6º boletim informativo por outras palavas - julho 2012
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POR OUTRAS PALAVRAS
Boletim Informativo N.º 6, Julho 2012
POR OUTRAS PALAVRAS?
Há cerca de sete meses, partindo de uma proposta do IEBA, um conjunto de
associações com os mais variados interesses e intervenções iniciou um processo
de monitorização e análise de notícias que, de alguma forma, possibilitou elabo-
rar uma discussão metódica relacionada com os diversos tipos de discriminação.
Até ao presente momento, esta unidade local de imprensa analisou conjuntamen-
te um número total de 65 notícias, entre as quais, 1 do Campeão das Províncias,
7 do Diário de Coimbra, 15 do Diário de Notícias, 1 do jornal O Expresso, 17 do
Jornal de Notícias, 4 do Jornal I, 4 do Primeiro de Janeiro, 8 d’ O Público e 8 do
Sol.
Da análise crítica do discurso mediático elaborada, destaca-se: i) um conjunto de
20 conteúdos que se considerou, de alguma forma, reafirmarem uma panóplia de
estereótipos sobre determinados temas, sujeitos e contextos; ii) 19 artigos que
(re)produzem um discurso xenófobo; iii) 5 artigos que reificam um discurso ciga-
nofóbico/racista; iv) 5 notícias que se considera contribuírem activamente para
um discurso LGBTfóbico; v) 15 peças relacionadas com as temáticas de género,
que se alega perpetuarem um discurso machista e patriarcal; vi) e, 1 que se argu-
menta substantivar um discurso nacionalista. Acredita-se que esta análise de
discursos e conteúdos mediáticos contribui não só para a criação de um espólio de
análise crítica da imprensa escrita em Portugal, como pode servir como base de
consulta a todos/as os/as jornalistas que escrevam sobre estas matérias.
Boletim Informativo n.º 6 - Julho de 2012
Monitorização: de 29 de Maio a 21 de Junho de
2012, foram monitorizados diariamente 10 jornais de
referência: 3 de âmbito regional (Campeão das Pro-
víncias, Diário As Beiras e Diário de Coimbra) e 7 de
âmbito nacional (Diário de Notícias, Jornal I, Jornal
de Notícias, O Expresso, O Público, Primeiro de
Janeiro e Sol).
Nesta edição:
1 - Editorial
2 - Pela Positiva, Alerta
3 - Homofobia
4 - Homofobia (continuação), Ciganofobia
5 - Ciganofobia (continuação)
6 - Xenofobia
7 - APPACDM, Sugestões de Leitura, Créditos
IN OTHER WORDS é um projecto financiado com o apoio da Comissão Europeia. A informação contida nesta publicação (comunicação)
vincula exclusivamente o autor, não sendo a Comissão responsável pela utilização que dela possa ser feita.
Visita ao parceiro da Estónia, Tallinn Univer-
Página 2 POR OUTRAS PALAVRAS
pela positiva Votadas a espaços físicos e sociais de invisibilidade, as trabalhadoras
domésticas, geralmente mulheres migrantes e imigrantes cuja docu-
mentação se encontra em situação irregular, são um grupo colocado
numa posição de vulnerabilidade. Embora a protecção destas traba-
lhadoras esteja contemplada na Lei Portuguesa, através do Decreto-
Lei n.º 235/92, a realidade é
que a invisibilidade das
situações a que muitas
mulheres estão sujeitas no
espaço doméstico ou legal,
dificulta a denúncia e a res-
pectiva efectivação da Lei. É
neste contexto que se desta-
ca a notícia ‘O invisível mundo dos abusos contra as trabalhadoras
domésticas’. Argumenta-se que este artigo procura abrir um deba-
te necessário no espaço da opinião pública em Portugal, fazendo-o
numa incursão temática completa, através da contextualização
histórica e contemporânea desta efeméride, que afecta milhares de
mulheres. O artigo explora ainda a realidade associativa, optando por dar voz a uma associação recém-
formada que une esforços para visibilizar e lutar contra a panóplia de abusos e violações veladas do espaço
privado.
O Graal, no âmbito do projeto "SauDar+" realizou no dia 26 de junho uma
Tertúlia “Abra os olhos para esta realidade: Tráfico Humano”, no café a
Brasileira em Coimbra.
Contou, para além de outros/as cidadãos/ãs, com a presença do Relator
Nacional para o Tráfico de Seres Humanos, da Comissão para a Cidadania
e a Igualdade de Géne-
ro, Dr. Manuel Albano
e da Equipa de Inter-
venção Social ERGUE-
TE, parceira do projec-
to SauDar+.
alerta Tertúlia “Abra os olhos para esta realidade: Tráfico Humano”
in O Público, 30/05/2012
in O Público, 30/05/2012
homofobia
N.º 6, Julho 2012 Página 3
Com o objectivo de destacar os meios de comunicação, em particular através das séries televisivas, enquan-
to ferramenta educativa e social, esta notícia enfatiza a ideia de como a ‘banalização da homossexualidade
na televisão’ (sic) contribuiu para ‘normalizar a homossexualidade na sociedade’ (sic). Neste sentido, o arti-
go alega ‘longe vão os tempos
em que uma personagem gay
ainda era motivo de notícia e
de espanto na televisão’ (sic),
instituindo a ideia de que o
‘tabu homossexual’ (sic) é
uma realidade passada
(conservadora) com tendência
a desaparecer ao longo do
tempo, acompanhando uma
suposta evolução social e
democrática tendencialmente
‘progressista’, ‘humanista’ e
‘integradora’, capaz de aceitar
a diferença.
A selecção deste artigo acon-
tece no sentido de argumen-
tar que, embora a proliferação
de séries de televisão tenha
contribuído activamente para
desafiar a heteronormativida-
de das representações sobre a
orientação sexual em alguns
espaços mediáticos, entende-
se que é exagerado e arrisca-
do postular a normatividade
dessas representações na sociedade em geral e nos media em particular, sem abrir um debate sobre hetero-
normatividade, homossexualidade e homofobia.
Em primeiro lugar deve admitir-se que, tendo em conta o aumento significativo do panorama de séries pro-
duzidas actualmente, o conjunto de séries que contemplam ou abordam questões relacionadas com a
homossexualidade é extremamente reduzido - como o próprio artigo aponta (3%). De acordo com os dados,
pode aferir-se que estas temáticas continuam a figurar como excepções. Deste modo, as séries nomeadas,
representam uma janela, um desafio às representações hegemónicas/dominantes relativas à orientação
sexual e não a superação da homofobia.
(Continua na página seguinte)
in Diário de Notícias, 29/05/2012
Página 4 POR OUTRAS PALAVRAS
homofobia (Continuação da página anterior)
Simultaneamente, admitir que a televisão, pela sua abrangência massiva é a responsável pelo ‘tabu homos-
sexual’ (sic) se ter tornado o ‘novo normal’ (sic) (e.g. estabelecer uma relação directa entre a existência des-
tas séries e a possibilidade de promulgação da Lei do casamento entre pessoas do mesmo sexo nos Estados
Unidos da América) é negligenciar as lutas sociais dos movimentos sociais (LGBT), correndo o risco de invi-
sibilizar a vigência da homofobia nas sociedades contemporâneas. Assim, a televisão - colocada, no artigo,
como representante da sociedade maioritária - perpassa a ideia de que o ‘tabu da homofobia’ já não é rele-
vante, silenciando um conjunto de violações de direitos perpetrada às pessoas com uma orientação/
identidade sexual não hegemónica. Destaque-se, ainda, que na sua maioria (e.g. considere-se o ‘Shameless’
como excepção), estas séries não deixam de reduzir as identidades sexuais a um conjunto de estereótipos, a
partir da construção de personagens-tipo: gays ou lésbicas, brancos/as, na faixa etária dos trinta/quarenta
anos e de classe média/alta. Embora as fórmulas de caracterização de personagens sejam ubíquas, a reali-
dade é que, considerando o papel preponderante dos media na apresentação daquele que é construído como
o ‘outro sexual’, estas questões têm impactos e consequências particulares, que devem ser debatidas. Relati-
vamente ao contexto português, perpassa-se ainda a ideia de que Portugal é um ‘país de brandos costumes,
(sic), ‘receptivo à diferença’ (sic). Parece-nos necessário frisar que esta afirmação invisibiliza um conjunto de
direitos sociais que continuam a ser negados, tais como a adopção por casais do mesmo sexo e a liberdade de
constituir família, bem como o facto de gays e lésbicas continuarem a ser vítimas de discriminação em vários
contextos e espaços públicos.
Neste sentido, mais do que noticiar a superação da homofobia, deveria, por um lado, atentar-se aos qua-
drantes activos de reivindicação dos movimentos LGBT e, por outro, às lógicas económicas que regem e
influenciam guiões e produções de conteúdo mediático, nunca esquecendo que uma coisa é a ficção e a repre-
sentação e a outra a realidade e a concessão efectiva de direitos, que se encontra ainda por consumar nas
diversas esferas da realidade dos casais de pessoas do mesmo sexo.
ciganofobia O discurso mediático produzido a propósito da
notícia ‘Pai, filha, genro e neto do Clã Monteiro em
Prisão Preventiva’ (capa) ou ‘Clã Monteiro
“apanhado” nas malhas da droga’ levanta um con-
junto de questões meritórias de análise que se
relacionam com: i) a estrutura, a forma e o estilo
de escrita; ii) a forma como os factos se metamorfo-
seiam em notícias e, consequentemente, que tipo
de tratamento lhes é dado; iii) os impactos que
determinadas notícias têm na opinião pública.
(Continua na página seguinte)
in Diário de Coimbra, 02/06/2012
N.º 6, Julho 2012 Página 5
ciganofobia (Continuação da página anterior)
A notícia analisada recorre a um discurso próximo do género literário policial, utilizando um conjunto de
expressões populares (e.g. ‘malhas da droga’ (sic)) que contribuem para uma traçar uma direcção do tom de
leitura dos eventos. Denote-se igualmente que, ao enfatizar mais os actores que os eventos, se atribui uma
maior relevância àqueles que fazem do que aquilo que é feito. Este dispositivo, em conjunto com uma iden-
tificação intencional da proveniência étnica e do chamado núcleo familiar dos sujeitos alegadamente envol-
vidos, coloca toda a ênfa-
se da notícia nas pessoas
identificadas como ciga-
nas e como parte da
família Monteiro. Isto
contribui não só para
uma essencialização da
categoria Monteiro (ideia
de que todos os
‘Monteiro’ são crimino-
sos), como para uma
ideia de perigo iminente
e nacional, uma vez que
segundo este artigo estas
‘redes criminosas’ (sic) se
encontram espalhadas
por vários pontos do país
(sic).
A notícia sustenta ainda uma ideia de ‘perigo’, de que esta ‘família’ (ou de todas as famílias com este nome)
se constituem com uma espécie de máfia organizada em torno do crime. Estas afirmações contribuem para
uma associação criada mediaticamente - há imagem do que foi já discutido noutros boletins informativos -
entre comunidade(s) cigana(s) e criminalidade. Isto contribuiu activamente para a proliferação da ciganofo-
bia em Portugal, o que se revela muito problemático. Argumente-se que esta identificação é problemática
estrutural e individualmente, uma vez que, tratando-se de um meio de comunicação regional, as consequên-
cias podem ser individualizadas e dirigidas, dado que o espaço social é menor e as pessoas conhecem-se
mais entre si. Acrescente-se que esta notícia espelha os jogos de (in)visibilidade pelos media, na medida em
que permite questionar porque é que determinados grupos são sistematicamente noticiados em determina-
da óptica, contribuindo para o (re)estabelecimento de determinadas associações de matriz racista.
in Diário de Coimbra, 02/06/2012
Página 6 POR OUTRAS PALAVRAS
Considera-se que esta notícia é problemática na medida em que veicula uma narrativa ambígua, que facilmente pode cair
numa ideia de (re)afirmação e (re)invenção da ideia do racial como algo que tem um fundamento biológico e/ou científico.
Começa a ser comum, devido à proliferação dos estudos nas áreas da medi-
cina e da genética, o aparecimento de um conjunto de artigos que procuram
dar a conhecer os avanços nestas áreas específicas da saúde e investigação.
Esta notícia, por exemplo, enuncia que há uma dificuldade acrescida quan-
do se procura encontrar dadores com compatibilidade genética para doentes
de minorias étnicas (sic). Embora seja positiva a denúncia nas dificuldades
de encontrar dadores, a notícia não deixa de (re)validar subtilmente a ideia
de que há diferentes ‘raças’ na medida em que a utilização do termo ‘etnia’ é
feita enfatizando uma ideia de racial/biológico e não de cultura, uma vez
que só é mobilizado para falar de fisicalidade, no sentido de traçar um
‘perfil’ e uma ‘herança’ genética (sic): ‘mas se o doente pertencer a uma
minoria étnica as hipótese [de encontrar um bom dador de medula] são
reduzidas para 25%’ (sic).
O artigo defende, ainda, aconselhado por especialistas, que é necessário
‘aumentar a diversidade genética do registo português’ (sic) deixando laten-
te a ideia de que há um ‘grupo’, uma ‘etnia Portuguesa’, um Portugal que é
geneticamente homogéneo (sic). Termina defendendo que estas - as comunidades entendidas como ‘não portuguesas’ -
‘são populações mais movíveis, mais difíceis de contactar’ (sic), o que dificulta o registo. Acrescente-se que as populações
referenciadas acabam por ser responsabilizadas pela falta de registos e são concebidas abstractamente como estrangeiras,
quando muitas das comunidades referidas pelo artigo como populações migrantes, estão há várias décadas em Portugal,
têm descendência e são sedentárias. Este artigo, pelo contrário, continua a constituir a diferença como exterior às frontei-
ras do país e o país como espaço homogéneo, erigindo barreiras.
xenofobia
xenofobia A análise deste artigo constitui-se como o terceiro comentário e denúncia à xenofobia presente e (re)criada nos meios de
comunicação social, designadamente na imprensa escrita. Considera-se que a
menção da nacionalidade de determinados indivíduos indiciados por comete-
rem crimes, tal como acontece nas notícias ‘Marroquino detido por violar a
companheira’ ou ‘Detidos assaltantes de lojas em centros comerciais’, contri-
buem activamente para a perpetuação de uma xenofobia estrutural, acompa-
nhada pelo aumento do nacionalismo na sociedade Portuguesa, reforçando a
(re)criação de uma linha abissal que divide aqueles constituídos como
‘nacionais’ e ‘estrangeiros’, na qual os ‘estrangeiros’ são sistematicamente posi-
cionados pelos media do lado da linha, na transgressão. Atente-se que, num
contexto económico e político em que a imigração tem sido legalmente cada vez
mais criminalizada e o policiamento em torno das comunidades tem aumenta-
do, é alarmante que os meios de comunicação contribuam activa e (des)
politizadamente para este jogo.
in Diário de Notícias,30/05/2012
in Diário de Coimbra, 13/06/2012
APPACDM de Coimbra tem como repostas
sociais o Colégio de Santa Maria, o
Centro de Recursos para a Inclu-
são, o Centro de Atividades Ocupa-
cionais, a Formação Profissional,
os Lares Residenciais, o Apoio
Domiciliário e um Centro de Medi-
cina Física e de Reabilitação. Para
além disto, possui ainda empresas
de economia social nas áreas de
Jardinagem, Lavagem-auto, Reco-
lha de óleos usados, Lavandaria,
Hotel Quinta da Fonte Quente,
Jardinagem, Produtos de Artesa-
nato e/ou culinária e uma Casa de
Chá situada no Jardim da Sereia,
em Coimbra. Tendo como mote a
missão: criar condições para que
cada pessoa com deficiência men-
tal (ou em situação de exclusão),
possa atingir a sua plenitude como
ser humano e social, potenciando a
sua individualidade e consolidando
a sua participação efetiva na socie-
dade, a APPACDM de Coimbra
orgulha-se também de ter obtido a
21 de Dezembro de 2010 a certifi-
cação EQUASS Assurance, para
todas as suas respostas sociais.
Sendo, desta forma, a primeira
instituição do distrito de Coimbra
a obter uma Certificação de Quali-
dade, fundamentada nos Princí-
pios EQUASS e a primeira
APPACDM do País.
APPACDM de Coimbra
Saiba mais em:
www.appacdmcoimbra.pt
Remoto o seu início ao ano de
1969, mas apenas constituída em
2000 como Instituição autónoma, a
APPACDM de Coimbra é uma das
mais importantes e reconhecidas
Instituições de apoio ao cidadão
com deficiência mental, quer na
sua envolvente, quer a nível nacio-
nal. Atualmente, a APPACDM de
Coimbra cobre os concelhos de
Coimbra, Arganil, Montemor-o-
Velho e Cantanhede, podendo ain-
da prestar apoio a indivíduos ou
famílias de outros concelhos.
Ao longo dos anos a Associação foi-
se desenvolvendo, procurando
criar respostas adaptadas às dife-
rentes necessidades, que ao longo
do ciclo de vida as pessoas porta-
doras de deficiência mental e suas
famílias vão sentindo em sintonia
com a própria evolução de concei-
tos e modelos de intervenção nesta
área. Neste sentido, a APPACDM
sugestões de leitura
Página 7 N.º 6, Julho 2012
- MARK HADDON, O estranho caso do cão morto , Editorial Presença, 2003
- ANTÓNIO MARTÍNEZ, Sou a Júlia, Temas e Debates, 2004
- 100 livros fundamentais sobre a deficiência—www.bengalalegal.com/100livros
na internet
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Conheça a política e actividades da Comissão Europeia na área da Justiça em: http://ec.europa.eu/justice/index_en.htm
créditos Edição: IEBA Centro de Iniciativas Empresariais e Sociais, Julho 2012
Revisão: ULAI Unidade Local de Análise de Imprensa - APPACDM Coimbra, APAV, GRAAL, NÂO TE PRIVES, SOS RACISMO
Contactos: IEBA Parque Industrial Manuel Lourenço Ferreira, Lote 12 - Apartado 38, 3450-232 Mortágua, ieba@ieba.org.pt
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