alimentos compensatÓrios: meio de restabelecer … · 1.1 aspectos introdutórios: conceito e...
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Faculdades Integradas – Fundação Educacional Dr. Raul Bauab - Jahu ISSN 2318 - 566X
Revista de Direito das Faculdades Integradas de Jaú
Volume 3 – 2015
ALIMENTOS COMPENSATÓRIOS: MEIO DE RESTABELECER O
EQUILÍBRIO SOCIOECONÔMICO ENTRE EX-CONSORTES
Elimei Paleari do Amaral Camargo* Jaime Leônidas Miranda Alves**
RESUMO - O presente trabalho tem como objetivo tecer uma análise qualitativa
acerca do instituto dos alimentos compensatórios, construção doutrinária amparada
no direito francês e espanhol que tem vistas a restabelecer o equilíbrio econômico-
financeiro existente entre os consortes, tal qual era na constância da relação familiar.
PALAVRAS-CHAVE: Alimentos compensatórios; direito comparado; direito das
famílias.
ABSTRACT – The presente work aims to make a qualitative analysis about the institute
of rehabilitative alimony, doctrinal creation with basis on the french and spanish law,
that aims to reestablish the economic and financial balance between consorts, as it
was during their Family relationship.
KEYWORDS: Rehabilitive alimony; comparative law; families law.
INTRODUÇÃO
O Direito Civil passou nos últimos anos por diversas mudanças com a
promulgação do Novo Código Civil, na década passada, e o advento de teorias que
analisaram sob novo prisma muitos de seus institutos clássicos. Ocorreu o fenômeno
de constitucionalização do Direito Privado, fazendo com que instituições do Direito
Civil fossem regaladas a nível constitucional passando a serem observados
consoantes princípios constitucionais e também mediante o direito internacional dos
direitos humanos.
Essas modificações foram mais radicais ainda no tocante ao Direito das
Famílias, que se tornaram complexas e multifacetárias. Nesse diapasão, surgem
novos institutos, como a união estável e a ampliam-se as possibilidades jurídicas de
família, além de construções doutrinárias embebidas em legislações e aspirações
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alienígenas, tais como os alimentos compensatórios, que ganham a cada dia, mais
relevância nos tribunais
O instituto dos alimentos compensatórios é criação nova no ordenamento
pátrio, influenciada diretamente dos ordenamentos francês e espanhol, e busca
restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro existente entre os ex-consortes,
restaurando, na medida do possível, o padrão de vida de ambos na constância da
relação familiar, seja matrimonial ou extramatrimonial.
Com efeito, não há legislação que regulamente os alimentos compensatórios,
fato que gera uma verdadeira neblina acerca de sua eficácia e aplicabilidade.
Questiona-se, assim, a relevância da aplicação dos alimentos compensatórios como
garantidor do princípio constitucional civil da solidariedade familiar e agente
reestruturador do equilíbrio econômico-financeiro entre ex-consortes.
Tal análise se faz importante no sentido em que responde questionamentos e
busca apontar diretrizes para a consolidação do Direito Civil Constitucional, que adota
como baluartes prímados da Teoria do Direito, tais como a dignidade da pessoa
humana, a solidariedade social e a igualdade entre os cônjuges.
Para tanto, foi realizado pesquisa de ordem bibliográfica, tendo a problemática
sido respondida por meio da utilização do método indutivo, que possibilitou criar um
entendimento concreto por meio de embasamentos abstratos.
1 ALIMENTOS
1.1 Aspectos introdutórios: conceito e natureza jurídica.
Para fins didáticos, faz-se mister a conceituação dos alimentos consentânea à
doutrina majoritária. Assim, Gomes (2002, p. 427) define alimentos como “prestações
para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si”.
Conforme Gonçalves (2008, p. 449), alimentos compreendem “não só o indispensável
ao sustento, como também o necessário à manutenção da condição social e moral do
alimentado”.
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A obrigação de prestar alimentos decorre do direito fundamental de sobreviver.1
Com efeito, sobreviver implica em garantir a vida, própria ou de outrem, de maneira
digna, consoante o disposto no art. 1°, III da Constituição Federal de 1988, princípio
delineador das estruturas do Estado Democrático de Direito. Todavia, como
consequência da impossibilidade do Estado Mínimo de prover ao indivíduo o
necessário para sua subsistência (digna)2, surge toda a regulamentação acerca do
direito de alimentos que, numa visão pós-positivista, deixa de ser apenas instrumento
de afirmação da dignidade da pessoa humana para se tornar expressão do princípio
constitucional da solidariedade.3 Nesse contexto, a solidariedade geral passa a ser
observada pelo prisma da solidariedade familiar. Observa-se que o direito à prestação
de alimentos pode ser tido como afirmação do disposto no art. 3°, da Carta Política,
que prevê como objetivos da República a “erradicação da pobreza e da
marginalização social”
Nesse sentido, preleciona Coelho (2012, p. 195):
1 Talvez se possa dizer que o primeiro direito fundamental do ser humano é o de sobreviver. E este, com certeza, é o maior compromisso do Estado: garantir a vida. Assim, é o Estado o primeiro a ter a obrigação de prestar alimentos aos seus cidadãos e aos entes da família, na pessoa de cada um que a integra. [...] Mas infelizmente o Estado não tem condições de socorrer a todos, por isso transforma a solidariedade familiar em dever familiar. Este é um dos principais efeitos que decorrem da relação de parentesco. (DIAS, 2010, p. 505) No mesmo sentido, Venosa (2008, p. 349): Em linha fundamental, quem não pode prover a própria subsistência nem por isso deve ser regalado ao infortúnio. A pouca idade, a velhice, a doença, a falta de trabalho ou qualquer incapacidade pode colocar a pessoa em estado de necessidade alimentar. A sociedade deve prestar-lhes auxílio. O Estado designa em primeiro lugar os parentes para fazê-lo, aliviando em parte seu encargo social. Os parentes podem exigir um dos outros os alimentos e os cônjuges devem-se mútua assistência. A mulher e o esposo, não sendo parentes ou afins, devem-se alimentos como fundamento no vínculo conjugal. Também os companheiros em união estável estão na mesma sotiação atualmente. Daí decorre, igualmente, o interesse público em matéria de alimentos. Como vemos, a obrigação alimentar interessa ao Estado, à sociedade e à Família 2 Silvio Rodrigues (2004, p. 373) dispõe que “a tendência moderna é a de impor ao Estado o dever de socorro aos necessitados, tarefa que ele se desincumbe, ou deve desincumbir-se, por meio de sua atividade assistencial. Mas, no intuito de aliviar-se desse encargo, ou na inviabilidade de cumpri-lo, o Estado o transfere, por determinação legal, aos parentes, cônjuges ou companheiro do necessitado, cada vez que aqueles possam atender a tal incumbência”. 3 Nesse sentido, Farias e Rosenvald (2010, p. 665) afirmam que os alimentos, ab initio, são constituídos sob o prisma da virtude e da necessidade ético-teologal, para a posteriori serem caracterizados como princípio jurídico,
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Nos horizontes delineáveis pelo modo de produção capitalista, a família ainda
deve exercer a função assistencialista, afinal em sistemas econômicos, como
o nosso, de crises periódicas e injustiças permanentes, é difícil construir-se
um programa eficiente de Seguridade Social, e, por isso, a família tenda a
não se desvincilhar tão cedo do encargo de amparo aos seus, nas
enferminades e velhice. Mesmo que o acúmulo social de força de trabalho
permita ao Estado, no futuro, garantir sua recuperação fora da família, os
laços afetivos nela existentes tendem a reservar sempre algum espaço
para a assistência aos seus membros. (grifo nosso)
Muito se debate na doutrina civilista acerca da natureza jurídica dos alimentos. A
esse respeito, há verdadeira celeuma entre os estudiosos do direito das famílias que
se filiam a diversas correntes teorias, não havendo assim, qualquer tipo de consenso.
Para Dias (2010, p. 506-507), obrigações de natureza alimentar extrapolam o
âmbito do direito das famílias, coexistindo, também: “pela prática de ato ilícito; (b)
estabelecidos contratualmente; ou (c) estipulados em testamento” , havendo em
cada hipótese peculiaridades atinentes à origem da obrigação. No direito de família,
propriamente, a obrigação alimentar recebe natureza a depender da fonte da
obrigação. Nesse contexto, a obrigação de prestar alimentos possui natureza
eminentemente principiológica, decorrendo do poder familiar, “dever dos pais de
sustentar os filhos” e da mútua assistência, “decorrente do casamento e da união
estável.”
Gonçalves, (2008, p. 451) filiado à lição de Gomes (2002, p. 179), conquanto
admita a existência das teorias da natureza de direito pessoal extrapatrimonial, e de
direito patrimonial, qualifica os alimentos como “direito de conteúdo patrimonial e
finalidade pessoal.” A essa corrente, acrescenta-se o posicionamento de Diniz (2008,
p. 556) que enxerga nos alimentos natureza mista, em razão de, nas palavras da
autora, apresentarem-se como “uma relação patrimonial de crédito-débito”, todavia,
tenha sua finalidade destinada à mantença digna da vida.
Vale menção ainda, a teoria defendida por Farias e Rosenvald (2010, p. 669),
segundo a qual os alimentos se caracterizam por sua natureza de direito da
personalidade, tendo em vista que “se destinam a asseguram a integridade física,
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psíquica e intelectual de uma pessoa humana”. Tal pensamento parece o mais
apropriado sob uma interpretação consoante os princípios da Constituição Federal de
1988 que refletem sob todo o direito das famílias.
Por fim, ultrapassado os questionamentos preliminares, volta-se a falar do princípio
da dignidade da pessoa humana, que consoante a assertiva de Farias e Rosenvald,
(p. 665,) “é a pedra de toque da fixação dos alimentos”, condicionando, assim, toda
regulamentação e aplicação desse instituto do direito civil-constitucional.
1.2 Introito Histórico
A doutrina é uníssona a apontar o direito romano como origem do instituto dos
alimentos, como é hoje conhecido. Malgrado a obrigação alimentar não se encontrava
conceituada no direito romano, suas facetas se faziam presentes em diversos
institutos, tais como o testamento, e a convenção, por exemplo.
Todavia, num primeiro momento, ainda do florescimento da monarquia romana,
não havia de se falar em prestação alimentar uma vez que, segundo Cahali (2008, p
.40) :o pater familias concentrava em suas mãos todos os direitos, sem que qualquer
obrigação o vinculasse aos seus dependentes, sobre os quais, alias, tinha o ius vitae
et necis”.
Assim, nesse momento histórico, aqueles que se encontravam “vinculados ao
pater famiiae não poderiam exercitar contra ele nenhuma pretensão de caráter
patrimonial, pois todos eram privados de qualquer capacidade patrimonial.”1 (GULIM;
LIGEIRO, p. 7, 2009)
A respeito da prestação alimentar no seio da família, romana, aduz Pereira (2003, p. 3):
Entre os romanos, os alimentos concedidos pelo marido à esposa, diziam-se prestados a título de officium pietatis, espelho da situação de inferioridade, restrição de direitos e discriminação, em que então vivia a mulher, a exemplo
1O mesmo é o entendimento de Leite (2005, p. 23), que aponta como característica da família romada a subordinação de seus integrantes ao pater famílias e de Buzzi (2003, p. 26), que aponta o modelo hierárquico vertical estruturantes dos agrupamentos familiares, e na qual, mais uma vez, a figura paterna possuía o comando do lar.
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dos filhos e dos escravos, submetida à autoridade do pater famílias, que sobre eles, inclusive, detinha o poder de vida e morte (ius vitae et nescis).
Com a evolução e eventual complexidade da sociedade romana, e significativa
modificação da estrutura do pater familias foi criado uma legislação que amparava os
cônjuges, ascendentes, ascendentes, descendentes, irmãos e irmãs, transformando
o dever social de prestar alimentos em dever jurídico.
O direito justiniano traçou os primeiros contornos acerca da obrigação de
prestação alimentos como instituto autônomo. Foi reconhecido a obrigação alimentar
“entre ascendentes e descendentes em linha reta ao infinito, paternos e maternos na
família legítima, entre ascendentes maternos, pai e descendentes na família ilegítima”.
(FRANCO; MACEDO et al, 2008, p. 144)
Foi no direito canônico, que se deu o grande desenvolvimento acerca do
instituto dos alimentos, uma vez que foi disciplinado um corpo normativo no qual a
obrigação de prestação alimentícia se estendeu sobrepondo os limites da relação
matrimonial e familiar. Assim, foram alcançados aqueles vinculados por uma relação
de família ilegítima1, por parentesco civil e espiritual. Excepcionalmente, o direito
canônico admitia a obrigação da Igreja Católica e do Estado em prover o mínimo
necessário para aquele incapacitado de prover sua subsistência.
1.2.1 Evolução do instituto dos alimentos no ordenamento brasileiro
No direito brasileiro pré-codificado, período marcado pelo início da colonização
lusitana e organização das Ordenações Filipinas já existiam alguns dispositivos que
tutelavam o direito objetivo aos alimentos, seja por parte do Estado ou da própria
família. Entre outras medidas2, era facultado ao juiz dar o necessário para a
1 Nesse contexto, foi abolido a exceptio plurium cumcumbentum, que previa que o filho ilegítimo fosse excluído da obrigação. 2 Dispõe o art. 230 das Ordenações Filipinas que “o direito recíproco à prestação de alimentos entre pais e filhos é extensivo a todos os ascendentes e descendentes, recaindo a todos os ascendentes e descendentes , recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, um em falta de outros.” E o art. seguinte: “os irmãos são obrigados a alimentar os irmãos por todos e quaisquer bens que possuam.”
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sobrevivência dos órfãos, e garantir que aprendessem a ler e escrever até a idade de
12 anos. Tal fato demonstra que, embora de maneira precária, a obrigação alimentar
já existia muito antes do início da vigência do Código Civil de 1916.
Com a evolução dos entendimentos principiológicos sustentadores do
ordenamento pátrio no último século, o instituto dos alimentos mudou drasticamente.
Com efeito, com o advento do Código Civil de 1916, período no qual ainda se cogitava
falar em pátrio poder1, era negado direito subjetivo a alimentos aos filhos ilegítimos,
expressão utilizada para determinar – e por que não, discriminar? – aqueles havidos
fora do casamento.
A situação de reconhecimentos dos filhos espúrios se modificou sensivelmente,
com a promulgação das Leis 883/49 e 7.841/89, conforme lição de Dias (2010, p. 503):
Somente 30 anos após foi permitido ao filho de homem casado promover, em segredo de justiça, ação de investigação de paternidade, apenas para buscar alimentos2. Embora reconhecida a paternidade, a relação de parentesco não era declarada, o que só podia ocorrer depois de dissolvido o casamento do genitor. Somente em 19893, é que foi admitido o reconhecimento dos filhos “espúrios” em face do princípio da igualdade entre os filhos, consagrado pela Constituição Federal.
Nesse contexto, a obrigação alimentar decorrente de casamento era atribuída em
desfavor do marido para com a mulher, inocente e pobre. A única hipótese em que
não subsistiria a obrigação de prestação alimentícia em favor da mulher, era havendo,
por parte desta, abandono do lar sem motivo justificado, vez que sua condição de
honestidade era condição si ne qua non para a obtenção do benefício dos alimentos.
Nas palavras de Dias: (2010, p. 503) “para fazer jus a eles, (alimentos), a mulher
precisava provar não só a sua necessidade, mas também que era pura e recatada,
além de fiel ao ex-marido, é claro.” Tal assertiva apenas reforça o perfil conservador
e patriarcal da época.
1 Entende-se que expressão pátrio poder se encontra atualmente em desuso em razão da incompatibilidade material face à Constituição Federal de 1988, que estatuiu, entre outros, os princípios da igualdade e respeito à diferença e o da solidariedade familiar. Nesse contexto, não cabe mais falar em pátrio poder, mas sim em poder familiar. 2 Lei 883/49 3 Lei 7.831/89
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Com a Lei do Divórcio, Lei 6.515/77, qualquer dos cônjuges poderia pagar
alimentos ao outro. O que se verificava, consoante a previsão legal era qual consorte
teve culpa pelo rompimento da relação matrimonial. Dispunha em seu art. 19: “o
cônjuge responsável pela separação judicial prestará ao outro, se dela necessitar, a
pensão que o juiz fixar”. Assim, apenas o cônjuge inocente poderia fazer jus à
prestação alimentícia, visto que a conduta não eivada de culpa era o pressuposto
fático para ser beneficiado com a pensão alimentícia. Afora os dispositivos já
mencionados, trataram, ainda que de maneira reflexa, sobre alimentos o Decreto-Lei
nº 10/58, o Decreto n.º 6.515/77, a Lei n.º 8.069 e o Novo Código Civil, Lei n.º
10.406/02.
Por fim, faz-se mister o comentário de que não só a legislação ordinária versa
acerca dos alimentos, visto que a Constituição Federal de 1988 trouxas em seu bojo
normas programáticas que, ainda que de forma implícita, versa sobre esse instituto, a
exemplo do art. 229 que estatui: “Os pais tem o dever de assistir, criar e educar os
filhos menores, e os filhos maiores tem o dever de ajudar e amparar os pais na velhice,
carência e enfermidade.”
1.3 Características dos alimentos
Tanto os alimentos quanto a obrigação alimentar propriamente dita possuem
características próprias de seus institutos que, todavia, complementam um ao outro.
Para o fim desse estudo, elenca-se algumas das características pertinentes aos
alimentos consoante entendimento da doutrina majoritária.
1.3.1 Personalíssimo
Os alimentos, em razão de se destinarem à subsistência do alimentando,
constituem direito pessoal, vale dizer, intransferível. Obtempera Gonçalves: (2008, p.
467) “a sua qualidade de um direito da personalidade é reconhecida pelo fato de se
tratar de um direito inato tendente a assegurar a subsistência e integridade física do
ser humano.
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1.3.2 Incessível
Cahali (2006, p.49-50) dispõe que “é direito personalíssimo no sentido de que
a sua titularidade não passa a outrem por negócio jurídico ou por fato jurídico.” Tem-
se, então que a impossibilidade de cessão de crédito futuro advindo da prestação de
alimentos não pode ser objeto de cessão ou qualquer espécie de transferência em
decorrência de seu caráter personalíssimo. (re. 1.3.1) A esse respeito, prevê o art.
1707 do Código Civil que o crédito decorrente de direito a alimentos é “insuscetível de
cessão.” Todavia, esse impedimento é de cunho relativo, haja vista que se a prestação
alimentar se encontrar vencida, isto é, já tiver se incorporado ao patrimônio do
alimentado, este pode dispor dela como bem entender.
1.3.3 Impenhorável
Reza o art. 1707 do Código Civil que o crédito decorrente de direito a alimentos é
“insuscetível de penhora”, o que busca resguardar a existência física do objeto
garantidor da mantença do alimentando. Segundo Gonçalves: (2008, p. 468) “as
apelações interpostas das sentenças que condenarem à prestação de alimentos são
recebidas apenas no efeito devolutivo, e não no suspensivo”. De forma análoga, veda
o art. 649, VII, do Código de Processo Penal a penhora das pensões destinadas ao
sustento do devedor ou de sua família. Faz-se mister, todavia, o comentário de que
a impossibilidade de penhora está vinculada apenas ao necessarium vitae, podendo
ser decretada a penhora do crédito de prestações vencidas.
1.3.4 Incompensável
Outra das garantias preconizadas pelo art. 1707 do Código Civil é a
impossibilidade de compensação dos créditos alimentícios. A compensação,
consoante lição de Diniz (1997, p. 172) pode ser entendida como: "... um modo de
extinção de obrigação, até onde se equivalerem, entre pessoas que são, ao mesmo
tempo, devedora e credora uma da outra". Uma vez que os alimentos se configuram
como o mínimo necessário para a manutenção da vida digna do alimentando, a
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compensação, ao extinguir total ou parcialmente a obrigação alimentícia, estaria
gerando prejuízo irreparável para a manutenção do alimentado.
1.3.5 Imprescritível
O direito aos alimentos é imprescritível. Vale dizer, o direito subjetivo do
indivíduo de postular em juízo o pagamento da prestação alimentícia, não prescreve,
ainda que o autor da ação tenha permanecido inerte por vários anos. Todavia,
conforme preceitua o art. 206, §2º, do Código Civil prescreve “em dois anos, a
pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data em que se vencerem.”
Assim, o que prescreve é o direito de cobrar as parcelas já fixadas em sentença, a
partir da data de seu vencimento.
1.3.6 Irrestituível
Acerca da irrepetibilidade dos alimentos, pondera Dias (2010, p. 511) que, uma
vez que se trata de verba destinada a garantir a vida e “se destina à aquisição de bens
de consumo para assegurar a sobrevivência, inimaginável pretender que sejam
devolvidos.” Conforme já se manifestou a jurisprudência pátria1, nem mesmo a
desconstituição do vínculo de paternidade, por meio de ação negatória de
paternidade, tem efeitos de restituir os alimentos prestados.
1.3.7 Intransacionável
1 Alimentos. Ação declaratória. Pretensão de obter a nulidade do acordo judicial que fixou alimentos em favor do réu, cuja paternidade foi desconstituída por decisão judicial. Enquanto não desconstituído o registro, produz ele todos os seus efeitos, em especial em relação à obrigação alimentar. Provimento parcial do recurso, para declarar a extinção da obrigação alimentar a contar do trânsito em julgado da sentença proferida nos autos da ação negatória de paternidade. Irrepetibilidade dos alimentos que impede a devolução dos valores já pagos. Ilegitimidade passiva dos corréus (ex-esposa e demais filhos do autor), em relação aos quais não se alterou a obrigação alimentar. Sentença de extinção, sem resolução de mérito, com relação a eles. Incidência de honorários advocatícios, Recurso do autor improvido. Recurso adesivo dos réus, provido em parte. (TJSP, AC 620.9084.4/0,Ac,3717764, 4º Cam. Dir. Priv., j 25.06.2009, rel. Des. Francisco Loureiro).
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Essa característica é consequência do caráter indisponível e personalíssimo do
direito aos alimentos, e se encontra prevista no art. 841 do Código Civil que permite a
transação apenas “quanto aos direitos patrimoniais de caráter privado”. Tem-se,
todavia, que a natureza intransacionável está relacionada ao direito de pedir
alimentos, uma vez que o quantum pode ser objeto de juízo arbitral ou de
compromisso. (GONÇALVES, 2008, p. 470)
1.3.8 Atual
Em decorrência da natureza de trato sucessivo e periódico da prestação
alimentar, o legislador previu no art. 1710 do Código Civil atualização monetária
segundo índice regularmente estabelecido com fins de impedir que os efeitos da
inflação diminuíssem o valor da prestação, o que prejudicaria a mantença do
alimentando. O direito aos alimentos deve ser percebido ad futurum, não ad
praeteritum, consoante o brocardo in praeteritum non vivitur. A necessidade da
concessão dos alimentos é inadiável sob pena de prejuízo irreparável ou de difícil
reparação.
1.3.9 Irrenunciável
Acerca da irrenunciabilidade do direito aos alimentos, dispõe Venosa (2008, p.
355) “o direito pode deixar de ser exercido, mas não pode ser enunciado, mormente
quanto aos alimentos derivados do parentesco”. Tal entendimento se mostra
consoante o previsto no art. 1707 do Código Civil, malgrado, hoje se tenha o
entendimento majoritário da jurisprudência e da doutrina civilista em sentindo
contrário. Segundo a corrente mais expressiva, da qual se destaca o posicionamento
de Farias e Rosenvald (2010, p. 641):, há de se falar em irrenunciabilidade dos
alimentos apenas na hipótese em que o alimentando é incapaz nos moldes dos art.
3º e 4º do Código Civil. Obtemperam:
Dessa maneira, apesar da redação do art. 1.707 do Codex, é possível concluir que o entendimento prevalecente é no sentido de que os alimentos são irrenunciáveis,
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apenas, quando fixados em favor de incapazes, como no exemplo dos alimentos devidos entre pais e filhos ou entre avós e netos (alimentos avoengos). Entre cônjuges, companheiros e parceiros homoafetivos, quando do término do casamento, da união estável ou da união homoafetiva, respectivamente, admite-se a renúncia, sendo vedada a cobrança posterior do pensionamento, até porque a relação jurídica familiar já se extinguiu.
Nesse sentido, o Enunciado 263 da Jornada de Direito Civil, que preceitua que o
art. 1707 do Código Civil não veda o reconhecimento válido e eficaz de “renúncia
manifestada por ocasião do divórcio ou da dissolução da união estável. A
irrenunciabilidade do direito a alimentos somente é admitida enquanto subsiste vínculo
do Direito de Família”.
A par das características supramencionadas, a doutrina enumera algumas outras,
tais como a reciprocidade, inalienabilidade, alternatividade, anterioridade e
peridiocidade.
2 ALIMENTOS COMPENSATÓRIOS COMO MEIO DE RESTABELECER O
EQUILÍBRIO SOCIOECONÔMICO ENTRE OS EX-CONSORTES
Ultrapassado o ensaio acerca das noções gerais do instituto dos alimentos, inicia-
se a análise acerca dos alimentos compensatórios e sua papel em estabelecer o
equilíbrio socioeconômico.
O fim do enlace, matrimonial ou extramatrimonial, traz como consequência a
modificação de vários aspectos da vida dos ex-companheiros. Tais modificações,
como regra, não interessam ao Direito, visto que são acontecimentos ordinários,
típicos da extinção da entidade familiar.
Contudo, ocorrendo a hipótese em que um dos cônjuges tenha por modificado
seu padrão de vida econômico de maneira a ameaçar a sua própria mantença, faz-se
necessário uma compensação por parte do ex- companheiro, que se dá na figura dos
alimentos compensatórios.
Alimentos compensatórios são aqueles existentes quando do fim da relação
matrimonial, ou de união estável, subsiste a necessidade de “equiparar os perversos
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efeitos decorrentes da ruptura da conjugalidade, diminuindo as perdas do padrão de
vida social e econômico de um dos consortes.” (FARIAS; ROSENVALD, 2010, p. 790).
Nesse diapasão, faz-se mister a menção à tentativa conceitual de Almeida e
Rodrigues Júnior ( 2012, p. 413) acerca dos alimentos compensatórios:
Considera-se o intuito da prestação comprensatória como uma nova técnica substitutiva da pensão alimentícia conjugal, consistindo num pagamento destinado a compensar, no que couber, o desequilíbrio econômico ocasionado pela extinção do casamento e da união estável nas condições de vida do cônjuge ou companheiro.1
Observa-se que o instituto dos alimentos compensatórios se faz presente
apenas nas hipóteses em que foi adotado, seja por força da Lei, seja por manifestação
volitiva dos ex-consortes o regime de separação de bens2. Ressalva-se que, mesmo
nesses casos, não se busca equiparar as condições financeiras daqueles que eram
casados ou viviam em união estável, visto que a desigualdade econômica existia
ainda durante o período em que conviveram, sendo suprida pelo outro consorte em
decorrência do dever de assistência que regia a relação familiar.
Na teoria de alimentos compensatórios não se cumpre discutir qual dos cônjuges
agiu com culpa para com o fim da relação afetiva, uma vez que o instituto em questão
não objetiva a indenização, mas apenas a compensação daquele prejudicado
economicamente. Estima-se o “o que cada um já possuía, perdeu ou deixou de
produzir em função do relacionamento” (MADALENO, 2011, p. 20), que poderá ser
1Ainda nesse diapasão, Madaleno, (2011, p. 951) qualifica a pensão compensatória como “(...) uma prestação periódica em dinheiro , efetuada por um cônjuge em favor do outro esposo, por ocasião da separação ou do divórcio vincular, em que se produza desequilíbrio econômico em comparação com o estilo de vida experimentado durante a convivência matrimonial, compensando deste modo, a sensível disparidade que o separando alimentário irã deparar com a separação em sua padronagem social e econômica, comprometendo, com a ruptura das núpcias os seus compromissos materiais, seu estilo de vida, e a sua própria subsistência. 2 O regime de separação de bens se caracteriza por não se comunicarem os frutos e aquisições e por permanecerem cada cônjuge na propriedade, posse e administração de seus bens. É aquele em que cônjuges conservam não apenas o domínio e a bens presentes e futuro, como também a responsabilidade pelas dividas anteriores e posteriores ao casamento. Pode ser consensual, quando escolhido mediante pacto antinupcial ou legal, quando o matrimônio ocorre em algumas das hipóteses previstas no art. 1641 do Código Civil.
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convertido na forma de pensão compensatória, relativizando-se, assim, o regime da
separação de bens.
Conforme ensina Gridard Filho (2012, p. 118) os alimentos compensatórios
ingressaram nos tribunais brasileiros por meio das influências exercidas pelo direito
comparado, a destacar o francês1 e o espanhol2, uma vez que a legislação brasileira
ainda não regulamentou propriamente este instituto.
Nesse sentido, o instituto dos alimentos compensatórios vem ganhando força na
doutrina e jurisprudência pátria com vistas a garantir o princípio constitucional da
1 No Direito francês, a Lei nº 75-617/75 é o marco legal inicial da discussão do instituto dos alimentos compensatórios, visto que substituiu a pensão alimentícia pela compensatória que passou a vigorar havendo dissolução matrimonial. Posteriormente, a Lei nº 2004-439/2004, deu nova redação ao art. 270 do Code, que passou a regulamentar a pensão compensatória, nos termos que se seguem: Le divorce met fin au devoir de secours entre époux. L'un des époux peut être tenu de verser à l'autre une prestation destinée à compenser, autant qu'il est possible, la disparité que la rupture du mariage crée dans les conditions de vie respectives. Cette prestation a un caractère forfaitaire ( O divórcio põe fim ao dever de socorro mútuo. Um dos cônjuges pode ser obrigado a abonar ao outro uma prestação destinada a compensar, na medida do possível, o desequilíbrio que a ruptura do matrimônio cria nas condições de vida respectivas.) 2 O Direito espanhol, sabidamente influenciado pelo francês, estabelece na Lei n.º30/1981 a pensão
compensatória. Ademais, o art. 97 do Código Civil espanhol prevê que: El cónyuge al que la separación
o divorcio produzca un desequilibrio económico en relación con la posición del otro, que implique un
empeoramiento en su situación anterior en el matrimonio, tendrá derecho a una compensación que
podrá consistir en una pensión temporal o por tiempo indefinido, o en una prestación única, según se
determino en el convenio regulador o en la sentencia. (Ao cônjuge que a separação ou divórcio produza
um desequilíbrio econômico em relação à posição do outro, que implique em uma piora relação à
situação da época do casamento, terá direito a uma compensação que poderá consistir em uma pensão
temporal ou por tempo indefinido, ou em uma prestação única, segundo se determinará em sentença.
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igualdade entre os gêneros1 e o princípio da solidariedade familiar2, que entende-se
resistir mesmo ao fim da relação conjugal. (SOUZA, 2013, p. 40)
Apesar da ausência de previsão legal, o adoção significativa da teoria do instituto
dos alimentos compensatórios pelos tribunais3 se dá em razão dos baluartes deste
1 Com este princípio da igualdade jurídica dos cônjuges e companheiros, desaparece o poder marital, e a autocracia do chefe de família é substituída por um sistema em que as decisões devem ser tomadas de comum acordo entre conviventes ou entre marido e mulher, pois os tempos atuais requerem que marido e mulher tenham os mesmos direitos e deveres referentes à sociedade conjugal, o patriarcalismo não mais se coaduna com a época atual, nem atende aos anseios do povo brasileiro; por isso juridicamente, o poder de família é substituído pela autoridade conjunta e indivisiva, não mais se justificando a submissão legal da mulher. Há uma equivalência de papéis, de modo que a responsabilidade pela família passa a ser dividida igualmente entre o casal. (DINIZ, 2008, p. 19). O princípio da igualdade dos cônjuges é previsto na Constituição Federal de 1988, nos arts 5°: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza... I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações nos termos desta constituição” e art. 226: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado... § 5° os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”. 2 Tal princípio decorre do princípio da solidariedade social (artigo 3º, inciso, I, da CRFB) e pode ser observado sob seus ângulos interno e externo. Se for observado externamente, pode-se dizer que cabe ao Poder Público, assim como à sociedade civil, a promoção de políticas públicas que garantam o atendimento às necessidades familiares dos pobres e excluídos. Contudo, se for analisado internamente, percebe-se que cada membro componente de um determinado grupo familiar tem a obrigação de colaborar para que os outros membros da família obtenham o mínimo necessário para o seu completo desenvolvimento biopsíquico. (LISBOA, 2002, p. 47) Paulo Luiz Netto Lôbo (2007, p. 05) aduz: “Assim, podemos afirmar que o princípio da solidariedade é o grande marco paradigmático que caracteriza a transformação do Estado liberal e individualista em Estado democrático e social, com suas vicissitudes e desafios, que o conturbado século XX nos legou. É a superação do individualismo jurídico pela função social dos direitos. [...] A solidariedade instiga a compreensão da família brasileira contemporânea, que rompeu os grilhões dos poderes despóticos – do poder marital e do poder paterno, especialmente – e se vê em estado de perplexidade para lidar com a liberdade conquistada. Porém, a liberdade não significa destruição dos vínculos e laços familiares, mas reconstrução sob novas bases. Daí a importância do papel da solidariedade, que une os membros da família de modo democrático e não autoritário, pela corresponsabilidade. 3APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO - SEPARAÇÃO - ALIMENTOS COMPENSATÓRIOS -
CABIMENTO - Cabe a fixação de alimentos compensatórios, em valor fixo, decorrente da administração exclusiva por um dos cônjuges das empresas do casal. Caso em que os alimentos podem ser compensados, dependendo da decisão da ação de partilha de bens, bem como não ensejam possibilidade de execução pessoal sob o rito da prisão. (AC 70026541623, Rel. Des. Rui Portanova, J. 04.06.2009) AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXPLORAÇÃO EXCLUSIVA DE BEM COMUM - ALIMENTOS INDENIZATÓRIOS - POSSIBILIDADE - A empresa objeto de litígio é bem comum. Logo, os frutos dela colhidos devem ser partilhados, porquanto os frutos de bem comum são igualmente comuns (CCB, art. 1.660, V). Cabível a fixação de alimentos de caráter indenizatório quando um dos cônjuges encontra-se na posse exclusiva da empresa comum e de sua exploração retira considerável renda que antes mantinha a entidade familiar. (AI 70027899350, Rel. Des. Rui Portanova, J. 21.05.2009) Bem como o Agravo de Instrumento nº 20110020035193 (TJ-DF) e Habeas Corpus nº 2009.00.2.013078-8 6, (TJ-
DF), Ainda, Agravo de Instrumento AI 70048894281 RS (TJ-RS); Agravo de Instrumento AI 35193120118070000 DF 0003519-31.2011.807.0000 (TJ-DF); Agravo de Instrumento AI 47016 SC 2010.004701-6 (TJ-SC); Agravo de Instrumento AI 3791 SC 2010.000379-1 (TJ-SC); RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS RHC 28853 RS
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institutos se moldarem consoante os princípios constitucionais da solidariedade,
dignidade da pessoa humana, responsabilidade e igualdade”, princípios estes
fundamentais ao Direito de Família”.(PEREIRA, 2010, p. 135)
A doutrina pátria acerca dos alimentos compensatórios, apesar de ancorada em
legislação e posicionamentos alienígenas, em alguns pontos parece ultrapassar suas
influências de Direito Comparado. Exemplo do que foi dito é a possibilidade daquele
que vivia em união estável, e não apenas o ex-casado, cobrar alimentos
compensatórios, fato que não encontra previsão no direito supranacional.
No estudo de Direito comparado, fala-se muito acerca das regulamentações
francesas e espanholas no tocante aos alimentos compensatórios, todavia, cumpre
mencionar que o direito Alemão também foi de grande influência no desenvolvimento
da teoria pátria. Com efeito, prevê o Bürgerliches Gesetzbuch pensão de natureza
compensatória ao ex-consorte que comprovadamente não puder trabalhar e, em
forma previdenciária, à parte que se dedicou aos trabalhos domésticos na constância
do casamento. (PEREIRA, 2010, p. 146).
A legislação francesa, já comentada, se distancia das outras no tocante ao caráter
definitivo do prestação compensatória. No sistema francês, nem mesmo a
comprovada restabilização do equilíbrio econômico-financeiro dos ex-consortes
possui o condão de extinguir o dever de prestar alimentos compensatórios.
No direito espanhol, em muitos aspectos similar ao francês, não havendo acordo
entre os cônjuges o juiz decidirá o quantum a ser pagado observando algumas
variáveis previstas em Lei, tais como a idade, o estado de saúde, a duração do
casamento e da convivência conjugal, entre outros.
Por fim, chama-se atenção à teoria argentina da pensão compensatória. Nesse
contexto, que se observa é um verdadeiro retrocesso quando comparado às doutrinas
2010/0155470-8 (STJ); Agravo de Instrumento AI 30046420098070000 DF 0003004-64.2009.807.0000 (TJ-DF); Agravo de Instrumento AG 195729220088070000 DF 0019572-92.2008.807.0000 (TJ-DF).
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supramencionados, em razão do ordenamento jurídico argentino ainda se
fundamentar na análise da culpa do cônjuge, tal qual o fazia o Código de Beviláquia,
no tocante às pensões alimentares ordinárias, como requisito para concessão de
pensão compensatória.
Tendo por concluído o estudo comparado, faz-se mister observar as diferenças
existentes entre a pensão alimentícia e a pensão compensatória, visto que esta tem
como pressuposto uma situação de desequilíbrio econômico entre os ex-consortes,
ao passo que aquela nasce da necessidade da parte para se sustentar.
Nesse diapasão, a pensão alimentícia regulada em lei (art. 1694, do Código Civil)
visa garantir a subsistência do credor no tocante às suas necessidades vitais, de
caráter assistencial, ao passo que a pensão compensatória tem como fim restabelecer
o equilíbrio econômico entre as partes, sobrevindo, assim, sua natureza reparatória.
(PRADO, 2005, p. 365)
Uma vez comprovado o binômio necessidade possibilidade, o pagamento de
pensão alimentícia não impede a fixação, por meio de sentença, de prestação
compensatória, por prazo indeterminado e de observância obrigatória até que a
restauração do equilíbrio econômico-financeiro entre os ex-consortes seja
reconhecida, também por sentença.
3 À GUISA DE CONSIDERAÇÕES
Este trabalho tratou acerca do instituto dos alimentos compensatórios. No Brasil,
o instituto dos alimentos compensatórios é construção doutrinária recente, fruto das
aspirações legislativas alienígenas, a destacar a francesa e espanhola, que recebeu
assento nos tribunais civis, a destacar o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e o
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, além de vários outros ao longo do
território que timidamente começaram a se manifestar nesse sentido.
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Toda a construção moderna a respeito dos alimentos compensatórios se torna
relevante, uma vez que se percebe que este instituto tem como finalidade precípua
garantir alguns dos mais importantes princípios constitucionais atinentes ao Direito
das Famílias. Nesse diapasão, a prestação compensatória ao ex-consorte que sofreu
prejuízo com o fim da relação afetiva funciona como mecanismo propulsor de eficácia
a princípios tais quais o da solidariedade familiar, e o da igualdade de gêneros.
Consentâneo o entendimento recente, os alimentos compensatórios vem como
maneira de relativizar as estruturas imperiosas do regime de bens, a destacar o da
separação legal, que muitas vezes, por imposição legal, vai de encontro à vontade
dos cônjuges e termina por limitar a solidariedade familiar.
Observa-se que no tocante aos alimentos compensatórios, apesar de não haver
regulamentação legal, ou talvez por isso, a teoria brasileira se destaca das demais em
razão de sua consonância com direcionamentos modernos no campo dos Direitos
Humanos. Nesse sentido, não apenas ao ex-cônjuge é regalado a pleitear alimentos
compensatórios, visto que os tribunais tem admitindo essa prerrogativa à figura do
companheiro.
Por fim, pode-se concluir que os alimentos compensatórios apresentam evolução
natural do Direito Civil Constitucional e a sua gradativa discussão na doutrina e na
jurisprudência revela a preocupação dos estudiosos e aplicadores do Direito em
garantir a solidariedade familiar e amparar aquele que, por qualquer razão, sofrem
prejuízo econômico financeiro com o fim da relação afetiva.
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