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A ORALIDADE NA ESCOLA
Bernardet Barancelli Valenga1
Orientadora: Ms. Solange Aparecida de Oliveira Collares2
RESUMO: Este texto visa provocar uma reflexão a respeito do trabalho com a oralidade nas turmas do Ensino Fundamental. A escolha do tema deve-se ao fato de percebermos que, apesar da oralidade ser considerada um dos domínios prioritários do ensino de Língua Portuguesa, é pouco trabalhada em sala de aula, refletindo na dificuldade de expressão oral dos alunos,o porquê de não se trabalhar esse conteúdo é nosso questionamento. Os motivos são muitos e vão desde o despreparo do professor até a dificuldade de se controlar a disciplina – hora de falar, hora de ouvir. O objetivo deste é oferecer ao aluno a possibilidade de acesso aos gêneros orais, considerando as variações linguísticas, identificando as marcas de oralidade e oportunizando o conhecimento necessário para o domínio da variedade padrão e os diferentes usos da linguagem, nos mais diversos contextos. Desenvolveu-se o trabalho fazendo uso de entrevista, teatro de fantoches com histórias em quadrinhos e seminário Os teóricos que deram suporte a este trabalho, Dolz & Schneuwly, Marchuschi e Bakhtin destacam a importância do ensino da linguagem oral. O desenvolvimento do trabalho ocorreu com uma turma de 36 alunos da 7ª série, bastante participativos, demonstraram interesse, desenvolveram todas as atividades propostas e, ao apresentarem os trabalhos expressaram-se de forma organizada respeitando os turnos da fala.
PALAVRAS-CHAVE: Oralidade. Variação Linguística. Histórias em
Quadrinhos.
INTRODUÇÃO: O PDE - Programa de Desenvolvimento Educacional é
ofertado aos professores da rede pública do Estado do Paraná pela Secretária
de Estado da Educação, em parceria com as Universidades Estaduais como
oportunidade para rever as práticas pedagógicas, proporcionando aos
professores da rede pública estadual subsídios teórico-metodológicos para o
desenvolvimento de ações educacionais sistematizadas e que resultem em
redimensionamento de sua prática.
É uma oportunidade para que nós, professores, retomemos o contado
com as universidades de onde estamos afastados há bastante tempo e ao
mesmo tempo, aproximar a universidade do ensino básico, através de
1 Professora de Língua Portuguesa da SEED2 Professora Ms. Do Departamento de Pedagogia da UNICENTRO
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atividades teórico-práticas orientadas, resultando na produção de
conhecimentos e mudanças qualitativas na prática escolar da escola pública
paranaense.
Este artigo é o resultado das leituras que feitas durante minha
participação no Programa. A inquietação que eu trazia em relação ao trabalho
com oralidade e respeito às variações linguísticas nas aulas de Língua
Portuguesa, confirmou-se nas vozes de Bakhtin, Marcuschi, Dolz &
Schneuwly,e Bagno, minhas principais referências neste trabalho.
A escolha do tema deve-se ao fato de percebermos a dificuldade de se
trabalhar com a oralidade nas turmas da educação básica, ensino fundamental.
Considerando as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais e das
Diretrizes Curriculares Estaduais, as aulas de Língua Portuguesa devem
desenvolver-se nos eixos de leitura, escrita e oralidade. O trabalho com escrita
e leitura ocorre com regularidade já a oralidade restringe-se às atividades de
correção de exercícios e alguma leitura feita em voz alta por alguns alunos
mais desinibidos que gostam de ler para os colegas. Quando se pensa em
declamação de poesia, apresentação de um livro lido, participação em um
seminário ou em um debate percebe-se a dificuldade de expressão e a timidez.
Oralidade e escrita
Desde que se começou a questionar o ensino de língua portuguesa a
partir da gramática normativa, muitos caminhos têm sido trilhados para se
chegar ao objetivo de formar cidadãos que usem a língua portuguesa de forma
escrito e/ou oral de forma satisfatória.
O ensino da estrutura da língua continua tão importante quanto era
antes, a diferença é que hoje se percebe que fala e escrita então inseridas em
um contexto e não resumidas a frases soltas, desprovidas de significado.
Nesse sentido, os textos passam a ser usados como apoio para as aulas de
língua portuguesa. Essa clareza e entendimento nos vêm por meio de Bakhtin:
Todos os diversos campos da atividade humana estão ligados ao uso da linguagem. Compreende-se perfeitamente que o
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caráter e as formas desse uso sejam tão multiformes quanto os campos da atividade humana, o que, é claro, não contradiz a unidade nacional de uma língua. O emprego da língua efetua-se em forma de enunciados (orais ou escritos) concretos e únicos, proferidos pelos integrantes desse ou daquele campo da atividade humana. Esses enunciados refletem as condições específicas e as finalidades de cada referido campo não só por seu conteúdo (temático) e pelo estilo da linguagem, ou seja, pela seleção dos recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua mas, acima de tudo, por sua construção composicional. Todos esses três elementos – o conteúdo temático, o estilo, a construção composicional – estão indissoluvelmente ligados no todo do enunciado e são igualmente determinados pela especificidade de um determinado campo da comunicação. Evidentemente, cada enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciado, os quais denominamos gêneros do discurso .(2003, p.261-262).
Com essa consciência, os textos começam a ser utilizados em sala de
aula, porém falta aos professores fundamentação teórica. Essa insegurança
deixou um vácuo no ensino de língua, deixou-se de lado a gramática e não
havia clareza de como trabalhar com textos. O mais prático foi seguir o livro
didático que de apoio, passou a ser “tábua de salvação” deixando de ver e
explorar a imensa riqueza de textos que circulam na vida das pessoas
diariamente como: panfletos de propaganda, bulas de remédios, manuais de
instrução, receitas, jornais, revistas, bilhetes, e-mail, blogs...
Dentre a diversidade de textos que circulam, a educação não pode
ignorar a influência das múltiplas mídias modernas nem deixar de refletir sobre
as mais diversas formas de linguagens de comunicação, presentes na vida das
pessoas diariamente entre as quais, destacamos as revistas de histórias em
quadrinhos3, os populares gibis, que nos anos 50 eram considerados
prejudiciais à educação, hoje são considerados importante material
pedagógico. Consideradas leitura fácil, as histórias em quadrinhos atraem
leitores de várias idades, crianças, jovens e até idosos divertem-se com as
histórias de humor ou aventura de super-heróis.
As histórias em quadrinhos surgiram no final do séc. XIX, e inicialmente
eram publicadas em forma de tirinhas, nos jornais. Representam personagens
humorísticos, heróis que combatem vilões, sempre refletindo os
3 Narração de história por meio de desenhos e legendas dispostos numa série de quadros.
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acontecimentos mundiais, os personagens não são aleatórios, cada um tem
sua ideologia e vão modernizando-se, acompanhando a evolução.
Por sua popularidade, questões envolvendo as histórias em quadrinhos,
passaram a ser cobradas em algumas provas de vestibular e do Enem e, em
muitos livros didáticos podemos encontrar material para o trabalho em sala de
aula, só que muitas vezes não é tão explorado quanto poderia:
Os quadrinhos são, sem dúvida, um riquíssimo material de apoio didático. Sendo bem trabalhados (o que poucas vezes acontece), propõem aos alunos um bom debate e um maior aprofundamento do que seja o uso da língua portuguesa. [...] é possível ensinar língua portuguesa com histórias em quadrinhos. O ideal seria o professor adaptar as atividades à sua realidade de sala ou, melhor ainda, aprimorá-las, reinventá-las, inová-las. Queremos mostrar que há um caminho fértil a ser seguido, um caminho ainda desconhecido ou ignorado por muitos docentes de Língua Portuguesa. BARBOSA (2009, p. 66).
Muitas vezes o trabalho com os quadrinhos fica apenas na
descontração, interpretação da piada ou do sucesso do herói, o que é
lamentável, pois perde-se a oportunidade de aproveitar um material de apoio,
que é apreciado pelos alunos, para maior aprofundamento dos conteúdos de
língua portuguesa
A LINGUAGEM DOS QUADRINHOS
As histórias em quadrinhos usam uma linguagem específica que junta
texto e desenho. Algumas mensagens são entendidas através da leitura do
texto, outra da imagem e outras ainda precisam da interação dos dois códigos.
Constitui-se de uma narrativa, apresentada em forma de quadrinhos dispostos
de formas variadas, dependendo da intenção do autor. As imagens dos
quadrinhos representam um momento específico ou uma sequência interligada
de instantes o que diferencia de uma fotografia que capta apenas o instante, o
quadrinho apesar de fixo, utiliza-se de recursos que dão ideia de movimento.
Os quadrinhos costumam ter um protagonista fixo que identifica a revista
e que contracena com personagens secundários. As representações dos
personagens vão desde figuras humanas, caricaturas até desenhos de animais
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com comportamentos humanos. A manutenção do interesse pelas histórias dos
personagens faz com que os autores mantenham inalteráveis as características
comportamentais e ideológicas de suas criações. Segundo Vergueiro:
[...] muitas histórias em quadrinhos tendem a firmar-se em estereótipos para melhor fixar as características de um personagem junto ao público. Este tipo de representação traz em si uma forte carga ideológica, reproduzindo os preconceitos dominantes na sociedade. (2009, p. 53).
A linguagem dos quadrinhos, como toda forma de comunicação de
massa, não é isenta, ela serve a interesses ideológicos do capitalismo e
normalmente reproduz preconceitos sociais.
Apesar da apresentação escrita, as histórias em quadrinhos
representam a linguagem oral para expressar a fala e pensamento dos
personagens (balões próximos à cabeça dos personagens que falam) e voz do
narrador (retângulo no canto superior esquerdo do quadrinho). Os sons
também são representados pelas onomatopéias, que são sinais que
representam ou imitam um som por meio de caracteres alfabéticos por
exemplo: co-co-có-ri-có (canto do galo), BUM! (explosão), Splash (queda na
água), Rring! Rring! (telefone), Smack (beijo), etc.
DA TEORIA PARA A PRÁTICA
Para iniciarmos efetivamente nosso trabalho, entregamos aos alunos um
texto: oralidade nas histórias em quadrinhos e orientamos para que fizessem
leitura silenciosa, depois cada aluno leu um parágrafo, alternados com
comentários e explicações levando-os a compreender a dinâmica das histórias
em quadrinhos que, por meio de balões, mistura imagens, textos, palavras,
levando o leitor a ouvir as falas em sua mente enquanto lê, criando
características específicas para cada personagem
Segundo Vergueiro (2009) acontece com muita frequência,
reclamações, quando as histórias em quadrinhos são transformadas em filmes
ou em peças teatrais, pois as pessoas dizem não reconhecer as falas das
personagens. Isto acontece porque, a dinâmica de apresentação das histórias
em quadrinhos, por meio dos balões, mistura imagem, texto, palavra, levando o
leitor a ouvir as falas em sua mente enquanto lê criando características
específicas para cada personagem.
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Dentro do tema escolhido: Reconhecimento das Variações Linguísticas
Via Histórias em Quadrinhos. Destacamos como nosso objetivo, trabalhar mais
efetivamente a oralidade e a diversidade linguística em sala de aula, pois, a
variedade linguística fica mais evidente na oralidade e é através dessa
oralidade que acontecem os preconceitos que classificam as pessoas pela
forma como se comunicam. Fazendo uso das histórias em quadrinhos,
principalmente as histórias do Chico Bento de Maurício de Souza, pretendemos
mostrar a importância de se reconhecer as mais diversas formas de
comunicação oral e de se adquirir, na escola, a forma de comunicação mais
prestigiada socialmente para que se possa ter escolha de uso em situações
formais e/ou informais.
As histórias em quadrinhos são propícias para se trabalhar adequação
de linguagem, variação e preconceito linguístico, aspectos próprios da língua
falada, compreensão de sentidos por meio de um contexto, coesão e coerência
e por fim, os elementos visuais presentes nas histórias em quadrinhos que são
muito importantes para a compreensão de contexto e sentido: alegria, medo,
indiferença podem ser compreendidos independentemente do texto escrito.
Após a leitura e os comentários entregamos uma revista em quadrinhos
para cada aluno (Turma da Mônica, Chico Bento, Pato Donald, Tio Patinhas,
Urtigão, Zé Carioca e outras) percebemos que alguns alunos nunca tinham lido
revista em quadrinhos, outros demonstraram familiaridade, mas o interesse
ficou claro, quando terminou o tempo de leitura, alguns pediram para continuar
lendo em outras aulas, outros pediram emprestado para levar para casa. A
orientação era que, todos deveriam ler pelo menos uma das histórias, das
revistas recebidas. Marcamos um tempo e chamamos a turma para a
discussão das leituras. Todos puderam falar sobre seu personagem, principais
características e um pouco da história lida. Aproveitamos para chamar à
atenção sobre as variedades linguísticas representadas nos textos lidos
Para descontrair, apresentamos um vídeo na TV pendrive: com imagens
de Chico Bento, personagem de Maurício de Souza, os alunos assistiram as
cenas de Chico Bento e cantaram juntos a música que remete à vida simples
do interior.
No final da aula, organizamos a turma em duplas e distribuímos algumas
questões para que realizassem entrevistas. Cada dupla deverá entrevistar pelo
menos quatro pessoas de escolaridade e profissões diferentes. A entrevista
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deveria ser registrada em formulário e/ou gravada, para apresentação na
próxima aula. Questões anexo I.
Os objetivos da entrevista foram observar a forma de falar das pessoas,
associando escolaridade à forma de expressão oral e exercitar a oralidade em
sala de aula, apresentando para a classe, de forma oral, o resultado de seu
trabalho.
A maioria dos(as) alunos(as) escreveu as respostas dadas no
formulário, alguns poucos, gravaram em seus celulares. Na apresentação
ficou claro, que o nível de escolaridade influencia de forma direta na maneira
de falar das pessoas. Além das apresentações das entrevistas, os alunos
foram questionados para que falassem de sua impressão sobre a manifestação
oral das pessoas entrevistadas. Os alunos que trouxeram as entrevistas
gravadas contribuíram muito para que pudéssemos identificar alguns vícios de
linguagem, como “daí, né, tipo assim”, presentes até mesmo na fala de
pessoas com mais escolaridade. Aproveitamos também o momento da
apresentação dos alunos (oralmente) para reforçar o cuidado com a linguagem
adequado-a ao contexto, neste caso sala de aula, falando para os colegas e
para a professora.
No segundo momento, distribuímos aos alunos um texto para leitura e
interpretação: Origem das Histórias em Quadrinhos. O texto traz informações
sobre o surgimento das histórias em quadrinhos no mundo e primeiras
manifestações no Brasil, principais autores, primeiros personagens, contextos
em que foram criados e o sucesso que alguns desses personagens fazem até
hoje. Além disso, o texto relata momentos de sucesso e momentos de crise
vividos pelos criadores até a década de 90, quando acontece o grande “bum”
das histórias em quadrinhos com o surgimento da cor computadorizada.
Quadrinhos no Brasil
No Brasil, o precursor das histórias em quadrinhos, foi Angelo Agostini4
com a publicação de Cenas da escravidão durante a campanha abolicionista,
as cenas, em 14 ilustrações fazem referência aos passos da paixão de Cristo,
retratando cenas de tortura a que eram submetidos os escravos cativos, depois
surgiram outros personagens como: Nhô Quim, Zé Caipora publicados nas
4 Angelo Agostini- em 1869 escreveu As Aventuras de Nhô Quim, considerada uma autêntica História em Quadrinhos
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revistas Dom Quixote e Tico-Tico. Em 1930 chegam ao Brasil as histórias
americanas. Em 1939, Roberto Marinho lançou o Gibi, nome que passaria a ser
sinônimo de revista em quadrinhos.
Em 1960 começam a ser publicadas no Brasil as histórias da Disney e
surgem novos personagens brasileiras como: Pererê, de Ziraldo, Gabola, de
Peroti, Sacarrolha, de Primaggio e toda a série de personagens de Maurício de
Souza.
A partir da leitura do texto, questionamos os alunos sobre as leituras
presentes em suas casas, se os pais leem, se compram livros e revistas,
jornais, se compram revistas de histórias em quadrinhos.
Após a interação oral entregamos algumas questões para compreensão
e discussão sobre personagens relatados nos textos que são conhecidos e
fazem sucesso até hoje. Propusemos que conversassem com pais, tios, avós,
enfim, pessoas mais velhas, sobre personagens de histórias em quadrinhos
conhecidas. Solicitamos que trouxessem revistas antigas que encontrassem
em casa para montarmos um mural com capas de revistas antigas e atuais.
. Alguns alunos não realizaram a tarefa, outros conversaram com pais,
avós ou tios e descobrimos que a maioria dos adultos sabatinados, teve sua
fase de leitor de “gibi”. Alguns trouxeram revistas antigas que tiveram suas
capas xerocadas para fazer parte de um mural: histórico sobre os quadrinhos
no Brasil e no mundo.
Continuamos o trabalho com a oralidade através das histórias em
quadrinhos, a partir de agora, nosso foco serão personagens criados por
Maurício de Souza, com enfoque especial na Turma do Chico Bento.
Apresentamos aos alunos um texto sobre a trajetória de Maurício de
Souza, um dos mais famosos caricaturistas do Brasil, criador da Turma da
Mônica.
Maurício começou a desenhar em 1959, quando uma história sua, Bidu,
sua primeira personagem foi publicada num jornal. Bidu e seu dono Franginha,
foram as primeiras personagens da Turma da Mônica.
A personagem Mônica, foi criada em 1963 e passou a ilustrar o
suplemento infantil do Estado de São Paulo que até hoje publica tirinhas de
Turma da Mônica. A revista da Mônica foi lançada em 1970 e já foi publicada
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pela Editora Abril e Editora Globo e desde 2007 é publicada pela Editora Panini
Comics.
Dentre as inúmeras personagens criadas por Maurício de Souza, está a
Turma do Chico Bento que representa uma turma de crianças vivendo num
meio rural, típico de cidades pequenas.
Após a leitura silenciosa do texto. Procedemos a leitura em voz alta, com
interrupções para comentários de esclarecimento, as contribuições dos alunos
foram enriquecedoras. Para melhor compreensão, entregamos a cada
aluno(a) uma revista de Maurício de Souza para que escolhessem uma das
histórias para leitura, em seguida comentamos sobre as personagens que
apareceram nas histórias lidas, distribuímos uma folha impressa com
atividades, para serem respondidas individualmente, a partir da escolha de
uma personagem da revista que tinham em mãos
Após a escolha da personagem (com características humanas),
deveriam escrever sobre: aparência, local onde vive, condição social, com
quem interage na história e forma de falar (expressão oral). O objetivo dessa
atividade é avaliar a capacidade de observação e descrição, atendo-se aos
fatos, sem julgamento.
A principal dificuldade encontrada nessa atividade foi fazê-los parar de
ler para fazer as atividades, a ideia central era, ler uma história e escolher um
personagem para desenvolver a atividade, mas não foi possível, precisamos
esperar que lessem toda a revista para só então continuar as atividades.
Alguns precisaram de ajuda para identificar, através da apresentação no
história, a condição social em que vive a personagem escolhida.
Terminada a atividade, socializamos oralmente, escolhendo
personagens para que não ficasse repetitivo, por exemplo: alguém que
escolheu a personagem Mônica, Cebolinha, Cascão, Magali, Chico Bento.
Importante observar que no trabalho com oralidade, há uma grande dificuldade
para que se ouça o outro, percebe-se a falta de preparo para manifestações
orais, principalmente quando quem fala é o colega.
ENSINANDO COM QUADRINHOS
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Os textos e as personagens das histórias em quadrinhos, segundo
Vergueiro (2009), podem ser propícios para trabalhar uma variedade de
conteúdos, entre eles:
Adequação de linguagem, em determinada situação se faz necessário o
uso mais próximo da norma culta para escrever ou falar, em outras mais
descontraídas, utilizamos uma linguagem mais informal (p.66-68);
Variação e preconceito lingüístico, a língua não é estática e nem
homogênea assim como as pessoas vivem em regiões diferentes, têm situação
econômica diferentes, pertencem a grupos diferentes, têm idades e níveis de
escolaridade diferentes também a forma de comunicação varia muitas vezes
levando ao preconceito classificando as pessoas como quem usa a forma
linguística “certa” ou “errada”(p.68-73);
Fala e escrita, não são dicotômicas5, mas vistas como complementares,
nos quadrinhos o texto representa a escrita e o uso dos balões representam o
discurso direto ou seja a oralidade (p.73-75);
Aspectos da oralidade, a língua falada possui aspectos próprios e
acontece num processo de interação em que duas ou mais pessoas dialogam
respeitando turnos, muitas vezes acompanhada de expressões próprias da
oralidade, tipo assim, daí, etc.( p.75-76);
Compreensão de sentidos por meio do contexto, muitas palavras só
podem ser compreendidas dentro de um contexto (p. 78-79);
Coerência, coesão, nas histórias em quadrinhos, principalmente nas de
humor, às vezes o texto é incoerente (de propósito) do ponto de vista normativo
mas, é justamente aí que está a graça da piada. Da mesma forma, a coesão
(amarração das diversas partes do texto) acontece nos quadrinhos da mesma
forma que nas demais produções textuais (p.80-83).
E por fim, os recursos de expressão visual p.83-84, presentes nas
histórias em quadrinhos são muito importantes para compreensão de contexto
e sentido: alegria, medo, indiferença podem ser compreendidos independente
do texto escrito.
5 Divisão em dois; bipartição
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Como podemos perceber, temos um material de fácil acesso, que
oferece inúmeras possibilidades de apoio didático para as aulas de língua
portuguesa, só precisamos. Afastar o preconceito e criar nosso próprio estilo.
A ORALIDADE COM CHICO BENTO
O passo seguinte é trabalharmos mais especificamente a personagem
Chico Bento, entregamos aos alunos o texto: Quadrinhos do Chico Bento que
foi lido, primeiro silenciosamente e depois em voz alta por um aluno. O texto
relata que Chico Bento foi criado em 1961 inspirado em um tio-avô de Maurício
de Souza, a primeira revista foi lançada em agosto de 1982 e que, antes disso,
Chico Bento já aparecia nas tirinhas de Hiroschi e Zezinho ( Hiro e Zé da
Roça).
A personagem, Chico Bento, vive com seus pais seu Bento e dona
Cotinha, mora num sítio no interior de São Paulo, anda descalço, usa chapéu
de palha, tem uma avó chamada Dita que lhe conta histórias. Fazem parte de
suas histórias sua namorada Rosinha, seus amigos Zé da Roça e Hiro, seu
anjo da guarda Zé Lelé, seu primo da cidade, sua professora, dona Marocas e
Nhô Lau, o dono das goiabas mais gostosas da região.
Após a leitura, realizamos atividades para compreensão do texto,
questionando, quem serviu de inspiração para a criação da personagem de
Chico Bento? Em que local acontecem a maioria das histórias? Que tipo de
linguagem predomina nas histórias do Chico Bento? Que leituras podemos
fazer dos balões?
OUVINDO UMA HISTÓRIA
Para continuamos nosso estudo sobre oralidade e variedade linguística
apresentamos um vídeo que mostra uma história em quadrinhos com
movimento e som. Assistimos uma vez, apenas para nos divertirmos com a
história e uma segunda vez, para observamos o modo de falar das
personagens, o local onde se passa a história, e a mensagem implícita.
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Trazer o vídeo foi uma forma de ilustrar a aula e mostrar que há várias
formas de se apresentar um texto. A transformação de uma história escrita em
filme facilita para quem tem resistência à leitura. No caso das histórias em
quadrinhos, diferente de outros textos escritos, a apresentação em forma de
vídeo, apenas dá movimento e voz aos personagens, mantendo-se fiel ao texto
escrito que já tem características de oralidade.
Em seguida, entregamos para cada aluno a cópia de uma história da
Turma do Chico Bento: Chico Bento em O que é a NATUREZA! Fizemos cópia
colorida para manutenção de todos os detalhes da história, suprimimos apenas
as falas para que eles criassem os diálogos. A história acontece, no sítio tendo
como personagens Chico Bento, Zé Lelé e uma porção de animais.
Não foi uma atividade muito fácil, alguns tiveram bastante dificuldade
para começar, propusemos então, que formassem duplas e, juntos
conversassem e tentassem entender a história. Deixei livre para que
escolhessem o(a) colega que tivessem mais afinidade. Foi uma boa estratégia,
as histórias ficaram parecidas porém mais ricas em detalhes.
É evidente que ninguém escreveu a história exatamente como a original,
mas chegaram bem próximos. Atividade concluída, deixamos livre para quem
quisesse ler o que havia escrito, para os colegas, alguns fizeram a leitura e em
seguida, recolhemos os trabalhos e procedemos à leitura da história original
escrita por Maurício de Souza (Chico Bento número 106, Editora Globo )
apenas para ilustrar.
Lendo as produções dos alunos percebemos que alguns escreveram
fazendo uso da norma padrão ignorando o tipo de personagem representado,
porém a grande maioria demonstrou ter compreendido o tipo de linguagem
utilizada naquele contexto, com aquelas personagens, escreveram fazendo uso
do “caipirês”.
A próxima atividade pretende familiarizá-los mais com as histórias do
Chico Bento, para isso, entregamos a cada um uma revista do Chico Bento
para que lessem. Durante a leitura observamos que alguns leram rapidamente
a sua revista e trocaram para ler também a do colega já outros demonstraram
pouco interesse e escolheram para ler, apenas as histórias mais curtas. Essa
atividade é preparatória para a escolha de uma história para ser representada
em forma de teatro de fantoches.
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TEATRO DE FANTOCHES
Para essa atividade, mandamos confeccionar fantoches da Turma do
Chico Bento: Chico Bento, Rosinha, Zé Lelé e o Primo da cidade, levamos para
a sala de aula também, a família de fantoches: mãe, pai, filho, filha, avô, avó
disponíveis na escola. Apresentamos o material juntamente com o cenário
(casinha) onde seriam encenadas as histórias.
No primeiro momento, todos queriam manusear os fantoches, andaram
pela sala, brincando, inventando falas, fazendo “caras e bocas”, deixamos um
tempo para esse primeiro contato e em seguida, recolhemos todo o material e
organizamos a sala para a atividade.
A ideia era formarmos nove grupos, com quatro elementos em cada
grupo, porém tivemos que ceder a alguns grupos que queriam ficar em cinco,
outros só em três, temos também nessa turma, uma aluna especial que pouco
se comunica com a turma, conseguimos que uma colega fizesse o trabalho
com ela (dupla).
Grupos formados, novamente entregamos as revistas em quadrinhos
para que lessem e escolhessem uma história para ser apresentada com a
utilização dos fantoches. A atividade foi demorada porque foi necessário que
lessem várias histórias para escolher a mais adequada para a apresentação,
algumas eram muito complexas com muitos personagens, outras muito
simples, muito curtas.
Com as histórias escolhidas, o próximo passo foi adaptar para a
apresentação, escolher quem vai manusear os fantoches e quem vai
apresentar as falas. Durante o trabalho circulamos pelos grupos, sugerindo,
incentivando e motivando alguns alunos que, como em todas as atividades,
demonstram pouco interesse. Na segunda aula, fomos para o salão nobre da
escola, optamos por levá-los ao salão para criar o clima de teatro, palco e
platéia e também o uso do microfone. Lá, os alunos puderam preparar o
material necessário e usar o cenário para ensaiar. Alguns grupos já quiseram
apresentar, deixamos livre, alguns repetiram para ganhar segurança na
apresentação. Na próxima aula, todos os grupos deverão apresentar em forma
de teatro, a história por eles escolhida.
As apresentações com os fantoches foram um momento lúdico bem
importante para se observar as manifestações de oralidade. Atrás de uma
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cortina, e falando através de um boneco os alunos puderam esquecer um
pouco a timidez e alguns imitaram o jeito de falar “caipirês” do Chico Bento, da
Rosinha e do Zé Lelé. A aluna com dificuldade de comunicação participou
manuseando o fantoche, enquanto sua colega fazia as falas das personagens.
Um dos objetivos de se trabalhar oralidade é munir o aluno de
conhecimentos linguísticos que o deixem seguro para expressar-se diante dos
colegas ou de um grupo desconhecido. Para isso, depois das apresentações
para os colegas de classe, chamamos turmas de alunos das quintas séries
para que também assistissem as apresentações. Essas foram as melhores
apresentações, o que nos leva a observar que, a repetição não é ruim e em
educação é através dela que melhoramos nossa performance, é assim com a
oralidade e também com a escrita.
Havíamos planejado desenvolver o projeto todo em dez aulas, porém as
apresentações com os fantoches exigiram um pouco mais de tempo. Entre a
adaptação da história, ensaios e apresentações foram utilizadas 4 horas aula,
mas valeu a pena, os grupos capricharam nas apresentações e na escolha das
histórias.
SEMINÁRIO
Para finalizar, também no salão nobre, realizamos um seminário6. O
assunto proposto, para completar nosso trabalho foi: Oralidade e Variação
Linguística O seminário faz parte dos gêneros textuais, que têm como foco a
oralidade, e é realizado através a exposição oral de um conteúdo específico
que se pretende transmitir. Pode ser apresentado em grupo ou individualmente
e deve considerar: domínio do assunto pelo expositor, preparo de um esquema
básico com as informações mais importantes que irão orientar a fala, utilização
de recursos audiovisuais, uso da linguagem padrão e cuidado com a
articulação das palavras e tom de voz.
Os alunos receberam as orientações e o esquema básico para
apresentação de um seminário e também as questões sobre as quais deveriam
se manifestar durante o seminário. No dia da apresentação, foram colocados
6 Sessão doe estudos em grupo com debate da matéria exposta por cada participante.
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em círculo e cada um pode expor sobre as questões que haviam previamente
recebido. Questões em anexo II
No esquema da distribuição das questões, três ou quatro alunos falavam
sobre a mesma questão confirmando ou discordando em suas falas, levando o
grupo todo a refletir sobre o assunto. Concluímos o seminário com comentários
reforçando a importância de se ter cuidado com nossa forma de expressão
oral, priorizando o uso da linguagem padrão, a compreensão e o respeito à
forma de falar das pessoas com quem convivemos.
CONCLUSÃO
Durante o desenvolvimento do projeto constatou-se a importância do
trabalho com a oralidade, que apesar de ser considerada um dos domínios
prioritários do ensino de Língua Portuguesa, é pouco trabalhada em sala de
aula, refletindo assim, na dificuldade de expressão oral dos alunos. O objetivo
foi oferecer ao aluno a possibilidade de acesso aos gêneros orais,
considerando as variações linguísticas, identificando as marcas de oralidade e
oportunizando o conhecimento necessário para o domínio da variedade padrão
e os diferentes usos da linguagem, nos mais diversos contextos.
Para atingir os objetivos fez-se uso de gêneros orais como entrevista,
teatro de fantoches e seminário utilizou-se como apoio didático as histórias em
quadrinhos. Segundo Vergueiro (2009), os textos e as personagens das
histórias em quadrinhos são propícios para trabalhar uma variedade de
conteúdos, entre eles: adequação de linguagem, variação e preconceito
linguístico, fala e escrita, aspectos da oralidade, coesão e coerência. O material
é de fácil acesso e oferece inúmeras possibilidades de apoio didático para as
aulas de Língua Portuguesa.
Além disso, o trabalho com os gêneros orais como entrevista, teatro de
fantoches e seminário fortaleceram a confiança na oralidade. O trabalho com
esses e/ou outros gêneros orais poderá capacitar os alunos para que façam
uso da linguagem oral nos mais diversos contextos.
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É responsabilidade da escola e mais especificamente do professor de
Língua Portuguesa trabalhar a oralidade junto com a escrita, considerando-as,
não como dicotômicas, mas dando a cada uma a devida importância. Os
mesmos cuidados que se têm com a escrita, deve-se ter com a oralidade,
considerando, língua padrão, variedades linguísticas e contexto de uso.
Faz-se necessário, portanto, colocar o aluno em contato com os gêneros
orais em todos os anos do Ensino Fundamental e também do Ensino Médio, só
assim, teremos alunos capazes de ter: discurso próprio, argumentos
sustentáveis e aptos a fazer uso da linguagem como forma de integração
social, sendo capazes de adaptar seu discurso aos diferentes contextos com os
quais venha a se deparar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAKHTIN/VOLOSHINOV, Mikhail. Os gêneros do discurso: problemática e definição. In: Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p. 279-236.
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___________________________. Estética da Criação Verbal. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
BAGNO, Marcos. Nada na Língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística. 3ª ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2007.
BARBOSA, Alexandre. Como usar as histórias em quadrinhos na sala de aula. 3 ed. São Paulo: Contexto, 2009.
LOUZADA, Ana Maria. Linguagem, mediação pedagógica e apropriação do conhecimento. Revista Presença Pedagógica. Belo Horizonte, v.10 n. 57, 2004.
MACEDO, Maria do Socorro Nunes, MORTIMER, Eduardo Fleury. Interações orais nas práticas de letramento na sala de aula. Revista Presença Pedagógica, Belo Horizonte, v.10 n.56, 2004.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Da Fala para a Escrita: Atividades de Retextualização. 1 ed. São Paulo: Editora Cortez, 2001,
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SCHNEUWLY, Bernard, DOLZ, Joaquim. Gêneros Orais e escritos na Escola. São Paulo: Mercado das Letras, 2007
Anexo I
a) Qual seu nome completo e qual é sua idade?
b) Qual sua profissão e qual sua escolaridade?
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c) Descreva seu trabalho.
d) Em sua opinião, o estudo pode melhorar a vida das pessoas? Por quê?
e) Transcreva algumas falas dos(as) entrevistados(as), observando recursos
usados na oralidade.
Anexo II
1.Que tipo de linguagens usamos para nos comunicarmos uns com os outros?
2.Quais as diferenças que podemos perceber entre a fala e a escrita?
3.Como reconhecemos que alguém escreve bem?
4.Como reconhecemos que alguém fala certo?
5.Existe certo e errado em relação à fala e à escrita?
6.Por que é importante escrever bem e falar bem (norma padrão)?
7.Como falam as pessoas mais bem consideradas no meio social?
8.Comente: “Toda fala tem uma razão de ser, não é para rir é para conhecer”
9.As pessoas que conhecemos falam sempre da mesma maneira?
10. Analisemos a fala de alguém que conhecemos bem, seu pai ou sua mãe,
por exemplo, como convidariam alguém para almoçar?
- O chefe ou superior no trabalho?
- Um(a) amigo(a)?
- Um filho(a) que acabou de chegar da escola?
11.Conhecer bem nossa língua, escrita (normas) e falada, fará diferença em
nossas vidas. De que forma podemos aprender mais?