. cit., p. 101.
(20) RODRIGUES, José Honório. Aspiraç•es nacionais. 2ª ed.,
São Paulo, Fulgor, 1965, pp. 31-32.
(21) PEREIRA, Osny Duarte. Estudos Nacionalistas: as cadeias
do imperialismo no Brasil. 2ª ed., Rio de Janeiro,
Conquista, 1962. 2 vol., p. 264.
(22) O Semanário, de 12 a 19/12/57.
(23) Cf. capítulo I deste trabalho.
(24) DELGADO, Lucilia de A. Neves. PTB: Do Getúlio ao
Reformismo (1945-1964). São Paulo, Marco Zero, 1989, p.
210. Sobre o PTB ver Mendes, Marly Lucília."O Partido é
V. Exª!"... (A evolução do PTB, 1945-1964). Dissertação
de Mestrado, Rio de Janeiro, UFRJ, 1987, e D'Araújo,
Maria Celina Soares. A ilusão trabalhista. Tese de
Doutorado, Rio de Janeiro, IUPERJ, 1989.
8
(25) DELGADO, Lucilia de A. Neves. Op. cit., pp. 207-211 e
237- 240.
(26) D'ARAÚJO, Maria Celina Soares. Op. cit., pp. 181-182.
(27) Id. ibid. , p. 190.
(28) SOUZA, Maria do Carmo C. Campello de. Estado e partidos
políticos no Brasil (1930 a 1964). São Paulo, Alfa-
ômega, 1976, p. 56. Este trabalho analisa em que medida
o Estado condiciona o sistema partidário, concluindo
que este condicionamentoé caracterizado pela tendência
autoritáriae centralizadora do período anterior a
1945.Ver também, LIMA JR., Olavo Brasil de. Os partidos
políticos Brasileiros:a experiência federal e regional:
1945/64. Trad.de Gustavo Aronowick, Rio de Janeiro,
Ediç•es Graal, 1983.
(29) O Semanário, nº 131, de 16 a 23/10/58.
(30) D'ARAÚJO, Maria Celina Soares. O Segundo Governo Vargas
(1951-1954). Rio de Janeiro, Zahar, 1982, p. 169.
(31) MARAM, Sheldon. Juscelino Kubitschek e a política
presidencial. In: GOMES, Angela de Castro (org.) O
Brasil de JK. Rio de Janeiro, Ed. da Fundação Getúlio
Vargas/CPDOC, 1991, p. 105.
(32) MARAM, Seldon. Op. cit., p. 108. Este candidato de
"união nacional" seria Juracy Magalhães, líder da UDN.
(33) D'ARAÚJO, Maria Celina S. A ilusão trabalhista. O PTB de
1945-1965. Rio de Janeiro, Tese de Doutorado, IUPERJ,
1989, p. 187.
(34) O Semanário, nº 231, de 08 a 14/10/60.
(35) Jornal do Brasil, 20.09.60.
(36) PEREIRA, Osny Duarte. Op. cit., p. 228.
8
(37) Ver nesse sentido PASSOS, Gabriel de R. (org.Antologia
nacionalista. São Paulo, Fulgor, 1958, p. XII, e
MIRANDA, Maria Augusta Tibiriçá. O petróleo é nosso.
Petrópolis, Vozes, 1983, pp. 416-417, onde a autora
reproduz discurso do vice-governador Roberto da
Silveira.
(38) MARX, K. e ENGELS, F. A Ideologia Alem_ (Feuerbach). 8ª
ed. Trad.de José Carlos Bruni e Marco A. Nogueira. São
Paulo, Hucitec, 1991, p. 74.
(39) O Semanário, nº 65, de 09 a 15/07/57.
(40) MAGALHÃES, Sérgio. (depoimento, 1978) Rio deJaneiro,
FGV/CPDOC História Oral, 1983.
(41) O Semanário, nº 74, 04 a 11/09/57.
(42) Op. cit.
(43) Idem.
(44) Ibidem.
(45) D'ARAÚJO, Maria Celina Soares. Op. cit., pp. 163-165.
(46) Maria Victoria Benevides,O governo Kubitschek. 3ª ed.,
Rio de Janeiro, Paz e Terra, p. 98, exagera ao afirmar
que a Liga de Emancipação Nacional era uma organização
comunista. Na verdade, a autora parece endossar o
argumento do governo para o fechamento da entidade.
(47) O Semanário, nº 145, de 29/01 a 04/02/59.
(48) OSemanário, nº 73, de 28/08 a 04/09/57. Sobre as
formulaç•es dos comunistas no Brasil, sobre a questão
nacional, ver CARONE, Edgard. O PCB. São Paulo, Difel, 2
v, 1983, e Prado Jr., Caio. A Revolução Brasileira. 5ª
ed. São Paulo, Brasiliense, 1977.
8
(49) O Semanário, nº 73, de 28/08 a 04/09/57.
(50) Francisco Weffort só refere-se ao nacionalismo elaborado
pelo Estado, op. cit., p. 40.
(51) HOBSBAWN, Eric. A Era do Capital: 1848-1871. 4ª ed., Rio
de Janeiro, Paz e Terra, 1982, pp. 113-154.
(52) O Semanário, nº 70, de 09 a 16/08/57.
(53) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Estudos Nacionalistas. Rio de
Janeiro, Civilização Brasileira, 1981, p. 79.
(54) LIMA SOBRINHO, A. J. Barbosa. Desde quando somos
nacionalistas ? Rio de Janeiro, Civilização Brasileira,
1963 (Coleção Cadernos do Povo Brasileiro), p. 123. O
termo complexo colonial tem origem nas observações de
Frantz Fanon sobre as conseqüências da dominação
européia na África. Cf. FANON, Frantz. Os Condenados da
Terra. 2ª ed., Tradução de José L. de Melo. Rio de
Janeiro, Civilização Brasileira, 1979.
(55) O Semanário, nº 150, de 12 a 18/03/59.
(56) Nosso século 1945/1960.A era dos Partidos. São Paulo,
Abril Cultural, 1980, p. 207.
(57) LAFER, Celso. O planejamento no Brasil. Observações
sobre o Plano de Metas (1956-1961). In: MINDLIN, Betty
L. Planejamento.
(58) LAFER, Celso. Estado e sociedade no Brasil: problemas de
planejamento. In: Argumento, ano 1, nº 2, novembro de
1973, p. 41.
(59) MARTINS, Luciano. Pouvoir et développment économique
formation et évolution des structures politiques au
Brésil. Paris, Antropus, 1976, pp. 432-433.
(60) LIMA SOBRINHO, A. J. Barbosa. Entrevista concedida ao
autor, fevereiro de 1992.
8
(61) Última Hora, 06/06/53.
(62) O Semanário, de 25/04 a 10/05/63.
(63) MARTINS, Luciano. Op. cit., pp. 432-433.
(64) PASSOS, Gabriel. (org.) Op. cit., pp. 60-61.
(65) VARNHAGEM, Francisco Adolfo. História Geral do Brasil.
Tomo 11, 1854, p. 814, citado por ALMEIDA, Theodoro
Figueira de. Brasília: a cidade histórica da América.
Riode Janeiro, s/ed., 1960, p. 19.
(66) FREIRE,José de Maring.A mudança da Capital é uma
aspiração Secular. Separata do nº VI da Revista do
Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais. Belo
Horizonte, Imprensa Oficial, 1959.
(67) BOMENY, Helena. Op. cit., pp. 148-151.
(68) VASCONCELOS, J. R. Brasília, peça de política
nacionalista. In: Revista Brasiliense, nº 14, nov/dez.
1957, pp. 174-175.
(69) CORBISIER, Roland. Op. cit., p. 54.
(70) FURTADO, Celso. A pré-revolução brasileira. Rio de
Janeiro, Fundo de Cultura, p. 115.
(71) SALVADOR, Frei Vicente do. História do Brasil (1500-
1627). 5ª ed., São Paulo, Melhoramentos, 1965.
(72) LEão, Cunha. Brasília: última bandeira. Lisboa, Separata
do nº 12 da revista Tempo Presente, 1960, pp. 5-10.
Alcir Lenharo, em Sacralização da Política, São Paulo,
Edit. Unicamp/Papirus, 1986, analisa a "cruzada" da
Marcha para Oeste, tanto no plano discursivo quanto das
justificativas administrativas. Para o autor, este tema
constitui um bom exemplo da fabricação de imagens
associadas à nação,ver particularmente pp. 53-74.
8
(73) Diário da Noite, 19/01/60.
(74) Brasil. Presidênciada República, Serviço de
documentação. Brasília e a opinião nacional, 1960. Rio
de Janeiro, Presidência... 1960, p. 25.
(75) RODRIGUES, José Honório. Op. cit., p. 162.
(76) O Semanário, nº 202, de 26/03 a 1º/04/60.
(77) BARDI, Pietro Maria. Profile of the New Brazilian Art.
Rio/São Paulo/Porto Alegre, Liv. Kosmos Editora, 1970,
pp. 44-52.
(78) MORAIS, Frederico. Livro-Módulo Governo do Distrito
Federal, s/d.
(79) NIEMEYER, Oscar. Minha experiência em Brasília. Riode
Janeiro, Vitória, 1961, pp. 49-53.
(80) PAPADAKI, Stamo. Brasília: um retorno. In: Módulo, nº
24, Rio de Janeiro, agosto de 1961, p. 3.
(81) CORBISIER, Roland. Brasília e o desenvolvimento
nacional. Rio de Janeiro, ISEB/MEC, 1960, passim.
(82) QUEIROZ, Maurício Vinhas de. Arquitetura e
desenvolvimento. In: Módulo, Rio de Janeiro (37), agosto
de 1964, p. 16.
(83) CORBISIER, Roland. Op. cit., p. 18.
(84) KUBITSCHEK, Juscelino. Por que construí Brasília. Rio de
Janeiro, Bloch, 1975, p. 302.
(85) O Semanário, nº 262, de 05 a 12/06/61.
(86) O Semanário, nº 247, de 31/01 a 07/02/61.
8
(87) QUEIROZ, Maurício Vinhas de. Op. cit., p. 19.
(88) MALRAUX, André. Brasília. Discurso proferido por
André
Malraux a 24/08/59. Rio de Janeiro, Presidência...
Serviço
de Documentação, 1959.
8
CAPµTULO III
MASSAS E PODER
"Existe um fato... da
máxima importânciana vida
pública no presente
momento. Esse fato é a
ascensãodasmassasao
completo poder social."
Ortega y
Gasset
3.1. A campanha pelas reformas de base
A campanha "o petróleo é nosso" permanecera até a década
de sessenta como o grande referencial de mobilização de
massas no Brasil. Fora inegavelmente popular e atingira seu
objetivo com a criação do monopólio estatal do petróleo,
criando ainda uma prática política presente nas várias
organizaç•es nacionalistas criadas a partir da segunda metade
dos anos cinqüenta. Progressivamente, essas organizaç•es vão
ampliando suas reivindicaç•es, configurando um amplo programa
nacionalista, que começa a encontrar definição também nas
formulaç•es partidárias.
8
Esse programa se populariza como reformas de base e se
consolida em 1958, quando a direção nacional do PTB designa
uma comissão formada por Osvaldo Lima Filho, Armindo Doutel
de Andrade, César Pinto, Francisco Clementino de San Tiago
Dantas e outros, com o objetivo de preparar o programa das
reformas de base, em que se destacam a reforma agrária e a
regulamentação da presença do capital estrangeiro (01). O
Senador Alberto Pasqualini (RS) e o Deputado Federal Hermes
Lima (BA) revelam a preocupação de que as reformas de base
sejam plenamente assumidas pelo Partido (02). No entanto,
pode-se afirmar que tanto nos partidos como nas organizaç•es
nacionalistas, já há um elevado grau de maturação sobre a
necessidade dessas reformas.
A relação entre organizaç•es nacionalistas e partidos
políticos foi marcada pela quebra dos limites que
originariamente caracterizaram essas organizaç•es. Os
partidos políticos ganharam na medida em que os grupos
nacionalistas funcionavam, por vezes, como órgãos de
assessoria, fornecendo quadros, planos e outras formulaç•es
programáticas. Por sua vez, as suas indecis•es levavam os
grupos a assumirem posiç•es que seriam mais próprias dos
partidos, como o lançamento das candidaturas do Marechal Lott
e João Goulart, pelo Movimento Nacionalista Brasileiro (03).
Após a derrota da candidatura Lott, o MNB entra em crise, que
o leva a crescente perda de influência.
A luta pela posse de João Goulart fortalece a liderança
de Leonel Brizola, que passa a ter papel de destaque nas
novas organizaç•es fundadas a partir de então. Em 1961 é
fundada a Frente de Libertação Nacional, congregando líderes
do movimento que permitiu a posse de Goulart, como os
governadores Leonel Brizola e Mauro Borges, parlamentares da
Frente Parlamentar Nacionalista e membros do MNB e da UNE.
Não tem vida longa; após as eleiç•es de 1962 já está
desarticulada. O seu sucedâneo é a Frente de Mobilização
Popular, fundada no mesmo ano e com a mesma composição de
forças, acrescida a presença de militares de baixa patente
reivindicando o direito de votar e ser votado. A FMP
constitui-se atuante grupo de pressão durante a tramitação do
projeto de reforma agrária do PTB, rejeitado na Câmara dos
Deputados, em outubro de 1963 (04).
As reformas de base adquiriram a forma de projetos mais
definidos quando da apresentação do programa de governo do
Primeiro-Ministro Brochado da Rocha, pessedista que
participara do governo Brizola. Segundo Cibilis da Rocha
Viana, a aceitação pelo Congresso dessa indicação deveu-se ao
8
forte apoio popular que Brochado da Rocha teria. Estava,
portanto, identificado com as reformas de base (05). O
programa foi apresentado em julho de 1962 e observava as
recomendaç•es contidas na mensagem presidencial enviada ao
Congresso Nacional no mesmo ano.
O Primeiro-Ministro solicitaria posteriormente delegação
legislativa, conforme previa o Ato Institucional que
instituíra o parlamentarismo, e em agosto apresenta os
projetos de lei que abarcavam desde o abastecimento e
expansão da produção agrícola até a consulta plebiscitária
sobre o sistema de governo. A tática dos opositores às
reformas foi demonstrar desinteresse, voltando suas críticas
à proposta sobre a antecipação do plebiscito. O Congresso
Nacional não se manifestou sobre as reformas, apenas concedeu
poderes para o Executivo alterar aspectos da legislação sobre
agricultura e abastecimento. Esta primeira tentativa de
aprovação das reformas se encerra quando o Primeiro-Ministro
não se submete ao voto de confiança e renuncia (06).
Parecia cada vez mais claro para os defensores das
reformas de base que era necessário criar condiç•es para o
efetivo exercício do governo por João Goulart -- era
necessário o retorno ao presidencialismo. As greves gerais de
julho e setembro de 1962, dirigidas pelo CGT (Comando Geral
dos Trabalhadores) tiveram importância considerável na
antecipação da consulta. A primeira mobilização provoca a
renúncia do Primeiro-Ministro Auro de Moura Andrade; a
segunda, consegue a antecipação do plebiscito para 6 de
janeiro de 1963. A primeira greve, considerada por Jover
Telles a maior mobilização operária que o país já teve
(07), procurou ampliar sua pauta insistindo na formação de um
ministério nacionalista; a segunda, exigia a sanção da Lei
de Remessa de Lucros e o aumento do salário-mínimo em 100%
(08). As duas paralisaç•es atingiram vários estados e
contaram com a participação de mais de 1 milhão de
trabalhadores.
Restabelecidos os poderes presidenciais, as reformas de
base têm nova oportunidade de implementação. Elas passam a
ser sintetizadas num conjunto de quatro blocos: reforma
agrária, reforma bancária, reforma tributária e
administrativa e reforma urbana. As duas primeiras chegaram a
ser encaminhadas ao Congresso, sendo a reforma agrária
rejeitada na Câmara dos Deputados, em outubro de 1963, fato
que provoca a renúncia do Ministro da Educação, Paulo de
Tarso, membro da Frente de Mobilização Popular (09).
Certamente, reforma agrária e controle do capital estrangeiro
8
foram os dois aspectos mais discutidos das reformas, e,
conseqüentemente, alvos de maior polêmica. Detenho- me a
seguir na análise desse segundo ponto, pois seu caráter
emblemático permite avançar na compreensão do programa
nacionalista.
3.1.1. O controle do capital estrangeiro
"No exato sentido, pois, tudo se resume a isto: o
capital é realizado em casa."
Ragnar Nurkse
O Congresso se antecipou ao Executivo, aprovando leis
situadas no espírito das reformas de base, como a Lei de
Remessa de Lucros, o Estatuto do Trabalhador Rural,
estendendo a legislação trabalhista para o campo e a
definição de política nuclear nacional, entre outras. Esta
atuação do Congresso relativiza a conhecida tese da
orientação basicamente conflitiva entre um poder executivo
reformista versus um legislativo conservador (10).
No debate sobre a remessa de lucros, os nacionalistas
adotam a tese de Ragnar Nurkse de que o capital se faz em
casa. Para Barbosa Lima Sobrinho, o centro do problema se dá
quando o fluxo de saída de capital é maior que o fluxo de
entrada. Quando isto acontece temos um processo de
descapitalização. Não existe capital internacional; "ele se
personaliza no dono. E se há um dono, o dono tem
nacionalidade..." (11). O capital que vem com seu portador ou
que ingressa na forma de empréstimos ao governo ou a empresas
brasileiras é visto com simpatia. Aquele que entra sob a
forma de empréstimos a empresas estrangeiras com garantia do
Tesouro Nacional é totalmente condenável (12).
O exame desse fluxo de entrada e saída é extremamente
favorável ao argumento dos nacionalistas: do total de capital
investido no setor manufatureiro, no período entre 1957 e
1965, o capital proveniente dos Estados Unidos participou com
apenas 22%; os outros 78% foram obtidos no próprio país (13).
8
Os investimentos globais do Plano de Metas também contaram
com reduzida participação do capital estrangeiro -- apenas
1/3. No final de seu governo, JK lamenta a pouca ajuda
recebida dos Estados Unidos (14). Com a intensificação da
presença do capital estrangeiro, os países de
industrialização recente se convertem em exportadores de
capital, já que um volume crescentemente maior de recursos
sob a forma de juros, royalties e lucros exportados passa a
ser remetido para os países de industrialização antiga.
Barbosa Lima Sobrinho e Aristóteles Moura consideram que
o capital nacional tem supremacia na formação total do
capital. A poupança doméstica contribuíra no período de 1950
a 1959 com 97,2% do total. Afirmam que frente à debilidade da
burguesia industrial interna, o desenvolvimento deve ser
alcançado com planejamento e execução estatal. Por sua
própria natureza, voltado para o lucro rápido, o capital
privado não se dirigirá aos setores básicos (15).
Da mesma forma, a importação de tecnologia exige
critérios e controle. A facilidade para a importação de
máquinas e equipamentos, criada com a Instrução 113, no
governo Café Filho, dispensando-a de cobertura cambial, abre
caminho para a associação capital nacional/capital
estrangeiro, pois as empresas nacionais se viram na
contigência de se associarem ao capital estrangeiro para
terem acesso a essas importaç•es. Esse tratamento
extremamente favorável ao capital estrangeiro permitiria sua
entrada no país a taxas nunca vistas, principalmente na forma
de capital de empréstimos (16).
Como conseqüência temos um quadro onde dois aspectos se
destacam: primeiro, foram contabilizados como capitais
estrangeiros montantes superiores aos efetivamente
incorporados. Barbosa Lima Sobrinho assim se refere a essa
"nacionalização" do capital:
"...capital estrangeiro, não raro, é tão somente
apelido. O que há é capital nosso, inscrito em nome de
estrangeiros. São recursos de nossos bancos, de nossa
poupança, prosperando atrás de barreiras alfandegárias,
levantadas para a proteção de iniciativas estrangeiras"
(17).
8
Este será sempre um forte argumento dos nacionalistas
para o estabelecimento de regulamentação que controle a
atuação do capital estrangeiro. Em segundo lugar, o acesso
aos favores permitiu que empresas beneficiadas se
expandissem, controlando outras, promovendo a concentração do
parque industrial (18).
A primeira legislação sobre o assunto é o decreto nº
9.025 apresentado no governo Dutra, em 27 de fevereiro de
1946 (19). Este decreto cria um sistema de garantia de câmbio
para a remessa de lucros de até 8% sobre o capital
estrangeiro registrado. O registro deve ser feito apenas do
capital que ingressa no país. Os lucros obtidos em cruzeiros
não podem ser considerados na remessa de lucros; é capital
que deve ser reinvestido no país. Em agosto de 1946, o
decreto é praticamente revogado, passando a SUMOC
(Superintendência da Moeda e do Crédito) a ter autonomia de
decisão sobre o assunto. Em janeiro de 1952 Vargas apresenta
novo decreto, revogado um ano depois pelo Congresso.
Extingue-se a progressiva nacionalização dos lucros e o
registro, concedendo-se amplas liberdades de movimentação ao
capital estrangeiro.
A euforia desenvolvimentista dos anos JK obscurece o
debate sobre a questão. Em fins dos anos cinqüenta, Sérgio
Magalhães (PTB/DF) começa a apresentar pequenos projetos de
lei sobre o assunto. Na campanha presidencial de 1960, os
dois principais candidatos, o Marechal Lott e o Sr. Jânio
Quadros, comprometem-se com o controle do capital estrangeiro
(20).
O movimento sindical passa a incluir o controle da
remessa de lucros entre as suas reivindicaç•es. Em
conferência realizada em março de 1959, metalúrgicos do
Distrito Federal aprovam documento que inclui esta
reivindicação e entregam-no ao presidente Juscelino, que o
aprova. O III Congresso Sindical Nacional, realizado nos dias
18 e 19 de fevereiro de 1961, aprova documento com o mesmo
teor. Em janeiro de 1962 a Comissão Permanente das
Organizaç•es Sindicais do Estado da Guanabara reivindica a
ratificação, pelo Senado, pelo Conselho de Ministros e pelo
presidente, da lei aprovada na Câmara, em novembro de 1961.
Nas greves gerais de julho e setembro de 1962, a
reivindicação também se fazia presente.
Embora o PTB incluisse esse ponto no seu programa, o
movimento de opinião que permitiu sua aprovação aconteceu, em
boa parte, fora dos partidos. As organizaç•es nacionalistas e
os sindicatos constituíram-se em eficientes grupos de
8
pressão, forçando o Congresso, como na antecipação do
plebiscito, a aprovar demandas reivindicadas pela sociedade.
Em agosto de 1959, o deputado Fernando Santana (PTB/BA)
discursa apresentando dados da SUMOC que revelam não ser tão
importante assim a presença do capital estrangeiro entre nós.
No mesmo mês, em pronunciamento no Clube Militar, o deputado
Sérgio Magalhães critica os favorecimentos cambiais. O
capital estrangeiro entra pelo câmbio livre e sai à taxa de
câmbio favorecido (21).
Os pronunciamentos do campo favorável à plena
liberalização do capital estrangeiro, nesse momento, situam
de forma genérica suas críticas ao nacionalismo. O projeto
ainda não merecia preocupaç•es. No mesmo agosto de 1959, o
Embaixador dos Estados Unidos, John Cabot, discursando na
Câmara de Comércio Americana, diz que o nacionalismo tem
apenas base emocional. O seu próprio país permitiu que o
capital estrangeiro participasse da construção nacional e
muito lucrou com isso; beneficiaram-se de grandes somas da
própria América Latina. Afirma que as exportaç•es de lucros
não são excessivas (menos de 3% sobre o investimento total).
Faz duras críticas aos comunistas: "Advogam a nacionalização
dos bens estrangeiros, por saberem não haver meio mais seguro
do que este para fazer naufragar a economia de uma nação..."
(22). O Subsecretário de Estado, Sr. Douglas Dillon, em
pronunciamento feito em fevereiro de 1960, repete os
argumentos do embaixador e acrescenta:
"...dificilmente se poderia esperar que os investimentos
estrangeiros continuem a ser atraídos para a América
Latina, se estiverem sujeitosa restriç•es, sem a
conveniente compensação" (23).
Em sua visita ao Brasil, no mesmo mês, o presidente dos
Estados Unidos, Dwight Eisenhower, ressalta a contribuição
positiva do capital estrangeiro: São Paulo, região que
concentra maior volume de capital estrangeiro é a mais
desenvolvida (24).
Barbosa Lima Sobrinho contesta esta defesa do capital
estrangeiro. Diz que "todos os países que progrediram
basearam-se em capitais próprios", e que ao alegarem terem
dependido de capital estrangeiro para o seu desenvolvimento,
estavam "renunciando às glórias dos que haviam construído a
8
grandeza econômica dos Estados Unidos." Cita relação de
cinqüenta milionários dos Estados Unidos que mais
contribuíram para o seu desenvolvimento e só encontra lá nove
estrangeiros, e mesmo assim, residentes no país (25).
Eleito, o Sr. Jânio Quadros ordena que o líder da UDN,
deputado Menezes Cortes, envie projeto em regime de urgência
sobre o tema; cumpria assim seu compromisso de campanha. Mas
o referido projeto é recebido com ressalvas pelos
nacionalistas. Segundo Barbosa Lima Sobrinho, o projeto de
Jânio Quadros pretendia reduzir o imposto sobre os lucros
extraordinários. Em lugar de aplicar impostos pesados às
invers•es realizadas, "o projeto do Sr. Jânio Quadros prefere
conceder-lhes um prêmio régio, na redução dos tributos a que
podem estar sujeitos os lucros excessivos do capital
estrangeiro" (26). No Congresso forma-se uma comissão
composta por Barbosa Lima Sobrinho (PSB/PE), Celso Brant
(PR/MG) e José Joffily (PSD/PA), que tem como centro a
preocupação com o reinvestimento. Isto é, os lucros obtidos
no país não poderiam ser registrados como capital estrangeiro
(27).
O deputado Daniel Faraco (PSD/RS), defensor do projeto
que visava apenas criar um instrumento fiscal, argumentava
que o "movimento de capitais externos, tanto de risco como de
empréstimo, e respectivas rendas, longe de ocasionar uma
sangria de recursos cambiais do país, reforça
consideravelmente esses recursos". O grave problema, segundo
o deputado, é a hemorragia interna (os déficits) (28).
Depois de intenso debate, é aprovado na Câmara dos
Deputados o substitutivo Celso Brant, que teve origem nos
pequenos projetos do deputado Sérgio Magalhães. O projeto
recebeu 151 votos favoráveis, 60 contrários e 116 deputados
estavam ausentes. Segundo Sérgio Magalhães, os deputados
filiados à Frente Parlamentar Nacionalista nunca passaram de
oitenta (29). Esta maioria expressiva indica um realinhamento
das forças políticas no Congresso. A campanha nacionalista
provocou efeitos devastadores nos partidos de centro e
centro-direita. PSD e UDN, considerados partidos
conservadores, praticamente se dividiram ao meio. PTB e PSB,
com programa e atuação impregnados por forte nacionalismo
apresentaram alto padrão de unidade (30). A existência nos
dois partidos considerados conservadores, PSD e UDN, de duas
alas reformistas ajuda a explicar esta cisão. As alas
reformistas estavam se revelando sensíveis às demandas da
sociedade. Era 30 de novembro de 1961 e o país vivia a crise
8
institucional em torno dos poderes do presidente:
presidencialismo ou parlamentarismo ?
A vitória era parcial, pois ainda restava a batalha do
Senado.
Os adversários do projeto denunciam que a expressiva
votação obtida constituir-se-ía em aberta interferência de
industriais paulistas; beneficiava-se São Paulo em detrimento
de Minas, Nordeste e Rio Grande do Sul. Este fato estaria
fazendo surgirem, na própria esquerda , críticas aos excessos
do projeto (31). Sérgio Magalhães atribui a localização de
resistências maiores no Rio de Janeiro ao fato de que ali se
situavam as sedes das principais empresas multinacionais
(32).
O Sr. Antônio Devisate, presidente da FIESP (Federação
das Indústrias do Estado de São Paulo), afirma que o projeto
precisa ser alterado; a Federação das Indústrias da Guanabara
também faz restriç•es a alguns dispositivos (33). Os
empresários paulistas defendem o registro de capital e,
principalmente, a fixação de uma ordem de prioridades
para os investimentos industriais novos (34).
Em conferência pronunciada no Conselho Nacional de
Economia, o presidente da Junta Administrativa da CNI
(Confederação Nacional da Indústria), Sr. Fernando Gasparian,
explicita o ponto de vista da entidade. A participação do
capital estrangeiro é de extrema utilidade, pois complementa
a poupança interna. O poder público deve pôr obstáculos à sua
entrada em setores já suficientemente cobertos pela produção
interna. Esta produção interna deve estar sendo "empreendida
em condiç•es satisfatórias de qualidade e preço". Não se deve
conceder vantagens ao capital estrangeiro (35).
O apoio de empresários a alguns aspectos do projeto é
alvo de duras críticas dos intransigentes defensores do
capital estrangeiro. O Embaixador John Cabot refere-se, em
seu discurso, a brasileiros que, ingenuamente, aceitam a
pregação comunista. Esses empresários são acusados de se
esconderem no manto protetor do nacionalismo para
consolidarem e protegerem seus monopólios. A não instalação
de empresas estrangeiras em setores ou regi•es onde as
empresas brasileiras atendem às necessidades visaria
beneficiar as industrias paulistas. Faz-se a defesa da
concorrência como forma de baratear os preços. A aliança de
8
comunistas e empresários locais objetiva que os primeiros
anulem a concorrência e os segundos escravizem o consumidor
(36).
No Senado o projeto sofre alteraç•es sensíveis,
estabelecendo impostos sobre as remessas, atenuando o
dispositivo de limite. Sérgio Magalhães, mesmo não
concordando com estas alteraç•es assina o projeto para que
ele tenha andamento. De volta à Câmara dos Deputados, os
deputados nacionalistas dão ao projeto sua feição original,
eliminando as alteraç•es realizadas pelo Senado. O projeto
readquire assim a forma do substitutivo Celso Brant, que é
novamente posto em votação e aprovado em 3 de setembro de
1962, em votação simbólica (37).
A lei limita as remessas anuais de lucros em 10% do
investimento registrado. O lucro que excede a este limite é o
chamado capital suplementar, que, embora pertença a
estrangeiros, não dá direito à remessa. O reinvestimento é a
quantia que poderia ter sido legalmente remetida para o
exterior, mas não foi (38).
O centro das atenç•es passa a ser o gabinete
presidencial. Press•es são feitas para que o presidente vete
os artigos polêmicos. Em janeiro de 1964, afirmando sua clara
opção pelas reformas de base, o presidente João Goulart
sanciona a lei.
8
Osny Duarte Pereira alerta para que não se tenha ilusões
quanto à lei, e lembra que ela foi usada pelas empresas
estrangeiras como álibi para justificar o retraimento de seus
investimentos a partir de 1963. A imprensa defensora da
completa liberdade para o capital estrangeiro contribui com a
desestabilização do governo Goulart, associando a aprovação
da lei à queda dos investimentos diretos de capital
estrangeiro (39).
Entre os nacionalistas há um consenso de que controlar a
remessa de lucros é tarefa difícil (40) e que esta medida
tomada de forma isolada pouco significa. Algumas
considerações como conclusões:
A repercussão do debate se deve à intensa penetração do
capital estrangeiro (mesmo considerado minoritário no total dos
investimentos). Por outro lado, a idéia de exercer algum tipo
de controle sobre este fenômeno motiva a ação dos nacionalistas
e torna seu discurso coerente e assimilável por amplos setores
da população. Note-se que em 1963 os investimentos estrangeiros
já controlavam 40% da indústria do país (41).
A coalização que se formou na sua aprovação aponta para
a possibilidade de um realinhamento partidário capaz de dar
sustentação ao modelo de economia independente que se estava
forjando. Embora houvesse alguma resistência do Congresso
quanto às reformas de base, é simplificar muito atribuir a
crise institucional do governo Goulart à polarização de um
executivo progressista versus um Congresso conservador (42).
Há sinais de demonstração de sensibilidade do Congresso à
pressão das massas - antecipação do plebiscito, aprovação do
Estatuto do Trabalhador Rural, além da lei citada acima. O
Congresso esboçava sinais de uma possibilidade: resolver as
contradições entre a estrutura agrária concentrada e a
expansão do capital estrangeiro, por um lado; e o modelo de
desenvolvimento independente, por outro (43).
3.1.2.Jango: entre os planos do FMI e o "Caminho Brasileiro"
8
Restabelecido o presidencialismo, o presidente Goulart
passa a viver o dilema de optar entre o clássico receitual
recessivo do FMI e o prosseguimento do desenvolvimento. A
primeira inclinação do presidente é por conciliar a política
do FMI com o projeto desenvolvimentista.
Cabe ao economista e auxiliar de Juscelino na criação da
SUDENE (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste),
Celso Furtado, a tarefa de realizar tal proeza, que recebe o
nome de Plano Trienal, publicado a 30 de dezembro de 1962 e
apresentado à nação no discurso de Ano-Bom de 1963. Nesta
apresentação Goulart é cauteloso; afirma não se tratar de
decis•es fechadas; espera assim que o Plano seja objeto de
amplo debate. As críticas foram, certamente, bem maiores do
que imaginava o presidente. Economistas como Ignácio Rangel,
ex-membro da Assessoria Econômica do governo Vargas, não
acreditam nessa fusão de monetarismo e estruturalismo (44). A
Frente Parlamentar Nacionalista e o CGT se op•em ao Plano.
O jornal O Semanário critica o presidente por não ter
aproveitado a campanha pelo retorno ao presidencialismo para
popularizar as reformas de base e a idéia do planejamento
econômico global. Considera o planejamento econômico a base
em que deveria se fundamentar o presidencialismo. Portanto,
a elaboração do Plano não poderia ter permanecido em sigilo.
O jornal, no entanto, deposita grandes esperanças no
planejamento, que é visto como a condição para a "justiça
social, efetiva, democrática". Como na campanha "o petróleo é
nosso", é necessário criar um "gigantesco movimento de
massas" para levar adiante esta concepção (45). As campanhas
da siderurgia e do petróleo -- exemplos de planejamento
parcial -- forjaram a "mística nacionalista". O CGT não
poderia deixar de responder a esta questão que o presidente
apresenta no Plano: por que não fazer do planejamento
econômico global o mesmo que foi feito nessas campanhas (46)
?
8
O Plano pretendia, ao mesmo tempo, oferecer aos
investidores e credores externos segurança quanto à
orientação do governo, o que significa conter gastos, conter
inflação, reduzir presença do Estado na economia, e promover
o desenvolvimento. Mantinha em seus postulados a necessidade
de alterar a estrutura agrária brasileira, com rapidez e
eficiência. Objetivo é ali apresentado apenas como elemento
de retórica, já que sua implementação inviabilizaria as metas
recessivas contempladas no conjunto do Plano.
As pressões por aumentos salariais e liberação de
créditos impedem o cumprimento das metas de estabilização
(47), as mudanças estruturais prometidas também não
acontecem; em maio, Celso Furtado já admite ter fracassado:
"a luta em que nos havíamos empenhado, no quadro do Plano
Trienal, para manter sob controle a situação econômica,
estava praticamente perdida" (48). A boa vontade de O
Semanário desaparecera:
"Isto é o Plano Trienal: Estagnação, Desemprego,
Retenção das empresas industriais do Estado; Elevação
dos impostos; Supressão do crédito bancário; falências e
concordatas; Salários e vencimentos devorados pela
"verdade cambial"; menos escolas, menos hospitais, menos
estradas, menos obras públicas, tudo trancado pelos
cortes orçamentários. Economia é a palavra de ordem que
o Ministro Celso Furtado lhe sopra aos ouvidos, como um
Necker ressuscitado" (49).
A partir do fracasso do Plano Trienal, João Goulart opta
claramente pelas reformas de base. Esta opção é feita de
forma contundente em dois documentos: o discurso pronunciado
no comício de 13 de março, na Central do Brasil; e a
mensagem presidencial enviada ao Congresso a 15 de março.
Estas duas falas se assemelham muito aos discursos de
Getúlio. No discurso de 13 de março, Jango, como o velho
8
líder, dirige-se aos "trabalhadores do Brasil". Há uma
acentuada preocupação com a renovação das instituições,
rompendo com o passado que impede o acesso de amplos setores
aos bens do desenvolvimento:
"Consciente das distorções verificadas ao longo do nosso
processo de transformação social e da necessidade
imperiosa de reformas estruturais e institucionais,
assumi a responsabilidade de comandar a luta pela
renovação da sociedade brasileira..." (50).
Não se trata apenas de prosseguir com o processo de
desenvolvimento, mas é dado a ele a dimensão de justiça e
igualdade outrora secundarizada: "O nosso lema, trabalhadores
do Brasil, é progresso com justiça, e desenvolvimento com
igualdade" (51). Dois obstáculos são identificados: a relação
com o capital estrangeiro e a estrutura agrária concentrada.
O primeiro obstáculo fora de forma razoável enfrentado pelo
Congresso quando aprovou a lei de remessa de lucros. A
referência do presidente a esta lei não apresenta nada de
catastrófico: "obtivemos o reescalonamento da dívida externa
do País pouco tempo após regulamentar a execução da Lei de
Remessa de Lucros..." (52). O segundo obstáculo é
exaustivamente abordado no discurso de 13 de março. É
enfatizado o seu alcance social e a integração com o modelo
de desenvolvimento independente:
"Areforma agrária não é capricho de um Governo ou
programa de um partido. É produto da inadiável
necessidade de todos os povos do mundo. Aqui, no Brasil,
constitui a legenda mais viva da esperança do nosso
povo, sobretudo daqueles que labutam no campo.
Areforma agrária é também uma imposição progressista
do mercado interno, que necessita aumentar a sua
produção para sobreviver" (53).
O presidente parece ter aguçada percepção das dimens•es
da crise. Comunica no comício que já assinara decreto com um
ensaio de reforma agrária, o chamado decreto da SUPRA
(Superintendência da Reforma Agrária). O presidente quer
deixar muito claro o novo caminho, as suas novas opç•es.
8
3.1.3.A nacionalização das refinarias: a ampliação do
monopólio
Do monopólio estatal ficaram excluídas as refinariais
particulares já existentes no país: Capuava, Ipiranga,
Manguinhos, Amazonas e Destilaria Rio-Grandense. A refinaria
de Manguinhos fora construída pelos empresários Elyeser
Magalhães, Peixoto de Castro e Drault Ernany.
A refinação tem uma importância estratégica na indústria
petrolífera. O general Horta Barbosa fundamenta assim esta
tese: "alicerce da independência econômica de um povo, a
indústria de refinação deverá ser criada com a descoberta ou
não de jazidas de petróleo" (54). No entanto, o fato de as
refinarias serem de propriedade de brasileiros diminuíria as
restriç•es entre os nacionalistas. Qual o significado então
do decreto de Jango, que nacionalizava as refinarias
particulares, apresentado no comício de 13 de março ?
Desde a organização do comício, passando pelas palavras
de Jango, até esse decreto assinado, há uma intenção de
associar o momento à figura de Vargas. O palanque, segundo
informaç•es do Palácio do Catete, seria o mesmo usado por
Getúlio Vargas nos seus mais importantes aparecimentos em
público (55). Estava João Goulart completando a obra iniciada
por Getúlio. Em dezembro de 1963 assinara decreto
estabelecendo o monopólio da importação de petróleo e seus
derivados. A nacionalização das refinarias, menos por seu
impacto na política do petróleo, assinalava o encontro com a
simbologia getuliana:
"Ao anunciar, à frente do povo reunido em praça pública,
o decreto de encampação de todas as refinarias de
petróleo particulares, desejo prestar homenagem de
respeito àquele que sempre esteve presente nos
sentimentos do nosso povo, o grande e imortal Presidente
Getúlio Vargas" (56).
8
A bandeira oferecida por Getúlio com a sua morte
tremulava para além das faixas e cartazes:
"O imortal e grande patriota tombou, mas o povo continua
a caminhada, guiado pelos seus ideais. E eu,
particularmente, vivo hoje momento de profunda emoção ao
poder dizer que, com este ato, soube interpretar o
sentimento do povo brasileiro " (57). (Osgrifossão meus)
A ligação de João Goulart com Vargas era muito estreita.
Assim, era natural que procurasse pautar sua atuação política
na do presidente morto em 1954, a cuja trajetória política
estava intimamente ligado, tendo sido seu Ministro do
Trabalho de 1953 a 1954. Acrescente-se a isso as
circunstâncias da morte do presidente, em que a posse de uma
cópia da carta-testamento e o seu emocionado discurso no
enterro o fazem herdeiro político de Getúlio.
Dessa forma, é inevitável a comparação entre os dois
líderes, em que se destaca o esforço de João Goulart em
prosseguir e aprofundar as transformaç•es implementadas desde
Getúlio, notadamente, a partir do restabelecimento de seus
plenos poderes, com a vitória do presidencialismo no
plebiscito de 6 de janeiro de 1963 e do fracasso do Plano
Trienal. A partir desse momento é claro o seu compromisso com
as reformas de base.
3.2. O projeto nacional-popular e o golpe de 1964
Benedict Anderson chama de nacionalismo de última onda
(58) o nacionalismo do século XX, que nasce como resposta ao
imperialismo, localizado fundamentalmente na °frica e °sia.
Amplio esta idéia considerando que na América Latina e no
Caribe a atuação do imperialismo e a formação de movimentos
nacionalistas também representam o principal fenômeno
político deste século na região. A primeira fase corresponde
ao desenvolvimento da idéia de nação nas grandes revoluç•es
do século XVIII -- a Revolução Americana e a Revolução
Francesa. A França revolucionária transformara-se em quartel-
general de todas as revoluç•es e exercia forte influência nos
movimentos de libertação anticoloniais. A idéia de nação se
encontra aqui ainda vinculada aos outros postulados liberais.
Não se pode, rigorosamente, falar de nacionalismo nesse
período, mas deve-se registrar que a idéia de nação cumpre um
papel revolucionário, assim como os outros princípios
8
liberais, ao se opor ao feudalismo. Somente a partir de
meados do século XIX, com a divisão do movimento
revolucionário, surge o que Hobsbawn chama de movimentos
nacionalistas conscientes, em que Itália e Alemanha são os
casos mais típicos. A partir do momento que sua formulação
ganha autonomia vincula-se ao pensamento conservador, ciclo
que só encerra com a sua reconciliação com a transformação
social, ocorrida a partir da década de trinta. Trata-se da
última onda, como assinala Benedict Anderson.
Barbosa Lima Sobrinho denomina essa última fase de
nacionalismo defensivo. Considera necessário distinguir
entre a concepção que orienta, por um lado, as nações da
África e Ásia; e, por outro, a Alemanha de Guilherme II e
Adolf Hitler (59). Hans Kohn afirma que, a partir do século
XX, o nacionalismo se constitui num "movimento socialmente
revolucionário" (60). O seu programa exige para todos os
membros do grupo nacional as mesmas oportunidades econômicas
e culturais. Ao conceituarem nacionalismo, autores como Lima
Sobrinho apresentam como substancial o antagonismo de
interesses ou de idéias. O imperialismo, no século XX,
torna-se o alvo desse antagonismo. A nação, que tantas vezes
foi "avó de impérios", agora pode ser apreendida pelas
classes populares, constituindo o nacional- popular.
Hobsbawn afirma que esta "combinação de liberação
nacional e transformação social" vai se constituir "numa
força formidável no século XX" (61).
Por sua vez, o movimento comunista se reconcilia com o
nacionalismo; no mundo, Hobsbawn localiza esse momento em
meados da década de 30 (62). No Brasil da década de cinqüenta
há uma notável colaboração entre comunistas e nacionalistas,
graças à alteração de linha programática realizada pelo PCB
em 1954, quando passa a defender a participação na frente
antiimperialista formada pela "pequena burguesia urbana, da
burguesia e dos latifundiários que tenham contradições com o
imperialismo..." (63). Ainda Hobsbawn: "o papel dos
comunistas na resistência antifacista emprestou uma
considerável plausibilidade a seus resgates de
patriotismo..." (64).
Para os nacionalistas, nação e imperialismo, ou anti-
nação, representam interesses inconciliáveis, sendo os
interesses antinacionais identificados pelo latifúndio e os
monopólios estrangeiros. Conciliar esses interesses com os
interesses nacionais, seria o mesmo que "conciliar o ser e o
não ser, a nação e a anti-nação" (sic)(65).
8
Esta fusão entre os chamados interesses nacionais e a
transformação social se expressa na luta pelas reformas de
base; reafirma-se, por exemplo que não há possibilidade de
autonomia nacional sem reforma agrária. A crescente
mobilização popular deixa de se constituir em simples
elemento de pressão para exigir participação no processo
decisório - a participação de representantes dos
trabalhadores na administração da Previdência Social já
acontecia desde 1960, quando foi aprovada a Lei Orgânica da
Previdência Social. Os últimos pronunciamentos de Jango e o
comício da Central assinalam o clímax dessa formulação e da
mobilização de massas pelas reformas. A sua aprovação
dependia, cada vez mais, do fortalecimento da frente
antiimperialista. Em 1962 Celso Furtado já detectara a
necessidade de promover essa coesão em torno das reformas no
Congresso. Elaborara manifesto visando comprometer os
candidatos ao Parlamento com o programa de reformas de base.
Para o autor, as reformas de base eram apresentadas de forma
pouco consistente:
"Teria que ser um documento convincente, mas escrito em
linguagem moderada, sem sectarismos, capaz de aglutinar
personalidades de um amplo espectro político. A idéia
era de que cada candidato ao Parlamento fosse convidado
por esses líderes e assiná-lo e, a fortiori, a cumpri-
lo, uma vez no exercício do mandato. Daí surgiria uma
Frente Parlamentar pelas Reformas de Base, cuja atuação
marcaria a próxima sessão do Congresso" (66).
Não pretendendo deter-me na análise do golpe de 1964,
quero chamar a atenção para as divisões na frente das
reformas de base como um elemento de enfraquecimento da
frente antiimperialista. Em agosto de 1963 foi realizado o
primeiro comício pelas reformas, com presença, estimada em
cerca de 100 mil pessoas, e presidido por Jango, acompanhado
pelos três ministros militares. Neste comício o presidente
enfatiza, mais uma vez, a necessidade das reformas. Aqui fica
clara a fratura na frente nacionalista: pessoas ligadas ao
deputado Leonel Brizola afirmaram, na ocasião, que o comício
visava fortalecer Jango para que este pudesse dar um golpe. O
golpe seria dado contra o governador Carlos Lacerda, mas o
seu objetivo real era "esmagar as esquerdas" (67).
8
Comparando a campanha "o petróleo é nosso" com a
campanha pelas reformas de base, Oswaldo Costa atribui à
obstinação com vitórias eleitorais um fator desagregador
considerável. O sucesso da primeira campanha ligava-se ao
desprendimento de suas lideranças (68).
Preocupações eleitorais e incapacidade em construir a
unidade interna capaz de resolver as contradições criadas
pelo avanço do projeto de desenvolvimento independentes são
elementos que iluminam o entendimento da crise de 1964.
O programa se amplia: da defesa do monopólio estatal da
energia às reformas de base. A unidade das forças engajadas
nesse projeto toma forma orgânica com a fundação, em 1962, da
Frente de Mobilização Popular. A FMP, de certa forma, é
sucedânea da Frente de Libertação Nacional e estuário para o
qual convergem os outros movimentos nacionalistas e
organizaç•es populares, como a UNE e o CGT.
8
NOTAS
(01) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alves de (coord.)
Dicionário Histórico e Biográfico Brasileiro: 1930-1983.
Rio de Janeiro, Ed. Forence Universitária: Fundação
Getúlio Vargas/Centro de Pesquisa e Documentação de
História Contemporânea (CPDOC).Financiadora de Estudos e
Projetos (FINEP), 1984, p. 2605.
(02) DELGADO, Lucília de A. Neves. PTB: Do Getulismo ao
Reformismo (1945-1964). São Paulo, Marco Zero, 1989, p.
(03) D'ARAÚJO, Maria Celina Soares. A ilusão trabalhista. O
PTB de 1945-1965. Rio de Janeiro, Tese de Doutorado,
IUPERJ, 1989, p. 187.
(04) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alvez de (coord.). Op.
cit. pp. 1390-1391, vol. 2.
(05) VIANA, Cibilis da Rocha. Reformas de Base e Política
Nacionalista de Desenvolvimento -- de Getúlio a Jango.
Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1980, pp. 116-
126.
(06) VIANA, Cibilis da Rocha. Op. cit., p. 177.
(07) DELGADO, Lucília de Almeida Neves. O Comando Geral dos
Trabalhadores (1961-1964). Petrópolis, Vozes, 1986, p.
189.
(08) DELGADO, Lucília de Almeida Neves. Op. cit., p. 192.
(09) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alves de. (coord.). Op.
cit., pp. 1390-1391.
(10) Esta tese esteve muito em voga no início dos anos
sessenta. É discutida por SOUZA, Maria do Carmo Campello
de. Estado e partidos políticos no Brasil (1930-1964).
2ª ed., São Paulo, Alfa-ômega, 1983, pp. 152-154.
Segundo a autora, a mudança sócio-econômica incidia em
tempos diferentes sobre a formação dos dois poderes,
provocando alteraç•es em sua atuação, com um
enfraquecimento relativo do executivo e o aumento da
8
representatividade e institucionalização dos partidos,
tornando possível a aprovação das reformas no Congresso.
(11) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Barbosa Lima Sobrinho
(depoimento). Rio de Janeiro, FGV/CPDOC, 1983, p. 370.
(12) MAGALHÃES, Sérgio et all. A Questão da Remessa de
Lucros. Rio de Janeiro, Ed. Universitária, 1962, passim.
(13) MARTINS, Luciano. Pouvoir et developpement economique.
Paris, Antropus, 1976, p. 440.
(14) CARDOSO, Miriam Limoeiro. Ideologia do Desenvolvimento -
- Brasil: JK-JQ. 2ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra,
1978, pp. 187-190.
(15) MAGALHÃES, Sérgio et al. Op. cit., passim.
(16) LESSA, Carlos. 15 anos de política econômica. São Paulo,
Brasiliense, 1983, p. 58.
(17) LIMA SOBRINHO, A. J. Barbosa. Desde quando somos
nacionalistas ? Rio de Janeiro, Civilização Brasileira,
1963 (Coleção Cadernos do Povo Brasileiro), p. 112.
(18) LESSA, Carlos. Op. cit., p. 69.
(19) Barbosa Lima Sobrinho em Estudos Nacionalistas, Rio,
Civilização Brasileira, 1981, e o verbete capital
estrangeiro do Dicionário Histórico-Biográfico
Brasileiro apresentam um bom relato dessa legislação no
Brasil.
(20) Novos Rumos, de 3 a 9 de abril de 1959 e Jornal do
Brasil, 20 de setembro de 1960, respectivamente.
(21) Jornal do Brasil, 19 de agosto de 1959.
(22) Idem, 16 de agosto de 1959.
(23) Ibidem, 13 de fevereiro de 1960.
(24) Ibidem, 26 de fevereiro de 1960.
(25) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Japão: o capital se faz em casa.
2ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1990, pp. 11-12.
(26) Jornal do Brasil, 5 de novembro de 1961.
(27) SKIDMORE, Thomas. Brasil: De Getúlio a Castelo. 4ª ed.,
Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1975, pp. 277-278.
8
(28) Jornal do Brasil, 7 de novembro de 1961.
(29) MAGALHÃES, Sérgio et. al. Op. cit., p. 73.
(30) SANTOS, Wanderley Guilherme dos. Sessenta e quatro:
anatomia da crise. São Paulo, Vértice, 1986, p. 99.
(31) MAGALHÃES, Sérgio. Sérgio Magalhães (depoimento, 1978).
Rio de Janeiro, FGV/CPDOC, 1983, p.
(32) Jornal do Brasil, 5 de dezembro de 1961.
(33) Idem, 3 de dezembro de 1961.
(34) Novos Rumos, de 2 a 8 de dezembro de 1961.
(35) Jornal do Brasil, 17 de dezembro de 1961.
(36) Idem, 6 de novembro de 1963.
(37) Para acompanhar a trajetória do projeto ver os
depoimentos acima citados e Wanderley Guilherme dos
Santos, op. cit., particularmente o capítulo 5.
(38) MAGALHMAGALHÃESES, Sérgio. Problemasdo desenvolvimento
econômico. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1960,
pp. 35-36.
(39) PEREIRA, Osny Duarte. A lei de remessa de lucros. In.:
Civilização Brasileira, setembro de 1964, nº 15, p. 209.
(40) Cf. Barbosa Lima Sobrinho, depoimento, op. cit., p. 408
e entrevista de Almino Afonso, Jornal do Brasil, 3 de
dezembro de 1961.
(41) DAVIS, Horace B. Para uma Teoria Marxista do
Nacionalismo. Rio de Janeiro, Zahar, 1978, p. 210.
(42) Cf. nota número 10 do presente trabalho.
(43) SOUZA, Nilson Araújo de. A herança de Getúlio (II). In
Hora do Povo, nº 163, de 02 a 16 de abril de 1985. O
autor afirma que os governos de Juscelino Kubitschek,
Jânio Quadros e João Goulart prosseguem o ciclo iniciado
com Getúlio Vargas. A ruptura desta orientação nacional-
democrática só ocorreria com o golpe de 1964.
(44) MIRANDA, José Carlos da Rocha. O Plano Trienal: o canto
de cisne do nacional-desenvolvimentismo. Campinas,
UNICAMP. Tese de Doutoramento, 1979, p. 141. Os
economistas e cientistas sociais ligadas à CEPAL,embora
8
se alinhassem em diversos pontos com o programa
nacionalista, irão progressivamente dele se afastando. O
livro de CARDOSO, Fernando Henrique. Empresário
Industrial e Desenvolvimento Econômico. Difel, São
Paulo, 1964, assinala essa ruptura. Nestelivro,
Fernando Henrique Cardoso nega a possibilidade de a
burguesia nacional vir a desempenhar papel importante no
modelo de desenvolvimento independente. Tal tendência
só tem se afirmado no interior desse grupo desde então.
(45) O Semanário, nº 317, de 10 a 16 de janeiro de 1963.
(46) O Semanário, nº 322, de 14 a 20 de fevereiro de 1963.
(47) SILVA, Hélio. 1964:golpe ou contragolpe ?Rio de Janeiro,
Civilização Brasileira, 1975, pp. 169-172.
(48) FURTADO, Celso. A fantasia desfeita. 2ª ed., Rio de
Janeiro, Paz e Terra, 1989, p. 166.
(49) O Semanário, nº 339, de 27 de junho a 3 de julho de
1963.
(50) CARVALHO, Maria Izabel Valladão de. Ideologia e discurso
político: os projetos governamentais do período 45 a 64.
São Paulo, USP, Tese de Doutoramento, 1988, p. 117.
(51) GOULART, João. Discurso do Dia 13 de Março. In: SILVA,
Hélio. Op. cit., pp. 457-466.
(52) Idem, ibidem.
(53) Ibidem.
(54) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alves de. (coord.). Op.
cit., p. 2713.
(55) SKIDMORE, Thomas. Op. cit., p. 347.
(56) GOULART, João. O Discurso do Dia 13 de Março. In: SILVA,
Hélio. Op. cit. p. 464.
(57) Idem, ibidem.
(58) Para o desenvolvimento deste parágrafo tomei como base:
o verbete nacionalismo escrito por Barbosa Lima Sobrinho
para o Dicionário Histórico-Biográfico, op. cit., pp.
2357-2362, o mesmo verbete na Enciclopedia Internacional
de las Ciencias Sociales. Vol. 7. Madrid, Aguilar,
1975, pp. 306- 310, de autoria de Hans Kohn, HOBSBAWN,
Eric. A Era das Revoluç•es: 1789-1848. 3ª ed., Rio de
Janeiro, Paz e Terra, 1981, capítulo sete, A Era do
8
Capital: 1848-1875. 4ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra,
1982, capítulo cinco, A Era dos Impérios: 1875-1914. 2ª
ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988, capítulo seis e
Naç•es e Nacionalismo desde 1780. Rio de Janeiro, Paz e
Terra, 1990, passim. Esta última obra sintetiza as
reflex•es do autor sobre o tema. O seu alto grau de
erudição não impede que, ao relaxar da análise do
aspecto econômico,acredite estar o nacionalismo entrando
em declínio a partir de 1950. Ressaltando o papel de
transformação social do nacionalismo, recorri a
ANDERSON, Benedict. Nação e Consciência Nacional. São
Paulo,°tica, 1989, passim e KOHN, Hans. A era do
nacionalismo. Rio, São Paulo, Fundo de Cultura, 1962
(?), passim.
(59) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alves de. (coord.) Op.
cit. pp. 2358-2359.
(60) KOHN, Hans. Nacionalismo. In: SILLS, David. (coord.)
Enciclopedia Internacional de las Ciencias Sociales.
Vol. 7 Madrid, Aguilar, 1975, p. 307.
(61) HOBSBAWN, Eric. A Era do Capital: 1848-1875. 4ª., Rio de
Janeiro, Paz e Terra, 1982, p. 112.
(62) HOBSBAWN, Eric. Naç•es e nacionalismo desde 1780. Rio de
Janeiro, Paz e Terra, 1990, 174.
(63) SOUZA, Nilson de Araújo de. Op. cit.
(64) HOBSBAWN, Eric. Op. cit., Idem.
(65) MAGALHÃES, Sérgio. Prática da emancipação nacional. 2ª
ed., Rio de Janeiro, Ediç•es Tempo Brasileiro, 1964, pp.
39-40.
(66) FURTADO, Celso. Op. cit., p. 143.
(67) O Semanário, nº 348, de 29 de agosto a 4 de setembro de
1963.
(68) O Semanário, nº 348, de 29 de agosto a 4 de setembro de
1963.
8
CONCLUS_ES
A campanha "o petróleo é nosso" é parte de um programa
mais amplo, que inclui a construção da estatal do setor
elétrico e o projeto nuclear autônomo. Os nacionalistas
têm claro que é vital a consolidação da empresa
petrolífera e esta é questão central de suas
manifestaç•es públicas, seja nas ruas, na imprensa ou no
Congresso Nacional. A defesa da Petrobrás, como procurei
mostrar, se dá na divulgação de suas primeiras
realizaç•es, apresentadas em exposiç•es de produtos
nacionais, como a organizada em janeiro de 1958 pela
UNE. Por outro lado, procura-se disseminar a instalação
de torres simbolizando a Petrobrás. Observa-se aqui a
tentativa de erigir monumentos não-oficiais intentando
fortalecer a coesão programática com o apelo ao
imaginário. Junto às torres simbólicas eram realizados
os atos em defesa do petróleo, acompanhados regularmente
pelo jornal O Semanário.
Ao contrário do petróleo, o debate em torno da questão
da eletricidade e do projeto nuclear quase que se restringe
ao Congresso e à imprensa, e, no caso do petróleo, vai exigir
longa maturação. A Eletrobrás só será criada em 1962, no
governo João Goulart;e a Comissão Nacional de Energia
Nuclear, em 1956, no governo Kubitschek.
A carta-testamento acompanha esse processo de construção
simbólica. É reproduzida e lida nas manifestaç•es e
transforma-se em profissão de fé nacionalista, constituindo-
se, sua leitura anual, por ocasião do aniversário de morte do
presidente Vargas, ritual incorporado à nossa memória
coletiva. A permanência desse
ritual até nossos dias confirma sua inclusão no que Hobsbawn
chama de "tradição inventada", em que a repetição inculca
valores e normas de comportamento. Esta repetição
implica continuidade em relação ao passado. Nesse
8
sentido, o uso que os nacionalistas fazem das figuras de
Tiradentes e Floriano Peixoto é bem representativo dessa
necessidade de elaboração simbólica.
Vargas, após o 24 de agosto, é incluído neste panteão
dos heróis nacionais. O passado transforma-se em tradição
para emprestar aos homens a força de que necessitam para
revolucionarem-se (01). No comício de 13 de março, um
espectro perpassa os gestos e palavras de Jango e da massa
presente na praça - Vargas.
No segundo momento procurei estabelecer duas tendências
principais: o movimento nacionalista revela seu pluralismo e
vitalidade com o surgimento, a partir de meados da década de
cinqüenta, de mais de uma dezena de organizaç•es, e, por sua
vez, o Estado se volta de forma mais efetiva para a formação
da consciência coletiva, em que Brasília é o exemplo dessa
preocupação e o Plano de Metas é a afirmação programática.
Fortalecido organicamente, o movimento intensifica a
conquista de adesão. O teor de seu discurso expressa a
certeza de que não basta um vago sentimento nacionalista, de
forma que é necessário razão e conhecimento da realidade
brasileira, nas palavras de Roberto Silveira (02). Em outras
palavras, é necessário transformar o sentimento coletivo de
nacionalidade em opinião pública.
A existência de duas concepç•es de nacionalismo-- o
nacionalismo desenvolvimentista e o nacionalismo militante
das diversasorganizaç•es -- revela a radicalização do debate.
Os sinais de fortalecimento do movimento nacionalista são
expressivos. Diversas organizaç•es são fundadas nesse
período. O Semanário, jornal das quais se torna porta-voz, é
fundado em 1956.
O terceiro momento é o da luta pelas reformas de base.
Há duas manifestaç•es de massa desse período marcadamente
caracterizadas por seu conteúdo nacionalista: os dois
comícios pelas reformas de base - o primeiro, realizado em
agosto de 1963; e o célebre comício de 13 de março de 1964.
O processo de equalização obtido nessas reuni•es de
massa é a face externa do desencontro em torno dos caminhos a
serem tomados. Para um setor expressivo do movimento
nacionalista, tanto o Congresso como o presidente João
8
Goulart são empecilhos sérios para as reformas. O debate em
torno de alternativas e ritmo para implementação das reformas
revela a abrangência a que chegou o movimento. Neste momento
ele já atingira setores situados a certa distância do seu
centro irradiador. O comentário do poeta Manuel Bandeira, em
1957, sobre o livro Que sabe você sobre o petróleo ?, de
Gondin da Fonseca, já prenunciava tal amplitude(03).
Dois projetos permanecem presentes em todas as
manifestaç•es, sejam nos comícios ou greves, apontando
emblematicamente para o aspecto nacional das reformas - o
controle do capital estrangeiro e a ampliação do monopólio do
petróleo, traduzido na nacionalização das refinarias.
A aprovação desses dois projetos e o início de
enfrentamento da questão agrária assinalam o amadurecimento
do projeto nacional-popular. O aumento da presença do Estado
na gestão econômica, acompanhada da intensificação da
participação popular, dilui o aspecto de "ideologia de
Estado" do nacionalismo. O projeto nacionalista, que se
articula desde a campanha "o petróleo é nosso" até 1964, tem
fortes vínculos com a sociedade. Aí reside sua força - o
nacional como apreensão das classes populares.
As determinaç•es concretas, analisadas neste trabalho
tendo como base o movimento nacional centrado nas classes
populares, articulam-se com o sistema capitalista mundial e
sugerem graves contradiç•es entre o projeto nacional-popular
e o processo de expansão estrangeira no país.
8
NOTAS
(01) MARX, Karl. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. In: Os
pensadores. 2ª ed., São Paulo, Abril Cultural, 1978, p.
329.
(02)MIRANDA, Maria Augusta Tibiriçá de. O Petróleo é Nosso. A
luta contra o "entreguismo", pelo monopólio estatal.
Petrópolis, Vozes, 1983, pp. 416-417.
(03)Contracapa de Que sabe você sobre o petróleo ? 5ª ed.,
Rio de Janeiro, Livraria São José, 1957.
8
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8
ANEXO I
CARTA-TESTAMENTO DE GET_LIO VARGAS
"Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo
coordenaram-se novamente e se desencadeiam sobre mim. Não me
acusam, insultam; não me combatem, caluniam - e não me dão o
direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a
minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre
defendi, o povo e principalmente os humildes. Sigo o destino
que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação
dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me
chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de
libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de
renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha
subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos
nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho.
A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso.
Contra a Justiça da revisão do salário mínimo se
desencadearam os ódios. Quis criar a liberdade nacional na
potencialização de nossas riquezas através da Patrobrás; mal
começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A
Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o
trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja
independente. Assumi o Governo dentro da espiral
inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os lucros
da empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas
declaraç•es de valores do que importávamos existiam fraudes
constatadas de mais de 100 milh•es de dólares por ano. Veio a
crise do café, valorizou-se o nosso produto. Tentamos
defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão
sobre a nossa economia, a ponto de sermos obrigados a ceder.
Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a
uma pressão constante, incessante, tudo suportando em
silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para
defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos
posso dar a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o
sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro,
eu ofereço em holocausto a minha vida. Escolho este meio de
estar sempre ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa
porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós
e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no meu
pensamento a força para a reação. Meu sacrifício vos manterá
unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de
8
meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e
manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio
respondo com o perdão. E aos que pensam que me derrotaram,
respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me
liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo
não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para
sempre em sua alma e meu sangue terá o preço do seu resgate.
Lutei contra a espolioação do Brasil. Lutei contra a
espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as
infâmias, a calúnia, não abateram meu ânimo. Eu vos dei a
minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio.
Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e
saio da vida para entrar na História."
ANEXO II
DISCURSO DO PRESIDENTE JOão GOULART, EM 13 DE MARÇO DE
1964
"(...) Estaríamos, assim, brasileiros, ameaçando o
regime se nos mostrássemos surdos aos reclamos da nação,
desta Nação e desses reclamos que, de Norte a Sul, de Leste a
Oeste, levantam o seu grande clamor pelas reformas de base e
de estrutura, sobretudo pela reforma agrária, que será o
complemento da abolição do cativeiro para dezenas de milh•es
de brasileiros, que vegetam no interior, em revoltantes
condiç•es de miséria. Ameaça à democracia, enfim, não é vir
confraternizar com o povo na rua. Ameaça à democracia é
empulhar o povo brasileiro, é explorar os seus sentimentos
cristãos, na mistificação de uma indústria do anticomunismo,
insurgindo o povo até contra os grandes e iluminados
ensinamentos dos grandes e santos Papas que informam notáveis
pronunciamentos, das mais expressivas figuras do episcopado
nacional. O inolvidável Papa João XXIII é que nos ensina,
povo brasileiro, que a dignidade da pessoa humana exige,
normalmente como fundamento natural para a vida, o direito e
o uso dos bens da terra, ao qual corresponde a obrigação
fundamental de conceder uma propriedade para todos. É dentro
desta autêntica doutrina que o Governo brasileiro vem
procurando situar sua política social, particularmente no que
diz respeito à nossa realidade agrária. O cristianismo nunca
foi o escudo para os privilégios condenados para o Santo
Padre, nem também, brasileiros, os rosários podem ser
levantados contra a vontade do povo e as suas aspiraç•es mais
legítimas. Não podem ser levantados os rosários da fé contra
o povo, que tem fé numa justiça social mais humana e na
8
dignidade das suas esperanças. Os rosários não podem ser
erguidos contra aqueles que reclamam a discriminação da
propriedade da terra, hoje ainda em mãos de tão poucos, de
tão pequena minoria (...).
(...) De minha parte, à frente do Poder Executivo, tudo
continuarei fazendo para que o processo democrático siga o
caminho pacífico, para que sejam derrubadas as barreiras que
impedem a conquista de novas etapas e do progresso. E podeis
estar certos, trabalhadores, de que juntos, Governo e povo,
operários, camponeses, militares, estudantes, intelectuais e
patr•es brasileiros que colocam os interesses da pátria acima
de seus interesses, haveremos de prosseguir, e prosseguir de
cabeça erguida, a caminhada da emancipação econômica e
emancipação social do país. O nosso lema, o nosso lema,
trabalhadores do Brasil, é progresso com justiça, e
desenvolvimento com igualdade. A maioria dos brasileiros já
não se conforma com a ordem social imperfeita, injusta e
desumana. Os milh•es que nada têm impacientam-se com a
demora, já agora quase insuportável, em receber os dividendos
de um progresso tão duramente construído, mas construído
também com o esforço dos trabalhadores e o sacrifício dos
humildes. Vamos continuar lutando pela construção de novas
usinas, pela abertura de novas estradas, pela implantação de
mais fábricas, de novas escolas, de hospitais para o povo
sofredor; mas sabemos, trabalhadores, que nada disso terá
sentido profundo se ao homem não for assegurado o sagrado
direito ao trabalho e a uma mais justa participação no
desenvolvimento nacional (...).
(...) A reforma agrária não é capricho de um Governo ou
programa de um partido. É produto da inadiável necessidade de
todos os povos do mundo. Aqui, no Brasil, constitui a legenda
mais viva da esperança do nosso povo, sobretudo daqueles que
labutam no campo.
A reforma agrária é também uma imposição progressista do
mercado interno, que necessita aumentar a sua produção para
sobreviver.
Os tecidos e os sapatos sobram nas prateleiras das lojas
e as nossas fábricas estão produzindo muito abaixo de sua
capacidade. Ao mesmo tempo em que isso acontece, as nossas
populaç•es mais pobres vestem farrapos e andam descalças,
porque não têm direito para comprar.
Assim, a reforma agrária é indispensável, não só para
aumentar o nível de vida do homem do campo, mas, também, para
dar mais trabalho às indústrias, e melhor remuneração ao
trabalhador urbano.
8
Interessa, por isso, também a todos os industriais e aos
comerciantes. A reforma agrária é necessária, enfim, à nossa
vida social e econômica, para que o País possa progredir, em
sua indústria e no bem-estar do seu povo.
Como garantir o direito de propriedade autêntica quando,
dos quinze milh•es de brasileiros que trabalham a terra, no
Brasil, apenas dois milh•es e meio são proprietários ?
O que estamos pretendendo fazer no Brasil, pelo caminho
da reforma agrária, não é diferente, pois, do que se fez em
todos os países desenvolvidos do mundo. É uma etapa de
progresso que precisamos conquistar e haveremos de conquistar
(...).
(...) Tenho autoridade para lutar pela reforma da atual
Constituição, porque esta reforma é indispensável e porque o
seu objetivo único e exclusivo é abrir o caminho para a
solução harmônica dos problemas que afligem ao nosso povo.
Não me animam, trabalhadores, - e é bom que a Nação me ouça -
quaisquer propósitos de ordem pessoal. Os grandes
beneficiários das reformas serão, acima de todos, o povo
brasileiro e os governos que me sucederem. A eles,
trabalhadores, desejo entregar uma nação engrandecida,
emancipada e cada vez mais orgulhosa de si mesma, por ter
resolvido mais uma vez, e pacificamente, os graves problemas
que a história nos legou.
Dentro de 48 horas vou entregar à consideração do
Congresso Nacional a mensagem presidencial deste ano.
Nela, estão claramente expressas as intenç•es e os
objetivos deste Governo. Espero que os senhores
congressistas, em seu patriotismo, compreendam o sentido
social da ação governamental, que tem por finalidade acelerar
o progresso deste País e assegurar aos brasileiros melhores
condiç•es de vida e trabalho, pelo caminho da paz e do
entendimento, isto é, pelo caminho reformista, pacífico e
democrático.
Mas estaria faltando ao meu dever se não transmitisse,
também, em nome do povo brasileiro, em nome destas cento e
cinqüenta ou duzentas mil pessoas que aqui estão, caloroso
apelo ao Congresso Nacional, para que venha ao encontro das
reivindicaç•es populares, para que, em seu patriotismo, sinta
os anseios da Nação, que quer abrir caminho, pacífica e
democraticamente, para melhores dias. Mas também,
trabalhadores, quero referir-me a um outro ato que acabo de
assinar, interpretando os sentimentos nacionalistas deste
País. Acabei de assinar, antes de dirigir-me para esta grande
8
festa cívica, o decreto de encampação de todas as refinarias
particulares (...).
(...) A partir de hoje, trabalhadores brasileiros, a
partir deste instante, as refinarias de Capuava, Ipiranga,
Manguinhos, Amazonas e Destilaria Rio-Grandense passam a
pertencer ao povo, passam a pertencer ao patrimônio nacional.
Procurei, trabalhadores, depois de estudos cuidadosos,
elaborados por órgãos técnicos, depois de estudos profundos,
procurei ser fiel ao espírito da Lei nº 2.004, lei que foi
inspirada nos ideais patrióticos e imortais de um brasileiro
que também continua imortal em nossa alma e nosso espírito.
Ao anunciar, à frente do povo reunido em praça pública,
o decreto de encampação de todas as refinarias de petróleo
particulares, desejo prestar homenagem de respeito àquele que
sempre esteve presente nos sentimentos do nosso povo, o
grande e imortal Presidente Getúlio Vargas.
O imortal e grande patriota tombou, mas o povo continua
a caminhada, guiado pelos seus ideais. E eu, particularmente,
vivo hoje momento de profunda emoção ao poder dizer que, com
este ato, soube interpretar o sentimento do povo brasileiro.
Alegra-me ver, também, o povo reunido para prestigiar
medidas como esta, da maior significação para o
desenvolvimento do País e que habilita o Brasil a aproveitar
melhor as suas riquezas minerais, especialmente as riquezas
criadas pelo monopólio do petróleo. O povo estará sempre
presente nas ruas e nas praças públicas, para prestigiar um
Governo que pratica atos como estes, e também para mostrar às
forças reacionárias que há de continuar a sua caminhada, no
rumo da emancipação nacional.
Na mensagem que enviei à consideração do Congresso
Nacional estão igualmente consignadas duas outras reformas
que o povo brasileiro reclama, porque é exigência do nosso
desenvolvimento e da nossa democracia. Refiro-me à reforma
eleitoral, à reforma ampla que permita a todos os brasileiros
maiores de 18 anos ajudar a decidir os seus destinos, que
permita a todos os brasileiros que lutam pelo engrandecimento
do País a influir nos destinos gloriosos do Brasil. Nesta
reforma, pugnamos pelo princípio democrático, princípio
democrático fundamental, de que todo alistável deve ser
também elegível.
Também está consignada na mensagem ao Congresso a
reforma universitária, reclamada pelos estudantes
brasileiros, pelos universitários, classe que sempre tem
8
estado corajosamente na vanguarda de todos os movimentos
populares e nacionalistas.
Ao lado dessas medidas e desses decretos, o Governo
continua examinando outras providências de fundamental
importância para a defesa do povo, especialmente das classes
populares.
Dentro de poucas horas, outro decreto será dado ao
conhecimento da Nação. É o que vai regulamentar o preço
extorsivo dos apartamentos e residências desocupados, preços
que chegam a afrontar o povo e o Brasil, oferecidos até
mediante o pagamento em dólares. Apartamento, no Brasil, só
pode e só deve ser alugado em cruzeiros, que é dinheiro do
povo e a moeda deste País. Estejam tranqüilos que dentro de
em breve este decreto será uma realidade.
E realidade há de ser também a rigorosa e implacável
fiscalização para que seja cumprido. O Governo, apesar dos
ataques que tem sofrido, apesar dos insultos, não recuará um
centímetro sequer na fiscalização que vem exercendo contra a
exploração do povo. E faço um apelo ao povo para que ajude o
Governo na fiscalização dos exploradores do povo, que são
também exploradores do Brasil. Aqueles que desrespeitarem a
lei, explorando o povo - não interessa o tamanho de sua
fortuna, nem de seu poder, esteja ele em Olaria ou na Rua do
Acre - hão de responder perante a lei pelo seu crime.
Aos servidores públicos da Nação, aos médicos, aos
engenheiros do serviço público, que também não me têm faltado
com o seu apoio e o calor de sua solidariedade, posso afirmar
que suas reivindicaç•es justas estão sendo objeto de estudo
final e que em breve serão atendidas. Atendidas porque o
Governo deseja cumprir o seu dever com aqueles que
permanentemente cumprem o seu para com o País (...)."
8
ANEXO III
QUADRO DE ORGANIZAÇ_ES NACIONALISTAS
+------------------------------------------------------------
-------------------------------------------------------------
---------------------------------------+
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ ¦
¦ ORGANIZAÇão ¦ CRIAÇão ¦ INICIATIVA E
¦ FINALIDADES E/OU ¦ EXTINÇão
¦ OBSERVAÇ_ES ¦
¦ ¦ ¦ COMPOSIÇão
¦ CARACTERµSTICAS ¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ ¦
+-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* Liga de Emancipa-¦* Abril de 1954¦* Membros do Centro de
Estudos¦ ¦* Junho de 1956
¦* A Liga de Emancipação¦
¦ ção Nacional ¦ ¦ e Defesa do Petróleo
e da¦ ¦
¦ Nacional foi extinta no¦
¦ ¦ ¦ Economia Nacional
¦ ¦
¦ governo JK. ¦
¦-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* Frente Naciona-¦* 9/06/1955 ¦* Principal dirigente:
Coronel¦* Definia nacionalismo como "o regi-¦* Interrompeu
suas ativi-¦ * Durante a campanha eleito-¦
¦ lista ¦ ¦ Nemo Canabarro Lucas
¦ me de liberdade e igualdade das¦ dades em novembro
de¦ ral de 1960, a Frente pro-¦
¦ ¦ ¦
¦ naç•es e dos homens dentro de cada¦ 1955, dando lugar
ঠcurou difundir a idéia da¦
¦ ¦ ¦
¦ nação." ¦ Frente de
Novembro. ɦ criação do Partido Nacio-¦
8
¦ ¦ ¦
¦ ¦ reativada após o
fecha-¦ nalista. ¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦ mento desta, em 1956.
¦ ¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦ Suas atividades são
en-¦ ¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦ cerradas
definitivamente¦ ¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦ em 1961, quando é
subs-¦ ¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦ tituída pelo
Partido¦ ¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦ Nacionalista.
¦ ¦
¦-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* ISEB - Instituto¦* 14/07/55 ¦* Criado no governo
Café¦* Dar conteúdo ideológico ao desen-¦* 1964, com o
golpe¦ ¦
¦ Superior de Estu-¦ ¦ Filho, com base em
proposta¦ volvimento nacional. ¦ militar.
¦ ¦
¦ dos Brasileiros. ¦ ¦ de um grupo de
intelectuais¦ ¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦ conhecido como
"Grupo de¦ ¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦ Itatiaia".
¦ ¦
¦ ¦
¦-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* Frente Parlamen-¦* 1956, após a¦* Formada por
representantes¦* Nota da FPN apoiando a política¦
¦* Dividida nas eleiç•es¦
¦ tar Nacionalista.¦ posse de JK. ¦ de vários partidos,
sendo¦ externa de Jânio. ¦
¦ presidenciais de 1960,¦
¦ ¦ ¦ que a maioria (60%)
era de¦ ¦
¦ quando uma parte apoia¦
8
¦ ¦ ¦ petebistas. Fundada
pela Ala¦ ¦
¦ Jânio; e outra, Lott. ¦
¦ ¦ ¦ Moça do PSD.
¦ ¦
¦ Novamente fragmentada em¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ 1962. ¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ A presença de Leonel¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ Brizola na liderança provo-¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ ca o afastamento dos¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ deputados moderados. ¦
¦-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* Frente 11 de¦* Março de 1956¦* Militares petebistas,
comu-¦* Dar conteúdo político ao movimento¦* Novembro de
1956, quando¦* Promove manifestação em¦
¦ Novembro. ¦ ¦ nistas e
parlamentares. ¦ de 11 de novembro de 1955. ¦
também é preso o Coronel¦ frente ao Ministério da¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦ Nemo Canabarro, líder
do¦ Guerra no primeiro aniver-¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦ movimento.
¦ sário do 11 de Novembro,¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ que atrai cerca de 150.000 ¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ pessoas. ¦
+------------------------------------------------------------
-------------------------------------------------------------
---------------------------------------+
+------------------------------------------------------------
-------------------------------------------------------------
---------------------------------------+
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ ¦
8
¦ ORGANIZAÇão ¦ CRIAÇão ¦ INICIATIVA E
¦ FINALIDADES E/OU ¦ EXTINÇão
¦ OBSERVAÇ_ES ¦
¦ ¦ ¦ COMPOSIÇão
¦ CARACTERµSTICAS ¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ ¦
+-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* GAP - Grupo de¦* 1957 ¦* Bloco Parlamentar
composto¦ ¦
¦ ¦
¦ Ação Política ¦ ¦ por mais de cem
deputados e¦ ¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦ contando com o
apoio de¦ ¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦ cerca de 40 da
minoria. ¦ ¦
¦ ¦
¦-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* MNB - Movimento¦* Junho de 1957¦* Professores e
funcionários¦ ¦* 1958
¦* Unifica-se em 1958 com a¦
¦ Nacionalista Bra-¦ ¦ da Faculdade
Nacional de¦ ¦
¦ Frente Nacionalista Brasi-¦
¦ sileiro. ¦ ¦ Filosofia.
¦ ¦
¦ leira, formando nova enti-¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ dade, intitulada Movimento¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ Nacionalista Brasileiro. ¦
¦-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* Frente Naciona-¦ ¦* Estudantes vinculados
à UNE.¦* Manifesto publicado em "O Semaná-¦* 1958
¦* Unifica-se, em 1958, com o¦
¦ lista Brasileira.¦ ¦
¦ rio", de 1 a 8/08/57. ¦
¦ MNB, formando nova entidade¦
8
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ intitulada MNB (Movimento¦
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ Nacionalista Brasileiro. ¦
¦-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* MNB - Movimento¦* 1958 (fruto¦* Estudantes vinculados
à UNE,¦* A primeira Convenção Nacional do¦ 1964, com
o golpe¦ ¦
¦ Nacionalista Bra-¦ da fusão en-¦ professores e
funcionários¦ MNB, realizada de 9 a 11/09/60,¦ militar.
¦ ¦
¦ sileiro. ¦ tre a FNB e o¦ da Faculdade
Nacional de¦ define a estrutura organizativa do¦
¦ ¦
¦ ¦ antigo MNB). ¦ Filosofia.
¦ movimento e homologou as candida-¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦
¦ turas do Marechal Lott e de João¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦
¦ Goulart à Presidência e à Vice-¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦
¦ Presidência da República. ¦
¦ ¦
¦-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* Liga Nacionalista¦* 1959 (posse¦* Gabriel Passos
(Presidente);¦* Defesa da independência econômica¦
¦* Não chegou a ter atuação¦
¦ Brasileira. ¦ da primeira¦ Sérgio MAGALHÃES
(Vice); e¦ do povo brasileiro como fundamento¦
¦ expressiva. ¦
¦ ¦ diretoria). ¦ Anderson Mascarenhas
(Secre-¦ e condição de sua liberdade¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦ tário Geral).
¦ política. ¦
¦ ¦
¦-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* Frente de Liber-¦ * 24/10/1961 ¦* Grupo que havia lutado
pela¦* Além do ideário nacionalista, tam-¦ * Após as
eleiç•es de¦ ¦
8
¦ tação Nacional. ¦ ¦ posse de João
Goulart,¦ bém presente em outras organiza-¦ 1962.
¦ ¦
¦ ¦ ¦ incluindo os
governadores¦ ç•es, a FLN enfatizava o seu cará-¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦ Mauro Borges e Leonel
Brizo-¦ ter democrático. Aqui os comunis-¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦ la, parlamentares da
FPN e¦ tas não seriam considerados "ove-¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦ membros do MNB e UNE.
¦ lhas negras." ¦
¦ ¦
¦-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* CPC - Centro Po-¦* Dezembro de¦* Intelectuais de
esquerda e¦* Defendia a relação arte/processos¦
¦* Antecedente: Teatro de¦
¦ pular de Cultura.¦ 1961/1962 ¦ UNE (Oduvaldo Viana
Filho,¦ materiais; era necessário que o¦
¦ Arena (SP) e UNE Volante. ¦
¦ ¦ ¦ Leon Hirzman e
C. E.¦ povo entendesse o mundo em que¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦ Martins).
¦ vive, para romper os limites da¦
¦ ¦
¦ ¦ ¦
¦ situação opressiva. ¦
¦ ¦
¦-------------------+---------------+------------------------
------+------------------------------------+-----------------
---------+-----------------------------¦
¦* Frente de Mobili-¦* 1962 ¦* Sucedâneo da FLN, era
também¦* Atuava como grupo de pressão junto¦
¦* Esteve presente no comércio¦
¦ zação Popular ¦ ¦ liderado por Leonel
Brizola ¦ ao presidente João Goulart. ¦
¦ das Reformas de 13 de março¦
¦ ¦ ¦ e reunia deputados da
FPN,¦ ¦
¦ de 1964. ¦
¦ ¦ ¦ sindicalistas e
estudantes. ¦ ¦
¦ ¦
+------------------------------------------------------------
-------------------------------------------------------------
---------------------------------------+
8
+-------------------------------------------------------
-------------------------------------------------------------
--------------------------------------------+
¦ ¦ ¦
¦ ¦
¦ ¦
¦ ORGANIZAÇão ¦ CRIAÇão ¦ INICIATIVA E
¦ FINALIDADES E/OU ¦ EXTINÇão
¦ OBSERVAÇ_ES ¦
¦ ¦ ¦ COMPOSIÇão
¦ CARACTERµSTICAS ¦
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¦* Movimento Nacio-¦* 05/07/1963 ¦* Esposas de
parlamentares da¦ ¦
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¦ nalista Feminino.¦ ¦ FPN.
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