a geograficidade da agroecologia em comunidades tradicionais na mata sul de pernambuco
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A GEOGRAFICIDADE DA AGROECOLOGIA EM COMUNIDADES TRADICIONAIS NA MATA SUL DE PERNAMBUCO: DO SABER CAMPONS CONSTRUO DE TERRITRIOS-REDE
Robson Soares Brasileiro Doutorando do Programa de Ps-Graduao em
Geografia da Universidade Federal de Pernambuco e Integrante do Laboratrio de Estudos Sobre Espao, Cultura e Poltica LECgeo do Departamento de Geografia
da UFPE robsonbrasileiro@gmail.com
Nvia Lopes Delmiro de Souza Graduanda do Departamento de Cincias Geogrficas da UFPE; Integrante do LECgeo e Bolsista Pibic
niviadelmiro@hotmail.com
David Tavares Barbosa Graduando em Geografia Pelo Departamento de Cincias Geogrficas da UFPE; Integrante do Laboratrio de Estudos Sobre Espao, Cultura
e Poltica LECgeo e Bolsista Pibic davidtbarbosa@hotmail.com
RESUMO: A presente pesquisa tem como objetivo compreender a geograficidade de algumas comunidades tradicionais (camponesas) na Mata Sul do Estado de Pernambuco. Atravs da contribuio da Geografia Cultural, busca-se demonstrar que a representao das identidades culturais e territoriais na regio pode ser fortalecida pela insero de novos elementos que no descaracterize as tradies populares dos agricultores camponeses, mas contribuam de modo significativo para a emergncia do saber campons. Os aportes tericos para o desenvolvimento desta pesquisa fundamentam-se na Geografia Cultural e sua interface com os conceitos de territrio e territrios-rede, bem como entre outras reas do conhecimento cientifico. A partir da, compreender as diversas territorialidades desses sujeitos sociais a partir de uma identidade local fortalecida por uma agricultura camponesa de base agroecolgica pode nos trazer uma dimenso geogrfica dos territrios de referncia identitria em reas de predominncia do monocultivo da cana-de-acar. Palavras-chave: Territrios-rede, agroecologia, campons, geografia cultural. Introduo
A emergncia da identidade territorial
Este trabalho de pesquisa analisa a organizao territorial e cultural de
algumas comunidades tradicionais da Mata Sul do Estado de Pernambuco (mapa: 01). Foram selecionadas quatro (04) reas de agricultura familiar camponesa adeptas do cultivo de produtos agroecolgicos em suas propriedades, stios ou
assentamento de reforma agrria. A discusso procura privilegiar a anlise da
organizao territorial desses sujeitos sociais, a emergncia da identidade territorial
e cultural, alm do processo de resistncia atravs da articulao desses sujeitos
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sociais a outros atores institucionais e sociais. Nesse vis a anlise da Geografia
Humana a partir da perspectiva da Geografia Cultural fornece elementos essenciais
para melhor compreenso das novas territorialidades camponesas no contexto da
agricultura de base agroecolgica.
Assim, procura-se no decorrer do trabalho discutir as principais repercusses
das novas territorialidades camponesas no processo de resistncia da identidade
cultural e territorial dessas comunidades tradicionais. Essa identidade est
intimamente ligada ao vnculo que estes agricultores camponeses tem com o
territrio, a manuteno de suas tradies culturais, ao saber fazer e saber ser, aos
processos de solidariedade e, sobretudo a enorme capacidade de se reinventar e se
adaptar a novas situaes. Nesse caso, esses sujeitos sociais tm no territrio no
apenas o cho (o espao fsico delimitado), mas assimilam os aspectos da
dimenso poltica desses espaos. As novas territorialidades camponesas discutida
nesta pesquisa procura analisar a agricultura de base agroecolgica no apenas
como um processo de resistncia dentro dessas comunidades tradicionais, mas
como um processo simblico-cultural, muito embora a dimenso territorial esteja
mais prxima do debate geogrfico. Entretanto esta anlise a partir da Geografia
Cultural enriquece os aspectos materiais e subjetivos do territrio, possibilitando
outras vises sobre as diversas territorialidades tecidas por estes sujeitos sociais.
Objetivo
Um dos objetivos deste trabalho compreender a dinmica scio territorial de
algumas comunidades camponesas na Mata Sul de Pernambuco. Procura-se
analisar como a geograficidade dos atores e sujeitos sociais que atuam nos
territrios que sofreram transformaes na paisagem mediante as diversas
territorialidades vm contribuindo para o fortalecimento da agricultura camponesa de
base agroecolgica, bem como, para a emergncia do saber cultural dessas
comunidades tradicionais. Esse cenrio de novas territorialidades representa para os
agricultores camponeses um espao de possibilidade para a construo e
desenvolvimento de alternativas econmicas, culturais, polticas, ambientais e
sociais que se contrapem aos padres do setor sucroenergtico predominante na
regio.
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Referencial terico e conceitual
Entre a geograficidade e a identidade territorial
Para melhor compreenso da dinmica territorial dessas comunidades
tradicionais relevante compreender o processo de resistncia desses sujeitos
sociais. Quais as estratgias de superao dos entraves impostos pelo monocultivo
da cana-de-acar? Quais as causas e consequncias da desvalorizao do
comportamento cultural do outro? Essas so questes primordiais para melhor
entendimento das novas territorialidades camponesas na regio. Pois a emergncia
dessas territorialidades a partir da agricultura de base ecolgica permeia atravs da
articulao do saber cientfico com o saber cultural desses agricultores. Sendo
assim, a anlise geogrfica nesta pesquisa procura compreender esses territrios de
agricultura campesina atravs da dimenso cultural da geografia, onde as
experincias e as relaes entre as pessoas com os lugares so tambm
valorizadas a partir da relao simblico-cultural com o territrio. importante
entender que os estudos sobre identidade na Geografia Cultural bastante recente,
tendo na territorialidade um elemento essencial. Claval (2001) chama a ateno para
o desenvolvimento da identidade no territrio, pois segundo o autor, a manifestao
das identidades nem sempre so idnticas, pois elas podem ser mais expressivas
em alguns grupos e menos em outros.
A territorialidade fascina os gegrafos h uma gerao. O espao uma categoria vazia, que no contm qualquer referncia sensibilidade, recepo, ao sentimento. Na vida real atribuem-se muito sentidos aos lugares onde se vive e s pequenas e grandes ptrias. A construo das identidades est intimamente ligada organizao territorial e maneira como percebida por quem responsvel por essa organizao ou a experimenta (CLAVAL, 2001, p. 66).
Na busca por compreender as diversas territorialidades camponesas na
regio em apreo, procura-se entender que a convivncia social no territrio leva a
percepo de que as identidades territoriais e culturais dos grupos de agricultores
que trabalham com prticas agroecolgicas extrapolam os limites dos territrios-
rede. Nesse caso, tem-se que observar estes territrios atravs da sua totalidade,
isto , pelos objetos e aes contidos no mesmo.
A geograficidade das comunidades tradicionais (camponesas) na Mata Sul de
Pernambuco apresenta dois aspectos importantes para esta pesquisa. Primeiro diz
respeito aos vnculos com a terra e a sua articulao com outros atores sociais.
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Em um primeiro momento as identidades e territorialidades podem ser
expressas para alm dos limites dos territrios-rede. Em segundo plano os atores
institucionais procuram legitimar as aes (experincias com agricultura
agroecolgica) nos territrios-rede. Esta legitimao se processa atravs da
assistncia tcnica e de uma certificao tica e participativa (comprometimento do
agricultor campons em no usar nenhum tipo de agroqumico em seus produtos),
esta ao fundamental para a construo de uma identidade geogrfica da
produo agroecolgica desses sujeitos sociais
Sendo assim, a geograficidade dos agricultores camponeses adeptos de
prticas agroecolgicas nos territrios-rede permitem articulaes horizontais a partir
do momento em que este sujeito social tem plena autonomia da sua fora de
trabalho e de seus meios de produo. As territorialidades construdas por esses
agricultores possibilitam a apropriao de micro pores do territrio na regio da
Mata Sul. Essa dimenso da territorialidade parece ser um elemento til coeso
dos grupos sociais, que tm a identidade reafirmada num territrio. Porm, tambm
pode ser uma fonte de reaes contrrias como, por exemplo, o preconceito.
(MARTINS, NOGUEIRA, 2010, p. 342)
No debate entre identidade e territrio na busca por sua dimenso conceitual
emergem as definies do conceito de cultura. Sabe-se que existem vrias
definies nas diversas reas do conhecimento cientfico, seja na Filosofia,
Sociologia, Antropologia e Geografia. Enfim todos procuram uma compreenso da
dimenso maior do que vem a ser cultura. Entretanto, neste trabalho prioriza-se o
conceito de cultura abordado atravs dos estudos da Geografia Cultural. Esta ltima
procura analisar os estudos culturais atravs de duas dimenses: a material e a
imaterial. A material por meio de aspectos visveis como objetos e gestos. E sob a
perspectiva imaterial, apresentada por Villa (2000) como uma cultura encoberta,
formatada nas crenas, valores e at mesmo nos medos (MOTA, 2010, p. 193).
Apesar do conceito de cultura ser abordado por muitas reas do
conhecimento cientfico, porm com perspectivas e anlises diferenciadas. No dizer
de Claval (2008) a dimenso cultural da geografia procura trabalhar as
representaes espaciais atravs de diferentes formas, seja pelas anlises dos
processos culturais e a descoberta da corporeidade e de seus ritmos ou por meio da
experincia vivida
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Outra abordagem cultural apresentada por Claval (2008) constitui-se no estudo dos processos culturais e scioculturais. Esta abordagem nasceu da anlise da circulao na dcada de 1950, e versa diretamente as relaes sociais na compreenso da estrutura funcional da sociedade. Esses processos provocam, ainda, uma quebra na forma como as realidades tanto sociais quanto polticas so estudadas. Isso coloca aspectos scio/poltico-culturais em evidncia como uma complementaridade de estudos da geografia humana, outrora iniciados. (MOTA, 2010, p. 193-194).
Segundo Castells (2002) a identidade um processo de construo de vrios
significados que fazem parte da vida dos indivduos. Esse atributo cultural
concretiza-se a partir dos significados e experincias vivenciadas nos territrios por
meio das trocas de sabes e intercmbios culturais. Ainda segundo este autor as
identidades podem ser legitimadora quando introduzida por instituies dominantes
presentes na sociedade, ela pode ser de resistncia construda por sujeitos sociais
ou atores institucionais em posies desfavorecidas na sociedade. E por ltimo a
identidade de projeto, capaz de redefinir a posio dos indivduos dentro da
sociedade. Neste trabalho o recorte para a identidade de resistncia, a partir do
momento em que a anlise concentra-se nas diversas territorialidades de
comunidades camponesas presentes em territrios de predominncia do
monocultivo da cana-de-acar. Neste sentido, as contribuies aos debates sobre
identidade apresentado por Castells diferenciam bastante daqueles abordado por
Hall (1997) no qual seu esforo dirigiu-se ao entendimento de uma identidade
nacional. O autor explica que identidade no nasce com o indivduo, mas sim, elas
vo sendo moldadas e transformadas a partir do espao vivenciado. No caso em
estudo a partir das representaes territoriais dos sujeitos sociais.
Na atualidade, o territrio tem sido um dos conceitos mais discutidos na
Cincia Geogrfica, bem como nas Cincias Sociais. Sua importncia e destaque na
Geografia tm angariado espaos atravs da sua praticidade e aplicabilidade em
polticas pblicas, essencialmente as condizentes com o planejamento e
ordenamento do territorial. No entanto, na perspectiva da Geografia Cultural a
concepo do conceito de territrio ganha outras dimenses ampliando ainda mais o
horizonte de anlise. Nesse sentido, valorizam-se as identidades territoriais e
culturais as quais esto diretamente ligadas ao comportamento e ao modo de vida
dos sujeitos sociais aqui estudados, se preferir as suas diversas territorialidades,
verificamos sua interpretao, bem como sua representao, cada vez mais em
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questes que abordam a cultura de vrios grupos humanos, resultando em estudos
de territorialidades especficas (SILVA, 2010, p. 419-420)
Para melhor compreenso do contexto acima, utiliza-se aqui o conceito de
territrios-rede, no sentido de elucidar os movimentos concretos e simblicos que
atuam na construo das experincias agroecolgicas. A construo de redes pelos
movimentos sociais, pela sociedade civil organizada e organizaes no
governamentais, representa um poderoso recurso para organizar, informar e
fortalecer iniciativas, pois permite uma maior integrao entre espaos que esto
aparentemente desconectados.
Nesse caso, os fluxos entre os territrios nas ltimas dcadas tm sido mais
dinmicos, o que amplia a necessidade de circulao tanto de pessoas, mercadorias
como de informao. Assim, a possvel formao de territrios-rede da agroecologia
na Mata Sul de Pernambuco tem priorizado um maior contato entre agricultores
camponeses com o envolvimento de experincias agroecolgicas em suas
propriedades.
Esses territrios com base em redes da agroecologia podem estar
provocando diversas transformaes entre os agricultores que fazem uso dessas
prticas. Alm de uma maior articulao entre alguns movimentos sociais com vrios
atores, traando estratgias no intuito de fortalecer os territrios-rede da
agroecologia. Todavia, as redes atribuem um sentido diferenciado e estratgico aos
territrios de agricultura camponesa.
Os territrios-rede podem ser definidos tambm enquanto espaos horizontais
de articulao nos quais os processos bsicos de participao tecem o
reconhecimento das relaes estabelecidas entre os vrios atores e sujeitos sociais,
isto , na identificao com o outro atravs do senso de pertencimento a um
mesmo grupo de interesses e significaes pautado no respeito, nos interesses
comuns e na confiana estabelecida entre seus integrantes mediante trocas de
informaes, bens e contedos direcionados ao desenvolvimento de experincias
agroecolgicas e comercializao de seus produtos. Deste modo, compreender a
construo desses territrios enquanto espaos de vivncia e integrao pode
permite a visualizao da agroecologia em diversas escalas, concebendo sua
distribuio espacial em territrios prximos e distantes ao mesmo tempo em que se
observa como esses territrios se articulam para fortalecer as prticas
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agroecolgicas. Mais adiante o foco da discusso deste trabalho estar pautado na
construo e dinmica dos territrios-redes, bem como nas comunidades
tradicionais pesquisadas
A realidade que se re-desenha na Mata Sul de Pernambuco
As experincias com agricultura camponesa de base agroecolgica podem
ser encontradas praticamente nas trs regies do Estado de Pernambuco (Mata
Pernambucana; Agreste e Serto). No entanto, o recorte espacial nesta pesquisa
delimita nossos estudos em quatro comunidades tradicionais na Mata Sul de
Pernambuco (mapa: 02): Assentamento Engenho guas Claras e Assentamento Engenho Serrinha municpio de Ribeiro PE; Assentamento Engenho Conceio
municpio de Sirinham PE e Assentamento Amaraji municpio de Rio Formoso
PE). O procedimento para escolhas dessas reas levou em considerao o
nmero e a expressividade das experincias agroecolgicas que esto sendo
desenvolvidas na localidade. A escolha tambm considerou o fato de que parte da
agricultura camponesa nessas comunidades esto inseridas em um processo
diferenciado de resistncia e construo de outra racionalidade produtiva, a partir da
proposta da agroecologia e sob a prtica de sistemas de produo orgnico e
agroflorestal.
As aes agroecolgicas desenvolvidas em algumas comunidades
camponesas na regio tm como destaque os territrios-rede, sob o qual se
desenvolvem dois processos bastante complexos: a interpretao das relaes
multiterritoriais e a perverso dessas relaes nas comunidades camponesas
(NETO, 2010). No municpio de Sirinham o Assentamento Engenho Conceio
uma referncia em agroecologia na regio. Nesta localidade alguns agricultores
trabalham com agricultura orgnica ou agrofloresta (fotos: 01 e 02). Este projeto de assentamento tem um diferencial em relao aos demais, isto , foi viabilizado pelo
Instituto de Terras de Pernambuco (Iterpe) antigo Fundo de Terras de Pernambuco
(Funtepe), diferentemente dos demais assentamentos na regio que geralmente so
implantados pelo Instituto de Colonizao e Reforma Agrria INCRA, rgo ligado
ao governo federal.
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No municpio de Ribeiro o Assentamento Engenho guas Claras e
Assentamento Engenho Serrinha (fotos: 03 e 04) destacam-se em termos agroecolgicos pela implantao de sistemas agroflorestais em algumas parcelas
dos assentados. Segundo Figueiredo (2010) o municpio responsvel por 16% da
produo agroecolgica na Mata Sul. Nesta rea a forma de manejo diferenciada,
bem como, a diversificao das espcies plantadas, alm da cobertura morta para
proteo e, ao mesmo tempo reposio dos nutrientes ao solo.
Em Rio Formoso as aes de carter agroecolgico tm uma expressividade
produtiva em torno de 12%, das experincias agroecolgicas desenvolvidas na
regio da Mata Sul segundo Figueiredo (2010). Destaque para o assentamento
Amaraji (fotos: 05 e 06), referncia em agroecologia no municpio. A referida rea
recebe apoio do Centro SABI Centro de Desenvolvimento Agroecolgico uma
ONG que presta assessoria tcnica aos agricultores da localidade.
Estes enfoques abrem espaos para novas formas de se pensar os territrios,
as identidades e representaes simblicas e culturais em reas da plantation
canavieira na Mata Sul. Nesse caso, considera-se aqui essas reas como uma
importante via para o desenvolvimento de polticas agrcolas mais direcionada e
eficazes ao pequeno produtor familiar.
O movimento que define a construo do processo de formao de territrios-
rede da agroecologia na regio pode permitir aos camponeses o fortalecimento do
saber tradicional. As unidades de produo camponesa inseridas nos territrios-rede
tm na conquista da terra uma temporalidade medida que esses territrios tornam-
se os ncleos centrais dos novos arranjos e redes territoriais da agricultura
camponesa na regio. importante destacar que as relaes de resistncia
camponesa nesses territrios no se restringem organizao ou ao na
participao das experincias com agricultura alternativa. A racionalidade produtiva
desses camponeses tem carter bem mais amplo, isto , o conjunto de relaes
desenvolvidas nos territrios-rede se ergue como resistncia ao modelo de produo
dominante na regio. Sendo assim, as novas territorialidades expressas por esses
agricultores podem referir-se otimizao do processo produtivo, ou porque no
dizer, a uma nova racionalidade produtiva.
Esse processo de re-existncia a partir das identidades com vnculos
territoriais e culturais podem ser interpretadas como territorialidades ativas e
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passivas. A identidade se constri, desconstri-se e se reconstri no tempo, ou
melhor, atravs do tempo (RAFFESTIN, 2003, p. 5 apud SAQUET, 2007, p.149). Na
regio um exemplo de territorialidade passiva pode expressar-se atravs da sujeio
de muitos agricultores ao trabalho no monocultivo da cana-de-acar, ou seja, uma
ao pr-definida pela estrutura dominante. J as territorialidades ativas
corresponderiam ao agir social desses agricultores atravs da filiao aos sindicatos
locais, da articulao com outros atores e sujeitos sociais, a ONGs e, a participao
nas lutas sociais.
Dessa forma, a emergncia de novas territorialidades sob a construo de
territrios-rede pode fortalecer o desenvolvimento de uma nova geograficidade em
determinados territrios. Esse processo pode ser conceituado a partir da formao
de uma teia complexa de interesses que ocorre em distintas escalas de atuao e
comporta um quadro diversificado de atores e sujeitos sociais, que integram os
territrios-rede da agroecologia. Neste caso, a geograficidade dessas comunidades
tradicionais em rea de plantation canavieira constituda a partir dos interesses
dos camponeses e do papel de discernir suas escolhas. Assim, a emergncia
dessas novas territorialidades pode ocasionar o processo de construo de redes
sociais.
Em algumas reas na regio esse quadro vem apresentando outras solues
ao agricultor campons, isto , muitos fazem a opo pela re-existncia em seus
territrios (stios, assentamentos, lotes) sem ter que se submeter aos ditos e mandos
do sistema predominante. Essa escolha s vem sendo possvel por causa das lutas
dos movimentos sociais, conquista de direitos e acesso a terra, alm da organizao
e mobilizao desses camponeses. Portanto, os novos arranjos e redes territoriais
so constitudos pela organizao social e pelos processos de formao de
enfoques agroecolgicos em pequenas comunidades camponesas.
A pequena produo campesina nos territrios com enfoques agroecolgicos
tem no processo de incluso a principal caracterstica para o fortalecimento dos
valores da agricultura camponesa, o que significa ir muito alm da tica do sistema
mercadolgico capitalista, nesse sentido o agricultor campons tem como base de
valores: o territrio, os recursos ecolgicos, a cultura e o vnculo a terra. Em seu
sentido mais especifico, a pequena propriedade camponesa pode ser considerada
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enquanto unidade de produo e reproduo familiar, sustentada nos valores
culturais, bem como nas razes com a terra e tradio familiar.
Metodologia
Para a realizao desta pesquisa, como mencionado anteriormente foram
selecionadas quartro reas de comunidades tradicionais camponesas nos
municpios de Rio Formoso; Sirinham e Ribeiro ambos localizados na regio da
Mata Sul de Pernambuco. O critrio para escolha dessas reas foram a
expressividades que as mesma possuem em termos de agricultura camponesa de
base agroecolgica, as geograficidades dos atores e sujeitos sociais e o contexto
histrico de vida dessas pessoas. Alm disso, a presena das Organizaes No-
Governamentais ONGs e a forte atuao dos movimentos sociais nesta poro do
territrio que tambm contribuiu bastante para a escolha da rea em estudo. Atravs
da realizao de entrevistas informais e semi-estruturadas, procurou-se identificar os
territorios-rede da agroecologia numa perspectiva geogrfica e cultural, nesse caso
foi elaborado um material cartogrfico a partir dos dados coletados em campo e da
utilizao de aparelhos GPS, para coleta de pontos georefernciados das reas com
enfoques agroecolgicos. Aps a aquisio desses dados foram utilizados os
programas Software ArcGIS 9.1 e o Mapsource para construo das bases
cartogrficas georreferenciadas, alm da utilizao de Shapefiles do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatstica IBGE.
Resultados e discusses
Territrios e Identidades: a emergncia do saber campons
Os territrios sob os enfoques agroecolgicos podem ser compreendidos a
partir das formas e das origens, como tambm pelas aes e iniciativas que
transformam as pequenas unidades de produo camponesa, inserindo-as em um
processo de fortalecimento da identidade territorial. Essa transformao
determinada pelo desenvolvimento de uma agricultura de base agroecolgica, que
ao congregar os interesses dos agricultores camponeses envolvidos/inseridos nos
territrios-rede, d suporte emergncia de uma campesinidade mais empenhada
na relao com outros sujeitos sociais e congregando novas responsabilidades que
vo muito alm da segurana alimentar.
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A identidade territorial pode ser aqui compreendida enquanto uma
geograficidade em reas de predominncia canavieira na Mata Sul de Pernambuco,
engendradas em torno da produo camponesa articulada com base em princpios
agroecolgicos de modo a estabelecer uma ligao poltica/produtiva para resistir
(re-existir) ao domnio da plantation canavieira. Seria produto espacial de uma
inovao que corresponde a uma estratgia de produo autnoma em
comunidades camponesas. O objetivo primordial dessas territorialidades romper
com o sistema predominante local, quebrando a dependncia desses agricultores
em relao ao sistema do monocultivo da cana-de-acar e a forma de
comercializao de seu excedente.
Ao romper com a dependncia do sistema agrrio dominante na regio essas
comunidades camponesas reafirmam a autonomia da sua produo, e da fora de
trabalho garantindo uma produo sustentvel. Assim, os territrios com enfoques
agroecolgicos so reas diferenciadas. Entretanto, pode-se afirmar que os
territrios da agroecologia nesta poro do Estado so caracterizados pelo despertar
de novas identidades territoriais e culturais trabalhadas, que so constitudas por
agricultores camponeses onde se tornam agroecologistas inovadores, inventores,
sujeitos sociais e polticos, todas essas expresses constituem agentes de um
processo de dilogo tcnico e saberes locais, configurando redes e relaes
socioterritoriais.
Assim, importante compreender a propriedade camponesa como um micro
territrio no qual o cotidiano apresenta especificaes organizacionais, isto , esto
relacionados s caractersticas especificas da propriedade e da famlia, como por
exemplo: o trabalho familiar na terra, a moradia, os roados, enfim, a extenso da
propriedade camponesa nas feiras agroecolgicas e suas relaes entre os
agricultores camponeses/consumidores locais e mediadores tcnicos. Nesse
processo de fortalecimento, construo e re-construo de identidades territoriais
numa perspectiva geogrfica encontram-se as:
Identidades Histricas: so identidades dinmicas e mltiplas que no se limitam a origem do sujeito social, mas procura acima de tudo analisar as possibilidades da
insero de novos elementos na sua construo. Nesse caso, a identidade
sempre uma construo histrica dos significados sociais e culturais que norteiam o
-
processo de distino e identificao de um indivduo ou de um grupo (CRUZ, 2007,
p. 97).
A identidade Relacional e Contrastiva: a identidade no um fixo ou conjunto de significados, mas sim uma interao entre sujeitos sociais. contrastiva porque
pode ser construda tambm em meio aos processos de tenses e conflitos entre
vrios grupos sociais, as identidades so sempre construdas na e pela diferena e
no fora dela e nenhuma identidade auto-suficiente, auto referenciada em sua
positividade, tendo seu significado definido no jogo da diffrance (CRUZ, 2007, p.
98).
A identidade Material e Simblica: material porque tambm construda pelas prticas e aes do cotidiano, onde existem interaes com vrios sujeitos sociais
numa base territorial ou espao utilizado, ou seja, uma construo social.
simblica e subjetiva porque pode ser construda atravs das representaes e nos
discursos. Portanto, na construo da identidade no possvel pensar de forma
dissociada da natureza simblica e subjetiva (representaes) e seus referentes
mais objetivos e materiais (Ibid., p. 99).
A Identidade Estratgica e Posicional: se processa na busca pela afirmao da sua diferena social, mediante a valorizao das tradies culturais como forma de
emergncia e fortalecimento das caractersticas individuais e coletivas do grupo.
Nesse sentido, a construo das identidades est em estreita conexo com as
relaes de poder; contestados, negociados a partir das relaes assimtricas de
poder na sociedade (Ibid., p. 100).
Identidades Hegemnicas ou Subalternas: so aquelas identidades que atuam no sentido de legitimar as relaes de poder na sociedade quanto para subvert-las, o
mesmo processo que serve reproduo do poder hegemnico, logo das
identidades hegemnicas, pode ser interrompido e reorientado no sentido de
produzir novas identidades (Ibid., p.101).
As identidades territoriais observadas nas comunidades pesquisadas neste
trabalho possuem um pouco de cada uma das identidades mencionadas acima. Isso
porque os laos de identidade territorial e cultural numa perspectiva geogrfica
podem ser percebidos atravs do vnculo e uso do territrio, como tambm, pelas
territorialidades desenvolvidas pelos diversos sujeitos sociais. Nesse contexto, a
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identidade territorial e cultural dessas comunidades tradicionais na parte sul da Mata
Pernambucana perpassa as barreiras dos simples laos de afetividade e de vnculo,
se estendendo a multi-relaes mais complexas dentro dos prprios territrios com
enfoques agroecolgicos.
Segundo Brasileiro e Maciel (2009) a identidade territorial das comunidades
tradicionais (camponesas) que desenvolvem experincias agroecolgicas em seus
micro-territrios concebida atravs das relaes e intercmbios que os sujeitos
sociais mantm com atores institucionais e sociais, alm do prprio vnculo com o
territrio, sendo este o espao delimitado da materializao e organizao de suas
diversas territorialidades. O desenvolvimento de prticas e aes agroecolgicas em
territrios de predominncia do monocultivo da cana-de-acar pode ser
considerado como um processo de inovao alternativa, ao passo que procura
integrar, fortalecer e valorizar uma identidade positiva.
Embora sob o peso do apetite aambarcador da cana, os territrios da Mata esto passando por algumas transformaes, principalmente no que tange a questes de identidade e cultura, busca por alternativas econmicas, preocupao ambiental, novo enfoque poltico dos movimentos sociais, dentre muitas outras. De uma identidade negativa, forjada na opresso histrica, brota dialeticamente um processo de identificao positiva, baseado na luta, na resistncia e gerao de possibilidades mais democrticas e equilibradas de uso dos recursos (BRASILEIRO, MACIEL, 2009, p. 28).
A complexidade dos novos arranjos e redes territoriais na regio pode
fortalecer o desenvolvimento de uma territorialidade alternativa, sendo por meio da
agroecologia uma maneira de se pensar em novas situaes que envolvam os
diversos sujeitos sociais locais, o territrio e novas formas de participao no
desenvolvimento local. Soma-se a esses benefcios a diversidade da produo e a
segurana dos produtos, j que so artesanais e obtidos com baixa ou nula
contaminao por agroqumicos, bem como a valorizao da identidade cultural do
pequeno produtor e da sua responsabilidade scio-ambiental (Ibid., p. 30).
Nesse contexto, as experincias agroecolgicas desenvolvidas nas
comunidades pesquisadas podem ser exemplos de aes que esto sendo traadas
no intuito de fortalecer a agricultura de base familiar e o processo de reforma agrria
na regio. Porm, a observao mais significativa no decorre da pesquisa foi a
constatao da diversidade e pluriatividade das relaes sociais que se constituem
nos territrios-rede da agroecologia.
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O territrio-rede, via mecanismos pluriativos oriundos da ao dos fluxos, constitui-se em uma sntese das transformaes operadas no lugar territorializado pelos fluxos territoriais, concluindo a transio de uma territorialidade a outra (ou seja, do lugar rede) (NETO, 2010, p. 106).
Ao analisar as territorialidades e as identidades em vigor na regio, verifica-se
que o atual padro de produo agrcola coloca em risco no s a segurana
alimentar, mas tambm a cultura e o saber tradicional de algumas comunidades, no
caso deste trabalho (comunidades de agricultores camponeses). Em contrapartida
verifica-se pequenos ncleos de resistncia, verdadeiros pontos luminosos em
territrios do monocultivo da cana. Esses pontos ainda so espaos com pouca
visibilidade, mas vm ganhando expressividade atravs das aes agroecolgicas.
Consideraes Finais
A importncia do trabalho dos mediadores tcnicos na promoo das
identidades territoriais e culturais fundamental para o desenvolvimento de uma
agricultura camponesa nos moldes de uma perspectiva agroecolgica, que por sua
vez, recria ou reforar vrias identidades construdas a partir das prticas cotidianas.
Estes elementos interagem com princpios tradicionais da agricultura campesina,
isso no sentido de afirmao da cultura local e da conservao ambiental. A adoo
de prticas agroecolgicas nesses territrios implica em mudanas de hbitos e
posturas, nas quais as preocupaes ambientais esto sendo includas com mais
evidncia na produo familiar, buscando alimentos saudveis produzidos atravs
de mtodos ecologicamente corretos.
A valorizao das tradies culturais camponesas inseridas nos arranjos e
redes territoriais pode ser expressa atravs das prticas e do conhecimento
vivenciado, e porque no dizer no prprio consumo de alimentos que so produzidos
por estes sujeitos sociais. A roa, o stio, o assentamento, a comunidade, a casa de
farinha e o galinheiro, so pequenos espaos demonstrativos de um sistema de
produo com significativa autonomia e sustentabilidade familiar. Assim, a
abordagem territorial sob o enfoque agroecolgico pode permitir aos atores e
sujeitos sociais o aprofundamento das questes agrrias, voltadas para uma
reflexo a partir da organizao produtiva em contraposio modernizao da
agricultura ou/e agricultura capitalizada.
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A organizao, articulao e mobilizao desses atores uma condio
bsica para formao e fluxo nos territrios-rede. Em outras palavras essas reas
surgem como espaos diferenciados de atuao de uma minoria que viabiliza
estratgias de adaptao nas redes configurao dos territrios com enfoques
agroecolgicos. O principal benefcio da formao desses territrios est na
possibilidade de articulao dos agricultores camponeses com outros atores sociais.
Nesse sentido, o desenvolvimento de redes de relaes de produo e trabalho que
estejam sustentadas na tica e nos princpios de uma agricultura ecologicamente
correta ou porque no dizer camponesa, onde os objetivos e a organizao da
produo so definidos pelos sujeitos pode contribuir para o desenvolvimento e
fortalecimento das comunidades camponesas aqui estuda.
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ANEXOS Mapa 01 Regio da Mata Pernambucana
Fonte: Base Cartogrfica do IBGE, 2009. Designer Grfico: Girlan Cndido. Org.: Robson Brasileiro.
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ANEXOS
Mapa 02 Mata Sul de Pernambuco - Destaque para as reas de Assentamento com Experincias
Agroecolgicas
Fonte: Base Cartogrfica do IBGE, 2009; Trabalho de campo, 2011. Designer Grfico: Girlan Cndido. Org.: Robson Brasileiro.
Foto 01: Produo Agroecolgica atravs do uso do Sistema de Mandalas Assentamento Engenho Conceio, Municpio de Sirinham PE. Data: 14/11/2009. Autor: Robson Brasileiro.
Foto 02: Sistema de Agrofloresta Assentamento Engenho Conceio, Municpio de Sirinham PE. Data: 14/11/2009. Autor: Robson Brasileiro.
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ANEXOS
Foto 03: Produo Agroflorestal no Assentamento Engenho Serrinha, Municpio de Ribeiro PE. Data: 14/11/2009. Autor: Robson Brasileiro.
Foto 04: Sementeira para Reflorestamento no Assentamento Engenho guas Claras, Municpio de Ribeiro PE. Data: 14/11/2009. Autor: Robson Brasileiro.
Foto 05: Produo Agroflorestal e Sistema de Horticultura Orgnica no Assentamento Amaraji, Municpio de Rio Formoso PE. Data: 15/11/2009. Autor: Robson Brasileiro.
Foto 06: Sistema Agroecolgico Atravs do uso da Mandala no Assentamento Amaraji, Municpio de Rio Formoso PE. Data: 15/11/2009. Autor: Robson Brasileiro.
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