feminismo e relaÇÕes de gÊnero no maranhÃo: … · este trabalho tem como objetivo apresentar...
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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X
FEMINISMO E RELAÇÕES DE GÊNERO NO MARANHÃO: AÇÃO POLÍTICA DO
FÓRUM MARANHENSE DE MULHERES E SUA REPERCUSSÃO NO
ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA
Maria Mary Ferreira1
Neuzeli Maria de Almeida Pinto2
Resumo: O Fórum Maranhense de Mulheres foi criado em 1986 a partir da iniciativa do Grupo de
Mulheres da Ilha, considerado o pioneiro das lutas feministas no Maranhão. Na formação do Fórum
participaram inicialmente além das Mulheres da Ilha, o Grupo de Mulheres Negras Mãe Andresa,
Espaço Mulher, Grupo 8 de Março, União de Mulheres, Grupo de Mulheres do PDT, Grupo de
Mulheres do PT, Coordenação Estadual da CUT, Coordenação de Mulheres da Fetaema, Coletivo
de Trabalhadores Rurais. Ao longo de trinta anos este colegiado vem realizando um conjunto de
ações feministas que repercutiram de forma positiva no enfrentamento da violência contra as
mulheres. Nesta comunicação apresentamos parte das ações empreendidas no período que
compreende os anos de 2006-2016 em especial ações de formação e ações públicas que motivaram
mudanças em setores do Estado e sociedade. Dessas ações destacamos a criação da Rede de
Enfrentamento à violência contra as mulheres no Maranhão. Trata-se de um estudo qualitativo
construído a partir de entrevistas, estudos de documentos que mostram como foram efetivadas as
ações e repercussão no Estado.
Palavras-Chave: Feminismo; Ação Política; Violência; Gênero; Maranhão
Introdução
Este trabalho tem como objetivo apresentar um balanço crítico do feminismo no Maranhão,
suas influências, suas perspectivas e seus desafios, tomando como referência os grupos feministas
organizados e articulados no Fórum Maranhense de Mulheres, organização da sociedade civil que
tem trinta anos e um ano de existência. Tais ações se articulam entre as ONGs, núcleos
universitários, partidárias, sindicais, entre outros. A repercussão do movimento feminista se dá na
sociedade e nos governos como uma consequência das suas muitas articulações em diversos campos
e em diferentes momentos.
Considerados como movimentos de poucas militantes, e por isso muitas vezes
desqualificados e estigmatizados, entretanto os movimentos feministas realizaram ações
consideradas de enfrentamento que impactaram pela forma inusitada, criativa como as feministas se
expressavam e como repercutia nos canais de comunicação, como se viu recentemente na Parada
1 Professora Associada do Curso de Biblioteconomia e do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da
Universidade Federal do Maranhão. Doutora em Sociologia/UNESP. Mestre em Políticas Públicas/UFMA. Graduada
em Biblioteconomia. (mmulher13@hotmail.com). 2 Professora Adjunta do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Maranhão, Mestre em
Psicologia e Doutora em Teoria e Pesquisa do Comportamento. (neuzeliameida@globo.com).
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Maranhenses de Mulheres realizada no 8 de março de 2017 que teve a presença de sete mil pessoas,
protestando contra a Reforma da Previdência e contra todas as formas de submissão e violência
contra as mulheres. Na imagem representada a seguir é possível perceber a grandeza e dimensão
desta manifestação.
Na construção do texto, recuperamos historicamente as ações empreendidas pelos primeiros
grupos feministas que em 1986 que criam o Fórum Maranhense de Mulheres responsável por um
conjunto de ações que possibilitaram visibilizar a luta das maranhenses por direito, igualdade e
políticas públicas. Neste texto apresentamos reflexões da ação politica do movimento feminista
protagonizado pelo Fórum Maranhense de Mulheres.
Em termos metodológicos, trata-se de um estudo qualitativo com enfoque dialético, cujos
sujeitos são as feministas que atuam nos diversos grupos no Maranhão. Os resultados mostram o
vigor deste movimento e os muitos desafios que se apresentam neste momento de crise do Estado
brasileiro, pós golpe.
A estrutura deste texto apresentada em três itens reflete no primeiro momento aborda a
trajetória dos movimento feministas e as lutas com foco na questão da violência por ter sido a
bandeira que mais unificou o Fórum Maranhense de Mulheres, no terceiro momento são
apresentados as ações mais intensas que marcam a atuação deste colegiado e ao final apresentamos
algumas conclusões que avaliam a dimensão deste movimento articulado pelo citado Fórum.
2 O Feminismo no Brasil e Maranhão e a intensidade da luta contra a violência
A emergência dos movimentos feministas no Maranhão reflete a efervescência das
organizações feministas criados no Brasil em meados da década de sessenta e setenta do Século XX
na luta contra a ditadura militar em que se juntaram centenas de mulheres em diferentes
organizações, buscado recompor o País retirando do jugo dos militares e das elites.
No Maranhão, porém, os movimentos feministas emergem a partir da criação do Grupo de
Mulheres da Ilha, pioneiro das lutas feministas neste Estado e responsável por socializar o debate
sobre a condição feminina nas organizações estudantis, de professores e nos partidos de esquerdas e
sindicatos, a exemplo da Associação de Professores da Universidade Federal do Maranhão, do
Movimento Democrático Brasileiro – MDB, Comissão Justiça e Paz, Sociedade de Defesa dos
Direitos Humanos, posteriormente, Partidos dos Trabalhadores - PT, Partido Democrático
Trabalhista – PDT, entre outros. A ação intensa desenvolvida pelo Grupo de Mulheres da Ilha fez
emergir um debate político sobre a situação de subalternidade das mulheres no Maranhão e mais
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especialmente em São Luís no qual se articularam as feministas nestas várias organizações. Da
articulação destes vários grupos foi criado em 1986 o Fórum Maranhense de Mulheres com a
finalidade de “pensar ações de forma articulada no Estado objetivando dar maior visibilidade à luta
das mulheres com vistas à implementação de políticas públicas” (FORUM, 1986, p.1)
Neste período, e ainda hoje a questão da violência passou a ser uma questão central e se
constituiu deste então uma luta política das brasileiras e das maranhenses tendo em vista que era o
tema que mais unificava e ainda unifica as organizações de mulheres e feministas naquele momento
histórico, conforme nos reporta Bandeira (2014, on line)
[...] na agenda do movimento feminista brasileiro, a questão da violência contra a mulher
tornou-se sua principal identidade, o que possibilitou ampliar o diálogo além dos espaços
da militância com a academia, em especial com os núcleos de pesquisa, bem como com a
sociedade civil, por meio das organizações não governamentais (ONGs). A atuação da
militância feminista e as reivindicações dos movimentos sociais criaram as condições
históricas, políticas e culturais necessárias ao reconhecimento da legitimidade e da
gravidade da questão, conferindo novos contornos às políticas públicas.
As reflexões de Bandeira foram refletidas por Ferreira (2007) quando esta analisa a ação do
movimento feminista no Maranhão no combate a violência contra as mulheres. Nesse estudo a
autora enfatiza que as agendas dos movimentos feministas no combate a violência foi construída
por todos os grupos de mulheres, mesmo aqueles não tão afinados com os movimentos feministas:
[...] dos grupos considerados feministas, aos grupos de mulheres meio avessos às questões
consideradas mais “radicais” como, por exemplo, a questão do aborto. [...] o problema da
violência unificava da “União de Mulheres” (grupos de mulheres ao Partido Comunista do
Brasil que advogava pela mudança do regime como fator decisivo para resolver os
problemas das mulheres), à Pastoral da Mulher, que tem forte ligação com a Igreja Católica,
e era opositora intransigente das feministas, particularmente quando se trata de defender os
direitos reprodutivos das mulheres.
As ações realizadas nos últimos 30 anos para mudar o quadro de violência contra as
mulheres esbarram em um problema: a morosidade da justiça, o distanciamento da justiça das
questões de gênero, a visão patriarcal que prevalece nos autos dos processos em que as mulheres
são vítimas, demonstrando dessa maneira que a magistratura não alterou seus valores patriarcais
sobre as mulheres e ainda a considera como subordinada nas relações conjugais. Desse modo as
inúmeras ações empreendidas pelo Fórum Maranhense de Mulheres nesta última década, transcritas
no item seguinte denotam a luta contínua para transformar a relações de gênero no Maranhão.
2.1 A ação dos movimentos feministas no Maranhão: botando a boca no mundo para
denunciar a violência
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A luta das feministas pela dignidade das mulheres mais especialmente contra a violência de
gênero vem de longe, porém, ao construir uma breve linha do tempo observamos a partir de vários
estudos, que esta luta ganha força, quando emergem as primeiras denúncias contra os “crimes da
paixão”, assim denominados por Mariza Correa, pesquisadora feminista da UNICAMP, que
polariza o debate sobre a violência contra as mulheres mostrando as injustiças e atrocidades dos
atos praticados por maridos, ex-maridos, namorados, ex-namorados e amantes contra mulheres com
as quais viviam algum tipo de relação amorosa. O assassinato de Ângela Diniz, no Rio de Janeiro, e
Marina Canto, no Maranhão:
[...] cometidas em estado de “forte emoção” e em “defesa legítima da honra”, segundo os
argumentos de seus assassinos - refletiam uma situação inaceitável para as mulheres e para
as organizações feministas. Esses fatos contribuíram para desencadear a luta pela dignidade
das mulheres com o argumento de que “Quem ama não mata”. Desta luta surgiram as
primeiras ações pela criação das delegacias especiais da mulher em todo o Brasil.
(FERREIRA, et. al. 2016, p.50).
O livro “Os crimes da paixão” lançado por Mariza Correa em 1981 reacende o debate sobre
o tema e desencadeia em todo o Brasil um clima de revolta contra a impunidade dos assassinos de
mulheres. Este clima de revolta e articulação dos movimentos feministas é favorecido pela
reabertura política e pelas novas perspectivas que se abriam para os brasileiros após longos anos de
repressão militar. Era um clima fértil para a ação do movimento feminista que passou a exercer
forte pressão diante do descaso do sistema policial e de ausência de justiça no tratamento da
violência contra a mulher.
Este clima de descontentamento e pressão das feministas favoreceu a criação das primeiras
delegacias da Mulher, fato que irá visibilizar a opressão de uma violência silenciada durante
séculos. A primeira delegacia a ser criada no Brasil foi a Delegacia de São Paulo em 1982. No
Maranhão a criação deste instrumento legal se deu em 1986 no Governo de Epitácio Cafeteira após
uma ampla mobilização dos estudantes da Universidade Federal do Maranhão após uma tentativa de
estupro dentro do Campus desta Universidade. É importante ressaltar que a luta pela criação da
Delegacia da Mulher no Maranhão inicia no processo de formação do Grupo de Mulheres da Ilha,
pioneiro das lutas feministas neste Estado, criado em 1980.
A violência contra as mulheres embora não tenha sido a luta que funda a ação do grupo de
Mulheres da Ilha, preocupado de refletir questões da subjetividade, entretendo, sua primeira ação
pública tem como tema a questão da violência. interioridade desencadeada no Maranhão a partir
de 1980 pelo Grupo de Mulheres da Ilha, depois encampada por outros grupos feministas a exemplo
do Grupo de Mulheres Negras Mãe Andresa, criado em 1986, foi depois encampada pelo Fórum
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Maranhense de Mulheres. , teve como marco um importante Debate: A Mulher e a Violência,
realizado em novembro de 1980 no Colégio Marista. Este debate reuniu mais de 400 pessoas entre
mulheres e homens.
Neste debate as Mulheres da Ilha surpreendem o público ao trazer os dados de uma pesquisa
realizada em quatro distritos policias, na qual constava-se um índice bastante elevado de denúncias
feito pelas mulheres nas delegacias. O silêncio da plateia naquele momento, contrastava com os
números em que mais de quatrocentas mulheres tinham comparecido as delegacias da Capital de
São Luís para denunciar seus maridos, namorados, irmãos, amantes da prática de estupros, tortura,
assédio, espancamentos. Nesses dados levantados desvendamos que muitas das mulheres vítimas
foram a óbito. Este primeiro debate promovido pelo até então único feminista existente em São Luís
foi como um “abrir os olhos e botar a boca no mundo”. Expressão que retrata o sentido de
esclarecimento de uma situação até aquele momento invisível.
3 A Violência contra a Mulher na Agenda do Fórum Maranhense de Mulher
A ação do Fórum Maranhense de Mulheres esteve quase sempre articulada às ações do
Grupo de Mulheres da Ilha, até término deste grupo em 2007. Os anos iniciais do Fórum foram
voltados para o fortalecimento da criação da Delegacia da Mulher de São Luís instalada em 1987.
Participavam mais ativamente deste movimento o Grupo Mulheres Viva Maria, que atuava como
grupo de reflexão com mulheres em situação de violência e o Grupo de Mulheres Negras Mãe
Andresa, criado em 1986, que entra na luta chamando a atenção para a desigualdade de raça e etnia
e lembrando que as negras e pardas era a maioria entre as mulheres vítimas de violência.
A ação dos grupos feministas articulados no Fórum Maranhense de Mulheres envolveu um
conjunto de questões que perpassavam os espaços do privado ou o mundo da casa. Embora grande
parte da violência tenha cor e classe, porém, foram emergindo as violências presente nas classes de
padrão econômico mais elevado. Os dados da Delegacia da Mulher surpreendiam.
No inicio dos anos noventa, ou seja, cinco anos após sua criação constatou-se que 20.291
mulheres tinham registrados boletins de ocorrências na Delegacia da Mulher. Constatava-se
também que o atendimento prestado pela delegacia às mulheres vítimas estava comprometido pela
inclusão de homens em seus quadros e pela falta de sensibilidade de funcionárias que prestavam
atendimento. Além dessas informações constatou-se que:
[...] grande parte da violência sofrida pelas mulheres não é denunciada, sobretudo, nos
casos de violência sexual, a DEM não atende todos os bairros de São Luís, ficando grandes
áreas urbanas como Maiobão, Cidade Operária e Adjacências de outras delegacias.
(FÓRUM, 2003, p. 21).
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3.1 Ações de Enfrentamento à Violência contra a Mulher no Maranhão
Os dados agrediam, chocavam e intimavam os movimentos feministas a agirem. Desse
modo o Grupo de Mulheres da Ilha em conjunto com o Sindicato dos Trabalhadores em
Estabelecimento de Ensino da Rede Particular do Maranhão a desencadearem uma campanha de
combate a violência contra a mulher em São Luís, oportunidade em que lançaram o Guia de Defesa
da Mulher. Foram distribuídos quinze mil guias nas escolas através de palestras com professores e
alunos, para setores da imprensa e também distribuídos em todas as Delegacias da Mulher do
Maranhão.
A guia em formato de cartilha, apresentava a situação da violência registrada na DEM/São
Luís através de dados em formato de tabelas, os tipos de violência que mais comumente atingia as
mulheres nesta cidade, tais como: constrangimento ilegal, ameaça, calúnia, injúria, estupro, lesão
corporal, entre outras violências e ao lado de cada crime era explicitado a violência e o tipo de
punição previsto no Código Penal Brasileiro.
O tema do enfrentamento da violência se institucionaliza tanto na agenda dos movimentos
quanto dos governos. Isso vai exigindo dos grupos feministas articulações mais urgentes para
pressionar o Estado por políticas públicas. As políticas públicas vale destacar, se constituem ações
importantes implementadas pelo estado democrático para interferir nos problemas que afetam a
sociedade brasileira, em se tratando de politicas públicas de combate a violência de gênero estas
respondem a pressão e reinvindicação dos movimentos feministas para interferir na erradicação
deste fenômeno. A luta dos movimentos feministas tornou pública a violência contra as mulheres e
possibilitou inúmeras estratégias de enfrentamento nos diversos estados brasileiros. Para Bandeira
(2004, on line) [...] “a luta do movimento feminista foi tornar pública a violência sofrida pelas
mulheres, no sentido de reconhecê-la como problema que envolve a sociedade em geral, o poder
familiar ainda a silencia”.
As feministas contribuíram para romper este silêncio e pressionaram o estado para criar
políticas para transformar essa realidade que dói e mata. Assim os encontros, debates, conferências
nacionais e internacionais fizeram o movimento feministas se tornar cada vez mais global se
tornando uma força organizada, capaz de influenciar em acordos institucionais de compromisso
com a igualdade social e de gênero. No Brasil um conjunto de políticas implementadas nos anos
noventa e nas primeiras décadas do Século XXI possibilitaram transformar a vida das brasileiras e
das maranhenses.
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A criação do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, o Pacto Nacional de Combate à
Violência de Gênero, a ampliação das Delegacias da Mulher, a Lei Maria da Penha, as Varas de
Combate a Violência de Gênero, foram organismos criados que tem entre seus horizontes o de
erradicar a violência de gênero.
A Lei Maria da Penha (2006), O Pacto Estadual de Combate a Violência no Maranhão
(2008), a Vara de Combate a Violência contra a Mulher foram respostas dos governos do Maranhão
à luta feministas por politicas públicas para as mulheres, todas essas Leis e estruturas legais foram
criadas para por fim a um drama que afeta as mulheres de todas as idades, de todas as classes, raças
e etnias. Os últimos índices de violência registrados na Delegacia da Mulher de São Luís nos
apontam que este é um fenômeno que continua presente na vida das mulheres e hoje se espraia por
setores que nos anos oitenta apareciam poucos registros.
3.2 As redes de Enfrentamento e as estratégias do Fórum para combater a violência de gênero
Nas últimas décadas quando se esperava que o fenômeno da violência contra a mulher seria
erradicado, pela ação dos órgãos criados e pela ação do Judiciário, observamos que a violência tem
aumentado e que permanece grande parte não notificada. Os dados na Delegacia da mulher de São
Luís nos anos de 2013 a 2015 registraram mais de dezesseis mil casos. Os dados demostram que a
violência aumenta na mesma proporção da impunidade, haja vista que a Vara da Violência contra a
Mulher criada em 2012 em São Luís e Imperatriz, municípios mais populosos do Maranhão, não
tem conseguido dar respostas às mulheres no sentido de punir os agressores, assim como emitir
medidas protetivas para garantir as mulheres vítimas proteção do Estado.
A situação tende a se agravar em virtude das medidas do governo Temer de diminuir os
gastos com as políticas de igualdade de gênero, tornando mais distantes ainda o projeto de
construção de uma sociedade na qual as mulheres possam andar livremente sem medo de ser
estuprada, espancada, assediada como tem sido prática comum na sociedade atual.
No período que compreende os anos de 2003 a 2016 o Fórum Maranhense de Mulheres
realizou ações políticas e de formação visando fortalecer os grupos feministas maranhenses no
combate a violência de gênero, principalmente. Dentre as ações destacamos: Vigílias, passeatas,
Atos públicos, campanhas de combate à violência contra a mulher, produção de material educativo,
audiências públicas, entre outras ações políticas.
Destas ações destacamos as realizadas em 2016 que iniciou com uma celebração da Lei
Maria da Penha em frente ao Tribunal de Justiça do Estado (foto 1), até a ultima ação realizada na
Universidade Federal do Maranhão nos trinta dias de ativismo promovido pelo Fórum, que encerrou
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com a Mesa Redonda Violência de Gênero: uma questão de Direitos Humanos. A escolha desta
universidade se deu em virtude desta ter sido palco de estupros contra várias mulheres.
Foto 1 de Silvia Cristina: ato de celebração dos 10 anos da Lei Maria da Penha
3.3 Ativismo, Formação Política no Enfrentamento da Violência: estratégias de ação do
Fórum Maranhense de Mulheres
Os “16 dias de ativismo contra a violência à Mulher” vêm sendo realizado pelo Fórum
Maranhense de Mulheres desde 1992, porém este tipo de evento foi sendo incorporada a agenda do
Estado e da Secretaria da Mulher, com ações pontuais, descaracterizando o sentido político desta
ação tal qual tinha sido pensado e desenvolvido pela AGENDE. Em 2015 o Fórum retoma essa
atividade incorporando um conjunto de ações integrava os grupos feministas aos diversos grupos de
mulheres em bairros, escolas e universidades.
Em 2016 as ações do Fórum foram apoiadas pelo Projeto “Mulheres, Política e Relações de
Gênero no Maranhão: formação e empoderamento de mulheres com foco na violência doméstica”,
financiado pelo Fundo Fale sem Medo da Fundação Avon. As articulações para realizar esta ação
envolveram 5 grupos feministas entre os quais destacamos os grupos de estudos de gênero das
universidade federal e estadual: NEGESF, GERAMUS, NAFEM, NIEPEM, além do Grupo de
Mulheres Negras Mãe Andresa.
O folder apresentado a seguir descreve de forma detalhada as mais de quarenta atividades
entre as quais destacamos: cursos de formação, oficinas, palestras, mesas redondas, festival,
exposições, concursos, saraus, rodas de conversa entre outras atividades que envolver mais de cinco
mil pessoas.
Na chamada do folder o Fórum faz referência ao momento político que o Brasil atravessava
e atravessa e denuncia o golpe contra a presidenta eleita Dilma Rousseff:
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Para nós mulheres, a Paz e a igualdade que lutamos há séculos estão cada vez mais
distantes: o golpe que retirou uma presidenta legítima do poder tem refletido
profundamente na cidadania das mulheres e influenciado no aumento dos índices de
feminicídios, de violência, assim como na diminuição da presença de mulheres nas câmaras
municipais e prefeituras. O machismo mostra sua cara e aprofunda cada vez mais a
desigualdade de gênero. (FÓRUM, 2016, p. 2).
Esta ação também se fez presenta nas passeatas organizadas pelo movimento sindical
e feministas. No ultimo 8 de março os protestos contra as Reforma da Previdência e contra o
governo Temer estiveram em varias passeatas organizadas pelas mulheres.
A violência deve ser tratada como uma questão social relevante e deve envolver a sociedade
em suas diferentes dimensões. Pensando nesta assertiva uma das atividades que mais repercutiu na
programação foi os Cursos de Formação para criação da Rede de Enfrentamento à Violência contra
a Mulher realizada em 7 municípios maranhenses: Barreirinhas, Chapadinha, São José de Ribamar e
Imperatriz, Turiaçu, Palmeirândia e São Luís. Na visão das participantes a importância da criação
da Rede de Enfrentamento se dá pela consciência de que a violência contra a mulher lhe retira a
capacidade de existir, pois afeta a alma e o intimo e lhes faz perder a vontade de viver.
Tabela 1 QUAL A SUA VISÃO SOBRE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER
Porque silencia a voz feminina dificultando suas denuncias
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Fere a dignidade
Uma das expressões mais cruéis da sociedade patriarcal, machista
Porque , apesar de todas as suas conquistas, ela ainda sofre psicologicamente por motivo da
violência e fisicamente
Cerca de 5 mulheres são espancadas e estupradas a cada dois minutos em nosso país
As mulheres ainda são submissas aos seus esposos, mas temos que lutar para melhorar essa
situação
Por causa dos maus tratos que os homens fazem com algumas mulheres e algumas não
denunciam
Porque atualmente as mulheres estão sempre enfrentando violência seja ela verbal ou não verbal
Porque a violência afeta a alma, intimo seu ser
Porque a violência silencia as mulheres e essa cidadania fica prejudicada
Porque toda vez que uma mulher se pronuncia algum homem tenta reprimi-la
Porque muitas vítimas tem medo de denunciar, porque muitas vezes os agressores não tem
punição
Porque ser causadora de várias danos, inclusive psicológico
Porque muitas das vezes mulheres não tem como se defender
Preocupa-me muito, que apesar dos avanços em relação as conquistas femininas é necessário
atingir o maior número de mulheres
A violência faz com que as mulheres percam a perspectiva do desenvolvimento que ela pode
causar na sociedade
Porque uma mulher violentada ela perde a vontade de viver
A violência é uma repressão para a mulher tanto no local de trabalho quanto em qualquer lugar
Porque não tem justiça na Brasil
Porque uma vez agredida, a mulher se torna mais frágil e passa a se considerar incapaz
Porque a mulher que é violentada não tem uma vida normal e em todos os lugares precisa de
mulher, somos essenciais e merecemos respeito
Porque muitas das mulheres não são empoderadas
A mulher não deve ser oprimida, deve ser livre
Porque atualmente é um dos problemas que afetam as mulheres e essa é muito revoltante para
nós
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As mulheres ainda se consideram inferiores aos homens e isso faz com que a mulher se sinta
intimidada em meio a sociedade
3 Conclusões
A repercussão do movimento feminista na sociedade maranhense é consequência das muitas
articulações desse movimento em diversos campos. Pode-se considerar que sua emergência é fruto
do processo de redemocratização do País, quando mulheres e homens se juntaram em muitos
momentos de mobilização: na luta pelas diretas já; na elaboração da nova Constituição promulgada
em 1988, na criação de estruturas legais de proteção a mulher, na luta pela criação dos conselhos da
mulher, na criação das delegacias especiais da mulher, e na instauração de vários debates que
culminaram com mudanças substanciais na sociedade e na implementação de políticas públicas, a
exemplo de Leis sobre o aborto legal, Lei que disciplinava a esterilização/laqueadura de mulheres,
leis de combate a violência doméstica, a exemplo da Lei Maria da Penha, da Criação das Varas de
Combate a Violência Doméstica em São Luís e Imperatriz, a Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104), e
tantos outros instrumentos legais e estruturas que possibilitou as mulheres serem vista como sujeito
e deu a este movimento o reconhecimento sobre sua dimensão política.
Falar sobre os enfrentamentos e as ações de luta e resistências feministas no Maranhão é
recompor a memória de uma história vivenciada pelo Grupo de Mulheres da Ilha e posteriormente
pelo Fórum Maranhense de Mulheres que continua sendo o porta-voz das lutas feministas ao
agregar todos os grupos ativos em São Luís e articular ações políticas em diversos municípios
maranhenses.
Referências
BANDEIRA, Maria de Lourdes. Violência de gênero: a construção de um campo teórico e de
investigação. Sociedade e Estado. v. 29, n. 2, maio/ago. 2014
FERREIRA, Maria Mary. As Caetanas vão à luta: feminismos e políticas públicas no Maranhão.
São Luís: EDUFMA, 2007.
______. Movimento feminista, movimento de mulheres: ações e desafios para as próximas décadas.
In: SALES, Celecina de Maria Veras; AMARAL, Célia Chaves Gurgel do; ESMERALDO, Gema
Galgani. Feminismo: memória e história. Fortaleza: Imprensa Universitária, 2000. p.69-76.
FERREIRA, Maria Mary; DIAS, Marly de Jesus Sá; PINTO, Neuzeli Maria de Almeida, et. al.
Direitos iguais para sujeitos de direito: empoderamento de mulheres e combate a violência
doméstica. São Luís, EDUFMA, 2016. 86p.
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FORUM MARANHENSE DE MULHERES. Violência contra a mulher e a cidadania feminina
no Maranhão: balanço critico. São Luís, 2003. 56p.
Feminism and Gender Relations in Maranhão: political action of the Maranhense Forum of Women
and its repercussion in the confrontation of Violence
The Maranhense Women's Forum was created in 1986 from the initiative of the Women's Group of
the Island, considered the pioneer of feminist struggles in Maranhão. In the formation of the Forum,
initially participated in addition to the Women of the Island, the Group of Black Women Mother
Andresa, Espaço Mulher, Group 8 of March, Women's Union, PT Women's Group, PT Women's
Group, CUT State Coordination, Coordination Of Fetaema Women, Collective of Rural Workers.
For over thirty years this collegiate has been carrying out a set of feminist actions that have had a
positive impact on coping with violence against women. In this communication we present the
actions undertaken in the period that covers the years 2006-2016 in particular training actions and
public actions that motivated changes in sectors of the State and society. Of these actions, we
highlight the creation of the Violence Against Women Campaign and the Maria da Penha Patrol.
This is a qualitative study based on interviews, studies of documents that show how the actions and
repercussions in the State were carried out.
Keywords: Feminism; Political Action; Violence; Genre; Maranhão
top related