rorty para geertz etnocentrismo

Upload: denise-coutinho

Post on 10-Jul-2015

397 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 5/10/2018 Rorty Para Geertz Etnocentrismo

    1/11

    .ARQUIVO

    SOBRE 0 ETNOCENTRISMO:Uma resposta a Clifford Geertz *

    Richard ROrty

    N o seu provocador artigo sobre "T he U ses of D iversity-, 0 P ro fe ss or Geer tzafirm a q ue 0 e tn o centr ismo r er ne te 9 . . < ; separacoes e as assim ettias entre os indi-viduos ou glU pOS para -um reino de um a diferenca suscep tivel de ser dom i-nada ou ignorada, para um a mera dissemelhanca- T rata-se de um a boa descri-~ao de como tratam os pessoas que pensarnos nao valer a pena cornpreender:aqueles a quem vem os com o inerned iavelrnen te loucos, estupidos, bocais oupecam inosos Estas pessoas nao sao vistas com o possiveis parceiros de conver-sacao, m as, no m aximo, como rneios para atingii fins Pensamos que nadatem os a aprender com pessoas desse genero , porque prefeririam os m orrer a terde partilhar com elas as crencas que julgam os serern centrals para as suas auto--iden tidades A lgum as pessoas pensam nos judeus enos ateus nesses term osOu tLas fazem 0 m esm o acerca d os n azis e dos fun dam entalistas religio sos

    Q uando nos, liberais burgueses, dam os connosco a pensal acerca das pes-soas desta form a - quando, por exem plo, reagimos em relacao aos nazis e aosfundam entalistas com indignacao e desprezo - tem os que reflectir sobre 0 quese passa A razao e que estam os a tam ar a atitude que precisam ente d izem osdesprezar Prefeririam os m orrer a ser etnocen tricos, m as a etnocentrism o eexactam ente a conviccao de que e prefenvel m oner a partilhar certas crencasDamos por nos a pensar se 0 nosso liberalism o burgues nao sera apenas m aisurn exem plo de urn enviesam ento cu ltural

    'hadu~ao de Anton io Maga lhacs COIll r ev isa o c ie nn fi ca d e Anto nio I II Magalhaes tStephen R Steer

  • 5/10/2018 Rorty Para Geertz Etnocentrismo

    2/11

    SOCIEDADE CUIIURAS

    E sta p erp le xid ad e tom a-n os p red isp os to s a sugestao segundo a qual a cul-tura da dem ocracia liberal ocidental estade algum m odo no m esm o plano queados Vandalos ou ados Ik Entao comecam os a pensar se as nossas tentativasde fazer com que outras partes do mundo adoptem a nossa cultura serao detipo diferente daquelas exem plifk adas pelo zelo dos m issionarios fundam enta-listas Se prosseguirm os nesta linha de pensam ento acabarem os pO L nos tornarnaquilo que pO I vezes se designa pO I liberais -convictos-! C om ecam os a per-der qualquer eapacidade de indignacao m oral, qualquer capaddade para sentirdespiezo nosso sentido de identidade dissolve-se J a nao podem os sentirorgulho em sel liberals burgueses, em ser parte de uma grande tradicao, emserrnos cidadaos de um a cultura que nao e um a cultura qualquer Iornam os asnossas m entes tao abertas que os nossos cerebros acabam por nos cair aos pes

    Este colapso da autoconlianca m oral, aquila a que G eertz cham a "a deses-per ada tolerancia do cosm opolitism o da U NESCO ", provoca um a reaccao nosentido do anti-anti-etno centrisrn o - d ireccao essa exem plificada p ar passagen sque Geertz foi bus car a levi-Strauss e aos m eus trabalhos 0 que, pm seuturno, provoca a contra-reaccao de Geertz D iz ele, par exem pio: -Qualquerfilosofia m oral presa do receio de se m isturar com 0 relativism o nescio ou coma dogm atism o transcendental acaba pO I nao conseguir pensar em nada melhotaeerca do que fazer com outras m aneiras de lidar com a vida do que faze-laspareeer pior do que a nossa propria e esta destinada a cair na perspectiva dem eram ente proeuraJ tornar 0 mundo seguro por condescendencia- Geertzreceia que a reaccao anti-anti-etnocentrista va dem asiado longe e que nos noscontentem os em pensar as com unidades hum anas com o -rnonadas sernanticas,p ra tic am en te d es pro vid as d e ja nela s-

    A lgumas comunidades humanas sao como esse tipo de monadas, outrasnao A nossa cultura liberal burguesa nao a e Pelo contrario , e um a culturaque se orgulha de estar eonstantem ente a aerescentar novas janelas, de cons-tantem ente alarg ar as su as sim patias E um a form a de vida que esta con stante-m ente a alargar as seus pseudo-casulos e a adaptar-se aquilo que vai encon-trando A sua consciencia do seu proprio valor m oral funda-se na sua toleran-

    1 NT : tra du zu no s d esta fo rm a a e xp re ssa o " we t lib era l" , da da a ir np os sib ilid ad e d e um a tra du ca o m aisliteral

  • 5/10/2018 Rorty Para Geertz Etnocentrismo

    3/11

    SOCIEDADE CUL I URAS

    cia e diversidade O s herois que ela g101ifica incluem aqueles que alargaram asua capaeidade de sim patia e de tolerancia Entre os in im igos que diabolizaencontram -se aqueles que procuram dim inuir esta capacidade, os perfidosetnocentristas 0 ant i- an ti -e tnocent ri smo nao e urna tentativa de m udar os habi-tos da nossa cultura, b loqueando mais uma vez as janelas Pelo contrario, eum a tentativa de lidar com 0 fenomen o do lib eralism o co nv icto, corrig ind o 0habito da nossa cultura de dar um a base filosofica ao seu desejo de aberturaso anti-anti-etnocentrism o nao diz que estam os prisioneiros dentro da nossam6nada ou da nossa linguagem , m as apenas que a monada cheia de janelasem que n6s vivem os nao esta m ais ligada a n atu rez a d a h uman id ad e au as exi-gencias de iacionalidade do que as m 6nadas sem janelas que nos rodeiam

    D esenvolverei esta questao, m as prim eiro gostaria de com entar 0 Caw doindio Bebado e a M d qu in a de Hemodia l i se apiesentado por G eertz2 N ao vejoeste caso da mesm a forma que Geertz Por iS50 comecarei pO I avancar a m euponto de vista e depois com entarei 0 d e G ee rtz

    A m inha reaccao ao caso apresentado por G eertz e que nao se trata de algadeprim ente, m as, antes, de anim ador M ostra que as nossas institu icoes liberaisfuncionam bem e sem percalcos Geertz diz que "a lista de espera [para ahernodialisel foi organizada em termos da sevendade da neeessidade e daordem de aplicacao- Assim deveria ter sido Dado que, com o ele diz, "0 indioja estava a fazer 0 tratam ento na altura em que 0 problem a se tornou visivel-,os m edicos -nao podiam por sua iniciativa . . intenom pe-lo E ntao acrescenta,e n tr e p a ren te se s, -nem, suponho, tal lhes seria permitido- E, de facto , nao, e eisso que eu aeho anim ador Se eles tivessem tentado suspender 0 tratamento,os m eios de cornunicacao social e os advogados especializados neste tipo dequestoes saltar-lhes-iam em cim a no dia seguinte Iodo 0 aparelho do E stadoliberal dernocratico, um aparelho para quem a im prensa e tao im portante com oos oficiais de justica, assegurou que urna vez que 0 indio tinh a tido 0 cuidado

    N ea e -C aso -, u m in dio n orte -am erk an o alco oli : n o su do cste d os E stad os U nid os, d epo is d e terestado na lista de espera comerou a f az c r t ra t amen to nurna maquina de hemodialise, a pe sa r d e serecusar a seguir as ordens do m edico no sentido de parar de heber M orreu uns anos depcis nam aquina, presurnlvelm ente em parte devido a bebida Geertz usou 0 c as o p ar a ilustrar 0 dilemam oral d os m edicos - c po r ex ten sao to da a so cied ad e ilu mina da - co nfro ntad os co m v al or es ec omporram en to s h ostis ao s s eu s h a hi to s -l ibcrais

  • 5/10/2018 Rorty Para Geertz Etnocentrismo

    4/11

    SOCIEDADE CUl IURAS

    de previam ente se inscrever na !ista de espera , iria poder vivei m ais anos parapoder beber do que aqueles que teria de outra fo rm a

    G eertz d iz que este foi -um caso dificil e que acabou da pior maneira- Dopon to d e vista legal, segurarnente , nao fo i urn caso dificil A ju stica processualfo i v isivelrnente feita A ssim com o nao parece tel sido dific il sob a ponto devista da m oral E rnoralm ente gratificante pensal que as decisoes de vida oum orte sao tom adas com base na -severidade da necessidade e da ordem deaplicacao-, e nao, po r exem plo, com base na posicao politica ou financeira,pertenca a uma fam ilia, ou com base na simpatia das pessoas envolvidasAssumimos 0 orgulho m oral do facto de a nossa sociedade tam ar decisoesdeste tipo com base nos m ecan ism os da iusti~ a processual

    G eertz continua, d izendo que nao percebe em que e que m ais etnocen-trism o, m ais relativ isrn o, o u m ais neutra lidade possam tornar as coisas m elho-res (em b ora m ais im ag in ac ao 0 possa fazer)" Eu concordo que nenhum a posi-~ ao filos6fica ou estrategia pode rnelhorar as coisas, m as nao estou segulOacerca de com o e que a im aginacao 0 possa fazer, porque nao estou certodaquilo que e necessirio m elhorar In terprc to i550 com o se G eertz quisessedizer que os m edicos poderiam ter ficado m enos perturbados com 0 seu insu-cesso em tornar 0 indio urn bam pacien te se tivessem conseguido por-se napele dele M as nao e claro que des tivessem que ficar assim ta o perturbadosN ao querem os, efectivam ente, que os m edicos facam difE :len

  • 5/10/2018 Rorty Para Geertz Etnocentrismo

    5/11

    SOCIE DADE CUI.IURAS

    medicos nao tinham era algum conhecimento do que e ser um membrodaquela tribe india, antes, durante e depois da conquista dessa tribo pelosbrancos

    G ostaria de fazer dois com entarios acerca desta diferenca entre G eertz e osm ed ic os P rirn eiro , 0 facto de m uitos m edicos, advogados e professores seremincapazes de se imaginal na pele de muitos dos seus doentes, clientes e estu-dantes nao significa que algo esteja a acontecer no escuro Hi su fic ie nte lu zpa ra eles fazerem 0 seu trabalho, e para 0 fazerem bern feito 0 unico sentidoem que algum a coisa acontece DO escuro e no sentido em que todas as tela-coes humanas que nao envolvam amor acontecem no eSCUTa Irata-se de umsentido amplo de "no escuro- analogo ao sentido ample de -solidao- na qualnos, m ilhoes de m ortais, vivem os Q uando executam os 0 psicopata ou m anda-mos 0 crim inoso de guerra para as gales, estam os, neste sentido am plo, a agirno escuro t que se tivessem os visto 0 crim inoso de guerra crescer, se tivesse-mos peiconido 0 cam inho que ele percorreu, talvez tivessem os dificuldade emreconciliar as exigencias do amor e as da justica Porem , e bom para a socie-dade que na maior parte dos casos a nossa ignorancia nos perm ita evitar estedilem a A s m ais das vezes, a justica tern de ser suficienteo segundo e mais importante comentario que eu gostaria de fazer acercade Geertz e dos medicos e que aquilo que se passou e 0 sinal de gl6ria danossa sociedade liberal, que atribui tanto poder a pessoas como Geertz e aosseus colegas antropologos com o a pessoas com o as m edicos Os antropologose outros connoiseurs da diversidade, de que fala Geertz , sao as pessoas dequem se espera e que tern 0 poder de ampliar os niveis de irnaginacao dasociedade, abrindo assim as portas a justica processual a pessoas para quemtinham estado ate entao fechadas Por que e que, no final de contas, 0 in dio fo iaceite na clinical Par que e que indios bebados fazern, para usar as palavras deGeertz, "tanto parte da America conternporanea- como os medicos y u p p z e s ?G r osz o m o do , porque os antropologos assim 0 fizeram Os indios bebadoseram m ais com uns na Am erica hi cem anos arras do que hoje, porern os antro-pologos eram menos comuns Devido a au senc ia d e in terp retes sim patico s qu ep udessem co lo car 0 comportamento deles no contexto de um conjunto estia-nho de crencas e de deseios, os indios bebados nao faziam parte da Americado seculo dezanove: quer dizer, a grande maioria dos ame i icanos do seculo

  • 5/10/2018 Rorty Para Geertz Etnocentrismo

    6/11

    SOCIEDADE CUl r URAS

    dezanove prestava-lhes tanta atencao como aos erim inosos psicopatas au aostolinhos cia aldeia Os indios, bebados au sobrios, eram nao-pessoas, sem dig-nidade hum ana, m eios para as fins dos n05SOS av6s O s antropologos tornaramdificil para nos continuarmos a pensar aeerca deles dessa forma e, por isso,acabaram par fazer com que des facam "parte da America contemporanea-Fazer parte de uma sociedade e, no sentido forte , ser assum ido como um pos-sivel parceiro de conversacao por aqueles que moldam a auto-imagem dessasociedade Os m eios de com unicacao social, induzidos pelos intelectuais emgeral e pelos antropologos em particular, tern estado a produzir esses parceirospara os indios M as se 0 antropologo nao tivesse sim patizado com , aprendidocom , ou mesmo par vezes amado os indios, estes teriam permanecido invisi-veis aos agentes da justica social jamais teriam chegado ao primeiro lugar dafila d e espera

    Perm itam -m e agora avancar com algum as conclusoes acerea daquilo quetenho vindo a dizer aeerca do caso de Geertz A principal e que as tarefasmorais de uma democracia liberal estao divididas entre os agentes de amor eos agentes de justica Por outras palavras, um a dem ocracia desse tipo em pregae coloca em posicao relevante quer os connoi seurs da diversidade quer osguardioes da universalidade O s prim eiros insistem em que hi pessoas em rela-

  • 5/10/2018 Rorty Para Geertz Etnocentrismo

    7/11

    SOCIEDADE CU I I URAS

    riad ores, escrito res, etno grafo s e joinalistas sensacionalistas, par exem plo, doque aos especialistas em universalidade, com o os teologos ou os fil6sofos Atorrnulacao de prineip ios rnorais gerais tem sido m enos util para 0 desenvolvi-m enta das institu icoes libera is do que a gradual expansao da im aginacaodaqueles que estao no poder, a sua vontade de gradualmente usar 0 te rmo-nos- para inclu ir cada vez m ais diferentes tipos de pessoas A Cond icdo daC la sse T r ab alh ad o ra em I ng la ie rr a de Engels e os trabalhos de autoies comoHarriet Beecher S towe, Fenellosa e M alinowski fizeram mais do que ADialecuca d a N atu re za de Engels, au as trabalhos de M ill e de D ewey, parajustificar a existencia dos fracos de fora aos poderosos de dentro

    P ortanto , sin to-m e inclinado a afastar as questoes que G eertz levanta aeereada resolucao das questoes socials criadas pela diversidade cultural, d izendoque deveriarnos continuar a fazer aquilo que a nossa sociedade liberal ja tern 0habito de fazer: ouvir a tentam ente os espeeialistas em particularidades, penni-tindo-lhes curnprir a sua funcao enquanto agentes de arnot e esperando quedes eontinuem a expandir a nossa im aginacao m oral Nao ha nada incom pati-vel entre este voto e 0 tip o d e a nti-a nti-e tn oc en trismo q ue G e ertz d esc re ve

    Perm itam -m e agora que regresse a um a defesa explieita do anti-anti-etno-centrismo que acim a esbocei Este m ini-movim ento nao deve ser visto nemcom o adiantando um a am pla visao filos6fica acerca da natureza da eultura nemcom o recom endando um a polltica social E ste problem a psicologico apenas seencontra nas alm as dos burgueses libera is que nao se tornaram pos-m odernos,aqueles que ainda usam a retorica racionalista do Ilum inism o para fundam entaras suas ideias Iiberais Estes libera is foram buscar ao Ilum inismo a nocaosegundo a qual ha uma coisa cham ada natureza humana comum , um subs-tracto m etafisico no qual coisas cham adas -direitos- estao inseridos, e que essesubstracto possui precedencia m oral sobre as supeiestruturas rneramente -cultu-rais- Preservar esta ideia produz 0 paradoxo auto-referendal a partir domomenta em que as liberals comecam a perguntar-se se a sua crenca numsubstraeto deste tipo nao sera um enviesam ento cultural O s liberals que saosimultaneamente connoi seurs da diversidade e racionalistas ilum inistas naoconseguem escapar desse im passe 0 seu racionalism o faz com eles proeuremo significado da distincao entre ju izo racional e enviesam ento cultural 0 seuliberalism o obriga-os a designar todas as duoidas aeerea da igualdade hum ana

  • 5/10/2018 Rorty Para Geertz Etnocentrismo

    8/11

    SOCll'DADE CUIIURAS

    com o iesultado de um enviesam ento irracional C ontudo, 0 s eu conhec imen tole va -o s a pensar que a maior parte dos habitantes do glo bo .nao a cre ditam s im -plesm ente na igualdade hum ana, que um a C I enca deste tipo e uma excen tr ic i-dade ocidental D ado que eles assum ern que seria chocantem ente etnocentricodizer "E depois? Nos, lib er ais o cid en ta is , a cr ed itamos d e [a cto nisso , e aindabern para nos', ficam imobilizados

    O s anti-anti-etnocentristas sugerem que os liberals devern dizer exacta-mente isso, e que devem deixar can a distincao en tre juizo racion al e env iesa-mento c ultu ra l 0 Ilum inism o esperava que a filosofia s imu lt an eament e jus ti fi -casse as ideals Iiherais e especificasse lim ites a to lerancia liberal atraves de umapelo a criterios t ranscul tura is de rac io na lid ad e P orem , os filoscfos de tradicaodeweyiana ji nao tern tal pretensao D izem -nos que terernos de estabelecer oslim ites caso a caso, pela in tuicao au atraves de com prom isso conversational enao atraves da referencia a criterios estaveis P ortanto , nos liberais burguesespos-modernistas ji nao etiquetam os as nossas ciencas e os nossos desejos cen-trais com o -necessarios- ou -naturais- e os peritericos com o -contingentes- ou-culturais- T al fica-se, em parte, a dever ao facto de os antropologos, escritorese historiadores terem feito um excelente trabalho exibindo a contingencia devariadas necessidades putativas Em parte, devido ao facto de fil6sofos com oQ uine, W ittgenstein e D errida nos terem cham ado a atencao precisam ente paraa id eia d e uma d is tin ca o n ec es sir io -c on rin ge nte

    Estes fil6sofos descrevem a vida hum ana atraves da m etafora de um conti-nuo refluxo de uma teia de crencas e desejos A partir do mornento em que seadopte esta m etafora, veremos a teia como que sem suturas, no sentido emque ji nao u sarem os distinco es ep istem ol6 gicas p ara a d ivid ir P ortanto , j a naopensarem os em nos como -tontes- seguras do conhecim ento cham a do azao-ou -sensacao- nem como fontes nao confiaveis como a -tradicao- au sensacornum- Pomos de lado as distincoes do tipo conhecimento cientifico vsenviesam ento cultural e -questao de facto vs questao de valor-

    Es ta s u lt ima s d ls ti ncoe s ja foram usadas para evidenciar as crencas que SUl-giam notavelm ente claras e distintas daquelas que pareciam relativam ente dis-cutiveis, aquelas em relacao as quais nos autoconscientem ente procuravamosmanter 0 espirito aberto M as na sua ausencia e natu ral q ue pio curem os ou trostermos que nos perm itam distinguir - ainda que apenas temporariamente e

  • 5/10/2018 Rorty Para Geertz Etnocentrismo

    9/11

    SOCIEDADE CUl TURAS

    p ara d eterrn inad os o bjectivo s - 0 centro da nossa auto-identidade da sua peri-feria T ip icam ente, os terrnos em que caim os sao autoconscientem ente etno-centricos. urn cristae, ou urn am ericano, ou um marxista, ou um filosoto, ouum antrop6logo, ou burgues liberal p6s-m odernista A o adoptar estas autoca-r ac te ri za coes anunc iamos a nossa audiencia de "onde e que vim os-, as nossasa fi li aco es e sp acio- temporai s cont ingen te s

    Em sum a, 0 anti-anti-etnocentrism o deve ser visto com o urn protesto contraa persistencia da retorica ilum inista num a era em que 0 nos so c on he cimentoda diversidade faz com que essa retonca surja com o auto-enganadora e esterilN ao se trata de um a reaccao contra 0 am or au contra a justica au contra as ins-tiru tcoes liberais Irata-se de um poueo de terapia filos6fica ad hoc , uma te nta -tiva para curar as feridas causadas nos liberals par aquilo que B ernard W illiam scham a a t eoria racionalista da racionalidade- - a ideia de que se esta a set ina-cional, e provavelm ente m aldosam ente etnocentrico , sem ple que se apela parac ri te ri os n eu tr ai s I5S0 obriga os liberais a considerarem m uito seriam ente 0facto de os ideais da justica processual e da igualdade humana serem paro-quiais, recentes, desenvolvim entos culturais excentricos, e reconhecer, entao ,que tal nao signifiea que pO I i5S0 sejam m enos dignos de que pO I eles se luteo que faz com que os ideais possam seT lim itados por um a cultura e, contudo,serem a m elhor esperanca das especies

    C onc1uirei estes com entarios retom ando a afirm acao de G eeltz segundo aqual -chegam os a um ponto na historia m oral do m undo em que somas obriga-dos a pensar acerca da diversidade (cultural) de um a forma m uito diferentedaquela em que 0 temos feito- E le desenvolve este ponto dizendo que -esta-mos a viver cada vez m ais no meio de uma enor m e cola gem ", que "0 mundo seesta a tamar em cada local m ais semelhante a um bazar kuwaitiano do que aum clube de gent lemen ingles- Concordo com estas descricoes, m as nao per-eebo pO T que e que Geertz pensa que nos liberais burgueses precisarnos dernudar 0 nosso pensam ento acerca da diversidade cultural no sentido de !idarcom essa situacao E que se trata apenas do tipo de situacao para a qual 0ideal liberal ocidental de justica processual foi pensado para lidar John R aw lsfez notar que "as circunstancias hist6ricas da em ergencia da nocao liberal dejustica- incluem '

  • 5/10/2018 Rorty Para Geertz Etnocentrismo

    10/11

    SOCIEDAD E CUIIURAS

    -resultarn e encorajam a diversidade das doutrinas e a pluraJidade conflitual eefectivam ente incom ensuravel de concepcoes de bern afirrnadas pelos m em -b ro s d as s oc ie dad es d em oc ra tic as existentes-

    A questao fundamental e que nao se tern de aceitar muito ma i s d a c ultu raocidental para achar atractivo a ideal liberal de justica processual A vantagemdo lib er alismo pos -mode rn is ta e que reconhece que ao recomendar esse idealnao esti a recomendar uma visao filosofica, uma concepcao da naturezahum ana ou do significado da vida hum ana, a representantes de outras culturasIudo 0 que ternos que fazer e apontar as vantagens praticas das instituicoesliberals ao perm itir aos indivk luos e as culturas conviverem sem se im iscuiremna privacidade de cada urn, sem se im iscuirern nas concepcoes dos outrosacerca do bem Podem os sugerir que a U I\1ESCOpensa a diversidade culturalnuma escala rnundial da mesma forma que os nossos ancestrais dos seculosdezassete e dezoito pensaram a diversidade religiosa num a escaJa atlantica:como alga a ser sirnplesm ente ignorado em favor do prop6sito da construcaode instituicoes politicas Podem os proper a construcao de um a ordem m undiala partir de urn mode1o deste genero: urn bazar rodeado de im imeros clubesp riv ado s exc lu sivo sTal com o Geertz, eu nunea estive num bazar kw aitiano (nern num clube degen t l emen ingles) Por isso posso dar asas a m inha fantasia Im agino m uitaspessoas num bazar do tipo de que estarnos a falar que prefeririam moner doque partilhar as crencas de m uitos daqueles com quem regateiam , pelo m enosenquanto 0 regateio Ihes trouxer algum proveito Um bazar deste tipo nao e ,obviam ente, urna com unidade, no sentido aprovativo forte de -cornunidade-usado pelos entices do liberalismo como Alasdair M acIntyre e R obert BellahNao se pode tel uma antiquada Gemeinscb fa t , a menos que toda a genre con-corde claramente acerca de quem conta como ser humano decente e quem naoconta como tal M as pode ter-se uma sociedade civ il do tipo democratico bur-gues Tudo 0 que e necessario e a capacidade para controlar os sentim entos decada um quando as pessoas que nos confrontam com o irrem ediavelm ente dife-rentes aparecern na Cam ara M unicipal, na rnercearia, ou no bazar Quando talacontece, sorria-se m ulto, facam -se os m elhores acordos possiveis, e, depois deurn dificil dia de negociacoes, que cada urn se retire para a seu clube A i sere-m os confortados pela com panhia dos nossos iguais em term os de m oral

  • 5/10/2018 Rorty Para Geertz Etnocentrismo

    11/11

    SOCIEDADE CU IIURAS

    Os liberais convictos rejeitatao esta sugestao de que a exdusividade doclube privado possa ser urna caractenstica c r u c i a l de urna ordern mundialideal Parecera uma traicao ao Ilum inismo irnaginarmo-nos a circular numm undo de narcisism o moral, congratu lando-nos a n6s proprios por nao saber-mos nem nos importai mos com saber como sao as pessoas do clube do outrolado do bazar M as se esquecennos 0 ideal ilum inista da auto-realizacao dahum anidade enquanto tal, podem os dissociar liberdade e igualdade da fraterni-dade Se assum irm os as posicoes dos nossos agentes do arnor, dos nossos COl1-noi seurs da diversidade, poderemos concordat com levi-S trauss quando dizque tal exclusividade e uma condicao necessaria e propria de identidade Seassum irrnos as poskoes dos nossos agentes de justica, poderernos vet com o eque identidades tao etnocentricas e exclusivistas podem cooperar no sentidode m anter 0 bazar aberto, em fazer com que as instituicoes da justica proces-sual continuem a funcionar Se procurarm os assum ir am bas as posicoes, perce-beremos que 0 Ilum inisrno nao poderia ter inspirado um a politica m undialcujos cidadaos partilhassern aspiracces comuns e uma cultura comum Naoprocurarem os, entao, um a sociedade que assum a crencas acerca do significadoda vida humana ou ceitos ideais morals como requisitos de cidadania Naoprocuraremos nada mais forte do que um comprom isso com a justica proces-sual raw lsiana - um comprornisso moral quando assum ido por mernbros dealguns clubes (e g , 0 nosso), m as urna questao de conveniencia quando feitopor membros de outros A sintese politica final do amor e da justica podeassim tornar-se num a textura intrincada de colagern de narcisisrno privado ep ragrna tismo publico