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Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno Jean Henrique Costa

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TEORIA CRÍTICA: ENSAIOS SOBRE

THEODOR W. ADORNO

Critical Theory: Selected Essays on Theodor W. Adorno

Jean Henrique Costa

Page 7: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

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Para todos que ainda não sucumbiram perante nossasociedade do conformismo.

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Riram do corpo do aleijadoque em vão tentou se erguer.

Riram ainda do improdutivo cegoque nada pôde ver.

Caçoaram da prostitutaque com todos se deitava.

Caçoaram ainda do afeminadoque diferente se alegrava.

Achincalharam do despossuídoque nada tinha na barriga.

Achincalharam ainda do mulatoque, tolo, com ouro se embranquecia.

Riem hoje do vagabundoque nas calçadas perambula.

Riem, ainda, do artista de ruaque com sua arte pouco reluz.

Parodiam a carênciaque peca pela falta.

Parodiam também a farturaque de abundosa se estafa.

Com a astúcia de Ulisses, continuam a rirmesmo que com isso nada haja para auferir.

E com o encanto da sereia, pouco podem resistir.

Riem de tudo!Para além do que não há no mundo.

Riem mesmo do lutoque de sorumbático apenas emudece.

Zombaram de todos os presentesque parados apenas riam.

Zombaram, principalmente, porque a platéiaparada e encantada, nada entendia.

Zombaram até do triste humorque, feliz por ser lembrado, gracejou.

Mas zombaram mais ainda do bom humorque, de tanto moralismo, até lamentou.

Zombaram... Zombam...

Zombarão...

De fato, nada disso é engraçado. Exceto, talvez, o infortúnio de quem ri.

Humor, Triste Humor

Jean Henrique Costa

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s indivíduos devemestimular o pesquisador a averiguar quem os condena a

Theodor W. Adorno e Max Horkheimer (1978, p. 128) Temas Básicos da Sociologia

essas coisas funcionam naturalmente não significa umacontraprova desse efeito, mas apenas que ele funciona demodo imperceptível, muito mais sutil e refinado, sendo

Theodor W. Adorno (2006a, p. 88) Educação e Emancipação

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PREFÁCIO

Desde as primeiras traduções da obra Dialética do Esclarecimento, de Theodor

Adorno e Max Horkheimer, a leitura, estudo e usos dos principais autores da

tornou lugar comum na Academia brasileira.

O que o leitor é brindado aqui não traz, aparentemente, novidade alguma na

imensa gama de comentadores e estudiosos da Teoria Crítica. Isso, só na aparência.

Jean Henrique Costa conseguiu reunir neste livro, três leituras significativas sobre a

inserção do pensamento de Theodor Adorno e as possibilidades analíticas de aspectos

fenomenológicos da cultura brasileira, notadamente a sua indústria cultural e sua

indústria do lazer.

No primeiro capítulo, o autor nos remete a uma discussão da obra seminal

adorniana, escrita em cooperação com Horkheimer (e supracitada), Dialética do

Esclarecimento. O tratamento dado por Costa neste ensaio nos reporta ao avanço dos

processos de racionalização e secularização e sua relação com as formas pelas quais o

capitalismo reproduz a cultura de forma alienante e fetichizante. Costa nos mostra

indústria cultural no atual estágio de acumulação capitalista não é uma produção de

mas exi

pleno III Reich. O texto debatido é uma resposta ao filósofo Walter Benjamin, onde

este visualizava as possibilidades abertas trazidas pelas novas tecnologias de mídia e

certas consequências positivas permitidas pela dessacralização da obra de arte.

Theodor Adorno, em oposição, apontava o seu lado negativo: o consumo fetichizado,

passivo e regressivo imperante nessa mesma arte e mídias. Remando contra a maré

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do pessimismo, que mesmo nos nossos dias, com a derrocada do Socialismo Real e

dos avanços neoliberais, impelem a um conformismo agudo, Costa mostra que

Adorno defendia um constante estado de crítica, um momento de possibilidade de

autonomia tanto na produção da cultura como na educação em si. Se vivenciamos

hoje, cada vez mais, devido às novas tecnologias e às formas fetichizadas de

, para o filósofo a

educação verdadeira é o oposto a tudo isso. A educação é aquela que difere desta

emancipação ecoa na sua crítica à indústria cultural em todas as suas formas.

No terceiro capítulo (produzido em co-autoria) folheamos uma análise cara ao

autor que transita pelos estudos do lazer desde antanho: Notas sobre o tempo livre.

Aqui, Costa é mais que inovador na análise, ele também inova na temática, ao trazer

as contribuiç

-nos no consumo, nos remetendo a mais

trabalho, fomentando mais ideologia, mais consumismo e mais práticas não-

O leitor tem em mãos três importantes vertentes e caminhos do pensamento

adorniano. Quebra-se nesta obra (opus), mais do que nunca, a visão de que Adorno é

um pensador pessimista ou que não pensou as mídias eletrônicas em sua

potencialidade. Costa nos brinda, em prosa elegante e sem retórica vazia, com a

percepção de um Adorno preocupado com o grande tema de sua vida: é possível,

dentro do desenvolvimento do capitalismo, com suas estruturas ideológicas e de

reprodução cultural, conseguir romper a dominação? Resumindo: a emancipação é

possível? Como cientistas sociais, a resposta é difícil já que não cabe ao cientista tal

resposta, como nos apontou Max Weber. Mas a grandeza de Theodor Adorno é

mostrar que, se ao menos não sejamos instrumentos de ação, possibilitemos a crítica

mais próxima do real possível.

Prof. Dr. Thadeu de Sousa Brandão

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO............................................................................................. 08

CAPÍTULO 1 A ATUALIDADE DA DISCUSSÃO SOBRE A INDÚSTRIACULTURAL ........................................................................................................ 10

CAPÍTULO 2 REVISITANDO O DEBATE SOBRE O FETICHISMO NAMÚSICA E A REGRESSÃO DA AUDIÇÃO ..................................................... 31

CAPÍTULO 3 NOTAS SOBRE O TEMPO LIVRE......................................... 50

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APRESENTAÇÃO

Os três ensaios aqui publicados não são inéditos. Embora tenham recebido

novo tratamento textual e, pontualmente, alguns acréscimos, ainda assim não

expressam nenhuma nova reflexão sobre a obra de Theodor W. Adorno.

Pessoalmente este livro nasceu do intuito de sistematização, em livro, de três

textos já publicados, respectivamente, nos anos de 2012, 2013 e 2014, nas revistas

Trilhas Filosóficas (UERN), Trans/Form/Ação (UNESP) e Turydes (EUMED). A

motivação básica deste exercício de novo tratamento de textos não inéditos reside na

permanente necessidade de aprimoramento textual, bem como, na necessidade de

tornar mais acessível um autor tão denso como Theodor W. Adorno. A aventura na

dialética adorniana é sempre um desafio na própria condição do repensar o sujeito e a

produção do conhecimento sob a égide da semiformação. Portanto, toda tentativa de

Por conseguinte, este pequeno livro Teoria Crítica:

Ensaios sobre Theodor W. Adorno busca reforçar o conjunto de publicações sobre

Adorno no Brasil, objetivando a contínua reafirmação de sua teoria crítica.

O livro está dividido em três capítulos.

O capítulo 1 discute a atualidade da discussão sobre a indústria cultural, debate

seminal produzido juntamente com Max Horkheimer na Dialética do Esclarecimento

em 1947.

O segundo capítulo debate

a Regr , uma amostra do que seria posto uma década

depois.

Por fim, no capítulo 3, na fecunda colaboração de Marcela Amália Pereira

Cabrita e Tássio Ricelly Pinto de Farias, analisa-se a problemática do tempo livre,

problema que Adorno especificamente se debruçou no texto homônimo publicado em

1969.

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Diante dos três ensaios aqui esboçados, espero que o leitor tenha em mãos um

agradável e frutífero encontro com Theodor Adorno. O rigor adorniano exige e

Jean Henrique Costa

Mossoró, RN, 08 de Junho de 2015

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CAPÍTULO 1

A ATUALIDADE DA DISCUSSÃO SOBRE A INDÚSTRIA CULTURAL1

A expressão Indústria Cultural (Kulturindustrie) foi cunhada pela primeira vez

em 1947, por Theodor W. Adorno e Max Horkheimer, nos fragmentos filosóficos

reunidos sob o título de Dialética do Esclarecimento, termo que viria contrapor o

conceito cultura de massa, por tratar de um fenômeno distinto quanto a sua natureza.

Preferiram, então, "[...] usar a expressão 'indústria cultural', para evitar a confusão

com uma arte que surgisse espontaneamente no meio popular, que é algo bastante

diferente" (FREITAS, 2008, p. 17). Na apreciação de Wolfgang Leo Maar (2003), o

termo "cultura de massas" parece indicar uma cultura solicitada pelas próprias

massas, fora do alcance da totalização. Contrariamente, o termo "indústria cultural"

ressalta o mecanismo pelo qual a sociedade como um todo é construída, sob o escudo

do capital, reforçando as condições vigentes. Segundo Gabriel Cohn, trata-se de um

conceito elaborado como resposta direta ao conceito de cultura de massa. Ambos

compartilham a referência à cultura. "Mas é significativo que, enquanto na expressão

'cultura de massa' ela aparece como nome, na sua contrapartida crítica ela esteja na

condição de predicado" (COHN, 1998, p. 18).

Em 1962, Adorno (1971, p. 287) chega a afirmar que, ao que tudo indica, "[...]

o termo indústria cultural foi empregado pela primeira vez no livro Dialektik der

Aufklãrung, que Horkheimer e eu publicamos em 1947, em Amsterdã". Tal oposição

conceitual se deveu ao fato da cultura de massa remontar a uma cultura

espontaneamente surgida da própria massa, da forma contemporânea chamada de arte

popular. Todavia, algo efetivamente distinto ocorre com a indústria cultural.

O que importa destacar é que dessa arte popular a indústria cultural se

distingue radicalmente: enquanto a cultura popular teria um caráter mais espontâneo e

1 Originalmente publicado na revista Trans/Form/Ação, Marília, UNESP, v. 36, n. 2, p. 135-154, Maio/Ago., 2013.

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nasceria internamente, numa dada comunidade, a indústria cultural constitui uma

manifestação maquinal produzida exteriormente (sob a égide do capital).

A indústria cultural é fruto da oportunidade de expansão da lógica do

capitalismo sobre a cultura. Não somente esse avanço progressivamente acontece no

domínio do cultural, mas também, cada vez mais, nas esferas da biologia (corpo), da

natureza, das relações humanas, do conhecimento etc. Como enfatizou Ernest

Mandel, existe no capitalismo tardio uma tendência à industrialização das atividades

superestruturais, e muitas dessas atividades já se organizam hoje em termos

industriais, produzidas para o mercado e para a maximização do lucro: "[...] a pop-

arte, os filmes feitos para a televisão e a indústria do disco são fenômenos típicos da

cultura capitalista tardia" (MANDEL, 1985, p. 352). Daí que, para Hullot-Kentor

(2008, p. 21), o conceito de indústria cultural em Adorno "[...] nos leva a crer que foi

para ele um achado preciso, resultado de uma auscultação minuciosa das tendências

históricas, mais do que um neologismo historicamente oportuno".

Há, contudo, quem ateste hoje em dia as limitações do conceito e,

inegavelmente, a realidade atual é bem distinta daquela vigente no período vital de

Theodor W. Adorno e Max Horkheimer. Todavia, suas limitações não invalidam,

nem o fenômeno, nem tampouco o método crítico. A indústria cultural está aí! Todos

os dias seus produtos, dentre best-sellers, games, filmes e músicas, invadem o

cotidiano de bilhões de pessoas. O que dizer, então, dessas cifras?

Sumariando, com Costa (2001, p. 110), a heteronomia cultural; a

transformação da arte em mercadoria; a hierarquização das qualidades; a

incorporação de novos suportes de comunicação pelos setores que já detinham os

meios de reprodução simbólica; o caráter de montagem dos produtos; a capacidade

destes em prescrever a reação dos receptores; a reprodução técnica comprometendo a

autenticidade da arte; o consumidor passivo; a falsa identidade entre o universal e o

particular; a técnica como ideologia; o "novo" como manifesto do imediato; e a

fraqueza do "eu" apontam para a continuidade da administração da cultura. Dessa

forma, o conceito, além de atual, faz-se empiricamente demonstrável. Segundo

afirma Crochík (2008, p. 304), "[...] certamente Adorno escreveu em outro tempo e

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em outros lugares, mas a regressão individual como fruto do avanço da sociedade da

administração prossegue". O capitalismo continua a liquidar, não com o trabalho, mas

com o trabalhador, e, para além disso, a criação de necessidades supérfluas vem se

ampliando.

Logo, parte importante das limitações impostas ao debate deriva mais do

fundamento não-dialético dos que apontam sua restrição do que da própria energia da

teorização. Os críticos - precariamente críticos! - suprimem a dialética em Adorno e,

ingenuamente, acreditam estar o autor superado.

Uma vez que ela [a crítica cultural] retira o espírito da dialética que este mantémcom as condições materiais, passa a concebê-lo unívoca e linearmente como umprincípio de fatalidade, sonegando assim os momentos de resistência do espírito. (ADORNO, 2001, p. 13).

Certamente o grande entrave do conceito de indústria cultural, no âmbito das

ciências sociais, deva-se à não mensurabilidade dos efeitos advindos dessa produção

cultural de massa. Adorno reconhece essa impossibilidade. Para ele, com razão, "[...]

não é possível estabelecer com clareza um nexo causal, por exemplo, entre as

'repercussões' das músicas de sucesso e seus efeitos psicológicos sobre os ouvintes"

(ADORNO, 1991, p. 93). Apesar desse impasse entre a especulação filosófica e a

verificação empírica, a contenda acerca do problema em tese não invalida sua

autoridade, nem tampouco suas propriedades relacionais.

Algumas teorias sociais hoje, embora reconheçam o peso de determinados

arranjos sociais para a explicação sociológica, apregoam certa reflexividade do

sujeito no direcionamento de suas vidas, baseando-se, ora no avanço dos processos de

racionalização e secularização, ora em perspectivas fenomenológicas (mundos

vividos). Algumas teorias derivam mais da ênfase do papel do indivíduo na vida

social; outras destacam mais a própria sociedade como estrutura coercitiva, que pré-

existe ao indivíduo. Individualismos metodológicos afirmam, em certo sentido, que o

conceito de indústria cultural possui forte dimensão determinista, pois coloca o

indivíduo como ente muito passivo frente as suas escolhas. Ora, tais posições são

parciais, uma vez que não há determinismo no conceito de indústria cultural. Não há

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simplesmente imposição de cima para baixo. Estrategicamente, a indústria cultural

lança no mercado coisas que são representações dos próprios consumidores, criadas

antes por sugestão e fortalecidas pelo cerco sistemático de sua exposição2. O próprio

Adorno reconhece que os consumidores não são estúpidos. A indústria cultural

sempre conta com um pouco de bom senso por parte de seus consumidores

(FREITAS, 2005).

A aceitação sem resistência - ou com pouca - não deriva simplesmente das

necessidades intrínsecas ao indivíduo, já que seria uma explicação muito banal.

Prescreve-se, logicamente, o que conjunturalmente permite ser prescrito. Todavia,

não se cria o produto e se joga para o consumidor (numa lógica fordista). Pelo

contrário, estuda-se o consumidor e se lança a mercadoria (sugerem-se necessidades,

expressão do espírito toyotista). Não há puramente uma questão de autonomia, mas

um jogo entre quem sabe as regras e quem não as conhece (ou não quer conhecer).

"A verdade em tudo isso é que o poder da indústria cultural provém de sua

identificação com a necessidade produzida" (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p.

113).

Adorno e Horkheimer (1985), na Dialética do Esclarecimento, abrem o

problema da indústria cultural afirmando que o declínio da religião no mundo

ocidental, decorrente do avanço dos processos de racionalização e secularização

(reflexão weberiana por excelência), não causou um caos cultural pela falta de uma

unidade de referência coletiva, pois o cinema, o rádio e as revistas se constituíram

num substituto para ela. Com o avanço da produção e do uso desses sucedâneos, o

núcleo essencial da discussão reside em torno da problematização acerca da indústria

cultural e seu caráter mistificador (fetichista) da realidade e coisificador3 do homem.

Adorno e Horkheimer constatam que o cinema e o rádio, por exemplo, não

precisam mais se camuflar de arte, uma vez que o caráter de mercadoria já está

2 "Pela via do fetichismo da mercadoria, o modo de produção impõe formas determinadas que, como'consciência' sujeitada, reproduzem a sujeição ao mesmo tempo em que geram experiências substitutivaspelas quais aparentam se constituir como sujeitos livres" (MAAR, 2002, p. 100). 3 "Em Marx por razões diversas, as mercadorias passam a ser ativas e o indivíduo se isola e se fragmenta peladivisão social do trabalho", transformando o homem em estatuto de coisa (MATOS, 2005, p. 18). EricFromm (1965, p. 82) também partilha desse argumento, uma vez que "[...] o homem transformou a si mesmonuma mercadoria, e sente sua vida como um capital a ser investido com lucro".

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estampado em cada um deles. Música, cinema, literatura magazine etc., tudo está a

serviço do mercado. "A verdade de que não passam de um negócio, eles a utilizam

como uma ideologia destinada a legitimar o lixo que propositalmente produzem"

(ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 100). Para eles, o novo não é a atitude

comercial da obra de arte, mas o fato de hoje serem, de fato, indústrias como tal,

renegando a própria ideia de arte.

Um primeiro norte metodológico deve ser colocado, neste momento, em

termos de orientação teórica. Segundo Durão (2008, p. 39), "[...] uma das armadilhas

mais traiçoeiras no estudo contemporâneo da indústria cultural está na facilidade de

adotar uma postura moralizante" diante do assunto, na tendência a lamentar acerca da

qualidade dos produtos culturais ofertados. Opondo-se a essa visão, deve-se lembrar

que o que determina o funcionamento da indústria cultural a princípio não possui

ligação direta com o termo "qualidade", mas com a acumulação de capital. Não se

trata em si de considerar a dimensão qualitativa, porém, essencialmente a sua

extensão quantitativa. O que puder se transformado em venda, será, pois, objeto da

indústria cultural: do funk carioca à massificação de Cds de Beethoven. Até mesmo a

morte, isto é, a exposição de situações-limite, torna-se objeto de venda, conforme

problematização de Zuin (2008), ao refletir sobre o projeto do filme

holandês Necrocam4.

Faz-se mister apontar uma segunda orientação teórica: a crítica à

mercantilização da cultura não deve ser feita do ponto de vista da "inferioridade

cultural". Contra tal postura moralizante, deve-se dar um enfoque dialético aos

fenômenos. A dialética adorniana é uma dialética negativa (conforme sua obra-prima

de 1966), que, afirmando e negando Hegel, consegue dar primazia ao momento de

negatividade da análise. Segundo Zuin, Pucci e Ramos-de-Oliveira (2001, p. 76-77),

a dialética tradicional significa elementos contraditórios que se negam num dos

momentos do processo lógico, mas que se compõem, no momento posterior. Há,

portanto, a ideia de conciliação de contrários. Utiliza-se do elemento negativo a

4 Prova de que na sociedade atual, até mesmo a morte se metamorfoseia em espetáculo: projeto de um filmeem que o cadáver teria uma microcâmera no caixão e, on line, os internautas poderiam controlar, viatermostato, o processo de decomposição do corpo (ZUIN, 2008).

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serviço de um resultado positivo. Em Adorno, há uma proeminente diferença.

Segundo afirma, mais especificamente no prefácio da Dialética Negativa, deve-se

"[...] libertar a dialética de tal natureza afirmativa, sem perder nada em determinação"

(ADORNO, 2009, p. 07). Adorno dará um peso maior ao elemento negativo. Nele, a

negatividade é o momento propulsor da dialética, ponto de partida de crítica do

princípio da identidade e ponto final como possibilidade de uma nova situação. Trata-

se de um método para se pensar e agir sobre a consciência reificada.

Dentre aqueles autores que realizaram uma crítica não-dialética da

"trivialidade" dos bens culturais, reconhecidos por Adorno, destaca-se Aldous

Huxley. De acordo com Almeida, Adorno e Horkheimer perceberam Huxley como

um nome importante no conjunto de pensadores, da primeira metade do século XX,

que realizaram uma crítica não-dialética da cultura. Huxley, mesmo tratando o tema

sob a ótica da vulgaridade dos bens de massa, trouxe uma distinção muito clara entre

"[...] o sentido tradicional da 'cultura' e os avanços, já historicamente visíveis, da

'massa', da 'barbárie', ou mesmo da 'vulgaridade' (como prefere Huxley)"

(ALMEIDA, 2008, p. 140).

Adorno (2001, p. 92), no texto Aldous Huxley e a utopia, reconhece que o

ponto de partida de Brave New World "[...] parecer ser a percepção da semelhança

universal de tudo o que é produzido em massa, sejam coisas ou homens. A metáfora

schopenhaueriana da manufatura da natureza é tomada ao pé da letra". Huxley estava

atento às modificações no âmbito da cultura, contudo, conforme Almeida (2008),

percebeu-as através de simples oposições entre civilização contra barbárie; elite

contra massa; prazer real contra prazer administrado; liberdade contra submissão à

diversão industrializada. Carece a Huxley, portanto, assumir o caráter histórico,

fundamentado pelo modo de produção econômico, dessas oposições. "Elas são, de

alguma forma, 'naturalizadas', transformadas em 'destino', sem que haja nenhum

modo de reação que não seja o puramente individual [...]" (ALMEIDA, 2008, p. 144).

Huxley, então, "[...] fetichiza o fetichismo da mercadoria" (ADORNO, 2001, p. 110),

ao separar as relações de produção de seu modo de produção.

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Slavoj (2003) igualmente ressalta a necessidade de não se reduzir

algumas perspectivas mais enérgicas a uma mera crítica cultural. Para ele, esse tipo

de crítica tem sido feita até mesmo pelos conservadores da sociedade de consumo.

Retomando as implicações do problema, o resultado desse processo de

tentativa de fetichização do mundo, seja da consciência em si, seja do próprio método

de análise - não há como esquecer de Agnes Heller (1991) e a sociologia como

desfetichização da modernidade5 - , é a "liquidação" da Ideia de indivíduo. O

conceito de reificação não é só relevante como alargamento do conceito de alienação,

como concretamente observável na aceitação naturalizada das mercadorias surgidas

sob o rótulo de culturais. Reforçando com as palavras de Erich Fromm (1965, p. 85),

"[...] os homens são, cada vez mais, autômatos que fazem máquinas que agem como

homens e produzem homens que agem como máquinas".

Lucien Goldmann (1980, p. 172) vem afirmar categoricamente que uma das

"[...] características fundamentais da sociedade capitalista é a de mascarar as relações

sociais entre os homens e as realidades espirituais e psíquicas, dando-lhes o aspecto

de atributos naturais das coisas ou de leis naturais". Desse princípio é que emerge a

reflexão marxista da reificação, em alemão, Verdinglichung.

Assim esclarece Tom Bottomore (2001, p. 314):

Reificação é o ato (ou resultado do ato) de transformação das propriedades, relações e ações humanas em propriedades, relações e ações de coisas produzidaspelo homem, que se tornaram independentes (e que são imaginadas comooriginalmente independentes) do homem e governam sua vida. Significaigualmente a transformação dos seres humanos em seres semelhantes a coisas [...]A reificação é um caso 'especial' de alienação, sua forma mais radical egeneralizada [...].

Nesse sentido, o clássico ensaio de Georg Lukács - a reificação e a consciência

do proletariado - é expressão da maior vitalidade no estudo da dialética marxista e,

com ela, o debate sobre a reificação. Para ele, "[...] o homem é confrontado com sua

5 Em Agnes Heller (1991, p. 208), diga-se de passagem, "[...] não há sociologia sem uma certa medida dereificação; a metodologia científica inclui a reificação", já que trabalha-se com categorias analíticas que sãoexteriores aos sujeitos e a investigação. "Adorno, por exemplo, afirmou que as mentes dos sujeitosindividuais na sociedade capitalista moderna já tinham sido reificadas e, portanto, o sociólogo empíricoincorre numa dupla reificação: a do método de pesquisa e a que decorre da aceitação de sujeitos reificadoscomo fontes de informações verídicas" (HELLER, 1991, p. 210).

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própria atividade, com seu próprio trabalho como algo objetivo, independente dele e

que o domina por leis próprias, que lhes são estranhas" (LUKÁCS, 2003, p. 199).

Como lembra Max Horkheimer (2007, p. 133), "[...] a máquina expeliu o maquinista;

está correndo cegamente no espaço".

Lukács reforça que, assim como o capitalismo se produz e reproduz

incessantemente, a reificação penetra na estrutura da consciência humana de maneira

cada vez mais profunda. Desse modo, a reificação se amplia com o progresso,

substituindo relações originais que antes eram mais transparentes em termos de

relações humanas por relações mais parcelizadas e mais fragmentadas. O essencial é

entender que a reificação atinge a todos: "Não há uma diferença qualitativa na

estrutura da consciência" (LUKÁCS, 2003, p. 219).

David Harvey (1994, p. 308) também realça esse caráter de ocultação da

realidade essencialmente ligado ao avanço da reprodução do capital: "[...] o processo

mascara e fetichiza, alcança crescimento mediante a destruição criativa, cria novos

desejos e necessidades, explora a capacidade do trabalho e do desejo humanos".

Assim, o resultado é a exaustão do indivíduo. Vale lembrar que, em Adorno, a

reificação não deve ser simplesmente eliminada, mas pensada como forma

determinada. "O real não deve ser eliminado como absoluto, mas negado em sua

determinação, superado" (MAAR, 2002, p. 03).

Olgária Matos (2005, p. 50), de tal modo, com base na Teoria Crítica, lembra

que o "[...] indivíduo autônomo, consciente de seus fins, está em extinção, em

desaparecimento". Domingues (2001, p. 79), da mesma forma, salienta que Adorno e

Horkheimer constatam analiticamente pouca importância ao indivíduo na

modernidade (devido ao bloqueio estrutural da práxis transformadora): "[...] na

verdade, descrevem o que viam como declínio da individualidade". O pensamento

adorniano citado em Habermas é elucidativo: "[...] a experiência individual apóia-se

necessariamente no antigo sujeito - historicamente já condenado - 'que ainda é para

si, mas não mais em si'" (HABERMAS, 1990, p. 142).

Por conseguinte, nas palavras de Adorno e Horkheimer (1985, p. 128), por um

lado, "[...] a individuação jamais chegou a se realizar de fato". Contudo, mesmo

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18

assim, a sociedade burguesa, "[...] contra a vontade de seus senhores", transformou os

homens de crianças em pessoas, mas à custa de uma individualidade muito indigente

e ilusória. Para Freitas (2005), trata-se de uma individualidade frustrada diante de si

mesma, já que está muito aquém de seus projetos. Precisamente, Zuin (2001, p. 11)

enfatiza que "[...] tal debilitação da individualidade é o resultado de um processo

social que tem como principal característica a universalização do princípio da lógica

da mercadoria, tanto na dimensão objetiva como na subjetiva". Nesse sentido - e

Lukács já alertara para tal fato -, a reificação ocorre tanto na realidade objetiva

quanto na subjetiva. Tanto as relações mercantis quanto a consciência se tornam

naturalizadas.

A indústria cultural, que não deve ser entendida no sentido estrito da expressão,

progrediu graças ao avanço técnico do capitalismo. Segundo Morin (1967, p. 24),

"[...] sin el impulso prodigioso del espíritu capitalista, esas invenciones [novas artes

técnicas] no hubieran conocido sin duda un desarrollo tan radical y masivamente

orientado". Como reforça Adorno, "[...] no capitalismo - isso é uma lei essencial - o

que existe só pode ser considerado na medida em que se amplia e se expande"

(ADORNO, 2008a, p. 122).

Os elementos constitutivos da indústria cultural, ou seja, diversão,

entretenimento, prazer etc., já existiam antes mesmo de ela vir à tona. Contudo, o que

o século XX viu surgir foi uma imensa maquinaria voltada à comercialização da

cultura. Nesse meio, o próprio interior de uma obra artística foi encerrado, quer dizer,

a Ideia de autor, o seu caráter de individualidade estética. "A indústria cultural

desenvolveu-se com o predomínio que o efeito, a performance tangível e o detalhe

técnico alcançaram sobre a obra, que era outrora veículo da Idéia e com essa foi

liquidada" (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 103-104).

Destarte, os bens da indústria cultural, grosso modo pensando as maiores cifras

(racionalizadas, massificadas e padronizadas), são essencialmente mercadorias. São

criados para cumprir a função de valor de troca. A racionalidade estética é

abandonada em prol da racionalidade instrumental. Zuin (2001, p. 10), sumariamente,

afirma que uma produção cultural submetida "[...] quase que por completo ao seu

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19

caráter de valor afasta-se de si própria, ou seja, termina por negar toda possibilidade

de felicidade ao dissimular um verdadeiro estado de liberdade".

Padilha (2002) menciona que essa industrialização crescente e suas

características mais importantes, na produção de mercadorias, estão também

presentes na produção cultural desde o final do século XIX. O cinema e a televisão,

por exemplo, obedeceram às mesmas regras da grande indústria: produção em série,

divisão racional do trabalho e padronização. Morin (1967, p. 37) ainda realça esse

aspecto, ao ressaltar que "[...] el gran arte nuevo, arte industrial tipo, el cine, ha

instituido una rigurosa división del trabajo, análoga a la que se opera en una fábrica

[...]". Dessa forma, a cultura produzida pela indústria cultural é padronizada e baseia-

se num gosto médio de um público que não tem tempo nem interesse em questionar o

que consome. Os meios de comunicação de massa procuram, através de um mundo

mágico, naturalizar as regras do jogo social, veiculando códigos serializados para

qualquer um em toda a parte do planeta (PADILHA, 2002).

Basicamente em boa parte da produção cultural - da indústria cultural - a

qualidade estende-se, antes de qualquer coisa, não por um dado qualitativo -

conforme já alertou Durão (2008) -, mas por cifras de quanto já vendeu e de quanto

irá render ainda. "O denominador comum 'cultura' já contém virtualmente o

levantamento estatístico, a catalogação, a classificação que introduz a cultura no

domínio da administração" (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 108). As

diferenças de qualidade atribuídas aos filmes, livros e músicas têm mais a ver com a

sua utilidade de venda do que com sua qualidade intrínseca. Por isso, para que todos

possam ser atingidos pela mão invisível da indústria cultural, as próprias distinções

são criadas, cunhando, assim, um certo ar de opção. "As vantagens e desvantagens

que os conhecedores discutem servem apenas para perpetuar a ilusão da concorrência

e da possibilidade de escolha" (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 101-102).

Esperadamente, como sequelas desse processo, mecanismos diversos da

ideologia disseminam que tal produção só existe porque há homens livres e capazes

desejando o consumo. O princípio liberal da competência individualista se mostra

também eficiente na indústria cultural: tudo pode ser vendido e comprado. No texto

Page 25: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

20

Crítica cultural e sociedade, Adorno (2001, p. 21) já se manifestara sobre o tema:

"[...] hoje 'ideologia' significa sociedade enquanto aparência". Dessa forma, em

Adorno a ideologia deixa de ser falsa consciência para se tornar propaganda do

mundo: "[...] a organização do mundo converteu-se a si mesma imediatamente em sua

própria ideologia" (ADORNO, 2006, p. 143). Não há mais ideologia no sentido

próprio de falsa consciência, mas somente propaganda a favor do mundo, mediante a

sua duplicação e a mentira provocadora, que não pretende ser acreditada, mas que

pede o silêncio (ADORNO, 2001, p. 25).

Por conseguinte, a indústria cultural consegue, no mesmo espaço, obter sucesso

de venda em objetos díspares. Pensem, por exemplo, nos programas de auditório, no

qual "[...] os 'enternecidos' apresentadores transitam, com espantosa facilidade, entre

o relato da filha que foi estuprada pelo próprio pai e os produtos de limpeza do

patrocinador" (ZUIN, 2008, p. 55). É como se a tragédia dos outros (alter) fosse coisa

pequena frente à miséria individual de cada um (ego).

Nesse sentido, sendo as grandes empresas ligadas ao cinema, à música, às

revistas de entretenimento etc. entidades capitalistas que visam ao lucro, não há

motivos para desconfiar que seus produtos sejam, quase que literalmente,

mercadorias no sentido ríspido do vocábulo. A letra de uma música que é elaborada

em um dia, com um instrumental de poucos arranjos, cada um mais dispensável que o

outro, tematizando a traição de uma esposa e os lamentos do marido melancólico, não

é outra coisa senão uma produção industrial, metaforicamente à maneira de uma

indústria que produz uma série de canetas esferográficas. Tudo está a serviço da

produção de mercadorias ou, mais além, como prefere Durão (2008, p. 43), da

superprodução semiótica: "[...] a própria linguagem, sua natureza e forma de

operação, quando completamente submetida à lógica de acumulação de capital".

Basta que se observe hoje, além dos avanços das tecnologias midiáticas, suas

manifestações empíricas: existem filmes em ônibus, insistentes comerciais em

camisetas, outdoors humanos etc.; ou seja, há toda uma crescente produção de

mensagens a serviço da indústria cultural.

Page 26: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

21

Nesse clima industrial da cultura, canções e filmes estandardizados nascem e

renascem a cada dia. Às vezes, muda o formato, mas a essência permanece. De todo

jeito, é sempre a mesma coisa. De marido traído a temática passa para a mulher

submissa; do homem namorador, muda-se para um amor impossível etc. Não apenas

músicas de sucesso nascem diariamente, mas também bandas, cantores, astros e

novelas "[...] ressurgem ciclicamente como invariantes fixos, mas o conteúdo

específico do espetáculo é ele próprio derivado deles e só varia na aparência"

(ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 103). Para Adorno e Horkheimer, cada filme é

um trailer do filme seguinte, bem como cada música, seja no conteúdo, seja na

montagem do produto.

O público se contenta com a reprodução do que é sempre o mesmo. "Essa

mesmice regula também as relações com o que passou. O que é novo na fase da

cultura de massas em comparação com a fase do liberalismo avançado é a exclusão

do novo. A máquina gira sem sair do lugar" (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p.

111). A indústria cultural consiste, portanto, na repetição do idêntico.

O princípio maior da indústria cultural é a diversão, o entretenimento.

Diversão! Palavra tão mencionada pelos apologistas da indústria cultural e tão

indigesta (faca de dois gumes). A diversão, nos termos mais genéricos da indústria

cultural - diga-se de passagem - , oferece exaustivamente a fuga do cotidiano. Eis o

que proporciona a indústria cultural. Fuga! Ernest Mandel esclarece tal proposição:

Para o indivíduo cativo, cuja vida é inteiramente subordinada às leis do mercado -não apenas (como no século XIX) na esfera da produção, mas também na esfera doconsumo, da recreação, da cultura, da arte, da educação e das relações pessoais -parece impossível romper a prisão social. A 'experiência cotidiana' reforça einterioriza a ideologia neofatalista da natureza da ordem social do capitalismotardio. Tudo o que resta é o sonho da fuga - por meio do sexo e das drogas, que porsua vez são imediatamente industrializados (MANDEL, 1985, p. 352).

Logo, "[...] a indústria cultural está corrompida, mas não como uma Babilônia

do pecado, e sim como catedral do divertimento de alto nível" (ADORNO;

HORKHEIMER, 1985, p. 118). Antecipa-se que o divertimento - protocolarmente -

da indústria cultural, em si, não possibilita capacidade de resistência. Tem grande

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22

probabilidade de ser mera diversão, distração. Não oferece, em si, possibilidade de

emancipação, nem crítica ao status quo. Conforme destacam Adorno e Horkheimer

(1985, p. 119), "[...] divertir-se significa estar de acordo [...] É na verdade uma fuga,

mas não [...] uma fuga da realidade ruim, mas da última idéia de resistência que essa

realidade ainda deixa subsistir".

Para pensar o grande desafio da primeira geração da Teoria Crítica, era preciso

ponderar "[...] as formas aparentemente mais inofensivas de condução da vida no

mundo contemporâneo [...], em busca do que nelas possa haver de regressivo"

(COHN, 1998, p. 14). Portanto, não há forma aparentemente mais inofensiva do que

a ocupação do tempo supostamente livre.

Logo, como resultado de um "divertir" nada afetuoso, termina a grande parte

da população envolvida numa forma de dominação muito sutil e, por isso mesmo,

mais perigosa. "Assim como o Pato Donald nos cartoons, assim também os

desgraçados na vida real recebem a sua sova [surra] para que os espectadores possam

se acostumar com a que eles próprios recebem" (ADORNO; HORKHEIMER, 1985,

p. 114). O humor triunfa sobre a própria (im)possibilidade de mudança da situação

vigente. A arte, como possibilidade de emancipação, de expressão diante do mundo

administrado, é abandonada por um humor que nada tem de engraçado, salvo a

própria infelicidade de quem ri. A indústria cultural, ofertando cada vez mais seus

produtos a um público sempre maior e propiciando diversão sempre "revigorada",

oferece algo ao povo e, ao mesmo tempo, priva-o de outra. Oferece diversão, mas

priva-o da possibilidade de uma vida com mais sentido.

Com a indústria cultural, abre-se o sonho capitalista de uma educação

plenamente produtivista e consumista. Como sabiamente alertou, já no século XVI,

Étienne de La Boétie (2009, p. 48), "[...] o homem é naturalmente livre e quer sê-lo,

mas sua natureza é tal que se amolda facilmente à educação que recebe". Por isso,

não tem sido tarefa abstrusa acomodar os homens segundo os clichês da indústria

cultural, pois, como lembra Horkheimer, no reconhecido estudo sobre Autoridade e

Família: não é apenas a coação imediata que faz os homens obedecerem a ordens,

Page 28: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

23

"[...] mas os próprios homens [que] aprenderam a acatá-las" (HORKHEIMER, 2008,

p. 192).

Para Adorno, o clímax dessa situação é atingido quando os esquemas da

indústria cultural não permitem mais a evasão ou a dificultam estruturalmente.

Segundo aponta, a astrologia representa um dos exemplos mais basilares dessa

sujeição. Caso um astrólogo prescreva a um de seus leitores/clientes guiar

cuidadosamente seu automóvel, num determinado dia chuvoso, certamente tal

conselho não lesará ninguém. Contudo, "[...] prejudicial é a estultice implícita na

reivindicação de que esse conselho, válido para qualquer dia e, portanto imbecil,

tenha requerido a consulta aos astros" (ADORNO, 1971, p. 294).

Perante a indústria cultural e seus meios de divertimento, pouca coisa (ou

quase nada) pode ser considerada inofensiva. O aforismo nº 5 de Minima

Moralia muito habilmente traz essa reflexão a partir da vida lesada:

Nada mais é inofensivo. As pequenas alegrias, as expressões da vida que parecemisentas de responsabilidade do pensamento não só contêm um elemento deobstinada tolice, de impassível endurecimento, como se põem imediatamente aserviço do seu extremo oposto. (ADORNO, 2008b, p. 21).

Disso decorre que o cerco da indústria cultural é vigoroso. Não se trata de

um conceito-fetiche6, mas de um conceito eminentemente ligado ao seu tempo social,

que, em termos de expansão do capitalismo, não se encerrou.

Para Gabriel Cohn (1998), a atualidade do conceito de indústria cultural reside

essencialmente em dois aspectos centrais: a ideia de que seus produtos são oferecidos

em sistema (o assédio sistemático de tudo para todos) e a noção de que a sua

produção obedece prioritariamente a critérios administrativos de controle sobre os

efeitos no receptor (capacidade de prescrição de desejos).

6 Uma vez que "[...] o desencantamento do conceito é o antídoto da filosofia, ele impede o seusupercrescimento: ele impede que ela se autoabsolutize" (ADORNO, 2009, p. 19).

Page 29: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

24

Remete à ideia de uma articulação crescente entre todos os ramos de umempreendimento produtor e difusor de mercadorias simbólicas sob o rótulo decultura, de tal modo que o consumidor se encontre cercado de maneira cada vezmais cerrada por uma rede ideológica com crescente consistência interna [...] Ocomponente crítico básico consiste aqui na ideia de que nos produtos da indústriacultural os múltiplos níveis não são constituídos por significados intrínsecos aosrequisitos formais da construção da obra, mas por níveis de efeitos, ou seja, derelações calculáveis entre determinados estímulos emitidos e as percepções oucondutas dos receptores. Não se trata, aqui, de mera 'manipulação'. Trata-se de umamodalidade específica de entidades simbólicas multidimensionais, produzidas edifundidas segundo critérios prioritariamente (mas não exclusivamente, embora nolimite o sejam) administrativos, relativos ao controle sobre os efeitos no receptor enão segundo critérios prioritariamente estéticos, relativos às exigências formaisintrínsecas à obra. (COHN, 1998, p. 20-21).

O cerco sobre o indivíduo tem sido crescentemente elevado. "[...] com falsa

unção a indústria cultural proclama orientar-se pelos consumidores e lhes oferecer

aquilo que desejam para si" (ADORNO, 2008b, p. 196). Assim, enquanto ela

desaprova toda possibilidade de autonomia do indivíduo, consegue por tabela aprovar

a heteronomia. Da mesma maneira, a capacidade de prescrição sobre o consumidor se

constitui em seu grande trunfo. "Não é bem que a indústria cultural se adapte às

reações dos clientes, mas sim que elas as finge" (ADORNO, 2008b, p. 197). Por isso,

a resistência se torna obstruída mediante tamanhas artimanhas administradas no

âmbito da cultura.

Evidentemente, muitas desigualdades hegemônicas da vida social podem não

ser estruturadamente criadas pela indústria cultural, mas, aqui e ali, reforçam-se nesse

tipo-modelo de consumidor. A indústria cultural "[...] los convierte en lo que ya son,

sólo que con mayor intensidad de lo que efectivamente son" (ADORNO, 1969, p.

64).

Não se trata, todavia, de insistir em modelos teóricos pautados essencialmente

contra a indústria cultural. Deve-se ter cuidado, pois "[...] o empenho desmistificador

é valioso mas não garante a eficácia da desmistificação [e] a ideologia pode estar no

excesso como na insuficiência" (KONDER, 2002, p. 258-259).

É mister salientar que, por um lado, conforme realça Konder (2002), não há

imunidade contra as ações sutis da ideologia. Ela se manifesta tanto na abstração

quanto na empiria; tanto na pretensão à universalidade quanto na resignação à

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25

particularidade. Por outro lado, "[...] ao mesmo tempo em que se iludem, os

indivíduos inquietos podem questionar suas próprias ilusões" (KONDER, 2002, p.

259). Logo, não se trata de estar a favor, nem contra. A presente discussão não está

numa "guerra cultural7".

Algumas análises são essencialmente contra o esboçado na presente reflexão

sobre a indústria cultural, alegando sempre elitismo valorativo, excesso de

especulação, busca por pureza conceitual e visão de homogeneização onde se verifica

diferenciação. No mais, na análise dos meios de comunicação de massa e do consumo

popular, de fato, esses elementos são questionáveis se levados ao extremo. Todavia, é

possível efetuar uma análise pujante da indústria cultural abrindo mão desses quatro

equívocos analíticos. E Adorno, na medida do possível, a fez! Primeiramente, se

elitismo for analisar criticamente os processos capitalistas e não se deixar encantar

por uma suposta diversidade também capitalistamente criada8, o debate adorniano é,

sim, elitista. Aliás, em Adorno, há uma crítica da cultura como espírito reservado.

Segundo afirma, "[...] ciega es la creencia en una Geiteskultur [cultura do espírito],

que, en virtud de su ideal de pureza autosuficiente, renuncia a la efectivización de su

contenido y deja librada la realidad al poder y su ceguera" (ADORNO, 1973, p. 102);

em segundo lugar, somente uma leitura apressada de Adorno diria que ele vê as

massas através da aludida pureza conceitual "perdida". Em Adorno, o capitalismo já

se encarregou de transformar tanto Mozart quanto Aviões do Forró em mercadorias;

por fim, a indústria cultural no atual estágio de acumulação capitalista não é uma

produção de base fordista, mas, de fato, flexível (toyotista). Logo, a diferenciação é

sua marca: diferenciação sempre indiferenciada, mas existente.

Assim, evitando suprimir a dialética em Adorno, e também evitando as

relações causais e substancialistas, é necessário perpetrar uma tentativa de

reequacionamento da relação entre estrutura e ação na análise da indústria cultural,

mostrando, para além das ideologias e para além das resistências, uma tensão entre

7 "A expressão 'guerras culturais' sugere batalhas campais entre populistas e elitistas, entre guardiões docânone e partidários da différence..." (EAGLETON, 2005, p. 79). 8 "[...] considero esse tão falado pluralismo como em grande medida ideológico. Ou seja, porque creio que acoexistência das forças é efetivamente capturada e determinada em sua aparência pelo sistema social em quevivemos e tudo domina" (ADORNO, 2008a, p. 130).

Page 31: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

26

elas. Contudo, a presente reflexão procura evitar um equilíbrio entre os dois lados do

campo de forças (dominação e resistência), uma vez que o lado estruturado vem

demonstrando uma grande potência em criar e sustentar disposições estéticas. Ou

seja, nas palavras de Adorno, há uma desproporção real entre o poder e a impotência

social.

La desproporción, que se vuelve desmesurada, entre poder e impotencia sociales seprolonga en el debilitamiento de la composición interna del yo, hasta el punto deque este no se mantiene sin identificarse con lo que, precisamente, lo condena a laimpotencia. (ADORNO, 1973, p. 22).

A indústria cultural é atual, vigorosa, e sua força vem desequilibrando

insistentemente esse campo. Os indivíduos não são padecentes culturais, mas vivem

em estruturas que igualmente não são. O resultado tem sido a expansão crescente do

poder da indústria cultural. Se esse tipo de evidência não for semiformação

(Halbbildung), no sentido adorniano, não há o que dizer mais acerca das ideologias

como instrumentos de reprodução do status quo, isto é, como esquiva dos "[...]

contactos que pudieran sacar a luz algo de su carácter sospechoso" (ADORNO, 1966,

p. 196).

Como desfecho, nem tudo é alienação, bem como nem tudo pode ser resumido

a uma compreensão de contextos estruturados, na qual a dominação é tomada

simplesmente como modo de vida (cultura vivida). A busca de uma síntese

epistemológica para essa dualidade - todavia, que não se abstenha de expor o tema da

consciência reificada - foi o intento crítico desta reflexão, bem como, igualmente,

expor que a indústria cultural contribui decisivamente para a manutenção de certos

contextos estruturados de dominação. A potência do conceito adorniano está aí. Só

não enxerga aquele que abate a dialética e/ou faz da diversidade cultural uma

propaganda do mundo.

Page 32: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

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CAPÍTULO 2

REVISITANDO O DEBATE SOBRE O FETICHISMO NA MÚSICA E A

REGRESSÃO DA AUDIÇÃO9

Über Fetischcharakter in der Musik und die Regression des Hörens (ADORNO,

1991) , de 1938, embora escrito antes mesmo da Dialética do Esclarecimento

(1947), expressa muito do entusiasmo criador do debate em torno do projeto

adorniano de uma sociologia crítica da música. O escrito é uma contestação ao texto

a obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica

Benjamim assinalava para as possibilidades abertas advindas das novas tecnologias

midiáticas e as conseqüências positivas abertas pela dessacralização da obra de arte,

Adorno percebia o seu lado negativo, ou seja, o consumo fetichizado, passivo,

regressivo10.

Adorno (1991) inicia o texto afirmado que as reclamações acerca da

decadência do gosto musical são bastante antigas, e que, sempre que a chamada paz

para ele, o próprio conceito de gosto está superado, uma vez que a existência de um

indivíduo com liberdade de escolha se encontra limitada sob a égide do Mundo

Administrado (verwaltete Welt).

Essas queixas sobre a degeneração do gosto se baseiam em considerações

muito sentimentais, acríticas e saudosistas, que louvam um passado que muito pouco

difere do presente. Para Adorno, a realidade produz a ilusão de se desenvolver a

9 Originalmente publicado na revista Trilhas Filosóficas Revista Acadêmica de Filosofia, UERN, Caicó-RN, ano V, n. 1, p. 59-76, jan.-jun. 2012. 10 as que

1973, p. 111).

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partir de cima, mas no fundo, segue sendo o que era11 (ADORNO, 1973, p. 42). Além

disso, na música a idéia de gosto é ainda mais controversa quando se compreende a

valor da própria coisa, o

(ADORNO, 1991, p. 79). Gostar de algo é quase que idêntico a reconhecê-lo e, nesse

mundo de mercadorias padronizadas e racionalizadas na música ou fora dela , esse

comportamento valorativo torna-se muito questionável.

As críticas adornianas se dirigem à categoria de arte ligeira (popular), em

contraposição a uma suposta arte autônoma. Uma preocupação basilar em Adorno

reside no caráter de educação que a música séria pode proporcionar aos indivíduos,

que, além de ser residual sob o domínio da indústria cultural, não estaria veiculada

nos meios de comunicação de massa. Logo, o que a empiria vem demonstrando é um

quadro infausto: massificação da música ligeira, que além de quase nada (ou pouco)

educar, fortemente contribui para desviar a atenção do público das contradições

estruturais da realidade. Como inferência mais genérica, pode-

de entreter, parece que tal música [ligeira] contribui ainda mais para o emudecimento

dos homens, para a morte da linguagem como expressão, para a incapacidade de

Mas, de fato, o que significa música popular (ligeira) para Theodor W.

Adorno? O que define a música séria, ou seja, aquilo que foge ao padrão da indústria

cultural?

Adorno, em colaboração de George Simpson no início da década de 1940

mais especificamente entre 40 e 41 , termina o seu escrito Sobre Música Popular

(On Popular Music), avançando na discussão acerca do fetichismo na música e a

regressão da audição. Para eles, a música costuma ser diferenciada, com freqüência, a

partir de distinções de níveis (qualidade). Essa diferença é tão aceita que cada um

mede o valor de cada tipo de música como totalmente independente da outra. Adorno

não concorda com tal classificação e afirma que o fator decisivo na diferenciação

11

(ADORNO, 1973, p. 42).

Page 38: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

33

entre música séria e música popular estandardização

(padronização). Através deste critério pode ser alcançada uma distinção concreta e

mais precisa. Assim sendo, a estrutura da música popular (ligeira) é uma estrutura

padronizada, até mesmo quando se tenta desviar desse padrão, de tal modo que nesse

modelo de música ligeira até mesmo os detalhes são padronizados, através dos

chamados break, blue chords, dirty notes.

Toda a estrutura da música popular é estandardizada, mesmo quando se buscadesviar-se disso. A estandardização se estende dos traços mais genéricos até osmais específicos. Muito conhecida é a regra de que o chorus [a parte temática]consiste em trinta e dois compassos e que a sua amplitude é limitada a uma oitava euma nota. Os tipos gerais de hits são também estandardizados: não só os tipos demúsica para dançar, cuja rígida padronização se compreende, mas também os tipos

garota perdida. E, o mais importante, os pilares harmônicos de cada hit o começoe o final de cada parte precisam reiterar o esquema-padrão. Esse esquemaenfatiza os mais primitivos fatos harmônicos, não importa o que tenha intervindoem termos de harmonia. Complicações não têm conseqüências. Esse inexorávelprocedimento garante que, não importa que aberrações ocorram, o hit acabaráconduzindo tudo de volta para a mesma experiência familiar, e que nada defundamentalmente novo será introduzido (ADORNO; SIMPSON, 1994, p. 116-117).

sentido musical da totalidade concreta da peça, que, em troca, consiste na viva

relação entre os detalhes, mas nunca na mera imposição de um esquema musical12

(ADORNO; SIMPSON, 1994, p. 117). Prontamente, cada detalhe está conexo com o

todo e o todo só adquire sua expressão com a conexidade dos detalhes, sempre

indispensáveis. Assim, é a totalidade concreta da peça quem domina. Na música

ligeira o sentido da totalidade da peça não é afetado caso algum detalhe seja alterado,

uma vez que toda a estrutura musical não passa de um automatismo. Os detalhes são

substituíveis, à maneira de uma engrenagem de máquina.

Outra diferença geralmente colocada, e também insuficiente, tem sido o critério

12 exemplo, na introdução do primeiro movimento da Sétima sinfonia, de Beethoven, o segundo tema(em dó maior) só alcança o seu verdadeiro significado a partir do contexto. Somente através do todo é queele adquire a sua peculiar qualidade lírica e expressiva, isto é, uma construção inteiramente contrastante como caráter como que de cantus firmus do primeiro tema. Tomado isoladamente, o segundo tema seria reduzido

Page 39: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

34

são, sem exceção, ritmicamente mais simples

hits como Deep Purple ou Sunrise

Serenade são per se mais difíceis de seguir que a maioria das melodias de, por

o, da mesma

forma que a diferença de nível não pode figurar como critério de distinção, a

complexidade igualmente não define o valor de uma peça musical.

De tal modo, para Adorno, a sumária diferença entre a natureza das peças

musicais reside no fato de que, na música séria em geral (vale salientar que também

existe uma parte da música séria submetida à indústria cultural), o detalhe contém o

Todo não é

alterado pelo evento individual.

Essa música ligeira como elemento do fetichismo e da audição regressiva

revela traços básicos definidores de sua condição padronizada. Primeiramente, a

divisão do trabalho existente entre compositor, harmonizador e arranjador simula

algo quase industrial, no qual ocorre uma divisão de funções e sua posterior

montagem do produto.

Em segundo lugar, a imitação é outra condição basal dessas músicas de

sucesso. Por estarem submetidas à lei do valor de troca, estão logicamente imbuídas

num mercado competitivo, portanto, nada mais natural que um hit de sucesso busque

copiar a fórmula de sucesso de outro.

Uma terceira característica é dada pela inserção da música ligeira no mercado

fonográfico, através do que Adorno e Simpson (1994, p. 125) chamaram de plugging,

ou seja, a repetição incessante de um hit particular de modo a torná-lo um sucesso

plugging almeja quebrar a

resistência ao musicalmente sempre-igual ou idêntico, fechando, por assim dizer, as

vias de fuga ao sempre-

Na mesma mão, a música que se propõe ao sucesso também deve apresentar

certo glamour, ou seja, ter caráter de show, de entretenimento. Esse glamour de certa

forma leva a um comportamento infantil, já que a representação do divertimento é

Page 40: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

35

buscada para relaxar do esforço, do trabalho, enfim, fuga do mundo da

responsabilidade.

Evidentemente, o caráter empresarial da música ligeira também não foi

deixado de lado na análise adorniana. Percebe-se que a música ligeira pertence a

determinados grupos e, deste modo, também faz parte do circuito geral do valor. Daí

que, adotando-se de forma competente as fórmulas mencionadas anteriormente,

promovida e transformada num sucesso, se houver uma adequada conexão entre

SIMPSON, 1994, p. 125).

Como seqüela de toda essa estrutura promocional, surge a expressão regressão

da audição, podendo ser mais bem entendida

(ADORNO, 1991, p. 80). A audição regressiva é encontrada, pois, no ouvinte que

não deseja pensar no Todo.

O ouvinte regredido torna-se um consumidor passivo, mero comprador de

músicas que proporcionam o prazer imediato. Crochík (2008) enfatiza esse aspecto

ao mostrar que a música era, e ainda hoje é, vista como um mero meio de

entretenimento, sem nenhuma implicação política, dimensão que Adorno muito lhe

atribuiu.

O modo de comportamento perceptivo, através do qual se prepara o esquecer e orápido recordar da música de massas, é a desconcentração. Se os produtosnormalizados e irremediavelmente semelhantes entre si exceto certasparticularidades surpreendentes, não permitem uma audição concentrada sem setornarem insuportáveis para os ouvintes, estes, por sua vez, já não sãoabsolutamente capazes de uma audição concentrada [...] De vez em quando seouvirá a opinião de que o jazz é sumamente agradável num baile e horrível deouvir (ADORNO, 1991, p. 96).

A música sob o domínio da indústria cultural possibilita um prazer superficial

que rejeita no prazer a própria noção de prazer, pois as músicas de sucesso, variantes

da indústria do entretenimento, impedem qualquer avanço crítico-intelectual. Para

Adorno o que regride de fato é a possibilidade de se chegar a um outro conhecimento

Page 41: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

36

consciente sobre música, ou seja, a liberdade de escolha frente à outra música oposta

a estandardização.

Como exemplo, Adorno realizou, em 1938, um estudo do então consagrado

programa de educação musical clássica pelo rádio, o The NBC Music Appreciation

Hour Conducted by Walter Damrosch (CARONE, 2003). O artigo de Adorno,

intitulado The analytical study of the NBC Music Appreciation Hour, na época, não

agradou ninguém, segundo apreciação contida em Carone (2003). Por quê?

comerciais e não lucrativo, promovido pela rede para pessoas em idade escolar [...]

(CARONE, 2003, p. 478).

De acordo com Carone, Adorno argumentou que o programa de rádio falhava

em transmitir uma verdadeira experiência musical, já que era pautado numa estética

do efeito, que reduzia a apreciação musical ao prazer ou à diversão derivados da

audição. Embora o conceito de indústria cultural ainda não tivesse sido formulado na

Dialética do Esclarecimento, Adorno já percebera o caráter pré-digerido da filosofia

do Programa. Este foi o ponto principal da crítica de Adorno ao programa de

-

487).

A popular Hora de Damrosch, que era seguida com muita atenção por seu aportenão comercial e que pretendia promover a educação musical, defendia falsasinformações sobre a música e uma imagem absolutamente distorcida desta[ADORNO, 1973, p. 121, tradução nossa]13.

Quatro inferências do estudo podem ser ilustrativas dessa crítica ao programa

da NBC. A primeira mostrou que a noção de apreciação consistia na ideia do efeito

sobre o ouvinte, interpretada em termos de prazer ou diversão. Esses princípios são,

todavia, termos emprestados da indústria do entretenimento e, em si, são superficiais

13 a seguida con mucha atención por su aporte no comercial y quepretendía promover la educación musical, defendía falsas informaciones sobre la música y una imagen

Page 42: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

37

e não conduzem a uma concreta experiência musical. Para Adorno, a noção de

"apreciação", como empregada pela The Music Appreciation Hour, baseava-se na

idéia de efeitos da música sobre o ouvinte, interpretada em termos de "prazer" e

"diversão". Estes princípios levam a distorções de sentido musical, pelo menos se são

tratados da forma como a Hora de Damrosch lidava com eles14.

A segunda inferência demonstrou que a filosofia do Programa confundia

reconhecimento com compreensão musical. Embora Adorno alerte que o

reconhecimento seja necessário ao entendimento musical, não se trata de coisas

idênticas. Para ele, o que ocorria no Programa era o fetichismo da propriedade do

conhecimento musical. Segundo afirma, a filosofia do The Music Appreciation Hour

concebia a diversão proporcionada pela música como sendo praticamente idêntica a

compreensão. Embora o reconhecimento possa contribuir para a compreensão

musical, de modo algum isto é, por si só, um processo idêntico. Caso contrário,

qualquer coisa profundamente nova seria excluída a priori15. Diante disso, a música

reconhecida se tornava uma propriedade daquele ouvinte expert em termos de

estoque musical.

Como terceira advertência, Adorno apontou que a estrutura desse tipo de

educação musical promovia um certo culto de pessoas em vez de uma compreensão

concreta da experiência musical, o que terminava por aumentar o prestígio da NBC.

A estrutura autoritária deste tipo de educação musical promovia um culto de pessoas

em vez de uma compreensão dos fatos. Assim, havia a promoção do nome do Dr.

Damrosch, cuja autoridade foi um meio de aumentar o prestígio da NBC com os

ouvintes do The Music Appreciation Hour. Estas características do Programa

praticamente produziam uma pseudo-cultura musical: o apreciador ideal de música,

14 s employed by the Music Appreciation Hour, is based upon the idea of

from the sphere of commercialized entertainment, and shallow in themselves, lead, even if excusable aspedagogically expedient in inducing people to listen, to distortions of musical sense and cultural absurdities,

. 15

recognition. Although recognition may contribute to musical understanding, it is by no means alone identicalwith such understanding. Otherwise anything profoundly new would be excluded a priori. Actually, what

-relationship with music, to a fetishism of ownership of.

Page 43: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

38

do ponto de vista da Hora, seria um Babbitt16 referência ao personagem George

Babbitt, de Sinclair Lewis, que simboliza a mediocridade cultural do homem norte-

americano 17].

Por fim, a cultura pseudo-musical do Hour se tornava mais marcante através

das técnicas mecânicas de ensino por meio do efeito do reconhecimento. Ao invés de

promover uma compreensão real da música, apenas se disseminavam informações

mecânicas. A tendência em direção a pseudo-cultura musical se tornava mais

marcante no ponto exato onde a The Music Appreciation Hour aparentemente tentava

testes utilizavam técnicas mecânicas de aprendizagem. Não eram aplicáveis aos

fenômenos concretos de escuta18.

Deste modo, a conclusão do estudo de Adorno revelou que, embora o

Programa não aparecesse como um negócio em sentido aberto, ainda assim possuía as

marcas da indústria do entretenimento, já que a intenção educativa tinha sido

sabotada por uma intenção comercial não confessa: vender música clássica, além de

comercializar a imagem da NBC (CARONE, 2003). Tratava-se aí do interesse no

desinteresse.

É conveniente apontar que em Adorno não há um excesso de má vontade para

com a música ligeira; nem tampouco apego valorativo pela música séria. Em

nenhuma das duas categorias ocorre juízo de valor. Para ele, a modificação de função

atinge todos os tipos de música e não somente a ligeira. Nesse sentido, Adorno

argumenta que uma parte da música séria se tornou independente do consumo,

16 ion, promotes a cult of persons instead of anunderstanding of facts. In the first place, there is the name of Dr. Damrosch himself, whose authority, at thesame time, is a means of enhancing the prestige of NBC with the listeners in the Hour. The actual measuringrod for musical personalities in the Hour is success. The conformist attitude of veneration for the successfulis closely allied, in musical matters, with a profoundly reactionary attitude. These features of the Hourvirtually produce a musical pseudo-culture: the ideal music appreciator, from the viewpoint of the Hour,

17(CARONE, 2003, p. 491). 18 -culture becomes most striking at the very point where the MusicApThese employ a mechanical technique, are not applicable to concrete listening phenomena but only to theinstruction given by the teacher, and are, as a whole, fit to promote only highly questionable information

Page 44: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

39

enquanto que o resto desta mesma música séria também foi submetida à lei do

-se tal música séria como se consome uma

mercadoria adquirida no mercado. Carecem totalmente de significado real as

(ADORNO, 1991, p. 84).

Retomando o fio condutor da discussão, com a regressão da audição, abre-se

um caminho mais dilatado para a indústria cultural, produtora do ouvido regredido e

indutora de mais regressão. O fetichismo musical escancarado pela indústria cultural

passa, então, a mostrar suas conseqüências. Por exemplo, uma delas é a valorização

pública dada às vozes dos cantores. Para Adorno (1991), em outros tempos, exigia-se

dos cantores alto virtuosismo técnico. Hoje, ter boa voz e ser cantor já é modus

operandi do sucesso. Esqueceu-se que a voz é, na música, apenas um de seus

exalta-se o material em si mesmo,

Logo, o fetichismo na música pode literalmente ser entendido como o

fetichismo da mercadoria, da mesma maneira que Marx o descreveu em O Capital.

Para Marx (1983), o fe

humano parecem dotados de vida própria, figuras autônomas, que mantêm relações

lmente o sucesso, que ele coisifica e aceita como

Daí que Adorno é enfático ao desvendar que a música atual é dominada pela

sua característica de mercadoria, sendo inclusive utilizada como instrumento para a

propaganda comercial de outras mercadorias. Essa coisificação da música torna os

ouvidos dóceis aos caprichos de um mercado nada preocupado com a condição de

regressão da audição. O consumidor é, pois, pré-fabricado pela indústria cultural.

Ouve-se a música conforme toda a esquematização já pré-estabelecida. Formas de

resistências são anuladas pelas estratégias comerciais, já que a fetichização musical

Page 45: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

40

ouvintes ainda fossem capazes de romper, com suas exigências, as barreiras que

Adorno, contudo, não caminha no sentido de observar um nexo causal entre as

músicas de sucesso e seus efeitos sobre os ouvintes. Todavia, coerente para com a

afirmação que os indivíduos já não estão em si, assevera dizer que a idéia de um

ouvinte atualmente influenciado se tornou vaga. Quem não está em si mesmo também

não pode ser influenciado integralmente.

Essa situação de fetichismo na música e regressão da audição contribui com o

estado de enfermidade conservadora do público. Praticamente nessa conjuntura se

torna intricado pensar para além dessa situação infantil geral. Adorno insiste numa

argumentação que é bastante limitada em muitos

consumidores em geral precisam e exigem exatamente aquilo que lhes é imposto

fetichista da música

produz, através da identificação dos ouvintes com os fetiches lançados no mercado, o

-se de uma dominação

perspicaz na qual o dominado entra no esquema da indústria cultural e não deseja

mais sair. Por duas razões: 1ª. Dificuldade estrutural de saída do cerco sistêmico e

crescente da indústria cultural; 2ª. Mesmo tomando consciência, não quer admitir que

seja uma espécie de receptáculo. Assim, permanece como um elemento a mais no

engodo das massas.

Todo esse esquematismo pode ser identificado pela produção musical de massa

que, como substância, fortemente corrobora com o ouvinte regredido e sua condição

de infantilidade. Contudo, mesmo esse ouvido regredido ao consumir a música ligeira

não o faz com a consciência tão tranqüila. Conforme Adorno (1991, p. 99), a

ambivalência dos ouvintes pacientes da regressão encontra a sua fórmula no seguinte

-se do estado passivo de consumidores sob coação

e procuram tornar- -

ainda mais iludidos. Todavia, e essa é uma observação importante que Adorno nos

Page 46: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

41

mesmo tempo que sentem prazer, no fundo as pessoas percebem-se traidoras de uma

Esse movimento de produção musical com caráter estandardizado causa certo

desconforto ao ouvido regredido mais atento, já que algo que ontem o encantava

agora deve causar repúdio. Segundo avalia, esse ouvinte gostaria de ridicularizar

aquilo que ontem mesmo o agradava, mas não o faz por razões de bloqueio estrutural

a posteriori

permanência na audição regressiva, redime-

favor do purame

Nesse ínterim, um elemento paradoxal surge: para uma música ligeira fazer

sucesso ela precisa conter traços que a diferencie das demais, mas, ao mesmo tempo,

deve conter ainda o completo esquematismo das demais canções. Em outras palavras:

deve ser igual e diferente concomitantemente. Eis aí uma situação embaraçada para

os managers do entretenimento de massa. Adorno e Simpson ilustram que uma

audição mais atenta das músicas estandardizadas poderia ser a condenação de seu

sucesso, já que o ouvinte logo se cansaria delas. Por outro lado, se não se presta

constantemente renovado de limpar do mercado seus novos produtos, de afugentá-los

para os seus túmul

(ADORNO; SIMPSON, 1994, p. 137).

Morin (1967, p. 30) esclarece oportunamente esse antagonismo mercadológico:

a indústria cultural deve vencer, pois, constantemente, uma contradição fundamental

entre suas estruturas burocratizadas-estandardizadas e a originalidade do produto que

ela deve fornecer19. Logo, como saída e desenlace desse antagonismo entre o

diferente e o igual coexistentes na música, ocorre a pseudoindividuação, isto é, a

envoltura da produção cultural de massa com a falsa idéia da livre-escolha. A

19

estructuras burocratizadas-1967, p. 30).

Page 47: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

42

padronização dos hits

escutando por eles. A pseudoindividuação, por sua vez, os mantém enquadrados,

fazendo-os esquecer que o que eles -

algo que, em si, já é indiferenciado. Busca dizer que os indivíduos são livres para

escolher o que, na verdade, já está escolhido previamente.

Como já alertado, não é que a indústria cultural impere determinando o que se

deve ouvir ou não. Trata-se de uma dominação muito arguta, na qual o próprio

dominado pouco consegue sua libertação; e também, mesmo na tomada de

consciência, não deseja sair.

subjacente a isso é o de que basta repetir algo até torná-lo reconhecível para que ele

reconhecimento em aceitação é uma equação doce para a consciência reificada.

Adorno e Simpson mostram, então, os componentes que estão envolvidos na

aceitação das massas. Em primeiro lugar, ao ouvir uma música ligeira de sucesso

ocorre uma vaga recordação que diz: - .

Todo esse crescente processo de estandardização provoca essa vaga recordação. Num

segundo momento, ocorre a identificação efetiva que diz: - . Surge, então, o

repentino reconhecimento após o avançar da música, uma vez que é difícil recordar

hits tão parecidos logo nos primeiros acordes. Num terceiro instante ocorre a

subsunção por rotulação: a interpretação da experiência do . Esse é o

elemento crucial do reconhecimento. No momento em que o indivíduo reconhece o

hit, ele sente segurança de estar entre muitos e acompanha a multidão de todos

aqueles que ouviram a canção. O momento seguinte é o da autorreflexão do ato de

reconhecer: . Essa transformação da

experiência em objeto torna-a mais objeto de propriedade do que nunca o fato de

que, por se reconhecer uma peça de música, se tenha comando sobre ela e se possa

reproduzi-la a partir de sua própria memória. Por fim, ocorre a transferência

psicológica da autoridade de reconhecimento para o objeto: .

Page 48: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

43

atribuir a ele, em termos de gosto, de preferência ou qualidade objetiva, o prazer da

RNO; SIMPSON, 1994, p. 134).

Essas etapas expressam os processos de aceitação da música sob o prisma da

indústria cultural. Visam a produção de uma concordância (embora seja importante

salientar que a padronização por si mesma não implica necessariamente em

desindividuação20). Como coroação, nascem e renascem essencialmente músicas

produzidas quase que industrialmente. Enfim, o devir educacional da música é

deixado de lado antes mesmo de sua concepção inicial. Tudo já está previamente

esquematizado. Uma desejável emancipação crítica do indivíduo é abandonada nos

simples atos de consumir e ouvir.

Em suas Notas de Literatura Lírica e

Sociedade da arte em geral não é a

simples demonstração de emoções, experiências individuais e sensações subjetivas.

especificação que adquirem ao ganhar forma estética, conquistam sua participação no

66). Para Adorno, a arte não pode ser reduzida ao

domínio do irracionalismo, do mero subjetivismo. Tal concepção seria similar às

estratégias da indústria cultural, já que nela permaneceria a consciência reificada

(ZUIN; PUCCI; RAMOS-DE-OLIVEIRA, 2001). A concepção adorniana de arte

aquela que busca escapar da produção da indústria cultural reside em sua

através da construção estética. Para ele, a arte, ao invés de ser mera exposição de

todo de uma

sociedade, tomada como unidade em si mesma contraditória, aparece na obra de arte;

p. 67

puramente individual. Para Adorno, o caráter social da arte deve mostrar, para além

20

p. 39).

Page 49: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

44

de sua individualidade estética, o anúncio de uma situação diferente; deve possibilitar

uma reação à coisificação do homem e do mundo. Segundo mostram Zuin, Pucci e

Ramos-de-Oliveira (2001, p. 44), em Adorno não se trata de uma arte pura, mas sim,

promessa de uma futu

Freitas (2008), também ancorada no pensamento adorniano, afirma que o

caráter fetichista da arte séria é necessário expresso pelo preceito da arte pela arte

( pour ) , uma vez que assegura o seu princípio antissocial e assegura o

desprezo por normas e códigos pré-estabelecidos. Por outro lado, paradoxalmente,

Adorno recusa a idéia da arte pela arte, dizendo que esta esteriliza o seu potencial

crítico. A arte possui, então, um forte vínculo com a sociedade, mas não aquele

estabel

histórica da relação entre os homens [...] reflete-se nos problemas inerentes das

aproxima da sociedade para, deste modo, fazer falar o seu silêncio. Como está

expresso na Teoria Estética

(ADORNO, 2006b, p. 15); ou seja: (ADORNO, 2006b,

p. 17).

A arte só pode pretender ser válida se carregar implicitamente uma crítica àscondições de produção, e se se recorda a distância privilegiada que ela guardadessas condições, esse valor se invalida instantaneamente. Inversamente, a arte sópode ser autêntica se reconhece, silenciosamente, o quão profundamente estácomprometida com aquilo a que se opõe; mas, ao levar essa lógica muito longe, enfraquece precisamente a sua autenticidade (EAGLETON, 1993, p. 253).

Por conseguinte, conforme nos enfatiza Terry Eagleton (1993, p. 255), a arte é,

ser-para-si e um ser-para-a-sociedade

básico os produtos da indústria cultural, sobretudo os mais massificados,

padronizados e racionalizados, distinguem-se radicalmente. Perpetram exatamente o

oposto, ou seja, aproximam-se da sociedade para, em seguida, silenciá-la.

Page 50: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

45

Novamente de acordo com Zuin, Pucci e Ramos-de-Oliveira, a teoria estética

adorniana vem mostrar que as obras de arte, além de despertarem o belo e o êxtase,

assim, um momento mimético no conceitual e um momento racional na arte. Na

leitura dos autores, nem a filosofia deve ser estetizada, nem a arte se racionalizar. A

experiência estética é, por conseguinte, a tensão entre esses dois pólos. Há na

Dialética Negativa uma passagem sinóptica dessa tensão:

Arte e filosofia não têm o seu elemento comum na forma ou no procedimentoconfigurador, mas em um modo de comportamento que proíbe a pseudomorfose. As duas permanecem incessantemente fiéis ao seu próprio teor através de suaoposição; a arte, na medida em que se enrijece contras as suas significações; afilosofia, na medida em que não se atém a nenhuma imediatidade (ADORNO, 2009, p. 21-22).

Essa perspectiva renovadora de Adorno é observada na Teoria Estética, obra

publicada postumamente em 1971, no qual, em um contexto marcado por conflitos, a

arte pode interiorizá-los e elaborá-los como experiência estética, e, ao provocar

perturbações e transtornos de percepção, mostrar condições de percepção de uma

realidade conflituosa (GINZBURG, 2003). A música pode ser e ter essa possibilidade

de expressão de uma estética crítica, não plenamente a música ligeira, mas a música

que permite uma experiência musical distinta do mero relaxamento e da pueril

diversão.

No tocante ao elemento diversão, atualmente tudo no sentido de

entretenimento, prazer, etc. é colocado pelos apologistas da indústria cultural,

modificasse, se um dia a arte, de mãos dadas com a sociedade, abandonasse a rotina

do s

criou a música, não efetivamente a da indústria cultural, mas a música que resiste a

audição regressiva.

A música séria possui uma potencialidade crítica, na medida em que pode ser

expressão do sofrimento humano diante do Mundo Administrado. Contudo, a música

Page 51: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

46

ligeira, além de ser muito fortemente distração, contribui potencialmente para a

regressão da capacidade de perceber algo além do imediato.

Para Adorno (2006a), na seleção de textos reunidos em Educação e

Emancipação, mais especificamente no texto homônimo, vivemos numa época de

educação não-emancipadora, mais voltada para a manutenção das instituições do que

para a busca da formação de indivíduos autônomos. Essa condição não-

emancipadora, chamada por Adorno de semiformação21, compreende-se, nas palavras

de Zuin (2001, p. 10), pela tentativa de oferecimento de uma formação educacional

que se camufla da real condição de emancipação dos indivíduos quando,

sivamente tanto para a reprodução da miséria espiritual

como para a manutenção da barbárie social. E o contexto social no qual a barbárie é

ucação representa a educação deturpada,

afirmativamente para a confirmação da reprodução do vigente, para a perpetuação de

um mundo da adaptação (MAAR, 2003).

Bahia (2004, p. 125) é

escolaridade com capacidade de compreensão do mundo22

termos dessa educação semiformadora mais confunde do que esclarece. A

semicultura é, pois, semiformação cultural que deforma e que limita o indivíduo,

trazendo obstáculos à uma formação crítica (ZUIN; PUCCI; RAMOS-DE-

OLIVEIRA, 2001).

Assume-se, deste modo, seguindo o projeto teórico adorniano, a tese da

necessidade da educação como um estado de consciência crítica ao status quo, capaz

21 a expressão semiformação foi cunhada modernamente no ano denascimento de Adorno 1903 pelo neohumanista Friedrich Paulsen, no livro Halbbildung. Significava o

re umsentido mais largo, ou seja, de adaptação acrítica embora potencialmente competente ao mundo social.

22

(ZUIN; PUCCI; RAMOS-DE-OLIVEIRA, 2001, p. 63).

Page 52: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

47

de pensar em suas contradições e imaginar algo para além dessa situação23.

Reforçando com a sinopse de Silva (2009), a educação em Adorno é uma educação

negativa no confronto com a realidade: educação para a crítica, para a contradição e

para a resistência. Daí que a emancipação não pode ser tratada como uma categoria

vazia, capaz de elevar o indivíduo a um mundo que não existe em concretude. Trata-

se, aliás, da formação de um sujeito que, além de saber jogar, conhece as regras do

jogo. Para Adorno, deve-se alertar aos homens o caráter de sua ilusão permanente,

mundus vult decipi

183).

A educação autêntica em Adorno tem um duplo sentido: adaptação, mas

também um estado de crítica, um momento de possibilidade de autonomia. Nele, a

educação verdadeira, ou seja, aquela que difere da semiformação ou semicultura, é,

sumariamente o mesmo que emancipação. Portanto, não se trata de pensar o conceito

de emancipação como uma categoria vazia, mas sim, como um vir-a-ser, já que é

preciso ver efetivamente as enormes dificuldades que se opõem ao conceito na atual

organização do mundo e, também, não ser possível pensar num indivíduo existindo

na sociedade simplesmente conforme suas próprias determinações. Mesmo este

suposto homem emancipado permanece arriscado a se tornar não emancipado, uma

vez que qualquer tentativa de crítica é submetida a resistências. Segundo Zuin (2001,

ificulta-se a sobrevivência do pensamento crítico numa sociedade em que os

Fechando esta reflexão, para Adorno (2006a), os defensores do status quo

procurarão sempre demonstrar que essa emancipação está superada; é utópica. Quem

se habilita a demonstrar o contrário? Quem se habilita a ilustrar uma nova música ou

um outro uso para a indústria cultural? Fica esta provocação como desfecho.

23 Um esclarecimento deve ser posto, baseado no pensamento adorniano problematizado por Freitag:

libertadora e repressora, não poderia, por si só, romper com essas estruturas objetivadas que se opõem de

tenha um sentido, ora elitista, ora utópico, já é um requisito para se pensar e refletir sobre o avanço da semi-cultura, da semi-formação.

Page 53: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

48

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Page 55: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

50

CAPÍTULO 3

NOTAS SOBRE O TEMPO LIVRE24

Este ensaio objetivou aproveitar algumas reflexões presentes em Theodor W.

Adorno para se pensar o lazer e o consumo do tempo livre nas sociedades

contemporâneas. Fundamentalmente a partir das discussões acerca da semiformação

(Halbbildung), da indústria cultural (Kulturindustrie) e do tempo livre (Freizeit),

entende-se o lazer como um fenômeno indissociável do espírito de nosso tempo,

marcado, segundo Adorno, pela heteronomia cultural, pela transformação do homem

em estatuto de coisa e pela ideologia como propaganda do mundo. Deste modo, não

há como se pensar lazer e tempo livre longe das relações sociais concretas, históricas

e, portanto, sujeitas aos imperativos da integração social.

Nesse sentido, este capítulo vem apresentar ou (re)apresentar a obra de

Theodor W. Adorno para os chamados estudos do lazer e do tempo livre, campo

interdisciplinar em que o autor ainda não é tão lido, sobretudo no Brasil. Autor de

uma obra de difícil compreensão, Adorno necessita ainda de maiores reflexões acerca

de suas ideias25. Logo, esta breve reflexão vem tentar preencher uma lacuna existente,

na medida em que traz as ideias de Adorno para um campo do conhecimento ainda

24 Produzido juntamente com Marcela Amália Pereira Cabrita e Tássio Ricelly Pinto de Farias. Originalmente publicado na revista Turydes (2014). Jean Henrique Costa, Marcela Amália Pereira Cabritay Tássio Ricelly Pinto deTurydes: Turismo y Desarrollo, n. 17 (diciembre 2014).Há uma versão ligeiramente reduzida publicada no livro Investigações sobre o Agir Humano, GalileuGalilei Medeiros de Souza e Francisco de Assis Costa da Silva (Orgs), Edições UERN, 2014. 25 Adorno é tido como autorde leitura particularmente difícil quem gosta de tudo pronto e arrumado, não deve lerAdorno. Essa leitura é para quem está disposto a uma experiência instigante, às vezes exasperante, massempre fecunda cada frase de seustextos é, por assim dizer, obrigada a trabalhar em excesso; cada sentença deve tornar-se uma obra-prima ouum milagre da dialética, fixando um pensamento um segundo antes que ele desapareça em suas própriascontradições [...] Todos os filósofos marxistas devem ser pensadores dialéticos, mas com Adorno pode-sesentir o esforço e a dificuldade desse estilo vivo em cada frase, numa linguagem construída contra o silencio,

(EAGLETON, 1993, p. 247-248).

Page 56: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

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marcado por uma visão muito instrumental do fenômeno do lazer. Assim, seguindo o

pensamento crítico adorniano, é necessário que o lazer seja pensado para além do

simples fato do entretenimento, ou ainda, da funcional reposição das energias vitais

para o trabalho.

O texto estrutural de apoio deste ensaio é Tempo Livre

ano da morte de

Adorno , que tem por

MARCELLINO, 2010, p. 03). Este texto foi publicado no Brasil originalmente em

Palavras e Sinais, de 1995, tradução brasileira de Stichworte: kritische modelle 2

(Frankfurt am Main, Suhrkamp).

Iniciando o debate, entende-se como tempo livre todo e qualquer tempo que se

passa longe do trabalho ou das distintas obrigações cotidianas. Diferentemente do

sentido comum de ócio, que expressaria algo mais contemplativo, o tempo livre está

atrelado e anda lado a lado com o trabalho. Mas até que ponto se tem realmente um

tempo livre? O que poderia ser esse tempo livre? Que tipo de "diversão" caberia

nele? Essas e outras questões são levantadas quando pensamos mais profundamente o

que é o tempo livre vigente sob relações capitalistas.

o tempo livre é acorrentado ao seu oposto

ele, o tempo livre depende fundamentalmente das relações concretas que esse

mantém com a sociedade. Por conseguinte, não há como se dissociar as práticas do

tempo livre do modo de produção vigente. Tal dissociação traz, em si,

metodologicamente, um viés ideológico. O mesmo sangue que corre no lazer corre

também no trabalho. Logo, em

situação geral da sociedade. Mas esta, agora como antes, mantém as pessoas sob um

fascínio. Nem em seu trabalho, nem em sua consciência dispõem de si mesmas com

ca de integração social sem precedentes,

fica difícil estabelecer, de forma geral, o que resta nas pessoas, além do determinado

Page 57: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

52

O problema da integração (tema que permeia toda discussão acerca da indústria

cultural, do fetichismo, da ideologia e da semiformação em Adorno) é central para

entender o prolongamento da não liberdade do tempo livre. Aliás, para Adorno, o

termo livre só funciona como paródia. Não há liberdade efetiva, real, concreta.

Entenda-se por liberdade como paródia apenas a liberdade de se integrar numa ordem

que não liberta das amarras vigentes. Como já estava posto na Dialética do

Esclarecimento em 1947: a máquina gira sem sair do lugar.

Nesse ínterim, a semiformação se torna o grande maestro da integração.

A formação cultural agora se converte em uma semiformação socializada, naonipresença do espírito alienado, que, segundo sua gênese e seu sentido, nãoantecede à formação cultural, mas a sucede. Deste modo, tudo fica aprisionado nasmalhas da socialização (ADORNO, 1996, p. 388-411).

Zuin reforça este entendimento:

Compreende-se o conceito semiformação justamente pela tentativa de oferecimentode uma formação educacional que se faz passar pela verdadeira condição deemancipação dos indivíduos quando, na realidade, contribui decisivamente tantopara a reprodução da miséria espiritual como para a manutenção da barbárie social. E o contexto social no qual a barbárie é continuamente reiterada é o da indústriacultural hegemônica (ZUIN, 2001, p. 10).

Vê-se, pois, que com o avanço da semiformação e da indústria cultural a

organização do tempo livre passa cada vez mais a depender de critérios objetivos do

que da autonomia do indivíduo. A heteronomia, expressão kantiana, vira uma regra.

Um exemplo é a ideologia do hobby ditada pela indústria cultural, que nada mais é do

apontadas por Adorno eram os hobbies, ocupações que serviam apenas para matar o

tempo e que todas as pessoas deveriam ter, fossem eles significativos ou não para

-se, com isso, que até as atitudes mais

simples tendem a passar pelo mercado. Tudo é pensado e colocado de forma que

permita que a vida social se torne mais planejada, principalmente com a expansão das

chamadas atividades do tempo livre (indústria do entretenimento), oportunizadas pela

Page 58: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

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redução legal da jornada de trabalho. O tédio passa a ser, então, uma enfermidade

marcante nas sociedades administradas.

De fato, o chamado tempo livre do trabalho, o que chamaremos aqui de tempo

graças às invenções, ainda não totalmente utilizadas em termos econômicos nos

campos da energia atômica e da aut

(ADORNO, 2002, p. 104). Contudo,

[...] Se se quisesse responder à questão sem asserções ideológicas, tornar-se-iaimperiosa a suspeita de que o tempo livre tende em direção contrária à de seupróprio conceito, tornando-se paródia; deste. Nele se prolonga a não-liberdade, tãodesconhecida da maioria das pessoas não-livres como a sua não-liberdade, em simesma (ADORNO, 2002, p. 104).

Assim, para Adorno o tempo livre tanto não pode ser pensado dissociado do

tempo das obrigações, bem como, das possibilidades efetivas de dominação. A

extensa citação abaixo, fruto de um depoimento biográfico do autor, ilustra o

argumento:

Eu não tenho qualquer hobby. Não que eu seja uma besta de trabalho que não sabefazer consigo nada além de esforçar-se e fazer aquilo que deve fazer. Mas aquilocom o que me ocupo fora da minha profissão oficial é, para mim, sem exceção, tãosério que me sentiria chocado com a idéia de que se tratasse de hobbies, portantoocupações nas quais me jogaria absurdamente só para matar o tempo, se minhaexperiência contra todo tipo de manifestações de barbárie que se tomaram comoque coisas naturais não me tivesse endurecido. Compor música, escutar música, ler concentradamente, são momentos integrais da minha existência, a palavrahobby seria escárnio em relação a elas. Inversamente, meu trabalho, a produçãofilosófica e sociológica e o ensino na universidade, têm-me sido tão gratos até omomento que não conseguiria considerá-los como opostos ao tempo livre, como ahabitualmente cortante divisão requer das pessoas. Sem dúvida, estou consciente deque estou falando como privilegiado, com a cota de casualidade e de culpa que istocomporta; como alguém que teve a rara chance de escolher e organizar seu trabalhoessencialmente segundo as próprias intenções. Esse aspecto conta, não em últimolugar, para o fato de que aquilo que faço fora do horário de trabalho não seencontre em estrita oposição em relação a este. Caso um dia o tempo livre setransformasse efetivamente naquela situação em que aquilo que antes foraprivilégio agora se tornasse benefício de todos e algo disso alcançou a sociedadeburguesa, em comparação com a feudal , eu imaginaria este tempo livre segundoo modelo que observei em mim mesmo, embora esse modelo, em circunstânciasdiferentes, ficasse, por sua vez, modificado (ADORNO, 2002, p. 105-106).

Page 59: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

54

Deste modo, quando se considera o trabalho uma coisa significativa, prazerosa

e gratificante, para Adorno, não se consegue considerá-lo oposto ao tempo livre. Por

isso não há porque denominar o que se faz no não-trabalho de hobby. A imensa

vontade de ocupar o tempo livre com algo que não lembre o trabalho, com coisas que

escapem a ele, é prova de que não se consegue esquecê-lo. Assim, fica claro que, lá

onde mais nos escondemos do trabalho, onde mais tentamos nos refugiar dele, no

As Estrelas Descem a Terra

aludido:

A ideia é que, mantendo-se estritamente separadas as esferas do trabalho e doprazer, ambos os tipos de atividade serão beneficiados: aberrações instintuais nãointerferirão com a seriedade do comportamento racional, e nenhum sinal sombriode gravidade e responsabilidade maculará a diversão. Obviamente, esse dispositivoé, de alguma maneira, derivado da organização social que afeta o indivíduo àmedida que sua vida é dividida em duas seções: numa delas, ele funciona como umprodutor; na outra, como consumidor. É como se essa dicotomia básica do processoda vida econômica da sociedade fosse projetada sobre o indivíduo.Psicologicamente, as conotações compulsivas baseadas em uma visão puritana nãopodem ser negligenciadas, não apenas no que diz respeito ao padrão bifásico davida como um todo, mas também a noções tais como a limpeza: nenhuma das duasesferas pode ser contaminada pela outra. Embora esse conselho possa oferecervantagens em termos de racionalização econômica, seus méritos intrínsecos são denatureza dúbia. O trabalho que é completamente separado do elemento lúdicotorna-se insípido e monótono, uma tendência que é consumada pela quantificaçãocompleta do trabalho industrial. O prazer, quando igualmente isolado do conteúdosério da vida, torna-se bobo, sem sentido, reduz-se completamente aoentretenimento e, em última instância, é apenas um mero meio de reproduzir a

capacidade de trabalho do indivíduo, enquanto a verdadeira substância de qualqueratividade não-utilitária jaz na maneira como ela encara e sublima os problemas darealidade: res severa verum gaudium [a verdadeira alegria é uma coisa séria, Sêneca, Epistulae Morales, 23, 4]. (ADORNO, 2008b, p. 98-99).

Uma outra forma de percepção do problema é simplesmente reparar como

organizamos o nosso fim de semana em função do nosso trabalho. Tudo é projetado

como forma de negar o trabalho, mas acaba sendo uma extensão dele. Bebe-se no

sábado a noite toda (já que não se trabalha no domingo); no domingo, bebe-se

somente até às dezesseis horas; depois disso, deve-se descansar, pois logo será

segunda-feira e toda rotina de trabalho será retomada. Sem esquecer que o próprio ato

-

Page 60: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

55

momento pensando em retomá-

separação entre sujeito e trabalho é impossível já que, no modo de produção

ar uma divisão [...] entre as pessoas em si e seus assim

-104).

Para não deixarmos de mencionar formas de lazer destacadas por Adorno

turismo e o camping,

Destarte, sob as relações capitalistas, no tempo livre se prolongam formas de vida

social organizadas segundo o regime do lucro. A indústria cultural cuida de manter a

administração da cultura. A indústria cultural é a ferramenta indispensável para a

manutenção e perpetuação do mundo administrado (verwalteten Welt), pois como

a administração monopolizada de suas satisfações podem significar, através da

dominação material dos indivíduos, o controle dos corpos e, por decorrência, das

entendemos ser muito mais uma cultura industrializada, produzida como forma de

perpetuar a dominação dos indivíduos no capitalismo, mas não como forma de se

opor a ele.

Mas o que vemos, ab initio, é que o tempo livre tornou-se planejado e

abertamente uma mercadoria. Um tempo de consumo. Um bem que além de ser algo

imposto é também excessivamente cobrado pelos próprios sujeitos. Não ter lazer e

não consumir no lazer significa estar fora de toda uma rede de signos e significados

no capitalismo. Ninguém quer ficar de fora! "O tempo livre segue como reflexo do

ritmo de produção imposto heteronomamente ao sujeito, que forçosamente é mantido

também nas fatigadas pausas" (ADORNO, 2008a, p. 171). O tempo livre tornou-se,

então, um negócio altamente rentável que é oferecido e quase forçado a ser

consumido da mesma maneira para toda a sociedade, como Adorno deixa claro na

expressão negócios do tempo livre (Frei-zeitgeschiffl). A indústria cultural se torna,

pois, o maestro desta semiformação.

Page 61: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

56

indústria cultural seria a capacidade de produzir o produto e ao mesmo

tempo criar sua necessidade de uso, ou seja, a indústria cultural seria um conceito e

indústria cultural". A indústria cultural é responsável por perpetuar a nossa condição

de vida irrefletida (o que Adorno chamou de vida danificada beschädigten Leben), na

medida em que nos incentiva a consumir e nos distancia da reflexão acerca do

trabalho necessário para bancar o consumo de nossa própria sujeição. Conforme

Adorno e Horkheimer (1985, p. 112-114):

[...] a indústria cultural permanece a indústria da diversão. Seu controle sobre osindivíduos é mediado pela diversão [...]. A verdade em tudo isso é que o poder daindústria cultural provém de sua identificação com a necessidade produzida, não dasimples oposição a ela [...]. A diversão é o prolongamento do trabalho sob o capitalismo tardio. Ela é procurada por quem quer escapar ao processo de trabalhomecanizado, para se pôr de novo em condições de enfrentá-lo. [...] O espectadornão deve ter necessidade de nenhum pensamento próprio, o produto prescreve todareação: não por sua estrutura temática que desmorona na medida em que exige opensamento , mas através de sinais. Toda ligação lógica que pressuponha umesforço intelectual é escrupulosamente evitada. [...] o pensamento é ele própriomassacrado e despedaçado.

A passagem acima se refere à coesão do modo de produção capitalista (sua

imensa capacidade de integração), a forma como ele aos poucos se torna cada vez

mais fortalecido à medida que cria em nós a necessidade que ele mesmo virá suprir.

Assim, a íntima relação entre indústria cultural e tempo livre se evidencia no fato de

justamente no tempo de não-trabalho (livre) pararmos para consumir os produtos da

indústria cultural que, transvestidos em produtos culturais, nos oferecem a fuga do

trabalho, sendo uma forma de descansar dele para, inconscientemente, retornarmos a

ele dispostos a produzir mais. E mesmo quando não estamos consumindo nada,

ocupamos nosso tempo com coisas que prolongam a nossa condição de sujeitos

coisificados, com práticas que nada acrescentam à nossa reflexão diante da vida e do

mundo. A reflexão mais densa de Adorno é pensar, pois, os riscos estruturais da

dominação a partir de elementos banais do cotidiano. Logo, o que se faz fora do

trabalho repercute estruturalmente no trabalho. No tempo supostamente livre não

Page 62: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

57

esquecemos a lógica do trabalho. Aceita-se e se nega contraditoriamente o trabalho e

suas dimensões.

Aqui nos deparamos com um esquema de conduta do caráter burguês. Por um lado, deve-se estar concentrado no trabalho, não se distrair, não cometer disparates;sobre essa base repousou outrora o trabalho assalariado, e suas normas foraminteriorizadas. Por outro lado, deve o tempo livre, provavelmente para que depoisse possa trabalhar melhor, não lembrar em nada o trabalho. Esta é a razão daimbecilidade de muitas ocupações do tempo livre (ADORNO, 2002, p. 106-107).

Para Adorno e Horkheimer (1985), o lazer é apenas uma fase projetada do

próprio trabalho, pois à medida que os indivíduos não aproveitam o descanso para

refletirem sobre suas condições de existência, permanecem alienados ao próprio

sistema , e, substancialmente, aproveitam os dias de folga para mergulharem nos

devaneios do consumo. Tudo é projetado de forma tal que os homens não se

detenham na reflexão acerca do estado de suas vidas e condições de trabalho. Com

isso surge a configuração de que eles são programados para trabalhar e consumir. O

próprio ócio vai se tornando apenas um consumo, pois neste momento a publicidade

invade os lares através da TV, do filme, da música produzida para o mercado e de

diversas outras mercadorias.

[...] os indivíduos, na necessidade de momentos de lazer e fuga do trabalho,submetem-se aos produtos da indústria cultural que, por sua vez, prometendo essafuga do trabalho, oferecem sempre atrações que reproduzem o cotidiano dotrabalho como se fosse novidade (FERNANDES, 2010, p. 28).

No tempo livre, o qual se acostumou chamar de lazer por oposição ao tempo de

trabalho (não-

feito por um motorista profissional, que dirige quarenta horas semanais e ao chegar

ao fim de semana se obriga a pegar a estrada em direção à praia e dirigir novamente

uma ou duas horas, para dizer na segunda-

menos refletir que fez no seu tempo livre aquilo que já havia

feito em toda a sua semana de trabalho. O mesmo acontece com um trabalhador da

construção civil que passa o dia inteiro realizando movimentos com tijolos, telhas,

Page 63: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

58

etc., e que a noite se dirige à academia para malhar e repetir os movimentos

realizados o dia todo. Portanto, observa-se que existe tanta imposição para o tempo

livre que nos tornamos reféns dele. O tempo livre passou a ser uma obrigação que a

sociedade tem com ela mesma e não um momen

atividades de livre escolha.

Entrementes, o ideal seria que todos os indivíduos tivessem algo construtivo

para fazer no seu tempo livre. Mas não é isso que ocorre. De uma forma geral, ocorre

o contrário: vemos uma falta de liberdade de poder fazer o que se gosta e o que se

quer. A heteronomia é dominante, seja pelas condições educacionais, seja pelas

sistema capitalista desenvolvendo papéis que lhes eram impostos pela sociedade, ou

p. 33). Assim, os indivíduos, de individualidade debilitada, não possuem liberdade,

nem dentro, nem fora do trabalho. Segundo Adorno, a separação entre as esferas da

produção e da não-produção está na consciência.

[...] a distinção entre trabalho e tempo livre foi incutida como norma a consciênciae inconsciência das pessoas. Como, segundo a moral do trabalho vigente, o tempoem que se está livre do trabalho tem por função restaurar a força de trabalho, otempo livre do trabalho precisamente porque é um mero apêndice do trabalho

vem a ser separado deste com zelo puritano (ADORNO, 2002, p. 106).

es enaltece a coisificação que

107). Para Adorno a liberdade vigente hoje é organizada, logo, torna-se coercitiva. A

ideologia do hobby já citada é exemplo disso. Todos buscam se enquadrar na moda

dos lazeres contemporâneos. A lista é enorme: artes marciais (o chamado mixed

martial arts hoje é prova disso), esportes radicais, viagens, etc. Adorno (2002, p. 107)

a o

tempo livre então tu és um pretensioso ou antiquado, um bicho raro, e cais em

Page 64: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

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Importa destacar que é essa necessidade de liberdade das pessoas que gera esse

comércio do tempo livre. É a partir do momento em que se deseja algo que a indústria

cultural comanda o tempo livre dos indivíduos. Podemos perceber essa dominação

simbólica em outro exemplo que Adorno cita: quando um indivíduo sai de férias é

esperado dele não só que aproveite, mas principalmente que volte com algo que

indique que o mesmo estava realmente de férias. Pensando nisso é citado o exemplo

do bronzeado, algo característico de quem está de férias. Além disso, o bronzeado

deixou de ser apenas um sinal de saúde e vida ao ar livre para ser também

obrigatoriedade da tez bronzeada concerne ao necessário reconhecimento dos outros

de que o indivíduo conseguiu se desvencilhar por algum tempo do trabalho,

Nesse meio tempo, a sutileza metodológica de Adorno (2002, p. 108) se

alcançada sem maiores dificuldades; as pessoas não percebem o quanto não são livres

lá onde mais livres se sentem, porque a regra de tal ausência de liberdade foi

O grande resultado disso é o estado de letargia no qual vivem os

indivíduos. O tédio se torna a materialização e prova deste estado. Para Adorno

(2002, p. 110),

O tédio existe em função da vida sob a coação do trabalho e sob a rigorosa divisãodo trabalho. Não teria que existir. Sempre que a conduta no tempo livre éverdadeiramente autônoma, determinada pelas próprias pessoas enquanto sereslivres, é difícil que se instale o tédio; tampouco ali onde elas perseguem seu anseiode felicidade, ou onde sua atividade no tempo livre é racional em si mesma, comoalgo em si pleno de sentido [...] Se as pessoas pudessem decidir sobre si mesmas esobre suas vidas, se não estivessem encerradas no sempre-igual, então não seentediariam. Tédio é o reflexo do cinza objetivo.

Este cinza objetivo se materializa na perda da criatividade (e, com ela, a

redução das possibilidades concretas de fuga do sempre-igual). A falta de criatividade

(leia-se fantasia) torna as pessoas desamparadas no consumo do tempo livre.

Page 65: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

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A pergunta descarada sobre o que o povo fará com todo o tempo livre de que hojedispõe como se este fosse uma esmola e não um direito humano baseia-senisso. Que efetivamente as pessoas só consigam fazer tão pouco de seu tempo livrese deve a que, de antemão, já lhes foi amputado o que poderia tornar prazeroso otempo livre. [...] Sob as condições vigentes, seria inoportuno e insensato esperar ouexigir das pessoas que realizem algo produtivo em seu tempo livre, uma vez que sedestruiu nelas justamente a produtividade, a capacidade criativa. Aquilo queproduzem no tempo livre, na melhor das hipóteses, nem é muito melhor que oominoso hobby (ADORNO, 2002, p. 111).

Para Adorno, tempo livre produtivo, ou seja, aquele distante da heteronomia,

somente pode ser possível para pessoas emancipadas. O que resta para a grande

massa que vive sob o escudo da heteronomia é a pseudoatividade, intitulada por

Adorno (2002, p. 113) como

sociedade, por um lado, reclama incessantemente e, por outro lado, refreia e não quer

está em

oposição somente ao trabalho, mas o segue diretamente como sua sombra.

Esta pseudoatividade enquadra os indivíduos numa auréola da livre escolha

quando, de fato, tudo já está escolhido previamente. Os filmes, músicas, jogos. etc.

divergem apenas na aparência da livre concorrência. Em essência, contêm o mesmo

objetivo da indústria cultural: a manutenção da condição estrutural de dominação dos

indivíduos, dentro e fora do trabalho.

Mas em que este texto Tempo Livre avança na teoria crítica (Kritische Theorie)

adorniana? Que Adorno podemos encontrar nele? Primeiramente, trata-se de um

Adorno que mantém fortemente o tom crítico e sempre fiel ao espírito da Teoria

Crítica, sem se deixar encantar pelos encantos da diversidade cultural, tampouco

pelas teorias conciliatórias da relação indivíduo-sociedade. Segundo, e esta é a grande

inferência, neste texto vemos um Adorno refinando sua teoria, ao apontar

possibilidades de questionamento do poder de sedução da indústria cultural. Ao

realizar um estudo, no Instituto de Pesquisas Sociais de Frankfurt, percebe que nem

tudo que é emitido pela indústria cultural pode ter eficácia efetiva.

Page 66: Teoria crítica: ensaios sobre Theodor W. Adorno

61

O estudo era relativo ao casamento da princesa Beatriz, da Holanda, com o jovemdiplomata alemão Claus Von Amsberg. Deveríamos verificar como o povo alemãoreagia a este casamento, o qual, difundido por todos os meios de comunicação demassas e minuciosamente descrito pelas revistas ilustradas, era consumido duranteo tempo livre. Dado o modo de apresentação e a quantidade de artigos que foramescritos sobre o acontecimento, atribuindo-lhe importância extraordinária, esperávamos que também os telespectadores e os leitores o considerariamigualmente importante. Acreditávamos, em especial, que operaria a hoje típicaideologia da personalização, que consiste em atribuir-se importância desmedida apessoas individuais e a relações privadas contra o efetivamente determinante, desdeo ponto de vista social, evidentemente como compensação da funcionalização darealidade (ADORNO, 2002, p. 115).

Diante desta constatação, de base empírica vale destacar, Adorno apresenta os

limites do poder da indústria cultural e, estruturalmente, abre caminho para se pensar

resistências diversas na produção e no consumo do tempo livre. Com o estudo

Adorno percebeu que uma parte da audiência se portou de modo bem realista em

relação ao acontecimento e avaliou com sentido crítico os fatos narrados. Assim, há

na obra adorniana possibilidades de resistência mesmo no consumo dos veículos de

comunicação de massa. A passagem abaixo é sinóptica desta condição:

Em conseqüência, se minha conclusão não é muito apressada, as pessoas aceitam econsomem o que a indústria cultural lhes oferece para o tempo livre, mas com umtipo de reserva, de forma semelhante à maneira como mesmo os mais ingênuos nãoconsideram reais os episódios oferecidos pelo teatro e pelo cinema. Talvez maisainda: não se acredita inteiramente neles. É evidente que ainda não se alcançouinteiramente a integração da consciência e do tempo livre. Os interesses reais doindivíduo ainda são suficientemente fortes para, dentro de certos limites, resistir àapreensão [Erfassung] total. Isto coincidiria com o prognóstico social, segundo oqual, uma sociedade, cujas contradições fundamentais permanecem inalteradas,também não poderia ser totalmente integrada pela consciência. A coisa nãofunciona assim tão sem dificuldades, e menos no tempo livre, que, sem dúvida, envolve as pessoas, mas, segundo seu próprio conceito, não pode envolvê-lascompletamente sem que isso fosse demasiado para elas (ADORNO, 2002, p. 116-117).

Portanto, na parte final do ensaio Tempo Livre, apresenta-se o grande trunfo de

porém, que se vislumbra aí uma chance de emancipação que poderia, enfim,

contribuir algum dia com a sua parte para que o tempo livre [Freizeit] se transforme

em liberdade (ADORNO, 2002, p. 117).

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Assim, não há concordância com grande parte da literatura hoje produzida

sobre a indústria cultural que enxerga o pensamento adorniano permeado por um

pessimismo totalizador. A crítica desse autor não se encerra totalmente nesse tal

pessimismo à medida que deságua na possibilidade utópica do tempo livre se

importância da educação, pois ela seria a única capaz de promover tal emancipação.

Esse processo de emancipação se daria inicialmente pela via da negatividade, ou seja,

processo deveria ser iniciado a partir da tomada de consciência dos meios pelos quais

o capitalismo, através da indústria cultural, tem administrado o mundo.

O mesmo Adorno que afirma em 1947, na Dialética do Esclarecimento, que

nunca se chegou a uma verdadeira individualização, afirma também em 1969, em

Tempo Livre

para, dentro de certos limites, resistir à apreensão [Erfassung p. 116), e o

primeiro passo para essa resistência, para o exercício mínimo da liberdade, seria dado

por a

(ADORNO, 1995, p. 183). Portanto, apesar de não negar (e acentuar) a alienação das

massas, Adorno ente

A esperança! É

como se a consciência crítica ainda não tivesse sido completamente dissolvida.

Tanto em Tempo Livre como em Educação e Emancipação Adorno expressa

alguma fé na recuperação da autonomia por parte das massas

originalmente pessimista, a tendência, no decorrer da obra de Adorno, é o caminho

(FERNANDES, 2010, p. 47). No entanto, não sob as condições vividas na Europa até

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o final da Segunda Guerra Mundial. Primeiro, por causa dos regimes totalitários e

autoritários; segundo, porque lá onde o homem se afirmou mais esclarecido, na

Alemanha dos grandes filósofos, aconteceu também o holocausto, o que para Adorno

foi a maior prova de que a racionalidade técnica havia destruído o sonho da razão

emancipatória; por fim, por ter sido a indústria cultural utilizada para todas essas

mazelas sociais, desde o culto à imagem do führer até a exaltação do orgulho alemão

através dos filmes de Joseph Goebbels, ministro da propaganda do Terceiro Reich. A

imaginação havia sido obliterada, e junto a ela, toda capacidade criativa.

benefício, e não por privilégio, para decidir, escolher e organizar segundo suas

indústria cultural anda de mãos dadas com o tempo livre, pois é ela quem dita às

regras do que deverá ser consumido, colocando no mercado o que se quer e deixando

a sociedade estruturalmente sem escolha efetiva (real). Contudo, é justamente no

meio desse turbilhão de acontecimentos que vemos que nem tudo é aceito ou pelo

menos não totalmente aceito.

O texto de Adorno foi publicado em 1969. Embora tenham se passado quase 50

anos da publicação do texto de Adorno sobre o lazer, datado de 1969, e o contexto

histórico seja completamente diferente, o texto é incrivelmente atual.

Estruturalmente os indivíduos vivenciam diversas imposições. Sejam elas na

própria família, no trabalho, na escola, religião, distintas ideologias, etc. Não importa

o grupo social, todos vivenciam estas imposições. Como cada indivíduo lida com tais

-se, mais ou menos

segundo um plano, produtos adaptados ao consumo das massas e que em grande

ão há

como pensar o lazer sem refletir acerca de toda estrutura educacional hegemônica. O

lazer é reflexo, pois, diretamente da educação vigente no espírito de nosso tempo,

marcado por ideais de competitividade, individualismo e pragmatismo. Também não

há como pensar o lazer sem pensar nos tempos sociais em que está inserido, dentro e

fora do mundo das obrigações. O mesmo ocorre com a indústria cultural: o cerco

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sistêmico, a capacidade crescente de prescrição de desejos e o consumo como

dominação do sujeito impactam diretamente na relação do indivíduo com o lúdico, o

ócio... Assim, num contexto de educação para o status quo, de existência de um

de todo avanço sistêmico da indústria cultural, o lazer deixa de ser, muito

provavelmente, um momento lúdico-criativo para se tornar tempo e ação de mais

ideologia, de mais consumismo, de mais práticas não-emancipatórias do indivíduo

(mais conformismo). O lazer deve educar, nele e para além dele. Contudo, todos os

limites apontados por Adorno mostram que o consumo do tempo livre tinha se

tornado cada vez mais a produção de mais dominação.

Mesmo assim,

Embora originalmente pessimista, a tendência, no decorrer da obra de Adorno, é o

[...] Assim, suas contribuições são fundamentais para entendermos o lazermercadoria (simples atividades colocadas no mercado de consumo, que nãoobedecem a outro critério senão o do lucro financeiro imediato) (FERNANDES, 2010, p. 47).

Logo, fecha-se (ou se abre, depende da perspectiva) este pequeno livro com a

confiança de que a teoria crítica adorniana contribui decisivamente para evitar uma

elaboração conceitual instrumental do lazer como mera recreação. Trata-se, pois, de

um rico referencial teórico crítico e disposto a denunciar as armadilhas do status quo,

dentro e fora do tempo livre.

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