a associaÇÃo dos juÍzes do rio grande do sul ajuris,

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1 EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO, DD. INTEGRANTE DO COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E RELATOR DA ADI Nº 5.730. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 5.730 OBJETO : REQUERIMENTO DE PARTICIPAÇÃO COMO AMICUS CURIAE A ASSOCIAÇÃO DOS JUÍZES DO RIO GRANDE DO SUL – AJURIS, inscrita no CNPJ sob o nº 92.965.748/0001-47, com sede na Rua Celeste Gobatto, nº 81, Porto Alegre, RS, doravante simplesmente denominada “AJURIS”, vem, por seus procuradores signatários, base na procuração adunada ao final (DOC. Nº 1), requerer sua admissão e participação no processo em epígrafe, na condição de AMICUS CURIAE, com fulcro no art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99, c/c. art. 138, do CPC de 2015, ora aplicado subsidiária ou supletivamente ao processo objetivo regido pela referida lei especial, com base nos fundamentos de fato e de direito que seguem. A Ação Direta de Inconstitucionalidade de nº 5.730 tem por objeto atos normativos expedidos pelo E. Tribunal Superior Eleitoral, com a finalidade de reorganizar a Justiça Eleitoral em todo o território nacional, cuja repercussão atinge não só magistrados com jurisdição eleitoral, mas também o Ministério Público, servidores da Justiça Eleitoral e, em especial, os destinatários desta justiça especializada que tem, a seu cargo, a difícil e importante tarefa de organizar as eleições nos mais de 5.500 municípios que integram o território nacional, bem como tutelar a lisura e legitimidade das eleições em todos os seus pleitos, municipais e gerais, e a tutela dos direitos fundamentais políticos. I – DA LEGITIMAÇÃO DA AJURIS PARA ATUAR COMO AMICUS CURIAE O ingresso da modalidade amicus curiae, em franca posição de vanguarda, tem sido acolhido por esta Suprema Corte, em inúmeros julgados,

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Page 1: A ASSOCIAÇÃO DOS JUÍZES DO RIO GRANDE DO SUL AJURIS,

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO, DD. INTEGRANTE DO COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E RELATOR DA ADI Nº 5.730. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 5.730 OBJETO : REQUERIMENTO DE PARTICIPAÇÃO COMO AMICUS CURIAE A ASSOCIAÇÃO DOS JUÍZES DO RIO GRANDE DO SUL – AJURIS, inscrita no CNPJ sob o nº 92.965.748/0001-47, com sede na Rua Celeste Gobatto, nº 81, Porto Alegre, RS, doravante simplesmente denominada “AJURIS”, vem, por seus procuradores signatários, base na procuração adunada ao final (DOC. Nº 1), requerer sua admissão e participação no processo em epígrafe, na condição de AMICUS CURIAE, com fulcro no art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99, c/c. art. 138, do CPC de 2015, ora aplicado subsidiária ou supletivamente ao processo objetivo regido pela referida lei especial, com base nos fundamentos de fato e de direito que seguem. A Ação Direta de Inconstitucionalidade de nº 5.730 tem por objeto atos normativos expedidos pelo E. Tribunal Superior Eleitoral, com a finalidade de reorganizar a Justiça Eleitoral em todo o território nacional, cuja repercussão atinge não só magistrados com jurisdição eleitoral, mas também o Ministério Público, servidores da Justiça Eleitoral e, em especial, os destinatários desta justiça especializada que tem, a seu cargo, a difícil e importante tarefa de organizar as eleições nos mais de 5.500 municípios que integram o território nacional, bem como tutelar a lisura e legitimidade das eleições em todos os seus pleitos, municipais e gerais, e a tutela dos direitos fundamentais políticos. I – DA LEGITIMAÇÃO DA AJURIS PARA ATUAR COMO AMICUS CURIAE O ingresso da modalidade amicus curiae, em franca posição de vanguarda, tem sido acolhido por esta Suprema Corte, em inúmeros julgados,

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sendo pacífico o entendimento de sua possibilidade jurídica, nos termos do art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99, hodiernamente amparado pelo art. 138, do Código de Processo Civil de 2015, tudo em favor de um processo efetivamente democrático e participativo. Nesse fio, a constitucionalização do processo – subjetivo ou objetivo – ainda que antecipada por leis de vanguarda, como os estatutos de 1999, que contemplam o processo e o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade (Lei nº 9.868, de 10.11.99), e da arguição de descumprimento de preceito fundamental, nos termos do § 1º do art. 102 da Constituição Federal, veio definitivamente consagrada pelo novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16.03.15) e, entre tantas inovações com vistas à constituição de um processo jurisdicional democrático, consagrou o instituto do Amicus Curiae, conforme seu art. 138. Tal dispositivo, no âmbito do processo objetivo, em especial tratando-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade, deve ser compreendido em harmonia com o art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868, de 10.11.99, a saber: o relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou entidades. Portanto, a atuação do amicus curiae legitima-se pela condição de portador de informações, elementos, dados, documentos, valores que, de outro modo, poderiam não chegar ao conhecimento do magistrado, conforme consistentes lições doutrinárias, tudo com vistas a uma prestação jurisdicional adequada, efetiva, tempestiva, garantindo, destarte, o exercício de uma democracia participativa, valores constitucionais a inspirar a atuação do Poder Judiciário. O processo, sob essa ótica, para a ser um espaço de construção do direito, legitimado pela comunidade de agentes atuando em cooperação. Trata-se, sob outra ótica, de um alargamento subjetivo do processo, que se justifica nas hipóteses de a pessoa física ou jurídica que exercer o papel de amigo da corte atuar em favor não de eventuais interesses parciais em conflito – ainda que indiretamente isso possa acontecer, porque decidir é optar entre uma ou outra versão, um ou outro pleito; decidir é partir-se –, mas em favor da construção da melhor e mais eficiente solução que ao Judiciário a Constituição outorga como seu dever-poder inerente a seu mandato popular. Dizendo com outras palavras, ainda que se expurgasse o princípio da cooperação, objetivamente adotado nas normas fundamentais do Código de

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Processo Civil de 2015, estatuto subsidiariamente aplicado à normatividade das leis de regência do processo objetivo, entre os demais agentes do processo – partes, terceiros, juiz – certamente a cooperação sobreviveria em relação ao amicus curiae. Este é, por excelência, o seu papel no processo: colaborar, cooperar, auxiliar o juízo. Às limitações de sua intervenção – também intimamente ligadas à racionalidade de sua participação – estarão ou deverão estar, outrossim, definidos e conectados aos poderes que lhe serão atribuídos, conforme decisão judicial, com vistas exatamente aos limites da própria cooperação a ser exercida e do conteúdo da demanda.

É com este ânimo que a ora postulante, AJURIS, comparece perante esta Suprema Corte, para ser admitida como AMICUS CURIAE na Ação Direta de Inconstitucionalidade c/ Pedido de Medida Cautelar ajuizada pela ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS – AMB, tombada sob nº 5.730 e que restou distribuída a Vossa Excelência. Justifica-se sua legitimação para atuar nos limites do art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99, c/c o art. 138, do CPC/15, pelas razões que seguem:

Conforme sua origem e história, a AJURIS, embora também o seja, não é exclusivamente uma associação de classe, na medida em que sempre agregou aos seus fins sociais, objetivos de desenvolvimento da cultura em geral e, em especial, da cultura jurídica, conforme dispõe o art. 1º, alíneas c e f, do seu Estatuto1:

Art. 1º – A Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, também designada pela sigla Ajuris, com sede e foro na cidade de Porto Alegre, RS, fundada em 11 de agosto de 1944, e com prazo indeterminado de duração, tem por finalidade: (...) c) estimular a cultura do direito, promovendo, entre seus associados e colaboradores, concursos de monografias, publicando-lhes os melhores trabalhos, e concedendo-lhes prêmios e incentivos; (...) f) por intermédio da Escola Superior da Magistratura, reconhecida como escola oficial pela Lei Estadual nº

1 http://www.ajuris.org.br/categorias/s1-institucional/c2-estatuto/, acesso em 12/7/2017, às 14h.

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14.597, de 08 de setembro de 2014, mediante atividade própria ou por convênio, organizar e ministrar cursos de formação e aperfeiçoamento de magistrados e servidores vinculados ao Poder Judiciário do Rio Grande do Sul; ministrar cursos preparatórios de concursos, de extensão e de pós-graduação nas áreas jurídica e transdisciplinares afins que visem à excelência da prestação jurisdicional e das funções essenciais à Justiça;

Sem prejuízo, por óbvio, de representação da classe,

conforme o mesmo dispositivo contempla na alínea h:

h) representar os anseios dos associados na afirmação das garantias constitucionais da magistratura;

A AJURIS, na perquirição de seus objetivos culturais, foi a

primeira associação de magistrados, em terras brasilis, que constituiu uma Escola própria voltada para o exercício da magistratura, mas que agregou, ao longo dos anos, inúmeros cursos, atendendo não só a magistratura e aos servidores da justiça, como a comunidade jurídica em geral, sendo a ESCOLA SUPERIOR DA MAGISTRATURA DA AJURIS reconhecida nacional e internacionalmente, o que é fato notório na comunidade jurídica. Inúmeros os seus cursos no passado, remoto e recente, e na atualidade, como é possível constatar de seu saite oficial (http://www.escoladaajuris.org.br/esm/) que acusam o seu importante papel na formação dos operadores do direito e na crítica construtiva do Direito e da Sociedade.

No mesmo andar, um dos periódicos mais antigos e prestigiados no mundo jurídico pátrio, a REVISTA DA AJURIS, ISSN 1670-1363, teve sua primeira edição publicada em julho de 1974, permanecendo no formato impresso até a edição de nº 132, quando migrou para o formato on line2, ISSN 2358-2480, classificada como Qualis B1, com edições trimestrais, representando sua efetiva e perene contribuição para o desenvolvimento do Direito.

Por certo inúmeras outras atuações e produtos da AJURIS estão absolutamente alinhados ao seu mister institucional, ora destacado, não sendo diferente com o estudo do Direito Eleitoral e da Justiça Eleitoral, seja pela

2 http://www.ajuris.org.br/OJS2/index.php/REVAJURIS, acesso em 12/7/2017, às 14h.

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realização de convênios com a Escola Judicial Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, a exemplo, entre outros, de ato firmado em data de 26 de julho de 2013 (DOC Nº 2), a existência de um Grupo de Estudos3 especificamente voltado para esta finalidade, bem como cursos de extensão realizados em passado recente, atualmente exigência da ENFAM, conforme Resolução ENFAM nº 2, de 14 de março de 2017, publicada no Diário da Justiça Eletrônico, edição nº 2166, Brasília, disponibilização em 17.03.17, publicação em data de 20.03.17 (DOC. Nº 3).

Com este perfil e história de trabalhos e pesquisas de conteúdo acadêmico no estudo do Direito, incluindo estudos específicos de Direito Eleitoral, a AJURIS se legitima, nos termos da lei de regência e do Código de Processo Civil, a comparecer aos autos da ADI 5.730, na condição de AMICUS CURIAE, como colaboradora do juízo, preenchendo à exaustão, os requisitos processuais de (i) ser o amicus curiae representado por pessoa jurídica especializada, com representatividade adequada; (ii) a relevância da matéria, com a especificidade do tema objeto da ADI 5.730, na medida em que tem por objeto atos normativos expedidos pelo Tribunal Superior Eleitoral que tratam da organização da Justiça Eleitoral, cuja repercussão da controvérsia diz com o tema das eleições, as quais se realizam e acontecem nos mais de 5.500 municípios da nação brasileira, correspondendo a um dos sustentáculos da democracia e da república. Presentes tais argumentações, considerando o objeto da demanda em causa e a representatividade da AJURIS, são inquestionáveis a legitimidade e o interesse da postulante para atuar na presente ação, na condição de AMICUS CURIAE, o que afinal requer. II – DO CONTEXTO HISTÓRICO, SOCIAL e POLÍTICO DA JUSTIÇA ELEITORAL NO BRASIL. Nenhum texto normativo - seja de hierarquia constitucional ou infraconstitucional – está ou pode estar divorciado de seu contexto cultural. O Direito é um produto cultural, como leciona Angelo Falzea, em seu trabalho Sistema Culturale e Sistema Giuridico4. Qualquer ato normativo que verse sobre a 3 http://www.escoladaajuris.org.br/esm/nucleos-de-estudo/direito-eleitoral/728-apresentacao-direito-eleitoral, acesso em 12/7/2017, às 14h05min. 4 In Ricerche di teoria Generale del Diritto e di Dogmatica Giuridica. Milano: Giuffrè, 1999.

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Justiça Eleitoral no Brasil deve estar conectado com o que essa instituição significa para a história da democracia e da república brasileira. Instituída pelo primeiro Código Eleitoral do Brasil, durante o governo provisório – Decreto nº 21.076 –, veio, ao lado do voto secreto, do voto feminino e do sistema proporcional, estabelecer uma nova realidade para o processo eleitoral brasileiro. A Justiça Eleitoral, na história brasileira, deve ser compreendida como órgão eleitoral, entregue ao Poder Judiciário, com funções próprias e, por vezes, atípicas à precípua função jurisdicional, dentre as quais (i) a administrativa, responsável não só pela condução do processo eleitoral como a recepção e a contagem dos votos, mas também a organização de um cadastro de eleitores que, ao longo dos anos representa o maior – ou senão o maior um dos maiores – cadastro público de registro de cidadãos do país5; (ii) a função jurisdicional de solucionar os conflitos decorrentes do processo eleitoral, a ser compreendido a partir de suas peculiaridades; (iii) a função consultiva, especialmente do Superior Tribunal Eleitoral e, na medida de suas competências eleitorais, aos Tribunais Regionais Eleitorais e, nos limites de sua atribuição; (iv) a função regulamentadora ao efeito de fazer valer as leis eleitorais, pleito a pleito, adequando-os à atualidade de cada eleição. Este modelo, que teve sua origem na vida política pós Revolução dos anos trinta, manteve-se intacto (com exceção, à obviedade, da Constituição de 1937) desde os seus primórdios, passando pela democratização do país representada pela Constituição de 1946, e não foi afetado pela Constituição de 1967, manteve-se sob à égide da Emenda Constitucional de 1969, sendo, definitivamente, consagrado pela Constituição de 1988. Ao longo das décadas, a Justiça Eleitoral aprumou-se e mostrou ao Brasil e ao mundo que era um modelo vencedor, respeitando, talvez como nenhum outro segmento, o dogma do federalismo, tão caro à história brasileira, ainda que de difícil aplicação, modernizando-se na adoção de sistema informatizado impecável de recepção e contagem de votos através da urna

5 Não é por outra razão que a recente Lei nº 13.444/17, de 11/05/2017, que criou a Identificação Civil Nacional, atribuiu à Justiça Eleitoral o armazenamento e a gestão da base de dados da ICN, a quem cumprirá manter atualizada e adotar as providências necessárias para assegurar a integridade, a disponibilidade, a autenticidade e a confidencialidade de seu conteúdo e a interoperabilidade entre os sistemas eletrônicos governamentais.

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eletrônica, aperfeiçoando, mais recentemente, o dito sistema pelo método da identificação biométrica, representando, sem dúvida, um divisor de águas no controle e fiscalização das eleições e respondendo, também, de forma exemplar, pela efetividade e tempestividade dos processos judiciais eleitorais. Sem embargo do sempre necessário aprimoramento, o Brasil deve à Justiça Eleitoral, para dizer o mínimo, respeito à sua história e suas conquistas, por vezes comparecendo como um oásis de qualidade na prestação de serviços públicos, e isso tudo com um corpo de magistrados e servidores enxuto, na medida em que se vale do sistema judiciário ordinário. Recentemente, nesse alinhamento, a Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade de seus líderes, manifestou publicamente sua extrema preocupação com os reflexos práticos decorrentes dos atos normativos expedidos pelo egrégio TSE, entendendo que a significativa redução de zonas eleitorais restringirá, de forma significativa, a abrangência de atendimento da Justiça Eleitoral à população gaúcha e brasileira, posicionando-se pela revisão de tais conteúdos em nome da defesa da democracia (DOC. Nº 4).

III – DA INCONSTITUCIONALIDADE DOS ATOS NORMATIVOS EXPEDIDOS PELO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

III.a) Preâmbulos. Como bem explanado pela petição inicial instauradora da

presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, promovida pela ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS – AMB, são objeto de impugnação os seguintes atos normativos: Resolução nº 23.512/2017, de 16/03/2017; Resolução nº 23.520/2017, de 01/06/2017; e Portaria nº 207/2017, de 21/03/2017. No interregno desses atos foi expedida também a Portaria nº 372, de 12/05/2017, aqui mencionada tão somente para historiar a sequência normativa, na medida em que veio a ser revogada pela Resolução nº 23.520/2017. O fato é que este conjunto de normas reescreve a geografia das zonas eleitorais espalhadas por todo o território nacional, atingindo, a grosso modo, mais de 900 Zonas Eleitorais no Brasil, a serem extintas por não observarem os novos requisitos impostos pelos atos normativos ora impugnados.

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A partir da primeira Resolução, nº 23.512, de 16 de março de 2017, promoveu-se significativa alteração quanto aos requisitos de instalação de Zonas Eleitorais nos municípios de 200 mil eleitores (aqueles que, em sede de pleito majoritário para cargos do Executivo Municipal, autorizam a realização de segundo turno), cujas zonas eleitorais passariam a ter número mínimo de 100 mil eleitores por cada zona e, o que mais revela, delegando ao Exmo. Sr. Ministro Presidente do Tribunal Superior Eleitoral a competência para expedir normas visando à adequação das Zonas Eleitorais existentes ao novo padrão. Por esse mesmo ato normativo, restou vedado aos TREs disporem sobre funções comissionadas e gratificações eleitorais do quadro de pessoal.

Ato contínuo, base no poder delegado, foi expedida pelo

Exmo. Sr. Presidente do Tribunal Superior Eleitoral a Portaria nº 207, de 21/03/2017, cuidando especificamente das capitais e determinando aos Tribunais Regionais Eleitorais a adequação da realidade atual, redistribuindo-se os eleitores em zonas que obedecessem aos novos requisitos, o que alcançaria a extinção de 72 (setenta e duas) zonas (de 233 para 161) nas capitais brasileiras.

Sobreveio, na sequência e no afã de editar normas, a

Portaria nº 372, de 12/05/2017, agora voltada para as demais zonas eleitorais de todo o território nacional, excluídas as capitais, novamente determinando que os tribunais locais extinguissem as zonas eleitorais, aproximadamente 900 (novecentas), que não atendessem os novos requisitos, ato este que veio a ser revogado pela Resolução nº 23.520/2017, cujo texto, ao fim e ao cabo, reedita as normas constantes da portaria revogada.

O prazo estabelecido, como alardeado pela petição inicial,

para a execução dos comandos insertos nos atos normativos referenciados, seria de 60 (sessenta) a contar dos 30 (trinta) dias assinados para apresentação dos planos de execução por cada tribunal regional, o qual estaria às vésperas de sua fluência, daí o porquê da urgência pleiteada desde o preâmbulo do presente feito.

Como declina a petição inicial, os três atos normativos que

subsistem padecem de vício de inconstitucionalidade formal, especialmente frente ao art. 121, caput, da Constituição republicana, que, sensível à organização da Justiça Eleitoral, pela importância que a mesma detém face à tutela da regularidade e legitimidade das eleições e da preservação dos direitos políticos fundamentais, ativos e passivos, estabelece que sua organização e a

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competência dos respectivos tribunais se dará mediante Lei Complementar – e só mediante Lei Complementar – sem renunciar, porém, a resguardar desde logo valores constitucionais, como adiante se verá.

No caso, cediço que o legislador nacional não editou o

estatuto referido pelo art. 121 da Constituição republicana, sendo pacífico o entendimento que a remissão se faz ao Código Eleitoral, recepcionado, destarte, como lei complementar, situação que persiste durante esses quase 29 anos da Constituição cidadã. Nesse fio, a lição de Paulo Henrique dos Santos Lucon e José Marcelo Menezes Vigliar:

O Código Eleitoral foi recepcionado, em sua parte compatível com a Constituição Federal de 1988, como espécie normativa de lei complementar, haja vista o mandamento constitucional do art. 121 (“Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais”)6

De sorte que, hodiernamente, o estatuto maior da

organização e da competência da Justiça Eleitoral prossegue a cargo da Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 que, a par de ter sido modificada em inúmeros capítulos por leis ordinárias subsequentes, não foram tais modificações (e nem poderiam, por se tratar de leis ordinárias) extensivas à matriz constitucional – organização e competência – da Justiça Eleitoral, que permanece em vigor com o mesmo perfil da década de sessenta, mais precisamente nos termos dos arts. 12 a 41, cuidando tanto de regras pertinentes ao Tribunal Superior Eleitoral, como aos tribunais regionais, aos juízes de direito e às juntas eleitorais.

Todavia, o Constituinte aproveitou os poucos dispositivos

constitucionais sobre essa Justiça para enfatizar que aos juízes eleitorais são asseguradas as “plenas garantias”, dando destaque, dentre estas, à inamovibilidade:

Art. 121. Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais. § 1º Os membros dos tribunais, os juízes de direito e os integrantes das juntas eleitorais, no exercício de suas funções, e no que lhes for aplicável, gozarão de plenas garantias e serão inamovíveis.

6 LUCON, Paulo Henrique dos Santos; VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Código Eleitoral interpretado, 3ª ed. São Paulo: Editora Atlas S.A, 2013, p. 2.

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§ 2º Os juízes dos tribunais eleitorais, salvo motivo justificado, servirão por dois anos, no mínimo, e nunca por mais de dois biênios consecutivos, sendo os substitutos escolhidos na mesma ocasião e pelo mesmo processo, em número igual para cada categoria. (...)

Não se trata de uma palavra inútil por já estar a

inamovibilidade incluída dentre as garantias da magistratura e nem também apenas para fazer constar que as estendeu aos integrantes das juntas eleitorais; o destaque foi feito também em relação aos juízes de direito que exercerem funções eleitorais, justamente para acentuar que, sem aquela garantia instrumental, haveria risco à integridade das eleições, à supremacia do voto, à tutela dos direitos fundamentais políticos.

Especificamente em relação ao TSE, a Carta de 1988 o

inseriu no topo da estrutura organizacional e hierárquica da Justiça Eleitoral; nas disposições transitórias, conferiu-lhe expressamente poder normativo de regulamentação, seja diretamente (art. 2º, § 2º, do ADCT), seja em caráter suplementar (art. 5º. § 2º, do ADCT), a saber:

ADCT Art. 2º. No dia 7 de setembro de 1993 o eleitorado definirá, através de plebiscito, a forma (república ou monarquia constitucional) e o sistema de governo (parlamentarismo ou presidencialismo) que devem vigorar no País. (Vide emenda Constitucional nº 2, de 1992) § 1º - Será assegurada gratuidade na livre divulgação dessas formas e sistemas, através dos meios de comunicação de massa cessionários de serviço público. § 2º - O Tribunal Superior Eleitoral, promulgada a Constituição, expedirá as normas regulamentadoras deste artigo. Art. 5º. Não se aplicam às eleições previstas para 15 de novembro de 1988 o disposto no art. 16 e as regras do art. 77 da Constituição. § 1º Para as eleições de 15 de novembro de 1988 será exigido domicílio eleitoral na circunscrição pelo menos durante os quatro meses anteriores ao pleito, podendo os candidatos que preencham este requisito, atendidas as demais exigências da lei, ter seu registro efetivado pela Justiça Eleitoral após a promulgação da Constituição.

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§ 2º Na ausência de norma legal específica, caberá ao Tribunal Superior Eleitoral editar as normas necessárias à realização das eleições de 1988, respeitada a legislação vigente.

De qualquer forma, ressalvadas as hipóteses em que o

Constituinte haja conferido poder de regulamentação direto, em tudo o mais esse poder normativo somente pode ser exercido no espaço delimitado pela Constituição ou, por delegação desta, pela lei.

É bem verdade que o Supremo Tribunal Federal já admitiu

que a inércia do legislador em prazo razoável autoriza, em determinadas margens, a atuação supletiva de regulamentação pelo Tribunal Superior Eleitoral7.

A inércia do legislador, porém, não outorga poder de

regulamentação ao TSE em matéria que exige lei complementar, como assentou o STF no julgamento da ADI 50288.

Nesse precedente, o STF distinguiu claramente entre poder

normativo e poder legislativo, para concluir pela inconstitucionalidade da Resolução nº 23.389/2013 do TSE, que estabelecera critério de distribuição do número de Deputados dos Estados e do Distrito Federal, proporcionalmente à população, “por violação do postulado da reserva de lei complementar ao introduzir inovação de caráter primário na ordem jurídica, em usurpação da competência legislativa complementar”.

7 Exemplo disso foi o embate sobre a fidelidade partidária que se deu após as eleições gerais de 2006, respondendo o Tribunal Superior Eleitoral a consultas realizadas pelos partidos políticos abandonados por seus candidatos eleitos sob suas siglas, entendendo que o mandato obtido nas urnas nos pleitos proporcionais pertenciam ao partido e não ao candidato. Objetivando o retorno de tais mandatos, os partidos prejudicados tiveram suas pretensões, primeiro junto à Casa Legislativa, em caráter administrativo, e posteriormente junto ao Supremo Tribunal Federal, via mandados de segurança, indeferidas, ainda que por motivos formais (inexistência de lei a regulamentar a matéria). Contudo, o próprio Supremo Tribunal Federal, na ocasião, recomendou expressamente ao TSE a edição de Resolução para garantir o devido processo legal da perda do mandato por desfiliação partidária, a exemplo do MS 26.937, Rel. Min. Eros Grau, acórdão publicado no DJE de 22/04/2009. In: A criação do direito pela Justiça Eleitoral: um estudo sobre o seu poder normativo. MACEDO, Elaine Harzheim; SOARES, Rafael Morgental, in Jurisdição eleitoral e direitos políticos fundamentais. MACEDO, Elaine Harzheim; FREITAS, Juliana Rodrigues (org.). Rio de Janeiro Forense; São Paulo: Método; Belém, PA: CESUPA, 2015, p. 66-67. 8 (ADI 5134, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 04/10/2016, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-215 DIVULG 06/10/2016 PUBLIC 07/10/2016).

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Portanto, e aqui, para evitar tautologia, a AJURIS reitera e subscreve integralmente os argumentos deduzidos na peça preambular da presente ADI, para concluir pela absoluta inconstitucionalidade formal das RESOLUÇÕES NºS 23.512/17 e 23.520/17 e PORTARIA Nº 207/2017, por violação ao art. 121, caput, da Constituição Federal, flagrantemente desrespeitada.

Porém, no mister de colaborar com esse E. Supremo

Tribunal Federal, há repensar o universo desses atos normativos e sua insustentabilidade frente à ordem constitucional, agregando-se os argumentos adiante, que, ao fim e ao cabo, se harmonizam com aqueles defendidos pela Autora do presente feito.

III.b) Disposições legais relevantes sobre a organização e competência da Justiça Eleitoral O Código Eleitoral reconhece ao Tribunal Superior Eleitoral

competências jurisdicionais e administrativas. O leque de competências jurisdicionais pode ser encontrado

no art. 22 do Código, que cuida tanto das competências originárias como das recursais.

Mas o que mais revela, para o caso, são as competências

administrativas, dentre elas as normativas (ou regulamentadoras), que estão catalogadas no art. 23 do Código:

Art. 23 - Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior, I - elaborar o seu regimento interno; II - organizar a sua Secretaria e a Corregedoria Geral, propondo ao Congresso Nacional a criação ou extinção dos cargos administrativos e a fixação dos respectivos vencimentos, provendo-os na forma da lei; III - conceder aos seus membros licença e férias assim como afastamento do exercício dos cargos efetivos; IV - aprovar o afastamento do exercício dos cargos efetivos dos juizes dos Tribunais Regionais Eleitorais; V - propor a criação de Tribunal Regional na sede de qualquer dos Territórios; VI - propor ao Poder Legislativo o aumento do número dos juizes de qualquer Tribunal Eleitoral, indicando a forma desse aumento;

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VII - fixar as datas para as eleições de Presidente e Vice-Presidente da República, senadores e deputados federais, quando não o tiverem sido por lei: VIII - aprovar a divisão dos Estados em zonas eleitorais ou a criação de novas zonas; IX - expedir as instruções que julgar convenientes à execução deste Código; X - fixar a diária do Corregedor Geral, dos Corregedores Regionais e auxiliares em diligência fora da sede; XI - enviar ao Presidente da República a lista tríplice organizada pelos Tribunais de Justiça nos termos do ar. 25; XII - responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas em tese por autoridade com jurisdição, federal ou órgão nacional de partido político; XIII - autorizar a contagem dos votos pelas mesas receptoras nos Estados em que essa providência for solicitada pelo Tribunal Regional respectivo; XIV - requisitar a fôrça federal necessária ao cumprimento da lei e das suas próprias decisões, ou das decisões dos Tribunais Regionais que o solicitarem; XIV - requisitar a força federal necessária ao cumprimento da lei, de suas próprias decisões ou das decisões dos Tribunais Regionais que o solicitarem, e para garantir a votação e a apuração; (Redação dada pela Lei nº 4.961, de 1966) XV - organizar e divulgar a Súmula de sua jurisprudência; XVI - requisitar funcionários da União e do Distrito Federal quando o exigir o acúmulo ocasional do serviço de sua Secretaria; XVII - publicar um boletim eleitoral; XVIII - tomar quaisquer outras providências que julgar convenientes à execução da legislação eleitoral.

III.c) Dos fundamentos das atos normativos questionados. Analisando-se os fundamentos normativos das Resoluções

nºs 23.512 e 23.520, afere-se que os seus respectivos “considerandos” primeiros se reportam, não à Constituição da República, mas ao art. 23, IX, do Código Eleitoral. Veja-se o teor de ambos os considerandos:

O TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, no uso das atribuições que lhe confere o art. 23, inciso IX, do Código Eleitoral;

(Leia-se, conforme já reproduzido: expedir as instruções que julgar convenientes à execução deste Código)

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Chama, desde o início, a atenção a circunstância de que não se trata de um inciso que contemple autorização expressa para extinguir zonas eleitorais, o que seria o exigível.

Ao contrário, cuida-se de um dispositivo genérico, que

confere poder normativo ou regulamentador, com finalidade instrumental limitada à execução do Código Eleitoral, ou seja, atribui ao TSE competência de regulamentação administrativa destinada à fiel execução de lei, sem agregar qualquer vigor justificativo para um comando normativo de natureza institucional e efeito interventivo no exercício da atividade jurisdicional da Justiça Eleitoral. Está fora do alcance desse poder normativo o de interferir, diretamente, na organização e na competência da Justiça Eleitoral, seja em que nível for.

E mais, não há qualquer outro fundamento legal invocado

nos considerandos. O outro considerando que sustenta os atos é – pasmem! -

infralegal, e diz com a Resolução TSE nº 23.422, de 6 de maio de 2014, alterada pela Resolução TSE nº 23.512, de 16 de março de 2017. Ou seja, o TSE, com fundamento numa Resolução, expede outra Resolução e revoluciona a geografia das zonas eleitorais, com drástica redução dos serviços eleitorais, quando a realidade social é de aumento paulatino da população e, consequentemente, do número de eleitores, em plena época que a demanda sobre a fiscalização das eleições por seus diversos instrumentos (só para citar algumas, as ações e representações sobre abuso de poder político, econômico e dos meios de comunicação, propaganda eleitoral e prestação de contas dos partidos políticos, coligações e candidatos) cada vez mais agrega valor à atuação da Justiça Eleitoral.

Ou seja, as normas novas e devastadoras para a estrutura da

Justiça Eleitoral vieram praticamente do nada. A par da notável fragilidade do embasamento normativo das

Resoluções sob exame, as suas disposições revelam potencialidade de intervir na organização nacional do sistema eleitoral e, o que é mais grave, no exercício do direito fundamental de participação política, atingindo milhões de eleitores e de milhares de cidadãos que porventura queiram exercer seus direitos políticos passivos em eleição futura.

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A Resolução nº 23.520, por sua vez, não exclui, ainda, a

necessidade de alteração massiva dos locais de votação, limitando-se a estabelecer um conceito aberto “preferencialmente”, a saber:

Art. 3º Os eleitores das zonas eleitorais extintas deverão ser redistribuídos para as zonas eleitorais cuja localização privilegie o acesso dos eleitores, preferencialmente sem alterações em seus locais de votação.

Tal Resolução instaura precariedade no serviço público

eleitoral, ante a expressa previsão de temporariedade dos postos de atendimento e ao conferir a administrador discricionariedade na transformação de zonas extintas em postos de atendimento temporários e, ainda, em definitivos. Tal hipótese viola o princípio da legalidade, norma constitucional elevada à hierarquia de garantia pétrea, nos termos do art. 5º, inciso II, da Carta Política, porquanto a criação, transformação e extinção de cargos e órgãos públicos seguem o preceito da reserva de lei, também por essa via mostrando-se inconstitucional:

Art. 4º As zonas eleitorais extintas poderão ser transformadas em postos de atendimento temporários, vinculados às zonas eleitorais às quais serão integradas, com vigência até 19 de dezembro de 2018, destinados ao atendimento ao eleitor – incluído o recadastramento biométrico – e ao apoio logístico às eleições de 2018. § 1º Os postos de atendimento temporários poderão manter o quadro atual de servidores até a data limite prevista no caput deste artigo. § 2º Os postos de atendimento temporários decorrentes do disposto nesta resolução poderão, a qualquer tempo antes do término do prazo previsto no caput deste artigo e a critério dos tribunais regionais eleitorais, ser transformados – por meio de ato normativo – em postos de atendimento definitivos. (...)

Além da discricionariedade para exercício de poder que o

princípio da legalidade veda, há também ofensa ao princípio da impessoalidade do serviço público, uma vez que a resolução admite a possibilidade de designação de funções comissionadas para tais cargos transformados por ato discricionário e infralegal.

Art. 4º (...)

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§ 3º Os tribunais regionais eleitorais poderão utilizar-se das funções comissionadas FC-01 das zonas eleitorais extintas para a coordenação dos trabalhos dos postos de atendimento criados em decorrência do disposto nesta resolução.

A mencionada Resolução invade a esfera de atribuições

constitucionais do legislador para estabelecer normas de competência e casos de modificação de competência jurisdicional e, mais, por atribuir a ato administrativo do tribunal inferior a competência para esse fim, o que ofende, simultaneamente, os princípios da legalidade, do juiz natural e da tempestividade processual, todos assegurados pelo já citado art. 5º, da Carta Magna:

Art. 7º Os processos em trâmite nas zonas eleitorais extintas deverão ser redistribuídos à zona eleitoral de destino, de acordo com planejamento do respectivo tribunal regional eleitoral.

Idêntica afronta à Constituição se encontra no art. 8º, ao

criar o cargo de juiz colaborador, função jurisdicional que não tem previsão nas normas constitucionais da estrutura do Poder Judiciário, nem na legislação complementar (LOMAN) ou em norma de organização judiciária prévia:

Art. 8º Nos meses de setembro e outubro de 2018, os juízes de zonas eleitorais do interior que abrangerem zonas extintas poderão contar com o auxílio de juiz colaborador, mediante justificativa fundamentada apresentada à Corregedoria Regional Eleitoral, observada regulamentação específica a ser expedida pelo Tribunal Superior Eleitoral.

A Resolução 23.520 se faz inconstitucional, também, quando

extrapola a competência de regulamentação que o Código Eleitoral confere no tema do zoneamento, estatuto esse, como dito no preâmbulo, com hierarquia de lei complementar. Com efeito, o inc. VIII do art. 23 somente atribui ao TSE o poder de dispor sobre a divisão de Estados em zonas e de criar novas zonas, não para extingui-las:

VIII - aprovar a divisão dos Estados em zonas eleitorais ou a criação de novas zonas;

A razão é óbvia: o poder administrativo conferido pela lei se limita a distribuir, ordenar ou mesmo aumentar a facilidade de acesso dos

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eleitores aos serviços eleitorais, não a sua diminuição, ante o evidente risco de restrição administrativa ao direito fundamental eleitoral.

Ainda que assim não fosse, a delegação de poder do

legislador ao administrador deve sempre ser interpretada restritivamente, porquanto este último está limitado pela legalidade e, destarte, só pode agir dentro dos limites de liberdade que ela confere.

IV – DA MEDIDA CAUTELAR/TUTELA DE URGÊNCIA Na esteira do destacado preambularmente, mostra-se

urgente que essa Egrégio Corte Suprema suspenda a eficácia dos atos normativos impugnados na presente demanda, considerando que o prazo fatal para a readequação e extinção de mais de 900 zonas eleitorais está por findar, razão pela qual se corrobora, também no ponto, o quanto contido na peça inicial da demanda promovida pela AMB.

Reitera-se, outrossim, que há mais de 50 anos que se

observa a competência e a organização da Justiça Eleitoral de acordo com o previsto pelo Código Eleitoral, sendo que os atos editados pelo egrégio TSE visam, ao fim e ao cabo, de forma praticamente imediata, à desconstrução da organização judiciária eleitoral consagrada ao largo do tempo, com flagrante ofensa às regras constitucionais.

V – DOS PEDIDOS E DOS REQUERIMENTOS.

Pelo fio do exposto, a ASSOCIAÇÃO DOS JUÍZES DO RIO GRANDE DO SUL – AJURIS, postula:

(i) seja admitida, na condição de AMICUS CURIAE, ao efeito de participar em todos os atos e momentos processuais que lhe sejam pertinentes;

(ii) a concessão da tutela provisória requerida na inicial, considerando a urgência na execução dos comandos de extinção de zonas eleitorais,

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determinada pelos atos normativos quinados, algumas com mais de 50 (cinquenta) anos de existência e de diuturno atendimento ao eleitor;

(iii) ao final, a procedência da ação ajuizada pela ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS – AMB, em todos os seus termos, a fim de reconhecer a inconstitucionalidade dos atos normativos questionados.

Finalmente, requer o seu cadastramento no feito, bem assim o de seus procuradores, para fins de comunicação dos atos processuais futuros. Porto Alegre, 11 de julho de 2017.

pp. ELAINE HARZHEIM MACEDO OAB/RS nº 7.249

pp. ROGER FISCHER OAB/RS nº 93.914

pp. CARLA HARZHEIM MACEDO OAB/RS nº 79.717