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“Não conta isso pra ninguém hein! Eu fiquei sabendo…” – No ar a rádio peão! Não quero fazer fofoca (longe de mim fazer uma coisa dessas!), mas fiquei sabendo de uma empresa que em meados de 2009, tomada por um boato de fechamento, jurava que estava garantida pelos acionistas até 2012 e dois meses depois simplesmente baixou as portas e fez uma demissão sumária. Surpresa? Os gestores disseram que sim, a rádio peão antecipou que não. Momentos de transição trazem consigo uma série de desdobramentos. Cortes de custo, adaptações na equipe, reavaliação de métodos, fusões e aquisições, demissões, suicídios, enfim, o bom e velho caos. O que contribui positiva ou negativamente com esses desdobramentos, entre outras coisas, é a tão falada Rádio Peão. Presente em todas as empresas esta verdadeira instituição corporativa age por vontade própria, não tem origem definida, pode ser encontrada em qualquer corredor, máquina de café, bebedouro e até mesmo em banheiros e lavatórios. Não se utiliza de meios digitais ou qualquer outra maneira de registro. Sobrevive e se fortalece numa das mais antigas habilidades do ser humano: A arte de contar histórias. E se o ditado estiver certo e “quem conta um conto aumenta um ponto”então é melhor tomarmos conta do placar, não é verdade? Vamos aos venenos e seus possiveis antídotos: A RP só é soberana em ambientes onde não há compartilhamento de informação. Alguns gestores tem a falsa impressão de que deter informação é igual a deter o poder. Pura ilusão. Quanto maior a rede sobre uma informação maiores os benefícios que virão dela. Duas cabeças pensam melhor que uma. Já estive em empresas em que o mural era atualizado a cada dois meses ou , quando frequente, exibia apenas informações superficiais, anúncios de sindicatos e listas de férias. As informações pertinentes e estratégicas continuavam guardadas a sete chaves (ou seriam a sete palmos?) Utilize os meios em sua plenitude e distribua informações que auxiliem o colaborador a atingir os resultados esperados. Que tal começar esclarecendo qual é o resultado esperado? Normalmente o assunto da semana na RP tem origem em algum fato ou acontecimento real, mas cresce e se desenvolve pela falta de informações oficiais, alimentando-se de especulações, medos, interesses e validações falsas e pode ser extremamente predatória se os peões começam a tomar atitudes em função disso. Não mate o mensageiro, trabalhe a mensagem RP é igual a tráfico de drogas. Os que comandam, os peixes grandes, nunca são pegos. Quando é preciso uma “higienização” para retomada de controle, são os pequenos que pagam o pato e nada melhor do que o bom e velho Boi de Piranha para acalmar os ânimos e trazer tudo a normalidade (ou pelo menos a sensação de). Você acha que consegue fechar uma rádio apenas por demitir um locutor?

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Page 1: Web view“Não conta isso pra ninguém hein! Eu fiquei sabendo” – No ar a rádio peão! Não quero fazer fofoca (longe de mim fazer uma coisa dessas!), mas

“Não conta isso pra ninguém hein! Eu fiquei sabendo…” – No ar a rádio peão!

Não quero fazer fofoca (longe de mim fazer uma coisa dessas!), mas fiquei sabendo de uma empresa que em meados de 2009, tomada por um boato de fechamento, jurava que estava garantida pelos acionistas até 2012 e dois meses depois simplesmente baixou as portas e fez uma demissão sumária.Surpresa? Os gestores disseram que sim, a rádio peão antecipou que não.

Momentos  de transição trazem consigo uma série de desdobramentos.

Cortes de custo, adaptações na equipe, reavaliação de métodos, fusões e aquisições, demissões, suicídios, enfim, o bom e velho caos.  O que contribui positiva ou negativamente com esses desdobramentos, entre outras coisas,  é a tão falada Rádio Peão.Presente em todas as empresas esta verdadeira instituição corporativa age por vontade própria, não tem origem definida, pode ser encontrada em qualquer corredor, máquina de café, bebedouro e até mesmo em banheiros e lavatórios. Não se utiliza de meios digitais ou qualquer outra maneira de registro. Sobrevive e se fortalece numa das mais antigas habilidades do ser humano: A arte de contar histórias.E se o ditado estiver certo e “quem conta um conto aumenta um ponto”então é melhor tomarmos conta do placar, não é verdade?

Vamos aos venenos e seus possiveis antídotos:

A RP só é soberana em ambientes onde não há compartilhamento de informação.

Alguns gestores tem a falsa impressão de que deter informação é igual a deter o poder. Pura ilusão. Quanto maior a rede sobre uma informação maiores os benefícios que virão dela. Duas cabeças pensam melhor que uma.

Já estive em empresas em que o mural era atualizado a cada dois meses ou , quando frequente, exibia apenas informações superficiais, anúncios de sindicatos e listas de férias. As informações pertinentes e estratégicas continuavam guardadas a sete chaves (ou seriam a sete palmos?)

Utilize os meios em sua plenitude e distribua informações que auxiliem o colaborador a atingir os resultados esperados.

Que tal começar esclarecendo qual é o resultado esperado?

Normalmente o assunto da semana na RP tem origem em algum fato ou acontecimento real, mas cresce e se desenvolve pela falta de informações oficiais, alimentando-se de especulações, medos, interesses e validações falsas e pode ser extremamente predatória se os peões começam a tomar atitudes em função disso.

Não mate o mensageiro, trabalhe a mensagem

RP é igual a tráfico de drogas. Os que comandam, os peixes grandes, nunca são pegos. Quando é preciso uma “higienização” para retomada de controle, são os pequenos que pagam o pato e nada melhor do que o bom e velho Boi de Piranha para acalmar os ânimos e trazer tudo a normalidade (ou pelo menos a sensação de). Você acha que consegue fechar uma rádio apenas por demitir um locutor?A Rádio Peão sempre existiu e existirá em toda e qualquer empresa, resta aos gestores utilizarem de seus conhecimentos, habilidades e competências de comunicação para torná-la inimiga ou aliada.

É claro que existem informações que dependem de sigilo, outras que podem causar algum estrago caso o mercado saiba antes da hora e outras que devem ser administradas em doses homeopáticas. Mas via de regra quanto mais informação, maior a compreensão do negócio por parte dos colaboradores e, consequentemente, maior comprometimento.

Veja este exemplo:

Tive o privilégio de conhecer a MASA da amazônia e seu presidente na época, Sr. Ulisses Tapajós, e ouvi dos funcionários que eu entrevistava a seguinte lenda (ou não) corporativa:

O Ulisses veio pra MASA com a missão de iniciar o processo de fechamento da unidade. Um dia chamou todos os funcionários no refeitório e disse em alto e bom som.

“-Estou aqui pra fechar esta fábrica. Os custos são altos, os resultados não melhoram e não conseguimos novos contratos. Isto está inviabilizando o negócio e dentro de algum tempo cada um de vocês será demitido. Mas eu acredito que podemos 

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fazer diferente. Podemos nos reerguer e dar a volta por cima, mas pra que isso aconteça teremos tempos dificeis pela frente. Reduções salariais, piora na alimentação, diminuição de benefícios e muitas outras coisas. Entretanto eu garanto a manutenção do emprego de todos até sairmos dessa.

-E então? O que faremos?”

E fizeram. Juntos a empresa conseguiu dar a volta por cima e algum tempo depoisconquistou por duas vezes o título de melhor empresa para se trabalhar no Brasil. Os benefícios voltaram, os salários se normalizaram e os colaboradores tratam o Sr Ulisses quase como um pai. (No mínimo um cupido, ele deve ser padrinho de uns 200 casais lá da empresa).E tudo isso teve início no compartilhamento de uma informação e um pedido de colaboração. O que teria acontecido se ele tivesse ficado quieto e simplesmente fizesse seu trabalho? Isso, felizmente, nós nunca saberemos.

Na minha vivência percebi que sempre que compartilhei um problema ele se resolveu mais rapidamente, sempre que fui verdadeiro colhi colaboração, toda  vez que me mostrei vulnerável obtive respeito e ajuda  e que quanto mais eu me conecto, melhor o resultado que obtenho.

Utópico? Talvez.

Inocente? Quem sabe.

Idealismo? Tomara.

Eficaz? Com certeza.

Mas não conta pra ninguém hein…

Márcio Mussarela

EXAME.COM 09/02/2010