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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL FLÁVIO DE PAULA A PRÁTICA DE REESCRITA NA ESCOLA: A PRODUÇÃO DE TEXTO COMO PROCESSO DISCURSIVO DOURADOS 2013

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Page 1: A PRÁTICA DE REESCRITA NA ESCOLA A PRODUÇÃO DE TEXTO COMO PROCESSO DISCURSIVO. TCC. FLÁVIO DE PAULA. 2013

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL

FLÁVIO DE PAULA

A PRÁTICA DE REESCRITA NA ESCOLA: A PRODUÇÃO DE TEXTO

COMO PROCESSO DISCURSIVO

DOURADOS

2013

Page 2: A PRÁTICA DE REESCRITA NA ESCOLA A PRODUÇÃO DE TEXTO COMO PROCESSO DISCURSIVO. TCC. FLÁVIO DE PAULA. 2013

FLÁVIO DE PAULA

A PRÁTICA DE REESCRITA NA ESCOLA: A PRODUÇÃO DE TEXTO

COMO PROCESSO DISCURSIVO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao

Curso de Letras-Habilitação Português/Espanhol da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul -

Unidade de Dourados (UEMS), como requisito

parcial para obtenção do grau de Licenciado em

Letras.

Orientadora Profª. Dra. Silvane Aparecida de

Freitas.

DOURADOS

2013

Page 3: A PRÁTICA DE REESCRITA NA ESCOLA A PRODUÇÃO DE TEXTO COMO PROCESSO DISCURSIVO. TCC. FLÁVIO DE PAULA. 2013

P347p Paula, Flávio de

A prática de reescrita na escola e o texto como processo

discursivo/Flávio de Paula. Dourados,MS: UEMS, 2013.

44p. ; 30cm.

Monografia (Graduação) – Letras/Espanhol – UEMS,

2013.

Orientadora: Profª. Drª. Silvane A. de Freitas Martins.

1.Textos na escola.I. Título.

CDD 20.ed. 372.607

Page 4: A PRÁTICA DE REESCRITA NA ESCOLA A PRODUÇÃO DE TEXTO COMO PROCESSO DISCURSIVO. TCC. FLÁVIO DE PAULA. 2013

FLÁVIO DE PAULA

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL

CURSO DE LETRAS HABILITAÇÃO PORTUGUÊS/ ESPANHOL

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

A PRÁTICA DE REESCRITA NA ESCOLA: A PRODUÇÃO DE TEXTO

COMO PROCESSO DISCURSIVO

APROVADO EM : ___________/ ___________/ 2013

________________________________________________________

Orientador: Profª. Dra. Silvane A. de Freitas

UEMS/ Dourados

____________________________ ______________________________

Profª. MSc. Elma Corrêa Scarabelli Profª. Marlucia Francisca de Oliveira

UEMS/DOURADOS UEMS/DOURADOS

Page 5: A PRÁTICA DE REESCRITA NA ESCOLA A PRODUÇÃO DE TEXTO COMO PROCESSO DISCURSIVO. TCC. FLÁVIO DE PAULA. 2013

À minha mãe Conceição Bazílio de Paula e ao meu pai Valdecir Ortiz

de Paula pelo apoio incondicional...

Page 6: A PRÁTICA DE REESCRITA NA ESCOLA A PRODUÇÃO DE TEXTO COMO PROCESSO DISCURSIVO. TCC. FLÁVIO DE PAULA. 2013

Minha total e sincera gratidão, primeiramente, a Deus pela força e

iluminação; aos meus pais que compreenderam meus isolamentos,

minhas noites em claro; aos meus amigos da faculdade e de fora dela

que de uma forma ou de outra foram essenciais na minha caminhada

até aqui; à minha orientadora Silvane A. de Freitas que aceitou

pacientemente a me mostrar caminhos...

Page 7: A PRÁTICA DE REESCRITA NA ESCOLA A PRODUÇÃO DE TEXTO COMO PROCESSO DISCURSIVO. TCC. FLÁVIO DE PAULA. 2013

RESUMO

Este trabalho foi constituído com o objetivo de entender como a concepção de linguagem

vista como processo enunciativo-discursivo pode contribuir para um ensino mais significativo

de língua portuguesa; buscou-se ainda verificar a validade da prática de reescrita nas aulas de

leitura e produção de texto na escola conciliando, assim, teoria e prática, compreendendo

também a construção textual como processo. Utilizamos como embasamento teórico os

Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa e estudos feitos por Geraldi (1996)

(1997) (2006), Travaglia 2003, Antunes (2003), Bakhtin (2003) entre outros, buscando seguir

o entendimento de língua e linguagem como discursivas e históricas. Para o corpus da

pesquisa foram selecionados dois textos dentre trinta produções elaboradas por alunos de uma

turma de 9º ano da Escola Estadual João Paulo dos Reis Veloso, na cidade de Dourados – MS,

a partir de uma proposta de artigo de opinião que aplicamos à turma enquanto bolsistas do

PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência). Pudemos constatar que

mediante a reescrita textual é possível que o aluno passe a refletir sobre o próprio texto,

considerando os aspectos linguísticos e discursivos que possibilitam melhor dizer o que se

tem a dizer; isso se constata nas mudanças consideráveis presentes entre uma versão e outra

do texto. Desse modo, esta pesquisa pode contribuir na reflexão sobre como fazer um ensino

de língua portuguesa que cumpra com o papel de formar alunos cidadãos capazes de produzir

textos orais e escritos adequados ao campo social em que estão inseridos.

Palavras-chave: ensino de língua portuguesa; produção de texto; reescrita de texto;

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RESUMEN

Este trabajo se realizó con el intento de entender como la concepción acerca del lenguaje

como proceso enunciativo-discursivo contribuye para una enseñanza más significativa de

lengua portuguesa; se buscó aún verificar la pertinencia de la práctica de reescribir textos en

las clases de lectura y producción de textos en la escuela reanudando, así, teoría y práctica,

comprendiendo también la construcción textual como proceso. Para ello utilizamos como

aporte teórico los Parámetros Curriculares Nacionales de Lengua Portuguesa y estudios

realizados por Geraldi (1996) (1997) (2006), Travaglia 2003, Antunes (2003), Bakhtin (2003)

entre otros, buscando seguir el entendimiento de lengua y lenguaje como discursivos e

históricos. Los objetos de pesquisa fueron dos textos elegidos entre treinta producciones

elaboradas por alumnos del 9º año de la Escuela Estadual João Paulo dos Reis Veloso,

ubicada en Dourados – MS, a partir de una propuesta de escribir artículo do opinión que

hicimos a esos alumnos, mientras actuábamos como becarios del PIBID (Programa

Institucional de Beca de Iniciación a la Docencia). Percibimos que al reescribir el texto el

alumno puede reflexionar sobre su propio texto, llevando en cuenta los aspectos lingüísticos y

discursivos que posibilitan mejor decir lo que tiene para decir; ello se percibe en los cambios

presentes entre una versión y otra del texto. Esta investigación puede contribuir en la reflexión

sobre cómo hacer una enseñanza de lengua portuguesa que cumpla con el papel de formar

alumnos ciudadanos capaces de producir textos orales y escritos adecuados al ámbito social

en que están inseridos.

Palabras clave: enseñanza de lengua portuguesa; producción de texto; reescrita de texto.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 10

1. ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA SOB UMA ÓTICA ENUNCIATIVO-

DISCURSIVA 13

1.1 O que se pretende com a disciplina de língua portuguesa na escola? 14

1.2 A concepção de linguagem determina o modo como se ensina 16

2. O TEXTO COMO UNIDADE BÁSICA PARA O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

(LÍNGUA PORTUGUESA) 20

2.1 A produção escrita na escola: o texto como processo 22

3. A PRÁTICA DE REESCRITA: O TEXTO ‘EM’ PROCESSO 26

3.1 Análise do Corpus 26

3.1.1 Primeira versão do texto do Aluno 1 28

3.1.2 Segunda versão do texto do Aluno 1 29

3.1.3 Primeira versão do texto do Aluno 2 31

3.1.4 Segunda versão do texto do Aluno 2 32

CONSIDERAÇÕES FINAIS 34

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 36

ANEXOS 38

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INTRODUÇÃO

O ensino de Língua Portuguesa tem passado por mudanças estruturais e teóricas. Na

atualidade, os estudos realizados nas áreas de Linguística, Sociolinguística, Linguística

Textual, Análise do Discurso e outras áreas tem sido importantes para a mudança de rumo nas

práticas de ensino.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais orientam um ensino de Língua Portuguesa

voltado para o estudo do texto, numa perspectiva discursiva e interdisciplinar. O

desenvolvimento da competência linguístico-discursiva do aluno passa a ser motivo basilar

para o trabalho em sala de aula, uma vez que a escola busca prepará-lo para atuar na

sociedade de modo que ele saiba se posicionar como sujeito e possa adequar sua linguagem

conforme a situação a que é exposto. Essa adequação da linguagem/discurso se dá mediante

os gêneros discursivos, relativamente estáveis, com os quais nos deparamos no dia a dia e nas

diversas esferas da sociedade.

A escola, por meio da aula de Língua Portuguesa, tem como meta propiciar ao aluno

o contato com os mais variados gêneros discursivos, seja por intermédio da leitura, seja pela

atividade de escrita e reescrita de textos. Essa atividade deve ser compreendida como um

processo que envolve a capacidade de autoavaliação da escrita para atingir o propósito de

comunicar da maneira mais inteligível possível.

Nesse sentido, temos como objetivo central, nesta pesquisa, destacar e entender a

importância de se conceber a linguagem como processo discursivo no ensino de Língua

Portuguesa e o texto como atividade enunciativo-discursiva que não deve ser produzido para a

escola e sim na escola. Isso implica uma mudança de postura do professor de Língua

Portuguesa que deve buscar estabelecer um ambiente diferenciado, propiciando condições

para que a sala de aula se torne um laboratório de produção de texto, onde o aluno

experimente, no sentido estrito da palavra, as diversas possibilidades de uso da linguagem.

Visamos discutir sobre um ensino/estudo de Língua Portuguesa em que se busquem

práticas significativas de linguagem na sala de aula para, a partir daí, dedicar-se ao estudo

metalinguístico. Para tanto objetivamos: 1) refletir sobre a integração entre teoria e prática nas

aulas de língua portuguesa, especificamente na prática de produção textual; 2) verificar a

relevância da reescrita na construção da competência linguístico-discursiva do aluno em que

se possibilite pensar sobre a língua em uso.

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A pesquisa foi motivada a partir das observações e práticas realizadas enquanto

bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) – programa

desenvolvido pela CAPES em parceria com as universidades para promover e incentivar a

docência, bem como fomentar a relação entre teoria e prática no período correspondente à

graduação –, quando foi possível pensar, enquanto acadêmico, a prática de ensino de Língua

Portuguesa numa escola Pública de Dourados, especificamente, na Escola Estadual Ministro

João Paulo dos Reis Veloso.

Como, nessa escola, as aulas de leitura e produção de texto foram incumbidas aos

bolsistas do PIBID, foi possível trabalhar com a prática de produção de textos, planejando as

aulas, ministrando-as e corrigindo as produções textuais.

O gênero discursivo trabalhado em sala de aula foi o artigo de opinião, que

possibilita ao aluno manifestar-se como sujeito de sua linguagem de modo mais explícito.

Uma produção desse gênero é o corpus utilizado para ser analisado neste trabalho.

Foram avaliados trinta textos produzidos por uma turma de alunos no 9º ano da escola

supracitada e escolhidas duas delas para comparar suas versões.

Buscamos verificar o nível de informatividade do texto, o modo como o discurso foi

colocado, a relação entre título e texto e, sobretudo, quais foram as mudanças havidas entre

uma versão e outra do texto que foi analisado em duas versões: a primeira versão e a segunda

versão.

No primeiro capítulo, buscamos abordar sobre o ensino de Língua Portuguesa sob

uma ótica enunciativo-discursiva. Embasamo-nos em estudiosos como Travaglia (2003),

Geraldi (1996) (1997) (2006), Martins (2002), entre outros, para destacarmos a importância

de um ensino de língua que se paute em práticas significativas em sala de aula, que busque

conciliar as novas teorias com as práticas realizadas em âmbito escolar.

No segundo capítulo, tratamos sobre o texto como unidade básica de ensino de

língua materna. Seguimos os pressupostos dos Parâmetros Curriculares Nacionais e a visão

discursiva do texto. Textos que são manifestação dos discursos que circulam na sociedade.

Cada âmbito social ou de atividade humana possui um gênero discursivo relativamente

estável que possui características de conteúdo, estilo e estrutura composicional que o definem.

Como os campos de atuação humana são muitos, também são muitos os gêneros discursivos.

Assim sendo, a produção textual não pode estar desvinculada do contexto social e o texto

deve ser concebido como processo e resultado de discursos.

No terceiro e último capítulo, fizemos uma breve abordagem acerca do gênero artigo

de opinião e temos como mote a análise de duas produções textuais de dois alunos.

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Verificamos que ambos os textos sofreram consideráveis alterações na segunda versão,

demonstrando que a prática de reescrita possibilita pensar sobre a língua em uso. Ao ler o

próprio texto o aluno avalia e busca novas formas de dizer o que havia dito na primeira

versão.

Mediante o que foi visto e dito, neste trabalho, se pode afirmar que não há mais valia

o estudo de língua portuguesa isolado de práticas significativas de produção de linguagem. Ao

entendermos que o ensino de língua portuguesa, na escola, precisa de uma mudança radical

em que se conciliem os estudos realizados na área e a prática em sala de aula, consideramos

que este trabalho fornece um contributo considerável para que essa mudança almejada se

concretize.

O estudo de língua portuguesa terá mudança significativa e qualitativa se

entendermos que não se produz linguagem fora do mundo, da realidade, do contexto sócio-

histórico. Desse modo, as aulas de leitura e produção de texto devem ser encaradas também

como crucial para um ensino-estudo de língua portuguesa se realizadas a partir de uma

concepção discursiva de língua e linguagem, dando ênfase ao processo para obter resultados

de qualidade, mediante a prática de reescrita e análise linguística. Isso tudo se faz possível se

o texto for compreendido como construto linguístico-discursivo, histórico e se constrói

inserido em processo significativo.

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1. ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA SOB UMA ÓTICA ENUNCIATIVO-

DISCURSIVA

Neste capítulo, pretendemos fazer uma reflexão sobre o ensino de língua portuguesa,

a partir do que tratam os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa;

embasamo-nos ainda em considerações de estudiosos que postulam um ensino de língua

materna pautado na concepção de linguagem como processo discursivo.

Há de se levar em conta que o ato de educar não está desvencilhado de uma postura

política. Somos seres políticos e agimos politicamente conforme a situação, contexto e

interlocutor. No ensino, isso não poderia ser diferente. Conforme Martins (2002, p. 20-21),

[...] A escolha de nossa prática pedagógica está vinculada à maneira de vermos o

mundo, de concebermos a sociedade e de querermos contribuir: ou para a

perpetuação da ideologia dominante, ou para a busca de transformação dessa

sociedade. Por isso, o nosso fazer pedagógico será sempre uma eterna escolha: um

Isto ou Aquilo.

Cabe salientar, consoante a essa autora, que a concepção que se tem acerca de

ensino/aprendizagem, de língua e avaliação, norteará o trabalho do professor. Embora perante

a situação que se encontra a escola como um todo – aqui escola está no singular, mas se refere

ao sistema escolar em si, em seu sentido mais amplo – há certa impressão de que o professor

está com as mãos atadas. A pior das hipóteses seria o professor estar com a mente amarrada,

engessada, quem sabe pelo sistema, quem sabe pela ausência de uma utopia. Utopia não em

sentido pejorativo de sonho inalcançável, mas de esperança em fazer acontecer um trabalho

significativo para professores e alunos.

A prática de um ensino significativo e humanístico ainda se depara com aquela

antiga visão de que o professor é o detentor da luz do conhecimento e o aluno, aquele que não

tem essa luz. Seria então o professor o lume do qual o aluno recebe pequenas chamas?

Diríamos de antemão que esse modo de ver professor e aluno já não cabe nesse novo

tempo. Em se tratando de ensino de língua materna, seria um erro afirmar que o aluno chega à

escola não sabendo falar a língua por trazer de casa alguns usos diferentes do que é

considerado padrão. Como é que a criança se comunica com os pais e amigos? Em que

língua? Ora, sabemos que a criança quando chegam à escola domina muito bem a sua língua

materna, sabe se comunicar com a família e os amigos, mesmo que apresente algumas

características comuns à fala infantil que, ao decorrer do tempo serão substituídas conforme

melhore sua articulação e assimile novas formas, novas palavras e novos significados.

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Nessa mesma linha de pensamento, Santos (2007, p. 90-91) argumenta que

O modelo de aprendizagem que embasa as necessidades de nosso tempo não é mais

o modelo tradicional que acredita que o aluno deve receber informações prontas e

ter, como única tarefa, repeti-las na íntegra. A promoção da aprendizagem

significativa se fundamenta num modelo dinâmico, no qual o aluno é levado em

conta, com todos os seus saberes e interconexões mentais. A verdadeira

aprendizagem se dá quando o aluno (re)constrói o conhecimento e forma conceitos

sólidos sobre o mundo, o que vai possibilitá-lo agir e reagir diante da realidade.

Cremos, com convicção e com o respaldo do mundo que nos cerca, que não há mais

espaço para a repetição automática, para a falta de contextualização e para a

aprendizagem que não seja significativa.

Caberia, ainda, seguindo esse raciocínio, fazer as mesmas perguntas que Geraldi

(2006) faz em relação ao ensino: para quê ensinamos o que ensinamos e para quê as crianças

aprendem o que aprendem?

A resposta ao “para quê”, talvez, seja a resposta que ambos, professor e aluno,

buscam e precisam responder para fundamentar e dar significação a sua prática. O professor

como aquele que tem o trabalho de mediar o processo de ensino/aprendizagem do aluno e,

este, também como sujeito de sua aprendizagem.

Assim, assevera Martins (2002, p. 22), “professor e aluno não podem ser vistos

apenas como aquele que ensina e aquele que aprende. Eles são sujeitos históricos. São

produtores de linguagem” (grifos da autora). É na linguagem e pela linguagem que ambos se

constituem sujeitos.

Em se tratando do ensino de português “nada do que se realiza na sala de aula deixa

de estar dependente de um conjunto de princípios teóricos, a partir dos quais os fenômenos

linguísticos são percebidos e tudo, consequentemente, se decide” (ANTUNES, 2003, p. 39).

Daí a importância de se pensar a conciliação entre teoria-prática-teoria, conforme postula

Martins (2002). Tal postura implica na mudança de perspectiva do profissional da educação.

1.1 O que se pretende com a disciplina de Língua Portuguesa na escola?

Muito se tem falado a respeito da função da escola e que, esta, deve propiciar ao

aluno integrar-se na sociedade e ter um posicionamento crítico acerca do mundo em que vive;

noutras palavras, capacitar o estudante para atuar conscientemente na sociedade conforme a

situação e o campo social do qual ele faz parte. Essa atuação, embora sejam amplas as

possibilidades, se dá principalmente pelo uso da linguagem majoritariamente manifestada pela

língua na modalidade escrita e padrão.

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Partindo de nossa experiência e embasando-nos em Geraldi (2006), pensemos: se

perguntarmos aos alunos do Ensino Fundamental ao Ensino Médio, se eles sabem para quê se

estuda português, a grande maioria responderá que não sabe e que não gosta. O professor, por

sua vez, dirá que é necessário para aprender a falar e escrever bem (assim vagamente

definido).

Sendo as principais atividades das aulas de língua portuguesa, a classificação

gramatical e análise sintática com exercícios maçantes, exaustivos e repetitivos, porque está

no conteúdo a ser seguido, o uso efetivo da linguagem fica relegado ao que muitos chamariam

“enrolação”, por incrível que pareça. Partindo-se desta realidade, qualquer um se sentiria

desmotivado, porque tudo o que não faz sentido, não é verdadeiramente significativo, tem sua

aprendizagem forçosamente difícil ou inócua.

Há de se destacar as tentativas dos órgãos governamentais em buscar novas

orientações para inovar o ensino mediante novas práticas. Dentre eles, citemos os PCN1, que

segundo Antunes (2003), “privilegiam a dimensão interacional e discursiva da língua e

definem o domínio dessa língua como uma das condições para a plena participação do

indivíduo em seu meio social”.

Esse domínio da língua perpassa por um fator que não se pode relegar: o domínio da

modalidade padrão. A esse respeito, Possenti (1996, p. 17) argumenta que o objetivo da

escola é ensinar o português padrão e criar condições para que ele seja aprendido. Uma tese

contrária baseia-se no preconceito que preconiza a dificuldade de aprender o padrão,

sobretudo, pelos alunos oriundos das camadas sociais menos privilegiadas que, em tese,

estariam alheias ao produto cultural dominante em que o português padrão predomina. Quanto

a isso, entretanto, poderíamos contrapor a crescente política inclusiva dos governos na

tentativa de diminuir as desigualdades sociais, o acesso à internet e o vasto domínio da

televisão e do rádio; “lugares” onde a modalidade padrão se evidencia predominantemente.

Diríamos que a escola precisa considerar os diversos modos que a língua se

apresenta. Seria mais nobre e mais eficaz estudar e conduzir os alunos no processo de

constituição e construção da linguagem segundo o contexto e o interlocutor. Ou seja, estudar

as formas de apresentação da linguagem que se dá mediante textos inseridos em diferentes

esferas discursivas. Quanto mais contato o aluno tiver com os diferentes textos, sejam orais ou

escritos, que circulam nos meios de comunicação social, melhor ele estará capacitado para

usar eficazmente a língua, mais ele estará ampliando sua competência discursiva.

1 Parâmetros Curriculares Nacionais

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Basicamente na mesma linha de pensamento, Travaglia (2003) entende que o ensino

de língua materna se justifica, sobretudo, pelo objetivo de desenvolver a competência

comunicativo-discursiva dos usuários da língua; essa competência diz respeito à capacidade

do falante em utilizar a língua adequadamente nas diferentes situações discursivas.

O foco das concepções aqui referenciadas não é a abolição do ensino gramatical na

escola, mas uma abordagem distinta de ensino da língua de um modo mais significativo.

Trabalhar-se-ia a linguagem em seu princípio enunciativo-discursivo questionando seus usos,

seus significados e os elementos linguísticos presentes nos textos que modalizam o discurso.

Nesse sentido, Possenti (2006) argumenta que dominar efetiva e ativamente uma língua

dispensa o domínio de uma metalinguagem técnica.

O fim último de ensinar língua portuguesa na escola seria então tornar o aluno sujeito

de sua linguagem, produzindo textos significativos e, conforme ele é envolvido nesse

processo possa entender que produzir linguagem, produzir texto é parte de um processo de

leitura, releitura, escrita e reescrita para dizer o que se quer dizer de maneira coerente,

cumprindo a contento o ato de comunicar. Quando ele entender e fizer parte desse processo,

as aulas de língua portuguesa e, por conseguinte, o professor terá cumprido seu papel. Forma-

se, assim, um ciclo de significação.

1.2 A concepção de linguagem determina o modo como se ensina

Para Travaglia (2003), a maneira como se entende a natureza da língua altera o modo

como se estrutura o trabalho com a língua em se tratando de ensino; a concepção que se tem

sobre a linguagem tem a mesma importância quanto à postura que o professor adota em

relação à educação. “Uma diferente concepção de linguagem constrói não só uma nova

metodologia, mas principalmente um “novo conteúdo” de ensino” (GERALDI, 2006, p. 45).

Nas palavras de Antunes (2003, p. 39), “Toda atividade pedagógica de ensino de português

tem subjacente, de forma explícita ou apenas intuitiva, uma determinada concepção de

língua.” (grifo da autora).

É o repertório teórico que o professor possui que determina o modo como ele

desenvolve sua prática em sala de aula. Aquela famosa frase de que “na teoria é tudo fácil e

lindo, mas na prática é outra coisa” perde sua valia se levarmos em conta o que foi exposto.

Forçosamente, cabe pensar que é o aparente distanciamento entre teoria e prática a causa de

uma prática de ensino não eficiente. Teoria e prática devem caminhar juntas e, segundo os

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autores mencionados anteriormente, a concepção teórica que se tem acerca da língua e da

linguagem embasa a práxis.

No viés do exposto no parágrafo anterior, é pertinente mencionar a dicotomia que há

entre ensino de língua e ensino de metalinguagem, sendo que este último é o que mais está

presente nas aulas de língua portuguesa desde a educação inicial, uma vez que as aulas de

língua portuguesa objetivam propiciar o domínio do dialeto padrão apenas. (GERALDI,

2006).

Geraldi (2006) assevera que optar pelo ensino da língua que considere as relações

humanas por ela mediadas exige entender a linguagem como processo de interação, seguindo

a perspectiva de que na escola deve-se oportunizar o acesso do aluno às diferentes

manifestações e expressão da linguagem. Isto implica ser reconsiderado o que se ensina para

compreender melhor o para quê se ensina.

O estado caótico do ensino de língua portuguesa, referido por Geraldi (Ibidem),

reside no fato de se ensinar metalinguagem de análise da variante padrão sem que o aluno

esteja habituado a ela. Acrescentaríamos ao pensamento desse autor que, na atualidade, os

alunos estão habituados a uma língua e linguagem que flui e acompanha a evolução

tecnológica, como se pode ver nos escritos das redes sociais e mensagens de texto em que se

abrevia quase tudo. O aluno então não estaria acostumado a uma língua severamente

resistente às mudanças.

O que mais acontece nas aulas de língua portuguesa é a ênfase ao ensino

metalinguístico sem que se destine tempo hábil para verdadeiras e significativas atividades de

linguagem. Essas atividades significativas de linguagem devem extrapolar a comum

metodologia de repetição mecânica de análise sintática e classificação gramatical.

Não postulamos nem pretendemos abolir o ensino de metalinguagem ou o estudo

sintático. O que buscamos é conceber que, antes dos exercícios forçosos e maçantes de

classificação gramatical, ou seja, o reconhecimento de classes de palavras e de funções

sintáticas em frases isoladas ou retiradas de texto com o intuito de fazer gramática

contextualizada, mas destituída de significação real, é preciso abordar a língua e a linguagem,

visando a uma comunicação efetiva e interativa, refletindo sobre a construção da linguagem e

seus efeitos de sentido. Embora essa proposta pareça um tanto abstrata e de difícil execução,

deve ser o ponto de partida para um estudo-ensino da língua que almeja, em longo prazo,

tornar o aluno linguístico-discursivamente competente.

Travaglia (2003, p.21-23) e Geraldi (2006, p.41) apresentam três concepções de

linguagem que norteiam o ensino de língua: uma que vê a linguagem como expressão do

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pensamento, outra como instrumento de comunicação e outra como forma e processo de

interação.

A linguagem como expressão do pensamento: é a concepção que embasa os

estudos tradicionais. A expressão acontece no interior da mente e sua

exteriorização é uma tradução. O pensamento e a linguagem seguem regras de

organização lógica. Quem não se expressa bem é porque não pensa. (Gramática

Tradicional)

A linguagem como instrumento de comunicação: essa concepção está ligada à

teoria da comunicação que vê a língua como um código (composto por signos

que se combinam conforme regras) capaz de transmitir ao receptor uma

mensagem. O código deve ser dominado pelos falantes que devem utilizá-lo de

maneira semelhante e preestabelecida, convencionada para que ocorra

efetivamente a comunicação. Não é considerado o momento ou a situação em que

se produz a fala. (Estruturalismo e transformacioalismo)

A linguagem como forma ou processo de interação: nesta perspectiva a

linguagem é vista como um lugar de interação humana, pois o indivíduo não

apenas traduz ou exterioriza um pensamento, mas age, com sua fala, com seu

discurso sobre o interlocutor. A linguagem ocorre num processo interativo de

produção de sentido entre os interlocutores em um contexto sócio-histórico e

ideológico. (Linguística da enunciação)

Neste texto monográfico, levamos em conta a terceira concepção por acreditarmos

que a língua não deve ser considerada isoladamente das suas condições de produção e uso.

Seu estudo e ensino “não pode deixar de considerar – como se não fossem pertinentes – as

diferentes instâncias sociais, pois os processos interlocutivos se dão no interior das múltiplas e

complexas instituições de uma dada formação social” (GERALDI, 1996, p. 28). A língua é

produto histórico, é condição de produção da história, marcada pelo uso e pelo espaço social

desse uso. Daí a importância de ser encarada não como mero código a ser memorizado, mas

ação entre interlocutores.

A definição de linguagem presente nos PCN corrobora com o que vem sendo dito.

Nesse documento, entende-se a linguagem como “uma forma de ação interindividual

orientada por uma finalidade específica; um processo de interlocução que se realiza nas

práticas sociais existentes nos diferentes grupos de uma sociedade, nos distintos momentos da

sua história” (BRASIL, 1997, p. 22).

Conforme essa perspectiva, o mesmo documento define a língua como

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19

[...] um sistema de signos histórico e social que possibilita ao homem significar o

mundo e a realidade. Assim, aprendê-la é aprender não só as palavras, mas também

os seus significados culturais e, com eles, os modos pelos quais as pessoas do seu

meio social entendem e interpretam a realidade e a si mesmas. (BRASIL, 1997, p.

22).

Nesse viés, é possível afirmar que o domínio da língua está estreitamente ligado com

a possibilidade de que haja plena participação social, pois é por meio dela que o homem se

comunica, acede a informações, expressa seus pensamentos, produz conhecimento. Em suma,

se constitui como sujeito.

A possibilidade de ter acesso a essas diferentes linguagens está na escola, que deve

propiciar ao aluno as condições necessárias para que ele se aproprie da maior quantidade

possível de informação e coloque em uso os conhecimentos linguísticos que, na escola,

aprende a aprimorar.

Assim sendo, o ensino de língua deve focar não mais no ensino vazio de

metalinguagem e classificação gramatical, mas em atividades de leitura de textos, prática de

produção de textos e prática de análise linguística. Esse modo de pensar o ensino de língua

portuguesa é possível se a linguagem for compreendida como enunciativo-discursiva e que ela

se manifesta sempre em forma de textos.

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2. O TEXTO COMO UNIDADE BÁSICA PARA O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

(LÍNGUA PORTUGUESA)

Comecemos este novo capítulo já tratando sobre o objeto que buscamos explorar: o

texto. Embora reconheçamos que existem textos orais e escritos, verbais e não verbais,

abordaremos especificamente o texto escrito.

Texto é um todo cujas partes ou frases relacionam-se entre si de modo coerente e

com sentido; é marcado por dois espaços brancos constituídos respectivamente pelo momento

anterior e posterior à palavra (ao texto); é produzido por um sujeito em tempo e espaço

determinados, configurando-se pela sua historicidade (SAVIOLI e FIORIN, 1996, p.14-17).

Grosso modo, texto não é um emaranhado de frases isoladas. Insere-se num contexto

historicamente marcado por variedades discursivas.

Segundo Costa Val (1999, p. 3), texto é uma “ocorrência linguística falada ou escrita,

de qualquer extensão, dotada de unidade sociocomunicativa, semântica e formal”. Com essa

afirmação, a autora diz que um texto será bem compreendido se avaliado sob o aspecto

pragmático que corresponde à sua atuação informacional e comunicativa, o aspecto

semântico-conceitual que denota a sua coerência e o formal que diz respeito à coesão textual.

Partindo do que essa autora postula, o texto não se resume ao ato de falar e escrever, mas se

estende aos acontecimentos sócio-histórico-culturais nos quais o produtor e o leitor estão

inseridos ou que, de certo modo, ouviram ou viram.

Para Cardoso (1999), texto é discurso verbalizado, ou seja, os discursos são lidos e

ouvidos mediante os textos. Ao mesmo tempo em que um discurso constitui-se por uma

pluralidade de textos, um texto possui também em sua composição, estilo e forma, vários

discursos. Neste último caso, observemos a questão da intertextualidade e das referências

externas presentes nos textos, nas quais autor e leitor se embasam para formar uma “cadeia”

significativa. O autor reúne os discursos aos que ele teve acesso e os dispõe no texto.

Conforme Travaglia (2003), discurso são as atividades comunicativas de um locutor

em situação de comunicação determinada, na qual estão envolvidos: o conjunto de enunciados

produzidos por ele e seu interlocutor e o evento de sua enunciação. Assim, o texto é “[...] o

resultado, o produto concreto da atividade comunicativa que se faz seguindo regras e

princípios discursivos sócio-historicamente estabelecidos que têm de ser considerados” (Idem,

p. 67). Sintetizando, texto é um todo coerente de qualquer extensão em que o discurso se

manifesta e este, por sua vez, resulta de uma construção sócio-histórica.

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21

Na perspectiva apresentada pelos PCN, o ensino da língua materna teria de se pautar

no estudo do texto, pois

Se o objetivo é que o aluno aprenda a produzir e a interpretar textos, não é possível

tomar como unidade básica de ensino nem a letra, nem a sílaba, nem a palavra, nem

a frase que, descontextualizadas, pouco têm a ver com a competência discursiva, que

é questão central. Dentro desse marco, a unidade básica de ensino só pode ser o

texto, mas isso não significa que não se enfoquem palavras ou frases nas situações

didáticas específicas que o exijam. (BRASIL, 1997, p. 29).

Sendo o texto unidade de ensino e os gêneros discursivos objeto de ensino, a prática

de produção de texto assume papel relevante. Por conseguinte, a opção de tratar a produção de

textos mediante o trabalho com os gêneros discursivos pode fazer como que o processo de

produzir e compreender textos seja mais satisfatório, uma vez que, ao incluir aspectos de

enunciação e discurso, permite considerar a situação de produção de determinado discursos.

(BARBOSA, 2000).

Para Bakhtin (2003), todos os campos em que o ser humano atua estão ligados ao uso

da linguagem e a língua se manifesta em forma de enunciados que refletem as condições e as

finalidades de cada campo de atuação. Cada campo de atuação manifesta seus enunciados

conforme o conteúdo temático, o estilo e a construção composicional. Esses elementos estão

atrelados ao enunciado e cada campo de atuação humana produz seus enunciados

relativamente estáveis, denominados gêneros do discurso.

Trabalhar a produção textual nessa perspectiva, considerando que os textos são

produzidos e publicados em diferentes setores sociais, conforme as necessidades e exigências

concernentes aos discursos ali vigentes possibilitará que se faça da sala de aula um laboratório

de produção de textos, de reflexão sobre língua e linguagem e os modos formais, estilísticos

com que se manifestam.

Na esteira desse pensamento, Geraldi entende a produção de textos, sejam orais ou

escritos, como

[...] ponto de partida (e de chegada) de todo o processo de ensino/aprendizagem da

língua. [...] Sobretudo, é porque no texto que a língua – objeto de estudos – se revela

em sua totalidade quer enquanto conjunto de formas e de seu reaparecimento, quer

enquanto discurso que remete a uma relação intersubjetiva constituída no próprio

processo de enunciação marcada pela temporalidade e suas dimensões. (1997, p.

135).

A escrita, como atividade discursiva em que, a priori, o autor se prontifica a expor

seu modo de pensar e sua experiência sobre e com o mundo, é, ao mesmo tempo, elemento

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fundamental de registro e expressão de informações e conhecimentos. Nesse processo, a

escola, especificamente, a disciplina de Língua Portuguesa, tem como incumbência a

preparação efetiva do aluno para que ele possa exercer de maneira eficaz sua condição de

cidadão manifestando-se também por meio da escrita de forma crítica e consciente. Essa

manifestação escrita, assim como na oralidade, não acontece por acaso, sem um fim e sem um

interlocutor, pois os textos orais e escritos são produzidos mediante uma dinâmica de

interação e é nessa interação que o sujeito se constitui.

O ensino de língua portuguesa tende mais para o estudo do texto que “[...] terá como

objetivo central, na pedagogia de língua materna, suscitar no aluno a exploração desses

recursos para a obtenção de uma melhor adequação às circunstâncias que determinam a

especificidade tipológica dos discursos”. (FREITAS, 2010, p. 156).

Consoante a essa asseveração, “é de suma importância que os professores da área de

Língua Portuguesa assumam seu verdadeiro papel, que é o de propiciar condições para que os

alunos saibam fazer uso adequado de nossa língua conforme a situação sócio-interativa”.

(Idem, 2010, p. 154).

2.1 A produção escrita na escola: o texto como processo

Comecemos este subitem fazendo alguns questionamentos que a experiência como

aluno e a leitura das reflexões de Geraldi (2006) nos inspiram: Quem não se lembra das

famosas redações sobre datas comemorativas ou retorno das férias? Quem não se lembra de

quando pegou seu texto de volta e o percebeu cheio de manchas vermelhas, “sangrando” pelos

“erros” cometidos? Fatídico fato ainda comum em muitas “aulas de produção de texto”. Os

sinais de inadequações ainda são a única resposta que o texto merece?

Se fizermos um apelo à memória é o que mais encontraremos. Textos e mais textos

escritos por escrever, por valer nota. Quiçá a melhor nota era e é o objetivo ao escrever na

escola, conforme a escola e para a escola. Escrever de novo para quê? Para quem? Escrever

sobre o que não se quer dizer nada?

A esse respeito Antunes (2003) constata que ainda há na escola uma escrita artificial

e inexpressiva, destituída de valor interacional e que não exercita aspectos relevantes da

língua, dando prioridade a exercícios descontextualizados de criar listas de palavras e frases

soltas sem relação alguma com a intencionalidade e o sentido com que as pessoas dizem o que

têm a dizer.

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Conforme Geraldi (2006), a prática de redação na escola tem sido um martírio para

alunos e professores. O professor se frustra ao ver textos mal redigidos, aos quais havia feito

correções, sugestões. Os alunos não releem o texto e muitas vezes, simplesmente atiram-no ao

cesto de lixo. Podemos dizer que não há mais lugar para atividades em sala de aula que não

sejam significativas. Provavelmente o modo de tratar o estudo da língua a partir de frases

isoladas seja um dos motivos de encontrarmos textos de alunos que têm sua coerência global

comprometida pela falta de relação entre suas partes.

Entendemos que os PCN de Língua Portuguesa propõem, assim como os teóricos

aqui referenciados, entre outros, que defendem um ensino de língua numa perspectiva

enunciativo-discursiva é, a partir do texto, aprender os fenômenos linguístico-gramaticais que

possibilitam uma comunicação efetiva e eficaz. “Ou seja, o texto é que vai conduzindo nossa

análise e em função dele é que vamos recorrendo às determinações gramaticais, aos sentidos

das palavras, ao conhecimento que temos da experiência.” (ANTUNES, 2003, p. 110).

Assim, o estudo da palavra e da frase só terá valor em atividades didáticas

específicas que o exijam, porém sempre de forma significativa, aplicáveis ao texto e em

função do desenvolvimento linguístico-discursivo do aluno.

Compreender o ensino de língua a partir dessas concepções é entender também a

aprendizagem, ou seja, a produção de texto como processo, pois quando falamos, realizamos

um processo mental de escolha das melhores palavras para verbalizar do modo mais claro

possível o que queremos dizer. Quando escrevemos, esse processo se torna ainda mais

complexo.

É preciso mudar o modo como se produz texto na escola, mediante projetos como

jornais, blogs etc. No entanto, juntamente a isso é necessário também vincular às aulas de

produção de texto escrito, a produção de texto oral que pode ser uma discussão sobre o tema a

ser abordado na hora de escrever; acrescente-se a essa asseveração a leitura de textos que

falem sobre o tema, preferencialmente, de acordo com o gênero discursivo estudado.

Tudo isso engloba a necessidade de que “o professor de Língua Portuguesa, para

preparar suas aulas de redação, deve compreendê-la como um processo de retextualização

para, então, buscar estratégias que possibilitem ao estudante escrever, ler e reescrever seu

texto, num processo contínuo de autoaprendizagem” (MARQUESI, 2013, p. 136).

Nesse processo de leitura, escrita e reescrita do próprio texto o aluno poderá mais

significativamente entender o próprio processo de construção do discurso. Um aluno escritor

competente seria, na esteira da mesma autora, aquele que, ao ler o seu texto e, segundo outras

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leituras que tenha feito, construa sentidos e seja capaz de retirar, acrescentar elementos ao

texto, tornando-o mais adequado ao meio que deverá ser publicado (ainda que virtualmente).

No processo de verificação do próprio texto, é possível, mediante a tutoria do

professor em sala de aula, aplicar o que Geraldi (1997) chama de prática de Análise

Linguística. Esta prática refere-se ao “conjunto de atividades que tomam uma das

características da linguagem como objeto: o fato de ela remeter a si própria” (p.189). Desse

modo, dentro da prática de Análise Linguística o autor coloca as atividades epilinguísticas e

metalinguísticas. À luz deste autor buscaremos entender melhor o que são essas atividades.

As atividades epilinguísticas possibilitam refletir sobre a linguagem e os diferentes

modos de dizer, de expressar; essa reflexão visa o uso destes recursos expressivos na

funcionalidade das atividades linguísticas que estão inseridos e engajados.

Citemos como exemplo de atividades epilinguísticas, pensar, a partir do texto do

aluno, sobre a substituição de palavras repetidas em demasia no texto de modo que o

significado a que se objetiva permaneça o mesmo. Inclusive citemos a própria repetição de

palavras que pode ser um recurso estilístico, principalmente em texto poético. Pensamos que o

recurso estilístico de repetir palavras é mais adequado ao texto poético, pois, um texto formal

cheio de palavras repetidas, ainda que se queira atingir algum objetivo forçosamente seu autor

será julgado não muito apto. Essa última afirmação evidencia o caráter social da linguagem e

consequentemente daquilo que ela produz. Isso tudo pensando no efeito de sentido que se

pode produzir.

Às atividades metalinguísticas cabe a

[...] reflexão analítica sobre os recursos expressivos, que levam à construção de

noções com as quais se torna possível categorizar tais recursos. Assim, estas

atividades produzem uma linguagem (a metalinguagem) mais ou menos coerente

que permite falar sobre a linguagem, seu funcionamento, as configurações textuais e,

no interior destas, o léxico, as estruturas morfossintáticas e entonacionais

(GERALDI, 1997, p. 190-91).

Esse seria o caso do estudo dos fenômenos gramaticais, suas nomenclaturas e suas

funções. Tudo isso antecedido por atividades epilinguísticas. Se tomarmos o exemplo sobre a

substituição das palavras repetidas no texto, na atividade metalinguística se daria nome a esse

processo: o uso da sinonímia.

O fato é que, na Análise Linguística se possibilita refletir sobre os recursos que o

autor utiliza para dizer o que quer dizer e como o quer, utilizando elementos textuais sejam de

pontuação, referenciação, regência, ordem estrutural, ordem sintática entre outros. Esses são

alguns elementos que se podem abordar numa Análise Linguística a partir do texto do aluno

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tornando o estudo mais significativo, uma vez que busca envolver de fato o aluno no processo

de aprendizagem. Em contrapartida, numa Análise Linguística, não significa tomar como

objeto todos os elementos de uma só vez.

Suassuna (2013) atenta para as situações didáticas de discussão e reelaboração

coletiva de textos que se constituem em alternativa à prática tradicional de ensino gramatical.

O professor, principal interlocutor dos alunos, deverá fazer perguntas aos textos (aos alunos)

motivadas principalmente pelos problemas neles encontrados. A partir dessas perguntas o

aluno passaria a pensar sobre o próprio texto e buscar novas versões para seu texto mediante o

uso de estratégias linguístico-discursivas diversas.

De acordo com a mesma autora, o diálogo do professor com o texto do aluno é mais

produtivo do que uma mera ação corretiva. Por meio dessa metodologia o aluno se torna leitor

crítico do próprio texto.

O retorno da produção do aluno é indispensável. Ao ler, escrever, reler e reescrever

ele busca cumprir o propósito de sua escrita que é interagir e intercompreender. Ele passa a

ver a produção textual como um processo do qual ele é o “carro chefe” que tem um professor

como ajudante de caminhada, na procura dos melhores meios e caminhos para melhor dizer o

que tem a dizer.

Trabalhar a produção textual como processo pode ser ainda mais eficaz na tentativa

de orientar o aluno no seu também processo de aprendizagem. O texto como processo implica

leitura de outros textos, escrita, leitura e releitura do próprio texto e reescrita. Ao trabalhar

dessa forma o aluno passa a ter voz e tem sua voz devolvida no ato da reescrita. “A devolução

da palavra ao aluno faz deste o condutor de seu processo de aprendizagem, assumindo-se

como tal” (GERALDI, 1997, p. 160).

Todo esse processo ao qual nos referimos requer tempo. Comumente, nas aulas de produção

textual se tem a ideia real e capitalista de “produzir”. O aluno tem de escrever como pré-

requisito para ter uma nota de participação. Algumas falas que se ouvem é que o aluno deve

escrever rápido, uma vez que não se pode “perder tempo”, porque o professor tem que passar

o conteúdo que seria a gramática pela gramática (no sentido mais tradicional, repetitivo e

classificatório possível).

Diante do exposto até aqui, podemos afirmar que “[...] é nas questões de produção e

compreensão de textos, e de suas funções sociais, que se deve centrar o estudo relevante e

produtivo da língua” (ANTUNES, 2003, p. 111). Dessa forma, acreditamos estar trabalhando

para um ensino verdadeiramente significativo.

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3. A PRÁTICA DE REESCRITA: O TEXTO ‘EM’ PROCESSO

Antes de começarmos a verificar os resultados da prática de reescrita em sala de aula,

façamos uma contextualização a respeito das produções textuais que aqui serão analisadas.

Trata-se de uma produção textual feita por uma turma de alunos de 9º ano da Escola

Estadual Ministro João Paulo dos Reis Veloso, na cidade de Dourados – MS. Nesta escola, as

atividades de leitura e produção de texto foram incumbidas aos alunos bolsistas do PIBID2

(Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência), acadêmicos do curso de Letras

Habilitação Português/Espanhol da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, entre 2012

e 20133.

Não menos importante, para darmos sequência a esta pesquisa, é dizer que fizemos

parte desse programa e fomos os responsáveis pela elaboração das aulas4 de leitura e

produção de texto que originaram as produções que aqui serão cotejadas – fato que tornaria o

trabalho mais árduo se fôssemos analisar a própria prática, pois, se corre o risco de destacar

apenas elementos positivos –. No entanto, as observações serão feitas em torno dos textos dos

alunos para verificar os aspectos relevantes à prática de reescrita, sua eficácia ou não, se

houve mudança significativa entre a primeira e a segunda versão do mesmo texto.

Embora não se pretenda fazer um discurso apologético da nossa prática enquanto

professores, é um risco que vamos correr. Mesmo que se queira ser o mais imparcial possível

tendo como objeto apenas os textos, ao sermos os interlocutores e avaliadores desses textos

em sala de aula, ao verificar e avaliar os resultados se estará avaliando também a nossa prática

enquanto professores. Porém, vale repetir que o que se almeja é apenas cotejar os textos.

3.1 Análise do Corpus

Comecemos falando brevemente sobre o gênero discursivo artigo de opinião –

gênero integrante do corpus – para contextualizarmos o que foi feito.

2 O PIBID é um programa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) cujo

objetivo é fomentar a iniciação à docência, contribuindo para o aperfeiçoamento da formação de docentes em

nível superior e para melhoria da qualidade da educação básica pública brasileira.

3 O trabalho foi realizado com alunos do 6º ano 9º ano do Ensino Fundamental no período vespertino. Dentre as

principais atividades está o auxílio à professora na aula destinada para leitura e produção de texto que ocorria em

dois dias da semana. No caso do 9º ano, fonte dos textos analisados trabalhou-se apenas um dia na semana com

uma hora destinada a essa atividade, normalmente devendo seguir o cronograma da professora que repassava a

exigência de agilidade nas aulas de produção de texto devido ao conteúdo que precisava ser passado. 4 As aulas não serão detalhadas neste trabalho por não ser o foco.

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Segundo Rodrigues (2000), o artigo de opinião é um gênero da esfera jornalística

impressa e multimídia (veiculado pela Internet). Encontra-se nos jornais comumente nas

páginas junto aos editoriais e é escrito por pessoas de fora da instituição que podem ser

colaboradores do jornal e ocupam papel de destaque na sociedade (autoridades políticas,

religiosas, médicos, escritores, advogados etc.). Ao escrever, apresentam seu ponto de vista

sobre determinado fato ou assunto da atualidade, de grande repercussão, normalmente

polêmico – o assunto ser polêmico não vem a ser uma regra fixa nos artigos de opinião, mas

é uma característica bastante comum. (grifo nosso)

Para a mesma autora o trabalho com o artigo de opinião na escola ou seu ensino-

aprendizagem

[...] justifica-se pela sua relevância sociodiscursiva, dada sua importância como um

dos instrumentos para a promoção da efetiva participação social do aluno-cidadão,

um dos objetivos gerais do Ensino Fundamental, bem como pelo resgate da função

social da escrita. Sua relevância destaca-se ainda pela sua dimensão pedagógica,

quer dizer, pela função que pode desempenhar no desenvolvimento de conteúdos

específicos da área de Língua Portuguesa.

Um dos objetivos da área de Língua Portuguesa para prática de produção de textos

escritos é o ensino do modo de produção do “discurso argumentativo”: os processos

de argumentação, modos de composição textual, unidades lingüísticas, entre outros

aspectos, que constituem especificamente nos diferentes gêneros. [...]

Sendo que a escrita tem uma função social como a autora salienta, seguindo a mesma

perspectiva, embasamos o nosso trabalho em sala de aula e, na hora de fazer a avaliação,

embora tenhamos verificado também aspectos ortográficos, optamos essencialmente por

verificar o desenvolvimento do trabalho discursivo, com o sentido geral do texto.

Buscamos motivar os alunos a escreverem no intuito de, devido à exiguidade do

tempo e inviabilidade financeira, fixar alguns dos textos no mural da escola cumprindo,

assim, um dos objetivos do texto, conforme assevera Geraldi (1997) que o texto tem como

finalidade ser publicado, pois não há autor que escreva sem considerar a existência de um

outro; o texto é, então, segundo o mesmo autor, “produto de uma atividade discursiva onde

alguém diz algo a alguém” (p.98). Desse modo, justifica-se mais claramente a importância de

se trabalhar com artigo de opinião.

Feita essa pequena abordagem acerca do gênero passemos agora a verificar os

textos5. Considerando-se que a totalidade das 30 produções ou atingiram parcialmente ou

totalmente às características do gênero, foram escolhidas 2 produções para cotejar os textos e

verificar os resultados da prática de reescrita.

5 Os textos podem ser consultados na íntegra conforme anexo. Na análise serão utilizados trechos a título de

exemplificação.

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3.1.1 Primeira versão do texto do Aluno 1

No que tange à superestrutura6 textual o aluno alcançou o que se esperava, que é,

pelo menos a exposição de argumentos em torno de uma tese; ele constrói uma sequência de

argumentos que defenderiam sua tese.

Quanto ao tema proposto, ele se posiciona favoravelmente já deixando isso claro no

primeiro parágrafo que constituiria a tese do texto a ser defendida. Coloca como argumento

primeiro que “muitos jovens estam matando, roubando e traficando eles não querem nem

saber porquê?”. A escrita do aluno apresenta equívocos ortográficos como se pode notar no

verbo estar (estam) conjugado na terceira pessoa plural do presente do indicativo. Esse

fenômeno denota uma marca de oralidade que pode ser uma relação que ele tenha feito com

outros verbos que na sua pronúncia ocorre uma transformação em que o m grafado em verbos

como “entram” e “sentam” [ẽtrãw] e [sẽtãw] se torna uma semivogal (w) semelhante ao que

ocorre em “estão” [estãw], na pronúncia do português falado no Brasil. Existem outros

aspectos referentes à ortografia que não estão de acordo com a norma, no entanto, não é o

nosso principal foco.

O construto textual geral, devido a alguns aspectos coesivos como concordância

verbal, falta de pontuação e paragrafação, é um tanto difícil de ler, mas com atenção se pode

entender o que o aluno quis dizer. A ideia principal que ele defende é a validade da redução

da maioridade penal para 16 anos, uma vez que os adolescentes a essa idade são usados por

maiores para praticar atos ilícitos e aqueles, protegidos pela legislação, são apenas levados a

uma unidade de detenção socioeducativa (UNEI) e sabem que não terão maiores problemas.

Para o aluno, a solução seria reduzir a maioridade penal porque “eles vai ter (terão)

uma condena(ção) maior aí já vai pro cadeião lá eles aprendem a se respeitar, a dar valor a (à)

liberdade que temos aqui fora”. Nesse argumento, o aluno coloca que ao sofrer uma

condenação maior, o infrator aprenderia a dar valor à liberdade. Nesse ponto, ele rompe uma

sequência de verbos na terceira pessoa e coloca um (temos) na primeira pessoa plural. Isso

pode indicar uma marca de aproximação do leitor ao sentido de valorizar a liberdade, algo que

ele o faz.

6 “A superestrutura é uma estrutura global que é característica de um tipo de texto. É uma espécie de esquema

(modelo cognitivo global) formal e abstrato, de caráter convencional e, portanto, dependente da cultura.

Normalmente envolve uma sequência esquemática e características de linguagem, de recursos retóricos ou

estilísticos”. (TRAVAGLIA, 1991, p. 1291)

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Percebemos que o texto está dividido em dois parágrafos somente. Essa forma de

construção é muito comum em textos escolares; às vezes ocorrem escritas de quase todo o

texto em um parágrafo apenas. Sabemos que um texto dissertativo argumentativo tem como

característica estar dividido entre introdução (um parágrafo), desenvolvimento (um ou mais

parágrafos) e conclusão (um parágrafo). Isto implica que nesse texto faltaria uma adequação.

O título que o aluno escolhe, talvez por se tratar de artigo de opinião, é “A minha

opinião”. Título recorrente em alguns textos. Quiçá isto seja herança dos textos “Minhas

férias”. O título, embora seja vago, marca a subjetividade opinativa presente no pronome

“minha”. Fato que significa um posicionamento marcado e subjetivo do sujeito quanto ao

tema proposto. Não obstante, foi-lhe pedido construir um título mais adequado ao texto, algo

que referisse ao que está escrito e que chamasse a atenção, como é uma característica dos

títulos de artigo de opinião.

O final do texto, a parte conclusiva, ficou sem sentido e dúbio como se pode notar

em “se reduzir para 16, vai melhorar bem o nosso mundo do crime”. Aqui ocorre uma

incoerência. Se ele se posiciona a favor da redução da maioridade penal, como pode fazer

parte do mundo do crime? Com isso levantamos uma questão importante: o tempo de

produção textual foi demasiado curto o que provavelmente tenha diminuído a chance de o

aluno ler o próprio texto. Vejamos o que acontece na reescrita.

3.1.2 Segunda versão do texto do Aluno 1

Ao comparar a primeira e a segunda versão notamos uma mudança brusca na

superfície do texto. O aluno escreve apenas um parágrafo. Poderíamos dizer que houve outra

inadequação quanto à estrutura de superfície do gênero. Ocorre, pelo que se pode notar, um

resumo do primeiro texto.

Nesse resumo que o aluno faz, há mudança significativa no modo como ele escreve.

Por mais que esteja escrito em um só parágrafo, podemos notar que o início do texto ele

escreve diferente, seleciona outras palavras. O aluno utiliza também, um recurso

argumentativo que é fazer pergunta. Após a declaração inicial, em que afirma enfaticamente

sua posição favorável à redução da maioridade penal com o uso do advérbio “sim” ao lado do

verbo “deve”, ele escreve: “[...] Por que? muitas pessoas estão fazendo desses adolescentes

como armas para traficar, assautar e matar”.

Ao cotejar o início dos textos percebemos que, no primeiro, ele coloca os jovens

como sujeitos que roubam, traficam e matam. No segundo, ele usa o pronome anafórico

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“desses” que determina o nome “adolescentes”. Constatamos que ele fez referência ao que

havia dito no primeiro texto, como se fosse uma sequência do que estava escrito e dado como

sabido pelo interlocutor, o professor. Mas verificamos também que ele sabe o uso da

concordância nominal, um fator positivo e comumente não observado nas “correções”.

Seria mais interessante, ao avaliar o texto de um aluno, verificar os desvios, mas

também valorizar os acertos. São os desvios que precisam ser trabalhados. Possenti (1996)

defende que se não ocorrem problemas não há porque trabalhar com eles. Neste caso, para

este aluno, não seria necessário tomar tempo com exercícios de concordância nominal, por

exemplo, a não ser que em outros casos ele se equivoque. O mais importante seria então, caso

os problemas de referenciação ocorram em mais textos, trabalhar-se-ia com este recurso

linguístico de coesão. A esse respeito sabemos que, caso ocorram problemas coesivos, o

significado do texto pode ficar comprometido.

No âmbito informacional, as duas versões não trazem grande quantidade de

informações. Ainda mais importante que a quantidade é a qualidade da progressão que se dá

ao assunto abordado no texto. O aluno precisa progredir também neste quesito.

Provavelmente, mais momentos de leitura em sala de aula poderia conferir a esse aluno a

oportunidade de ampliar seu campo de visão sobre o assunto, caso os textos tratem sobre o

mesmo tema. Sem embargo, as atividades de leitura devem propiciar a leitura de vários textos,

de variados tipos e gêneros e conteúdos. Dessa forma se trabalha também numa perspectiva

interdisciplinar e possibilita ao aluno estabelecer relações ao produzir seus textos.

Consideremos, ainda, que estabelecer relações entre assuntos é um importantíssimo processo

de construção de sentido, tanto para o escritor quanto para o leitor: a intertextualidade.

O título atribuído ao texto foi modificado para “A maioridade penal” significando,

quiçá, o assunto a ser abordado. Não cabe aqui fazer juízo valorativo quanto ao melhor título

que deveria ser atribuído ao texto. Ao que parece, a reescrita surtiu efeitos positivos. É

possível, embora tenha sido escrito em um só parágrafo, que a conclusão que ele dá ao texto é

bem melhor à que foi desenvolvida na escrita anterior. Fazendo referência à prática de crimes

cometidos por adolescentes que são aliciados por adultos o aluno escreve: “se a maioridade

penal ficasse de 16 anos isso não ia acabar mais conserteza nossa cidade iria melhorar

bastante”.

Levando em conta a construção de sentido ele faz uma modificação importante. Se

na conclusão anterior ele dá a entender que faz parte do crime, na segunda versão ele coloca a

redução da maioridade penal como fonte de mudança na sociedade (em relação ao crime).

Quanto à questão gramatical e ortográfica percebemos que, o aluno, primeiro escreve o verbo

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ir no sentido de futuro, mas conjugado no pretérito imperfeito do indicativo “ia”; mais adiante

ele faz o uso adequado no futuro do pretérito “iria” – um fator comparativo importante no

próprio texto –. A falta de vírgula entre a oração subordinada adverbial condicional e a

adversativa iniciada pela conjunção “mas”, confundida novamente devido à influência da

pronúncia com a grafia do advérbio quantitativo “mais”, seria outro objeto de análise

linguística; acrescenta-se ainda a grafia da locução adverbial afirmativa “com certeza” que,

além de estar grafado junto, o aluno substitui o c pelo s – grafia muito comum, aliás em

alguns textos escolares –. Neste último caso, poderia se trabalhar juntamente à grafia, a classe

de palavra e principalmente a função dela no texto e sua possível substituição da locução pelo

“certamente”.

Provavelmente, mais mudanças importantes teriam ocorrido se houvesse uma

terceira reescrita; atividade esta que traria mais benefícios para a aprendizagem do aluno e,

provavelmente, o texto estaria mais bem escrito e com maior informatividade.

3.1.3 Primeira versão do texto do Aluno 2 (aluna)

De antemão, neste texto, podemos observar que, quanto à superestrutura, houve

adequação mais satisfatória em relação ao gênero proposto. Isso se pode perceber ao

observarmos a organização do texto e a forma como o discurso é construído. Esses são fatores

importantes e positivos que contribuem para o desenvolvimento do texto e de sua

inteligibilidade.

Comecemos pelo título do texto que parece ser interessante e faz um convite ao leitor

para refletir sobre o assunto e, provavelmente a ler o que está sendo dito sobre o mote: “A

maioridade penal reduzida, resolveria?”.

No primeiro parágrafo, a aluna faz uma contextualização a respeito do tema que ela

aborda no texto. Esta é uma característica comum presente nos artigos de opinião. Ela não

deixa evidente, no primeiro parágrafo, sua posição em relação ao assunto. Uma análise mais

criteriosa diria que ela tende a ser favorável à redução da maioridade penal. Vejamos:

Hoje em dia a maioria dos crimes são cometidos por jovens menores de 18, e como a

maioridade aqui no Brasil é de 18 anos, esses jovens cometem delitos e vão para a UNEI

para cumprir medidas sócio-educativas. Ao sair da UNEI a maioria desses jovens voltam e se

aprofundam mais na vida do crime.

Aparentemente a autora estaria a favor da redução da maioridade penal, mas ela vai

construindo argumentos que levam à conclusão de que a maioridade penal não resolveria a

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delinquência juvenil. Ela sugere a aprovação da pena de morte como meio para inibir a prática

de crimes. Essa sugestão demonstra um senso comum em se tratando de legislação, pois, a

pena de morte não se aplica a todos os delitos.

A aluna-autora tenta trazer o leitor para a defesa de sua tese de que não se deve reduzir

a maioridade penal: “Agora, imagine esses jovens indo para esses presídios ao (aos) 16 anos?

Se juntando com criminosos mais experientes?”. O questionamento é uma estratégia

argumentativa que ela lança mão para aproximar-se do leitor.

Ainda que o texto esteja conforme a proposta, é possível melhorá-lo. Vejamos sua

segunda versão.

3.1.4 Segunda versão do texto do Aluno 2 (aluna)

A mudança é bastante significativa principalmente no modo como ela aborda o tema e

na extensão do texto. O primeiro parágrafo já apresenta inclusive uma mudança de

perspectiva. Se na primeira versão ela coloca que a maioria dos crimes são cometidos por

menores, na segunda versão, ela adota outra postura enunciativa. Observemos:

“Atualmente no Brasil, estão ocorrendo crimes constantes envolvendo menores, e

como nesse país a maioridade é de dezoito anos, esses jovens não respondem pelo(s) seus

atos”.

Constatamos que até a forma de contextualizar é substituída por “atualmente”.

Percebemos que a aluna faz bem a referenciação com o uso de “nesse” e “esses” para referir-

se ao Brasil e aos menores respectivamente. Ao escrever o numeral, na segunda versão, ela

opta pela escrita por extenso do número.

A partir das orientações em sala, ao ler o texto, a aluna decide modificá-lo para torná-

lo melhor, e o faz acrescentando mais argumentos, dentre eles o uso de exemplificação

presente nos parágrafos 1, 2 e 3.

De modo mais efetivo, desenvolve uma técnica de fazer o leitor pensar e seguir seu

raciocínio. Ela o faz já com o título que opta por não modificar. E no parágrafo final, ela

convida o leitor a pensar (Agora pense) e faz perguntas: “Reduzir a maioridade penal,

resolveria? Ou o jeito seria a pena de morte?”. O modo como ela coloca o verbo no

condicional implica também uma modalização do discurso que, se dá não de forma coercitiva

ou de argumentum ad báculum, mas de maneira convidativa a uma reflexão. No entanto, ela

deixa claro que a pena de morte poderia ser uma solução melhor que a redução da maioridade

penal.

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Na segunda versão, ela mantém seu posicionamento e melhora a maneira de dizer,

acrescenta argumentos, usa outras palavras. Em suma, fez por si mesma, a análise linguística

do seu texto. Um fato mais que positivo e principal para se alcançar o objetivo da disciplina

de língua portuguesa, como já mencionado em páginas anteriores: formar um aluno-cidadão

que seja capaz de observar o mundo a sua volta de modo crítico e, no caso do texto, capaz de

também ler de forma crítica sua produção.

No âmbito informacional, a segunda versão tem maior completude, pois a aluna-autora

apresenta novos elementos que reforçam seus argumentos e lhe dão mais propriedade.

Poderíamos aprofundar mais acerca dos aspectos discursivos presentes nos textos,

inclusive em possíveis diferenças de estilo entre homem e mulher na hora de escrever. No

entanto, isso necessitaria maior tempo e abordagens que optamos abordar em um trabalho

posterior.

Devemos considerar, a partir do exposto, a validade de se pensar o texto como

processo e a necessidade de incutir esse pensamento também nos alunos. Assim,

consideramos também a validade da prática de reescrita e Análise Linguística em sala de aula,

pois, mesmo o texto com mais ou menos problemas pode passar por um processo de

reestruturação.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como podemos constatar, a partir do que foi exposto, o ato de educar é um ato

político. O professor não está isento de ensinar a partir de suas concepções sobre

aprendizagem. No ensino de língua portuguesa, a concepção que o professor tem acerca de

língua e linguagem vai amparar sua prática em sala de aula.

Vimos ainda que os PCN de Língua Portuguesa orientam um ensino mediante o

estudo do texto numa perspectiva discursiva, uma vez que, considerando o texto e a

linguagem como atividade discursiva é possível levar em conta os sujeitos e as situações

históricas de produção do discurso. Esse ensino do texto, numa perspectiva discursiva, se dá

mediante o estudo dos gêneros discursivos. A escola deve prover ao aluno o contato com as

diferentes manifestações discursivas para que ele possa preparar-se já na escola a atuar na

sociedade de maneira crítica e adequada às situações a que é exposto.

Para Bakhtin (2003), os gêneros do discurso são diversos e infinitos devido a que

“são inesgotáveis as possibilidades da multiforme atividade humana e porque em cada como

dessas atividades é integral o repertório de gêneros do discurso, que cresce e se diferencia à

medida que se desenvolve e se complexifica um determinado campo”. Para cada campo de

atividade humana existe um gênero do discurso relativamente estável que possui um conteúdo

temático, um estilo e uma construção composicional que o identifica.

É com a finalidade de preparar os alunos a cada campo de atuação humana em que

ele for atuar que se deve trabalhar com os gêneros do discurso e, por conseguinte, numa

perspectiva discursiva de linguagem.

As aulas de leitura e produção de texto não podem ser substituídas pelas aulas de

classificação gramatical, mas estas devem inserir-se nas atividades de produção significativa

de linguagem, por meio da prática de Análise Linguística. Assim, não se exclui o estudo

metalinguístico, mas se dá a ele um novo sentido, uma nova forma.

O texto como atividade discursiva, como vimos nos textos analisados, tem na

incompletude uma de suas características fundamentais. Incompletude no sentido de sempre

poder ser melhorado, receber ou retirar informações.

Será na prática de reescrita que o aluno terá a oportunidade de se habituar a ler o

próprio texto e também analisá-lo, avaliá-lo. Desse modo, não só o professor será responsável

pela avaliação do texto, marcando as inadequações. O aluno precisa estar inserido nesse

contexto para que ambos, professor e aluno possam ter consciência de que o texto é resultado

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de um processo que deve ser antecedido por leituras, discussões, escrita, leitura, releitura e

reescrita.

Verificamos que é válida a prática de reescrita, pois foram constatadas mudanças

importantes entre uma versão e outra dos textos analisados. Entendemos que se houvesse

outra reescrita provavelmente haveria outras mudanças que tornariam os textos mais coerentes

e coesos, entretanto, não dispúnhamos de tempo suficiente. Desse modo, enfatizamos a

necessidade de entender que para produzir bons textos requer tempo. Se o aluno tiver tempo

suficiente desde a primeira escrita para pesquisar, ler o próprio texto antes de entregá-lo, a

produção textual terá cada vez menos inadequações do ponto de vista gramatical e também

discursivo.

É preciso fazer da aula de língua portuguesa um laboratório significativo de

produção de textos, de linguagem. Produzir textos não mais deve ser encarado como castigo,

como mero instrumento de avaliação para atribuir nota. Produzir textos deve ter o intuito de

estudar a língua de maneira significativa, principalmente, inseridos em projetos que envolvam

os alunos em práticas também significativas, como a elaboração de jornais, saraus etc.

Pensar o ensino de língua portuguesa como língua materna, numa visão discursiva,

pode ser o caminho para trazer mudanças importantes no cenário educacional brasileiro. Em

vez de produzir poemas para ter nota, o aluno poderia aprender a enxergar a poesia, senti-la.

Na verdade, ele poderia voltar a vê-la se retirasse a venda que a escola, muitas vezes, coloca

sobre seus olhos.

Consideremos também, a título de palavras (quase)finais que a reescrita faz parte da

vida de todo escritor. Neste texto monográfico, por exemplo, quantas palavras e frases foram

substituídas, apagadas, reinventadas para melhor construir o significado do que aqui se

propunha. Reescrever não significa mudar tudo – ainda que às vezes seja preciso –; tem mais

valor o ato de reescrever quando se aprende a dizer e fazer diferente para ser coerente.

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ANEXOS

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PRIMEIRA VERSÃO DO TEXTO DO ALUNO 1

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SEGUNDA VERSÃO DO TEXTO DO ALUNO 1

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PRIMEIRA VERSÃO DO TEXTO 1 DO ALUNO 2

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TRANSCRIÇÃO DA PRIMEIRA VERSÃO DO TEXTO 1 DO ALUNO 2

A maioridade penal reduzida, resolveria?

Hoje em dia a maioria dos crimes são cometidos por jovens menores de 18 anos, e

como a maioridade aqui no Brasil é de 18 anos, esses jovens cometem delitos e vão para a

UNEI para cumprir medidas sócio-educativas. Ao sair da UNEI a maioria desses jovens

voltam e se aprofundam mais na vida do crime.

No presídio, há pessoas que são maiores de idade, pessoas “vividas” e com mais

prática no crime. Já na UNEI, só há jovens que estão começando a vida, sem muita prática.

Agora, imagine esses jovens indo para esses presídios ao 16 anos? Se juntando com

criminosos mais experientes? Eles iriam aprender mais coisas e mais cedo.

A maioridade penal não resolveria a delinquência desses jovens, só pioraria mais

ainda, porque após cumprirem sua pena sairiam de um presídio com mais experiência e

orientações dos mais velhos. Ou seja, mais crimes com pessoas mais jovens ocorreriam. O

jeito seria a pena de morte, pois ficariam assustados e talvez não cometeriam nenhum delito.

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SEGUNDA VERSÃO DO TEXTO DO ALUNO 2