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SUMÁRIO ARTIGOS ORIGINAIS Capa AVALIAÇÃO GERIÁTRICA ABRANGENTE DE IDOSOS ATENDIDOS EM UMA UNIDADE DE SAÚDE DA FAMÍLIA COMPREHENSIVE GERIATRIC EVALUATION OF THE ELDERLY TREATED AT A FAMILY HEALTH UNIT. Leonardo Leitão Batista, Maria das Graças Melo Fernandes, Maria do Socorro Lucena da Nóbrega Pesquisa A UTILIZAÇÃO DA METODOLOGIA DA PROBLEMATIZAÇÃO NO CURSO INTRODUTÓRIO PARA SAÚDE DA FAMÍLIA DO PÓLO DE CAPACITAÇÃO DA UFJF THE UTILIZATION OF QUESTIONING METHODOLOGY IN THE INTRODUCTORY COURSE OF FAMILY HEALTH AT THE TRAINING HUB OF UFJF Beatriz Francisco Farah, Célia Regina Pierantoni PERFIL SOCIAL DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE VINCULADOS AO PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA DA ZONA NORTE DO MUNICÍPIO DE JUIZ DE FORA SOCIAL PROFILE OF THE COMMUNITY HEALTH AGENTS LINKED TO THE PROGRAM FAMILY HEALTH OF THE OF THE NORTH ZONE OF THE MUNICIPAL DISTRICT OF JUIZ DE FORA Marcelo Henrique da Silva, Maria Ruth dos Santos TRABALHANDO COM FAMÍLIAS UTILIZANDO FERRAMENTAS USING TOOLS TO WORK WITH FAMILIES Janaina Vieira Da Silva, Sueli Maria dos Reis Santos ARTIGOS DE REVISÃO Gerência UMA DISCUSSÃO SOBRE AS COMPETÊNCIAS E HABILIDADES DE GESTORES NO ÂMBITO DO SISTEMA PÚBLICO DE SAÚDE A DISCUSSION OF THE COMPETENCIES AND ABILITIES OF THE MANAGERS IN THE PUBLIC HEALTH SYSTEM

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SUMÁRIO ARTIGOS ORIGINAIS Capa AVALIAÇÃO GERIÁTRICA ABRANGENTE DE IDOSOS ATENDIDOS EM UMA UNIDADE DE SAÚDE DA FAMÍLIA COMPREHENSIVE GERIATRIC EVALUATION OF THE ELDERLY TREATED AT A FAMILY HEALTH UNIT.

Leonardo Leitão Batista, Maria das Graças Melo Fernandes, Maria do Socorro Lucena da Nóbrega Pesquisa A UTILIZAÇÃO DA METODOLOGIA DA PROBLEMATIZAÇÃO NO CURSO INTRODUTÓRIO PARA SAÚDE DA FAMÍLIA DO PÓLO DE CAPACITAÇÃO DA UFJF

THE UTILIZATION OF QUESTIONING METHODOLOGY IN THE INTRODUCTORY COURSE OF FAMILY HEALTH AT THE TRAINING HUB OF UFJF Beatriz Francisco Farah, Célia Regina Pierantoni PERFIL SOCIAL DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE VINCULADOS AO PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA DA ZONA NORTE DO MUNICÍPIO DE JUIZ DE FORA SOCIAL PROFILE OF THE COMMUNITY HEALTH AGENTS LINKED TO THE PROGRAM FAMILY HEALTH OF THE OF THE NORTH ZONE OF THE MUNICIPAL DISTRICT OF JUIZ DE FORA

Marcelo Henrique da Silva, Maria Ruth dos Santos TRABALHANDO COM FAMÍLIAS UTILIZANDO FERRAMENTAS

USING TOOLS TO WORK WITH FAMILIES Janaina Vieira Da Silva, Sueli Maria dos Reis Santos

ARTIGOS DE REVISÃO Gerência UMA DISCUSSÃO SOBRE AS COMPETÊNCIAS E HABILIDADES DE GESTORES NO ÂMBITO DO SISTEMA PÚBLICO DE SAÚDE A DISCUSSION OF THE COMPETENCIES AND ABILITIES OF THE MANAGERS IN THE PUBLIC HEALTH SYSTEM

Edna Aparecida Barbosa de Castro, Estela Márcia Saraiva Campos DIFICULDADES DE IMPLANTAÇÃO DO PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA COMO ESTRATÉGIA DE REFORMA DO SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIRO DIFFICULTIES IN IMPLANTING THE FAMILY HEALTH PROGRAM AS A STRATEGY FOR REFORM OF THE BRAZILIAN HEALTH CARE SYSTEM

Telmo Mota Ronzani, Cornelis Johannes van Stralen

Educação em Saúde LER/DORT: UM GRAVE PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA QUE ACOMETE OS CIRURGIÕES-DENTISTAS

REL/WROD: A SERIOUS PUBLIC HEALTH PROBLEM THAT ATTACKS DENTIST

Mônica Andrade Araújo, Marcos Vinicius Queiroz de Paula

Tribuna EDUCAÇÃO EM SERVIÇO, EDUCAÇÃO CONTINUADA, EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE: SINÔNIMOS OU DIFERENTES CONCEPÇÕES? Beatriz Francisco Farah

AVALIAÇÃO GERIÁTRICA ABRANGENTE DE IDOSOS ATENDIDOS EM UMA

UNIDADE DE SAÚDE DA FAMÍLIA

RESUMO

O estudo abrangeu setenta idosos selecionados aleatoriamente. A coleta de dados realizou-

se em abril de 2002, mediante entrevista, observação e exame físico, contemplando a

avaliação física, mental, funcional e social. Na avaliação social, 93% recebiam de 01 a 04

salários-mínimos; 58,6% eram analfabetos e coabitavam com 2 a 5 pessoas; 63%, casados;

30% viúvos. Na avaliação física, destacaram-se a hipertensão arterial em 82% e a

obesidade em 64,3%. Os déficits auditivo e visual, respectivamente, em 33% e 81% deles.

O padrão de sono alterado se apresentou em 56%. As alterações urinárias e intestinais,

respectivamente, em 28% e 25%. A avaliação funcional demonstrou que a maioria é

independente na realização das atividades da vida diária: higienizar-se (94,3%), alimentar-

se (98,6%), vestir-se (88,6%), locomover-se (91,4%) e comunicar-se (45,7%). As

atividades instrumentais da vida diária em 47,1% deles. Na avaliação mental, a função

cognitiva alterou-se em 56% dos idosos e 46% tinham depressão. Palavras- chave: Geriatria. Terceira Idade. Doenças da Velhice

COMPREHENSIVE GERIATRIC EVALUATION OF THE ELDERLY TREATED AT A

FAMILY HEALTH UNIT.

ABSTRACT:

The study included seventy elderly patients who were randomly selected. Data was

collected in April, 2002, by appointment, observation and physical examination,

contemplating physical, mental, functional and social evaluation. In the social Evaluation,

93% received 01 to 04 minimal salaries; 58,6% were illiterate and lived with two to five

people; 63% were married; 30% were widow(er)s. In the physical evaluation, high blood

pressure was observed in 82% and obesity in 64,3% of them. Concerning auditive and

vision deficits,33% and 81%, respectively, were found to have them. Sleeping problems

were present in 56%. There were urine and intestine disturbances in 28% and 25%,

respectively. The functional valuation showed that most of them are independent in daily

activities, for example: hygiene habits (94,3%), eating ( 98,6%), dressing (88,6%), moving

(91,4%) and communicating (45,7%).

There was instrumental activity of daily life in 47,1% of them. In the mental evaluation,

cognitive function had changed in 56% of the elderly and 46% had depression.

Key words: Geriatrics. Elderly. Diseases of the Elderly

INTRODUÇÃO

Um notável fenômeno está ocorrendo em todo o mundo: idades mais

avançadas estão se tornando mais comuns. Em muitos países, o grupo que cresce mais

rapidamente é o de idade mais avançada. Isso ocorre mesmo em países como o México, em

que o grupo de quinze anos e menos tem o dobro do tamanho e a expectativa de vida ao

nascimento é cerca de cinco anos inferior a dos EUA e a do Canadá. Desde 1950, o grupo

de 65 anos ou mais passou de oito para 13% da população geral nos EUA. Até 2020,

prediz-se que esse segmento populacional aumente mais 50%, de modo que um total de 50

milhões de pessoas sobreviva até, pelo menos, os 65 anos (Finch e Schneider, 1997).

No Brasil, segundo estatísticas do Ministério da Saúde, a faixa etária de

sessenta anos ou mais é a que mais ascende em termos proporcionais, já que, em 2025, a

faixa etária dos idosos crescerá dezesseis vezes em relação à população total, que só

cresceu cinco vezes nesse mesmo período, o que nos colocará, em termos absolutos, como

a sexta população de idosos do mundo. Isso representa 32 milhões de pessoas com 60 anos

ou mais. Esse crescimento tem sido motivo de grande interesse dos estudiosos do

envelhecimento populacional, de vários países do mundo (Brasil, 1995).

Entre os fatores responsáveis pelo crescente aumento da população idosa, em

nosso país, destaca-se a diminuição expressiva dos níveis de fecundidade, em todas as

classes sociais, com uma diminuição do número médio de filhos das mulheres brasileiras,

que ocorreu num contexto em que expressivas parcelas da população nacional situam-se no

limiar da pobreza, além de estarem afastadas das benesses do mercado formal de trabalho,

do sistema educacional e de outras políticas sociais que contribuem para a redução da

fecundidade (Moreira, 1998).

Na atualidade, verifica-se, como aspecto que contribui para o

envelhecimento populacional, o desenvolvimento tecnológico, principalmente em países

desenvolvidos, mas que, também, é observado em nosso contexto, onde houve melhoria da

qualidade de vida, assistência à saúde disponível, seja através de planos privados de saúde,

seja através de Programas do Governo, a exemplo do Programa Saúde da Família (PSF),

acesso aos medicamentos na rede pública, melhoria das condições de saneamento básico,

atenção para imunização e controle das doenças crônicas e infecto-contagiosas.

O aumento proporcional da população idosa, em nível mundial e nacional,

requer mais do que recursos, carecendo de uma conscientização dos profissionais de saúde

no atendimento diferencial a essa população que, comprovadamente, demanda diversos

recursos diagnósticos e terapêuticos (Duarte, 2001). Apesar disso, nosso país ainda não está

preparado para dar assistência de qualidade e adequada aos idosos. Não há, por exemplo,

geriatras em quantidade suficiente para atender os pacientes idosos, sendo esses atendidos

por clínico geral, cardiologista, neurologista e outros (Levy, 2001). Cabe destacar que,

tanto o envelhecimento como as alterações da saúde que os tem como fator determinante

implica que o idoso deve receber uma atenção multidimensional por profissionais

capacitados para tal assistência.

Para receber o idoso na Unidade de Saúde da Família (USF), a equipe

multiprofissional deve estar preparada para entender o processo de envelhecimento nas suas

múltiplas dimensões e, a partir daí, propor ações específicas em saúde, já que a

probabilidade de adoecer aumenta com a idade, e compreender que os problemas de saúde

evidenciados pelos idosos, em geral, são oriundos, concomitantemente, de fatores

biológicos, psicológicos e sociais (Paschoal, 1996). Destaca-se, também, que, a pouca

discussão acerca dos determinantes sócio-econômicos do processo de saúde e enfermidade

dos idosos, em nossos cursos universitários, centrados, ainda, num modelo

hospitalocêntrico e biomédico, constitui-se numa das principais causas da inadequada

abordagem da saúde do idoso (Brasil, 1995).

O despreparo das instituições públicas para atender os idosos é ressaltado

pelo próprio Ministério da Saúde (1997) ao afirmar que o aumento nos gastos do setor

saúde decorrente do maior número de idosos, principalmente com incapacidades, não se

tem traduzido em melhoria das condições apresentadas por esses indivíduos. Técnicos do

Ministério da Saúde (1997) também expressam a ineficiência da abordagem clínica

tradicional, base do Modelo Médico vigente, para um diagnóstico e tratamento acurados

dos idosos, pois muitos dos problemas típicos do envelhecimento considerados “gigantes

da geriatria” (insuficiência cerebral, imobilidade, incontinência urinária, instabilidade

postural e quedas, além das iatrogenias) apresentam uma alta prevalência de não

identificação, no âmbito da avaliação do idoso, realizada pelos profissionais de saúde.

Considerando as questões expostas, evidencia-se que o cuidado com o idoso

deve ser algo diferenciado, o que implica, portanto, na idealização ou utilização de modelos

de atenção multidimensional que considerem suas características peculiares, pois, no geral,

o idoso apresenta doenças múltiplas que lhe determinam limitações funcionais e

psicossociais.

Uma avaliação holística do idoso inclui a análise de seu funcionamento

físico, mental e social; por isso permite que a atenção ao idoso seja concentrada, não só na

doença, mas no quanto ela afeta sua capacidade funcional no ambiente em que ele vive

(Levy, 2001). Desse modo, a avaliação geriátrica abrangente ou global do idoso é uma

estratégia que deve ser utilizada, pelos profissionais de saúde, em qualquer contexto da

assistência a ele (hospitalar, comunitário e familiar), por permitir identificar o seu perfil de

saúde-doença e habilidade funcional de forma mais criteriosa e ampla.

Não obstante, especialmente no âmbito da Unidade de Saúde da Família, a

avaliação dos idosos realizada pelos profissionais de saúde nem sempre contempla os

variados aspectos físicos, funcionais, mentais e sociais envolvidos na etiologia de seus

problemas. Esse fato implica um conhecimento superficial desses profissionais e do serviço

acerca da situação saúde-doença e da capacidade funcional dos idosos nesse contexto

ambiental, bem como, inviabiliza um planejamento estratégico de ações sociais e de saúde

para esses indivíduos, norteados por suas necessidades específicas. Considerando o

exposto, este estudo visou ao alcance do seguinte objetivo:

Realizar uma avaliação geriátrica abrangente de idosos atendidos numa

Unidade de Saúde da Família.

ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS

Trata-se de um estudo exploratório desenvolvido na área de abrangência da

USF I, zona urbana do município de Tavares-Pb. Nessa unidade de saúde, existem 1037

famílias cadastradas, distribuídas em dez micro-áreas. A assistência à saúde a essas famílias

é efetivada pelos próprios pesquisadores (médico e enfermeira), com colaboração de dez

agentes comunitários de saúde (ACS), sendo seis lotados na zona urbana e quatro na zona

rural.

A população do estudo compreendeu 424 idosos residentes na área de

abrangência da USF mencionada. A amostra investigada contemplou setenta idosos (16,5%

dessa população) selecionados de forma acidental, ou seja, aqueles idosos atendidos no

serviço, no período da coleta de dados, que aceitaram participar do estudo, após

esclarecimento dos seus propósitos e procedimentos realizados, conforme preconizado pela

Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde (Brasil, 1996), que versa sobre os

aspectos éticos da pesquisa envolvendo seres humanos.

O instrumento de coleta de dados se constituiu de um roteiro de entrevista

estruturado, baseado nas dimensões para avaliação multidimensional do idoso: avaliação

social, física, funcional e mental. Na construção deste instrumento, foram incluídas escalas

já validadas e bastante utilizadas na avaliação de algumas dimensões biopsicossociais do

idoso como o Mini-Exame do Estado Mental (Minimental State Examination) de Folstein et

al. citado por Bertolucci (2000), a Escala de Depressão Geriátrica de Yesavage (1983) e a

Escala de Risco Nutricional descritas por Canteira e Domingo (1998).

APÊNDICE I

INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS

I- CARACTERIZAÇÃO DA AMOSTRA: Idade: ______ Sexo: M ( ) F ( ) II- AVALIAÇÃO FÍSICA: Diagnósticos/DoençadeBase:___________________________________ Peso: _______ Kg Altura:_______cm IMC:_______Kg/h² PA: ______x_____mmHg Déficit Auditivo: ( ) Não ( ) Sim. Déficit Visual: ( ) Não ( ) Sim. Alterações Vasculares Periféricas: Varizes: ( ) Sim ( ) Não Alterações Neurológicas: Sono: Normal ( ) Insônia ( ) Sono interrompido ( ) Hiperssonia ( ) Alterações Musculoesqueléticas: Dor articular ( ) Sim ( ) Não ( ) Discreta ( ) Limitante Alterações na Eliminação: *Urinária: Continente ( ) Incontinente ( ) Disúria ( ) *Intestinal: ( ) Normal ( ) Incontinente ( ) Constipação ( ) Diarréia Boca:

( ) Edentado ( ) Uso de prótese ( )Dentes Naturais ( ) Má higienização de dentes restantes ou de dentaduras

Uso de Medicamentos: ( ) Sim ( ) Não. Especifique: ____________________________________________________________ Em caso afirmativo responda: ( ) Uso contínuo ( ) Uso Temporário ( ) Auto-medicação ( ) Receita Médica ( ) Indicação Farmacêutica ( ) Indicação de Familiares ou Amigos Toma a medicação sozinho(a) ? ( ) Sim ( ) Não. Por quê? ________________________________________________________

III- AVALIAÇÃO NUTRICIONAL: ESCALA DE RISCO NUTRICIONAL(adaptada por CANTERA; DOMINGO, 1998)

MARQUE APENAS AS RESPOSTAS AFIRMATIVAS - SIM Sofre de doença que fez modificar o tipo ou a quantidade de sua alimentação 02 ( ) Consome menos de 02 refeições diárias 03 ( ) Consome poucas frutas, verduras e produtos lácteos 02 ( ) Consome bebida alcoólica diariamente 02 ( ) Tem problemas dentários ou bucais que dificultam a alimentação 02 ( )Nem sempre dispõe de dinheiro suficiente para adquirir os alimentos 04 ( ) Come só, na maioria das vezes 01 ( ) Consome 03 ou mais medicamentos ,com receita ou não, por dia 01 ( )Perdeu ou aumentou 5Kg nos últimos 06 meses 02 ( )Nem sempre encontra-se em condições físicas para fazer compras, Cozinhar ou alimentar-se 02 ( )Pontuação: 0-2 Ausência de Risco 3-5 Risco Moderado 6 ou mais Alto Risco IV- HABILIDADE FUNCIONAL Atividades da Vida Diária ( A ) Com facilidade ( B ) Com dificuldade ( C ) Com ajuda ( D ) Não realiza Higiene Pessoal ( ) Higiene oral ( ) Pentear-se ( ) Banho ( ) Uso de sanitário Alimentação ( ) Alimenta-se sozinho ( ) Serve-se sozinho Vestuário ( ) Veste-se ( ) Despe-se ( ) Calça sapatos Mobilidade e Locomoção ( ) Caminha ( ) Sobe e desce escadas ( ) Deita-se ( ) Levanta-se

( ) Senta-se ( ) Passa da cama para a cadeira ( ) Anda pela casa Comunicação ( ) Fala ( ) Entende o que se fala ( ) Lê ( ) Escreve ( ) Telefona Atividades de Vida Prática ( ) Tarefas Domésticas. Realiza-as: Sim ( ) Não ( ) ( ) Atividades Externas. Realiza-as Sim ( ) Não ( ) V- AVALIAÇÃO DA SAÚDE MENTAL

MINI-EXAME DO ESTADO MENTAL ( FOLSTEIN,1975) Pontuação Máxima Pontuação ORIENTAÇÃO 5 ( ) 1. Em que (ano) (mês) (dia da semana)( horas) nós estamos ? 5 ( ) 2. Em que (país) (estado) (cidade) (andar) (lugar) estamos ? REGISTRO 3 ( ) 3. Dar o nome de três objetos: 1 segundo para dizer cada um. Então pedir ao paciente que repita todos os 3 depois que você disser Dar 1 ponto para cada palavra respondida certa. Então repeti-las até aprender as três. Contar as tentativas e registrá-las. TENTATIVAS ATENÇÃO E CÁLCULO 5 ( ) 4. Subtrair 7 de 100, 1 ponto para cada correta, parar após 5 respostas . ( Alternativamente, soletrar a palavra “ mundo”, também de trás para a frente) MEMÓRIA RECENTE 3 ( ) 5. Pedir as 3 palavras repetidas acima. Dar 1 ponto para cada resposta correta LINGUAGEM 9 ( ) 6. Dar o nome de uma caneta e de um relógio (2 pontos). 7. Repetir a palavra “paralelepípedo” (1 ponto) 8. Seguir um comando em 3 estágios: “Apanhe esta folha de papel com a sua mão direita, dobre-a no meio e coloque-a no chão”( 3 pontos). 9. Ler e obedecer: “Feche os olhos” ( 1 ponto) 10. Escreva uma frase (1 ponto). 11. Copiar o desenho ( 1 ponto). PONTUAÇÃO: 24-30 corretos- função cognitiva íntegra 20-23 corretos- leve deficiência cognitiva 16-19 corretos- moderada deficiência cognitiva 15 ou menos corretos- grave deficiência cognitiva

PONTUAÇÃO TOTAL: 1. 1 ponto para cada resposta certa. 2. 1 ponto para cada resposta certa. 3. 1 ponto para cada nome dos 3 objetos que for repetido corretamente da primeira vez. Então,

repeti-los até o paciente repetir também todos os 3, mas não dar nenhum ponto a mais. 4. 1 ponto para cada subtração correta. Se o paciente não fizer ou não conseguir qualquer

subtração, diga-lhe a palavra “mundo” para soletrar de trás para a frente. Se uma tentativa de subtração foi feita, esta é a tarefa preferida.

5. 1 ponto para cada objeto. 6. 1 ponto para cada objeto nomeado corretamente. Não dê nenhum ponto se for dito um nome

aproximado mas incorreto. 7. 1 ponto se completado corretamente. 8. 1 ponto para cada comando seguido. 9. 1 ponto somente se o paciente levar adiante a atividade. Nenhum ponto se a frase for lida

corretamente mas não realizada. 10. A sentença deve estar gramaticalmente correta e ter sujeito, verbo e predicado. 11. 1 ponto se cada uma tiver 5 lados e a superposição estiver correta.

ESCALA DE DEPRESSÃO GERIÁTRICA (YESAVAGE,1983)

1. Está basicamente satisfeito com sua vida ? SIM NÃO 2. Abandonou muitas atividades e interesses ? SIM NÂO 3. Sente que a sua vida está vazia ? SIM NÃO 4. Sente-se freqüentemente aborrecido ? SIM NÃO 5. Está bem-disposto a maior parte do tempo ? SIM NÃO 6. Tem medo que lhe suceda algo de mal ? SIM NÃO 7. Sente-se feliz a maior parte do tempo ? SIM NÃO 8. Sente-se freqüentemente sem esperança ? SIM NÃO 9. Prefere ficar em casa mais do que sair fazer coisas novas ? SIM NÃO 10. Acha que tem mais problemas de memória do que a maioria ? SIM NÃO 11. Acredita que é maravilhoso estar vivo ? SIM NÃO 12. Pensa que, tal como está agora,

Não vale para nada ? SIM NAO 13. Pensa que a sua situação é desesperadora ? SIM NÃO 14. Sente-se cheio de energia ? SIM NÃO 15. Acha que a maioria das pessoas está melhor que você ? SIM NÃO Se as respostas coincidem coma opção em maiúsculas. Anotar um ponto. Avaliação: 0 5 :normal 5 10: depressão moderada + 10 : depressão grave VI- AVALIAÇÃO SOCIAL: Escolaridade: ( ) Analfabeto ( ) Semi-alfabetizado ( ) Ensino básico completo ( ) Ensino básico incompleto ( ) Ensino fundamental completo ( ) Ensino fundamental incompleto ( ) Ensino superior completo ( ) Ensino superior incompleto Estado Civil: ( )Casado ( )Solteiro ( ) Viúvo ( ) Separado ( ) União Consensual

Reside com (parentesco/idade): __________________________________________________________________________________________________________________________________ Renda Individual: ( ) Menos de 1 Salário Mín. ( ) De 1 a 4 Salário Mín. ( ) de 5 a 8 Salário Mín. ( ) De 9 a 13 Salário Mín. ( ) De 14 a 19 Salário Mín.( ) mais de 20 Sal. Mín. A Renda Provém de : ( ) Aposentadoria ( ) Pensão ( )Ajuda de Familiares Atividades Sociais: ( ) Igreja ( ) Associações ( ) Grupos de Idosos ( ) Reuniões Familiares ( ) Reuniões com Amigos Moradia (tipo): ( ) Casa ( ) Barraco Ocupação: ( ) Alugada ( ) Própria ( ) Cedida Residem: _______ pessoas Água Encanada: ( ) Sim Não ( ) Esgoto: ( ) Sim Não ( ) Eletricidade: ( ) Sim Não ( ) Banheiro: ( ) Interno ( ) Externo Degrau: ( ) Sim ( ) Não. Em caso afirmativo, responda: Iluminada ( ) Sim ( ) Não Corrimão ( ) Sim ( ) Não Quintal: ( ) Fácil Acesso ( )Difícil Acesso.

A aquisição dos dados foi realizada, pelos pesquisadores, através de

consultas realizadas no âmbito domiciliar e na USF I, mediante entrevista, observação e

exame físico, durante o mês de abril de 2002. A análise das informações foi realizada

mediante uma abordagem quantitativa, por meio do Software EPI INFO, 6.04 d Centers for

Disease Control e Prevention (CDC), USA/World Health Organization (WHO) Geneva,

Switzaland, 2001 para Windows versão 8.0.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

I - AVALIAÇÃO SOCIAL

A análise da condição social do grupo pesquisado explicita que, em relação à

escolaridade, a maioria era analfabeta (58,6%), sendo 28 do sexo feminino (68,3%) e 13 do

sexo masculino (31,7%). Dos 29 idosos alfabetizados (41,4%), 16 eram do sexo feminino

(55,2%) e 13 do sexo masculino (44,8%). Em se tratando da renda, observou-se que 93%

recebiam de um a quatro salários-mínimos, sendo a aposentadoria sua principal fonte de

renda (88%). Quanto ao estado civil, 63% dos idosos eram casados, 30% viúvos e 7%

solteiros. Em relação à situação de moradia, a pesquisa evidenciou que o tipo de domicílio

mais encontrado foi a casa (98,6%). No que tange à ocupação do domicílio, 92,9% dos

gerontes residiam em casa própria. Em se tratando do saneamento, 90% das residências

tinham água encanada e a rede de esgoto foi encontrada em 83% dos imóveis.

II – AVALIAÇÃO FÍSICA

Quanto às doenças de base, foram observadas, respectivamente, a Hipertensão

Arterial Sistêmica (82%), o Diabetes mellitus (9%), a associação entre Hipertensão Arterial

Sistêmica e o Diabetes mellitus (6%) e a Depressão (3%). No aspecto referente à

hipertensão, verificamos as especificidades expressas na figura 1.

Figura 1 – Distribuição dos idosos, segundo a Classificação da Hipertensão Arterial.

Tavares, 2002.

Normal Alta 14%

Normal28%

Ideal14%

HAS 37%

HAS 211%

HAS 126%

IdealNormalNormal Alta HAS 1HAS 2HAS 3

HAS 1 – Hipertensão Arterial Sistêmica Estágio 1

HAS 2 – Hipertensão Arterial Sistêmica Estágio 2

HAS 3 – Hipertensão Arterial Sistêmica Estágio 3

Os estudos epidemiológicos realizados em diferentes contextos colocam em

evidência a relevância da hipertensão arterial na população idosa. Neste estudo, conforme

exposto, dos 70 idosos avaliados, 31 (44,2%) apresentaram algum grau de hipertensão

arterial: hipertensão arterial estágio 1 (26%), hipertensão arterial estágio 2 (11%) e

hipertensão arterial estágio 3 (7%). Considerando essa questão, Carvalho Filho et al. (1994)

e Pinto e Pierre (1999) afirmam que cerca de 50% da população acima de 65 anos apresenta

elevação da pressão arterial, especialmente da sistólica, sendo a maioria dos casos do tipo

essencial. Entretanto, quando secundária, predomina a de origem renovascular.

Segundo Maranhão et al. (1998), a hipertensão arterial no idoso implica a

diminuição da sua expectativa de vida, geralmente acarretada por lesões vasculares,

cardíacas, renais e outras. Nesse mesmo entendimento, Pinto e Pierre (1999) ressaltam que

o aumento dos níveis tensionais relaciona-se com o maior número de eventos

cardiovasculares, principalmente com o acidente vascular cerebral.

Tabela 1 – Distribuição dos idosos, segundo a relação entre Obesidade e Hipertensão

Arterial. Tavares, 2002.

CLASSIFICAÇÃO DA HIPERTENSÃO ARTERIAL

OBESIDADE | HA1 HA2 HA3 IDEAL NORMAL ALTA NORMAL| Total

----------+----------------------------------------------------------+ -----

NÃO | 8 2 1 4 2 8 | 25

> 32.0% 8.0% 4.0% 16.0% 8.0% 32.0% > 35.7%

| 44.4% 25.0% 20.0% 40.0% 20.0% 42.1% |

SIM | 10 6 4 6 8 11 | 45

> 22.2% 13.3% 8.9% 13.3% 17.8% 24.4% > 64.3%

| 55.6% 75.0% 80.0% 60.0% 80.0% 57.9% |

----------+----------------------------------------------------------+------

Total | 18 8 5 10 10 19 | 70

| 25.7% 11.4% 7.1% 14.3% 14.3% 27.1% |

HAS 1 – Hipertensão Arterial Sistêmica Estágio 1

HAS 2 – Hipertensão Arterial Sistêmica Estágio 2

HAS 3 – Hipertensão Arterial Sistêmica Estágio 3

Em relação ao fator de risco Obesidade na patogênese da Hipertensão

Arterial, verificou-se que das 45 pessoas idosas obesas (64,3%), 20 delas eram hipertensas

(44,4%), entre as quais, considerando-se o estágio da hipertensão, 22,2% pertenciam ao

estágio I, 13,3% ao estágio II e 8,9% ao estágio III.

Estudos epidemiológicos têm demonstrado uma forte relação entre

Obesidade e Doenças Cardiovasculares e fatores de riscos específicos, como hipertensão e

dislipidemia (Frage Filho, 1999). Embora associações epidemiológicas entre hipertensão

arterial e obesidade sejam bem estabelecidas, o mecanismo pelo qual a obesidade está

envolvida na gênese da pressão arterial elevada ainda não está totalmente estabelecido.

Farmer e Gotto Júnior (1992) e Rey (1999) afirmam decorrer do aumento da resistência

periférica e de alterações na homeostase neuroendócrina.

A ocorrência pareada de hipertensão arterial e obesidade, especialmente nos

idosos, pode desencadear, com maior freqüência, as cardiopatias isquêmicas, a insuficiência

cardíaca, os acidentes vasculares cerebrais e as mortes oriundas de distúrbios

cardiovasculares (Hubert et al., 1983).

Quanto aos fatores determinantes da obesidade no idoso, destacam-se o

aumento da dieta, a redução do gasto energético e o sedentarismo. Desse modo, cabe aos

profissionais de saúde envolvidos na assistência ao idoso enfatizarem modificações no seu

estilo de vida, que conduzam melhoria, tanto dos níveis pressóricos como da obesidade, a

exemplo do engajamento do idoso em programas de exercícios aeróbicos, como a

caminhada.

Para Mulrow e Brand (2001), evidências sugerem que, salvo contra-

indicações para realizar exercícios, pessoas idosos com hipertensão podem obter benefícios

até com modesto aumento na atividade aeróbica. Quanto à obesidade, Busby-Whitehead

(2001) ressalta que o exercício regular contribui para a manutenção do peso ideal através da

perda calórica, além de melhorar a distribuição de gordura. Ou seja, a gordura abdominal

ou andróide (implicada em maior risco para a saúde) é mobilizada preferencialmente para a

gordura subcutânea periférica.

No que se refere às alterações sensoriais, tanto a literatura pertinente como

dados empíricos demonstram que o envelhecimento afeta todos os órgãos sensitivos,

especialmente a audição e a visão. A investigação da função auditiva nos idosos

pesquisados nos permitiu verificar déficit neste sistema em 23 idosos (33%), dado também

verificado por Jackler e Kaplan (2001), que destacam: cerca de 25% dos indivíduos entre

65 e 75 anos e quase 50% dos que têm mais de 75 anos apresentam dificuldades de

audição.Entre as causas envolvidas na perda auditiva do idoso, a mais comum é a

presbiacusia, que compreende a perda sensorioneural caracterizada por dificuldade de ouvir

sons de alta freqüência e por um comprometimento da compreensão de conversas (Siegler,

1998). Essa autora salienta como outras causas de déficit auditivo no idoso os tampões

ceruminosos, otosclerose, ototoxicidade, doença de Menière e neuromas acústicos.

Já o déficit visual foi identificado em 81% da amostra, o que compreende 57

idosos. Embora as patologias visuais não façam parte do envelhecimento normal, há uma

maior incidência de doença ocular nos idosos. As mais comuns são: as cataratas, os

glaucomas, a degeneração macular senil e a retinopatia diabética (Smeltzer e Bare, 2002).

Ao abordar tais alterações, Jackler e Kaplan (2001) afirmam que a degeneração macular

relacionada com a idade consiste na principal causa de perda visual permanente em idoso,

além de possuir etiologia desconhecida e de sua incidência aumentar, a cada década, nos

indivíduos com idade superior a 50 anos, alcançando seu limiar máximo, aproximadamente,

aos 75 anos.

As alterações sensoriais trazem implicações negativas para a interação

socioambiental do idoso, particularmente a capacidade de receber e tratar informações

provenientes do meio ambiente e, conseqüentemente, o isolamento social e a dependência.

Considerando essa realidade, Smeltzer e Bare (2002) salientam que a privação sensorial

experimentada pelo idoso pode gerar-lhe aborrecimento, confusão, irritabilidade,

desorientação e ansiedade, aspectos que devem ser analisados pelos profissionais de saúde

na avaliação dos problemas biopsicossociais do idoso.

Quanto às alterações vasculares periféricas, especificamente a presença de

varizes em membros inferiores, 83% dos idosos pesquisados possuíam esse problema. Dada

a incidência aumentada das varizes no idoso, decorrente, principalmente, da perda da

elasticidade tecidual presente no envelhecimento com conseqüente enfraquecimento

venoso, a equipe geriátrica deve implementar ações que favoreçam a melhoria do

desconforto do idoso decorrente de tais alterações, como fadiga nas pernas, cãibras

musculares, sensação de peso nos membros inferiores e dor (Netina, 1998).

Dentre as alterações neurológicas, investigamos o padrão de sono, em que

verificamos que 31 idosos (44%) apresentaram sono normal. Já as alterações verificadas

foram a insônia (40%) e o sono interrompido (16%). Esse achado é confirmado por Daly e

Taler (1997), ao descreverem que estudos epidemiológicos evidenciam que 30 a 50% das

pessoas idosas queixam-se de dificuldade em adormecer ou permanecer dormindo.

Segundo Curiati e Alencar (1994), na velhice, o período noturno do sono

tende a sofrer um encurtamento, enquanto surgem períodos de sonolência durante o dia.

Mailloux-Poirier (1995) aborda que as alterações do sono mais importantes observadas na

velhice consistem no alongamento do estádio I, o encurtamento dos estádios II, III e IV,

assim como do período de sonhos, além de despertares freqüentes e intermitentes. Desse

modo, o sono do idoso torna-se polifásico (alternância de períodos de sono e virgília),

assemelhando-se ao sono do recém-nascido, o que leva-o a cochilar durante o dia.

Dentre os fatores que podem interferir na qualidade do sono dos idosos,

destacam-se: problemas cardíacos (angina do peito, arritmia cardíaca, insuficiência cardíaca

e hipertensão); problemas respiratórios (dispnéia, apnéia, desencadeadas principalmente

pelo enfisema); problemas gástricos (dor); problemas endócrinos (hipertireoidismo,

diabetes, que produz nictúria e poliúria); a demência e a depressão, além de alguns

medicamentos, a exemplo da quinidina, esteróides, β-bloqueadores, aminofilina, fenitoína,

L-dopa e descongestionantes nasais (Mailloux-Poirier, 1995). Salientamos a presença

desses fatores nos idosos investigados, particularmente, os efeitos da hipertensão, do

diabetes, da depressão e do uso de medicamentos específicos.

As alterações musculoesqueléticas, especialmente a dor articular, são

situações de alta prevalência em idosos e fortemente implicadas em prejuízos em sua

capacidade funcional . A ocorrência desse fenômeno foi verificada em 42 (83%) dos idosos

pesquisados.

A dor articular é desencadeada, tanto por alterações fisiológicas pertinentes

ao envelhecimento, como de doença articular degenerativa que, segundo Smeltzer e Bare

(2002), afetam todos os idosos com mais de 70 anos, começando na meia-idade. Mailloux-

Poirier (1995) ressalta que, entre os problemas que afetam a mobilidade do idoso, a artrite e

o reumatismo, com dor conseqüente, afetam cerca de 50% dos idosos, constituindo um

importante motivo para sua utilização dos serviços de saúde.

Com relação à eliminação urinária, verificamos que 72% dos idosos não

apresentaram alterações urinárias. A incontinência ocorreu em 19% dos idosos, enquanto

que a disúria em apenas 9%. Esse resultado demonstra a importância da incontinência

urinária no contexto do envelhecimento e está em consonância com o estudo de Maciel

(1999) que destaca que, em estudos realizados na comunidade, a exemplo desse último, a

prevalência da incontinência urinária entre idosos oscila entre 8% e 34%.

Ao contrário da crença existente, o envelhecimento por si só não é a causa de

incontinência urinária. Existem diversas alterações que podem causar incontinência urinária

no idoso: instabilidade do detrusor, ingestão aumentada de líquidos com inversão do ritmo

diurno normal do volume e concentração urinária, drogas habitualmente utilizadas pelos

idosos e, finalmente, os efeitos da deficiência do estrogênio nas mulheres (Mayome, 1995).

A incontinência urinária no idoso gera conseqüências múltiplas do ponto de

vista físico, emocional, social e econômico. As conseqüências físicas consistem na

dermatite amoniacal, odor característico, propensão a úlceras de decúbito, infecção urinária

e quedas (Resnick e Yalla, 1992). Do ponto de vista socioemocional, a incontinência

urinária no idoso pode ser tão devastadora quanto é debilitante no aspecto físico, pois ele

tende a ver esse problema como uma perda de controle sobre seu corpo e como o ponto

final de uma vida produtiva. Ante essa realidade, é comum surgirem sentimentos de

humilhação, ansiedade e solidão, passando o idoso a evitar falar sobre o assunto, temendo

ser ridicularizado ou considerado velho inútil (Simonetti et al., 2001). Em termos

econômicos, a incontinência urinária representa um problema extremamente dispendioso,

tanto para o sistema de saúde, quanto para os portadores, obrigados a consumirem fraldas,

absorventes e outros dispositivos (Simonetti et al., 2001).

No que se refere às alterações intestinais avaliadas, foram encontradas,

respectivamente, a constipação (24%) e a diarréia (1%). Segundo Rezende et al. (1999), a

falta de um critério uniforme no diagnóstico de constipação intestinal e a diversidade da

metodologia empregada em inquéritos epidemiológicos para avaliação desse problema, não

permitem conhecer-se a verdadeira prevalência da constipação intestinal na população geral

e no idoso. Esse autor afirma, ainda, que a prevalência da constipação intestinal no idoso

varia dentro de amplos limites, na dependência dos hábitos alimentares, do tipo de

atividade, doenças intercorrentes e uso de medicamentos.

Conforme Ahronheim (1997), a constipação no idoso é atribuída à

imobilidade, menor ingestão de líquidos e fibras, prolongamento no tempo de trânsito

intestinal, distúrbio da sensibilidade anorretal, doenças neurológicas, lesões intestinais e

uso de medicações constipantes, como antidepressivos tricíclicos, anticolinérgicos, alguns

antihipertensivos, analgésicos opiáceos, anti-ácidos contendo alumínio, resinas fixadoras de

ácidos biliares e outros.

Apesar disso, Stewart et al. (1992), ao investigarem a ocorrência de

constipação em 3.166 pessoas acima de 65 anos, observaram a ocorrência do problema em

26% das mulheres e 15,8% dos homens. Do mesmo modo, Sandler et al. (1990), num

estudo demográfico abrangendo 15.014 pessoas, das quais 12,8% relataram constipação,

constataram a prevalência de 23,3% em idosos. Assim sendo, os dados verificados no

âmbito deste estudo consolidam os nossos resultados.

Em relação ao uso e indicação de medicamentos, observamos que houve

uma considerável prevalência do uso contínuo de medicação com receita médica (80%).

Outro dado que merece ser considerado é que a grande maioria dos idosos (80,5%) referiu

fazer uso da medicação sozinho e apenas 19,5% tomavam medicação com ajuda. Entre os

motivos implicados no não uso dos medicamentos de forma independente, foram relatados

pelos idosos : déficit de memória (37,5%), imobilidade no leito (12,5%), não compreensão

da técnica da aplicação da insulina (12,5%), medo de tomar medicação errada (12,5%),

déficit visual (12,5%) e tremores nas mãos (12,5%).

As classes terapêuticas mais consumidas pelos idosos foram: diuréticos (08),

diuréticos com inibidor simpático (04), anti-ácido (04), IECA (03), IECA com diurético

(03), bloqueador de canal de cálcio (02), analgésico (02), ansiolítico (02), hipoglicemiante

(02), entre outros. Esse achado impõe aos profissionais de saúde a adoção de maior

vigilância, pois a terapia medicamentosa, especialmente os tratamentos a base de diuréticos,

anti-hipertensivos, ansiolíticos e hipoglicemiantes estão envolvidos, em maior grau, na

ocorrência de reações adversas nos idosos, como confusão, fraqueza, tontura, incontinência,

imobilidade e outras (Murad e Casali, 1999).

III – AVALIAÇÃO FUNCIONAL

Com relação às atividades da vida diária, 94,3% dos idosos referiram

facilidade para a execução da higiene pessoal; 98,6% relataram independência no ato da

alimentação; 88,6% colocavam e retiravam vestimentas sem auxílio; 91,4% expressaram

ser capazes de realizar de forma independente, atividades como caminhar, subir e descer

escadas e deitar-se; 45,7% não apresentavam problemas relativos à comunicação, como

falar, entender o que se falava, ler, escrever e telefonar. Quanto às atividades da vida

prática ou atividades básicas intermediárias, a maioria dos idosos (65,7%) realizava apenas

tarefas domésticas, enquanto as atividades externas eram realizadas por 47,1% dos idosos.

Conforme o exposto, do ponto de vista físico, a maioria dos idosos é

independente no que se refere às atividades básicas elementares, pois, ao considerarmos as

atividades públicas, eles possuem significativa dependência. De forma similar, Coelho

Filho (1999), ao realizar um inquérito domiciliar na capital do Estado do Ceará, envolvendo

uma amostra de 744.000 habitantes, identificou que apenas 52,3% dos idosos entrevistados

relataram autonomia total para realização das atividades da vida diária.

IV – AVALIAÇÃO DA SAÚDE MENTAL

Entre os problemas implicados mais seriamente na saúde mental dos idosos,

sobressaem-se o déficit de memória e a depressão. No referente à memória, 56% dos idosos

investigados apresentaram problemas, sendo 26% deficiência grave, 17% deficiência

moderada e 13% manifestaram deficiência leve. Essa elevada incidência de problemas de

memória nos idosos envolvidos neste estudo apresenta congruência com os dados relativos

ao estudo de Bolla et al. (1991), realizado em nível comunitário, abrangendo a população

como um todo, o qual expressa que mais da metade dos idosos apresenta déficit de

memória. Para Bertolucci (2000), essa condição incide mais nos idosos, porque a maioria

deles estão susceptíveis a manifestarem problemas neurológicos, como demências,

acidentes vasculares cerebrais e doenças potencialmente lesivas para o cérebro como o

Diabetes mellitus e a hipertensão arterial.

Quanto à depressão, considerado o transtorno mental que mais prevalece no

geronte, 46% dos idosos pesquisados evidenciaram o problema. Segundo Smeltzer e Bare

(2002), embora a depressão entre os indivíduos com mais de sessenta anos seja comum, ela

geralmente permanece sem diagnóstico e sem tratamento.

Considerando essa realidade, no âmbito da atenção primaria à saúde,

Gordilho (2002) afirma que, nesse contexto, apenas uma minoria dos idosos tem seu

problema de depressão diagnosticado e, satisfatoriamente, conduzido pelos profissionais de

saúde, apesar de tratar-se de uma doença de forte prevalência nessa faixa etária, que pode

gerar, no idoso, limitações na sua capacidade funcional.

Segundo Heok (2000), as dificuldades vivenciadas por profissionais de

saúde para diagnosticar depressão no idoso se expressam em estudos epidemiológicos,

realizados em diferentes países, com taxas de prevalência da doença apresentando grandes

variações. Entre os fatores que podem interferir na variabilidade dos resultados dos estudos

epidemiológicos da depressão no idoso, o autor destaca: a confiabilidade das escalas de

mensuração, a seleção dos indivíduos e do contexto no qual estão inseridos e a existência

de critérios diagnósticos diversos.

A literatura pertinente ressalta, insistentemente, a natureza multifatorial da

depressão. Nessa perspectiva, buscamos apreender a possível relação da depressão com a

faixa etária, considerando os idosos os “velhos jovens” (60 a 79 anos) e os “velhos velhos”

(acima de 80 anos), com o sexo e o nível de escolaridade do grupo pesquisado. Nessa

análise, não observamos dependência entre maior longevidade e maior possibilidade de

desenvolvimento de depressão, achado, também, verificado por Resnick (2001).

Corroborando com essa assertiva, Heok (2000) registra que, pesquisa realizada em Londres,

envolvendo 890 idosos, ao comparar a prevalência da doença entre idosos mais jovens e

idosos mais velhos, observou taxas de predominância muito similares. Considerando o

sexo, essa mesma pesquisa verificou maior prevalência da depressão em mulheres idosas,

achado, também, identificado nessa pesquisa em 62,9% dos casos

Quanto à possível relação entre a depressão e o nível de escolaridade dos

idosos, observamos que a depressão foi expressa, em maior grau, pelos idosos analfabetos

(58,6%). A literatura específica não clarifica, eficazmente, essa relação, no entanto, ressalta

com insistência a influência de fatores sociais e da qualidade de vida no desenvolvimento

ou exacerbação do problema. Considerando que idoso, particularmente o analfabeto,

experimenta restrições na sua participação social e na sua qualidade de vida, esse achado

está em consonância com tal literatura.

Lotufo Neto (2000) expõe que a falta de recursos financeiros, de serviços

básicos, de moradia adequada, a aposentadoria e o baixo nível intelectual são fortes

preditores de depressão no idoso, por gerarem prejuízos na sua qualidade de vida, que tem

clara relação com a ocorrência desse fenômeno.

Apesar da relevância dos aspectos mencionados, é necessário que os

profissionais de saúde engajados no cuidado ao idoso reconheçam nele, eficientemente, os

sinais e sintomas da depressão, o que viabiliza seu pronto atendimento. Os idosos

deprimidos referem dor psíquica, desconforto somático, diminuição objetiva da capacidade

de execução de tarefas costumeiras, perda do autocontrole, percepção de falta de incentivo

para viver, redução da concentração e da memória, sentimento de desamparo e

manifestação de desejos suicidas (Smeltzer e Bare, 2002).

Essas são as evidências clínicas clássicas de depressão no idoso. Não

obstante, devemos comungar com o pensamento de Lotufo Neto (2000), ao afirmar que a

cultura modifica o tom geral da vida emocional e o quanto a emoção afeta os outros e que é

necessário conhecer-se o idioma local que expressa o sofrimento, isto é, deve-se estar

atento para as influências culturais na expressão das doenças, principalmente, daquelas que

envolvam sentimento. Com relação aos sintomas depressivos no idoso, o autor expressa

que, no ocidente, é a classe social que determina as queixas relatadas por esse indivíduo,

sendo: na classe D, manifestações comportamentais; na classe C, dores físicas e sintomas

somáticos; na classe B, temor; na classe A, insatisfação consigo mesmo, sentimento de

culpa, solidão e isolamento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A avaliação geriátrica depende de uma visão geral e multiprofissional, desde

o primeiro atendimento, com atenção a certos cuidados e peculiaridades dessa população,

destacando-se aspectos da anamnese e exame físico e, conseqüentemente, reduzindo

agressões diagnósticas e terapêuticas desnecessárias. Cabe aos profissionais de saúde

fazerem o acompanhamento posterior, que poderá ser realizado em nível ambulatorial,

institucional ou domiciliar, já que o aumento proporcional da população idosa, em nível

mundial e nacional requer, mais do que recursos, uma conscientização desses profissionais

no atendimento diferencial a essa população.

Para se oferecer uma resposta adequada aos problemas de saúde do idoso,

não basta oferecer-lhe, por exemplo, uma intervenção geriátrica/gerontológica em um

enfoque unidimensional, cuja expressão mais comum, em nosso meio, é o atendimento

clínico, mas ampliar a abordagem de modo a fazer uma leitura do mundo psicossocial no

qual ele está inserido. Isso evita alguns equívocos que podem ser cometidos na sua

assistência.

1 Médico Residente de Clínica Médica da Universidade Federal de Campina Grande,

Especialista em Saúde da Família pelo Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva da

Universidade Federal da Paraíba

2 Profa. Assistente de Enfermagem Médico-Cirúrgica e Administração do Centro de

Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba. Mestre em Enfermagem em Saúde

Pública, Doutoranda em Ciências da Saúde

3 Enfermeira, Especialista em Saúde da Família pelo Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva

da Universidade Federal da Paraíba

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Leonardo Leitão Batista- Médico Residente de Clínica Médica da Universidade Federal de Campina Grande, Especialista em Saúde da Família pelo Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal da Paraíba Rua Coronel Barata, 53 / Telefone: (83) 244 3050 Bairro:Jardim 13 de maio / CEP: 58025-300 / João Pessoa-Pb E-mail: [email protected] Maria das Graças Melo Fernandes- Profa. Assistente de Enfermagem Médico-Cirúrgica e Administração do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba. Mestre em Enfermagem em Saúde Pública, Doutoranda em Ciências da Saúde

Maria do Socorro Lucena da Nóbrega - Enfermeira, Especialista em Saúde da Família pelo Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal da Paraíba Submissão: agosto de 2003 Aprovação: novembro de 2003

A utilização da metodologia da Problematização no Curso Introdutório para Saúde da Família do Pólo de Capacitação da UFJF

Beatriz Francisco Farah Célia Regina Pierantoni Resumo: Esse artigo foi apresentado na disciplina Recursos Humanos: Mercado de

Trabalho e Formação Profissional, do Curso de Doutorado do Instituto de Medicina

Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, e será um capítulo da tese de

doutorado “As repercussões do Curso Introdutório como estratégia de organização do

trabalho das equipes de Saúde da Família, experiência do Pólo de Juiz de Fora/MG”. O

objeto de estudo é a utilização da metodologia da Problematização no Curso

Introdutório para Equipes de Saúde da Família - C.I. que tem como objetivo descrever

a experiência do Pólo de Capacitação da UFJF. Os instrumentos usados foram análise

documental e o consolidado das avaliações finais preenchidas pelos participantes dos

C.I., no período de 2000 a agosto de 2002, totalizando 55 cursos e 2882 pessoas

capacitadas. Verificou-se que a metodologia da problematização é adequada ao curso,

favorece o aprendizado, é criativa e envolve o grupo como um todo na construção dos

conhecimentos.

Palavras Chaves: Metodologia da Problematização, Curso Introdutório, Saúde da Família. The utilization of Questioning Methodology in the Introductory Course of Family

Health at the Training Hub of UFJF Abstract: This article was presented in the Human Resources class: Labor Market and Professional Training of the Doctorate Course at the Instituto de Medicina Social of the Universidade Estadual do Rio de Janeiro, and will be a chapter in the doctoral thesis “The repercussions of the Introductory Course as a strategy for organizing the work of Family Health teams, experience of the Juiz de Fora/MG hub”. The object of the study is the utilization of the methodology of Questioning at the Introductory Course for Family Health teams – I. C., with the goal: to describe the experience of the UFJF Training Hub. The instruments used were: documentary analysis and the consolidation of the final evaluations filled out by the participants of the I.C., during the period of 2000 until August of 2002, totaling 55 courses and 2,882 people trained. It was noted that the methodology of questioning was appropriate for the course, favors learning, is creative and involves the group as a whole in the construction of knowledge. Key Words: Questioning Methodology, Introductory Course, Family Health

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1. Introdução

As décadas de 80 e 90 foram marcadas pelos importantes avanços e

transformações ocorridas na política de saúde e educação, pelos desafios impostos para

a construção do Sistema Único de Saúde – SUS e, conseqüentemente, de profissionais

capacitados para implantá-lo e implementá-lo.

A concepção de saúde passa a ser entendida como resultado de múltiplas

determinações e mantenedora de uma relação direta com o social, determinando o

processo de adoecer e de morrer nas comunidades, norteando o modelo assistencial de

saúde preconizado pelo SUS.

Verificou-se nessas décadas que, para promover a real implantação do modelo

proposto pelo SUS e a transformação nele pretendida, haveria a necessidade de

reorganização dos serviços, pois ainda continuam organizados no modelo tradicional de

prestação de serviço, e de formação de profissionais capacitados para intervir nos

problemas de saúde. Observou-se que, tanto no ensino como no serviço, a abordagem é

curativa, tendo como foco o indivíduo e a doença.

O modelo de assistência à saúde delineado para o SUS tem como diretrizes: os

princípios filosóficos e organizacionais do SUS; a incorporação do conceito ampliado

de saúde, entendido como qualidade de vida; a utilização dos critérios epidemiológicos

para a definição das prioridades, respeitando os perfis epidemiológicos de cada região

ou município; o planejamento da assistência embasado nas reais necessidades de saúde

da população e que utilize como instrumento o diagnóstico de saúde local, bem como a

base as informações epidemiológicas; a promoção de mudanças nas práticas

assistenciais, assegurando uma atenção integral à saúde dos cidadãos, priorizando as

ações preventivas e promocionais da saúde; trabalhadores capacitados para utilizarem a

epidemiologia como instrumento de reorientação da sua prática.

Observa-se, na prática, a presença hegemônica do modelo tradicional em

detrimento ao do SUS, apesar de ser reconhecido por teóricos e até internacionalmente

como um modelo avançado e sofrer dificuldades para se impor enquanto política de

saúde.

Durante os anos de implantação do SUS, observaram-se os vários relatos de

experiências dos municípios ao se implantar o modelo de assistência à saúde

2

preconizado pelo SUS. Alguns obtiveram sucesso, especialmente aqueles que tinham

nos recursos humanos o objeto de intervenção para a implantação e implementação,

pois o SUS impõe a necessidade de aquisição de novas habilidades, posturas, aptidões e

conhecimentos interdisciplinares, para intervir na realidade e resolver os problemas

nela inseridos. Constatou-se, na prática, que os profissionais não se encontravam

suficientemente preparados para atuarem nessa nova prática.

Verificou-se, também, a necessidade de reestruturar as formas de ensinar

(transmissão dos conhecimentos) e aprender nos processos educativos desses

profissionais, deixando para trás a concepção de aprendizagem pela memorização e de

considerar os alunos como mero depósito de conteúdos, para se transformarem em

agentes de transformação das realidades, exigindo destes competência técnica,

conhecimento, mas também presença atitudinal para soluções dos problemas das

diversas realidades. Esse perfil desejado se concretizará quando for aguçado no

profissional a criticidade e a reflexão, que são despertados pelas pedagogias utilizadas

durante a sua formação ou durante os processos educativos em sua vida profissional.

O surgimento do Programa da Saúde da Família – PSF, em 1994, pelo

Ministério da Saúde – MS, reforçou de acordo com suas diretrizes e princípios, a

necessidade de um novo perfil profissional. O PSF foi um dos desafios que motivou a

utilização de pedagogias problematizadoras, pois para solucionar os diversos problemas

encontrados pelas equipes em suas localidades, somente os domínios do conhecimento

e da técnica não são suficientes.

Baseado nestas reflexões, o Pólo de Capacitação, Educação Permanente de

Pessoal para Saúde da Família da Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF, desde

o ano de 2000, vem utilizando em seus cursos e capacitações metodologias

problematizadoras, sendo uma delas o Ensino Baseado em Problemas – PBL e a outra a

Problematização.

No presente trabalho, procuraremos relatar a experiência deste Pólo com a

utilização da metodologia da problematização no Curso Introdutório para Saúde da

Família.

2. Programa da Saúde da Família

3

Em 1994, o Ministério da Saúde implanta o PSF como uma estratégia para a

inversão do modelo assistencial de saúde, tendo como eixo estruturante as ações

básicas de saúde. A proposta deve ser entendida como uma forma de implementar o

modelo assistencial proposto para o Sistema Único de Saúde – SUS, uma vez que se

trabalha em conformidade com os princípios desse mesmo sistema, definindo

responsabilidades entre os serviços e a população.

As ações nesse modelo devem ser desenvolvidas a partir da percepção da saúde;

portanto, enfocam a promoção e a recuperação da saúde, a prevenção e a cura das

doenças, e devem ser destinadas à família, ao indivíduo e à comunidade a partir do seu

espaço sócio-cultural (Machado, 2000; Negri, 2000; Machado de Souza, 2000; Neto,

2000).

O trabalho integrado e articulado dos componentes da equipe (médico,

enfermeiro, auxiliar de enfermagem e agente comunitário de saúde) é uma

característica indispensável ao enfrentamento dos problemas de saúde de uma

população territorializada e para o desenvolvimento das ações de forma oportuna,

resolutiva e capaz de impulsionar as ações intersetoriais.

Vale ressaltar que, segundo Machado de Souza (2000),

a Saúde da Família não é uma proposta nova. Na verdade ela agrega saberes e práticas acumuladas há muito tempo por diversas pessoas e diversas instituições ao longo desse país (p.15).

Mas para que a Saúde da Família se afirme como um modelo transformador das

práticas em saúde, pois já vem fazendo parte do trabalho, do interesse e da vontade de

muitos profissionais e instituições que militam na área da saúde coletiva1, torna-se

necessário enfrentar o problema da insuficiência de recursos humanos preparados para

atuarem nessa estratégia, uma vez que a Saúde da Família refere-se ao desempenho dos

profissionais com ações a serem desenvolvidas de promoção e assistência a grupos

familiares, que não se encontravam nos currículos de formação.

1 Saúde Coletiva, segundo Carvalho (1993) é o conjunto mais geral de ações dirigidas às populações, ao meio ambiente e à sociedade, englobando todos os tipos de assistência à saúde - lato sensu – com base nas necessidades de saúde das populações. Sugere direitos, situações históricas, condições de vida, crítica à idéia de que o indivíduo é o único responsável por sua saúde/doença. Incorpora as ciências sociais ao estudo dos fenômenos saúde/doença, prestação de serviços à população (p.135).

4

Cabe aos profissionais inseridos nos serviços e nas instituições formadoras de

recursos humanos o desafio de reorientar a formação e a capacitação dos profissionais

de saúde em todo o país, iniciadas antes da implantação do SUS, para induzir as

transformações necessárias.

De acordo com a pesquisa nacional2 realizada sob a coordenação de Machado

(2000), havia em dezembro de 1999, 4.945 equipes distribuídas em 1.870 municípios.

Observou-se que no universo de profissionais pesquisados, 3.131 (1.480 médicos e

1651 enfermeiros), existia uma baixa qualificação especializada dos médicos, um terço

deles não havia concluído residência médica (37,16%) e poucos enfermeiros com

habilitação profissional (37,07%). Dentre o grupo de profissionais com especialização

(39,53% médicos e 35,49% enfermeiros), observou-se que o perfil dos médicos era

clínico e dos enfermeiros, sanitarista. A maioria das informações obtidas por esses

profissionais sobre o PSF era adquirida através das publicações do Ministério da Saúde

e quase a totalidade expressava a necessidade de maior aprimoramento técnico-

científico (93,35% médicos e 96,7% enfermeiros). Dentre as necessidades de

capacitação, os profissionais referenciavam os cursos de curta duração, nos quais se

insere o Curso Introdutório.

Impõem-se, portanto, que a Saúde da Família, ao deixar de ser apenas uma

proposta para se transformar numa política e se colocar na agenda de priorização das

políticas públicas do país, investa maciçamente na qualificação dos recursos humanos

para a gestão e implementação do novo modelo assistencial (Machado de Souza, 2000).

Cabe, nesse momento, ressaltar que essa afirmação de que a Saúde da Família

deixa de ser uma proposta ou programa para se transformar em estratégia não é

compartilhada por muitos autores, pois a Saúde da Família possui todas as

características de programa na medida em que define parâmetros, metas, diretrizes, e

sua implantação se dá de forma verticalizada, possuindo financiamento específico,

dentre outros.

Essa discussão não será realizada nesse trabalho, porque não é o objeto desse

estudo, mas acredita-se que a Saúde da Família é orientadora da reestruturação do

modelo assistencial de saúde, por direcionar a organização a partir da atenção básica.

2 A pesquisa nacional referenciada é do Ministério da Saúde coordenada por Machado (2000) intitulada: “Perfil dos Médicos e Enfermeiros do Programa de Saúde da Família no Brasil”.

5

O Ministério da Saúde, no Plano para o Quadriênio 1999/2002 colocou como

meta de expansão do PSF para 20.000 equipes que iriam fazer o acompanhamento de

69 milhões de pessoas (Negri, 2000). Para que se concretizasse a proposta, existia o

desafio de reorientar a formação dos futuros profissionais que ingressariam no mercado

de trabalho, bem como daqueles que já se encontravam inseridos nele, necessitando de

capacitações e de educação permanente para as transformações desejadas na proposta

da Saúde da Família.

Dentre as linhas de ação desse Plano, destacava-se a relativa ao

desenvolvimento de recursos humanos, que criava os Pólos de Capacitação, Formação

e Educação Permanente de Pessoal para a Saúde da Família, que foram

institucionalizados através do edital nº 4 de 06/12/96 do MS e implantados em 1997.

Os Pólos são espaços de articulação entre o conhecimento e a ação através da

parceria renovada entre instituições de ensino e os serviços de saúde, tendo como

missão o propósito de capacitação, formação e educação permanente para o pessoal da

Saúde da Família. Os programas são desenvolvidos através de convênios entre

Secretaria de Estado e Secretarias Municipais de Saúde. (Machado de Souza, 2000, p.

15; Souza de Figueiredo, 2000).

Segundo dados do Ministério da Saúde/Secretaria de Assistência à

Saúde/Departamento de Atenção Básica - M.S/SAS/DAB – 2002, estão implantados,

no Brasil, 19 Pólos, e 11 estão em processo de implantação.

Há necessidade de se esclarecer que os Pólos não são projetos verticalizados

impostos pelo Ministério da Saúde. Eles caracterizam-se por um processo coordenado

de parcerias que envolvem diversas instituições de saúde e de outros setores da

sociedade, nos planos municipal e estadual, bem como instituições governamentais e

não-governamentais, com o acompanhamento, apoio técnico e, dentro das

disponibilidades, com o aporte de recursos financeiros federais (Brasil, 2000).

Atualmente, segundo dados do M.S/SAS/DAB-2002, o Brasil possui 16.960

equipes distribuídas em 4.185 municípios, atendendo 57 milhões de pessoas. Verifica-

se, portanto, que a meta estabelecida não foi atingida.

A proposta do Ministério da Saúde (Brasil, 2003) é ampliar a Saúde da Família.

Nos próximos quatro anos, a meta é duplicar o número de equipes levando a assistência

a mais de 100 milhões de pessoas, tendo como uma das estratégias o Projeto de

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Expansão e Consolidação da Saúde da Família - PROESF. Esse projeto prevê a

expansão da Saúde da Família para os municípios com mais de 100mil habitantes, com

investimentos previstos totalizando 550 milhões de dólares até 2009 (50% do

empréstimo do Banco Mundial e 50% de contrapartida do governo federal).

Portanto, a intenção é ampliar as ações dos Pólos de Saúde da Família que terão

a natureza de sua função modificada. Serão núcleos de articulação entre universidades,

escolas técnicas, centros formadores, escolas de saúde pública, núcleos de saúde

coletiva, hospitais universitários, gestores municipais e estaduais do SUS e Conselhos

de Secretários Municipais de Saúde (Brasil, 2003).

Os Pólos trabalharão com a proposta de educação permanente das equipes de

saúde atendendo prioritariamente as que atuam na atenção básica, mas também terão

como alvo a educação permanente das equipes de urgência e emergência de atenção

domiciliar, de atenção ao parto e deverá atuar de acordo com as prioridades definidas

pelo SUS em suas instâncias de deliberação (Brasil, 2003).

Segundo o ministro da saúde, Humberto Costa (2003), para se desenvolver uma

política pública como essa existe a necessidade de capacitar os profissionais e criar as

condições para sua implantação. Dessa forma, ratifica-se a necessidade de unir todas as

instituições em prol da formação e educação permanente dos profissionais, inovando e

investindo em aprendizagem significativa e objetivando a construção e a transformação

da realidade social.

3. O Pólo de Capacitação, Formação e Educação Permanente para Saúde da Família do Sudeste e Sul de Minas Gerais da Universidade Federal de Juiz de Fora/Núcleo de Assessoria Treinamentos e Estudos em Saúde – NATES/UFJF.

A UFJF, credenciada pelo Ministério da Saúde desde 1997, sedia no NATES o

Pólo de Capacitação, Formação e Educação Permanente para Saúde da Família do

Sudeste e Sul de Minas Gerais da UFJF. O Pólo foi aprovado em 1999, mas já havia

sido credenciado em 1997 na modalidade de projeto. Tem como missão a integração

entre o ensino e o serviço, promovendo a qualificação dos profissionais que integram as

equipes de Saúde da Família, assim como discentes dos cursos da área de saúde.

Fazem parte as seguintes instituições: Universidade Federal de Juiz de Fora

(Faculdade de Medicina, Faculdade de Enfermagem, Pró-Reitoria de Extensão, Pró-

Reitoria de Graduação); Secretarias Municipais de Saúde com PSF na área de

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abrangência; Diretorias Regionais de Saúde – DRS/SES/MG (Juiz de Fora, Ubá,

Manhumirim, Leopoldina, Ponte Nova, São João Del Rei e Barbacena); DRS na Região

sul de Minas (Varginha, Alfenas, Pouso Alegre, Passos).

ÁREA DE ABRANGÊNCIA

Fonte: IEC – Pólo de Capacitação UFJF/NATES, 2002.

As regiões sul e sudeste de Minas Gerais, que compõem o Pólo, possuem um

total de 352 municípios, dos quais 275 possuem a estratégia de Saúde da Família. São

628 equipes envolvendo 7.079 profissionais (Minas Gerais, 2003).

O Pólo vem desenvolvendo suas ações nas seguintes linhas de trabalho: temas

estratégicos de Saúde da Família; capacitação de recursos humanos para o PSF;

atividades de educação permanente. A primeira inclui a realização de oficinas de

Trabalho Regionais de Saúde da Família, Encontros Regionais de Equipes de Saúde da

Família, Oficinas de Práticas Educativas, edição da Revista de Atenção Primária já no

As atividades desenvolvidas pelo Pólo da UFJF atingem um total de 352 municípios no Sudeste e Sul de Minas Gerais, que estão distribuídos entre 11 Diretorias Regionais de Saúde, beneficiando cerca de 4.900.000 habitantes.

Área de abrangência das atividadesdesenvolvidadas

Gráfico 1: Abrangência do Pólo da UFJF e Capacitação no C.I.

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quinto ano, atividade de Acompanhamento e Avaliação de Equipes de Saúde da

Família. A segunda, o Curso de Especialização em Saúde da Família (quinta turma);

Curso de Especialização em Gestão de Sistemas e Serviços de Saúde; Residência em

Saúde da Família para médicos, enfermeiros e assistentes sociais; Curso de Capacitação

de Técnicos e Auxiliares de Enfermagem e Procedimentos Básicos na Ótica da Saúde

da Família; cinqüenta e cinco Cursos Introdutórios sendo seis para turmas de alunos de

graduação dos últimos períodos dos cursos de Medicina, Enfermagem, Serviço Social,

Odontologia, Fisioterapia, Farmácia-Bioquímica, e Psicologia; Cursos de Capacitação

Gerencial e Capacitações Pedagógicas para docentes em Metodologia de PBL e

Problematização, além de pesquisas.

Entre as atividades de educação permanente, destacam-se os seminários de

atualização em Atenção Primária a Saúde, seminário de Atenção à Mulher no Pré-Natal

e Parto, Lista de Discussão na Internet – ênfase nas decisões clínicas, cursos de

pequena duração como manejo de dados epidemiológicos.

O Pólo da UFJF vem, portanto, desenvolvendo ações, tanto na formação quanto

nos serviços e realmente vem cumprindo o seu papel de elo articulador entre a

universidade e os serviços.

Uma das capacitações para as equipes da Saúde da Família realizadas pelo Pólo

é o Curso Introdutório.

4. Curso Introdutório para Equipes de Saúde da Família da UFJF.

O Curso Introdutório para os profissionais que compõem as equipes da Saúde

da Família, segundo o Ministério da Saúde – MS (1999), tem como objetivo introduzir

as equipes de Saúde da Família no serviço, visando instrumentalizar os profissionais

com conteúdos essenciais para o início do trabalho nessa estratégia.

Para esse curso são sugeridos alguns conteúdos como forma de orientar as

equipes de Saúde da Família no trabalho a ser desenvolvido nessa estratégia, como:

princípios e diretrizes do SUS e do PSF; organização inicial do processo de trabalho;

aspectos da atenção integral à saúde individual e coletiva; diagnóstico da comunidade;

sistema de informação em atenção básica – SIAB.

Esses conteúdos não devem ser entendidos como uma grade rígida a ser

cumprida. O curso é flexível e busca a adequação entre os recursos disponíveis e as

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necessidades das equipes. Recomenda-se que os cursos devam ser realizados de forma

mais descentralizada possível e de preferência no próprio município, oportunizando a

participação de todos os membros que compõem a equipe e que sejam desenvolvidos

logo após a implantação do PSF no município. Uma outra recomendação é que a

metodologia adotada permita às equipes participarem na construção do seu próprio

conhecimento; portanto, a presença de todos os membros da equipe nesse encontro é

fundamental, pois é nesse momento que os conceitos serão discutidos e definidos para

serem incorporados na prática.

Após a realização do Curso Introdutório, espera-se que os profissionais estejam

capacitados a: compreender os princípios e diretrizes básicas do PSF, no âmbito do

SUS; identificar os fundamentos e instrumentos do processo de organização e prática

dos serviços da Saúde da Família; compreender as bases para o desenvolvimento do

processo de planejamento das ações e serviços das unidades de Saúde da Família.

O Pólo de Capacitação e Formação Permanente de Recursos Humanos em

Saúde da Família da UFJF vem desenvolvendo Cursos Introdutórios desde 1997.

Até o ano de 1999, os Cursos Introdutórios eram realizados de forma

centralizada no Núcleo de Assessoria, Cursos e Estudos em Saúde – NATES/UFJF – e

eram ministrados basicamente para médicos e enfermeiros das equipes ou outros

profissionais de nível superior que compunham as equipes. Nesses cursos, os conteúdos

atendiam à proposta sugerida pelo MS e a metodologia dominante era a da transmissão

de conhecimentos.

Diante das recomendações propostas pelo Ministério da Saúde (1999), o Pólo,

no ano de 2000, reorganizou a proposta do Curso Introdutório para as equipes de Saúde

da Família e passou a ser prioridade na área de capacitação. Conjuntamente, com as

sete Diretorias Regionais de Saúde – DRSs – da região sudeste de Minas que compõem

o Pólo, o Curso Introdutório foi reestruturado e descentralizado, passando a ser

desenvolvido nas cidades-sede das DRSs, uma vez que havia uma grande dificuldade

no deslocamento dos treinandos, o que prejudicava a participação de todos os membros

da equipe.

O objetivo do C.I. é sensibilizar e informar os profissionais para a nova

estratégia, ampliando a visão a respeito do modelo assistencial, de forma a contribuir

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com as mudanças das práticas cotidianas e na melhoria da qualidade de vida da

população.

Todo o processo de reestruturação do Curso foi organizado e construído a partir

de uma oficina de capacitação pedagógica promovida pelo Pólo, em maio de 2000, para

um grupo de profissionais que trabalhava em oficinas de Práticas Educativas,

representantes das DRS que compõem o Pólo e os representantes das DRS no Comitê

da Saúde da Família, por se entender que esses estão mais próximos das equipes e das

necessidades. Vários desses profissionais vieram a ser os multiplicadores desse curso,

pois acreditava-se que os conteúdos a serem desenvolvidos no Introdutório deveria

partir do próprio grupo, uma vez que a maioria deles estava inserida de alguma forma

na Saúde da Família de seus municípios ou nas DRSs. Esse grupo foi responsável por

toda a reestruturação, tanto dos conteúdos, como da metodologia adotada no curso,

criando roteiros específicos para cada assunto a ser abordado, de forma que os

conteúdos formassem uma rede de conhecimentos integrados.

Os cursos foram sendo realizados e, durante um ano, o conteúdo, as ferramentas

utilizadas para o desenvolvimento como fitas de vídeo, músicas, dinâmicas, os

instrumentos criados (perfil dos domicílios de risco, diagnóstico de saúde, as avaliações

dos facilitadores, avaliação do C.I., roteiro do facilitador), a própria metodologia e os

facilitadores foram sistematicamente avaliados quanto: à adequação dos objetivos dos

conteúdos e dos instrumentos criados, ao desempenho do facilitador com a metodologia

e conteúdo e, se no geral, o C.I era flexível para a adequação às diversas realidades e

necessidades das equipes para a organização inicial da Saúde da Família.

Após as análises dessas avaliações, obteve-se como resultado o manual do C.I.

do Pólo da UFJF.

4.1. Metodologia da Problematização

A metodologia de ensino escolhida para o Curso Introdutório para Saúde da

Família do Pólo da UFJF foi a da Problematização.

As metodologias problematizadoras surgiram no pós-guerra como uma das

estratégias de reconstrução dos países fortemente destruídos pela guerra. Mas é na

década de 70 que, nos países latino-americanos, essas metodologias aparecem e seus

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usos são estimulados na saúde por recomendação das Sociedades das Escolas Médicas

como forma de melhorar o padrão de ensino-aprendizagem nos cursos de graduação.

A metodologia da Problematização vem sendo utilizada no Brasil desde a

década de 80 em algumas universidades, inicialmente na formação de auxiliares de

enfermagem e, posteriormente, nos cursos de graduação como a Universidade Estadual

de Londrina, algumas universidades do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais.

A problematização é uma metodologia utilizada no ensino, no estudo e no

trabalho. O desenvolvimento do aprender e do ensinar parte dos problemas

identificados pelo educando na realidade a qual está inserido. Parte da base que o

mundo está em constante modificação que desencadeia rapidamente novas mudanças.

Portanto, o que se espera é o aumento da capacidade do educando em detectar e

resolver os problemas reais e descobrir as soluções. O conhecimento nesse processo é

importante, porém, não é o mais importante.

Segundo Berbel (1998), a metodologia pode ser utilizada sempre que seja

oportuno, em situações em que os temas estejam relacionados com a vida em

sociedade (p.142).

Portanto, a metodologia da problematização é considerada compatível e

adequada para o desenvolvimento de atividades de ensino e pesquisa nos cenários de

ensino comunitário e dos serviços de saúde que exigem do educando, além do

conhecimento, uma tomada de consciência e decisões para intervir nos problemas da

realidade na qual estão inseridos, exigindo do profissional comprometimento e

responsabilidade.

As metodologias problematizadoras vêm sendo referendadas pelas comissões de

revisão curriculares da área da saúde. A experiência do uso da metodologia da

problematização nos cursos de graduação, apesar de pequena, tem obtido resultados

positivos, pois trabalhar com problemas faz despertar no aluno o interesse e o espírito

crítico, auxiliando na sua formação em agente de transformação da realidade para as

mudanças necessárias.

Sugere-se, também, a inserção da disciplina como forma de preparar o aluno

para o seu futuro papel de educador. No curso de graduação da Enfermagem de

algumas universidades, como exemplo UFMG, UEL, UERJ, dentre outras, isso já vem

acontecendo.

12

Então, cabem às universidades ousarem nas mudanças curriculares,

oportunizando estratégias capazes de formar um profissional que exerça seu papel de

educador, sujeito do processo ensino-aprendizagem e capaz de resolver problemas do

cotidiano de sua prática, através de reflexões críticas da realidade onde se insere.

A referência nesta metodologia é Juan Dias Bordenave (1982), que explica a

utilização da metodologia através do Arco de Charles Maguerez. Dentre os autores

brasileiros, está Paulo Freire.

A palavra chave, tanto da aprendizagem como do ensino, é problema. A

aprendizagem se dá através de reflexões da prática para a transformação dela. Não se

dá de forma individual, tem inserido a transformação social. Se essa aprendizagem

acontece em uma situação grupal, essa se dará de forma coletiva. A construção da

aprendizagem se dá por etapas partindo da realidade e nela retornando.

O processo da aprendizagem se inicia quando o aluno, através da observação da

realidade, detecta situações ou problemas que chamam a sua atenção. A partir da

percepção de sua experiência de vida ou prática conjuntamente com as pessoas

envolvidas no processo de ensino-aprendizagem (professor, aluno, profissionais de

serviço), ele vai criando os seus próprios conhecimentos, através de reflexões,

associações lógicas e teorizações.

Nessa metodologia, o ensino se dá a partir de perguntas e indagações aos

educandos sobre a observação do problema e da situação, facilitando o processo de

reflexão do educando. É fundamental que se entenda que o papel do professor não é o

de ensinar, uma vez que ninguém ensina a outra pessoa; o processo da aprendizagem é

interno e só pode ser verificado após a internalização das reflexões. A busca dos

conhecimentos é necessária para a mudança de atitude e para a transformação da

realidade.

Utiliza-se o Arco de Charles Maguerez (apud Bordenave, 1982), que é

composto de cinco etapas que se desenvolvem a partir da realidade ou de um recorte da

mesma e para a realidade retorna, exercitando a cadeia dialética de ação – reflexão –

ação.

Gráfico:2 Arco de Charles Maguerez

13

Realidade

Observação da Realidade(Problema)

Aplicação à Realidade(Prática)

Ponto Chave Hipótese de Solução

Teorização

A primeira etapa é a da Observação da realidade social concreta: os educandos

são orientados pelo facilitador a olharem atentamente e a registrarem o que percebem

sobre a parcela da realidade em que o tema está sendo vivido.

Essa observação permitirá aos educandos identificarem dificuldades, carências,

discrepâncias de várias ordens, que serão transformados em problemas. As discussões

entre os membros do grupo e o facilitador ajudarão na formulação ou redação do

problema.

No C.I. os participantes iniciam cada tema a ser trabalhado relatando a sua

experiência ou vivência para o grupo. São sensibilizados, às vezes, com dinâmicas

inespecíficas (com o objetivo apenas de acordar, motivar e integrar os participantes) e

específicas (tem relação com o tema a ser discutido) para que os participantes

sensibilizados para o tema deixem emergir situações/problemas trazendo para o grupo

os fatores determinantes, o contexto sócio-político-cultural para melhor refletir o

assunto. Utilizam-se, também, filmes, representações sobre o assunto com figuras,

desenhos, dramatizações, jogos.

A segunda etapa é a identificação dos pontos-chave: os educandos refletirão

sobre as possíveis causas do problema em estudo. Por que será que esse problema

acontece? Os educandos percebem, nesse momento, que a maioria dos problemas de

origem social são multideterminados e que interferem na existência do mesmo.

Verificam a necessidade das parcerias para solucionarem os problemas. Nesse

momento é feita uma análise criteriosa e crítica pelo educando da situação, pois se tem

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como objetivo solucionar o problema. Serão, então, selecionados os tópicos

importantes.

No C.I., o facilitador, através de perguntas que orientaram a discussão, procura

identificar com o grupo quais são os pontos-chave das situações trabalhadas e quais são

os fatores determinantes.

A terceira etapa é a Teorização: etapa do estudo da investigação. Os educandos

se organizam tecnicamente para buscarem as informações de que necessitam

(biblioteca em busca de livros, revistas, aula, pesquisas, palestras, dentre outros). As

informações colhidas são analisadas e avaliadas quanto a sua contribuição para a

resolução do problema.

Essa etapa no C.I. é atingida pelos participantes após esgotarem os

conhecimentos que possuem sobre o tema na discussão em grupo ou em plenárias com

apresentação de trabalhos realizados e com a troca de experiências. O facilitador tem

como função despertar e auxiliar o grupo para o acréscimo de conhecimento sobre o

tema para enriquecer o construído pelo grupo e também sistematizar todo o conteúdo

produzido por ele. Alguns temas são teorizados com textos de apoio, filmes em fitas

vídeo, palestras.

A quarta etapa é a de elaboração de Hipótese de solução: todo o estudo deverá

oferecer elementos para os educandos criticarem e criativamente elaborarem as

possíveis soluções.

Vale ressaltar que durante todo o C.I. as equipes de Saúde da Família não são

desfeitas, trabalham com os membros que a compõem para garantirem soluções dos

problemas viáveis aos seus contextos. Portanto, nesse momento no C.I. a equipe

trabalha pensando e tentando criar hipóteses de acordo com sua realidade. É observado

nos intervalos do curso que as equipes conversam e trocam informações procurando

levantar a melhor solução para os seus problemas.

A quinta etapa será a da Aplicação à realidade: retorno das decisões para serem

executadas e caracteriza o momento que os educandos levarão uma resposta do estudo.

Essa etapa é a que uma das autoras está estudando em sua tese de doutorado,

“As repercussões do Curso Introdutório como estratégia de organização do trabalho das

equipes de Saúde da Família, experiência do Pólo de Juiz de Fora/MG”, pois o

objetivo do C.I. é que os participantes apliquem o conhecimento com a finalidade de

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organizarem o trabalho de acordo com as diretrizes e princípios da Saúde da Família

em suas realidades locais, melhorando a prática de assistência para as populações.

Vale ressaltar que o método é o caminho utilizado para o ensino/aprendizado;

portanto, possui dois eixos: o teórico-metodológico e o técnico-metodológico. A

utilização exclusiva do último eixo a reduz à condição de procedimento de ensino;

dessa forma estará reproduzindo acriticamente a realidade social, ou seja, distante da

proposta de mudança e transformação social. Deve-se lembrar que os problemas estão

inseridos em contextos diferentes e que possuem determinantes históricos, sociais,

políticos e culturais diferentes.

O papel do instrutor/facilitador na metodologia difere do modelo da transmissão

em que o professor é o dono do saber; nessa situação ele será o instrutor, o facilitador

do processo ensino-aprendizagem. Existe uma interação entre o educando e o

facilitador, no exercício do ensinar, que pode se dar a partir da troca de conhecimentos

e experiências. Constrói-se junto com o educando o conhecimento. Necessita-se de

estar capacitado para a utilização da metodologia, ter clareza dos limites e avanços

necessários para trabalhar os problemas e temas. Sua utilização exige do professor

posturas diferentes (de detentor de todo o conhecimento a facilitador do processo) do

modelo tradicional de ensino, bem como a postura do aluno, que de mero expectador

passa a fazer parte da construção de seus conhecimentos.

O papel do educando durante todo o processo é ativo e participativo. Observa,

faz perguntas, expressa suas percepções e opiniões e, por isso, é motivado a aprender,

Para Bodernave (1993), a problematização permite que

o aprendiz seja constantemente ativo, formulando perguntas, percepções e opiniões, a partir da observação da realidade com seus próprios olhos, nas quais os aprendizes estão inseridos, sendo motivados para a percepção dos problemas reais significativos e para a busca de soluções dos problemas (p.17).

Essa posição do educando durante o processo ensino/aprendizagem difere das

pedagogias tradicionais, as quais considera o aluno como simplesmente um papel em

branco ou receptor de informações passivo.

Ressalta-se que o propósito maior é preparar o educando para tomar consciência

de seu mundo e atuar intencionalmente para transformá-lo. Espera-se que ele aja

16

politicamente como cidadão e profissional e que seja agente social que participa da

construção da história de seu tempo.

4.2. Estruturação do Curso Introdutório

O Curso possui carga horária de 48 horas e é desenvolvido em dois finais de

semana (de quinta a sábado). Foi dividido didaticamente em duas etapas. A primeira

aborda, através de vivência dos participantes, os conceitos de saúde, indivíduo,

educação em saúde, família, trabalho em equipe e participação popular. Durante o

período de dispersão, os treinandos têm como atividade desenvolver uma estratégia de

educação permanente da equipe.

A segunda etapa instrumentaliza e apresenta ferramentas essenciais para a

Saúde da Família, abordando os conteúdos referentes à Política de Saúde, Estratégia da

Saúde da Família, Planejamento: conhecendo a comunidade (território, cadastramento,

sistema de informação, planejamento).

A equipe tem como atividade final à realização de um “Diagnóstico de Saúde”,

seguido de um roteiro (instrumento criado para o C.I), que resgata toda a discussão do

curso.

A Avaliação e a supervisão desse diagnóstico fica sob a responsabilidade das

coordenações municipais e regionais do PSF.

Quadro 1 - Objetivos Temáticos do Curso Introdutório para Saúde da Família

1ª etapa

Conteúdo Objetivo Conceito de Saúde – 4 horas Construir um conceito ampliado de saúde

resgatando determinantes deste processo. Educação em Saúde – 4 horas Instrumentalizar as equipes para o

desenvolvimento da educação em saúde, através de uma prática que busque a participação, a troca, o respeito, a vivência da população.

Indivíduo – 4 horas Refletir sobre o indivíduo e suas vivências Família – 4 horas Refletir sobre os diversos arranjos familiares e

trabalhar os preconceitos. Trabalho em equipe – 4 horas Sensibilizar a equipe para o trabalho

interdisciplinar visando a ação integral. Participação Popular – 4 horas Sensibilizar as equipes sobre a importância da

participação popular na saúde, como fator fundamental no processo de transformação de sua prática.

17

2ª etapa

Conteúdos Objetivo Política de Saúde e Modelos Assistenciais – 4 horas

Conhecer e refletir sobre a história recente da política de saúde no Brasil, para situar-se no contexto do seu trabalho. Refletir sobre os modelos assistenciais, focalizando a Atenção Primária à Saúde

SUS Municipal e Saúde da Família – 4 horas

Compreender os princípios e diretrizes básicas da Saúde da Família no âmbito do SUS

Planejamento: Conhecendo a Comunidade - 4 horas

Conhecer a realidade local (diagnóstico da comunidade), através do mapeamento da área de atuação da ESF e do cadastramento das famílias. Discutir o processo de territorialização como instrumento fundamental na construção do diagnóstico de saúde e, conseqüentemente, no planejamento das ações mais próximas à realidade da população na qual estão inseridas as equipes. Sensibilizar os participantes para a importância do cadastro de famílias como um instrumento de diagnóstico/planejamento para definir as ações da equipe e conhecer a comunidade.

Planejamento: Sistemas de Informação – 4 horas

Apresentar os diversos sistemas de informação, sensibilizar e refletir sobre a importância dos indicadores como instrumento para o planejamento e avaliação das ações a serem desenvolvidas.

Planejamento: Estratégias de Ação – 8 horas

Sensibilizar e instrumentalizar os participantes sobre a importância do planejamento e a utilização de instrumentos de planejamento na lógica do Programa Avançado de Gerência em Atenção Primária a Saúde – PAG/APS.

Após a construção desse novo desenho do Curso Introdutório, ele já foi

realizado nas onze DRS totalizando cinqüenta e cinco cursos para profissionais e

alunos dos cursos de graduação da área de saúde da UFJF, conforme quadro a seguir.

Vale ressaltar que o Pólo da UFJF, a partir do ano de 2001, foi identificado

como referência para a região norte do país com relação ao C.I. Isso aconteceu devido à

preocupação do Ministério da Saúde – MS com a qualidade da implantação de Pólos no

país. A estratégia utilizada foi impulsionar o intercâmbio entre os Pólos estruturados e

18

os “novos” (que estavam se estruturando), com o objetivo de auxiliar nessa implantação

e troca de experiência.

O Pólo da UFJF, já formou multiplicadores do Curso Introdutório nos Pólos do

Amapá (2001), Acre e Roraima (2002), totalizando setenta e um profissionais.

Quadro 2 – Total de Cursos Introdutórios ministrados pelo Pólo de Capacitação da UFJF, relacionando o total de profissionais e alunos capacitados e de municípios atendidos, no período de 2000 a 2002.

Ano Total de CI Nº capacitados Total de municípios atendidos

2000 08 292 28 2001 25 1.450 95 2002 22 1.241 56 TOTAL 55 2882 179

Fonte: IEC/NATES-UFJF, 2002

Considerando que todos os integrantes da equipe de Saúde da Família fazem

parte do processo de trabalho em saúde e que, para a viabilização da Saúde da Família e

conseqüentemente do SUS, existe a necessidade de que todos os trabalhadores de saúde

respondam satisfatoriamente aos problemas de saúde. Portanto, o C.I. é realizado para

todos os profissionais que compõem a equipe.

O critério adotado pelo Pólo de oferecimento dos cursos acontece em reunião do

comitê da Saúde da Família, onde os representantes das DRS apresentam suas

necessidades e a coordenação do Pólo, de acordo com a verba disponível, distribui os

cursos para as DRS, conforme o número de equipes a serem capacitadas.

Os cursos são realizados descentralizados, ou seja, no município sede da DRS

ou em municípios o mais próximo possível das equipes, evitando grandes

deslocamentos das mesmas.

É feito um cronograma dos cursos a serem realizados pela coordenação do C.I;

onde não existe um facilitador do C.I. são deslocados facilitadores do Pólo da UFJF

que, além de realizarem o C.I., fazem acompanhamento, avaliação e formação de

multiplicadores para essa DRS.

Como a meta do Pólo é a descentralização do C.I. para que o processo de

capacitação aconteça mais rápido, devido à velocidade de implantação das equipes, o

19

Pólo possui um processo de formação de multiplicadores do C.I. Ele acontece em três

etapas.

A primeira é a de sensibilização dos futuros multiplicadores na metodologia da

problematização, com carga horária de vinte e oito horas.

A segunda é a realização do C.I. onde se dará a discussão de todo o manual e do

estudo dos textos de apoio, totalizando trinta e seis horas.

A terceira, o futuro multiplicador acompanha, na função de monitor, um ou

mais C.I. com facilitadores mais experientes, onde são preenchidas avaliações pelos

facilitadores experientes, sobre o desempenho do mesmo durante os cursos. Essas

avaliações são analisadas pela coordenação do C.I. do Pólo. Os cursos que os monitores

acompanham são aqueles realizados na sua DRS de origem. Só será facilitador quando

tiver domínio do conteúdo, do entendimento do roteiro de cada tema e da metodologia

de ensino.

Cada C.I. é formado por um grupo de sessenta participantes, que são

subdivididos em turmas de vinte profissionais (em média, duas equipes completas) para

dois facilitadores.

5. Metodologia do estudo

Este estudo é de natureza quanti-qualitativa. Foi utilizado como instrumento de

coleta de dados, consolidado nas avaliações finais preenchidas pelos participantes dos

C.I., no período de 2000 a agosto de 2002, totalizando 55 cursos e 2.882 pessoas

capacitadas. Foi selecionada nesta avaliação a pergunta: “Qual a sua opinião sobre as

técnicas de ensino utilizadas?”

A pergunta selecionada foi escolhida porque, durante as análises das avaliações

preenchidas pelos participantes, observou-se que muitos faziam menções sobre a

metodologia do ensino.

Na análise documental, procurou-se resgatar os documentos históricos de

criação do Pólo, os relatórios de avaliação encaminhados aos M.S. para prestação de

contas e a história da criação e reestruturação do C.I.

O sujeitos do estudo foram os profissionais das equipes de Saúde da Família e

os alunos dos cursos de graduação da área da saúde da UFJF, que participaram do C.I.

do Pólo da UFJF.

20

6. Resultados

Dos dois mil oitocentos e oitenta e dois participantes dos C.I. verificou-se que

quinhentos e setenta e seis participantes não responderam a avaliação. Do total de duas

mil trezentos e seis avaliações respondidas, novecentos e quarenta e três faziam

referência à metodologia do curso; mil e duzentas avaliações abordavam as técnicas de

ensino utilizadas no C.I. e cento e sessenta e três não responderam a pergunta.

Gráfico 3: Resultado da Análise do Consolidado das Avaliações do C.I.

1200

943

576163

abordavam astécnicas de ensinoutilizadas no C.Ifaziam referência ametodologia do curso

não responderam aavaliação

não responderam apergunta

Ao se analisar os dados das avaliações dos dois mil trezentos e seis participantes

dos C.I., foram consideradas apenas as respostas que referiam à metodologia

totalizando novecentos e quarenta e três. Pode-se observar que a maioria das respostas

é feita por uma frase ou por uma única palavra, em que exprimem as percepções, as

sensações e sentimentos vivenciados durante os C.I.

Procurou-se organizar a análise dos dados separando inicialmente, as opiniões

positivas e “contrárias” à metodologia, para se ter uma visão geral dos dados

apresentados e, conseqüentemente, fazer uma avaliação inicial do conteúdo das

mesmas, aonde se chegou à conclusão que, do universo pesquisado, somente vinte e

uma eram “contrárias”.

As variáveis emergiram das opiniões dos participantes do C.I., cujas respostas

ou frases puderam ser resumidas em uma palavra chave e categorizadas em seis grupos.

Observou-se que as palavras com as quais os participantes expressaram sua

opinião refletem a vivência dos participantes na metodologia e o primeiro contato com

21

a mesma. Para cada categoria procurou-se fazer uma análise segundo o referencial

teórico adotado nesse estudo: Bordenave (1993), Freire (1996) e Berbel (1998).

A primeira categoria aborda a “suficiência da metodologia” ao C.I. para os

participantes representada pelas palavras: ótima, excelente, muito boa, boa, proveitosa

e satisfatória, demonstrando que a problematização se adequa ao C.I., mas também ao

trabalho e ao estudo, totalizando seiscentos e setenta e três percepções.

Essa adequação é afirmada pelos participantes quando relatam que: “pode ser

usada na comunidade” (2); “pode ser usada no trabalho” (05). Segundo Berbel (1998)

a metodologia pode e deve ser aplicada em qualquer assunto relacionado com a vida

em sociedade, não só no trabalho, mas também no estudo e ensino. “Incentivam a

melhorar a prática” (01), isso acontece através das reflexões da própria prática dos

participantes.

“Facilitou a aprendizagem”(13), acredita-se que o método proporcione a

facilitação da aprendizagem, pois os participantes são motivados a produzirem os seus

conhecimentos para a solução dos problemas.

Pode-se dizer que a positividade do grupo de palavras dessa categoria está

relacionada ao fato de que a metodologia se baseia na solução de problemas observados

dentro do contexto sócio-econômico-político e cultural em que se encontram, portanto

as soluções surgem das próprias pessoas que vivenciam os problemas tornando a

metodologia suficiente.

A segunda categoria reflete o “método da problematização” através das

palavras: objetiva, clara, eficiente, organizada, totalizando sessenta e uma percepções.

Ao contrário do que muitas pessoas pensam, a metodologia possui uma

rigorosidade metódica, sem a qual os educandos ficariam perdidos no processo. O

objeto do conhecimento parte do real e percorrerá etapas organizadas onde se

promoverá a reflexão crítica do educando sobre o objeto de estudo e se traçará durante

o percurso o objetivo.

Quando se refere à rigorosidade metódica, não se quer dar a impressão de etapas

estanques e fechadas, pois às vezes, durante as etapas de observação, reflexão e a

investigação de um conteúdo, podem surgir necessidades de estudar e pesquisar outros

assuntos que explicam ou fazem parte da solução do problema que se está estudando.

22

Vale ressaltar que o método é o caminho que o facilitador utilizará, porém a

mudança que se espera no aluno e na realidade social que está inserido não é garantida

pelo simples fato de se utilizar o método. Isso só acontecerá se associarmos o método

mais o embasamento teórico que sustentam essa pedagogia.

Durante a análise dessa categoria, sobressaíram as percepções de alguns

participantes como:

™ “a metodologia é concreta” (01); “parte de nossa realidade” (01); “de fácil

entendimento” (02), ratificando a importância de se partir das experiências e vivências

dos participantes, pois trazem suas realidades para o grupo. Na metodologia, partirmos

da realidade e para ela retornamos, tornando o processo ensino/aprendizagem mais

compreensível;

™“busca soluções para a nossa realidade” (02), procura a solução para os problemas

dentro do contexto sócio-econômico-político e cultural da realidade a qual se observou

o problema;

™ “não saímos com dúvidas” (01), ao seguir a proposta metodológica, as dúvidas vão

sendo sanadas à medida que aparecem pelo próprio grupo de educandos. Alguns

aspectos são relevantes ao se sanar as dúvidas como: o interesse, a motivação, a

importância.

A terceira categoria demonstra a “essência da metodologia” que totalizou

setenta percepções, através das palavras: participativa, construtiva, instrutiva,

reflexiva, quando explica que o conhecimento será construído pelos educandos,

facilitadores e outras pessoas envolvidas com o problema identificado na realidade em

que os educandos estão inseridos e que também farão parte do processo de

ensino/aprendizagem. Portanto, a construção do conhecimento é participativa e

instrutiva.

Os relatos registrados dos participantes justificam essa categoria de análise:

™ “permite a participação de todos” (07), todos os participantes devem dar a sua

opinião, o facilitador do processo ensino/aprendizagem tem papel fundamental na

estimulação do grupo. Verifica-se que, quanto mais heterogêneo o grupo, mais rico se

tornam as discussões e a produção do conteúdo devido a troca de experiências;

™ “permite o trabalho em equipe” (03), a construção do conhecimento é coletiva,

aproxima as pessoas em prol da resolução dos problemas;

23

™ “construção coletiva do conhecimento” (01), é uma das diferenças entre os demais

métodos de ensino/aprendizagem. Nela, o conteúdo é construído por todos que estão no

grupo de discussão e os envolvidos na resolução do problema. Na metodologia da

transmissão, por exemplo, a construção é solitária;

™ “ajudou na integração do grupo” (02), a metodologia promove aproximação das

pessoas e a integração a partir da troca de experiências e da construção coletiva do

conhecimento;

™ “estimula a reflexão” (04), permite que reflitamos a nossa postura para uma atuação

transformadora. A reflexão está presente em todas as etapas do método;

™ “na simplicidade aprendemos a comunicar através do diálogo e da troca de

experiência e sentimentos” (02), a metodologia permite a troca de experiência mesmo

que seja a de vida, incentivando a comunicação e o diálogo ao contrário da metodologia

da transmissão;

™ “liberdade de se expressar” (01), o grupo é livre para se expressar, o certo ou errado

é refletido e discutido;

™ “desenvolve conhecimento através da vivência e experiência” (03), parte da

observação da realidade através de vivência e da experiência que os participantes

trazem de sua prática e para a realidade retornam com as possíveis soluções;

™ “se adequa aos diferentes grupos” (01), utiliza o diálogo, a comunicação não

necessita de homogeneidade nas características dos participantes. Quanto mais

heterogêneo o grupo, mais rico se torna a troca de experiência e mais interessantes são

as discussões.

A quarta categoria demonstra “como acontece o processo do ensino/

aprendizagem”, totalizando cento e onze percepções. Por ser dinâmico o processo e por

instigar no educando a curiosidade, a criticidade, a investigação, a busca da solução

para o problema, a metodologia torna-se estimulante. É dinâmica e criativa, porque os

educandos não recebem passivamente o conhecimento e são estimulados a construí-lo,

bem como a solucionarem os problemas dentro do contexto sócio-econômico e político,

exigindo do educando a criatividade.

Apesar de não ser uma metodologia “nova” como é referendada por muitos

educandos, no nosso contexto de ensino/serviço ela vem sendo utilizada a partir dos

24

anos 80, o que faz com que várias pessoas venham a conhecer a metodologia somente

agora no C.I.

As palavras descontraída, inovadora, interessante podem ser explicadas em

decorrência da experiência vivenciada de aprendizagem baseada na transmissão de

conteúdo, onde as dúvidas eram levadas para a casa para serem resolvidas, o

conhecimento se dava de forma vertical (professor repassava para o aluno o

conhecimento que possuía e ele memorizava sem questionamento). O ato do aprender

era individual, solitário, introvertido, ao contrário do que se preconiza na

problematização.

A quinta categoria está relacionada à “logística para a aplicabilidade da

metodologia”, totalizando sete percepções:

™ “exige facilitador experiente para desenvolvê-la” (04), o facilitador tem que ser

capacitado e ter internalizado a ideologia e as propostas da metodologia;

™ “não necessita de recursos caros para aplicá-la” (02), não necessita de grandes

investimentos, mas são necessários pelo menos que os facilitadores sejam capacitados

na metodologia, vontade de inovar para transformar, salas adequadas com número de

alunos suficientes (dez por facilitador) para o desenvolvimento da metodologia. O

material de consumo, como equipamentos e biblioteca, normalmente são encontrados

em escolas e podem ser adaptados para o uso da metodologia;

™ “não utiliza palestra” (01), na problematização não existe proibição quanto ao uso

de palestras, desde que esta seja antecedida pelas demais etapas do processo. Há

momentos e assuntos em que existe a necessidade de se teorizar com palestras para

enriquecer a construção dos conteúdos. O uso da problematização não inviabiliza a

utilização das outras metodologias de ensino.

A sexta categoria refere-se as “percepções contrárias” à metodologia; apesar de

poucas (vinte e uma), verificou-se que estavam relacionadas ao fato de ser para muitos

uma metodologia “nova”. Portanto, fazem parte da resistência natural às mudanças.

Fica bem característico quando os participantes se referem à metodologia relatando

“prefiro aula expositiva”. Além disso, aula expositiva não exige a participação ativa do

aluno.

As palavras chata e cansativa nas metodologias problematizadoras, para Freire

(1998), se referem ao acompanhamento das idas e vindas do pensamento do aluno na

25

construção do conhecimento. Relata ainda, que a aula é um desafio e não uma cantiga

de ninar, portanto os alunos cansam e não dormem. Outro ponto que pode ser refletido

é que os educandos não recebem nada pronto, tudo é construído exigindo sua

participação durante todo o processo de ensino/aprendizagem.

A experiência de anos no modelo tradicional de ensino/aprendizagem no qual o

educando esteve solitário recebendo e procurando informações para o seu aprendizado,

fez com que ele, diante de um grupo de educandos que pretende construir

coletivamente o conhecimento, prefira fazer sua tarefa individual e solitária, como

aparece no relato do participante do C.I. “não gosto de dinâmica de grupo”.

Outra situação observada é com relação às opiniões dos participantes quando

relatam ser a metodologia complicada, pouco prática e que a heterogeneidade do

grupo dificultou a fala e a compreensão. Verifica-se que quanto mais cristalizados

somos pelo modelo de ensino tradicional, mais difícil se torna falar, aceitar e ouvir

opiniões do outro. Fomos formados para permanecermos quietos e aceitar sem

argumentar o que o outro diz.

No C.I. os participantes devem dar e emitir opiniões, pois toda a abordagem do

curso inicia-se com a vivência dos participantes. Em algumas situações pode acontecer

do processo se tornar complicado se o facilitador do C.I. não intervém adequadamente

nas discussões e reflexões, orientando adequadamente as mesmas. Para que isso não

ocorra, o facilitador deve não só estar capacitado quanto à metodologia, mas também

ter internalizadas as mudanças que a mesma proporciona quando se conhece e entende

a metodologia. Por isso é tida também como uma metodologia para ser aplicada no

nosso dia-dia, na nossa vida, pois exige da pessoa que a aplica postura igual perante a

vida (relações mais igualitárias,abertura, flexibilidade, saber ouvir, aceitar o outro

como ele é, respeitar o ritmo de cada pessoa, entre outras). Pode-se inferir que o

processo de internalização, na maioria das vezes, é lento, pois implica em mudança de

visão de mundo.

Durante a realização do C.I., como já relatado, o conhecimento vai sendo

construído a partir das vivências das pessoas. Muitos são os relatos dos participantes

dos C.I. em que uma das autoras desse estudo participou como facilitadora, e ouviu dos

mesmos que conheceram seus parceiros de equipe da Saúde da Família ali no curso. Há

momentos no C.I. que as pessoas se colocam e falam de si, com naturalidade refletem

26

suas posturas, se tocam nas dinâmicas. No dia-dia de trabalho as equipes, talvez

imbuídas com as atividades a serem desenvolvidas, não se percebem enquanto

indivíduos, não percebem o outro como ele é e/ou não tem tempo para parar, conversar

e conhecer os colegas da equipe. A palavra constrangedora pode estar ligada às

situações acima descritas.

7. Considerações Finais

As esperanças foram renovadas com a mudança na política do país, em especial

na Saúde da Família, com a proposta de ampliação do número de equipes, objetivando

levar saúde as famílias brasileiras.

Isso ratifica a necessidade de investimento na capacitação dos profissionais já

inseridos no processo de trabalho, como também nos cursos de graduação na área de

saúde, justificando a preocupação do Pólo da UFJF/NATES em oferecer cursos que

promovam a qualificação destes sujeitos com aprendizagem significativa. Para tanto, o

Pólo vem trabalhando em projetos e cursos como o C.I. com pedagogias ativas

auxiliando no processo de mudança do modelo assistencial.

O estudo apontou para a adequação e suficiência da metodologia da

problematização ao C.I., a qual favorece o aprendizado, é criativa e envolve o grupo

como um todo na construção dos conhecimentos, através do diálogo e de troca de

experiências e sentimentos. É uma forma fácil e “nova” para se trabalhar com a

comunidade.

Acredita-se na superioridade da metodologia da problematização, pois promove

o crescimento integral do educando aguçando a sua capacidade de pensar, raciocinar,

refletir, comunicar, cooperar, de trabalhar em equipe e principalmente de criar

compromisso e responsabilidade, na medida que tenta solucionar o problema inserido

em seu contexto real.

Se fizermos uma comparação com a proposta da Saúde da Família, verifica-se

que o que se espera dos profissionais das equipes é o perfil traçado acima, que possam

ser sujeitos de ações transformadoras, por isso, necessita-se de profissionais resolutivos

e críticos, que possam avaliar e refletir a sua prática para se alcançar as mudanças

desejáveis e pretendidas na Saúde da Família. Portanto, a metodologia da

27

problematização é uma ferramenta importante na formação do profissional para a

Saúde da Família, desde que utilizada adequadamente.

Pode-se inferir que o Pólo da Saúde da Família da UFJF/NATES foi ousado em

utilizar a problematização no C.I., por acreditar que o indivíduo é responsável pelo seu

processo de aprendizagem e por sua transformação pessoal e contextual.

Acredita-se que a capacitação desses trabalhadores utilizando esta metodologia,

seja uma das abordagens a serem utilizadas para a transformação das práticas

profissionais em direção ao modelo assistencial proposto pela Saúde da Família em

consonância com o do SUS. Considerando que todos os profissionais da equipe são

agentes deste processo de mudança, a capacitação desses agentes deve ir além da

simples auto-adaptação ao modelo e não deve reproduzir o modelo hegemônico,

curativo, individual, centralizador. Eles devem refletir criticamente, construindo e

reconstruindo sempre suas práticas, o que é oportunizado nesse curso.

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30

Notas: 1. Saúde Coletiva, segundo Carvalho (1993), é o conjunto mais geral de ações dirigidas às populações, ao meio ambiente e à sociedade englobando todos os tipos de assistência à saúde - lato sensu – com base nas necessidades de saúde das populações. Sugere direitos, situações históricas, condições de vida, crítica à idéia de que o indivíduo é o único responsável por sua saúde/doença. Incorpora as ciências sociais ao estudo dos fenômenos saúde/doença, prestação de serviços à população (p.135). 2. A pesquisa nacional referenciada é do Ministério da Saúde coordenada por Machado (2000) intitulada: “Perfil dos Médicos e Enfermeiros do Programa de Saúde da Família no Brasil”. i i

1

PERFIL SOCIAL DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE

VINCULADOS AO PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA DA

ZONA NORTE DO MUNICÍPIO DE JUIZ DE FORA

MARCELO HENRIQUE DA SILVA – Enfermeiro do Programa Saúde da Família da

Secretaria Municipal de Saúde de Juiz de Fora – MG, Especialista em Saúde da Família

pela UFJF.

e-mail: [email protected]

MARIA RUTH DOS SANTOS – Farmacêutica-Bioquímica, Professora Substituta do

Departamento de Saúde Coletiva da UFJF, Doutoranda em Saúde Coletiva pelo

Instituto de Medicina Social da UERJ.

e-mail: [email protected]

RESUMO

Este estudo analisa o perfil social dos agentes comunitários de saúde(ACSs) da Zona

Norte de Juiz de Fora. Os resultados mostram que os ACSs pertencem a uma categoria

predominantemente feminina, concentrando-se na faixa entre 20-30 anos e escolaridade acima

do requerido pelo processo seletivo de Juiz de Fora, antiga quarta série primária. Moram há

mais de vinte anos no bairro onde atuam. Têm fraca participação nos grupos institucionais e

mobilizações comunitárias.Desconheciam o conceito de saúde que a população possuía e suas

formas de organização e mobilização. Antes de se tornarem ACSs, exerciam atividades no

comércio e indústria. Pleitearam ser ACS pela oportunidade de emprego, desconhecendo

previamente suas funções e o PSF.

Palavras chave: Agente Comunitário de Saúde,Perfil Social, Programa de Saúde da Família,

Programa de Agentes Comunitários de Saúde.

ABSTRACT

SOCIAL PROFILE OF THE COMMUNITY HEALTH AGENTS LINKED TO THE

PROGRAM FAMILY HEALTH OF THE OF THE NORTH ZONE OF THE

MUNICIPAL DISTRICT OF JUIZ DE FORA

This study analyzes the social profile of the communitarian health agents (ACSs) of

the North Zone of Juiz De Fora. The results show that the ACSs are predominantly female,

concentrated in the 20-30 year age group, and have a level of instruction higher than the

minimum required by the Juiz de Fora municipal selection process. They have lived for more

than twenty years in the neighborhoods where they work. They have weak participation in the

2

institutional groups and community mobilizations. They were unaware of the concept of

health that the population possessed and its forms of organization and mobilization. Before

becoming ACSs, they worked in commerce and industry. They had applied to be ACS for the

chance for employment, having been previously unaware of its functions and the PSF.

keywords: Communitarian Health Agent, Social Profile, Family Health Program, Program of Communitarian Health Agents.

3

Introdução

A Conferência de Alma-Ata, realizada na antiga União Soviética ,em 1978, lançou

como meta mundial a ser alcançada pelos países "Saúde para todos no ano 2000". A meta

estabelecida deveria ser alcançada pelos países através da organização da atenção primária à

saúde, enquanto parte de um sistema nacional de saúde, e da participação comunitária.

Os compromissos firmados pelo Brasil a partir de Alma Ata irão repercutir na

Constituição Federal de 1988, com a criação do Sistema Único de Saúde ( SUS), fruto de

lutas antigas de profissionais de saúde, usuários e movimentos sociais e do consenso presente

na sociedade quanto a total inadequação do sistema de saúde, sendo necessário transformá-lo

radicalmente.

A implantação do SUS tem por objetivo melhorar a qualidade da atenção à saúde no

país, assegurando serviços e ações resolutivos, de forma equânime, integral e dirigido aos

indivíduos, às famílias e comunidades, enquanto direito de cidadania e qualidade de vida, o

que requer a reformulação da organização dos serviços de saúde e das práticas de atendimento

à população.

Contudo, o quadro em que se encontrava a saúde no país dificultava a efetivação

dessas medidas: a atenção dispensada à saúde organizava-se fundamentalmente na prestação

de serviços médicos, individuais, de enfoque curativo, voltado para internações muitas vezes

caras, desnecessárias e baseada na procura espontânea dos serviços.

Paradoxalmente, o conceito ampliado de saúde, enquanto direito de todos e dever do

Estado, consagrado na VIII Conferência Nacional de Saúde e inscrito na Carta Magna,

evidencia, na prática, a necessidade de mudanças progressivas nos serviços, deslocando-se de

um modelo assistencial centrado na doença e no atendimento a quem procura, para um

modelo de atenção integral à saúde. Esse modelo terá que incorporar progressiva e

sistematicamente ações de promoção e de proteção, em conjunto com aquelas de tratamento e

reabilitação, na busca de resultados positivos para todos e melhoria da qualidade de vida.

Neste contexto, a adoção de novos modelos assistenciais está se constituindo em uma

estratégia importante para a melhoria do quadro sanitário do país. Várias experiências de

implantação de modelos alternativos surgiram , como as ações programáticas em saúde,

vigilância em saúde, municípios saudáveis e a adoção dos Programas de Agentes

Comunitários de Saúde e de Saúde da Família (PACS/ PSF).

O Ceará foi o Estado pioneiro na contratação dos ACSs nos serviços de saúde. A

conjuntura da região que envolvia problemas com a seca e a necessidade de arregimentação

4

de frentes de trabalho para o enfrentamento da situação, foram os fatores responsáveis pela

criação do Programa no Estado.

Em entrevista , o Dr. Carlayle Larvor, ex-secretário de Saúde daquele Estado, assim se

manifestou:

(...) surgiu uma seca no Ceará e houve a necessidade de empregar as pessoas

que estavam sem emprego e passando fome. Então, sugerimos a idéia de empregar

mulheres. Sempre nas emergências se empregam os homens , mas há muitas mulheres

que não têm marido, que são as donas da casa. Então, sugerimos empregar seis mil

mulheres dentre aquelas mais pobres do Estado, que eram escolhidas por um comitê

formado por trabalhadores, igreja, representantes do Estado e do município. A gente

definiu coisas muito simples e que eram muito importantes para a saúde, como

conseguir vacinar todos os meninos, achar todas as gestantes e levar para o médico,

ensinar a usar soro oral. Assim, dentro de quatro meses, treinamos seis mil mulheres

sem nenhuma qualificação profissional. E o mais importante é que fossem pessoas que

a comunidade reconhecia, mulheres que merecessem o respeito da comunidade. Assim

foi o início do trabalho. Cessou o programa de emergência à seca que tinha 200 mil

trabalhadores. Mas essas mulheres da saúde foram as únicas que continuaram a

trabalhar, porque o sucesso foi grande demais". ( Nogueira et al.,2000, p.4)

A experiência serviu para o Ministério da Saúde ( MS ) lançar, em 1991, o PACS,

com o objetivo de contribuir para a redução da morbi-mortalidade, principalmente infantil e

materna na região Nordeste do Brasil, através de ações desenvolvidas no primeiro nível de

atenção. O PACS se propõe a melhorar a capacidade da população de cuidar da sua própria

saúde, transmitir informações e promover a ligação entre a comunidade e os serviços de saúde

locais.

No entanto, ao ser implementado, o PACS se depara com uma rede de serviços

organizada no padrão tradicional de atendimento, predominantemente voltada para ações

curativas, individualizadas, esporádicas, direcionadas para a doença e desvinculada da

comunidade. Desse modo, a idéia dos ACSs como elo entre a comunidade e serviço, não se

viabiliza na prática, pois, de um lado, o PACS se fortalecia e, de outro, a rede de unidades

básicas de saúde se encontrava desorganizada , sucateada e despreparada para tais objetivos.

Em 1994, o MS lança o PSF como estratégia de reorganização da atenção básica, na

ótica da vigilância em saúde, valorizando os princípios constitucionais de universalidade,

integralidade e eqüidade da atenção. O PSF se baseia na definição de responsabilidades entre

5

serviços de saúde e população, estabelecendo uma nova relação entre profissionais e

comunidade voltada para uma nova concepção de trabalho centrada na equipe

multiprofissional, no fortalecimento de ações intersetoriais e na participação da comunidade.

A proposta implementa o conceito de territorialização, ficando as equipes responsáveis por

um número de famílias delimitadas em uma área geográfica.

Conforme requisitos definidos pelo MS, os ACSs devem morar nas respectivas áreas

de atuação, no mínimo, há dois anos; possuir idade mínima de 18 anos; saber ler e escrever;

ter disponibilidade para trabalhar em regime de tempo integral. Devem estar vinculados ou a

uma unidade de saúde tradicional ou a uma unidade de saúde da família. Devem atender entre

400 a 750 pessoas, desenvolver atividades de prevenção de doenças e promoção da saúde por

meio de ações educativas no domicílio e na comunidade sob a supervisão de um enfermeiro.

(Brasil, 1994)

De 1994 até março de 2000, o número de ACSs aumentou de 29.098 para 118.160,

cobrindo 68,4 milhões de habitantes em 76% dos municípios brasileiros, ou seja, 4182

cidades em um universo de 5507. Todavia, ao expandir o programa para o restante do país e

considerando a enorme disparidade regional, geográfica , econômica, social, cultural e de

organização de serviços em relação ao nordeste, acreditamos que o perfil do ACS deverá ser

adaptado a essa nova realidade.( Brasil, 2000)

Assim, as tarefas e rotinas de trabalho dos ACSs devem sofrer adaptações e alterações

para adequação às novas exigências que requerem um conjunto de intervenções intersetoriais

importantes e efetivas. Acreditamos que essas intervenções devam agregar a participação dos

movimentos sociais por melhores condições de vida, articuladamente com a capacitação das

famílias, o que implicará no reforço da autonomia para cuidarem da própria saúde, ampliando,

dessa forma, a agenda de trabalho dos ACSs nas médias e grandes cidades.

... mediante a incorporação dos ACSs em comunidades mais complexas, onde

coexistem e convivem organizações, movimentos e lideranças comunitárias

portadoras de visões, concepções e projetos de saúde diferenciados; com perfil de

demanda aos serviços de saúde ainda mais complexo em função do padrão de morbi-

mortalidade, que inclui doenças típicas da pobreza e as da modernidade, e a

inexistência ou insuficiência de redes de apoio, ajuda e solidariedade institucionais

nas comunidades, fazem com que as intervenções dos ACSs nestes contextos

provavelmente sejam também complexas. ( Santos, 2001, p.9)

6

Acreditamos que o perfil dos ACSs seja um dos fatores determinantes no sucesso das

ações de promoção e prevenção almejadas pelo programa tanto nos centros urbanos de médio

e grande porte, como nos municípios menos populosos, uma vez que,

o ACS pode ser visto como um trabalhador genérico, de identidade

comunitária , que realiza tarefas não restritas no campo da saúde, ao contrário do

que ocorre com outros trabalhadores do SUS. Tem perfil social composto basicamente

por sua capacidade de liderança e uma história de iniciativas na linha de ajuda

solidária intracomunitária, exigência de seu processo de recrutamento e avaliação

contínuos. ( Nogueira et al., 2000, p.26 )

Em Juiz de Fora, uma cidade de porte médio do sudeste mineiro, os ACSs foram

inseridos nas Unidades Básicas de Saúde em 1999, após processo seletivo . Por se tratar de

uma cidade com características de morbi-mortalidade diferenciadas das regiões nordestinas e

por se constituir em um pólo regional de grande influência para a Zona da Mata mineira,

acreditamos que o perfil dos ACSs deva atender ao contexto complexo de um centro urbano.

Atualmente, das 41 UBSs existentes no município de Juiz de Fora, 23 têm o PSF, totalizando

56 equipes de PSF e 294 ACSs.

Objetivo:

Traçar o perfil social dos ACSs vinculados ao PSF da Zona Norte de Juiz de Fora, a

partir dos pressupostos estabelecidos pelo PACS, considerando a inserção dos mesmos numa

cidade de porte médio .

Metodologia

O estudo realizado foi do tipo descritivo exploratório, tendo como cenário as Unidades

de Saúde da Família da Zona Norte de Juiz de Fora. Os sujeitos do estudo foram os ACSs

lotados nessas unidades .

Para a coleta de dados e informações, utilizamos um formulário aplicado como pré-

teste em uma UBS, sendo o mesmo aplicado posteriormente nas outras unidades. Analisamos,

ainda, documentos referentes ao projeto de implantação do PACS e do processo de

recrutamento e seleção dos ACSs no município de Juiz de Fora.

Os participantes do estudo foram informados sobre o objetivo, garantia de anonimato e

somente participaram após consentimento formal, conforme a Resolução 196/96 do Conselho

Nacional de Saúde .

7

Os dados acerca do perfil social dos ACSs foram tabulados, utilizando-se para isso o

programa EPI-INFO e apresentados em forma de tabelas para facilitar a visualização.

Utilizamos freqüências absolutas e relativas para a interpretação dos mesmos, além de

compará-los com a literatura referente ao tema estudado.

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

O estudo foi realizado em todas as UBSs da Zona Norte de Juiz de Fora, que atuam na

lógica do PSF/PACS. Participaram os ACSs que atuam nessas unidades, com exceção dos

que não quiseram participar e os que estavam ausentes por qualquer motivo. A tabela 1

mostra o número de agentes de saúde lotados nas UBSs.

Tabela 1: Distribuição do número de Agentes Comunitários de Saúde por Unidades

Básicas de Saúde estudadas. Juiz de Fora, 2003

UBS Freq %

Barreira do Triunfo 7 11,7

Jóquei Clube I 8 13,3

Jóquei Clube II 12 20,0

Jardim Natal 7 11,7

Milho Branco 9 15,0

Santa Cruz 13 21,7

São Judas 4 6,7

Total 60 100,0

A distribuição desigual dos ACSs obedece aos parâmetros do MS , já referidos ,

refletindo em uma alocação maior de ACSs naqueles espaços territoriais com maior número

de famílias e, conseqüentemente, maior número de equipes do PSF atuantes.

Quanto ao sexo, observa- se a predominância do sexo feminino , como mostra a tabela

2. Trata-se de uma profissão majoritariamente feminina, condizente com as suas

origens.Sabemos que os ACSs ressurgiram no Ceará com a contratação de uma frente de

trabalho de mulheres para ajudar a combater os problemas decorrentes da seca. Parece que

essa tendência de feminilização da profissão de ACS perdura, inclusive nos grandes centros

urbanos, onde a situação de desemprego é bastante alta.

Tabela 2: Distribuição dos Agentes Comunitários de Saúde segundo sexo. Juiz de Fora, 2003

8

Sexo Freq %

Feminino 58 967

Masculino 2 3,3

Total 60 100,0

Em relação ao estado civil e número de filhos, nota-se que 43,3% dos ACSs são

casados, possuindo em média dois filhos, acompanhando a média de filhos da população

brasileira divulgada pelo IBGE (1997), que é de 2 filhos. A Tabela 3 apresenta esses números.

Tabela 3: Estado civil e número de filhos dos Agentes Comunitários de Saúde da Zona Norte

de Juiz Fora. Juiz de Fora, 2003

Estado civil Freq % N° de filhos Freq %

Solteiro 18 30,0 0 13 21,7

Casado (a) 26 43,3 1 13 21,7

Descasado(a) 6 10,0 2 19 31,7

União estável 8 13,3 3 9 15,0

Outro 2 3,3 4 5 8,3

Total 60 100,0 5 1 1,7

Total 60 100,0

Na distribuição por faixa etária dos ACSs, há uma concentração de 35% na faixa de

20 a 30 anos, sendo homogênea nas faixas seguintes. Julgamos que essa homogeneidade em

idades superiores a trinta e um anos ocorra em virtude da precariedade do mercado de

trabalho, o que faz com que pessoas menos jovens busquem ocupações e empregos, como no

caso de ACS, para atuarem e garantirem a sua sobrevivência.

Tabela 4 : Distribuição por faixa etária dos agentes comunitários de Saúde da Zona Norte de

Juiz de Fora. Juiz de Fora, 2003

Idade Freq %

De 20 a 30 anos 21 35,0

De31 a 40 anos 12 20,0

De 41 a 50 anos 14 23,3

De 51 a 60 anos 13 21,7

Total 60 100

9

Outro dado que merece discussão é a escolaridade dos ACSs participantes da pesquisa.

Destaca-se que a maioria apresenta escolaridade de ensino médio completo. A tabela

seguinte revela esses números.

Tabela 5 : Escolaridade dos Agentes Comunitários de Saúde da Zona Norte de Juiz de Fora .

Juiz de Fora, 2003

Escolaridade Freq %

Ensino fundamental

incompleto

17 28,3

Ensino fundamental completo 4 6,7

Ensino médio incompleto 12 20,0

Ensino médio completo 22 36,7

Superior incompleto 3 5,0

Superior completo 2 3,3

Total 60 100

Os dados chamam atenção, pois a escolaridade exigida no processo de seleção é o

ensino fundamental incompleto (antiga quarta série primária). Cotejando esses números com

os relativos ao ensino profissionalizante, verificamos que 51,7% possuem algum curso

profissional, como a seguir mostrado.

10

Tabela 6: Distribuição de cursos profissionalizantes por Agente Comunitário de Saúde. Juiz

de Fora, 2003

Curso profissionalizante

citado

Freq %

Auxiliar de enfermagem 2 6,6

Cabeleireira 1 3,3

Cabeleireira/ manicure 1 3,3

Contabilidade 3 10,0

Corte e costura 5 16,6

Edificações 1 3,3

Informática 2 6,7

Magistério 6 20,0

Metalurgia 1 3,3

Patologia clínica 1 3,3

Processamento de dados 3 10,0

Técnico em enfermagem 2 6,7

Telefonista 1 3,3

Vendas e artesanato 1 3,3

Total 30 100,0

Vislumbramos pelos dados que um pequeno percentual de ACSs tinha alguma

vinculação anterior com a área da saúde.Apenas 16,6% qualificaram-se em profissões típicas

de saúde como técnico e auxiliar de enfermagem e patologia clínica. A insuficiência ou até a

escassez de mercado de trabalho para todas essas ocupações e ou profissões pode nos ajudar

a explicar a escolha pela ocupação de agente comunitário de saúde. De qualquer forma, seria

interessante aproveitar o potencial prévio desses trabalhadores para atuar em questões mais

específicas e atinentes `a sua formação anterior, como por exemplo os formados em

magistério, para as práticas educativas; os da área de informática e contabilidade para

trabalharem nos sistemas de informação e planejamento em saúde, juntamente com a equipe

de Saúde da Família.

Outro dado encontrado diz respeito ao desejo dos ACSs em prosseguir os estudos. Do

total de 60 entrevistados, apenas 51,7% afirmaram querer prosseguir seu processo de

educação. Entretanto, a maioria pretende ingressar em carreiras distintas das da saúde,

conforme mostra a tabela seguinte.

11

Tabela 7: Pretensão de estudo citada pelos Agentes Comunitários de Saúde da Zona Norte de

Juiz de Fora. Juiz de Fora, 2003

Pretensão de estudo Freq %

Administração 2 7,4

Auxiliar de enfermagem 3 11,1

Carreira militar 1 3,77

Direito 2 7,4

Educação física 1 3,7

Enfermagem (superior) 2 7,4

Geografia 1 3,7

Medicina, Enfermagem 1 3,7

Pedagogia 2 7,4

Ensino fundamental 2 7,4

Psicologia 2 7,4

Ensino médio 2 7,4

Serviço social 1 3,7

Supletivo 1 3,7

Técnico em higiene bucal 1 3,7

Turismo 2 7,4

Veterinária 1 3,7

Total 27 100,0

Pela análise das respostas ao quesito outros empregos, verificamos que uma parcela

significativa dos entrevistados se dedica às funções de ACS exclusivamente, até mesmo

porque a jornada exigida contratualmente perfaz oito horas diárias. Dos participantes do

estudo apenas 15,0% desenvolvem outra atividade, predominantemente relacionada à saúde.

12

Tabela 8 : Atividade exercida além da função de Agente Comunitário de Saúde. Juiz de

Fora,2003

Atividade exercida Freq %

Acompanhante de idosos 1 11,1

Faxineira 1 11,1

Manicure 2 22,2

Psicologia 1 11,1

Socorrista da cruz vermelha 1 11,1

Técnico de enfermagem 1 11,1

Vendedor ambulante 2 22,2

Total 9 100

Os dados apresentados na tabela referem-se à vinculação do ACS à sua comunidade,

considerando local de nascimento, tempo de residência no município, residência na microárea

de atuação e participação em mobilização e grupos sociais institucionalizados ou não.

Dos sessenta entrevistados, 50% nasceram no município de Juiz de Fora . Os demais,

muito embora não tenham nascido, declararam ter se mudado para Juiz de Fora há muito

tempo, conforme mostra a tabela abaixo.

Tabela 9 : Tempo de residência em Juiz de Fora dos Agentes não nascidos no município.

Juiz de Fora, 2003

Tempo de residência Freq %

Menos de 5 anos 0 0,0

De 5 a 10 anos 5 16,7

De 10 a 20 anos 8 26,7

De 20 a 30 anos 6 20,7

De 30 a 40 anos 8 26,7

Acima de 40 anos 3 10,0

Total 30 100,0

Dentre os motivos citados por esses agentes para sua transferência para Juiz de Fora

encontramos os seguintes: transferência da família 26,7%; transferência do cônjuge 23,3% e

busca de emprego e estudos 50,0%. Os dados confirmam a tendência de Juiz de Fora de se

13

constituir em um pólo regional de influência para a Zona da Mata, atraindo pessoas em busca

de trabalho e estudo e de maiores e melhores oportunidades de vida.

Em relação à vinculação com a comunidade de atuação do ACS, o tempo de residência

em sua área geográfica foi levantado. Esse requisito é importante e indicado pelo MS, sendo

exigido pelo processo seletivo ocorrido no município. Pela tabela a seguir o tempo de

residência dos ACSs em seu bairro é elevado.

Tabela 10 : Distribuição dos Agentes Comunitários de Saúde por tempo de residência em

seu bairro de atuação. Juiz de Fora, 2003

Tempo de residência no

bairro de atuação

Freq %

Menos de 2 anos 0 0,0

De 2 a 5 anos 5 8,3

De 5 a 10 anos 6 10,0

De 10 a 15 anos 15 25,0

De 15 a 20 anos 8 13,3

Há mais de 20 anos 26 43,3

Total 60 100,0

Acreditamos que um dado mais sensível da vinculação do ACS com sua comunidade

seja a residência em sua microárea de atuação, pois nesses locais as pessoas que residem

próximo desenvolvem relações sociais e todos se conhecem. Para ser o elo entre o serviço de

saúde e a comunidade, pensamos que o ACS deva conhecer profundamente as relações

sociais que ocorrem e toda a problemática da população de sua microárea. Dos entrevistados,

65,0% residem na microárea onde atuam e 61,7% nunca moraram fora do bairro que

nasceram. Do exposto, vê-se que esses dados vêm ao encontro dos parâmetros estabelecidos

pelo MS, confirmando que o processo seletivo do município respeitou as normas operacionais

do Programa de Agente Comunitário de Saúde.

A vinculação do ACS com as pessoas e grupos institucionais ou não institucionais de

sua comunidade é importante como forma de construir redes sociais de apoio para o

desenvolvimento de seu trabalho, pois este nem sempre trata de questões de saúde tão

diretamente. Conhecendo as pessoas do bairro é a forma que o agente tem de fazer o elo entre

o serviço de saúde e os moradores da comunidade. Conhecendo as pessoas é possível

diagnosticar seus problemas de saúde, os riscos ambientais , ocupacionais e sociais a que elas

14

estão expostas e, com isso, juntamente com a equipe de saúde, planejar atividades de

promoção, prevenção e reabilitação em saúde. Na tabela 11 estão apresentados os dados

sobre o conhecimento do ACS acerca das famílias de sua responsabilidade.

Tabela 11: Nível de conhecimento do ACS acerca das pessoas e famílias do bairro onde

atua. Juiz de Fora, 2003

Nível de conhecimento Freq %

Conhecia muitas pessoas 32 53,3

Conhecia poucas pessoas 15 25,0

Conhecia mais ou menos 10 16,7

Conhecia só a própria família 2 3,3

Não conhecia as pessoas 1 1,7

Total 60 100,0

A tabela 12 mostra a participação dos Agentes estudados em grupos institucionais.

15

Tabela 12: Participação do ACS em atividades de grupos institucionais. Juiz de Fora, 2003

Grupo institucional Freq %

Grupo religioso

Não participava, nem participa 24 40,0

Não participava, porém participa 13 21,7

Participava, porém não participa 8 13,3

Participava e participa 15 25,0

Total 60 100,0

Associação/ sociedade de moradores

Não participava, nem participa 47 78,3

Não participava, porém participa 6 10,0

Participava, porém não participa 1 1,7

Participava e participa 6 10,0

Total 60 100,0

Conselho de saúde

Não participava, nem participa 58 96,7

Não participava, porém participa 2 3,3

Total 60 100,0

Partido político

Não participava, nem participa 60 100,0

Total 60 100,0

Observamos que a maioria dos ACSs tem fraca participação nos grupos institucionais

citados. Esperávamos que essa participação fosse maior, visto que é nesses locais que se

discutem questões ligadas diretamente a sua atividade,como por exemplo no Conselho Local

de Saúde, onde se discutem e se buscam melhores condições de saúde para a comunidade

local.

Outro ponto que consideramos importante é a capacidade de liderança comunitária e a

referência que a comunidade tem das pessoas que são selecionadas para o cargo de ACS.

Acreditamos que o ACS deva ser uma pessoa dinâmica , envolvida com sua comunidade e,

em conformidade com Carlyle Lavor, citado por Nogueira et al. (2000), deve ser escolhido

16

por ser um indivíduo de destaque na comunidade e pela sua capacidade de comunicação,

saber traduzir aquilo que está acontecendo na comunidade aos profissionais de saúde. No

estudo, observamos que a maioria dos ACSs não era referência para a sua comunidade, sendo

que apenas 33,3% eram chamados pelas pessoas do bairro para ajudá-las nas questões de

saúde. O mesmo ocorre com a capacidade de mobilização e lutas do ACS juntamente com os

outros moradores do bairro para a melhoria das condições de vida e saúde. Vejamos a tabela a

seguir.

Tabela 13: Participação dos ACS em mobilização e lutas da comunidade para a melhoria das

condições de vida e saúde. Juiz de Fora, 2003

Freq %

Não participava, nem

participa

27 45,0

Não participava, porém

participa

7 11,7

Participa 1 1,7

Participava, porém não

participa

1 1,7

Participava e participa 24 40,0

Total 60 100,0

Do mesmo modo, a maioria dos ACSs (58,3%) não tinha conhecimento do que as

pessoas e famílias de seu bairro sabiam sobre saúde. No entanto, 50,0% dos entrevistados

afirmam ter conhecimento das condições gerias de vida das pessoas e famílias da sua

comunidade, mas 58,3% desconhecem a forma de organização das pessoas e famílias para o

enfrentamento de problemas gerados pelas condições gerais de vida Contraditoriamente,

53,3% alegam participar das reuniões comunitárias para a discussão desses problemas.

Os dados da tabela 14 estão demonstrando os tipos de trabalho desenvolvidos pelos

ACSs antes de assumirem seus cargos, assim como os fatores que os levaram a se candidatar

ao cargo e seus conhecimentos prévios sobre o PACS/PSF.

Dos sessenta entrevistados, 60,0% afirmaram ter emprego anterior ao de ACS , sendo

o primeiro emprego de apenas 20,0%. A situação de emprego apontada pelos ACSs é

mostrada na tabela seguinte.

17

Tabela 14: Situação de emprego anterior dos Agentes Comunitários de Saúde. Juiz de Fora,

2003

Situação de emprego anterior %

Setor público 5,0

Setor privado 69,4

Mercado informal 30,6

Total 100,0

A maioria, antes de se tornar ACS e de assumir o trabalho em saúde, desenvolvia

atividades ligadas ao comércio e indústria , sem nenhuma vinculação direta com a área da

saúde, conforme mostra a tabela abaixo.

18

Tabela 15: Trabalhos desenvolvidos pelos Agentes Comunitários de Saúde antes de sua

vinculação ao Programa. Juiz de Fora, 2003

Tipo de trabalho Freq %

Acompanhante de idosos 1 3,3

Arrematadeira, dobradeira 1 3,3

Auxiliar de escritório 2 6,7

Balconista 2 6,7

Cabeleireira 1 3,3

Comércio 3 10,0

Corte e costura 4 13,3

Doméstica 1 3,3

Empacotadeira 2 6,7

Faxineira 1 3,3

Ferroviário 1 3,3

Frentista, policial militar 1 3,3

Garçonete 2 6,7

Malharia 1 3,3

Manicure 2 6,7

Psicologia 1 3,3

Recepcionista 1 3,3

Secretaria 1 3,3

Servente 1 3,3

Serviços gerais 1 3,3

Total 30 100,0

Em relação aos motivos que os levaram a se candidatar ao cargo de ACS,

consolidamos os seguintes como primeira opção: 56,7% apontaram a oportunidade de

trabalho; 18,3% a vontade de ajudar as pessoas e famílias do bairro; 3,3% citaram o desejo de

trabalhar como ACS; 5,0% a vontade de contribuir para a melhoria das condições gerais de

vida do bairro; 5,0% o desejo de ter emprego estável; 13,3 % a necessidade financeira e

1,7% por gostar de trabalhar com o público como primeira opção. Esses dados confirmam a

hipótese de que a necessidade de um emprego foi o motivo que levou a maioria dos ACSs a

se candidatar ao cargo.

19

Em relação ao conhecimento prévio sobre as funções desempenhadas pelo ACS,

73,3% afirmam que não possuíam nenhum conhecimento prévio sobre o trabalho, o mesmo

ocorrendo em relação ao PSF, em que76,7% desconheciam as propostas de intervenção da

estratégia de Saúde da Família.

Considerações finais

O estudo possibilitou discutir o perfil social do ACS - trabalhador genérico e

de identidade comunitária. Vimos que o ACS tem seu perfil social composto pela

capacidade de liderança e iniciativa para a ajuda solidária que devem ser considerados

em seu processo de recrutamento e seleção.

O trabalho possibilitou, também, conhecer o perfil social dos Agentes

Comunitários de Saúde da Zona Norte de Juiz de Fora : trata-se de uma categoria

predominantemente feminina, a maioria mulheres casadas com uma média de dois

filhos. A faixa etária predominante concentra-se entre 20-30 anos, força de trabalho

ainda jovem, sendo distribuída homogeneamente nas faixas seguintes. Possuem grau

de escolaridade bem acima do requerido para o ingresso no cargo, sendo que a maioria

dedica-se exclusivamente às funções de ACS. Os que não nasceram no município,

residem em Juiz de Fora há muito tempo, acima de dez anos. Grande parte mora há

mais de vinte anos no bairro onde atua e possui bastante conhecimento das pessoas

da comunidade.

Contraditoriamente, apesar do alto grau de conhecimento das pessoas do

bairro, têm fraca participação nos grupos institucionais como, por exemplo, o

Conselho de Saúde e a Associação de Moradores e nas mobilizações sociais para a

melhoria das condições de vida. Desconheciam o conceito de saúde que a população

de sua área de abrangência possuía, bem como a forma de organização e mobilização

da comunidade para a luta e enfrentamento de problemas gerados pelas condições de

vida. Já trabalhavam antes de se tornarem agentes, principalmente em atividades

ligadas ao comércio e indústria. Candidataram-se ao cargo de agente pela

oportunidade de emprego surgida e desconheciam as funções do ACS, assim como o

Programa Saúde da Família.

O estudo aponta para a necessidade de maior engajamento dos ACSs em

mobilizações comunitárias, pois acreditamos que o perfil social deste profissional

requer a participação nessa atividade. Talvez os próximos processos seletivos devam

levar isso em consideração, pois para ser e fazer o tão propalado elo entre a

20

comunidade e os profissionais de saúde, não basta apenas morar há muito tempo na

área onde irá atuar: é preciso conhecer, ter capacidade de liderança, iniciativa e

capacidade de mobilização da sua comunidade para a luta por melhores condições de

vida e saúde.

Muito embora se trate de uma profissão nova, tendo sido regulamentada em

julho de 2002, acreditamos que o trabalho poderá contribuir para os estudos dessa

temática, apontando critérios necessários e desejáveis para processos seletivos que

possibilitem a contratação de profissionais qualificados ao exercício das funções de

ACS de forma adequada, refletindo numa prática cotidiana que responda à demanda

existente.

VII- Referências Bibliográficas BRASIL. Norma Técnica. Programa de Agentes Comunitários de Saúde. O trabalho do Agente Comunitário de Saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde, 1994. BRASIL. Norma Técnica. Agentes Comunitários de Saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde, 1996 BRASIL Norma Técnica. Programas: Saúde da Família e Agentes Comunitários de Saúde: atividades 1999. Brasília, DF: Ministério da Saúde, Secretária de Políticas de Saúde, 2000. P. 55 – 56. BRASIL. Norma Técnica. Lei N° 10.507, de 10 de julho de 2002. Cria a Profissão de Agente Comunitário de Saúde e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2002. JUIZ DE FORA. Norma Técnica. Projeto de Inclusão do Agente Comunitário de Saúde no SUS/JF. Juiz de Fora, MG: Secretaria Municipal de Saúde, 1998. JUIZ DE FORA. Norma Técnica. Equipes de PSF. Juiz de Fora, MG: Secretaria Municipal de Saúde,2001. JUIZ DE FORA. Ofício n° 261/98. Juiz de Fora, MG: Secretaria Municipal de Saúde, 1998. JUIZ DE FORA. Proposta do Processo Seletivo dos Agentes comunitários de Saúde. Juiz de Fora, MG: Secretaria Municipal de Saúde de Juiz de Fora, Comissão do Programa Saúde da Família, 1999.

21

NOGUEIRA, R. P. et al. A Vinculação institucional de um trabalhador sui-generis - O Agente Comunitário de Saúde. IPEA, Texto para discussão n. 735, Brasília, p 4-26, 2000. SANTOS, M. R. O Trabalho dos Agentes Comunitários de Saúde em Centros de Médio e Grande Porte da Região Sudeste do Brasil. 2001. 57 p. Projeto de tese (Doutorado em Saúde Coletiva) apresentado ao corpo docente do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Submissão: agosto de 2003 Aprovação: novembro de 2003

1

Trabalhando com Famílias Utilizando Ferramentas

Janaina Vieira Da Silva*

Sueli Maria dos Reis Santos**

RESUMO

O presente trabalho surgiu da vivência acadêmica que levou ao questionamento das

dificuldades e dos desafios enfrentados pelos profissionais que atuam na Saúde da Família,

mais especificamente a maneira de se trabalhar com essas famílias. Os objetivos propostos

foram descrever algumas ferramentas utilizadas neste trabalho, identificar a importância, as

facilidades e as dificuldades de trabalhar com família utilizando essas ferramentas, com a

finalidade de elaborar um instrumento prático, lógico, objetivo baseado na realidade local. O

trabalho foi realizado dentro de uma abordagem qualitativa, utilizando o estudo de caso. Para

a coleta de dados, foram usadas as ferramentas: Genograma, Ciclo de Vida e PRACTICE. Os

resultados conseguidos permitiram propor um plano de intervenção individualizada a cada

conjunto familiar, obtendo resultados mais consistentes e duradouros, além de uma

compreensão mais ampla sobre a família.

PALAVRAS-CHAVE Saúde da Família; Ferramentas; Genograma; Ciclo de Vida; Practice.

Using Tools to Work With Families ABSTRACT

The present work arose from of the academic experience that let to a questioning of the difficulties and the challenges faced by the professionals who work in the area of Family Health; more specifically, how to work with these families. The proposed goals were to describe some tools used in this work, identify the importance, the easy and difficult aspects of working with families using these tools, in order to elaborate a practical, logical, objective goal based on local realities. The work was accomplished within a qualitative approach using case studies. For data collection, the following tools were used: Genogram, Life Cycle and PRACTICE. The results obtained allowed a plan of individualized intervention for each family group to be proposed, thus obtaining more consistent and lasting results, in addition to greater understanding of the family.

KEY WORDS: Family Health; Genogram, Life Cycle, Practice

_________________

*Enfermeira do PSF de Tocantins

2

** Profª Adjunta do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Saúde Pública da

FACENF/UFJF.

Faculdade de Enfermagem-Campus da UFJF- Bairro Martelos- CEP36010-970

E-mail: [email protected]

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Cuidar de famílias envolve uma série de incertezas como, por exemplo, qual seria o

papel da família como cliente para os profissionais de saúde? Seria cuidar de um grupo ou de

seus membros separadamente? Como abordar famílias que apresentam formas tão

diversificadas? Os instrumentos para abordar famílias estão coerentes com a sua importância?

Portanto, o profissional de saúde, ao assistir a família, defronta-se com várias

questões que exigem dele um posicionamento.

Com esse enfoque e a partir do nosso interesse pelo Programa de Saúde da Família,

(PSF) durante as atividades do Curso de Graduação em Enfermagem, e observando as práticas

das UBS existentes em Juiz de Fora (em número de vinte e quatro que atuam com PSF), que

passamos a questionar as dificuldades e os desafios enfrentados pelas equipes de saúde da

família e como elas trabalham com essas famílias.

Por meio dessas indagações e de um referencial teórico, com base na literatura que

discute temas relacionados à saúde da família, os problemas vivenciados pela enfermagem em

sua interação familiar, conhecimento sobre as propostas da estratégia de Saúde da Família,

bem como temas relacionados a ferramentas de abordagem familiar, surgiu o interesse para

elaborar e/ou adaptar um instrumento teórico metodológico com a finalidade de fornecer

subsídios que contribuíssem com a prática dos profissionais que atuam ou pretendem atuar no

Programa de Saúde da Família (PSF).

Esse instrumento abordou não somente os indivíduos pertencentes à família com alguma

patologia, mas, sim, a família como um todo, incluindo seu passado hereditário e o risco que

3

oferece aos membros atuais, juntamente com outras influências clínicas, sociais e interacionais

que a envolvem. Portanto, conhecer a família e compreendê-la em seu processo de viver.

Sendo assim, construímos os seguintes objetivos para nortear o trabalho:

- descrever algumas ferramentas utilizadas no trabalho com famílias;

- identificar a importância de trabalhar com família a partir da utilização das

ferramentas: Ciclo de Vida, Genograma e PRACTICE;

- detectar as facilidades e dificuldades na utilização das ferramentas para trabalhar

com famílias.

A relevância do estudo para o ensino de enfermagem e para os profissionais de saúde

está em compreender como trabalhar famílias utilizando as ferramentas. A partir desta

compreensão, a equipe tem condição única de propor ações a fim de alcançar a melhoria dos

indicadores de saúde da comunidade e, também, obter a satisfação não só da população

atendida como da equipe que executa a proposta.

VISITANDO A LITERATURA: FAMÍLIA – CUIDADO – SAÚDE

A enfermagem, em sua trajetória, está atualmente enfrentando um grande desafio em

como interagir, conhecer e trabalhar com famílias, principalmente em se tratando do Programa

de Saúde da Família.

Primeiramente, para enfrentar tal desafio, o ponto indispensável é saber o que é

família, conhecer seu significado e importância para o cuidado à saúde, bem como seu

envolvimento com o processo saúde-doença de seus membros; portanto, compreendê-la em

sua totalidade.

A Família

4

Segundo Elsen (1994), a enfermagem deve descobrir que a família não é um

recipiente passivo do cuidado, mas, sim, um agente, sujeito do seu próprio processo de viver.

Sendo assim, torna-se necessário construir uma estratégia para se trabalhar com elas.

Conceituar família é uma tarefa muito complexa, pois segundo Penna (1994), o termo

conceito é caracterizado por ser imutável, constante em qualquer contexto e para melhor

defini-lo é preciso isolá-lo em sua aparente essência. Mas, então, qual seria a essência da

família, se cada indivíduo, através de sua vivência, cultura... possui um conceito para tal?

Existem alguns autores que se propuseram a expor suas definições de família, como

Patrício (1994), que define família como:

um sistema interpessoal formado por pessoas que se interagem por variados motivos, tais como afetividade e reprodução, dentro de um processo histórico de vida mesmo sem habitar o mesmo espaço físico. É uma relação social dinâmica que durante todo seu processo de desenvolvimento, assume formas, tarefas e sentidos elaborados a partir de um sistema de crenças, valores e normas, estruturadas na cultura da família, na classe social a qual pertence, em outras influências e determinações do “ ambiente” em que vivem, incluindo valores e normas de outras culturas. Durante seu processo de viver, a dinâmica familiar apresenta mudanças representadas por aquelas esperadas no decorrer do desenvolvimento, e pelas mudanças situacionais ou acidentais, originadas no ambiente familiar e externo. ( Patrício, 1994, p.97).

Boehs (1990) entende que a família é constituída por pessoas ligadas entre si por

diversas razões, situando-se no sistema de parentesco, e com a cultura determinando sua

estrutura, o tipo de ligação e a interação de seus membros. Afirma que a família possui fases

de desenvolvimento demarcadas por um evento particular ocorrido no interior da mesma, e

seus membros ocupam posições e exercem tarefas de desenvolvimento, como o cuidado com a

saúde. A família, como um todo, também possui tarefas de desenvolvimento que são

influenciadas pela cultura.

Assim, como definição, “família é o organismo formado por todas aquelas pessoas

ligadas por um vínculo de sangue, ou seja, todas as pessoas provindas de um tronco ancestral

comum...” (Freire, 2002, p.).

5

Por meio de tais definições, não podemos partir do pressuposto de que todos

possuem em suas mentes um significado idêntico para o termo família, pois cada um viveu em

uma unidade familiar distinta e, portanto, família não se define; ela existe e se mostra por si,

possuindo cada uma um conceito único no sentido de existência, de história e de limitações e

possibilidades.

Outra controvérsia em relação a esse tema e que é de grande importância para os

profissionais de saúde, que pretendem trabalhar com famílias, seria o conceito de família sadia

e de família doente.

Conforme Boehs (1990,p.126 )

família sadia é aquela que mantém um conjunto de reservas físicas, psíquicas, sócio-culturais e de ambiente físico que permitem normatizar sua vida e instituir novas normas em situações novas. Enquanto família doente é aquela que tem diminuição ou ausência de reservas que impedem normatizar sua vida familiar e instituir novas normas.

O Cuidado

A essência da assistência à saúde e da enfermagem é o cuidado, dito como domínio

central, dominante e unificador da profissão. Segundo George (1993), o cuidado é definido

por fenômenos relacionados com o comportamento de prestação de auxílio, apoio ou

capacitação para um indivíduo ou por outro indivíduo (ou até mesmo por um grupo), com

necessidades evidentes ou antecipadas de melhorar ou aperfeiçoar uma condição ou vida

humanas. Portanto, para o autor, cuidar é mover, manter, recuperar a saúde ou criar melhores

condições de vida, através de meios que vão além das necessidades físicas, emocionais e

sociais do indivíduo, família ou grupo.

A enfermagem, assim como outros profissionais de saúde, deve visualizar a família

como uma unidade de cuidado, sendo o núcleo de saúde responsável por seus filhos e por

todos os seus entes.

6

Conforme enfatizado por Elsen (1994), a família funciona como uma unidade básica

de saúde para seus membros, o que leva a enfermagem a enfrentar um novo desafio de “cuidar

de quem cuida”. Tal desafio gera novas perspectivas, como cuidar da família no local que ela

se encontra, ou seja, no próprio domicílio.

A enfermagem, como um “ser cuidador” , deve desenvolver atitudes não só para um

indivíduo, mas para a família, que precisa ser lembrada. Afirma Silva (2000) que é necessário

saber escutar, respeitar as diferenças, aprender com os outros, acompanhar as mudanças,

partilhar o aprendizado de suas experiências, permitindo que os outros vivam as suas, ser

coerente, evitar rotular as pessoas, aprender a sorrir e, finalmente, não pensar que se é o

detentor do saber.

A Saúde

Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), citado por Brasil (1997, p.89), a

saúde é definida como um estado de bem estar geral, físico, mental e social, não apenas a ausência

de doença. Essa compreensão está longe de ser uma realidade, pois simboliza um

compromisso, um horizonte a ser atingido. Remete à idéia de uma saúde ótima, possivelmente

inatingível e utópica, já que mudanças e instabilidades são predominantes na vida. Reforça o

quanto a saúde não é um fenômeno estável.

A saúde deve ser encarada não como imagem complementar da doença, mas, sim,

como construção permanente de cada indivíduo e da coletividade, que se expressa na luta pela

ampliação do uso das potencialidades individuais e da sociedade. Acresce ainda que saúde não

é um estado, mas um processo permanente de busca de equilíbrio dinâmico de todos os fatores

que compõem a vida humana.

Segundo Boff (1999, p.145)

7

saúde não é ausência de danos. Saúde é a força de viver com esses danos. Saúde é acolher e amar a vida assim como se apresenta, alegre e trabalhadora. Saudável e doentia, limitada e aberta ao ilimitado que virá além da morte.

Conforme a definição da OMS, nenhum ser humano será totalmente saudável ou

totalmente doente. Ao longo de sua existência, vivenciará condições de saúde e de doença de

acordo com suas potencialidades, suas condições de vida e suas interações com elas.

Seguindo essa linha de pensamento, a expressão processo saúde/doença, para ser

construída, exige a superação de uma visão estática sobre saúde e doença e, como a própria

expressão denomina, refere a processo que corresponde a um caráter dinâmico, não estático

que supõe movimentos de ação e reação, estímulo e resposta, agressão e defesa.

Portanto, entender saúde e doença como um processo, na prática, proporciona

conhecer o modo como vivem, adoecem e morrem os indivíduos, não esquecendo das

percepções culturais e das características individuais. Interferir sobre o processo saúde/doença

está ao alcance de todos e não é uma tarefa a ser delegada, deixando ao cidadão ou à

sociedade o papel de objeto da intervenção da “natureza”, do poder público e dos profissionais

de saúde.

O Programa Saúde da Família

Segundo Brasil (1997), o PSF é um programa do governo cujo principal propósito é

reorganizar a prática de atenção à saúde, priorizando ações de prevenção, promoção e

recuperação de agravos, de forma integral e contínua.A primeira etapa de sua implantação

iniciou-se em junho de 1991, através do Programa de Agentes Comunitários de Saúde

(PACS). A partir de janeiro de 1994, começaram a ser formadas as primeiras equipes do

Programa de Saúde da Família (PSF), incorporando e ampliando a atuação dos Agentes

Comunitários de Saúde.

8

O objetivo do Programa Saúde da Família é a organização da prática assistencial em

novas bases e critérios, em substituição ao modelo tradicional de assistência,

hospitalocêntrico. A atenção passa a estar centrada na família, entendida e percebida a partir

do seu ambiente físico e social, o que vem possibilitando às equipes de saúde da família uma

compreensão ampliada do processo saúde/doença e das necessidades que vão além de práticas

curativas.

A estratégia de saúde da Família reafirma e incorpora os princípios básicos do

Sistema Único de Saúde (SUS) que são universalização, integralidade, eqüidade,

descentralização, hierarquização / regionalização e participação popular / controle social.

O atendimento é prestado na Unidade Básica de Saúde ou no domicílio pela equipe

multiprofissional (médico, enfermeiro, auxiliar de enfermagem e agentes comunitários de

saúde) que compõem a equipe de saúde da família, assumindo a responsabilidade por uma

determinada população a ela vinculada, em que desenvolve ações de promoção da saúde e de

prevenção, tratamento e reabilitação de agravos.

No Programa Saúde da Família, freqüentemente, são cuidados mais de um membro

da mesma família. A vida das pessoas, em geral, está intimamente ligada às relações que se

desenvolvem dentro de um contexto familiar; tais relações, bem como condições

geneticamente determinadas, poderiam ser estudadas e aproveitadas se, na nossa prática,

houvesse registro e entendimento da família.

Ferramentas para trabalhar com famílias

Para se trabalhar com família deve haver um completo entendimento da mesma e,

para isso, se mostra necessária à utilização de ferramentas de abordagem familiar. A seguir,

dentre as ferramentas que podemos lançar mão em atenção primária, serão listadas algumas

que são particularmente úteis, enfocando sua utilização e aplicação.

9

Iniciando pela ferramenta Ciclo de Vida da Família, esta tem o papel de “identificar

situações em que o surgimento de disfunções é mais freqüente“. (Wagner, 2001, p.12).

Essa ferramenta divide a história da família em estágios de desenvolvimento

previsíveis, sendo que cada estágio é caracterizado por tarefas específicas de desenvolvimento

e por estresse associado com a execução ou não das tarefas do estágio.

Conforme Mcgoldrick

o estresse familiar é geralmente maior nos pontos de transição de um estágio para outro no processo de desenvolvimento familiar, e os sintomas tendem a aparecer mais quando há uma interrupção ou deslocamento no ciclo de vida familiar em desdobramento. ( Mcgoldrick, 1995, p.8).

A análise do Ciclo de Vida permite auxiliar a família na compreensão das tarefas que

devem ser cumpridas para atravessar estas transições. É importante ressaltar que não se pode

ignorar o contexto social, econômico e político e seu impacto sobre as famílias, movendo-se

através de fases diferentes do ciclo de vida em cada momento na história.

A ferramenta Ciclo de Vida da família, segundo Duvall apud Mcgoldrick (1995),

divide a família em oito estágios de desenvolvimento previsíveis. O primeiro estágio inclui a

saída da pessoa de casa. Nesta etapa, a pessoa sofre o estresse de conquistar a independência

tanto econômica quanto emocional em relação aos seus pais.

O segundo estágio contempla o compromisso tanto da mulher quanto do homem em

relação ao seu parceiro; as tarefas a serem cumpridas referem-se ao estabelecimento de uma

relação íntima entre os parceiros e um maior desenvolvimento da separação emocional com

seus pais.

O terceiro estágio está relacionado com o aprender a viver junto; seria a fase onde o

casal aprende a dividir os vários papéis de modo equilibrado e também a relação família e

amigos se torna mais independente.

10

A chegada de um novo membro à família, ou seja, o primeiro filho, seria o quarto

estágio no Ciclo de Vida, em que as tarefas a ele associadas seriam o ajustamento do sistema

conjugal para criar espaço para o filho, a responsabilidade tanto educativa quanto financeira e

a divisão do papel dos pais.

Após esta fase, entra o viver com o adolescente. É o quinto estágio, em que deve

aumentar a flexibilidade das fronteiras familiares para incluir a independência dos filhos e

fragilidade da geração mais velha, assim como reforçar as questões conjugais e profissionais

no meio da vida.

No sexto estágio estará presente a saída do filho, comumente chamado de “Ninho

Vazio”, em que devem ser aceitas várias entradas e saídas no sistema familiar, como voltar a

viver como casal sem filhos, com ajuste ao fim do papel dos pais, desenvolvimento de

relacionamento de adulto para adulto entre os filhos crescidos e seus pais.

O sétimo estágio menciona a fase da aposentadoria. As mudanças a serem

enfrentadas são: o fim do salário regular, sendo necessário um ajuste financeiro;

desenvolvimento de novas relações com filhos, netos e cônjuge.

Para concluir, o último estágio faz referência à velhice, em que se deve lidar com a

perda de habilidades e maior dependência aos outros, como também lidar com a perda de

amigos, familiares e, eventualmente, do cônjuge.

Portanto, o conhecimento do desenvolvimento familiar é de extrema importância e

utilidade para os profissionais de saúde que trabalham com a família, incluindo a enfermagem,

pois facilita a previsão, antecipa sobre os desafios que serão enfrentados no estágio de

desenvolvimento de uma família e auxilia a mesma a reconhecer as mudanças e seguir em

frente o seu desenvolvimento. Através desses dados permite-se melhorar o entendimento do

contexto dos sintomas e doenças, tornando-se uma ferramenta essencial para a coleta de dados

no Programa de Saúde da Família.

11

Dentre as ferramentas de avaliação que se pode lançar mão em atenção primária está

o Genograma, que é um instrumento gráfico, um método de coleta, armazenamento e

processamento de informações sobre uma família. Registra informações sobre os seus

membros e suas relações por, pelo menos, três gerações. Proporciona adquirir, de uma forma

rápida, grande número de dados sobre a família, incluindo seu passado hereditário e o risco

que oferece aos membros atuais, juntamente com influências clínicas, sociais e interacionais.

Ele não se restringe a detectar problemas de natureza genética, mas também

problemas relacionados com fatores sociais, ambientais, influenciados por hábitos familiares,

assim como problemas com etiologia desconhecida, tornando-se uma ferramenta

extremamente útil para os profissionais de Saúde da Família.

Conhecer a história familiar é importante, mas o recolhimento dos dados não deve

restringir-se a aspectos superficiais. É esse o papel do Genograma, que informa de maneira

completa e objetiva os dados de uma determinada família, fazendo de forma realista uma

revisão do passado familiar e dos potenciais problemas de saúde, assim como fornece

informações ricas sobre os relacionamentos, incluindo ocupação, religião, etnia e migração.

Esta ferramenta fornece dados úteis não só para os profissionais de saúde, que

avaliam de forma mais completa seu objeto de cuidado - a família - , mas também para a

própria família a respeito de seu desenvolvimento e possibilitar melhor compreensão de sua

situação. O Genograma é construído na primeira visita ou contato com a família e deve ser

revisto quando se quer obter maiores informações.

Segundo Lorrane et al (2002), para se construir o Genograma deve-se fazer uso de

símbolos padronizados para ser entendido por todos. Após a escolha dos símbolos, os

membros da família devem ser representados em séries horizontais, que significam linhagens

de geração. Nas gerações posteriores, a primeira criança nascida deve ser colocada à esquerda,

sendo ordenadas as seguintes da esquerda para a direita. Cada indivíduo deve ser representado

12

com nome, idade e outros dados significativos. Não se pode esquecer de datar a construção do

Genograma, pois a idade deve ser atualizada. Se preferir, ao invés de colocar a idade, pode-se

colocar a data de nascimento, o que também é correto.

Cada membro deve ser representado por um quadrado, quando do sexo masculino, e

um círculo, quando do sexo feminino. Para a construção, deve existir um indivíduo,

denominado indivíduo índice, que foi o principal motivo para o desenvolvimento da

ferramenta, sendo identificado por um quadrado ou círculo duplo.

Para permitir uma obtenção mais rápida dos dados, deve haver uma familiaridade

com os símbolos padrões, mas variações podem ser desenvolvidas com o intuito de fornecer

informações mais exatas ou úteis.

Segundo Mcgoldrick e Gerson (1985), a leitura do Genograma deve contemplar a

estrutura familiar e informações como etnia, escolaridade, profissão, eventos da vida familiar

e, ainda, problemas sociais e de saúde. Através destes dados, deve-se fazer a interpretação do

gráfico de acordo com possíveis decisões (diagnósticos, prevenção e tratamento).

Portanto, o Genograma permite uma visão global da estrutura familiar e dos modelos

de funcionamento da família, uma perspectiva tanto cronológica quanto dinâmica.

Além das ferramentas citadas, existe uma ferramenta de registro, o PRACTICE, que

é um acróstico, ferramenta de acesso à família, que orienta encontros com a mesma.

De acordo com Walters (s.d.), a ferramenta de acesso à família PRACTICE foi

projetada como uma diretriz para avaliação do funcionamento das famílias, focando-se no

problema.

A ferramenta é comumente usada para organizar as informações adquiridas da

família, facilitando o desenvolvimento da avaliação familiar, podendo ser usada para itens de

ordem médica, comportamental e de relacionamentos.

13

Este instrumento deve ser preenchido de forma objetiva, enfocando o que se

necessita, enfatizando que nem todos os itens que compõem o PRACTICE devem ser

registrados, mas apenas o que for específico para o caso.

Este modelo serve como guia no contato com a família e é usado da seguinte forma:

cada letra do acróstico corresponde a um assunto a ser investigado e registrado. Segue a

especificação de cada item possível de ser analisado:

P→ referente ao problema apresentado;

R→ referente aos papéis de cada membro da estrutura familiar.

A→ afeto, como a família se comporta diante do problema apresentado;

C→ informa qual o tipo de comunicação dentro da estrutura familiar;

T→ menciona em qual fase do ciclo de vida a família se encontra;

I→ história de doença na família, passado e presente;

C→ como os membros da família enfrentam o estresse da vida;

E→ quais os recursos que a família possui para enfrentar o problema em questão.

Portanto, essa ferramenta é uma forma pedagógica que guia encontros com a família

sem esquecer de nenhum ponto a ser registrado e investigado, sendo útil a sua utilização nos

primeiros encontros.

TRAJETÓRIA DO ESTUDO

O presente estudo enfocou o trabalho com famílias utilizando as ferramentas,

técnicas de acesso às mesmas, como Ciclo de Vida, o Genograma e o PRACTICE a fim de

elaborar um instrumento prático, lógico, objetivo, baseado na realidade local.

No entendimento de Triviños (1987), a abordagem será qualitativa tendo em vista

que a mesma permite compreender o problema no interior da realidade onde está inserido, sem

14

criar situações artificiais, tornando-a irreal ou que levam a interpretações ou generalizações

equivocadas.

Segundo o autor citado, a influência do meio sobre os atores é de vital importância.

Portanto:

“as tentativas de compreender a conduta humana isolada do contexto no qual se manifesta criam situações artificiais que falsificam a realidade, levam a engano e elaborar postulados não adequados, a interpretações equivocadas. (Triviños, p.122)”.

A investigação qualitativa é por si um estudo descritivo, em que o pesquisador terá a

oportunidade de descrever os fenômenos encontrados, as contradições exacerbadas pelos

atores e a realidade em foco e confrontar o conhecimento empírico.

Dentro do método qualitativo, utilizaremos o Estudo de Caso. Segundo Triviños

(1987) e Gil (1999) este é descrito como um tipo de pesquisa qualitativa, sendo seu objeto de

estudo uma unidade que deve ser analisada de modo profundo e exaustivo, de maneira a

permitir seu conhecimento amplo e detalhado. Exige maior objetivação, originalidade,

coerência e consistência das idéias.

Este tipo de pesquisa investiga um fenômeno atual dentro do seu contexto de realidade,

não sendo definidos procedimentos metodológicos rígidos, tornando necessário que se

desdobre os cuidados tanto no planejamento quanto na coleta e análise dos dados.

Através do Estudo de Caso, com aplicação das ferramentas, foi possível identificar a

história de vida das famílias.

Foi usada a técnica de entrevista semi-estruturada, tendo como questão norteadora à

fundamentação de cada ferramenta a ser utilizada.

Os entrevistados foram todos os membros da família, evitando com isso dar uma

visão unilateral e incompleta da mesma, conforme sugere Triviños (1987).

15

Utilizou-se como técnica de coleta de dados as ferramentas Ciclo de Vida, o

Genograma e PRACTICE, a partir dos instrumentos elaborados, cujo manual de

preenchimento e o formulário para coleta de dados estão em anexo.

Após a elaboração do instrumento, este foi testado em uma família que passou a ser

acompanhada, mas que não foi incluída como sujeito no estudo.

A UBS, cenário do estudo, conta com duas Equipes de Saúde da Família (ESF) e com

o total aproximado de 6844 pessoas em 2569 famílias cadastradas, cuja classe social e

econômica predominante é baixa. O diagnóstico de saúde da área de abrangência da UBS

referida tem como risco de saúde clientes portadores de hipertensão arterial, alcoolismo,

drogas, bem como adolescentes grávidas e crianças desnutridas.

A unidade conta com dezoito funcionários e oferece atendimento odontológico,

médico e de enfermagem, distribuídos em duas Equipes de Saúde de Família (ESF).

Optamos por eleger duas famílias para serem trabalhadas, a partir da utilização das

ferramentas, com a finalidade de constatar a importância de uma forma de abordagem sob

uma ótica mais abrangente que a biológica, a fim de conhecer a família de forma ampliada.

A condição para inclusão no estudo era estar cadastrada numa Unidade Básica de

Saúde de Juiz de Fora e estar sendo acompanhada pela equipe de saúde da família.

Como as famílias eram cadastradas por endereço, sorteamos primeiro a rua e a seguir

o número da residência. Uma família acompanhada foi sorteada e a outra foi incluída no

estudo, a partir da indicação do agente comunitário de saúde, que solicitou que realizássemos

uma visita domiciliar. Ao conversar com a mesma, percebemos a sua necessidade e avaliamos

que seria interessante incluí-la na pesquisa.

O anonimato foi garantido a partir do termo de consentimento e, além disso, foi

solicitada uma autorização do coordenador da Unidade Básica de Saúde para que fossem

utilizadas as dependências da UBS.

16

Os sujeitos que compõem as famílias sorteadas para a pesquisa foram identificados

através de Sr. (a) e Srta. seguidos por letras maiúsculas do alfabeto português, para garantir o

anonimato.

AS FERRAMENTAS NA ABORDAGEM COMPREENSIVA DA SAÚDE DA

FAMILIA.

Uma vez construído o formulário de coleta de dados e entendidas as ferramentas que o

compõem é importante compreendê-las em sua utilização na prática com famílias. Através

desta análise é possível identificar suas facilidades, dificuldades, benefícios e possibilidades

em seu uso. Esta compreensão se discute a seguir.

Primeiramente, foi solicitado pelo agente comunitário de saúde o agendamento de um

melhor dia e horário com a família sorteada para a entrevista. No dia em questão,

comparecemos à residência, onde houve uma boa receptividade por parte da responsável pela

mesma, identificada como “Sra. A”.

Antes de iniciarmos a entrevista, foi explicada à “Sra. A” a pesquisa, apresentando o

termo de consentimento e, ainda, se havia interesse em fazer parte do estudo. Ficou evidente o

não entendimento por parte da responsável pela família sobre a pesquisa, que optou por

assinar o termo após as perguntas.

Iniciamos perguntando sobre nome, idade e data de nascimento dos indivíduos que

compõem a família de “Sra. A”, preenchendo com isso os dados de identificação do

instrumento. A família é constituída de duas filhas, identificadas como “Srta. B” e “Srta. C”

respectivamente, um filho “Sr. D” , e um neto, “Sr. E” ,filho de “Srta. B”.

A fim de adquirir informações sobre toda a família para elaboração do genograma, foi

pedido que “Sra. A” falasse sobre seu casamento, filhos, pais, sogros e neto, destacando

problemas de saúde, passados e presentes. Após os dados coletados, foi possível elaborar o

17

Genograma, sem maiores dificuldades, identificando no mesmo as tendências e os problemas

de saúde que a família possuía, constituindo um dado de suma importância para a elaboração

de intervenções.

Durante a longa explanação da “Sra. A” sobre sua família (não deixando “Srta. B” e

“Sr.E” contribuírem com informações), foi possível identificar alguns pontos das ferramentas

PRACTICE e Ciclo de Vida, entre eles: como a família enfrenta o problema de saúde

apresentado por “Sra. A”, que é uma fratura de vértebra lombar em decorrência de uma

queda; doenças na família passadas e presentes, estágio no ciclo de vida e o suporte familiar

existente.Com isso encerramos a primeira visita com a assinatura do termo de consentimento

por “Sra. A”.

Com o passar de uma semana e após a elaboração e o registro no instrumento das

ferramentas Genograma, Ciclo de Vida, alguns itens do PRACTICE e o acompanhamento e a

avaliação, foi realizada a segunda visita à família, com a finalidade de realizar a conferência

familiar, que contribui na visão de toda a família diante do problema apresentado e também

no preenchimento da ferramenta PRACTICE. Assim, a visita possuiu o intuito de intervenção

nos problemas apresentados.

Porém, os objetivos almejados não foram alcançados, pois somente se encontrava na

residência a “Sra.A”, que nos recebeu muito bem. Como não foi possível a realização da

conferência familiar, nos detivemos ao seu problema de saúde e discutimos sobre o estágio no

ciclo de vida em que “Sra.A” está passando, enfocando seus limites e as tarefas a serem

cumpridas para atravessar esta transição. Ao nos despedimos, foi perguntado à “Sra.A” sobre

um horário em que todos os residentes da casa estivessem disponíveis para a realização da

conferência familiar, mas a mesma indagou ser muito difícil reuni-los em um mesmo horário.

18

Ao retornar na semana seguinte com o intuito de ser a última visita, uma das filhas de

“Sra. A” nos recebeu de forma não muito agradável, dizendo que sua mãe estava deitada e

não poderia nos atender.

Na mesma semana houve um encontro rápido com “Sra. A”, que estava de saída,

permitindo apenas indagar sobre como foram nossas discussões anteriores e se havia

contribuído de alguma forma em sua vida. A “Sra. A” declarou que foram importantes as

discussões, pois aprendeu mais sobre seu problema de saúde e os limites impostos tanto pela

idade quanto pelo problema de saúde apresentado atualmente.

As dificuldades encontradas diante da utilização das ferramentas nesta família em

questão foram, inicialmente, conseguir realizar a conferência familiar, devido o impedimento

de reunir toda a família, impossibilitando o preenchimento total da ferramenta PRACTICE.

Outro fator que dificultou foi a insistência da responsável pela família em falar sozinha,

possibilitando apenas uma visão diante dos dados coletados.

Por outro lado, as facilidades encontradas foram o preenchimento de forma simples

dos dados de identificação; a aquisição dos dados necessários à construção do Genograma

como também sua elaboração; o uso da ferramenta Ciclo de Vida.

A utilização das ferramentas trouxe como benefício para a família entrevistada a

compreensão de como é importante aceitar e entender de forma satisfatória as tarefas a serem

cumpridas no estágio do ciclo de vida atual, assim como valorizar as tendências hereditárias

que a família possui.

Enquanto profissional , as ferramentas contribuíram como meio de garantir maior

entrosamento e conhecimento da família e maior facilidade na elaboração das intervenções

necessárias diante dos problemas apresentados.

A primeira entrevista com a segunda família utilizada como sujeito da pesquisa foi

com o intuito de realizar uma visita domiciliar. Durante os primeiros momentos da conversa,

19

notamos que a família poderia contribuir no estudo de forma enriquecedora. Com esse

propósito foi explicada à família a pesquisa e o termo de consentimento, ficando a

responsável pela mesma receosa em assinar o documento, deixando para assinar

posteriormente.

O que mais diferenciou a utilização do instrumento na segunda família em relação à

primeira foi a realização da conferência familiar no primeiro encontro, o que dificultou a

coleta dos dados devido a discussões e tumultos ocorridos durante a mesma.

Diante dos poucos momentos sem conflitos entre os membros da família, foi possível

coletar algumas informações necessárias para o preenchimento dos dados de identificação e

elaboração do Genograma. Os residentes da casa são a mãe, identificada como “Sra. F”, duas

filhas, “Srta. G” e “Srta. H”, e dois netos, I e J, filhos da “Srta. G”.

A conferência familiar contribuiu no preenchimento da ferramenta PRACTICE, sendo

possível, durante a mesma, identificar como a família se comporta diante dos problemas

apresentados - desemprego dos seus membros e gravidez na adolescência. Outros pontos

levantados foram o tipo de comunicação dentro da estrutura familiar e a forma de enfrentar o

estresse da vida.

Ao constatar que a conferência familiar tornou-se desgastante tanto para os

entrevistados quanto para o pesquisador, encerramos o encontro com a assinatura do termo de

consentimento e marcamos o retorno para a semana seguinte.

O segundo encontro ocorreu na data marcada, com o intuito de realizar consulta

individual com os membros residentes na casa. Porém, não conseguimos realizar essa tarefa

com a “Sra. F”. A pedido dela, foi aferida a sua pressão arterial (PA), constatando 170X100

mmHg. Discutimos sobre sua saúde e a necessidade de consulta médica regular em sua idade,

sessenta e cinco anos. Por coincidência, era a data de seu aniversário e, como a retiramos dos

seus afazeres domésticos, encerramos a visita, mesmo porque suas filhas interrompiam nossa

20

conversa, não permitindo que a mãe expressasse suas dúvidas e respondesse aos nossos

questionamentos.

Ao retornar no terceiro encontro, mesmo antes de bater à porta, conseguíamos ouvir

gritos vindos do interior da casa, indicando que mãe e filha discutiam. Por não achar

conveniente interromper e avaliar que a visita poderia ser prejudicada pelo clima de

discussão, resolvemos retornar em um outro momento.

O último encontro foi marcado pela boa receptividade de todos da casa, não existindo

o clima de desconfiança por parte de “Srta. G” e “Srta. H”, o que permitiu alguns momentos

de conversa somente com “Sra. F”, que tornou a pedir que aferíssemos sua PA constatando,

170x90 mmHg. Foram reforçadas as orientações sobre hipertensão arterial, suas tendências

hereditárias observadas no Genograma e a necessidade de uma consulta médica.

Aproveitando a oportunidade, foi questionado à “Sra. F” sobre nossas discussões

anteriores e se haviam contribuído de alguma forma em sua vida. Ela nos disse que gostou

muito, pois aprendeu muita coisa e foi uma oportunidade de falar e cobrar das filhas assuntos

que não tinha coragem de discutir. Além disso, a visão de uma pessoa de fora poderia ajudar

nos problemas de sua família.

As dificuldades encontradas na utilização das ferramentas com a família em questão

foram o preenchimento dos dados de identificação e a elaboração do genograma dentro da

conferência familiar, considerando, também, a não experiência na utilização dessa ferramenta

por parte das pesquisadoras e pesquisados. Outro fator dificultador foi a não oportunidade de

realizar consulta individual com todos os membros da família, a fim de obter dados pessoais

que não apareceram anteriormente dentro da conferência.

O preenchimento do instrumento foi um pouco prejudicado, pois os estágios da

ferramenta Ciclo de Vida estavam direcionados para família nuclear, limitando sua utilização

nas famílias ampliadas, embora Mcgoldrick (1995) aborde as variações maiores do Ciclo de

21

Vida, bem como do ‘Ciclo de Vida dos Pobres’, cabendo, portanto, maiores discussões sobre

esta ferramenta.

Como facilidade na utilização do instrumento, destacamos o preenchimento da

ferramenta PRACTICE em decorrência da realização da conferência familiar, mesmo

possuindo alguns pontos que são repetitivos em relação a outras ferramentas, como o estágio

no ciclo de vida e a história de doença na família passada e presente.

Em relação aos benefícios na utilização das ferramentas para a família, o que marcou

foi a oportunidade do desabafo por parte dos seus membros sobre assuntos que os

incomodavam, mas não havia coragem de os expor, o que foi possível durante a conferência

familiar que passou a ser uma tentativa de melhorar o relacionamento intradomiciliar e

contribuir para aumentar o respeito entre seus membros.

Para os profissionais que utilizam as ferramentas constituiu uma oportunidade de

conhecimento da família em sua totalidade, identificando seus membros e suas necessidades,

assim como as tendências hereditárias que cada família possui, alcançando uma assistência de

forma integral, priorizando não apenas o físico e biológico, mas também o psico-social e o

econômico, que podem influenciar na saúde do indivíduo.

As ferramentas utilizadas para se trabalhar com famílias fornecem aos profissionais

subsídios para identificar, dentro da mesma, qual membro se mostra mais viável para intervir

quando surge algum problema em seu meio, e propor um plano de intervenção para cada

família em específico, considerando as facilidades e dificuldades encontradas. Com isso,

aumenta-se a resolutividade da intervenção proposta, permitindo resultados mais consistentes

e duradouros no seu acompanhamento. E, como finalidade maior de sua utilização, ampliar a

aderência e a efetividade ao serviço de atenção primária.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

22

A realização deste estudo tornou-se relevante, pois mostrou que trabalhar com famílias

é uma arte desenvolvida por meio da compreensão e exploração das estruturas familiares, com

a finalidade de elaborar uma estratégia personalizada a cada conjunto familiar, isto sendo

possível com o uso das ferramentas.

As ferramentas utilizadas como coleta de dados na metodologia do estudo permitiram,

de modo adequado, atingir o objetivo de demonstrar o quanto é necessário conhecer a família,

seus membros, as linhas de poder e decisão dentro dela, seu modo de perceber o processo de

saúde e doença, seus recursos naturais e seus suportes, tanto financeiro quanto emocional.

Com esta análise, foi possível propor um plano de intervenção, respeitando o seu estilo de

vida.

Ao realizar a análise do estudo, consideramos que os objetivos propostos foram

alcançados, pois confirmou a importância da utilização das ferramentas como forma de

conhecer, compreender a estrutura e o estilo de vida de cada família. No decorrer do estudo,

algumas dificuldades ocorreram, como a de preencher o formulário, devido a falta de

experiência em coordenar uma conferência familiar, assim como estabelecer as suas

prioridades.

Quanto às limitações, podemos destacar o quanto é importante respeitar a realidade de

vida das pessoas para não cometer atitudes centradas no próprio modo de ver a vida. Essa

atitude do profissional de perceber as situações, considerando como única a sua visão de

mundo, pode colocá-lo em confronto com o entendimento do outro, levando à fragilização ou

ao fracasso nas relações entre profissional e família.

Cabe ressaltar as limitações dos pesquisadores, tendo em vista não serem profissionais

da equipe , para tanto, tiveram que empenhar esforços para atingirem os objetivos que, por

muitas vezes, frente aos obstáculos, precisaram ser persistentes e corajosos.

23

As facilidades estiveram presentes na realização do estudo, como o uso da ferramenta

Genograma, que fornece dados importantes sobre as tendências hereditárias que os membros

da família possuem. A partir dos dados coletados pelas ferramentas, a elaboração do plano de

intervenção pode ser construída, com certa facilidade, além de estar coerente com a estrutura

familiar.

O uso das ferramentas permite ao profissional de cuidados primários criar um vínculo

com a família, pois, ao dar atenção, facilita ser aceito para investigar e intervir, obtendo a

satisfação não só da população atendida, como também da equipe que executa a proposta.

Mesmo tendo sido aplicada em poucas famílias, a utilização das ferramentas neste

trabalho foi suficiente para perceber a necessidade de algumas mudanças, tais como a

adaptação dos estágios do ciclo de vida para utilizá-los não apenas em famílias nucleares.

Além disso, a revisão da ferramenta PRACTICE se torna indispensável pois, aliada ao Ciclo

de Vida e ao Genograma, provocou a repetição desnecessária de alguns dados.

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TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em

educação. São Paulo: Atlas, 1987, 175p.

Submissão: setembro de 2003 Aprovação: novembro de 2003 ANEXO

Manual de preenchimento do Formulário de Intervenção Familiar.

I) Dados de identificação

Preencher com o endereço da família cadastrada O seu número de cadastro, caso haja.

Anotar a data do preenchimento do formulário, assim como nome, idade e data de

nascimento de todos os membros da referida família.

II) Diagnóstico familiar

Situação Identificada

Identificar dentro da família membros e situação que requerem maior atenção, como também

doenças e fatores de risco.

PRACTICE

Esta ferramenta fornece uma estrutura básica para a organização dos dados colhidos com a

família, facilitando o desenvolvimento da avaliação familiar.

• P ⇒ Descrever o problema apresentado na família.

• R ⇒ Neste item, deve-se identificar qual o papel dos membros da família.

Exemplo: Casal parece ter papéis bem definidos em muitas áreas.

• A ⇒ Afeto: como a família se comporta diante do problema

apresentado.

• C ⇒ Caracterizar o tipo de comunicação existente entre os membros da

família.

Exemplo; Dificuldade dos cônjuges de escutar as considerações um do outro.

• T ⇒ Tempo no ciclo de vida.

• I ⇒ Doença na família passada e presente.

26

• C ⇒ Como os membros da família enfrentam o estresse da

vida.

• E ⇒ Identificar a existência de um suporte familiar, qual e como é esse

contato.

Genograma

Método de coleta, armazenamento e processamento de informações sobre a família de forma

rápida e resumida, facilitando o diagnóstico familiar.

Processo para a construção de um Genograma:

• Consiste em três gerações, representando todos os membros da família com nome,

idade e data de nascimento.

• Cada geração é representada na mesma linha horizontal, sendo que o primeiro filho da

família deve estar à esquerda, seguido pelos demais filhos em ordem decrescente.

• Para se registrar a idade dos membros da família, deve-se colocar acima do símbolo,

seguido do nome abaixo do símbolo, não se esquecendo de colocar a data de

falecimento e a idade em que faleceu.

• Identificar, também, ano ou tempo de casamento ou divórcio.

• As doenças e/ou fatores de risco através de siglas devem ser registradas abaixo do

nome, enfatizando que a causa morte deve ser identificada e grifada.

• Marcar, através de uma linha contínua, as pessoas que moram na mesma residência,

identificando aqueles que não possuem laços consangüíneos na mesma linha

horizontal de sua geração, mas sem traços.

Siglas:

ALC – Alcoolismo EP – Epilepsia ALE – Alergia HAN - Hanseníase ANA – Analfabetismo HAS – Hipertensão arterial ASM – Asma HIV – Imunodeficiência adquirida AVE – Acidente vascular encefálico IAM – Infarto Agudo do miocárdio BE – Baixa escolaridade IRA – Insuficiência respiratória aguda BR – Baixa renda ME – Morte por causa externa DC – Doença coronariana NEO - Neoplasia DEF – Deficiência física OBE - Obesidade DEM – Deficiência mental TAB - Tabagismo DEP – Desnutrição TB- Tuberculose DES – Desemprego TP – Transtorno psíquico DM – Diabetes mellitus UDI – Uso de drogas ilícitas DST – Doença sexualmente transmissível VD – Violência doméstica

27

Símbolos: Adaptação a partir dos símbolos-padrão do heredrograma proposto por Rakel R,E

(1997)

homem • aborto espontâneo ⊗ morte Ο mulher Ο aborto induzido Ο

adotado ∆ gravidez mãe solteira sem a participação do pai na criação do filho

Ο Mãe solteira com participação do pai na criação do filho.

gêmeos univitelinos gêmeos bivitelinos Ο Ο 10 3

casamento e tempo de casados divórcio e tempo

Ο Ο Ο 4 não casados e tempo homem com duas famílias em que vivem juntos relação extraconjugal

Ο linha contínua indicando os indivíduos Ο que moram juntos

Ο Ο Ο

28

Agregado

OBS: Caso sejam muitas siglas, devem ser registradas no rodapé do instrumento, assim como

doenças e fatores de risco não existentes acima.

54 50

Exemplo: TAB/DM José Maria ΟHAS / ALC 21 17 1999 /10 ASM AnaΟ • ⊗ Joana NEO

Pedro

29

Estágio no Ciclo de Vida

Esta ferramenta possui a finalidade de identificar em qual estágio a família se encontra dentro

do ciclo de vida para, com isso, conhecer o desenvolvimento da família e tornar fácil a

construção do diagnóstico familiar.

• Estágios do ciclo de vida - devem ser identificados através do quadro abaixo,

acompanhados das tarefas a serem cumpridas.

Estágios no ciclo de vida Tarefas a serem cumpridas 1.Saída de casa - Estabelecimento de identidade em relação

ao trabalho e independência financeira. - Iniciar separação emocional de seus pais.

2. União das famílias pelo casamento: novo casal.

- Estabelecer uma relação íntima um com outro. - Maior desenvolvimento da separação emocional com seus pais.

3. Apreender a viver junto - Dividir os vários papéis do casal de modo equilibrado.

4. Chegada do primeiro filho - Ajustar o sistema conjugal para dar espaço ao filho. - Dividir o papel dos pais. - União na educação dos filhos, tarefas financeiras e domésticas.

5. Filhos adolescentes - Mudança do relacionamento pais e filhos permitindo ao adolescente entrar e sair do sistema. - Começar a mudar no sentido de cuidar da geração mais idosa.

6. A saída dos filhos: ninho vazio - Voltar a viver como casal sem filhos. - Ajuste ao fim do papel dos pais. - Desenvolvimento de relacionamento adulto-adulto entre os filhos crescidos e seus pais.

7. Aposentadoria - Ajuste ao fim do salário regular. - Desenvolvimento de novas relações com filhos, netos e cônjuge.

8. Velhice - Lidando com a perda das habilidades e maior dependência a outro. - Lidar com perdas de amigos, familiares e cônjuge.

III) Acompanhamento e avaliação:

30

Objetivos e Metas a serem Alcançadas.

Traçar os objetivos e metas a serem alcançados para solucionar os problemas identificados.

Exemplo: Ganho de peso da criança com desnutrição.

Estratégias de Intervenção

Delinear as condutas de atuação a serem empregados para aplicação efetiva das intervenções.

Exemplos: - Estratégias de promoção e prevenção de saúde.

- Encaminhamentos para serviços específicos.

Nível de Intervenção

As ações podem ser realizadas no nível individual, familiar ou associadas entre si.

Instrumentos de Intervenção

Descrever os instrumentos de intervenção utilizados, tais como consulta individual, visita

domiciliar e conferência familiar.

Início da Intervenção

Colocar a data do início da intervenção ( coleta dos dados).

Indicadores para Avaliação

A partir da situação identificada, descrever os indicadores capazes de medir as modificações,

avanços ou retrocessos resultantes do processo de intervenção e que servem para acompanhar

e monitorar o seu grau de resolutividade.

Periodicidade da Avaliação

Período de tempo necessário para avaliação das ações desenvolvidas semanal ou

quinzenalmente.

Profissional responsável

Profissional responsável pelo diagnóstico, acompanhamento e/ou avaliação.

Impacto da Ação

Modificações finais obtidas através das intervenções capazes de refletirem o grau de alcance

das metas, eficiência, eficácia e resolutividade das ações.

31

Formulário para Coleta de Dados Dados de identificação Endereço________________________________________________ Nº da família ________ Data __________ Indivíduos que compõem a família: 1.______________________________________________ 2.______________________________________________ 3.______________________________________________ 4.______________________________________________ 5.______________________________________________ 6.______________________________________________ 7.______________________________________________ 8.______________________________________________ 9.______________________________________________ 10._____________________________________________ Diagnóstico familiar Situação identificada PRACTICE

P R

A C T I C

E

Sexo Data de Nasc. Idade

32

Genograma Estágio no ciclo de vida

Acompanhamento e avaliação

Objetivos e Metas Estratégias de Intervenção

Nível de Intervenção

Início da Intervenção Instrumentos de Intervenção

Indicadores para Avaliação Periodicidade da Avaliação

Profissional Responsável

Impacto da Ação

Uma Discussão sobre as competências e habilidades de gestores no âmbito do Sistema Público de Saúde 1

UMA DISCUSSÃO SOBRE AS COMPETÊNCIAS E HABILIDADES DE GESTORES NO ÂMBITO DO SISTEMA PÚBLICO DE SAÚDE1

Edna Aparecida Barbosa de Castro2 Estela Márcia Saraiva Campos3

RESUMO

Este texto propõe uma discussão sobre os aspectos conceituais que envolvem o cotidiano do trabalho dos gestores no âmbito do SUS. Originou de inquietações, como por exemplo: como lidar em situações cujo planejamento e intervenções têm como ponto de partida as Políticas de Saúde? Com processos demandados de organizações hierarquizadas, em que o objeto de trabalho deixa de ser, diretamente, o indivíduo com suas enfermidades e passa a ser a instituição de saúde com suas demandas? O objetivo é estimular reflexões acerca das competências e habilidades de gestores e profissionais em formação para futuras atuações, para que desenvolvam seus planos de trabalho utilizando-se de: potencial próprio, autocrítica, criatividade e reconhecimento de habilidades. Dialogamos com autores, dentre eles, Campos (2000) e Deluiz (2001). O lidar com o poder, a autonomia, o carisma/liderança, o diálogo, a ética nas relações de trabalho, evidenciam-se como categorias valiosas ao se pensar numa nova lógica de gestão no âmbito do SUS, precisando sair do espaço das idéias e transcender para o espaço social concreto, em que as relações humanas acontecem e os problemas surgem e precisam ser resolvidos. PALAVRAS-CHAVE: gestão de Sistema – gerência em saúde - competências - habilidades A DISCUSSION OF THE COMPETENCIES AND ABILITIES OF THE MANAGERS IN THE PUBLIC

HEALTH SYSTEM ABSTRACT This text proposes a discussion on the conceptual aspects involving the day-to-day work of the managers of the SUS. It arose from concerns such as: how to deal with situations whose planning and intervention have their start in Health Policies? Or with processes questioned by hierarchical organizations, in which the object of the work is not, directly, the individual and his illness, but the health institution and its needs? The objective is to stimulate reflection concerning the competency and abilities of managers and professionals who are now being trained for future work, self-criticism, creativity and recognition of abilities. We have dialogue with authors, among others, Campos (2000) and Deluiz (2001). Dealing with power, autonomy, charisma/leadership, dialogue and ethics in work relations reveal themselves to be valuable categories, when thinking about a new management logic at SUS, needing to go

1 Texto produzido originalmente para o curso de Especialização em Gestão de Sistemas e Serviços de Saúde da UFJF – Programa de Qualificação de Equipes Gestoras do SUS – MS, Janeiro/2003. 2 Enfermeira, Coordenadora do Curso de Graduação em Enfermagem da Faculdade de Enfermagem da UFJF-MG – Professora do Departamento de Enfermagem Aplicada - Área de Atuação: Saúde do Adulto - Mestre em Educação pela UFJF – Doutoranda em Saúde Coletiva/IMS-UERJ. E-mail: [email protected] 3 Enfermeira, Coordenadora do Pólo de Capacitação em Saúde da Família – NATES/UFJF, professora convidada do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Medicina – UFJF- Mestre em Saúde Coletiva/IMS-UERJ – Doutoranda em Saúde Coletiva/IMS/UERJ. Endereço: NATES- Campus da UFJF- Bairro: Martelos, CEP: 36016-970, Juiz de Fora - M.G. E-mail: [email protected]

Uma Discussão sobre as competências e habilidades de gestores no âmbito do Sistema Público de Saúde 2

beyond the realm of ideas and transcend to the concrete social arena, where human relationships take place and problems arise and need to be solved. KEY WORDS: Systems management – Health management – competencies - abilities

1. Considerações Iniciais

O profissional de saúde na atualidade, cada vez mais, vem sendo chamado a pensar sobre problemas coletivos, ou seja, que não estão no âmbito da saúde de um único indivíduo. Questões abrangentes, como semiologia emanada de uma coletividade, planos de intervenção requerendo, progressivamente, esforços também coletivos, têm provocado o surgimento de novas habilidades e competências. Estas vão se agregando constituindo uma nova visão no âmbito da especialidade que envolve a gestão e o planejamento em saúde.

Como lidar em situações cujo planejamento e intervenções têm como ponto de partida as Políticas de Saúde? E como lidar com outras originadas no interior das instituições? Com processos demandados de organizações hierarquizadas, em que o nosso objeto de trabalho deixa de ser, diretamente, o indivíduo com suas enfermidades e passa a ser a instituição de saúde com suas demandas? E quais são as habilidades que devemos possuir ou refiná-las quando assumimos um cargo de gestão? Quais são as competências demandadas para um gestor de saúde?

No bojo das demandas da sociedade por cuidados à saúde, evidenciam-se desafios que nem sempre o profissional de saúde encontra-se preparado para enfrentar, tendo como referência, tão somente, as competências e habilidades inerentes à sua prática clínica ou as que lhe encerraram o curso de graduação. Temos estado diante de questões amplas, como a fome, a mortalidade relacionada à desnutrição, aos agravos cardiovasculares, aos oncológicos, à emergência de novas doenças, como o caso da AIDS e à violência, cuja compreensão e busca de solução não se limita a um único viés de pensamento como, por exemplo, o construído no campo da saúde sob a vertente do olhar biomédico, incorporado pelas corporações profissionais.

Essa nova prática de atenção à saúde é ressaltada por Campos (2002) como sendo baseada na assistência integral e universal à saúde, com enfoque voltado para a melhoria da qualidade de vida. Com isso, passa a distinguir dois tipos de práticas sanitárias: a atenção à demanda, considerada enquanto intervenção pontual e individual aos problemas autopercebidos, e a vigilância à saúde. No caso da vigilância à saúde, enquanto uma prática sanitária, Campos (2002) destaca que essa se articula às atividades de promoção da saúde, de prevenção da doença e atenção curativa, pressupondo, para tanto, o trabalho em equipe multi e interprofissional ao lado da intersetorialidade das ações.

Nessa perspectiva, outras ciências têm, em seu curso, estado a serviço de compreender os grandes problemas da humanidade através de suas disciplinas, como a sociologia, a antropologia, a economia, a pedagogia, a psicologia, a filosofia.

A interdisciplinaridade surge como uma importante diretriz, quando pensamos em uma nova lógica de gestão no âmbito do SUS. Uma interdisciplinaridade que precisamos ir construindo desde a formação profissional e, numa construção para além dos saberes imbuídos à nossa prática quando realizada isoladamente, com o referencial único de nossa corporação profissional. Uma interdisciplinaridade que precisa sair do espaço das nossas idéias, transcendendo para o espaço social concreto, onde as relações humanas acontecem e os problemas surgem e precisam ser resolvidos. Uma interdisciplinaridade construída através do diálogo, como sempre nos propôs Freire (1977) em toda a sua obra. Uma interdisciplinaridade muitas vezes mediada pelo conflito, pelas diferenças, que são essenciais à construção de novos saberes e práticas. Não pormenorizaremos esse tema aqui; entretanto, não podemos omiti-lo, ainda que de modo breve, no tema alvo deste texto, que são as competências e as habilidades de um gerente/gestor em saúde.

Uma Discussão sobre as competências e habilidades de gestores no âmbito do Sistema Público de Saúde 3

A temática, as competências e as habilidades de um gestor de saúde, que este texto evidencia, trazemos à tona para que possa ser discutida e compreendida a partir de nossas vivências em cargos de gestão/gerência4. E, para isso, convidamos o leitor a visitar e a re-visitar sua prática, valorizando suas experiências, à medida em que prosseguir na leitura.

Pretendemos propiciar uma reflexão acerca da temática em foco, permitindo que profissionais que ocupam cargos de gestão/gerência, e outros, em processo de formação para futuras atuações, elaborem e desenvolvam seus planos de trabalho utilizando-se de seu próprio potencial, capacidade de autocrítica e criatividade e reconhecimento de suas habilidades. Este texto tem a intenção de ser uma referência para o início de um longo debate.

Buscaremos dialogar com alguns autores que têm influenciado o nosso pensar e o nosso agir nos últimos anos, preocupando-nos, sobretudo, com o contexto do nosso sistema público de saúde, o SUS, e nos questionando: qual o perfil de gestor que vislumbramos? E, para tal, que competências e habilidades são necessárias?

Apresentaremos uma discussão, portanto, sobre conceitos que consideramos chave para a compreensão do perfil de gestor. Os primeiros que nos parecem emergentes no âmbito dessa prática são os de competências e habilidades. Em seguida, discutiremos algumas dentre as competências e habilidades, cuja abordagem consideramos válidas frente as atuais discussões sobre planejamento e gestão em saúde em nosso país.

2. Gestão e Planejamento em Saúde: processo, competências e habilidades.

As transformações oriundas das diretrizes emanadas pelo Sistema Único de Saúde

(SUS), vêm possibilitando, desde o início dos anos 90, mudanças significativas no processo produtivo em saúde, com repercussões importantes na lógica de organização do trabalho e das instituições de saúde.

A implementação da descentralização, uma das diretrizes definidas pelo SUS através da promulgação da Constituição de 1988 (Brasil,1988), que vimos assistindo a passos largos por todo o país, vem propiciando avanços nos processos de gestão do sistema de saúde, sobretudo a partir de meados da última década.

A tomada de decisão de descentralizar o processo de gestão do SUS põe em evidência uma nova lógica de gestão. As práticas vêm mostrando que esse novo modo de pensar e de gerir serviços, setores e o próprio sistema vem requerendo ajustes e releituras pelos profissionais e pelas instituições acerca do processo de trabalho do gestor. Emerge desse mercado de trabalho um olhar crítico, tanto em relação às organizações de saúde (Instituições), quanto em relação aos processos de produção dos profissionais (Sujeito da produção) inseridos nas instituições de saúde.

E, num contexto de trabalho em que as atividades de gerência/gestão e planejamento ganham uma nova ênfase, que expressa a partir do referencial de descentralização do comando, da direção do processo de trabalho, há exigência de um repensar de suas concepções teóricas e práticas. As dimensões científica, social, política, econômica e cultural, que envolvem o processo de gerência/gestão tornam-se mais presentes e com maior visibilidade na prática profissional.

4 O termo gestão vem sendo adotado na prática para se referir ao conjunto de políticas e de estratégias formuladoras no nível político. Já o termo gerência está reservado para as ações desenvolvidas no nível operacional.

Uma Discussão sobre as competências e habilidades de gestores no âmbito do Sistema Público de Saúde 4

As dimensões do processo de Gestão e de Planejamento, em suas modelagens, tiveram, historicamente, a partir do referencial teórico de Taylor (1960), o entendimento de que os dirigentes não deveriam, jamais, deixar nas mãos dos trabalhadores o comando dos processos mais complexos da produção. A partir dessa premissa, Taylor e seus seguidores sugeriram um método de gestão representativo, a partir de uma “gerência científica”. O pensamento implícito à proposta Taylorista deu origem a uma racionalidade planejada à vida cotidiana, eliminando o traço de subjetivismo no momento de execução das tarefas, passando a valorizar um campo de saber, compreendido como de caráter científico, fundamentado em tipos ideais, perseguindo a “melhor maneira” de se executar uma operação. Além da racionalidade gerencial, Rocha (1998, p.139) destaca que na perspectiva taylorista, “o planejamento é assumido como uma das etapas para a implementação das políticas previamente existentes às quais se subordina o processo de planejamento”.

Essa “melhor maneira de fazer”, idealizada a partir da concepção taylorista, estaria sendo indicada a partir de estudos empíricos, realizados em outras circunstâncias e transportados, independente de crítica, para os momentos de execução da tarefa. Esta concepção de organização dos processos de trabalho orientou uma tradição gerencial, cujas características de organização do trabalho conformavam um trabalho prescrito, onde o trabalhador tinha pouca intervenção nos processos produtivos, gerando, conseqüentemente, grande restrição de sua autonomia enquanto sujeito do processo.

Com as reformas estruturais ocorridas no sistema de saúde, aliadas ao processo de flexibilização das relações de trabalho (Liedke, 1997), a partir das décadas de 80 e 90, um novo modelo de produção do trabalho emerge, colocando o trabalhador na centralidade do processo, tendo como foco a reestruturação produtiva. Dessa forma, ampliam-se as discussões sobre a intelectualização do trabalho, passando o processo de produção a exigir do trabalhador, além do conhecimento técnico, da qualificação profissional e da incorporação de novas habilidades e competências, a possibilidade de resolver problemas, de gerenciar e de realizar trabalho em equipe.

Essa visão atual sobre o cotidiano da vida do trabalho permite-nos apreender algumas dentre as habilidades de um gerente/gestor como, por exemplo, a valorização do exercício da ousadia, da criatividade e da composição de interesses pelo trabalhador com outros sujeitos relativamente autônomos. Esse conjunto de atributos, associados ao entendimento de que o espírito do trabalho seria marcado pelas noções de disciplina e competência, além do saber, da iniciativa, da ousadia e da criatividade para imaginar e construir o novo, tem nos influenciado o pensar a gestão e a formação de recursos humanos para o SUS, considerando as competências e habilidades no âmbito dessa formação.

Antes de prosseguirmos, consideramos relevante ressaltar que vimos nos referindo à produção em saúde como sendo decorrente de um “processo” produtivo, que se inclui, do ponto de vista da classificação econômica, no âmbito do setor de serviços. E quando o compreendemos como “processo”, que tem o sujeito ou aquele que o produz na centralidade, acreditamos que o “produto” guarda em si a singularidade dos sujeitos que o produzem. Ao avaliarmos a “produção”, não poderemos avaliá-la sem olhar para aqueles que a produziram, considerando, além da sua trajetória de vida, suas condições de trabalho e a dimensão que têm (consciência) do processo em si de produzir.

A atividade inventiva dos trabalhadores passou, na concepção de Deluiz (2001, p.8), ”a ser incessantemente mobilizada e o conhecimento incorporado como saber de gestão”. Com isso, alia-se ao pressuposto de que saber gerir a produção é, também, saber gerir a si próprio na atividade produtiva. Nesse contexto, o conteúdo e a qualidade do trabalho humano modificam-se.

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Esse entendimento tem propiciado o repensar do “processo de produção em saúde”, que segundo Campos (2000, p.68), deve ser entendido enquanto relações que acontecem de modo simultâneo, entre a atividade produtiva, o agente da produção, possibilitando a constituição do sujeito - co-produção de sujeitos e a equipe de trabalho – do coletivo organizado representativo da Instituição.

Desta forma, as atividades de gestão/gerência e de planejamento devem ser entendidas como uma tarefa de trabalho não somente da produção de bens e serviços, mas também de pessoas e de coletivos organizados. O pensamento de Campos (2000, p.72) acerca dessas atividades encerra que as mesmas podem ser consideradas como uma “tarefa coletiva” e, ao ser entendida e praticada desta forma, induz à formação de sistemas de co-gestão, e não somentea uma atribuição de minorias poderosas ou de especialistas.

O exercício de co-gestão, de co-governo, entendido nessa perspectiva, está associado à produção de “espaços coletivos organizados”, os quais cumpririam três funções básicas: administrar e planejar processos de trabalho objetivando a produção de bens e serviços; intervir nas relações de poder, possibilitando alterações dos esquemas de dominação, democratizando o acesso às informações, a participação nas discussões e na tomada de decisões, com vistas à produção de novos contratos e à construção de nova hegemonia, e propiciar um espaço de reflexão crítica, que passe a influenciar na produção de subjetividade e na constituição dos sujeitos.

Nessa ótica de gerir processos e sujeitos, a discussão situa-se na perspectiva da ampliação das competências inerentes ao trabalhador em exercício de gestão/gerência. Deluiz (2001, p.13) pontua que na literatura corrente, a noção de competência é vista, em termos gerais, como a “capacidade de articular e mobilizar conhecimentos, habilidades e atitudes, colocando-os em ação para resolver problemas e enfrentar situações de imprevisibilidades em uma dada situação concreta de trabalho e em um determinado contexto cultural”.

Ramos (2001, p.19) apresenta uma compreensão de competência, do ponto de vista da psicopedagogia, que nos obriga a refletir sobre os métodos de planejamento e gestão baseados em objetivos. Para ela, a competência toma o lugar da noção de comportamento antes associada aos objetivos e confundida com o próprio conteúdo da capacidade. “A competência preocupa-se, fundamentalmente, com o domínio cognitivo que sustenta o desempenho ou o comportamento com a inteligência prática ou a estrutura e o funcionamento da competência ou capacidade; enquanto os objetivos comportamentais confundem o comportamento com o próprio domínio cognitivo”. Cabe-nos, todavia, estarmos atentos para as propostas metodológicas que perseguem objetivos, de modo rígido e segundo protocolos inflexíveis, buscando alcançá-los a qualquer custo. Propostas que omitem o pensar e o repensar de nossa prática, levando-nos a uma reprodução sem o refletir e o re-fazer nossas ações.

É certo que o refletir e o re-fazer, segundo Monteiro (1998, p.12-5) põe-nos diante do “risco” de termos nossos objetivos transformados e de termos, sobretudo, nossa própria visão do problema modificada. A intencionalidade, todavia, com que perseguimos objetivos não deve negar a subjetividade impregnada no processo de produção, nem tampouco permitirmos que ela se solidifique, como se fosse algo estanque e estático do começo ao fim do processo.

E como avaliar o processo de trabalho baseado em competências? Podemos aqui assumir a idéia de Depresbiteris (2001) que, do ponto de vista da formação do profissional, a avaliação é considerada como elemento chave quando fazemos opção por uma formação e uma prática baseada em um sistema de competências. O que e como avaliar? Essa autora aponta que antes devemos ter claro quais competências devem ser avaliadas, com que critérios, e, finalmente, com que indicadores de qualidade são relevantes para avaliarmos o outro e sermos avaliados. Há consenso entre os autores que estudam o tema, como, por exemplo, Ramos (2001, p. 21), de que é o desempenho (expressão concreta dos recursos que

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o indivíduo articula e mobiliza no enfrentamento dessas situações) e não as competências que pode ser observado diretamente e, por isso, pode ser tomado como objeto da avaliação, permitindo inferir sobre um conjunto de competências. Um exemplo prático seria os recursos adotados (habilidades) pelo profissional frente a tomadas de decisões que dependem de informações obtidas através de rede de informações.

Assim, no entendimento que vimos constituindo dentre os requisitos necessários ao trabalhador desta nova conjuntura, encontram-se as competências, tanto de natureza cognitiva, relacionadas com o “saber em si” (conhecimento de base), e ao “saber fazer” (conhecimento técnico), como de natureza comportamental, relacionada ao “saber ser” e saber “(con)viver” (as atitudes). Este conjunto de capacidades pode ser assim identificado como capacidade de ler e interpretar a lógica funcional; de abstração e objetividade; de dedução estatística; de expressão oral, escrita e visual; de argumentação; de realizar trabalho em equipe; de iniciativa e exercício da autonomia e de responsabilidade; além da habilidade para negociação, para construção de parcerias.

Concordamos com Deluiz (2001, p.7), que a organização do trabalho se mostra como que num campo de “arbitragem”, tendo em vista sua performance polivalente, integrada, em equipe, com mais flexibilidade e autonomia, no qual, além dessas habilidades, outras devem estar evidentes no profissional como um saber de gestão: a capacidade de diagnosticar, prevenir, antecipar, decidir e interferir em relação a uma dada situação concreta de trabalho.

Elencamos algumas dentre as habilidades inerentes ao gerente/gestor para comentarmos. São elas: o lidar com o poder, a autonomia, carisma/liderança, a dialogicidade e a ética no trabalho. De certa forma, são habilidades que se relacionam do ponto de vista conceitual e darão suporte às habilidades técnicas específicas aos postos de trabalho.

O gerente/gestor inclui-se no grupo governo ou direção da instituição e isso lhe garante atributos que o põem em destaque frente aos outros grupos internos ou externos e que a ela se submetem. A compreensão do poder que emanamos e que a nós retorna, o como lidar com a diversidade de situações que demandam poder parece-nos um instrumental útil à prática da gestão. Lara (1998) discute as relações de poder a partir do conceito de Max Weber de que o poder é a “probabilidad de imponer la propia voluntad, dentro de uma relación social, aun contra toda resistência y culquiera que sea el fondamento de esa probabilidad” (Weber, M. 1944, p. 43 citado por Lara, 1998, 86). Esse autor nos apresenta uma compreensão de poder como sendo um “jogo de vontades” que é inegável à produção humana, pois segundo ele “as pessoas se produzem historicamente nesse embate inevitável. Somos todos frutos dele. Somos poderes que emergem do jogo de outros poderes e em relação a eles”. Desta forma, constitui-se numa relação dialética entre vontades, na qual uma vontade vai se impondo a outras.

O poder, entendido enquanto relação entre dominantes e dominado, passa a ser entendido como resultado e como relação a partir de uma visão democrática, influenciada pela visão de Weber. Na “luta” entre vontades, diversos instrumentos e atributos são requeridos até chegarmos a um resultado. A capacidade de envolver, de seduzir através de carisma, de convencimento, de diálogo, de negociação ou mesmo através de imposições que chegam a adotar a força bruta. O que, afinal, se obtém: “o resultado é que define o poder. E o resultado é à vontade de um ou de alguns se impondo à vontade de outro ou de outros”. (Lara, 1998, p. 86).

Um autor que contribui para a compreensão da institucionalização do poder é Michel Foucault (1995), que o entende a partir de uma diversidade de forças que se originam do homem em seu coletivo, guardando características culturais significativas que ele chama de “antropogênica”. Do embate dessas forças, surge o poder. Em especial, nas relações que se evidenciam entre gerentes/gestores e coletivos organizados. Campos (2000, p.152) apresenta uma compreensão de poder como sendo “a capacidade de co-produzir necessidades sociais, compromissos e contratos”, possibilitando a instituição de “sistemas de co-gestão”que levam à “Gestão Democrática e Participativa”.

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A capacidade de direção passa a ser traduzida pelas definições: habilidade e potência para compor consensos, fazer alianças e para implementar projetos na idéia de Gramsci, (1976); pela capacidade de governo, no sentido mais operacional na visão de Matus, (1993), e por uma aptidão a ser socialmente construída, já que co-governar é uma tarefa inerente a todos os membros de uma equipe de trabalho (Campos, 2000).

No contexto da política de saúde norteadora do SUS, estar em cargos de gerência/gestão, independente do processo de vínculo trabalhista, pois passa pela mediação política e, nem sempre, o carisma e autonomia para liderar são dadas como conseqüência. Segundo Gertz (2000, p. 184) “o carismático não é, necessariamente, dono de algum atrativo especialmente popular, nem de alguma loucura inventiva, mas está bem próximo ao centro das coisas”. Esse autor sofre influência de Max Weber, que considera o carisma como um fenômeno cultural expresso por um conjunto de formas simbólicas emanadas de uma elite governante, dando mostras de que ela realmente governa.

Encontramo-nos, enquanto gestores/gerentes, em posições que nos cobram liderança e transcendência em relação a outros. Estamos no âmbito do sistema de saúde, em lugar que concentra atividades importantes, onde as idéias dominantes se fundem a instituições dominantes, constituindo-se em lugares (arenas) onde os eventos ocorrem. Lugares que geram influências, de maneira fundamental, na vida das pessoas. São esses lugares os “setores” do serviço público de saúde, cujos cargos ocupamos e com os quais os cidadãos (“usuários”) se vêm envolvidos. Existe, portanto, uma relação de envolvimento explícito que gera uma dependência implícita. Lideramos, porque pessoas dependem de nós e é essa relação de dependência que devemos repensar, já que é fruto de envolvimento com outros seres humanos.

E nesse repensar não poderemos omitir o diálogo e a ética nas relações de trabalho. A prática do diálogo é que constrói saberes e práticas. E quando ele se mostra como um recurso valioso para mediar as relações de produção de serviços em saúde, precisamos desmistificá-lo e torná-lo acessível ao dia-a-dia de trabalho. Precisamos assumi-lo em nossas ações cotidianas para além do discurso, compreendendo-o numa dimensão ampliada. Um dos maiores estudiosos do mundo sobre a teoria da dialogicidade e antidialogicidade foi Paulo Freire. Para o humanismo verdadeiro nas relações de trabalho, podemos compreender o significado de “ser dialógico” na concepção de Freire (1977, p.42). Para esse autor, “ser dialógico não é dizer-se, descomprometidamente dialógico. É vivenciar o diálogo. Ser dialógico é não invadir, é não manipular, é não sloganizar. Ser dialógico é empenhar-se na transformação constante da realidade”.

E devemos exercitar cotidianamente a prática do diálogo ao planejar e implementar ações que, muitas vezes, já chegam em nós fragmentadas, verticais e imbuídas de poder que nos parece inegociável. Todavia, desmistificar e dar processualidade às nossas ações torna-se mais prazeroso se adotamos o diálogo como premissa para a eficiência em nossa prática. Requer que apuremos sempre a nossa capacidade de ouvir e de falar, de interagir com os sujeitos da produção, porém numa negociada atitude de reconhecimento da intencionalidade que conduz o diálogo. Freire prossegue alertando que o “diálogo é o encontro amoroso dos homens que, mediatizados pelo mundo, o pronunciam, isto é, o transformam, e, transformando-o, o humanizam para a humanização de todos”. (Freire, 1977, p. 43).

Finalmente, os elementos apresentados anteriormente necessitam estar em harmonia com a ética nas relações de trabalho em saúde, uma necessária ética que se conjuga com a subjetividade. Schaiber (1996) discute a ética a partir das questões emanadas dos sujeitos que se encontram na centralidade do processo de produção em saúde e na problemática da vida cotidiana. É no dia-a-dia da ação que a ética vai sendo compreendida, através das relações subjetivas e não somente como valores e crenças descolados de uma realidade. Gerentes/gestores de serviços de saúde precisam estar atentos às dimensões que envolvem o

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trabalho que gerenciam, em suas especificidades, de modo a conjugar a diversidade de fatores que o envolvem.

Assim, sem a pretensão de concluirmos o debate sobre as competências e habilidades de um gestor/gerente, acreditamos, como Schaiber (1996, p.46), que o processo de produção em saúde possui uma dimensão de natureza ética. Para o exercício ético frente ao processo de produção de serviços em saúde, há que se compreender o sujeito que produz além das suas potencialidades técnicas. Há que se valorizar os aspectos subjetivos que permeiam a execução das ações técnicas, como “as escolhas, as vontades que não são, exclusivamente, técnicas, mas expressões de valores éticos e projetos/interesses políticos, através da ação técnica”.

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Submissão: junho de 2003 Aprovação: outubro de 2003

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Dificuldades de Implantação do Programa de Saúde da Família como Estratégia de Reforma do Sistema de Saúde Brasileiro1.

Telmo Mota Ronzani1 Cornelis Johannes van Stralen2

Resumo

Este artigo é uma revisão bibliográfica a respeito de alguns conceitos básicos da

Atenção Primária à Saúde (APS), relacionando-os com as políticas de implantação do

Programa de Saúde da Família. Parte-se do embate entre dois paradigmas principais que

pautam a prática dos profissionais e a implantação de políticas de saúde. O primeiro

paradigma, ainda preponderante, fundamenta a formação superespecializada, com

dependência dos recursos tecnológicos complexos e um isolamento entre as disciplinas

de saúde. O segundo paradigma se baseia na ampliação das ações, voltadas para os

conceitos de prevenção e promoção em saúde, princípios fundamentais do PSF. Desta

forma, esta estratégia se desenvolve convivendo com tais paradigmas, muitas vezes de

forma competitiva ou na confusão prático-conceitual dos pressupostos da APS.

Ressaltamos que é preciso uma avaliação crítica do PSF para que seus objetivos

primordiais não se percam ao longo de sua história.

Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde; Políticas de Saúde; Saúde Coletiva.

Difficulties in Implanting the Family Health Program as a Strategy for Reform of the Brazilian Health Care System

Abstract: This article is a bibliographical revision regarding some basic concepts of

Primary Health Care (PHC), relating them with the policies of implementation of the

Family Health Program (FHP). It begins with the contradiction between the two main

paradigms that divide the professional' practice from the implementation of health

policies. The first paradigm, still preponderant, is based on the overspecialized

formation, with dependence on the complex technological resources and an isolation

among the disciplines of health. The second paradigm is based on the amplification of

work, going back to the concepts of prevention and health promotion, fundamental

assumption of FHP. This way, this strategy is developed co-existing with such

paradigms, often in a competitive way or in the practical-conceptual confusion of the

1Psicólogo, Especialista em Saúde Coletiva, Mestre em Psicologia Social, Doutorando em Ciências da Saúde pela Escola Paulista de Medicina- UNIFESP, Pesquisador da UDED-UNIFESP. Endereço: Av 11 de Junho, 685/136 bl 2 - Vila Clementino - São Paulo-SP - CEP: 04041-090 Tel: (11) 5572-8272 Fax: (11) 5539-0155 Email: [email protected] 2Psicólogo, Doutor em Sociologia e Política, Professor Adjunto da UFMG.

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presuppositions of PCH. We point out that a critical evaluation of FHP is necessary so

that its primordial objectives aren’t lost along its path.

Key-Words: Primary Care Health; Health Policies; Collective health.

Introdução

Poderíamos dizer que, atualmente, existem duas propostas, de certa forma antagônicas, dentro

das ciências da saúde. A primeira é aquela que privilegia as práticas especializadas, em que os lugares de

prática e formação por excelência dos profissionais de saúde são os hospitais e, por outro lado, uma

tendência que procura seu espaço, principalmente nas últimas décadas, fazendo um esforço para se

efetivarem reformas dos sistemas de saúde que procurem mudar o enfoque político e assistencial e que

levem em consideração as ações relacionadas à promoção em saúde, em contraposição a práticas

meramente especializadas. Nesse contexto, o Programa de Saúde da Família (PSF) apresenta-se como

uma estratégia assistencial que procura implantar um novo modelo de atenção à saúde, voltada para a

saúde da família, considerando-a em todos os seus espaços de vida.

Porém, juntamente com essa tentativa de reforma, algumas confusões conceituais acabam

refletindo diretamente nos serviços de Atenção Primária à Saúde (APS). É a partir desse embate que

procuramos realizar nossa discussão. Observamos propostas de mudança de enfoque assistencial, mas que

— devido primeiramente à hegemonia das práticas pautadas na especialização no meio acadêmico e

segundo às confusões relativas às práticas de APS — a formação acadêmica e identidade dos

profissionais continuam ainda baseadas no modelo flexineriano (Ronzani, 2002).

Tal fato, direta ou indiretamente, influencia na configuração da principal estratégia de APS

atualmente no Brasil, o PSF. Esses serviços tem se multiplicado em todo país. Em 2000, os Pólos de

capacitação de profissionais envolviam cinqüenta e oito escolas e faculdades de Medicina e sessenta e

duas escolas e faculdades de Enfermagem, somando um total de trinta e dois Pólos implantados em todo o

Brasil (Sousa, 2000a). O número de equipes de PSF passou de 847 em 1996, para 4950 em dezembro de

1999 (Machado 2000). Porém, não existe uma homogeneidade na prática desses profissionais, sendo que

muitas Unidades de Saúde da Família (USF), muitas vezes, apenas reproduzem os antigos modelos de

Postos de Saúde que se limitam à prática curativa. Observa-se, ainda, que tal crescimento não está

acompanhado de uma mudança efetiva da prática dos profissionais, sendo que, na maioria das vezes, se

reproduzem antigos modelos, sob um discurso dito como inovador. Os estudos nessa direção começam a

ser desenvolvidos pois torna-se cada vez mais visível a disparidade entre a formação tradicional com o

discurso que se quer novo, porém influenciado por confusões conceituais ou por questões ideológicas

(Pedrosa e Teles, 2001; Souza, 2001).

A APS, então, mais especificamente o PSF, torna-se um discurso oficial nos meios profissionais

e acadêmicos; porém a formação dos profissionais é ainda pautada no modelo antigo, em que se prioriza a

especialização e o trabalho fragmentado em detrimento da formação generalista. Outro fato comum é o

discurso tradicionalmente biologizado do profissional de saúde em detrimento das questões psicossociais

também envolvidas nesse processo. Algumas escolas já procuram fazer uma mudança e uma crítica de tal

formação, fazendo reformas curriculares. Porém, a nosso ver, existe um fator mais complexo em relação a

esse problema, que seria a formação de uma identidade profissional presente no discurso do profissional

9

de saúde, que prioriza a superespecialização e a fragmentação do trabalho, pautado em recursos

tecnológicos complexos, identidade esta mantida por questões corporativas ou mesmo por manutenção do

status (Ronzani, 2002).

Este artigo, então, faz uma revisão bibliográfica sobre alguns conceitos primordiais para o

entendimento da APS, principalmente da promoção de saúde e da tentativa de reforma de políticas de

saúde no país. Nossa pesquisa bibliográfica foi feita em banco de dados de artigos nacionais e

internacionais, documentos ou outras publicações de relevância para o tema abordado. Procuramos fazer

uma discussão sobre amplitude dos objetivos a serem alcançados pelos sistemas de saúde no mundo que

se preocupou com a complexificação e ampliação das questões envolvidas no fenômeno saúde/doença,

ressaltando que as práticas em saúde não se limitam mais apenas ao fato de ausência de doença, comum

num passado recente e ainda preponderante em alguns países, havendo uma maior preocupação com

questões sócio-econômico-culturais que se relacionam com o processo saúde/doença e consequentemente

uma ampliação de ações que visam à melhoria da saúde da população.

É a partir deste constante conflito conceitual que procuramos desenvolver o presente artigo.

Dessa forma, os estudos a respeito da APS são importantes por alguns aspectos principais: ou por essa

estratégia apresentar bons resultados — tanto a respeito de qualidade e equidade de serviços quanto na

relação custo-benefício — pelo uso de um discurso pautado nos pressupostos básicos da APS, ou, por

outro lado, seria uma prática que mostra uma deturpação de tais princípios e uma falta de preparo de

profissionais e gestores para a implantação de tal política assistencial, priorizando o custo em detrimento

do benefício e profissionais que acabam repetindo uma prática tradicional que vai de encontro aos

princípios da APS.

Sendo assim, discutimos mais detalhadamente os princípios que embasam as ações no PSF, a

partir da discussão dos pressupostos da atenção primária e promoção em saúde, suas características e

problemas de efetivação para entendermos melhor a dinâmica dessa constante contradição tanto

conceitual como prática das políticas de priorização da APS.

Políticas de Saúde no Brasil

Como já discutido acima, a implantação de programas de APS no Brasil apresentaram

características próprias, decorrentes de suas políticas de saúde. Para entendermos melhor a caracterização

da implantação do PSF no Brasil e sua relação com as políticas de saúde, torna-se útil utilizarmos a

caracterização bastante didática dos sistemas de saúde dos países da América Latina, proposta por Frenk e

Londoño (1997). Apesar da falta de uma análise mais aprofundada do sistema de saúde brasileiro, os

autores fazem uma caracterização de nosso sistema de saúde como sendo o “Modelo de Contrato

Público”. Tal modelo se caracteriza pela compra e oferta de serviços de saúde privados e públicos,

possibilitando, assim, teoricamente uma escolha de serviços de melhor qualidade e de forma competitiva.

Porém, observamos um crescimento cada vez maior do setor privado para uma população específica e

uma falta de regulação da função denominada Articulação2, pois, segundo os autores, tal função no

sistema de saúde brasileiro é confundida com a função denominada Financiamento, havendo uma

fragmentação do oferecimento e controle de preços e qualidade dos serviços.Assim, o modelo de Política

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de Saúde brasileiro apresenta-se como um sistema que privilegia o mercado e o setor privado. O Estado

acaba garantindo o mercado para esse setor, que oferece serviços complexos e de alta tecnologia e que, ao

longo da história, vai se tornando um setor independente e instituído pelo Estado, comprometendo o

princípio da eqüidade (Cohn, 1995; Soares, 2000). Dessa forma, observamos que a política de saúde

brasileira foi marcada por um Estado financiador do setor privado para que estes, quando não mais

necessitavam desse financiamento, se desvinculassem do Estado, passando a ser um “competidor” através

de uma regulação do próprio Estado. Paradoxo este que tem como decorrência a ausência de eqüidade e a

dificuldade de acesso de vários setores da sociedade aos serviços de saúde.

A partir destas características, coloca-se mais uma ambigüidade das reformas dos sistemas de

saúde:

(...) enquanto a estratégia de Atenção Primária à Saúde se difunde a partir da Conferência de Alma-

Ata, os centros hegemônicos da economia mundial revalorizam o mercado como mecanismo

privilegiado para a alocação de recursos e questionam a responsabilidade estatal na provisão de

bens e serviços para o atendimento das necessidades sociais, inclusive saúde (Paim e Almeida Filho,

1998, p. 301).

No Brasil, a reforma do sistema de saúde foi encabeçada pelo chamado Movimento da Reforma

Sanitária. Este movimento foi articulado por sanitaristas e outros setores da sociedade no sentido de se

fazer uma reforma do antigo sistema. Poderíamos dizer que a criação do SUS (Sistema Único de Saúde)

foi o resultado dessa luta, que incorpora na constituição de 1988 vários princípios e diretrizes da VIII

Conferência Nacional de Saúde:

1) Universalidade, assegurando a todos os indivíduos o direito à saúde através de serviços de saúde e

políticas econômicas e sociais.

2) Descentralização dos serviços de saúde, segundo os níveis de administração pública, com ênfase na

esfera local3.

3) Hierarquização, organizando os serviços de saúde de acordo com sua complexidade.

4) Integralidade, integrando a assistência curativa com a prevenção e a promoção.

5) Regionalização, organizando ações e serviços tendo em vista sua especificidade e demandas locais.

6) Participação Popular, através da gestão participativa das políticas de saúde.

Entretanto, observamos que existem muitos problemas para a efetivação e a prática do SUS, pois

há uma contradição entre a legislação que prioriza a prática e ação do Estado na saúde e a realidade

política e econômica que faz o Estado reduzir sua ação social para dar espaço à livre concorrência do

mercado.

Há, então, um constante embate entre o privilegiamento do aspecto econômico e a tendência de

as políticas de saúde privilegiar ações voltadas para a prevenção e promoção à saúde, levando em

consideração as determinações sociais do processo de saúde/doença, tornando a saúde um campo

marcado pela interdisciplinaridade, em que as Ciências Sociais apresentam um papel importante de ação

(Jekel, et al.1996; Minayo, 2000).

A Atenção Primária à Saúde

11

A partir da preocupação na expansão prático conceitual das políticas de saúde em todo o mundo

e com o objetivo de definir novas estratégias assistenciais baseadas no conceito de saúde proposto pela

Organização Mundial de Saúde (OMS), ocorreu na cidade de Alma-Ata, no ano de 1978, a Conferência

Internacional Sobre os Cuidados Primários em Saúde, tornando-se o marco na tentativa de se promover a

saúde envolvendo outros setores da sociedade (OMS, 1978). Nessa conferência foram estabelecidos

alguns parâmetros básicos da Atenção Primária à Saúde como uma estratégia de assistência baseando-se

no conceito de saúde da OMS. A APS seria importante não somente para a prevenção e promoção da

saúde, mas também para o desenvolvimento sócio-econômico dos países (FEPAPEM, 1986; Jekel, et

al.1996; Paim e Almeida Filho, 1998; Rubin, 1996). O seu relatório final afirma que as medidas para

melhorar a saúde e a situação sócio-economica devem ser vistas como mutuamente complementares, e

propõe a APS como estratégia para alcançar a meta “Saúde para todos no ano 2000”, meta essa definida

pela 30a Assembléia Mundial da OMS realizada em 1977. Nesta perspectiva, o relatório conclui que a

APS seria a chave para conseguir um grau aceitável de Saúde para Todos, ajudaria aos povos a

contribuírem a sua própria evolução social e econômica (FEPAPEM, 1986; OMS, 1978; Paim e Almeida

Filho, 1998).

Para compreendermos as propostas do PSF, não poderíamos deixar de citar, também, as

Conferências Internacionais sobre Promoção da Saúde (I Conferência Internacional sobre Promoção da

Saúde, Ottawa, 1986; II Conferência Internacional sobre Promoção de Saúde, Adelaide, 1988; III

Conferência Internacional sobre Promoção de Saúde, Sundsvall, 1991; IV Conferência Internacional

sobre Promoção de Saúde, Jacarta, 1997), a Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde na

Região das Américas, ocorrida em 1992, na Colômbia, e a I Conferência sobre Promoção da Saúde do

Caribe, realizada em 1993, em Trinidad e Tobago. Tais conferências, assim como em Alma-Ata,

apresentam princípios e diretrizes importantes para as políticas internacionais e nacionais em relação à

promoção em saúde, inclusive para o PSF no Brasil. Os relatórios destas conferências apontam para a

planificação intersetorial de ações em saúde e para a formulação de políticas saudáveis (WHO, 1986;

WHO, 1988; WHO, 1991; WHO, 1997).

Poderíamos então usar a conceituação de promoção em saúde como sendo o processo de

possibilitar às pessoas um maior controle sobre sua saúde, baseado principalmente nos princípios de

justiça social e eqüidade. A saúde, então, é vista como algo bastante amplo e envolve vários aspectos e

pré-requisitos. Nesta perspectiva, foram definidas, em Jacarta, cinco prioridades para o campo da

promoção da saúde:

1. Promover a responsabilidade social com a saúde, através de políticas públicas

saudáveis e comprometimento do setor privado.

2. Aumentar os investimentos no desenvolvimento da saúde, através do enfoque

multissetorial, com investimentos em saúde, e também em educação, habitação e

outros setores sociais.

3. Consolidar e expandir parcerias para a saúde entre os diferentes setores em todos os

níveis do governo e da sociedade.

12

4. Aumentar a capacidade da comunidade e fortalecer os indivíduos para influir nos

fatores determinantes da saúde, o que exige educação prática, capacitação para

liderança e acesso a recursos.

5. Definir cenários preferenciais para atuação (escolas, ambientes de trabalho, etc.)

(Buss, 2000).

Para se chegar a ações efetivas na promoção em saúde, é necessário, dentre outras ações, o

planejamento de políticas públicas de saúde, a integração de ações de saúde com outros setores como o

meio-ambiente e a economia, a participação e o controle social das políticas de saúde. O Governo

Federal, através do PSF, objetiva tais mudanças, mas no dia-a-dia esbarra com realidades de formação

profissional e organização de serviços, até mesmo em Unidades de Saúde da Família, que ainda não

conseguem transpor a barreira de práticas pautadas em ações individuais e isoladas (Ronzani, 2002).

Para podermos embasar nosso foco de discussão, devemos deixar claro que as ações e políticas

de saúde baseadas na APS apresentam como diferencial fundamental o enfoque na promoção de saúde e

não mais somente na prevenção — evitar que uma determinada doença ocorra. É a partir do conceito de

promoção em saúde, principalmente, que podemos encontrar algumas contradições e dificuldades pelas

quais os profissionais passam para conseguirem atingir os objetivos do PSF. A primeira dificuldade

estaria no fato de que, a partir da promoção em saúde, as práticas não devem se limitar à doença em si,

mas devem considerar o contexto histórico cultural e as concepções a respeito de determinados

fenômenos e situações sociais (Minayo, 2000; OMS, 1978).

Para podermos fornecer mais alguns subsídios para nossa discussão e percebermos a amplitude

dos objetivos da APS e as dificuldades encontradas pelos profissionais de saúde em atingi-los, cabe-nos

detalhar um pouco mais tais objetivos. Os cuidados primários em saúde seriam definidos como

acessibilidade de todos os indivíduos e famílias de uma comunidade a serviços essenciais de saúde

prestados por meios que lhe sejam aceitáveis, através de sua participação integral e a custos que a

comunidade e o país possam absorver (OMS, 1978). Neste sentido, a APS seria caracterizada, de forma

sucinta, como uma prática preventiva e de promoção física, social e psicológica da saúde de forma mais

ampla possível e com menores custos (FEPAPEM, 1986; OMS, 1978; Paim e Almeida Filho, 1998;

Rubin, 1996).

Poderíamos então destacar os cinco princípios básicos da APS: acessibilidade, que seria o

primeiro contato com a equipe de maneira a avaliar as queixas das pessoas; abrangência, que consiste no

oferecimento amplo de ações no cuidado de doenças crônicas e prevenção psicossocial; coordenação, ou

seja, disponibilidade de um sistema de informação e avaliação das ações; continuidade, que desenvolve

ao longo do tempo um relacionamento com a comunidade e possibilita a promoção de uma forma mais

consistente e ao longo prazo; e, por último, responsabilidade, que consiste na interação constante com a

comunidade a respeito dos serviços oferecidos, de forma não somente a fornecer um esclarecimento do

trabalho da equipe, mas também na discussão da forma de atuação mais adequada àquela comunidade

(Paim e Almeida Filho, 1998; Rubin, 1996).

Além da importância social, o aspecto econômico também é um importante fator para a

implementação desses programas, uma vez que a APS pode diminuir sensivelmente a hospitalização, os

gastos tecnológicos — pois neste nível de atenção à saúde utiliza-se de tecnologias básicas — e com uma

13

resolutividade estimada em cerca de 75% a 85% (Jekel, et al. 1996; OMS, 1978; Paim e Almeida Filho,

1998; Rubin, 1996). Nos países em desenvolvimento como o Brasil, a APS se torna ainda mais

importante, uma vez que nos situamos em dois problemas de saúde ao mesmo tempo. Ainda não se

conseguiu erradicar algumas doenças infecto-contagiosas — comuns em países em desenvolvimento — e

ao mesmo tempo cresce cada vez mais a incidência de doenças crônico-degenerativas — comuns em

países desenvolvidos (Frenk e Lodoño, 1997). Sendo assim, passamos por uma situação controversa, pois

não conseguimos resolver antigos problemas de saúde e, ao mesmo tempo, novos problemas estão

aumentando.

A divisão da saúde em níveis de atenção é realizada numa busca de racionalidade dos sistemas

de saúde de acordo com sua complexidade. Poderíamos distinguir os três níveis de atenção em saúde da

seguinte forma: 1) nível primário: caracteriza-se por não haver distinção de idade, sexo nem de causa de

consulta, com objetivo de ação antes que uma determinada doença se instale ou de diagnóstico precoce;

2) nível secundário: caracteriza-se por ser ambulatorial ou hospitalar, no qual se distinguem problemas

para populações específicas que demandam atenção em nível especializado, com a progressão de uma

determinada doença mais avançada, porém ainda passível de uma intervenção mais básica; 3) nível

terciário: caracteriza-se por ser eminentemente hospitalar, com a realização de ações especializadas e com

uso de tecnologias mais complexas.

Entretanto, como estratégia, a APS ultrapassa os limites do setor saúde. Tendo em vista a

preocupação em se analisar os múltiplos fatores envolvidos na questão da saúde, as práticas e as

características de planificação dos programas de APS devem levar em consideração a realidade de cada

país e população específica, principalmente em relação às realidades sociais, econômicas e culturais de

cada comunidade (Ronzani, 2000).

Além disso, a prática do profissional repercute nos resultados das políticas de saúde de forma

mais ampla (Campos, 1992). Twaddle (1996) discute a questão da padronização mundial da prática

médica, fazendo com que a relação médico-paciente se torne distanciada e sem considerar o contexto

sócio-cultural. Tal fato também é apontado por Minayo (2000) a respeito da barreira criada entre médico

e paciente, através de um código de linguagem fechado e específico. Dessa forma, muitas práticas

alternativas não-profissionais ganham cada vez mais espaço de ação na comunidade. Em conseqüência,

somado à dificuldade de acesso aos serviços de saúde pública, observamos a população procurando

práticas alternativas como curandeiros ou procedimentos “caseiros” para a resolução de seus problemas.

Tal fato faz com que o profissional tenha um difícil acesso à comunidade e não consiga implementar

práticas efetivas de saúde.

Levando em consideração tal distanciamento entre o profissional e a população, discute-se a

importância de se considerar aspectos sociais, econômicos e culturais de uma determinada sociedade. O

acesso aos serviços de saúde estaria, então, diretamente associado a questões sociais. Starfield (1998)

aponta que quanto maiores os recursos sociais dos indivíduos e comunidades, maior a probabilidade de

melhores condições de saúde. Esta autora ainda faz uma relação entre desigualdade econômica e

desigualdade ao acesso à saúde. A APS é defendida como uma possibilidade de redução dos efeitos

decorrentes da desigualdade social. Porém, em decorrência das reformas dos sistemas de saúde em alguns

14

países onde se prioriza a privatização dos serviços, o princípio da eqüidade se encontra comprometido em

decorrência de práticas mercantilistas que levam a exclusão social.

Apesar da difusão dos programas de APS, as políticas mundiais tendem a preconizar

unilateralmente o desenvolvimento econômico em detrimento de políticas sociais. Por isso, torna-se

importante uma avaliação crítica dos programas de APS que estão sendo implantados, para que a relação

custo-benefício não se torne a principal fonte de redução de custos e, consequentemente, haja uma

redução da qualidade dos serviços prestados e um “nivelamento por baixo” das equipes de atenção à

saúde (Paim e Almeida Filho, 1998; Ronzani, 2000; Souza, 1999). Esta avaliação implica uma

reavaliação prática e teórica das políticas públicas para que haja uma nova forma de se atuar, levando em

conta as questões sociais relevantes à sociedade.

Outro fator que deve ser levado em consideração para a implantação dos programas de APS seria

as possíveis conseqüências decorrentes da “Atenção Primitiva à Saúde”, conceito desenvolvido por Testa,

citado por Paim e Almeida Filho (1998), que seria uma política assistencial adotada por países que

dispõem de serviços diferenciados para distintos grupos sociais, e que estão preocupados

fundamentalmente em reduzir os gastos em saúde, organizando serviços de segunda categoria para uma

população considerada inferior. Por isso, a APS, por si só, não garante um acesso de todos aos serviços de

saúde, de forma equânime e de qualidade. É necessária uma planificação de políticas de saúde que sejam

compatíveis aos princípios da APS.

O PSF e a Reforma do Sistema de Saúde no Brasil

Para entendermos como a APS se torna a principal estratégia de melhoria de acesso e eqüidade

na saúde e da reforma dos sistemas de saúde, é importante voltarmos à discussão sobre o conceito de

saúde. Este conceito tem sido rediscutido, ampliando-se o foco do binômio saúde/doença para uma

preocupação com as questões sócio-econômicas e psicológicas envolvidas, também encontradas nesse

processo (Faria, 2000; Ferrara, et al. 1972; OMS, 1978; Paim e Almeida Filho, 1998; Souza, 1999). Desta

forma, as ações referentes à saúde ampliam-se e articulam-se com os vários aspectos da vida da

sociedade.

A Organização Mundial de Saúde discute já há algumas décadas, a redefinição, ou melhor, a

mudança de enfoque a respeito da conceituação de saúde, sendo não somente a ausência de doença mas

como o completo bem-estar físico, mental e social (Faria, 2000; Ferrara, et al. 1972; OMS, 1978; Paim e

Almeida Filho, 1998; Rubin, 1996; Singer, et al. 1981). Tal idéia de saúde leva-nos a pensar na

manutenção de um estado ótimo, que sintetiza a sensação de bem-estar. Saúde, então, deixa de ter a

interpretação de ausência de doença, sendo equivalente a um bem-estar mais amplo. Como decorrência, a

intervenção e a assistência à saúde não podem mais se limitar aos ambientes hospitalares, havendo a

necessidade de ampliação dos campos de atuação, além da articulação com outros setores sociais e a

inserção de outros profissionais para o alcance da promoção à saúde (Ferrara, et al., 1972; Jekel, et

al.1996; Johnson, 1991; Muller Neto, 1991). Todavia, como ressalta Ferrara et al. (1972), tal conceito nos

reporta a uma concepção estática, uma vez que saúde apresenta a equivalência de bem-estar de uma forma

imprecisa. Em decorrência da dificuldade de uma definição clara de “bem-estar”, a conceituação de saúde

15

da OMS apresenta alguns problemas operacionais. Singer et al. (1981), no mesmo raciocínio, discute a

falta de operacionalidade deste novo conceito. Além disso, este autor discute a incapacidade dos serviços

e sistemas de saúde tradicionais em lidarem com tal conceito e resolverem os problemas de saúde de

forma satisfatória.

Apesar de tal problema, a redefinição conceitual apresenta sua importância, uma vez que alguns

países estão procurando promover mudanças nos sistemas de saúde, visando a uma maior eficiência e

eqüidade dos serviços. Porém, ainda existem alguns problemas de planificação e reformas dos sistemas de

saúde no mundo. Especificamente nos países em desenvolvimento, existe uma tendência à

“modernização“ através de investimento de medicina de alta tecnologia, deixando de lado as ações de

atenção primária (Twadle, 1996). A partir de tal fato, existe uma espécie de perpetuação dos quadros de

saúde da população, colocando em segundo plano as ações básicas preventivas e priorizando uma ação

superespecializada, com pouca resolutividade e difícil acesso à população em geral (Campos, 1992;

Campos, 1997a; Campos, 1997b; Costa Neto, 2000; Soares, 2000). Por isso, procura-se cada vez mais

uma reforma dos sistemas de saúde voltadas para a APS.

O PSF é, atualmente, a principal estratégia de APS no Brasil e é até mesmo visto como alavanca

de uma transformação do sistema como um todo. Porém, as Unidades de Saúde da Família (USF) têm-se

expandido sem um controle mais rígido desses serviços. Observa-se uma inadequação da formação dos

profissionais da equipe e uma dissonância entre a política de saúde proposta e o dia-a-dia do profissional.

Além disso, a representação social a respeito do perfil e da prática do profissional de saúde e do seu lugar

na sociedade, implica demandas nem sempre condizentes com aquilo que o PSF pretende oferecer. Em

decorrência de tais fatos, dentre outros, a reforma do sistema de saúde brasileiro tem ocorrido com

algumas características próprias e alguns entraves no que diz respeito principalmente aos serviços de

APS, como discutidos acima. A seguir discutimos como o PSF se configura como estratégia de reforma

do sistema de saúde brasileiro e alguns problemas na sua implantação e expansão.

O Programa Saúde da Família como Estratégia de APS

Em conseqüência dos princípios e das diretrizes do SUS e da difusão das estratégias de Atenção

Primária à Saúde, iniciaram-se esforços para reformular o modelo de atenção à saúde. Neste contexto, o

Programa de Saúde da Família, então, torna-se não apenas uma estratégia de Atenção Primária mas

também de reformulação do modelo assistencial (Faria, 2000; Santos, et al. 2000; Sousa, 2000a;

Vasconcelos, 2000; Viana e Dal Poz, 1998).

Poderíamos dizer que os primórdios do PSF seriam os médicos de família. Em 1963, a OMS

publicou um documento sobre a formação do médico de família. Tal preocupação foi decorrente do

modelo de formação flexneriana, que acarretou na superespecialização e fragmentação da formação

médica (Vasconcelos, 2000). Colocou em questão se a atenção médica tradicional teria realmente

promovido uma melhoria efetiva na saúde da população ou continuava muitas vezes se servindo de um

papel dominador e controlador do corpo e da vida social do sujeito como um todo.

16

Os serviços de saúde, como conseqüência do modelo de formação flexineriano, tornam-se muito

mais produtores de demandas do que um serviço que promova saúde efetivamente (Jekel, et al.1996;

Minayo, 2000). Outro fator bastante discutido por diversos autores é a respeito do interesse corporativo da

medicina tradicional em manter alguns privilégios e interessados muito mais em atender a interesses

econômicos do que a responder às necessidades reais de saúde da população (Minayo, 2000). Contra essa

tendência, surgia a proposta do médico de família, porém ainda pautada no modelo americano de

medicina liberal que, até certo ponto, é uma prática excludente, pois as famílias atendidas dependeriam de

uma capacidade financeira para o pagamento dos honorários do profissional (Vasconcelos, 2000).

A partir de tal influência, mas com adaptações em relação ao modelo americano, alguns

profissionais procuraram trazer diversas experiências da medicina comunitária. Tais experiências, a

princípio, estavam vinculadas principalmente às pastorais da igreja católica e a outros movimentos sociais

emergentes nas décadas de 70 e 80 (Vasconcelos, 2000). A medicina comunitária já demonstrava, então,

uma certa preocupação com as práticas coletivas, mas ainda limitada a ações pontuais e curativas.

Na década de 90, surge um maior enfoque na importância da família e da comunidade na

reorganização dos serviços de saúde. Isto foi inspirado, entre outros, pelo modelo de atenção primária

cubano e pela tendência de aproximar a assistência institucional e a não institucional, construindo redes

de solidariedade primária.

O Governo Federal aponta, então, como principais estratégias de reforma assistencial do sistema

de saúde brasileiro, o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e o Programa de Saúde da

Família (PSF), que propiciaram uma mudança na alocação de recursos financeiros, na organização dos

serviços e na concepção e atenção à saúde. Segundo Viana e Dal Poz (1998), o PSF se constituiria numa

estratégia de reforma incremental3 do sistema de saúde no Brasil. Seu objetivo principal é o de

aprimoramento e consolidação das propostas do SUS (Brasil, 1997). Para tanto, tem havido um

investimento financeiro por parte do Ministério da Saúde no sentido de induzir à implantação do PSF em

todo país (Souza, 2001). Da mesma forma, a partir de 1997, foram estabelecidas as responsabilidades de

cada esfera do Governo e as funções dos profissionais que fazem parte das equipes do PSF (Brasil, 1997).

Podemos notar, já nesse momento, uma atribuição de responsabilidades, principalmente da esfera

municipal, levando a ações muito mais burocráticas e à manutenção do incentivo financeiro do que

propriamente da efetivação do Programa. Além disso, algumas responsabilidades foram pré-estabelecidas

sem a preocupação de que os municípios teriam ou não a capacidade técnica para executá-las (Brasil,

1997).

O PACS foi antecessor do PSF, criado no ano de 1991. Este Programa teve como modelo inicial

as experiências realizadas nos estados do Mato Grosso do Sul, Paraná e Ceará, que tinham como objetivo

principal a diminuição da mortalidade infantil e materna. Tal experiência foi avaliada como satisfatória e

implantada principalmente nos estados das regiões Norte e Nordeste (Souza, 2001). Este programa já

incorporava os princípios de uma maior aproximação com a comunidade e do abandono do enfoque

reducionista da prática médica profissional, incentivando a criação do PSF devido aos bons resultados

obtidos (Viana e Dal Poz, 1998).

Anteriormente à implantação do PSF, existiam basicamente dois modelos de medicina

comunitária. O primeiro, implantado na cidade de Niterói (RJ), chamado de Programa de Médicos de

17

Família, inspirado no modelo cubano, onde não havia Agentes Comunitários de Saúde. O segundo,

implantado na cidade de Porto Alegre (RS), onde se desenvolvia um projeto de saúde comunitária a partir

de práticas de educação em saúde para os profissionais sobre diversos temas e havia já uma adscrição de

área de atuação.

O PSF foi efetivamente implantado no ano de 1994 e expandido para o resto do país. Esse

programa se baseou em experiências de outros países como Canadá, Cuba, Suécia e Inglaterra, porém

levando em consideração características da realidade brasileira (Viana e Dal Poz, 1998).

Aos poucos, o PSF tornou-se um instrumento de reestruturação e reorganização do SUS, que vai

de encontro ao modelo assistencial tradicional. Tal estratégia apresenta alguns princípios baseados nos

pressupostos do SUS, tais como a universalização das ações, porém focalizando a população socialmente

menos favorecida, promovendo ações especiais e diferenciadas. Outro princípio seria o de que é possível

haver práticas focalizadas e, ao mesmo tempo, atender ao caráter de universalidade do SUS e

reformulação da política de saúde como um todo (Brasil, 1996; Brasil, 2000; Vasconcelos, 2000; Viana e

Dal Poz, 1998). O PSF se apresenta como uma estratégia assistencial em que a família e o seu meio social

são o foco de ação. Esta estratégia apresenta as seguintes diretrizes e características básicas: o PSF é a

porta de entrada para o sistema de saúde; visa à integralidade dos níveis de atenção; existe uma definição

do território a ser atendido a partir do critério populacional; as ações devem ser realizadas numa relação

multiprofissional (Souza, 2001).

É bastante clara a tentativa de reorganização do sistema de saúde, de transposição dos modelos

tradicionais e da mudança na prática profissional a partir do PSF:

A diferença vai muito além do nome. Enquanto os postos e centros de saúde

tradicionais adotam um modelo passivo de atenção, limitados a encaminhar doentes

para os centros especializados ou para o hospital mais próximo, as Equipes de

Saúde da Família (ESF), em atividade nas Unidades de Saúde da Família (USF),

identificam os problemas e necessidades das famílias e da comunidade, planejando,

priorizando e organizando o atendimento (Brasil, 2001, p. 5). Sobre a caracterização das ações das Equipes, o Ministério da Saúde aponta:

Mais ainda, as ESF dispõem de meios e profissionais capazes de resolver a maioria dos problemas de

saúde ali mesmo, na USF. Quando necessário, as ESF realizam atendimento no próprio domicílio. Só

os casos excepcionais, que representam menos de 15% do total atendido pelas USF bem instaladas,

são encaminhados para as unidades onde haja profissionais especializados e equipamentos mais

sofisticados (Brasil, 2001. p.5).

Podemos observar na descrição acima, que o PSF se torna uma prática ampla e complexa,

necessitando de uma equipe com um preparo técnico bastante diversificado. Realidade ainda pouco

possível em função de uma ambigüidade em relação à formação — formação esta entendida como as

ações formais, mas também pelas relações acadêmicas, grupos e instituições informais —, currículo

acadêmico atual dos profissionais de saúde e a demanda de trabalho como proposto e os entraves políticos

que passam desde a esfera federal até as esferas municipais (Costa Neto, 2000; Ronzani, 2000).

18

Outro problema a ser observado em relação à implantação do PSF como estratégia de reforma do

sistema de saúde brasileiro seria a contradição entre os princípios que regem suas ações e sua

operacionalização. Como já foi dito, o PSF apresenta como objetivo geral a mudança do antigo modelo de

atenção à população com a inversão da lógica no modelo de atenção primária vigente. Porém, este

modelo tem causado alguns problemas na questão da restrição ao acesso a esses serviços com a

justificativa de manutenção da qualidade prestada. Desta forma, torna-se conflituosa a proposta de

mudança de paradigmas assistenciais e o princípio básico do SUS que seria a universalidade de acesso. O

PSF apresenta ainda problemas de efetividade social, uma vez que tem seu território de ação ainda

restritos e competindo com os modelos tradicionais ainda preponderantes (Pinheiro, 2001). Além do mais,

observamos que a implantação do PSF é ainda bastante heterogênea, servindo de manobras eleitoreiras

ou de apenas mais uma fonte de renda para os municípios, sem mudar a lógica de saúde como proposta.

Sendo assim, as características do PSF dependerão da perspectiva política dos administradores municipais

(Ronzani, 2001), correndo o risco de uma atomização da estratégia de PSF e, conseqüentemente, havendo

uma reprodução dos atuais problemas da política de saúde brasileira, como aponta Sousa (2000b):

ineficiência, iniqüidade, pouca resolutividade, insatisfação profissional e das famílias/comunidades.

Atualmente, a política de saúde brasileira tem dado grande enfoque à regionalização e à

hierarquização de ações de acordo com a complexidade. A Norma Operacional de Assistência à Saúde de

2002 (NOAS 01/02), estabelece uma classificação de municípios através do Plano Diretor de

Regionalização (PDR), de acordo com os níveis de complexidade dos serviços de saúde e com critérios

populacionais. Mais uma vez foi um projeto que não avaliou as realidades de cada região do país,

havendo uma dificuldade na sua execução. A partir da NOAS, há uma centralização de alguns

procedimentos em municípios pólo, que não têm condições de infra-estrutura para receber usuários de

outros municípios e nega a estrutura existente em algumas cidades ou regiões. Observa-se uma

priorização para a criação de novas Equipes de PSF nos municípios de médio e pequeno porte, porém não

se discutem as mudanças e ajustes necessários para minimizar os problemas já existentes (Brasil, 2002).

Além disso, as mudanças no sistema de saúde brasileiro estão sendo propostas, como no caso do PSF,

sem serem devidamente discutidas pelas escolas de saúde pública ou outros órgãos de formação

profissional, como os pólos de capacitação existentes em todo o país, fazendo com que elas sejam

igualmente vistas de forma totalmente céticas ou acríticas, como afirma Almeida Filho (1997) e Campos

(1997b).

19

Considerações Finais

Procuramos, a partir dessa revisão bibliográfica, levantar alguns questionamentos a respeito da

efetivação da política de saúde brasileira atual, com o objetivo de problematizarmos e deixar mais claros

alguns possíveis entraves para a efetivação do PSF. Enquanto não se discutir de forma ampla as questões

levantadas nesse artigo, já discutida por outros autores, continuaremos a escutar o discurso oficial de

priorização da APS, porém com um crescimento apenas quantitativo dessa estratégia. Sabemos que o PSF

é uma estratégia implantada há poucos anos e que seu aprimoramento também depende do fator tempo.

Entretanto, é preciso que se levantem e se discutam seus problemas para que esta estratégia não se perca

no tempo e caia no descrédito tanto dos profissionais e, principalmente, da população em geral.

Concluindo, avaliamos que o PSF é uma proposta com potencial para promover algumas

mudanças na situação de saúde da população, mas que passa por problemas como a formação de recursos

humanos e a confusão freqüente a respeito dos seus pressupostos, dentre outros. Assim, postulamos que

há uma dissonância entre a proposta assistencial e a sua efetivação prática, favorecendo a reprodução de

antigos modelos.

Procuramos, dessa forma, contribuir para que as ações em saúde coletiva se desenvolvam cada

vez mais e que possibilitem o objetivo último das pessoas envolvidas no estudo dos fenômenos sociais

brasileiros: a conquista da dignidade de nossa população.

NOTAS

1. O presente artigo é parte da Dissertação de Mestrado em Psicologia Social da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

2. Os autores fazem uma divisão de quatro funções principais dos sistemas de saúde nos países. É através destas funções que eles analisam as políticas adotadas nos países . As quatro funções são: 1) modulação: projeto, implementação e monitoramento do andamento do sistema de saúde; 2) financiamento: mobilização de dinheiro para recursos; 3) oferecimento: seria o funcionamento dos serviços; 4) articulação: organização e gerenciamento dos cuidados de saúde.

3. Merece destaque este princípio pela controvérsia e discussão a respeito deste conceito. O objetivo da descentralização seria o da democratização do Estado, acarretando maior justiça social e maior controle da população e esferas locais. A descentralização se tornou um conceito estático e com uma conotação positiva do termo. Deve-se discutir porém, que descentralização, por si só não apresenta características boas ou más. Sabe-se de muitas confusões a respeito do termo, principalmente no que se refere às políticas de descentralização de alguns municípios, onde se confunde com freqüência a descentralização com “prefeiturização”, baseada em uma política de autoritarismo, falta de participação popular e democratização dos serviços. A caracterização do processo de descentralização dependerá das estratégias políticas e sociais a serem tomadas pelo município. Para que um programa de APS seja efetivo, é preciso que haja um processo de descentralização democrático, participativo e com capacidades para tomadas de decisão mais adequadas à realidade sócio-histórico-cultural de uma determinada comunidade (Muller Neto, 1991; Stein, 1997). Outro ponto muito bem discutido por Luz (2001) é que o processo de desresponsabilização da saúde vem ocorrendo no Brasil de uma forma de uma descentralização das obrigações do Estado mas, ao mesmo tempo, uma centralização de recursos, havendo uma responsabilização excessiva sobre os municípios sem que estes tenham um respaldo técnico-financeiro para tal.

4. Segundo tais autores, a reforma incremental seria pequenos ajustes sucessivos do sistema de saúde, diferenciando-se do que eles denominam de reforma big-bang, que seria mudanças expressivas e significativas no funcionamento dos sistemas de saúde, de forma rápida e pontual.

20

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Submissão: junho de 2003 Aprovação: novembro de 2003

LER/DORT: UM GRAVE PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA QUE ACOMETE

OS CIRURGIÕES-DENTISTAS

REL/WROD: A serious public health problem that attacks Dentist

Mônica Andrade Araújo *

Marcos Vinicius Queiroz de Paula**

RESUMO

As Lesões por Esforços Repetitivos (LER) ou Distúrbios Osteomusculares

Relacionados ao Trabalho (DORT) são consideradas um problema de saúde pública

pela alta prevalência em diversas profissões. Representam a conseqüência tardia do

mau uso crônico de um delicado conjunto mecânico, que é o membro superior. É

uma patologia de difícil diagnóstico e tratamento, apresentando um alto índice de

recidiva. A melhor forma de controlá-la é através dos programas de prevenção. Os

Cirurgiões-Dentistas estão no grupo de riscos das LER/DORT. Devem se organizar

no trabalho, seguindo as normas ergonômicas adequadas, proporcionando maior

conforto e, conseqüentemente, aumento da sua vida profissional. Devem adotar um

estilo de vida com atividades físicas, evitando o sedentarismo, observar as correções

posturais e tomar atitudes que favoreçam uma vida mais saudável, com maior e

melhor rendimento profissional. Através da revisão bibliográfica, buscamos

aprofundar o conhecimento sobre as LER/DORT, enfatizando as principais etiologias

e as possíveis formas de prevenção.

Palavras-chaves: lesões de esforços repetitivos, distúrbios osteomusculares

relacionados ao trabalho, saúde pública.

ABSTRACT

Repetitious Effort Lesions (REL) or Work Related Osteomuscular Disturbances

(WROD) are considered to be a serious public health problem due to their high

prevalence in different professional fields. This represents a late consequence of

chronic bad use of a delicate mechanical joint, which is the upper limb. Its

pathology is of difficult diagnosis and treatments and presents high level of

recurrence. The use of prevention programs is the best way to control it. Dentist

belongs to the REL/WROD hazard group. Professionals should organize

themselves and follow adequate ergonomics posture, which provide better comfort,

consequently creating a longer professional life span. Dentists should be physically

active, avoiding a sedentary lifestyle, observe correct posture and have a healthy

life attitude which results in better professional gains. This revision study aims to

further knowledge about REL/WROD, emphasize principal etiologies and possible

prevention methods.

Key words: Repetitious effort lesion, work related osteomuscular disturbances,

public health

___________________________________________________________________

*Especialista em Saúde Coletiva pela Faculdade Odontologia/UFJF

** Prof. Adjunto do Dep.Clínica Odontológica da Faculdade de Odontologia/UFJF

------------------------------------------------------------------------------------------------------

INTRODUÇÃO

A Odontologia é uma profissão rica em oportunidades sob o aspecto da

satisfação pessoal e profissional. Entretanto, atualmente, tem sido considerada uma

profissão estressante, constantemente associada a agravos à saúde (Caldeira-Silva et

al., 2000; Helfenstein & Feldman, 2001).

Nesta profissão, segundo Medeiros & Riul (1994), o Cirurgião-Dentista está

exposto a vários riscos associados a diversos agentes presentes no ambiente de

trabalho, tais como: agentes biológicos (fungos, bactérias, vírus); químicos

(mercúrio, gases, poeira); físicos (ruído, iluminação, radiação, temperatura,

ventilação, instrumentos de corte e abrasão); mecânicos (posturas de trabalho

incorretas, movimentos repetitivos prolongados); psíquicos (ritmo e intensidade das

tarefas, metas de produtividade, insatisfação social e pessoal).

As Lesões por Esforços Repetitivos (LER) ou Distúrbios Osteomusculares

Relacionados ao Trabalho (DORT) são relacionados como a segunda causa de

morbidade na população adulta em vários países, inclusive no Brasil (Freeman et al.,

1995a). Os Cirurgiões-Dentistas estão entre os profissionais mais acometidos por

estas doenças, assim como os bancários, jornalistas, digitadores, enfermeiros,

secretários, laboratoristas, escritores (Luduvig, 1998). Estas lesões atingem os

profissionais da Odontologia devido às características de suas atividades, pois

trabalham constantemente em posturas inadequadas, sem períodos de repouso e sob

forte tensão emocional. As LER/DORT, que estão freqüentemente associadas ao

exercício da Odontologia, são as seguintes: Cervicobraquialgia, Ombro Doloroso,

Síndrome do Desfiladeiro Torácico, Epicondilite Lateral, Síndrome do Túnel do

Carpo, Tenossinovite de Quervain (Lazeris et al., 1999).

O interesse crescente pelo assunto, na realidade, é a constatação

contemporânea de um fenômeno antigo (Regis Filho & Lopes, 1997). Atualmente,

tornou-se um problema de saúde pública, devido ao aumento significativo do número

de casos. Esta patologia pode levar o profissional àincapacitação temporária ou até

mesmo permanente (Santana et al., 1998; Rio, 2000; Santos Filho & Barreto, 2002).

A maioria dos Cirurgiões-Dentistas não têm conhecimento a respeito desta

doença e desconhecem os riscos e implicações a que estão sujeitos, por isso são

necessários estudos a respeito do assunto, enfatizando o lado preventivo que é de

fundamental importância nestas condições.

1. DEFINIÇÃO E NOMENCLATURA

Segundo Helfenstein & Feldman (2001), Lesões por Esforços Repetitivos

(LER) não são uma doença ou uma entidade nosológica. Na realidade, as LER

representam um conjunto heterogêneo de afecções do sistema músculo-esquelético

que estão relacionadas ao ambiente de trabalho.

Há uma vasta nomenclatura na literatura para intitular as LER: Distúrbios ou

Desordens por Trauma Cumulativo, Síndrome da Sobrecarga Ocupacional, Síndrome

do Esforço Repetitivo, Distúrbios Músculo-Esqueléticos Ocupacionais, Síndrome

Ombro-Braço, Síndrome do Membro Superior, Síndrome Cervicobraquial

Ocupacional, Síndrome da Hipersolicitação, Síndrome da Dor Crônica do Membro

Superior, Injúrias por Uso Repetitivo, Lesões de Sobrecarga Ocupacional, Injúrias

Ocupacionais de Esforço de Repetição, Distúrbios do Membro Superior

Relacionados ao Trabalho.

Adotou-se, recentemente, no Brasil, o termo DORT (Distúrbios

Osteomusculares Relacionados ao Trabalho), mais adequado, substituindo o termo

LER, pois engloba vários outros estados dolorosos, sem a necessária presença da

lesão tecidual; porém ainda não é satisfatório, pois as afecções ósseas ocupacionais

são quase todas exclusivas dos "acidentes" de trabalho, excluindo os distúrbios

ligamentares e as neuropatias periféricas.

Alguns consideram como LER/DORT apenas as enfermidades da coluna

cervical, cintura escapular e membros superiores, excluindo outros segmentos do

corpo; entretanto, deve ser considerado qualquer distúrbio que seguramente esteja

relacionado ao trabalho, independente do local afetado.

Lima (2001) considerou a LER como um conjunto de doenças que acometem os

nervos, músculos e tendões juntos ou separadamente. Apresenta característica

degenerativa e cumulativa e é sempre precedida de dor ou incômodo. Quando a

origem da LER for uma atividade ocupacional, denomina-se DORT.

2. ASPECTOS HISTÓRICOS

Síndromes neurológicas comportamentais, doenças inflamatórias tendíneas e

dores musculares relacionadas à sobrecarga mecânica no trabalho têm sido relatadas

na literatura desde o início do século XVIII. Dr. Bernardino Ramazzini, considerado

pai da medicina ocupacional, realizou a primeira contribuição histórica em 1713,

escrevendo o livro DE MORBIS ARTIFICUM DIATRIBA (versão inglesa: Doença

dos Trabalhadores), baseado em estudo de 54 profissões de sua época. Identificou os

distúrbios e traçou uma causa ocupacional para eles. Acreditava que lesões

encontradas em escreventes eram causadas pelo uso repetitivo das mãos, pela

posição das cadeiras e pelo trabalho mental excessivo. No início do século XIX, essa

condição ficou conhecida como "paralisia do escrivão" e, posteriormente, como

"câimbra do escrevente". Nesse período, surgiram várias outras "câimbras

ocupacionais" para justificar o quadro de dor, parestesias, sensação de peso e fadiga

nos braços, acompanhados de dor lombar e cervical. William Gowers denominou

essa condição de "neurose ocupacional". Em 1833, foi documentada a primeira

epidemia de "câimbra do escrevente" no serviço britânico civil, tendo sido atribuída à

introdução de uma pena de aço. Entre 1960 e 1980, houve uma epidemia de LER no

Japão. Na Austrália, no início dos anos 70, começaram a aparecer descrições

periódicas de sintomas. Houve um grande e progressivo aumento do número de

diagnósticos. O termo "tenossinovite" passou a ser utilizado por muitos como dor ou

desconforto nos membros superiores relacionados ao ambiente de trabalho. Na

metade dos anos 80, já era considerada uma "Epidemia Australiana" e representou o

maior problema de saúde pública da Austrália (Helfenstein & Feldman, 2001).

No Brasil, as estatísticas dessa patologia são deficientes, porém o número de

diagnósticos é bastante significativo, e o país vive uma situação epidêmica com

relação às LER. Em Belo Horizonte, de 1985 a 1988, houve um aumento na

prevalência de 1% para 40%, sendo o sexo feminino responsável por 76% dos casos

novos. Em São Paulo, entre 1985 e 1992, a estimativa de casos diagnosticados foi de

mais de 20.000. Os principais fatores que contribuem para o aumento do número das

LER no Brasil são: falta de organização no local de trabalho, insatisfação no

trabalho, despreparo de médicos e de outros profissionais envolvidos, influência da

ação de sindicatos, ações políticas, sistema trabalhista permissivo, fatores

psicológicos e sociais, ou seja, condições laborativas inadequadas associadas a vários

fatores não-ocupacionais (Helfenstein & Feldman, 2001).

3. ETIOLOGIA

A etiologia deste conjunto de afecções é desconhecida. De uma maneira geral,

os fatores etiológicos na organização do trabalho podem ser assim resumidos:

desrespeito aos fatores ergonômicos e antropométricos (equipamentos, acessórios,

mobiliários, posicionamentos, distâncias); excesso de jornadas; falta de intervalos

apropriados; técnicas incorretas; posturas indevidas; força excessiva na execução de

tarefas; sobrecarga estática; sobrecarga dinâmica.

Matta & Zacaron (1997) relataram, baseando em pesquisas, que um em cada

dois Cirurgiões-Dentistas tem alguma patologia na coluna lombar, decorrentes de

problemas posturais ocupacionais. Descreveram as diferentes posturas de trabalho

adotadas por estes profissionais ao longo dos anos. A primeira posição foi em pé, ao

lado da cadeira, com o paciente sentado. Nesta posição, há uma sobrecarga nos

tendões, ligamentos, músculos e articulações, surgimento de varizes, há aumento dos

batimentos cardíacos, sobrecarga do sistema circulatório, pois o peso do corpo fica

distribuído de maneira desigual, fazendo com que o profissional adote posições

incorretas que ocasionam sérios danos à coluna vertebral. Com o surgimento do

mocho (cadeira auxiliar), o Cirurgião-Dentista passou a adotar a posição sentada,

porém ainda em condições desfavoráveis, pois o equipamento odontológico não era

ergonomicamente adequado. Posteriormente, o aperfeiçoamento das cadeiras e dos

equipamentos permitiu que o profissional alcançasse uma postura de trabalho mais

adequada, diminuindo os esforços musculares e da coluna.

Regis Filho & Lopes (1997) realizaram uma revisão bibliográfica, na qual

constataram que houve aumento na incidência de casos de LER nos últimos anos.

Como etiologia para o aparecimento desta doença, são citados alguns fatores:

atividades profissionais que exijam força excessiva e/ou repetição de um mesmo

padrão de movimento; defeitos posturais; atividades domésticas e atividades

esportivas que exijam grande esforço dos membros superiores.

Tagliavin et al. (1998) relataram que, à medida que o trabalho torna-se mais

dependente da técnica, aumentou o número de acidentes e doenças ocupacionais,

sendo o Cirurgião-Dentista um dos profissionais expostos a elevado risco de contrair

essas doenças do trabalho. Além da má postura, de falhas na ergonomia, os fatores

psicológicos influenciam os acometimentos de dor e desconforto. Pescoço, ombros e

costas são regiões bastante acometidas pelas lesões na classe odontológica, quando

comparados com outros grupos profissionais também sujeitos a doenças

ocupacionais. Os autores observaram que os Cirurgiões-Dentistas se preocupam

muito com a qualidade de seu trabalho em detrimento da preocupação com a postura,

com a ergonomia; daí ocorrerem diversas alterações patológicas.

Caldeira-Silva et al. (2000) constataram que a maioria das LER/DORT é

ocasionada por agentes mecânicos provenientes do esforço físico despendido nos

procedimentos realizados pelo Cirurgião-Dentista. Esforço físico que é empregado

principalmente para manter determinadas posições e posturas de trabalho. Relataram

que o processo de industrialização, ocorrido nos últimos séculos, provocou inúmeras

mudanças no mundo do trabalho, sendo uma delas o aumento significativo do

número de casos de LER/DORT. Alguns fatores podem estar relacionados a este

fato: mecanização, informatização e automação dos sistemas de produção e melhor

conhecimento da sintomatologia e técnicas diagnósticas das LER/DORT.

Barreto (2001) observou que os distúrbios osteomusculares também se

manifestam com a utilização de instrumentos rotatórios, pois a constante vibração

gerada pelos micromotores pode se propagar pelos tendões, músculos e ossos,

gerando micro lesões.

Lalumandier & McPhee (2001) citaram os principais fatores de risco

associados com as Desordens Traumáticas Cumulativas (DTC), tais como: repetição,

força excessiva, postura inadequada, pressão direta, vibração, postura restritiva por

longo tempo. Relataram que os profissionais da Odontologia estão entre os que mais

são acometidos pelas DTC nas mãos.

4. ESTRESSE E LER/DORT

Diversos autores relataram que a prática odontológica tem sido considerada

como a mais estressante entre as profissões de saúde. Um número cada vez maior de

Cirurgiões-Dentistas tem sofrido com doenças de ordem física e mental e acredita-se

que isto seja conseqüência do estresse ocupacional. Estudos sugerem que esse

estresse se deve às pressões relacionadas com o tempo, sobrecarga de trabalho,

preocupações financeiras, problemas com funcionários, defeito de equipamentos,

condições deficientes de trabalho e a sua natureza monótona. Recomendam que é

fundamental o profissional reconhecer os fatores desencadeantes do estresse e os

meios de controle (Freeman et al., 1995b; Luduvig, 1998; Santana et al.,1998).

Michelin et al. (2000) constataram que a insatisfação com o trabalho, a tensão

social da época atual, a tensão emocional e o estresse contribuem sobremaneira para

o surgimento do DORT.

O médico do trabalho e ergonomista Rodrigo Pires do Rio, em entrevista ao

Jornal do CROMG (2002), relatou sobre sua monografia "Levantamento de estresse

psíquico (distresse) em dentistas da cidade de BH", onde verificou que 55% dos

profissionais entrevistados estavam em um nível intenso de estresse, atribuído

principalmente à questão financeira, mas também a uma dificuldade de

relacionamento interpessoal dentro e fora do trabalho, elevado desconforto físico e

frustração de expectativas profissionais.

5. PERFIL EPIDEMIOLÓGICO

Regis Filho & Lopes (1997) realizaram uma pesquisa, na cidade de

Florianópolis-SC, junto a ex-alunos do curso de graduação em Odontologia da

Universidade Federal de Santa Catarina para verificar o perfil epidemiológico em

relação à incidência de "Lesões por Esforço Repetitivo" (LER) sob o enfoque

ergonômico. Observaram que um baixo número de profissionais acometidos pela

doença realizou algum tipo de tratamento. Constataram que as LER são um problema

de saúde pública, pois afetam diversos grupos profissionais e em grande número,

levando à incapacidade temporária ou até mesmo permanente. De acordo com

Oliveira (1991), citado pelos autores, pessoas que executam tarefas altamente

repetitivas e forçadas têm 29 vezes mais risco de contrairem tendinite em punhos e

mãos.

Caldeira-Silva et al. (2000) declararam que os distúrbios ósseos, musculares e

das articulações se transformaram numa verdadeira epidemia nas últimas décadas do

século XX. Em pesquisa realizada pelos autores no 18° Congresso Internacional de

Odontologia de São Paulo, em 1998, a dor e as incapacidades funcionais foram as

queixas mais comuns. Dos Cirurgiões-Dentistas entrevistados, 31,9% referiram

algum sintoma, sendo que desses, 17% indicaram diagnósticos relacionados às

LER/DORT. As regiões mais acometidas foram membros superiores e coluna

vertebral, o que está de acordo com a maioria dos estudos epidemiológicos.

Michelin et al. (2000) realizaram uma pesquisa com 36 Cirurgiões-Dentistas

docentes da Faculdade de Odontologia da Universidade de Passo Fundo para avaliar

o perfil epidemiológico dos Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho

(DORT). Adotaram como metodologia a utilização de um questionário que procurou

levantar aspectos quantitativos e qualitativos, sendo algumas questões relacionadas

ao tempo de atividade profissional, jornada de trabalho semanal, especialidade

odontológica de atuação, questões específicas, tais como a presença de distúrbios nas

articulações dos dedos, ombro, pescoço e outras regiões. Obtiveram como resultado

uma alta prevalência de relatos de freqüentes problemas de dores lombares,

desconforto no pescoço e ombro, além de dores nos quadris, pernas, pulsos e mãos.

31% dos Cirurgiões-Dentistas apresentavam problemas na região lombar, 27% na

região cervical, 23% no ombro e 17% no pulso. 23% dos profissionais com mais de

quarenta horas semanais de trabalho apresentaram alguma alteração nas regiões de

pescoço, pulso, cotovelo e ombro.

Lalumandier & McPhee (2001) realizaram um estudo sobre a prevalência e

fatores de risco associados a problemas nas mãos e Síndrome do Túnel do Carpo em

higienistas dentais. Constataram que tem aumentado o número de Desordens

Traumáticas Cumulativas (DTC) nos Estados Unidos da América, país que utiliza

um grande número destes profissionais.

Rio (2000), em entrevista ao Jornal do CROMG, relatou sobre sua monografia:

"Estudo de dor crônica, relacionada ao trabalho em dentistas da cidade de Belo

Horizonte". A autora realizou uma pesquisa com 100 Cirurgiões-Dentistas da capital

mineira e constatou que os mesmos têm carga horária semanal elevada, não sobrando

tempo para outras atividades. Constatou que 86% dos Cirurgiões-Dentistas

entrevistados tiveram algum sintoma nos últimos 6 meses nos seguintes membros:

pescoço/região cervical, mãos/punho, ombros, região lombar, região tóraco-dorsal e

cotovelos. Dos entrevistados que relataram algum sintoma, 96,5% atribuíram este

fato à carga de trabalho.

Santos Filho & Barreto (2002) realizaram um estudo da prevalência de dor

osteomuscular e fatores associados ao sintoma em 388 Cirurgiões-Dentistas da rede

pública da cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais. Obtiveram como resultado uma

taxa de 58% de Cirurgiões-Dentistas que apresentaram dor músculo-esquelética no

segmento superior, sendo 22% no braço, 21% na coluna, 20% no pescoço e 17% no

ombro. 26% relataram dor diária, 40% dor moderada ou forte, 77% de dor crônica.

Além da dor, a maioria apresentou outro sintoma associado como dormência,

sudorese e redução de força muscular.

5.1- SINTOMAS

Os sintomas mais freqüentes relatados pelos Cirurgiões-Dentistas acometidos

pela LER/DORT são: dor na coluna vertebral (Matta & Zacaron, 1997; Poi et al.,

1999; Barreto, 2001; Durante & Vilela, 2001; Lima, 2001; Santos Filho & Barreto,

2002); dor no pescoço e ombros (Poi et al., 1999; Durante & Vilela, 2001; Santos

Filho & Barreto, 2002) e inflamações nos tendões (Lopes & Villanacci Neto, 1994;

Matta & Zacaron, 1997; Poi et al., 1999; Durante & Vilela, 2001; Santos Filho &

Barreto, 2002).

A dor noturna foi descrita por Lopes & Villanacci Neto (1994); a dor nas pernas

e nos pés por Matta & Zacaron (1997); nos quadris, joelhos e tornozelos por Poi et

al. (1999) e são sintomas comuns aos profissionais que trabalham constantemente

com posturas deficientes (Barreto, 2001).

De acordo com Lima (2001), os indícios de uma eventual lesão podem ser:

sensação de peso, dormência, dor em movimento específico, perda de sensibilidade,

formigamento, dor generalizada ao repouso, perda de força e inchaço.

5.2- SEXO

De acordo com os resultados encontrados nas pesquisas realizadas, o sexo

feminino foi o mais acometido pelas LER (Lopes & Villanacci Neto, 1994; Regis

Filho & Lopes, 1997; Lazeris et al.,1999; Santana et al.,1998).

Durante & Vilela (2001) e Sato (2001) verificaram que vários são os fatores

predisponentes para o desenvolvimento destas lesões nas mulheres, tais como: tarefas

domésticas após o trabalho, musculatura mais frágil, uso de anticoncepcionais,

menor densidade e tamanho dos ossos; porém, ainda não houve um estudo profundo

sobre o assunto.

5.3- FAIXA ETÁRIA

Lopes & Villanacci Neto (1994) não chegaram a um dado específico quanto à

faixa etária; verificaram que o distúrbio acomete profissionais na faixa de idade

produtiva.

No estudo realizado por Santana et al. (1998) a faixa etária mais acometida por

esta patologia foi a de 27-34 anos.

Durante & Vilela (2001) observaram que existe uma maior predisponibilidade

de ocorrer a doença em Cirurgiões-Dentistas com idade entre 41 e 60 anos,

discordando da literatura estudada que relaciona a maior incidência com a faixa

etária em torno dos 30 anos.

6. PREVENÇÃO

Poi et al.(1999) constataram que a maioria dos Cirurgiões-Dentistas é

portadora de algum tipo de doença ocupacional, tratando-se de um acometimento

sério e preocupante.

Estudos sobre a doença definem a prevenção como a melhor medida para

evitá-la e o primeiro passo é realizar constantemente o auto-exame, observando

possíveis mudanças nos hábitos rotineiros (Ribeiro, 2002).

Sato (2001) afirmou que a prevenção é um aspecto bastante importante e, em

virtude da causalidade das LER/DORT, não se tem dúvida de que é a organização do

trabalho que deve ser modificada, principalmente a relação trabalhador-trabalho e

que a educação em saúde é uma outra prática que precisa ser estimulada junto às

populações de risco.

As ações preventivas a LER/DORT adotadas pelos profissionais irão

propiciar uma melhora na sua qualidade de vida. Os autores consultados

recomendam:

1)- Alternância entre períodos de esforço muscular (Lopes & Villanacci Neto,1994;

Caldeira-Silva et al., 2000; Helfenstein & Feldman, 2001; Sato, 2001; Barreto, 2001)

e alternância de tarefas que exijam maior e menor esforço (Lima, 2001).

2)- Evitar ficar em posição estática por um período de tempo prolongado (Lopes &

Villanacci Neto,1994; Lima, 2001; Sato, 2001).

3)- Evitar forças e movimentos repetitivos (Lopes & Villanacci Neto,1994;)

4)- Adotar posturas ergonômicas corretas:

a- Manter as articulações numa posição neutra e os membros próximos ao

corpo; evitar a flexão da coluna vertebral para frente; prevenir a exaustão

muscular; executar paradas curtas com freqüência (Caldeira-Silva et al.,

2000); manter, sempre que possível, os punhos em posição neutra, isto é,

estirados (Lopes & Villanacci Neto, 1994).

b- Quanto à posição de trabalho do profissional, depende principalmente da

característica do operador, da superfície dentária e da região da arcada a ser

realizado o procedimento e do tipo de visão adotada pelo operador. Estes

fatores provocam discussão na literatura, pois alguns autores sugerem que o

profissional trabalhe assentado na posição de 9h, outros na de 12h, não se

chegando a um consenso quanto a melhor posição a ser adotada. Quanto à

posição do paciente, a maioria dos estudos preconiza que o paciente deve

estar na posição supina para a maior parte dos procedimentos (Caldeira-Silva

et al., 2000; Helfenstein & Feldman, 2001).

c- Reduzir a velocidade e a força compressiva dos instrumentos manuais (Lopes

& Villanacci Neto,1994).

d- Rio (2000) fez recomendações aos profissionais quanto à escolha dos

equipamentos mais ergonomicamente adequados, observando sempre alguns

itens importantes como a cadeira do paciente, o mocho odontológico, o

equipo e o armário odontológico, dentre outros.

e- Utilização de meias de média compressão para prevenção de varizes

(Barreto,2001).

f- Evitar o uso de luvas que apertam o punho (Ribeiro, 2002).

Além destas medidas preventivas, Matta & Zacaron (1997) recomendam aos

Cirurgiões-Dentistas incluirem em sua rotina diária exercícios de relaxamento que

têm como objetivo aliviar a dor e a tensão muscular, manter a amplitude de

movimento e manutenção do equilíbrio muscular (Regis Filho & Lopes, 1997;

Tagliavin et al.,1998; Helfenstein & Feldman, 2001; Lima, 2001; Barreto 2001;

Ribeiro, 2002).

Os exercícios de alongamento têm como objetivo obter flexibilidade das

articulações dos ombros, cotovelos, punhos e dedos, melhorar a circulação, soltar as

áreas tensas, preservando a saúde e possibilitando maior qualidade de vida dos seus

praticantes (Poi et al.,1999).

Michelin et al. (2000) recomendaram ao profissional evitar o sedentarismo e

realizar atividades físicas. Constataram que o DORT é considerado um dos maiores

problemas de saúde ocupacional. Observaram que fatores psicossociais são tão

importantes quanto os fatores físicos no desenvolvimento, exacerbação ou aceleração

desses distúrbios.

No caso dos sintomas persistirem, deve-se procurar orientação médica, pois

estes problemas podem causar o afastamento do Cirurgião-Dentista de suas tarefas

(Barreto, 2001).

7. DIAGNÓSTICO

Lopes & Villanacci Neto (1994) fizeram uma descrição dos procedimentos

diagnósticos, determinando que se faça diagnóstico diferencial da Síndrome do Túnel

Carpal com as seguintes síndromes: Síndrome do Desfiladeiro Toráxico, Síndrome

do Supinador, Síndrome do Pronador Redondo, Síndrome do Túnel Cubital e

Síndrome do Túnel Guyon que apresentam características clínicas semelhantes à

Síndrome do Túnel Carpal.

Lech et al. (1998), entrevistando um médico especialista em cirurgia do membro

superior, verificou que o diagnóstico da LER/DORT (Lesão por Esforço

Repetitivo/Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho) é clínico, com dados

de queixas do paciente, exame físico especializado e exames laboratoriais. O

profissional deve conhecer as condições de trabalho do paciente. Não é um

diagnóstico preciso, pois estas lesões podem ser confundidas com outras patologias.

Luduvig (1998) determinou como sendo de vital importância o diagnóstico

precoce da doença, pois quanto mais tempo demorar a ser descoberta e tratada, mais

prejudicada ficam as atividades diárias do profissional.

8. TRATAMENTO

Lazeris et al. (1999) citaram os tipos de tratamento a que os Cirurgiões-Dentistas

acometidos pela doença mais utilizaram, tais como: fisioterapia, massagem,

imobilização, uso de antiinflamatórios e repouso.

A conduta de tratamento inicia-se com um tratamento conservador, afastando o

profissional da atividade de esforço repetitivo, medicação analgésica e

antiinflamatória, fisioterapia, reforço muscular, orientações preventivas e gerais

sobre a organização do trabalho. E, em alguns casos, o tratamento cirúrgico é

indicado. O prazo médio para o tratamento e cura da doença não pode ser

determinado, pois depende da resposta individual ao tratamento, que deve ser

intensivo, com uma equipe multidisciplinar para que o problema não se torne crônico

(Lech et al.,1998).

Segundo Luduvig (1998), no tratamento das LER/DORT necessita-se de uma

equipe multiprofissional composta por médicos que identificam o problema e

coordenam o tratamento; fisioterapeuta responsável pela aplicação de exercícios para

reabilitar movimentos comprometidos; terapeuta ocupacional responsável pela

adaptação do local de trabalho ao tipo físico da pessoa e psicólogo ou psiquiatra que

tenta detectar a causa de fatores como angústia e ansiedade no trabalho.

Como tratamento para estes casos, Barreto (2001) indicou a diminuição ou

neutralização temporária da ação dos músculos muito exigidos associado à aplicação

de gelo e realização de exercícios de alongamento.

Helfenstein & Feldman (2001) relataram tratamentos dos distúrbios mais

freqüentes, enfatizando que estes podem ser farmacológicos, com a utilização de

analgésicos, antiinflamatórios, antidepressivos, ou não-farmacológicos, através de

acupuntura, exercícios, terapia psicológica.

9. RELAÇÃO LER/DORT – TRABALHO

Sato (2001) considerou que as LER constituem um objeto para a saúde do

trabalhador, já que demandam o equacionamento e a resolução de diversos

problemas e são, com isto, um pretexto para o avanço da construção desse campo de

conhecimento. Destacou, em primeiro lugar, que estas lesões não respeitam as

fronteiras entre as categorias profissionais e a importância de sua manifestação faz

com que sejam consideradas um grave problema de saúde pública. Salientou que se

constituem em um objeto sobre o qual o campo trabalho e saúde devam se debruçar,

o que leva a se questionarem as entidades de representação dos trabalhadores sobre a

sua política em saúde do trabalhador. Relatou que, neste campo, as LER

exemplificaram uma estratégia de prática sindical que interferiu na adoção de

políticas públicas na área de saúde do trabalhador, de onde resultou, em 1987, o

reconhecimento pela Previdência Social de uma "nova doença" e, em 1993, a

elaboração da norma técnica, por este mesmo instituto, que passa a integrar a

legislação de Segurança e Medicina do Trabalho da Consolidação das Leis do

Trabalho. Em segundo lugar, chamou a atenção que trabalhadores acometidos por

esta doença passam a ter maior consciência sobre sua posição no processo de

produção, e a constatação de que a vivência como portador de LER e as interações

com ambientes sociais confirmadores dessa percepção são situações facilitadoras

para a emergência de sujeitos com a potencialidade para transformar os contextos de

vida e os scripts socialmente definidos. Por outro lado, as LER questionam o

trabalhador sobre o quanto percebe e valoriza o próprio corpo e sobre as repercussões

dessa doença em suas vidas e na de outras pessoas. Considerou que a manifestação

dessas lesões demandou a criação de práticas interdisciplinares nos serviços públicos

de saúde por parte de diversos profissionais de saúde, como médicos, engenheiros,

psicólogos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, ergonomistas, assistentes

sociais, entre outros. Decorrente da peculiaridade da manifestação das LER,

salientou que essas doenças são incapacitantes e que os métodos de cura e tratamento

são múltiplos e informados por orientações diversas. Um dos campos que demandam

maior tratamento é o sofrimento psíquico que os adoecidos pelas LER expressam,

dadas às repercussões psicossociais negativas que a situação de afastamento do

trabalho provoca

Michelin et al. (2000) observaram que, das especialidades odontológicas de

atuação dos Cirurgiões-Dentistas, aquelas com maior número de casos de distúrbios

foram, respectivamente, Traumatologia Bucomaxilofacial, Endodontia, Periodontia,

Dentística Restauradora, Odontopediatria e Prótese Dentária.

Barreto (2001) verificou que os endodontistas apresentam grande incidência de

tendinites e tenossinovites de punho.

10. CONCLUSÕES

Todas as atividades profissionais que exijam esforço repetitivo, quando

realizado em grande intensidade, podem desencadear um quadro de LER/DORT.

As LER/DORT são uma patologia preocupante, pois atualmente o número de

indivíduos afetados tem aumentado significativamente.

O desenvolvimento destas lesões é multifatorial, sendo importante analisar os

fatores de risco envolvidos direta ou indiretamente. Dentre esses fatores estão:

posturas inadequadas, carga músculo-esquelética, carga estática, pressões locais

sobre os tecidos, invariabilidade de tarefas, vibração, estresse, além de fatores não-

ocupacionais como atividades domésticas, esportivas, manuais.

O sedentarismo, a perda natural de elasticidade muscular por desuso, a

adiposidade, a perda da elasticidade das estruturas articulares, defeitos posturais,

somados às doenças degenerativas, são fatores agravantes para o desenvolvimento

das doenças ocupacionais.

Os acometimentos posturais são os mais negligenciados pelos Cirurgiões-

Dentistas, pois os seus efeitos só serão percebidos depois de anos.

A LER/DORT é responsável pela grande maioria dos afastamentos temporários

de profissionais do trabalho, podendo levar ao afastamento definitivo, pois este

distúrbio pode provocar invalidez.

Portanto, é necessário que o Cirurgião-Dentista se conscientize da importância

fundamental da prevenção nas LER/DORT. Deve adotar um estilo de vida saudável

com práticas de atividades físicas, alongamentos, alimentação saudável, controle do

estresse, além de organizar-se no trabalho seguindo as normas ergonômicas.

Exercícios elaborados por Caldeira-Silva et al. (2000)

1- Massageie a palma da mão do centro para fora por alguns minutos.

2- Com a mão espalmada para baixo, realize a semiflexão dos joelhos.

3- Como no exercício 2, porém com o polegar apoiado.

4- Realize e mantenha a flexão do polegar da mão passiva, combinando o desvio

do punho em direção ao solo. Mantenha os ombros relaxados.

5- A mão ativa envolve e flexiona os dedos da mão passiva em forma de concha.

6- A mão ativa flexiona o punho da mão passiva, mostrando a concha para si.

11- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Dentista. Revista Brasileira de Odontologia, v. 58, n. 1, p. 6-7, jan./fev. 2001.

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Resumo.

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23- SATO, L. LER: objeto e pretexto para a construção do campo trabalho e saúde.

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24- TAGLIAVIN, R. L.; POI, W. R.; REIS, L. A. S. R. Prevenção de dor e

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exercícios de alongamento. JAO- Jornal de Assessoria e Prestação de Serviço ao

Odontologista, v. 2, n.8, p. 10-4, mar./jun. 1998.

Submissão: junho de 2003 Aprovação: agôsto de 2003

1

EDUCAÇÃO EM SERVIÇO, EDUCAÇÃO CONTINUADA, EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE: SINÔNIMOS OU DIFERENTES CONCEPÇÕES? Beatriz Francisco Farah E-mail:[email protected]

A questão da educação para profissionais de saúde vem evoluindo ao longo do

tempo, se modificando e sendo acrescida de informações de acordo com o momento

sócio-econômico-político vivenciado no país. Essa evolução resultou em conceitos

diversos, que são utilizados, em determinados momentos, como sinônimos e, em

outros, como concepções diferentes: educação em serviço, educação continuada e

educação permanente.

A necessidade de se organizar processos educativos para os profissionais de

saúde sempre esteve presente no contexto dos serviços de saúde pública, dada a

necessidade de se adequar esses profissionais para atuarem nesses serviços, visto que

a formação desses era baseada em currículos predominantemente voltados para o

modelo biomédico, hospitalocêntrico, centrado na doença, em detrimento da

promoção da saúde e prevenção das doenças.

Fazendo uma retrospectiva sobre a educação dos profissionais de saúde,

constata-se que a preocupação de se fazer processos educativos para os recursos

humanos vem sendo referendada desde a III Conferência Nacional de Saúde – 1963,

propondo essa atividade como forma de evitar o desajustamento técnico em relação

aos recursos do meio e de evitar a fuga do técnico do local de trabalho.

Nas Conferências Nacionais de Saúde subseqüentes, incluindo a I e II

Conferências Nacionais de Recursos Humanos para a Saúde (1986 e 1993), registrou-

se a necessidade de educação continuada para os profissionais de saúde em serviços,

que, gradativamente, foi se tornando imprescindível, como forma de tornar os

recursos humanos capazes de compreenderem as necessidades dos serviços e os

problemas de saúde da população.

Os planejadores e estudiosos da saúde tinham clareza, desde aquela época, que

a conjuntura de formação profissional não estava orientada para a solução dos

problemas de saúde do país, emanadas das novas exigências coletivas, em virtude da

estrutura curricular pouco flexível. A reformulação dos currículos e sua adequação ao

mercado de trabalho e às reais necessidades do país era necessário ser viabilizada.

Consideravam também necessária a participação dos órgãos formadores de recursos

2

humanos, conjuntamente com os serviços, na educação continuada dos profissionais

de saúde.

Mas os serviços, ao proporem esses processos educativos que, na verdade, não

passam de meros treinamentos preocupados em aumentar a produtividade ou a

adequação dos profissionais aos programas verticais, sejam eles nacionais, estaduais

ou municipais, estão preocupados apenas com o aprimoramento das técnicas,

desvinculadas da prática concreta dos trabalhadores de saúde. As metodologias

utilizadas nestes treinamentos reproduzem os conhecimentos através da transmissão

que pouco contribui para as mudanças desejadas no setor, não propiciando aos

profissionais a qualificação técnica desejada e nem a formação de cidadãos. A

inversão do modelo fica cada vez mais distante, na medida em que esses treinamentos

não desenvolvem o compromisso com a universalidade, a eqüidade, a integralidade e

o atendimento das necessidades de assistência à saúde da população.

Com a regulamentação do SUS, através da Lei 8080/90, tornou-se premente a

organização de processos educativos para se implantar e implementar o SUS, com

vistas ao modelo assistencial preconizado e também para atender ao Artigo 200 que

regulamenta “que é função dos municípios ordenar e formar os recursos humanos”

para que possam atuar no SUS. Passa, então, aos Municípios uma grande

responsabilidade, como também a preocupação de estarem buscando parceiros para a

nova empreitada, que é a de capacitar seus profissionais de acordo com as diretrizes e

os princípios do SUS para atuarem no modelo assistencial de saúde proposto.

O desenvolvimento de processos educativos para os profissionais que atuam

nos serviços de saúde constituiu-se numa estratégia para a implementação do SUS e

para orientar a melhoria da qualidade de assistência prestada aos usuários do SUS.

Os serviços, por sua vez, tentando adequar estes profissionais às demandas que

necessitam, propõem processos educativos para aprimorarem o trabalho através da

preparação dos seus agentes, no sentido de dar respostas às necessidades específicas

de formação, manutenção, recuperação e reabilitação de saúde, frente a

posicionamentos políticos-ideológicos distintos (Souza et al, 1991, p. 16).

A educação em serviço foi o primeiro conceito a ser operacionalizado,

conforme sugere o histórico das Conferências Nacionais de Saúde, como forma de

ajustamento dos profissionais às necessidades de saúde nos serviços públicos,

principalmente nas décadas de 60 e 70. Nesse período ainda existiam os currículos

predominantemente voltados para o modelo biomédico.

3

Para Silva et al (1989, p. 10):

educação em serviço é um conjunto de práticas educacionais planejadas com a finalidade de ajudar o funcionário a atuar mais efetiva e eficazmente, para atingir diretamente os objetivos da instituição.

Esse tipo de educação ainda é muito utilizada na capacitação dos profissionais

de saúde, porque tem como finalidade principal os interesses da instituição, deixando

em segundo plano o interesse dos profissionais. Dessa forma, são mais usados os

treinamentos, pois estão mais centrados nas técnicas (habilidades), do que nos

conhecimentos teóricos a serem adquiridos. A educação em serviço objetiva o

desenvolvimento profissional, provendo os serviços de profissionais mais capacitados

para o trabalho.

Por sua vez, a educação continuada surgiu como uma das estratégias para a

capacitação de grupos de profissionais de saúde já inseridos nos serviços. Segundo

Silva et al (1989, p. 9 e 10), a educação continuada deve ser entendida como

conjunto de práticas educacionais planejadas no sentido de promover oportunidades de desenvolvimento do funcionário, com a finalidade de ajudá-lo a atuar mais efetivamente e eficazmente na sua vida institucional. ... a educação continuada está voltada para melhorar ou atualizar a capacidade do indivíduo, em função das necessidades dele próprio e da instituição em que trabalha.

Nesse conceito, as autoras abordaram a educação continuada como um

benefício destinado ao próprio indivíduo que participa do processo educativo e esse

benefício retorna para a instituição na qual trabalha. Esse retorno repercute na

instituição sob a forma de satisfação, motivação, conhecimento, maior produtividade

e otimização dos serviços (Silva et al, 1989, p.10), tornando o conceito mais

abrangente do que a educação em serviço.

Dilly e Jesus (1995) compreendem que a educação continuada implica em

práticas necessárias para o desenvolvimento do indivíduo, tornando-o,

conseqüentemente, mais qualificado para atuar na sua função e na vida institucional.

Já o conceito de educação continuada formulado pelo grupo da Organização

Pan-Americana da Saúde – OPAS, citado por Rodrigues (1984, p.130), diz ser a

educação continuada um processo permanente que se inicia após a formação básica e

está destinado a atualizar e melhorar a capacidade de uma pessoa ou grupo, frente às

evoluções técnico-científicas e às necessidades sociais. Esse conceito proporciona a

visão da necessidade de passagem de informações contínuas aos indivíduos, como

4

forma de atualizar seus conhecimentos, a partir das reais necessidades sociais e da

própria evolução do setor saúde.

O último conceito de educação continuada a ser referido é o conceito discutido

na I Conferência Nacional de Recursos Humanos para Saúde (1986). Nela foi

discutido que educação continuada é um processo organizado, permanente,

sistemático, direcionado a clientes institucionais, com uma política de saúde definida,

tendo em vista a real necessidade dos usuários (p.164).

Portanto, diante desses conceitos, a educação continuada torna-se, então, em

uma abordagem para complementar a formação dos profissionais, auxiliando-os a

aproximarem-se da realidade social e oferecendo subsídios para que possam entender

e atender as necessidades de saúde da população e contribuir para a organização dos

serviços com as mudanças necessárias ao atendimento das demandas.

Já a educação permanente, segundo Barquera, citado por Peru - Ministério de

Salud (1993, p. 19) surgiu, concretamente, nos países desenvolvidos da Europa

Ocidental. Na América Latina é vista como uma nova proposta, com uma prática

ainda incipiente.

Para Hadadd (1990, p.136 e 137), o conceito de educação permanente em

saúde

busca alternativas e soluções para os problemas reais e concretos do trabalho habitual privilegiando o processo de trabalho como eixo central da aprendizagem e enfatizando a capacidade humana de criar conhecimento novo, a partir da discussão e análise conjuntas e participativas dos problemas reais, de suas causas e das implicações que as alternativas de solução têm na busca da transformação da prática de saúde, objetivo essencial do ato educativo .

A educação permanente é centrada no processo de trabalho e tem como

propósito melhorar a qualidade de vida humana em todas as dimensões pessoais e

sociais, auxiliando na formação integral do indivíduo e na transformação do meio para

uma futura sociedade (Hadadd, 1990, p. 25).

Como se deseja alcançar uma atuação criadora e transformadora dos

profissionais nos serviços de saúde, é necessário que se busque a educação

permanente dos seus profissionais, porque o seu processo é compartilhado

coletivamente entre trabalhadores de saúde e usuários do sistema para a busca de

soluções dos problemas reais locais.

5

O processo educativo a ser construído para os profissionais de saúde que

atuam no SUS não deve ser entendido como aquele que substitui apenas as lacunas de

formação na graduação. Ele deve ocupar os espaços criados pelo modelo assistencial

proposto para o SUS e que precisam ser preenchidos para sua efetivação. O processo

ainda deve ser um meio de adaptação do conhecimento técnico para a transformação

das práticas dos profissionais de saúde.

O processo educativo estabelecido através da educação permanente deverá

contribuir para um modelo de assistência à saúde, no qual as adaptações do

conhecimento possam ser incorporadas como uma nova visão e prática no trabalho em

saúde (Teixeira e Pinto, 1993).

Portanto, tem-se optado por adotar o conceito de educação permanente por

entender que o processo de trabalho na saúde é coletivo, e não depende

exclusivamente de um saber individual do profissional para dar respostas aos

problemas de saúde da população.

A educação é um processo permanente, que busca alternativas e soluções para

os problemas de saúde reais vivenciados pelas pessoas e grupos em suas realidades.

Ela deve ser entendida como um fator que influenciará no processo de reflexão e

transformação das práticas vigentes nos serviços, para que os profissionais possam

enfrentar a realidade, através da complementação e/ou aquisição de novos

conhecimentos. Todo processo educativo não tem um fim em si mesmo. Ele é um

processo inacabado, sendo necessário retroalimentá-lo continuamente pela dinâmica

do setor saúde.

É fundamental, atualmente, que qualquer instituição de saúde tenha um projeto

de educação permanente para os seus servidores. É necessário lembrar que esses

projetos não sobrevivem sem articulação com as instituições formadoras de recursos

humanos.

Existe a necessidade de se promover a verdadeira integração ensino – serviço,

pois se reconhece que uma das formas de se aprender é aprender fazendo. Portanto, é

um caminho de mão dupla. As escolas articuladas com os serviços podem formar um

profissional adequado e capacitado para atuar de acordo com a política de saúde

vigente no país, e o serviço se capacita com a presença das escolas no serviço.

Assim, a educação permanente deve ter como objetivo aproximar os

profissionais de saúde à realidade e às necessidades coletivas de saúde.

6

Deve-se entender a educação permanente como instrumento que auxilia na

qualificação das ações de saúde de seus praticantes, buscando sempre alternativas e

soluções para os problemas de saúde reais vivenciados pelos trabalhadores de saúde

em suas realidades.

Consideramos, portanto, a existência de diferentes concepções que devem

nortear a ação educativa.

Referências Bibliográficas

BRASIL. Leis, Decretos, etc. Lei nº 8080, de 19 de Setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para promoção, proteção e recuperação de saúde, a organização e funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Brasília, DF: Diário Oficial, 19 de Setembro de 1990. _______. Ministério da Saúde. Secretaria Executiva - Coordenação Geral de Desenvolvimento de Recursos Humanos para o SUS. Relatório da I Conferência Nacional de Recursos Humanos para a Saúde. Cadernos Recursos Humanos Saúde. Brasília, v.1, n 1, p. 141 – 183, 1993. DILLY, C. M. L. e JESUS, M. C. P. Processo educativo em enfermagem; das concepções pedagógicas à prática profissional. São Paulo: Robe Editorial, 1995. HADDAD, J. et al. Processo de trabajo y educacion permanente de personal de salud: reorientacion y tendencias en America Latina. Educacion Médica y Salud, v. 24, n. 2, p. 136 - 204, abr/jun 1990. PERU. Modulo de educacion permanente en salud. 2 ed, Lima: Ministerio de Salud. Escuela Nacional de Salud Publica, 1993. RODRIGUES, M. Z. Educação continuada em enfermagem de Saúde Pública. Revista da Escola de Enfermagem USP. São Paulo, v.18, n.2, p. 129 - 140, agos. 1984. SILVA, M. J. P.et al. Educação continuada: estratégias para o desenvolvimento do pessoal de enfermagem. Rio de Janeiro: Marques – Saraiva, 1989. SOUZA, A. M. de A. et al. Processo educativo nos serviços de saúde. Brasília: Organização Pan- Americana de Saúde - OPS, 1991.

ATUALIZAÇÃO BIBLIOGRÁFICA

RESENHA

Enfermeiras e Famílias - Um Guia para Avaliação e Intervenção na Família

Lorraine M. Wright & Maureen Leahey

Por Sueli Maria dos Reis Santos

Esta publicação, da editora Roca, aponta caminhos para avaliação e

intervenção na família, a partir da descrição de esquema conceitual,

considerando o sistema familiar como unidade dos cuidados de saúde. Enfatiza

a importância da teoria da comunicação e a necessidade da visão de mundo que

influenciam o modelo de atenção à saúde e a sensibilidade ao gênero, utilizando

situações clínicas na aplicação desses conceitos. Por meio de apresentação de

seqüências de entrevistas reais, a obra ilustra o uso do modelo na prática

clínica; aborda como preparar e conduzir as entrevistas com famílias; apresenta

sugestões de questionários que podem ser utilizados por enfermeiras (os) para

trabalhar com famílias, descrevendo duas ferramentas para avaliação estrutural,

o genograma e o ecomapa. Também fornece idéias para documentar

quantidades significativas de dados obtidos durante a avaliação e o

acompanhamento da família. A relevância dessa obra está na avaliação e

intervenção na família e ressalta o modo de concluir terapeuticamente as

entrevistas com as famílias (sejam únicas ou várias as conferências familiares).

Finaliza, destacando que este livro é uma ferramenta para estudantes,

enfermeiros, educadores e profissionais para fundamentar conceitos e práticas

sobre a avaliação e intervenção na família, de forma a adquirir confiança e

compromisso em seu trabalho. Além disso, pode contribuir efetivamente na

promoção da saúde e no enfrentamento de problemas psico-sócio-econômicos,

que influenciam a saúde e a reabilitação da saúde. Relata, também, que no

contexto da globalização da enfermagem da família, os textos sobre o Modelo

Calgary de Avaliação da Família foram traduzidos para o francês, japonês,

coreano e sueco.

Contato: Editora Roca Ltda, Rua Dr. Cesário Mota Jr.,73CEP 01221-020- São

Paulo-SP Site: www.editoraroca.com.br

LANÇAMENTOS

INTERFACE - COMUNICAÇÃO, SAÚDE E EDUCAÇÃO

“Interface - Comunicação, Saúde, Educação” é uma publicação semestral da

fundação Uni e das disciplinas pedagógicas de Pós-graduação da Faculdade de

Medicina de Botucatu/ UNESP, voltada à articulação das Ciências da Saúde

com as Humanidades, especialmente com a Comunicação, a Educação e a

formação universitária. (Contracapa da Interface)

Volume 7, n. 12 e n.13, de fevereiro e agosto 2003, respectivamente.

Email: [email protected]

REVISTA DE SAÚDE PÚBLICA - JOURNAL OF PUBLIC HEALTH

Periódico especializado, internacional, aberto a contribuições da comunidade

científica nacional e internacional. Tem entre seus compromissos garantir a

ampla divulgação da produção técnico-científica que aborda temas relevantes

para a saúde pública do Brasil e exterior. O volume 37, de agosto de 2003,

entre outros temas, apresenta artigos sobre a relação entre bem-estar espiritual e

transtornos psiquiátricos menores: estudo transversal; sobre fatores associados à

inadequação do uso da assistência pré-natal.; e sobre anemia e peso ao nascer.

Todos esses assuntos são de interesse dos atores da APS.

Email: [email protected]

TRABALHO, EDUCAÇÃO E SAÚDE

Periódico semestral, editado pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim

Venâncio, da FIOCRUZ, destina-se à publicação de debates, análises e

investigações, de caráter teórico ou aplicado, sobre temas relacionados à

educação profissional em saúde, sob a ótica da organização do mundo do

trabalho. Email: [email protected]

I Levantamento domiciliar sobre o uso de drogas psicotrópicas no Brasil –

2001

Esta publicação, do Centro Brasileiro de Informações sobre drogas

psicotrópicas- CEBRID, da Universidade Federal de São Paulo, constitui um

importante documento para a pesquisa na temática citada. O uso indevido de

drogas tem sido tratado na atualidade como questão de ordem internacional,

objeto de mobilização organizada das nações em todo o mundo.

(CEBRID, 2002, apresentação).

Contato: Centro Brasileiro de Informações sobre drogas psicotrópicas-

CEBRID – Email: [email protected] Site: www.cebrid.epm.br

Fone: (11) 5539-0155 Ramal: 127 Fax: (11) 5084-2793

Livreto informativo sobre drogas psicotrópicas

Esta publicação, também do CEBRID, é voltada para alunos a partir da 6ª série

do ensino fundamental. Interessante material, supre uma lacuna para os

profissionais que atuam na APS em ações educativas intersetoriais, como no

ensino, desenvolvimento social e outros.

Contato: Centro Brasileiro de Informações sobre drogas psicotrópicas-

CEBRID – Email: [email protected] Site: www.cebrid.epm.br

Fone: (11) 5539-0155 Ramal: 127 Fax: (11) 5084-2793

AUDIT- teste para identificação de problemas relacionados ao uso de

álcool, roteiro para uso em atenção primária.

Intervenções breves – para uso de risco e uso nocivo de álcool, manual

para uso em atenção primária.

Babor, T.F. e Higgins-Biddle, J.C.

Versão brasileira: FMRP / USP – PAI-PAD; UNIFESP-UEDE/ DEP.

PSICOBIOLOGIA; UFJF – PROMED/ LAPPDA/ FACMED; UFPR – DEP.

FARMACOLOGIA

Interessante publicação voltada para a APS, contendo 2 abordagens

complementares em um único livro, descreve um modelo para rastreamento de

álcool e intervenções breves em atenção primária. As intervenções breves têm

se mostrado efetivas e vêm sendo valorizadas no manejo de pessoas que fazem

uso de risco ou nocivo de álcool, além de preencher a lacuna existente entre o

trabalho de prevenção primária e de tratamentos mais especializados para

pessoas com graves transtornos em conseqüência do uso de álcool. (Resumo,

p.4)

Contato: Distribuição da edição em português PAI – PAD – FMRP – USP

Fone: (16) 602-2727 Fax: (16) 602-2544.

Palavra de Homem

Homens, saúde e vida cotidiana, uma proposta de pesquisa-ação. Livro de Alan

Silva Alves et al., Rio de Janeiro: NESC/UFRJ e ENSP/FIOCRUZ. “Tem o

propósito de dar voz àqueles que, em nossa sociedade, são ensinados a serem

machos, duros, dominadores: os homens com H maiúsculo. Seus autores são

homens que lutam cotidianamente para encontrar um lugar ao sol, neste país

cheio de sol mas também de injustiça, de pobreza, de violência e de desrespeito

aos direitos humanos básicos” (p.9, apresentação) Faz parte do projeto

Homens, saúde e vida cotidiana do Núcleo Gênero e Saúde – ENSP/FIOCRUZ

E-mail: [email protected] e do Laboratório de Gênero e Saúde do

NESC/UFRJ, E-mail: [email protected].

Caderno CEPIA 5 - Gênero, corpo e enfermagem

Esta publicação é um registro de algumas palestras do curso de extensão

“Gênero, corpo e enfermagem”, realizado em parceria pela CEPIA (Cidadania,

estudo, pesquisa, informação, ação) e Faculdade de Enfermagem da UERJ.

Apresenta os temas: Saúde, mulher e sociedade: uma introdução ao debate, de

Jaqueline Pitanguy; Os discursos sobre a enfermagem brasileira e as questões

de gênero, de Ieda de Alencar Barreira; A política de saúde no Brasil no

contexto das reformas neoliberais, de Laura tavares Ribeiro Soares; Bioética

aplicada à enfermagem: aproximação dos desafios do ensino, de Alejandra Ana

Ratania de Pozzi; Fronteiras simbólicas: gênero. Corpo e sexualidade, de Maria

Luiza Heilborn; Violência contra a mulher na perspectiva dos direitos humanos,

de Leila Linhares Barsted. Esta coletânea, certamente, enriquecerá a discussão e

poderá inspirar e estimular estudos voltados para este campo.

Site: www.cepia.org.br e E-mail: [email protected]

Revista Promoção da Saúde Tema Saúde da Mulher Brasileira ano3 – no. 6 – outubro de 2002– publicação do Ministério da Saúde/Secretaria de Políticas de Saúde/Projeto Promoção da Saúde – e-mail: [email protected] Revista Conciencia Latinoamericana vol.XIII – no. 5 – dezembro de 2002 – do movimiento Catolicas por el Derecho a Decidir – e-mail: [email protected], Home page: www.catolicasonline.org.br Revista Bocas no Mundo ano I – no. 2 de julho de 2002 -da Articulação de Mulheres Brasileiras – uma articulação feminista anti-racista – E-mail: [email protected] , Home page: www.articulacaodemulheres.org.br Revista de Saúde do Distrito Federal vol 12 – no. 4 de outubro/dezembro de 2001 – Publicação Técnico-Científica do Sistema de Saúde do Distrito Federal JORNAIS E INFORMATIVOS Jornal Fêmea – do Centro Feminista de Estudos e Assessoria - CFMEA de Brasília, Distrito Federal – que tem como objetivo estar divulgando acontecimentos políticos nacionais e internacionais, de interesse das mulheres, bem como estar subsidiando discussões e reflexões políticas que consolidem os direitos das mulheres – Home page: http://www.cfemea.org.br. Informativo Fazendo Gênero – do grupo Transas do Corpo de Goiânia, Goiás – Home Page: www.transasdocorpo.com.br

Jornal Vida Vivida – do Centro de Referência de Educação em Saúde da Mulher – MUSA (Mulher e Saúde) de Belo Horizonte, Minas Gerais – e-mail: [email protected] Dossiê – Políticas Públicas e Relações de Gênero no Mercado de Trabalho, de Silvia Cristina Yannoulas – Brasília, novembro de 2002. Através da parceria da Agência Canadense para o Desenvolvimento Internacional (ACDI/CIDA) e do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFMEA), o Dossiê aborda uma análise geral da realidade das mulheres no mundo e nas relações de trabalho e propõe Agendas Parlamentar, Sindical e Feminista no Brasil, que possam estar mudando essa realidade. Constitui-se, assim, em uma ferramenta para subsidiar a construção de políticas públicas que promovam a igualdade de gênero no mundo e nas relações de trabalho Home page: http://www.cfemea.org.br. E- mail: [email protected]