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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
EM GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”
A CONTRIBUIÇÃO DAS DIFERENTES LINGUAGENS NA CONSTRUÇÃO DA LEITURA E ESCRITA
POR: DELMA DA SILVA MARTINHO TURMA 38
Rio de Janeiro 2003
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
EM SUPERVISÃO ESCOLAR
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”
A CONTRIBUIÇÃO DAS DIFERENTES LINGUAGENS NA CONSTRUÇÃO DA LEITURA E ESCRITA
Apresentação de monografia à Universidade
Cândido Mendes como condição prévia para
a conclusão do Curso de Pós-Graduação
“Lato-Sensu” em Supervisão Escolar
POR: DELMA DA SILVA MARTINHO PROFESSOR ORIENTADOR : FABIANE MUNIZ DA SILVA
Rio de Janeiro 2003
“Falar, conversar e escutar histórias, gesticular, desenhar, rabiscar e pintar, brincar, escrever e ler, atribuir sentidos são sistemas simbólicos instituídos pela sociedade para a comunicação e expressão e aprendidos pelas crianças nas suas diversas interações sociais. Por essas vias criam-se leitores, escritores com várias possibilidades de expressão”. Anete Abramowicz e Gisela Waiskop
A Deus por estar sempre
guardando a minha vida,
iluminando meu
caminho.
À minha mãe pelo
esforço, dedicação,
incentivo para que eu
chegasse até aqui.
Aos meus irmãos e
sobrinhos pelo carinho,
satisfação e apoio
demonstrados
RESUMO
A educação infantil teve seu surgimento relacionado ao aspecto social
devido às mudanças ocorridas com a introdução da mulher ao mercado de trabalho.
Inicialmente seu objetivo era primordialmente assistencialista,onde preocupava-se
apenas com o cuidado físico da criança. Porém, com o decorrer do tempo atentou-se
para a necessidade do trabalho pedagógico e seu aspecto cognitivo. Com isso, hoje
a Educação Infantil (0 a 6 anos) já está incluída ao sistema através da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Infantil (Lei 9394/96).
No entanto, o trabalho realizado na Pré-Escola se dá de formas
diversificadas apesar de estarem direcionadas ao desenvolvimento pedagógico.
Porém, a referente pesquisa atenta-se para a necessidade da criança em estar
voltada a ludicidade, pois este fator contribui para que a mesma descubra o prazer
de aprender através da brincadeira. Para isso, o ambiente precisa ser interativo e
tranqüilo.
Já na Pré-Escola observa-se a preocupação com a aquisição da leitura
e escrita formais. Com isso, acabam sendo “esquecidos” fatores importantes de
descoberta e desenvolvimento do aluno tais como as linguagens musical, gestual,
pictória, plástica ... que contribuem para a comunicação humana e que auxiliam na
percepção da criança com o mundo.
Portanto, não basta transmitir ao aluno da Educação Infantil os códigos
mecânicos da língua sem que o mesmo tenha a oportunidade de experimentar a
função social da comunicação humana.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO 6
2. CAPÍTULO I - A Educação Infantil: o histórico e a função 8
3. CAPÍTULO II - A importância do brincar na Educação
Infantil: o prazer de aprender brincando
13
4. CAPÍTULO III - As diferentes linguagens e a construção da
leitura e escrita
17
5. CAPÍTULO IV - A função social da alfabetização 28
6. CONCLUSÃO 31
7. BIBLIOGRAFIA 32
INTRODUÇÃO
O interesse dessa pesquisadora em abordar a contribuição das
linguagens na Educação Infantil, ocorreu devido à preocupação com observações
informais a respeito de profissionais que alfabetizam de maneira sistemática com os
tradicionais exercícios de memorização. Por esse motivo, alguns aspectos
importantes, acredito, acabam sendo esquecidos, e assim os alunos deixam de
vivenciar muitas questões apresentadas na Educação Infantil.
Alguns dos aspectos mais esquecidos creio, por esse tipo de prática
pedagógica, é a ludicidade, a troca de conhecimento através da interação, a função
social da escrita e o desenvolvimento das diferentes linguagens utilizadas como
forma de comunicação.
Na Educação Infantil existe uma ansiedade muito grande no que se
refere à aquisição da leitura e escrita. Com isso, busca-se diferentes formas de
desenvolve-las. Uma delas é o procedimento mecânico e repetitivo dos códigos
linguïsticos. O que se percebe é a necessidade da criança construir o mundo letrado
que a cerca e o significado que a comunicação lhe revela para a organização de
conceitos. Por isso, a colaboração das diferentes linguagens tem grande função na
elaboração da alfabetização como leitura de mundo. Gomes (1993) é um dos
autores que compartilha dessa preocupação com a seguinte citação:
“A escola precisa ser um espaço de acesso a todas as
linguagens(escrita, musical, corporal, plástica, dramática, etc),
mas não necessariamente um espaço de formação de atores,
escritores, gravadores, músicos, etc. Ela é um espaço de
experiência totalizadoras onde a criança poderia ampliar seus
referenciais de mundo”.(p.127)
A criança é essencialmente lúdica, por isso as práticas pedagógicas não
podem esquecer desse fator tão importante para ela como fonte de prazer e
conhecimento. A atividade escolar não precisa esquecer desse recurso para que se
torne mais séria. O jogo, por fazer parte da vida da criança, possibilita um trabalho
enriquecedor, pois promove atividades agradáveis, que são realizadas com satisfação e
envolvimento.
Sendo assim, é preciso que haja um ambiente descontraído, criativo e com
propostas direcionadas às descobertas cognitivas de forma prazerosa, para que a
criança interaja com as informações, internalizando-as. Daí, ser importante a construção
do conhecimento, através da ludicidade e nas relações interpessoais que a mesma
garante.
A preocupação com esse assunto vem sendo apontada pelos autores como
Jean Piaget, Vygotsky, Freud e Emília Ferreiro, entre outros.
O primeiro preocupando-se com as diferentes fases desenvolvimento
cognitivo do indivíduo, esclarecendo os processos de formação do conhecimento na
criança. Sua contribuição teórica se deu às pesquisas realizadas por Emília Ferreiro,
que numa perspectiva pedagógica a relaciona ao conceito de alfabetização.
A colaboração de Freud refere-se à teoria psicanalítica, relativa ao
funcionamento mental do ser humano. Já para Vygotsky, a aprendizagem se dá a partir
da relação com o outro permitindo o desenvolvimento mental e assim construindo o
conhecimento.
O pensamento de Vygotsky é direcionado a uma tendência
socioconstrutivista que nos leva a pensar sobre a importância da relação social para o
aprendizado.
Esse trabalho tem como objetivo levar, docentes, a refletirem sobre a
importância da relação da criança com o mundo de forma a envolver e desenvolver as
linguagens corporais, musicais, plásticas, textuais, gestuais e emocionais. É preciso
repensar sobre as práticas pedagógicas, analisando a importância da linguagem para a
efetiva construção da leitura e da escrita.
CAPÍTULO I - A Educação Infantil: o histórico e a função
A história da Educação Infantil está relacionada à mudança da
organização social, em especial ao papel da mulher que devido a fatores culturais,
econômicos e políticos, foi absorvida pelo mercado de trabalho e então, necessitou
buscar outras alternativas em relação à educação dos seus filhos. Assim, a creche,
primeiro momento da Educação Infantil, passa ajudar no cuidado e educação das
crianças, recebendo uma maior atenção na nossa sociedade.
Inicialmente preocupou-se somente com o entendimento assistencial das
crianças, enquanto seus pais trabalhavam, não atentando-se para o pedagógico. A
história nos mostra um contexto social onde o papel da mulher destinava-se somente
aos cuidados do ambiente domésticos e familiares (filhos e marido). Hoje, após muitos
movimentos de luta pela igualdade de oportunidade, cada vez mais as mulheres vêm
conquistando seu espaço, assumindo diferentes atividades fora de casa, não só pela
necessidade econômica como também pela realização pessoal. Essa modificação
histórica do papel da mulher, levou a reflexão da real função do trabalho realizado nas
instituições de Creches e Pré-Escolas.
Até o início do século XX, o trabalho desenvolvido nas creches era
semelhante aos internatos, pois destinava-se, principalmente, a filhos de mãe solteiras
que devido ao fato, tomavam o atendimento como um favor prestado. Sendo assim,
essas mães não tinham consciência da função pedagógica que as instituições que
atendiam crianças de faixa etária de zero a seis anos poderiam oferecer.
Com a expansão das indústrias, em meados do século XIX, uma grande
quantidade de mulheres fundiu-se ao trabalho nas fábricas, somando-se aí as casadas.
Iniciou-se então, a preocupação com o atendimento a seus filhos, questão que passou a
apresentar um novo enfoque com a chegada dos imigrantes europeus ao Brasil, que
também foram atraídos pelo trabalho industrial. Com eles surgiram movimentos de
reivindicações dentre os quais estavam a organização de creches para filhos das
operárias, instituições que atendiam crianças de zero a seis anos. Preocupados, os
industriais, montaram creche e escolas maternais. Oliveira (1992) relata esse momento
quando cita:
“Os donos das indústrias, por seu lado, procurando diminuir a
força dos movimentos operários, foram concedendo certos
benefícios sociais e propondo novas formas de disciplinar seus
trabalhadores. Eles buscavam o controle do comportamento dos
operários, dentro e fora da fábrica. Para tanto vão sendo criadas
vilas operárias, clubes esportivos e também algumas creches e
escolas maternais para os filhos dos operários.” (p.18)
Paralelas as creches atendidas pelas fábricas, surgiram as instituições
escolares filantrópicas, assistidas pelo governo e pela classe rica. O trabalho das
creches neste período era basicamente assistencial, predominando fatores como
alimentação, higiene e segurança. O desenvolvimento cognitivo e emocional ainda não
eram valorizados.
Muitos questionamentos colocaram o papel das creches e pré-escolas em
pauta, como a miséria e a marginalidade que era relacionada a classe popular. Para
explica-las, surge a teoria da “privação cultural” nas décadas de 60 e 70, buscando na
creche uma alternativa como forma de superar a pobreza apresentada por essas
famílias. Assim iniciaram-se as propostas de trabalho em algumas creches e pré-
escolas públicas, voltadas para o aspecto cognitivo e preparação para alfabetização.
Nesta época, as instituições particulares que atendiam crianças de zero a
seis anos, cuja clientela era formada pela classe privilegiada socialmente, já voltavam
seus
para estimulação da criatividade, sociabilidade e desenvolvimento infantil,
baseados na Psicologia.
Após grandes reivindicações populares, as creches passaram a ser um
direito do trabalhador. Como resultado houve um aumento na participação das mães
diante do trabalho das creches e o surgimento de novas creches públicas. Hoje,
algumas empresas concedem verbas aos seus funcionários para que estes paguem
uma creche a sua escolha. Há também, em todo país, as creches comunitárias e muitas
vezes assistidas por ONGs (Organizações não governamentais).
O aumento da procura pela Educação Infantil se deu não só pela
participação gradativa da mulher no mercado de trabalho, como também pela
conscientização da sociedade sobre a importância dos cuidados desenvolvidos nessa
fase de zero a seis anos. Com isso, a partir da Constituição de 1988, a Educação
Infantil foi incorporada ao sistema de ensino e o atendimento a essas crianças passou a
ser reconhecido legalmente, sendo incluído na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Infantil (Lei 9394/96), onde é citado no Referencial Curricular:
“A Educação Infantil é considerada a primeira etapa da educação
básica (título V, capítulo II, seção II, art.29), tendo como finalidade
o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade”
(p.11)
A finalidade do atendimento nas instituições de Educação Infantil, ao
longo da história teve idéias diversificadas, porém pode-se dar destaque ao educador
Friedrich Froebel (Alemanha, 1837), que contribuiu para o funcionamento do primeiro
Jardim de Infância. Para ele a criança não deveria ser vista como um adulto em
miniatura e a partir dessa idéia desenvolveu teorias sobre a educação na fase pré-
escolar, onde se acreditava que o gesto, o canto, a linguagem e a brincadeira eram
contribuintes significativos para o desenvolvimento da aprendizagem.
Portanto, observa-se que na Alemanha, a Educação Infantil já iniciou-se
com caráter pedagógico. O pensamento de Froebel se difundiu entre vários países,
inclusive no Brasil, onde no século XIX em São Paulo, foi organizado o primeiro Jardim
de Infância com modelos baseados nas idéias de Froebel, e o primeiro Curso de
Formação de Professores para essa faixa etária. Após esse período, muitas outras
instituições voltadas para educação pré-escolar começaram a surgir.
No decorrer do tempo observou-se diferentes práticas pedagógicas, sofrendo
influências da Psicanálise e das teorias de desenvolvimento da criança. Houve a
preocupação com o aspecto emocional,tomando como base as teorias de Piaget e
Vygostsky.
Hoje, a Educação Infantil conta com uma política mais direcionada ao trabalho de
senvolvido com crianças de zero a seis anos. Como resultado o Ministério de Educação
e do Desporto elaborou a Referencial Infantil, já citado anteriormente. O referente
documento foi publicado pelo Governo Federal, sendo resultado de debates com
profissionais que atuam na Educação Infantil e tem com objetivo servir de “guia de
reflexão” para o trabalho pedagógico.
De acordo com esse Referencial Curricular essas instituições devem integrar as
funções de educar e cuidar como é citado.
“As novas funções para a Educação Infantil devem estar
associadas a padrões de qualidade. Essa qualidade advém de
concepção de desenvolvimento que consideram as crianças nos
seus contextos sociais, ambientais, culturais e, mais
concretamente, nas interações e práticas sociais que lhes
fornecem elementos relacionados as mais diversas linguagens e
aos contato com mais variados conhecimentos para a construção
de uma identidade autônoma” (p.23)
Portanto, pode-se dizer que hoje há a preocupação não só com os cuidados
físicos, como também com o emocional e cognitivo, porém de forma integrada,
buscando um trabalho de qualidade, voltado para o desenvolvimento infantil
desfragmentado. Embora o Referencial proponha um trabalho de qualidade, não se
pode esquecer que é um documento elaborado para servir de guia de reflexão e por isso
deve se adequar a cada realidade e haver também a análise crítica de cada equipe
pedagógica ao basear-se nele visando uma efetiva prática com qualidade.
Conforme foi citado anteriormente, vários paradigmas sobre o atendimento a
criança foram construídos ao longo do tempo, principalmente no que se refere à criança
pobre, onde a ela estava associada, entre outros fatores, o abandono. Esse fator leva
seus pais a perderem sua guarda, sendo a mesma enviada a internatos, muitas vezes.
Preocupando-se com isso, em 13 de julho de 1990, foi promulgado o Estatuto da
Criança e do Adolescente, que sugere em seus artigos o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer... enfim, as condições de viver com dignidade para o
bom desenvolvimento integral do Homem.
Percebe-se com isso que a criança tem seus direitos assegurados por lei e dentre
eles está a Educação como é mencionado no art.54 (IV) do Estatuto: “É dever do Estado
assegurar a criança: o atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis
anos de idade”. (p.28)
Portanto, é notório que ao longo dos anos as crianças têm sido foco de debates
políticos e educacionais visando estabelece-las no contexto de cidadania. Kramer é uma
das autoras que tem demonstrado preocupação com o universo infantil, engajando-se
em estudos e propostas pedagógicas voltadas para a infância, por acreditar na
necessidade e importância que este trabalho requer como cita a mesma autora (1996):
“Vale dizer que nesses quase 20 anos, estive mobilizada pela
dimensão política dos temas relativos à criança, pela prática de
pesquisa e pela intervenção e educacional, âmbitos nos quais se
manifesta sempre uma dada concepção de infância”. (p.17)
Daí ser importante refletirmos sempre sobre as questões que garantam o
melhor atendimento às crianças na fase escolar inicial, já que acredita-se na importância
da mesma para seu desenvolvimento e formação. A Educação Infantil hoje, tem a
função de promover a aprendizagem em integração com as estruturas do pensamento
infantil, propondo um trabalho criativo e instigante.
CAPÍTULO II - A importância do brincar na Educação Infantil: o prazer
de aprender brincando
A criança é essencialmente lúdica, por isso é preciso ter consciência da
necessidade que ela possui em utilizar a linguagem simbólica como forma de refletir,
explorar e adquirir conhecimentos, assim com transformar conceitos anteriores em
novas aprendizagens. A criança aprende brincando, sendo assim seu desenvolvimento
cognitivo, emocional e motor podem e devem ser estimulados através dos jogos e
brincadeiras, tornando o ambiente prazeroso, tão importante no processo de
aprendizagem. Segundo Lima (1999):
“A criança, diferentemente do adulto, só deve brincar. Seu
desenvolvimento depende do lúdico, ela precisa brincar para
crescer, precisa de jogo como forma de equilibração com o
mundo. Sua maneira de assimila r(transformar o meio para que se
adapte às suas necessidades) e de acomodação (mudar a si
mesma para adaptar-se ao meio que ofereceu resistência) deverá
ser sempre através do jogo”. (p.33)
A brincadeira contribui para a auto-estima das crianças e com isso cria-se
também uma autoconfiança para que eles exponham seus pensamentos, explorem suas
capacidades e formulem idéias sem medo do desconhecido, favorecendo o seu
desenvolvimento nos diversos aspectos. É fundamental que a criança sinta-se segura,
para que seu processo de aprendizagem transcorra tranqüilamente, passando pelas
etapas de forma organizada, assimilando-as. Como cita Machado (1999): “Brincar é
também raciocinar, descobrir, persistir e perseverar, aprender a perder percebendo que
haverá novas oportunidades para ganhar, esforçar-se, ter paciência, não desistindo
facilmente”. (p.27)
Uma das práticas pedagógicas utilizada com crianças deve ser a
ludicidade, pois ela torna o ambiente interativo, enriquecendo o trabalho de ensino-
aprendizagem. A troca de experiência é um auxílio indispensável nesse processo,
apresentando momentos em que questões são apontadas, refletidas, exploradas,
explicadas e conseqüentemente internalizadas. A interação proporciona a socialização
das descobertas.
Por isso, os conceitos de leitura e escrita podem ser elaborados através de
um espaço lúdico e criativo, e não por procedimentos mecânicos e sem valor
significativo para a criança, afastando-a do real contexto de alfabetização. Através dos
jogos e brincadeiras a mesma encontra possibilidades de discutir, pensar e repensar
sobre a construção dos seus conhecimentos. Nas palavras de Lima (1999):
“.... a atividade escolar deverá ser uma forma de lazer para a
criança. Considerar a aprendizagem uma tarefa sisuda não
significa que fique mais séria, é, apenas, um preconceito existente
em nossas escolas. A criança aprende melhor brincando, e
TODOS os conteúdos podem ser ensinados através de
brincadeiras e jogos, em atividades predominantemente lúdica”.
(p.33)
O espaço de aprendizagem pode estar plenamente relacionado a
brincadeiras, pois ela faz parte do dia-a-dia das crianças e é o momento em que
organizam suas emoções, constroem e reconstroem seus pensamentos. Sendo assim,
através dos jogos o educador cria todo um ambiente descontraído, necessário para uma
forma efetiva de aprendizagem. O ambiente alfabetizador precisa ser, entre outros
aspectos, sedutor e nada seduz mais a criança do que a brincadeira, tão presente na
vida dela. Fundação Roberto Marinho (1991) cita:
“Brincar é uma realidade cotidiana na vida das crianças, e para
que elas brinquem é suficiente que não sejam impedidas de
exercitar sua imaginação...
A brincadeira expressa a forma como uma criança reflete, ordena,
desorganiza, destrói e reconstrói o mundo a sua maneira.” (p.86)
O processo de alfabetização deve estar interligado com sua
funcionalidade, para que isso ocorra de maneira coesa, deve haver uma prática
pedagógica direcionada a dar sentido a mesma, de maneira que os alunos percebam o
prazer da leitura e escrita. Para que aconteça , é necessário que haja todo um
desenvolvimento entre o aluno e o que lhe é “ensinado”, e o lúdico, entre outros fatores,
pode contribuir muito para isso. Além disso, a brincadeira garante à criança
experimentar possibilidades, criar hipóteses, errar, acertar,livres de receios. O brincar
também é uma forma de linguagem. Fundação Roberto Marinho (1991) cita Piaget,
compartilhando dessa idéia. Assim ela a expõe:
“... a verdadeira linguagem social das crianças, quer dizer, a
linguagem utilizada na atividade fundamental das crianças – o
jogo – é uma linguagem de gestos, movimentos e mímica, tanto
quanto uma linguagem de palavras”. (p.56)
Quando se fala em brincadeira, deve-se ter em mente o seu sentido mais
específico, que é o divertimento. No entanto, observa-se diferentes maneiras de brincar
e cabe ao educador adequá-las ao seu trabalho e às necessidades dos seus alunos,
sejam nas brincadeiras livres ou dirigidas. Durante os jogos livres, o professor tem
oportunidade de observar as linguagens que as brincadeiras dirigidas há um maior
contato com o processo de desenvolvimento em que o aluno se encontra.
Froebel, precursor dos Jardins de Infância, já privilegiava o trabalhava o
trabalho lúdico por acreditar na função do jogo para o desenvolvimento infantil e deste
ser o caminho mais satisfatório e tranqüilo para a ampliação da aprendizagem pela
criança. Para efetivar este trabalho, criou materiais e jogos pedagógicos para serem
trabalhados com a criança como forma de aguçar a criatividade e o crescimento
intelectual. Essas idéias foram difundidas e aceitas por diferentes correntes
pedagógicas, percorrendo até os dias de hoje.
A criança precisa estar segura no aspecto sociopsicomotor para um melhor
resultado cognitivo. Deixar que as crianças se expressem é fundamental, pois a
expressão, a comunicação são o que dão funcionalidade a alfabetização e não só o
conhecimento dos códigos lingüísticos. A atividade lúdica proporciona um ambiente de
conhecimento sobre o mundo através da participação e reorganização de idéias.
Por isso, a ludicidade e Educação Infantil não podem estar separadas, pois uma
está inserida na outra para que haja o desenvolvimento pleno e real da aprendizagem.
Por dar prazer, o brincar deve se a principal atividade infantil. É importante
reconhecermos o lúdico como uma necessidade para a vida da criança. Contudo, propor
a ludicidade não requer descaracterizar a importância do trabalho desenvolvido na Pré-
Escola, tanto quanto as outras etapas da vida escolar do aluno.
CAPÍTULO III - As diferentes linguagens e a construção da leitura e
escrita
Desde muito pequenas, as crianças buscam formas de entender o mundo em que
vivem. É através da interação que elas constroem conceitos e (ou) hipóteses sobre seus
questionamentos. Durante esse processo de construção, recorrem a diferentes
linguagens como forma de garantir a comunicação. Elas possibilitam o seu contato com
o mundo, pensando e repensando sobre ele e assim compreendendo melhor.
A comunicação pode ser manifestada através do corpo, da música, da emoção,
dos textos, dos gestos, do grafismo e as artes plásticas. Na medida em que as crianças
podem valer-se das linguagens, seu universo comunicativo se amplia e
conseqüentemente seus conhecimentos também. Sendo assim, a criança necessita
vivenciar esses aspectos para um melhor desenvolvimento. Sampaio (1993) é um dos
autores que compartilha dessa idéia citando:
“Embora seja indispensável que a criança tenha acesso à
linguagem escrita, a escola tem de pensar que a criança vive num
universo de linguagem. Ter acesso na escola às diferentes
linguagens- gráfica, gestual, plástica, cinestésica, musical,
corporal, televisiva, informática, etc, é fundamental. A Pré-Escola
e o espaço , por excelência, de iniciação nessas linguagens”.
(p.61)
Outro fator importante a ser lembrado é que o desenvolvimento da criança
acontece de forma integrada entre ela e os seu meio social. Daí ser importante o
desenvolvimento das diferentes linguagens como forma de comunicação e também de
descobertas, tornando o aprendizado prazeroso. Porém, percebe-se que na angústia de
um resultado imediato para a alfabetização formal, alguns docentes recorrem a
procedimentos mecânicos e repetitivos dos códigos lingüísticos, esquecendo-se que o
processo de alfabetização faz parte de um conjunto e não de algo isolado da vida
cotidiana do aluno.
Tanto as linguagens verbais como as não verbais promovem a expressão,
por isso as propostas pedagógicas devem estar atentas quanto a isso, valorizando tais
atividades no dia-a-dia das crianças e assim ampliando a alfabetização.
Muitos questionamentos sem vendo apontados sobre a alfabetização na
Pré-Escola, porém hoje sabemos que a mesma faz parte do processo de representação
do pensamento e da fala. Portanto, concluímos que o ser humano alfabetiza-se desde
quando nasce, pois busca formas amplas de expressão que são passadas culturalmente
através do choro, dos gestos, da fala, da percepção auditiva ou visual e do grafismo.
Assim, a Pré-Escola precisa colaborar com a evolução do processo de
alfabetização favorecendo o seu desenvolvimento. Esse favorecimento se dá com a
criação do ambiente alfabetizador tão íntimo das crianças, dentro ou fora da escola. Tal
ambiente possibilita as mais variadas experiências de comunicação.
Quando falamos na importância das diversas linguagens é preciso
compreendermos que elas fazem parte do processo do desenvolvimento do ser
humano, especificamente da criança.Assim como o bebê utiliza-se de vários recursos
para expressar-se, passando por um processo evolutivo natural, ele também dispõe de
estímulos externos do seu meio social. A medida que vai crescendo vai encontrando
outros meios de comunicação, fazendo sua leitura do mundo, e a leitura e escrita
formais também fazem parte deste processo.
É preciso entender que o aspecto emocional é a linguagem não-verbal,
que impulsiona todo o processo do desenvolvimento humano, intelectual e psicológico.
A criança necessita estar bem emocionalmente para que os obstáculos sejam sanados
com segurança. A escola deve propiciar um espaço afetivo, desprovido de preconceitos,
que com relação interpessoal a criança aprenda a lidar com situações-problema, sem
traumas e que perceba o ambiente escolar sendo o seu. Essa segurança é um fator
contribuinte para que o aluno externalize seus sentimentos, lidando com os possíveis
”erros” com naturalidade, ajudando-o também a elaborar suas hipóteses sobre leitura e
a escrita com autonomia. Lima (1999) confirma esse pensamento citando:
É necessário que a criança se aproprie cognitiva e afetivamente
de SUA escola, e a escola é a principal responsável por este
processo que se deve iniciar simplesmente por recebe-las com
carinho.” ( p. 40)
A criança precisa estar bem emocionalmente para que o processo de
aprendizagem flua gradativamente e o professor precisa estar atento quanto a possíveis
problemas emocionais apresentados pela criança. O equilíbrio emocional propõe auto
confiança necessária para estimulação das descobertas e o educador deve ter um olhar
especial em relação a este aspecto para que possa compreender e respeitar melhor
seus alunos. O aspecto emocional, como já foi dito anteriormente, é um dos fatores que
garantem a possibilidade do bom desempenho do processo de aprendizagem.
O período de adaptação da criança na escola, é um momento que precisa
de uma atenção especial, pois a criança está saindo do meio familiar para ingressar
num meio social, até então desconhecido. Ela necessita sentir segurança tanto de quem
a leva à escola, quanto de quem a recebe, para a partir daí criar uma relação de
confiança. O professor deve respeita as individualidades dos alunos, acolhendo objetos
pessoais que algumas crianças, no período de adaptação, necessitam utilizar como
forma de buscar segurança e equilíbrio emocional. A má condução do processo de
adaptação pode originar em reações de medo posteriormente.
A escola precisa transmitir para a criança ambiente de prazer, com
situações adequadas de aprendizagem, propiciando relações afetivas entre professor e
aluno. Por isso, antes de preocupar-se com a alfabetização sistematizada dos alunos, o
docente deve voltar-se para os aspectos que contribuem para o melhor desempenho de
assimillação da aprendizagem, e o emocional está entre estes aspectos.
Outras formas de expressar o pensamento e a fala devem ser tão
valorizadas quanto a escrita decodificada. É essa valorização que torna para a criança a
comunicação significativa e conseqüentemente a alfabetização formalizada. A mesma
deve aguçar a curiosidade e desejo de descoberta e isso só ocorrerá se a criança
perceber a necessidade e o prazer que a leitura e a escrita nos proporcionam. Por isso,
é preciso que o educador crie todo um ambiente amistoso e agradável para favorecer o
desenvolvimento da criança.
Através da música podemos criar formas de estimular interesse pelos
conceitos de leitura de escrita, sem dizer o quanto a música oferece uma vasta
sensibilidade. A música é um meio de expressão que se desenvolve em diferentes
povos e culturas que não há barreiras sociais que distanciem as pessoas da mesma.
Desde muito pequenas as crianças têm contato com o universo sonoro na
comunidade em que está inserida. Por isso, desde cedo ela aprende a construir seu
repertório musical, selecionando-o de acordo com seu gosto pessoal, que deve ser
respeitado. Porém, é importante que ela tenha oportunidade de expandir seu
conhecimento sobre diferentes tipos musicais.
Associado a música está a dança, que também é uma forma de expressão
através do corpo. O bebê, ao ouvir um ritmo musical já utiliza-se de movimentos para
acompanhá-lo, seja através de palmas ou outras variações do corpo. A Fundação
Roberto Marinho (1991) expressa essa idéia fazendo a seguinte citação:
“As crianças sabem que dançar é uma atividade associada à
música, isto é , que dançar é produzir com o corpo movimentos
que acompanham determinado ritmo musical. Podemos observar
que, desde muito pequenas, elas já acompanham as músicas que
ouvem com palmas, sapateados, volteios de cabeça ou de
quadris.” (p.7)
Com isso, percebe-se o quanto a música contribui para a comunicação,
podendo citar também quanto ela promove integração das pessoas e dos povos.
Variadas propostas de trabalho com música vem sendo desenvolvidas
na Educação Infantil. A maioria das vezes elas estão relacionadas com a educação da
rotina da escola, outras para desenvolver a parte psicomotora da criança. Com isso
esquece-se de que através da música, a escola pode promover atividades de produção
e contentamento.
A música é uma linguagem que possibilita uma rica oportunidade de
desenvolver o aprendizado, pois expressa sentimentos e pensamentos e propõe o
trabalho com outras áreas de conhecimento, entre eles pode-se citar os conceitos de
leitura e escrita. A música pode despertar na criança um interesse por esses conceitos
de maneira agradável e mais, a música por promover a ampliação sonora auxilia na
percepção da relação entre a linguagem oral e escrita. Como é citado no Referencial
Curricular da Educação Infantil (1998):
“Deve ser considerado o aspecto da integração do trabalho
musical ás outras áreas já que, por um lado, a música mantém
contato estreito e direto com as demais linguagens expressivas
(movimento, expressão cênica, artes visuais,etc) e, por outro,
torna possível a realização de projetos integrados.” (p.49)
A música deve propor o trabalho com os sentidos, contribuindo para que
as crianças vejam o mundo poeticamente, de forma integrada.
É por meio da dança e da música, que a criança pode conhecer e
aumentar sua capacidade expressiva, exteriorizar seu pensamento e também identificar
a expressividade das outras pessoas.
Mais uma forma de expressão a ser citada é a linguagem artística através
do desenho, pintura e da escultura, expressão estas, utilizadas ao longo dos tempos
como primeira forma de comunicação escrita.
Por meio das artes visuais a criança expõe seu jeito de ver o mundo, seu modo de
pensar. Observamos que os desenhos das crianças tem características semelhantes de
acordo com a faixa etária e passam por etapas evolutivas no decorrer do tempo e que
iniciam pelas chamadas garatujas ou rabiscações e que aos poucos as crianças vão
dando significados nomeando seus desenhos. Por volta dos três anos de idade, as
representações começam apresentar formas fechadas, havendo aí uma progressiva
organização dos traços. Outro caminho é a utilização de linhas a essas formas
fechadas, para representarem a figura humana. Mais tarde os desenhos passam a ter
formas mais organizadas e com mais clarezas.
Com isso, podemos perceber que a criança vai “aprimorando” seu
desenho para buscar a maior semelhança entre o seu pensamento é a forma de
representa-lo. Através dessa linguagem gráfica-plástica onde o desenho é a sua
representação, a criança pode notar que há várias formas de se comunicar a partir do
momento que dá significado a sua idéia. A Fundação Roberto Marinho (1991) exprime
esse pensamento e assim cita:
“Qualquer que seja o caminho tomado, a conquista é imensa – as
crianças ficam eufóricas. Não sendo tolidas pelos adultos ou pela
escola, as crianças terão enorme prazer em desenhar,
representando a partir de então, por estudos e conquistas
sucessivas, tudo que existe no mundo.” (p.134)
As atividades de Artes não podem ser desenvolvidas mecanicamente,
como são desenvolvidas na maioria das instituições que desenvolvem um trabalho de
Educação Infantil. O docente precisa estimular a exploração de diferentes materiais,
precisar possibilitar aos alunos a ousarem, criarem e se desenvolverem.
O ser humano conta também com a linguagem falada para comunicar-se.
Os bebês iniciam sua linguagem oral com choros e balbucios e posteriormente palavras
que significam para eles e para as pessoas do seu meio social, uma forma de
comunicação. Essas palavras são resultados das informações que recebem do seu
ambiente de convívio com outras pessoas e dos meios de comunicação.
A criança desde muito cedo já apresenta uma capacidade narrativa. Ela
gosta de relatar fatos do cotidiano pessoal e perguntar sobre assuntos até então
desconhecido, construindo seu aprendizado sobre o mundo. Para que sua capacidade
oral se amplie, é importante que dêem a ela oportunidade de falar, que tenha contato
com diferentes tipos de textos e histórias.
Por estarem sempre interessadas a ouvirem histórias, esse tipo de
atividade apresenta grande significado no trabalho dos docentes na questão da
alfabetização. Ouvirem histórias, também é uma maneira de perceber como um texto
pode ser constituído, como as situações são apresentadas, é portanto uma forma de
leitura. A história desperta, entre outros fatores, curiosidades como: quem a fez, como
se fez, como terminará, aguçando o processo intelectual e criativo da criança. Porém é
preciso que haja emoção por parte de quem está contando a história para que a
sedução seja completa. Compartilhando dessa idéia Zaccur (1993) cita:
“..As crianças estão sempre predispostas a ouvir histórias.
Sobretudo se quem conta cria uma atmosfera mágica em que a
voz assume diversos papéis e se colore de emoção.
Como a aguda intuição de quem tem pressa em alcançar o trem
da história, as crianças buscam se apropriar da matéria
necessária ao processo de sua constituição como sujeitos
produtores de linguagem”. (p.42)
A narrativa pode estar também relacionada a linguagem teatral, uma vez
que a criança pode perceber a representação de textos através dos movimentos
corporais e da dinâmica da voz. É importante que a criança perceba essa possibilidade
como mais uma forma de expressão, onde as idéias e sentimentos são externalizados e
conceitos são elaborados.
Sendo assim, através da narrativa a criança pode notar que uma mesma
história pode ser contada de várias maneiras e entonação mostrando-a que é possível
recriar. É essa interação entre criar e recriar que ampliará o potencial de produção da
criança, pela internalização e transformação.
As linguagens, sejam elas verbais ou não –verbais, não são meros
passatempos ou preparação para uma posterior aprendizagem. Elas são formas de
expressão que precisam ter seus espaços na escola desfragmentado, pois o indivíduo
não executa seus sentidos de forma isolada. Ao utilizarem-se da pintura, por exemplo,
as crianças estão valendo-se de diferentes sentidos ao mesmo tempo. É necessário que
a criança tenha acesso aos diferentes tipos de linguagens para que possam perceber
suas habilidades e construir uma identidade.
Todas as formas de expressão são tão importantes quanto a comunicação
escrita, pois uma possibilita o enriquecimento da outra.
Vejamos agora a linguagem escrita, forma de comunicação muito utilizada
no contexto social. Mas para que a criança tome esse tipo de linguagem como tal, é
preciso que dê significado a leitura e escrita, que assim como seus desenhos, esses
conceitos são construídos através de um processo.
Ao ter contato com diferentes linguagens como foram de expressão, o
significado de leitura e escrita é facilmente percebido por ela. Esses conceitos serão
buscados para que a criança torne sua comunicação mais ampla, uma vez que a
sociedade que vivemos é provida de recursos escritos. Gomes (1993) expõe essa idéia
com o seguinte relato:
“Para acompanhar o processo de aquisição da linguagem escrita,
seria interessante traçar um paralelo entre traçar essa linguagem
e outras. Uma criança que estivesse familiarizada com outras
linguagens compreenderia a escrita como mais um processo,
enquanto construção.” (p.138)
Com isso, percebe-se o quanto é importante para a construção da leitura e
escrita a percepção de que a mesma não se dá de forma isolada, e a criança e os
docentes devem ter clareza disso para que todas as formas de expressão sejam
valorizadas.
Portanto, a elaboração dos conceitos de leitura e escrita está relacionada,
entre outros aspectos, ao seu valor significativo, que pode ser explorado através dos
recursos comunicativos que a sociedade dispõe, proporcionando um trabalho
pedagógico criativo, interativo e enriquecedor.
Sabemos que na vida cotidiana, a criança desde cedo tem contato com a
linguagem escrita. Tão presente em nossa sociedade, seja nas embalagens, jornais,
revistas, outdoors, letreiros das casas comerciais..., elas formam fontes de informações
sobre a escrita. Dependendo do meio em que vivem, será maior ou menor o acesso das
crianças a essas informações.
As crianças ao depararem com este mundo letrado, começam a estimular
sua curiosidade sobre este sistema de representação. Questionamentos são levantados
e ao longo de um processo, hipóteses são elaboradas por elas, até chegarem ao
conceito de leitura e escrita.
Apesar de cotidianamente, as crianças terem um contato natural com a
linguagem escrita, a escola é um espaço onde deve promover todo um ambiente
alfabetizador, estimulando o desenvolvimento e descobertas sobre a linguagem escrita.
Criando um ambiente alfabetizador, a escola estará possibilitando que todas as crianças
se encontrem mais amplamente com o universo letrado, dando igualdade de
oportunidade para vivenciarem as experiências do contexto de leitura e escrita.
Mas é importante que não se deixe de lado o desenvolvimento das outras
linguagens, que podem facilmente ser interagidas ao sistem de escrita convencional,
dando mais dinamismo e prazer ao aprendizado e a prática pedagógica dos docentes.
As crianças, de um modo geral, passam por etapas de construção do
conhecimento, até que se apropriem da escrita convencional. É preciso que os docentes
percebam esse conhecimento como parte de um processo, para que assim valorize o
desenvolvimento do aluno.
A cada etapa do processo, hipóteses sobre a leitura e a escrita são levantadas e
experimentadas pelas crianças, de acordo com as fontes de informações que recebem
no seu dia-a-dia, dentro ou fora da escola. Uma fonte muito significativa é o seu próprio
nome, tão importante para ela, pois está relacionada a sua identidade. Ao terem a
escrita dos seus nomes expostas na turma, discussões sobre semelhanças e diferenças
dos mesmos são levantadas, apontando-se aí uma grande possibilidade para a
elaboração desses conceitos.
Outras atividades pedagógicas onde ocorram a leitura e a escrita com a
interação dos alunos, também auxiliam na construção do conhecimento . Ao transcrever
um texto, ao elaborar histórias coletivas, enfim ao utilizar-se da leitura e escrita junto às
crianças, o professor dá oportunidades a elas de pensarem e perceberem não só a
escrita das palavras, como a estrutura dos diferentes tipos de textos. Assim, as
palavras aparecem dentro de um contexto, o que dá sentido a linguagem. Ferreiro
(1993) expressa essa idéia da seguinte forma:
“Os adultos fazem anotações, lêem cartas, comentam os
periódicos, procuram um número de telefone etc. Isto é, produzem
e interpretam a escrita no mais variados contextos. É evidente
que, por si só, a presença isolada do objeto e das ações sociais
pertinentes não transmitem conhecimento, mas ambas exercem
uma influência, criando as condições dentro das quais isto é
possível” (p.43)
Durante o processo de construção de escrita e leitura, as crianças fazem
análises diversas sobre essa linguagem como: quantas e quais letras precisam para
escrever determinada palavra. Na maioria das vezes atribulam em muitas letras para
representarem nomes de coisas grandes ou poucas para algo pequeno. Este é,
portanto, uma fase pela qual a criança passa durante o processo. E assim, vão sendo
testadas as hipóteses sobre a escrita, utilizando sua lógica que muitas vezes não são
interpretadas pelo adulto.
No avanço desse processo, a criança testa outras hipóteses mais
elaboradas, onde percebem que se escreve de acordo com o som da sílaba. Nesta fase
ela cria a hipótese silábica, em que para cada som ela utiliza uma letra ou caractere.
Porém em análise a essas hipóteses, algumas teorias não mais a satisfaz quando
comparada a escrita convencional. Então passa a reestruturá-la.
Posteriormente a criança chega a fase denominada silábico-alfabético,
caracterizado por uma escrita em que a criança ora utiliza uma letra para determinada
sílaba e ora usa duas como representação da sílaba. Surge assim, novos conflitos, pois
a criança busca escrever de acordo com a escrita convencional, observada no seu
cotidiano. Mas a medida que lhe é dada a oportunidade de construção desta forma de
expressão, esses conflitos vão sendo sanados, tornando então, alfabetizado. Ainda da
mesma autora:
“Imersa em um mundo onde há a presença de sistemas
simbólicos socialmente elaborados, a criança procura
compreender a natureza destas marcas especiais. Para tanto,
não exercita uma técnica específica de aprendizagem. Como
já fez antes com outros tipos de objeto, vai descobrindo as
propriedades dos sistemas simbólicos através de um
prolongado processo construtivo... Utilizamos o marco
conceitual da teoria psicogenética de Piaget para compreender
os processos de construção do conhecimento no caso
particular da linguagem escrita.” (p.43-44)
Até aqui, observamos o sistema de construção do conhecimento de
leitura e escrita passa por um processo gradativo. Porém, isto não ocorre sozinho, é
importante que a criança tenha acesso a determinadas informações sobre o
letramento. Por isso se faz importante o papel da escola, pois ela oferece ou deve
oferecer aos alunos atividades que possibilitem a reflexão sobre as linguagens e
neste caso a linguagem escrita.
É importante que as crianças tenham como já foi dito anteriormente
contato com diferentes tipos de textos e histórias e que o professor deixe claro que
está lendo o que está escrito ou que está apenas contando a história, assim como
propor atividades em que as crianças possam perceber a sonoridade das palavras e
suas semelhanças. A elaboração de histórias coletivas onde a língua aparece como
um todo e não isoladamente, promovem o interesse pela escrita.
Mesmo que as crianças ainda não escrevam alfabeticamente, elas já
na Pré- Escola precisam ser estimuladas a fazê-la, para que reflitam sobre esse
conceito, desenvolvendo a chamada escrita espontânea. Neste momento o
professor terá oportunidade de observar a fase em que a criança se encontra,
participando como mediador do processo.
Portanto, será através da relação de interação entre adultos e crianças,
que elas irão elaborar e reelaborar os conceitos convencionais da leitura e da
escrita, e a Pré-Escola precisa dar oportunidade para que a criança desvende esse
mistério que é para ela, de ler e escrever.
CAPÍTULO IV - A função social da alfabetização
Mais do que aprender os códigos lingüísticos,alfabetizar-se é tornar-se
um leitor e um escritor, capaz de compreender a função dessa aprendizagem,
fundamental desse mundo letrado em que vivemos.
As crianças, mesmo antes de ingressarem na escola, percebem a
vastidão de palavras e textos que estão a sua volta. Com isso, ela cria uma
curiosidade natural sobre esta forma de expressão, percebendo o seu mundo.
Portanto, nota-se que a leitura e a escrita possuem uma função social
e assim devem ser desenvolvidas, dentro de um contexto. É uma forma de levar o
aluno a compreender o mundo, a refletir e reescrever sobre o que é lido.
Muitos docentes em sua prática pedagógica do trabalho com
alfabetização, ainda não têm consciência dessa função social que a alfabetização
possui, com isso acabam por desenvolverem trabalhos em que a mesma acontecem
por meio de palavras isoladas e cópias, mas isso não basta, é preciso contribuir para
o letramento, que é a base da alfabetização, isto é, a alfabetização efetiva.
Alfabetizar-se não é apenas decodificar a língua, é uma questão que vai muito mais
além, é fomentar o desejo infindável de conhecer as possibilidades que ela nos traz.
Fundação Roberto Marinho (1991) faz a seguinte referência para compartilhar dessa
idéia:
“A Pré-Escola não deve se preocupar em alfabetizar crianças
ensinando a elas os mecanismos do código alfabético. Deve,
sim, fazer com que as crianças descubram todo o prazer que a
escrita e a leitura podem oferecer a seus usuários.” ( p.75)
Esse prazer que a leitura e a escrita podem promover, está
relacionada, entre outros aspectos, em tornar a criança ou o alfabetizando, um ser
ativo, que possam agir e interagir com o mundo.
Porém, muitas vezes o que ocorre é um trabalho de absorção de
memorização, o que está longe de ter significado real para a criança, que busca tão
logo chegar a esse universo lingüístico que a fascina, mas que diante desta prática
pode acabar por distanciá-la. Tal fato ocorre, por que a medida em que não
dominam a escrita convencional no momento esperado pelo professor, sua auto-
estima e confiança são desestruturadas. Oswald (1996) cita Kramer, o que reafirma
essa idéia:
“Será justo exigir que as crianças permaneçam na aridez da
linguagem mecânica –instrumento -, distanciando-as, ao invés
de aproxima-las, do significado da escrita como arma e
sonho? E o retirar prazer do lido? E o expressar idéia,
sentimentos, desejos? E o penetrar no mundo do simbólico e
também assim conhecer outros povos, outras letras, outras
gentes, o meu Brasil?” (p.28)
Para que a escola cumpra seu papel social, é importante que realize
atividades de modo que desenvolvam tal papel, e a alfabetização é uma delas. Ler e
escrever, como já foi dito, significa compreender o mundo letrado, de forma crítica. O
universo lingüístico é rico e não pode ser empobrecido com textos sem conteúdos,
sem valor significativo, somente para que a criança decore os códigos da língua.
A criança, desde pequena precisa ser estimulada ao hábito da leitura
de maneira reflexiva, pois isso é que lhe promoverá o letramento referido
anteriormente. Por ter a função de informar ou entreter, a linguagem escrita precisa
ser vista como algo de prazer, transformação e conhecimento. O aluno precisa
perceber a utilidade que o poder de leitura escrita têm no seu cotidiano seja para
estar inserido à sua sociedade, seja para interagir na mesma.
Devido a isso, o processo de alfabetização necessita estar em
harmonia com a relidade do educando, para que este sinta o desejo pela mesma
como forma de buscar nela suas potencialidades para refletir, expressar ou
concretizar suas aspirações. Freire (1985) cita:
“...este movimento do mundo à palavra e da palavra do mundo
está sempre presente. Movimento em que a palavra dita do
mundo mesmo através da leitura que ele fazemos. De alguma
maneira, porém, podemos ir mais longe e dizer que a leitura
não é apenas precedida pela leitura do mundo mas por uma
certa forma de “escreve-lo” ou de “reescreve-la”, quer dizer, de
transformá-lo através de nossa prática consciente.” (p.22)
Levando o aluno a compreender a função social dessa linguagem, a
escola estará colaborando para que este aluno torne-se de fato um leitor – escritor.
Para isso é preciso que lhe ofereçam oportunidades de criar e refletir desde cedo,
mesmo que ainda não saibam ler. Elas necessitam interargir com a leitura, e o
professor pode auxilia-la quanto a isso, trabalhando e explorando junto a elas, bons
textos. São essas experiências desde a primeira infância que irão formar um bom
leitor e sê-lo significa, entre outros fatores, saber do poder que a linguagem
apresenta em nossa sociedade.
A partir do momento que o indivíduo domina a leitura na sua totalidade,
ele possui mais entendimento do seu contexto social de cidadania, com isso
questionamentos são levantados, refletidos e reivindicados, tornando a ter um
percepção crítica do mundo. Perez (2001) expõe essa idéia com o seguinte trecho:
“Aprender a ler, a escrever é, antes de mais nada, aprender a
ler o mundo; compreender seu contexto, localizar-se no
espaço social mais amplo, a partir da relação linguagem –
realidade. O processo de alfabetização se realiza no
movimento dinâmico entre a palavra e mundo: a palavra dita
flui no mundo carregada de significação existencial:
“palavramundo” – a mais perfeita tradução do acontecer
humano”.
Por isso, a questão da alfabetização é um tema que está em foco
constantemente em nosso país, pois a cada ano o índice de analfabetismo aumenta
e os iletrados passam por muitas conseqüências sociais. Embora a escola não
garanta uma condição de vida melhor, esta estará contribuindo para sua
participação cidadã de forma autônoma, possibilitando a luta de uma sociedade
mais democrática.
CONCLUSÃO
A reflexão sobre as práticas pedagógicas dos docentes é o que conduz
essa pesquisa, para que a Educação Infantil desenvolva um trabalho de qualidade, e
seja visto não como uma preparação para a aprendizagem e sim como a realização
desta aprendizagem. Para que isso ocorra é necessário que alguns aspectos sejam
discutidos e as idéias sobre a função da alfabetização sejam repensadas.
A Educação Infantil possibilita a utilização das diversas linguagens,
com isto o professor tem um vasto recurso para desenvolver um trabalho
significativo e criativo, com a mesma seriedade do caminho sistemático que algumas
práticas oferecem.
Refletir sobre a construção dos conceitos de leitura e escrita na
Educação Infantil, leva a repensar sobre a função da alfabetização e a inter-relação
entre ela e as outras formas de linguagens, seja oral, gestual, musical, plástica,
gráfica..., pois todas são formas de expressão utilizada na relação humana.
O docente precisa ter consciência que a alfabetização é um processo,
e que ocorre dentro e fora da escola, pois o aluno está inserido numa sociedade
letrada e seu contato com a linguagem escrita ocorre a todo momento. Com isso,
não cabe ao professor determinar o tempo que se pode iniciar a criança nesse
processo. A alfabetização não é a repetição insignificante dos códigos da língua e
sim uma forma de expressar-se e ler o mundo.
As linguagens não devem ser desenvolvidas mecanicamente,
formando meros reprodutores. A escola deve propiciar as crianças a possibilidade de
atuarem ativamente diante das situações e conteúdos apresentados. Assim, os
alunos estarão vivendo seus papéis de cidadãos que agem e interagem na
sociedade.
A Educação Infantil precisa ser um espaço acolhedor afetivamente; um
espaço onde a criança possa demonstrar e conhecer seu potencial; onde através da
relação aluno – aluno e aluno – professor, ela tenha oportunidade de construir um
conhecimento; um espaço onde ela possa desenvolver atividade com satisfação.
Enfim, precisa ser um lugar de construção real da aprendizagem.
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