sertão: ressignificado

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Projeto de conclusão do curso de Design na UFPE.

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Sertão: Ressignificado

Recife - 2015

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Universidade Federal de Pernambuco - UFPE

Centro de Artes e Comunicação

Departamento de Design

Trabalho de Conclusão de Curso

Discente: Marcela Costa Reis

Docente Orientador: Hans da Nóbrega Waechter

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Agradeço a meus queridos pais, Mirian e Thomas, que me mostraram

a doçura da vida.

Aos meus irmãos Pedro e Eduarda, pela cumplicidade que só

o amor pode trazer.

À minha vozinha Marluce, que desde cedo me mostra o poder da

paciência.

A todos os sertanejos, em especial ao povo da comunidade

de Conceição das Crioulas, por me mostrarem um lado que eu não

sabia ter.

Dedico este trabalho ao culpado pelas minhas melhores risadas,

Ismael.

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CONCEIÇÃO DAS CRIOULAS, PE.

Page 9: Sertão: Ressignificado

SUMÁRIO

RESUMOINTRODUÇÃO

CONTEXTO DA PESQUISA

METAS E OBJETIVOSOBJETIVO GERAL

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

METODOLOGIA DO TRABALHO

ESTRUTURA DO ESTUDO

O DESIGN COMO EIXO TRANSFORMADORDESIGN É FERRAMENTA

MANIPULANDO OS SENTIDOS: O DESIGN DE EXPERIÊNCIA

COLETA DE INFORMAÇÃOVIAGEM AO PAJEÚ

REGISTRO DE CONCEIÇÃO DAS CRIOULAS

LEITURAS SOBRE UM SERTÃO

ELEMENTOS ESTÉTICOS E TRABALHOS EXISTENTES

PROJETANDOGERAÇÃO DE ALTERNATIVAS

EXAME E SELEÇÃO DE ALTERNATIVAS

PROCESSO DE FEITURA DAS PEÇAS

DEFINIÇÃO TÉCNICA

PEÇAS GRÁFICAS

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAMAPA

091010131313131415152025252630384242444545465457

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SALGUEIRO, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

Este trabalho mostra como foi o processo de pesquisa e criação do

projeto Sertão – Ressignificado, de autoria da discente Marcela Costa

Reis, com orientação do professor Hans Waechter. Primeiro a partir

da fundamentação teórica, analisando o design como ferramenta e o

design da experiência, e segundo a partir da imersão geográfica no es-

paço, culminando com a geração de artefatos gráficos experimentais

a partir do registro fotográfico e posterior manipulação das imagens

e criação de ilustrações, gerando 7 postais com temas inerentes à pes-

quisa.

RESUMO

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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CONTEXTO DA PESQUISA

Em termos territoriais, o Sertão de Pernambuco representa 63,66% da

área estadual com 1.575.033 de habitantes, segundo o Censo do IBGE

– 2010, o que corresponde a 17,91% da população do Estado. A mesor-

região do Sertão Pernambucano é constituída pelas microrregiões:

Araripina, Moxotó, Pajeú e Salgueiro. A mesorregião Sertão do São

Francisco é composta pelas microrregiões: Itaparica e Petrolina.

A denominação usual de “sertão nordestino” é dada às regiões inte-

rioranas mais afastadas do litoral, independente do nível de desenvol-

vimento social ou econômico. Porém, a expressão também pode ser

usada para designar mais especificamente as regiões do interior da

Bahia, Pernambuco e Piauí, onde se concentram algumas das cidades

com maiores índices de desigualdade social do país, além de baixíssi-

mos indicadores de desenvolvimento socioeconômico.

Sendo fácil de perceber, a cultura do sertão nordestino está intima-

mente ligada ao clima, e à história de sua colonização, tendo sido a pri-

meira região interiorana do Brasil a ser explorada. Devido à pressão

das grandes plantações de cana-de-açúcar que se desenvolviam nas

regiões mais úmidas, a criação de gado avançou pelo sertão e até hoje

é uma das principais atividades da região e, embora seja uma ativida-

de incipiente se comparada às regiões centro-oeste e sul, caracteriza o

modo de ser do sertanejo nordestino. A área do sertão pernambucano

tem sofrido transformações além daquelas ligadas diretamente ao seu

clima, como no âmbito da política e do crescimento, através das obras

INTRODUÇÃO

BOM NOME, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

de transposição do Rio São Francisco, da construção da Transnordes-

tina, e da produção de vinhos. Não cabe a este projeto fazer juízo de va-

lor destas obras, apenas elencá-las como elementos transformadores.

Pernambuco tem despontado como um grande fruticultor e produtor

de vinhos e espumantes na região mais próxima ao rio São Francisco.

A força deste setor é tanta que foi pano de fundo de uma série televi-

siva de nome Amores Roubados, produção da Rede Globo, sendo ence-

nada no alto sertão, mostrando o lado da riqueza e opulência possíveis

de existir naquela área.

Mas a maior parte da população sofre ainda com a estiagem e os bai-

xíssimos Índices de Desenvolvimento Urbano. Porém, ainda que a

seca atinja diretamente o consumo familiar de água potável, é perce-

bido que ela atinge em maior parte a produção pecuária e agrícola,

pois é notório o desenvolvimento de sistemas de captação de água,

como cisternas implantadas por programas sociais em parceria com a

população local, para que a população da área rural tenha água potável

própria para consumo.

Talvez a primeira lembrança que suba à mente das pessoas sobre Per-

nambuco seja o litoral do estado: rico, em amplo desenvolvimento

econômico, com uma riqueza cultural imensa e belezas naturais. Já

o sertão do estado não tem o mesmo impacto na memória. O interior

do estado de Pernambuco não é lembrado como uma área própria

para turismo, negócios ou lazer num primeiro momento. O acesso à

área ainda é precário, tendo como principal modal o carro, seguido do

BOM NOME, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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ônibus. Não são feitos investimentos em transportes rápidos, como

o trem, que possam facilitar a migração entre cidades. O sertão tem

grande área explorada inapropriadamente, que poderia servir de fer-

ramenta-motor para o desenvolvimento populacional.

Existem, dentro da área sertaneja pernambucana e fronteiras, espa-

ços de pesquisa e turismo, como: o Parque Nacional do Catimbau, que

possui sítios arqueológicos e registros de pinturas rupestres; a Chapa-

da do Araripe, um sítio arqueológico que abriga uma floresta nacional,

uma área de proteção ambiental e um geoparque; grupos indígenas

remanescentes das antigas tradições, como os Pankararu e os Atikum;

a Floresta Nacional de Negreiros, em Serrita; a região vinícola ao redor

de municípios como Lagoa Grande, Petrolina e Santa Maria da Boa

Vista.

Existem também festividades e eventos, como: a Bienal do Livro do

Sertão em Salgueiro; a Cavalgada a Pedra do Reino, em São José do

Belmonte; a Missa do Vaqueiro, em Serrita; o Festival de Cinema de

Triunfo, no Cine-Teatro Guarany, tombado pelo patrimônio histórico;

festivais de poesia em São José do Egito e cidades ao redor, frequen-

tadas por poetas de grande influência na região como Dedé Monteiro;

passeios turísticos de barco pelo Rio São Francisco. Nos municípios

do sertão pernambucano ainda é possível praticar, devido a grande di-

versidade geográfica e pouca variação climática, esportes de aventura

como trekking, rapel, trilhas de bicicleta, camping, entre outros.

BOM NOME, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

O sertão pernambucano faz parte da cultura e do desenvolvimento

econômico do estado. Com um potencial turístico muito forte, di-

versificar a base econômica é de extrema necessidade. Identificar a

existência de arranjos produtivos locais é um dos meios pelos quais

se pode construir novas maneiras de desenvolver a localidade em que

está inserido. Ações de fomento ao microempreendedorismo também

são importantes para o desenvolvimento local e regional.

OBJETIVO GERAL

Ressignificar o sertão pernambucano, gerando interesse da população

através do apelo visual pelo sertão.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Realizar leitura e revisão acerca do contexto atual do sertão

pernambucano;

Realizar estudos de campo para imergir no universo sertanejo.

Gerar peças através de ferramentas que incentivem o interesse pelo

sertão pernambucano;

Tornar essas peças acessíveis à população, como domínio público.

METODOLOGIA DO TRABALHO

Para guiar este trabalho, foi escolhida a metodologia de Bernd Löbach,

por compreender que ela era ampla o suficiente tanto para o processo

de pesquisa, quanto para gerar as alternativas. Consiste em 4 etapas:

METAS E OBJETIVOS

BOM NOME, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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1. Análise do ProblemaAqui é onde é conhecido o problema, são coletadas as informações,

analisadas as informações e clarificados e definidos os objetivos;

2. Geração de AlternativasAqui são escolhidos os métodos para solucionar os problemas, produ-

zidas ideias e geradas as alternativas;

3. Avaliação de AlternativasGeradas as alternativas, estas são examinadas, selecionadas e avalia-

das;

4. Realização da Solução do ProblemaAqui é realizada a solução do problema. É feita uma avaliação da solu-

ção, que pode ser já prototipada e feita sua definição técnica.

ESTRUTURA DO ESTUDO

O presente trabalho encontra-se dividido em três partes distinas, sen-

do a primeira delas a fundamentação teórica, na qual discorre-se so-

bre o papel do design nesta tarefa de ressignicação. A segunda parte

consiste na coleta de informações necessárias para posterior realiza-

ção do trabalho. E a terceira parte consiste no projeto gráfico em si e

seu processo de feitura.

BOM NOME, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

DESIGN É FERRAMENTA

É importante para este trabalho destrinchar a diferença entre proje-

to de arte e projeto de design, utilizando o design como ferramenta

para mostrar que ainda que alguns elementos estéticos de repertório

individual entrem nas peças finais produzidas, dentro daquele artefa-

to houveram métodos de pesquisa, geração e seleção de alternativas,

experimentação e prototipação. Há ainda outras maneiras de validar

o projeto como sendo um projeto de design, mas o essencial está aqui,

utilizando o instrumental de design da informação para produção de

uma peça com um propósito.

O conhecimento do método de projetar é um valor liberatório, é um

“faça você mesmo” na sua melhor forma. A disciplina do design é na

verdade uma ferramenta poderosa para pensar ou repensar objetos,

contextos e serviços. O Design se ampliou do Desenho Industrial para

uma ferramenta administrativa e geradora de bens intangíveis. A par-

tir do momento em que se determinam métodos para projetar, e quan-

do o problema já foi destrinchado, projetar não é uma tarefa difícil.

Está cada vez mais comum escutarmos a expressão “pessoas projetan-

do por elas mesmas“. Isso significa que podemos retirar o design e a

criatividade como qualidades apenas de alguns poucos seres humanos

para mostrá-las acessíveis a toda a humanidade.

MUNARI (1981) compara o ato de projetar com os livros de culinária.

Antes que as receitas possam entrar no livro, elas são testadas e expe-

rimentadas inúmeras vezes, no sentido de diminuir ao máximo o grau

O DESIGN COMO EIXO TRANSFORMADOR

BOM NOME, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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de erro daquele método. Os ingredientes são medidos e o modo de fa-

zer é descrito cartesianamente para que, ao final, tudo possa correr da

melhor maneira. Assim funciona o design quando utilizado de manei-

ra metodológica, e não artística. Várias técnicas de geração e seleção

de alternativas foram desenvolvidas, principalmente após o advento

do design funcionalista no início do século XX. Desta maneira, uma

diretriz pode ser seguida para que o projeto se dê da melhor maneira.

Muitos designers iniciantes ou inexperientes acham que desta forma

sua criatividade pode ser tolhida, e podem sofrer até entender que al-

gumas coisas são feitas antes de outras coisas, pois quando se lida com

projeto, o pensamento artístico e a intuição ficam de lado.

Ainda assim o método do projeto não é algo absoluto e incorrigível.

Cabe a cada profissional ou qualquer pessoa que esteja no ato de pro-

jetar perceber melhorias no processo de criação. Os próprios métodos

não foram criados no nada através de inspiração causal. Eles foram

aperfeiçoados de outros sistemas e estão em constante evolução. Se-

gundo MUNARI (1981) o problema não se resolve por si só, no entanto

já contém todas as informações para sua solução, e é necessário co-

nhecê-las e utilizá-las na solução do projeto.

Separar um projeto de design como assim o é neste trabalho de con-

clusão de um projeto de arte se baseia em um exemplo que Lígia Fas-

cioni sugere no seu livro Design Desmodrômico. Ela conseguiu definir

o Toy Art como um projeto de design e não como um objeto de arte de-

corativa. Vivemos hoje sobre o tripé projeto-conceito-estética, a partir

SERRA TALHADA, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

do qual podemos separar elementos intuitivos e subjetivos como os

artefatos artísticos dos projetos que utilizaram o design como ferra-

menta. Toy Art é um tipo de bonequinho feito de plástico, vinil ou ou-

tro material qualquer que virou mania no Japão no final dos anos 90

e depois dominou o resto do mundo. Apesar de algumas séries desses

brinquedos terem alguma intenção artística, é um produto de con-

sumo fabricado em escala industrial. Mas alguns dizem que não tem

função. E é aqui que Lígia Fascioni chega ao nosso tempo e fala sobre

a função simbólica, a qual Bruno Munari parecia não levar muito em

consideração.

O Toy Art tem projeto, o que o torna passível de ser produzido em esca-

la; tem conceito, que explica a intenção do objeto e o motivo pelo qual

o designer optou por essa forma, material, cores; e preza a questão

estética, que vem da palavra aesthesis, que significa “aquilo que é sen-

sível, que afeta os sentidos”, ou seja, como as pessoas sentem, vêem,

cheiram, tocam e ouvem. Tornar a interação entre a pessoa e o objeto

uma experiência útil, produtiva e prazerosa é função primordial de

qualquer projeto executado por um designer. Em resumo, o Toy Art

tem a função de demonstrar que seu dono comunga de certos valores.

E isso é tarefa para um designer, ou alguém que pensa usando o de-

sign como ferramenta.

Para a engenharia o foco é a máquina. Para o design o foco é a pessoa.

Designers existem para servir as pessoas, tornar sua estada no planeta

melhor. Tim Brown, CEO da IDEO foi quem cunhou o termo Design

SALGUEIRO, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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Thinking, para conseguir expressar a diferença entre ser designer e

pensar como designer. Tim fala da migração do design do nível táti-

co e operacional para uma abordagem mais estratégica. Por isso, os

CEOs, gestores, administradores, executivos, gerentes, vendedores e

até estagiários deveriam pensar como designers. Só assim as empre-

sas conseguirão ser inovadoras no sentido mais radical da palavra.

Design Thinking não substitui o trabalho que os designers normalma-

nete fazem, pois é preciso continuar projetando embalagens, marcas,

produtos, sites e outras peças gráficas como os designers sempre fi-

zeram. Mas o Design Thinking é uma ferramenta de inovação; é uma

abordagem predominantemente de gestão, que se vale de técnicas que

os designers usam para resolver problemas. O Design Thinking não

exige investimentos altos, pois a filosofia em si é simples. Geração de

ideias sem juízo de valor, experimentação, prototipação rápida e inte-

ração com as pessoas/usuários no processo de co-criação. Basicamen-

te o custo maior é fazer com que uma equipe explore as possibilidades

criativas.

Um dos melhores exemplos de alguém que usa, até talvez inconscien-

temente, o design thinking como ferramenta para gerar valor seja o

arquiteto e designer Marcelo Rosenbaum.

Ele, junto com os designers Paulo Biacchi e Carolina Armellini, do Fe-

tiche Design, e com a equipe do Nada se Leva, se reuniram com 78

artesãos e moradores das aldeias Nova Esperança e Amparo, da etnia

SALGUEIRO, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

Yawanawá. Juntos, eles produziram nove luminárias feitas de miçan-

gas de vidro. Para chegar até a fase de desenvolvimento das peças, a

equipe fez uma extensa pesquisa junto às pessoas que sabiam as his-

tórias, lendas e mitos da cultura Yawanawá. A partir disso, foi possível

identificar os Kenês, que são desenhos figurativos de animais e ele-

mentos da natureza representados por grafismos. Estes desenhos,

portanto, tornaram-se referência para as padronagens e estampas das

peças. Ele traz a memória traduzida em design.

Em projetos de design para a indústria, podemos prever com precisão

como determinados recursos técnicos e tecnológicos e matérias-pri-

mas serão utilizados e as suas características desejadas para atender à

função do produto ou a um padrão formal. Já as técnicas do artesão e

as matérias-primas são recursos vivos com especificidades diferentes

em cada objeto. O designer deve educar, no sentido amplo da peda-

gogia, onde o educador não sabe tudo, mas constrói o saber a partir

das experiências. O designer, neste contexto, não atua diretamente no

projeto do produto nem na sua confecção. Ele em todo o processo dá

apoio, ajuda a estabelecer critérios, e a particularizar e diferenciar o

seu produto. Neste contexto, o artesão, como detentor da técnica e da

experiência da cultura associada ao local de origem, une-se ao design

para expandir a percepção, compartilhar conhecimentos e atualizar o

desenho. A singularidade do artefato tem se tornado tão importante,

que a própria indústria se utiliza de artifícios para simular uma pro-

dução artesanal, pois a identidade individual ganhou força após tanto

modernismo funcionalista.

SERRA TALHADA, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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FASCIONI (2012) diz que os designers tem passado as últimas décadas

buscando o compromisso entre as necessidades humanas e a tecno-

logia disponível, sem nunca perder de vista as descrições práticas do

negócio. E conseguem desenvolver tudo isso levando em consideração

a intuição e a capacidade de desenvolver ideias que tenham função

emocional além do funcional.

MANIPULANDO OS SENTIDOS: O DESIGN DE EX-PERIÊNCIA

BELCHIOR (2014) diz que dar um novo sentido a um objeto, alterar

seu conceito, percepção ou interpretação original é um processo que

pode ser chamado de ressignificação. Ressignificar é tornar coerente o

objeto para o sujeito sob o ponto de vista do contexto vigente, contexto

este que sempre se modifica.BELCHIOR (2014) também dá a definição

de desígnio, como “intenção, projeto com um propósito”, e dá a defi-

nição de design, como “criado e concebido segundo critérios”. Neste

trabalho, para gerar interesse pelo sertão na população em geral, os

signos e referências serão manipulados seguindo uma linha específi-

ca, para que desta forma a percepção do sujeito possa ser modificada

de maneira positiva. A manipulação dos signos através de um avanço

na semiótica é desejada do ponto de vista social, para melhoria das

relações humanas. Para AZEVEDO (1996) o ser humano é o único ser

capaz de transfomar o meio ambiente pelo conceito, que é o que é bus-

cado neste trabalho. ROMANINI (2010) diz que é preciso investir na

SÃO JOSÉ DO BELMONTE, PE.

Page 23: Sertão: Ressignificado

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

compreensão do processo como atividade pragmática, ou seja, que en-

volva hipóteses criativas voltadas para uma atividade que é ao mesmo

tempo ética e estética, que almeja eficácia, mas sem deixar de conside-

rar um mundo melhor possível.

O Design de Experiência (XD) é a prática de desenhar produtos, pro-

cessos, serviços, eventos e ambientes com foco na qualidade da expe-

riência do usuário e soluções culturalmente relevantes. É uma área em

ascensão, que vem de outras áreas que incluem psicologia cognitiva

e psicologia da percepção, linguística, ciência cognitiva, arquitetura

e design de ambientes, análise de eventualidades, design de produto,

teatro, design da informação, arquitetura da informação, etnografia,

branding, design de interação, design de serviços, heurísitcas e design

thinking. O papel do designer é encontrar os touchpoints, ou seja, os

momentos da relação do ser humano com a interface especificada que

gerem ideias, emoções e memórias, e fazê-las durarem e serem sig-

nificantes. A experiência é moeda aquecida nos dias de hoje, inclusi-

ve em épocas de crise. Segundo o relatório “Economia Criativa: Uma

Opção de Desenvolvimento Viável”, divulgado pela ONU em 2010, as

pessoas estão dedicando uma parcela maior de suas receitas a memo-

ráveis experiências de vida, inclusive em momentos de crise econômi-

ca, como em 2008.

Se antes as empresas competiam baseadas em qualidade, custo e tem-

po, hoje estes atributos não são suficientes. Mais do que nunca os pro-

dutos devem emocionar as pessoas, uma vez que elas querem fugir

BOM NOME, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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da monotonia, ter seus sentidos ultraestimulados e vivenciar novas

experiências. E o designer é personagem estratégico nesta história fa-

zendo a ponte entre produto e usuário, concretizando necessidades

e emoções. O Marketing Experiencial é uma área do marketing e da

publicidade que trata disso, engajando as pessoas (os seus clientes) na

construção da identidade da marca através da participação direta em

suas ações de promoção. É o marketing transparente, que mostra sua

intenção de entrar no repertório individual e no imaginário coletivo, e

de maneira que entretenha as pessoas. Emoção, empatia e considera-

ção são cruciais para o sucesso da estratégia.

Segundo BELCHIOR (2014) podemos dizer que hoje vivemos a era dos

bens intangíveis, ou seja, valorizamos a experiência que o objeto nos

proporciona, especialmente se estas experiências forem transforma-

doras. E o design é uma das disciplinas que mais contribui para o de-

senvolvimento desses valores intangíveis, por ser, em sua natureza,

multidisciplinar e transversal. Isso pode ser percebido em setores li-

gados à experiência, como o turismo e o entretenimento, que crescem

a taxas seis vezes maiores que os demais setores. Ele ainda diz que,

os valores simbólicos agregados e a potencialidade de experimentar

diferentes sensações aumentam a percepção de valor e fazem com que

bens intangíveis agreguem mais valor do que os bens e valores tangí-

veis.

FIDALGO E MOURA (2013) falam: “Todos os ambientes concebidos

(designados) são campos dinâmicos que nos situam num mundo ar-

tificial feito tanto do que é material (objetos) como do que não é (sen-SÃO JOSÉ DO BELMONTE, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

sações, afecções, ligações). Graças à sua ubiquidade, estes ambientes

treinam a nossa percepção, afetando-nos, orientando-nos e permitin-

do-nos, assim, compreender como, através deles, sujeitos e objetos

se relacionam e se tornam inalienáveis. Fazemos coisas às coisas e as coisas fazem-nos coisas a nós. (...) Cada vez mais, é a experiência em

si, sem rastro material, que é objeto, primeiro de design e depois de

consumo. Com a progressiva desmaterialização do objeto, o designer

passa a integrar uma estratégia global de manipulação de códigos e

parâmetros abstratos num ecossistema eletrônico desdobrado em

múltiplas variações e (não) lugares, reforçando a natureza fantasma-

górica da experiência estética contemporânea e catapultando o de-

sign, e o próprio objeto, para o território da imagem.”

Mais do que lidar com usuários, clientes, consumidores, termos utili-

zados amplamente pelos profissionais da área do design, se lida com

seres humanos, pessoas. É importante relembrar isso no momento

que se está projetando experiência do usuário. Quando se dá outros

nomes às pessoas para as quais se está projetando, elas são desperso-

nalizadas. Termos como “usuário” são degradatórios e afasta o pro-

fissional da missão principal dele: ajudar as pessoas. Cliente é quem

paga as contas. Consumidor é quem consome. Usuário é quem aperta

botões, interage com a interface e fica confuso. Don Norman fala que é

preciso personificar as pessoas como algo real, algo que respira. É para

elas que se projeta. Pessoas são seres complexos e ricos. Outros termos

tendem a ignorar sua rica estrutura de habilidades, motivações e es-

trutura social.

SERRA TALHADA, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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É para as pessoas que este trabalho pretende se direcionar. Para enri-

quecer repertório individual e imaginário coletivo. Para gerar interes-

se, e para que elas possam se relacionar com as peças além da informa-

ção: buscando a experiência.

BOM NOME, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

VIAGEM AO PAJEÚ

Uma primeira viagem de reconhecimento foi feita na cidade de Serra

Talhada, passando ainda pelos distritos de Bom Nome e de São José

do Belmonte, no sertão do Pajeú. Ali, já se delineava qual caminho a

seguir para conceituar as peças que serviriam para ressignificação do

sertão. Passando por estradas desgastadas, sem acostamento e mu-

danças de clima, uma vegetação belíssima se pôs à mostra. É preciso

repetir que o sertão tem problemas, mas também é preciso dizer que

não é apenas isso. Não é desejado aqui criar uma glamourização ser-

taneja, na qual se pense ser fácil se locomover até o ambiente, ter uma

boa experiência hoteleira, fazer incríveis passeios turísticos com faci-

lidade, porque não o é. O desejo no projeto é o de criar vontades, ge-rar novas imagens nas mentes das pessoas, para que posteriormente esse tipo de experiência possa ser vivida como se deve.

No Museu do Cangaço em Serra Talhada foi observada toda a história

do cangaço. Foi percebido como a religião para eles não era vista de

maneira ortodoxa, mas sim como uma maneira de “fechar o corpo”

para as adversidades. Na visita à Pedra do Reino foi conhecido o nas-

cimento da sua lenda. Segundo HOEFLE (1997), a antiga colonização,

os problemas econômico-ambientais típicos das zonas semiáridas e o

relativo isolamento do sertão, por sua vez, propiciaram um rico campo

para a manutenção de tradições do catolicismo popular que há muito

tempo tinham desaparecido dos centros que definem a ortodoxia ca-

tólica mundial e nacional.

COLETA DE INFORMAÇÃO

SERRA TALHADA, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

26

Estas características também providenciaram terra fértil para o surgi-

mento das transformações religiosas próprias que enfatizaram o lado

messiânico.

Há arraigado um certo medievalismo nas tradições sertanejas: baca-

marteiros, cavalgadas, cavalhadas, festas na praça da igreja principal,

escolha de reis e rainhas em festas religiosas, romarias. Todas advin-

das da colonização européia, que moldou tantos traços belos e peculia-

res dentro daquela cultura.

Fica claro na pesquisa que o conhecimento da riqueza que surge desse

tipo de manifestação é essencial para entender e manipular os signos

do sertão, no sentido de trazê-los à frente dos signos de conotação ne-

gativa, para então poder dar continuidade à ressignificação daquele

espaço.

REGISTRO DE CONCEIÇÃO DAS CRIOULAS

Para aumentar o leque de referências vivas e visuais antes do início

do projeto, foi necessário um maior aprofundamento no sertão. Des-

ta vez uma visita direcionada, não na intenção de reconhecimento de

terreno, mas sim de reconhecimento sociocultural. Como as pessoas

se relacionam com um ambiente ainda tão precário em infraestrutura,

politizado, mas tendo relação estreita com as manifestações supersti-

ciosas e místicas de sua cultura.

SALGUEIRO, PE.

Page 29: Sertão: Ressignificado

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

Assim foi escolhida para registro a comunidade de Conceição das

Crioulas. Um quilombo pertencente ao distrito de Salgueiro, no alto

sertão pernambucano. Conceição das Crioulas fica a cerca de 40km da

cidade de Salgueiro, que por sua vez se encontra a 512km da capital do

estado, Recife. A comunidade não foi escolhida à toa: lá, aonde vivem

cerca de 4.000 habitantes remanescentes quilombolas, a comunidade

se destaca a partir de sua fundação. Seis negras livres chegaram na-

quela área por volta de 1802, ainda época da realeza, e arrendaram um

pedaço de terra no pé da Serra do Umã, hoje Serra das Crioulas, para

fabricação de algodão, que vendiam no município de Flores. Com a

venda da plantação, compraram a terra e lá se estabeleceu o que hoje

é uma CRQ - Comunidade Remanescente de Quilombo. Hoje, a maior

parte das terras está tomada por fazendeiros e invasores, e os habitan-

tes lutam para reintegração, já que receberam em 2000 o título de seu

território e foram certificados em 2005 pela Fundação Palmares.

Conceição das Crioulas destaca-se por ser uma das primeiras comu-

nidades do estado a buscar seus direitos enquanto quilombolas, com

um histórico de organização e mobilização fortemente marcado pela

liderança feminina. No final da década de 1980, o contato com uma

missão de freiras carmelitas suscitou o interesse do povo pela sua pró-

pria história e estimulou o envolvimento com sindicatos, ONGs e mo-

vimentos sociais, a exemplo do movimento de trabalhadores rurais e

do movimento negro. Em 2000, foi fundada a Associação Quilombola

de Conceição das Crioulas (AQCC), hoje responsável pela Comissão de

Articulação Estadual das Comunidades Quilombolas de Pernambuco

(MORIM, 2014).SÃO JOSÉ DO BELMONTE, PE.

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Em 2005, o grupo ligado à Universidade Federal de Pernambuco, o

Imaginário Pernambucano, foi até a comunidade para consultoria e

capacitação do artesanato local. Além de geração de renda para as bo-

nequeiras, “loiceiras”, bordadeiras e membros do grupo de artesanato,

o excelente trabalho ministrado serve para perpetuação da história de

Conceição das Crioulas.

A experiência educacional de Conceição das Crioulas é considerada

referência para o movimento quilombola e outras organizações que

trabalham com educação. A comunidade construiu um projeto de

“educação específica e diferenciada” que trabalha com uma concepção

na qual os valores, a cultura, os costumes, as tradições, a sabedoria

das pessoas mais velhas e a história dos antepassados fazem parte do

processo histórico da comunidade.

Segundo Maria de Lourdes da Silva, educadora da comunidade e

membro da Comissão de Educação, a iniciativa surgiu como respos-

ta à discriminação e ao preconceito que os quilombolas vivenciavam.

“Daí conquistamos um espaço importante com uma escola em nossa

comunidade. Noventa por cento dos educadores são do nosso próprio

meio, e a comunidade participa da elaboração do projeto pedagógi-

co”, explica. As aulas são ministradas na escola Professor José Men-

des, inaugurada em 1995. Antes desta data, os jovens de Conceição das

Crioulas só podiam cursar até a 4ª série do Ensino Fundamental. A luta

pela oferta de educação da 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental na

comunidade foi o início de uma jornada de mobilização em defesa do

CONCEIÇÃO DAS CRIOULAS, PE.

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direito a uma educação diferenciada que contemplasse a realidade das

comunidades quilombolas. Outra conquista da comunidade foi a pri-

meira biblioteca afroindígena do Brasil.

Maria de Lourdes também é líder comunitária, irmã da presidente da

AQCC, Valdeci Maria da Silva Oliveira, e foi quem recebeu a discente

por um dia em sua casa para registro do III Festival Quilombola de

Conceição das Crioulas. Antes de chegar na comunidade, que tem di-

fícil acesso por estrada de terra, pôde-se conhecer Martinho, mestre

de capoeira, através da Secretaria de Cultura e Esportes do município

de Salgueiro. Martinho pediu para que sua irmã, Petronilha, guiasse

a discente até Conceição das Crioulas, e assim foi um pouco antes do

pôr-do-sol e do início das festividades. A estrada era difícil, de terra

seca e cheia de pedregulhos, mas com uma vegetação típica exuberan-

te ao redor.

Lá chegando, Maria de Lourdes, ou Lourdinha, e sua irmã Valdeci nos

receberam para que pudéssemos fazer o registro fotográfico do feste-

jo. Várias comunidades quilombolas do estado de Pernambuco, e in-

clusive da Bahia, foram até Conceição das Crioulas para apresentações

culturais e rodas de conversa a respeito de seus direitos políticos e cul-

turais. Conceição das Crioulas é, além de uma sociedade matriarcal,

uma comunidade extremamente politizada, onde os negros que lá ha-

bitam possuem elevada auto-estima. Aonde é estimulada a aceitação

da sua cor e de seus traços negros. Foi possível perceber logo de cara

que poucos ali faziam procedimentos químicos nos seus cabelos por

CONCEIÇÃO DAS CRIOULAS, PE.

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exemplo, para parecerem lisos. Os cachos e os penteados afros eram

exibidos com muito orgulho e até uma certa pompa e realeza. Mar-

tinho, que além de mestre capoeira, conhece bem a história de Con-

ceição das Crioulas, nos contou sobre como eles tomam cuidado com

a geração mais nova: para que ela não perca suas raízes culturais, se

valorizem e não baixem a cabeça - principalmente as mulheres. Se-

gundo o próprio Martinho, “ai do homem que se meter com uma mu-

lher de Conceição”. Martinho também contou que até 1995, Conceição

das Crioulas vivia dominada pelo tráfico de maconha, um problema

conhecido naquela área do estado. Acontece que os plantadores e tra-

ficantes de maconha se utilizavam dos moradores de Conceição para

acoitar a droga ilícita. Se dizia que “um negro de Conceição se compra

com rapadura e uma garrafa de cachaça”. E no sentido de mudar a

direção do horizonte que se delineava, a comunidade se restabeleceu

como referência de educação, política e cultura.

LEITURAS SOBRE UM SERTÃO

Sobre as leituras, foram primeiro pesquisadas informações sobre o

folclore sertanejo. No acervo da biblioteca da Fundação Joaquim Na-

buco foram feitas leituras de um dos maiores antropólogos estudado-

res da história da região, Luís da Câmara Cascudo. Luís da Câmara

Cascudo não apenas fez um livro retratando a viagem dele pelo sertão

nordestino com foco no Rio Grande do Norte, como também criou

uma antologia do folclore sertanejo. É claro que os sertões do nordeste

tem histórias muito próximas e parecidas. Luís fez a distinção de al-

CONCEIÇÃO DAS CRIOULAS, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

gumas dessas histórias por região. Assim pode-se sentir um pouco da

atmosfera religiosa que contida nos mitos sertanejos.

Já em Serra Talhada foi visitado o museu do cangaço, organização que

conta com o apoio da população para permanecer viva. Lá foram en-

contradas centenas de peças, instrumentos e fotografias da época dos

cangaceiros. BARRETO (2008) diz que o homem sertanejo do final do

século XIX e início do século XX conviveu sobremaneira com místicos

e cangaceiros. Produtos da mesma cultura, vítimas de igual opressão.

Formavam-se dois grupos: o dos cangaceiros propriamente ditos, e o

de místicos, que geralmente se reuniam em torno de um beato ou con-

selheiro. Ficam como os nomes mais expressivos: Virgulino Ferreira

da Silva (o Lampião), Antônio Conselheiro e Frei Damião. Paulo Dan-

tas afirma: “Os beatos pertencem ao chamado folclore mágico, já os

cangaceiros ao folclore heróico”. Lampião mata, depreda, incendeia,

mas depois de alguns momentos reza, tira terço, ajoelha-se ao raiar do

dia e ao final da tarde. A religiosidade arcaica do sertanejo é proporcio-

nal a sua valentia. O místico anda lado a lado com o cangaço. BARRE-

TO (2008) diz que, no ano de 1889, na primeira sexta feira de março, a

beata Maria de Araújo caiu em transe ao receber a hóstia das mãos do

padre Cícero, fato repetido várias vezes. É dito também que as hóstias

sangraram. A noticia se espalha, não só no Cariri, mas em todo sertão

nordestino. Multidões acorrem a Juazeiro para presenciar o milagre. A

Igreja interpreta a situação como uma ameaça a seu poder.

CONCEIÇÃO DAS CRIOULAS, PE.

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MELLO (2010) fala sobre a estética e simbolismo das vestes do can-

gaceiro, fator rico à este trabalho que trabalhará muito com a simbo-

logia: “A estética, que caracterizava aqueles homens de armas, provi-

nha da Península Ibérica, valendo acrescentar a afirmação a seguir:

Predominando nesses atavios, a frieza geométrica das faixas gregas

ao esoterismo oriental dos signos de Salomão, presente nos chapéus

dos bandidos, com passagem pela tradição mais recente da flor-de-

-lis – motivo constante da indumentária dos cangaceiros – sugestão

de poder tomada de empréstimo à casa real da França e disseminada

naquele mundo ainda bruto.”

LUCENA (2014) comenta que desse modo, fica evidente um misticismo

que acompanhou Lampião e seus companheiros na sua rotina por toda

a sua arriscada e errante vida. Existem catolicismos no Brasil; desde o

oficial da Igreja Católica até o popular rural, amplamente propagado

entre os sertanejos. Este, baseado em magias e superstições de amule-

tos e rezas fortes bem como na presença de rezadeiras, beatos e faná-

ticos, trata-se de uma contribuição dos camponeses lusitanos egressos

de sua terra natal, e, por isso mesmo, é tido como o mais puro, uma vez

que está isento da hierarquização oficial.

SOUZA (2004) diz que há, quando se faz reportagem à crença sertane-

ja, um inevitável contemplar de um sincretismo religioso, que resulta

na mistura de animismo indígena + fetichismo africano + superstição

portuguesa. CHANDLER (1981) defende que tais práticas pertencem

ao que ele cognominou de catolicismo sertanejo, cujas principais prá-

SALGUEIRO, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

ticas são as de se realizarem orações as quais fechariam o corpo do

indivíduo. CASCUDO (1978), por seu turno, observa que as referidas

rezas de corpo-fechado fazem menção ao bruxedo europeu – incorpo-

rado ao catimbó – cuja característica marcante residiria em proferir,

e repetir, palavras tidas como sagradas, para, dessa forma, alcançar a

inviolabilidade diante dos inimigos.

Um exemplo claro da religiosidade existente nos sertões é a monu-

mental ingerência protagonizada pelo padre Cícero, pois “casa ser-

taneja que se prezasse não podia deixar de ter em suas paredes, no

mínimo, os quadros do ‘Sagrado Coração de Jesus’ e do Padim Ciço”.

(SOUZA, 2004, p. 24). As atitudes místicas, por seu turno, eram mar-

cadas pelo uso de rosários no pescoço, a posse de patuás, contendo

rezas consideradas fortes, que “escritas e dobradas com uma hóstia

consagrada, furtada do sacrário, misturada com o próprio sangue do

bandido e o oferecimento do credo” (OLIVEIRA, 1970, p. 119).

A importância dos amuletos se manteve numa relação endêmica entre

os cangaceiros. E isso é perfeitamente confirmado na seguinte senten-

ça: Uma das “rezas” preferidas pelo pessoal do grupo era a da “Pedra

Cristalina”. […] Não é preciso que uma oração, para produzir efeito,

seja pronunciada, ou sequer conhecida no seu texto pelo portador.

Basta a permanência no pescoço, no bolso, ou na própria capanga en-

rolada como um “Agnus Dei” ou apenas dobrada. Lampião não aban-

donou, até a morte, a sua “Pedra Cristalina” (LIMA, 1965, p. 115).

BOM NOME, PE.

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Scott William Hoefle pesquisou a fundo a relação do sertanejo nordes-

tino com a religião. Hoefle destrinchou, através de pesquisa de campo,

a relação do sertanejo com a religião. Na sua longa estada de pesquisa

participante no sertão sempre surgiam valiosos comentários sobre a

religião, desde piadas sobre o padre até atos de atrito entre católicos e

protestantes. Esse tipo de ação nos lembra o romance o Auto da Com-

padecida, de Ariano Suassuna, no qual a comédia e a religião andam

lado a lado. Ele comenta também sobre os movimentos messiânicos

do início do século XX, como o que deu origem ao também livro de

Ariano Suassuna, o Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do San-

gue do Vai-e-Volta.

Segundo o escritor belmontense Ernando Alves de Carvalho, o messia-

nismo político-religioso de Portugal do século XVI ressurge deturpado

e violento no interior de Pernambuco, três séculos depois. Os chefes

do movimento prometiam uma vida melhor quando retornasse o rei.

Negro voltaria branco, feio seria bonito, o pobre seria rico, doente vol-

taria com saúde. O sebastianismo em Pernambuco existiu na primeira

metade do século XIX em dois lugares, na Serra do Rodeador, em Bo-

nito, e na Serra Formosa, em São José do Belmonte. Ambos tivveram

uma derrocada trágica. Os fanáticos sebastianistas da Serra Formosa

fundaram uma espécie de reino, que os dava direito a uma coroa feita

de cipós. Também manipulavam uma bebida à base de ópio e jurema.

O primeiro rei foi João Antônio. Ele dizia que o rei havia lhe aparecido

para mostrar-lhe um tesouro. Andava com pedrinhas brilhantes nas

mãos, angariando “fiéis”, que o seguiram e fixaram sua comunidade

SALGUEIRO, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

na Pedra Bonita. João Antônio não resistiu à pressão das autoridades

e afastou-se da Vila. Deixou em seu lugar o cunhado, João Ferreira,

que se tornaria um rei louco, cruel e sanguinário. Ele fez as pessoas

crerem que Dom Sebastião estaria “encantado” na Pedra e só retorna-

ria, realizando todas as promessas feitas àquele povo, quando o lugar

fosse lavado com sangue. São muitos os relatos de mortes voluntárias

(com pessoas se jogando do alto da Pedra) e involuntárias (a maioria

era decapitada, incluindo crianças) ocorridas entre os dias 14 e 17 de

maio. Cinquenta e três pessoas foram sacrificadas nos três dias da

matança, incluindo sua mulher, a rainha Izabel. Tal ato despertou a

ira do cunhado, Pedro Antônio. Ele falou aos discípulos que, na ver-

dade, Dom Sebastião precisava agora do sangue do próprio rei. João

Ferreira, conta-se, teria morrido com requintes de crueldade. O ma-

jor Manoel Pereira da Silva, outro conhecido personagem da história,

soube do ocorrido e foi com suas tropas conter a verdadeira chacina

provocada pelos reis da Pedra Bonita (que Ariano Suassuna, em seu

romance, chamou de Pedra do Reino). Os cavaleiros da cavalgada que

ocorre atualmente, no local, rememoram a ida do major ao reino mais

sangrento da “monarquia” brasileira.

Sobre a filiação religiosa no sertão, HOEFLE (1994) fala que antes da

penetração do protestantismo e de cultos afro-brasileiros nas últimas

décadas, existiram outros tipos de atividades religiosas alternativas,

alguns dos quais ainda são praticados em escala meonr hoje em dia.

Membros e participantes de irmandades de flageladores, danças de

São Gonçalo e movimentos milenaristas foram, e ainda são, recru-

SALGUEIRO, PE.

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tados entre os pobres da zona rural e da cidade. Assim, não estamos

tratando de uma população católica única, que só foi dividida recen-

temente, mas sim de uma história de predomínio religioso do cato-

licismo ortodoxo sob a liderança da classe alta agrária e comercial,

representada pelo padre e leigos proeminentes envolvidos nas ativi-

dades da Igreja. O catolicismo permanece a fé da grande maioria dos

sertanejos. Uma atitude esperada da parte dos homens sertanejos é a

hostilidade para com os padres. Primeiro de tudo porque julgam os

padres homens muito estranhos e em segundo lugar, porque tomam

muito tempo de suas mulheres. Essa hostilidade às claras para com o

clero no Sertão é rara, onde a maioria dos homens respeita-o por fé e

reverência. Se não por alguns desses motivos, eles o fazem por receio,

pois a maldição de um padre é considerada a mais poderosa existente.

Identificam-se no sertão três elementos típicos do cristianismo ani-

mista pré-reformista: 1) a crença em espírios do mato; 2) a crença em

almas e 3) o culto aos santos. A apelação a meios sobrenaturais para

controlar a natureza em momentos de grande perigo no ciclo da agri-

cultura é um fenômeno comum no mundo todo e, no catolicismo po-

pular, é uma antiga tradição. A crença em espíritos do mato, como o

caipora e os animais encantados.

Os carneiros-de-lã-dourada das montanhas distantes e os cavali-

nhos-d’água do rio São Francisco habitam ambientes não humanos e

opõem-se à pecuária. Induzem os animais domésticos a abandonarem

os rebanhos para viverem independentes do homem. Segundo CAS-

CUDO (1954) o caipora é uma figura semelhante aos deuses da floresta,

SALGUEIRO, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

do tipo da Diana do folclore europeu, de forma que se trata ou de uma

crença sincrética ameríndio-européia ou de uma crença panhumana

de caçadores em geral.

Os cultos afro-brasileiros (candomblé, xangô, catimbó) e o espiritis-

mo, como praticados no sertão, não podem ser considerados como

religiões plenamente desenvolvidas no mesmo sentido em que é o ca-

tolicismo ou mesmo os cultos afro-brasileiros do litoral do Nordeste.

De fato, as pessoas que abraçam os cultos no sertão não os consideram

também como sendo sua religião. Elas se consideram católicas primei-

ramente. Porém o xangô das comunidades e os curandeiros espíritas

ambulantes do sertão utilizam uma cosmologia que é uma síntese

de rituais e crenças derivados dos cultos afro-brasileiros do litoral,

ideias originárias do ameríndios, catolicismo popular, noções tradi-

cionais de medicia popular, bruxaria e até mesmo alguns traços dos

movimentos milenaristas do passado. As sessões dos cultos incluem

um vago sentido de adoração aos espíritos que os visitam. Os nomes

de Padre Cícero, Frei Damião, São Sebastião e Rei Sebastião são invo-

cados nos cânticos. De fato, as seitas sincretizam tanto a fé e os ritos

católicos, que seus membros não vêem contradição entre participar

deles e ainda serem bons católicos. Os espíritos benéficos são associa-

dos com a direita, com a cor branca, com a luz e com um ambiente leve

e alegre. Os maus são associados com a esquerda, com cores escuras,

com o escuro e com um ambiente pesado e soturno. É interessante

pensar nessa variação cromática para a futura produção das peças.

SALGUEIRO, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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A religião faz parte do dia-a-dia do sertanejo, não como o é no litoral.

A solidão em si é o castigo máximo para o sertanejo, e ele a afasta atra-

vés da fé e dos rituais religiosos. Atos que, em outro contexto, seriam

considerados socialmente estranhos e ridicularizados passam a ser

admirados como um sinal de fé.

Nos dias de festas religiosas, o sagrado e o profano não estão total-

mente separados. Muitos dos festejos misturam o sagrado e o social.

O misticismo sertanejo está conjugado com a rotina e os costumes

contemporâneos do povo. E é através do reconhecimento de artefatos

importantes no cotidianodo sertanejo que é pretendido propagar co-

nhecimento para a população através das peças gráficas finais deste

projeto.

ELEMENTOS ESTÉTICOSE TRABALHOS EXISTENTES

Já é possível notar que o forte na estética das manifestações sertanejas

é um traço de medievalismo. Armaduras, dicotomia cromática (o ver-

melho e o azul são predominantes em festas, bem como a dualidade

claro/escuro). Alguns movimentos já consagrados e outros recentes

tentam montar essa estética típica da região nordeste e do sertão. Uma

delas é o Movimento Armorial, que nas palavras de Ariano Suassuna

“tem como traço comum principal a ligação com o espírito mágico dos

“folhetos” do Romanceiro Popular do Nordeste (Literatura de Cordel),

com a Música de viola, rabeca ou pífano que acompanha seus “canta-

SALGUEIRO, PE.

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res”, e com a Xilogravura que ilustra suas capas, assim como com o

espírito e a forma das Artes e espetáculos populares com esse mesmo

Romanceiro relacionados”. Sendo “armorial” o conjunto de insígnias,

brasões, estandartes e bandeiras de um povo, a heráldica é uma arte

muito mais popular do que qualquer coisa. Desse modo o nome adota-

do significou o desejo de ligação com essas heráldicas raízes culturais

brasileiras. O Movimento tem interesse pela pintura, música (sendo o

Quinteto Armorial referência deste movimento), literatura, cerâmica,

dança, escultura, tapeçaria, arquitetura, teatro, gravura e cinema.

Mais recentemente temos o Museu Cais do Sertão, situado na cidade

do Recife, que traz além da clássica tipologia de museu, uma expe-

riência interativa multimídia, como uma sala documentário, um túnel

denomidado “Túnel do Capeta”, que consiste em um túnel cheio de

espelhos e com alguns áudios, no qual o homem se vê, bem como o é

no sertão. O Museu também teve o cuidado de usar uma iconografia

própria, baseada em uma tipografia referenciando os ferros de marcar

o gado. Assim o sertão é representado visualmente de maneira impe-

cável neste museu.

Dentro da cultura visual temos um grande artista da imagem da xilo-

gravura, tão popular no romanceiro nordestino e sertanejo: J. Borges.

E uma cria dessa estética visual, Derlon Almeida utiliza sua estética

de maneira mais urbana, em grafites, camisetas e outras superfícies.

Temos também o artista Juraci Dórea cuja arte possui fortes ligações

com o sertão baiano, região de forte carga simbólica no imaginário

SALGUEIRO, PE.

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tanto nordestino quanto brasileiro. Joana Lira também é uma jovem

artista que trabalha com o imaginário popular para criar suas peças

com forte influência da cultura brasileira.

Dentro da sonoridade temos grandes nomes. Na contemporaneidade

temos o trabalho de Patrick Torquato. Patrick Torquato é Gerente de

Música da Secretaria de Cultura da Cidade do Recife. Também é DJ e

Radialista. Ele fez uma seleção musical sobre o Sertão de Pernambuco

para o site O Brasil Com S. Ele diz: “Desenhar a sonoridade do sertão é

quase uma covardia, uma profusão imensa de referências, tendências

e influências, montam um panorama rico de fontes étnicas e culturais

reunidas em um mesmo caldeirão geográfico que ultrapassa as fron-

teiras políticas dos estados de um Brasil que ao mesmo tempo é rural e

urbano, e que para os olhos (e ouvidos) que vivem nas grandes cidades

parece parado no tempo. Organizar um repertório que pudesse passar

por determinadas curvas, vales e lagoas deste imenso sertão pan-nor-

destino é delicado e quase cirúrgico, garantir que todas as expressões

apareçam é quase impossível, então me direcionei para montar de

uma forma que os que aparecessem contribuíssem para representar

de forma diversa, ampla e plural esta região tão rica e que se localiza

geograficamente no coração do povo e desta Região.” Estão na seleção

de Torquato nomes como Dominguinhos, Gilberto Gil, Coco Raízes de

Arcoverde e Luiz Gonzaga.

No universo da moda temos como referência Ronaldo Fraga, que sem-

pre se preocupou com o social dentro de seu trabalho, e criou a coleção

SALGUEIRO, PE.

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de outono-inverno 2014 apresentada no SPFW inspirada no escritor

Mário de Andrade, Graciliano Ramos, João Cabral de Melo Neto e José

Lins do Rego.

Este projeto se inspira também em projetos como Imagens Comer-

ciais de Pernambuco, do departamento de design da UFPE, do projeto

Iconografia das Carrocerias de Caminhão de Pernambuco, de Fátima

Finizola e Damião Santana, e do projeto Abridores de Letras de Per-

nambuco, de Fátima Finizola, Solange Coutinho e Damião Santana.

Esses trabalhos tiveram uma preocupação de tornar a pesquisa tão im-

portante quanto o programação visual final, e trazem a frase de Janete

Costa à frente de seu trabalho: “Interferir sem Ferir”.

SALGUEIRO, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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GERAÇÃO DE ALTERNATIVAS

Agora que existe uma problemática a ser resolvida e após feita a pes-

quisa acadêmica e de campo, é possível, dentro da metodologia de Lo-

bach, iniciar com devida clareza a geração de alternativas. Alguns es-

tudos foram feitos para analisar que tipo de mídia seria utilizada para

representação dos elementos gráficos ressignificantes. Analisando o

trabalho de artistas já mencionados, como Joana Lira, Ronaldo Fraga,

e outros trabalhos feitos por coletivos, foi decidido que a mídia seria

de escolha do usuário, ou seja: seriam criadas peças gráficas a serem

disponibilizadas para uso público, e esse público terá liberdade para

usufruir dos gráficos criados.

Pensando que a versatilidade será útil para o usuário, o design de es-

tampas de padrão repetitivo em postais foi a escolha para objeto final

deste trabalho. O postal tem forte valor afetivo agregado, o que ajuda-

rá na boa recepção de seus interlocutores. Foi conversado com o orien-

tador que não era quisto por esta discente uma estética vetorizada, já

muito trabalhada e cansada no meio. No sentido de dar mais destaque

ao trabalho experimental e para que não houvesse também dissonân-

cia da realidade sertaneja, tão manual e crua, os elementos seriam

criados manualmente através da ilustração, dispensando assim o uso

da vetorização, já muito utilizada e cansada em seu meio.

Faltava então solucionar o método de representação dessas ilustrações.

O estilo próprio de ilustração da discente não estava em primeiro plano

PROJETANDO

BOM NOME, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

para escolha, pois mais importante do que demonstrar o estilo, sendo

este um trabalho com método e de design, gerar alternativas viáveis

para reprodução e de boa visualização era a maior preocupação.

Assim sendo, foram curadas e impressas 68 fotos tiradas nas viagens

feitas. É importante frisar que as fotos foram tiradas através do olhar

da autora deste trabalho. Essas fotos possuíam elementos visuais inte-

ressantes para o repertório. Assim as fotos foram impressas em preto

e branco, com alteração de contraste, para que os elementos de cor

saíssem do caminho da criação e as formas tomassem conta.

Com ajuda de papel manteiga, 47 elementos puderam ser categoriza-

dos em 5 categorias: Animais, Religião, Objetos, Grafismo, Natureza.

A partir daí, houve mais um processo de curadoria, do que poderiam

ser elementos importantes nesse trabalho de ressignificação. Como

este trabalho visa propor novas ideias e significados e não existem

estudos acerca da semiótica de elementos visuais relativos ao sertão,

a escolha ainda é mais subjetiva do que objetiva. De maneira a não

ficar disparatado demais do imaginário coletivo, alguns elementos

mais conhecidos foram mantidos e assim pôde-se começar a gerar as

alternativas de padronagem. A princípio a forma como os elementos

seriam representados foram desenhados apenas a nanquim em papel

manteiga. Houve então facilidade de mudanças e ajustes para chegar

ao que seria o desenho final. Os desenhos seguiram quatro temáticas

relacionadas ao cotidiano atrelado ao misticismo sertanejo: Festejos, Morte, Rotina, Fartura.

SÃO JOSÉ DO BELMONTE, PE.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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Sendo um trabalho primordialmente de experimentação, muitos ele-

mentos que poderiam já ser conhecidos do público em geral como

sendo místicos ou cotidianos foram deixados de lado para dar ênfase

em uma mudança de atmosfera. Porém, todos os elementos estéticos

compreendidos nas leituras sobre o sertão e nas viagens de campo fo-

ram sempre revisitados.

Apesar de alguns temas serem aparentemente densos, foi decidido

que todas as padronagens usariam uma escala cromática mais sutil,

evitando os tons pastéis e amarronzados tão utilizados em peças de

cunho sertanejo. O rosa, o turquesa, um pouco de verde e amarelo fo-

ram escolhidos. Todos os temas são vividos diariamente por sertane-

jos, pobres e ricos, com muita vontade de viver. A tristeza, ainda que

constante, não abate o desejo pela vida, e este desejo é um elemento

subjetivo a tentar ser representado nas padronagens.

EXAME E SELEÇÃO DE ALTERNATIVAS

Geradas essas alternativas de composição, elas foram examinadas e

selecionadas, e a partir daí os protótipos puderam ser iniciados. Os

elementos desenhados à nanquim foram então redesenhandos no

papel vegetal, que possibilita uma estética de giz ao se utilizar lápis

de cor. Esses elementos foram então fotografados em alta qualidade

e passados para o computador, para que aí pudessem ser manipulados

digitalmente.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

Após o recorte de cada um dos elementos, foram feitas composições

e estudos de padronagem. Com uma paleta de cor já definida, ficou

mais fácil acrescentar cores análogas ou complementares a depender

da atmosfera desejada para a peça. Foram então selecionadas X pa-

dronagens resultantes e aplicadas em um modelo de postal, cujo verso

continha algumas informações a respeito do projeto e da padronagem

em si. Os postais estão agora disponíveis para download na página on-

line do behance da autora.

PROCESSO DE FEITURA DAS PEÇAS

Curadoria das fotos; Nanquim em manteiga; Grafite e lápis de cor em

papel vegetal; Fotografias em alta resolução; Manipulação Digital; Im-

pressão.

DEFINIÇÃO TÉCNICA

Papel manteiga 41g/m²; Papel vegetal; Lápis HB e 4B; Caneta nanquim;

Lápis de cor; Câmera DSLR; Illustrator; Papel triplex.

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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MORTE

BAÚ DE MEMÓRIAS

GRAFISMO DE ALTAR

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

COTIDIANO

BODES

ANTENAS CENTURY

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

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COTIDIANO

CABRESTO

TRAMA DE REDE

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49

SERTÃO: RESSIGNIFICADO

FARTURA

FEIJÃO VERDE

CESTARIA

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SERTÃO: RESSIGNIFICADO

50

MORTE

CRUZEIROS

DE ESTRADA

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FESTEJOS

GAMBIARRA

CÉU DO SERTÃO

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FESTEJOS

PÍFANOS

SONORIDADE SERTANEJA

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PARTE POSTERIOR

DOS POSTAIS

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Recife

Garanhuns

PesqueiraArcoverde

TriunfoSerraTalhada

Salgueiro

Conceiçãodas Crioulas

BomNome

São Josédo Belmonte

MAPA

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