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XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" MECANIZAÇÃO E EMPREGO NA CAFEICULTURA DO CERRADO MINEIRO ANTONIO CÉSAR ORTEGA (1) ; MARCELA CASTRO MOURO (2) . 1.UFU, UBERLANDIA, MG, BRASIL; 2.UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA, UBERLÂNDIA, MG, BRASIL. [email protected] APRESENTAÇÃO ORAL MERCADO DE TRABALHO AGRÍCOLA Título MECANIZAÇÃO E EMPREGO NA CAFEICULTURA DO CERRADO MINEIRO Grupo de Pesquisa: 8 – Emprego Rural Resumo Analisamos neste texto a intensificação do uso de colhedeiras mecânicas na cultura de café, na mesorregião do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba. Nessa região, de características de cerrado, encontra-se uma das experiências mais bem sucedidas de arranjo produtivo territorial em torno da cafeicultura. Nela, a partir da organização dos produtores em torno de associações de produtores municipais, que culminou na constituição do CACCER (Conselho das Associações dos Cafeicultores do Cerrado Mineiro), obteve-se o reconhecimento da denominação de origem do Café do Cerrado. No que diz respeito a organização do processo produtivo, a introdução da mecanização da colheita, e suas conseqüências sobre a geração de emprego, foi a transformação tecnológica mais significativa nos últimos anos. Sua introdução tem provocado uma série de impactos no mercado de trabalho agrícola, de um lado, com ampliação do desemprego de uma mão-de- obra com baixa qualificação, de outro, com a geração de postos de trabalho que requerem maior qualificação dos trabalhadores. O desemprego da força de trabalho de baixa qualificação tem sido sentido não somente nos centros urbanos daquelas microrregiões, mas também nos municípios de origem dos trabalhadores temporários, na sua maioria migrantes de regiões brasileiras economicamente inferiores à região Sudeste. Assim, mais do que enfrentar uma tendência irreversível, como é o caso da mecanização da atividade produtiva, é preciso dirigir políticas públicas de geração de emprego e renda naquelas regiões, permitindo, assim, uma inclusão econômica e social mais sustentável. Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural 1

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XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro"

MECANIZAÇÃO E EMPREGO NA CAFEICULTURA DO CERRADO MI NEIRO

ANTONIO CÉSAR ORTEGA (1) ; MARCELA CASTRO MOURO (2) .

1.UFU, UBERLANDIA, MG, BRASIL; 2.UNIVERSIDADE FEDER AL DEUBERLÂNDIA, UBERLÂNDIA, MG, BRASIL.

[email protected]

APRESENTAÇÃO ORAL

MERCADO DE TRABALHO AGRÍCOLA

Título MECANIZAÇÃO E EMPREGO NA CAFEICULTURA DO CERRADO

MINEIRO

Grupo de Pesquisa: 8 – Emprego Rural

ResumoAnalisamos neste texto a intensificação do uso de colhedeiras mecânicas na cultura

de café, na mesorregião do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba. Nessa região, decaracterísticas de cerrado, encontra-se uma das experiências mais bem sucedidas de arranjoprodutivo territorial em torno da cafeicultura. Nela, a partir da organização dos produtoresem torno de associações de produtores municipais, que culminou na constituição doCACCER (Conselho das Associações dos Cafeicultores do Cerrado Mineiro), obteve-se oreconhecimento da denominação de origem do Café do Cerrado. No que diz respeito aorganização do processo produtivo, a introdução da mecanização da colheita, e suasconseqüências sobre a geração de emprego, foi a transformação tecnológica maissignificativa nos últimos anos. Sua introdução tem provocado uma série de impactos nomercado de trabalho agrícola, de um lado, com ampliação do desemprego de uma mão-de-obra com baixa qualificação, de outro, com a geração de postos de trabalho que requeremmaior qualificação dos trabalhadores. O desemprego da força de trabalho de baixaqualificação tem sido sentido não somente nos centros urbanos daquelas microrregiões,mas também nos municípios de origem dos trabalhadores temporários, na sua maioriamigrantes de regiões brasileiras economicamente inferiores à região Sudeste. Assim, maisdo que enfrentar uma tendência irreversível, como é o caso da mecanização da atividadeprodutiva, é preciso dirigir políticas públicas de geração de emprego e renda naquelasregiões, permitindo, assim, uma inclusão econômica e social mais sustentável.

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XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro"

Palavras-chaves: mecanização rural, cafeicultura, emprego rural, cerrado mineiro.

AbstractThe intensification of the use of mechanical harvesters in the culture of coffee in the meso-region of Triângulo Mineiro and Alto Paranaíba1 was analyzed in this paper. In such an area,that has characteristics of cerrado2, there can be found one of the most well succeedexperiences related to territorial productive arrangements on coffee growing. With theorganization of the producers together with associations of municipal producers, whatculminated in the constitution of CACCER (Council of the Associations of the CerradoMineiro Coffee growers), it was obtained the recognition of the origin denomination of theCerrado Coffee. In what regards the organization of the productive process, the introductionof the crop mechanization and its consequences on employment generation was the mostsignificant technological transformation in recent years. Its introduction has provoked a seriesof impacts in the agricultural job market, on the one hand, with unemployment increasing oflow qualification labor and, on the other hand, with the generation of work positions thatrequire workers' larger qualification. Unemployment of the manpower of low qualificationhas been felt not only in the urban centers of those micro-regions, but also in the municipaldistricts from where the temporary workers come, mainly migrating from Brazilian areaswhich are economically inferior to the Southeast area. In this way, more than facing anirreversible tendency, as it is the case of the mechanization of the productive activity, it isnecessary to have public policies of employment generation and income in those areas,allowing a more sustainable economical and social inclusion.

Key Words: Rural mechanization – coffee growing – rural employment – cerrado mineiro.

Introdução

Este paper é resultado da continuação de estudos que vimos realizando há alguns anossobre as conseqüências do progresso técnico sobre o mercado de trabalho na cafeicultura doCerrado Mineiro3. Nossa análise do emprego da força de trabalho na colheita do café noTriângulo Mineiro e Alto Paranaíba (TMAP), em Minas Gerais, de que nos aproximamossobre o que se conhece por Cerrado Mineiro, foi dirigida aos períodos recentes, em que oemprego manual na cafeicultura, predominantemente com a participação dos migrantes, vem

1 Southwest of the State of Minas Gerais.2 Cerrado Mineiro: A king of Savannah in the State of Minas Gerais, Brazil.3 Resultados dessas pesquisas publicamos alguns trabalhos: ORTEGA, A. C. . Nuevas formas asociativas en lacaficultura brasileña y sus formas de financiamiento: representación pro producto y la interprofisionalización. In:Enrique de Loma-Ossorio Friend. (Org.). Experiencias de organización y financiación en el sectoragroalimentario. 1 ed. San José: IICA, 2000, v. 2, p. 44-62. ORTEGA, A. C. ; GARLIPP, Ana Alice Damas ;JESUS, Clesio Marcelino de . Terceirização e Emprego Rural na Agricultura do Cerrado Mineiro: os Casos daMecanização no Café e na Cana-de-Açúcar.. In: Clayton Campanhola; José Graziano da Silva. (Org.). O NovoRural Brasileiro. Novas Atividades Rurais. 1 ed. Brasília, DF: Embrapa Informações Tecnológicas, 2004, v. 6, p.95-124. ORTEGA, A. C. ; FERREIRA, Romulo Gama . Impactos da intensificação da mecanização da colheitado café na microrregiões de Patos de Minas e Patrocínio-MG. In: IX Encontro Nacional de Economia Política,2004, Uberlândia-MG. Anais do Congresso da SEP. São Paulo : SEP, 2004. v. 1. p. 1-20. ORTEGA, A. C. ;FERREIRA, Romulo Gama . Progresso técnico e agricultura familiar - impactos sobre a ocupação e a migraçãorural-urbana nas microrregiões de Patos de Minas e Patrocínio - MG. In: XI Seminário sobre a EconomiaMineira, 2004, Diamantina. Anais do XI Seminário sobre a Economia Mineira, 2004. v. 1. p. 1-20.

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sendo reduzida em função da mecanização da colheita, facilitada pelo surgimento de empresasterceirizadoras.

Nosso objetivo, portanto, é mostrar que a intensificação do uso de colhedeirasmecânicas nas culturas de café, em específico, na mesorregião do Triângulo Mineiro e AltoParanaíba, tem provocado uma série de impactos no mercado de trabalho agrícola. Essesimpactos causam, principalmente, a ampliação do desemprego de uma mão-de-obra combaixa qualificação.

O procedimento metodológico utilizado em nossa pesquisa implicou uma revisãobibliográfica, a coleta e a análise de dados primários e secundários e de entrevistas comrepresentantes do setor, empresários e técnicos. Os dados referentes ao emprego formal damão-de-obra foram obtidos a partir da base CAGED (Cadastro Geral de Empregados eDesempregados), fornecida pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Já os dados referentes àprodução de café no Cerrado Mineiro foram coletados por meio do SIDRA (Sistema IBGE derecuperação automática).

1- A introdução e a consolidação do café no Cerrado Mineiro

A região do Cerrado Mineiro possui uma temperatura média de 18°C a 23°C, uma altitude deprodução cafeeira de 800 a 1.300 metros acima do nível do mar e um índice pluviométrico de1600 milímetros anuais, com baixa umidade relativa do ar no período da colheita. Somados àscaracterísticas do relevo, essas são condições bastante favoráveis ao cultivo do café. Não é àtoa que os 155 mil hectares de café plantados naquela área (CONAB, 2004) e,aproximadamente, 440 milhões de pés de café, distribuídos por 55 municípios do CerradoMineiro, oferecem uma produção média de 3.500.000 sacas de 60 Kg cada por ano.

O café é introduzido de maneira intensa na região com a política de modernização dacafeicultura brasileira iniciada em 1969, depois de forte geada no norte do Paraná e oeste deSão Paulo. Com o objetivo de erradicar os cafeeiros com baixa produtividade e cultivados emregiões sujeitas a geadas, foi implementado o Plano de Renovação e Revigoramento dosCafezais (PRRC), conhecido pelo lema “Renovar para Salvar”.

Com o PRRC, o Cerrado Mineiro tornou-se a região prioritária de incentivo à cafeiculturanacional. Essa política foi implantada por iniciativa do já extinto IBC (Instituto Brasileiro doCafé) e do GERCA (Grupo Executivo de Racionalização da Cafeicultura), principalmentecom recursos do Tesouro Nacional e do Banco do Brasil. Segundo Ortega (2005), o planovisava elevar a produção e a produtividade do café por meio da implantação de cultivosracionais em áreas climaticamente favoráveis.

O financiamento concedido pelo PRRC aos produtores envolvia as seguintes finalidades:plantio, formação de mudas, poda, compra de fertilizantes, defensivos químicos eequipamentos, e, por fim, custear as despesas com infra-estrutura. Tais recursos beneficiaram,prioritariamente, a mesorregião do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, em Minas Gerais.

Com os bons resultados obtidos, outros programas governamentais de incentivo foramimplementados na região, como, por exemplo, o Programa de Assentamento Dirigido do AltoParanaíba (PADAP), o Programa de Desenvolvimento dos Cerrados (POLOCENTRO) e oPrograma de Cooperação Nipo-brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados(PRODECER).

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Até os anos 1970, a produção de café no Cerrado Mineiro destinava-se basicamente aoconsumo próprio. Mas, com os resultados obtidos (ampliação da área plantada, uso detecnologias modernas, elevada produção e produtividade), o café passou a ser dirigidoessencialmente para a exportação. Dessa maneira, ocorrem, desde 1970, transformações nacafeicultura do Cerrado Mineiro que contribuíram imensamente para o desenvolvimento dessaatividade, com contribuição positiva para a balança comercial, com base em:

a. Planos de incentivo à ocupação de novas fronteiras agrícolas, ocasionando amigração de produtores do Sul e Sudeste do país para o Triângulo Mineiro eAlto Paranaíba;

b. Financiamento da compra de terras para novos colonos; c. Políticas de crédito agrícolas do Sistema Nacional de Crédito Rural.

Com relação à estruturação produtiva, para sua introdução, foi preciso que as terras de cerradofossem “adaptadas”. Seus solos ácidos e pobres em nutrientes foram transformados para seadequarem ao cultivo do café. Assim, é preciso reconhecer que as inovações químicas foramfundamentais para o desenvolvimento da cafeicultura no Cerrado Mineiro. Por meio delas,foram realizadas correções no solo, com aração e gradagem da terra, aplicação de calcário,adubação orgânica, com nutrientes (fosfato, nitrogênio e potássio) e micronutrientes (sulfatode zinco e ácido bórico) necessários ao desenvolvimento da planta.

Para sustentar o processo de crescimento da planta são usados, ainda, defensivos agrícolas,como os herbicidas e fungicidas. Esses defensivos, assim como os nutrientes químicos, sãoaplicados mecanicamente. Além desses insumos, mais recentemente, para o uso decolhedeiras, são utilizados produtos químicos para o amadurecimento uniforme dos frutos.Aplicados próximo ao período de colheita, fazem com que o grão se desprenda maisfacilmente do ramo, além de gerar um amadurecimento mais rápido e facilitar a colheita.

Merecem destaque, também, as inovações biológicas, particularmente as novas variedades deplantas que possam ser bem exploradas pelas máquinas. Por exemplo, são introduzidasplantas com facilidade de desprendimento dos grãos da rama, com porte baixo, galhosdistribuídos de forma mais uniforme e presença de maturação precoce, semiprecoce e tardia.Logo, estas características facilitam o deslocamento na máquina na lavoura.

Por fim, são criadas as condições adequadas para maior utilização das inovações mecânicas.Além de instrumentos acopláveis ao trator para realizar o preparo do solo ligado ao plantio(arados e grades, roçadeiras, arruadores, distribuidores, caretas, pulverizadores e aplicadoresde herbicidas), foi disseminada, mais recentemente, a mecanização da colheita.

Em meados da década de 1970, foram desenvolvidas as chamadas derriçadeiras, tambémacopladas ao trator. Já na década de 80, surgiram as máquinas automotrizes. Mas foi só nadécada de 90 que a mecanização da colheita do café começou a intensificar-se, visto que aqualidade das colhetadeiras mecânicas melhoraram, deixando de causar danos às plantas.Com isso, a perspectiva do uso dessas máquinas era a de uma maior rentabilidade, secomparado ao emprego da colheita manual.

Uma inovação que contribuiu imensamente para a mecanização da colheita foi a técnica dosemi-adensamento, isto é, a reorganização do espaço entre as ruas da plantação de café. Alargura entre as ruas passou de cinco metros para a variação de três a quatro metros, e alargura de até dois metros entre as plantas passou a variar entre meio metro e um metro. Comisso, houve um aumento do número de plantas por hectare, expandindo, pois, a produtividade.

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Estima-se que, em 1990, a quantidade de colhedeiras mecânicas no Cerrado Mineiro era de80, sendo que, em 2004, este número aproximava-se de 280 (CACCER, 2004). Isso poupa de30 a 40% da mão-de-obra volante destinada à colheita manual na região do Cerrado Mineiro.Uma colhedeira mecânica colhe, em média, 60 sacos de café por hora, num período entre 18 e22 horas por dia, substituindo, assim, mais de cem trabalhadores em um dia de serviço.

Grande parte dessas colhedeiras pertencem a empresas terceirizadoras e a grandes produtores.Cada máquina custa entre R$ 200 mil e R$ 500 mil e é utilizada entre maio e agosto de cadaano (época da colheita). Portanto, sua aquisição somente é viável para os grandes produtores,sendo que, para os pequenos e médios produtores, a terceirização é a opção mais indicada,pagando um valor em torno de R$ 140,00 por hora utilizada para os modelos de colhedorasmais avançados.

Com todas essas transformações, houve uma significativa redução do contingente detrabalhadores na cafeicultura do Cerrado Mineiro, com impactos não somente restrito aoCerrado Mineiro, mas também àquelas regiões de onde saem os migrantes temporários, comoé o caso do Vale do Jequitinhonha, Norte de Minas, sul da Bahia, norte do Paraná e, maisrecentemente, da Zona da Mata Mineira.

O Café do Cerrado é a primeira região produtora de café demarcada no Brasil, segundodecreto do governo de Minas Gerais desde abril de 1995, sendo esta a primeira indicação deprocedência reconhecida pelo INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial).

Com as políticas liberalizantes do governo Collor (1990), extinguiu-se o InstitutoBrasileiro do Café (IBC), incentivando uma organização e regulação privada dos cafeicultoresdo Cerrado Mineiro, que consolidaram suas associações para produzirem um produtodiferenciado no mercado. Atualmente, são aproximadamente 3500 cafeicultores e 4600propriedades filiados às associações de produtores integradas pelo Conselho das Associaçõesde Cafeicultores do Cerrado (CACCER, 2004).

Em 1998, o CACCER foi credenciado pelo governo de Minas Gerais, por intermédio doIMA (Instituto Mineiro de Agropecuária), como certificador de origem e qualidade de café,tornando-se a primeira entidade certificadora oficial de café. O CACCER possui convêniocom a SCAA (Associação Americana de Cafés Especiais), a qual é a maior entidade destegênero no mundo, possuindo o mais consistente sistema de classificação de cafés especiais.

Desde 2002, as cooperativas do Café do Cerrado passaram a utilizar a metodologiaSCAA. Assim, com o sistema de código de barras de logística no certificado e com cada selode garantia costurado na saca de café, o consumidor final tem a possibilidade de verificar aidoneidade do produto, bem como obter maiores informações sobre o sistema de produção.

O Cerrado Mineiro é uma das raras regiões do mundo a produzir cafés naturais, ou seja,aqueles que são secos com casca. Isso se deve, em grande parte, ao inverno extremamenteseco e com temperaturas amenas, coincidindo com o período de colheita do café. Ascaracterísticas básicas da bebida do Café do Cerrado são: aroma intenso, com notas variandoentre caramelo e nozes, acidez delicada, predominantemente cítrica, corpo variando demediano a encorpado, sabor adocicado e achocolatado intenso e finalização de longa duração(CACCER, 2006).

Por tudo isso, pode-se afirmar que o principal foco do CACCER tem sido odesenvolvimento de um sistema de certificação que se fundamente nos seguintes princípios:garantia de origem, de qualidade, de idoneidade do modelo da produção e de rastreabilidade.

Para realizar essa atividade, o CACCER possui um sistema de geo-referenciamento,com banco de dados das propriedades certificadas, garantindo, assim, a origem e a segurançaalimentar. Este sistema permite a localização da propriedade e a precisão de seus limites, a

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demarcação da área, bem como de reservas legais, altitude, declividade e cursos d’água, alémdo mapeamento completo das áreas de café.

Segundo um dos produtores entrevistados (Revista Campo Aberto, ano 19, nº81), oscompradores querem, cada vez mais, torrar o café perto dos mercados consumidores e, porisso, tem crescido a compra diretamente da origem. Antes de entrar em outro país, o produto étestado para confirmar que não há qualquer resíduo tóxico. Assim, o rastreamento éfundamental nos mercados mais exigentes, como o Japão e a Europa. Devido às grandesexigências do mercado, uma mini-indústria de beneficiamento foi instalada na propriedade doprodutor entrevistado, que tem um sistema de qualidade total implantado desde 1999.

Nessa fazenda, são 20 funcionários fixos, os quais fazem sugestões de melhoria noprocesso produtivo e são premiados no final do ano pelas contribuições. No ano de 2004,mais da metade da produção fora destinada à exportação, sendo que o café preparado éensacado e entregue diretamente ao porto de Santos, a mil quilômetros da propriedade. Essamaior exigência quanto à qualidade, de acordo com lideranças do Café do Cerrado e deprodutores, é uma tendência também no mercado consumidor brasileiro, que vem aumentandosua exigência sobre a qualidade da bebida consumida.

2 - A mecanização da colheita do café

Os métodos tradicionais de mecanização da colheita do café só são possíveis de ser aplicadosem terrenos com declividade de até 20 %. Isso, associado às limitações operacionais eeconômicas, mostra que a mecanização depende sempre da complementação do serviçobraçal. Além disso, as máquinas necessitam de operadores, pessoal de manutenção,comercialização e assistência técnica, ou seja, mão-de-obra especializada, o que denota que,se, de um lado reduz-se o número de trabalhadores pouco qualificados, de outro, introduzem-se novos trabalhadores, mais qualificados.

A colheita do café é mais difícil de ser executada do que a de outros produtos em razão daestrutura da planta, sua desuniformidade de maturação e do teor de umidade. Nesta etapa, ascolhedeiras, em determinadas condições de trabalho, chegam a fazer em um dia de serviço, oequivalente a 250 homens, de acordo com dados da UFV(http://www.ufv..br/poscolheita/cafe/indice.htm, acesso em 15/5/2006), embora algunsengenheiros agrônomos entrevistados digam que elas substituem de 180 à 200 trabalhadores.A mecanização das operações agrícolas tem início com o preparo do solo, passando pelasoperações do cultivo, semeadura, plantio, adubação e controle fitossanitários, alcançandofinalmente as operações de colheita. Esta última etapa destaca-se por ser a mais complexa e amais importante do ponto de vista do agricultor, pois representa uma enorme redução doscustos de produção, rapidez no processo, redução da preocupação com a contratação deelevado número de trabalhadores, que representa transtornos logísticos e riscos trabalhistas,de acordo com os produtores entrevistados.

Na região do Cerrado Mineiro, a colheita inicia-se em maio e termina em setembro. Asoperações de colheita são as seguintes (http://www.ufv..br/poscolheita/cafe/indice.htm, acessoem 15/5/2006):

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a) Arruação, que representa a operação de limpeza da área ao redor e sob ocafeeiro. Esta limpeza consiste em remover a terra solta, plantasdaninhas e detritos, amontoando-se este material nas entre-linhas. Estaoperação deve ser feita antes que os frutos comecem a cair no chão;

b) Derriça, que representa a operação de retirada do fruto da planta. Aderriça pode ser feita no chão arruado ou sobre panos colocados sob ocafeeiro;

c) Varrição, que representa a operação de amontoamento e recolhimento docafé caído no chão. No caso da derriça feita no chão, a varrição é feitaantes, para separar o café caído do café derriçado. Para a derriça no pano,a varrição é feita posteriormente;

d) Recolhimento, que é também conhecido como levantamento do café, oqual consiste em juntar o café varrido ou derriçado;

e) Abanação, que representa o processo de limpeza do café varrido ouderriçado, separando-se folhas, gravetos, torrões, pedras, etc;

f) Transporte, que é a operação de retirada do café já recolhido da lavoura esua condução para o terreiro, onde prosseguem as operações de pós-colheita.

Apesar da redução no número de trabalhadores necessários na colheita mecanizada, estaatividade, entretanto, não dispensa totalmente o uso de serviço manual. As máquinas nãoconseguem colher todos os frutos da planta, e os que permanecem após a derriça mecânicasão retirados por meio de uma operação manual denominada de “repasse”.

Quanto ao custo, o da colheita mecanizada de café é menor que o da colheita manual. Alémdisso, é importante salientar que a colheita mecânica melhora a qualidade do café colhido.Este processo consiste em uma colheita seletiva a favor dos frutos maduros, sendo que osgrãos verdes são mais difíceis de ser derriçados pelo processo de vibração, que ficam para o“repasse” quando já estiverem maduro. Isto não acontece no caso da colheita manual, a qualnão consegue fazer uma separação do “café-cereja” (fruto maduro) e do fruto verde.

Numa das propriedades visitadas no município de Lagoa Formosa, na microregião dePatos de Minas – MG a fase de maturação dos grãos ocorre nos meses de junho e julho e,nesta etapa, tudo é feito para apanhar o fruto o menos verde possível. Segundo seuproprietário, “para os torrefadores de cafés finos, verde não é café. Tem que virar ‘cereja’.Quando a maturação atinge mais de 90% começamos a colheita, que vai até outubro”. Nasvariedades mais precoces, o “café-cereja” já começa a secar no próprio pé. O rastreamentodos lotes que servirão ou não para exportar vem sendo selecionados desde a lavoura, e a cadaetapa do processo de preparação vai se definindo (REVISTA CAMPO ABERTO. Ano 19,nº81. Massey Fergusson. Fevereiro de 2005).

Depois de uma pré-secagem no terreiro, o café vai para a secadora e daí vai para a tulha.Depois de um mês no descanso, para melhorar a qualidade, é que ocorre o beneficiamento. Jádescascado, o café é peneirado e ventilado para separar os resíduos e defeitos. O processo éfinalizado na máquina de seleção eletrônica, a qual possui fotocélulas que identificam eseparam cada grão pela cor. Os melhores lotes, ou seja, os de tonalidade uniforme e semdefeitos, vão para o mercado externo (REVISTA CAMPO ABERTO. Ano 19, nº81. MasseyFergusson. Fevereiro de 2005).

As colhedeiras mecânicas de café estão cada vez mais sofisticadas, podendo ser citadacomo exemplo a colhedora K-3 Challenger 4x4 da Jacto, a qual oferece a possibilidade de amáquina ser equipada com GPS, que fornece mapas de produtividade da área total ao final do

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trabalho, indicando com precisão os setores de maior ou menor produção. Segundo oengenheiro agrônomo do departamento de marketing da empresa Jacto, “com este mapa, ocafeicultor pode programar a correção da fertilidade do solo com maior precisão, evitando,assim, desperdícios” (REVISTA PANORAMA RURAL. Ano IV, nº 58, dezembro de 2003).Por meio do gráfico 1, com os dados referentes à área plantada e à área colhida de café nos 55municípios pertencentes ao CACCER, pode-se perceber uma pequena expansão da áreaplantada nos últimos anos (2003-2005).

Gráfico 1 – Área plantada e área colhida (em hectares) de café nos 55 municípiosatualmente pertencentes ao CACCER (1990 – 2005)

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1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

área plantada área colhida

Fonte: IBGE. Elaboração própria, com base nos dados do SIDRA (Sistema IBGE derecuperação automática).

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Gráfico 2 – Produção total (em toneladas) de café beneficiado nos 55 municípiosatualmente pertencentes ao CACCER (1990 – 2005)

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50000

100000

150000

200000

250000

300000

350000

400000

450000

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: IBGE. Elaboração própria, com base nos dados do SIDRA (Sistema IBGE derecuperação automática).

No gráfico 2, podemos observar uma elevação da produção bastante superior ao da áreaplantada relativa ao total da produção de café nos 55 municípios pertencentes ao CACCER.Pode-se concluir, portanto, que a quantidade produzida de café foi proporcionalmentesuperior a da área plantada e a da área colhida, o que significa ganhos de produtividade dacafeicultura da região.

De acordo com dados da CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento), no ano de 2002,o Brasil colheu 48,4 milhões de sacas de café, sendo este um recorde nacional. Mas, de 2002para a safra de 2003, houve uma diminuição de 5,2% da área plantada de café no Brasil, o quetambém ocorreu nos 55 municípios pertencentes ao CACCER, como se pode observar nográfico acima.

Com essa diminuição da área plantada, houve uma redução no estoque de café dos paísesconsumidores, pressionando o preço internacional para cima. Logo, como podemos constatarpor meio dos gráficos 1 e 2, na colheita de 2004, houve ganhos de produtividade, visto que aprodução aumentou mais do que a área plantada. Entretanto, em 2005, a produtividade caiu,devido à diminuição do preço do café em 2004, o que desmotivou o investimento em custeioda produção.

A lavoura de café sempre apresentou uma característica de biênio em suas safras, ou seja, aprodução total oscila em anos intercalados, produzindo mais em um determinado ano e menosno ano seguinte, visto que onde se produziu um grão não é possível produzir outro no anoseguinte, pois a rama tem que crescer até atingir uma dimensão que permita o nascimento do

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grão. Porém essa característica bianual vem se perdendo nos últimos anos, particularmente nocaso produção do Cerrado, em função das técnicas de irrigação. Assim, podemos notar, nográfico a seguir, que o biênio não ocorre em alguns períodos.

Gráfico 3 – Produtividade (em toneladas produzidas por área plantada em hectares)de café beneficiado nos 55 municípios pertencentes ao CACCER (1990 – 2005)

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: Elaboração dos autores, com base nos dados do SIDRA (Sistema IBGE derecuperação automática)

Esse gráfico é derivado dos dados dos gráficos 1 e 2. A quantidade produzida de cafébeneficiado (em toneladas) de cada ano foi divida pela área plantada (em hectares) de cadaano, para se obter o valor da produtividade anual.

O preço da saca (60 kg) de café ficou em R$ 298,46 no dia 1/12/2006 (CEPEA-ESALQ-USP). Um dos produtores entrevistado afirmou que, em 2005, colheu 23 sacas de café porhectare, sendo que a cotação do café no dia 1/12/2005 era de R$ 241,45 (CEPEA-ESALQ-USP). Em 2006, colheu 94 sacas de café por hectare, sendo que ele possui 200 hectares deárea plantada. Assim, o fator que impulsiona a recuperação da atividade é a oferta ajustada àdemanda, uma vez que os volumes de café com qualidade diferenciada, conhecido comogourmet, ainda são reduzidos em relação ao total da produção disponível, na qual predominao grão tradicional.

Em 2005, os brasileiros consumiram 15,54 milhões de sacas de café, segundo a Abic, sendoeste crescimento de 4% perante o ano anterior. No mesmo período, o consumo médio mundialaumentou apenas em 0,69%, segundo a Organização Internacional do Café (OIC). De acordocom o cafeicultor entrevistado por um grande diário nacional, que foi o primeiro produtor decafé de Monte Carmelo a ser certificado pelo CACCER, atendendo a três requisitos

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(qualidade, rastreabilidade e modo de produção), a certificação faz a diferença quando ospreços estão baixos. Esse cafeicultor afirma que o seu custo de produção varia entre R$180,00 e R$ 200,00 por saca colhida, sendo que de 30% a 40% da produção são exportados(JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO. Caderno de Economia. Ano 127, nº 41060 – 19 demarço de 2006).

Outro produtor, também entrevistado pelo diário, proprietário de uma fazenda em Patrocínio-MG, e que também se tornou produtor certificado nos três quesitos referidos acima, declarouter gasto R$ 70.000,00 de recursos próprios para se enquadrar aos critérios do modo deprodução do padrão certificado, como construir uma nova área para armazenagem dedefensivos, por exemplo. Afirmou, ainda, que, com isso, ampliou entre 15% e 20% aprodutividade de sua fazenda de 175 hectares de área plantada, e reduziu de 5% à 7% o custovariável, sendo que neste está incluída a mão-de-obra braçal. Atualmente, gera uma produçãomédia de 5 mil sacas por ano, ou seja, 29 sacas de café por hectare. Cerca de 30% do café finoproduzido são totalmente exportados para o Japão, e o café tradicional, porém diferenciado, évendido para os EUA e Europa. O produtor declarou, ainda, que consegue cerca de US$ 10 amais por saca sobre o preço médio do mercado por causa da qualidade certificada e darastreabilidade do produto (JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO. Caderno de Economia.Ano 127, nº 41060 – 19 de março de 2006).

Portanto, a produção em maior quantidade, e com a melhor qualidade, gera maiores lucros aoprodutor. Com isso, a busca pela diminuição dos custos pode ser observada na colheita, compreferência pela colheita mecânica. Assim, reforça-se, cada vez mais, uma tendência àmecanização da colheita do café, embora a mão-de-obra ainda seja predominantementemanual no Cerrado Mineiro.

A terceirização da mecanização na cafeicultura do Cerrado Mineiro

Um fenômeno que intensifica ainda mais o uso de máquinas colhedeiras na cultura do café é aterceirização. De acordo com dados do Censo Agropecuário de 1995/96, 13.679estabelecimentos na mesorregião do TMAP utilizaram instrumentos de trabalho depropriedade de terceiros. De acordo com Garlipp, Jesus e Ortega (2003, p.98), o índice deterceirização4 encontrado na região revela que, já em 1995/96, mais de um terço do total deestabelecimentos agropecuários da mesorregião utilizava força mecânica de terceiros nacondução dos trabalhos agrários.

Ainda segundo os dados censitários, aqueles pesquisadores apontaram que o estado de MinasGerais possui uma posição de destaque quanto à terceirização com relação aos outros estadosda região Sudeste. Em Minas Gerais, a participação dos instrumentos de trabalho de terceirosé de 63,5%. Seu IT (índice de terceirização) atingiu 36,9%, ficando superior ao conjunto da

4 O “índice de terceirização” encontrado por esses pesquisadores utilizou como base o trabalho de LAURENTI

(2000), que, por sua vez, foi elaborado com base no “índice de desativação” formulado por ARNALTE, A. E., op.Cit., p 105. Aquele índice é expresso pela seguinte fórmula, I = [ B / ( A + B ) ] x 100 onde: I = índice dedesativação em percentagem; A = total de estabelecimentos rurais nos quais as máquinas utilizadas são depropriedade do titular do estabelecimento; e B = total de estabelecimentos rurais nos quais as máquinas não sãode propriedade exclusiva do titular do estabelecimento.

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região a que pertence, sendo que a mesorregião do TMAP obteve um IT de 35,9%, valorpróximo ao estado de Minas Gerais.

Segundo Garlipp, Jesus e Ortega (2003, p.100), dentre as principais formas de acesso aoestoque de instrumentos de trabalho de terceiros, o aluguel de força de tração representa a demaior importância e concluem que:

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No cenário agrícola regional, assim como no nacional, o aluguel de instrumentos de trabalhostambém é uma fonte de obtenção de renda para uma parcela significativa dos estabelecimentosagropecuários, que realizam esse serviço de forma combinada com a produção agrícola. Cria-se, assim, um conjunto de estabelecimentos agropecuários cuja composição de renda não édefinida apenas pelo comércio de produtos agrícolas produzidos dentro da sua unidadeprodutiva, mas pela atuação, também, na prestação de serviços, constituindo um setor terciáriorural. (Garlipp, Jesus e Ortega, 2003, p. 103)

Para uma melhor abordagem do tema, podemos citar o exemplo de uma empresa prestadorade serviços: a NIVALMAQ, no mercado desde 1994, com sede em Araguari-MG, e quepossui, atualmente, 22 máquinas colhedoras de café. Destas máquinas, 14 são do modelo K3da Jacto e 8 são da Korvan, a qual, atualmente, não está mais à venda no mercado demáquinas agrícolas. A NIVALMAQ possuía, no ano de 2000, 13 máquinas. Já no ano de2003, estava com 17 e, no ano de 2006, expandiu a sua frota para 22 máquinas, revelando,assim, o grande aumento das empresas terceirizadoras.

Durante o período da colheita do café no Cerrado Mineiro, que coincide com a colheita noestado de São Paulo, a empresa aluga, aproximadamente, 70% das máquinas no estado deMinas Gerais e 30% em São Paulo. A empresa atua também em outros estados (Bahia, Goiás,Paraná e Tocantins), nos quais a época da colheita é diferente de Minas Gerais. Atualmente, aNIVALMAQ cobra em torno de R$ 140,00 por hora de uso da máquina Jacto, modelo K3,cujo valor é de cerca de R$ 500.000,00. Pelo uso da colhetadeira Korvan, a empresa cobra R$150,00 por hora.

No ano de 2003, os valores de aluguel de máquinas girava em torno de R$ 80,00 a R$ 120,00a hora. Portanto, temos uma elevação dos preços relativos cobrados pelos aluguéis, devido aoaumento de empresas prestadoras de serviços, sendo que, até o ano de 1998, poucas empresasatuavam na região, o que garantia uma forte demanda para aqueles que possuíam máquinas eexecutavam serviços externos.

Segundo Jesus (2003, p.74), para chegar a esses valores, os prestadores tomam por base seuscustos de operação e depreciação mais o lucro. Enquanto isso, os produtores que possuemmáquinas e que, depois de realizada sua colheita, alugam suas máquinas, baseiam seus preçosno valor de mercado que as empresas especializadas estão praticando.

Um outro exemplo a ser citado é o da empresa TOMÉ, também com sede em Araguari, quefoi criada em 1998 e, atualmente, possui 19 máquinas, todas do modelo K3 da Jacto, sendoduas delas adquiridas recentemente (em 2006). Seus clientes são produtores de café de todo oestado de Minas Gerais, e o valor cobrado pelo aluguel está em torno de R$ 140,00 a hora.

Além do custo referente ao aluguel das máquinas, também ficam por conta do produtor oscustos com manutenção, caso necessária, e de mão-de-obra (operadores da máquina) e o óleodiesel. Uma colheitadeira consome aproximadamente 5 litros de óleo diesel por hora, o queequivale à um custo próximo de R$ 9,00 por hora, atualmente.

Assim, com a terceirização, supera-se um dos obstáculos aos investimentos em máquinas naagricultura, pois, com a intensificação de seu uso, acelera-se a depreciação do capitalinvestido, coisa que tardaria muito mais, caso a máquina fosse utilizada somente numapropriedade. Além disso, há que se registrar a redução dos custos com força de trabalho. Tudofavorecendo a disseminação de seu uso.

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Evolução do emprego na cafeicultura do Cerrado Mineiro

No TMAP, nas últimas décadas, ocorreram profundas transformações na agropecuária. Aspastagens naturais foram dando espaço às pastagens plantadas, culturas altamentemecanizadas (café, soja, algodão e milho) foram sendo incorporadas, e a mão de obra braçalfoi sendo reduzida.

Na tabela 1, podemos observar que, no ano de 1980, havia um predomínio da criação de gadoem pastagens naturais nos municípios que hoje mais se destacam na produção de café noCerrado Mineiro. Já nos anos 1995/1996, as pastagens naturais caíram para pouco menos daárea anterior, enquanto que as pastagens plantadas tiveram a sua área mais que duplicada.Estes dados mostram que houve uma intensificação do uso de instrumentos de trabalho paraaumentar a produtividade, visto que as pastagens plantadas elevam a produtividade do gadode corte, assim como do gado leiteiro.

Tabela 1 – Total da utilização das terras nos principais municípios produtores de caféno TMAP (55 municípios filiados ao CACCER). (Há)

1980 1985 1995/96

Lavouras perm. 109.876 139.465 153.255

Lavouras temp. 607.606 865.866 869.624

Pastagensnaturais

4.596.938 3.831.057 2.156.979

Pastangensplant.

1.101.429 1.568.034 2.398.968

Fonte: IBGE – Censo Agropecuário de 1980, 1985 e 1995/96

Observa-se, também, que houve um aumento na área de cultivo da lavoura permanente nosmunicípios cujas principais culturas são representadas pelo café, o que nos leva a concluir quehouve uma expansão do tamanho da área cultivada na cafeicultura, visto que, na região doCACCER, o café é a única cultura significativa em lavouras permanentes. A área cultivada delavouras permanentes passou de 109.876 ha em 1980 para 153.525 ha em 1995/96, sofrendoum aumento de, aproximadamente, 40% no período em consideração.

Quanto ao número de tratores utilizados nesses municípios do CACCER, por meio dos dadosdos Censos Agropecuários, também pudemos observar uma significativa elevação de seu uso.Em 1980, eram 8.806 tratores, em 1985 12.846 e em 1995/96 passamos a ter 20.398 tratores.Portanto, um crescimento de 131,64%, mas que não foi proporcional entre os municípiosestudados daquele Conselho, sendo que, ainda de acordo com os dados censitários, o maioraumento ocorreu em Patrocínio, Monte Carmelo, Carmo do Paranaíba, Araguari,Coromandel, Rio Paranaíba e Serra do Salitre.

Embora o número de arados tenha subido no período de 1980 a 1985, esses instrumentostiveram o seu número reduzido em 1995/96. Enquanto isso, os arados de tração mecânica

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apresentaram um crescimento contínuo ao longo do período (1980-1995/96). Assim,podemos notar que os produtores da região vêm privilegiando o uso de instrumentosmecânicos em detrimento de outras formas de produção para realizar a grande maioria de suasatividades agrícolas (JESUS, p. 32, 2003).

A principal máquina introduzida na região é mesmo a colhedeira mecânica, que reduz oscustos de produção, mas elimina muitos postos de trabalho.

De acordo com os dados do Censo Agropecuário, as máquinas para colheita nos municípiosque mais se destacam na produção de café no Cerrado Mineiro, passaram de 1.161 para 1.927no período de 1980-1985, e aumentaram para 3.192 em 1995/96, sofrendo, assim, umcrescimento de quase 175% no período de 1980 a 1995-96. Portanto, como é nas atividadesde colheita em que mais se concentra o trabalho braçal na cafeicultra, a substituição pelacolheita mecânica afeta drasticamente o emprego.

De acordo com os dados da tabela abaixo, no período de 1970–1985, houve uma taxa decrescimento do emprego positiva, visto que a atividade cafeeira da região estava seampliando, mas, no período de 1985 a 1995/96, essa taxa se inverteu, em decorrência daintensificação do uso de máquinas nas diversas atividades agrícolas, sendo que o trabalhotemporário apresentou um decréscimo maior que o trabalho permanente. Esses números docenso agropecuário de 1995/96 podem ser questionados em função da mudança da data decoleta de dados do censo em 1995/96, mas é consenso que ocorreu a introdução das máquinascolheitadeiras nesse período, afetando o emprego regional. Dados dos próximos censos, deacordo com todos os entrevistados, provavelmente mostrarão situação ainda mais dramáticado ponto de vista do emprego, pois foi exatamente nos últimos 10 anos que se intensificou ouso daquelas máquinas.

Apesar da queda do volume de emprego, de acordo com os especialistas entrevistados, suaintensidade ainda não é maior em função da presença da agricultura familiar, particularmentena microregião do Alto Paranaíba. Como afirma Jesus (2003, p. 35),

Um dos motivos que faz com que a taxa de desemprego na região não seja mais elevada, deve-se ao fato de que, nesta região, existe um grande número de pequenos cafeicultores, queexecutam suas atividades com a mão-de-obra manual e, normalmente, contam com os própriosmembros da família, o que leva a um menor índice de êxodo rural na região.

Tabela 2 - TMAP – (1970 – 1995/96) – Pessoal Ocupado Distribuído por Categoria(Permanentes, Temporários e Parceiros)

TriânguloMineiro eAltoParanaíba

1970 1980 1985 1995/96

Crescimento Médio (Tx)

1970/80

1980/85

1985/95-6

OcupaçãoTotal

147.660

224.545

264.161

192.274

4,281 3,303 -3,126

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Permanentes

18.351

53.696

62.097

52.503

11,334 2,950 -1,664

Temporários

22.902

43.866

65.963

29.592

6,715 8,501 -7,703

Parceiros 25.449

9.471 7.239 1.621 -9,412 -5,233 -13,899

Fonte: CENSOS AGROPECUÁRIOS, MG, FIBGE – 1970, 1980, 1985 e 1995/96.

Apesar disso, de maneira geral, vem se intensificando a queda do volume de emprego nacafeicultura regional, afetando assim, não somente os trabalhadores temporários residentes,como os migrantes temporários oriundos de outras regiões brasileiras. De acordo com asentrevistas, esses trabalhadores são, em sua maioria, filhos de pequenos proprietários deregiões deprimidas economicamente e, portanto, esse desemprego implica maioresdificuldades na manutenção dessas terras e dessas famílias.

Nos gráficos seguintes (4 e 5), podemos observar que os trabalhadores da cultura docafé são admitidos no mês de abril e demitidos em setembro, visto que eles são contratadospara trabalharem no período da colheita.

A área colhida representada no gráfico 4, se comparada aos dados dos gráficos 2 e 3,nos anos 2003, 2004 e 2005, permite-nos observar que o número de contratações detrabalhadores na época da colheita está diretamente relacionado com a dimensão daquantidade produzida. Entre 2000 e 2004, havia uma “super-oferta” mundial de café. Mas, em2005, houve uma virada nos preços, com o maior equilíbrio entre oferta e demanda mundial ea redução nos estoques de café.

Ao estabelecermos um parâmetro entre a área colhida (gráfico 1) e as informações referentesaos gráficos 2 e 3, nota-se que, a partir do ano 2000 – ano em que os produtores de café foramobrigados a formalizarem os seus contratos de emprego em função do aumento dafiscalização –, o número de contratações de trabalhadores nas épocas de colheita estádiretamente relacionado com a dimensão da área colhida, sendo que isso fica nítido nos anosde 2003, 2004 e 2005. Esse resultado deve-se ao fato de que a colheita do café, namesorregião do TMAP, ainda é predominantemente manual.

Gráfico 4 – Admissões de trabalhadores formais na cafeicultura na mesorregiãodo TMAP (1997 – 2005)

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14000

Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho Julho Agosto Setembro Outubro Novembro Dezembro

quantidade

de t

raba

lhadore

s

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

Fonte: CAGED (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), Ministério doTrabalho e Emprego.

Entretanto, a transição para a colheita mecanizada, em detrimento da colheita manual, é umarealidade, apesar dos custos que implica para o produtor, que precisa realizar, por exemplo, oreplantio das plantas em novos espaçamentos. Para muitos produtores entrevistados, paraalém dos ganhos em produtividade e qualidade, a colheita mecanizada reduz as exigências deforça de trabalho e, portanto, conflito com o Ministério do Trabalho. Para cada trabalhador, éexigido o fornecimento de um boné, uma viseira, refeição, a qual gira em torno de R$ 6,00,alojamento e exame médico. E, para cada quatro trabalhadores, deve-se fornecer uma garrafade água. Esses encargos, juntamente com a assinatura da carteira de trabalho dostrabalhadores rurais, passaram a ser difíceis de ser burlados a partir de 2000, quando afiscalização nas lavouras de café da região se intensificou. Segundo Jesus (2003, p.54),

O principal motivo para adoção da colheita mecânica tanto para produtores que possuemmaquinário próprio, como pra quem terceirizou o serviço, está na redução de custos, secomparada com a colheita manual. Além deste motivo, os produtores apontam também aredução nos “problemas” trabalhistas ao lidar com um número menor de trabalhadores(redução de pessoal contratado). É importante registrar também, segundo os entrevistados,uma maior agilidade no processo de colheita.

Gráfico 5 – Desligamentos de trabalhadores formais na cafeicultura na mesorregiãodo TMAP (1997 – 2005)

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Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho Julho Agosto Setembro Outubro Novembro Dezembro

de

des

ligam

ento

s

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

Fonte: CAGED (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), Ministério doTrabalho e Emprego.

De acordo com um engenheiro agrônomo de Araguari-MG, o custo da colheita mecanizadafica em torno de 40% a 50% mais barato que a colheita manual. Cada colhedeira de cafédiminui, diretamente, cerca de 40 trabalhadores rurais, pois, mesmo na colheita mecanizada,ainda há dispêndio de mão-de-obra – cerca de 5 trabalhadores quando a colhedeira é ligada –,mas esse dispêndio de mão-de-obra é bem menor que na colheita manual. Portanto, essaredução nos custos de produção, mais do que as dificuldades com a legislação trabalhista, éque vem, de fato, incentivando os produtores a adotar a colheita mecanizada.

Em entrevistas com cafeicultores, identificamos esse desejo de substituição. Entretanto, paraque as máquinas possam deslocar-se no meio das lavouras, os proprietários de lavouras maisantigas e não planejadas para a colheita mecânica devem efetuar algumas modificações: ocorte de árvores próximas e no meio das lavouras, o arranque de algumas ruas de café, oalargamento dos carreadores, o rebaixamento de curvas de nível e a construção de acessosmais largos para chegar às propriedades. Além disso, a declividade do terreno também é umfator muito importante para a colheita mecanizada, visto que a máquina colhedora é adaptadaa terrenos com a menor declividade possível.

Há que se observar que os produtores de áreas de grande declividade são pequenosproprietários. Assim, para eles, a adoção da colheita mecânica, mesmo que fosse com autilização de máquinas alugadas, é inviável. O que significa dizer que, para esses produtores,os ganhos de qualidade e produtividade ficam aquém dos produtores mais bem localizados.

Apesar disso, sua exclusão não fica decretada em função do uso da colheita manual. Deacordo com Jesus (2003, p. 64), é difícil saber quem utilizou ou não a colheita mecânica, poisum mesmo produtor pode colher uma área dentro da propriedade e outra não, dependendo daprodutividade, ou um ano sim e outro não, pois a cultura é considerada de biênio, ou seja, um

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ano com muita carga e outro com baixa. Assim, muitos produtores não utilizam a colheitamecânica quando a produtividade é considerada baixa, principalmente aqueles que terceirizamo serviço.

Embora a maioria dos produtores digam ser mais vantajosa a colheita mecânica, emdetrimento da colheita manual, mesmo que grande parte ainda não a utilize, alguns produtoresafirmam que uma máquina em atividade sobre a lavoura danifica muito mais a planta, pois elaatinge toda a extensão da rama e do cafeeiro, atingindo, assim, a ponta na qual estão sedesenvolvendo novos botões de flores e as ramas que não estão produzindo. Todavia,atualmente, de acordo com os técnicos entrevistados, esse problema está cada vez maisdistante, em vista das inovações que estão ocorrendo nos modelos novos de colhedeirasmecânicas de café, que estão surgindo no mercado.

De acordo com o cafeicultor entrevistado, ele pretende adequar futuramente a sua lavoura aouso da colheita mecânica, por ser menos trabalhoso e devido às exigências por parte doMinistério do Trabalho, apontadas anteriormente. Mas, por enquanto, sua colheita ainda é100% manual, sendo que ele possui 4 funcionários fixos e, no período de colheita, ele contratade 40 a 50 trabalhadores, oriundos do sul da Bahia, na divisa com o estado de Minas Gerais.

Esses homens dirigem-se para a região no período da seca no Nordeste e viajam em busca deuma renda melhor para, depois da colheita, voltarem para o sul da Bahia e abastecerem suasrespectivas famílias com os rendimentos obtidos na colheita de café. Quando voltam para osseus lugares de origem, em sua maioria, trabalham fazendo “bicos” ou em agricultura desubsistência quando proprietários de terra.

O salário desses trabalhadores, contratados pelo produtor entrevistado, variam de acordo coma quantidade colhida de café, mas, segundo o cafeicultor entrevistado, o salário médio de cadatrabalhador gira em torno de R$ 600,00 à R$ 700,00 mensais, com uma jornada de trabalhoiniciando-se às 7 h e terminando às 17 h, com intervalo para almoço. O transporte apenas paraa volta do trabalho fica por conta do produtor, além da refeição e do alojamento.

Constatou-se, também, que esses 50 trabalhadores contratados durante a época de colheitaconseguem aumentar as suas rendas quando voltam para seus lugares de origem. Elesmandam para suas famílias uma pequena quantidade e, só quando voltam para lá, ao final dacolheita, é que levam todo o rendimento que conseguiram. Isso nos mostra que a qualidade devida e os salários na região onde há o predomínio da seca são bem inferiores que na regiãoSudeste. Portanto, à medida que se intensifica o uso da colheita mecânica, políticas públicasdirigidas a essas regiões economicamente deprimidas devem ser intensificadas, pois osimpactos mais perversos sobre a substituição do trabalho manual para o mecânico ficam comessas regiões. Em contrapartida, no caso do território do café do Cerrado Mineiro, há umaelevação do trabalho permanente, mais qualificado e mais bem remunerado, gerado peladisseminação daquele tipo de colheita, requerendo operadores, mecânicos, intensificação dosserviços terciários, etc.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

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Ao longo deste trabalho, procurou-se destacar a influência do processo de mecanização nacafeicultura do Cerrado Mineiro sobre o emprego.

A região produtora de café do Cerrado Mineiro, a única região do mundo que certifica o cafédesde o local onde é plantado até a fabricação do produto final, passou por profundastransformações em seu modo de produção e, atualmente, possui uma tendência a mecanizarsua colheita, ainda que essa atividade continue sendo predominantemente manual.

Entretanto é possível identificar alguns impactos sociais perversos, por exemplo, sobre a mão-de-obra temporária, que precisam ser antecipados, já que, como constatamos em nossapesquisa, trata-se de um movimento sem volta.

Os produtores de café do Cerrado Mineiro, que respondem por uma boa parte da produçãobrasileira de café exportado e também pela produção de uma das melhores qualidades decafés do país, vêm incrementando a mecanização de suas colheitas. Assim, à medida que seintensifica o uso da colheita mecânica, políticas públicas dirigidas a essas regiõeseconomicamente rebaixadas devem ser intensificadas, pois os impactos mais perversos sobrea substituição do trabalho manual para o mecânico ficam com essas regiões.

Em contrapartida, no caso do território do café do Cerrado Mineiro, com a introdução dacolheita mecânica, contrariamente ao que se poderia esperar, há uma elevação do emprego,particularmente o permanente, mais qualificado e mais bem remunerado, pois passou-se arequer operadores de máquinas, mecânicos, intensificação dos serviços terciários, etc.

Portanto, os impactos mais perversos dessa substituição do trabalho manual pelo mecânico nacafeicultura do Cerrado Mineiro são mais sentidos nos municípios de origem dostrabalhadores temporários, migrantes de regiões brasileiras economicamente inferiores àregião Sudeste. Assim, mais do que enfrentar uma tendência irreversível, como é o caso damecanização da atividade produtiva, é preciso dirigir políticas públicas de geração deemprego e renda naquelas regiões, permitindo, assim, uma inclusão econômica e social maissustentável.

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