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ÂNGULO: DA CAPACIDADE DA VISÃO HUMANA À GATESHEAD MILLENIUM BRIDGE
1COMO ABORDAGEM DO CONCEITO
Bruno Moreno Francisco, Unespar – Câmpus de Campo Mourão, [email protected] Daniela Miray Igarashi, Unespar – Câmpus de Campo Mourão, [email protected]
RESUMO: O presente relato cinge os resultados de um trabalho que foi desenvolvido durante a realização do Estágio Supervisionado I2. Visualiza-se nesta prática uma abordagem de conceito de ângulo no sexto ano do Ensino Fundamental na qual se levou os alunos a reconhecerem as diferentes concepções de ângulos, tais quais envolvessem medida de uma abertura, de uma inclinação, de uma volta ou giro, ou de uma região, e adjacente a isso, definir colaborativamente o conceito de ângulo. Para sua descrição, de natureza qualitativa, utilizamos da observação e da produção escrita dos alunos. Em resposta, tal prática mostrou que a série de situações tidas como contextualizadas, atenta para construirmos significativamente um repertório matemático para o conceito de ângulo. Palavras-chave: Ângulos. Contextualização. Ensino e aprendizagem de Matemática. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Pensando na condição de estagiários, este trabalho contempla a busca por alternativas de
ensino de Matemática, com vistas à construção do conceito de ângulo. Para esse fim, apresentamos
alguns enfoques intuitivos de tal conceito, fazendo o uso e representação de materiais concretos
acessíveis do dia-a-dia com o propósito de “significar” a aprendizagem e o seu entendimento.
Durante a regência de estágio, o plano de ensino docente para os sextos anos do Ensino
Fundamental em que trabalhamos, contemplava, no período, o ensino de Ângulos e Retas. Diante
1 Gateshead Millennium é o nome dado à ponte que se tornou um marco para o Nordeste da Inglaterra. Foi
construída sobre o rio Tyne ligando a margem norte da cidade de Newcastle com Gateshead e aberta ao
público em 2001, sendo apenas inaugurado no ano seguinte pela rainha Elizabeth II. A ponte é essencialmente
duas curvas graciosas e em torno dos seus pontos flexíveis, sua arquitetura permite o transporte de “passar por
baixo”, através de um movimento de rotação inovador, semelhante ao de uma pálpebra quando abre lentamente.
Visualmente elegante quando estático e em movimento, a ponte oferece um grande espetáculo durante a
operação de abertura. Disponível em: <http://www.wilkinsoneyre.com/projects/gateshead-millennium-
bridge.aspx?category=bridges> Acesso em: 4 mai. 2014.
2 Das distribuições legais, o Estágio Supervisionado I da Universidade Estadual do Paraná, Campus Fecilcam de Campo Mourão, é realizado no 3º ano da Graduação, sendo o Estágio Supervisionado II, no 4º ano. As atividades de tal etapa permitem, grosso modo, aos estudantes o contato com a realidade educacional da Educação Básica com vistas à participação em situações do cotidiano escolar. A prática de ensino, sob a forma de Estágio Supervisionado é realizado em turmas de 6ª à 9ª ano do Ensino Fundamental para alunos do 3º ano da graduação, e 1º a 3º ano do Ensino Médio para acadêmicos do 4º ano, respectivamente. A regência é, por sua vez, realizada em duplas, cada qual com seu orientador e, para alcance de tal, são observadas 5 aulas num primeiro momento mais 20 de regência.
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disso, queríamos levar os alunos a reconhecerem os diferentes significados para o conceito de ângulo
e, por outro lado, procurar construir uma definição para o mesmo, sabendo que este conceito apresenta
várias acepções.
É de praxe que os estudos no campo da Educação Matemática tem se tornado acentuado no
que tange a esfera da pesquisa científica. Nesse sentido, coloca-se em discussão um guia de nossas
observações, tomando por referência algumas considerações acerca de conceitualização, bem como de
procedimentos de construção de conceitos.
Enquanto professores de Matemática, novas formas de ensinar e aprender os conceitos
matemáticos tornam-se uma das nossas preocupações. Aliás, se torna um desafio questionar a prática
do ensino e aprendizagem desta disciplina, em especial, o modo como os conceitos são ensinados ou
construídos na sala de aula.
Acreditamos que, pela forma como apresentamos nosso trabalho, podemos fazer com que o
leitor se aproprie da nossa sequência didática sobre a abordagem do conceito de ângulo. Certamente,
para além da forma como desencadeamos o trabalho em sala de aula, nossa intenção foi de buscar uma
proposta que possibilite ao aluno o alcance de uma aprendizagem diferenciada na disciplina de
Matemática.
ABORDAGEM DE CONCEITO: TOMANDO NOTA DO ENSINO DE ÂNGULOS
No contexto da Educação Matemática, tomamos como base teórica o indicativo de aprendizagem na
dimensão significativa3. Com base nisso, lançamos mão de uma estratégia de ensino que permita o conceito de
ângulo ser visto de forma contextualizada e que não privilegie os laços formais e abstratos deste conceito.
Sendo o conceito de ângulo ligado a Geometria, temos, em primeira mão, que:
[...] os conceitos geométricos constituem parte importante do currículo de matemática no ensino fundamental, porque, por meio deles, o aluno desenvolve um tipo especial de pensamento que lhe permite compreender, descrever e representar, de forma organizada, o mundo em que vive (BRASIL, 1997, p. 39).
Por essa importância e, também pelo fato de que a definição do conceito de ângulo não
contempla a trivialidade e que ainda exige dos alunos uma capacidade de abstração – embora seja
elementar da Geometria e aparentemente simples – este conceito torna-se difícil de ser aprendido e
3 Entende-se por aprendizagem significativa a aquisição de novos significados. Uma aprendizagem desse parâmetro pode ser representada, de forma geral, pela ideia de que um novo conhecimento ao ser aprendido é relacionado de forma não arbitrária e não literal a aspectos relevantes que o aprendiz já possui em sua estrutura cognitiva (AUSUBEL; NOVAK; HANESIAN, 1980, p.34; AUSUBEL, 1968, p.38-9 apud CALDEIRA, 2009, p. 203). Em nossas palavras, para que um novo conceito seja aprendido, é necessário se ancorar em conhecimentos previamente estabelecidos nas estruturas cognitivas do aprendiz.
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difícil de ser ensinado. Logo, como destaca Gadotti (2008), não se pode esperar que os alunos
aprendam o conceito de ângulo por meio, tão somente, das definições.
Levando isso em conta durante o processo de definição/conceituação de ângulo, Casas e
Luengo (2005) concordam que a figura abaixo basta para evidenciar a dificuldade em defini-lo:
E põem em questão:
Quanto mede esse ângulo? Certamente, não há uma única resposta, pois o mesmo pode medir 60° ou 300°. Também pode medir –60° ou –300º. Poderá também ser 420°. Percebe-se intuitivamente o objeto, mas há uma grande dificuldade em descrever suas características. Por exemplo, a que ângulo se refere? Basicamente, são três tipos de definições para um mesmo conceito que aparece historicamente: ângulo como par de semirretas, como região no espaço e como quantidade de giro (p.202).
Na presença dessa dificuldade, Gadotti (2008) adverte que:
[...] o conceito de ângulo não dá para ser expresso só com palavras, sendo necessário utilizar exemplos, figuras, aplicações. Além disso, cada definição apresenta algumas limitações, muitas vezes não contemplando todos os tipos de ângulo (GADOTTI, 2008, p.12, grifos dos autores).
Pensando-se nos exercícios de construção do conceito de ângulo, tais como os propostos
acima (exemplos, figuras e aplicações), admitimos ser relevante ensiná-lo a partir da experiência
cotidiana do aluno. De fato, o cotidiano é usado pelos professores assim como é indicado em alguns
livros didáticos, quando se deseja contextualizar um conceito. Para Mello (2008), quanto mais
próximos estiverem o conhecimento escolar e os contextos presentes na vida dos alunos e no mundo
que ele transita, mais o conhecimento terá significado.
Essa discussão que surge acerca da contextualização do saber matemático é abordada pelos
PCN, quando aponta que:
[...] um conhecimento só é pleno se for mobilizado em situações diferentes daquelas que serviram para lhe dar origem. Para que sejam transferíveis a novas situações e generalizadas, os conhecimentos devem ser descontextualizados, para serem novamente contextualizados em outras situações (BRASIL, 1997).
Nessa prerrogativa, reforçamos que uma possibilidade para os alunos entenderem o conceito
de ângulo, implica não só na busca por generalizá-lo, mas por criar condições que permitam
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transferir/relacionar seu aprendizado a outros contextos. Entretanto, não consideramos que o sucesso
deste debate de contextualização seja um indicativo de uma total compreensão de ângulo.
Vale ressaltar que, mesmo que as situações do dia-a-dia corroborem no sentido de “arar” a
construção de significados para muitos conteúdos, faz-se necessário considerar também a
possibilidade de construção de significados a partir de questões formais da própria Matemática. Senão,
“[...] muitos conteúdos seriam descartados por não fazerem parte da realidade dos alunos. Além disso,
muitas razões explicam uma formação matemática básica para todas as pessoas e o aspecto utilitário é
apenas uma delas [...]” (VASCONCELOS, 2008, p.46).
Nessa perspectiva de construção de significados, damos importância à definição de forma
transparente e clara de qualquer conceito matemático, sendo que a maneira como é apresentado ao
leitor, seja por meio da linguagem verbal ou escrita, julgamos ser um quesito fundamental para
compreendê-lo, ora pelo professor ora pelo aluno.
Apresentamos, nesse intuito, a abordagem materializada do conceito de ângulo em sala de aula
em interface ao que Bairral4 (2002), com seu artigo “Aulas diferentes de Matemática: o caso dos
ângulos” apresenta: diferentes alternativas que podem ser consideradas para trabalhar o ângulo de
forma intuitiva, desfigurando uma linguagem matemática rigorosa.
Tendo isso em mente, na nossa proposta pedagógica esperamos ter, de início, condições de
visualizar a ocorrência, ou não, de aprendizagem do conceito de ângulo.
CONTEXTO DA EXPERIÊNCIA
Nesta parte do texto, caracterizamos os sujeitos e os procedimentos adotados na experiência,
mediante a regência do Estágio Supervisionado I, em que fomos submetidos.
A turma do sexto ano, previamente escolhida, do Ensino Fundamental, de um colégio público
do município de Campo Mourão – PR, tinha um perfil bastante eclético, contando com vinte e quatro
alunos de diferentes rendimentos escolares, inclusive alunos repetentes. Antes da aplicação, já
havíamos sido informados que não era uma turma fácil de trabalhar em razão da diversidade presente e
dos predicados que não são diferentes dos estudantes com onze, doze anos: a conversa, a agitação e
distração, dos quais tomaram nota em fichas de observação realizadas durante o início do estágio.
A regência foi realizada em doze encontros com uma carga horária de vinte horas/aula. Ao
ritmo da professora titular da disciplina, as atividades desenvolvidas contariam como atividades
4 BAIRRAL, M.A. (2002). Aulas diferentes de Matemática: o caso dos ângulos. Presença Pedagógica, Belo Horizonte, v.8, n.45, maio/jun., p.51-57.
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normais de aula programadas para o terceiro bimestre, contando, inclusive, como cinquenta por cento
da nota dos estudantes no respectivo bimestre.
Ao comando da atividade, os alunos trabalharam sob a disposição de um grande semicírculo,
do qual tiramos proveito de dialogar, a princípio, sobre nossa formação e expectativas quanto à turma,
bem como a forma como trabalharíamos em sala.
Em se tratando do plano de ensino proposto em tal colégio, nesta turma, abordamos o
conteúdo de Ângulos e Retas em que foram produzidas diferentes atividades e avaliações. No entanto,
neste trabalho temos a intenção de relatar a parte da nossa experiência que consideramos mais
interessante, ou seja, aquela que parece ter contribuído mais intensamente no processo de
aprendizagem de Matemática.
A proposta pedagógica inicial planeava ensinar de maneira “diferente” o conceito de ângulo,
mostrando vários campos de emprego desta unidade temática. Queríamos discutir a construção de um
conceito que poderia ser descrito em poucas linhas, de uma maneira dinâmica. Para tanto, desde o
primeiro contato com a turma, utilizamos de diferentes exemplos para mostrar a existência de um
ângulo, sem, contanto, escrever uma definição formal na lousa.
Contando mais...
“[...] Tudo depende da forma como vemos tudo o que já passamos.
Procure o melhor ângulo das experiências que você já viveu, e use-as para viver as novas [...]”.
(Malu Oliveira)
A propósito do conteúdo, debatemos num primeiro momento com a classe sobre alguns
significados ao lidar com o conceito de ângulo, dentre os quais aqueles que sugerem uma medida de
abertura, inclinação, giro ou volta e região.
Nesta fase, entender as diferentes situações em que um ângulo está presente se tornou uma
atividade a qual intitulamos “Produzindo significados”. Em uma folha, como mostraremos mais a
frente, colocamos figuras representando os exemplos que seriam discutidos em sala de aula ao lado de
linhas adicionais, em que os alunos deveriam escrever a noção intuitiva de ângulo que julgavam estar
correta. Esta atividade de explicação e discussão dos exemplos ocorreu em seis horas/aula de
cinquenta minutos.
No intuito da atividade, foram desenhadas na lousa duas representações de montanhas. Ambas
possuíam a mesma altura, porém com diferentes inclinações. Em tal caso, propomos à turma discutir
qual seria a montanha menos cansativa para o alpinista escalar. Em resposta, a montanha com menos
inclinação foi apontada pela turma, porém eles não conseguiam explicar com palavras o motivo exato
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para a escolha. Alguns a indicavam por ser a rota mais “reta” ou mais “plana”, ou também pelo fato da
outra ser muito “alta”. Outro aluno tentou indicar com as mãos o fato de uma montanha ter menos
inclinação que a outra.
Todavia, a explicação ocorreu ao enfatizarmos o simples lance de uma montanha ser mais
inclinada ou mais íngreme que a outra, e que a de menos inclinação tinha um ângulo menor em relação
ao chão e em relação à montanha comparada.
Na sequência, levamos um relógio para a sala de aula visando também seu estudo. A
representação do ângulo em um relógio, por sua vez, centrou-se em seus dois ponteiros. Os ponteiros
são os “lados” do ângulo, enquanto a abertura entre eles forma a região denominada de ângulo. Os
alunos descreveram o ângulo nos ponteiros do relógio como ângulos de abertura ou giro, pois
alegavam que os ponteiros davam voltas. Além disso, mostramos aos alunos que entre dois ponteiros
de um relógio formavam-se dois ângulos, um maior que o outro, ou ambos iguais, dependendo da
maneira como eram alinhados. Em nota, indicávamos sempre o ângulo que estávamos trabalhando.
Afinal, dois lados podem sempre denotar dois ângulos.
Da mesma maneira, um leque foi utilizado para demonstrar um exemplo de ângulo como
abertura. Quanto mais se abria o objeto, maior era o ângulo que suas extremidades formavam. Da
própria armação que tal objeto é construído, conseguimos ver o leque dividido em pequenas partes
iguais, devido às várias hastes que o compõe. Assim, abrindo-o lentamente, percebe-se que o seu
ângulo total (quando está completamente aberto) pode ser dividido em ângulos de igual tamanho.
De forma semelhante com que apresentamos o exemplo das montanhas, sugerimos outro
modelo de representação de ângulo, em que mostrava uma rampa e um cadeirante. Com respeito à
investigação do ângulo ali presente, indagamos os alunos: Qual das rampas seria melhor para o
cadeirante subir? A representação da rampa foi também feita na lousa e a discussão se seguiu ao que
muitos alunos entenderam ser a rampa não muito “alta”. Acompanhando o processo de aquisição de
um conceito, a turma mostrava-se participativa e os alunos demonstravam interesse em dar sua própria
opinião. Alguns alunos se lembraram do outro exemplo, indicando logo que o ângulo neste caso
representava uma inclinação. Nesta ocorrência, o ângulo e a inclinação estavam entre o chão e a
rampa, e com a pretensão de apresentar os elementos de um ângulo na próxima aula, destacamos este
fato.
É digno de nota lembrar que aproveitamos da situação acima para debatermos as reais
condições que os cadeirantes encontram na cidade de Campo Mourão, advertindo, portanto, ao senso
crítico e consciente dos alunos sobre tal fato.
Assim, depois de levarmos uma tesoura para a sala, intencionamos indicar o ângulo formado
pelas lâminas do objeto. Alguns alunos indicaram que ali deveria haver um ângulo de abertura. O
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exemplo foi utilizado para mostrar que o ângulo pode ter diferentes tamanhos e que, apenas por fazer
uma abertura um pouco maior, já se tem um ângulo com um valor diferente do anterior. Quanto maior
a abertura das lâminas da tesoura, maior fica o ângulo entre as lâminas.
Depois, com a ajuda de um aluno, obtivemos a região que sua visão alcançava. Utilizamos fios
de barbante para demarcar a região que o aluno conseguia ora enxergar ora não. O ângulo formado
pelos dois fios de barbante demarcava toda a região que o aluno conseguia enxergar sem mover sua
cabeça.
Uma bandeirinha de festa junina, feita de papel, foi colocada em exposição para os alunos. O
formato como é desenhada permitia visualizar várias “cantos”, os quais os alunos indicaram a
existência de um ângulo. Assim, a bandeirinha possuía diferentes ângulos de diferentes tamanhos, das
quais poderíamos caracterizá-la como ângulo de abertura e/ou região.
A próxima representação de ângulo objetivava simular duas escadas colocadas juntas. “É
possível oferecer maior segurança ao utilizá-la”: foi o que um dos alunos lembrou ao esboçarmos na
lousa tal representação. A abertura formada entre as duas escadas constitui um ângulo. Os alunos
observaram que o mesmo não poderia ser muito pequeno, porque não haveria estabilidade quando
alguém usasse a escada. Porém, não poderia ser muito grande, visto como as escadas poderiam vir a
cair no chão, abertas. Daí, um questionamento foi levantado: “Quando as escadas estão fechadas,
juntas, qual é o ângulo entre elas?” Neste momento nossa intenção era mostrar que o ângulo pode ser
nulo em algum momento de sua representação.
Questionamos os alunos se eles já tinham ouvido a expressão “gol no ângulo” no futebol. Tal
dito popular é solto quando a bola, em seu alcance, é chutada próximo ao canto da trave do gol e o
jogador faz o gol. Isso faz sentido, já que ali há um ângulo de 90°. Até esse momento ainda não
tínhamos falado sobre os valores de um ângulo. Procuramos pela sala outros ângulos que eram iguais
ao ângulo do canto da trave, e encontramos vários outros “cantos” que possuíam o mesmo ângulo,
como o canto da lousa, porta, parede, janela e caixa, por exemplo.
Uma representação de uma roda-gigante também foi desenhada na lousa. Apresentamos os
ângulos que se formavam na estrutura do brinquedo, ou melhor, das hastes que seguram cada banco.
Alguns alunos afirmaram que se tratava de um ângulo de volta inteira ou de giro, uma vez que o
brinquedo girava. Outros alunos trouxeram a ideia de que se tratava de um ângulo de abertura, pois as
hastes poderiam ter abertura maior ou menor.
Por fim, o último exemplo apresentava uma das grandes obras de engenharia do mundo: a
ponte Gateshead Millenium construída em Newcastle, Inglaterra, que para possibilitar a
passagem/travessia de barcos pelo Rio Tyne, assim como a circulação de pedestres e ciclista entre as
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duas margens do rio, pode ser inclinada em até 40°. Fazendo-se referência ao conceito de ângulo,
nota-se, neste caso, a ideia de abertura, inclinação ou rotação, da qual demora cerca de quatro minutos.
Atribuindo-se a ponte um custeio de mais de 30 milhões de euros em pouco mais de 850
toneladas, tornou-se um ponto de interesse turístico da Inglaterra. Curiosamente, a Gateshead
Millenium Bridge é muitas vezes apelidada de Winking Eye (piscar de olhos) devido ao movimento
semelhante de abrir e fechar os olhos.
Figura 1 – Representação da Gateshead Millenium Bridge. Fonte: os autores.
Figura 2 – Vista panorâmica da Gateshead Millenium Bridge em Newcastle, Inglaterra. Fonte: Disponível em: < http://www.clubedoconcreto.com.br/2014/07/pontes-estranhas.html> Acesso em: 29
set. 2014.
ocê sabe o que é ângulo?
Nesta atividade você conhecerá o quão variado pode ser os significados
desse conceito. Para isso, observe as diferentes situações abaixo e
conclua, em cada uma: qual a noção de ângulo que pode ser representada? V
TAREFA 1 – Produzindo significados
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Imagem 1 – Situações utilizadas para significar o conceito de ângulo. Fonte: Os autores.
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Ao final das discussões, convidamos os alunos a estabelecerem uma definição escrita para o
que seria um ângulo. Com nossa ajuda, puderam escrever na lousa um conceito que, por enquanto, foi
aceito por eles: “Um ângulo é uma medida de uma abertura, de uma inclinação, de uma volta ou giro,
ou de uma região”. Ressaltamos para os alunos que no decorrer das etapas de seus estudos, essa
definição pode vir a ser complementada ou transformada pelo rigor matemático. Portanto, não é a mais
correta ou definitiva.
Em seguida, apresentamos um tópico a que denominamos de “Elementos do ângulo”, no qual
se explicou o nome dado a cada componente de um ângulo, dentre os quais temos os dois lados e um
vértice que os une.
Nesse sentido, como já descrevemos, existe uma série de situações de aprendizagem que
podemos utilizar para que os alunos construam diferentes concepções/significados sobre os díspares
aspectos apresentados do conceito de ângulo e, assim, desenvolvam e construam significativamente o
seu repertório matemático.
Mapa conceitual: um artificio para uma aprendizagem significativa
No decorrer da regência foram trabalhados outros conteúdos matemáticos, também
envolvendo ângulos, tais como a apresentação do grau, medidas de ângulos utilizando o transferidor e
a classificação dos ângulos quanto as suas medidas em graus. Sendo assim, diferentes tarefas foram
novamente propostas, tanto para reforçar a aprendizagem como também para avaliá-los parcialmente
naquele bimestre. Ao fim desta etapa, elaboramos um mapa conceitual que foi impresso e entregue
para os alunos e, como sua característica, abordava, resumidamente, todo conteúdo trabalhado naquela
turma. Para mais, ensinamos os alunos sobre o como realizar a leitura do mapa de conceitos elaborado
para, então, explorar conjuntamente – professor e aluno – a unidade temática de maneira mais aberta,
panorâmica do conceito.
Segundo Tavares (2007), “mapas conceituais são uma estrutura esquemática para representar
um conjunto de conceitos imersos numa rede de proposições”. Foi idealizado por Joseph D. Novak da
Universidade de Cornell, na década de 60 e fundamentado na Teoria de Aprendizagem Significativa
de David Ausubel. Por outro lado, Moreira (2006) diz que os mapas conceituais, no componente
curricular de Matemática, podem ser utilizados para averiguar o conhecimento prévio dos alunos sobre
certos conceitos, instrumento de avaliação, revisão de conceitos e resumo de conteúdos.
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Imagem 2 – Mapa conceitual elaborado para o conceito de ângulo. Fonte: Os autores
Percebendo deslizes...
No teste avaliativo, tido como proposta final da regência e para o qual queríamos descobrir
qual tipo de conceito os estudantes haviam internalizado, sugerimos produzir um teste oral,
acreditando ser a melhor maneira de avaliação. Porém, as dificuldades inerentes a este tipo de teste,
como o pouco tempo disponível e o grande número de alunos, fizeram com que optássemos por uma
avaliação escrita individual.
Tal teste compreendia seis questões, das quais citaremos apenas a primeira: “Lembrando-se
das aulas sobre ângulos, escreva a sua definição para o conceito de Ângulo”.
Durante a avaliação, alguns alunos tiveram dúvidas, alegando não terem entendido o que era
necessário fazer, ao que respondemos explicando de diferentes maneiras que deveriam escrever o que
acreditavam que era o ângulo. Quanto a isso, também os provocamos questionando-os: “Se você
tivesse que explicar a outra pessoa o que é ângulo, como faria?”. Ainda assim alguns alunos diziam
ter dificuldade em escrever, pois não lhes vinha nada à cabeça. Essa incompreensão do conceito e a
dificuldade de o aluno descrevê-lo ou argumentá-lo autonomamente, pode ser entendida como
consequência da carência de leitura de textos, quer seja na Matemática quer seja em outra área do
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conhecimento, haja vista, porém, que “[...] a leitura deve possibilitar a compreensão de diferentes
linguagens, de modo que os alunos adquiram uma certa autonomia no processo de aprender”
(SMOLE; DINNIZ, 2001, p. 69).
Pudemos perceber que determinadas respostas5 dadas pelos alunos foram bem similares. Aqui
estão algumas delas:
A1: Ângulos são medidas de graus que medem roda-gigante e etc.
A2: Ângulo é uma medida de graus.
A3: Ângulo tem um vértice e dois lados. Seja ele raso, obtuso e pode ter quantos graus você
quiser até 360°.
A9: Ângulo é uma forma de abertura, inclinação, rotação ou giro. É a medida de objeto.
A18: Ângulo é uma medida do seu dia-a-dia, para medir os objetos.
A21: A medida de uma região, rotação, inclinação e abertura.
A título de discussão, nenhuma das respostas está incorreta se considerarmos a intenção em
escrever, relevando a concordância ou erros gramaticais encontrados. De todas as definições
apresentadas acima, a mais comum descrita pelos alunos foi a do A2, o qual define o ângulo como
uma medida de graus.
Por outro lado, o aluno A3 descreveu os elementos de um ângulo; algumas de suas
classificações e que um ângulo “pode ter quantos graus você quiser até 360°”. Lembrando que nosso
enfoque não foi trabalhar com ângulos maiores do que 360°, porém fora citado que existem ângulos
maiores que este valor. Provavelmente, esta informação não deve ter sido significativa para tal aluno.
Novamente, com esta definição, fala-se sobre ângulo, mas não sobre o que ele é de fato.
O aluno A21 apresentou a definição construída por nós com o auxílio da turma, isto é “um
ângulo é uma medida de uma abertura, de uma inclinação, de uma volta ou giro, ou de uma região”.
Da mesma forma, o aluno A9 parece ter escrito com a mesma intenção.
Em análise, talvez a forma como a questão foi elaborada seja uma das causas da não
compreensão do exercício: por se tratarem de palavras que, por vezes, não fazem parte do vocabulário
da turma como “conceito” e “definição” e, portanto, podem ter causado um conflito no entendimento
da questão. Ainda que tenhamos esclarecido o seu significado quando trabalhamos com estas palavras,
não foi o suficiente para que os alunos aprendessem.
5 Os alunos serão indicados pela letra A seguida de seu número na lista de presença.
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A dificuldade também reside no fato de que os alunos têm dificuldade para expressar uma
ideia em forma de texto. A prática de expressar sua compreensão em forma escrita, talvez, seja pouco
desenvolvida, não apenas na Matemática, mas, também em outras disciplinas. Além do que, ao
tentarem descrever um conceito para ângulo, podem acreditar que isso seja apropriado à outras
disciplinas, mas não para a Matemática. Todavia, “o ensino da Matemática tem por objetivo também
lidar adequadamente com a língua materna. Nele, os sujeitos (professores e alunos) comunicam ideias
matemáticas, conceitos, saberes, pensamentos usando a linguagem” (COUTINHO; ALBUQUERQUE,
2009, p. 2).
A falta de uma definição diferente da esperada (a esperada é a que formulamos em conjunto)
pode ter origem também no simples fato de que as aulas e os exemplos não foram um tanto suficiente
para a construção de um conceito de ângulo. O que não foi totalmente surpreendente, dado que seis
horas/aula podem não ser suficientes para construir uma definição própria. Ou mesmo pelo simples
fato de que apenas os exemplos não são aceitáveis, e que os alunos poderiam ter sido estimulados a
escrever mais, dar seus próprios exemplos, ou construir seus próprios ângulos.
De todo modo, a nossa percepção sobre esse importante detalhe só foi percebida no momento
em que havíamos analisado as respostas dos alunos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: UM FECHAMENTO DA EXPERIÊNCIA
A título de consideração final, damos atenção ao interesse pelo saber matemático que foi
despertado, assim como o entusiasmo dos alunos em participar da tarefa. Ao mesmo tempo, a
abordagem do conceito de ângulo, designada neste trabalho, permitiu envolver boa parte da turma no
sentido de opinar e determinar qual significado de ângulo se enquadrava nas diferentes situações
expostas.
Sobre mais um aspecto, nos chama atenção a aplicabilidade cotidiana dos conteúdos no
processo de ensino e aprendizagem de Matemática, haja vista que os alunos mencionam, conforme
apontam as justificativas de algumas pesquisas em Educação Matemática, que a aversão em relação à
Matemática está no fato dela ser considerada uma disciplina abstrata e como são trabalhados os
conteúdos, ao passo que parecem ter pouca aplicação ou nenhum significado prático e/ou conceitual
que o faça lembrá-lo depois.
Essa atitude, por sua vez, gera um questionamento, até mesmo pra nós professores: Até que
ponto deve-se acreditar que o conhecimento matemático deve ser inserido na vida prática do aluno?
Na verdade, se faz importante mostrar tais conexões, como evidenciou este estudo, todavia, atenta-se
em primeira mão para a busca do saber e não a utilização (representação da realidade) imediata desse
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conhecimento ou, como aponta Vasconcelos (2008), é importante considerar questões internas da
própria Matemática, para significar certo conteúdo. Senão, parece dever do docente provar que tudo
tem utilidade prática.
Porém, reafirmamos que este trabalho permitiu tecer um bom exemplo de conceito utilizado
no dia-a-dia de certos sujeitos: sem o conhecimento do conceito de ângulo, muitas áreas do
conhecimento e tecnologia não poderiam trabalhar como o fazem hoje.
O presente relato de experiência aponta ainda, conforme assegura Giménez (1996), para a
atenção que o professor deve ter aos diferentes processos cognitivos dos alunos ao realizarem tarefas
matemáticas e, para isso, a importância de utilizar uma variedade de atividades nas quais alunos e
professores possam comunicar suas ideias e produzir significados.
Além disso, em se tratando de um processo holístico, é possível garantir uma variedade de
situações de aprendizagem que podemos utilizar para que nosso aluno construa significado sobre os
diferentes aspectos (ângulo como característica de objetos, como inclinação, como abertura, como
expressão de uma orientação, etc.) do conceito de ângulo e, assim, desenvolva e construa o seu
repertório matemático.
REFERÊNCIAS
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