autismo, comunicaÇÃo e linguagem: estratÉgias e
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
CAMPUS ARAPIRACA
UNIDADE EDUCACIONAL PALMEIRA DOS INDIOS
CURSO DE PSICOLOGIA
LUDMYLA ROSALIE ALVES DE LEMOS
AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E POSSIBILIDADES
DE INTERVENÇÃO A PARTIR DE UMA REVISÃO DE LITERATURA
PALMEIRA DOS ÍNDIOS
2020
Ludmyla Rosalie Alves de Lemos
Autismo, comunicação e linguagem: estratégias e possibilidades de intervenção a
partir de uma revisão de literatura
Trabalho de Conclusão de Curso - TCC apresentado a Universidade Federal de Alagoas – UFAL, Campus de Arapiraca, Unidade Educacional Palmeira dos Índios, como requisito parcial para a obtenção do título de graduação em Psicologia.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Danielle Oliveira da Nóbrega.
PALMEIRA DOS ÍNDIOS
2020
Catalogação na fonte
Universidade Federal de Alagoas
Biblioteca Unidade Palmeira dos Índios
Divisão de Tratamento Técnico
Bibliotecária Responsável: Kassandra Kallyna Nunes de Souza (CRB-4: 1844)
L556a Lemos, Ludmyla Rosalie Alves de
Autismo, comunicação e linguagem: estratégias e possibilidades de
intervenção a partir de uma revisão de literatura/ Ludmyla Rosalie Alves de
Lemos, 2020.
80 f.
Orientadora: Danielle Oliveira da Nóbrega.
Monografia (Graduação em Psicologia) – Universidade Federal de
Alagoas. Campus Arapiraca. Unidade Educacional de Palmeira dos Índios.
Palmeira dos Índios, 2020.
Bibliografia: f. 75 – 80
1. Psicologia. 2. Autismo. 3. Transtorno do espectro autista. 4. Autismo
– comunicação. I. Nóbrega, Danielle Oliveira da. III. Título.
CDU: 159.9
AGRADECIMENTOS
A Deus, por ter me permitido trilhar todos os caminhos que passei, sendo meu
amparo e minha força nos momentos bons e ruins. Gratidão por cada experiência
vivida ao longo desses anos e por todas as bênçãos que Ele me concedeu.
Minha mãe, Cida, que viveu esse sonho comigo muito antes da minha entrada
na universidade. Minha maior incentivadora e quem esteve ao meu lado em cada
manhã em que eu ia à faculdade. Desde o princípio, fazendo o possível e o
impossível para que eu tivesse uma boa educação e que um dia eu conquistasse
minha graduação. Para ela, agradeço por tudo que fez e faz por mim.
Minha família, por todas as orações, por todas as vezes que torceram por
mim e vibraram com minhas conquistas. Meu pai, Aroldo. Meus irmãos, Fábio e
Murilo. Minhas avós, tia e primas. Serei eternamente grata por terem estado ao meu
lado nessa jornada.
Meu namorado, Efrain, por cada vez que me disse ―quanto maior o sacrifício,
maior a bênção‖, por todas as suas orações e pelas vezes que me ouviu reclamar,
desabafar e sentiu comigo um pouquinho do amor que eu pude ter ao longo de
tantas experiências vivenciadas. Sempre grata pelo seu incentivo e por todas as
vezes que acreditou em mim e no meu sonho. Estendo também meu agradecimento
a sua família por todo carinho e orações que tiveram comigo ao longo desses anos.
A minha amiga, Brenda, que não só torceu por mim como viveu esses 5 anos
ao meu lado. Entre as tristezas, alegrias e medos esteve ao meu lado sendo um
grande conforto. Ao meu lado nas aulas, trabalhos, eventos, cursos e, por fim, em
uma experiência que nos enriqueceu muito enquanto futuras profissionais: a clínica-
escola. Entre trocas e muito companheirismo, partilhamos juntas a vida acadêmica e
muito em breve a profissional.
Para Karol, agradeço pela sua amizade, pela sua atenção e cuidado todas as
vezes que me ouviu e que me incentivou. Uma amizade que nasceu nos corredores
da UFAL e se estendeu para a vida. Entre risadas e desabafos, partilhamos muitos
momentos nas idas e vindas de Palmeira, acompanhando e torcendo uma pela
outra, em cada progresso que a universidade nos permitia.
Às Psicolindas, por terem sido o melhor grupo de amigas que eu pude ter.
Brenda, Yara, Deb, Fran, Kerol, Socorro, Mary, Emille, Luzia, Amanda e Tam. A
UFAL colocou a maioria de vocês na minha vida e serei sempre grata por cada
manhã que vocês foram um suporte e um alívio para a nossa rotina universitária,
com vocês o fardo se tornou mais leve e mais divertido. Obrigada por tantos risos e
experiências, sem vocês minha permanência na UFAL não teria sido a mesma.
Minha professora e orientadora, Professora Danielle, uma mulher que admiro
enquanto pessoa e profissional. Seu olhar e suas experiências despertam em mim
sensibilidade e respeito pelo outro. Me acompanha desde meu primeiro estágio,
partilhando seu conhecimento, vivências e permitindo que eu encontrasse a minha
grande paixão na Psicologia.
Uma dessas experiências e diria que a mais especial e significativa foi o meu
contato com todas as crianças com TEA do meu Estágio Básico 1 e, em especial, a
minha inserção no Grupinho Aquarela. Lá encontrei seis crianças que me motivaram
a ser uma melhor profissional e a defender sempre os direitos da pessoa com
deficiência. Para vocês: Allysson, Arthur, Gabriel, Matheus, Pedro Gabriel e
Pedro Silva dedico esse trabalho e agradeço pelo o tanto que vocês me
ensinam, a vivência do TEA com vocês ressignificou meu olhar, minha prática
e me deu muito mais motivação.
A psicóloga Luana por ter partilhado comigo seu amor pela Psicologia e pelo
TEA. Suas experiências, sua prática e seu carinho me inspiram. Carregarei comigo e
em minha prática profissional muito do que vivenciei e aprendi com você, primeiro no
grupinho e depois a cada sexta-feira.
Por fim, agradeço a todas as pessoas que direta ou indiretamente estiveram
comigo ao longo dessa caminhada. Aos meus professores, por todo o conhecimento
que me possibilitaram ao longo desses anos, ressignifiquei meu olhar para o ser
humano e para a singularidade de cada um. Sei que não sou a mesma do início de
minha formação e agradeço por tudo e todos que contribuíram para que esse sonho
acontecesse.
É tão lindo!
Não precisa mudar
É tão lindo!
Deixa assim como está
E eu adoro e agora
Eu quero poder lhe falar
Dessa amizade que nasceu
Você e eu!
Nós e você!
Vocês e eu!
E é tão lindo!...
(Al Kasha / Edgard Poças / Joel Hirschhorn)
RESUMO
O referido trabalho trata-se de uma pesquisa bibliográfica de cunho qualitativo, amparada na Psicologia Histórico-cultural, tendo como objetivo geral compreender, a partir de literaturas encontradas na Revista Brasileira de Educação Especial, quais estratégias utilizadas no trabalho terapêutico e educacional direcionadas ao desenvolvimento da linguagem e comunicação de pessoas com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). A pesquisa foi realizada através de fontes bibliográficas encontradas na Revista Brasileira de Educação Especial disposta no portal Scielo, no ano de 2019, do dia 09 de julho ao dia 12 de agosto. Para a efetuação da mesma, foram utilizados os descritores: ―Autismo‖; ―Transtorno do Espectro do Autismo‖; ―Transtorno do Espectro Autista‖; e ―Autista‖. No total, encontrou-se 38 artigos científicos, sendo que apenas 7 foram selecionados, pois discutiam a problemática em foco. Com isso, tendo a técnica de análise de conteúdo como ferramenta para análise, foram levantadas duas categorias: 1) linguagem, comunicação e o TEA: que traz discussões encontradas nas literaturas acerca das concepções de linguagem e comunicação e aponta que dificuldades nesses âmbitos impedem a interação social da pessoa com TEA e 2) estratégias e resultados: as práticas terapêuticas e educacionais descritas nos artigos envolviam Comunicação Alternativa e Ampliada (CAA), o Picture Exchange Communication System (PECS), Modelagem em vídeo (MV) e, por fim, a utilização de fotografias pessoais como recurso terapêutico em que buscaram trabalhar histórias de vida enfocando a mediação. Com os resultados obtidos, concluiu-se que existem muitas possibilidades estratégicas de incluir a pessoa com TEA com dificuldade ou ausência de fala nos diversos contextos vivenciados por ela. A partir dessas estratégias e considerando a ótica da Psicologia Histórico-cultural, compreendemos que os sujeitos se desenvolvem através das relações sociais, históricas e culturais, fundamentais para a sua comunicação e interação social. Assim, nessa perspectiva, a mediação do outro tende a facilitar esse processo de aquisição da linguagem e comunicação, propiciando situações de interações sociais.
Palavras-chave: Transtorno do Espectro Autista. Linguagem e Comunicação. Comunicação Alternativa e Ampliada. Psicologia Histórico-cultural.
ABSTRACT
The referred work deals with a qualitative bibliographic research, based on Historical-Cultural Psychology, with the general objective of understanding, from the literature shown in the Revista Brasileira de Educação Especial, which statistics are used in the therapeutic and educational work directed to the development of language and communication of people with Autism Spectrum Disorder (ASD). A research was carried out through bibliographic sources found in the Revista Brasileira de Educação Especial, disabled in the Scielo portal, in 2019, from July 9 to August 12. To effect the same, for the accomplishment of the same the descriptors: "Autism"; ―Autism Spectrum Disorder‖; ―Autistic Spectrum Disorder‖; and "Autistic". In total, 38 articles were found, but only 7 were selected, since they deal with the problematic in focus. Since then, having content analysis as a research technique, two categories of analysis have been created: 1) language, communication and ASD: which brings discussions about literature related to concepts of language and communication and shows what are the differences between individuals prevented from social interaction of the person with ASD and 2) strategies and results: as therapeutic and educational practices described in the articles involved Alternative and Extended Communication (CAA), the Picture Exchange Communication System (PECS), Video Modeling (MV) and, finally, using personal photographs as a therapeutic resource in which to seek to work life stories involving mediation. With the results obtained, he concluded that there are many strategic possibilities of including a person with ASD with difficulty or absence of speech in different contexts experienced by him. From these strategies and considering the perspective of historical-cultural psychology, we understand that individuals develop through social, historical and cultural relations, which are fundamental for their communication and social interaction. Thus, in this perspective, mediation in another way facilitates the process of language and communication acquisition, providing situations of social interactions.
Keywords: Autistic Spectrum Disorder. Language and Communication. Alternative and Extended Communication. Historical-cultural psychology.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AEE Atendimento Educacional Especializado
APAE Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
AV Automodelagem em vídeo
CAA Comunicação Alternativa Ampliada
CID-10 Código internacional de doenças
CSA Comunicação suplementar e/ou alternativa
DSM-V Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª
edição
LB Linha de base
MV Modelagem em vídeo
MVO Modelagem em vídeo com outros como modelo
MVPV Modelagem em vídeo a partir do ponto de vista
PAS Participantes alunos
PEA Perturbação do Espectro do Autismo
PECS Picture Exchange Communications System
PFS Participantes familiares
PROCAAF Programa de Comunicação de Alternativa e Ampliada Familiar
SCIELO Scientific Eletronic Library Online
TEA Transtorno do Espectro Autista
TGD Transtornos globais do desenvolvimento
ZDP Zona de desenvolvimento proximal
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 11
2 PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL: HISTORICIDADE E
FUNDAMENTOS
16
3 O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: CONSTRUÇÃO
HISTÓRICA DO CONCEITO E A VISÃO DA PSICOLOGIA
HISTÓRICO-CULTURAL
26
3.1 O TEA em uma leitura da Psicologia Histórico-cultural 32
4 PERCURSOS METODOLÓGICOS 40
5 ENTRE O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA, A
LINGUAGEM E A COMUNICAÇÃO ALTERNATIVA: UMA
ANÁLISE DE LITERATURA
46
5.1 Categoria 1: Linguagem, comunicação e o TEA 47
5.2 Categoria 2: Estratégias e resultados 59
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 70
REFERÊNCIAS 75
11
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como tema a linguagem e a comunicação da pessoa com
Transtorno do Espectro Autista (TEA). O interesse pela temática surgiu mediante a
vivência da pesquisadora em sua experiência de Estágio Básico 1, no centro de
reabilitação Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), quando pode
estagiar com crianças com TEA.
E, também, devido a esse interesse, ocorreu sua inserção em um projeto de
extensão intitulado ―(Inter)ações e (Con)vivências: promoção de inclusão de crianças
com Transtorno do Espectro do Autismo‖. O projeto de extensão surgiu no ano de
2017 e justifica-se pela necessidade de promover ações que viabilizem a inclusão
social de pessoas com deficiência e, em específico, com TEA. Desse modo, o
projeto em tela insere-se na temática da reabilitação da pessoa com TEA e tem o
intuito de atuar no processo de reabilitação de crianças com TEA, promovendo
situações de mediação simbólica que sejam favoráveis para o desenvolvimento
desses sujeitos.
Assim sendo, dada a inserção no projeto de extensão com crianças com TEA
e diante do contato com a realidade de cada criança, a pesquisadora pode perceber
a singularidade encontrada nessa síndrome, como também perceber novas
maneiras de comunicação que até então não eram percebidas por ela.
O trabalho com essas crianças suscitou um novo olhar para o TEA e as
discussões de caso abriram portas para buscar compreender melhor como a
comunicação e linguagem perpassam o desenvolvimento do sujeito com TEA.
Desse modo, a pretensão deste trabalho é contribuir com essa demanda para que
intervenções posteriores focadas na linguagem e na comunicação sejam
desenvolvidas.
O TEA é uma condição que pode afetar as mais diversas áreas do
desenvolvimento. Apresenta-se em intensidade e formas variadas e, dentre as áreas
prejudicadas, estão: interação social, comunicação, comportamentos restritos e
repetitivos. Devido a esses comprometimentos, pessoas com TEA podem envolver-
se em ecolalias, não atribuir funcionalidade a brincadeiras, como por exemplo,
brincar apenas observando a roda de um carro girar. Também questões motoras e
sensoriais estão dentro das dificuldades enfrentadas pelo sujeito com TEA.
12
Atualmente, o referido transtorno é concebido como uma deficiência. Tal
definição ocorreu no ano de 2012 e, desde então, esses indivíduos passam a ter
seus direitos assegurados, conforme consta a Lei nº 12.764, de 27 de dezembro de
2012, que diz:
§ 1º Para os efeitos desta Lei, é considerada pessoa com transtorno do espectro autista aquela portadora de síndrome clínica caracterizada na forma dos seguintes incisos I ou II: I - deficiência persistente e clinicamente significativa da comunicação e da interação sociais, manifestada por deficiência marcada de comunicação verbal e não verbal usada para interação social; ausência de reciprocidade social; falência em desenvolver e manter relações apropriadas ao seu nível de desenvolvimento; II - padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades, manifestados por comportamentos motores ou verbais estereotipados ou por comportamentos sensoriais incomuns; excessiva aderência a rotinas e padrões de comportamento ritualizados; interesses restritos e fixos (BRASIL, 2012, p. 1).
Como se observa nessa definição, uma das questões que circunscrevem o
tema abordado são as dificuldades de comunicação que ganham relevância pelo
fato do sujeito com TEA ter dificuldades significativas na interação social. Sua
ausência ou comprometimento originam uma série de obstáculos no
desenvolvimento desse sujeito.
A linguagem verbal é a forma de comunicação mais comum entre as pessoas.
Nota-se que pessoas que não usam esse canal de comunicação tendem a sair de
um padrão que ocasiona a muitos obstáculos em seu contato com o outro (GOMES,
2018). A dificuldade de compreender a linguagem e de compartilhar sentidos com a
pessoa com TEA pode gerar no outro um baixo investimento em estabelecer
relações interpessoais, o que interfere diretamente no processo de aprendizagem
desse sujeito que está em constante constituição.
De todo modo, tornam-se cada vez mais visíveis instituições que atendem ao
público de pessoas com TEA, seja em prol do trabalho do terapêutico ou educativo,
mas, no geral, a sociedade está passiva a esse contato o que implica na busca em
conhecer mais sobre esse transtorno para assim se fazer uma melhor inclusão
dessas pessoas, possibilitando seu desenvolvimento biopsicossocial.
Diante desse panorama, todos os âmbitos que recebem pessoas com TEA
entram em contato com as dificuldades de linguagem e comunicação presentes na
grande maioria dos quadros clínicos, fazendo necessários profissionais das mais
13
diversas áreas que estejam aptos para atuar com as diferentes realidades e formas
de aprendizagem.
O fato de que nem todas as pessoas são capazes de verbalizar ou fazer uso
da fala de modo que seja de fácil compreensão geral provocou a possibilidade da
criação de sistemas de comunicação que visassem suplementar essa fala ausente
ou prejudicada. Nesse sentido, a Comunicação Alternativa Ampliada (CAA) surge
para suprir essa demanda e, como parte dessas possibilidades, outros recursos
também foram surgindo com o mesmo objetivo. O trabalho terapêutico e educativo
passou a fazer uso de muitos desses meios como ponte de acesso à comunicação
com a pessoa com TEA. No entanto, com o número crescente de métodos e
técnicas disponibilizadas, seu uso, em certos contextos, passou a ser utilizado de
forma mecânica e sem a devida adaptação e contextualização.
Diante disso, anunciamos nosso objeto de estudo: quais as estratégias
utilizadas no trabalho terapêutico e educacional direcionadas ao desenvolvimento da
linguagem e comunicação de pessoas com TEA? Faremos isso a partir de uma
análise bibliográfica da Revista Brasileira de Educação Especial. Desse modo temos
como objetivo geral: compreender, a partir de literaturas encontradas na Revista
Brasileira de Educação Especial, quais estratégias utilizadas no trabalho terapêutico
e educacional direcionadas ao desenvolvimento da linguagem e comunicação de
pessoas com TEA. E como objetivos específicos: compreender as concepções de
linguagem e comunicação encontradas nas literaturas; analisar a importância da
linguagem e comunicação no desenvolvimento da pessoa com TEA; e identificar
estratégias interventivas no tocante à linguagem e à comunicação.
Para corresponder aos referidos objetivos, escolhemos a pesquisa
bibliográfica de cunho qualitativo, ancorada em uma das correntes teóricas da
Psicologia que enfoca um olhar dialético para o ser humano e seu comportamento.
Desse modo, o referencial teórico escolhido foi a Psicologia Histórico-cultural que
carrega consigo uma perspectiva crítica devido a seus fundamentos epistemológicos
e teóricos. Concebe o sujeito como um ser ativo, social e histórico (BOCK, 2001).
Através desse entendimento, traz consigo o importante papel da linguagem como
mediador essencial na interação da pessoa com o meio em que vive.
Nesse sentido à linguagem, esta é compreendida como central no
desenvolvimento humano. Interfere e transforma as significações do que é
apreendido no processo social e histórico de cada sujeito. Trata-se de um processo
14
constitutivo complexo e considerado o principal mediador no desenvolvimento das
funções psicológicas superiores. Funciona como instrumento da comunicação,
planejamento e autorregulação (ALVES, 2006).
Com relação a comunicação este conceito diz respeito a um processo
complexo de transmissão de informações, em que se pode partilhar desejos e
necessidades. Ocorre em contextos naturais e cotidianos da vida do sujeito, sendo a
comunicação verbal o meio de comunicação mais utilizado entre os seres humanos.
Todavia não existe apenas essa forma de comunicação fazendo-se necessário
pensar em formas alternativas que busquem suplementar ou substituir essa prática,
a fim de que todos possam desenvolver-se e que tenham a possibilidade de exprimir
seus pensamentos e sentimentos (ORRÚ, 2012).
Orrú (2012) discorre sobre as ideias de Vigotsky sobre o processo de
aquisição de linguagem, afirmando que esse movimento se efetiva no processo
social, ou seja, partindo do externo para, aos poucos, transformar-se em um sistema
de signos internalizado. A autora explica que a cultura e a mediação semiótica são
assuntos centrais na obra do autor, estando constantemente relacionadas ao
desenvolvimento do sujeito e a outros processos, que se efetuam através dessa
mediação e serão detalhados nos capítulos subsequentes.
Assim, como justificativa desse trabalho, pontuamos a necessidade de
provocar reflexões em torno dessa temática, visando pensar a pessoa com TEA a
partir de sua singularidade e considerar suas potencialidades. Nesse sentido, é
preciso buscar métodos e técnicas que ofereçam situações favoráveis de mediações
e, nesse contato com o outro, estar apto para significar todas as ações, propiciando
uma troca de experiências e sentidos.
É válido ressaltar que não existe uma única estratégia em busca desse
objetivo, um único método ou técnica. Tampouco acredita-se que uma técnica,
reproduzida mecanicamente, irá ser a mais válida. Visto que, quando se discute
sobre o espectro, implica perceber que não existe uma única forma de ser, mas sim
múltiplas formas de vivenciá-lo. Logo, por mais que seja unânime saber que a
linguagem e comunicação precisam ser trabalhadas em toda e qualquer relação
desse sujeito, a forma de intervir não será a única para todos que possuem TEA.
Para a Psicologia, a relevância do estudo justifica-se pela possibilidade de
discutir esses aspectos no âmbito da profissão, o que pode provocar no profissional
uma inquietação para modificar sua prática. Como estudante e futura profissional, tal
15
pesquisa é importante por fornecer informações que implicam em um olhar mais
sensível e também a perspectiva de outros desdobramentos de pesquisas. Pensar o
TEA como uma condição que não existe para limitar a pessoa, mas sim para romper
com as barreiras que são postas pela sociedade e mostrar todas as possibilidades
de vivências da pessoa no mundo.
Este trabalho está dividido em seis partes e quatro capítulos, uma parte diz
respeito à Introdução e outra às Considerações Finais. Nesta primeira parte, é
possível observar a problemática da pesquisa, os objetivos e justificativa dessa
pesquisa e também o referencial teórico escolhido para dar suporte às ideias
construídas.
O primeiro capítulo discute o referencial teórico escolhido, bem como discorre
sobre seus fundamentos epistemológicos e teóricos.
O segundo capítulo aborda um registro histórico do TEA, traçando uma linha
do tempo desde a descoberta desse transtorno até os dias atuais. Nesse
levantamento, abarcou-se conceito, características, causas e critérios utilizados em
prol de um diagnóstico. Também foi possível realizar uma leitura do TEA sob a ótica
da Psicologia Histórico-cultural.
No terceiro capítulo, são apresentados os procedimentos metodológicos
utilizados nessa pesquisa. Tem-se aqui uma breve introdução sobre os sete artigos
selecionados, a partir do banco de dados da Revista Brasileira de Educação
Especial.
No quarto e último capítulo, é retratada a análise referente à pesquisa, na
qual utilizou-se a técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 2004) discutindo os
dados encontrados, que foram distribuídos em duas categorias: 1) linguagem,
comunicação e o TEA; e 2) estratégias e resultados.
Por fim, temos as considerações finais que retomam os objetivos dessa
pesquisa para assim refletir sobre o que foi encontrado a partir das análises
realizadas.
16
2 PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL: HISTORICIDADE E FUNDAMENTOS
O referido capítulo trata dos principais conceitos e fundamentos da Psicologia
Sócio-histórica, fazendo uso da Psicologia Histórico-cultural como abordagem para o
desenvolvimento desse trabalho. A mesma será a norteadora para que haja um
entendimento acerca de diversos aspectos que envolvem o Transtorno do Espectro
Autista (TEA). Essa perspectiva oferece grandes contribuições para o
desenvolvimento e inclusão de crianças com TEA, pois faz uma leitura de ser
humano que, a partir de suas relações sociais, da mediação com o outro e da
linguagem, é ativo, social e histórico em seu processo de desenvolvimento e de sua
aprendizagem.
Essa corrente teórica conta com a contribuição do trabalho de Vygotsky
(1896-1934), que trouxe em suas postulações possibilidades de superação das
visões dicotômicas até então existentes em meio às abordagens da Psicologia.
Nesse sentido, propõe uma crítica à visão reducionista muito difundida na época, em
que o comportamento humano era explicado como algo inerente de origem interna
ou externa ao homem. A Psicologia Sócio-histórica incentiva uma Psicologia de
caráter dialético, fundamentada no marxismo e adotando o materialismo histórico e
dialético como filosofia, teoria e método (BOCK, 2001).
De acordo com Lucci (2006), o momento pelo qual Vygotsky surge no cenário
da Psicologia fundamentando suas ideias foi quando a revolução socialista, que
ocorreu na Rússia, em 1917, estava em seu ápice, um momento pelo qual a
população passava por uma série de dificuldades econômicas, escassez de
alimentos e um grande número de pessoas que foram vitimadas com doenças, tais
como o próprio Vygotsky, que sofrera de tuberculose. Mesmo com a vitória da
revolução, a Rússia estava enfrentando um momento conturbado, no qual os novos
dirigentes do país tinham como objetivo implantar um novo modelo de governo que
tivesse como fundamento a teoria marxista, visando ao surgimento de uma nova
sociedade e também à criação de uma nova ciência.
Assim, o momento em que Vygotsky surgiu no cenário russo foi muito propício
à ocasião, quando um novo modelo de sociedade estava sendo impresso, fazendo
com que fosse necessária a construção de uma nova visão de homem. Também foi
uma fase em que a Psicologia passou a ser utilizada para análise de problemas com
uma solução prática. Em meio a sua formação humanista e sua bagagem cultural,
17
Vygotsky tinha as ferramentas necessárias para contribuir com essa nova proposta,
oferecendo suas contribuições para as áreas da Educação, Pedologia (ciência da
criança) e para Psicologia (LUCCI, 2006).
Todavia, vale frisar que com o endurecimento do regime soviético, a
Psicologia passou por uma série de restrições durante o governo de Stalin, período
em que os testes psicológicos foram banidos, assim como a Psicologia que era
voltada para as áreas da educação e indústria. As obras do próprio Vygotsky, nessa
época já falecido, eram tidas como parte de uma lista negra e eram proibidas de
serem difundidas. Apenas em 1953, com a morte de Stalin, que a obra elaborada e
aplicada por Vygotsky pode ser reintegrada e difundida (LUCCI, 2006).
No que diz respeito às contribuições de Vygostsky no desenvolvimento da
Psicologia, Lucci (2006) explicita que o psicólogo buscou romper com as ideias que
existiam na época nesse campo do saber psicológico. Conforme o autor, havia uma
dicotomia entre uma psicologia mentalista e uma naturalista, o que implica um
dualismo entre mente-corpo, natureza-cultura e consciência-atividade, cujas divisões
permaneciam acentuadas sem haver uma abordagem que as superasse e
explicasse o nascimento das funções psicológicas humanas. Essa dicotomia dita por
Vygotsky torna-se clara quando o mesmo elencou a variedade de objetos de estudo
encontrados pelas abordagens em Psicologia, tais como: o inconsciente
(Psicanálise), o comportamento (Behaviorismo) e o Psiquismo e suas propriedades
(Gestalt). Assim sendo, ele propôs uma nova Psicologia que se baseava no método
e princípios do materialismo histórico dialético, ou seja, uma teoria marxista do
funcionamento intelectual humano (LUCCI, 2006).
Tal dicotomia está presente, inclusive, no nascedouro da Psicologia científica.
De acordo com Bock (2001), a Psicologia tornou-se ciência, em 1875, a partir das
contribuições de Wundt, com seu objeto de estudo sendo a experiência consciente.
Mas, ainda que com toda a contribuição que sua obra ofereceu, o mesmo não
conseguiu superar as questões dicotômicas que estavam em torno da Psicologia da
época, propondo duas psicologias: uma Psicologia Experimental e uma Psicologia
Social. Para ele, sendo um recurso para resolver as questões que estariam ligadas
ao natural e social; autonomia e determinação; interno e externo. Entretanto,
nenhuma delas conseguiu superar a perspectiva determinista e mecanicista
presente em seus pressupostos. Logo, a compreensão do fenômeno psicológico
permanecia insuficiente mantendo-se uma visão dicotômica.
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Em meio ao cenário em que se encontrava a Psicologia, Vygotsky, buscou
superar o dualismo da época, aderindo ao materialismo histórico e dialético, sendo a
base epistemológica de suas formulações (BOCK, 2001).
Para compreender o método utilizado por Marx e aderido por Vygotsky, é
válido salientar que, segundo Martins (2008), Marx parte do princípio de que a
realidade e tudo o que a constitui é de caráter material, sendo anterior à consciência.
Esse método de pensar a realidade a torna objetiva e real, assim, tudo o que
consiste nela, incluindo as sensações, ideias, conceitos, etc. emergem a partir da
materialidade do real. Nesse processo, o mundo objetivo é captado pelos sentidos e
representado pela consciência a quem irá tornar compreensível.
De acordo com Alves (2010, p. 1) a definição de materialismo para Marx é:
Materialismo é toda concepção filosófica que aponta a matéria como substância primeira e última de qualquer ser, coisa ou fenômeno do universo. Para os materialistas, a única realidade é a matéria em movimento, que, por sua riqueza e complexidade, pode compor tanto a pedra quanto os extremamente variados reinos animal e vegetal, e produzir efeitos surpreendentes como a luz, o som, a emoção e a consciência. O materialismo contrapõe-se ao idealismo, cujo elemento primordial é a ideia, o pensamento ou o espírito.
Seguindo esse caminho, o materialismo histórico tem como objetivo as
transformações econômicas e sociais, que se determinam a partir dos meios de
produção, enquanto a dialética posta por Marx é considerada a filosofia do
materialismo histórico, a parte teórica desse processo. O materialismo dialético
compreende que não existe essas concepções dualistas entre os âmbitos: sociais e
individuais, objetividade-subjetividade, interno-externo (ALVES, 2010).
Assim sendo, ainda conforme Alves (2010, p. 1),
Os princípios fundamentais do materialismo dialético são quatro: (1) a história da filosofia, que aparece como uma sucessão de doutrinas filosóficas contraditórias, dissimula um processo em que se enfrentam o princípio idealista e o princípio materialista; (2) o ser determina a consciência e não inversamente; (3) toda a matéria é essencialmente dialética, e o contrário da dialética é a metafísica, que entende a matéria como estática e anistórica; (4) a dialética é o estudo da contradição na essência mesma das coisas.
Nesta concepção, a história é movimento e não estática, inclui todo o
processo da constituição do ser e o que há em sua volta. Assim, o sujeito é
considerado como um ser social e histórico e a dialética presente nesse movimento
19
se colocam como a lógica pela qual ele deve ser compreendido. O materialismo
histórico dialético, então, é considerado a epistemologia marxiana.
Vygotsky, em seus trabalhos, formulou suas ideias trazendo o social como
condição fundamental para a compreensão do desenvolvimento humano,
conduzindo elementos em sua obra que auxiliassem para tal compreensão. O ponto
de partida em suas ideias foi seu estudo acerca das funções psicológicas dos
indivíduos, as quais classificou em elementares, de origem biológica, e superiores,
de base sociocultural. Nesse sentindo, as funções psicológicas elementares estão
presentes nas crianças e nos animais; são determinadas pelas ações involuntárias,
reações imediatas e sofrem controle do meio externo. Já as funções superiores
ocorrem a partir do meio social, estando presentes apenas no homem. Por isso,
Vygotsky considera as ações psíquicas de origem sociocultural, pois há uma
interação do sujeito tanto no âmbito cultural, quanto no social (LUCCI, 2006).
Em ―A Formação Social da Mente‖, Vygotsky (1991) fala sobre como ocorreu
o processo de desenvolvimento de sua compreensão sobre as funções psicológicas.
Para o autor, foi de grande responsabilidade tratar sobre tais questões,
considerando cenário que a Psicologia se encontrava. A princípio, deveria incluir em
suas postulações uma abordagem que explicasse e que fosse possível haver uma
descrição das funções psicológicas superiores, de um modo a ser aceitável para as
ciências naturais. Desse modo, precisava também trazer um caráter científico a suas
ideias e, para isso, o estudioso buscou identificar os mecanismos cerebrais
subjacentes a uma função, sem perder a historicidade que embasou toda a sua
obra. Os métodos e princípios do materialismo dialético foram utilizados por ele
como o meio para solucionar os paradoxos presentes na Psicologia. Assim, sua
concepção sobre os processos psicológicos superiores esteve ancorada nessa
perspectiva e tais fenômenos foram compreendidos como processos de movimento
e mudança.
Em síntese, temos que o social e o cultural são características fundamentais
na obra de Vygotsky, além disso, o caráter histórico usado para explicar o
desenvolvimento humano em suas obras foi o que o diferiu tanto das outras
perspectivas de sua época (SIRGADO, 2000). Tais aspectos são pertinentes a sua
lei geral do desenvolvimento cultural. Sobre essa lei, Vygotsky explana que:
20
Um processo interpessoal é transformado num processo intrapessoal. Todas as funções no desenvolvimento da criança aparecem duas vezes: primeiro, no nível social, e, depois, no nível individual; primeiro, entre pessoas (interpsicológica), e, depois, no interior da criança (intrapsicológica). Isso se aplica igualmente para a atenção voluntária, para a memória lógica e para a formação de conceitos. Todas as funções superiores originam-se das relações reais entre indivíduos humanos (VYGOTSKY, 1991, p. 41).
Lucci (2006) explica que o sujeito tem o desenvolvimento mental a partir da
interiorização das funções psicológicas, o que não acontece naturalmente e não é
apenas um processo de mudança do externo para o interno, mas diz respeito ao
processo pelo qual o interno é constituído, não seguindo um caminho único,
universal e independente do desenvolvimento cultural. A origem e o
desenvolvimento desse processo superior são sociais e mantêm três categorias de
mediadores que são: os signos e instrumentos; atividades individuais e relações
interpessoais.
O homem, na sua condição de um ser histórico e cultural é ativo e moldado
pela própria cultura que cria. Ao longo do tempo, o fazer humano se modifica,
caminhando de acordo com as demandas emergentes e as necessidades humanas.
As relações interpessoais são um fator determinante na vida do indivíduo, pois é a
partir da relação com o outro e por ela própria que ele é determinado. Logo, o
biológico e o social tornam-se características que se interligam nesse processo de
desenvolvimento (LUCCI, 2006).
Para Vygotsky, o desenvolvimento de habilidades para a concretização de
funções específicas e também a gênese da sociedade ocorrem a partir do trabalho,
que é tido como a atividade humana (LUCCI, 2006). Ancorado nas concepções
postas por Marx, Vygotsky afirma que os homens são formados através do trabalho.
Nessa relação, eles se objetivam e transferem características que são próprias
deles, como físicas e psíquicas, nos produtos de seu trabalho. É por meio do
trabalho que as relações sociais se internalizam e dão efeito ao desenvolvimento
psíquico (CASTRO, 2013).
Inspirado no conceito de trabalho de Marx e Engels, Sirgado (1990) elenca o
conceito de atividade, sendo este considerado um conceito fundamental na
construção da Psicologia Sócio-histórica e que está presente tanto nas ideias de
Vygotsky, como de Leontiev, este último sendo seu principal idealizador. Tem
21
relação com a questão da consciência, já que a mesma é vista surgindo a partir do
processo de atividade humana.
O que nos torna únicos e diferentes dos animais é o fato de que a atividade
humana, sendo mediadora das relações do homem com a natureza, é uma atividade
criadora. Assim, ao agir sobre a natureza externa, o homem também é transformado
por ela. Nesse sentido, há três elementos compondo o modelo de atividade de
trabalho, que são: o sujeito ativo, o objeto e o mediador. A partir do objeto concebido
pelo trabalho é que se constitui a objetivação, ou seja, a concretização e a
internalização, do trabalho do homem.
Para Oliveira (2010), atividade refere-se a uma determinada mediação entre
homem e natureza, sendo esta última já modificada pelo trabalho humano. Não se
restringe apenas aos limites biológicos, ou seja, além de ser transformador da
natureza, o homem também está a ser modificado por ela, não se limitando a
satisfazer suas necessidades biológicas, mas sim, buscando dirigir-se pelas leis
histórico-culturais.
Aguiar (2001) também aborda o conceito de atividade e fala sobre o processo
de construção do fenômeno psicológico. Este é compreendido como a ―[...] atividade
do homem de registrar a experiência e a relação que mantém com o ambiente
sociocultural‖ (AGUIAR, 2001, p. 96). Para a autora, a relação do homem com o
mundo, seja a de interferir nesse mundo e também ser afetado por ele, permite ao
sujeito a construção de seus registros. O homem passa a se relacionar com o
mundo objetivo, coletivo, social e cultural e, a partir desses fatores, que se constitui
como ser humano. Assim, o fenômeno psicológico constitui-se por meio de toda
essa relação sociocultural que o homem está sujeito.
De acordo com Sirgado (1990), foi a partir do conceito de atividade que
Vygotsky elaborou o ponto indispensável de sua teoria acerca do funcionamento
psicológico: a mediação semiótica ou mediação simbólica. O conceito de mediação,
para Oliveira (1997, p. 26), é ―o processo de intervenção de um elemento
intermediário numa relação; a relação deixa, então, de ser direta e passa a ser
mediada por esse elemento‖. Para a autora, no decorrer de nossas experiências,
vamos atribuindo mais sentido às relações mediadas, fazendo com que estas se
tornem mais complexas, assim, ao longo do percurso do indivíduo, as relações
mediadas passam a predominar sobre as relações diretas. Vygotsky, em suas obras,
expõe a ideia de que a relação do homem com o mundo não é direta, mas sim
22
mediada. E, ainda sobre mediação, Vygotsky elenca dois tipos de mediadores: os
instrumentos e os signos.
Oliveira (1997, p. 29) aborda que ―o instrumento é um elemento interposto
entre o trabalhador e o objeto de seu trabalho, ampliando as possibilidades de
transformação da natureza‖. Desse modo, pode-se afirmar que o instrumento é
utilizado quando se pretende alcançar certo objetivo, com isso, ele se torna um
mediador social entre a relação indivíduo e mundo. São elementos externos ao
sujeito, ou seja, sua função é provocar uma mudança nos objetos. Já em relação
aos signos, Vygotsky os intitula de instrumentos psicológicos, sendo uma ferramenta
que está relacionada ao interior do indivíduo, auxiliando em seus processos
psicológicos.
Quanto ao uso desse sistema simbólico, há uma mudança indispensável que
ocorre que é o processo de internalização, que significa ―[...] a reconstrução interna
de uma operação externa‖ (VYGOTSKY, 1991, p. 40).
Ainda sobre o processo de internalização, Cole e Scribner (1991, p. 11)
afirmaram que:
Vygotsky acreditava que a internalização dos sistemas de signos produzidos culturalmente provoca transformações comportamentais e estabelece um elo de ligação entre as formas iniciais e tardias do desenvolvimento individual. Assim, para Vygotsky, na melhor tradição de Marx e Engels, o mecanismo de mudança individual ao longo do desenvolvimento tem sua raiz na sociedade e na cultura.
Para Lucci (2006), a linguagem é o principal mediador social, tendo grande
importância e influência para o desenvolvimento das funções psicológicas
superiores. Atua sendo um sistema simbólico, que está envolto na história social do
homem, e age organizando os signos em estruturas complexas. Também funciona
como instrumento de comunicação, planejamento e autorregulação. Tal função
comunicativa permite ao indivíduo conectar-se ao mundo externo, onde terá a
possibilidade de ressignificar informações, conceitos e significados.
Oliveira (1997) aborda que o desenvolvimento da linguagem e as relações
que a mesma tem com o pensamento são temas crucias na obra de Vygotsky. A
necessidade de comunicação que há no sujeito é o que viabiliza o desenvolvimento
da linguagem. Há um percurso necessário para que o ser humano saia do aspecto
tão somente biológico para se transformar em um ser de caráter sócio histórico. Para
23
isso, é necessário o uso da linguagem como um sistema de signos aliado ao
surgimento do pensamento verbal. Ambos conceitos têm forte relação para o
desenvolvimento do indivíduo e, em específico, ao da criança. Dessa forma,
Quando os processos de desenvolvimento do pensamento e da linguagem se unem, surgindo, então, o pensamento verbal e a linguagem racional, o ser humano passa a ter a possibilidade de um modo de funcionamento psicológico mais sofisticado, mediado pelo sistema simbólico da linguagem (OLIVEIRA, 1997, p. 47).
Orrú (2012), ao falar sobre pensamento e linguagem, aborda a relação entre a
atividade produtiva do ser humano e sua atividade cognitiva, em que a primeira
refere-se aos saberes históricos produzidos pelos homens que se convertem em
saberes do próprio indivíduo através da atividade cognitiva. Em meio a esse
processo, há a linguagem sendo mediadora e formadora da consciência. Ainda, a
autora afirma que ―A linguagem é, portanto, um instrumento da consciência com o
atributo de compor, controlar e planejar o pensamento em uma função de
intercambio social‖ (ORRÚ, 2012, p. 93).
Dentro dessa linha, Orrú (2012) aborda a relação que há entre a linguagem e
o pensamento e percebe-se a importância que a linguagem tem nesse processo e o
quanto é responsável pela transformação e o desenvolvimento do pensamento.
Sobre a relação da aprendizagem nesse processo, a autora elenca que:
Para tais processos, concorre a aprendizagem, que ocorre mediante a transformação construtiva de pensamentos, sentimentos e ações, envolvendo uma interação entre conhecimentos preliminares e conhecimentos novos que constroem outros significados psicológicos, resultantes em outras ações, pensamentos e linguagem (ORRÚ, 2012, p. 96).
Nessa perspectiva, Vygotsky teve como tema central de suas obras questões
que estavam relacionadas com o desenvolvimento humano, o aprendizado e a
relação entre desenvolvimento e aprendizado. Em seu percurso, levou muitas de
suas contribuições para a Psicologia e sempre apontou a relevância dos processos
de aprendizagem e o quanto estes se relacionam ao desenvolvimento das funções
psicológicas superiores. Atribui relevância ao papel do outro nesse processo de
aprendizado e também à necessidade que o sujeito tem de situações que propiciem
seu desenvolvimento. Para melhor compreender a relação que há entre
24
desenvolvimento e aprendizado, Vygotsky formulou o conceito de zona de
desenvolvimento proximal - ZDP (OLIVEIRA, 1997).
Segundo Isaia (1998), o conceito de zona de desenvolvimento proximal
desenvolvido por Vygotsky busca compreender a assimilação entre a dimensão do
real e potencial do desenvolvimento humano, levando em consideração não só
aquilo que o sujeito já saiba e que já tenha internalizado, mas fundamentalmente
aquilo que ainda pode vir a aprender, através da mediação e das relações com o
outro. Dessa maneira, com a mediação semiótica, o uso de instrumentos e o auxílio
da relação cultural entre o social e o individual é que o respectivo conceito se
concretiza.
Como salienta Vygotsky (1991), a ZDP, ou seja, aquilo que o indivíduo e, em
específico, a criança podem vir a realizar, é um instrumento para desenvolver o
trabalho de psicólogos e educadores. Ela viabiliza o conhecimento de como ocorre o
curso interno do desenvolvimento, do quanto a criança já se desenvolveu e do
quanto ainda pode vir a se desenvolver.
Assim, caminhando para a compreensão do desenvolvimento da pessoa com
TEA e fazendo uma leitura da deficiência sob a ótica da perspectiva sócio-histórica,
Vygotsky trouxe diversas elucidações sobre essa área, tendo como ponto central
seu entendimento sobre a ZDP. Conforme Costa (2006), o autor centraliza seu
trabalho nas possibilidades do sujeito e não em seus défices. Desse modo, buscou
ampliar seu olhar se dispondo a trazer grandes contribuições para a temática. O
conceito de ZDP mostra que, a partir da mediação do outro, sejam estes pais,
amigos, professores, o sujeito terá condições de produzir melhor do que sozinha.
Esse processo revela que a criança tem possibilidades de desenvolver o que até
então não realizava.
De acordo com Vygotsky (2011), a partir da distinção entre as duas esferas
do desenvolvimento, a natural e a cultural, foi que houve um novo modo de pensar
as questões referentes à educação, enfatizando a concepção dialética do
desenvolvimento da criança. Por um longo período, o desenvolvimento da criança foi
tido por uma linha linear, como explicou Vygotsky (2011, p. 867):
Toda a nossa cultura é calculada para a pessoa dotada de certos órgãos – mão, olho, ouvido – e de certas funções cerebrais. Todos os nossos instrumentos, toda a técnica, todos os signos e símbolos são calculados para um tipo normal de pessoa. E daqui surge aquela ilusão de convergência, de passagem natural das formas naturais às culturais, que,
25
de fato, não é possível pela própria natureza das coisas e a qual tentamos revelar em seu verdadeiro conteúdo.
Os casos de desenvolvimento de pessoas com deficiências possibilitam
perceber com nitidez a diferença entre o desenvolvimento cultural e o natural, sendo
o primeiro, um caminho para a educação da criança com deficiência. Assim,
caminhos indiretos são construídos, proporcionando o desenvolvimento dessa
criança através de um aparato fisiológico que, por vezes, pode ser diferente do tido
como natural.
Por muito tempo, todo o olhar da Psicologia para a criança com deficiência
deu-se a partir de uma visão de perda, das faltas que a deficiência acometia nela.
Entretanto, para substituir esse entendimento, elabora-se outro olhar, que analisa a
dinâmica da criança com deficiência e seu desenvolvimento, partindo da
compreensão dessas perdas e faltas, mas também buscando enxergar para além,
obtendo estímulos para caminhos alternativos de desenvolvimento (VYGOTSKY,
2011).
Mediante a compreensão e o estudo das ideias de Vygotsky sobre a
deficiência e todo o aparato que sua teoria pode oferecer acerca do
desenvolvimento da criança com deficiência, em específico, da criança com TEA, é
que esse trabalho está pautado. Assim, no próximo capítulo, serão discutidos os
principais conceitos e definições que estão envoltos no Transtorno do Espectro
Autista, fazendo uma ponte com a teoria de Vygotsky, a partir da perspectiva sócio-
histórica de desenvolvimento e buscando um maior entendimento sobre o respectivo
transtorno.
26
3 O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO
CONCEITO E A VISÃO DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL
Neste capítulo, será realizado um remonte histórico acerca do TEA,
abrangendo a origem do termo, o início dos estudos sobre o conceito, sua definição,
características, causas e os aspectos utilizados para chegar ao diagnóstico,
abordando, assim, as principais características que circundam essa síndrome,
tomando como referencial a perspectiva da Psicologia Histórico-cultural.
De acordo Silva, Gaiato e Reveles (2012), o autismo configura-se como um
dos Transtornos Globais do Desenvolvimento Infantil, manifestando-se antes dos 3
anos de idade e que perdura por toda a vida. Todavia, o uso desse termo é anterior
ao sentido atual. Segundo Orrú (2012), a palavra autismo é de origem grega (autós),
cujo significado é por si mesmo, fazendo menção aos comportamentos humanos
que são centrados em si mesmos.
Assim, o termo ―autismo‖ foi implementado pela primeira vez na psiquiatria
por Plouller, em 1906, com a discrição de indicativo clínico de isolamento em alguns
casos (BRASIL, 2013). Já conforme descrito por Stelzer (2010), as primeiras
descrições a respeito do ―autismo‖ foram introduzidas pelo médico psiquiatra Eugen
Bleuler (1857-1939), o qual introduziu na literatura médica o termo ―autismo‖. A
princípio, era utilizado para falar sobre pessoas com muitas dificuldades para
interagir com as outras e com muita tendência ao isolamento. O significado que
Bleuler tinha sobre o autismo difere muito do que encontramos nos dias atuais já
que para ele o autismo tinha correlação com a esquizofrenia.
Na década de 1940, o psiquiatra austríaco, Léo Kanner foi o primeiro a
discordar da definição colocada por Bleuler, assumindo, em suas publicações, que o
autismo era uma condição diferente da esquizofrenia. Redirecionou seus estudos
para as crianças que ele observou ter comportamentos atípicos, com a presença de
estereotipias e dificuldades na interação social (ORRÚ, 2012).
Em 1943, descreveu o caso de 11 crianças que apresentavam características
marcantes de distúrbio do desenvolvimento, publicando um informe intitulado por:
―Alterações autistas do contato afetivo‖. Kanner destacou-se como o primeiro médico
a publicar uma análise detalhada sobre o que nomeou de ―Distúrbios Autístico do
Contato Afetivo‖. Nesse estudo de caso, conseguiu perceber e detalhar algumas
características que se apresentavam, tais como dificuldades em estabelecer
27
relações interpessoais, comportamentos repetitivos, prejuízos na linguagem e uma
sequência limitada de atividades ritualizadas (ORRÚ, 2012).
Orrú (2012, p. 19) explica que:
Kanner diferenciava o distúrbio autístico do grupo das esquizofrenias, discordando do que fora afirmado por Bleuler em 1911, por entender não se tratar de uma doença independente e, sim, de mais um dos sintomas da esquizofrenia. Bleuler enfatizava a ―deteriorização emocional‖ no quadro clínico da esquizofrenia, ressaltando, no autismo, mais o distúrbio com relação à realidade do que ao contato afetivo. Todavia, Kanner, desde o início, constatou que, apesar de o esquizofrênico se isolar do mundo, havia uma grande diferença em relação ao autista, pois este jamais conseguiu, sequer, penetrar nesse mundo mencionado por Bleuler.
Em 1956, Kanner elencou dois sinais básicos como indicativos do quadro: o
isolamento e a imutabilidade; e também confirmou a natureza inata desse distúrbio.
Desde então, têm sido adotadas as mais diversas denominações e sendo descritas
por diferentes sinais e sintomas mediante a classificação diagnóstica utilizada, mas
sempre aderindo aos dois pontos explicitados por Kanner (BRASIL, 2013).
Em 1944, Hans Asperger, um pediatra austríaco, cujo interesse era na área
de educação especial, fez a descrição do caso de quatro crianças que possuíam
dificuldades em se integrar em grupos. É válido salientar que Asperger não teve
conhecimento sobre as obras publicadas por Léo Kanner sobre o autismo infantil,
denominando a condição como uma ―psiquiatria autística‖ que se apresentava um
transtorno estável de personalidade caracterizados pelo isolamento social.
Em suas observações, notou que as crianças apresentavam uma pobreza
notável na comunicação não-verbal, uma empatia pobre e uma tendência a
intelectualizar as emoções, uma fala prolixa e uma linguagem que tendia ao
formalismo. Diferentemente do estudo de caso realizado por Kanner, as crianças
observadas por Asperger não eram tão retraídas ou alheias, elas também
desenvolviam, às vezes precocemente, uma linguagem altamente correta (KLIN,
2008).
De acordo com Belisário Filho e Cunha (2010), as descrições de Asperger
foram publicadas em alemão, logo no pós-guerra, não sendo traduzidas para outro
idioma, sendo provavelmente um dos motivos pelo qual suas obras terem sido
desconhecidas por de parte do tempo. Apenas na década de 1980 que seus
trabalhos foram reconhecidos e o médico tido como um dos pioneiros nas pesquisas
sobre o autismo.
28
As observações realizadas por Kanner e Asperger apresentavam tanto pontos
convergentes como divergentes. Percebe-se que a preocupação maior de Asperger
foi com os aspectos educacionais dessas crianças, o que não foi pontuado nas
postulações realizadas por Léo Kanner. Já como critérios semelhantes, ambos
perceberam nas crianças que observaram a ausência ou dificuldades na
comunicação e linguagem (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010).
Mediante os estudos realizados por Hans Asperger foi que teve origem o que
mais adiante foi intitulado de transtorno de Asperger. Com base no Manual de
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 4ª edição do DSM-IV, as
características do transtorno de Asperger são: prejuízos na interação social e no
desenvolvimento de padrões repetitivos de comportamentos, interesses e atividades.
Nesse caso, não se observa atrasos significativos na linguagem, no
desenvolvimento cognitivo, nas habilidades de autoajuda e comportamento
adaptativo (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010).
Ainda conforme Belisário Filho e Cunha (2010) há a possibilidade de que o
transtorno de Asperger seja mais tardio para aparecer e ser identificado,
apresentando-se mais fortemente manifestado no período escolar onde as
dificuldades de interação tornam-se mais evidentes. Quando chegam na vida adulta,
essas pessoas podem apresentar dificuldades com a empatia e modulação da
interação social.
Na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas
Relacionados à Saúde (CID 10), o TEA é abordado como um transtorno invasivo do
desenvolvimento que é percebido pela presença de comprometimentos, ou seja, um
desenvolvimento atípico que se manifesta até os 3 anos de idade. As três áreas
prejudicadas são: 1) interação social; 2) comunicação; e 3) comportamento restrito e
repetitivo. Algo que também vem sendo percebido é a incidência maior em meninos
do que em meninas. Somado aos comprometimentos citados, há também problemas
como: medo/fobias, perturbações de sono e alimentação, ataques de briga e
agressão, autolesões (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1998).
Já o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-V
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014), aborda o conceito de autismo
da seguinte forma:
29
O transtorno do espectro autista caracteriza-se por déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, incluindo déficits na reciprocidade social, em comportamentos não verbais de comunicação usados para interação social e em habilidades para desenvolver, manter e compreender relacionamentos. Além dos déficits na comunicação social, o diagnóstico do transtorno do espectro autista requer a presença de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades. Considerando que os sintomas mudam com o desenvolvimento, podendo ser mascarados por mecanismos compensatórios, os critérios diagnósticos podem ser preenchidos com base em informações retrospectivas, embora a apresentação atual deva causar prejuízo significativo (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p. 31-32).
Desse modo, observa-se que a compreensão de autismo vem se modificando
com o passar dos anos. Por muito tempo, o transtorno autista, transtorno de
Asperger e o transtorno global do desenvolvimento eram compreendidos
separadamente. Já o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais –
DSM-V apresentou uma junção desses três transtornos, pois avaliou os prejuízos
que vão de leves aos mais graves em áreas de comunicação social, interação e
comportamentos restritivos e repetitivos e passou a agrupá-los em um contínuo, não
sendo mais necessário haver a distinção entre os três (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATON, 2014).
O TEA, conforme consta nas Diretrizes de Atenção à Reabilitação da Pessoa
com Transtornos do Espectro do Autismo (TEA), passou a pertencer a um grupo de
Transtornos Globais (ou invasivos) do Desenvolvimento (TGD) e, ainda mais
recente, denominaram-se o Transtorno do Espectro do Autismo sendo apenas parte
dos TGD (BRASIL, 2014).
O conceito de Transtornos Globais do Desenvolvimento surge no final dos
anos 1960, através dos trabalhos de M. Rutter e D. Cohen, autores que, através de
suas contribuições, traduziram o autismo como sendo um transtorno do
desenvolvimento. Através desse modelo explicativo, o autismo deixou de ser
compreendido como uma psicose infantil, como foi compreendida ao longo de anos
(BELISÁRIO FILHO; CUNHA 2010). Mais recentemente, segundo as Diretrizes de
Atenção à Reabilitação da Pessoa com Transtornos do Espectro do Autismo (TEA),
denominaram-se os transtornos do espectro do autismo, para se referir a apenas
uma parte dos TGD: o autismo, a síndrome de Asperger e o transtorno global do
desenvolvimento sem outra especificação (BRASIL, 2014).
30
Com relação às causas do autismo, sendo esse um questionamento muito
feito – principalmente quando os pais e/ou responsáveis pela criança se deparam
com o diagnóstico – ainda continua sendo um dos pontos de maior discussão a
respeito do quadro. Ao longo do tempo, várias teorias já foram elencadas sobre o
seu porque, algumas já foram descartadas, como a da ―mãe geladeira‖, descrita e
defendida por Kanner. Nessa ideia, o autor atribuía à mãe o papel de principal
responsável pela síndrome apresentada na criança. Sua justificativa era a de que ele
acreditava que os comportamentos e comprometimentos que a criança apresentava
se davam devido a um ambiente frio e sem afeto, resultando no desenvolvimento
atípico da criança (ANDRADE, 2012).
O autor Sacks (1995), em seu livro ―Um antropólogo em marte: sete histórias
paradoxais‖, também aborda algumas das teorias que já fizeram parte da
compreensão dos motivos causais do TEA. Segundo Sacks,
Que a disposição para o autismo seja biológica é algo que não está mais em questão, nem as provas cada vez maiores de que ele seja, em alguns casos, genético. Geneticamente, o autismo é heterogêneo — por vezes dominante, por outras recessivo. Ele é mais comum nos homens - A forma genética pode ser associada, no indivíduo ou na família afetada, a outros distúrbios genéticos, como dislexia, distúrbios de déficit de atenção, distúrbio obsessivo-compulsivo ou síndrome de Tourette. Mas o autismo também pode ser adquirido, o que foi percebido pela primeira vez nos anos 60, com a epidemia de rubéola, quando um grande número de bebês cujas mães tiveram a doença durante a gravidez acabaram desenvolvendo-o. Ainda não se sabe se as chamadas formas regressivas do autismo — por vezes com perdas abruptas de linguagem e comportamento social em crianças entre os dois e quatro anos que anteriormente vinham se desenvolvendo de uma forma relativamente normal — são causadas geneticamente ou pelo meio. O autismo pode ser uma consequência de problemas metabólicos (como a fenilcetonúria) ou mecânicos (como o hidrocefalia). O autismo, ou as síndromes com características autistas, pode aparecer mesmo durante a vida adulta, embora raramente, em especial após certas formas de encefalite (SACKS, 1995, p. 168).
Atualmente, é considerado uma síndrome neuropsiquiátrica. Ainda que não
haja ao certo sua origem etiológica definida, fatores neurobiológicos, genéticos e
fatores de risco psicossociais são apontados, de acordo com estudos, estando
associados ao TEA. Dentre os sinais e sintomas que se expressam nesse caso
clínico, nem todos se apresentam de forma generalizada nos indivíduos, entretanto,
as características de invariabilidade de condutas e isolamento, estão sempre
presentes (BRASIL, 2014).
31
Em relação ao diagnóstico, constata-se que, com o DSM-V, houve uma
mudança no que se diz respeito ao que foi chamado de tríade autística: interação
social, comunicação e comportamento restrito e repetitivo. Mediante ao manual
citado, são observadas apenas duas categorias: 1) Déficits de comunicação e
interação social; e 2) padrões repetitivos e restritos de comportamentos, interesses e
atividades. São esses os critérios utilizados, atualmente, para compor o diagnóstico
de TEA (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATON, 2014).
Esse processo de diagnóstico é essencialmente clínico e torna-se mais
efetivo quando realizado por equipe multidisciplinar que deve compor, no mínimo,
um médico psiquiatra ou neurologista, psicólogo e fonoaudiólogo, havendo um
compartilhamento de saberes cada qual com suas especificidades. Também é
necessário uma entrevista com os pais ou cuidadores, na qual são colhidas
informações que percorrem desde a gestação até a idade atual da criança. Por fim,
há a observação direta do comportamento quando são avaliados os critérios já
explicitados de interação social, linguagem e comunicação (BRASIL, 2013).
Atualmente, a classificação oficial do autismo é realizada tendo como fonte os
critérios encontrados no CID-10, somados com os do DSM-V. Assim, fazendo uso
desses dois recursos e com todos os outros passos é possível ter mais eficiência e
confiança nesse diagnóstico.
No decorrer de cada leitura e tendo em vista cada momento histórico
vivenciado pelo autismo, percebe-se a singularidade que há em cada indivíduo que
possui esse diagnóstico e o quanto ele ainda é um fenômeno novo. Não há uma
razão única para afirmar sua causa, nem mesmo uma única forma de se manifestar.
Tal como descrito por Silva (2019, p. 28):
O TEA não deve ser circunscrito à ideia de um transtorno, mas sim uma condição do sujeito, uma possibilidade de seu ser no mundo. Para tanto, aponta-se a necessidade de uma perspectiva crítica que considere os sujeitos, independente de pensar somente em causas e sintomas de transtornos como algo que limite o desenvolvimento desses indivíduos.
Concordando com Silva, na próxima seção, buscaremos traçar algumas
ideias sobre uma visão da Psicologia Histórico-cultural do TEA, a partir de
discussões acerca do conceito de deficiência, em especial no âmbito da inclusão.
32
3.1 O TEA em uma leitura da Psicologia Histórico-cultural
Para entender o TEA em uma visão crítica, é necessária uma elucidação de
dois pensamentos sobre do que viria a ser deficiência. A discussão em torno da
concepção de deficiência é algo que vem acontecendo já há um bom tempo,
havendo inúmeras problematizações sobre o tópico e diferentes formas de concebê-
la. Em uma sociedade fortemente alicerçada em um modelo normalizante de se
pensar, torna-se indispensável discussões que fomentem uma visão que coloquem o
sujeito com deficiência sendo alguém capaz de se desenvolver com as adequações
necessárias.
De acordo com Diniz (2003), em grande parte do tempo, a deficiência passou
a ser unicamente compreendida através do modelo médico que se trata de uma
lógica biologicista, na qual a lesão do sujeito é apenas vista como uma perda, que o
limita integralmente. A necessidade de um modelo que se opusesse a essa lógica
tão normatizante surgiu quando o modelo social se estruturou em contraposição
esse entendimento medicalizante.
O modelo social da deficiência estruturou-se em oposição ao que ficou conhecido como modelo médico da deficiência, isto é, aquele que reconhecia na lesão a primeira causa da desigualdade social e das desvantagens vivenciadas pelos deficientes, ignorando o papel das estruturas sociais para a opressão dos deficientes (DINIZ, 2003, p. 2).
Através do modelo social, a concepção de deficiência começa a ser vista por
um outro viés, pois, para o modelo social, a produção da deficiência vai estar
relacionada à estrutura social, enquanto para o modelo médico, estará
essencialmente no indivíduo. Originalmente, o modelo social partia de dois
pressupostos: um deles era a ideia de que a limitação do sujeito para desenvolver-
se não estava unicamente na lesão que o mesmo viesse a ter, mas sim nas
barreiras que eram postas a ele; e a segunda era a ideia de que, com a retirada
dessas barreiras, em específico as sociais, o sujeito poderia desenvolver sua
independência (DINIZ, 2003).
Sobre a discussão que há em torno do conceito de deficiência e,
considerando as dimensões biopsicossociais, foi promulgado, no ano de 2007, o
texto da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
No decorrer do documento da Convenção, são nítidas as mudanças que ocorreram
33
com a transição de uma concepção pautada em um modelo médico para um modelo
social (BRASIL, 2009).
A deficiência, tal como consta no documento da Convenção, é compreendida
como:
[...] um conceito em evolução e que a deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas (BRASIL, 2009, p. 1-2).
Porquanto a pessoa com deficiência passa a não ser mais compreendida
como alguém reduzida a sua lesão, mas sim, como alguém dotado de possibilidades
e habilidades a serem desenvolvidas. O fator limitante redireciona-se para as
barreiras ambientais em que a pessoa está inserida, suscitando a necessidade de
políticas públicas que possam efetuar a acessibilidade e a equiparação de
oportunidades.
Assim sendo, a presença de uma deficiência não implica no fato de que o
sujeito deva ser considerado doente, o documento da Convenção aproxima-se do
modelo social de se pensar a deficiência, tendo como propósito ―[...] proteger e
assegurar o exercício pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades
fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua
dignidade inerente‖ (BRASIL, 2009, p. 3)
Com os olhares voltados para a sociedade, é possível perceber o quão
limitante ela vem sendo para uma pessoa com deficiência, cerceando a
possibilidade da mesma desenvolver-se nas condições adequadas. Reconhecendo
a deficiência como uma construção social, é possível perceber a relação que há
entre o sujeito em sua condição e a sua relação sócio-histórica e cultural (SILVA,
2019).
Consoante a tal reconhecimento, a Psicologia Histórico-cultural traz em suas
ideias contribuições para o assunto que está sendo abordado, como vimos
brevemente no capítulo anterior. Nuernberg (2008) aborda a diferenciação que
Vygotsky fez ao tratar sobre deficiências, distinguindo-as em duas categorias:
primária e secundária. A primeira tem origem na dimensão orgânica e a segunda
envolve os aspectos psicossociais. No que concerne às limitações secundárias,
nota-se a relação cultural que remete ao fato de o elemento cultural ser construído e
34
pautado em função de um padrão de normalidade, que resulta em todas as barreiras
existentes, sejam elas sociais, culturais, profissionalizantes e educacionais da
pessoa com deficiência. Desse modo,
Cria-se, assim, um círculo vicioso no qual, ao não se acreditar na capacidade de aprender das pessoas com deficiência, não lhe são ofertadas condições para superarem suas dificuldades. Em conseqüência [sic], elas ficam condenadas aos limites intelectuais inerentes à deficiência, tomados assim como fatos consumados e independentes das condições educacionais de que dispõem (NUERNBERG, 2008, p. 309).
Mesmo com tantas barreiras, as pessoas com deficiência podem se
desenvolver, em muitos casos, adotando vias alternativas de desenvolvimento,
possibilitado pela compensação social, conceito elaborado por Vygotsky. A
compensação social consiste na reação do sujeito com deficiência em superar as
limitações que lhe são postas, utilizando-se da mediação simbólica. O autor faz uma
leitura entre questões sociais e culturais. E instiga áreas, em especial a da
educação, a criar oportunidades para que a compensação social possa ocorrer de
forma efetiva e objetiva (NUERNBERG, 2008).
O próprio Vygotsky (2011, p. 869) cita sobre o conceito de compensação e, já
em sua época, nota-se que ele sempre trazia em suas obras que era possível
compreender a deficiência para além de seu caráter primário. Atribuindo grande
enfoque para o desenvolvimento cultural e tudo o que dele pode se ter como
oportunidades.
O olhar tradicional partia da ideia de que o defeito significa menos, falha, deficiência, limita e estreita o desenvolvimento da criança, o qual era caracterizado, antes de mais nada, pelo ângulo da perda dessa ou daquela função. Toda a psicologia da criança anormal foi construída, em geral, pelo método da subtração das funções perdidas em relação à psicologia da criança normal. Para substituir essa compreensão, surge outra, que examina a dinâmica do desenvolvimento da criança com deficiência partindo da posição fundamental de que o defeito exerce uma dupla influência em seu desenvolvimento. Por um lado, ele é uma deficiência e atua diretamente como tal, produzindo falhas, obstáculos, dificuldades na adaptação da criança. Por outro lado, exatamente porque o defeito produz obstáculos e dificuldades no desenvolvimento e rompe o equilíbrio normal, ele serve de estímulo ao desenvolvimento de caminhos alternativos de adaptação, indiretos, os quais substituem ou superpõem funções que buscam compensar a deficiência e conduzir todo o sistema de equilíbrio rompido a uma nova ordem.
35
Em consonância com o que foi exposto por Orrú (2012), as pessoas com
deficiência ao longo da história foram colocadas à margem da sociedade,
encontrando sempre barreiras que as impediam de se desenvolver e sendo alvos de
adjetivos que as limitavam e rotulavam como pessoas incapazes e doentes. Tudo
mediante a uma cultura que criou seus parâmetros de referência em um modelo
perfeito. Historicamente, a deficiência foi associada às mais diversas causas, sendo
vinculada a manifestações sobrenaturais, penalizações de cunho religioso até as
concepções atuais. Pelos caminhos percorridos, é possível acompanhar o modo que
a pessoa com deficiência foi sendo tratada e percebida, estando distante sobre o
conhecimento dos direitos do cidadão.
Esse padrão normalizante de ditar como se deve ser é algo que vem sendo
muito discutido. Amaral (1998) faz uma análise sobre o que viria a ser uma diferença
significativa, diferença física e deficiência. Para ela, uma diferença significativa diz
respeito a determinadas características do sujeito que desviam do que é socialmente
construído como normal ou ideal e que causam tensão ou conflito em um dado
grupo. Em suas reflexões, a autora considera que a deficiência, como uma diferença
significativa, não deve ser considerada de forma pejorativa ou patológica. Ao
contrário:
Penso que se abstrairmos ou mesmo ―desconstruirmos‖ a conotação pejorativa das palavras: significativamente diferente, divergente, desviante, anormal, deficiente e pensarmos nos parâmetros que as produzem, poderemos nos debruçar sobre elas para melhor contextualizar os critérios empregados para sua eleição com designativas de algo ou alguém. Ou seja, penso que devemos reconhecer que normalidade e anormalidade existem (e por isso abstenho-me de usar aspas), mas o que efetivamente interessa na experiência do cotidiano é problematizar os parâmetros que definem tanto uma como outra. Penso também que a partir da exploração e do questionamento desses parâmetros pode-se pensar a anormalidade de forma inovadora: não mais e somente como patologia – seja individual ou social – mas como expressão da diversidade da natureza e da condição humana, seja qual for o critério utilizado (AMARAL, 1998, p. 15, grifos da autora).
No caso do TEA, também é patente essa associação, como se as
características apresentadas pelo indivíduo fossem um traço de uma patologia.
Todavia, assim como Amaral (1998), entendemos que se trata mais de uma
condição do sujeito.
Assim, o TEA, tal como conhecido nos dias atuais, abarca diversos
comportamentos atípicos, que se manifestam em cada indivíduo de forma singular,
36
sendo marcado por três níveis que vão medir a intensidade desses comportamentos:
leve, moderado e severo.
Ainda que com leis que já buscavam efetivar o direito das pessoas com
deficiência, o TEA, por um espaço de tempo, não era considerado dentro dessas leis
por não ser concebido como uma deficiência. Como mencionamos na Introdução,
apenas no ano de 2012, com a Lei de nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012, que
as pessoas com o Transtorno do Espectro do Autismo obtiveram esse lugar,
passando a ter seus direitos reservados e podendo usufruir das políticas de inclusão
destinadas às pessoas com deficiência.
Antes de tudo e tal como posto por Orrú (2012), com toda a diversidade de
comportamento atípicos e da maneira pela qual podem se apresentar em cada
sujeito, pode-se perceber que quando o processo de intervenção precoce é
planejado seguindo os parâmetros de uma equipe multidisciplinar que vão em busca
de desenvolver uma avaliação contínua, há uma maior chance da pessoa com
autismo desenvolver-se de maneira a reduzir os impactos que o TEA possa
oferecer.
Dentre o quadro de comportamentos e dificuldades que o TEA engloba, há de
um modo muito marcante, os déficits de comunicação e linguagem. A evolução de
sistemas simbólicos para os mais complexos ou abstratos, inerentes à linguagem,
contribui para o melhor desenvolvimento e ajustamento social do sujeito, permitindo
que ele possa melhor interagir com os demais. Culturalmente, é a partir da
linguagem que o sujeito irá desenvolver suas habilidades sociais, entretanto, é na
linguagem e comunicação em que se converge o maior obstáculo no autismo,
mesmo ainda havendo pessoas autistas que conseguem desenvolver suas
habilidades de conversação (ORRÚ, 2012). Sobre isso, o DSM-V afirma que:
Déficits verbais e não verbais na comunicação social têm manifestações variadas, dependendo da idade, do nível intelectual e da capacidade linguística do indivíduo, bem como de outros fatores, como história de tratamento e apoio atual. Muitos indivíduos têm déficits de linguagem, as quais variam de ausência total da fala, passando por atrasos na linguagem, compreensão reduzida da fala, fala em eco até linguagem explicitamente literal ou afetada. Mesmo quando habilidades linguísticas formais (p. ex., vocabulário, gramática) estão intactas, o uso da linguagem para comunicação social recíproca está prejudicado no transtorno do espectro autista (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p. 53).
37
Ancoradas nas concepções e critérios do DSM-V e CID-10, materiais
utilizados para o diagnóstico do TEA, compreendemos que pessoas com autismo de
graus leves a severos podem manifestar suas capacidades limitadas no
desenvolvimento de sua linguagem. É ressaltado, embasado em estudos
neurológicos, que ambientes ruidosos e barulhentos podem incomodar e causar
danos à comunicação. Também, a questão social em que se insere a pessoa com
TEA tem oferecido grandes considerações a respeito das dificuldades ou da
ausência da interação social. Em uma sociedade marcada pelo grande estigma e
preconceito que circundam a pessoa com deficiência, nota-se uma prática de
imposição de um padrão normatizante de contato para com o outro, o que resulta
em uma visão reduzida para todo o potencial que a pessoa com deficiência venha a
ter (ORRÚ, 2012).
O desconhecimento relativo ao desenvolvimento da pessoa com TEA
percorre não só o senso comum, como a áreas educacionais e até mesmo a área
clínica. Sobre a questão da educação da pessoa com TEA, abre-se a necessidade
de repensar a educação tal como ela está ainda sendo compreendida, devendo o
desenvolvimento da linguagem estar como eixo principal em um projeto pedagógico.
Reforçamos ainda mais a importância que a linguagem tem na vida do sujeito, a
partir dela que temos a comunicação, que pode ocorrer de múltiplas formas, seja
através de uma linguagem falada, escrita ou codificada.
A função comunicativa da linguagem ocorre a fim de que tais pessoas
consigam expressar seus sentimentos, pensamentos. Como um recurso para
aqueles que possuem prejuízos nessas habilidades, foi desenvolvido a
Comunicação Suplementar e/ou Alternativa (CSA), que são uma forma de construir
símbolos que podem ser de representações visuais, auditivas ou táteis com o
objetivo de ―[...] favorecer a capacidade das pessoas no estabelecimento e na
manutenção da interação social e possibilidade da comunicação‖ (ORRÚ, 2012, p.
68). O CSA pode ser uma ponte de acesso para professores, familiares e
profissionais.
Em uma perspectiva histórico-cultural, não se exclui a importância da
participação do outro nesse processo da constituição da linguagem no
desenvolvimento da pessoa com TEA. É, pois, na relação com o outro que o sujeito
irá se desenvolver, constituir-se enquanto ser e quando irá se apropriar da cultura. A
linguagem, assim, para além da função comunicativa, implica diretamente para o
38
desenvolvimento das funções psicológicas superiores, destaca-se em seu papel
fundamental na vida do sujeito que o possibilita a ter uma participação efetiva no
mundo social. Desse modo, através dela, o indivíduo irá significar o mundo
sociocultural em que está inserido tanto como a si mesmo (CHIOTE, 2013).
Diante da criança com TEA e analisando as questões de linguagem e
dificuldades de comunicação, nota-se que o papel do outro na vida da criança se
limita, enquanto o outro também limita suas ações para com a criança. Seguindo a
leitura de Vygostky acerca da deficiência secundária, a relação que porventura se
estabelece com o outro passa a ser algo sem sentido ou com sentidos restritos da
criança para com o outro e com ela mesmo. Aqui, ressalta-se a importância que
esses sentidos produzidos têm na vida do sujeito, estando diretamente ligados a
como que o indivíduo irá organizar e orientar suas ações (CHIOTE, 2013).
É notório que as concepções hegemônicas do TEA estão relacionadas às
noções de desvio e anormalidade, descrevendo o sujeito unicamente pelo seu
diagnóstico. Cessar com essas concepções requer um novo olhar para a pessoa
com TEA que busque o rompimento da visão estigmatizante que a deficiência tem e
direcione um olhar para as possibilidades que há em cada indivíduo. Concordamos
com Chiote (2013) quando afirma que é preciso considerar a criança com TEA a
partir de seu meio social, situando-a a partir do que ela pensa, sente e da forma com
que representa o mundo. O desenvolvimento, tal como já explicitado, não acontece
de forma independente da vida social, o outro tem papel constitutivo na vida do
sujeito, tanto como a linguagem.
O desenvolvimento cultural, como já citado anteriormente, é fundamental na
vida do sujeito. Ao situar uma criança com deficiência sem pensar em estratégias de
inclusão que viabilizem seu melhor desenvolvimento, coloca-se em risco o acesso
ao seu contato com a cultura e tudo o que dela se obtém. Atualmente, o TEA passou
a ter várias formas de intervenção com profissionais de áreas diversas, contando
com recursos que viabilizem a reabilitação do sujeito. Algumas dessas alternativas
de intervenção, embora possuam efetividade em certos aspectos, muitas vezes
excluem a importância do desenvolvimento a partir do social, do contexto em que
cada indivíduo se insere, o que resulta na ausência de situações significativas que
possibilitem a internalização do que se é experienciado (CHIOTE, 2013).
Desse modo, a análise do contexto no qual a pessoa com TEA está inserida,
revela que o desconhecimento leva ao atraso na evolução de qualidade de vida
39
dessas pessoas. O olhar limitado impede de ver o potencial que cada um possui e a
capacidade de desenvolver suas habilidades com as condições que lhe são
necessárias.
40
4 PERCURSOS METODOLÓGICOS
A presente pesquisa surgiu a partir do interesse em analisar como a
linguagem e comunicação de pessoas com o Transtorno do Espectro Autista (TEA)
vêm sendo abordadas e discutidas na Revista de Educação Especial Brasileira e
quais estratégias de intervenção nesse âmbito vêm sendo mais difundidas. Desse
modo, trata-se de uma pesquisa exploratória, pois, conforme Gonsalves (2005),
busca um desenvolvimento maior sobre determinada temática, propiciando um
esclarecimento de ideias de algo pouco explorado, contribuindo como uma pesquisa
de base para que, posteriormente, haja um suporte para investigações mais
elaboradas.
Nesse sentido, para atender aos objetivos traçados, optou-se por uma
pesquisa de caráter bibliográfico e qualitativo, na qual foi realizada uma revisão de
trabalhos já publicados que discutissem sobre comunicação e linguagem de pessoas
com TEA. Nessa pesquisa, enfocamos, nos artigos científicos encontrados, os
métodos de trabalho e a concepção que vem sendo publicada sobre a comunicação
e linguagem da pessoa com TEA.
No tocante à pesquisa qualitativa, Minayo, Deslandes e Gomes (2002)
explicam que ela trabalha com um universo de significados que não podem ser
quantificados, também com motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes. Tal
abordagem direciona seu aprofundamento no mundo dos significados das ações e
das relações humanas. Assim, o referido método de pesquisa torna-se abrangente
para valorizar a singularidade humana.
Amaral (2007) fala sobre a pesquisa bibliográfica e a situa como sendo uma
etapa fundamental para o desenvolvimento de um estudo, que tem respaldo no
levantamento, fichamento e arquivo de informações que serão integradas à
pesquisa. Nesse sentido, ―a pesquisa bibliográfica implica em um conjunto ordenado
de procedimentos de busca por soluções, atento ao objeto de estudo, e que, por
isso, não pode ser aleatório‖ (LIMA; MIOTO, 2007, p. 38).
A pesquisa bibliográfica permite ao pesquisador entrar em contato com uma
vasta quantidade de materiais dispostos em diversas plataformas de pesquisas e
livros, que contribuem para o desenvolvimento de novos estudos. Também é válido
41
para ver a evolução de estipulado tema no decorrer dos anos, servindo como ponto
de partida para novas concepções.
Em suma, esse método de pesquisa torna-se relevante, pois permite uma
maneira singular de se conceber e avaliar a realidade. Fazendo um levantamento, a
partir dos artigos científicos encontrados, esse método ajudou na organização desse
trabalho para que fosse possível realizar um melhor desenho de como se constituiu
o trajeto metodológico percorrido.
A pesquisa bibliográfica foi desenvolvida através de artigos científicos já
publicados na plataforma de busca Scientific Eletronic Library Online (Scielo).
Iniciou-se no dia 09 de julho até o dia 12 de agosto do ano de 2019, em um dos
periódicos do Scielo, a Revista Brasileira de Educação Especial, que se constitui de
uma coletânea de artigos que buscam aprofundar questões de teoria e práxis
referentes à produção científica brasileira sobre assuntos correlacionados às
pessoas com deficiência. Para a busca, foram usados os seguintes descritores:
―Autismo‖, ―Transtorno do Espectro do Autismo‖, ―Transtorno do Espectro Autista‖ e
―Autista‖. Esses descritores foram escolhidos, uma vez que se referem ao nosso
objeto de estudo. Não houve filtro para o espaço de tempo das publicações de modo
a abranger uma quantidade maior de trabalhos.
Desse modo, emergiram alguns trabalhos que tratam dessa temática, no
entanto, nem todos aqueles que surgiram foram utilizados, uma vez que não
atendiam ao critério de abordar diretamente a comunicação e a linguagem. No total,
o resultado obtido foi de 38 artigos científicos, porém, apenas 6 foram selecionados
para análise por corresponderem ao critério para a fundamentação e produção
desse trabalho.
Após a filtragem dos artigos encontrados, foi realizada uma leitura
pormenorizada dos mesmos. Com isso, foi possível elaborar fichamentos que
serviriam de base para a construção da análise desse trabalho. No quadro 1, estão
dispostas as informações concernentes aos artigos analisados, com os títulos, ano
de publicação, autores das obras e o tipo de pesquisa realizada.
42
Quadro 1: Artigos selecionados na pesquisa bibliográfica
Título Ano Autores (as) Tipo de Pesquisa
Características e especificidades da comunicação social na perturbação do Espectro
do Autismo.
2016 Reis; Pereira;
Almeida
Bibliográfica
A constituição da subjetividade de adolescentes autistas: um olhar para as histórias
de vida.
2010 Baragollo;
Panhoca
De campo
Comunicação alternativa e ampliada para educandos com autismo: considerações
metodológicas.
2010 Nunes; Nunes
Sobrinho
Bibliográfica
Avaliação de um programa de comunicação alternativa e ampliada para mães de
adolescentes com autismo
2010 Walter;
Almeida
De campo
Revisão de estudos sobre o Picture Exchange Communications System (PECS) para
o ensino de linguagem a indivíduos com autismo e outras dificuldades de fala.
2013 Mizael; Aillo Bibliográfica
As Contribuições do Uso da Comunicação Alternativa no Processo de Inclusão
Escolar de um Aluno com Transtorno do Espectro do Autismo
2016 Togashi;
Walter
De campo
Modelagem em vídeo para o ensino de habilidades de comunicação a indivíduos
com autismo: revisão de estudos
2017 Rodrigues;
Almeida
Bibliográfica
Fonte: a autora
43
A seguir, a fim de contextualizar os artigos analisados, expomos um breve
resumo de suas discussões.
Reis, Pereira e Almeida (2016) analisaram as ―Características e
Especificidades da Comunicação Social na Perturbação do Espectro do Autismo‖,
fazendo uma leitura da comunicação e linguagem a partir do discurso, pragmática,
prosódia, sintaxe, morfologia e semântica da criança com TEA. Nesse caminho,
seguem os critérios dispostos no DSM-V e ainda confrontam as diferentes
perspectivas que embasam os argumentos contidos neste manual.
Bagarollo e Panhoca (2010) fazem um relato de pesquisa intitulado ―A
Constituição da Subjetividade de adolescentes autistas: um olhar para histórias de
vida‖. Os objetivos desse trabalho foram o de analisar processos dialógicos de cinco
adolescentes autistas cujo enfoque era: indícios de experiências vivenciadas no
cotidiano e dizeres sociais impregnados nos discursos orais desses adolescentes.
Para alcançar seu objetivo, fizeram uso de fotografias pessoais e o trabalho com
histórias de vida.
Adentrando na temática da Comunicação Alternativa e Ampliada (CAA),
Nunes e Nunes Sobrinho (2010), em seu estudo denominado ―Comunicação
alternativa e ampliada para educandos com autismo: considerações metodológicas‖,
porpõem-se a analisar um acervo composto por 56 trabalhos científicos que tinham
como tema central a CAA com o público voltado para educandos do autismo. Seu
objetivo foi o de mensurar o que vem funcionando no atendimento à pessoa com
TEA, podendo ser um parâmetro de efetividade para aqueles que buscam
modalidades diversas de intervenções.
Walter e Almeida (2010), em seu estudo de caso intitulado ―Avaliação de um
programa de comunicação alternativa e ampliada para mães de adolescentes com
autismo‖, buscaram avaliar os efeitos de um programa de CAA no contexto familiar
de pessoas com autismo. A pesquisa contou com seis participantes, compondo esse
número estavam mães e seus respectivos filhos que precisariam ter o diagnóstico de
autismo e ser não verbal ou ter ausência de uma fala funcional. Cientes da
importância da família no convívio do sujeito, pretendeu-se capacitar familiares para
o uso de CAA com seus filhos autistas. O método se deu em três etapas,
envolvendo duas fases para o experimento: linha de base e intervenção.
Ainda referente a esse sistema de comunicação, Mizael e Aiello (2013) em
sua pesquisa ―Revisão de estudos sobre o Picture Exchange Communication
44
System (PECS) para o ensino de linguagem a indivíduos com autismo e outras
dificuldades de fala‖ realizaram uma revisão de literaturas brasileiras e estrangeiras
sobre o estado da arte do PECS, investigando o que vem sendo pesquisado, os
resultados e novos direcionamentos.
Togashi e Walter (2016) discutem em ―As Contribuições do Uso da
Comunicação Alternativa no Processo de Inclusão Escolar de um Aluno com
Transtorno do Espectro do Autismo‖ a importância que essa técnica oferece para o
processo de inclusão escolar, sendo a comunicação um fator essencial para o
melhor desenvolvimento de um aluno com TEA. A pesquisa ocorreu em duas
etapas: a primeira aconteceu em uma sala de recursos no município do Rio de
Janeiro e os participantes dessa pesquisa foram a professora e o aluno com TEA. Já
a segunda fase ocorrera entre o mesmo aluno, sua professora e uma estagiária de
sua sala de aula regular.
Para finalizar, Rodrigues e Almeida (2017), em sua discussão acerca das
limitações na comunicação de pessoas com TEA, buscaram revisar literaturas que
discutissem sobre ―Modelagem em Vídeo para o Ensino de Habilidades de
Comunicação a Indivíduos com Autismo: Revisão de Estudos‖. Dessa forma, o
objetivo dessa revisão foi o de discutir os resultados das intervenções que
programaram a modelagem em vídeo (MV) no ensino de habilidades de
comunicação para sujeitos com TEA.
Como método de análise dos artigos selecionados, optamos por utilizar a
análise de conteúdo. A mesma contribui para o processo de análise, pois ―toma em
consideração as significações (conteúdo), eventualmente a sua forma e a
distribuição destes conteúdos e formas (índices formais e análise de co-ocorrência)‖
(BARDIN, 2004, p. 38). Assim, é requerido ao analista delimitar o seu objetivo para
efetuar sua busca e, a partir dos dados colhidos, ele poderá compreender os
significados dos itens descobertos, tomando como base o contexto analisado. É um
trabalho com as palavras, as significações destas, no qual o pesquisador se debruça
sobre aquilo que está por trás das palavras.
Diante do material produzido, trabalhamos com categorias definidas a priori.
Assim, as leituras dos materiais obtidos foram norteadas por essas definições, de
modo a atender os objetivos dessa pesquisa.
De acordo com Bardin (2004, p. 32), a categorização
45
É o método das categorias, espécie de gavetas ou rubricas significativas que permitem a classificação dos elementos de significação constitutivos da mensagem. É portanto um método taxonómico [sic] bem concebido para satisfazer os colecionadores preocupados em introduzir uma ordem, segundo certos critérios, na desordem aparente.
A respeito dos sete trabalhos encontrados, foram elaboradas duas categorias,
a saber: 1) linguagem, comunicação e o TEA; 2) estratégias e resultados. As
seguintes categorias foram escolhidas, pois atendem aos objetivos do presente
trabalho que intenciona discutir como vem sendo trabalhadas e discutidas a
comunicação e a linguagem em pessoas com TEA. No próximo capítulo,
discutiremos cada categoria à luz de nossos pressupostos teóricos.
46
5 ENTRE O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA, A LINGUAGEM E A
COMUNICAÇÃO ALTERNATIVA: UMA ANÁLISE DE LITERATURA
O referido capítulo irá apresentar os resultados obtidos na pesquisa
bibliográfica, expondo uma discussão sobre como vêm sendo trabalhados e
compreendidos os conceitos de linguagem e comunicação com o sujeito com TEA,
com foco nos artigos dispostos na Revista Brasileira de Educação Especial.
O DSM-V, ao falar sobre o Transtorno do Espectro Autista, enfatiza as
dificuldades e prejuízos que circundam os indivíduos com o respectivo diagnóstico.
A dificuldade no desenvolvimento da fala ou das habilidades comunicativas é um
dos critérios que norteia o diagnóstico desse transtorno. A partir desse critério,
decorrem as complicações quanto à interação social que se manifestam nos mais
diversos contextos.
Para além dessas ideias, o atual estudo emergiu com a questão: quais as
estratégias utilizadas no trabalho terapêutico e educacional direcionadas ao
desenvolvimento da linguagem e comunicação de pessoas com TEA? Denota
relevância para a população, pois, embora muito venha sendo discutido sobre a
temática, ainda é uma dificuldade trabalhar com essa questão.
Os défices de comunicação e de linguagem têm sido foco de preocupação
nos estudos sobre o desenvolvimento de pessoas com TEA. Esses conceitos são
tidos como fundamentais para o processo constitutivo do ser humano, já que é
através da linguagem que o sujeito interage social e culturalmente. Contudo, são
nesses dois conceitos que a pessoa com TEA enfrenta suas maiores dificuldades.
Os critérios dispostos no DSM-V e CID-10 retratam as dificuldades e as limitações,
suscitando olhares que se direcionam para estudos e intervenções (ORRÚ, 2012).
Assim, os próximos tópicos irão se delinear voltados para a discussão do que já vem
sendo produzido sobre esta temática.
A seguir, serão discutidas as duas categorias de análise, explicitando e
discutindo-as: 1) linguagem, comunicação e o TEA; 2) estratégias e resultados.
Diante dessas categorias, é possível obter as informações encontradas nos
artigos científicos, sejam elas por meio de estudos de caso ou pesquisas de cunho
bibliográfico. Nelas, vai ficar patente observar a linguagem e a comunicação sendo
compreendidas através de formas mais mecanizadas e também observar a
47
importância de entender a linguagem como um elemento mediacional do
desenvolvimento do sujeito. Por sua vez, os trabalhos analisados concordam com a
ideia de que a linguagem é fundamental no processo de desenvolvimento da pessoa
com TEA.
E na categoria que trata das estratégias e resultados, observa-se que a
grande maioria da literatura fez uso de métodos e técnicas de Comunicação
Alternativa e Ampliada (CAA) como ponte de acesso ao trabalho do
desenvolvimento da comunicação ausente ou prejudicada da pessoa com TEA.
5.1 Categoria 1: Linguagem, comunicação e o TEA
Esta categoria trata das concepções de linguagem e de comunicação,
explícitas ou implícitas, encontradas nos artigos pesquisados. Com o intuito de
compreendermos tais conceitos, apresentaremos, a seguir, uma discussão e análise
sobre a temática por meio da literatura pesquisada. Nesta seção e como ponto de
partida, discutiremos os entendimentos de linguagem e comunicação que vêm
sendo utilizados na literatura, a partir das respectivas concepções teóricas de cada
estudo. Mediante a intrínseca relação entre linguagem e comunicação, este capítulo
também irá realizar uma análise norteada pela abordagem histórico-cultural.
Embasados nos critérios dispostos no DSM-V, Reis, Pereira e Almeida
(2016) descreveram e problematizaram as “Características da Comunicação
Social na Perturbação do Espectro do Autismo (PEA)”. Com isso, os autores
destacaram a fusão da interação social com a comunicação, validando sua
importância para a definição e intervenção em crianças com PEA1. Também se
dispuseram a realizar um confronto com as diferentes perspectivas que subsidiam
argumentos e críticas à classificação proposta pelo DSM-V, tendo em vista que o
mesmo sofrera alterações nas características diagnósticas do PEA.
Os autores mencionados não apresentam, especificamente, suas concepções
de comunicação e linguagem, no entanto, conceituam o uso da linguagem como
1 Como forma de respeitar as opções dos autores dos textos analisados, daremos preferência a
manter os termos trabalhados por eles. Assim, como no texto de Reis, Pereira e Almeida (2016), eles se utilizam de Perturbação do Espectro do Autismo (PEA), nas citações a esse texto, manteremos tal nomenclatura.
48
uma ferramenta para a comunicação e elencam as características e dificuldades que
a criança com PEA terão nesses dois âmbitos. E é por esse caminho que iremos
buscar compreender a comunicação e a linguagem neste texto.
De acordo com Reis, Pereira e Almeida (2016), crianças com PEA
apresentam graves alterações não só de linguagem, mas de comunicação.
Independente da idade e do nível de desenvolvimento em que a criança esteja, as
alterações na comunicação social são reconhecidas. Tais dificuldades são evidentes
ao perceber os níveis de compreensão do processamento verbal e não-verbal e
também ao nível da expressão que corresponde à utilização do gesto natural,
codificado e da uso da palavra como ferramenta para a comunicação com o outro.
Diante do exposto, percebe-se que as formas comunicativas mais utilizadas
são formas pré-simbólicas não convencionais, o que oferece poucas possibilidades
de intenções comunicativas. Assim, os autores explanam que a comunicação de
crianças com PEA, em grande parte do tempo, é utilizada para pedir objetos, pedir e
rejeitar ações, ou seja, regular o comportamento do outro e não com intenções de
interação social (REIS; PEREIRA; ALMEIDA, 2016).
Prosseguindo em sua análise, os autores discutem sobre como o processo de
aquisição de linguagem em uma criança com PEA acontece de forma lenta,
revelando suas singularidades ao se apresentar. Em alguns casos, a linguagem se
desenvolve dentro padrão previsto para a idade, semelhante às crianças típicas,
porém, em dado momento ocorre o que os autores chamaram de ―regressão da
linguagem‖. Sobre isso, explanam que ―Geralmente, a regressão é um processo
gradual onde a criança não aprende palavras novas e falha no envolvimento
comunicativo durante as rotinas diárias em que participou no passado‖ (REIS;
PEREIRA; ALMEIDA, 2016, p. 4).
Acerca das especificidades da linguagem, os autores fazem uma análise a
partir de competências do discurso, da pragmática, da prosódia, da sintaxe, da
morfologia e da semântica da criança com PEA. Para melhor compreender tais
competências, fazem uma escrita explicativa de cada uma. Quanto ao conceito da
pragmática, este se refere ao uso da linguagem como uma ferramenta para a
comunicação, em específico, de como que a linguagem é empregada no contexto
em interações sociais. Conforme expresso nas palavras de Reis, Pereira e Almeida
(2016, p. 330):
49
A pragmática compreende tanto as funções linguísticas tais como o registro (alterando o discurso dependendo de quem está a falar e para quem), negociação dos turnos de comunicação (turn-taking) e a escolha de expressões referenciais (―um‖ em vez de ―o‖) assim como funções não-linguísticas, tais como contacto ocular, linguagem corporal e expressões faciais.
Assim, tanto a pragmática, como o discurso requerem uma compreensão
mais estrutural da linguagem e como se usa essa estrutura no decorrer das
interações sociais. Há estudos que comprovam que as crianças com PEA têm
dificuldades no discurso do tipo conversacional que se perpetuam até na idade
adulta.
Ligada com a pragmática está à prosódia, que vai se referir aos aspectos
fonológicos da língua e diz respeito à pausa durante um diálogo, à entonação, à
duração, velocidade da fala e segmentação do fluxo do discurso. Para melhor
explicitar, Reis, Pereira e Almeida (2016, p. 331) afirmam que:
A prosódia é, pois, fundamental para a aquisição da estrutura da língua materna em idades precoces bem como para a comunicação em geral ao longo do ciclo de vida, com implicações evidentes a nível social e profissional. A este nível, todas as crianças com PEA apresentam dificuldades e, por isso, evidenciam menores capacidades para usar a prosódia de forma a resolver ambiguidades sintáticas.
Prosseguindo em Reis, Pereira e Almeida (2016) sobre as competências de
linguagem, há ainda a sintaxe, morfologia e a semântica. A sintaxe, considerado o
domínio mais complexo do núcleo linguístico, diz respeito à combinação de palavras
utilizadas nas frases. Em crianças com PEA, de acordo com alguns estudos citados
pelos autores em tela, percebe-se uma linguagem cuja estrutura gramatical é mais
rígida.
Ao nível da morfologia, os autores já citados anteriormente revelam existir
poucos estudos significativos sobre essa competência. No entanto, ao comparar a
outras crianças com atrasos de linguagem, percebe-se que as crianças com PEA
apresentam atrasos na produção de morfemas. Por fim, quanto à semântica das
palavras, ou seja, o conhecimento de seus significados, crianças com PEA também
apresentam dificuldades quanto a esse desempenho. Conforme Reis, Pereira e
Almeida (2016, p. 328)
[…] mesmo quando a criança com PEA adquiriu tanto a forma lexical como a semântica, mantém um nível de competência comunicativa muito
50
primitivo, pela sua incapacidade de acrescentar novas informações e estender tópicos de conversação a vários turnos comunicativos. Estes comprometimentos conversacionais provêm da pobre consciência de que as pessoas comunicam não apenas para atingir ―objetivos‖, mas também pela simples troca de informação.
Em suma, o primeiro estudo que analisamos aponta que os défices nas
competências da linguagem acabam gerando uma barreira interpessoal que tende a
interferir na comunicação da criança com PEA. Sinaliza-se a importância da
comunicação e da linguagem como uma ferramenta que permita a essas pessoas
manter uma relação interpessoal com o outro.
Fazendo uma relação com autores fundamentados na Psicologia Histórico-
cultural, destacamos os escritos de Orrú (2012). A autora sintetiza algumas das
dificuldades de comunicação que a pessoa com TEA venha a ter, tais como: puxar,
empurrar ou conduzir o outro em busca de algo que seja o seu desejo; expressões
por meio de uma ou duas palavras, ao invés de frases; tendência ao monólogo; uma
fala que não condiz com o contexto da conversação; dificuldades na compreensão
de frases; mímicas e gesticulações; ausência ou pouco contato visual; dificuldade de
compressão em conteúdos abstratos.
Sobre isso, concordamos com a autora quando explica que tais dificuldades
recorrentes interferem não só no processo constitutivo do sujeito, como também em
suas relações interpessoais que demandem o uso da linguagem (ORRÚ, 2012).
Chiote (2013) aborda também sobre as dificuldades de linguagem da criança
com autismo e aponta que esta é marcada por suas estereotipias, dentre elas, há a
ecolalia. As ecolalias correspondem a repetições imediatas ou tardias de palavras.
Muitas vezes, essa repetição tardia ou imediata é interpretada com estranhamento
por parte das pessoas e, em muitos casos, como algo que é apenas derivado do
diagnóstico do TEA.
Saliente-se que há algumas orientações teóricas que preveem a necessidade
de extinguir a ecolalia pela sua não funcionalidade. Sobre a ecolalia, os autores
argumentam que
Embora a ecolalia possa não facilitar o desenvolvimento gramatical, parece ter uma função comunicativa parcial (EIGSTI et al., 2011). Prizant e Duchan (1981) descobriram que mais de 33% do discurso ecolálico produzido pelas crianças da amostra do seu estudo tinham uma função de ―turn-taking‖ e 25% uma função declarativa Para além da ecolalia, indivíduos com PEA inventam frequentemente novas palavras (neologismos) que não são utilizados em crianças com desenvolvimento típico e que geralmente têm
51
um significado idiossincrático específico (EIGSTI et al., 2011). (REIS; PEREIRA; ALMEIDA, 2016, p. 329).
Com efeito, amparadas em Chiote (2013) e na abordagem histórico-cultural,
compreendemos que esse pensamento acaba minimizando o valor simbólico e a
função comunicativa que as ecolalias podem oferecer. Considerando a relevância da
mediação simbólica na interação entre pessoas e que tal interação proporciona a
formação das funções psicológicas superiores e da subjetividade, a ecolalia não é
necessariamente um elemento a ser desprezado na medida em que ela pode ser
utilizada como uma ferramenta de acesso à comunicação e ao universo simbólico do
sujeito.
Chiote (2013) remete a esse conceito de mediação como uma tríade na
relação, ou seja, um processo no qual dois sujeitos precisam da intervenção de um
terceiro elemento para se relacionarem, não havendo uma relação direta, mas sim
mediada. Isto é, a relação estabelecida com o outro não é direta, seguindo desse
preceito, mas mediada pelos instrumentos, pelos signos e pelo o outro que nos
constitui, tal como preconiza Vygotsky. A linguagem, como sistema simbólico,
assume uma importância fundamental em todo o processo de desenvolvimento do
sujeito. Assim, torna-se necessário analisar as interações e as práticas inclusivas
que interferem na vida da pessoa com TEA.
Nesse sentido, a ecolalia configura-se como um elemento dessa relação.
Com ela, pode-se buscar construir, junto com os sujeitos, sentidos sobre suas ações
de modo a atingir o que Chiote (2013, p. 46) explica:
Os processos de convencionalização de sentidos que perpassa os gestos e as palavras das crianças estão inter-relacionado com a interpretação que o adulto faz deles e com o modo como a criança se apropria do sentido produzido na dinâmica interativa. Investir nos processos de significação é apostar que é possível compartilhar sentidos com a criança com Autismo, significando suas ações ao mesmo tempo em que a orienta para aquilo que se espera da criança em determinadas situações.
Caminhando nessa perspectiva, em outro trabalho analisado (BAGAROLLO;
PANHOCA, 2010), que teve como título “A constituição da subjetividade de
adolescentes autistas: um olhar para as histórias de vida”, foi identificado o uso
do referencial teórico histórico-cultural. As autoras desenvolveram uma pesquisa de
campo cujo objetivo foi analisar processos dialógicos de cinco adolescentes autistas,
tendo como foco: indícios de experiências que eles vivenciam no cotidiano e dizeres
52
sociais impregnados em seus discursos orais, buscando subsídios para o processo
terapêutico de tais sujeitos.
A intervenção proposta parte do trabalho de fonoaudiólogos, sendo essa uma
das áreas atuantes em sujeitos com TEA. Optou-se pelo trabalho com histórias de
vida para poder conhecer a realidade de cada participante a partir de sua própria
fala. Esta escolha justificou-se mediante a abrangência de possibilidades de
atuações terapêuticas que podem derivar da referida pesquisa.
As narrativas que compõem o trabalho não foram organizadas previamente,
cada participante estava livre para decidir sobre o que iria falar. Os assuntos foram
organizados e explorados pela terapeuta através das fotografias da própria história
de vida deles. Durante o diálogo, os sujeitos participantes assumiram a posse da
palavra, a iniciativa, o direcionamento e o domínio da temática (BAGAROLLO;
PANHOCA, 2010).
As autoras delinearam seu relato de pesquisa pensando a linguagem a partir
da ótica histórico-cultural, como já mencionado. Desse modo, a linguagem é posta
ocupando uma centralidade no sujeito, não sendo possível haver funcionamento
humano fora do seu domínio. Isto é,
Estando, então, a linguagem no centro do humano, todas as suas formas de manifestações se tornam alavancas para o desenvolvimento dos sujeitos, pois o sujeito, ao fazer uso da linguagem para comunicação, passa a se inserir cada vez mais na rede de relações sociais e, assim, mantendo-se no movimento dialético da constituição humana (VIGOTSKI, 2000; PINO, 2005). (BAGAROLLO; PANHOCA, 2010, p. 233)
Seguindo essa compreensão da linguagem, Lucci (2006) ratifica aspectos que
discutimos neste trabalho, ou seja, que a linguagem é considerada o principal
mediador na formação e desenvolvimento das funções psicológicas superiores e,
por isso, apresenta tamanha relevância. Também tem direta influência no processo
de constituição do sujeito. Vygotsky debruçou-se em sua obra a discorrer não só
sobre a origem da linguagem, mas também sobre sua direta ligação com o
desenvolvimento do pensamento.
Ainda sobre a importância da linguagem, Lucci (2006, p. 9) explicita:
Em suma, a linguagem constitui o sistema de mediação simbólica que funciona como instrumento de comunicação, planejamento e auto-regulação. É justamente pela sua função comunicativa que o indivíduo se apropria do mundo externo, pois é pela comunicação estabelecida na
53
interação que ocorrem ―negociações‖, reinterpretações das informações, dos conceitos e significados.
Como expõe a citação, a linguagem possui várias finalidades e, dentre elas,
há a função comunicativa, cuja intenção é a de expressar, transmitir e de receber
informações, seja através da linguagem falada, escrita ou codificada por meio de
signos ou símbolos (ORRÚ, 2012).
Ainda de acordo com Orrú (2012), o meio de comunicação mais usado pelos
seres humanos é o verbal, entretanto, nem todas as pessoas se adéquam a esse
modelo. Pensando a linguagem a partir da sua função comunicativa como descrita,
suscitou-se a necessidade da criação de sistemas que supram essa carência em
pessoas com défices nesse critério. Para essa finalidade e afim de que essas
pessoas possam exprimir seus pensamentos e sentimentos, foram desenvolvidos
métodos de Comunicação Suplementar e/ou Alternativa (CSA).
Em sua maioria, os artigos reunidos discutiram o uso de métodos e técnicas
da Comunicação Alternativa Ampliada (CAA), fazendo uma leitura da importância da
linguagem na vida do indivíduo com TEA a partir dessa ferramenta. Dentre os
estudos analisados, temos o de Nunes e Nunes Sobrinho (2010), intitulado
“Comunicação alternativa e ampliada para educandos com autismo:
considerações metodológicas”.
Os autores realizaram uma revisão de literatura com o objetivo de analisar as
características metodológicas de 56 artigos científicos focados na temática da CAA
para alunos com TEA. Embora não explicitem suas concepções em relação aos
conceitos linguagem e comunicação, validam a necessidade e importância de que
haja métodos e técnicas que possam complementar e substituir a linguagem oral
comprometida ou ausente.
Com isso, assinalam a CAA como uma prática promissora. Desse modo, com
base nos resultados colhidos na pesquisa, os autores buscaram identificar as
melhores práticas adotadas pelos programas de intervenção para a população de
pessoas com TEA.
Ainda sobre o uso da CAA, Walter e Almeida (2010), no artigo intitulado
―Avaliação de um programa de comunicação alternativa e ampliada para mães
de adolescentes com autismo”, realizaram um relato de pesquisa, no qual
buscaram avaliar os efeitos de um programa de CAA no contexto familiar de
pessoas com autismo. O estudo dispôs de seis participantes, sendo três
54
participantes familiares (Pfs), representados pelas mães, e seus respectivos filhos,
chamados de participantes alunos (Pas), com diagnóstico de autismo não-verbal
e/ou fala não funcional.
As autoras sustentaram a ideia de que é preciso refletir formas de tratamento
e metodologias de ensino voltadas para as pessoas autistas não somente no
contexto escolar, mas, principalmente, em suas casas junto a seus familiares. Sobre
a comunicação, afirmam que ―É preciso buscar formas de comunicação que sejam
funcionais e que possam ser generalizadas não somente em relação ao contexto
onde a pessoa está inserida, mas que sejam compreendidas e úteis por toda a
família‖ (WALTER; ALMEIDA, 2010, p. 430).
Sobre o uso da CAA, Walter e Almeida (2010, p. 430) discorrem:
Quando se fala em comunicação alternativa, há muito mais em jogo que uma mera prancha de símbolos ou um sistema computadorizado. A comunicação alternativa fundamenta-se na ideia de possibilitar à pessoa com deficiência o uso da linguagem e de instrumentos que lhe permitam superar o obstáculo da disfunção e ter acesso, seja como for, ao desempenho comunicativo.
Com efeito, concordamos com as autoras da importância de visualizar a CAA
para além de sua função comunicativa. Nessa direção, retomamos as relações entre
pensamento e linguagem na perspectiva vigotskiana na medida em que, como
discutimos, a linguagem possui função central na constituição do sujeito, em
específico, a função constitutiva das funções psicológicas superiores.
A respeito dessa relação, Orrú (2012) reproduz que o pensamento não é
apenas expresso através das palavras, mas é a partir delas que passa a existir.
Embora haja essa relação entre pensamento e palavra, ambos possuem diferentes
movimentos. O pensamento se diferencia da palavra, pois é um reflexo generalizado
da realidade que se concretiza através da linguagem, enquanto a palavra traz
consigo uma característica de abstração. Embora haja distinções, ambos se
complementam nesse processo de expressão de um pensamento.
Desse modo, a linguagem vai muito além de sua função comunicativa, ela é,
também, organizadora, planejadora de ação e reguladora de comportamentos.
Embora seja de grande utilidade o uso dos métodos de comunicação alternativa no
trabalho com pessoas que possuam ausência da fala, é primordial que haja um
diálogo e uma ação mediadora com os sujeitos. Para além de um trabalho que
55
priorize o treino de habilidades comunicativas, é vital a existência de uma relação
que vise a constituição do sujeito que se dá por meio da linguagem, da interação
social e da contextualização histórica (ORRÚ, 2012). Como explica Orrú,
[...] a CSA é utilizada como um mediador semiótico à construção do signo, para auxiliar a construção da linguagem que traz consigo possibilidade de produção de significações, gerada na relação com o outro, em ambientes culturalmente contextualizados (ORRÚ, 2012, p. 76-77).
Conforme demonstra Orrú (2012), a participação do outro tem vital
importância no processo de aprendizagem do sujeito. Esse processo de aquisição
da linguagem tem sua gênese na interação e nas relações sociais do sujeito. Padilha
(2000), fazendo também uma leitura acerca dos escritos de Vygotsky, afirma que
uma palavra sem significado é apenas um som vazio. No entanto, é a partir dessas
relações sociais que os significados vão se construindo.
Mizael e Aillo (2013), no texto intitulado “Revisão de estudos sobre o
Picture Exchange Communication System (PECS) para o ensino de linguagem
a indivíduos com autismo e outras dificuldades de fala”, também contribuem
com estudos sobre o uso da CAA no processo do ensino de linguagem a indivíduos
com autismo e outras dificuldades de fala. Sua pesquisa apresentou como objetivos
revisar as literaturas brasileiras e estrangeiras sobre o estado da arte do Picture
Exchange Communication System (PECS) como um instrumento de ensino da
linguagem, apontar o que tem sido pesquisado, assim como os resultados que mais
foram encontrados e propor direções para novos estudos.
O PECS destaca a relação interpessoal, na qual ocorre um ato comunicativo
entre o sujeito com dificuldades ou ausência total de fala e outra pessoa, através de
trocas de figuras. Para que ocorra a efetivação desse sistema, o treino com o PECS
se desenvolve em seis fases (melhor detalhadas na segunda categoria), que se
delineiam entre fazer pedidos através das trocas de figuras por itens desejados até a
emissão de comentários espontâneos (MIZAEL; AILLO, 2013).
As autoras em tela, cientes dos comprometimentos na comunicação,
advindos do TEA e dos prejuízos que isso oferece à interação social, tratam a
comunicação como uma peça chave para que haja a relação com os outros, logo,
métodos alternativos cujo objetivo é o ensino da linguagem tornam-se essenciais
para essas pessoas.
56
Embora existam diversos programas de CAA para indivíduos com TEA, não
há, até o momento, um guia que defina qual o sistema de comunicação que vá ser
mais efetivo para cada situação. É a partir dessa problemática que as autoras
defendem o incentivo às pesquisas de revisão bibliográfica, pois, por meio de
estudos já produzidos, será possível observar quais os ganhos e o que há para
melhorar (MIZAEL; AILLO, 2013).
Togashi e Walter (2016), cujo título do trabalho é “As Contribuições do Uso
da Comunicação Alternativa no Processo de Inclusão Escolar de um Aluno
com Transtorno do Espectro do Autismo”, também discutiram sobre o uso do
sistema do PECS em pessoas com TEA, abordando os ganhos que essa alternativa
tem no processo de inclusão escolar dessas pessoas. Essa pesquisa apresentou
como objetivo verificar a eficácia e continuidade do uso do PECS-Adaptado 2pela
professora do Atendimento Educacional Especializado (AEE) com seu aluno com
TEA. As autoras buscaram descrever um relato de pesquisa, no qual se deu com a
observação do participante.
Sobre a comunicação, as autoras apontaram como uma etapa importante no
processo de inclusão e também como algo essencial para o desenvolvimento social
e cognitivo de sujeitos com TEA com ausência ou dificuldades na fala. Com isso, as
autoras defenderam o uso da CAA como um meio de estabelecer a comunicação de
pessoas com TEA.
Para elas, a CAA abrange o uso de sistemas e recursos alternativos de
comunicação, sendo uma subárea da Tecnologia Assistiva, fundamental para
pessoas que não possuem fala funcional.
Ainda, Togashi e Walter (2016, p. 353) conceituam o PECS como:
Um sistema de Comunicação Alternativa e Ampliada, cuja utilização é feita partir de trocas de figuras (cartões de comunicação), ou seja, troca-se o cartão de comunicação que está em poder do usuário pelo item desejado por ele, podendo ser um objeto, a solicitação de alguma ação, ou até mesmo a demonstração de algum sentimento ou sensações, a fim de efetivar a comunicação com seu interlocutor.
Ao discutir a questão do uso do PECS com a pessoa com TEA, na
perspectiva histórico-cultural, é preciso pensar a todo instante na ação mediadora e
2 O termo PECS-Adaptado indica que ocorreram modificações em relação ao PECS original contendo
adaptações implementadas, no entanto, o objetivo final é o mesmo.
57
em sua importância. Nesse sentido, o outro interlocutor precisa solidificar suas
ações repletas de intencionalidade, favorecendo, a partir da relação dual e dialógica,
uma utilização contextualizada.
Quando a pessoa com TEA faz uso de um quadro de figuras para comunicar
o que deseja, dentro de circunstâncias concretas de acontecimentos e ações,
encontramos uma possibilidade real em seu desenvolvimento sociocultural.
Portanto, esse processo não irá se resumir apenas a um treino de habilidades, mas
sim ter como enfoque o desenvolvimento da linguagem pautado em suas funções
interacionais com o outro e consigo (ORRÚ, 2012).
Outra maneira de suplementar a comunicação e trabalhar o que Rodrigues e
Almeida (2017), chamaram de ―habilidades de comunicação‖ é a prática da
Modelagem em Vídeo (MV). As autoras, no artigo “Modelagem em Vídeo para o
Ensino de Habilidades de Comunicação a Indivíduos com Autismo: Revisão de
Estudos”, realizaram uma revisão de literatura cujo objetivo foi discutir os resultados
das intervenções que implementaram a MV para ensinar habilidades de
comunicação para indivíduos com TEA.
Utilizando como fonte de dados o Portal de Periódico da CAPES, com
descritores específicos, afirmam que as características de linguagem das pessoas
com TEA devem ser observadas e consideradas, pensando em intervenções que
estejam voltadas para o desenvolvimento dessas habilidades de comunicação.
Ainda, elencam o quanto essas habilidades comunicativas estão vinculadas às
habilidades sociais, atribuindo vital importância à comunicação.
Foram utilizados três critérios de inclusão dos artigos, sendo eles: a) utilizar a
modelagem em vídeo isoladamente, associada a outra intervenção ou como parte
de um pacote de tratamentos, como variável independente; b) habilidades de
comunicação deveriam fazer parte da variável independente; c) todos os estudos
deveriam ter como participantes pessoas com TEA. Desse modo, buscaram
enfatizar os ganhos que essas pessoas tinham em suas habilidades de
comunicação através do uso da MV.
Essa prática de MV é ancorada na visão de que pessoas com TEA são
favorecidas a responder melhor as estratégias de ensino por meio de pistas visuais,
logo, refere-se à imitação de determinados comportamentos ou habilidades
demonstradas através de vídeos por adultos ou pares. A partir das habilidades
comunicativas, busca-se trabalhar as dificuldades associadas ao diagnóstico, como
58
contato visual, iniciativa comunicativa, expressões faciais, gestos, dentre outras
(RODRIGUES; ALMEIDA, 2017).
Orrú (2012) discorre sobre a relação do desenvolvimento e aprendizagem,
tecendo algumas observações sobre a perspectiva comportamental de compreensão
da aprendizagem. Primeiramente, em prol do condicionamento de habilidades e
comportamentos, um objetivo é proposto e, para alcançá-lo, emprega-se uma
técnica de análise de tarefas, partindo da lógica de estabelecer uma sequência de
aprendizagem. Todos os conteúdos são reduzidos para ocorrer o condicionamento
do sujeito e, assim, a memorização reprodutiva de comportamentos, que, por vezes,
tendem a ser vazios de sentidos e significados.
A autora considera que essa concepção de aprendizagem distancia-se do que
Vygotsky estudou. Para ele, nos processos que se referem ao desenvolvimento e à
aprendizagem, os sujeitos são ativos, ou seja, transformam sua realidade, como a si
mesmos. Essa relação dialética que há entre sujeito e mundo ocorre através das
mediações, nas quais o sujeito irá internalizando e significando o mundo a sua volta
(ORRÚ, 2012).
Ainda de acordo com Orrú (2012), os signos internalizados são marcas
externas de tudo o que está nesse plano, objetos, situações e eventos que ocorrem
no mundo real. Ao longo do processo de desenvolvimento, o indivíduo, através da
atividade mediada, passa a ter conteúdos mentais que tomam esse lugar,
considerados os principais mediadores da relação homem e mundo.
Com efeito, Vygotsky elucida que o processo de internalização implica uma
série de transformações, previstas na lei do desenvolvimento cultural. O autor, ao
propor a referida lei, postula que um processo interpessoal transforma-se em um
processo intrapessoal. Ou seja, as funções que se manifestam no desenvolvimento
da criança primeiro acontecem no nível social, para assim, ocorrer na esfera
individual (VYGOTSKY, 1991). Em outras palavras,
A transformação de um processo interpessoal num processo intrapessoal é o resultado de uma longa série de eventos ocorridos ao longo do desenvolvimento. O processo, sendo transformado, continua a existir e a mudar como uma forma externa de atividade por um longo período de tempo, antes de internalizar-se definitivamente. Para muitas funções, o estágio de signos externos dura para sempre, ou seja, é o estágio final do desenvolvimento (VYGOTSKY, 1991, p. 41).
59
Desse modo, tal processo não se dá apenas no plano individual de cada
sujeito, mas sim passam a ser compartilhadas por um conjunto de pessoas de um
grupo social, favorecendo a comunicação e potencializando interações sociais. Isto,
por fim, irá fornecer os subsídios para o desenvolvimento psicológico do indivíduo.
Assim, a linguagem, como um dos principais sistemas simbólicos, exerce papel
fundamental na comunicação, o que está diretamente ligado a esse processo de
significações compartilhadas (OLIVEIRA, 1997).
Com os dados descritos aqui, notificamos a importância de discutir os
conceitos de linguagem e comunicação da pessoa com TEA, tendo em vista que são
critérios para um diagnóstico por serem uma das maiores dificuldades desse
transtorno. Foram apontadas várias possibilidades em prol de suplementar os
défices da linguagem e da comunicação. Indo além disso, é preciso considerar que a
linguagem constitui-se como mediador fundamental na constituição do sujeito e de
suas funções psicológicas superiores.
Considerando isso, vale ressaltar, agora, que é necessário também pensar
em estratégias para seu uso e quais seus respectivos resultados, é o que veremos
adiante.
5.2 Categoria 2: Estratégias e resultados
Nesta sessão, discutiremos as várias estratégias encontradas na literatura em
relação ao trabalho com a pessoa com TEA com dificuldades ou ausência de
comunicação e linguagem. Dentre as ações apontadas como estratégias, estão:
Comunicação Alternativa e Ampliada (CAA), Picture Exchange Communication
System (PECS), Modelagem em vídeo (MV) e o trabalho com as histórias de vida
dos sujeitos e a utilização de fotografias pessoais como recurso terapêutico.
Com a proposta de uma revisão de literatura sobre as características da
comunicação social na Perturbação do Espectro do Autismo (PEA), Reis, Pereira e
Almeida (2016) tratam acerca das adequações e do desenvolvimento de
competências comunicativas, explanando algumas possibilidades de intervenções.
Em síntese, os autores defendem um conjunto de práticas que servirão de
estratégias no trabalho com a pessoa com PEA, tais como: o trabalho de uma
60
equipe de diferentes áreas disciplinares aliado ao apoio da família, que se
constituem como eixos importantes em todo o processo de acompanhamento da
criança com TEA; plano individual de intervenção precoce; focar na funcionalidade
das intervenções na vida da criança; capacitações tanto de familiares como da
equipe de profissionais e também práticas de intervenção individualizadas e
sensíveis às prioridades da criança e diversidade de cada família (REIS; PEREIRA;
ALMEIDA, 2016).
Com isso, concluem que
Em síntese, este conjunto de práticas sustenta a importância de uma intervenção o mais precoce possível, realizada nos contextos naturais, da criança e da sua família, que objetive a potencialização de níveis de envolvimento e participação da criança; promotores de oportunidades de aprendizagem e de desenvolvimento das suas competências comunicativas e sociais (REIS; PEREIRA; ALMEIDA, 2016, p. 333).
Nesse sentido, compreendemos que as oportunidades de aprendizagem
podem ser exploradas com mediações na Zona de Desenvolvimento Proximal
(ZDP). Conforme Vygotsky (1991, p. 58)
Ela é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes.
Vygotsky (1991) compreende que o trabalho na ZDP proporciona um olhar da
aprendizagem em perspectiva, ou seja, trabalha-se com o potencial do sujeito, com
o seu vir-a-ser. Para tanto, a mediação simbólica faz-se essencial na medida em que
a interação com o outro impulsiona o processo de aprendizagem do sujeito, criando
novas ZDP.
Ao dar sequência com as outras discussões encontradas nos artigos
utilizados para a realização deste estudo, visualizamos intervenções com o uso de
outros recursos, tais como a CAA e o PECS. Alguns autores discutiram sobre essas
duas ferramentas de comunicação.
Retomamos o estudo desenvolvido por Nunes e Nunes Sobrinho (2010)
quanto ao uso de CAA, que realizaram uma revisão de literatura sobre esse tema. A
busca dos artigos seguiu os seguintes critérios: tipo de CAA, delineamento de
61
pesquisa, número de participantes envolvidos, variáveis dependentes e
independentes, medidas de generalização, manutenção e validade social.
Dentre esses estudos, constatou-se que 18 fizeram uso de sistemas manuais
de língua de sinais; 26 utilizaram sistemas pictográficos de comunicação; 9 sobre o
uso de sistemas assistidos com acionadores de voz e 3 utilizaram sistemas híbridos,
contendo mais de uma modalidade de CAA (NUNES; NUNES SOBRINHO, 2010).
Outro trabalho envolvendo o uso de CAA foi desenvolvido por Walter e
Almeida (2010), que buscou realizar uma avaliação de um programa de CAA para
mães de adolescentes com autismo. O procedimento experimental ocorreu em duas
fases: linha de base (LB) e intervenção. O processo de intervenção contou com a
capacitação teórica e prática das mães, incluindo a aplicação, utilização e
manutenção do uso da CAA com os filhos no ambiente familiar. Esse programa
recebeu o nome de ProCAAF (Programa de Comunicação de Alternativa e Ampliada
Familiar).
Para concretude desse objetivo de pesquisa foram elaboradas, pelas
pesquisadoras, as seguintes etapas: conhecimento das necessidades comunicativas
das mães; observação dos comportamentos comunicativos dos filhos no contexto
familiar e registro de desempenho no uso da CAA pelas mães e pelos filhos. Para
atingir essas etapas, fizeram uso de questionários visando conhecer qual o padrão
comunicativo dos filhos, observação, filmagem e coletados os registros realizados
pelas mães referentes ao desempenho em porcentagem dos níveis de auxílio
oferecidos aos filhos e sua independência para utilizar a CAA.
Com os dados coletados no decorrer de um ano, Walter e Almeida (2010)
sinalizam o desempenho dos familiares e dos participantes com TEA em utilizar a
CAA em casa para comunicar seus desejos, necessidades e suas emoções.
O estudo realizado por Walter e Almeida (2010) permite ao leitor visualizar a
importância que a família tem no desenvolvimento da linguagem no indivíduo com
TEA. A vivência do TEA não é apenas do sujeito, mas também de seus familiares.
Ante ao impacto causado pelo diagnóstico de TEA, a atuação do psicólogo nesse
trabalho aliado aos familiares torna-se fundamental. Assim, foi analisado que os
programas de orientação aos familiares que ocorrem em parceria com profissionais
têm maior possibilidade no desenvolvimento de pessoas com autismo, promovendo
mudanças significativas.
62
A família é considerada o núcleo básico de apoio social do indivíduo, tem vital
importância em contribuir na formação do sujeito e possibilitar um desenvolvimento
social, emocional, cognitivo, etc. Familiares de pessoas com deficiência passam por
diversas mudanças em suas vidas, havendo repercussões que demandam um
ajustamento para a nova realidade (PADUA; RODRIGUES, 2013).
Padua e Rodrigues (2013, p. 2323) explanam que:
Assim, a família é compreendida como um sistema onde cada membro influencia e afeta os outros. Ela, enquanto um grupo, tem seu funcionamento regular que permite uma certa estabilidade e regularidade para garantir o bem estar dos membros. As eventuais mudanças que podem ocorrer dentro do contexto familiar provocam um desequilíbrio nas relações e desafiam ao grupo adaptar-se a nova situação.
Portanto, pensar no trabalho com a pessoa com deficiência é também pensar
sobre a importância que familiares e cuidadores possuem nesse processo de
desenvolvimento, sendo uma estratégia fundamental. Logo, conforme Vygotsky
(2003), é no meio familiar que a criança irá aprender a significar e apreender suas
ações, no qual estarão a todo o momento internalizando signos e símbolos que
servirão de mediadores na organização do pensamento e no desenvolvimento das
funções psicológicas superiores.
Outro estudo sobre CAA, por sua vez, explora o emprego do PECS. As
autoras Mizael e Aillo (2013), através de sua pesquisa bibliográfica revisaram
outros estudos que abordavam o PECS no ensino a linguagem em pessoas com
TEA e outras dificuldades de fala. Essa alternativa ressalta a relação interpessoal e
permite haver uma relação comunicativa entre duas pessoas, através de trocas de
figuras.
Conforme as autoras, o PECS é desenvolvido em seis fases de treinos: 1)
fazer pedidos através da troca de figuras pelo item desejado; 2) ir até a prancha de
comunicação, apanhar a referida figura e entregá-la para um adulto; 3) discriminar
entre as figuras; 4) solicitar itens, utilizando várias palavras em frases simples,
fixadas na tábua de comunicação; 5) responder a pergunta ―o que você quer?‖; 6)
emitir comentários espontâneos.
O estudo se delineou com quatro artigos encontrados na literatura estrangeira
e seis na literatura brasileira. A análise se desenvolveu com os seguintes critérios:
número de participantes, delineamento de pesquisa, duração do estudo, setting,
63
fases implementadas, resultados encontrados, fidedignidade inter-observador e de
procedimento, validade social, manutenção e generalização. Em ambas as
literaturas, o PECS evidenciou-se como uma ferramenta eficaz no ensino de
linguagem a indivíduos com autismo, podendo observar também uma maior
incidência de vocalizações com intenções comunicativas ou até mesmo a fala
funcional (MIZAEL; AIELLO, 2013).
Togashi e Walter (2016) também trazem as considerações realizadas em
seu estudo de caso sobre as contribuições da CAA na inclusão escolar de uma
criança com TEA. A pretensão era introduzir o uso do sistema PECS – Adaptado
junto aos alunos com TEA, atuando no AEE. Ocorreram em sete sessões, que foram
analisados a partir do protocolo de registro dos níveis oferecidos nas fases do
PECS.
Embora se tenha um baixo número de pesquisas que envolvam o uso das
CAA voltadas para o público com TEA, as autoras argumentam que a prática tem
mostrado um histórico de sucesso em seu uso, com resultados positivos e com uma
significativa melhora no desenvolvimento da comunicação e da linguagem.
Para tanto, a pesquisa do referido estudo desenvolveu-se em duas etapas:
capacitação de 35 professores de AEE e verificação e acompanhamento da
aplicação do referido sistema por quatro professoras selecionadas após o curso de
capacitação e que atendiam alunos com TEA sem fala funcional. A partir dos
questionamentos que surgiram com o término da pesquisa é que foi desenvolvido o
trabalho em análise, dividido em dois estudos: o Estudo I, foram apresentados os
dados do Follow-up da investigação maior e o Estudo II, foi destinado a descrever o
processo de introdução e utilização do PECS-Adaptado no ambiente da escola
regular.
Do Estudo I, participaram um aluno com TEA e uma professora da sala de
AEE. Esse estudo aconteceu na sala de recursos de uma escola regular da rede
municipal do Rio de Janeiro. Foram utilizados filmadora digital, câmera fotográfica
digital e fichas de anotações do PECS-Adaptado. Havia o Relatório de Observação e
também foi confeccionado o material de CAA para o uso do aluno, em formato de
cartões que tinham dois tamanhos diferentes, utilizando figuras do PECS, uma
prancha móvel e um painel que ficava fixo na parede e um álbum de comunicação.
As sessões de follow-up ocorreram no espaço de tempo de cinco meses, com
duração das sessões variando de 12 a 21 minutos. Foram realizadas atividades
64
pedagógicas que promoviam interação da professora com o aluno através do uso do
PECS. Em seguida, como análise de dados, foi feito o uso de um modelo de
protocolo de registro de PECS-Adaptado, no qual foi avaliado os níveis do apoio que
foram oferecidos ao aluno e observando a independência do mesmo em buscar
seus itens de interesse. Mediante a essa observação é que era possível ao aluno
avançar nas fases do PECS-Adaptado (Fase 1 à Fase 5).
Já o Estudo II objetivou analisar as interações comunicativas do aluno com
TEA em sua sala de aula regular e verificar os efeitos da utilização das CAA no
contexto escolar. Teve como participantes o mesmo aluno da pesquisa anterior, sua
atual professora da classe regular e uma estagiária contratada para trabalhar
diretamente com o aluno em questão. Realizada em uma sala de aula do ensino
fundamental, foram desenvolvidas quatro sessões de Linha de Base, três sessões
de capacitação da professora e estagiária sobre o uso de CAA e do PECS-Adaptado
e seis sessões de Intervenção, dispostas em um período de oito meses.
Na Linha de Base, foi observado como se desenvolviam as relações sociais
do aluno e também de suas professoras, as atividades propostas pela professora e
como ocorria a interação comunicativa entre eles. No período da intervenção,
ocorreu a capacitação da professora e da estagiária. Após esse momento, ambas
passaram a trabalhar com o aluno a partir de atividades pedagógicas, em que foi
observado os momentos de interação entre o aluno e suas interlocutoras.
Os resultados da pesquisa realizada por Togashi e Walter (2016) indicaram
continuidade do uso de PECS-Adaptado pela professora, uma maior interação
comunicativa do aluno com a estagiária durante as intervenções, finalizando com a
generalização do uso do PECS-Adaptado na sala de aula regular. Assim, conclui-se
que a comunicação é um dos fatores fundamentais quando se fala em inclusão
escolar e que, com o seu auxílio, tende a ocorrer de forma mais efetiva.
Considerando os escritos da abordagem histórico-cultural, destacamos que a
atividade do professor é fundamental para o desenvolvimento do sujeito com TEA.
Chiote (2013) frisa que, no espaço escolar, é preciso perceber o sujeito em sua
condição de constituição. Assim, a aprendizagem da criança com autismo deve ser
voltada para os processos de significação em que a criança precisa ser
ressignificada para além do diagnóstico. A interação social com os outros colegas
pode ajudar nesse processo em prol de desenvolver habilidades e conhecimentos.
65
Como mencionamos anteriormente, Chiote (2013) explica que se deve
trabalhar nos processos de significação, ou seja, é preciso o compartilhamento de
sentidos com a criança com TEA.
Isso implica uma compreensão da CAA que não se reduza a um olhar
instrumental de comunicação. Sobre isso, Orrú argumenta:
Se a forma de trabalho fosse a de expor o símbolo fora do contexto real, objetivando a memorização e a troca do símbolo com a ação e/ou objeto, teríamos aqui uma proposta do exercício do treino de habilidades. Estando ausente a intencionalidade da construção de significado e de sentido, este último se encontra no porquê de ação estar sendo realizada (ORRÚ, 2012, p. 122).
Assim, de acordo com a abordagem histórico-cultural, é preciso atuar na
construção contextualizada da comunicação. Ao pensar o desenvolvimento da
pessoa com TEA, deve-se, então, também produzir relações entre a linguagem e o
pensamento.
No que vem tratar da linguagem da pessoa com TEA, Orrú (2010) tece
críticas ao trabalho dentro de uma perspectiva mecanicista que desconsidere a
concepção simbólica do sujeito. As CAA, tidas a partir da abordagem histórico-
cultural, não irão buscar apenas uma proposta de trabalho de modificação de
comportamento, por meio de treino de habilidades ou de resgate de uma
comunicação funcional. Compreende-se que, através da ação mediadora presente
nas CAA, é possível apresentar situações que estejam repletas de significados. Sem
a existência de sentidos e significados, não haverá interação social e,
consequentemente, o desenvolvimento da linguagem. Nas palavras de Orrú,
O diferencial do uso da CSA, a partir da abordagem histórico-cultural, está, justamente, em não realizar trocas de objetos por CSA, de maneira mecânica e descontextualizada, mas em inserir este sistema nas experiências e nos contextos em seu cotidiano, na perspectiva da produção de sentidos (ORRÚ, 2012, p. 126).
Além disso, destacamos a mediação na construção da identidade do sujeito,
nos casos de ausência da fala ou de dificuldades na mesma. Aqui, o papel do outro
segue sendo de vital importância nos processos mediacionais.
Segundo Chiote (2013), essa mediação deve ser alicerçada em processos
compensatórios, que busquem explorar as possibilidades de cada sujeito e que os
impulsionem a interagir com os outros e com o meio. Através desse conceito, o
66
profissional não mais olhará para um sujeito com deficiência sob a ótica de suas
perdas e limitações, mas sim se voltando para seus pontos fortes e suas
possibilidades.
Outra estratégia encontrada na intervenção e trabalho com o sujeito com TEA
é a Modelagem em Vídeo como um recurso para o ensino de habilidades de
comunicação. Rodrigues e Almeida (2017) explicam essa prática como um recurso
baseado em evidências para o público de pessoas com TEA, tendo em vista que
esse grupo de pessoas responde melhor às estratégias de ensino por meio de pistas
visuais. A partir dessa compreensão que as autoras se dispuseram a avaliar os
resultados dessa intervenção.
Essa técnica consiste na imitação de alguns comportamentos ou habilidades
que são ilustradas por meio de vídeos por um adulto ou pares. O procedimento
acontece com uma pessoa sendo convidada a assistir ao vídeo, enquanto um adulto
ou par modela uma habilidade a ser desenvolvida dentro de um contexto de
atividade. Estímulos e reforços são oferecidos em busca do objetivo até que a
pessoa imite o comportamento do modelo com a oportunidade de desempenhar as
habilidades em vídeo (RODRIGUES; ALMEIDA, 2017).
Existem três tipos básicos de intervenções em MV que são: 1) modelagem em
vídeo com outros como modelo (MVO), ou seja, é preciso o uso de um adulto ou par
como modelo que podem ser conhecidos ou não pelo aprendiz; 2) automodelagem
em vídeo (AV) utiliza o aprendiz como o modelo, pois, assim, ele visualiza a si
próprio desempenhando determinada tarefa; e 3) modelagem em vídeo a partir do
ponto de vista (MVPV), que é filmado na perspectiva da primeira pessoa e é
elaborado com a filmadora na altura do ombro de uma pessoa, o que trará a
impressão de que acontece através dos olhos do aprendiz e somente suas mãos
são visíveis no vídeo, que realizam o comportamento alvo.
O estudo em análise pode sumarizar intervenções que empregaram a MV no
ensino de habilidades de comunicação avaliaram critérios como duração de vídeo,
generalização por meio de ambientes, materiais, pessoas e estímulos. Fizeram parte
dos estudos pessoas com idade de 3 a 36 anos, destes, apenas um apresentava
diagnóstico de síndrome de Down, os demais eram todos com TEA. Os estudos
foram conduzidos em sua maioria em escolas especiais. Todas as variáveis do
estudo estavam relacionadas a habilidades de comunicação agrupadas em seis:
67
expressões faciais, fazer pedidos por meio da CAA, a fala, gestos, entonação e
contato visual.
Com a coleta de todos os critérios de avaliação, perceberam que essa prática
é eficaz no ensino de habilidades de comunicação por meio da MV. Os resultados
apoiam o uso da modelagem em vídeo na reabilitação de crianças com TEA. No
entanto, devem-se considerar as particularidades diagnósticas desta população para
que assim a intervenção seja mais eficaz (RODRIGUES; ALMEIDA, 2017).
Levando em consideração que cada sujeito apresenta características e níveis
diferentes de TEA, quando se trata de incluir, faz-se necessário que haja um modelo
interventivo singular para cada situação. De acordo com Orrú (2012), a maneira pela
qual o sujeito é assistido em seu meio social, familiar e cultural, também irá
influenciar diretamente em seu desenvolvimento. Esses sujeitos possuem sua
subjetividade e sua singularidade que vão sendo constituídas de forma dialética com
o meio social que vivem. Assim, é a partir das mediações dispostas nas relações
que a pessoa com TEA irá encontrar os caminhos para sua subjetividade.
Desse modo, compreendemos que, conforme Chiote (2013), em muitos casos
a pessoa com TEA é reduzida ao transtorno, restringindo as possibilidades
educativas às práticas de reabilitação e adequação social. Devemos situar esse
público a partir de como ele é significado e constituído pelo outro, porém, é preciso
percebê-lo em sua singularidade, como um sujeito que pensa, deseja, sente e
representa o mundo de maneira ímpar.
A última estratégia apontada está na pesquisa de Bagarollo e Panhoca
(2010), que buscou analisar o processo dialógico de adolescentes autistas por meio
do uso de fotografias. A escolha desse método se deu mediante a preocupação com
os detalhes dos episódios focais, já que é através das situações vivenciadas
anteriormente que o sujeito poderá emergir novas formas de desenvolvimento. No
diálogo estabelecido durante as sessões e através dos retratos, os adolescentes
tiveram o poder da palavra, a iniciativa de fala e o domínio sobre o que cada uma
daquelas imagens retratava.
Sobre a escolha pelo o uso de fotografias, as autoras afirmam que:
Além disso, as fotografias tiveram a função de signo mediador da memória, permitindo que o sujeito recordasse situações vivenciadas, trazendo-as e expandindo-as durante as sessões. O uso de retratos possibilitou o exercício de um funcionamento mediado da memória, de caráter superior,
68
ultrapassando os limites de uma recordação imediata e instintiva. (BAGAROLLO; PANHOCA, 2010, p. 248)
As fotografias foram utilizadas como um signo mediador da memória na vida
dos três adolescentes. A partir das imagens, o terapeuta pode estabelecer junto a
eles um resgate de suas memórias, discorrendo e expandindo as informações que
foram sendo trazidas. Desse modo, essa estratégia terapêutica foi utilizada como
uma forma de imersão da linguagem e manutenção do diálogo. É pela linguagem, tal
como dito por Chiote (2013), que o sujeito é inserido no mundo cultural e simbólico,
sendo ela o nosso sistema simbólico mais importante, pois permite ao outro ter uma
participação na vida social e também é considerado um modo de perceber o mundo,
de relacionar-se e constituir-se a partir dele.
A terapeuta/pesquisadora participava ativamente dos diálogos, auxiliando no
relato dos fatos. A todo o momento a presença desta se fez necessária para
promover a manutenção do diálogo, nesse caso se a mesma estivesse apenas
ouvindo, provavelmente, o relato seria encerrado rapidamente (BAGAROLLO;
PANHOCA, 2010).
Esse estudo corrobora como a presença do outro permite ao sujeito a
possibilidade de internalizar novos conceitos. Assim como dito por Chiote (2013), tal
presença tem papel fundamental no processo de desenvolvimento humano, já que,
com a inserção do sujeito na cultura, ocorre um processo dual de mediação que é
caracterizada pelo signo e pelo outro.
A inserção na cultura também propicia esse desenvolvimento e, assim,
Bagarollo e Panhoca (2010) evidenciam a partir das ações trazidas por um dos
sujeitos sua inserção cultural cercada de significações, de conceitos e de material
artístico. Em algumas situações, ficaram explícitas o uso de ecolalias, entretanto,
diferente do que é difundido, esse episódio permitiu compreender que o sujeito da
pesquisa faz uso deste tipo de fala para manter o diálogo, responder às questões do
terapeuta e continuar o relato.
Também, pode-se perceber que essa repetição se dá mediante a uma falta de
repertório linguístico para que haja a continuidade da interação. Desse modo, essa
prática pode ser considerada como uma estratégia linguística que, por meio dessas
circunstâncias, possibilitam a interação e manutenção da conversação.
Por fim, tomamos as conclusões das autoras acerca desse relato de pesquisa
para estabelecer a conclusão do atual capítulo e permitir a relação com as
69
Considerações Finais, uma vez que suas conclusões unem-se à nossa perspectiva
quanto às intervenções sobre TEA no tocante à linguagem e a comunicação.
Nessa direção, as autoras concluíram que, dentro da perspectiva histórico-
cultural, o trabalho fonoaudiológico, assim como as demais áreas que perpassam o
trabalho terapêutico, deve voltar-se não para a reabilitação, mas para o
conhecimento do meio social em que esses sujeitos vivem, permitindo assim a
construção de novas significações, apropriação de si mesmo e vivências sociais e
culturais. A relação com o outro e, em específico com sujeitos com TEA, deve ser
realizada em um espaço onde a mediação seja especializada e direcionada. Dessa
maneira, considerando a singularidade e o modo de funcionar de cada um é que
será possível haver essa relação.
70
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo deste trabalho, dedicamo-nos à literatura científica acerca da
compreensão sobre os conceitos de linguagem e comunicação no TEA e quais as
formas interventivas utilizadas para esse público, em específico, para aqueles que
possuam dificuldades ou ausência da fala. Desse modo, quanto ao nosso objetivo
geral, que foi compreender, a partir de literaturas encontradas na Revista Brasileira
de Educação Especial, quais estratégias utilizadas no trabalho terapêutico e
educacional direcionadas ao desenvolvimento da linguagem e comunicação de
pessoas com TEA, constatou-se um somatório de produções científicas sobre a
temática.
Além disso, seguindo os objetivos específicos, que são compreender as
concepções de linguagem e comunicação encontradas nas literaturas; analisar a
importância da linguagem e comunicação no desenvolvimento da pessoa com TEA;
e identificar estratégias interventivas no tocante à linguagem e à comunicação, ficou
evidente, com o desenvolvimento desta pesquisa, uma concordância de perspectiva
na maioria das literaturas.
Assim, cientes das dificuldades dispostas nesses quesitos, os autores
concordam que as dificuldades de linguagem e comunicação podem gerar uma
barreira interpessoal na relação com o outro, impedindo a interação social da pessoa
com TEA. Embora algumas literaturas não tenham deixado de forma mais explícita
sua definição para linguagem e comunicação, não negaram sua importância no
desenvolvimento social e cognitivo do sujeito com TEA, também partilharam do
entendimento de que embora a linguagem mais utilizada seja a oral está não é a
única forma de possível. Na realidade da pessoa com TEA, esta pode desenvolver
sua linguagem para além da oral e assim comunicar-se por outras vias.
Correlacionando com a Psicologia Histórico-cultural, a linguagem assume
papel central no desenvolvimento humano, embora uma das funções da linguagem
seja a comunicação, que possui extrema relevância, sua importância não se resume
a isso, pois também temos a linguagem como mediadora para o desenvolvimento do
sujeito, de suas funções psicológicas superiores e reguladora de comportamentos.
Dado o seu destaque no desenvolvimento humano em grande parte das
literaturas analisadas pode-se encontrar métodos e técnicas complementares ou
71
substitutos da linguagem oral comprometida ou ausente, validando sua necessidade
e relevância.
Diante disso, conforme analisado, dentre as práticas voltadas para o público
com TEA com o objetivo de suplementar ou substituir a comunicação, estão: o uso
da CAA apresentado de múltiplas formas e, em meio a essas formas, o uso do
PECS, um sistema de comunicação por troca de figuras; e modelagem em vídeo.
Também verificamos a presença fundamental de práticas que envolviam mediação,
como o trabalho com histórias de vida tido a partir do uso de fotografias.
Contemplamos, ao longo das análises, que muitas estratégias eram voltadas
para o uso da CAA como ferramenta para estabelecer a comunicação e a interação.
Por certo, a literatura revelou que esses métodos são eficazes e muito utilizados no
trabalho com pessoas com TEA e com prejuízos ou ausência na comunicação.
Entretanto, ressaltamos que o uso desses métodos deve visar à participação ativa
do sujeito nesse processo e a sua interação social efetuada através da mediação do
outro, que irá se concretizar por meio de relações sociais, histórica e culturalmente
dadas.
Nessa perspectiva, cabe ao profissional estabelecer estratégias interventivas
que ressaltem um processo de aprendizagem, em que esteja atenta para não reduzir
o sujeito com TEA à reprodução de comportamentos mecânicos e vazios de
sentidos e significados, mas que este seja visto como um ser ativo em seu próprio
processo de aprendizagem a partir do desenvolvimento da linguagem. A valer,
consideramos importante estabelecer relações que propiciem a aquisição da
linguagem no sujeito e, deste modo, estará simbolizando e internalizando elementos
da sua cultura.
Algumas pontes de discussões foram averiguadas no decorrer das análises.
Em meio a elas, foi observada a importância que a comunicação desempenha no
processo de inclusão do aluno com TEA em seu contexto escolar. Em um dos
materiais analisados, demonstrou-se a carência de formações continuadas voltadas
para educadores que atuem com pessoas com TEA com dificuldades de
comunicação e em que o uso de algum método suplementar seja preciso. Assim,
quanto aos programas de inclusão, faz-se necessário o apoio ao contexto
educacional e aos professores de pessoas com TEA.
Também encontramos textos que ressaltaram a importância de um conjunto
de práticas que sustentassem uma intervenção o mais precoce possível, que fosse
72
realizada em contextos naturais do indivíduo, como exemplo o contexto familiar. Em
um estudo que teve como objetivo avaliar os efeitos de um programa de CAA no
contexto familiar de pessoas com TEA, foi possível perceber a relevância de incluir
esse núcleo em prol do desenvolvimento dessas pessoas e pensar em técnicas que
estejam alinhadas às reais necessidades dos familiares no contexto familiar. Essa
percepção parte da compreensão sobre a família e, nesse estudo, voltamos os
olhares para familiares de pessoas com deficiência. A família tem significativa
contribuição no desenvolvimento do sujeito com TEA, pois é nesse meio em que irá
significar e contextualizar suas próprias ações.
Ainda com o desenvolvimento de nosso estudo, notou-se um rigor em
pesquisas que priorizaram analisar as CAA em busca das melhores práticas
adotadas pelos programas de intervenção fundamentando a análise em critérios
mais técnicos onde o sujeito era tido apenas como um participante de determinados
experimentos retidos em grupos de controle. Em meio a esse cenário, foram
levantadas questões como a importância de observar a singularidade contida no
diagnóstico do TEA e que cada método ou técnica precisa ser avaliado a partir
dessa singularidade e realidade de cada um. Embora pesquisas com rigor científico
se façam necessárias, esse olhar para o sujeito que pensa, sente e tem seus
próprios anseios precisa ser fortemente considerados.
Com a pesquisa, foi possível avaliar que a comunicação perpassa todo o
desenvolvimento do sujeito com TEA e que é unânime em cada trabalho sua
importância. Também foi visto como resultados que muitas literaturas defendem o
uso de estratégias de intervenção que estejam fundamentadas no uso de métodos e
técnicas de CAA sendo este considerado um recurso útil no ensino e na tentativa de
estabelecer uma comunicação com a pessoa com TEA que merece um olhar e um
incentivo maior para o desenvolvimento de pesquisas.
Diante desse caminho, temos que a abordagem histórico-cultural compreende
que é através da linguagem e da comunicação que o sujeito irá interagir de modo
social e cultural. Neste caminho, define sua própria identidade ao passo que se
envolve nessas relações já que é através das relações sociais que o
desenvolvimento humano irá se delinear. Como observamos, a mediação simbólica,
proposta por Vygotsky, contribui muito no que diz respeito à constituição da
linguagem de sujeitos com TEA. Desse modo, instrumentos utilizados nesse
73
processo de ensino e de aprendizagem, tal como a CAA são efetivados quando há
essa relação mediacional com o outro e com o meio.
Como foi dito anteriormente, em ambos os conceitos discutidos nessa
pesquisa é que reside o maior obstáculo acometido em razão do próprio diagnóstico
do TEA. No entanto, o desenvolvimento da linguagem e da comunicação não
depende apenas do sujeito, nem do profissional que o acompanha, seja terapêutico
ou educador, mas também das relações estabelecidas em todo o contexto cultural e
social. Profissionais qualificados também somam nesse processo desde que
busquem ser mediadores na aprendizagem desses sujeitos.
É indispensável o desenvolvimento da sensibilidade no profissional que
trabalha com uma pessoa com TEA. Enquanto profissional, este precisa buscar
compreender a individualidade de cada sujeito para assim estabelecer e desenvolver
a comunicação destes. O estudo contínuo desses profissionais permite abranger a
ideia de não ver o sujeito com TEA apenas como alguém com défice, mas de
enxergá-lo como uma pessoa que é ativa em seu processo de ensino e
aprendizagem e em constante transformação. Nesse sentido, é preciso
compreender que fazer uso da CAA é permitir que esse sujeito esteja tendo como
mediador esse método, na produção de seus sentidos e significados. É necessário
investir, por meio da compensação, em caminhos alternativos que busquem quebrar
as barreiras que lhe são postas e enxergá-lo diante de suas possibilidades,
contribuindo para que seu desenvolvimento cultural aconteça.
Diante disso, destacamos a necessidade da realização de outros trabalhos,
como pesquisas interventivas, que busquem a colaboração de professores,
familiares, terapeutas e afins, saindo da literatura bibliográfica em direção de
pesquisas de campo, para que, posteriormente, os resultados obtidos possam ser
utilizados como caminhos possíveis de atuação. Esse tipo de pesquisa propicia
enormes ganhos no conhecimento do TEA e na importância que a linguagem e a
comunicação oferecem na vida desse público, colaborando com a elaboração das
melhores formas de intervenção no conhecimento dessas áreas, como também em
formas de estabelecer relações.
Tais estudo permitem, ainda que aos poucos, compreender a devida
importância que é atribuída a esses conceitos e sair da visão de não considerar o
sujeito em seu processo de aprendizagem e nem de validar as formas comunicativas
que já possua. Assim, poderiam ser abertos espaços para que todos os que façam
74
parte da vida da pessoa com TEA o tenham em sua singularidade e participação
ativa em seu desenvolvimento e aprendizagem.
Concluímos que esta pesquisa não traz pontos finais, mas sim busca
provocar uma inquietação para estudos posteriores. Para finalizar, preferimos
destacar a relevância atribuída aos conceitos de linguagem e comunicação e sua
contribuição no desenvolvimento do sujeito com TEA. Também, salientamos que são
conceitos fundamentais para que haja relações interpessoais entre esse público.
Cientes das barreiras encontradas, notificamos estratégias interventivas que
buscam amparar essa área que, por vezes, é prejudicada ou ausente. Para isso,
práticas precisam ser pensadas através da realidade de cada indivíduo. Ainda,
entendemos que profissionais e educadores são ferramentas importantes nesse
processo, no entanto, familiares também precisam ser incluídos na busca de
melhores estratégias e como uma ponte em busca do desenvolvimento desse
sujeito. Já que as relações sociais, históricas e culturais perpassam a vida do ser
humano e são constitutivas da subjetividade destes, ressaltamos que a sociedade
em geral precisa estar consciente de seu papel em prol de incluir a pessoa com
TEA.
75
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