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DO PODER EXECUTIVO
Manoel Messias Peixinho1
SUMÁRIO: Introdução. 1. Atribuições do Poder Executivo. 2. Da competência do
Presidente da República. 3. Do Vice-Presidente. 4. Dos Ministros de Estado. 5. Das
eleições presidenciais. 6. Dos crimes de responsabilidade do Presidente da República. 7.
Do impeachment. 8. Do Conselho da República. 9. Do Conselho de Defesa Nacional.
Conclusão. Bibliografia.
Introdução
O objetivo desse artigo é analisar a competência e atribuições do Poder
Executivo de acordo com as normas previstas na Constituição, nos atos normativos e na
jurisprudência. Adotado o objetivo principal, foram abordados os seguintes temas:
atribuições do Poder Executivo, competência do Presidente da República e do Vice-
Presidente, função dos Ministros de Estado, eleições presidenciais, crimes de
responsabilidade do Presidente da República, processo de impeachment e a inserção
constitucional do Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional.
Partiu-se das diferenças entre presidencialismo e parlamentarismo para melhor
compreender as funções que são exercidas pelo Poder Executivo no sistema
presidencialista. As funções de Chefe de Estado e de Chefe de Governo no
presidencialismo importam na concentração de relevantes competências nas mãos de um
único líder. Contudo, como se verá, presidência é uma instituição que abrange diversos
órgãos e pessoas jurídicas desconcentrados e descentralizados para que haja o
funcionamento da máquina administrativa eficiente e que políticas públicas possam
destinadas à sociedade. Além do estudo do Poder Executivo e de seus desdobramentos,
como a Vice-Presidência, os Ministros de Estado e os órgãos de aconselhamento e
assessoria presidencial (Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional),
também foram abordados temas correlatos ao Poder Executivo, a exemplo das eleições
1 Doutor em Direito Constitucional pela PUC-Rio. Realizou pós-doutorado na Universidade de Paris X. Professor do Departamento do Direito da PUC-RIO e do Programa de Mestrado da UCAM-RJ. E-mail:peixinho@mcp-advogados.com.br
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presidências, aos crimes de responsabilidade e ao processo de impeachment. A
metodologia desse trabalho buscou fazer um estudo com base na Constituição, nos atos
normativos infraconstitucionais, no estudo doutrinário e jurisprudencial de forma concisa
para atender aos objetivos da obra na qual se inserem essas breves reflexões. Houve, em
alguns momentos, digressões pontuais, a exemplo dos casos de nepotismo nas nomeações
dos cargos de livre nomeação e de notas críticas sobre o processo de impeachment em
razão do momento histórico em que estamos a vivenciar no Brasil.
Este ensaio não é exaustivo. As breves linhas visam a provocar críticas e
reflexões sobre modelos de representação e gestão que têm se mostrado ilegítimos e
insatisfatórios para grande parte dos brasileiros.
No que diz respeito aos temas “crimes de responsabilidade do Presidente
da República e processo de impeachment”, foram utilizadas passagens do livro que será
publicado em breve sobre o Processo de Impedimento do Presidente da República e o
Estado Democrático de Direito, em fase de editoração.
1. Atribuições do Poder Executivo
Antes de sintetizar as atribuições do Poder Executivo, é relevante expor as
diferenças e similitudes entre os sistemas presidencialista e parlamentarista. O sistema
presidencialista concentra as competências de Chefe de Estado com as de Chefe de
Governo nas mãos do Presidente da República. No sistema parlamentarista,
diferentemente, há a competência do Chefe de Governo, exercida pelo Primeiro Ministro
e a do Chefe de Estado, exercida pelo Presidente da República (República
Parlamentarista) ou Monarca (Monarquia Parlamentarista).2 De forma didática, segue o
quadro comparativo de ambos os sistemas.
PRESIDENCIALISMO PARLAMENTARISMO
Origem: norte-americana Origem: longa evolução histórica, forte
influência inglesa
2 ZARINI, Helio Juan. Derecho Constitucional. 2ª edición. Buenos Aires: 1999, p. 297-301.
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Eleição: povo Chefe de Estado indica o Primeiro-
Ministro, com aprovação do Parlamento
Mandato: tempo determinado Mandato sujeito à perda da maioria
parlamentar pelo partido que pertence ou
através do voto de desconfiança
Ampla liberdade de escolha dos Ministros Chefe de Estado tem a discricionariedade
de dissolver o Parlamento
Separação de funções estatais mais
definida
Parcela da atividade executiva deslocada
para o Parlamento
No presidencialismo não cabe qualquer atuação do Parlamento para afastar o
Presidente da República por motivos de descontentamento político. Se o Parlamento não
concorda com a atuação do Presidente somente há a possibilidade de obstrução ou esperar
a realização de novas eleições. Há países que optaram por um sistema
semipresidencialista, como é o caso de Portugal. No semipresidencialismo existe
competências que são exclusivas do Presidente da República e outras que são
compartilhadas com o Parlamento. Segundo J.J. Gomes Canotilho, “os poderes (próprios
ou partilhados) constitucionalmente reconhecidos ao Presidente da República não devem
confundir-se com direção política presidencial. O Presidente da República não é, na
estrutura constitucional, um Presidente que governa, mas é, seguramente, um Presidente
com funções politicamente conformadoras (dissolução da AR, nomeação e demissão do
Primeiro-Ministro, dissolução dos órgãos das regiões autónomas, exercício de poderes de
crise, decisão quanto a propostas referendarias, ratificação tratados internacionais).” 3
A escolha entre presidencialismo e parlamentarismo advém de opções políticas
conjunturais. Conforme se pode verificar na literatura jurídica, há um quantitativo mais
significativo de países no mundo que optam pelo parlamentarismo em detrimento do
presidencialismo em razão de existir mais estabilidade democrática nos países que
adotaram o parlamentarismo.4 No Brasil, por exemplo, houve dois processos de
3 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª edição. Portugal: Almedina, 2016, p. 579. 4 NINO, Carlos Santiago. Fundamentos de decrecho constitucional. Buenos Aires: 1992, p.626-267.
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impeachment em 24 anos. O primeiro ocorreu em 02 de outubro de 1992 e o segundo no
dia 31 de agosto de 2016.
As atribuições do Poder Executivo são norteadas pelo princípio da especialidade,
que é inerente à desconcentração e à descentralização administrativa. Estas competências
são desempenhadas por determinados órgãos e por pessoas jurídicas de direito público ou
de direito privado a visarem melhor eficiência na prestação dos serviços públicos ou na
exploração de atividade econômica, uma vez que na figura do Presidente da República
não podem ser concentradas todas as competências.5
2. Da competência do Presidente da República
No âmbito das reponsabilidades, é preciso fazer uma distinção entre o Presidente
da República, o Poder Executivo e a Administração Pública. Roberto Dromi6 doutrina
que a Administração Pública é um conjunto de recursos humanos e materiais com que
conta o Poder Executivo na prestação de serviços públicos a fim de cumprir a missão que
lhe é imposta pela Constituição e pelas leis. De início, é preciso diferençar a figura do
Presidente da República da instituição Presidência. Conforme assinala Bruce Ackerman,
“a Presidência moderna é uma instituição, e não exclusivamente uma pessoa”. A partir
dessa separação conceitual, Ackerman afirma que a Presidência da República
compreende a eleição para o posto de Presidente e uma sucessão de fases de consolidação
que “corresponde ao diálogo contínuo com o grande público, a utilização de um grande
número de servidores públicos para a direção da burocracia estatal, a direção das Forças
Marmadas como comandante-em-chefe, dentre outras atribuições.7
O Poder Executivo se diferencia, assim, da figura do Presidente da República
porque no âmbito do Poder Executivo existe uma organização hierárquica com uma
estrutura piramidal em que em no posto mais elevado se encontra o Chefe do Poder
Executivo. A Constituição, no artigo 76, diferencia as duas noções ao estatuir que “o
Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de
Estado”. Já no artigo 84, II, constata-se a competência privativa do Presidente da
5 ARAGÃO, Alexandre Santos. Curso de Direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. p. 106. 6 DROMI, Roberto. Derecho administrativo. 12ª edición. México: Ciudad Argentina, 2009, p. 114-115. 7 ACKERMAN, Bruce. Constitucionalismo e Constituição. In ASENSI, Felipe Dutra e PAULA, Daniel Giotti de. Tratado de Direito Constitucional. Constituição no Século XXI. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014, p.334.
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República, que é “exercer, com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da
administração federal”. Logo, é de se concluir que o Poder Executivo é formado pelo
Presidente da República, pelos Ministros de Estado e pelos servidores subordinados etc.,
“o que caracteriza o sistema de governo presidencialista”, porque “o Presidente da
República, como Chefe do Poder Executivo, enfeixa as funções de Chefe de Estado e
Chefe de Governo, e não depende da confiança do Congresso, para ser investido no cargo
nem para nele permanecer, uma vez que tem mandato fixo de quatro anos, ao contrário
do que ocorre no sistema parlamentar.”8
O art. 84 da Carta Magna dispõe, em um rol meramente exemplificativo, as
competências privativas do Presidente da República nas suas funções de Chefe de
Governo (I a VI; IX a XVIII e XX a XXVII) e de Chefe de Estado (VII; VIII e XIX).
Somente as atribuições dos incisos VI, XII e XXV, primeira parte, podem ser delegados
aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado Geral da
União nos limites das respectivas limitações.
No direito brasileiro são reconhecidas, também, ao Presidente da República, as
competências para regulamentar as leis e expedir atos normativos autônomos. A
Constituição (artigo 84, IV, segunda parte) concede ao Presidente a competência para
expedir decretos e regulamentos para a fiel execução da lei. É uma competência
fundamental de auxiliar o Poder Legislativo na concretização da legislação, uma vez que
as leis gerais não são capazes de detalhar todas as particularidades e peculiaridades
inerentes às conjunturas econômica, social e política.9 No plano da organização da
Administração Pública, o Presidente poderá, por meio de Decreto, extinguir órgãos
públicos.10
Ainda no âmbito da competência normativa, o Presidente da República pode criar
direito ex novo com a adoção de medidas provisórias que têm forma de lei desde a sua
expedição mediante o preenchimento dos requisitos de relevância e urgência, conforme
8 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 40.ed. São Paulo: Malheiros, 2017, 542-543. 9 CF. MALBERG, R. Carré. Teoría general del Estado. Traducción de José Lión Depetre. México: Facultad de Deerecho/Facultad de Cultura Económica. 1992, p.502-522. 10 Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: VI – dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos.
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estabelece a Constituição (artigo 62 e incisos).11 Dentre outras competências relevantes
do Presidente da República podem ser destacadas as seguintes: (1) legitimidade
constitucional para propor emendas à Constituição12; (2) iniciar o processo legislativo nas
matérias afetas à organização e à estruturação da Administração Pública13; (3) receber do
Poder Legislativo a delegação de competência para elaboração de leis delegadas.14 No
sistema de freios e contrapesos, que é responsável pelo equilíbrio entre os Poderes, o
Presidente da República tem, dentre outras atribuições: (1) sancionar e vetar as leis
11 Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. 12 Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: II - do Presidente da República. 13 Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: - iniciar o processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Constituição. Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição. § 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que: I - fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas; II - disponham sobre: a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração; b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios; c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998). d) organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios; e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 84, VI; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001) f) militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva. (Incluída pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998) 14 Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional. § 1º Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre: I - organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; II - nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais; III - planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos. § 2º A delegação ao Presidente da República terá a forma de resolução do Congresso Nacional, que especificará seu conteúdo e os termos de seu exercício. § 3º Se a resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional, este a fará em votação única, vedada qualquer emenda.
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oriundas do Poder Legislativo15; (2) escolher um terço dos membros dos Ministros do
Tribunal de Contas da União16; (3) nomear os membros de Tribunais Superiores17.
3. Do Vice-Presidente
A direção superior da administração federal exige, necessariamente, uma
competência desconcentrada distribuída pelos diversos agentes públicos, a exemplo dos
Ministros de Estado, Secretários de Estado, dentre outros servidores públicos altamente
qualificados. Vale acrescentar que o Presidente da República será sucedido pelo Vice-
Presidente no caso de vacância (caráter definitivo) ou substituído (teor temporário) no
caso de impedimento, nos termos da Constituição (artigo 79)18. Na hipótese de vacância,
o Vice-Presidente assume de forma definitiva a Presidência da República e não há no
direito brasileiro novas eleições para o preenchimento do cargo de Vice-Presidente. O
Vice-Presidente pode acumular a sua função com outros cargos públicos, desde que não
15Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: XV - nomear, observado o disposto no art. 73, os Ministros do Tribunal de Contas da União; Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução. V - vetar projetos de lei, total ou parcialmente. Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. § 1º - Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto. 16 Art. 73. Omissis. § 2º Os Ministros do Tribunal de Contas da União serão escolhidos: I - um terço pelo Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, sendo dois alternadamente dentre auditores e membros do Ministério Público junto ao Tribunal, indicados em lista tríplice pelo Tribunal, segundo os critérios de antiguidade e merecimento. 17 Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: XVI - nomear os magistrados, nos casos previstos nesta Constituição, e o Advogado-Geral da União. Art. 101. Omissis. Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal. Art. 104. Omissis. Parágrafo único. Os Ministros do Superior Tribunal de Justiça serão nomeados pelo Presidente da República, dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal... Art. 107. Os Tribunais Regionais Federais compõem-se de, no mínimo, sete juízes, recrutados, quando possível, na respectiva região e nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros com mais de trinta e menos de sessenta e cinco anos... Art. 111-A. O Tribunal Superior do Trabalho compor-se-á de vinte e sete Ministros, escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e cinco anos e menos de sessenta e cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, nomeados pelo Presidente da República após aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal... Art. 115. Os Tribunais Regionais do Trabalho compõem-se de, no mínimo, sete juízes, recrutados, quando possível, na respectiva região, e nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros com mais de trinta e menos de sessenta e cinco ano... 18 Art. 79. Substituirá o Presidente, no caso de impedimento, e suceder-lhe-á, no de vaga, o Vice-Presidente. Parágrafo único. O Vice-Presidente da República, além de outras atribuições que lhe forem conferidas por lei complementar, auxiliará o Presidente, sempre que por ele convocado para missões especiais.
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haja impedimento constitucional ou legal. Pode ser nomeado, por exemplo, para Ministro
ou Secretário de Estado sem que tenha que se desincompatibilizar com a Vice-
Presidência. A indiferença que se atribui ao Vice-Presidente no Brasil ocorre porque a
figura carismática do Presidente da República é que tem o poder de convencimento
eleitoral e geralmente nos arranjos de coalização partidária, a negociação do Vice-
Presidente na formação da chapa majoritária é apenas para dar sustentabilidade política
às alianças partidárias.
4. Dos Ministros de Estado
Nos moldes da Constituição (artigos 76, 84, I, II e 87), os Ministros de Estado são
escolhidos pelo Presidente da República (são cargos ad nutum, isto é, exoneráveis a
qualquer tempo). São seus auxiliares tanto no exercício do Poder Executivo como na
direção superior da administração federal. O cargo do Ministro de Estado é de provimento
em comissão, devendo ter os seguintes requisitos cumulativamente: brasileiro nato ou
naturalizado (exceto Ministro de Estado da Defesa que deve ser nato, pela EC n.23-99),
ter mais de 21 anos e ter o gozo dos direitos políticos. Além desses atributos, os Ministros
devem ter notórios conhecimentos para o exercício da função pública e idoneidade moral.
Estes últimos atributos são negligenciados pelo sistema atual, uma vez que há Ministros
e outros agentes públicos analfabetos funcionais e de conduta moral subterrânea com
folha criminal extensa. A solução para que sejam extirpados do cenário político esses
“agentes públicos” desqualificados exige a democratização cívica por parte dos eleitores.
Somente o voto consciente pode destronar esses parasitas do poder.
A Constituição (§ único do artigo 87) dispõe as competências dos Ministros de
Estado. Vale ter atenção no artigo 88, alterado pela EC n.32-01, que suprimiu do
dispositivo “estruturação e atribuições”: “a lei disporá sobre a criação e extinção de
Ministérios e órgãos da administração pública.”
Cabe ao STF processar e julgar os Ministros de Estado nos crimes de
responsabilidade praticados sem conexão com o Presidente da República, e nos crimes
comuns, de acordo com o art. 102, I, “c” CRFB. Já nos crimes de responsabilidade
conexos com os do Presidente da República, cabe ao Senado Federal, nos moldes do
artigo 52, I e § único.
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Vale citar um entendimento do STF em que é prescindível a autorização pela
Câmara dos Deputados em se tratando de crime de responsabilidade por Ministro de
Estado sem conexão com o praticado pelo Presidente da República.
O processo de impeachment dos Ministros de Estado, por
crimes de responsabilidade autônomos, não conexos com
infrações da mesma natureza do Presidente da República,
ostenta caráter jurisdicional, devendo ser instruído e julgado
pelo STF. Inaplicabilidade do disposto nos arts. 51, I e 52, I da
Carta de 1988 e 14 da Lei 1.079-1950, dado que é prescindível
autorização política da Câmara dos Deputados para a sua
instauração. Prevalência, na espécie, da natureza criminal
desses processos, cuja apuração judicial está sujeita à ação
penal pública de competência exclusiva do MPF (art. 129, I
CRFB). Ilegitimidade ativa ad causam dos cidadãos em geral,
a eles remanescendo a faculdade de noticiar os fatos do
Parquet.” (Pet 1.954, Rel. Min. Maurício Corrêa. J.
11.09.2002. Plenário, DJ de 1º.08.2003).
Os Ministros, segundo Paolo Biscaretti Di Ruffia, “apresentam-se como órgãos
do governo enquanto participam (seja individualmente, seja com o Chefe de Estado, seja
colegialmente) na determinação da direção política geral; aparecendo como os mais
elevados órgãos administrativos, se forem considerados como chefes hierárquicos dos
respectivos ministérios”.19
5. Das eleições presidenciais
A Constituição (artigo 77)20 dispõe sobre as regras de eleição do Presidente e do
Vice-Presidente da República, de forma indissociável. A eleição deve ocorrer no primeiro
19 DI RUFFIA, Paolo Biscaretti. Direito Constitucional. Tradução de Maria Helena Diniz. São Paulo: RT, 1984, p. 413. 20 Art. 77. A eleição do Presidente e do Vice-Presidente da República realizar-se-á, simultaneamente, no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno, e no último domingo de outubro, em segundo turno,
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domingo de outubro e caso haja segundo turno, isto é, quando a maioria absoluta de votos
não tiver sido alcançada (sem computar os votos em branco e nulos), o pleito acontecerá
no último domingo do mesmo mês. A eleição em dois turnos atende ao princípio
majoritário do sistema eleitoral. Num processo democrático livre deve ser preservada a
vontade da maioria dos eleitores que, no direito brasileiro, terá a oportunidade de se
manifestar duas vezes quando um dos candidatos não obtiver a maioria absoluta dos votos
válidos. O dispositivo constitucional insiste que o eleitor eleja o candidato que possa
atender a vontade da maioria com a divisão democrática das responsabilidades entre os
eleitores.
Eleitos o Presidente e seu Vice, ambos tomarão posse em sessão do Congresso
Nacional, prestando o compromisso com a Constituição (artigo. 78)21. O mandato do
Presidente (artigo 82 da Carta Magna) é de 4 anos se inicia no dia 1º de janeiro do ano
seguinte da sua eleição. É permitida a reeleição22 por um único período subsequente.23
Os requisitos para eleição do Presidente e Vice-Presidente devem observar os
ditames constitucionais (§ 3º do artigo 14)24 e são intransponíveis para os cargos eletivos
se houver, do ano anterior ao do término do mandato presidencial vigente. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 16, de 1997). § 1º A eleição do Presidente da República importará a do Vice-Presidente com ele registrado. § 2º Será considerado eleito Presidente o candidato que, registrado por partido político, obtiver a maioria absoluta de votos, não computados os em branco e os nulos. § 3º Se nenhum candidato alcançar maioria absoluta na primeira votação, far-se-á nova eleição em até vinte dias após a proclamação do resultado, concorrendo os dois candidatos mais votados e considerando-se eleito aquele que obtiver a maioria dos votos válidos. § 4º Se, antes de realizado o segundo turno, ocorrer morte, desistência ou impedimento legal de candidato, convocar-se-á, dentre os remanescentes, o de maior votação. § 5º Se, na hipótese dos parágrafos anteriores, remanescer, em segundo lugar, mais de um candidato com a mesma votação, qualificar-se-á o mais idoso. 21 Art. 78. O Presidente e o Vice-Presidente da República tomarão posse em sessão do Congresso Nacional, prestando o compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil. Parágrafo único. Se, decorridos dez dias da data fixada para a posse, o Presidente ou o Vice-Presidente, salvo motivo de força maior, não tiver assumido o cargo, este será declarado vago. 22 A PEC nº 113A, de 2015, que tramita na Câmara dos Deputados, prevê, dentre outros temas, o fim para a reeleição dos cargos do Poder Executivo. Há outras 4 (quatro) PECs que tramitam no Senado com o mesmo conteúdo: PEC 35/2014, PEC 48/2016, PEC 19/2015 e a PEC 4/2015. 23 Sobre e eleição do Presidente e do Vice-presidente, cf. CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 11ª edição. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 973. 24 Art. 4º Omissis. §3º São condições de elegibilidade, na forma da lei: I - a nacionalidade brasileira; II - o pleno exercício dos direitos políticos; III - o alistamento eleitoral; IV - o domicílio eleitoral na circunscrição; V - a filiação partidária; Regulamento; VI - a idade mínima de: a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador; b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal; c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-
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do Poder Executivo e para os cargos do Poder Legislativo. Segundo a Constituição (§7º,
artigo 14), “são inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes
consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República,
de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os
haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato
eletivo e candidato à reeleição.
O dispositivo constitucional em comento visa a coibir o nepotismo eleitoral a fim
de evitar que as relações de parentesco e compadrio não maculem o princípio republicano
da igualdade no pleito eleitoral. Porém, ocorre que na atualidade brasileira existem feudos
eleitorais que se sucedem no poder para a manutenção do patrimonialismo político.
Governadores, Prefeitos e outros agentes públicos nomeiam irmãos, irmãs, mulheres,
filhos e afilhados para funções executivas sem que existam quaisquer critérios de
competência e probidade. Prevalece, no atual sistema eleitoral, uma continuidade de
práticas eleitorais espúrias que nem a Lei de Improbidade25 e nem a Lei da Ficha Limpa26
conseguiram derrotar totalmente. É preciso reafirmar o que foi dito acima sobre os
“critérios pessoais” de nomeação de agentes públicos: somente com o amadurecimento
da democracia e da cidadania cívica o eleitor poder excluir os péssimos políticos e renovar
o Parlamento e o Executivo com representantes dignos do mandato eletivo. É preciso
reconhecer que a Súmula Vinculante nº 13 foi um grande avanço no direito brasileiro para
obstar a prática do nepotismo, ao proibir
a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta,
colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da
autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica
Prefeito e juiz de paz; d) dezoito anos para Vereador. § 4º São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos. § 5º O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subsequente. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 16, de 1997) § 6º Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito. § 7º São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição. 25 Lei nº 8429/1992. 26 Lei Complementar nº 135/2010.
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investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para
o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda,
de função gratificada na administração pública direta e indireta
em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante
designações recíprocas, viola a Constituição Federal.
Porém, o STF abriu uma infeliz brecha ao reconhecer que a nomeação de parentes
para cargos públicos de natureza política não viola o teor da Súmula Vinculante nº 13,
com a ressalva de que o exame dos casos concretos podem caracterizar a prática de
nepotismo. A vedação, segundo a Suprema Corte, seria somente para cargos
administrativos, conforme são destacados os seguintes precedentes.
A jurisprudência do STF preconiza que, ressalvada situação de
fraude à lei, a nomeação de parentes para cargos públicos de
natureza política não desrespeita o conteúdo normativo do
enunciado da Súmula Vinculante 13." (RE 825682 AgR,
Relator Ministro Teori Zavascki, Segunda Turma, julgamento
em 10.2.2015, DJe de 2.3.2015)
Reclamação - Constitucional e administrativo - Nepotismo -
Súmula vinculante nº 13 - Distinção entre cargos políticos e
administrativos - Procedência. 1. Os cargos políticos são
caracterizados não apenas por serem de livre nomeação ou
exoneração, fundadas na fidúcia, mas também por seus
titulares serem detentores de um munus governamental
decorrente da Constituição Federal, não estando os seus
ocupantes enquadrados na classificação de agentes
administrativos. 2. Em hipóteses que atinjam ocupantes de
cargos políticos, a configuração do nepotismo deve ser
analisado caso a caso, a fim de se verificar eventual 'troca de
favores' ou fraude a lei. 3. Decisão judicial que anula ato de
nomeação para cargo político apenas com fundamento na
13
relação de parentesco estabelecida entre o nomeado e o chefe
do Poder Executivo, em todas as esferas da federação, diverge
do entendimento da Suprema Corte consubstanciado na
Súmula Vinculante nº 13." (Rcl 7590, Relator Ministro Dias
Toffoli, Primeira Turma, julgamento em 30.9.2014, DJe de
14.11.2014).
A despeito dos vícios políticos acima descritos que interferem na vontade popular
e no arraigado patrimonialismo brasileiro, as eleições presidenciais marcam o auge da
democracia em que o sufrágio popular elege o Presidente para a chefia política e
administrativa do país. A democracia se manifesta quando um povo livre e consciente
elege os seus representes, ainda que haja a ameaça cotidiana do poder econômico e da
manipulação das mídias comprometidas com as classes dominantes.
É relevante mencionar que o Presidente da República, ao ser sufragado pelas
urnas, recebe a legitimidade popular para propor, com o auxílio dos Ministros e do
conjunto de agentes públicos que compõe a Administração Pública, as políticas públicas
estratégicas. No Brasil, o poder constituinte originário concedeu ao Presidente da
República as prerrogativas de governar, gerir e representar o país. Somente o Poder
Legislativo se equipara ao Presidente da República em termos de legitimidade política.
A renovação do mandato presidencial por meio de eleições livres é fundamental
para que haja a alternância no poder e é por isso que somente é permitida ao Presidente
da República apenas uma renovação. Ou seja, o mandatário supremo somente poderá
permanecer no poder por 8 (oito) anos,27 sendo 4(quadro) na primeira eleição e mais
quatro anos.28
Em caso de impedimento ou vacância do cargo do Presidente da República e de
Vice-Presidente ocorrerão as seguintes consequências políticas, conforme dispõe a
27 Art. 14. Omissis. § 5º O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subsequente. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 16, de 1997) 28 Art. 82. O mandato do Presidente da República é de quatro anos e terá início em primeiro de janeiro do ano seguinte ao da sua eleição.
14
Constituição (artigo 80). Em primeiro lugar, “serão sucessivamente chamados ao
exercício da Presidência o Presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado Federal e
o do Supremo Tribunal Federal”, respectivamente. Porém, há que se observar o tempo da
vacância ou impedimento para a realização de novas eleições diretas ou indiretas. Antes
de completados dois anos de mandato, a eleição para novo mandato presidencial será
direta com a convocação dos eleitores. Contudo, se a vacância ou impedimento se der nos
últimos dois anos de mandato do Presidente, a eleição far-se-á pelo Congresso Nacional.29
6. Dos crimes de responsabilidade do Presidente da República
É relevante destacar que no âmbito dos Estados (artigo art. 74 da lei 1.079/1950)
“constituem crimes de responsabilidade dos governadores dos Estados ou dos seus
Secretários, quando por eles praticados, os atos definidos como crimes nesta lei”. Ou seja,
compete à União legislar em matéria de impedimento dos Governadores e de seus
secretários. Assim, as Constituições estaduais devem apenas repetir os dispositivos
previstos na Constituição Federal e na lei 1079/1950 (princípio da simetria), além de
observar a orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal.
Os crimes de responsabilidade estão tipificados de forma exaustiva no artigo 85 da
Constituição Federal e no artigo 4º da Lei 1079/1950. Dessa forma, quando se trata de
processo sancionatório em que há restrição de direitos e garantias, a interpretação do rol
das tipificações deve ser restritiva, à semelhança do que ocorre com o direito penal e com
o direito administrativo sancionador. A Constituição de 1988 veda a responsabilização
do Presidente da República por atos anteriores ao mandato (§4º do artigo 86).
Os crimes comuns são estatuídos no Código Penal e nas leis especiais que
tipificam condutas reprováveis. Os crimes de responsabilidade, por sua vez, são ilícitos
jurídicos praticados por agentes políticos. A tipificação dos crimes de responsabilidades
está prevista no artigo 85 da Constituição e na Lei nº 1.079/195030. Não é possível criar
29 Art. 81. Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga. § 1º - Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei. § 2º - Em qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período de seus antecessores. 30 BROSSARD, Paulo. O Impeachment. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 75.
15
tipificações por meio de atos normativos infralegais e por analogia. Nesse sentido, a lição
de Pontes de Miranda31 (1967, p. 350-352) é peremptória: “crimes de responsabilidade,
no Brasil, são apenas aqueles que a lei apresenta – lei necessariamente federal – como
crimes de responsabilidade”.
7. Do impeachment
A expressão impeachment é derivada do francês (empêcher) e significa
literalmente impedir, dificultar, acusar, imputar algum ilícito ou defeito a alguém. O ato
de impeachment significa, ainda, desacreditar a retidão, conduta e a credibilidade. 32
O rito processual adotado no caso de impedimento do Presidente da República
está previsto na Constituição, regulado pela Lei nº 1.079/1950 e pelos Regimentos
Internos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Porém, a ADPF 378 MC / DF33
alterou o teor de diversos dispositivos da Lei nº 1.079/1950 e dos Regimentos Internos.
Segundo o julgamento do STF, na ADPF 378 MC/DF, em interpretação conforme
a Constituição34 do art. 38 da Lei nº 1.079/1950, “é possível a aplicação subsidiária dos
Regimentos Internos da Câmara e do Senado ao processo de impeachment, desde sejam
compatíveis com os preceitos legais e constitucionais pertinentes”. Porém, o que se
percebe quando se analisa a ADPF 378 MC/DF é que o Supremo Tribunal Federal ao dar
uma interpretação conforme a Constituição alterou diversos dispositivos da Lei
1.079/1950 e dos Regimentos da Câmara e do Senado.
O Supremo Tribunal Federal define com precisão o que vem a ser matéria
interna corporis:
31 MIRANDA, Pontes. Comentários à Constituição de 1967. Tomo III. São Paulo: RT, 1967, p. 350-352. 32 BABCOCK GOVE, Philip. WEBSTER'S. New International Dictionary of the English Language, 1961, p. 765. 33ADPF 378 MC/DF-DISTRITO FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR NA ARGUIÇÃO DE
DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL Relator (a): Min. EDSON FACHIN. Relator
(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO Julgamento: 17/12/2015. Órgão Julgador: Tribunal Pleno.
Publicação. PROCESSO ELETRÔNICO. DJe-043 DIVULG 07-03-2016. Publicado em 08-03-2016. 34 Sobre a interpretação conforme a Constituição, cf.PEIXINHO, Manoel Messias. A Interpretação da Constituição e os princípios fundamentais. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 67.
16
Agravo regimental em Mandado de segurança. Ato do
Presidente da Câmara dos Deputados. Forma de convocação
de reunião de comissão. Interpretação de dispositivos
regimentais da câmara dos deputados. Ato interna corporis,
não sujeito ao controle judicial. Não cabimento do writ.
Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento. 1.
O Supremo Tribunal Federal já assentou que os atos
classificados como interna corporis não estão sujeitos ao
controle judicial (Precedentes: MS 22.183, Redator para o
acórdão Ministro Maurício Corrêa, DJ 12/12/1997; MS
26.062-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 4/4/2008; MS
24.356, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 12/9/2003) 2. In casu,
restou claro que o ato praticado pelo impetrado, diante da
situação fática descrita pelos impetrantes, envolveu a
interpretação dos dispositivos regimentais, ficando restrita a
matéria ao âmbito de discussão da Câmara dos Deputados.
Dessa forma, afigura-se incabível o mandado de segurança,
pois não se trata de ato sujeito ao controle jurisdicional
(Precedentes: MS 28.010, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe
20/5/2009, e MS 33.705 AgR, Rel. Min.Celso de Mello Dje
29/3/2016). 3. Agravo regimental a que se nega provimento.
Decisão unânime. A Turma negou provimento ao agravo
regimental, nos termos do voto do Relator. Presidência do
Senhor Ministro Luís Roberto Barroso. 1ª Turma, 16.8.2016.35
Para que uma matéria seja considerada interna corporis é preciso que os direitos
subjetivos dos impugnantes não são sejam afetados e que a referida matéria não seja
passível de controle de legalidade e ou de constitucionalidade. Não é admissível que o
Parlamento desrespeite a Constituição ou as leis em nome de uma falsa imunidade interna
corporis.
35 31951 AgR / DF - Distrito Federal. Relator (a): Min. Luiz Fux. Julgamento: 16/08/2016. Órgão Julgador:
Primeira Turma. Publicação. Processo eletrônico. Publicado em 31-08-2016.
17
O processo de impeachment se inicia com uma denúncia à Câmara dos Deputados
que pode ser feita por qualquer cidadão que tenha conhecimento de fatos configuradores
de crime de reponsabilidade36. A denúncia deve ser fundamentada com a exposição de
fatos e direito que demonstrem que a condutada do acusado se enquadra nos casos
previstos na Constituição e na Lei nº 1.079/1950.
Compete ao Presidente da Câmara dos Deputados fazer o exame preliminar para
o recebimento da denúncia.37 O Presidente da Câmara dos Deputados tem competência
para acatar a denúncia contra o Presidente da República sem que haja necessidade de
defesa prévia. Este foi o entendimento firmado pelo STF38 ao repelir a pretensão que
pleiteava o direito de defesa prévia como condição para o recebimento da denúncia.
A avaliação dos pressupostos para o exame de admissibilidade da denúncia não
se funda em decisão discricionária. Seria absurdo tal juízo porque os crimes de
responsabilidades estão exaustivamente previstos nos atos normativos reguladores do
impeachment. Da decisão que defere ou indefere o processamento da denúncia, cabe
controle jurisdicional pelo Supremo Tribunal Federal porque a suposta conduta ilícita
imputada ao agente político tem tipificação discriminada. Se a denúncia for deferida,
desde que preenchidos os requisitos normativos, será encaminhada a peça de libelo a uma
Comissão Especial que a processará. Nesse sentido, já se pronunciou o STF sobre os
limites objetivos no recebimento da denúncia pelo Presidente da Câmara dos Deputados.
Uma vez deferida a denúncia pelo Presidente da Câmara, inicia-se o processo de
admissibilidade do impedimento do Presidente da República na Comissão Especial, que
se reunirá no prazo de 48 (quarenta e oito horas) para eleger o Presidente e Relator.
36 Art. 15 da Lei nº 1.079/1950. A denúncia só poderá ser recebida enquanto o denunciado não tiver, por
qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo. 37"Impeachment do presidente da República: apresentação da denúncia à Câmara dos Deputados:
competência do presidente desta para o exame liminar da idoneidade da denúncia popular, 'que não se reduz
à verificação das formalidades extrínsecas e da legitimidade de denunciantes e denunciados, mas se pode
estender (...) à rejeição imediata da acusação patentemente inepta ou despida de justa causa, sujeitando-se
ao controle do Plenário da Casa, mediante recurso (...)'. MS 20.941-DF, Sepúlveda Pertence, DJ de 31-8-
1992." (MS 23.885, rel. min. Carlos Velloso, julgamento em 28-8-2002, Plenário, DJ de 20-9-2002.) Vide:
MS 30.672-AgR, rel. min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 15-9-2011, Plenário, DJE de 18-10-2011. 38 ADPF 378 MC/DF-DISTRITO FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR NA ARGUIÇÃO DE
DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL Relator (a): Min. EDSON FACHIN. Relator
(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO Julgamento: 17/12/2015. Órgão Julgador: Tribunal Pleno.
Publicação. PROCESSO ELETRÔNICO. DJe-043 DIVULG 07-03-2016. Publicado em 08-03-2016.
18
A defesa deve demonstrar que a denúncia não está devidamente fundamentada
com os argumentos jurídicos e com as provas que comprovam a prática indiciária do
crime de responsabilidade. Porém, nesta fase processual, não há defesa de mérito com um
lastro probatório rigoroso. Contudo, a defesa deve demonstrar a atipicidade da conduta
supostamente ilícita. Na defesa prévia não devem ser desprezadas as provas que posam
desconstituir uma denúncia inepta ou manifestamente infundada.
Como se pode verificar da jurisprudência citada, especificamente na ADPF 378
MC/DF, o STF ingressou no mérito de matéria interna corporis para regular o
funcionamento da Comissão Especial do Senado Federal, a composição da representação
parlamentar, o modo de votação (aberta ou fechada) e a possibilidade de apresentação das
candidaturas avulsas etc. É impressionante como a hermenêutica do STF é seletiva na
escolha dos temas que considera interna corporis. Essa seletividade nada mais é do que
a assunção pelo STF de posições políticas discricionárias sobre seletivos temas que
devem ser passíveis de controle de constitucionalidade ou de legalidade.
O STF se valeu de uma hermenêutica pragmática ao adotar um modelo de
pragmatismo jurídico bem definido por Ronald Dworkin: o pragmatismo jurídico é uma
concepção cética do direito. Nega que uma comunidade assegure alguma vantagem real
ao exigir que as decisões de um juiz sejam verificadas por qualquer suposto direito dos
litigantes à coerência com decisões políticas tomadas no passado... O pragmatismo rejeita
a ideia de direito e de pretensões juridicamente protegidos e oferece uma interpretação
muito diferente da nossa prática jurídica: que os juízes tomam e devem tomar quaisquer
decisões que lhes pareçam melhores para o futuro da comunidade, ignorando qualquer
forma de coerência com o passado como algo que tenha valor em si mesmo”. 39
A instauração do processo de impedimento do Presidente da República se dá,
previamente, por comando do artigo 51 da Constituição.40 Na Câmara dos Deputados
deverão ser observados os procedimentos de acordo com a artigo 23 da Lei nº 1.079/1950.
39 DWORKIN, Ronald. O Império da lei. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 119. 40 Art. 51 da Constituição. Compete privativamente à Câmara dos Deputados: I - autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente e o Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado.
19
Nos moldes do Regimento Interno da Câmara dos Deputado, o processo de impedimento
deve ser orientado pelo rito conforme os §6º, §7º, §8º e §9º do mesmo dispositivo.
Recebida a denúncia pela Comissão Especial, caberá ao Plenário da Câmara
aprovar ou rejeitar a acusação. Rejeitada a acusação, o processo será arquivado. Se for
aceita a denúncia, o processo seguirá para o Senado para que delibere sobre o mérito da
acusação. O trâmite do processo de impeachment no Plenário da Câmara é apenas de
ratificação ou indeferimento da denúncia. No julgamento na ADPF 378 MC/DF, o STF
declarou “recepcionados pela CF/1988 os artigos 19, 20 e 21 da Lei nº 1.079/1950
interpretados conforme a Constituição, para que se entenda que as diligências e atividades
ali previstas não se destinam a provar a (im) procedência da acusação, mas apenas a
esclarecer a denúncia”.
Nessa fase processada na Câmara é admitida a realização de diligências com
objetivo de esclarecer determinados pontos da denúncia, mas não é compatível com essa
fase do processo a produção de provas que enfrentem o mérito da denúncia, conforme foi
firmado pelo STF que admite, contudo, a possibilidade do exercício mitigado do princípio
do contraditório e da ampla defesa apenas para melhor subsidiar o entendimento dos
Deputados que deliberação sobre a autorização de afastamento provisório do Presidente
da Câmara dos Deputados.
A Competência para o julgamento do mérito da acusação do Presidente da
República é do Senado Federal, conforme disposição do artigo 52 da Constituição
Federal.41 Recebida a comunicação da Câmara com a autorização para a abertura do
processo de impedimento, o Senado iniciará o processo mediante a observância de duas
etapas processuais. A primeira etapa se dá com a distribuição da denúncia para uma
Comissão Especial. A segunda etapa é feita pelo plenário. A Comissão Especial observará
na sua composição, à semelhança do ocorre na Câmara, a proporcionalidade partidária42.
41 Art. 52 da Constituição Federal. Compete privativamente ao Senado Federal: I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 02/09/99) 42 Art. 52 da Constituição Federal, artigo 24 Lei nº 1.079/1950 e artigo 380 do Regimento Interno do
Senado.
20
O STF43 regulou o processo de impedimento do Presidente da República e
preencheu algumas lacunas existentes na Lei 1.079/1950 e no Regimento Interno do
Senado Federal.
Compete a Comissão Especial instruir o processo de acusação, coletar as provas
necessárias, ouvir as partes interessadas e testemunhas. Contudo, a produção de provas
nesta fase é apenas para deliberar sobre a admissibilidade da acusação. Em respeito ao
princípio do devido processo legal, é fundamental que a Comissão prestigie os meios
necessários à ampla defesa, ainda que de forma sumária. Após o cumprimento de todas
as formalidades instrutórias, a Comissão deliberará, por maioria simples, se aceita ou
recusa a denúncia. Recebida esta será encaminhada a peça de libelo para a apreciação
pelo plenário do Senado, que também deliberará por maioria simples se aceita ou recusa
a denúncia. Recusada esta, o processo será arquivado.44
O rito de julgamento do Presidente da República está previsto na Lei 1.059/1950.
O Regimento Interno do Senado Federal45 regula o processo de impeachment em
completo à Lei 1.059/1950. Aceita a denúncia pelo pleno do Senado Federal, o Presidente
da República será afastado por até 180 dias.46 Neste prazo será feito o juízo probatório
elástico com a produção de todas as provas necessárias ao julgamento do mérito da
acusação sob a presidência do Presidente do Supremo Tribunal Federal.47 As provas
43 ADPF 378 MC/DF-DISTRITO FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR NA ARGUIÇÃO DE
DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL Relator (a): Min. EDSON FACHIN. Relator
(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO ARROSO Julgamento: 17/12/2015. Órgão Julgador: Tribunal Pleno.
Publicação. PROCESSO LETRÔNICO. DJe-043 DIVULG 07-03-2016. Publicado em 08-03-2016. 44 ADPF 378-MC, rel. p/ o ac. min. Roberto Barroso, julgamento em 16-12-2015, Plenário, DJE de 8-3-
2016. 45Art. 380. Para julgamento dos crimes de responsabilidade das autoridades indicadas no art. 377, obedecer-se-ão as seguintes normas: IV - o Primeiro Secretário enviará ao acusado cópia autenticada de todas as peças do processo, inclusive do libelo, intimando-o do dia e hora em que deverá comparecer ao Senado para o julgamento; V - estando o acusado ausente do Distrito Federal, a sua intimação será solicitada pelo Presidente do Senado ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado em que ele se encontre; VI - servirá de escrivão um funcionário da Secretaria do Senado designado pelo Presidente do Senado. Art. 381. Instaurado o processo, o Presidente da República ficará suspenso de suas funções (Const., art. 86, § 1º, II). Parágrafo único. Se, decorrido o prazo de cento e oitenta dias, o julgamento não estiver concluído, cessará o afastamento do Presidente da República, sem prejuízo do regular prosseguimento do processo (Const., art. 86, § 2º) Art. 382. No processo e julgamento a que se referem os arts. 377 a 381 aplicar-se-á, no que couber, o disposto na Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950. 46 Constituição Federal, artigo 86, § 1º, II e § 2º. 47Constituição, art. 52, parágrafo único e parágrafo único do art. 377 do Regimento Interno do Senado
Federal.
21
podem ser produzidas a requerimento das partes ou de ofício pelo Senado Federal,
conforme decidido pelo STF.48
Se o processo não for julgado no prazo de 180 dias, haverá o retorno do acusado.
O Presidente do Supremo Tribunal Federal é a instância recursal natural para dirimir os
conflitos que venham a ocorrer durante o julgamento do mérito do processo de
impedimento. Porém, o Senado Federal não é compelido a aceitar a denúncia da Câmara
dos Deputados. Poderá o Senado Federal rejeitar a denúncia, conforme entendimento
firmado pelo STF.49
No julgamento do Senado, segundo o parágrafo único do artigo 52 da
Constituição Federal e do artigo 378 do Regimento Interno do Senado, há a
obrigatoriedade de dois terços dos membros do Senado para que haja a condenação do
acusado. No caso de autorização para abertura do processo, o Supremo Tribunal Federal
entendeu que o quórum é de maioria simples, à semelhança do que ocorre para abertura
do processo de julgamento de Ministros do STF e PGR50.
O processo de impeachment, segundo o processo previsto na Lei 1079/1950,
estabelece que após o cumprimento de todas as formalidades inerentes à defesa do
Presidente da República em respeito ao devido processo legal, o Senado proferirá a
decisão. Se a sentença for absolutória, o réu será declarado inocente e retornará ao seu
posto (art.32). No caso de condenação, segundo os artigos 33 e 34 da Lei 1079/1950, os
efeitos são a destituição do cargo e inabilitação e para o exercício da função pública.
Assim, nos termos do artigo 33 o Senado fixaria o prazo de inabilitação do Presidente da
República.51
48 ADPF 378 MC/DF-DISTRITO FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR NA ARGUIÇÃO DE
DESCUMPRIMENTO DE PRE0CEITO FUNDAMENTAL Relator (a): Min. EDSON FACHIN. Relator
(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO ARROSO Julgamento: 17/12/2015. Órgão Julgador: Tribunal Pleno.
Publicação. PROCESSO LETRÔNICO. DJe-043 DIVULG 07-03-2016. Publicado em 08-03-2016. 49 ADPF 378 MC/DF-DISTRITO FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR NA ARGUIÇÃO DE
DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL Relator (a): Min. EDSON FACHIN. Relator
(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO ARROSO Julgamento: 17/12/2015. Órgão Julgador: Tribunal Pleno.
Publicação. PROCESSO LETRÔNICO. DJe-043 DIVULG 07-03-2016. Publicado em 08-03-2016. 50ADPF 378 MC/DF-DISTRITO FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR NA ARGUIÇÃO DE
DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL Relator (a): Min. EDSON FACHIN. Relator
(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO ARROSO Julgamento: 17/12/2015. Órgão Julgador: Tribunal Pleno.
Publicação. PROCESSO LETRÔNICO. DJe-043 DIVULG 07-03-2016. Publicado em 08-03-2016. 51A Constituição Federal, no seu artigo 52 estabelece que Art. 52. Compete privativamente ao Senado A Constituição Federal, no seu artigo 52 estabelece que Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
22
Dessa forma, o prazo que é discricionário para a fixação da inabilitação do
Presidente da República foi positivado em 8 (oito) anos pelo Senado Federal. Assim, o
prazo discricionário de inabilitação do Presidente da República no artigo 33 da Lei
1079/1950 não foi recepcionado pelo parágrafo único do artigo 52 da Constituição de
1988.
No julgamento do impedimento da Presidenta Dilma Rousseff, ocorrido no dia
21 de agosto de 2016, o Senado Federal, por iniciativa do Presidente do Supremo Tribunal
Federal, condutor do processo de impedimento, resolveu dividir a votação a partir de um
pedido de destaque pelo Randolfe Rodrigues (Rede-AP). No caso paradigmático, o
Presidente do Supremo Tribunal Federal, por decisão monocrática em razão do destaque
apresentado pelo partido político, colocou em votação em separado as duas penalidades:
(1) perda do cargo e (2) inabilitação para o exercício de função pública.
No Mandado de Segurança 21689/DF52 da relatoria do Ministro Carlos Velloso,
o STF decidiu que “no sistema atual, da Lei 1.079, de 1950, não é possível a aplicação da
pena de perda do cargo, apenas, nem a pena de inabilitação assume caráter de
acessoriedade”, conforme se verifica no julgado:
Constitucional. "Impeachment". Controle judicial.
"impeachment" do Presidente da República. Pena de
inabilitação para o exercício de função pública. C.F., art. 52,
I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles; (...) Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis. Federal: I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles; (...) Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis. 52MS 21689/DF - Distrito Federal. Relator (a): Min. Carlos Velloso. Julgamento: 16/12/1993.Órgão
Julgador: Tribunal Pleno. Publicação DJ 07-04-1995. EMENTA: - CONSTITUCIONAL.
"IMPEACHMENT". CONTROLE JUDICIAL. "IMPEACHMENT" DO PRESIDENTE DA
REPUBLICA. PENA DE INABILITAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DE FUNÇÃO PÚBLICA. C.F., art.
52, parágrafo único. Lei n. 27, de 07.01.1892; Lei n. 30, de 08.01.1892. Lei n. 1.079, de 1950.
23
parágrafo único. Lei n. 27, de 07.01.1892; Lei n. 30, de
08.01.1892. Lei n. 1.079, de 1950. I. - Controle judicial do
"impeachment": possibilidade, desde que se alegue lesão ou
ameaça a direito. C.F., art. 5º, XXXV. Precedentes do S.T.F.:
MS n. 20.941-DF (RTJ 142/88); MS n. 21.564-DF e MS n.
21.623-DF. II. No sistema atual, da Lei 1.079, de 1950, não é
possível a aplicação da pena de perda do cargo, apenas, nem a
pena de inabilitação assume caráter de acessoriedade (C.F.,
1934, art. 58, par. 7. C.F., 1946, art. 62, par. 3. C.F., 1967, art.
44, parag. único; EC n. 1/69, art. 42, parágrafo único; C.F.,
1988, art. 52, parag. único. Lei n. 1.079, de 1950, artigos 2º,
31, 33 e 34).
No meu entendimento não poderia o Presidente do Supremo Tribunal Federal
fazer uma hermenêutica contorcionista para decidir pela possibilidade da perda dos
direitos políticos sem a consequente inabilitação para o exercício de função pública.
8. Do Conselho da República
Órgão superior de consulta do Presidente da República sem caráter vinculatório.
O Conselho da República só se reúne quando o Presidente da República convoca sob a
direção presidencial. A Constituição estatui a composição do Conselho da República, que
é formado por agentes públicos e representantes da sociedade civil.53 A competência do
referido Conselho é de mero pronunciamento, aconselhando o Presidente da República
nas matérias consideradas de relevância nacional, a exemplo de intervenção federal,
estado de defesa, estado de sítio e questões relevantes para a estabilidade das instituições
democráticas.54 A lei 8.041/1990 regula o Conselho em que são regulamentadas as
53 Art. 89. O Conselho da República é órgão superior de consulta do Presidente da República, e dele participam: I - o Vice-Presidente da República; II - o Presidente da Câmara dos Deputados; III - o Presidente do Senado Federal; IV - os líderes da maioria e da minoria na Câmara dos Deputados; V - os líderes da maioria e da minoria no Senado Federal; VI - o Ministro da Justiça; VII - seis cidadãos brasileiros natos, com mais de trinta e cinco anos de idade, sendo dois nomeados pelo Presidente da República, dois eleitos pelo Senado Federal e dois eleitos pela Câmara dos Deputados, todos com mandato de três anos, vedada a recondução. 54 Art. 90. Compete ao Conselho da República pronunciar-se sobre: I - intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio; II - as questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas. § 1º
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competências constitucionais. Estas foram reguladas no sentido de que a intervenção do
Conselho será somente sobre intervenção federal, estado de defesa, estado de sítio e
questões atreladas à estabilidade das instituições democráticas.
9. Do Conselho de Defesa Nacional
Órgão de consulta do Presidente da República. É convocado e presidido pelo
Chefe do Poder Executivo. São membros natos: o Vice-Presidente da República, o
Presidente da Câmara dos Deputados, o Presidente do Senado Federal, o Ministro de
Justiça, o Ministro de Estado e Defesa, o Ministro das Relações Exteriores, o Ministro de
Planejamento, os Comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica.55 Os assuntos a
serem consultados são atrelados à soberania nacional e à defesa do Estado democrático.56
Ao contrário do Conselho da República, não há na sua composição representantes da
sociedade civil. Por fim, a lei 8.183-91 regula o Conselho de Defesa Nacional e suas
competências.
Conclusão
A figura do Presidente da República num Estado Democrático de Direito é
fundamental para que haja a adoção de políticas públicas que atendam às necessidades
básicas da sociedade. É claro que a figura presidencial não se confunde com lideranças
O Presidente da República poderá convocar Ministro de Estado para participar da reunião do Conselho, quando constar da pauta questão relacionada com o respectivo Ministério. § 2º A lei regulará a organização e o funcionamento do Conselho da República. 55 Art. 91. O Conselho de Defesa Nacional é órgão de consulta do Presidente da República nos assuntos relacionados com a soberania nacional e a defesa do Estado democrático, e dele participam como membros natos: I - o Vice-Presidente da República; II - o Presidente da Câmara dos Deputados; III - o Presidente do Senado Federal; IV - o Ministro da Justiça; V - o Ministro de Estado da Defesa; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999) VI - o Ministro das Relações Exteriores; VII - o Ministro do Planejamento. VIII - os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999) 56 § 1º Compete ao Conselho de Defesa Nacional: I - opinar nas hipóteses de declaração de guerra e de celebração da paz, nos termos desta Constituição; II - opinar sobre a decretação do estado de defesa, do estado de sítio e da intervenção federal; III - propor os critérios e condições de utilização de áreas indispensáveis à segurança do território nacional e opinar sobre seu efetivo uso, especialmente na faixa de fronteira e nas relacionadas com a preservação e a exploração dos recursos naturais de qualquer tipo; IV - estudar, propor e acompanhar o desenvolvimento de iniciativas necessárias a garantir a independência nacional e a defesa do Estado democrático. § 2º A lei regulará a organização e o funcionamento do Conselho de Defesa Nacional.
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onipresentes e carismáticas que são representativas de modelos de estados
semidemocráticos. A semidemocracia é uma democracia carente de legitimidade e se
aproximam de Estados totalitários. O presidencialismo deve ser representativo de uma
sociedade plural e republicana que compartilha com os outros Poderes as aspirações dos
cidadãos e dos diversos setores da sociedade. Desde a promulgação da Constituição de
1988 até o presente momento assiste-se, com alguns hiatos, um a déficit de
representatividade e turbulências institucionais em razão de existir por parte da classe
política brasileira um comprometimento republicano, fundado na administração pública
imparcial, proba e eficiente. A apropriação dos bens públicos pelos gestores estatais,
representativos das diversas instâncias de poder, demonstra que precisamos de mais
séculos de democracia e república.
Ainda que esteja a presidência da República constantemente vigiada por outras
instituições públicas e pela sociedade civil, é precisa que haja mais democracia, mais
participação direta da população para que possam ser renovadas as representações
políticas e institucionais em todas as esferas de poder.
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