a chave da teosofia (1889)

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ÃcruMe vya Te052rJÃ

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Autora: Helena Petrovna Blavatsky. Obra editada em 1889.

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ÃcruMevyaTe052rJÃ

H.P. BLAVATSKY

M

Título original: The Key to TheosotthyO The Theosophical Publishing House, 1972

Digitalizado por:

Os filhos de Hermes

INTRODUçÃO

A VERSÃO PARCIAL

Os termos Teosot'ia e teosófico foram introduzidos novocabulário da cultura ocidental do séc. XIX após a fun-dação da Sociedade Teosófica em Nova Iorque, em 1875.Porém, durante os primeiros anos de existência da Sociedade,pouco se f.ez quer para tentar definir esses termos, qìterpara esclarecer o seu verdadeiro significado. As primeirasexposições, tanto escritas como orais, feitas pelos dois prin-cipais fundadores da Sociedade, H. P. Blavatsky e H. S.

Olcott, concentraram-se sobretudo na reintrodução no pen-sarnento mundial duma sabedoria antiga cujo fio de ourose podia seguir ao longo de culturas, civilizações e épocassucessivas. A primeira obra de Mme. Blavatsky, Ísis sentV,óu, publicacla apenas dois anos após a fundação cia Socie-dade, é precisamente um compêndio volumoso de factos cteorias fiiosóficas, religiosas, científicas, mitológicas, aleg6-ricas e simbólicas em qÌÌe se dernonstra que a tradição doocultismo remonta à mais clisiante antiguidade. A sua obraprincipal, A Doutína SecreÍa, publicada em lB88, é umaexposição exttemamente completa dos principais ensina-mentos da filosofia esotórica tanto no que diz respeito àCosmogénese como à Antropogénese, ou seja, as origens cinfluências das leis universais na natureza e no homem.

O aparecimento da abra A Chave da Teosofia em 1889,

A CTTAVE DÁ TEOSOFIÁ

um dos dois últimos livros ds H. P. Blavatsky publicadosdurante a suÍÌ vida (o outro foi A Voz do Silêncio, umaobra constituída por excertos de <O Livro dos Preceitos deOuron, um tratado místico na linha ctro Budismo Mahayana,traduzidos por Mme. Blavatsky), ofereceu tanto à SociedadeTeosófica coÍno ao mundo em geral um extenso documentobásico sobre aquilo a que um dos primeiros críticos daobra chamou ((a anatornia e fisiologia da Teosofia) (*).H. P. B. (assim era conhecida Mme. Blavatsky) tinha semdúvicla consciência da necessidade que havia cle publicar umaobra simples mas completa destinada a expor os ensinamen-tos da Sociedade Teosófica (**), e ainda a corrigir os nume-rosos equívocos que haviam surgido quanto ao objectivo daSociedade e à filosofia teosófica. Uma vez que H. P. Bla-vatsky fora ern grande parte responsável pela introduçãodessa filosofia no pensamento ocidental, e considerando queafirmou sempre ser apenas um simples porta-voz de adeptosorientais que considerava seus mestres, sabia melhor do que

TNTRODUÇ,4O À VERSÃO PARCTAL

ninguém quão grandes eram os equívocos que haviam surgidoà volta da filosofia teosófica. FI. P. Blavatsky conhecia me-lhor do que ninguém os insultos injurÌosos dirigidos contraa jovem Sociedade de que ela era um dos fundadores, poisa maioria desses insultos dirigiam-se a ela mesma.

Com o aparecimento de A Cha,-e da Teosofía o termo<Teosofia> foi utilizado pela primeiïa yez desde a fundaçãoda Sociedade no título dum livro. A natureza da obra e,irnplicitamente, o seu objectivo, encontravam-se clescritosno subtítulo: <<IJma exposição clara, sob a forma de perguntase respostas, sobre Etica, Ciência e Filosofia, para cujo estudoa Sociedade Teosófica foi fundada.> A forma adoptacla pelaautora adequava-se muito especialmente às necessidades quedeviam ter existido na altura, pois o interrogador fictíciopunha precisamente as questões em que se baseavam grandeparte dos equívocos e dos ataques contra a Teosofia e osobjectivos da Sociedade.

H. P. 8., então a viver em Londres, reunia à sua voltaum grupo de membros que, como alunos conscientes dosprofundos conhecimentos e extraordinária capacidade da suamestra, a assediavam com perguntas acerca da Religião--Sabedoria, expressão frequentemente utilizada paÍa designara Teosofia. Sabia, portanto, em prirneira mão, a necessidadeque havia entre os estudantes de Teosofia de se proceder auma exposição sistemática desta filosofia. Assim, o seu livroera não só uma resposta aos críticos da Sociedade, como umaanálise clara, concisa e compreensível dos próprios princípiosfundamentais da Teosofia. O livro é hoje, tal comona altura em que foi publicado, a resposta clássica tantopara aqueles que clesejam compreender o sistema <religioso--filosófico-cósmico-ético)) que é a Teosofia, como para aque-les que apenas desejam deturpar a verdade desse sisterna oudenegrir a Sociedacle que serve de veículo à sua expressão.Não há obra, anterior ou posterior a esta, que melhor definao objectivo único da Sociedade, ou em que a tarefa da Socie-dade e sua eventual evolução esteja mais bem delineada.

(*) A publicação da obra Builismo Esotérico, de A. P. Sinnett,um dos primeiros membros e figura destacada da Sociedade Teosó-fica, depois de os seus fundadores terem ido para a Índia, deve serconsiderada efectivamente a primeira exposiõão descritiva da filo-sofia teosófica per se. Editada em 1883, esta obra reúne ensina-mentos e informações de cartas notáveis conhecidas pelo nome de<Cartas de Um Mahatma>. Lamentavelmente, porém, o título daobra de A. P. Sinnett levou muita gente a pensar que a Teosofianão passava duma nova forma da religião conhecida por Budismo,equívoco que H. P. Blavatsky esclarece em A Chave da Teosofia.

(**) Por <ensinamentos da Sociedade Teosófica>> não se deveráentender que a Sociedade impõe dogmas ou exige fé dos seusmembros. O nome da Sociedade, como muitos têm defendido,implica antes um objectivo que não se encontra expressamentemencionado nos Três Objectivos oficialmente estabelecidos pelaorganizaçáo, nomeadamente a exposição de uma filosofia denomi-nada Teosofia. Poderá dizer-se que a Sociedade defende esta expo-sição, mantendo simultaneamente uma plataforma de inteira liber-dade de pensamento em relação a todos aqueles que se dedicam aoestudo da sua doutrina ou se filiam nela. Assim, tal como H. P. B.salientou em A Chave da Teoso ía, a Sociedade não é nem dogmá-tica nem sectária, <foi formada para ajudar os homens a cornpreen-derem que a Teosofia existe e para os ajudar a ascender a elaatravés do estudo e assimilação das suas verdades eternas)),

IO TI

A CHAVE DA TEOSOFIA

Qual o motivo, então, de uma versão parcial, se o livro<ensina a anatomia e fisiologia da Teosofia>? O motivoreside apenas no facto de a obra original conter nulnerosascitações e referôncias a opiniões bastante generalizadas naépoca de H. P. 8., e o leitor interessado que pretenda chegarrapidamente ao fundo da Teosofia talvez se sentisse frus-trado pelas inúmeras passagens que apenas encobrem essa

<anatomia>. Fez-se, portanto, um esforço no sentido de eli-minar aquilo que não era essencial, incluindo referências quejá não vêm a propósito, citações que perderam importância,e argumentos que pouco ou nenhurn significado tôm parao leitor actual. A Versão Parcial baseia-se na edição ori-ginal de 1889, cujo texto integral se encontra à venda; nãose fizeram quaisquer alterações ao texto, interpolações oucomentários interpretativos. Incluem-se, no entanto, algumasnotas do editor, inequivocamente assinaladas, destinadas aexplicar certos termos que têrn hoje em dia um significadomuito diferente claqueie que lhes era atribuído no séculopassado. O único propósito que presidiu à preparação dapresente Versão Parcial foi proporcionar ao leitor um tra-balho que reunisse duma forma directa os ensinamentos fun-damentais da Teosofia tal como foram apresentados peloseu mais notável expoente, H. P. Blavatsky, tentando simul-taneamente conservar o tom, a força e a qualidade vital dotrabalho original.

As chaves destinam-se a abrir portas. A Teosofia tem sidopara muitos milhares de pessoas a chave que abriu as portasdo espírito e do coração, descobrindo-lhes horizontes insus-peitados de sabedoria e compreensão. A Teosofia foi paraessas pessoas a chave que ihes permitiu chegar aos tesourosdo espírito iluminado, os tesouros do amor e da compaixão,que, quando partilhados, levam ao Tesouro Supremo, a Fra-ternidade Universal. Porém, ter a chave não basta; parachegar aos segredos do conhecimento, para abrir as portas da

compreensão, para libertar as jóias da compaixão, é precisodar a volta à chave. Se esta Versão Parcial dum clássico

INTRODUCÃO À VERSÃO PÁRCIAL

de todos os tempos, A Chave da T'eosotta, levar novos estu-clantes a tentarem abrir as postas que conduzem à sabedoria,a utilizarern o conhecimento em benefício da humanidade,terá desempenhado um papel extremamente Írtil.

.loy Mills

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PREFÁCIO

O propósito deste livro encontra-se claramente expressono seu título, (A CHAVE DA TEOSOFIA>>, e não sãoprecisas muitas palavras para o explicar. Não se trata dumcompêndio completo ou exaustivo de Teosofia, mas apenâsde uma chave para abrir a porta que poderá levar a umestudo mais profundo da matéria. Esboça em traçcs largosa Religião-Sabedoria, explicando os seus princípios funda-mentais; tenta simultaneamente responder às diversas objec-ções levantadas pelo homem ocidental médio interessado eapresentar, duma folma simples e numa linguagem tão claraquanto possível, conceitos pouco conhecidos. Seria, no en-tanto, espemr de mais que este livro conseguisse tornar aTeosofia inteligível sem um esforço mental sério por parte doleitor, mas espera-se que a obscuridade que possa subsistirapós uma leitura atenta se deva ao pensamento em si e nãoà linguagem, à profundiciade do assunto e não à falta declareza. Para aqueles que sofrem cle preguiça mental ou sãode compreensão lenta, a Teosofia continuará a ser, neces-sariamente, um enigma, pois no mundo mental, tal comono mundo espiritual, o homem só pode avançar pelo esforçoìnclividual. O autor nãu pode pensar pelo leitor, e, ainda queisso fosse possível, este não tiraria daí qualquer benefício.

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A CTT/IITE DA TEOSL)FIÁ

O autor agraclece calorosamente aos numerosos teósofosque lhe enviaram silgestões e perguntas, ou que de qualquermoclo contribuíram para a redacção deste livro. A obra será

sem dírvida mais úrtìl graças ao seu auxílio e será essa amelhor recompensa que poderiam receber.

H.P"B

A TEOSOFIA E

I

A SOCIEDADE TEOSOFICA

SIGNIFICADO DO NOME

Pergunta. Muitas pessoas afirmam qlle a Teosofia e assuas doutrinas são uma nova religião actualmente em voga.Pode clizer-se que a Teosofia é uma religião?

llss:posta. Não. A Teosofia é o Conhecimento ou Ciên-cia Divina.

P. Qual é o verdadeiro significado do termo Teosofia?R. <Sabedoria Divina>>, Qecooaía (Theosophia) ou Sabe-

cloria dos deuses, corno \eoyoríw (theogonia), genealogia dosdeuses. A palavra Oedc significa um deus em Grego, urn dosseres divinos, e não tem nada a ver com o termo <<Deusl>

tal corno é entendido hoje. Não é portanto a <Sabedoria deDetrs>>, como já tem sido traduzido, mas sim Sa:bedoria Di-vina, ou seja, aquela que os deuses possuem.

P. Qual é a origern do nome?R. O nome foi introduzido pelos filósofos da Escola de

Alexandria, que eram chamados amigos da verdade, de g,ì(phil), <<amigo>, e à),ú\ew (aletheia), <<verdade>. O nomeTeosofia data do terceiro século da nossa era e surgiu comAmmonius Saccas e os seus discípulos (*), que criaram osistema ecléctico teosófico.

- . (*) Também chamados Analogistas. Como explicou o prof. AlexWilder, F. T. S. (Membro da Sbciedade Teosóiica), na sua obraNew Platonism and Alchemy: The Eclectíc Philosophy, foram assim

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A CHAYE DA TEOSOFIA

P. Qual era a finalidade desse sistema?R. Em primeiro lugar, inculcar determinadas grandes

verdades morais nos seus discípulos, bem como em todosaqneles que eram <amigos da verdade>>. Daí o lema adoptadopela Sociedade Teosófica: <Não há religião superior à ver-dade.> (*) O principal objectivo dos Fundadores da EscolaTeosófica llcléctica eía um clos três objectivos da sua suces-sora actual, a Sociedacle Teosófica, nomeadamente reconci-liar todas as religiões, seitas e nações sob um sistema comumde ética baseado nas verdades eternas.

P. Como é que pode provar que isso não é um sonhoimpossível e que todas as religiões do mundo se baseiam defacto na rnesma verdacle única?

R. Pelo estuclo comparativo e anâlise dessas religiões.<Todos os cultos antigcs apontarn pâïa a existência de uma

A TEOSOFIA E A SOCIEDADE TEOSÓFICA

única teosofia que ihes é anterior. "A chave capaz de abrirum deles terâ de abrir todos os outros; de contrário nãoserá a chave certa."> (*)

LINHA DE CONDUTA DA SOCIEDADE TEOSÓFICA

P. No tempo de Ammonius Saccas havia diversas gran-cles religiões antigas e eram numerosas as seitas que existiarnsó no Egipto e na Palestina. Como conseguia ele con-ciliá-las?

R. Fazendo aquilo que estamos agora a tentar fazeroutra vez. Os neoplatónicos formavam uma escola nume-rosa e pertenciam a filosofias religiosas diferentes, tal comoos teósofos de hoje. O judeu Aristóbulo afirmou, nessetempo, que a ética de Aristóteles continha os ensinamentosesot,éríco,s da Lei de Moisés; Fílon, o Judeu, tentou con-ciliar o Pentateuco com a filosofia pitagórica e platónica;e Josefo provou que os Essénios de Carrnel não passavamcle simples copistas e seguidores dos Terapeutas egípcios(os curandeiros). E assim fazemos nós hoje. Podemos rnostrarcomo se deu a evolução de todas as religiões cristãs, incluindoas seitas mais pequenas. Estas não são mais que pequenosgalhos ou rebentos dos ramos maiores; mas tanto os rebentoscomo os ramos nascem do mesmo tronco - a RELIGIÃO -- SABEDORIA. O objectivo de Ammonius Saccas foi provarprecisamente isso; Ammonius Saccas tentou levar gentiose cristãos, judeus e idólatras, a esquecerem as suas dissi-dências e conflitos, e a lembrarem-se apenas de que todoseles possuíam a mesma verdade, embora a formulassem demaneiras diferentes, e que todos eles eram filhos de umamãe comum. É este também o objectivo da Teosofia.

P. Em que fontes é que se baseia para fazer tais afirma-ções sobre os antigos teósofos de Alexandria?

chamados devido ao facto de interpretarem todas as lendas e narra-tivas sagradas, mitos e mistérios, legundo uma regra ou princípiode analogia e correspondência, de forma que acontecimentos veri-ficados no mundo exterior erám tomados èomo uma expressão deoperações e experiências da alma humana. Foram também designa-dos neoplatónicos. Embora geralmente se situe a origem da Teoso-fia ou do sistema ecléctico teosófico no séc. III, a dar-se crédito aDiógenes Laércio, a sua origem é muito anterior, pois este atribuiuo sistema ao sacerdote egípcio Pot-Ámon, que viveu no princípio daDinastia Ptolomaica. O mesmo autor afirma que o nome é cópticoe significa pessoa consagrada a Ámon, o Deus da Sabedoria. ATeosofia é o equivalente de Brahmã-Vidya, conhecimento divino.

(*) A Teosofia Ecléctica baseia-se em três princípios funda-mentais: (l) Existência duma Divindade suprema ou essência infi-nita, absoluta e incompreensível, que é a origem de toda a naturezae de tudo aquilo que existe, visível e invisível. (2) Carácter imortal eeterno do homem, pois sendo uma emanação da Alma Universala sua essência é idêntica à desta. (3) Teurgia, ou <trabalho divino>,ou aquilo que gera um tabalho de deuses, de theoi, <deuses>, eergein, <trabalhar>. O termo é muito antigo, mas, como pertence aovocabulário dos MISTERIOS, o seu uso não estava vulgarizado.Consistia numa crença mística - comprovada na prática poradeptos iniciados e sacerdotes - segundo a qual se o homem setornasse tão puro como os seres incorpóreos, isto é, se regressasseà pureza primitiva da sua natuteza, conseguiria levar os deuses acomunicarem-lhe os mistérios divinos, e mesmo por vezes a torna-rem-nos viúveis, quer subjectiva quer objectivamente.

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(*) Wilder, op. cit., p. ll"

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A CHT|VE DA TEOSAFIA

R. Em numerosos escritores conhecidos. Um deles,

Mosheim, diz: Ammonius Saccas ensinou que a religião das

multidões caminhava a par e passo com a fiiosofia e, talcomo ela, fora gradualmente corrompida e obscurecida pormeras vaidades, superstições e mentiras humanas; que deve-

ria, portanto, ser expurgada dessas irnpurezas e interpretadasegundo princípios filosóficos a fim de recuperar a sua pu-

reza primitiva; e que o todo a que Cristo se referia era afinalo restabelecimento cla Sabedoria dos antigos e o seu regresso

à sua integridade primitiva - uma certa limitação do doininio universal da superstição-e ainda, até certo ponto, a

correcção e eliminação dos erros que haviam sido assimi-lados pelas diversas religiões populares (*).

Ou seja, precisamente aquilo que os teósofos modernosdefendem. Mas enquanto o grande ,A.migo da Verdade eraapoiado e auxiliado na sua orientação por dois Doutoresda lgreja, Clemente e Atenágoras, por todos os doutos Ra-binos da Sinagoga, pela Academia e pelos Sábios da Flo-resta (**), e ensinava uma única doutrina, nós, seus segui-

dores, não somos reconhecidos, sendo antes insultados e per-

seguidos. Por aqui se vê que há 1500 anos as pessoas erambastante mais tolerantes do que o são neste sêculo esclo-

recida.P. Não teria Arnmonius Saccas o apoio da Igreja por-

que, apesar das suas heresias, ensinava o Cristianismo e era

um cristão?R. De modo nenhum. Ammonius Saccas era cristão por

nascimento, mas nunca aceitou o Cristianismo da Igreja.O autor acima referido disse o seguinte a seu respeito:Bastava-lhe expor os seus ensinamentos <<segundo os antigospilares de Hermes, que Platão e Pitágoras conheciam e nos

quais basearam a sua filosofia>. Ao encontrar os mesmos

(*) Wilder, op. cit., p. 5.(*1) Referênèia muito provável aos ermitérios dos Sannyasis

(ashrams) -(N. do T.).

A TEOSOFIA E A SOCIEDADE TEOSÓFICA

sentimentos expressos no prólogo do Evangelho segundoS. João, Ammonius Saccas supôs, e com razáo, que o objec-tivo de Jesus era restabelecer a grande doutrina da Sabedoriaem toda a sua primitiva integridade. Considerava que as

narrativas da Bíblia e as histórias dos deuses eram alegoriasilustrativas da verdade, ou fábulas que não deviam seraceites (*).

A RETIGIÃO.SABEDORIA ESOTÉRICA EM TODOS OS TEMPOS

P. Considerando que não existem nenhuns escritos deAmmonius Saccas, como é que se pode ter a certeza de quefoi isso que ele ensinou?

R. Também Buda, Pitágoras, Confúcio, Orfeu, Sócratese mesmo Jesus não deixaram nacla escrito e, no entanto,são figuras históricas cujos ensinamentos sobreviveram. Osdiscípulos de Ammonius Saccas (entre os quais se contamOrígenes e Herenio) escreveram tratados e explicaram a suaética. Além disso, os seus alunos - Orígenes, Plotino e Lon-gino (conselheiro da famosa Rainha Zenôbia) - deixaramtodos trabalhos volurnosos acerca do Sistema dos Amigos daVerdade, pelo menos no que diz respeito àquilo que se sabeda sua profissão de fé pública, jâ que a sua doutrina secompunha de ensinamentos exotéricos e esotéricos.

P. Como é que esses últimos chegaram aos nossos dias,se afirmam que a chamada RELIGIÃO - SABEDORIA eraesotérica?

R. A REI IGIÃO - SABEDORïA foi sempre una, e,sendo a última expressão do conhecimento humano possível,foi, portanto, cuidadosamente preservada. É muito anterioraos teósofos de Alexandria, chegou aos nossos dias e sobre-viverá a toclas as outras religiões e filosofias.

P. Onde e por quem é que ela foi preservada?

20 2l

A CHAI/E DA TEOSOFIÁ

R. Entre os Iniciados de todos os paÍses; entre aquelesque procuravam realmente a verdade-os seus discípulos;e nas regiões do mundo onde desde sempre se atribuiu maiorvalor e mais se aprofundaram essas questões: a Índia, a ÁsiaCentral e a Pérsia.

P. Pode apresentar-me provas do seu esoterismo?R. A melhor prova que lhe posso dar é que todos os

cultos reiigiosos, ou, melhor, filosóficos, consistiam numensinamento esotérico ou secreto, e numa veneração exoté-rica (destinada ao público). Além disso, é um facto bemconhecido que os MISTERIOS dos antigos compreendiamem todas as nações os MISTERIOS maiores (secretos) e osMISTERIOS menores (públicos), como por exemplo as ceri-mónias secretas que se rcalizavam em Elêusis, na Grécia.Tanto Hierofantes da Samotrácia e do Egipto, e os Brâmanesiniciados da Índia antiga, como mais tarde os Rabinos he-breus, mantiveram secretos os verdadeiros princípios dassuas doutrinas bona fide, com receio de que fossem profa-nados. Os Rabinos judeus chamavam ao seu conjunto deprÌncípios religiosos seculares a Merkabah (corpo exterior),<<veículo>, ou ((d capa sob a qual se esconde a alma invi-sível>>, ou seja, o seu mais alto conhecimento secreto. Nãohouve uma única nação antiga que transmitisse às massas,através dos seus sacerdotes, os seus verdadeiros segredos filo-sóficos, comunicando-lhes apenas a ((casca). O Budismo doNorte tem o seu <grande> veículo e o seu ((pequeno) veículo,conhecidos por Escola Mahayana e Escola Hinayana. Pitâ-goras chamou à sua Gnose <<o conhecimento das coisas quesão> e reservoÌr esse conhecimento apenas para os discípulosque conseguiam digerir esse alimento espiritual e sentir-sesatisfeitos, fazendo-os jurar que guardariam silêncio e sigilo.Os alfabetos ocultistas e as cifras secretas são resultado daevolução dos antigos escritos hieráticos do Egipto, cujo se-gredo, na Antiguidade, estava exclusivamente em poder dosHierogramatistas, ou sacerdotes egípcios iniciados. Segundoos seus biógrafos, Ammonius Saccas fazia os seus alunos

,4 TEOSOFIA E A SOCIEDADE T'EOSOFICA

jurarem não divulgar as suas mais altss doutrinos, exceptorìqueles que já haviarn sido iniciados no conhecimento preli-tninar, que por sua vez também estavam vinculados porjuramento. Aliás, não encontramos tarnbém idêntica atitudeno Cristianismo primitivo, entre os Gnósticos, e mesmo nosensinamentos de Cristo? Este falava às multidões em pará-bolas com um duplo sentido, explicando-as allenas aos dis-cípulos. <<A vós>>, disse Cristo, <é dado conhecer o mistériodo reino de Deus, mas aos que estão ile fora tudo se thespropõe em parábolas> (S. Marcos, iv, 2). <Os Essénios cla

Judeia e do Carmel estabeleciam uma distinção semelhante,dividindo os seus seguidores em neófitos, irmãos e per-

leitos>>, ou seja, os iniciados (*). Podemos encontrar exemplosdisto em todos os países.

P. É possívei alcançar-se a <Sabedoria Divina> apenasatravés do estudo?

R. Julgo que não. Os teósofos antigos, tal como os deagora, afirmaram que não é possível conhecer-se o infinitoatravés do finito, ou seja, qlÌe o Eu finito não pode chegarao conhecimento do infinito, mas que a essência divina podeser comunicada ao Eu espiritual superior num estado deêxtase.

P. Como é que explica isso?

R. O verdadeiro êxtase foi definido por Plotino comosendo <a libertação do espírito da sua consciência finita e asua identificação com o infinitor>. Este estado é idênticoàquele que na Índia se designa por Samadhi. Os Yoguispraticam este últirno mediante uma preparação física ba-seada na maior abstinência de comida e de bebida, e umapreparação mental que consiste num esforço permanente depurificação e de elevação do espírito. A meclitação é umaoração silenciosa e sem palavlas ou, como disse Platão, ((um

ardente voltar da alma para o divino, não para pedir umbem específico qualquer (comc acontece na oração vulgar),

22 ./J

A CHAVE DÁ TEOSOFIA

mas o bem em si - o Bem Supremo universal>, do qualnós sornos na terra uma parte e de cuja essência todos nósemanámos. E Flatão acrescenta: <<assim, guardai o silênciona presença dos dívínos, até que eles afastem as nuvens dosvossos olhos e vos façarn ver com a luz que cleles emana nãoo que vós julgais ser o bern mas aquilo que ó intrinseca-mente bom>. (*)

P. Portanto, a Teosofia- não é, como aJguns afirrnam,um sistema concebido recentemente?

R. Só os ignorantes se podem referir clesse modo à Teo-sofia. A Teosofia é tão antiga como o rnundo, tanto nos seusensinamentos como na sìJa ética, senão no nome, e é tam-bém o sistema mais amplo e mais católico que existe.

P. Qual o motivo, então, por que há uma tal ignorânciano que diz respeito à Teosofia entre as nações do MundoOcidental? Por que razã,o é que a Teosofia é um livro fe-chado pâra raças que são reconhecidas como as mais cultase avançadas?

R. Na nossa opinião, existiram na antiguidade naçõestão cultas e, sem dúvida, mais <<avançadas> espiritualmentedo que nós. Mas há várias explicações para esta ignorânciavoluntária. Uma delas foi dada por S. Paulo aos ateniensescultos: o facto de o verdadeiro discernimento espiritual, e atéde o interesse, se ter perdido durante muitos séculos devidoà sua grande dedicação às coisas dos sentidos e à sua longaescravidão à letra morta do dogma e do ritual. Mas o motivoprincipal é sem dúvida o facto de a verdadeira Teosofia tersido mantida sempre secreta.

A TEOSOFIA E A SOCIEDADE TEOSÓFICA

P. Já demonstrou que esse sigilo na realidade existia,rnas qual é a sua verdadeira causa?

R. As causas foram: Primeiro, a perversidade e egoísmocla natureza hurnana dum modo geial, a sua tendência paragratificar sempre desejos p€ssoais em detrimento do próximoe clos familiares. Nunca se pocleria confiar segredos dívinosa pessoas assim. Segundo, o facto de não se poder esperarque essas mesmas pessoas impedissern que o conhecimentosagrado e clivino fosse profanado. Foi esta última razão queÍ'cz também com que as verdades e os símbolos mais sublimesfossem pervertidcs e que as coisas do espírito fossem gra-clualmente transformadas, em imagens antropomórficas, con,.cretas e grosseiras; por outras palavras, que a ideia cle deusfosse diminuída e surgisse a idolatria.

TEOSOFIA NÃO É BUDISMO

P. f)iz-se frequentemente que os teósofos são <BudistasEsotéricos>. Poderá dizer-se então que são adeptos de Gau-tama Buda?

R. Tanto como dizer-se que os músicos são adeptos de

Wagner. Alguns são budistas por religião; todavia, entre nós,há muito mais hindus e bramanistas, bem como europeus e

americanos cristãos, do que budistas convertidos. Esse errosurgiu deviclo a uma interpretação errónea do verdadeirosignificado do título da excelente obra de A. P. Sinnett,Esoteríc Buddhísm, cuja última palavra deveria ter sido es-

crita com um único <<d>> em vez de dols, pois nesse caso signi-ficaria aquilo que era pretendido, ou seja, <<Sabedoril'srzo>(cle Bodha, bodhi, <inteligência>r, <<sabedoria>) e nã,o budis-mo, olr seja, a filosofia religiosa de Gautama Buda. A Teo-sofia, como já se disse, é a RELIGIÃO - SABEDORIA.

P. Qual a diferença que existe entre o budismo, a reli-gião fundada pelo Príncipe cle Kapilavastu, e o <Sabedo-riísmo>> que diz ser sinónimo de Teosofia?

(*) A_ ve-rdadeira^ Teosofia é, para os místicos, aquele estadoque Apolónio- de Tiana descreveu da seguinte máneiia: <Vejo opresente e o futuro como se os visse num espelho límpido. O s-ábionão precisa de esperar pelos vapores da terrã e pela corrupção doar para prever pragas e epidemias.., Os theoi, ou deuses, vêem ofuturo; os homens comuns, . o presente; os sábios, aquilo.que estápara acontecer>. A <Teosofia dos Sábios>, de que elé fala, encon-tra-se bem expressa na afirmação: <O Reino dè Deus está dentrode nós.>

24 25

A CHAVE DÁ TEOSOFTA

R. Precisamente a mesma diferença que existe entre osensinamentos secretos de Cristo, que são chamados ((os mis-térios do Reino dos Céus>, e o ritualismo e a teologia dogmá-tica posteriores das diversas lgrejas e seitas. Buddha significao <Iluminado)) por Bodha, ou entendimento, Sabecloria. Esteconceito foi integralmente assimilado nos ensinamentos eso-téricos que Gautama comunicou apenas aos seus Arhat*

P. Mas alguns orientalistas afirmam que tsuda nuncaensinou uma doutrina esotérica.

R. Isso é a mesma coisa que afirmar que a Naturezanão tem segredos para os hornens de ciência. Adiante citareiuma conversa entre tsuda e o seu discípulo Ananda quedesmente essa afirmação. Os ensinamentos esotéricos deBuda eram apenâs o Gupta-Yidya (conhecimento secreto)dos antigos brâmanes, cuja chave os seus sucessoÍes moder-nos, salvo raras excepções, perderam poÍ completo. E esteVídya foi absorvido por aquilo que é agora conhecido porensinamentos ocultos'da escola Mahayana do Budismo doNorte. Quem o negar não passa dum simples pseudo-orien-talista ignorante.

P. Mas a ética cla Teosofia não é iclêntiça àquela queBuda ensinava?

R. Sem dúvida, porque essa ética ê a alma da Religião -- Sabedoria, e foi em tempos património comum dos iniciadosde todas as nações. Mas tsuda foi a primeira pessoa a incor-porar essa ética sublime nos seus ensinamentos públicos e

a torná-la a pedra angular e verdadeira essência do seu sis-tema público. E nisto que reside a enoÍme diferença entreo budismo exotérico e todas as outras religiões, pois en-quanto estas clão çrimazia ao ritual e ao dogma, o budismoinsistiu desde sempre sobretudo na ética. Isto explica a seme-lhança, senão identidade, que existe entre a ética da Teo-sofia e a da religião de Buda.

P. Há grandes diferenças entre os dois sisternas?R. Uma das grandes diferenças entre a Teosofia e o

budismo exot,érico é que este nega por completo a existência

Á TEOSOFTA E A SOCIEDADE TEOSOFTCA

(a) de qualquer Divindade e (b) de quaiquer vida conscientetlepois da morte, ou mesmo de qualquer sobrevivência daindividualidade autoconsciente no homem. Isto se nos refe-rirmos apenas aos ensinamentos públicos de Buda; maisadiante explicarei por que motivo Buda se mostrava tãoreticente nessa matéria. Poróm, as escolas cla lgreja Buclistaclo Norte, fundadas nos países para onde se retiraramos Arhats iniciados após a morte do Mestre, ensinam todasaquilo a que hoje se chama as doutrinas teosóficas, porqueestas fazem parte do conhecimento dos iniciados. Contudo,Teosofia não é Budismo.

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II

TEOSOFIA EXOTERICA E ESOTERICA

O OUE A ACTUAL SOCIEDADE TEOSÓFICA NÃO É

P. Portanto as doutrinas teosóficas actuais não são umrenascimento do Budismo nem foram, tão-pouco, inteira-mente copiadas da Teosofia neoplatónica?

R. Não. Mas a melhor rnaneira de responcier a essas

perguntas é citar uma comunicação sobre <<Teosofia> apre-sentacla pelo Dr. J. D. Buck, F. T. S., na Convenção Teosó-fica realizada en Chicago, em Abril de 1889:

<A Sociedade Teosófica foi criada coÍn o objectivo deproclamar as doutrinas teosóficas e fomentar a vida teosó-

fica. A actual Sociedade Teosófica náa é a primeira organi-zação do género. Tenho um livro intitulado ActividadesTeosóficas da Socíedade de Filadélfia, publicado em Lon-clres em 1697, e outro com o seguinte título: Introdução cì

T,eosofia, ou Ciência do Místérío de Cristo, isto é, da Dívin-dade, da Natureza e do Ser, abrangendo a fíIosofia de todas

as forças da vids, tanto mógicas corno es:pirituais, tendo

em vísta a elaboração dum guia prátíco da maís sublimepurezã, santídacle e perfeíção evangélíca, bem como o pro-pósito de alca:nçar .a visõto divina e a:s art,es, poderes e outrctsprerrogutíva:s angéIicas e sagradas da regeneração, publi-cado em Londres em 1855.

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A CTTAVE DA TEOSOFIA

(No ano seguinte (1856) foi publicada uma outra obra emoitavo real, tipo diamante, cle 600 páginas, intitulada Mis-celânea Teosót'ica. Desta última foram apenas publicados500 exemplares pâra distribuição gratuita por Bibliotecas e

Universidades. Estes rnovimentos anteriores, que foram mui-tos, surgiram no seio da própria lgreja entre pessoas cle

grande devoção e çarâcter puro; todos os seus escritos têmum cunho ort.odoxo, empregando as expressões cristãs e,tal como acontece em relação aos escritos do eminente ecle-siástico William l-aw, o leitor comum só os distinguiria pelasua grande sinceridacle e picdade. Não erârn mais quetentativas para compreencler e expiicar o significado pro-fundo e verdadeiro alcance das Escrituras Cristãs, e parailustrar e esclarecer a vida teosófica. Durante a Reforma,João Reuchlin, apesar de ser um amigo íntimo e fiel cle

Lutero, fez uma tentativa semelhante, tendo obticlo o mesmoresultado. A ortodoxia nunca pretendeu ser esclarecida ouinformada. Tal como Festo disse a Paulo, assim tambémestes reformadores foram avisados de que o cxcesso de conhe-cimentos conduzia à loucura e que seria perigoso ava!çarmais. Sem falar da sua verbosidacle, que era em parte umaquestão de hábito e de formação dos autores, e em parteresultado cla opressão da religião pelo poder temporal, e,indo ao ârnago da questão, deverá dizer-se que estes escritoseram teosóficos no sentido estrito da palavra e dizem exclu-sivamente respeito ao conhecimento por parte clo homem dasua própria natureza e à vida superior da alma. Tem-seafirmado que o movimento teosófico actual é uma tentativapara converter a Cristandade ao Budismo, o que significasimplesmente que a palavra <heresia> deixou de inspirarterror e perdeu a força. Houve em todas as épocas indivíduosque apreenderam melhor ou pior as doutrinas teosóficas eas puseram em prática. Essas doutrinas não são exclusivo denenhuma religião e não estão limitadas a nenhuma sociedadeou época. São um direito inato da alma humana. A ortodoxiatem de ser definida por cada indivíduo à sua própria custa

TEOSOFIA EXOTERICA E ESOTERICA

corrsoante a sua natureza" e as suas necessidades, e de acordocom a sua experiência. Talvez seja por este motivo queaqueles que supuseram que a Teosofia era uma nova religiãoprocuraram em vão o seu credo e o seu ritual. O seu credoó o respeito pela Verdade e o seu ritual <Honrar toda a ver-clade pondo-a em prática>.

<A diversidade de opiniões e interpretações fictícias sobrea Sociedade Teosófica mostra como o princípio da Frater-nidade Universal é mal compreendiclo pela grande maioriada humanidade e quão raramente a sua transcendência é

reconheciclzr. A Sociedade Teosófica foi fundada com baseno princípio único "da fraternidade essencial do Homem.Tem sido a.cusada de ser budista e anticristã, como se

pudesse ser simultaneamente ambas as coisas, e quando tantoo Budismo como o Cristianismo, tal como foram pregadospelos seus inspirados funcladores, consicleram a fraterni-clade o ponto essencial da doutrina e da vida. A Teosofiatem ainda sido considerada uma criação recente ou, namelhor das hipóteses, uma palavra nova atrás da qual se

csconde um rnisticismo antigo. Embora seja verdade quemuitas Sociedades fundaclas para proclamar os princípios cio

altruísmo ou cla fraternidade essencial, e que se uniram paraos defender, hajam tido nomes difelentes, não é menosverdade que rnuitas delas foram chamadas teosóficas e queos seus princípios e objectivos eram semelhantes aos daSociedade assim designada actualmente.r>

Julgo que não poderia dar uma resposta melhor nemrnais explícita às perguntas que me fez.

P. Nesse caso, além da ética budista, qual o sistema quea Socieclade Teosófica defende ou adoptou?

R. Nenhum, e todos. Não defendemos nenhuma reli-gião nem nenhuma filosofia específica; aproveitamos aquiloque cada uma delas tem de positivo. Mas deverá dizer-se quea Teosofia, tal como todos os outtos sistemas antigos, se

encontra dividida em Secções Esotéricas e exotéricas.P. Qualéadiferença?

3CI 3I

A CHAYE DA TEOSOFTA

R. Os membros da Sociedade Teosófica têm inteira li-berdade de professar qualquer religião ou filosofia, podendoaté não professar nenhuma, clesde que aceitem e estejamdispostos a pôr em prática pelo menos um dos três objec-tivos da Associação. A Sociedade é um organismo filan-trópico e científico para a difusão da fraternidade comoprática e não como teoric. Os seus membros podem sercristãos ou muçulmanos, jucleus ou pársis, budistas ou bra-manistas, espiritualistas ou materialistas, pouco importa; mas

todos eles têm de ser filantropos ou estucliosos. Por outraspalavras, os membros têm de ajudar, na medida das suas

possibilidades, a pôr em prática pelo rnenos um dos objec-tivos do programa da Sociedade; cloutro modo não hâ razãapara se tornarem membros efectivos. É o caso da maioriados membros da secção exotérica da Sociedade, que são cle

dois tipos: <efectivos> e <independentes>> (*). Estes membrospodem ou não tornar-se Teósofos de facío. São rnembrosapenas por terem ingressado na Sociedade, mas se uma pes-

soa não tem qualquer consciência da justeza divína das coi-sas, ou tem uma noção sectória e egoísta, se assim se pocle

dizer, da Teosofia, a Socieclade não pode fazer dela umverdadeiro teósofo.

TEÓSOFOS E MEMBROS DA SOCIEDADE TEOSÓFICA

P. E aqueles que se declicam ao estuclo da Teosofiaesotérica? São verdadeiros teósofos?

R. Não necessariamente; só quando derem provas deque o são. Esses ingressaram no grupo interno e comprome-teram-se a cumprir, tão rigorosamente quanto possível, as

TEOSOFTA EXOTERICA E ESOTERICA

rcgras da secção oculta. É um compromisso difícil, pois aprirrcipal regra estabelece que se deve renunciar totalmenteiì personalidade individual. É entre estes membros que secncontram os poucos verdadeiros teósofos da Sociedade'l'cosófica. Isto não quer dizer que não haja teósofos foracla Sociedade, pois há muitos mais do que seria de julgar.

P. Nesse câso, porque hão-cle eles tornar-se membroscla chamada Sociedade Teosófica? O que é que poderãoganhar com isso?

R. Nada, mas o auxílio e o apoio dos outros membrosda Sociedacle podem constituir uma grande ajuda. A uniãoÍ'az a força e a harmonia, e esforços simultâneos bem orien-tados podem produzir maravilhas. Este tem sido desde sem-pre o segredo de todas as associações e comunidades.

P. Mas não será possível um homem com um espíritocquilibrado e inteiramente dedicado a um único objectivo,um homem com uma força de vontade e uma perseverançainquebrantáveis, tornar-se um ocultista ou mesmo um Adeptotrabalhando sozinho?

R. É, mas tem dez mil possibilidades contra uma detrão o conseguir. Uma das muitas razões é o facto de nãoexistir hoje em dia livro nenhum sobre Ocultismo ou Teurgiaque exponha os segredos da Alquimia ou da Teosofia medie-val numa linguagem fácil cle entender. Os que existemempregam uma linguagem simbólica ou servem-se de pará-bolas. Ora, se há muito que o Ocidente perdeu a chave clessalinguagem e dessas parábolas, como é que uma pessoa podesaber qual é o significado correcto daquilo que está a lerou a estudar? É nisso que reside o grande perigo, é isso queleva à magia negra (*) inconsciente e à mediuminidade maisinútil. Aquele que não tiver por mestre um Iniciado, agirámelhor deixando essas coisas de lado. Basta olharmos ànossa volta e vermos o que se passa. Enquanto dois terços

(*) Ìr{ota do Editor: Este termo não tem qualquer conotação coma cor da pele.

(*) <Membros efectivos> são aqueles que ingressaram num ramodeterminado da S. T.; <<membros independentes> são aqueles quepertencem à Sociedade como um todo, têm um diploma passadopela Sede (Adyar, Madras), mas não estão ligados a qualquer ramoou secção.

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A CHAVE DA TEOSOFIA

da sociedade civílizada consideram que é ridículo pensar que

a Teosofia, o Ocultismo, o Espiritismo e a Cabala podemter um significado qualquer, o outro terço é constituídopelos eiementos mais heterogéneos e divergentes. Algunsacreditam no rnístico e até no sobrenotural (!), mas cadaum acredita à sua maneira. Daí que não haja duas pessoas

a pensar da mesma maneira ou que estejam de acordo sobrequalquer princípio ocuito fundamental, embora muitas pes-

soas afirmem qì.re possuem o conhecimento supremo, levandotalvez muita gente a pensar que elas são adeptos completa-mente desenvolvidos. Não só não existe no Ocidente nenhumconhecimento científico e exacto do Ocultismo - nem se-

quer da verdadeira astrologia, único ramo do Ocultismoque nos seus ensinamentos exaíéricos tem ieis defüridas eum sistema definido - como não existe qualquer noção dosignificado clo vercladeiro Ocuitismo. Algumas pessoas res-

tringem a sabedoria antiga à Cabala e ao Zohar judeu, que

cada uma interpreta à sua maneira segundo a letra morta dosmétodos rzbínicos. Outras consideram Srvedenborg ouBcehme os expoentes máximos da mais elevada sabedoria;para outras, ainda, o mesmerisrno é o grande segredo damagia antiga. Poréin todos aqueles que tentam pôr as suas

teorias em prática não tarciam a cair na magia negra, devicicr

à sua ignorância. Felizes aqrieles que Ìhe conseguern escapar,pois não há meios nern critérios em que se pcssanr apoiar

irara distinguir aquilo que é verdadeiro daquilo que é falso.Conhece-se uma árvore pelos seus frutos e um sistema

pelos resultados que produz. Quando os nossos adversáriosforem çapazes de nos apontar uma pessoa que tenha conse-guido sozinha, pelo estudo do Ocultismo através clos tempos,tornar-se um adepto virtuoso como Ammonius Saccas, oumesmo Plotino, ou um teurgista como lâmblico, ou que hajarealizado actos semelhantes àqueles que se atribuem a Saint--Germain sem ter qualquer rnestre para o guiar e sem ser

um médium, um indivíduo convencido de que tem poderesparapsíquicos, ou um charlatão - então admitirernos que

TEOSOFIÁ EXOTÉRICA E ESOTERICA

cstamos enganados. Mas, até lá, os teósofos preíerem seguirrus leis naturais já comprovadas cla tradição da CiênciaSagrada. Há místicos que fizerum grandes ciescobertas dec1uímica e de física que quase pertencem ao domínio datlquimia e do Ocultismo; outros cujo gérrio os levou à des-coberta de parte, senão de todos, dos aifabetos perdidosda <linguagern dos Mistérios> e que conseguem, portanto,lcr correctamente os pergaminhos hebraicos; houve aindartlguns videntes que tiverarn vislumbres rnaravilhosos closscgredos ocultos da Natureza. Mas todos eles sã,o especia-lista:s. Um será um inventor teórico, outro urn cabalistahcbreu, isto é, sectário, o terceiro um Swedenborg rnoclerno,trras qualquer deles nega aquilo que não faz parte cla suaciôncia ou religião pessoais. Não há um irnico que se possagttbar de as suas descobertas terem repr.esentado um bene-l'ício universal ou nacional ou mesmo para si próprio. Salvotlguns curandeiros, não houve nenhurn que tivesse ajudadou humanidade, ou sequer um número restrito cle homensrlt sua própria comunidacle, com a sua ciôncia. Onde estãoos Caldeus de outrora, aqueles que faziam curas maravi-lhosas <<não com sortilégios mas com símplices>? Onde estâtttn Apolónio de Tiana capaz de curar os doentes e dercssuscitar os mortos onde quer que se encontre e sejamtluais forem as circunstâncias?

P. O objectivo da Teosofia é então produzir acleptoscurandeiros?

R. Os seus objectivos são vários, mas os mais impor-tuntes são aqueles que podem contribuir para minorar osol'rimento humano, seja ele moral ou físico. E, no nossocntender, o sofrimento moral é bem pior clo que o físico.A Teosofia tem de inculcar a êtica no espírito dos homens,tcm de purificar a alma, se é que pretende libertar o corpol'Ísico de sofrimentos que, à excepção de casos de aciclente,síio sempre hereditários. Não é estudando o Ocultismo paraI'ins egoístas, para satisfazer uma ambição ou gratificarum orgulho ou uma vaidade pessoais, que se poderá alguma

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A CHAVE DA TEOSOFIA

vez alcançar o verdadeiro objecto da Teosofia, ou seja, ajudara humanidade que sofre. Nem é estudando um único ramoda filosofia esotérica que uma pessoa se torna um Ocultista,mas estudando, senão dominando, todos eles.

DIFERENçA ENTRE TEOSOFIA E OCULTISMO

P. Falou de Teosofia e Ocultismo. São a mesma coisa?

R. De forma alguma. Uma pessoa pode ser um exce-

lente teósofo, seja dentro ou t'ora da Sociedade, sem ser porisso um ocultista. Mas não se pode ser um verdadeiro ocui-tista sem se ser um teósofo autêntico; caso contrário, ser*se-á

apenas um praticante, consciente ou não, da magia negra.

P. O que é que quer dizer com isso?

R. Jâ expliquei que um verdadeiro teósofo tem de pôrem prática o mais sublime ideal moral, tem de se empenharem tornar realidade a sua unidade com toda a humanidade,e trabalhar incansavelmente pelos outros. Ora, se um ocul-tista não fizer tudo isto, é porque está a agir egoistamentepara seu benefício pessoal, e se tiver adquirido um poderprático superior ao do homem comum torna-se imediata-mente um inimigo do mundo e daqueles que o rocleiammuito mais perigoso do que o homem médio.

P. Portanto um ocultista é apenas um homem commais poder do que as outras pessoas?

R. Muito mais, se for um ocultista prótico e realmenteinformado, e não apenas um ocultista de nome. Ao con-trário do que dizem as Encicloffdias, as ciências ocultasnão sáo <ciências ímagínárías da ldade Média relacionadascom uma suposta. acção ou influência de qualidades ocultasou poderes sobrenaturais, como por exemplo a alquimia,a magia, a necromancia e a astrologia>; são ciências reais,que existem, exttemamente perigosas. Ensinam qual é o

poder secreto das coisas da Natureza, desenvolvendo e culti-vando os poderes ocultos <latentes no homemr>, dando-lhe

TEOSOFIÁ EXOTERTCA E ESOTERICÁ

rrssirn trernendas vantagens sobre outros homens menos ins-truÍdos.

P. Mas essas ciências ocultas, a magia e a feitiçaria,ttiro são consideradas pelas pessoas cultas e informadas resí-tluos duma ignorância e duma superstição antigas?

R. Devo dizer-lhe que a sua afirmação é uma espadaclc dois gumes. Também há muitas pessoas <cultas e infor-tnadas>r que consideram o Cristianismo e todas as outrasrcligiões resíduos da ignorância e da superstição. Há teó-sofos excelentes que acreditam no sobrenatural, e até emtttilagres divínos, o que não acontece com os ocultistas. Osocultistas praticam a Teosofia cíentífíca, baseados numr:onhecimento exacto dos segredos da Natureza, ao passo(f Lrc se um teósofo puser em prâtica poderes ditos anormais,,rlnr conhecimentos de Ocultismo, limitar-se-â a caft numaI'orma de mediuminidade muito perigosa, porque, embora seguie pela Teosofia e pelo seu mais alto código moral, exercecssn prática na ignorância, co n urna fé sincera mas cega.

ÍITFERENçA ENTRE TEOSOFTA E ESptRtTtSMO

P. Os teósofos acreditam no Espiritismo?R. Se chama <Espiritismo> à explicação que os espíritas

tlrlo sobre alguns fenómenos anormais, entáa não acredita-rrros. Os espíritas afirmam que essas manifestações são pro-tluzidas pelos <espíritos> dos mortos, normalmente familiaresricus que segundo eles voltam à terra para comunicar comnrprcles que amaram ou a quem estão ligados. Nós afirmamos(luc os espíritos dos mortos não podem regressar à terra,lrrlv<l casos muito raros e excepcionais, e que não comunicam('{)lll os homens a não ser por meios puramente subjectìvos.Atluilo que aparece objectivamente ó apenas o fantasmarlo cx-homem físico.

P. Os teósofos também rejeitam os fenómenos?lì. De forma alguma, a não ser nos casos de fraude

r rrle ncional.

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Á CHAVE DA TEOSOFIÁ

P. Então como é que os explicam?

R. De muitas maneiras. As causas dessas rnanifestaçõesnão são tão simples como os espíritas pensam. Antes de

mais, o elews ex machina das chamadas <rnaterializações>é norrnalmente o corpo astral ou <duplo> do médium oude alguém qì,re se encontra presente.

P. Disse <normalmente>; então o que acontece nosoutros casos?

R. Isso depende da natureza das manifestações. Porvezes são os despojos astrais, as (cascas astrais>l de l(ama--lôka, o que resta das personalidades que desapareceram;outras vezes, os Elementais. A individualidade conscientedos seres desencarnados não se pode materíalizar, nem poderegressar da sua esfera mental ou Devachân ao plano da

objectividade terrestre.

P. Mas muitas das mensagens recebidas dos <espíritos>revelam não só inteligência, como um conhecimento de

factos que o médium ignora, e que por vezes nem sequerestão presentes no espírito do investigador ou de qualquerdos participantes duma maneira consciente.

R. Isso não prova necessariamente que sejam os espí-

ritos que têm a inteligência e o conhecimento que referiu,ou que os mesmos sejam emanações das almas desincar-nadas. Conhecem-se casos de sonâmbulos que cornpuseramobras musicais e poemas ou resolverarn problemas de mate-mática enquanto se encontravam em transe, sem nuncaterem aprendido música ou rnatemática. Outros responde-ram com inteligência a perguntas que lhes foram feitase houve ainda casos de sonâmbulos que falaram línguas,como por exemplo o hebreu e o latim, que desconheciampor completo quando acordados. Qualquer destes fenómenosse manifestou clurante um sono profundo. Perante isto,insiste que fenómenos deste tipo são provocados por <espí-

ritos>?

P. Mas como é que os explica?

TEOSOFIA EXOTEÍèICÁ E ESOTERICA

R. Nós defendemos que a centelha divina que existerro homem é una e idêntica na sua essência com o EspíritoUuiversal, e como tal o nosso <Ego espiritual> é pratica-rrrcnte omnisciente, mas não pode manifestar o seu conhe-cinrento devido às limitações da matéria. Portanto, quantorÌìcnos se fizerem sentir estas limitações, ou, por outras pala-vrrrs, quanto mais o çorpo físico se encontrar paralisadono que diz respeito à sua actividade e consciência indepen-rlctrtes, como acontece num sono ou num transe profundos,tru ainda em estados febris, mais o Ego oculto se poderrrtnifestar neste plano. É esta a explicação que damos pararrtlueles fenómenos de uma ordem superior verdadeirarnenterrraravilhosos, em que se manifestam uma inteligência e umcouhecirnento inegáveis. Quanto às manifestações de ordemirrfcrior, como por exemplo os fenórnenos físicos e as bana-lidades e lugares-comuns do <espírito> vulgar, seria precisorrrris espaço e tempo do que podemos dispensar nestetttomento para explicar nìesmo o menos importante dosnossos pontos de vista sobre c assunto.

P. ÉIá quem diga que a Sociedade Teosófica foi inicial-tttcnte fundada para combater o Espiritismo e a crençarrn sobrevivência da individualidacle do hornem.

R. Não é verdade. As nossas convicções baseiam-setoclas na imortalidade dessa individualidade. O que aconteceI'roquentemente é que se confunde personalidade com indi-viilualidade. Todavia, sern comprender essa diferença nãoé possÍvel compreencler a filosofia oriental, e é ela que estárrt origern das clivergências que existem entre a doutrinateosófica e a espírita.

P. Gostaria que se explicasse rnelhor.R. O que eu quero dizer é que embora os nossos ensi-

rtrrtncntos insistam sobretudo na iclentidade do espírito etlu matéria, e embora digamos que o espírito é matérialtotcncial e que a matéria não é mais que uma cristali-zlç:ão do espírito (tal como o gelo é vapor solidificado),unriÌ vez que a condição original e eterna de tudo não é

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A CHAYE DA TEOSOFIA

espírito mas meta.-?.spírito, por assim dizer (não passandoa matéria sólida e visível duma simples manifestação perio-dica), defendemos que o termo espÍrito só se pode aplicarà verdadeíra individualidade.

P. Mas qual é a diferença entre essa <<verdadeira indi-vidualidadeD e o ((euD ou (ego)) de que todos temos cons-ciência?

R. Antes de lhe responder é preciso definir o que se

entende por ((eD) e por (ego> (*). Nós fazemos uma distinçãoentre a simples autoconsciência, ou seja, a simples noçãode <eu soü euD, e a noção mais complexa de (eu sou osr. Smith> ou (eu sou a sra. Brorvn>. Uma vez que acredi-tamos numa série de nascimentos do Ego, isto é, na rein-carnação, é sobre esta distinção que assenta toda a nossateoria. O que acontece quando uma pessoa diz <<eu sou osr. Smith> é que se está realmente a referir a uma sériede experiências diárias ligadas pela memória e que for-mamaquilo que o sr. Smith diz ser <<ele>. Mas nenhuma dessas<experiências>l é realmente o ((euD ou o <<Egol>, nem sãoessas expeïiências que lhe dão a noção de que ele é ele,pois na verdade ele esquece a grande maioria das suas expe-riências diárias, e estas só produzem nele a sensação deindividualidade enquanto duram. Nós, os teósofos, fazenosportanto uma distinção entre este amontoado de <experiên-cias>>, a que chamamos falsa personalidade (por ser finitae evanescente), e aquele elemento que existe no homem e aque se deve a noção de <eu sou eu>. É a este ((eu sou eu)que chamamos a verdadeira individualidade e, para nós.este Ego ou individualidade, tal como um actor, desempenhamúltiplos papeis no palco da vida (**). Digamos que cadauma das novâs vidas do mesmo Egct na terca ê uma noite

TEOSOFIA EXOTERICA E ESOTERTCA

no palco de um teatro. Urna noite o actor, ou o Ego, allareceno papel de Macbeth, na seguinte no de Shylock, na terceirano de Romeu, na quarta no de Hamlet ou de Rei Lear,c por aí íora até ter percorrido todo o seu ciclo de incar-nações. O Ego inicia a peregrinação da vida como um espí-rito, um Ariel ou um Puck, desempenhando um papel de

ligurante como soldado, criado ou membro do coro; emseguida começa a tomar uma parte mais activa na acção,<rra desempenhando papéis principais ora papéis sem impor-tância, até que por fim abandona o palco como Prospero,o mdgìco.

P. Estou a compreender. Afirma, então, que esse Àgoverdadeiro não pode regressar à terra depois da morte. Masnão será que o actor, caso tenha conservado uma noçãode individualidade, tem inteira liberdade de regressar à cenade acções anteriores, se o desejar?

R. Nós dizemos que não, porque um tal regresso àterra seria incompatível com qualquer estado de felicidadeperleíta depois da morte, como hei-de demonstrar maisndiante.

POR OUE MOTIVO É ACEITE A TEOSOFIA?

P. Até certo ponto compreendo, mas estou a ver queos vossos ensinamentos são bastante mais complexos e meta-Í'Ísicos que os do Espiritismo ou do pensamento religiosocomum. Qual o motivo, então, por que a Teosofia quedcfende suscita simultaneamente tanto interesse e tanta hos-tilidade?

R. Creio que há diversos motivos. Posso apontar, emprimeiro lugar, a grande reacção do materialismo grosseirorlaqueles que defendem o conhecimento científico. Ëmsegundo lugar, uma insatisfação generalizada em relaçãorì teologia das diversas lgrejas cristãs. Em terceiro lugar,uma consciência crescente do facto de que creclos tão manifes-

(*) Nota do Editor: O significado da palavra <<ego> tal corno éempregue aqui não deve ser confundido com aquele que the éatribuído na psicologia moderna.

(**) Vide infra, <<Da individualidade e da personalidade>.

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A CTTAVE DA TEOSOFIA

tamente contraditórios, tanto em si mesmos como uns emrelação aos outros, nã.o podem ser verdadeiros, e preten-sões que não se verificam não podem ser reais. Em quartoIugar, a convicção de muitas pessoas, e a certeza de algumas,de que tem de existir algures um sistema filosófico-religiosoque seja científico e não apenas especulativo. Por último,a noção de que talvez seja necessário ir procurar esse sistemaem ensinamentos muito anteriores a qualquer doutrinamoderna.

P. Mas como é que esse sistema surge precisamenteneste momento?

R. Apenas porque aconteceu ter chegado a hora deo divulgar, facto de que são testemunho os esforços detantos estudiosos para alcançaÍem a verdade, custe o quecustar e esteja ela onde estiver. Perante isto, os seus guar-diões permitiram que se divulgasse pelo menos parte dessa

verdade.P. Deverá considerar-se a Teosofia uma revelação?R. De modo nenhum, nem sequer no sentido de ser

qualquer coisa que foi directa e recentemente revelada porseres superiores, sobrenaturais ou, pelo menos, sobre-huma-nos. Só se poderá dizer isso no sentido de a Teosofia serum descobrir de verdades extremamente antigas a pessoas

que até agora as desconheciam, e que ignoravam até queum conhecimento tão antigo pudesse existir ou ter sidopreservado.

P. Se a verdade é aquela que a Teosofia defende, porque motivo se lhe deparou tanto antagonismo e tão poucaaceitação?

R. Mais uma vez por vários motivos, sendo urn delesa aversão dos homens às <<inovações>>, como se costumadizer. O egoísmo é essencialmente conservador e rejeita tudoaquilo que possa constituir motivo de perturbação; prefereuma mentira fâcil, pouco exigente, à maior verdade, desdeque esta implique o sacrifício do mínimo conforto. O podercla inércia mental é grande quando urna coisa não promete

TEOSOFIA EXOTERICA E ESOTERICA

urn benefício ou uma recompensa imediatos. Por outro laclo,

os ensinamentos teosóficos são invulgares, as suas doutrinassiro extremamente obscuras e alguinas delas negam redon-damente fantasias rnuito do agrado clos partidários doutrossistemas. Se juntarmos a isto o esforço pessoal e a vida deglande plJrezÃ. que se exige àqueles que aceitam um códigoclcsprovido de qualquer forma de egoísrno, faciknente seperceberá por que motivo a Teosofia está condenada a umI)rogresso tão lento e tão difícil. A Teosofia é fundamen-ttlmente a filosofia daqueles que sofrem e que perderamtodas as esperanças noutros meios que os pudessem ajudarit não se afundarem no atoleiro que é a vida. Além disso,a história de qualquer sistema religioso ou moral demonstraque, de início, ao ser introduzido num terreno estranho,csse sistema teve de vencer toclos os obstáculos criados peloclbscurantismo e pelo egoísmo.

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PLANO DE ACÇÃO DA

UI

SOCIEDADE TEOSOFICA

OBJECTIVOS DA SOCTEDADE

P. Quais são os objectivos da Sociedade Teosófica?R. Os objectivos da Sociedade são três e têm-se man-

tido desde a sua fundação: 1) formar o núcleo duma Fra-ternidade Universal da Humanidade sem qualquer distinçãode raça, cor ou credo; 2) promover o estudo da religiãoe ciências do mundo e demonstrar a importância da lite-ratura asiática antiga, nomeadamente das filosofias bramâ-nica, budista e zoroastriana; 3) investigar os mistérios ocul-tos da Natureza sob todos os aspectos possíveis, e em especialos poderes psíquicos e espirituais latentes no homem. Estessão, em traços largos, os três cbjectivos principais da Socie-dade Teosófica (*).

P. Não me pode explicar mais pormenorizaclamenteesses objectivos?

. (t) Nota do Editor: Os objectivos da Sociedade sofreram diversasalterações apó-s a,fundação dêsta, em 1875. Em 1896 foi adoptadaa.seguinte redacção que se manieve desde então: (l) Formai umnúcleo da Fraternidade Universal da Humanidade.' sem oualouerdistinção _de raça, credo, sexo, casta ou cor. (2) Foúentar ô esfudocomparativo das

_ religiões, filosofias e ciências. (3) Investigar as

leis inexplicadas da natureza e os poderes latentes iró homeml

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A CHAVE DA TEOSOFIA

R. Os três objectivos acima referidos podem ser divi-didos em tantas cláusulas explanatórias quantas forem neces-sárias.

P. Comecemos então pelo primeiro. A que neios poderáa Sociedade Teosófica recorrer a fim de promover um sen-timento de fraternidade entre raças que se sabe terern asmais diversas religiões, costumes, crenças e rnaneiras depensar?

R. Deixe-me acrescentar uma coisa que parece ter urnacerta relutância em dizer. Claro que temos consciência deque as nações estão divididas, não só entre si como atéinternamente. Daí a sua pergunta e o facto de o nosso pri-nreiro objectivo lhe parecer uma Utopia, náo ê verdade?

P. De facto tem razáo, mas o que é que tem paracontrapor a isso?

R. Ao facto em si, nada; mas há rnuito a dizer quantoà necessidade de remover aquiio que faz com que a Frater-nidade Universal seja de mornento uma Utopia.

P. Na sua cpiniãro, quais são essas causas?R. Em primeiro lugar e acima de tudo, o natural

egoísrno da natureza humana. O desinteresse expresso nosensinamentos altruístas de Jesus não passa hoje cle um. temateórico pata a. oratória dos sermões, ao passo que as máxìmasdo egoísmo prático, contra as quais Cristo pregou em vão,estão profundamente enraizadas no modo de vida das naçõesocidentais. A grande máxima da lei dessas nações é <olhopor olho, clente por dente>. Ora, não tenho qualquer receiode afirmar que só a Teosot'ia é que poclerá erradicar a per-versidade inerente a essa doutrina e a muitas outras.

A ORIGEM COMUM DE TODOS OS HOMENS

P. Como?R. Demonstrando lógica, filosófica, metafísica e mesmo

cientificamente que: a) Todos os homens têm espiritual e

PLANO DE ACÇÃO DA SOCTEDADE TEOSÓFICA

Í'isicamente a mesma origem, e é este o ensinamento funcÌa-mental da Teosofia. ó) Sendo a humanidade fundamental-mente de uma única e mesma essência, e senclo essa essênciaurÌa -- infinita, incriada e eterna, quer lhe chamemos Deusou Natureza -, não há nada qÌ]e possa afectar uma naçãoou um hornem que não afecte toclas as outras nações e todosos outros hornens.

P. IvIas não foi isso que Cristo ensinou, isso é maisrrm conceito panteísta.

R. O seu erro é esse. Trata-se dLlm conceito puramenterrisÍíio.

P. Como é quc o pode provar?R. Facilnlente. Cristo disse: <Amai-vos uns aos outros*

t' <Amai os vossos inimigos> porque <se amais (apenas)(ìs que vos amam, que recompensa (ou mérito, haveis detcr? Não o fazem os publícanos(*)? E, se saudais somente()s vossos irmãos, que fazeis de extraorclinário? Não o fazemlrrnrbóm os pubÌicanos?> São estas as palavras de Cristo.Mirs no Génesis, íX, 25, lê-se: <Maldito seja Canaan; quet'lc scja o último dos escravos dos seus irmãos.>> Assim, aque-lcs que se regcm pela Bíblia, preferem a lei de Moisésrr lci de arnor cle Crislo. Easeiarn-se no Antigo Testamento,lxris enccntram nele justificação para todas as suas paixões,rs suas leis cle conquista, anexação e iirania sobre raças:r (lue chamam int'eriores. A hisiória só por si dá,nos umallilicla ideia dos crimes que foram cometiclos em nome clestal)rssagem infernal (caso seja tomada à ietra) do Génes:is.

P. Já a ouvi dizer que a identidade da origem física doIrorrrem é demonstrada pela ciência, e a da sua origem esp!litual pela Religião-Sabecloria. Todavia, não temos conhe-

(*) Publicanos: eram naquele tempo considerados autênticos la_rl'tics e carteiristas. o ngmé e a profissão de publicano ãiam-oosrliris _odiosos entre os Judeus. Eìtavam proitjidos Oe en-tiãi ìólì'rrrplo e S. Mateu.s (xviij, 17) refere-se a págãos e puOti.aìós-iomõ',('Ít(r() a mesma colsa. Não passavam, porém, de cobradores de im_ltrt5[115 pg1n4n6g.

46 47

A CHAVE DÁ TEOSOFIA

cimento de darwinistas que dêem testemunho de grandeafeição fraternal.

R. Essa é uma das provas da deficiência dos sistemasmaterialistas, e demonstra que os teósofos têm razão. A iden-tidade da origem física do homem não apela de maneiranenhuma para os nossos sentimentos mais profundos e ele-vados. A matéria, destituída da alma e do espírito, ou dasua essência divina, não consegue falar ao coração humano.Mas a identidade da alma e clo espírito, do homem verda-deiro e imortal, tal como a Teosofia ensina, uma vez com-provada e profundamente enraizada nos nossos corações,poderá levar-nos bem longe na via da verdadeira caridadee da verdadeira solidariedade fraternal.

P. Mas como é que a Teosofia explica a origem comumcle todos os homens?

R. Ensinando que a roiz de toda a natureza, seja elaobjectiva ou subjectiva, e de tudo aquilo que existe nouniverso, visível ou invisível , é, foí e será sempre uma essên-

cia una e absoluta, na qual tudo começa, e à qual tucloretorna.

P. Há mais alguma coisa que os estatutos da SociedadeTeosófica aconselhem os seus membros a fazer? No planofísico, claro.

R. A fim àe despertar o sentimento de fraternidadeentre as nações, temos de participar no intercârnbio inter-nacional de artes e produtos úteis aconselhando, informandoe colaboranclo com todos os indivíduos e associações válidos.Temos ainda de inculcar nos homens a ideia de que, se araiz da humanidacle ê una, deve haver também uma verdadeque se manifeste em todas as religiões.

P. ïsso diz respeito à origem comum de todas as reli-giões e, nesse aspecto, talvez tenha razão. Mas, na prática,como é que isso se aplica à fraternidade no plano fisico?

R. Em primeiro lugar, aquilo que ó verdadeiro no planometafísico deve sê-lo também no plano físico. Em segundolugar, porque não há nada como as divergências religiosas

PL.4NO DE ACÇÃO DA SOCIEDADE TEOSÓFICA

para gerar ódios e conÍliios. Quando urn indivíduo se con-sidera o detentor único da verdade absoluta, é perfeitamenterratural da sua parte julgar que o seu próxirno se encontrapreso nas garras do Erro ou do Demónio. euando se con-seguir levar o homem a compreender que nenhuma das reli-giões é detentora de toda a verdade, que todas elas sãomutuamente compiementares, e que só é possível encontrara verdade total conciliando todos os pontos de vista depois clese separar o que cacla urna delas tem de verdadeiro daquiloque é falso, então poderá falar-se de verdadeira fraternidadeom religião. O mesmo se poderá dizer em reiação ao planol'ísico.

P. Gostaria que se explicasse um pouco melhor.R.. F-açamos urna comparação. Uma planta é consti-

tuída pela raiz, pelo caule, pelos rebentos e pelas folhas.Supondo que a humanidade, no seu todo, é o caule quecresce a partir da raiz espiritual, esse caule será igualmentetr uniclade da planta. Tudo aquilo que afectar o caule irá,inevitavelmente, afectar todos os rebentos e folhas cla planta.(lom a humanidade passa-se a mesrna coisa.

P. Sem dúvida, mas isso não implica que uma coisarlue afecte uma folha ou um rebento vá necessariamenterrÍ'ectar a planta toda.

R. Quer então dizer que o facto cle se fazer mal a untIromem não irnplica que se esteja a prejudicar toda a huma-nidade? Como é que sabe? A própria ciência materialistacnsina que qualquer coisa, por pequena que seja, que pre-jLrcliclue uma planta, vai afectar toclo o seu crescimento etlcsenvolvirnento fnturos. Se muitas vezes um corte numtledo pode fazer o corpo inteiro sofrer e reagir sobre todoo sisterna nervoso, é muito possível que existarn outras leiscspirituais a agir sobre as plantas e os animais, bern cornosobre a própria humanidacle; Ínas, se não admite que essaslcis actuem sobre as plantas e os animais, talvez negue asua existência.

P. A que leis é que se está a referir?

48 49

A CHAYE DÁ TEOSOFIA

R. Damos-lhe a designação de leis kármicas, mas sópoderá compreender o seu verdadeiro significado se estudarOcultismo. Porém, a afirmação que fiz não se baseia nessasleis, mas sim na analogia da planta. Se considerar a ideiano seu sentido mais amplo, â um nível universal, há-deverificar que na verdadeira filosofia todas as acções físicasproduzem efeitos morais permanentes. Se fizer mal a umhomem no plano físico, poderá talvez pensar que a dorou sofrimento dele não irá afectar de forma alguma aquelesque o rodeiam, e muito merìos homens de outras nações.Nós afirmamos que a seu tempo isso aconl.ecerí Dizemos,portanto, que não é possível existirem na terra sentimentosde fraternidacle como os que os grandes Reformaclores,sobretudo Buda e Jesus, pregaram, a não ser que os homenssejam levados a compreender, e a aceitar como verdadeaxíomátíca, que quando procedem mal para com os outroso seu acto irá prejudicar não só a eles como, a longo prazo,tocla a humanidade.

OUTROS OBJECTIVOS DA SOCIEDADE TEOSóFICA

P. Gostaria que me explicasse agora como é que a Socie-dade se propõe realizar o seu segundo objectivo.

R. Reunindo na biblioteca da sua sede em Adyar,Madras, todas as obras válidas que nos seja possível sobre as

religiões do mundo; o mesmo Íarão os membros da Socie-dade em relação às bibliotecas iocais das Secções Regionais.Compilando todas as informações correctas sobre as diversasfilosofias, tradições e lenclas antigas, e divulgando-as da

maneira que nos for possível, como por exemplo atravésda tradução e publicação de obras originais importautes,extractos dessas obras e comentários sobre as mesmas, oude palestras de indivícluos especializados.

P. E no que diz respeito ao terceiro objectivo: desen-

volver no homem os seus poderes espirituais e psíquicoslatentes?

PLANA DE ÁCÇÃO DÁ SOCIEDADE TEOSÓFICA

R. Isso terá igualmente de ser feito através de publi-cações quando não for possível rcalizar conferências oullcnsamentos pessoais. O nosso dever é manter vivas nctIromem as suas intuições espirituais. Combater e neutralizar- depois de devidamente investigadas e de comprovada a

sua natureza irracional - todas as formas de fanatismo,scja ele religioso, científico ou social, e sobretudo a hipo-crisia, quer esta se âpresente como sectarismo religioso oucrença em milagres ou em coisas sobrenaturais. Temos deprocurar conhecer todas as leis da natureza e divulgar esseconhecimento. Promover o estudo de leis que os hornenstle hoje não compreenclem, as leis das chamadas CiênciasOcultas, com base num ,-erdadeiro conheciruento da natu-t'ery. Depois de joeirados, o folclore e as tradições populares,l)or muito fantasiosos que por vezes pareçam, podemconcluzir à descoberta de segredos da natureza perdidosclesde há muito, mas importantes. A Sociedade Teosóficaprolrõe-se, portanto, seguir essa linha de investigação, tendocm vista alargar o seu câmpo de observação científico el'ilosófico.

50 5I

IV

RELAÇÃO ENTRE A SOCIEDADE TEOSÓFICAE A TEOSOFIA

DO AUTO-APERFEIçOAMENTO

P. O aspecto em que a Sociedade Teosófica insiste maisó, portanto, o progresso moral?

R. Sem dúvida! Todo aquele que quiser ser um verda-deiro teósofo terá de viver como tal.

P. Se assim ê, tal como já referi atrás, o comporta-mento de alguns membros da Sociedade está em contradiçãocom essa norma fundamental.

R. Tem razáo. Mas isso é inevitável; aliás, o mesmose pode dizer daqueles que se intitulam cristãos e agemcomo se o não fossem. Não se pode atribuir a culpa dissoÍÌos nossos estatutos ou às nossas regras, mas sim à nattrezahumana. Um verdadeiro teósofo deverá <agir com justiçac caminhar com humildade>.

P. O que quer dizer com isso?R. Apenas que o eu individual deverá esquecer-se de

si mesmo em benefício dos outros.P. Isso é puro altruísmo.R. É. E bastaria que em cada dez membros da Socie.

rlade Teosófica houvesse um que o praticasse para a nossaorganização ser uma verdadeira organização de eleitos. Maslrh muitas pessoas que se recusam a ver a diferença funda-

53

A CHAVE DA TEOSOFIA

mental que existe entre a Teosofia e a Sociedade Teosófica,entre a ideia e a sua expressão imperfeita.

P. Mas neste caso é muito difícil estabelecer a dis-tinção entre o abstracto e o concreto, pois só a partir desteé que é possível fazer um ju2o.

R. A justiça, tal corno a caridade, deve começar pornós próprios. Alguma vez se lembraria de atacar ou ridi-cularìzar o Sermão da Montanha porque as leis sociais,políticas e mesmo religiosas da sociedade em que vive nãoconseguiram, atê agora, pôr em prâtica os princípios queele estabelece, quer no espírito, quer na letra? <Não oponhaisresistência ao mal, amai os vossos inimigos, abençoai os

que vos amaldiçoam, f.azeí bem aos que vos odeiam>, pois<se alguém violar um destes mais elementares preceitos e

ensinar assim aos homens, dessa maneira será o menor noreino dos Céus>r, e (quem chamar o'louco" (a seu irmão)correrá perigo do fogo do inferno>. Como é que se permitejulgar os outros quando não consente que os outros ojulguem? Se insiste em afirmar que não existe qualquercliferença entre a Teosofia e a Sociedade Teosófica, estáimplicitamente a acusar o Cristianismo e a sua essência

verdadeira da rnema falta de coerência. Nunca é de maisdizer que há uma grande diferença entre o ideal abstractoe o seu veículo.

OABSTRACTOEOCONCRETO

P. Gostaria que explicasse melhor essa diferença.R. A Sociedade é uma organização vastíssima de homens

e mulheres, constituída pelos elementos mais heterogéneos.A Teosofia, no sentido abstracto, é a Sabedoria Divina,ou o conjunto do conhecimento e da sabedoria subjacentesao Universo, a homogeneidade do BEM eterno; no sentidoconcreto, é apenas o somatório desse mesmo bem tal como'a natureza o distribui pelos homens aqui na terra. Alguns

SOCIEDADE TEOSOFICÁ E Á TEOSOFIÁ

nrernbros esforçam-se sinceramente por compreender e objec-[ivar, se assim se pode dizer, a Teosofia nas suas vidas;outros pretendem apenas saber o que é a Teosofia e nãolrraticá-la; outros ainda terão entrado para a SociedadeiÌpenas por curiosidade ou corno resultado dum interessepassageiro, ou talvez, até, porque amigos seus são mernbros.Como é que o sistema pode ser julgado pelo nível daqueles(lue se intitulam membros sern que tenham direito a isso?A Sociedade só pode ser considerada a personificação da'l'cosofia nos seus motivos abstractos; nunca poderá ciizerrlue é o seu veículo concteto enquanto na sua organizaçãosubsistirem todas as imperfeições e fraquezas humanas. Serrrc permite recorrer a uma imagem oriental, diria que a'l'cosofia é o oceano infinito da verdade, do amor e dasubedoria universais, cujo esplendor se reflecte na terra,to passo que a Sociedade Teosófica não será mais queuma pequena bolha visível nesse reflexo. A Teosofia ê arratureza divina, visível e invisível, e a Sociedade Teosóficaó a naturez-a humana a tentar ascender à sua origem divina.A Teosofia é, finalmente, o sol fixo e eterno, e a Sociedade'l'cosófica o cometa efémero que procura uma órbita a fimtlc se tornar um planeta e girar sempre na atracção do soltla verdade. A Sociedade Teosófica foi fundada a fim detrtostrar aos homens que a Teosofia existe e de os ajudarrr ascender a ela attavés do estudo e assimilação das suasvcrdades eternas.

P. Pareceu-me que tinha dito que a Sociedade Teosó-l'ica. não possuía preceitos nem doutrinas próprios?

R. De facto não temos. A Sociedade não defende nemcrtsina uma sabedoria sua. É apenas depositária de todasrrs verdades proferidas pelos grandes videntes, iniciâdos eprofetas de ópocas históricas e rnesmo pré-históricas, oupclo menos de todas as verdades que conseguiu recolher.NÍio passa, portanto, de um canal através do qual é divul-glcla uma parte da verdade contida nas declarações dosgrandes mestres da humanidade.

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A CHAVE DA TEOSOFIA

P. Mas não é possível alcançar essa verdade fora daSociedade?

R. A existência inegável de grandes iniciados - verda-deiros <Filhos de Deus> - rnostra que houve indivíduosisolados que conseguiram alcançar muitas vezes essa sabe-doria, nunca poróm sern a orientação de um mestre nocomeço. Porém, muitos dos seus discípulos, quando por suavez se tornaram mestres, reduziram o catolicismo desses

ensinamentos à estreiteza dos dogmas sectários que perfi-lhavam. Adoptavam e seguiam então os preceitos de umúnico mestre em detrimento cle todos os outros - se é queos seguiam, como se verifica em relação ao Sermão daMontanha. Cada religião é, portanto, uma pequena parteda verdade divina intelpretada de modo a abranger umvasto panorama da imaginação humana que pretendia repre-sentar e substituir essa verdade.

P. Mas disse que a Teosofia não era uma religião?R. De forma alguma, pois a Teosofia é a essência de

todas as religiões e da verdade absoluta, sendo cada credoapenas uma pequena gota dessa mesura essência. Vou recor-rer novamente a uma metáfora. d Teosofia, na terra, é

como a luz branca. sendo cada religião apenas uma das

sete cores do espectro. Cada uma dessas cores, ignorandotodas as outras e acusando-as de serem falsas, não só reclamapara si a primazia como afirma sef o lug branca em si,chegando mesmo a anatemizar as suàs próprias cambiantes,que classifica de heresias. Porém, à medida que o sol daverdade se for elevando mais e mais no horizonte do enten-dimento do homem, e cada cor se for esbatendo até acabarpor ser reabsorvida, a humanidade deixará de estar sob amaldição de polarizações artificiais e acabará por se encontrarsob a luz pura e incolor da verdade eterna. Então teráalcançado a Theosophía.

P. Afirma, então, que todas as grandes religiões tiveramorigem na Teosofia e que só assimilanclo-a o mundo se poderálibertar da maldição dos seus grandes erros e ilusões?

SOCIEDADE TEOSÓFICA E A TEOSOFIA

R. Precisamente. Dizemos ainda que a Sociedade Teo-sófica é a humilde semente que, se for regada e a deixaremviver, acabará por produzir a Árvore cla Sabedoria do Bemc do Mal que está enxertada na Árvore da Vida Eterna.Os hornens só poderão esperar alcançar a verdade se estu-clarem as várias grandes religiões e filosofias da humanidade,comparando-as objectivarnente e com imparcialidade. Ésobretudo descobrindo e anotando os vários pontos que essasrcligiões e filosofias têm em comum que se poderá atìngircsse firn, pois assim que conseguimos cornpreender o seusignificaclo oculto - quer estudando quer aprendendo cornalguóm que o conheça - verificamos, quase sempre, que elecxprime uma grande verdade da Natureza.

P. Já ouvimos falar de uma Idade de Ouro passada,c acaba de descrever aquilo que poderá vir a ser uma ldadede Ouro do futuro. Quando surgirá esta última?

R. Apenas quando a humanidade no seu todo sentirque ela é necessária. Hâ uma máxima do Javidqn l(heradpersa que diz: <<Hâ dois tipos de verdade - uma delas érnanifesta e evidente; a outra precisa constantemente descr demonstrada e comprovada.> E só quando esta últimase tornar tão evidente a nível universal como agora é obs-cura e co no tai susceptível de ser deturpada por sofistase casuístas, só quando amiros os tipos de verdade formaremcle novo urn todo, é que os homens pensarão todos darnesma maneira.

P. Mas decerto que as poucas pessoas que sentiramnecessidade de tais verdades optaram já por algo de defi-nitivo. Disse que a Sociedade não tem doutrinas própriasc que portanto os seus membros podem acredi{ar naquiloque quiserem e aceitar o que entenderem. trsso dá a impressãorlc que a Sociedade Teosófica está decidida a ressuscitara confusão de línguas e de crenças da Torre de Babel daAntiguidade. Não há crenças comuns a todos os membroscla Sociedade?

56 57

A CTTAYE DÁ TEOSOFIA

R. O que eu queria dizer ao, afirmar que a Sociedadenão tinha princípios ou doutrinas próprios, era que os seusmembros não são obrígados a perfilhar uma doutrina ouum credo específicos.

I]NSINAMENTOS

v

FUNDAMENTAIS DA TEOSOFIA

DE DEUS E DA ORAçÃO

P. Os teósofos acreclitam em Deus?R. Depende daquilo que entende por Deus.P. Quando digo Deus estou a falar no Deus dos Cristãos,

o Pai de Jesus e o Criador; por outras palavras, o Deusllíblico de Moisés.

R. Nesse Deus não acreditamos. Não aceitamos a ideiatlum Deus pessoal, ou dum Deus extracósmico e antropo,rrrórfico, que aÍïnal não é mais que um reflexo gigantescodo homem; aliás, nem sequer o mais perfeito dos homens. Narrossa opinião, o Deus da teologia não passa dum amontoadotlc contradições e duma impossibilidacle lógica. Como tal,rcjcitamo-lo.

P. Agradecia que me explicasse os motivos dessa atitude.R. São muitos, e não é possível referi-los todos. Mas

posso apontar-lhe alguns. Esse Deus de que falou não é,scgundo aqueles que acreditam nele, infinito e absoluto?

P. Creio que sim.R. Então, se é infinito, isto é, sern limites, e sobretudo

sc ó absoluto, como é que pode ter forma e ser criador do(tuc quer que seja? A forma implica uma limitação, bem('()rì1o um princípio e um fim, e, para criar, um Ser tem de

58 59

A CHÁI/E DA TEOSOFIA

pensar e pianear. Como é que o ABSOLUTO pode perìsar'ou, por outras palavras, ter uma aÍìnidade qualquer comaquilo que é limitado, finito e condicionado? É um absurdonão só do ponto cle vista lógico como filosófico. Até aCabala hebraica rejeita tal ideia, fazendo do único e Abso-luto Princípio Deífico uma Unidade infinita a gue chamaAin-Soph ('k). Fara criar, o Criador, tem de agir, e, comoisso é impossível para o ABSOLUTO, foi necessário apre-sentar o princípio infinito como causa indirecta da evolução(e não da criação), isto ó, através da emanação dos Zéfiros(outro absurdo que se deve neste caso aos tradutores cla

Cabala) (*x).P. Então os teósofos são ateus?R. Não nos consicleramos ateus, a não ser que por ateus

se entenda aqueles que não crêem num Deus antropomór-fico. Acreditamos num Princípio Divino lJniversal, origemde TUDO, do qual tudo procede, e ao qual tudo retornano fim do grande ciclo do Ser.

P. Mas isso é precisamente aquilo que o Fanteísmo sem-pre defendeu. Se os teósofos são panteístas não podem serdeístas, e se não são deístas são ateus.

R. Não necessariamente. O termo Fanteísmo é maisum claqueles termos que têm sido usados abusivamente ecujo significado verdadeiro e primitivo foi deturpado devidoa toda uma série de preconceitos e a uma visão parcial. Se

aceita a interpretação dada pelos cristãos à etimologia destapalavra, segundo a qual ela é composta por nâu, <<todo>, e

6u;. , <<deus>>, e em seguida parte do princípio de que isto signi-

ENSINAMENTOS FTJNDAMT'NTÁIS DA TEOSOFIA

l'ica que cada pedra ou cada árvore que existe na Naturezaó um Deus, ou o Deus UNICO, terá sem dúvida razão emcosiderar que os panteístas não são mais que adoradoresclc feitiços e que merecem o nome que têm. Mas se, comottós, analisar a etimologia da palavra dum ponto cle vistacsotérico, chegará a conclusões muito diferentes.

P. Qual é, então, a sua definição de panteísmo?R. Deixe-me ser eu a fazer-lhe uma pergunta. O que é

tlue entende por Pa.n ou Natureza?P. A Natureza é, no meu entencler, o conjunto de toclas

rus coisas que existem à nossa volta; o conjunto cle causas ecÍ'eitos no mundo da matéria, a cliação ou universo.

R. É, portanto, a manifestação da totalidacle clas causasc efeitos conhecidos; o conjunto de todos os agentes e forçasl'initas, completamente desligados dum Criaclor ou cle Cria-clores inteligentes, e talvez <concebida como uma força únicac isolado>, como dizem as enciclopédias.

P. Creio que sim.R. Pois nós não tomamos em consider.ação esta natu-

rcza material e objectiva a que chamamos uma ilusão eva-Iìescente, I por 6fry também não entendemos NatuÍeza noscntido que normalmente lhe é airibuído como derivado dapalavra latina Natura (devir, d.e nasci, nascer). euandol'alamos de Divindade e a identificamos, fazendo-a poríantocoincidir com a Natureza, estamos a falar na iraturezaoterna e incriada e não desse arnontoado de sombras Í'ugidiasc irrealidades finitas. A nossa DIVINDADE está em todaru parte, em cada átomo do Cosmos, visível e invisível, em,sobre e em redor de todos os átomos visíveis e moléculasrlivisíveis; pois ELA é a força misteriosa da evolução e invo-lução, a força criadora omnipresente, omnipotente e atéomnisciente.

P. A omnisciência é apanágio dum ser pensante, e ostcósofos afirmam que o Absohlio não pensa.

R. Afirmamos que o ABSOLUTO não pensa, pois opcnsamento é algo limitado e condicionado. Mas esquece-se

(*) Ain-Soph, !!0 ftN:zô náu: ó dnetpos, que não tem fim ouïmites, em e com a Natureza, o que não existe e É, mas que nãoê um Ser.

(**) Como é que o princípio eterno não-activo pode emanar ouemitir? O Parabrahm dos Vedantistas não o faz, nem o Ain-Sophda Cabala caldaica. É uma lei eterna e periódica- devido à oúaluma força activa e criadora (o logos) eniana do Único, incorìce-bível e inefável, ao iniciar-se cada mahamanvantara, ou novo ciclode vida.

60 6t

A CHAVE DÁ TÊOSOFIA

cle que em filosofia a inconsciência absoluta é também cons-ciência, pois doutro moclo não seria absoluta.

P. Então o Absoluto dos teósofos pensa?R. Não, não pensa, pela simples razão de que é o

próprio Pensamento Absoluto. E também não existe, pelomesmo motivo, porque é a existência absoluta, o Ser e nãounr ser. Se ler o maravilhoso poema cabalístico de SolomonBen Yehudah Gebirol, no Kether-Malkttth, compreenderá:<Tu és um, a origem cle todos os números, mas não comoelemento cle numeração, pois a unidade não comporta multi-plicação, mudança ou forma. Tu és um, e o mais sábio doshomens perde-se no mistério del tua unidade, pois não aconhece. Tu és um, e a tua unidade não diminui e nãoaumenta nunca, nem pode ser alterada. Tu és írnico e ne-nhum pensamento meu te pode impor um iimite ou definir-te.Tu ES, mas não como algo que existe, pois o entendimentoe a visão clos mortais não podem alcançar a tua existêncianem determinar o teu onde, como e porquê>, etc. Poroutras palavras, a nossa Divindade é o construtor eternodo universo em constanle evolução, e não o sett criador; ê

o próprío tmiverso a manifestar-se L partir da sua essênciae não a ser críado. É, no seu simbolismo, a esfera sem cir-cunferência, que tem um único atributo actuante que com-preende todos os outros atributos existentes ou imagináveis

- ELE MESMO. E a lei única da qual procedem leismanifestadas, eternas e imutáveis, embora ela não sejamanifestável porque é a LEI absoluta, que nos seus períodosde manifestaçáo é O eterno Devir.

É NECESSÁRIO ORAR?

P. Gostava que me dissesse se os teósofos acreditam naoração e se rezam?

R. Não. Preferimos agir a fala:r.P. Não oferecem sequer orações ao Princípio Absoluto?

ENSINAIITENTOS FUNDÁMENTAIS DA TEoSoFIA

R. Por que motivo havíamos de o fazer? O Incognos-cível só admite relações entre as partes que o integram, masruão existe para manter quaisquer relações finitas. euanto àsua existência e fenómenos, o universo visível depende demanifestações interactuantes desse mesÍno universo e das leisque as regem, e não da oração ou de orações.

P. Os teósofos não acreditam, portanto, na eficácia daoração?

R. Da oração que se aprende de cor e se repete, não,se por oração entende um pedido dirigido a um Deus des-conhecido.

P. Mas haverá outra espécie de oração?R. Sem dúvida; chamamos-lhe a ORAçÃO DA VON-

'|ADE, que é mais uma ordem interior do que um pedido.P. Então a quem é que os teósofos dirigem a sua oração

cluando rezam?R. Ao <<nosso Pai no céu> no senticlo esotérico da ex-

pressão.

P. E esse sentido é diferente daquele que a Teologia lheltribui?

R. Totalmente diferente. Um ocultista ou um teósofotlirige as suas orações ao Pai <<inet'óvel>> (leia e tente com-preender S. Mateus vi, 6), <Pai> esse que está no próprioIromem, e não a um Deus extracósmico e portanto finito.

P. Para os teósofos, então, o homem é um Deus?R. Diga <Deus> e não um Deus. para nós, o homem

interior é o único Deus de que podemos ter conhecimento.Nem poderia ser doutra forma. Se aceita o nosso postuladoscgundo o qual Deus é um princípio infinito imanente emtuclo, como é que o homem pode deixar de estar completa-rrrente impregnaclo de e na Divindade? Chamamos <<nosso paino céu> àquela essência divina que sentimos dentro de nós,rìo nosso coração e na nossa consciência espiritual, e que nãolcm nada a ver com a ideia antropomórfica que o nossocórebro físico ou a nossa fantasia possam fazer dele: <Nãosabeis que sois o templo de Deus e gue o espírito do Deus

62 63

A CTTAVE DA TEOSOFIA

(absoluto) habita em vós'Ì>> (x) Mas não se pode antropornor-fizar essa essência. Nenhum teósofo que defenda a verdadedivina e não humana poderá dizer que esse ((Deus inefáveb>ouve ou é distinto quer do homem finito quer da sua essênciainfinita, pois ambos são uma e a mesma coisa. Do mesmomodo, não deverá dizer, como já tive oportunidade de referir,que a oração é um peclido. A oração é antes um mistério, umprocesso oculto, mediante o qual pensamentos e desejosfinitos e condicionaclos, que não são susceptíveis de ser assi-

milados pelo espírito absoluto não condicionado, se traduzemem vontades espirituais e na vontade em si, processo esse

a que se dá o nome cle <<transmutação espirituab. A intensi-dade das nossas aspirações arclentes transforma a oraçãona <pedra filosofal>, isto é, aquilo que transforma o chumboem ouro puro. Sendo a única essência homogénea, a ((oração

da vontade> que referi torna-se uma força activa ou criacloraque produz efeitos consoante os nossos desejos.

P. Quer com isso dizer que a oração é um processo

oculto que produz resultados físicos?R. Exactamente. A f orça de vontade torna-se uma força

actuante. Mas ai dos ocultistas e teósofos que, em vez dedominarem os desejos do ego pessoal inferior ou homemfísico e de se dirigirem ao seu EGO espiritual Superior irnerso

(*) (I Cor., iii, 16). B, frequente encontrarem-se nos escritosteosóficos afirmações contraditórias sobre o princípio Crístico nohomem. Uns chamam-lhe o sexto princípio (Buddhi), outros o séti-mo (Atman). Se os teósofos cristãos pretendem empregar essasexpressões, que o façam, mas duma maneira correcta do ponto devista filosófico, isto é, de acordo com a analogia dos velhos símbolosda Religião-Sabedoria. Nós afirmamos que Christos não é apenasum dos três princípios superiores, mas sim os três consideradoscomo uma Trindade. Esta Trindade representa o Espírito Santo,o Pai e o Filho, consoante corresponda ao espírito abstracto, aoespírito diferenciado ou ao espírito incarnado. Krishna e Cristosão filosoficamente o mesmo princípio sob o aspecto tríplice dasua manifestação. No Baghavad Gilo, vemos que Krishna ora seintitula Atman, o Espírito abstracto, ora Kshetrajna, o Ego Superiorou Ego reincarnante, ora EU lJniversal, três designações que aoserem transportadas do Universo para o homem correspondem aAtma, Buddhi e Manas. No Anugita encontra-se a mesma doutrina.

ENSINAMENTOS FUNDAMENTÁIS DA TEOSOFIA

rra luz Atrna-Búdica dizendo <Seja feita a vossa vontade ec não a minhar>, etc., emitam ondas de força de vontade paraI'ins egoístas e profanos! Isso é pura magia negra, uma abo-nrinação e feitiçaria espiritual.

P. Como é que explica o facto universal de todas asrrações e povos terem adorado e rezado a um Deus oul)cuses? Aiguns adoraram e propiciaram demónios e espí-ritos malignos, mas isso só prova a universalidade da con-vicção da eficácia da oração.

R. Isso deve-se a um outro facto, o de a oração terrliversos significados além daquele que lhe é atribuído peloscristãos. A oração não é apenas uma súplica ou um pedído;lutigamente era sobretudo uma invocação e um encanta-rrrento. O mantra, oração entoada ritmicamente pelos hindus,lcm precisamente esse significado, pois os brâmanes consi-clcram-se superiores aos deva:s ou (Deusesl> comuns. IJmaoração tanto pode ser um apelo ou um encantamento desti-nado a fins maléficos e uma maldição (como acontece quan-do dois exércitos Íezam simultaneamente pela destruiçãonrúrtua), como um pedido de bênçãos. E como a grandernaioria das pessoas é imensamente egoísta, e reza apenas porsi própria para pedir que lhe seja dado o seu <<pão de cada dia>cln vez de trabalhar por ele, e pam suplicar a Deus que nãorr deixe <<cair em tentação> e a livre do mal, acontece quet oração, tal como é entendida hoje, é duplamente perni-ciosa: (a) porque destrói a confiança do homem em si mesmo;(b) porque desenvolve nele um egoísmo e um egocentrismoninda mais ferozes do que aqueles que são inerentes à suanatureza. Mais uma vez digo que nós acreditamos na<comunhão) e numa acção simultânea e uníssona com orrosso <<Pai inefável>; acreditamos ainda que há momentosraros de felicidade extâtica resultantes de uma fusão danossa alma superior com a essência universal e da suarutracção pela sua origem e centro, um estado a que duranterr vida se dá o nome de Samadhi, e depois pa morte Nirvana.lìccusamo-nos a rezar a seres finitos criaQbs, ou seja, deuses,

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A CHAYE DÁ TEOSOFI,4

santos, anjos, etc., Ìlois isso, na nossa opinião, não passa

de idolatria. Não podemos rezar ao ABSOLUTO por motivosque já expliquei, por isso tentamos substituir a oração estérile inútil por acções meritórias que produzam o bem.

A ORAçÃO DESTRÓI A AUTOCONFIANçA

P. Mas o próprio Cristo Íezava e recornendava a oração.

R. Assim está escrito, mas essa <oração) era precisa-mente a comunhão com o <Fai inefâvely que acabo cle

referir. Aliás, se identificássernos Jesus com a divindadeuniversal, cairíamos no ilogismo absurdo cle colocar o<próprio Deusr> a ïezar a si mesmo e a distinguir a vontadedesse Deus da sua!

P. Gostaria de adiantar outro argumento frequente-mente invocado pelos cristãos. Os cristãos dizem: <Sinto quenão sou capaz de dominar as paixões e as fraquezas pelo meuesforço pessoal. Mas quando rezo a Jesus Cristo sinto queele me dá força e que, graças a essa força, sou capaz de asdominar,l>

R. Não aclmira. Se <Jesus Cristo> é Deus, e como talindependente e distinto daquele que reza, é evidente quetudo é e tem de ser possível a <Deus todo-poderoso>. Oncleestá então o mérito, ou a justiça cle tal domínio? Porque éque o pseudodominaclor há-de ser recompensado por umacoisa que obteve à custa de simples orações? Alguma vezlhe passaria pela cabeça, a si que é um simples mortal, a ideiade pagar um dia inteiro de salário a um trabalhador se tivessefeito praticamente o trabalho todo dele, enquanto ele se limi-tara a sentar-se debaixo duma macieira a rezarJhe a sipara que o fizesse? Esta ideia de se passar uma vida inteiranuma total ociosidade moral, à espera que alguém faça otrabalho mais difícil ou crÌmpra os deveres que nos perten-cem - quer esse alguém seja Deus ou outro homem --, é

ENSINAMENTOS FUNDAMENTAIS DA TEOSOFIA

urna icleia que nos repugna e que consideramos unr avilta_mento' da dignidade humana.

P. Aonde é que os teósofos vão buscar força para subju_garem as suas paixões e o seu egoísmo?

R. Ao seu Ego Superior, ao espírito divino ou Deus quetôm em si, e ao sou Karma. euantas l,ezes será necessáiiotlizer que se conhece a árvore pelos seus frutos e a naturezapelos seus efeitos?

DA ORIGEM DA, ALMA HUMANA

P. Como explica então o facto de o homem ser. cÌotaclodc EspÍrito e de Alma? Donde pror,êm eles?

R. Da Alma Universal. Concedidos por um Deus pessaaló que não são. Donde provém o elementohúmido da rnedusa?Do oceano que a rocleia, em que vive e respira e em quecxiste, e ao qual retorna quando morre.

P. Rejeita então a doutrina segundo a qual a Alma édada ou insuflada no homem por Deus?

R. Somos obrigados a isso. A <Alma> de que se falano Génesis (ii, 7) é, tal como aí se diz, <<a alma vivente>> ouNephesh (a alma animal, vítal) que l)eus (nós preferimostlizer a <<natureza>) e a lei ímutóvel) clá ao homero, b.* .o-ott todos os animais; não é a alma pensante ou intelecto, etnuito menos o Espíríto imortal.

P. Deixe-me pôr a pergunta doutra maneira: é Deusque dá ao homem uma Alma racional humana e um Espíritoirnortal?

R. Mais uma vez, discordo dos termos em que colocaru questão. Considerando que não acreditamos num Deuspessoal, como é que ele pode dar ao homem o que quer quescja? Mas ainda que admitíssemos por hipóte.. qu.

""irt" .r*

Deus que aceita correr o risco de criar uma,Alina nova paracrrda recém-nascido, a única coisa que poderemos dizer é(lue um tal Deus decerto não é dotado nem de sabedoria nem

66 67

Á CT]AVE DA TEOSOFIA

de previsão. Outras dificuldades ainda e a impossibilidade de

reconciliar esse Deus com as virtudes de misericórdia, justiça,

equidade e omnisciência que lhe são atribuídas, são outrostantos obstáculos intransponíveis que negam dia a dia, e

hora a hora, esse clogma teológico.P. Que outras dificuldades são essas?

R. Estava a pcnsar num argumento incontestável que

um pregador famoso, um sacerdote budista cingalês, apre-

sentou a um missionário cristão, um homern que não era de

forma alguma ignorante e que estava sem dúvida preparado

para o debate público ern que ele foi apresentado. Isto passou-

-se próximo de Colornbo, e o missionário desafiara o sacer-

dote Megituwatte a dizer por que motivo o Deus cristão nãoera aceite pelos <pagãos>. Como sempre' nessa discussão

memorável o missionário não se mosttou à altura do seu

adversário.P. Gostaria de saber como é que isso aconteceu.

R. Foi muito simples. O sacerdote budista começou

por perguntar se o Deus dele dera os mandamentos a Moisés

para serem cumpridos sô pelos homens, enquanto que ele

próprio não era obrigado a observá-los. O rnissionârio re-jeitou essa ideia indignaclo. <Bem>>, retorquiuJhe o aclver-

sário, <<o senhor diz que Deus não abre quaisquer excepções

a essa regra e que nenhuma Alma poderá nascer sem que

ele o deseje. Ora Deus, entre outras coisas, proíbe o adul-

tério e, por outro lacio, o senhor afirma que é ele que cria

cada criança que nasce e que the dâ uma Alma. Deverá

então deduzir-se que os milhões de crianças que nascem do

crime e do adultério são obra desse Deus? Que Deus proíbe

e castiga o não cumprimento das suas leis e que, apesar

disso, /odos os diqs e a tado o momento estó (t criar almas

pdra essas mesmas crianças? Segundo a lógica mais simples'

esse Deus é cúmplice desses crimes, pois se não fosse a sua

ajuda e interveirção esses iilhos da luxúria nunca poderiam

nascer. Que justiça há em castigar não só os pais culpados,

como â criança inocente, por umâ coisa feita por esse mesmo

ENSIN ÁMENTOS F UNDÁ MI!N'I'AIS DA TEOSOF']Á

Deus a quem, entretanto, o senhol não atribui culpas nenhu-mas>>? O missionário olhou para o relógio e alegou que jáera tarde de mais para prosseguir a discussão

P. Esquece que todos esses aspectos inexpiicados sãornistérios e que a nossa religião nos proíbe de tentar penetraros mistérios de Deus.

R. Não esquecemos, apenas rejeitamos tais impossibiliclades. Aliás não pretendemos que acredite naquilo em quenós acreditamos. Estava apenas a responder às perguntasque me fez.

ENSINAMENTOS BUDISTAS SOBRE OS ASSUNTOS TRATADOSNESrA SECçÃO

P. Que diz o Budismo aceÍca da Alma?R. Depende se se está a referir ao Budismo exotérico,

popular, ou à doutrina budista esotérica. euanto ao prirneiro,poderei citar o Catecismo Budista, que diz o seguinte: <<Almaó uma palavra de que os ignorantes se servem para exprimiruma ideia falsa. Se tudo é passível de mudança, então ohomem também o é, e todas as partes materiais que ocompõem têm de mudar. Aquilo que ó passível de mudançanão ó permanente, pelo que não poderá haver sobrevivênciaimortal duma coisa mutável.> Isto parece-me bastante claroc definitivo. Mas quando mais adiante se diz que cada novapersonalidade, em cada um dos renascimentos sucessivos, étr conjunto de Ska:ndhas, ou atributos, da personalidade ante.rior, e perguntamos se este novo conjunto de Skandhas êigualmente lm novo ser que não conserva nada daquele queru precedeu, lemos o seguinte: <<Em certo sentido é um novoscr, mas noutro não é. Os Sksndhas estão em constantemutação durante esta vida, e embora deterrnin_ado homemA. B. de quarenta anos seja idêntico, em matéria de persona-liclade, ao jovem A. B. de dezoito, o, desgaste e restabeleci-rncnto constantes clo seu corpo e as transformações que a

68 69

A CHAYE DA TEOSOFIA

sua mente e o seu carácter vão sofrendo ïazent dele umser diferente. Quando velho, porém, esse homem colhe osfrutos ou sujeita-se ao sofrimento resultante dos seus pensa-mentos e acções em todos os estágios anteriores da sua vida.Portanto o novo ser que renasce, sendo a mesma indíviduali-dade (mas não a mesma personalidade) apenas com um novoconjunto de Skandhas ou os mesmos sob uma forma dife-rente, terá de sofrer as consequências das suas acções e

pensamentos durante a existência anterior.>> Trata-se dumametafísica obscura que não nega de forma alguma a exis-tência da Alma.

P. O Budismo Esotérico não propõe uma coisa seme-lhante?

R. Tem razão; trata-se de uma doutrina que faz partetanto do Budísmo Esotérico, ou Sabedoria Secreta, como doBudismo exotérico, ou seja, a filosofia religiosa de GautamaBuda.

P. Mas não há dúvida de que a maior palte dos budistasnão acreditam na imortalidade da Alma?

R. Tal como nós não acreditamos, se por Alma entendeo Ego pessoal ou alma vivente - Nephesh. Mas todos osbudistas eruditos acreditam no Ego divíno ou individual. Osque o não fazem revelam falta de discernimento. Estão tãoenganados nesse ponto como aqueles cristãos que tomam asinterpolações teológicas dos editores mais recentes dos Evan-gelhos acerca da condenação e do fogo do inferno por afir-mações textuais de Jesus. Nem Buda nem Cristo jamais escre-veram fosse o que fosse. Qualquer deles falava alegoricamentee servia-se de <frases misteriosas>>, como faziam, e farão aindapor muito tempo, todos os verdadeiros Iniciados. Ambasas Escrituras tratam todas essas questões metafísicas comgrande prudência, e tanto os escritos budistas como os cris-tãos pecam por esse excesso de exoterismo, sendo o signifi-cado cla letra morta exagerado em ambos os casos.

P. Quer então dizer que os ensinamentos de Buda e deCristo nunca foram correctamente interpretados?

ENSIN A\(ENTOS FUNDÁA,TENTAIS DA TEOSOFIA

R. Precisamente. Os Evangelhos Budista e Cr-istão fo-ram ambos pregados com o mesmo objectivo. eualquer dessest'cformadores era um filantropo convicto e, na prática, umdtruísta, e aquilo que pregnram era sem dúvída o Socialismonrais nobre e mais elevado, o auto-sacrifício até ao últimocxtremo. <Que os pecados do mundo inteiro caiam sobrettrim para que eu possa aliviar a miséria e sofrimento doItomem!>, diz Buda. <(...) Não deixarei chorar um úrnicoItomem que possa salvar!>, exclama o Príncipe-pedinte queusava como vestuário os trapos abandonados nos cemitérios.<Vinde a mim todos os que estais cansados e oprimidos e

lliviar-vos-ei> (*), é o apelo que Jesus Cristo, o <Homem dasDores>, que não tinha em quem se apoiar, lança aos pobresc deserdados. Tanto Buda como Cristo pregaram o amorscm limites pela humanidade, a caridade, o perdão dasinjúrias, o esquecimento de nós próprios e piedade para comas multidões iludidas; ambos demonstraram o mesmo des-prezo pela riqueza, não fazenclo qualquer distinção entrettleltm e tuum. Aquilo que desejavam era, sem revelartodos os mistérios sagrados da iniciação, dar aos ignorantes enos desorientados, cujo fardo na vida era demasiado pesado,uma esperança e um vislumbre da verdade que thes dessemIorça nos momentos mais difíceis. Mas os objectivos dos doislìcformadores não se realizaram, devido ao excesso de zelotlos seus seguidores tardios. As palavras clos Mestres foramntal compreendidas e mal interpretaclas -- vejam-se as con-scquências!

P. Mas por que motivo é que o Budismo e o Cristianis-rÌìo representam clois pólos opostos da mesma doutriria?

R. Porque as condições em que forarn pregados nãolìrram âs mesmas. Na Índia, os brâmanes, ciosos do seuconhecimento superior, clo qual excluíam todas as castasc.xcepto a deles, haviam atirado milhões de homens para aitlolatria e até para o feiticismo. Buda viu-se obrigado a pôr

70

(*) Mt. xi, 28.

7I

Á CHÁVE DA TEOSOFIA

energicamente fim a um excesso de imaginação doentia e

superstição fanática resultantes de uma ignorância que rara-mente se tinha visto até aí ou se voltou a ver. Antes umateísmo filosófico do que tal adoração cega para aqueles

<<Que clamam aos deuses e não são ouvidosOu não são atendidos>

e que vivem e morrem no desespero mental. Antes de

divulgar a verdade, Buda teve de conter essa torrente turvade superstição e de desenraizar toda uma série de erros. F.

como não podia revelat tudo, pela mesma tazão que Jesus,que lembra aos ^çerrs discípulos que os Mistérios do Reinodos Céus não são para as massas ignorantes mas só para os

eleitos e que, portanto, <lhes falava em parábolas> (Mt. xiii,3, 11), Buda, na sua prudência, ocultou demasiado. F.e-cusou-se atê a dizer ao rnonge Vacchagotta se havia ou nãoum Ego no homem. Quando instado a responder, <o Sublimemanteve-se silencioso>.

P. Isso ciiz respeito a Gautama Buda, mas de que ma-neira é que se relaciona com os Evangelhos?

R. Leia a História e medite nela. Na altura em que se

diz terem ocorrido os acontecimentos narrados nos Evan-gelhos, verificava-se uma efervescência intelectual seme-lhante em todo o mundo civilizado, embora os resultados noOriente e no Ocidente fossem opostos. Os velhos deuses

estavam a desaparecer. Enquanto as classes civilizadas se

deixavam arrastar pelos Saduceus descrentes para negações

materialistas e para a letra morta do Mosaísmo na Palestina,e para a dissolução moral em Roma, as classes mais baixas e

mais pobres corriam atrás da feitiçaria e de deuses estranhos,ou tornavam-se hipócritas e fariseus. Também ali chegaraa hora duma reforma espiritual. O Deus cruel, anttopomór-fico e cioso dos Judeus, com as suas leis sanguinárias de olhopor olho e dente por dente, do derramamento de sangue e dos

sacrifícios de animais, tinha de ser relegado para segundo

ENSINAMENT'OS FUNDAA,TENTAIS DA TEOSOFIÁ

plano e substituído por um <Pai inefável> misericordioso.Este tinha de se apresentar não como unì Deus extracósmico,rnas como um Salvador divino do homem físico, adorado noseu coração e na sua alma, tanto por ricos como por pobres.Tal como na Índia, também aqui não era possível divulgar ossegredos da iniciação para que o Revelador. e as coisasreveladas não fossem espezinhados por se dar a cães aquiloque é sagrado e se lançarem pórolas a porcos. Assim, areserva tanto de Bucla como de Jesus - que também seabsteve de revelar claramente os Mistérios cla Vida e daMorte e quer tenha ou não vivido o período que lhe ê atri-buído na história - lcvou respectivamente às negações abso-lutas do Budismo do Sul e às três expressões contraclitóriascla Igreja Cristã, existinclo 300 seitas só na Inglaterra protes-tante.

72 73

VI

ENSINAMENTOS TEOSÓFICOS SOBREA NATUREZAF. O HOMEM

A UNIDADE DE TUDO NO TODO

__ P. Agora que já me explicou o que Deus, a AIma e oHomem não são na sua opinião, gostaria que me dissesse Àque são à luz da sua doutrina.

R Na sua origem e na eternidade, os três, tal como oUniverso e tudo o que nele existe, formam um todaeom aUnidade absoluta, a essência divina incognoscível de quentrás lhe falei. Não acreditamos na criação -u. .. puruugËn,pcriódicas e consecutivas do universo do prano *ujrJtiuopara o plano objectivo do ser, em intervãlos regulares elbrangendo períodos de tempo extraordinariamenie l.rrgo*.P. Pode desenvolver um pouco mais essa ideia?R. A fim de o ajudar a compreender melhor, vou esta-belecer um paralelo com o uno ,õh, primeiro e depois comas duas metades desse ano, que no pólo Norte correìpondemrespectivamente a um dia e uma noite de seis meses. Agoratcnte imaginar em vez dum ano sorar de 365 dias a ETER-NIDADE. Suponha que o sol representa o Universo, e querr clia e a noite polares de seis úere, cluram Ig2 tríliões ottrluatriliões de anos em vez de 1g2 dias cada. Assim como os<rl se ergue todas as manhãs no nosso horizonte objectivàvindo do seu espaço antipodal e (para nôs) subjectívo, tam_

75

,.1 CI!AVE DA TEOSAFIA

bém o Universo emerge perioclicamente no plano cla objec-Íiviclade procedendo do plano da subjectividade - ou sejaos antípodas claquele. E a isto que chamamos o <Ciclo daVida>. E assim corno o sol desaparece do horizonte, tambémo Universo desaparece perioclicamente, quando chega a

<noite Universal>. Os Hinclus chamam a essa alternância<Dias e Ì{oites de Brama>, ou o tempo do Manvuntsra e doPralaya (dissolução). O homem ocidental pode chamar-lhesDias e Noites lJniversais, se preÍerir. Durantc estas últimasTudo está no Todo, todos os átomos mergulham numa únicaHomogeneiclade.

EVOLUçÃO E ILUSÃO

P. Mas quem é que cria o Universo sempre que eleressurge?

R. Ninguém o cria. A Ciência chamaria a este processoevolução; os filosofos pré-Cristãos e os Orientalistas chama-vam-lhe emanação; nós, Ocultistas e Teósofos, vemos nelea única realídade universal e eterna que projecta um reflexoperiódico de si 1trópría nas profundezas infinitas do Espaço.Este reflexo, que para si é o universo materíal objectivo, nãoó para nós senão uma ilusïro temporária. Só o que é eterno é

real.

P. Nesse caso, nós também somos ilusões.

R. Somos, como personalidades transitórias, que hojesão uma pessoa e amanhã outra. Diria que os rápidos clarõest7a aurora boraal são a <realidacle>1, por muito reais quepareçaÍn enquanto os contempla? Claro que não; a únicarealidade é a causa que a produz, caso seja permanente eeterna; o resto é apenas uma ilusão passageira.

P. Nada disso explica como é que surge essa ilusão cha-nada lJniverso; como é que o ser consciente se manifesta apartir da inconsciência que é.

E N SI N A M E NTOS T EOSOF ICOS

R. Sô é inconsciência para a nossa consciência finita.Seja por radiação ou por emanação-não vale a penacntrarmos aqui numa discussão cle terminologia _, o úni_verso passa da subjectividade homogénea païa o primeirolrlano de manifestação. São sete os plurro, ãe maniiestação,c à medida que vai passancio por cada um cleles vai_se tor_nando mais denso e material até atingir o plano ern que noscncontramos, planetário ou Solar, que, segundo clizem, ó umsistema sui generís.

P. O que é que quer dizer com sui gene,r,is?R.. Quero dizer que, embora a lei fundamental e a

actuação universal das leis da Natureza sejam uniformes,o nosso sistema solar (tal com qualquer outro sistema entreos milhões existentes no Cosmos) e até a Terra têm um pro_grama de manifestações próprio, diferente dos programas dos.ut'os sistemas. Fala-se dos habitantes de outros planetas eirnaginamos que no caso de serem hontens, ou seja, serespensantes, devem ser como nós. Até os anjos ,.-pr:, foram

'cpresentados por poetas, pintores e escultores coúo versões

rrrais perfeitas clo homem com asas. euanto a nós, isso é um()rro e uma ilusão; porque, se na Terra, que é tão pequena, secncontra uma tal diversidade de tipos na sua flora, fauna elté na própria humanidade-da alga marinha ao cedro dol,íbano, da medusa ao elefante, clo bosquímano ao Apolo dolÌclveder

-, qualquer alteração nas cãnciições cósmicas elrlanetárias terá necessariamente como resultado uma flora,ttma fauna e uma humanidade muito diferentes. Se asrìlcsmas leis clão origem a grupos de coisas e seres tão dife_rcutes no nosso plano, incruindo nele todos os seus planetas,rriro é difícil compreender que a natureza ext,eríor dos outros:ristcmas solares possa ser aincla mais diferente e que, por-lirrrto, é estúpido julgar as outras estrela:s, os outros mundos. .s ontros seres pelos nossos, tal como faz a ciência física.

P. Em que se baseia para fazer tal afirmação?R. Naquilo que a ciência dum modo geral nunca acei_

Irrrír como prova--o testemunho acumulaclo cluma sérje

76 "t '7

A CHAVE DA TEOSOFIA

interminável de Videntes que o atestaram. As suas visõesespirituais, verdadeiras explorações por e através de sentidosfísicos e espirituais libertos da carne, foram sistematicamenteverificadas e comparadas entre si e a sua natureza minucio-samente estudada. Rejeitou-se tudo aquilo que não foi corro-borado por uma experiência unânime e colectiva, conside-rando-se apenas verdade aquilo que, em épocas diferentes eem diferentes latitudes, em toda uma série de observaçõessucessivas se verificou ser conforme aos testemunhos deoutros videntes. Os métodos usados pelos nossos estudiosose pelos estudantes das ciências psico-espirituais não cliferemdos dos estudantes das ciências naturais e físicas, como aliáspoderá verificar. Simplesmente os nossos campos de inves-tigação situam-se em dois planos diferentes e os instrurnentosque empregamos não são feitos por mãos humanas, pelo quemerecem talvez até mais confiança. As retortas, acumula-dores e microscópios do químico e do naturalista podemavariar-se; o telescópio e os instrumentos horológicos doastrónomo podem estragar-se, enquanto que os nossos ins-trumentos de trabalho não estão sujeitos à influência doclima ou dos elementos.

P. E, portanto. tem fé neles?R. Fé é uma palavra que não existe nos dicionários de

teosofia: dizernos antes conhecimento baseado na observaçãoe na experiêncía. Potém, enquanto na ciência física a obser-vação e a experiência levam os cientistas a tantas hipótesesde trabalho quantas as cabeças que as propõem, o nossoconhecimenlo só admite os factos que se tornaram irre-futáveis e que foram completa e absolutamente demons-trados.

DA CONST|TUIçÃO SEPTENÁR|A DO NOSSO PIANETA

P. Para a Teosofia, a Terra faz parte duma cadeia deTerras, não é assim?

EN SI N AME NTOS TEOSOF ICOS

R. E. IvIas as outras seis <<Terras) ou Globos não seencontram no mesmo plano de objectividacte cla nossa Terra,e por isso não as podemos ver.

P. Isso deve-se ao facto de se encontrarem a uma grandedistância?

R. De modo nenhum, pois conseguimos ver a olho nuplanetas e ató estrelas que se encontram a enormes distânciasfísicas; o facto deve-se a esses seis Globos estarem fora dosÌrossos meios físicos cle percepção, ou seja cÌo nosso plano cleexistência. Não só têm uma densidade, peso e textula mate_riais completamente diferentes da Terra è dos outroslolanetasconhecidos, como se. encontram para nós numa cafrada doespaço diversa da nossa, por assim clizer. urna camacla queos n.ssos sentidos físicos não podem ver nem sentir. Masquando digo <camadal não deverá imaginar que estou afalar de camadas no senticlo de estratos sobrepostos, poisassim estaria mais uma vez a fazer uma interpretação erróìeae absurda. Por <<camada> entenclo o plano do espaço infinito,que, pela sua natureza, não está ao alcance das nossas per_cepções, quer mentais quer físicas, mas que existe realmintefora da nossa intelectualidade ou consciência comuns, forado nosso espaço tridimcnsional e cla nossa divisão do támpo.Cada um dos scte planos (ou camadas) fundamentais docspaço tem uma objectividade e subjectividade próprias, umespaço e um tempo próprios e uma consciência e sentidospróprios.

P. O que entende por senticlos próprios?R. É ou não verdade que nos sonhos temos sentidos

diferentes? Sentimos, falamos, ouvimos, vemos, saboreamose funcionamos geralmente num plano diferente, sendo amudança de estado da nossa consciência realçacla pelo factocle uma série de actos e acontecimenios abrang".rào, p.nro_rnos nós, una sórie de anos, atravessarem imagúariamãnte anossa mente nunl instante. Ora essa extraordinária rapidezclos nossos processos, mentais durante os sonhos e, simulta_neamente, a perfeita naturalidade de toda as outras funções

78 79

A CTTAVE DA TEOSOFIA

rnostran-nos que estamos num plano diferente. A nossa

filosofia diz que, tal como existem sete forças fundamentaisna natureza e sete planos de ser, há também sete estados de

consciência em que o homem pode viver, pensar, recordare ser.

P. Não aceita, portanto, a explicação dos sonhos dadapeÌa biologia e pela fisiologia?

R. Claro que não. Acreditamos na existência de seteplanos de ser Cósmico e sete estados de Consciência, e se,

no que se refere ao Universo ou Macrocosmos, paramos noquarto plano, pois não julgamos ser possível ir mais alémcom um certo grau de certeza, em relação ao Microcosmos,ou homem, especulamos livremente sobre os seus sete estados

c princípios.P. Quais são eles?

R. Consideramos em primeiro lugar que no homem hádois seres diferentes: o espiritual e o físico, o homem quepensâ e o homem que regista todos os pensamentos que écapaz de assimilar. Portanto vemos nele duas naturezas:o ser superior ou espiritual, constituído por três <princípios>ou a:specíos, e o inferior ou quaternário físico, formado porquatro, on seja, ao todo sete.

A NATUREZA SEPTENÁRIA DO HOMEM

P. Não será isso o que chamamos Espírito e Alma e

corpo físico?R. Não. Essa é a velha divisão platónica. Platão era um

Iniciado e por isso não podia revelar informações secretas,

mas aqueles que conhecem a doutrina arcaica encontramesses sete aspectos nas várias combinações de Alma e Espíritoenunciadas por Platão. Este considerava que no homem haviaduas partes: uÍna, eterna e formada pela mesma essência

do Absoluto, e, a outrâ, mortal e corruptível, cujos elementos

constituintes provinham dos Deuses menores <criados>>.

ENSINÁMENTOS TEOSÔF ICOS

Segundo ele, o homem é forrnado por um corpo mortal, umprincípio imortal e uma <espécie ãe Alma mortal inOepen-dente, a que nós, Teósofos, chamamos respectivamente ohomem físico, a Alma Espiritual ou Espírito e a Alma animalp lous e a psyche). Esta divisão foi ìambém adoptada porPaulo, outro Iniciado, que defende a existência d;- ;";;;psíquico que é semeado no corpo corruptivel (a aha ãucorpo astral) e dum corpo espiritual de substância incor-ruptível que ressuscita. Até Tiago (iii, 15) defende'a _rr*uposição ao dizer que a <Sabedoria> (da nossa alma inferior)não vem do alto mas é terrena (<psíquico, <Crmorriu.u,vide texto grego), a0 passo que a outra é sabedoria divina.Ora é perfeitamente claro que platão e o próprio pitágoras,embora falando apenas de três <princípios>, jhes atrituíamnas suas várias cornbinações sete funções distintas que cones_pondem precisamente aos sete aspecios de que faláremos emseguida:

DIFERENçA ENTRE ALMA E ESPÍRITO

P. Tem sido acusada de defender a aniquilação da per_sonalidade. É verdade?

R. De modo nenhum. Mas como essa questão da dua_lidade - a individuaridade do Ego Divino e a. personaridadedo animal humano - implica a possibilidade de à Ego imortalreal aparecer em sessões de espiritismo como <<espírito mate_rializado>>, coisa que nós não aceitamos, os nossos adversárioscomeçaram a fazer-nos essa acusação absurda. O que acon_tece geralmente e quase sempre é a consciência pessoalmergulhar na consciência individual ou imortal do Ego, ouseja, uma transformação ou transfiguração divina,

-rónaoapenas totalmente aniquilado o quaternário inferior. Ouacha que o corpo ov a personalidade temporária, isto é, asombra do homem, o seu <<astral>, os seus instintos animaise atê a sua vida física podem sobreviver juntamente

"o* .80 81

DIVIS,ÃO TEOSOFICA

(h) Yida ou prin-cípio Vital

ú

ÍJìIÃz

d,

zg

FD

'cl) Rupa ouSthulasaríra

b) Prana

c) Linga-sharira (c)

d) Kama-nrna (ã|

l

l

ía) Corpo físico

TERMOS EMSÂNSCRITO

çoes

SIGì.TIFICADOEXOTÉRICO

Corpo Astral

Sede dos dese-jcs. e. paixõestìnlmaÌs

l(e)t"II

I

Manas - prin-l íe)cípio dualnas suas fun-

A Mente, a In-teligência: queé a mente hu-mana superior,cr:lja luz ou ra-diação rÌne aM(tnada, du-rante a vicla,ao hornemrnortal

A Akna Espi-ritualEspíriÍo

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I

(f)

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BXPLICAÇÃO

(a)

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(c)

(d)

Veículo de todos osoutros <princíPios>durante a vidaNecessário apenasDaraa,cedepataãs funções do Mo-nos inferior, que en-globam todas as queestão limitadas aocórebro (físico)O Duplo, o fan-tasmaCentro do homemanirnal, onde se en-contra a linha divi-sória que separa ohomem mortal daentidade imortal

/e) O estado futuro e' o destino Kármicodo homem variamconsoante o Manasgravita em sentidoclescendente aproximanrlo-se de Karna--r,upa, sede. das pai-xoes anlmals, ou emsentido ascendenteaproximando-se deBuddhi, o Ego Es-piritual. Neste caso,a consciência supe-rior das aspiraçõesEspirituais indivi-duais da Mente(Manas),aoassi-milar Buddhi, éabsorvida por ele,formando o Ego,que atinge a felici-dade no Devachân.

(/) l/eículo do espíritouniversal puro.

(g) Forma uma unidadecom o Absoluto,como sua irradia-ção.

Atma

83

ËNSINÁMENTOS TEOSÓFICOS

<Ego espirituai> e tornar-se sempiternos? Como é natural,tudo isso deixa de existir no momento ou pouco tempo clepoisda morte do corpo. Com o tempo, desintegra_su Ë"-pt.tu_mente e clesaparece da vista, sendo aniquilado como umìodo.

P. Portanto também nega a ressurceiÇão da carne?R. Sern clúvida. Por que razã.o haviaLlros nós, que acre_

ditamos na filosofia esotérica arcaica dos Àntigos, dL aceitaras especulações antifilosóficas duma teologia cristã posteriorinspiracla nos sistemas exotéricos, cle origem Egípcia * Gr.go,dos Gnósticos?

P. Os ÍJgípcios veneravarn os Espíritos cla Natureza edivinizavam até as cebolas; os F{indus ainda hoje sã,o icló-latras; os Zoroastrianos acloravâm e ainda aclorarrr o sol; e osmaiores filósofos gregos

- basta apontar platão e Demó-crito __ erarn sonhadores ou materialistas. Como é que podelazer uma tal comparação?

. R. 'ïalvez seja assim no catecismo moderno cristão e atécientífico, mas não para os espíritos imparciais. Os Egípciosveneravam o <<Unico), a quem chamavam NuÍ, e foi a pìrtirdessa palavra que Anaxágoras formou a palavra

-Nous

Itlouç aüroxpar{ç , (a Mente ou Espírito Autopotente>,o à,gy'hcxì; nryúoeuÇ, o motor principal ou primum mobile detudo. Para ele, o Nous era Deus e o logos era o homem,uma emanação de Deus. 0 Nous é o espírito (tanto noCosmos como no homem) e logos, quer como Universo quercomo corpo astral, uma emanação daquele, não sendó ocorpo fÍsico mais que a parte animal. As nossas facul-clades externas apreendem os fenómenos rRas apenas o Nous(: capaz de reconhecer os númenos. Só o logos ol o númenosobrevive, poïque é imortal pela sua própria natureza e essên_cia; o logos no homem é o Ego Eterno, ìquele que reincarnac não tem fim. Mas como pode a sombra efémerà ou externa,o invólucro transitório dessa Emanação divina que retornaà origern de que procedeu, set aquilo que perdura na suaìncorruptíbílidade?

A CHAYE DA TEOSOFIA

P. No entanto não vai poder evitar que a acusem de

ter inventado uma nova divisão dos elementos espirituaise psíquicos do homem, pois nenhum filósofo se tefere a eles,

ainda que esteja convencida de que Platão o faz'R. E mantenho a minha afirmação. Além de Platão

posso apontar também Pitágoras, que defendia a mesma

ideia (*). Este considerava a Alma uma Unidade capaz de

se mover por si própria (mónada), composta por três ele-

mentos: Nons (Espírilo), phren (a rnente) e thumos (vida,

sopro ou o Nephesh dos Cabalistas), que correspondem ao

nosso <<Atma-Buddhi> (Espírito-Alma superior), a Manas(o Ego) e a Kama-rupa juntamente com o reflexo ínferiorde Manas. Aquilo que os filósofos Gregos da Antiguidade

designavam por Alma, duma maneira geral, chamamos nós

Espírito ou Alma Espiritual, Buddhi como veículo de Atma(Agathon, ou Divindade Suprema de Platão). O facto de

Pitágoras e outros afirmarem que não só o hornem mas

também os animais possuem o plren e o thumo's prova que

se referiam ao reflexo inferior de Manas (instinto) e a Kama-

-rupa (paiNóes animais). E como Sócrates e Flatão aceitaram

essa divisão e a adoptaram, se a estes cinco, Agathon (Divin-

dade ou Atma), Psique (Alma em sentido colectivo), Noas

(Espírito ou Mente), Phren (mente física) e Thumos (Kama-

-rupa ou paixões) acrescentarmos o eidolon dos Mistérios,

a forma astral ou o duplo e o corpo físico etêrico, será

fácil demonstrar que as ideias de Pitágoras e Platão eram

idênticas às nossas. Os próprios Egípcios aceitavam a divisão

septenária. Segundo eles, ao deixar este mundo, a Alma(EGO) tinha de passar pelas suas sete câmaras ou prin-

cípios, os que deixava para trás e os que levava consigo.

E N SI N A M E NTOS T EOSO F IC.OS

A única diferenga é que, tendo sempre presente no espíritoo castigo que lhes seria infligido, que era a morte, se reve-lassem as doutrinas dos Mistérios, divulgavam as suas teoriasem termos muito gerais, ao passo que nós as despnvolvemose explicamos pormenori zadamente.

(*) <Platão e Pitágoras>, diz Plutarco. <dividem a alma em duasor.ì"ó: a iáóiõnat (no?tica)'e a irracional (agonia); a parte racionalãí âtma humana é eterna, pois embora não seja Deus é o produtodúma divindade eterna, masã parte que foi privada de razã'o (agnoia)mórrel (De placitio philosoph-orum, Livro IV, iv, vii.)

84 85

VII

DOS VÁR.IOS ESTADOS APOS A MOR.TE

O I"{OMEM FÍSICO E O HOMEM ESPIRITUAL

P. Muito me alegra ouvi-la dizer que acredita na imor_talidade da .dlma.

R. Da Á,lma, não. Do Espírito divino, ou melhor, naimortalidade clo Ego reincarnante.

P. Mas qual é a diferença?R. Para a nossa filosofia são duas coisas rnuito dife_

rentes, mas a questão é demasiado abstnrsa e difícil para serabordada em meia-dúzia de palavras. Ern primeiro lular tere_mos de analisar os dois conceitos supuràduun.nte ã depoisem conjunto. Comecemos pelo Espírito.

Segunclo a nossa doutrina, o EspÍrito (o <pai inefáveb,segunclo Jesus) ou Atman, não é propriedade inclividual denenhum hornem mas sim a essência Divfua que não tern coi.ponem forma; é imponderável; invísível e indivisível; aquiìoque não existe e, no entanto, é, tal como os Budistas dúemclo Nirvana. Pai_ra sobre o hornem mortal; aquilo que penetranele e impregna todo o seu corpo são apenas os seus raiosomnipresentes ou a sua luz, irracliados atravós d.e Buddhi,seu veículo e emanação directa. E este, aliás, o sentidooculto das afirmações de quase todos os filósofos da Anti-guidade quando diziam que (a parte racional da alma hu_

B7

A CHAVE DA TEOSOFIA

mana)) (*) nunca penetrava totalmente no homem, mas ape-nas pairava mais ou menos sobre ele através da Almaespiritual irracional (*n') ou Buddhi.

P. Tinha a impressão, talvez errada, de que só a <AlmaAnimab erra irracional e não a Divina.

R. Deverá aprender a distinguir aquilo que é negativaou passívamenle <<irtaçional>> por ser indiferenciado, do queé irracional por ser demasiado actívo e positivo. O homemé ao mesrno ternpo uma correlação de poderes espirituaise de forças químicas e físicas que se tornarn actuantes emresultado daquilo a qì.re chamamos <princípios>.

P. Tenho lido bastante sobre esse assunto e parece-meque, ernbora estejam de acordo num ou noutro ponto, asideias dos filósofos antigos erarn muito diferentes das dosCabalistas medievais.

R. A diferença fundamental é que, enquanto nós acre-ditamos, tal como os Neoplatónicos e os Orientais, queo espírito (.dtma) nunca se une hipostaticamente ao homemvivo, derramando apenas a sua luz ern maior ou rnenor quan-tidade sobre o homem interior (o composto psíquico e espi-ritual dos princípios astrais), os Cabalistas afirmam que, aoseparar-se do oceano de luz e do Espírito Universal, o Espí-rito humano penetra na Alma do homem, aí permanecendodentro da cápula astral durante a vida.

P. Qual é a posição da Teosofia relativarnente a estaquestão?

R. Segundo a Teosofia, só a radiação do Espírito (ouAtma) está presente na cápsula astral, e só no que diz respeito

(*) Em sentido genérico a palavra <racional> neste contextosignifica emanado da Sabedoria Eterna.

(**) Irracíonal no sentido de que como emanaçáo pura da menteUniversal não pode ter qualquer razão individual própria neste planoda matéria. Mas, tal como a Lua que recebe a luz do Sol e a vidada Terra, também Buddhi, cuja luz de Sabedoria procede de Atma,recebe de Manas as suas qualidades racionais. No entanto, per see como coisa homogénea, carece de qualquer atributo.

DOS VÁR\OS ES\4íOS AP{):i A A4CIRTE

a essa mesma radiação espiritual. Dizemos que c homenr. e aalma têm de conquistar a imortalidade ascendendo parl. aunidade, à qual, se bem sucedidos, se ligarão e na qual serãofinalmente, por assim clizer, absorvidos. A inctrividualizaçãodo homem depois da morte depende do espírito, não da suaalma nem do seu corpo. Ernbora a palavra <<personalidade>,tal como é geralmente entendida, seja um absurdo se apli-cada literalmente à nossa essência imortai, esta é, no entanto,como Ego individual, uma entidade distinta, imortal e eternaper se. Só no caso dos ddeptos da magia negra ou de crimïnosos sem possíbilidade de redenção, ou seja, aqueles queforam crimínosos durante uma longa s,árie de vidas, ê que ofio de luz que liga o espírito à alma pessoal desde o nasci-mento da criança se parte violentamente e a entidade libertado corpo se separa da alma pessoal, que é aniquilada semdeixar no espírito o menor vestígio. Se a união cntre o Manasinferior ou pessoal e o Ego individual reincarnante não severificar durante a vida, aquele terá o mesmo destino queos animais inferiores, dissolvendo-se gradualmente no étere aniquilando-se a sua personalidade. Mas, até nesse caso,o Ego permanece um ser distinto. Ele (o Ego espiritual)apenas perde uma passagem pelo Devachan - depois dessavida especial e na realidade inútil - como per.s onalídadeidealizada, reincarnando quase imediatamente depois de gozara liberdade por um curto período de tempo como espíritoplanetário.

P. Em lsls sem Yêu afirma que esses EspÍriíos plane-tários ou Anjos -

((os deuses dos Pagãos ou os Arcanjos dosCristãos> - nunca tomarão a forma de homens no üossoplaneta.

R. É verdade. Não <<esses)), como disse, rnas a:lgumashierarquias superiores de Espíritos Planetários. E nuncaserão homens neste planeta porque são Espíritos libertos pro-cedentes dum mundo anterior e que, corno tal, não podemvoltar a ser homens neste. No entanto, todos eles voltarãoa viver no Mahamanvantara seguinte, muiio superior a este,

B8 89

A ÇFÍAVE DÁ TEOSOFIÁ

depois de esta <grande Épocal e de o <<Brahrna pralaya> (urncurto período representado por um número duns 16 alga-rismos) terminarem, pois com certeza que sabe que, segundoa filosofia Oriental, a humaniclade é constituída por esses

<Espíritos> aprisionados em corpos hurnanos. A difereuçaentre os animais e os homens reside no facto de que aquelessão animados potencíalmente pelos <princípios>> e estes são--no efectittamenta Percebe agora qual é a diferença?

P. Sim, mas isso é um problema qÌ)e os metafísicosnunca conseguiram resolver.

R. Tem razão. Todo o esoterisrno da filosofia tsudistase baseia nesse ensinamento rnisterioso. Até os própriosmetafísicos tôrn muita tendência para confundir o efeito coma causa. Um Ego que conquistou a vicla irnortal como espíritopermanecerá o mesmo ser interior ao longo de todos os seusrenascimentos na terra, o Ere não imptrica necessariarnenteque tenha de continuar a ser o Sr. Srnith ou o Sr. Brownque foi na terra ou de perder a sua inCividualidade. Daí quea alma astral e o coïpo terrestre do hornem possaïn, na vidapara alérn da rnorte, ser absorvidos pelo oceano cósmicode elementos sublirnados e deixar de sentir o seu último Egopess:oal (caso não merecer elevar-se a um plano superior)e que o Ego dívino possa manfer a mesma entidade inalte-rada, ainda que esta experiência terrestre da sua emanaçãopossa ser totalmente obliterada no momento ern que se

separa do seu veículo indigno.P. Se o <Espírito>> ou parte divina da alma já existia

corno ser distinto de toda a eternidade, tal corno ensinavamOrígenes, Sinésio e ourtros filósofos, e se é exactamente amesÍna coisa que a alma metafisicamente objectiva, cornopoctre deixar de ser eterno? E que importa nesse caso que ohomem tenha uma vida pura ou uma vida animal se, façao que fizer, não pode nunca perder a sua individualidacle?

R. Essa doutrina, tal como a acaba de expor, é tãoperniciosa nas suas consequências como a do sacrifício ex-piatório. Se este último clogma bem como a icleia falsa de que

DOS VÁRIüS ESTADOS Ápos Á A,IORTE

somos tocios imortais tivessem sido demonstrados ao muncl<;na sua verdade, a humaniclade teria beneficiado grandementecom a sua difusão. Não ó de mais insistir que Pitágoras,Platão, Timeu e Locres e a antiga Escola de Alexandriadiziam que a Alma do hornem (ou os seus <<princípios> supe-riores e atributos) procede cla Alrna Universai do Mundo,a que chanramos Aether (Pater Zeus). dssim, nenhum destes<princípios> pode ser a essência pura da Mónada Pitagóricaou do nosso Atma-Buddhí, poi'qlre a Á.nima Mundí náa ésenão o efeito, a emanação subjectiva, ou melhor, a radiaçãodaquela. Tanto o Espírito humana (ou individualidade), oEgo Espiritual reincarnante, como Buddhi, a alma Espiri-tual, são preexistentes.

P. Considera que a Alma, ou seja, a Alma pensantedo homem ou aquilo a qne chama Ego, ê mat&ìa?

R. Matéria não, rnas substância sem dúvida. Aliás apalavra <<matéria>> não me repugnaria desde que fosse seguidado adjectivo primordíal. Segundo a Teosofia, essa matériaé coeterna com o Espírito, não sendo a nossa matêria visível,tangível e divisível, rnas a sua máxima sublimação" O EspírìtoFuro não é senão um grau do não-F,spírito ou /odo absoluto.A não ser que aceite que o homem evoluiu a partir desteEspírito-matéria prirnordial e representa uma escala suces-siva e gradual de <princípios> que vão do meta-Fspirito atéà matéria mais grosseira, como é que pode considerar ohamem-ìnterior itnortal e, ao mesmo tenpo, como umaEntidade espiritual e urn hornem rnortal?

P. Nesse caso, por que não ver em Deus uma Entidarlesemelhante?

R. Porque aquilo que é infinito e não condicionado nãopode ter forrna nem ser um s€r. Uma <entidade> é imortal.não na sua forrna individual mas só na sua essência últinra.quando, uma vez atingido o último ponto ctro ciclo, é absor.-vida pela sua natureza primordial. E, torna-se espírito qutncloperde o nome de Entidade.

90 9I

A CHAVL NÁ TEOSOFIÁ

Como forma, a sua imortalidade está limitada ao seu

ciclo de vida ou Mahamanvantnre, após o que é idênticaao Espírito lJniversal, com o qual forma uma unidade, dei-xando. portanto, de ser uma Entidade clistinta. A Almapessoal - expressão que usamos para designar a centelhacle consciência que mantém no Ego Espiritual a ideia do<<Eu> pessoal da última incarnação - continua a existir comorecordação separada e distinta durante a sua passagem peloDevachan; depois disso junta-se às inírmeras incarnações doEgo, tal como ao fim dum ano a recordação de um ouvários dias se dilui na nossa memória. Se o seu Deus é infi-nito como pretende, como é que pode estar associado a con-clições finitas? Só é imortal aquilo que está indissoluvelmentecimentado por Atma (ou seja o Buddhi-Manas). A Almado homem (isto é, da personalidade) per se não é nem imortal,nem eterna, nem divina. Segundo Zohar (I,65 C, 66 a), <<tal

como a alma ao ser enviada para a terra se cobre de

roupagens terrestres para se proteger enquanto aqui estiver,assim também recebe lá no alto um trajo brilhante a fim depoder olhar sem se ferir para o espelho cuja luz provém doSenhor da Lun. O Zohar diz ainda que a alma não pode

alcançar a região da bem-aventurança se não tiver recebidoo <beijo sagrado> ou se não se tiver reunido com a substânciad,e que emanou- o espírito (*). Todas as almas são duaise, ao passo que a alma é um princípio feminino, o espíritoé masculino. Enquanto aprisionado no corpo, o homem éuma trindade, a não ser que, devido à sua impureza, se tenhadivorciado do espírito. <Infeliz a alma que ao seu divinoesposo (espírito) prefere o casamento terrestre com o corpomaterial>, diz um texto do Livro das Chaves, uma obrahermética. Infeliz na verdade, poïque nada restará dessa

personalidade e nada será gravado nas tábuas imperecíveisda memória do Ego.

DOS VÁRIOS ESTÁDOS APOS A MORTE

P. Como pode deixar de ser imortal aquilo que, emboranão insuflado no homem por Deus, é, segundo as suas pró-prias palavras, formado por uma substância idôntica à subs-tância divina?

R. Todos os átomos e partículas de matéria, e nãoapenas de substância, são ìmperecíveís na sua essência, masnão na sua consciência índívidual. A imortalidade não émais que a nossâ- consciência ininterrupta c, como tal, aconsciência pessoal não pode durar para além da persona-lidade, não é assim? Essa consciência so sobrevive atravésdo Devachan, aoós o que é reabsorvida, primeiro pela cons-ciência índíviduail e depois pela consciència universal.

DA RECOMPENSA E DO CASTIGO ETËRNOS E DO NIRVANA

P. Julgo ser desnecessário perguntar-lhe se acredita nosdogmas cristãos do Faraíso e do Inferno ou nas recompensase castigos eternos pregados pelas igrejas Ortodoxas.

R. A Teosofia rejeita inteiramente esses dogmas talcomo são descritos nos vostsos catecismos, recusando-seacima de tudo a aceitar que o Paraíso ou o fnferno sejameternos. Mas acreditamos firmemente naquilo a que cha-mamos Leì da Retribuição e na absoluta justiça e sabedoriaque regem esta tgi*gJl$.*mgÀ Daí que nos recusemos termi-nantemente a aceitar a convicção cruel e antifilosófica clarecompensa e castigo eternos.

P. Tem outras razões para rejeitar este dogma?R. A razã,o principal reside na reincarnação. Como já

disse, nós não aceitamos a ideia de que para cada criançaque nâsce seja criada uma*glm,A "rçrJê. Acreditamos que todoo ser humano é portador ot veículo dum ãgo coevo de todosos outros Egos, porque todos os ,Ê'gos são da mesma essênciae pertencem à emanação primordial de um único-ãg"q"-.-!ÍÌfi$flge universal, que Platão designava por JW.:X(ou segundoDeus manifestado) e que nós, Teósofos, denominamos o('i) II, 97 a; T, 168 a.

92 93

A CÍ{AIlE DÁ TEOSQF'IA

princípio divino manifestado; este forma uma unidade coma mente ou alma puiyer$p] e não com o Deus antropomór-fico, extracósmico e pessoal em que muitos teístas acre-cÌitam.

P. Mas, uma vez que aceita a existência dum princípiomanifestado, não entendo por que não acredita que a ahnade cada novo rnortal seja criada por esse Princípio, tal comoo foram todas as outras Almas.

R. Forque aquilo que é ímpessoal não pode criar, pla-near ou pensar a seu bel-prazer. Sendo uma lei universai,imutável nas suas manifestações periódicas, que consistemem irradiar e manüestar a sua essência no princípio de cadanovo cicl,o_d_+_yt4jr, não pode criar homens apenas para algunsanos depois se arrepender de os ter criado. Se temos de acre-ditar num princípio diyj-+o, então que seja num cuja har-monia, lógica e justiça sejam tão absolutas como o amor,sabedoria e imparcialidade; e um Deus que criasse cada

alma para durar os breves anos duma vida, independente-mente do facto de ela ir animar o corpo dum homem prós-pero e feliz ou o durn pobre desgraçado condenado a sofrerdesde o nascirnento até à morte, embora nada tenha feitopara merecer destino tão cruei, seria mais um espírito malé-fico do que um Deus. Ora, nem sequer os filósofos .fudeus,que acreditavam (esotericarnente, claro) na Bíblia Mosaica,jamais defenderam tal ideia; aliás acreditavam na reincar-nação, tal como nós.

P. Pode dar exemplos que compïovem essa afirmação?

R. Sem dúvida. Fílon, o Judeu, diz (em De Somníis,I, $ 22): <O ar está cheio delas (cle almas); as que estãomais perto da terra e .gue descem para se unirem a corposmortais, aaìruòpopoôorv q:tïc , retornam a outros corpos emque estão ansio,sas por viver.>> Na Zohar diz-se que a alrnasuplica a Deus que the conceda a liberdade: <<Senhor doUniverso! Sou feliz neste rnundo e não é meu desejo ir paraoutro onde serei apenas uma escrava e ficarei exposta a toclas

DOS VÁRIOS ãSTIDOS APOS A ArORTE

as corrupções.)) (*) A resposta da Divindade ilustra bem adoutlina da necessidade fatal, a lei eterna e imutável: <contraa tua vontade te transformas em embrião e contra a tuavontade nasces.> q,r*) A iuz seria incompreensívei se nãopudesse manifestar-se em contraste co(n a escuridão; o bemcleixaria de ser bem se não houvesse o mal para pôr emevidência o seu valor inestimável; também do mesmõ rnodoa virtude pessoal não teria quaiquer mérito se não tivesseexperimentado o fogo da tentação. Nada, a não ser a Divin-dade Oculta, é eterno ou inalterável. Nada do que é finito- quer porque haja tido um começo, quer porque tenhaum fim-pode perÍnanecer estacionário; tudo tem de avan-çar ou retroceder. E uma alma que anseie unir-se com o seuespírito como única maneira de alcançar a irnortalidacledeve purificar-se através de {pansmiglaçõ-es cíclicas progres_siy*_q, procurando até atingir a única terra de felicidaãe erepouso eterno, charnada <O Falácio do Arnou no Zohar,;'ï:;11{})';l(*o*); <Moksha> na religião hindu; <O plero-ma da Luz Eterna> pelos Gnóticos e <rNirvana> pelos Bu_distas. Todos estes estados são transitórios e não eternos.

P. Mas não há aí qualquer referência à reincarnação.R. LIma alma que suplica que a deixem prr-urró.",

onde está tem de ser pree'xístente, nã,o podenão ter sidocriada nssse momento. Aliás o Zohar (III, 61 c) confirma oque acabo de dizer. Ao falar dos Egos re-incarnantes (asalmas racionaís), aqueles cuja última pórsonalidade tem dedesaparecer inteiramente, diz: <Toclas as alrnas que no céu sealienaram do santo dos santos - bendito seja o ieu Nome --lançaram num abismo a sua existência, antecipando o mo-mento de descerem de novo à terra.>> <<O santo dos santos>significa aqui, esotericamente, â!nr-gll, ou Atma,Buddhí.

F. Além disso acho muito estranho que se refira aolrtrirvana como sendo sinónirno do R eino dos céus ou paraíso,

(*) Zohar, lI, 96 a. ed. Amst.(**) Mishnqh Pirke Aboth, IV, $ 29.(***) II, 97 a.

94 95

Á CHÁVE DA TEOSOFIA

quando, segundo todos os Orientalistas eminentes, é sinónimode aniquilação!

R. Só se a palavra for tomada literalmente e no que diz

respeito à personalidade e à matéria diferenciada. Estas

ideias sobre a reincarnação e a trindade do homem foramtambém defendidas por muitos dos primeiros Padres cristãos.Antes de poder unir para sempre a sua mais pura essência

ao espírito imortal, a alma pessoal tem de se desintegrarem partículas. Na filosofia tsudista a palavra aniquiloçãosignifica apenas dispersão da matória, seja qual for a formaou a aparência com que se apresente, porque tudo o que

tem forma é temporário, não passando, portanto, dumailusão. Pois para a eternidade os períodos mais longos que

se possam imaginar não são mais que um abrir e fecharde olhos. O mesmo se poderá dizer da forma, que desaparece

para sempre como o clarão súbito dum relâmpago antes de

tetmos tempo de nos apercebermos do que o vimos. Só

quando a entidude espiriiual se sepaïa païa sempre de todasas partículas de matéria, substância ou forma e se torna de

novo um sopro Espiritual é que ela entra no Nírvona eternoe inalterável, que dura o mesmo tempo que durou o ciclode vida, ou seja, uma eternidade. Esse sopro que existeem Espírito não é nada, porqtte ê tudo; como forma, oucomo aparência, é completamente aniquilado, mas, comoEspírito absoluto, é, pois tornou-se o próprio Ser. Mesmoa expressão <absorvida na essência universal>, usada quando

se fala da <Alma> como Espírito, significa <<união com).Nunca pode significar aniquilação, porque isso equivaleriaa uma separação eterna.

P. Não lhe parece que pode ser acusada de pregar aaniquilação ao falar nesses termos? Acaba de reafirmar que

a Alma do homem regressa aos seus elementos primordiais.R. Esquece-se com certeza de que já aqui expus as dife-

renças existentes entre os vários significados da palavra<Alma>; aliás tarnbém lhe fiz notar que a palavra Espíritotem sido traduzida com pouca exactidão. A Teosofia fala

E N SI N A M ENTOS TEOSÓF ICOS

cm Alma animal, humana e espírítual e estabelece a dife.rença que há entre elas. Platão, por exemplo, chama (ALMAracionab ao que nós chamamos Buddhi, acrescentandoJheno entanto o adjectivo <espiritual>; mas àquilo que nósdenominamos Ego reincarnante, Mene4 chama ele Espírito,Nous, etc., ao passo que nós só usamos a palavra Espírito,isolada e sem a qualificarmos, em relação a Atma. pitágorasdefendeu uma doutrina idêntica ao afirmar que o Ego (Nous)é coeterno com a Divindade e que a alma cleve passar porvários estádios para atingir a perfeição divina, enquanto othumos retorna à terra e o próprio phren, o hÍanas inferior,é eliminado. Também Platão define a Alma (Buddhi) comoo <movimento que é capaz de se tnover por si próprio>.<A Alma - diz ainda - é a mais antiga de todas as coisase o começo do movimento.>> Chama, portanto, <<Alma> aAtma-Buddhi e <Espírito> a Manas, e nisso diverge daTeosofia.

<A alma foi gerada antes do corpo, e o corpo é posteriorc secundário, uma vez que, de acordo corn a natureza, égovernado pela alma que governa.> <A alma, que ciirige emtodos os aspectos todas as coisas que são movidas, clirige cleigual modo os céus.>>

<A alrna conduz, assim, tudo no céu, na terra e no maratravés do seu movimento - podendo este designar-se porquerer, considerar, cuidar, consultar, formar opiniões verda-deiras e falsas, estar num estado de alegria, tristeza, con-fiança, medo, ódio, amor, juntamente com todos os rnovi-mentos primários que a estes se associam... Sendo uma deusa,cla escolhe sempre como seu aliado Now, que é também umdeus, e disciplina todas as coisas recta e venturosamente; se,porém, se junta à Anoía- e não ao nous - produz o efeitocontrário.> (*)

Nesta linguagem, o negativo é consideraclo existênciacssencial, tal como nos textos budistas, e é segundo essa

(n) ls Leis, X, 896-7 B.

97

A CHAYE DA TEOSOFIA

mesma exegese que se emprega a palavra aniquilação.O estado positivo é o ser essencial, mas sem manifestação.De acordo com a doutrina budista, quando o espírito entrano Nirvana perde a sua existência objectiva, mantendo, noentanto, o ser subjectivo. Dum ponto de vista objectivo issoé tornar-se o <<nada> absoluto, mas, dum ponto de visiasubjectivo, é <nenhuma coisa>1, nada que possa ser apreen-dido pelos sentidos. Assim, o Nirvana dos budistas repre-senta a certeza da irnortalidacle individual no Espírito e nãona Alma, que, apesar de ser <a mais antiga de todas as

coisasn, não deixa de ser também - assim como todos os

outros Deuses - uma emanação finita, senão na substância,pelo menos nas formas e individualidade.

DOS VÁRIOS PRINCÍPIOS DO HOMEM

P. Embora tenha ouvido falar muito sobre essa consti-tuição daquilo a que chama o <<homem interior>, devo con-fessar, como diria Gabalis, que, para mim, <<não tem pes

nem cabeça>>.

R. É natural, pois trata-se duma questão extremamentecomplexa e, tal como clisse, difícil de entender correctamente,não sendo fácil distinguir os vários aspecto's que designamospor <princípios> do EGO real. Aliás torna-se ainda maisdifícil na medida em que existem divergências flagrantesentre as várias escolas Orientais quanto ao número desses

princípios, embora basicamente o substrato doutrinal sejao mesmo.

P. Refere-se, por exemplo, aos Vedantistas? Não sãoeles que reduzem os sete <princípios> da Teosofia a cinco?

R. Tem razão, ÍrÌas, se bem que não pretenda discutireste ponto com um Vedantista erudito, permito-me afirmar,a título meramente pessoal, que, na minha opinião, têm umarazão evidente para o fazer. Para eles, o Homem é apenaso agregado espiritual composto, que é constituído por diversos

E N S I N AMENTOS TEOSÔF ICOS

aspectos rnentais, já que o corpo físico é, no seu entender,uma coisa indigna, não passando duma mera ilusão. Aliáso Vedanta não é a única filosofia a sustentar essa posição.No Tao-te-King, Lao-Tze menciona também apenas cincoprincípios, pois, tal como os Vedantistas, omite dois prin-cípios, ou seja, o espírito (Atma) e o corpo físico, ao qualchama até <o cacláven>. Há ainda a Escola Taraka Raja yogu,que reconhece exclusivamente três <princípios>; mas, na rea-lidade, como Sthulopadhi ou corpo físico no seu estado cons-ciente, Sukshmopadhi, o mesmo corpo em Svapna ou estaclocle sonho, e Karanopad.hi, <<corpo causab> ou aquilo que passaduma incarnação para outra, são duais nos seus aspectos,perfazem assim um total de seis. Se lhes juntar Atma, oprincípio divino e impessoal ou o elemento imortal noHomem, que não se distingue do Espírito Universal, obteráde novo sete (*).

P. Essa divisão parece-me idêntica à dos Cristãos mís-ticos: corpo, alma e espírito.

R. Absolutamente idêntica. Podemos facilmente consi-derar o corpo o veículo do <Duplo vitab, este último o veí-culo da Vida ou Prana, Kama-rupa ou alma (animal), o veí-culo mental superior e ínferior, encontrando, assim, seis prin-cípios, acima dos quais estará o espírito imortal uno. Segundoo Ocultismo, todas as mudanças qualitativas do nosso estadode consciência dão ao homem um novo aspecto, güe,a prevalecer, e a tornar-se parte do seu Ego vivo e actuante,deve receber (e recebe) um nome especial, a fim de distinguiro homem que se encontra nesse estado específico do homemque ele é quando se apresenta noutro estado.

P. É precisamente isso que é muito difícil de com-preender.

R. Pelo contrário, parece-me até muito fácil, uma vezque tenha apreendido a ideia fundamental, isto é, que o

- (! Para _uma expücação mais clara, ver A Doutrina Secreta,

vol. I, p. 157 (p.209 Ed. Edyar).

98 99

A CHAYE DA TEOSOFIA

homem actua neste ou em qualquer outro plano de cons-ciência estritamente de acordo com a sua condição mentale espiritual. Divida o ser terrestre chamado homem em trêsaspectos principais, se entender; aliás terá de o fazer se

não o quiser reduzir a um simples animal. Considere o seucorpo objectivo, o seu princípio pensante-que é só um

tr)ouco superior ao elemento instintívo no animal - ou almavital consciente e aquilo que o coloca tão incomensuravel-mente para além e acima do animal, ou seja, a sua almaracional ou <<espírito>. Pois bem, se considerarmos estes trêsgrupos ou entidades repxesentativas e os subdividirmos deacordo com os ensinamentos ocultistas, o que é qtre encon-tramos?

Em primeiro lugar, o Espírito (no sentido de Absolutoe, portanto, TODO indivisível) ou Atma; como em filosofiaeste não pode ser situado nem limitado, sendo apenas aquiloque E na Eternidade e que não pode estar ausente de qualquerponto geométrico ou matemático do universo da matéria ouda substância, por ínfimo que ele seja, não deveria sequerna verdade chamar-se princípio <humano>. Em Metafísicaserá antes, e na melhor das hipóteses, esse ponto do espaçoque a Mónada humana e o seu veículo, o homem, ocupamdurante cada uma das suas vidas. Mas esse ponto é tão irna-ginário como o próprio homem, não passando na realidadeduma iiusão, maya; mas para nós, bem como para os outrosEgos pessoais, somos uma realidade durante essa breve ilusãochamada vida e temos de acreditar eÍn nós, pelo menos nanossa imaginação, e ainda que mais ninguém o faça. A fimde o tornar mais apreensível para o intelecto humano, numaprimeira tentativa de estuclar o Ocultismo e resolver o á-bê-cê

do misiério do homem, o Ocultismo chama a este sétimoprincípio a síntese do sexto e atribui-lhe como veículo a AlmaEspiritual oa BuddhL Ora esta esconde um segredo nuncarevelado a ninguém excepto aos chelas, que fazem voto irre-vogável, ou àqueles que sejam dignos de confiança. A almadivina ou Buddhi é, portanto, o veículo do Espírito. Em

E N SI N A M ENTOS T EOSÓ F I CO S

conjunção, estes dois são um só, impessoal e sem atributos(neste plano, é evidente) e constituem dois princípios esp!rituais. Passemos à Alma Hwna.na, Manos ov mens, e todosconcordarão certamente que a inteligência do homern é pelomenos dual: um homem de espírito generoso dificilmentepoderá r,ir a ser um espírito mesquinho; há um abismo entreo homem com tendências intelectuais e espirituais e o homemobtuso' estúpido, material ou mesmo com instintos animais.

P. Mas por que não há-de o homem ser representadoantes por dois princípios ou dois aspectos?

R. Todos os homens têm em si estes dois princípios,um dos quais mais activo do que o outro, e há casos atÀ emque um deles foi totalmente impecliclo cle se desenvolver,ou, por outras palavras, paralisado pela força e predomi_nância do outro aspecto,, seja ern que senticlo for. Estes são,pois, aquiio a que chamamos os dois princípios ou aspectosde Manas-o superior e o inferior; o primeirr, o úunu,superior ou o EGO consciente e pensante, gravita em direc_ção à Alma esiriritual (Buddhi); e o segundo, o princípioinstintivo, é atraído por Kama, sede dos desejos e paixõesanimais no hornem. Temos assim quatro princípios provados,sendo os três últimos: (1) o <<Duplo>, qì.re concordámos emdesignar por Alma Plástica, semelhante a Froteu, e que éo veículo do segundo; o príncípío da vida; e o terceiro,queéocorpofísiço.

P. Mas, para si, qual deles é que reincarna?R. O Ego Espiritual pensante, o princípio permanente

do homem ou aquilo que é a sede de Manas. Não é o Atmanem sequer Atma-Buddhi, considerado como Mónada dual,que é o homem ìndíviduol ou divino, mas sirn Manas, poisAtman é o TODO lJniversal, tornando-se apenas o EUSUPERIOR do hornem quando ligado a Buddhi, seu veículo,que O une à individualidade (ou homem clivino). Buddhi--Manas, que é chamado CorTso Caussl (união clos 5.' e 6.oPrincípios), é também a Consciência que o liga a todas aspersonalidades que ele habita na terra. Conclui-se, portanto,

100 101

A CHAVE DA TEOSOFIÁ

que, sendo Alma um termo genérico, há nos homens três

aspectos de Alma: a terrestre ou animal, a Alma Humana e

a Alma Espiritual; estas, em sentido estrito, são uma únicaAlma com três aspectos. Do primeiro aspecto nada perma-

nece depois da morte; do segundo (nous ou Manas) apenas

a essência divina, caso est'eja imaculada, sobrevive, ao passo

que o terceiro, além de ser imortal, se torna divino corzs-

cienÍemente pela sua assimilação pelo Manas Superior. Mas,para esclarecer este assunto, será necessário dizer antes dc

mais algumas palavras sobre a Reincarnação.

O OUE É A MEMóRIA SEGUNDO A DOUTRINA TEOSóFICA?

P. O mais difícil vai ser explicar e fundamentar a suaposição. Não encontrei ainda nenhum Teósofo que tivesseconseguido apresentar-me uma única prova vátIida capazde abalar o meu cepticismo.

R. O seu argumento reduz-se à velha objecção de quetodos esquecemos a nossa incarnação a+terior. Na sua opi-nião isso invalida a nossa doutrina? pesioalmente acho quenão e de qualquer modo essa objecção não pode ser def!nitiva.

P. Gostaria que me apresentasse os seus argumentos.R. São breves e poucos. porém. se tomar ern conside_

ração: a) a total incapacidade dos melhores psicólogos moder-nos para explicarem ao mundo a natureza da mente e b) aseu completo desconhecimento das potencialidades e estadossuperiores da mesma, terá de reconhecer que essa objecçãose baseia numa conclusão apriorística tirada sobretudo deprovas circunstanciais e aparenternenlc razoár'eis. Jâ agora,diga-me o que é para si a <memória>.

P. O meu conceito de memória não difere do conceitogeneralizaclo: a faculdade que a nossa mente tem de recordar

vIIr

DA REIhICARNAÇÃO OU RENASCIMENTO

102 103

Á CHAYE DA TEOSOFIA

e de reter o conhecimento de pcnsamentos, âctos e aconte-cimentos ocorridos anteriormente.

R. A isso deve acrescentar que há uma grande <.iiferença

entre as três formas de memória geralmente aceites. Alémda memória em geral, hâ a Lembrança, a Recardação e aRentiniscência, náo é verdade? Já alguma vez pensou nessa

diferença? Convém não esquecer que memória é um termogenérico.

P. No entanto essas palavras são tocias sinóninos.R. Na verdade não são, pelo menos em filosofia. A

memória é apenas uma capacidade inata dos scres pensantes

e até dos animais que lhes permite reproduzir impressõespassadas graças a uma associação de ideias sugerida essen-cialmente pelas coisas objectivas ou por uma acção sobreos nossos órgãos sensoriais externos. A memória é umafaculdade que depende inteiramente do funcionamento maisou menos saudável e normal do nosso cérebro físico; aIembrança e a recordação sã.o atributos e servas dessa me-mória. Mas a reminiscência é uma coisa completamente dife-rente. A reminiscência define-se como algo de intermédioentre a lembrença e a reco,rdação, ou seja, um ((processo

consciente de recordar acontecimentos passados sem umaref erência completa e variada a coisas específicas que carac-terizam a recordação>. Ao falar de recordação e lembrança,Locke diz: <Quando uma ídeia ocorre de novo sem a inter-venção dum objecto semelhante no nosso sensório externoé uma lembrança; se é procurada pela mente e representadade novo com dor e esforço, então é uma recordação.>> Porém,o próprio Locke não define claramente a reminiscência, já,

que não se trata duma faculdade ou atributo da nossa memó-ria física mas duma percepção intuitiva distinta e exteriorao nosso cérebro físico; uma percepção abrangendo comoabrange (sendo chamada a intervir pelo conhecimentosempÍe-presente do nosso Ego espiritual) todas aquelas visõesdo hornem que são consideradas anormais - desde imagenssugeridas pelo génio aos delírios da febre e até loucura- e

DA REINCÁRNAÇÃO OU RENASCIL,TENTO

que pâra a ciência não têm existência fora da nossa imagi_nação. O Ocultismo e a Teosofia, contudo, vêem a remi-niscêncía numa perspectiva totalmente diferente. para nós,enquanto a memória é física e evanescente, dependenclo dascondições fisiológicas do cérebro, a reminiscência é, a memó_ria da alma. E ê esta memória que dá a todos os sereshumanos, quer o entendam ou não, a cettez:a de que jáviveram antes e que hão-de viver ainda. Já wordsworth ctizia:

<O nosso nascimento não passa dum dormir e dumIesquecer,

A alma que nasce connosco, a Estrela da nossa vida,Teve o seu poentê noutro lugarE vem de muito longe.> (*)

P. Se é nesse tipo de memória - poesia e anomaliasda imaginação, segundo as suas própriãs palavras _ quebaseia a sua doutrina, não me paÍece que consiga

"orru.rrõr,muita gente.R. Eu não <disse> que era imaginação. Limitei-me a

dizer que, dum modo geral, os fisiólogos e cientistas consi_deram essas reminiscências conao alucinações e um produtoda imaginação, conclusãoerudíta a que chegaram. Ndo nega_mos que essas visões do passado e esses vislumbres de coisashá muito ocorridas sejam anormais quanflo comparadoscom a nossa experiência diária normal e a nossa memóriafísica. Mas, para além disso, sustentarnos que a memória,como Olympiodorus disse, é apenas faúarta e aquilo que emnós merece menos confiança (*x). Ammonius Saccas afir-

(+) <Ode sobre Sugestões de Imortalidade>,, (**) ,ê fantasia>, diz Olympiodorus (Comentdrío sobre o Fédont(e um obstaculo .para as nossas concepções intelectuais: e assim-

!^u1ng9_-r94os agrtados pela influência. ilspiradora da Divindade,s9^ a^Íantasra^rntervier,_a energia entusiásticá cessa, porque o entu_l1lmo. e o êxtase opõem-se um ao outro. Se pérluntãrem só aatma e capaz de_se tornar actuante sem a fantadia, lesponderemosque a sua capacidade de percepção dos universair'pióuï-àrËá^elI em, portanto, percepções independentes da fantasia, mas. a<i meimãtempo, a tantasia estimula as suas energias tal coúo umá tempes_tade persegue os que navegam no mar)).

ra4 105

Á CHÁYE DA TEOSOFIA

mava que a única faculdade do homem que se opunha direc-tamente à predição ou previsão dum acontecimento futuroé a mentóría. Alêm disso, não esqueça que a memória é

uma coisa e a mente atJ pensamento outta; uma é umgravador, um registador que se avaria com grande facilidade;a outra (pensamentos) é eterna e imperecível. Recusar-se-iaa acreditar na existência de certas coisas ou homens sóporque não os viu com os seus olhos? O testemunho colectivode gerações passadas que viram Júlio César não constituiriagarantia suficiente de que existiu efectivamente? Porquenão há-de então acreclitar em idêntico testemunho" em rela'ção aos sentidos psíquicos das massas?

P. Mas não lhe parece que essas diferenças são dema-siado subtis para serem aceites pela maioria dos mortais?

R. Eu diria antes pela maioria dos materialistas. E aesses dizemos: reparem coÍno, apesar da curta duração daexistência comum, a memória é demasiado fraca para poderregistar todos os factos ocorridos durante a vida. Quantasvezes atê os factos extremamente importantes estão ador-mecidos na nossa memória até serem despertados por algumaassociação de ideias ou levados a tornarem-se actuantes porqualquer outro elemento de ligação! Isto é particularmentefrequente entre as pessoas de idade avançada, em que â

capacidade de recordar está diminuída. Assim, se nos lem-brarmos daquilo que sabemos acerca dos princípios físicose espirituais do homem, não é o facto de a nossa memórianão ter conseguido gmvar as *,q1s-a! vjdas anteriores quenos deve surpreender, mas sim o contrário, admitinclo queisso pudesse aco rtecer.

POROUE NÃO NOS LÊMBRAMOS DAS NOSSAS VIDAS PASSADAS?

P. Já me explicou em traços gerais os sete princípios;gostaria agora que me dissesse em que medida são respon-sáveis pela perda total de memória em relação a viclas ante-riores.

DA REIÌ,ICÁRNAÇÃO OU RENÁSCIMENTQ

R. E, muito simples. una vez que os princípirx qucnós chamamos físicos e que são, todos aceites pela ciência,embora esta lhes atribua outros nomes (*), se desintegramdepois da morte, juntamente com os seus elementos cons-tituintes, a mentória e o seu cérebro, a memória desaparecìdaduma personalidade clesaparecida não pocle recordar nemregistar nada na reincarnação seguinte do EGO. A rein-carnação significa que a este Ego será dado um novo cotpo,rrm novo cérebro e uma novct memória. Seria, portanto,absurdo esperar que esta memória recordasse aquilo quenunca registou, tal como seria inútil observar ao microseópiouma camisa que nunca tivesse sr'do usada por um assassino,procurando descobrir nela manchas de sangue que só sepoderiam encontrar nas roupas que ele na realidade tivesseusado. Não é a camisa limpa que tern de ser examinada masas roupas que o assassino usava no momento em que per-petrou o crime; e, se elas tiverem sido queimadas e destruí-das, como é possível fazê-Lo?

P. Sim, mas como é que pode ter a ceúeza de que ocrime foi efectivamente cometido ou de que o <homem dacamisa limpu já vivera antes?

R. Por processos físicos não é com certeza; nem poracreditar no testemunho daquilo que deixou de existir. Masexiste uma coisa que se chama prova circunstancial, umavez que as nossas sábias leis a aceitam talvez mais até doque deveriam. Para acreditar na reincarnação e nas vidasanteriores, temos de nos pôr em relação com o nosso Egopermanente, real, e não com a nossa memória evanescente.

P. Mas como podem as pessoas acreditar numa coisaque não conhecem e nunca viram, ou mesmo contactarcom ela?

J*) Nomeadamente o corpo, a vida, instintos passionais e ani-mais, o espectro astral d_e toïos os homens (quer'apreendido pèiòpensamenrq ou pelos olhos do espírito, quér obj^ectivamentè eseparado do corpo físico), princípios-esses a ìue chamamos Sthula--Saríra, Prana, Kama-Rupã e Linga-Sarira qvide supra).

t06 107

A CHAVE DÁ TEOSOFIA

R. Se há pessoas que acreditam na Gravidade, no Éter,na Força e o que quer que seja da Ciência, em abstracçõese <hipóteses de trabalho> que nunca viram, tocaram, chei-raram, ouviram ou saborearam, porque não hão-de outrasacreditar pela mesma tazã.o no seu Ego permanente, queé uma <hipótese de trabaiho> bem mais lógica e importanteque qualquer das outras?

P. Qual é afinal esse misterioso princípio eterno? Impor-ta-se de explicar a sua nattteza de modo a torná-lo maiscompreensível?

R. É o EGO que reincarna, o <<Eu>> indivídual e imortal

-não pessoal; em suma, o veículo da MONADA Atma--Búdica, aquilo que é recompensado no Devachan e punidona terra, enfim aquilo a que se liga unicamente o reflexodos Skandhas ou atributos de cada incarnação (*).

P. O que entende por Skandhas?R. Precisamente o que eu disse: <atributos> - nos quais

está incluída a memória-qve perecem todos como umaflor, deixando apenas atras de si um ténue perfume. Voucitar um outro parágrafo da obra 0 Catecismo Budísta deH. S. Olcott (**), directamente relacionado com esta ques-tão, que aborda da seguinte maneira: <O homem idosorecorda os incidentes ocorridos na sua juventude, apesarde ter mudado física e mentalmente. Nesse caso, porque éque não trazemos do nosso último nascimento llara o actuala recordação das nossas vidas passadas? Porque a memóriafaz parte dos Skandhas e, como estes não são os mesmosna nova existência, desenvolve-se uma memória que registaos factos dessa existência específica. Porém o registo ou

DA REINCARNAÇÃO OA RENASCIMENTO

reflexo de todas as vidas passadas tem de sobreviver, poisquando o príncipe Siddhartha se transformou em Budareviu todos os seus anteriores nascimentos,.. e todo aqueleque atinge o estado de lhana pode seguir retrospectivamentea linha das suas üclas.> Isto prova que, enquanto as quali-dades imorredouras da personalidade - tais como o amor,a bondade, a caridade, etc. - se ligam ao Ego imortal,imprimindo nele, por assim dizer, uma imagem permanentedo aspecto divino do homem que foi, os seus Skandhasmateriais (aqueles que geram os efeitos Kármicos mais acen-tuados) são tão evanescentes como o clarão dum relâmpago,não podendo impressionar o novo cérebro da nova perso-nalidade, sem que esta impossibilidade prejudique de qual-quer modo a identidade clo Ego reincarnante.

P. Pretende com isso dizer que só sobrevive aquilo aque chama a memória cla Alma, essa Alma ou Ego quesão uma e a mesma coisa e que da personolidade nada fica?

R. Não é bem isso; a não ser que o homem anteriortenha sido um materialista absoluto em cuja natureza nãohouvesse sequer uma fenda por onde pudesse passar umraio espiritual, hâ sempre qualquer coisa da personalidadeque sobrevive porque deixa a sua marca eterna no Eu per-manente reincarnante ou Ego Espiritual (*). (Ver <<Da Cons-ciência depoís da moríe e depois do nascímento>). A perso-nalidade e os seus Skandhas mudam sempre em cada novonascimento. Como já anteriormente referi, ela é apenas opapel representado pelo actor (o Ego verdadeiro) por umanoite. É por isso que no plano físico não temos qualquerrnernória das vidas passadas, embora o Ego real as tenhaviviclo e as conheça todas.

P. Nesse caso, coÍno explica que o homem real ou Espi-ritual não imprima este conhecimento no seu novo <<Eur>

pessoal?

(*) Segundo a doutrina Budista, há cinco Skandhas ou atributos:<yRupa (fo1ma do corpo), qualidades materiais; Vedana, sensação;Sanna, ideias abstractas; Sankharo, tendências da mente; Yinnãna,poderes mentais. São estes os atributos de que somos cónstituídos;é graças a eles que temos consciência da existência e é atravésdeles que comunicamos com o mundo que nos rodeia.

(**) H. S. Olcott, Presidente e Membro Fundador da SociedadeTeosófica.

. (*) Oq Eu Espirítual, por oposição a Eu pessoal. O leitor nãodeve confundir este Ego Espiritual com o <EU SUpERIOR>, queé Atma, o Deus em nós, e inseparável do Espírito Universal. ^

108 IA9

A CHAVE DA TEOSOFIÀ

R. E porque o Ego Espiritual só pode actuar quando oEgo pessoal está paralisado. O <Eu> Espiritual do homem é

omnisciente e possui todo o conhecimento que é inato nele,ao passo que o eu pessoal é um produto do seu meio e

escravo da memória física. Se aquele se pudesse manifestarininterruptamente, deixaria de haver homens na terra, poisseríamos todos deuses.

P. Mas deve haver expcepções, deve haver quem se

recorde das suas vidas anteriores.R. E há. Mas quem é que acredita no que dizem? Esses

psíquicos são geralmente considerados histéricos alucinados,entusiastas loucos ou charlatães, pelo materialismo moderno.Se falarmos de alma às pessoas, algumas perguntarão: <Oque é a Alma?> <<Já conseguiu alguma vez provar a suaexistência?> E evidente que é inútil discutir com materia-listas. Mas mesmo a esses eu perguntaria: <Lembra-se doque era ou fez quando era bebé? Conserva a mínima recor-dação da sua vida, pensamentos, actos, ou mesmo do queviveu durante os primeiros dezoito meses ou os primeiros doisanos de sua existência? Então, partindo do mesmo princípio,porque não nega que tenha vivido como bebé?> Se a istoacrescentarmos que durante o período de Devachan o Egoreincarnante oa índivídualidade retém apenas a essênciada experiência da sua vida passada na terra ou personalidade,enquanto toda a experiência física regressa a um estadopot,encìal ou, por assim dizer, se converte em fórmulas espi-rituais; se nos lembrarmos ainda de que o período que medeiaentre dois renascimentos é de dez a quinze séculos duranteos quais a consciência física está total e absolutamente inac-tiva, não tendo órgãos através dos quais actuar e não tendo,,portanto, existêncìa, a razão da ausência de toda e qualquerrecordação na memória puramente física torna-se evidente.

P. Acaba de dizer que o EGO ESPIRITUAL é omnis-ciente. Onde está então essa apregoada omnisciência duranteaquilo a que chama vida em Devachan?

DA REINCARNAÇÃO OA RENASCIMENTO

R. Durante esse tempo está latente e potencial porque,em primeiro lugar, o Ego Espiritual (o composto Buddhi--Manas) não ê o EU SUPERIOR, eue, sendo uno com aAlma ou inteligência lJniversal, é omnisciente; em segundolugar, porque Devachan é a continuaçáo idealizada da viclaterrena que acaba de deixar, urn período de adaptação retri-butiva e uma recompensa por injustiças e dores imerecidassofridas durante essa vida. Em Devachan o Ego Espiritualsó é omnisciente potencialmente, sendo-o de facto apenas noNirvana, quando o Ego está submerso na Alma-InteligênciaUniversal. Porém volta a seÍ quase omnisciente na terradurante essas horas em que certas condições anormais emudanças fisiológicas do corpo libertam o Ego dos condi-cionamentos da matéria.

DA INDIVIDUALIDADE E DA PERSONALIDADE

P. Mas qual é a diferença entre uma e outra?R. Para perceber bem a ideia terá primeiro de estudar

os conjuntos duais de princípios: os espiriruais, au seja aque-les que pertencem ao Ego imperecível , e os materíoís, aquelesque constituem os coryos em constante mutação ou sériede personalidades desse Ego. Vamos atribuirlhes nomes ecaracterizá-los:

I. Atma, o <<Eu Superior>>, não ó o seu Espírito nemo meu, sendo antes como o Sol que brilha paratodos. É! o <<príncípio divino>> universalmente difuso,inseparável do seu Meta-Espírílo único e absolutotal como um raio de sol é inseparável da luz do sol.

II. Buddhi (a alma espiritual) é apenas o seu veículo.Nenhum deles tem qualquer utilidade para o corpodo homem, quer isoladamente quer em conjunto,assim como a luz do Sol e os seus raios não têmqualquer utilidade para um bloco de granito enter-

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A CHAVE DÁ TEOSAFTA

rado na teÍta, a não ser que a Díada divina seiaassimìlada por e reflectida em alguma consciêncis.Nem Atrna nem Buddhi são jamais atingidos peloKarma porque o primeiro é o aspecto superior doKarma, a agente o'peïante de SI MESMO numaspecto, e o segundo é inçonsciente neste plano.Essa consciência ou inteligência ê Manas.

IIL Manas(*), o resultado ou produto numa formareflectida de Ahamkara, <<a concepção do Eu> ouINDMDUALIDADE. Quando inseparavelmenteunido aos dois primeiros, é, portanto, chamado oEGO ESPIRITUAL e Taijasa (o irradiante). E a

verdadeira Individualidade, ou seja o homem divino.Foi este Ego que - tendo inicialmente incarnadona forma hurnana desprovido de sentidos, animadopela presença em si da própria mónada dual, massern conhecimento dessa presença (uma vez que nãotinha consciência) -fez da forma humanóide umverdadeiro hamem. É esse Ego, esse <Corpo Causal>que paira sobre todas as personalidades em que oKarma o obriga a incarnar e que é responsávelpor todos os pecados cometidos através de e emtodos os novos corpos e personalidades - as más-caras evanescentes que escondem o verdadeiro Indi-víduo clurante uma longa série de renascimentos.

P. Mas acha isso justo? Por que razáo hâ-de esse Egoser castigado por actos que já esqueceu?

('È) MAHAT ou <Inteligência lJniversal> é a origem de Manas.Este é Mahat, ou seja, a mente, no homem. O Manas é tambémdesignado Kshetrajna, <espírito incarnado>, porque, segundo a nossafilosofia, foram os Manasà-putras, ou <Filhoi da Inteligência Univer-saln, que criaram, ou melhor, produziram, o homem pensante,<<manu>, incarnado na Terceira Raça humana da nossa Ronda.Assim, Manas é o verdadeiro Ego Espiritual permanente e incar-nante, a INDMDUALIDADE, e as nossas várias e numerosaspersonalidades são apenas as suas máscaras exteriores.

DA REINCARNAÇÃO OA RENASCIMENTO

R. Não, não os esqueceu; eÌe conhece e lembra_se tãobem das suas más acções como você se lembra do que fezontem. Pensa que, pelo facto de a memória dessa ainálgamade compostos físicos chamada (corpo) não recordu, o qu"o seu antecessor (a personalidade que t'oí) fez, o Ego realos esqueceu?

P. Mas não há qualquer forrna de comunicação entrea consciência Espiritual e a humana ou rnemória?

R. Claro que há. Como é que explicaria a intuição,a ((voz da consciêncial), as preinonições, as reminiscênciasindefinidas e vagas, etc., se não houvesse essa comunicação?Que bom seria se ao menos a maioria dos homens instruídostivesse a extraordinâria capacidacle de percepção espiritualde Coleridge, que revela a sua intuição nalgumas passagensdos seus escritos. Ouça o que ele diz em relação à pro-babilidacle de <todos os pensamentos serern em si própriosimperecíveisn. <se a faculdade inteligente (recordaçõer i,iui-tas) se tornasse mais completa bastaria urna oïganizaçáodiferente que lhe fosse adequada, urn corpo celesÍe em yezdo corpo terresíre, para que todas as almas humanas tives-sem conhecimento da experiência colectiva de íada a suaexistência (ou melhor, existências) passada>. E este corpoceleste é o nosso EGO Manásico.

DA RECOMPENSA E CASTIGO DO EGO

P. Segundo disse, o Ego, independentemente da vida quea pessoa em que incarnou possa ter ievado na Terra, nuncaé castigado depois da morte.

R. Nunca, salvo raríssimas excepções.P. Mas, se é castigado nesta vida por más acções come_

tidas durante uma vida anterior, então deveria também serrecompensado quer aqui, quer depois de liberto do corpo.

R. E é. Se não aceitamos que haja qualquer castigofora da terra é porque o único estado que o Eu Espiritualconhece depois da morte é o de uma total beatitude.

112 TT3

A CHAVE DA TEOSOFIA

P. O que é que quer dizer com isso?R. Apenas o seguinte: os crímes e pecados cometidos

num plano de object:ívidade e num mundo de matéría nãopodem ser punidos num mundo de pura subjectivídade. Nãoacreditamos no inferno nem no paraíso como lugares; nemnum fogo do inferno objectivo ou em verÍnes que nuncamorrem; nem em Jerusalém com ruas pavimentadas de safirase diamantes. Acreditamos, sim, num estado depois da rnorteou condição mental semelhante àquela em que nos encon-tramos durante um sonho muito real. Acreditamos numalei imutável de Amor, Justiça e Misericórdia absolutos.E, por acreditarmos nisso, dizemos: <Apesar do pecado edas graves consequências da transgressão kármica originaldos Egos agora incamaclos (*), nenhum (ou a forma perió-dica e material exterior da Entidade Espiritual) pode ser,com justiça, considerado responsável pelas consequênciasdo seu nascimento. É essa mesma Lei infalivelrrente sábiae justa, mais do que misericordiosa, que inflige ao Egoincarnado o castigo Kármico por todos os pecados cometidosdurante a sua vida anterior na Terra, que proporciona àEntidade já liberta do corpo um longo período de descansomental, isto é, o esquecimento total de todos os aconteci-mentos tristes e mesmo do mais pequeno pensamento dolo-roso que teve lugar na sua vicla anterior como personalidade,

DA REINCARNAÇÃO OU RENASCIMENTA

tleixando apenas na memória da alma a reminiscência doque foi felicidade ou a ela conduziu. As palavras de plotinoao dizer que o nosso corpo é o verdadóiro rio Letes, pois<as almas que nele mergulham tudo esquecem), são bemmais profundas do que pode parecer à primeira vista. pois,tal como o nosso corpo terreno é como o Letes, tambémo nosso corpo celes,te o é ainda muito mais no Devachan.

P. Devo daí deduzir que o assassino, o violador de todaa es@cie de lei divina e humana, não é castigado?

R. Quem é que disse isso? A nossa filosofia tem umadoutrina do castigo tão inflexível como a clo mais rígidoCalvinista, com a diferença de que é muito mais filosúicae está mais de acordo com a justiça absoluta. Nenhumaacção, nem um só pensamento pecaminoso, deixarão de serpunidos; este último ainda mais severamente do que a pri-meira, uma vez que um pensamento tem muito mais foìçapara produzir maus resultados do que uma acção. Acredita_Inos numa lei de Retribuição infalível denominada KARMA,que se traduz num encadeamento natural cle causas e suasinevitáveis consequências.

P. Mas como e onde actua essa iei?R. Todo aquele que trabalha merece o seu salário, diz

a Sabedoria no Evangelho. Todas as acções, boas ou más,são procriadores prolíferos, diz a Sabedoria dos Tempos.Junte estas duas frases e perceberá o <porquê>. Depois dedar à Alma, liberta das vicissitudes da vidã pessoal, umacompensação suficiente, aliás centuplicada, o Karma, acom_panhado do seu exército de Skandhas, espera no limiar doDevachan, donde o Ego reemerge para assumir uma novaincarnação. É nesse mo,mento que o futuro destino do Egoagora repousado oscila na balança da Retribuição justa,enquanto ele fica de novo sujeito à lei Kármica activa. Énesse renascimento que o espera, um renascimento escolhidoe preparado por essa LEI misteriosa e inexorável mas infa_lível na equidade e sabedoria das suas disposições, que ospecados da vida anterior do Ego são punidos. Mas ò eg.

(*) Foi com base nesta transgressão que surgiu o dogma cruele ilógico dos Anjos Caídos. No volume IV (Ed. Adyar) de A Dou-trina Secreta faz-se referência a este assunto. Todos os nossos(Igos> são entidades pensantes e racionais (Manasa-putrcs) queviveram quer sob uma forma humana, quer sob outras formasno ciclo da vida (Manvantara) anterior e cujo Karma consistia emincarnar no homem deste ciclo. Os MISTÉRIOS ensinavam que,como tardaram em cumpnr esta lei (ou se (recusaram a criar>,como o Hinduísmo diz dos Kumaras e a lenda cristã diz do ArcanjoS. Miguel), ou seja, como não incarnaram quando deviam os corposque lhes eram predestinados, ficaram manchados (Izide EstânciasVIII e IX de <S/o/cas of Dzyan>, Vol. lll de A Doutrina Secreta,pp. 31 e 32), dai resultando o pecado original das formas despro-vidas de sentidos e o castigo dos Egos. Quando se fala de os AnjosRebeldes serem lançados no Inferno pretende-se apenas dizer queesses Espíritos puros ou Egos estão aprisionados em corpos dematéria impura -a carne.

114 115

A CHAVE DA TEOSOFIA

não é lançado em nenhum Inferno imaginário, com chamas

teatrais e ridículos demónios de cauda e chifres, mas simnesta terra, onde pecou, e onde terá de expiar todas as

suas más acções e pensamentos. Cada um colhe o que semeia'

A Reincarnação reunirá à sua volta todos os outros Egos

que sofreram, directa ou indirectamente, por sua culpa ou

mesmo por acção inconsciente da sua personalidade anteriot.Serão lançados por Némesis no caminho clo homem novo,que oculta o velho, o EGO eterno e...

P. Mas onde está a equidade de que fala, se essas /?ollos

personalidades não têm consciência de terem pecado ou de

terem sido vítimas dos pecados dos outros?R. Poder-se-á dizer que o casaco arrancado ao homern

que o roubou e rasgado pelo homem a quern fora roubadoe que reconheceu a sua propriedade foi justamente tratado?A nova personalidade não passa dum novo traje com cerac-

terísticas, cor, forma e qualidade específicas; mas o homemreal qlue o usa é o mesmo criminoso cle sempre. É a indivi-dualidade que sofre através da sua personalidade. E é isto,

exclusivamente isto, que explica a terrível, embora só apa-

rente, injustiça da distribuição dos diferentes destinos entrcos homens. Quando os seus filósofos modernos conseguiremexplicar-nos porque é que tantos homens aparentemenicinocentes e bons nasceram só para sofrer durante uma vida

inteira; porque é que tantos nascem pobres e morrem à fomcnos bairros miseráveis das grandes cidades, abandonados pela

sorte e pelos homens; porque é que uns nascem na maiot'pobreza, outros abrern os olhos para a vida em palácios;

porque é que muitas vezes é dado aos piores homens e muittrraramente aos que o merecem um nascimento nobre e unldestino ditoso; porque há mendigos cujos evs ínterior"es sãcr

iguais aos dos ho nens mais nobres e superiores; quando estas

e muitas outras coisas forem satisfatoriamente explicaclas

quer pelos seus filósofos, quer pelos teólogos, sÓ então, tr

nunca antes, terá o direito de rejeitar a teoria da reincar'nação.

DO DESTINO DOS PRINCíPIOS INFERIORES

P. Referiu-se ao Kama-loka, o qiue ê?R. Quando um homem morre, os seus três princípios

inferiores, isto é, corpo, vida e o veículo desta última, ocorpo astral ou duplo do homem yiyo, deixam_no parasompre. Depois, os seus quatro princípios _ o princípio cen_tral ou médio, alma animal ot Kama-rupa, çom tudõ aquilorlue assimilou do Manas inferior, e a trtada superior, pu*u-para o Ka:ma-loka. Este é um lugar astral, o límbo da teo_logia escolástica, o Hades dos antigos e, rigorosamentel'alando, tm lugar apenas em sentido relativo. Nào tem umaiirea nem limites definidos, mas existe de,ntro do espaçosubjectivo, ou seja, para além das percepções dos ,ár.ó,scntidos. Existe realmente, e ê ai que os eìdolons astraistlc todos os seres que viveram, incluindo os animais, esperamü sua segunda morte. No caso dos animais, esta veriiica_se(Ìom a desintegração e desaparecimento total das suas partí_c,ulas astrais. No caso do eidolon humano, ela começa quìndorr tríada Atma-Buddhi-Manas se ((separa)) dos seus princípiosirl'criores, o* do reflexo da ex-personalidade, uo puì.u, puruo f)evachan.

P. O que acontece depois?

IX

DO KAMA-LOKA E DO DE'r'ACHAN

il6 117

A CHAYE DA TEOSOFIA

R. Depois, o fantasma Kama-rúpícq despojado do prin-cípio pensante que o informa, o Manas superior, e do aspectoinferior deste, a inteligência animal, e privaclo da iuz damente superior e do cérebro físico, desagrega-se.

P. De que maneira?R. Deixa de poder pensar até no mais baixo plano

animal. A partir desse momento já não é sequer Manas<<inferiolr>, pois este não é nada sem o Manas <<superior>1.

P. E é essa não-entidade que se materializa nas sessões

de espiritismo?R. Precisamente. Uma verdadeira não-entidade, de facto,

pelo que diz respeito às faculdades de raciocinar e pensar,e, embora astral e fluídica, não deixa de ser uma Entídade,como se vê em certos casos em que, depois de ter sido magné-tica e inconscientemente atraida para um médium, revivetemporariamente vivendo nele por procuração, por assimdizer. Vive uma espécie de vida vicária na Aura do rnédium,raciocinando e falando quer através do cérebro do médiumquer do de outras pessoas presentes. Mas esta questão podelevar-nos a penetrar demasiado em terreno alheio, o que nãopretendo de modo algum. Falemos de novo da reincarnação.

P. Quanto tempo, então, é que o Ego reincarnantepermanece no Devachan?

R. Segundo a nossa doutrina, isso depende do grau deespiritualidade e do mérito ou demérito da incarnação ante-rior. Em média, o período devachânico dura dez a quinzeséculos.

P. Mas por que razão é que esse Ego não pode mani-festar-se e comunicar com os mortais, como afirmam os

espíritas? O que é que impede uma mãe de comunicar com os

filhos que deixou na terra, um marido de comunicar coma mulher, etc.? Devo confessar que é uma crença extre-mamente consoladora e não me admira que aqueles que

a professam sintam tanta relutância em abandoná-la.R. Nem são obrigados a fazë-lo, a não ser que prefiram

a verdade à ficção, por muito <consoladora)) que esta possa

DO KAMA-LOKA E DO DEVACHAN

ser. As nossas doutrinas poderão não agradar aos espíritas,mas aquilo em que acreditamos e que ensinarnos é bemmenos egoísta e cruel do que aquilo que eles pregam.

P. Não percebo. Não vejo onde está o egoísmo.R. O egoísmo está na doutrina do regresso de Espi

ritos, as verdadeiras <personalidadesr> como eles dizem, evou explicar porquê. Se o Devachan, chame-lhe paraíso sequiser, for um <lugar de beatitude e felicidade suprema>(ou melhor, estado), será lógico pensar que não é possívelexperimentar nele qualquer sofrimento nem sequer a mínimador. <Deus secará as lágrimas> dos olhos de todos aquelesque estão no paraíso, diz o livro das profecias. E se os <Esp!ritos dos mortosn pudessem regressar à terra e ver o que aíse passa, sobretudo em suas co^eds, que espécie de felicidadepoderiam sentir?

MOTIVO POR OUE OS TEóSOFOS NÃO ACREDITAM NO REGRESSODE (ESPÍRITOS>r PUROS

P. Que quer dizer com isso? porque é que isso haviade afectar a sua felicidade?

R. É muito simples; vou clarlhe um exemplo. Umamãe morre deixando sem amparo os filhos de tenra idadeque ela adora, e até talvez um marido que muito, ama.Segundo a nossa doutrina o seu <Espírito> ou Ego (aquelaindividualiclade que durante todo o período devachânicoestará impregnada dos sentimentos mais nobres da sua antigapersona:lídade, au seja, o amor pelos filhos, piedade paracom aqueles que sofrem, etc.) separa-se então do <valede lágrimas), e a sua felicidade futura consiste numa santaignorância de todas as atribulações que deixou para trás.Os espíritas afirmam, pelo contrário, que esse Espírito temtanta consciência dessas atribulações como tinha anterior-nrente, ou maís ainda, pois <os Espíritos vêem mais do queos mortais incarnados>. Para nós, a felicidade que se goza noDevachan consiste na plena convicção de nunca se ter aban-

t18 I19

A CHAI/E DÁ TEOSOFTA

donado a terra e de que a morte não existe; a consciênciaespiritual daquela mãe depois da morte fáyla-á, pensar que viverodeada pelos seus filhos e por todos aqueles que amava; enão haverá hiato nenhum que possa afectar a mais perfeita c

absoluta felicidade do Espírito liberto do corpo. Os espíritasnegam isto redonclamente. Segundo eles, os infelizes doshomens, nem pela morte se libertam do sofrimento destavida. Assim, aquela rnulher que amava o marido, que durantea vida estivera disposta a poupar-lhe sofrimento nem queisso representasse para ela grande clor, vê-se, clepois damorte, condenada a assistir ao desespero dele e a sentirtodas as lágrimas ardentes que ele chora por ela seÍn opoder ajudar de maneira nenhuma. Poderá tal estado deconsciência coadunar-se com a felicidade? Se assim é, a<felicidade> representa a maior maldição e, ao pé dela, acondenação ortodoxa será um consolo!

P. Mas como é que a sua teoria evita isso? Como é quepode conciliar a teoria da omnisciência da Alma com a suaignorância ern relação àquilo que se passa na terra?

R. Porque a lei do amor e da misericórdia assim esta-belece. Durante cada período de permanência em Devachano Ego, omnisciente como é per se, reveste-se, por assim dizer,d,o reflexo da personalidade que foi. Acabo de lhe dizer quea eflorescência ídeal de todas as qualidades ou atributosabstractos, e como tal imperecíveis e eternos, que encon-traram um eco no coração da personalidade durante a vida,como por exemplo o amoÍ e a misericórdia, o amor do bem,da verdade e do belo, continuam ligados ao Ego depois damorte, acompanhando-o, portanto, para o Devachan. Assim,durante o período devachânico, o Ego torna-se o reflexo idealdo ser humano que era antes de deixar a terra, e esse não éomnisciente. Se o fosse nunca estaria no estado a que cha-mamos Devachan.

P. Como explica isso?

R. Se quer uma resposta segundo os princípios da nossafilosofia, dirlhe-ei que isso se deve ao facto de, fora da

DO KAMÁ-LOKA E DO DEI/ÁCHAÌ\r

verdade eterna, que não tem forma, cor ou limites, tudo serilusão (Maya). Para aqueles que conseguem ultrapassar o véude Maya - é o caso dos grandes Adeptos e Iniciados - nãohá Devachan. Quanto ao mortal comum, a sua felicidadenele é total. Para ele, Devachan é o esquecimento absolutode tudo aquilo que era motivo de dor ou cle sofrimento naincarnação anterior, e até da própria existência da clor e dosofrirnento. ,Aquele que está em Devachan vive um ciclointermédio entre duas incarnações, rodeado de tuclo aquiloa que aspirou em vão, e na companhia de todos aqueles queamou na terra. Aí realiza tudo aquilo que desejou. Vive,assim, durante muitos séculos, uma existência de felicidadepura, verdadeira recompensa pelos sofrimentos da vida ter-rena. Em resumo, mergulha num oceano de felicidade inin-terrupta, atravessada apenas por acontecimentos cujo graude felicidade é ainda maior.

P. Mas isso é mais que uma ilusão, é uma verdadeiraexistência feita de alucinações utópicas!

R. Talvez o seja na sua opinião, mas não do ponto devista filosófico. Aliás não estará a nossa vida terrena recheadade ilusões? Nunca conheceu homens e mulheres que vivemuma felicidade ilusória durante anos e anos? Digo-lhe maisvÍna vez que esse esquecimento, ou essa alucinação - se

prefere chamar-lhe assim, não passa de uma lei misericor-diosa da nat'ureza e de rigorosa justiça. Seria de enlouquecerpensar que um espírito puro se pocle sentir feliz enquantocondenado a presenciar os pecados, os erros, as traições e,

sobretudo, o sofrimento daqueles de quem a morte o separoue a quem ama acima de tuclo, sern os poder ajudar.

P. Tem razão. Devo confessar que nunca tinha vistcla questão desse ângulo.

R. Justamente, e é preciso ser'-se extremarnente egoístae totalmente desprovido dum sentido de justiça retributivapara se conceber tal coisa. Estamos com aqueles que per-demos fisicamente e muito mais perto deles clo que quandoestavam vivos. E isto não é fruto da imaginação daqueles que

120 121

A CHAVE DA TEOSOFIÁ

estão em Devachan, como muitos poderão pensar, mas umarealidade. O amor divino puro não é apenas a flor docoração humano, tem as suas raízes na eternidade. O amorsagrado espiritual é imortal e, mais tarde ou mais cedo, oKarma fará com que todos aqueles que se amaram comessa afeição espiritual incarnem de novo no seio duma mesmafamília. Defendemos, por outro lado, que o amor para além--túmulo - chame-lhe ilusão se quiser - tem uma força má-gica e divina qüe age sobre os vivos. O Ego cl,e uma mãe,cheio de amor pelos filhos imaginários que vê junto de si,vivendo uma vida de felicidade que para ele ê Ião real comoquando se encontrava na terra __ esse amor influenciarásempre os filhos ainda incarnados. Manifestar-se-á nos seussonhos e, frequentemente, em determinados acontecimentos:protecções e intervençóes provìdencicts, pois o amor é umescudo poderoso que não é limitado nem pelo espaço nempelo tempo. E o que se passa com esta mãe em Devachan,passa-se também com todas as relações e ligações humanas,excepto aqueias que são exclusivamente egoístas ou materiais.Poderá depreender o resto por analogia.

P. Não admite, portanto, qualquer possibilidade decomunicação entre os vivos e os espíritos desincarnado,s?

R. Essa possibilidade existe e hâ atê duas excepções àregra. A primeira verifica-se durante um pequeno númerocle dias imediatamente após a morte duma pessoa e antesde o Ego passar ao estado Devachânico. euanto a saber sealgum mortal, à excepção de alguns casos raros (em que aintensidade do desejo do moribundo de regressar com umfim determinado obrigou a sua consciência superior d perma-necer desperta, tendo sido, portanto, a individualídade, o<Espírito>, que comunicou), beneficiou com o regresso cloespírito ao plano objectivo, é outra questão. Depois da morte,o espÍrito fica aturdido e não tarda a cair naquilo a que nóschamamos <inconsciência pr,ê-devachânica>>. A segunda ex-cepção diz respeito aos Nírmanakayas.

P. Quem são eles? E o que significa Nirmanakaya?

NCI KAMA.LOKÁ E DQ DEVÁCHAN

R. Nirmanakaya é o nome que se dá àqueles que, em-bora tenham conquistado o direito ao Nirvana e ao reponsocíclico -- não se trata de Devachan, pois este é uma ilusãoda nossa consciência, um sonho feliz, e porque para se terclireito ao Nirvana é preciso já não se sentir qualquer desejonem ter qualquer possibiliciade de alimentar ilusões terre-nas -, renunciaram ao estado nirvânico por piedade paracom a humanidade e para com aqueles que deixaram naterra. Esses adeptos, ou Santos, como preferir, renunciam aoNirvana e decidem permanecer invisíveis, em espírito, naterra, pois consideram que é uma atitude egoísta entrega-rem-se à felicidade. enquanto a humanidacle geme sob aopressão da miséria provocada pela ignorância. Não têrn umcorpo material, pois já o abandonaram, mas permanecemcom todos os seus princípios na vida astral da nossa esfera.Esses podem, e comunicam efectivamente, com algunseleitos, mas não o fazem decerto com médiuns vulgores.

P. Fizlhe esta pergunta sobre os NirmanaÈayas porqueli nalgumas obras alemãs, e noutras, que era a designação que

se dá à aparência terrena ou corpo dos Budas, nos ensina-mentos do Budismo do Norte.

R. Tem razão; acontece, porém, que os orientalistasconsideram erradamente que esse corpo terreno é. objectivoe físico em vez de astral e subjectivo.

P. E que bem podem eles fazer na terra?R. Pouco, no que diz respeito aos indivíduos, pois não

têm o direito de interferir no Karma, e só podem aconselhare inspirar os mortais para benefício da humanidade em geral.Fazem, contudo, mais acções benéficas do que poderia ima-ginar.

P. É uma ideia que a ciênçia nunca aceitarâ, nem sequera psicologia moderna, pois para elas nenhuma parcela dainteligência pode sobleviver ao cérebro físico. O que é quelhes responderia?

R. Não me daria sequer ao trabalho de lhes responder;limitar-me-ia a dizer, citando (M. A. Oxon>: <A inteligência

t22 123

A CHAVE DA TEOSOFIA

perpetua-se depois da morte do corpo. O pensamento não dizapenas respeito ao cérebro... Aquilo que sabemos permite-nosafirmar a indestrutibilidade do espírito humano>> (Identidadedo Espírito, p. 69).

P. Mas <M. A. Oxon> não é espírita?

R. É, e aliá.s o único espírita verdadeiro que conheço,embora cliscorde dele em algumas questões de somenos.Excluindo isso, não há espírita nenhum que se tenha aplo-ximado tanto das verdades ocultas como ele. Tal comoqualquer teósofo, (M. A. Oxon>> refere-se constantementeaos <perigos superficiais que ameaçarn curiosos imprudentese sem preparação que atravessam o limiar do Ocultismosem pensar no que isso lhes poderá custar>>. Concordo comas três proposições que ele apresentou na sua palestra deJulho de 1884.

P. Que proposições foram essas?

R. l. Existe uma vida que coincide com a vida física docorpo, e é independente dela.

2. É corolário necessário da proposição anterior qucessa vida se prolonga para além da vida do corpo(nós dizemos que ela se prolonga por todo operíodo devachânico).

3. Hâ comunicação entre os habitantes desse estadode existência e os do mundo em que vivemosagora.

Tudo depende, porém, dos aspectos secundários e menosimportantes destas proposições fundamentais. Tudo dependeda noção que temos de Espírito e Alma, ou de Individuali-dade e Personalidade. Os Espíritas náo fazem distinção entreuma e outra, considerando-as umâ só, ao passo que nósas distinguimos e dizemos que, salvo nos casos acima refe-riclos, o Espíríto não volta à terra, embora a Alma animalo possa fazer. Mas voltemos ao assunto que nos interessadirectamente: os Skandhas.

DO KAMA-LOKA E DO DEVACHAN

F. Começo a compreender melhor. É, por assim dizer,o Espírito dos Shandhas mais nobres, que, ligando-se ao Egoreincarnante, sobrevivem, indo juntar-se ao conjunto das suasexperiências angélicas. E são os atributos relacionados comos Skandhas materiais, com rnotivos egoístas e pessoais,que desaparecem do campo de acção entre duas incarnações,reaparecendo na incarnação seguinte como efeitos Kármicosa serem expiados, e, portanto, o Espírito nunca deixa oDevachan. E assim?

R. Mais ou menos. O seu raciocínio será perfeitamentecorrecto se acrescentar que a lei da retribuição, ou Karma,rccompensa os seres superiores e mais espirituais no Deva-chan, não deixando nunca de os recompensar de novo naterra, ao dar-lhes a possibilidade de continuarem a desen-volver-se e ao atribuir ao Ego um corpo que lho perrnitafazer.

ALGUMAS PALAVRAS SOBRE OS SKANDHAS

P. O que acontece aos Skandhas inferiores da persona-lidade depois da morte clo corpo? São completamente des-truídos?

R. São e não são - aí tem um novo mistério metafísicoe ocultista. São destruídos como instrumentos da persona-lidade, mas subsistem como efeitos Kármicos, como germes,suspensos na atmosfera do plano terrestre, prontos a voltarà vida, como inimigos vingadores, e ligar-se-ão à nova pemo-nalidacle do Ego quando este reincarnar.

P. Isso ultrapassâ a minha compreensão; é-me muitodifícil apreender o que diz.

R. Compreenderá quando tiver assimilado todos ospormenores. Então verá que, em lógica, coerência, pro-fundidade filosófica, misericórdia e equidade divinas, a dou-trina da Reincarnação não tem par na terra. Consiste emacreditar que cada Ego que incarna, ou cada alma divina,

124 r25

A CHAVE DA TEOSOFIA

tem a possibilidade de progredir sempre, evoluindo do exte-rior para o interior, do material para o Espiritual, atingindouma unidade absoluta com o Princípio divino no fim de cadafase. De força em força, da beleza e perfeição de um planopara a beleza e perfeição maiores doutro, com possibilidadede atingir uma glória, um conhecimento e uma força supe-riores em cada ciclo. É este o destino de todos os Egos, quesão por isso os seus próprios Salvadores em cada mundo e

incarnação.

P. Agora que já tratámos da questão dos Skandhas, vol-temos à da consciência que sobrevive à morte. Em Devachanpossuímos um conhecimento maior do que aquele que temosdurante a vicla na Terra?

R. Pode dizer-se, em determinado sentido, que adqui-rimos um conhecimento maior; isto é, temos a possibilidadede desenvolver mais qualquer faculdade que amámos e porque lutámos durante a vida, desde que diga respeito a coisasideais e abstractas, como por exemplo a música, a pintura,a poesia, etc., pois Devachan é apenas uma continuaçãoidealizada e subjectiva da vida na terra.

P. Mas se, em Devachan, o Espírito está liberto damatória, por que motivo não possui todo o conhecimento?

R. Porque, como já tive oportunidade de referir, o Egofica, por assim dizer, ligado à memória da sua última incar-nação. Assirn, se pensar bem naquilo que lhe disse e juntaros factos todos, há-de verificar que o estado,devachânico nãoé um estado de omnisciência, mas sim uma continuaçãotranscendental da vida pessoal que acabou. É, para a alma,o descanso das agruras da vida.

P. Mas os materialistas científicos afirmam que nadafica depois de o homem morreï; que o corpo humano apenasse desintegra nos elementos que o compõem; e que aquilo aque chamamos alma não passa de uma autoconsciênciatemporária resultante cla acção orgânica, que se desvanecerácomo vapor. Não acha que é uma posição estranha?

DO KAMA.LOKA E DO DEVÁCHAN

R. A meu ver não é nada estranho. Se eles dizem quea autoconsciência deixa de existir no momento em que ocorpo morre, estão afinal a fazer uma profecia inconsciente,pris desde que estejam firmemente convencidos daquilo queafirmam não podem ter uma vida consciente clepois da morte.É que, efectivamente, não há regra sem excepção.

DA CONSCIÊNCIA DEPOIS DA MORTE E DEPOIS DO NASCIMENTO

P. Mas se, regra geral, a autoconsciência subsiste depoisda morte, porque há-de haver excepções?

R. Não pode haver excepções quanto aos princípios fun-damentais do mundo espiritual. Mas há regras para aquelesque vêem e regras para aqueles que preferem ser cegos.

P. Compreendo perfeitamente. É uma aberração daparte do cego dizer que o Soi não existe porque ele nãoo vê. Mas decerto que os seus olhos espirituais o obrigarãoa ver depois da morte. E, isto que quer dizer?

R. Não só não será obrigado a ver, como não verá sejac-r que for. Tendo negado sempre durante a vida que haja umaexistência depois da morte, não a poderá ver, porque, se a suacapacidade espiritual foi impedida de se desenvolver clurantea vida, não é depois da morte que o poder â fazer e ele perrna-necerá cego. Ao afirmar que o cego será obrigudo a ver,torna-se evidente que estamos a falar de coisas diferentes.Está-se a referir ao espírito do espírito, ou à charna dachama, por outras palavras, a Atma, e está a confundi-lc:com a alma humana, Manas... Não me está a compreender;deixe-me explicarJhe melhor. Aquilo que pretende saber ése, no caso dum materialista convicto, é possível a auto-consciência e o autoconhecimento perderem-se por com-pleto depois da morte, não é verdade? A minha resposta éque é possível, uma vez que, acreditando firmemente na nossaDoutrina Esotérica, segundo a qual o perÍodo depois damorte, ou seja, o espaço de tempo entre duas vidas ou rlois

126 127

A CHAVE DA 7-EOSOFIA

rìascimentos, não passa clum estado transitório, afirmo queesse estado que tem lugar depois da morte pode ser exacta-rnente idêntico, sem qualquer transgressão à lei fundamental,ao de um homem que se encontra profundamente incons-ciente, quer esse intervalo entre dois actos do drama ilusórioda vida dure um ano ou um milhão de anos.

P. Mas como é que isso pode ser se acaba cle dizer que as

leis fundamentais do estaclo que tem lugar depois da mortenão admitem excepções?

R.. Isto não quer cÌizer que haja excepções. A iei espi-ritual da continuidacle só se aplica àquilo que é verdadeira-mente real. lJasta cornpreender aquilo clue entendemos portsuddhi e a dualidade de Manas para compreender a razáopela qual o materiaiista poderá não ter uma existência auto-consciente depois da morte. Uma vez que Manas, nos seus

aspectos inferiores, é a sede da inteligência terrena, só podeproporcionar uma percepção do Universo baseada naquiloque ela apreende; não pode dar uma visão espiritual. Diz-sena escola Oriental que a diferença entre Budclhi e Manas(o Ego), ou Iswara e Prajna (*), não é senão aquela queexiste entre uma floresta e as suas órvores, ou entre um lagoe as suas óguas.

P. Farece-me que, nessa inragem que acaba de dar, a

floresta representa Buddhi, e as árvores Manas-taijasa (x*).Ora se Buddhi é imortal, como é que uma coisa que é seme-thante a ele, ou seja, Manas-taijasa, pode perder completa-mente a consciôncia de si mesma aló ao momento em quevolta a incarnar? Não percebo.

(*) Iswara é a consciência colectiva da divindade manifestada,Brahma, ou seja, a consciência colectiva da Hoste de Dhyan Chohans(vide A, DOUTRINA SECRETA); e Prajna é a sua sabedoria indi-vidual.

(**) Taíjasa significa aquilo que resplandece como consequênciada sua união com Bucldhi, por outras palavras, Manas, a almahumana, iluminado pelo esplendor da alma divina. Pode, portanto,descrever-se Manas-taijasa como sendo o intelecto resplandecente,a razã.o humana iluminada pela luz do espírito; Buddhi-Manas é arevelação do intelecto e da autoconsciência divinos e humanos.

DO KAMA-LOKA E DO DEVACHAN

R. Não percebe porque insiste em confundir uma re-presentação abstracta do todo com as variações acidentais daforma. Lembre-se que embora se possa dizer que tsucldhi--Manas é incondicionalmente imortal, o mesrÌo não se po-derá dizer do Manas inferior, e ainda menos de Taijasa, queé apenas um atributo. Nem Manas nem Taijasa podem existirsem Buddhi, a alma divina, porque o primeiro (Manus) é,no seu aspecto inferior, um atributo qualificativo da perso-nalidade terrena, e o segundo {Taijasa) é idêntico ao primeirona medida em que é apenas o mesmo Manas iluminado pelaluz de Buddhi. Este, por sua vez, não seria rnais que umespírito impessoal sem aquele elemento que a aÌma humanalhe empresta e que o condiciona e the dá, neste Universoilusório, a a:"porência de estar separado da alma universal,enquanto dura o ciclo da incarnação. Deverá antes dizer queBuddhi-Msnas não pode morrer nem perder na Eternicladea sua autoconsciência complexa, nern a recordação das suasincarnações anteriores, em que as duas - isto é, a altnaespiritual e a alma humana - estiveram intimamente liga-das. Mas, no caso dum materialista, tudo se passa demaneira diferente, pois a sua akna não só não recebe nadacla alma divina, como se recusa a reconhecer a sua exis-tência. E impossível aplicar este axiomã aos atributos e quali-ficações da alma humana; seria a mesma coisa que clizer quea cor da sua face é imortal porque a sua alma divina éimortal, quando essa cor, tal como Taijasa, não passa dumfenómeno transitório.

P. Quer, portanto, dizer que não clevemos confundir nonosso pensamento númeno e fenómeno, causa e efeito?

R. Exactamente, e digo mais uma vez que o esplendor deTaijasa, quando circunscrito apenas ao Manas ou ahnahumana, é meramente transitório, pois pâra a personalidadeterrena do homem a imortalidade e a consciência depoisda morte tornam-se simples atributos condicionados, nlmedida em que dependem inteiramente de condições ecrenças criadas pela própria alma humana durante a vida

128 129

A CHAVE DA TEOSOFIA

do corpo. O Karma actua permanentemente; depoís da mortecolhemos apenas os frutos daquilo que semeámos durantea nossa vida na terra.

P" Mas se, depois cla morte do meu corpo, o meu Egomergulha num estado cle total inconsciência, onde serãopunidos os pecados que cometi durante a vida?

R. Segundo a nossa filosofia o castigo Kármico só é

aplicado ao Ego na incarnação seguinte. Depois da morte oEgo apenas é recompensado pelo sofrimento imerecido queteve de suportar durante a sua incarnação anterior (*).Mesmo para o materialista, o castigo depois da morte con-siste, portanto, na ausência de qualquer ïecompensa e naperda total da consciência da felicidade e repouso. O Karmaé filho do Ego terreno, fruto das acções da árvore, que é apersonalidade objectiva que todos vêem, e também fruto cle

todos os pensamentos e até dos móbiles do <<eu>> espiritual;mas o Karma é também a mãe carinhosa que cura as feridasque ela própria câusou durante a vida anterior antes decomeçar a torturar o Ego, infligindoJhe novas feridas. Podedizer-se que não há sofrimento mental ou físico na vida deum mortal que não seja fruto ou consequência directa dumpecado qualquer cometido numa existência anterior; poroutro lado, uma vez que esse mesmo mortal não conservaa mínima recordação desse pecado na vida que está a viver,sente que não merece ser castigado e pensa portanto quenão é ele o culpado daquilo que está a sofrer. Este simplesfacto é suficiente para dar à alma humana o direito a todaa consolação, repouso e felicidade na sua existência depoisda morte. Assim, para o eu espiritual a morte é sempre umalibertadora e uÍna amiga. Para o materialista que não era

DA KALÍA-LOKA E DO DEVACHÁN

má pessoa, apesar do seu materiaiismo, o espaço de tempoque decorre entre duas vidas será como o sono ininterruptoe tranquilo duma criança, quer sem sonhos quer povoado deimagens de que não terá qualquer percepção definida. parao mortal vulgar será um sonho tão real como a vida, cheiode felicidade e visões absolutamente reais.

P. Então o homem físico tem cle suportar sempre cego_mente o sofrimento resultante dos castigos Kármicos que oEgo chamou sobre si?

R. Não é bem isso. No momento solene da rnorte,rÌÌesmo que esta seja repentina, todos os homens vêem desen_rolar-se perante si, nos seus mínimos pormenores, toda asua vida passada. Durante um breve instante a Ego pessoalune-se ao Ego, índívidual ornnisciente. Mas esse instante équanto basta para lhe mostrar todo o encadeamento de causasque actuaram ao longo da sua vida. Nesse momento o homemvê-se e compreende-se tal como é, despojado de tocla a lisonjae auto-ilusão. Observa a sua vida e fica como um espectadorque olha para a arena antes de a abandonar; sente e com-preende a justiça de todo o sofrimento que teve de suportar.

P. Isso acontece a toda a gente?R. A toda, sem excepção. A Teosofia ensina-nos que

hornens excepcionalmente bons e santos vêem não só clesón-rolar-se perante si a vida que vão deixar, mas até várias vidasanteriores, onde se produziram as causas que fizeram delesaquilo que foram na vida que está prestes a terminar. Reco-nhecem, então, a lei do Karma em toda a sua justiça egrandeza.

P. Há algum momento semelhante antes do nascimento?R. Há. Tal como no momento da morte o homem tem

uma visão retrospectiva da vida que levou, também nomomento de renascer na terra o Ego, despertando do estadoDevachânico, tem uma visão prospectiva da vida que oespera, tomando consciência de todas as causas que levarama ela. Toma consciência delas e vê o que vai se,r o seufuturo, porque é entre o Devachan e o novo nascimento que

(*) Alguns teósofos rejeitam esta afirmação, mas as palavrassão do Mestre e o significado de <imerecido> é aquele que aÍ selhe atribui. A ideia fundamental é que os homens sofrem, muitasvezes, os efeitos de acções praticadas pelos outros e que portantonão pertencem estritamente ao seu próprio Karma; é por estesofrimento que eles têm, evidentemente, de ser recompensados.

130 T3T

A CHAVE DA TEOSAFTA

o Ego recupera toda a sua consciência ntanósica, l.ornando-semais uma vez, por um breve momento, o cleus que era antesde se tornar matéria e incarnar pela primeira vez numhomem de carne, de acordo corïì ã iei do l{arma. O <fio deouro)) vê todas as suas <pérolas> sem que uma irnica lhepasse despercebicla.

O OUE SE ENTENDE REALMENTE POR ANIOUILAçÃO

P. Já ouvi alguns teósofos falarern dum fio de ouro noqual estariam enfiadas as suas vidas. O que querem eies dizercom isso?

R. Nos Livros Sagraclos hindus, diz-se que aquilo queincarna periodicamente é Sutratma, que significa literal-mente <Alma-Fio>. Isto é sinónimo do Ego reincarnante

- Manas unido a Buddhi -, o qual absorve as recordaçõesmanásicas de todas as nossas vidas anteriores. Dá-se-lhe essa

designação poïque, tal como as pérolas de urn colar, tambémas longas séries de vidas humanas estão enfiadas nesse

único fio.P. Voltemos ao materialista que, embora não negando

os seus sonhos, pois isso nunca poderia fazer, nega a imor-talidade duma maneira geral e a sobrevivência da sua própriaindividualidade.

R. Embora não o saiba, esse materiaiista tem razão.Se um homem não tem qualquer percepção interior da imor-talidade da sua alma, ou não acredita nela, a sua alma nuncapode tornar-se Buddhi-taijasi, permanecendo apenas Manas,e para este não é possível haver imortalidade. Para se viveruma vida consciente no mundo post-mortem é preciso, emprimeiro lugar, ter-se acreditado nessa vida durante a exis-tência na terra. É nestes dois aforismos da Ciência Secretaque se baseia toda a filosofia sobre a consciência depois damorte e sobre a imortalidade da alma. O Ego recebe sempreaquilo que merece. Depois da dissolução do corpo, o Ego

DO KAMA.LAKA E DO DEVACHAN

entra ou num período de consciência plenarnente desperta ounum estado de sonhos caóticos, ou ainda num sono semquaisquer sonhos difícit de distinguir da aniquilação. Sãoestes os três tipos de sono depois da morte. Mais uma vezafirmo qlae a morte é um sono. Depois da morte clesenrola-seperante os olhos espirituais da alma uma representação deacordo com um programa aprendido e, muitas vezes, incons-cientemente elaborado por nós próprios: a realizaçáo prá.ticade convicções correctds oì.r de ilusões que nós mesmoscriámos.

P. O materialista, rejeitando tudo aquilo que os cincosentidos ou a ciência não comprovam, baseanclo-se exclusiva-mente em dados fornecidos por esses sentidos apesar da suaimperfeição, e negando até todas as manifestações espirituais,considera a vida a única existência consciente. Assim, tudoo que lhe acontecer estará de acordo com as suas crenças.Perderá o seu Ego pessoal e mergulhará num sono semsonhos até despertar de novo. Não é assim?

R. Mais ou menos. Não esqueça a doutrina quase uni-versal que considera dois tipos de existência consciente:a terrena e a espiritual. Esta última deverá ser consideradareal pelo simples facto de nela habitar a Mónada eterna,imutável e imortal, ao passo que o Ego, ao incarnar, se cobrede novas vestes totalmente diferentes das de incarnações ante-riores, em que tudo, excepto o seu arquétipo espiritual, estásujeito a uma transformação de tal modo radical que nãopermanecem quaisquer vestígios da sua forma anterior.

P. Como é isso? O meu (eu) consciente terreno nãose extingue apenas temporariamente como a consciência domaterialista, mas sim definitivamente, sem deixar vestígios?

R. De acordo com o que nos é ensinado, tem de extin-guir-se completamente tudo, excepto o Princípio, eü€, unidoà Monada, se transforma numa essência puramente espirituale indestrutível corn a qual se funde na Eternidade. Mas comoé que um materialista consumado, em cujo ((eD) pessoal Bud-dhi jamais se reflectiu, poderia levar para a Eternidade uma

r32 133

A CHAVE DA TEOSOFIA

única partícula da sua personalidade terrena? C) <eu> espi-ritual do homem é imortal mas, do <<eu>> terreno, o homernsó pode levar lmra a Eternidade aquilo que se tornou dignode ser irnortal, ou seja, apenas o aroma cla flor que a morteceifou.

P. O que acontece, então, à flor, o ((eu)) terreno?R. A flor, tal como todas as flores passadas e futuras

que desabrocharam e que hão-de vir a desabrochar no ramo--mã.e, Sutratma, todas elas filhas duma raiz ou Buddhi, trans-formar-se-á em pó. O seu <<eu>> actual, tal como o conhece,não é o corpo que está sentado aqui à minha frente, nemaquilo a que eu chamaria Manas-Sutratma, mas sim Sutrat-ma-Buddhi.

P. Mas isso não explica por que é que dìz que a vidadepois da morte é imortal, infinita e real, e a vida terrenauma mera aparência ou ilusão, porque afinal essa vida depoisda morte tarnbém é limitada, embora os seus limites possamser muito mais amplos do que os da vida terrena.

R. Sem dúvida. O Ego espiritual do homern move-se nâeternidade como um pêndulo entre o momento do nascimentoe o da morte. Mas se, por um lado, a cluração desses Ínonìen-tos que assinalam o período da vida terrena e da vida espiri-fual é limitada, e se o próprio número de estágios na Eterni-clade entre o adormecer e o despertar, entre a ilusão e arealidade, tem um princípio e um fim, por outro lado o pere-grino espiritual é eterno. Segundo a üossa doutrina, os mo-mentos da sua vida depois da morte, quando, já liberto docorpo, o homem enfrenta a verdade e não as ilusões das suas

existências terrenas transitórias, durante aquele período daperegrinação a que chamamos <ciclo de renascirnentos)o são,portanto, a Írnica realidade. Não obstante serem limitaclos,esses períoclos não impedem que o Ego, caminhando sempre

Wra a perfeição, siga gradual e lentamente, sem nunca se

desviar, o caminho que o há-de levar à transformação últimaem qÌÌe, tendo atingido o seu objectivo, se torna um serdivino. Esses períodos e estágios não são um entrave mas

DO KAMÁ..LQKÁ E DO DEVACÍTAN

antes algo que contribuì para a consecução desse resultadofinal, e sem eles o Ego divino nunca poderia alcançar o seuobjectivo último. Já the dei uma imagem muito conhecida aocomparar o Ego, au indivitlualidade, com um actor, e assuas diversas e nurnerosas incarrrações com os papéis queeste desempenha. Alguma, vez cliria que esses pa@is e asroupas que o actor tem de vestir para os desempenhar são aindividualidacle do próprio actor? O Ego, tal como o actor,é obrigado a desempenhar durante o Ciclo cle Necessidade,até atingir o limiar do Parcnirvana, muitos papéis que lhepodem desagradar. Quer lhe charnemos Sutratma, quer lhechamemos Ego, a nossa inclividualidade espiritual é como aabelha que anda de flor em flor a recolher pólen para fazermel, deixando o resto para ser comido pelos vermes da terra.Guardando apenas de cada uma das suas personalidades ter-renas em que o Karma o obriga a incarnar o néctar dasqualidades espirituais e da autoconsciência, o Ego reúne-asnum todo, emelgindo da crisálida como um Dhyan Chohanglorioso.

P. Dir-se-ia que, para a personalidade terrena, a imor-talidade é ainda condicional. Quer dizer que a imortalidadenãa é incondicional?

R. De modo nenhum. Mas a imortalidade não podeatingir aquilo que não exist,e, pois para tudo aquilo queexiste como SAT, ou que emanâ de SAT, a imortalidadee a Eternidade são absolutas. A matéria é o pólo opostoclo espírito e, no entanto, matéria e espírito são uma sócoisa. A essência de tudo, isto ó, do Espírito, da Força e

da Matéria, ou dos três num só, não tem fim nem princípio,mas a forma que esta unidade tríplice assutne em cadauma das suas incarnações, a sua exterioridade, não é maisque a ilusão das nossas concepções pessoais. Daí que con-sideremos o Nirvana e a Vida Universal a única realidade,relegando a vida terrena, incluindo a personalidade terrena emesmo a sua existência Devachânica, païa o reino irreal dailusão.

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A CTTAT.IE DA I:EOSOFIA

PALAVRAS DEFINIDAS PARA EXPRIMIR COISAS DEFINIDAS

P. Não acha que a confusão que existe quanto às fun-ções de cada um dos Princípios do homem se deve ao factode não haver termos precisos para designar cada um ilessesPrincípios?

R. Esse problema deve-se ao facto'de termos começadoa expor os Princípios e a discuti-los, designando-os pelosnomes sânscritos em vez de criarmos imediatarnente nomesequivalentes em inglês que os teósofos pudessem empregar.I)evernos procurar solucioná-lo.

P. Acho bem, porque isso talvez evite uma confusãomaior; parece-me que até agora não houve dois escritoresteósofos que tivessem designado o mesmo Princípio pelolnesmo nome.

R.. A confusão é mais aparente do que real. Já ouvialguns dos nossos teósofos manifestarem admiração e cri-ticarem diversos ensaios sobre esses princípios que se veri-ficou depois não conterern outro erro senão o facto dcemplegarem a palavra <dlma> para designar os três prin-cípios sem explicar aquilo que os distingue.

Daqui em diante, para evitar equívocos, proponho-mctraduzir literalmente os termos ocultistas orientais para inglês,a fim de que estes sejam utilizaclos de futuro.

O EU SUPERIOR é

Á,tma, o raio inseparável do EUúNICO e Universal. É o Deus /rans-cendente, mais do que o Deus enr

nós. Felizes daqueies que forem ctr-pazes de irnpregnar dele o seu ,Egr.,

ínterior.

DO KAMA.LAKA E DO DEVACHAN

O EGO divinoESPIRITUAL é

O EGO INTERIORou SUPERIOR é

O EGO INFERIORou PESSOAL é

a Alma espiritual ou Buddhi, intima-mente unida a A1[a:nas, o princípio dointelecto, sem o qual não pode serEgo inas apenas Veículo Átmico.

Ma:nas, o <Quinto> Princípio, assimchamado quando desligado de Bud-dhi. O Princípio do intelecto só é

o Ego Espiritual quando se fundecom Btrddhi, formando uma só enti-dade. E a Individualidade permanen-te ou <Ego Reincarnante>.

o hornem físico associado ao seu Euínferíor, ou seja, aos instintos ani-mais, paixões, desejos, etc. É designa-do por <falsa personalidade> e é cons-tituído pelo Manas inferíor aliado aKama-rupa, e operando através docorpo Físico e do seu fantasma ou<duplo>.

O outro Princípio, <<Prana>), ou <Vida>, é, rigorosamentefalando, a força irradiante ou Energia de Atma - como aVida Universal e o EU úNICO -*, o SEU aspecto inferior, oumelhor, mais físico (nos seus efeitos), pelo facto de se mani-festar. O Prana ou Vida impregna todo o ser do lJniversoobjectivo e só é considerado um <princípio> por ser um factorindispensável e o deus ex machina clo homem vivo.

136 137

X

DA NATUREZA DO NOSSO PRINCÍPIOPENSANTE

O MISTÉRIO DO EGO

P. Já se disse que os Skandhas - incluindo a memória __

sofrem alterações em cada incarnação. Por outro lado, afir-ma-se que o reflexo das vidas anteriores, que, segundo nosdisseram, é inteiramente constituído por Skandhas, <temde sobreviveu. Ainda não consegui perceber bem o que éque sobrevive exactarnente e gostaria que mo explicasse.É apenas esse <reflexo), ou esses Skandhas, ou sempre omesmo Ego, Manas?

R. Acabo de lhe explicar que o Princípio que reincarna,ou seja, aquilo a que chamamos homem divino, permaneceindestmtível ao longo cle todo o ciclo de vida: indestrutívelcomo Entidade pensante e mesmo como forma etérea. O<<reflexo>> é apenas a recordação espiritualizada, durante operíodo Devachânico, da ex-personalídade, Sr. A ou Sr.u B,com que o Ego se identifica durante esse período. IJma vezque este não é mais que uma continuação da vida na terra,por assim dizer, o ponto mais alto e culminância dos poucosmomentos felizes dessa existência passada que se apresentacomo uma sucessão ininterrupta, o Ego terá de se identi-ficar com a consciência ltessoal dessa vida para que perma-neça dele alguma coisa.

139

A C'I-IAVI' DÁ '|E,OSOÍ;IA

P. Isso significa que, apesar da sua natureza divina, oEgo passa todos esses períodos entre duas incarnações numestado de obscurecimento mental ou insanidade temporária.

R. Acreditando nós que, fora da Reali<lade UNICA,tudo ó uma ilusão passageira - incluindo o Universo -"não consideramos isso um estado de insaniclade, rnâsuma sequência ou evolução natural da vida terrena.O que é a vida? IJm amontoado das mais diversas experiên-cias, cle ideias, emoções e opiniões que se alteram diariamente.Quando somos jovens, acontece frequentemente entre-garmo-nos com entusiasmo a Llm ideal, ou tentarmosimitar e fazer ressuscitar um herói ou uma heroína; algunsanos depois, quando o vigor dos nossos sentimentos cleadolescente esmoreceu e se moderou, somos os primeiros arir dos nossos arrebatamentos. E, todavia, houve uma alturaem que a nossa personalidade se identificou de tal maneiracom o nosso ideal - sobretudo se esse ideal era um ser vivo -que aquela se fundia e se perdia completamente neste.Poderá dizer-se dum homem de cinquenta anos que ele óa mesma pessoa que era aos vinte? O homem interior ê, amesmo; a personalidade viva exterior transformou-se e mu-dou por completo. Chamaria também insanidade a estasmodificações do estado mental humano?

P. Como thes chama então? E sobretudo corno é queexplica a permanência de um e a evanescência da outra?

R. A resposta está na dupla consciência da nossa mente,e ainda na natureza dual do <princípio> mental. Há umaconsciência espiritual, a inteligência manásica iluminada pelaluz de Buddhi, que apreende abstracções subjectivamente, e aconsciência sensível (a luz manásica inferior), que é insepa-rável do cérebro físico e dos sentidos. Esta última é contro-lada pelo cérebro e pelos sentidos físicos e, estando depen-dente deles, vai-se extinguindo, acabando por morrer com odesaparecimento desse mesmo cérebro e desses mesmos sen-tidos. É só a primeira esp'écie de consciência, cuja origemse encontra na eternidade, que sobrevive e vive pata sempre,

DA NATUREZA DO NOSSO PRINCíPIO PENSANTE

podendo portanto ser consicleracla imortal. O resto não passa

cluma ilusão passageira.

P. Como é que MANAS, apesar de lhe chamarem Nous,um <<Deusr>, é táo fraco durante as suas incarnações queacaba por ser vencido e acorrentado pelo corpo?

R. Posso responder-ihe com uma pergunta semelhante:<Como é que aquele que considera <<o Deus dos Deuses> e

Unico Deus vivo, é tão fraco que permite que o mal (ou o

Demónio) leve a melhor não só sobre e/e como sobre tudoaquilo que criou, quer durante a sua permanência no Céu,quer durante o tempo que incarnou e viveu na Terra?> Vairesponder-me outra vez: <<Trata-se dum Mistério, e estamosproibidos de tentar penetrar nos mistórios de Deus.>> Como a

nossa filosofia religiosa não nos faz tal proibição, respondoà sua pergunta dizendo que todo o princípio divino serácondicionado e paralisado pela matéria animal instável, a nãoser que Deus desça como um Avatur. Neste plano de ilusões, aheterogeneidade levará sempre a melhor sobre a homogenei-clade. e quanto mais perto estiver uma essência do princípioque the dá origem, a Homogeneidade Primordial, mais difícilserá a este último afirmar-se na terra. Todos os Seres huma-nos têm poderes espirituais e divinos latentes, e quanto maiorfor o alcance da sua visão espiritual, mais poderoso será oDeus que têm em si. Mas como são poucos os homens queconseguem sentir esse Deus e como, duma maneira geral,a divindade é sempre iimitada no nosso pensamento porconceitos anteriores - ideias essas que nos são inculcadasdesde a infância -, élhe difícil compreender a nossa filo-sofia.

P. E é esse nosso Ego que é o nosso Deus?R. De maneira nenhuma; <IJm Deus> náo ê a divindade

universal mas apenas uma centelha do oceano do FogoDivino. O Deus em nós de que fala a Teosofia, ou o ((nosso

Pai Inefável>, é aquilo a que chamamos o (EU SUPERIOR)),Atma. O nosso Ego incarnante era, originariamente, umDeus, tal como todas as emanações primorcliais do Princípio

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A CHAVE DA TEOSOFIA

Unico fncognoscível. Mas desde a sua <descida na matériar>,tendo de incarnar ao longo de todo o ciclo de vida sucessi-vamente desde o princípio até ao fim, deixa de ser um deuslivre e feliz, para se tornar um pobre peregrino em buscadaquilo que perdeu. Posso darJhe uma resposta mais com-pleta citando uma passagem de Ísis sem Véu (Vol. II, 593)sobre o HOMEM INTERIOR:

<<A humanìdade em geral sempre acreditou, desde a maisremota antiguidade, na exístência duma enÍidade espiritual epessoal no homem pessoal e físico. Esta entidade interior eramais ou menos divina consoante estivesse mais perto ou maislonge da perf eição - Christos. Quanto maior fosse essaunião, mais sereno seria o destino do homem e menos peri-gosas as suas condições exteriores. Esta crença não é fana-tismo nem superstição, mas apenas ìrma sensação constantee intuitiva da proximidade dum outro munclo espiritual einvisível que, embora seja subjectiva para os sentidos dohomem exterior, é absolutamente objectiva para o ego inte-rior. Além disso, os homens sempre acreditaram que existemcondições exteriores e interíores que afectam a determinaçãocom que a nosscr) vontade influí nas nossas acções:. Rejeitavamo fatalismo na medicla em que este consistia na manifestaçãocega duma força ainda mais cega. Mas acreditavam nodestino (ou Karma) que todos os homens tecem, fio a fio,à sua volta, desde o nascimento até à morte, tal como aaranha faz a sua teia; e esse destino é conduzido quer poraquela presença a que alguns chamam o anjo-da-guarda, querpelo nosso homem interior astral mais íntimo, que é muitasvezes o génio mau do homem de carne (ot a personalidade).

Qualquer deles influencia o hornem exterior, mas um delesterá de prevalecer; e a Ieí da compensação (e retribuição),rígida e implacável, intervém e segue o seu curso, desde oprincípio desta luta invisível, acompanhando fielmente asflutuações do conflito. Depois de tecido o último fio, o ho-mem encontra-se aparentemente envolto na teia que elepróprio criou, e verifica que está sob o domínio absoluto do

DA NATUREZA DO NOSSO PRINCÍPrc PENSANTE

destino que ele próprio troçou, o qual ou o prende como umaconcha inerte de encontro a uma rocha imóvel, ou o trans-porta como uma pena no remoinho dos seus actos.>

É este o destino do HOMEM, do verdadeiro Ego, não doAutómato, do invólucro que dá pelo nome de homem. É aele que compete subjugar a matéria.

A NATUREZA COMPTEXA OE MANAS

P. Mas queria falar-me da natureza essencial de Manase da relação que existe entre esta e os Skandhas do homemfísico?

R. Essa natureza misteriosa, versátil, impossível de pren-der, e quase indistinta nas suas correlações com os outrosprincípios, é extremamente difícil de compreender e maisainda de explicar. Manas é um princípio, sendo também, noentanto, uma Entidade e uma individualidade ou um Ego. Éum <<Deus>> e, todavia, está condenado a um ciclo interminávelde incarnações, pelas quais é responsável e pelas quais temde sofrer. Para rne fazer compreender teria de começar peloprincípio e dar-lhe, em poucas linhas, a genealogia desseEgo.

P. Pode fazê-lo.R. Tente imaginar um <Espírito)), um Ser celestial, cha-

me-lhe o que quiser, cuja natureza essencial é divina, mascuja pureza não é suficiente pata se unir ao TODO, e quepara alcançar essa união tem de purificar a sua natureza.Só o poderâ fazer se viver índivídual e pessoalmenÍe, isto é,espiritual e fisicamente, todas as experiências e sentimentosque existem no lJniverso multiforme e diferenciado. Terá,portanto, depois de ter adquirido essa experiência nos reinosinferiores e depois de ter subido o maior número possívelde degraus da escada do ser, de passar por todas as expe-riências nos planos humanos. Essa Entidade é, na sua própriaessência, PENSAMENTO, sendo por isso designada na sua

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A CHAYE DA TEOSQFIA

pluralidade Manasa-putlor, ((os filhos da mente (Universal)>.Este <Pensarnento>> indivíduulizado ê aqulIo a que chamamosa v.erdacieíro Ego humano, a Entidade pensante encerradanum invólucro de carne e osso. É sem dúvida uma EntidadeEspiritual e não Maíéria, e essas Entidades são os EGOSincarnantes que informam o conjunto de matéria animal aque se dá o nome de humanidade, sendo clesignadas porMonas:a ou <<Mentesl>. Mas uma vez aprisionadas no co4)ofísico, isto é, incarnadas, a sua essência torna-se dual. Poroutras palavras, os raios da Mente divina e eterna, tomadoscomo entidades individuais, assumem um atributo duplo:a) a sua característica inerente e es'sencíal, a mente, quese eleva parâ o céu (o Manss superior) e b) a qualidadehumana de pensar, ou cogitação animal, que se torna racio-nal devido à superioridade do cérebro humano, o Manasinfluenciado por Kama, ou Manas inferior. O primeirogravita em direcção a Buddhi; o segundo evolui em sentidodescendente, para a sede das paixões e dos desejos animais.Para este não há lugar no Devachan nem a possibilidadede se associar à tríada divina que ascende como uma UNI-DADE paÍa a felicidade mental. Todavia, é o Ego, a Enti-dacle Manásica, que é considerada responsável por os pecadosdos atributos inferiores, tal como um pai é responsávelpelos delitos do filho enquanto este não pode responderpor eles.

P. E esse <filho> éapersonalidade?R. E. Por isso, quando se afirrna que a personalidade

morre com o corpo, não está tudo dito. O corpo, que eraapenas o símbolo objectivo do Sr. A ou da Sra. B, desa-parece com todos os seus Skandhas materiais, que sãoas manifestações visíveis daquele. Mas aquilo que constituidurante a vida o conjunto de experiências espirituais, as

aspirações mais nobres, as afeições imperecíveis e a naturezanão egoís'Ía do Sr. ou da Sra. B fica, durante o períodoDevachânico, ligado ao Ego, que se identifica com a parteespiritual dessa Entidade terrena agora desaparecida. O

DA NATAREZA DO NOSSO PRINCÍPIO PENSÁNTE

ACTOR está tão imbuído do papel que acaba de desem-penhar que sonha com ele durante toda a noite Devachânicae esta visão mantém-se até soar a hora de ele regressarao palco da vida para desempenhar outro papel.

ESTA DoUTRINA É ENSINADA NO (EVANGELHO SEGUNDO S. JOÃOI

P. Haverá algo de semelhante nos ensinamentos deCristo?

R. Hâ, e qualquer ocultista, ou mesmo cabalista, beminformado lhe dirá o mesmo. Se esquecermos o significadoda letra morta e nos cingirmos ao Espírito esotérico veremosque Cristo, ou pelo menos o quarto Evangelho, fala da rein-carnação e da aniquilação da personalidade. Veja os versiculos I a 6 do capítulo XV do Evangelho segundo S. Ioão.De que fala a parábola senão da tríada superior no homem?Atma é o Agricultor; o Ego Espiritual ou Buddhi (Christos),a Cepa; enquanto que a Alma animal e vital, a personalidade,é a <<vara>. <<Eu sou a verdadeira Cepa e meu Pai é o agri-cultor. Toda a vara que em mim não dá fruto ele corta-a...Assim como a vara não pode dar fruto por si mesma se nãopermanecer lla cepa, assim vós também não, se não perma-necerdes em mim. Eu sou a Cepa, vós as varas... Todo aqueleque não perunanece em mim, é lançado fora, como a vara,e seca. Os homens apanham essas varas, lançam-nas no fogoe elas ardem.>

Nós explicamos isto da seguinte maneira: dizemos que oAgricultor significa Atma, o Símbolo do Princípio infinitoe impessoal (*); enquanto que a Cepa representa a AlmaEspiritual, Christos, e cada vara representa uma nova incar-nação.

(t') Nos Mistérios é o Hierofante, o <<Pai>r, quem planta a Videira.Cada símbolo tem sete chaves. O revelador do Pleioma era semprechamado <Pai>>.

t44 145

A CHAVE DA TEOSOFIA

P. Mas em que factos se baseia para fazet uma inter-pretação de tal modo arbitrâria?

R. Não há arbitrariedade nenhuma em tal interpretação,pois a universalidade da simbologia é garantia da sua exacti-dão. Herrnas (*) diz que foi <Deus> quem <plantou a Vinha>,isto é, quem criou a humanidade. Na Cabaia lê-se que oAncião dos Anciãos ou <<Grandiosa Face> (**) planta a vinhaque ïepresenta a humanidade, sendo a cepa símbolo da Vida.Representa-se aí, portanto, o Espírito do <,ltei Messias>> a

lavar as suas vestes no vinho vindo do alto, desde a criaçãodo mundo 1**x). E o Rei Lfessias ó o Ego que se purificalavando os suas vestes (isto é, as suas personalidacles ao renâs-cerem) no vinho vindo do alto, ou BUDDI{L Adam, ouA-Dam, é <<sanguer>. A Vida da carne está no sangue(nephesh

-alma), Í,evítico" xvii, II. E Adam-Kadmon é ofilho Unigénito. Noé também planta uma vinha - o berçoaiegórico da futura humanidade. Esta mesma alegoria voltaa ser adoptada e encontramo-la reproduzida no Codex Naza-reus. Sáo criadas sete cepas, as quais corresponclem às nossas

Sete Raças com os seus sete Salvadores ou Budas, qucprocedem de Kebar-Zivo, sendo regadas por Ferho (ou Far-cha) Raba (*{<x*). Quando os bem-aventurados ascenderematé aos seres da Luz veráo Iavar-Zivo, Senhor da VIDA e aPrimeira CEPA (*{:xx*). Estas metáforas cabalísticas são,assim, naturalmente repetidas na Evangelho segundo S. João(xv, I).

Não nos podemos esquecei' de que no sistema humano.mesmo naquelas filosofias que ignoram a nossa divisão septe-nâna, o EGO ou lnmem pensante é designado por logos, ou

(*) (Hermas Pastot, parábola V, $ 6).(**) Nota do Tradutor: No original <<Long face> - <<Macro pro-

sopus)) -- expressão habitual na tradição gnóstica e na literaturacabalística, significando a dimensão não manifestada da próprinDivindade.

(r**) Zohar, Comentário sobre o Génesis, xl, 10.1***'*1 Codex Nazaraeus, Vol. III, pp. 60, 61.(**{rr'{.) Ibid., yol. II, p. 2gl.

DA NATAREZA DO NOSSO PRINCÍPrc PENSANTE

Filho da Alma e do Espírito. <<Manas é o Filho adoptivo doRei - e da Rainha -> (termos esotéricos equivalentes deAtma e Buddhi), diz uma obra ocultista. E o <<hornem-deus>de Platão que se crucifica no Espaço (ou período de duraçãode um ciclo de vida) para redenção da MATERIA. FáJopassando por numerosas incarnações, conduzindo assim ahumanidade até à perfeição, e deixando deste modo espaçopara que formas de vida inferiores evoluam para formassuperiores. Em nenhuma vida ele próprio deixa de progredire de ajudar, simultaneamente, toda a natureza física aprogredir; mesmo a possibilidade ocasional e muito rarade perder uma das suas personalidades, no caso cle essapersonalidade ser inteiramente desprovida da mais pequenacentelha de espiritualidade, contribui pâra o seu progressoindividual.

P. Mas se o Ego é considerado responsável pelas trans-gressões das suas personalidades, decerto que também teráde responder pela perda, ou melhor, pela aniquilação total,duma delas.

R. De modo nenhum, a não ser que não tenha feitonada para evitar esse terrível destino. Mas se, apesar de todosos seus esforços, a sua voz, a voz da no,ssa co'nsciêncía, náoconseguiu penetrar as paredes da matéria, o embotamentodesta, que é resultado da natureza imperfeita daquilo que ématerial, é considerado uma deficiência da natureza. O Egoé suficientemente castigado ao perder o Devachan e, sobre-tudo, ao ter de incarnar quase imediatamente.

P. Essa doutrina segundo a qual é possível percler-se aalma - ou personalidade, como lhe chama - opõe-se às teo-rias ideais tanto dos cristãos como dos espíritas, emboraSrvedenborg a adopte em certa medida quando fala de morteEspírituaL. Mas os cristãos e os espíritas nunca a aceitarão.

R. Isso não pode de forma alguma alterar um factode natureza, se for na verdade um facto, nem impedirque tal coisa aconteça ocasionalmente. O universo etudo o que nele existe, seja moral, mental, físico, psíquico

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Á CHAVE DA :TEOSOFIA

ou Espiritual, assenta numa lei perfeita de equilíbrio e har-monia. Como já disse noutra ocasião (vide Ísis sem Véu,I, 318-19), a força centrípeta não se poderia manifestar nasrevoluções harmoniosas das esferas sem a força centrífuga;e todas as formas e sua evolução são produto dessa forçadual da natureza. O Espírito (ot Buddhi) é a energia espi-ritual centrífuga e a alma (Ma:nas) é a energia espiritualcentrípeta, e païa produzirem um único resultado têrn de

estar em perfeiia união e harmonia. Se o movirnento cen-trípeto da alma terrena que tende para o centro que sobreela exerce atracção for de algum modo afectado; se a sua

evolução for travacla por ter de suportar um peso de matériamaior do que lhe é possível ou clo que é necessán'o no estado

Devachânico, a harmonia do todo será destruíela. A vicla pes-

soal, ou melhor, o seu reflexo ideal, só poile ter continuidadese for sustentada por essa dupla força, ou seja, pela uniãoíntima de Buddhi e h[anas, ern cacla renascimento ou viclapessoal. Qualquer desvio da harmonia, por pequeno que seja,

a afecta, e, quanclo se perde irrernecliavehnente, as cluas forçasseparam-se no mornento da morte. Durante um breve inter-valo, a forma pessoal (que tanto pode ser designada Kamo'-rupa corno fuIayavi-rupct), cuja eflorescência espiritual,unindo-se ao Ego, segue este para o Devachan, dando a sua

coloração pessoal à ìndívidualidade permanente (temporaria-mente, por assim dizer), é levada para o Karna-loka, ondepermanece e onde será gradualmente aniquilada. Pois para

aqueles que são totalmente depravados, completamente des-

providos de espiritualidade e irremediavelmente perversos,

é depois da morte que chega o momento crítico e supremo.Se durante a vida o esforço último e desesperado do EU IN-TERIOR (Manas) para unir parte da sua personalidade a si

mesmo e ao raio intensamente brilhante de Buddhi divinose frustrar; se se impedir constantemente que este raio pene-

tre a casca cada vez mais espessa de cérebro físico, o EGOEspiritual ou Manas, uma vez liberto c1o corpo, fica inteira-mente desligado do resto etéreo da personalidade; e esta,

DÁ NATUREZA DA NOSSO PRINCÍPIO PENSANTE

ou Kama-rupa, seguindo os seus apelos terrenos, é arrastadapara o Hacles, a que nós charnamos Kama,loËc, onde per_manece. Porém, a aniquilação nunca é instantânru . u ìuuconclusão pode levar séculos. Aí permanece a personalidadejuntamente com os re,stos de outros Egos pessoais maisafortunados, transformando-se, tal como eles, numa coscae num Elemental.

P. Mas a autora de lsrs sem Véu não foi acusada de terpregado contra a reincarnação?

R. Sim, foi, por pessoas que não compreenderam o quepretendia clizer. Na altvra em que a obra foi escrita, osespíritas, quer ingleses, quer americanos, não acreditavamna reincarnaçã.o, e aquilo que nela se dizia a esse respeitoera destinado aos espíritas franceses, cuja teoria é tão pãucofilosófica e tão absurda como a doutrina oriental e iogicae evidente na sua verdade. Como é que a autora de lszssem Véu pode negar a reincarnação Kármíca que se dá alongos intervalos de i000 a 1500 anos, quandó eh é umprincípio fundamental tanto do Budismo como do IIin-duÍsmo?

P. Rejeita, então, completamente as teorias dos Espíritase dos Espiritualistas? (*)

R. Completamente, não; aÌlenas no que diz respeito àssuas doutrinas fundamentais. Tal coÍno os Espíritas e ãs Espi-ritualistas, acreditamos na existência de <Espíritosr>, isto é,de seres invisíveis dotados de maior o,r -enón inteligência.Mas enquanto a Teosofia afirma que há inúmeros tlpos egéneros de Espíritos, os nossos adversários admitem up.rrusa existência de <Espíritos> humanos, clesincarnados, que,tanto quanto sabemos, são na sua grancle maioria CASCASde Kama-loka.

P. Não acredita, portanto, nos fenómenos que eles de-fendem?

-,,^Í-ì-T.^^ïa^d. -4. palavra <espiritualista> designa aqui os Espí_rrras rngleses e americanos.

r48 t49

Á CHAVE DA TEOSOFIA

R. É precisamente por ter excelentes motivos para acre-ditar nesses fenómenos (excepto alguns casos dc fraude deii-berada) e por saber que são tão reais como estar"mos os doisvivos, que todo o meu ser se revolta contla eles. h{ais umavez, estou a referir-me apenas a fenómenos iísicos e nãomentais ou mesmo psíquicos. Coisas de natureza idênticaatraem-se mutuamente. Conheço pessoalmente homens e mu-lheres de sentimentos elevados e de grande pureza e bondade,que passaram muitos anos sob a orientação directa e mesmosob a protecção de <Espíritos> elevados, quer clesincarnadosquer planetários. Estas Inteligências só guiam e controlamos mortais em casos raros e excepcionais em que se sen-tem atraídos e magneticamente arrastados pelo passaclo

Kármico do indivíduo. Não basta uma pessoa sentar-see esperar <pelo desenvolvimentor> para os aftair. Isso apenasserve para abrir a porta a um enxame de <fantasmasr> bons,maus e indiferentes, de que o médium se torna escravo paratoda a vida. É a essa mediuminidade e comunicação promís-cu.as que rne oponho e não ao misticismo espiritual. Este é

dignificante e sagrado; aqueles são de natureza idêntica aos

fenómenos de há dois séculos pelos quais tantas bruxas e

bruxos foram punidos.P. Na sua opinião, tudo isso é apenas feitiçaria?R. O que quero dizer ê que todo esse contacto com os

mortos, seja consciente ou inconsciente, ê necromartcia e,

além disso, uma prática extremamente perigosa. Já muitoantes de Moisés todas as nações inteligentes consideravam ainvocação dos mortos uma prática pecaminosa e cruel, namedida em que ia perturbar o repouso das almas e interferirna sua evolução para estados superiores. A sabedoria colec-tiva de todos os tempos sempre denunciou, energicamente,tais práticas. A minha posição pessoal é a seguinte: enquantoalguns dos chamados <espíritos> não sabem o que dizem,limitando-se a repetir como papagaios aquilo que encontramno cérebro do médium e de outras pessoas, outros são extre-mamente perigosos e só nos podem atrastar para o mal.

XI

DOS MISTÉRIOS DA R.EINCARNAçÃO

hENASCIMENTOS PËRIÓDICOS

P. Quer, então, dizer que tcdos nós já vivemos na terraantes, em numerosas incarnações, e que continuaremos arenascer da rnesma maneira?

R. Precisamente. O ciclo de vida, ou melhor, o ciclocle vida consciente, começou quando o homem animal mortalse separou em dois sexos, e terminará ao findar a últirnageração de homens na sétima ronda e sétima raça da huma-nidade. Considerando que estamos apenas na quarta rondae quinta raça, ê mais fácil imaginar do que representar asua duração.

P. E estamos sempre a incarnal ern novas personali-dades?

R. Sem dúvida; aliás, pode comparar-se esse ciclo devida ou período de incarnações com a vida humana. Talcomo esta ó constituída por dias de actividade separados pornoites de sono ou inactividade, assim também no ciclo deincarnações a uma vida de actividade se segue o repousoDevachânico.

P. E é essa sucessão de nascimentos que se define comoreincarnação?

R. Nem mais. Só através clesses nascirnentos é que osinúmeros milhões de Egos podem evoluir continuamente para

150 T5I

A CHAVE DA TEOSOFIA

a perfeição última e para o lepouso final (cuja duração seráidêntica à do período de actividade).

P. E o que é que determina a duração ou qualidadesespeciais dessas incarnações?

R. O Karma, a lei universal de justiça retributiva.P. Considera-o uma lei inteligente?R. Não é possível classificar uma coisa irnpessoal, uma

coisa que não é uma entidacle mas uma lei actuante universal,empregando um adjectivo ou uma qualificação. Se me per-guntar qual é a inteligência causativa do Karma, terei dclhe responder que não sei. Mas se me pedir para definir os

seus efeitos e pàra lhe dizer quais são segundo a nossa dou-trina, poderei dizerlhe que a experiência de milhares clc

épocas nos mostra que são equídade, sabedoría e ínteligênciuinfalíveis e absolutas. Pois o Karma, nos efeitos quLÌ

produz, é aquilo que corrige constantemente a injustiçlhumana e todas as deficiências da na|ureza aquilo que repararigorosamente os agravos; uma lei retributiva que reconlpensâ e castiga com igual imparcialidade. No sentido rnaisestrito, poderá dizer-se que <<não olha a pessoas)) e, por outrolado, que não pode ser propiciado nem afastado pela oração.

P. Podemos, então, inferir o passado dum homem lpartir do seu presente?

R. Só na medida em que se acredite que a sua vida. actullé aquilo que, em toda a justiça, devia ser: um meio de expiar'os pecados da vida anterior. Claro que, à excepção dos viclcrrtes e dos grandes adeptos, nós, como mortais comuns qlr(,

somos, não temos possibilidade de saber que pecados fomrrresses. Com os poucos dados de que normalmente dispomosé-nos impossível determinar sequer o que foi a juventurlt'duma pessoa idosa; por motivos idênticos, também não podcmos tirar conclusões definitivas quanto ao que terá siclo rr

vida anterior dum homem, baseando-nos apenas naquilo rlrrrvemos na sua vida actual.

DOS MISTERIOS DA REINCARNAÇÃO

OOUEÉOKARMA?

P. MasoqueéoKarma?R. Como já disse, consideramo-io a Lei última do Uni-

velso, a fonte, origem e princípio de todas as outras leisque exisiem na Natureza. O Karma é a lei infalível queajusta o efeito à causa, nos planos físico, mental e espiritualdo ser. Como nenhuma causa, por muito pequena ou muitogrande que seja, deixa de produzir o respectivo efeito, querse trate duma perturbação cósmica ou do simples acto demover a mão, c como uma coisa produz outra que lhe éidêntica, o Karma é a lei invisível e desconhecida que ajustasábia, inteligente e equitativamente cada efeito à sua causa,seguindo esta até àquilo que a procluziu. Embora o Karmaem si seja incognoscível, a sua acção é perceptível.

P. Portanto, estamos mais uma vez perante o <Abso-luto>, o <Incognoscível), e não nos podemos servir dele paracxplicar os problemas da vida?

R. Pelo contrário. Pois embora não saibamos o que oKarma ê per se e na sua essência, sabemos efectivamentet:omo actua, e podemos definir e descrever o seu modo deactuação com exactidão. Só não sabemos qual é a sua Causaúltima, tal como a filosofia moderna admite universalmenteque a Causa última de todas as coisas é <incognoscível>.

P. E o que tem a Teosofia a dizer quanto à solução dosmales da humanidacle?

R. Para ser precisa, segundo a nossa doutrina, todos osgrandes males sociais, a distinção de classes na Sociedadec de sexos nos problernas da vida, a distribuição desigual docapital e do trabalho, devem-se àquilo a que sóbria e rigo-rosamente chamamos KARMA.

P. Mas decerto que todos esses males que parecem atin-gir as massas duma maneira um tanto indiscriminada nãosiro um Karma INDIVIDUAL merecido?

R. Não; não é possível defini-los tão rigorosamente nosscus efeitos a ponto de demonstrar que o ambiente individual

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A CFIAYE DA TEOSOFTÁ

e as circunstâncias específicas da vida de cada indivíduo nãosão mais que o Karma retributivo que esse indivíduogerou numa vida anterior. Não nos podemos esquecer quecada átomo está sujeito à lei geral que governa todo o corpoa quc pertence, o que nos coloca perante a existência dumaesfera de acção mais vasta da lei do Karma. Não vê queo conjunto de Karmas individuais constitui o Karma danação a que esses indivíduos pertencem, e mais, que osomatório dos Karmas das nações é o Karma do Mundo?Os males de que falou não são característicos do indivíduonem sequer da Nação, são mais ou menos universais; cé neste domínio alargado de interdependência humana quea lei do Karma se manifesta legítima e equitativamente.

P. Devo, então, concluir que a lei do Karma não é

necessariamente uma 1ei individual?R. É isso mesmo que eu quero dizer. Seria impossível o

Karma reajustar o equilíbrio de forças na vida e no progressodo rnundo se não tivesse uma esfera cle acção vasta e geral.Os teósofos acreditam que a interdependência cla Humanidade é a causa daquilo a que se chama Karma Distributivo,e é esta lei que oferece a solução para a grande questão dosofrimento colectivo e alívio desse rnesrno sofrimento. Alémdisso, existe uma lei oculta segundo a qual nenhum homempode superar as suâs deficiências individuais sem elevar, porpouco que seja, todo o corpo do qual faz parte integrante.f)o mesmo modo, ninguérn pode pecar nem sofrer os efeitosdo pecado sozinho. Na realidade, o <Isolamento> é coisa qucnão existe, e o ponto mais próximo desse estado egoísta qucas leis da vida permitem está na intenção ou motivo.

P. E não haverá nenhum meio de o Karma distributivoou nacional ser concentrado ou reunido, por assim dizer, c

conduzido à sua realização natural e legítirna sem toclo essc

sofrimento prolongado?R. Regra geral, e dentro de determinados limites quc

definem a época a que pertencemos, não é possível acelerarnem retardar o cumprimento da lei do Karma. Mas duma

DOS AfISTERIOS DA REINCARNAÇÃO

coisa estou certa: o limite de possibilidade em qualquerdesses sentidos ainda nunca foi atingido.

P. Que infeliz humaniclade; dir-se-ia que não há qual-quer esperança imediata de alívio a não ser que sobrevenhaum terramoto ou uma destruição universal!

R. Que cÌireito temos nós cle pensar semelhante coisaenquanto rnetade da humanidade está em condições de pro-porcionar alívio imediato das privações a que estão sujeitosos seus semelhantes? Quando todos os indivíduos tiveremcontribuído païa o bem geral, com todo o dinheiro, trabalhoc pensamentos dignificantes que puderem, então, e só então,se atingirá o ponto de equilíbrio do Karma Nacional. Com-pete às almas heróicas descobrir a causa desta pressãoclesigual do Karma retribuiivo e, por um esforço supreÍno,reajustar o equilíbrio de forças e salvar os homens durnaniquilamento moral mil vezes mais grave e mais permanente-mente prejudicial do que uma catástrofe física semelhante,que, para si, parece ser a única saída possível desta misériaacumulada.

P. Diga-me, então, como descreveria, duma maneirageral, essa lei do Karma.

R. Segundo a Teosofia, o Karma é uma Lei de reajus-tamento que tende semtr)re a restabelecer o equilíbrio per-turbado no mundo físico e a harmonia interrompida nomundo moral. Afirmamos que o Karma não actua sempredesta ou daquela maneira, mas actua sempre de moclo arestabelecer a Harmonia e preservar o equilíbrio em virtudedos quais o lJniverso existe.

P. Dê-me um exemplo.R. Imagine um lago. Uma pedra cai na água provo-

cando ondas que vão perturbar as águas tranquilas. Estasondas movem-se num vaivém até que por fim, devido àacção daquilo a que os físicos chamam a lei da dissipaçãoda energia, param e a água regressa ao estado de tranqui-lidade em que se encontrava anteriormente. Do mesmomodo, toda a acção, seja em que plano for, vai perturbar

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Á Cí]AVE DÁ 'TEASOFIA

a perÍeita harmonia clo Universo, e as vibrações assim pro-duzidas, se a sua âtea fot limitada, continuarão a fazer-sesentir até que o equilíbrio seja restabelecido" Mas, umavez que a perturbação tem origern num ponto específico,é evidente que o equilíbrio e a harmonia só podem serrestabelecidos se as forças que dele partiram por efeito daperturbação rroltarem a convergir nesse mesmo ponío.

P. Mas não vejo nada de moral nessa lei" Parece-meuma simples lei física segundo a qual acção e reacção sãoiguais e opostas.

R. Para nós, <Bem> e <<Harmoniar>, <<Mal> e <<Desar-ntonia>, são sinónimos. Além disso acreilitamos que a dore o sofrimento são sempre resultado da ausência de Har-monia, e que a causa única e terrível da perturbação daHarmonia ê, o egoísmo, seja qual for a forma sob a qualse apresente. Assim, o Karma devolve a cada homem asconsequêncías reaís clas suas próprias acções, sem qualquerconsideração de ordem moral; mas como o homem recebeaquilo que lhe é devido por tudo, é evidente que terá deexpiar todo o sofrimenfo que causou, tal como colherá emalegria e regozijo os frutos cle toda a felicidade e harmoniapara que contribuiu.

P. Gostaria que me desse um exemplo concreto daacção do Karma"

R. É impossível. Como já tive oportunidade de dizer,âpenas podemos ter a certeza de que a nossa vida e circuns-tâncias actuais são resultado directo das nossas própriasacções e pensamentos em vidas anteriores. Mas nós, quenão sornos Videntes nem Iniciados, não podemos ter umconhecimento mais pormenorizado da acção da lei do Karma.

P. Poderâ alguém, quer seja Adepto ou Vidente, seguiresse processo Kármico de reajustamento em todos os seuspormenores?

R. Sem dúvicla; <aqueles que sabenz> podem fazê-ktutilizando poderes que estão latentes em todos os homens.

DOS MISTERIOS DA REINCARNACÃO

OUEM SÃO OS OUF SABEM?

P. Isso aplica-se tanto a nós como a outras pessoas?

R. Sim. Tal como acabo de dizer, todos dispomos damesma visão limitada, excepto aqueles que atingiram naincarnação presente o mais elevado grau de visão espirituale clarividência. Nós só podemos compreender que, se as

coisas se devessem passar de modo diferente connosco, ter--se-iam passado, efectivamente, de modo diferente, e quesomos obra de nós próprios, só tendo aquilo que merccemos.

P. Receio bem que tal noção só servisse para nosangustiar.

R. Creio que é precisamente o contrário. O facto denão se acreditar na lei justa da retribuição é mais susceptívelde despertar no homem toda a espécie de sentimentos derevolta. A criança, tal como o homem, não gosta de sercastigada, ou mesmo repreendida, se achar que não o merece;já não ficaú tão ressentida com um castigo muito maissevero se o considerar merecido. Acreditar no Karma é omotivo mais elevado pam uma pessoa se reconciliar coma sua sorte na vida, e o maior incentivo no sentido de umapessoa se esforçar por melhorar a incarnação seguinte. Essemotivo e esse incentivo deixariam de existir se estivéssemosconvencidos de que a nossa sorte não é resultado dumaZei rigorosa ou de que o clestino não está nas nossas mãos.

F. Acaba de dizer que esse sistema ctre Reincarnação deacordo com a Lei do Karma se refere à razáo, à justiçae ao sentido moral. Mas não implicar'á também o sacrifíciode qualidades mais nobres, como a compreensão e a com-paixão e, como tal, um endurecimento dos instintos maiselevados da natrtreza humana?

R. Sô aparentemente; na realidade não. Não é possíveluma pessoa receber mais ou menos do que aquilo que merecesem que isso resulte numa injustiça ou num favoritismo paracom os outros; aliás, se uma lei deixasse de ser aplicada pormotivos de compaixão acabaria por provocar mais sofri-

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A CHAVE DA TEOSOFIÁ

mento do que aquele que conseguiria evitar, mais irritação eataques do que agradecimentos. Também não pode esque-cer-se que não somos nós que aplicamos a lei, emborasejamos responsáveis pelas causas que a levam a produziros seus efeitos; que é a lei que se executa a si própria,e ainda que o estado de Devachan é a manifestação maisrica que se possa esperar de uma justa compaixão e umajusta misericórdia.

P. Disse que os Adeptos são uma excepção à regra daignorância da generalidade dos homens. Eles sabem real-mente mais do que nós acerca da Reincarnação e dos outrosestados futuros?

R. Sem dúvida. Exercitando faculdades que todos nóspossuímos, mas que só eles desenvolveram até à perfeição,consegueÍn entrar em espírito nesses vários planos e estadosque temos vindo a discutir. Desde tempos imemoriais qucgerações após gerações de Adeptos têm vindo a estudar osmistérios do ser, da vida, da morte e do renascimento,e todos eles, por sua vez, ensinaram alguns dos facto.s queaprenderam.

P. O objectivo da Teosofia é produzir Adeptos?R. A Teosofia considera que a hurnanidade é uma ema,

nação da divindade no caminho de regresso à sua origem.Num ponto avançado desse caminho, o Adeptado ó

atingido por aqueles que dedicaram diversas incarnaçõcsa preparar-se para isso. Não se pode esquecer que ninguénrjamais conseguiu atingir o grau de Adepto das CiênciasSecretas numa só vida; para isso são precisas muitas incar-nações depois de se ter conscientemente optado por esscobjectivo e iniciado o treino necessário. Hâ, provavel-mente, muitos homens e mulheres na nossa sociedade qut:iniciaram essa árdua subida para a iluminação há váriasincarnações e que, no entanto, devido às ilusões pessoais rlirvida presente, ou não têm consciência disso, ou estão cnrvias de perder torJas as oportunidades de avançarem maisdurante esta vida. Sentem uma atracção irresistível pclo

DOS MISTÉRIOS DA REINCARNAÇ.4O

ocultismo e pela Vida Superíor; no entanto, são demasiadoinclividualistas e obstinados e estão demasiado apaixonadospelos encantos ilusórios da vida mundana e pelos prazeres efé-meros do mundo para os abandonar, perdendo assim a opor-tunidade que lhes é dada na incarnação actual. Mas para ohomem comunÌ, e no que diz respeito aos deveres práticos davida quotidiana, um resultado tão longínquo não constituicbjectivo adequado nem um motivo eficaz.

P. Qual será, então, o seu objectivo ao ingressarem naSocieclade Teosófica?

R. l\,{uitos estão interessados pelas nossas doutrinas esentem, instintivamente, que elas são rnais verdadeiras doque as de qualquer religião dogmática. Outros optaram fir-memente por atingir o mais elevado ideal do dever humano.

DTFERENçA EhÍTRE FÉ E CONHECTMENTO, OU ENTRE FÉ CEGAE FÉ RACIONAL

P. Diz que essâs pessoâs aceitam e acreditam nas dou-trinas da Teosofia. Mas como não pertencem ao númeroclos Adeptos que acaba de referir, têm de aceitar os ensina-rnentos da Teosofia com base uma t'é cega" Em que é queisto difere das religiões convencionais?

R. Aquilo a que chama <<fé>> e aquilo que em relação aosclogmas clas religiões cristãs não passa afinal de fé cega,é entre n6s <<conhecímento>>, a sequência lógica de coisasqrte sabemos acerca de certos íoctos da natuteza. As dou-trinas cristãs baseiam-se na interpretação e, portanto, notestemunho indirecto de Videntes; ÍN nossas baseiam-se notestemunho invariável e constante de Videntes. A teologiacristã comum, por exemplo, afirma que o homem é criadopor Deus e constituído por três partes - corpo, alma ecspírito -, todas elas essenciais para a sua integridade etodas elas, quer na forma grosseira da existência física ter-rena, quer na forma etérea da experiência após a ressurrei-

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A CHAVE DA TEOSOFIÁ

ção, para semple necessárias ao homem, tendo cada homenrportanto uma existência perrnanente distinta da dos outroshomens e do l)ivilio. A Teosofia, por outro lado, defendeque, sendo o homem uma emanação da Essência DivinaDesconhecida, mas sempre presente e infinita, o seu corpoe todas as outras coisas são impermanentes e, como tal,urna ilusão; a única substância durável nele é o Espírito,e mesmo este perde a sua individualidade distinta nornornento em que se une cle novo na sua totalidade aoEspírito Ilníversql.

P. Mas, se até a individualidade perdemos, o que sc

clá é simpiesmente uma aniquilação.

R. Itejeito a sua arfirmação, uma vez que estotr a Íalarde individualidade separada e não universal. Esta passa aïazer pafte do todo; a gota de orvalho não se evapora,passando antes a fazer parte do mar. O homem físico ó

a:niqwilado quando o feto que foi se torna um homemvelho?

P. DaÍ se cìepreende, então, que o homem de tacto nït<t

existe e que tudo é IJspírito?

R. Está enganado. O que se depreende é que a uniãodo Espírito com a rnatéria é apenas temporária; ou, poroutras palavras, uma vez que o Espírito e a matéria são

a mesma coisa, isto é, os dois pólos opostos da substânciiruniversal manifestada, o Espírito deixa de ter direito a esse

nome enquanto a mais pequena partícula e átomo de subs-tância manifestada estiver ligada a qualquer forma, comoresultado da diferenciação. Acreditar noutra coisa é fé cega.

P. É, portanto, com base no conhecimenlo e não na

fé que afirma que o princípio permanente, o Espírito, apenaspassa pela matêría?

R. Diria antes o seguinte: afirmamos que o aparccìmento <1o princípio permanente e único, o Espírito, sob u

forma de matéria,, é efémero e que, como tal, não passrr

duma ilusão.

DOS MISTÉRIOS DA REINCARNAÇ"1O

P. Muito bem; e essa afirmação baseia-se no conheci-rnento e não na fê?

R. Exactamente. Mas, como estou a ver muito bemaonde quer chegar, digo-lhe já que nós consideramos a /é,tal como a defende, uma doença mental, e a fé verdadeira,isto é, a pistis dos gregos, uma ((crença baseada no conhe.cimento>>, quer este se fundamente em provas fornecidaspor sentidos físicos au espirituais.

P. O que é que quer dizer?tt. Se pretende saber qual é a cliferença entre as d.uas

coisas, posso dizerJhe que há urna grande diferença entreJé baseada nu autoridade e fé basea,da na intuiçãct espiritual.

P. E que diferença é essa?R. Uma é credulidade e superstição humanas, a outra

é convicção e íntuição humanas.P. E é essa <intuição> que a impede cle aceitar Deus

como um Pai pessoal, Legislador e Regente do Universo?R. Precisamente. Acreditamos num princípio incognos-

c:ível, pois só por uma aberração cega é que se poderálfirmar que o lJniverso, o homem pensante e até todasas maravilhas do mundo da matéria poderiam ter surgidoscm que quaisquer potências inteligentes tivessem contri-buído para a disposição extraordinariamente sábia de todasrrs partes que os compõem. A natureza pode errar, e muitasvozes erra no pormenor e nas manifestações exteriores dosscus materiais, mas nunca nas suas causas e resultadosi nteriores.

P. Fé por fé, não será melhor a fé do Cristão, que,rÌa sua fraqueza e humildade humanas, acredita que há no(léu um Pai misericordioso que o protegerá da tentação,o ajudará na vida e the perdoará os pecados, do que al'ó fria, orgulhosa e quase fatalista dos budistas, vedanlistasc teósofos?

R. Pode continuar a chamar (fé) à nossa crença, sequiser. Mas, considerando que voltámos de novo à questãorlc sempre, gostaria de lhe perguntar o seguinte: fé por

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A CHAVE DA TEOSOFIA

fé, não será melhor aquela que se fundamenta na lógica cno raciocínio rigoroso do que aquela que se baseia apenasna autoridade humana - ou no culto de heróis? Além disso.a sua fé não só se opõe a qualquer noção de justiça oucle lógica, como, se a analisarmos bem, concluz o homenrà perdição moral, impede o progresso da humanidade c.fazendo da força razáo, transforma constantemente o homeirrnum Caim para com seu irmão Abel.

P. Do que é que está a falar?

TERÁ DEUS O DIREITO DE PERDOAR?

R. Da Doutrina da Expiação. Refiro-me àquele prirr-cípio que nos ensina que, por muito grandes que sejam os

nossos crimes contra as leis de Deus e dos homens, serenÌ()sperdoados desde que acreditemos que Jesus se sacrificoupara salvar a humanidade e que o seu sangue iimpará tocllsas manchas. Há vinte anos que prego contra essa doutrirr;re gostaria agora de chamar a sua atenção para um parágral'ode lsrs sem Yéu (vol. II, p. 5a\ escrito em L877.

<A misericórdia de Deus é ilimiiada e incomensurável.B impossível conceber um pecado humano tão grave clut'

o preço pago antecipadamente pela redenção do pecadornão o possa ïesgatar, ainda que fosse mil vezes pior. Alórrrdisso, nunca ê tarde de mais para uma pessoa se arrepenclcr'.Mesmo que o transgressor espere atê ao último minutoda última hora do último dia da sua vida mortal para prol'crir,de lábios exangues, a sua confissão de fé, pode ir parâ o

Paraíso; foi isso que fez o ladrão moribundo e que poclcr'íiofazer outros tão vis como ele. São estas as pretensõcs tlrr

Igreja e do Clero; pretensões que os pregadores mais í'anrosos de Inglaterra metem na cabeça dos seus cornpatrìolrrsapesar do "esclarecimento trazido pelo séc. XIX"), ópot'rrque não podia ser mais paradoxal. Ora, a que poderá istolevar?

DOS NIISTÉRIOS DA REINCARNAÇÃO

P. Não será o Cristão mais feliz do que o budista ouo brâmane por isso mesmo?

R. Não; pelo menos os homens cultos não o são, poishá muito que na sua grande maioria deixaram praticamóntecle acreditar neste dogma cruei. Mas não conheço nacla queconduza mais facilmente os que acredííam nele aré aa limiarde todo's os crimes imagínóveis. Deixe-me citar-lhe outrapassagem cle lsrs sem Véu (vide vol. II, pp. 542-543):

<Se sairmos do domínio limitado do credo c consicle_Ì'armos o universo como um tcdo cujo equilíbrio se deveà harmonia perfeita de todas as partes que o integram, veri_Íicamos como toda a.lógica e como o mínimo senticlo rjeJustiça se insurge contra esta Expiação por interposta pessoa!Se o criminoso apenas pecasse contra si mesmo e só fizessemal a si próprio; se mediante um arrependimento sinceroirudesse obliterar acontecimentos passados não só da memóriaclo homem, mas também daquele registo imperecível quenenhuma divindade - nem a Mais Suprema das Supremas -pode fazer desaparecer, talvez este dogrna não fosse incom-llreensível. Mas afirmar que uma pessoa pode fazer mal aoscu semelhante, matar, perturbar a harmonia da sociedadet-r a ordem natural das coisas e depois * por cobardia, espe_rÍÌnça ou compulsão, não importa - ser perdoaclo por acre.ditar que o facto de um homem ter derramado o seu sanguevai limpar outro sangue derramado, é absurdo! poderãotts consequêncías dum crime ser obliteradas embora o crimepossa ser perdoado? Os efeitos duma cousa nunca se restrin_gem aos limites dessa causa, tal como as consequênciastlum crime não se restringem apenas ao delinquente e asua vítima. Qualquer boa ou má acção produz efeitos dumarrraneira tão palpável como uma pedra atirada para ,a âguatranquila. A imagem é banal mas não podia ser melhor,portanto servir-me-ei dela. Os círculos concêntricos sãottrniores e sucedem-se com rnaior rapidez consoante o objectolnnçado seja maior ou menor, Ínas o mais pequeno seixo,ou melhor, o mais pequeno grão, provoca ondulação. E não

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A CHAVE DA TEOSOFIA

é só à superfície da água que esta agitação é visível. Debaixode água, despercebidas, as gotas exercem pressão umas sobreas outras em todas as direcções - para fora e para tlaixo -até que os laclos e o fundo são tocados pela força que exer-cem. Mais, o ar poj: cima da superfície da água é agitadoe, segundo dtzern os físicos, esta perturbação faz-se sentirde camada em camada em direcção ao espaço para sempre;a matéria sofreu um impulso e este nunca se perde nemnunca pode ser anulaclo!...

ïsto aplica-se ao crime e ao oposto do crime. A acçâopodera ser rnstantânea, os efeitos são eternos. Se algumavez, depois da pedra lançada no charco, formos capazesde a fazer voltar à nossa mão, obliterar a força despendida,fa;er as ondas etéreas vc,ltar ao estado cle não-ser em que

se encontravam e apagar todos os vestígios do acto de lançaro projéctil, de forma que o registo do Tempo não mostreque jamais aconteceu, então, e só então, ouviremos paciente-mente os argumentos dos cristãos a favor cla eficácia cla

Expiação.>E deixaremos cle acreditar na Lei do Karma. Mas pot'

agora convidamos a humanidade a dizet qual das duas dou-trinas denota um maior sentido de justiça deífica, e qualé mais razoâvel, me$mo do simples ponto de vista humanoe lógico.

P. O destino último do homern não é, portanto, unrCéu presidido por l)eus, mas a transformação gradual clrr

matêna no seu eleinento priinordial, o Espírito?R. É para esse fim que tudo tende na nattteza.P. Não há alguns teósofos que associam a ideia dc

<descida do espírito na matéria)) com o mal, e o renasci-mento com a dor?

R. }Jâ, e como tal tentam diminuir a duração do seu

período probatório na terra. Mas não se trata dum malsem contrapartida, na medida em que nos proporciona ir

experiência de que necessitamos para alcançar o conheci-mento e a sabedoria. Estou a falar claqueia experiênci;r

DOS A(TSTERIOS DA RETNCALINAÇÃO

que nos ensina que as necessidades da nossa natureza espi-ritual só poderão ser satisfeitas pela felicidade espiritual.Enquanio estivermos presos ao corpo, estamos sujeitos àclor, ao sofrimento e a todas as desilusões da vida. Assim,para mitigar essa dor e esse sofrimento, tentamos alcançaro conhecimento, pois só ele é que nos pode proporcionaralívio e dar esperança dum futuro rnelhor.

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XU

o QUE Ìi A TEOSOFTA PRÁTICA?

O DEVER

P. Nesse caso, porque há reincarnações, se nenhumadelas consegue assegurar-nos uma paz permanente?

R. Porque o objectivo final só poderá ser alcançadoatravés de experiências de vida, e estas traduzem-se essen-cialmente em dor e sofrimento. Só através deste é que pode-mos aprender. As alegrias e os prazeres não nos ensinamnada; são evanescentes s, a longo prazo, a única coisa aque nos levam é à saciedade. Alérn disso, a nossa constanteincapacidade trlara encontrar na vida um prazer permanenteque nos permitisse satisfazer as necessiclacles da nossa natu-reza superior demonstra claramente que cssas necessidadessó poclem ser satisfeitas no seu próprio plano, isto é, noplano espilitual.

P. A consequência natural clisso não será o desejo deabandonar a vida duma maneira ou doutra?

R. Se por esse desejo entende <<suicídio>1, de maneiranenhuma. IJma consequência clessas nunca poderá ser con-siderada <<natural>, devenclo-se antes a uma doença mentalmórbida ou a ideias rnaterialistas extremamente enraizadas.E o pior dos crimes e as suas consequências são terríveis.Mas se por esse desejo entende âpenas uma aspiração a

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A CT{ÁVE DA TEASOFIA

uma existência espiritual e não uma vontade de abandonar'a tena, então trata-se sem dúvida clum desejo muito natural.Caso contrário a morle voluntária seria uma renúncia clo

cargo que oÇupamos e dos deveres que nos incumbem, benrcomo uma tentativa de nos furtarmos a respcnsabilidaclcsKármicas, danclo portanto origem a um novo Karma.

P. Mas, se as acções no plano material não satisfazenr.porque hão-de os deveres, que afinal também são acções.ser obrigatórios?

R. Em primeiro lugar, porque segundo a nossa filo-sofia o objectivo de cumprirmos os nossos deveres paracom todos os homens, e só depois para com nós mesmos,não ê alcançar a felicidade pessoal mas a felicidade dosoutros; ê fazer o bem pelo bem e não por aquilo que ekrnos possa trazer. É verdade que do cumprimento do devcrpode resultar felicidade, ou melhor, satisfação, mas nãoé nem deve ser isso o que nos leva a agir.

P. E como é que define esses cleveres, oll ((deverD, crììtermos gerais?

R. O dever é aquilo que á devido à Hurnanidade, aos

nossos semelhantes, vizinhos, família e, sobretudo, aquikrque devemos a todos aqueles que são mais pobres e estãomais desamparados do que nós. É uma dívida que, se nã<r

for paga durante a vida, fará de nós insolventes espirituaise falidos morais na nossa próxima incarnação. A Teosoiiaé a quinta-essência do dever. Por último, se me perguntarcomo é que entendemos o dever teosófico na prática e dcacordo com o Karma, poderei responder que o nosso devcré beber, sem um murmúrio, até à última gota, aquilo quco cálice da vida nos reserva; colher as rosas da vida apeníìs;

pelo perfurne que poderão derramar sobre os oulinos, e cnntentarmo-nos com os espinhos, se para gozarmos esse pcr'

fume tivermos de privar alguém dele.

P. O que é que considera ser devido à humaniclarlt'em geral?

O QUE E A TEOSOFIÁ FRÁTICA?

R. Pleno reconhecimento de direitos e privilégios iguaispara todos, sem distinção de raça, cor, posição sociai onnascimento.

P. Em que circunstâncias se falta a, este dever?R. Quando hâ a mínima usurpação do direito de

outrem, quer se trate de um homem ou cle uma nação,em que a justiça, bonclacle, consideração ou misericórdiaque desejamos para nós próprios lhe são de qua.lquer modonegadas. Toda a política actual se baseia na omissão clc

tais direitos e na mais feroz afirmação do egoísrno nacional.P. A Sociedacle Teosófica participa cle alguma maneira

na política?R. Como Sociedacle, temos o maior cuidado em evitar

participar na política pelos motivos que lhe vou apresentar.Tentar introduzir reforrnas políticas antes de termos conse-guido uma reforma da natureza humsna, é como deita,r vinhonovo em garralas velhos. Se conseguirmos que os homenssintam e reconheçam no seu íntimo qual é o seu dever vercla-deiro e real para com todos os homens, autornaticamentedeixarão de existir todas as espécies de abusos de podere de leis iníquas nas políticas nacionais baseadas no egoísmohumano, social e político. O jardineiro que tenta arrancardum canteiro as ervas daninhas cortando-as à superfície dosolo em vez de as arrancar pela raiz, não passa dum insen-sato. Não é possível levar-se a cabo qualquer reforma políticaduradoura enquanto os governos estiverem nas mãos dosmesmos homens egoístas de sempre.

RErAçÕES DA SOCTEDADE TEOSóF|CA COM AS REFORMÀS

POLíTICAS

P. A Sociedade Teosófica não é, portanto, uma orga-nizaçáo política?

R. De maneira nenhuma. É internacional no sentidomais elevado da expressão e na medida em que entre os

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A CHÁVE DÁ TEOSOFIA

seus membros se contam homens e mulheres de todas asraças, credos e maneiras de pensar que trabalham em con-junto para o mesmo fim, o progresso da humanidade; mascomo sociedade não desempenha qualquer papei em políticasnacionais ou partidárias.

P. Porquê?R. Pelas razões que acabo de referir. Além disso, a

acção política tem necessariamente de mudar com as cir-cunstâncias da época e idiossincrasias dos indivíduos. Emboradevido à própria nattreza da sua posição como teósofos osmembros da Sociedade Teosófica estejam de acordo sobreos princípios da Teosofia (doutro modo não seriam membrosda sociedade), não se pode concluir daí que estejam de acordoem tudo. Como sociedade só podem agir em conjunto emassuntos que a todos digam respeito, ou seja, naquilo que dizrespeito à própria Teosofia; corno indivíduos têm inteiraliberdade de seguir esta ou aquela via específica de pensa-mento e acção políticos, ilesde que isso não vá entrar emconflito com os princípios teosóficos nem de qualquer modoafectar a Sociedade Teosófica.

P. Mas a Sociedade Teosófica decerto que não está com-pletamente afastada de questões sociais que têm vindo aassumir uma importância crescente?

R. Os próprios princípios da Sociedade Teosófica pro-vam que a Sociedade, ou melhor, a maioria dos seus ü1em-bros, não estão afastados dessas questões. Se a humanidaclcsó pode progredir mental e espiritualmente mediante a apli-caçã.o, em primeiro lugar, de leis fisiológicas válidas e cien-tíficas, é dever imperioso de todos aqueles que lutam poresse progresso fazer tudo o que está ao seu alcance paragarantir a execução dessas mesmas leis. Por muito que iss<rlhes custe, os teósofos têm perfeita consciência de que acondição social da grande maioria das pessoas, sobretuclonos países ocidentais, torna impossível uma formação adc-quada dessas pessoas, tanto no plano físico como espiritual,e isso constitui um impedimento ao seu desenvolvimento cur

O gUE E A TEOSOFIA PRÁTICA?

ambos os planos. Como essa formação e esse desenvolvimentosão um dos objectivos declarados da Teosofia, a SociecladeTeosófica concorda plenamente com todos os verdadeirosesforços nesse sentido.

P. Mas o que quer dizer com <verdadeiros esforços>?Cada reformador social tem a sua própria panaceia e cadaum deles considera que a solução por ele proposta é a únicaque pode fazer progredir e salvar a humanidacle.

R. Tem toda a razáo e é por esse motivo que se temfeito tão pouco no campo social. A maioria dessas panaceiasnão estão sujeitas a um princípio orientador, e sobretudo nãohá um princípio único qualquer que estabeleça uma ligaçãoentre todas elas. Perde-se assim um tempo e uma energiapreciosos, porque, em vez de colaborarem, os homens lutamuns contra os outros, muitas vezes, infelizmente, mais pelorenome e benefícios que isso lhes pode trazer do que pelagrancle causa que afirrnam defender e que deveria ser oobjectivo principal das suas vidas.

P. Nesse caso, como é que os princípios teosóficos de-viam ser aplicados de modo a proÍnover a cooperação sociale a realização de esforços vercladeiros no sentido duma me-lhoria social?

R. Vou recordar-lhe rapidamente quais são esses prin-cípios: Unidade e Causalidade universais, Solidariedade Hu-mana, a Lei do Karma e a Reincarnação. São estes os quatroclos da corrente de ouro que deve unir a humanidade e

Í'azer detra uma família, uma Fraternidade Universal.P. Como?R. No estado em que a sociedade se encontra, sobre-

tudo nos chamados países civilizados, somos constantementelcvados a constatar que há inúmeras pessoas que têm desuportar miséria, pobreza e doenças. A sua condição físicaó deplorável e, muitas vezes, as suas faculdades mentais e

cspirituais estão praticamente inactivas. Por outro lado, nooutro extremo da escala social, muitas pessoas levam umavida de inconsequente indiferença, Iuxo material e auto-

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Á L'HAVE DÁ T"EOSOFIA

-satisfação egoísta. Ora estas formas de existência não sãoassim por acaso. Qualquer delas ó resultacÍo das condiçõesde vida clessas pessoas e o não cumprimento do clever socialpor uma das paríes está intimamente ligado à atrofia e faltade desenvolvimento da outra. A lei da causalidade universaiaplica-se à sociologia, tal corno a todas as verdadeiras ciên-cias. IVías o resultado lógico dessa causalidade é necessaria-nente aquela solidariedads humana em que a Teosofia tantoinsiste. Se a acção de uma pessoa age sempre sobrc a vidade todos, e é esta a vercladeira ideia científica, só serápossível alcançar a verdadeira soliclariedacle humana de quedepende o engranclecimento da raça quando todos os homense mulheres se tornarern irmãos uns dos outros, pondo emprática na sua vida do dia-a-dia a verdacleira fraternidade.Esta acção e interacção, esta verdadeira fraternidade, emque cada um viverá para todos e todos viverão para cada um,constitui um dos princípios fundamentais que todos os teó-sofos deveriam comprometer-se não só a ensinar como a pôrem prática na sua própria vida.

P. Isso está tudo muito bem como princípio geral, mascomo ó que o aplicaria concretamente?

R. Pense uns momentos naquilo a que chama os factosconcretos da sociedade humana. Compare as viclas não só dasmassas populares, como de muitos claqueles que pertencemàs chamadas classes média e superior, corn aquilo que pode-riam ser em condições mais saudáveis e dignas em que pre-valecessem a justiça, a bonclade e o amor, em vez do egoísmo,a indiferença e a vioiência que muiias vezes parecem reinar.Todas as coisas boas e más da humanidacle têm origem ntrcarácter humano, e este foi e continua a ser condicionadopela sucessão interminável de causas e efeitos. Mas estecondicionamento aplica-se ao futuro tal como ao presente cao passado. O egoísmo, a indiferença e a violência não podemser de maneira nenhuma o estado normal da raça - acre-ditar nisso seria desesperar da humaniclade, e nenhum teósofoo poderá fazer. É, possível progredir, mas o progresso só pode

O QUE E A TEOSOFIA PRÁTICA?

ser aicançado rnedianle o cleselrvolvimento clas qualidadesmais nobres. A verdadeira evolução mostra-nos que poclemosmodificar e aperfeiçoar o organismo, modii'icando o am-biente em que eie vive; em sentido mais estrito, isto tambémé verdade em relação ao homem. Os teósofos têm, portanto,como obrigrçã,o fazer tudo o que estiver ao seu alcance ccÍnpregar todos os meios cle que disponham para partici-parem em todos os esforços sensatos e acertaclos que tenhampor objectivo a melhoria das condições de vida clos pobres.Esses esforços devem ser orientacios para a total emanci-pação social destes, ou para uma tomada de consciência dcr

sentido do dever por parte daqueles que actualmente tantasvezes o esquecem em quase todas as suas relações.

P. De acordo. Mas a quem é que compete decidir sedeterminacla acção social é ou não sensata'l

R. Não é possível ninguém nem socieclade nenhumaestabelecer uma regra rígida quanto a esse aspecto. Muitascoisas têm necessariarnente de ficar ao critério individuaicle cada um. Mas há, no entanto, uma pergunta que se podesempre fazer: a acção proposta tenderá a promover a ver-dadeira fraternidade que a Teosofia pretende alcançar? Ne-nhum teósofo verdadeiro terá grande dificuldade em respon-der a esta pergunta, e, caso a resposta seja afirmativa, teút,como dever ajudar a formar a opinião pública. A únicamaneira de o conseguir consistirá em inculcar nas pessoasas rnais nobres e elevadas noções de deveres públicos e pri-vados que estão na base de todo o progresso espiritual e

material. O teósofo deverá ser, por outro lado, e em todasas circunstâncias, um centro de acção espiritual, e tanto elecomo a sua vida quotidiana deverão irracliar aquela forçaespiiitual superior que constitui o irnico meio de regenerâros seus semelhantes.

P. Mas porque é que o há-de fazerT Segundo disse,tanto ele como toclas as outras pessoas estão condicionaclospelo seu Karma e este manifesta-se necessariamente deacordo com determinadas regras.

t 7') t73

A CHAVE DA TEOSOFIA

R. E a própria Lei do Karma que reforça tuclo aquiloque eu disse. O indivíduo não pode considerar-se distinto daraça, nem a raça distinta do indivíduo. A Lei do Karmaaplica-se igualmente a todos, embora nem todas as pessoasestejam no mesmo grau de desenvolvimento. Ao ajudar osoutros a desenvolverem-se, o teósofo sabe que está não sóa ajudá-los a reahzat o seu Karma, como também, no sentidomais estrito, está a cumprir o seu próprio Karma. Aquilo quetem sempre em vista é o progresso da humanidade, da qualtanto ele como os outros fazem parte integrante, e ele sabeque quaiquer incapacidade cla sua parte para responcler aoque há de mais elevado dentro de si irá retardar não só asua evolução como a de toda a humanidade. Com as suasacções tanto poderá impedir como contribuir para que ahr:rmanidade alcance o plano de existência superior seguinte.

P. Em que medida é que isso está ligado ao quarto prin-cípio que referiu, a Reincarnação?

R. Existe nma estreita ligação entre o que acabo cledizer e o princípio da Reincarnação. Se a nossa vida actualclepende clo desenvolvimento de determinados principios quesão produto de embriões deixados por uma existência ante-rior, a lei aplica-se ao futuro. ïJma vez que tenhamos com-preendido qlle a causalidade universal não é apenas presente,mas passada, presente e futura, todas as acções realizaclasno plano em que nos encontramos actualmente passam aestar, com a maior naturalidacle e facilidade, no lugar queverdadeiramente lhes compete e, por outro lado, são vistasna sua verdadeira relação connosco e com os outros. Asacções más e egoístas fazem-nos sempre recuar e não avan-çar, ao passo que os pensamentos nobres e acções altruístassão degraus que nos podem conduzir aos planos superiorese mais gloriosos do ser. Se a existência estivesse reduzida aesta vida terrena, então esta seria sem dúvida, em muitosaspectos, uma vida medíocre e insignificante; mas, se a con-siderarmos como uma preparação paÍa a esfera de existênciaseguinte, poderemos ver nela o portão de ouro através do

O QUT E A TEOSOFIA PRÁTICÁ?

qual poderemos entrar, não egoistamente e sós, mas na corn-panhia dos nossos semelhantes, nos palácios que estão clooutro lado.

DO AUTO.SACRIFíCIO

P. O objectivo mais elevado da Teosofia é justiça iguaÌpara todos e amor pala com todas as criaturas?

R. Não; há outro ainda mais elevado.P. Qual é?

R. Dar aos outros mais do que a nós próprios - o &Lüa--sacrifício. Este era a característica comum e mais notáveldos grandes Mestres da Humanidade cle que a história nosdá um exemplo em Gautama Budha e os Evangelhos emJesus cle Nazareth. Só por si ela conseguiu assegurar-lhes orespeito e gratidão eternos das gerações que se lhes seguiram.Segundo a Teosofia, devemos, porém, auto-sacrificarmo-noscom discernimento, pois se a nossa entrega de nósmesnros não for feita com justiça e se agirmos cegamente.independentemente das consequências que daí possam advir,vimos muitas vezes a verificar que o nosso sacrifício não sófoi em vão corno prejudicial. Uma das Íegrâs fundamentaisda Teosofia é a Justiça para com nós rnesrnos - tomada comounidade da humanidade colectiva e não corno uma auto-justiça pessoal, não devendo ser maior nem menor do queaquela de que usamos para coÍl os outros, excepto se pelosacrifício do nosso eu índívidual pudermos beneficiar outros.

P. Não podia explicar melhor o que acaba de dizerdando um exemplo?

R. Para a Teosofia, o auto-sacrifício por um bem real,e tendo ern vista salvar muitas ou diversas pessoas, é muitosuperior à auto-renúncia por um ideal sectário, como porexemplo <<salvar os pagãos da condenação eterna>>. Na nossaopinião, o Padre Damien, um hornern de trinta anos quesacrificou a sua vida para benefício e alívio do sofrimento

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A CHAVE DA TEOSOFIA

dos leprosos ele Molokai, c quc viveu sozinho com eles du-rante dezoito anos até que acabou por contrair a doença e

morrel', não morreu em t,íto. Com o seu sacrifício o PadreI)amien conseguiu aliviar e dar uma relativa felicidade arnilhares de desgraçados. Deu-lhes consolação física e mentai.Acendeu um raio de luz na noite negra e dolorosa dumaexistência cuja total ausôncia cie esperança não tem para-lelo na história do sofrimento hurnano. Era um verdudeirote(tsot'o e a sua mernória ficará para sempre registada nosnossos anais.

P. Os teósofos consideram, portanto, o auto-sacrifícioum dever?

R. Sim, e justificanos â nossa posição mostrando queo altruísmo é uma parie integrante do nosso próprio desen-volvirnento. Mas temos cÌe agir com discernimento. Umhomem não tem qualquer clireito de se matar à fome paraque cutro homem tenha que comer, a não ser que a vidadesse outro homem seja evidentemente maìs útil para amaioria do que a sua própria vida. Mas é seu dever sacrificaro seu próprio conforto e trabalhar pelos outros se estes nãoo puderem fazer. 'É, seu dever dar tudo aquilo que é inteira-mente seìr e que só o pode beneficiar a si mesmo se o guardaregoistamente para si. A Teosofia prega a auto-renúncia, masnão ensina o auto-sacrifício irreflectido e inútil nem aceitao fanatismo.

P. Mas como é que se pode alcançar um grau de desen-volvimento tão elevado?

R. Pondo em prática os nossos preceitos duma maneiraesclarecida. Usando da nossa razão superior, intuição espi-ritual e sentido moLal, e seguindo os ditames daquilo a quechamamos a <<voz da consciência>, que é afinal a voz donosso EGO e que fala mais alto em nós do que os terramotose trovões de Jeová em que <o Senhor não está>.

P. Se são esses os nossos deveres para corn a humani-dade dum modo geral, quais são, no seu entender, os nossoscleveres parâ com o nosso próximo?

O QAE E A TEOSOFIA PRÁTICA?

R. Exactamente os mesmos, mais aqueles que advêmde obrigações especiais relacionadas com laços familiares.

P. Então não é verdade, como se diz, que assim que umhomem se torna membro cla Sociedade Teosófica começagradualmente a afastar-se da sua mulher, dos seus filhos edos seus deveres para com a família?

R. Isso é uma calúnia sem qualquer fundamento, comotantas outras. O prirneiro dever teosófico é cumprirmos onosso dever para com todos os hornens e, sobretudo, paracom quern temos responsabilidades específicas, quer porqueas assumimos voluntariamente, como no caso dos laços ma-trirnoniais, quer porque o nosso destino nos obriga a isso;refiro-me às responsabilidades que temos para com os nossospais e parentes.

P" E qual é o dever do teósofo para consigo mesmo?R.. Controlar e dominar o seu eu inferior através do

eu Superior. Purificar-se interior e moralmente; não recearnada nem ninguém a não ser o tribunal da sua própriaconsciência. Nunca deixar as coisas em meio; isto é, se eleacha que determinada coisa está certa e que tem de a f.azer,que a faça aberta e corajosamente; se a considera errada, quenão pense nela sequer. É dever do teósofo aliviar o seu fardopensando no aforismo sensato de Epicteto que iliz: <Nãodeixes que nenhuma observação fútil que o mundo imbecilt'aça sobre ti te afaste do teu dever, pois não tens qualquerpoder sobre as suas censuras e, como tal, estas não devempreocupar-te de maneira nenhuma.>

P. Mas suponhamos que um membro da Sociedade Teo-sófica afirma não poder ser altruísta para com os outros ale-gando que ((a caridade começa em casa)), que tem muitoque fazer ou que é dernasiado pobre para poder ajudar dealgum modo a humanidade ou Ínesmo qualquer dos seuselementos. Quais as regras que se aplicam num caso destes?

R. Ninguém tem o direito de afirmar que não podefazer nada pelos outros, seja sob que pretexto for. <Ao cum-prir o dever certo no local certo, um homem pode fazer do

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A CÍTAVE DA TEOSOFIA

mundo seu devedor>>, diz um escritor inglês. Dar um copode água fresca a um viajante sequioso é um dever mais nobree meritório do que oferecer uma clúzia de jantares despro-positados a pessoas que os podem pagar. Só é possível umhomem tornar-se teósofo se já o for interiormente, mas se

o não for pode continuar na mesma a ser membro da nossaSociedade. Não temos regras para obrigaÍ uma pessoa a pra-ticar a Teosofia se ela não o desejar.

P. Mas, se não é esse o desejo dela, porque há-de entrarpara a Sociedade?

R. Essa é uma pergunta a que só podem responder osque agem assim. É mais um caso em que não temos o direitode fazer juízos prematuros, ainda que a opinião duma comu-nidade inteira esteja contra a pessoa em questão.

DA CARIDADE

P. Como é que os teósofos encaram o dever cristão daCaridade?

R. De que caridade é que está a falar? Da caridadedo pensamento ou da caridade prática no plano físico?

P. Estou a falar da caridade prâtica, uma vez que acaridade do pensamento é necessariamente abrangida pelanoção de fraternidade universal.

R. É preciso agir individualmente e não colectivamente;seguir os preceitos do Budismo do Norte: <<Nunca ponhascomida na boca dos que têm fome pela mão de outro>;<<Nunca deixes que a sombra do teu próximo (um terceiro)se interponha entre ti e o objecto da tua dádivu; <<Nunca

dês tempo ao sol para secar uma lágrima antes de a limpares>.E ainda: <<Nunca dês dinheiro ao pobre, ou comida ao saccr-dote, que pede à tua porta, por íntermédio dos teus críados,não vá o teu dinheiro diminuir a sua gratidáo e a tua comiclatransformar-se em feb.

O QUE É A TEOSOFIA PRÁTICA?

P. Como é que isso se aplica na prática?R. A noção teosófica de caridade significa esforço pes-

soal pelos outros; misericórdia e bondade pessoais;interessepessoal pelo bem-estar dos que sofrem; simpatia, previsãoe ajuda pessoais nas suas atribulações e necessidades. Acre-ditamos na necessidade de aliviar a fome da alma tanto oumais que a do estômago.

COMO OS MEMBROS PODEM AJUDAR A SOCIEDADE

P. Como é que espeïa que os membros da SociedadeTeosófica a ajudem naquilo que ela se propõe fazer?

R. Em primeiro lugar, estudando e compreendendo asdoutrinas teosóficas de modo a poderem ensiná-las aos outros,especialmente aos jovens. Em segundo lugar, aproveitandotodas as oportunidades de falar com os outros e de lhesexplicar o que é a Teosofia e aquilo que não é, eliminandoequívocos e despertando interesse pelo assunto. Em terceirolugar, ajudando a divulgar a nossa literatura, comprandolivros quando dispõem de meios para isso, emprestando-ose dando-os e convencendo os amigos a fazerem o mesmo.Em quarto lugar, defendendo a Sociedade de calúnias injus-tas por todos os meios ao seu alcance. Em quinto lugar, eacima de tudo, fazendo da sua vida um exemplo.

P. Mas essa literatura que referiu, e cuja divulgaçãoconsidera tão importante, não me parece ter grancle utilidadeprittica no que diz respeito a ajudar a humanidade. Não sepode dizer que isso seja uma forma de pôr a caridade emprática.

R. Discordo. Para nós, um bom livro que faça as pessoaspensar, que fortaleça e esclareça os seus espíritos e lhespermita apreender verdades de que elas tinham uma vagaconsciência mas que não conseguiam formular, faz um bemreal considerável. Quanto àquilo a que chama actos decaridade concretos, que se traduzem em benefícios materiais

178 179

A CHAVE DA TEOSOFIA

para os nossos semelhantes, devemos fazer o que puciermos.

O dever do teósofo é, sobretudo, esquecer a sua próprìapersonalidade.

O OUE UM TEÓSOFO TEM OBRIGAçÃO DE NÃO FAZÊR

P. Na Sociedade Teosofica hâ leis ou cláusulas quc

estabeleçam quaisquer proibições para os seus membros'/R. Muitas, mas não as impomos. Essas normas expri-

mem o ideal da nossa organizaçáo, mas cleixamos a sua

aplicação prática ao critério dos mernbros. IJ precisarnentcpor isso que me vejo forçada a salientar a diferença quo

existe entre a verdadeira Teosofia e a Sociedade Teosófica,pois esta, apesar de todos os seus esforços e boas intenções"

não passa afinal do veículo indigno da primcira.F. Não me poderá dizer que escolhos perigosos shtr

esses que surgem no mar alto da 'I-eosofia?

R.. Bem lhes pode chamat escolhos, pois já houve rnuitosmembros sinceros e bem intencionados da Sociedade Teo-sófica que encalharam neles com conseqÌ]ências fatais! L'no entanto, às vezes parece que seria cxtremamente fácilevitar determinadas coisas. Vou dar-lhe um exemplo de uma

coisa que os teósofos não devern fazer e que conslitui unlrt

verdadeiro dever teosófico:Nenhum teósofo deve ficar calado ao tornar conheci

mento de acusações ou calúnias contra a Sociedade ou pcs-

soas inocentes, quer estas sejarn ou não membros cla Socie-

dade.

P. Mas supondo que essa acusação é verdadeira, tttt

que pode ser verdadeira, sem nós sabermos'?

R. Nesse caso terá de exigir que lha provem, ouvir'as partes interessadas com irnparcialidade e não se limitara não contradizer. Não temos qualquer direito de acreditarnuma afirmação caluniosa antes de termos provas irreltrtáveis quanto à sua exactidão.

O QUE E Á TEOSOFIA PRÁTICÁ?

P. Então o que é que se deve fazer?R. Accmpaixão, ainclulgência,a caridade e a paciência

são virtudes que nos deviarn permitir sempre clesculpar osnossos irrnãos pecadores e não julgar aqueles que erramcom demasiada dureza. Um teósofo nunca deve esquecerque muitas falhas se devem a deficiências e fraquezas danatuteza humana.

P. Ìrium caso ilesses os teósofos clevem então perdoarcompletamente?

R. Ern fodos os casos, e isso aplica-se sobretudo à pessoacontra a qual o pecado é cometido.

P. hdas o que deverão eles fazer se ao perdoar searriscam a magoar alguém ou a deixar que outros sejammagoados?

R. Devem fazer o seu dever, aquilo que a sua cons-ciência e natureza superior lhes ditar, mas só depois deponderarem bem a atitude que devem tomar. A justiçaconsiste em não fazer mal a nenhum ser vivo, mas a justiçatarnbém manda que nunca deixemos que se faça mal àmaioria, ou rnesmo a uma única pessoa inocente, deixandopassâr sem censura uma pessoa culpada.

P. Quais são as outras coisas que os membros da Socie-dade Teosófica não devern fazer?

R. Ne-nhum teósofo se deve contentar com uma vidaociosa e frívola que não lhe traz bem nenhum a ele eainda menos aos outros. Deverá trabalhar pelo bem daquelesque precisam dele se não tiver possibiliclade de lutar pelaHumanidade, e esforçar-se desse modo pelo desenvolvimentoda causa teosófica.

P. Isso exige qÌ.re uma pessoa tenha uma nattreza excep-cional e deve ser clifícil para muita gente.

R. Nesse caso será melhor que não se tornern membrosda Sociedade Teosófica, ern vez de fingirem ser uma coisaque não são. Não pedimos a ninguém que dê mais doque aquilo que pode. qller se trate de dedicação, tempo,trabalho ou clinheiro.

r80 I8I

A CHÁVE DA TEOSOFIA

P. E que mais?R. Nenhum membro activo deverá atribuir demasiada

importância ao seu avanço ou conhecimento pessoais emmatéria de estudos teosóficos, devendo antes trabalhar omais que puder pelos outros. Não deverá deixar que sejamos poucos trabalhadores dedicados a suportar todo o pesoe responsabilidade da causa teosófica. Os membros devemsentir que é seu dever compartilhar o trabalho comum namedida das suas possibilidades e dar toda a colaboraçãcrque lhes for possível.

P. E justo. Que mais há?R. Nenhum teósofo deverá colocar a sua vaidade pes-

soal, ou os seus sentimentos, acima dos interesses da Socie-dade como um todo. Aquele que sacrifica esses interessesou a reputação doutras pessoas no altar da sua vaidadepessoal, benefício mundano ou orgulho, não deveria con-tinuar a ser membro da Sociedade. Um órgão cancerosoé quanto basta para afeçtar todo o corpo.

P. É dever dos membros ensinar aos outros e pregaïa Teosofia?

R. Sem dúvida. Nenhum membro tem o direito de ficarde braços cruzados sob o pretexto de saber demasiado poucopara poder ensinar, pois há sempre pessoas que sabem aindamenos do que ele. Além disso, só quando uma pessoacomeça a temtar ensinar aos outros é que descobre a suaprópria ignorância e tenta vencê-la. Mas esta regra é menosimportante.

P. Qual é, então, o dever teosófico mais importante?R. Estar sempre disposto a reconhecer e a confessar

os seus próprios defeitos. É preferível pecar por sobrevalo-rizar os esforços do próximo do que por não se ser capazde os apreciar. Nunca dizer mal duma pessoa nem caluniarninguém. Dizer sempre aberta e directamente aquilo quetemos contra alguém. Nunca repetir nada que ouçamosdizer contra os outros, nem guardar rancor contra aquelesque nos magoam.

O QAE É A TEOSOFIA PRÁTICA?

P. Como é que se pode distinguir a maledicência dacrítica justa? Não será nosso dever prevenir os nossos amigose o nosso próximo contra pessoas que sabemos serem com-panhias perigosas?

R.. Se pelo facto de não censurannos alguém corremoso risco de deixar que outros sejam magoados, é sem dúvidanosso dever tentar evitá-lo prevenindo os interessados emparticular. Mas nunca devemos espalhar uma acusação feitacontra outra pessoa, seja ela verdadeira ou falsa. Se forverdadeira e não afectar senão o pecado,r, deixemo-lo en-tregue ao seu Karma. Se for falsa, evitaremos desse modouma injustiça maior. Não devemos, portanto, falar dessascoisas com pessoas a quem não dizem directamente respeito.Mas se a nossa discrição e silêncio puderem magoar ou pôrem perigo outras pessoas, então devo acrescentar: <<Diz a ver-dade custe o que custarn, e repito as palavras de Annesly:<Aconselha-te com o dever e não corn os acontecimentos.>>Há casos em que uma pessoa tem de dizer: <Mais vale nãoser discreto do que deixar de cumprir o dever.>>

P. Já que admite haver pelo menos t:anta, senão mais,maledicência, calúnia e questiúnculas na Sociedade Teo-sôfica do que nas Igrejas Cristãs, para não falar de asso-ciações científicas, gostaria que me dissesse que espéciede Fraternidade é essa?

R. É, de facto, uma amostra de fraca qualidade nestemomento, e, atê que seja cuidadosamente joeirada e reor-ganizada, a Socieclade Teosófica não serâ- melhor que outrasorganizações. Mas não esqueça que a natuteza humanaé a mesma d,entra e fora da Sociedade. Gs seus membrosnão são santos; na melhor das hipóteses são pecadores quese esforçam por se aperfeiçoar e que têm muitas possi-bilidades de cair de novo devido à sua fraqueza.

P. Não me parece que esteja numa posição muitoinvejável.

R. Na realidade não estou. Mas não acha que temde haver algo de muito nobre, muito elevado e muito verda-

182 183

A CITAVE DA TEOSAFIA

deiro na Sociedade e na sua fìiosofiadirigentes continuem a trabalhar por elaforças?

P. Devo confessar que tal perseverança me admira, ejá perguntei a mirn mesmo por que é que o fariam.

R. Pode acreditar clue não ó para nossa satisfaçãcrprópria. Para a geração vindoura, o caminho perl. a paz.

será um pouco menos espinhoso e um pouco mais largo;todo este sofrimento terá produzido bons resultados e cr

auto-sacrifício não terá siclo em vão. Neste momento, oobjectivo principai e funclamental da Sociedade ê, lançarnos corações dos homens sementes que a seu tempo germi-nem e que, em condições mais propícias, conduzam a umareforma salutar que traga às massc,s uma maior feliciclacledo que aquela que lhes foi clado gozar at6, agora.

XII{

DOS EQUÍVOCOS SOBRE A SOCIEDADE TIIOSOtrICA

TEOSOFÍA E .ASCETISMO

P. Ouvi dizer que as vossas regras exigern que os

mernbros sejam vegetarianos, celibatários e ascetas, masainda aqui não fez nenhuma afirmação nesse sentido" Impor-ta-se de me dizer qual é exactarnente a posição da SociedadeTeosófica em relação a esse ponto?

R. Para lhe dìzer'a verdade, as nossas ïegras não Ía.zem

qualquer imposição clesse tipo. A Sociedade Teosófica nãosó não exige como nem sequer espera que qualquer dns

seus membros seja asceta sob que aspecto for, a não serque considere ascetismo esperar que tentemos ajudar os

outros homens e não sejamos egoístas na vida quotìdiana.P. No entanto, o que é certo é que muitos dos vossos

rnembros são vegetarianos convictos. Aliás, isso é particular-mente frequente entre aqueles que clesempenham funçõesimportantes na Sociedacle.

R. Isso é absolutamente natural. Mas parece que scrirmelhor expor-lhe os nossos pontos de vista sobre o ascetismodum modo geral, e depois entencierá a nossa posição emrelação ao vegetarianismo, etc.

P. Faça favor.R. Como já the disse, muitos daqueles que se tornam

vercladeiros estudiosos cla Teosofia e colaboradores activos

pa_ra que os seuscom toclas as suas

18,í TB5

A CHAVE DA TEOSOFTA

da nossa Sociedade desejam fazer algo rnais do que estudarapenas na teoria as verdade$ que ensinamos. Pretendemconhecer a verdade por meio duma experiência pessoaldirecta e estudar o Ocultismo com o objectivo de alcançara sabedoria e a força de que necessitam a fim de ajudaros outros duma maneìra eficaz e criteriosa e não cegamentea sabedoria e a força de que necessitam a fim de ajudareme ao acaso. A primeira coisa que os membros aprendernatravés do seu estudo é uma noção verdadeira da relaçãodo corpo ou invólucro físico com o homem interior e verda-deiro. A relação e a interacção mútua entre estes dois aspectosda natureza humana são-lhes explicaclas de modo que de-pressa tomam consciência da superioridade do homeminterior relativamente ao inrrólucro exterior ou corpo.

P. Estou a perceber. Só consideram necessário o asce-tismo moraL É um meio para atingir um fim, sendo essefim conseguir o perfeito equilíbrio da natureza int'erior d.o

homem e alcançar o domínio absoluto sobre o corpo comtodas as suas paixões e desejos, não é?

R. Exactamente. Mas devemos servir-nos deste meiocom inteligência e prudência e não cega e estupidamente;como um atleta que se está a preparar para uma importantecompetição e não como um agiota que, de tanta fornetrmssar, adoece a firn de satisfazer a sua paixão pelo ouro.

P. Compreendo agora a sua ideia geral, mas vejarnoscomo se aplicaria na prática. O que pensa do vegetarianisrno,por exemplo?

R. Um grande cientista alemão já demonstrou que,independentemente da rnaneira como for cozinhado, qual-quer tecido anirnal conserva certas características acentuadasdo animal a que pertenceu, características essas que podemser reconhecidas. Além disso, pelo sabor, qualquer pessoasabe que carne está a comer. Nós vamos um pouco maislonge e provamos que, ao ser comida e assimilada peiohomem, a carne dos animais lhe transmite fisiologicamentealgumas clas características do animal de que proveio. Por

DOS EQAÍVOCOS SOBRE A SOCIEDADE TEOSÓFICA

outro lado, as ciências ocultas ensinam e demonstram isso

mesmo àqueles que as estudam, por meio duma demons-tração ocular, fazendolhes ver também que este efeito <infe-riorizante ou animalizatte>> sobre o hornem é maior nocaso de a carne ingerida provir de animais muito grandes,

menor se for proveniente de pássaros, menor ainda se se

fialar de peixes ou outros animais de sangue frio e rnínimose só se coÍner vegetais.

P. Parece que o meihor seria não comer absoiutamentenada?

R. Se pudéssemos viver sem comer, assim seria de facto.Mas, tal como as coisas são, é preciso comer para viver e,

portanto, aconselhamos os estudiosos verdadeiramente inte-ressados a comerem os alimentos que menos embotem e

pesem no seu cérebro e no setr corpo, que menos efeitoproduzam no aspecto de dificultar e retardar neles o desen-

volvimento da intuição e das suas faculdades e poderes

interiores.P. Nesse caso não perfilha todos os argumentos que os

vegetarianos geralmente invocam?R. Claro que não. Alguns dos seus argì.rmentos são

pouco consistentes, baseando-se muitas vezes em premissas

absolutamente falsas, o que não impede, no entanto, que

muitas das coisas que dizem sejam verdade. Por exemplo,nós pensamos que muitas doenças, e principalmente a grande

predisposição para contrair doenças que se está a tornar umacaracterística tão acentuada do nosso tempo, se devem emgrande parte ao facto de se comer caïne. Mas levaria muitotempo discutir aqui detalhadamente os méritos do vegeta-rianismo, portanto seria melhor mudar de assunto.

P. Só mais uma pergunta. O que é que devem fazeros membros da Sociedade Teosófica em relação à sua ali-mentação no caso de adoecerem?

R. Seguir o melhor conselho prático que conseguirem

obter, naturalmente. Ainda não entendeu que nós nuncaimpomos regras rígidas a esse respeito? Veja se consegue

T86 187

Á {:HAVli ilA T'1L050|:tA

Ìcmbrar-se de que â nossa posição relalivamente a qulestòcsclessa natureza é racianal e nunca {'a.nática. Se por doençaou por um laábito arreigado um homem não puder pasarsem carne, pois então que a corna. Não é um crime;apeíìas retarclará urn pollco o seu dcsenvolvimento, porqueafinal de contas *s acções e funções pura.mente físicas tômbern menos impcrtância do que acluiio quo !-lm homernpensü e scnle , do quc os rlescjos quc aÌimenta na sua mentce que ele pcrrnite que se enraízem e clcsenvolvam.

P. Mas, no que toca aos vinhos e outras bebidas alcoó-licas, suponho que não aconselha o seu consllmo, pois não?

R. Eles são mais prejudicr'ais ao ciesenvolvirnento morale espirifual do que a carne, pois as bebiclas alcoólicas, sejamde que tipo forern, têm uma influência directa, marcadae muito perniciosa sobre o estaclo psíquico do hornem. Beberé quase tão destrutivo para o desenvolvimento dos seuspoderes interiores como consumir regularmente haxixe, ópioe outras drogas semelhantes.

TEOSOFIA E CASAMENTO

P. Consideremos or-rtl a questão. Um homem cleve casar,-se ou ficar solteiro?

R. Depende clo tipo dc homem que for. Se está afalar clum homem que pretenda viver no Ínundo, que, âpesarde ser um Teósofo sincero e um defensor ardente da nossacausa, ainda tenha laços e desejos que o prendem ao mundo,que, em sumâ, não sinta que rompeu pâra sempre com aquiloque os homens chamam vicÌa e que cleseje âpenâs umaúnica coisa - conhecer a verdade c ser capâz de ajudar osoutros -, então não há qualquer tazão para que não se case,se quiser correr o risco de .iogar nessa lotaria em que sãomuito ma.is os bilhefes brancos do que os prérnios. Certa-mente não nos consiclera erbsnrdos c faliálicos a ponto cìeirmos llïegar contra o casamento. Pelo contrário, excepto

DOS EQUÍVOCOS SOBRE A SO{:{EDADE 7'EOSOFí('A

naìguns casos de Ocultismo prático, t'r c:ilsanicnkr ó o úrnicro

remédio contra a imoralidade.F. Mas porque não se pode alcançar esse conhecimentcr

e esse poder sendo casado?R. Meu caro senhor, não posso entlar em pormenores

Íisiológicos consigo mas posso apresentar-Ìhe uma boa razãoque, juigo, responderá à sua pergunia e explicará os motivosde ordem morai eÍn que nos baseamos. Poderá um homernservir a dois senhores? Não. Fois nesse caso tambórn nãolhe será possível clividir a sua atenção entre o estudo doOcultismo e uma mulher. Se o tentar fazer, falhará seindúvida em arnbas as coisas. Aiém clisso, devo recordal'-lheque o estndo do Ocultismo prático é clemasiaelo sério e

perigoso para que urn homern se entrcgue a ele, a nãoser que esteja clisposto a dcdicar-se-lhe inieira"mente e a

sacrificar tudo, cctmeçando por si próp;rio, pala atingir oseu fim. Refiro-me, portanto, àqueles que estão deciclidosa trilhar o caminho do disciprúacio que conduz ao objectivomais elevado.

POROUE HAVERÁ TANTOS PRECONCEITOS CONTRA ASOCIEDADE TEOSÓFICA?

P. Se a Teosofia é realmente isso que cliz, não r,ejoporque há-de haver tanta má vontade contra ela.

R. Que o é, não há dúvida, mas não se esqueça dosmuitos e poderosos aclr,'ersários que tivemos clesde que a

Sociedade se formou. Corno acabo cle dizer, se o movirnentoTeosófico fosse mais uma moda como tantas outras, emúltima análise tão inofensivas como passageiras, as pessoas

limitar-se-iarn a rir-se dele *- como já o fazem hoje aquelesque aincla não compreenderam o seu verdacleiro objectivo -e deixálo-iam em paz. Mas não é. A Teosofia ó intrinse-camente o movimento mais sério clo nosso tempo; alémdisso é uma ameaça parà a maioria das mistificações, pre-

188 t89

A CHAYE DA TEOSOFIÁ

conceitos e males sociais ainda hoje táo enraizados nasociedade.

P. Importa-se de me fornecer mais dados a fim deeu poder responder devidamente quando me fizerem per-guntas sobre o assunto? Em suma, conte-me em poucaspalavras a história da Sociedade e diga-me porque é queo mundo acredita em todas essas coisas?

R. A maioria das pessoas estranhas à Sociedade nãosabia nada sobre eia, sobre os seus motivos, obìectivos econvicções. Logo desde o princípio o mundo viu apenas naTeosofia certos fenómenos maraviihosos. A Socieclade nãotardou a ser considerada como uma associação que tinha apretensão de possuir poderes <<miraculosos>>. O mundo nuncase apercebeu de que urn dos ensinamentos fundamentaisda Sociedade era que não se deve acreditar em milagresnem sequer na possibilidade de eles existirem; que são poucosos membros que possuem poderes parapsíquicos e menosainda os que se importam com isso. Tal como nunca entendeuque tais fenórnenos nunca se produzern em público massó entre amigos - são como um acessório destinado adernonstrar directamente que essas coisas se podem pÍrssarsem necessidade de salas escuras, espíritos, médiuns ou dosacessórios habituais. Infelizmente esse equívoco foi muito ali-mentado e exagerado pelo primeiro livro publicado sobreo assunto, e que aliás deu bastante que falar na Europa - OMundo OcuJto, da autoria de A. P. Sinnett.

P. Por que razã.a e desde quando é que os Espíritasodeiam a Sociedade?

R. Desde o primeiro dia da sua existência. Assim quese soube que a Sociedade Teosófica, como organismo, nãoacredita em comunicações com os espíritos dos mortos e queconsidera que esses <espíritos> são, na sua maioria, reflexosastrais de personalidades desincarnadas, cascas, etc., os Espí-ritas começaram a nutrir um ódio violento por ela e sobre-tudo pelos seus Fundadores. Esse ódio data jâ de 1875 emantém-se ainda hoje. Em 1879 a sede da Sociedade Teo-

DOS EQUÍYOCOS SOBRE A SOCIEDADE TEOSÓFICA

sófica foi transferida de Nova Iorque para Bombaim, naÍndia, e mais tarde para Madras, onde ainda permânece.

Quando o primeiro ramo da Sociedade, a Sociedade Teo-sófica Britânica, foi fundado ern Londres, os Espíritas Ingle-ses começaram imediatamente a atacar-nos, tal como os

Americanos tinham feito e como aconteceu depois comEspíritas Franceses.

P. Mas corno explica a atitucle hostil clo clero emrelação à Sociedade quando, afinal, as doutrinas Teosóficasse opõem ao Materialismo, grande inimigo de todas as

formas de religião nos nossos dias?R. A oposição do clero fundamenta-se no princípio

geral de que (quem não é por mim é contra mim>>. Comoa Teosofia não defende nenhuma Seita ou Credo em parti-cular, é considerada inimiga de todos, na medida em queprega que toclos eles têm pontos em que estão errados.Na Índia os missionár'ios odiavarn-nos e tentaram esmagar--nos porque o escol da juventude culta indiana e muitosBrâmanes, que eram para eles praticamente inacessíveis.ingressaram na Sociedade. No entanto, alresâr do ódio daclasse, dum modo geral, a Sociedade Teosófica conta commuitos elemenios clo clero, inclusivamente com um ou doisbispos, entre os seus membros.

P. E o que levou a S. P. R. (*) a tomar posição contraa vossa Sociedade? Quer a S. P. R. quer a Sociedade Teo-sófica prosseguiam estudos semelhantes em alguns aspectose vários membros faziam também parte da Sociedade Teo-sófica.

R. d princípio as nossas relações com os dirigentesda S. P. R. eram muito amigáveis, mas quando apareceu nc!

Christian College Magaline um ataque aos fenómenos para-psíquicos, a S. P. R. achou que se tinha comprometido aopublicar nas suas Actas demasiados fenómenos ocorridos

(*) S. P. R. - Society for Psychical Research - Sociedade deInvestigação Parapsicológica.

190 I9I

Á CFIAVE DA TEOSOFTÁ

cofiÌ rnembros da Sociedade Teosófica. Preiendendo apre-sentar-se como uma atúaridude e um organisrno rigarosu-mente cíentít'ico, teve de escolher entre manter cssa repu-tação aíastando-se cla Sociedacle Teosófica e procurandoaté clesiruí-la, e correr o risco de ser confunciida coln os<crédulos> Teósofos e Ëspíritas. Não havia outra saida, outraalternativa e, portanto, renegou-nos. Fara ela era questão cle

absoluta necessiclade. Mas, tão empenhados estavam os nossosinimigos ern encontrar urn rnotivo verosímil capaz de explicara vida de dedicação e de tral:alho incansável dos dois Fun-<tradores e a inexistôncia de qualquer compensação de carác-ter pecuniário ou de qualquer outro gérrero, que se viralìÌobrigados para justificar essa dedicação a recorrer à famosa<teoria da espia rÌtssai), que não só é totaÌmente absurda,como profundamente ridícula. Depois do prirneiro impactoprovocado por esse ataque, a Sociedacle Teosófica viu os seusmembros duplicarern e triplicarem, mas a má ìmpressão queele produziu ainda hoje subsiste.

P. Antes de passarrnos a outro assunto Ialvez seja melhortentar apurar a ver"dade em relação a este. Alguns escritorestêm classificado os vossos ensinarnentos de <<imorais e perni-ciososil; outLos, alegando que muitas das chamadas <<auto-ridades> e Orientalistas não encontram nas religiões indianassenão o culto do sexo nas rnais variadas Íormas, acusam-voscie não ensinar mais do que o culto fálico. Segundo eles,estando tão estreitarnente ligactra ao pensamento oriental,principalrnente ao Indiano, a Teosofia mcderna não se podelibertar dessa mancha. Por vezes chegam até a acusar osTeósofos europeus cle terem ressuscitacio as práticas reìa-cionaclas corn esse culto. O que tem a dizet sobre isto?

R. Já tinha ouvido e lido isso e só tenho a responderque ó a calúnia mais infunclada e falsa jamais ievantadae difundida. <As pessoas estúpidas só podem ter sonhosestúpidos>, diz um provérbio russo. Sinto o saÍrgue ferverao ouvir essas acusações vis e totalmente desprovidas cle

fundamento, bascadas em mer&s inferências. Per.qunte às

DOS MIS?'ËJ?íOS'.4 REINCAR.?,IAçÃO

centenas cle ingieses respeitáveis, hornens e mulheres, quehá anos são rnembros da Sociedade Teosófica, se algumavez lhes ensinaram qualquer preceito imaral ou doutrinaperniciosa. A uraneira como os nossos ensinamentos e con-vicções têm sido constante e intencionalmente desvirtuados é

realmente infame.P. Mas não pode negar que o elernento fáúica existe

efectivamente nas religiões orientais.R. Nem nego; afirmo apenas que isso não prova nada,

tal como a suâ presença Íìo Cristianismo, a religião do Oci-dente, também nada prova. Se o quiser comprovar leia aobra Os Rosa-Cruz de Hargrave Jenning. No Oriente osimboiismo fálico é, talvez, mais cru por ser mais fiel ànatrrreza, ou talvez devesse antes dizer mats ingénuo e sin-cero do que nc, Ocidente. Mas não é mais licencioso nemsugere ao espírito Oriental as ideias grosseiras que sugereaos Ocidentais, salvo uma ou duas excepções.

Mas esse assunto foi pormenorizadamente analisado emA Doutrina Secrcta, obra para que o remeto novamentese pretende mais elementos. Para concluir, quero sublinharque a verdadeira essência da Teosofia se opõe frontalmenteao culto fálico, e a sua secção oculta ou esotérica aindamais do que a doutrina exotérica. Não pode haver afirrnaçãomais falsa do que essa.

t92t93

XIV

OS (MAHATN,4AS>r TEOSOFICOS

SËRÃO (ESPÍRITOS DE LUZD Ol,.! (DEMóNIOS MALDITOST?

P. Quem são afinal aqueles a quem chama <Mestres>?R. Enr prirneiro lugar sáo homens uívos, que nasceram

tal como nós e estão condenados a morrer como qualqueroutro mortal.

P. Mas o que significa realmente a palavra <Mahatmar>?R. Apenas uma ((grande alma>, grande devido à ele-

vação moral e à rcalização intelectual. Se chamam grandea um soldado bêbado como Alexandre, ilor que razáo náohavemos de chamar <Grandes> àqueles que fizeram bemmaiores conquistas no caÍrpo dos segredos da Natureza daque Alexandre jamais fez no campo de batalha? É umtermo Indiano e uma palavra muito antiga.

P. E porque lhes chamam <Mestres>?R. Chamamos-lhes <<Mestres) porque eles são os nossos

instrutores; e porque foi através deles que nos chegaramtodas as verdades teosóficas, por mais incorrectamente quealguns as tenham expressado e outros as tenham entendido.São homens de grande sabedoria e que vivem em grandesantidade, a quem damos o nome de Iniciados. Não são

ascetas, no sentido comum da palavra, embora evidente-

195

A CHAVE DA TEOSOFTA

mente se rnantenhanÌ aíastados da agitação e das lutas domundo ocidental.

P. Mas não acha que esse isolamento é urn egoísrnoda parte deles?

R. Onde é que está o egoísmo? As vicissitudes da Socie-dade Teosófica não são suficientes para the provar que omundo não está preparado nem para os reconhecer nempara aproveitar os seus ensinarnentos? Só se isolam do Oci-dente. Nos seus países andam em público como as outraspessoas.

P. Mas os Teósofos não lhes atribuem poderes sobre-naturais?

R. Tal como já disse, não acreditamos erÌì nada sobre-natural. Os poderes que eles possuem devem-sc apenas aofacto de terern clesenvolvido faculdades latentes em todosos homens e mulheres e cuja realidade a ciência oficialcomeça a reconhecer.

P. E verdade que esses hornens inspírarn alguns dosvossos escritores e que muitas ._ senão todas - obras Teo-sóficas foram ditadas por eles?

R.. Algumas foram. Há passagens que foram integrale textualmente ditadas por eles, mâs, na maioria dos casos,limitam-se a inspirar as ideias, deixando a forma literáriaao cuidado dos escritores.

P. Mas isso é miraculoso; é, de facto, um mílagre. Comoé que eles o conseguem fazer?

R. Meu caro senhor, está a laborar nurn grande erroe será a própria ciência que irá refutar os seus argumentosnum futuro próximo. Porque havia de ser urn <<milagre>,como diz? Um milagre implica uma intervenção sobrena-tural, quando na verdade nada há acima ou para alémda NATUREZA e das suas leis. Quando existe entre duasmentes uma relação de simpatia e os instrumentos atravésdos quais funcionam estão sintonizados para reagir magné-tica e electricamente uma à outra, nada impede que haìatransmissão voluntária de pensamentos entre elas, pois como

OS <<MAHATMAS>> TEOSOFICOS

a mente não ó cìe naturezzr ì-angíveÌ para que a distânciapossa constituir urn obstácuio entre ela e o objecto da suacontemplação, iìeduz-se qrie a única ciiferença que podehaver entre cÌuas mentes é uma diferença cle ESTAIIO.IVfas, se esta não existir, onde está c milagre de tra:nsmissãatle 1;ensamt:nto seja a que ctristância for?

i). Diga-rne uma ccisa: os Arieptos inspiraram ou dita-ïam a muitos 'Ieósolos?

R. Felo contrár.io, a muil.o poucos. Essas operaçõesrcquerem conclições especiais. LJrn Adepto da FraternidadeNegra (*) (<Irrnãos cla Sornbra> e Dugpas, como nós lheschamamos) sem escrúpulos, mas hábil, terá bem menos difi-culdades em fazê-io. hião tencjo leis de carácter Espiritualque llie imponham qualquer proibição, um <Íeiticeiro> Dugpanão hesitará em obter controlo sobre qualquer mente e emsubrnetê-ia inteiramente ac's seus poderes maiéficcs. Masos ncssos Mestres recusam-se a fazê-7a. A não ser que caiamna Magia Negra, os tr/Iestres não têm o direito c1e tentardcminar completamente o Ego irnortal de qualqueÍ pessoâc, tr)or isso, só podem agir sobre a natureza física e psíquicacio indivíduo, ern nada afectando, portanto, c livre exercíciotla sua vontade. Assim, se não existir uma relação para-psíquica entre uma pessoa e os Mestres baseada numa fée dedicação absolutas dessa pessoa para corn eìes, estes,ao transmitirem os seus pensamentos, têm grande dificuldadeem penetrar o caos nebuloso da esfera daquele cotr quempretendem comunicar. Mas não me pârece que este sejao lugar indicado para tratar dum assunto desta natureza.Easta dizer que, se esse podel existe, é porque há Inteli-gêncìas (incarnadas ou não) que o orientam e instrumentosvivos conscientes através clos quais ele é transrnitido e

pelos quais é recebido. Mas, no que toca à magia negra,todaacautelaépouca.

(*) O uso da palavra <Negra> não tem qualquer conotação coma cor da pele. * Ed.

t96 19V

A CHÁYE DÁ TEOSOFIÁ

P. Mas o que entende exactamente por (mìagia negra>?R. Apenas a abuso dos poderes parapsíquicos ou de

qualquer segreda da natureza,. o facto de se utilizarem ospoderes Ocultos para fins egoístas e pecaminosos. Na minhaopinião, um hipnotizador que, aproveitando-se dos seus pocle-res de <<sugestão>r, força um indivíduo a roubar ou maiarê um mago negro.

P. Mas se os Mestres existem porque não se apresentamperante todos os homens e refutam duma vez pata sempreas inúmeras acusações que são feitas a Mme. Blavatskve à Sociedade?

R. Que acusações?P. Que eles não existem e são uma invenção dela.

Que são fantoches, <Mahatmas de mulheres tagarelas>. Seráque isso não prejudica a sua reputação?

R. Ëm que é que essa acusação a poderá realmenteprejudicar? Será que ela ganhou alguma coisa com a suapretensa existência ou daí retirou lucro ou fama? A minharesposta é que isso só the trouxe insultos, injúrias e calúniasque muito a teriam magoado se não tivesse aprendido hámuito a manter-se totalmente indiferente perante tais acusa-ções falsas. Afinal o que é que isso representa? No fundo umelagío qua, se não se tivessem deixado arrastar por umódio cego, os tolos que a acusam não teriam feito sem pensarduas vezes. Dizer que foi ela que inventou os Mestres equi-vale a dizer que cleve ter sido ela quem inventou os textosfilosóficos divulgados pela literatura Teosófica. Que foi elaa autora das cartas a partir das quais foi escrita a obraBudismo Esotérico, e a única inventora de todos os prin-cípios enunciados em A l)outrina Secreta, muitos dos quaissão elos de ligação que a ciência aincla procura e que virãoa ser descobertos dentro dos próximos cem anos, facto queo mundo reconheceria se fosse justo. Ao fazerem tais afir-mações estão também a reconhecer que ela é muito maisinteligente do que centenas de homens (do que muitos homensmuito inteligentes e mesmo um bom número de homens

OS <MAHATMAS>> TEOSÓFICOS

de ciência) que acreditam no que ela diz e que, portanto,foram todos ludibriados por ela! Se eles dizem a verdadeé porque ela deve ser vários Mahatmas medidos uns nosoutros como as caixas chinesas, visto que as chamadas <<cartas

dos Mahatmas)) que os seus acusadores lhe atribuem estãoescritas em estilos totalmente diferentes.

P. Mas, na realidade, esses Mestres existem?R. Nós afirmamos que sim. Muitas pessoas, inclusi-

vamente aÌguns Teósofos e ex-Teósofos, clizem que nuncativeram qualquer prova da sua existência. A isso Mme.Blavatsky responde com a seguinte alternativa: se ela os

inventou a eles, então foi também ela que inventou a suafilosofia e os conheçimentos práticos que algumas pessoas

adquiriram; e nesse caso que importa que existam ou nãose ela está aqui e de qualquer modo a su& existência díïi-cilmente pode ser negada? Se o conhecimento transmitidopor ela é intrinsecamente bom e é aceite como tal pormuitas pessoas de inteligência superior à média, porquese há-de levantar tamanha polémica em relação ao assunto?A hipótese de ser uma impostora nunca se provou e nuncase poderá provar, ao passo que é certo e inegável que, fosseinventada por quem fosse, a filosofia pregada pelos <Mestres>é uma das mais elevadas e mais benéficas filosofias de

sempre, uma vez que tenha sido devidamente entendida.P. Mas se dispõem de homens tão sábios e bons para

guiar a Sociedade como explica que se tenham cometidotantos erros?

R. Os Mestres nõo guiam a Sociedade nem sequer os

Fundadores, e nunca ninguém afirmou que o fizessem: limi-tam-se a vigiáJa e a protegê-la. Aliás, a melhor prova dissoé que nenhum erro foi capazde a abalar e nenhum escândalono seu seio ou ataque vindo de fora a conseguiu derrubar.Os Mestres olham para o futuro e não para o presente;e cada erro que se comete é uma fonte de experiência paraos dias que hão-de vir. Aquele outro <<Mestre> que deu aum homem cinco talentos não lhe disse como havia de

198 199

A CI-IAVE DÁ TEOSOFIA

os multipìicaï ncni. impechu que o servo icÌiota enterrasseo seu talento na terra. Cacla urn tem de aXcançar a sahecÌariaatravés da sua experiência e dos seus méritos próprios.

ABUSO DE NOMËS E TËRMOS SA.GRADOS

P. Nesse caso, tuclo aquilo que lenho ouvido clizer,nomeadamente que rnuitos dos escri'Lores Teosóficos pre-tendem ter sido inspirados por essec Mestres ou tê-los vistoe conversado com eles, é falso?

R. Tanto pode ser falso corno nãc. Como ó que posso

saber? É a eies quc compete piová-lo. Aiguns, poucos

- muito pouccs mesüÌc, devo clizer -, me níit'a,rr ilcclera-damente ou esiaverïì aiucinados quanctrc se vanglorialam cle

terem sido inspirados, mas outros foram de facto inspiradospor grandes Adeptos. Uma árvore conhece-se pelo seus fru-tos; e tal como todos os Teósofos devem ser julgaclos pelosseus actos e não pelo que escrevem ou dizem, tatnbém Íodasas obras Teosóficas devem ser aceites pelos scr..ls nóritos e

não por qualquer pretensão cle autoridacle q.ue possam

reclamar.P. Mas scrá que isso se apÌica tambérn aos livros cle

Mme. Blavatsky, à Doutrina Secrets, por exemirlo?R. Evidentemente que sim. Ela afirma expressarnente

no PREF'ÁCIO que está a divulgar as doutrinas que os

Mestres lhe transrnitiram mas não pretende ter sicio ins-piracla ao escrever as suas obras mais receni;es. Quanto aos

nossos melhores Teósofos, acredito que eles preferem tam-bém neste caso não ver os nomes dos Ìt4esires envolvidos,seja de que maneira for, com os nossos livros. Ilá doisMestres cujos nomes foram já muitc profanados. E clifícilencontrar um médium que não pretenda têJos visto. Toclas

essas Socieciades fraudulentas que pare. aí há dizeni âgoriì,para efeitos comerciais, que são guiadas e dirigidas por<<Mestres> que muítas vezes apontarn conlo senclo muito supe-

OS (A4A H AI'Al ÁS>t 7'|.:OSQ|;ICQS

tiores aos nossos! h'luito e gravementc pecaram aquelesque, quer ievarJos pela ambição ou pela vaidade, quer poruma mediuminidade irresponsável, Íizerarn tal afirmação.L4uitas pessoas foram exploradas por essas Sociedades queclìzem vencler os segredos cio poder, do conhecimento e daverdacle espiritual a troco de simples ouro. E, o que é piorainrla, os nomes sagrados do Ocultismo e dos seus santosdefensores forain enlameadcs, manchados, ao serem asso-

ciaclos a motivos sórdjdos e a práticas imorais, enquanto quemilhares de homens foram ir:rpediclos de alcançar o caÍninhoda verdadc e cla 1u;: devido zro elescrédito e à má fama aque essas impostulas, burlas c fraudes deram origem.

P. E verclaclc quo os seus nomes são flequentementecitactros hoje em dia inas não rne lernbro de ter ouvido falarde ì\,4estres até trtâ pouco tempo.

R. Teln razão. E se tivéssemcs seguido o sábio prin-cípio de guarelar silêncio cm vez ile nos deixarmos arrastarpela notoriedade ao publicarmos tudo o que sabíamos e

tínhamos ouvido, nunca teria havido tal profanação. Infe-iizmerite fomcs nós, os Teósofos, os primeiros a falar destascoises, a divutrgar a existância dc <Adeptosr> e <Mestres>r

no Oriente e o conhecimento Ocullista; e agora o nomepertence ao clomínio público. É sobre nós, agora, que recaio Katrma, ou seja as consequências da profanação dos nomese coisas sagradas. Tudo o que hoje se cncontla na literaturasobre estes - e não se pode cÌizer que seja pouco - deveser atribuído ac impulso dado neste sentido pela SociedadeTeosófir:a e seLìs Fundadores. N{as o que está feito esfáfeito e c1e nirìa serve lamentá-lo; resta-nos apenas sofreras consequências, na esperança cle que â nossa indiscriçãotenira ajudactro outros a chegarem mais facilmente aos Mes-tres, cujos nümes são agora invocados em vão por toda a

irarte e que têm servido de cobertura a tantas iniquidades.

201

CONCLUSÃO

O FUTURO DA SOCIEDADE TÊOSÓFICA

P. Qual é, na sua opinião, o futuro da Teosofia?R. Se é da Teosofia que fala, a minha resposta é que

tal como sempre existiu ciclo após ciclo do Passado, assim

existirá também para todo o sempre, porque Teosofia é

sinónimo de VERDADE ETERNA.P. Perdão, eu referia-me ao futuro da Sociedade Teo-

sófica.R. O seu futuro dependerá quase exclusivamente do

grau de altruísrno, integridade, dedicação e sobretudo do

conhecimento e sabedoria dos seus membros, a quem com-petirá prosseguir o trabalho e dirigir a Sociedade após a

morte dos Fundadores.P. Entendo perfeitamente a importância do altruismo

e da dedicação mas não vejo como é que o conhecimentopode ser um factor tão essencial corno as outras qualidades

que apontou. Não lhe parece que a literatura existente, àqual estão constantemente a ser âcrescentados novos elemen-

tos, deveria basfar?R. Não me estava a referir ao conhecimento técnico

da doutrina esotérica, embora ele seja da maior importância;falava antes da grande necessidade que os nossos sucessores

203

A CHÁ1ií] NA TEOSOT;IÁ

na diïecção da Sociedade terão de discernir com ciareza eimparcialidade. ToCas as experiências do género da SociedaclcTeosófica têrn lalhado aíé agora pcrque mais tarde ou maisceclo acabaram por degenerar numa seita e por impor osseus próprios tlogrnas rígick;s, perdenclo assim gradual e im-perceptivetrmente a vitaljclade que só a verclade viva podctransmitir.

P. ì\4as, se se conseguir el,itar r:sse perigo?R. Nesse çassl a Sclieclade scbreviverá ao século vinte.

ïrá graduatrrnenÍe irnpregnar e pcnetrar a grancÌc massa deseres pensailíes e inteiigentes com a sua visão ampla e nobrec1a Religião, Dever e Filantropia. Lenta rnas firmemenle, iráquetrranclo os grilhões de creclos e dogmas, cle prr:conceitossociais e de castas; porá termo acs confiitos e removerá osobstáculos entre raças e nações e abrirá caminho païa areatrizaçáo prática da Fraternidade entre todos os homens.Graças aos sells ensinamentos, graÇâs à filosofia que tornouacessível e inteligível para a mente rnoderna, o Ocidenteaprenderá a compreender e a admirar o Oriente no seuverdadeiro valor. For outro lado, o desenvolvimento dospoderes e faculdades parapsíquicas prosseguirá normalmente.Serão poupados à humanidade cs terríveis perigos rnentais e

físicos que são inevitáveis quando esses poderes e faculdadesse manifestam, como se receia que aconteça, nurn amtrientede egoísrno e de paixões negativas. O clesenvolvimento menfale psíquico do homern realizarse-â em harmonia com a suaevolução moral e as circunstâllcias materiais que o rodeiamreflectirão a pa.z e a boa vontaile fraternal que reinarão nasua mente eÍn vez de reflecfirem a discórclia e a luta quehoje se nos cleparam ent tcda a partc.

P. Que lin<lo quadro! hdas espera realmente que tudoisso se realize no curto espaço de um século?

R. E difícil. Mas clevo dizer-lhe qì.re. no últirno quarteÌde cada século, os <<Mestres> e1e que lhe falei tentam con,tribuir para o progresso espiritual da Hurnanidade dumaforma notória e concreta. Nos fins cle cada século houve

OS <<L,ÍA ÍI ATA,ÍAS>t TE0SoFICO:;

invariavelmente uma expiosão ou um aumento de espirituali-dade ._ chameJhe misticismo se preferir. Apareceram nomundo, como seus agentes, uma ou mais pessoas e e'lil'ul-gou-se, em maior ou menor grau, o conhecimento e ensina-mentos ocultos. Se se der a esse trabalho poderá reconstituit'esses movimentos, século após século, descle a época a que

i'emotanÌ os docurnentos hitóricos cle que dispornos.

P. Mas ccmo é que isso está relacionaclo com o futurocla Sociedade Teosófica?

R. Se a tentativa actual, que a nossa Sociedade repre-senta, tiver mais êxito do que as anteriores, então, quancio

chegar o momento de o século vinte se eviclenciar, ela existiráconÌo ruÌ1 organismo vivo, organizada e são. Graças à propa-gação dos seus ensinamentos, as rnentes e os corações dos

homens terão evcluído positivamente, serão mais puros e,

tal como já disse, os seus preconceitos e ilusões dcgmáticas

terão sido ultrapassados em certa meclida. Por outro laclo,

além c1e haver uma literatura extensa e acessível à clisposiçã-o

clos homens, o próximo impulso irá encontrar um grupo nrÌ-

meroso e unído ile pcssoas dispostas a receber o novo portador

do facho da Verdade. Irá encontrar as mentes dos hornens

preparadas para a sua mensagem, urna linguagem própriapara veicular as verclades que irá anunciar, uma orgnizaçãoque esÌlera a sua chegada e que afastará clo seu caminho os

obstáculos e dificuldades materiais puramente mecânicos"

Imagine o que uma pessoa a quem fosse dada essa oporlu-nidade poderia fazer. Reflicta sobre tudo isto e depois diga-rne

se sou demasiado optimista quando afirrno que se a Socie-

dade Teosófica sobreviver e for fiel à sua missão, aos seus

impr"rlsos iniciais, durante os próximos celÌì ânüs - cliga me

se vou longe de mais ao cleclarar que â terrir scrá uln céu

no século vinte e um, colïìparada com o qlle é agora.

205

ÍNDICE

Introdução à versão parcial

Prefácio

SECÇÃO r

A Teasofia e a Sociedade Teosófica:

Significado do nomeLinha de conduta da Sociedade TeosóficaA Religião-Sabedoria esotérica em todos os tempos ... ...Teosofia não é Budismo ...

SECÇÃO II

TeosoÍia Exotërica e Esotéríca:

O que a actual Sociedade Teosófica não é ...Teósofos e Membros da Sociedade TeosóficaDiferença entre Teosofia e Ocultismo ...Diferença entre Teosofia e Espiritismo ...Por que motivo é aceite a Teosofia?

SECÇÃO IIIPlano de Acção da Sociedade Teosôfica:

Objectivos da SociedadeA origem comum de todos os homens ..Outros obiectivos da Sociedade Teosófica[Da sacralidade e do compromisso ... ...

9

l5

t7192l25

2q3236

454650

3t4l

207

...1

SECÇÃO IV

Iìeluçiio eníre a Sociedade Teosófica e e Teor;ofia:I)o auto-aperfeiçoamentoOabstractoeoconcreto

SECÇÃO V

Ensinantent<ts f undamcn.tai.,s da Teosofìatr)e Deus e da oração

secçiì()

SECÇÃO VI

Ensínamentos T'e,sóficos ,yobre a Natureza e o ÍIomem:A unidade de Tudo no Todo

[Os ensinarnentos gregos

!l neccssúr'io orar? ..A oração clestrói a autoconfiança ...Da origern da alma humanaEnsinamentos budistas sotrre os assuntos trataclos nesia

59

6667

6q

J-ì54

9398

EvoluÇão e ilusãoDa constituição septenária do nosso ptranetaA natureza septenária do homem ... ... ..Diferença entre alma e espírito

75''/6

78BO

8l

SECÇÃO VIII)os vdrios estados após a molte:

O homem físico e o homem espiritualI)a recompensa e do castigo efernos eDos vários Princípios do homern ...

SECÇÃO VIIT

Da Reincarnaçõ,o ou Renascímento:

O que é a memória segundo a doutrina teosófica? .., ...Forque.não los lembramos das nossas vidas passadas? ...Da Individr-ralidade e da Personalidade ...l)a recompensa e castigo do Ego

SECÇÃO IX

Do Kanw-Loka e do Devachan:Do destino dos Princípios inferioresMotivo por que os teósofos não acreditam no regresso de

<Espíritos> puros ...

'Jo Niïu"o... ...

103106111r 13

117

119

208 âüc)

Algurnas palavras sobre os SkandhasDa consciência depois da morte e depois do nascimentoO que se entende realmente por âniquilação ... ... ...Palavras clefinielas pala exprimir coisas clefinidas ..,

[Teosofia e EducaçãoÈ";q;é travera tantoJ pié.ô".Ëitot

.. ... ...1

125127t32136

139143145

SECÇÃO X

l)a natttreza clo nctsso Princípío pensanlc:

O Mistério do EgoA natureza complexa de ManasE,sta doutrina é ensinada no Evangelho segunclo S. Jorir,t

SECÇÃO XI

Dcts mìstérios da Reíncarnaçõo:

1ì.enascimentos perióclicosO que é o Karma? ... ...Quem são os que sabem?Diferença entre Fé e Conhecimento,

Fé RacionalTerá l)eus o direito de perdoar'/

ou entre Fé Cega e

SECÇÃO XIT

O que é a Teosofia prótica?:

O deverRelações da Sociedade Teosófica com as reformas políticasDo auto-sacrifício ...Da CaridadelTeosofia para todos .. . . .]Como os membros podem ajudar a Sociedade0 que um teósofo tem obrigacão de não fazer .

SECÇÃO XTIT

Dos equívocos sobre a Sociedacle Teosófìca:

IConceitos erradosTeosofia e AscetismoTeosofia e Casamento ...

.l

151153157

159162

r671691751',l8

179180

185188

189contra a Sociedade

'feosófica?

Ls""aã"sãõiedade teosóii; il; Á.ió.iáôao .om finniucrativos ... ... I

lMembros Trabalhadores da Sociedacle f-eosófica ... ...i

As <<Mahatmas>> Teosófícos:Serão <Bspíritos de LuzD ou (Demónios malditosD? ... ... 195Abuso de nomes e termos sagrados 200

CONCLUSÃO

O Futuro da Sociedade Teosófica 203

2IA