[teresa southwick] uma simples paixão

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick Quando o destino resolve conceder uma segunda chance... Penélope Doyle sempre quis encontrar um príncipe encantado que não se transformasse em sapo depois de beijado. Mas quando seu noivo roubou seu coração e seu dinheiro, ela fez o juramento de que nunca mais acreditaria em contos de fada... Porém, ao conhecer seu novo chefe, o sheik Rafiq Hassan, voltou a acreditar no verdadeiro amor. Será que um sheik bonito olharia duas vezes para uma simples moça americana, ainda que inteligente e talentosa? A resposta veio em forma de beijo... Digitalização e Revisão: Simoninha - 1 -

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Um Sheik

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Page 1: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick

Quando o destino resolve conceder uma segunda chance...Penélope Doyle sempre quis encontrar um príncipe encantado que não se

transformasse em sapo depois de beijado. Mas quando seu noivo roubou seu coração e seu dinheiro, ela fez o juramento de que nunca mais acreditaria em contos de fada...

Porém, ao conhecer seu novo chefe, o sheik Rafiq Hassan, voltou a acreditar no verdadeiro amor. Será que um sheik bonito olharia duas vezes para uma simples moça americana, ainda que inteligente e talentosa? A resposta veio em forma de beijo...

Digitalização e Revisão: Simoninha

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickQuerida leitora

Estamos trabalhando "pesado" com os novos Romances que você irá encontrar nas bancas em 2004! Neles você encontrará mais paixão, mais aventura, e muitas novidades, como romances de novas autoras! Não deixe de enviar cartas e e-mails com sugestões! Elas são muito importantes e sem elas não poderíamos levar até você o melhor Romance!

Fernanda Cardoso Editora

P.S.: Para saber mais sobre a família do enigmático sheik Rafiq Hassan, leia também o Julia 1269 que será lançado neste mês!

UMA SIMPLES PAIXÃOTeresa Southwick

Copyright © 2003 by Teresa SouthwickOriginalmente publicado em 2003 pela Silhouette Books, divisão da Harlequin

Enterprises Limited. Todos os direitos reservados, inclusive o direito de reprodução total ou parcial, sob qualquer forma. Esta edição é publicada através de contrato com a Harlequin Enterprises Limited, Toronto, Canadá. Silhouette, Silhouette Desire e colofão são marcas registradas da Harlequin Enterprises B.V. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência.

Título original: To Catch a SheikTradução: Dorothy SophieEditora e Publisher: Janice FloridoEditora: Fernanda CardosoEditoras de Arte: Ana Suely S. Dobón, Mônica MaldonadoPaginação: Dany Editora Ltda.EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.Rua Paes Leme, 524 - 10e andar CEP 05424-010 - São Paulo - BrasilCopyright para a língua portuguesa: 2003 EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.Impressão e acabamento:RR DONNELLEY AMÉRICA LATINATel.: (55 11) 4166-3500

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO I

Penélope Colleen Doyle não acreditava em contos de fada, nem na idéia de que beijando um sapo ele se transformaria em um belo príncipe. Mas caminhar pelo palácio real de El Zafir sem dúvida a fez desejar que isso fosse verdade.

— Estamos chegando? — ela perguntou ao guia.— Sim, senhorita. Só mais um momento.Penélope esquecera o nome do rapaz. Sua memória costumava ser excelente, mas

naquela situação era normal que falhasse. Estava em El Zafir, a terra da magia, encantamento e romance, no palácio real de corredores de mármore e salas repletas de preciosa mobília. Mas, naquele momento, experimentou uma absurda vontade de fugir.

"Deus do céu, eu estou aqui!" Mas nem o pânico desencadeado pela adrenalina daria forças a uma pessoa que não dormia fazia mais de vinte e quatro horas.

Dobraram um corredor e pararam diante de uma impressionante porta dupla de marfim. O pé-direito era tão alto que lhe lembrou uma cena do filme King Kong, onde portões gigantescos deviam manter o gigante preso.

— Esta é a ala de negócios do palácio, senhorita.— Há um mapa que eu possa usar para me localizar? Alguma coisa com um X que me

mostre onde me encontro?— Não.O homem nem mesmo esboçou um sorriso. Se ninguém naquele país tinha o mínimo

senso de humor, iria ser muito difícil permanecer ali durante dois anos.O guia empurrou a porta da direita, revelando um cômodo acarpetado em forma de T.— Acompanhe-me, senhorita.— Pois não.Como se lhe ocorresse afastar-se dele... Ficaria perdida durante dias. Teriam de

mandar um pelotão procurá-la. Haveria busca e resgate no palácio de El Zafir?O jovem passou por várias portas e então virou à direita, atravessando outra porta que

se abria em um escritório. A sala era maior que o apartamento em que Penélope morava.O moço indicou-lhe um sofá, encostado em uma das paredes.— Sente-se. A senhorita receberá instruções concernentes a seus deveres.— Da princesa Farrah Hassan?— Não.Então de quem?, ela gostaria de saber.Sem mais nenhuma explicação, o guia se virou e a deixou a sós.Penélope apreciaria muito tomar café, mas tudo naquele cômodo era intimidante. A

sua frente, uma escrivaninha de cerejeira brilhava tanto que poderia servir de espelho para ela ajeitar os cabelos, que iam até a cintura, mas que se encontravam presos e não necessitavam ser ajeitados.

A mesa tinha um computador com impressora, scanner e uma máquina de fax. Atrás, perto da parede, uma copiadora. Penélope gostaria de saber se todos os escritórios eram tão bem equipados.

Nesse momento, notou uma porta fechada, à direita. Talvez tivesse café ali atrás. Poderia bater e dar uma olhada.

Não. Recebera ordem de esperar. Suspirando, sentou-se no aconchegante sofá. Um segundo depois, suspirou de novo, por outra razão. Jamais vira tanto conforto. O couro do sofá não era frio, mas fabulosamente luxuoso. Continuou no aguardo, lutando para manter os olhos abertos.

Rafiq Hassan, o príncipe de El Zafir, Ministro do Interior e Assuntos Estrangeiros, adentrou o escritório, para conhecer sua assistente. De imediato, o príncipe avistou uma jovem sentada no sofá. Sentada não era a palavra correta. Ela estava largada. Seria essa a pessoa que iria trabalhar com ele?

Aproximou-se e a analisou. A estranha usava um vestido caqui largo, que a cobria do pescoço até abaixo dos joelhos, deixando visíveis os tornozelos, muito bem-feitos. Calçava sa-patos baixos e fechados. Era uma mulher pequena. Entretanto, os óculos feios e pretos sobre o rosto oval não favoreciam sua aparência.

No momento, não precisaria dos óculos, pois tinha os olhos fechados. Rafiq recordou uma história americana que ele contava aos sobrinhos. Seus cabelos eram dourados, e ela dormia pesado.

Ele se curvou, dizendo:

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Desculpe-me, senhorita...Cílios longos e brilhantes se moveram. Estariam sendo aumentados pelas lentes dos

óculos horrorosos? Quando ela o olhou, o príncipe viu lindos e grandes olhos azuis.— Hum?— Senhorita?— Olá... — Penélope piscou diversas vezes e endireitou-se, observando o ambiente,

como se estivesse desorientada. Então, encarou-o. — Acho que não estou mais em Kansas.— Tem razão.Antes que ela cobrisse o bocejo com a delicada mão, Rafiq notou que seus dentes

eram brancos e perfeitos.— E uma expressão americana do filme O Mágico de Oz, quando Dorothy percebe que

estava muito longe de casa.— Sei disso. Eu vi o filme. Você é americana?— Sim, recém-chegada do Texas.— Ouvi falar a seu respeito. Ela sorriu.— Eu estaria surpresa se você não soubesse. Também trabalha aqui?— Sim.— Este escritório deve ser bem movimentado se há necessidade de dois assistentes.Assistente? "Essa moça pensa que sou assistente?!" Rafiq ia desfazer o equívoco,

quando ela se aprumou e ele notou o contorno sensual de seus seios. Ali não havia lentes que pudessem aumentá-los...

— Poderia me indicar onde está o bule de café?— Posso pedir café, se é isso o que quer — ele afirmou, parecendo preocupado.— Seria ótimo. Ficarei muitíssimo agradecida. Rafiq foi até a escrivaninha e pegou o

telefone.— Café, por favor. Bem forte.— Deus o abençoe.Quando Rafiq se virou para ela, Penélope o fitava com os olhos arregalados, por detrás

das grossas lentes.— O que foi?— Perdão. Não quis encará-lo. É que...— Fale...— Não. Você me achará esquisita. Se vamos trabalhar juntos, não quero que me julgue

assim.— Prometo que não julgarei. Por que me olhou daquela maneira? Tenho alguma

verruga no nariz? Alguma mancha no rosto? Achou minha aparência estranha?— De modo algum. Você é muito bonito. Quero dizer, se o resto dos homens deste país

for assim... — Penélope corou. — Lamento. Espero que não se importe. Eu apenas... bem, não tenho idéia de como... Na pesquisa que fiz sobre El Zafir, não encontrei nada sobre... Sinto muito, mas você perguntou...

— Sim, perguntei.O modo ingênuo como Penélope se atrapalhava com o que dizia deixava claro que ela

não o fizera de caso pensado. Fora um cumprimento inocente e Rafiq estava muito perto de perdoá-la por tê-lo confundido com um funcionário.

— De onde vim, os caubóis são o protótipo dos homens, e a maioria das secretárias ou assistentes são mulheres.

Rafiq não sabia se se sentia lisonjeado ou insultado, e fez uma anotação mental para se informar sobre os caubóis texanos. E revogou a decisão de perdoá-la. No entanto, teve vontade de continuar a conversa:

— Então, você é uma assistente?Ela fez que sim, tirou os óculos e esfregou os olhos. O príncipe esperava ver sua

maquiagem manchada, mas Penélope não usava nenhuma. Sua pele era perfeita e linda.— Cheguei a El Zafir esta manhã. Deveria ter chegado há dois dias, mas os vôos

atrasaram devido às tempestades. De onde eu venho, costuma-se dizer que, se você não gosta do clima, basta esperar um minuto. Mas dessa vez não tive tal sorte.

— Como veio a meu... a El Zafir, senhorita...— Doyle. Penélope Colleen Doyle. Mas pode me chamar de Penélope.— Muito bem.— Fui contratada pela princesa Farrah Hassan. Você a conhece?— Sim. — Fez um esforço para não rir.

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Page 5: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Ela é fabulosa! E a irmã do rei. Serei sua secretária.— Quando foi contratada?— No mês passado.— E você acabou de chegar?— Sim. Tive de alugar meu apartamento e arrumar lugar para guardar minhas coisas.Penélope parecia jovem demais para ter a responsabilidade de viver sozinha.— Quantos anos tem, Penélope? Ela arqueou uma das sobrancelhas.— Nos Estados Unidos essa pergunta não seria feita. É deselegante perguntar a idade

de uma mulher.— Entendo. Mas você parece jovem demais para...— Tenho vinte e dois anos. E não é de sua conta, mas sou formada em pedagogia e

também em administração. - E precisava de um emprego com um bom salário. Assim, enviei meu currículo a uma agência que emprega moças para cuidar de crianças de gente rica. Depois de ver minhas qualificações e fotos, a princesa me escolheu. De acordo com o diretor da agência, ela estava procurando uma babá simples e comum para tomar conta dos filhos de seu sobrinho viúvo. Ou divorciado, não me recordo bem.

— Quer dizer que foi assim?— Não sei se é apropriado perguntar, mas por que será que a princesa procurava justo

por uma babá simples e comum?Não havia motivo para revelar que ele era responsável por essa exigência.— Não faço idéia. Ela deu de ombros.— Nem eu. Mas foi uma exigência.— Entendo.Rafiq podia ser a pessoa mais charmosa da família, mas a declaração direta de

Penélope o deixou pensativo. Seu conhecimento sobre as mulheres se resumia a tipos sofisticados, moças altas e glamourosas. Não se interessava por jovens de baixa estatura e sem charme, que usavam óculos grandes e feios.

— Prefiro enfrentar a vida de cabeça erguida. Se a enterramos na areia, como os avestruzes... deixamos o resto do corpo exposto, se é que está me entendendo. Sou uma pessoa prática. É melhor enfrentar os fatos sem esperar um conto de fadas. Não concorda?

O príncipe não tinha certeza do que responder. Seria melhor mudar o rumo da conversa:

— Quer dizer que tem uma entrevista com minha... com a princesa?— Sim. Encontrei-me com ela em Nova York. Minha primeira viagem de avião. Foi

emocionante, mas houve um problema.— Sim?As portas do escritório se abriram e uma empregada apareceu empurrando um

carrinho com serviço de prata e xícaras de porcelana.— Obrigado, Salima.— Por nada, Al...— Deixe tudo na escrivaninha — ele disse, interrompendo rápido a criada. — Cuidarei

disso.— Sim, senhor. — Ela se curvou e se foi.— Nossa! Todo o mundo é assim tão deferente? Nós, americanos, devíamos tomar

algumas lições. Você terá de me ajudar. Não quero ofender ninguém. Se me vir fazendo alguma coisa desrespeitosa, chame-me de lado para que eu não faça papel de boba, está bem?

— Você é americana — ele afirmou, como se isso fosse o suficiente.Então, Rafiq se serviu de café.— Importa-se de me servir, também? Nem posso acreditar que peguei no sono. Tenho

de religar meu motor.— Você não me parece desligada.— Estou falando demais? Às vezes faço isso. Mas hoje estou pior do que de hábito. Na

certa por estar cansada e nervosa. Uma péssima combinação. Isso o aborrece? A princesa parece não se importar.

— Ela é uma mulher muito forte. Creme ou açúcar?— Café preto, por favor. Rafiq lhe estendeu a xícara.— O que você estava dizendo?— Onde parei? — Penélope tomou um gole. — Oh, sim! Fui a Nova York para conhecer

a princesa. Meu vôo estava atrasado.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Devido ao mau tempo do norte do Texas?— Isso mesmo. Você presta bastante atenção, não é? Havia muito trânsito na cidade.

Quando cheguei à suíte do hotel, por sinal maravilhosa, a princesa já tinha contratado outra pessoa.

— Uma babá simples e comum?— Sim. — Franziu o cenho. — Ainda não consigo imaginar o motivo desse critério.

Enfim, a princesa foi tão gentil que me convidou para ficar para o lanche. Conversamos bastante, comendo chocolate.

— E mesmo!— Sim... Chocolates deliciosos. Godiva. Enfim, ela disse ter gostado muito de mim e

que precisava de uma assistente. E me contratou. Fez uma oferta irrecusável. Bem, você deve saber quanto a família real de El Zafir costuma pagar.

— Sem dúvida.— Casa e comida incluídas.— Uma oferta ótima!— Nem me diga! Como é que você disse se chamar? Que rude da minha parte ter

esquecido. Deve ser o cansaço. Depois de uma boa noite de sono ficarei nova em folha. Costumo ser muito boa para guardar nomes.

— Acho que não disse como me chamo.Rafiq notou que ela ficou intrigada. Para uma mulher que alegava exaustão, Penélope

tinha muita energia. Com descanso seria, como os americanos diziam, uma bola de fogo. Sim, isso definia Penélope.

Rafiq não pôde deixar de querer saber se aquela energia toda era reservada tão-só ao trabalho ou também se aplicava a sua vida particular. Aos homens, em especial.

— Está me olhando de uma maneira esquisita. Tenho alguma mancha no rosto? Uma verruga no nariz? Sou esquisita? — Penélope brincou.

— Não, nada disso.— Seu nome não pode ser tão feio. Uma vez que iremos trabalhar juntos, preciso saber

como se chama, para não ter de chamá-lo de "ei, você".Ele assumiu uma postura altiva.— Sou Rafiq Hassan, príncipe de El Zafir, Ministro do Interior e Assuntos Estrangeiros.Penélope arregalou os olhos e deixou cair a xícara de porcelana, esparramando café

no vestido e no carpete. Abriu a boca, mas não conseguiu dizer nada.Uma vitória para ele. Conseguira fazer com que ela se calasse.

Rafiq bateu na porta da suíte de sua tia Farrah.Seus passos ecoaram no piso de mármore do vestíbulo, e ele foi até a sala de visitas

com janelas de vidro até o teto que davam para o Mar da Arábia. Um grande sofá semicircular sobre um tapete alto e claro dominava o centro do cômodo. As únicas cores do recinto estavam nos quadros pendurados nas paredes. A irmã do pai de Rafiq possuía uma valiosa coleção de arte.

Rafiq parou perto do sofá e olhou para a tia, que tinha documentos no colo.— Gostaria de falar com você, tia Farrah.— É claro. Do que se trata, querido?— Resumindo em uma palavra: Penélope.Ela sorriu. Sua tia estava na casa dos cinqüenta e era ainda uma mulher atraente e

vibrante. Seus cabelos escuros eram macios e tocavam a gola do conjunto Chanel turquesa que vestia.

— Ela é maravilhosa, não é?— É... alguma coisa...— O que há de errado, Rafiq? — Farrah franziu as sobrancelhas e pôs os papéis de

lado.— Penélope pegou no sono no sofá de meu escritório.— Pobrezinha... Mas você deve admitir que seu sofá é muito confortável. Ela fez uma

viagem cansativa e insistiu em começar a trabalhar como fora combinado. Não quis ouvir falar em adiar o início de suas atividades.

— Quero a cabeça dela, titia.— Seria uma bela recompensa pela dedicação da moça.— Estou brincando, titia.— Ainda bem! — Farrah deu risada. — O governo aboliu essa forma de punição muitos

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickanos atrás, antes de eu ter nascido.

— Acho que cortar-lhe a língua seria mais apropriado.— Meu querido sobrinho, que crime Penélope cometeu?— Ela é... — Parou, incapaz de encontrar termos adequados para descrever seus

sentimentos. — Uma mulher...— Ah... — disse Farrah, como se ele tivesse explicado tudo. — Ficou impressionado

com Penélope.— De modo algum. Nunca encontrei uma moça que eu não pudesse entender.— Portanto, está intrigado.— Nada disso. Que absurdo!— Rafiq, você já se apaixonou?Ele não sabia como responder àquilo. Muitas jovens o haviam encantado, e o príncipe

se envolvera com algumas. Mas amor?— Não comece com isso de novo, tia. Amor é um luxo não permitido a um príncipe. Só

temos deveres. Casarei e produzirei herdeiros.— Quando?—r Quando estiver pronto. Mas não entendi *o que isso tem a ver com Penélope Doyle.Farrah juntou as mãos sobre o colo.— Devido à morte trágica e prematura de sua mãe, não posso deixar de sentir que sua

educação foi muito negligenciada, o que é uma lástima. Tutores, empregados, internatos...— Tive uma excelente formação. Agora, sobre essa pequena americana...— Penélope é uma brisa de ar fresco. Mas se você não concorda...Rafiq se virou e deparou com uma expressão muito conhecida no rosto da tia,

fazendo-o lembrar que ela era uma mulher mais velha, um membro da família real que merecia respeito, honra e proteção. Mas o brilho nas pupilas de Farrah o fez pensar que talvez não fosse ela que necessitava de proteção.

— Por que eu deveria concordar, titia? Ela é uma insignificante garota do Texas. E miúda. Eu achava que as coisas do Texas fossem muito maiores.

— Sim, acho que Penélope é uma exceção. As pessoas íntimas dela chamam-na Penny, sabia?

— Penny! Até o apelido dela é insignificante. Trata-se de uma moeda de baixíssimo valor.

— Você já ouviu o ditado "Encontre um penny, pegue-o e você terá sorte o dia todo"?— Acho que sim.Por dentro, Rafiq achava graça. Ao virar-se, constatou que sua tia estava no mesmo

estado de espírito.— E então, o que me diz, titia?— Sua reação diante de Penélope foi a que eu esperava. Agora, não terei de avisá-lo

para manter distância.— Se está preocupada com isso, então por que meu pai me tomou o assistente e me

deu uma mulher?— Ele queria alguém experiente. E é o rei, ora bolas! Penélope é perfeita para você,

para suas necessidades. Profissionais, bem entendido. Se eu fosse você, pensaria duas vezes antes de questionar seu pai.

— Está bem. Mas estou magoado por você achar necessário questionar meu comportamento.

— Além de sua reputação com o sexo oposto, estou preocupada com Penélope.— Por quê?— Ela foi maltratada por um homem.— Como? De que maneira?— Penélope me contou a horrível história em Nova York. Sua mãe morreu quando ela

estava com doze ou treze anos. Era professora e solteira. Mesmo assim, deixou uma herança para a filha, que foi aplicada. Penélope planejava abrir uma pré-escola, até que um sujeito sem princípios a envolveu e acabou se apoderando de seu dinheiro. Nunca mais ela confiou em um homem.

— Quem trata uma mulher desse modo não é um verdadeiro homem. Sobretudo uma como...

— Como o quê?— Não importa. Gostaria de encontrar esse cretino — afirmou Rafiq, com os dentes

cerrados. — Umas chibatadas seriam ótimas para dar-lhe uma lição.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Concordo. — Farrah sorriu com serenidade. — Mas agora Penélope está aqui, e nós

cuidaremos dela. Isto é, eu cuidarei. Em minha opinião, as coisas não poderiam ser melhores.Rafiq ficara intrigado com Penélope, e isso o deixara um pouco nervoso, sentimento

que nunca tivera em relação a ninguém. Não gostou nada daquilo. Talvez conseguisse convencer a tia a lhe arranjar outro assistente.

— O que é, Rafiq?— As coisas estariam melhores se meu pai devolvesse meu secretário. Assim você

ficaria com sua Penélope Doyle, com minha aprovação e meus votos sinceros de que mantenha sua sanidade mental.

Farrah meneou a cabeça.— Creio que durante algum tempo será impossível ter seu assistente de volta.— Por quê?— Isso é com o rei.— Então, falarei com ele.— Enquanto isso não acontece, com as preparações para o baile de caridade

internacional marcado pela primeira vez em El Zafir, você precisará de ajuda. E de um toque feminino.

— Você é mulher e minha assistente para o evento. Não é suficiente?— Penélope trabalhará para nós dois.Rafiq não se deu por vencido. Tentaria outra jogada.— Isso é justo para ela? Trabalhar também para mim? Já lhe dará bastante serviço,

titia.— Não se preocupe. Desconfio que Penélope é muito esforçada.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick

— Se é que ela consegue calar a boca a ponto de conseguir se concentrar no que faz.— Em minha opinião, ela é muito charmosa.— É essa sua única qualificação? Entendi que estava procurando emprego de babá

para as crianças de Fariq.— Sim, mas Penélope tem muita energia e é uma pessoa brilhante. É formada em

duas faculdades, em pedagogia e administração. E possui boas referências de Sam Prescott.Sam Prescott era de uma família muito rica do Texas, amigo de Rafiq desde que eram

garotos. Durante anos eles brincavam que, se a América fosse um reinado, Sam e seus irmãos seriam sheiks. Seus pais se conheciam e tinham negócios em comum.

— Como Sam a conhece, titia?— A Fundação Prescott dá bolsas para alunos necessitados, e Penélope era um deles.

Foi escolhida, e os Prescott se interessaram por conduzi-la a uma carreira. Era a melhor, e ganhou uma bolsa de estudos na sede da Fundação Prescott, em Dallas. Tive informações de que é rápida, inteligente, trabalha duro, é muito capaz e aprende com facilidade.

— Pelo visto, treiná-la será minha responsabilidade.— Esse olhar assustaria crianças pequenas, querido. Diga-me que não olhará para ela

dessa maneira, Rafiq. Você é o relações-públicas da família, e se...— Não tenho o hábito de assustar crianças, nem mulheres. Mas há o assunto do café...— O que aconteceu com o café?— Caiu das mãos dela.— Você fez alguma coisa para que isso acontecesse?— Apenas me apresentei.Depois de deixá-la acreditar que ele era um assistente e de persuadi-la a revelar que o

achava bonito. Na verdade, Rafiq gostara do engano. Duvidava que Penélope tivesse falado com tanta irreverência se soubesse quem ele era. Estava acostumado a receber elogios, mas como Penélope não sabia sua identidade, o cumprimento fora, sem nenhuma dúvida, sincero.

— Onde ela está, agora? — Farrah quis saber.— No quarto que você lhe designou, na ala dos hóspedes. Eu lhe dei o resto do dia

para se recuperar da viagem.— Ótimo! Estou contente por termos conversado, e tenho de frisar que você não tem

de jogar charme para cima de Penélope. Até que outros arranjos sejam feitos, ela é sua assistente, e nada mais. Não podemos ter os negócios de El Zafir prejudicados porque resolveu flertar com outro membro feminino de nosso pessoal.

— Obrigado, tia Farrah — ele disse, sem poder deixar de sorrir.— Isso não é um cumprimento. E direi mais uma vez: seja profissional e cortês no

ambiente de trabalho. Apenas isso.— Sou um príncipe. Benevolência é um de meus atributos. Você mesma me ensinou a

ser simpático. E eu aprendi.— Também lhe ensinei a respeitar os mais velhos, mocinho, e está agindo como um

garoto voluntarioso.— Pelo contrário. Não me vejo dessa maneira, de modo algum.— E lógico que não. Você nunca vê. Nem seus irmãos.— O que têm Kamal e Fariq a ver com isso?— Nada. Estou apenas expondo uma realidade.— Os homens da família real Hassan juraram submissão ao país e à família. Somos os

protetores do povo de El Zafir. Não podemos errar.— Essa é uma responsabilidade sagrada e temerosa, meu sobrinho. E encontrei uma

moça que, acredito eu, fará um excelente trabalho e será uma ótima assistente. Uma pessoa brilhante e alegre, que gostaria de permanecer comigo durante anos. Peço apenas que você não faça nada que a obrigue a voltar para os Estados Unidos.

— Nem pensaria nisso, titia.— Chego a tremer quando você é tão cordato. Rafiq ia retrucar, mas ela o fez parar

com um aceno.— Estou sendo sincero.— Tomara que sim, pelo bem da paz do palácio. Quando Rafiq saiu dos aposentos da

tia, seus pensamentos se voltaram para Penélope. Brilhante e alegre? Não tinha certeza se reparara nessas qualidades. Talvez devesse falar com ola outra vez, apenas para se certificar de não tê-la subestimado. Ou para conhecê-la melhor.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO II

Penélope andava de um lado para o outro em sua suíte. Esgotada pelo nervoso e pela pequena quantidade de cafeína consumida, não conseguia relaxar. Se ao menos pudesse dormir...

Gostou que seus aposentos fossem tão grandes, pois desse modo tinha bastante espaço para caminhar e tentar se acalmar.

Como pudera ser tão estúpida e por que ele a deixara continuar falando?!Rafiq. O nome combinava com ele: misterioso. O príncipe era muito bonito, mas isso

não desculpava sua conduta. Era um governante do seu país, afinal.Mortificada, Penélope lembrou-se da conversa fútil que mantivera com ele. Rafiq sabia

qual o salário que iam lhe pagar. Era sobrinho da princesa Farrah. E ela, muito ingênua, confessara que o achava belo. Santo Deus! Quanta bobagem dissera!

Cobriu o rosto com as mãos, desejando que a fadiga pudesse bloquear a cena humilhante. Fizera papel de tonta.

Não era a primeira vez que um homem fazia isso com ela. A última vez, ele roubara seu dinheiro e desaparecera. "Como seria bom poder desaparecer!"

Rafiq lhe dera o resto do dia de folga. Para acostumar-se com o ambiente, ele dissera.— Queria estar morta — Penélope murmurou.Muito embora, se desse seu último suspiro ali, o cenário seria fabuloso. As paredes

eram brancas, mas a cor era quebrada pelas tapeçarias penduradas nelas, na sala de visitas, sala de jantar e quarto, que formavam a magnífica suíte. Um sofá macio ficava em um canto da sala que se abria para um jardim cheio multicolorido.

Havia também flores em jardineiras sob as janelas. Não se avistava o oceano, mas da sacada podia-se sentir a fragrância do mar misturada ao perfume das flores. Os dois aromas juntos criavam um aroma inebriante que ela nunca sentira antes.

O quarto tinha uma cama grande com quatro colunas, uma cômoda e um armário enorme. Como se4ivesse roupas suficientes para enchê-los... No canto, uma poltrona e uma chaise-longue forradas com tecido branco.

Mas o que estava fazendo ali? Era uma pergunta retórica, que, por isso, não exigia resposta. Não ficaria ali por muito tempo. Não depois do vexame com o príncipe.

Rafiq lhe dera folga, mas Penélope achava que era um preâmbulo para dispensá-la. Não a deixaria ficar depois de ter sido insultado por ela. Penélope não o conhecia, mas isso não justificava o amontoado de besteiras que lhe dissera. Na realidade, o príncipe Rafiq a pegara desprevenida e alimentara seu engano. Mas tratava-se de um príncipe, e ela... não passava de uma simples plebéia.

Uma inesperada batida na porta fez seu coração acelerar.Devia ser ele.Seria deportada para os Estados Unidos naquele instante.Foi atender.Era ele! Pela segunda vez naquele dia, Penélope sentiu-se incapaz de pronunciar uma

palavra.— Posso entrar?— É claro. — Ela lhe deu passagem e o seguiu. O príncipe a fitou.— Você está diferente.— Sou a mesma pessoa. Apenas não tenho como... Ele apontou para a calça que ela

usava.— Estou me referindo a suas roupas.— Oh... — Penélope olhou para os pés descalços, para o jeans e a camiseta escrito

"Texas".Quando tornou a olhar para o príncipe, achou ter visto um brilho diferente, algo que

não conseguiu decifrar. Mas ocorreu-lhe apenas um termo para descrever aquelas íris negras: ardentes.

A pesquisa que fizera sobre o país e a família real revelara, que o sobrenome dele, Hassan, significava "bonito", e Rafiq decerto era um bom exemplo.

O rosto dele era largo, mandíbula quadrada, máscula, muito perto da perfeição. De alta estatura, ombros largos e o tórax forte e delineado. Vestia um terno azul-marinho, e era muito diferente do protótipo do caubói texano.

Penélope tinha as palmas das mãos úmidas, o pulso acelerado e os joelhos bambos.— Eu não...

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Sim?— Como devo chamá-lo? Sua Majestade? Alteza? Príncipe? Estava sendo impertinente,

mas não pôde evitar. Além disso, o que tinha a perder? Embora ele tivesse parte da culpa, Rafiq devia estar ali para demiti-la. Dali iria direto para o aeroporto.

— Pode me chamar de Vossa Alteza, príncipe Rafiq Hassan, Ministro do Interior e Assuntos Estrangeiros, o benevolente.

Penélope pensou em pegar um bloco de notas para escrever tudo o que ele falara, quando o viu sorrindo.

— Você está brincando... — Sim, estou.— Graças a Deus!— Pelo quê?— Por você ter senso de humor.— Duvidava disso?O príncipe continuava sorridente, e Penélope percebeu que ele não era arrogante, nem

parecia carrasco de mulheres incautas.— Por ocasião de nosso primeiro encontro, você nem esboçou um sorriso.— Por isso estou aqui, Penélope.— Para mostrar-me que sabe sorrir?— Não. Para... começar de novo.Por uma fração de segundo, Penélope achou que Rafiq ia pedir desculpas por tê-la

induzido a agir como uma idiota. Olhou-o e ajustou os óculos sobre o nariz.— Achei que tinha vindo aqui para acabar comigo.— Por quê?— Estava pensando que ia ser execrada e esquartejada em praça pública no cair da

tarde.— Na verdade, a idéia de decapitá-la me ocorreu.— Não!— Sim. Ou de cortar sua língua.Penélope deu um passo para trás antes de perceber que ainda sorria. Um sorriso

bonito, que mostrava dentes brancos e perfeitos.— Está me provocando...— Estou. — Rafiq enfiou as mãos nos bolsos. — Achou que ia demiti-la?— Podia jurar que sim. Você teria motivos.— Não estou aqui para fazer isso.— Isso é um alívio. Mas tem de admitir que, se tivesse me dito quem era, eu não teria

derrubado a xícara de café no carpete de seu escritório.— Não tenho de admitir nada — respondeu, sério. — Sou o príncipe.— E claro. E um príncipe é o chefe de todos os mortais.— Mais ou menos isso. — Suas pupilas cintilavam, o que demonstrava seu bom-humor.— Se não foi para admitir sua parcela de culpa, por que está aqui?— Para dar-lhe as boas-vindas.— Obrigada. — Inclinou a cabeça para o lado. — Ainda não me disse como devo

chamá-lo.— Príncipe Rafiq em público. Em particular, quando estivermos trabalhando, apenas

meu nome é mais apropriado."Rafiq..." Penélope teve um calafrio.Ele era diferente de todos os homens que conhecera. O simples pronunciar de seu

nome já envolvia uma atmosfera de magia, encantamento e romance. Pela primeira vez, admitia que os pôsteres sobre o país eram verdadeiros.

— Cabe a mim treiná-la e...— Pensei que eu fosse trabalhar para a princesa Farrah.— Houve uma mudança nos planos. Meu pai pegou meu assistente, e minha tia...— A princesa Farrah?— Isso mesmo. Ela é irmã do meu pai. E deu você para mim. Os arrepios voltaram ao

ouvir que ela havia sido dada a ele.Por que seu pensamento corria tão solto, afinal?Aquele era um país exótico, com cultura e história diferentes. Mitos de mulheres sendo

surradas de joelhos e carregadas por homens que as hipnotizavam eram sempre mostrados nos filmes. As feministas podiam fazer objeções, mas Penélope tinha a sensação de que

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickapenas ver Rafiq faria de qualquer mulher uma escrava.

— Então, trabalharei com você? Ele confirmou, balançando a cabeça.— Se quiser, posso conseguir chocolate, para que possamos ter uma boa conversa.— Você é mesmo diferente dos outros.Deus do céu! Não podia acreditar que dissera isso. Como um único ser humano era

capaz de falar tanta bobagem junta? Agora sabia quem ele era!— Diferente? — Rafiq não parecia chocado, nem ofendido. Apenas curioso.— De onde venho, há programas de televisão dedicados à crença de que a maioria dos

homens não escuta o que as mulheres dizem.— Talvez caubóis texanos deixem muito a desejar. Sim, ele escutara sua observação.

Penélope corou.— É possível que ouvir e lembrar seja demais para eles. Rafiq achou graça. Seus

dentes eram mesmo branquíssimos ou o contraste com sua pele morena era o que os fazia parecer mais claros?

— Com todo o respeito, Penélope, ainda não encontrei uma mulher que prefira ser ignorada por um homem.

Ele parecia um grande conhecedor do sexo oposto. Isso corroborava o que Penélope tinha lido a respeito da família real. Lera nos tablóides detalhes das românticas aventuras do príncipe Rafiq. Até vira fotografias dele, o que a fez sentir-se ainda mais ridícula por não tê-lo reconhecido. Mas em pessoa, em carne e osso, era muito mais lindo do que nos jornais e nas revistas.

Com quantas moças ele teria se envolvido? Dez? Vinte? Cem?E com quantos caubóis ela se envolvera? Zero. Nada. Portanto, quem era mais

qualificado para julgar?— Certo. Você tem razão.— Obrigado. — Ele olhou ao redor. — Espero que as acomodações sejam satisfatórias.— Nem diga! Este é o lugar mais bonita em que já estive.— Comparado ao Texas?— Comparado a qualquer outro. Até ao hotel onde me encontrei com sua tia.— É mais espartano do que o hotel de Nova York preferido de tia Farrah.— Mas a simplicidade é mais bonita. Às vezes, menos é mais.— Entendo bem o que quer dizer.De novo Penélope achou ardente o olhar negro de Rafiq. Fez-se silêncio, e ela sentiu

falta de ar.— Fale-me de você, Penélope.A sugestão a surpreendeu. Não tinha certeza do motivo, mas pareceu estranho um

membro da família real se interessar por sua humilde pessoa.— Não quer sentar-se, Rafiq?Ele hesitou apenas um instante. Com graça atlética, sentou-se no sofá e cpnvidou-a a

acomodar-se a seu lado.Penélope obedeceu, deixando uma apropriada distância entre os dois.— O que gostaria de saber sobre mim?— Por que deixou seu país para trabalhar em um lugar tão distante quanto El Zafir?Havia muitos motivos.— Seu país é muito progressista.— Estamos trabalhando duro para conseguir isso. O que mais?— Acho que já falei que o salário é bom — ela afirmou, sorrindo.— Sim, já. Dinheiro é importante para você?— Só uma pessoa que nunca teve problemas financeiros faria essa pergunta.— Isso significa "sim"?— Lógico.— Diga-me por quê.— Você não vai querer saber.— Pelo contrário. Quero, sim.— Dinheiro é importante para mim porque minha mãe teve de trabalhar demais para

nos manter.— E seu pai?— Nunca o conheci. Sempre fomos apenas minha mãe e eu. E ela morreu quando eu

era jovem.— A minha também. Tia Farrah preencheu a lacuna, quando mamãe se foi.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Você tem sorte. Não tive ninguém para cuidar de mim. Fui criada em orfanatos.— Sinto muito.— Aos dezoito anos, o Estado diz que você é adulto e que tem de cuidar de si mesmo.— O Estado está errado. Nessa idade somos ainda crianças. Ela deu de ombros.— Pode ser. Mas eu estava determinada a me formar.— E conseguiu. Formou-se em pedagogia e administração. Minha tia disse-me que

você trabalhou para Sam Prescott, em Dallas.— Sim. Os Prescott têm sido muito bons comigo. Na realidade, foi Sam que sugeriu

que eu viesse trabalhar em El Zafir.Porque planejara abrir sua própria pré-escola e, tola que era, perdera seu dinheiro.No entanto, Penélope achou que Rafiq não ia querer ouvir sua história. E ela tampouco

desejava contar. Não queria que o príncipe soubesse o quanto fora estúpida, enganada por um homem bonito. Jurara nunca mais deixar que isso acontecesse.

Rafiq a olhava com tanta intensidade que Penélope teve a sensação de que ele lia sua alma. Esperava que não. O príncipe não iria querer que alguém tão crédula trabalhasse' para ele.

— Conheço Sam Prescott desde menino. Há alguma razão particular para que queira ganhar muito dinheiro, Penélope?

Porque prometera a sua mãe. O voto que fizera, muito tempo atrás, significava tudo para ela. Mas ele não ia querer ouvir a respeito. Era um homem de negócios.

— Meu sonho é abrir uma pré-escola.— Por quê?— Não acha óbvio?— O que quero dizer é: por que pré-escola?— Ah... Porque gosto muito de crianças.Ela percebeu que Rafiq não estava aborrecido com a conversa. Pelo contrário, parecia

interessado, o que lhe deu coragem para prosseguir:— Acho que é hereditário. Minha mãe adorava lecionar na escola elementar. Antes de

eu ter idade suficiente para começar os estudos, ela lutava para pagar uma creche.— Uma pré-escola teria dupla função: criar e educar. E isso?— Certo. Enquanto as mulheres fizerem parte da força de trabalho, e eu não vejo

como isso poderá mudar a qualidade do lugar onde as crianças possam ficar será uma preocupação.

— Em El Zafir também.— Verdade?Rafiq constatou como Penélope se sentia confortável no sofá. Recostara-se, apesar de

o sofá ser grande e seus pés mal tocarem o chão. Pés pequenos, ele notou, e descalços, as unhas pintadas com esmalte vermelho. Eram atraentes.

Ela pôs as pernas de lado e descansou o cotovelo no encosto. Seus cabelos loiros não estavam mais puxados para trás, apenas presos na nuca, com algumas mechas caídas ao lado do rosto.

Rafiq teve vontade de afastar as mechas. Brigara contra essa reação desde que ela abrira a porta para ele.

Penélope não estava mais com o vestido largo. Pusera um jeans que marcava sua cintura fina e as pernas esguias. Tinha o tipo oposto das mulheres que interessavam a Rafiq. Era evidente que esperava que ele continuasse a conversa, mas o príncipe havia se esquecido do tema em pauta.

— Pensei que em El Zafir a maioria das mulheres não trabalhasse fora de casa.— Cada vez mais elas optam por seguir uma carreira, neste país.— Quer dizer que as crianças começaram a se tornar um problema.— Exato.— Eu ainda gostaria de saber por que seu irmão quis uma babá simples e comum para

seus filhos.Rafiq observava os lábios de Penélope. Eram muito sensuais. Teve vontade de

experimentá-los, mas não podia. Ela ia ser sua assistente, nada mais. Tinha de ter isso sempre em mente e esquecer as formas curvilíneas que o jeans delineava.

Era seu patrão, e ela era pouco mais do que uma criança.Rafiq tinha vinte e nove anos, mas Penélope o fazia sentir-se um ancião.— Preciso ir. — Ele se levantou. — A respeito do trabalho...— Sim?

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickPenélope também se pôs de pé. Sua cabeça mal chegava aos ombros dele.Rafiq teve necessidade de protegê-la. A mesma coisa que sentiria por uma criança,

tentava se enganar. Essa reação espantosa surgira apenas porque ele só se relacionava com garotas altas. Nenhuma delas evocara seu instinto protetor.

Segundo sua tia, Penélope fora magoada, e Rafiq reconhecera a desilusão no olhar dela, quando comentara de seu sonho em abrir uma pré-escola. Teve raiva do homem que a enganara.

— Quanto ao trabalho? — ela o instigou.— Isso mesmo, eu...— A que horas quer que eu compareça ao escritório?— Às nove. Ela sorriu.— Ao menos não pegarei trânsito.— Não. — Rafiq pigarreou. — Sobre seus trajes...— Sua tia já me orientou sobre esse ponto. Não se usa calça comprida em público. Ela

disse que em El Zafir uma mulher cobre os braços, e as saias devem estar abaixo dos joelhos.— Certo.— Então, até amanhã.— Até amanhã, Penélope.— Esperarei ansiosa.Ele também. Mais do que deveria.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO III

Penélope fechou a porta da suíte para ir jantar com os Hassan. Outra vez sentiu-se como Dorothy a caminho da Cidade das Esmeraldas, ou qualquer outro personagem de um conto de fadas.

Ia fazer sua refeição com a família real.A qualquer momento, poderia bater asas e voar como uma fada.Depois de uma semana em El Zafir sentia-se um pouco mais confortável caminhando

pelo palácio, sem precisar de uma bússola. Conhecia o caminho até a sala de jantar real. Mas como deixar de tremer depois de ter recebido o convite da própria princesa Farrah? Deveria ter recusado?

Seu bom senso lhe dissera que não era nada inteligente morder a mão que a alimentou. Retrair-se não era uma opção. Além do mais, gostava da princesa e a respeitava.

Descendo a escada, apoiou-se no corrimão. A escadaria de mármore tinha passadeira no centro. No final dos degraus, Penélope virou à esquerda e empurrou a porta dupla que levava à sala de jantar, repetindo para si mesma que não deveria falar demais.

Olhou para dentro do cômodo e se surpreendeu ao ver que toda a família real já se encontrava presente.

Estaria atrasada? Odiava se atrasar. E entrar em um recinto onde todos a observassem entrar. Pelo menos, ainda não havia ninguém à mesa.

Consultou o relógio de pulso. Adiantara-se dez minutos, para tentar chegar antes de todos, mas não conseguira. A família real era mais pontual do que ela. Detestava atraso e nervosismo, dois fatores que causaram seu desastroso primeiro encontro com o príncipe.

Cumprimentou a todos, um por um.Precisava agir com cautela, para não derrubar um chapéu, uma coroa ou... o café.Como um ímã atraindo o metal, seu olhar procurou seu chefe. Rafiq, que conversava

com os irmãos, sorriu-lhe. Em um instante, o homem sério, altivo e autoritário com que se familiarizara deixou de existir. Penélope sentiu as pernas fracas de novo, mas por uma razão diferente: era muito mais fácil se relacionar com seu patrão do que com o homem que sorria para ela de maneira informal.

Rafiq lhe dissera que, quando não estivessem em público, poderia se dirigir a ele por seu primeiro nome. Seria esse jantar um acontecimento informal? Deveria tratá-lo como?

Como gostaria de ter um pouco de traquejo social.Olhou para o vestido preto longo que usava e lembrou-se de que a moça que o

vendera lhe dissera que nunca se comete erro usando um vestido preto. Seu primeiro equívoco fora acreditar em uma adolescente de cabelos cor-de-rosa, mas não tinha dinheiro para comprar coisa melhor.

— Ah, Penélope... — A princesa Farrah, em um vestido de seda verde-escuro e brincos de brilhantes nas orelhas, se aproximou para cumprimentá-la.

— Boa noite, Alteza. Espero não estar atrasada. A senhora disse que...— Está perfeita, querida. Não está, Gamil? — perguntou ao rei.A dois passos de distância, o rei se virou e a cumprimentou.— Srta. Doyle, estou muito contente por tê-la conosco no jantar desta noite.— Foi muita gentileza sua convidar-me, Majestade.A princesa lhe dissera que seria um jantar íntimo, em família. Encontrando o olhar da

princesa, Penélope indagou:— A senhora se veste assim todas as noites, para jantar?— Três ou quatro vezes por semana. — A princesa sorriu. — Nos eventos oficiais veste-

se black-tie ou roupas mais formais.— O que temos aqui não é formal?— De modo algum! É um jantar em família.Penélope sentiu um aperto no estômago. Todos estariam rindo dela.— Então, para a família real, esses trajes são casuais?— Sim, creio que se pode chamar desse modo — respondeu o rei.— Perdão, Majestade, não quis ser impertinente. É que não tenho referências para

julgar uma situação como essa. O senhor foi muito gentil em me convidar. Desse modo, estou tendo a oportunidade de ver de quem seu filho herdou a boa aparência.

Um elogio sempre cai bem.O rei achou graça e se inclinou um pouco.— Farrah está certa. Você é mesmo como uma brisa de ar fresco. E também muito

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwicklisonjeira.

— Pelo contrário, Majestade. Lisonja implica falta de sinceridade, o lhe asseguro que estou sendo sincera.

Rafiq parecia-se muito com o pai. O rei Gamil estava nos seus cinqüenta anos, mas parecia ter menos de quarenta. Não seria exagero dizer que poderia passar por irmão mais velho de seus belos e ardentes filhos. O monarca lembrava um ator de cinema, e Penélope não entendia por que ele e a princesa Farrah não tinham seus consortes.

— Nós gostaríamos de recebê-la de maneira apropriada em nosso país — disse o rei.A princesa tomou um gole de sua taça e acrescentou:— Eu esperava que Rafiq lhe tivesse feito o convite. Quando percebi que meu sobrinho

esquecera, me apressei para retificar a situação.Penélope achou que Rafiq poderia ter esquecido de propósito, com medo de que ela

derrubasse alguma coisa em seu terno Armani.Embora seu relacionamento com o príncipe estivesse progredindo a olhos vistos,

Penélope achava que jamais deixaria de lado o infame incidente do café.Nesse momento, Rafiq se juntou a eles.— Boa noite, Penélope.— Olá... — Sua voz saiu fraca, e ela desejou de todo o coração que fosse devido à

escadaria que descera.— Posso lhe servir uma taça de champanhe? — Rafiq ofereceu-lhe.— Sim, obrigada. Nunca tomei champanhe. — Fitou-o, sorrindo. — Acho que você vai

querer manter distância de mim.— E por que eu faria isso? O dia de sua chegada não foi, estou certo, a primeira vez

que tomou café.— Suponho que é demais querer que esqueça aquele incidente, não é?— Costumo escutar o que as mulheres falam e lembrar-me — afirmou, brincalhão. —

Vou me arriscar, já que é a primeira vez que você toma champanhe.— Meu filho tem o coração de um leão. — O rei piscou, bem-humorado.Rafiq sorriu para o pai e foi em direção a um dos empregados uniformizados, que

segurava uma bandeja de prata.Penélope pegou a taça com cuidado e não pôde evitar sentir-se como uma governanta

em um romance de época. O tipo de mulher que não deveria estar participando da reunião.— Rafiq, você falhou em não ter convidado Penélope mais cedo — a princesa Farrah

dizia. — É o que os americanos chamam de atitude padrão, uma oportunidade para que as pessoas que trabalham para nós nos conheçam a todos.

— Uma família grande e feliz — Penélope comentou.— Isso mesmo. — O rei a encarou. — E tornou-se óbvio, em todos esses anos, que uma

equipe satisfeita trabalha melhor e é mais produtiva. Acha que sou um tirano, srta. Doyle?— De jeito nenhum, Majestade.A princesa tocou o cotovelo do irmão.— Desculpe-nos, minha querida. Gamil e eu devemos ajudar Johara com os gêmeos de

Fariq.— Eles me parecem bem — afirmou o rei. Farrah olhou para o irmão.— Hana e Nuri são ótimas crianças, mas você sabe tão bem quanto eu que podem se

tornar inquietos com uma facilidade assombrosa.Gamil estudou a irmã e logo concordou com ela.— Farrah está certa. Desculpem-nos, por favor. Penélope ficou nervosa. Era muita

coisa, muita ansiedade em tão pouco tempo. No trabalho, sentia-se em seu elemento, e já se acostumara a se relacionar com Rafiq como patrão. Ele* lhe dava tarefas que ela procurava desempenhar da melhor maneira possível, e o príncipe não parecia desapontado com sua performance. E não era do tipo que aceitava empregados medíocres.

Os dias transcorriam seguindo padrões. Na parte da manhã, Penélope abria os e-mails de Rafiq e os imprimia, colocando-os em sua mesa. Então, retornava as chamadas telefônicas com mensagens do príncipe confirmando reuniões. As tardes eram reservadas para essas reuniões. Ele saía e entrava do escritório, enquanto ela continuava a atender a telefonemas e pegar mais mensagens.

Penélope comentara com Rafiq que, na faculdade, trabalhara como secretária particular de Sam Prescott, que lhe ensinara muita coisa. El Zafir era um país pequeno, mas as tarefas eram as mesmas, e ela sentia-se muito à vontade.

Trabalhar era um papel que gostava de desempenhar, mas agora havia qualquer coisa

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Page 17: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickdiferente. Sentiu outra pontada no estômago e tornou a olhar para Rafiq, esperando que lhe dissesse alguma coisa.

Penélope fazia esforço para não falar muito, mas não pôde agüentar mais:— Com o risco de ser injusta, posso dizer que este salão é muito, muito agradável? E

maravilhoso?— Agradeço.— Os lustres são de tirar o fôlego. Embora eu tenha de dizer que não posso evitar

pensar como fazem para mantê-los tão limpos e brilhantes. Deve ser um serviço muito maçante.

— Nunca pensei nisso.— Mas pode acreditar. Olhe... —Penélope apontou para cima, com a taça na mão. —

Deve haver milhares de peças de cristais, e cada uma delas brilha como se fosse diamante. O efeito é deslumbrante.

— Sim, é verdade — ele disse, olhando para ela...O que aquilo significava? No escritório, o príncipe era sério e circunspeto, mas agora

sua expressão era intensa, como se pudesse desvendar cada pensamento secreto de Penélope.

Ela estava trêmula desde que o vira, e procurava falar pouco. Mas isso era difícil, pois acostumara-se a dizer qualquer coisa para quebrar o silêncio.

Olhou para o aparelho de jantar.— Aqueles pratos são contornados com ouro verdadeiro?— Creio que sim. Penélope arregalou os olhos.— E quanto às facas e garfos?— Ouro. Sólido.— Nossa! Jura?!— Pode apostar — ele afirmou, esboçando um sorriso.— Nunca vi nada mais bonito que este salão. A toalha sobre a mesa, os candelabros

nas paredes... As flores. Aquelas orquídeas e aquelas rosas são naturais?— São. Foram apanhadas há pouco. Sinta o perfume.— Está me fazendo de tola, Rafiq. Ele levou a mão ao peito.— Agora você me magoou!— Não foi intencional.— Verdade?— Jamais seria impertinente a esse ponto.Olhando ao redor, Penélope viu os irmãos de Rafiq, o príncipe Fariq e o príncipe Kamal.

A irmã dele, a princesa Johara, estava adorável em um vestido longo de veludo castanho que ressaltava o brilho dos cabelos e dos olhos escuros. Estava perto dos gêmeos de cinco anos do príncipe Fariq.

Nuri vestia-se como o pai, e Hana usava um vestido simples ile veludo verde. Até as crianças pareciam mais apropriadas do que ela.

— Estou feliz por este jantar ser simples e íntimo — afirmou Penélope.— Por quê?— Não me vesti de maneira correta e...Antes que continuasse a falar, a princesa Farrah bateu com um garfo em uma taça de

cristal.— Todos tomem seus lugares, por favor. O jantar será servido. Penélope, sente-se ao

lado de Rafiq, perto de Hana e Nuri."Senhor, permita que eu não derrube nada!"Rafiq sentiu o perfume de Penélope quando puxou a cadeira - para que se sentasse. O

tecido de seu vestido lhe marcava a cintura fina e os quadris perfeitos. Desde o dia de sua chegada, ele a vira apenas com roupas folgadas.

Observou-a sentar-se com graça e leveza.Para sua decepção, Penélope prendera os cabelos loiros no alto da cabeça, mas alguns

fios pendiam sobre sua nuca. Rafiq teve vontade de beijar aquele pescoço delgado, mas seria uma atitude absurda, naquele momento.

— Obrigada. — Ela olhou para ele, enquanto o príncipe se acomodava a seu lado.Penélope arrumou os óculos sobre o nariz.— Nunca ninguém ajeitou a cadeira para eu me sentar.— Por nada, senhorita.Ela tomou um gole de champanhe.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Na realidade, houve uma ocasião, sim. Uma vez um garoto fez isso, no orfanato.

Mas ele puxou a cadeira quando eu não estava olhando, e caí no chão.— Garoto...— "Miserável", você está querendo dizer.— Pensava em garoto imbecil, mas miserável também serve. Rafiq a estudava, mas

não notou nenhum traço de autopiedade. Penélope apenas relatava uma experiência, uma história engraçada.

Ele sorriu, pensando naquela moça mignon que o destino maltratara, mas não dobrara.

— O que achou do champanhe?— Delicioso. Rafiq não se esquecera de convidá-la para o jantar. Apenas não sabia se seria

conveniente vê-la fora do ambiente profissional. O rei ergueu a taça. — Quero que me acompanhem em um brinde de boas-vindas ao mais novo elemento

de nossa equipe. Acredito que todos nós ja conhecemos. Penélope, que sua estada conosco em El Zafir seja serena e repleta de paz.

— Obrigada, Majestade.Nos minutos que se seguiram, empregados colocaram tigelas de sopa fumegante à

frente de cada um. Rafiq observou que Penélope olhava ao redor. Podia quase sentir ondas de tensão irradiando-se dela. Quando todos começaram a comer, ela tocou cada talher e pegou a colher mais afastada do prato.

— Então, me diga, Penélope, está gostando daqui? — o rei quis saber.Por que não estaria?, pensou Rafiq. Ia ganhar um bom salário, tinha casa e comida. Ela

era eficiente e organizada, e se adaptara bem ao escritório. Como não estar contente?Todos os dias, depois do expediente, Rafiq se pegava pensando nela.Penélope se virou para Gamil.— Estou muito contente, Majestade.— O que acha de nosso país? — Fariq perguntou.— Ainda não tive oportunidade de conhecer muita coisa, mas posso dizer com

completa honestidade que é tudo muito bonito e diferente do lugar de onde vim.— Fale-nos sobre os Estados Unidos — pediu Johara. Penélope viu a expressão ardente

da adolescente.— Eu trabalhava na fazenda dos Prescott. Acho que os conhece.— Sim, conheço-os muito bem — afirmou o rei.— Onde mais você esteve? — Rafiq indagou. Penélope fitou todos os presentes e o

encarou, tímida.— Duvido que queira me ouvir falar sobre minha vida, Alteza. É tediosa demais.— Pelo contrário. — Farrah limpou os lábios com um guardanapo. — Gostaríamos de

ouvir tudo a seu respeito.Rafiq e seus parentes se concentraram em Penélope, à medida em que ela falava

sobre si.O rei perguntou se ela conhecera seu pai, o melhor amigo de Sam Prescott. Penélope

confirmou, e isso impediu que ela contasse a parte da história que narrava como fora enganada e roubada pelo homem que dizia amá-la. Foi bom, porque isso ninguém precisava saber.

Enquanto dissertava, os empregados retiraram o primeiro prato e serviram a entrada. — Eu adoraria ir para a faculdade na América — declarou Johara.— É longe demais — retrucou o pai dela, com severidade.— Mas Kamal, Fariq e Rafiq foram, papai.— É diferente.— Não vejo como.Rafiq observava a rebeldia de sua jovem irmã, que insistia, apesar das inúmeras

recusas do rei. Apesar de sua conduta rebelde, Johara cortou a carne no prato de Nuri. E logo Penélope fez o mesmo com a carne do prato de Hana. Obrigada, Penélope.

Kamal olhou para ela.— Logo, Penélope, nós a faremos conhecer o que nosso país tem para oferecer. Tenho

certeza de que Rafiq ficaria feliz em acompanhá-la num tour. Nesse meio tempo, diga-me, o que acha de seu trabalho?

Ela empurrou os óculos, e através das grossas lentes era possível ver seu olhar

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickanimado.

— Adoro o que faço. É desafiador e me mantém ocupadíssima. Estou gostando muito.— E... não achou nenhum problema em trabalhar para Rafiq? — Fariq piscou,

malicioso.— Nenhum. — Penélope pigarreou. — E já aprendi muitas coisas com ele. O príncipe é

paciente e um excelente professor. Como ele é Ministro do Interior e Assuntos Estrangeiros, estou aprendendo muito sobre os negócios de El Zafir.

Os dois irmãos de Rafiq riram da ingenuidade dela. Rafiq sabia que eles tentavam atormentá-lo. Na verdade, Rafiq não confiara na escolha da tia. Mas, até o momento, Penélope se mostrara muito eficiente. E estava agradecido por ela não ter o hábito de esperá-lo nua em sua cama, como fizera a última babá das crianças. Penélope era uma moça séria.

Mas Rafiq gostaria de saber se ela não se sentia atraída por ele.— Tem saudade da América?— Não tenho muito do que sentir saudade, Johara. Acho que posso dizer que não.— Como estão os preparativos para o baile de caridade, Farrah?— Estamos fazendo a lista de convidados, meu irmão. Apenas os muito ricos deverão

comparecer. Nosso objetivo é conseguir uma boa soma em dinheiro para alimentar crianças carentes.

— É uma causa de grande valor — Penélope comentou. — Tive uma classe com problemas de aprendizado. E o motivo era a fome, que impede que os alunos se concentrem nas aulas. O cérebro precisa de nutrientes para funcionar direito e assimilar informações.

— E verdade — concordou Farrah. — Não consigo raciocinar quando estou com fome.Rafiq inclinou-se para a frente. Aquele era um tópico pelo qual ele tinha paixão.— Mas tem de ser mais do que batata e carne. As crianças precisam se sentir seguras

em todos os níveis da existência. Como conseguir isso se elas não sabem nem de onde virá sua refeição seguinte? Creio que o mundo mudará quando nossos garotos forem bem-cuidados e alimentados. Penélope tem razão: precisamos dar combustível a seus cérebros.

Risos infantis o interromperam do outro lado da mesa, e Fariq franziu as sobrancelhas para os filhos.

— Vejo duas crianças que deveriam estar concentradas em alimentar seus cérebros.De soslaio, Rafiq percebeu movimento sob a toalha da mesa. Penélope tinha enrolado

o guardanapo na mão de modo a fazer duas orelhas de coelho que ela movimentava, para alegria dos pequenos.

Observando-a, um doce sorriso ergueu seus lábios. As faces de Penélope estavam vermelhas como duas rosas.

— Papai, Penélope fez um coelhinho! — Hana deu risada.— Desculpe-me — ela interrompeu a brincadeira. — Mas eles estavam impacientes, e

achei que seria bom distraí-los.— E conseguiu. — Gamil ria. — Muito criativa.— Sim. Em geral, a essa hora, eles estão impossíveis, e Fariq os manda subir com a

babá. Onde aprendeu isso, querida? Em uma de suas classes?Penélope fez que não.— Uma das assistentes sociais me ensinou, princesa. Eu era velha demais para ser

adotada, mas tinha idade suficiente para ajudar as crianças novas que chegavam ao orfanato. Era um modo de fazê-las rir.

Quando todos terminaram a refeição, os pratos foram retirados e serviu-se a sobremesa e o café. Os gêmeos ganharam sorvete.

— Não é necessário muita coisa para fazer esses dois sorrirem — comentou o avô.Alguém já teria feito Penélope sorrir? Rafiq gostaria de saber. Não pôde evitar

perceber que ela ficava mais à vontade com crianças do que com adultos. E quem podia culpá-la depois DOS reveses que a vida lhe destinara? Mais uma vez desejou protegê-la e impedir que fosse ferida de novo.

Quando os pequenos terminaram a sobremesa, Fariq olhou para o relógio.— Hora de dormir, crianças.— Não, papai, não!— Queremos ficar com Penélope — acrescentou Hana. Fariq se levantou.— Levarei vocês de volta para Crystal.— Como está se saindo a nova babá? Fariq franziu as sobrancelhas para Kamal.— Preenche as exigências...— Todas?

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Pelo menos até agora ela não se mostrou atraída por Rafiq. Até aqui, tudo bem.Mas Rafiq notou a expressão diferente no rosto do irmão e estranhou o fato de insistir

em levar os filhos para cima, em vez de pedir que Johara o fizesse. Aquilo não era comum.Quando Fariq e as crianças se foram, Penélope se levantou.— Está ficando tarde. Acho que também vou me recolher. Rafiq ergueu-se.— Espero que tenha gostado da noite.— Muito!— Penélope, Rafiq mencionou que um diplomata americano estará visitando El Zafir

daqui a algumas semanas?— Eu vi na agenda, princesa. Rafiq agendou um passeio pela cidade para mostrar-lhe

os últimos poços de petróleo perfurados.— Vou preparar uma recepção formal para a ocasião.— Deverei participar?— Sim, querida, você será peça importante no evento.— É um compromisso?— Não é obrigatório, se é o que está querendo saber.— Agradeço por sua gentileza de me incluir no acontecimento, princesa. Mas, com

todo o respeito, declino do convite. Agora, se me derem licença...Rafiq começou a segui-la até a porta quando foi detido pela tia.— Por que está me segurando?— Deixe-a ir, Rafiq.— Quero saber por que ela recusou o convite. Desejo sua presença.— Por quê?— Parecerá estranho que uma americana trabalhando para nós se recuse a

comparecer a um encontro social em homenagem a um compatriota seu.— Posso dizer por que ela fez isso. Rafiq esfregou a nuca.— Então me diga. Do contrário, irei atrás dela para saber.— Iria lhe causar embaraço.— É claro que não. Apenas quero entender o motivo.— Rafiq... — Farrah suspirou. — Não é assim tão simples.— Por que não?— A pobrezinha não tem roupa adequada para a ocasião. Que diferença faria a roupa que Penélope estaria usando?Isso era insignificante. Mulheres lindas, que gastavam fortunas em trajes para estar na

moda, viviam se atirando nos braços dele. E o príncipe sabia, por experiência própria, que todas tinham a cabeça e a alma vazias.

— Comprarei alguma coisa para ela usar, titia. Na realidade, tenho mesmo de fazer uma viagem de negócios a Paris, e pretendo levá-la comigo. Que lugar melhor para se comprar roupa? E não repita que não entendo a situação.

— Eu nem sonharia com isso, meu amor. Direi apenas que Penélope tem tanto orgulho quanto você e seus irmãos. Ela não aceitará.

— Mas tem de comparecer à recepção. Precisarei da presença dela.Farrah sorriu, e Rafiq teve a certeza de que tinha relação com a veemência com que

desejava a presença de sua assistente.

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Page 21: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO IV

Não confunda relacionamento físico com amor — disse Farrah. Rafiq nunca confundia sexo e amor. A bem da verdade, nunca se apaixonara. Entusiasmara-se e estivera para casar-se várias vezes, mas nunca dera certo. E estava até agradecido. A experiência de seus irmãos mais velhos, seu pai e sua tia tinham-no convencido de que o amor era uma complicação que não queria para si. Iria apertas cumprir sua obrigação e escolher uma moça para se casar. Quando estivesse pronto.

— Perdoe-me, titia, mas não faz sentido.— Perdoe-me, sobrinho, não percebi que tinha de explicar-lhe tudo com detalhes. Você

tem uma certa reputação com as mulheres.— Não acredite em tudo o que ouve. Farrah sorriu.— De jeito nenhum! Mas Penélope não teve um lar na vida. Na realidade, ela é pouco

mais que uma criança.— Não concordo.— Ela pode ter as curvas de uma mulher, mas é virgem. Rafiq tinha muito respeito

pela tia, mas encarou essa informação com ceticismo.A maioria das jovens americanas não perdia a virgindade quando se formavam no

colégio? Ela já admitira que tivera um relacionamento com um homem... um salafrário. Embora fosse JOVEM demais para ele, Penélope decerto não era inocente e pura quanto Farrah queria fazê-lo acreditar.

Como sabe desse detalhe tão íntimo, titia?Farrah fez um gesto vago com a mão.— Isso é óbvio, Rafiq.— Não para mim. E quanto ao camarada que a seduziu e roubou o dinheiro dela?

Penélope estava envolvida com ele. — O sujeito nunca a tocou.— Penélope revelou-lhe isso?Chocolate fazia mais efeito do que álcool para soltar a língua de uma mulher.

Entretanto, Rafiq já notara que Penélope Doyle falava bastante mesmo sem chocolate e sem álcool.

Farrah lhe lançou um olhar imperioso.— Seria indiscreto de minha parte revelar mais. Basta dizer que ela nunca se deitou

com um homem. Chegou a El Zafir pura e intocada. E assim deverá permanecer.Rafiq encontrou a expressão implacável da tia e se intimidou.— Sou um homem honrado. Não costumo atacar virgens.— Acredito em sua ética, Rafiq. Você tem honra, mas é homem. Não quero ofendê-lo,

mas comporte-se.— Sempre agi de modo exemplar. Agradeço seu interesse, mas essa observação é

desnecessária. Boa noite, tia.— Espere. Há mais uma coisa.— Sim?— No dia em que Penélope chegou, dei a você instruções sobre sua maneira de tratar

os negócios do palácio para que tudo permaneça em paz. Lembra-se do que eu falei?Rafiq pensou por um momento.— Fazer apenas o que se faz comumente. Apenas cortesia no ambiente profissional.— Ótimo. Então entendeu que não pode levar Penélope para Paris com você.— Não entendo! Quando viajo a negócios, meu assistente sempre me acompanha.

Penélope trabalha para mim e tem de ir aonde vou. Isso é normal. E, embora eu não tenha de me defender, sinto que devo lembrá-la de que sou sempre cortês. Portanto, serei cortês também em Paris.

— Quer dizer que não pretende seguir minhas instruções. Eu concordaria se seu assistente fosse um homem.

— Não é culpa minha se as circunstâncias me forçaram a ter uma moça como secretária. Mas minhas necessidades não foram alteradas. Farrah suspirou.

— Vamos voltar a minha reputação, titia?— Isso não pode ser ignorado. E segundo o dito popular: onde há fumaça, há fogo.

Colhe-se o que se semeia, querido.— Não colho tanto quanto dizem as más línguas. Farrah ia dizer algo mais, mas Rafiq a

impediu erguendo a mão.

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Page 22: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Tem minha palavra de que não prejudicarei Penélope em El Zafir e em nenhum

outro lugar.Antes que perdesse a calma, Rafiq curvou-se diante da tia e saiu da sala de jantar.

Porém, não conseguiu deixar a raiva para trás, nem a curiosidade sobre sua intrigante assistente.

Depois do almoço, Penélope saiu de sua suíte, e caminhava para a ala de negócios do palácio. Na maioria das vezes, Rafiq pedia comida no escritório, e eles almoçavam enquanto trabalhavam. Em outras ocasiões, como nesse dia, ela comia sozinha em seus aposentos.

Respirou fundo, satisfeita com a deliciosa salada de frutas que acabara de saborear. Preferia os lanches do escritório, mas isso não tinha nada a ver com comida, e sim com a estimulante companhia de seu patrão.

Desde o jantar com a família real, uma semana atrás, Penélope notara sutis diferenças no príncipe. Se não soubesse dos fatos, juraria que ele estava flertando com ela.

Mas Penélope sabia. E seu último flerte lhe trouxera sérios aborrecimentos. O fiasco acabara com a promessa que fizera a sua mãe. Agradecia a Sam Prescott por ter mencionado o emprego em El Zafir, onde poderia juntar o capital necessário para abrir sua escola. E estava determinada a não permitir que mais ninguém a impedisse de cumprir sua promessa.

Se pelo menos não tivesse conhecido Rafiq...Seria casual o toque de sua mão em seu braço? E ele lhe dava olhares que lhe

causavam arrepios.Mas naquela tarde o príncipe iria para Paris, dando-lhe alguns dias para respirar

sossegada. Sentiria falta dele, entretanto.Virando no corredor que levava à ala de negócios, ouviu risadas de criança.Entrou no escritório de Rafiq. Na frente do sofá de couro onde ela adormecera,

encontrou o patrão, vestido com um de seus caros ternos, de quatro no chão acarpetado. Nuri se sentara sobre suas costas, e Hana batia palmas e ria.

Penélope achou graça.— Vejo que tem uma importante reunião de trabalho, Alteza.— Estamos brincando de índios e caubóis! — o garotinho gritou. — Eu sou o caubói!— E eu, o cavalo do caubói.— A parte da frente ou a de trás? — ela não conseguiu deixar de provocá-lo.— Ambas. — Rafiq olhou para Penélope, com a expressão de um sheik. — É diferente

do padrão masculino de seu país, mas...Penélope riu.— Tio, é minha vez! — Hana disse.Com entusiasmo, Nuri socava as costas de Rafiq.— Ainda não. Tio, você tem de me derrubar primeiro. Quando Rafiq se ergueu, o

menino agarrou-se em seu paletó. Era uma cena linda. O dirigente de um país, brincando no chão com os sobrinhos. Mas Penélope já o ouvira defender o bem-estar das crianças do mundo.

Se Rafiq fosse um homem comum e ela não tivesse se proposto a não se relacionar mais com nenhum, estaria em apuros.

Mas ele era um príncipe, e Penélope se decidira a juntar dinheiro antes de voltar a seu país. Podia sentir-se atraída por Rafiq, mas não haveria perigo. Sabia o que estava fazendo.

— Bem, o que temos aqui?Penélope se virou e viu Crystal Rawlins, a babá de cabelos claros. Era difícil ver a cor

dos olhos dela através dos óculos. Penélope perguntou-se se no palácio de El Zafir seria pré-re-quisito que mulheres americanas tivessem vistas fracas para poder trabalhar.

— Olá, Crystal. Acho que podemos dizer que Rafiq está brincando de Roy Rogers.— É verdade.— Vejo que vocês duas já se conhecem. — O príncipe olhava para sua assistente e

para a babá.— Sim. Meu quarto é próximo ao de Crystal. Nós nos vemos com freqüência.— Já se recobrou da experiência no deserto? — Rafiq perguntou à babá.Penélope ouvira dizer que Fariq e Crystal haviam ficado presos no deserto. Graças à

moderna tecnologia e às comunicações, não correram perigo, mas poderia ter sido grave.Penélope imaginou a experiência e desejou passar por ela, com Rafiq.— Não foi assim tão perigoso. Fariq e eu estávamos cavalgando e fomos apanhados

por uma tempestade de areia. Tivemos de ficar em uma tenda durante toda a noite.— Ouvi dizer. — Rafiq se pôs de pé, embora Nuri ainda estivesse pendurado em seu

pescoço. — Meu irmão foi sábio em abrigar-se até que a tempestade terminasse. É muito fácil

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Page 23: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickse perder nessas condições. Os sinais não são vistos, incluindo as estrelas. O deserto não perdoa quem ignora seus perigos.

Penélope encostou-se na escrivaninha.— Até no palácio, com paredes espessas, a tempestade dá medo. Uma simples tenda

deve ter sido terrível.Crystal sorriu.— Eu não descreveria a tenda real como simples. Mas foi amedrontador. Ainda bem

que as crianças estavam a salvo, aqui.— Johara não os deixou ir.— Graças a Deus, pois eles sempre nos acompanham nessas incursões ao deserto. E

muito bom ver como a família toda se preocupa com suas crianças.— Nossa família é assim — afirmou Rafiq. — E meu irmão em particular. Para Fariq,

seus filhos são mais importantes do que tudo.Penélope achou que Crystal enrubescera à menção do príncipe Fariq e se pôs a pensar

se a tempestade de areia tinha sido o único perigo que a babá enfrentara. Por motivos que não entendia, Penélope preferia Rafiq, mas Fariq também era muito bonito.

Rafiq olhou para Crystal, sorrindo.— Eu ficaria feliz em entreter meus sobrinhos outra vez, se você concordar em sairmos

para visitar alguns pontos turísticos.A babá retribuiu o sorriso.— É muita gentileza sua, Alteza. Comentários sobre sua pessoa sempre saem nos

tablóides e... bem... o que estou querendo dizer é que tenho certeza de que sua má reputação é exagerada.

— Minha tia foi sábia em contratar você. Penélope teve ciúme e quase se distraiu em relação a outra dúvida sua: estaria perdendo algum pormenor da conversa? Lera que o príncipe era um playboy, mas com ela fora apenas cordial e educado.

— Agora vou levar esses pequenos embora. Vamos, Hana e Nuri.— Vamos! — gritaram os gêmeos, ao mesmo tempo. Crystal levou-os, e Rafiq ficou a

sós com Penélope. Ele fitou sua assistente, pensando no porquê de o destino ter posto seu irmão e a babá sozinhos no deserto.

Penélope se candidatara ao mesmo emprego com as mesmas exigências: ser simples e comum. Mas, quanto mais a conhecia, mais Rafiq a achava interessante, e pretendia ficar com ela indefinidamente. A proibição da tia o atiçava ainda mais.

Ou teria seu interesse sido despertado devido à inocência apregoada por Farrah?Rafiq sabia que Penélope tinha pouco traquejo social, o que não acontecia com as

jovens com as quais se relacionava, mas tinha dificuldade em acreditar que ela fosse assim tão pura e inocente.

Irritou-se. Estava se importando demais na pequena assistente de óculos grandes.— Gostaria de saber... — ela disse, enquanto mexia em alguns documentos sobre a

escrivaninha, de costas para ele.— O quê? — Não, não é de minha conta.Desde quando sua assistente policiava o que dizia? Rafiq ficou curioso.— Insisto em que fale.— Está bem. Você pediu. — Penélope se virou, e seus olhares se encontraram.E, de algum modo, Rafiq soube que ela não ia fazer a pergunta original. Mas as

sombras em seus olhos azuis eram magníficas, e o príncipe gostaria de saber o que a deixava triste.

— O que é Penélope?— Será terrível ficar aqui depois que você partir para Paris.— Sentirá saudade?— Sim.Rafiq quis de novo levá-la consigo.Seu irmão ficara sozinho com a babá, mas, nesse caso, o destino interviera, não fora

intencional. Por outro lado, Rafiq ia tratar de negócios, e a presença de sua assistente seria inestimável. Ela ficaria em outro quarto, é lógico, e ele jamais confundira amor com sexo. O primeiro nunca lhe acontecera, e não esperava que acontecesse naquele momento. O segundo estava fora de questão, pois prometera à tia.

Desse modo, por que não poderia levá-la? E Penélope afirmara que sentiria sua falta. Como deixá-la para trás?

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Page 24: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Quer ir a Paris comigo? Estou falando sério.— Paris? Na França?— Sim, Paris fica na França.— Mas seu avião já está programado para sair... — Consultou o relógio de pulso.

— ...daqui a duas horas.— E daí?— Eu teria de fazer a mala.— E?— É pouco tempo. Eu poderia esquecer algo. — Ouvi dizer que há lojas na Cidade Luz — provocou-a. — Portanto, poderá comprar o

que quiser. Está decidido. Você vai.Penélope levou a mão à testa, sentindo a cabeça ferver.— Isso é tão inesperado. Quero dizer, você poderia ter falado mais cedo.— Eu fui...O que ele ia dizer? Que fora proibido pela tia? Ele era o príncipe Rafiq Hassan, Ministro

do Interior e Assuntos Estrangeiros. Se queria que sua secretária o acompanhasse em uma viagem de negócios, era isso o que iria acontecer. Não tinha de dar explicações a ninguém.

— Você me acompanhará. Ponto final.Eufórica, Penélope bateu palmas como uma criança que ganha um brinquedo.— Vou a Paris!O entusiasmo dela quase a tornou bonita. Mas Rafiq sabia que não fora isso o que

provocara aquele estranho sentimento em seu peito, como se seus pulmões precisassem de mais ar. Tinha o absurdo desejo de tomá-la em seus braços. E, antes que o fizesse, saiu do escritório.

Pelo jeito, a possibilidade de ficar sozinha com ele não a aborrecera. Era óbvio que Penélope confiava nele. Isso era bom. Talvez o considerasse um irmão mais velho. Isso era ruim.

No momento em que Penélope pisou no avião da família real, com poltronas de couro reclináveis e quarto de dormir, começou a receber um curso completo do estilo de vida dos ricos e famosos.

A caminho do hotel, passaram pela Torre Eiffel e pelo Arco do Triunfo. Antes disso, Rafiq tinha ordenado que seu motorista os conduzisse a Versalhes.

Ele sorriu quando Penélope disse que o palácio de EL Zafir era tão grande e belo quanto o Versalhes.

O hotel era elegantíssimo. Piso de mármore, tapetes persas, mobília coberta de cetim, acabamento em ouro e flores por toda parte. Penélope tinha sua própria suíte, espaçosa e completa, com um grande banheiro, cama king size e uma saleta de visitas. Havia uma porta de comunicação com a suíte de Rafiq. Eles ocupavam um andar inteiro.

Era seu segundo dia na capital francesa. As vinte e quatro horas anteriores foram gastas com telefonemas, reuniões e um jantar de negócios. Nessa manhã, eles visitaram orfanatos e abrigos localizados em uma parte da capital de que as agências de turismo não faziam propaganda. A pobreza que Penélope viu partiu seu coração.

Rafiq trouxera o convite para que um representante francês comparecesse ao jantar beneficente no palácio.

Penélope descansava em seus aposentos, com os pés erguidos, quando bateram na porta. Uma mulher entrou, acompanhada por uma assistente, trazendo uma arara cheia de roupas. A desconhecida, autoritária, dissera que vinha a pedido de Sua Alteza Real, o Príncipe Rafiq Hassan, que ordenara a ela, madame Gisele, que trouxesse uma variedade de trajes que, segundo sua própria opinião, ela iria adorar. Experimentaria tudo, sem compromisso.

Penélope não poderia estar mais encantada. Visitara a cidade, e agora tinha a oportunidade de provar peças de marca. Como Rafiq era atencioso...

Posicionou-se na frente a um espelho de três faces e provou um conjunto de blazer preto sobre uma saia reta que chegava aos joelhos.

— E perfeita! — ela disse, suspirando.O traje a deixara muito elegante, e Penélope não se importava com o fato de nunca

poder adquiri-lo.— E caro demais para mim.A madame fez um gesto vago com a mão.— Nem pense nisso. Penélope tornou a suspirar.— Como sabia que me serviria, madame Gisele?

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Sua Alteza Real pediu tamanhos pequenos. E devo dizer que ele estava certo.Gisele, com seus cabelos escuros e olhos castanhos, parecia ter mais ou menos

cinqüenta anos, e balançava a cabeça, aprovando.— Ele tem experiência com medidas femininas, não tem?— Não. Isto é, acho que sim. Na realidade, não faço a menor Idéia.— O príncipe é um homem entre homens. Se eu fosse vinte anos mais jovem... Sorte

da moça que conquistar seu coração. — Então, o olhar sonhador de Gisele. — Gostou desse?— Adorei tudo o que a senhora trouxe, madame.— Excelente. Agora, vestidos para coquetéis e roupas de gala. Penélope experimentou

diversos vestidos, alguns até os joelhos, outros até os tornozelos, todos elegantes e de caimento impecável. Por fim, Gisele pegou um vestido coberto por uma capa protetora de plástico.

Extasiada, Penélope olhou para ele.— Meu Deus!— Sim, é magnífico. Prove-o, querida.O vestido era longo, de mangas compridas. Percebendo que tinha de tirar o sutiã,

Penélope desculpou-se e foi ao banheiro, deixando a porta entreaberta.— Que amor! Acha que eu já não vi isso centenas de vezes?— Mas não viu a mim, madame.O traje era leve como o ar, e não tinha muito tecido na parte de cima. Era de seda e

renda, e Penélope percebeu que não poderia fechá-lo atrás, sem ajuda.Segurando a parte de cima sobre os seios, entrou no quarto.— Madame, importa-se de fechar para mim? Não pude... oh... Deparou com Rafiq.

Penélope não o ouvira entrar. Ruborizou e estacou no lugar. Mas, quando viu o olhar de Rafiq, ficou ainda mais embaraçada.

— Sua Alteza pediu-me para avisá-lo quando a senhorita provasse esse vestido — explicou Gisele.

Os olhos de Rafiq estavam perigosamente ardentes.— Vire-se. — Ele fez um movimento circular com o indicador. — Eu fecharei o zíper.Ela obedeceu.A respiração quente do príncipe chegou até seus cabelos e ombros, arrepiando-a.

Sentiu o contato de suas mãos, o som do zíper sendo fechado, e o tecido colando em seu corpo. Logo, ele terminou a tarefa, e Penélope deixou escapar um longo suspiro.

Mirou-se no espelho. O vestido de renda chegava até o carpete e também lhe cobria os seios, mas mesmo assim ela se sentia exposta. Não tinha nada a ver com o traje, mas com o olhar de Rafiq. Parecia que ele lia sua alma.

O príncipe tirou os grampos que prendiam os cabelos de Penélope, e os cachos loiros caíram como cascata. Em seguida, removeu seus óculos e entregou-os a Gisele, que os pôs sobre a cômoda, deixando o aposento logo em seguida.

Eles ficaram a sós.— Adorável — Rafiq murmurou, segurando sua cabeleira. — Eu já sabia disso.— Foi você quem escolheu esta roupa?— Escolhi todas elas. Gisele me mandou os desenhos por fax, e eu me decidi por

esses.— Você tem excelente gosto.Penélope mal podia respirar, e não por causa do corpo justo do vestido.Rafiq estava perto demais, quente demais e lindo demais. Tudo inadequado para seu

sistema respiratório.— Sei o que aprecio. Se isso é ter bom gosto...— Há alguma coisa em que você não seja bom, Rafiq?— Não.Sem os óculos, a imagem dele no espelho aparecia um pouco borrada para Penélope.— Gostei muito de ter experimentado todos esses belos trajes, mas por que teve tanto

trabalho? Tudo vai voltar à loja...Nesse momento, Gisele retornou.— Alteza, tudo o que escolheu serviu com perfeição. Não há necessidade de reparos.— Ótimo. Mande tudo para o avião. Iremos embora esta noite.— O quê?! — Penélope o encarou. Ele arqueou uma sobrancelha.— Você precisava de roupas apropriadas para a recepção diplomática. Agora as tem.

— Virou-se para sair do aposento.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Não acho isso uma boa idéia, Alteza.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO V

Alteza?", Rafiq notou o sarcasmo. Alguma coisa estava errada com ela, mas não tinha idéia do que poderia ser.

— Você não pode enviar todas essas roupas para o avião.— Posso e o farei, Penélope. De fato, você já me ouviu dando essa ordem. Já está feito.— Então terá de dar uma contra-ordem. Não posso pagar por essas peças.— E isso o que a está perturbando — constatou, aliviado. — A conta será mandada

para mim.— E acha que isso resolve tudo?— Evidente.Rafiq viu Penélope passar da surpresa à irritação. Mas por que ficara irritada? Agora

tinha um guarda roupa completo.— Isso é tudo o que você pode dizer? — Ela colocou as mãos nos quadris, ainda mais

brava.Rafiq a achou encantadora, e não conseguia tirar os olhos dela. O sangue corria mais

rápido em suas veias.— Não há mais nada para dizer, Penélope.— Engano seu. Há muito. Para começar, é inconveniente.— Pelo contrário. Você precisava de roupas para as festas oficiais do palácio e para

outras funções. Agora as têm.— Se teme que eu vá embaraçá-lo como também a toda a família real, não se

preocupe. Planejo comprar trajes novos quando tiver dinheiro suficiente.— Não há necessidade. Já estão compradas.— Não. Você as comprou. Eu não tenho condições de adquirir essas roupas e nunca

terei. Meu sonho é outro.— A pré-escola. Não se preocupe, seu sonho está garantido. Não terá de sacrificar

nada.Rafiq estava espantado. Em sua experiência, apenas jóias geravam mais gratidão do

que roupas de marca. E apenas lhe comprara roupas!Não tinha o hábito de defender suas atitudes, sobretudo sobre um tema tão trivial.

Seriam assim todos os americanos ou apenas aquela mulher?— Está certo sobre não fazer sacrifícios. Porque tudo isso permanecerá com madame

Gisele.— Está decidido, Penélope. — E o tom de voz de Rafiq dava a discussão por encerrada.Mas Penélope meneou a cabeça. Não cederia assim tão fácil.— Desde quando me transformei em uma boneca que você pode vestir? Não sou uma

Barbie. Tenho o corpo bem diferente. Nada de pernas longas, e grandes... — Mostrou os seios com as mãos.

Para Rafiq, ela era perfeita. O contorno de seus seios era visível. Eram pequenos, redondos e firmes, e a pele parecia muito suave e macia. Gostaria de sentir a textura e o gosto daqueles seios. Mas seria muita ousadia.

Lembrou a si mesmo que não eram os trajes que faziam um homem ou uma mulher. Embora o vestido revelasse os atributos físicos de Penélope, não mostrava seu verdadeiro caráter.

Estudou o contorno teimoso dos lábios dela, e a raiva, que a fazia empinar o queixo. Isso era um exemplo de sua natureza. Admirou-a ainda mais.

— Fui contratada para ser uma simples secretária. Não há motivo para que eu me vista desta maneira.

— O requisito "simples e comum" era para uma babá. Não é essa a posição que está ocupando. Tem de se trajar como minha assistente.

Na realidade, assistente de sua tia, fato que ele preferia ignorar no momento.— E não são as roupas que fazem as pessoas.— Concordo. — Ele pensara a mesma coisa segundos antes.— Nesse caso, não vejo onde está o problema. Roupas de grife não alterarão o modo

como cumprirei meus deveres como sua assistente.— Não sei o que a perturba tanto. Zangado, Rafiq resolveu tentar explicar mais uma

vez:— Não me entenda mal, Penélope. Isto não é pessoal. Há numerosas situações em que

necessitarei de sua presença, e sua aparência será um reflexo de El Zafir enquanto for minha

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Page 28: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickfuncionária. Como é uma moça inteligente, creio que entenderá. Minha tia me informou que você recusou estar presente à recepção diplomática por não ter um vestido apropriado. Apenas eliminei esse problema. Esse assunto é sobre dever, emprego e país.

— Como assim? — Ela ergueu uma sobrancelha. Estando Penélope sem os óculos, o príncipe pôde observar a expressão dos belos olhos azuis.

— Se você ficar sem clipes, grampos ou papel para a impressora, não terei de providenciar?

— E vestidos de grife são também material de trabalho?— Sem sombra de dúvida. — Rafiq sorriu. — Entendeu depressa.— Não tanto quanto você pensa. As peças que uso parecem boas para mim, e posso

pagá-las sozinha. Mas o custo das que você escolheu somam uma quantia que eu poderia usar na construção de minha escola. Não gastarei esse dinheiro com frivolidade. Agradeço a oferta, mas não posso aceitá-la. — Sou seu patrão e ordeno que aceite. Era demais para ele. Rafiq passou os dedos pelos cabelos Desde quando o sheik mais charmoso da família real tinha d< ordenar que uma mulher aceitasse presentes seus?

E por que era tão importante para ele que ela aceitasse? Mas não queria se incomodar com isso nesse momento. Negociar com uma americana teimosa era mais importante. Tal vez fosse uma lisonja; ou, como Penélope diria, um cumprimento sincero.

— Você está adorável nesse vestido. Embora ele seja revelador demais, mesmo para uma recepção diplomática.

— Ótimo. É o mais caro de todos. Não posso tê-lo.— Eu posso. E o comprarei. Ele estará no avião quando partirmos para El Zafir.— Mesmo que eu não esteja?As palavras de Penélope causaram um arrepio em Rafiq. A idéia de voltar a El Zafir

sem ela era inaceitável.— Por que não estaria? O palácio real paga bem e financiará seu sonho.Penélope relaxou os ombros de leve, parecendo a Rafiq que havia capitulado.— Agora você está certo. E promessa é promessa. Não posso perder meu emprego.— Excelente! Assunto encerrado. Ela passou por ele.— Verei se madame Gisele abre o vestido para mim.— Não se preocupe. Posso fazer isso. — Rafiq baixou o zíper, tomando o cuidado de

não tocá-la.Se isso acontecesse, não sabia o que viria em seguida. Era um enorme desafio.Ver as costas de Penélope quando o traje abriu-se lhe salpicou a testa de suor. Ainda

bem que o avião estava esperando. Outra noite com ela do outro lado da porta que comunicava nuas suítes seria mais do que poderia suportar.

Segurando o vestido sobre os seios, Penélope se virou.— Se isto é demais para uma recepção diplomática não entendo por que insiste em

comprá-lo. Nunca o usarei, Rafiq.Dito isso, ela desapareceu no banheiro e trancou a porta.— Está enganada, minha pequena. Você tornará a usá-lo. Mas ele seria o único a ver.Penélope entrou em seu escritório e sentou-se à escrivaninha. Ela e Rafiq chegaram

tarde de Paris, na noite anterior. Tudo parecia uma fantasia até que olhou as roupas penduradas em seu armário. Por

que o príncipe gastara tanto dinheiro?Óbvio, devido às aparências e o orgulho de El Zafir como nação. Não era por sua

causa. Nem se tratava de um conto de fadas. No entanto, uma pequena parte de Penélope gostaria que fosse.

Por isso pretendia manter o incidente das roupas sempre em perspectiva. O príncipe vencera a batalha, mas Penélope tinha a certeza de que aquilo era uma guerra e que haveria mais batalhas, antes que um deles erguesse a bandeira branca.

Ouviu vozes no corredor e reconheceu uma delas como sendo de Rafiq.Tocou os cabelos, para se certificar de que estavam em ordem e ajeitou os óculos

sobre o nariz.Rafiq entrou na sala, e ela sorriu, o coração querendo saltar do peito.— Bom dia! Posso pedir o café?— Bom dia, Penélope. Teve tempo suficiente para se recuperar da viagem?— Estou ótima. Deixe-me verificar sua agenda.— Está trabalhando hoje?— Evidente. Por que pergunta?

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Page 29: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Não está vestida de maneira apropriada.— Pelo contrário. — Olhou para o vestido caqui que usara no primeiro dia. — Estou

muito bem.— Por que não colocou uma roupa nova?Como poderia fazê-lo entender que não tinha condições de comprar roupas

parisienses? Para o príncipe era insignificante, pois era riquíssimo. Para ela, era impossível.Certa vez, outro homem prestara atenção a ela e jurou amá-la. Dissera também que

poderia dobrar sua herança e montar a pré-escola com o nome de sua mãe. Penélope acreditara, mas o mentiroso a roubara e fugira.

Quando um homem a notava, mesmo sendo um príncipe, era bom ficar alerta. Nada nem ninguém a afastaria de seu objetivo outra vez.

— Se você tem medo que eu o envergonhe...— Não é isso.— Ótimo. — Ela virou a cadeira para ficar de frente ao computador. — A agenda de

hoje é leve. Fiz isso de propósito, devido a sua viagem. Não há visitantes, nem reuniões. Em conseqüência, ninguém me verá nesta...

— ...roupa sem graça. Esperava vê-la vestindo outra coisa.— Para uma ocasião como esta, preferi usar o que tenho.— Então não planeja trabalhar?— Trabalharei, sem dúvida. Em meu próprio serviço. Penélope não percebera o quanto

temia aborrecê-lo. Rafiq era tão encantador... Seria mais fácil se não fosse.A vida dela fora uma série de imprevistos difíceis e erros estúpidos que não queria

repetir. Não tinha intenção de ser devorada por um lobo em pele de cordeiro.Entretanto, Rafiq escolheu aquele momento para sorrir, e o coração de Penélope

disparou. Precisava manter o autocontrole.— Como a agenda está leve, creio que vou aproveitar a rara oportunidade para dar um

passeio.— Boa idéia, Rafiq. Tomarei conta de tudo enquanto você...— Gostaria que viesse comigo.— Eu... não sei o que dizer. Um passeio seria bom, mas...— Não iremos de carro, mas a cavalo.— Sério?— Já cavalgou antes?— Não. Sim. Quero dizer, apenas duas vezes. Quando estava em um orfanato, fomos

convidados para ir a uma fazenda e tive a oportunidade de cavalgar. Mas isso foi há séculos.— Foi quando conheceu os caubóis?— Não.— Então, quando?— Na escola, na loja de mantimentos, na rua, nos bares.— Você ia a bares? Ela deu risada.— Não. Apenas falei isso para ver se você ainda estava ouvindo. Eu não tinha tempo

para isso. Trabalhava, ia para a escola e estudava.- Todas boas razões para que me acompanhe. — Como assim? - Estou lhe oferecendo a oportunidade de soltar seus cabelos, sua

alma.O olhar de Rafiq ficou mais intenso ao fitar os cabelos dela, presos de maneira

conservadora.MAS Penélope não tinha tempo para ficar admirando o olhar Rafiq. Ele queria que ela o

acompanhasse, e isso não lhe parecia uma boa idéia. Tinha de fortificar suas defesas contra o Príncipe Charme e seu sorriso devastador.

— Tenho serviço para fazer, Rafiq. Ele ergueu as sobrancelhas escuras.— O termo "equilíbrio" é importante em todas as situações. Em outras palavras, temos

de investir a mesma quantidade de tempo e energia no trabalho e em situações de relaxamento. E você não está fazendo isso.

— Está dizendo que muito trabalho e nada de distração me tornarão uma empregada estúpida?

— Isso mesmo.— Agradeço pelo que está tentando fazer, mas você disse que é raro ter a

oportunidade de cavalgar. Vou atrapalhá-lo.— Eu a ensinarei.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Não sei...— Não quer aprender?— Não é isso, pelo contrário. Mas não é necessário que se envolva...— Não quer que eu a ensine?— Oh, não! Não pretendi insultá-lo. Apenas não quero tomar seu tempo valioso com

uma atividade tediosa. Deve aproveitar sozinho.— Acha que será tedioso ensiná-la a cavalgar?— Sim, acho.— Deixe que eu decido o que é ou não é agradável para mim.— Está bem.— Portanto, sua resposta é "sim"?— Mas não tenho roupa adequada. . — Seu jeans estará muito bem.— Achei que não fosse apropriado.— Mas é.Vencida, Penélope não tinha mais desculpas. Como poderia dizer "não"? Rafiq era seu

patrão, e ela estava morrendo de vontade de aprender a cavalgar. Afinal, por que superestimava a situação?

— Certo. Vamos dar nosso passeio, Alteza.Decerto, cavalgar com Rafiq seria como estar trabalhando no escritório. Ele iria

mandar, e ela, obedecer.

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Page 31: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO VI

Rafiq pegou as rédeas e olhou para Penélope. — Tem certeza de que não tem medo? Podemos ir no mesmo cavalo até você adquirir mais confiança.

— Não é necessário. — Ela sorriu. — Sinto-me ótima. E o animal parece calmo. Talvez eu tenha sido uma cowgirl em vidas passadas. Você deve ser bom professor, e logo me tornarei uma amazona de primeira categoria.

Rafiq ficou desapontado com a recusa, e seu coração acelerou ao ver seus olhos azuis brilhantes e as faces rosadas.

Eles estavam nos estábulos do palácio. O clima era entre inverno e primavera, o que em El Zafir significava uma temperatura muito agradável.

Rafiq instruía Penélope nos conceitos básicos de como cavalgar.Não entendia por que ela o fascinava tanto. Ouvira dizer que o que um homem não

pode ver o intriga. Talvez os óculos, que escondiam seu rosto, ou o jeans, que ele lhe sugerira usar.

Observou as coxas dela, tão próximas de suas mãos, que seguravam a rédea. Rafiq não estava acostumado a ficar perturbado por uma mulher.

Precisava mesmo de uma estimulante cavalgada que clareasse seus pensamentos.— Se você jura... — ele balbuciou.— Juro. Não pretendo correr pelo deserto. Talvez em outra ocasião — Penélope

brincou.— Tudo bem. Embora eu deseje correr como o vento, vou me conter, para acompanhá-

la. — Montou no cavalo.Não podia sair em disparada, pois o cavalo de Penélope seguiria o dele, e ela não tinha

experiência. Também não iria deixá-la sozinha, porque o deserto não perdoa os incautos.Por que Penélope se recusara a usar as roupas que ele comprara? Nunca passara por

uma situação similar. Todas as jovens que conhecera aceitaram seus presentes exultantes.— Que dia glorioso! — Penélope exclamou, olhando para o céu.— Sim, é mesmo.À medida que os cavalos caminhavam, ela respirava fundo, inalando o ar fresco e

agradável.A camisa de algodão que Penélope pusera lhe moldava as formas, e Rafiq quis muito

saber como era a textura de sua pele.Olhando para ele, Penélope disse:— Não acredito que já tenha visto um céu como esse. Nem no Texas.— E o Texas é padrão de céu como é de caubóis?— Você nunca vai me deixar esquecer isso, vai?— Não.Nem tampouco que sua tia afirmara que ela era uma moça capaz de aprender tudo.

Nesse momento, preferia que não fosse, pois teria uma desculpa para abraçá-la e protegê-la.Rafiq suspirou ao recordar os ombros alvos de Penélope ao usar o vestido preto que

ele comprara em Paris.— Provoque-me, se quiser, mas é o firmamento mais azul que já vi.— Fico contente por ter gostado, Penélope. Ordenei este dia em especial para você.Ela riu.— Você é competente, Alteza, mas não acho que seja tanto assim.O sorriso radiante de Penélope teve o efeito de uma flechada no peito de Rafiq.Ele era competente, sim, e desejava mostrar isso a ela.Rafiq não acreditava que Penélope fosse tão inocente quanto Farrah dissera. Mas não

era uma moça cosmopolita, também.A reputação de Rafiq no palácio permanecia péssima por causa de uma mulher

incapaz de se controlar. A casa ainda estava se recuperando de um alvoroço pelo qual ele fora culpado, mas que na verdade não fora causado por ele. E imaginar que estava se arriscando por uma coisa muito pior...

"Arriscar" era um termo suave demais. Seu corpo parecia em chamas por causa de Penélope. E ela era funcionária sua, uma jovem a quem lhe fora proibido tocar.

— Meu Deus! — Penélope se mostrava admirada.— Sim?— Você está parecendo muito ansioso por alguma coisa.— Estava pensando na cavalgada.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— O que, especificamente?— Que gostaria de ir... bem mais longe. Penélope franziu a testa.— Se quer voar como o vento, pode ir. Já comentou que o cavalo é treinado a voltar

aos estábulos. Não se prenda por mim.— Não, Penélope. Mas eu gostaria de apressar o passo. Há algo que quero lhe mostrar.

Acha que está pronta para ir um pouco mais depressa?— Sim, estou.— Seu desejo é uma ordem. — E Rafiq pressionou o animal, de leve.Seu cavalo obedeceu, e o de Penélope o imitou. Penélope se concentrou e tentou

lembrar-se de cada orientação que recebera dele.Seguiram em frente até encontrar um lugar com grama verde, palmeiras e água

brilhando como diamantes ao sol.— Um oásis! — Penélope ficou encantada.— Sim.— Vamos parar aqui?— Isso mesmo.Rafiq conduziu a montaria até debaixo de uma palmeira, ao lado de um pequeno lago.

Apeou e prendeu-o na árvore. Pegou a rédea do animal de Penélope e fez o mesmo. Sem demora, os cavalos baixaram as cabeças e puseram-se a pastar.

Penélope passou a perna pela sela para apear. Atrás dela, Rafiq pôs as mãos em sua cintura para ajudá-la, e seu peito encostou nas suas costas. Um leve estremecimento de Penélope deixou claro que a aproximação não lhe fora indiferente.

— Venha, Penélope, precisamos nos refrescar um pouco.— Boa idéia!Ele tirou dois cantis da sela, ajoelhou-se e afundou as mãos na água molhando a nuca

e o rosto. Penélope também, pegando em seguida o cantil para beber.A água molhou seus lábios, que Rafiq teve vontade de lamber. Como gostaria de ser

um homem menos honrado e não ter prometido a sua tia que Penélope estaria a salvo em sua companhia, que não lhe causaria nenhum dano!

Mas que tipo de dano poderia causar-lhe?Penélope enxugou os lábios molhados.— Este lugar é esplêndido. Quanta beleza... No meio de um deserto!— Sim, quanta beleza — ele murmurou, sem se desviar dela. Os olhos azuis de

Penélope cintilaram.— Está brincando comigo?— Por que acha isso?— Pelo modo como me olha. Está zombando de mim.— Jamais faria isso. Você é adorável, em minha opinião. E também vivaz e esperta.

Estou em constante estado de antecipação para ouvir o que você dirá em seguida.— Fico contente. Uma garota como eu tem de ser boa no que faz.— Por quê? O que quer dizer com "uma garota como eu?"— Uma moça simples e comum. Não que eu esteja reclamando. Na vida, dança-se

conforme a música. Temos de maximizar nossa força. Uma pessoa bonita pode caminhar por um salão, e isso é suficiente. Eu preciso usar a cabeça e ser engenhosa. — Ela deu risada. — Mas você não entende nada disso. Afinal, é um homem muito bonito.

— Esse não é um adjetivo a que um homem costuma aspirar.— Sabe do que estou falando. Você não é apenas um belo homem, um sheik, mas é

alguém que as pessoas reverenciam. Não sabe o que é ser comum, tímido e insignificante.— Posso providenciar chocolate — ele tentou brincar.— E todos têm consideração por você. Como perguntei antes: há alguma coisa em que

você não seja competente?Rafiq gostaria de dizer que sim: não conseguia resistir ao proibido. E, mais do que

tudo, queria afastar a tristeza do semblante dela. E havia apenas uma maneira de fazer isso.— Penélope... — Rafiq endireitou o corpo e esticou a mão até ela.— O que está fazendo?— Vou beijá-la.Rafiq tirou-lhe os óculos e os pôs no bolso de trás da calça. Em seguida, passou os

braços dela ao redor de seu pescoço.— Não vou magoá-la.— Eu sei.

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Page 33: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickO príncipe gostaria de indagar como Penélope sabia. E avisá-la para não ser tão

confiante. Ele podia ser bom para ela, mas havia outros homens que...Penélope sabia disso, no entanto.Além do mais, não podia mais esperar para beijá-la.Rafiq afundou os dedos na cabeleira dela, sentiu-lhe a maciez e abaixou a cabeça. O

primeiro contato com os lábios de Penélope o fez mergulhar em um mágico instante, como se estivesse livre para voar.

Ele ergueu o rosto e a estudou. Seus lindos olhos azuis, a suave respiração que saía de sua boca entreaberta, o leve arfar. Sorrindo, pôs a mão na nuca de Penélope, que cerrou as pálpebras, e tornou a beijá-la, com mais intensidade. Os lábios e o corpo dela estavam rígidos de tensão, como se não estivesse acostumada a ser enlaçada por um homem, a ser beijada.

Mas já estivera noiva. Como podia isso ser verdade?Rafiq lambeu os lábios dela para mostrar o que queria. A respiração dela tornou-se

mais rápida, e Penélope, por instinto, se aconchegou a ele, mas continuou com a boca cerrada.Ela não entendera o que ele queria? Seria tão inocente quanto Farrah sugerira?O primeiro beijo de Rafiq pôs por terra a força de vontade de Penélope e qualquer

pensamento coerente. Em seguida, sensações desconhecidas tomaram conta dela, que sentiu um calor intenso, do dedão do pé até a raiz dos cabelos, tão delicioso e envolvente.

Seus batimentos cardíacos aceleraram como se ela estivesse cavalgando um cavalo veloz pelo deserto.

Gostaria de aprender com Rafiq sobre sensualidade. Queria que ele a tocasse como fazia com as outras pelas quais era atraído.

Rafiq interrompeu o beijo.— Penélope?— Hum? — Ela o fitou.— Abra a boca. Ela arregalou os olhos.— Oh, meu Deus...— Não fique alarmada. Vou ensiná-la a beijar. Penélope deu um passo atrás.— Estou mortificada! Temos de voltar!— Mas...— É hora de irmos, Rafiq. Não acha?Se tivesse feito isso cinco minutos antes, não teria passado por tal humilhação. Um

beijo de misericórdia em uma moça simples e comum. Que coisa horrível! Por que o príncipe fizera uma coisa dessas com ela?

— Penélope...— Olhe, se quer saber, não beijei muitos homens. Para ser franca, não beijei nenhum.— Mas e aquele que foi seu noivo?— Como sabe disso? A princesa Farrah lhe contou?— Sim. Rafiq permaneceu no lugar, esperando alguma informação da parte dela.Se ele não fosse o dirigente daquele país, Penélope o poria no devido lugar e não lhe

diria nada.Foi quando viu piedade nos olhos dele. Isso era demais. Não ia dizer-lhe nada, nem

que nevasse no deserto. Não iria expor sua alma.Penélope deu-lhe as costas e se dirigiu até o cavalo, desamarrou-o, pegou na rédea e

montou. Rafiq era mesmo um bom professor. Ela ficou vermelha, lembrando-se de que ele

queria ensiná-la a beijar. Sentia-se uma completa idiota.Chorando, virou a rédea para a direita e tomou o caminho de volta. Só então lembrou-

se de que Rafiq ficara com seus óculos.Olhando para trás, ela o viu montar e tirar algo do bolso.Quando algo começa a dar errado, tudo o mais dá errado também.Rafiq a alcançou, mostrando os óculos quebrados.— Esqueci-me deles. Eu lhe comprarei outros.— Obrigada. Nunca mais quero falar sobre alguma coisa que não esteja relacionada a

trabalho.— Como queira.Mas não era o que ela queria. Penélope adoraria que sua vida fosse mais simples, que

tivesse tido mais tempo com sua mãe. E não ter sido tão estúpida a ponto de ser usada por um homem que lhe roubara todo o dinheiro que possuía. Queria que Rafiq não a tivesse beijado.

Porém, nenhum de seus desejos seria realizado. Pelo visto, sua fada madrinha era uma

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Page 34: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickfarsa.

Penélope desesperava-se sem os óculos, pois precisava ler uma papelada que trouxera do trabalho para examinar. Bateram na porta, e ela se alegrou por ter uma chance de tirar os olhos dos papéis.

Ao atender, deparou com Crystal Rawlins.— Olá. — A babá lhe entregou um rolo de fita crepe. — Trouxe-lhe isto, para que você

possa colar seus óculos até que sejam substituídos.— Obrigada. — Penélope pegou o adesivo. — Quer entrar? Crystal hesitou por um

momento.— Sim, tudo bem. Fariq está com as crianças, e eu posso me ausentar por alguns

minutos.Penélope pegou as duas metades dos óculos antes de seguir u colega para a sala de

estar da suíte. As duas sentaram-se no sofá.— Como é tomar conta das crianças do príncipe Fariq?— Fácil e difícil ao mesmo tempo. É complicado educar crianças, e eu não tive muita

experiência. Sou filha caçula.— Sorte sua. Sou filha única. — Penélope colou as duas partes dos óculos e os pôs. —

Pronto! É bom poder enxergar de novo. Estava com medo de passar pelo rei Gamil e pela princesa Farrah e não cumprimentá-los.

— Nunca quis usar lentes de contato? — Crystal ajeitou os próprios óculos no rosto.— Tentei uma vez, sem sucesso. Sentia como se tivesse toda a areia do deserto de El

Zafir nos olhos, que lacrimejavam sem cessar. Horrível. Prefiro óculos. São mais baratos e mais eficientes.

Seu único engano fora ter deixado um príncipe tirá-los para beijá-la. Se ao menos não tivesse gostado tanto! Queria odiar Rafiq pela humilhação, mas não fora culpa dele. A idiota era ela, que nunca fora beijada.

Olhou para a amiga e ficou tentada a contar tudo o que ocorrera. Mas mudou de idéia. Já sofrerá bastante por um dia.

— Você já decidiu, Penélope?Crystal usava uma blusa de seda verde-esmeralda sob um colete com estampa floral.

O tecido lhe moldava a silhueta. Seus cabelos claros estavam presos na nuca, o que fazia seus olhos sobressaírem. Eram verdes, quase da cor da blusa.

— Lentes de contato não são para mim, Crystal. Mas você devia experimentá-las. Seus olhos são muito bonitos. Não devia escondê-los atrás das lentes.

— Engraçado você dizer isso.— Por quê?— Por nada. — Crystal deu de ombros.— Não quis me meter em sua vida. Deus sabe que não tenho base para falar de

beleza.— Por que diz isso?— Olhe para mim. Não tenho ilusões sobre minha aparência.— Você se acha feia?— Não caçoe de mim.— Perdão, mas amigas não mentem uma para a outra.— Nós somos amigas? — Espero que sim. Como seus óculos se quebraram? Penélope sentiu a temperatura

corporal aumentar ao rememorar o que ocorrera no oásis.— E uma longa história. Basta dizer que foi uma experiência perturbadora em muitos

aspectos.— De acordo com os rumores, você foi cavalgar com o príncipe Rafiq. Devo presumir

que ele está, de alguma maneira, envolvido?— Sim. Não! Na verdade, se não se importa, não quero falar disso.— Tenho certeza de que Sua Alteza ficará feliz em lhe dar óculos novos.— Ele já ofereceu.— Talvez sugira lentes de contato. Já que você agora tem um trabalho fixo... Mas

aquele comentário a respeito de sua aparência quer dizer que não se acha atraente?— Na vida, tem-se de dançar conforme a música, é o que sempre digo."Céus... Corro o risco de me tornar a rainha dos clichês."— Quando se têm limões, faz-se limonada, Crystal. Aprendi que minha força está na

inteligência, e não na aparência.

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Page 35: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Mas somos mulheres. Há uma invenção muito poderosa chamada cosméticos.— Não acredito que ajudariam.— Está errada. Com um penteado mais bonito, roupas e maquiagem, ficaria muito

bonita. Eu a vi sem os óculos.Penélope deu risada.— Se você for mesmo minha amiga, devo lhe dizer que náo é caridoso dar falsa

esperança a alguém.— Eu não faria isso.— Gostaria de poder acreditar em você, Crystal. E- de ser sofisticada. Ah, e o que eu

não daria para ser alta e escultural?!— O tipo de garota que atrairia a atenção de um príncipe?— Eu não estava pensando nisso!Já tinha atraído a atenção de Rafiq e não queria complicação para si. Nada deveria

afastá-la do seu objetivo.— Mas admito que ele é lindo.— De que "ele" estamos falando? Rafiq, Fariq ou Kamal? E também o rei, lógico. I— Rafiq. É o tipo de homem que, no colégio, faz uma moça ter vontade de todas as

manhãs querer levantar-se da cama e ir para a escola. Mas ele jamais olharia duas vezes para mim, nem em milhões de anos.

— Nem nos contos de As Mil e Uma Noites?— Não.— Bem, tenho de avisá-la que ser bonita também acarreta problemas.— Como o quê? Não posso imaginar nenhuma situação onde a beleza possa se tornar

uma dificuldade. — Você é que pensa, minha amiga. — Como assim? — Deixe para lá. Estou apenas tentando dizer que há coisas mais importantes do que

a aparência com que se preocupar. Penélope suspirou. — Sei que está certa, Crystal. E sou grata pela oportunidade de trabalhar aqui, em El

Zafir. Mas não posso evitar querer ser um pouco mais interessante, menos comum. Falando nisso, você tem idéia de por que "simples e comum" era uma qualificação para a função de babá?

— Sim. Por causa de seu príncipe. — Se está se referindo a Rafiq, ele não é meu príncipe.— Estou falando de Rafiq, e me recuso a discutir se ele é ou não é seu príncipe. O

tempo dirá. — E o que houve com ele? — Parece que a última babá dos filhos de Fariq se apaixonou por ele e armou uma

confusão no palácio, quando resolveu esperar Rafiq na cama dele. — Bem, creio que essa não é a melhor maneira de recebei uma avaliação positiva,

mas... — Isso não é tudo. A jovem decidiu também que devia esperá-lo nua. — Não!— Sério. Pelo jeito, não foi a primeira vez que uma mulher da equipe de empregados

do palácio sucumbiu aos encantos e ao charme do príncipe. De acordo com os comentários, Rafiq não se interessa por mulheres comuns. Assim, o rei Gamil fez essa exigência para evitar futuros problemas.

Penélope arregalou os olhos. Se isso era verdade, por que ele a beijara?— Trabalhar para ele tem sido ruim para você?— Não, Crystal. Embora eu não seja do tipo que atrai homens, agradeço pelo aviso.— Bem, é hora de dormir. — Ela se levantou.— Obrigada pela fita crepe.A vida seria muito menos complicada se estivesse trabalhando com crianças em vez

de assessorar o príncipe.O beijo que ele lhe dera a perturbara muito, além de ter sido o responsável por seus

óculos quebrados. Mas não fizera nada para atraí-lo. Apenas trabalhara no mesmo escritório e respirara o mesmo oxigênio.

Penélope abriu a porta para a amiga sair.— Gostei muito de conversar com você. Devemos fazer isso mais vezes.

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Page 36: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCrystal sorriu.— Eu também gostaria. Na próxima tarde em que o príncipe Rafiq se oferecer para

brincar com os sobrinhos, poderemos explorar a cidade juntas.— Será ótimo. Boa noite.— Boa noite, Penélope. :— E Crystal se afastou. Penélope fechou a porta, encostando-

se nela.— Terei sorte se conseguir cochilar..."Quer dizer que Rafiq não aprecia mulheres comuns." Não havia dúvida de que a

princesa Farrah a contratara porque sua aparência não interessaria ao sobrinho. Depois do beijo, queria saber se...

Não. Tinha de esquecer tudo e se ater a suas tarefas. Precisava do emprego para atingir suas metas. Não iria cair nessa cilada do destino.

A última coisa que quero é quebrar a paz do palácio e ser demitida.O acontecido no oásis não mais se repetiria. Era seu destino e seu sonho de abrir uma

pré-escola para honrar sua mãe que estavam em jogo. Nada ficaria em seu caminho.Nem mesmo um sheik maravilhoso.Era óbvio que calculara mal. Ficar com Rafiq no oásis era muito diferente do que no

escritório.Portanto, tinha apenas de trabalhar. Nada de passeios e conversas íntimas com Sua

Alteza, o príncipe Rafiq Hassan.

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Page 37: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO VII

Rafiq entrou no escritório e levou um susto ao ver Penélope usando os óculos remendados.

A visão o remeteu ao dia anterior, e o desejo de beijar-lhe os lábios e sentir o calor das curvas perfeitas de seu corpo o dominou. Respirou fundo e passou o dedo pelo colarinho da camisa, desejando que o ar-condicionado estivesse ligado no máximo.

Já a vira usando aquele vestido preto de mangas longas e fechado até o pescoço. Penélope teimava em não colocar a roupa que ele lhe comprara.

Rafiq estivera fora do palácio por toda a manhã, tratando do preparo do baile de caridade que ocorreria em alguns meses.

Decidira não tocar mais no assunto dos trajes, visto que Penélope pedira que conversassem apenas sobre trabalho. Tecnicamente ela estava com a razão, mas o príncipe não conseguia se esquecer de como sua pele ficara bela naquele vestido preto.

Era hora do almoço, mas em vez de fazer sua refeição em um dos restaurantes da cidade, Rafiq preferiu voltar ao escritório. Não tinha certeza, mas achou que o motivo era sua original e divertida assistente.

— Bom dia, Penélope.Ela olhou para cima e piscou. Estivera tão absorvida pelos afazeres que demorou um

pouco para fixar a atenção nele. Ou seriam os óculos quebrados que lhe atrapalhavam a visão?Precisava providenciar-lhe óculos novos, decidiu Rafiq, já que lota o responsável pela

quebra dos velhos.- Oh, Rafiq, boa tarde... Pensei que só retornaria depois do almoço.— Você já almoçou?— Não. Ia terminar de digitar este relatório antes.Seria imaginação de Rafiq ou ela ruborizara? Teria alguma coisa a ver com o beijo no

oásis?— Pedirei alguma coisa para nós. — Como queira. — E Penélope voltou-se de novo para o monitor.Rafiq passou pela escrivaninha dela, foi até seu escritório e pegou o telefone. Depois

de fazer o pedido ao chef, conferiu as mensagens recebidas e anotadas em um bloco com a letra bonita de sua secretária.

A letra parecia com ela: pequena, precisa e intrigante.Ora, o que havia de errado com ele?! Até quando tentava trabalhar, pensava em

Penélope.Isso tinha de acabar. Era o príncipe Rafiq Hassan, e uma garota miúda, com óculos

grandes e feios não deveria ser suficiente para fazê-lo perder a concentração.No momento seguinte, tornou a usar o telefone e ligou para seu médico particular. Um

príncipe, um homem de sangue real, mantinha suas promessas.Pouco depois, o almoço chegou e foi colocado sobre a mesa, no escritório de Penélope,

para onde Rafiq se dirigiu.Ela o fitou, e as suaves linhas de seu rosto ficaram tensas. Seus lábios carnudos

afinaram.Seria imaginação dele ou Penélope estava contida, mais reservada?Apesar de ter mencionado cortar-lhe a língua, sentia falta de sua conversa ingênua e

fluente.— Vamos comer?— Como queira.Rafiq puxou a cadeira para que ela se sentasse e notou que Penélope continuava

tensa, evitando ser tocada por ele, que ficou desapontado. Era muito agradável tocá-la.Sentou-se à frente dela e ordenou que o garçom começasse a servi-los.— Pedi apenas isso, mas você pode ter o que quiser.— Como queira, Alteza.De novo a mesma expressão polida.Rafiq não pensava em Penélope como sua funcionária. E não saberia dizer quando isso

mudara.Quando ficaram a sós, ele a olhou, constatando que Penélope não parecia à vontade.

Suas respostas monossilábicas não eram naturais.Rafiq queria a mulher que estivera com ele no oásis: risonha e quente. Aquela que fora

beijada por ele.

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Page 38: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickFora um beijo casto, mas o toque daqueles lábios ficaria gravado em sua memória

para sempre.Tudo o que precisava era acabar com o ressentimento dela. Assim, poderia descobrir

por que Penélope estava magoada. Afinal, sua experiência com o sexo oposto lhe dizia que ela gostara do beijo tanto quanto ele.

Precisava tocar em um assunto pelo qual Penélope fosse apaixonada. E sabia bem qual era.

— Fale-me sobre seus planos para a pré-escola. Penélope hesitou por um instante, antes de perguntar:

— O que quer saber?— Comece do início. Por que esse projeto é tão importante para você?— Achei que já houvesse explicado.— Creio que é mais do que amor por crianças e de seguir os passos de sua mãe.

Nunca conheci uma mulher que chegou tão longe para começar um negócio.— Tem razão. E mais do que isso. Fiz uma promessa a mamãe quando ela estava à

morte. Jurei que faria alguma coisa que deixasse sua memória viva. Algo bom, bonito, que desse às crianças um começo de vida positivo, como o que ela dera para mim. Não tive minha mãe por muito tempo, mas não estaria aqui agora, sem a orientação que recebi dela. Vou fundar o Centro de Desenvolvimento Infantil Mary Elizabeth Doyle.

— Entendo.A mãe de Penélope devia ter sido uma mulher notável, para gerar tanta devoção.— Levantarei fundos para bolsas de estudo para crianças pobres. Quero diminuir a

diferença entre as da classe média e as sem recursos, para que ambas tenham o mesmo nível ao entrar no primeiro grau. Trabalhar com você nas obras de caridade será de muita valia, quando eu voltar para casa. Espero coletar dinheiro para assistir a mães solteiras que têm de trabalhar e precisam de um bom lugar para deixar seus filhos. Um que seja também intelectualmente estimulante.

— Já escolheu um local para o centro?— Sim, já está escolhido.Rafiq sentiu que era necessário estimulá-la mais.— Onde?Penélope o encarou e tirou os óculos.— Não é muito longe de onde mamãe lecionava. E um bairro residencial, bem distante

da área comercial da cidade.— Então já tem o prédio?— Ainda não.— Comprou o terreno?— Não.— Então, como pode ter certeza de que o local estará disponível quando retornar ao

Texas?— Não posso garantir, mas tenho esperança. Se eu tivesse como comprá-lo...— Mas você não tem.E ele sabia por quê. Rafiq sentiu o sangue ferver ante a idéia daquela jovem honesta e

honrada de quem haviam roubado toda a herança deixada por sua mãe.— Conte-me sobre o marginal que lesou você.— Esta não é uma hora propícia. Prefiro esquecer.— Não seria mais fácil se me contasse?— Você já sabe. 1— Gostaria de ouvir de você.— É um decreto real?— Posso providenciar um, se necessário. -Os olhos de Penélope brilharam, o que deu muita satisfação a Rafiq.— O marginal morava no mesmo prédio que eu. Para ser mais exata, ao lado. Disse

ser advogado, mas descobri, mais tarde, que era um empregado de escritório que tivera acesso a meu arquivo. Também era bonito e charmoso. Eu estava sozinha e...

— Continue — encorajou-a.— Ele passava bastante tempo comigo, e pensei que gostasse de mim. Chegou a me

pedir em casamento, e eu aceitei. Dessa maneira, quando se ofereceu para investir minha herança, nem o questionei. Disse-me que, aplicando o dinheiro, eu poderia realizar meu sonho duas vezes mais rápido.

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Page 39: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— E o sujeito não fez o investimento.— Deve ter investido, mas não em meu nome. Nunca mais o vi.— Não notificou a polícia?— Sim. Mas não puderam fazer muita coisa. O espertinho usava um nome falso, e

estava com todo o dinheiro. Não havia nada assinado, portanto, nada fora roubado. Apenas minha confiança.

— Entendo.— Fui uma completa idiota. Não era uma sorte para uma garota como eu encontrar um

homem como ele? Um perfeito cavalheiro? Nunca questionei o motivo de me tratar como uma irmã.

— Por que não?Rafiq afastou o pensamento de que também ele pretendera tratá-la assim. Mas não

dera certo.— Ele nunca planejara se casar comigo. Queria apenas minha herança. Nunca sequer

me beijou.— Nunca?— Apenas no rosto e na testa. Do modo como você beija Johara. Se pelo menos ele

fosse gay... — Baixou os olhos para o prato, onde a comida estava quase intocada. — Nunca quis dormir comigo, enquanto roubava meu dinheiro.

— Em El Zafir isso é crime.— Ele não ter dormido comigo?— Não. Tirar dinheiro de uma mulher inocente. Neste país, a pena seria rápida e

severa.— Teriam decapitado o miserável? Ou língua teria sido cortada? Ou seria esquartejado

em praça pública?— Tudo isso.Rafiq ficou contente por fazê-la sorrir. Mas o motivo verdadeiro dessa alegria ainda era

um mistério para ele.Tinha uma idéia para fazer o brilho voltar àqueles belos olhos azuis e o sorriso não

mais deixar aquela linda boca.— Posso comprar o terreno onde você quer construir sua escola.Penélope piscou.— Será outro momento igual ao de Paris.— Como assim?— Não posso aceitar nada que não tenha conseguido ganhar com meu trabalho, Rafiq.— Essa sua qualidade é admirável. Mas eu pretendia adiantar seu salário e ir

descontando aos poucos.Penélope ficou sem fala durante vários momentos. Rafiq sabia que despertara seu

interesse.— Creio que vou confiar em você, porque fiz uma promessa a minha mãe e não quero

perder a chance de adquirir aquele terreno. Desde que me dê sua palavra de que descontará de meu pagamento.

— Tem minha palavra, e a propriedade estará em seu nome.— Então, aceito sua oferta.— Ótimo! Farei o que for necessário para adquirir o terreno.— Obrigada, Rafiq. Sabe, não quero ser uma pessoa difícil. É que aprendi a lição de um

modo cruel. Nunca mais serei tão inocente e tão crédula.Sua veemência despertou algo em Rafiq. Era uma lástima que o noivo mau-caráter

tivesse roubado a pureza de espírito de Penélope. Mas não podia reclamar, pois a castidade dela estava intacta.

— Pureza é uma jóia que deve ser preservada, Penélope. Deveria estar orgulhosa por ter sido poupada.

— E estaria, se tivesse sido testada. Mas ele nunca tentou nada.Se a reação dela a seu beijo não o tivesse convencido de que Penélope era pura, essa

resposta o teria feito.Rafiq nunca conhecera alguém que fosse incapaz de uma falsidade. Até conhecer

Penélope. Farrah estava certa: Penélope Doyle era inocente e virgem.Essa constatação fez seu coração acelerar, e sentiu uma necessidade premente de

protegê-la.Possuí-la também?

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickNão. Ele fora proibido. No entanto, sentia-se ansioso e desejava beijá-la outra vez.Rafiq era honrado, e jurara não feri-la ou trazer desgraça para a família real.Na verdade, o ato não valeria o escândalo que poderia advir.Paixão e atração se desvanecem com o tempo. Nenhuma mulher conseguira

conquistar seu amor.Penélope despertara em Rafiq o sentimento mais embaraçoso de sua vida. Era hora de

voltar a assuntos inócuos.Como se tivesse lido seu pensamento, Penélope mudou o rumo da conversa:— Vamos falar de você. E óbvio que percebeu o quanto minha mãe foi importante para

mim. E quanto a sua? Fale-me dela.— Mamãe morreu quando eu era ainda pequeno. — O príncipe tomou um gole de água

da taça de cristal. — Você é afortunada.— Olhando por esse prisma, digo que tem razão. Sinto muito, Rafiq.— Meu pai criou seus filhos para serem homens, e tia Farrah completou nossa

educação. Não cheguei a sentir falta da presença feminina.— Pelo que li a seu respeito, você nunca fica sem companhia feminina.— Não acredite em tudo o que lê.— Certo. Todavia, seu nome está ligado a muitas namoradas. Todas maravilhosas. De

fato, uma das revistas o elegeu o sheik solteiro mais cobiçado do mundo.Penélope o provocou para tentar desanuviar o olhar triste que o assunto sobre mães

despertara nele. Quase o via como um menino carente. Uma tia nunca substitui uma mãe.— Sim, sou um solteiro cobiçado. E um sheik.— Nunca esteve noivo?— Não.— Por quê? Eu pelo menos fui noiva uma vez. Mesmo que meu noivo tenha sido um

delinqüente.— Cheguei perto do noivado várias vezes. Porém, as mulheres são todas muito

parecidas. Quando eu achar a companheira apropriada, cumprirei meu dever: casarei e terei filhos.

— E se a mulher apropriada disser "não"?— Absurdo. Ela nem sonhará recusar a honra de se casar com Rafiq Hassan, príncipe

de El Zafir. — Sorriu. — E há o fato de que as mulheres me acham... atraente.— Quer dizer que nada faz para encorajá-las?— Evidente que não. Penélope, já lhe disseram que seus olhos são sensacionais?— Acho que sim.— Estou sendo franco. Quando não estão escondidos atrás das lentes, ficam mais

azuis que o céu sem nuvens do deserto.Rafiq já tirara seus óculos sob aquele céu que agora descrevia. E a beijara... e a fizera

desejar mais. E ainda queria mais.— E é culpa minha eles estarem quebrados.— Meus olhos?— Seus óculos, Penélope. Marquei um horário para você com o médico do palácio. Ele

lhe dará assistência na substituição dos óculos. — Rafiq apontou o dedo indicador para ela. — Não quero discussões sobre pagamento. A conta será mandada para mim. Sou o responsável.

— Está bem, aceito.— Tão fácil assim? — ele se admirou. — Não vai discutirantes de concordar?— Quando você está certo, está certo.— Estou sempre certo. — Suas pupilas cintilaram de malícia. Era desse modo que

Penélope mais gostava dele: provocando-a com frases de duplo sentido cheias de ternura que lhe tocavam a sensibilidade.

Rafiq era mesmo muito charmoso e simpático, e quase a fizera se esquecer do episódio do oásis.

Contudo, não podia esquecer, precisava manter-se alerta.Abrir a pré-escola sempre fora o objetivo pessoal de sua vida. Agora, oficialmente,

tinha mais um objetivo: não incorrer no mesmo erro duas vezes.Rafiq Hassan estava brincando com ela. O que mais poderia ser? Não era mulher para

ele.Se ao menos a lembrança do beijo não fosse tão doce...

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO VIII

Penélope notou que Rafiq tinha um aspecto cansado. Percebeu no momento em que ele entrou no salão de baile.

O ambiente era belíssimo, de tirar o fôlego. O teto era alto, o piso de mármore e numerosos lustres brilhavam e iluminavam a profusão de flores que o decoravam. Seu patrão estava ali para se assegurar de que tudo seria perfeito para o baile beneficente que aconteceria na noite seguinte.

Rafiq parecia um general revistando suas tropas. Olhava as mesas e as cadeiras sendo carregadas e dispostas segundo o diagrama que os dois programaram juntos.

Toalhas de linho começavam a ser drapeadas para cobrir as mesas. A comida e a bebida foram importadas de Nova York, junto com o chef.

Rafiq falara com Penélope a respeito do cardápio. Queria que todos os convidados gostassem da refeição que ofereceriam. O champanhe era francês, e a sobremesa, requintada.

O príncipe poderia ter delegado a supervisão para outra pessoa, mas fizera questão de cuidar ele mesmo de tudo. Trabalhara dezoito horas por dia para ter certeza de que El Zafir faria bonito aos olhos do mundo.

Penélope mantivera-se a seu lado, feliz como nunca.Ao vê-la, Rafiq sorriu, e o coração de Penélope pareceu criar asas e ameaçar sair

voando de seu peito.Ele atravessou o enorme salão, evitando os entregadores, e parou perto dela.— Gosto de sua prancheta.— Provoque-me se quiser, Rafiq, mas prefiro fazer listas e depois checar se nada foi

esquecido. Isso faz com que me sinta mais produtiva e segura.— E acha que eu iria provocá-la?— Sem dúvida. A qualquer minuto.O olhar que ele lhe endereçou fez subir a temperatura de Penélope como no calor de

agosto do Texas. Isso acontecia toda vez que ficava próxima dele.Penélope esperava que o secretário de Rafiq voltasse logo para que ela pudesse

trabalhar para a princesa Farrah, como havia sido planejado. Caso contrário, seus miolos fritariam.

— Quero agradecer-lhe pela ajuda nos preparativos do baile de amanhã, Penélope.— Não foi nada. Era minha obrigação, embora eu saiba que você não conseguiria fazer

tudo sem mim.— Isso não é verdade. Eu teria feito, sim. Mas ter sua ajuda tornou a tarefa mais fácil e

muito mais agradável.Ele sempre sabia o que responder.— Espero que tudo corra bem.— Eu também.— Por que isso é tão importante para você?Penélope já sabia, porém. Lembrava-se do que Rafiq dissera no jantar em família do

qual ela participara, logo após sua chegada ao país. Mas o príncipe discorria sobre o tema com tamanha paixão, seus olhos brilhavam tanto que se tornavam ainda mais bonitos, e Penélope gostaria de ouvi-lo falar de novo.

— A fome em nosso planeta é uma coisa imperdoável e insuportável. Com recursos, dinheiro, trabalho e solidariedade, poderá ser banida da face da Terra.

— Nossa... — foi tudo o que ela conseguiu dizer.Rafiq era ainda mais tentador quando falava daquele jeito. No entanto, o incidente no

oásis dava a Penélope a certeza de como isso acabaria.Uma vez que sabia o que era bom para si mesma, devia esquecer o que houvera. Mas

essa decisão não evitou que lhe fizesse outra pergunta:— Se há alguém que entenda a importância disso, sou eu. Rafiq olhou para ela,

emocionado. — Então pode entender por que quero fazer a maior doação desse evento anual. Não

há motivo para que a fome, e a pobreza de crianças, não possa ser erradicada. E será, tenho certeza. Os efeitos de uma privação longa são severos: estresse, doenças, irritabilidade e incapacidade de aprendizado. Se quisermos melhorar o mundo, devemos começar com as crianças.

— Muito bem, Alteza. Está se aquecendo para a noite de amanhã?— Eu me exalto quando toco nesse assunto.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Isso tem alguma coisa a ver com seus sobrinhos?— Graças aos céus, eles não têm nenhuma privação. Mas, sim. Viajei por todos os

continentes e vi muitas coisas. E nem tudo foi bom. Imagino como deve ser terrível amar um pequenino como eu amo Hana e Nuri e ser incapaz de dar-lhes um mero pedaço de pão e um copo de leite para se alimentar.

— Sim. É de cortar o coração.— Quando a última criança for alimentada ao menos com um pedaço de pão e um

copo de leite, meu serviço estará terminado. Não antes disso.Rafiq era maravilhoso.Penélope olhou bem dentro dos seus olhos e quase se perdeu. Precisava se manter

atenta. Estava fraquejando.— Bem... E óbvio que você gosta muito de crianças.— Sim. — Ele sorriu. — Adoro.— Sendo assim, por que não tem seus próprios filhos?— Pelo tempo em que está em El Zafir, creio que está ultrapassando os limites.

Decidiu aproveitar minha fadiga para fazer questões indiscretas?Ela também estava cansada. Essa seria a única explicação para tamanha tolice. Fizera

o possível para manter-se afastada dele desde o beijo no deserto, e agora confundira-se toda e metera os pés pelas mãos. Mas a resposta dele era muito" importante.

— Está querendo tirar vantagem de mim? — Rafiq esboçou um sorriso enigmático. — Ora, deixe para lá. Há uma explicação muito simples para isso: não sou casado.

— Não há nada simples em relação a você.— Verdade?— Talvez seus padrões sejam altos demais.— Deve ser isso. Sou um membro da família real de El Zafir. Mas um dia me casarei.— Não do jeito como leva a vida.— E você? Teve muitas experiências?— Não. Deixe-me esclarecer uma coisa, Rafiq. Casamento não deveria ser difícil para

você, que teve numerosas oportunidades. Assim, qual é o problema?— Não há nenhum. Conheci muitas mulheres e fui atraído por algumas. — E deu de

ombros, como se já tivesse respondido.— E daí?— A atração acaba.— Por isso, você as dispensa.— Não é bem assim. Quando a fascinação terminava, eu me afastava, mas de maneira

muito diplomática.— Evitando o casamento?— E salvando a amizade. Dizem que sou o mais charmoso da família. Não sei se isso

tem fundamento, mas tive sucesso em continuar amigo de todas as namoradas que tive. Todavia, sei de meus deveres. Quando estiver pronto, casarei.

Penélope lembrou: tinha de ser a mulher apropriada.Por um momento, esqueceu-se de que Rafiq não mencionara a palavra "amor" nem

uma única vez. Apenas que se dava bem com todas as mulheres que namorara até o interesse arrefecer. Penélope odiou saber disso.

— Tem medo de amar?— Não tenho medo de nada — ele afirmou, com veemência. Penélope percebeu que

fora longe demais. Por isso, ajustou seus novos óculos no nariz e apertou a prancha contra o peito.

— Haverá muitas moças no baile de caridade... — ela tentou parecer casual.— Sim, e pretendo usar meu charme para que elas façam uma boa doação para nossa

causa.— Você é o homem certo para isso. Não é uma sorte que esteja na chefia desse

projeto?Rafiq achou a entonação de Penélope um tanto brusca, mas não entendeu o motivo.

Também não viu razão para que os olhos dela perdessem o brilho, daquela maneira.Mas... desde quando perdia tempo analisando o olhar de sua assistente?Desde o momento em que a vira dormindo em seu escritório, ele mesmo respondeu.Deveria haver uma lógica para isso. Passara a confiar plenamente nela em apenas três

meses de convívio profissional.Penélope se tornara muito eficiente, antecipando todos os seus desejos. Seria apenas

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickparte da verdade dizer que seus afazeres ficaram mais agradáveis, e ele achava que não mais se acostumaria com alguém menos eficiente.

— Algo errado, Penélope?— Não.Ela mentia. Já a conhecia bem e sabia que nunca usaria apenas uma palavra, se podia

usar muito mais e complicar tudo. Era estranho, mas Rafiq podia ler os pensamentos dela como se fossem um livro aberto.

Como dissera várias vezes, conhecera muitas mulheres, mas nenhuma como Penélope Doyle.

— Diga-me o que a está preocupando. — Rafiq cruzou os braços.— Se você insiste... Creio que eu não deveria comparecer ao baile. Sei que está

preocupado, quer que tudo seja impecável, pois a Terra inteira estará nos observando. Entretanto... e se eu derrubar alguma coisa? Ou escorregar no piso de mármore? Ou usar o garfo errado no jantar? O que todos dirão sobre a família real contratar uma secretária incompetente para seu príncipe?

Rafiq suspeitava que havia mais do que isso. Penélope perdera a alegria quando ele dissera que pretendia fazer charme para as mulheres para conseguir fundos para o projeto. Isso a teria incomodado? A idéia de vê-lo dar atenção às outras a desagradava?

"Tomara que seja isso!"— Não tenha medo.— Acha que me dando ordem para não ter medo tudo dará certo?— Sim, acho.— Impressionante! Pode ordenar a meu estômago que se comporte para que eu não

vomite? Ah, você está brincando outra vez! — ela afirmou, vendo-o sorrir.— Garota esperta. Conclusão da conversa, Penélope: exijo sua presença no baile.Rafiq não sabia por que, mas fazia questão de ter Penélope no evento. Não podia

imaginar a festa sem ela.Vestida com um robe, Penélope sentou-se na banqueta da penteadeira. Crystal se

postou atrás dela para mirá-la pelo espelho e estudar o que poderia ser feito. Deveria ter pesquisado, mas isso implicaria muito trabalho, e elas não tinham muito tempo para transformar Penélope em alguém da qual a família real se orgulhasse.

Crystal queria ajudar a amiga, mas não entendia muito de maquiagem e penteados.A noite da festa enfim chegou.Os Hassan estavam exibindo o país aos olhos do mundo. A imprensa mundial estaria

presente, e só de pensar nisso Penélope sentia náuseas. E não seria uma ordem de Rafiq que impediria que se sentisse dessa maneira.

— Vamos começar com seus cabelos.— Eles são longos, lisos e finos, Crystal. Um pesadelo. Não há nada que você possa

fazer. Vou prendê-los em um coque.— Deus meu, como alguém pode ser tão equivocada quanto à aparência?! Nove entre

dez mulheres na face da terra morreriam só para ter cabelos iguais aos seus, que são sensacionais, do tipo em que todo homem gostaria de afundar os dedos.

A esse comentário, Penélope estremeceu. Rafiq concordaria com isso? Bem, ele não era a maioria dos homens. Era um príncipe... e ela, uma plebéia.

Continuava a não entender por que Rafiq chegara tão perto a ponto de beijá-la.Apesar de lutar pela causa das crianças, o príncipe ainda era um conquistador, sempre

acompanhado de belas e sofisticadas jovens. Não podia ser crédula e ingênua outra vez.— Deixe-me ver... vamos prendê-los, mas não em um coque. Quero algo mais

sofisticado.Penélope observava, agradecida a Crystal, que prendia seus cabelos de um modo mais

elaborado, imprimindo-lhe um pouco de altura e fazendo com que seu pescoço parecesse mais longo.

— Nossa! — exclamou Penélope, quando a amiga terminou o trabalho.— Sim, ficou ótimo.— Excelente! Estou até me achando bonita. Bem, acho que é hora de pôr o vestido.— Ainda não. Trouxe minha bolsa de pintura e cosméticos. Portanto, vire-se e feche os

olhos.— Por quê? Irei gritar e pular para trás quando terminar seu serviço?— Não posso pintar suas pálpebras se estiverem abertas. Você vai ficar linda. Pare de

ser tão negativa.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickAinda um pouco desconfiada, Penélope obedeceu, deixando a amiga trabalhar. Rimei,

sombra, hidratante, base, pó e blush.— Quando eu acabar, você deixará os óculos para trás, ainda que sob o risco de

passar por sua melhor amiga sem reconhecê-la.— Estou usando lentes de contato.— Não! Quando isso aconteceu? — Crystal perguntou, enquanto passava sombra nas

pálpebras de Penélope.— Rafiq me recomendou seu médico particular, que me enviou a um oftalmologista.

Depois de um exame, o doutor explicou que houve avanços na tecnologia desde quando eu tentei, pela primeira vez, usar lentes, e que deveria tentar de novo. Foi o que fiz. São caras, mas me acostumei a elas e estou enxergando melhor.

— Maravilha! — Crystal trabalhou mais um pouco, até dizer: — Pronto! Abra os olhos. Só falta o batom para realçar seus lábios, que por sinal são sensuais.

Depois de aplicar o batom, Crystal pediu:— Esfregue os lábios com delicadeza.Crystal tirou o excesso de batom com um lenço de papel, e Penélope se aproximou do

espelho.A mulher que via era... uma beleza! A maquiagem fez com que seus olhos ficassem

mais azuis e um tanto misteriosos. Sua pele estava lisa e irretocável como uma porcelana, e o blush realçara as maçãs de seu rosto.

— Deus! Quem é essa moça? O que fez com Penélope Doyle, Crystal?— Sou ou não sou uma artista? Agora, ao vestido.A roupa estava pendurada na porta do guarda-roupa, coberta por uma capa de

plástico. Crystal removeu-a e segurou o traje para que Penélope o vestisse. Ela virou as costas para a amiga fechar o zíper.

Em seguida, Penélope pegou as sandálias prateadas e as calçou. Então, voltou-se mais uma vez para o espelho, admi-rando-se de todos os ângulos.

— Você está deslumbrante! — Crystal sorria de orelha a orelha.O vestido tinha fios prateados que a faziam brilhar como os lustres do palácio. Não

pôde deixar de pensar na opinião de Rafiq.— Será que a família real gostará? Crystal pôs os óculos para ver melhor.— Traduzirei "família real" para "príncipe Rafiq". Sim, acho que ele ficará encantado.— Ótimo.— Penélope, sei que brinco dizendo que você... digamos... o aprecia, e isso pode

parecer que a estou encorajando. Porém, como estou me sentindo sua fada madrinha, permita-me um aviso: previna-se contra príncipes vestindo smoking. Tenho de lhe dizer que...

— ...garotas comuns como eu não vivem felizes para sempre com sheiks de países exóticos.

— Na realidade, eu ia dizer garotas como nós. E...— E quando o relógio bater meia-noite eu ainda serei apenas a secretária do príncipe.— Sim. Mas lembre também... Penélope ergueu as mãos.— Amanhã ninguém virá bater em minha porta para que eu prove sapatinhos de

cristal como prova de amor eterno.— Isso mesmo. Você leu meus pensamentos.— Não se aflija. — Penélope apontou para seu reflexo. — Não tenho certeza de onde

Penélope Doyle está escondida neste instante. Mas não imporia. Agradeço a madame Gisele a Rafiq por roupas tão lindas. Pela primeira vez na vida, sinto-me bonita. Tudo o que peço é uma noite. Ao amanhecer, tornarei a ser Penélope Doyle, a simples e comum assistente do príncipe Rafiq.

Crystal apertou os ombros da amiga.— Agora, vá, não se atrase.— Além do que, usar sapatos de cristal não me atrai.— Por que não?— Meu objetivo é abrir uma pré-escola. Talvez uma cadeia de escolas. Gostaria de

fazer o máximo pelas crianças. Dar bolsas de estudo e tudo o que for possível.— Isso é muito bom, querida.— Foi para isso que vim a El Zafir. Nos Estados Unidos, demoraria muito para eu

começar a pôr meus planos em execução.— Eu a preveni sobre o príncipe Rafiq, mas não se esqueça de se divertir, também. Só

não caia no erro de apaixonar-se.

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Page 45: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Não farei isso, prometo.— Tudo bem. Minha tarefa aqui está terminada. Aproveite o baile.— Bem, me divertir não será tão fácil. Estarei trabalhando. Tudo está em ordem, mas

preciso coordenar as atividades. Rafiq e eu cuidamos de todos os pormenores junto com Emil.— Nesse caso, acho que poderá relaxar e se divertir um pouco.— Duvido que eu consiga relaxar.Crystal fez o sinal-da-cruz na testa de Penélope.— Vá, minha querida. Seja livre ao menos por uma noite. Deixe seu coração alçar vôo.Penélope deu risada.— Creio que o aroma dos cosméticos subiu a sua cabeça. Ela foi até a cama e apanhou

a bolsinha prateada, que combinava com as sandálias.— Queria que você fosse comigo, Crystal.— Estou cuidando dos meninos, já que Fariq estará na festa. Ele cuida de Hana e Nuri,

agora. As crianças só concordaram em ficar depois que prometi uma surpresa a eles.— Você parece madrinha daqueles dois.— Faço o melhor que posso. Agora, vá e não arruíne a maquiagem, ficando

preocupada. Você parece uma milionária. De súbito, Crystal parou de brincar e afirmou, com seriedade: — Tenho o

pressentimento de que este dia mudará sua vida.Penélope não respondeu. Sentiu um aperto no peito e na garganta. Estava muito

nervosa.Ainda assim, apertou a mão da amiga e saiu da suíte.Não queria mudar nada. Se a fada madrinha estivesse realizando seus desejos, a única

pretensão de Penélope era fazer Rafiq e a família dele sentirem orgulho dela.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO IX

Rafiq ficou extasiado com a visão que surgiu na porta.Penélope entrou no salão de baile, que começava a receber os convidados para o

coquetel.Depois do jantar haveria dança e as doações. Rafiq tinha o pressentimento de que o

evento seria um sucesso. Iam arrecadar uma boa soma, e a ajuda dela fora valiosa.Penélope parecia uma princesa. Estava linda, de tirar o fôlego.O coração de Rafiq disparou, e preparava-se para caminhar até ela quando alguém o

segurou pelo braço.— Alteza?Relutante, Rafiq parou e olhou para a mulher que o impedira de andar.— Boa noite — ele cumprimentou a jovem que lhe sorria.— Belíssima festa...— Fico feliz que esteja gostando.— Não se lembra de mim, não é?Rafiq a estudou com atenção: alta, cabelos e olhos castanhos, lábios carnudos. Uma

moça atraente, mas ela estava certa. Não se recordava dela.— Peço perdão, senhorita...— Amanda Arbrook. Encontramo-nos em Londres, no ano passado.— E um prazer revê-la, srta. Arbrook.Rafiq recordava o nome. O pai dela era um americano muito rico que fizera fortuna

com tecnologia de computadores. Esperavam dele uma boa doação.Ele olhou para o salão e viu Penélope conversando com um homem apenas alguns

anos mais velho que ela. Ficou tenso e ofegante, como se tivesse corrido vários metros.— Por favor, chame-me de Amanda.Rafiq lutava para se concentrar no que a jovem falava.— E você deve me chamar de Rafiq.— Estou muito contente por estar aqui, hoje. Essa é uma causa muito nobre.— Sem dúvida — ele concordou, olhando para Penélope por sobre os ombros de

Amanda.— Papai já deu ao rei um cheque, creio que bem generoso.Rafiq curvou-se um pouco.— Meus agradecimentos a sua família.— É o mínimo que podemos fazer. Espero que durante o baile nós dois possamos nos

conhecer melhor.— Eu também gostaria. Por favor, reserve alguns momentos para mim, mais tarde.

Agora, preciso falar com alguém para garantir que a noite seja um absoluto sucesso. Pode me dar licença?

— É claro.Rafiq fez um galanteio e atravessou o salão em direção aPenélope.— Com quem você estava falando?— Quando?— Agora, Penélope. Eu a vi do outro lado.— Oh... — Ela sorriu, radiante. — Era Peter Michaels, da Inglaterra. Peter trabalha com

telecomunicações e já fez suadoação.— O que ele lhe disse?— Que havia doado uma pequena soma em dinheiro — respondeu, surpresa.— Não falou nada mais?— Conversa banal. O que mais poderia ter dito? Estamos aqui para isso.— Não todos, Penélope. Alguns querem tirar vantagem.— Como assim? Era óbvia a inocência dela em reconhecer um lobo à procura de caça. A idéia de Penélope sendo seduzida o irritou.— Deixe pra lá. Penélope fitou-o e sorriu.— Está muito elegante, Alteza.— Isso quer dizer que aprova meu traje? — Ele a brindou com um lindo sorriso.Por razões que conhecia bem, Rafiq nunca permanecia irritado com nada e com

ninguém quando Penélope estava por perto.

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Page 47: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Esse smoking é muito incrível.— Embora eu não seja um caubói, você me acha bonito?— Pensei que havíamos concordado em deixar para lá essa história de caubói.Penélope ficou séria, mas seus olhos brilhavam de admiração.— Não acredito que queira um elogio meu, com todas essas pessoas aqui reunidas.— Na realidade, quero sim, Penélope. E então?— Sabe que é um homem muito bonito.Era divertido vê-la lutando entre elogiá-lo e querer que ele se comportasse...Rafiq notou a pulsação acelerada na veia do pescoço de Penélope.— Está nervosa?— Não.Os olhos dela eram grandes e exóticos. Foi quando percebeu que Penélope não usava

os óculos enormes e feios.— Está enxergando bem? Talvez precise de ajuda. — Rafiq segurou-lhe o braço.— Por que eu precisaria?— Para que nada a atrapalhe. Não confia em mim?— Não é isso. Estava apenas decidindo para onde ir.— Como assim?— Estou usando lentes de contacto, por isso, enxergo muito bem. Fique tranqüilo.— Isso é ótimo!Rafiq não imaginava nenhuma desculpa para permanecer ao lado de sua secretária,

mas o fato era que não havia outro lugar na Terra onde quisesse estar.Erguendo os ombros, decidiu que não precisava de desculpa nenhuma. Ele era o

príncipe Rafiq Hassan. Podia fazer o que achasse melhor.E nessa noite queria se certificar de que nenhum lobo se aproximaria de seu inocente

carneirinho.— Preciso ir até Emil para garantir que tudo está correndo bem, Rafiq.Nesse momento, a orquestra começou a tocar uma valsa romântica, dando a Rafiq

razão para mantê-la consigo.— É óbvio que Emil tem tudo sob controle. Gostaria de dançar?— Não sei... Não quero monopolizá-lo. Você não tem de esbanjar seu charme com as

mulheres, para conseguir recursos?— Há muito tempo para isso.— É apropriado que eu dance com você?— Não apenas apropriado como necessário.— Sério?— A etiqueta determina que devemos abrir o baile para demonstrar que já é permitido

aos convidados dançar. Afinal de contas, eles serão ainda mais generosos se se divertirem.— Eu não tinha pensado nisso. Longe de mim atrapalhar as doações.— Aqui está uma mulher que me compreende.E Rafiq constatou que era verdade. Penélope era vibrante, divertida e enfrentava

todos os desafios com coragem, bom senso e bom-humor. Além do mais, essa noite ela estava muito bela. Estonteante, para ser mais exato.

Depois de conduzi-la à pista, perto da orquestra, o sheik a tomou nos braços, desejoso de estar com ela em outro local, um que não fosse público. Ela seguia seus passos com facilidade.

E por que não o faria? Parecia um anjo, e anjos flutuam, voam...— Então, o que achou do vestido? Rafiq a olhou e decidiu que não podia ser franco.

Não iria dizer que estava linda, mas que preferia que estivesse sem roupa.— Não posso revelar o que estou pensando.— Por quê? Não gostou?— De jeito nenhum. O vestido está ofuscado pela mulher que o veste.— Você é terrível...— Nada disso. Estou sendo honesto. Você está esplêndida.— Não está brincando comigo?— Não. Eu não mentiria. Mas gostaria que estivesse usando o vestido preto.Penélope errou os passos, e ele a apertou, o braço ao redor de sua cintura, puxando-a

para mais perto.A sensação foi muito boa, e Rafiq se pôs a imaginar como faria para tê-la nos braços

outra vez.

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Page 48: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickPenélope passou a mão pelo ombro dele.— Você disse que aquele vestido é revelador demais. Lembra? Eu lhe falei que seria

um desperdício de dinheiro, visto que nunca o usaria.— Não diga "nunca". — Baixou a cabeça e murmurou: — Ainda a verei vestida com

ele.Rafiq sentiu uma pressão no braço, parou de dançar e se preparou para dizer que não

queria ser interrompido.— Boa noite, sobrinho. Penélope... — Farrah os cumprimentou, parando próxima aos

dois.— Alteza... — Penélope fez uma reverência e se afastou de Rafiq. — A senhora está

deslumbrante. Seu traje é magnífico.A princesa Farrah usava um vestido dourado de mangas longas, fechado até o

pescoço, e parecia excepcional para uma mulher de sua idade.— Lamento interromper sua dança. Rafiq, seu pai e seus irmãos estão esperando,

como também sua irmã. Johara está cansada e não se sente bem. Gostaríamos de formar uma fila para cumprimentar nossos convidados. Aí ela poderá se retirar.

Rafiq se aborreceu, indeciso entre o dever e o desejo.— Estou indo, titia.— Ótimo. Vejo você mais tarde, Penélope?— Creio que sim, Alteza.Rafiq relutava em deixar Penélope, sabendo que sua ausência permitiria que outros

homens se aproximassem dela. A idéia lhe era insuportável.E, pela primeira vez em sua altiva existência, sentiu-se vulnerável.Tudo isso por causa de sua assistente?Penélope lhe indagara certa vez se ele tinha medo de se apaixonar. Teria?Evidente que não. Não temia nada.Mas não gostava do que estava sentindo. Ou da idéia de que outra pessoa pudesse

perturbar sua felicidade. Precisava, de alguma maneira, acabar com essa fraqueza antes que fosse tarde demais.

Penélope observava Rafiq dançar com a jovem americana. Sabia que o pai dela já efetuara uma doação vultosa, mas mesmo assim seu chefe continuava gastando charme com Amanda Arbrook.

Sentiu ciúme, embora soubesse que não tinha esse direito.Tentando desviar seus pensamentos improdutivos, passou a prestar atenção ao

evento.O baile era um estrondoso sucesso, e Penélope mal podia esperar para saber a soma

final dos donativos.A noite chegava ao fim, e ela queria ir para seu quarto, para não ver Rafiq ao lado de

outra mulher. Mas não podia. Era parte de sua função ficar até o fim.Notava que Rafiq sorria para a bela americana, que era muito diferente dela. Decidiu

deixar o salão, para não sofrer mais.Saiu para o jardim. O aroma da terra fértil e dos jasmins penetrou suas narinas. Uma

iluminação sutil ressaltava as palmeiras, os chorões e as flores. Essa parte do palácio parecia mesmo um cenário de contos de fadas. E Penélope sentia-se como Cinderela, embora a visão de Rafiq com outra nos braços a lembrasse que não devia acalentar sonhos absurdos.

Caminhou pela aléia de pedras até uma linda e iluminada fonte. A brisa noturna ajudou a esfriar seu rosto afogueado.

Ouviu passos fortes atrás de si.— Então foi para cá que você fugiu? Ela se virou.— Rafiq!— Esperava por outra pessoa?— Você está negligenciando suas companheiras ricas.— Elas não são minhas companheiras. Você... — Hesitou. — Você precisa de mim. — Mesmo?— É meu dever permanecer a seu lado.— Por quê?— Porque você está incrível, esta noite. Os homens cairão a seus pés. Eu mesmo estou

tendo dificuldade em resistir. E matarei qualquer um que se atreva a tocá-la.— Não acho que isso será necessário.Rafiq estava dizendo que tinha dificuldade em resistir a ela? Que a achava atraente?

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Page 49: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickDeveria acreditar nisso? Não seria sábio.

— Ninguém me tocará. Estou a salvo.— E óbvio. Eu estou aqui. Se algum desavisado pretender segui-la, minha presença o

desencorajará. Assim, evitaremos o escândalo que poderá haver se eu tiver de defender sua honra.

— Entendo. Portanto, ficar comigo é um meio de defender a família e o país. Um dever.

— Isso mesmo.— E por que você acha que eu chamaria atenção de outros homens?— Está querendo elogios? — Ele riu, os dentes muito brancos brilhando ao luar.— Para ser sincera, não posso imaginar que alguém tenha notado minha presença.— Está errada. Esta noite você está diferente. Parece mais confiante, e mostra-se

encantadora como nunca a vi. Minha querida Penélope, é a tentação personificada, fique sabendo. Efervescente como um champanhe precioso.

Penélope tinha de questionar as palavras dele. Sua. única experiência com um homem fora um completo desastre, e seu único beijo com Rafiq provara que nem beijar ela sabia. Como ele podia compará-la a champanhe?

Mas dizer que mataria o homem que a tocasse*era demais.O coração dela batia descompassado. Como resistir a ele?Foi quando seu bom senso prevaleceu. Rafiq estava apenas sendo educado. Sentia-se

responsável pela bobinha do Texas. Desde o incidente no deserto, não mostrara o mínimo interesse romântico por ela, e apaixonar-se pelo príncipe não tinha cabimento.

No entanto, uma pergunta teimava em não deixá-la em paz. E Penélope decidiu indagar:

— Por que mataria um homem por minha causa? Rafiq a encarou, e a intensidade de seu olhar a excitou. Sem dizer nada, o sheik a enlaçou pela cintura e a puxou.

— Se algum tolo fizer isso, irá se arrepender profundamente. Devagar, Rafiq baixou o rosto em busca dos lábios dela. Penélope achou que ia morrer. Precisava fugir, mas queria muito saber como seria beijar Rafiq da maneira certa. Esperou, pronta para segui-lo para onde quer que ele a conduzisse.

Enfim, ele a beijou. Com muita delicadeza. E Penélope teve de se segurar nele quando sentiu sua língua acariciando-lhe a boca. Mas dessa vez Penélope entreabriu os lábios, e ele não hesitou em tomar o que ela lhe oferecia.

Quando ele se afastou, Penélope suspirou, arrependida.Rafiq a fitou com intensidade, segurou-lhe o rosto entre as mãos e beijou-lhe os olhos.

Em seguida, os cantos dos lábios e o pescoço.Penélope nunca experimentara nada semelhante.Nesse momento, sentiu a mão de Rafiq sobre seu seio. Penélope ofegava, ansiosa para

que ele continuasse a acariciá-la.Ainda com os lábios colados nos dela, o príncipe murmurou:— Se outro alguém fizer isso, não viverá para se arrepender.— Oh, céus... Rafiq...— Você é uma jóia rara e preciosa. E serei eu quem lhe ensinará todos os prazeres que

a esperam. Nenhum outro homem a terá.O sheik a abraçava com ternura, como se quisesse protegê-la de espiões e bandidos,

ou qualquer outra coisa que pudesse atingi-la.Penélope queria que aquele momento durasse para sempre. Rafiq pareceu entender,

porque tornou a beijá-la, com mais intensidade.Penélope não conseguia raciocinar. Sentiu as pernas fraquejarem, e cairia se não

estivesse sendo amparada por ele.Entendeu, enfim, por que sempre fugira dos homens: sempre estivera à procura de

Rafiq Hassan. E o encontrara, e estava nos braços dele, sendo beijada e acariciada. Achara o homem de sua vida, e nunca mais iria querer ficar longe dele.Foi quando ouviram vozes, e se afastaram um do outro.Penélope notou que Rafiq respirou fundo e passou os dedos pelos cabelos. Estaria tão

excitado quanto ela?Impossível. Penélope não era o tipo de mulher que excitava alguém como Rafiq.Antes que Penélope pudesse pensar em outra coisa, o príncipe Kamal apareceu. E não

vinha só.Penélope já vira a mulher que o acompanhava antes. Era muito bonita, e o príncipe

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickapontava para o jardim, explicando-lhe alguma coisa. Foi então que os viu. E sorriu.

— Ah, aqui estão os dois desaparecidos! Meu irmão Rafiq e sua assistente, Penélope Doyle. Esta é Alexandrita Matlock, srta. Doyle, uma compatriota sua.

Sorridente, a moça estendeu a mão, primeiro para Rafiq e depois para Penélope.— Alexandrita? - Rafiq perguntou. — Não é o nome de uma pedra semipreciosa?— Como meus pais tiveram senso de humor colocando-me esse nome, me vi na

obrigação de fazer algumas pesquisas. Sim, tem razão, Alteza. Na verdade, é um mineral raro.Kamal sorria para a companheira.— Muito apropriado. Ela é uma mulher rara.Penélope os estudou. Alexandrita não era alta, e seus cabelos castanhos estavam

penteados de modo simples no alto da cabeça. Os olhos castanhos, cor de uísque, eram alegres e brilhantes.

— Não sou, não, Kamal. Apenas não sou suscetível a suas lisonjas. Traduzindo, não cederei â seus pedidos.

— Não são lisonjas. E estou apenas tentando mostrar-lhe os melhores pontos de El Zafir. Tenho muito orgulho de meu país.

— Sinto-me como se estivesse entrando no cinema no meio do filme — Penélope brincou.

— Perdoe-me — disse Kamal. — Nossa tia conheceu a srta. Matlock em sua última viagem aos Estados Unidos. Ali, como gosta de ser chamada, é enfermeira. A princesa Farrah ofereceu-lhe um lugar no hospital que está em construção na cidade.

— Tia Farrah devia ser Ministra dos Recursos Humanos. Tem um talento notável para encontrar pessoas eficientes.

— Nossa tia convidou Ali para o baile desta noite, para nos dar a oportunidade de conhecê-la. Fiz-lhe uma oferta que espero ela não recuse. Gostaria que aceitasse ser a chefe das enfermeiras da ala feminina do hospital.

Ali riu.— A oferta é tentadora. Seria de grande valia em meu currículo. Estou impressionada

com tudo o que vejo em El Zafir.— Nesse caso, deve aceitar minha oferta — afirmou Kamal.— Acho que meu noivo não gostará que eu trabalhe em um lugar tão distante.— Está para se casar? — Kamal perguntou, surpreso.— Sim.— El Zafir perde e um só homem ganha. Mas não acredito que você seja uma mulher

que viria de tão longe se o emprego estivesse fora de questão.— Vossa Alteza pensa que me conhece assim tão bem? Penélope teve vontade de

puxar Ali e avisá-la do perigo que corria.Levou a mão aos lábios e agradeceu aos céus por eles terem chegado para

interromper os beijos e os afagos de Rafiq, antes que as coisas piorassem.— Preciso entrar para verificar o andamento da festa. Vocês me dão licença?— E claro, srta. Doyle, fique à vontade — Kamal respondeu.— Prazer em conhecê-la, Ali.— O prazer foi meu, Penélope.— Muito prazer, srta. Matlock. Vou acompanhar Penélope...— Não, Rafiq! — Penélope quase gritou. Precisava fugir dele, mas não queria parecer

tão ansiosa.Olhou para os três e tentou disfarçar:— Isto é, não quero interromper. Fique, por favor. Se o príncipe Kamal não conseguisse

persuadir Ali a aceitar o emprego, Penélope tinha certeza de que Rafiq conseguiria.Rápido, ela se afastou rumo ao palácio.Rafiq dissera que a protegeria, mas quem a protegeria dele? Fora enganada por um

homem que queria seu dinheiro. Mas Rafiq era muito rico, mais do que ela poderia imaginar. Sendo assim, por que a beijara? O que queria dela?

Por que não conseguia resistir ao sheik? Estaria destinada a apenas atrair homens errados?

Seria verdade o que se falava nos talk-shows: há mulheres que se apaixonam pelos homens errados porque têm medo de ser felizes?

Ao entrar no salão, Penélope já havia constatado que corria perigo de se apaixonar por alguém muito diferente dela e que seria uma completa idiota se caísse na armadilha.

Uma risada histérica rompeu dentro dela quando pensou em Cinderela perdendo o

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Page 51: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwicksapato de cristal ao fugir do palácio. Penélope entrava no palácio e corria o perigo de perder muito mais do que um sapato. E seus sonhos poderiam virar fumaça.

A última vez que se apaixonara, por um rematado ordinário, seu sonho lhe escapara pelos dedos. Jurara nunca mais ser idiota.

Todavia, a intensidade de seus sentimentos por Rafiq a apavorava.Tinha de ser cautelosa, pois algo lhe dizia que essa experiência poderia ser ainda pior.Dessa vez poderia perder tudo: seu coração e sua alma.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO X

Onde estaria Penélope? Puxando seu cavalo pela rédea, Rafiq olhou para o caminho que levava ao castelo. O animal relinchou e ergueu a cabeça, sentindo a aflição do dono.

Penélope já deveria ter chegado.Os cavalos já haviam sido selados, e naquele momento Rafiq esperava por ela do lado

de fora do estábulo. Era uma manhã de primavera, e tinham por hábito cavalgar antes de iniciar o expediente no escritório.

Rafiq achava que era um modo agradável de começar o dia, mas desconfiava de que isso fosse apenas mais um estratagema de seu inconsciente para ficar perto de Penélope. Mas, nessa manhã, sentia-se mais ansioso para começar os exercícios.

Por que seria?Teria alguma coisa a ver com o fato de Penélope ter fugido dele na última vez em que

estiveram juntos? Ela tentara disfarçar, mas na realidade fugira.E as mulheres não costumavam fugir de Rafiq Hassan; pelo contrário, estavam sempre

a persegui-lo.Não via Penélope desde o baile. Não trabalharam no final de semana, e ele se

mantivera ocupado com assuntos familiares e negócios de Estado.Apesar da linda manhã e da brisa fresca que trazia o perfume do Mar da Arábia, Rafiq

estava muito impaciente. Deveria procurá-la?Lembrou-se da expressão assustada de Penélope na noite do baile, antes de escapar

dele. Se seu irmão não o tivesse atrapalhado, teria ido atrás dela. Não a teria deixado ir embora.

Quando, por fim, conseguira se desvencilhar de Kamal, não foi capaz de encontrá-la.E Penélope ocupava, sem cessar, seus pensamentos. Precisava vê-la com urgência, e

essa necessidade era-lhe estranha.Seria amor?Resmungou, e o cavalo ergueu a cabeça, inquieto. Rafiq acalmou o animal:— Não pode ser amor, meu amigo.De súbito, rememorou a questão que Farrah lhe fizera no dia em que Penélope

chegara. Sua tia perguntara se ele já estivera apaixonado.Nunca. Nesse sentido, teria sua educação sido falha?— A emoção nada mais é do que fraqueza, algo que deixa o homem muito vulnerável.

Estou imune a isso — Rafiq afirmou para si mesmo.No entanto, não escava imune ao ciúme. Não queria ver Penélope conversar com outro

homem. Sobretudo depois do beijo que haviam trocado.Sabia que Penélope também o desejava, na mesma intensidade que ele.Não sabia se devia xingar Kamal ou agradecer a ele pela intromissão, que, afinal de

contas, o ajudara a manter a promessa que fizera à tia de não tocar em sua assistente.— Onde ela estará, amigo? — Deu alguns tapinhas no pescoço do animal. — Se

Penélope não chegar logo, iremos procurá-la.No momento seguinte, ela virou a esquina do estábulo, apressada.— Oi! — cumprimentou-o, ofegante.— Você está atrasada.— Desculpe-me. Vim apenas para avisar que não posso cavalgar.— Tudo bem. Podemos deixar para amanhã.— Não. Fique à vontade, Rafiq. Não poderei mais cavalgar com você.Rafiq sentiu um misto de aborrecimento e irritação. Teve o pressentimento de que ela

pensara em não vir nem para avisá-lo. Mas, como era uma pessoa honesta e sincera, acabara por vir. Por isso, o atraso.

— Aprendi a gostar de nossas cavalgadas matinais, Penélope. Há algum motivo para não mais me acompanhar?

Ela foi até seu cavalo, ficando de costas para o sheik. Acariciou o animal, e Rafiq notou que sua mão tremia.

— Logo você terá de volta seu assistente, e eu estarei trabalhando para a princesa Farrah. Não terei tempo. Precisarei aprender regras diferentes e concentrar toda minha atenção nas novas incumbências.

O aborrecimento e a irritação transformaram-se em raiva, e Rafiq se esforçou para controlar a reação. Não costumava ser. rejeitado por uma mulher. E muito menos por aquela, que, segundo seus instintos, também o desejava.

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Page 53: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Mentirosa.Os ombros de Penélope ficaram tensos, como se ele tivesse gritado com ela.— Eu não sabia que você tinha tal opinião sobre mim.— Até este momento, não tinha.— Lamento que não entenda, mas acho que é o melhor... Rafiq agarrou-lhe o braço e a

sentiu trêmula. Ele não a estava apertando, mas Penélope teve de fazer esforço para soltar-se.No entanto, Rafiq não pretendia deixá-la ir antes que lhe desse respostas satisfatórias.

E iria deixar claro que ela não tinha motivo nenhum para temê-lo.— Aonde você vai?— Para o escritório.— Ainda não terminamos de discutir. — Ele segurou-lhe os dois braços.— Não há nada a dizer.— Engano seu. Tenho muito a lhe falar.— De nada adiantará.— Tem medo de mim, Penélope?— Não posso... Por favor, deixe-me ir.— É porque a beijei no jardim? Você não gostou do que sentiu? Tem medo?— Não. Isto é... sim. Nunca senti aquilo antes.— Ah... — Rafiq! sorriu, satisfeito. — Então teme as emoções que lhe são estranhas.— Não é apenas isso. — Penélope olhava em todas as direções, como se procurasse

um lugar para escapar.Por fim, encarou-o, e em seus belos olhos azuis havia uma expressão triste.— E muito complicado. Por favor, deixe-me ir, Rafiq. Era só o que ela queria. Afastar-se

dele.Mas, quanto mais Rafiq olhava para Penélope, mais queria acariciá-la, beijá-la...

possuí-la.Prendeu os cabelos dela atrás das orelhas. Sorrindo, Rafiq baixou a cabeça e beijou-lhe

o ombro, perto do pescoço. Penélope suspirou.Ele não estava errado. Ela também o queria.Nesse caso, por que queria deixá-lo?Rafiq ergueu o rosto e notou que Penélope inclinara a cabeça, deixando livre o acesso

para os beijos dele. Seus olhos estavam fechados, os lábios,.entreabertos, e a respiração acelerada.

E a imagem daquela mulher tão inocente e tão só o comoveu.Antes que pudesse agir, ouviram passos se aproximando. Virando-se, Rafiq deparou

com tia Farrah, vestindo calça comprida, botas até os joelhos e camisa de seda branca. Era óbvio que chegava para cavalgar, e Rafiq viu a expressão de desaprovação no olhar dela. Ele conhecia muito bem aquele olhar.

— O que está acontecendo, Rafiq? Tensa, Penélope deu um passo para trás.— Princesa Farrah!— Como vai, Penélope? — Tornou a falar com o sobrinho: — Vejo que optou por não

seguir meus conselhos.O que podia dizer? Fora pego em flagrante.— Há uma coisa que preciso explicar, tia. Eu tenho...— Estou decepcionada com você, Rafiq.— Mas, Alteza... — Penélope disse. — Não aconteceu nada. Apenas vim explicar ao

sheik que não posso mais cavalgar com ele.— Sim. E vejo que meu sobrinho tentava mudar sua decisão. Eu o avisei, Rafiq. Mas

devia ter adivinhado. Homens adultos são como garotos. Querem o que é proibido.Rafiq endireitou os ombros.— Sou o príncipe Rafiq Hassan e...— E eu sou a mulher que o conhece desde que era bebê.. Acha que não sei o que está

acontecendo aqui?Rafiq lutava para manter-se calmo.— Não tem idéia do que está acontecendo, tia.— Engano seu. Apenas espero que faça a coisa certa. Rafiq notou a expressão

desnorteada de Penélope. Seu único desejo era tomá-la nos braços para confortá-la, para explicar... Explicar o quê? Por quê? — Não pretendo me defender.

Havia coisa mais importante que ele precisava discutir com sua secretária, e não queria sua tia, ou quem quer que fosse, presente.

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Page 54: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickRafiq olhou para as duas mulheres e meneou a cabeça.— Há negócios que precisam de minha atenção. Falarei com você mais tarde,

Penélope.Assim que ele se foi, Penélope fitou a princesa.— Alteza, o que quis dizer com homens que são garotos? Que desejam o que não

podem ter? Isso tem a ver com Rafiq?— Primeiro, deixe-me perguntar-lhe uma coisa: meu sobrinho a beijou?— Não. — Penélope cruzou os dedos nas costas.— Então o que acabei de ver foi uma ilusão? Antes que responda, devo dizer-lhe que

minha visão é excepcional. Estamos no deserto, mas não acredito em alucinações. Entretanto, posso estar errada. Pode acontecer de vez em quando.

Penélope abaixou a cabeça.— Quer dizer que Rafiq não a beijou?— Ele não me beijou, Alteza. Era quase verdade, visto que, dessa vez, ele não chegara

a beijá-la. Não dera tempo. Haviam sido interrompidos.— Diga-me outra coisa, Penélope. Excluindo o que acabou de acontecer, ele alguma

vez a beijou? E não pense em mentir para mim, pois eu saberei. A sinceridade foi a primeira coisa que notei em você, e é uma de suas maiores qualidades. Não mentiria para salvar a própria pele.

— Aqui em El Zafir, qual é a penalidade para a mentira? Decapitação? Ser apedrejada em praça pública?

— Uma vida de infelicidade — Farrah afirmou, suavemente. E isso foi o pior que ela podia ter dito.

— Sim, Alteza, eu o beijei.— Foi você quem iniciou o beijo? Lembre-se, não minta para mim. Tire a mão das

costas e pare de fazer figa, criança.Penélope relaxou. Sua única opção era confessar os fatos.— Está bem. Vossa Alteza venceu. Rafiq me beijou, mas isso foi tudo...— E foi agradável? Gostou de beijá-lo?— Foi maravilhoso. — Penélope suspirou. — Mas eu não entendo. O que é proibido

para ele?— É proibido ao sheik ter você, minha querida.— Eu?! — Pôs a mão sobre o peito, confusa. — Agora é que não compreendo nada... E

em momentos assim que sinto mais falta de minha mãe.A princesa se aproximou e tomou-lhe as mãos.— Não é culpa sua. E espero que pense em mim quando sentir necessidade de falar

com sua mãe.— Sim, Alteza. — Penélope percebeu que nunca confiara em mais ninguém desde a

morte da mãe. — Mas quem proibiu Rafiq de me beijar?— Eu. Antes de vocês irem para Paris. Você é muito inocente, e disse isso a meu

sobrinho. Chegou inocente a nosso país, meu bem, e continuará assim.— Não aconteceu nada entre nós, Alteza. Juro. E lhe asseguro que não acontecerá. Era

por isso que eu estava explicando a Rafiq que não vou mais cavalgar na companhia dele.— Ótimo.Mas Penélope notou que a princesa não parecia muito alegre.— Sei que é uma moça ajuizada, que não será iludida por um rosto bonito e palavras

lisonjeiras. Bem, já disse o que precisava, agora voltarei ao palácio.— Mas a senhora não ia cavalgar?— Perdi a vontade. Almoça comigo?— Será uma honra.— Ótimo. Então, até mais tarde.

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Page 55: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO XI

Penélope sentou-se à luxuosa escrivaninha da princesa Farrah para organizar a agenda do dia. O telefone tocou, e ela atendeu de pronto.

— Escritório da princesa Farrah. Penélope Doyle falando.— Preciso falar com você. E assunto de máxima importância. O coração de Penélope

disparou ao ouvir a voz de Rafiq.— Já teve seu assistente de volta, Alteza. Não trabalho mais para você.Penélope deixara de trabalhar para Rafiq fazia três dias, e odiava admitir que morria

de saudade dele.— Estou ciente de que minha tia se apropriou de seus serviços, mas isso não muda o

fato de que desejo lhe falar.— Estou muito ocupada — ela disse, olhando para a mesa organizada, tão diferente da

dele.— Você está me evitando, Penélope.— Não sabia que queria falar comigo, Alteza.— E tampouco retornou minhas chamadas em seus momentos de folga. Não a tenho

visto em seus passatempos habituais.Rafiq sabia o que ela gostava de fazer quando não estava trabalhando?, indagou-se

Penélope.Ela adorava andar a cavalo mais para ter o prazer da companhia dele do que pelo

exercício. Na realidade, adorava trabalhar com o príncipe. E estar perto dele.Mas a princesa Farrah não mais permitira. O assistente de Rafiq fora dispensando pelo

rei, e os préstimos de Penélope foram requisitados pela princesa. c— Penélope? Você está aí?— Sim.— Quero que jante comigo hoje.— Não posso.— Por quê?Penélope tinha medo. Rafiq tentava seduzi-la. Não por gostar dela, mas pelo desafio. E

ela sabia muito bem que acabaria sucumbindo. Não podia correr esse risco.No entanto, a idéia de deixar de vê-lo lhe era insuportável. Tinha consciência de que

se apaixonara por Rafiq e que não conseguiria esconder isso dele por muito tempo. Não podia arriscar-se a ser demitida. A única coisa pior do que estar apaixonada por um homem proibido era não poder manter a promessa que fizera à mãe.

— Porque não — respondeu, lacônica.— Isso não é resposta. Quero que jante comigo esta noite. Às sete. E, Penélope, pode

considerar isto como um decreto real. Uma ordem. — E desligou.Penélope parou no corredor que levava à suíte de Rafiq com a certeza de que não

deveria estar ali. Ele era o último homem na face da Terra que ela queria ver. E também o único que lhe interessava. Rafiq não necessitaria de um decreto real para conseguir isso. Bastaria sua voz, profunda e sedutora.

Passou a mão pelos cabelos. Usava um vestido de tricô preto, que ia dos tornozelos até o pescoço. O sheik lhe dissera que usasse o outro, mas Penélope lembrara-se do olhar de Rafiq ao vê-la com aquela roupa, em Paris, e achou mais seguro não obedecê-lo.

"Bem, aqui vou eu." Bateu na porta, e, segundos depois, Rafiq atendeu.A primeira impressão era de que ele vestia um smoking, mas logo em seguida

Penélope notou que se tratava de um terno escuro, camisa cinza e gravata no mesmo tom. Um traje comum.

Comum? Penélope quis dar risada. No que se referia a Rafiq, nada era comum. Ele era o homem mais diferente, intrigante e perigoso que conhecera.

— Boa noite, Penélope.Ela não conseguiu responder, ao sentir-se observada dos pés à cabeça.Penélope calçava sapatos pretos de saltos altos. Não conseguira resistir usá-los.Seu coração batia descompassado, e seu rosto estava afogueado. Mesmo assim, não

se desviou dele.— Não está usando o vestido que escolhi, Penélope.— Vossa Alteza mandou que eu pusesse o vestido preto.— Tem razão. Eu deveria ter sido mais específico. Foi um erro meu.Penélope observou nos olhos de Rafiq a mesma expressão que vira em Paris.

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Page 56: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickMemorizara aquele olhar ardente e a mandíbula rígida. E ela nem estava usando aquele vestido preto.

— Entre, por favor. — Ele lhe deu passagem."Deve ser assim que a mosca se sente ao ser atraída pela aranha."— Com licença. — Os saltos dos seus sapatos fizeram barulho no piso de mármore.Nunca estivera ali. Era tudo muito bonito. As paredes, adornadas por quadros, e havia

vários vasos de cristal com flores frescas.Rafiq fechou a porta.— Queria que você usasse o outro vestido.— Achei que eu tivesse liberdade de escolher o que visto.— Sim. Está certa.Nem sempre. Errara ao se apaixonar por ele.— Nem todas as mulheres podem usar um traje preto tão bem quanto você. Está

maravilhosa, embora eu a prefira de cabelos soltos.— Não vi essa anotação no memorando. Ele sorriu.— Da próxima vez não me esquecerei de preveni-la. Não haveria uma próxima vez,

Penélope decidiu.— Não faz mal. Isso é fácil de corrigir. — Rafiq moveu-se para trás dela, que notou um

espelho grande que os refletia.O sheik ergueu os braços e se pôs a tirar os grampos que lhe prendiam os cabelos. Em

seguida, mergulhou o nariz na cabeleira sedosa para aspirar sua fragrância.O calor de seu corpo, o cheiro de sua pele e o poder de sua presença a fizeram

estremecer.— Sua beleza é natural! Um tesouro inestimável. Penélope suspirou e se virou para

encará-lo.— O que quer discutir comigo, Rafiq?— Está com pressa? Vai pegar um avião?Ela não sabia até que ponto ele iria. E isso a apavorava.— Não. Apenas quero saber do que se trata.— Chegaremos lá. Antes, vamos tomar champanhe.— Há algo para celebrar?— Claro! A vida.Penélope pegou a taça que ele lhe oferecia.— Por que não brindamos aos anjos da guarda?— Quero brindar a você — Rafiq respondeu, as pupilas brilhando.Penélope tomou metade da taça de um só gole.— Por que a mim?— Porque é uma mulher muito diferente da maioria.— Obrigada. Eu acho...— E um cumprimento. — O sheik serviu mais champanhe a Penélope. — Você é

inteligente, divertida e fácil de se treinar. Aprende rápido e mostra potencial para trabalhar em qualquer setor. Também é muito sensível.

Aonde ele queria chegar com aquilo?Penélope o observava sob a luz difusa dos candelabros. Seu traje era impecável, seu

rosto, bem barbeado. Era um homem perfeito, e ela, apenas uma mulher medíocre.Experimentou uma leve vertigem. Ingerira apenas uma taça de champanhe, e já lhe

subira à cabeça, pois comera quase nada o dia todo.— Importa-se se eu me sentar?— Perdoe-me. — Rafiq lhe fez uma leve reverência, pôs a bebida de lado e a fez

acomodar-se no sofá.— Ah, que delícia! — Ela suspirou. — Sabe, meus pés estão começando a doer.

Sempre quis saber se sapatos deste tipo machucam mais do que os calçados que uma moça simples usa.

— E então?— Eu via o preço destes e ficava horrorizada.— Sim, eles machucam mais.— Falarei com o desenhista.— Você pode fazer isso? — Penélope arregalou os olhos.— Evidente que sim.Rafiq ajoelhou-se aos pés de Penélope, ergueu-lhe um pé e tirou-lhe o calçado, que

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Page 57: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickcolocou sobre a mesinha de centro.

— O que você está fazendo?— Fazendo com que se sinta melhor.— Estou me sentindo bem.A próxima coisa que ele lhe diria seria sugerir-lhe que vestisse alguma coisa mais

confortável? Nunca passara por aquilo, mas vira no cinema. Se não tomasse cuidado, Rafiq lhe abriria o vestido. Lembrou-se do que sentira quando Rafiq fizera isso, em Paris.

— Olhe, Alteza...— O que foi? Está brava? — Ele franziu o cenho.— Por que pensa isso?— Pelo modo como se dirigiu a mim. Só fala desse medo quando está zangada. Não

entendo o que pode estar desagradando você.— Sim, estou brava. Acha que sou tão ingênua a ponto de me deixar seduzir com

facilidade?— Do que está falando?— Sua tia me contou tudo.— "Tudo" o quê?— Ela explicou que lhe disse para não tocar em mim quando fomos a Paris. Afirmou

que homens são como meninos: sempre querem o que é proibido. E você sabe... eu... eu nunca...

— Nunca ficou com um homem?— Sim. É isso. — Respirou fundo. — Mas sei reconhecer quando um rapaz quer seduzir

uma moça. Faz tudo o que você fez: beija-a, lhe compra roupas e sapatos caros. Toda aquela encenação na noite do baile, ameaçando matar qualquer um que se aproximasse de mim...

Penélope voltou a suspirar. Como gostaria de acreditar que Rafiq se importava com ela! Como gostaria de ter uma família, ter alguém a quem pudesse confiar suas alegrias e suas tristezas!

Mas Rafiq devia estar rindo dela o tempo todo.— Você é tão mau quanto o marginal que fingiu me amar para roubar meu dinheiro,

Rafiq.Era uma coisa horrível de se dizer, mas pareceu funcionar. O sheik se ergueu e a

encarou, muito sério.— Como ousa me insultar, comparando-me àquele marginal?!— Se a carapuça serviu... E não é só isso. Você precisa melhorar sua estratégia. Aonde

quer chegar dizendo que sou incomum, divertida, esperta e capaz de ser treinada?— E eu ainda não mencionei ser boa mãe:— O quê?!Penélope curvou-se para sentar na beirada do sofá com tanta rapidez que sentiu uma

leve tontura. Pôs a taça sobre a mesa sem deixar de encará-lo.— E boa esposa.— Es... esposa?— Desejo que se case comigo, Penélope. Ela estalou os dedos.— Já sei! O rei falou que é hora de você escolher uma pessoa apropriada. Aposto que

foi isso.Ele meneou a cabeça.— Não, não foi o rei. É uma decisão minha.Penélope ficou estupefata. Toda mulher sonha com um pedido de casamento, e

algumas até sonham com o príncipe encantado. Fizera isso quando garota. Mas em seus sonhos e fantasias, o príncipe sempre jurava amor eterno.

Engoliu em seco, para desfazer o nó que se formara em sua garganta.— Desculpe-me. O pedido pareceu-me mais como uma proposta de emprego.— E é. Ser esposa de um sheik, príncipe da Casa de Hassan, é um emprego. É minha

responsabilidade escolher minha companheira com sabedoria.— Sendo assim, perdoe-me se eu não estou agindo de forma adequada. Fui enganada

uma vez por um moço bonito. Você é ainda mais belo que ele. Não vou cair na cilada de novo. Você é engenhoso, Alteza. Propõe casamento a uma garota como eu, que daria qualquer coisa para fazer parte de uma família. Se eu me deixar levar, acabarei em sua cama, e me dispensará na manhã seguinte.

— Se você fosse homem, eu iria chamá-la para ir lá fora brigar — afirmou, com os dentes cerrados.

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Page 58: [Teresa Southwick] Uma Simples Paixão

Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickEm seguida, pôs sua taça sobre o tampo.Penélope sabia que exagerara, mas não pudera se conter. Por dentro, estava

morrendo. Sempre se magoa a quem se ama. Que estupidez!— Se eu fosse homem, não estaríamos tendo esta conversa. — Penélope esperou, com

todas as fibras de seu ser, que ele lhe confessasse seu amor.Lágrimas começaram a rolar por seu rosto.— Admito que fui testado até meu limite pela precaução de tia Farrah. O proibido

seduz, e logo se torna uma obsessão. Mas comecei a ver que você é inteligente, divertida, leal e honesta. Seria uma ótima sócia em meus negócios, como também excelente esposa. Sua resposta apaixonada a meu toque e a meus beijos não deixa dúvida de que, treinada, será excepcional.

Estaria ele falando sobre sexo? Falava tudo isso porque ela se abandonara sem o menor pudor a seus beijos? As lembranças a fizeram enrubescer. Mas tinha que se dominar.

A oferta de Rafiq lhe daria tudo o que sempre quisera. Mas ele não mencionara uma coisa muito importante.

— Você me ama? — indagou, esperançosa.— O que amor tem a ver com isso? — Rafiq fitava a taça vazia. — Por que complicar

um relacionamento perfeito? Seremos muito bons juntos. Case-se comigo.— Era isso o que eu temia.Ele não a amava, nem poderia amá-la.— Ordeno que não chore. — Apontou um dedo para ela.— Acha que consegue tudo o que deseja apenas com uma ordem?Penélope levantou-se e notou que calçava apenas um sapato. Enxugou as lágrimas e

mostrou a ele os dedos molhados.— Está vendo? Não pode mandar em tudo e querer tudo. Você é como o resto dos

mortais. Não tem condições de comprar amor. Amor é dado de graça. Serei bem clara, Alteza. Prefiro comer vidro a ser sua esposa.

Tinha de sair dali o mais rápido possível, mas não pôde resistir a falar mais uma coisa:— Só lamento que agora nunca poderei abrir a pré-escola em memória de minha mãe.Penélope deu-lhe as costas e, usando apenas um sapato, tentou caminhar com

dignidade até a porta. Abriu-a e saiu para o corredor. Então, tirou o outro calçado e correu o mais que pôde.

Ainda teve esperança de que Rafiq fosse atrás dela. Mas isso não aconteceu.Melhor assim. Queria estar sozinha quando começasse a chorar de verdade.Na manhã seguinte à desastrosa conversa com sua assistente, ou melhor, ex-

assistente, Rafiq levantou-se quando a princesa Farrah entrou em seu escritório.— O que você fez a Penélope?— Não estou entendendo. Por que acha que fiz alguma coisa a ela?Rafiq passara a noite insone, tentando entender o que teria dado errado. O incidente e

as últimas palavras de Penélope impuseram-lhe um profundo sentimento de vazio que ele nunca experimentara antes, e que detestava.

Céus! Por que ela lhe perguntara se a amava?— É claro que fez alguma coisa!— Se há alguém que não tem culpa de nada, sou eu, tia.— Duvido muito.— Penélope recusou meu pedido de casamento.— Isso é maravilhoso! — A raiva no olhar de Farrah se atenuou, e ela sorriu.Rafiq a encarou, sem compreendê-la.— Titia, ela me insultou e você acha isso maravilhoso? Farrah inclinou de leve a

cabeça e olhou para o sobrinho com atenção.— Já lhe ocorreu que você ainda não se casou por estar esperando se apaixonar

primeiro?— Não, nunca.Até conhecer Penélope Doyle, sua vida fora serena, embora um pouco sem graça.— Deixe-me dizer o que estou vendo, Rafiq. Você é uma pessoa que gosta de estar em

evidência. Mesmo quando criança, não suportava ser posto de lado. Quer sempre o controle da situação e acha que está sempre certo.

— E estou.Ignorando-o, Farrah continuou:— Toda mulher que atraía sua atenção era assim, também. Em um ambiente tão

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickestéril, o amor não pode surgir, e muito menos crescer. Seus relacionamentos eram fadados ao fracasso. Por isso tive de intervir.

— Não estou entendendo nada.— Eu sabia que Penélope seria a mulher perfeita para você.— Mas... do que está falando?— Quando a conheci, em Nova York, a vaga que ela pleiteava já havia sido preenchida.

— Farrah caminhou até a sala de visitas e sentou-se no sofá, cruzando as pernas.— Disso eu já sei.Permanecia na mesa de centro o sapato que Penélope usara na véspera.— Também achei que ela seria uma brisa fresca neste palácio. Quanto mais

conversava com ela, mais eu a achava perfeita para você. Alguém meiga para suavizar sua conduta, e ao mesmo tempo forte o suficiente para não se deixar dominar.

Rafiq começou a sentir o cheiro da conspiração.— Meu pai sabe disso?— Meu irmão e eu estamos em completa harmonia.— Então o rei se apropriou de meu secretário para dar lugar a Penélope?— Sim. Uma brilhante estratégia, se quer a minha opinião.— Achei que casamentos arranjados fossem coisa do passado. Estou enganado? Estão

vivos e em franco progresso em El Zafir?— Se meus sobrinhos não fossem tão teimosos e obtusos, isso não seria necessário.— Quer dizer que Fariq e Kamal podem esperar...— ...alguma assistência. Creio que a situação entre seu irmão Fariq e a babá está

progredindo bem. E se você abrir a boca para contar isso a ele, irá se arrepender.Rafiq gostaria de saber como sua tia poderia cumprir a ameaça, mas sabia que ela não

era de fazer ameaças vãs.— Não direi nada, fique tranqüila.— Ótimo. Agora tenho de persuadir a enfermeira americana, Ali Matlock, a aceitar o

lugar no hospital que Kamal ofereceu a ela.— Está tudo muito bem, tia. Mas eu propus casamento a Penélope, e ela não aceitou.

Acho que não mereço a culpa.— Acabei de falar com Penélope. A pobre criança não pára de chorar.— Alguém a magoou? Diga-me quem foi e ele se arrependerá.— Você. E, por seu aspecto, o preço foi alto. Você precisa dormir um pouco, Rafiq. Sua

aparência é terrível... O que disse a ela?— Que é uma moça sensível, inteligente, alegre, leal, honesta e capaz de ser treinada.

E que daria uma esposa e mãe excepcionais.— E quanto a amor?— Por que vocês, mulheres, são obcecadas por emoções nebulosas? Não vejo o que

isso tem a ver com amor!Farrah fez um esgar.— Por isso Penélope me pediu para rescindir seu contrato de trabalho para que possa

voltar aos Estados Unidos.Rafiq sentiu um aperto no peito.— Ela está indo embora?— Foi o que me disse.Rafiq passou a mão na nuca e se virou para olhar a tia.— Sobrinho? Você está pálido! O que houve?— Nada...Farrah se ergueu e se aproximou do sheik.— O que está sentindo?— Não sei dizer. Uma dor que nunca tive antes. Como se houvesse um vácuo dentro

de mim. Como se esse espaço vazio fosse me engolir. O que será isso?— Você é o príncipe dos sapos. — Farrah observava o sobrinho com piedade.— Não gosto de insultos, titia, mesmo que sejam para ajudar.— Desculpe-me, mas não pude resistir. O que posso fazer por você?— Explique-me o que são essas sensações.— Bem... Acho que isso é amor.— Não acredito no que diz.— Era isso o que eu temia. Sei que sempre acreditou que as mulheres são todas

iguais, mas isso não é verdade, Rafiq. O amor escolheu uma mulher para você, uma que é tão

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwickdiferente que não consegue esquecer.

— E foi você quem provocou isso.Tia Farrah trouxera Penélope, e agora apenas a idéia de que ela poderia ir embora

fazia seu estômago doer.— Sim, eu e meu irmão.— Sendo assim, me explique por que informou Penélope de que eu fora proibido de

tocá-la.— Ela perguntou.— Mas não teria feito isso se não tivesse mencionado o assunto, tia.Farrah deu de ombros.— Tive de intervir. Você estava chegando a lugar nenhum.— Ao que tudo indica, estou sentenciado a chegar a lugar nenhum para sempre. —

Apoiou as mãos nos quadris.Rafiq fizera o possível para não admitir isso, mas sua tia o fizera ver o que não queria.

Amar Penélope era a única explicação para a dor profunda em seu coração.Mas o que poderia fazer a respeito?— Penélope perguntou se eu a amava, titia.— E o que você respondeu? Dessa vez foi Rafiq quem suspirou.— Disse-lhe que amor só complicaria nosso relacionamento perfeito. E que poderíamos

ser bons juntos. Em seguida, ordenei-lhe que se casasse comigo.— Oh, céus... O que ela respondeu?— Que prefere comer vidro a ser minha esposa. Farrah estudou o sobrinho sem nada

dizer, por instantes.— Pobre Rafiq...— Não preciso de sua compaixão, tia, mas sim de sua ajuda.Foi você que começou isso. O que devo fazer? Além disso, Penélope me acusou de ser

pior do que o cafajeste que a roubou.— Ah, querido! Seu crime foi o de não reconhecer o amor. Nossa Penélope sabe o que

é a doçura desse sentimento. Foi separada cedo demais da mãe, mas apaixonou-se, por isso o reconhece, mas teme aceitá-lo e tornar a perdê-lo. E vocês formam um casal tão belo!

— Não está ajudando, tia Farrah.— Tem de ir atrás dela e impedir que parta.— De que modo?— Diga-lhe o que sente, bobinho. Você sabe o que está sentindo.Farrah se aproximou do sobrinho, segurou-lhe o rosto entre as mãos e o beijou.— Boa sorte, amorzinho.Quando ela saiu, Rafiq olhou para o sapato que Penélope deixara para trás.Sua tia dissera que eles formavam um belo casal. Sim, ele precisava da sua Penélope.

Ela era alimento para sua alma, e necessitava dela tanto quanto de ar para respirar.— Você e eu temos algo em comum. — Ele deslizava o dedo no calçado. — Somos

inúteis sem nosso par.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa SouthwickCAPÍTULO XII

Penélope tirou os óculos e friccionou os olhos para tentar afastar o cansaço. Não dormira a noite toda.

Partiria de El Zafir do mesmo modo como chegara: sem nada.Rafiq lhe propusera um casamento sem nenhum envolvimento emocional. Havia

alguma coisa diferente nas duas humilhações por que passara na vida: a primeira afetara sua dignidade; a segunda magoara seu coração.

Sentira que seu sonho de montar uma pré-escola com o nome de sua mãe ia dar certo. Depois, começara a ter esperanças de estar vivendo um conto de fadas. Ambas as fantasias desapareceram à meia-noite, quando ela se conscientizou de que Rafiq não a amava e nunca a amaria.

Do terraço de sua suíte, olhava para a cidade. Aprendera a amar El Zafir, seu povo e os membros da família real. Dizer adeus à princesa Farrah fora mais difícil do que imaginara.

E ainda havia Rafiq.Seria difícil partir, mas não podia mais permanecer ali.Suspirando, lembrou-se de que jamais concretizaria seu sonho. No entanto, não podia

deixar que um erro pessoal a mantivesse longe de seu maior objetivo.Uma batida na porta a despertou das tristes divagações. Devia ser o empregado para

buscar sua bagagem e levá-la até o carro. Ao atender, porém, deparou com Rafiq.— Penélope...Ele tinha um aspecto terrível, como se não dormisse por dias. Sua calça estava

amarrotada, como também a camisa branca, cujas mangas enrolara até os cotovelos. Penélope sempre o vira vestido de forma impecável, perfumado e bem barbeado. O que teria acontecido?

— Alteza!— Desde quando me trata com formalidade? — Rafiq entrou na sala da suíte.— É melhor assim.— Acha mesmo? Feche a porta.Ele parou diante dela, com um braço às costas.— É uma ordem?— Se for essa a única maneira de fazer com que me obedeça... Penélope fechou a

porta.— O que você quer? Acho que não temos mais nada a dizer. Rafiq tirou o braço das

costas e lhe entregou o sapato que ela deixara em sua suíte.— Esqueceu isto em meus aposentos.— Obrigada. Mas não era necessário trazê-lo. O outro pé está no armário. .Rafiq sentou-se.— O que faz par com este?— Sim. Junto com as roupas que você comprou. Eu adoraria ver seu assistente usar

alguma delas. Ele na certa...— Tudo ficaria muito apertado nele. Diga-me, ia embora sem se despedir?— Dissemos tudo ontem, Rafiq.— Acho que não.— O que mais há para ser dito?— Comprei em seu nome o terreno que você queria para a pré-escola.— Por que eu deveria acreditar nisso?Ele tirou um envelope do bolso do paletó e o entregou a ela.— Os documentos estão aqui, incluindo nomes e telefones dos agentes que

negociaram a transação com o banco.Com dedos trêmulos, Penélope pegou o envelope e examinou os documentos.— Está me dando a pré-escola?— E tão importante para você...— Mas... por quê? Depois de tudo que lhe falei...— Minha tia a adora, Penélope. E me culpa por sua partida precipitada, como também

de privá-la de uma assistente muito capaz.Penélope se virou para esconder as lágrimas.— Terei muita saudade da princesa Farrah.— Sentirá saudade de mais alguém? "De você...", ela gostaria de dizer. Mas não podia

revelar isso e manter sua dignidade.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Arrependo-me de partir antes de meu contrato ter terminado, mas a princesa

entendeu e afirmou que não me forçaria a ficar, se estou infeliz.— E está? — Como não obteve resposta, ele continuou: — Desejo ver seu rosto. Vire-

se. Olhe para mim, Penélope.— Não. Preciso ir para casa...— Esta é a sua casa.— Não... não é.Rafiq se aproximou, segurou-lhe os braços, e Penélope teve vontade de se apoiar

naquele corpo forte. Em vez disso, deixou que o sheik a virasse para poder encará-la.— Dizem que o lar da gente é onde nosso coração está. Quero ouvir de seus lábios que

seu coração não está aqui. Sei que não mentirá. Conheço-a muito bem. Diga-me que não dei-xará seu coração para trás... comigo... quando retornar aos Estados Unidos.

Penélope piscou, tentando disfarçar o pranto, que a impedia de enxergá-lo.— Tenho boas recordações do período que passei em El Zafir.— Não quero que você se vá.— Ficar aqui está fora de questão.— Isso é um absurdo! É claro que pode ficar. Eu lhe pedi para ser minha esposa.— Não posso. Nunca imaginei que pudesse viver um conto de fadas. Agora sei que se

eu ficar por menos será um erro.— Não pode ir, Penélope. Não posso ficar sem você.— Isso é ridículo. Você tem muito dinheiro. Pode comprar ò que quiser. — Tudo o que tenho é uma profunda dor aqui. — Rafiq apoiou a mão fechada sobre o

peito. — É onde meu coração costumava estar.— Como?— Pois é. Ele foi roubado.Todos os sentidos de Penélope ficaram em alerta.— Por quem?— Por você. — O sheik a enlaçou. — Ele só fica comigo quando a tenho em meus

braços.A cabeça de Penélope rodava. Não conseguiria se manter em pé sozinha.— Por favor, não brinque comigo, Rafiq.— Nunca. Está certa, tenho dinheiro para comprar tudo que eu desejar. Mas há algo

que deve entender, Penélope: desejo você. Há apenas uma Penélope Doyle, e isso a torna inestimável. Minha jóia do deserto.

— Não sei o que dizer...— É simples: diga que ficará e me livre desta dor terrível.— Desculpe-me causar-lhe desconforto, Rafiq, mas não ouvi nada que me faça mudar

de idéia e ficar.— Ah, você quer palavras ternas... Lembra-se de quando me perguntou se havia

alguma coisa em que eu não fosse bom?— Sim.— Descobri que não sou bom em questões do amor.— Quer dizer que admite que o amor é importante, e não apenas uma complicação

inventada pelas mulheres para aborrecer os homens?— Admitirei apenas que te amo.— Rafiq...Penélope tentou dar um passo para trás, para vê-lo melhor, mas ele a segurou com

firmeza.— Ainda não disse o que sente por mim, mocinha.— Você deve saber.— Não. Você apenas falou que prefere comer vidro a ser minha esposa. Sou novo

nesse negócio. Acho que gostaria de ouvir palavras ternas, também. — Segurou-lhe o rosto entre as mãos. — Diga que me ama, Penélope. Creio que vejo isso em seus olhos. Diga que estou certo. Preciso ouvir.

— Eu te amo, Rafiq. Acho que desde o primeiro momento em que o vi, antes de saber que era um príncipe.

Rafiq cerrou as pálpebras por um instante e a estreitou mais em seus braços.— Estou muito feliz. Então... você fica?— Como sua assistente? Rafiq gargalhou.— Creio que já dissemos isso antes. E não gostei da resposta.

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Julia 1267 – Uma simples paixão – Teresa Southwick— Tente de novo. Penso que esta noite há magia no ar. Rafiq se afastou e pegou-a

pela mão. Apanhou também o sapato que estava sobre a mesinha.— Venha comigo. O sheik a conduziu ao sofá e a fez sentar-se. Em seguida, ficou sobre

um joelho e ergueu-lhe o tornozelo. Tirou-lhe o sapato marrom e disse:— Penélope Doyle, quer se casar comigo?— Também sou nova nisso, mas nos livros e filmes, quando alguém propõe

casamento, o costume é se ofertar um anel.— Nos contos de fadas, a donzela em cujo pé o sapato serve se casará com o príncipe.

— E calçou o sapato no pé dela. — Parece perfeito!— É evidente, bobinho...— Não quero me arriscar. O resultado é muito importante para mim. Não faça

suspense. Eu te amo. Você me daria a honra de ser minha esposa?Penélope escorregou do sofá e se ajoelhou diante dele.— Eu ficaria honrada em ser sua esposa, Alteza. Mas tenho um pedido.— Entendo que queira começar sua pré-escola. Se preferir, podemos ter nossa lua-de-

mel nos Estados Unidos, e eu a ajudarei. E, quando voltarmos a El Zafir, pedirei ao rei que a faça Ministra da Educação Infantil deste país. Também aqui as mulheres trabalham e precisam que cuidem de seus filhos.

O coração de Penélope estava tão repleto de amor que ela achou que ia transbordar de felicidade. Aquilo era muito mais do que ousara um dia sonhar.

— Aceito. Mas não era isso o que eu ia pedir. — O que é, então?— Quero que me beije, pelo menos uma vez por dia, do modo como me beijou no

jardim, quando do baile de caridade. Você me fez acreditar em contos de fada. Quero ter essa incrível sensação pelo resto de nossas vidas.

— Que felicidade a minha não poder negar-lhe nada! — Rafiq sorriu, cheio de ternura e amor. — Será meu prazer realizar cada desejo seu para a eternidade.

E Rafiq Hassan, príncipe de El Zafir, Ministro do Interior e Assuntos Estrangeiros, abraçou Penélope, que logo seria sua noiva, e a beijou com paixão, selando a promessa de serem felizes para sempre.

* * * *

TERESA SOUTHWICK vive no sudeste da Califórnia com seu marido e herói, que está mais do que feliz de partilhar com ela os pontos de vista masculinos. Fã ávida de romances, ela está deliciada em viver seu sonho de escrever para Silhouette Books.

Teresa também escreve romances históricos sob o mesmo nome.

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