romanceiro da incofidencia

36
Estudo de Obra- Romanceiro da Inconfidência Prof: Lígia I - A HISTÓRIA NOS LABIRINTOS POÉTICOS "Liberdade essa palavra que o sonho humano alimenta que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda!" O ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA, publicação de 1953. é uma obra de inspirado e profundo amor à liberdade, às tradições históricas. A poeta Cecília Meireles escolheu como forma de expressão a técnica dos romances populares medievais, de inspiração épica e lírica. Os romances, de origem Ibérica, eram narrativas em verso (redondilha maior) escritas em linguagem popular, usual. O ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA é um longo poema, com 96 textos poéticos, em que "a autora assume a voz de um rapsodo (cantor-poeta ambulante da Grécia antiga) para reconstituir a histórica Minas Gerais do século XVIII. Abrange história e imaginação numa fusão perfeita. Desfilam os ambientes auríferos e diamantinos, com sua organização sócio-política e económica. Recompõe-se poeticamente a ventura idealista dos famosos conjurados, o auge de seus sonhos libertários - o heróico Tiradentes. Cecília faz-nos lamentar a derrota do movimento de asas, que poderia ter liberto do poder lusitano, se não fosse a pusilanimidade de Joaquim Silvério dos Reis. O eu poético aponta para o fato fatal do ouro ter trazido forme, algemas, masmorras, cadafalsos. Onde houve riqueza, houve jugo do poder e houve mortes. Contudo, a proposta era bem explícita: LIBERDADE AINDA QUE TARDE, sonho visionário e contagioso veneno. "Cecília Meireles não é inteiramente afirmativa quanto à relação de causa e efeito entre as ações e duração dos fatos. A sua abordagem poética é prepassada por mistérios, conduzindo-nos a reflexões, a ambíguas indagações: os mortos serão realmente mortos? Há tanta coisa submersa na "cova do tempo", tanto a se investigar no âmbito da História". O ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA não se subordina à história, mas sim propõe a sua recriação poética. O passado em si não é objeto de todo decifrado, mas sim fonte curiosa de investigação a fim de se compreender melhor a estrutura do presente, para projetar melhor um futuro. Lembremo-nos de que o tempo é de todo soberano e os homens submissos a ele, conforme se lê nos versos Cicilianos. "Os mortos não tem existência própria, é óbvio, só ganham-na se redivivos na reinvenção poética, sem a qual, segundo Cecília Meireles, a vida não é possível. " A par de um roteiro histórico, visualizado em incansáveis pesquisas com inúmeras fichas de notas, vivências do ambiente, viagens, sonhos, observações e imersões no passado, Cecília Meireles obteve o levantamento da época histórica que se propôs poetizar. Desencadeou-se uma

Upload: hildalene-pinheiro

Post on 21-Jun-2015

520 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Romanceiro da incofidencia

Estudo de Obra- Romanceiro da InconfidênciaProf: Lígia

I - A HISTÓRIA NOS LABIRINTOS POÉTICOS

"Liberdade essa palavraque o sonho humano alimentaque não há ninguém que explique,e ninguém que não entenda!"

O ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA, publicação de 1953. é uma obra de inspirado e profundo amor à liberdade, às tradições históricas. A poeta Cecília Meireles escolheu como forma de expressão a técnica dos romances populares medievais, de inspiração épica e lírica. Os romances, de origem Ibérica, eram narrativas em verso (redondilha maior) escritas em linguagem popular, usual.O ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA é um longo poema, com 96 textos poéticos, em que "a autora assume a voz de um rapsodo (cantor-poeta ambulante da Grécia antiga) para reconstituir a histórica Minas Gerais do século XVIII. Abrange história e imaginação numa fusão perfeita. Desfilam os ambientes auríferos e diamantinos, com sua organização sócio-política e económica. Recompõe-se poeticamente a ventura idealista dos famosos conjurados, o auge de seus sonhos libertários - o heróico Tiradentes. Cecília faz-nos lamentar a derrota do movimento de asas, que poderia ter liberto do poder lusitano, se não fosse a pusilanimidade de Joaquim Silvério dos Reis. O eu poético aponta para o fato fatal do ouro ter trazido forme, algemas, masmorras, cadafalsos. Onde houve riqueza, houve jugo do poder e houve mortes. Contudo, a proposta era bem explícita: LIBERDADE AINDA QUE TARDE, sonho visionário e contagioso veneno."Cecília Meireles não é inteiramente afirmativa quanto à relação de causa e efeito entre as ações e duração dos fatos. A sua abordagem poética é prepassada por mistérios, conduzindo-nos a reflexões, a ambíguas indagações:os mortos serão realmente mortos? Há tanta coisa submersa na "cova do tempo", tanto a se investigar no âmbito da História". O ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA não se subordina à história, mas sim propõe a sua recriação poética. O passado em si não é objeto de todo decifrado, mas sim fonte curiosa de investigação a fim de se compreender melhor a estrutura do presente, para projetar melhor um futuro. Lembremo-nos de que o tempo é de todo soberano e os homens submissos a ele, conforme se lê nos versos Cicilianos. "Os mortos não tem existência própria, é óbvio, só ganham-na se redivivos na reinvenção poética, sem a qual, segundo Cecília Meireles, a vida não é possível. "A par de um roteiro histórico, visualizado em incansáveis pesquisas com inúmeras fichas de notas, vivências do ambiente, viagens, sonhos, observações e imersões no passado, Cecília Meireles obteve o levantamento da época histórica que se propôs poetizar. Desencadeou-se uma transfiguração poética para enriquecer a abordagem da história. Os poemas do romanceiro são revestidos por alucinante, comovente beleza que transcende a própria base histórica. O ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA é, portanto, uma fusão impressionante, mística-mágica, entre História e Poesia. Cria-se no leitor mais sensível uma nostalgia dos antepassados mineiros do Brasil, que buscavam a trilha da liberdade. Ressurgem o período aurifero-diamantino, com suas deslumbrantes personagens embriagados pela ganância de riqueza e outros mais alucinados; os sonhadores com liberdade. Personagens embotados no tempo viveram cada um a sua verdade: sede do brilho da fortuna, ânsia de conquistar digna libertação. Muitos ébrios de negritude gananciosa; tantos perdidos na querência libertária; outros, praticando a mesquinha traição. E nós, presentes, espreitando fascínios poéticos sedutores.Cecília Meireles criou um eu poético (épico-lírico), possuído pela paixão, que se debruçou sobre a Inconfidência Mineira - essa história política insuflada, poderosamente, pela ambição, pelo sensualismo, pelo misticismo, pela paisagem envolta em mistério. O eu poético está atento a tudo, observador, tudo vê, de tudo suspeita. Mergulha-se no tempo, reconstrói-se a história. A autora compôs brilhantíssima obra na qual História, Poesia, linguagem se conjugam para constituir o mais esplêndido poema Nacional em homenagem ao nosso passado, de apreço à nossa memória, de amor à liberdade. (LI - BER - DA - DE).Quanto à estrutura, Cecília Meireles designou os poemas em obediência à unidade histórico-poética onde os romances são numerados e nomeados. Há também as falas, os cenários e dois poemas avulsos. Os poemas estão amparados na lembrança de nossa essência histórica. Existe toda uma sabedoria e amor-pátrio nos vigorosos poemas de natureza épica-lírica, mesclados ao caráter dramático. O singular resultado de uma

Page 2: Romanceiro da incofidencia

poetização que honra, dignifica, glorifica a História Libertária que é nossa. Poesia que nos convence, pela emoção, de que os fatos da nossa vida sócio-política-cultural possuem raízes históricas muito nossas que precisam ser conhecidas e preservadas; questionadas e passadas a limpo.Cecília Meireles foi maiúscula, plural no ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA para transformar o que ontem eram aflições, delações, ou visões libertárias em duras indagações, algumas certezas e muitos ardentes mistérios. Procuramos as verdades da vida do nosso passado, além das falácias do poder de manipulação e opressão. Com muita fineza poética e autenticidade, os vultos históricos são iluminados, respeitados e liricamente desalienados. A voz da História, ouvida através da poesia, dá-nos exata medida de uma convição artística: a arte recria genialmente o processo histórico. E uma voz nítida, apesar de estar repleta de medo, contradições humanas e de tons inquiridores. Há poemas que nos comunicam ao espírito a delicadeza árcade de uma época; outros que exigem o assombro e indignação frente a execuções infames.Cecília Meireles pôde temperar, liricamente, históricos incidentes da Inconfidência Mineira. Foi bastante sensível para analisar os fatos históricos a fim de construir seus poemas em linguagem depurada, requintada, firme, singela. Toda a linguagem poética em função de revalorização histórica. O "Romanceiro da Inconfidência, apesar de conter uma resposta positiva à angústia do tempo, faz alguma concessão à utopia romântica." (Admite uma projeção intemporal no ideário humano em busca da Liberdade.)"Cecília Meireles, em seus poemas do Romanceiro, permanece pessimista em sua concepção de História. Nunca se mostrou convencida de que a História fosse uma linda que vai do paraíso ao paraíso, com alguns desvios pelo meio. Para a poeta, a História era uma infinita sucessão de erros e fardos pesados, que ninguém sabe aonde leva. " "Uma concepção dada ao desespero. Cecília, sabiamente, soube ver os desastres e tragédias da História e construiu tentativas de reinventar a vida, destinadas a torná-la possível. "O ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA nos conduz a uma atmosfera de lembranças ressuscitadas na memória do tempo, onde História e Poesia encontram abrigo numa linguagem de poderosa expressividade. As indagações do primeiro poema (Fala Inicial)

"ó vinte e um de abril sinistro,que intriga de ouro e de sonhohouve em tua formação?Quem ordena, julga e pune?Quem é culpado e inocente?Onde, os rostos? Onde, as almas?"

Encontram respostas mansamente formuladas numa linguagem de sensível sabedoria e temível realidade."Na mesma cova do tempocai o castigo e o perdãoMorre a tinta das sentençasE o sangue dos enforcados"...

Imaginariamente, somos conduzidos ao tempo da Inconfidência Mineira, tempo das ideias venenosas contra a opressão do poder. A época das delações, das sentenças de prisão, degredo e "morte natural para sempre naforca'^ para o criminoso de lesa-majestade, Tiradentes. Tempo de idílio interrompido de Manila e Dirceu. (A inconformada Marília em sua Imaginária Serenata.) Época da dor dramática de dona Bárbara Eliodora, que perdeu seu esposo Alvarenga e sua filha, que morreu tão jovem, Maria Ifigênia Tempo do poeta Cláudio Manoel da Costa, figura sobre a qual permanece o "mistério parado":Teria Glauceste sido morto, ou se suicidado? Quem sabe foi protegido em fuga? Enigmas sobre a névoa que se adensa na poeira do tempo. A poesia do Romanceiro traz também os ilustres assassinos. Desfila, ainda, o resultado das vaidades de espírito, como no caso da rainha louca, Maria I, que assinou a sentença de condenação para os inconfidentes. Cecília dedicou versos até aos cavalos da Inconfidência. Com um grau de sensibilidade inigualável, a autora nos surpreende com sua poesia humanamente histórica.Ao se ler o ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA, é possível ver, na atemporalidade da Ouro Preto de hoje, suas vielas tortuosas e arquiteturas seculares, sua poética com palavras de delírio, desespero, opressão, liberdade, violência, vida, morte. Há juras de amor, há conspirações e denúncias entre pontes, chafarizes, segredos e flores murchas pelo tempo. Há leques, colinas, janelas, portas, enterros e enormes silêncios. "O céu é o mesmo sobre os tempos que atravessam o coração das horas aflitas." Revelam-se suspirosos segredos, gemidos, lamentos de personagens antigas, de eras antigas donde se destacam Felipe, Chico Rei, João Fernandes, Chica da Silva, Marília, Dirceu, Glauceste, Nise, Bárbara, Alceu, Toledo, Rolim, Pamplona, Francisco António, Vitoriano, Silvério, Tiradentes e tantos outros. Todos ganham seu destaque nessa obra que, como um rio de música, desagua em nossa mente e sentimento, com a certeza de que o tempo da Memória Nacional foi plenamente reconquistado. O ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA ensina-

Page 3: Romanceiro da incofidencia

nos um apego à História Pátria através de indagações, exclamações, cismas, lamentações, advertências. O retraio da morte se desenha insistentemente, tendo ao lado a eternidade do sonho de Liberdade. Toda a História das Minas Gerais, tramada na era inconfidente, transita frente a nossa imaginação. Recompomos também os mais árcades cenários - das mais belas flores silvestres, ouvimos o toque de "sinos da agonia" ecoando nos ares de tempos que não se findam. Por horizontes que desmaiam na luz de uma eternidade histórica vemos a "mão do alferes que de longe acend\ Mergulhamos na máquina da memória criadora através da poesia do ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA para repetirmos, seduzidos como Cecília Meireles.

Ai, palavras, ai, palavras,que estranha potência, a vossa!Ai, palavras, ai, palavrassois de vento, ides no vento,no vento que não retomae em tão rápida existência,Tudo se forma e transforma!"...

II - O TÍTULO: ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA

Romance = Nome dado para narrativas em verso, assunto heróico fantasioso de origem medieval - popular, originário na Península Ibérica.

Eiro = sufixo de coleçãoColeção de romances acerca do ouro, do diamante, da liberdade, envolvendo a história (trama) da

Inconfidência Mineira

III - GÉNERO LITERÁRIO

1°) Épico = Revela a história de interesse NACIONAL. Reconstituição da memória brasileira - contexto da nacionalidade.2°) Lírico = Contém poemas de natureza sentimental, subjetiva e melancólica, os quais enfocam as paixões e os sentimentos humanos.3°) Dramático = Constam poemas de nome CENÁRIO, para contextualizar o ambiente; outros versos de caráter representativo (teatrais) com diálogo, monólogo, fala. Uma espécie de coro de vozes prepassa todo o ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA.

IV - DIVERSIDADE DOS ESTILOS LITERÁRIOS

1°) BarrocoA noção do efémero sempre se inscreve na obra de Cecília Meireles. A transitoriedade está em tudo, os contrastes das realidades da vida também. O ser humano sempre em dualismo; constantes jogos de pólos opostos em binómios: vida-morte, pecado-perdão, corajoso-pusilâmine, relativo-absoluto. O abarrocado sentido trágico para a vida e a morte.

2°) NeoclassicismoRecriação da ambiência árcade, registram-se paisagens bucólicas e as ideias dos poetas arcádicos - a vida fingida de pastor; as amadas pastoras idealizadas. Cecília visita o PAÍS DA ARCÁDIA.

3°) RomantismoA figura mística e utópica de TIRADENTES redimensionado como herói (sem perder traços humanos). O homem que comporta o sonho de liberdade dos brasileiros. Tiradentes descrito poeticamente como o sonhador-idealista, cavaleiro andante visionário qual Dom Quixote. Proclamador da liberdade política e igualdade social. A exaltação gloriosa do passado histórico acentua o sentimento romântico- nacionalista: o amor à pátria.Elevação do sentimentalismo lírico, os amores impossíveis e trágicos:(Marília e Dirceu); (o assassinato para impedir a paixão da donzelinha).

Page 4: Romanceiro da incofidencia

4°) SimbolisinoPresença de sugestões simbólicas, envolvidas em mistério e misticismo. A poeta delinea a loucura, o sonho, a exposição dos estados d'alma.Valoriza-se o inconsciente, o vago e etéreo. Há diversas interrogativas em tomo do inexprimível (inexplicável) tanto humano como histórico.O ritmo melódico e musical conjuga-se à exploração de imagens sinestésicas, em sintonia com a abstração ou transições do concreto para o intangível.

5°) ModernismoA mesclagem (fusão) entre os géneros literários: Épico - Lírico -Dramático, a convivência de vários estilos de época de acordo com a expressividade temática ou com a reconstituição de época; a poetizaçãodos fatos históricos constituem a modernidade do ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA.A revisão da história numa perspectiva de avaliação critica e questionadora, para a tomada de consciência guanto aos valores

Nacionalistas: defesa ideológica do sonho dos revolucionários da INCONFIDÊNCIA MINEIRA; protesto (ataque) contra a opressão do poder da Metrópole Lusitana.O modernismo também está na dimensão universalizante, porque CECÍLIA MEIRELES poetiza o sonho maior do homem: conquista da LIBERDADE. Outros temas generalizados: paixões humanas, armadilhas da traição (pusilânimes) a ganância (cobiça) por riqueza.

V - ESTRUTURA DO ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA

Publicação do ano de 1953, contém 96 poemas assim distribuídos:

(A) 85 romances - marcados em algarismos romano, com títulos, destinados a desenvolver a história que se recria poeticamente.

(B) 5 falas = 1a Fala inicial, 2a Fala à antiga Vila Rica, 3a Fala aos pusilânimes, 4a Fala à Comarca do Rio das Mortes, 5a Fala aos Inconfidentes Mortos.Evidencia-se o eu lírico-poético manifestando seus sentimentos melancólicos. Há um tom de lamentação frente à história de injustiças e desastres.

(C) 4 Cenários - cada cenário situa o local dos acontecimentos e "desenha" as paisagens de Vila Rica.

(D) l Imaginária Serenata.

(E) 1 Retrato de Marília em Antônio Dias Focalização de Marília a lamentar a perda de Tomás António Gonzaga

(D). Marília de Dirceu já velha; próxima da morte (E).

VI - ROTEIRO DO ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA

1a Parte - FALA INICIAL

Referência à arbitrariedade do poder e à ação implacável do tempo devorador.Cenário - Reconstituição dos ciclos do ouro, do diamante e da liberdade sonhada

a) CICLO DO OURO: romance I até romance XII (VILA RICA). A descoberta do ouro; a exploração insana dessa riqueza; as mortes por cobiça (destaque para o R. IV da Donzela Assassinada). __A morte do rebelde Felipe dos Santos (R. V) condenado como Traidor da Metrópole Lusa (crime de Lesa - Majestade). A figura de Chico Rei (relação dos negros com o ouro). A figura de Tiradentes ainda menino (R. XII): Nossa Senhora da Ajuda - prenúncio da condenação do alferes à força.

b) CICLO DO DIAMANTE. Romance Xin até romance XIX. (SERRO DO FRIO - TEJUCO)reconstítuição da história do Contratador de Diamantes João Fernandes de Oliveira e da amante Chica da Silva (negra exótica) O Conde de Valadares conduziu João Fernandes a Portugal para prestar contas a

Page 5: Romanceiro da incofidencia

Coroa Real, fim do "império" de Chica e Fernandes (R. XIX) - A fugacidade do tempo e efemeridade de todas as riquezas.

2a Parte - CICLO DA LIBERDADE

c) A trama da INCONFIDÊNCIA MINEIRA e A TRAIÇÃO de Joaquim Silvério dos reis. O cenário: Evocação à paisagem de Vila Rica Fala à Antiga Vila Rica:identificação entre as figuras dos chafarizes e os homens que viveram em Vila Rica

d) Do romance XX até romance XXVIIIA vida social, política e económica de Vila Rica, com antecedentes da INCONFIDÊNCIA MINEIRA. A escassez de riqueza aurífera, levando ao projeto da Derrama. A trama da INCONFIDÊNCIA por ideia dos intelectuais, mineradores, padres, civis, militares: o alferes Joaquim José da Silva Xavier (Tiradentes). Ergue-se a bandeira da Inconfidência Mineira: Libertas quae será tamem: Liberdade ainda que tarde). A peregrinação do alferes Tiradentes, divulgador das ideias libertárias.

e) Do romance XXVTtI até o romance XLVIICarta denúncia de J. Silvério. Alguns admiravam a coragem de Tiradentes; outros, porém, consideravam-no um louco. Previsão da morte trágica de J. J. da Silva Xavier. Silvério dos Reis, comparado ao traidor Judas. Tiradentes foi abandonado por todos os ex-companheiros, encontrava-se distante de Minas Gerais, solitário e perdido em seus sonhos libertários. A prisão de vários inconfidentes e inúmeras arbitrariedades da Coroa Portuguesa: a justiça (bastarda, injusta, vendida) escolheu

Tiradentes como criminoso de Lesa-Majestade: (traidor punido com a morte na forca). Arranjavam-se falsas testemunhas para depoimentos condenatórios. Sequestro dos bens de todos os inconfidentes.

3a Parte - SENTENÇAS, CONDENAÇÕES E EXECUÇÕES

Fala aos Pusilânimes (perversos, fracos) Os covardes, mesquinhos que abriam mão de qualquer sonho em favor de denunciar falsamente até os próprios parentes. Delações devido à mesquinhez, à cobiça e ao medo.

f) Do romance XLVII até romance LXIVA trama de destinos cruéis - misteriosos em tomo da morte de Cláudio Manuel da Costa.Denúncia dos enganos cometidos pela justiça. Previsão da condenação de Tiradentes para o sacrifício exemplar: morte na forca. Reflexão sobre o poder das palavras idealistas e condenatórias. A prisão do poeta ouvidor Tomás António Gonzaga. Os bens do alferes Tiradentes (parcos pertences) destinados ao leilão. Defesa imaginária para o sonhador e "lunático" J. J. da Silva Xavier. Cortejo do Sacrifício Exemplar para o réu Tiradentes, o qual caminhava rumo à forca. Um bêbado questionou o aparatoso espetáculo da morte por enforcamento. A execução de Tiradentes. Reflexões sobre o sonho de liberdade que o "herói" não conseguiu realizar, porém ofereceu sua vida em nome da Libertação do Brasil.

4a Parte: OUTROS DESTINOS DE INCONFIDENTES E FAMILIARES. D. MARIA I, RAINHA LOUCA

Cenário: Localiza-se, em abandono, o jardim do poeta Gonzaga.

g) Do romance LXV até o romance LXXX O exílio de Gonzaga (o "Dirceu de Marilia") em Moçambique - terra africana escravizada por Portugal. O casamento do poeta com Juliana de Mascarenhas. O desconsolo de Maruia {Maria Dorotéia Joaquina de Seixos Brandão) que (na Imaginária Serenata) não se conformava com o destino do amado Dirceu (Tomás A. Gonzaga). Detalhes sobre a cruel loucura da rainha Maria I, que condenou os inconfidentes. A majestade tomou-se prisioneira da Demência.

h) Fala à Comarca do Rio das Mortes, onde se focalizaram Pé. Toledo (caído em esquecimento) e dona Bárbara Eliodora (desesperada pela prisão perpétua de seu marido Alvarenga Peixoto (exilado na África). A bela Maria IHgênia, filha de Bárbara e do poeta Alvarenga, morreu ainda criança. Agravava-se a depressão de dona Bárbara. A morte e o enterro de Bárbara Eliodora. Destaque para a ação corrosiva, implacável do tempo.

Page 6: Romanceiro da incofidencia

5a Parte: MORTE DA RAINHA LOUCA. O TESTAMENTO DE MARÍLIA E A FALA AOS INCONFIDENTES MORTOS.

i) No poema Retrato de Marília em António Dias focalizou-se Marília na velhice, ainda prisioneira do amor por Dirceu. Poema Cenário;agravamento da loucura de Maria I.

j) Do romance LXXXI até a Fala aos Inconfidentes Mortos.A força bruta dos assassinos que mataram por riqueza e poder. Maria I se via condenada ao inferno;morreu temendo a fúria de Satanás. O enterro da rainha Louca.Cecília Meireles saúda os cavalos da Inconfidência no r. LXXXIV.Marília escreveu seu testamento já muito velhinha, restava-lhe apenas aguardar a morte.Na Fala dos Inconfidentes Mortos = reforço da ideia do tempo corrosivo - imenso: Tempo - água implacável (devorador) a lavar - levar tudo e todos.Apenas a memória possui o poder de resgatar o tempo.

VII - PROTAGONISTAS - ANTAGONISTAS E FIGURANTES EM ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA

1°) OS PODEROSOS: A FÚRIA CRIMINOSA DO PODER

a) D. JOÃO V: Rei de Portugal (avó de Maria I) Viveu em luxo - ostentação, mas seu Reino era devedor à Inglaterra, a qual pagava com o ouro do Brasil. Foi enganado conforme o r. VI da Transmutação dos Metais: no lugar de caixotes de ouro recebeu chumbo, falsa paga do quinto do ouro).

b) MARIA I: Rainha da Coroa Portuguesa na época da Inconfidência Mineira (1789). Assinou as sentenças de condenação dos inconfidentes. Enlouqueceu quando morreram seu marido e dois filhos. No enfoque poético, roeu-se de remorsos por causa das prisões perpétuas e mortes que saíram de suas mãos. Sofreu pavores do inferno, de demónio, aprisionada pela loucura. Em 1808 chegou ao Brasil com o filho D. João VI. Ela morreu em profunda demência.

c) D. PEDRO DE ALMEIDA: Conde de Assomar, Governador Tirânico de Minas Gerais (1717 a 1821) mandou executar Felipe dos Santos na forca. Alertou ao rei João V que as Minas Gerais tinham o espírito da conspiração e exigiam o braço de ferro do governo.

d) JOSÉ LUÍS MENESES DE CASTELO BRANDO E ABRANCHES: Conde de Valadares. Designado pela Coroa Portuguesa para prender João Fernandes, contratador do Distrito Diamantino. Antes de cumprir sua missão, recebeu muita riqueza de J. Fernandes, omitindo-lhe as verdadeiras intenções. Depois traiu o contador, levando-o preso por não pagar o fisco à Coroa.

e) LUÍS ANTÓNIO FURTADO DE MENDONÇA: Visconde de Barbacena. Governador de Minas Gerais (1788 - 1792), cuja missão era cobrar a Derrama. Mandou suspender a derrama para evitar a Inconfidência Minera, prendeu os conjurados. Sugere-se que talvez Barbacena também estivesse envolvido na conspiração.

2°) OS INIMIGOS DO PODER

a) JOAQUIM JOSÉ DA SILVA XAVIER:Tiradentes. Recriado como herói, figura como mito, o cavaleiro da esperança, filantrópico - altruísta, idealista qual D. Quixote. Encerrava o desejo rebelde de libertar o Brasil do jugo de Portugal. Foi corajoso para enfrentar a morte em favor de um sonho. Apontado como criminoso de lesa-majestade, como traidor (maior vítima da Coroa Portuguesa) executaram-no na forca e depois esquartejaram-lhe o corpo.

b) FELIPE DOS SANTOS: revoltoso português - um tropeiro que protestou contra a abusiva cobrança de impostos, liderou um movimento rebelde (1720) condenado, sem julgamento, foi conduzido à força e depois de morto amarraram-no em cavalos para que seu corpo fosse esquartejado. Ordens cruéis do cruel Conde de Assumar.

Page 7: Romanceiro da incofidencia

c) CLÁUDIO MANUEL DA COSTA - Poeta das Minas Gerais - o árcade Glauceste Satúrnio Rico minerador e desembargador de Vila Rica. Um articulador de ideias revolucionárias. Encarcerado num cubículo da Casa dos Contos. Dúvidas quanto ao seu destino: Suicídio? Assassinato? Fuga? Raptado? No ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA o mistério permanece:Cláudio era secretário do governo e afilhado de João Fernandes.

d) TOMÁS ANTÓNIO GONZAGA - Poeta de Portugal ocupava o cargo de Ouvidor-mor de Vila Rica. Celebre devido à lírica amorosa Marília de Dirceu. Há dúvidas sobre sua atuação como inconfidente: rebelde, sim ou não? Prenderam-no na "Ilha das Cobras", onde escreveu a segunda parte da lírica, transparecendo uma autodefesa. Negou qualquer participação no movimento inconfidente. Foi degredado para Moçambique, onde exerceu cargo na magistratura. Casou-se com Juliana de Mascarenhas, rica e analfabeta.

e) JOSÉ INÁCIO DE ALVARENGA PEIXOTO - Poeta português, magistrado, latifundiário e minerador. Habitava a Comarca do Rio das Mortes (região de São João Dei Rei) Era marido de Bárbara Eliodora, a quem amava profundamente. Foi preso, degredado para a África e condenado à prisão perpétua. Pouco restou de sua obra poética (destruída pelo confisco português.) Na prisão escreveu apaixonados e entristecidos versos a amada. Morreu precocemente.

f) PADRE OLIVEIRA ROLIM - Reflexo da devassidão do clero: culpado por crimes pequenos;envolvido com mulheres casadas e donzelas. Possuía "livros libertinos" (Voltaire - Mably). Enquanto discutiam sua prisão, fugiu levando seus "sete pecados": aventureiro, envolvido com maçonaria, contrabando, mulherengo.

g) CARLOS CORREIA DE TOLEDO E MELO - Padre Toledo era próspero minerador paulista. Residia naComarca do Rio das Mortes. Possuía diversos livros comprometedores, cheios de ideias liberais. Prenderam-no e degredaram-no na condição de inconfidente rebelde.

h) FRANCISCO ANTÓNIO - Militar e proprietário rural, escravocrata. Envolvido na inconfidência, foi preso e deportado para Angola.

i) SEBASTIÃO FERNANDES REGO - Responsável pela troca do quinto do ouro por grãos de chumbo, trapaça contra o rei D. João V.

j) VITORIANO VELOSO - alferes condenado ao degredo na África, porque surpreenderam-no levando uma carta conspiradora a Francisco António.

I) INÁCIO PAMPLONA - Minerador. Diz que talvez ele tenha vindo escondido (especulações poéticas) para raptar o poeta Cláudio Manuel, salvando-o em surdina: Será?

3°) OS PUSILÂMINES

a) JOAQUIM SELVÉRJO DOS REIS - Minerador individado, delatou a Inconfidência Mineira para obter perdão a suas dívidas, além de outros benefícios financeiros. Pior traidor que Judas, pois não sentiu remorsos. Envelheceu gozando as vantagens económicas que obteve como traidor.

b) TESTEMUNHA FALSA - Configura-se o tipo de pessoa que aceitava (por dinheiro) acusar quem a Coroa Portuguesa queria condenar.

c) DELATORES - Sempre havia gente disposta a delatar nas Minas Gerais. No "diz que me disse" das intrigas dos meirinhos, carcereiros, capitão, ouvidor, minerador, militar, povo...

d) CAIXEIRO VICENTE VIEIRA DA MOTA - Não se lembrava, por conveniência, dos favores que lhe fizera o alferes Tiradentes (arrumou-lhe os dentes). Testemunhou na acusação do réu-mor Joaquim José da Silva Xavier.

e) CARCEREIRO - Uma voz em primeira pessoa que, ao encarcerar o preso Tiradentes, previu que este seria

Page 8: Romanceiro da incofidencia

condenado por crime de lesa-majestade.

f) MALDIZENTES - Vozes que comentaram a desgraça do poeta Gonzaga -degradado para África - falaram em favor da punição, com prazer.

g) SENTINELAS - Soldados que espionaram e vigiaram Tiradentes para, depois, prendê-lo.

4°) DA REGIÃO DO SERRO DO FRIO (TEJUCO)

a) JOÃO FERNANDES DE OLIVEIRA - Nomeado por duas vezes consecutivas como contratador de Diamantes. Alcançou enorme quantidade de gemas preciosas às custas da morte de inúmeros escravos, perdidos em perigosos locais de mineração. Viveu como amante da negra que alforriou - Chica da Silva, com quem teve 13 filhos. Ainda que oferecesse imensa fortuna ao Conde de Valadares, não conseguiu evitar o pior: foi preso e encaminhado a Portugal, para prestar contas de sua fortuna suntuosa, arranjada em cumplicidade com contrabandistas.

b) FRANCISCA DA SILVA (a Chica que Manda) Negra famosa no Tejuco devido à sua exuberância, extravagância, exotismo e riqueza (coberta pêlos diamantes do amante João Fernandes). Chica, astuta, alertou-o sobre o fingimento do Conde de Valadares, mas não foi ouvida. Acabou-se o reinado de Chica da Silva quando o contratador foi levado para Portugal.

c) FELISBERTO - Um conde contratador de diamantes, ameaçou apunhalar até à morte o Ouvidor Bacelar, o qual se apaixonara por uma donzela das relações do contratador.

d) SAPATEIRO CAPANEMA - (Manuel) considerado conspirador, traidor da Coroa porque disse que os branquinhos do Reino, um dia, seriam expulsos do Brasil. Foi condenado à prisão por seu atrevimento.

5°) FIGURAS FEMININAS

a) DONZELINHA ASSASSINADA - Eu lírico da moça morta vaga como um fantasma, para contar que foi assassinada (com um punhal de ouro) pela mãos de seu pai; pois ela se enamorou por um rapaz pobre.

b) DONZELINHA POBRE - Vivia sozinha lamentando a ausência de toda a sua família, que viajou para as catas de ouro, movidos por imensa cobiça.

c) MARÍLIA - Maria Dorotéia Joaquina. A musa árcade inspiradora das liras de Gonzaga. Foi noiva deste poeta-ouvidor. A bela jamais se conformou com o exílio do amado. Não pode crer que Tomás António se casou, portanto viveu muitos anos a esperá-lo de volta a Vila Rica. Marília transformou-se numa prisioneira de seu amor por Dirceu, para toda a vida.

d) BÁRBARA ELIODORA - A esposa amada (do norte estrela) de Alvarenga Peixoto. Nunca se conformou com as desgraças que se abateram sobre o seu marido (Alceu): degredado para Ambaca, em Angola. Ela viveu entre mágoas e sofrimentos, na Comarca do Rio das Mortes, até enlouquecer de tristeza, prisioneira da dor de um amor perdido.

e) MARIA IFTGÊNEA - A linda filha de Bárbara e Alvarenga, parecia uma princesa. Morreu ainda menina, aumentando a desgraça e tristeza da mãe.

f) JULIANA DE MASCARENHAS - Rica herdeira de um mercado de escravos. Em Moçambique desposou o juiz Tomás António Gonzaga.

6°) OUTRAS FIGURAS

a) CHlCO REI - Foi rei em Luanda (África), entretanto capturaram-no como escravo. Em M. G. trabalhou nas minas de ouro e atuou como uma espécie de líder entre os negros. Chico incentivava a procura e o desvio clandestino do ouro em Vila Rica, incitando os pretos a comprarem as suas liberdades.

Page 9: Romanceiro da incofidencia

b) DOMINGOS - Todos relacionados a Tiradentes: Domingos Xavier Fernandes (avô); Domingos Silva Santos (pai); Domingos Abreu (padrinho); Domingos Fernandes Cruz (hospedeiro); Domingos Rodrigues Neves (condutor dos pedaços do corpo esquartejado do alferes Tiradentes).

c) NEGROS DAS CATAS - Inúmeros escravos que trabalhavam nas Minas de Ouro e Diamante. Vítimas de sofrimentos - crueldades e explorações desumanas.

d) LADRÕES E CONTRABANDISTAS - Homens que atuavam principalmente roubando, extraviando ouro para o desassossego da Coroa Portuguesa.

e) CAÇADOR FELIZ - Representante dos homens gananciosos cuja alegria estava apenas em encontrar ouro, para tanto não se importavam de morrer.

f) D. RODRIGO CÉSAR - O suspeito inicial de ter mudado ouro em chumbo do rei D. João V; agiu em parceria com Sebastião Fernandes Rego.

g) CIGANO - Previu a desgraçada morte de Tiradentes na forca. Intuiu que o alferes mantinha um sonho, não o considerou louco.

h) MULATA - MINHA BOA CAMARADA - Mulher de quem Tiradentes se despediu, quando viajou ao Rio de Janeiro, para a caminhada em função de expor as ideias de independência ao povo. Ela previu a tragédia do sonhador, pois pobre não podia sonhar com liberdade e muito menos falar em ser livre.

i) EMBUÇADO - Alguém mascarado alertou os Inconfidentes que fugissem, pois as prisões já estavam decretadas. Aconselhou Cláudio Manuel a desaparecer.

j) CARRASCO CAPITANIA - Acreditava nas boas intenções de Tiradentes; portanto, antes de enforcá-lo, ajoelhou a seus pés e chorou.

l) BÊBADO DESCRENTE - Questionou o absurdo de se fazer um cortejo festivo para conduzir Tiradentes à força ironicamente, apresentava-se mais lúcido que tantos, pois desaprovava o horror da morte na forca ser tão festejada.

m) ILUSTRES ASSASSINOS - Aqueles gananciosos por riqueza e poder, os quais assinavam condenações à morte dos que se punham em desfavor aos seus interesses pessoais.

n) PASCOAL DA SILVA GUIMARÃES - Imigrante português enriquecido no comércio e mineração. Juntamente com Felipe dos Santos articulou o levante de 1720.

o) TROPEIROS - Os que conduziam animais de cargas. Alguns criticavam Tiradentes, outros admiravam-no ao ouvi-lo falar no sonho de liberdade. Tantos consideravam-no louco.

VIII - RECONSTITUIÇÃO HISTÓRICA

l °) A ÉPOCA DO OURO - VILA RICA

Reflexões sobre os acontecimentos trágicos em consequência da ganância (fome) de ouro. Morte, prisões, loucura não havia nada que cessasse a ambição (febre) pelo ouro. Gerações inteiras se sucederam na cata de riqueza, perdidas num abismo de ganância que superava a própria necessidade de viver. Instaurava-se um clima de absoluta intranquilidade e exploração; os impostos abusivos (Quinto); Casa de Fundição (1719); a revolta de Felipe dos Santos (1720) com a execução bárbara; falsificação do quinto do ouro; Chico Rei líder do povo negro: "tanto escravo trabalhando para não ter nada". Brancos e negros já cativos do ouro.

2°) A ÉPOCA DO DIAMANTE - SERRO DO FRIO

A coroa Lusitana declarou monopólio sobre a extração do diamante (1729), portanto houve muita atividade clandestina e

Page 10: Romanceiro da incofidencia

contrabando. Criou-se o imposto por captação e a intendência dos diamantes (1734). Arraial do Tejuco - limitou-se a área do garimpo. Arrendamento por braças;suspendeu-se a captação. O processo do contrato: famoso contratador João Fernandes e sua amante Chica da Silva. O casal exótico foi traído pelo Conde de Valadares, resultando o fim do império dos "donos" do Tejuco.

3°) A INCONFIDÊNCIA MINEIRATece-se um painel social, político, económico dos antecedentes da Inconfidência Mineira: influência das ideias Iluministas e da Independência dos E.U.A.; movimento mineiro contra a opressão, impulsionado - idealizado pelas elites da influência liberal; crescimento das pressões económicas através de impostos (Derrama) porque a Coroa Real não creditava na escassez do ouro.

Joaquim José da Silva Xavier, Tiradentes, um alferes militar do regimento dos dragões, de espírito vivo (empreendedor) inconformado com sua situação modesta, buscava fortuna e projeção social. Tentara formar riqueza na mineração e fracassara. Sabia da opressão política e económica sobre Minas Gerais, sobre o Brasil.Relacionou-se com José Álvares Maciel, recém chegado da Europa, com ideias liberais a fervilharem. Provavelmente Maciel teria sugerido plano inconfidente. Tiradentes, influenciado também por ideias dos intelectuais e elites de Vila Rica, passou a divulgar ideias contra a opressão, destacava o confronto entre a pobreza do povo e a opulência da terra. Portugal impedia a prosperidade da terra brasileira. O revolucionário conseguiu adesão do Tenente Coronel Francisco Paula Freire ao movimento revoltoso.Os inconfidentes marcaram o levante para o dia da Derrama - ("Tal Dia é o Balizado": código dos conjurados). A ideia de iniciar a revolta em MG foi de Tiradentes, o qual recebeu o apoio de Alvarenga Peixoto. A denúncia de Silvério dos Reis, aos ouvidos do Visconde de Barbacena, resultou a suspensão da Derrama e por consequência inviabilizou o movimento inconfidente. Barbacena enviou Joaquim Silvério ao Rio de Janeiro para delatar tudo ao Vice-Rei, D. Luís Vasconcelos Sousa. Prenderam Tiradentes no Rio de Janeiro e em Vila Rica iniciou-se a Devassa, processo que durou 3 anos. Muitos inconfidentes foram contemplados com o perdão régio; vários exilados; alguns condenados ao cárcere perpétuo; apenas Tiradentes recebeu a pena máxima por crime de Lesa-Majestade: enforcamento. O réu foi executado no Campo da Lampadósia a 21 de abril de 1792. Depois de enforcado, esquartejaram-no e seus pedaços foram exibidos aos olhos do povo. O traído serviu ao sacrifício exemplar para meter medo na população colonial.A dimensão de herói para Tiradentes só ocorreu com o advento da República, a qual o consagrou como Mártir da Liberdade (século XIX).

IX - PERFIL DO ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA

Há perspectivas universalistas no questíonamento das arbitrariedades -atrocidades do poder condenador. O poder autoritário, assassino, ganancioso garante a soberania do Estado através de mecanismos punitivos. A força bruta manda calar os que ousam protestar contra a opressão.A densidade universal focaliza sonhos de liberdade, autonomia política, traição, destinos, amores, cobiças, vida e morte. Defesa da luta revolucionária por liberdade, dignidade, justiça social (conspiração contra o poder). As Ideias de Independência motivadas por pensamentos iluministas e ideias libertárias. Nenhum brilho, nem do ouro ou do diamante, brilha mais do que o brilho da liberdade."A noção ou sentimento de transitoriedade de tudo é o fundamento da minha personalidade. Creio que isso explica tudo quanto tenho feito em Literatura, jornalismo, educação". (Declaração de Cecília Meireles). Percebe-se no Romanceiro da Inconfidência a temática da brevidade da vida, da fugacidade e ação voraz do tempo: o homem submisso à voracidade do tempo. A necessidade de resgatar a época histórica: valorização do sentimento nacionalista, das tradições, do passado de uma pátria. Existe na obra um lirismo equilibrado e sóbrio, o qual revela um domínio absoluto das expressões poéticas, para transmitir sentimentos de tristeza e de resignação frente ao desconcerto do mundo, à natureza humana, ao inevitável trágico destino, ao homem envolto pêlos acontecimentos históricos de natureza opressora.

Page 11: Romanceiro da incofidencia

X - SELEÇÃO DE POEMASFALA INICIAL

Não posso mover meus passos por esse atroz labirinto de esquecimento e cegueira em que amores e ódios vão:- pois sinto bater os sinos,percebo o roçar das rezas, vejo o arrepio da morte, à voz da condenação;- avisto a negra masmorra e a sombra do carcereiro que transita sobre angústias, com chaves no coração;- descubro as altas madeiras do excessivo cadafalso e, por muros e janelas, o pasmo da multidão.

Batem patas de cavalo. Suam soldados imóveis. Na frente dos oratórios, que vale mais a oração? Vale a voz do Brigadeiro sobre o povo e sobre a tropa, louvando a augusta Rainha,-já louca e fora do trono - na sua proclamação. O meio-dia confuso, O vinte-e-um de abril sinistro, que intrigas de ouro e de sonho houve em tua formação? Quem ordena, julga e pune? Quem é culpado e inocente?

Na mesma cova do tempo cai o castigo e o perdão. Morre a tinta das sentenças

e o sangue dos enforcados... - liras, espadas e cruzes pura cinza agora são.Na mesma cava, as palavras, o secreto pensamento, as comas e os machados, mentira e verdade estão.

Aqui, além, pelo mundo, ossos, nomes, letras, poeira... Onde, os rostos? onde. as almas? Nem os herdeiros recordamrastro nenhum pelo chão.

Ó grandes muros sem eco, presídios de sal e treva onde os homens padeceram sua vasta solidão... Não choraremos o que houve, nem os que chorar queremos:contra rocas de ignorância rebenta a nossa aflição.

Choramos esse mistério, esse esquema sobre-humano, a força, o jogo, o acidente da indizível conjunção que ordena vidas e mundos em pólos inexoráveis de ruína e de exaltação.

O silenciosas vertentes por onde se precipitam inexplicáveis torrentes, por eterna escuridão!

Page 12: Romanceiro da incofidencia

ROMANCE I OU DA REVELAÇÃO DO OURO

Lá vão pelo tempo adentro esses homens desgrenhados:duro vestido de couro enfrenta espinhos e galhos;em sua carta curtidanão pousa vespa ou moscardo;comem larvas, passarinhos, palmitos e papagaios;sua fome verdadeira é de rios muito largos, com franjas de prata e de ouro, de esmeraldas e topázios.

(Que efeito de ti, montanha, que a face escondes no espaço?)

Selvas, montanhas e riosestão transidos de pasmo.E que avançam, terra adentro,os homens alucinados. Levam guampas, levam cuias,levam flechas, levam arcos;atolam-se em lama negra,escorregam por penhascos,morrem de audácia e miséria,nesse temerário assalto,

ambiciosos e avarentos,abomináveis e bravos, para fortuitas riquezas,estendendo inquietos braços,- os olhos já sem clareza,- os lábios secos e amargos.

(Que efeito de vós, ó sombrasque leva de rastos?)

E, atrás deles, filhos, netos,seguindo os antepassados,vêm deixar a sua vida,Caindo nos mesmos laços,perdidos na mesma sede,teimosos, desesperados,por minas de prata e de ourocurtindo destino ingrato.Emaranhado seus nomespara a glória e o desbarato, quando, dos perigos de hoje.outros nascerem, mais altos. Que a sede de ouro é sem cura,e, por ela subjugados,os homens matam-se e morrem,ficam mortos, mas não fartos.

Page 13: Romanceiro da incofidencia

ROMANCE V OUDA DESTRUIÇÃO DO OURO POBRE

Dorme, meu menino, dorme, que o mundo vai se acabar. Vieram cavalos de fogo:são do Conde de Assumar. PeIo Arraial de Ouro Podre, começa o incêndio a lavrar.

O Conde jurou no Carmo não fazer mal a ninguém. (Vede agora pelo morro que palavra o conde tem! Casas, muros, gente aflita no fogo rolando vêm!)

Dentro do tempo há mais tempo, e, na roca da ambição, vai-se preparando

[a teia dos castigos que virão:há mais forcas, mais suplícios para os netos da traição.

Em baixo e em cima da terra, o ouro um dia vai secar. Toda vez que um justo grita, um carrasco o vem calar. Quem não presta, fica vivo;quem é bom, mandam matar.

Dorme, meu menino, dorme...Dorme e não queiras sonhar. Morreu Felipe dos Santos e, por castigo exemplar, depois de morto na forca, mandaram-no esquartejar!

Cavalos a que o prenderam,estremeciam de dó,por arrastarem seu corpoensanguentado, no pó.Há multidões para os vivos:porém quem morre vai só.

Dorme, meu menino, dorme, - que Deus te ensine a lição dos que sofrem neste mundo violência e perseguição. Morreu Felipe dos Santos outros, porém, nascerão.

Não há Conde, não há forca, não há coroa real !mais seguros que estas casas, que estas pedras do arraial, desse Arraial do Ouro Podre que foi de Mestre Pascoal.

Page 14: Romanceiro da incofidencia

ROMANCE VIII OU DOCHICO-REI

Tigre está rugindonas praias do mar. Vamos cavar a terra, povo, entrar pelas águas:o Rei pede mais ouro, sempre, para Portugal.

Muito longe, em Luanda,era bom viver.Bate a enxada comigo, povo,desce pelas grotas!-Lana banda em que corre o Congoeu também fui Rei.

Mais ouro, mais ouro,ainda vêm buscar.Dobra a cabeça, e espera, povo,que este cativeirojá nos escorrega dos ombros,já não pesa mais!

Olha a festa armada:é vermelha e azul.Canta e dança agora, meu povo,livres somos todos!Louvada a Virgem do Rosário,vestida de luz.

Page 15: Romanceiro da incofidencia

ROMANCE XIV OUDA CHICA DA SILVA

(Isso foi lá par a os lados do Tejuco, onde os diamantestransbordam do cascalho.)

Que andor se atavia naquela varanda? E a Chica da Silva:é a Chica-que-manda!

Cara cor da noite, olhos cor de estrela. Vem gente de longe para conhecê-la.

(Por baixo da cabeleira, tinha a cabeça rapada e até dizem que era feia.)Vestida de tisso,de raso e de holanda, -é a Chica da Silvaé a Chica-que-manda!

Escravas, mordomos seguem, como um rio, a dona do dono do Serro do Frio.

Gira a noite, gira,dourada ciranda da Chica da Silva, da Chica-que-manda.

E que tanque de assombro veleja o navio da dona do dono do Serro do Frio(Dez homens o tripulavam, para, que a negra entendesse como andam barcos nas águas.)

Nem Santa Efigênia, toda em festa acesa, brilha mais que a negrana sua riqueza.Contemplai, branquinhas, na sua varanda, a Chica da Silva, a Chica-que-manda!

(Coisa igual nunca se viu.Dom João Quinto, rei famoso,não teve mulher assim!)

Page 16: Romanceiro da incofidencia

ROMANCE XV OU DAS CISMAS DA CHICA DA SILVA

Na sua cama dourada, Chica da Silva não dorme.Pensa nas falas do Conde, pensa no ouro, e desta sorte aconselha a João Fernandes:- Hoje, todo o mundo corre, Senhor, atrás de riquezas:nem é doutro mal que sofreesse vosso falso amigo,esse Conde de má sorte.Quem sabe o que o traz tão longe?Quais serão as suas ordens?E o Contratador responde (imagino o que dizia):- O Conde de Valadares de mágoa e pesar definha, por ter uma família ausente E a nobre Casa em ruínas.

Aqueles folhelhos de ouroiluminaram-lhe a vista.Se é pobreza que sofre,que custa, dar-lhe alegria?Não se há de dizem que a um nobrenão deram socorro as Minas...

E diz a Chica da Silva ao ricaço do Tejuco:- Eu neste Conde não creio;com seus modos não me iluso;detrás de suas palavras,anda algum sentido oculto. Os homens, à luz do dia, olham bem, mas não vêm muito:dentro de quatro paredes, as mulheres sabem tudo. Deus me perdoe, mas o Conde vem cá por outros assuntos.

CENÁRIOEis a estrada, eisaponte, eis a montanha sobre a qual se recorta a igreja branca.

Eis o cavalo pela verde encosta. Eis a soleira, o pátio, e a mesma porta.

E a direção do olhar. E o espaço antigo para a forma do gesto e do vestido.

E o lugar da esperança. E a fonte. E a sombra.E a voz que já não fala, e se prolonga.

E eis a névoa que chega, envolve as ruas,move a ilusão de tempos e figuras.

A névoa que se adensa e vai formando Nublados reinos de saudade e pranto.

Page 17: Romanceiro da incofidencia

ROMANCE XXIV ou DA BANDEIRA DAINCONFIDÊNCIA

Através de grossas portas, sentem-se luzes acesas,-e há indagações minuciosasdentro das casas fronteiras:olhos colados aos vidros, mulheres e homens à espreita, caras disformes de insónia, vigiando as ações alheias. Pelas gretas das janelas, pelas frestas das esteiras,agudas setas atiram a inveja e a maledicência. Palavras conjeturadas oscilam no ar de surpresas, como peludas aranhas na gosma das teias densas, rápidas e envenenadas, engenhosas, sorrateiras.

Atrás de portas fechadas, à luz de velas acesas, brilham/ardas e casacas, unto com batinas pretas. E há finas mãos pensativas, entre galões, sedas, rendas, e há grossas mãos vigorosas, de unhas fortes, duras veias, e há mãos de púlpito e altares, de Evangelhos, cruzes, bênçãos. Uns são reinais, uns mazombos;e pensam de mil maneiras;mas citam Vergílio e Horácio, e refletem, e argumentam, falam de minas e impostos,

de lavras e de fazendas, de ministros e rainhas e das colónias inglesas.

Atrás de portas fechadas, à luz de velas acesas, uns sugerem, uns recusam, uns ouvem, uns aconselham. Se a derrama for lançada, há levante, com certeza. Corre-se por essas ruas? Corta-se alguma cabeça? Do cimo de alguma escada, profere-se alguma arenga? Que bandeira se desdobra? Com que figura ou legenda? Coisas da Maçonaria, do Paganismo ou da Igreja? A Santíssima Trindade? Um génio a quebrar algemas?

Vede como está contente, pelos horrores escritos, esse impostor caloteiro que em tremendos labirintos prende os homens indefesos e beija os pés aos ministros!

(No grande espelho do tempo, cada vida se retraía:os heróis, em seus degredos ou mortos em plena praça;- os delatores, cobrando o preço das suas cartas...)

Page 18: Romanceiro da incofidencia

ROMANCE XXXVII ou DE MAIO DE 1789

1° de Maio

Passou por aqui o Alferes? Sim, passou, mas já vai longe.Quem vem agora trás dele?Quem voa pelo horizonte?Dizem que é Joaquim Sitvério! (Maldito seja tal homem:tem vilania de Judas com arrogâncias de Conde.}

Mesmo na Semana Santa, esteve escolhendo os nomes dos que vão ser perseguidos. E venceu vales e montes no encalço de um condenado, para que de perto o aponte (e o Tempo, que é só memória, com sua sombra se assombre).

Já se sabe quem foi preso. Ninguém dorme. Todos falam, todos se benzem de medo. Passos da escolta nas ruas- que grandes passos, no Tempo! Mas o homem que vão levando é quase só pensamento:

- Minas da minha esperança, Minas do meu desespero! Agarraram-me os soldados, como qualquer bandoleiro. Vim trabalhar para todos, E abandonado me vejo. Todos tremem. Todos fogem. A quem dediquei meu zelo?

10 de Maio

Noite escura. Duro passos.

Por que as Minas estremecem com dolorosa ansiedade? - Foi preso um simples Alferes, que só tinha um bacamarte.

Fim de Maio

Andam as quatro comarcasem grande desassossego:vão soldados, vêm soldados;tremem os brancos e os negros. Seja levaram Gonzaga e Alvarenga, mais Toledo! Se a Cláudio mandam recadospara se esconda a tempo!

Page 19: Romanceiro da incofidencia

ROMANCE I, IIl ou DAS PALAVRAS AÉREAS

Ai, palavras, ai, palavras, que estranha potência, a vossa! Ai, palavras, ai, palavras, sois de vento, ides no vento, no vento que não retoma, e, em tão rápida existência, tudo se forma e transforma! Sois de vento, ides no vento, e quedais, com sorte nova!

Ai, palavras, ai, palavras, que estranha potência, a vossa! Todo o sentido da vida principia à vossa porta;o mel do amor cristaliza seu perfume em vossa rosa;sois o sonho e sois a audácia, calúnia, fúria, derrota...A liberdade das almas, ai! Com letras se elabora... E dos venenos humanossois a mais fina retorta:frágil, frágil como o vidro e mais que o aço poderosa! Reis, impérios, povos, tempos, pelo vosso impulso rodam...

Detrás de grossas paredes, de leve, quem vos desfolha? Pareceis de ténue seda, sem peso de ação nem de hora... - e estais no bico das penas, e estais na tinta que as molha, e estais nas mãos dos juizes, e sois barco para o exílio, e sois Moçambique e Angola!

Ai, palavras, ai, palavras, i dei s pé Ia estrada afora, erguendo asas muito incertas, entre verdade e galhofa, desejos do tempo inquieto, promessas que o mundo sopra...

Ai, palavras, ai, palavras, mirai-vos: que sois, agora?

-Acusações, sentinelas, bacamarte, algema, escolta;- o olho ardente da perfídia, a velar, na noite morta- a umidade dos presídios,- a solidão pavorosa- duro ferro de perguntas com sangue em cada resposta- e a sentença que caminha- e a esperança que não volta-e o coração que vascila-e o castigo que galopa

Ai, palavras, ai, palavras, que estranha potência a vossa! Perdão podíeis ter sido!- sois madeira que se corta,- sois vinte degraus de escada,- sois um pedaço de corda...- sois povo peIas janelas, cortejo, bandeira, tropa...

Ai, palavras, ai, palavras que estranha potência a vossa! Éreis um sopro de aragem...- sois um homem que se enforca!

Page 20: Romanceiro da incofidencia

ROMANCE LXIII ou DO SILÊNCIO DO ALFERES

"Vou trabalhar para todos!"- disse a voz do alto da estrada. Mas o eco andava tão longe! E os homens, que estavam perto, Não repercutiam nada...

"Bebamos, pois, ao futuro!"- exclamara na pousada. Todos beberam com ele, todos estavam de acordo. E agora não sabem nada.

"Levai bem pólvora e chumbo!" disse a voz aos da boiada. Mas o rosilho passava, e os homens riam-se dela, sem lhe responderem nada.

"Quem me segue? Que me querem? "- pergunta a voz espantada. Mas o traidor escondido e as sentinelas esquivas não lhe esclarecem mais nada.

Já se afastam os amigos, e já não tem mais amada. Leva uma dobla no bolso, leva uma estrela no sonho, e uma tristeza sem nada.

("Ah, se eu me apanhasse em Minas...")- suspira a voz fatigada.

Mas largo é o rio na serra! "Quem tivesse uma canoa... " (Não servira para nada...)

(Já vão subindo os algozes, com duros passos na escada. No bacamarte que empunha, há quatro dedos de chumbo, porém não dispara nada. Tanto tempo na masmorra! Tanta coisa mal contada! Os outros têm privilégios, amigos, ouro, parentes... Só ele é que não tem nada.

E vós sabeis, ó vilas, e tu bem sabes, estrada, quem galopava essa terra, quem servia, quem sofria, por quem não fazia nada!

Dizem que por sua língua anda a terra emaranhada... Pois quem quiser faça agora perguntas sobre perguntas, - que já não responde nada.Já lhe vão tirando a vida. Já tem a vida tirada. Agora é puro silêncio, repartido aos quatro ventos, já sem lembrança de nada.)

Page 21: Romanceiro da incofidencia

FALA AOS INCONFIDENTES MORTOS

Treva da noite, lanosa capa nos ombros curvos dos altos montes aglomerados... Agora, tudo jaz em silêncio:amor, inveja, ódio, inocência, no imenso tempo se estão lavando...

Grosso cascalho da humana vida... Negros orgulhos, ingénua audácia, e fingimentos (e covardias!)vão dando voltas no imenso tempo, - à água implacável do tempo imenso, rodando soltos, com sua rude miséria exposta...

Parada noite, suspensa em bruma:não, não se avistam os fundos leitos... Mas, no horizonte do que é memória da eternidade, referve o embate de antigas horas, de antigos fatos, de homens antigos.

E aqui ficamos todos contritos, a ouvir na névoa o desconforme, submerso curso dessa torrente do purgatório...

Quais os que tombam, em crime exaustos. quais os que sobrem, purificados?

XI - QUESTÕES OBJETIVAS

l) Todas as afirmativas referentes ao ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA, de Cecília Meireles estão correias, EXCETO:

a) Tomás António foi inconfidente ativo, convicto conforme no romance "um preso chamado Gonzaga".b) Os amores de Marília e Dirceu foram "ilusões da vida em flor", pois o antigo ouvidor se casou com outra noiva.c) Enfoque para o sofrimento de Marília, que se recusou a aceitar o fim de seu idílio amoroso com Gonzaga.d) Em maio, no exílio, o poeta Tomás António Gonzaga casou-se com dona Juliana de Mascarenhas.e) Por ocasião de sua prisão, os bens do poeta Dirceu foram sequestrados, por ordens da Coroa Portuguesa.

2) Em todas as opções há exemplo do autoritarismo da Metrópole frente ao Brasil Colónia, a partir da leitura do ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA, de Cecília Meireles, EXCETO em:

a) "- Acusações, sentinelas, bacamarte, algema, escolta:- o olho ardente da perfídia. a velar, na noite morta;- a umidade dos presídios,- a solidão pavorosa;- duro ferro de perguntas, com sangue em cada resposta;- e a sentença que caminha,- e a esperança que não volta,- e o coração que vacila,- e o castigo que galopa."

Page 22: Romanceiro da incofidencia

b) "Já vem o peso da morte, com seus rubros cadafalsos, com suas cordas potentes,com seus sinistros machados,com seus postes infamantes para os corpos em pedaços;já vem a Jurisprudência interpretar cada caso,- e o Reino está muito longe,- e há muito ouro no cascalho,- e a Justiça é mais severacom os homens mais desarmados."

c) "Ah, quem põe cadeiastambém nos meus braços? Quem minha alma assombra com tanto perigo? Em sonho rodeias Meus ocultos passos. Ouve a tua sombra o que, longe, digo?"

d) "Não creio que a alma padeça tanto quanto o corpo aberto, com chumbo e enxofre a correrem pelas chagas, nem consiga o inverno inventar mais dores do que os terrenos decretos que o trono augusto sustém."

e) "Eram muito mais os sócios:- a trempe tem muitas pernas... mas, por isto ou por aquilo, por estas razões e aquelas, agarraram-se, somente, os que foram indicados,- pois mais pode quem governa..."

3) Assinale a opção que aponta os pusilânimes, conforme se apresentam na obra ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA, de Cecília Meireles:

a) Inácio Pamplona e Padre Rolim.b) Alferes Vitoriano e Caixeiro Vicente.c) Joaquim Silvério e Carrasco Capitania.d) Testemunha falsa e Padre Rolim. !

e) Silvério dos Reis e Caixeiro Vicente.

4) Todos os fragmentos apontam para o ritual da morte do alferes Tiradentes, conforme se lê no ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA, de Cecília Meireles, EXCETO:

a) "E ver levantar-se o braço, e ver pular pelo espaço o negro Capitania!

"Nem por pensamento traías teu Rei..." Mas, na grande praça há um silencioso tumulto:

Page 23: Romanceiro da incofidencia

grito do remorso oculto, sentimento da desgraça...

Pára o tempo, de repente., Fica o dia diferente. E agora a carreta passa.”

b) "Já vai o mártir andando cercado da clerezia. Franjas, arreios dourados, clarins, cavalos, soldados, e uma carreta sombria,

Ah, quanto povo apinhado pêlos morros e janelas! Ouvidores e ministros Carregam perfis sinistros No alto de faustosas selas. c) "Era o clero, a nobreza, o povo e, entre aspersões e responsórios, estolas, reverências, velas, a oscilação dos incensórios. E cavalos de mantas pretas levando a vagos territórios um pequeno corpo sozinho, perdido em régios envoltórios."

d) "- agora estão vendo ao longe, de longe escutando o passo do alferes que vai à forca, levando ao peito o baraço, levando no pensamento caras, palavras e fatos:as promessas, as mentiras, línguas vis, amigos falsos, coronéis, contrabandistas, ermitões e potentados, estalagens, vozes, sombras, adeuses, rios, cavalos..."

e) 'Parecia um santode mãos amarradas, no meio de cruzes, bandeiras e espadas. - Se aquela sentença já se conhecia, por que retardarama sua agonia.(Não soube. Ninguém sabia.)"

5) Todas as opções apresentam características da obra de Cecília Meireles,ROMANCEIRO D AINCONFIDÊNCIA, EXCETO:

a) Mistura de subjetividade em reinterpretação histórica.b) Descrição de cenários da antiga Vila Rica.c) Indignação frente ao autoritarismo do poder da metrópole sobre a Colónia.

Page 24: Romanceiro da incofidencia

d) Excludência de uma avaliação crítica sobre a história que se reescreve.e) Defesa do direito ao pensamento libertário, e à dignidade humana.

6) Em todas as opções, os versos do ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA, deCecHia Meireles, expressam claramente a ideia de opressão política,EXCETO em:

a) "Lá vai para a serra,comentando fatos:Haverá derrama?Haverá levante?Já mandou recados,Conspira, organiza,anda em sobressalto."

b) "Dorme, meu menino, dorme- que Deus te ensine a liçãodos que sofrem neste mundoviolência e perseguição.Morreu Felipe dos Santos:outros, porém, nascerão."

c) "É por isso que se entreolhamcom duas pupilas de aço;que uns aos outros se destroçamcom seus facões e machados;companheiros e parentessão rivais e amigos falsos."

d) "(Agora são tempos de ouro.Os de sangue vêm depois.Vêm algemas, vêm sentenças,vêm cordas e cadafalsos,na era de noventa e dois)."

e) "... A que um dia fora aclamadaenvolta em vestes lampej antes,onde o que não fosse ouro e prataera de flores de brilhantes...A que de olhos tristes miravaPaisagens, multidões, semblantes,..."

7) Todas as estrofes do ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA, de CecíliaMeireles, identificam a mesma personagem da Inconfidência Mineira,EXCETO:

a) "E sua mulher tão bela;e sai mulher tão nobre,Bárbara - que ele diziaa sua Estrela do Norte, ,nem lhe dirigia a vidanem o salvara da morte."

b) "Inocente, culpado?Enganoso? Sincero?por muito que o confesse,

Page 25: Romanceiro da incofidencia

o amor não recuperoNo entanto, ó surda gente,daqui nem ouro quero"...c) "Era em maio, foi por maio,quando a ti, pobre pastor,te vieram cercar a casa,de prisão danto-te voz.Iguais corriam as fontes,como em dias de primor."

d) "- Pêlos modos, me paredeque lhe hão de fazer bem falta?Dizem que tinha um cavaloque Págasos se chamava.Não pisava neste mundo,mas nos planaltos da Arcádia."

e) "Escapaste aqui da forca,da forca e das línguas bravas;vê se te livras das febres,que se levantam nas vagas,e vão seguindo naviocom seus cintilantes miasmas..."

8) Todos os episódios relacionados nas opções podem ser lidos noROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA, de Cecília Meireles, EXCETO:

a) A morte de Felipe dos Santos, na forca, em 1720. Ele foi condenado peloConde de Assumar, porque organizou uma revolta contra o poder lusitano.

b) A trama da Inconfidência articulada por intelectuais, militares, religiosos(mozambos e reinóis) contra a opressão da Metrópole portuguesa, quesufocava a colónia com altíssimos impostos.

c) Ênfase para a loucura da Rainha Maria I, que assinou a condenação dosInconfidentes e a sentença de morte na forca para Joaquim José da SilvaXavier.

d) A execução sigilosa do Pé. Toledo, que por ser membro da Igreja, não foisubmetido ao sacrifício exemplar, em praça pública, e sim morto àsescondidas.

e) A liderança de Chico Rei que estimulava os negros a extraviar o ouro nascatas, para comprarem a liberdade.

9)

"Malditoesse ouro que faz escravos,esse ouro que faz algemas,que levanta densos murospara as grades nas cadeias,que arma nas praças as forcas,lavra as injustas sentenças,arrasta pêlos caminhosvítimas que se a esquartejam."

Page 26: Romanceiro da incofidencia

A melhor temática para os versos extraídos do ROMANCEIRO DAINCONFIDÊNCIA, de Cecüia Meireles esta na opção:

a) A força indomável da ambição que se alimenta de ouro e diamante, decoisas e de gente.b) A inútil defesa, a irremediável saudade, levando as vítimas da inveja e dafome de ouro e diamante.c) O efeito da cobiça, do desespero da maledicência daqueles que almejavama liberdade e a riqueza.d) O fracasso das inconfidências e dos inconfidentes traídos, amaldiçoadospela desgraça.e) A ambição e as injustiças dos cobiçosos, agindo em nome do ouro efazendo vítimas.

10) Há apenas uma opção INCORRETA quanto ao ROMANCEIRO DAINCONFIDÊNCIA de Cecília Meireles assinale-a:

a) As personagens poético-históricas apresentam-se tão estáticas como seestivessem realmente paradas no tempo remoto.b) Há recriação da fala/ pensamentos das personagens com o emprego dediálogos e monólogos.c) O ambiente social, político e económico de Minas Gerais, por ocasião daInconfidência Mineira, é resgatado na memória.d) Observam-se muitas realidades contraditórias expressas através deantíteses e paradoxos.e) Os vocativos, as vozes anónimas são constantemente utilizadas comorecursos expressivos.Pag 38

11) Em todos os fragmentos do ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA, de CecfliaMeireles, há vozes no passado a ecoarem no tempo, EXCETO:

a) "E diz o Vigário ao Poeta;"Escreva-me aquela letrado versinho de Verfílio..."E dá-lhe o papel e a pena.E diz o Poeta ao Vigário,com dramática prudência:"Tenha meus dedos cortados,antes que tal verso escrevam..."LIBERDADE, AINDA QUE TARDE."

b) "Tigre está rugindonas praias do mar...Hoje, os brancos também, meu povo,são tristes cativos!Virgem do Rosário, deixai-nosDescansar em paz."

c) "Ou fala? E apenaso nosso ouvido,na terra surdaque os homens pisam,já nada entendedo vosso longo,triste discurso,

Page 27: Romanceiro da incofidencia

- amáveis sombras."

d) "Vou para o Inferno!"- murmura."Já estou no Inverno!" "Nãoquero que o Diabo me veja!"...- clama.

e) "- Ordens são, que hoje recebo...Fala o Conde mui fingido:- Padece por vós meu zelo:de um lado, o dever de amigo,mas, de outro, a lealdade aoReino..."

12) Assinale a opção INCORRETA quanto à identificação dos inconfidentes,registrados por Cecïïia Meireles, no ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA.

a) "Sete pecados consigosorridente carregava.Se setenta e sete houvera,do mesmo modo os levara.Por escândalos de amores, Padre Oliveira Rolimsacerdote se ordenara.Só Deus sabia os limitesentre seu corpo e sua alma!”

b) "Com seus vários camaradas?E as cadeiras de cabiúna,que se viam nesta sala?E os seus brilhantes damascos, Alvarenga Peixotode ramagens encarnadas?Onde, as feras? Onde, os vinhos?Onde, as temerárias falas?"

c) "Foi trabalhar para todos...- e vede o que lhe acontece!Daqueles a quem servia, Joaquim José da Silva XavierJá nenhum mais o conhece.Quando a desgraça é profunda,que amigo se compadece?"

d) "Inocente, culpado?Enganoso? Sincero?Por muito que o confesse, Tomás António Gonzagao amor não recupero.No entanto, ó surda gente,Daqui nem ouro quero..."

e) "Que fugisse, que fugisse...- bem lhe dissera o embuçado! - Cláudio Manoel da Costaque não tardava a ser preso,que já estava condenado,que, os papéis, queimasse-os todos..."

Page 28: Romanceiro da incofidencia

Vede agora o resultado:mais do que preso, está morto,numa estante reclinado,e com o pescoço metidonum nó de atilho encarnado."

XII-RESPOSTAS

01-A 04-C 07-A 10-A 02-C 05-D 08-D 11-C 03-E 06-E 09-A 12-B

Maria Betânia Diniz Ferreira.