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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC - SP RENATA CRISTINA NASCIMENTO HENRIQUES SOUSA A construção afetiva da experiência de viajar nos contratos de comunicação de Viagem e Turismo MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA SÃO PAULO 2012

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC - SP

RENATA CRISTINA NASCIMENTO HENRIQUES SOUSA

A construção afetiva da experiência de viajar

nos contratos de comunicação de Viagem e Turismo

MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA

SÃO PAULO

2012

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RENATA CRISTINA NASCIMENTO HENRIQUES SOUSA

A construção afetiva da experiência de viajar

nos contratos de comunicação de Viagem e Turismo

MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como

exigência parcial para obtenção do título de Mestre em

Comunicação e Semiótica, sob a orientação do

professor Dr José Luíz Aidar Prado.

SÃO PAULO

2012

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Banca Examinadora

_____________________________________________________

_____________________________________________________

_____________________________________________________

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À minha amada Mãe,

exemplo de amor soberano,

que mesmo quando abalada, por razões da vida,

superou as dificuldades para assim dar exemplo de força

e fazer com que eu alcançasse mais este objetivo.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, fonte máxima de inspiração, que me deu sabedoria e permissão para galgar mais esta

etapa importante da minha vida.

Ao meu noivo, por ser meu grande companheiro há mais de 10 anos, e que provou que com

amor e cumplicidade podemos superar tudo.

Ao Prof. José Luiz Aidar Prado, orientador deste trabalho, a orientação e as valiosas

discussões que o tornaram possível.

Aos colegas de classe, que contribuíram, com seus estudos e relatos de experiência de vida,

para uma aprendizagem colaborativa.

Ao meu querido irmão e a meu pai, fontes de carinho, amor verdadeiro e estímulo para galgar

sempre mais um degrau.

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“Cada vez que o reino humano me parece condenado ao peso

das paredes, digo para mim mesmo que à maneira de Perseu, eu

devia voar para outro espaço, mudar meu ponto de observação,

considerar o mundo sobre outra ótica, outra lógica, outros meios

de conhecimento”.

ÍTALO CALVINO

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SUMÁRIO

Lista de figuras ....................................................................................................................... 09

Resumo .................................................................................................................................... 11

Abstract ................................................................................................................................... 12

Introdução .............................................................................................................................. 13

Sobre a revista Viagem e Turismo ......................................................................................... 19

1. CAPÍTULO I – Consumo e mídia na contemporaneidade

1.1. A cultura do consumo no mundo atual .............................................................................. 21

1.2. Consumo do imaterial ........................................................................................................ 25

1.3. Mídia na pós-modernidade ................................................................................................ 28

1.4. Mídia turística .................................................................................................................... 31

2. CAPÍTULO II – A revista Viagem e Turismo e os programas de cruzeiros marítimos

2.1. O início de um contrato ..................................................................................................... 37

2.2. Incluindo o leitor ............................................................................................................... 40

2.3. As capas de Viagem e Turismo .......................................................................................... 52

2.4. Viagem e Turismo na internet ............................................................................................ 58

2.5. Cruzeiros Marítimos .......................................................................................................... 59

2.6. Cruzeiros Marítimos no Brasil .......................................................................................... 61

2.7. Empresas de cruzeiros marítimos ...................................................................................... 66

2.7.1. Costa Cruzeiros ....................................................................................................... 66

2.7.2. CVC ........................................................................................................................ 68

2.7.3. MSC Cruzeiros ........................................................................................................ 69

2.7.4. Royal Caribbean ..................................................................................................... 69

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3. CAPÍTULO III – Publicidade e consumo dos cruzeiros marítimos

3.1. A viagem no fazer publicitário .......................................................................................... 71

3.2. As fases dos anúncios em seu desenvolvimento semiótico ............................................... 79

3.2.1. Primeira fase: Publicidade como informação (A viagem é o navio) .............................. 80

3.2.2. Segunda fase: Aparecimento do corpo do consumidor .................................................. 82

3.2.3. Terceira fase: Passionalização da narrativa sobre a viagem: A experiência como centro

no contrato de comunicação ......................................................................................... 88

3.3. Passionalização .................................................................................................................. 99

Considerações Finais: A viagem ao cosmético e ao lúdico ................................................ 103

Referências Bibliográficas....................................................................................................114

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Exemplo de veiculação de anúncio da empresa Costa Cruzeiros ........................... 16

Figura 2 - Exemplo de veiculação de anúncio da empresa Royal Caribbean .......................... 17

Figura 3 - Exemplo de veiculação de anúncio da empresa Royal Caribbean .......................... 18

Figura 4 - Capas de Revistas Viagem e Turismo no site Abril – mídia kit ............................... 19

Figura 5 – Seção Passaporte - Viagem e Turismo, junho de 1997............................................ 39

Figura 6 - Reportagem “Balada sem ressaca” - Viagem e Turismo, janeiro de 2008 ............... 46

Figura 7 – Seção Viajantes - Viagem e Turismo, janeiro de 2008............................................ 49

Figura 8 – Carimbo “Confie na sua viagem” Viagem e Turismo julho de 2011 ...................... 50

Figura 9 – Capa de Viagem e Turismo, junho de 1997............................................................. 52

Figura 10 - Capa de Viagem e Turismo, outubro de 2003 ........................................................ 53

Figura 11 – Capa de Viagem e Turismo, junho de 2011 .......................................................... 55

Figura 12 – Anúncio de partidas dos navios da Linea C .......................................................... 67

Figura 13 – Anúncio Costa Cruzeiros “Os Transatlânticos” ................................................... 81

Figura 14 – Anúncio MSC Cruzeiros “Você vai amar!” ......................................................... 84

Figura 15 - Anúncio CVC Cruzeiros “Viva seu sonho de verão no Funchal” ......................... 85

Figura 16 – Anúncio Royal Caribbean e Celebrity Cruises ..................................................... 87

Figura 17 – Anúncio Royal Caribbean. “Histórias of the Seas” .............................................. 90

Figura 18 – A. Royal Caribbean. “Uma grande brincadeira merece um grande parque.........91

Figura 19 – Anúncio Royal Caribbean. “Aqui você é o Rei” .................................................. 93

Figura 20 – Anúncio MSC Cruzeiros. “Varanda com vista para o mar é para poucos”........... 95

Figura 21 - Anúncio MSC Cruzeiros – “Mediterrâneo, Segredos, Cultura” ............................ 97

Figura 22 – Anúncio da Costa Cruzeiros “Costa na Europa” ................................................ 111

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Números desenvolvidos pela CLIA.......................................................................60

Tabela 2 - Movimentação de passageiros de 2000 a 2010.......................................................63

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Número de navios por temporada no Brasil .........................................................64

Gráfico 2 - Número de escalas por temporada no Brasil .........................................................64

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RESUMO

Esta pesquisa visa examinar os procedimentos enunciativos e efeitos de sentido observáveis

nos anúncios de cruzeiros marítimos da revista Viagem e Turismo. Trata-se, mais

especificamente, de assinalar a maneira pela qual os enunciadores constroem as figuras das

viagens, tematizadas de formas específicas, convidando o enunciatário a participar deste

cenário imaginário. Adotou-se a hipótese de que a construção de figuras e temas

fundamentados nos imaginários do consumo contemporâneo foi empregada nesses anúncios

como argumento mercadológico, interessadamente, a fim de identificar o consumidor

construído pelo capitalismo globalizado, sedento por novas formas de interação social,

experiências culturais e buscando ser o conhecedor de outras realidades. O trabalho mobiliza

as teorias de consumo de Gilles Lipovetsky, Zymunt Bauman e o conceito de “marketing da

experiência” de Isleide Fontenelle. Entendemos aqui o marketing de experiência como forma

de modalização dos discursos realizada pela mídia, que apela ao leitor a partir dos aspectos

sensoriais. Para estudar a relação entre enunciador e enunciatário operamos com o conceito de

“contrato de comunicação” de Patrick Charaudeau, entendido como conjunto de referências

comuns que permitem o estabelecimento de laços comunicativos e recíprocos entre os sujeitos

em questão e moldam seu intercâmbio linguageiro. Para a análise discursiva deste material

recorremos aos modelos da semiótica propostos por Diana Barros e Vicente Pietroforte. O

corpus da pesquisa é uma seleção de edições da revista Viagem e Turismo, no período de

1995 a 2010. Tal discussão é fundamental, pois as mídias investem na construção de

identidades e multiplicam, assim, a criação de figuras e temas que caracterizam programas

modalizadores.

Palavras-chave: consumo, publicidade, contratos de comunicação, passionalização, revista

Viagem e Turismo.

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ABSTRACT

The objective of the present research paper is to discuss enunciative procedures and meaning

effects observable in cruise advertisements published in Travel and Tourism (Viagem e

Turismo) magazine; particularly, the way in which enunciators construct figures related to the

cruises, themed in specific modes, inviting enunciatees to participate in such an imaginary

scenario. We assumed the hypothesis that the construction of figures and themes supported by

the imaginaire of contemporary consumption has been purposely used in these advertisements

as a marketing argument so as to identify the consumer constructed by globalized capitalism,

eager for new forms of social interaction, cultural experiences and different realities. This

study involves the consumption theories elaborated by Gilles Lipovetsky and Zymunt

Bauman, as well as the concept of "experience marketing" by Isleide Fontenelle. We regard

“experience marketing” as a form of discourse modalization performed by the media by

means of sensory aspects which appeal to readers. In order to understand the relationship

between enunciator and enunciatee we take recourse to the concept of "communication

contract" by Patrick Charaudeau, understood as a set of common references that allow for the

establishment of communicative and reciprocal ties among the individuals subjects in

question and give shape to their language exchanges. The semiotic models proposed by Diana

Barros and Vicente Pietroforte are used in the discursive analysis of the relevant material.The

research corpus is a selection of issues of Travel and Tourism magazine published within the

period that ranges from 1995 to 2010, The aforementioned discussion is of crucial

importance, for the media invest in the construction of identities, thus multiplying figures and

themes that characterize modalizing programs.

Keywords: consumption, advertising, communication contracts, passionalization, Viagem e

Turismo magazine.

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INTRODUÇÃO

A passagem da cultura de massas para a cultura das mídias pode ser

examinada com relação sistema-mundo da vida. O capitalismo

desorganizado ou multinacional ancora-se não mais no valor do trabalho e na

produção medida em horas de trabalho, mas no valor do imaterial: o trabalho

de produção material, mensurável em unidades de produto por unidade de

tempo, é substituído por trabalho dito imaterial, ao qual os padrões clássicos

de medida não mais podem se aplicar. (PRADO, 2006, p.19).

Na era que chamamos de capitalismo cognitivo, o sujeito não é mais pautado por uma

identidade permanente, imutável. Devido ao constante movimento de criar e recriar itens para

a atual sociedade de consumidores foram necessárias também, mudanças significativas na

maneira pela qual os sujeitos passaram a ser interpelados. Transformações nas composições

estruturais deram forma a um novo tipo de sujeito, que passou a vestir-se com diferentes

identidades. Estes novos sujeitos, muitas vezes criados pelo próprio mercado, são definidos

basicamente a partir da condição de consumidores, que se satisfazem até o momento em que a

economia decide que é hora de seduzi-lo novamente pelo desejo do irrealizado. O

consumismo é uma das principais características da sociedade atual. De acordo com Bauman

(2008, p. 41):

Para que isso aconteça, é necessário que a capacidade profundamente

individual de querer, desejar e almejar deve ser, tal como a capacidade de

trabalho na sociedade de produtores, destacada dos indivíduos e reciclada

numa força externa que coloca a sociedade dos consumidores em

movimento.

Para que seja contínua, a sociedade de consumo é instigada à eterna insatisfação. “A

vida de consumo não pode ser outra coisa senão uma vida de aprendizado rápido, mas

também precisa ser uma vida de esquecimento veloz.” (BAUMAN, 2008, p. 124). Neste caso

é possível entender porque as campanhas publicitárias de turismo se utilizam de produtos

intangíveis para o sujeito. É necessário que sejamos melhores para obter novos

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conhecimentos. Porém, para que haja convívio entre os indivíduos, é necessário seguir um

padrão para que as ações de cada um façam sentido para si mesmo e para a sociedade.

Portanto, mesmo com tantas transformações, todos nós, componentes desta sociedade pós-

tradicional, queremos nos manter ligados uns aos outros.

Neste contexto, estudaremos os regimes de produção de sentido na construção dos

anúncios de cruzeiros marítimos, abordando temáticas ligadas ao sucesso, à alegria, ao

convívio, à cultura, ao exótico, a partir dos regimes de visibilidade atuantes nos contratos de

comunicação das peças publicitárias escolhidas. Observaremos como os anúncios se

categorizam e como dispõem os regimes de visibilidade para os enunciatários. O que se

entende por aventura, qual conhecimento é absorvido quando o navio atraca em alguma

cidade pelo mundo, como se divertir dentro de um navio, são exemplos de temáticas

relacionadas à passionalização da narrativa sobre a viagem; tais serão os conteúdos a serem

abordados no corpus da pesquisa. Foram colocadas e trabalhadas as seguintes questões de

pesquisa: de que maneiras as empresas de cruzeiros marítimos passaram a construir a

experiência em suas peças publicitárias? Quais são os dispositivos comunicacionais que

constroem e fortalecem os contratos de comunicação? Como os enunciadores convocam os

enunciatários? De que modo se organiza anualmente a distribuição dos agendamentos

temáticos relativos ao desenvolvimento das campanhas publicitárias? Examinou-se o

incentivo do consumo do imaterial através das temáticas exploradas e as formas pelas quais a

passionalização da narrativa é desenvolvida nas várias fases dos anúncios. Esta

passionalização é um passo para o apelo aos aspectos sensoriais e para a experimentação das

sensações através das imagens e apela diretamente ao sensível. O corpus é constituído pelas

peças publicitárias de quatro empresas de cruzeiros marítimos que veicularam suas

campanhas na revista Viagem e Turismo: Costa Cruzeiros, CVC, MSC Cruzeiros e Royal

Caribbean. Delimitamos os anos de estudo entre 1995 a 2010, separados em três fases.

Identificaremos as estratégias discursivas dos enunciadores e para responder a algumas das

questões acima, elaboraremos também itens que categorizam o desenvolvimento dessas

campanhas publicitárias, assim como a análise semiótica de alguns dos anúncios mensais.

Mas, antes de iniciar as análises, traremos os conceitos principais, que a partir de Lipovetsky

(1989, 2007), Bauman (2001, 2007, 2008) e Prado (2011) nos orientarão sobre a sociedade do

consumo contemporânea e a passionalização da narrativa e que contribuirão também no

entendimento da produção de sentido dos discursos nos meios de comunicação. No campo da

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experiência as teorias de Rifkin (2001) e Fontenelle (2002, 2004) nos ajudaram na

compreensão do apelo ao sensível. O levantamento também inclui teoria que tematiza os

contratos comunicacionais conforme Charaudeau (2006), que nos ajudará a compreender os

processos cotidianos que envolvem a socialização do indivíduo através da circulação dos

saberes. De acordo com Prado (2008, p. 95): “Os enunciadores midiáticos, do marketing e da

publicidade são sujeitos-supostos-sabedores que fornecem aos enunciatários o saber, na forma

de mapas, ou seja, receitas modalizadoras para as ações”.

Portanto, esta pesquisa visa principalmente compreender os contratos de comunicação

dos anúncios de cruzeiros marítimos presentes na revista Viagem e Turismo. Mas para isso,

primeiramente analisamos a relação entre consumo e mídia na contemporaneidade,

investigando estratégias mercadológicas que buscam construir sentidos a partir de percursos

passionais. O segundo passo da pesquisa consistiu na avaliação crítica das narrativas da

revista Viagem e Turismo, buscando a investigação dos elementos que constituem sua

construção simbólica. Interessou-nos, também, a investigação dos contratos de específicos de

enunciação ou leitura, em que foram criadas posições modalizadoras de sujeitos. Na terceira

parte, analisamos as imagens dos anúncios impressos, o corpus da pesquisa, sob o aspecto

semiótico (decomposição das figuras e agendamentos temáticos) e tentamos compreender os

processos cotidianos que envolvem a socialização do indivíduo para o consumo, recorrendo

aos modelos semióticos propostos por Barros (1988) e Pietroforte (2003). Nosso objetivo não

foi simplesmente fazer uma análise semiótica de cada anúncio, mas também destacar o papel

dessa imagem na construção da mensagem do anúncio e da argumentação persuasiva do

consumo, não apenas de bens materiais, mas também o consumo de bens simbólicos. No

material analisado, identificamos três fases diferentes no desenvolvimento das campanhas das

empresas de cruzeiros marítimos na revista Viagem e Turismo. A primeira fase é a da

publicidade como informação (a viagem é o navio), a segunda fase é a do aparecimento do

corpo do consumidor e a terceira fase a da passionalização da narrativa sobre a viagem: a

experiência como centro no contrato de comunicação.

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Primeira Fase: Publicidade como informação (a viagem é o navio)

Nesta primeira fase, o anúncio é apenas informativo, com conteúdo repleto de

informações turísticas e, portanto, não existe uma articulação mais complexa entre figura e

tema. O enunciatário não aparece construído no contrato de comunicação como alguém com

inúmeros objetos de interesse.

FIGURA 1: Exemplo de anúncio da empresa Costa Cruzeiros, veiculado pela representante

Agaxtur, ’30 anos de sucesso’. Anúncio pouco usado, apenas compunha uma revista mais

formal, com conteúdo repleto de informações turísticas.

Fonte: (Revista Viagem e Turismo - Maio de 2008)

Segunda fase: Aparecimento do corpo do consumidor

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Nesta fase, os anúncios começam a mostrar o corpo como um item imprescindível

para demonstrar o alcance de uma vida melhor, e torna-se impossível falar em valorização da

vida sem recorrer às suas figuras na publicidade. Não se tratava mais somente de informar o

roteiro de uma viagem, como no primeiro período, mas de construir um contrato

comunicacional para um público com desejos.

FIGURA 2: Primeiro exemplo de veiculação de anúncio da empresa Royal Caribbean: ‘Aqui

dentro cabe muita aventura’ em que a construção das figuras do discurso é atrelada à estética

da mercadoria (a viagem como experiência estésica).

Fonte: (Revista Viagem e Turismo - Fevereiro de 2004)

Terceira fase: Passionalização da narrativa sobre a viagem: a experiência como centro

no contrato de comunicação

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Aqui, a passionalização da narrativa vem à frente, e o anunciante passa a considerar

com mais ênfase os desejos do enunciatário, convidando-o a viver uma experiência de

vida/prazer. As empresas se utilizam de uma estratégia passional para construir as viagens

como centros sensíveis de prazer desejado, tematizadas como centro nos contratos de

comunicação. Nessa fase a publicidade se volta para um público com corpo, que vive suas

paixões, entre as quais a de viajar, a de conhecer o mundo e a de conhecer-se no mundo a

partir das experiências sensoriais, sociabilizantes de viajar.

FIGURA 3: Segundo exemplo de veiculação de anúncio da empresa Royal Caribbean: ‘Uma

grande viagem, merece uma grande descoberta’ em que a construção das figuras do discurso

apela diretamente ao sensível do leitor/consumidor.

Fonte: (Revista Viagem e Turismo - Maio de 2008)

Assim, entendemos que estudar estes fenômenos sociais exige obter um olhar crítico

para as novas relações e os atos de enunciação propostos pela imagem publicitária expressada

a partir dos anúncios impressos.

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Sobre a revista Viagem e Turismo

A revista Viagem e Turismo é a publicação líder absoluta do segmento turístico com

59% do share1, apresentando tiragem mensal de 135 mil exemplares, atingindo mais de 267

mil leitores em todo o país, o seu lema é ‘Sonhe. Planeje. Embarque’. Os anúncios buscam

fazer com que o enunciatário sonhe (a partir da convocação estésica), planeje a viagem (a

partir das informações oferecidas pelo enunciador e pelos anunciantes) e embarque, ou seja,

mergulhe na aventura de viajar.

FIGURA 4: Revistas Viagem e Turismo

Fonte: Site da Abril, mídia kit, acesso em 12 de fevereiro de 2012

Editada pela Editora Abril, a revista Viagem e Turismo tem por objetivo oferecer dicas

e informações aos viajantes, sobretudo no que envolve as diversas facetas de uma viagem: a

escolha, o planejamento, o embarque e a experiência no destino. De acordo com pesquisas

realizadas no site da revista (http://www.turismoabril.com.br/midiakit/vt/missao.php), os

leitores da revista gostam de viajar, adoram fazer compras e estão abertos a novas

1 Fonte: IVC/DINAP/PCO ASSINATURAS/PLAN CONSTR E GESTÃO CORP/ IVC jan a dez 2008

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experiências. Conforme os números do mídia kit, o leitor de Viagem e Turismo viaja 6 vezes

mais do que a média dos brasileiros2. Seu público é composto por 54% de mulheres e 46% de

homens, 58% deles entre as idades de 25 a 49 anos e 87% representam as classes A e B3. É a

única publicação do setor que não aceita convites de qualquer empresa, buscando sempre

trazer informações confiáveis sobre os principais destinos do Brasil e do exterior. É vencedora

do 21º Prêmio Veículos da Editora Referência, como melhor veículo de turismo; foi eleita três

vezes campeã da Comissão Europeia como a Melhor Revista do Brasil; possui 11 troféus do

Prêmio Abril de Jornalismo e é detentora da maior circulação média mensal do segmento.

2 Comparado com a média da população. Fonte: XLIX Estudos Marplan – Janeiro 2008 à Dezembro 2008.

3 Fonte: XLIX Estudos Marplan – Consolidado 2008

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1. CAPÍTULO I – Consumo e mídia na contemporaneidade

1.1. A cultura do consumo no mundo globalizado

Comprar objetos, pendurá-los ou distribuí-los pela casa, assinalar-lhes um

lugar em uma ordem, atribuir-lhes funções na comunicação com os outros,

são os recursos para se pensar o próprio corpo, a instável ordem social e as

interações incertas com os demais. Consumir é tornar mais inteligível um

mundo onde o sólido se evapora. (CANCLINI, 2005, p.65)

Quando falamos em consumo, pensamos rapidamente em uma prática diária, muitas

vezes sem planejamento ou antecipações, mas podemos dizer que isso mudou, pois o

consumo tornou-se uma condição para a nossa sobrevivência. Pode-se entender que com o

passar dos anos o consumo passou por uma espécie de desenvolvimento, alterando suas

significações para os indivíduos. Hoje, o processo do consumo não pode ser considerado

como um mero ato passivo, e sim uma ação, o que nos faz percebê-lo como uma atitude que

cada indivíduo toma de acordo com seu contexto, sua realidade. Para Bauman (2007, p.110):

A sociedade contemporânea não faz somente parte da sociedade de

consumo, mas está interessada em nutri-la, construindo e reforçando a cada

nova edição mapas para os desejos humanos que se baseiam na rapidez da

substituição das coisas.

Bauman (2001) também diz que a relação entre o consumo e seu caráter identitário se

dá muitas vezes de forma descartável, dinâmica, destituída de uma lógica identitária que se

definiria somente através do espírito da posse. Para Bauman (2001, p.88) “o consumo de hoje

defende a tese de que não corresponde à saciedade de necessidades, mas sim ao espírito do

desejo”. O desejo expressa a vontade de ser, de se associar simbolicamente a modos de ver as

coisas do mundo e modos de representar-se esteticamente. Vive-se entre a realização do

desejo, que transmite o sentido de liberdade individual, mas que tem em contrapartida a

dependência em relação ao consumo, a exigência de ser consumidor para ser cidadão. Ainda

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segundo Bauman (2001, p.39), “A marca registrada da sociedade moderna é o

reconhecimento dos cidadãos através de um processo de individualização que exige que cada

um pareça o que é”.

Rocha (2008) alega que “uma boa forma de alicerçar a superioridade moral da

produção do consumo” é a visão do consumo na cultura contemporânea como algo

superficial, como um vício compulsivo, e um problema fútil, e ressalta que esta convocação

possui um grande apelo ideológico. É através do sistema de consumo e da narrativa midiática

que se dá o compartilhamento de certos valores, sendo elaborado um imaginário amplamente

difundido e que caracteriza o processo de mundialização ou planetarização da cultura. O

consumo é um sistema de significação, e a sua principal necessidade a ser suprida é a

necessidade simbólica. O sistema da mídia é o grande operador da dimensão pública, fazendo

com que nos sociabilizemos para o consumo de forma semelhante.

A narrativa midiática é um dos principais suportes desse processo de

planetarização da cultura e, através dela, é construída uma espécie de senso

comum, expandindo formas sociais e valores do Ocidente nos mais diversos

lugares da terra, naturalizando o imaginário capitalista em qualquer cultura,

em todas as culturas. (ROCHA, 2008, acesso em 12/01/2012)

Para Lipovetsky (1989): “A pós-modernidade não terá sido mais que um estágio de

transição, um momento de curta duração”. (LIPOVETSKY, 1989, p.58). Ele acredita que a

utilização de bens e objetos a fim de produzir uma distinção social provém do fato da

introdução de uma sociedade igualitária, a qual extinguiu as hierarquias pelo nascimento.

Jamais se consome um objeto por ele mesmo ou por seu valor de uso, mas

sim em razão de seu valor de troca de signo, isto é, em razão de prestígio, do

status, da posição social que confere. (LIPOVETSKY, 1989, p.171).

Segundo o autor, a classificação dos indivíduos é realizada de acordo com seus bens

de consumo e o valor que eles possuem na hierarquia social.

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É preciso reconhecer no consumo um instrumento de hierarquia social e nos

objetos um lugar de produção social. Desse modo, a sociedade de consumo,

não é senão um imenso processo de produção de valores signos.

(LIPOVETSKY, 1989, p.172)

Hoje se observa uma época em que o comportamento está se sobressaindo em

detrimento dos objetos consumidos, pois já não importa somente o poder de aquisição, mas

sim o uso que será destinado a tal bem.

O consumo, no essencial, não é mais uma atividade regrada pela busca do

reconhecimento social; manifesta-se, isso sim, em vista do bem estar, da

funcionalidade, do prazer para si mesmo. O consumo maciçamente deixou

de ser uma lógica do tributo estatuário, passando para a ordem do

utilitarismo e do privatismo individualista. (LIPOVETSKY, 1989, p.173)

Na visão trazida pelo autor (2007), esta nova era incita os homens ao gozo pleno,

insistindo na nova cultura cotidiana, que presta culto às sensações imediatas, aos prazeres do

corpo e dos sentidos.

Quanto mais uma sociedade enriquecesse, maior seria o consumo e as

necessidades de consumir, promovendo-se uma mercantilização dessas

necessidades. As democracias enveredaram por uma nova era de

mercantilização dos modos de vida, as práticas de consumo exprimem uma

nova relação com as coisas, com os outros e consigo. A dinâmica da

expansão das necessidades se prolonga, mas carregada de novos significados

coletivos e individuais. (LIPOVETSKY, 2007, p.24)

Lipovetsky chega mesmo a reconhecer a positividade presente na superficialidade

consumista, ao admitir que o consumo represente uma fonte real de satisfação, mesmo não

sendo sinônimo de felicidade. “Esvaziada de valores, resta à sociedade depositar no consumo

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os ideais de moralidade, ética, solidariedade, enfim, de felicidade”. (LIPOVETSKY, 2007, p.

24). Pode-se dizer que a busca por uma vida feliz é o valor mais característico da sociedade

atual de consumidores. As campanhas publicitárias usam essa busca pela tão almejada

felicidade como uma espécie de isca para fisgar o indivíduo. Porém, essa felicidade nunca é

totalmente satisfatória, e é nesse ponto que se entra no conceito do consumo baseado na

insatisfação das pessoas. É fundamental compreender que o consumo tornou-se uma prática

inseparável do desenvolvimento das sociedades contemporâneas e, principalmente, há muito

tempo a sociedade de consumo se exibe sob o signo do excesso de mercadorias, que se

intensificaram devido à grande oferta de produtos e serviços. Provavelmente a transformação

mais perceptível e relevante seja a mudança do consumo por necessidade para um consumo

desenfreado baseado no desejo, repleto de fantasia, criatividade e procura de sentido.

Compreende-se, assim, que o indivíduo do mundo atual valoriza muito mais a criatividade, o

individualismo e o funcionalismo, e que o conjunto simbólico com o qual essas pessoas

vivenciam o mundo e fazem suas escolhas está diretamente ligado ao desejo construído pela

ação da mídia:

Por toda a história humana, as atividades de consumo tem oferecido um

suprimento constante de matéria-prima da qual a variedade de forma de vida

e padrões inter-humanas pode ser moldada, e de fato o foi, com a ajuda da

inventividade cultural conduzida pela imaginação. (BAUMAN, 2008, p. 37)

Bauman afirma que essas alterações foram percebidas pelas empresas e intervieram

tanto criação publicitária quanto no consumidor, fazendo com que estes consumidores

repensassem em suas posições no cenário atual. Logo, é preciso atentar para a relevância da

mídia na participação da modernização mundial, bem como na experiência cultural da pós-

modernidade. O indivíduo consumidor começa a ser visto pelo mercado como aquele sujeito

que atribui sentidos/significados próprios à mensagem a partir de seu contexto de

representação. Ou seja, é necessário compreender o consumidor como um agente que tem

desejos de consumir e viver a experiência imaginada. Nesse sentido, pode-se entender como a

cultura incorpora todos os aspectos da vida social, e jogo do desejo e da possível felicidade

revela estratégias diversas produzidas para transformar o cidadão em consumidor.

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Nessa direção, ao se pensar nos conceitos de consumo desenvolvidos acima, verifica-

se a necessidade de se entender como os discursos publicitários turísticos impressos nessa

revista intervêm na percepção da realidade e como produzem os significados sociais. E é neste

contexto que Trigo (1993, p.53) afirma que:

A sociedade pós-moderna atravessa o momento em que muitos aspectos das

relações sociais refletem características que atingem as atividades de lazer e

de turismo, entendidas também como um tipo de relação social. As relações

entre o indivíduo e a sociedade foram alvo de uma mediatização

generalizada no decurso da qual a construção de imaginários, a formulação

de normas e a consolidação de visões de mundo dependem cada vez mais da

presença de órgãos de comunicação social. Vivemos na era do consumo, nos

deparamos com novas necessidades e novos desejos diariamente e é possível

afirmar que a relação entre mídia, valorização do turismo e consumo está

relacionado diretamente com as transformações que ocorreram na vida

contemporânea.

1.2. Consumo do imaterial

Vivemos em uma época de oferta ilimitada (nada é ilimitado) de bens simbólicos. As

imagens, inatingíveis, se transferem em forma de desejos (soa estranho essa imagem na forma

de desejo) para os objetos e o sujeito consumidor, espectador de imagens, tem todo (nunca é

todo) o seu imaginário social construído por elas, tornando-se assim, um consumidor

compulsivo, buscando freneticamente saciar seus desejos. Sobre essa sociedade, Bauman

(2008, p.63) reflete:

A sociedade de consumo tem como base suas alegações à promessa de

satisfazer os desejos humanos em um grau que nenhuma sociedade do

passado pôde alcançar, ou mesmo sonhar, mas a promessa de satisfação só

permanece sedutora enquanto o desejo continua insatisfeito; mais importante

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ainda, quando o cliente não está plenamente satisfeito – ou seja, enquanto

não se acredita que os desejos que motivaram e colocaram em movimento a

busca da satisfação e estimularam experimentos consumistas tenham sido

verdadeira e totalmente realizados.

O consumo do imaterial está diretamente ligado ao consumo de signos e imagens,

revelando que este sujeito está buscando valorizar os aspectos cada vez mais abstratos, como

o desejo e prazer, as satisfações emocionais e estéticas derivadas das experiências do

consumo. Para Baudrillard (1995), a pós-modernidade é uma época em que a possibilidade de

substituir o real por uma versão que, não tendo lastro no real, produz, pelo mecanismo dos

universais abstratos, um efeito eficaz de realidade.

Tanto na lógica dos signos como na dos símbolos, os objetos deixam

totalmente de estar em conexão com qualquer função ou necessidade

definida, precisamente porque respondem a outra coisa diferente, seja ela a

lógica social, seja ela a lógica do desejo, as quais servem de campo móvel e

inconsciente de significação. (BAUDRILLARD, 1995, p.11)

Para Lipovetsky (2007), o imaginário dá lugar a novos valores que propõem o livre

desenvolvimento da personalidade de cada um, reconhecendo os pedidos individuais, de

acordo com as ambições dos sujeitos. O ato de consumir deixa de ser um modelo que oferece

distinção e passa encontrar suporte nos valores subjetivos da imaterialidade: conforto, lazer,

prazer, dentre outros.

Eis um tipo de sociedade que substitui a coerção pela sedução, o dever pelo

hedonismo, a poupança pelo dispêndio, a solenidade pelo humor, o recalque

pela liberação, as promessas do futuro pelo presente. (LIPOVETSKY, 2007,

p. 35).

Lipovetsky (2007, p. 41) ressalta que se configura assim uma busca do consumo como

suporte imaterial a atuar a partir da emoção, e que se supõe também se apresentar como uma

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forma redentora de superar as angústias, medos e inseguranças que permeiam o cotidiano

contemporâneo. “Similarmente, o consumo imaterial se apresenta como possibilidade de

oferta emocional de vivências, que arquivadas nas dependências da memória permitem o

preenchimento de brechas de experiências de acessos socioculturais”. Experimenta-se, então,

o consumo como um momento a ser aproveitado, como se ele preenchesse o indivíduo com as

melhores sensações mundanas.

Quanto mais o consumo se desenvolve, mais objetos se tornam meios

desencantados, instrumentos, nada mais que instrumentos: assim caminha a

democratização do mundo material. (LIPOVETSKY, 1989, p. 175).

A mídia fez com que o ser humano mudasse sua relação com o dia-a-dia e tivesse

contato direto com ofertas cada vez mais diversificadas, permitindo corresponder às

dimensões imaginárias tanto da vida coletiva quanto da individual. Em outras palavras, os

objetos comprados, cobertos de sentidos e significados, dão satisfação e sentido à vida do

consumidor pós-moderno. Portanto, analisar o consumo do imaginário implícito nas

campanhas publicitárias pressupõe refletir como o sujeito se relaciona com si próprio e com

os outros.

Enfim, publicitários e jornalistas oferecem à sociedade contemporânea as narrativas

sobre um consumo desejado, expressando identidades e comportamentos, procurando

interpelar pelo lado emocional e sensorial dos consumidores e, fundamentalmente, buscando

orientá-los a ter um modo de vida que os faça sentir a necessidade de certos produtos, sejam

eles produtos palpáveis em qualquer loja ou um produto imaterial, a felicidade encontrada em

uma viagem a um cruzeiro marítimo, por exemplo. Para Gorz (2005, p.11):

O marketing e a propaganda fabricam valores simbólicos, estésicos e sociais,

tornando obsoletos produtos já existentes, e conseguem para a empresa um

mercado que durante algum tempo é protegido contra a concorrência de

outras empresas.

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Nesta direção, procura-se também, entender e estabelecer um vínculo entre discurso

publicitário turístico, mais especificamente o de cruzeiros marítimos que ocorre na revista

‘Viagem e Turismo’, e o consumo do imaterial criado pelo material simbólico expressado nas

narrativas publicitárias e que, portanto, por meio da produção das campanhas publicitárias,

cria e mantém um processo de socialização para o consumo.

1.3. Mídia na pós modernidade

A passagem do capitalismo industrial para seu estágio pós-industrial decorre de uma

queda da ênfase na produção material em favor da imaterialidade das marcas e outros

tangíveis. Castro (in BACCEGA, 2008, p.139) ressalta que mais uma vez os pilares

publicidade e marketing entram em cena, buscando moldar de forma favorável à percepção da

imagem através da qual uma marca venha a ser reconhecida e valorizada. “Se antes se

vendiam coisas, atualmente vendem-se, sobretudo, imagens e modos de ser”. Verifica-se um

investimento mais sutil do mercado nos próprios processos de subjetivação. Neste sentido, a

mídia desempenha uma função primordial ao veicular e induzir idéias, atitudes e padrões de

comportamento que podem servir de modelo para a construção de identidades em nossos dias.

Todavia, ao desenvolver um exemplo da vida social característico deste período, Sodré (2002,

p.23) adverte que:

O espelho midiático não é simples cópia, reprodução ou reflexo, porque

implica em uma nova forma de vida, com um novo espaço de interpelação

coletiva dos indivíduos, portanto, outros parâmetros para a constituição de

identidades pessoais. Dispõe, consequentemente, de um potencial de

transformação da realidade vivida que não se confunde com manipulação de

conteúdos ideológicos. A forma midiática condiciona apenas na medida em

que se abrem as permeabilizações ou permite hibridizações com outras

formas vigentes.

Castro (in BACCEGA, 2008, p. 140) afirma que estes estilos de vida manifestam-se

através das práticas, hábitos e signos que a própria mídia veicula e fomenta, haja vista a

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criação de celebridades midiáticas, ícones cadentes do consumo e para o consumo. “No

conjunto de estilos de vida contemporâneos percebe-se a participação do consumo cultural

como balizador de status, distinção e pertencimento”. Sodré e Moraes (2004, p.23) afirmam

neste sentido que: “a globalização é um outro nome para a ‘teledistribuição’ mundial de um

determinado padrão de pessoas, coisas e, principalmente, informações”. Esse processo

econômico com crescente integração das economias e sociedades faz com que os fenômenos

de midiatização e mercantilização da cultura andem de mãos dadas, tornando-se essenciais

para garantir o avanço do capitalismo e dos quais a mídia se apropria para vender o que hoje

se tornou o principal produto da pós-modernidade: a felicidade. Bauman (2008, p.60) diz que:

O valor supremo da sociedade em que vivemos é uma vida feliz. A

sociedade de consumidores talvez seja a única da história humana a prometer

felicidade na vida terrena, aqui e agora. Em suma, uma felicidade

instantânea e perpétua.

Reavendo o que Sodré (2002) afirma acima, esta nova esfera existencial de

midiatização em que vivemos constitui de “um novo modo de presença do sujeito no mundo”.

(SODRÉ, 2002, p.24).

Portanto, essa ‘mutação capitalista’ é uma espécie de nova economia em que

a dimensão imaterial da mercadoria prevalece sobre a imaterialidade,

tornando o valor social ou estésico maior do que o valor de uso e o valor de

troca. (SODRÉ, 2006, p.56)

Para Lipovetsky (1989), a mídia determina um tipo de cultura individualista

caracterizada pela turbulência, pelo rompimento, pela mistura sistemática; não dispondo mais

de saberes fixos, superpostos às inúmeras mensagens cambiantes, os indivíduos são muito

receptivos às novidades de fora, são levados a diversas direções conforme as informações que

recebem. Desse modo, nossa relação com o saber é cada vez mais elástica: sabemos muitas

coisas, porém quase nada de sólido, de assimilado ou de organizado.

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A mídia tem por efeito desestabilizar os conteúdos e a organização dos

conhecimentos: o saber fechado, mas dominado do universo tradicional, foi

substituído por uma cultura de massa muito mais extensa, mas também mais

epidérmica, mais variável. (LIPOVETSKY, 1989, p.229)

Lipovetsky (1989) também acredita que a comunicação midiática ordena-se sob a lei

da sedução e do divertimento, e é reestruturada implacavelmente, precisando exibir novos

encantos, imaginar novas apresentações e novas fórmulas de prender a atenção. Em outras

palavras, na medida em que a mídia caminha, reina o processo de sedução.

A sedução da informação é também um instrumento da razão individual.

Devemos compreender que o desenvolvimento do raciocínio individual

passa cada vez menos pela discussão entre os indivíduos e cada vez mais

pelo consumo e pelas vias sedutoras da informação. Neste sentido, deve-se

considerar que a mídia socializa na sedução da troca verbal e relacional,

participando assim na civilização do conflito ideológico e social.

(LIPOVETSKY, 1989, p.231).

Ainda com Lipovetsky (1989), a informação dissolve a forma das convicções e tornam

os indivíduos permeáveis, prontos para abandonar sem grande causa seus sistemas de

referência. “O indivíduo torna-se desestabilizado em suas convicções, é um filho da mídia”

(1989, p.235). A mídia, juntamente com o consumo, permite às sociedades democráticas

passar por uma experimentação social mais rápida e mais maleável, repletas de

superficialidade e mobilidade do saber.

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1.4. Mídia Turística

Para ilustrar melhor a dimensão do consumo dos lazeres em nossas sociedades,

Lipovetsky diz que “as despesas ligadas ao setor de lazer, da cultura e da comunicação

ocupam um lugar progressivo no orçamento das famílias e aumentam mais depressa que a

média dos consumos”. (LIPOVETSKY, 2007, p.61)

A indústria do entretenimento é uma indústria da experiência que se

concretiza numa orgia de simulações, de artifícios espetaculares, de

estimulações sensoriais destinadas a fazer os indivíduos sentir sensações

mais ou menos extraordinárias, a fazê-los viver momentos emocionais sob

controle em ambientes realistas, estereotipados e climatizados.

(LIPOVETSKY, 2007, p.64)

Nessa via, pode-se dizer que a comunicação tem papel fundamental no

desenvolvimento do turismo e que a principal conexão entre elas é essencialmente que a

primeira informa e critica sobre roteiros e a segunda vende e tenta, assim, realizar a promessa

feita anteriormente. De acordo com Godoy (1999 apud ZARDO, 2003, p.97), as revistas e o

turismo estão profundamente conectados:

Turismo e comunicação são indissociáveis para o bom desenvolvimento da

atividade, uma vez que é somente através da comunicação que o turista irá

alcançar o produto que deseja consumir, além de obter variadas informações

e novidades de consumo em turismo. Assim, a linguagem jornalística facilita

a compreensão do consumidor acerca das informações pertinentes ao seu

consumo turístico. Não somente é importante o enfoque promocional, mas

também os aspectos técnicos do atrativo ou destinação turística, fato este que

poderá muito ser administrado pela comunicação.

É notório que a mídia transformou o turismo em mais um produto a ser ofertado em

um mercado pluralizado, excessivamente disputado e submetido à sua lógica. As revistas

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direcionadas ao público de viajantes ou de pessoas que pretendem saber mais sobre lugares

diversos reúnem características marcantes deste novo cenário jornalístico: um mercado regado

pela publicidade, com cores vibrantes, papel de melhor qualidade, manchetes enormes, efeitos

visuais e retratos com modelos contratados para expressar a mais alta perfeição, tentando

sempre emocionar o leitor e fazê-lo acreditar que é necessário adquirir a revista ou um pacote

de viagem para se tornar melhor. Esse novo modelo é o que parece satisfazer os dois lados da

moeda: expressa a realização do sonho do leitor e o orienta como fazê-lo, satisfazendo assim

uma sociedade repleta de discursos e novos valores comportamentais e hábitos de consumo,

incluindo o turismo e por outro lado atende aos interesses das grandes empresas que operam

no setor turístico e pagam para veicular seus anúncios nas principais páginas. Aqui, este

mercado de revistas segmentadas aparece apenas como uma pequena peça da gigantesca

engrenagem que é o sistema que vivemos hoje. Para não sucumbir à crescente submissão dos

veículos ao poder da publicidade e tentar sobreviver à concorrente internet, as revistas

segmentadas criaram um amplo leque de opções tanto para a criação de novos veículos como

para os consumidores de informação que se sentem atraídos pelos seus interesses particulares

e tornam-se dependentes dos mapas de sucesso oferecidos nestes veículos.

Consequentemente, Prado (2005) diz que a mídia contemporânea não apenas informa, mas

orienta para a ação e dirige a forma de ler dos sujeitos.

Neste tipo de reportagem, o dizer midiático dirige ao leitor uma carga

pragmática a partir de contratos específicos de enunciação ou leitura. Trata-

se, portanto, não de abordar o jornalismo como atividade exclusivamente

representadora da realidade, mas como conformadora, criadora, que põe e

repõe as identidades do leitor. (2005, p. 41).

Viagem e Turismo se encaixa nessa caracterização das novas formas de mídia, pois

cria o desejo de viajar em seus leitores, descreve os roteiros, dá dicas do que fazer, aonde ir e

como conseguir realizar a melhor viagem da sua vida e ao mesmo tempo vende suas páginas

para as empresas turísticas ofertarem seus produtos, que por muitas vezes são produzidos

baseados nos assuntos previamente informados pela revista. A mídia criou, a partir daí, uma

nova estética, que estimula desejos e aspirações, que constroem imaginários, e que superou

suas formas tradicionais. Para Fontenelle (2004, p.186), “é neste momento que a publicidade

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ressalta a função da imagem: o anúncio não destaca a função ou capacidade técnica do

produto, mas um estilo de vida”. Ferrari (2002, p.83) diz que a revista é a forma mais

representativa da mídia para o turismo:

Não é difícil detectar e indicar que a mídia impressa tornou-se o principal

veículo de informação turística no Brasil. A mídia impressa é considerada

uma mídia clássica, e no caso do turismo brasileiro ela tornou-se a maior

representante dos veículos de comunicação para a propagação de informação

e comercialização de seus produtos e serviços.

A mídia tradicional torna-se carro-chefe para a divulgação de produtos e serviços

turísticos, seja em forma de anúncio ou buscando um espaço no jornalismo, mas sem esquecer

que ambos são resultado de uma forte relação de parceria entre mercado e mídia.

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2. CAPÍTULO II: A revista Viagem e Turismo e os programas de cruzeiros

marítimos.

Vivemos em uma realidade em que circulam sem cessar múltiplos programas

comunicacionais, em que os discursos verbais e visuais têm absorvido cada vez mais a cultura

contemporânea. Para Castro e Gomes (in PEREZ; BARBOSA, 2007), a maneira pela qual a

publicidade se faz notar, provocar e ousar é por meio de recursos inovadores que utilizam a

dimensão simbólica. O discurso da publicidade aparece, assim, como porta-voz do sistema

social e “funciona como instrumento de comunicação e de reprodução social, além de

mascarar a intenção comercial tão explicitamente existente” (p.10). O valor simbólico remete

às campanhas publicitárias uma função singular, na medida em que nele se encontram

informações pré-determinadas pelo anunciante e atividades persuasivas que reproduzem

interesses e gostos para sensibilizar o indivíduo. Ainda conforme Castro e Gomes (op. cit.,

p.10), as estratégias relacionadas à construção discursiva, como as escolhas de dizer algo, são

“muitas vezes formuladas para mascarar o efeito comercial e sensibilizar o consumidor”.

Fontenelle também acredita que o apelo aos aspectos sensoriais é a nova força do consumo:

A marketização da vida influencia o cotidiano, ou a vida vivida, pois

desempenha forte apelo aos aspectos sensoriais do homem na

contemporaneidade. Hoje, os consumidores são convidados a viver as

marcas, experimentar sensações através delas e não mais, somente, a

comprar produtos materiais. Essa nova fase do consumo, o principal produto,

intangível e imaterial, é justamente o acesso à experiência. Experiência essa

que ofereça entretenimento e cultura, que apela diretamente ao emocional do

consumidor sensibilizando-o para o consumo (FONTENELLE, 2004, p.190)

Apesar de ter se desenvolvido no decorrer dos anos, desde o início de sua

editoração, a revista Viagem e Turismo sempre foi uma publicação que vendia, além de

pacotes turísticos, uma aspiração alcançável. Trata-se de uma mídia pós-moderna, que

direciona seus leitores para um mundo perfeito, que busca modalizar o leitor para que tenha à

disposição identificações com viajantes-tipos e que descreve passo a passo quais os caminhos

traçados para construir uma viagem euforizada. A construção dessa mídia pode ser

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compreendida a partir do pensamento de Prado, que afirma que certos valores são

sobredeterminantes, criando um campo em que o enunciatário se estrutura de modos

específicos a partir de posições modalizadoras do sujeito, e que o dizer midiático dirige ao

leitor uma carga pragmática a partir de contratos específicos de enunciação ou leitura:

A mídia não busca somente informar, mas construir, por meio de várias

estratégias comunicativas, mapas cognitivos para seus leitores, orientando-os

para a ação e dirigindo suas formas de ler, situando-os performativamente

em certas posições de sujeito enquanto enunciatários (2005, p. 4).

Viagem e Turismo é uma revista segmentada, ou seja, espaço de comunicação

direta que visa um determinado público. Através dos contratos de comunicação estabelecidos

com o enunciatário, as empresas de cruzeiros marítimos aqui estudadas apresentam regimes

específicos de visibilidade e convocam seus enunciatários, interpelando-os a um desempenho:

compre uma viagem no cruzeiro marítimo e seja tudo isso o que apresentamos em termos de

um viajante ideal, tenha tudo isso que é oferecido nos anúncios. As construções temáticas e as

figuras que aparecem nas campanhas são previamente pensadas como argumento dentro do

contrato de comunicação em busca de um consumidor.

Para explicar melhor o que são e como funcionam tais contratos comunicacionais,

recorremos a Charaudeau, que, em seu livro Discurso das Mídias (2006), afirma que eles são

responsáveis pelo intercâmbio linguageiro e regulam as expectativas dos sujeitos

comunicantes. O reconhecimento das restrições pelos parceiros dessa troca linguageira “nos

leva a dizer que estão ligados por uma espécie de acordo prévio sobre os dados desse quadro

de referência” (2006, p. 68). Para o autor, é a existência dos contratos de comunicação que

possibilita entre os parceiros um conjunto de referências comuns que permitam o

estabelecimento de um entendimento comunicativo.

A situação de comunicação é como um palco, com suas restrições de espaço,

de tempo, de relações, de palavras, no qual se encenam as trocas sociais e

aquilo que constitui o seu valor simbólico (CHARAUDEAU, 2006, p. 67)

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De acordo com Charaudeau, que dedica grande parte do seu trabalho à análise de

contratos estabelecidos pelos meios de comunicação, o entendimento dos elementos que

constituem o contrato de comunicação requer a consideração de um conjunto de dados e,

nessa perspectiva, os contratos comunicativos se constroem e se atualizam nas próprias

relações, ao mesmo tempo em que as informam.

Em Viagem e Turismo, as campanhas publicitárias são criadas anualmente, a

partir de estudos do perfil do consumidor e buscando saber seus desejos e estilos de vida. O

apelo diretamente ao sensível do consumidor se apresenta tematizado nos contratos de

comunicação, conectando o enunciador ao enunciatário pela indução ao consumo não só a

partir da argumentação e da informação sobre viagem e navio, mas também a partir de

estratégias sensíveis, que apelam ao sentimento, à sensação, ao corpo. Os enunciadores

procuram utilizar linguagens mais próximas do enunciatário, colocando-se como especialistas

no assunto, dirigindo-se com argumentos e estratégias passionais, mostrando “o navio que

oferece aquilo que você quer ser ou ter ou fazer”. Assim, por meio da construção de textos, o

enunciador convoca estes sujeitos ao consumo. Os enunciatários/consumidores são

convocados a se aventurarem, a serem felizes, a serem bem tratados, a adquirirem novos

conhecimentos, cultura, diversão e a buscarem as empresas que oferecem os serviços

apresentados. O amplo uso de convocações de ser, fazer ou ter nos discursos midiáticos visa o

que Bauman apresenta como sujeito-mercadoria:

A “subjetividade” do sujeito, e a maior parte daquilo que essa subjetividade

possibilita ao sujeito atingir, concentra-se num esforço sem fim para ela

própria se tornar, e permanecer, uma mercadoria vendável (2008, p. 20).

Bauman também afirma que a procura pela inclusão ou exclusão dos modelos de

conduta determinados pelo mercado de hoje é uma busca guiada e a todo tempo redirecionada

e reorientada por campanhas publicitárias sucessivas. Para ele, a constante construção e

reformulação dessas identificações elaboradas pelo mercado passa a ser o novo espaço

modelador da vida e,“num ambiente líquido, imprevisível e de fluxo rápido, precisamos, mais

do que nunca, de laços firmes e seguros de amizade e confiança mútua.” (2009, p. 139).

Enfim, necessitamos,antes de tudo, sentir vínculo afetivo com produtos e serviços para nos

sentirmos presentes e necessários na sociedade em que nos encontramos.

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Desta forma, Viagem e Turismo propôs uma relação entre enunciador e

enunciatário que foi se modificando ao longo do tempo. A revista assume desde o início um

compromisso para que o leitor sinta-se pronto para realizar a melhor das viagens, em todos os

aspectos, e assim garante o lucro e o contínuo aperfeiçoamento da técnica de vender guias de

orientação, sugestão e de perguntas e respostas sobre turismo. Porém, suas estratégicas

discursivas foram aperfeiçoadas e modificadas ante as mudanças sociais e, nesta parte da

dissertação, analisaremosas mudanças estratégicas pelas quais Viagem e Turismo passou para

conquistar e manter leitores. Para evidenciar a evolução da revista desde seu início,

consideremos,basicamente,duas principais fases: a primeira, em que a proximidade com o

leitor não se caracterizava pela indicação de ações precisas e o leitor, na grande maioria das

reportagens, era mero espectador; e a segunda, em que há a valorização do leitor por meio da

sua participação. Essa reformulação no decorrer dos anos trouxe estratégias cada vez mais

ancoradas na intensa produção de experiências “reais”, tanto no desenvolvimento das matérias

como nos anúncios publicitários.

2.1. O início de um contrato

Com a sua primeira edição lançada em novembro de 1995, Viagem e Turismo foi

a primeira revista brasileira dedicada exclusivamente ao turismo. Seu surgimento coincidiu

com a queda da cotação do dólar, o que colaborou para um crescimento notável de viagens

internacionais nos anos seguintes. Impulsionados pelo crescimento desta indústria, no ano de

estreia da revista, cerca de 3,1 milhões de pessoas viajaram para fora do país, um número

nunca antes alcançado e, juntamente com a explosão de viajantes, houve o surgimento de

outras novas publicações.

As seções de turismo dos jornais apenas complementavam o editorial como um

adereço repleto de informações pouco interessantes. Foi aí que Viagem e Turismo, com o

lema “Sonhe. Planeje. Embarque”, ganhou espaço no mercado, ocasionado pelo progressivo

investimento de parte da população brasileira como consumidor turístico. A falta de

comprometimento de diversas publicações com o assunto turismo fez com que Viagem e

Turismo se tornasse a publicação líder do segmento criado por ela mesma. Porém, a revista

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manteve por muito tempo os mesmos projetos editoriais e gráficos do início de sua

publicação, passando a carecer de uma revitalização com o decorrer dos anos. Ainda nos

primeiros cinco anos, mesmo com novas formatações, Viagem e Turismo manteve seu

discurso concentrado principalmente no texto verbal. A construção da narrativa, as linguagens

audiovisuais e verbais e, principalmente, os contratos comunicacionais propostos não recaíam

sobre a economia simbólica dos mercados da pós-modernidade, em que predomina o fluxo de

valores imateriais, conduzidos pelas disputas simbólicas entre figurativizações. O principal

conteúdo editorial era baseado nas reportagens mais informativas, sem dar muita importância

ao que vemos hoje, ou seja, à valorização do leitor por meio de sua participação visível e

passionalizada.

Abaixo é possível ver um exemplo dessa 1a

fase, em que celebridades, e não

leitores comuns, faziam parte do conteúdo da revista. A seção “Passaporte”, de 1997, trouxe a

atriz Regina Duarte, sob o tema “O melhor do mundo, segundo as viagens de Regina Duarte”,

mostrando todos os países visitados por ela. Esta reportagem, localizada na última página da

revista, mostrava os lugares visitados pela celebridade. Essa sessão foi publicada até o mês de

junho de 2001. Na breve reportagem, vemos que os lugares visitados por ela sempre eram do

exterior (devido ao nome da seção), o que nem sempre poderia ser repetido pelo leitor

comum, mas servindo como projeção de viagens ideais, possíveis somente quando o leitor

pudesse se organizar financeiramente. Viagem e Turismo apresentava, dessa forma, os lugares

onde as celebridades se refugiavam das pessoas comuns, leitores da própria revista. Esse

processo de tentativa de identificação do enunciatário com a celebridade visava explorar a

construção de um processo comunicacional que se fundamentava sempre em uma relação

desigual, entre alguém que têm muito a oferecer e outro que necessita de algo, que vivia na

falta-de-viagem.

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FIGURA 5: Viagem e Turismo, junho de 1997 – “Seção Passaporte”.

Nas edições a partir do ano de 2000, com a evolução da revista, Viagem e Turismo

passou a abordar seu leitor de forma mais incisiva progressivamente, sofrendo diversas

modificações para renovar o relacionamento com o enunciatário. Este, imerso num novo

mercado passionalizador, sedento por novas experiências, caminhava para a forma cultural

ideal do capitalismo globalizador: o multiculturalismo.

Em outras palavras, o respeito do multiculturalista pela especificidade do

Outro é a forma mesma como afirma sua própria superioridade. O novo

supereu (tenha prazer, viva intensamente, seja uma nova pessoa num novo

corpo) aparece figuratizado nas capas das revistas semanais e mensais sobre

o culto ao corpo: aprenda a gozar; dicas para enriquecer; cinco passos para

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dinamizar seu corpo; como se tornar oura pessoa nesse verão etc. (PRADO,

2006, p.24)

Esse “supereu” do gozo é a forma mais importante das últimas décadas de

convocação e captura da atenção do enunciatário. VT mudou seu contrato comunicacional

para que seu leitor ocupasse mais espaço dentro do conteúdo editorial da revista.

2.2. Incluindo o leitor

Como dito anteriormente, a partir de 2000, progressivamente, a revista convida o

leitor a participar das reportagens e traz uma linguagem de confiança dirigida ao enunciatário.

O contrato de comunicação da revista muda, oferecendo ao enunciatário aquilo que ele

próprio quer ver, saber e conhecer. É claro que existem reportagens padronizadas e roteiros

pré-determinados, afinal, Viagem e Turismo não deixa de descrever os passos para uma

viagem perfeita, mas agora procura estabelecer esta relação com a viagem como experiência,

provada e aprovada não somente por ela, mas muitas vezes também por seus leitores. Aqui, a

revista ultrapassa o nível do texto informativo e apresenta novos projetos editoriais e

gráficos, e várias seções estão revitalizadas.

A linguagem não é somente um meio em que as palavras designam objetos e

estados de coisas no mundo por meio de representações mais ou menos

adequadas segundo um método de verificação da verdade por

correspondência, mas também um meio em que coisas ditas servem para os

enunciadores/agentes fazerem coisas (PRADO, 2005, p. 1).

A utilização de novas temáticas abordadas na revista resultou no crescimento da

circulação de exemplares e Viagem e Turismo; já com segmentação bastante definida, passou

a abordar o comportamento e o estilo de vida dos viajantes, variando suas seções de turismo

entre temáticas de aventura, romance, amizade, infância, conhecimento, diversão e família.

Viagem e Turismo passa a considerar com mais ênfase os interesses de seus leitores na

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publicação, tornando-se ainda mais presente em suas escolhas particulares. Além disso,

funciona como uma fornecedora de manuais: ela cria a viagem ideal e cabe ao leitor seguir as

regras desse manual para conhecer os lugares mais incríveis e se tornar um viajante

euforizado. A revista também propõe a construção de uma formação identitária,

demonstrando seu domínio através do regime de prescrição proposto na revista. Viagem e

Turismo se torna um manual completo para viajantes habituais e para aqueles que ainda

pretendem viajar.

Prado (2005, p.4), em suas reflexões sobre a mídia contemporânea, diz que as

estratégias comunicativas criadas geram mapas que servem para orientar seus enunciatários

para a ação, dirigindo assim suas formas de compreensão; a mídia impõe certos valores,

fazendo com que o enunciatário se estruture a partir desses modos específicos a partir de

posições modalizadasde sujeito. Essa força performativa da linguagem aparece por meio do

conceito de “palavra de ordem” de Deleuze. Para o filósofo (1995), essa expressão é utilizada

para definir a dimensão de repetição da linguagem. Essa linguagem, imbricada nas relações de

poder, repete os conteúdos dominantes e efetua pressupostos implícitos de uma ordem política

numa dada sociedade. A dimensão da palavra de ordem é justamente a relação entre estes

pressupostos e os enunciadores, ou seja, a linguagem não é, antes de tudo, informativa, mas

transmissão de palavras de ordem.

Chamamos palavras de ordem não uma categoria particular de enunciados

explícitos, mas a relação de qualquer palavra ou de qualquer enunciado com

pressupostos implícitos, com atos de fala que se realizam no enunciado, e

que se podem realizar apenas neles. (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p. 16).

Prado (2009, p. 6) define palavra de ordem como “ponto de engate a partir do qual

se constitui uma totalização discursiva”, sustentando o discurso, ainda que provisoriamente, e

convocando o leitor para a fantasia. O enunciador, “para convocar, recorre a palavras de

ordem, pelas quais o texto se totaliza nessa narrativa fantasística” (PRADO, 2009, p. 6).

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Voltando a Deleuze e Guattari, as palavras de ordem são regimes de signos que

perpassam a sociedade e formam regimes mistos, que se transformam, redundando nas

mesmas palavras. É o discurso indireto, sempre presente, sempre imanente.

O discurso indireto é a presença de um enunciado relatado em um enunciado

relator, a presença da palavra de ordem na palavra. É toda a linguagem que é

discurso indireto. Ao invés de um discurso indireto supor um discurso direto,

é este que é extraído daquele, à medida que as operações de significância e

os processos de subjetivação em um agenciamento se encontram

distribuídos, atribuídos, consignados, ou à medida que as variáveis do

agenciamento estabelecem relações constantes, por mais provisórias que

sejam. (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p. 23)

Dessa forma, compreende-se que a linguagem não é mera representação, nem que

sua função principal seja somente a de comunicar informações. A linguagem é sempre

relativa a um agenciamento, é um processo que não para de se formar e se reformular, e que

trabalha sobre fluxos semióticos, fluxos materiais e fluxos sociais.

As palavras de ordem atuam com bastante eficácia quando se trata de consumo,

em que se fazem presentes inúmeros dispositivos de convocação. Como nos lembra Bauman,

a liberdade que o consumidor possui em poder escolher objetos produzidos e comercializados

em massa “não funciona sem dispositivos e substâncias disponíveis no mercado” (2001, p.

99). E complementa Prado:

O dispositivos buscam capturar a atenção, motivar a felicidade, a resposta

ativa do consumidor em sua força de ouvidor, de seguidor de valores de

consumo, de repercutidor, de consumidor. O enunciador, para se fazer ouvir,

trabalha o texto em sua força de apelo, de interpelação, de narrativa

carregada de sentidos ligados ao mundo cotidiano; para se fazer seguido,

constrói enquadramentos a partir de sua força de autoridade de sabedor [...]

No dispositivo de convocação dos sistemas dos media e da publicidade se

busca capacitar o leitor em um campo e modalizá-lo para ser o melhor, para

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sentir-se bem, bem adaptado ao mundo, para se tornar o melhor amante, o

melhor profissional, para poder fazer o melhor em termos de sucesso e para

tanto o enunciador mapeia, com a ajuda dos tecnosespecialistas, o que deve

ser feito para se conseguir esse plus, esse valor a mais, esse gozo a mais [...]

A convocação diz ao leitor: você só precisa de um programa e de um mapa

para bem viver, para achar seus objetos perdidos, para reencontrar-se, para

encontrar seu par, para fazer seu par gozar juntinho com você, para ter o

máximo sucesso na vida, no trabalho, na vida amorosa. O enunciador é o

sabedor que mostra os modos de obter tudo isso sem enfretamento desse

antagonismo fundamental da linguagem e da vida. (PRADO, 2009, p. 4-6)

A constante utilização, por exemplo, da convocação que afirma “experimente”

nos discursos midiáticos, principalmente de revistas segmentadas, pode ser relacionada ao que

Bauman fala sobre a vida organizada da sociedade na modernidade líquida: “a vida

organizada em torno do consumo é orientada pela sedução, por desejos sempre crescentes e

quereres voláteis – não mais por regulações normativas” (BAUMAN, 2001, p. 90). A

construção das figuras que demonstram experiência na revista Viagem e Turismo é

representada por imagens de modelos “experimentando” aquilo que o enunciatário gostaria de

vivenciar. Essas convocações são apresentadas como palavras de ordem e, em Viagem e

Turismo, elas se expressam em orações imperativas, como “Participe, envie sua foto, sua

história” ou “Siga nosso roteiro, está imperdível!”. Essas interpelações impelem o sujeito agir,

pois estes tendem a incorporar a palavra de ordem, fazendo com que a revista esteja presente

na vida do leitor, sendo reconhecida como uma referência do que fazer quando viajar; a

revista destaca-se a partir de seu estilo de informar o que é seguro e o que é o melhor para o

viajante.

No caso do turismo, o tema “experiência” é frequente: viver a experiência de estar

em tal lugar, viver intensamente aquele lugar. Essa experiência torna-se a palavra de ordem e

sempre aparece figurativizada nas publicações de Viagem e Turismo. Os turistas são

convocados a “viverem a experiência”, a serem alegres, a sentirem as sensações, a serem

livres de tudo e de todos e a buscarem os produtos e/ou serviços que os façam se sentir

daquele jeito. Para Lipovetsky, essa questão da experiência está intimamente ligada ao

turismo:

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As indústrias de lazer trabalham hoje com a dimensão participativa e afetiva

do consumo, multiplicando as atividades de oportunidades de viver

experiências diretas. Já não se trata mais apenas de vender serviços, é

preciso oferecer experiência vivida, o inesperado e o extraordinário capazes

de causar emoção, ligação, afetos, sensações. (2007, p.63)

De fato, o entretenimento configura-se como uma das principais fontes de receita

na atualidade. Lipovetsky considera a sociedade atual como ligada ao prazer e à expressão de

cada um, que necessita de menos repetição cansativa e estereótipos: “O apogeu da mercadoria

não é o valor do signo diferencial, mas o valor experencial, o consumo puro valendo não

como significante social, mas como conjunto de serviços para o indivíduo” (2007, p.43).

Atualmente, a construção identitária encontrada na revista se desenvolve pelo fator

instantâneo criado pelo consumo, algo que é interessadamente proposto no conteúdo

publicitário e editorial. Para Prado (2005, p.9), “o leitor é construído na posição de outro-

passivo, enquanto o agente de saber, a agência da ação, é o enunciador”. Ele ainda

complementa que, se o leitor seguir o enunciador, deixará de ser passivo e se tornará ativo,

atuante e feliz.

Apesar de Viagem e Turismo se declarar a única publicação do setor que não

aceita convites, e por isso se permite publicar e recomendar o que quiser, trazendo as

melhores e mais confiáveis informações sobre diferentes destinos, em sua enunciação faz-se

habitualmente o uso de estratégias de orientação, instigando a idéia de que, por meio da

adesão ao conceito exposto,seja pelo apelo publicitário,seja pelo conteúdo editorial, o viajante

conseguirá realizar sua viagem perfeita. O resultado disso é que, por muitas vezes, além de

oferecer dicas e informações aos viajantes sobre tudo o que envolve as diversas facetas de

uma viagem – o desejo, o planejamento, o embarque e a experiência no destino –, o conteúdo

editorial confunde-se com o das publicidades. Prado explica como funcionam estes manuais:

No final do século XX, o capitalismo midiático tinha desenvolvido um

sistema perito de elaboração de mapas cognitivos, herdeiros das linhas

fordistas da indústria cultural, constituindo uma efusiva e colorida

corporação audiovisual – a identificação do consumidor-espectador se faz

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pelo inteligível, pois se trata de propor valores para diferentes posições do

sujeito, por meio de contratos comunicacionais: a mídia mapeia valores e

modaliza para os leitores modos de saber, fazer e de ser para consegui-los.

Acoplados aos mapas cognitivos estão os dispositivos “estésicos”, ou seja,

dispositivos passionalizadores das mídias, que têm função pragmática de

fazer encarnar os discursos em seus públicos cada vez mais específicos e

segmentados.(2006, p.21)

Para exemplificar o desenvolvimento das estratégias empregadas pela revista,

utilizaremos como modelo textos que trazem como tema principal os cruzeiros marítimos,

reportagens pelas quais o público viajante e leitor de VT se interessa, devido ao sucesso que

este tipo de viagem vem fazendo dentro do mercado de turismo brasileiro. Como poderemos

verificar, com o passar do tempo, Viagem e Turismo passou a estudar o perfil do enunciatário,

buscando saber quais eram suas vontades, qual o estilo de vida com que ele sonhava, onde ele

desejava estar e com quem, para, a partir daí, construir o discurso ideal. Tais textos

certamente levam em consideração as expectativas dos seus leitores, utilizando uma

linguagem mais próxima de seu público e apresentando a revista como um parceiro mais

experiente, dirigindo-se a ele com argumentos passionais, remetendo à experiência afetiva,

sensorial, ligada ao corpo e, nessas construções, o enunciador mostra ter mais conhecimentos

que o enunciatário. Assim, por meio de textos sérios e confiáveis, mensalmente construídos

em seus discursos, o enunciador convoca estes sujeitos ao consumo do turismo.

Tendo conquistado seu espaço como a revista mais importante do segmento de

turismo, Viagem e Turismo tornou-se o guia competente e confiável do viajante brasileiro. Em

seu discurso foi construído o sentido de proximidade, em que o leitor sente uma comunicação

direta e confiável com o enunciador. Aplicando uma comunicação de líder absoluta do

segmento, a revista, ao comunicar-se com seus leitores, parte da conjectura de que eles

compartilham os interesses descritos na edição mensal, de que todas as idéias, perguntas e

dicas necessárias estarão ali. Viagem e Turismo se apresenta como a revista ideal para quem

quer fazer turismo, pois sabe das melhores dicas, está sempre ligada nos novos destinos e,

principalmente, é experiente e portadora do conhecimento dos temas apresentados.

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Os programas cognitivos (de conhecimento) e estésicos (se especializam no

público) dos meios de comunicação foram fundamentais para a produção do

capitalismo multinacional, na medida em que oferecem mapas organizadores

do cotidiano dos públicos, baseados em uma tecnologização progressiva (ou

semiotização) dos discursos. (PRADO, 2006, p.21)

FIGURA 6: Viagem e Turismo, janeiro de 2008 – Reportagem “Balada sem ressaca”.

Em reportagem realizada em janeiro de 2008 (edição 147), intitulada “Ressaca em

alto mar” e realizada a bordo do navio Island Escape, podemos ver que Viagem e Turismo

valoriza a experiência de seu enunciatário e, assim, coloca seus leitores na posição de

entendidos no assunto, condição não só dela, podendo ter algo a dizer sobre suas experiências,

sejam elas boas ou ruins. Na reportagem, leitores de VT viajaram a bordo do navio, já em

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águas brasileiras e um dos mais populares do verão, que, devido aos preços baixos das saídas,

é conhecido como o “navio da galera”, apesar de ter público variado:

Noto dois grupos grandes de estudantes e, pelas camisetas com o emblema

da escola, descubro que vieram para comemorar a formatura. Vejo também

muitas famílias, alguns casais e grupos de senhoras e senhores. (Viagem e

Turismo, janeiro de 2008, p. 104)

O Island Escape é conhecido por sua informalidade, pois é um navio que oferece

entretenimento para toda e qualquer idade, além de ter todas as suas atividades adaptadas ao

público brasileiro. A porcentagem de tripulantes brasileiros a bordo é bem maior do que nos

outros navios, além de que estes seguem rígidos padrões internacionais mesmo quando em

águas brasileiras, oferecendo, muitas vezes, serviços não costumeiros aos brasileiros.“Na

Europa, não temos muitas festas a bordo e os passageiros são mais velhos. No Brasil, é o

inverso, o público é jovem e tem festa até de madrugada”, diz o diretor de hotelaria Calvim

James (Viagem e Turismo, 2008, p. 107).

A reportagem traz abordagem diversa das usuais, mais informal que as de

costume. Além de o texto ser narrado em primeira pessoa, escrito por uma jornalista que foi e

participou de toda a viagem, certamente com a intenção de aproximar enunciador e

enunciatário, o enunciador não apenas descreve o navio ao modo de uma reportagem

informativa, como também expõe, principalmente, a experiência de quem embarcou e

vivenciou, relatando tudo o que aconteceu a bordo, inclusive o que não gostou. Além dos

detalhes informativos sobre alimentação, hospedagem e serviços, aproveita e apela

diretamente ao percurso passional/emocional, divulgando comentários de passageiros a bordo:

Com o navio em alto-mar, é bem diferente. A todo instante os alto-falantes

divulgam a programação para os próximos horários. E a freqüência é

massiva. “Aqui o clima é descontraído e as pessoas são divertidas. Ao

contrário do Mistral, onde as pessoas são bem mais formais” diz a

comerciante Regina Foguet. Regina repetiu a dose em 2005. Velha

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conhecida do navio, tem só uma reclamação. “Ele está precisando de uma

reforminha”, repara. E é verdade. (Viagem e Turismo, 2008 p. 107).

Nesta reportagem, a jornalista utiliza-se do espaço íntimo do indivíduo para

estipular um contrato de comunicação baseado na utilização do marketing da experiência para

a construção de identidades. Para Fontenelle, esta experiência é produzida pelo próprio

mercado:

É a experiência sensorial, que define o que é válido, que possui serviços que

emocionam e fazem crer que se vive uma experiência profunda e autêntica.

A intenção do enunciador que tem na experiência sua principal matéria-

prima é fazer com que o consumidor contemporâneo, impregnado de

indagações, consuma por meio de comoção dessas sensações descritas em

um processo disfarçado, mas puramente mercadológico. (FONTENELLE,

2004, p. 196)

Ainda na mesma reportagem, mas localizada depois do texto final, em que o

enunciatário já tinha dado sua opinião a respeito da viagem, e com uma sinalização

diferenciada para destacar o título, a seção “Teste de Viagem” traz, desta vez, somente o

enunciador conferindo e avaliando as condições da cabine, da comida, do entretenimento

adulto e infantil, o serviço e a sinalização a bordo da embarcação. É possível notar que neste

caso o texto não está mais na primeira pessoa, mas, mesmo assim, o contrato de comunicação

mantém o prometido, pois o enunciador evidencia que passou pela experiência para poder

escrever. Além de descrever experiências, o enunciador também demonstra sua aprovação

pelo carimbo situado na primeira página, junto ao título, demonstrando, desde o início, que o

texto é seguro e confiável. “Entretenimento adulto: É o forte do cruzeiro. Em todos os dias a

programação é intensa. Tem música e atividades na piscina, shows, festas, gincanas e jogos

para quaisquer idade. Há dois bares externos, mais movimentados durante o dia, e três

internos, com estilos diferentes. O SundownerLounge, para ouvir uma boa música, o The Pub,

para beber e jogar, e o BountyLounge, para dançar” (Viagem e Turismo,2008, p. 108).

Caso o leitor necessite de mais informações, ainda pode acessar o “Mais no viaje

aqui”, no endereço www.viajeaqui.com.br/cruzeiros. Viagem e Turismo também insere no

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texto que está “Por dentro de outros navios testados pela VT” e, através de pequenas fotos (em

círculo) dos navios, informa que tais dados estarão disponíveis na página 110.

Para evidenciar mais um recurso do contrato de comunicação no sentido de

valorizar a experiência vivida, como dissemos acima, a seção “Passaporte” que mostrava

celebridades, acabou em junho de 2001 e em agosto do mesmo ano, Viagem e Turismo criou

a seção “Viajantes – Acabei de chegar”, para euforizar a participação de seu leitor. Nessa

seção os leitores têm um espaço reservado para sua exposição e são estimulados a mandar

fotos dos lugares visitados, para, assim, participar e aparecer na revista. Ao contrário do que a

revista propunha antes, ao divulgar lugares para os quais iam sobretudo as celebridades, agora

é o leitor que ganha espaço na revista, transformando-se no personagem principal.

FIGURA 7: Seção Viajantes – Acabei de chegar. Viagem e Turismo, janeiro de 2008.

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A revista busca a todo momento seduzir o leitor para que ele interaja

constantemente, neste caso, a partir da perspectiva de integrar um grupo de leitores em uma

mesma seção. O fato de ter sido ouvido e valorizado pela publicação revela uma relação de

encantamento entre enunciador e enunciatário, e este último tende a se sentir importante e

necessário. A revista manifesta a importância dada ao leitor explicitamente, pedindo a ele que

responda a esse apelo: “PARTICIPE! Acabou de chegar: Mande fotos, dê dicas, conte suas

impressões...” Ao mesmo tempo em que busca constantemente modalizar o enunciatário,

oferecendo conselhos acerca do que, aonde e quando fazer, a revista também utiliza aspectos

passionais e abre espaço para o leitor (ao participar do teste de viagem) viver efetivamente o

que será escrito em suas páginas. O enunciador descreve opiniões de outros participantes, não

somente os leitores levados à viagem, dando sua opinião final sobre o resultado da viagem.

Também não podemos deixar de mostrar como Viagem e Turismo, além de escrever sobre sua

experiência no ramo inúmeras vezes durante as reportagens, criou um carimbo “Confie na sua

viagem”, atestando aos leitores que o que está escrito foi testado pela publicação.

FIGURA 8: Carimbo “Confie na sua viagem”. Viagem e Turismo, julho de 2011.

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Portanto, quando Viagem e Turismo se mostra detentora de muitas experiências

com viagens e, através de suas matérias, é capaz de fazer com que o enunciatário queira viver

e sentir todas as sensações descritas por seus repórteres, a revista promove um regime que

orienta seus leitores sobre o que devem fazer em sua viagem. Através do uso da sua força

persuasiva e da estratégia da passionalização e do apelo ao sensível da experiência, ela

implicitamente afirma que o enunciatário pode conquistar tudo aquilo, conhecer os lugares

sugeridos, experimentar boas comidas, contanto que faça o que a revista recomenda e,

principalmente, utilize os serviços ofertados pelos seus parceiros confiáveis, expostos nas

páginas publicitárias.

O sistema (incluindo os subsistemas midiáticos) não cessa de bombear

figuras e formas do mundo da vida para constituir e revestir seus produtos e

marcas, que, por sua vez, constituem e vestem os sujeitos nas várias posições

discursivas de sujeito. (PRADO, 2006, p.20)

Numa relação de constante atualização e interação, os leitores que cumprem o

contrato e a modalização ofertados ganham novos espaços e competências concedidos pela

revista. Para se tornarem capazes de alcançar o objetivo, que, no caso dos leitores de Viagem e

Turismo, é realizar uma viagem perfeita, muitas das novas matérias são construídas a partir

das experiências vividas de seus próprios leitores. Desta forma, é estabelecida entre

enunciador e enunciatário uma relação de cumplicidade. O leitor aceita o contrato

estabelecido, pois acredita que assim conseguirá atingir todos os seus objetivos, criados por

VT.

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2.3. As capas de Viagem e Turismo

FIGURA 9: Capa de Viagem e Turismo, junho de 1997.

De 1995, quando foi lançada, até o início de 2003, Viagem e Turismo apresentava

pouquíssimas evoluções nas características em sua capa. Analisando as edições até 2002,

podemos verificar que as capas continham menos informações e ilustrações, os layouts eram

bem mais simples e continham cores mais sérias. O tamanho da edição no ano inicial (29,5cm

x 22,5cm) também era diferente do atual (26cm x 20cm), a revista se apresentava mais

comprida e menos larga que hoje.

As fotos utilizadas nas capas davam mais ênfase a itens específicos da reportagem

principal, como no caso da foto acima, em que o tema Egito foi retratado pela esfinge de

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Gizé. Os outros temas eram destacados com outras cores, sempre em diagramação retilínea. O

logo também era sempre composto por duas cores, que variavam a cada edição. A

diagramação retilínea era composta por poucas cores, sugerindo um leve movimento. As

poucas chamadas para outras reportagens representavam um discreto crescimento.

FIGURA 10: Capa de Viagem e Turismo, outubro de 2003.

A partir de 2003, Viagem e Turismo passou por uma reforma importante em suas

capas. A linguagem gráfica tornou-a mais dinâmica e chamativa, alternando os tamanhos das

fontes. A diagramação, apesar de continuar retilínea, não apresenta mais aquela rigidez de

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tamanhos e itens uns embaixo dos outros; agora há uma certa movimentação nas frases. As

chamadas se produzem em maior número, indicando quantidade crescente de matérias,

sempre aparecendo duas em cores, as cores utilizadas no logo. As composições das capas

fazem uso, na maioria das vezes, de cores ligadas à natureza e essa harmonia apresenta agora

mais do que as 3 ou 4 cores identificadas nas capas anteriores. Marcadores são utilizados em

cores diferenciadas para promover os passos que o leitor deverá seguir, e servem também para

criar uma classificação do que fazer, conduzindo o leitor a pensar numa espécie de agenda a

fim de realizar o que a revista propõe.

Comparando o exemplo acima com as edições anteriores, as capas de Viagem e

Turismo apresentam, neste estágio, mais informações, layout mais elaborado e as fotos

indicam movimentos. O logo também foi reformulado, deixando de lado as letras mais finas,

substituídas por fontes com desenho mais curvilíneo, proporcionando, assim, o sentido de

círculo, ciclo, enfim, de algo com conteúdo mais redondo/curvo e afetivo, pleno. O logo ainda

manteve as duas cores, porém, agora as letras são levemente contornadas por uma cor e

recheadas por outra. A palavra “turismo” do título da revista, Viagem e Turismo, foi colocada

de lado, em tamanho menor, para dar mais espaço e destaque para “Sonhe. Planeje.

Embarque”. O lema em destaque sugere que, dentro do conteúdo da revista, o leitor

conseguirá achar informações para realizar as três coisas: sonhar, planejar e embarcar. Viagem

e Turismo começa aqui a dar mais importância para seus mapas-guias; para identificar seu

leitor com esse serviço, a revista começa a distribuir gratuitamente estes mapas dentro das

edições, podendo ser destacados e levados durante as viagens. Além dos mapas-guias, a

revista também dá destaque à palavra “Ganhe”, e presenteia seus leitores com matérias de

roteiros diferenciados.

VT ressalta que foi “eleita a melhor revista de turismo do Brasil” pelo 21º Prêmio

Veículos da Ed. Referência, para assim demonstrar seu potencial e sua importância diante dos

leitores e concorrentes. Também enfatiza que agora publica matérias em que promove a

inteiração com o leitor, como em: “Como viajar para 60 países? Nosso leitor explica”. O leitor

não é somente incorporado à edição, mas tem importância suficiente para ser destaque de

capa; sua opinião é considerada válida, importante para atestar ainda mais a confiança no

conteúdo editorial. Anteriormente, a confiança era mantida através somente do relato dos

repórteres, como em (no exemplo de junho de 1997 – Egito): “Nosso repórter testa a praia da

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novela das oito”. Naquela época, dentro da perspectiva daquele contrato de comunicação, não

era necessário trazer a opinião do seu leitor. Agora, as opiniões dos leitores expostas nas

capas de Viagem e Turismo constituem modelos de viagens de sucesso, viagens perfeitas,

oferecidas como chamariz para que o leitor se identifique com essa experiência

passionalizada, afetiva, e reconheça e incorpore esses objetivos.

FIGURA 11: Capa de Viagem e Turismo, junho de 2011 – Mudança na capa.

Somente para demonstrar a reformulação das capas (pois a análise dos anúncios se

restringe até o ano de 2010), verificamos que a partir de 2011, Viagem e Turismo reformulou

sua capa novamente. Algumas mudanças não muito significativas foram realizadas entre

2003, mas foi neste último ano, em 2011, que Viagem e Turismo modificou suas capas de

forma mais enfática. Agora, a parte verbal está menos colorida, possui chamadas mais curtas,

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letras menores, em suma: a revista foi revitalizada e se demonstra mais elegante, própria para

um enunciatário sofisticado.

A diagramação também foi alterada: antes, as chamadas eram predominantemente

localizadas do lado esquerdo em textos retilíneos e agora elas flutuam pela capa, revelando

um ar de relaxamento: Viagem e Turismo também é um lugar para “conhecer” lugares através

da leitura e relaxar. São utilizados diversos tipos de fontes, as variações de negrito foram

substituídas pelo itálico, mais sutil. O logo apresenta mudança na fonte, estas, neste momento,

monocromáticas e com tons fluorescentes, portanto mais fortes e vivas, indicando

revitalização. Os selos de “Promoção Viagem e Turismo” apresentados nas capas são

utilizados como uma forma de garantia da idoneidade dos sorteios. As fotografias escolhidas

para retratar o tema principal da capa emolduram os cenários como um todo, apresentando

maior número de itens mostrados, um panorama completo, representando o sonho do

enunciatário ali, a ser realizado, na palma de sua mão, através de Viagem e Turismo. Este tipo

de enquadramento privilegia a paisagem e convida o enunciatário a vivenciar aquele cenário

propositalmente montado. Com a ajuda de programas como Photoshop, as cores, as

construções e até mesmo a própria natureza têm seus itens mais belos ressaltados, às vezes

extensivamente trabalhados, dando um aspecto de perfeição, muitas vezes artificial.

Diferentemente dos anos anteriores, entre os principais temas agendados para as capas da

revista, neste período, encontram-se paisagens com figuras organizadas de forma magistral.

Toda a beleza possível do local está mostrada. A cena fotográfica escolhida para a capa e

exposta mensalmente disputa lugar de evidência entre as outras revistas do segmento. Fotos

que mostram a presença de figurantes se intercalam com outras em que não aparece ninguém,

refletindo uma preocupação do enunciatário para que este se imagine naquele lugar e

deixando sempre o enunciador “ligado” em seu público.

Neste novo estilo de capa, Viagem e Turismo apresenta cores clássicas, mas não

dispensa os tons fluorescentes para ressaltar o título. A revista trafega entre fotos com estilos

tradicionais para montar cada capa de forma singular. Sobre os concursos, a revista sempre

anuncia algo, como neste caso: “3 Viagens” para seus leitores. As figuras de casais

apaixonados, jovens desbravadores ou crianças alegres representam um ideal para muitos

viajantes de Viagem e Turismo e sempre estão entre os temas principais. Assim, ser

reconhecida como a “melhor revista de turismo no Brasil” se torna também um ideal para a

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revista. Diante das palavras “Sonhe. Planeje. Embarque”, a revista tenta se encaixar como

uma possibilidade identitária adequada aos seus enunciatários. Como visto anteriormente, a

preocupação em mostrar os selos com seus prêmios, relatando ser a revista “várias vezes

eleita como a campeã absoluta na categoria”, é bastante forte e este procedimento está

associado às estratégias discursivas das capas de VT.

Viagem e Turismo tenta representar no imaginário de seu leitor uma mídia

confiante, que investiga e testa roteiros e, por isso, garante que o melhor seja oferecido ao seu

leitor. Entretanto, somente a opinião de seus profissionais não foi o bastante, tendo sido

necessário incluir o leitor nas narrativas e nas imagens, para haver uma maior identificação

com o enunciatário. Essa aproximação e inclusão do leitor na enunciação da revista se

apresenta para o leitor como uma possibilidade de ele se tornar destaque no veículo. Viagem e

Turismo transformou-se em objeto de desejo do enunciatário. Como analisado neste capítulo,

verificamos que Viagem e Turismo tornou-se um grande espaço de comunicação sobre

turismo e é através do contrato de comunicação estabelecido com o seu enunciatário que os

regimes específicos de visibilidades são previamente estabelecidos. A revista dirige-se aos

seus enunciatários intimando-os a um desenvolvimento específico: se você fizer do jeito que

eu-enunciador faço ou recomendo, poderá ter como resultado a experiência almejada de

viagem. Essas convocações são realizadas por meio destes contratos e tanto as temáticas

quanto as figuras que aparecem nas edições são antecipadamente pensadas como um

argumento em busca de um leitor que acredita na idoneidade da publicação e a compra

mensalmente.

A maneira como Viagem e Turismo se dirige a seus leitores não pode, porém, ser

considerada como mero fruto de uma decisão isolada, mas sim como decorrente da evolução

do projeto editorial, da constante pesquisa em relação a seu público, da publicidade e do

próprio capitalismo. A importância dada à publicidade é resultado do desenvolvimento do

capitalismo e essa expansão publicitária é uma consequência da transformação do cidadão em

consumidor. Na cultura contemporânea, a publicidade, encontrada em toda parte, transformou

a identidade de cada um em mercadoria: os indivíduos precisam assimilar a lógica publicitária

e enxergar a si próprios como produtos-produtores, que definem suas experiências a partir do

mundo do consumo.

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2.4. Viagem e Turismo na internet

As estratégias discursivas empregadas em Viagem e Turismo desde a inclusão do

leitor, que serviram para aproximar enunciador e enunciatário, criaram uma relação mais

próxima entre as partes, que permanece até hoje. Tal relação foi intensificada por meio das

novas ferramentas de mídia social. Para confirmar seu contrato, Viagem e Turismo apostou no

site da revista, que traz, além do manual de viajante, sugestões, guias e livros sobre o assunto

e uma galeria de fotos com depoimentos de viajantes que enviaram fotos e suas histórias.

Com essa estratégia, Viagem e Turismo tenta se relacionar com seus leitores on-line,

propondo que eles também podem ajudar a desenvolver o conteúdo da revista.

Além dessa parte da revista em versão virtual, Viagem e Turismo também criou

comunidades no Orkut, no Facebook e no Twitter. Essas comunidades se destinam à

discussão das edições, às respostas de enquetes, à participação em concursos culturais e

principalmente ao acesso às notícias, dicas, sugestões e informações diárias. Essa interação

diária e constante viabilizada pela internet promoveu ainda mais o sentido de proximidade

entre o leitor e a revista. O leitor pode comentar as edições mensais, acessar as edições

anteriores, fazer testes para seu conhecimento como viajante, participar de promoções, acessar

outros blogs de viagem e guardar no “Minha Viagem” suas dicas de viagem prediletas. Em

frente a tantas tentativas, torna-se incontestável o apelo de Viagem e Turismo à formação

também de uma comunidade virtual entre seus leitores. O propósito é reforçar ainda mais a

relação com o leitor que participa dessa comunidade, criando uma espécie de saber comum,

advindo da experiência dos leitores com sua leitura da revista e de suas próprias viagens.

Porém, toda essa relação entre revista e leitor tem como objetivo fomentar o consumo,

momentaneamente na compra contínua da revista e posteriormente na compra de pacotes

turísticos veiculados na publicação. A revista interpela o leitor/consumidor a atender à

convocação, comprando para se tornar um viajante euforizado.

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2.5. Cruzeiros Marítimos

De acordo com Amaral (2009), até os anos 1920, os navios eram vistos apenas como

um instrumento de transporte para a busca por novas terras ou riqueza. A partir daí, novos

modos começaram a surgir, quando alguns indivíduos que buscavam meios para tolerar as

longas viagens entre América e Europa acabaram por conciliar algum prazer e entretenimento

à viagem. Antes de 1921, era notável a desigualdade de classes sociais dentro dos navios, não

somente distinguindo as pessoas mais afortunadas, mas a questão era visivelmente nítida a

bordo, exatamente como vimos no tão aclamado filme Titanic, pois o navio era dividido em

áreas restritas e as pessoas da classe econômica, geralmente imigrantes, tinham limitações de

circulação, para que não importunassem os mais abastados, comerciantes ricos que viajavam a

negócios com suas famílias, em suas áreas públicas como bares, restaurantes e suas luxuosas

cabines.

Para limitar a quantidade de imigrantes dentro dos navios, após a primeira guerra

mundial, em 1924 o congresso norte-americano aprovou uma lei que restringia a apenas 2%

do total de passageiros a população de uma determinada nacionalidade a bordo, colocando em

risco as companhias que viviam do movimento migratório. A partir disso, fazer um tour pela

Europa a bordo de um navio de cruzeiro passou a ser um modelo de viagem quase que

exclusivo dos ricos. Outro apelo para tal fim foi a lei seca norte-americana: quem estivesse a

bordo dos navios nas viagens entre Estados Unidos e Canadá, portanto, em águas

internacionais, poderia beber e festejar do início ao fim sem qualquer problema.

Ainda assim, as condições da indústria de transporte e entretenimento pelo mar eram

limitadas, devido à utilização pós-reforma de navios participantes da segunda guerra mundial.

Mas, de acordo com Amaral (2009), o fato decisivo para o mercado de cruzeiros marítimos foi

o seu posicionamento de oferecer passagens a clientes que tinham medo ou que não podiam

bancar a viagem pelo ar. “Essa nova situação obrigou a indústria marítima a se reformular e a

partir de 1950 os navios se transformaram em grandes fornecedores de entretenimento como

conhecemos nos dias atuais” (AMARAL, 2009, p. 3).

Para termos uma noção da representatividade desse mercado na atualidade nos Estados

Unidos, país que abriga o mercado mais movimentado no mundo em cruzeiros marítimos,

traçamos a seguir um breve relatórios dos números desenvolvidos pela CLIA.

Aproximadamente 13 milhões de pessoas no mundo viajaram de cruzeiros marítimos em

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2008. No ano seguinte, esta indústria continuou em expansão e sua contribuição para a

economia dos Estados Unidos, com compras diretas pelas linhas de cruzeiro e seus

passageiros, totalizou US$ 17,15 bilhões. Esta despesa resultou em US$ 35,11 bilhões de

impacto total e os gastos gerados com o pagamento de salários para 314.000 trabalhadores

norte-americanos foram de US$ 14,2 bilhões.

TABELA 1: Fonte: CLIA Economic Summary,

Com um mercado tão promissor, pensou-se necessário iniciar um processo de

educação dentro do mercado de cruzeiros marítimos, e para tanto foi criada a CLIA – Cruise

Line International Association4, conjunto de 26 empresas de cruzeiro maritimo que

representam mais de 97% da capacidade de cruzeiro comercializado na América do Norte.

Essa organização não governamental tem aliança com 16.000 agências de viagens e agentes-

membros e cerca de 100 importantes fornecedores da indústria estratégica. A CLIA busca

estabelecer a importância deste mercado e seu impacto econômico, e, para tanto, atua em

pontos fundamentais como a educação de agentes de turismo e o relacionamento com

autoridades e opinião pública.

Na última década, a produção total de gastos relacionados às viagens de cruzeiro nos

4 CLIA: A organização sem fins lucrativos Cruise Lines International Association (CLIA) é uma organização

composta por 26 das principais empresas de cruzeiro que servem a América do Norte e que opera em

conformidade com a Comissão Marítima Federal. A CLIA é uma organização não governamental e existe para

promover todas as medidas que geram um ambiente de cruzeiro seguro e saudável, educar e treinar seus

agentes de viagens, bem como promover e explicar o valor, conveniência e acessibilidade da experiência em

cruzeiros.

Total econômico do benefício da indústria de cruzeiro

US$ 35,1

bilhões

Despesas diretas de mercadorias de serviços das linhas de cruzeiros e dos

hóspedes

US$ 17,1

bilhões

Total de empregos gerados para estes custos

314.000

Total salarial gerado para estes empregos

US$ 14,2

bilhões

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EUA aumentou de US$ 16,6 bilhões em 2000 para US$ 37,9 bilhões em 2010, um aumento

de 128%, ou um aumento médio anual de 8,6%. O impacto na geração de emprego também

foi bom, aumentando de pouco mais de 257 mil empregos em 2000 para pouco menos de 330

mil em 2010, um aumento de 28,4%.

De acordo com o site da CLIA, apesar da breve baixa em 2009, a indústria de

cruzeiros norte-americana recuperou-se em 2010. Na verdade, a indústria atingiu novas

máximas e passou algumas referências importantes para um número de métricas operacionais,

incluindo a capacidade global de passageiros. Como a economia dos EUA começou a sua

recuperação moderada em 2010, a indústria norte-americana de cruzeiros continuou a

ultrapassar o crescimento da atividade econômica global, em geral, e da indústria de viagens e

turismo, especificamente.

Até o final de 2011, as linhas dos membros da CLIA embarcarão um total de mais de

16 milhões de passageiros. Ao mesmo tempo, a indústria continua a se comprometer com 14

novos navios até o final de 2011, e um investimento total de mais de US$ 10 bilhões

(CRUISE LINES INTERNATIONAL ASSOCIATION, 2009).

2.6. Cruzeiros marítimos no Brasil

A inauguração do Departamento de Cruzeiros Marítimos, no início de 1962, deu

impulso inicial ao turismo de cruzeiros. A atividade atravessou as décadas de 1970 e 1980,

mas foi freada com a proibição total da operação de cabotagem (navegação com origem e

destino dentro dos limites do país), prevista em norma da Constituição de 1988, revogada em

1996, que reabriu o turismo de cruzeiros. A Abremar – Associação Brasileira de Empresas

Marítimas afirma que, desde então, o setor passou a conviver com a desregulamentação. Até

então, era proibido aos navios de bandeira estrangeira fazer cabotagem na costa brasileira e as

companhias enfrentaram proibição total da operação. Com a desregulamentação, aos poucos

os navios integraram-se à paisagem de várias cidades à beira-mar do país. Atualmente, mais

de 60 transatlânticos navegam pelo litoral brasileiro.

Pelos dados apresentados no site da ABREMAR, o segmento de cruzeiro marítimo é

um dos que registram maior índice de crescimento na indústria turística nacional. Nos

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últimos anos, a atividade teve crescimento exponencial de 623%5 e expansão média de 33%

ao ano. O Brasil possui condições naturais muito favoráveis à expansão dos cruzeiros

marítimos e ocupa o quinto lugar no ranking mundial da CLIA. Ainda de acordo com a

associação, o país conseguiu apresentar de forma sistemática um significativo crescimento

dos cruzeiros marítimos como vetor de desenvolvimento, geração de empregos e distribuição

desse impacto em toda a cadeia produtiva, como impostos, comissões para agentes de viagens

e também o crescimento da atividade.

Mas, para relatar o início dessa atividade no Brasil, voltamos a Amaral (2009), que diz

que, nos anos 60, quando o movimento migratório para os países da América Latina passa a

não ser mais a questão principal, e sim os serviços e entretenimento oferecidos a bordo:

Os cruzeiros passam a oferecer em um produto só todos os requisitos

exigidos pelos viajantes: hospedagem, agenciamento, alimentação,

entretenimento dignos de hotéis 5 estrelas e obviamente, o transporte para

cidades turísticas, atrativos naturais e novas culturas. Essa torna-se então

uma atividade socioeconômica que se relaciona com todos os setores da

economia mundial e que atende as necessidades dos novos costumes, valores

culturais e hábitos emergentes. (AMARAL, 2009, p.4)

Portanto, os cruzeiros passam a oferecer em um produto só todos os requisitos

exigidos pelos viajantes: hospedagem, agenciamento, alimentação, entretenimento dignos de

hotéis 5 estrelas e, obviamente, o transporte para cidades turísticas, atrativos naturais e novas

culturas. Essa torna-se então uma atividade socioeconômica que se relaciona com todos os

setores da economia mundial e que atende as necessidades dos novos costumes, valores

culturais e hábitos emergentes. Com o passar dos anos e devido às condições climáticas propícias a

este tipo de atividade coincidirem com o inverno hemisfério norte, quando as companhias costumam

deslocar seus navios ociosos para mercados emergentes, conseguimos integrar os chamados “gigantes

dos mares” às paisagem de algumas cidades brasileiras.

5 Fonte: ABREMAR – Associação Brasileira de Empresas Marítimas. Fundada em 2006, representa

institucionalmente o setor e atua em prol do desenvolvimento sustentável da atividade. Criou grupos de

estudos técnicos para desenvolver projetos e ações que visam promover o setor e sensibilizar o governo e a

sociedade sobre o impacto econômico gerado pelos cruzeiros.

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De acordo com os dados informados pelo Concais6, de 1998 a 2011 foi investido o

valor de R$ 48 milhões no terminal marítimo do porto de Santos e, até o final do ano de 2012,

serão acrescidos mais R$ 11 milhões, totalizando R$ 59 milhões em investimentos. A previsão

para a temporada 2012/2013 é de mais de 1,2 milhões de passageiros. Isso demonstra que o

mercado brasileiro está satisfeito com as novidades de grandes e novos navios na costa

brasileira, mas ainda é necessário cobrar atenção dos governos locais para investimentos nessa

área, para que novas localidades possam fazer parte desse empreendimento. Abaixo segue a

tabela com os números da movimentação de passageiros de 2000 a 2010.

Temporada Embarque Desembarque Trânsito Total Evolução

acumulada %

00/01 36.721 35.417 16.530 88.668 94%

01/02 70.488 68.783 12.579 151.850 160%

02/03 70.130 71.101 10.240 151.471 160%

03/04 66.237 67.257 20.334 153.828 163%

04/05 98.361 98.285 28.907 225.553 238%

05/06 153.656 154.258 46.364 354.278 374%

06/07 219.011 219.268 53.594 491.873 520%

07/08 274.337 273.931 49.056 597.324 631%

08/09 359.156 359.523 50.337 769.016 812%

09/10 453.579 454.315 71.972 979.866 1.035%

10/11 512.200 517.821 90.809 1.120.830 1.184%

TOTAL 2.378.666 2.385.201 461.421 5.225.288

TABELA 2: Movimentação de passageiros de 2000 a 2010. Fonte: Concais.

Os números da operação de cruzeiros marítimos no Brasil têm apresentado

crescimento constante e substancial no decorrer dos anos. Os gráficos 01 e 02, abaixo,

representam a variação a partir da temporada de 1998, o chamado “boom” dos cruzeiros nas

temporadas de 2000 e 2001, o considerável crescimento da oferta em águas brasileiras entre

os anos 2005 e 2006 e o estágio atual, com o maior número de cruzeiros já ofertados.

6 O Terminal Marítimo de Passageiros Giusfredo Santini – Concais –, inaugurado em 23 de novembro de 1998, é

o maior e mais moderno da América Latina, com 41,5 mil m². A Concais S/A é uma empresa privada, operadora e administradora do Terminal Marítimo de Passageiros Giusfredo Santini.

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GRÁFICO 1: Número de navios por temporada no Brasil. Fonte: Concais.

GRÁFICO 2: Número de escalas por temporada no Brasil. Fonte: Concais.

Como podemos ver nos gráficos acima, em 2007/2008 houve um declínio no

desenvolvimento da capacidade da indústria de cruzeiros marítimos brasileira, que logo foi

retomado em 2009/2010, aumentando o desafio das agências de viagens de encher novamente

os navios de cruzeiro. Esse retardamento ocorrido na temporada de 2007/2008 também

resultou em uma redução na taxa de crescimento de passageiros, gastos nas linhas de cruzeiro

e comissões dos agentes de viagens.

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A temporada de cruzeiros marítimos 2009/2010 teve 18 transatlânticos que

percorreram a costa brasileira e fizeram 407 atracações em 21 portos nacionais.

Transportaram 720.621 turistas. “O aumento número de turistas teve reflexos também na

lucratividade dos agentes que viagens, que receberam um total de US$ 57 milhões em

comissões, aumento de 54% sobre a temporada anterior” (ABREMAR, 2012). Como vimos

pelas tabelas, a temporada de cruzeiros 2010/2011 teve excelente resultado. Os 20

transatlânticos que percorreram a costa brasileira transportaram volume recorde de

passageiros: 792.752 cruzeiristas. Foram 414 atracações em 21 portos nacionais ao longo de

quase sete meses.

A análise do impacto econômico da região da Baixada Santista, bem como a variação

a partir de 2006 e especificamente o percentual da temporada de 2010, com um crescimento

de pouco mais de 300%, demonstra gastos, empregos gerados e salários pagos. Todos os

números impressionantemente relevantes, e que demandam crescente atenção por parte das

autoridades e da opinião pública para este segmento importante para a economia turística

brasileira. Portanto, os cruzeiros marítimos trazem inúmeros benefícios econômicos para as

regiões. Além dos gastos de turistas e tripulantes, muitos dos insumos adquiridos para a

operação do navio são nacionais, como combustíveis, materiais de limpeza, bebidas, frutas,

alimentos básicos, entre outros. A estimativa apresentada pela Abremar é de que, para cada

US$ 7 mil deixados no país, se abre um novo posto de trabalho. Tanto as companhias

marítimas como os passageiros pagam altas taxas para a utilização da infraestrutura portuária

e local. Um dos setores mais beneficiados pela atividade de cruzeiros marítimos no Brasil é o

do emprego. Os pontos expostos demonstram a importância dos cruzeiros marítimos não só

em termos de lazer, como na contribuição para a economia e a geração de empregos. Na

temporada de 2009/2010, só a bordo dos navios, foram 3.955 empregos gerados.

De acordo com os dados fornecidos no site da Abremar, de 2000 pra cá, a indústria de

cruzeiros marítimos vem se firmando como importante vetor de desenvolvimento para os

destinos que se encontram ao longo da nossa costa. Como dissemos, hoje, os navios são um

instrumento para a divulgação dos destinos turísticos do litoral brasileiro. Porém, é

imprescindível a melhoria dos portos tanto da parte de atracação como na organização das

filas nos terminais de passageiros. As viagens de cruzeiros exercem fascínio nas pessoas, pois

os navios proporcionam uma viagem de alta qualidade e a possibilidade de conhecer vários

lugares em pouco tempo, sem burocracias e obstáculos. Portanto, os cruzeiros marítimos

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possuem um dos mais potentes meios para ampliar o turismo brasileiro – graças, em parte, ao

nosso litoral, que fornece condições oportunas à navegação praticamente durante todo o ano.

E também à favorável relação custo/benefício.

Não poderíamos deixar de destacar pessoas como Sr. Aldo Leone7, profissional

pioneiro no fretamento de navios, que teve papel fundamental no desenvolvimento deste

segmento, através de seus passos iniciais no país. O Sr. Aldo Leone, dono da Agaxtur,

importante operadora de turismo da cidade de São Paulo, fretou muitos navios para oferecer

um produto mais específico para o público brasileiro. “O primeiro navio a ser fretado foi em

julho de 1963, o Princesa Leopoldina, que tinha roteiro em Manaus” (AMARAL, 2009, p. 6).

2.7. Empresas de cruzeiros marítimos

2.7.1. Costa Cruzeiros

Fundada em 1854, a Costa Cruzeiros, empresa italiana, transportava inicialmente

tecidos e azeite. No período pós-guerra, começou a transportar seus imigrantes europeus para

países da América do Sul. A partir de 1959, a chamada, na época, Linea C começou a

construir navios totalmente destinados aos cruzeiros e logo após extinguiu as divisões entre

primeira e segunda classe, construindo bares, restaurantes e outros lugares em que todos

pudessem interagir.

Há 64 anos, com 768 passageiros, o navio Anna C partiu de Gênova em direção ao Rio

de Janeiro e a Buenos Aires, iniciando uma nova fase na empresa, que começou a oferecer

serviços de primeira classe, como o fornecimento de ar condicionado a seus hóspedes. O

Anna C foi o transatlântico precursor de outros navios da armadora, que, com o passar do

tempo, foram surgindo na Rota de Ouro e Prata (Brasil, Uruguai e Argentina). O segundo a vir

para o Brasil foi o Andrea C, que foi o primeiro a fazer cruzeiros marítimos na costa

brasileira, em 1969, quando foi fretado por Aldo Leone.

7 Aldo Leone (31/01/1927 – 10/07/2008): italiano, fundador e presidente da operadora de turismo Agaxtur e

ex-presidente da Braztoa (Associação Brasileira de Operadoras de Turismo). Profissional pioneiro em fretamento de navio de cruzeiros, com 71 fretamentos.

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FIGURA 12: Partidas dos navios da Linea C. Fonte: Jornal A Tribuna, 17/04/1955.

No site www.portogente.com.br, podemos ver que os primeiros anúncios dos navios

da Linea C eram um tanto confusos, por serem escritos por pessoa de origem italiana, que não

tinha domínio total do idioma português: “Os navios a motor Anna C e Andrea C, foram

construídos especialmente com o intuito de proporcionar aos seus passageiros nos climas

tórridos dos trópicos. Esses navios de cor branca e de linhas delicadas não têm apenas o

aspecto de iates particulares de luxo, mas dispõem de tudo que se apresenta até o momento

em técnicas modernas para tornar tudo a bordo o mais agradável possível.” (PORTOGENTE,

2012).

Em 2000, a então chamada Costa Croaciere iniciou o programa de expansão da frota,

com investimento total de 5,5 bilhões de euros para a construção de 13 navios até 2013. Em

2007, a Costa Cruzeiros bateu recorde de hóspedes na Europa, ultrapassando 1 milhão de

passageiros transportados no ano.

A Costa Cruzeiros chega a 2011 com 16 navios em operação, saindo de 25 portos em

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todo o mundo e com o marco de 24 navios trazidos para o Brasil em toda sua trajetória. Essa

empresa merece destaque por sua representatividade no desenvolvimento turístico no país,

operando aqui desde 1947; conseguiu se expandir mais no momento em que passou a optar

pela operação própria desses navios diretamente no mercado, deixando as operadoras de

turismo mais seguras com relação à venda dos cruzeiros e não mais à venda e operação dos

mesmos.

2.7.2. CVC

A CVC, uma das maiores operadoras de turismo no Brasil, trouxe na temporada de

2003/2004 um dos navios considerados mais avançados e luxuosos do mundo, o Blue Dream

R5. Com 95% das cabines com vista para o mar e quase dois tripulantes por passageiro, foi

considerado um cruzeiro com atendimento personalizado.

Essa temporada foi um marco para a empresa, já que anteriormente só havia

trabalhado com fretamentos em conjunto com outras operadoras e ocupava posição de

destaque em vendas de cruzeiros da Costa Cruzeiros desde 1999. O primeiro fretamento total

CVC foi um sucesso, com investimento para a vinda e operação do navio no valor de cerca de

US$ 6 milhões, fora os US$ 2 milhões reservados para a divulgação do navio. Com esse

navio, em 2004, apenas uma temporada depois, a CVC conseguiu aumentar sues vendas em

25% e em 2005 atingiu a marca de 10 milhões de passageiros atendidos.

Também em 2005 a CVC trouxe, além de outros 4 navios, o primeiro cruzeiro que

operou em Fernando de Noronha, o Pacif, com capacidade para 650 passageiros e que possuía

o roteiro mais caro e mais disputado na categoria, além de introduzir o sistema all inclusive,

que consiste em bebidas inclusas durante as viagens, diferencial até hoje entre as outras

empresas de cruzeiros marítimos.

Hoje, a CVC é considerada a maior operadora de turismo do Brasil e mostra, de

acordo com o crescente investimento no mercado de cruzeiros marítimos, que este não é

somente um mercado em potencial para as agências de turismo, mas ótimo também para

operadoras de turismo. Assim, a CVC passou a ter espaço significativo no cenário turístico

dos cruzeiros marítimos, mesmo fretando navios de outras empresas e não operando com seus

próprios navios, como fazem empresas como a Costa Cruzeiros, Royal Caribbean e MSC.

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2.7.3. MSC Cruzeiros

A MSC (Mediterranean Shipping Cruises), companhia também italiana, é uma

empresa totalmente europeia e líder no mercado de cruzeiros pelo Mediterrâneo. Emprega 12

mil funcionários ao redor do mundo e está presente em 42 países.

Em 2002, após vários anos de crescimento significativo, a MSC Cruzeiros decidiu

instalar seu escritório próprio no Brasil e passou a não ser mais representada pela Píer I. A

MSC ainda atua principalmente no mercado italiano, em franca disputa com a outra empresa

italiana, a Costa Cruzeiros, mas possui um forte plano de expansão para o Caribe e a América

do Sul, atuando com uma moderna frota de navios com idade média de 5 anos. A costa sul-

americana se mostrou uma grande oportunidade de mercado a ser explorada, já que, no

Caribe, a concorrência com outras empresas revela um cenário mais competitivo.

Com mais de 36 escritórios espalhados pelo mundo, um grande número de navios para

transporte de carga e 12 navios de cruzeiros, a empresa transporta cerca de 1,2 milhões de

hóspedes por ano, sendo 300 mil só na América do Sul. Para sua frota de navios de cruzeiro,

foi realizado um investimento de 5,5 bilhões de euros, iniciado em 2003.

A MSC opera hoje com uma frota de 12 navios. Os últimos a serem entregues foram o

MSC Fantasia e o MSC Splendida, ambos com 133.500 GRT, 333 metros de comprimento e

38 metros de largura, com 1.637 cabines cada um, 1.325 tripulantes e capacidade para 3.959

hóspedes. A estratégia de expansão da empresa inclui mais 2 outros navios para serem

entregues em 2012: O MSC Meraviglia e o MSC Favolosa, ambos menores que os navios

acima, mas com 80% das cabines externas, das quais 65% possuem varandas. No final do ano,

a companhia operará com uma frota total de 14 navios e o objetivo alcançado de transportar

mais de 1,4 milhões de hóspedes.

2.7.4. Royal Caribbean

Em 2000, a Royal Caribbean iniciou suas atividades no Brasil, através de sua

representante local, a Sun & Sea International Representações. Porém, operou seu único navio

na época, o Splendour of the Seas, somente por apenas 2 temporadas.

Logo após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, a empresa optou por

reposicionar seus navios apenas em portos norte-americanos, onde seus principais turistas, os

cidadãos locais, pudessem dirigir até o porto de embarque, evitando assim, os aviões –

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possíveis alvos de ataques terroristas. Devido a este movimento estratégico, a expansão

internacional, incluindo o mercado brasileiro, foi revista e os navios que estavam ou deveriam

ser posicionados em outros destinos foram remanejados para focar o mercado norte-

americano. Neste período, a Royal Caribbean decidiu operar no Brasil somente com outra

empresa do grupo, a Island Cruises. Com um navio chamado Island Escape, procurou

oferecer um produto com diversos serviços adaptados ao público brasileiro. O único

restaurante aberto 24 horas por dia, oferecido aos hóspedes do Island Escape, provou ser um

sucesso, pois os consumidores brasileiros esperavam por isso: ter a liberdade de escolha do

que comer no momento em que quisessem e não ter que obedecer às regras de horários que as

outras empresas ofereciam.

O ano de 2008 marcou diversas mudanças para a empresa, que anunciou a abertura de

um escritório próprio no Brasil, acabando, assim, com a parceria com a representante Sun &

Sea International. A Royal Caribbean possui uma frota de 22 navios de cruzeiro que operam

principalmente no Caribe. A classe Oasis, a mais nova da empresa, oferece 2 navios que

revolucionaram o mercado de cruzeiros marítimos: o Oasis of the Seas e o Alure of the Seas,

gigantes dos mares, que possuem 25 opções de restaurantes e 2.394 tripulantes. Atualmente,

apenas 2 das 22 opções oferecidas operam em águas brasileiras: o Splendour of the Seas e o

Vision of the Seas.

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CAPÍTULO III: Publicidade e consumo dos cruzeiros marítimos

3.1. A viagem no fazer publicitário

As relações entre publicidade e consumo vêm ganhando a apreciação de

importantes estudiosos nos últimos anos, e nosso objetivo neste capítulo é fazer uma reflexão

acerca da publicidade e sua ligação com o consumo nos anúncios de cruzeiros marítimos, não

apenas de pacotes turísticos, mas também o consumo de bens simbólicos. Para isso, vamos

tratar inicialmente da publicidade e de suas interações com o consumo, detendo-nos a seguir o

pensamento de que a publicidade estrutura o conteúdo dos meios de comunicação de massa

pela forma a partir da qual ela divulga os produtos, promove os serviços e exerce papel

importante na construção de identidades consumidoras. E, por fim, trata-se de estudar a

relevância do fazer publicitário para a manutenção da sociedade de consumo, a partir da

análise dos anúncios das empresas de cruzeiros marítimos na revista Viagem e Turismo, que

buscam convocar seus enunciatários mercadologicamente, apresentando a responsabilidade

informativa de seus produtos e serviços e, construindo, para além da persuasão, contratos

comunicativos carregados de apelo passional e sensorial, afetivo.

Se, até a segunda metade do século XIX, a publicidade era marcada pelo seu

caráter informativo, a Revolução Industrial trouxe-lhe predomínio da

persuasão sobre a informação. Neste momento, o processo de

industrialização e de crescimento mercadológico consagrou a publicidade

como instrumento indispensável do auge do comércio e dos primeiros

encontros competitivos da economia capitalista na formação dos mercados.

Sua evolução ficou definitivamente associada ao desenvolvimento da

sociedade de consumo. (CASTRO; GOMES, in BARBOSA; PEREZ, 2007,

p.3)

Como vimos no primeiro capítulo, nossa sociedade se construiu, nas últimas

décadas como consumidora-consumista e desenvolveu a capacidade intensa de o indivíduo

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desejar estilos de vida renovados e carregados de afetos. Este compromisso com o

encantamento só permanece fascinante enquanto o desejo continua não realizado

completamente, pois milhares de outras novidades são criadas a cada instante. Para Prado,

essa criação intensa que nos deixa altamente insatisfeitos dia após dia é resultado do

desenvolvimento dos dispositivos que buscam capturar a nossa atenção e motivar a nossa

felicidade:

O enunciador, para se fazer ouvir, trabalha o texto em sua força de apelo, de

interpelação, de narrativa carregada de sentidos ligados ao mundo cotidiano

e constrói enquadramentos a partir de sua força de autoridade de sabedor. No

dispositivo de convocação dos sistemas dos media e da publicidade se busca

capacitar o leitor em um campo e modalizá-lo para ser o melhor, para sentir-

se bem, bem adaptado ao mundo, para se tornar o melhor amante, o melhor

profissional, para poder fazer o melhor em termos de sucesso e para tanto o

enunciador mapeia, com a ajuda dos tecno-especialistas, o que deve ser feito

para se conseguir esse plus, esse valor a mais, esse gozo a mais. (PRADO,

2009, p. 4-5)

Em outras palavras, a sociedade de consumo floresce enquanto consegue manter o

indivíduo acostumado com a insatisfação e com um incessante desejo por coisas novas. Para

Bauman coloca que, para atender às necessidades criadas a todo o momento, de fazer o ser

humano se sentir o melhor, assim como oferecer novos mecanismos de motivação de compra,

e de orientação sobre o que fazer, onde comprar, o que comprar, a economia tem de se basear

no exagero e na troca repentina de produtos. Essa economia consumista se mantém ativa com

troca das mercadorias e só é considerada produtiva quando o dinheiro tem circulação máxima

entre as pessoas; já os produtos deixam de ser eficazes logo depois de usados, seguindo

diretamente para os lixões.

A publicidade compreende, portanto, um sistema de comunicação midiática que

ocupa intensamente o cotidiano contemporâneo, não apenas informando ou mostrando os

diferenciais dos produtos e serviços oferecidos pelos anunciantes, com o objetivo de incitar o

consumo, mas, muito além dessa sua função evidente, a publicidade é a própria mercadoria,

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difundida no mercado simbólico, embevecida em seu banho sígnico. Baudrillard, em seu livro

O sistema dos objetos (2002, p.185), afirma que o sistema publicitário reproduz padrões de

comportamentos e modus vivendi, expressando temas e valores sociais, de acordo com um

sistema de gratificação. Para o autor, esse sistema, a partir do qual o indivíduo deve integrar-

se à sociedade, uma vez que esta se adapta a ele, desempenha uma postura maternal, já que os

objetivos são produzidos para a satisfação das necessidades dos consumidores. Ou seja,

símbolos aparecem em mercadorias funcionando como um apelo passional ao consumo.

Os prestígios da publicidade e do consumo têm por função favorecer a

absorção espontânea dos valores sociais ambientes e a regressão individual

ao consenso social. (BAUDRILLARD, 2002, p.192)

Ainda segundo o sociólogo e filósofo francês (2002), a publicidade desempenha o

papel de cartaz permanente do poder de compra da sociedade. Ele a compara aos sonhos, nos

quais não existe negatividade ou relatividade. Assim, o discurso persuasivo da publicidade

não visa tanto a compulsão pela compra, mas a adesão do consumidor ao consenso social

anunciado. Daí o porquê de Baudrillard afirmar que a publicidade é a apenas um álibi para o

consumo. Este mesmo mundo publicitário anuncia um universo de oportunidades muito mais

vantajoso, e, como toda campanha publicitária é um texto social que responde ao que está em

desenvolvimento em certo período, ela apresentará a sua versão do que é favorável para o

consumidor. Mas também não podemos deixar de ressaltar que a cultura consumista é

marcada por uma pressão constante para que sejamos cada qual um alguém melhor dentro da

sociedade de consumo. Para Prado, a convocação diz ao leitor: “você só precisa de um

programa e de um mapa para bem viver, para achar seus objetos perdidos, para reencontrar-se,

para encontrar seu par, para fazer seu par gozar juntinho com você, para ter o máximo sucesso

na vida, no trabalho, na vida amorosa” (PRADO, 2009, p. 6). O enunciador torna-se

referência que mostra os modos de obter tudo o que é projetado como desejado. Porém, como

vimos, os mercados de consumo se concentram na desvalorização imediata de suas ofertas

para que novas mercadorias tomem o posto de mais cobiçadas, e isso é estimulado por esse

pensamento de que sempre está faltando algo e que esse algo pode ser comprado nas

prateleiras. E é nessa sociedade que a felicidade é o propósito mais usado para atrair atenção

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nas campanhas publicitárias, destinadas a reforçar essa suposta necessidade. Sinônimo de

felicidade é o pertencimento ao grupo ideal, ao padrão da época, o que pode fazer a viagem

perfeita. É aí que a publicidade adota a estratégia de salientar nas mensagens os valores mais

tangíveis do produto, por meio da razão, e opta também por acrescentar seu poder de

persuasão, voltando-se assim para os apelos emocionais baseados em experiências de vida,

como afirma Rifkin: “Os novos homens e mulheres pós-modernos estão buscando

constantemente novas experiências vividas. As novas indústrias culturais, por sua vez, estão

criando um número quase infinito de scripts para representar as experiências de vida”. (2001,

p. 173)

Sobre a questão das experiências de vida, tão utilizadas nos cenários criados para

campanhas publicitárias, Fontenelle propõe que essa cultura se fortalece na medida em que os

homens desejam vivenciar novas experiências. “Estas são alimentadas por uma indústria de

consumo que vende tanto os bens materiais como imateriais: a felicidade, por exemplo, é a

busca desenfreada do ser feliz, o sentir-se poderoso ou realizado” (FONTENELLE, 2004,

p.187). Para a autora, a mídia tem a necessidade de expor em seu cenário uma realidade cheia

de valores de consumo, que vai ao encontro direto dos desejos de seu público-alvo. O público

que uma campanha publicitária visa atingir não é um alvo fixo, mas móvel, e não é por acaso

que, no mundo inteiro, a publicidade vem desenvolvendo novas possibilidades táticas de

encontros com seu público, seja pelas encenações que objetivam influenciar o público pela

emoção, seja promovendo o divertimento, a surpresa, o desafio. Obviamente, é estratégico

esse investimento da publicidade contemporânea nas construções retóricas voltadas menos

para as qualidades dos produtos e mais para a emoção que provocam, objetivando levar ao

leitor campanhas mais divertidas, que lhe proporcionem entretenimento. Os esforços

publicitários de bem posicionar os produtos no mercado simbólico vão na direção de fazer

com que o consumidor esteja o maior tempo em interação positiva com as marcas.

As organizações capitalistas fizeram da mídia tradicional o carro-chefe para

a veiculação de seus produtos e serviços, seja mediante o anúncio comercial,

ou via inserção desses produtos ou serviços naquilo que denomino de

“mídia-realidade”, qual seja, a mídia informativa – a mídia de notícias, qual

que se pretende veicular “a coisa real” – inserção essa feita de maneira

aparentemente natural, descomprometida, mas fortemente sustentada por

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uma relação de parceria muito séria entre o mercado e a mídia. Esse é o

campo que denomino publicidade (FONTENELLE, 2004, p.186).

Para Rocha, o consumo de anúncios não deve ser confundido com o consumo de

produtos, pois, para o autor, o que menos se consome em um anúncio é o próprio produto:

“Em cada anúncio vendem-se estilos de vida, sensações, emoções, visões de mundo, relações

humanas, sistemas de classificação, hierarquia. Um produto vende-se para quem pode

comprar, um anúncio distribui-se indistintamente” (ROCHA, 1995, p. 27). Anteriormente a

isso, ele diz que, com a industrialização, os produtos passaram a ser cada vez mais

desumanizados, pois as máquinas, presentes ativamente em todo o processo produtivo,

retiram a marca humana dos produtos. No entanto, os produtos são consumidos por nós, seres

humanos, indivíduos particulares, e por isso são incorporados a várias singularidades sociais,

devendo “ter face, nome e identidade para que tenham lugar no fluxo de vidas específicas”

(op. cit., p. 27). Para ele, o domínio da produção é, assim, oposto ao domínio do consumo, no

qual homens e objetos adquirem sentido, produzem significações e distinções sociais. E é

justamente a publicidade o mediador entre a produção industrial, desumanizada, e o consumo,

construído como humanizado. Com a intervenção publicitária, os produtos deixam de ser

reconhecidos pela sua utilidade exclusivamente material e, como afirma Fontenelle, a idéia da

imagem como valor para o mercado está associada ao desenvolvimento de anúncios

comerciais:

Há uma urgente necessidade de diferenciar os produtos e serviços da mídia e

é neste momento que se começa pensar na “imagem” através de uma forma

de anúncio comercial que passava a descolar a imagem de seu produto. A

produção de imagem passou a se tornar mais importante que o próprio

produto, a ponto que em que, hoje, interessa em desenvolver um produto

para uma imagem e não mais o contrário (FONTENELLE, 2004, p. 187).

Com o crescimento da produtividade, os produtos, massificados, ansiavam por

algo que pudesse destacá-los em um mercado altamente concorrido. Diz Fontenelle que: “É

neste momento que começa a se pensar na ‘imagem’ através da forma de anúncio comercial

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que passava a descolar a imagem do seu produto” (FONTENELLE, 2004, p.187). Nesse

sentido, Fontenelle diz que não se tratava mais de se anunciar um produto para sua função

específica, mas para um tipo de estilo de vida que ele poderia representar. Portanto, criar

cenários maravilhosos para as campanhas publicitárias passou a ser algo utilizado pelo

mercado publicitário com o intuito de alocar seus produtos na mídia. A criação do “desejado”

nada mais é do que o resultado da necessidade de a mídia refletir, cada vez mais, a nossa

própria realidade. Considerando a maneira pela qual como as fronteiras entre realidade e

fantasia foram se rompendo cada vez mais a fim de produzir imagens para consumo, as

relações emocionais com o consumidor foram crescendo, já que o que se busca hoje são

emoções, satisfações intangíveis, mas que produzam reações sensoriais. Fontenelle afirma que

é “a nossa experiência sensorial que define o que é válido. Os produtos e os serviços devem

emocionar, não é mais suficiente a imagem ou o entretenimento.” (op. cit., p.196)

A busca pela experiência, no campo do consumo e das relações entre mídia e

mercado, é uma conseqüência direta da comercialização da imagem. Nesse

sentido, também não haveria nada de novo se pensássemos do ponto de vista

daquelas mercadorias que passaram a ser veiculadas via marcas e imagens,

promovendo um estilo de vida, uma “experiência de comer, de ler, de tomar

banho, se sentar, cozinhar”. Neste caso, o produto era comprado por causa

da imagem que ele apresentava e esta imagem era a promessa da experiência

que viria junto com o uso do produto. Ou seja: era necessário possuir o

produto para alcançar a experiência prometida (FONTENELLE, 2004,

p.190).

De acordo com Fontenelle, “O mercado da experiência engloba, portanto, a

imagem como valor” (FONTENELLE, 2004, p.192). Como poderemos ver logo mais nas

análises, as imagens veiculadas nos anúncios de cruzeiros marítimos retratam a experiência

que o consumidor poderá viver a bordo, a compra dessa viagem seria o acesso a uma

experiência única. Segundo David Harvey, com o avanço nos transportes e na comunicação,

“a luta pelo capital simbólico coletivo tornou-se ainda mais importante” (2003, p.148, apud

FONTENELLE, 2004, p. 191), e ele ainda afirma que foram esses dois fatos que provocaram,

juntos, um boom na indústria do turismo: “Paga-se pelo acesso que a indústria do turismo é

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capaz de fornecer ao viajante sedento por experiências culturais e, por isso mesmo, o turismo

tornou-se uma das grandes indústrias da experiência” (idem).

Enfim, quando a publicidade opta por emocionar o consumidor, buscando gerar

sua empatia pelo produto, ela se guia pelos valores da euforia. O material publicitário, neste

caso, procura influenciar o consumidor acentuando euforicamente em seu conteúdo o humor,

o entretenimento, a sensibilidade, e isso é fundamental no turismo. A atividade publicitária

desse ramo exige um olhar atento aos acontecimentos da realidade socioeconômica e cultural

de onde vivemos, funcionando com a utilização de um conjunto de métodos: trata-se de

conhecer o público específico, os aspectos positivos dos produtos, marcas ou serviços, com o

intuito de obter a aprovação do público e a venda do que foi ofertado. O sistema em que a

publicidade turística está inserida é extremamente ligado ao ambiente que rodeia o

indivíduo/consumidor, e as mensagens transmitidas trazem informações e significados do

mundo exterior, os quais servem para determinar o comportamento desse indivíduo, que

tentará se adaptar para fazer parte desse sistema. Para Castro e Gomes, o “sistema de

comunicação mercadológica serve a duas finalidades: informar e persuadir” (in BARBOSA;

PEREZ 2007, p.7). Os anúncios servem para informar o receptor sobre tudo aquilo que é

avaliado como atraente, para que ele adote a decisão de comprar o produto ou serviço. “Em

publicidade seleciona-se somente a informação que motiva, que induz o público a adquirir o

produto que satisfará suas necessidades” (idem).

Podemos afirmar que a persuasão comercial, ou publicidade, pode ser

considerada, com base em um ponto de vista técnico, como “um conjunto de

técnicas que se compõe de regras e procedimentos de persuasão com os

quais dá a conhecer, a partir de anúncios, que em conjunto chamamos de

campanha, um produto ou serviço, para que se consuma ou utilize.”

(JOANNIS, 1965, p. 336, apud CASTRO; GOMES, p.8, in BARBOSA;

PEREZ, 2007)

Dessa perspectiva, podemos admitir que a criação publicitária confirma seu

reconhecimento como produtora de sentido, fazendo com que as pessoas sejam levadas a um

cenário no qual seus gostos e interesses são expostos e elas podem e devem desejar as coisas

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oferecidas. Nessa direção, a ordem econômica desencadeia novos padrões sociais e culturais,

acarretando uma constante renovação de mercadorias e de serviços, e a ilusão da completa

trocabilidade de bens. Assim, o valor simbólico passou a ser um diferencial significativo na

busca de novas configurações de conquista do consumidor. Barros (1988) afirma que a

enunciação distribui o saber de diferentes modos e obtém efeitos também diferenciados; as

figuras do conteúdo recobrem os percursos temáticos abstratos e atribuem-lhes traços de

revestimento sensorial:

Essa etapa da análise explica as relações entre enunciação e enunciado –

modalização virtualizante do sujeito do enunciado, delegação do saber,

relações entre actantes e atores discursivos e actantes narrativos, instauração

no tempo e no espaço do discurso – e entre o enunciador e enunciatário –

implicação de conteúdos, realização de atos de linguagem, procedimentos

argumentativos – como recursos discursivos para comunicar valores e

convencer e persuadir o enunciatário. (BARROS, 1988, p. 112)

Para concluirmos esta reflexão sobre o papel da publicidade nos dias atuais,

ressaltamos que os anúncios de cruzeiros marítimos, que veremos logo mais, têm sido

marcados pela sua capacidade de convocar os consumidores por sua linguagem simbólica,

pois trabalham essa linguagem nas diferentes potencialidades de sentidos. É por este motivo

que a responsabilidade cultural destas campanhas apresenta o desafio de escolher caminhos

criativos capazes de obter um aumento no impacto da mensagem, tornando-as cada vez mais

motivadoras e necessárias. Compreenderemos também, com as análises, que a publicidade

turística acrescenta à vida das pessoas algo emocionante, desafiador, e apresenta a capacidade

de sensibilizar o público, despertando o desejo do consumidor de estar naquele lugar,

construído textual e imageticamente no anúncio. Os anúncios analisados foram divididos em

três fases: a primeira chamada de “publicidade como informação”, a segunda de “o

aparecimento do corpo do consumidor” e a terceira de “passionalização da narrativa sobre a

viagem: a experiência como centro no contrato de comunicação”. Essa terceira fase publica

anúncios com apelo à experiência e convida o leitor a vivenciar o que está na foto, utilizando

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imperativos e fazendo crer que, como no exemplo, essa experiência pode ser vivenciada

através da compra da viagem.

3.2. As fases dos anúncios em seu desenvolvimento semiótico

Com mais de 17 anos de existência, Viagem e Turismo propõe-se a autenticar a

experiência de seus textos. Como pudermos ver nos capítulos passados, com o passar do

tempo, a relação entre a publicação e o leitor foi se transformando e as estratégicas foram se

desenvolvendo de acordo com as necessidades da sociedade atual. A partir deste ponto da

dissertação, compreenderemos as mudanças estratégicas utilizadas no desenvolvimento das

campanhas publicitárias veiculadas em Viagem e Turismo. Veremos, ao longo das análises,

os anúncios construídos por meio de elementos persuasivos voltados para o universo sensorial

do consumidor.

Com as primeiras campanhas publicitárias veiculadas pelas principais empresas

de cruzeiros marítimo atuantes no Brasil a partir de 1995, Viagem e Turismo tornou-se terreno

fértil, pois, antes do início dessa divulgação, o mercado de cruzeiros era majoritariamente

marcado pela presença de roteiros internacionais e cruzeiristas endinheirados. O público

brasileiro não tinha, até então, muitas opções no mercado próprio, a não ser alguns poucos

navios fretados por empresas de turismo. Este cenário mudou drasticamente com o progresso

de investimentos e a atuação de empresas internacionais em solo brasileiro, o que se refletiu

no fortalecimento da indústria do turismo, incluindo, é claro, o segmento de cruzeiros

marítimos e do entretenimento.

O resultado do início da atuação dessas empresas no Brasil foi o desenvolvimento

de estratégias de comunicação para ofertar estes cruzeiros como produto nacional oferecido

pelas operadoras ao público geral. Este público, sedento por ascender socialmente, encontrou

no embarque em luxuosos navios europeus uma forma de cada qual se sentir ator de

importância, vendo aí oportunidade perfeita para emergência de um novo sujeito social e, por

outra via, os anunciantes trataram de construir campanhas publicitárias cheias de apelos ao

marketing da experiência, em que cada qual pudesse construir variadas identidades pessoais e

coletivas. As empresas passaram a se apresentar como enunciadores especialistas, sugerindo,

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através de imagens e mapas cognitivos das viagens, o que se deveria fazer para ter uma

viagem perfeita, quais experiências poderíamos desfrutar em um navio de cruzeiros, além de

muitas outras, construindo, enfim, um estilo de comportamento através dessas imagens de

outros mundos a encontrar e vivenciar. A experiência como centro do contrato de

comunicação é uma consequência da comercialização da imagem, recurso que passou a ser

utilizado pelo mercado a fim de construir cenários para desenvolvimento dessas campanhas,

com apelo não somente à argumentação e ao fornecimento de informações, mas também ao

apelo sensível do corpo e à passionalização.

Vejamos, agora, a análise da evolução dos anúncios veiculados na revista Viagem

e Turismo, advertindo que, na presente pesquisa, esta evolução foi dividida em três partes. O

primeiro período das campanhas se passa durante as temporadas de 1995 a 1999, quando nos

anúncios há predomínio da informação; o segundo momento vai de 2000 a 2004, quando o

enunciador desenha o fetiche do objeto “viagem” ligado à cultura de consumo; e o terceiro

período, de 2005 a 2010, em que o fetichismo da imagem não é mais construído diretamente

como estando ligado somente à mercadoria “viagem”, mesmo que não deixe de representá-la

propriamente, mas se amplia para adentrar o mundo do marketing de experiência.

3.2.1. Primeira fase: Publicidade como informação (a viagem é o navio)

Os anúncios veiculados nas temporadas de 1997 a 1999 eram destinados a um

público de maior renda, pois viajar de navio ainda era considerado sinônimo de glamour e

exclusividade. A expectativa desses anúncios era chamar a atenção de pessoas abastadas e

emergentes da sociedade, que desejavam embarcar em sofisticados navios europeus sem

precisar ir a outro continente. Abaixo copiamos um dos anúncios da Costa Cruzeiros,

veiculado através de uma operadora turística no mês de agosto de 1997.

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FIGURA 13:– Anúncio Costa Cruzeiros. “Os Transatlânticos”- Viagem e Turismo, agosto de 1997

A campanha da Costa Cruzeiros da temporada 1997/1998 foi lançada na revista

com a responsabilidade mercadológica de informar seus novos navios e propagava todos os

roteiros oferecidos. O contrato comunicacional do anunciante com o leitor é simples e direto;

aqui não há uma articulação mais complexa entre figura e tema, mas apenas a foto do produto.

Não há uma narrativa que conta uma história e envolva o leitor, resolvendo-se somente como

um anúncio informativo, que mostra o navio e explicita quais são os destinos oferecidos. O

enunciatário não aparece construído no contrato de comunicação como alguém com inúmeros

objetos de interesse. O anúncio é claro e em uma primeira análise podemos dizer que se trata

de um produto fechado. É pouco ousado e nada criativo, tal como os demais anúncios deste

período, que apenas compunham uma revista mais formal, com conteúdo repleto de

informações turísticas.

Não se tratava de provocar o desejo do consumidor, apenas de encontrá-lo no

meio do mundo com esse desejo já preparado e pronto para receber a informação dos

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cruzeiros disponíveis. Este anúncio, pouco colorido, possui o mínimo de figuras e as

existentes mostram os navios. As cores pouco vibrantes se alinham com a simplicidade do

texto e do apelo, costurados pelo contrato de comunicação. O alinhamento em seis fileiras

verticais à esquerda e igualmente distribuídas comunica apenas os elementos informativos e

promove um efeito inerte, estável e sem continuidade. Ainda na página, o anunciante dá

ênfase, por duas vezes, à experiência de seus agentes de viagem, o que funciona como uma

tentativa de se impor como a melhor empresa do setor, a mais importante, porém, isso não

promove uma aproximação maior com o seu enunciatário, pois busca dar maior prestígio à

empresa e não à enunciação dos interesses do cliente.

3.2.2. Segunda fase: o aparecimento do corpo do consumidor

Em contraposição ao conservadorismo informativo da primeira fase da

publicidade da revista, os anúncios de cruzeiros marítimos foram impulsionados pelo

crescente mercado de cruzeiros nacionais, o que implicou no surgimento de outros

anunciantes e no desenvolvimento de campanhas que despertassem mais os leitores.

Na temporada de 2003, pudemos perceber que os anunciantes fizeram diversas

reformulações em suas campanhas publicitárias. A revista já tinha se reposicionado, buscando

sua nova identidade e um novo perfil de leitores. Agora, tinha como público-alvo 58% de

mulheres entre 25 e 49 anos, número crescente de leitores do sexo feminino, e que pertenciam

em 87% dos casos às classes sociais A e B. Mesmo tendo um público levemente

predominante de mulheres, a ideia também foi integrar a imagem do homem e da família

viajante às páginas dos anúncios de Viagem e Turismo. Assim, a revista passou a ter um

conteúdo mais amplo e a desenvolver seções e textos mais próximos do público geral,

começando a se afirmar como a “revista com dicas de viagem”, seja para a família, para o

casal de namorados, seja para os jovens ou idosos.

Não se tratava mais somente de informar uma viagem num navio, como no

primeiro período, mas de construir um contrato para um público com desejos, devidamente

figurativizado no anúncio. Nesta fase, os anúncios começam a mostrar o corpo como um item

imprescindível para demonstrar o alcance de uma vida melhor. O mercado investe fortemente

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no corpo e no signo, e torna-se impossível falar em valorização da vida sem recorrer às suas

figuras na publicidade.

A construção dos temas a seguir envolve discursos ligados à estética da

mercadoria, à qualidade de vida e ao sucesso no mercado das imagens. Essa intensa

valorização do corpo depende da experiência ligada ao consumo. Os pacotes semióticos são

elaborados pelos analistas simbólicos, de modo que os anúncios começam a traçar mapas de

início predominantemente informativos, mas posteriormente sobretudo passionalizadores. Um

aspecto importante a ressaltar nas construções das campanhas da segunda fase liga-se às

diferentes representações da felicidade. É fundamental observar a variedade discursiva e a

introdução do corpo imaginário na mídia. As figuras de belos casais, apaixonados, e corpos

esculturais em piscinas e outras atividades de exercício, convívio e entretenimento começam a

aparecer em vários anúncios. Tal conjunto encarna o modelo ideal de felicidade, que envolve

noites dançantes com o marido, o namorado, diversão em piscinas artificiais ou a visita a

cassinos em plena luz do dia, tudo em alto mar. Em outras palavras, a imagem construída no

anúncio é aquela atrelada à estética da mercadoria (a viagem como experiência estésica),

aquela ligada ao consumo dos modelos identitários. Trata-se de um discurso construído por

analistas simbólicos, especialistas nas tecnologias dos discursos.

A seguir, podemos ver o anúncio da MSC Cruzeiros da temporada de 2003:

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FIGURA 14: Anúncio MSC Cruzeiros. “Você vai amar!” - Viagem e Turismo, outubro de 2003.

Em 2003, os anúncios apresentavam mais imagens, havendo, na maioria delas, a

introdução de figuras de pessoas em diversas situações. A inclusão de situações a serem

vividas a bordo ganha maior espaço na construção das campanhas, e assim podemos perceber

que esta etapa tornou-se mais ampla que a anterior, em termos dos elementos semióticos

trabalhados pelo contrato de comunicação. Temas como “família” e “curtição”, entre outros,

que concretizam os temas da sociabilidade e da diversão na viagem, apelando aos sentidos e

ao corpo passionalizado, têm espaço mais frequente na publicação, com palavras de ordem

que exaltam a empresa, o nome do navio ou a agência de turismo. Palavras de ordem como

“Nada supera esta experiência” (do anúncio da operadora Transatlântica acima) perdem

campo e surgem novas palavras de ordem, que apelam mais à experiência do consumidor:

“Você vai amar!”. Na grande maioria dos casos, as figuras construídas ligam-se a um discurso

de modalização: seja feliz, ame, se divirta, compre uma viagem em um cruzeiro marítimo.

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As imagens apresentadas juntamente com o produto a ser vendido expõem os

desejos daqueles que comprariam e gostariam de “Viver a sensação de sonhar acordado”.

Casais de namorados, famílias, crianças, jovens em curtição, praias paradisíacas (paradas dos

navios), entre outros, já são nesse momento apresentados como exemplo de estilo e

comportamento nos anúncios. Nessa nova fase do contrato comunicacional, o consumidor

adquire corpo, desejo, presença no anúncio. Os descontos de 10% ou para o 3º e 4º hóspedes

ou aéreos grátis aparecem como tendência para chamar a atenção dos clientes e continuam

presentes em todas as campanhas até hoje. Isso foi possível devido à presença da própria

empresa no Brasil, para articular as vendas, demonstrando seu comprometimento com o

cliente e ressaltando isso no anúncio “MSC Agente Geral”.

FIGURA 15: Anúncio CVC Cruzeiros.

“Viva seu sonho de verão no Funchal” - Viagem e Turismo, dezembro de 2003

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A mistura de figuras como navios, pessoas e locais turísticos que compõem os

anúncios aparece de maneira bastante frequente em Viagem e Turismo nas temporadas a partir

de 2000, antecipando um movimento crescente nas temporadas posteriores e que perdura até

as campanhas atuais. Os anúncios, muito mais coloridos e menos formais, aparecem como

tendência e os jeitos despojados e relaxados não somente dos corpos, mas também da

editoração, ganham espaço nas campanhas das principais empresas. No anúncio da CVC

acima, o vestuário praiano brasileiro é marcado pela inclusão de maiôs, biquínis, chapéus

coloridos, ao lado de drinks e frutas tropicais, enaltecendo o bem-estar do enunciatário; é

nesse momento que o anúncio deixa de ser apenas informativo e passa a promover os objetos

de interesse das pessoas, apelando e chamando o enunciatário a viver aquela experiência.

Viajar é colorido, é divertido, é leve, ligado ao prazer dos sentidos, à natureza e às boas coisas

das culturas. O logo da CVC encontra-se entre as empresas que operam o pacote turístico,

tentando emprestar sua credibilidade para as outras empresas, menos conhecidas. A

linguagem trata de construir um contrato de comunicação que instiga os desejos do

consumidor de viver essa vida de “curtição”: “Viva o seu sonho de verão no Funchal”, “Natal

e Reveillón em Fernando de Noronha”, “Tudo em até 7 vezes sem juros”. Neste período,

percebe-se que as empresas tentam demonstrar comprometimento com o bem-estar do

enunciatário e este, por sua vez, atento aos inúmeros objetos de interesse expostos, vê aquilo

como um objeto ofertado por um especialista, apresentando o que se pode e deve fazer no

navio para que sua viagem seja maravilhosa. Aqui podemos ver como a construção das

figuras que pertencem ao contrato de comunicação mostra metonimicamente as partes,

remetendo ao todo de prazer da viagem. Somente o uso de ícones associados à viagem

(navios, biquínis, praias paradisíacas, massagens) ou a predominância de tons de azul,

referente à cor do mar, já reportam ao espírito da imagem do turista, historicamente associada

aos cruzeiros marítimos. Cada elemento da imagem remete a esse todo de experiência. A

transformação da primeira fase, que mostra a publicidade somente como informação, para a

segunda fase, apresentando corpos em alegria na figuratização, mostra que o anúncio passa a

esboçar figuras com sentimentos/paixões e a criar um conjunto de sentidos do prazer como

um todo.

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FIGURA 16: Anúncio Royal Caribbean e Celebrity Cruises - Viagem e Turismo, outubro de 2003

Utilizando elementos pertencentes ao campo semântico do turismo, os anúncios

aparecem produzidos com essas imagens e foram até mesmo incorporados ao estilo de

empresas conhecidas como menos informais, como é o caso da Royal Caribbean. Na imagem

acima, notamos que o anúncio é dividido por duas empresas da mesma companhia, a Royal

Caribbean e a Celebrity Cruises; apesar da divisão e da aparente “oposição”, na verdade os

anúncios se complementam e tentam fazer uma breve diferenciação entre as empresas, porém

as palavras são complementares. Para a Royal Caribbean, a palavra de ordem se materializa

na expressão “Destinos perfeitos para nossos navios”, e, para a Celebrity, em “Navios

perfeitos para qualquer destino”. A “perfeição” é o significante que une as duas metades

diferenciadas. Isso está associado às estratégias discursivas que a Royal Caribbean, através do

“ter o melhor para você” – tenha você o perfil de ser cliente da Celebrity ou da Royal –, possa

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ajudar o consumidor a conquistar seu objeto de valor. Pela própria construção cênica, é

possível perceber qual das “oposições” representa cada empresa. A expressão facial dos

modelos que representam a Royal Caribbean é a de um casal muito mais relaxado, mostrando

momentos de intimidade, e o casal que representa a Celebrity Cruises é mais romântico, em

um jantar a dois. Os tipos de sujeitos apresentados por Royal Caribbean (proprietária das duas

empresas) são muito bem delimitados por seus estilos, e assim a empresa consegue diferenciar

seus produtos. O texto verbal também apresenta sinais que fornecem características para

facilitar as construções das identidades de cada perfil. Em Celebrity, empresa mais formal,

temos: “Inovação e atenção a cada detalhe”, “Tudo em um navio Celebrityé exclusivo” e o

enunciador se refere aos seus navios como os mais sofisticados do mundo. Já em Royal,

“Você tem 18 opções de resorts flutuantes”, “Os maiores navios do mundo”.

Para Royal, o sujeito consumidor é ousado, gosta de explorar o mundo, tem uma

postura mais descomprometida e usa roupas informais, e Celebrity abriga os clientes que

procuram mais luxo e conforto. Como reflexo desta descrição, percebemos que a finalidade

dessa construção discursiva de Royal Caribbean está, em cada adjetivo, relacionada à venda

de seus produtos, mesmo que destinados a públicos diferentes.

3.2.3. Terceira fase: Passionalização da narrativa sobre a viagem: a experiência como

centro do contrato de comunicação

A partir de 2005, na terceira fase, os anúncios passam por outra reforma, mudança

que já vinha se desenvolvendo desde 2000. Esta reformulação mudou o projeto gráfico dos

anúncios e propôs uma passionalização8 da narrativa, que, como descreve Muniz Sodré

(apud PRADO, 2011), é “experiência primordial, que tem mais a ver com o sentido que

com a razão”. Este dispositivo estésico veio à frente para tornar as campanhas mais

dinâmicas e desejáveis. Comparando-as com as edições anteriores à nova proposta, os

anúncios se tornaram mais limpos, com layouts mais simples e menos informações, e houve

uma emergência da imagem como valor. Questões relativas à indistinção entre realidade e

8 Dispositivos “estésico”, ou seja, dispositivos passionalizadores das mídias, que têm a função pragmática de

fazer encarnar os discursos em seus públicos cada vez mais específicos e segmentados (PRADO, 2009).

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fantasia, à estetização do valor e à busca pela experiência vieram à tona; esta última tornou-se

o centro do contrato de comunicação. Para tanto, foi necessária uma adequação aos interesses

dos consumidores: as empresas se utilizaram de uma estratégia passional para construir as

viagens não só como objetos de desejo dos enunciatários, mas também como centros sensíveis

de prazer desejado, utilizando o marketing da experiência para transformar o processo de

geração de sentido em argumento de consumo. Para Fontenelle (2004), os consumidores são

convidados a experimentar sensações através das imagens; o produto principal tornou-se o

intangível, o imaterial. O apelo aos aspectos sensoriais, a experimentação das sensações

através das imagens e as atividades ligadas ao bem-estar, que ofereçam entretenimento e

cultura, apelam diretamente ao emocional/passional, ou seja, aos aspectos sensíveis, dos

sentidos do consumidor, e é nessa fonte de inspiração de vida vivida que o marketing da

experiência tem sua maior fonte de matéria-prima.

Hoje é a experiência sensorial que define o que é válido, os serviços têm que

emocionar, fazer crer que se vive uma experiência profunda e autêntica. O

que está embalado para consumo são aspectos culturais mais amplos, como

formas de vida, memória e comunidades afetivas (FONTENELLE, 2004, p.

196).

Deste modo, as construções dos anúncios necessitam apelar diretamente à

percepção do consumidor e assim se apresentarem tematizadas como centro nos contratos de

comunicação, tentando fazer a conexão entre o enunciador e o enunciatário pela indução ao

consumo. Bauman também diz que “Não compramos apenas produtos e serviços, mas o ato

de aquisição fica também evidenciado na busca e anexação de personas do indivíduo e as

pessoas que com este se relacionam” (BAUMAN, 2001).

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FIGURA 17: Anúncio Royal Caribbean. “Histórias of the Seas” - Viagem e Turismo, janeiro de 2008

Sempre utilizando momentos felizes e mostrando o que se pode e deve fazer

prazerosamente dentro de um navio, durante uma viagem de sonho, as figuras estabelecem um

percurso passional de alegria, confraternização e liberdade com o enunciatário. No anúncio

acima, com título “Histórias of the Seas”, o objetivo é mostrar que as experiências e

recordações do consumidor-viajante serão como as do anúncio e por isso explora-se um

momento confidencial e íntimo do casal figurante. Frases como “Nos navios da série

Freedom, você patina, escala, atravessa uma rua de verdade e no Liberty of the Seas – maior

navio do mundo, pode até surfar”, já não são mais suficientes. Agora é preciso homologar isso

na imagem, estabelecendo um clima afetivo baseado na passionalização da narrativa. As

campanhas se fartam com o imaginário que a publicidade permite construir e se utilizam do

marketing da experiência para guiar os indivíduos até seus objetos de desejo. As estratégias

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enunciativas adquirem, assim, além de um fim informativo, formas de sensibilização

passionalizada dos consumidores.

Nestes anúncios, podemos ver que as grandes frases que remetiam à confiança nas

empresas e informações diversas passaram a se alocar em espaços menores, permitindo que o

enunciador tenha agora mais espaço para a visualização das fotos de pessoas esportivas,

saudáveis e apaixonadas. Nesta fase, 50% ou mais do espaço são reservados ao cenário

passionalizado e as ações ali fotografadas mostram por si só o que o navio oferece. A

informação vem empacotada na narrativa passionalizada e nos textos verbais específicos,

quando necessário.

FIGURA 18: Anúncio Royal Caribbean.

“Uma grande brincadeira merece um grande parque” - Viagem e Turismo, abril de 2008

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Como todos os anos, os anúncios sofrem alterações, e a campanha da Royal

Caribbean de 2008/2009, apesar de manter quase os mesmos elementos da anterior, partiu

para um desenho mais curvilíneo, proporcionando, assim, um efeito de aventura, como se uma

onda tomasse conta do lugar. Além de ter quebrado a monotonia retilínea, muito mais

acentuada na campanha de 2007/2008 e anteriores, a identidade visual do anúncio é composta

por um degradê de azuis, que sugere movimento e mudanças, além de diversidade de

sensações, sem deixar de lembrar que tudo isso ocorre no mar. Para o título do anúncio “Uma

grande brincadeira merece um grande parque”, as letras utilizadas também apresentam

elementos curvilíneos que rompem sutilmente com a monotonia da diagramação das outras

campanhas, produzindo agora efeito muito mais informal. As composições cada vez mais

coloridas trazem figuras vibrantes e joviais. As crianças começam a fazer parte da

composição das figuras e ganham um espaço bastante importante tanto no texto verbal quanto

no visual, garantindo elementos que promovem um aspecto ativo e lúdico à campanha.

As chamadas começam a aparecer com mais destaque em cores contrastantes,

como é o caso do post it ou no mesmo degradê do logo, mas sempre em tamanhos maiores e

em negrito. O logo, composto por quatro cores, permanece com o mesmo layout e foi

acrescentado o texto “Mega Navio. Mega Férias”, que permaneceu por duas campanhas. As

informações gerais sobre a viagem perdem espaço, porém as mesmas são alocadas em

diagramação baseada em pequenos retângulos, sempre citando a pista de patinação, piscinas, a

parede de escalada ou a piscina para surfe mostrada acima. Trata-se justamente da construção

visual do mega parque, caracterização passionalizadora do navio. Neste momento, os roteiros

são considerados secundários e descritos no mínimo de linhas possíveis. O show é a

experiência sensível não só do navio, mas no navio.

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FIGURA 19: Anúncio Royal Caribbean. “Aqui você é o Rei” - Viagem e Turismo, junho de 2009.

Desta vez, a família que aparece no anúncio de junho de 2009, “Aqui você é o

Rei”, é representada como o núcleo mais importante. O nome do navio, Splendour, já

combina inicialmente com a posição de rei. A união entre os membros, o registro de

momentos especiais, as brincadeiras descontraídas, enfim, a demonstração de felicidade, são

bastante expressivos, e aqui podemos ver que ocorre uma passionalização pelo contrato, que

posiciona o consumidor numa posição de ser bem tratado, de se divertir, etc. O enunciador

propõe uma construção identitária por meio das experiências a serem vividas mediante o

embarque nos navios. Agora há uma passionalização dos personagens, que adquirem

movimento, relação corporal, tudo ligado ao desejo e ao divertimento. A beleza e a aparência

jovem dos modelos são enquadradas na foto geralmente em posição de movimento, o que

permite “emoldurar” toda a situação em volta, sem deixar de captar o navio ao fundo. Neste

período, existe uma narrativa que conta uma história “Em um reino não tão distante”, onde o

enunciatário é considerado o personagem principal e todos os seus desejos podem ser

atendidos; a agência não é mais o primeiro plano do anúncio, mas está à serviço do desejo e

das paixões do consumidor, que são os agentes da aventura, desse mundo lúdico. As figuras

criadas se articulam com o tema escolhido e ambos estão configurados no contrato de

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comunicação, produzindo assim um sentido compreendido como um todo: o centro da viagem

é você e a agência só está aqui para realizar essa experiência passionalizada.

Esta é a fase, enfim, em que o anunciante passa a considerar com mais ênfase os

desejos do enunciatário ao fantasiar aquele contexto, posicionando-se como a empresa que

sabe o que você deseja e que fará de tudo para realizar esses desejos. As chamadas compõem

o anúncio de forma organizada e ressaltam a hierarquia das informações expostas, que são

percebidas pelo uso de fontes em tamanhos diferenciados, como “Você é um Rei”, no nome

dos navios na costa brasileira e o valor e forma de pagamento. O anúncio é mais clean, pois

informações como as saídas e diversos roteiros já não mais poluem o cenário, mas ainda

assim são informadas em “Consulte outras opções de roteiro”. As temáticas de alegria,

confraternização e romance compõem cerca de 80% das campanhas, itens que refletem a

passionalização em direção ao marketing de experiência. A sociabilidade é um argumento de

grande valor e o anúncio para fazer uma viagem de navio torna-se uma ferramenta de

sedução, uma estratégia para a conquista dessa sociabilidade. Tendo noção disso, as empresas

apresentam em suas campanhas resposta para essa necessidade e é aí que há uma inversão. As

pessoas, ganham espaço e aparecem com mais força no contrato de comunicação. É claro que

o navio continua o centro da proposta de experiência, mas agora ele não é mais o objeto

técnico de valor central, mas o grande parque de diversões e sensações que permite a

experiência de sonho, diversão e prazer do consumidor.

Aqui, a Royal Caribbean comprova que o novo estilo da campanha é resultado de

um desenvolvimento. O assunto sobre relacionamentos e interação social dentro do navio se

apresenta agora como parte da experiência no megaparque. As figuras das pessoas, famílias,

casais e crianças representam um ideal de felicidade para a sociedade desse início do século

21. Diante das frases “Aqui você é um Rei” ou “Ele tinha caprichos impensáveis, mas sempre

era atendido em seus desejos”, ou ainda “Embarque com a Royal Caribbean e seja tratado

como um Rei!”, a campanha se encaixa como uma possibilidade identitária adequada. Essa

estratégia busca se aproximar do turista/consumidor e criar uma sensação de unicidade com

ele, em que não se trata somente de um navio ou uma empresa qualquer, mas sim de uma

hiperexperiência de vida/prazer na Royal Caribbean, o que reforça a ligação entre enunciador

e enunciatário.

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FIGURA 20: Anúncio MSC Cruzeiros.

“Varanda com vista para o mar é para poucos” - Viagem e Turismo, janeiro de 2008

Outras empresas também usam tais estratégias, como é o caso do anúncio da MSC

acima, que busca constituir um reforço ao sentido de intimidade com o enunciatário,

apresentando os modelos com roupas íntimas, conferindo um efeito de estreitamento no

relacionamento com o enunciatário. Aqui fica claro que aquela história de os navios de

cruzeiros serem restritos à alta sociedade acabou, pois eles tentam mais que nunca ampliar

seus públicos entre as classes médias: “Varanda com vista para o mar é para poucos – Mais

uma lenda que a MSC manda por água abaixo”. Ao mesmo tempo em que vemos a tentativa

de ‘popularização’ do cruzeiro, é possível constatar que a construção do discurso visual desta

campanha simula o mundo grego, pois a cor utilizada para o fundo do anúncio e as figuras

que nos remetem a Poseidon e Anfitrite, esposa do rei do mar, situadas no canto direito

inferior, nos remetem à civilização perdida de Atlântida. Aqui há uma ficcionalização do

sonho de viajar, remetendo ao mundo mítico antigo. Vale lembrar que as ilhas gregas são

consideradas os destinos mais glamorosos entre os roteiros de cruzeiros marítimos. Aqui os

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detalhes do texto verbal se engatam com o visual, sendo que a palavra de ordem “lenda”

totaliza a mensagem mítica do sonho de viajar como uma ação não somente de prazer, mas

cultural.

Nesse anúncio também podemos ver que os navios apresentados, MSC Opera e

MSC Armonia, estão envoltos por um círculo, lembrando-nos que essa é a vista que temos de

dentro das cabines, pois algumas das janelas dos navios são redondas. O logo desta campanha

da MSC foi estilizado e simula uma rosa dos ventos, figura que representa as quatro direções

fundamentais. A linguagem, aparentemente intencionada para ser popular, expressa a

construção do possível para todos: “A sua viagem ainda vai ser assim”; a democratização ou

‘popularização’ dos cruzeiros aparece no texto verbal/visual, mas também nas formas de

pagamento, de modo a demonstrar, de forma bastante singular, que essa viagem não é dirigida

somente aos ricos. Ao lado desse apelo democratizador está o apelo ao cultural e ao sonho de

viajar, em que o enunciador tenta visivelmente seduzir pelos toques míticos gregos. O anúncio

também destaca conteúdos exclusivos no site criado pela empresa

www.viagemdosmeussonhos.com.br e oferece dicas especiais, reforçando a ligação entre

enunciador e enunciatário. Nesta campanha, a MSC mostra-se capaz de compreender o

universo do turista brasileiro, aproxima-se do mundo íntimo do enunciatário, oferece o que há

de melhor para todos, mas não deixa de mostrar a viagem como item de sofisticação, mesmo

que popularizada, estabelecendo assim uma troca simbólica com o consumidor.

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FIGURA 21: Anúncio MSC Cruzeiros – “Mediterrâneo, Segredos, Cultura” - Viagem e Turismo,

junho de 2009

Em junho de 2009, a MSC Cruzeiros veicula um anúncio com um apelo à cultura,

de modo mais intenso que no anterior e ausente nos demais. O logo da MSC é separado e as

palavras: Mediterrâneo, Segredo e Cultura entram neste espaço e revelam que a modernidade

ligada à imagem do navio é remetida ao segredo da cidade antiga e à cultura. Com a frase

“Europa. O cenário perfeito para sua família viver momentos inesquecíveis, a bordo dos

navios mais modernos do mundo”, tenta mostrar que é possível desvendar a história da

Europa enquanto o navio moderno atravessa uma cidade qualquer do Mediterrâneo. Assim, as

figuras estabelecem um percurso passional pela inteligência, pelo aumento de informação

cultural, ligados ao prazer estésico da experiência de viajar. Comparada com as campanhas

anteriores, esta propõe cores mais fortes, como se estivesse pedindo atenção aos

enunciatários, como se o que estivesse sendo oferecido ali fosse algo mais vivo, sensível,

interessante para o corpo e não somente para a mente. Aqui os tons comuns de azul ficam

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mais escuros, contrastando com cores tão chamativas como o vermelho, este que descreve

valores e formas de pagamento. Aqui fica claro que o objetivo maior não é relaxar, apesar de

que isso ocorrerá, afinal, estar a bordo de um cruzeiro marítimo já é algo relaxante, mas o

objetivo principal é agregar conhecimento das cidades onde ele atraca, ligando isso à cultura,

ao passado. O prazer aqui é culturalizado, para além do entretenimento. Não se pode deixar de

reparar no desenho de um “solzinho” com óculos escuros e sorriso no rosto, ligado à frase

“Menores grátis o ano todo”, incentivando que os pequenos, sedentos por diversão e aventura,

venham conferir, além do cruzeiro, as formas de cultura e prazer que a Europa oferece.

A empresa possui uma das maiores frotas de navio da Europa e Caribe e pode-se

notar que o navio destinado ao roteiro pelo mediterrâneo tem o nome ligado à cultura: “MSC

Música”. Podemos notar que os textos retilíneos voltam muito mais acentuados, a identidade

visual do anúncio é composta por uma paisagem, quase que monótona, e não sugere mais o

movimento ofertado nos anúncios anteriores.

Portanto, com a nossa pesquisa, o olhar crítico deve, então, a nosso ver, deslocar-

se para o papel que a publicidade assume como construtora de mundos desejados, por meio da

construção de cenários, de linguagem e das representações de figuras. A publicidade torna-se

então “fantasista”, explora os domínios da criatividade e do imaginário, elabora novas

técnicas, entrelaça as técnicas tradicionais com as que mais lhe convêm, e prepara novas

condições de existência dos consumidores. Os cenários passionalizados construídos

representam um ideal para os consumidores e isso está associado às estratégias discursivas

dos enunciadores, fazendo com que, através da “experiência vivida” no anúncio, o

enunciatário possa conquistar seu objeto de valor. As empresas anunciantes se utilizam da

experiência vivida e impressa nos anúncios como estratégia passional para a busca incessante

da identificação do sujeito consumidor. Transformar-se em objeto de desejo do outro é meta

do enunciador. A passionalização se transforma em argumento para um consumo, o consumo

do próprio sujeito na esteira mercadológica do capitalismo pós-moderno.

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3.3. Passionalização

A intenção dessas campanhas publicitárias da terceira fase, onde a passionalização

é o centro do contato da comunicação, é tentar, por meio desses anúncios, fazer com que o

enunciatário se identifique com a viagem, com a empresa, seja através do cenário, da ação

fotografada ou mesmo pela interpelação performativa que faz o enunciatário sentir que pode

estar ali também e, assim, crer no discurso do enunciador. Com este tipo de apelação

emocional, o enunciatário não vê o anúncio como algo fora de suas possibilidades, porque,

através deste tipo de propaganda, ele acredita que as experiências retratadas ali podem se

tornar realidade. Os anúncios de cruzeiros marítimos utilizam os cenários que refletem o

consumo da experiência para seduzir constantemente seus enunciatários e, a partir da

perspectiva de integrar um grupo viajante, conhecedor de novas culturas, coloca aqueles que

aceitam tal força ilocucionária na direção do consumo. A nosso ver, esse tipo de mídia utiliza

a experiência cotidiana, no sentido de transformá-la em produto. Trata-se então de modalizar

o sujeito, reforçando o consumo através de um conhecimento que é transmitido também pelos

sentidos. Os anúncios oferecem a seus leitores contratos de comunicação que os seduzem a

participar de um cenário lúdico, montado, com fragmentos de experiências sugeridas pela

própria sociedade. Prado (2006) fala sobre essa fase do capitalismo cognitivo, por ancorar-se

nos saberes comuns:

Os programas cognitivos e estésicos dos meios de comunicação foram

fundamentais nessa direção, na medida em que oferecem mapas

organizadores do cotidiano dos públicos, baseados em uma tecnologização

progressiva (ou semiotização) dos discursos. No final do século XX, o

capitalismo midiático tinha desenvolvido um sistema perito de elaboração de

mapas cognitivos, herdeiro das linhas fordistas na indústria cultural,

constituindo uma efusiva e colorida corporação audiovisual – a identificação

do consumidor-espectador se faz pelo inteligível, pois se trata de propor

valores para diferentes posições de sujeito, por meio de contratos

comunicacionais: a mídia mapeia valores e modaliza para os leitores modos

de saber, fazer e de ser para consegui-los (a busca do sucesso, da beleza, do

prazer e da riqueza). Acoplados aos mapas cognitivos estão os dispositivos

“estésicos”, ou seja, dispositivos passionalizadores das mídias, que têm a

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função pragmática de fazer encarnar os discursos em seus públicos cada vez

mais específicos e segmentados. (PRADO, 2006, p. 21)

Essa forma de abordagem leva em conta traços cognitivos, interativos e

passionais. A utilização do emocional corresponde ao processo de sensibilização do

enunciatário, para despertar nele a vontade de aderência, via corpo, ao contrato. Sendo assim,

a publicidade explora seus recursos para sensibilizar, emocionar e comover o consumidor.

Esses dispositivos comunicacionais, com dicas de como ser mais feliz, como fazer a viagem

dos seus sonhos, como viver intensamente, aparecem figurativizados nos anúncios de

cruzeiros marítimos, construindo assim regimes de visibilidade em que se apresentam

somente o lado gostoso, em que modelos bonitos e jovens se incorporam nas personalidades a

partir de significantes da felicidade, do conhecimento e de novas aventuras. Esses anúncios

não param de criar cenários com figuras que retratam a experiência do consumidor e, nessa

direção, é interessante analisar como os discursos desse mercado direcionam os indivíduos

para a busca pelo consumo turístico, com base nesses dispositivos criados a partir do que é

desejado. Este mercado é, portanto, motivado por um consumidor atingido por inúmeras

imagens ligadas a experiências emocionais de consumo, e que é convidado a consumir sem

cessar, participando da invenção de novos significados de consumo e de vida, que o

capitalismo cuida de providenciar o mais rápido possível. Para Prado, “a mídia e a

publicidade constroem o mercado do gozo, em que os consumidores são instigados a

participar, a interagir e a querer viver as experiências descritas nos anúncios”:

O mercado, ancorado na cultura dos media e na publicidade, orienta, mapeia

a busca dos indivíduos a partir dos textos sincréticos imantados de apelos à

emoção e à percepção corporal, construídos pelos analistas-simbólicos,

especialistas nas tecnologias discursivas. (PRADO, 2008, p.7)

Estes enunciadores se dedicam à construção de contratos que fazem com que a

mídia funcione de modo performativo, convocando o enunciatário a querer viver as

experiências construídas com apoio dos especialistas. “Os enunciadores midiáticos, do

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marketing e da publicidade são sujeitos-supostos-sabedores que fornecem aos enunciatários o

saber, na forma de mapas, ou seja, receitas modalizadoras para as ações” (PRADO, 2008,

p.9). Estes contratos comunicativos utilizados pelos especialistas em turismo visam tornar

próximas as identificações com uma imagem vivencial trazida pelos anúncios, cenários com

apelo para o consumo. Para Prado, “O empuxo ao consumo é uma forma de modalizar a busca

por essa individuação privilegiada tomando por base uma apresentação passionalizada de

valores, ligados a marcadores culturais” (PRADO, 2008, p.10).

Portanto, enunciadores midiáticos de revistas segmentadas, especializadas em

turismo, oferecem, em seus anúncios, imagens e pacotes com valores para que seus futuros

consumidores alcancem a posição ideal apresentada no impresso. Esses anúncios fornecem

um discurso publicitário que mobiliza o outro para saber o que é aquilo, para o querer estar

naquele lugar e para o fazer, o comprar. Esse discurso é um bate e volta contínuo com o leitor,

sempre em busca de sua adesão. Sempre amparados nos valores da sociedade de consumo, os

anúncios promovem modalizações do seu leitor, construindo o argumento de que, comprando

a viagem proposta, o enunciatário conquistará seu objeto de valor. A partir dos valores da

importância da visibilidade midiática, os consumidores se identificam ao modelo que aparece

nas veiculações e aderem aos contratos como forma de penetrar nessa esfera de visibilidade,

que nada mais é que uma estratégia vendida periodicamente no discurso da revista Viagem e

Turismo. Sobre esses dispositivos, Zozzoli (in BARBOSA; PEREZ, 2007) afirma:

Dessa maneira, contribui para a instauração de modelos de produto, estilo de

vida e modo de consumo e para a venda de mercadorias produzidas em série,

que aparecem como dotadas de qualidades que as apresentam como

diferentes e detentoras de algum trunfo; algo que as torne e faça parecer, de

qualquer modo, únicas, ou quase únicas... Quase sempre invasiva, muitas

vezes lúdica, procurando surpreender e, até, por vezes, assumindo posturas

chocantes, a publicidade é diversa, onipresente na vida cotidiana com

mensagens efêmeras repetidas. (ZOZZOLI, in BARBOSA; PEREZ, 2007,

p.33)

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Conforme Zozzoli, a publicidade se direciona para as consciências coletivas e

individuais, procurando divulgar, transmitir, convencer e participar efetivamente do reforço

ou da instauração de necessidades” (ZOZZOLI, in BARBOSA; PEREZ, 2007 p.33). Ela

objetiva influenciar atitudes, e não somente transmitir dados a respeito de um produto ou

serviço. A publicidade turística procura antes de tudo ser atrativa e sedutora e apela à emoção.

Quando, por exemplo, a MSC propõe que “Varanda com vista para o mar é para poucos –

Mais uma lenda que a MSC manda por água abaixo”, ela se apresenta como capaz de fazer o

destinatário aceitar que é possível viajar de cruzeiro e ter uma bela vista para o mar, que isso

pode ser realidade. O enunciador promove um regime de manipulação e o enunciatário adere

ao contrato e descobre que pode conquistar tudo isso, contanto que compre o pacote como

prescrito no anúncio. Para alcançar a aceitação dos enunciatários, a empresa precisa se

demonstrar capaz de realizar positivamente as suas convocatórias. Ou seja, nos anúncios

turísticos, para a empresa veiculadora do anúncio ser reconhecida como aquela que realizará o

seu sonho da viagem euforizada, o enunciador deve construir uma imagem similar à

idealizada pelas reportagens de Viagem e Turismo. Por meio da interpelação, os sujeitos são

chamados à ação, conforme os anúncios apresentados, neste caso da Royal Caribbean, “Aqui

você é o Rei”, que faz com que cada sujeito incorpore a palavra e queira ser rei, afinal, quem

não quer? O discurso do enunciador sai das páginas da revista e ganha o desejo dos

enunciatários. Sobre essa interpelação, Prado coloca que “é a parte da convocação que,

iniciada pela palavra de ordem, chama a pessoa no meio do mundo, constituindo, em ato, o

sujeito de cada discurso” (PRADO, 2009, p.216).

Nos discursos dos anúncios da terceira fase, a passionalização aparece como

estratégia para a construção de uma identificação singular com o enunciatário. As empresas

propõem, em seus discursos prescritivos, que o consumidor pode e deve construir sua viagem

euforizada por meio de alcançar os lugares expostos nos anúncios. Espetacularizando a

experiência da viagem retratada, o enunciatário ganha projeção pela associação à felicidade

presente no sentido construído do anúncio. Por meio de frases imperativas, os anúncios

deixam pouco espaço para questionamentos, pois aquilo é o que realizará o desejo do

leitor/consumidor. A circulação do discurso carrega o significado, contendo os simbolismos

do produto. O mundo de aparências da publicidade faz da viagem euforizada um meio de

expressão de uma promessa de satisfação, que reflete os desejos de seus potenciais

compradores. Podemos dizer que hoje é a troca de sentido, o significado para o atual modo de

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viver que é valorizado e, para dar um sentido a uma mercadoria por meio do desenvolvimento

de campanhas publicitárias, faz-se necessário conhecer o caminho do significado. E, para este,

é fundamental saber interpretar as propostas do produto, identificando os pontos de contato

que farão o público reconhecer algo que ele valoriza e que se destaca da concorrência.

Considerações Finais: A viagem ao cosmético e ao luxo

Cada público-alvo de uma campanha publicitária a ser desenvolvida é analisado

por suas similaridades, sejam elas comportamentais, políticas, psicológicas ou qualquer outra

característica. Seus integrantes estão conectados por possuírem gostos parecidos, que os

potencializam como um conjunto, logo, a produção publicitária é desenvolvida de acordo com

a mediação entre o interesse do anunciante e o interesse pelo fortalecimento do consumo

desse certo grupo. Conforme Zozzoli:

Vimos que a atividade publicitária consiste em conhecer o consumidor e os

modos de se comunicar com ele. Ela encontra embasamento nas mais

diversas teorias propondo, ao amalgamá-la intuitivamente ou sob forma de

modelos com base em relato e analise de experiências refletidas, em

entendimento de como proceder para idealizar campanhas e planejar

estratégias de mídia e, principalmente criar anúncios. (ZOZZOLI, in

BARBOSA; PEREZ, 2007, p.33)

A publicidade se constrói no cotidiano social, todavia, não podemos deixar de

perceber que, na sociedade atual, ela nos é introduzida diariamente pelos dispositivos

midiáticos, estes com interesse minucioso na conservação da superioridade de seus critérios.

Zozzoli ainda afirma que a publicidade exagera qualidade e prazer e tende a apagar os

defeitos. “Ela exerce uma função ‘cosmética’ e lúdica ao retirar os produtos do anonimato

para dar-lhes vida própria. Ao prometer o fim do ‘tédio’ com o uso do produto anunciado, ela

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gera uma associação subliminar de bem-estar” (ZOZZOLI, in BARBOSA; PEREZ, 2007,

p.38).

Se um anúncio de um produto turístico apresenta uma paisagem maravilhosa, a

figura de uma pessoa bonita, um casal apaixonado, ou crianças brincando felizes, é porque

esta publicidade mostra um cenário euforizado, pois apresenta maior aceitação dentro do

padrão proposto. Campanhas publicitárias que não seguem os padrões propostos para tal

mercado estão, em geral, condenadas ao fracasso. Mesmo sabendo que o cotidiano de nossas

vidas não é um mar de rosas, e que nem todos os seres humanos são bonitos ou felizes, estes

anúncios, considerados “fora do padrão”, não possuem o privilégio de serem veiculados neste

mercado, pois a publicidade turística é um espaço para aqueles que precisam sentir que estão

associados ao padrão do que é ideal, sentir que estão inseridos na aprovação social. Pelo

menos isso é o que a publicidade considera. O enunciador é reconhecido por ter conseguido

atingir simbolicamente o sujeito, fazendo com que ele sinta emoções e deseje estar naquele

lugar impresso no anúncio. Contudo, essa busca por conseguir atingir o enunciatário é sem

fim, pois o padrão ideal é movediço. A publicidade precisa seguir na mesma velocidade a

versatilidade dos modelos de vida criados pela sociedade, para não perder a posição de

sedutora. Portanto, a publicidade, principalmente a que trabalha o turismo, é mutável, e essa

expansão de anúncios em revistas especializadas é consequência da transformação do

cidadão/turista em consumidor de mídias. Bauman nos diz que, num mundo em que coisas

deliberadamente instáveis são matérias-primas das identidades, “é preciso estar

constantemente em alerta; mas antes de tudo é preciso manter a própria flexibilidade e a

velocidade de reajuste em relação aos padrões cambiantes do mundo ‘lá fora’” (BAUMAN,

200, p.100). Para Prado:

As questões que implicam em modalizações de ser, de saber, de fazer, de

poder, não são formatadas somente a partir da informação jornalística, mas

“segundo regimes de visibilidade e de atenção, ancorados em fortes

estratégias de passionalização” (PRADO, 2009, p.2).

A busca do encontro com o desejado aparece neste sujeito contemporâneo como

uma grande busca infinita. E esta procura por se saciar é aproveitada pelos media, que

figurativizam modelos de felicidade, de satisfação a serem seguidos, baseados na compra do

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produto em questão. Com estes anúncios, os sujeitos podem encontrar mais facilmente a

satisfação de seus desejos. Os seres “desejantes”, como vimos, constituem um interessante

nicho para o mercado publicitário e com comunicações voltadas a este segmento, os media

interpelam estes sujeitos com estratégias convocatórias que prometem exatamente o que o

sujeito procura.

Nos capítulos anteriores, vimos como os discursos midiáticos deste mercado

costumam euforizar o que é ligado ao turismo. Entretanto, as opções oferecidas, apesar de

apresentarem motivação na realização de um desejo, prendem o indivíduo cada vez mais às

amarras do mercado. Apresentando o consumo passionalizado nos anúncios, promove-se uma

ilusão de que, através de escolhas, o sujeito tem plena liberdade para comprar e conseguir o

que quer ser, viver, sentir, enfim, de se sentir satisfeito, com o desejo realizado de ser feliz,

livre e aventureiro em suas viagens. Conforme coloca Prado (2008):

Temos agora um mercado motivado pelo consumidor, que, bombardeado

com tantas imagens e textos sincréticos ligados a experiências emocionais de

consumo, é convidado a gozar sem limites (PRADO, 2008, p.92)

Portanto, cada sujeito busca conquistar esse gozo, e essa busca é ininterrupta,

posto que o padrão mudará assim que o desejo se realizar. Então, guiado pelo consumo, o

indivíduo é freneticamente convocado a viver em plena busca do gozo. A felicidade alcançada

através do consumo e o gozo prometido tornaram-se cada vez mais efêmeros, e são

modificados segundo as exigências do mercado. Vimos, então, que o discurso do capitalismo

contemporâneo se interessa por demais em destacar o gozo almejado pelos consumidores.

Como coloca Prado (2008), esse capitalismo se interessa pelo consumo como “vivência

primordial”, em que a relação com o consumo passa a ser muito mais íntima e emocional

(2008, p. 93). Os desejos turísticos se materializam rapidamente nos cenários construídos para

as campanhas que, por meio da publicidade, oferecem ao consumidor satisfação dos

sentimentos. E, como vimos com Fontenelle (2004), sobre o mercado da experiência, esse

consumo promete não mais a mercadoria pura e simples, mas experiências lúdicas e afetivas,

sob a perspectiva da aventura. Assim, quando são apresentadas figuras nos anúncios, o que

está à venda não é apenas um pacote turístico, mas sim a “experiência” retratada. Por isso, os

discursos midiáticos apresentam os predicados sensíveis das mercadorias. Regido pela

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imagem e aprisionado pelo próprio consumo, na ânsia de obter a satisfação plena, o homem se

torna refém da reconstrução contínua de seu sonho de viagem, a cada edição da revista. Para

melhor seduzir os consumidores, os anunciantes passaram a se utilizar de estratégias de

aproximação com aquilo que é desejado e o expõem em seus anúncios.

A passionalização associada simbolicamente ao consumo aparece, então,

figurativizada nos anúncios de cruzeiros marítimos. Como vimos nas análises da terceira fase,

a publicidade exerce um poderoso papel em uma sociedade imagética e, com as mudanças

econômicas e sociais do século XX, os aparelhos de comunicação ganharam enorme

importância no imaginário coletivo. Assim passaram a intervir em um mercado no qual os

argumentos passionais conquistam mais o consumidor do que qualificações dos produtos. Por

sua vez, os consumidores compram para associar-se a um universo simbólico. Vivemos numa

época onde o desejo é concebido como algo que se busca realizar e, na busca por tal

realização, nos deparamos com a substituição por outros desejos. Dessa maneira, parece-nos

que o desejo é pensado como um dos balizadores da vida cotidiana. Porém, sabemos que

encontrar a satisfação que nos realizaria completamente é do nosso ponto de vista, impossível.

O desejo se colocou como uma perspectiva simbólica de organização do homem. Adquirir

algo, hoje, é encontrar resposta para a pergunta: qual o diferencial simbólico, afetivo e

emocional para que se compre esse, e não aquele, produto ou serviço? O produto, neste caso,

nada mais é do que um meio de acesso ao que ele representa, portanto ao que ele,

semioticamente, transmite aos nossos sentidos. Para compartilhar os mesmos assuntos de

interesse do leitor, a passionalização aparece, então, como argumento no intuito de que haja

aceitação do contrato de comunicação estabelecido. Os anúncios analisados figurativizam

elementos constitutivos do imaginário do leitor de Viagem e Turismo. Assim, apresentar os

cenários euforizados é contemplar um modelo desejado pelo próprio leitor. Como empresas

experientes no mercado, elas oferecem ao enunciatário a solução para realizar a viagem dos

seus sonhos. A construção simbólica da felicidade, da realização de um desejo ao comprar a

viagem construída nos anúncios, é assimilada pelo leitor como sendo seu modelo de viagem

perfeita.

O objetivo principal desta pesquisa foi investigar os procedimentos enunciativos e

efeitos de sentido dos anúncios de cruzeiros marítimos da revista Viagem e Turismo, como

também verificar como estes enunciadores constroem as figuras das viagens, tematizadas,

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convocando o enunciatário a participar de cenários imaginários. Conforme dissemos, Rifkin

afirma que o uso das experiências de vida dos indivíduos da pós-modernidade atingiu

significativamente tanto a forma como os enunciadores constroem seus anúncios, quanto

como seus leitores recebem as mensagens. E o homem pós-moderno “busca constantemente

novas experiências vividas. As novas indústrias culturais, por sua vez, estão criando um

número quase infinito de scripts para representar as experiências de vida” (2001, p.173).

Para apurar esta afirmação, nos interessamos em analisar, no primeiro capítulo do

trabalho, a relação entre consumo e mídia na contemporaneidade, investigando as estratégias

mercadológicas que buscam construir sentidos a partir de percursos passionais e afetam

diretamente a posição dos enunciadores na construção de identidades dos sujeitos da

contemporaneidade. O segundo passo da pesquisa consistiu na avaliação crítica das narrativas

da revista Viagem e Turismo, buscando a investigação dos elementos que constituem sua

construção simbólica, para assim compreender os contratos de comunicação dos anúncios de

cruzeiros marítimos presentes nessa publicação. Com este estudo, pudemos confirmar que a

publicidade adotou a estratégia de salientar o seu poder de persuasão, mas voltado para os

apelos emocionais.

Para que as pessoas compram “textos” principalmente de revistas e da

televisão? A resposta não é “para se informar”, mas: para se enquadrar, ao se

informar, para se localizar, para ter narrativas de enquadramento no mundo,

para saber qual é o meu mundo, como ele funciona, como eu posso pertencer

melhor a esse que já é o meu mundo. Que realidade é essa à qual pertenço e

devo pertencer como ser e devir que sou? Como eu me transformo para

melhor ser esse que eu gostaria de ser? Como entendo melhor o mundo? Tais

questões implicam em modalizações de ser, de saber, de fazer, de poder,

modalizações tais que não são formatadas somente a partir do dado bruto da

informação jornalística, mas segundo regimes de visibilidade e de atenção,

ancorados em fortes estratégias de passionalização, ou seja, no apelo

passionalizado para captar a atenção do leitor (PRADO, 2009, p. 2).

Viagem e Turismo se posiciona como um guia, modalizando seu enunciatário, a

fim de formar o leitor/consumidor ideal, construído pelo capitalismo globalizado, desejoso

por novas experiências culturais. No terceiro capítulo, analisamos os regimes de produção de

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sentido na construção dos anúncios de cruzeiros marítimos, a partir dos regimes de

visibilidade atuantes nos contratos de comunicação das peças publicitárias escolhidas.

Observamos como os anúncios se categorizam em temáticas relacionadas à passionalização da

narrativa sobre a viagem e como dispõem os regimes de visibilidade para os enunciatários,

compreendendo assim os processos cotidianos que envolvem a socialização do indivíduo para

o consumo. Concluímos também, no percurso de nossa pesquisa, que a mídia utiliza-se dos

aspectos sensoriais para construir programas modalizadores para o consumo. Nesse sentido,

vale fazer um paralelo com o que Lipovetsky afirma sobre o consumo: “Jamais se consome

um objeto por ele mesmo ou por seu valor de uso, mas sim em razão de seu valor de troca de

signo” (1989, p.171).

A maior parte dos anunciantes de turismo depende das classes média e média alta

para vender seus roteiros; 87% dos leitores de Viagem e Turismo correspondem a essas

classes. Ambos os grupos, principalmente a classe média, em crescente desenvolvimento em

nosso país, passam por grandes mudanças econômicas, tendo em suas mãos o poder de

consumo, seja de produtos, serviços ou estilos de vida. Como afirma Rocha, “Em cada

anúncio vendem-se estilos de vida, sensações, emoções, visões de mundo, relações humanas,

sistemas de classificação, hierarquia” (1995, p. 27). Para ele, os esforços publicitários de bem

posicionar os produtos no mercado simbólico vão na direção de fazer com que o consumidor

esteja o maior tempo possível em interação positiva com as marcas. É com grande interesse

nesse mercado crescente que os anunciantes dessa área desenvolvem suas campanhas

publicitárias, propondo elementos simbólicos para garantir a venda de determinado produto,

marca ou serviço.

Conforme as teorias desenvolvidas na pesquisa, Lipovetsky (1989, p.231) afirma

que a mídia “é reestruturada implacavelmente, precisando exibir novos encantos, imaginar

novas apresentações e novas fórmulas de prender a atenção”. Ele ainda sustenta, no livro

Felicidade Paradoxal (2007), que o consumidor pós-moderno é frágil, sedento por novas

formas de interação social, vive em uma busca incessante pela felicidade e jamais desistirá da

possibilidade de tentar controlar sua própria felicidade. Por este motivo, pudemos verificar

que o mercado investe em diferentes tipos de representação de felicidade, construindo

identidades e multiplicando, assim, a criação de figuras e temas persuasivos e/ou

passionalizadores. Contudo, não é de hoje que as revistas segmentadas são motivo de estudo,

e vários autores já constataram que elas se posicionam como donas do saber, tentando

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representar no imaginário de seu leitor uma mídia confiante, que sabe o que é melhor para seu

leitor e dita regras para se conseguir o que deseja. Este processo mostra que ao atualizar seu

discurso e expor narrativas sobre um consumo desejado, expressando identidades e

comportamentos, buscando orientar os leitores a ter um modo de vida que os faça sentir a

necessidade de certos produtos, Viagem e Turismo encontrou enunciatários que também

procuram interpelar pelo lado emocional e sensorial e dão a devida importância para a

elaboração da imagem na construção da mensagem do anúncio.

Ao analisar o discurso da revista Viagem e Turismo, verificamos que ela mostra, a

todo o momento, como outras revistas segmentadas, que apresenta uma relação de confiança

com seu enunciatário. Para provar sua idoneidade, ela se compromete a mostrar em seus

textos que é uma publicação isenta de convites, que escreve o que quer, vai atrás da

confirmação e merece credibilidade por meio da comprovada participação de seus repórteres e

leitores. Ela trabalha para a segurança e o bem-estar do leitor. Para informá-lo, mas também

para mostrar a ele o mapa dos prazeres de viagem. A revista ainda criou reportagens onde os

leitores participam das viagens e entram no texto, dizendo se aprovaram ou não, e dando dicas

e sugestões – nessa parte, o leitor tem o poder, que lhe é dado pela revista, confirmando,

assim, que existe seu espaço dentro da publicação. O contrato de comunicação de VT valoriza

esse espaço para o enunciatário, sugerindo que se fuja à padronização de roteiros

completamente pré-determinados descritos por seus repórteres e que se deixe lugar para o

inesperado e, principalmente, se partilhe esse inesperado (realizado por seus leitores) com a

grande comunidade de leitores-viajantes. No sentido de valorizar ainda mais as experiências

vividas por seus enunciatários, a revista publica, na seção “Viajantes”, as palavras dos

enunciatários sobre diferentes viagens, colocando-os na posição de especialistas, por terem

algo a dizer sobre suas experiências. Na verdade, a revista convida o leitor a gozar,

instigando-o por meio de aspectos sensoriais.

Os dispositivos buscam capturar a atenção, motivar a felicidade, a resposta

ativa do consumidor em sua força de ouvidor, de seguidor de valores de

consumo, de repercutidor, de consumidor. O enunciador, para se fazer ouvir,

trabalha o texto em sua força de apelo, de interpelação, de narrativa

carregada de sentidos ligados ao mundo cotidiano; para se fazer seguido,

constrói enquadramentos a partir de sua força de autoridade de sabedor.

(PRADO, 2009, p. 4)

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Na análise dos anúncios de cruzeiros marítimos, consideramos que essa

atualização, que orienta os indivíduos para a ação do comprar, do viver, do realizar, utiliza

programas modalizadores baseados em experiências vividas como principal força motriz.

Como vimos, esse processo ocorreu a partir do desenvolvimento de três fases: a primeira fase

é a da publicidade como informação; a segunda fase é a do aparecimento do corpo do

consumidor, ligado ao consumo dos modelos identitários; e a terceira fase é a da

passionalização da narrativa sobre a viagem, que torna a experiência o centro principal do

contrato de comunicação – e em que a imagem construída no anúncio é atrelada à estética da

mercadoria, que traz a viagem como experiência estésica.

Para Fontenelle (2004), o apelo aos aspectos sensoriais e a experimentação das

sensações através das imagens que ofereçam entretenimento e cultura apelam diretamente ao

emocional/passional: “é a experiência sensorial que define o que é válido, os serviços têm que

emocionar, fazer crer que se vive uma experiência profunda e autêntica” (2004, p. 196). Os

anúncios passionalizados das empresas turísticas, observados na terceira fase, são resultado do

fato de a publicidade turística atualizar seu discurso e seus programas modalizadores a partir

das experiências de vida, no sentido de convertê-las em produto, focando a argumentação

persuasiva não apenas para o consumo de bens materiais, mas também para o consumo de

bens simbólicos. Também se examinou o incentivo do consumo do imaterial através das

temáticas exploradas e as formas pelas quais a passionalização da narrativa é desenvolvida

nas várias fases dos anúncios. Este tipo de anúncio ganhou espaço nos media por estar sempre

representando o que o homem contemporâneo deseja vivenciar, novas experiências. E, para

apenas para demonstrar um fechamento dessa terceira fase, vemos a seguir o anúncio da

“Costa na Europa”. Este se coloca como exemplo imprescindível de formas de outras

realidades, de conhecedor de tudo. O anúncio constrói um sentido de fazer crer que o

enunciatário concretizará seu desejo baseado na experiência do enunciador. Um mesmo

anúncio euforiza vários lugares do mundo, afirmando que estas imagens dão um tipo de

acesso a um novo mundo.

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FIGURA 22: Anúncio da Costa Cruzeiros “Costa na Europa” - Viagem e Turismo, abril de 2008

Quando a publicidade segue o caminho de emocionar o consumidor, ela se guia

pelos valores da euforia e o material publicitário busca influenciar o consumidor, acentuando

euforicamente em seu conteúdo o humor, o entretenimento e a sensibilidade. Portanto,

podemos afirmar que os programas modalizadores aplicados nos anúncios turísticos, mais

especificamente nos de cruzeiros marítimos, utilizam-se de experiências para despertar o

interesse do público, cada vez mais saturado de informações. Nesta direção, vimos que

estabeleceu-se um vínculo entre o discurso publicitário turístico e o consumo do imaterial,

criado pelo material simbólico expresso nas narrativas publicitárias e que, logo, por meio da

produção das campanhas publicitárias, cria e mantém signos colados às mercadorias como

marcadores de identidades vinculados a estilos de vida. Por isso, é interessante aproveitar este

espaço final para explicar algumas das razões da tendência de explorar o conteúdo

passionalizador. Uma das possibilidades é a necessidade que enunciatários possuem,

mercadologicamente, de não deixar seus anúncios passarem sem serem notados, ficarem fora

de moda, ou fora do que o indivíduo contemporâneo quer ver. Como dissemos no início do

estudo, antigamente a publicidade explorava predominantemente os atributos tangíveis dos

produtos. Apresentada com argumentos racionais, a informação era o vetor predominante para

convencer o público. Nas últimas décadas, todavia, o apelo publicitário às emoções, aos

benefícios sensoriais capazes de levar o púbico à identificação com um determinado estilo de

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vida, se tornou prevalente. Todo o processo precisa estar em constante movimento,

desenvolvendo-se de acordo com o tema atual, para não cair no isolamento mercadológico.

Com Prado (2008, p.2), então, pudemos identificar um dos motivos para a tendência acima

apontada:

Com o fim de universalizar o consumo advindo com a sociedade não-

repressiva, tal subsistema constrói regimes de visibilidade e de interação, em

que se apresenta somente o lado glamuroso da arte de se equilibrar num chão

movediço, que brilha nos corpos soltos, bonitos, jovens, rejuvenescidos e

turbinados, preocupados em cuidar da qualidade de vida, de beleza, da saúde

e dos prazeres efêmeros, ou que se incorpora nas personalidades

discursivizadas a partir de significantes do sucesso e da riqueza e em seus

emblemas. (PRADO, 2008, p. 2)

Como vimos nas análises dos anúncios selecionados, o discurso desenvolvido é

compatível com a lógica do consumo em que a revista está inserida. Além de representarem

as imagens desejadas pelos leitores, os anúncios aparecem em Viagem e Turismo como

sonhos realizáveis, como se concretizá-los fosse a coisa mais fácil do mundo.

Conforme Charaudeau (2006), para que haja adesão ao contrato de comunicação

estabelecido entre enunciador e enunciatário, é necessário haver sempre assuntos de interesse

do público-alvo. Assim, a figura passionalizada da viagem jamais poderia faltar nas páginas

publicitárias de Viagem e Turismo. Estes cenários, construídos nas campanhas pelas empresas

de cruzeiros, sensibilizam o sujeito e tentam persuadi-lo à compra, portanto, a maior

preocupação deste anunciante é ser reconhecido como a empresa mais confiável e capaz de

realizar os sonhos dos futuros viajantes, mesmo que para isso seja necessário representar

cenas espetaculares.

Enfim, é muito mais eficaz para o enunciador atual veicular anúncios que

envolvam imagens que demonstrem uma experiência vivida, passionalizada, euforizada. O

interesse no discurso publicitário das empresas de cruzeiros marítimos deu-se principalmente

para compreender a dimensão simbólica das campanhas publicitárias desenvolvidas por esse

ramo econômico, que cresce a cada ano, e desvelar seus efeitos cognitivos, interativos e

emocionais. A reflexão aqui proposta procurou situar a publicidade turística como um

fenômeno complexo, intimamente ligado a questões da sociedade, da cultura e da economia.

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Pudemos constatar que o conceito da comunicação publicitária parte do fato de que, para

tornar um produto ou serviço aceito pelo mercado, o enunciador deve dirigir as mensagens a

um grupo de enunciatários carentes dessa modalização, seja ela predominantemente

informativa ou passional; desta forma, é necessário conhecer suas características, descrever

peculiaridades que definam suas especificidades e, finalmente, estudar o modelo que permita

reproduzir, adequadamente, os elementos que nela intervêm. A publicidade é vista, portanto,

como uma construção discursiva decorrente da tensão entre interesses econômicos e valores

simbólicos. Estes valores simbólicos apresentam aspectos cognitivos, interativos e

emocionais, e geram a produção de sentido e conhecimento, atuando junto aos consumidores,

tentando convencê-los a comprar. O importante é fazer com que o consumidor não apenas

atente para o que lhe é oferecido abertamente, mas, principalmente, se sensibilize e confirme

sua adesão.

Ao longo da pesquisa, tivemos a confirmação de que a publicidade age como um

agente articulador de sentidos, consequência da utilização de estratégias específicas,

configuradas discursivamente e representadas sob diversas formas. Coube a nós, em nossa

investigação, reconhecer essas tensões, que, em conjunto, são responsáveis pela construção,

circulação e reconhecimento dos sentidos e dos significados produzidos pela publicidade.

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