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Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro 21 Cad. Psicanál., CPRJ, Rio de Janeiro, ano 30, n.21, p.21-44, 2008 A questão dos afetos na metapsicologia freudiana The question of affection in Freudian Metapsychology Carlos Alberto Plastino 1 Resumo: O artigo discute a abordagem freudiana da problemática dos afetos, acompanhando as grandes linhas da reexão de Freud desde o início de seu trabalho teórico até a formulação da segunda teoria da angústia e do primado da afetividade. Assinalando a existência de dois níveis diferentes de elaboração teórica – um mais próximo da experiência clínica e outro no registro metapsicológico –, o artigo analisa a subordinação da metapsicologia a pressupostos paradigmáticos da modernidade. A ênfase destes nos processos quantitativos bloqueia a consi- deração dos fatores emocionais centrais na experiência clínica. Sublinhando a primazia sempre outorgada por Freud à dita experiência como fonte do saber construído pela psicanálise, o artigo discute a provisoriedade das elaborações metapsicológicas. Aponta, assim, tanto as limitações do princípio de prazer como o abandono, por Freud, da perspectiva quantitativa constitutiva de dito princípio. Palavras-chave: Afetividade, metapsicologia, virada, historicidade, Freud Abstract: This paper discusses the Freudian approach to the problematic of aection. It does so by follow- ing the major lines of Freud’s reections since the beginning of his theoretical work until the formulation of his second theory of anxiety and the primacy of aectivity. Pointing to the existence of two levels of theoretical elaboration – one closer to the clinic experience and the other in the metapsychological level –, the paper analyzes the metapsychology’s subordination to modernity’s paradigmatic assumptions. The laer’s emphasis in quantitative processes blocks the consideration, under it, of the emotional factors that are crucial in the clinic experience. Highlighting the primacy that Freud always conceded to such experi- ence as the source of the knowledge constructed by psychoanalysis, the paper discusses the provisionality of metapsychological elaborations indicating both the limitations of the principle of pleasure and the abandonment, by Freud, of the quantitative perspective which constitutes such principle. Keywords: aectivity, metapsychology, turn, historicity, Freud 1. Psicanalista, Professor do IMS-UERJ; PUC-Rio.

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A questão dos afetos na metapsicologia freudiana

Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro 21Cad. Psicanál., CPRJ, Rio de Janeiro, ano 30, n.21, p.21-44, 2008

A questão dos afetos na metapsicologia freudiana

The question of affection in Freudian Metapsychology

Carlos Alberto Plastino1

Resumo: O artigo discute a abordagem freudiana da problemática dos afetos, acompanhando as grandes linhas da refl exão de Freud desde o início de seu trabalho teórico até a formulação da segunda teoria da angústia e do primado da afetividade. Assinalando a existência de dois níveis diferentes de elaboração teórica – um mais próximo da experiência clínica e outro no registro metapsicológico –, o artigo analisa a subordinação da metapsicologia a pressupostos paradigmáticos da modernidade. A ênfase destes nos processos quantitativos bloqueia a consi-deração dos fatores emocionais centrais na experiência clínica. Sublinhando a primazia sempre outorgada por Freud à dita experiência como fonte do saber construído pela psicanálise, o artigo discute a provisoriedade das elaborações metapsicológicas. Aponta, assim, tanto as limitações do princípio de prazer como o abandono, por Freud, da perspectiva quantitativa constitutiva de dito princípio.Palavras-chave: Afetividade, metapsicologia, virada, historicidade, Freud

Abstract: This paper discusses the Freudian approach to the problematic of aff ection. It does so by follow-ing the major lines of Freud’s refl ections since the beginning of his theoretical work until the formulation of his second theory of anxiety and the primacy of aff ectivity. Pointing to the existence of two levels of theoretical elaboration – one closer to the clinic experience and the other in the metapsychological level –, the paper analyzes the metapsychology’s subordination to modernity’s paradigmatic assumptions. The latt er’s emphasis in quantitative processes blocks the consideration, under it, of the emotional factors that are crucial in the clinic experience. Highlighting the primacy that Freud always conceded to such experi-ence as the source of the knowledge constructed by psychoanalysis, the paper discusses the provisionality of metapsychological elaborations indicating both the limitations of the principle of pleasure and the abandonment, by Freud, of the quantitative perspective which constitutes such principle. Keywords: aff ectivity, metapsychology, turn, historicity, Freud

1. Psicanalista, Professor do IMS-UERJ; PUC-Rio.

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Gramática dos afetos

Cadernos de Psicanálise, CPRJ22Cad. Psicanál., CPRJ, Rio de Janeiro, ano 30, n.21, p.21-44, 2008

...Freud estava sempre preparado para deixar um poeta, um fi lósofo ou sua própria intuição descreverem o caminho para fenômenos que não haviam sido abrangidos pela metapsicologia da época. Donald. W. Winnicott 2

A segunda teoria sobre a angústia, formulada por Freud no seu texto de 1926 (FREUD, 1926, 1986) caracteriza uma virada fundamental da sua concepção metapsicológica dos afetos, virada sintetizada pela afi rmação do primado da afetividade nos processos psíquicos e na constituição da subjetividade. Este importante movimento teórico se insere nas profun-das mudanças operadas por Freud na sua metapsicologia, mudanças que incluem a formulação da segunda teoria pulsional (FREUD, 1920, 1986) e da segunda tópica (FREUD, 1923, 1986). É importante sublinhar a so-lidaridade existente entre essas formulações, já que, no seu conjunto, elas exprimem o movimento teórico do fundador da psicanálise no sentido de ultrapassar os pressupostos paradigmáticos que, na primeira parte de sua obra, embasaram suas formulações metapsicológicas. A sustentação, na segunda teoria pulsional, de qualidade nas pulsões e, na segunda tópica, da precedência do inconsciente originário (Id) sobre o inconsciente recalcado, constituem ao mesmo tempo a contestação dos pressupostos ontológicos e antropológicos que presidiram as primeiras formulações metapsicológicas freudianas; e a condição de possibilidade para poder pensar – neste registro metapsicológico – o papel central da afetividade.

A formulação da terceira síntese metapsicológica3 caracteriza também uma maior aproximação entre as formulações metapsicológicas e as for-mulações teóricas que, num nível menor de abstração (“expressão direta da experiência clínica”), desenvolvem a compreensão de Freud sobre os processos psíquicos. Neste último registro, com efeito, a centralidade dos fatores emocionais foi reconhecida desde o início da obra freudiana. Assim, comentando os processos psíquicos vivenciados por suas pacientes histéri-cas, Freud afi rma, já em 1895, o primado da afetividade. “Nos estudos sobre a histeria – rememora em 1910 – estávamos em vias de obter uma teoria puramente psicológica da histeria, na qual atribuíamos o primeiro lugar aos processos afetivos” (FREUD, 1910, 1986, p.15). Esta afi rmação precede em cinco anos à formulação da existência da realidade psíquica diferente 2. Winnicott , D. O uso de um objeto no contexto de Moisés e o monoteismo in Explorações psicanalíticas,

Artmed, Porto Alegre, 1994, p.187.3. A primeira síntese metapsicológica foi formulada no capítulo VII da Interpretação dos sonhos; a

segunda, cuja formulação o próprio Freud considerou posteriormente prematura (FREUD,1925,1986, p.55) nos textos ditos metapsicológicos de 1914/1915. A terceira síntese inclui os textos ditos da “virada dos anos XX”, iniciada com a publicação de Além do princípio de prazer.

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Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro 23Cad. Psicanál., CPRJ, Rio de Janeiro, ano 30, n.21, p.21-44, 2008

da realidade material e do psiquismo inconsciente como constituindo o psiquismo genuíno. Explicito esta cronologia porque ela mostra que a sig-nifi cação dos fatores emocionais na vida psíquica precede, na experiência e compreensão de Freud, sua compreensão do psiquismo inconsciente, cuja existência ele postula a partir do capítulo VII da Interpretação dos sonhos (FREUD, 1900, 1986). Creio que é procedente pensar que é precisamente esse reconhecimento da centralidade dos fatores emocionais nos processos histéricos que dá sentido à afi rmação de Freud segundo a qual os Estudos sobre a histeria conteriam “o núcleo da psicanálise” (FREUD, 1895, 198...25 e FREUD, XIX Breve informe, p.206). Com efeito, é apenas o reconheci-mento da centralidade dos fatores emocionais na vida psíquica e na com-preensão de seus processos que torna possível admitir dita afi rmação. Do contrário, não haveria como entender que um texto produzido antes da formulação teórica dos principais conceitos da psicanálise (inconsciente, pulsão recalque) pudesse conter “o germe da psicanálise”. A signifi cação dos fatores emocionais constitui de fato uma importantíssima transforma-ção da concepção antropológica na época dominante, portando o germe de um rompimento com a concepção ontológica e antropológica tornada dominante na modernidade. A subseqüente formulação do inconsciente como constituindo o psiquismo genuíno aprofunda dito rompimento, justifi cando a opinião de Castoriadis para quem “muito mais que a ordem moral da sociedade e sua ordem ontológica e lógica que a psicanálise põe em causa” (CASTORIADIS, 1976, p.374).

A profunda inovação trazida pela afi rmação freudiana sobre a sig-nifi cação da vida emocional não foi recolhida na primeira e na segunda síntese metapsicológica, criando um descompasso entre a experiência clí-nica de Freud e seus ensaios teóricos de menor nível de abrangência e suas formulações metapsicológicas. Dito descompasso se constituiu num fator central de tensão entre ambos registros da obra freudiana, transformando-se – a partir da afi rmação da primazia da experiência clínica – no motor da reformulação metapsicológica. Diversos fatores contribuíram para esse descompasso. Convém lembrar aqui, em primeiro lugar, as condições que presidiram a construção da metapsicologia na obra freudiana. Defrontando-se na experiência clínica com a existência do inconsciente, Freud constatara a necessidade de “descobrir integralmente tanto os métodos terapêuticos quanto suas premissas teóricas” (vol. XXII, 203). Esta necessidade se impôs na medida em que não existia “nenhum conhecimento psicológico ao qual fosse possível subordinar – como princípio explicativo – os processos aní-micos descobertos através da análise dos sonhos” (FREUD, 1900, 1986). Foi

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essa necessidade que originou a invenção da metapsicologia, necessidade reforçada pelo fracasso da tentativa ensaiada no Projeto de uma psicologia para neurologistas, orientada a encontrar um fundamento orgânico para os fenômenos psíquicos constatados na clínica. Esta tentativa representou um forte investimento de Freud para elaborar suas descobertas clínicas “na matriz da ciência”, tal como esta era entendida no seu tempo e carac-terizada pela premissa sustentada no célebre “juramento de Berlim”, no qual renomados cientistas, dentre os quais professores diretos de Freud, assumiam seu credo materialista. Du Bois-Reymond, um desses cientistas, sintetiza como segue o mencionado juramento.

Brücke4 e eu nos comprometêramos solenemente a impor esta verdade, a saber, que somente as forças físicas e químicas, com exclusão de qualquer outra, agem no organismo. No caso dessas forças não conseguirem ainda explicar, precisamos nos empenhar em descobrir o modo específi co ou a forma de sua ação, utilizando o método físico-matemático , ou então postular a existência de outras forças equivalentes em dignidade às físico-químicas, inerentes à matéria, redutíveis à força de atração e repulsão. (ASSOUN Paul-Laurent, 1983, p.53, 54)

Este projeto fracassou e, embora Freud mantivesse ainda por muitos anos a “hipótese de fundo” que o sustentava, tornou-se imprescindível construir um contexto diferente – a metapsicologia – para teorizar em maior nível de abstração os fenômenos psíquicos revelados pela experiência clíni-ca. O fracasso do Projeto, nas palavras de Freud, resultou em última instância da impossibilidade de fazer derivar os fenômenos da qualidade (portadores de sentido) do jogo dos fatores quantitativos, ou seja, da impossibilidade de elaborar “uma psicologia de ciência natural, a saber, apresentar pro-cessos psíquicos como estados quantitativamente comandados de umas partes materiais comprováveis”(FREUD, 1996, 1950, 1986, p.339). Mais precisamente, o objetivo de Freud nessa obra era explicar cientifi camente os processos defensivos constatados na experiência clínica.

Tudo o que eu estava tentando fazer – escreve para Fliess ao comunicar-lhe a decisão de abandonar o Projeto – era explicar a defesa, mas experimente só tentar explicar algo que vem do âmago da natureza. Tive que abrir caminho palmo a palmo através da qualidade, do sonho, da memória, em suma, a psicologia inteira. (MASSON, p.137)

4. Diretor do laboratório de fi siologia de Viena no qual Freud desenvolveu pesquisas no início de sua carreira. Freud se refere a ele na sua Apresentação autobiográfi ca como sendo seu “veneradíssimo mestre”.

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Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro 25Cad. Psicanál., CPRJ, Rio de Janeiro, ano 30, n.21, p.21-44, 2008

Anuncia-se assim, no início mesmo da empreitada freudiana, a questão crucial dos fatores afetivos. Reconhecidos sem ambigüidade na experiência clínica como responsáveis por deslanchar os mecanismos defensivos, de-monstram ser intratáveis no contexto de uma abordagem teórica presidida pelos pressupostos da fi losofi a materialista. Assim, da insufi ciência e da inadequação da “psicologia da consciência” – única então disponível – e do fracasso da tentativa de descobrir a “base orgânica” dos fenômenos psíquicos, nasce a necessidade de se construir uma metapsicologia. Antes de discutir brevemente algumas importantes características desta, convém se deter ainda sobre a questão da “base material” dos fenômenos psíquicos. Como foi lembrado acima, mesmo após ter abandonado o Projeto, Freud continuou a sustentar, como “hipótese de fundo” – de fato imposição da perspectiva cientifi cista – o fundamento físico-químico das perturbações psíquicas, exprimindo sua esperança de que, algum dia, este fundamento fosse encontrado5. Esta crença foi sustentada inclusive no próprio texto da A Interpretação dos sonhos, em cujo capítulo sete Freud postula a existência da realidade psíquica como sendo diferente da realidade material. Esta perspectiva cientifi cista foi, contudo, fi nalmente abandonada pelo cria-dor da psicanálise. Com efeito, em um dos seus últimos textos, Esquema da psicanálise, retomando a problemática discutida no Projeto, adota uma posição teórica que ultrapassa o reducionismo da determinação material para acolher a complexidade da vida humana e dos processos de conhe-cimento desta. Refl etindo sobre a vida psíquica, declara que se fosse pos-sível estabelecer uma referência precisa sobre o “cenário orgânico” desses processos, no máximo se obteria sua localização precisa, sem no entanto progredir na sua compreensão. (FREUD, 1938, 1940, 1986, p.143). Reivindica em conseqüência a autonomia da psicologia – cujo objeto é precisamente a compreensão dos processos anímicos – diante das outras ciências, citando explicitamente a física e a química. Adotando a perspectiva que entende serem as teorias científi cas construções, e reiterando que o real-objetivo permanecerá sempre não discernível (FREUD, 1938, 1940, 1986, p.198), conclui que as ciências devem contentar-se em estabelecer as leis a que obe-decem os processos de que se ocupam. É isto, acrescenta, que a psicanálise fez a respeito da vida anímica, criando para tanto novos pressupostos e novos conceitos. Trata-se, acrescenta ainda Freud, de aproximações, que

5. “Não tenho a menor inclinação de deixar a psicologia suspensa no ar sem uma base orgânica” – escreve para Fliess em 1898. No entanto, à parte essa convicção não sei como prosseguir, nem teórica nem terapeuticamente, de modo que preciso comportar-me como se apenas o psicológico estivesse em exame. Por que não consigo encaixá-los (o orgânico e o psicológico) é algo que sequer comecei a imaginar”. (A correspondência de S. Freud para W. Fliess, 1887-1904, 22/9/1898. p.337.)

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no entanto, possuem o mesmo valor das construções auxiliares das outras ciências. (FREUD, 1938, 1940, 1986, p.156).

A metapsicologia foi então inventada como conseqüência do fracasso da tentativa de encontrar uma base material para os fenômenos psíquicos. Ela não foi, contudo, pensada como sendo uma nova base sobre a qual construir o saber psicanalítico. Freud é explícito nisto: a metapsicologia constitui a “superestrutura da psicanálise”, o teto do edifício teórico, não seus fundamentos. “Pareceu legítimo” – escreve na sua Apresentação auto-biográfi ca – “completar as teorias que são expressão direta da experiência, com hipóteses aptas para dominar o material e referidas a constelações que não podem ser matéria de observação direta” (FREUD, 1925, 1986, p.31). Superestrutura especulativa, portanto, que tem como objetivo formular hipóteses que permitam uma melhor e mais abrangente compreensão dos fenômenos observados na experiência clínica. Esta experiência constitui então a base da metapsicologia, que deve ser sempre considerada uma construção provisória, “cujas peças se sacrifi carão sem dano nem lamenta-ções assim que demonstrem sua insufi ciência” (FREUD, 1925, 1986, p.31). A compreensão freudiana do caráter provisório da metapsicologia foi por ele coerentemente mantida ao longo da elaboração de sua obra, na qual a sucessiva formulação de “sínteses metapsicológicas” obedeceram sempre à necessidade de abandonar ou complementar construções teóricas postas em xeque por novas experiências clínicas.

A construção de um novo saber exige aplicar ao material observado “certas idéias abstratas que se recolheram de alguma outra parte” – escreve Freud no início de seu artigo Pulsões e destinos de pulsão (FREUD, 1015a, 1986). Como sabemos, essas idéias abstratas foram tomadas de empréstimo nos conhecimentos referidos à área médica e, mais importante ainda, às concepções hegemônicas sobre o ser, o conhecer e o próprio homem. Ou seja, ditas “idéias abstratas” foram as elaboradas pelo paradigma moderno, cujos pressupostos eram em geral aceitos sem crítica, como se fossem evi-dentes por si mesmos. Estes pressupostos, como se sabe, incluem a separação da natureza e da cultura e do corpo e o psiquismo, bem como a redução de natureza e corpo a uma perspectiva maquínica e meramente quantitativa. A estreita vinculação das elaborações metapsicológicas – particularmente das primeira e segunda sínteses – com os pressupostos paradigmáticos da modernidade, permite compreender as difi culdades enfrentadas por Freud na construção de sua obra teórica, difi culdades lenta e insufi cientemente resolvidas. Com efeito, organizar a metapsicologia no contexto desses pressupostos supunha procurar nestes subsídios para pensar aspectos

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do real (psiquismo inconsciente, vida emocional e sentido, modalidades intersubjetivas de conhecimento) excluídos e ignorados por esses mesmos pressupostos. Um exemplo importante desta limitação pode ser verifi cado nas difi culdades enfrentadas por Freud para pensar teoricamente a exis-tência do inconsciente. Os pressupostos paradigmáticos da modernidade, como se sabe, pensavam o homem conforme uma perspectiva dualista na qual o psiquismo, reduzido à consciência racional, se inseria num corpo pensado conforme a metáfora da máquina. No horizonte teórico possível dentro desta perspectiva não cabia, obviamente, o psiquismo inconsciente. Assim sendo, mesmo constatando sua ação na experiência clínica, Freud se absteve inicialmente de postular sua existência, contentando-se com referências a um “grupo psíquico cindido, corpo estranho dotado de efi cá-cia, do qual o doente nada sabe”(FREUD, BREUER, 1995, 1986, p.32). Por diversas vezes nos Estudos sobre a histeria Freud parece chegar ao limiar da formulação do conceito de inconsciente, mas outras tantas vezes recua. O “material inconsciente” apresentado por suas pacientes é considerado, mas não a idéia de um inconsciente sistemático.

Se obtém a enganosa impressão – escreve Freud – de uma inteligência superior que estaria fora da consciência do doente, manteria coeso, com determinados fi ns, um grande material psíquico e instauraria um ordena-mento pleno de sentido para seu retorno à consciência. (FREUD e BREUER, 1895, p.279 )

Finalmente a psicanálise se viu compelida a “tomar a sério o conceito de inconsciente” (FREUD, 1925, 1986, p.30), afi rmando, desde a publicação da A interpretação dos sonhos, não apenas sua existência, mas o fato de cons-tituir “o psiquismo genuíno”, acrescentando ainda que todo o psíquico é, em princípio, inconsciente, sendo que a qualidade da consciência poderia ser acrescentada ou faltar (FREUD, 1925, 1986, p.30). A afi rmação da prece-dência do inconsciente na vida psíquica é então afi rmada sem ambigüida-des. E, todavia, o peso dos pressupostos paradigmáticos se torna evidente no registro da formulação metapsicológica. Assim, na primeira tópica, o ponto de partida será a consciência, o inconsciente sendo originado pos-teriormente através da mediação do recalque primário. São conhecidos os impasses que esta formulação acarretou na obra freudiana, impasses que acabaram por impor a formulação da segunda tópica e, com ela, a postula-ção do Isso, pensado como inconsciente originário indissociável do corpo. As limitações impostas à teorização freudiana pelo peso dos pressupostos paradigmáticos da modernidade na elaboração metapsicológica se expri-mem também em outros importantes conceitos. Mencionarei aqui apenas

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o princípio de prazer, de forte inspiração fi sicalista, e – mais diretamente vinculado com nosso tema – a questão dos afetos inconscientes. Voltarei a ambos os temas posteriormente.

O “empréstimo” tomado por Freud de outras ciências não foi, como se vê, sem custos. As “ferramentas” teóricas tomadas de empréstimo in-troduziram na metapsicologia as características e limites que correspon-dem à sua origem. Forjados para lidar com a realidade material – única considerada pela modernidade hegemônica –, esses instrumentos teóricos demonstravam-se carentes de sutileza para lidar com aspectos da realidade que a matriz nas quais essas ferramentas foram construídas simplesmente ignorava.

Os afetos e os processos de conhecimentos

Os impasses impostos à elaboração da teoria psicanalítica pela ade-são de Freud aos pressupostos centrais do paradigma moderno foram progressivamente, porém também parcial e insufi cientemente, superados. Um dos aspectos centrais desse processo reside na decisiva incidência dos ensinamentos contidos na própria experiência sobre a concepção dos processos de conhecimento. Sendo a experiência clínica a matriz da pro-dução do saber elaborado pela psicanálise, e consistindo esta experiência numa relação intersubjetiva centralmente atravessada por fatores afetivos – resistência, transferência e contratransferência –, o papel da afetividade no próprio processo de produção de conhecimento torna-se fundamental. Freud não chegou a escrever o ensaio sobre as conseqüências epistemoló-gicas do inconsciente sobre o qual dissera em 1907 ter tido um vislumbre (FREUD-JUNG, 1976, p.112). Entretanto, sua progressiva compreensão da complexidade do psiquismo humano lhe permitiu adquirir uma rica com-preensão da complexidade das modalidades de apreensão da realidade, superando o reducionismo iluminista e aprofundando sua concepção, na verdade bastante inicial na sua obra, sobre “o saber dos poetas”. Em seus textos ditos “da virada”, nos quais formula sua terceira síntese epistemo-lógica, Freud abre amplo espaço para a especulação, por ele assimilada, na conhecida frase sobre “a bruxa epistemológica”, à intuição. Esta abordagem ilustra uma importante transformação da concepção da própria metapsi-cologia, menos atrelada aos pressupostos paradigmáticos da modernidade e mais próxima da experiência clínica e de suas modalidades de conhecer. Esta transformação atribui ao próprio inconsciente e à vida emocional uma importante participação nos processos de conhecimento da realidade psíquica.

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A questão dos afetos na metapsicologia freudiana

Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro 29Cad. Psicanál., CPRJ, Rio de Janeiro, ano 30, n.21, p.21-44, 2008

A intuição, entendida como percepção pelo inconsciente, caracteriza uma modalidade de apreensão do real diferente da organizada pela sepa-ração do sujeito de conhecimento em relação a seu objeto. Supõe, por parte do sujeito do conhecimento, uma atitude que, longe de estar centrada no movimento do ego orientado a ordenar e dominar o objeto, se posiciona numa atitude de acolhimento que na linguagem winnicott iana pode ser pensada como de não-integração6 e, na freudiana, pelo que Freud denomina “atenção fl utuante”. Nesta atitude, que Freud considera como correlativa à regra fundamental da análise, a associação livre, o analista:

Se abandona à sua própria atividade mental inconsciente, evitando no possível a refl exão e a formação de expectativas conscientes, não pretendendo registrar particularmente na sua memória nada do escutado. Assim, captu-raria o inconsciente do paciente com o seu próprio inconsciente. (FREUD, XVIII, p.235)

O processo intuitivo, contudo, não opera no vácuo. Ela emerge no contexto de uma experiência, fazendo com que a especulação – desdo-bramento da intuição – seja indissociável da observação. Freud insiste na importância desta relação, sublinhando que o recurso à especulação, da qual se livrara na elaboração de seus últimos textos, fora acompanhado permanentemente pela observação clínica (FREUD, 1925, 1986, 53, p.55). Embora enfatizado na última parte de sua obra, o papel da intuição nos processos de produção de conhecimento foi postulada por Freud já na primeira época de seu trabalho. Assim, em 1910, escreve:

Vejo que o senhor anda a encarar o trabalho como eu, deixando o caminho óbvio para seguir sua própria intuição. Este é a meu ver o procedimento mais correto; para o nosso próprio espanto, todas as voltas que damos revelam-se mais tarde absolutamente lógicas. (FREUD/JUNG, 1976, p.416)

Visando enfatizar a especifi cidade de sua perspectiva epistemológica, Freud insiste na sua Apresentação autobiográfi ca em diferenciar sua própria abordagem daquela da fi losofi a, da qual declara ter evitado se aproximar. Assim, mesmo reconhecendo as coincidências existentes entre seu pensa-mento e o de Schopenhauer – particularmente no que tange ao primado da afetividade – e o de Nietzsche, sublinha que suas próprias idéias foram produzidas com independência das idéias desses fi lósofos (FREUD, 1925, 1996, p.56). O objetivo de Freud nestes comentários é claramente o de rei-vindicar a especifi cidade de seu processo de conhecimento, sublinhando a estreita vinculação existente entre a intuição e a experiência. Como su-

6. Convém lembrar que esta atitude receptiva é, nessa perspectiva, condição da criação.

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gerido acima, este processo de conhecimento é inseparável da afetividade, da vida emocional. Para compreendê-lo convém distinguir, com Bergson, a emoção que é consecutiva a uma idéia ou a uma imagem representada, de outra que, não sendo determinada por uma representação, é grávida de representações, nenhuma delas propriamente formada. Assim, a emo-ção seria a causa destas, não seu efeito. Para o pensador francês é a emoção que deslancha a intuição, fornecendo a matéria-prima para a construção do conhecimento (BERGSON, 2000, p.40-41). Esta maneira de pensar não era desconhecida para Freud, que sublinhava a signifi cação da atividade que é capaz de “colher do turbilhão dos próprios sentimentos as intelecções mais profundas” (FREUD, 1930, 1986, p.128). Assim, a participação da emoção na apreensão do sentido é central: “sob as palavras e sob a frase – escreve Bergson – há algo mais simples que uma frase e mesmo que uma palavra: o sentido, que é menos uma coisa pensada que um movimento do pensamento, menos um movimento do que uma direção” (BERGSON, 1979, p.76). Esta perspectiva amplia enormemente o terreno no qual é pre-ciso pensar a problemática da signifi cação, obrigando a diferenciar entre sentido e signifi cado. Reservando este último termo para as criações da linguagem, o distingue do primeiro, com o qual é possível nomear as expe-riências “diretas e imediatas”, processadas por via puramente afetiva, para utilizar a expressão freudiana. É esta diferença que permite compreender que um recém-nascido, cuja capacidade de apreender os signifi cados con-tidos na linguagem é ainda inexistente, seja capaz de apreender o sentido da atitude materna, fazendo sentido para ele ser amado ou rejeitado, não sendo necessário para isso esperar que incorpore o signifi cado da palavra amor. A ignorância destas questões cruciais, indissociáveis da progressiva compreensão freudiana dos afetos e de suas modalidades de apreensão e transmissão, equivale, a meu ver, a manter a psicanálise atrelada aos limites impostos pelos pressupostos do paradigma da modernidade7. Reduzir toda apreensão de sentido à signifi cação criada e transmitida pela linguagem equivale a reduzir a capacidade humana de apreensão e doação de sentido à consciência. É este o limite no qual esbarrara Freud no contexto da primeira e da segunda síntese metapsicológica, limite cuja contradição com as descobertas realizadas pela própria psicanálise tornou-se evidente nos artigos de 1915, particularmente, no capítulo III do artigo O inconsciente. Os sentimentos possuem certamente um signifi cado e este é criado pela linguagem. Mas eles não são apenas uma criação da linguagem, um conceito. São, antes, uma emoção, e, enquanto tais, plenos

7. Discuto esta importante questão com mais detalhe em (PLASTINO, 2004).

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de sentido e dotados da capacidade de transmissão desse sentido. Não é a signifi cação da linguagem que dá o sentido do amor, por exemplo, embora a signifi cação linguageira seja importantíssima para a vivência da experi-ência amorosa em cada cultura8. Esta questão, na qual a problemática da afetividade se associa intimamente à de apreensão do sentido, é grávida de importantes conseqüências. Assim, por exemplo, postulando a existência da identifi cação primária como sendo uma apreensão direta e imediata do outro, processada por via “puramente afetiva”, Freud insere a questão da afetividade no cerne mesmo do processo de constituição da subjetividade, tema que voltarei a abordar posteriormente.

Impasses e reformulações

Foi assinalado acima que a subordinação das categorias metapsi-cológicas aos pressupostos do paradigma da modernidade limitaram a possibilidade de teorização, no registro metapsicológico, das descobertas operadas na prática clínica. E, ainda, que esta limitação, no contexto da primazia outorgada por Freud à experiência clínica na hierarquia epistemo-lógica da psicanálise, estabeleceu uma permanente tensão entre os registros clínico e metapsicológico, impulsionando uma atitude de reformulação da metapsicologia. As profundas mudanças operadas na terceira síntese metapsicológica com relação às duas primeiras são indissociáveis da pro-gressiva aceitação por Freud da participação do próprio inconsciente e dos fatores emocionais no processo de conhecimento. Convém ainda lembrar que essa ótica permitiu, na elaboração da terceira síntese, um maior grau de autonomia vis-à-vis dos pressupostos paradigmáticos da modernidade, embora este processo tenha fi cado, na obra freudiana, inconcluso. Este últi-mo aspecto, creio, obedece a diversos fatores, incluindo a resistência oposta por Freud a algumas das conseqüências de suas próprias descobertas. Um exemplo disto pode ser encontrado no texto no qual Freud formulou sua segunda tópica. Neste, após registrar a descoberta de que o ego pode ser também, no sentido genuíno, inconsciente, e ao propor-se “averiguar 8. Assinalo com este comentário minha diferença neste ponto com a posição teórica sustentada na bela

exposição de Eduardo Rosenthal na mesa redonda “As múltiplas faces de Eros” organizada pelo Círculo Psicanalítico no ciclo sobre os afetos, mesa redonda da qual participara também Ana Lila Lejarraga. No contexto de uma conversa sobre a questão, Eduardo teve a gentileza de sintetizar, no parágrafo que anexo a seguir, sua opinião sobre o tema. Agradeço sua colaboração à discussão que desenvolvo neste artigo.“O amor não preexiste a todo contexto lingüístico. Não é, tampouco, uma pura construção descritiva e normativa. Há certamente aspectos involuntários, irrefreáveis e irracionais do amor, mas que não constituem sua ‘essência’, como por exemplo, a dita paixão amorosa. No entanto, tais aspectos propriamente inomináveis operam como causa (Lacan) ou como problema (Foucault), ainda que inespecífi cos ou indeterminados, diante do que cada comunidade histórica produz discursos amorosos correspondentes.”

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mais sobre ele”, o criador da psicanálise afi rma serem conscientes todas as percepções externas operadas pelos sentidos e também as sensações internas de sensações e sentimentos (FREUD, 1923, 1986). Esta afi rmação não se harmoniza nem com a experiência clínica de Freud nem com os desenvolvimentos teóricos mais tardios, incluindo alguns tão importantes como os referidos à identifi cação primária ou ao sentimento de culpa. E não se trata de uma afi rmação superada por descobertas veiculadas em textos posteriores. A identifi cação primária foi postulada em 1921, antes portanto da redação de O ego e o Id. Também a existência de sentimento de culpa inconsciente era conhecida por Freud antes dessa data. Como último exemplo, pode-se lembrar ainda que no Além do princípio de prazer – isto é, três anos antes do texto comentado – Freud afi rmara a existência de traços mnémicos – freqüentemente os mais fortes e duradouros – originados em processos que nunca chegaram à consciência (FREUD, 1920, 1986, p.256). A afi rmação contida no texto comentado só pode ser entendida, então, como expressão da resistência freudiana a rever, no mais alto nível de abstração, categorias e conceitos postulados pelo paradigma moderno no qual ele fora formado. Embora esta disposição freudiana não tenha sido sem conseqüências para o posterior desenvolvimento da teoria psicanalí-tica, estas conseqüências foram limitadas pela inquebrantável decisão de Freud de outorgar à clínica a primazia no processo de construção teórica, e ainda por sua rejeição a transformar a teoria psicanalítica num sistema, preferindo suportar impasses e contradições (como no exemplo assinalado acima) a sacrifi car suas descobertas em prol de uma apresentação coerente e sem impasses.

A “virada teórica” operada a partir de 1920 foi precedida – na verdade tornada inevitável – por uma série de descobertas clínicas e de impasses teóricos expostos nos textos ditos metapsicológicos de 1914-1915. Foram esses impasses, aliás, que levaram Freud a considerar posteriormente que essa segunda síntese metapsicológica tinha sido prematura. Em conjunto, as referidas descobertas clínicas tornam evidente a insufi ciência da metáfora maquínica – que presidira até então as elaborações metapsicológicas – para pensar o psiquismo humano. Estas descobertas e constatações de impas-ses foram expostas e consideradas por Freud nos textos sobre Introdução do Narcisismo, Recordar, repetir e reelaborar, O Inconsciente e O recalque. Não disponho, neste artigo, de espaço para desenvolver as questões referidas a cada um desses textos, razão pela qual me limitarei a algumas considerações sobre o artigo Recordar, repetir e reelaborar e a rápidos comentários sobre o artigo Para introduzir o narcisismo e sobre o capítulo III do artigo sobe O

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inconsciente. É importante ainda salientar que as novas descobertas clínicas e a constatação de impasses teóricos que elas acarretaram deslancharam na refl exão freudiana um profundo processo de reformulação, cuja caracterís-tica fundamental é a solidariedade existente entre os diferentes registros da metapsicologia. No conjunto, esses textos complementam a perspectiva da descrição dos processos psíquicos (até então dominante) com a perspectiva do agente desses processos.

O processo de afastamento da metáfora maquínica foi longo, sinuoso, incompleto e não isento de contradições. Sua direção, contudo, é clara. Ela indica, no que tange aos afetos, um caminho que vai dos estreitos limites da abordagem quantitativa, à posição teórica assumida quando da formu-lação da segunda teoria pulsional, na qual é afi rmado, sem ambigüidades, o primado da afetividade e a existência de qualidade na pulsão (FREUD, 1923, 1986, p.45) (FREUD, 1930, 1986, p.114). A dimensão da transformação operada pode ser avaliada lembrando que, ainda nesse texto de 1926, Freud confessara – após mais de quatro décadas de trabalho clínico e teórico – não saber o que são os afetos. Apontando para uma problemática vizinha a essa, ele escrevera, já em 1920, não contar com nenhum fundamento, nem fi losófi co nem psicológico, capaz de indicar o signifi cado das sensações de prazer ou de desprazer (FREUD, 1920, 1986), acrescentando pouco depois que “prazer e desprazer não podem ser referidos ao aumento ou diminuição de uma quantidade, parecendo depender de um fator qualitativo” (FREUD, 1924, 1986, p.166). Com essas declarações, creio, Freud assume com clareza a insufi ciência da concepção elaborada desde o início de sua obra sobre a dinâmica psíquica e sobre os processos afetivos.

Esta insufi ciência, convém lembrar, deriva da adoção, na tentativa de compreensão dos fenômenos detectados na clínica, de um instrumental fi sicalista9. Esta orientação é incorporada pelo criador da psicanálise no trabalho que escreve em 1896 para complementar sua discussão sobre as psiconeurose de defesa (FREUD, 1895, 1986), discussão iniciada dois anos antes. Nas funções psíquicas, escreve no fi nal desse trabalho:

Convém distinguir algo – montante de afeto, soma de excitação- que possui todas as propriedades de uma quantidade (...) algo que é suscetível de aumento, diminuição, deslocamento e descarga e se difunde pelos traços mnémicos das representações como o faria uma carga elétrica sobre a super-fície do corpo (FREUD, 1896, ..., p.61).

9. Entende-se por fi sicalismo a posição que sustenta ser a linguagem da física obrigatória para qualquer produção científi ca. O fi sicalismo inspira claramente o acima mencionado “Juramento de Berlim”, assumido pelos mestres de Freud.

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O foco é posto então na quantidade, em um todo de acordo com a perspectiva da modernidade. Montante de afeto ou soma de excitação são expressões utilizadas de maneira pouco rigorosa por Freud nesta época. Às vezes – como no parágrafo citado –, ambos os termos são utiliza-dos como sinônimos. Em outros textos, “montante de afeto” é empregado como equivalente a “sentimentos” ou ainda “emoções”, enquanto o termo “excitações” é empregado para referir-se seja a “quantidades”, seja a “in-tensidades psíquicas”. Num período bem posterior, tendo já elaborado o conceito de pulsão – do qual esses termos são precursores – ao analisar o que denomina “agente representante da pulsão”, Freud diferencia dois elementos, sendo um a representação e o outro a energia pulsional que a investe, denominada por ele de “montante de afeto” ou ainda “fator quan-titativo” (FREUD, 1915, 1986). Nesta época ainda, ou seja, no período de formulação da segunda síntese metapsicológica, Freud afi rma que “afetos e sentimentos correspondem a processos de descarga cujas exteriorizações últimas se percebem como sensações” (FREUD, 1915, 1986). Nas duas pri-meiras sínteses metapsicológicas, portanto, Freud adota uma concepção puramente quantitativa dos afetos. Esta expressão designa o que na clínica e na vida é percebido como emoções e sentimentos, mas que no nível da “ciência” só pode ser tratado como uma quantidade. Mantém-se assim fi el à perspectiva paradigmática da modernidade, para a qual tudo o que se refere ao corpo e à natureza devia ser tratado conforme o modelo da máquina, com total esvaziamento da problemática do sentido. Este, como se sabe, era considerado atributo exclusivo da cultura, indissociável da consciência (e nesta época para Freud, de representações que, tendo sido consciente, foram recalcadas).

Nos parágrafos que precedem aproximei diversas vezes o conceito de pulsão do de “emoções” e “ sentimentos”. Acompanhei, ao fazê-lo, a própria escrita freudiana que, em diversos momentos, indica essa assimilação. No Além do princípio de prazer, por exemplo, ao afi rmar que as expressões da compulsão à repetição mostram em alto grau um caráter pulsional, utili-za o termo alemão triebhaft , que segundo James Strachey, seu tradutor ao inglês, “traduz o impulsivo, apaixonado, irrefl exivo, o oposto à conduta racional e esclarecida” (FREUD, 1920, 1986, p.35, nota 2). A substituição das “pulsões elementares” (eros e pulsão de morte) pela polaridade amor é ódio, como Freud faz no O ego e o Id (FREUD, 1923, 1986, p.43) apontam também no sentido dessa aproximação. Esta substituição se tornou possí-vel após a formulação da segunda tópica, exemplifi cando o que indiquei acima ao falar da solidariedade entre todos os registros da metapsicologia.

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Com efeito, ao introduzir na segunda tópica o Id, Freud incorpora na sua concepção do psiquismo uma instância originária, indissociável do corpo e capaz de vivências emocionais. Desse Id, Freud escreverá, citando Groddeck e Nietzche, que “responde a uma necessidade da natureza, do nosso ser” (FREUD, 1923, 1986, p.25, nota 12). Este ponto, creio, é muito importante, pois se o termo pulsão designa também a dinâmica emocional, isto signifi ca que na última formulação freudiana as emoções se inserem no nosso ser natural, não tendo apenas um signifi cado criado pela cultura. Ao referir-se a “uma necessidade da natureza, do nosso ser”, Freud está exprimindo uma concepção da natureza alheia à metáfora da máquina, metáfora esta que, na primeira parte de sua obra, presidiu sua compreensão dos afetos e das pulsões exclusivamente no seu aspecto quantitativo. Postulando a existência da “ambivalência afetiva originária”, Freud mostra, sem ambi-güidades, que, para ele, amor e ódio são emoções que têm sua origem na natureza. Assim, em 1930, em O mal-estar na cultura, referindo-se à dita ambivalência, escrevera que ela constitui “um bloco de natureza na nossa constituição psíquica” (FREUD, 1930, 1986). Convém ainda registrar que ao reafi rmar explicitamente a existência de qualidade na pulsão (FREUD, 1923, 1986, p.45) e ainda assimilando a segunda teoria pulsional às emoções de amor e ódio, a escrita freudiana desautoriza a perspectiva na qual sua segunda teoria pulsional possa ser lida como postulando um impacto de intensidade (pulsão de morte) tendo apenas uma função disruptiva. Esta leitura supõe manter a teoria freudiana atrelada aos limites do paradigma moderno, inclusive naqueles importantes aspectos onde dita teoria ultra-passou esses limites10.

O ponto de chegada do processo de reelaboração empreendido por Freud foi, então, a substituição de uma perspectiva puramente quantitativa da pulsão pela consideração de suas diversas qualidades e, ainda, a aproxi-mação entre o conceito de pulsão e as emoções. No percurso, entretanto, foi preciso ultrapassar diversos impasses, como o registrado por Freud no texto O Inconsciente (FREUD, 1915, 1986c). Neste texto, discutindo no capítulo III os sentimentos inconscientes, Freud se depara com sérios impasses. Postula inicialmente que para que um sentimento seja sentido é necessário que a consciência tenha notícias dele, não existindo então a possibilidade de existirem sentimentos inconscientes (FREUD, 1915, 1986, p.173). Lembra a seguir que, na prática psicanalítica, é comum falar de amor, ódio e fúria

10. Em outros aspectos os pressupostos do paradigma moderno continuam a infl uenciar a elaboração teórica freudiana até o fi nal de sua obra. É o caso do determinismo e do essencialismo que sustentam sua segunda teoria das pulsões.

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inconscientes e também de sentimento inconsciente de culpa. Para superar esta contradição lança mão de sua concepção inicial sobre o mecanismo do recalque, segundo a qual este operaria pela separação da representa-ção do afeto, lembrando que, se a sufocação do afeto é o objetivo genuíno do recalque, é apenas a representação que é recalcada, enquanto o afeto é transformado em angústia ou deslocado para outra representação. Não existiriam, então, afetos inconscientes “como formação real” – como é o caso das representações que subsistem no inconsciente –, mas apenas como “possibilidade de desenvolvimento”. A diferença, escreve, reside em que as representações são traços mnémicos – e os sentimentos correspondem a processos de descarga. Após mobilizar todas estas antigas ferramentas teóricas, Freud concluiria a análise da questão afi rmando que “no estado atual nosso conhecimento dos afetos e sentimentos” não pode exprimir com maior clareza essa diferença (FREUD, 1915c-1986, p.174/175).

Aspectos da terceira síntese metapsicológica

Os impasses percebidos por Freud em seus textos de 1915 o levaram mais tarde a concluir ter sido sua segunda síntese metapsicológica uma tentativa prematura. Na seqüência de sua produção teórica empreendera um profundo trabalho de reformulação, construindo a concepção que veio a ser denominada a “virada dos anos XX”. Um ponto importante neste processo foi a tematização do investimento libidinal no próprio ego, que Freud elabora no seu artigo Introdução do narcisismo. Não apenas porque desloca o foco do registro dos mecanismos – no qual privilegiara a pers-pectiva quantitativa – para o registro do sujeito que sente, no qual se im-porá a perspectiva qualitativa. Ainda porque, embora Freud nunca tenha modifi cado a perspectiva moderna que supõe o indivíduo como anterior à sociedade11, ao postular, no texto comentado, que a passagem do auto-erotismo para o narcisismo supõe “uma nova ação psíquica”, introduz a questão da participação afetiva do outro na constituição do narcisismo.

Outro momento teórico importante que prepara e impõe a “virada dos anos XX” foi a elaboração do conceito de “compulsão à repetição”. A partir dele Freud foi obrigado a questionar a hipótese segundo a qual o processo de prazer regularia automaticamente os processos psíquicos. A constatação da existência da compulsão à repetição foi feita na experiência

11. Esta é uma questão fundamental que não cabe discutir aqui. Lembrarei apenas que o pano de fundo da obra freudiana sobre esta questão supõe uma relação confl itiva entre o indivíduo e a sociedade, fazendo indispensável a repressão como condição da existência da sociedade. Embora não tenha sido tematizado explicitamente por Freud, nesta ótica a castração foi pensada por parte da teoria pós-freudiana como o processo constitutivo da subjetividade.

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clínica e mereceu, por parte de Freud, uma primeira e importante elabora-ção teórica que, mais do que exprimir uma nova descoberta, lançava um novo olhar sobre um fenômeno já conhecido, oferecendo a partir disso uma “concepção mais unifi cadora” (FREUD, 1914, 1986, p.143). Destronando a vigência irrestrita do princípio de prazer, a constatação da “compulsão de repetição” levou Freud a orientar sua procura no sentido de aprofundar o conhecimento da ação da afetividade nos processos psíquicos. E o fez por dois caminhos diferentes. No texto de 1914 discutirá a evolução da técnica psicanalítica, salientando a decisiva participação dos fenômenos transferenciais no processo analítico. Por outro lado, poucos anos depois, no texto que inicia a série de trabalhos que integram sua virada teórica, introduz a segunda teoria pulsional, indissociável do que denominará “ambivalência afetiva originária”. No texto de 1914 aparece, pela primeira vez na obra freudiana, o conceito de “reelaboração”. Isto é importante, não apenas porque assinala uma importante mudança na técnica, mas também porque modifi ca radicalmente a compreensão dos fatores que intervêm nos processo de cura, reconhecendo a participação central dos fatores emocionais. Passando revista às sucessivas mudanças técnicas pe-las quais passara a prática psicanalítica, Freud conclui que a interpretação das resistências não operava, por si só, o levantamento do recalque, nem permitia ao paciente o acesso às lembranças esquecidas. O paciente não lembra, registra Freud, ela atua , transferindo sobre o analista e sobre outras circunstâncias de sua vida presente, as emoções vivenciadas no passado esquecido. O processo analítico exige então um lento processo, que inclui a atividade interpretativa, mas que tem como peça central fatores da ordem da afetividade, vivenciados uma e outra vez na repetição transferencial. Neste processo, escreve Freud, a condição patológica vai entrando peça após peça no âmbito do tratamento, transformando a neurose ordinária em neurose de transferência. O principal recurso para dominar a compulsão de repetição, continua Freud, é o manejo da transferência, isto é, da atua-lização, pela transferência sobre o analista, das emoções outrora vivencia-das pelo paciente. A primazia dos fatores afetivos no processo de cura, é salientado por Freud sem ambigüidades ao comparar o processo descrito com a “abreação” do “montante de afeto” estrangulado pela repressão, abreação que constituía o objetivo procurado no início da prática freudiana (FREUD, 1914, 1986, p.157). Com esta aproximação, Freud confi rma uma conclusão por ele exposta no seu anterior artigo sobre técnica psicanalítica. Nesse artigo, ao referir-se à magnitude de afeto necessária para superar as resistências do paciente, afi rma que essa magnitude afetiva é produzida

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pela energia criada na relação transferencial (FREUD, 1913, 1986, p.143). O que está em jogo no tratamento não é, pois, um processo intelectual, mas uma transformação da vivência emocional do paciente.

A linha de refl exão empreendida por Freud no Além do princípio de prazer segue por outro caminho, mas acaba convergindo com a orientação mais geral do movimento teórico de Freud neste último período de sua produção. Esta orientação, que se exprime em diversas construções teóricas, tem como eixo o que o próprio Freud denominou o primado da afetivi-dade, isto é, o reconhecimento da centralidade da vida emocional para a compreensão dos processos psíquicos. Entretanto, embora motivada pela intenção de pensar teoricamente o impasse provocado pela conceitualiza-ção da “compulsão à repetição”, a refl exão construída no Além do princípio de prazer se desenvolve mais afastada da clínica, permanecendo, por isso mesmo, subordinada em maior grau aos pressupostos do paradigma mo-derno, mais especifi camente à perspectiva quantitativista. Com efeito, como foi assinalado acima, Freud atribuiu desde cedo ao princípio de prazer a regulação automática dos processos psíquicos. A conceitualização da “com-pulsão à repetição” derrubara esta crença. Não apenas porque mostrava a existência de processos psíquicos não regulados por aquele princípio, mas porque tornava evidente que este constituía uma simplifi cação incapaz de dar conta da complexidade dos processos psíquicos. Tornava evidente, em outras palavras, que o mecanismo de carga/descarga era inteiramente inadequado para pensar essa complexidade. Na “compulsão à repetição”, essa inadequação apenas salta aos olhos. Em outras palavras, ela mostra não apenas que o princípio de prazer não é de aplicação universal, mas constitui uma perspectiva reducionista incapaz de apreender o que realmente inte-ressa conhecer na dinâmica psíquica: a qualidade, as emoções, o sentido, isto é, o que na experiência clínica se revela central. Freud certamente não refl etiu nestes termos e, possivelmente, não concordaria, mas creio que é o que se desprende da evolução de seu próprio pensamento.

O movimento teórico de Freud para pensar a questão posta pela “compulsão à repetição” começa por postular a hegemonia inicial da pulsão de morte na dinâmica psíquica. Seria ela a responsável pela compulsão. Coloca-se, a seguir, outra questão: qual é o processo através do qual a pulsão de morte é neutralizada, a permanência da vida se torna possível e o princípio de prazer conquista seu papel de regulador automático dos processos psíquicos? Esta é a questão da ligação, problemática que neste momento da teoria Freud aplica à pulsão de morte. Digo neste momento da teoria porque, em momentos anteriores, a problemática da ligação fora

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pensada por Freud com relação a outras duas perspectivas. Primeiro no contexto do par de opostos “princípio de prazer/princípio de realidade”. Nesse caso o operador da ligação seria a consideração das exigências da realidade externa, impondo um adiamento da descarga imediata. Depois, no par processo primário/processo secundário, no qual a ligação é operada pela introdução da linguagem como código, com suas exigências lógicas. Esta segunda linha de aplicação constituiu o pano de fundo da refl exão freudiana em torno do que ele próprio criticou depois como “excessiva intelectualização” da psicanálise, como foi discutido acima. Estes dois casos e também o terceiro, no qual a ligação se refere à pulsão de morte, constituem a aplicação do que Freud denominou sua “hipótese mais geral”, hipótese esta que postula a existência na vida psíquica de duas modalidades de energia, uma livre e orientada diretamente à descarga e a outra ligada. Esta “hipótese mais geral” tinha sido formulada por Breuer, parceiro de Freud nos Estudos sobre a histeria (FREUD, BREUER, 1995, 1986, p.205) e adotada por Freud na seqüência de seu trabalho teórico12.

Postular que a ligação da pulsão de morte operada por Eros permite o estabelecimento da hegemonia do “princípio e prazer” signifi ca atribuir a este princípio o papel de guardião da vida psíquica. Freud percebe, con-tudo, que este raciocínio é insustentável, na medida que tanto o princípio de prazer quanto a pulsão de morte procuram a anulação das tensões, a eliminação da agitação da vida. Vê-se então obrigado a concluir que ao invés de ser o guardião da vida psíquica, o princípio de prazer é súdito da pul-são de morte (FREUD, 1920, 1986, p.61). Esta é uma questão fundamental. Creio que ela revela uma importante inconsistência na linha inicial de seu pensamento teórico. Trata-se da dupla – e potencialmente contraditória – acepção do termo prazer. Este termo designa, com efeito, tanto o processo de descarga de quantidades de excitação, processo através do qual Freud – inspirado na sua experiência com as neuroses atuais13 – tentou pensar a dinâmica psíquica, quanto a experiência mesma da vida, ou seja o prazer no sentido do uso lingüístico corriqueiro. Esta dupla acepção do termo 12. Ao centrar sua atenção no terceiro caso, isto é, no da ligação da pulsão de morte, Freud introduz a

questão de Eros e, com ela, tematiza uma questão fundamental: a signifi cação para a compreensão do psiquismo e a construção teórica da psicanálise, de modalidades de conhecimento alheios à ciência, neste caso específi co o mito (FREUD, 1920, 1986, p.55/56). Esta importantíssima questão, referida à epistemologia da psicanálise, não tem recebido, creio, a atenção que merece por parte de boa parte do pensamento psicanalítico.

13. Como é sabido, das duas modalidades inicialmente distinguidas por Freud, as neuroses atuais e as neuroses de transferência, é sobre as segundas que se centrará a refl exão freudiana. O que não impediu que Freud continua-se a universalizar um critério que lhe fora inspirado pela especifi cidade que sua compreensão inicial outorgara às neuroses atuais: uma etiologia entendida como acumulo não descarregado de tensão sexual.

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prazer, e os deslizamentos que Freud opera de um ao outro, estão na base, creio, dos impasses teóricos enfrentados por Freud. Com efeito, a dinâmica psíquica, na dimensão que interessa à psicanálise, é presidida pela questão da qualidade e do sentido. Desde o início, Freud percebeu que eram ques-tões dessa ordem que operavam a emergência do processo de recalque. O deslizamento desta acepção ligada ao uso lingüístico do termo prazer para a acepção que lhe outorga a metapsicologia, se transformou numa falha na consistência da refl exão freudiana. No primeiro caso, o prazer e o desprazer estão referidos ao sentido outorgado a determinada qualidade do processo, no segundo caso, a questão é pensada apenas em termo de acúmulo ou descarga de quantidades de excitação. O deslizamento semân-tico assinalado atende à exigência “científi ca” de substituir a perspectiva da qualidade pela da quantidade, mas o resultado é que a construção teórica deixa escapar o que realmente interessa. É o velho problema enfrentado por Freud ao tentar o fracassado Projeto de uma psicologia para neurologistas. Esta inconsistência não escapou a Freud, que encerra o Além do princípio de prazer reconhecendo que o caminho empreendido pode não ser o melhor para pensar o desafi o trazido pela conceitualização da “compulsão à re-petição” (FREUD, 1920, 1986, p.55), declarando não estar convencido com as hipóteses desenvolvidas (FREUD, 1920, 1986, p.57) e alertando sobre a necessidade de se estar preparado para abandonar um caminho que se seguiu por algum tempo (FREUD, 1920, 1986, p.62).

A questão foi retomada por Freud no artigo sobre Problemas econômicos do masoquismo, publicado um ano após da formulação da segunda tópica. Nele, Freud desfaz a assimilação entre o princípio de prazer e a pulsão de morte. O estabelecimento da vigência do princípio e prazer, pensa agora, é conseqüência da neutralização da pulsão de morte pela ligação operada por Eros. O princípio de prazer recupera assim o título de “guardião da vida psíquica”, ou mesmo da vida em geral, escreve Freud (FREUD, 1924, 1986, p.165). É importante assinalar que nesta reabilitação do princípio de prazer a acepção do termo prazer utilizada por Freud é a que é dada pelo uso lingüístico corriqueiro. Ou seja, Freud produziu um novo deslizamento lingüístico, mas agora no sentido contrário àquele que detonara a crise teórica. Com isto, contudo, não supera a inconsistência teórica assinalada acima. Apenas a dribla, operando o deslizamento semântico. O raciocínio desenvolvido no Além do princípio de prazer, que o levara a assimilar este princípio com a pulsão de morte, continua sendo sustentável ao interior da lógica quantitativista de carga/descarga, lógica que constitui desde o início de sua obra o fulcro da concepção do princípio de prazer. Freud o

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percebe, afi rmando que é preciso referir prazer e desprazer não mais ape-nas a processos de carga e descarga, mas a fatores “que só pode qualifi car como qualitativos” (FREUD, 1920, 1986, p.166)14.

De todo esse processo teórico descrito emerge o que Freud denominou “o primado da afetividade” na concepção do processo psíquico e na cons-tituição da subjetividade. Na postulação desse primado faz parte ainda a inversão da teoria sobre a angústia, à qual Freud passa a atribuir a gênese do processo do recalque. Assim fazendo, retira o protagonismo do registro econômico, alusivo a força, quantidade e intensidade. A origem da angús-tia não requer explicação econômica, escreve Freud no Inibição, sintoma e angústia (FREUD, 1926, 1986, p.89). Ela é reproduzida como estado afetivo seguindo imagens mnêmicas originadas por vivências anteriores. Esta afi rmação é fundamental, e em um todo coerente com o processo teórico acima resenhado. À luz desta perspectiva, não parece pertinente atribuir ao registro econômico a primazia no último período da teorização freudiana, ainda menos quando essa pretensa primazia relega a signifi cação do psi-quismo inconsciente (registro tópico) e de Eros (registro dinâmico), registros estes enfatizados por Freud na última parte de sua obra. Postulando nesta última parte de sua obra o primado da afetividade, Freud integra na sua metapsicologia a signifi cação das emoções na vida psíquica, aproximando fi nalmente sua teorização metapsicológica da sua compreensão dos pro-cessos psíquicos tal como eles apareciam na experiência clínica. Reconhece assim a inadequação da abordagem quantitativa para compreender a vida psíquica, e ainda a insufi ciência das informações brindadas pela “ciência estrita”. Recorre, em conseqüência, a conhecimentos produzidos em outros campos do saber (mitologia) para integrar na sua perspectiva o fundamental papel de Eros. Assim, também no terreno epistemológico a participação da afetividade é reconhecida.

O papel central da afetividade se exprime também no campo da clí-nica, tornando-se a peça central do processo de cura através da vivência da relação transferencial. Aos afetos é também atribuído um papel crucial na emergência da subjetividade através da compreensão do processo de identifi cação primária. Convém atentar para o fato de que, criando este conceito, Freud aponta para uma compreensão da subjetividade que emerge na intersubjetividade. Neste último ponto, todavia, assim como naquele

14. Postulado o papel de Eros na preservação da vida, Freud se propõe compreender o processo através do qual a pulsão de vida liga a pulsão de morte. Nesse intuito, refl ete sobre a importantíssima questão da fusão e desfusão pulsional. Lamentavelmente não disponho de espaço para desenvolver esta problemática, posteriormente tão enriquecida por Winnicott na sua análise dos processos de relacionamento entre a motilidade e o erotismo.

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que se refere ao papel de Eros na afi rmação da vida, o pensamento de Freud parece ter atingido seus limites. Com efeito, ao pensar o papel de Eros, Freud não supera a perspectiva determinista da modernidade, atrelando a vida e a criatividade humana à eternização do confl ito com a pulsão de morte.

O potencial de transformação teórica contido na afi rmação do primado da afetividade é imenso, porque ele muda de raiz a concepção antropológica em torno do qual se organiza o paradigma moderno. Entretanto, o desen-volvimento desse potencial requer articular a compreensão da afetividade com uma concepção da subjetividade que, afastando o pressuposto de um narcisismo primário, aprofunde as conseqüências do caráter constitutivo da intersubjetividade. Freud avançou pouco nessa articulação. É verdade que reconheceu a existência da identifi cação primária e com ela da origem intersubjetiva da subjetividade. Mas apesar de sua gigantesca signifi cação, esse reconhecimento aparece na obra freudiana mais como uma intuição genial do que como uma descoberta cuja centralidade exige o remanejamen-to de aspectos fundamentais da teoria. O pano de fundo do pensamento de Freud sobre a origem da subjetividade continuará sendo a concepção individualista da modernidade, num cenário de relações confl itantes com a sociedade. É verdade também que diversas afi rmações freudianas, por vezes modifi cando posições teóricas precedentes, apontam no sentido da superação desse cenário. Exemplo disso é a consideração do Isso como expressão de uma necessidade do ser humano, de sua natureza, fazendo dele a sede inicial da libido e do outro o objeto de seus primeiros investi-mentos. Freud aponta, assim, para uma dinâmica na qual o investimento da libido no próprio ego é considerado como secundário (narcisismo se-cundário). Não avança todavia, nesse sentido, nem no de reconhecer, ao lado das exigências pulsionais, a existência de necessidades psíquicas cujo atendimento é condição para a constituição da subjetividade e exige a par-ticipação fundamental do outro. Esses caminhos foram aprofundados pela teoria pós-freudiana. Mas a discussão disso foge à proposta deste artigo.

Carlos Alberto PlastinoAvenida Lineu de Paula Machado, 117/301Jardim Botânico – Rio de Janeiro – RJ CEP: 22470-040E-mail: [email protected]

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