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Conhec. Dest., Serra, ES, v. 01, n. 02, jul./dez. 2012.
PEDAGOGIA SOCIAL: DEFINIÇÕES, FORMAÇÃO, ESPAÇOS DE TRABALHO,
GRANDES NOMES & EPISTEMOLOGIAS
Hiran Pinel1
Paulo Roque Colodete2
Jacyara Silva Paiva3
Resumo Apresenta contemporaneamente a Pedagogia Social definindo-a como um saberfazer em processo de construção; descrevendo espaços de trabalho ou de intervenção (e interferência); destacando os Grandes Nomes na construção dessa Pedagogia e finalmente pontua as Epistemologias, dando destaque a uma de foco humanista existencial crítico que transita, por exemplo, entre pensadores como Freire, Merleau-Ponty, Rogers etc. Palavras-chave: Pedagogia Social: Grandes Nomes. Epistemologias: Humanista-Existencial Crítica. Formação: Inicial: Continuada. Educador social: Profissionalização.
1 Professor Associado III da Universidade Federal do Espírito Santo, Centro de Educação, Departamento
de Teorias do Ensino e Práticas Educacionais, Programa de Pós-Graduação em Educação – UFES/ CE
/ DTEPE / PPGE. Doutor em Psicologia – Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Educação pela
UFES. Graduado psicólogo. Licenciado em Pedagogia. Licenciado em Filosofia. Licenciado em
Psicologia. Bacharel em Psicologia. Psicopedagogo. Educador social. Líder da Linha de Pesquisa:
Diversidade e Práticas Educacionais Inclusivas. Pós doutorando em Educação e Cinema, pela
Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, FAE/ UFMG. Autor principal. E-mail:
hiranpinel@ig.com.br
2 Doutor e Mestre em Educação pela – UFES/ CE / DTEPE / PPGE. Graduado em Enfermagem.
Psicólogo. Licenciado em Psicologia. Bacharel em Psicologia. Profissional de saúde pública –
enfermeiro e psicólogo. Educador social. Psicopedagogo. Professor universitário. Coautor. Paulo Roque
Colodete CV: http://lattes.cnpq.br/1608282389805237
3 Doutor e Mestre em Educação pela – UFES/ CE / DTEPE / PPGE. Bacharel em Direito. Licenciada em
Pedagogia. Advogada. Professora. Educadora social. Professora universitária. Gestora escolar.
Coautora. jaciarapaiva@hotmail.com
Conhec. Dest., Serra, ES, v. 01, n. 02, jul./dez. 2012.
1 INTRODUÇÃO
A origem deste artigo emergiu de uma pesquisa bibliográfica discursiva, cujo objetivo
era o de descrever, pela via reflexiva, acerca de alguns fundamentos da Pedagogia
Social, considerada como muitas vezes interligada à esfera da Educação Especial e
Inclusiva encontrando justamente aí correlações de apoio e força, e com isso
destacando as definições, as formações, os espaços de trabalho, os Grandes Nomes e
uma Epistemologia representada aqui por Carl Rogers que foi marcado por Paulo Freire
na prática, mesmo que filosoficamente façam travessias diferenciadas a partir da
Fenomenologia. Focamos uma Pedagogia Social que subsidie ações do educador
social.
Convém esclarecermos que os termos Pedagogia Social e Educação Social não são
sinônimos. Pedagogia Social é uma disciplina científica; uma teoria que irá fornecer as
ferramentas para a Educação Social, que é uma práxis. Entretanto, uma está
intrinsecamente ligada à outra, mesmo que se diferenciem na produção discursiva
(Pedagogia Social) para criar tentativa de sustentação de uma práxis (Educação
Social). Trata-se de mais uma invenção de diferenciar termos frente ao uso deles com
igual intensidade e densidade (e tensidade) na nossa realidade; trata-se ao nosso
sentir, de demarcar espaços profissionais e discursivos (teóricos).
Nesse contexto é que levantamos e respondemos às seguintes questões pelo método
bibliográfico fenomenológico de pesquisa: O que é Pedagogia Social? Qual o seu
objeto de estudo? Qual a diferença entre Pedagogia Social e Educação Social? O que é
formação do educador social? Como se apresentam os documentos oficiais de seus
cursos – com as disciplinas – que nos indica o que se espera do seu labor? Quais são
os espaços de trabalho do educador social? Quem fundou o que se denomina
Pedagogia Social? Qual a referência teórica atual? Que Epistemologia ganha sentido
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no contexto dos dois autores supracitados?
2 DEFININDO PEDAGOGIA SOCIAL
Zucchetti (2008; p. 1) diz, em relação à Pedagogia Social, existem poucos estudos
nessa seara, já na Europa (especialmente Espanha) esse saberfazer é entendido como
ciência da Educação. Mas o seu enfoque se deu no século XIX na Alemanha, “mas é ao
longo do século XX que a pedagogia social se consolida e se transforma em formação
acadêmica”.
A Pedagogia Social é um saberfazer que tem sido mais estudado na
contemporaneidade. Apesar de bibliografias esparsas encontradas na década de 60,
no Brasil existe a emergência das práticas educacionais, por exemplo, aos meninos e
meninas em situação de rua. Organizações da sociedade atual acabam por demandar a
presença e a ação do educador social, como as fazem as ONGs (Organizações Não-
Governamentais), OSCs (Organizações da Sociedade Civil), OSCIPs (Organizações da
Sociedade Civil de Interesse Público), Institutos, Fundações e outras entidades do
Terceiro Setor. Enfim, há um intenso interesse por esse tema, seja como o nomeamos
(Pedagogia Social e educador social), seja com outras nomenclaturas como Pedagogia:
Empresarial (sob um enfoque crítico psico-sócio-pedagógico), Hospitalar, Comunitária,
Especial e Inclusiva - fora ou dentro da escola numa perspectiva defendida nesse
artigo, da Família e Comunidade, Não-Formal, Não-Escolar, Social de Rua, das
Medidas Sócioeducativas, dentre outros.
Procurou-se nesse artigo provocar os iniciantes acerca do sentido e definição da
Pedagogia Social e do educador social. Quando nos interessamos por um determinado
campo de conhecimento, adentramos em um mundo muito complexo e marcado por
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diversos tipos de lutas, em palcos diferenciados. Assim, o que construímos como
Pedagogia Social perpassa essa complexidade de diferentes campos sociais que lutam
por existir e por interesses específicos de acordo com protagonismos de certos grupos.
Tais grupos direcionam investimentos (econômicos, sociais, pessoais, intelectuais) para
a constituição efetiva desse campo.
Especificamente no Brasil, de acordo com Pinel (2011), podemos citar o papel e tarefas
desempenhadas pelo Prof. Dr. Roberto da Silva, da Faculdade de Educação da
Universidade de São Paulo. Sganderla e Carvalho (2007; p. 108), referindo-se à idéia
de Bourdieu, afirmam que esses embates individuais/ pessoais e intelectuais4 têm
campos com uma lógica própria e especificidades sui generis (ou quase) que se
desvelam pelas “[...] relações de força entre os agentes (indivíduos e grupos) e as
instituições que lutam pela hegemonia no interior do campo, isto é, pelo monopólio da
autoridade que detém o poder de ditar as regras, de repartir o capital específico de cada
campo”.
A Pedagogia Social está sendo trazida a lume graças a um grupo de pessoas
(professores, educadores sociais, psicólogos, assistentes sociais, pedagogos,
psicopedagogos, psicanalistas – dentre outros) que investe seu tempo em pesquisas e
na produção de conhecimento que venha esclarecer algo em constante devir, um
projeto aberto. Martin (2001, p. 21), por exemplo, define a Pedagogia Social como um
tipo de intervenção social (trabalho social), realizada desde estratégias e conteúdos
educativos, em áreas de promoção do bem-estar e de melhora da qualidade de vida,
mediante uma série de mecanismos (serviços sociais, políticas educativas e sociais),
4 Investem em estudos e pesquisas temáticos como o de especificar o objeto de identidade da Pedagogia Social que justifique, por exemplo, com isso, a criação de um ofício regulamentado, o de educador social, que trabalhará fundamentado na Pedagogia. Ou se inventa/ cria um objeto não tão específico assim, mas que possibilite delimitar possibilidades profissionais, mesmo que para a sua existência demande recorrer às Ciências da Educação, por exemplo, como a Psicologia, Sociologia, Filosofia, Biologia, História – dentre outras ciências, artes e letras.
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encaminhados a resolver problemas carenciais de coletivos marginalizados, a prevenir
problemas da população em geral, a garantir uma série de direitos para uma correta
vida comunitária (desenvolvimento comunitário) e, em suma, otimizar os processos de
socialização.
Caliman (2011) conceitua a Pedagogia Social como uma ciência prática, social e
educativa, não-formal, que justifica e compreende em termos mais amplos a tarefa da
socialização e, em modo particular, a prevenção e a recuperação no âmbito das
deficiências da socialização e da falta de satisfação das necessidades fundamentais.
Esse mesmo autor destaca o fato de que a Pedagogia Social pode ser entendida por
outros estudiosos também como uma articulação e especialização do discurso
pedagógico, como o são também a Pedagogia Comparada, a História da Pedagogia, a
Pedagogia Especial etc.
Atualmente, a Pedagogia Social parece orientar-se sempre mais para a realização
prática da educabilidade humana voltada para pessoas que se encontram em
condições sociais desfavoráveis. O trabalho do educador social emerge, pois, como
uma necessidade da sociedade industrializada, enquanto nela se desenvolvem
situações de risco e mal-estar social (no que se descreve civilização) que se
manifestam nas formas de pobreza, marginalidade, consumo de drogas, abandono,
indiferença social, exposição às “balas perdidas”, rejeição escolar e familiar, humilhação
comunitária advindo de preconceitos, estigmas e discriminação.
A Pedagogia Social é uma ciência que se produz pela prática (e práxis)
educacional/pedagógica (bem como social e psicossocial) não-formal (e formal), que
dentre outras tarefas-saberes, propõe ser uma forma pedagógica e educacional de
trabalho social de ajuda (de acordo com as necessidades) e de revitalização crítica da
solidariedade e cidadania, havendo mais perspectivas que podem ganhar sentido,
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dependendo do contexto sócio-histórico e realidade vivida, como o esforço de inserir o
educando em movimentos políticos (há o perigo aí de partidos repressores e
moralizantes), luta por uma ecologia social (e qualidade de vida), socialização em geral
nas escolas, por exemplo, Educação Moral e Cívica, Educação para a Justiça – dentre
outros.
Sua proposta é a de educar (e cuidar – em todos os seus sentidos, inclusive no de
educar) ao outro através de teorias/ recursos e técnicas didático-pedagógicas, aos
problemas e aos sofrimentos humanos na esfera da socialização, com atuação em
áreas de risco visando a minimização, bem como fazer o acompanhamento psicossocial
e pedagógico (não-formal e formal, inclusive escolar). Trata-se dos educandos que
vivenciam processos de marginalização e que se sentem sem a mínima autonomia para
protestar e denunciar esse vivido injusto – sem ter seus direitos humanos garantidos.
Apresenta ainda - esse humano - carências afetivas (e vitais – como alimentação,
tratamento médico etc.) ou faltas sociais (em todas as dimensões) – humanos, grupos,
coletividade, comunidades, sociedades. É preciso ser protagonista.
Moraes (2010, p.1) a define esclarecendo que a Pedagogia Social vem sendo estudada
por diferentes pesquisadores e apresenta múltiplas definições, o que dá a ela uma
característica peculiar. Poderíamos defini-la inicialmente como uma ação teórico-prática
e sócioeducativa realizada por educadores ou agentes sociais. Ela pode ser vista como
um campo de estudo no qual a conexão entre Educação e Sociedade acontece de
forma prioritária, ou ainda, uma esfera de atividades que acontece em diferentes
espaços não-formais de educação e que combate e ameniza os problemas sociais, por
meios de ações educacionais.
Outros autores procuram obstinadamente especificá-la na ânsia de encontrar um objeto
único, definindo o seu lugar no âmbito referencial da Pedagogia Social. Esse referencial
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está formado por todos os processos educativos que compartilham, no mínimo, dois ou
três dos seguintes atributos: “dirigem-se prioritariamente ao desenvolvimento da
sociabilidade dos sujeitos; têm como destinatários privilegiados indivíduos ou grupos
em situações de conflito social; têm lugar em contextos ou por meios educativos não
formais” (TRILLA, PETRUS e ROMANS, 2003, p. 29).
Entretanto essa seara ainda precisa dizer a que veio, considerando que o tema
Pedagogia Social é recente e o que mais se discute e busca atualmente é a elaboração
de uma Epistemologia (PINEL, 2011). A criação científica de conceitos que podem
trazer alguma identidade à Pedagogia Social e aos educadores sociais que a praticam
está apenas começando, especialmente no Brasil, confirmando inclusive sua presença
(política e curricular) nos cursos de Pedagogia e licenciatura, bem como nas práticas
educativas em geral5. A Pedagogia Social produz conhecimentos que poderão subsidiar
as práticas do educador social que objetiva a promoção da cidadania. Ela é um
saberfazer pedagógico e, portanto, também ligado ao curso de Pedagogia e aos
sujeitos que forma inicialmente. Pinel (2011) descreve como objeto (inserido no mundo
em constante mudança e no seu estado devir) da Pedagogia Social, o processo
educativo6 oferecido ao ser educando do homem, considerando a disposição que todos
temos para adentrarmos aos reinos das educabilidades (formais, considerando que as
informais já nos envolvem cotidianamente). Outros autores pontuam que o objeto é o
ser do homem aberto à educação (ser educando).
Machado (2009) afirma que há dois objetos da Pedagogia Social, sendo o primeiro a
socialização do sujeito (desenvolvida pela família, escola, agências não-escolares etc.)
5 No curso de Pedagogia da UFES foi recentemente incluída (2008) essa disciplina - como optativa.
6 O objeto de toda Pedagogia [recordemos que toda ela é ou deveria ser social] é o processo educativo intencional [contextualizado social e politicamente – LIBÂNEO, 2001] não-formal e até formal – dentre outros espaços-tempos em que existe e se põe (e impõe) à Pedagogia como intervenção, estudo e pesquisa.
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caracterizando-a como uma Ciência Pedagógica da Educação; e o segundo remetido
ao trabalho social com enfoque pedagógico que é planejado, executado e avaliado por
uma equipe multidisciplinar (da qual faz parte o educador social como profissional da
Pedagogia Social), objetivando atender às necessidades sociais do ser humano7.
Por estar no mundo, a Pedagogia Social se nutre de outros saberes-fazeres para se
constituir – Educação Especial, Educação Inclusiva, Psicopedagogia, Sociologia,
Política, Artes e Literatura, Psicologia da Aprendizagem e do Desenvolvimento,
Psicologia Clínica, Psicologia Social Marxiana, Filosofia – dentre outros. Ela se
reinventa e/ou se produz/cria pelos contextos pedagógicos/educacionais e o faz numa
procura incessante de iluminar sempre alguma originalidade de ser ciência, mesmo que
esbarre (de modo positivo), nas pluralidades de diversas produções interligadas a ela -
puro hibridismo.
Dentre outros, de modo geral, as ações (e pesquisas) na esfera da Pedagogia Social
estão interessadas em dois pontos quase sempre indissociáveis: 1) a colocação do
sujeito da educação nas redes sociais, sua inclusão; 2) a promoção humana através de
ações socioculturais visando aprendizagens-desenvolvimento. O objetivo da educação
é o de capacitar o indivíduo para viver em sociedade (PETRUS, 1977; 1994).
Enfim, concordamos também que a Pedagogia Social exige um processo permanente
de teorização sobre a prática, para o avanço histórico do movimento popular em que se
insere. A criação e recriação dos fundamentos metodológicos favorecem a formação
sólida e consistente da postura do Educador Social, principalmente transformando-o em
um agente multiplicador, ou seja, formador de formadores, na prática social, junto aos
7
Pinel (2011) diz que o educador social pode tanto ser um profissional da Pedagogia (de um curso geral da Pedagogia, mas que se especializou em Pedagogia Social e se interessa profundamente por esse ramo) ou de um profissional habilitado em um curso superior específico (bacharelado ou licenciatura) em Pedagogia Social.
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setores populares. Os momentos de reflexão e de sistematização coletiva favorecem o
crescimento, a autonomia e a independência dos educadores sociais, bem como a
autocrítica e a auto-revisão constante de seu processo como agente de mudança,
também do grupo com o qual partilha sua ação educativa (GRACIANI, 2009).
3 FORMANDO EDUCADORES SOCIAIS NO BRASIL
Primeiramente, é preciso entender o sentido do termo formação. Esse termo está
relacionado a alguma tarefa, atividade, trabalho, labor, oficina. Trata-se aqui e agora da
formação (inicial e ou continuada) de educadores sociais ou a sua supervisão (outra
visão de sentido na formação). Nesse contexto, a formação tem uma função social de
aperfeiçoamento dos recursos humanos de uma instituição, transmitindo
saberesfazeres, saber-ser para quem irá atender e opção por quem você fez – projetos
de vida, escolhas, decisões, responsabilidades. A Pedagogia Social luta no sentido de
conceber um profissional mais qualificado, com uma formação técnica (teórica) e clínica
(o sofrimento do trabalhador) – um duplo sentido de aprender (e de ensinar) que se faz
muitas vezes indissociável. Para Pinel (2011) ser educador social é uma experiência de
alegrias, mas também de tristezas, donde vemos a miséria em todos os sentidos e
também passamos e vivemos ameaças às nossas próprias vidas, especialmente no
Brasil no trabalho com meninos e meninas de rua e detentos – ameaças, diga-se de
passagem, advindas de todos os lados e ideologias. Finalmente, existe uma formação
na qual a proposta é lidar e mexer com a cultura e o clima institucionais.
A formação do educador social no Brasil acontece mais frequentemente em cursos de
pós-graduação lato sensu e em alguns poucos cursos de graduação. Na Itália, pondera
Caliman (2006), há uma divisão de saberes que constituem o curso de graduação
(inserido na Universidade em um Centro de Educação): para formar os educadores
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sociais, em um curso de Pedagogia Social, a Faculdade de Educação da UPS8 (Itália)
distribui assim a sua grade disciplinar: 31,2% de disciplinas pedagógicas; 14,6% de
psicológicas; 14,6% de humanísticas; 12,5% são disciplinas sociológicas; 12,5% de
técnicas e de animação cultural e os outros 4,2% de disciplinas jurídicas.
Um curso de pós-graduação lato sensu (especialização) no Brasil apresenta assim a
sua ementa9: Conhecer a história das políticas sociais, da legislação e da assistência
no Brasil; analisar as transformações experimentadas pela concepção da situação da
criança na sociedade brasileira; instrumentalizar os profissionais que trabalham com a
infância e adolescência em situação de risco, no conhecimento das políticas públicas
de atendimento, da evolução dos programas sociais e da prevenção, para embasar a
prática social e profissional; instrumentalizar os profissionais que trabalham com idosos
para a intervenção nas políticas públicas e atendimento, nos programas sociais e na
comunidade, de forma a proporcionar um maior alcance de direitos.
Uma grade curricular de um curso de especialização em Pedagogia Social10: Formação
do Povo Brasileiro e Análise da Conjuntura Atual; Política Pública e a Aplicação dos
Estatutos e da LOAS11; Pedagogia Social: Histórico e Conceitos; Conceito de Educação
Social e Intervenção Sócio-Educativa; Fundamentos Antropológicos da Educação
Social; Psicologia do Desenvolvimento: Contextos e Socialização; Educação Popular:
Prática da Liberdade e da Autonomia; Educação de Jovens e Adultos: Suas
Metodologias e Implicações; Educação Comunitária: Contextos e Significados;
Animação Sócio-Cultural: da Criança ao Idoso; Redes Sociais: Planejamento, Estrutura
e Sustentabilidade; Metodologia do Trabalho Científico; Orientação das Monografias.
8 Università Pontifícia Salesiana di Roma – UPS.
9 In:http://www.topformacao.com.br/pos-graduacao/pos-graduacao-pedagogia-social-presencial-facinter-faculdade-internacional-de-curitiba-cu12710. Acesso em: 06/06/2010.
10 In: http://www.educaedu-brasil.com/pos-graduacao-em-pedagogia-social-pos-graduacao-15788.html. Acesso em: 06/06/2010.
11 Lei Orgânica de Assistência Social – LOAS.
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Um manual de orientação profissional, por exemplo, indica que o curso de Pedagogia
apresenta algumas especializações e aponta para a área de Pedagogia Social dizendo
que nesta especialização “o profissional de pedagogia desenvolve atividades e
conteúdos específicos para ONGs”12 – mas na prática vivida a Pedagogia Social é
muito mais do que isso. O pedagogo deve estar onde demanda Educação/Pedagogia
assim como uma parte dela, que é a Pedagogia Social, cabendo também ao
profissional muita luta pela respeitabilidade do seu ofício.
4 ESPAÇOS DE TRABALHO
Cada país onde foi regulamentada a profissão de educador social faz as suas
exigências desse sujeito no seu labor, criando legislações, Códigos de Ética,
descrevendo tarefas que lhe são específicas e em equipes multidisciplinares,
supervisionando - mesmo que de modo geral - suas intervenções – dentre outros.
Dentre esses espaços, há o de produzir intervenção no sentido de atuar na inadaptação
social – ou o que isso significa no mundo (cultura, sociedade...), diz Pinel (2011). Assim,
a Pedagogia Social (Pinel, 2011): a) é compreendida como sinônimo de correta
socialização – no que quer dizer “correta” e a crítica disso-daí-mesmo; b) pressupõe
intervenção qualificada de profissionais com a ajuda de recursos e presença de umas
determinadas circunstâncias sobre um sistema social – diálogo profissional
individual/grupal, categoria e sociedade; c) refere-se também à aquisição de
competências sociais – agindo criativamente nesse contexto, criando e subvertendo o
que é competente numa dada sociedade; d) representa o conjunto de estratégias e
intervenções sócio-comunitárias no meio social; e) é concebida como formação social e
12
GUIA DA CARREIRA. Disponível em: <http://www.guiadacarreira.com.br/artigos/profissao/pedagogia/>. Acesso em: 06/06/2010.
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política do indivíduo, como educação política do cidadão crítico e não subserviente; f)
atua na prevenção de desvios sociais – numa proposta de resistência ao estabelecido
como sólido e verdadeiro universalmente; g) define-se como trabalho social, entendido,
programado e realizado desde a perspectiva educativa e não meramente
assistencialista – mas sem negar os momentos de profundo conflito onde comer é sinal
de viver e estar de pé para respirara e com isso resistir e lutar; h) é definida como ação
educadora da sociedade (PETRUS, 1977; 1994) donde a Pedagogia aparece e se
presentifica de modo crítico, bem no sentido paulofreireano.
Já Quintana (1988), diz que a Pedagogia Social, como uma das áreas no campo de
Trabalho Social, envolve uma série de especialidades: 01. Atenção à infância com
problemas (abandono, ambiente familiar desestruturado etc.); 02. Atenção à
adolescência (orientação pessoal e profissional, tempo livre, férias etc.); 03. Atenção à
juventude (política de juventude, associacionismo, voluntariado, atividades, emprego
etc.); 04. Atenção à família em suas necessidades existenciais (famílias
desestruturadas, adoção, separações etc.); 05. Atenção à terceira idade; 06. Atenção
aos deficientes físicos, sensoriais e psíquicos; 07. Pedagogia Hospitalar – tornando-se
assim parte do complexo mosaico do que é Pedagogia Social, afirmaríamos; 08.
Prevenção e tratamento das toxicomanias e do alcoolismo – dentro de uma perspectiva
de Educação em Saúde e Saúde Pública, diríamos; 09. Prevenção da delinqüência
juvenil (reeducação dos dissocializados) – dentro de uma perspectiva crítica,
refletiríamos; 10. Atenção a grupos marginalizados (imigrantes, minorias étnicas, presos
e ex- presidiários); 11. Promoção da condição social da mulher; 12. Educação de
adultos; 13. Animação sócio-cultural. Pinel (2011) e Colodete (2013) acrescentam a
Pedagogia Empresarial como parte da Pedagogia Social, especialmente depois de
desenvolver pesquisa capixaba, em que educadores sociais se denominavam também
pedagogos sociais.
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As áreas são, algumas vezes, muito complexas e híbridas, por isso é sempre adequado
confirmar um trabalho de Pedagogia Social inter e multidisciplinar, e a produção de
mais conhecimentos esclarecedores, mas é muito estimulante um saberfazer que se
imbrica e nos provoca a refleti-la e a encontrar caminhos específicos (próprios) e com
outras ciências que complementam, as artes e as literaturas também.
Na Universidade Federal do Espírito Santo, no Centro de Educação, demos um curso
de aperfeiçoamento, com duração de um ano, em Pedagogia Social. Nesse curso de
extensão universitária, criamos disciplinas como Pedagogia Social e Movimentos
Sociais (destacamos aqui a prática do MST13, de grande significado e sentido, e outros
movimentos atuais e passados); Legislações Indispensáveis ao Educador Social;
Psicologia Fenomenológica e Existencial; História da Pedagogia Social; Psicologia
Social Marxiana14; Pedagogia Comunitária; Educação de Jovens, Adultos e Idosos
dentre outras.
Na disciplina Métodos e Técnicas de Intervenção em Pedagogia Social, ao estudarmos
Boran, Carkhuff, Levy Moreno, Rogers, Baremblitt, Lourau, Lapassade, Pichón-Riviere,
Bleger, Deleuze dentre outros teóricos, nos pareceu, de modo explícito, que o objeto da
Pedagogia Social é o que podemos chamar de “movimentos sociais”, no sentido maior
de socialização (de tendência marxiana com leituras de Makarenko - de 1888 a1939) e
de cuidado com os oprimidos (Paulo Freire), fornecendo-lhes condições imediatas de
sobrevivência, ensino e de modos de lutar pela sua cidadania (que é de todos e de
todas) que, muitas vezes, é arrancada à força.
13
Movimento dos Sem Terra. 14
Aron (2005) assim conceitua como marxista que pesquisadores que são ortodoxos, isto é, aqueles que defendem a dialética da luta de classes – base do que se denomina marxismo de Marx; como marxiano que é a proposição de investigação que se remete ao pensamento de Marx sem pertencer à interpretação ortodoxa do marxismo; já o marxólogo é o especialista no conhecimento e na interpretação científica do pensamento de Marx. Há evidentemente a Psicologia Marxista também, que segue [o mais perto possível], de modo ortodoxo, as ideias de Marx, e que por isso se autonomeiam marxistas.
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Segundo Machado (2010), por serem os objetos da Pedagogia Social decorrentes de
necessidades sociais, essas áreas de intervenções sofrem muitas alterações de acordo
com as pressões sócio-históricas, a realidade vivida.
Quintana (1988) coloca-se na defesa do duplo objeto da Pedagogia Social: 1)
socialização do indivíduo; 2) Trabalho Social, remetendo à Pedagogia Especial, às
questões dos Meios de Comunicação, bem como da Pedagogia do Tempo Livre e
Pedagogia Empresarial.
Já Ventosa (1992) destaca a Educação Para/ Pelo Trabalho que se distingue de
Educação de Jovens, Adultos (e Idosos), pela natureza das propostas; inclui novas
áreas como Educação Cívica e Educação Para a Paz.
Entretanto, para fins de estruturação e estudo, é preciso entender que pelas
características próprias (MACHADO, 2009; 2010), as áreas de intervenção sócio-
educacional podem ser organizadas em três grandes grupos que, separados ou
integrados, respondem à diversidade de contextos e de intervenções. São eles: 1) a
Animação Sociocultural; 2) a Educação de Adultos; 3) a Educação Especializada, onde
a
Educação Especial pode vir compor o complexo mosaico do que seja o devir sempre Pedagogia Social – ou vice versa – ensinando-a a planejar, executar o a ação e avaliar inclusive programas especiais para e com pessoas com deficiência, promovendo a inclusão social e até escolar (no sentido do religare à escola) – bem como denunciando injustiças e articulando com grupos de movimentos de resistência, de oposição ao estabelecido como verdade única (PINEL, 2011, p. 122).
Gohn (2001, p. 32) define Educação Não-Fornal (Pedagogia Social) como,
práticas que abordam processos educativos que ocorrem fora das escolas, em processos educativos da sociedade civil, ao redor de ações coletivas do chamado terceiro setor da sociedade, abrangendo movimentos sociais, organizações não governamentais e outras
Conhec. Dest., Serra, ES, v. 01, n. 02, jul./dez. 2012.
entidades sem fins lucrativos que atuam na área (GOHN, 2001, p. 32).
Santos (1994, p. 47) sugere que, ao conceito apresentado por Gohn, seja acrescido da
Educação no Terceiro Setor que “deve ser voltada para as populações pauperizadas e
ter, como compromissos centrais, o apoio aos processos de emancipação humana e
superação das condições de exploração, às quais grandes parcelas sociais estão
submetidas”.
Essas terminologias indicam subdivisões com uma ênfase maior nos sujeitos e suas
condições do que em características pedagógicas comuns, ocasionando uma
multiplicidade de formas de nomeação, ao infinito, no âmbito do não-formal. Assim, há
Educação de/na Rua, Educação Comunitária, Educação no/do Terceiro Setor dentre
outras, sugerindo uma tentativa de circunscrever as especificidades em detrimento das
convergências dentro desse saberfazer (ZUCCHETTI, 2003). O fato é a existência de
uma demanda urgente em aprofundar discussões, ampliar o domínio de conhecimentos
teóricos e investir em pesquisas na área de Pedagogia Social (MACHADO, 2009).
Trata-se assim de um dos desafios à formação do educador social, uma formação que
lhe dê sustentação teórica de enfoque afetivo, cognitivo e filosófico, bem como que
encontre um espaço de escuta para sua pessoa singular e em grupo – com alegria, com
tristeza, ou alegriatristeza.
5 GRANDES NOMES: FUNDADORES DA PEDAGOGIA SOCIAL
Desde a Grécia antiga, perpassando pela educação oriental, houve Grandes Nomes
que produziram Educação Social. Assim, a História da Educação traz em suas
entrelinhas ou de modo explícito, grandes educadores sociais como foram Korczak,
Natorp e Freire como bem confirma Pinel (2011).
Conhec. Dest., Serra, ES, v. 01, n. 02, jul./dez. 2012.
Korczak pode ser descrito como um educador principalmente de tendência
fenomenológico-existencial e, posteriormente, de tendência pedagógico-libertária ou
ainda, parte dos dois movimentos – Pinel (2011). Seu nome de batismo era Henryk
Goldszmit. Nascido em Varsóvia no dia 22 de julho de 1878/1879 e morto em Treblinka
em agosto de 1942. Foi pediatra, autor infantil e pedagogo.
Seus escritos eram densos, tensos, intensos e, através da ficção falava de sua
Pedagogia – Escolar e Social. Korczak era cuidadoso no trato com as crianças, mas
impunha a responsabilidade diante das escolhas que faziam na vida. Textos alegres,
tristes – e alguma vezes um discurso datado, da sua época, mas sempre profundo no
sentido fenomenológico. Seus livros nos evocam a refletir sobre os seus projetos de
vida, sua disposição em criticar a sociedade da época – enfim uma produção textual
brilhante. De sua produção, destacamos: “Como Amas Uma Criança”, “Diário do
Gueto”, “Quando Eu Voltar a Ser Criança” dentre outros.
Durante o seu trabalho com orfanatos, casas-lares ou o que hoje se denomina abrigos,
com o objetivo de acolher e educar meninos e meninas pobres, órfãos, abandonados
de guerra etc, sua amiga (pedagoga) Stefa Wilczinska teve influência pela escolha da
faculdade de Pedagogia. Ali ele entrou em contato com as obras dos pensadores da
Escola Nova, que estava em voga por toda a Europa.
Um dos pioneiros desse movimento foi o escritor russo Leon Tolstoi (1828-1910), muito
admirado por Korczak pelas idéias anarquistas, pacifistas, pela pregação de uma vida
simples e em proximidade à natureza e, além de tudo, um denunciador de instituições
como as igrejas e governos, dogmas e tribunais - entendidas como ferramentas de
dominação e submissão ao outro. No final da década de 1850, Tolstoi preocupado com
a deficiência da educação do campo, criou em Iasnaia Poliana uma escola para filhos
de camponeses, onde ele mesmo escreveu grande parte do material didático,
Conhec. Dest., Serra, ES, v. 01, n. 02, jul./dez. 2012.
provocando a Pedagogia de sua época ao valorizar que os discentes ficassem livres,
sem excessivas regras e sem punições físicas.
Korczak gostava também do estilo (e discurso) educacional de Johann Heinrich
Pestalozzi (1746-1827), um pedagogo suíço e educador pioneiro da reforma
educacional. No livro “Como Gertrudes ensina suas crianças" ele expõe seu método
pedagógico, de partir do mais fácil e simples para o mais difícil e complexo.
Para educar as crianças e jovens, Korczak recorria ao teatro – sempre produzindo
reflexões críticas baseadas no humanismo-existencial que impregnava a sua
Pedagogia Social e práxis. Desenvolveu a reprodução política do seu país no micro-
contexto do orfanato a partir de técnicas (e filosofia) de Parlamento, Tribunal de Justiça,
por isso o orfanato era chamado de República das Crianças. Lá, as crianças aprendiam
o que é justiça, amor, generosidade, cidadania, solidariedade vivenciando esses valores
subjetivos (e concretos), pois os problemas cotidianos eram resolvidos nesses
encontros. Publicou um jornal com texto das crianças. Defendeu e deu origem o que
hoje chamamos de Direitos da Criança – sendo precursor.
Entretanto, uma Pedagogia (ainda mais a Social) recebe impactos das variáveis sócio-
histórica, política e econômica. Assim é que a crise econômica mundial deflagrada em
1929 e o fortalecimento das ideologias nacionalistas e totalitárias foram aos poucos
destruindo ideais revolucionários como os de Korczak. O anti-semitismo em toda a
Europa tornou cada vez mais difícil a situação para os judeus, sobretudo na Polônia.
Em 1936, o velho professor (e médico) foi despedido da rádio onde dava conselhos
médico, psicológicos e pedagógicos aos pais – e por isso era muito popular. Motivo da
demissão? Ser judeu. Visitou Israel e ficou muito impressionado com os kibutzim
(propriedades agrícolas coletivas), chegando a pensar em mudar seu orfanato para
aquele país.
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A invasão nazista na Polônia, que causou a eclosão da II Guerra Mundial, no dia 01 de
setembro de 1939, impediu a realização dos planos de Korczak, que foi trabalhar em
um hospital militar, abandonando suas funções no Lar das Crianças. Além disso, ainda
havia os progronim, isto é, atentados populares contra os descendentes da religião
judaica, impedindo que o educador social sequer levasse suas crianças para passeios
fora da cidade, estratégia muito utilizada por ele para educá-las.
Descrevem Lewowicki, Singer e Murahovschi (1998) que, em 1940 o orfanato de
Korczak já havia sobrevivido a dois progronim. Em 1942, a Gestapo ordenou a
transferência da instituição para uma casa pequena e suja, no gueto de Varsóvia. Ali, o
médico pedagogo social usou sua influência para conseguir alimentos e medicamentos
para as crianças. Famoso e de prestígio, o educador obteve propostas de escapar do
gueto, mas recusou-as, preferindo ficar com suas crianças, produzindo o texto (registro)
“Memórias”, escrito entre maio e agosto.
Lewowicki (1994) destaca positivamente o programa social planejado, executado e
avaliado por Korczak, docentes e discentes. Esse pedagogo tinha muita sensibilidade
pelos problemas sociais que experienciava, sempre atuando contra todas as
manifestações de maldade, arbitrariedade e injustiça. Ele soube capturar o fato de que
fenômenos negativos se manifestam ou produzem impactos tanto na dimensão
individual como na social e sempre se opôs a toda forma de violência material,
psicológica, espiritual e pedagógica. Ainda assim, prosseguiu lutando contra os
fenômenos da pobreza, do desemprego, da exploração e da desigualdade social.
Korczak morreu junto com suas duzentas crianças e jovens do internato, quando foi
obrigado a dirigir-se a um campo de concentração, morrendo em câmaras de gás. O
dia: 10 de agosto de 1942. O professor foi à frente das crianças, caminhando como
numa procissão, para os trens que os levariam para a morte.
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Paul Natorp (1854-1924) é outro educador social sempre citado. Defendendo a ideia de
que a palavra “Pedagogia” não significa somente a educação da criança nas suas
formas tradicionais, mas sim à obra inteira de elevação do homem ao alto da plena
humanidade – conceito até hoje aprovado. A Pedagogia Social não é a educação do
indivíduo isolado, mas sim do homem que vive em uma comunidade, porque a sua
finalidade não é somente o indivíduo.
Paulo Freire (1921–1997) entende que ninguém "Já agora ninguém educa ninguém,
como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão,
mediatizados pelo mundo" (FREIRE, 1983, p. 79). Freire traz em seus discursos marcas
da Fenomenologia, Existencialismo, Marxismo e talvez seja o teórico mais conhecido e
estudado pelos pedagogos sociais no Brasil e no mundo.
Freire sempre se interessou pela Pedagogia Social de modo específico, além de seu
pensamento (discurso advindo da prática/práxis) ser rico em possibilidades para tal
área do saberfazer, tanto que em 1986 foi publicado pela UNICEF e extinta FUNABEM
o manual onde consta um diálogo entre ele e educadores sociais de rua acerca do que
significa ser esse trabalhador (FREIRE, 1986).
6 EPISTEMOLOGIA HUMANISTA-EXISTENCIAL CRÍTICA
Paiva (2010) procura e desvela uma Epistemologia da Pedagogia Social de Rua que se
concretiza embasada em Paulo Freire e em Enrique Dussel encontrando neles marcas
da Fenomenologia, do Existencialismo e do Marxianismo (Aron, 2005): “Ter Paulo Freire
como marco teórico da ação interventiva da Pedagogia Social é algo vital e de máxima
urgência, uma clínica subversiva e de muita alegria” (PINEL, 2006, p. 27).
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Aqui-agora, de modo alternativo e como ato de resistência, pretendemos trazer alguns
sentidos advindos da produção da Psicologia e Pedagogia criada por Carl Ransom
Rogers (1902-1987), denominada de Abordagem Centrada na Pessoa ou ACP. Diz
Pinel (2006, p. 17) que
fui trabalhar como educador social, ligado à instituição estatal IESBEM, tendo por marco teórico idéias e ações propostas por Rogers, um psicólogo e pedagogo que me marcava em 1983, e que era muito presente nas minhas formações em Psicologia e em Orientação Educacional, bem como já estava atraído pela demanda de mostrar-me projeto de vida profissional interligando-me aos diversos temas de Paulo Freire como alegria, esperança e especialmente conscientização crítica – mas reconhecia em ambos as raízes filosóficas diferenciadas.
Rogers se desvela humanista-existencial produzindo seu discurso pelo método
fenomenológico de investigação. Rogers, por exemplo, depois de se envolver
existencialmente com os fenômenos que ele estudava (pela via da prática clínica
psicológica e como professor universitário junto aos latinos e negros dentre outros)
produzia um distanciamento reflexivo (indissociado do envolvimento) donde descrevia e
narrava o vivido.
Tal perspectiva, ao contrário de algumas afirmativas, considera também o impacto do
ambiente imediato e amplo (ideológico, econômico, político, midiático – dentre outros)
no processo de subjetivação. Mesmo que veja o mundo com “uma oferta mundana
negativa ao humano” (PINEL, 2006, p. 22), há aspectos positivos que ele descreve,
mesmo que se referindo ao imediato.
Ao longo de sua produção, Rogers nomeou seu discurso como no que denominou de
Abordagem Centrada na Pessoa (ou: ACP). Não em vão ele não recusava em participar
de passeatas contra o uso da energia nuclear em bombas atômicas, por exemplo.
A ACP, ao nosso sentir, descreve seis pressupostos que foram revisitados por Pinel
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(2006) que assim os reescreveu a partir de sua prática como psicólogo, psicopedagogo,
pedagogo social e educador especial e inclusivo: 1) Uma concepção do homem
embasada na corrente humanista da Psicologia, produzida pelo método
fenomenológico, donde ele (ser-sendo humano) é descrito como bom, positivo e
naturalmente socializado, aberto às experiências de sentido que o torna digno de
confiança e com isso que se mostra com Tendência Atualizante (TA):
Todo o organismo é movido por uma tendência inerente a desenvolver todas as suas potencialidades e a desenvolvê-las de maneira a favorecer sua conservação e enriquecimento. (...) A tendência atualizante não visa somente (...) a manutenção das condições elementares de subsistência como as necessidades de ar, alimentação, etc. Ela preside, igualmente, atividades mais complexas e mais evoluídas tais como a diferenciação crescente dos órgãos e funções; a revalorização do ser por meio de aprendizagens de ordem intelectual, social, prática... (ROGERS; KINGET, 1977, apud GOBBI et al., 1998, p. 144).
2) Uma abordagem (fenomenológica e com traços existenciais, por focar o sujeito
concreto vivido no cotidiano) que dá destaque à “experiência subjetiva”, donde o outro
(outridade/ alteridade) é vital e resignificado nas relações interpessoais (intersubjetivas)
compreendidos empaticamente, ou seja, do seu próprio quadro de referências; 3) Um
modo de ser (sendo no mundo) que facilita a penetração em relações que o constituem
de modo inventivo envolvido existencialmente que está no encontro entre pessoas,
pessoa-pessoa-pessoas – ser no mundo; 4) uma noção de problema ( do ser no
mundo) advindo do choque entre o “eu ideal” (romantizado mas com possibilidades
concretas de devir-ser) e o “eu real” (aquilo que precisa ser concretamente vivido até
para alcançar seu projeto de vida sonhado); 5) de uma intervenção humanista-
existencial que foque o resgate do sentido existencial de ser-sendo (sempre no mundo),
através das atitudes de empatia, aceitação incondicional e congruência – atitudes que
podem ser associadas as três outras descritas por Robert Carkhuff (PINEL, 2006):
confrontação, imediaticidade e concreticidade; 6) o professor, educador ou outro
ensinante que trabalha com a ACP se transforma e ao ensino/ensinante - pelas atitudes
positivas que são favoráveis á saúde mental. O ensino mecânico e rígido é provocado
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demais pela ACP desfazendo-a e com isso afastando-se da mera repetição e a visão do
outro como repositório de informações destacando o vivido em “aprendizagem
significativa” (encarnada), pois toca o mais profundo ser (sendo) da pessoa (no mundo)
fazendo mudanças subjetivas, comportamentais, afetivas, cognitivas, sociais – falamos
“aprendizagem-carne” (PINEL, 2009) aquela que resgata a TA: os princípios e as
atitudes rogerianos facilitam “não só o desenvolvimento intelectual do aluno, como
também o seu crescimento enquanto pessoa total, promovendo a aprendizagem
significativa e a interiorização do processo de aprender” (CAPELO, 2000; p. 9).
O criador da ACP também marcou profundamente a formação de assistentes sociais do
seu país e em alguns outros do Ocidente – sua presença era comum na formação
dessas profissionais brasileiras: “... em Vitória ES, uma das primeiras profissionais (e
em maior quantidade; em serviço público) a penetrarem na Educação Social foram as
assistentes sociais, que desenvolviam intervenções diversas junto aos meninos e
meninas em situação de rua e em instituições de abrigo e cuidado. Foram elas que me
requisitaram do meu trabalho do internato para as ruas da capital, donde teimávamos
desenvolver prevenção ao uso de drogas a partir de profunda escuta empática e
orientações devidas” (PINEL, 2011; p. 19). Também marcou as enfermeiras, como
alguns cursos de Direito, e muito os pedagogos e psicólogos.
Dizia Rogers que ele produziu seu discurso, sem influencias teóricas específicas, mas
podemos capturar dessa invenção discursiva dele, marcas de Lao Tsé (filósofo chinês
nascido entre os séculos IV aC e VII aC15 que de modo geral apregoava a não-
diretividade: “Se nada for feito, tudo estará bem”, escreveu Tsé in "O Livro do Caminho
e da sua Virtude"); essa marca foi depois reconhecida por ele), Martin Buber (1878-
15
Talvez Lao Tsé seja um mito e não uma pessoa real. Sua obra é composta por discursos que provavelmente foram sendo agregados de diversas contribuições de mestres taoístas. Tao pode ser traduzido como "via" ou "caminho": é o que há de profundo e misterioso na realidade; é o que faz com que tudo seja como é.
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1965; foco nas relações Eu+Tu+Nós), do Zen-Budismo (no momento em que esse
apregoa a centralidade da "experiência direta da/na realidade"), Sigmund Freud (1856-
1939; reconhecia os mecanismos de defesa e a transferência, mas não o inconsciente,
descrevendo essa instancia primitiva como sociável, dialógica e relacional). Outra
marca sua advém do fundador do Existencialismo Søren Kierkegaard (1813-1855).
Paulo Freire (1921-1997) é outro nome associado às práticas rogerianas (centradas na
pessoa)16. O próprio Rogers reconheceu isso em 1978. Eles apresentam raízes
filosóficas semelhantes, a fenomenológica, mas as modificam nas suas travessias
científicas. Há dois nomes da ACP que também fazem essa associação: Maureen
O’Hara e John Wood. Já o centrado na pessoa, o brasileiro Fonseca (2006, p. 8) diz
que há “um no fundo de um abismo entre as obras de Freire e de Rogers”, mas não
contesta que há semelhantes preocupações dos dois pensadores da Educação
(inclusive a Social) com os marginalizados, mesmo que esses sejam abordados
pedagógica e psicopedagogicamente de modo diferenciados devido à cultura
(sociedade e história) em que estão envolvidos, bem como os sujeitos das
intervenções, em fim ambos atuaram em contextos diferentes, Freire no Terceiro Mundo
e Rogers no Primeiro Mundo que bem se legitima os Estados Unidos. Entretanto,
produzir críticas aos dois pensadores (e a outros) é um ato cheio de inventividade,
criação, participação e diálogo – obra de arte que é (sendo) - e quase nunca significa
apenas produzir dissociação fundamentalista.
Hoje alguns estudiosos buscam as possíveis relações, mesmo que distantes entre
Rogers e: Paulo Freire (indo além das semelhanças reconhecidas por ele), Vigostski,
bem como os filósofos Heidegger e Sartre (PINEL, 2011).
16
Há também um movimento entre pesquisadores freireanos de trazer ao núcleo de seu pensamento diversos autores, dentre eles Rogers e seus seguidores, que nesse caso específico, traz o artigo, provando essa associação, de Maureen O'Hara (GADOTTI, 2001).
Conhec. Dest., Serra, ES, v. 01, n. 02, jul./dez. 2012.
Assim há na contemporaneidade um denso, tenso e intenso resgate da ACP, que
mesmo trazendo a lume criticidade à sua produção (acusada até injustamente de muito
romântica e não crítica), pontua a vitalidade no seu discurso acerca do resgate da
pessoa plena (holística) em contraposição (prática psicopedagógica de resistência) ao
tempo-espaço neoliberal de massificação e negação do sujeito; da valorização do ser
humano se estiver inserido no consumismo e competição vorazes, processos de
subjetivação que reproduz a alienação. Já não se quer ser (sendo) si-mesmo, mas um
desejo atroz de ser o outro em um sentido de esquizofrenização.
7 PÓS-ESCRITO
A Pedagogia Social de marcas profundas (outras vezes, mais suaves) humanistas-
existenciais demanda adotar sempre as ideias (e ou algumas delas) de Rogers.
Precisará o educador social desenvolver atitudes centradas na pessoa, acreditando
com fortaleza na capacidade do sujeito da Pedagogia Social, em crescer e aprender
significativamente, e com isso de fazer-se consciente da realidade vivida e o papel do
afeto na comoção de ações de intervenções que objetivam modificar a realidade
imediata e a mais ampla, tonando-se cotidianamente cidadãos que exigem o modo
democrático como o melhor de se viver e lutar. Nesse sentido mais belicoso,
defendemos que na formação do educador social se faz necessário a associação entre
Rogers e Freire, destacando, entretanto as diferenças (e leves semelhanças) filosóficas,
e reiluminando as possibilidades de interferência e intervenção:
Uma abordagem desse tipo, centrada na pessoa, é uma filosofia que se acha em consonância com os valores, os objetivos e os ideais que historicamente constituíram o espírito da nossa democracia. (...) Ser plenamente humano, confiar nas pessoas, conceder liberdade com responsabilidade não são coisas fáceis de atingir. O caminho que apresentamos constitui um desafio. Envolve mudanças em nosso modo de pensar, em nossa maneira de ser, em nossos
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relacionamentos com os estudantes. Envolve uma dedicação difícil a um ideal democrático (ROGERS, 1986; p. 326-327).
Entretanto, é preciso que se faça uma leitura refletiva e crítica de Rogers. Ele tem sido
objeto de algumas críticas como o excesso romantismo na crença na pessoa; o não
reconhecimento dos aspectos maléficos do ser humano; da não descrição (e análise)
desses “modos de ser sendo junto ao outro no mundo” (PINEL, 2006) com sua
metafórica “carne em sangue exposta em praça pública (e inter e intra pessoalmente)”;
pouco (ou nenhum) enfoque nos aspectos socioculturais e históricos na existência junto
ao outro no mundo etc. Uma opção epistemológica não pode significar alienação do
educador social, que pode transitar nesse tipo de humanismo-existencial construindo
uma ponte crítica, e produzindo negociação discursiva com outros autores como
Merleau-Ponty e Paulo Freire, por exemplo.
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