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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – UERJ
FACULDADE DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES – FFP
DEPARTAMENTO DE LETRAS - DEL
Ana Julia Castanheira Campos Moraes Louzada
A Formação do Aluno Leitor nas Séries Iniciais: As práticas de leitura e letramento na Escola Municipal Anísio Teixeira
São Gonçalo
2016
Ana Julia Castanheira Campos Moraes Louzada
A Formação do Aluno Leitor nas Séries Iniciais: As práticas de leitura e letramento na Escola Municipal Anísio Teixeira
Monografia apresentada ao
Departamento de Letras da Faculdade
de Formação de Professores da
Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (DEL/FFP/UERJ), como
requisito parcial para o grau de
licenciada em Letras –
Português/Literaturas.
Orientadora: Profª Drª Inês Ferreira de Souza Bragança
São Gonçalo
2016
FICHA CATALOGRÁFICA
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/CEH/D
L895 Louzada, Ana Julia Castanheira Campos Moraes.
A formação do aluno leitor nas séries iniciais: as práticas de leitura e letramento na Escola Municipal Anísio Teixeira / Ana Julia Castanheira Campos Moraes Louzada. – 2016.
74f.
Orientadora: Profª. Drª. Inês Ferreira de Souza Bragança.
Monografia (Licenciatura em Letras – Português/Literatura) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Faculdade de Formação de Professores.
1. Educação. 2. Leitura. 3. Letramento. I. Bragança, Inês Ferreira de Souza. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Faculdade de Formação de Professores.
CDU 371
Dedico este trabalho à comunidade escolar da Escola Municipal
Anísio Teixeira: as experiências partilhadas representaram um
verdadeiro divisor de águas na minha formação docente.
AGRADECIMENTOS
Agradeço eternamente a Nossa Senhora. Mãe e protetora, me fez sentir
amparada em todos os momentos desta caminhada.
A minha mãe e minha avó, que juntas cumpriram a árdua tarefa da minha
criação. Meus exemplos de vida, sempre presentes e demonstrando apoio. Até nos
momentos mais difíceis, nunca permitiram que eu deixasse de acreditar do que eu era
capaz.
Ao meu marido, que acompanhou a minha graduação desde os primeiros
períodos e nunca deixou de estar ao meu lado. Companheiro com quem partilho alegrias
e frustrações me fazendo feliz todos os dias.
A todos os colegas que tive a oportunidade de conhecer na graduação, em
especial ao querido Rozalvo Canella Jr., que sempre me estendeu a sua mão amiga.
Aos membros da equipe da Escola Municipal Anísio Teixeira, em especial a
minha amiga e Diretora da Unidade Escolar, Mara Lobo, que com sua paixão por esta
escola e suas crianças me cativa todos os dias; a Pedagoga Tatiana Fagundes, que desde
o primeiro momento se mostrou completamente disposta a colaborar com a minha
pesquisa; e a querida amiga Professora Katia Vasconcellos, que de forma tão generosa
me auxiliou em cada etapa da construção deste trabalho.
A todos os alunos da Escola Municipal Anísio Teixeira, que diariamente me
fazem acreditar que nós podemos fazer a diferença.
A minha querida orientadora, que com toda a sua ternura me acolheu quando eu
mais precisei e com tanto carinho e confiança, me apresentou um novo mundo de
possibilidades.
A todos vocês, a minha imensa gratidão.
Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?
Carlos Drummond de Andrade
RESUMO
O presente trabalho monográfico tem por objetivo compreender como as práticas
leitoras exercem influência na formação de alunos leitores com expertise de
conhecimentos de mundo, e se estas práticas, sendo fomentadas ainda nas séries iniciais,
auxiliam na multiplicação desta formação. Utilizamos como referencial teórico-
metodológico a pesquisa narrativa e realizamos entrevistas/conversas com personagens
que vivenciam o cotidiano da Escola Municipal Anísio Teixeira, um projeto piloto de
educação integral em tempo integral no Município de Niterói - Rio de Janeiro. A
pesquisa desenvolve-se por meio do estudo da literatura e das pesquisas de autores
como Geraldi (2015), Lajolo (2004), Paulo Freire (1994), entre outros, alinhavando um
diálogo com as narrativas dos membros da comunidade escolar. Através de uma
abordagem qualitativa, o trabalho buscou compreender conceitos que atravessam o
campo dos estudos sobre práticas pedagógicas de leitura, letramento e narrativas.
Analisamos o conteúdo das entrevistas/conversas realizadas e percebemos que os
incentivadores/modelos de leitores influenciam na formação de alunos leitores. Também
pudemos apurar que, no contexto escolar, são indispensáveis propostas diferenciadas
que se entrelacem com o afetivo dos alunos, para que os mesmos participem de forma
ativa e desenvolvam seu lado criativo, bem como outras potencialidades nas diversas
linguagens que englobam o currículo escolar.
Palavras-Chave: Leitura, Letramento, Tempo Integral, Pesquisa Narrativa.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 8
1. O LEITOR NA CONTEMPORANEIDADE: DESAFIOS E PERSPECTIVAS ...... 11
2. O LEITOR NA CONCEPÇÃO DE TEMPO INTEGRAL ...................................... 15
2.1. PRÁTICAS DE LEITURA E LETRAMENTO NA ESCOLA MUNICIPAL
ANÍSIO TEIXEIRA .......................................................................................... 18
3. A PESQUISA NARRATIVA NO ESPAÇO ESCOLAR ......................................... 24
3.1 CAMINHOS PERCORRIDOS: PONTOS E CONTRAPONTOS DO
TRABALHO COM NARRATIVAS ................................................................. 25
3.2. LÓCUS PESQUISADO: PERCEPÇÕES DOS ATORES ENVOLVIDOS
NA FORMAÇÃO DE ALUNOS LEITORES NA ESCOLA MUNICIPAL
ANÍSIO TEIXEIRA .......................................................................................... 27
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 31
REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 34
ANEXO I – Quadros de Análise de Conteúdo Grupo A ............................................. 37
ANEXO II – Quadros de Análise de Conteúdo Grupo B ............................................ 53
ANEXO III – Quadros de Análise de Conteúdo Grupo C ........................................... 65
ANEXO IV – Quadros de Análise de Conteúdo Grupo D .......................................... 73
8
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, vários pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento
têm se interessado pela temática da leitura, principalmente a que vivenciamos na escola.
A leitura e seu ensino formal sempre estiveram inseridos no Brasil em um quadro de
“desencontro”, que se caracteriza tanto pela “inexistência” de leitores proficientes
(KLEIMAN, 2007) quanto de oportunidades efetivas de leitura. Embora muitos projetos
sociais e governamentais estejam sendo criados para reverter essa situação - cito aqui
para exemplificar o projeto de iniciativa privada da Fundação Itaú Social “Coleção Itaú
criança” e no âmbito governamental federal o Programa Nacional Biblioteca na Escola
(PNBE) - a leitura ainda não se tornou uma prática social efetiva entre os brasileiros.
Nem o advento das redes sociais, que gerou um visível aumento da interação através da
escrita, trouxe mudanças consideráveis neste sentido. A escola, como espaço
privilegiado de desenvolvimento da capacidade intelectual e linguística, tem exercido
um papel determinante no que diz respeito ao modo como os alunos desenvolvem seus
hábitos de leitura.
Dessa forma, esta pesquisa tem como eixo principal as Práticas Pedagógicas de
Leitura e Letramento, e busca verificar em que medida esta interação vem cumprindo
seu papel na formação de alunos leitores. Não apenas no sentido de decodificação de
textos literários, mas em uma concepção mais abrangente e que foge do simples ato de
decifrar e oralizar o código escrito. Lajolo (2004) afirma que devemos ler para entender
o mundo, para viver melhor, e que a leitura não pode se esgotar nos estreitos círculos da
escola.
Este “desencontro” ao qual nos referimos é citado por Silva (1995) como sendo
historicamente atribuído ao professor de Língua Portuguesa, pois vê-se nele a
responsabilidade de trabalhar a leitura como parte do ensino que lhe compete: o da
língua. No entanto, já se sabe que o conhecimento da língua é apenas uma parte do
saber necessário para a compreensão e interação do indivíduo no mundo. Os aspectos
extralinguísticos que determinam a produção de um texto são tão, ou mais, importantes
que a linguagem nele inserida. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais
(doravante PCN’s): A ideia de que se expressar com propriedade oralmente ou por escrito é “coisa para a aula de Língua Portuguesa”, enquanto as demais disciplinas se preocupam com o “conteúdo”, não encontra ressonância nas práticas sociais das diversas ciências. [...] Não é possível esperar que os textos que subsidiam
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o trabalho das diversas disciplinas sejam auto-explicativos. Sua compreensão depende necessariamente do conhecimento prévio que o leitor tiver sobre o tema e da familiaridade que tiver construído com a leitura de textos do gênero. É tarefa de todo professor, portanto, independentemente da área, ensinar, também, os procedimentos que o aluno precisa dispor para acessar os conteúdos da disciplina que estuda. (BRASIL, 1998, p. 31-32)
Diante deste quadro, tem sido possível acompanhar um número significativo de
alunos que chegam ao sexto ano do ensino fundamental sem que tenham desenvolvido,
minimamente, a competência leitora (KLEIMAN, 2007). Tal fato, tem se apresentado
como um obstáculo, não só para continuidade de suas carreiras escolares, mas também
para que possam estar no mundo de maneira autônoma.
Tem sido possível perceber, por outro lado, que alguns espaços escolares
parecem estar conseguindo alcançar os objetivos propostos em relação a leitura ainda
nas séries iniciais do ensino fundamental.
Nessa perspectiva, e buscando dialogar com as experiências vividas em sala de
aula, esta pesquisa parte da seguinte inquietação inicial: Por que muitos alunos têm
chegado ao sexto ano do ensino fundamental sem saber ler, segundo os parâmetros da
comunidade escolar e da sociedade? E para tal indagação investimos na pesquisa de
campo desenvolvida na Escola Municipal Anísio Teixeira, localizada no bairro de São
Domingos, no município de Niterói-RJ.
A escola, que foi inaugurada em março de 2014, surgiu como fruto dos estudos
de uma comissão organizada para pensar um projeto de educação integral para o
município de Niterói. Sendo, portanto, a primeira escola pública municipal de Niterói
pensada para atender alunos em horário integral. A referida comissão elaborou todo o
seu projeto pedagógico e sua matriz curricular, que é diferenciada das demais escolas da
rede.
Pensar uma proposta curricular em tempo integral implica um esforço renovado de buscar outras e quem sabe, novas alternativas para organizar os tempos, os espaços e as atividades a serem desenvolvidas no cotidiano escolar, visando proporcionar experiências variadas de aprendizagem que tenham um caráter desafiador, significativo e prazeroso. [...] Partindo da hipótese que a aprendizagem é um fenômeno social que se produz no diálogo e nas trocas entre sujeitos, evidencia-se que a efetividade da ação educativa, relaciona-se com as condições materiais e subjetivas que se estabelecem entre os sujeitos da educação com o mundo e com os outros. Diante de tal compreensão, os tempos e espaços de aprendizagem passam a ser de interação entre o estudante e as diferentes formas de comunicação, ou seja, de aproximação entre sujeito e objeto de conhecimento. (NITERÓI, 2013, p.31)
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Porém, quando a escola iniciou seu funcionamento e teve sua equipe pedagógica
formada, práticas leitoras, como experiências instituintes1, foram incorporadas no seu
cotidiano, cito aqui o “Café Literário”, as “Rodas de Leitura Simultâneas”, a criação da
disciplina “Produção Textual e Leitura” e a escolha do “Patrono da Turma”, práticas
estas que trataremos adiante.
Ao buscarmos estabelecer contato com os atores que norteiam este estudo, ou
seja, a comunidade escolar da Escola Municipal Anísio Teixeira, nos deparamos com
uma realidade diferente da que acima citamos. Outras questões surgiram: E quando as
práticas pedagógicas leitoras funcionam? Quando as iniciativas de incentivo a leitura
formam, de fato, alunos leitores ainda nas séries iniciais?
Partindo-se do tema, e das questões que surgiram, traçamos como objetivo geral:
Identificar práticas pedagógicas de leitura que formam leitores, segundo os parâmetros
da comunidade escolar e da sociedade, nas séries iniciais. De forma mais específica,
interessamo-nos por compreender de que maneira essas práticas são inseridas no
cotidiano escolar e analisar seus impactos na formação de alunos leitores.
Elegemos como metodologia para a realização da nossa pesquisa a abordagem
qualitativa, por meio da pesquisa narrativa. Considerando este o procedimento mais
apropriado para atingir nossos objetivos, em consonância com Geraldi (2015):
O uso de narrativas como método de investigação ou de pesquisa (aqui tratadas como sinônimos) decorre, em parte, da insatisfação com as produções no campo da educação que se caracterizaram por fala sobre a escola em vez de falar com ela e a partir dela. [...] Consideramos que o modo como muitas pesquisas têm caracterizado os profissionais da educação e o cotidiano da escola é distante, enviesado e diferente dos modos de compreensão e significação elaborados pelos próprios sujeitos pesquisados. (GERALDI, 2015, p. 2-3)
A pesquisa narrativa emerge como opção aos métodos tradicionais que
distanciam os pesquisadores do seu campo de pesquisa. O autor continua: Genuinamente diferentes são os sentidos produzidos pelas pesquisas em que os próprios sujeitos são autores e coautores das narrativas. Em outras palavras, pesquisar sobre os professores e pesquisar com os professores ou
1 Segundo Linhares e Heckert (2009): “[...] as experiências instituintes são ações políticas, produzidas historicamente, que se endereçam para uma outra educação e uma outra cultura, marcadas pela construção permanente de um respeito à vida e uma dignificação permanente do humano em sua pluralidade ética, numa afirmação intransigente da igualdade humana, em suas dimensões educacionais e escolares, políticas, econômicas, sociais e culturais.”
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pesquisar na escola e com a escola, resultam em estudos diversos. [...] A aproximação entre pesquisador e pesquisado, longe de ser um mecanismo de “contaminação” da pesquisa, significa a possibilidade de construção de outras compreensões acerca das nossas experiências. (GERALDI, 2015, p. 3)
Para tanto, utilizamos pesquisa documental, entrevista/conversa, observação do
lócus pesquisado e diálogo com teóricos da área da leitura e letramento, tais como
Senna (2007), Lajolo (2004), Silva (1995), Freire (1994), entre outros que pesquisam e
discutem esta área com pesquisas já consolidadas, apresentando ao final nossas
percepções acerca do trabalho realizado.
1. O LEITOR NA CONTEMPORANEIDADE: DESAFIOS E PERSPECTIVAS
Segundo Jair Ferreira dos Santos (1986) o “pós-modernismo é o nome aplicado
às mudanças ocorridas nas ciências, nas artes e nas sociedades avançadas desde 1950,
quando, por convenção, se encerra o modernismo (1900-1950)” (SANTOS, 1986, p.7).
Perry Anderson (1999) lembra-nos que o termo pós-modernidade, já usado
anteriormente no mundo das artes, teve sua primeira abordagem filosófica quando Jean
François Lyotard publicou, em 1979, sua obra “A condição pós-moderna”.
A chegada da pós-modernidade está ligada ao surgimento das sociedades pós-
industriais baseadas na informação, nas quais o conhecimento tornara-se a principal
força econômica de produção. Dentre outras coisas, Lyotard (1979) afirma que a ciência
já não podia reivindicar o privilégio sobre outras formas de conhecimento que
pretendera ter nos tempos modernos quando, com sua pretensão de verdade absoluta em
relação ao conhecimento comum, escondia sua base em duas grandes narrativas:
[...] a primeira, herdada da Revolução Francesa, que colocava a humanidade como agente histórico de sua própria libertação por meio do avanço do conhecimento e, a segunda, descendente do idealismo alemão que via o espírito como progressiva revelação da verdade. (SANFELICE, 2003 p. 3-4)
Estes seriam, segundo Lyotard (1985), os mitos justificadores da modernidade.
A perda da credibilidade dessas narrativas tornou-se um traço definidor da
condição pós-moderna, uma vez que a ciência atrelou-se ao capital, ao Estado e a
verdade ficou reduzida ao desempenho e à eficiência. A ciência e a educação passaram
a ser essenciais para a realização do livre pensamento, tendo em vista que substituíram o
dogma pelo conhecimento.
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Nos anos de 1980, uma profunda mudança da conjuntura mundial ocorreu, onde
a euforia do capitalismo triunfante e a ofensiva ideológica de direita culminaram no
colapso do bloco soviético. O que impôs o neoliberalismo, a vitória global do mercado.
Outro autor que teve sua obra dedicada a pós-modernidade e nos trouxe uma
perspectiva crítica sobre o modelo de sociedade que surgiu após o desfecho do projeto
de modernidade foi Fredric Jameson. Em sua obra, Jameson relaciona cultura e a
economia na contemporaneidade e apresenta reflexões significativas e que dialogam
com as principais teorias que buscam compreender o atual momento histórico.
A primeira conferência de Jameson sobre pós-modernidade foi em 1982 e o
tornou referência na área. Em seu discurso podemos citar cinco itens definitivos:
a) O mais fundamental – a ancoragem do pós-modernismo em alterações objetivas da ordem econômica do próprio capital. A pós-modernidade entendida como sinal cultural de um novo estágio na história do modo de produção reinante; (assinala-se a explosão tecnológica da eletrônica moderna e seu papel como principal fonte de lucro e inovação; o predomínio empresarial das corporações multinacionais, deslocando as operações industriais para países distantes com salários baixos; o imenso crescimento da especulação internacional; a ascensão dos conglomerados de comunicação com um poder sem precedentes sobre toda a mídia e ultrapassando fronteiras. Tudo foi afetado por estes fenômenos). b) Quais foram as consequências dessa mudança no mundo objetivo para a experiência do sujeito? Entre os traços da nova subjetividade está a perda de qualquer senso ativo de história, seja como esperança, seja como memória. É um perpétuo presente que na era do satélite e da fibra ótica impões o espacial dominando o imaginário. A terra está unificada eletronicamente e institui-se a simultaneidade de eventos mundo afora como espetáculo diário, instalando-se uma geografia substituta nas consciências, enquanto as redes circundantes de capital multinacional, as quais efetivamente dirigem o sistema, ultrapassam a capacidade de qualquer percepção. Mas o sujeito é uma superficialidade, inseguro, debilitantemente acidentado, marcado por depressões e mudanças de humor, impedido de historicidade. As polaridades típicas do sujeito vão da exaltação da ‘corrida às mercadorias’, do eufórico entusiasmo do espectador ou consumidor, para a depressão no vazio niilista mais profundo do nosso ser, como prisioneiros de uma ordem que resite a qualquer outro controle ou significado. c) O pós-moderno expandiu-se praticamente a todas as artes e em grande parte do discurso sobre elas (é uma revolução de formas, de conteúdos e de quebras de limites). d) Quais eram as bases sociais e o padrão geopolítico do pós-modernismo? O capitalismo avançado continuava sendo uma sociedade de classes, mas nenhuma classe dentro do sistema era exatamente a mesma de antes. Em escala mundial – na era pós-moderna -, nenhuma estrutura estável de classe comparável à do capitalismo anterior cristalizou-se ainda. e) O lance final: qual é a atitude adequada a pós-modernidade? Lamentar-se porque seria uma corrupção do moderno? Celebrá-la como uma emancipação? Ou evitar uma postura moralista? A cumplicidade da pós-modernidade com uma lógica do mercado e do espetáculo é inequívoca. Mas a sua simples condenação é inútil. A questão não é ética, mas de juízos complexos e ambivalentes de uma perspectiva mais propriamente política e dialética. Uma crítica autêntica da pós-modernidade não poder ser uma recusa ideológica da mesma. Ao contrário, a tarefa dialética seria abrir caminho por meio dela, de forma tão completa que nosso entendimento da época emergisse transformado. Uma compreensão totalizante do novo
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capitalismo ilimitado – teoria adequada à escala global de suas conexões e disjunções – continua sendo o irrenunciável projeto marxista. (SANFELICE, 2003, p. 5-7)
Assim como SANFELICE (2003), as considerações acima são suficientes para
os nossos propósitos no momento. Pois “o que nos interessa é o quadro que ele delineia
para a denominada pós-modernidade” (SANFELICE, 2003, p.7).
Pós-modernidade, para nós, portanto, é um fenômeno que expressa uma cultura
da globalização e de sua ideologia neoliberal.
A base material da pós-modernidade é então a globalização econômica com todas as implicações que este fenômeno vem significando para as sociedades ou sujeitos, como já dito, subjetivamente desprovidos de qualquer senso ativo de história. Impõem-se, como se fossem absolutos e daqui em diante eternizados, a pós-modernidade, a globalização, a lógica de mercado e o neoliberalismo que, apesar das posturas pós-modernas, é a sua própria grande narrativa. (SANFELICE, 2003, p. 7)
Se pós-modernidade, globalização, a lógica de mercado e o neoliberalismo se
imbricam, de que modo podemos relacionar as faces deste fenômeno com a educação?
No discurso neoliberal a educação deixa de ser parte do campo social e político
para ingressar no mercado e funcionar a sua semelhança. Passa a cumprir as exigências
daqueles que acreditam em um viés mercadológico da educação, onde a prioridade não
é formar cidadãos conscientes de seu papel na sociedade e sim formar um mercado de
reserva que responda às necessidades dos grandes capitalistas.
As palavras de ordem do discurso neoliberal para a educação, segundo Sonia
Alem Marrach em seu artigo “Neoliberalismo e Educação”, de 1996, são:
Qualidade total, modernização da escola, adequação do ensino à competitividade do mercado internacional, nova vocacionalização, incorporação das técnicas e linguagens da informática e da comunicação, abertura da universidade aos financiamentos empresariais, pesquisas práticas, utilitárias, produtividade [...]. (MARRACH, 1996, p.1)
Marrach (1996) atribui à retórica neoliberal um papel estratégico à educação, e
esta, segundo a autora, determina-lhe basicamente três objetivos:
1) Atrelar a educação escolar à preparação para o trabalho e a pesquisa acadêmica ao imperativo do mercado ou às necessidades da livre iniciativa. Assegura que mundo empresarial tem interesse na educação porque deseja uma força de trabalho qualificada, apta para a competição no mercado nacional e internacional. Fala em nova vocacionalização, isto é, numa profissionalização situada no interior de uma formação geral, na qual a aquisição de técnica e linguagens de informática e conhecimento de matemática e ciência adquirem relevância. Valoriza as técnicas de organização, o raciocínio de dimensão estratégica e a capacidade de trabalho
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cooperativo. [...] 2) Tornar a escola um meio de transmissão dos seus princípios doutrinários. O que está em questão é a adequação da escola à ideologia dominante. Esta precisa sustentar-se também no plano das visões do mundo, por isso, a hegemonia passa pela construção da realidade simbólica. Em nossa sociedade a função de construir a realidade simbólica é, em grande parte, preenchida pelos meios de comunicação de massa, mas a escola tem um papel importante na difusão da ideologia oficial. O problema para os neoliberais é que nas universidades e nas escolas, durante as últimas décadas, o pensamento dominante, ou especular, conforme Alfredo Bosi, tem convivido com o pensamento crítico nas diversas áreas do conhecimento e nas diversas práticas pedagógicas dialógicas, alternativas. Nesse quadro, fazer da universidade e da escola veículos de transmissão do credo neoliberal pressupõe um reforço do controle para enquadrar a escola a fim de que cumpra mais eficazmente, sua função de reprodutora da ideologia dominante. 3) Fazer da escola um mercado para os produtos da indústria cultural e da informática, mas é contraditório porque, enquanto, no discurso, os neoliberais condenam a participação direta do Estado no financiamento da educação, na prática, não hesitam em aproveitar os subsídios estatais para divulgar seus produtos didáticos e paradidáticos no mercado escolar. (MARRACH, 1996, p. 4-5)
Teorias baseadas nesses princípios tiveram grande impacto sobre políticas e
práticas educacionais. Restringindo-se ao treinamento do trabalhador e evitando a
formação do cidadão – sempre sob uma perspectiva tecnocrática - a eficácia destas
propostas foi medíocre.
O crescimento da demanda de educação pública, especialmente de 1º e 2º graus, criou as condições que estimulam e legitimam concepções industrialistas de educação, baseadas em teorias econômicas: a democratização do acesso à educação, por analogia aos conceitos de produção industrial de massa, mercado de consumo de massa e economia de escala, passa a ser vista como educação de massa voltada para o mercado de trabalho. As atuais contestações desse paradigma, ainda bastante dominante, agrupadas nos conceitos de ‘neofordismo e pósfordismo’, propõem para a educação as mesmas mudanças que estão acontecendo no mundo da economia e do trabalho, consequências da globalização econômica e do avanço tecnológico sem precedentes que obriga as empresas a se adaptarem: flexibilização (currículos e métodos), descentralização (inter e multiculturalidades), maior responsabilização do trabalhador melhor habilitado". (BELLONI, 1998, p.12)
A escola é agora apenas mais uma entre as muitas agências especializadas na
produção e na disseminação da cultura. Em concorrência com as diferentes mídias, a
escola tende a perder terreno e prestígio no processo mais geral de transmissão da
cultura.
“Se o ambiente pós-moderno é dominado pela tecnociência aplicada à
informação e à comunicação” (SANTOS, 1986, p. 14), a educação é chamada a
priorizar o domínio de certas habilidades a ela relacionadas e, os que não possuem as
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habilidades para tratar a informação, ou não têm os conhecimentos que a rede valoriza,
ficam totalmente excluídos.
Neste momento sócio-político-econômico, a escola vive uma lógica de mercado
que não se mostra neutra. Ensinar o aluno a ler e escrever é uma opção política e
ideológica, assim como a forma que o profissional elege para o seu fazer pedagógico.
As crianças não vão para a escola simplesmente para aprender a ler e a escrever, a
escolarização acontece como um instrumento de inserção mínima na sociedade atual.
Dessa forma, concordamos com Senna (1999), “Sendo a linguagem a faculdade
de atribuição de juízos a conhecimentos, a leitura é a habilidade – derivada da
linguagem – através da qual o indivíduo aplica seus juízos para compreender a
experiência” (SENNA, 1999, p. 28).
A convivência do homem com o mundo, a partir da leitura por ele realizada –
uma leitura escolarizada - traz ênfase ao papel do letramento como um canal que leva à
cidadania plena. A busca por escolarização é, na verdade, a busca por uma legitimação.
Pois a escolarização permite a inserção do indivíduo na sociedade de forma não
marginal.
Entendemos então que ler não é simplesmente decifrar palavras. Logo, torna-se
necessário perceber a leitura como um processo ativo de construção mental e de
inserção no todo social no qual vivemos e tecemos relações e significados. Sob esta
perspectiva, concordamos também com Lajolo (2004) quando esta afirma:
[...] lê-se para entender o mundo, para viver melhor. Em nossa cultura, quanto mais abrangente a concepção de mundo e de vida, mais intensamente se lê, numa espiral quase sem fim, que pode e deve começar na escola, mas não pode (nem costuma) encerrar-se nela. (LAJOLO, 2004, p.7)
E, com esse entendimento, apresentamos a seguir a proposta pedagógica
diferenciada que se posiciona na contramão do movimento instituído2, para a vivência de novas práticas. 2. O LEITOR NA CONCEPÇÃO DE TEMPO INTEGRAL
2 Segundo Linhares e Heckert (2009): “As experiências instituintes não se encontram sob nenhum tipo de redoma que as pudessem separar do que já está instituído. Pelo contrário. Umas e outras estão sempre juntas e em litígios, buscando expandir-se, ou seja, penetrar no espaço e tempo histórico. Se as experiências instituintes procuram desdobrar-se em movimentos criadores e estremecer o que foi organizado pela história, o instituído também procura incorporar o que ainda está se processando, buscando institucionalizar, normatizar o instituinte”.
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As demandas pela melhoria da qualidade da educação estão cada vez mais
presentes no cotidiano da história da educação brasileira. Muitas iniciativas surgem
neste cenário, e uma das pioneiras, que emergiu no país no início dos anos 1930, é a
proposta de Educação em Tempo Integral, sob a orientação do educador Anísio
Teixeira.
Existem muitas definições e entendimentos diferentes sobre educação integral e
educação em tempo integral.
A compreensão do tempo é uma busca constante do indivíduo e da sociedade.
Pesquisando, encontraremos definições das mais simples às mais complexas. Segundo
Arco-Verde (2013):
O tempo como faculdade de sínteses, é uma construção social e humana que deve ser aprendida e interiorizada. Os diferentes tempos sociais e os ritmos da vida cotidiana constituem o contexto que determina esta aprendizagem. Um destes tempos sociais, nem sempre de acordo com outros, é o tempo escolar. (ARCO-VERDE, 2013, p. 145)
Neste sentido, verificamos o tempo escolar integral como o que busca, através
da ampliação da jornada escolar, oferecer a oportunidade do desenvolvimento pleno do
indivíduo no espaço escolar, fazendo uso de atividades diversas que atinjam áreas
variadas desta formação.
A educação integral está relacionada diretamente com matrizes ideológicas em
diferentes conjunturas organizacionais. Coelho (2009) elucida que:
Se empreendermos uma pesquisa sobre o tema educação integral, verificamos que ela possui amplitude histórica e teórico-conceitual que precisa ser resgatada sob pena de empreendermos de forma bastante abrangente e, consequentemente pouco precisa. (COELHO, 2009, p. 84)
Wallerstein (2002) atenta para o fato da coexistência de três grandes correntes
político-ideológicas ao longo do século XIX. Sendo estas: o conservadorismo, o
socialismo e o liberalismo.
Dentre estas correntes que vislumbram cada qual uma intenção formativa desta
natureza humana, destacamos a visão de educação integral reforçada por Coelho (2009):
Acreditamos que esse modelo de ver e perceber a formação do homem corresponde à natureza do que denominamos de educação integral: uma perspectiva que não hierarquiza experiências, saberes, conhecimentos. Ao contrário, coloca-os como complementares e fundadas radicalmente no social. (COELHO, 2009, p.85)
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De acordo com o atual Plano Nacional de Educação - Lei n° 13.005 de 25 de
junho de 2014 (doravante PNE 2014-2024), a meta n° 6 e suas estratégias encontram-se
assim definidas:
Meta 6: oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, cinquenta por cento das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, vinte e cinco por cento dos(as) alunos(as) da educação básica. Estratégias: 6.1. promover, com o apoio da União, a oferta de educação básica pública em tempo integral, por meio de atividades de acompanhamento pedagógico e multidisciplinares, inclusive culturais e esportivas, de forma que o tempo de permanência dos(as) alunos(as) na escola, ou sob sua responsabilidade, passe a ser igual ou superior a sete horas diárias durante todo o ano letivo, com a ampliação progressiva da jornada de professores em uma única escola; 6.2. instituir, em regime de colaboração, programa de construção de escolas com padrão arquitetônico e de mobiliário adequado para atendimento em tempo integral, prioritariamente em comunidades pobres ou com crianças em situação de vulnerabilidade social; 6.3. institucionalizar e manter, em regime de colaboração, programa nacional de ampliação e reestruturação das escolas públicas, por meio da instalação de quadras poliesportivas, laboratórios, inclusive de informática, espaços para atividades culturais, bibliotecas, auditórios, cozinhas, refeitórios, banheiros e outros equipamentos, bem como da produção de material didático e da formação de recursos humanos para a educação em tempo integral; 6.4. fomentar a articulação da escola com os diferentes espaços educativos, culturais e esportivos e com equipamentos públicos, como centros comunitários, bibliotecas, praças, parques, museus, teatros, cinemas e planetários; 6.5. estimular a oferta de atividades voltadas à ampliação da jornada escolar de alunos(as) matriculados nas escolas da rede pública de educação básica por parte das entidades privadas de serviço social vinculadas ao sistema sindical, de forma concomitante e em articulação com a rede pública de ensino; 6.6. orientar a aplicação da gratuidade de que trata o art. 13 da Lei nº 12.101, de 27 de novembro de 2009, em atividades de ampliação da jornada escolar de alunos(as) das escolas da rede pública de educação básica, de forma concomitante e em articulação com a rede pública de ensino; 6.7. atender às escolas do campo e de comunidades indígenas e quilombolas na oferta de educação em tempo integral, com base em consulta prévia e informada, considerando-se as peculiaridades locais; 6.8. garantir a educação em tempo integral para pessoas com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação na faixa etária de quatro a dezessete anos, assegurando atendimento educacional especializado complementar e suplementar ofertado em salas de recursos multifuncionais da própria escola ou em instituições especializadas; 6.9. adotar medidas para otimizar o tempo de permanência dos alunos na escola, direcionando a expansão da jornada para o efetivo trabalho escolar, combinado com atividades recreativas, esportivas e culturais. (BRASIL, 2014, p. 59-61)
Percebemos na legislação um movimento caracterizado especialmente para a
criação de programas nos diferentes âmbitos (federal, estadual e municipal), que
atendam ao aumento do tempo de permanência deste aluno, visando sua proteção social,
com estratégias de aprendizagem em áreas além das já trabalhadas na grade das escolas
parciais. Desenvolver não só habilidades de leitura e escrita, mas, um conhecimento
cultural e artístico.
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2.1. PRÁTICAS DE LEITURA E LETRAMENTO NA ESCOLA MUNICIPAL ANÍSIO TEIXEIRA
Nosso estudo se apresenta em consonância com a proposta da Secretaria
Municipal de Educação, Ciência e Tecnologia e a Fundação Municipal de Educação de
Niterói que instituíram, em 16 de fevereiro de 2013, a Portaria nº 01/2013, que
constituiu a Comissão Especial “Professor Dácio Tavares Lôbo Júnior”. A Comissão foi
implantada com a finalidade de elaborar a proposta pedagógica do Ensino Fundamental
em tempo integral na Rede Municipal de Educação de Niterói. Nesta direção, se funda
nossa análise, na busca de compreender os esforços que se efetivaram para a construção
e implementação de uma escola diferenciada das demais que compõe esta rede.
Assim, em 10 de março de 2014, é inaugurada uma escola fruto do relatório da
referida Comissão. Fruto também de uma negociação de quase nove anos entre
Governo do Estado do Rio de Janeiro e Prefeitura Municipal de Niterói para a cessão
do espaço físico com a contrapartida de que a Prefeitura assumiria a primeira etapa do
Ensino Fundamental (1º e 2º ciclos). Após esse período o espaço que antes se chamava
Escola Estadual Professor Ismael Coutinho foi municipalizado e deu lugar a Escola
Municipal Anísio Teixeira (doravante EMAT).
A escola está localizada no bairro de São Domingos e funciona em horário
integral, de segunda a sexta-feira, das 08 horas às 17 horas (com exceção das quartas-
feiras, onde o horário de saída acontece às 15 horas)3 e atende os 1° e 2° ciclos do
Ensino Fundamental.
Em seu quadro profissional, conta com uma equipe gestora, denominada nesta
rede de ensino por Equipe de Articulação Pedagógica (EAP). Atuam na escola os
docentes – sob regime estatutário e de contrato – que podem exercer sua função como
Professor Regente, Professor de Apoio Especializado, Professor Articulador e Professor
de Disciplinas Específicas. Além da Equipe de Apoio, que conta com os Merendeiros,
Agentes (de portaria, de administração educacional e de coordenação de turno) e
Auxiliares de Serviços Gerais (Garis da Companhia de Limpeza de Niterói – CLIN
atuam na Unidade Escolar).
Pedagogicamente, a escola foi organizada em salas base e salas ambiente, por
onde os Grupos de Referência (doravante GR) circulam vivendo assim proposições 3 Em toda Rede Municipal de Educação de Niterói acontece às quartas-feiras a reunião de planejamento coletivo dos professores. No caso da EMAT, a reunião acontece das 15 horas às 17 horas.
19
variadas. São 9 (nove) salas de aula que atendem, no ano de 2015, 206 (duzentos e seis)
alunos divididos em 8 (oito) turmas, são elas:
Grupo de Referência Ano de Escolaridade
GR1A 1° ano do 1° ciclo do Ensino Fundamental GR2A 2° ano do 1° ciclo do Ensino Fundamental GR2B 2° ano do 1° ciclo do Ensino Fundamental GR2C 2° ano do 1° ciclo do Ensino Fundamental GR2D 2° ano do 1° ciclo do Ensino Fundamental GR3A 3° ano do 1° ciclo do Ensino Fundamental GR4A 4° ano do 2° ciclo do Ensino Fundamental GR5A 5° ano do 2° ciclo do Ensino Fundamental
As salas de aulas são organizadas da seguinte forma:
Sala Proposta Turma
SALA 1 Sala de Artes Plásticas Todos os GR SALA 2 Sala Base GR1A e GR2C SALA 3 Sala Base GR2B e GR2D SALA 4 Sala de Leitura Todos os GR SALA 5 Sala de Ciências e Matemática Todos os GR SALA 6 Sala de Francês e Música Todos os GR SALA 7 Sala Base GR2A e GR3A SALA 8 Sala de Artes Cênicas e Arte Livre Todos os GR SALA 9 Sala Base GR4A e GR5A
Além disso, a unidade conta com sala de informática, pátio coberto, quadra de
esportes coberta e jardim.
O ingresso dos alunos para as classes oferecidas pela EMAT é feito por meio de
matrícula (em período estipulado pela própria Fundação Municipal de Educação), não
sendo pré-determinada por nenhum órgão ou pessoa qualquer exigência ou critério que
impeça o acesso de determinado aluno na instituição. Isso permite que uma clientela
bastante heterogênea ingresse na escola, o que garante a riqueza da diversidade do corpo
discente. Um dos fatores percebidos como positivos em nossa observação é justamente
a variedade na composição sócio econômico e cultural da escola, que, desde sua
inauguração, já atendeu alunos de outras nacionalidades, tais como: americana,
moçambicana, argentina, indiana, cubana. Tal fato proporciona uma excelente relação
de constante aprendizado sobre o outro e sua origem. Nesse aspecto, o trabalho com
alunos com necessidades especiais é bem efetivo, integrando estes alunos ao cotidiano
20
de sua turma de origem e tecendo relações com todos os alunos da escola onde todos
têm dificuldades e todos têm potencialidades.
A escola inicia sua história com uma proposta pedagógica e matriz curricular
elaboradas pelos membros da Comissão Especial “Professor Dácio Tavares Lôbo
Júnior”, sendo assim diferenciada das demais escolas da Rede Municipal de Educação,
pois foi a primeira escola pública municipal de Niterói pensada para atender alunos em
tempo integral.
O educador Anísio Teixeira (1994) nos diz: [...] não se pode conseguir essa formação em uma escola por sessões, com os curtos períodos letivos que hoje tem a escola brasileira. Precisamos restituir-lhe o dia integral, enriquecer-lhe o programa com atividades práticas, dar-lhe amplas oportunidades de formação de hábitos de vida real, organizando a escola como miniatura da comunidade, com toda a gama de suas atividades de trabalho, de estudo, de recreação e de arte. (TEIXEIRA, 1994, p. 63)
Apoiados na citação acima, a equipe elegeu como prioridade enfatizar a
formação integral do aluno para além da jornada estendida em número de horas.
Objetivou-se a criação de um currículo integral que ampliasse as, até então, atuais
quatro horas diárias de efetivo trabalho escolar. Ampliando este tempo e incorporando
um conjunto de atividades de aprendizagem que articulassem de maneira
interdisciplinar os diferentes campos das ciências, das artes, das tecnologias, do lúdico e
do esporte mediatizados pela linguagem verbal e não verbal.
Apresentamos a seguir, o quadro que a unidade estudada seguiu inicialmente
como Matriz Curricular referencial das atividades desenvolvidas.
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O currículo da EMAT está organizado a partir dos eixos de Estudo e Pesquisa,
conforme a Matriz Curricular acima:
● Base Nacional Comum4: atividades integradas (Língua Portuguesa, Matemática,
Ciências, Geografia e História); consolidação das aprendizagens; educação física
e arte, dividida em: música e arte plástica;
● Parte Diversificada: educação, saúde e meio ambiente; direitos humanos e
cidadania; mídias e novas tecnologias; corpo e movimento e língua estrangeira
(francês).
Na Base Nacional Comum são priorizados os domínios de diferentes linguagens e
formas de expressão (verbal e não verbal), articulando-as às questões da diversidade
cultural e cidadã. Os conteúdos curriculares dessa base, na perspectiva do currículo para
Escola de Cidadania e de Diversidade Cultural, ajudam o aluno a ampliar suas
capacidades de comunicação e expressão, por meio de práticas criativas e usos de
diferentes linguagens, tais como: oral, artística, corporal, de leitura e escrita. Da mesma
forma possibilita a construção de conhecimentos, práticas e valores socioculturais
determinantes para a formação de uma identidade aberta à valorização da pluralidade
cultural.
Na parte diversificada do currículo são priorizadas questões relativas ao espaço e
ao tempo, articulados aos aspectos econômicos, políticos e socioculturais. Os conteúdos
curriculares da parte diversificada referem-se às relações que o aluno estabelece com o
mundo, procurando conviver com a diversidade, respeitando e valorizando as
diferenças. Nesse sentido, destaca-se o conhecimento de si mesmo, enfatizando sua
vivência cidadã, as relações interpessoais e as formas de intervenção no meio físico e
social. Os conteúdos curriculares desse eixo ajudam o aluno com o cuidado do corpo e
da saúde, além de levá-los a analisarem as relações existentes entre os seres humanos e
os seres vivos e entre estes e o ambiente. Ajudam, ainda, no reconhecimento e utilização
das mídias e das novas tecnologias considerando o contexto da sociedade atual, bem
como o contato com uma língua estrangeira que amplia e cria a possibilidade de
4 Esta nomenclatura corrobora com as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN’s, não fazendo parte da discussão atual sobre Base Nacional Comum Curricular.
22
perceber outras culturas e línguas. Nesse eixo, pretende-se contribuir para a formação da
identidade do aluno no contato com a pluralidade cultural, revelada em formas
diferenciadas de origem e aproveitamento dos conhecimentos científicos possibilitados
por exploração de situações problema, ainda que, precisando de apoio de materiais
concretos para que, de forma progressiva, realizem abstrações e desenvolvam o
raciocínio lógico e científico.
Entretanto, com o passar do primeiro ano de funcionamento da Unidade Escolar
a equipe de profissionais da EMAT entendeu como necessária uma reformulação na
Matriz até então adotada, em caráter experimental. O ambiente do cotidiano escolar
apresentou questões que fugiram a proposta inicial. Demonstrando assim a flexibilidade
da organização tanto da escola, como da proposta curricular, sempre com o cuidado de
chegar-se a uma continuidade da visão original da proposta, surge a necessidade de um
novo olhar. Segundo Freire (1992): “Não podemos duvidar que a nossa prática nos
ensina. Não podemos duvidar de que conhecemos muitas coisas por causa de nossa
prática.” (FREIRE, 1992, p. 71)
Assim foi constituída a Matriz Curricular adotada atualmente, que propõe uma
nova organização e passou a ser adotada pela Unidade Escolar no segundo semestre do
ano de 2015.
23
Uma das mudanças que a equipe pedagógica propôs foi a divisão dos grupos de
referência durante as aulas de disciplinas específicas (francês, música e arte plástica).
Enquanto parte da turma está nas aulas de disciplinas específicas, o outro grupo está na
Sala de Leitura com a professora da disciplina Produção Textual e Leitura. Os grupos
foram divididos pelas professoras regentes e não houve um critério preestabelecido pela
equipe pedagógica na separação dos grupos, como o desempenho dos alunos, por
exemplo.
A disciplina Produção Textual e Leitura foi um componente curricular que
passou a constar nesta nova matriz. A partir desse componente foi possível dedicar um
tempo específico em grupos menores para que os alunos pudessem desenvolver suas
competências de leitura e escrita.
A Unidade Escolar conta ainda com diferentes experiências instituintes que
visam valorizar e incentivar as práticas leitoras. Tais como o “Café Literário”, que
acontece às quartas-feiras durante o horário de café da manhã dos alunos. Sempre de
forma voluntária, um funcionário da escola, ou até mesmo um aluno, conta uma história
enquanto as crianças realizam a primeira refeição do dia. A escola sugere uma
abordagem lúdica e na maioria das vezes o “contador” está caracterizado como um dos
personagens.
Outra prática inclusa na rotina escolar na modalidade “atividade permanente”
são as “Rodas de Leitura Simultâneas”, o projeto acontece uma vez ao mês (sempre na
última quarta-feira, nesta data não acontece o café literário), e mais uma vez conta com
a participação voluntária dos funcionários da EMAT – é interessante destacar a presença
de funcionários da equipe de apoio no projeto, tais como merendeiros, auxiliares de
serviço gerais, coordenadores de turno e funcionários da secretaria. O projeto funciona
da seguinte forma: Cada funcionário escolhe um livro para contar e faz uma resenha do
mesmo. Esta resenha é entregue a equipe pedagógica que formata todas as resenhas de
forma igual e monta um mural com os títulos, imagens e resenhas de cada livro. Os
professores regentes então levam seus alunos ao mural e cada um deles escolhe a
história que quer ouvir, destacando que não há assinatura nas resenhas, portanto os
alunos não sabem quem será o “contador”. Eles podem usar como critério de escolha o
título, a resenha ou até mesmo a imagem. Após realizada a escolha, na data e horário
determinados, reúnem-se todos os alunos e contadores no pátio da Unidade Escolar, e é
feita a revelação, para as alunos, de quem contará a história, e para os contadores, de
quem escolheu a sua história. Os grupos são distribuídos pelos espaços da escola e
24
acontece a roda de leitura. A escola sugere que ao final da roda de leitura seja realizada
uma proposta de atividade. As atividades ficam expostas na Unidade Escolar, onde
todos, inclusive a comunidade, tenham acesso.
Ressaltamos ainda, como experiências de incentivo as práticas leitoras, a escolha
do “Patrono da Turma”. No início do ano letivo, cada GR faz a escolha de um autor
para ser eleito o Patrono da Turma. Ele dará nome ao GR e terá sua biografia e obra
trabalhadas durante todo o ano letivo. Ao final do ano é realizado um grande Sarau,
aberto a toda comunidade escolar, onde cada GR apresenta o seu autor e o que
trabalharam sobre ele. A mostra dos trabalhos traz uma proposta interdisciplinar, pois
abrange diversas formas de apresentação.
Lajolo (2004) nos diz que:
Do mundo da leitura à leitura do mundo, o trajeto se cumpre sempre, refazendo-se, inclusive, por um vice-versa que transforma a leitura em prática circular e infinita. Como fonte de prazer e de sabedoria, a leitura não esgota seu poder de sedução nos estreitos círculos da escola. (LAJOLO, 2004, p. 7)
Ao analisar as práticas diferenciadas da unidade escolar em questão percebemos
a busca por uma formação integral do aluno - dando-lhe oportunidade de acesso ao
mundo da leitura e consequentemente ao seu despertar consciente para sua existência
nesse mundo, estimulando sua vocação cidadã; registramos que tais iniciativas são
experienciais, não sendo necessários aparatos tecnológicos caros e que se tornem
empecilhos a tais construções pedagógicas.
3. A PESQUISA NARRATIVA NO ESPAÇO ESCOLAR
Elegemos como metodologia para a realização da nossa pesquisa a abordagem
qualitativa, por meio da pesquisa narrativa. Pois quando estabelecemos que os
parâmetros da pesquisa qualitativa seriam aqueles que responderiam melhor aos
objetivos propostos anteriormente, definimos, também, que as narrativas seriam a
principal matéria prima deste trabalho.
Nos últimos vinte anos, essa abordagem vem sendo bastante difundido e
utilizado na formação docente e na pesquisa. Pesquisadores como Nóvoa (1992),
Geraldi (2015), entre outros, vem se dedicando à produção de trabalhos nesta
perspectiva.
25
A nova atenção concedida às abordagens (auto) biográficas no campo científico é a expressão de um movimento social mais amplo, bem patente na produção literária e artística. Encontramo-nos perante uma mutação cultural que pouco a pouco faz reaparecer os sujeitos face às estruturas e aos sistemas, a qualidade face à quantidade, a vivência face ao instituído (NÓVOA, 1992, apud VASCONCELLOS, p.293)
A utilização das narrativas como referencial teórico-metodológico, se mostra
como um caminho favorável para a compreensão da história e da memória dos sujeitos
envolvidos. Pois como Telles (1999) afirma, a pesquisa narrativa:
[...] vem estabelecendo seu lugar como forma emancipadora de pesquisa em educação ao fornecer o contexto necessário para que os professores se tornem, ao mesmo tempo, agenciadores de suas reflexões e autores de suas próprias representações [...]. (TELLES, 1999, p. 81)
Geraldi (2015) destaca que a separação entre professor e pesquisador acadêmico
traz um distanciamento para os sentidos. Onde “pesquisar sobre os professores e
pesquisar com os professores ou pesquisar na escola e com a escola, resultam em
estudos diversos”. (GERALDI, 2015, p. 3).
Utilizar a pesquisa narrativa como uma alternativa para lidar com tais questões,
possibilita explicitar que os interesses epistemológicos do trabalho estão voltados para
os saberes da experiência, e corroborando com o que defende Geraldi (2015),
afirmamos que esses saberes devem ser resgatados e postos em diálogo com o
conhecimento científico.
Conhecimentos socialmente produzidos – de que o conhecimento chamado “científico” é apenas uma parte – têm sido desperdiçados ou têm circulação restrita porque são considerados de segunda ordem. (GERALDI, 2015, p. 4)
Desse modo, afirmamos a contribuição deste recurso metodológico para a
pesquisa, posto que as narrativas dos membros da comunidade escolar da EMAT
permitiram um mergulho mais profundo no cotidiano da escola, no intuito de perceber
os movimentos instituintes através da partilha de experiências entre os atores da
pesquisa.
3.1. CAMINHOS PERCORRIDOS: PONTOS E CONTRAPONTOS DO TRABALHO COM NARRATIVAS
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A escolha dos sujeitos da pesquisa foi feita majoritariamente a partir de critérios
de dimensão afetiva. Por também fazer parte da comunidade escolar da EMAT, estive,
durante a realização da pesquisa, cercada de pessoas que me são muito queridas.
Portanto, não houve espaço para a neutralidade na realização das entrevistas/conversas,
pois estou, no meu cotidiano, inteiramente inserida no campo de pesquisa. Entretanto,
com a metodologia escolhida, seguimos o rigor acadêmico exigido para a realização
deste trabalho monográfico, não influenciando as respostas aqui retratadas.
Ao propor as entrevistas/conversas e, tendo sido prontamente atendida por todos
aqueles aos quais busquei para apresentar as etapas da pesquisa, inclusive pelos alunos e
responsáveis – a fim de lhes colocar a par do trabalho e receber dos mesmos a
autorização e preenchimento do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, obtive
total receptividade e apoio quanto a realização do trabalho.
O tempo foi determinante para a escolha do número de participantes, pois o
desejo ainda é o de contar as histórias dos nossos 53 funcionários, 206 alunos e um
número próximo a este de responsáveis. Considerando o tempo hábil para a realização
do trabalho e buscando um corpo de entrevistados que, neste momento, atendesse aos
interesses da pesquisa, definimos que a pesquisa contaria com sete personagens que
representariam os membros da comunidade escolar da EMAT. São estes5:
Grupo Membros Representantes
A Professores Katia e Renata
B Funcionários Mara e Tatiana
C Alunos Paula e João6
D Responsáveis Etiene
A escolha das professoras Katia e Renata se fez em virtude das funções que as
mesmas exercem na EMAT. A professora Katia, sendo Professora Articuladora, atende
a todos os GR e a professora Renata, sendo a Professora Articuladora que responde pela
disciplina Produção Textual e Leitura também trabalha com todos os GR. As demais
escolhas foram, como afirmei acima, determinadas por critérios de afetividade.
5 A apresentação dos membros da comunidade escolar da EMAT é feita adiante.
6 Nomes atribuídos no contexto da investigação.
27
Algumas entrevistas/conversas aconteceram na unidade escolar e outras
aconteceram através de gravações de áudios via aplicativo de mensagens instantâneas.
A experiência foi bastante prazerosa e, extremamente rica, no sentido de permitir um
novo olhar sobre as práticas instituintes da EMAT que, até então, eu julgava conhecer. Criamos um roteiro com questões pertinentes à temática da pesquisa para nortear
as entrevistas/conversas, porém a interação entrevistado x entrevistador nos fez
percorrer caminhos diversos aos que a princípio traçamos. Geraldi (2015) nos diz que
“Perguntar sobre uma experiência faz parte do processo de compreensão dela. Perguntas
e caminhos são indiciados à medida que a história vai ganhando forma de narrativa”
(GERALDI, 2015, p. 17).
As narrativas, fundadas no trabalho da busca de memórias, não seguem o tempo
cronológico e são repletas de idas e vindas ao decorrer das falas dos sujeitos. Pois na
medida em que estes a fazem, desvelam a sua experiência, ao mesmo tempo em que a
constroem e a reconstroem. Geraldi (2015) cita João Guimarães Rosa, e aqui reproduzo
o mesmo trecho de Grande Sertão: Veredas: “A lembrança da vida da gente se guarda
em trechos diversos, cada um com seu signo e sentimento, uns com os outros acho que
nem não se misturam. Contar seguindo alinhavado, só mesmo sendo as coisas de rasa
importância” (ROSA, 2006, p. 98-99). E esta fala “desalinhavada” torna a linguagem
verbal insuficiente, as representações não verbais (gestos, olhares, etc...) surgem como
parte fundamental das histórias narradas. Nesse sentido, o processo de transcrições7
apresentou-se como um exercício de retorno ao momento das entrevistas/conversas e
possibilitou um olhar mais atento às histórias que me estavam sendo contadas.
A construção da análise de conteúdo das entrevistas/conversas foi organizada
através da eleição de eixos temáticos que consideramos pertinentes a pesquisa.
3.2. LÓCUS PESQUISADO: PERCEPÇÕES DOS ATORES ENVOLVIDOS NA FORMAÇÃO DE ALUNOS LEITORES NA ESCOLA MUNICIPAL ANÍSIO TEIXEIRA
Para narrar as percepções acerca do lócus pesquisado, começo apresentando-os
abaixo:
7 As transcrições foram realizadas em torno de 18horas aproximadamente. Todas realizadas por mim.
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Grupo A: Professores
Nome Função Formação8
Katia Vasconcellos Professora Articuladora Mestranda na UNIRIO
Renata Rodrigues Professora de Produção Textual e Leitura Doutoranda na UFRJ
Grupo B: Funcionários
Nome Função Formação
Mara Lobo Diretora Geral Pós-graduada na UERJ
Tatiana Fagundes Pedagoga Doutoranda na UERJ
Grupo C: Alunos
Nome Idade Ano de Escolaridade
Paula 8 anos 3° ano
João 9 anos 2º ano
Grupo D: Responsáveis
Nome Grau de parentesco Ano de escolaridade9
Etiene Mãe 5º ano
O roteiro elaborado para as entrevistas/conversas consistia em questões que
abordavam as experiências como leitores dos entrevistados e a narração das práticas
leitura e letramento inseridas no cotidiano da EMAT.
Uma das questões feitas aos membros da comunidade escolar pertencentes aos
grupos A. B e D era o que eles consideravam como características que definem um
leitor. Ao fazer este questionamento o interesse era verificar quais as representações de
leitor que apareciam em suas falas.
Como se pode verificar nos relatos, é possível afirmar que as visões do lócus
pesquisado corroboram com as definições de leitor utilizadas neste trabalho. Nenhum
dos entrevistados considerou o ato de decifrar o código escrito como uma determinante 8 Cito aqui a situação atual de formação dos profissionais da EMAT. Suas narrativas de formação estão presentes nas transcrições em anexo.
9 Refiro-me ao ano de escolaridade do aluno pelo qual a entrevistada é responsável.
29
para a formação da identidade leitora. Em diversos trechos de suas narrativas afirmam e
defendem o protagonismo - aliado a curiosidade e imaginação – assim como a busca do
prazer na leitura, como fatores de definição.
Trazemos agora para o texto o que os docentes e equipe pedagógica destacaram
como características que definam um leitor:
Leitor é aquele que tem prazer pela leitura, que gosta de ler, que perde o seu tempo, que para um momento e aprecia aquela leitura. E é isso que falta para a maioria das pessoas. Ler para poder aprender, ler para estudar, eu acho que a gente consegue. Mas ler por prazer, ler para ter felicidade, para distrair..., isso eu acho que é uma característica: ler por prazer. (Mara) Acho que o interesse, a concentração e, fundamentalmente, a imaginação. Sem imaginação você não consegue construir um bom leitor. Ele tem que ser uma pessoa que busque dialogar com o que ele está lendo. (Katia) É aquele que consegue não só ler a palavra, mas tem a possibilidade de fazer uma leitura do mundo. (Tatiana) Talvez, se eu falasse muitas características do leitor, eu seria redundante, então eu digo que, para mim, a grande característica do leitor é o protagonismo. Ele é protagonista dessa cena. (Renata) Eu acredito que um leitor seja aquele que lê sem a obrigação de ler. Porque em vários momentos você é obrigado a ler, mas quando você busca a leitura como uma maneira até de diversão ou como uma maneira de prazer, de aumento do seu conhecimento, buscar essa forma, isso é um leitor. (Etiene)
Por esses exemplos é possível perceber que, apesar das diferentes trajetórias os
participantes comungam de uma mesma ideia do que seria o leitor.
Outro destaque que fazemos é em relação ao momento de narração da
experiência leitora. Nesta questão percebemos a presença das memórias afetivas e a
lembrança de pessoas significativas que influenciaram no processo de formação leitora
dos entrevistados.
Eu tinha um irmão mais velho - dois anos mais velho que eu - que aprendeu a ler antes. E eu ficava fascinada pelos livros de escola dele, pelos dicionários..., aí quando eu aprendi a ler com 6 anos, eu já me tornei uma leitora. [...] Eu sempre gostava de ler os livros do meu irmão – que eram mais adiantados, fotonovela da minha mãe, livros de faroeste dos meus tios [...] (Mara) Eu me lembro que minha mãe sempre expôs a gente a livros. [...] E muitos dos livros que eu lia eram os livros que minha mãe lia. (Katia) Os meus pais sempre tiverem essa preocupação de que tanto eu, quanto a minha irmã - que é um ano mais nova - que a gente tivesse essa formação, esse acesso, que a gente tivesse esse gosto pela leitura. (Renata)
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Só que um dia eu estava em casa e a minha avó pediu para eu ler um livro, aí eu tive que ler. Aí eu gostei muito mesmo daquele livro. Então, eu me interessei por ler. (Paula)
Nestes fragmentos de entrevistas/conversas, pode-se perceber que a família se
mostra como peça fundamental do processo de formação leitora. O movimento de
retorno ao passado realizado pelos entrevistados faz aflorar os momentos em que os
livros entraram em suas vidas. Além dos familiares, os primeiros professores também
são lembrados como incentivadores. [...] a primeira coisa que eu lembro é do momento de alfabetização. As lembranças que eu tenho são bem pontuais, e duas me marcam muito. Uma é a professora cantando a música da abelhinha. (Canta um trecho da música) Que eu achava linda a musiquinha, e vinha o “a, e, i, o, u”. E outra é a minha professora me chamando para ler na cartilha. (Tatiana) Então, a gente tinha uma biblioteca com um acervo muito interessante e eu tinha uma professora de Produção de Texto e Leitura em uma oficina do horário integral. E ela desenvolvia alguns trabalhos, já no 6° ano, para a gente produzir resumo, resenha, recontar algumas histórias [...] (Renata) Às vezes ela [a professora] toma leitura, para ver se a gente está bem. Às vezes ela faz papel de texto. (João)
Ao narrar suas experiências, histórias e preferências, os entrevistados mostram-
se, ao mesmo tempo, anunciando novas possibilidades, intenções e projetos.
E eu tenho que certeza que a cada ano que passa a escola desenvolve outros projetos, como já construiu a nova matriz curricular esse ano na questão da produção textual e leitura com a participação da professora Renata, e acho que a gente vai continuar construindo esse trabalho fazendo ele cada vez mais efetivo. (Katia) Às vezes a gente tem uma ideia, até um pouco rígida, sobre alguns determinados assuntos sobre o desenvolvimento da disciplina, mas a gente só entende mesmo como a disciplina vai funcionar quando a gente encontra com aquele determinado grupo, quando o trabalho está de fato acontecendo. Então eu avalio muito positivamente. É um trabalho que, possivelmente, com algumas alterações, vai permanecer em 2016. (Renata) A gente tem uma série de projetos que acontecem e que são voltados para a leitura. Nós temos a Roda de Leitura Simultânea – que agora eu acho que vai ganhar mais força [...]. (Tatiana)
Quando questiono o grupo C em relação às atividades que mais gostam de fazer
na escola, percebemos que as práticas de leitura figuram como suas preferências.
Do que eu mais gosto... É a sexta-feira agora quando a Tia Patrícia manda um livro. (Paula) O que eu faço aqui na escola que eu mais gosto? Isso!
31
Uhmm..., é de ler uma boa história! (João)
Destacamos também as impressões acerca dos reflexos das práticas instituintes
narradas na formação de aluno leitores.
[...] a gente consegue ver nossos alunos pedindo, o tempo inteiro, para ler para a gente e ver também eles com livros e lendo o tempo todo. Eles não se recusam a fazer nenhuma atividade que a gente peça. A gente fala: “Vamos ler tal coisa...”, então todo mundo se anima, todo mundo acha lindo (risos), acha legal, presta atenção. (Tatiana) O momento de leitura era um momento tão divertido quanto o momento de brincar no pátio para eles. Então o maior ganho que a gente teve foi esse. (Renata)
Eu vejo mudança nas crianças..., o gosto pela leitura. (Mara)
Apesar da breve história de existência, a EMAT, mostrando-se como um
ambiente favorável às práticas de leitura e letramento, já apresenta impressões de
efetivas mudanças que resultam na formação de alunos leitores.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A origem deste trabalho foi marcada pelos diversos questionamentos decorrentes
das observações que realizamos a respeito das práticas pedagógicas de leitura e
letramento. Tais observações encontraram pares dialogantes com as leituras que
realizamos. A inquietação provocada pelo número elevado de alunos que completavam
os primeiros anos do ensino fundamental sem que tivessem desenvolvido,
minimamente, a sua competência leitora, deu luz aos objetivos da pesquisa.
Entretanto, após a escolha do lócus pesquisado, deparamo-nos com uma
realidade de escola básica diferente daquela que motivou inicialmente este estudo. Nos
vimos em uma escola da rede pública municipal de Niterói- RJ que, ainda nas séries
iniciais, está conseguindo lograr sucesso na missão de formar alunos leitores. A partir
desta nova realidade e dos novos questionamentos que surgiram em decorrência da
mesma, traçamos como objetivo identificar as práticas pedagógicas de leitura e
letramento que formam leitores, segundo os parâmetros da comunidade escolar da
EMAT e da sociedade, nas séries iniciais, além de buscar compreender de que maneira
essas práticas são inseridas no cotidiano escolar e analisar seus impactos na formação de
alunos leitores.
32
Considerando que o referencial teórico-metodológico que orienta esse trabalho é
a pesquisa narrativa, realizamos uma série de entrevistas/conversas com membros da
comunidade escolar para que a partir dos relatos de experiências dos mesmos,
pudéssemos elucidar nossas questões. Durante todo o processo de construção do
trabalho dialogamos com teóricos da área de leitura e letramento para que junto com as
narrativas nos auxiliassem a compreender de que forma essas práticas eram inseridas no
cotidiano dos alunos e docentes da EMAT.
Podemos destacar que a EMAT é uma escola que se distingue das demais da sua
rede. Sua proposta de educação integral e a matriz curricular diferenciada fazem da
unidade escolar um ambiente favorável às experiências instituintes de leitura e
letramento. Buscando nas experiências leitoras narradas, nota-se também que os
membros da equipe escolar valorizam a prática leitora, e em decorrência disso,
dedicam-se ao trabalho de formação de alunos leitores.
Nesse sentido, outro aspecto interessante a ser ressaltado é a quantidade de
informações que aparecem nas entrevistas/conversas realizadas, o exercício de retorno
ao passado, assim como a narração das práticas pedagógicas e seus reflexos, são apenas
possíveis em decorrência da metodologia utilizada. O método narrativo propicia que os
sujeitos falem de suas constituições pessoais e profissionais, revelando suas
subjetividades.
Assim, dedicando um olhar mais atento, percebemos que as trajetórias de
formação leitora dos docentes e da equipe pedagógica, da mesma maneira que as suas
percepções acerca das características que definem um leitor, mostram-se semelhantes. O
que propicia uma unidade no trabalho que é realizado na escola.
A análise de conteúdo das entrevistas/conversas trouxe à tona alguns pontos de
extrema relevância, tais como: a percepção de que um leitor fluente e crítico começa sua
trajetória com incentivo em casa ou copiando um modelo próximo de leitor, que lhe
desperta admiração. Outra característica marcante que se revela nas falas é a questão do
leitor ultrapassar a barreira da decodificação. A leitura para além da junção silábica e,
consequentemente a leitura pausada e desconexa.
Também destacamos o fato dos profissionais afirmarem a questão da prática de
um leitor fluente ser aquele que usa da imaginação, da criatividade, entendendo assim,
que o leitor que se destaca na atual sociedade, desenvolve igualmente gosto por outros
tipos de linguagens, abrindo assim portas para um entendimento de mundo para além do
que em geral, se apresenta socialmente.
33
Apesar da breve história de existência, a EMAT já vem logrando êxitos no status
de escola formadora de alunos leitores. Ainda é muito cedo para fazer uma avaliação
mais profunda dos reflexos destas práticas, mas a contribuição deste trabalho reside
justamente nesta questão: mostrar que é possível, na rede pública de ensino, ainda nas
séries iniciais, surgirem experiências instituintes que se afirmem como práticas que
contribuem para a formação de alunos leitores.
34
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36
WALLERSTEIN, I. Após o liberalismo: em busca da reconstrução do mundo.
Petrópolis: Vozes, 2002.
37
ANEXO I – Quadros de Análise de Conteúdo Grupo A TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA REALIZADA NO DIA 7 DE DEZEMBRO DE 2015. LOCAL: VIA APLICATIVO DE MENSAGENS INSTANTÂNEAS ENTREVISTADA: KATIA VASCONCELLOS ENTREVISTADORA: ANA JULIA CAMPOS HORÁRIO DE PERMANÊNCIA: 21:32h ÀS 21:48h TEMPO DE GRAVAÇÃO: 16 MINUTOS Legenda de cores: AMARELO: Todos os destaques referidos a apresentação/formação
ROSA: práticas leitoras/ narração da experiência leitora
AZUL: Dados demográficos e sócio-culturais.
VERMELHO: Pessoas significativas.
VERDE: Definições e conceitos sobre formação leitora.
CINZA: recorrência na fala de tempos/espaços
CINZA ESCURO: explicação do trabalho desenvolvido/compreensão
Apresentação
AJ: Boa noite, Katia! Gostaria de agradecer sua disponibilidade. Sei que os horários são complicados de conciliar..., então, muito obrigada! K: Que nada..., é um prazer. AJ: Então vamos lá..., vou começar pedindo que você se apresente. K: Meu nome é Katia Regina, professora na Escola Municipal Anísio Teixeira, duas matrículas, desde a fundação da escola – antes da inauguração - na consolidação da escola em fevereiro, a organização no caso Tenho pós graduação Lato Sensu em Literatura Infanto-Juvenil e, atualmente curso o mestrado em Educação na UNIRIO. AJ: Fevereiro de 2014, certo? K: Isso..., no começo do ano passado. AJ: Ok! Katia, agora eu vou pedir que você faça um exercício de retorno ao passado e narre para mim sua experiência como leitora.
38
Narração da experiência leitora Influência(s)
K: Eu me lembro que minha mãe sempre expôs a gente a livros. Ela comprava livros do Círculo do livro e tinham umas pessoas que vendiam livro de porta em porta, alguns chegavam pelo correio. E eu me lembro das minhas primeiras experiências como leitora lendo esses livros. Então, eu tinha muita coisa de Monteiro Lobato, mas eu nunca fui uma leitora apaixonada por literatura infantil. Eu sempre fui uma leitora apaixonada por ler os livros que minha mãe lia. Com 9, 10 anos, eu gostava de ler livros que me remetiam a literatura mais juvenil mesmo. Carlos Heitor Cony, “Um Capitão de quinze anos”, “Me dá uma força, gente!”, “O irmão que tu me deste”, Pedro Bandeira, enfim..., livros assim. E muitos dos livros que eu lia eram os livros que minha mãe lia. Ela acabava de ler Agatha Chrisitie e eu pegava para ler, ela acabava de ler “Mamãezinha querida” e eu pegava para ler. Eram livros que eu não tinha compreensão total deles, mas que abriram os meus horizontes e complementaram muito o meu vocabulário. AJ: Sua mãe parece ter sido muito importante na sua trajetória... K: E foi mesmo... AJ: Katia, eu peço agora que você me diga quais são as características, que para você, definem um leitor. K: Acho que o interesse, a concentração e, fundamentalmente, a imaginação. Sem imaginação você não consegue construir um bom leitor. Ele tem que ser uma pessoa que busque dialogar com o que ele está lendo. E, em caso de incompreensão do texto, a gente tem que ver como que esse leitor reage com essa dificuldade. Eu, por exemplo, sempre quando não conseguia entender um texto, eu o deixava de lado e minha estratégia era buscar outra coisa para ler e em outro momento busca-lo. Eu fiz isso com um livro: “As meninas”, da Lygia Fagundes Telles, se não me engano. Eu levei seis anos para conseguir ler esse texto, porque eu não tinha maturidade para entender. AJ: Nossa! Seis anos? K: Foi... (risos)
39
Conceito/compreensão referentes à formação leitora. Práticas leitoras Recorrência na fala de tempo/espaço de construção do leitor
AJ: E no Anísio Teixeira, quais são práticas de leitura que estão inseridas no cotidiano dos alunos? K: Bom, eu acho que a formação do leitor começa quando você oferece um ambiente preocupado, e não poluir visualmente, não encher de informações e, ao mesmo tempo, não deixar o aluno com essa coisa de pegar modelos xerocados e pintar, de colocar coisas “formatadinhas” nos murais. Porque a partir do momento que ele é autor, ele começa a ser leitor. Passa a ser protagonista. A questão da Roda de Leitura Simultânea e do Café Literário, é muito importante, porque provoca nos alunos a percepção de que todas as pessoas que compõe a escola leem. Muitas crianças se tornam desejosas de também estar naquela posição, de também pegar o livro, de também ler. Então você constrói uma identidade leitora nesse aluno, você provoca para que ele tenha uma relação de querer estar naquele momento, ora como ouvinte e em outro momento ele está sendo estimulado a ser o próximo leitor. Isso é muito interessante. AJ: De fato! E para terminarmos, você já conseguiria avaliar as contribuições dessas práticas na formação desses alunos? K: Eu acho que essas práticas vão interferir, diretamente, em uma relação afetiva e efetiva com esses livros. Esse aluno vai se construir dentro dessa prática. Ele torna-se um leitor, a partir do momento que ele percebe que nós temos uma leitura de mundo, e um mundo letrado, acima de tudo. Então isso é muito interessante. Que ele tenha no livro não um desafio, como empecilho, mas que ele tenha no livro um desafio a ser vencido. É diferente você ter a leitura como um desafio a ser conquistado e a leitura como um obstáculo que vai te paralisar. Então, nesse sentido, eu acho que todas essas práticas que comungam na formação desse aluno leitor são muito importantes. E eu tenho que certeza que a cada ano que passa a escola desenvolve outros projetos, como já construiu a nova matriz curricular esse ano na questão da produção textual e leitura com a participação da professora Renata, e acho que a gente vai continuar construindo esse trabalho fazendo ele cada vez mais efetivo. É isso! AJ: Foi ótimo! Muitíssimo obrigada, Katia! K: Foi um prazer.
40
TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA REALIZADA NO DIA 10 DE DEZEMBRO DE 2015. LOCAL: VIA PLICATIVO DE MENSAGENS INSTANTÂNEAS ENTREVISTADA: RENATA RODRIGUES ENTREVISTADORA: ANA JULIA CAMPOS HORÁRIO DE PERMANÊNCIA: 23:19h ÀS 00:58h TEMPO DE GRAVAÇÃO: 1 HORA E 39 MINUTOS
Legenda de cores: AMARELO: Todos os destaques referidos a apresentação/formação
ROSA: práticas leitoras/ narração da experiência leitora
AZUL: Dados demográficos e sócio-culturais.
VERMELHO: Pessoas significativas.
VERDE: Definições e conceitos sobre formação leitora.
CINZA: recorrência na fala de tempos/espaços
CINZA ESCURO: explicação do trabalho desenvolvido/compreensão
Apresentação
AJ: Então vamos lá..., quero começar agradecendo a sua
disponibilidade! Sei que está tarde e amanhã o dia começa
cedo!
R: Os horários são apertados. É assim mesmo... (risos)
AJ: Vou começar pedindo para que você se apresente e fale um
pouco da sua formação e atuação na Anísio Teixeira.
R: Boa noite! Eu me chamo Renata Rodrigues, sou formada
em Letras e Pedagogia, Mestre em Educação pela UERJ,
atualmente doutoranda em Letras Vernáculas com foco em
Literatura Brasileira pela UFRJ. Eu trabalho como professora
há pouco mais de seis anos, a minha primeira matrícula foi na
Prefeitura de Nova Iguaçu, trabalhando com as séries iniciais,
já trabalhei na Prefeitura do Rio de Janeiro também com as
41
Narração da experiência leitora
séries iniciais. Atualmente eu trabalho em Nova Iguaçu com a
disciplina Leitura e Produção de Texto no fundamental 210 e na
Prefeitura de Niterói no fundamental 111 com leitura e
produção de texto também.
AJ: Renata, agora eu vou pedir para você fazer um exercício
de retorno ao passado e narre para mim a sua experiência como
leitora.
R: Bom, eu tenho algumas lembranças da infância de 5, 6, 7
anos de idade. A maioria dos meus presentes de aniversário,
Natal, dia das crianças..., sempre estavam vinculados a um
livro. Os meus pais sempre tiverem essa preocupação de que
tanto eu, quanto a minha irmã - que é um ano mais nova - que
a gente tivesse essa formação, esse acesso, que a gente tivesse
esse gosto pela leitura. Isso é o que eu lembro muito em casa,
na infância. Nas escolas que eu estudei as bibliotecas não
costumavam ser de acesso muito fácil e, normalmente,
reuniam livro didático para pesquisa. Eu tive um contato muito
interessante e com um acervo muito bom, curiosamente,
lembrando agora, em uma escola que eu estudei em período
integral no 6° ano de escolaridade, que foi um CIEP. Naquele
momento, 1993, era chamado Ginásio Público – GP453
Itaboraí, a cidade onde eu morei a maior parte da minha vida.
Então, a gente tinha uma biblioteca com um acervo muito
interessante e eu tinha uma professora de Produção de Texto e
Leitura em uma oficina do horário integral. E ela desenvolvia
alguns trabalhos, já no 6° ano, para a gente produzir resumo,
resenha, recontar algumas histórias..., então a experiência,
enquanto leitora, mais significativa na escola, foi em uma
10 Segunda etapa do Ensino Fundamental (6° ao 9° ano).
11 Primeira etapa do Ensino Fundamental (1° ao 5° anos).
42
Influência(s)
escola integral..., um CIEP, no 6° ano de escolaridade quando
eu estava com 11 anos, 10 anos para fazer 11 anos de idade.
Depois a vida foi seguindo um pouco mais..., aquela
preocupação com o vestibular e etc... Meu pai também tinha
essa preocupação muito intensa com a minha formação de
leitora; preocupação em casa e de todo mundo, com minha
irmã também. Acho que eu tinha uns 15 anos quando ele
começou a fazer assinatura de jornal e de uma revista..., eu era
adolescente e lembro que era obrigada a ler e em alguns
momentos não tinha vontade, não queria muito, mas era um
exercício diário que o meu pai cobrava e depois ficava
perguntando sobre o que a gente leu, qual era a nossa opinião
sobre determinado assunto. E ele foi conduzindo isso, tanto ele
quanto minha mãe, com mãos de ferro até chegar no
vestibular. Um exercício de retorno a minha memória enquanto
leitora, eu tenho isso muito bem marcado. Depois eu acho que
minha formação foi dando conta disso..., me tornei professora,
além do mestrado e doutorado que citei, eu fiz uma pós-
graduação na UFF em Leitura e Produção de Textos, outra em
Literatura Infanto-Juvenil. Então..., são essas as lembranças.
AJ: Bacana! Sua formação é bem completa..., muito legal!
R: Obrigada!
AJ: E, sob o seu ponto de vista, que características definem um
leitor?
R: Há algum tempo, eu tenho estudado alguns teóricos alemães
- da estética da recepção - e de uma maneira bem geral, a
estética da recepção elege o leitor como principal figura de um
ato de leitura. Talvez, se eu falasse muitas características do
leitor, eu seria redundante, então eu digo que, para mim, a
43
Conceito/compreensão referentes à formação leitora.
grande característica do leitor é o protagonismo. Ele é
protagonista dessa cena. No meu entendimento, o texto só se
move, ele só se modifica e ganha novos contornos, a partir das
leituras. Então, ele é protagonista no ato da leitura. Quando o
escritor está fazendo qualquer coisa, ele pressupõe um leitor -
que pode não ser exatamente aquele que vai ler. Eu acho que a
grande característica, no meu entendimento, do leitor é o
protagonismo. Ele protagoniza a cena literária, de fato. O texto
é produzido para ser lido, pode ser produzido para um público
específico e chegar até outro, e isso, talvez, seja o que menos
importa. O que importa é que ele é que vai modificar. Eu não
vou ler um texto da mesma maneira que você vai ler, as
contribuições que você teve ao longo da sua vida vão interferir
na maneira que você vai ler o texto, as contribuições que eu
tive vão me fazer ler de uma maneira, a que a sua irmã teve, a
que minha sobrinha teve..., eu penso muito nessas questões.
Então eu acho que a maior característica de um leitor é
protagonizar o ato de leitura.
AJ: Muito interessante, Renata! E agora seguindo para,
especificamente, a Escola Municipal Anísio Teixeira..., você
pode narrar as práticas de leitura que estão inseridas no
cotidiano do aluno dentro da Unidade Escolar?
R: Bom, a disciplina Produção Textual e Leitura na Escola
Municipal Anísio Teixeira chegou a nossa escola em caráter
experimental neste segundo semestre de 2015. Não significa
que essa não era uma prática na escola anteriormente, mas
depois de algumas conversas com a equipe pedagógica da
escola, de uma maneira geral, elas entenderam a necessidade
desse trabalho em um horário diferenciado e nós iniciamos
nesse semestre. No trabalho com o primeiro ciclo, nós
desenvolvemos um projeto em que as crianças pudessem
44
Práticas leitoras
recontar uma história clássica - que era a história dos “3
porquinhos” - mas a história que essas crianças fariam o
reconto, seria uma versão um tanto quanto mais moderna e
baseada em um livro só com imagens. As crianças iriam
recontar a história baseadas nas imagens daquele livro. Só que
antes desse primeiro contato com essa nova histórias dos “3
porquinhos”, eles tiveram contato com outras histórias. Na
verdade, tiveram o contato com essa temática dos “3
porquinhos” em alguns gêneros: na poesia, no conto clássico.
E o primeiro ciclo – que compreende os 1°, 2° e 3° anos – teve
um trabalho mais nesta perspectiva: de conhecer diferentes
gêneros textuais com um foco maior nessa história. O que não
impediu que eles conhecessem outras histórias, que eles
conhecessem outros poemas, que eles tivessem acesso a outros
tipos de leituras. Mas o foco principal foi o reconto dessa
história dos “3 porquinhos”, que culminou com um livro que
foi ilustrado pelo professor de artes da escola. E a proposta do
livro é que eles possam a qualquer momento, fora do espaço
escolar, retomar essa escrita e talvez inserir novos elementos,
buscar outras informações, pensar em novas histórias e que
eles não fiquem presos somente a história dos “3 porquinhos”
– da qual eles tiveram acesso a algumas diferentes. Então o
trabalho de leitura com o primeiro ciclo, especificamente, foi
um trabalho de estímulo, um trabalho de encantamento, um
trabalho divertido. O que não evitou algumas cobranças que se
fizeram necessárias ao longo do processo, de acordo com cada
ano de escolaridade; algumas cobranças que foram feitas para
o terceiro ano, não foram feitas para o primeiro, porque
algumas crianças ainda no primeiro ano sentiram uma
necessidade de narrar com uma linguagem não verbal – que é
uma possibilidade também – outras crianças se perceberam
mais a vontade dramatizando algumas histórias. Então foi um
momento de perceber também qual era intimidade maior com a
45
leitura, qual era o afeto maior com que tipo de texto, com que
gênero textual, com o que as crianças se afetavam mais em
relação àquela leitura. Algumas crianças, de fato, preferiam o
vídeo, outras se identificaram muito com a poesia. Foi um
momento interessante nesse sentido. Já com o segundo ciclo –
o 4° e 5° ano – foi uma proposta que, inicialmente, seria com o
livro “Zoom” e nós pensamos em trabalhar o respeito às
diferenças, às individualidades e dentro dessa temática, eles
também teriam contato com vários gêneros textuais – essa é a
grande proposta: de que as crianças na escola consigam
perceber e pensar a Língua Portuguesa através de diferentes
gêneros textuais - e o trabalho de produção escrita foi um
pouco mais específico. Eles trabalharam com biografia,
autobiografia – nessa tentativa de reconhecer a si próprio,
produzimos também diários. Nosso trabalho com o segundo
ciclo ficou muito próximo das escritas do “eu”, das escritas de
si. Com algumas memórias, diários..., porque ao longo do
trabalho, embora a proposta fosse, inicialmente, trabalhar com
resumos, resenhas de outras histórias, durante o trabalho eu
percebi que as crianças se sentiam muito mais a vontade
falando das próprias histórias e ouvindo as histórias dos
colegas. Então facilitou muito esse trabalho com biografias,
diários, memórias, nesse sentido. E, já no final do projeto, nós
buscamos algumas identidades de personalidades afro-
brasileiras. As crianças pesquisaram as biografias de algumas
heroínas afro-brasileiras, de Zumbi dos Palmares, de alguns
ídolos que eles selecionaram da música ou do esporte. Foi mais
ou menos nesse sentido o trabalho com o segundo ciclo. De
certa maneira, o que resume, tanto de trabalho com primeiro
quanto com segundo ciclo, na Escola Municipal Anísio
Teixeira é pensar a Língua Portuguesa a partir dos afetos das
crianças, dos textos que eles mais se identificam, dos gêneros
que eles mais se identificam, pensando a Língua Portuguesa e
46
tentando trabalhar nessa perspectiva de ouvir o outro, de falar
de si e de respeitar as diferenças de uma maneira bem
integradora, digamos assim.
AJ: Você pode falar mais um pouco da organização da sua
disciplina? Como ela funciona em relação à carga horária?
Você atende grupos, certo? Como é feita essa divisão?
R: A disciplina funciona da seguinte maneira: todos os alunos
da escola são atendidos durante uma hora semanalmente, em
grupos de 12 a 13 alunos. As turmas são divididas em dois
grupos e essa divisão é feita pelo Professor Regente da turma.
Porque como eles são os professores que ficam durante mais
tempo com a turma, são os que melhor conhecem e entendem
o que funciona. E a divisão não é no sentido de quem é
bagunceiro ficar com o mais quietinho, é em uma perspectiva
de quem vai trabalhar melhor junto, quem vai cooperar melhor
com o colega, que equipes vão funcionar melhor. E é bacana
que algumas professoras deram nomes às equipes, e esses
nomes foram eleitos pelos alunos. Foi um trabalho bem
interessante nesse sentido.
AJ: Não houve nenhum tipo de critério relativo a desempenho?
Um grupo que lê e outro que não lê, um que tem mais
habilidade de escrita e outro que ainda precisa desenvolver
melhor..., não houve esse critério?
R: Na verdade, o que as professoras me sinalizaram foram as
escolhas de quem funcionaria melhor junto. Naturalmente, eu
percebo as habilidades de escrita e de leitura. Eu vejo um
grupo bastante heterogêneo. Eu tenho crianças “super” leitoras,
que em uma hora, se eu estou focando em outro trabalho mais
específico com uma criança que demanda um pouco mais de
atenção, aquela criança já leu três livros. Então essa criança às
47
vezes conta histórias para outros colegas – porque os colegas
solicitam. Eu acho que esse é o bacana do trabalho, porque é
um trabalho de estímulo a leitura. Então se a gente fizesse uma
divisão muito certinha de um grupo leitor e um grupo não
leitor, as crianças iam perceber e iriam questionar: “é aula de
reforço?”, “é para aprender a escrever melhor?”, “é para
aprender a ler melhor?”. Quando a gente entende que isso é a
consequência de um trabalho em conjunto com várias práticas
que existem na escola. É claro que é uma responsabilidade
muito maior, tanto da regente quanto minha - nessa disciplina
de Produção Textual e Leitura - mas em nenhum momento a
gente faz essa divisão de leitor/não leitor. A gente não faz essa
divisão. Nós procuramos manter grupos que vão fazer com que
o trabalho flua de uma maneira mais interessante para todo
mundo. Porque a ideia é que eles tenham prazer no que eles
estão fazendo. Eles precisam se divertir escrevendo, eles têm
que pedir para escrever, eles precisam querer ler..., essa é a
ideia!
AJ: E durante essa aula eles têm acesso livre a livros e outros
tipos de leitura? Existe essa opção de eles buscarem de forma
autônoma essa leitura?
R: Sim, existe! Embora a gente tivesse um projeto definido
com a história dos “3 porquinhos” para o primeiro ciclo e o
“Zoom”, que acabou não tendo continuidade no segundo ciclo,
todo o trabalho era realizado na sala de leitura, com todos os
livros expostos e, como as crianças são bem diferentes uma das
outras, se eu tinha uma proposta de atividade, de escrita de
texto, ou de reescrita, e eu tinha um grupo que terminava
primeiro, a primeira coisa que eles faziam era correr para um
livro ou para a mala de livros. Porque os livros que eles
consideravam mais especiais ficavam guardados na mala e eles
48
tinham acesso o tempo inteiro. Às vezes é difícil realizar
algum tipo de trabalho porque eles se empolgam e vão lendo.
Eu tenho uma lembrança muito forte de outra turma do
segundo ano que encontrou um livro de mágica..., teve um
momento que eu precisei esconder o livro de mágica porque eu
não conseguia fazer mais nada! Porque eles já entravam
correndo e todas as mágicas que eram sugeridas no livro eles
queriam fazer. Era uma comédia! Eu me divertia com eles...,
havia dias que eu deixava a proposta de lado e embarcava na
ideia da mágica com eles, mas tinha dia específico que eu
precisava fazer um determinado trabalho e tinha que esconder
o livro. Eu era a maldosa! (risos) Eles passavam também
metade da aula implorando: “Professora, cadê o livro de
mágica?”, “Tia, pelo amor de Deus, onde está o livro?”. E
tinha mágica para passar de ano, mágica para aprender
matemática, mágica para aprender melhor, e eles faziam todas
as mágicas. Era bem divertido! (risos)
AJ: Muito bom! (risos)
R: (risos)
AJ: E agora para terminarmos, Renata. Eu gostaria que você
avaliasse as contribuições dessas práticas todas que você listou
na formação de alunos leitores. Você vê contribuições dessas
práticas na formação de leitores dentro da Anísio Teixeira?
R: Eu entendo que as atividades da sala de leitura tentam ir de
encontro com o projeto pedagógico da escola, que já foi
construído de uma maneira diferente das demais escolas da
rede. Foi uma escola projetada para ser integral, em tempo
integral, de educação integral também. Então, nessa
perspectiva, é claro que a gente selecionou alguns materiais
49
por faixa etária, mas isso não foi uma seleção tão rígida a
ponto de que se uma criança se interessasse por outro tipo de
leitura que não fosse adequada a faixa dela, ela fosse impedida
de ter acesso àquele livro. A minha avaliação da disciplina,
embora ela tenha sido implementada nesse semestre, ainda em
caráter experimental e sabendo que precisam ser feitos alguns
ajustes para o ano de 2016, é muito positiva. Porque,
conversando com a maioria dos alunos, eles tinham momentos
de diversão, sim! O momento de leitura era um momento tão
divertido quanto o momento de brincar no pátio para eles.
Então o maior ganho que a gente teve foi esse. E de ter um
momento mais específico para as produções de texto, para
quando possível, apesar do tempo curto, especialmente para o
segundo ciclo, a oportunidade de reescrita do próprio texto –
que a gente considera isso muito importante. Eu avalio a
disciplina, no contexto da nossa escola, de extrema
importância. Nós nos reinventamos durante a disciplina,
havíamos pensado algumas coisas específicas e durante o
decorrer fomos mudando algumas coisas e muito de acordo
com os pensamentos das crianças, de como eles se
desenvolviam ao longo da disciplina, o que mais agradava e o
que menos agradava. Teve um determinado momento do
projeto com os “3 porquinhos” que algumas crianças ficaram
saturadas da história, e isso é compreensível. A gente se
reinventou e começou a buscar outras propostas durante o
processo, mas chegou um determinado momento que a gente
retomou porque as crianças solicitaram. Então eu tenho uma
avaliação muito positiva, porque embora a disciplina, como eu
já disse, tenha sido em caráter experimental, a gente tem a
possibilidade de se reinventar, de reescrever, de reconsiderar
na nossa escola o tempo todo que a gente percebe o que é
melhor para a criança naquele momento. Às vezes a gente tem
uma ideia, até um pouco rígida, sobre alguns determinados
50
assuntos sobre o desenvolvimento da disciplina, mas a gente só
entende mesmo como a disciplina vai funcionar quando a
gente encontra com aquele determinado grupo, quando o
trabalho está de fato acontecendo. Então eu avalio muito
positivamente. É um trabalho que, possivelmente, com
algumas alterações, vai permanecer em 2016. Acho que
basicamente é isso.
AJ: Lindo! (risos)
R: (risos)
AJ: Eu sei que o período de implantação da disciplina é muito
curto, você contou que foi agora no segundo semestre. Então
ainda é difícil avaliar. Eu entendo. Mas, mesmo nesse tempo
curtinho, já é possível identificar algum reflexo nas crianças?
Alguma postura de algum aluno em relação a leitura, de
quando a disciplina iniciou e agora no final do ano, é possível
identificar alguma mudança? Essa é a última, prometo! (risos)
R: (risos) Bom, Ana, eu consegui observar algumas mudanças
básicas no comportamento de leitor. De selecionar o livro, até
os pequenos, eles já conseguem localizar a edição do livro,
onde fica o resumo ou a resenha da história. Eles já conseguem
esperar e entender que quando um colega está lendo um livro,
ele pode ir lendo outro ou ele pode aguardar; que ele pode
conversar com o colega sobre aquela história que foi lida. Isso
eu acho muito importante. E dos grupos maiores, como teve a
participação da professora do reforço em uma atividade
específica – que ela quis fazer com a turma – eu entendi que
eles conseguiram perceber a intertextualidade sem a gente
fazer o uso da palavra ou do conceito de intertextualidade. Eles
conseguiram ver um filme que era uma adaptação da história
51
da “Cinderela”, mas não era muito nítida, era uma história
moderna que invés do sapato ela perdeu o celular. Eles fizeram
essa atividade com a professora do reforço e chegaram na
minha aula seguinte querendo pegar as edições da “Cinderela”
que a gente tinha na sala e começaram a comparar: “Ah... mas
no filme acontece diferente!”. E eles começaram a me contar
que ela perdeu o celular, que era uma história moderna,
diferente. Eu consegui ter essa percepção dos menores em uma
questão de organização mesmo, tanto que nessa última semana
eles cismaram de organizar e separar os livros que a gente tem
repetidos. Eles ganharam essa dimensão de organização, de
reconhecer no livro onde eles encontram a história, de me
mostrar quem é o autor, quem ilustrou. Isso no primeiro ciclo.
Já no segundo ciclo, o que me marcou muito foi essa questão
da intertextualidade, que eles começaram a perceber também
as mesmas histórias contadas de maneiras diferentes, por
povos diferentes. Eles perceberam alguns contos africanos que
tinham algumas histórias de princesas e rainhas bem próximas
dos clássicos universais que a gente conhece, e muito
timidamente eles chegaram a comentar. Isso foi muito bacana!
Foi uma das coisas mais divertidas que eu consegui perceber.
AJ: Ótimo!
R: Pode perguntar mais! (risos)
AJ: Não, tá ótimo! (risos) Muito bacana o trabalho da escola,
muito legal de conhecer mais. Gostaria de agradecer pela
disposição, pela acolhida. Muito obrigada! Eu sei que é
corrido, que o seu horário é apertado, vide a hora que a gente
está conversando. Nós estamos terminando 00:57h, mas eu
queria te agradecer muito. Foi muito rico!
52
R: Eu que agradeço, Ana Ju! Por você ter lembrado de mim!
Espero ter contribuído com você. Um beijo e até daqui a
pouco! (risos)
AJ: Até! (risos)
53
ANEXO II – Quadros de Análise de Conteúdo Grupo B
TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA REALIZADA NO DIA 21 DE DEZEMBRO DE 2015. LOCAL: VIA APLICATIVO DE MENSAGENS INSTANTÂNEAS ENTREVISTADA: MARA ROSANA LOBO ENTREVISTADORA: ANA JULIA CAMPOS HORÁRIO DE PERMANÊNCIA: 20:30h ÀS 20:54h TEMPO DE GRAVAÇÃO: 24 MINUTOS
Legenda de cores: AMARELO: Todos os destaques referidos a apresentação/formação
ROSA: práticas leitoras/ narração da experiência leitora
AZUL: Dados demográficos e sócio-culturais.
VERMELHO: Pessoas significativas.
VERDE: Definições e conceitos sobre formação leitora.
CINZA: recorrência na fala de tempos/espaços
CINZA ESCURO: explicação do trabalho desenvolvido/compreensão
Apresentação
AJ: Boa noite, Mara! Gostaria primeiro de agradecer pela
atenção e sua disponibilidade, apesar do horário. Muito
obrigada!
M: Sem problemas.
AJ: Mara, você pode começar se apresentando. Falando um
pouquinho da sua formação e da sua atuação na Anísio
Teixeira.
M: Então vamos lá..., hoje eu estou diretora da Escola
Municipal Anísio Teixeira. Iniciei minha carreira na Escola
Municipal Ayrton Senna em 2006 como professora do
primeiro segmento do ensino fundamental. Sou Pedagoga e fiz
Psicopedagogia e Gestão Escolar.
54
Narração da
experiência leitora
Influência(s)
Conceito/compreensão
referentes à formação
leitora.
AJ: Agora, fazendo um exercício de retorno ao passado, peço
que narre as suas experiências como leitora.
M: Bom, eu acho que o que me motivou a ler foi a curiosidade.
Eu tinha um irmão mais velho - dois anos mais velho que eu -
que aprendeu a ler antes. E eu ficava fascinada pelos livros de
escola dele, pelos dicionários..., aí quando eu aprendi a ler com
6 anos, eu já me tornei uma leitora. Porque eu tinha uma
curiosidade muito grande. Eu sempre gostava de ler os livros
do meu irmão – que eram mais adiantados, fotonovela da
minha mãe, livros de faroeste dos meus tios, jornais que
chegavam em casa..., enfim, eu sempre tive muita curiosidade
para ler. E é o que me motiva até hoje..., é a curiosidade.
Quando eu tinha 14 anos eu fui morar em Goiás e me tornei
sócia de uma biblioteca. Eu não conhecia quase ninguém e eu
passei a ser leitora assídua. Eu lia todos os dias..., às vezes
quatro livros por semana. Muitas das vezes o meu pai brigava
comigo, porque eu estava lendo demais e não me deixava ficar
de luz acesa. Eu lia com a luz da janela, com a luz do poste que
tinha em frente ao meu quarto. Aí nessa época eu li “Utopia”,
de Thomas More, “A Divina Comédia”, de Dante Alighieri...,
todos os livros que alguém falava alguma coisa..., e eu sou
assim até hoje. Quando alguém cita um livro que acha
interessante, eu procuro ler esse livro. O que me move mesmo
é a curiosidade.
AJ: E quais as características que você elege que possam
definir um leitor?
M: Na minha opinião, leitor não é só aquele que lê. Leitor é
aquele que tem prazer pela leitura, que gosta de ler, que perde
o seu tempo, que para um momento e aprecia aquela leitura. E
é isso que falta para a maioria das pessoas. Ler para poder
55
Práticas leitoras
Recorrência na fala de
tempo/espaço de
construção do leitor
aprender, ler para estudar, eu acho que a gente consegue. Mas
ler por prazer, ler para ter felicidade, para distrair..., isso eu
acho que é uma característica: ler por prazer. Porque, na
verdade, quem lê por prazer é o leitor.
AJ: Agora, Mara, eu vou pedir que você narre as práticas de
leitura inseridas no cotidiano dos alunos da Escola Municipal
Anísio Teixeira. Como que essas práticas acontecem?
M: Nossa escola vai para o seu terceiro ano de funcionamento,
e desde o momento que nós pensamos em formar as salas de
aula - na inauguração - nós pensamos nos cantinhos de
leitura..., onde teriam livros bonitos para essas crianças terem
acesso a vários tipos de leitura. Então nesses cantinhos têm
livros, gibis, revistas..., onde as crianças têm livre acesso a
esse material. Além disso, a gente tem o Café Literário, onde
funcionários leem livros de histórias para as crianças no café
da manhã e a Roda de Leitura Simultânea. Os funcionários
escolhem livros, colocam as resenhas no mural e os alunos
escolhem os livros que lhe agradem através dessas resenhas.
Nós temos uma sala onde têm livros disponibilizados que é a
Sala de Formação do Leitor12. Fazemos dessa forma...,
deixando bem à vontade para a criança manusear o livro, sentir
a textura. Nós já percebemos que têm crianças que param na
hora do recreio para ficar lendo gibis, ou outros livros da
literatura infanto-juvenil. Na escola, nós temos que
proporcionar isso: o prazer pela leitura. Não aquela leitura
obrigatória, onde a criança tem que aprender com aquele livro
de história. Na verdade, ela precisa apreciar a leitura, gostar do
que está lendo, gostar do que está ouvindo. Eu acho que é por
aí...
12 Referida anteriormente como “Sala de Leitura”
56
AJ: Eu sei que a escola é recente. Foram apenas dois anos
letivos – e caminhando para o terceiro - mas você já consegue
fazer uma avaliação dessas práticas na formação de alunos
leitores? Essas práticas estão contribuindo para a Anísio
Teixeira formar alunos leitores?
M: Eu acredito que sim! Eu vejo mudança nas crianças..., o
gosto pela leitura. Semana passada nós fizemos a formatura do
quinto ano e cada aluno formando ganhou um livro de presente
dado por um funcionário da escola. E a gente percebeu a
alegria das crianças ao abrir o presente e ter um livro lá dentro.
Nós estamos percebendo, ao longo do nosso trabalho, que as
crianças estão gostando de manusear, de conhecer os autores...,
a gente trabalha também nas turmas com autores. Ano passado
(2014) e nesse ano, os professores escolheram autores e
trabalharam biografia, trabalharam obras desses autores...,
então, ainda no segundo ano da escola, as crianças já
conhecem dois autores diferentes, com sua obra. Eu acho que
isso nós vamos percebendo no dia a dia, no crescimento dessas
crianças. Eu acredito que sim! Que a gente consegue promover
o gosto pela leitura com esse trabalho.
AJ: Com certeza! Muito obrigada, Mara!
M: Não há o que agradecer! Boa noite!
57
TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA REALIZADA NO DIA 17 DE DEZEMBRO DE 2015. LOCAL: ESCOLA MUNICIPAL ANÍSIO TEIXEIRA (SALA 1) ENTREVISTADA: TATIANA FAGUNDES ENTREVISTADORA: ANA JULIA CAMPOS HORÁRIO DE PERMANÊNCIA: 15: 45 ÀS 16:05 h TEMPO DE GRAVAÇÃO: 20 MINUTOS
Legenda de cores: AMARELO: Todos os destaques referidos a apresentação/formação
ROSA: práticas leitoras/ narração da experiência leitora
AZUL: Dados demográficos e sócio-culturais.
VERMELHO: Pessoas significativas.
VERDE: Definições e conceitos sobre formação leitora.
CINZA: recorrência na fala de tempos/espaços
CINZA ESCURO: explicação do trabalho desenvolvido/compreensão
Apresentação
Narração da
experiência leitora
AJ: Então vamos lá! Primeiro gostaria de agradecer seu tempo
e sua atenção, e pedir para que você se apresente, por favor.
T: Meu nome é Tatiana, eu sou pedagoga dessa escola e tenho
o tempo que essa escola tem de trabalho, 2 anos também.
AJ: Tati, eu vou pedir agora que você faça um movimento de
retorno ao seu passado e que você narre a sua experiência
como leitora, a sua experiência pessoal.
T: Tá..., a primeira coisa que eu lembro é do momento de
alfabetização. As lembranças que eu tenho são bem pontuais, e
duas me marcam muito. Uma é a professora cantando a música
da abelhinha.
(Canta um trecho da música)
T: Que eu achava linda a musiquinha, e vinha o “a, e, i, o, u”.
E outra é a minha professora me chamando para ler na cartilha.
58
Influência(s)
A cartilha, que eu não lembro o nome, mas eu sei que era uma
cartilha e que eu gostava de chegar em casa e ler. E quando eu
descobri que sabia ler, que eu conseguia, eu achava o máximo.
Então eu ficava estudando e lendo. Só aquilo. A cartilha em
casa. E aí depois o meu contato com os livros foi
principalmente com os livros didáticos até eu chegar ao ensino
médio. Foi quando eu cheguei ao ensino médio, na escola, que
a professora começou a propor outros livros, literatura.
AJ: Uhum...
T: Mas antes disso, na minha casa não tinham muitos livros.
Tinha uma coleção de contos de fadas que eram enormes.
Então eu não gostava de ler, só lia um pedacinho. E depois, já
no segundo segmento do ensino fundamental, eu lembro que
ganhei a coleção do Machado de Assis. Essa coleção era de
uma pessoa muito querida minha que havia falecido e foi aí
que eu comecei a ler e a gostar de ler e a conhecer. E depois
desse momento, eu acho que foi quando eu comecei a ler e ter
como prática a leitura. Ter gosto pela leitura,
independentemente daquilo que a escola estivesse fazendo.
AJ: Sim..., e você consegue citar algumas características que,
para você, definem o que é o leitor?
T: Olha..., existe um espectro enorme, né?
AJ: Com certeza! (risos)
T: Então... (risos), se a gente for tentar definir isso, não é um
ponto específico. Eu acho, e aí não tem como fugir da minha
formação, sempre que se fala de leitor eu penso em Paulo
Freire.
59
Conceito/compreensão
referentes à formação
leitora.
AJ: Certo...
T: É aquele que consegue não só ler a palavra, mas tem a
possibilidade de fazer uma leitura do mundo. Mas, além disso,
a gente precisa, realmente, entender a necessidade de você ser
um leitor, um sujeito que consegue se apropriar do que está
escrito, independente do portador textual, e compreender
aquilo que está ali. Então, eu acho que ser leitor é: primeiro
você ter a possibilidade de ler absolutamente qualquer coisa
que se apresente para você sem que isso seja o gerador de
alguma, não dúvida, mas de alguma incoerência naquilo que
você está lendo. Entendeu? Então, eu acho que o leitor tem que
ser capaz de ler tudo aquilo que é oferecido a ele e conseguir
interpretar aquilo que está sendo colocado. Eu não posso ler,
por exemplo, um letreiro em algum lugar e achar que está
escrito outra coisa. Fazer outra interpretação. Posso até ampliar
o entendimento daquelas leituras, pensar que subliminarmente
existe uma série de coisas ali e etc... Eu posso e devo fazer
isso, como leitora de mundo, mas existe uma mensagem ali
que eu devo conhecer. Então eu acho que essa formação fica
faltando um pouco quando a gente abre muito o espectro do
que seja um leitor.
AJ: Exato!
T: Porque se o leitor é aquele que pode ler qualquer coisa em
todos os espaços, no final das contas, você vê que só aqueles
que têm a possibilidade, não só de ler, mas de interpretar e de
fazer as outras leituras, é que consegue se movimentar bem na
sociedade. Os outros ficam naquela restrição e caí naquela
coisa do analfabetismo funcional.
60
Práticas leitoras
AJ: E agora, especificamente dentro da Anísio Teixeira, eu
gostaria que você narrasse quais são as práticas de leitura que
estão inseridas no cotidiano da escola.
T: A gente tem uma série de projetos que acontecem e que são
voltados para a leitura. Nós temos a Roda de Leitura
Simultânea – que agora eu acho que vai ganhar mais força, os
espaços de leitura todos que são criados com as crianças, o
Café Literário na parte da manhã. E, além disso, o trabalho
com leitura que as professoras fazem com os alunos dentro de
sala e o componente curricular de Produção Textual e Leitura
são componentes agregadores nesse sentido. Mas o mais
importante, e interessante, é que as professoras tem
apresentado a leitura para as crianças de uma maneira que,
primeiro: eles não veem peso nisso, não é uma avaliação. Não
existe julgamento da criança a partir daquilo que ela está
lendo. Mas, são as possibilidades que vão sendo criadas na sala
de aula para esta criança ler. Entendeu?
AJ: Sim...
T: Então, para mim, a principal prática de leitura na escola é
aquela que é formada pelas professoras. Que tem possibilitado
que essas crianças criem um gosto pela leitura que extrapola os
limites desse tipo de leitura só para você avaliar a capacidade
de decodificação, por exemplo. E, por conta disso, agregado as
outras coisas que acontecem na escola, a gente consegue ver
nossos alunos pedindo, o tempo inteiro, para ler para a gente e
ver também eles com livros e lendo o tempo todo. Eles não se
recusam a fazer nenhuma atividade que a gente peça. A gente
fala: “Vamos ler tal coisa...”, então todo mundo se anima, todo
mundo acha lindo (risos), acha legal, presta atenção. Agora, eu
não consigo ainda visualizar uma coisa para dizer que é isso
61
que faz a diferença. Eu que é esse conjunto todo, e é esse
incentivo dos professores, inicialmente, que provoca esse
movimento no cotidiano deles.
AJ: Essa disciplina que você falou que compõe a matriz,
Produção Textual e Leitura, ela entrou na matriz agora no
segundo semestre após a reformulação.
T: Isso!
AJ: Essa disciplina veio como mais um incentivo? Ou foi mais
por uma questão pedagógica de organização e dividir as turmas
para as aulas das disciplinas específicas? Qual foi a motivação
para a criação e inserção desta disciplina na matriz?
T: Eu acho que aqui na escola nós temos essa preocupação, eu
particularmente, tenho uma preocupação muito grande de que
a criança possa ler e seja incentivada a ler e a escrever. Porque
eu venho de uma realidade de escola em que um número muito
grande de crianças chegava ao terceiro ano sem ler, sem ter
tido garantido esse direito para ela. De ler e de escrever de
maneira que ela consiga ir avançando. Então a partir desta
preocupação nossa, de que eles possam ter ampliada cada vez
mais essa possibilidade e vendo que isso poderia entrar na
nossa matriz, eu acho que foi um movimento feito para
organizar. Mas a motivação primeira não foi para dividir as
turmas, porque nós poderíamos ter colocado qualquer outra
coisa. A motivação foi criar mais um canal para que eles
pudessem trabalhar a leitura e mais a escrita. Porque a gente
viu que até o segundo ano as crianças estão caminhando muito
bem, no terceiro também – considerando o grupo que a gente
pegou: o primeiro ano que entrou aqui na escola ano passado.
Então eles conseguiram avançar na leitura, e o desafio que se
62
mostrou grande foi, justamente, a escrita. A sistematização...,
escrever não é só você colocar ortograficamente as palavras.
Existe uma série de outras coisas envolvidas na escrita. Então
as hipóteses que as crianças vão criando, cada uma cria uma
diferente e você precisa realizar uma intervenção individual
para que eles possam conseguir adequar essa escrita à norma
padrão. Eu acho que foi mais focado na possibilidade de
produção textual. Que aí a gente colocou na matriz.
AJ: Certo... A escola é recente e os alunos que ingressaram no
primeiro ano ainda não terminaram o ciclo. Isso só vai
acontecer no próximo ano, em 2016. Mas, nesse momento,
você já consegue avaliar as contribuições dessas práticas para a
formação de alunos leitores? Você já deu alguns exemplos,
contando que as crianças gostam de ler, que elas se animam,
mas você acha que já pode ser feita uma avaliação...
T: Das práticas para formar esses alunos?
AJ: Isso!
T: Eu acho que o tempo que a gente tem ainda é pouco. Mas,
me parece que essa configuração de educação integral permite
que as crianças façam isso mais rapidamente do que em uma
escola regular. É uma impressão só. Não tenho outros dados de
outras escolas. A gente tem uma escola aqui na Rede,
inclusive, que é parcial e todo mundo se alfabetiza, lê e tal...
Então, pode ser que não seja só isso. Mas isso seria um ponto
que eu destaco. E foi, inclusive, a fala da professora Beth no
nosso primeiro fórum - que em julho as crianças já estavam
lendo - ela é professora há muitos anos e disse que não tinha
visto isso antes. Então ela acha que tenha sido por conta da
formação integral.
63
Recorrência na fala de
tempo/espaço de
construção do leitor
AJ: O tempo que ela consegue dedicar às crianças...
T: Exatamente! O comprometimento das professoras. A
certeza que elas têm de que elas precisam garantir esse direito
para a criança. A gente tem que oferecer muitas coisas para
eles, mas a gente não pode esquecer do fundamental. Então, eu
acho que nós acompanhamos muito isso..., o que acontece com
uma criança que não consegue ler e escrever se ela sai desse
período de alfabetização sem conseguir isso. Como a gente
percebe que nossas crianças estão conseguindo, a gente quer
mais! Quer isso e muitas outras coisas, mas porque a gente
conseguiu garantir isso. E as práticas, para mim, acontecem
principalmente na sala de aula. O que eu acho que a gente fez
muito, foi a partir das demandas das professoras, criar as
possibilidades para que elas pudessem trabalhar. Elas não
tinham nenhum material pedagógico, então nós fomos atrás de
apostilas pedagógicas, e construímos o nosso material. Esse
tipo de coisa, que na realidade são os pequenos detalhes, que
se você permite, dá condição para os professores fazerem
aquilo que eles foram formados para fazer. Eu acho que são
essas práticas que dão conta disso.
AJ: Então as práticas, na verdade, não são apenas as práticas
instituídas pela escola. Da EAP para a equipe de regentes..., é
um movimento contrário. Surgem as demandas das
professoras, do que acontece na sala de aula, elas trazem para a
equipe de articulação pedagógica e vocês vão adaptando...
T: Exatamente! Foi com isso que a gente percebeu quais eram
as crianças que não estavam lendo ainda. E aí a gente começou
a construir um caminho para que eles passassem a ser
atendidos de maneira mais individualizada. Para poder
64
perceber qual era o caminho de aprendizagem deles. Para mim,
o movimento sempre tem que ser esse. O movimento de
reconhecimento das necessidades das crianças parte da sala de
aula com as professoras. Com a nossa audição dos próprios
alunos..., a gente tem que poder ouvi-los para ver quais são as
necessidades deles e tentar construir alguma coisa a partir daí.
Lógico que algumas práticas que envolvem todas as escolas, a
gente também propõe, não tem nenhuma implicação negativa
nisso, mas não pode ser só isso.
AJ: Sem dúvida.
T: Se for só isso, a gente inverte e as propostas se perdem.
Porque os professores passam a fazer só porque tem que fazer,
porque alguém pediu. Então a gente sempre tem que voltar um
pouquinho se isso estiver acontecendo. E parece que a escola,
de alguma maneira - a instituição escolar - favorece a esse tipo
de coisa. Então, é uma reflexão: todo mundo precisa fazer, o
tempo inteiro, apontamentos para que isso não aconteça e no
final das contas prejudique quem a gente menos quer
prejudicar que é a criança que está aprendendo.
AJ: Ótimo, Tati! Muito obrigada!
T: De nada! Obrigada a você.
65
ANEXO III – Quadros de Análise de Conteúdo Grupo C TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA REALIZADA NO DIA 11 DE DEZEMBRO DE 2015. LOCAL: ESCOLA MUNICIPAL ANÍSIO TEIXEIRA (SALA DE RECURSOS) ENTREVISTADO: JOÃO (NOME ATRIBUÍDO NO CONTEXTO DA INVESTIGAÇÃO) ENTREVISTADORA: ANA JULIA CAMPOS HORÁRIO DE PERMANÊNCIA: 12: 55 ÀS 13:02 h TEMPO DE GRAVAÇÃO: 07 MINUTOS
Legenda de cores: AMARELO: Todos os destaques referidos a apresentação
ROSA: práticas leitoras/ narração da experiência leitora
AZUL: Dados demográficos e sócio-culturais.
VERMELHO: Pessoas significativas.
VERDE: Definições e conceitos sobre formação leitora.
CINZA: recorrência na fala de tempos/espaços
CINZA ESCURO: explicação do trabalho desenvolvido/compreensão
Apresentação
AJ: Oi! Tudo bem? Fala para mim o seu nome.
J: João.
AJ: E a sua idade?
J: 9 anos.
AJ: E qual o nome da sua escola?
J: Escola Municipal Anísio Teixeira.
AJ: De quem você é aluno?
J: Da Tia Giselle.
AJ: E em que ano você está?
J: Segundo ano.
AJ: João, agora vou pedir para você me contar uma experiência,
alguma coisa que você já tenha vivido, em relação a leitura.
J: Uhmmm... (pensativo)
AJ: Alguma coisa que teve um livro relacionado, um texto, uma
história... Alguma coisa legal que você ache que possa me contar.
J: Um livro que eu li. Eu já li 7 livros de Nárnia. E lá falava sobre
os animais que falavam.
66
Narração da
experiência leitora
Influência(s)
Práticas leitoras
AJ: Você sabe me dizer quais são esses 7 livros?
J: O cavalo e o menino, a feiticeira e o guarda-roupa, uhmmm....
AJ: São todos das Crônicas de Nárnia? Você leu toda a coleção?
J: Sim!
AJ: E quem te deu esses livros?
J: Meu papai.
AJ: Ele que te deu todos eles?
J: Sim.
AJ: E você que pediu esses livros de presente? Como foi?
J: Não! Ele que me deu! (o pai)
AJ: E você ganhou e leu todos de uma vez?
J: Sim!
AJ: E você já leu “todinhos”?
J: Sim! (risos)
AJ: Nossa! Que legal, João! E você sabe me dizer quanto tempo
levou para ler todos eles?
J: Uhmmm... meio ano.
AJ: E você gostou das histórias?
J: Sim! É divertido.
AJ: E aqui na escola, você faz alguma atividade que seja
relacionada à leitura?
J: Sim! Eu produzo às vezes textos, às vezes quando eu não estou
fazendo nada eu escrevo um textinho silenciosamente. Quando
não tem nada para fazer.
AJ: Mas e a professora na sala, ela faz atividades relacionadas à
leitura?
J: Faz! Um monte...
AJ: O que ela faz?
J: Às vezes ela toma leitura, para ver se a gente está bem. Às
vezes ela faz papel de texto.
AJ: Então às vezes ela pede para vocês lerem e outras vezes ela
pede para vocês escreverem?
J: É!
67
AJ: Você só faz essas coisas nas aulas com a Tia Giselle ou tem
alguma outra aula que você faz isso também?
J: É..., só na aula da Tia Gisele.
AJ: E nas outras aulas..., você não faz nada disso?
J: Ah... esqueci! Tem a aula da outra tia, na sala 4.
AJ: Da Tia Renata?
J: Sim!
AJ: A aula de Produção Textual...
J: Isso! Eu também faço lá!
AJ: E lá você faz o que?
J: Eu faço quase a mesma coisa que com a Tia Giselle.
AJ: Entendi. Só que em outra sala e com outra professora, né?
J: É..., é!
AJ: Entendi! E disso tudo que você faz aqui na escola, o que você
mais gosta?
J: O que eu faço aqui na escola que eu mais gosto?
AJ: Isso!
J: Uhmm..., é de ler uma boa história!
AJ: Ler uma boa história? (risos) É o que você mais gosta de
fazer?
J: É!
AJ: E você consegue ler bastante aqui na escola?
J: Sim!
AJ: Vocês tem acesso a livros aqui na escola?
J: Sim!
AJ: E a professora deixa, quando você está com vontade de ler,
pegar um livro e ler uma boa história?
J: Só quando não tem dever a fazer..., aí ela deixa. E depois do
almoço que ela deixa para ler.
AJ: Então está ótimo, João! Obrigada!
J: Posso ir?
AJ: Pode sim...
J: Tchau, tia!
68
TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA REALIZADA NO DIA 17 DE DEZEMBRO DE 2015. LOCAL: ESCOLA MUNICIPAL ANÍSIO TEIXEIRA (SALA DE RECURSOS) ENTREVISTADA: PAULA (NOME ATRIBUÍDO NO CONTEXTO DA INVESTIGAÇÃO) ENTREVISTADORA: ANA JULIA CAMPOS HORÁRIO DE PERMANÊNCIA: 13: 03 ÀS 13:11 h TEMPO DE GRAVAÇÃO: 08 MINUTOS Legenda de cores: AMARELO: Todos os destaques referidos a apresentação
ROSA: práticas leitoras/ narração da experiência leitora
AZUL: Dados demográficos e sócio-culturais.
VERMELHO: Pessoas significativas.
VERDE: Definições e conceitos sobre formação leitora.
CINZA: recorrência na fala de tempos/espaços
CINZA ESCURO: explicação do trabalho desenvolvido/compreensão
Apresentação
AJ: Olá, Tudo bem?
P: Tudo!
AJ: Posso pedir para você se apresentar?
P: Eu sou Paula e eu tenho 8 anos de idade.
AJ: E me diz o nome da sua escola...
P: Anísio Teixeira.
AJ: Você está em que ano?
69
Narração da experiência leitora
Influência(s)
Conceito/compreensão referentes à formação leitora.
P: Terceiro ano
AJ: E quem é a sua professora?
P: Patrícia
AJ: Agora eu vou pedir para você me contar alguma experiência que você já tenha vivido relacionada a leitura. Algum livro que você leu, alguma coisa bacana que você já tenha vivido com a leitura e que você queira me contar.
P: É..., que quando eu estava no segundo ano a tia passava uns livros para a gente poder ler, aí eu acho que era sexta-feira e era o dia que mais odiava! Porque eu não gostava de ler, eu achava aquilo um saco. Só que um dia eu estava em casa e a minha avó pediu para eu ler um livro, aí eu tive que ler. Aí eu gostei muito mesmo daquele livro. Então, eu me interessei por ler.
AJ: Você já estudava no Anísio Teixeira quando você estava no Segundo ano?
P: Sim
AJ: Mas os livros que você tinha que ler aqui na sexta-feira eram diferentes do livro que você leu com a sua avó?
P: Eram, mas também eram legais. Só que eu pensava, que eu só queria acabar o livro. Eu não pensava na história, em como ela era legal.
AJ: Entendi. Então foi depois que você leu o livro com a sua
70
Práticas leitoras
Recorrência na fala de tempo/espaço de construção do leitor
avó, na sua casa, que você começou a gostar de ler, foi isso?
P: É.
AJ: E me fala agora quando são as atividades que você faz aqui na escola que são relacionadas a leitura? Existe alguma atividade que você faz que seja relacionada a leitura?
P: Uhmm... Tem... Tipo... Tem o guia de estudos que você pode escolher qual atividade você quer fazer. Tem o livro que, por exemplo, hoje o guia de estudos se você quiser fazer português, vai ser página tal. Aí a gente pega o livro de português vai na página e lê um texto. Essa é uma atividade.
AJ: Entendi! Bacana! E tem mais alguma outra atividade que vocês fazem? Você usam livros de histórias?
P: Tem! A aula da Tia que eu esqueci o nome agora. Uma que é assim (usando mímica para tentar descrever a professora)
AJ: A aula que vocês trabalham Produção Textual e Leitura?
P: É...
AJ: Tia Renata.
P: Isso... Aí a gente fez a história dos 3 porquinhos.
AJ: E como foi essa história que vocês fizeram?
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P: A Tia pegou o livro e contou para a gente a história dos 3 porquinhos, aí a tia deu uma folha que já estava com todas as imagens e as linhas para a gente. A gente coloriu e foi escrevendo a história dos 3 porquinhos igual a tia contou para a gente.
AJ: Vocês tiveram que reescrever a história que a professora contou.
P: Aham
AJ: E tirando esses momentos, têm livros na sua sala? Quando você sente vontade de ler, você tem acesso a livros? Como que é?
P: Tem sim. É assim... tem o muralzinho que é o Cantinho da Leitura, aí você pode ler gibi ou você também pode ler livro. Aí tem alí a parte dos gibis e a parte dos livros. Normalmente eu gosto mais de ler gibi.
AJ: Mas você pode pegar a qualquer momento? Que horas você pode ir no Cantinho da Leitura?
P: É... quando a Tia Patrícia está em sala, quando a gente já copiou bastante coisas, e ainda tem hora para a gente ficar em sala e a gente não está fazendo nada, aí a gente pode ir lá na mesa da tia e pedir para ela, perguntar assim: “Tia Patrícia, a gente pode ir lá no Cantinho da Leitura e ficar lendo um livro?” Aí a tia pode deixar ou não.
AJ: Certo... E disso tudo que você me falou, o que você mais gosta?
P: Do que eu mais gosto... É a sexta-feira agora quando a Tia
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Patrícia manda um livro.
AJ: Ah... a professora manda um livro para a casa? Como é isso?
P: É assim, tem um monte de pastas vermelhas e dentro dessas pastas tem livros. Nesses livros já estão escritos nossos nomes que a Tia colocou, aí a tia abre a pasta, fala o nome e dá para a criança e daí por diante. Ou ela escolhe algum aluno para poder ela dar o livro.
AJ: E você leva esse livro para casa?
P: Isso. Aí eu tenho que lê o sábado e o domingo. E quando a gente volta, a gente tem que falar sobre esse livro.
AJ: Então isso é o que você mais gosta?
P: É... é o que agora eu mais gosto.
AJ: Então tá, P.! Muito obrigada!
P: De nada! Tchau!
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ANEXO IV – Quadros de Análise de Conteúdo Grupo D TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA REALIZADA NO DIA 17 DE DEZEMBRO DE 2015. LOCAL: ESCOLA MUNICIPAL ANÍSIO TEIXEIRA (SALA DE PROFESSORES) ENTREVISTADA: ETIENE DAVID ENTREVISTADORA: ANA JULIA CAMPOS HORÁRIO DE PERMANÊNCIA: 16: 32H ÀS 16:44 h TEMPO DE GRAVAÇÃO: 12 MINUTOS Legenda de cores: AMARELO: Todos os destaques referidos a apresentação
ROSA: práticas leitoras/ narração da experiência leitora
AZUL: Dados demográficos e sócio-culturais.
VERMELHO: Pessoas significativas.
VERDE: Definições e conceitos sobre formação leitora.
CINZA: recorrência na fala de tempos/espaços
CINZA ESCURO: explicação do trabalho desenvolvido/compreensão
Apresentação
Definições de leitor
AJ: Boa Tarde, Etiene. Se apresente, por favor.
E: Meu nome é Etiene. Sou mãe da S. que cursou o quinto ano
aqui nessa unidade.
AJ: Etiene, eu gostaria que você me falasse o que você
considera como características que definem um leitor.
E: Eu acredito que um leitor seja aquele que lê sem a
obrigação de ler. Porque em vários momentos você é obrigado
a ler, mas quando você busca a leitura como uma maneira até
de diversão ou como uma maneira de prazer, de aumento do
seu conhecimento, buscar essa forma, isso é um leitor. Eu acho
isso.
AJ: A S. é uma leitora?
E: É! É leitora desde antes de decodificar a escrita. Ela sempre
gostou de manusear livros, isso desde bebê teve esse incentivo
de ter os livros a mão. E assim, muito estranhamente, sempre
preferiu livro a brinquedo. Ela pede livro, ela tem muito mais
livros do que brinquedos e gosta, lê rápido. Quando existe, por
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Influência (s)
Conceito/compreensão
referentes à formação
leitora
Práticas leitoras
exemplo, um filme com um livro, ela quer ler o livro primeiro,
não quer ver o filme. Faz análise crítica do filme, porque
normalmente é diferente (do livro). Então, ela é leitora sim.
AJ: A S. está com quantos anos?
E: 11 anos.
AJ: E como que você avalia o papel da Escola Municipal
Anísio Teixeira na formação da S. como leitora? Eu sei que a
S. ficou apenas um ano na escola, apenas o último ano, mas
você acha que as práticas de leitura que existem na escola, de
alguma forma, influenciaram a S.?
E: Como eu disse, esse interesse da S. pelos livros já é muito
antigo - desde antes de decodificar a escrita. E existem alguns
espaços na escola que propiciam, no caso dela, o estímulo de
continuar sendo assim, de não deixar de ser assim e estimular
que ela trouxesse uma troca. De que ela se colocasse como
leitora e como se “picasse” as outras crianças em volta dela
que terminaram o ano gostando de ler também um pouco mais.
Além de ter espaços dentro da escola que proporcionam essa
formação do leitor, existe a possibilidade dessa troca, existe o
estímulo para que essa troca aconteça. Então aconteceu essa
troca dela com os colegas, de ela ter ajudado a estimular outros
alunos.
AJ: Ser um exemplo?
E: Isso. Porque isso que acho que é um papel da escola. Não
tolir isto. De trazer uma coisa positiva de uma criança,
aproveitar isso e saber semear com outras esse mesmo
interesse. Que só tem a crescer. Eu sei que isso é propaganda
de jornal, mas quem lê sabe mais!
AJ: Está ótimo, Etiene. Parabéns pela filha tão especial que
você tem. Muitíssimo obrigada.
E: Obrigada a você.
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