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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS FACULDADE DE DIREITO DO RECIFE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO CLEYBER VALENÇA CORDEIRO PIRES A REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES REGIONAIS POR MEIO DA TRIBUTAÇÃO INDUTORA: UM ENFOQUE NO IMPOSTO SOBRE A RENDA Dissertação de Mestrado Recife 2012

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS FACULDADE DE DIREITO DO RECIFE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO

CLEYBER VALENÇA CORDEIRO PIRES

A REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES REGIONAIS POR MEIO DA TRIBUTAÇÃO INDUTORA: UM ENFOQUE NO IMPOSTO SOBRE A RENDA

Dissertação de Mestrado

Recife 2012

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CLEYBER VALENÇA CORDEIRO PIRES

A REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES REGIONAIS POR MEIO DA TRIBUTAÇÃO INDUTORA: um enfoque no Imposto sobre a Renda

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade de Direito do Recife/ Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do grau de mestre. Área de Concentração: Estado, Regulação e Tributação Indutora. Linha de Pesquisa: Estado, constitucionalização e direitos humanos. Orientador: Prof. Dr. Sérgio Torres Teixeira.

Recife 2012

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Catalogação na fonte

Bibliotecária Eliane Ferreira Ribas CRB/4-832

P667r Pires, Cleyber Valença Cordeiro

A redução das desigualdades regionais por meio da tributação indutora: um enfoque no Imposto sobre a Renda / Cleyber Valença Cordeiro Pires. – Recife: O Autor, 2012.

105 f. : quadros.

Orientador: Sérgio Torres Teixeira.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Pernambuco. CCJ. Direito, 2012.

Inclui bibliografia.

1. Brasil - Constituição (1988) - Art. 3º, inciso III, art. 170, inciso VII - Redução das desigualdades regionais. 2. Normas tributárias indutoras - Justiça regional. 3. Imposto de renda - Deduções - Legislação - Brasil. 4. Direito tributário - Brasil. 5. Brasil. Lei Complementar nº 101, de 04 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal). 6. Desigualdades regionais - Soluções. 7. Incentivos fiscais - Política. 8. Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas – IRPJ. 9. Brasil - Norte e Nordeste - Desenvolvimento - Indução - Concessão de incentivos – IRPJ de direito privado. I. Teixeira, Sérgio Torres (Orientador). II. Título.

343.8104 CDD (22. ed.) UFPE (BSCCJ2012-032)

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AUTOR: Cleyber Valença Cordeiro Pires TÍTULO: A redução das desigualdades regionais por meio da tributação indutora: um enfoque no Imposto sobre a Renda

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade de Direito do Recife/ Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do grau de mestre. Linha de Pesquisa: Estado, constitucionalização e direitos humanos. Área de Concentração: Estado, Regulação e Tributação Indutora. Orientador: Prof. Dr. Sérgio Torres Teixeira.

A banca examinadora composta pelos professores abaixo, sob a presidência do primeiro, submeteu o candidato à defesa, em nível de Mestrado, e o julgou nos seguintes termos: Menção Geral: _______________________________________________________________

Prof. Dr. Francisco de Queiroz Bezerra Cavalcanti (Presidente/UFPE)

Julgamento: ____________________ Assinatura: ____________________________

Prof. Dr. João Hélio de Farias Moraes Coutinho (1º Examinador externo/UNICAP)

Julgamento: _____________________ Assinatura: ____________________________

Prof. Dr. Leonardo José Ribeiro Coutinho Berardo Carneiro da Cunha (2º Examinador interno/UFPE)

Julgamento: _____________________ Assinatura: ____________________________

Recife, 06 de setembro de 2012.

Coordenador do Curso: Prof. Dr. Marcos Nóbrega

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Para minha esposa,

Ana Angélica, e Beatriz,

fruto do nosso amor.

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AGRADECIMENTOS

À Deus, pelo dom da vida, da saúde e da família, e por me permitir mais uma etapa na minha carreira, em especial por ter alcançado uma pós-graduação em tão distinta instituição.

Ao Professor Sérgio Torres Teixeira, pelo apoio constante em todos os momentos

dos últimos anos de minha carreira acadêmica.

Aos Professores do Programa da Pós-Graduação em Direito da UFPE, em especial

a Raymundo Juliano, Francisco Queiroz, Luis Alberto Gurgel, Marcos Nóbrega, Artur

Stamford, Alexandre da Maia e Aurélio Boaviagem, por sua importante contribuição

durante o período de concretização da vertente pós-graduação.

Ao Professor João Hélio Coutinho, pelo seu essencial suporte durante a fase de

conclusão do projeto de pesquisa, como profundo conhecedor da matéria tributária,

fonte de inspiração acadêmica para mim, desde os tempos da graduação.

À minha esposa, Ana Angélica de Pontes Galvão, sempre atenciosa, amorosa e

paciente, que tem sido minha incentivadora e companheira nos momentos felizes e

de dificuldade.

À nossa filha Beatriz Galvão, por quem nutrimos amor incondicional.

Aos meus pais, Cleyder Pires e Edilene Valença; e aos meus irmãos, Ricardo e

Eduardo.

Aos amigos por seu suporte e incentivo.

Aos queridos colegas do mestrado, especialmente a Marília Andrade, Cynthia

Almeida, Leonardo Almeida e Humberto Carneiro.

A todos os funcionários do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFPE, em

especial a Carminha e Gilka.

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RESUMO

PIRES, Cleyber Valença Cordeiro. A redução das desigualdades regionais por meio da tributação indutora: um enfoque no Imposto sobre a Renda. 2012. 105 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Pós-Graduação em Direito, Centro de Ciências Jurídicas / Faculdade de Direito do Recife – FDR, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2012.

Atualmente, no Brasil, as normas tributárias indutoras vêm sendo utilizadas de forma aleatória e para suprir necessidades momentâneas e, no mais das vezes, para incentivar e beneficiar determinados grupos econômicos, quando deveriam servir a propósitos programados e mais benéficos à toda a coletividade. Nesse sentido, as normas tributárias indutoras poderiam ser utilizadas para incentivar o desenvolvimento regional, em especial as regiões norte e nordeste, historicamente renegadas por políticas públicas direcionadas às demais regiões econômicas do país. Levando em conta este panorama, foi realizado o estudo aprofundado dos princípios da legalidade e da isonomia, bem como dos princípios que regem o direito tributário, os mecanismos de incentivo contidos na legislação do imposto de renda que favorecem a indução do desenvolvimento regional. Concluímos pela viabilidade da utilização da indução do desenvolvimento das regiões norte e nordeste do Brasil por meio da concessão de incentivos através do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas de direito privado.

Palavras-chave: Desigualdades regionais, reduções, tributação indutora, Imposto sobre a Renda.

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ABSTRACT

PIRES, Cleyber Valença Cordeiro. The reduction of regional disparities by inducing taxation: a focus on Income Tax. 2012. 105 p. Dissertation (Master's Degree of Law) – Programa de Pós-Graduação em Direito, Centro de Ciências Jurídicas / Faculdade de Direito do Recife – FDR, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2012.

Currently in Brazil, inducing tax rules are being used randomly and to meet the momentary needs and, in most cases, to encourage and benefit certain economic groups, when they should serve to scheduled and more beneficial purposes to the entire community. In this context, inducing tax rules could be used to encourage regional development, especially the north and northeast, historically disowned by public policies directed to other economic regions of the country. Given this background, we performed a detailed study of the principles of legality and equality, and the principles governing the tax law, the incentives contained in income tax laws that favor the induction of regional development. We conclude that it is feasible to use the induction of the development of northern and northeastern Brazil through incentives using the Income Tax of Legal Persons of Private Law.

Keywords: Regional inequalities, reductions, inducing tax, Income Tax.

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SUMÁRIO Introdução ............................................................................................................... 10 1 O Imposto sobre a Renda e proventos e as Pessoas Jurídicas de Direito Privado......................................................................................................................12 1.1 Origem do Imposto sobre a renda........................................................................12 1.2 O Imposto sobre a Renda e Proventos na Constituição de 1988........................13 1.3 Princípios dirigentes do IR....................................................................................19 1.4 Demais princípios tributários aplicáveis.............................................................. 21 1.5 As diferentes formas de apuração do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas.....................................................................................................................24 1.5.1 Lucro Real, Lucro Presumido e Lucro Arbitrado...............................................25 1.5.2 Simples Nacional...............................................................................................29 1.5.3 Microempreendedor individual – MEI................................................................33 1.6 Limitações aos incentivos somente em benefício das pessoas jurídicas que arrecadam sob a ótica do lucro real...........................................................................34 2 Aspectos econômicos, a tributação Indutora e o IRPJ.................................... 39 2.1 O capitalismo e a intervenção econômica do Estado.......................................... 39 2.2 A intervenção no domínio econômico no Brasil e a Constituição de 1988......... 44 2.3 O IRPJ e a extrafiscalidade..................................................................................51 2.4 A tributação indutora............................................................................................54 3 Desenvolvimento regional incentivado pelo IRPJ ........................................... 66 3.1 A redução das desigualdades regionais na Constituição Federal de 1988 ....... 66 3.1.1 A Questão da Guerra Fiscal como entrave ao desenvolvimento regional........70 3.1.2 Algumas medidas para minimizar a Guerra Fiscal............................................76 3.2 As desigualdades regionais em números............................................................ 78 3.3 A tributação indutora como meio de promoção da redução de desigualdades.. 82 3.4 O IRPJ e os mecanismos para incentivar o desenvolvimento ........................... 83 Conclusões.............................................................................................................. 92 Referências ..............................................................................................................98

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INTRODUÇÃO

Historicamente, vários foram os momentos em que governos contribuíram

para o aparecimento das desigualdades regionais, como na fase colonial (em face

da centralização do poder no sudeste do país) e, posteriormente, agravada na

famosa política do café-com-leite, instituída na República Velha (1894 – 1930),

período no qual os Estados de São Paulo e Minas Gerais se alternavam no poder,

ditando as normas e direcionando as políticas públicas para suprir os interesses de

uma minoria.

Após os referidos períodos, sobreveio a Revolução de 1930, o Estado Novo, a

República Nova, o período desenvolvimentista promovido por Juscelino Kubitschek,

os governos militares, mas raras foram as tentativas de promover o nivelamento

regional do Norte e Nordeste do Brasil, com as demais regiões.

Com a redemocratização do Brasil, contudo, foram traçados objetivos

fundamentais e norteadores da economia nacional, dentre os quais se destaca a

redução das desigualdades regionais, conforme disposto no artigo 3º, inciso III, e no

artigo 170, inciso VII, ambos da Carta Magna de 1988.

De acordo com o proposto pela Constituição, o desenvolvimento econômico

representa uma efetiva mudança, a conjuntura atual (e histórica) caracterizada por

vultosos investimentos nas regiões mais beneficiadas no passado.

Assim, para a promoção do referido nivelamento regional, o Estado pode

induzir, mediante a utilização de normas tributárias, os agentes econômicos à prática

de comportamentos desejáveis, ou coibir os indesejáveis, para alcançar o equilíbrio

constitucionalmente previsto.

Nesse sentido, as normas tributárias indutoras podem atuar como mais um

fator para alcançar a justiça regional proposta pelo legislador constituinte.

Desse modo, é importante o estudo dos incentivos existentes nas leis atuais,

demonstrando a importância para o desenvolvimento econômico regional, mas

focando criticamente o problema da falta de incentivos em alguns setores ainda não

beneficiados.

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Quanto à eventual ameaça dos incentivos ao princípio da isonomia, bem

como em relação à sua viabilidade constitucional, impende verificar se o permissivo

inscrito no artigo 151, inciso I, in fine, da Constituição Federal de 1988, pode atuar

como um fator de relativização desse princípio.

Todavia, é importante destacar que as normas tributárias indutoras estão

restritas às divisões do exercício do poder público, verificando as competências

tributária e reguladora do Estado.

Isso porque, uma das limitações do sistema tributário nacional consiste na

vedação aos entes federativos além de sua esfera de poder, em especial no que se

refere à concessão de incentivos fiscais, preservando o federalismo adotado pelo

Estado Brasileiro. Para tanto, basta recordar as limitações impostas pela Lei

Complementar nº 101, de 04 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).

Nesse contexto, não se pode olvidar da evolução do capitalismo no mundo,

iniciando com o modelo do liberalismo, passando ao estado social (“wellfare state”),

até chegar ao atual estado neoliberal (mínimo/gestor/regulador).

A influência do movimento neoliberal contribui para o desenvolvimento da

concepção de um Estado mínimo, construindo a idéia de uma administração de

resultados, retirando-se do Estado o papel centralizador da gestão direta de seus

serviços (desestatização), adaptando-o a um modelo gerencial, como ente regulador

e fiscalizador. Destacam-se, por conseguinte, os poderes de tributar e de regular.

Nesse contexto, o presente trabalho procura apontar soluções para as

desigualdades regionais, através de uma política de incentivos fiscais eficiente e

centralizada, por meio do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas – IRPJ.

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CAPÍTULO I

O Imposto sobre a Renda e proventos e as Pessoas Jurídicas de Direito Privado

1.1. Origem do Imposto sobre a Renda

No Brasil, a tributação incidente especificamente sobre a renda das pessoas

foi introduzida por Dom Pedro Segundo, imperador do Brasil, através da Lei nº 317,

de 21 de outubro de 1843, conforme se infere da redação de seu artigo 23 e

parágrafos:

Art. 23. Fica creada a seguinte contribuição extraordinaria durante o anno desta lei.

§ 1º Todas as pessoas que receberem vencimentos dos Cofres Publicos Geraes, por qualquer titulo que seja, ficão sujeitas a uma imposição, que será regulada pela maneira seguinte:

De 500.000 á 1.000.000 2 por cento 1.000.000 á 2.000.000 3 por cento 2.000.000 á 3.000.000 4 por cento 3.000.000 á 4.000.000 5 por cento 4.000.000 á 5.000.000 6 por cento 5.000.000 á 6.000.000 7 por cento 6.000.000 á 7.000.000 8 por cento 8.000.000 para cima 9 por cento

§ 2º Ficão exceptuados da regra estabelecida no paragrapho antecedente os vencimentos das praças de pret de terra e mar, e os vencimentos dos militares em campanha.

§ 3º Na palavra vencimentos se comprehendem quaesquer emolumentos que se perceberem nas Secretarias, ou Estações Publicas.

§ 4º O Governo estabelecerá o modo de arrecadar-se esta nova imposição.

Importante perceber que o tributo instituído pela Lei nº 317/1843 teve caráter

de contribuição extraordinária, e apenas alcançava os vencimentos dos funcionários

públicos, assim denominados aqueles que percebiam remuneração paga pelos

cofres públicos.

Outrossim, referida norma imperial estabeleceu uma das primeiras regras de

isenção, em benefício dos militares na reserva remunerada e os que efetivamente

estavam à serviço.

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Entretanto, o Imposto sobre a Renda – IR, tal como conhecido atualmente,

surge tão somente com o advento da Lei Orçamentária nº 4.625, de 31 de dezembro

de 1922, que em seu artigo 31 assim tratava:

Art. 31. Fica instituído o imposto geral sobre a renda, que será devido anualmente, por toda pessoa física ou jurídica, residente no território do país, e incidirá, em cada caso, sobre o conjunto líquido dos rendimentos de qualquer origem.

Diferentemente do seu predecessor, portanto, o IR vertido na legislação de

1922, abrange quaisquer rendimentos de pessoas físicas ou jurídicas, e não

somente os percebidos por funcionários públicos.

Outras regras interessantes que podem ser identificadas no IR/1922 são a

anualidade e o alcance, apenas, sobre as rendas de residentes no país, bem como a

incidência sobre a totalidade dos rendimentos líquidos de qualquer natureza.

Em que pese sua instituição em 1922, o tributo teve sua arrecadação iniciada

em 1924, com a sua primeira regulamentação efetuada através do Decreto nº

16.580, de 04 de setembro de 19241.

1.2. O Imposto sobre a Renda e Proventos na Constituição de 1988

A Constituição Federal de 1988 – CF/88 inaugurou um novo momento para o

Direito Tributário Brasileiro, instituindo um sistema jurídico sólido e baseado em

princípios e garantias fundamentais2 assegurados aos contribuintes, insuperáveis

por normas infraconstitucionais e infralegais.

1 Disponível em http://www.receita.fazenda.gov.br/Memoria/irpf/legislacao/legislacao.asp#1923. Acesso em

20 fev 2012. 2 Nesse sentido, citamos os seguintes precedentes do Supremo Tribunal Federal – STF: a) “A RESERVA DE LEI

EM SENTIDO FORMAL QUALIFICA-SE COMO INSTRUMENTO CONSTITUCIONAL DE PRESERVAÇÃO DA INTEGRIDADE DE DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS. - O princípio da reserva de lei atua como expressiva limitação constitucional ao poder do Estado, cuja competência regulamentar, por tal razão, não se reveste de suficiente idoneidade jurídica que lhe permita restringir direitos ou criar obrigações. Nenhum ato regulamentar pode criar obrigações ou restringir direitos, sob pena de incidir em domínio constitucionalmente reservado ao âmbito de atuação material da lei em sentido formal. - O abuso de poder regulamentar, especialmente nos casos em que o Estado atua "contra legem" ou "praeter legem", não só expõe o ato transgressor ao controle jurisdicional, mas viabiliza, até mesmo, tal a gravidade desse comportamento governamental, o exercício, pelo Congresso Nacional, da competência extraordinária que lhe confere o art. 49, inciso V, da Constituição da República e que lhe permite "sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar (...)". Doutrina. Precedentes (RE 318.873-AgR/SC, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.). Plausibilidade

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Em relação ao Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, o

constituinte traçou as regras gerais do tributo, bem como a competência particular

da União para instituí-lo e arrecadá-lo, conforme se infere do artigo 153, inciso III, da

CF/88:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

[...]

III - renda e proventos de qualquer natureza;

§ 2º - O imposto previsto no inciso III:

I - será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na forma da lei;

Seu fato gerador, como visto no texto da CF/88, é a aquisição de renda ou

proventos de qualquer natureza.

Por sua vez, a Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário

Nacional – CTN), absorvida no pela CF/88 com o “status” de Lei Complementar

Nacional, traz, em seu artigo 43, a definição do que viria a ser renda e proventos,

observe-se:

Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:

I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;

II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.

jurídica da impugnação à validade constitucional da Instrução Normativa STN nº 01/2005”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal.Processo nº AC 1033 AgR-QO. Relator: Ministro Celso de Mello. 25 de mai. 2006. Tribunal Pleno. DJ 16 de jun. 2006; e b) “Recurso extraordinário – Emenda Constitucional nº 10/96 – Art. 72, inciso III, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) - Contribuição Social sobre o Lucro (CSLL) – Alíquota de 30% (trinta por cento) - Pessoas jurídicas referidas no § 1º do art. 22 da Lei nº 8.212/91 – Alegada violação ao art. 195, § 6º, da Constituição Federal. 1. O poder constituinte derivado não é ilimitado, visto que se submete ao processo consignado no art. 60, §§ 2º e 3º, da Constituição Federal, bem assim aos limites materiais, circunstanciais e temporais dos §§ 1º, 4º e 5º do aludido artigo. 2. A anterioridade da norma tributária, quando essa é gravosa, representa uma das garantias fundamentais do contribuinte, traduzindo uma limitação ao poder impositivo do Estado. 3. A emenda Constitucional nº 10/96, especialmente quanto ao inciso III do art. 72 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – objeto de questionamento - é um novo texto que veicula nova norma, e não mera prorrogação da emenda anterior. 4. Hipótese de majoração da alíquota da CSSL para as pessoas jurídicas referidas no § 1º do art. 22 da Lei nº 8.212/91. 5. Necessidade de observância do princípio da anterioridade nonagesimal contido no art. 195, § 6º, da Constituição Federal. 6. Recurso Extraordinário a que se nega provimento”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal.Processo nº RE 587008. Relator: Ministro Dias Toffoli. 02 de fev. 2011. Tribunal Pleno. DJe 06 de mai. 2011.

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Em que pese a expressão “de qualquer natureza” vertido nos dispositivos do

artigo 153, inciso III, da CF/88 e do artigo 43, incisos I e II, do CTN, não está o

legislador infraconstitucional autorizado a ampliar os conceitos de renda e proventos,

fatos geradores do Imposto sobre a Renda.

É preciso compreender renda como o efetivo acréscimo ao patrimônio do

contribuinte, afastando a idéia de que qualquer valor recebido pelo sujeito passivo

da obrigação tributária seja passível da tributação.

Nesse sentido, explica José Artur Lima Gonçalves3:

O conceito de renda é pressuposto pela Constituição e implica, inexoravelmente, o confronto entre certas entradas e saídas – dentro de um período de tempo – do qual (confronto) resultará, ou não, um saldo positivo (renda). [...] A dedutibilidade das saídas – despesas – necessárias à efetivação das entradas relevantes não é favor do legislador infraconstitucional (essa dedutibilidade é exigência sistemática da Constituição). O mesmo se dá com prejuízos, que devem ser considerados, por exigência implícita da Constituição, que, ao referir a renda, pressupõe um ‘plus’ patrimonial líquido.

Por isso, não será qualquer valor auferido pelo contribuinte que poderá ser

tributado pelo FISCO – através do IR – mas apenas aqueles que superem “todos os

investimentos e despesas efetuados para a obtenção do ingresso”4.

De acordo com Roque Carraza5,

para o Direito, os conceitos de renda e proventos não coincidem com os da Economia, que considera qualquer acréscimo patrimonial passível de sofrer a tributação em pauta. Nas hostes jurídicas tais conceitos tem uma extensão bem mais restrita: acréscimo patrimonial, experimentado durante certo lapso de tempo , que só pode ser levado à tributação quando atende aos princípios da isonomia, da capacidade contributiva e da não confiscatoriedade - e, portanto, prestigia a vida, a dignidade da pessoa humana e a propriedade, preservando 'o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos' valores supremos que levaram os representantes do Povo Brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte, a inscrevê-los já no Preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil.

E continua6:

3 GONÇALVES, José Artur Lima. Imposto sobre a renda – resultados auferidos no exterior por filiais, sucursais,

controladas e coligadas. RDDT nº 74, novembro/01. pp. 70/81. 4 PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência.

9 ed. rev.atual. – Porto Alegre: Livraria do Advogado: ESMAFE, 2007. p. 707. 5 CARRAZZA, Roque Antônio. Imposto sobre a renda (perfil constitucional e temas específicos). 3 ed. São

Paulo: Malheiros, 2009. p. 53. 6 Idem. p. 57.

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Deveras, parece-nos que dentre os diversos conceitos de renda e proventos de qualquer natureza, fornecido pelas Ciência Econômica, pode o legislador ordinário apenas optar por um deles, e, ainda assim, desde que sua escolha permita compatibilizar a incidência com os princípios constitucionais que norteiam tal tributação, máxime o da capacidade contributiva. É que, de acordo com a Constituição, renda e proventos de qualquer natureza devem representar ganhos ou riquezas novas. Do contrário, não será atendido o princípio da capacidade contributiva.

Assim, a jurisprudência das Cortes nacionais têm repudiado a tributação de

valores que não representem efetivos ganhos ou novas riquezas para o contribuinte,

à exemplo das verbas com natureza indenizatória e os juros moratórios derivados

dessas quantias.

É o que se depreende dos seguintes julgados:

RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. VERBA INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DO TRABALHO. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL (CF, ART. 109, I, PARTE FINAL). ACORDO. PARCELA RETIDA PELA DEVEDORA A TÍTULO DE IMPOSTO DE RENDA. IMPOSSIBILIDADE. NÃO INCIDÊNCIA DE IMPOSTO DE RENDA SOBRE PARCELA INDENIZATÓRIA, AINDA QUE PAGA MEDIANTE PENSIONAMENTO. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

1. Nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal, estão excluídas da competência da Justiça Federal as causas relativas a acidente do trabalho.

2. Os valores recebidos a título de indenização não sofrem a incidência do imposto sobre a renda, pois representam compensação pela perda da capacidade laboral, e não acréscimo patrimonial.

Precedentes.

3. Ainda que a indenização seja paga sob a forma de pensionamento mensal, os pagamentos não perdem a natureza indenizatória, não subsistindo razão para a retenção de imposto de renda na fonte.

Precedente.

4. Recurso especial desprovido.7

***

PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - CORREÇÃO - IMPOSTO DE RENDA - JUROS MORATÓRIOS - CARÁTER INDENIZATÓRIO - ACRÉSCIMO PATRIMONIAL - RELEVÂNCIA - OMISSÃO QUANTO A TESE DEFENDIDA NO RECURSO ESPECIAL.

1. Constatada omissão de tese defendida no recurso especial, merecem acolhida os embargos de declaração.

7 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Não incidência de imposto de renda sobre parcela indenizatória, ainda

que paga mediante pensionamento. Processo nº REsp 1106854/RJ. Relator: Ministro Raul Araújo. 04 de out. 2011. Quarta Turma. DJe 17 de out. 2011.

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2. A distinção feita pela Primeira Seção desta Corte entre danos emergentes e lucros cessantes não se presta para enfrentar a tese da incidência do imposto de renda sobre juros moratórios, considerando-os como lucros cessantes.

3. Juros de mora que fazem parte da indenização e como tal é considerado pelo Código Civil, independentemente do conceito econômico do que seja acréscimo patrimonial.

4. Embargos de declaração acolhidos, sem efeitos infringentes.8

***

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. OMISSÃO. ERRO DE PREMISSA. IMPOSTO DE RENDA SOBRE OS JUROS DE MORA ORIUNDOS DE INDENIZAÇÃO PREVIDENCIÁRIA, E NÃO DE RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. NÃO INCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE DE EFEITOS INFRINGENTES.

1. Os embargos declaratórios somente são cabíveis para modificar o julgado que se apresentar omisso, contraditório ou obscuro, bem como para sanar possível erro material existente no acórdão.

2. Não incide Imposto de Renda sobre os juros de mora oriundos de indenização previdenciária. Precedente: REsp. 1.075.700/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe 17.12.2008.

3. Embargos de declaração acolhidos, sem efeitos infringentes, para sanar a omissão apontada.9

Outrossim, não se pode, ao conceituar renda, confundi-la com os termos

“receita ou rendimento”, inseridos forçosamente pelo FISCO (para satisfazer sua

ânsia arrecadatória) nos §§ 1º e 2º, do artigo 43, do CTN, através da Lei

Complementar nº 104, de 10 de janeiro de 2001, observe-se:

Art. 43. [...]

[...]

§ 1º A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)

§ 2º Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)

8 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Imposto de renda - juros moratórios - caráter indenizatório. Processo nº

EDcl no REsp 1040915/PR. Relatora: Ministra Eliana Calmon. 03 de mai. 2012. Segunda Turma. DJe 14 de jun. 2012. 9 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Imposto de renda sobre os juros de mora oriundos de indenização

previdenciária, e não de reclamatória trabalhista. Não incidência. Processo nº EDcl no AgRg no REsp 1233189/RS. Relator: Ministro Humberto Martins. 17 de abr. 2012. Segunda Turma. DJe 24 de abr. 2012.

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Destaque-se que a expressão receita significa qualquer quantia recebida pelo

contribuinte, o que não se coaduna com os conceitos de renda ou proventos, mesmo

com a amplitude dada pela Constituição.

Aliás, merecem destaque os artigos 109 e 110, do CTN, que vedam a

alteração, pelo legislador ordinário, dos efeitos tributários e conceitos de direito

privado previstos na Constituição:

Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários.

Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.

Ora, como não é qualquer entrada de recursos que pode ser caracterizado

como renda, a inclusão de receitas e rendimentos como base de cálculo do IR,

inseridas pelo legislador na construção da LC nº 104/2001, terminou por ampliar de

forma ilegítima do conceito de renda instituído pela CF/88.

Assim, façamos nossas as palavras de Ives Gandra da Silva Martins10,

informando que:

Pela introdução dos §§ 1º e 2º retrocitados, alarga-se o campo de imposição do referido tributo, com a expressão ‘receita ou rendimento’, o que vale dizer, é acrecentado fato gerador inexistente no texto anterior, qual seja, o correspondente à equiparação de receita e rendimento para efeitos da determinação da disponibilidade econômica ou jurídica. [...] Parece-me, pois, nitidamente inconstitucional a distensão da base de cálculo veiculada pela Lei Complementar nº 104/01.

Sobre o assunto, destacamos que o Supremo Tribunal Federal – STF está

para julgar (julgamento previsto para o 2º semestre de 2012) a Ação Direta de

Inconstitucionalidade nº 2.588, até o momento com 04 (quatro) votos pela

procedência da ADI em apreço (Min. Ellen Gracie, Min. Marco Aurélio, Min.

Sepúlveda Pertence e Min. Ricardo Lewandowski), ou seja, a favor das

manifestações doutrinárias sobre o alargamento inconstitucional do conceito de

renda contidos naqueles dispositivos.

10

MARTINS, Ives Gandra da Silva. Imposto de Renda e o artigo 43 do CTN. RDDT nº 68, maio/01. p. 77/79.

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1.3. Princípios dirigentes do IR

Demais disso, outra característica fundamental na análise do IR é que dito

tributo é norteado pelos os princípios específicos da generalidade, universalidade e

progressividade, previstos no artigo 153, inciso III, § 2º, inciso I, da CF/88.

O primeiro deles – generalidade – é decorrente diretamente do princípio

constitucional da isonomia, inscrito no artigo 5º, caput, da CF/88, bem como da

igualdade tributária, nos termos do artigo 150, inciso II, da CF/88.

Em consonância com dito princípio especial do IR, a tributação deve atingir

todos os que praticarem a hipótese de incidência prevista na CF/88, ou seja,

praticado o fato gerador pelo contribuinte, não pode a União instituir tratamento mais

benéfico a determinado contribuinte, que esteja em condições semelhantes a outro

que não receba similar benesse.

Nas lições de Roque Antônio Carrazza11, o princípio da generalidade “veda

discriminações e privilégios entre contribuintes”, de modo que “alguns contribuintes

fossem total ou parcialmente dispensados de suportar a carga do IR enquanto

outros na mesma situação econômica tivessem que arcar com ela em sua

totalidade.”

A correta compreensão deste princípio será fundamental para que se alcance

a proposição levantada neste trabalho acadêmico, que versa, justamente, sobre a

redução de desigualdades entre contribuintes (pessoas jurídicas de direito privado)

submetidos ao IR. Por isso, muitas serão as vezes em que será o mesmo recordado.

Outro princípio específico do IR é o da universalidade, orientando que este

tributo deve incidir sobre a totalidade dos acréscimos patrimoniais auferidos pelo

contribuinte, durante o período aquisitivo da riqueza tributável.

Sobre a universalidade, explica Mary Elbe Queiroz12:

O sentido mais adequado é que a apuração da base de cálculo do imposto, que deverá ocorrer em um dado instante, abranja o total de rendimentos que for percebido em

11

CARRAZZA, Roque Antônio. Imposto sobre a renda (perfil constitucional e temas específicos). 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 68. 12

QUEIROZ, Mary Elbe. Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. 1 ed. Recife: Manole, 2003. p. 37.

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determinado período de tempo fixado na lei (periodicidade) como necessário para que se possa aferir a real capacidade contributiva dos sujeitos.

O último dos princípios especiais, que orientam o IR, é a progressividade. De

acordo com esta regra constitucional, o FISCO deve tributar os contribuintes de

forma proporcional ao que tenha auferido em termos de renda ou proventos.

Em outras palavras, quanto maior a renda (base de cálculo) auferida por

determinado contribuinte, progressivamente maior será a incidência (alíquota),

resultando em uma maior carga tributária a ser recolhida do contribuinte.

Acaso pudéssemos transformar o direito em regra matemática, teríamos

como fórmula principal “T = BC x %”, donde “T” significa tributo (IR) arrecadado,

“BC” a base de cálculo (renda positivamente auferida), e “%” a alíquota aplicável

para dado contribuinte.

Aumentando a alíquota (%), para diferentes faixas de contribuintes, assim

entendidos os que apresentem maior base de cálculo tributável (BC), verificamos a

tributação progressiva do IR.

Assim, a regra da progressividade, que a primeira vista poderia parecer

injusta, nada mais é do que a aplicação rasteira do princípio da igualdade ou

isonomia, no modelo aristotélico, segundo o qual deve a lei tratar os iguais de forma

igual, e os diferentes de maneira diversa.

Nesse sentido, nos diz Roque Antônio Carrazza13, que:

o critério da progressividade é consectário natural dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, pois exige que contribuintes com maiores rendimentos recebam tratamento fiscal mais gravoso que os de pequeno porte econômico. Mas não apenas isso: melhorando a distribuição de renda, auxilia a concretização da igualdade material (concreta, substancial), consagrada em nosso Estado Democrático de Direito, plasmado pela Constituição de 1988.

A progressividade também possui pertinência temática com nosso trabalho,

na medida em que pode orientar uma melhor política de incentivos fiscais, como

será visto no momento apropriado.

13

CARRAZZA, Roque Antônio. Imposto sobre a renda (perfil constitucional e temas específicos). 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2009. pp. 72/73.

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Por fim, o IR está regulamentado exaustivamente no Decreto nº 3.000, de 26

de março de 1999, também conhecido como Regulamento de Imposto sobre a

Renda de 1999 – RIR/99, consolidando as regras esparsas pela legislação ordinária

em um único texto, que deve ser observado pelo aplicador do direito, sejam estes

estudiosos do assunto, ou os que vivenciam a prática tributária em seu dia-a-dia.

Devemos observar, contudo, que a análise desta norma infralegal não pode

prevalecer sobre as normas legais e constitucionais em nosso sistema tributário

nacional, sob pena de incorrer em inconstitucionalidade.

1.4. Demais princípios tributários aplicáveis

O arcabouço constitucional do sistema tributário nacional, elenca limitações

ao poder de tributar, ou princípios, que devem ser considerados na aplicação e

interpretação dos tributos pelo operador do direito, dentre os quais mencionamos a

legalidade, a irretroatividade, a anterioridade, a anterioridade nonagesimal, a

igualdade, a capacidade contributiva e a vedação ao confisco.

Como o próprio nome quer significar, as limitações constitucionais ao poder

de tributar, impedem que os entes federativos surpreendam os contribuintes com

exações repentinas e descabidas, representando verdadeiras garantias

fundamentais em favor dos sujeitos passivos das obrigações tributárias.

Assim, eventuais violações a essas garantias, praticadas por agentes públicos

vinculados ao FISCO, podem ser afastadas de ofício por autoridade fazendária

superior ou mediante a proteção do Poder Judiciário.

A legalidade tributária, inserida no artigo 150, inciso I, da CF/8814, e no artigo

97, do CTN15, determina que os entes federativos não podem instituir ou aumentar

tributos sem que seja produzida uma lei que os estabeleça ou majore.

14 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao

Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

15 Art. 97. Somente a lei pode estabelecer: I - a instituição de tributos, ou a sua extinção; II - a majoração de

tributos, ou sua redução, [...];

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Além disso, referida lei deve ter natureza de lei complementar quando os

tributos a serem criados sejam o Imposto sobre Grandes Fortunas – IGF (artigo 153,

inciso VII, CF/88), empréstimos compulsórios (artigo 148, CF/88), ou os impostos

residuais e extraordinários (artigo 154, incisos I e II, CF/88).

Fogem, à regra da legalidade, os tributos responsáveis pela manutenção da

ordem econômica nacional, ou seja, aqueles que são responsáveis pela estabilidade

da economia, que não podem aguardar o demorado processo legislativo praticado

no Congresso Nacional.

Assim, constituem exceções à legalidade tributária, os impostos relativos ao

comércio internacional (Importação – II, e Exportação – IE), o Imposto sobre

Produtos Industrializados – IPI, o Imposto sobre Operações Financeiras – IOF,

dentre outros.

Pela regra da irretroatividade, inserida no artigo 150, inciso III, alínea “a”,

CF/8816, não estão, as Fazendas Públicas, autorizadas a cobrar tributos em relação

a eventos ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou

aumentado.

Isso significa, que mesmo após a criação da norma tributária, o FISCO não

poderá cobrar impostos, taxas, ou outras espécies de tributos, antes que se inicie o

termo de vigência da norma, sob pena de invalidade da cobrança.

Mesmo considerando que a norma tributária já seja vigente, o princípio da

anterioridade, nos termos do artigo 150, inciso III, alínea “b”, CF/8817, impede a

cobrança do tributo no mesmo exercício financeiro de sua instituição ou majoração.

Como os exercícios financeiros acabam por coincidir com os anos civis,

havendo a edição e vigência de lei tributária criando ou aumentando tributos, esta

norma só terá eficácia no ano seguinte à sua publicação.

16 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao

Distrito Federal e aos Municípios: III - cobrar tributos: a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início

da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;

17 Art. 150. [...]: III – [...]: b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou

aumentou;

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Novamente, em relação à anterioridade, devemos observar as exceções aos

tributos responsáveis pelo controle econômico e político, como o II, IE, IPI, IOF,

Imposto Extraordinário de Guerra – IEG, entre outros.

Para evitar que os entes federados editem normas tributárias no final de um

ano, para surpreender os contribuintes no início do exercício subseqüente, previu o

legislador constituinte a limitação denominada anterioridade nonagesimal, também

chamada mitigada ou especial, descrita no artigo 150, inciso III, alínea “c”, CF/8818.

Segundo este princípio, o FISCO deve aguardar por 90 (noventa) dias, após a

publicação da lei instituidora ou que tenha majorado o tributo, para que possa iniciar

a sua cobrança de quem pratique os fatos geradores nela prevista.

Aplicam-se à anterioridade nonagesimal as mesmas exceções já referidas

para a legalidade e anterioridade normal.

O princípio da igualdade tributária, previsto no artigo 150, inciso II, CF/8819,

visa assegurar tratamento isonômico aos contribuintes que estejam em situação

equivalente, representando a clássica exposição das idéias aristotélicas de que

deve-se tratar os iguais de maneira igual, e os diferentes de forma distinta.

No tocante aos tributos de competência da União, a primeira manifestação

constitucional atinente à igualdade ou isonomia tributária que merece destaque é o

disposto no artigo 151, inciso I, da CF/88, expressis:

Art. 151. É vedado à União:

I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País;

Como se compreende do texto constitucional supra citado, pode haver

tributação diferenciada através da concessão de incentivos fiscais, desde que

voltados à promoção da redução de desigualdades regionais.

18

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: III - cobrar tributos: c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; 19 Art. 150. [...]: II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação

equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

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Essa permissão se repete no texto da Carta Magna no artigo 170, inciso VII:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

VII - redução das desigualdades regionais e sociais;

Além dessa hipótese, o legislador constituinte permitiu a discriminação, ou

seja, o tratamento favorecido com o objetivo de potencializar as pequenas

empresas, nos termos do artigo 170, inciso IX, da CF/88:

Art. 170. [...]

IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.

Como se vê, para atender os ideais de igualdade, algumas vezes temos que

procurar aplicar benefícios a determinados contribuintes, em detrimento de outros,

para assegurar a construção de uma economia mais justa e desenvolvida por igual.

Desse princípio deriva a limitação à capacidade contributiva, esculpida no

artigo 145, §1º, da CF/88, que determina a graduação da tributação de acordo com a

potencialidade de cada contribuinte para recolher dinheiro aos cofres públicos.

Por derradeiro, temos o princípio da vedação ao confisco, inscrito no artigo

150, inciso IV, CF/8820, segundo o qual o FISCO está impossibilitado de tributar

montantes que ultrapassem os limites confiscatórios da propriedade do contribuinte.

1.5. As diferentes formas de apuração do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas

Antes de prosseguirmos, duas colocações se fazem necessárias: i)

propositalmente não falaremos da forma de apuração para as pessoas físicas, tendo

em vista que nosso trabalho não versa sobre estes contribuintes do IR; e ii) seria

displicente falar em Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas de Direito

Privado, já que as pessoas jurídicas de direito público estariam imunizadas deste

tributo, em face da regra contida no artigo 150, inciso VI, alínea “a”, da CF/88.

20 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao

Distrito Federal e aos Municípios: IV - utilizar tributo com efeito de confisco;

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Assim, cinco são as formas, ou ficções legais, para apuração do IR das

pessoas jurídicas, a saber: i) lucro real; ii) lucro presumido; iii) lucro arbitrado; iv)

simples nacional; e v) empreendedor individual.

1.5.1. Lucro Real, Lucro Presumido e Lucro Arbitrado

Como regra geral, a apuração pela sistemática do lucro real determina que o

contribuinte deve recolher, sobre os valores que efetivamente lucrou, um valor de

15% (quinze por cento), se o lucro não foi superior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais),

com um adicional de 10% (dez por cento) sobre o valor do lucro que exceder os R$

20.000,00 (vinte mil reais), nos termos do artigo 228, e parágrafo único do RIR/9921.

O lucro da empresa, resumidamente, pode ser obtido por uma fórmula

simples: L = R – D; onde (L) é o lucro real da empresa, (R) importa o total das

receitas auferidas e (D) equivale ao somatório das despesas e custos dedutíveis,

estes últimos custos devidamente comprovados (notas fiscais, recibos, etc.) e

compatíveis com a atividade da empresa.

Assim, colocando didaticamente, temos as tabelas que se seguem,

demonstrando como deve ser calculado o tributo sobre uma empresa fictícia X:

Apuração do Lucro da Empresa X Receita de venda de produtos R$ 90.000,00 Receita de prestação de serviços R$ 80.000,00 Total de receitas da empresa X R$ 170.000,00 Total de despesas/custos dedutíveis - R$ 120.000,00 Lucro (total de receitas – total de despesas/custos)

R$ 50.000,00

Adição de despesas não dedutíveis R$ 5.000,00 Lucro Real (Lucro + Despesas não dedutíveis) R$ 55.000,00

IRPJ (Lucro Real) Lucro Real R$ 55.000,00 Tributo devido (IRPJ à alíquota de 15%) R$ 8.250,00 Adicional sobre excedente de R$ 20.000,00 (10% de R$ 25.000,00)

R$ 2.500,00

21

Art. 228. O imposto a ser pago mensalmente na forma desta Seção será determinado mediante a aplicação, sobre a base de cálculo, da alíquota de quinze por cento (Lei nº 9.430, de 1996, art. 2º, § 1º). Parágrafo único. A parcela da base de cálculo, apurada mensalmente, que exceder a vinte mil reais ficará sujeita à incidência de adicional do imposto à alíquota de dez por cento (Lei nº 9.430, de 1996, art. 2º, § 2º)

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Total de IRPJ R$ 10.750,00

Para o cálculo do tributo sob a égide do lucro presumido, deve o empresário

utilizar diferente forma de apuração do IRPJ, presumindo que as receitas constituem

o lucro para o exercício, aplicando diferentes alíquotas, a depender da origem da

receita ser em relação à prestação de serviços ou comercialização de produtos.

Nessa modalidade, não se leva em consideração as despesas obtidas,

presumindo que todo o apurado pela empresa deve ser o seu lucro, consoante as

regras contidas nos artigos 518 e seguintes, do RIR/9922.

Usando os mesmos dados fictos, criados para o lucro real da empresa X,

temos, agora, como comparar as duas formas de apuração, consoante as tabelas

abaixo:

Apuração do Lucro Presumido da Empresa X Receita de venda de produtos R$ 90.000,00 Receita de prestação de serviços R$ 80.000,00 Total de receitas da empresa X R$ 170.000,00 Lucro presumido na venda (8% de R$ 90.000,00) R$ 7.200,00 Lucro presumido nos serviços (32% de R$ 80.000,00) R$ 25.600,00 Lucro presumido no período R$ 32.800,00

IRPJ (Lucro Presumido) Lucro Presumido R$ 32.800,00 Tributo devido (IRPJ à alíquota de 15%) R$ 4.920,00 Adicional sobre excedente de R$ 20.000,00 (10% de R$ 12.800,00)

R$ 1.280,00

22

Art. 518. A base de cálculo do imposto e do adicional (541 e 542), em cada trimestre, será determinada mediante a aplicação do percentual de oito por cento sobre a receita bruta auferida no período de apuração, observado o que dispõe o § 7o do art. 240 e demais disposições deste Subtítulo (Lei no 9.249, de 1995, art. 15, e Lei no 9.430, de 1996, arts. 1o e 25, e inciso I). Art. 519. Para efeitos do disposto no artigo anterior, considera-se receita bruta a definida no art. 224 e seu parágrafo único. § 1º Nas seguintes atividades, o percentual de que trata este artigo será de (Lei no 9.249, de 1995, art. 15, § 1o): I - um inteiro e seis décimos por cento, para atividade de revenda, para consumo, de combustível derivado de petróleo, álcool etílico carburante e gás natural; II - dezesseis por cento para a atividade de prestação de serviço de transporte, exceto o de carga, para o qual se aplicará o percentual previsto no caput; III - trinta e dois por cento, para as atividades de: a) prestação de serviços em geral, exceto a de serviços hospitalares; b) intermediação de negócios; c) administração, locação ou cessão de bens, imóveis, móveis e direitos de qualquer natureza.

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Total de IRPJ R$ 6.200,00

Nos exemplos trazidos a este texto, a empresa X pagaria menos tributo

(IRPJ) usando a forma de apuração do Lucro Presumido (R$ 6.200,00), contra os

valores para pagamento do IRPJ no Lucro Real (R$ 10.750,00).

Todavia, é importante destacar que os exemplos utilizados não constituem a

regra geral, e que cada empresa deve efetuar a sua opção pela sistemática de

apuração, conforme os seus dados financeiros.

A vantagem da opção pelo lucro presumido existe quando o empresário

possui lucro maior que o percentual elencado na legislação para essa forma de

apuração, tendo em vista que, independente do percentual de lucro verdadeiro, ele

só pagará IRPJ sobre o lucro que informou de forma presumida.

Essa modalidade de apuração do IRPJ obriga a empresa a recolher o tributo,

mesmo que não tenha obtido lucro, ou seja, na hipótese de suas despesas tenham

sido superiores às suas receitas, chamado de prejuízo.

A opção pela sistemática do lucro real ou lucro presumido deve ser efetuada

uma vez ao ano pelo empresário, no mês de janeiro, observando a tendência de

receitas da empresa, e ambas as formas não dispensam o contribuinte da

manutenção da escrituração contábil apropriada, que compõe a obrigação acessória

do tributo.

Além disso, o RIR/99 traz limitações para a adesão à forma de apuração pelo

lucro real e pelo lucro presumido.

Com efeito, não podem optar pelo lucro presumido as empresas que possuam

receita bruta total, no ano calendário anterior, superior a 48 (quarenta e oito) milhões

de reais, como disposto no artigo 14, da Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 199823.

23 Art. 14. Estão obrigadas à apuração do lucro real as pessoas jurídicas:

I - cuja receita total, no ano-calendário anterior seja superior ao limite de R$ 48.000.000,00 (quarenta e oito milhões de reais), ou proporcional ao número de meses do período, quando inferior a 12 (doze) meses; (Redação dada pela Lei nº 10.637, de 2002) II - cujas atividades sejam de bancos comerciais, bancos de investimentos, bancos de desenvolvimento, caixas econômicas, sociedades de crédito, financiamento e investimento, sociedades de crédito imobiliário, sociedades corretoras de títulos, valores mobiliários e câmbio, distribuidoras de títulos e valores mobiliários,

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Outrossim, ainda segundo o mesmo dispositivo, devem optar pelo lucro real

as empresas que: a) atuem como instituições bancárias; b) tenham recebido lucros,

rendimentos ou ganhos de capital oriundos do exterior; c) usufruam de benefícios

fiscais relativos à isenção ou redução do imposto; d) explorem as atividades de

fundos de investimentos e créditos; e) sociedades por ações; e f) sociedades com

participação, em seu capital, de entidades da administração pública.

Por fim, o Lucro Arbitrado não é uma opção de apuração do contribuinte, vez

que deve ser aplicado pelo FISCO quando aquele não efetua a correta escrituração

de sua contabilidade, de forma acidental ou intencional.

Nesses casos, quando se conhece a receita bruta sonegada, é aplicada a

alíquota normal, acrescida de um percentual de 20% (vinte por cento) sobre esta

receita, ou seja, o dobro do adicional normalmente aplicado, para efeito punitivo do

contribuinte, conforme determina o artigo 16, da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de

1995:

Art. 16. O lucro arbitrado das pessoas jurídicas será determinado mediante a aplicação, sobre a receita bruta, quando conhecida, dos percentuais fixados no art. 15, acrescidos de vinte por cento.

Todavia, quando não se pode alcançar um valor para a receita bruta da

empresa, o FISCO pode arbitrar um valor para esta, aplicando as regras inseridas

no artigo 51, da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995:

Art. 51. O lucro arbitrado das pessoas jurídicas, quando não conhecida a receita bruta, será determinado através de procedimento de ofício, mediante a utilização de uma das seguintes alternativas de cálculo:

empresas de arrendamento mercantil, cooperativas de crédito, empresas de seguros privados e de capitalização e entidades de previdência privada aberta; III - que tiverem lucros, rendimentos ou ganhos de capital oriundos do exterior; IV - que, autorizadas pela legislação tributária, usufruam de benefícios fiscais relativos à isenção ou redução do imposto; V - que, no decorrer do ano-calendário, tenham efetuado pagamento mensal pelo regime de estimativa, na forma do art. 2° da Lei n° 9.430, de 1996; VI - que explorem as atividades de prestação cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção e riscos, administração de contas a pagar e a receber, compras de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring). VII - que explorem as atividades de securitização de créditos imobiliários, financeiros e do agronegócio. (Incluído pela Lei nº 12.249, de 2010)

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29

I - 1,5 (um inteiro e cinco décimos) do lucro real referente ao último período em que pessoa jurídica manteve escrituração de acordo com as leis comerciais e fiscais, atualizado monetariamente;

II - 0,04 (quatro centésimos) da soma dos valores do ativo circulante, realizável a longo prazo e permanente, existentes no último balanço patrimonial conhecido, atualizado monetariamente;

III - 0,07 (sete centésimos) do valor do capital, inclusive a sua correção monetária contabilizada como reserva de capital, constante do último balanço patrimonial conhecido ou registrado nos atos de constituição ou alteração da sociedade, atualizado monetariamente;

IV - 0,05 (cinco centésimos) do valor do patrimônio líquido constante do último balanço patrimonial conhecido, atualizado monetariamente;

V - 0,4 (quatro décimos) do valor das compras de mercadorias efetuadas no mês;

VI - 0,4 (quatro décimos) da soma, em cada mês, dos valores da folha de pagamento dos empregados e das compras de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem;

VII - 0,8 (oito décimos) da soma dos valores devidos no mês a empregados;

VIII - 0,9 (nove décimos) do valor mensal do aluguel devido.

Após arbitrar um valor para a receita bruta da empresa fiscalizada, deve o

ente tributante aplicar as mesmas regras de alíquota contidas no artigo 16, da Lei nº

9.249/95, já expostas no parágrafo imediatamente anterior.

1.5.2. Simples Nacional

O Simples Nacional, foi criado pela Lei Complementar nº 123, de 14 de

dezembro de 2006, com o objetivo de fornecer tratamento tributário diferenciado,

com a redução a carga tributária suportada pelas microempresas e empresas de

pequeno porte.

Como regra geral, as empresas que atuem com comércio, indústria,

prestação de serviços e locação de bens móveis, e que tenham faturamento até R$

3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais), podem optar pelo Simples

Nacional, recolhendo de forma unificada os seguintes tributos: a) IRPJ; b)

Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL; c) Contribuição para

Financiamento da Seguridade Social – COFINS; d) Programa de Integração Social e

o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público – PIS/PASEP; e)

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Contribuição Patronal Previdenciária – CPP; f) Imposto sobre Operações Relativas à

Circulação de Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços de Transporte

Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS (quando devido); e g)

Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS (quando devido).

Para definir as alíquotas utilizadas para o cálculo dos tributos devidos no

regime do Simples Nacional (somando todas as alíquotas dos tributos acima

referidos), a LC nº 123/2006 traz anexos, diferenciando a tributação por setor de

atividade e faixa de faturamento, com percentuais variando entre 4% (quatro por

cento) e 17,42% (dezessete inteiros e quarenta e dois décimos por cento).

À título de IRPJ, o Simples Nacional possui variação de alíquotas entre 0%

(zero por cento) – para empresas, independente do ramo de atividade, com

faturamento anual de até R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) – e 6,12%

(seis inteiros e doze décimos por cento) – para empresas atuando na prestação de

serviços, com faturamento entre R$ 3.420.000,01 (três milhões, quatrocentos e vinte

mil reais e um centavo) a R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais).

Tomemos como exemplo, assim, para o cálculo do valor devido aos cofres

públicos em uma situação hipotética, uma empresa que atue no comércio, e que

tenha auferido uma receita bruta, nos últimos 12 (doze) meses, de R$ 1.000.000,00

(um milhão de reais).

De acordo com a seguinte parte da tabela contida no Anexo I, da LC nº

123/2006, estas são as alíquotas de tributos a recolher pela empresa Y:

Alíquotas e Partilha do Simples Nacional – Comércio

Receita Bruta em 12 meses

(em R$) Alíquota IRPJ CSLL COFINS PIS/PASEP CPP ICMS

De 900.000,01 a 1.080.000,00

8,28% 0,38% 0,38% 1,15% 0,27% 3,28% 2,82%

Nesse caso, supondo, ainda, que a empresa Y tenha percebido uma receita

bruta em agosto/2012 de R$ 90.000,00 (noventa mil reais), o cálculo do montante de

tributos a pagar obedece a seguinte regra:

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Receita Bruta em agosto/2012 (em

R$)

Alíquota

(soma de todos os tributos)

IRPJ CSLL COFINS PIS/PASEP CPP ICMS

90.000,00 8,28% 0,38% 0,38% 1,15% 0,27% 3,28% 2,82%

Tributo devido (em R$)

7.452,00 342,00 342,00 1.035,00 243,00 2.952,0

0 2.538,0

0

Percebe-se que, nesse painel imaginário, a empresa Y suportará uma

tributação total de 8,28% (oito inteiros e vinte e oito décimos por cento), pagando,

apenas, R$ 342,00 (trezentos e quarenta e dois reais) à título de IRPJ, este último

com a alíquota de 0,38% (trinta e oito décimos por cento).

Embora esse enquadramento no Simples Nacional seja bem atrativo para as

empresas, em especial no tocante ao IRPJ, existem regras rígidas que vedam a

adesão a essa sistemática de apuração tributária pelas empresas elencadas no

artigo 17, da LC nº 123/2006:

Art. 17. Não poderão recolher os impostos e contribuições na forma do Simples Nacional a microempresa ou a empresa de pequeno porte:

I - que explore atividade de prestação cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia, gestão de crédito, seleção e riscos, administração de contas a pagar e a receber, gerenciamento de ativos (asset management), compras de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring);

II - que tenha sócio domiciliado no exterior;

III - de cujo capital participe entidade da administração pública, direta ou indireta, federal, estadual ou municipal;

V - que possua débito com o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, ou com as Fazendas Públicas Federal, Estadual ou Municipal, cuja exigibilidade não esteja suspensa;

VI - que preste serviço de transporte intermunicipal e interestadual de passageiros;

VII - que seja geradora, transmissora, distribuidora ou comercializadora de energia elétrica;

VIII - que exerça atividade de importação ou fabricação de automóveis e motocicletas;

IX - que exerça atividade de importação de combustíveis;

X - que exerça atividade de produção ou venda no atacado de:

a) cigarros, cigarrilhas, charutos, filtros para cigarros, armas de fogo, munições e pólvoras, explosivos e detonantes;

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b) bebidas a seguir descritas:

1 – alcoólicas;

2 – refrigerantes, inclusive águas saborizadas gaseificadas;

3 – preparações compostas, não alcoólicas (extratos concentrados ou sabores concentrados), para elaboração de bebida refrigerante, com capacidade de diluição de até 10 (dez) partes da bebida para cada parte do concentrado;

4 – cervejas sem álcool;

XI - que tenha por finalidade a prestação de serviços decorrentes do exercício de atividade intelectual, de natureza técnica, científica, desportiva, artística ou cultural, que constitua profissão regulamentada ou não, bem como a que preste serviços de instrutor, de corretor, de despachante ou de qualquer tipo de intermediação de negócios;

XII - que realize cessão ou locação de mão-de-obra;

XIII - que realize atividade de consultoria;

XIV - que se dedique ao loteamento e à incorporação de imóveis;

XV - que realize atividade de locação de imóveis próprios, exceto quando se referir a prestação de serviços tributados pelo ISS;

XVI - com ausência de inscrição ou com irregularidade em cadastro fiscal federal, municipal ou estadual, quando exigível.

Dita limitação tem provocado inúmeras batalhas judiciais, tanto para manter

as empresas que já se beneficiam desta forma de apuração e recolhimento

tributário, quanto para incluir empresas que não estão elencadas no rol taxativo, do

artigo 17, da LC nº 123/2006.

O intuito do legislador, portanto, foi desonerar os micro e pequenos

empresários em atividades consideradas importantes para a economia local e

geração de empregos, para que possam desenvolver economicamente suas

empresas até que não necessitem mais desse incentivo legal, e passem a recolher

os seus tributos pela sistemática regular, optando, em relação ao IRPJ, pelo lucro

real ou presumido.

Assim, a LC nº 123/2006 procura fazer cumprir o disposto no artigo 170,

inciso IX, da CF/88:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

[...]

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IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.

O Simples Nacional representa um avanço na proteção dos interesses dos

contribuintes de pequeno porte, que possuem situação frágil no meio competitivo

nacional, e que, sem receber ditos incentivos, terminariam por encerrar suas

atividades antes do primeiro ano.

Não se pode caracterizar, outrossim, qualquer violação ao princípio da

isonomia tributária, já que a existência do Simples Nacional se deve para a proteção

dos interesses previstos na própria Constituição, como visto acima.

Por constituir significativo benéfico em favor dessas pequenas empresas, não

entendemos possível a concessão de outros incentivos fiscais para os contribuintes

que se enquadrem na forma de apuração pelo Simples Nacional.

1.5.3. Microempreendedor individual – MEI

A última forma de apuração tributária para as pessoas jurídicas foi introduzida

no corpo da LC nº 123/2006, através da Lei Complementar nº 128, de 19 de

dezembro de 2008 – LC nº 128/2008, e é denominada Microempreendedor individual

– MEI.

Esta reforma legislativa teve por escopo a retirada de milhões de pequenos

negociantes da informalidade, oferecendo vantagens fiscais e securitárias aos

aderentes, além de benefícios como a gratuidade de profissionais contábeis durante

o primeiro ano de adesão.

Nesta nova modalidade de pessoa jurídica, a carga tributária é reduzida ao

pagamento mensal de 5% (cinco por cento) do salário mínimo para o Instituto

Nacional do Seguro Social – INSS, acrescidos de R$ 5,00 (cinco reais) se o

empreendedor for prestador de serviços e R$ 1,00 (um real) se o mesmo atuar como

comerciante ou industria (manufatura).

O pagamento destes valores assegura ao empreendedor individual cobertura

aos diversos benefícios previdenciários, a exemplo do auxílio-doença, da

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aposentadoria por idade, do salário-maternidade após carência, pensão por morte à

sua família e auxilio reclusão.

Outro benefício é a contratação de um funcionário com baixo custo, devendo

o empreendedor recolher, apenas, 3% (três por cento) para a previdência e 8% (oito

por cento) ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS.

Como se percebe, esta modalidade de empresa, está dispensada (isenta) do

pagamento dos tributos normalmente suportados, até mesmo pelos optantes do

Simples Nacional, como IRPJ, COFINS, PIS/PASEP, entre outros.

Novamente, estamos diante de situação que enaltece o disposto no artigo

170, inciso IX, da CF/88, e que não ofende o princípio da isonomia tributária.

1.6. Limitações aos incentivos somente em benefício das pessoas

jurídicas que arrecadam sob a ótica do lucro real

Por opção do legislador, os incentivos fiscais são concedidos às pessoas

jurídicas que apuram o tributo sob a regra do lucro real, não se verificando a mesma

opção para as demais formas de apuração.

Isso acontece desde 1998, quando a Lei nº 9.718/98, introduziu limitação para

que as pessoas jurídicas que optem por forma de apuração diversa da sistemática

do lucro real, como transcrição integral no RIR/99, observe-se:

Lei nº 9.718/98

Art. 14. Estão obrigadas à apuração do lucro real as pessoas jurídicas:

IV - que, autorizadas pela legislação tributária, usufruam de benefícios fiscais relativos à isenção ou redução do imposto;

RIR/99

Art. 246. Estão obrigadas à apuração do lucro real as pessoas jurídicas (Lei nº 9.718, de 1998, art. 14):

IV - que, autorizadas pela legislação tributária, usufruam de benefícios fiscais relativos à isenção ou redução do imposto;

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Impende verificar que até 31/12/1997, era possível usufruir de benefícios

fiscais, mesmo sendo optante da apuração pelo lucro presumido, o que foi cassado

pelo artigo 10, da Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 199724.

A limitação legal é clara e nos parece justa em relação às empresas que

gozam dos benefícios resultantes das sistemáticas de apuração pelo Simples

Nacional e MEI, já que se percebe grande renúncia fiscal por parte da União em

relação a estas formas empresariais, especialmente em relação ao IRPJ, objeto do

nosso estudo neste trabalho acadêmico.

Além disso, como já demonstrado, esses incentivos concedidos aos

pequenos empresários são um sucedâneo natural das determinações programáticas

do texto do artigo 170, inciso IX, da CF/88, como já exposto na neste trabalho,

quando tratados os princípios norteadores do direito tributário.

Contudo, temos que traçar algumas considerações sobre a exclusão de

benefícios fiscais para as empresas que adotam a sistemática de apuração do lucro

presumido, em especial para perceber se este impedimento provoca injustiça ou

afronta os princípios gerais tributários e os específicos do IR.

A primeira questão a ser analisada, quando verificamos a diferenciação na

concessão de benefícios fiscais entre contribuintes que apuram o IRPJ por

sistemáticas diversas (lucro real ou presumido), seria uma possível violação ao

princípio da isonomia tributária.

Afinal, apurar o IRPJ através da metodologia do lucro presumido constitui um

incentivo fiscal para a empresa que efetua essa opção?

Como visto anteriormente, a opção pelo lucro presumido pode ser uma boa

estratégia para pagar menos IRPJ que o devido pela sistemática do lucro real.

Todavia, um importante fato a ser considerado é a situação do empresário

optante do lucro presumido sofrer prejuízo contábil, ou seja, ter mais despesas que

receitas, ou mesmo na situação das despesas se igualarem às despesas da

empresa.

24

Art. 10. Do imposto apurado com base no lucro arbitrado ou no lucro presumido não será permitida qualquer dedução a título de incentivo fiscal.

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Nessas hipóteses, a empresa terá que recolher IRPJ, mesmo tendo que tirar

capital de suas reservas financeiras, se as possuir. Observe-se, ainda, que não

necessariamente a empresa precisa ter as suas despesas iguais às suas receitas,

para que o empresário sofra um prejuízo, já que o pagamento do tributo sairá dos

cofres da empresa, contando como uma “despesa”, após as despesas não-

tributárias serem contabilizadas.

O FISCO, por outro lado, fica em uma situação confortável, pois terá,

independentemente das receitas auferidas pela empresa, e variações de mercado,

direito a uma arrecadação fixa e pré-estabelecida, sem ter que efetuar maiores

cálculos.

O lucro presumido é, antes de tudo, um método de facilitar o recolhimento de

IRPJ, bem como a fiscalização tributária.

Outrossim, destacamos que a faculdade de apurar pelo lucro presumido

constitui um incentivo a não-sonegação tributária, visto que o empresário, tendo que

pagar menos IRPJ, é desestimulado de praticar qualquer conduta delituosa.

Desse modo, o empresário que opta pelo lucro presumido está assumindo

mais um risco, que um benefício fiscal, embora se saiba que, correndo tudo como

planejado, pode ser mais vantajosa essa opção.

Devemos considerar, ainda, que a adoção do lucro presumido pela empresa,

em tempos de graves crises financeiras internacionais e concorrência desleal

(China), através de mecanismos assimilados ao “dumping”25, reverte uma situação

que seria mais favorável ao lucro presumido, em algo desvantajoso ou arriscado.

25 “O conceito atual de dumping está expresso no artigo 2 do Acordo sobre a Implementação do Artigo VI do

Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio 1994, ou simplesmente Acordo Antidumping (AAD). Tal artigo dispõe

que: Para as finalidades do presente Acordo, considera-se haver prática de dumping, isto é, oferta de um

produto no comércio de outro país a preço inferior a seu valor normal, no caso do preço de exportação do

produto ser inferior àquele praticado, no curso normal das atividades comerciais, para o mesmo produto

quando destinado ao consumo do país exportador. Para que o dumping seja caracterizado, é necessário haver

comprovação do dano material à industria doméstica já estabelecida ou o retardamento na implantação de

uma industria, bem como do nexo causal, ou seja, o dano ou a ameaça de dano à industria doméstica – aqui

entendida como a totalidade dos produtores nacionais de produto similar ao importado ou conjunto de

produtores cuja mercadoria em análise constitua parcela significativa da produção nacional – deve ser

necessariamente resultante do dumping.” BARROS, Maria Carolina Mendonça de. Antidumping e

protecionismo. São Paulo: Aduaneiras, 2003. p. 21.

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Além disso, recorde-se que a opção por uma ou outra forma de apuração

pode ser realizada anualmente, não implicando em uma escolha definitiva e

irrevogável.

Finalmente, cumpre destacar um dado interessante colhido do sitio eletrônico

da Secretaria da Receita Federal do Brasil – SRFB26, que informa que a

arrecadação do exercício 2011, de IRPJ, estava assim dividida:

Contribuintes que Apuram IRPJ

pelo Lucro Real Contribuintes que Apuram IRPJ

pelo Lucro Presumido Valor (em

milhões de R$) % (do total da arrecadação)

Valor (em milhões de R$)

% (do total da arrecadação)

63.970 61,48 22.356 21,48 Como a arrecadação através do lucro real compreende 61,48% (sessenta e

um inteiros e quarenta e oito décimos por cento), contra os 21,48% (vinte e um

inteiros e quarenta e oito décimos por cento) dos contribuintes que arrecadam pela

sistemática do lucro presumido.

Ora, como a arrecadação de IRPJ através do lucro real é três vezes superior

a apuração pelo lucro presumido, a concessão de incentivos fiscais para empresas

que apurem pela primeira forma implica em renúncia fiscal muito superior que em

relação aos contribuintes que optem pelo lucro presumido.

Nessa questão, outro fator importante a ser verificado é que, em face da

complexa escrituração e regras para a apuração sob a sistemática do lucro real,

“aproximadamente 80% das empresas optam pelo lucro presumido e apenas 20%

pelo lucro real (exclui-se desse número as optantes pelo Simples Federal)”27.

Desse modo, como os benefícios fiscais se aplicam apenas às empresas que

apuram através do lucro real, a maior parte dos contribuintes de IRPJ não têm

acesso a esses incentivos, em face das limitações legais vigentes.

Destaque-se que, afora os valores das receitas auferidas por estas empresas,

normalmente não existem outras diferenças que justifiquem a concessão de

26

Disponível em: http://www.receita.fazenda.gov.br/publico/arre/2011/AnalisemensalDez11.pdf. Acesso em 19/06/2012. pg. 23. 27

MACHADO, Charles M. Lucro real x Lucro presumido. Disponível em: http://www.machadoc.com.br/informativos/informativo52.htm. Acesso em: 25 de jul. 2012.

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incentivos às empresas que recolhem IRPJ por meio das regras do lucro real, mas

não às que adotam o lucro presumido.

Trata-se, pois, de dupla desvantagem para as empresas que são tributadas

pela sistemática do lucro presumido, tendo em vista a quebra ao princípio da

isonomia/igualdade tributária, além do risco de sofrer prejuízo fiscal e, mesmo assim,

ter que arcar com IRPJ.

Por isso, entendemos que a opção do contribuinte pela sistemática do lucro

presumido não constitui vantagem sobre os contribuintes que optam pelo lucro real,

ao contrário, pode representar mais desvantagem.

Defendemos, portanto, que a opção pelo lucro real ou presumido não deve

constituir empecilho para que a empresa receba incentivos fiscais para auxiliar no

desenvolvimento regional, sob pena de violar os princípios da isonomia tributária e

da generalidade do IR, bem como para proteger os dispositivos elencados nos

artigos 5º, caput e 150, inciso II,da CF/88.

Em que pesem essas considerações, atentos às limitações legais vigentes

atualmente, nosso trabalho será aplicável, apenas, às empresas que apuram o IRPJ

com a utilização das regras para apuração sob o lucro real, o que não impede o

legislador, na busca de justiça fiscal, instituir formas para induzir a economia por

meio do IRPJ na modalidade de apuração pelo lucro presumido.

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CAPÍTULO II

Aspectos econômicos, a tributação Indutora e o IRPJ

2.1. O capitalismo e a intervenção econômica do Estado

O capitalismo começa a surgir após a crise do sistema feudal na Europa,

sobretudo a partir do século XII, quando a terra perde espaço como principal fonte

da riqueza, e a sociedade passa a se estruturar em torno da manufatura artesanal,

germinando uma economia de mercado.

Com o desenvolvimento e crescimento dos centros urbanos, as relações

comerciais entre as cidades são aprimoradas, dando lugar a diversificação de

negócios e surgimento de rotas comerciais.

A evolução comercial é potencializada com a evolução nos sistemas de

transporte, especificamente com o período conhecido como as “Grandes

Navegações”, iniciadas no século XV, com a conquista e colonização de novas

terras, o que terminou por desenvolver novos mercados e ampliar as relações

mercantis.

Essa fase foi denominada pelos historiadores de capitalismo comercial, tendo

como característica principal a circulação e distribuição de matérias primas e

produtos elaborados entre as metrópoles e as colônias.

Com a criação da máquina a vapor, as manufaturas são paulatinamente

substituídas, dando lugar às indústrias inglesas, consolidando o capitalismo como

sistema de produção no século XVIII.

A forte industrialização que se seguiu, impôs o rápido desenvolvimento do

setor industrial, em um período que recebeu o nome de revolução industrial28.

28

“O processo de industrialização na Europa não era nenhuma novidade em meados do século XVIII, contudo, a indústria e a produção eram limitados por questões tecnológicas, posto que a força motriz dos meios de produção eram essencialmente humana ou animal. No momento em que o intelecto humano consegue conceber máquinas não necessitem de força humana ou animal, as máquinas a vapor, a história estava sendo escrita e uma nova revolução “explodia”, a chamada Revolução Industrial. [...] É certo que a Revolução Industrial desenvolveu-se primeiramente na Grã-Bretanha, onde foram desenvolvidas as primeiras máquinas a vapor e, consequentemente, as primeiras fábricas que iniciaram a produção em massa de bens de consumo. Desta forma, o capitalismo e a produção industrial em massa foram implementados e desenvolvidos na Grã-Bretanha e, logo depois, em alguns outros países europeus e nos Estados Unidos da América, de uma forma

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O capitalismo, então, atinge o seu auge no século XX, com o surgimento das

grandes corporações, derivadas das fusões e incorporações empresariais, e com a

consolidação de potências econômicas mundiais.

No campo da ideologia, autores como John Locke, Montesquieu, David

Hume, Adam Smith e John Stuart Mill tiveram participação essencial no predomínio

do modo de produção capitalista, através do desenvolvimento dos ideais liberais.

De acordo com a teoria liberal, o estado não deveria intervir nas atividades

dos particulares, já que o homem, em face da liberdade inerente à sua natureza, não

precisaria estar submisso à interferência do poder público.

Assim, para John Locke, precursor dos ideais liberais:

A liberdade natural do homem consiste em estar livre de qualquer poder superior sobre a Terra e em não estar submetido à vontade ou à autoridade legislativa do homem, mas ter por regra apenas a lei da natureza. [...] A liberdade, portanto, não corresponde ao que nos diz sir R. F., ou seja, uma liberdade para cada um fazer o que lhe aprouver, viver como lhe agradar e não estar submetido a lei alguma. [...] A liberdade da natureza consiste em não estar sujeito a restrição alguma senão à da lei da natureza.29

Em que pese o discurso de liberdade para o homem não se sujeitar ao poder

absolutista, John Locke defende o parlamento e a criação de leis, desde que

fundadas na proteção da propriedade, observe-se:

O motivo que leva os homens a entrarem em sociedade é a preservação da propriedade; e o objetivo para o qual escolhem e autorizam um poder legislativo é tornar possível a existência de leis e regras estabelecidas como guarda e proteção às propriedades de todos os membros da sociedade, a fim de limitar o poder e moderar o domínio de cada membro da comunidade.30

Enquanto Locke foi o responsável pelas bases do capitalismo liberal, Adam

Smith o concretizou em definitivo, através da idéia de que caberia ao mercado se

avassaladora. Com o desenvolvimento do capitalismo, o conceito de riqueza também é modificado; antes, o nível de riqueza de uma nação era medido pela acumulação de metais preciosos ligados ao comércio exterior; após, prosperam as teses de Adam Smith, que ligam a riqueza a objetos úteis que podem ser produzidos por uma determinada sociedade, referindo-se a qualidades físicas ou concretas dos objetos, tornando-os necessários as atividades humanas, sendo que para a teoria econômica clássica, a forma de obtenção da riqueza dá-se pelo trabalho, ou seja, pelo esforço humano para obter tais objetos”. MIRANDA, Fernando Silveira Melo Plentz. A Mudança do Paradigma Econômico, a Revolução Industrial e a Positivação do Direito do Trabalho. Revista Eletrônica Direito, Justiça e Cidadania – Volume 3 – nº 1 – 2012. p. 11-12. 29

LOCKE, John. Dois tratados sobre o governo. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 401-402. 30

Idem. p. 140.

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auto regular através da livre concorrência, em consonância com a regra da oferta e

da procura.

Para referido autor, através dos ideais de laissez-faires, laissez–passer; le

monde va de lui-mêne, o mercado atingiria um equilíbrio natural por si só, sem a

interferência do estado, e como resultado, o mercado promoveria constante

progresso conduzindo a humanidade a uma condição na qual não haveria escassez

e tudo seria bem-estar:

O esforço natural de cada indivíduo de melhorar sua própria condição, quando lhe é permitido exercê-lo com liberdade e segurança, é um princípio tão poderoso que, só por si, sem qualquer outra contribuição, é não só capaz de criar a riqueza e prosperidade de uma sociedade como ainda de vencer um grande número de obstáculos com que a insensatez das leis humanas tantas vezes cumula as suas ações.31

Desse modo, Adam Smith explica que os mecanismos de mercado, a qual

denominou a mão invisível32, não necessitariam da intervenção de outras forças

externas, principalmente a interferência pública.

O Estado, assim, deveria reduzir seu papel na economia, se limitando a

preservar a lei, a ordem e a defesa nacional.

A premissa de ausência total do estado na economia, preconizada pelo

sistema liberal, termina por demonstrar sua fragilidade quando o mercado não

consegue controlar suas falhas, culminando em crises econômicas que levam o

estado a efetuar maciças intervenções na economia, em especial no final da década

de 1920 até os anos da década de 1930, quando foi implantado o New Deal33 nos

EUA, que quebrou o paradigma de não intervenção na economia.

31

SMITH, Adam. Riqueza das nações. v.2. Lisboa: Fundação Calouste Guibenkian, 1993. p. 68. 32

“Mão invisível: Conceito desenvolvido por Adam Smith em seu livro a Riqueza das Nações, significando uma coordenação invisível que assegura a consistência dos planos individuais numa sociedade onde predomina um sistema de mercado. De acordo com Smith, um indivíduo que busca apenas o seu próprio interesse é na verdade conduzido por uma mão invisível a obter um resultado que não estava originalmente em seus planos. Esse resultado obtido corresponderia ao interesse da sociedade”. SANDRONI, Paulo. Dicionário de Economia

do Século XXI. Rio de Janeiro: Record, 2005. p. 511. 33

“O que ficou conhecido como New Deal no governo de Franklin Roosevelt (1933-45), não passou apenas de um conjunto de medidas de políticas econômicas e sociais na tentativa de salvar os EUA de sua maior crise econômica da história. Entre as diversas medidas, destacam-se, portanto: criação de um sistema de seguridade social, com benefícios para os trabalhadores em termos de aposentadorias; criação de um sistema de seguro-desemprego; e fornecimento de auxílio financeiro às famílias menos abastadas e com filhos em idade de dependência”. GOMES, Fábio Guedes. Conflito social e welfare state: Estado e desenvolvimento social no Brasil. RAP, Rio de Janeiro 40(2):201-36, Mar./Abr. 2006. p. 206.

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42

O estado, então, deixa de ver a sua intervenção na economia como

desnecessária, para adotar um modelo proposto pelo economista britânico John

Maynard Keynes, para quem:

The most important Agenda of the State relate not to those activities which private

individuals are already fulfilling, but to those functions which fall outside the sphere of the

individual, to those decisions which are made by no one if the State does not make them.

The important thing for government is not to do things which individuals are doing

already, ad to do them a little better or a little worse; but to do those things which at

present are not done at all.34

Dessa forma, o pensamento liberal incorpora o bem estar social, auxiliado

pelo pensamento Keynesiano, para consignar a possibilidade de intervenção direta

do estado quando os particulares não estão interessados em exercer essa ou aquela

atividade essencial.

O estado passa a acumular as funções de empresário e gerente de preços e

tributos, através da criação das empresas estatais e dos tabelamentos econômicos e

aumento da carga tributária.

Nessa nova perspectiva, Manoel Afonso Vaz, escreve que caberia ao estado

a manutenção de 03 (três) funções básicas:

a) a obrigação de defender a nação contra as violações e ataques de outras nações independentes;

b) a obrigação de salvaguardar todo o membro da própria nação contra ataques, mesmo que legais, de todos os outros, ou seja, manter uma legislação imparcial;

c) criar e manter certas instituições públicas cuja criação e manutenção não possam ser

esperadas da iniciativa privada.35

As idéias de Keynes começam a ser combatidas na década de 1970, em

especial pelos pensadores neoliberais, que defendiam um retorno ao pensamento

liberal, sobretudo em face do endividamento dos estados derivado da interferência

direta destes na economia, através do custeio do bem estar social.

Para os neoliberais, a solução para a crise gerada pelo estado Keynesiano

seria a redução progressiva do poder estatal, amenização da carga tributária, a

34

KEYNES, John Maynard. The end of laissez-faire. Amherst, New York: Prometheus Books, 2004. p. 7. 35

VAZ, Manoel Afonso. Direito Econômico: a ordem econômica portuguesa. Coimbra: Coimbra, 1985. p. 15.

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privatização das empresas estatais e a diminuição do poder de fixar ou autorizar

preços pelo estado.

Assim, surge como diretriz a intervenção do estado de forma indireta sobre a

economia, ao contrário do que vinha sendo praticado pelos estados ocidentais

capitalistas até então.

De acordo com Luís S. Cabral de Moncada, esse modelo de intervenção

indireta:

[...] o Estado não se comporta como sujeito econômico, não tomando parte ativa e

directa no processo econômico. Trata-se de uma intervenção exterior, de

enquadramento e de orientação que se manifesta em estímulos ou limitações, de vária

ordem, à actividade das empresas36.

Sobre as formas de intervenção do estado na economia, destacamos que

esta pode ocorrer na economia ou sobre a economia.

Segundo João Hélio de Farias Moraes Coutinho, essa divisão inicial ainda

comporta uma subdivisão de ambos os conceitos, resultando que:

[...] a intervenção no domínio econômico pode ocorrer por absorção e por participação, enquanto a intervenção sobre o domínio econômico se efetiva por indução e por direção.

Diz-se que a intervenção é por absorção, quando o Estado veda o exercício de idêntica atividade por outrem, absorvendo, portanto, aquele segmento econômico. Assim, ocorre a monopolização da atividade, com os subjacentes aspectos negativos para o regime de mercado. Desse modo, a absorção deve ser rigidamente disciplinada, porquanto só deve ser admitida em casos excepcionais, a exemplo da atuação em setores da economia que constituam relevante interesse nacional, como no caso de bens considerados estratégicos.

A intervenção por participação é aquela em que, além do Estado, outros agentes econômicos atuam numa determinada atividade. Haverá, então, apenas participação do Estado, e não absorção da atividade. Destarte, o regime jurídico aplicado ao Estado é o mesmo aplicado aos agentes privados, mantendo-o em igualdade com eles, sob pena de não ocorrer participação, mas concorrência desleal, que, a toda evidência, resultará em monopólio.

A intervenção por meio de normas de direção é aquela em que não é permitido outro comportamento que não o previsto na norma. A norma de direção vincula a determinada hipótese um único consequente. Nesse caso, seu descumprimento acarretará uma sanção jurídica. Pode-se citar como exemplo o tabelamento de preços, haja vista que, estipulado pelo Estado o preço máximo de comercialização de um bem ou de um serviço, seu descumprimento ensejará uma penalidade, que, via de regra, é uma multa.

36

MONCADA, Luís S. Cabral de. Direito Econômico. 3 ed. ver. e atual. Coimbra: Coimbra, 2000. p. 337.

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44

[...]

Noutro giro, a intervenção por meio de normas de indução opera-se quando o Estado não estabelece procedimentos obrigatórios a serem observados pelos agentes econômicos, mas quando o Estado privilegia certas atividades em vez de outras, induzindo, assim, os agentes a adotarem essas práticas. Nessa forma de intervenção, não há sanção jurídica pela não adoção da opção privilegiada pelo Estado, mas o agente econômico não poderá usufruir as vantagens ofertadas, caso não as adote.37

Embora o Chile tenha sido o primeiro país a implementar medidas neoliberais,

através do regime ditatorial de Augusto Pinochet, através de medidas de intervenção

sobre a economia, foi na Inglaterra que o modelo neoliberal ganhou evidência, tendo

em vista o sucesso das medidas incorporadas pelo governo de Margaret Thatcher,

na década de 1980, dentre as quais destacamos a privatização de estatais,

revogação dos privilégios dos sindicatos, estabilização da moeda e de um regime

tributário diferenciado.

O modelo britânico foi seguido pelos EUA no governo de Ronald Reagan,

que, em face da peculiar realidade norte americana, utilizou uma redução na

regulação da economia com diminuição da tributação, em uma política que ficou

conhecida como supply-side economics.

2.2. A intervenção no domínio econômico no Brasil e a Constituição

de 1988

No Brasil, os ideais liberalistas começaram a ser difundidos por Hipólito da

Costa, através do jornal Correio Brasiliense, bem como ao pensador Silvestre

Pinheiro Ferreira, pouco antes da independência brasileira em 1822.

Os ideais liberais, que tiveram que conviver com o regime monárquico no

Brasil, alcançaram seu auge com a publicação da Constituição de 1891, quando

ocorreu a transição para o sistema republicano.

Dessa maneira, embora o liberalismo econômico já fosse aplicado no Brasil

império, consoante ensina Antônio Paim, a consolidação desse modelo em sua

plenitude ocorreu quando:

37

COUTINHO, João Hélio de Farias Moraes. A legitimidade dos incentivos fiscais num contexto de guerra

fiscal. Tese de doutorado apresentada ao Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 2011. p. 114-115.

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A Constituição de 1891 deu aos liberais um instrumento aglutinador, permitindo-lhes elaborar o que Nelson Saldanha denominou de pensamento político oficial. Assim, pelo menos ao longo das três primeiras décadas republicanas, o liberalismo corresponde à doutrina política oficial.38

Posteriormente, o modelo liberal é substituído pelo keynesiano, em sintonia

com o que acontecia nos EUA e outros países capitalistas:

Na Europa, essa doutrina seria substituída pelo keynesianismo, mas somente no período posterior à crise econômica de 1929. No Brasil, a plataforma intervencionista seria concebida por um teórico positivista - Aarão Reis (1856/1936) - e incorporada à prática política instaurada por Getúlio Vargas após a Revolução de 30.

Em síntese, durante os quarenta anos da República Velha assiste-se, de um lado, ao ocaso do liberalismo - que parecia tão forte, já que impusera ao país a Constituição de 1891 e assumira as rédeas do pensamento político oficial - e, de outro lado, à confluência da prática autoritária no sentido da doutrina castilhista.39

Assim, a partir da década de 1930, Getúlio Vargas, profundo admirador da

política do New Deal adotada nos EUA40, implanta diversas medidas de cunho

keynesiano, como a criação de leis para proteção social e do trabalhador, e a

criação de grandes estatais.

A política keynesiana instaurada por Getúlio Vargas é ampliada durante todos

os períodos autoritários do século XX, resultando em grande endividamento externo

e interno no país, além de uma crise monetária sem precedentes, com índices

inflacionários além dos patamares aceitaveis.

Diante desse cenário e motivado pelas idéias neoliberais, o legislador

constituinte de 1988 passa a adotar um sistema que veda a intervenção direta do

estado na economia, conforme se infere do artigo 173, da CF/88:

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

38

PAIM, Antônio. História do liberalismo brasileiro. São Paulo: Mandarim, 1998, p. 89. 39

Idem. p. 91. 40

Os presidentes brasileiro e norte americano mantinham uma recíproca admiração um para com o outro, tanto que Franklin Roosevelt mencionou a importância que tinha Getúlio Vargas: "Despeço-me esta noite com grande tristeza. Há algo, no entanto, que devo sempre lembrar. Duas pessoas inventaram o New Deal: o Presidente do Brasil e o Presidente dos Estados Unidos. ROOSEVELT, Franklin D. Remarks made by the President, in reply to the address of the President of Brazil, at the banquet given in his honor at the Brazilian Foreign Office. Rio de Janeiro, 27 de novembro de 1936. Franklin D. Roosevelt Library. Speech Files, Box 30, File 1021-A.

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Referida limitação, quando violada pelos entes federativos, já foi objeto de

julgamento por diversas vezes no Superior Tribunal de Justiça - STJ, que possui

entendimento pacificado sobre a necessidade da União a indenizar os prejuízos

sofridos por particulares, em face da intervenção direta na economia, ou seja,

quando a interferência estatal tem por objeto a fixação de preços:

RECURSO ESPECIAL DA UNIÃO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. SETOR SUCROALCOOLEIRO. FIXAÇÃO DE PREÇO ABAIXO DO CUSTO PRODUTIVO. PREJUÍZOS. INDENIZAÇÃO DAS DIFERENÇAS DEVIDAS. PRECEDENTES DO STF E DO STJ. PEDIDO DE REDUÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA. SÚMULAS 282 E 356 DO STF.

1. O STJ pacificou o entendimento de que a União tem o dever de indenizar as usinas do setor sucroalcooleiro que obtiveram prejuízos decorrentes da fixação de preços pelo Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) em detrimento dos custos de produção apurados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

2. Precedentes: RE 422.941/DF, Segunda Turma do STF, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 24.3.2006; AgRg no Ag 1.207.618/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 10.8.2010, DJe 10.9.2010; AgRg no AgRg no REsp 753.163/DF, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 2.4.2009, DJe 27.4.2009; REsp 771.787/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Segunda Turma, julgado em 15.4.2008, DJe 27.11.2008.

[...]

Recurso especial da EMPRESA parcialmente provido.41

O mesmo entendimento é perfilhado pelo Supremo Tribunal Federal - STF,

consoante se percebe no julgamento modelo abaixo transcrito:

CONSTITUCIONAL. ECONÔMICO. INTERVENÇÃO ESTATAL NA ECONOMIA: REGULAMENTAÇÃO E REGULAÇÃO DE SETORES ECONÔMICOS: NORMAS DE INTERVENÇÃO. LIBERDADE DE INICIATIVA. CF, art. 1º, IV; art. 170. CF, art. 37, § 6º. I. - A intervenção estatal na economia, mediante regulamentação e regulação de setores econômicos, faz-se com respeito aos princípios e fundamentos da Ordem Econômica. CF, art. 170. O princípio da livre iniciativa é fundamento da República e da Ordem econômica: CF, art. 1º, IV; art. 170.

II. - Fixação de preços em valores abaixo da realidade e em desconformidade com a legislação aplicável ao setor: empecilho ao livre exercício da atividade econômica, com desrespeito ao princípio da livre iniciativa.

III. - Contrato celebrado com instituição privada para o estabelecimento de levantamentos que serviriam de embasamento para a fixação dos preços, nos termos da lei. Todavia, a fixação dos preços acabou realizada em valores inferiores. Essa conduta

41

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Setor sucroalcooleiro. Fixação de preço abaixo do custo

produtivo. Prejuízos. Indenização das diferenças devidas. Processo nº REsp 1066831/DF. Relator:

Ministro Humberto Martins. 17 de nov. 2011. Segunda Turma. DJe 23 de nov. 2011.

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gerou danos patrimoniais ao agente econômico, vale dizer, à recorrente: obrigação de indenizar por parte do poder público. CF, art. 37, § 6º.

IV. - Prejuízos apurados na instância ordinária, inclusive mediante perícia técnica.

V. - RE conhecido e provido.42

***

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. SETOR SUCROALCOOLEIRO. FIXAÇÃO DE PREÇOS. LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA LIVRE INICIATIVA. VIOLAÇÃO. PRECEDENTES.

1. Inadmissível em recurso extraordinário a análise de legislação infraconstitucional e o reexame de fatos e provas dos autos. Incidência das Súmulas nº s 636 e 279/STF.

2. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que fere o princípio da livre iniciativa a fixação de preços em valores abaixo da realidade.

3. Agravo regimental não provido.43

Ao mesmo tempo em que proíbe o estado de atuar como empresário, ou seja,

intervir de forma direta, a carta magna estabelece as regras para a intervenção

indireta, consoante a seguir:

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

Essa intervenção, contudo, deve se pautar pela proteção à propriedade e à

livre iniciativa, os pilares do liberalismo, observe-se:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

II - propriedade privada;

42

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Intervenção estatal na economia: regulamentação e regulação

de setores econômicos: normas de intervenção. Liberdade de iniciativa. Processo nº RE 422941.

Relator: Ministro Carlos Velloso. 06 de dez. 2005. Segunda Turma. DJ 24 de mar. 2006. 43

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Setor sucroalcooleiro. Fixação de preços. Legislação

infraconstitucional. Reexame de fatos e provas. Impossibilidade. Princípio da livre iniciativa. Violação.

Processo nº RE 598537 AgR. Relator: Ministro Dias Toffoli. 01 de fev. 2011. Primeira Turma. DJe 28 de

mar. 2011.

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IV - livre concorrência;

Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

Aliada a análise dos dispositivos tratados nos parágrafos antecedentes

(arts.173, 174, 1º e 170), com os direitos e garantias fundamentais previstos nos

artigos 5º, 6º e 7º, da CF/88, percebe-se que o legislador constituinte, embora

influenciado pelos ideais liberais, também manteve traços dos modelos

protecionistas e de cunho social previstos nas constituições anteriores.

Além disso, a intervenção econômica do estado só será permitida com a

verificação da violação: a) da concorrência em razão da formação de monopólios,

oligopólios, cartéis, trustes e outras anomalias que caracterizam a concentração do

poder econômico nas mãos de um ou de poucos, em detrimento dos cidadãos; e b)

da existência digna do cidadão, de acordo com os ditames da justiça social previsto

na constituição.

Sobre essas limitações interventivas, trazemos à baila interessante

pronunciamento do Supremo Tribunal Federal - STF:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. FIXAÇÃO PELO PODER EXECUTIVO DOS PREÇOS DOS PRODUTOS DERIVADOS DA CANA-DE-AÇÚCAR ABAIXO DO PREÇO DE CUSTO. DANO MATERIAL. INDENIZAÇÃO CABÍVEL.

1. A intervenção estatal na economia como instrumento de regulação dos setores econômicos é consagrada pela Carta Magna de 1988.

2. Deveras, a intervenção deve ser exercida com respeito aos princípios e fundamentos da ordem econômica, cuja previsão resta plasmada no art. 170 da Constituição Federal, de modo a não malferir o princípio da livre iniciativa, um dos pilares da república (art. 1º da CF/1988). Nesse sentido, confira-se abalizada doutrina: As atividades econômicas surgem e se desenvolvem por força de suas próprias leis, decorrentes da livre empresa, da livre concorrência e do livre jogo dos mercados. Essa ordem, no entanto, pode ser quebrada ou distorcida em razão de monopólios, oligopólios, cartéis, trustes e outras deformações que caracterizam a concentração do poder econômico nas mãos de um ou de poucos. Essas deformações da ordem econômica acabam, de um lado, por aniquilar qualquer iniciativa, sufocar toda a concorrência e por dominar, em conseqüência, os mercados e, de outro, por desestimular a produção, a pesquisa e o aperfeiçoamento. Em suma, desafiam o próprio Estado, que se vê obrigado a intervir para proteger aqueles valores, consubstanciados nos regimes da livre empresa, da livre concorrência e do livre embate dos mercados, e para manter constante a compatibilização, característica da economia atual, da liberdade de iniciativa e do ganho ou lucro com o interesse social. A intervenção está, substancialmente, consagrada na Constituição Federal nos arts. 173 e

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174. Nesse sentido ensina Duciran Van Marsen Farena (RPGE, 32:71) que "O instituto da intervenção, em todas suas modalidades encontra previsão abstrata nos artigos 173 e 174, da Lei Maior. O primeiro desses dispositivos permite ao Estado explorar diretamente a atividade econômica quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. O segundo outorga ao Estado, como agente normativo e regulador da atividade econômica. o poder para exercer, na forma da lei as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo esse determinante para o setor público e indicativo para o privado". Pela intervenção o Estado, com o fito de assegurar a todos uma existência digna, de acordo com os ditames da justiça social (art. 170 da CF), pode restringir, condicionar ou mesmo suprimir a iniciativa privada em certa área da atividade econômica. Não obstante, os atos e medidas que consubstanciam a intervenção hão de respeitar os princípios constitucionais que a conformam com o Estado Democrático de Direito, consignado expressamente em nossa Lei Maior, como é o princípio da livre iniciativa. Lúcia Valle Figueiredo, sempre precisa, alerta a esse respeito que "As balizas da intervenção serão, sempre e sempre, ditadas pela principiologia constitucional, pela declaração expressa dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, dentre eles a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa" (DIÓGENES GASPARINI, in Curso de Direito Administrativo, 8ª Edição, Ed. Saraiva, págs. 629/630, cit., p. 64). [...]44

Importante, ainda, ressaltar as colocações de Francisco de Queiroz Bezerra

Cavalcanti45, para quem o estado pode atuar:

1. Enquanto agente da atividade econômica: a exploração direta de atividades econômicas compete ao setor privado, sendo permitido o seu desenvolvimento pelo Estado quando necessário aos imperativos de segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definido em lei (art. 173 da CF/88).

2. Como ente regulador: situação em que desempenha um papel importante na proteção dos princípios que pautam a ordem econômica, a regulamentação não tende a sofrer redução, mesmo com a nova postura (neoliberal) do estado, evidenciando a sua missão de fiscalizar as atividades econômicas exercidas pelo setor privado.

3. Como agente indutor: nessa seara, pode valer-se da política fiscal, com a concessão de incentivos setoriais ou regionais, empregando maior ou menor incidência da carga tributária como mecanismo redutor de custos e estimulador de atividades econômicas.

Esse ecletismo da constituição de 1988, unindo as idéias neoliberais com a

proteção das medidas socializantes, reflete não só o momento de sua formulação,

como também o passado autoritário e protecionista dos governos anteriores, que

imprimiu suas marcas na carta magna.

Nesse sentido, destacam-se as palavras de Uadi Lammêngo Bulos:

44

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Intervenção do estado no domínio econômico. Responsabilidade objetiva do estado. Fixação pelo poder executivo dos preços dos produtos derivados da cana-de-açúcar abaixo do preço de custo. Dano material. Processo nº RE 632644 AgR. Relator: Ministro Luiz Fux. 10 de abr. 2012. Primeira Turma. DJe 10 de mai. 2012. 45

CAVALCANTI, Francisco de Queiroz Bezerra. Reflexões sobre o papel do Estado frente à atividade econômica. Revista Trimestral de Direito Público, n◦ 20. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 70-74.

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De fato, o constituinte, de modo claro, optou por um ordenamento econômico composto. Significa que a ordem econômica da Carta de 1988 está impregnada de princípios e soluções contraditórias. Ora abre brechas para a harmonia de um capitalismo neoliberal, ora enfatiza o intervencionismo sistemático, aliado ao dirigismo planificador, ressaltando até elementos socializantes. Nisso tudo revela uma postura híbrida, porque consagra uma espécie de “paralelismo de princípios”46.

Em que pese referida oposição de princípios norteadores e ideais na

constituição de 1988, destacamos que esse “paralelismo” pode ser positivo para a

sociedade.

Como destaca J. J. Gomes Canotilho, o ecletismo de idéias previstas em um

texto magno é benéfico, já que atende aos diversos interesses da sociedade, senão

vejamos:

Numa sociedade plural e complexa, a constituição é sempre um “pacto” entre forças políticas e sociais. Através de “barganha” e de “argumentação”, de “convergências” e “diferenças”, de cooperação na deliberação mesmo em caso de desacordos persistentes, foi possível chegar, no procedimento constituinte, a um compromisso constitucional ou, se preferirmos, a vários “compromissos constitucionais”. O carácter compromissório constitucional da Constituição de 1976 representa uma força e não uma debilidade. Mesmo quando se tratava de “conflitos profundos” (deep conflit), houve a possibilidade de se chegar a bases normativas razoáveis. Basta referir o compromisso entre o princípio liberal e o princípio socialista, [...]47

Dentre os benefícios desse ecletismo, destacamos a possibilidade de

coexistência harmônica entre os fundamentos essenciais da cidadania, da dignidade

da pessoa humana, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

Diante do exposto, o modelo de intervenção econômica introduzida pela

Constituição de 1988, ao mesmo tempo em que assegura proteção ao sistema

capitalista de produção, com a inegável confirmação dos ideais neoliberais, também

garante a predominância dos direitos fundamentais consagrados nas constituições

modernas.

Basta, para isso, que o direcionamento governamental aplique políticas que

manifestem mais o lado liberal ou a vertente social.

No presente trabalho acadêmico, privilegiaremos o estudo da intervenção do

estado sobre a economia, através de normas de indução, como já visto nos textos

46

BULOS, Uadi Lammêngo. Constituição Federal anotada. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 1258-1259. 47

CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria constitucional. 7. ed. Coimbra: Almedina, 1998, p. 218.

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de João Hélio de Farias Moraes Coutinho48, ou a ação do estado como agente

indutor com a promoção de políticas fiscais para estimular as atividades

econômicas, em sintonia com o que pensa Francisco de Queiroz Bezerra

Cavalcanti49.

2.3. O IRPJ e a extrafiscalidade

Preliminarmente ao estudo da tributação indutora, entendemos essencial a

compreensão de alguns pontos básicos, em especial os seguintes, relacionados

com a vinculação das receitas tributárias e a sua destinação.

Falar que o IRPJ é um imposto, ou seja, uma das espécies do gênero tributo,

embora constitua simplória colocação, tem uma importante implicação, pois,

pertencendo a esta classificação, sua receita não está vinculada a qualquer

atividade ou serviço prestado pelo Estado, como destacam o artigo 16, do CTN e o

artigo 167, inciso IV, da CF/88:

CTN

Art. 16. Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.

CF/88

Art. 167. São vedados:

IV - a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo;

Isso porque, diferentemente do que acontece em relação às taxas e às

contribuições de melhoria, os impostos são de recolhimento obrigatório pelo

contribuinte, sem que o estado tenha que efetuar uma contraprestação direta àquele

valor pago.

48

COUTINHO, João Hélio de Farias Moraes. A legitimidade dos incentivos fiscais num contexto de guerra

fiscal. Tese de doutorado apresentada ao Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 2011. p. 114-115 49

CAVALCANTI, Francisco de Queiroz Bezerra. Reflexões sobre o papel do Estado frente à atividade econômica. Revista Trimestral de Direito Público, n◦ 20. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 70-74.

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Por isso, diz-se que o fato gerador dos impostos não está vinculado a uma

prestação estatal, com destinação do produto de sua arrecadação para o custeio

das despesas gerais do Estado.

É evidente que o Estado tem deveres para com os cidadãos, e que o valor

arrecadado pelo FISCO a título de impostos, irá repercutir nestas obrigações e na

prestação de serviços públicos à população, mas o que não pode haver é a

cobrança do indivíduo ou da coletividade por um serviço específico, derivado de

determinado imposto recolhido.

Nesse sentido, vemos as lições de Hugo de Brito Machado50:

[...] Assim, quando o Estado cobra o imposto de renda, por exemplo, toma em consideração, exclusivamente, o fato de alguém auferir renda. Não importa que o Estado tenha, ou não, prestado algum serviço, executado alguma obra ou desenvolvido alguma atividade relacionada com aquele de quem vai cobrar o imposto.

[...] Costuma-se distinguir o imposto da taxa dizendo que o imposto não é contraprestacional, enquanto a taxa é contraprestacional. Tal assertiva é correta apenas no sentido de que, como já explicamos, o fato gerador do dever jurídico de pagar taxa é uma atuação estatal específica relativa ao contribuinte, enquanto o fato gerador do dever de pagar imposto é independente de qualquer atuação estatal relativa ao contribuinte.

Dessa forma, a função primordial dos impostos é a arrecadação de valores

aos cofres públicos, também chamada de finalidade meramente fiscal

(arrecadatória).

Por outro lado, os tributos, incluindo os impostos, podem ser utilizados para

outras finalidades, que não apenas o acúmulo de capitais pelos entes tributantes,

para posterior definição sobre o seu destino, mas também para intervir direta ou

indiretamente na economia.

Diversos autores identificaram a extrafiscalidade, como Aliomar Baleeiro51,

para quem "a doutrina e a jurisprudência têm reconhecido ao legislador tributário a

faculdade de estimular ou desestimular comportamentos, por meio de uma

tributação progressiva ou regressiva, ou da concessão de benefícios e incentivos

fiscais".

50

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 32 ed. rev., atual. e amp. Malheiros: São Paulo, 2011. p. 301. 51

BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 233.

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53

Também José Casalta Nabais52, em Portugal, afirma que os tributos têm o

"intuito de actuar directamente sobre os comportamentos económicos e sociais de

seus destinatários".

No Brasil, Ruy Barbosa Nogueira53 tratou sobre a matéria, esclarecendo que:

[...] o Estado pode impor tributação sobre as relações econômicas ocorridas em seu território (poder de tributar e soberania fiscal) e, por outro lado, impor regulamentação (soberania reguladora) para garantir o bem-comum. Ademais, o poder de regular é o poder de promover o bem público pela limitação e regulação da liberdade, do interesse e da propriedade.

Assim, conclui o mencionado doutrinador:

quem pode regular, pode impedir, restringir e/ou favorecer, lançando mão dos meios necessários, inclusive o tributo, através do qual se pode fomentar uma atividade e/ou restringi-la. Por isso mesmo, essas funções do tributo devem ser harmonizadas com o poder de regular.54

Para definir a extrafiscalidade, entendemos por transcrever as colocações de

Marcus de Freitas Gouvêa55:

O Estado elege um valor que deva ser concretizado, mas não espera que isso ocorra mediante estímulos ou desestímulos tributários aos cidadãos. A lei determina que a arrecadação do tributo seja canalizada diretamente para fim constitucionalmente valorado.

De se notar que há, neste fenômeno, uma ligação marcante entre a fiscalidade e a extrafiscalidade: o tributo promove arrecadação de haveres. Entretanto, tal arrecadação destina-se a um fim específico e a consecução deste fim desprende-se da fiscalidade e vai constituir o efeito extrafiscal na norma tributária. A distinção é sutil e meramente didática, mas, isso considerado, pode ser feita.

A fiscalidade quer financiar despesas, a extrafiscalidade quer, mediante o financianciamento de despesas determinadas, a consecução dos fins que justificaram a criação de um tributo.

Exemplificando: se, por um lado, o Estado tem a faculdade de intervir na economia com a receita de impostos (medida irrelevante para o Direito Tributário) o legislador pode instituir contribuição para custear a atividade de intervenção do Estado na economia, quando a intervenção passa a ser obrigatória, segundo o Direito Tributário. Neste caso, além de arrecadar os recursos, o legislador quer que a intervenção se efetive.

52

NABAIS, José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos: contributo para a compreensão do estado

fiscal contemporâneo. Coimbra: Livraria Almedina, 1998. p. 629. 53

NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. 54

Idem. 55

GOUVÊA, Marcus de Freitas. A extrafiscalidade no Direito Tributário e suas classificações. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1226, 9 nov. 2006. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/9151>. Acesso em: 19 jun. 2012.

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54

Assim, pode o Estado aplicar as receitas derivadas do IRPJ para quaisquer

finalidades que pretenda alcançar, inclusive para estimular o crescimento e

desenvolvimento de áreas ou regiões específicas, utilizando a apuração deste tributo

para fins extrafiscais.

Nesses casos, diz-se que o tributo não foi arrecadado para abastecer,

apenas, os cofres públicos, mas principalmente para induzir uma situação desejada

pelo ente federativo.

Em relação a esta tributação que produz efeito extrafiscal, preferimos seguir a

orientação de Luís Eduardo Schoueri56, que dedicou um trabalho exclusivo sobre o

que denominou de “normas tributárias indutoras”.

2.4. A tributação indutora

Embora, muitos tenham sido os autores que discutiram o fenômeno da

extrafiscalidade, a expressão “normas tributárias indutoras”, na academia nacional,

surgiu com o estudo promovido por Luís Eduardo Schoueri, intitulado “Normas

tributárias indutoras e intervenção econômica”57.

Para o citado professor, não existiriam, propriamente, tributos indutores, mas

sim um conjunto de normas tributárias preexistentes que, aliadas à vontade do

legislador em alcançar determinada finalidade, produziriam a indução de

determinada situação, observe-se:

A opção, neste estudo, pela referência às “normas tributárias indutoras”, em lugar dos “tributos indutores” ou “tributos arrecadadores” deve-se à premissa de que as últimas categorias dificilmente se concretizariam, em sua forma pura. De um lado, por mais que um tributo seja concebido, em sua formulação, como instrumento de intervenção sobre o Domínio Econômico, jamais se descuidará da receita dele decorrente, tratando o próprio constituinte de disciplinar sua destinação. Fosse irrelevante ou indesejada a receita proveniente dos chamados “impostos extrafiscais”, não haveria porque o constituinte contemplá-la. Por outro lado, a mera decisão, da parte do legislador, de esgotar uma fonte de tributação no lugar de outra implica a existência de ponderações extrafiscais, dado que o legislador necessariamente considerará o efeito sócio-econômico de sua decisão. Afinal, de regra, o legislador tributário não precisa se valer de um “tributo

56

SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas Tributárias Indutoras e Intervenção Econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005. 57

Ididem.

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55

indutor”, propriamente dito, para atingir suas finalidades, preferindo antes adotar modificações motivadas por razões indutoras em normas tributárias preexistentes. 58

Essas normas, responsáveis pela natural arrecadação tributária, poderiam ser

ampliadas ou o seu produto ser destinado a outras finalidades que não a mera

arrecadação.

Em relação à dificuldade de concretização de “tributos indutores”, referida

pelo cogitado autor, todavia, temos que tecer alguns comentários.

Salientamos a possibilidade de criação, como competência tributária residual

da União, de imposto sobre grandes fortunas – IGF, nos termos de lei complementar

a ser elaborada pelo Congresso Nacional, consoante se depreende da leitura do

artigo 153, inciso VII, da CF/88:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

[...]

VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.

A Constituição Federal não impõe qualquer limite no campo de atuação deste

tributo, apenas restringindo suas regras à produção de lei complementar.

Ora, temos neste tributo um exemplo claro da possibilidade de instituição de

um “tributo indutor”, ao nosso ver, na medida em que a finalidade de sua criação

poderia ser a redução de desigualdades entre contribuintes, ou seja, promover uma

redistribuição de renda, atendendo aos ditames constitucionais, em especial às suas

normas programáticas59.

A criação de um tributo dessa natureza, incidindo sobre grandes fortunas, é

problemático e discutido por vários povos.

Na França, esse imposto já é cobrado dos contribuintes pessoa física60, que,

atualmente, possuem patrimônio superior a € 1.300.000,00 (um milhão e trezentos

mil euros), instituído em 1989, sob o nome de “Impôt de Solidarité sur la Fortune –

ISF” (Imposto Solidário sobre a Fortuna), em substituição ao “Impôt sur les Grandes

Fortunes – IGF” (Imposto sobre Grandes Fortunas), criado em 1982.

58

SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas Tributárias Indutoras e Intervenção Econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 16. 59

As normas constitucionais programáticas são “aquelas normas constitucionais através das quais o constituinte, em vez de regular, direta e imediatamente, determinados interesses, limitou-se a traçar-lhes os princípios para serem cumpridos pelos seus órgãos (legislativos, executivos, jurisdicionais e administrativos), como programas das respectivas atividades, visando à realização dos fins sociais do Estado.” Cf. SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 6 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p. 138. 60

Disponível em: http://www.impots.gouv.fr/portal/. Acesso em 24/06/2012.

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Nos Estados Unidos da América – EUA, embora não exista um tributo dessa

natureza instituído, em 24/01/2012, o presidente Barack Obama suscitou a

necessidade de criação de tributos que incidam sobre as fortunas dos americanos

mais ricos61.

O problema para a concretização deste tributo em nosso ordenamento

jurídico e em outros, parece-nos, é o conflito de interesses políticos e econômicos

das pessoas que financiam as candidaturas dos chefes do Poder Executivo, bem

como dos Congressistas, que não querem se submeter a mais essa exação.

Quanto a instituição de mais um tributo no Brasil, no entanto, não podemos

deixar de recordar que a carga tributária62 no ano de 2010 foi de 35,13% (trinta e

cinco inteiros e treze décimos por cento), segundo estudos realizados pelo Instituto

Brasileiro de Planejamento Tributário – IBPT63.

A carga tributária brasileira poderia ser considerada pequena quando

comparada a países como a Noruega (42,80%) e a Suécia (44,08%), ou

exacerbada, se comparada aos Estados Unidos da América – EUA (24,8%),

Austrália (25,9%) ou Japão (26,9%)64.

A diferença marcante, contudo, é que todos esses países possuem ótimos

Índices de Desenvolvimento Humano – IDH65, quando comparados ao Brasil,

consoante se percebe na tabela abaixo:

País Carga Tributária IDH

Noruega 42,8% 0,943 Austrália 25,9% 0,929 Estados Unidos da América – EUA 24,8% 0,910 Suécia 44,08% 0,904 Japão 26,9% 0,901 Brasil 35,13% 0,718

Fontes: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD e The Organisation for Economic Co-operation and Development – OECD.

61

Disponível em: http://finance.fortune.cnn.com/2012/01/25/obama-tax-debate/. Acesso em 24/06/2012. 62

Carga tributária é o percentual obtido pela divisão do valor total da arrecadação de tributos do país no período de um ano, pelo valor do PIB (Produto Interno Bruto), ou seja, a riqueza produzida no período de valoração dos tributos arrecadados. 63

Disponível em: http://ibpt.com.br/img/_publicacao/14191/196.pdf. Acesso em 20 de jun. 2012. 64

Disponível em: http://www.oecd-ilibrary.org/taxation/total-tax-revenue_20758510-table2. Acesso em 31 de jul. 2012. 65

O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é uma medida comparativa de riqueza, alfabetização, educação, esperança de vida, natalidade e outros fatores para os diversos países do mundo. É uma forma padrão para avaliar e medir o bem-estar de uma população, especialmente bem-estar infantil. Referido índice foi desenvolvido em 1990 pelo economista paquistanês Mahbubul Haq, e vem sendo usado desde 1993 pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD, em seu relatório anual.

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Do cruzamento desses dados, percebemos que a carga tributária brasileira,

embora esteja em patamar intermediário aos países comparados, não consegue

produzir o mesmo grau de desenvolvimento que aquelas localidades.

Outrossim, comparando a situação de Austrália e Noruega, verificamos que a

elevada carga tributária do país nórdico não lhe permite uma situação de

desenvolvimento muito superior à daquele localizado na Oceania.

Então, podemos concluir que a carga tributária de um país não é proporcional

ao grau de desenvolvimento de seu povo.

Também é correta a premissa de que não é necessária uma alta carga

tributária para que um país alcance patamares satisfatórios de desenvolvimento,

considerando que os EUA e o Japão (que se ergueu como potência mundial em

menos de um século) possuem carga tributária bem inferior a brasileira.

Assim, o desenvolvimento de um país depende bem mais do bom

gerenciamento de seus recurso, que da quantidade de tributos arrecadados, mesmo

porque esses podem atuar como limitadores da produção nacional, atrapalhando o

crescimento econômico do local.

Diante disso, verificamos que o gerenciamento dos recursos derivados dos

tributos no Brasil não é correto, resultado de muita corrupção, alto endividamento

público e gestores públicos mal preparados.

Parece-nos, inclusive, que a situação da aplicação dos tributos apurados

demanda urgente revisão pelos governantes, para que não se chegue a uma nova

situação de criação de nomes “caricatos” para a tributação, como outrora verificamos

o “quinto dos infernos”66, gerando a necessidade da criação do “santo do pau oco”67,

ou mesmo para não gerar revoltas como a que levou à independência Norte

Americana da Inglaterra68.

Portanto, a solução dos problemas nacionais no campo da tributação não

reside na criação de mais um imposto, como falávamos anteriormente o IGF, mas

sim em um enxugamento e reestruturação do sistema tributário nacional, e na

66

Expressão usada no tempo do Brasil enquanto colônia de Portugal, para repudiar o percentual de 20% (vinte por cento), ou seja, um quinto, de toda a riqueza explorada em solo brasileiro (minérios, pau Brasil, produtos agrícolas, etc.) 67

Forma de sonegação fiscal, engenhosamente criada e utilizada pelos colonos brasileiros, na qual se inseria ouro dentro das estátuas de madeira de santos católicos, para evitar o pagamento do quinto à Portugal. 68

Nos referimos ao “imposto do chá”, cobrado pela comercialização desta bebida em solo Norte Americano, servindo como “a gota d’água” na insatisfação dos colonos contra a metrópole.

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criação de um sistema de gestão mais avançado, diminuindo a corrupção e o

endividamento público.

Outro ponto importante a ressaltar, ainda sobre a dificuldade de concretização

de “tributos indutores”, é a direção dada pelo legislador constituinte na condução dos

impostos que intervêm diretamente na economia, de competência da União, inscritos

no artigo 153, incisos I (Imposto de Importação – II), II (Imposto de Exportação – IE),

IV (Impostos sobre Produtos Industrializados – IPI) e V (Impostos sobre Operações

Financeiras – IOF), todos da CF/88.

Isso porque, nos termos do artigo 153, §1º, da CF/8869, os tributos supra

referidos podem ter suas alíquotas modificadas pelo Poder Executivo, atuando,

essas exações, com função de induzir determinada situação no âmbito econômico.

Esta função indutora, das normas tributárias, é justamente o que persegue o

trabalho de Luís Eduardo Schoueri70:

Identificam-se, assim, as normas tributárias indutoras a partir de sua função. A referência a tais normas, enquanto corte abstrato, apenas servirá para realçar uma função (ou uma das várias funções) que a norma tributária desempenha. Vê-se, pois, definido o objeto do presente estudo: por normas tributárias indutoras se entende um aspecto das normas tributárias, identificado a partir de uma de suas funções, a indutora.

Desse modo, as normas tributárias indutoras não necessariamente

constituem normas individuais ou tributos especialmente instituídos para induzir

determinado comportamento em benefício da sociedade, mas normas já existentes

no sistema tributário nacional, que podem ser acrescidos de dispositivos com

finalidade extrafiscal.

O legislador, portanto, pode atuar na produção de normas indutoras através

do agravamento da tributação para impedir uma situação indesejada (como, por

exemplo, impossibilidade de usufruir incentivos fiscais se o empresário promover

desmatamento) ou mediante a concessão de incentivos para alcançar os objetivos

almejados.

Merece especial atenção a lição de Heleno Taveira Tôrres71, para quem:

todo incentivo fiscal (depénses fiscales, tax expenditures) concedido sob amparo constitucional é legítimo, enquanto nutre-se do desígnio de reduzir desigualdades e promover o bem comum, como o desenvolvimento nacional ou regional. Não é odioso o

69

Art. 153. [...]§ 1º - É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V. 70

SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas Tributárias Indutoras e Intervenção Econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 30. 71

TORRES, Heleno Taveira. Incentivos Fiscais na Constituição e o “Crédito-prêmio de IPI”. In: Direito Tributário Atual. 18 ed. São Paulo: Dialética & Instituto Brasileiro de Direito Tributário, 2005. p. 79.

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incentivo que se invista na condição de meio para o atingimento de finalidades públicas ou privadas, mas coletivamente relevantes, sustentado em desígnio constitucional que se preste à promoção da quebra de desigualdades ou fortaleça os direitos individuais ou sociais ou ainda o próprio sentido de unidade econômica do federalismo, na condição de “renúncia de receita” ou de “gasto público”, sob a égide das condições acima enumeradas. O papel promocional dos incentivos fiscais consiste no servir como medida para impulsionar ações ou corretivos de distorções do sistema econômico, visando a atingir certos benefícios, cujo alcance poderia ser tanto ou mais dispendioso, em vista de planejamentos públicos previamente motivados.

Por óbvio, o agravamento para desestimular determinados comportamentos

do contribuinte não pode gerar ou ampliar desigualdades entre contribuintes, ou

seja, não pode acarretar uma situação em que poucos contribuintes possam

suportar o agravamento, enquanto outros simplesmente cessariam suas atividades.

Do mesmo modo, a concessão de incentivos para poucos setores da

economia, em detrimento de outros, provocaria um sucateamento destes, em clara

desvantagem com os demais.

Em tais hipóteses, estaríamos diante de frontal violação aos princípios da

capacidade contributiva e da isonomia tributária, o que é defeso por nosso

ordenamento constitucional.

Temos visto, desde a crise econômica mundial de 2008, instaurada pelo

“estouro da bolha” imobiliária Norte Americana, uma série de comportamentos

indutores em âmbito tributário no Brasil, a exemplo da redução do IPI para

automóveis e para eletrodomésticos de linha popular.

Aliando esses incentivos fiscais com os programas meramente

assistencialistas do governo federal (bolsa família, entre outros), aparentemente, o

Brasil tem sido pouco afetado pelas crises econômicas que surgem em sucessivo à

já mencionada nos EUA.

O questionamento que devemos fazer é: só esses setores da economia

merecem atenção governamental para aumentar as suas vendas, e livrar o país da

crise?

Acreditamos que não, pois, conforme considerações já esboçadas

anteriormente, referida situação pode acarretar prejuízos severos a setores

econômicos importantes, provocando violações ao princípio da isonomia.

Cabe, contudo, uma decisão de natureza política para corrigir essa

impropriedade.

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Outra questão a ser verificada, em relação as normas tributárias indutoras, é

que elas devem atuar por indução e não por direção.

Como visto anteriormente, essas duas modalidades (direção e indução)

constituem formas de intervenção sobre a economia, ou seja, são frutos do modelo

regulatório neoliberal introduzido no artigo 174, da CF/88.

Especificamente sobre a aplicação dessa divisão no campo tributário,

entendemos interessante o pensamento de Edilson Pereira Nobre Júnior72, para

quem:

na atuação por direção, está-se ante comandos imperativos, notabilizados pelo caráter cogente, a impor determinados comportamentos aos agentes econômicos, por ex., disposição instituidora de tabelamento de preços, ou que determine a forma de comercialização de determinado produto, ao passo que, na atuação indutiva, contamo-nos de forma diferente, com normas que, embora apontem uma determinada conduta ou organização a ser seguida pelo seu destinatário, não o obrigam unicamente a segui-la, situação que se tem na criação de estímulos, ou incentivos indiciadores da prática de um certo comportamento pelo administrado.

As normas diretivas, assim, atuam impondo um comportamento, ou seja, são

normas que, com força cogente, determinam uma ação do seu destinatário.

No entender de Eros Roberto Grau73, a intervenção por direção se concretiza

através de:

comandos imperativos, dotados de “cogência”, impositivos de certos comportamentos a serem necessariamente cumpridos pelos agentes que atuam no campo da atividade econômica em sentido estrito – inclusive pelas próprias empresas estatais que a exploram.

Esse tipo de comportamento, contudo, não pode ser exigido em relação aos

tributos, vez que é faculdade atribuída aos contribuintes a prática ou não de um fato

jurídico que pode constituir uma exação, observe-se:

Não obstante tais dificuldades, permanece, do ponto de vista jurídico, a distinção entre normas de direção e de indução, a partir do grau de liberdade do administrado. Especialmente para o tema de que versa este trabalho – normas tributárias indutoras – a distinção é importante, já que não se poderia cogitar de direção por meio de normas tributárias, que pressupõem, necessariamente, a possibilidade de o contribuinte incorrer ou não no fato gerador. Fosse o contribuinte obrigado a incorrer no fato gerador, então se estaria diante de um efeito confiscatório, atentando, ademais, contra o direito de

72

NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. Intervenção estatal sobre o domínio econômico, livre iniciativa e proporcionalidade (céleres considerações). Revista de Direito Administrativo. v. 235. Rio de Janeiro: Renovar, jul./set., 2001, p. 179-193, p. 180. 73

GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988: interpretação e crítica. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 157.

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propriedade. Fosse impossível a ocorrência do fato gerador, por outro lado, então nem sequer se poderia falar de norma tributária, já que o tributo inexistiria.74

Não pode, portanto, o contribuinte ser obrigado a praticar determinada

situação que implica no recolhimento de um tributo, hipótese essa que violaria o

corolário da vedação ao confisco.

Ao FISCO não é fornecido o poder de obrigar os contribuintes a praticar as

hipóteses de incidência previstas em lei.

Por outro lado, nada impede que o FISCO aponte uma situação mais gravosa

e outra mais interessante ao contribuinte, para que esse, optando por praticar o fato

gerador da incidência tributária, escolha a forma induzida pelo ente tributante.

Nesse toar, destacamos as lições de Fernando Facury Scaff75, para quem:

[...] a intervenção indutiva também poderá existir no sentido de desestimular uma atividade econômica, e não de incentivá-la. Tal hipótese ocorre quando, por exemplo, o Estado determina altas alíquotas de imposto de importação na hipótese de entrada de automóveis estrangeiros no território nacional. Tal forma desincentivaria a importação de automóveis, porém não vedaria tal atividade.

A norma de indução, portanto, é totalmente compatível com as normas

tributárias em nosso ordenamento jurídico, devendo ser as escolhidas para a

promoção dos incentivos visando o cumprimento do programado na Carta Magna.

Nessa seara de indução de situações almejadas na Constituição, importante

destaque merecem os chamados “incentivos fiscais”.

Os incentivos fiscais são vantagens pecuniárias derivadas da redução ou

ausência de cobrança de tributos, ou mesmo um retardamento na cobrança destes,

em função de um investimento que o contribuinte vá realizar, concedidos aos que

atendam determinadas condições estabelecidas em Lei.

A redução/ausência de tributação derivada de Lei é denominada isenção,

enquanto o retardamento na arrecadação é usualmente tratado como diferimento.

Referidos incentivos fiscais devem observar normas legais severas, não

permitindo, normalmente, que o contribuinte tente se valer de uma interpretação

analógica à situação de outro contribuinte.

É o que se denota da transcrição do artigo 111, do CTN:

Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:

74

SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas Tributárias Indutoras e Intervenção Econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 46. 75

SCAFF, Fernando Facury. Contribuições de intervenção e direitos humanos de segunda dimensão. Instituto de Direito Tributário de Londrina. Disponível em: http://www.idtl.com.br/artigos/121.pdf. Acesso em 05 de ago. 2012.

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[...]

II - outorga de isenção;

Assim, a isenção deve ser analisada literalmente, não permitindo sua

concessão para outras hipóteses que não as elencadas na lei que as instituiu, ou a

sua manutenção no caso de serem retiradas do ordenamento.

Ademais, as isenções possuem limitações à sua instituição, impostas pela

Constituição, como bem se posicionou José Souto Maior Borges76:

No poder de tributar se contém o poder de eximir, como o verso e o reverso de uma medalha.

Ao atribuir a competência para tributar, a Constituição Federal não apenas permite, mas às vezes programa, ela própria (p. ex., arts. 150, § 6º e 155, XII, e e g), a abstenção do exercício dessa competência pela via da isenção, em determinadas circunstâncias excepcionais.

Além disso a Constituição estabelece princípios, como o de legalidade (arts. 5º, II e 150, I) e isonomia tributárias (arts. 5º, caput e item I, arts. 145, § 1º e 150, II) que vinculam a legislação integrativa ordinária (art. 151, I, in fine e item III) e complementar (art. 150, XII, “e” e “g”) na disciplina das isenções.

Consequentemente, estão sujeitas as isenções, pelo ordenamento constitucional tributário, a condicionamentos idênticos aos que são estabelecidos para a instituição de tributos. Torna-se manifesta, assim, a interligação entre o regime jurídico do tributo e o das isenções.

O poder de isentar é o próprio poder de tributar visto ao inverso.

Seja qual forma tomem (isenções ou diferimentos), esses incentivos fiscais

constituem inegável renúncia de receitas aos cofres públicos.

Nesse sentido77:

Do ponto de vista financeiro, as normas tributárias indutoras podem ter efeito seja de um pagamento a fundo perdido, seja de uma concessão de crédito sem juros. Enquanto a primeira hipótese se concretiza no exemplo da isenção, a última aparece em casos de deferimentos (inclusive na antecipação de despesas, como se dá na depreciação acelerada). Neste sentido, parece acertado entender que os incentivos fiscais são uma forma de subvenção, sujeitando-se, então, ao regime imposto à última.

Juridicamente, entretanto, deve-se ressaltar que o conceito de subvenção pressupõe uma prestação pecuniária pelo Estado, o que incorre no caso de incentivos fiscais, quando adotam a forma de renúncia. Neste sentido, apenas os créditos tributários recairiam naquela categoria. Entretanto, como argumenta Bayer, não pode a visão formal deixar de reconhecer que essencialmente ocorre uma subvenção, seja com uma prestação pecuniária, seja com uma renúncia por parte do Estado. Também Tipke é categórico ao incluir as normas tributárias indutoras que afastam a carga tributária entre

76

BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da Isenção Tributária. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2007. pp. 30-31 77

SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas Tributárias Indutoras e Intervenção Econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 57.

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as formas de subvenções, o que implica deverem elas se justificar, como qualquer subvenção.

Vemos que o comentado autor trata os incentivos fiscais como formas de

subvenção.

Segundo Heraldo da Costa Reis78, as subvenções “destinam-se a atender à

manutenção de outras entidades de direito público ou privado. São transferências

destinadas a cobrir despesas de custeio das entidades beneficiadas” e se dividem

em:

Subvenções sociais, as que se destinem a instituições públicas ou privadas de caráter assistencial ou cultural, sem finalidade lucrativa. É fundamental que, nos limites das possibilidades financeiras, a concessão de subvenções sociais visem sempre à prestação de serviços essenciais de assistência social, médica e educacional, sempre que a suplementação de recursos de origem privada, aplicados a esses objetivos, revelar-se mais econômica. O valor das subvenções, sempre que possível, será calculado com base em unidades de serviços efetivamente prestados ou postos à disposição dos interessados, obedecidos os padrões mínimos de eficiência previamente fixados (ver art. 12, § 3º, I e art. 16, par. único – Lei 4.320/64);

Subvenções econômicas, transferências destinadas à cobertura dos déficits de manutenção das empresas públicas, de natureza autárquica ou não, expressamente incluídas nas despesas correntes do orçamento das entidades federativas (União, Estados, Municípios e Distrito Federal), bem como a cobrir diferença entre os preços de mercado e os preços de revenda, pelo Governo, de gêneros alimentícios ou outros e pagamentos de bonificações a produtores de determinados gêneros alimentícios ou materiais (ver art. 12, § 3º , II e art. 18, par. único, letras a e b – Lei 4.320/64).

Por essa razão, a concessão de incentivos fiscais demandam, para sua

implementação, além de prévia descriminação orçamentária, expressa e aceitável

justificação, sob pena de comprometer o orçamento do ente tributante, com a

responsabilização dos administradores públicos.

Superados esses limites legais e constitucionais, os incentivos fiscais podem

ser fonte de estímulo para a participação do setor privado em programas sociais

(incentivo ao esporte, cultura, entre outros), bem como para desenvolver interesses

públicos através da iniciativa privada, com baixo custo para o Estado.

Além disso pagar menos tributos sempre gera nos contribuintes a sensação

de justiça fiscal, ou seja, de que estão pagando o valor justo e contribuindo para

determinado setor, reduzindo a sonegação fiscal.

Entretanto, vale lembrar que a renúncia estatal por meio dos incentivos pode

acarretar: a) benefícios para contribuintes mais ricos; b) desequilíbrios fiscais, em

78

REIS, Heraldo da Costa. Subvenções, contribuições e auxílios. Revista de Administração Municipal -Municípios, Rio de Janeiro, v.54, n. 268, p. 56, out./dez. 2008. p. 2.

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face do desconhecimento do montante que será renunciado; c) prejuízos para outros

entes federativos, que dependam de parte dos tributos que estão sendo

renunciados; d) os contribuintes beneficiados poderiam promover determinadas

atividades, independentemente de receberem incentivos; e) os contribuintes podem

ficar “acostumados” aos benefícios, causando maior repúdio o seu término.

Importante discussão deve ser tratada acerca da possibilidade de utilização

das normas tributárias indutoras aliadas aos impostos, tendo em vista a proposta do

presente trabalho acadêmico, em especial o IRPJ.

Novamente, trazemos à baila as lições de Luís Eduardo Shoueri79:

Por fim, importa lembrar, do estudo das causas (justificação) em matéria tributária, a importância de que se reveste, para os impostos, a idéia de solidariedade, da qual a capacidade contributiva é manifestação. Se a Ordem Econômica tem, nos termos do artigo 170 da Constituição Federal, por finalidade assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, vê-se que não se pode apontar incompatibilidade entre as normas tributárias indutoras e os impostos, já que ambos se integram no objetivo da construção de uma sociedade livre, justa e solidária (artigo 3º da Constituição Federal).

De fato, os impostos possuem a função básica de constituir a principal fonte

de receitas do Estado, para que este possa saldar suas despesas com

funcionalismo e estrutura, bem como para investir esses recursos nas necessidades

básicas da população.

Poderiam ser, então, os impostos, utilizados para fins extrafiscais, ou seja,

estes tributos podem ser investidos em outras finalidades que não suprir os gastos

gerais?

Em outras palavras: os impostos deixam de pertencer a esta espécie tributária

por terem suas receitas investidas em outros fins que não a arrecadação?

Cremos que não há impedimento para que o Estado se valha de normas

tributárias indutoras para os impostos.

As receitas derivadas da arrecadação de impostos podem ser aplicados pelos

entes federados da forma que melhor lhe aprouverem, respeitados os limites legais

e também a noção de que a concessão excessiva de incentivos fiscais pode

acarretar todos os problemas já referidos no decorrer deste capítulo.

Supridas as necessidades econômicas básicas do Estado, este pode utilizar-

se de normas tributárias indutoras em relação aos impostos, inclusive para agilizar a

79

SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas Tributárias Indutoras e Intervenção Econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005. pp. 167-8.

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prestação do serviço público que, sendo alcançado diretamente pelos recursos

derivados dos particulares, minimizam a burocracia estatal e aumentam a sua

eficiência.

Assim, como referido por Luís Eduardo Schoueri, os impostos e as normas

tributárias indutoras se integram perfeitamente para alcançar os preceitos

insculpidos no artigo 3º, da CF/88 (liberdade, justiça e solidariedade).

Para reforçar a possibilidade de introduzir normas tributárias indutoras nos

impostos, em particular no IR, transcrevemos literal colocação de Roque Antônio

Carrazza80:

O IR pode perfeitamente ser posto a serviço da extrafiscalidade.

Realmente, embora exista para gerar as receitas de que a União necessita para atender às suas funções, o IR também deve favorecer os valores citados no item anterior – e, portanto, precisa ser utilizado para fomentar a defesa e a proteção da Ecologia e do meio ambiente, a proteção da saúde e da assistência pública, a superação das desigualdades sociais etc. [...]

Como vemos, os exemplos podem ser multiplicados, que são legião, e reforçam a idéia, acima exibida, de que o IR pode ser um excelente instrumento de execução de políticas sociais e de aprimoramento do homem.

Por fim, impende destacar que, dentre os direitos contidos nas normas

constitucionais programáticas, que podem ser estimulados ou promovidos pela

tributação indutora, encontramos: i) a proteção aos direitos do consumidor; ii) a

defesa do meio ambiente; iii) a redução das desigualdades regionais; iv) a promoção

do emprego formalizado; v) a função social da propriedade; vi) outros direitos.

Assim, muitos estudos podem ser formulados a partir da melhor compreensão

e utilização das normas tributárias indutoras, bastando o interesse da sociedade e

do legislador para a promoção ou desenvolvimento de direitos essenciais.

Neste trabalho, como está claro, nos limitaremos a analisar apenas a

possibilidade de desenvolvimento regional, incentivado pelas normas tributárias

indutoras, através do IRPJ.

80

CARRAZZA, Roque Antônio. Imposto sobre a renda (perfil constitucional e temas específicos). 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 145.

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CAPÍTULO III

Desenvolvimento regional incentivado pelo IRPJ

3.1. A redução das desigualdades regionais na Constituição Federal de 1988

Verificamos que a redução das desigualdades regionais é assunto tratado

como objetivo fundamental do Brasil, consoante se infere logo no início do texto

constitucional, no artigo 3º, da CF/88:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

[...]

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

Com efeito, o legislador constituinte procurou – com a introdução do artigo 3º,

inciso III, da CF/88 – sanear um problema que surgiu ao longo de um processo

histórico marcado pela distribuição desigual de investimentos entre regiões

geoeconômicas nacionais (norte, nordeste, centro-oeste, sudeste e sul).

Isso porque, especialmente no século XIX, as regiões norte e nordeste eram

desguarnecidas de todas as formas de investimentos governamentais, que se

concentraram no eixo sul-sudeste.

Desse modo, surgiu um grande abismo social e econômico entre as regiões

geopolíticas nacionais, o que incutiu no constituinte de 1988 a necessidade de tratar

do assunto das desigualdades regionais em diversos pontos da Carta Magna

vigente.

Por isso, vemos como princípio da ordem econômica, inserido na CF/88, a

redução das desigualdades regionais:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

[...]

VII - redução das desigualdades regionais e sociais;

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A ordem econômica é o conjunto de normas e princípios “que devem orientar

a atuação do Estado e dos particulares nos processos de produção, circulação,

distribuição e consumo das riquezas do país”81.

Para Eros Roberto Grau82, o artigo 170, da CF/88:

oferece uma proposta principiológica de conciliação dialética entre diversos elementos sócio-ideológicos, ora sinalizando para o capitalismo e a configuração de um Estado liberal, ora apontando uma opção pelo socialismo e pela organização de um Estado intervencionista, a revelar um compromisso entre as forças políticas liberais e as reivindicações populares de justiça social no mercado capitalista.

Assim, ao eleger a redução das desigualdades regionais como princípio da

ordem econômica, o constituinte determinou que o sistema produtivo deve se voltar,

sempre que possível, ao cumprimento desse escopo constitucional.

Destaque-se que a competência para a promoção dessa redução de

desigualdades é da União, nos termos do artigo 21, da CF/88:

Art. 21. Compete à União:

[...]

IX - elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social;

Parece-nos óbvia essa atribuição de competência à União, tendo em vista

que, embora o texto constitucional pregue em sentido diverso, os estados da

federação não possuem interesse para com o desenvolvimento dos demais, ou seja,

falta aos mesmos a noção/sentimento de solidariedade.

Como evidência dessa ausência de solidariedade para com os outros estados

federativos, mencionamos a existência da bem divulgada guerra fiscal, que

assombra as discussões mais calorosas sobre a necessidade de uma reforma

tributária.

Claramente, esses entes federativos, por serem pessoas jurídicas de direito

público (ficções legais), não possuem consciência (em sentido fisiológico), sendo

seus atos motivados pelas populações locais e pelos interesses dos governantes de

cada circunscrição.

81

BARROSO, Luís Roberto. A ordem econômica constitucional e os limites à atuação estatal no controle de preços. Revista Diálogo Jurídico. Salvador, n. 14, p.7, jun./ago. 2002. 82

GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 8 ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 218.

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Por isso, nada mais acertado que a redução dessas desigualdades históricas

serem promovidas pela União, como entidade neutra e controladora das demais.

Para tanto, a União pode se valer de diversos mecanismos, dentre os quais

os incentivos fiscais (isenções, reduções e diferimentos), nos termos do artigo 43, §

2º, da CF/88:

Art. 43. Para efeitos administrativos, a União poderá articular sua ação em um mesmo complexo geoeconômico e social, visando a seu desenvolvimento e à redução das desigualdades regionais.

[...]

§ 2º - Os incentivos regionais compreenderão, além de outros, na forma da lei:

I - igualdade de tarifas, fretes, seguros e outros itens de custos e preços de responsabilidade do Poder Público;

II - juros favorecidos para financiamento de atividades prioritárias;

III - isenções, reduções ou diferimento temporário de tributos federais devidos por pessoas físicas ou jurídicas;

IV - prioridade para o aproveitamento econômico e social dos rios e das massas de água represadas ou represáveis nas regiões de baixa renda, sujeitas a secas periódicas.

Para o legislador constituinte, o interesse pela redução das desigualdades

regionais é de grande importância, tanto que para a sua promoção, restou

assegurado à União o direito de não observar o “princípio da uniformidade

geográfica da tributação”83, verbis:

Art. 151. É vedado à União:

I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País;

Essa ressalva do legislador originário é perfeitamente justificável sob a ótica

da busca da justiça social, conforme nos ensina Aliomar Baleeiro84:

A Constituição de 1988 admite expressamente a concessão de incentivos fiscais em favor de áreas mais pobres, a fim de promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico regional (art. 151, I). Não se trata de uma quebra da regra da isonomia, mas

83

“Princípio da uniformidade geográfica. Surge explícito na redação cristalina do art. 151, I, da Carta Magna [...]. É fácil ver, nas suas dobras, mais uma confirmação do postulado federativo e da autonomia dos Municípios, posto que o constituinte vedou a eventualidade de qualquer distinção ou preferência relativamente a um Estado, a um Município ou ao Distrito Federal, em prejuízo dos demais.” Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 166. 84

BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 8 ed. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2010. pp. 654-655.

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da autorização de tratamento diferente e mais favorável às regiões diferentes, economicamente mais fracas.

Embora, imediatamente, a isenção incentivadora possa premiar quem tenha grande capacidade contributiva e demonstre aptidão para se adaptar a plano de governo, como os prêmios à exportação, a dedução de investimentos na área da SUDENE etc., o objetivo é reduzir a miséria, as grandes desigualdades econômicas entre grupos e regiões. A justiça é, mesmo nesses casos, a meta, a finalidade última, embora os contribuintes, diretamente beneficiados com a redução da carga tributária, sejam estimulados ao investimento por meio de outros critérios e não em atenção à inexistência de capacidade econômica.

Por isso, pode o legislador conceder benefícios fiscais, mesmo a contribuintes

com maior capacidade contributiva, para alcançar o almejado desenvolvimento

regional, sem que incorra em violação à isonomia tributária.

O critério que será observado, portanto, será o interesse do contribuinte em

auxiliar o Estado na consecução do seu objetivo para desenvolver determinada

região social e economicamente.

Recorde-se que, quando o Estado concede incentivos fiscais a determinados

contribuintes, estes, desonerados em parte de importante despesa (tributos), podem

contratar mais funcionários (que, empregados, adquirem capacidade contributiva,

gerando arrecadação ao Estado), adquirir máquinas e equipamentos menos

poluentes, reduzir preços aos consumidores, entre outros efeitos provocados pela

indução tributária.

Outrossim, impende ressaltar que o artigo 151, inciso I, da CF/88, não permite

à União a instituição de tratamentos tributários diferentes aos contribuintes

localizados em diferentes regiões, ou seja, não tolera o agravamento da situação

dos contribuintes instalados em áreas historicamente mais favorecidas, mas apenas

o benefício tributário localizado e com a finalidade de buscar o equilíbrio.

Nesse sentido, argumenta Hamilton Dias de Souza85, informando que “o

dispositivo não permite o estabelecimento de regimes tributários diversos entre as

várias regiões. Consente apenas que para algumas delas, em virtude de suas

características, possa haver incentivos.”

Desse modo, não pode o legislador cobrar mais tributos de regiões mais

desenvolvidas e menos das pobres, tão somente estabelecer benefícios fiscais em

85

SOUZA, Hamilton Dias de. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. (Coord.). Comentários ao Código Tributário

Nacional. São Paulo: Saraiva, 1998. v. 1, p. 8-9.

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caráter temporário a alguns contribuintes, para que estes atuem como fatores de

auxílio ao desenvolvimento regional.

3.1.1. A Questão da Guerra Fiscal como entrave ao

desenvolvimento regional

A guerra fiscal é um termo muito divulgado pela doutrina, jurisprudência e

meios de comunicação, nos tempos atuais.

Segundo Fernando Facury Scaff:

A expressão guerra fiscal retrata uma situação de disputa econômica entre entes autônomos, possuidores de competência tributária, que visam obter para seus respectivos territórios um determinado empreendimento econômico, oferecendo, para tanto, benefícios para atrair as pessoas interessadas, sejam vantagens de ordem tributária ou de outra natureza, como infraestrutura, capacitação de recursos humanos, disponibilização de crédito a menor custo, dentre outras.86

O conceito apresentado por Fernando Facury Scaff é bem representativo da

atual situação de concessão de benefícios oferecidos, em especial pelos Estados-

membros da federação, na busca de empreendimentos que produzam o

desenvolvimento de seus territórios.

Embora a guerra fiscal seja mais visível em relação aos Estados da

federação, usualmente através do ICMS, essa não é a única forma de embate fiscal

federativo, consoante se percebe da doutrina de Daniel Monteiro Peixoto:

A principal “arma” é a concessão de benefícios e incentivos fiscais. Como “munição”,

utiliza-se das mais diversas espécies tributárias disponíveis aos entes subnacionais: a

desoneração do ISS, pelos Municípios, pode servir de meio de atração de empresas

prestadoras de serviços; benefícios ligados ao IPVA, pelos Estados-membros, atraem o

registro de veículos automotores por particulares, ou mesmo, grandes locadoras.

Todavia, da forma em que montado o sistema tributário brasileiro, o maior “poder de

fogo” ficou a cargo do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), de

competência dos Estados-membros [...] 87

Como se percebe, na ausência de uma estrutura de incentivos centralizada,

ou seja, sem que a União exerça as suas competências de controle inseridas nos

86

SCAFF, Fernando Facury. Guerra Fiscal, Neoliberalismo e Democracia. Revista do Direito, Santa Cruz do Sul, nº 11, jan./jul. 1999. p. 135. 87

PEIXOTO, Daniel Monteiro. In: SANTI, Eurico Marcos Diniz de. (Coord.). Curso de Direito Tributário e

Finanças Públicas: do fato à norma, da realidade ao conceito jurídico. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 1082-83.

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artigos 21 e seguintes da CF/88, todos os “entes subnacionais” acabaram por adotar

um política de incentivos desgovernada e na tentativa de suprir, apenas, suas

necessidades locais.

Nesse sentido, Marcos Nóbrega e Carlos Maurício Figueiredo destacam que:

Alguns pontos podem ser considerados para entender o crescimento da guerra fiscal na última década. Um primeiro ponto relevante foi a efetiva ausência de uma política industrial e sobretudo regional. O desmanche ou fechamento das agências regionais de fomento foi crucial para esse fenômeno. Sendo assim, a política tributária dos Estados, mediante concessão de incentivos de ICMS, passou a fazer as vezes ao arrepio da lei. Tal prática levou a uma competição desordenada, promovendo o aumento da concentração industrial em vez de minorá-la, posto que os pequenos Estado, já combalidos em suas finanças, tiveram que conceder, proporcionalmente, mais incentivos para a atração de investimentos, não considerando, muitas vezes, de forma clara o retorno dos mesmos.88

Como cada ente federativo subnacional teve que orientar sua política de

incentivos, sem a observância de um poder central que os controlasse, o princípio

federativo que rege a atual carta magna terminou por ser fragilizado pela guerra

fiscal.

De acordo com Fernando Rezende:

[...] o virtual abandono, pelo governo federal, das políticas voltadas ao desenvolvimento das regiões economicamente mais atrasadas fez com que a tendência de redução das disparidades de renda entre regiões Norte e Nordeste e Sul e Sudeste se interrompesse, a partir de meados dos anos oitenta, aumentando as dificuldades dos estados localizados nas regiões mais pobres para sustentar as suas políticas no campo de atendimento às necessidades sociais.89

Para Marlon Jorge Liebel e Glauco Oscar Ferraro Pires90, “os estados

promoveriam a guerra fiscal a fim de preencher o espaço vazio deixado pela

omissão federal (ausência de regulação e de políticas nacionais de

desenvolvimento), fato que criaria o mais perverso dos sistemas.”

88

NÓBREGA, Marcos; FIGUEIREDO, Carlos Maurício. Renúncia de Receita, Guerra Fiscal e Tax Expenditure: Uma Abordagem do Art. 14 da LRF. Revista Interesse Público, Especial – Responsabilidade Fiscal, Porto Alegre, 2002, p. 41. 89

REZENDE, Fernando. Modernização tributária e federalismo fiscal. In: REZENDE, F; OLIVEIRA, F. A. Descentralização e federalismo fiscal no Brasil: desafios da reforma tributária. Rio de Janeiro: Konrad Adenauer Stiftung, 2003, p. 25-40, p. 29. 90

LIEBEL, Marlon Jorge; PIRES, Glauco Oscar Ferraro. A “guerra fiscal”: mecanismos e resultados. Fórum Fiscal dos Estados Brasileiros & Fundação Getúlio Vargas; REZENDE, Fernando (coord.). Cadernos Forum Fiscal nº 2, Competição Fiscal, 2006. p. 70.

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Dessa luta desequilibrada, aponta Ricardo Varsano91,

os vencedores das guerras fiscais são, em geral, os estados de maior capacidade financeira, que vêm a ser os mais desenvolvidos, com maiores mercados e melhor infra-estrutura [...] ao renunciar à arrecadação, o estado está abrindo mão ou da provisão de serviços (educação, saúde, a própria infra-estrutura etc.) que são insumos do processo produtivo ou do equilíbrio fiscal, gerando instabilidade macroeconômica.

Nesse passo, João Hélio de Farias Moraes Coutinho92 aponta para a violação

do federalismo pela guerra fiscal, em especial por demonstrar a incompatibilidade,

dessa concorrência entre entidades, com o modelo cooperativo inerente à

organização federativa moderna:

Assim, a guerra fiscal é sinal maior das radicalizações e ressentimentos locais e regionais, decorrentes de políticas públicas incapazes de conter o déficit na capacidade de investimento público, assim como as desigualdades regionais gritantes, fruto da ausência de projetos de desenvolvimento pactuados nacionalmente e de posturas políticas desesperadas, de caráter nitidamente desagregador.

Portanto a locução guerra fiscal denota uma situação de conflito federativo. O ente que aufere alguma vantagem impõe, em diversas situações, uma perda a algum ou a alguns dos demais, já que a guerra raramente é um jogo de soma positiva.

A Federação – cláusula pétrea da Constituição – sai enfraquecida dessa guerra, haja vista que o federalismo cooperativo93 em nada se coaduna com a ausência dessa característica numa guerra fiscal. Quanto às empresas, há as que ganham, mas também as que perdem com a guerra fiscal.

A guerra fiscal está na contramão da história, uma vez que as federações, atualmente, a exemplo da alemã, buscam consolidar e aprimorar o federalismo cooperativo94, em que políticas são traçadas, objetivando reduzir as distorções inatas ao modelo.

91

VARSANO, Ricardo. A “guerra fiscal” do ICMS: quem ganha e quem perde. Texto para discussão nº 500, Rio de Janeiro: IPEA, 1997. p. 5. 92

COUTINHO, João Hélio de Farias Moraes. A legitimidade dos incentivos fiscais num contexto de guerra

fiscal. Tese de doutorado apresentada ao Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 2011. p. 124-25. 93

Cf. ABRUCIO, Fernando Luiz. Os laços federativos brasileiros: avanços, obstáculos e dilemas no processo de coordenação intergovernamental. São Paulo: USP, 2000 (Tese de Doutorado). Há basicamente dois modelos de articulação governamental: o competitivo e o cooperativo, os quais propõem soluções distintas para o problema da coordenação. O primeiro modelo pode ser observado nos Estados Unidos, enquanto o segundo na Alemanha, no Canadá e na Austrália. O modelo competitivo é estudado por economistas e cientistas políticos filiados a Teoria das Escolhas Públicas. Os principais pressupostos do modelo cooperativo estão presentes nas formulações da Escola do Federalismo Fiscal. 94

Cf. PRADO, Sérgio. A questão fiscal na Federação Brasileira: diagnóstico e alternativas. Documento elaborado no âmbito do Convênio CEPAL/IPEA (Projeto: Brasil: o estado de uma nação). Brasília: CEPAL, São Paulo: IPEA, 2007, p. 75-76: “A noção de federalismo cooperativo é associada à existência de sólidas instituições que organizam a atuação conjunta dos governos, tornando-se fóruns e instrumentos pelos quais a intervenção estatal é organizada através de um processo continuado de negociação intergovernamental formalizada em grandes e pequenos organismos burocráticos, conselhos intergovernamentais e órgãos colegiados. Na Alemanha, este caráter cooperativo tem sua manifestação mais importante no fato de que a legislação federal uniforme é dominante, mas os estados têm elevada participação na elaboração desta

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Outrossim, quanto a modalidade de guerra fiscal praticada pelos Estados-

membros em relação às prestações e operações interestaduais, tributadas pelo

ICMS, verificamos uma afronta direta ao que determina o artigo 155, § 2º, inciso IV,

observe-se:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

§ 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

IV - resolução do Senado Federal, de iniciativa do Presidente da República ou de um terço dos Senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros, estabelecerá as alíquotas aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação;

Embora a guerra fiscal praticada nessas condições seja vedada pela

Constituição de 1988, os Estados-membros não têm se sentido intimidados pelas

determinações constitucionais.

Ademais, as sanções estabelecidas nos artigos 8º e 9º, da Lei Complementar

nº 24, de 07 de janeiro de 197595, não têm inibido os Estados e Municípios, já que

terminam por onerar mais os contribuintes que os entes federados concedentes.

legislação através do Bundesrat, a câmara alta alemã, que é composta por delegados indicados pelos governos estaduais. [...] o Brasil não apresenta quaisquer traços que lembrem o federalismo cooperativo. Antes de tudo, a participação dos interesses estaduais na legislação federal não é técnico-executiva como no Bundesrat alemão, mas é intermediada pela estrutura política fragmentária do Congresso Nacional e por um Senado tradicional, com representantes eleitos, onde os interesses partidários tendem a filtrar e borrar a representação dos interesses estaduais”. Conforme consta do Bundesrat website, “The basic idea underlying the democratic and federal constitution of Germany is the division of power. In the performance of their tasks, the Federation and the Länder should work within a mutual checks-and-balance system but also practice mutual co-operation and consideration. The main difference between the German form of federalism and other federative systems when it comes to the division and execution of tasks is that the individual federal state governments participate directly in the decisions of the national state or Federation. This is done through the Bundesrat. Within this system of division of power and combined performance of tasks, the Bundesrat has three central functions: it defends the interests of the Länder vis-à-vis the Federation and indirectly vis-à-vis the European Union; the ensures that the political and administrative experience of the länder is incorporated in the federation’s legislation and administration and in European Union affairs; like the other constitutional organs of the Federation, the Bundesrat also bears its share of the overall responsibility for the Federal Republic of Germany.” Disponível em: http://www.bundesrat.de/cln_161/nn_10940/EN/funktionen-en/funktionen-en-node.html?_nnn=true Acesso em: 10 ago. 2012. 95

Art. 8º - A inobservância dos dispositivos desta Lei acarretará, cumulativamente: I - a nulidade do ato e a ineficácia do crédito fiscal atribuído ao estabelecimento recebedor da mercadoria; Il - a exigibilidade do imposto não pago ou devolvido e a ineficácia da lei ou ato que conceda remissão do débito correspondente. Parágrafo único - As sanções previstas neste artigo poder-se-ão acrescer a presunção de irregularidade das contas correspondentes ao exercício, a juízo do Tribunal de Contas da União, e a suspensão do pagamento das quotas referentes ao Fundo de Participação, ao Fundo Especial e aos impostos referidos nos itens VIII e IX do art. 21 da Constituição federal.

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Observem-se, a respeito da guerra fiscal, os seguintes julgados do Supremo

Tribunal Federal - STF:

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO E DE TRANSPORTE INTERESTADUAL E INTERMUNICIPAL. COBRANÇA NAS OPERAÇÕES INTERESTADUAIS PELO ESTADO DE DESTINO. EXTENSÃO ÀS REMESSAS PARA CONSUMIDORES FINAIS. COMÉRCIO ELETRÔNICO. “GUERRA FISCAL”. DENSA PROBABILIDADE DE VIOLAÇÃO CONSTITUCIONAL. LEI 9.582/2011 DO ESTADO DA PARAÍBA. MEDIDA CAUTELAR REFERENDADA.

1. A Constituição define que o estado de origem será o sujeito ativo do ICMS nas operações interestaduais aos consumidores finais que não forem contribuintes desse imposto, mas a legislação atacada subverte essa ordem (art. 155, § 2º, II, b da Constituição).

2. Os entes federados não podem utilizar sua competência legislativa privativa ou concorrente para retaliar outros entes federados, sob o pretexto de corrigir desequilíbrio econômico, pois tais tensões devem ser resolvidas no foro legítimo, que é o Congresso Nacional (arts. 150, V e 152 da Constituição).

3. Compete ao Senado definir as alíquotas do tributo incidente sobre as operações interestaduais.

4. A tolerância à guerra fiscal tende a consolidar quadros de difícil reversão.96

***

INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Lei nº 11.393/2000, do Estado de Santa Catarina. Tributo. Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS. Benefícios fiscais. Cancelamento de notificações fiscais e devolução dos correspondentes valores recolhidos ao erário. Concessão. Inexistência de suporte em convênio celebrado no âmbito do CONFAZ, nos termos da LC 24/75. Expressão da chamada "guerra fiscal". Inadmissibilidade. Ofensa aos arts. 150, § 6º, 152 e 155, § 2º, inc. XII, letra "g", da CF. Ação julgada procedente. Precedentes. Não pode o Estado-membro conceder isenção, incentivo ou benefício fiscal, relativos ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS, de modo unilateral, mediante decreto ou outro ato normativo, sem prévia celebração de convênio intergovernamental no âmbito do CONFAZ.97

Art. 9º - É vedado aos Municípios, sob pena das sanções previstas no artigo anterior, concederem qualquer dos benefícios relacionados no art. 1º no que se refere à sua parcela na receita do imposto de circulação de mercadorias. 96

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imposto sobre operações de circulação de mercadorias e de prestação de serviços de comunicação e de transporte interestadual e intermunicipal. Cobrança nas operações interestaduais pelo estado de destino. Extensão às remessas para consumidores finais. Comércio eletrônico. “Guerra fiscal”. Densa probabilidade de violação constitucional. Processo nº ADI 4705 MC-REF. Relator: Ministro Joaquim Barbosa. 23 de fev. 2012. Tribunal Pleno. DJe 19 de jun. 2012. 97

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Lei nº 11.393/2000, do Estado de Santa Catarina. Tributo. Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS. Benefícios fiscais. Cancelamento de notificações fiscais e devolução dos correspondentes valores recolhidos ao erário. Concessão. Inexistência de suporte em convênio celebrado no âmbito do CONFAZ, nos termos da LC 24/75. Expressão da chamada "guerra fiscal".

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O Supremo Tribunal Federal - STF, assim, caracteriza a guerra fiscal como de

densa probabilidade de violação à Constituição, além de reconhecer a afronta à Lei

Complementar nº 24/75, quando da prática de incentivos fiscais sem o necessário

convênio estabelecido pelo CONFAZ.

Como o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal - STF demora muito

tempo para inibir o dispositivo dos Estados ou Municípios que institua os benefícios

indevidos e, como muitos entes adotam a tática da revogação da lei ou decreto

pouco antes da manifestação final sobre o assunto, reeditando a norma

inconstitucional após o arquivamento do processo, em completo desrespeito às

decisões da Corte Suprema, a guerra fiscal acaba não sendo combatida de forma

apropriada.

Essa é a conclusão a que chega Luiz Alberto Gurgel de Faria98, expressis:

Como se pode extrair dos casos elucidados, a orientação do Tribunal é efetivamente severa na repressão à guerra fiscal, sendo as decisões adotadas normalmente por unanimidade e em caráter urgente. Nada obstante, a via judicial não vem sendo suficiente para barrar a guerra, pois o judiciário geralmente é provocado quando já decorrido muito tempo da concessão do benefício irregular. Além do mais, há casos em que a unidade federada revoga a norma impugnada, para prejudicar o pedido na ação direta de inconstitucionalidade, e a reedita mais à frente, com outra roupagem.

Assim, em face do descumprimento aos preceitos legais e constitucionais

pelos Estados e Municípios, bem como em razão da falta de políticas de incentivos

coordenadas pela União, e ainda, por não estar sendo possível uma melhor atuação

da Corte Suprema, permanece forte a guerra fiscal, com os malefícios à sociedade

que ela traz.

Tudo isso justifica nossa escolha, neste trabalho, pelo estudo da redução das

desigualdades por meio da tributação indutora fundada no IRPJ, já que reacenderia

uma política central de investimentos, controlada diretamente pela União.

Inadmissibilidade. Ofensa aos arts. 150, § 6º, 152 e 155, § 2º, inc. XII, letra "g", da CF. Processo nº ADI 2345. Relator: Ministro Cezar Peluso. 30 de jun. 2011. Tribunal Pleno. DJe 04 de ago. 2011. 98

FARIA, Luiz Alberto Gurgel de. A extrafiscalidade e a concretização do princípio da redução das

desigualdades regionais. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p. 152.

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3.1.2. Algumas medidas para minimizar a Guerra Fiscal

Já no momento de formação da Constituição de 1988, Alcides Jorge Costa

alertava sobre os problemas que poderiam advir da ausência de controle central

sobre as concessões de incentivos pelos Estados e Municípios:

seria desaconselhável que a Estados e Municípios fossem atribuídos impostos de efeito econômico no âmbito nacional, sem estabelecer algum tipo de limitação de competência legislativa, sob pena de ter-se um País submetido a muitas políticas tributárias diferentes e conflitantes entre si e, certamente, um País que seria palco de guerras fiscais permanentes. A autonomia de Estados e Municípios deve ser preservada. Exige-o a diversidade do País. Mas esta autonomia não pode por em xeque a unidade econômica do País, nem desfazer um mercado naturalmente comum.99

Complementa esse entendimento, a compreensão de Ricardo Lobo Torres de

que “no federalismo a extrafiscalidade pode ser manipulada por qualquer dos entes

tributantes, desde que, amalgamada ao tributo que lhe pertencer, tenha por objetivo

influir sobre o campo que se situe sob o seu poder de polícia”100

Assim, para referidos autores, os Estados e Municípios poderiam interferir na

ordem econômica local, através das normas indutoras, mas estariam impedidos de

intervir economicamente além de suas fronteiras, ou seja, incentivar as empresas

em situações que possam provocar prejuízos materiais aos demais entes federados.

Como visto, o principal motivo da guerra fiscal é a intervenção econômica dos

Estados e Municípios, incentivando empresas para se instalar em seus territórios,

atuando, justamente, em áreas que não poderiam ou deveriam intervir.

Recorde-se, ainda, que a crescente onda de interferência econômica supra

territorial de Estados e Municípios se deve à ausência da atuação da União no

cumprimento de sua função constitucional para redução das desigualdades

regionais.

Como soluções para essa crise fiscal, Sérgio Prado e Carlos Eduardo G.

Cavalcanti101 propõem a adoção de 03 (três) medidas que entendem suficientes

para acabar com a guerra fiscal, quais sejam:

99

COSTA, Alcides Jorge. Algumas Idéias sobre uma Reforma do Sistema Tributário Brasileiro. Direito Tributário

Atual. NOGUEIRA, Ruy Barbosa (coord.), vols.7/8, Instituto Brasileiro de Direito Tributário; Resenha Tributária, 1987/88. pp. 1757-58. 100

TORRES, Ricardo Lobo. Sistemas Constitucionais Tributários. Rio de Janeiro: Forense, 1986. p. 635. 101

CAVALCANTI, Carlos Eduardo G.; PRADO, Sérgio. A Guerra Fiscal no Brasil. Brasília: IPEA, 2000. p. 130-131.

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1ª) estabelecimento de restrição de ordem abrangente, se possível em nível constitucional, que vete os mecanismos principais utilizados ou, pelo menos, aqueles considerados mais nocivos;

2ª) ampliação do arranjo institucional do Conselho Nacional de Política Fazendária, tornando-o um fórum de fiscalização e controle efetivo;

3ª) adoção de mecanismos tributários diretos, ou seja, princípio do destino na cobrança do ICMS.

Concordamos com a primeira medida sugerida, e entendemos que poderia

ser editada uma emenda constitucional, proibindo a concessão de incentivos fiscais

pelos Estados e Municípios, exceto nas hipóteses em que esses benefícios não

interfiram na economia ou na arrecadação de outros entes.

Acerca da interferência do CONFAZ, embora esta já esteja prevista na Lei

Complementar nº 24/75, evidentemente não vem surtindo os efeitos pretendidos,

pois os entes federativos vêm ignorando as determinações dessa entidade.

Talvez, com um endurecimento das punições para os entes que descumpram

as determinações do CONFAZ, fosse possível afastar a ocorrência da guerra fiscal.

Nessa direção, Luiz Alberto Gurgel de Faria102 aponta medidas punitivas mais

severas, que constam do texto sobre a reforma tributária, atualmente em discussão

no Congresso Nacional:

Na emenda constitucional já em tramitação no Congresso Nacional há, também, uma preocupação em impedir que novos incentivos venham a ser concedidos irregularmente, de modo que foi prevista punição severa: a suspensão das transferências do Fundo de Participação dos Estados (FPE), do novo Fundo de Equalização de Receitas (FER) e dos recursos da política de desenvolvimento regional aos Estados que concederem novos benefícios em desacordo com as normas constitucionais.

[...]

Caso isso aconteça e venham a ser aprovadas sanções tão rígidas para a guerra fiscal, poder-se-á, finalmente, alcançar o fim deste combate. Enquanto isso não ocorrer, os conflitos administrativos, legislativos e judiciais continuarão.

Aliadas essas punições com incremento de poder de atuação do CONFAZ,

poderíamos verificar uma maior efetividade nos resultados alcançados por este

órgão de controle, atualmente menosprezado pelos entes federados.

102

FARIA, Luiz Alberto Gurgel de. A extrafiscalidade e a concretização do princípio da redução das

desigualdades regionais. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p. 147.

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Por fim, em relação a alteração da sistemática de cobrança do ICMS, terceira

medida sugerida por Sérgio Prado e Carlos Eduardo G. Cavalcanti, João Hélio de

Farias Moraes Coutinho103 também opina pela adoção da cobrança no destino,

senão vejamos:

Assim, a adoção do princípio de destino seria uma medida que praticamente104 eliminaria a guerra fiscal do ICMS, apesar de não assegurar que a disputa pelos investimentos não continuaria por outros meios. Essa também é a opinião do então secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Bernard Appy105, para quem “a guerra fiscal existe exatamente por conta dessa alíquota de origem”.

Independentemente das medidas adotadas, entendemos que deve ser

priorizado o retorno da União à sua função de controlar os incentivos concedidos,

com políticas sérias e planejadas, em especial para concretizar a redução das

desigualdades regionais.

Consolida a nossa opinião, o entendimento de Luís Eduardo Schoueri106

sobre o assunto:

Excetuado o caso de lei federal, que institua incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do País, o texto constitucional não tolera que norma tributária indutora venha a implicar distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro.

Portanto, quaisquer tentativas de amenizar ou eliminar a guerra fiscal, deve

começar com a federalização dos incentivos fiscais, em especial para tentar

promover a redução das desigualdades regionais.

3.2. As desigualdades regionais em números

A título exemplificativo, aportamos alguns dados estatísticos, neste trabalho,

para melhor compreensão e demonstração das desigualdades regionais em nosso

país.

103

COUTINHO, João Hélio de Farias Moraes. A legitimidade dos incentivos fiscais num contexto de guerra

fiscal. Tese de doutorado apresentada ao Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 2011. p. 145. 104

Dissemos “praticamente” porque não há garantia de que a guerra fiscal deixe de existir pela utilização de outros instrumentos, como : financiamentos, doações de terrenos etc. No entanto, acreditamos que com essa virulência não mais existiria a guerra fiscal. 105

Cf. Notícia veiculada pela Agência Brasil, sob o título “ICMS cobrado na origem eliminará a guerra fiscal, acredita o governo”. Disponível em: HTTP://www.ipea.gov.br. Acesso em: 15 ago. 2012. 106

SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas Tributárias Indutoras e Intervenção Econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 358.

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O primeiro dado importante a ser verificado, demonstrado na “Tabela 1”

abaixo, é a participação relativa de cada região geoeconômica brasileira no Produto

Interno Bruto – PIB107, no ano de 2009.

Tabela 1: Participação percentual das Grandes Regiões no Produto Interno Bruto

2002-2009

Grandes Regiões Participação percentual no Produto Interno Bruto (%) 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

Brasil 100 100 100 100 100 100 100 100 Norte 4,7 4,8 4,9 5,0 5,1 5,0 5,1 5,0

Nordeste 13,0 12,8 12,7 13,1 13,1 13,1 13,1 13,5 Sudeste 56,7 55,8 55,8 56,5 56,8 56,4 56,0 55,3

Sul 16,9 17,7 17,4 16,6 16,3 16,6 16,6 16,5 Centro-oeste 8,8 9,0 9,1 8,9 8,7 8,9 9,2 9,6

Fonte: IBGE, em parceria com os Órgãos Estaduais de Estatística, Secretarias Estaduais de Governo e Superintendência da Zona Franca de Manaus - SUFRAMA.

Segundo os dados acima, a capacidade de produção de riquezas da região

norte é 11 (onze) vezes menor que a região sudeste, enquanto a região nordeste

tem um potencial produtivo 4 (quatro) vezes menor que a mesma região paradigma.

Com efeito, as estatísticas apresentadas demonstram um grande

desequilíbrio, em termos de desenvolvimento, entre as regiões brasileiras, fruto de

desiguais investimentos aplicados em sua maior parte na região sudeste, que

responde pela produção de mais de 55% (cinquenta e cinco por cento) das riquezas

nacionais.

Outro indicador relevante, apontado pelos cientistas sociais, para medir o

grau de crescimento econômico, é o PIB per capita, senão vejamos:

O Produto Interno Bruto per capita é normalmente utilizado como um indicador do ritmo de crescimento da economia. Na perspectiva do desenvolvimento sustentável, costuma ser tratado como uma informação associada à pressão que a produção exerce sobre o meio ambiente, em consumo de recursos não-renováveis e contaminação. O crescimento do produto, porém, também pode ser condição para a satisfação das necessidades humanas correntes, para o combate da pobreza, diminuição do desemprego e para minorar outros problemas sociais. Seu crescimento é visto como sinal de um alerta nas condições dos países ricos, cujo padrão de vida e riqueza são os maiores responsáveis pelos problemas ambientais globais. Entre os países mais pobres ou em desenvolvimento é, em todos os sentidos, mais desejável que estejam presentes taxas elevadas de crescimento econômico, muito embora, na atualidade, eles próprios já

107

Total dos bens e serviços produzidos pelas unidades produtoras residentes destinados ao consumo final sendo, portanto, equivalente à soma dos valores adicionados pelas diversas atividades econômicas acrescida dos impostos, líquidos de subsídios, sobre produtos.

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não possam se descuidar da proteção ao meio ambiente como, no passado, se permitiram os chamados países centrais. 108

De acordo com informações da “Central Intelligence Agency – CIA” (Agência

Central de Inteligência) Norte Americana, o crescimento do PIB per capita no Brasil

pode ser representado pelo seguinte Gráfico:

Gráfico: Produto Interno Bruto (PIB) per capita (US$)109

País 1999 2000 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Brasil

6.150

7.400

7.600

7.600

8.100

8.300

8.800

9.500

10.200

10.100

10.800

Fonte: Central Intelligence Agency – CIA: World Factbook

Em consonância com os números exibidos, percebe-se que o Brasil está

apresentando um crescimento de destaque em sua economia, já que, em um

período de 10 (dez) anos, quase dobrou o valor de seu PIB per capita.

Trazendo esses dados para o campo regional, de acordo com o IBGE110, em

números apresentados na “Tabela 2”, abaixo, referentes ao ano de 2009, são

significativas as diferenças econômicas entre as regiões do país, novamente

destacando o abismo existente entre as regiões norte e nordeste, quando

comparadas com a região sudeste:

108

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Estudos e pesquisas – Informação Geográfica:

Indicadores de Desenvolvimento Sustentável. Brasil, 2008. p. 313. 109

Disponível em http://www.indexmundi.com/g/g.aspx?v=67&c=br&l=pt. Acesso em 28/06/2012. 110

CONTAS Regionais 2009. Disponível em http://www.ibge.gov.br/home/download/estatistica.shtm. Acesso em 25/06/2012.

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Tabela 2: Produto Interno Bruto, população residente e Produto Interno Bruto per capita, segundo as Grandes Regiões e as Unidades da Federação – 2009

Grandes Regiões Produto Interno Bruto per capita (R$)

Brasil 16.917,66 Norte 10.625,79

Nordeste 8.167,75 Sudeste 22.147,22

Sul 19.324,64 Centro-Oeste 22.364,63

Como se infere das estatísticas acima, a riqueza por habitante na região

nordeste representa a menos da metade da média nacional, além de ser equivalente

a aproximadamente 37% (trinta e sete por cento) do PIB per capita da região

sudeste.

Contudo, o desenvolvimento não pode se resumir aos indicadores

econômicos que medem o PIB e o PIB per capita, conforme explica Paulo César

Milone111:

O aspecto fundamental é que o desenvolvimento econômico não pode ser analisado, somente, por meio de indicadores que medem o crescimento do produto ou do produto per capita. Desenvolvimento deve ser complementado por índices que representem, ainda que de forma incompleta, a qualidade de vida dos indivíduos. Desse modo, deveremos ter um conjunto de medidas que reflitam alterações econômicas sociais, políticas e institucionais, tais como renda per capita, expectativa de vida, mortalidade infantil, fertilidade, educação, analfabetismo, distribuição de renda entre diferentes classes e setores, centralização da atividade econômica, poder político, entre outras.[...]

O desenvolvimento, portanto, deve ser entendido como um estado de

equilíbrio na produção, distribuição e consumo de riquezas, de modo que nenhum

Estado pode ser considerado desenvolvido se mantiver uma estrutura social

caracterizada por vertentes simultâneas de riqueza e pobreza.

Desse modo, pelos poucos dados exibidos, podemos perceber a existência

das desigualdades econômicas regionais no Brasil, e ainda, que essas diferenças

têm se mantido, em médio prazo, sem alterações importantes.

111

MILONE, Paula Cesár. Crescimento e desenvolvimento econômico: teorias e evidências empíricas. In: PINHO, Diva Benevides; Vasconcelos, Marco Antonio S. de. (Orgs.) Manual de economia. 5 ed. 7 tiragem. São Paulo: Saraiva, 2004. p.483-499/486

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3.3. A tributação indutora como meio de promoção da redução de

desigualdades

Como vimos no Capítulo II, as normas tributárias indutoras podem ser

utilizadas para alcançar diversas finalidades, desde a proteção do meio ambiente até

a promoção de equilíbrio econômico entre regiões.

Para André Elali:

[...] nota-se que a concessão de incentivos fiscais é de indubitável relevância em termos de buscar-se o desenvolvimento econômico. Assim, é ponto pacífico que tais medidas visam ao melhoramento das condições do sistema econômico, destacando-se os seguintes objetivos dos auxílios de Estado (subvenções, subsídios, incentivos fiscais etc.): i) a redução das desigualdades regionais; [...]

Ademais, por expressa determinação dos artigos 43, § 2º, 151, inciso I e 170,

inciso VII, todos da CF/88, é plenamente possível a utilização das normas tributárias

indutoras para alcançar a efetiva redução das desigualdades regionais.

Nesse sentido, impende observar as lições de Heleno Taveira Tôrres112, para

quem “todo incentivo fiscal concedido sob amparo constitucional é legitimo,

enquanto nutre-se do desígnio de reduzir desigualdades e reduzir o bem comum,

como o desenvolvimento regional ou nacional”.

Também Leila Paiva, afirma que “todas as pessoas jurídicas de direito público

interno poderão fazer uso da norma jurídica tributária com fins extrafiscais,

respeitados dois requisitos: a concessão constitucional de competência tributária e

material e o rol dos direitos e garantias fundamentais”.113

Assim, as normas tributárias indutoras podem (e devem) ser utilizadas com a

finalidade de reduzir as desigualdades regionais, antes de tudo, como forma de fazer

cumprir os princípios de igualdade insculpidos na Carta Magna.

Como já destacamos anteriormente, a norma prevista no artigo 151, inciso I,

da CF/88, in fine, constitui a maior evidência da possibilidade de instituição de

normas extrafiscais para reduzir desigualdades.

Com efeito, o próprio constituinte informa naquele dispositivo a necessidade

de reduzir desequilíbrios construídos historicamente, estimulando a concessão de

incentivos fiscais, pelo legislador ordinário.

112

TORRES, Heleno Taveira. Incentivos Fiscais na Constituição e o “Crédito-prêmio de IPI”. In: Direito

Tributário Atual. 18 ed. São Paulo: Dialética & Instituto Brasileiro de Direito Tributário, 2005. p. 79. 113

PAIVA, Leila. Disciplina Jurídica e Extrafiscalidade. Dissertação de mestrado apresentada ao departamento de direito econômico e financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, Ed. da autora, s.d. p. 159.

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Para Luís Eduardo Shoueri114,

ao incluir a redução das desigualdades regionais e setoriais entre os princípios da Ordem Econômica, revelou-se o Constituinte ciente de sua existência mas inconformado com tal realidade, propondo à Ordem Econômica sua redução, como forma de alcançar seus fins de justiça social e dignidade humana.

Quanto à necessidade de observância da uniformidade da tributação, já

referida anteriormente nesse trabalho, entendemos que esta não é violada quando

se concedem incentivos no intuito de reequilibrar disparidades entre regiões.

Ressalte-se, outrossim, que a preservação do próprio federalismo depende de

um equilíbrio regional, a ser promovido pela tributação indutora.

Para o autor supra citado,

conquanto a tributação uniforme seja requisito para a existência de um mercado único, e não obstante a importância deste mercado para o próprio constituinte, houve este por bem relativizá-lo, quando em confronto com seu desejo de redução de desigualdades regionais, tendo em vista sua finalidade de justiça social e dignidade humana.115

E conclui116: “assim é que normas tributárias indutoras que promovam regiões

menos favorecidas, [...] devem ser compreendidas como forma de concretizar o

princípio ora referido.”

Diante de todo o exposto, não restam dúvidas de que estas normas tributárias

indutoras podem ser utilizadas para reparar as injustiças históricas cometidas contra

as regiões brasileiras menos privilegiadas.

É certo, todavia, que o processo não será simples e demanda forte

investimento do Estado, além de vontade política, já que as disparidades hoje

existentes são enormes, para não dizer abissais.

3.4. O IRPJ e os mecanismos para incentivar o desenvolvimento

regional

Existem hoje diversos incentivos fiscais concedidos à pessoas jurídicas de

direito privado, bem como para pessoas físicas.

Nesse tocante, relembramos a discussão introduzida no primeiro capítulo,

quando mencionamos a inexistência de incentivos fiscais para as empresas que

apurem o seu IRPJ com base no lucro presumido.

114

SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas Tributárias Indutoras e Intervenção Econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 99. 115

Idem. pp. 99-100. 116

Ibidem. p. 100.

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Isso porque, em consonância com o disposto no artigo 10, da Lei nº 9.532, de

10 de dezembro de 1997117, somente poderiam usufruir os incentivos de normas

tributárias indutoras do desenvolvimento regional, as pessoas jurídicas tributadas

com base no lucro real, uma vez que é estritamente proibido o aproveitamento de

incentivos fiscais por pessoas jurídicas que apurem o tributo devido com base no

lucro presumido.

Ora, como o lucro real é uma forma de apuração preferida pelas grandes

empresas, as medianas e as em início de atividade terminam por não receber

incentivos.

Ultrapassada essa questão, dentre os incentivos fiscais aplicáveis ao IRPJ,

optamos por destacar o mecanismo da depreciação acelerada, como um sistema,

dentre vários, que poderiam ser utilizados pela União.

Não pretendemos, assim, estabelecer uma única forma de incentivo fiscal,

mas uma opção interessante para o estado e, ao mesmo tempo, para os

particulares.

Na evolução econômica e patrimonial de uma empresa, é natural a aquisição

de máquinas e equipamentos para aumento de sua produção e crescimento no seu

ramo de atuação, incorporados aos ativos imobilizados da empresa.

Essas máquinas e equipamentos, com o passar do tempo, sofrem o desgaste

derivado do uso ou obsolescência, trazendo para o empresário a necessidade de

efetuar constante manutenção e, ao final da vida útil, a substituição das inutilizadas

ou obsoletas.

Para compensar esses custos empresariais foi criada a técnica jurídico-

contábil da depreciação, permitindo que o empresário possa investir na renovação

de sua linha produtiva, na medida em que o seu “parque tecnológico” se desgasta.

Essa forma de indução da economia não constitui exclusividade brasileira,

sendo aplicada em vários países, como nos EUA, onde as

Federal tax policies often involve incentives to boost investment. By shortening the

recovery periods of depreciable assets, annual depreciation deductions increase,

providing businesses with accelerated tax deductions that actually lower (through the

117

Art. 10. Do imposto apurado com base no lucro arbitrado ou no lucro presumido não será permitida qualquer dedução a título de incentivo fiscal.

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time value of money) the present value of the cash outlay initially needed to purchase

new investments.118

De acordo com E. L. Ferrari119, a “depreciação é a despesa com a perda de

valor de bens tangíveis do ativo imobilizado, sujeitos ao desgaste pelo uso, ação da

natureza ou por se tornarem obsoletos”.

Já para S. Iudícibus120, “a depreciação a ser aquela contabilizada deve ser [...]

a que efetivamente corresponder ao desgaste efetivo pelo uso ou perda da sua

utilidade, mesmo por ação da natureza ou obsolescência”.

Assim, a depreciação consiste no “registro contábil do valor de um bem

consumido pela empresa num determinado período, em função do seu uso e/ou

obsolescência”121.

Contudo, não são todos os bens da empresa que podem utilizar o mecanismo

da depreciação. Ademais, para utilizar referido incentivo, a empresa deve observar

regras restritivas gerais, previstas na legislação que regulamenta o Imposto sobre a

Renda das empresas, dentre as quais, citamos as do artigo 305 do RIR/99,

expressis:

Art. 305. Poderá ser computada, como custo ou encargo, em cada período de apuração, a importância correspondente à diminuição do valor dos bens do ativo resultante do desgaste pelo uso, ação da natureza e obsolescência normal (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57).

§ 1º A depreciação será deduzida pelo contribuinte que suportar o encargo econômico do desgaste ou obsolescência, de acordo com as condições de propriedade, posse ou uso do bem (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 7º).

§ 2º A quota de depreciação é dedutível a partir da época em que o bem é instalado, posto em serviço ou em condições de produzir (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 8º).

§ 3º Em qualquer hipótese, o montante acumulado das quotas de depreciação não poderá ultrapassar o custo de aquisição do bem (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 6º).

§ 4º O valor não depreciado dos bens sujeitos à depreciação, que se tornarem imprestáveis ou caírem em desuso, importará redução do ativo imobilizado (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 11).

118

MILLER, Karen C.; SHAW, J. Riley; FLESHER, Tonya K. Bonus depreciation Incentives: the impact on General

aviation aircraft. Advances in Taxation, Volume 18. Emerald Group Publishing Limited, 2008. p. 76. 119

FERRARI, E. L. Contabilidade Geral: teoria e mais de 1.000 questões. Rio de Janeiro: Impetus, 2012. p. 289. 120

IUDÍCIBUS, S.; MARTINS, E.; GELBECKE, E.R.; SANTOS, A. Manual de Contabilidade Societária: aplicável a

todas as sociedades de acordo com as normas internacionais e do CPC. São Paulo: Atlas, 2010. p. 249. 121

DESTRI, Mauro José Teixeira. Por que e para que “contabilidade para não contadores?. Revista cadernos de

administração, Ano 1, Vol. 1, nº 02 Jul – Dez/2008. p. 16.

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86

§ 5º Somente será permitida depreciação de bens móveis e imóveis intrinsecamente relacionados com a produção ou comercialização dos bens e serviços (Lei nº 9.249, de 1995, art. 13, inciso III).

Relativamente à legislação do Imposto de Renda das empresas, são

exemplos de incentivos para a consecução do desenvolvimento regional a utilização

de mecanismos de Depreciação Acelerada Incentivada (artigo 313, do Decreto nº

3.000, de 26 de março de 1999 – RIR/99)122; Programas de Desenvolvimento

Tecnológico Industrial – PDTI e Programas de Desenvolvimento Tecnológico

Agropecuário – PDTA (artigo 321, do RIR/99)123; incentivos às atividades culturais

ou artísticas tipicamente regionais, com fundamento na Lei nº 8.313, de 23 de

dezembro de 1991; entre outras.

Assim, no Brasil, são permitidos os seguintes mecanismos da depreciação

acelerada incentivada124:

Depreciação integral no próprio ano da aquisição de bens do ativo imobilizado, exceto a terra nua, adquiridos por pessoa jurídica que explore a atividade rural.

Depreciação integral, no próprio ano da aquisição, de máquinas, equipamentos, aparelhos e instrumentos, novos, destinados à utilização nas atividades de pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica, para efeito de apuração do IRPJ e da CSLL.

Depreciação acelerada para efeito de apuração do imposto de renda, calculada pela aplicação da taxa de depreciação usualmente admitida, multiplicada por quatro, sem prejuízo da depreciação normal, das máquinas, equipamentos, aparelhos e instrumentos, novos, adquiridos entre 1º de maio de 2008 e 31 de dezembro de 2010, destinados ao ativo imobilizado e empregados em processo industrial de empresas fabricantes de veículos, de autopeças e de bens de capital.

Depreciação acelerada incentivada de bens móveis integrantes do ativo imobilizado, adquiridos para atividade hoteleira entre 3 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2010, calculada pela aplicação da taxa de depreciação admitida pela legislação tributária, sem prejuízo da depreciação contábil.

122

Art. 313. Com o fim de incentivar a implantação, renovação ou modernização de instalações e equipamentos, poderão ser adotados coeficientes de depreciação acelerada, a vigorar durante prazo certo para determinadas indústrias ou atividades (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 5º). 123 Art. 321. Às empresas industriais e agropecuárias que executarem Programas de Desenvolvimento

Tecnológico Industrial - PDTI e Programas de Desenvolvimento Tecnológico Agropecuário - PDTA poderá ser concedida, nas condições fixadas em regulamento do Poder Executivo, depreciação acelerada calculada pela aplicação da taxa de depreciação usualmente admitida, multiplicada por dois, sem prejuízo da depreciação normal, das máquinas, equipamentos, aparelhos e instrumentos, novos, destinados à utilização nas atividades de pesquisa e desenvolvimento tecnológico, industrial e agropecuário (Lei nº 8.661, de 1993, arts. 3º e 4º, inciso III). 124

Confederação Nacional da Indústria. Fórum Nacional da Indústria: Consolidação das Propostas do Setor

Privado à Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP II). São Paulo, 2008. p. 7-8.

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Utilização de crédito de 25% sobre a depreciação contábil de máquinas e equipamentos adquiridos entre 1º de outubro de 2004 e 31 de dezembro de 2010 na apuração da CSLL para todas as empresas optantes pelo Lucro Real.

As formas de depreciação acima citadas foram estabelecidas pela Lei nº

11.196, de 21 de novembro de 2005, que ficou conhecida como “lei do bem”, e

constituem importante mecanismo extrafiscal, para fomentar o desenvolvimento

tecnológico agrícola e de turismo.

Todavia, muitos setores ainda precisam ser incentivados, a exemplo da

educação básica e a profissionalizante, meio ambiente e direitos consumeristas,

entre outros vistos anteriormente.

Perceba-se, outrossim, que os incentivos informados nessas legislações

(Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999 – RIR/99, Lei nº 8.313, de 23 de

dezembro de 1991 e Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005), e em outras, não

restringem os benefícios fiscais para os investimentos realizados nas regiões mais

desenvolvidas.

Ao invés de auxiliar na redução de desigualdades regionais, essas normas

extrafiscais podem, portanto, agravar ainda mais os referidos desequilíbrios, já que

as regiões que possuem maior parque industrial e são mais desenvolvidas acabam

recebendo incentivos proporcionalmente maiores aos locais onde não se pode

verificar esta situação.

Isso porque, considerando que a maior concentração industrial e de capital

está localizada na região sudeste do país, incentivar o desenvolvimento tecnológico

destas empresas equivale conceder benefícios de igual porte para quem já tem uma

situação consolidada – como as empresas nessa região – e para as empresas

recém instaladas na região Nordeste, por exemplo.

Não há redução de desigualdades, sem que atue o legislador de forma

desigual, ou seja, “a instituição de um tributo com finalidade extrafiscal [...] fará com

que o ente estatal se afaste, em maior ou menor medida, do ideal de igualdade

particular preliminarmente instituído”125.

Isso não significa cortar por completo os incentivos para a região Sudeste,

mas sim dar incentivo fiscal maior para as empresas que se instalem nas regiões

Norte e Nordeste.

125

ÁVILA, Humberto. Teoria da igualdade tributária. 2 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 162

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Nesse ponto, independe a capacidade do contribuinte que receberá o

incentivo, já que a finalidade é proteger o direcionamento constitucional traçado na

carta magna126.

Repise-se, ainda, a importância do que demonstramos no tocante à

necessidade de que os incentivos partam da União, já que este ente atuaria de um

ponto central e neutro em relação aos demais.

Mas por quê a opção pelo mecanismo de depreciação acelerada é tão

adequado para atuar de forma extrafiscal?

Depreciação, amortização e exaustão são encargos de inversão. Por sua vez,

esses encargos constituem uma das cinco categorias de deduções que a pessoa

jurídica pode registrar com o propósito de determinar o seu lucro operacional, a

saber: custos, despesas, encargos, provisões e perdas.

O que caracteriza os encargos de inversão como categoria especial de

deduções é que eles constituem custos resultantes das obrigações de capital fixo da

sociedade empresária.

Os encargos de inversão devem ser registrados periodicamente como custos

ou despesa operacional da pessoa jurídica mediante quotas de depreciação,

amortização ou exaustão.

Depreciação, amortização ou exaustão distinguem-se com base na natureza

dos bens objeto da aplicação de capital e das causas que determinaram esses

encargos. Assim, podemos dizer que:

a) depreciação é o encargo correspondente à perda de valor de bens físicos;

b) amortização é o encargo de natureza financeira correspondente à

aplicação de capital que, em geral tem por objeto direitos, e não bens físicos;

c) exaustão se assemelha à depreciação sob o aspecto de que os encargos

correspondem à diminuição de valor de bens físicos. Mas se distinguem quanto à

causa que determinou o encargo, que no caso da exaustão – própria de recursos

minerais e florestais - é a extração de recursos naturais.127

126

ÁVILA, Humberto. Teoria da igualdade tributária. 2 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 161. 127

PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Imposto de Renda. Rio de Janeiro: APEC, 1969, passim.

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Esse mecanismo depreciativo já faz parte da contabilidade da empresa, que

em todos os exercícios fiscais inclui a depreciação dos bens como despesas

contábeis, obtendo um “desconto” no valor a pagar de IRPJ, até que o valor do bem

chegue a 0 (zero), o que pode levar alguns anos.

Como o contribuinte já receberá esse “benefício”, por meio de técnica

contábil, a depreciação acelerada, ou seja, reduzir o número de anos de

depreciação, alcançando um maior “desconto” tributário em determinado ano, pode

constituir uma ótima forma de incentiva o empresário, sem abrir mão de receita

tributária.

Entendemos, portanto, que esse mecanismo de depreciação acelerada pode

(e deve) ser incentivado, em especial nas regiões Norte e Nordeste, ou mesmo que

exclusivamente nestas regiões, na busca da redução das desigualdades.

Outro ponto marcante para destacar é que essa forma de incentivo fiscal, atua

como uma forma de subvenção, ou seja, o Estado termina pagar aos particulares

para que estes atuem em seu lugar.

O Estado, portanto, não só renuncia a receitas fiscais, como termina por

pagar aos particulares altos valores para incentivar as atividades escolhidas.

Destacamos, contudo, que o legislador deve dar preferência aos incentivos

fiscais destinados às novas empresas que pretendam se instalar nessas regiões

historicamente menos favorecidas, e não para aquelas que já estão instaladas, salvo

nas situações em que essas resolvam atualizar os seus parques industriais.

Dessa forma, para que as empresas já instaladas obtenham incentivos fiscais,

buscando manter a sua competitividade (com máquinas e equipamentos mais atuais

e produtivos), teriam que realizar investimentos idênticos às novas empresas,

eliminando possível alegação de violação ao princípio da isonomia.

Dizemos que este princípio não seria afetado, pois referidas medidas

colocariam empresas novas e antigas em situação de igualdade, sem forçar

embates judiciais para ver preservada a isonomia tributária.

Ademais, com a federalização dos incentivos fiscais, ou seja, deixando a

concessão de benefícios que interfiram além do território do ente concedente a

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cargo da União, proposta no ponto 3.1.1 desta dissertação, teríamos a eliminação

das pressões dos particulares sobre os Estados e Municípios.

Assim, perceberíamos o fim da perpetuação dos incentivos fiscais, por meio

do condicionamento de manter as instalações das empresas no território do ente

concessor das isenções, ou seja, por meio de chantagem contra os Estados ou

Municípios.

Outro ponto importante a ressaltar, é a questão do valor alcançado com o

incentivo fiscal concedido à empresa requerente.

No caso da depreciação acelerada, se o valor da dedução obtida pela

empresa for alto, esta irá recuperar mais rápido as quantias investidas no seu ativo

imobilizado.

Em compensação, uma vez depreciado o patrimônio da empresa, esta não

poderá mais efetuar qualquer dedução sobre as máquinas e equipamentos

depreciados, o que importa um aumento nos tributos a serem pagos ao FISCO.

Assim, se a taxa de depreciação for de 20% (vinte por cento) ao ano, a

empresa levaria 5 (cinco) anos para deduzir os valores das máquinas e

equipamentos dos valores de sua arrecadação tributária, consoante o gráfico abaixo.

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

1º Ano 2º Ano 3º Ano 4º Ano 5º Ano

Depreciação de 20% Anual

Depreciação de 20% Anual

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Em outro cenário, se a depreciação for efetuada em um percentual de 50%

(cinquenta por cento) ao ano, em apenas dois anos teríamos a depreciação

completa do bem de produção:

Depreciar o patrimônio adquirido de forma acelerada importa, portanto, em

pagar menos tributos imediatamente, ao custo de não haver o que deduzir a médio

prazo.

Esse fator não importa, necessariamente, desvantagem para a empresa, na

medida em que a dedução em curto prazo pode compensar os mais altos tributos a

pagar futuramente.

Devemos considerar, ainda, que algumas empresas, especialmente as que

dependem de maior aparato tecnológico, sofrem a necessidade de atualizar

constantemente suas máquinas e equipamentos, que ficam obsoletos mais

rapidamente, o que justifica, ainda mais, o mecanismo de depreciação acelerada.

Por outro lado, o FISCO, que irá abdicar de uma maior quantia de tributos de

inicio, a médio prazo terá maior arrecadação tributária, já que os bens totalmente

depreciados não podem gerar quaisquer deduções.

0

10

20

30

40

50

60

1º Ano 2º Ano

Depreciação de 50% Anual

Depreciação de 50% Anual

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A utilização do mecanismo de depreciação acelerada, constitui uma proposta

para incentivar a redução das desigualdades regionais, através da indução tributária,

atraindo as pessoas jurídicas de direito privado.

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CONCLUSÕES

O Imposto sobre a Renda – IR, nos moldes similares aos atuais, surgiu na

década de 20, do século XX, através do artigo 31 da Lei Orçamentária nº 4.625, de

31 de dezembro de 1922.

Recepcionado pela Constituição de 1988, através do artigo 153, inciso III, de

competência da União, o IR tem como fato gerador a aquisição de renda ou

proventos, estes compreendidos como o efetivo acréscimo ao patrimônio do

contribuinte.

Além dos princípios específicos da generalidade, universalidade e

progressividade, previstos no artigo 153, inciso III, § 2º, inciso I, da CF/88, que

norteiam o IR, na qualidade de tributo, este se submete, ainda, aos princípios gerais

da legalidade, da irretroatividade, da anterioridade geral, da anterioridade

nonagesimal, da igualdade, da capacidade contributiva e da vedação ao confisco.

Quanto à sua forma de apuração, o legislador ordinário delimitou cinco

maneiras para recolhimento do IR das pessoas jurídicas, a saber: i) lucro real; ii)

lucro presumido; iii) lucro arbitrado; iv) simples nacional; e v) empreendedor

individual.

Parece-nos claro que as empresas que recolhem tributos por meio do Simples

Nacional e os Microempreendedores individuais – MEI estão bem supridos de

benefícios fiscais concedidos pelo Estado, não sendo cabível a propositura de outras

normas tributárias indutoras em seu favor.

Já as empresas que apuram o referido imposto sob a sistemática do lucro

presumido, em nossa visão, deveriam receber incentivos fiscais equivalentes aos

auferidos pelas pessoas jurídicas que recolhem pelo método do lucro real, posto que

não possuem qualquer vantagem em face dessas, ao contrário, pode trazer até mais

riscos para a empresa.

Entendemos, inclusive, que a não concessão de incentivos a pessoas

jurídicas que escolham o lucro presumido constitui violação aos princípios da

isonomia tributária e da generalidade do IR, bem como às normas veiculadas pelos

artigos 5º, caput e 150, inciso II,da CF/88.

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Todavia desde 1998, a Lei nº 9.718/98, introduziu limitação para que as

pessoas jurídicas que desejem receber incentivos fiscais tenham que se submeter à

apuração pela sistemática do lucro real.

Nesse toar, sugerimos a edição de uma norma legal que revogue as

proibições contidas na legislação em comento, permitindo que as pessoas jurídicas

de direito privado que apuram seu IRPJ sob a metodologia do lucro presumido

possam gozar de incentivos fiscais.

Pensamos, ainda, que embora o fato gerador dos impostos, por sua natureza,

não esteja vinculado a uma prestação estatal específica, com destinação do produto

de sua arrecadação para o custeio das despesas gerais do Estado, este pode

investir as receitas derivadas do IRPJ para quaisquer finalidades que pretenda

alcançar, inclusive para estimular o crescimento e desenvolvimento de áreas ou

regiões específicas, utilizando a apuração deste tributo para fins extrafiscais.

Em relação às normas tributárias indutoras, demonstramos que estas podem

estar dispersas pelo ordenamento jurídico, sem que seja necessária a criação de

tributos indutores, bastando a introdução de normas auxiliares aos tributos já

existentes, para que estes desenvolvam objetivos extrafiscais.

Assim, duas seriam as formas para se alcançar as normas tributárias

indutoras: o agravamento de tributação para impedir atividades indesejadas ou

concedendo incentivos para concretizar os objetivos sociais.

Outrossim, deixamos claro, ao longo do texto, que as normas tributárias

indutoras devem atuar, como já indica o adjetivo que as qualifica, por indução e

jamais por direção, tendo em vista que este método é incompatível com a própria

natureza dos tributos.

Como as normas tributárias indutoras importam em inevitável renúncia fiscal,

estas devem ter prévia inscrição na lei orçamentária, além de expressa e aceitável

justificação, para que não comprometa o orçamento do Estado, com a

responsabilização dos administradores públicos.

Concluímos, ainda, que, como as receitas derivadas da arrecadação de

impostos podem ser aplicadas pelos entes federados da forma que melhor lhe

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aprouverem, respeitados os balizadores constitucionais relacionados no art. 167,

inciso IV, da CF/88, os impostos são totalmente compatíveis com as normas

tributárias indutoras.

Entre os campos de aplicação das normas tributárias indutoras temos a

proteção aos direitos do consumidor, a defesa do meio ambiente, a redução das

desigualdades regionais, a promoção do emprego formalizado, a função social da

propriedade, entre outras possibilidades.

Demonstramos que o constituinte priorizou a redução das desigualdades

regionais como princípio da ordem econômica e, sobretudo, como um dos objetivos

fundamentais da República, encarregando a União como responsável por alcançar

aqueles objetivos programados.

Para tanto, o constituinte flexibilizou algumas normas e princípios,

possibilitando, mesmo a contribuintes com grande capacidade contributiva, ou seja,

àqueles que normalmente não precisariam desses benefícios, apenas para estimular

a redução das desigualdades, e sem que isso importe em violação ao princípio da

isonomia.

O inverso, contudo, não é permitido. Com efeito, a Carta Magna veda o

agravamento da situação dos contribuintes instalados em áreas historicamente mais

favorecidas.

Dentre os dados estatísticos apresentados, vimos que, apesar do crescimento

da economia brasileira nos últimos anos, os desequilíbrios entre as regiões

geopolíticas têm se mantido estáveis, com a região sudeste acumulando mais de

55% (cinquenta e cinco por cento) das riquezas nacionais.

Por isso, concluímos que as normas tributárias indutoras podem(e devem) ser

utilizadas com a finalidade de reduzir as desigualdades regionais, antes de tudo,

como forma de fazer cumprir os princípios de igualdade insculpidos na Carta Magna.

Restou claro que os incentivos concedidos atualmente beneficiam mais as

regiões desenvolvidas, e que os muitos outros setores da economia precisariam ser

incentivados, na busca do equilíbrio regional.

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Assim, os incentivos que estão sendo concedidos agem de forma

descontrolada, aumentando as desigualdades ou, no mínimo, as mantêm sem

modificações.

Pensamos, desse modo, que para perseguir os ideais de igualdade (que

nunca serão atingidos de forma perfeita), deve o legislador efetuar fortes incentivos

fiscais para estimular empresas de todos os setores produtivos a se instalar nas

regiões Norte e Nordeste.

Como medida imediata, pensamos ser possível a ampliação das punições

para os Estados ou Municípios que descumprirem as determinações da Constituição

e da Lei Complementar nº 24/75, bem como a ampliação dos poderes de controle e

punitivo do CONFAZ.

Outra medida interessante no combate à guerra fiscal seria o estabelecimento

da cobrança do ICMS no destino, tornando inútil a concessão de incentivos fiscais

na origem.

Preferimos, todavia, entender que referidos incentivos devem ser exercidos

de forma centralizada pela União, na forma outorgada pelo artigo 21, inciso IX, da

CF/88, para evitar que os estados membros fiquem efetuando disputas entre si

(guerra fiscal), através da proibição da concessão de incentivos por estes entes, no

intuito de atrair investimentos e empreendimentos para seus territórios.

Isso porque, para que ocorra uma correta distribuição de rendas e a

promoção do desenvolvimento das regiões menos favorecidas, se faz necessário um

“olhar de cima”, para verificar quais as regiões nacionais precisam de mais

investimentos e, dentro dessa organização, quais os estados e municípios.

Assim, não é possível efetuar o desenvolvimento das regiões historicamente

menos favorecidas, sem que a União efetue essa distribuição de investimentos,

tendo em vista ser o único ente isento de interesses individuais, prezando pelo

inteiro desenvolvimento nacional.

Primeiramente, é necessária a expressa proibição da concessão de incentivos

fiscais pelos Estados e Municípios, para as situações que possam interferir na

economia dos demais entes federativos, mediante a instituição de Lei

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Complementar, como previsto no artigo 43, § 1º, inciso I, da CF/88, ou mesmo uma

emenda constitucional dedicada a esse fim.

Ficando a União com o poder exclusivo para a concessão de incentivos,

várias seriam as possibilidades de incentivar o desenvolvimento das regiões

renegadas historicamente.

Como sugestão, oferecemos a idéia de incentivar as empresas através da

ampliação dos incentivos a título de depreciação acelerada para o IRPJ, tendo em

vista que esta técnica permite o incentivo aos particulares, sem que haja significativa

renúncia fiscal.

Por isso, esse mecanismo deve ser estimulado, em especial para empresas

que pretendam se instalar nas regiões menos favorecidas, para auxiliar no processo

de reequilibrar as desigualdades criadas historicamente, e não para aquelas que já

estão instaladas, salvo nas situações em que essas resolvam atualizar os seus

parques industriais.

Com isso, as empresas já instaladas teriam que realizar investimentos

idênticos às novas empresas para obter os mesmos incentivos fiscais, buscando

manter a sua competitividade, preservando, assim, o princípio da isonomia tributária.

O ganho para o FISCO é evidente, na medida em que justifica a concessão

desigual de incentivos fiscais, ao tempo em que evita a perda de arrecadação.

Outro fator importante é que a federalização dos incentivos evitaria a

perpetuação dos incentivos fiscais, que consiste em um dos maiores problemas da

guerra fiscal, já que, atualmente, as empresas condicionam sua permanência no

território do Estado ou Município à renovação das isenções.

A origem das desigualdades regionais reside no mesmo mecanismo que

propomos para reduzi-las, ou seja, a concessão de incentivos fiscais para empresas

que estejam localizadas nas regiões Norte e Nordeste.

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REFERÊNCIAS

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