mídia, consumo e a produção dos modos de ser menina
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Mídia, consumo e infâncias: a produção dos modos de ser menina
na contemporaneidade...
Profa. Joice Araújo Esperança Aline de Freitas Eslabão Juliana Silveira Oliveira Priscila da Silva Oliveira
Universidade Federal do Rio Grande – FURG Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental
Nível Doutorado Grupo de Pesquisa Sexualidade e Escola
N. é uma menina de nove anos. Seus pais realizam a coleta e separação do lixo que recolhem nos bairros situados no entorno da escola, a fim de venderem a parcela reciclável. Assim obtém seu
sustento. Diariamente, a menina leva para a escola diversos objetos de consumo que seus pais selecionam para presenteá-la. Dentre eles estão gibis e revistas, brinquedos, jogos, material escolar... Hoje,
ela portava vários exemplares da Revista Recreio. Um deles tratava do seriado Power Rangers. As crianças da turma demonstraram interesse e entusiasmo pelo conteúdo da revista. As conversas
sobre o seriado culminaram com a organização de uma brincadeira, em que meninos e meninas protagonizaram os personagens do
seriado que assistem na emissora Rede Globo (Diário de Pesquisa, 2005).
Para iniciar, uma cena...
“Eu ia comprar um monte se eu pudesse. Sabe a novela das nove?
Eu ia ser que nem a Irene: ia comprar um monte de coisa bonita,
roupa, jóia...” (menina, 8 anos).
“Sabe aquele programa do Caldeirão do Huck, que tem a lata velha? Ele
arrumou o carro e daí tinha som, TV, videogame. Eu queria ter um carro
assim” (menino, 7 anos).
“É a Barbie [aponta para um desenho]. Elas pegam as pranchas e vão surfar e depois tomar banho de piscina. Também tem um
boné grátis que vem junto. Na propaganda, diz assim: você escolhe rosa ou branco” (menina, 7 anos).
Eu vi na TV a bonequinha e vem com uma piscininha e com uma prancha. E daí era pra comprar na Loja Continental. K
Outras cenas...
Menino cuja família não possuía geladeira, mas havia adquirido uma TV de LCD a prestações; meninas e meninos cujas famílias recebiam
auxílios governamentais e os empregavam na compra do último celular com câmera fotográfica; meninas que, aos 9 anos, tingiam o cabelo e o alisavam para parecerem-se com atrizes de telenovelas;
grupos de meninas que se vestiam como integrantes do grupo “Rebeldes” e encenavam coreografias no espaço do recreio e da sala de aula; adultos que relatavam sobre a insistência das crianças em adquirir brinquedos e aparelhos de MP3; crianças que realizavam a
lavagem e guarda de carros para adquirir brinquedos de séries televisivas e tênis Nike...
[...] a infância é variável – histórica, cultural e socialmente variável. As crianças são vistas – e vêem a si mesmas – de
formas muito diversas em diferentes períodos históricos, em diferentes culturas e em diferentes grupos sociais
(BUCKINGHAM, 2007, p.19).
Sebastião Salgado
Pluralidade dos modos de ser e viver das crianças, das formas de significar a(s) infância(s)...
Sebastião Salgado
Nas sociedades de consumo avançadas, as crianças são interpeladas, posicionadas e
produzidas como consumidoras desde a mais tenra idade. Seu engajamento em práticas de consumo acontece a despeito das diferenças
culturais e sociais implicadas na fabricação de múltiplas infâncias, como os pertencimentos de
classe e gênero...
Sociedade de consumidores, vida
para consumo!
“O ambiente existencial que se tornou conhecido como sociedade de consumidores se distingue por uma reconstrução das relações humanas a partir do padrão, e à semelhança, das
relações entre os consumidores e os objetos de consumo” (BAUMAN, 2008, p.19).
Sociedade de produtores – Sociedade de consumidores
Ponto de ruptura: Revolução consumista
Passagem do consumo ao consumismo
O “consumismo” chega quando o consumo assume um papel-chave, tornando-se um
atributo da sociedade.
• renegociação do sentido do tempo, compulsão à
mudança;
• permanente liquidez de idéias, das necessidades, dos desejos e da satisfação, dos compromissos (estão sempre em vias de se desfazer);
• excesso, descarte, desperdício...
• dissolução do sentido de comunidade – individualização.
• consumo: lógica da vida, a transformação das pessoas em mercadorias.
Sociedade de consumidores:
“Embora elas [as crianças] tenham uma longa participação no
mercado consumidor, até recentemente eram considerados
pequenos agentes ou compradores de produtos. Elas atraíam uma
pequena parcela dos talentos e recursos das indústrias e eram
abordadas principalmente por intermédio de suas mães. Isso se
alterou. Hoje em dia, crianças e adolescentes são o epicentro
da cultura de consumo”(SCHOR, 2009, p.2).
Mudança de rumo histórico: a aliança crianças e consumo.
As crianças têm uma longa história como consumidoras e
como atores econômicos (SCHOR, 2009).
Principal orientação metodológica – escuta das próprias crianças sobre a temática consumo e na
observação de suas interações in loco. Estratégias: produção de auto-retratos,
proposição de entrevistas-conversa, diálogos acerca de histórias infantis, questionários e
desenhos legendados.
Pesquisa com crianças dos Anos Iniciais...
Numa sociedade de consumidores, é preciso estar em constante movimento... Consumir = remodelar-se
a si mesmo incessantemente...
Enquanto construções históricas e contingentes, as identidades de gênero também são forjadas a partir
do consumo, enquanto condição existencial que modela os modos de ser sujeito na sociedade
contemporânea
Produção dos modos de ser menina: preceitos da cultura consumista.
Sociedade de consumidores
Mídia = pletora de significados, pedagogia cultural, ensina modos de ser e viver...
corpo
gênero
sexualidade
consumo beleza
saúde
diversidade cultural
...
“Comodificação” das identidades!
Barbie vai às compras
Consumismo apresentado às meninas na forma de
brinquedo!
Outra cena...
Durante o Projeto “Brinquedos e Brincadeiras”, propus às crianças a escrita de palavras com a letra “p”. Apresentei a elas palavras referentes a brinquedos e brincadeiras, que iniciam com a letra “p”. Algumas delas foram referências na minha infância e podem ser facilmente encontradas em livros didáticos para alfabetização. A primeira palavra, “pipa”, era desconhecida por algumas crianças... Foi preciso recorrer às variações desse vocábulo, como “pandorga” e “papagaio”. A seguinte, “pião”, causou estranhamento entre elas e não hesitaram em perguntar: “o que que é pião, hein?”. Depois de explicar, os meninos identificaram semelhanças entre o “pião” e o objeto lúdico “Beyblade” de uma série de desenho animado. Depois de algum tempo, disse-lhes: “Será que alguém conhece mais algum brinquedo ou brincadeira que tem o nome que inicia com “p”? Nesse momento, temi pelas respostas daquelas crianças de diferentes idades, algumas com histórico de repetência e que demostravam uma desconfiança persistente em sua capacidade para aprender a ler e a escrever. Foi quando um dos meninos disse “Play” [referindo-se ao videogame PlayStation]... Outras crianças completaram: “Pokémon”, “Power Ranger”, “Polly”, “Princesas” [da Disney]... (Diário de Classe, Turma Branco Algodão, 2007).
Adentrei a sala do primeiro ano e as crianças mostraram-se receptivas a minha presença. As estagiárias apresentaram-me e deram seguimento a escrita de uma história com as crianças. [...] Ao término da atividade, as crianças se aproximaram e pude perceber que uma delas portava o recorte de uma reportagem que versava sobre o cantor adolescente Justin Bieber. Enquanto observava a disputa de algumas crianças pelo acesso à reportagem, um grupo de meninos tratou de explicar-me como penteavam o cabelo, a fim de parecer-se com o ídolo. Segundo eles, havia um vídeo do Youtube com as instruções necessárias para tal. De acordo com as estudantes estagiárias, um dos meninos da sala recusava-se a usar o uniforme da escola, no intento de vestir-se como Justin Bieber. Presenciei grupos de crianças cantarem em coro a faixa “Baby”, de grande repercussão nas rádios e nos programas de TV e notei que ostentavam figurinhas, fotos e material escolar personalizado com a imagem do astro da música pop. Enquanto uma das estagiárias perguntava às crianças sobre o que haviam aprendido naquela semana, elas continuavam cantando [...]. (Registros das visitas de estágio do curso de Pedagogia, 2010).
Mais uma cena...
Acesso às mídias: mudanças no estatuto das crianças, no significado das infâncias...
Experiências cotidianas das crianças são repletas de narrativas, imagens e mercadorias produzidas pelas
grandes corporações globalizadas de mídia.
O próprio significado da infância nas sociedades contemporâneas está sendo criado e definido por meio das interações das crianças com as mídias eletrônicas
(BUCKINGHAM, 2007).
As crianças brasileiras estão entre as que mais assistem TV no mundo (média de 4h51min) – Instituto Alana.
14% das crianças brasileiras estão obesas e 25% acima do peso – Instituto Alana
Heróis de filmes de ação e astros da música pop – modelos de papéis preferidos das crianças de 12 anos – Pesquisa intercultural da Unesco
Estima-se que crianças de até 10 anos têm em média trezentas a quatrocentas marcas e logomarcas na memória e assistem a 40 mil comerciais na TV por ano. (LINN, 2006; SCHOR, 2009).
Disciplina de Mídias e Educação
Estudar as mídias – compreensão do tempo presente, a cultura em
que vivemos, os modos de vida que produzimos e que nos produzem
(FISCHER, 2006).
Contatos:
joiceesp@yahoo.com.br
http://profajoice.blogspot.com
Grupo de Estudos Mídia, infâncias e consumo Encontros quartas-feiras (FURG)
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