a “inclusÃo” do indÍgena na escola

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Revista Panorâmica On-Line. Barra do Garças – MT, vol. 23, p. 76 - 86, jul./dez. 2017. ISSN - 2238-921-0 76 A “INCLUSÃO” DO INDÍGENA NA ESCOLA Juscineide Aparecida Figueiredo 1 Victor Alves Santos 2 Gislene dos Santos Alves 3 Pollyany Pereira Martins 4 Resumo: Esse estudo tem como objetivo analisar a “inclusão” do indígena na escola “comum”. Respondendo questionamentos como: de que forma os indígenas são inseridos nas escolas? É respeitado os princípios e diretrizes estabelecidos na LDB/CF (Lei de Diretrizes e Bases e Constituição Federal)? Suas características culturais sofrem interação gradativa no ambiente de diversidade como a escola? Metodologicamente, utilizou-se revisão bibliográfica, baseadas em autores como Magalhães (2009), Tsi’rui’a (2012), Damata (2016), entre outros. Fundamentou-se evidências por meio de afirmações e declarações postas ao pesquisador, observações, que possibilitaram contato pessoal e estreito com o fenômeno investigado e entrevistas, que trarão um contato ainda maior e imediata captação do objeto estudado. Visando discutir sobre esta inclusão, foi pensado uma proposta de levantamento de informações extraídas de escolas regulares localizadas nas cidades de Aragarças-GO e Barra do Garças-MT, para assim, buscar chegar a respostas dos pontos de inquietações e apresentar uma abordagem discursiva. O não conhecer da cultura do outro pode ocasionar visão etnocêntrica, muitas vezes impedindo de visualizar outras possibilidades, como a convivência saudável entre culturas distintas. Na análise feita para a construção desse trabalho; talvez a maior barreira tanto de convívio, como de apoio ao ensino seja a língua; percebendo se como fator de dificuldade na permanência de alunos indígenas na escola “comum”. Palavras-chave: Inclusão. Indígena. Lei. THE “INCLUSION” OF THE INDIGENOUS IN SCHOOL Abstract: This study has with objective analysis the “inclusion” of the indigenous in “regular” school. Answering questions like: in what way the Indians are included in school? Are 1 Discente do Curso de Licenciatura em Geografia, Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Campus Universitário do Araguaia (CUA). E-mail: [email protected] . 2 Discente do Curso de Licenciatura em Geografia, Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Campus Universitário do Araguaia (CUA). E-mail: [email protected] . 3 Discente do Curso de Licenciatura em Geografia, Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Campus Universitário do Araguaia (CUA). E-mail: [email protected]. 4 Mestre. Rede Estadual de Ensino. E-mail: [email protected] .

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Revista Panorâmica On-Line. Barra do Garças – MT, vol. 23, p. 76 - 86, jul./dez. 2017. ISSN - 2238-921-0

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A “INCLUSÃO” DO INDÍGENA NA ESCOLA

Juscineide Aparecida Figueiredo1 Victor Alves Santos2

Gislene dos Santos Alves3 Pollyany Pereira Martins4

Resumo: Esse estudo tem como objetivo analisar a “inclusão” do indígena na escola “comum”. Respondendo questionamentos como: de que forma os indígenas são inseridos nas escolas? É respeitado os princípios e diretrizes estabelecidos na LDB/CF (Lei de Diretrizes e Bases e Constituição Federal)? Suas características culturais sofrem interação gradativa no ambiente de diversidade como a escola? Metodologicamente, utilizou-se revisão bibliográfica, baseadas em autores como Magalhães (2009), Tsi’rui’a (2012), Damata (2016), entre outros. Fundamentou-se evidências por meio de afirmações e declarações postas ao pesquisador, observações, que possibilitaram contato pessoal e estreito com o fenômeno investigado e entrevistas, que trarão um contato ainda maior e imediata captação do objeto estudado. Visando discutir sobre esta inclusão, foi pensado uma proposta de levantamento de informações extraídas de escolas regulares localizadas nas cidades de Aragarças-GO e Barra do Garças-MT, para assim, buscar chegar a respostas dos pontos de inquietações e apresentar uma abordagem discursiva. O não conhecer da cultura do outro pode ocasionar visão etnocêntrica, muitas vezes impedindo de visualizar outras possibilidades, como a convivência saudável entre culturas distintas. Na análise feita para a construção desse trabalho; talvez a maior barreira tanto de convívio, como de apoio ao ensino seja a língua; percebendo se como fator de dificuldade na permanência de alunos indígenas na escola “comum”. Palavras-chave: Inclusão. Indígena. Lei.

THE “INCLUSION” OF THE INDIGENOUS IN SCHOOL Abstract: This study has with objective analysis the “inclusion” of the indigenous in “regular” school. Answering questions like: in what way the Indians are included in school? Are

1 Discente do Curso de Licenciatura em Geografia, Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Campus Universitário do Araguaia (CUA). E-mail: [email protected]. 2 Discente do Curso de Licenciatura em Geografia, Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Campus Universitário do Araguaia (CUA). E-mail: [email protected]. 3 Discente do Curso de Licenciatura em Geografia, Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Campus Universitário do Araguaia (CUA). E-mail: [email protected]. 4 Mestre. Rede Estadual de Ensino. E-mail: [email protected].

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respected the principles and guidelines established on LDB/CF (law of guidelines and bases and federal constitution)? Are their cultural characteristics gradual interacting on diversity environment such as school? Methodologically, to this was used a bibliographic review, based on writers such as Magalhães (2009), Tsi’rui’a (2012), Damatta (2016), among others. The evidences was underlie through affirmations and statements set to the researcher, observations that allowed personal and close contact with the investigated phenomenon and interviews, that have already will bring an even greater contact and immediate capture of the object studied. Aimed at discussing this inclusion, a proposal was made to collect information extracted from regular schools located in the cities of Aragarças-GO and Barra do Garças-MT, in order to seek answers to the doubts points and offer a discursive approach. The unknowing the culture of the other can lead to ethnocentric vision, often hindered the visualization of other possibilities, such as healthy coexistence between different cultures. On the analysis made for the construction of that work; perhaps the greatest barrier both to conviviality and to supporting teaching is language; perceiving themselves as a factor of difficulty on the permanence of indigenous students in the “regular” school. Key words: Inclusion. Indigenous. Laws. Introdução

Este ensaio surgiu a partir de uma atividade proposta na disciplina de

Psicologia da Educação, desenvolvida no Curso de Licenciatura em Geografia do

Campus Universitário do Araguaia (CUA) da (UFMT). O tema escolhido e retratado no

decorrer deste texto versa sobre a “inclusão” indígena na escola, e sua inserção nas

instituições de ensino, a participação efetiva na escola, o contato social, entre outras.

No propósito de discutir sobre esta inclusão, realizou-se levantamento de

informações extraídas de escolas regulares localizadas nas cidades de Aragarças/GO e

Barra do Garças/MT, para assim, buscar chegar a respostas dos pontos de inquietações

dos quais: como os indígenas são inseridos nas escolas? É respeitado os princípios e

diretrizes estabelecidos na Lei de Diretrizes e Bases (LDB) e Constituição Federal

(CF)? Suas características culturais sofrem interação gradativa no ambiente de

diversidade como a escola? São indagações inquietantes que proporcionou apresentar

uma abordagem discursiva.

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A priori, observa-se que, o aluno indígena para que possa ser acolhido dentro

da sociedade que adentra, mais para conhecer do que pertencer, portam celulares,

mudam o vestuário, o que não é problema algum para o atual momento social. Viver em

uma cultura sem se modificar de alguma forma é praticamente impossível, o que não

quer dizer que tenha que se esquecer das raízes, a união de pontos positivos de cada

uma só fortalece o indivíduo e a comunidade em que vive.

A questão está nos problemas que aparecem junto a uma associação de coisas,

que são consumidas dentro de um novo modelo que se insere na vida cultural da

sociedade “civilizada”; como os mais constantes usos de drogas ilícitas e abuso de

bebidas alcoólicas. Há quem diga que o índio não tem cultura, mas o que é cultura? Para

Damatta (2010):

Cultura é uma palavra usada para classificar as pessoas e, às vezes, grupos sociais, servindo como uma arma discriminatória contra algum sexo, idade (‘as gerações mais novas são incultas’), etnia (‘os pretos não tem cultura’) ou mesmo sociedades inteiras (p. 01 – grifos do autor).

O presente ensaio pautou-se, metodologicamente, em revisão bibliográfica, no

qual se fundamentou evidências das afirmações e declarações do pesquisador,

observações, que possibilitaram contato pessoal e estreito com o fenômeno investigado

e entrevistas, que trarão um contato ainda maior e imediata captação do objeto estudado.

Desde a chegada dos portugueses, indígenas são expropriados de suas terras,

obrigados a viverem em locais com pouca comida, solos de baixa produtividade,

dificultando sua existência, o que os obriga a novas possibilidades, inserindo-se em

novas culturas, desvinculando-se da sua, buscando formas de lutar para sobreviver sem

perdê-la. Eles buscam ainda novas formas de sobrevivência, misturando-se com a nova

cultura passam a desenvolver novos hábitos, muitas vezes repudiados por seus povos.

Acreditam na constituição de uma boa convivência com o não-índio, como afirma

Magalhães (2009):

Ao vir para a cidade, acreditam que vão encontrar novas oportunidades para refazer suas vidas, ou seja, modificá-las, esperam reencontrar, nos espaços urbanos, uma sociedade que os recebam com dignidade, e que as portas de um trabalho possam se abrir, acreditam

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ainda na reintegração do não-índio com o indígena, e isso é muito difícil de acontecer (p. 206).

Ao ir para a escola do “branco”, indígenas buscam novas fontes de

conhecimento, oportunidades que pouco ocorrem, o processo de inserção do trabalho é

“impossibilitado”, de maneira preconceituosa, mesmo que o indígena tenha qualificação

formal, a entrada em cursos superiores é de difícil acesso, por exemplo, por razões da

falta de compreensão da língua, entre outras.

1 A população indígena

Após um grande período em declínio a população indígena voltou a crescer. De

2000 a 2010, houve aumento de 48%, os indígenas das 48 etnias existentes no Estado de

Mato Grosso, os índios mato-grossenses correspondem a 5,26% da população indígena

brasileira. As terras indígenas mais populosas são a Pareci, em Tangará da Serra, a 242

km de Cuiabá, e o Parque do Xingu, nordeste do estado. A região de Barra do Garças,

Brasnorte, Canarana, General Carneiro, Juara e Peixoto de Azevedo apresentaram os

maiores índices de natalidade. Segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística (IBGE, 2010), Cuiabá foi o único município que teve diminuição da

população indígena. Contudo, a queda foi inferior a 1%, que corresponde a redução de

80 pessoas.

A pesquisa apontou ainda que houve redução no número de índios vivendo nas

áreas urbanas de Mato Grosso. Em 2000, 74,83% da população morava na zona rural e,

10 anos depois, esse percentual passou para 83,96%.

A população da terra indígena São Marcos, município de Barra do Garças/MT,

conta com 4.493 indivíduos, que se declaram indígenas, segundo IBGE (2010), destes

uns saem para estudar na cidade, outros estudam na aldeia, contemplando 2.916 pessoas

alfabetizadas. As Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste apresentaram crescimento no

volume populacional dos autodeclarados indígenas, enquanto as Regiões Sudeste e Sul,

perda de 39,2% e 11,6%, respectivamente, e 274 línguas indígenas foram identificadas,

nesse mesmo recenseamento.

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2 O indígena na escola do não-índio

A entrada na escola é garantida pela Lei de Diretrizes e Bases e Constituição

Federal, que determina a inserção de “todos”, seus direitos devem ser “garantidos”,

como a adequação do ensino às culturas. No artigo 23, § 2°, a LDB (2015) afirma que

“o calendário escolar deverá adequar-se às peculiaridades locais, inclusive climáticas e

econômicas, a critério do respectivo sistema de ensino, sem com isso reduzir o número

de horas letivas”.

É obrigatório estudos de povos indígenas representados no Art. 26-A. “nos

estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-

se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena”, o que é

representado em livros didático em apenas uma página e/ou textos complementares, que

nem sempre são utilizados por professores, o que acaba ferindo a lei.

Nas falas de coordenadores das escolas visitadas, nos meses de agosto e

setembro de 2016, observou-se a existência de intérprete da língua materna Xavante,

principal etnia encontrada nos municípios pesquisados, em todas as escolas do

município de Aragarças/GO, o efetivo exercício destes profissionais que condicionam o

melhor ensino aprendizagem do estudante indígena da etnia Xavante.

Em contrapartida, nas escolas de Barra do Garças-MT, ainda não se efetua tal

atividade nas salas de aula, sendo perceptível a dificuldade de comunicação entre

professor-aluno devido à incompreensão da língua utilizada por ambos, a falta que faz

no desenvolvimento dos alunos indígenas inseridos, o que vai contra a Constituição

Federal, artigo 210 § 2°. A comunicação é a principal fonte de possibilidade de

aprendizagem, sem a mesma a barreira é complexa, necessário que professor e aluno

desenvolvam maneiras de conseguirem rompê-la, o que nem sempre ocorre.

O intérprete da língua materna é um profissional fluente na língua, geralmente

um membro da etnia. Na cultura Xavante meninos são reclusos na “casa do índio” para

seu desenvolvimento, idade adulta, que inicia em torno dos 11 aos 13 anos, em que

vivem aprendendo funções importantes ao seu povo, como caçar, pescar, entre outras.

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Nesse momento os mesmos não podem conversar com mulheres, somente com suas

mães, por essa razão não falam com professoras. Eles são ensinados a não responder aos

mais velhos e na cultura “branca” não se sentem a vontade em falar, mesmo quando são

questionados, como afirma Tsi’rui’a (2012):

Na sala de aula, eles ficam com o seu grupo, mas podem ficar também com os ‘ritéi’wa porque são rapazes, mas as meninas não devem estudar com os adolescentes wapté na mesma sala. Essa é a norma que se deve seguir na cultura Xavante, eles não devem conversar com as meninas ou com as mulheres, a não ser a própria mãe (...) os wapté

não têm vez para tirar as suas dúvidas, pois segundo a sua cultura, não é permitido falar publicamente (p. 230).

Os povos Xavante se autodenominam Auwe, que significa “gente verdadeira”,

do ramo central da Família linguística Macro-Jê, vivem em seis áreas indígenas, São

Marcos, Parabubure, Sangradouro, Couto Magalhães, Rio das Mortes e Areões, nos

dizeres de Nascimento (2010):

São aproximadamente 12.400 pessoas distribuídas em aproximadamente 104 Aldeias, em dez Municípios: Água Boa, Nova Nazaré, Barra do Garças, Canarana, Campinápolis, Novo São Joaquim, Paranatinga, Poxoréu, General Carneiro e Ribeirão Cascalheira (p. 42).

Os Xavante procuram a escola como meio de defesa do povo “branco”, o

entendimento da língua para que não sejam “enganados” como antes, como afirma

Nascimento (2010) “Ao procurar a educação escolar os Xavante não estavam

preocupados em se tornar instruídos e sim aprender a falar português com o intuito de se

defender do "branco", para não ser enganado”.

O comportamento dos povos indígenas é igual, de certa maneira, do branco,

quando passam por dificuldades no período fragilizado associando sua cultura, se

sentido nem branco, nem índio, como ressalta Magalhães (2009):

Os jovens indígenas não sabem o que buscar, não se fixam na cidade, porque não encontram apoio, não se fixam nas aldeias porque acreditam que na cidade podem encontrar a possibilidade de ascensão social e até individual. Essa perda de identidade muitas vezes provoca desvios de comportamento. Privados de suas liberdades, passam a ser vítimas de quase todos os processos sociais do não-índio (p. 206).

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Integrantes indígenas percebem o perigo de perdê-los cada vez mais para

outros povos, tentam mostrar a importância de manter sua cultura ativa. Os Xavante

precisam viver e conviver com a proximidade de culturas diferenciadas, sem perder a

deles, buscando formas de preservá-la, como afirma Hi’rátiwató (2008) “os índios mais

velhos têm medo de perder a sua cultura tradicional”.

A visão etnocêntrica da cultura impede de visualizar outras possibilidades, que

a cultura é inferior e não pode realizar outras funções, somente as que lhes são pré-

determinadas, o que enfoca Tsi’rui’a (2012):

[...] os Xavante experimentaram essa outra cultura no início da fundação de São Marcos, que engloba todo o ser da pessoa dos indígenas a serem considerados como civilizados e, ainda se diz que não existem mais índios por usarem roupa, relógios, celulares que são costumes do modelo ocidental, do mundo dos civilizados. É estranho ainda dizer aos indígenas ou aos negros ou ainda aos caboclos que não têm estudos e, por isso, não têm culturas e para ter cultura precisa ter diploma ou certificado de reconhecimento (p. 196).

O capital sempre contribuiu e se beneficiou para esse processo de degradação

da identidade sofrida atualmente pelos indígenas, o mesmo passou a ser mais um

consumidor no processo capitalista, adquirindo produtos eletrônicos, acessórios, como

roupas e calçados, bebidas e inclusive drogas.

Uma vez inseridos nas escolas não indígenas, os Xavante trazem consigo sua

cultura, costumes a serem seguidos e que interferem a frequência nas aulas, por

exemplo, ferindo o Art.23 e Art.26-A da LDB, no qual há um desrespeito, sendo que o

estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena aparecem na maioria das vezes em

projetos que duram uma semana no mínimo e um bimestre no máximo. A Consciência

Negra é debatida apenas na ocasião de sua comemoração, 20 de novembro. A

valorização, o respeito pela cultura negra é deixado de lado pela comunidade escolar. O

dia do índio é lembrado sempre da mesma forma, sendo que o próprio indígena nunca é

consultado para trazer um pouco de sua cultura para a escola.

A identidade indígena ainda hoje é preservada, de certa maneira, pelo apelo

folclórico que possui, apesar de que o indígena só é lembrado no dia 19 de abril de cada

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ano, na qual, escolas pintam os rostos dos alunos e colocam uma coroa de penas na

cabeça, uma visão totalmente equivocada dos nativos encontrados no Brasil.

É obrigatório o ensino da cultura indígena e negra no Brasil, no entanto não é o

que ocorre. O indígena que é pouco retratado nos estudos de seus povos dentro das salas

de aula, espelhado num índio americanizado, com penachos na cabeça e que clama por

chuva através da “dança da chuva”, não do nativo encontrado aqui, quando os

portugueses chegaram. Imagine então um indígena estudando sua própria cultura e se

deparar com isso? Não vai se auto reconhecer!

O Ministério da Educação disponibiliza nas redes sociais materiais didáticos

próprios para a Educação Escolar Indígena nas aldeias, de etnias “reconhecidas” pelo

MEC. As escolas dos brancos podem ter acesso a estes materiais, mas não é o que se

percebe, permitindo uma visão distorcida do pouco que se “estuda” dos povos

mencionados anteriormente.

A interação das culturas pode ser enriquecedora para ambas, necessitando de

um intermediador que o promova, o que não ocorre efetivamente, a busca de

conhecimento que leva o indígena à escola deixa-o a mercê de julgamento de seu modo

de ser e viver, sendo a linguagem importante mecanismo de interação, que favoreça a

inclusão, o que segundo Maders e Barcelos (2012):

[...] é possível na interação e no relacionamento com os outros através de processos interculturais, mediados pela linguagem e pelo diálogo. Este processo, de mediação dialógica, se constituirá em solo fértil para a inclusão quando tivermos uma ação pedagógica e uma educação escolar indígena que se paute, fundamentalmente, na escuta sensível do outro e no cuidado para com suas especificidades históricas e culturais (p.14).

Alunos indígenas entram nas escolas com expectativas, muitas vezes,

frustradas, o que acaba por afastar os mesmos. Professores podem, e devem, se

empenhar em tentar facilitar o aprendizado de todos os alunos, as dificuldades que

apareçam não podem ser vistas como empecilho ao processo de aprendizagem. Quando

uma mãe descobre que terá um filho com necessidades especiais ela não o ignora, ao

contrário, se dedica ao máximo para que o mesmo possua, da melhor forma possível,

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sua vida facilitada, o que pode servir de exemplo a todos os profissionais da

aprendizagem.

Considerações finais

Percebeu-se que a “inclusão” do indígena nas escolas não indígenas não ocorre

de fato como deveria ou prevê as legislações da educação. O aluno indígena é

matriculado, sem promover sua inserção; o mesmo é por diversas situações do ensino

aprendizado, ignorado na sala de aula, sendo deixado nos cantos das salas como se não

compreendessem o que se está sendo explicado, afinal ele entende ou o professor deve

se fazer entender?

A lei estabelece a obrigatoriedade da presença efetiva de profissionais que

trabalhem a língua materna, então quais seriam os motivos de impedimento da

secretaria de educação Municipal e Estadual para não promoverem e dispor de ações

que beneficie o ensino melhorado para as crianças e adolescentes indígenas residentes

no espaço urbano e matriculados em escolas de Barra do Garças-MT; com contratação

de profissional intérprete da língua materna específica ao grupo étnico presente. Assim

como, de muitas outras cidades que tem povos indígenas matriculados em suas escolas.

A língua é um fator importante na aprendizagem, porém a mesma ocorre de

muitas outras maneiras, alunos surdos não ouvem, mas possuem professor de apoio

especializado em língua de sinais, esses alunos atualmente, são na sua maioria

amparados, e quando não o são, por um período curto de tempo, é por falta de

profissional que atenda a demanda escolar.

A busca por outros mecanismos de aprendizagem deve ser constante, levar os

alunos a se sentir, e ser realmente incluídos nas escolas. Seu desenvolvimento pode ser

facilitado e prazeroso, não penoso como o que vem acontecendo.

O preconceito cultural, etnocêntrico, dificulta a compreensão do ser, limitando

a capacidade do mesmo se adaptar e socializar com outros povos com respeito e

igualdade. A troca cultural de povos acontece como de um país e outro, por exemplo, de

maneira natural, então porque com povos indígenas acontece dessa forma rude,

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desrespeitosa, diminuindo a cultura dos mesmos? Se a população brasileira é

miscigenada, inclusive em partes da cultura alimentar, por exemplo, deve-se respeito à

cultura. Os indígenas constituem a população nacional, a chegada dos portugueses no

Brasil ampliou e diversificou essa população com a participação dos africanos. Deste

modo, exigir e buscar por uma inclusão real e operante dos grupos indígenas regionais é

o mínimo que se deve para com os mesmos.

Referências

BRASIL. Constituição (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm> Acesso em: 24 out. 2016. _______Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/home/>. Acesso em: 28 out. 2016. _______ [Lei Darcy Ribeiro (1996)]. LDB nacional [recurso eletrônico]: Lei de diretrizes e bases da educação nacional: Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. 11. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2015. DAMATTA, R. Você tem cultura? Disponível em: <http://naui.ufsc.br/files/2010/09/DAMATTA_voce_tem_cultura.pdf>. Acesso em: 03 set. 2016. MADERS, S.; BARCELOS,V. Educação escolar indígena e inclusão – por uma pedagogia do cuidado e da escuta. In: Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul, 9. 2012, Caxias do Sul – RS. Resumos... Caxias do Sul: Programa de Pós Graduação em Educação e Fórum Sul de Coordenadores de Programas de Pós-Graduação em Educação, 2012. p. 15. MAGALHÃES, M. A. L. Educação Indígena em Contextos Urbanos dos Municípios de Barra do Garças, Pontal do Araguaia e Aragarças: Desafios de Novos Tempos. In: MAGALHÃES, M. A. L. (Org.). Polifonia. Cuiabá: Editora Universitária, 2009. p. 203-213. NASCIMENTO, A. M. do. Barra do Garças, das pedras aos grãos: uma história de migrações e ocupações (1960-1980). 109 f. Dissertação (Mestrado) – História, Pontifícia Universidade Católica de Goiás, 2010.

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TSI’RUI’A, A. T. A sociedade Xavante e a educação: um olhar sobre a escola a partir da pedagogia Xavante. 258 f. Dissertação (Mestrado) – Educação, Universidade Católica Dom Bosco, Campo Grande, 2012.