a eutanÁsia em face ao princÍpio da dignidade da...
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A EUTANÁSIA EM FACE AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Euthanasia In The Face To The Principle Of Human Dignity
Pâmela Priscila Valdonado da Silva
Aluna do curso de direito, projeto de pesquisa apresentado no âmbito das atividades de TCC.
Professor Orientador: Roderlei Góes
Resumo: o presente artigo aborda sobre o que seria de fato uma morte ou uma condição de
vida digna que vem resguardada pela nossa Carta Magna. Ou seja, tem o intuito de análise
jurídica da prática da Eutanásia em face ao princípio da dignidade da pessoa humana na busca
do real valor de que trata tal princípio. Se na Constituição Federal é conferido o direito à vida
digna, bem como a liberdade, sendo assim cabe garantir a qualquer ser humano o direito de
decidir sobre sua própria vida, a forma que ache digna de viver ou morrer. Logo, cabe
investigar se em caso de ameaça de morte em caso de doença grave em estado terminal ou
invalidez permanente que não possa de jeito nenhum ser revertida, o direito de escolha do
paciente se quer ou não continuar sobrevivendo com ajuda artificial de aparelhos é um direito
do próprio doente escolher se quer uma morte digna, leve, sem sofrimento escolhendo a
Eutanásia ou se quer uma morte pelo seu processo natural, às vezes, dolorosa. Não há no
nosso ordenamento jurídico brasileiro uma norma que ampare a prática da Eutanásia, contudo
existem estudos seja do ponto de vista ético, moral, religioso e clínico que garantem que o
direito à vida é maior, irrenunciável e inviolável, mas que ainda é mais valioso viver de forma
digna do que a simples existência biológica.
Palavras-chave: Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Eutanásia. Estado vegetativo.
Direito de escolha. Legalização.
Abstract: this article discusses about what would actually be a death or a dignified standard
of living which is guarded by our Constitution. Ie has the legal analysis intention of the
practice of euthanasia in light of the principle of human dignity in the pursuit of real value
that comes with that principle. If the Constitution is granted the right to a dignified life and
freedom, so it is guarantee every human being the right to decide about his own life, the way
we think worthy to live or die. So it is up to investigate whether in the event of death threats
in case of serious illness in terminal or permanent disability state that does not can in no way
be reversed, the right of choice of the patient whether or not to continue to survive with
artificial aid devices is a Right from the patient himself choose whether to a dignified death,
light without suffering choosing euthanasia or whether a death by your natural process
sometimes painful. There are in our Brazilian legal system a rule that sustain the practice of
euthanasia, but there are studies is from an ethical point of view, moral, religious and clinical
guaranteeing the right to life is greater, inalienable and inviolable, but even more valuable live
in a dignified manner than the simple biological existence.
Keywords: Principle of Human Dignity. Euthanasia. Vegetative state. Right to choose.
Legalization.
Sumário: Introdução. 1. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e os direitos
fundamentais. 2. Conceito de Eutanásia. 3. Direito comparado. 3.1.Países que legalizaram a
Eutanásia 3.2.Países que autorizam ou toleram a Eutanásia 3.3.Países que proíbem a
2
Eutanásia 4. Espécies de Eutanásia. 4.1 Distanásia. 4.2 Ortonásia. 4.3 Suicídio Assistido. 4.4
Mistanásia. 5. Aspectos Jurídicos, Éticos, Morais e Religiosos. 6. Bioética e Biodireito. 6.1.
Os primórdios da Bioética. 6.2 O papel do Biodireito. 7. Projeto de alteração da Lei Penal
relativamente à Eutanásia. 8. O direito de escolha. 8.1 Opiniões contrárias ao tema. 8.2
Opiniões favoráveis ao tema. Conclusão. Referências Bibliográficas.
Introdução
O foco desse trabalho é fazer ressurgir os avanços que a medicina vem trazendo, bem
como sua análise jurídica, ética, moral e religiosa, acerca do tema, argumentos que sejam
válidos e indulgentes tanto de quem defende a conduta quanto de quem abomina.
A morte já faz parte da natureza humana, no entanto para a medicina, apesar desse assunto
ser frequente e do aparato tecnológico ser enorme e possibilitar a sobrevivência de um
paciente em estado crítico, a morte ainda é vista como um desastre nessa área.
No entanto, manter um corpo vivo por aparelhos é um sofrimento maior do que a própria
morte, já que às vezes é um alívio para o doente, sua família e demais que fazem parte do seio
familiar, pois sabe-se que um dia todos irão morrer, entretanto, não é a morte por si só que
apavora o ser humano, e sim a forma que isso irá ocorrer, são situações que ainda causam
receio ao ser humano.
Com isso surgiu à biomedicina que se aplica a pesquisa de medicamentos apropriados à
conservação da vida, pode ser usada unida com outras ciências, sua principal função é a busca
pela qualidade de vida do ser humano. Não se esquecendo da Bioética, já que uma está ligada
a outra de alguma forma, pois enquanto aquela visa a qualidade de uma vida melhor ao ser
humano, esta liga a qualidade com os valores fundamentais de moral e de direito que o
indivíduo merece, é nessa ciência que se encontra basicamente é o controle nos avanços
medicinais que a ciência vem desenvolvendo ao longo dos anos.
A questão é amplamente debatida, já que vários princípios constitucionais se chocam
quando o assunto é abordado. De um lado está o direito à vida e de outra a dignidade. Será
que é digno um ser humano não ter o direito de escolher pôr fim a um sofrimento que ele
mesmo sabe que não irá acabar. Apesar de a legislação pátria tratar a Eutanásia como
homicídio privilegiado, a questão é muito mais extensa do que parece ser.
Portanto, é esse o objetivo central do trabalho, não é correto aplicar ao tema como
comparado ao homicídio privilegiado, está na hora de regular a matéria, tendo em vista que os
3
elementos individuais são totalmente diferentes, são questões diferentes, não devendo a
Eutanásia ser tratada com os mesmos elementos do homicídio privilegiado.
1.Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e os direitos fundamentais
Inicialmente cabe explanar acerca do surgimento desse princípio no nosso ordenamento
jurídico.
É sabido que o mundo em geral já sofreu com a tirania provocada pelo poder, seja ele
através de um representante de um Estado, País, determinada figura pública ou Política. A
razão é que depois da chegada da Declaração Universal da ONU de 1948, é que esse
absolutismo acabou, ou pelo menos essa seria a ideia, foi assim que começou o equilíbrio
entre o elo mais fraco e o mais forte, pois foram conferidos limites para que o ser humano
possa viver de forma digna.
A Declaração Universal é um marco histórico dos direitos humanos, já que foi organizada
por diferentes origens jurídicas e culturais do mundo todo, sendo assim pela primeira vez na
história essa norma estabelece a proteção universal dos direitos humanos, pois inspirou as
Constituições de diversos Estados e democracias juntamente com uma série de tratados
internacionais.
Vem estabelecido já no preâmbulo da Declaração Universal que o reconhecimento da
dignidade inerente a todos os que fazem parte da humanidade de seus direitos iguais é o
fundamento principal da liberdade, da justiça e da paz do mundo.
Sendo assim todo ser humano tem direito à vida, a liberdade e a segurança pessoal e o
estado democrático de direito tem como fundamento a dignidade da pessoa humana.
Infelizmente não é só o Estado o único vilão na história, já que quando se fala em direitos
individuais não tem como não incluir os particulares, ou seja, os demais indivíduos que fazem
parte do nosso meio, já que cada um tem uma forma de pensar e de agir.
Desta forma, nos ensina SARMENTO:
(…) se no Estado Social o público avançara sobre o privado, agora ocorre o
fenômeno inverso, com a privatização do público. O Público e privado cada
vez mais se confundem e interpenetram, tornando-se categorias de difícil
apreensão neste cenário de enorme complexidade. Numa sociedade desigual
como a brasileira, com baixo nível de mobilização política, onde o Estado
sempre esteve privatizado, eis que instrumentalizado em prol dos interesses
4
privados das elites, o processo descrito encerra graves riscos. Teme-se que o
Estado se torne flexível para alguns, mas que continue muito duro com os
outros; que a administração seja consensual para os que têm algum poder,
mas imperativa e fria para os que não têm poder nenhum1.
Ensina-nos Cunha Junior que:
A dignidade da pessoa humana princípio fundamental taxado na
Constituição Federal/88 é condutor essencial a identificação material dos
direitos fundamentais e apenas estará assegurado esse princípio quando o ser
humano conseguir utilizar de todos os direitos fundamentais que exista. Ou
seja, é quase impossível ao homem, está garantida plenamente a sua
dignidade2.
O princípio da dignidade da pessoa humana é um princípio que veio sendo construído por
muitos anos, foi uma história longa até chegar aonde chegou, tendo em vista que aplica um
valor ao ser humano que antigamente não era assegurado, garante ao ser humano a proteção
contra tudo o que possa lhe causar depreciação, menosprezo ou qualquer mal.
Para a maioria dos doutrinadores, a dignidade da pessoa humana não é vista como um
direito elencado pelo ordenamento jurídico, já que se trata de uma qualidade inerente ao ser
humano, pois possuímos desde que nascemos, independente de quaisquer circunstâncias,
requisitos ou condições. São valores intrínsecos ao ser humano.
Quando se fala em dignidade da pessoa humana estão englobados todos os direitos
fundamentais assegurados ao homem. Não é possível falar em uma vida digna sem falar em
igualdade, liberdade, saúde, educação, trabalho digno, segurança, a honra e a propriedade.
Ora, como um ser humano viverá digno sem todos esses direitos fundamentais andando lado a
lado. Não tem como sequer imaginar.
Assim sendo, o princípio da dignidade da pessoa humana é tratado em parte como regra e,
em parte como princípio. Contudo não é absoluto, mas a regra que devido a sua extensa
interpretação, não existe uma limitação com nenhuma relação de preferência, já que pode ser
utilizado em diferentes alcances.
1 SARMENTO, Daniel Antonio de Moraes. Os direitos fundamentais nos paradigmas liberal, social e pós-
social. In: SAMPAIO, José Adércio Leite (Coord.). Crise e desafios da constituição. Belo Horizonte: Del Rey,
2004, p. 403. 2 CUNHA JUNIOR, Dirley da. A efetividade dos Direitos Fundamentais Sociais e a Reserva do Possível.
Leituras Complementares de Direito Constitucional: Direitos Humanos e Direitos Fundamentais. 3. ed.,
Salvador: Editora Juspodivm, p. 349-395, 2008. Material da 4ª aula da disciplina Teoria Geral dos Direitos e
Garantias Fundamentais, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Direito do Estado
– UNIDERP/REDE LFG.
5
O princípio da dignidade da pessoa humana está relacionado com a liberdade e valores,
bem como as condições materiais de vida que um ser humano está sujeito, contudo ainda não
é regra, pois esse tema ainda é tratado pelo mínimo existencial que o ser humano necessita
que é devido e que possa alcançar.
Assim sendo, direito do homem quer dizer direitos que ainda não se encontram escritos,
ou seja, sabe-se que existe, no entanto não se sabe aonde poderá encontra-lo, pois já se
encontram em sua essência, todavia não vem expresso.
Portanto, os Direitos Fundamentais são os direitos que os seres humanos têm direito e que
já vêm descritos no nosso ordenamento jurídico, já está garantido por nossa constituição,
enquanto que a Dignidade da Pessoa Humana faz parte dos direitos fundamentais construídos
pelos Direitos Humanos lá atrás e que tem como arrimo o princípio da universalidade dos
direitos humanos.
Na condição de valor basilar, a Dignidade da Pessoa Humana acaba sendo absorvida por
todas as demais garantias fundamentais estabelecidas na nossa Carta Magna, entretanto
reafirmando que não é um direito absoluto, pois faz parte das garantias fundamentais que o
texto constitucional traz.
Dessa forma, nos ensina SARLET, que:
A dignidade da pessoa humana, na condição de valor fundamental atrai o
conteúdo de todos os direitos fundamentais, exige e pressupõe o
reconhecimento e proteção dos direitos fundamentais de todas as dimensões.
Assim, sem que se reconheçam à pessoa humana os direitos fundamentais
que lhes são inerentes, em verdade estar-se-á negando-lhe a própria
dignidade.3
2. Conceito de Eutanásia
É sabido que a morte é inexorável a qualquer ser vivo, entretanto o único ser vivo que
sabe que um dia irá morrer é o próprio ser humano.
Mesmo sabendo que a morte é inevitável, desejamos que esta seja rápida, sem dor,
tranquila que não cause danos físicos ou morais ao próprio ser humano ou a sua família,
infelizmente não é sempre assim que acontece.
3 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de
1988. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, p. 88-89.
6
A Eutanásia é um termo de origem grega que significa boa morte ou morte sem dor (EU:
bem ou boa/ THANASIA: morte), ou seja, consiste numa morte mais piedosa, sem sofrimento
tanto físico quanto moral.
Esse termo foi criado no século XVII, pelo filósofo inglês Francis Bacon em sua obra
“História da vida e da morte”, como tratamento mais adequado para as doenças incuráveis.
No decorrer dos anos, o tema foi ganhando várias vertentes, mas o seu sentido principal
continuou sendo a de que a Eutanásia é um meio utilizado para abreviar um sofrimento
prolongado que um indivíduo vem passando, ou seja, é de proporcionar ao outro que se
encontra em estado terminal com enfermidade incurável ou agravosa que torne sua agonia e
dor excessiva, prolongada e sem nenhum meio que a amenize, um alívio.
Nesse sentido a Eutanásia atinge diversas visões. A de que seria utilizada para acabar de
vez com aquela vida indigna que o paciente estava vivendo, entendendo que seria uma
condição de vida insuportável de lidar. Outra de que seria utilizada para acabar com a vida do
paciente que se encontra num estado de dores físicas tamanhas que nem a medicina encontra
solução ou margem de esperança para aliviar essa tortura moral em que está vivendo. E ainda
que fosse utilizada para acabar com a vida do paciente antes que chegasse ao inevitável, ou
seja, a sua morte já é certa, no entanto ainda não está passando pelos sofrimentos, agonias que
serão gerados pela doença futuramente.
Assim sendo, a Eutanásia não é mais tida como a vilã na história, pois se imagina que era
utilizada simplesmente para dar cabo à vida de um ser humano. Felizmente esse pensamento
tomou formas diferentes e atualmente é vista como um meio que o paciente que se encontra
sem esperanças médicas de viver ou que esteja sofrendo uma dor imensurável, totalmente
debilitado, vivendo uma vida imoral e indigna, de optar por não viver mais dessa forma e nem
de ver seus familiares e entes queridos sofrendo juntos sem esperanças de que no final depois
de tanto sofrimento este chegaria ao fim, ou seja, a Eutanásia não é a morte em si, ela apenas
age sobre a própria morte.
Vale frisar que o foco principal da Eutanásia não é o paciente sadio, deixando sempre
claro isso. Ela visa àquele paciente com enfermidades incuráveis, que se encontram
totalmente sem chances de cura ou uma possível melhora, atormentados tanto pelas dores
físicas quanto morais, abalados, sem um por cento de esperanças.
Para Evandro Corrêa de Menezes, entende-se que “a eutanásia é aquele ato em virtude do
qual uma pessoa dá morte a outra, enferma e parecendo incurável, ou a seres acidentados que
7
padecem dores cruéis, a seu rogo ou a requerimento e sob impulso de exacerbado sentimento
de piedade e humanidade”. 4
E ainda:
A cada segundo, minuto, todos os dias no mundo inteiro muitas pessoas se
encontram nessa situação e rogam que a Eutanásia seja a sua escolha, que
tenham o direito de escolher a morte, por si mesmas, ou que seja permitido
que outras pessoas as matem, pois não aguentam mais viver dessa forma,
como um vegetal esperando que um dia chegue o alívio de não sofrer mais
assim.5
Nesse sentido, RONALD DWORKIN complementa:
A medicina hoje ostenta de uma tecnologia capaz de manter a vida dessas
pessoas que já se encontram “mortas”, os métodos utilizados são tão
avançados que são capazes de manter esses indivíduos “vivos” por dias,
semanas, meses e até por anos, ou seja, a ciência se encontra tão evoluída
que esses indivíduos que só estão esperando a sua hora ou que estão
incapacitados de tal forma que não há como mensurar tamanha dor que estão
passando ou totalmente inconscientes de tão “drogadas” por remédios,
interligadas por milhares de aparelhos que se fossem desligados não
sobreviveriam por meia hora ou seu caso clínico se agravaria ainda mais,
exploradas por dezenas de médicos que não são capazes de reconhecer e
para os quais já deixaram de ser pacientes para tornar-se verdadeiros campos
de batalha. Situações desse tipo nos aterrorizam a todos. E o pior é viver
como um vegetal inconsciente, mas escrupulosamente bem cuidados. Ou
seja, o indivíduo tem esse direito de optar por querer ou não viver dessa
forma, e cada vez mais o quanto antes esse tema deve ser analisado com
antecedência6.
3. Direito Comparado
Em muitos países a prática da Eutanásia já se encontra legalizada, fundada no conceito da
boa morte com dignidade. Pela maioria dos países a Eutanásia ainda é vista como uma forma
4 MENEZES, Evandro Corrêa de. Direito de Matar: (Eutanásia). 2 ed.Rio de Janeiro: Ed. Freitas Bastos, 1997.
p. 39/40 5 Idem. p. 39/40 6 DWORKIN, Ronald. Domínio da Vida: Aborto, eutanásia e liberdades individuais. Trad. CAMARGO,
Jefferson Luiz. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p 252.
8
de homicídio privilegiado, principalmente pelos países Sul Americanos, já em alguns países
não é visto como crime e em outros não possui uma tipificação.
Sendo assim, nos ensina JAIME ARBUEIZ CARNEIRO FILHO:
As diversas legislações estrangeiras têm se ocupado frequentemente ao tema
da Eutanásia em seus respectivos códigos. Sendo assim, pela maioria dos
povos latinos a sua prática é tida como uma forma de homicídio privilegiado,
e em outros como uma ausência de delito, exceto por motivo egoístico,
embora alguns adotem ainda uma postura extremamente conservadora, que
não excluem a sua prática com as diversas formas de homicídio7.
Quanto às legislações europeias, estas são mais tranquilas quanto à prática da Eutanásia,
ora isentando de qualquer pena, ora cominando penas atenuadas, apesar de que em alguns
países ainda não seja regulada de forma estrita.
Parte do território Australiano pelo período de 1996 a 1997 regulou pela primeira vez a
prática da Eutanásia ativa, já que fora revogada pelo parlamento Australiano após oito meses
em vigor, cuja denominação era a Lei dos Direitos dos Pacientes Terminais. Esta lei
estabelecia inúmeros critérios e precauções até permitir a realização da Eutanásia.
Nos EUA em 1991, foi proposta uma alteração do CC da Califórnia, que determinava que
uma pessoa adulta, em estado terminal, contudo apta mentalmente, poderia requerer e receber
ajuda médica para morrer, permitindo que a morte fosse realizada de maneira indolor, humana
e digna e que os médicos teriam prerrogativa legal destes atos, não sendo considerado crime.
No Código Penal Boliviano foi introduzido em seu ordenamento jurídico no Art. 257, um
tipo penal que se refere expressamente à Eutanásia, no qual a sua prática confere a quem
pratica uma pena de um a três anos de reclusão, sendo que nos casos de consentimento do
interessado, poderá ser concedido o perdão judicial e ainda algumas atenuantes atreladas ao
caso concreto. (Bolívia, 2003)8.
Mesmo no caso de perdão judicial a conduta continuará sendo antijurídica, pois conforme
às circunstâncias de cada caso, é instituído uma pena mais branda com relação ao homicídio
simples e agravado, sendo caracterizada como homicídio piedoso, pois será elemento
particular do tipo que elimina qualquer outra forma para se praticar tal delito (Bolívia, 2003)9.
7 FILHO, Jaime Arbueiz Carneiro. Eutanásia. Revista Consulex. São Paulo, a. 3, n. 29, mai. 1999.
8 BOLÍVIA. Código penal boliviano. Delito Autônomo Privilegiado. Bolívia, 2003.
9 Idem
9
O Uruguai também estabelece o perdão judicial em seu Art. 37 que diz que além do
paciente ter feito reiterados pedidos, o autor que praticar a Eutanásia deve ter antecedentes
honráveis e o motivo ser expressamente por estado de piedade ao doente.
Já no Código Penal Colombiano, o homicídio piedoso está regulado em seu Art. 326, onde
quem matar outrem objetivando pôr fim a agonia e tristeza originária de doença grave ou
incurável, responderá pelo ato podendo pegar cerca de seis meses a três anos de prisão,
diferente do código penal boliviano que necessita da manifestação do voluntário para
configurar a Eutanásia. (Colômbia, 2003)10
.
Há mais de dez anos a prática da Eutanásia vem sendo praticada informalmente por alguns
médicos na Colômbia, após ser decidido em processo pela Suprema Corte que não era
considerado crime em determinadas circunstâncias, apesar de que sua prática ainda precisa ser
regulamentada a fim de reduzir justamente os excessos praticados.
Em El Salvador, a prática da Eutanásia está fixada no Código Penal em seu Art. 130,
como homicídio piedoso, estabelecida à sanção de um a cinco anos de prisão sempre que o
paciente se encontre desenganado em estado de sofrimento que seja de conhecimento público
tanto pelos médicos quanto pelos familiares e quem quer que o assista, e é claro que o
paciente confirme expressamente o seu desejo de morrer inúmeras vezes (El Salvador,
2004)11
.
A prática da Eutanásia no Código Penal Paraguaio não se distingue muito dos descritos
acima, está regulada em seu Art. 106, e seu texto também estabelece uma pena mais branda de
até três anos de reclusão ao autor que cometer a Eutanásia contra o paciente. Destacando que
o paciente deve se encontrar seriamente doente e totalmente desenganado pelos médicos, e
sua vontade deve ser expressamente demonstrada por inúmeras vezes. (Paraguai, 2003)12
.
Também na legislação Peruana é regulado no Código Penal em seu Art. 212 que a prática
da Eutanásia é tida como homicídio piedoso, devendo o paciente se encontrar em estado de
sofrimento eterno ou com doença incurável, e ainda deve ter solicitado de maneira expressa e
consciente como forma de pôr fim a uma dor insuportável, a pena não é superior a três anos
de reclusão. (Peru, 1996)13
.
10 COLOMBIA. Código penal colombiano. Delito autônomo privilegiado. Colômbia, 2003. 11
REPÚBLICA DE EL SALVADOR. Código penal. Elsa Vadorenho. Homicídio Agravado. República de El
Salvador, 2004. 12
PARAGUAI. Código penal paraguaio. Homicídio Doloso. Paraguai, 2003. 13
PERU. Código penal. Nuevo código penal. Ediciones El Carmen, 1996.
10
Os países europeus possuem legislações variadas sobre a Eutanásia aos doentes em estado
terminal, vegetativo ou considerado indigno pelo excesso de sofrimento.
Oficialmente, alguns países legalizaram a prática da Eutanásia, outros criaram leis que
toleram alguns procedimentos que põe fim de forma indireta a dor do paciente, e ainda
existem os que ainda comparam a Eutanásia como forma de assassinato.
3.1.Países que legalizaram a Eutanásia
Na Holanda a Eutanásia ativa é praticada desde abril de 2002, ocorre pelo uso de uma
droga que provoca a morte no paciente. Para que seja autorizada, o paciente deve possuir uma
doença incurável e que esteja em estado de sofrimento intolerável e sem fim e seu pedido
deve ser feito ainda quando estiver consciente. O parecer quanto ao estado clinico que o
paciente se encontra deve ser realizado por um médico e confirmado por outro. Vale frisar
que também é autorizada a prática da Eutanásia em menores de 12 anos seguindo, é claro, os
critérios estabelecidos pela lei.
Na Bélgica desde setembro de 2002 foi descriminalizado a prática da Eutanásia. O doente
deve se encontrar em estado de sofrimento físico e/ou psíquico sem fim e totalmente
insuportável, o paciente deve ser maior de idade, está totalmente consciente e realizar a
solicitação reiteradas vezes de forma voluntária e pensada, livre de coação. Sua vontade
poderá ser escrita e terá prazo de validade por cinco anos. Desde março de 2014 o país
autoriza que crianças que apresentem discernimento e se encontre com uma doença incurável,
optem pela prática da Eutanásia. Em Luxemburgo a prática da Eutanásia foi regulada desde
março de 2009, quando constatar de fato que o paciente esteja desenganado pelos médicos e
sua prática é ilegal para os menores de idade.
3.2.Países que autorizam ou toleram a Eutanásia
Na Suíça a prática da Eutanásia na sua forma direta não é aceita pelo país, contudo, é
permitido o suicídio assistido, onde o paciente recebe uma droga letal e ele mesmo ingere sem
ajuda de qualquer outra pessoa. Não é permitido que o paciente receba ajuda para provocar a
sua morte, mas aceita que sejam desligados os aparelhos que mantêm o paciente vivo
artificialmente.
Na França a prática da Eutanásia foi regulada em 2005 através de uma lei chamada
Leonetti, onde favorece que os pacientes em estado avançado de uma doença incurável sejam
11
submetidos a tratamentos que atenuem o seu sofrimento com ajuda de medicamentos e
sedativos, que consequentemente possam abreviar a vida desse paciente.
Na Suécia a única forma que a Eutanásia pode ser praticada é na sua forma passiva. Em
2010 o país permitiu que os tratamentos que mantêm o paciente vivo artificialmente sejam
interrompidos.
Na Grã-Bretanha a Eutanásia é praticada na sua forma passiva desde 2002, onde a
legislação do país é mais tolerante em casos específicos. Ocorre a suspensão dos cuidados
médicos, desde que a vontade do paciente seja demonstrada expressamente.
Na Alemanha e Áustria a prática da Eutanásia só é permitida na sua forma passiva e ainda
assim só será admitida a pedido do paciente.
Na Dinamarca qualquer indivíduo pode declarar por escrito desde 1992 que não quer ser
submetido a tratamentos invasivos.
Na Noruega só será admitida na sua forma passiva e a requerimento do paciente
consciente que se encontre em fase terminal, e no caso que se encontre inconsciente, a sua
solicitação pode ser feita por um familiar.
Na Hungria e República Tcheca o paciente que se encontre em estado terminal, portador
de uma doença incurável, poderá se recusar a ser submetido a qualquer tratamento médico. O
mesmo ocorre na Espanha, os pacientes têm o direito de recusar tratamento médico.
Em Portugal só se admite a suspensão de tratamentos médicos em casos específicos pelo
Conselho de Ética, entretanto a Eutanásia tanto ativa quanto a passiva é condenada.
3.3.Países que proíbem a Eutanásia
Na Itália o código Penal italiano prevê a pena de seis a quinze anos de reclusão, mesmo
com autorização do Paciente, pois a prática da Eutanásia ativa é comparada ao homicídio
involuntário. O suicídio assistido também é um delito.
Na Grécia e Romênia prevê pena de sete anos de reclusão para quem praticar a Eutanásia.
Em Bósnia e Sérvia a Eutanásia é punida na mesma proporção do crime de homicídio.
Na Croácia prática da Eutanásia é proibida desde janeiro de 2013, no entanto a pena
prevista para esse crime é relativamente branda.
12
Polônia: A prática da Eutanásia é punível com pena de três meses a cinco anos de
reclusão, entretanto em casos excepcionais, o juiz pode diminuir a pena do autor ou ainda
renunciar à aplicação da pena.
Na Irlanda é totalmente proibido qualquer forma de auxílio à morte ou ao suicídio
assistido, sendo punida com pena de catorze anos de reclusão.
4. Espécies de Eutanásia
Como existem diversos tipos e classificações encontradas por diversos autores quanto às
espécies de Eutanásia, é bom ressaltar a priori que a Eutanásia pode ser distinguida quanto a
sua ação que pode ser ativa, passiva e de duplo efeito e quanto ao consentimento do paciente
que pode ser voluntária, involuntária e a não voluntária.
Em se tratando das espécies, pode ser classificada em: Eutanásia, Distanásia, Ortonásia e
o Suicídio Assistido.
A Eutanásia como já aclarado, é a morte dada àquelas pessoas que sofrem de doenças
incuráveis e dolorosas ou que se encontrem em estado vegetativo próximo ao fim da vida sem
nenhuma chance de salvação ou alívio, movida pela compaixão, piedade e solidariedade
humana. É praticada usualmente por familiares, parentes, amigos e médicos do paciente.
Ressaltando que o objetivo principal da Eutanásia é que o paciente esteja acometido por uma
doença incurável e a sua motivação seja compassiva.
Na acepção de CLAUS ROXIN:
“A Eutanásia é identificada em sentido estrito quando em casos em que a
morte é iminente, com ou sem ajuda de terceiros, a ajuda é prestada após o
início do processo da morte. Em sentido amplo, quando outrem colabora
para a morte de outra pessoa que, apesar de poder viver mais tempo,
pretende pôr fim a sua vida”.14
4.1 Distanásia
A Distanásia ocorre quando o paciente continua vivo somente com a ajuda artificial, ou
seja, o sofrimento do paciente é prolongado com ajuda de aparelhos, mesmo que a ciência
médica não presuma possibilidade de cura ou melhora.
14
ROXIN, Claus. A apreciação jurídico-penal da eutanásia. Revista Brasileira de ciências criminaisr [do
Instituto brasileiro de ciências criminais]. São Paulo: Revista dos Tribunais, n.o 32, outubro/dezembro,
2000.p. 10-11.
13
Em vez de permitir que o paciente tenha uma morte natural, prolonga-se sua aflição, seu
sofrimento sem que nem o próprio paciente ou a equipe médica tenham uma noção ou
estimativa de melhora ou ainda de uma qualidade de vida digna.
Esclarece ADONI que a “Distanásia não prolonga a vida, mas sim o processo de morrer,
pouco importando a situação e as condições de dignidade humana do paciente, pois a
Distanásia tem como foco uma cega e censurável obstinação terapêutica, prendendo-se ao
próprio tratamento em si e às realidades tecnológicas existentes”. 15
O que se entende da Distanásia resumidamente é que é algo comum que ocorre
corriqueiramente em hospitais, sendo aceita pela sociedade, tendo em vista que passa a ideia
de que tudo está bem e que se a qualquer momento o paciente vir a falecer entende-se que
tudo foi feito para que o paciente ficasse vivo e quem sabe obtivesse uma melhora.
A Distanásia é considerada pelos médicos como uma conduta antiética, pois se submete o
paciente a um tratamento que não irá curar e nem tampouco melhorar a qualidade de vida
daquele paciente, pois consiste em tratar o que já foi tratado e não resolvido. Somente irá
prolongar ainda mais seu sofrimento tanto fisicamente quando moralmente.
4.2 Ortonásia
Diferentemente da Distanásia, surge a Ortonásia que consiste na morte natural do paciente
acatando a vontade do próprio paciente e de seus familiares, tratada também como Eutanásia
passiva. É o ato de deixar o paciente morrer no seu tempo certo, sem meios que abreviem ou
prolongue sua morte por entender que seria inadmissível prolongar o sofrimento físico, moral,
emocional e econômico do paciente.
A Ortonásia é definida conforme a Resolução do Conselho Federal de Medicina – CFM
nº: 1805/2006, como a situação do doente já se encontrar em estado de saúde que segundo
conhecimento humano e diagnóstico médico, é sabido que prontamente o paciente irá
falecer.16
Somente o médico pode realizar a Ortonásia, pois o médico não está obrigado a
prolongar a morte e nem a vida do paciente por meios artificiais sem a autorização do próprio
paciente.
15
ADONI, André Luis. Bioética e Biodireito: Aspectos Gerais sobre a eutanásia e o direito à morte digna,
2001. p. 406. 16
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Disponível em
http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2006/1805_2006.htm, acessado em 23/11/2015, às 15h38min.
14
4.3 Suicídio Assistido
Outra forma de Eutanásia é o Suicídio Assistido, que ocorre quando alguém, uma terceira
pessoa ajuda o doente que não dispõe de meios para conseguir, por si só, a sua morte,
oferecendo meios convenientes para isso.
O paciente é quem provoca a sua morte mesmo tendo a ajuda de outrem. A diferença
fulcral para que o Suicídio Assistido seja considerado uma forma de Eutanásia é que o
paciente tenha anteriormente solicitado ajuda para morrer diante do fracasso de obter melhora
do seu estado clínico, quando verificar que os métodos terapêuticos e paliativos contra o
estado lamentável que se encontra e que acaba por retirar a sua dignidade, ou seja, o próprio
paciente chega à conclusão que sofrerá sem conseguir a reversão do seu caso, sobrevivendo
como um vegetal.
Mesmo o paciente solicitando e consentindo a ajuda de terceiro, a conduta ainda é
considerada ilícita.
4.4 Mistanásia
Por último, mas não menos importante, está a Mistanásia, apesar de ser um termo pouco
utilizado, representa uma morte miserável, antes da hora. Podem ocorrer em casos de omissão
de socorro, erro médico, negligência, imprudência e imperícia. É conhecida também como
Eutanásia social.
Ocorre em sua maioria em pessoas que não têm acesso ao sistema de saúde.
5. Aspectos Jurídicos, Éticos, Morais e Religiosos
A Legislação Penal Brasileira é regida pelo Código Penal de 1940 que foi criada pelo
decreto lei 2.848 de 07 de dezembro de 1940, o qual não tipificou a prática da Eutanásia.
A prática da Eutanásia não é aceita pelo nosso ordenamento jurídico, pois se entende que
a sua prática vai contra o mais valioso dos bens que é a vida, já que é vista como um
homicídio, sendo assim como não existe uma norma legal que fale claramente em Eutanásia,
sua prática é tida como “homicídio privilegiado”.
Atualmente no caso de um médico realizar a Eutanásia, o profissional pode ser condenado
pelo crime de homicídio com pena de doze a trinta anos de reclusão ou por crime de auxílio
ao suicídio com pena de dois a seis anos de reclusão.
15
Como não há uma norma penal que configure a prática da Eutanásia, cabe o magistrado
analisar a questão minuciosamente e tipificar a conduta de forma análoga, o que é utilizado
pela norma brasileira é que a prática da Eutanásia está configurada no Art. 121, §1º do Código
Penal que trata de uma diminuição de pena do crime de homicídio, pois se o autor comete o
crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta
emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um
sexto a um terço.17
Além da Legislação comparar a prática da Eutanásia com o homicídio privilegiado,
regulamenta também esta questão no seu Art. 122 do Código Penal que menciona que induzir
ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça com pena de dois a seis
anos de reclusão se o suicídio se consumar e se da tentativa resultar lesão corporal grave a
pena é de um a três anos.18
Além do Código Penal, existe o Código de Ética Médica que seguindo a linha de
pensamento do pai da Medicina – Hipócrates, menciona que a nenhum ser humano será dado
para agradar, nenhum remédio mortal ou sequer conselhos para induzir a salvação. No entanto
expõe o Art. 57 que o médico não tem o direito de contribuir direta ou indiretamente a morte
do doente.
Desta forma, o médico de qualquer forma, diretamente ou indiretamente está de mãos e
pés atados, não podendo de forma alguma utilizar de meios que abrevie a vida de um
indivíduo doente mesmo em estado terminal.
Portanto, ainda reforça GENIVAL VELOSO que mesmo que o doente esteja
irremediavelmente condenado à morte e a esperá-la de forma sofrida, continua sendo em
qualquer hipótese, um homicídio. 19
Apesar de ser um crime privilegiado, a sua prática ainda é rechaçada pelo Código Penal,
devendo o autor que praticou ou auxiliou a sua efetivação ser condenado nas formas da lei,
não importando se foi feito a pedido do paciente, por motivo de piedade, de compaixão.
Sendo assim, a prática da Eutanásia ocorre atualmente de forma discriminada.
17
CÓDIGO PENAL BRASILEIRO. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/Del2848compilado.htm. Acessado em 23/11/2015 às 13h:31min. 18
Idem 19
D.O. de 11 de janeiro de 1965- Seção I – Parte II. apud FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico. 3.
ed. São Paulo: Bik-Procienx, 1982. p 269/270.
16
Entende-se que, apesar da prática do homicídio praticado na forma da Eutanásia ser
considerado piedoso, que o autor não tem intenção de forma alguma em causar danos ao
paciente, bem como sua família, pelo contrário, só quer acabar de vez com aquele sofrimento
acometido pelo doente que às vezes tem noção que sua condição nunca mais será reversível e
o pior que irá se sentir um vegetal, pois não terá sua vida digna de volta e nem uma possível
condição de vida digna naquele estado, ainda sim é considerado crime e sua sanção na
maioria das vezes é muito maior do que se pode esperar, tendo em vista que o “criminoso”
nesse caso não só responderá na esfera penal, como também na esfera cível e até no campo
ético.
Nos dias de hoje a Eutanásia apesar de não possuir um ordenamento jurídico com
referência ao tema, e sendo vista pelo nosso Código Penal como uma forma de homicídio,
ainda que privilegiado, a Eutanásia não é vista mais como uma simples possibilidade de
ocasionar a morte de um indivíduo. Para estas pessoas que estão sofrendo, que estão
“vivendo” de forma intolerável, inaceitável, é uma forma que colocar um basta nessa situação,
pois não basta viver com dignidade, se ao final da vida não é assim que termina.
A Ética não deve ser vista como forma de agir, pois estaríamos falando da Moral que é
quem determina a forma como cada indivíduo deve agir e se comportar, sendo assim a Ética é
a ciência da conduta humana que automaticamente traz a moral.
Ou seja, a Ética e a Moral apesar de andarem de mãos dadas, são distintas. A Ética está
ligada ao estudo fundamentado dos valores morais que orientam o comportamento humano
em sociedade. Basicamente é uma reflexão sobre a moral. Enquanto a Moral são os costumes,
convenções, normas, os preconceitos criadas e estabelecidas dentro de cada sociedade.
Ao trazer esses dois conceitos no caso em baila, é preciso destacar o Código de Ética que
veda a utilização em qualquer caso, de meios destinados a abreviar a vida do paciente, ainda
que a pedido deste ou de seu familiar.
Ocorre que em se tratando da Eutanásia, seria muito mais ético retirar a vida de um
indivíduo que se encontre com uma doença incurável e que esteja em estado de sofrimento
eterno, onde a única coisa a se esperar é a sua morte e até que esta chegue esteja sobrevivendo
de forma indigna, pois mesmo com tantos meios de tratamentos possíveis utilizados, sabe-se
que não terá a sua dignidade de volta.
Assim sendo, se o princípio da dignidade da pessoa humana garante justamente que o
indivíduo seja ele quem for, no estado que se encontre, tenha o direito de viver dignamente, é
17
justo que o paciente que se encontre esperando somente a morte para descansar de vez,
decidir sobre sua vida.
Seria justo manter um ser humano vivo por meios artificiais sofrendo tanto fisicamente,
uma dor que não se pode mensurar, já que só o próprio paciente é quem sabe o que está
sentindo preso dentro de um corpo que já está morto pedindo para que acabe logo, quanto
uma dor moral.
Não é o correto seguir à risca o princípio da dignidade da pessoa humana somente pelo
fato de ser considerado que a vida é o bem maior a ser protegido. E enquanto a forma indigna
que o ser humano está sendo submetido e, inclusive contra a sua vontade, não deve ser
avaliado, já que o próprio princípio aborda justamente a forma digna que um ser humano
merece viver. Frisando que já foi demonstrado no início do trabalho que o princípio da
dignidade da pessoa humana não é absoluto, então o direito de escolha do paciente em optar
por continuar vivendo sofrendo e esperando a morte chegar, pois sabe-se que ela é certa, ou
escolher em morrer de forma digna.
Imagine uma pessoa que era tratada como sinônimo de disposição, que trabalhava,
estudava, praticava esportes, tinha uma vida até então dentro das normalidades e que num
determinado momento da vida é acometida por uma doença incurável e que tem ciência que
por mais que se submeta aos melhores tratamentos médicos e de longa duração chegará uma
hora em que não terá mais chances de viver de forma digna, que somente irá respirar com
ajuda de aparelhos e saberá que seus órgãos mesmo funcionando artificialmente nunca mais
voltará a ser a pessoa quem era antes, ou seja, não é correto interferir no direito de escolha
desse indivíduo mesmo tendo direito sobre sua vida. A legislação não pode ser superior ao
direito de escolha desse indivíduo.
É muito mais ético respeitar o direito de escolha desse indivíduo do que simplesmente ser
egoísta e acreditar esperançosamente que um dia ele irá voltar a ter saúde e viver dignamente
como vivia.
A questão é que a sociedade busca argumentos fora da ciência para justificar e julgar se
essas escolhas são éticas, dignas ou justas, pois sabe-se que como a moral é definida de
acordo com os costumes, com um conjunto de normas que regulam o comportamento do
indivíduo perante a sociedade, têm-se o medo de que a possível regularização da prática da
Eutanásia em alguns casos, em algumas exceções, façam com que aos poucos sejam aceita
pela sociedade e com o tempo acabe sendo regulamentada como foi o caso do casamento
18
homo afetivo que custou ser abordado, devido à resistência cultural da maioria e que ao final
foi tratado de forma justa como deveria ser tratada.
É com base nesse tópico que se adentra em outro tema bastante polêmico e que é um dos
argumentos com exceção ao princípio da dignidade da pessoa humana, que faz com que a
prática da Eutanásia não seja regularizada.
Os conceitos religiosos na visão das grandes religiões mundiais geram consequentemente,
é claro, opiniões diferentes e interpretações do que realmente seria ético e digno.
O Budismo, uma das maiores religiões do mundo hoje com cerca de 500 milhões de
seguidores fundada pelo indiano Siddhartha Guatama é uma religião que não acredita na
existência de um Deus criador, sendo considerada mais uma filosofia de vida que obtêm
iluminação completa por meio da meditação e que com isso mostra o caminho do despertar
espiritual e da liberdade. Sendo assim, quando se trata de questões polêmicas como a
Eutanásia e outros temas considerados tabus, o Budismo se diferenciam de muitas outras
religiões.
Procura levar em consideração todas as formas do sofrimento, o processo de decisão do
doente, equilibrando o desejo do paciente em optar por uma morte tranquila, que o médico
não cause nenhum tipo de dano e que o desejo da sociedade não seja somente o de preservar a
vida. O budismo não vê a morte como o final da vida, ele enxerga a morte como uma
transição, como uma passagem, sendo assim já reconhecem esse direito que o ser humano tem
em determinar quando deveriam passar desta existência para a seguinte.
Logo, a morte é considerada chegada quando o indivíduo não consegue mais exercer uma
vontade consciente, ou seja, quando o cérebro perdeu definitivamente a capacidade de viver,
podendo concluir que tanto a Eutanásia ativa quanto a passiva é autorizada, devendo é claro
analisa-los separadamente.
Para a religião espírita, é sempre culpado aquele que não sabe esperar o tempo que Deus
marcou para a sua existência. Para alguns autores a Eutanásia é definida como algo puramente
material, sendo assim considerada uma atitude impensada aos olhos do espiritismo.
Acredita-se que o sofrimento seria aparentemente abreviado no momento de hoje, mas que
futuramente esse ato geraria maiores problemas ao longo de sua caminhada espiritual e
evolutiva, pois a religião espirita baseia-se e acredita-se em reencarnações, portanto, o mal
que você causa e não repara hoje em vida, você poderá pagá-lo em outra vida.
19
Em se tratando da religião Islã, para a unanimidade das quatro grandes escolas islâmicas,
fundadas por Abou Hassifa, Malek, Chaffei e Ahmed Ibm Handibal, é ilícita a prática da
Eutanásia.
Surgida após o Cristianismo, o Islamismo trata a vida como algo sagrado, inviolável,
devendo nenhuma pessoa ser submetida a qualquer dano ou ainda que sua vida seja retirada
sob autorização de lei, sendo vedada a utilização de quaisquer meios que auxiliem a morte.
Algumas escolas têm posicionamentos diferentes quando a prática, a escola de Handibal é
de que se a Eutanásia ocorreu com o consentimento do paciente, equivale a sua renúncia de
reclamar a imposição da pena, devendo, contudo, responder pelos seus atos perante Deus.
O Judaísmo é uma religião que estabelece condutas para seus seguidores. Ela dispõe que
o homem não tem disponibilidade da vida e do próprio corpo, pertencentes a Deus. A vida é
considerada um valor infinito e indivisível. O direito de morrer não é reconhecido, o médico é
visto como um instrumento de Deus para preservar a vida, a definição de morte não deriva
exclusivamente dos fatos médicos e fisiológicos, e sim uma questão ética e legal. No entanto,
quanto a questão do prolongamento da vida do paciente, o judaísmo acredita que seja
obrigatório, e o prolongamento da agonia não é, ou seja, quando o médico está convencido
que o seu paciente poderá falecer daqui três dias, fica autorizado suspender as manobras
reanimatórias e de tratamento não analgésico (Eutanásia passiva).
Para o Cristianismo que é uma das maiores religiões predominante no Brasil, muito
embora cada doutrina religiosa entenda de uma forma diferenciada a outras da prática da
Eutanásia, existem diferenças e semelhanças em cada doutrina.
No catolicismo a Eutanásia é considerada uma ofensa à dignidade da pessoa humana,
sendo considerada um crime contra a vida e de um atentado contra a humanidade, pois a vida
para os católicos é um dom do amor de Deus que deve ser considerada. Assim a igreja
católica é contra a prática da Eutanásia.
Apesar da tecnologia está avançando com o passar dos anos, opiniões surgindo ao longo
dos estudos sobre o tema, a opinião que a igreja católica vem adotando é a de que a prática da
Eutanásia é ilícita.
Para a igreja adventista do sétimo dia em relação à Eutanásia, a doutrina é a favor quando
se trata da Eutanásia passiva, porém ao falar em Eutanásia ativa não há um posicionamento
oficial.
20
Para a igreja Batista a Eutanásia também só é permitida na sua forma passiva, pois
defende que o paciente tem o direito de tomar as suas próprias decisões em relação as
medidas a serem tomadas ou suspensão de tratamentos, contudo, é condenável totalmente a
prática da Eutanásia na sua forma ativa.
A religião Mórmon foi fundada por um homem chamado Joseph Smith há mais de
duzentos anos. Ele afirmava ter recebido uma visita pessoal de Deus e de seu filho Jesus
Cristo e que lhe fora dito que todas as igrejas e quem as seguiam fielmente eram uma
abominação. Desta forma, ele passou a tentar estabelecer uma religião que assegura ser a
única e verdadeira igreja na terra. O Mormonismo contraria, transforma e amplia a Bíblia para
a religião Mórmon quando a morte é com toda certeza inevitável deve ser vista como uma
benção e intencionalmente parte da existência eterna, ou seja, não existe a obrigação de
estender a vida na terra, porém a prática da Eutanásia não é permitida, pois viola os
mandamentos de Deus.
Para a religião Testemunha de Jeová, a morte de um paciente é iminente e inevitável. A
Eutanásia passiva é permitida, já a prática da Eutanásia ativa é considerada homicídio que
viola a santidade da vida.
A Bíblia não nos comanda a fazer tudo o que podemos para manter uma pessoa viva. Se
uma pessoa está sobrevivendo apenas com ajuda de máquinas, não é imoral desligá-las e
deixar a pessoa morrer, ou seja, se uma pessoa se encontra em estado vegetativo persistente
por um período prolongado, não seria uma ofensa a Deus remover quaisquer tubos, máquinas
ou qualquer aparelho que mantenha a vida artificial de determinada pessoa, uma vez que se
entende nessa questão religiosa que se Deus quiser manter esse paciente vivo sem ajuda de
aparelhos, ele o fará, pois é maior do que tudo.
É claro que apesar de existirem inúmeras religiões, predominante ou não no Brasil, é
difícil e doloroso tomar uma decisão dessas. Nunca é fácil dizer ao médico ou mesmo acatar a
decisão do ente querido que se encontra nesse estado crítico que não pretende mais viver.
Nunca se deve tentar dar cabo a uma vida de forma que ainda há possibilidade de viver de
forma digna, mas ao mesmo tempo, não se tem o direito de alongar a vida de uma pessoa o
tanto quanto possível, a qualquer custo, pelo fato de não conseguir aceitar a ideia de que
amanhã não verá o ente querido.
Infelizmente é muito mais confortável e aceitável saber que o ente querido mesmo
sobrevivendo por meios artificiais, se encontra ali próximo. Embora a dor ainda seja presente,
21
em ver o familiar, amigo ou quem quer que esteja sofrendo, sem esperanças, pois sabe-se que
se não for por um milagre divino o indivíduo não voltará a vida digna, é mais fácil conviver
com essa dor diária do que com a decisão de se afastar de vez, cortar esse sofrimento que liga
tanto o paciente quanto o familiar.
É nesse ponto que entra a questão religiosa. É claro que não está sendo julgada qualquer
religião, pois o presente artigo não aborda qual religião é a melhor, pior, correta ou não a ser
seguida, e sim se a prática da Eutanásia deverá ser considerada lícita sendo regularizada e não
sendo mais considerada uma afronta contra o bem maior que é a vida.
Ou seja, é mais fácil ao ser humano a ideia de se apegar ao fato de que é pecado a
realização da Eutanásia porque a vida é um dor maior e crer nisso e ter esperanças que um dia
esse indivíduo “morto-vivo” voltará a vida é mais fácil de lidar, do que aceitar que isso não
acontecerá e tomar a decisão de acabar com esse sofrimento, angústia, amargura, agonia
interminável porque sabe que não terá mais a presença física desse ente, mesmo ele não
esboçando nenhum sinal de vida.
Assim sendo, pôde se concluir pelas religiões destacadas no texto que a maioria delas
aceitam a prática da Eutanásia na sua forma passiva, mas reprovam a sua forma ativa.
Entretanto, no final das contas a prática da Eutanásia ocorre, pois, a morte do paciente ocorre
justamente pela falta de recursos exigidos a sua sobrevivência, desta forma, ao final o
paciente morrerá. A única diferença é que na Eutanásia ativa a morte ocorre mais rapidamente
com ajuda de meios que acelerem essa morte, contrário então da passiva abordada pela
maioria das religiões elencadas.
Consequentemente, como já dizia Nicolau Maquiavel, os fins justificam os meios.
6. Bioética e Biodireito
A Bioética é o estudo relacionado a biologia, medicina e a ética, ao qual busca investigar
todas as condições necessárias para uma administração responsável do profissional de saúde
em relação à vida humana em geral e da dignidade da pessoa humana em particular ligada
estritamente ao Biodireito.
O Biodireito é o ramo do direito público que corresponde à Bioética. Estuda as relações
jurídicas entre os avanços tecnológicos ligados a medicina e ao direito, priorizando assuntos
relacionados ao corpo e a dignidade da pessoa humana.
22
6.1. Os primórdios da Bioética
Devido à rapidez com que a ciência juntamente com a tecnologia vem crescendo ao longo
dos anos, faz com que a sociedade se questione a respeito de temas que ainda consideram um
tabu e questões que geram bastante debate entre a maioria.
Assim sendo, com a finalidade de acabar com estes questionamentos foi que surgiu a
Bioética que aborda diversas ciências de maneiras diferentes por diversos estudiosos.
O termo Bioética surgiu em 1970, utilizado por Van Rens Selaer Potter para mencionar
uma nova ciência da sobrevivência e do conhecimento dos sistemas de valores humanos, ou
seja, a ética aplicada à ciência20
. Se a ciência está sendo utilizada de forma correta sem que
seja violado o corpo humano e consequentemente a vida do paciente.
A respeito do entendimento de Potter, MARIA HELENA DINIZ, descreve que:
A bioética seria então uma nova disciplina que recorreria às ciências
biológicas para melhorar a qualidade de vida do ser humano, permitindo a
participação do homem na evolução biológica e preservando a harmonia
universal. Seria a ciência que garantiria a sobrevivência na Terra, que está
em perigo, em virtude de um descontrolado desconhecimento da tecnologia
industrial, do uso indiscriminado de agrotóxicos, de animais em pesquisas ou
experiências biológicas e da sempre crescente poluição aquática, atmosférica
e sonora.21
Nesse mesmo diapasão, ensina RINALDO PEREIRA SILVA que “a contribuição da
bioética para a humanidade consiste na reavaliação da tecnologia que tem o conhecimento
como o fim absoluto, independente, como se não tivesse relação com os homens que o
executam e com aqueles que dele padecem”. 22
A Bioética não está limitada somente às ciências da saúde, uma vez que o seu objetivo
principal é a vida no geral, ou seja, em todas as áreas que a vida seja o tema.
Assim, existem duas formas principais no estudo da Bioética: Uma que parte do
reconhecimento da pessoa e sua essência como condição precedente para o respeito da
20
POTTER, Van Rensselaer. Bioética. In: O mundo da Saúde, Ano 22. v. 22 nº 6, Nov/ dez. São Paulo: FISC,
1998. 21
DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2.ed. aum. e atual. de acordo com o novo Código Civil
(Lei n. 10.406, de 10-01-2002). São Paulo: Saraiva, 2002. p. 09. 22
SILVA, Biodireito: a nova fronteira dos direitos humanos. p. 160.
23
dignidade da pessoa humana. E a outra que adota uma postura mais individualista não uma
proposta de ética, mas sim de uma moral que estabelece normas para agir corretamente.23
A Bioética tem três princípios base: a autonomia, beneficência e a justiça.
O princípio da Autonomia requer que os indivíduos que sejam capacitados em decidirem
sobre suas escolhas pessoais, devam ser tratados com respeito sobre as suas decisões, ou seja,
tem o direito de decidir sobre o que fazer com o seu corpo, bem como a sua vida.
O princípio da Beneficência proíbe conferir dano determinado, ou seja, estabelece que o
médico deva utilizar meios que causem o menor prejuízo possível à saúde do paciente,
resumindo que suas ações não causem mal ao paciente.
O princípio da justiça estabelece como condição principal a equidade, ou seja, a obrigação
ética que cada indivíduo deve ser tratado, de dar a cada ser humano o que lhe é devido de
forma adequada. Devendo o médico sempre atuar com imparcialidade, evitando sempre que
aspectos sociais, culturais, morais, religiosos, financeiros ou quaisquer outros que interfiram
na relação com o paciente.
No contexto atual, DAURY CESAR FABRIZ discorre que:
A Bioética pode ser vista como uma probabilidade de se criar um novo
discurso sobre a vida, colocando em discurso uma nova ética em resposta a
uma verdade absoluta que já foi criada atualmente. Frisando que esse novo
ponto de vista de ética não tem a ambição de se colocar como a única
verdade, mas tem o objetivo de gerar uma discussão e analisar os vários
aspectos que a atual e moderna tecnologia trouxe de avanço ao campo da
biomedicina.24
6.2 O papel do Biodireito
Partindo de uma conceituação didática, Biodireito é:
É um ramo do Direito que aborda, especificamente, das relações referentes à
natureza jurídica de todas as questões que envolva a vida do ser humano, ou
seja, questões como o próprio tema, como o aborto, transplante de órgãos e
tecidos entre seres vivos ou mortos, entre tantos outros que lidam como
23
SGRECCIA, Elio. Maual de Bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Loyola, 1996. p. 154. 24
FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003, p. 86.
24
fundamento a dignidade da pessoa humana (Art.1°, III, da Constituição
Federal). 25
Conforme ensina REINALDO PEREIRA SILVA, “em consequência do dinamismo com
que a tecnologia nos dias de hoje vem dando a medicina, surgiu o Biodireito que é um ramo
do direito e que também faz ligação entre a Bioética e o direito, buscando sempre o equilíbrio
entre a ciência e a pessoa humana”. 26
O Biodireito resumidamente nada mais é que a ligação doutrinária, legislativa e judicial
que envolve determinadas questões que estão associadas a Bioética.
Nesse entendimento ensina THYCO BRAHE FERNANDES:
O Biodireito na verdade é a formação doutrinária, legislativa e judicial
acerca das questões que envolvem a bioética ou até corriqueiras e
inquietantes que vão da análise minuciosa do tema, passando pelos meios
que serão desenvolvidos, depois passando por questões judiciais que se
dividem em vários aspectos como a garantia constitucional do direito à
saúde, a falta de leitos hospitalares e a justa distribuição de saúde à
população.27
O Direito sempre irá intervir no campo das diversas ciências da saúde, que seja para
legitimá-las, quer seja para regulamentar ou proibir outras, por isso o Biodireito sempre será
convocado.
É bom ressaltar que o Direito não desempenha sozinho um papel totalmente viável, é
imperioso a legitimidade jurídica através das descobertas e também dos riscos que estão
sujeitos para uma melhor condição humana.
Assim ensina MARIA CELESTE:
O Direito, por si só, não desempenha um papel totalmente duradouro nessas
questões, é necessário a legitimidade jurídica divulgada através dos debates
realizados com os cientistas de diversas áreas. O direito se constrói em
relação as suas descobertas, mas também a partir dos riscos que as novas
técnicas criam para a condição humana. É da união e cooperação destes
25
DireitoNet. Biodireito. Disponível em: http://www.direitonet.com.br/dicionario_juridico. Acessado: 25 de
novembro de 2015, às 13h53min. 26
SILVA, Reinaldo Pereira. Introdução ao Biodireito. Investigações polítco-jurídicas sobre o estatuto da
concepção humana. São Paulo: LTr, 2002. p. 12. 27
FERNANDES, Thyco Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do biodireito: aspectos do direito
de família e do direito das sucessões. Florianópolis: Diploma Legal, 2000. p. 42.
25
dessas duas vertentes que se determinam as condutas, posturas e sanções que
serão aplicadas por toda comunidade humana.28
O Biodireito nasce sobre os vestígios dos direitos fundamentais, sendo assim, inseparável,
já que trata dos direitos morais relacionados à vida, à dignidade da pessoa humana, a
privacidade. Ou seja, o Biodireito coloca em prática na sua forma jurídica o que vem
garantido no texto constitucional ou proclamado por um grupo de pesquisadores, sábios ou
mesmo por um legislador religioso ou moral. Assegurando na forma da lei as verdadeiras
garantias fundamentais ao homem.
7. Projeto de alteração da Lei Penal relativamente à Eutanásia
No Brasil já chegou a ter uma iniciativa parlamentar favorável quanto à eutanásia e um
contra. O projeto de lei 125/96, de autoria do senador Gilvam Borges, do PMDB pretendia
liberar a prática da Eutanásia em algumas situações, e foi submetido à avaliação das
comissões parlamentares em 1996, entretanto, o projeto acabou não vingando e foi arquivado
três anos depois. Já se tratando de um projeto de lei contrário, o deputado Osmânio Pereira
propôs a proibição clara da eutanásia no país, definindo-a como crime hediondo, porém, a
proposta também foi arquivada.
Atualmente existe em trâmite o projeto de lei nº: 236 de 07/07/2012, apresentado pelo
Senado Federal de autoria do Senador José Sarney, que visa à criação de um novo Código
Penal Brasileiro, decisivamente traz grandes novidades para a esfera penal, principalmente em
questões que ainda são tabus para a sociedade e geram bastante debate.29
Dentre tantas inovações que o projeto de lei traz, encontra-se a tipificação da prática da
Eutanásia, que está prevista no Art. 122 da possível lei penal como uma modalidade nova e
independente de crime diferente do crime de homicídio.
Art. 122. Matar, por piedade ou compaixão, paciente em estado terminal,
imputável e maior, a seu pedido, para abreviar-lhe sofrimento físico
insuportável em razão de doença grave:
Pena – prisão, de dois a quatro anos.
28
SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos desafios. p. 118. 29
PROJETO DE LEI DO SENADO nº 236, de 2012 - (NOVO CÓDIGO PENAL), Disponível em
http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/106404, Acessado em 26/11/2015, às
12h29min.
26
Pelo menos no parágrafo primeiro do referido artigo, o legislador demonstrou um
progresso quanto ao tema, o qual possibilita ao magistrado deixar de aplicar a pena conforme
as circunstâncias do caso concreto.
§1º O juiz deixará de aplicar a pena avaliando as circunstâncias do caso, bem
como a relação de parentesco ou estreitos laços de afeição do agente com a
vítima.
No entanto, parte da maioria dos doutrinadores brasileiros acredita que o direito à vida
continua sendo um direito fundamental quase absoluto, sendo relativo somente em casos
extremamente extraordinários que devem ser expressamente previstos em lei, ou taxado na
Constituição Federal.
Ocorre que embora a maioria dos doutrinadores entenderem que o direito à vida é quase
que absoluto vale frisar que não é a mesma coisa que falar que o princípio da dignidade
humana é absoluto. Já foi demonstrado no início do trabalho que tal princípio não é absoluto,
sendo assim, não deve confundir o direito à vida que é quase que absoluto, com o princípio da
dignidade da pessoa humana, ainda que ambos caminhem juntos.
Reforçando a questão, o próprio STF continuadamente já teve a
oportunidade de se manifestar nesse sentido, de que não existem direitos
absolutos, quaisquer que sejam estes e com base nessa confirmação diversos
tribunais têm utilizado esse entendimento para se embasarem em questões
envolvendo o tema.30
Nesse sentido, não há porque insistir em uma proteção demasiada quanto ao direito à vida,
colocando em risco, inclusive, outros direitos fundamentais necessários até para manter o
próprio direito à vida, já que é muito relativo manter a vida acima de todos, sendo que essa
questão é muito dependente de outros fatores.
Ora, é correto impor a um indivíduo que se encontre sem chances alguma de vida ou de
uma possível melhora, e pior, sem ter ao menos uma condição de vida digna, que este não
poderá pôr fim ao seu sofrimento.
A questão é muito mais social do que de direito, pois é muito mais fácil impor um novo
tipo penal incriminando a prática da Eutanásia, do que garantir o direito à vida digna de um
30
Os Direitos e Garantias fundamentais não tem caráter absoluto. Disponível em:
http://www.jusbrasil.com.br/busca?q=Os+direitos+e+garantias+individuais+n%C3%A3o+t%C3%AAm+car
%C3%A1ter+absoluto&c=, Acessado em 26/11/2015, às 12h56min.
27
indivíduo. Portanto, o projeto de lei tipificando a prática da Eutanásia não quer dizer e nem
garante que o bem jurídico a vida esteja totalmente protegida.
Assim sendo, a tipificação da Eutanásia no projeto de lei nº: 236/2012 vai contra o
entendimento do próprio STF de que os direitos e garantias fundamentais são direitos
absolutos.
O direito à vida é um direito público subjetivo a ser respeitado e protegido pelo Estado, e
um direito subjetivo a cada indivíduo, sendo assim não é devido ao Estado intervir no direito
de escolha do paciente, pois a questão é muito mais além do que somente manter o indivíduo
vivo, ou seja, não é justo manter o paciente vivo a qualquer custo pelo simples fato de que
abreviar seu sofrimento seria considerado crime, enquanto este continuaria uma vida artificial
sofrida, sem nenhuma dignidade.
O direito à vida não pode ultrapassar as demais garantias fundamentais garantidas ao
indivíduo, pois a visão correta seria proteger não só o direito de continuar vivo, mas também
o direito de se ter uma vida digna quanto à sua subsistência.
A dignidade da pessoa humana deve abarcar não só a dignidade da vida, mas também a
dignidade da morte. Não deve haver uma proteção exagerada de um direito para o outro, uma
vez que o meio que a ciência utiliza às vezes para a manutenção da vida de um determinado
indivíduo não deve ultrapassar e nem contrariar os próprios princípios e garantias
fundamentais.
Desta forma, mesmo o atual Código Penal não dispondo de uma previsão legal sobre a
Eutanásia, pois se entende por um fato não punível e uma conduta formalmente típica, este
não ofende o sentimento social de justiça, do entendimento que o justo, apesar de ser “ilícito”,
deve ser feito.
Sempre é bom ressaltar que a Eutanásia não possui o desígnio de violar a vida de alguém
cometendo o homicídio, e sim, garantir a proteção da vida contra a vontade livre e consciente
de terceiros que tenham a vontade ilícita de tão somente pôr fim a vida de determinado
indivíduo.
O projeto de lei que institui uma nova redação ao Código Penal quanto a Eutanásia foi
bastante pobre ao qualificá-la como crime, pois se tivesse o autor do projeto sido mais
arrojado, teria colocado a prática da Eutanásia como uma forma de excludente de ilicitude e
sua prática seria vista com mais rigor evitando o excesso quanto a sua prática.
28
Assim sendo, conclui que o projeto de lei em face da Eutanásia não expande a proteção à
vida, só reprime ainda mais o direito de liberdade que o indivíduo detém, impedindo-o de
decidir sobre sua existência, um direito que é único e exclusivamente seu não cabendo
terceiros ou sequer o Estado intervir nesse processo de escolha.
Por fim, convenhamos que já seja muito difícil que o Estado garanta ao indivíduo
saudável todos os direitos e garantias fundamentais que a nossa Constituição traz de forma
ampla EM VIDA, que dirá ao indivíduo que se encontra A BEIRA DA MORTE.
8. O direito de escolha
Ainda que a ciência tenha evoluído e dado mais esperanças quanto à expectativa de vida
para muitos pacientes, ocorreu um acréscimo do número de doentes sem chance alguma de
cura, somente mantidos vivos graças a esse aparato tecnológico que a medica atualmente
possui.
É nesse ponto que o indivíduo que ainda não tem um posicionamento firme quanto a
Eutanásia se pergunta se a sua prática seria válida ou não, já que mesmo a ciência tendo
evoluído, bem como o número de enfermos, seria adequado provocar um aumento no custo da
saúde da sociedade.
8.1 Opiniões contrárias ao tema
Os que são contra a prática da Eutanásia afirmam que o Estado tem o comprometimento
de preservar a vida de qualquer indivíduo, evitando que estes sejam expostos a qualquer
situação de perigo e até mesmo a morte.
Sendo assim, alegam que o Estado deve utilizar de todos os métodos possíveis para
prolongar a vida desse indivíduo e que a prática da Eutanásia é um ato ilícito provocado
contra aquele doente ainda que seja praticada para acabar com o sofrimento, ainda que
solicitado por este.
Nem o paciente, familiares e até o médico tem o direito de promover a morte ou ainda
deixar de prestar assistência médica ainda que se trate de doença incurável, pois alegam que o
paciente que se encontra em estado terminal não tem a possibilidade de expressar sua
autonomia e se ainda tivesse, mesmo que mínimo, seria insuficiente para determinar sua
vontade quanto a Eutanásia.
Afirmam ainda que a prática da Eutanásia seria utilizada como desculpa para se praticar o
homicídio.
29
MARIA HELENA DINIZ ensina que:
A insuportabilidade do sofrimento e a inutilidade do tratamento não podem
justificar a prática da Eutanásia, pois o primeiro argumento é prognóstico,
podendo ser falível ou podendo surgir um novo método de cura. Ademais, a
medicina tem avançado rapidamente e cada vez mais dispõe de meios para
vencer o sofrimento. O segundo argumento é rebatido por aqueles que são
contra a eutanásia por considerarem o conceito de inutilidade do tratamento
ambíguo.31
Ou seja, o homem não tem o direito de se matar e nem de solicitar a outrem que o faça,
pois, a vida é um direito protegido por nossa legislação e se há uma possibilidade, ainda que
mínima quanto às chances de cura, o Estado deve garantir ao indivíduo.
A vontade do médico e nem mesmo o paciente é superior ao que determina a lei.
8.2 Opiniões favoráveis ao tema
Quem defende a prática da Eutanásia entende que sua prática seria utilizada em casos
onde o paciente se encontra em estado irreversível ou terminal, onde o próprio paciente tem o
direito de escolher se quer continuar sofrendo mesmo sabendo do seu estado ou se quer pôr
fim nisso. E no caso do paciente não ter condições para requerer que isso seja feito, cabe aos
familiares decidirem.
É claro que ates de tomar tal decisão, é dever do médico esclarecer detalhadamente todos
os riscos que o paciente terá e também todas as possibilidades de tratamento para a sua
doença.
Esse argumento utilizado pelas pessoas que vão contra prática da Eutanásia de que a
medicina evoluiu de tal forma que futuramente poderá surgir tratamentos e avanços
tecnológicos ainda maiores a fim de descobrir a cura de uma determinada doença ou até um
tratamento adequado, é frágil e repelido quando bate de frente com a teoria a favor da prática
da Eutanásia, pois é bastante duvidoso esse termo “futuramente”, ora, nem a própria ciência
tem essa certeza.
Esse indivíduo que está sofrendo uma dor física e moral que só ele mesmo tem dimensão,
não pode ser obrigado a aguardar por um futuro incerto, ora, até chegar esse dia que sua
angústia terá um fim ou que se não tenha uma reversão, mas um tratamento adequado e que
garanta viver de forma mais digna. Ou seja, se nem o médico têm esse prognóstico, que dirá o
31
DINIZ, Maria Helena. O estado atual do Biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 308 e 309.
30
paciente. Não é justo aguardar sofrendo, se apegar a esperança de que um dia seu mal terá um
fim, exceto pela morte.
O Estado já não tem condições de manter um tratamento digno às pessoas que estão
debruçadas em leitos hospitalares pelo país. Que estão sofrendo atrás de remédios, buscando
uma ajuda, uma esperança para o seu caso, que dirá manter esses indivíduos cuja doença é
irreversível, que não se apresenta um sinal de vida sem ajuda de aparelhos.
Apesar de ser papel do Estado em garantir que os nossos direitos fundamentais sejam
preservados, infelizmente não é possível. É um conjunto de fatores que interferem para que
isso aconteça.
Na teoria o princípio da dignidade da pessoa humana garante que o ser humano deva ter
uma vida digna, através das demais garantias fundamentais que o ser humano tem direito, ou
seja, condições dignas para que possa alcançar uma vida saudável, trabalho, saúde, liberdade e
todos os demais que qualquer ser humano tem direito, ou seja, é através dessa teoria que o
Estado deve proporcionar ao indivíduo, contudo, não é assim que acontece.
É muito difícil o ser humano obter uma vida digna plena, que dirá uma morte digna.
Quando se vai contra a prática da Eutanásia, consequentemente está indo contra o direito
de escolha do paciente que está em estado terminal. É direito seu decidir o que é bom ou ruim
para a sua vida, se é digno manter-se nesse estado vegetal, se optar pela morte é melhor do
que continuar sofrendo.
A Eutanásia visa à autonomia do paciente, ela respeita o direito de escolha que esse
paciente ou seus familiares tem. Ao contrário dos que pensam que a Eutanásia vai contra o
princípio da dignidade da pessoa humana, estão totalmente equivocados, pois ela garante ao
paciente a escolha que a legislação proíbe. É simplesmente o direito de escolha que se tem,
pois não é como a maioria que vão contra a Eutanásia pensam que é chegar e praticar a
Eutanásia porque o paciente se encontra naquele estado vegetativo, é observar todas as
possibilidades e consequências que esse ato irá gerar e após dar ao paciente esse direito de
escolher sobre a sua vida.
Sendo assim, será que é muito mais humano manter um indivíduo que se encontra em
estado irreversível passando por um sofrimento intenso, do que ajudá-lo a morrer de forma
digna. Ou seja, é válido privilegiar a vida humana ao passo que está sendo negligenciado a
qualidade de vida ou de conferir uma morte digna a esse ser humano.
31
Deve existir uma proporção onde se mantenha o equilíbrio entre exercícios restritos e
impedindo que o texto constitucional seja infringido.
Nesse sentido que entra o princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade que tem o
intuito a vontade de evitar resultados desproporcionais e injustos, isto é, o propósito de
proteger um determinado valor fundamental não deve violar outro direito fundamental ainda
que teoricamente seja de grande valia. Dessa forma, tal princípio visa favorecer o conteúdo da
questão e restringir o necessário avaliando sempre quais valores são mais importantes ao ser
humano.
Em primeiro lugar se avalia se existe um choque de direitos fundamentais e
posteriormente avalia a questão identificando os pontos mais relevantes do caso concreto e ao
final decide se a questão se adequa a necessidade e a proporcionalidade indispensável para
que ocorra o equilíbrio entre os meios utilizados para a sua prática, bem como seu fim, ou
seja, cada caso é um caso.
Ora, se o paciente no momento que descobre que está doente opta por não fazer
tratamento, por não buscar sua melhora, porque é obrigado a tratamentos que lhe causam
muita dor e sofrimento somente para mantê-lo vivo.
Portanto, a Eutanásia deve ser legalizada, uma vez que o direito à vida garantido pelo
Estado não deve ser imposto, uma vez que o direito de escolha é livre e sendo este negado
está sendo automaticamente roubado a liberdade desse indivíduo.
Assim a dignidade sempre deve ser preservada, pois de que adianta o ser humano viver
com dignidade ao longo da vida para ao final dela, perde-la.
Considerações Finais
Conclui-se que a prática da Eutanásia vem sendo praticada há muitos e muitos anos atrás,
como se pôde observar no decorrer do estudo. Apesar de ter sido muito praticada com a
finalidade somente de pôr fim a vida de um ser humano, ela é tida como uma forma de dar ao
ser humano uma morte suave, de acalmar aquele indivíduo que padece de uma doença
incurável, que se encontre em estado terminal, sofrendo porque às vezes em alguns casos tem
consciência que seu estado é irreversível.
Seu objetivo nunca foi de acabar com a vida de nenhum ser humano, e sim de dar uma
morte digna ao indivíduo que esteja preso num corpo que só é considerado vivo devido a
32
tecnologia que a medicina possui e aos seus familiares e entes queridos que
consequentemente sofrem vendo esse indivíduo padecer. Apesar da nossa legislação não
abordar o tema Eutanásia de forma positiva, ainda sim, deve concordar que a legislação a trata
de forma branda, pois sabe-se que sua utilização nunca foi de matar um doente e sim de
abreviar a dor desse doente que se encontra desenganado.
Foi comprovado que o princípio da dignidade da pessoa humana não é absoluto, inclusive
o STF entende que as garantias fundamentais não são direitos absolutos, pois sempre um vai
depender do outro e não tem a possibilidade de considerar um mais importante do que outro,
logo que todos são inerentes ao ser humano. O direito à vida é intrínseco ao ser humano, bem
como o direito de viver dignamente. De que adiantou uma vida digna se ao final dela o ser
humano não pode escolher por morrer de forma digna também.
O Estado não tem essa autonomia perante cada indivíduo. Se o indivíduo tem noção do
estado que se encontra, só ele pode mensurar a dor que está sentindo, tanto física quanto
moral em se vê definhando num leito de hospital e vê seus entes queridos sofrendo junto,
goza de plena consciência e quer optar por isso, qual o direito que o Estado tem em interferir
nessa escolha, se nem o próprio Estado pode garantir totalmente que um indivíduo não sofra
qualquer mal ou que sua vida seja posta em risco, já que seu dever é esse, de assegurar o bem
maior considerado por este, que é a vida. Não se pode se utilizar do argumento de que
futuramente, quem sabe que dia esse ser humano irá melhorar ou viver sem ser por meios
artificiais.
A questão é mais social, ética e moral do que parece ser. Desta forma com base nos
diversos argumentos abordados no texto, positivos e negativos, bem como sua aceitação em
diversos países do mundo inteiro, a Eutanásia deve ser considerada legítima, aceita no meio
jurídico. Não é justo manter um ser humano preso a uma decisão que não é sua, se a própria
medicina não tem esperanças, não é justo deixar esse indivíduo sofrendo, em estado
vegetativo e redobrando custos que nem o Estado e até as vezes nem a sua família tem, já que
sua mantença e esperança de melhora é muito cara, os custos são altos e sem prazo
determinado só gerando lucro a indústria que se alimenta do sofrimento alheio mantidos pela
esperança de uma cura fictícia futura sem nenhuma qualidade de se viver dignamente, quanto
mais de morrer.
33
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